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Para os autores, a cidade compreende dois tipos de espaços: o construído, fechado,
privatizado – casas, lojas, fábricas, hospitais, escolas, bares – e o aberto e de uso
coletivo – ruas, becos, largos, praças, jardins, praias. O que se denomina vida
comunitária é um conjunto de desempenhos suportados por palcos que tenderão a ser
identificados de acordo com o enquadramento em um desses dois modelos. Tentam
demonstrar que os indivíduos e grupos se utilizam de recursos para se distinguir dos que
são de fora através de mecanismos sócio-culturais acionados quando se precisa abrir –
coletivizar – ou fechar – privatizar – o espaço.
O universo de estudo compreendeu um bairro do Rio de Janeiro eleito pelo governo para
sofrer uma renovação urbana em virtude da sua deterioração, dando lugar a estruturas e
modo de vida mais modernos. O suporte teórico englobou as representações coletivas de
Durkheim; e a metodologia incluiu observação, mapas, entrevistas, filmagens, fotos,
gravações (SANTOS & VOGEL, 1981).
Na parte do texto destinada aos primeiros contatos com o bairro e com a população, os
autores citam algumas definições de rua e sua relação com a casa. Assim, tem-se:
“(...) de imediato, separam-se a rua, espaço conotado pela externalidade e o
quintal que, não sendo casa, é, no entanto, da casa; que apesar de externo, não
é a aruá. Da rua não se vê o quintal e vice-versa. A casa, porém, olha
igualmente para a rua e para o quintal (...) da casa olha-se para a rua, que,
sendo pública, é de todos. A vista do quintal deve ser, em contrapartida, limitada
ao nosso quintal, pois a materialidade dos anteparos – muros, cercas vivas,
trepadeiras, etc – expressa o direito a uma relativa invisibilidade. Essas
fronteiras do respeito mútuo unem e separam ao mesmo tempo” (SANTOS &
VOGEL, 1981, p.49).
“O quintal enquanto extensão da casa, adquire, em primeiro lugar, um
significado de intimidade. O acesso a essa área só é possível literal e
metaforicamente através da casa e, portanto, a pessoas da casa. No quintal se
expõe uma dimensão da vida cotidiana que é recorrentemente escondida (...)”
(SANTOS & VOGEL, 1981, p.50).
Apesar desta citação, os autores complementam com o fato de que, em dias de festas e
reuniões, o quintal abre-se para pessoas que não pertencem ao grupo doméstico. Em
seguida, comentam:
“(...) a rua como domínio oposto ao da casa, tenderia a identificar-se com o
público, o formal, o visível e o masculino. A casa, como sua contrapartida,
estaria vinculada, em princípio, ao privado, ao informal, ao invisível e ao
feminino. Estes, no entanto, são apenas pólos de um eixo para compreensão do
universo social. Os dados da percepção distintiva do masculino/feminino, do
visível/invisível, do público/privado, do formal/informal, bem como dentro/fora,
são codificados diversamente, nas diferentes culturas. São significantes
privilegiados cuja combinação e significados variam contextualmente (...)”
(SANTOS & VOGEL, 1981, p.51).