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Nessas vivências cotidianas, em um movimento de felizes descobertas, tive a
oportunidade de me aproximar da história das artes plásticas cearense, até então desconhecida
para mim. Surpreendi-me – de forma positiva e negativa -, com o curso paradoxal de muitas
trajetórias de nossos artistas que, gozando de certo prestígio no estrangeiro, quase não tinham
reconhecimento da crítica e do público local.
Esses percursos individuais, que pelas dificuldades e obstáculos encontrados, mais se
assemelhavam a sagas homéricas, me ofereciam, neste sentido, um quadro panorâmico das
realidades e condições que se impunham àqueles que desejavam viver de arte nesse Estado,
nas décadas passadas. Confesso que a visão desse conjunto não era lá muito boa.
O que pude perceber é que por muito tempo o Ceará apresentou um ambiente inóspito
para a pintura, desfavorável em termos estruturais e pictóricos para o florescimento de seus
talentos. A sorte é de que nessas terras os artistas possuem duas características principais as
quais o jornalista Jeovah Motta bem denota: a tenacidade e a energia (apud LEITE, 1949).
Portanto, contrariando a todas as determinações materiais e até climáticas – a questão da
representação da luz peculiar do Ceará sempre fora um problema para nossos pintores – surge
composições como: os abstratos enérgicos de Bandeira; os figurativos majestosos de
Raimundo Cela; as imagens delineadas a traço forte de Aldemir Martins e os bichos surreais
de Chico da Silva.
Assim, paralelo a estas experiências de cunho mais específico proporcionadas pela
bolsa, procurei contemplar, através do curso de disciplinas: Estética, Filosofia da Arte,
História da Arte - e leituras individuais, meu interesse pela área especial. Neste momento,
ainda que de forma introdutória, tentava estabelecer aproximações às perspectivas teóricas de
estudo da arte presentes; principalmente, na obra de Theodor Adorno, Pierre Bourdieu e
Norbert Elias. Resultantes deste exercício de interligação entre experiência de bolsista e
experiência acadêmica, os trabalhos finais das disciplinas remetiam-se constantemente a
temáticas da arte cearense. E um assunto em especial mostrava-se recorrente em minhas
articulações: a carreira artística peculiar de Chico da Silva.
Figura ambígua, polêmica, dona de um percurso bastante singular, Chico da Silva, em
meio a condições adversas – pobreza, analfabetismo, ausência de técnica aos moldes
acadêmicos- insere-se no campo artístico cearense projetando-se para o cenário nacional e