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Com a chegada da puberdade introduzem-se as mudanças que levam a vida sexual
infantil a sua configuração normal definitiva. Até esse momento, lembra Freud:
pulsão sexual era predominantemente auto-erótica; agora, encontra o objeto
sexual. Até ali, ela atuava partindo de pulsões e zonas erógenas distintas que,
independendo uma das outras, buscavam um certo tipo de prazer como alvo
sexual exclusivo. Agora, porém, surge um novo alvo sexual para cuja
consecução todas as pulsões parciais se conjugam, enquanto as zonas
erógenas subordinam-se ao primado da zona genital. Posto que o novo alvo
sexual atribui aos dois sexos funções muito diferentes, o desenvolvimento
sexual de ambos passa agora a divergir muito. O do homem é o mais
conseqüente e também o mais facilmente acessível a nossa compreensão,
enquanto o da mulher representa até mesmo uma espécie de involução. A
normalidade da vida sexual só é assegurada pela exata convergência das
duas correntes dirigidas ao objeto sexual e à meta sexual: a de ternura e a
sensual. A primeira destas comporta em si o que resta da primitiva
eflorescência infantil da sexualidade. É como a travessia de um túnel
perfurado desde ambas as extremidades.
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Freud lança um olhar para o modo como as zonas erógenas se encaixam “na nova
ordem”, destacando que sobre elas recai um papel importante na introdução na excitação
sexual:
o olho , talvez o ponto mais afastado do objeto sexual, é o que com
mais freqüência pode ser estimulado, na situação de cortejar um objeto, pela
qualidade peculiar cuja causa no objeto sexual costuma ser chamada de
‘beleza’. Daí se chamarem “atrativos” os méritos do objeto sexual. A essa
estimulação já se liga, por um lado, um prazer, e pelo outro ela tem como
conseqüência um aumento da excitação sexual ou a produção dela, caso
ainda esteja faltando. Se a isso vem somar-se a excitação de outra zona
erógena, por exemplo, a da mão que é tocada, o efeito é o mesmo: uma
sensação de prazer, de um lado, que logo se intensifica pelo prazer
proveniente das alterações preparatórias (da genitália), e, de outro, um
aumento da tensão sexual, que logo se converte no mais evidente desprazer
quando não lhe é permitido o acesso a um prazer ulterior. Talvez mais
transparente ainda seja um outro caso: por exemplo, quando se estimula por
contato, numa pessoa não excitada sexualmente, uma dada zona erógena,
digamos, a pele do seio de uma mulher. Esse contato logo provoca uma
sensação prazerosa, mas, ao mesmo tempo, presta-se como nenhum outro
para despertar uma excitação sexual que exige um aumento do prazer. O
problema está justamente em saber como é que o prazer vivenciado pode
despertar a necessidade de um prazer ainda maior.
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Perto do final da vida, efetuando uma crítica sobre si próprio, Freud não hesita em
afirmar que durante o seu percurso lhe escapou alguma coisa da feminilidade, "esse
continente negro". E dirige a Marie Bonaparte a pergunta que se tornou célebre: “A grande
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FREUD, Sigmund. Op. Cit. p. 213
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FREUD, Sigmund.. Op. Cit. p. 215-216