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ARQUITETURA E PRIVACIDADE EM AMBIENTES DE
ATENÇÃO À SAÚDE
LUCIANA DE MEDEIROS VIANNA
Tese de Doutorado apresentada ao
Programa de Pós-graduação em Arquitetura,
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da
Universidade Federal do Rio de Janeiro,
como parte dos requisitos necessários à
obtenção do título de Doutor em Arquitetura.
Orientadora: Profª. Drª Ivani Bursztyn
Co-orientador: Prof. Dr. Mauro Santos
Rio de Janeiro
Março 2010
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II
ARQUITETURA E PRIVACIDADE EM AMBIENTES DE ATENÇÃO À SAÚDE
Luciana de Medeiros Vianna
Orientadora: Profª. Drª Ivani Bursztyn
Co-orientador: Prof. Dr. Mauro Santos
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de s-graduação em Arquitetura,
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da Universidade Federal do Rio de
Janeiro, como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor em
Arquitetura.
Aprovada por:
---------------------------------------------------------------------------
Profª. Drª. Ivani Bursztyn [Orientadora]
(PROARQ/FAU/UFRJ)
---------------------------------------------------------------------------
Prof. Dr. Mauro Santos [Co-orientador]
(PROARQ/FAU/UFRJ)
---------------------------------------------------------------------------
Profª. Drª. Giselle Arteiro Nielsen Azevedo
(PROARQ/FAU/UFRJ)
---------------------------------------------------------------------------
Prof. Dr. Luiz Carlos Toledo
(UERJ)
---------------------------------------------------------------------------
Profª. Drª Gleice Virgínia Azambuja Elali
(PPGAU/UFRN)
---------------------------------------------------------------------------
Prof. Dr. Luiz Fernando Rangel Tura
(FM/UFRJ)
Rio de Janeiro
Março 2010
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III
Vianna, Luciana de Medeiros.
M488 Arquitetura e privacidade em ambientes de atenção à saúde / Luciana de
Medeiros Vianna. Rio de Janeiro: UFRJ / FAU, 2010.
xi, 167 f.: il.; 30 cm.
Orientadora: Ivani Bursztyn.
Co-orientador: Mauro Santos.
Tese (doutorado) UFRJ / PROARQ / Programa de Pós-Graduação em
Arquitetura, 2010.
Referências bibliográficas: f. 147-153.
1. Arquitetura hospitalar. 2. Privacidade. 3. Representações sociais. 4.
Oncologia. I. Bursztyn, Ivani. II. Santos, Mauro. III. Universidade Federal do Rio
de Janeiro, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Programa de Pós-
Graduação em Arquitetura. IV. Título.
CDD 725.5028
IV
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus, pela saúde e pela vida.
À minha família, pelo amor que nos une e nos fortalece.
À minha orientadora, Ivani Bursztyn e ao meu co-orientador, Mauro Santos, pela amizade
construída ao longo desses anos e pela confiança depositada no meu trabalho, tanto em
relação ao tema desta tese, como aos estudos desenvolvidos no Grupo de Pesquisa e
Projeto Espaço Saúde.
Aos professores membros desta banca de doutoramento, agradeço pela presença e
pelas contribuições apontadas desde o exame de qualificação.
À professora Angela Arruda, pela atenção e delicadeza com que me recebeu nas suas
disciplinas no curso de Pós-graduação em Psicologia da UFRJ.
Aos meus eternos professores José Pinheiro e Gleice Elali, pela amizade, incentivo e
pelos ensinamentos na área de estudos pessoa-ambiente.
À arquiteta e amiga Maria Alice, responsável pela minha iniciação em Arquitetura
Hospitalar, agradeço pela amizade, confiança e oportunidades de trabalho.
À amiga Riane, praticamente uma irmã, agradeço pelo carinho, paciência e apoio
oferecido durante diversas etapas da nossa vida profissional e pessoal.
À equipe do Espaço Saúde, agradeço pelo auxílio na parte gráfica deste trabalho, pelos
momentos de descontração e pela amizade firmada.
À equipe da Secretaria do Proarq, especialmente Guia e Rita, agradeço pela atenção e
esclarecimentos prestados ao longo desses anos de doutorado.
Ao Dr. Maciel Matias e à equipe da Liga Norte Riograndense Contra o Câncer, pela
recepção atenciosa e pela permissão concedida para a realização da etapa de campo
desta pesquisa.
Aos pacientes, acompanhantes e funcionários das unidades de saúde da referida Rede,
agradeço pelos depoimentos prestados.
À coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES pela
concessão da bolsa de estudos.
V
ARQUITETURA E PRIVACIDADE EM AMBIENTES DE ATENÇÃO À SAÚDE
LUCIANA DE MEDEIROS VIANNA
Orientadora: Profª. Drª. Ivani Bursztyn
Co-orientador: Prof. Dr. Mauro Santos
Resumo da Tese de Doutorado apresentada ao Programa de
Pós-graduação em Arquitetura, Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, como
parte dos requisitos necessários à obtenção do título de Doutor
em Arquitetura.
A privacidade é uma condição própria do ser humano, entendida como necessidade e
direito, sempre relacionada aos aspectos psicológicos, ambientais e culturais de cada
indivíduo e sociedade. Nos ambientes de atenção à saúde, tem aparecido com
freqüência nos textos que abordam ética, infecção hospitalar e conforto, vinculada
também às características arquitetônicas do local estudado. No entanto, quando o foco é
a pesquisa em Arquitetura, pouco se sabe a respeito dessas relações no contexto
hospitalar brasileiro. Assim, o objetivo deste trabalho é compreender a relação existente
entre o espaço físico e a privacidade dos pacientes em três unidades de saúde
especializadas em oncologia da cidade de Natal, Rio Grande do Norte, Brasil. A
investigação foi baseada nas teorias de Altman sobre privacidade e nas de Moscovici
acerca das Representações Sociais. O estudo incluiu enfermarias e salas de
quimioterapia dos referidos estabelecimentos e contou com entrevistas e levantamentos
físicos dos locais mencionados. As entrevistas compreenderam um grupo de 20 pessoas,
composto por pacientes e acompanhantes e sua análise seguiu as proposições de Bardin
sobre análise de conteúdo. As categorias discutidas constituíram-se em: relações
interpessoais, presença do acompanhante, experiências anteriores e doença, todas
associadas à necessidade do indivíduo de compartilhar ou não o espaço físico e a
experiência de tratamento/hospitalização. As discussões mesclaram as categorias de
análise com detalhes de projeto ou fotografias dos ambientes. Os resultados apontaram
semelhanças quanto aos componentes arquitetônicos relacionados às condições de
privacidade e a importância de diferentes opções de arranjos espaciais no mesmo local.
A compreensão desses dados contribui para a realização de futuros projetos de
arquitetura não só em oncologia, mas em outras especialidades, bem como para a
realização de novas pesquisas na área.
Palavras-chaves: arquitetura hospitalar, privacidade, representações sociais, oncologia.
VI
ARCHITECTURE AND PRIVACY IN HEALTHCARE ENVIRONMENTS
LUCIANA DE MEDEIROS VIANNA
Advisor: Ivani Bursztyn, D.Sc.
Co-Advisor: Mauro Santos, D.Sc.
Abstract of the Doctoral Thesis submitted as partial
requirement of the degree in Doctor of Architecture in the
Architecture Post graduation Program, Faculty of Architecture
and Urbanism of Federal University of Rio de Janeiro.
The privacy is an own requirement of human being, understood as a right and need,
always related with physiologic, environmental and cultural aspects of each individual and
society. It is frequent in healthcare environments the approach about ethic, hospital
infection and comfort in publications linked with architectural characteristics. However,
when the focus of the research is architecture, there is no much evidence about theses
relationships in the Brazilian hospital context. Therefore, the aim of this work is to
understand what kind of relationship exist between the physical space and the privacy of
the patients in three health units specialized in oncology in Natal city, Rio Grande do
Norte State, Brazil. The investigation was based in theories of Altman of privacy, as well
as, theories of Moscovici about social representation. It was realized interviews and
physical surveys in chemotherapy rooms and wards of those health units. A group of 20
people, including patients and companions were interviewed and the analysis were
realized according to Bardin propositions. The categories discussed were consisted in:
interpersonal relationship, companion presence, previous experience and sick, all of them
associated with the need of individual to share or not your physical space, as well as, your
treatment experience and hospital stay. The discussions mixed analysis categories with
photographs and design details of the environments. The outcomes showed similarities
between the architectural components related with privacy conditions and the importance
of different options of spatial arrangements in the same place. At the end, it is important to
report the comprehension of these data and their contribution to the development of future
architecture projects in oncology and other specialities, as well as, its to realizing new
researches.
Keywords: healthcare design, privacy, social representation, oncology.
VII
SUMÁRIO
LISTA DE QUADROS ....................................................................................................................... IX
LISTA DE FIGURAS .......................................................................................................................... X
INTRODUÇÃO ................................................................................................................................... 1
CAPÍTULO I PRIVACIDADE, PESSOA, AMBIENTE ...................................................................... 8
1.1 - Privacidade: contexto e relação com estudos pessoa-ambiente ................................... 8
1.2 - O público e o privado na arquitetura ............................................................................... 16
CAPÍTULO II AMBIENTE HOSPITALAR, PRIVACIDADE E O PACIENTE ................................. 25
2.1 - Arquitetura e evolução dos espaços de atenção à saúde ............................................ 26
2.1.1 Espaço e doença ............................................................................................................ 26
2.1.2 Espaço e tecnologia: o hospital-máquina ....................................................................... 30
2.1.3 Espaço e terapia: repensando o hospital-máquina ........................................................ 35
2.1.4 Ideais pós-modernos ...................................................................................................... 37
2.2 - Humanização em saúde e tendências atuais de projeto ............................................... 48
2.2.1 Novos paradigmas de saúde e doença .......................................................................... 48
2.2.2 Nova configuração do espaço ........................................................................................ 49
2.3 - Privacidade no ambiente hospitalar e o cenário da oncologia ..................................... 56
2.3.1 Privacidade e hospitalização .......................................................................................... 56
2.3.2 Projeto e privacidade em quartos individuais e coletivos ............................................... 62
2.3.3 Breves notas sobre o câncer .......................................................................................... 66
2.3.4 O ambiente hospitalar e a oncologia .............................................................................. 69
CAPÍTULO III PLANEJAMENTO E REALIZAÇÃO DA PESQUISA ............................................. 80
3.1 – Trajetória metodológica ................................................................................................... 80
3.1.1 Estudo exploratório ......................................................................................................... 80
3.1.2 Universo, participantes, técnicas, procedimentos e instrumentos ................................. 83
3.2 – A Teoria das Representações Sociais ............................................................................ 88
3.3 – Apresentação dos resultados.......................................................................................... 93
3.3.1 Caracterização dos estabelecimentos assistenciais de saúde pesquisados ................. 93
3.3.2 Perfil dos participantes ................................................................................................... 99
3.4 - Discussão ......................................................................................................................... 105
3.4.1 Relações interpessoais ................................................................................................ 106
3.4.2 Presença do acompanhante ........................................................................................ 116
3.4.3 Experiências anteriores ................................................................................................ 120
3.4.4 Doença ......................................................................................................................... 122
3.4.5 Demais aspectos analisados ........................................................................................ 129
CAPÍTULO IV CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 139
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................................. 147
APÊNDICES ................................................................................................................................... 154
Apêndice 1 – Autorização do Comitê de Ética em Pesquisa .............................................. 154
Apêndice 2 – Primeira versão do roteiro de entrevistas para pacientes ........................... 156
VIII
Apêndice 3 – Versão aplicada do roteiro de entrevistas para pacientes ........................... 157
Apêndice 4 – Termo de consentimento livre e esclarecido (pacientes) ............................ 158
Apêndice 5 – O projeto de reforma do CECAN ..................................................................... 160
IX
LISTA DE QUADROS
Quadro 01: Componentes arquitetônicos x suporte psicossocial do edifício hospitalar. ................ 55
Quadro 02: Aspectos e componentes arquitetônicos característicos dos hospitais de câncer ...... 72
Quadro 03: Principais eixos do roteiro de entrevistas ..................................................................... 87
Quadro 04: Aspectos a serem observados no ambiente ................................................................ 88
Quadro 05: Perfil dos entrevistados da Policlínica ........................................................................ 100
Quadro 06: Perfil dos entrevistados do Hospital Luís Antônio ...................................................... 101
Quadro 07: Perfil dos entrevistados do Centro Avançado em Oncologia – CECAN .................... 103
Quadro 08: Dimensões e categorias extraídas das entrevistas ................................................... 105
Quadro 09: Entrevistados e a preferência pela interação constante ou reserva .......................... 106
Quadro 10: Entrevistados x entendimento da experiência hospitalar ........................................... 128
X
LISTA DE FIGURAS
Figura 01: Diferentes ângulos visuais no espaço arquitetônico ...................................................... 17
Figura 02: Hotel Dieu, Paris, França ............................................................................................... 27
Figura 03: Tipologia pavilhonar - Johns Hopkins Hospital, EUA. ................................................... 28
Figura 04 (esquerda): Vista externa enfermarias Johns Hopkins Hospital ..................................... 29
Figura 05 (direita): Vista interna das enfermarias do Johns Hopkins Hospital. .............................. 29
Figura 06: Enfermaria Nightingale ................................................................................................... 29
Figura 07: Pvto. tipo do Free University Hospital Center ................................................................ 30
Figura 08: Vista do Free University Hospital Center ....................................................................... 31
Figura 09: Fachada do Princess Margaret Hospital ........................................................................ 33
Figura 10: Modulor .......................................................................................................................... 39
Figura 11: Trechos do corte e planta baixa do City Hospital, Veneza ............................................ 40
Figura 12 (esquerda): Torre-cápsula, Nagakin, Tóquio. ................................................................. 42
Figura13 (direita): Prentiss Hospital for Woman and Psychiatric Institute, Chicago, EUA ............. 42
Figura 14: Planta baixa térreo do Centenial Medical Center .......................................................... 44
Figura 15: Vista externa do Centenial Medical Center.................................................................... 44
Figura 16 (esquerda): Atrium do Dartmouth-Hitchcock Medical Center ......................................... 45
Figura 17 (direita): Lobby do Mary Birch Hospital for Woman ........................................................ 45
Figura 18: Vista interna da recepção – Hospital Sarah, Belo Horizonte ......................................... 46
Figura 19: Vista externa – Hospital Sarah Rio de Janeiro .............................................................. 46
Figura 20: Vista externa da passarela do Hospital Moinhos de Vento/RS ..................................... 47
Figura 21: Vista interna de sala de estar do Hospital Moinhos de Vento/RS ................................. 47
Figura 22: Planta baixa com enfermarias de 3 leitos e quarto individual........................................ 63
Figura 23: Enfermarias com diferentes dimensões e posicionamento dos leitos ........................... 63
Figura 24: Planta baixa - enfermarias de um leito .......................................................................... 63
Figura 25 (esquerda): Planta baixa de quarto duplo do Klinikum Dessau ...................................... 64
Figura 26 (direita): Perspectiva relacionada ao ambiente descrito acima ...................................... 64
Figura 27: Vista externa do Klinikun Dessau, Alemanha. ............................................................... 64
Figura 28 (esquerda): Sala de meditação do Sletten Câncer Institute ........................................... 72
Figura 29 (direita): Sala de meditação do The Cancer Center, Maimonides Hospital .................... 72
Figura 30 (esquerda): Biblioteca do do Sletten Cancer Institute ..................................................... 73
Figura 31 (direita): Sala do acelerador linear do do Sletten Cancer Institute ................................. 73
Figura 32 (esquerda): Vista externa do North Arundel Hospital Tate Cancer Center ..................... 73
Figura 33 (direita): Sala de quimioterapia do mesmo hospital ........................................................ 73
Figura 34: Vista externa do Meadville Medical Center Oncology Wellness Institute ...................... 74
Figura 35: Sala de quimioterapia do Meadville Medical Center Oncology Wellness Institute ........ 74
Figura 36: Vista externa do UPCM Câncer Center ......................................................................... 75
Figuras 37 e 38: Vista interna da sala de quimioterapia do UPCM Câncer Center ....................... 75
Figura 39: Sala de quimioterapia do Detroit Medical Center, ......................................................... 75
XI
Figura 40: Sala de quimioterapia do Norris Cotton Cancer Center ................................................ 76
Figura 41: Sala de quimioterapia do Edwards Cancer Center, Cabell Huntington Hospital ........... 76
Figura 42: Sala de quimioterapia do Samaritan Lebanon Community Hospital ............................. 77
Figura 43: Sala de quimioterapia do Samaritan Lebanon Community Hospital ............................. 77
Figura 44 (esquerda): Circulação do setor de quimioterapia do Hospital Moinhos de Vento/RS, .. 78
Figura 45 (direita): Sala individual de quimioterapia do mesmo hospital ........................................ 78
Figura 46: Mapa com a localização das unidades de saúde na cidade de Natal ........................... 94
Figura 47: Implantação esquemática da Policlínica. ....................................................................... 95
Figura 48: Vista externa da Policlínica ............................................................................................ 96
Figura 49: Implantação esquemática do Hospital Luís Antônio. ..................................................... 97
Figura 50: Vista externa do Hospital Luís Antônio. ......................................................................... 97
Figura 51: Vista externa do CECAN................................................................................................ 98
Figura 52: Implantação esquemática do CECAN. .......................................................................... 99
Figura 53: Distribuição dos pacientes da Policlínica por enfermaria e por leito ........................... 100
Figura 54: Localização, dentro do setor de internação, das enfermarias dos entrevistados. ....... 101
Figuras 55 e 56: Distribuição dos pacientes do Luís Antônio por enfermaria e por leito .............. 102
Figura 57: Distribuição dos pacientes do Luís Antônio por enfermaria e por leito ........................ 102
Figuras 58 e 59: Distribuição dos pacientes do Luís Antônio por enfermaria e por leito .............. 103
Figuras 60 e 61: Distribuição dos pacientes do CECAN por salão de quimioterapia ................... 104
Figuras 62 e 63: Salão B de quimioterapia, SUS, cadeiras dispostas lado a lado....................... 108
Figuras 64 e 65: Salão A de quimioterapia, SUS ......................................................................... 108
Figura 66: Salão A de quimioterapia, SUS, com visualização dos leitos. Fonte:acervo próprio. . 109
Figuras 67 e 68: Salão de quimioterapia do convênio com cadeiras dispostas lado a lado ........ 109
Figuras 69 e 70: Setor de quimioterapia do convênio, apartamento 1 ......................................... 110
Figura 71: Salão A de quimioterapia, SUS ................................................................................... 111
Figuras 72 e 73: Enfermaria tipo da Policlínica. Visualização das divisórias .............................. 111
Figuras 74 e 75: Enfermaria Nossa Senhora de Fátima do Hosp. Luís Antônio .......................... 112
Figura 76 (esquerda): Armário padrão das enfermarias da Policlínica. ........................................ 113
Figura 77 (direita): Bancada padrão das enfermarias do Hosp. Luís Antônio .............................. 113
Figura 78: Poltrona do acompanhante das enfermarias da Policlínica......................................... 116
Figura 79 (esquerda): Bancos dispostos nos pátios internos do Hosp. Luís Antônio ................... 117
Figura 80 (direita): Cadeiras para os acompanhantes nas circulações do Hosp. Luís Antônio ... 117
Figura 81 (esquerda): Presença dos acompanhantes no salão A de quimioterapia do SUS ....... 118
Figura 82 (direita): Cadeiras para os acompanhantes no salão de quimioterapia do convênio ... 118
Figura 83: Layout/excesso de leitos em enfermaria do Hospital Luís Antônio ............................. 119
Figura 84: Pavimento de internação da Policlínica. ...................................................................... 131
Figura 85 (esquerda): Circulação do pavimento de internação da Policlínica .............................. 131
Figura 86 (direita): Sala de estar no pavimento de internação da Policlínica ............................... 131
Figura 87: Trecho do Hosp. Luís Antônio ressaltando localização de enfermarias pesquisadas 132
Figura 88 (esquerda): Circulação das enfermarias A, B, C, D e E do Hosp. Luís Antônio ........... 132
XII
Figura 89 (direita): Circulação das enfermarias N. S. Fátima e Etelvino Cunha .......................... 132
Figura 90: Trecho do Hosp. Luís Antônio ressaltando localização de enfermarias pesquisadas 133
Figura 91 (esquerda): Ligação entre prédio mais recente e mais antigo do Hosp. Luís Antônio . 133
Figura 92 (direita): Circulação das enfermarias de 1 a 7 do Hosp. Luís Antônio. ........................ 133
Figura 93: Trecho do ambulatório CECAN ................................................................................... 134
Figuras 94 e 95: Circulações de acesso aos salões de quimioterapia do SUS e do convênio .... 134
Figuras 96 e 97: Visualização da sala de espera geral do CECAN e seus jardins internos ........ 135
Figuras 98 e 99 (esquerda e meio): Interferência entre as portas da enfermaria ........................ 136
Figura 100 (direita): Visualização da enfermaria a partir da circulação ........................................ 136
Figura 101: Visualização de leitos através da porta na enfermaria Etelvino Cunha ..................... 136
Figura 102: Visualização do interior da enfermaria N. S. de Fátima ............................................ 136
Figura 103: Cadeiras dispostas de costas para as janelas do salão B de quimioterapia do SUS 137
Figura 104: Salão A de quimioterapia do SUS. ............................................................................. 137
1
INTRODUÇÃO
O espaço físico, natural ou construído, faz parte de nossas vidas desde que nascemos.
Acostumamo-nos a determinadas características dos ambientes que nos cercam
tamanho, cor, textura, iluminação, mobiliário, cheiro – e, em certos casos, nos adaptamos
a outras ou ajustamos o local às nossas necessidades. Os espaços e os usos que
fazemos deles expressam mensagens que muitas vezes não precisam estar
acompanhadas de palavras. Fechar ou abrir portas e janelas ou escolher locais mais
reservados para realizar determinadas atividades fazem parte de um repertório utilizado
constantemente por cada um de nós. Lidar com as questões do cotidiano inclui a
necessidade por privacidade em diferentes locais e circunstâncias ao longo da vida.
Nos ambientes de atenção à saúde, pois, esses fatores podem ocorrer de modo
semelhante, embora a possibilidade de escolha não seja uma realidade comumente
observada. A razão para tanto consiste na quantidade e diversidade de pessoas,
equipamentos e procedimentos necessários à prestação desses serviços, capazes de
aumentar os níveis de estresse, insegurança e insatisfação de pacientes e
acompanhantes. No entanto, nos últimos 30 anos, as inovações tecnológicas, os novos
paradigmas da Arquitetura e as discussões acerca dos processos saúde geraram
mudanças construtivas, operacionais e de conforto nessas instituições. Vê-se edifícios
concebidos segundo uma série de parâmetros técnicos, funcionais e de cuidado com o
paciente responsáveis por diferenciá-los dos antigos hospitais monocromáticos e
sombrios aos quais muitos de nós tivemos contato. Conceitos como os de “healing
environment”, supportive design e “humanização”, desenvolvidos de formas distintas
nas regiões nas quais são aplicados, passaram a fazer parte das políticas atuais de
atenção à saúde.
A disseminação desses conceitos permitiu uma série de desdobramentos das pesquisas
no campo da saúde, sendo utilizados a partir de diferentes olhares e abordagens
metodológicas. Nessa linha de pensamento, o cuidado com a privacidade dos pacientes
tem aparecido com freqüência nos textos que abordam ética, infecção hospitalar e
conforto. Se, por um lado, apontam para a necessidade de mudança de comportamento
por parte dos profissionais de saúde no que diz respeito ao comprometimento e invasão
de privacidade dos pacientes e familiares, por outro lado ressaltam a associação entre tal
conceito e as características arquitetônicas do hospital. Há que se destacar, portanto, que
essa relação irá se constituir no fio condutor deste trabalho.
2
a) Problematização, hipóteses e objetivos do trabalho
De uma maneira geral, as discussões acerca da privacidade no ambiente hospitalar estão
direcionadas aos setores de maior permanência do paciente, compostos pelas
enfermarias e pelas unidades de tratamento intensivo. Conforme apontam Thompson e
Goldin
1
(1975), o setor de internação esteve organizado, até o século XIX, de forma a
abrigar o maior número possível de doentes no mesmo local. Quartos individuais, quase
inexistentes, eram recomendados apenas aos pacientes com quadros infecciosos ou
àqueles que desejassem pagar elevados preços pelo alojamento exclusivo. Dessa forma,
esse foi o modelo de enfermaria comumente visualizado nos hospitais da Antiguidade, da
Idade Média e até mesmo nos estabelecimentos projetados no início do século XX.
Após a Segunda Guerra Mundial, a construção de hospitais em larga escala privilegiou
arranjos espaciais e números de leitos por enfermaria em função da capacidade de
supervisão do pessoal de enfermagem, uma vez que a eficácia do trabalho médico e a
funcionalidade do edifício eram pré-requisitos básicos nesse tipo de projeto. Quartos
individuais como única opção de tratamento oneravam os custos destinados à construção
e manutenção do estabelecimento em virtude do aumento de área construída, dos
percursos realizados pela equipe hospitalar e do número de funcionários para
desempenhar rotinas diárias. No que concerne às distâncias percorridas dentro do
hospital, tais considerações ainda permanecem nas discussões atuais sobre o projeto.
No quesito internação, principalmente a partir dos anos de 1990, as diferentes opções de
quartos e enfermarias tornaram-se presença marcante para atender as exigências do
mercado de prestação desses serviços.
Sendo os locais mais propícios ao comprometimento da privacidade, devido às próprias
condições com as quais o paciente tem que lidar para receber os cuidados necessários,
as internações tornaram-se fonte de múltiplos olhares dentro da instituição hospitalar e
cenários de uma gama variada de pesquisas
2
. Quando tratadas sob a ótica dos
profissionais de saúde, principalmente enfermeiros e psicólogos, as discussões
fundamentam-se nos conceitos de dignidade e confidencialidade do paciente durante a
experiência de hospitalização. Dentro de um vasto panorama metodológico, comparam-
se vantagens e desvantagens de quartos individuais e coletivos associando-as a grupos
1
Observe-se que a célebre obra “The hospital: a social and architectural history” dos referidos autores é,
antes da história do hospital, a história social e cultural das enfermarias hospitalares. Assim sendo, possui
diversos trechos sobre privacidade no setor de internação.
2
As pesquisas estão referenciadas ao longo dos capítulos que compõem este documento.
3
específicos de pacientes, infecção hospitalar e questões que dizem respeito à satisfação
do cliente com os serviços recebidos.
No que diz respeito aos estudos que mencionam a estrutura física do hospital como um
dos itens que afetam a privacidade dos pacientes, os profissionais de saúde ainda
apresentam destaque na quantidade das reflexões sobre o assunto, embora este não
seja seu objeto de estudo. Portanto, pode-se dizer que o exame desse contexto evidencia
uma lacuna no entendimento da tríade privacidade x hospital x ambiente físico e a
necessidade de investigações, no campo da Arquitetura, que se apropriem dessas
articulações
3
. Além disso, considerando a presença escassa de trabalhos envolvendo
outros setores do hospital, como urgência, emergência e unidades de diagnóstico e
terapia, pouco se sabe a respeito da influência desses ambientes nas condições de
privacidade dos usuários desses serviços. Sabendo dessas condições, cabe-nos indagar:
No que diz respeito à privacidade, que aspectos presentes na literatura
estrangeira se aplicam à realidade brasileira? O que seria específico do ambiente
hospitalar? Em que medida a privacidade torna-se importante em determinado
contexto hospitalar brasileiro? Que situações são mais propícias ao uso de
mecanismos para obter privacidade? Que mecanismos são esses? Envolvem que
elementos do espaço físico? Que detalhes da organização espacial do local em
questão interfere na privacidade?
A diversidade de aspectos implícitos nessas questões exige alguns esclarecimentos e a
adoção de critérios que funcionem de recorte para o que se pretende abarcar com este
trabalho. Em primeiro lugar, questiona-se aqui o que é visto na literatura nacional e
internacional sobre o assunto e o que é observado nas rotinas de pesquisas em
instituições brasileiras. Sabe-se que, no que diz respeito à Arquitetura, essas
divergências podem assumir grandes proporções quando se trata dos hospitais da rede
pública do nosso país. Mesmo com a criação de programas e políticas nacionais de
humanização
4
, vê-se, com freqüência, estruturas hospitalares pouco direcionadas às
necessidades e conforto dos pacientes e funcionários locais, necessitando de reformas
3
Quando o foco volta-se exclusivamente para a privacidade dentro da Arquitetura e para as pesquisas
realizadas no Brasil, é possível mencionar estudos que tratam dos ambientes residenciais e de trabalho,
como será mostrado adiante (ver, por exemplo, REIS e LAY, 2003).
4
Os movimentos de humanização tem como princípio geral a promoção da pessoa nas práticas de saúde por
meio do aprimoramento da relação profissional-paciente e hospital-comunidade. Nesses termos,
compreendem a estrutura física e organizacional das instituições hospitalares a partir de diferentes ações.
Ver humanização a partir de Howard (1975); Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar
(BRASIL, 2000) e HumanizaSUS (BRASIL, 2004).
4
ou ampliações, caracterizadas pelas precárias condições de acessibilidade e conforto
ambiental. Claro está que as razões para isto extrapolam os limites deste estudo e a
finalidade da nossa proposta, mas o registro dessa realidade é um dos pontos de alicerce
para as discussões a serem desenvolvidas.
Num segundo momento, questiona-se o que não pode ser generalizado, que a
privacidade possui forte influência cultural. Em coerência com os estudos realizados
sobre suas principais propriedades, funções e mecanismos, é válido mencionar que a
privacidade é um processo dinâmico, que muda conforme necessidades de cada pessoa,
cada grupo e cada circunstância. Desse modo, a busca por maiores ou menores níveis
de privacidade varia ao longo da vida, mas carrega nas suas entrelinhas hábitos e
costumes do dia a dia. Além disso, características ambientais, distâncias interpessoais e
outros conceitos como o de territorialidade ou aglomeração, incidem diretamente sobre a
busca por maiores ou menores níveis de privacidade (WESTIN, 1967; ALTMAN, 1975).
Assim, tendo em vista todas essas variações, mas ao mesmo tempo, uma série de
indicações baseadas na literatura e em experiências próprias de trabalho na área,
consideramos a hipótese de que a privacidade é valor do espaço físico e representativa
dentro do processo terapêutico.
Nesses termos, para a elaboração dos objetivos do trabalho, a opção pelo cenário da
oncologia concluiu um ciclo de decisões iniciais. Num primeiro momento, foi considerada
a expansão das pesquisas e projetos no setor frente às altas taxas de incidência de
câncer no Brasil e no mundo. Além disso, firmava-se o compromisso de aliar a pesquisa
de campo à obtenção de dados para subsidiar um projeto de uma unidade ambulatorial
voltada para a oncologia, na cidade de Natal/RN. Essa parceria também possibilitou a
incorporação de tipos distintos de edifícios e ambientes de tratamento, englobando
enfermarias e salas de quimioterapia. Isto posto, os objetivos desta pesquisa foram:
Objetivo Geral:
Analisar que tipo de relação existe entre a privacidade dos pacientes e o espaço
físico das salas de quimioterapia e enfermarias de hospitais de câncer.
Objetivos Específicos:
Discutir, com base na literatura específica, as influências do ambiente hospitalar
nas condições de privacidade;
5
Avaliar as condições arquitetônicas de unidades hospitalares escolhidas como
estudos de caso – da cidade de Natal, Rio Grande do Norte;
Compreender de que maneira a privacidade aparece nos discursos sobre o ato
de compartilhar os espaços de tratamento;
Compreender em que medida a privacidade torna-se um item agregado ao
processo de restabelecimento do paciente;
Discutir semelhanças e diferenças entre sugestões apontadas pela literatura
estrangeira e a realidade local;
Traçar diretrizes básicas que orientem futuros projetos para o setor.
b) Escolhas metodológicas
Para auxiliar a busca por um caminho trico-metodológico possível e coerente com a
Arquitetura, optou-se pela escolha de suporte teórico do campo de estudos pessoa-
ambiente e da Psicologia Social, além de alguns aspectos investigados em edificações
residenciais e de trabalho. Dessa forma, reunindo dados arquitetônicos de tais pesquisas
e conceitos utilizados em Psicologia e Enfermagem, foi possível traçar um caminho pelo
qual a pesquisa pudesse desenvolver-se.
De modo sucinto, a investigação foi baseada nas teorias de Altman (1975) sobre
privacidade e nas de Moscovici (2005) acerca das Representações Sociais. O universo
de pesquisa incluiu enfermarias e salas de quimioterapia de três estabelecimentos
assistenciais de saúde e contou com entrevistas e levantamentos físicos, todos
fundamentados no referencial teórico de diferentes campos do saber, acima
mencionados. As entrevistas compreenderam pacientes e acompanhantes e sua análise
seguiu as proposições de Bardin (1977) sobre análise de conteúdo. Até a definição total
da metodologia a ser empregada na realização da etapa empírica da tese, estudos
exploratórios e pré-testes foram responsáveis pelo processo de amadurecimento das
questões de pesquisa.
c) Justificativa e relevância da pesquisa
Os questionamentos envolvendo as decisões arquitetônicas podem, em maior ou menor
grau, incorporar aspectos relacionados aos estudos pessoa-ambiente e suas vertentes
culturais. Para efeito deste e de outros trabalhos baseados em tal forma de abordagem,
parte-se do princípio de que esse tipo de conhecimento é um grande aliado para nós,
6
arquitetos, principalmente porque nos fornece subsídios para um desenho mais próximo
de algumas realidades específicas.
Nos ambientes hospitalares, esses estudos embasam a procura por soluções de projeto
que auxiliem o restabelecimento do paciente e a satisfação de familiares e profissionais
de saúde. Dentre tantos fatores responsáveis pelo efeito atenuante do estresse durante a
experiência em hospitais, as condições de privacidade são mencionadas freqüentemente
nos estudos da área da saúde, mas seus elementos arquitetônicos têm aparecido de
forma insipiente. Assim, apostamos aqui no caráter inovador desta pesquisa e no desafio
enfrentado nas descobertas de campo.
A partir dessas considerações, torna-se interessante salientar que a tese elaborada é
fruto de antigos questionamentos acerca da relação pessoa-ambiente no contexto
hospitalar. O interesse pela área em questão teve início ainda na graduação em
Arquitetura, situação na qual tive contato com a disciplina de Psicologia Ambiental e com
o trabalho num escritório de Arquitetura Hospitalar na cidade de Natal. Com efeito, os
dois enfoques passaram a fazer parte dos meus objetivos profissionais, já que os estudos
comportamento-ambiente, envolvendo o edifício de atenção à saúde, tornaram-se a base
dos meus estudos durante um curso de especialização e, posteriormente, de Mestrado
em Psicologia (MEDEIROS, 2004).
Nesse sentido, com o intuito de dar continuidade a esses conhecimentos e aprofundá-los
nos aspectos que envolvem o projeto arquitetônico de estabelecimentos assistenciais de
saúde, a realização desta tese também teve o propósito de contribuir no desenvolvimento
do trabalho do Grupo de Pesquisa e Projeto Espaço Saúde/PROARQ/UFRJ, dedicado às
pesquisas em edifícios hospitalares desde o ano de 2001.
d) Estrutura da tese
Cada trecho deste trabalho expõe, o mais fielmente possível, o processo de
desenvolvimento das idéias que geraram as discussões aqui presentes. A divisão do
texto em quatro capítulos principais cumpre o papel de organizar os assuntos conforme
motes distintos de cada etapa percorrida, tanto teóricas como práticas. Ao final do
documento, encontram-se alguns apêndices que ilustram determinados quesitos da
pesquisa.
7
CAPÍTULO I:
Trata-se de um capítulo que introduz o tema privacidade, suas principais definições,
funções, propriedades e mecanismos, expondo autores e teorias voltadas para os
estudos pessoa-ambiente. Neste sentido, tamm estão incluídos nos subcapítulos as
relações entre os espaços públicos e privados no que diz respeito ao fato de serem de
uso individual ou coletivo. Discute-se idéias e conceitos que serão utilizados na etapa
empírica da pesquisa.
CAPÍTULO II:
O segundo capítulo refere-se às transformações sofridas pelos espaços hospitalares em
decorrência dos seguintes fatores: inovações tecnológicas, avanços da Medicina,
mudanças de paradigmas na Arquitetura, desenvolvimento do campo de estudos pessoa-
ambiente e surgimento de movimentos de práticas de saúde mais humanas. Dentro
desses aspectos, os hospitais especializados em oncologia ganham destaque, assim
como seus principais elementos voltados para o suporte ao paciente. Dentre tais
componentes, a privacidade ganha notoriedade e é associada aos ambientes de atenção
à saúde.
CAPÍTULO III:
Este capítulo é destinado à trajetória metodológica da pesquisa, aos seus resultados e
suas discussões. Estão incluídas as fases que antecederam a etapa de campo oficial,
tais como: estudo exploratório; universo e participantes da pesquisa; evolução dos
instrumentos de coleta e análise de dados e as teorias escolhidas para realizar tais
análises. Os resultados e discussões incluem caracterização dos locais da pesquisa,
perfil dos participantes e as reflexões sobre as categorias presentes nos depoimentos
dos entrevistados.
CAPÍTULO IV:
O último capítulo desta tese engloba as reflexões sobre a pesquisa como um todo,
contribuições, dificuldades para realização e possíveis recomendações para futuros
trabalhos na área.
8
CAPÍTULO I
PRIVACIDADE, PESSOA, AMBIENTE
Este capítulo apresenta um panorama geral acerca da privacidade, seus principais
conceitos e possibilidades de enfoques dentro de diferentes áreas do conhecimento.
Como capítulo introdutório, tem a função de expor teorias e mecanismos que relacionam
indivíduo e ambiente, partindo do pressuposto de que ambos estão em interação
constante. Assim, os conceitos de espaço pessoal e territorialidade, inerentes ao estudo
da privacidade, também recebem ênfase e estruturam as questões norteadoras para o
trabalho como um todo.
Considerando o ambiente físico como um dos elementos básicos no estudo da
privacidade, este capítulo também discute o público e o privado em arquitetura através de
reflexões que associam o uso do espaço aos aspectos culturais da sociedade. Casa,
intimidade, família, rua e vizinhança são universos com os quais os autores selecionados
realizam suas contribuições. Suas teorias e definições referem-se à forma de abordagem
que relaciona pessoa e ambiente e aparecem, em sua maioria, em pesquisas
desenvolvidas na área de arquitetura. A organização do texto tem o propósito de
identificar elementos que possam complementar o conjunto de idéias que fundamentarão
a pesquisa.
1.1 - Privacidade: contexto e relação com estudos pessoa-ambiente
O estudo da privacidade tem trazido importantes contribuições para diversas áreas do
saber, cada uma delas com suas definições, propostas e linguagem própria. De acordo
com Newell (1992), não há concordância sobre o fato de a privacidade ser uma condição
individual, uma qualidade do lugar, um processo, uma meta ou um comportamento
observável. Para os filósofos, a privacidade é uma parte necessária da existência
humana. Para os advogados, um direito básico, um direito de viver sem a interferência do
estado ou de outros quando julgar necessário. Para os sociólogos, importante para a
sustentação das relações humanas em geral e da intimidade. A autora também comenta
que algumas sociedades não possuem palavra correspondente à privacidade em sua
linguagem, como por exemplo os árabes, russos e japoneses. Nesses contextos, são
utilizados termos referentes às funções ou mecanismos da privacidade.
9
Moore (1984) discute a privacidade a partir de estudos exploratórios da área de
antropologia, com ênfase nos contextos social e cultural do comportamento humano.
Aborda a privacidade e direito privado em função da noção de intrusão/interferência dos
outros. Apesar da presença de comentários a respeito da sociedade da época, seu
conteúdo principal é formado por estudos de antigas civilizações, como forma de
compreender parte do comportamento atual. Em resumo, o elemento básico da violação
da privacidade é a intrusão: a necessidade de privacidade é a necessidade de proteger-
se contra intrusos. E é também uma necessidade socialmente criada, pois se não
estivéssemos dentro de uma sociedade, não precisaríamos de privacidade. Porém, o
desejo e a quantidade/qualidade de privacidade possuem variações conforme grupos.
A violação da privacidade ainda segundo o autor, intrusão do espaço pessoal pode
ocorrer em diversos níveis e de diversas formas. Porém, o direito à intrusão geralmente
se concentra entre membros de grupos com muita intimidade e afeto, com a justificativa
de proteção ou amor ao outro. Ainda assim, muitos de nós escolhemos nos resguardar
em algumas situações. Nas sociedades modernas, cujos meios de comunicação
democratizam a informação, o cuidado com a confidencialidade tem sido fator recorrente.
No tocante às necessidades fisiológicas e ao sexo, a maior parte das civilizações
requerem privacidade. O que varia é o tipo de isolamento ou limite empregado para
estabelecer o afastamento dos intrusos de acordo com as regras próprias de cada cultura
relacionadas ao status social e ao gênero.
Westin (2003) analisa a privacidade na sociedade moderna a partir das relações cidadão-
governo, patrão-empregado e consumidor-mercado. Segundo o autor, privacidade é o
direito que tem o indivíduo de determinar qual informação sobre si deve ser conhecida
pelos outros. Quando esse direito é reconhecido como lei ou convenção social pode ser
chamada de direito privado. Para examinar de que maneira as normas de privacidade
operam na sociedade é preciso observar três segmentos: político, sócio-econômico e
pessoal.
Conforme filosofia política de cada sociedade, existem aspectos que pertencem à esfera
pública e outros à esfera privada. Já no nível sócio-cultural, fatores ambientais, como alta
densidade nas grandes cidades ou problemas de descriminação racial, determinam a
necessidade por privacidade. Nesse caso, poder e status social também interferem na
procura por maior ou menor privacidade e equilíbrio entre o nível de privacidade desejada
e alcançada. Ironicamente, segundo comentários de Westin (2003), os mais ricos,
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famosos e politicamente poderosos possuem maior assédio da mídia, governo e políticos
rivais e, consequentemente, necessitam de maiores cuidados em relação à privacidade.
O nível pessoal de privacidade engloba as funções já definidas pelo autor em seu livro de
1967. Neste texto, Westin categoriza a privacidade segundo tipos - solidão, intimidade,
anonimato, reserva - e funções - liberação emocional, auto-avaliação, autonomia pessoal
e limitação e proteção da comunicação. No que diz respeito aos tipos, pode-se dizer que:
Solidão: a pessoa está sozinha e livre da observação dos outros (condição mais
externa)
Intimidade: quando um pequeno grupo se separa dos demais para ficar só (casais)
Anonimato: quando uma pessoa está num lugar público sem ser reconhecida
Reserva: a pessoa inclui uma barreira psicológica contra intrusão ou ignora os outros
mesmo na sua presença.
Já com relação às funções, Westin (1967) faz a seguinte descrição:
Autonomia pessoal: desejo de evitar manipulação, dominação ou exposição
Liberação emocional: relaxamento dos papéis desempenhados socialmente
Auto-avaliação: experiências de padrões de comportamento individuais (ex. rezar)
Limitação e proteção da informação: confidencialidade (individual ou entre grupo). Para
complementar, ressalta que a dimensão pessoal reflete necessidade e desejos
particulares e mudam constantemente de acordo com as circunstâncias e fases da vida.
Dentro do campo de estudos comportamento-ambiente, também chamada de Psicologia
Ambiental, os conceitos de espaço pessoal, distâncias interpessoais e territorialidade
estão intimamente ligados à noção de privacidade. Essa área do conhecimento se ocupa
em estudar a forma como o homem age sobre o seu ambiente e é influenciado por ele,
de modo a entender as relações psicológicas que se estabelecem entre as pessoas e
seus entornos. Caracteriza-se pela forma multidimensional ou multidisciplinar com que
estuda essa interrelação, porque aproxima os aspectos relevantes de uma variedade de
disciplinas cujos interesses se referem à compreensão do comportamento humano em
sua relação com ambientes específicos (ITTELSON et. al., 1974; PINHEIRO & ELALI,
2001).
11
Além disso, engloba diferentes métodos de investigação, que nas ciências do
comportamento a complexidade das questões pode exigir a adoção de várias estratégias
para a coleta de dados (SOMMER & SOMMER, 1997). Assim, a escolha de métodos e
técnicas a empregar, cada um com alcances e limites diferenciados, está baseada no
problema e nas circunstâncias nas quais o estudo se desenvolve. Segundo Aragonés e
Amérigo (1998), existem mais dois aspectos que são característicos da Psicologia
Ambiental. Primeiramente, uma abordagem holística, já que estuda o indivíduo dentro de
um contexto. Em segundo lugar, a discussão de temas da Psicologia Social, como por
exemplo, espaço pessoal e aglomeração.
Os anos de 1960 e 1970 marcaram o início de um período de grande aproximação entre
Arquitetura e Urbanismo e Psicologia (VALERA, 1996). Como será comentado adiante,
este período foi palco de questões derivadas da problemática urbana e habitacional que
geraram discussões de arquitetos, sociólogos e psicólogos na busca de alternativas.
Caracterizado por um contexto econômico favorável, o aumento da demanda por novas
construções e mudanças no planejamento urbano proporcionou a expansão das
ideologias humanistas. Nesse período, a Psicologia Ambiental era também chamada de
Psicologia Arquitetônica e ampliava sua área de interesse aos aspectos mais sociais
relacionados com a satisfação residencial e a qualidade de vida.
O trabalho em hospitais psiquiátricos também marcou o início dos estudos da interação
pessoa-ambiente. Um dos pioneiros dessa área, Robert Sommer, começou sua carreira
com o objetivo de criar espaços atrativos que permitissem o contato entre os usuários,
desencadeando uma série de questões que deram início ao conceito de espaço pessoal
(SOMMER, 1973). O termo reflete dois empregos: o primeiro refere-se à zona
emocionalmente carregada em torno de cada pessoa, uma área com limites invisíveis
que cerca nosso corpo e que é defendida contínua e ativamente. O segundo, refere-se
aos processos através dos quais as pessoas marcam e personalizam os espaços nos
quais e com os quais convivem, seja moradia, trabalho, instituições ou locais de lazer.
Conforme sevisto adiante, o espaço pessoal está intimamente ligado às condições de
privacidade.
Com base nos estudos de Hall (1977), proxemia é o termo criado para fazer referência às
observações e teorias inter-relacionadas, relativas ao uso que o homem faz do espaço
como elaboração especializada da cultura. De acordo com o autor, todos nós nos
relacionamos e nos comunicamos utilizando determinadas distâncias interpessoais. Entre
os animais, além da territorialidade, tais espaçamentos adquirem diversas funções, seja
12
controle da população, distanciamento por diferenciação entre as espécies ou expressão
de status. Entre nós, seres humanos, variam conforme a cultura e sistemas sensoriais:
visual, auditivo, olfativo, táctil.
Dentro da proxêmica, o espaço pode ter características fixas como por exemplo, uma
parede ; características semi-fixas mobiliário ou obstáculos e ainda ser informal,
que é o espaço ao redor do corpo e que determina as distâncias interpessoais, divididas
em íntima, pessoal, social e pública. A íntima ocorre em situação privada e a
comunicação envolve calor, toque, som e cheiro. A pessoal pode permitir trocas, mas as
pessoas estão um pouco mais distantes. A social ocorre no trabalho, em relações casuais
e impessoais. A pública ocorre em encontros formais ou em interações com pessoas de
status mais elevado. Hall sugere medidas em centímetros e em metros para classificar as
distâncias e algumas de suas peculiaridades em diferentes culturas.
Partindo deste princípio, a regulação do espaço ao redor das pessoas também pode ser
entendida dentro do estudo da territorialidade. Segundo Valera e Vidal (1998), este
conceito tem a ver com a defesa de uma área contra invasões e pode ou não envolver as
distâncias interpessoais. Para os animais, a função da territorialidade é a sobrevivência;
para nós, ajuda na organização social, na proteção do espaço físico e na identidade
pessoal e grupal.
Conforme ressaltam os autores, grande parte dos estudos sobre privacidade apresenta
relação com territorialidade, conceito considerado como elemento-chave para o
entendimento das interações sociais. Para regular as interações e controlar informações,
os principais aspectos relacionados a esta função são dominação e controle do território
e organização das atividades que nele ocorrerão. Para manter a identidade grupal, é
necessário considerar a apropriação do espaço com ocupação, personalização, apego
e defesa – e a sinalização.
Segundo Valera e Vidal (1998), existem três tipos de territórios na busca da privacidade:
primários, secundários e públicos, definição que será retomada na próxima seção. Os
territórios primários são aqueles de controle permanente e exclusivo, de grande
significado afetivo, como nossa casa, por exemplo. Os territórios secundários incluem os
de menor permanência e que geralmente devem ser compartilhados com pessoas ou
grupos, como salas de aula ou mesa habitual de um restaurante. Já os territórios
públicos, englobam os locais abertos, os quais todos tem o mesmo direito de ocupar.
13
Altman (1975) é a referência, ao lado de Westin (1967), mais citada nos trabalhos sobre
privacidade que consideram a relação pessoa-ambiente. Segundo o autor, existem oito
aspectos principais da privacidade:
É um processo de controle do contato social;
Envolve a relação entre privacidade desejada e alcançada, sendo o nível satisfatório de
privacidade o equilíbrio entre os dois tipos;
Processo dialético porque envolve restrição e procura da interação com os outros em
determinadas circunstâncias;
Processo de otimização porque envolve quanto acesso ao seu eu será permitido;
Regula duplamente a relação entre o eu e os outros;
Envolve diferentes unidades sociais: indivíduo, família e outros grupos;
Pode ser obtida através de mecanismos verbais, não-verbais ou ambientais;
Tem duas funções principais: controle da interação e estruturação da identidade
individual.
Todas as culturas têm mecanismos comportamentais para controlar a acessibilidade
social em relação aos outros. Para exemplificar essa afirmação, Altman cita alguns
estudos realizados em diferentes países a respeito de grupos sociais distintos. O conceito
de privacidade aparece nas pesquisas de diferentes áreas do saber: psicologia,
sociologia, antropologia, ciências políticas, direito e arquitetura. Entretanto, seus
significados variam, pois enquanto alguns autores enfatizam definições que envolvem
afastamento ou restrição da interação, outros trabalham com a idéia de controle - às
vezes restrição, às vezes procura.
A definição de privacidade proposta por Altman (ALTMAN, 1975, p.18) é: “controle
seletivo de acesso ao eu ou aos outros” e contém três propriedades centrais para sua
abordagem:
Envolve diferentes unidades sociais: indivíduo x indivíduo; indivíduo x grupo, etc.
Processo bidirecional: dos outros em relação a mim; de mim em relação aos outros
Processo ativo e dinâmico: muda através do tempo e das circunstâncias.
Sua análise conceitual está ancorada em quatro aspectos principais: unidades sociais,
caráter dialético, caráter otimizador e processo de regulação de limites. Assim, tem-se:
14
Unidades da privacidade: privacidade é um evento interpessoal que envolve relações
entre pessoas ou grupos: pessoa-pessoa, pessoa-grupo, grupo-pessoa e grupo-grupo.
Entre os quatro tipos propostos por Westin (1967), três tem a ver com o indivíduo e o
desejo de se separar dos outros, que são solidão, anonimato e reserva. Já a intimidade,
envolve o grupo como unidade social.
Natureza dialética: Altman comenta que existem situações nas quais as pessoas
querem ficar sozinhas e longe do contato com os outros e existem situações nas quais
os outros são buscados. Separações permanentes não são desejáveis e podem ser
prejudiciais. A natureza dialética está no constante equilíbrio entre forças opostas: estar
acessível ou inacessível.
Caráter otimizador: é característica da privacidade na qual existe um equilíbrio entre
quantidade e qualidade de interação ou restrição do contato. Obter privacidade em
níveis baixos ou em excesso causa insatisfação.
Processo de regulação de limites: envolve conceitos estudados no campo
comportamento-ambiente, como espaço pessoal zona invisível ao redor do corpo
para separação dos outros - e territorialidade - manutenção de um espaço para
defender-se ou preservar-se dos outros. Entram também os processos de privacidade
desejada e alcançada e o contato dos outros ou para os outros.
Altman (1975) explica que os mecanismos utilizados para atingir níveis desejados de
privacidade incluem os verbais, não-verbais - usando o corpo -, ambientais - espaço
pessoal e territorialidade - e culturalmente definidos por determinadas normas e práticas.
Às vezes um mecanismo pode substituir outro ou ser usado combinado, mudando de
acordo com circunstâncias e com nosso sistema de feedback.
Verbais: o principal veículo da interação é a comunicação. As palavras são usadas para
expressar estado pessoal e desejos. O comportamento verbal pode ser considerado a
partir de duas perspectivas: conteúdo e estrutura. O primeiro se refere ao que é dito e o
segundo às características da fala: estilo de linguagem, qualidade da voz, etc.
Não verbais: comportamentos não-verbais, popularmente chamados de linguagem
corporal”. Envolve o uso de diferentes partes do corpo para comunicar algo. Algumas
pesquisas enfatizam a postura do corpo, posição das pernas, gestos e movimentos com
a cabeça como sendo as principais linguagens.
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Ambientais: o ambiente físico possui relação com a privacidade, mas constitui-se no
mecanismo mais complexo, pois abrange roupas, espaço pessoal e características do
ambiente territórios, áreas e objetos. Idade, ocupação e estilo de roupa adotado
garantem um status no grupo e dizem para as pessoas quem você é, ajudam a definir
situações e papéis sociais.
A tese de Newell (1992) teve como objetivo descobrir em que situações os indivíduos
precisam de privacidade e de que maneira a obtém. Num segundo momento também
procurou responder: que aspectos do indivíduo e do ambiente mantêm relação entre si na
busca por privacidade? Para Newell, a privacidade significa uma condição temporária e
voluntária de separação do domínio público e envolve as dimensões visual, tátil, olfativa,
auditiva ou outros meios de obter informação. Está intimamente associada aos fatores
pessoais e ambientais, numa relação mútua e constante.
A investigação citada envolveu uma parte exploratório-qualitativa e outra quantitativa com
243 estudantes universitários, voluntários e alunos do curso de Psicologia de um estado
americano. Os dados coletados a partir dos questionários passaram por análises de
freqüência e de correlação através de programa de estatística. Os resultados alcançados
suportam a definição de privacidade como um reflexo da interação pessoa-ambiente.
Houve grandes diferenças entre homens e mulheres na necessidade por privacidade,
ações para obtê-la, situação e lugar. Grande parte das mulheres e dos homens se
baseou em situações anteriores para tomar decisões no presente, o que suporta a
hipótese de que as novas situações dependem das antecedentes. Dos 30 lugares
seguros mencionados, 26 foram citados pelas mulheres e apenas 4 pelos homens.
Houve relação com funções biológicas porque a privacidade sempre é desejada para
momentos românticos e sexuais. É uma condição voluntária e temporária porque
depende de vários aspectos também temporários e de caráter subjetivo.
Antes de finalizar esta seção, vale destacar algumas idéias propostas por Altman (1975).
Trata-se de aspectos territoriais que explicam de que maneira a distribuição espacial dos
ambientes e o layout podem ser utilizados para regular a privacidade. Seus exemplos
enfatizaram pesquisas realizadas por diversos autores com famílias de baixa renda
acerca da limitação de espaço dentro da moradia e a ausência de privacidade. O uso do
banheiro trazia constrangimentos quando estava próximo à cozinha, não havendo
privacidade visual, auditiva ou olfativa. Ao mesmo tempo, foi verificado que os membros
da família sempre dão muita importância ao quarto e à presença e localização de janelas,
cortinas e camas na busca por privacidade visual e acústica. Em outros contextos de
16
pesquisas, como nas moradias inglesas, a disposição dos ambientes e presença de
aberturas com relação à privacidade fizeram parte dos resultados.
1.2 - O público e o privado na arquitetura
A denominação dos espaços como público ou privado varia conforme perspectiva e
enfoque de cada autor, além, é claro, do tipo de discussão em pauta. É interessante
destacar que, conforme citado na seção anterior a respeito da territorialidade, Valera e
Vidal (1998) mencionam três tipos de territórios demarcados pelos indivíduos. Não se
trata, portanto, de espaços públicos ou privados, mas de locais eleitos, através de uma
série de fatores, como passíveis de controle e defesa.
Segundo Chermayeff e Alexander (1963), os espaços que nos rodeiam podem ser
divididos hierarquicamente dentro de seis domínios: urbano-público, que são as
avenidas, ruas e parques; urbano-semi-público, que constituem áreas públicas de
controle governamental e institucional, como escolas, hospitais e teatros; grupamento
público, que incluem serviços públicos com acesso restrito, como alguns edifícios
institucionais; grupamento privado, que permitem acesso público, mas são locais
privados, como recepções, circulações, lavanderias; familiar-privado, que envolve o
controle da família, como os espaços residenciais; e o individual, privado, que inclui um
cômodo específico. São formas de classificar os espaços que podem diferir ou não de
outros autores.
É o que acontece com Hertzberguer (1999), por exemplo. No tocante ao uso dos termos
público e privado para caracterizar espaços de uso coletivo ou individual, o autor mostra-
se contrário. A princípio, uma área pública seria acessível a todos a qualquer momento,
com sua manutenção dividida coletivamente; ao passo que privada seria aquela área
acessível a um pequeno grupo ou pessoa que tem a responsabilidade de mantê-la. No
entanto, essas definições não correspondem ao que é visualizado na realidade, pois
existem sutilezas de diversas ordens no uso dos espaços de diferentes contextos. As
demarcações de territórios, as sequências de espaços para expressar controle de grupos
específicos ou a presença de espaços intermediários ou intervalos para alcançar o
mesmo objetivo; aberturas e transparências podem ser citadas como importantes
variáveis a serem observadas na expressão do grau de acesso aos ambientes. Por isso,
um espaço considerado público pode ser privado e vice-versa.
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Hertzberguer (1999) promoveu um extenso trabalho sobre o uso que as pessoas fazem
dos espaços urbanos e arquitetônicos. Para expor suas idéias sobre a maneira pela qual
as pessoas se envolvem com seus ambientes e como o projeto arquitetônico interfere
nessa relação, insere imagens para falar em territorialidade, apropriação do espaço ou
domínio visual.
0
1
:
Diferentes ângulos visuais no espaço arquitetônico (HERTZBERGUER, 1999)
No período em que desenvolveram suas idéias, Chermayeff e Alexander (1963)
chamaram a atenção para o desenvolvimento das cidades e a falta de planejamento das
mesmas frente aos problemas ocasionados pelo veículo: poluição, tráfego e ruído. Os
autores partiram do princípio de que os projetos residenciais deveriam afastar o máximo
possível o mundo exterior caótico dos espaços domésticos. Para alcançar este fim, a
disposição dos cômodos da casa deveria ser planejada de forma a garantir os níveis de
privacidade desejados. Assim, à medida que se caminha pela casa, uma gradação ou
sequência de espaços do menos privado para o mais privado protegeria os cômodos
mais íntimos. Espaços internos, ajardinados e em contato com os cômodos da moradia,
também ajudariam seus habitantes na busca por privacidade acústica e visual.
Nas cidades brasileiras, o uso do espaço tem sido um debate constante, segundo
apontam Santos e Vogel (1981). Aprofundar o conhecimento a respeito das formas de
apropriação de determinados espaços de uso coletivo para entender melhor os
processos de desenvolvimento da cidade, foi o objetivo do trabalho por eles realizado.
Ressaltam que qualquer sociedade apresenta códigos culturais que viabilizam a leitura, a
apropriação e o aproveitamento dos lugares. As noções de localização, territorialidade e
do que lhes seja pertinente e adequado são constituídas através do recurso a estes
códigos.
18
Para os autores, a cidade compreende dois tipos de espaços: o construído, fechado,
privatizado – casas, lojas, fábricas, hospitais, escolas, bares – e o aberto e de uso
coletivo ruas, becos, largos, praças, jardins, praias. O que se denomina vida
comunitária é um conjunto de desempenhos suportados por palcos que tenderão a ser
identificados de acordo com o enquadramento em um desses dois modelos. Tentam
demonstrar que os indivíduos e grupos se utilizam de recursos para se distinguir dos que
são de fora através de mecanismos sócio-culturais acionados quando se precisa abrir
coletivizar – ou fechar – privatizar – o espaço.
O universo de estudo compreendeu um bairro do Rio de Janeiro eleito pelo governo para
sofrer uma renovação urbana em virtude da sua deterioração, dando lugar a estruturas e
modo de vida mais modernos. O suporte teórico englobou as representações coletivas de
Durkheim; e a metodologia incluiu observação, mapas, entrevistas, filmagens, fotos,
gravações (SANTOS & VOGEL, 1981).
Na parte do texto destinada aos primeiros contatos com o bairro e com a população, os
autores citam algumas definições de rua e sua relação com a casa. Assim, tem-se:
“(...) de imediato, separam-se a rua, espaço conotado pela externalidade e o
quintal que, não sendo casa, é, no entanto, da casa; que apesar de externo, não
é a aruá. Da rua não se o quintal e vice-versa. A casa, porém, olha
igualmente para a rua e para o quintal (...) da casa olha-se para a rua, que,
sendo pública, é de todos. A vista do quintal deve ser, em contrapartida, limitada
ao nosso quintal, pois a materialidade dos anteparos muros, cercas vivas,
trepadeiras, etc expressa o direito a uma relativa invisibilidade. Essas
fronteiras do respeito mútuo unem e separam ao mesmo tempo” (SANTOS &
VOGEL, 1981, p.49).
“O quintal enquanto extensão da casa, adquire, em primeiro lugar, um
significado de intimidade. O acesso a essa área só é possível literal e
metaforicamente através da casa e, portanto, a pessoas da casa. No quintal se
expõe uma dimensão da vida cotidiana que é recorrentemente escondida (...)”
(SANTOS & VOGEL, 1981, p.50).
Apesar desta citação, os autores complementam com o fato de que, em dias de festas e
reuniões, o quintal abre-se para pessoas que não pertencem ao grupo doméstico. Em
seguida, comentam:
“(...) a rua como domínio oposto ao da casa, tenderia a identificar-se com o
público, o formal, o visível e o masculino. A casa, como sua contrapartida,
estaria vinculada, em princípio, ao privado, ao informal, ao invisível e ao
feminino. Estes, no entanto, são apenas pólos de um eixo para compreensão do
universo social. Os dados da percepção distintiva do masculino/feminino, do
visível/invisível, do público/privado, do formal/informal, bem como dentro/fora,
são codificados diversamente, nas diferentes culturas. São significantes
privilegiados cuja combinação e significados variam contextualmente (...)”
(SANTOS & VOGEL, 1981, p.51).
19
As ruas podem ser consideradas como lugar de passagem, caminho que leva ao
trabalho, lazer ou culto. Estão associadas às calçadas, que por sua vez acompanham o
correr das casas, definindo um espaço intermediário que é o das pessoas na rua. As
calçadas pertencem às casas, mas não significa que sejam parte das mesmas enquanto
propriedade. Seu caráter público contrasta, por vezes, com as formas pelas quais são
utilizadas circunstancialmente com a presença de cadeiras, como prolongamento da
sala.
No que diz respeito às portas e janelas, os autores tecem os seguintes comentários:
“(...) as janelas tem vários significados. Podem servir para comunicar-se com a
rua sem que se tenha que abrir a porta para isso. (...) Das janelas, por exemplo,
as mães observam as crianças na calçada ou na rua (...) As crianças, os
assuntos da casa, os eventos cotidianos que afetam o lar são os temas das
conversas através da rua (...)” (SANTOS & VOGEL, 1981, p.53).
As venezianas das janelas também funcionam como meio de observação dita
“dissimulada”. A janela também pode servir como balcão no caso de um ambiente
comercial. A porta aberta ou entreaberta assemelha-se à janela, mas também se
diferencia desta. É lugar de sentar-se para ver a rua, de reunir-se para conversar, de
atender pessoas e é o limiar da casa. Na calçada, junto da porta, é que se colocam as
cadeiras ou se desenvolvem certas brincadeiras infantis. Pode-se mencionar aqui o
estudo da proxêmica de Hall (1977), apresentado na seção anterior, especificamente o
trecho que faz referência às características do espaço e aos tipos de distâncias.
Além das casas de família, as oficinas, garagens, armazéns e quitandas podem também
apropriar-se das calçadas. Segundo os autores: “(...) quanto mais portas se abrem para a
calçada, tanto mais completamente o espaço público é passível de apropriação pela casa
(...)” (SANTOS & VOGEL, 1981, p.54).
No discurso das pessoas que vivem no bairro, o mesmo aparece reiteradamente como
uma grande família, um lugar onde todos se conhecem e onde solidariedade. A
apropriação do espaço envolve também a constante observação e vigilância em relação
às pessoas e atividades estranhas aos moradores.
Em texto acerca da casa e da rua, Da Matta comenta que a sociedade se faz e refaz
através de um sistema complexo de relações sociais, vista e compreendida por meio de
duas categorias sociológicas: a casa e a rua.
20
“(...) quando, então, digo que casa e rua são categorias sociológicas para os
brasileiros, estou afirmando que, entre nós, estas palavras não designam
simplesmente espaços geográficos ou coisas físicas comensuráveis, mas acima
de tudo entidades morais, esferas de ação social, províncias éticas dotadas de
positividade, domínios culturais institucionalizados e, por causa disso, capazes
de despertar emoções, reações, leis, orações, músicas e imagens
esteticamente emolduradas e inspiradas” (DAMATTA, 1987, p. 15).
Assim, o espaço da casa pode aumentar ou diminuir de acordo com outra unidade que
surge como foco de oposição ou contraste: “(...) a casa define tanto um espaço íntimo e
privativo de uma pessoa (por exemplo: seu quarto de dormir), quanto um espaço máximo
e absolutamente público, como ocorre quando nos referimos ao Brasil como nossa casa”
(DAMATTA, 1987, p.16).
Além disso, o autor comenta que em casa podemos fazer coisas que são condenadas na
rua e fazer na rua o que é condenado em casa. O espaço se confunde com a própria
ordem social, de modo que, sem entender a sociedade e suas redes de relações sociais
e valores, não se pode interpretar como o espaço é concebido. O espaço não existe
como uma dimensão social independente e individualizada. Ele está interligado com
outros valores que servem para orientação geral. Tempo e espaço constroem e o
construídos pela sociedade. Em algumas sociedades os dois conceitos se confundem e
operam num sistema complexo, como nos casos em que determinados grupos marcam o
tempo por meio de atividades ou condições ecológicas. Às vezes a idéia de tempo muda
de acordo com o espaço ou o acontecimento. Ao invés de horas, minutos e segundos,
passa a ser um momento importante, revelando sua natureza social e capacidade de
variação.
Por outro lado, alguns espaços fazem mais do que separar contextos e configurar
atitudes. Eles contêm visões de mundo ou éticas que são particulares, como a casa e a
rua. Segundo DaMatta (1987), embora existam muitos brasileiros que falem a mesma
coisa em todos os lugares, o esperado é que a casa e a rua demarquem fortemente
mudanças de atitude, gestos, roupas, assuntos, papéis sociais e quadro de avaliação de
existência em todos os membros da sociedade. O simbolismo da casa pela casa é
extenso em nossa sociedade. Casamento, casadouro e casal são palavras que vem de
casa e que denotam um ato relacional, plenamente coerente com o espaço da morada e
da residência. Se a pessoa não está em casa, está privada de um tipo de espaço
marcado pela familiaridade e hospitalidade. Porém, a rua também pode ter locais
ocupados permanentemente por grupos sociais que ali vivem como se estivessem em
casa.
21
O autor também comenta que a rua tem espaços de moradia e a casa tem espaços ditos
“arruados”. Estes fazem a ponte entre o interior e o exterior como portas, janelas,
varandas, salas de visitas, cozinhas, entradas de serviço, dependência de empregados
e com o próprio desenho da casa, como por exemplo, os corredores. Estes podem ser
comparados à rua como espaço de relacionamento das demais peças ou ambientes da
casa. Segundo DaMatta, “(...) a rua está para a casa como o corredor está para todos os
cômodos da casa brasileira tradicional (...)” (p. 61).
Em linha semelhante de raciocínio, Hertzberguer (1999) afirma que a rua e espaços
adjacentes configuram-se importantes áreas de desenvolvimento de atividades coletivas,
principalmente quando as condições são propícias para tal. Quanto maior o envolvimento
dos usuários com o local, maiores as chances de cuidado e manutenção do mesmo.
Paralelamente a essas questões, o autor destaca que os corredores e circulações de
espaços internos podem ser comparadas às ruas, pois assumem essa função em
determinados lugares.
A casa e o conforto são discutidos por Rybczynsky (1996) a partir de uma aproximação
com os conceitos de lar e intimidade. O espaço doméstico, a vida familiar e seus hábitos
são comentados pelo autor através de um período compreendido entre Idade Média e
século XX. Durante muito tempo a preocupação com a privacidade não foi um fator
presente no cotidiano das pessoas, que as moradias abrigavam múltiplas funções
domésticas e de trabalho em ambientes com dimensões restritas. No século XVIII, os
espaços residenciais começaram a apresentar subdivisões internas, com alas destinadas
aos criados, à recepção de visitantes, e ao convívio privado, além da presença de
banheiros dentro dos cômodos.
De acordo com Rybczynsky (1996) havia diferenças entre as moradias dos países
europeus, mas de um modo geral, o aparecimento de tecnologias como fator
desencadeador de conforto foi possível no século XIX. Essa melhoria dos elementos
técnico-construtivos incluiu o uso de iluminação a gás, ventilação, vaso sanitário. no
século XX, com o Movimento Moderno em Arquitetura, as casas passaram a ser
projetadas conforme um padrão, dentro do qual, a partir do momento em que o arquiteto
identificasse a solução correta, cabia ao morador se adaptar a ela. Desse momento em
diante, conforme destaca o autor, cabe repensar se as definições unidimensionais e
técnicas de conforto, que ignoram a história, são satisfatórias. A idéia de conforto deveria
incluir conveniência, eficiência, domesticidade, bem-estar físico e privacidade.
22
O trabalho de Reis e Lay (2003) investiga as atitudes dos moradores de habitações
populares em relação à adequação da privacidade, a partir dos aspectos associados às
conexões visuais e funcionais. A conexão visual engloba, a partir de um determinado
ponto de referência, o número de espaços visualizados em relação ao número de
espaços da residência e o tipo de espaço visualizado. a conexão funcional, inclui os
tipos de espaços conectados, o grau de integração entre os espaços e tipos de espaços
topológicos, que seriam aqueles que guardam relações de posicionamento e não
métricas.
Segundo pesquisas realizadas anteriormente pelos autores, a privacidade é a segunda
prioridade dentre os aspectos a serem considerados na moradia, atrás somente do
tamanho da habitação. Além disso, poucos estudos no Brasil têm dado ênfase à
privacidade neste tipo de edificação. De um modo geral, para definir conceito, funções e
mecanismos da privacidade, os autores utilizam referencial teórico do campo de estudos
comportamento-ambiente, mais especificamente de Altman (1975). Para as análises
físicas, fazem uso de referências específicas ligadas aos softwares e cnicas criadas por
autores que investigam campos visuais e cálculos dos valores dos espaços mais
integrados e mais segregados. No tocante à privacidade visual, os autores investigam a
presença e localização de alguns componentes físicos: divisórias separando ambientes,
portas abrindo para determinados ambientes, sentido de abertura das portas e sua
localização no cômodo, acesso de ambientes por meio da passagem em outros.
Cruzando informações obtidas através de questionários com as análises físicas obtidas
pelos pesquisadores, os principais resultados apontam a satisfação da maior parte dos
moradores com a privacidade visual, mas existem diferenças significativas entre os tipos
de habitações. O número de moradores por residência não apareceu como parte
integrante das explicações de tais achados. As conexões visuais e funcionais estão
associadas diretamente aos níveis de privacidade no interior da moradia, o que,
conseqüentemente possui relação com o layout, presença e/ou localização de elementos
como escadas, portas e barreiras físicas.
A respeito das conclusões da pesquisa citada, pode-se questionar a ausência de relação
entre o número de moradores e a satisfação com a privacidade, já que o fato de ser visto
por mais ou menos pessoas estaria entre as preocupações de quem deseja afastar-se ou
não do domínio público. Quem vê, quem é visto e o que é visto também são categorias
fundamentais em outros estudos cujo objetivo fosse o aprofundamento das questões que
associam espaço físico e privacidade.
23
Numa pesquisa realizada em ambientes de trabalho, Kupritz (1998) identificou recursos
de design que pudessem auxiliar no controle da privacidade. A importância desse estudo
residiu no fato de que esse tipo de espaço caracteriza-se pela presença de ruído
constante, possibilidade de interrupções e distração provocada pelas pessoas e pelas
condições físicas do local. A autora utilizou conceitos da área comportamento-ambiente
entre os quais privacidade seria a regulação da interação entre o eu e os
outros/ambiente. Assim, rês temas são centrais: afastamento, controle de informação e
regulação da interação. No tocante ao espaço físico, faz reflexões sobre privacidade
visual e acústica, diretamente ligadas aos elementos arquitetônicos e arranjos espaciais.
A autora comparou escritórios de planos abertos com atividades distintas. A coleta de
dados incluiu observação, fotografias e aplicação de questionários e análise
compreendeu a correlação das informações obtidas. Os pesquisadores basearam-se
principalmente na questão: que determinado item de design é importante para a
realização de suas atividades de trabalho? Assim, corroborando com a literatura sobre o
assunto e no caso específico de escritórios, o número de compartimentos e portas, bem
como de paredes ou divisórias, associaram-se aos níveis de privacidade alcançados ou
não. Entre os resultados estão as seguintes sugestões: a presença de salas para
reuniões ou conversas reservadas; planos de trabalho compartimentados e fechados;
locais para guarda dos pertences dos funcionários.
Conforme Hertzberguer (1999), a visão é um importante sentido utilizado na percepção e
uso do espaço, sendo também um importante aspecto a ser considerado nos projetos
arquitetônicos. Segundo o autor:
“Devemos procurar sempre o equilíbrio entre visão e reclusão, ou seja, buscar
uma organização espacial que torne qualquer um, em qualquer situação, capaz
de escolher sua posição em relação aos outros. (...) O grau com que os lugares
são separados ou abertos em relação aos outros, e a maneira como isto é feito,
está nas mãos do arquiteto e, consequentemente, podemos regular o contato
desejado numa situação particular para afirmar a intimidade onde ela é
necessária e, ao mesmo tempo, não restringir excessivamente o alcance de
visão do outro(...)” (HERTZBERGUER, 1999, p. 202).
Em seus escritos, Hertzberguer tamm sugere a inclusão de diferentes alturas nos
espaços projetados, de modo a incluir diferentes ângulos de visão dentro dos mesmos.
Além disso, aponta os benefícios de trazer o mundo exterior para dentro do ambiente
através de aberturas e uso do vidro característica do Modernismo mas também o
inconveniente da vulnerabilidade provocada pela utilização em excesso desse artifício.
24
Tomando como base todos esses comentários, faz-se necessário considerar dois
aspectos: o primeiro seria a não obrigatoriedade de utilizar as diferenciações entre
espaço público ou privado ao longo deste trabalho, que o fato de se tratar de uma
questão de ponto de vista, os termos acima indicados não definiriam ou nomeariam com
a devida flexibilidade os espaços a serem contemplados nesta tese. Até o momento,
basta pensar nas possíveis relações entre os espaços, entre quem está fora e quem está
dentro e o que está fora e o que está dentro. O segundo aspecto refere-se aos itens que
estão presentes no espaço físico e que interferem nas condições de privacidade dos
usuários, como organização espacial, layout e materiais utilizados nos edifícios. Apesar
da busca por pistas arquitetônicas que funcionem de guias para o trabalho como um
todo, não há como esquecer a subjetividade presente nesse tipo de relação. Assim, serão
discutidos a seguir uma série de fatos que transformaram o espaço hospitalar e
justificaram o estudo da privacidade.
25
CAPÍTULO
II
AMBIENTE HOSPITALAR, PRIVACIDADE E O PACIENTE
Este capítulo trata da evolução dos espaços de atenção à saúde e do desenvolvimento
de uma arquitetura dita hospitalar, caracterizada por conceitos e dimensões próprias
deste campo do conhecimento. Não se trata de uma recapitulação histórica detalhada,
mas da seleção de pontos marcantes para o entendimento deste trabalho. Discute-se a
transição da arquitetura moderna para a pós-moderna, a substituição ou manutenção de
velhos conceitos e o aparecimento de novas preocupações na concepção de projetos,
como os significados transmitidos pelo edifício e sua inserção no contexto local. Dentro
desse cenário de mudanças, lazer, consumo e satisfação do cliente aparecem como
importantes fios condutores da arquitetura dos estabelecimentos assistenciais de saúde.
Paralelamente a esses fatores, também o desdobramento de uma série de pesquisas
envolvendo os usuários desses edifícios, fato que permite a inserção do tema
privacidade.
Discutidas as principais mudanças sofridas pelo hospital durante o século XX, destacam-
se aqui as questões psicológicas e sociais ligadas ao adoecimento e à hospitalização.
Objetiva-se incluir os novos paradigmas de saúde e doença e as discussões em torno de
movimentos de humanização nos parâmetros gerais utilizados na arquitetura pós-
moderna. O resultado na área das políticas de saúde é a presença de sistemas e
programas voltados para práticas mais humanas, com participação de profissionais e
pacientes no cotidiano dos serviços hospitalares. Em arquitetura, vê-se a concepção de
projetos compostos por atributos específicos para oferecer suporte psicossocial ao
paciente, incluindo a privacidade, objeto de estudo deste trabalho.
Em seguida, será dada ênfase à privacidade dentro dos ambientes de atenção à saúde,
utilizando-se pesquisas das áreas de Enfermagem, Psicologia e Arquitetura para expor o
assunto. Inserir o tema oncologia nas discussões sobre privacidade representa mais do
que indicar um dos recortes desta pesquisa. Significa apresentar algumas idéias sobre
câncer, suas modalidades de tratamento, dificuldades de enfrentamento da doença e
características dos hospitais voltados essa especialidade, considerando também as
relações estabelecidas com a busca pela privacidade.
26
2.1 - Arquitetura e evolução dos espaços de atenção à saúde
2.1.1 Espaço e doença
Os estabelecimentos destinados à cura dos enfermos, ou pelo menos à tentativa de cura
através dos mais variados rituais e crenças religiosas, existem desde a antiguidade.
Segundo trabalhos como os de Thompson e Goldin (1975) e de Antunes (1991), os
templos gregos tinham a função de abrigar doentes, necessitados e indigentes, servindo
também como uma espécie de hospedaria, daí o termo “hospital”. Religiosos e leigos
realizavam o atendimento dos pacientes buscando sua salvação eterna através de tais
obras de caridade.
A doença sempre teve um grande espaço na história dos hospitais e na história de
urbanização das cidades. Conforme discute Foucault (1979), até século XVIII o hospital
não era um meio de cura, nem a medicina uma prática hospitalar. Isso se tornou
possível a partir do momento em que os países europeus criaram políticas de intervenção
nas cidades e a medicina tornou-se social, urbana e coletiva, porque passava a ser, além
dos homens e dos organismos, a medicina do ar, da água, das condições de vida e do
meio. As medidas de intervenção basearam-se em cálculos de natalidade, mortalidade e
registro de epidemias até a vacinação coletiva e a normalização da prática e do saber
médicos. Além disso, avaliações dos lugares de acúmulo e amontoamento de tudo que
pudesse provocar doenças, como os cemitérios e hospitais, também fizeram parte
dessas políticas.
Nesse período, o hospital era um ambiente insalubre, de propagação de doenças e local
de separação/exclusão. O Hotel-Dieu (Figura 02), em Paris, pode ser citado como
importante representante da época, construído e ampliado com o objetivo de abrigar
necessitados e indigentes. Este edifício caracterizou-se pela existência de enfermarias
gigantescas, utilizadas por homens e mulheres, independente do tipo de doença, sem
iluminação e ventilação suficientes e com serviços de apoio/armazenagem de
suprimentos concentrados nos mesmos espaços. O Hotel-Dieu passou por vários
incêndios, sendo o pior deles no ano de 1772, quando grande parte de sua estrutura foi
destruída. Tal fato culminou na criação de um decreto para elaboração de projeto e
construção de um novo hospital para o local (THOMPSON & GOLDIN, 1975).
27
Figur
a 0
2
:
Hotel Dieu, Paris, França (http://wwwihm.nlm.nih.gov/ihm/images/A/08/429.jpg
Acessado em 06/03/2008 – Cortesia da National Library)
Na época, segundo Foucault (1979), acreditava-se que as teorias médicas não eram
suficientes para definir um programa hospitalar, nem que os planos arquitetônicos dariam
a fórmula do bom hospital. Na proporção que as cidades foram se medicalizando, alguns
profissionais mostraram-se comprometidos em estudar o espaço hospitalar em busca de
ações para anular seus efeitos nocivos.
O trabalho de organização desses espaços teve seu início quando estudiosos - não
arquitetos - realizaram viagens pela Europa a fim de observar e registrar sua
funcionalidade. Foram anotados: número de doentes, número de leitos, dimensões das
salas, taxa de mortalidade e de cura, relação entre fenômenos patológicos e espaciais e
todos os percursos/deslocamentos das roupas limpas e sujas pela edificação. Vale
ressaltar que essas observações eram fundamentalmente para efeitos da funcionalidade
do hospital e nada tinham a ver com a privacidade dos pacientes. Esse tipo de controle
da desordem foi baseado nas medidas tomadas nos hospitais marítimos e militares,
locais de grande concentração de pessoas e doenças, devido ao tráfico de mercadorias e
da própria atividade militar (FOUCAULT, 1979).
Dentre os modelos criados para substituir o Hotel-Dieu, o tipo pavilhão (Figuras 03, 04 e
05) foi o mais promissor. Ventilação natural e insolação representaram os princípios
centrais dessa tipologia, composta por blocos de enfermarias dispostos no terreno com
um distanciamento uniforme, conectados por uma circulação de acesso aos outros
pavilhões e serviços de apoio. Durante 100 anos foi a melhor saída encontrada para
garantir salubridade aos hospitais. Vale salientar que as enfermarias pavilhonares do
século XIX foram desenvolvidas a partir de um trabalho realizado por uma enfermeira
28
chamada Florence Nightingale. Conforme suas idéias, cada enfermaria deveria ser
composta por um número menor de leitos e ter seu próprio posto de enfermagem e
banheiros (Figura 06). Também foram previstos detalhes relativos ao funcionamento e
supervisão do setor de internação, dimensionamento dos ambientes, disposição do
mobiliário e elementos do projeto considerados benéficos para iluminação e ventilação
naturais (THOMPSON & GOLDIN, 1975; VERDERBER & FINE, 2000).
Figura 0
3
:
Tipologia pavilhonar - Johns Hopkins Hospital, EUA.
Autor do projeto da época: John S. Billings (THOMPSON & GOLDIN,1975).
29
Figura 0
4
(esquerda): Vista externa enfermarias Johns Hopkins Hospital (THOMPSON & GOLDIN, 1975).
Figura 05 (direita): Vista interna das enfermarias do Johns Hopkins Hospital.
(http://wwwihm.nlm.nih.gov/ihm/images/A/12/728.jpg Acessado em 06/03/2008 – Cortesia da National Library)
Figura 06
: Enfermaria Nightingale (THOMPSON & GOLDIN, 1975).
30
2.1.2 Espaço e tecnologia: o hospital-máquina
Após a Segunda Guerra Mundial, ocorreu uma expansão sem precedentes dos serviços
de atenção à saúde, com a emergência de novas áreas de especialização e a
incorporação de novas tecnologias médicas. O hospital cresceu em tamanho e em
complexidade (Figuras 07 e 08). Suas atividades foram agrupadas em “zonas” ou
departamentos, segundo a sua natureza funcional: internação; apoio ao diagnóstico e
tratamento; apoio técnico e logístico. Sob a égide da arquitetura moderna, a organização
dessas “zonas” passava a ser a chave do planejamento hospitalar, no sentido de produzir
um todo integrado e funcional.
Para fazer frente a esse novo desafio, planejadores e administradores copiaram modelos
organizacionais do mundo dos negócios: para a organização e administração do hospital
modernista, os conceitos fundamentais passaram a ser eficiência, racionalidade,
produtividade e conformidade (DILANI, 2000). Para esse mesmo autor, o hospital se
tornou um exemplo ilustrativo da eficiência industrial, de acordo com as condições e
formas de pensar da chamada “era da máquina”, caracterizada por uma racionalização
firmemente dirigida e uma conseqüente centralização das funções.
Figura 07
: Pvto. tipo do Free University Hospital Center - Berlin
Autores do projeto: Arthur Davis e Franz Mocken (VERDERBER & FINE, 2000).
31
Figura 0
8
: Vista do Free University Hospital Center (VERDERBER & FINE, 2000).
Foi nesse período que se cristalizou na atividade hospitalar a direção seguidora dos
princípios da produção em série. O conteúdo de trabalho foi reduzido tanto quanto
possível. Os suprimentos eram transportados desde os locais de sua produção até os
locais de consumo — ou seja, da zona de suporte (cozinha, lavanderia, central de
esterilização etc) para as zonas clinica e de internação (centro cirúrgico, apartamentos e
enfermarias, apoio ao diagnóstico etc) através de uma central de transporte, de onde
partiam macas e carrinhos acionados conforme a necessidade. O hospital, concentrado e
especializado, tornou-se uma unidade fabril e refletiu a evolução dos cuidados de saúde
na direção da tecnocracia e da despersonalização.
Os estabelecimentos hospitalares basearam-se em vários princípios utilizados pela
arquitetura da época. A planta livre, por exemplo, um dos cinco pontos defendidos por Le
Corbusier e expressão de grande parte de suas obras, passou a ser referência certa para
os projetos desses estabelecimentos. A dissociação entre a estrutura e as paredes da
edificação favorecia as freqüentes reformas e ampliações. Além disso, o fato de que a
arquitetura deveria resolver os aspectos práticos e econômicos da edificação, recusando
a ornamentação ou os detalhes desnecessários que encareceriam a construção e
empregando elementos padronizados, se encaixava muito bem no ramo médico-
hospitalar.
32
Nessa ênfase dada à padronização durante o Movimento Moderno, Le Cobusier (1994)
postula que:
“O padrão é uma necessidade de ordem trazida para o trabalho humano (...)
Todos os homens têm o mesmo organismo, mesmas funções. Todos os homens
têm as mesmas necessidades (...) Estabelecer um padrão, é esgotar todas as
possibilidades práticas e razoáveis, deduzir um tipo reconhecido conforme as
funções, com rendimento máximo, com emprego mínimo de meios, mão-de-obra
e matéria (...)” (LE CORBUSIER, 1994, p. 89).
Segundo Argan (2004), a arquitetura moderna apropriou-se dos meios e dos processos
produtivos da indústria e concebeu o projeto segundo um standard capaz de resolver
exigências práticas na esfera social. Assim, o standard alcançou a máxima difusão, não
apenas nas formas arquitetônicas, mas em todas as formas do mobiliário e dos utensílios
e assumiu como sua a condição de espaço o espaço em que se explica a função social
nos momentos de trabalho, moradia, etc.
“O standard, de fato, não é um tipo de forma, mas de objeto: utensílio, máquina,
móvel, casa e, se quiser, cidade. E como tal toma o lugar que tinha o módulo no
processo de projetação clássica: a ponto de se poder afirmar que a grande
descoberta da arquitetura moderna é a substituição do módulo-medida pelo
módulo-objeto. É este é o ponto de partida para novos processos operativos, de
uma nova avaliação da função edílica, de uma nova (mas a posteriori)
concepção do espaço, e também, nem é preciso dizer, da industrialização dos
processos construtivos“ (ARGAN, 2004, p.100).
Nesse contexto, apesar dos dois autores anteriormente citados não estarem se referindo
a uma categoria específica de edificação, mas à arquitetura de um modo geral, é possível
que se faça algumas considerações. De fato, com o incentivo ao objeto padrão ou ao
standard, o hospital sofreu inúmeras modificações, tanto no que diz respeito ao projeto
como em relação à construção propriamente dita. Em primeiro lugar, para que o hospital
fosse projetado e construído com maior rapidez e economia de meios, foi necessário
estudar um dimensionamento “ideal” para todos os seus ambientes. Tal exercício foi
realizado com base na estrutura, no mobiliário e equipamentos típicos desse ramo de
atividade, gerando medidas consideradas “padrão”. Em segundo lugar, dentro da ótica da
arquitetura hospitalar da época, as peças fundamentais para o bom funcionamento do
hospital eram: a máxima eficiência do staff e a organização do espaço para acomodar
rotinas e máquinas. Daí o uso dos padrões.
O estilo internacional, que predominava na arquitetura moderna desde os anos 1930,
revelou-se como perfeita expressão arquitetônica da medicina de alta tecnologia e foi
adotado pela corrente hegemônica da arquitetura hospitalar do período (VERDERBER &
FINE, 2000). No processo de subordinação da estética à funcionalidade, o estilo
33
exacerbou a padronização de formas e materiais visando a fabricação e a construção
(Figura 09). Consolidou-se, então, o processo de “tipificação na arquitetura”: a repetição
de unidades espaciais, como casa-tipo ou pavimento-tipo e a produção em série de
elementos arquitetônicos e construtivos - esquadrias, revestimentos, coberturas.
Figura 0
9
:
Fachada do Princess Margaret Hospital, Inglaterra
Autores do projeto: Powell, Moya, Llewelyn-Davies (VERDERBER & FINE, 2000).
Em suma, a arquitetura do estilo internacional adotava uma modulação das dimensões
espaciais, estruturais, e de mobiliário. No interior dos edifícios, predomina a falta de
ornamentação e cores e seguia-se um modelo ergonômico padronizado. Os tetos planos,
os volumes monolíticos, a estrutura modular em concreto e aço com grandes vãos de
vidros nas fachadas definiam, em conjunto, o exterior dos edifícios. Essas soluções foram
universalizadas, difundindo-se o estilo internacional como de aplicação extensiva a
distintas latitudes (FRAMPTON, 2000).
A unificação dessas idéias a partir da criação de políticas e programas de saúde que
regularizassem a construção e reforma desses estabelecimentos gerou, tanto nos
Estados Unidos como na maior parte dos países europeus, a multiplicação de edifícios
praticamente idênticos. O objetivo desses programas junto a iniciativas dos ministérios da
saúde de cada país, era o de criar uma receita de departamentos estandardizados que
poderiam ser adotados pelas autoridades regionais de acordo com a sua demanda, fosse
para ampliar um edifício existente, fosse para construir um novo hospital. A intenção
também era economizar tempo, espaço e dinheiro (MIQUELIN, 1992).
Pode-se dizer, inclusive, que tais programas e a elaboração de documentos contendo
uma série de conceitos e regras lógicas recomendadas para articular as três grandes
34
zonas ou os diversos setores do hospital, funcionaram como uma primeira versão de
normas e planos diretores atuais. Esses acontecimentos também marcaram a evolução
de uma arquitetura dita ‘hospitalar’.
No Brasil, o primeiro documento que representou uma medida disciplinadora na
construção desses edifícios surgiu nos anos de 1970, mais especificamente em 1974,
ocasião em que o governo se propunha a financiar uma grande expansão da rede
hospitalar pública e privada. Foram chamadas de Normas de Construção e Instalação do
Hospital Geral e, em seguida, Portaria nº 400. Durante esse período, tais normas
sofreram diversas críticas quanto aos problemas não previstos no documento e quanto
aos modelos de hospital que eram dados como exemplos. Muitos estabelecimentos
tiveram suas construções baseadas nesses modelos, como uma cópia dos projetos
apresentados no instrumento normativo (BRASIL, 1974; BARRETO, 2002).
Em 1994, outra norma foi lançada pelo Ministério da Saúde, em que não existia mais o
“hospital” como tipologia definida, nem a presença de módulos como critério de projeto,
mas o estabelecimento assistencial de saúde com atribuições associadas às atividades a
serem desenvolvidas a Portaria 1884. Uma metodologia de planejamento da
instituição foi enfatizada com base nas demandas por serviços assistenciais em cada
área de cobertura, município ou perfil epidemiológico de determinada região (BRASIL,
1994). Considerando a necessidade constante de atualização dessas normas, surgem
novas resoluções que substituem as anteriores e passam a entrar em vigor na área de
infra-estrutura física em saúde. Assim, para o planejamento, programação, elaboração e
avaliação de projetos físicos, a Resolução de n. º 50, complementada em alguns quesitos
pela Resolução de n. º 307, constitui-se atualmente num dos regulamentos essenciais
para o trabalho do arquiteto (BRASIL, 2002).
Nessas normas mais recentes, a privacidade dos pacientes é mencionada no capítulo
referente ao dimensionamento, quantificação e instalações prediais dos ambientes,
dentro da programação físico-funcional dos estabelecimentos assistenciais de saúde.
Quanto ao atendimento imediato, nas salas coletivas de observação, está destacado que
apenas admite-se sala única para homens e mulheres se houver dispositivo de vedação
que permita a privacidade dos pacientes. O mesmo está escrito nos itens a respeito dos
boxes em salas coletivas de observação das UTIs.
35
2.1.3 Espaço e terapia: repensando o hospital-máquina
Também chamados de “máquinas de curar”, esses hospitais passaram a ser cada vez
mais especializados e projetados para assegurar eficiência das atividades
desempenhadas pelo staff. Se, por um lado, a corrida pela tecnologia permitiu o
desenvolvimento do setor, por outro, provocou questionamentos a respeito da
desvalorização das necessidades dos pacientes frente ao excesso de padronização e
aos equipamentos do hospital. As transformações observadas nos ambientes de atenção
à saúde estiveram pautadas em três fatores principais: na necessidade de encontrar um
equilíbrio entre quantidade, custos e qualidade dos serviços prestados; no interesse
surgido pela relação ambiente x usuários e pelo estudo das reações emocionais e
fisiológicas das pessoas influenciadas pelo ambiente; nos princípios pós-modernos
ligados à informação, lazer e consumo.
a) A partir dos anos de 1970, estudiosos da área da saúde iniciaram discussões a
respeito de uma possível descentralização dos serviços, baseada na construção de
unidades médicas menores distribuídas pelas cidades. Cada unidade, dependendo do
nível de complexidade dos serviços oferecidos, deveria atender a uma quantidade
específica de habitantes de uma região. Por serem menores e por funcionarem dentro de
uma rede hierarquizada de serviços que vão desde a prevenção até os cuidados críticos,
essas unidades atenderiam também ao aspecto economia de custos com sua infra-
estrutura reduzida. O mega-hospital, como era conhecido até esse período, cedeu lugar
aos ambulatórios, aos centros de diagstico e tratamento e aos hospitais
especializados.
b) Segundo Verderber e Fine (2000), vários aspectos presentes nos projetos e
construções da época sofreram críticas e foram modificados a partir dos anos de 1980.
Pessoas envolvidas numa perspectiva mais humanista sugeriam a aplicação das ciências
comportamentais no planejamento e design do ambiente construído. Essas críticas
baseavam-se em quatro observações:
As decisões de projeto e planejamento eram tomadas com base na opinião de
arquitetos, engenheiros e administradores. O paciente não era consultado.
A máxima do modernismo, “a forma segue a função”, ocasionava a desvalorização das
necessidades dos pacientes frente ao funcionamento e aos equipamentos do hospital.
Uso de modelos padronizados para organização espacial e mobiliário do edifício, como
se as pessoas também fossem padronizadas.
36
Falta de interesse em conhecer as implicações do ambiente hospitalar para o
comportamento dos usuários.
As primeiras investigações no contexto hospitalar que tinham como objetivo discutir de
que forma o ambiente físico poderia interferir no comportamento dos pacientes foram
iniciadas ainda no final dos anos de 1950. Um dos pioneiros dessa área, Robert Sommer,
foi chamado a um hospital psiquiátrico no Canapara descobrir o que havia de errado
no local. Mesmo com o piso, esquadrias, iluminação e mobiliário reformados, não
permitia interação entre os pacientes. Uma das primeiras questões levantadas, foi o fato
dos usuários do ambiente não serem ouvidos quanto às mudanças realizadas no espaço
e demais aspectos da vivência no hospital. A partir do momento em que começou a
conversar com essas pessoas, descobriu que os pacientes recém-chegados reclamavam
mais e observavam coisas que os mais antigos nem mencionavam. Odores, ruídos e
alguns detalhes da rotina hospitalar que incomodavam visitantes, não eram percebidos
pelos funcionários, pois com o tempo, por mais estranho e desagradável que pareça, o
costumeiro torna-se fixo e natural.
Padrões de ocupação de bancos e cadeiras em diferentes lugares também fizeram parte
das observações, até porque embasariam as novas soluções de organização espacial
das enfermarias. Buscando o enriquecimento da pesquisa, o comportamento de
pacientes e funcionários continuava sendo observado depois das modificações no
ambiente, assim como o pedido de opinião continuava auxiliando o trabalho realizado.
Nesse sentido, Sommer início a uma série de discussões a respeito dos métodos de
pesquisa a serem adotados nos estudos pessoa-ambiente, o que inclui entrevistas,
questionários e observação natural.
No mesmo período, outro trabalho dentro dessa mesma vertente é conduzido nos
Estados Unidos, com a participação de uma equipe de psicólogos (PROSHANSKY,
1990). Inicialmente, os profissionais deveriam realizar uma revisão de literatura sobre o
projeto físico dos hospitais psiquiátricos e sua possível relação com o comportamento de
profissionais e pacientes, a fim de discutir de que forma o ambiente físico poderia
interferir no tratamento desses últimos. Pesquisas nessa área eram escassas, portanto,
tiveram de desenvolver sua própria orientação conceitual e metodológica para abordar o
problema. Assim, nesse tipo de estudo, tornava-se essencial conhecer pacientes e
profissionais e saber como e quando os espaços eram utilizados.
37
Segundo Rivlin (1992), trabalhos dessa natureza possibilitaram a observação e
documentação da interferência do sistema hospitalar no comportamento de pacientes e
funcionários, bem como o surgimento de conceitos envolvendo a relação pessoa-
ambiente. Essas pesquisas também geraram a elaboração de artigos e livros sobre a
área em questão, incluindo a participação de arquitetos, antropólogos, geógrafos e
psicólogos, fato que leva em conta o desenvolvimento da multidisciplinaridade.
c) Segundo autores como Verderber e Fine (2000) e Miller e Swensson (2002), nos anos
de 1980 os provedores dos serviços hospitalares dividiram-se em dois grupos: os que
estavam interessados na discussão a respeito da universalidade do direito à saúde e nas
questões relativas ao processo saúde-doença; e os que viam na prestação dos serviços a
possibilidade de lucro, funcionando como uma empresa com atrativos para sua clientela
potencial. No início, essas duas correntes funcionavam como ponto de vistas separados,
mas em seguida convergiram e proporcionaram uma reorganização nas estruturas
médico-hospitalares.
Apesar do caráter reducionista existente neste tipo de comentário, percebe-se uma
tendência atual no mercado médico-hospitalar que associa a valorização da pessoa nas
práticas de saúde como será visto adiante com fins comerciais e lucrativos. Como
conseqüência desses acontecimentos, os estabelecimentos de saúde, principalmente os
de caráter privado, passaram a ter seu planejamento, construção e administração
fundamentados num cenário de lazer e consumo, característicos do pós-modernismo.
Fazem parte desse grupo os hospitais que apresentam configuração arquitetônica e
serviços semelhantes aos de hotéis e shoppings, cuja lógica de funcionamento é a
satisfação do cliente ou consumidor - o antigo paciente passa a ser assim denominado.
2.1.4 Ideais pós-modernos
Em relação aos problemas ocasionados pelo Movimento Moderno, cabe destacar o
posicionamento de Martinez em relação ao excesso de funcionalismo utilizado nesta
corrente de prática e pensamento:
“No próprio processo de projeto, o ‘funcionalismo rigoroso’ exigia uma etapa
intermediária, um modelo adicional que se interpunha entre a formulação verbal
das necessidades e o modelo do objeto (o projeto) ou a sua abstração (o
partido). Esse modelo era o ‘organograma’, estabelecendo uma série de relações
entre as partes do programa (comumente os títulos dos locais necessários) e
fixando os nexos entre elas segundo uma gradação de necessidades. (...) O
organograma tende, portanto, a induzir à idéia de que a funcionalidade de um
edifício se reduz a um dimensionamento apropriado dos espaços e à criação de
circulações adequadas entre uma constelação de lugares dispostos
38
estrategicamente na planta, de acordo com necessidades de proximidade. (...)
As condições que tornam habitável um espaço interior – proteção climática,
isolamento acústico e outras não estão registradas no organograma”
(MARTINEZ, 2000, p. 65).
Ainda segundo o autor, o que se procura num projeto funcionalista é aproximar seu
modelo ao da máquina ou organismo, como um conjunto de lugares especializados
ligados de maneira eficaz por circulações diferenciadas. Além disso, no que diz respeito à
planta livre, assinala:
“Na Arquitetura Moderna, desenvolvida com seu conceito de ‘planta livre’, não
unidades espaciais perceptíveis e autônomas, apenas porções de um
espaço ‘universal’ e contínuo. Os limites espaciais são indicações de um
parcelamento, porém se conserva permanentemente a presença do espaço total
(...)” (MARTINEZ, 2000, p. 171).
Essas constatações nos remetem diretamente aos modelos de hospitais empregados
durante o Modernismo e suas derivações ainda visualizadas atualmente. É importante
lembrar, porém, que muitos desses princípios criticados por Martinez e por outros
estudiosos do assunto, se adequam à função do hospital e às normas que regem o setor.
Para ilustrar esse assunto, Miquelin (1992) enumera alguns pontos considerados
norteadores para a tomada de decisão em planejamento e projeto: regularidade na
modulação; estandardização de espaços e componentes construtivos; adoção de partido
arquitetônico com previsão de crescimento; agrupar, por setores, áreas de grande
complexidade de instalações; facilidade de manutenção das instalações; utilização de
paredes e divisórias não estruturais onde for permitido e adotar o módulo técnico ou
prumada mecânica de instalações nas circulações verticais. Todos esses artifícios
permitem maior adaptação do edifício à incorporação das novas tecnologias.
De fato, conforme aponta Carvalho (2002), a definição de uma modulação estrutural deve
ser implementada no projeto com a maior brevidade, por influenciar no partido
arquitetônico e dimensões adotadas. Contudo, o autor não indica uma medida-padão
para ser seguida, mas acrescenta que a modulação auxilia na racionalização da escolha
de materiais, na padronização das esquadrias e vãos e orientação de ampliações e
reformas. Acrescenta seus comentários ressaltando a importância de elaborar
fluxogramas e funcionogramas antes de iniciar as etapas de projeto, que a correta
solução de fluxos e acessos é condição primordial nesses estabelecimentos. Segundo o
autor, “não se trata de exageros de funcionalismo, mas um dado real que se refletirá em
toda vida útil do edifício” (CARVALHO, 2002, p. 23).
39
A arquitetura moderna também não proporcionava a idéia de conforto, privacidade,
identidade, segurança e forma convencional que o público desejava, que se mostrava
muito técnica, repetitiva, redutiva e aberta. Os espaços contínuos e transparentes
ampliaram a discussão acerca da necessidade de lugares definidos e interiores. O
usuário ideal proposto a partir do Modulor de Le Corbusier não correspondia ao homem
real. Dessa forma, Montaner (2001) diz que:
“(...) O Movimento Moderno (...) pensa a arquitetura em função de um homem
ideal, puro, perfeito, genético, total. Um homem ético e moralmente completo,
de costumes puritanos, de uma funcionalidade espartana, capaz de viver em
espaços totalmente racionalizados, perfeitos, transparentes, configurados
segundo formas simples” (p.18).
Aqui cabe destacar um exemplo do uso do “Modulor” (Figura 10) em um projeto realizado
nos anos de 1960, por Le Corbusier, para um hospital na Itália que não chegou a ser
construído (VERDERBER & FINE, 2000). O projeto previa a divisão do edifício em quatro
partes, que também obedeciam ao zoneamento utilizado até então em arquitetura
hospitalar: diagnóstico e tratamento, serviços e internação, sendo mais uma parte
destinada ao estacionamento, recepção e registro de pacientes. Apesar disso, a tipologia
adotada não era a mesma dos outros hospitais - bloco inferior e uma torre de internação.
Sua configuração caracterizava-se pela forma espalhada no terreno. A zona de
internação teve como base o chamado Modulor de Le Corbusier, espécie de homem-
padrão utilizado para dimensionar os espaços projetados (Figura 11).
10
:
Modulor (MONTANER, 2001).
40
Figura
11
:
Trechos do corte e planta baixa do City Hospital, Veneza (VERDERBER & FINE, 2000).
A partir das críticas ao excesso de racionalismo e funcionalismo do movimento moderno
e do uso de um modelo ideal de usuário para os edifícios da época, várias discussões
deram início a novas propostas arquitetônicas. As características formais desenvolvidas a
partir dos anos de 1950 variaram em relação aos padrões do período anterior.
“(...) o destacável exclusivismo do movimento maquinista foi se transformando
em um modelo aberto em que o contexto, a natureza, o vernáculo, a
expressividade de formas orgânicas e escultóricas, a textura dos próprios
materiais, as formas tradicionais e outros fatores passam a predominar (...)”
(MONTANER, 2001, p.36).
As ciências sociais, também chamadas de ciências que tratam do homem e que incluem
a sociologia, antropologia, psicologia e economia, interferiram nas idéias dos arquitetos e
possibilitaram uma revalorização da esfera da vida cotidiana e da psicologia dos
usuários. Uma das correntes mais coerentes é aquela que, influenciada pelos
existencialismos e pelo auge das ciências do homem sociologia, antropologia,
psicologia, etc. propõe como referência predominante o humanismo. Isso implica em
uma especial sensibilidade pelas culturas locais (...)” (MONTANER, 2001, p.56).
41
No caminho da evolução natural da nova tradição da arquitetura moderna, conforme
aponta Montaner (op. cit.), ocorre uma monumentalização dos edifícios sobre plataforma;
tratamento das fachadas com o objetivo de apresentar mais a individualização do que a
produção em série e mais a diversidade formal do que a repetição modular; e a
concepção da arquitetura como idéia de lugar, como algo mais concreto, humano,
carregado cultura, história, símbolos e qualidades definidas pela luz e pela textura dos
materiais. A concepção e o método de projeto baseiam-se no empirismo, o que, segundo
o autor:
“(...) trata-se de uma postura que (...) busca inspiração nos dados do lugar, no
clima, no programa, nos futuros usuários, nos materiais autóctones (...). Supera
a sensibilidade esquemática do Movimento Moderno e defende um novo tipo de
racionalismo com base no raciocínio e no acúmulo de experiências a partir do
pequeno, do concreto e do detalhe, a partir do respeito pelo sentido comum.
Não se trata de estabelecer modelos, senão que de desenvolver um novo
conceito, um método de propor e pensar através do projeto. Logicamente é um
critério que se adequa com posturas humanizadoras, respeitosas com a
psicologia do usuário, e com as características do entorno e da natureza (...)”
(MONTANER, 2001, p.94).
Vários fatores definiram os anos que compreenderam a década de 60 como o período de
mudança radical, sendo o primeiro deles o falecimento dos grandes mestres do
Movimento Moderno. Em segundo lugar, os projetos dos arquitetos mais jovens
passaram a evidenciar uma outra orientação, com novos elementos formais e a
valorização da tradição histórica. Surgiram também textos de caráter teórico que
procuram formular os instrumentos necessários e os conceitos críticos para evidenciavam
uma nova e crescente situação.
nos anos de 1970, a idéia de entrada no período pós-moderno começou a ser aceita
em diversas áreas do cotidiano, principalmente nos países desenvolvidos. Proliferaram
as propostas arquitetônicas baseadas nas novas possibilidades tecnológicas e eclodiram
projetos de mega-estruturas denominadas como high-tech, construídas de concreto
armado e aço, caracterizadas pelo tamanho colossal, com possibilidade de crescimento e
substituição/multiplicidade de funções e unidades, junto a um certo caráter lúdico e
futurista (Figuras 12 e 13).
42
1
2
(esquerda): Torre-cápsula, Nagakin, Tóquio. Autor projeto: Kisho Kurokawa (MONTANER, 2001).
Figura13 (direita): Prentiss Hospital for Woman and Psychiatric Institute, Chicago, EUA. Autor projeto:
Bertrand Goldberg (VERDERBER & FINE, 2000).
Além do alto custo para sua construção e das críticas que este tipo de edifício vinha
sofrendo a partir das correntes mais humanistas, a eclosão dos movimentos ecologistas
aliados ao campo da arquitetura bioclimática, favoreceram o desenvolvimento de novos
métodos de design. Ao longo desse período, as investigações voltadas ao
aproveitamento de fontes alternativas de energia solar, eólica, etc. passaram a fazer
parte dos condicionantes de projeto e a interferir nas formas dos edifícios, cidades e
territórios. A participação dos usuários no processo de design também se configura como
importante ferramenta nesse quadro de transformações.
Na sua idéia de participação dos usuários do ambiente no processo de planejamento e
projeto, Sommer (1979) prioridade às avaliações dos edifícios. Para o autor, o
arquiteto não deveria impor suas preferências aos outros e, por isso mesmo, deveria
procurar conhecer mais seus clientes e os seus desejos, bem como o resultado do seu
projeto depois de construído e ocupado. As avaliações deveriam ser realizadas por
equipes interdisciplinares e por meio de métodos e técnicas também utilizadas nas
ciências do comportamento. Os custos das avaliações poderiam ser inclusos no valor
cobrado pelo projeto.
A partir dos anos de 1980, houve uma crescente diversidade de tendências
arquitetônicas, mescladas por avanços e retrocessos. Conforme destaca Montaner
(2001):
43
“(...) Agora o mais importante da arquitetura é sua capacidade comunicativa, ou
seja, sua fachada, a imagem que o edifício oferece. Isso será uma caractestica
definitiva da arquitetura pós-moderna que irá estritamente ligada à emergente
cultura visual dos meios de comunicação e que carrega o perigo de cair na mera
mercadori, trivialidade e superficialidade. A arquitetura perde seus atributos
básicos e se converte em pura mensagem de imagens, por cima dos espaços,
processos, funções, tipologias, estruturas, técnicas ou formas. A informação
exaltada como a principal mercadoria, no panorama da arquitetura internacional
triunfarão cada vez mais as propostas que facilmente se transformem em
slogans, se reproduzam em imagens, e se convertam diretamente em objetos
midiatizáveis” (p.166).
É interessante notar que os pós-modernistas vêem-se diante da oportunidade de
diversificar as formas arquitetônicas e urbanas devido às novas tecnologias e variedade
de materiais, assim como em decorrência da não obrigatoriedade de projetar conforme
produção em massa. Os arquitetos podem comunicar-se com grupos distintos de clientes
de modo personalizado e conceber projetos para diferentes situações, funções e culturas
de gosto. um fascínio atual pelo embelezamento, ornamentação, fragmentação,
cenografia e pelo efêmero (HARVEY, 1992).
Em relação aos estabelecimentos assistenciais de saúde, grande parte desses princípios
foi incorporada nas duas últimas décadas, tanto nos países desenvolvidos como nos
países em desenvolvimento. Algumas instituições investem nos projetos arquitetônicos e
modelos de gestão hospitalar baseados em serviços que atraem consumidores
potenciais, com assistência centrada no cliente paciente e sua família e padrões
construtivos que fazem referência ao lazer e ao consumo. É o caso, por exemplo, dos
hospitais com aparência e serviços de hotel e shopping, citados anteriormente.
Com dimensões bastante reduzidas em relação aos hospitais modernistas, as novas
unidades descentralizadas possuem um número menor de leitos, departamentos e
também menor número de pavimentos. Os acessos destinados aos pacientes, visitantes
e aqueles destinados aos serviços estão distribuídos de forma a otimizar os percursos e
possíveis conflitos de atividades. Espaços de convívio dentro da edificação ou eixos de
conexão entre os diferentes setores estão presentes nessa tendência. Como resultado, a
inclusão do atrium central ou lobby são artifícios largamente difundidos na arquitetura
hospitalar.
De acordo com Miller e Swensson (2002), os medical malls são centros ao redor de um
atrium de circulação pública com um eixo que conecta as principais partes do hospital. Os
que seguem o modelo de hotel possuem características semelhantes e suas unidades de
internação estruturadas para o atendimento aos hóspedes – pacientes ou clientes e seus
respectivos familiares (Figuras 14, 15, 16 e 17).
44
Figura 1
4
:
Planta baixa térreo do Centenial Medical Center, EUA.
Autores do projeto: Earl Swensson Associates (MILLER & SWENSSON, 2002)
Figura 1
5
:
Vista externa do Centenial Medical Center, EUA (MILLER & SWENSSON, 2002).
45
1
6
(esquerda): Atrium do Dartmouth-Hitchcock Medical Center, EUA. Autores do projeto: SBRA
Architecture (MILLER & SWENSSON, 2002).
Figura 17 (direita): Lobby do Mary Birch Hospital for Woman, EUA. Autores do projeto: Stichler Design Group
(MILLER & SWENSSON, 2002).
Além desse tipo de proposta arquitetônica, também podem ser observadas as que
primam pela inserção no contexto, escala reduzida e aproveitamento máximo dos
recursos naturais de ventilação e iluminação. No Brasil, alguns hospitais apresentam
esse tipo de perfil, embora os da Rede Sarah Kubitchek estejam entre os mais
conhecidos. Sob a ótica do conforto ambiental, da tecnologia da construção ou ainda do
processo de concepção de projeto, pode-se discutir uma variedade de componentes
lançando mão desses edifícios voltados para a reabilitação.
Alguns princípios gerais definem o partido arquitetônico dos hospitais Sarah, ainda que
cada proposta apresente determinadas particularidades provenientes do perfil hospitalar
adotado, das características do terreno ou dos condicionantes geográficos locais. De
acordo com Latorraca (2000), é possível enumerar como pontos em comum nos projetos
da Rede: a flexibilidade, extensibilidade e padronização da constrão; criação de
espaços verdes; flexibilidade nas instalações; iluminação natural e conforto térmico dos
ambientes Imperam o uso de materiais pré-fabricados, estrutura metálica, tubulações
visitáveis de fácil acesso e uso de sheds na cobertura para captação de iluminação e
ventilação naturais e de galerias de ventilação no subsolo (Figuras 18 e 19).
No que concerne aos moldes de uma arquitetura dita “contemporânea”, Segre (2003)
ressalta que, nos casos dos hospitais da Rede Sarah, houve a substituição dos volumes
46
pesados e das caixas de concreto pelo uso da argamassa armada, do aço, do vidro e do
alumínio. A estrutura leve e sinuosa transforma o edifício em sinfonias de luz, cor e
natureza e criam no paciente o desejo de manter contato com a água e com a natureza
presente no entorno. Como será exposta no próximo capítulo, a integração do edifício à
paisagem circundante e o uso desse espaço adjacente como extensão do próprio espaço
hospitalar compõem o conjunto de medidas que oferece suporte psicossocial ao paciente
(ver também Figuras 20 e 21).
Figura 1
8
:
Vista interna da recepção – Hospital Sarah, Belo Horizonte.
Autor do projeto: João Filgueiras Lima (LATORRACA, 2000)
Figura 1
9
:
Vista externa – Hospital Sarah Rio de Janeiro – 2002.
Autor do projeto: João Filgueiras Lima. Fonte: www.sarah.br
47
As análises expostas até então demonstraram que, efetivamente, os projetos de
arquitetura hospitalar reuniram tão fortemente determinados princípios do Modernismo,
que parte das soluções daquele período continuam em voga nos dias atuais. Os
organogramas e fluxogramas, por exemplo, ainda são utilizados para organizar
unidades/setores hospitalares, acomodar ambientes no espaço e distribuir seus
respectivos fluxos. As três grandes zonas que transformaram a tipologia hospitalar, ou
seja, internação, apoio ao diagnóstico e tratamento e apoio técnico e logístico, também
permanecem, mas compartimentadas em outras unidades - chamadas de unidades
funcionais. Por outro lado, cresce o número de projetos e pesquisas que levam em conta
a relação do edifício com o entorno, a relação do usuário com o edifício, a relação do
edifício com novos paradigmas de saúde e doença e os elementos derivados dessas
relações.
Figura 20
:
Vista externa da passarela do Hospital Moinhos de Vento/RS, Brasil. Projeto arquitetônico original
de uma empresa alemã / Autores de reforma e ampliação do ano de 2004: Nedef Arquitetos e Bross
Consultoria e Arquitetura. Fonte: acervo próprio
Figura 21
:
Vista interna de sala de estar do Hospital Moinhos de Vento/RS, Brasil. Fonte: acervo próprio
48
2.2 - Humanização em saúde e tendências atuais de projeto
2.2.1 Novos paradigmas de saúde e doença
Para cada área do conhecimento, saúde e doença apresentam definições diferentes. Se
por um lado são processos biológicos, por outro recebem influência direta das condições
de vida das comunidades, além de assumirem, para cada um de nós, um sentido
pessoal. O que hoje se sabe, apesar de serem fenômenos bastante abrangentes, é que
saúde não é ausência de doença. A cada descoberta na medicina, a cada mudança
no modo de enxergar o próprio ser humano e sua capacidade de lidar com saúde e
doença, novos conceitos ganham notoriedade. Assim, mudam também modos de vida,
de trabalho, políticas e práticas de saúde e, consequentemente, os próprios hospitais e
demais estabelecimentos de saúde.
Dentro da história das ciências médicas, sociais e psicológicas, os modelos explicativos
de doença foram relacionados a diferentes aspectos, tanto fisiológicos ou da vida em
sociedade, como mais tarde, psicológicos. Segundo Nunes (2000), a doença é um
distúrbio biológico fortemente afetado por fatores sociais. Na Alemanha do século XVIII,
surgiram as primeiras iniciativas do Estado para controlar as influências das condições
precárias de vida e trabalho sobre as questões sanitárias e de higiene. No século XIX,
com a Revolução Industrial, estas condições se agravaram e as cidades tornaram-se
sede de sérios problemas sociais e de saúde. Assim, a preocupação com os aspectos
sociais da doença passa a ser transferida para os aspectos individuais, uma vez que os
estudos da época mostravam a descoberta da bacteriologia. A doença então começou a
ser tratada como uma variação de fenômenos fisiológicos. no século XX, estudos
apontaram a interferência dos princípios da ecologia no processo de adoecimento e, nos
anos de 1960, que as causas da doença não deveriam estar centradas apenas nos
processos biológicos ou ecológicos, mas nos processos sociais.
De acordo com Martins (1996), aspectos econômicos, políticos e ideológicos tem
superado os aspectos psicológicos na discussão sobre saúde e doença. Segundo a
autora, apesar dos profissionais envolvidos na assistência prestada ao paciente
admitirem a relação entre as emoções e os fatores fisiológicos do ser humano, continuam
agindo como se a causa da doença fosse somente orgânica e o tratamento
exclusivamente medicamentoso. Nesse sentido, alguns trabalhos dentro da Psicologia
vêm demonstrar o efeito das emoções como causa das doenças, inclusive explicando
49
que, quando as emoções não são expressas, são desviadas para canais inapropriados
do organismo.
De acordo com Remen (1993), saúde é o equilíbrio das dimensões mente-corpo-
sentimento e requer uma vida com qualidade, calor, amizade, propósito, humor e
esperança. A ruptura desse equilíbrio, aliado às nossas escolhas e uso que fazemos do
nosso corpo, afeta os três aspectos da pessoa e ocasiona a doença, seguida de dor e
sofrimento próprios de cada um. Em posição semelhante, Santos e Sebastiani (2001)
apontam que a doença é:
“(...) a desarmonia orgânica ou psíquica, que, através de sua manifestação,
quebra a dinâmica de desenvolvimento do indivíduo como um ser global,
gerando desarmonização da pessoa; compreende-se esse desequilíbrio como
um abalo estrutural na condição de ser dentro de sua sociocultura” (p.150).
Os autores complementam suas idéias mostrando a importância de tornar a equipe de
saúde sensível a essas questões, à comunicação que estabelece com o paciente e ao
trabalho interdisciplinar. Dentro do hospital, essas medidas instrumentalizam os
profissionais em sua relação com o paciente a fim de melhorar a qualidade de vida na
hospitalização e tratamento.
2.2.2 Nova configuração do espaço
Segundo Dilani (2001), esse novo milênio traz a necessidade de transpor o princípio do
excesso de funcionalismo, padronização e racionalização da construção. Novos fatores
presentes no processo saúde-doença exigem mudanças nos sistemas de saúde,
incluindo o planejamento e gestão dos edifícios hospitalares. A intenção é beneficiar todo
e qualquer usuário desses estabelecimentos e diminuir o estresse presente na
experiência de hospitalização do paciente.
De acordo com Evans e Cohen (1987), um dos caminhos para entender a relação entre o
ambiente e o comportamento humano é analisar as condições ambientais que são
capazes de interferir no funcionamento humano ideal e produzir o estresse. No que diz
respeito a este último, segundo os autores, existem várias definições que variam
conforme resposta do indivíduo ou situação que causa interrupção desse funcionamento
dito ideal. Ainda assim, a definição mais aceita na literatura é a de que o estresse é
fundamentalmente um desequilíbrio entre as oportunidades do ambiente e as metas do
indivíduo e sua capacidade de enfrentar esse desequilíbrio. Quanto aos aspectos
fisiológicos, são enfatizadas as respostas estimuladas pelo corpo e as substâncias
50
produzidas, bem como o aumento da freqüência cardíaca, da pressão arterial e da
respiração. Quanto aos psicológicos, são enfatizadas as interpretações do indivíduo
sobre o significado dos eventos ambientais e sua maneira de reagir. De todo modo, os
estressores podem afetar as pessoas de várias formas, gerando nervosismo, tensão ou
ansiedade.
Rodriguez-Marin (1995) ressalta que, quando alguém entra num hospital, o primeiro
impacto é o do ambiente físico, seguido, se for o caso, da total falta de intimidade e da
transformação da sua vida privada em pública, permanentemente acessível aos
profissionais. O paciente é obrigado a obedecer as instruções da equipe médica e a
cumprir regras gerais do local. Se for internado, assume o papel de enfermo hospitalizado
e dependente do sistema da instituição. Geralmente, o pessoal do hospital assume todo o
controle dos meios, recursos e mobilidade dos pacientes, incluindo recursos físicos e de
informação.
Assim, de acordo com Rodriguez-Marín (1995), a hospitalização aparece como:
Um estressor cultural: o paciente deve aceitar novas normas, valores e símbolos de
uma subcultura hospitalar, que freqüentemente são inconsistentes com ele mesmo.
Um estressor social: o papel do paciente hospitalizado envolve elementos que
pressionam a identidade psicossocial do indivíduo, e as interações sociais em um
hospital podem ser fonte de estresse.
Um estressor psicológico: pode introduzir desde fenômenos de dissonância entre dois
ou mais fenômenos cognitivos a situações de dependência ou situações consideradas
infantis.
Um estressor físico: a maioria das percepções físicas do hospital (odores e ruídos) e o
próprio entorno físico do mesmo podem causar emoções negativas na maioria dos
pacientes.
Figueiredo (2005) discute o ambiente hospitalar dentro de uma perspectiva terapêutica. A
partir de uma revisão de literatura que ressalta o papel do hospital sobre os aspectos
psicológicos dos usuários, a autora comenta cada uma das dimensões presentes nessas
instituições: social, cultural, simbólica, organizacional e física. Sustenta a idéia de que,
em resposta a evolução da sociedade e das novas necessidades dos indivíduos, a
prestação dos cuidados de saúde deve ajustar-se aos avanços científicos, tecnológicos,
de humanização, de personalização e de participação no cuidar levando em conta a
gestão racional dos recursos envolvidos. Torna-se interessante enfatizar, entretanto, que
51
suas reflexões apontam a importância de trabalhar o espaço físico para atenuar o
estresse causado sobre os usuários desses ambientes, mas também apontam a
impossibilidade de anular completamente tais efeitos:
“Um espaço gerador de estresse jamais poderá suportar o bem-estar, a
recuperação dos doentes ou o desempenho dos profissionais, pois todos os
processos cognitivos e psicológicos nomeadamente a percepção, a utilização, a
ocupação, a apropriação (territorialidade), a socialização versus privacidade, a
identidade (pessoal, social ou a um lugar), a vinculação a um lugar, a
participação, a satisfação e a motivação, estão alterados” (FIGUEIREDO, 2005,
p.303)
Para Malkin (1992), as causas do estresse na hospitalização incluem o fato de estar
cercado num lugar desconhecido, perder a independência, encontrar-se separado da
família e/ou em situação de isolamento, a falta de informação, a ameaça da doença e o
aparecimento de possíveis problemas com medicamentos. A autora apresenta exemplos
de hospitais norte-americanos que seguem uma filosofia chamada de Planetree, baseada
na premissa de que o paciente deve ter poder de escolha e controle sobre vários
aspectos ligados ao seu tratamento. É o que se denomina de cuidado centrado no
paciente, conjunto de medidas que envolvem a relação médico-paciente, o apoio da
família e principalmente o acesso à informação, desde a lista de medicamentos prescritos
pelo médico, até o acesso à informação em livros e revistas da área. No processo de
recuperação acrescentam-se música, filmes e literatura.
Um aspecto muito característico dos hospitais é a variedade de usuários presentes e
suas diferentes necessidades ou expectativas, fato que pode ocasionar conflitos na forma
de cada subgrupo - pacientes, funcionários e visitantes - lidar com o espaço físico (San
Juan, 1998). Como exemplo, o autor aponta o problema existente na sensação de
conforto térmico, acústico e visual dos pacientes em relação aos funcionários. Enquanto
os primeiros preferem uma atmosfera mais tranqüila, com silêncio e pouca iluminação, os
segundos, por se encontrarem em constante atividade, requerem maior iluminação e
temperaturas mais baixas. Na maior parte das vezes, a maximização da eficácia médica
é o primeiro fator a ser levado em consideração no desenho dos hospitais, quando
deveria estar no mesmo patamar do cuidado com o bem-estar do paciente e de uma
série de recomendações acerca dos projetos de tais estabelecimentos. Uma delas, a
possibilidade de projetar espaços que permitam a interação entre pacientes, é reforçada
com a ressalva de que a interação não deve ser um imperativo, mas sim uma opção.
É válido destacar também que, segundo Dilani (2001), os estabelecimentos de saúde
guardam relação com duas perspectivas presentes nas atitudes biomédicas: patogênica
52
e salutogênica. Na primeira, existe uma tendência em considerar partes doentes do corpo
humano, divididas em partes ainda menores e tratadas separadamente do restante do
organismo. A essa perspectiva correspondem os edifícios ultra-especializados, centrados
exclusivamente em práticas objetivas e impessoais. Conforme foi explicitado, essas
características fazem parte da postura higienista adotada em meados do século XX,
praticada em larga escala nos dias atuais.
Dentro da segunda perspectiva, a salutogênica, a doença é vista como algo
multifacetado, com uma variedade de causas ou elementos. Tem como ambientes
correspondentes, os que funcionam oferecendo suporte psicossocial aliado à tecnologia e
à ciência. Nesse caso, os processos de promoção de saúde são centrais para a
consolidação de filosofias de cuidado com o paciente e para o desenvolvimento de
projetos de ambientes assistenciais de saúde. Não se limitam ao estudo dos riscos de
exposição à doença, mas se estende aos fatores que podem contribuir para a promoção
de saúde. Desse modo, arquitetura também pode e deve oferecer subsídios a uma
nova forma de conceber espaços de saúde.
Dentre as recomendações para fortalecer os processos de saúde e influenciar resultados
médicos, merecem destaque aspectos do comportamento dos indivíduos e das políticas
institucionais que correspondem a determinados ambientes e/ou elementos
arquitetônicos: controle da mobilidade e da interação social/privacidade; suporte social;
acesso à natureza e distrações e condições físicas satisfatórias de temperatura,
iluminação, ruído, odores. Esses requisitos se relacionam à organização espacial, layout,
presença de determinados ambientes e integração da edificação com o entorno,
conforme será destacado a seguir.
De acordo com Carpman e Grant (1986), um “projeto humanísticode arquitetura deve
contemplar o ponto de vista de pacientes e visitantes. Para alcançar esse fim, arquitetos
e demais planejadores devem considerar a interação das pessoas com seus ambientes e
consequentemente, o estado emocional e psicológico em que se encontram os pacientes
ao serem submetidos a algum procedimento e ao entrarem em contato com a
diversidade/quantidade de aparatos e pessoas presentes no local. Segundo os autores,
as necessidades dos pacientes e visitantes são levadas em conta quando quatro
aspectos são obedecidos: sinalização, conforto físico, possibilidade de regular o contato
social e cuidado com significados transmitidos pelo ambiente. No arranjo ou organização
dos espaços, lembrar que pacientes e visitantes podem levar consigo uma imagem
53
positiva ou negativa do que foi visto, tocado, cheirado e ouvido durante o período que
passaram no hospital.
Sinalização: em se tratando de edifícios com uma organização espacial complexa e
bastante diferente da que pacientes e visitantes estão acostumados, as sinalizações
tornam-se essenciais na orientação das pessoas no espaço.
Conforto físico: o projeto deve considerar elementos como iluminação, temperatura e
nível de ruído, favorecendo os ambientes de permanência de pacientes e visitantes e
possibilitando o controle/ajuste por parte destes últimos.
Regulação do contato social: o projeto também deve considerar a possibilidade de
regulação da interação entre as pessoas.
Significados simbólicos: o ambiente pode transmitir significados através dos elementos
citados anteriormente e também pode ser apreendido através dos sentidos.
Malkin (1992) também sugere que o projeto arquitetônico leve em consideração aspectos
semelhantes aos anteriores, apesar de seu modelo apresentar uma lista mais extensa e
mais detalhada do que seria um healing environment”. A privacidade, por exemplo,
poderia ser trabalhada com elementos que permitissem, ou não, o contato do paciente
com outros - box individuais - ou ainda que possibilitassem esse paciente não ser visto do
lado de fora do hospital - controle das janelas. Com isto, também estaria sendo
trabalhada a visão da natureza e a entrada de luz e/ou ventilação natural no quarto.
A autora comenta que alguns desses componentes envolvem antigas filosofias orientais,
como as terapias holísticas de integração mente-corpo e o uso de elementos como água,
música, vegetação e cores para ajudar no processo de recuperação do paciente. É
importante lembrar que os fatores a serem considerados na criação de um ambiente
terapêutico, geralmente são focalizados nas áreas de circulação e maior permanência
dos pacientes, como setor de internação, mais especificamente o quarto ou enfermaria e
as unidades de terapia intensiva.
Para explicar a teoria do supportive design” Ulrich (2001) se baseia na capacidade do
ambiente de atuar sobre resultados terapêuticos através da redução dos níveis de
estresse. Para tanto, alguns aspectos devem ser levados em consideração no processo
de projeto de estabelecimentos assistenciais de saúde:
54
Controle da interação, incluindo privacidade: com elementos que permitam essa
escolha;
Promoção do suporte social: com áreas destinadas à família;
Acesso à natureza e distrações positivas: jardins, contato interior-exterior do edifício e
outros ambientes.
Ulrich vem trabalhando com o tema desde os anos de 1980. Mais recentemente, segundo
reflexões acerca do supportive design (Ulrich et. al.; 2005), chama a atenção para os
problemas causados pelo ruído nas unidades de internação. O autor comenta as
vantagens do quarto individual e sugere medidas arquitetônicas como elementos de
absorção ou diminuição da propagação do som – para atenuar o ruído.
É possível verificar a existência de uma gama de trabalhos, principalmente no panorama
internacional, que relacionam características do ambiente hospitalar e a satisfação ou
percepção dos usuários. Whitehouse et al. (2001) realizaram uma avaliação pós-
ocupação num hospital infantil em San Diego, Estados Unidos, com o objetivo de avaliar
a utilização e a satisfação de pacientes, familiares e funcionários com um jardim
planejado no ambiente. Através de entrevistas, observações e questionários, os
pesquisadores verificaram que as pessoas percebiam o jardim como um lugar que
favorecia o restabelecimento dos pacientes e reduzia o estresse dos funcionários, mas
que não era utilizado tão efetivamente quanto poderia. Entre outros fatores, os
pesquisadores recomendaram mudanças para promover um uso mais freqüente do
jardim.
O trabalho de Ulrich (2000) sugere a implantação de áreas de jardins dentro do hospital
como medida terapêutica, até mesmo porque pode diminuir os gastos com medicamentos
e os elementos naturais auxiliam na diminuição do estresse e podem ser empregados
tanto dentro do hospital como nas áreas externas. Esse tipo de medida era comumente
utilizada nos hospitais psiquiátricos e começa a ser retomada nos hospitais gerais, como
resposta a um modelo no qual imperavam o excesso de funcionalidade e o “não
desperdício” com áreas livres.
A qualidade do atendimento prestado ao paciente pode ser por ele avaliada de diferentes
maneiras (ARNEILL & DEVLIN, 2002). Uma delas é através dos procedimentos médicos
utilizados, que o paciente geralmente não entende, e a outra é pela forma como o
atendimento é oferecido e percebido pelo paciente. De acordo com o estudo realizado,
quanto melhor a aparência e a iluminação do ambiente e mais novos os móveis, melhor é
55
avaliada a qualidade do atendimento, ressaltando que a capacidade de compreensão do
médico ou profissional de saúde também interferem na percepção da qualidade.
Dessa forma, pode-se enumerar e apresentar sob a forma de um quadro-síntese cada
componente discutido pelos autores supracitados:
ITEM
ASPECTOS ENVOLVIDOS
COMPON
ENTES ARQUITETONICOS
Controle dos meios
/ autonomia
Informações sobre o local e sobre o
tratamento
Sinalização / comunicação visual
Postos de informação
Acessibilidade arquitetônica / desenho
universal
Controle da
interação social
Escolha da interação com outros
pacientes ou visualização constante
Layout / distâncias interpessoais
Espaços abertos x fechados
Elementos que permitam ou não a
visualização da pessoa e a passagem do
som/cheiros
Posição do mobiliário em relação às portas e
circulações
Suporte social
Presença da família e trabalho com
equipe multidisciplinar
Locais para permanecer com a família ou
amigos
Locais para realizar atividades terapêuticas
com a equipe hospitalar
Acesso à natureza
ou ao exterior do
edifício
Possibilidade de visualizar espaços
externos e jardins
Aberturas / varandas / janelas com vista para
o exterior do edifício
Jardins para caminhadas ou contemplação
Condições físicas
Conforto ergonômico, térmico,
acústico e lumínico
Acessibilidade / desenho universal
Detalhes técnicos quanto à ventilação,
insolação e ruídos
Implantação do edifício no lote e escolha dos
materiais de acabamento
Quadro 01: Componentes arquitetônicos x suporte psicossocial do edifício hospitalar. A faixa que está
destacada em amarelo refere-se a questões trabalhadas nesta tese de doutoramento.
Sabendo que parte significativa de trabalhos que seguem esta vertente tem sido
publicada em países centrais, torna-se relevante enfatizar que, nos últimos anos,
pesquisadores brasileiros da área de arquitetura hospitalar passaram a incluir a
perspectiva do usuário nas suas reflexões. Tais estudos desenvolvem-se a partir de
técnicas para conhecer a satisfação dos indivíduos com determinados elementos
arquitetônicos ou a partir da análise de edifícios sob o ponto de vista das recomendações
internacionais sobre humanização (COSTI, 2002; SANTOS & BURSZTYN, 2004;
VASCONCELOS, 2004).
Assim, hospitais e demais estabelecimentos do ramo, assumem uma nova configuração
no que diz respeito ao espaço físico e à assistência prestada ao paciente. Partindo do
pressuposto de que a privacidade pode e deve ser um aspecto capaz de fundamentar
decisões projetuais e que tem sido pouco trabalhada em arquitetura de ambientes de
atenção à saúde, o próximo capítulo tem a função de discutir mais detalhadamente o
assunto e inseri-lo no cenário da oncologia.
56
2.3 - Privacidade no ambiente hospitalar e o cenário da oncologia
2.3.1 Privacidade e hospitalização
De uma maneira geral, as discussões acerca da privacidade no ambiente hospitalar o
direcionadas aos setores de maior permanência do paciente, compostos pelas
enfermarias e pelas unidades de tratamento intensivo. Tal fato não exclui a preocupação
com outras áreas hospitalares, como urgência, emergência ou unidades de diagnóstico e
terapia, principalmente no tocante a esta tese de doutoramento, mas tem apresentado
um número maior de pesquisas desenvolvidas por profissionais da área de saúde.
Grande parte dessas investigações refere-se tanto ao comportamento da equipe, como à
presença de componentes espaciais capazes de auxiliar as condições de privacidade do
paciente.
Dentro da equipe de funcionários responsável pelos cuidados oferecidos ao paciente, os
enfermeiros representam os que permanecem por mais tempo no desempenho de
atividade voltada aos indivíduos hospitalizados e, por esse motivo, os responsáveis
diretos por uma quantidade maior de situações que envolvem a perda da privacidade.
Dessa forma, questões sobre ética e direitos humanos têm permeado constantemente as
reflexões desses profissionais, tanto no cenário internacional como nacional. Assim, por
exemplo, podem ser mencionados os trabalhos de Charles-Edwards e Brotchie (2005)
em unidades destinadas ao atendimento infantil; o de Puplim e Sawada (2002), acerca da
necessidade de ultrapassar o tecnicismo presente nas práticas de saúde e de considerar
as dificuldades do paciente; e o de Deshefy-Longhi et. al. (2004), sobre da visão de
pacientes e funcionários a respeito da privacidade e confidencialidade.
No estudo desenvolvido por Woogara (2005) em um hospital geral de Londres,
profissionais de saúde e pacientes de diferentes tipos de enfermarias foram entrevistados
a fim de expressarem seu entendimento sobre privacidade. Corroborando com a literatura
da área, as categorias incluíram aspectos relacionados à pessoa e à informação. Apesar
das semelhanças com outras pesquisas sobre o assunto, dois fatos chamaram a
atenção: a maior parte dos pacientes adota uma postura de aceitação diante dos
problemas ocasionados pelo comprometimento da sua privacidade e muitos profissionais
de saúde desconsideram a privacidade como uma prioridade no atendimento prestado.
Apesar da existência de leis, decretos e regulamentos do governo a respeito dos direitos
humanos e do direito à dignidade, os resultados da pesquisa mostraram que a maior
parte dos profissionais não tinha conhecimento sobre o conteúdo desses documentos.
57
Em um dos poucos trabalhos realizados em espaços destinados ao atendimento
imediato, Barlas et.al. (2001) investigou a percepção dos pacientes em relação à
privacidade do local, com o objetivo de promover mudanças construtivas e de layout. O
estudo comparou, numa unidade de emergência de um hospital universitário, as salas
que possuem paredes como divisórias e as que possuem apenas cortinas. Conforme
informações obtidas através de entrevistas, um número maior de pacientes atendidos nas
áreas com cortinas considerou que o nível de privacidade não era satisfatório, que
havia a possibilidade de ver, ouvir, ser visto e ouvido mais facilmente.
A partir de uma pesquisa realizada com o objetivo de investigar o sentimento dos
pacientes frente à invasão do seu espaço territorial e pessoal pelos profissionais de
enfermagem, Sawada (1995) alerta para a necessidade de considerar a ansiedade
gerada por estes aspectos nas práticas de saúde. O referencial teórico utilizado é
constituído por autores que trabalham com a relação pessoa-ambiente e que tratam das
distâncias interpessoais, do espaço pessoal e da territorialidade. O estudo é composto
por questionários com escalas adaptadas à cultura brasileira, aplicados aos pacientes
internados em enfermarias de hospital público. É interessante destacar que as perguntas
incluídas no instrumento de coleta de dados não apresentam os termos espaço pessoal
ou territorialidade, mas uma série de situações envolvendo pessoas, comportamentos e
componentes físicos do local capazes de indicar o grau de satisfação, indiferença ou
irritabilidade do paciente. Os resultados apontaram, entre outros aspectos, a interrupção
do sono e descanso do paciente pela equipe de enfermagem e a entrada no espaço
físico do mesmo, toque e proximidade íntima como fatores de incômodo e ansiedade.
Segundo a autora, o conhecimento dessas questões ajuda no planejamento de reformas
e mudanças no espaço físico e no trabalho de orientação da equipe de enfermagem.
Alguns autores têm se dedicado ao estudo das representações do corpo no campo da
enfermagem como, por exemplo, Bittencourt et. al. (2009). Os autores verificam as
tendências atuais de pesquisa sobre imagem corporal dentro da produção científica
nacional de enfermagem. As discussões envolvem diversas categorias de análises
retiradas dos textos lidos e apontam o câncer como o principal enfoque da temática em
questão. A agressividade terapêutica relacionada às cirurgias, quimioterapia e
radioterapia, muitas vezes mutilantes, alteram de modo considerável as imagens
corporais dos pacientes. Destacou-se tamm o número de trabalhos ligados ao câncer
feminino.
58
Ferreira et. al. (2002) discutem a natureza biológica e social dos indivíduos atrelada ao
conceito de gênero, pois interessava investigar as representações sociais do feminino e
do masculino no cuidar e no cuidado de enfermagem sob a ótica do cliente. Os
participantes compreenderam vinte e seis clientes da unidade de internação de um
hospital universitário e a coleta de dados incluiu entrevista e observação de campo
durante cinco meses. A partir da análise das entrevistas, as autoras discutiram diferenças
entre homens e mulheres no que se refere aos seus corpos, fruto de um convívio social
mediado pela cultura. Apesar dessa constatação carregar uma série de aspectos que
aprofundam as discussões no assunto, de uma maneira geral aponta para a valorização
das marcas do gênero impressas e expressas no sujeito dentro dos cuidados de
enfermagem.
Em pesquisa sobre o significado do termo dignidade para pacientes e profissionais de
saúde, Baillie (2009) desenvolve sua investigação num setor de cuidados pós-cirúrgicos
num hospital público da Inglaterra. Suas perguntas centrais baseiam-se na forma de
tratar a dignidade do paciente, principalmente a partir de medidas de caráter
comportamental por parte dos profissionais que realizam o trabalho diário no setor de
internação. Os resultados apontam que a dignidade está diretamente relacionada às
condições de privacidade do paciente, vinculadas também à falta de controle na maneira
como alguns procedimentos são realizados e na exposição corporal. Para a surpresa da
autora, os pacientes associaram sua vulnerabilidade à estrutura física do local
pesquisado, citando o layout das enfermarias como um dos aspectos a serem revistos
para melhorar a situação atual.
Conforme comentado no capítulo anterior a respeito das dificuldades ocasionadas pela
hospitalização, a falta de privacidade e a transformação da vida privada do paciente
numa vida pública, constantemente acessível aos membros da equipe médica e de
enfermagem, é um fator característico na unidade de internação (RODRIGUEZ-MARIN,
1995; SANTOS & SEBASTIANI, 2001). Característico, mas que pode e deve ser
amenizado por meio de ações comportamentais e elementos físicos.
O texto de Josep e Ulrich (2007) examina de que forma os diferentes aspectos do som
ruído, fala, inteligibilidade e música ocasionam impactos no paciente e como o design
pode melhorar as condições de acústica no ambiente hospitalar. As informações obtidas
revelam que os hospitais são extremamente barulhentos, com níveis de ruído acima do
recomendado pela Organização Mundial de Saúde, gerando impacto tanto nos pacientes
como na equipe de profissionais que presta atendimento. Os problemas apresentados
59
pelos pacientes englobam irritação, perda de sono e aumento da ansiedade, ao passo
que, pelos profissionais de saúde os sintomas da exposição prolongada ao rdo são
irritação, estresse, fadiga, exaustão emocional e dificuldades para desempenhar tarefas.
A música funcionaria diminuindo a ansiedade de ambos.
Para os estudiosos no assunto, segundo Josep e Ulrich (2007), o excesso de ruído é
provocado principalmente pelo elevado número de fontes de barulho e pela quantidade
maior de materiais refletores do que absorventes nos ambientes. Assim, as medidas para
reduzir o ruído teriam duas origens: comportamental e de design. Esta última envolve o
uso de materiais absorventes e planejamento de quartos individuais nas unidades de
internação. Inteligibilidade da fala seria a compreensão do que é dito na comunicação
entre profissionais de saúde e paciente no cotidiano das rotinas hospitalares. Para isso é
necessário considerar a qualidade acústica dos ambientes. Privacidade da fala refere-se
ao fato de ouvir ou ser ouvido pelos outros e em que medida e local isso acontece. Nesse
caso, os componentes arquitetônicos capazes de melhorar as situações de privacidade e
confidencialidade da fala incluem: quartos individuais na internação, aplicação de
materiais absorventes em algumas salas e divisórias e existência de locais adequados
para conversar com o paciente e/ou familiares.
O trabalho de Douglas e Douglas (2004) teve o propósito de investigar a percepção e as
atitudes dos pacientes acerca do ambiente hospitalar num estabelecimento localizado no
Reino Unido. A proposta também era contribuir na elaboração de futuras reformas e
futuros projetos na referida área. O estudo foi de natureza exploratória e incluiu a
participação de 50 pacientes de diferentes áreas do hospital, desde setores cirúrgicos e
maternidade até setores voltados para geriatria. As questões desenvolvidas a partir das
entrevistas tinham como base o entendimento de como o ambiente hospitalar,
englobando atendimento e espaço físico, poderia afetar positivamente e negativamente
pacientes e familiares. Embora as diferenças de gênero, idade e patologia pudessem
dificultar a análise dos dados coletados, as respostas apresentaram semelhanças quanto
aos itens positivos, negativos e sugestões dadas. Os pacientes ressaltaram a
necessidade de se sentirem seguros no ambiente e de terem condições satisfatórias de
privacidade. Paralelamente, falaram a respeito da criação de ambientes menos
impessoais, com vista para o exterior, locais para a realização de atividades recreativas
ou de contemplação e locais para convívio entre familiares.
Do estudo supracitado, vale comentar um de seus aspectos mais interessantes: as
dificuldades enfrentadas, pelo pesquisador, para realizar as entrevistas. Segundo os
60
autores, os pacientes não se sentiram bem quanto ao uso do gravador e, mesmo nos
casos em que o uso do gravador foi permitido, os ruídos das enfermarias prejudicaram a
qualidade do som e não permitiram a transcrição das fitas. Assim, a solução adotada foi a
presença de mais dois pesquisadores no momento das entrevistas para que todos
tomassem nota do que estava sendo dito e transcrevessem os discursos com maior
segurança e fidelidade.
Heikkinen et. al. (2006) desenvolvem suas reflexões a partir dos múltiplos aspectos e
definições da privacidade: necessidade, direito, estado de inacessibilidade e um período
de afastamento da interação. Em ambientes de atenção à saúde está associada a fatores
físicos, sociais, psicológicos e de informação, conforme discutem autores do campo da
ética e dos estudos comportamento-ambiente. No tocante aos fatores físicos, a pesquisa
realizada com o propósito de identificar a noção dos funcionários acerca da privacidade
em estabelecimentos públicos e privados, revelou que o corpo, o espaço pessoal, a
territorialidade e alguns elementos do espaço físico sobressaíram nas respostas. Quanto
aos últimos componentes, os participantes da pesquisa citaram a presença de portas,
aberturas, divisórias de vidro e local para guarda de pertences como itens de medida
para investigar os níveis de privacidade.
O trabalho de Huton (2002) explora o significado do espaço privado para adolescentes na
unidade de internação de um hospital. O instrumento de coleta de dados foi a entrevista e
os principais resultados indicaram o desejo por determinados ambientes mais reservados
para ler, falar ao telefone ou descansar. Apesar da literatura da área apontar o quarto
individual como melhor opção para garantir níveis satisfatórios de privacidade, este
estudo mostrou que os entrevistados preferiram quartos duplos, que podiam ter a
companhia de alguém da mesma idade. Banheiros dentro do quarto também foram
considerados como importante item na procura por privacidade, assim como a presença
de portas e cortinas em alguns ambientes.
No estudo de Huton (2002), a revisão bibliogfica apresenta dados a respeito das
enfermarias Nightingale e sua relação com a privacidade. Se por um lado Nightingale
pensou nas condições de ventilação e iluminação do ambiente para melhorar o processo
terapêutico, por outro lado as condições de privacidade eram inexistentes e nem
representavam importância na época. Entretanto, de acordo com os autores da área,
essa tem sido uma preocupação atual para minimizar o impacto do ambiente hospitalar
no paciente.
61
Ainda a respeito das enfermarias Nightingale, o texto de Johnson (2005) coloca uma
interessante questão: a necessidade do paciente por privacidade, apesar de
compreensível, é incompatível com a necessidade de supervisão por parte da equipe de
enfermagem. Tanto no modelo de enfermarias baseado no panóptico, como nas
enfermarias Nightingale, era preciso ver e vigiar os pacientes. Essa necessidade ainda
existe, mas acompanhada por outros aspectos, ligados à ética e aos direitos do paciente.
Partindo do pressuposto de que a privacidade total é impossível, o autor destaca quatro
faces a serem consideradas:
Corpo: a dignidade é desrespeitada quando a privacidade é excessivamente violada e
os corpos dos pacientes ficam expostos. Acontece principalmente nas situações em
que ocorre a realização das necessidades fisiológicas e a higiene corporal.
Espaço: desejo dos pacientes pela privacidade de espaço mais reservados ou
elementos que auxiliem na busca por privacidade, como o uso de biombos e cortinas
em enfermarias.
Informação: envolve principalmente as questões acústicas e aquelas relacionadas ao
compromisso com a discrição/confidencialidade de dados a respeito do paciente.
Comportamento individual: respeito à necessidade dos pacientes de estarem mais ao
lado de familiares e amigos.
Isto posto, podemos perceber que a privacidade está sempre associada a variáveis do
comportamento humano e do ambiente físico, sendo este último passível de maiores
controvérsias, dada a dificuldade de encontrar teorias exclusivamente arquitetônicas que
dêem conta do assunto. Assim, veremos de que maneira os espaços destinados à
acomodação do paciente foram organizados ao longo do tempo em função da
privacidade e de que forma essa organização espacial inclui ou não os componentes
arquitetônicos estudados em outras categorias de edifícios, comentados em seções
anteriores.
62
2.3.2 Projeto e privacidade em quartos individuais e coletivos
Como ponto de partida, pode-se tentar estabelecer algumas diferenças entre termos
utilizados neste trabalho. Os termos “individual” e “coletivo” aqui não significa o mesmo
que foi comentado no Capítulo 1, sobre espaços de acesso e manutenção coletiva. Aqui
os termos dizem respeito à presença de um ou mais pacientes num quarto ou enfermaria
de instituição assistencial de saúde. Paralelamente, o emprego dos termos instituição
pública ou privada nos capítulos que seguem tamm difere do que foi tratado no
Capítulo 1 sobre espaços “públicos” e “privados”. Para os estabelecimentos de atenção à
saúde, esse uso assume o caráter de ser pago ou não, de ser um serviço contratado pelo
cliente que necessita de cuidados médicos ou de ser oferecido pelos governos federal,
estadual e municipal através do SUS.
Até o século XIX, as enfermarias hospitalares sempre estiveram organizadas de forma a
abrigar vários pacientes. De acordo com Thompson e Goldin (1975), essa situação se
apresentou de modo diferente por razões médicas ou sociais, nas quais incluíam a
separação de pacientes com problemas mentais ou infecciosos graves ou com situação
sócio-econômica bastante elevada. Assim, as enfermarias de planos abertos (Figura 5)
era o modelo comumente visualizado nos hospitais da antiguidade, da idade média e até
mesmo nos estabelecimentos projetados em pavilhões.
Ainda conforme os autores supracitados, as enfermarias Nightingale eram caracterizadas
pela ausência de privacidade por parte dos pacientes. Se supervisão e vigilância eram
tidos como fatores decisivos nos cuidados de enfermagem, além, claro, das questões
sanitárias citadas no Capítulo 2, não havia a preocupação com a privacidade. Thompson
e Goldin chegam a mencionar, inclusive, que o pensamento da época era que quarenta
pacientes internados num espaço poderiam ser supervisionados com maior eficiência
do que dez deles distribuídos em quatro enfermarias, que neste último caso seria
necessária a presença de outros funcionários.
Com o passar dos anos e o aparecimento das discussões sobre novos paradigmas de
saúde e doença e sobre a relação entre as características dos ambientes e o
comportamento dos usuários, arquitetos e demais planejadores hospitalares repensaram
a questão da privacidade nas enfermarias. Vale destacar que a presença de banheiros
dentro das enfermarias também foi um aspecto de fundamental importância na
organização desses espaços. Porém, o planejamento de quartos individuais como única
opção de internação incidia diretamente sobre os custos destinados à construção e
63
manutenção desses estabelecimentos. Se essa medida beneficiaria os pacientes,
também exigiria um número maior de funcionários para atendê-los separadamente,
que a área construída e os percursos realizados durante as rotinas diárias também
aumentariam.
Segundo Thompson e Goldin (1975), Carpman e Grant (1986) e Verderber e Fine (2000),
a partir dos anos de 1960 várias propostas arquitetônicas foram idealizadas na tentativa
de atenuar esses problemas. Assim, algumas soluções de projeto contemplaram
desenhos que apresentavam desde um até seis leitos numa enfermaria, seguindo o
raciocínio de que a área ocupada pelos cômodos com menor número de leitos teria que
corresponder à área de enfermarias com maior número (Figuras 22, 23, 24, 25 e 26).
Figura 2
2
:
Planta baixa com enfermarias de 3 leitos e quarto individual
Autor do projeto: Edward F. Stevens (THOMPSON & GOLDIN, 1975).
2
3
:
Enfermarias com diferentes dimensões e posicionamento dos leitos (CARPMAN & GRANT, 1986).
Figura 24: Planta baixa - enfermarias de um leito. Autoria não identificada (THOMPSON & GOLDIN, 1975).
64
Figura 2
5
(esquerda): Planta baixa de quarto duplo do Klinikum Dessau – Alemanha
Figura 26 (direita): Perspectiva relacionada ao ambiente descrito acima. Autores do projeto: Eling e Novotony
Mahner (SCHIRMER & MEUSER, 2006).
Figura 2
7
:
Vista externa do Klinikun Dessau, Alemanha. Fonte: http://www.klinikum-dessau.de
De acordo com Chaudhury et. al (2006), a comparação entre enfermarias coletivas e
quartos individuais em unidades de internação está centrada nos benefícios gerados pela
privacidade, que também ocorre redução nos níveis de estresse, na quantidade de
medicamentos, menores chances de erros por parte da equipe de enfermagem e maior
controle de infecção hospitalar. A pesquisa realizada em quatro hospitais com a
participação de profissionais de enfermagem confirmou tais dados recorrentes na
literatura sobre o assunto. De fato, existe a preferência pelos quartos individuais quando
feita a relação com o processo de restabelecimento do paciente. Porém, quando
questionados a respeito das distâncias percorridas para atender os pacientes de quartos
individuais e coletivos, os participantes da pesquisa apontaram o segundo modelo como
mais confortável, dada a possibilidade de ver um número maior de pacientes num
ambiente.
65
Numa pesquisa sobre os benefícios dos quartos individuais nos setores de internação
hospitalar, Van de Glind et. al. (2007) destaca alguns aspectos relacionados aos
conceitos de healing environment e evidence based design”. Apesar de serem
conceitos que abarcam diversos aspectos da estrutura física e gestão do edifício
hospitalar, também apresentam quesitos ligados ao número de leitos adotados por setor
de cuidados com o paciente internado. A pesquisa foi fundamentada numa revisão
bibliográfica e concentrou-se nos seguintes itens: satisfação do paciente, privacidade,
níveis de ruído, qualidade do sono e riscos de infecção hospitalar. Como resultado da
análise das informações obtidas, os autores apontaram os quartos individuais como
alternativa adotada por diversas instituições hospitalares em função da relação custo-
benefício, melhores resultados médicos e maior satisfação do cliente.
Em um outro trabalho, dessa vez acerca das interações entre profissionais de saúde e
paciente em quartos individuais ou coletivos, Van de Glind et. al. (2008) verificou algumas
diferenças no que diz respeito ao tipo de ambiente em que essa interação se dá. De
acordo com seu estudo, os quartos individuais permitiram visitas e conversas mais
demoradas e um número maior de perguntas, dos pacientes, sobre aspectos
considerados mais íntimos.
Apesar da existência de projetos que contemplam um, dois, três, quatro, cinco, seis ou
mais leitos numa enfermaria e de alguns trabalhos apontarem o quarto individual como
única opção para garantir privacidade, não será essa a idéia a ser perseguida nesta
pesquisa. Como foi dito a respeito da relação entre privacidade e cultura, bem como
acerca dos sentidos atribuídos ao processo de saúde e doença ou ao processo de
hospitalização, pode-se imaginar que não uma resposta única quando se trata de
conceitos subjetivos. Essa resposta, pois, deve estar direcionada a um determinado
contexto, acompanhada de uma série de aspectos que a influenciam.
Nesses termos, há que se ressaltar, ainda, a existência de outras modalidades de
tratamento realizadas em espaços diferentes dos ambientes de internação, como as
salas de hemodiálise ou as de quimioterapia, por exemplo. E é neste último aspecto, os
espaços compartilhados voltados para a oncologia, o foco das próximas seções deste
trabalho.
66
2.3.3 Breves notas sobre o câncer
O câncer é uma doença relacionada ao crescimento desordenado das células, que
invadem tecidos e órgãos. Suas causas podem ser externas ou internas ao organismo,
estando inter-relacionadas. Quando as causas são externas, referem-se ao meio
ambiente e aos hábitos e costumes intrínsecos a sociedade. Quando as causas são
internas, estão relacionadas a fatores geneticamente pré-determinados e à capacidade
do organismo de se defender dessas agressões.
Dentro da história da Medicina, o estudo do câncer sempre ocupou lugar de destaque,
mesmo porque os registros médicos a respeito das antigas civilizações atestavam as
primeiras descobertas e teorias acerca dos tumores malignos. Dentro da escola
hipocrática, acreditava-se que a doença era o resultado de um desequilíbrio orgânico e
do excesso de bile negra, um dos fluidos responsáveis pela saúde humana. No século
XIX, estudos desenvolvidos na área de câncer apontaram a vinculação entre a doença e
as células, mas as possibilidades de tratamento eficazes ainda eram inexistentes
(TEIXEIRA & FONSECA, 2007).
Conforme apontam os autores, somente com os avanços da ciência e da tecnologia no
final do século XIX, as possibilidades de intervenção contra o câncer experimentaram
seus primeiros passos. Estudos envolvendo patologia celular; anestesia; anti-sepsia; e,
principalmente, a descoberta dos raios-X e da radioatividade permitiram transformações
no tratamento do câncer. No início do século XX somente eram curáveis os cânceres
pequenos e localizados que pudessem ser removidos completamente pela cirurgia. Em
seguida, a radioterapia foi usada após a cirurgia para controlar pequenos crescimentos
tumorais que não tivessem sido removidos cirurgicamente. Com o tempo, a quimioterapia
foi acrescentada para destruir as poucas células cancerosas remanescentes e,
finalmente, seu uso a partir de múltiplos agentes – quimioterapia combinada – para
substituir drogas isoladas talvez tenha sido a maior das descobertas. Algumas neoplasias
com crescimento muito rápido – leucemias, linfomas, alguns cânceres pediátricos –
respondem bem à quimioterapia combinada e podem ser curadas hoje em dia. Nos dias
atuais, o conhecimento da relação entre câncer e genes promete uma série de benefícios
para a área em questão.
O câncer pode ser tratado de várias maneiras isoladas ou combinadas e incluem a
cirurgia, radioterapia, quimioterapia ou transplante de medula óssea. A radioterapia é um
tratamento realizado através de radiação que destrói um tumor ou impede o crescimento
67
das suas células e pode ser utilizada em conjunto com outros métodos. A quimioterapia
constitui-se num tratamento que utiliza medicamentos para combater a doença, podendo
ser administrada via oral, intramuscular, subcutânea, tópica, intratecal ou aplicada na veia
do paciente. A duração do tratamento é planejada de acordo com o tipo de tumor e varia
em cada caso, assim como o tempo de aplicação. Pode ser realizada em regime
ambulatorial ou hospitalar, nos casos em que a internação se faz necessária. Além
desses, ainda há o tratamento a partir do transplante de medula óssea, para os casos em
que a doença afeta as células do sangue
(www.inca.gov.br).
Conforme apontam Teixeira e Fonseca (2007), o câncer possui na sua história um grande
paradoxo: à medida que a medicina foi alargando os conhecimentos e desenvolvendo
tecnologias cada vez mais poderosas contra seus nefastos efeitos, o pavor das
populações em relação a ele também se ampliou.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (www.who.int), a previsão de
mortalidade por câncer aumentará em 45% entre os anos de 2007 e 2030, efetivamente
em função do crescimento demográfico e do envelhecimento da população. Na maior
parte dos países desenvolvidos, o câncer é a segunda causa de mortalidade depois das
enfermidades cardiovasculares, dado que está se tornando uma tendência também nos
países em desenvolvimento, segundo estudos epidemiológicos recentes.
No Brasil, conforme apontam as estimativas do Instituto Nacional do Câncer INCA
nos anos de 2010 e 2011 aparecerão em média 400 mil novos casos da doença. Os tipos
mais incidentes serão os cânceres de próstata e pulmão para o sexo masculino e os
cânceres de mama e de colo do útero para o sexo feminino, acompanhando o mesmo
perfil observado na América Latina. Enquanto as regiões norte e nordeste do Brasil
apresentam as menores taxas de incidência de câncer, as regiões sul e sudeste
apresentam as maiores, devido às melhores condições socioeconômicas da população,
maior expectativa de vida e longevidade, além do melhor acesso aos serviços de saúde
(www.inca.org.br).
Diante dessas expectativas, fica evidente a necessidade do desenvolvimento de ações
para o controle do câncer nos diferentes níveis de atuação, desde a promoção da saúde
e programas de prevenção até a formação de recursos humanos para atuar na área.
Trabalhos como o de Castro (2009) e o de Quintana et al (2004) levantam a questão das
representações do câncer e das campanhas de prevenção da doença. Enquanto o
primeiro estudo verifica a percepção do câncer pela mídia e sua consonância com a atual
68
política do Ministério da Saúde, o segundo enfatiza as representações do câncer para um
determinado grupo de mulheres e sua relação com o que é preconizado nos meios de
comunicação. São formas de alcançar maiores níveis de abrangência das campanhas
para a população brasileira.
Um número considerável de pesquisas associando câncer e representações sociais pode
ser encontrado nos bancos de dados da área da saúde. Os autores, em sua maioria
enfermeiros ou psicólogos, procuram nesses achados os meios para prestar uma
assistência mais eficiente no que diz respeito à prevenção e ao próprio cuidado dentro da
relação estabelecida com o paciente no ambiente de tratamento. De uma maneira geral,
como podem ser observados a partir dos trabalhos de Cascais et. al. (2008), Coutinho e
Trindade (2006), Vieira e Queiroz (2006) e Queiroz et. al. (2005), o câncer ainda possui
fortes ligações com a idéia de morte, medo, sofrimento e incapacidade.
Dentro dessa vertente, o trabalho de Lara (2005) destaca idéias próprias e de outras
pessoas sobre o ncer. Trata-se de um texto que intercala depoimentos pessoais com o
resultado de várias entrevistas realizadas durante o período destinado ao tratamento nos
serviços de saúde voltados para o câncer. Dentre tantos aspectos julgados pertinentes
para associar a esta tese, vale ressaltar os que estão ligados à dificuldade de mencionar
o termo câncer e de conversar sobre o assunto. Além disso, o sofrimento que se estende
desde o diagnóstico da doença até as diversas fases do tratamento também expressam o
cuidado que deve ser estabelecido nas relações interpessoais e familiares.
Numa discussão sobre doença e cultura na pós-modernidade, Morris (1998) comenta que
uma doença grave e prolongada pode provocar inúmeras mudanças, destruir o corpo
paralisar a mente e os familiares. No entanto, a doença depende de características
biológicas e históricas, variando conforme grupos sociais e região geográfica na qual
esse grupo habite. Sabe-se, pois, que as mudanças sociais e econômicas vividas ao
longo dos séculos mudaram não as formas de vida e as doenças, mas também o
modo de enxergá-las. Hoje as doenças são outras e as causas de morte também. As
doenças pós-modernas passaram a ser as cardíacas, a AIDS, o câncer e a depressão,
exemplos citados pelo autor em suas discussões sobre a relação doença e estilo de vida.
“(...) As pessoas em todas as eras procuraram remédio para aquilo que as
afligia, desde os banhos romanos às ervas chinesas. Todavia, nunca antes os
cidadãos tinham estado à mercê dos meios de comunicação eletrônicos
desesperados para encher o tempo de antena com a informação médica mais
recente; nunca as pessoas tinham enfrentado o dilúvio diário de publicidade
69
ligada à saúde subsidiado por hospitais, seguradoras e enormes laboratórios
farmacêuticos internacionais. (Morris, 1998, p. 84).
Os questionamentos apresentados pelo autor supracitado são de várias ordens e incluem
uma série de elementos da cultura ocidental atual. Entretanto, suas idéias percorrem
sempre o víeis do modelo biocultural do ser humano, fora dos padrões de separação
corpo e mente e da visão mecanicista da vida, como ele próprio sugere. A doença não
deveria ser vista isolada dos contextos culturais.
2.3.4 O ambiente hospitalar e a oncologia
A história dos hospitais de câncer confunde-se com a própria história dos
estabelecimentos hospitalares em geral. Antes de serem ambientes terapêuticos, esses
estabelecimentos de estrutura física precária e atendimento prestado através da
caridade, eram locais de acolhimento de pobres e indigentes necessitando de cuidados
no momento da morte. Nesse sentido, é possível encontrar registros que apontam a
existência de asilos exclusivos para cancerosos em algumas regiões européias.
Segundo Teixeira e Fonseca (2007), em 1742, na cidade de Reims, na França e mais
tarde, em 1799, na Ingleterra, foram fundados espécies de albergues voltados à proteção
dos doentes de câncer. Em meados do século XIX, na França, arredores de Lyon, a
Associação das Senhoras do Calvário implantou um asilo para mulheres cancerosas,
mantido e administrado por mulheres viúvas voltadas para a caridade. Outros registros,
como é o caso do Royal Marsden Hospital, destacam sua importância como primeiro
hospital do mundo dedicado ao estudo e tratamento do câncer. Sua fundação data de
1851, pelo médico Willian Marsden, cuja esposa havia falecido em função de um câncer
(www.royalmarsden.nhs.uk).
No Brasil, a primeira instituição voltada exclusivamente para as pesquisas radiológicas e
para o tratamento do câncer surgiu em belo Horizonte, em 1922. Visando acompanhar os
moldes do Instituto de Radiun de Paris, pioneira nas pesquisas que utilizavam a
substância nos tratamentos de radioterapia, a construção do hospital e a compra do radio
seguiu critérios do exemplo europeu e só foi possível graças a ajuda dos governos
federais e estaduais. Por algum tempo, as ações e instituições filantrópicas também
marcaram a assistência oncológica no país, com sede, principalmente nas santas casas
de misericórdia (TEIXEIRA & FONSECA, 2007).
70
O Instituto Nacional do Câncer pode ser citado como a principal referência em oncologia
do país. Seu destaque justifica-se principalmente porque sua história esteve e ainda
está vinculada à história e ao desenvolvimento das políticas nacionais de saúde
relacionadas ao câncer. As primeiras instalações do Instituto no local onde se encontra
atualmente, na Praça da Cruz Vermelha, Rio de Janeiro, datam de 1957. Ao longo dos
anos, foi reconhecido como Instituto Nacional de Câncer, passou por alterações
estruturais e funcionais, estabeleceu novas parcerias com órgãos de gestão e acordos
técnico-científicos responsáveis pelo aumento do seu nível de abrangência. nos anos
de 1990, após a criação do SUS, passou a ser órgão governamental responsável por
assistir o Ministério da Saúde na formulação da política nacional de prevenção e controle
do câncer. Seus serviços e estruturas hospitalares foram triplicadas e organizadas em
unidades com atendimento direcionado aos diferentes perfis de pacientes. Na primeira
década do ano 2000, o INCA iniciou um projeto direcionado à população brasileira que
não vive em capitais com assistência oncológica integral e hoje é responsável pela
coordenação desse e de outros projetos. As quatro unidades hospitalares do INCA,
localizadas no município do Rio de Janeiro, integram o Sistema Único de Saúde SUS
e oferecem tratamento integral às pessoas que têm tumores malignos.
Torna-se válido destacar, pois, que outros estabelecimentos hospitalares no Brasil
possuem notoriedade quanto aos serviços oferecidos aos pacientes com câncer.
Instituições de médio e grande porte, públicas, privadas ou filantrópicas adequam-se às
regulamentações do Ministério da Saúde para funcionar segundo critérios que variam
conforme tipo de serviço prestado e nível de complexidade alcançado.
Na medida em que estas edificações são construídas, reformadas ou ampliadas, outros
fatores são assimilados e incorporados aos projetos arquitetônicos, ou seja, aqueles que
dizem respeito ao suporte psicossocial, já comentados anteriormente. Nesse debate,
quando se fala em instituição e serviço especializado em oncologia, costuma-se
mencionar uma série de características de um ambiente voltado integralmente para o
cuidado com o paciente, sempre acompanhadas pela referência ao profissionais
capacitados ou aos equipamentos de alta tecnologia.
Cada estabelecimento de saúde, seja no Brasil ou em qualquer parte do mundo, expõe
seus atributos mesclados à sua missão ou ao seu compromisso com a pesquisa, embora
estejam sempre pontuando um aspecto essencial: a certeza de que o diagnóstico e o
tratamento do câncer exigem cuidados que dizem respeito aos aspectos psicológicos do
71
paciente. A assistência passa a receber a denominação de holística”, comentada nas
seções anteriores.
Numa pesquisa sobre a unidade de internação pós-cirúrgica de um hospital especializado
em oncologia, situado em Nova Iorque, Smykowski (2008) discute as reformas
arquitetônicas realizadas no setor em função da opinião dos usuários do local. O objetivo
era aumentar as condições de privacidade dos pacientes e diminuir os níveis de ruído no
local. O projeto de reforma, depois analisado novamente quando o espaço entrou em
funcionamento, contemplou a separação dos pacientes por módulos de quatro pessoas.
Em cada um desses módulos, foram inseridas cortinas entre os leitos, iluminação e
televisões individuais e poltronas para o acompanhante. Além disso, no próprio
pavimento, foram projetadas salas de esperas para os familiares e salas para reuniões
privadas entre os familiares e a equipe médica.
Num outro exemplo sobre um trabalho realizado em hospital de câncer, Lourenço e
Neves (2008) formularam uma proposta para a implementação de um ambiente de UTI
de cuidado e conforto para o visitante do paciente internado. Trata-se da UTI da Unidade
I do INCA, Rio de Janeiro, e da possibilidade de minimizar os impactos causados pelo
ambiente nos visitantes que necessitam freqüentar o local. O estudo foi desenvolvido
com base em 20 entrevistas semi-estruturadas que seguiram os seguintes eixos: o que
provoca conforto e desconforto no ambiente; o que ajudaria a melhorar as condições de
conforto e quem poderia ajudar nesse sentido. Os resultados apontaram a ajuda das
equipes multidisciplinares com os familiares no enfrentamento da doença, mas também
mostraram a falta de privacidade dos pacientes e dos familiares no momento das visitas,
bem como a necessidade de mudança de layout do local para acomodar pessoas e
equipamentos.
Nesse contexto, mesclado por publicações técnicas ou científicas direcionadas aos
profissionais que lidam com a realidade da oncologia, é possível destacar algumas
características gerais por eles citadas, sejam profissionais de saúde,
gestores/administradores ou ainda os que lidam com a construção e manutenção desses
edifícios.
72
Tais características, sempre expostas nos sites de hospitais
5
, revistas
6
ou livros
especializados no assunto
7
, relacionam ações de saúde e os espaços físicos destinados
para acomodar essas atividades, podendo ser resumidas a partir do quadro abaixo. Do
material reunido a partir dessas fontes, também foi possível selecionar algumas imagens
que expressam a forma como esses espaços estão sendo projetados.
ITEM
ASPECTOS ENVOLVIDOS
COMPONENTES ARQUITETONICOS
Informação
Prestar informações sobre
diagnóstico e tratamento
Salas para palestras
Bibliotecas
Salas de acesso à internet
Suporte social
Presença de familiares e
acompanhantes durante as
diferentes fases do tratamento e
trabalho com equipe multidisciplinar
Locais para permanecer com familiares
Locais para o acompanhante
Locais para realizar atividades terapêuticas
com a equipe hospitalar
Suporte emocional
Prestar assistência psicológica,
terapêutica, espiritual e assistência
estética
Locais para realizar consultas
Locais para realizar atividades terapêuticas
Locais para meditar
Locais para receber assistência estética
Quadro 02: Aspectos e componentes arquitetônicos característicos dos hospitais de câncer
Em que pese a importância de todos os aspectos relativos ao projeto hospitalar, pode-se
dizer que os que relacionam-se à privacidade estão diretamente associados ao espaço
interno ou à interação interior-exterior do edifício, especialmente no uso de salas de
exames, tratamentos ou áreas de circulação. Nesse sentido, é interessante observar as
diferentes opções de layout e o cuidado com a privacidade dos pacientes nas mesmas
(Figuras 28 a 45).
Figura 2
8
(esquerda): Sala de meditação do Sletten Câncer Institute, EUA.
Autores do projeto: NTD Architecture (YEE, 2008).
Figura 29 (direita): Sala de meditação do The Cancer Center, Maimonides Hospital, EUA.
Autores do projeto: Guenther 5, Perkins + Will (YEE, 2008).
5
Ver, por exemplo, sites de hospitais nacionais e internacionais especializados em câncer.
6
Ver, por exemplo, www.healthcaredesignmagazine.com
7
Quanto às publicações, pode-se citar Malkin (1992); Marberry (1995); Yee (2004); Yee (2008) dentre vários
outros.
73
30
(esquerda): Biblioteca do do Sletten Cancer Institute, EUA (YEE, 2008)
Figura 31 (direita): Sala do acelerador linear do do Sletten Cancer Institute, EUA (YEE, 2008)
3
2
(esquerda): Vista externa do North Arundel Hospital Tate Cancer Center, EUA (YEE, 2004)
Figura 33 (direita): Sala de quimioterapia do mesmo hospital. Autores do projeto: Cannon Desgn
74
Figura 3
4
:
Vista externa do Meadville Medical Center Oncology Wellness Institute, EUA.
Autores do projeto: Astorino Architecture (www.healthcaredesignmagazine.com)
Figura 3
5
:
Sala de quimioterapia do Meadville Medical Center Oncology Wellness Institute, EUA.
(www.healthcaredesignmagazine.com)
75
3
6
:
Vista externa do UPCM Câncer Center, EUA
Autores projeto: Mihai Marcu, Alan L. Fishman, Robert Moro, Roger Hartung, Thomas Hartman (YEE, 2004)
Figuras
3
7
e 3
8
:
Vista interna da sala de quimioterapia do UPCM Câncer Center, EUA (YEE, 2004)
Figura 3
9
:
Sala de quimioterapia do Detroit Medical Center, EUA.
Autores do projeto: Cannon Design (YEE, 2004)
76
Figura 40
:
Sala de quimioterapia do Norris Cotton Cancer Center, EUA.
Autores do projeto: Merzproject (YEE, 2004)
Figura 41
:
Sala de quimioterapia do Edwards Cancer Center, Cabell Huntington Hospital, EUA
Autores do projeto: Perkins + Will Architecture (YEE, 2008)
77
Fig
ura 4
2
:
Sala de quimioterapia do Samaritan Lebanon Community Hospital, EUA.
Autores do projeto: Clark e Kjos Architects (YEE, 2008)
Figura 43
:
Sala de quimioterapia do Samaritan Lebanon Community Hospital, EUA
Autores do projeto: Clark e Kjos Architects (YEE, 2008)
78
Figura 4
4
(esquerda): Circulação do setor de quimioterapia do Hospital Moinhos de Vento/RS, Brasil.
Figura 45 (direita): Sala individual de quimioterapia do mesmo hospital. Fonte: acervo próprio
Para concluir este rculo de fatores discutidos até o momento e as possíveis
interferências entre os mesmos, vale indicar determinadas escolhas e preocupações
sobre a privacidade dentro de um vasto panorama de opções de trabalho que o tema
hospital e oncologia abarcam. Assim, com o propósito de nortear os eixos principais da
pesquisa e desenvolver um quadro de idéias que subsidiem o estudo empírico, vale
destacar os seguintes pontos:
A hospitalização e os diversos tratamentos realizados nos espaços assistenciais de
saúde assumem diferentes significados para o paciente, existindo vários aspectos
responsáveis pelo medo e ansiedade presentes nesta experiência;
As atitudes dos profissionais de saúde e determinadas características do espaço físico
amenizam o impacto causado pelo ambiente hospitalar nos pacientes. A possibilidade
de controlar a interação social e, consequentemente, as condições de privacidade são
medidas positivas nesse sentido;
Sabendo que a privacidade assume diversas definições quantos são os olhares sobre
sua importância para a vida em sociedade, partimos da perspectiva que envolve a
relação pessoa-ambiente para seu estudo;
Nos estabelecimentos assistenciais de saúde as características arquitetônicas
associadas à privacidade visual e acústica são variáveis a serem investigadas,
envolvendo: diferentes arranjos espaciais para a internação, modelos de layout,
79
elementos de separação/contato entre setores e pessoas e elementos que relacionam-
se à territorialidade e ao espaço pessoal;
Em decorrência do número reduzido de trabalhos da área de arquitetura que investigam
a privacidade em ambientes hospitalares, especialmente os que não fazem parte da
internação, outros elementos podem ser buscados nos estudos que tratam da
privacidade na moradia e em espaços de trabalho.
80
CAPÍTULO III
PLANEJAMENTO E REALIZAÇÃO DA PESQUISA
O processo de construção de uma proposta metodológica passa por diversas etapas até
sua definição final. Na maior parte dos casos, as experiências adquiridas em pesquisas
anteriores e o conhecimento das situações em que outros autores optaram por
determinados métodos e técnicas de trabalho têm o papel de auxiliar a organização de
uma nova metodologia a ser utilizada.
Partindo desse princípio, optou-se pela eleição de diferentes caminhos para planejar a
pesquisa. Considerando as informações acerca do estudo da privacidade obtidas na
literatura disponível, havia a necessidade de observá-las em determinado contexto
hospitalar para incluir, descartar ou criar novos elementos de análise tanto
arquitetônicos como comportamentais. Um estudo de natureza exploratória e,
posteriormente, a realização de um pré-teste
8
, possibilitaram a descoberta de problemas
e de soluções na forma de coletar as informações.
Neste capítulo também estão expostos o contexto da pesquisa, participantes, técnicas,
procedimentos e instrumentos envolvidos. Em seguida, os dados coletados em campo
estão organizados segundo critérios que facilitam a leitura dos resultados e a discussão
do seu conteúdo, ou seja, por estabelecimento pesquisado e por categorias da análise de
conteúdo. Assim, as informações serão expostas de duas formas: através da
caracterização do local e do perfil dos participantes da pesquisa; e por categoria de
análise das entrevistas, relacionando-as aos pressupostos teóricos propostos para as
reflexões.
3.1 – Trajetória metodológica
3.1.1 Estudo exploratório
Durante o desenvolvimento deste estudo, o conhecimento de trabalhos da área da saúde,
especialmente os de natureza qualitativa, bem como os da área de Arquitetura,
exerceram forte influência nas primeiras decisões acerca do tipo de abordagem a ser
8
O pré-teste foi realizado durante um mês nas instituições escolhidas como universo de pesquisa. Sua
principal função foi a adequação do roteiro de entrevistas ao propósito do trabalho, cujos detalhes encontram-
se na seção correspondente.
81
empregada. Contudo, para descobrir dados sobre a privacidade e seus elementos
constituintes era preciso dividir a atenção entre as informações provenientes dos usuários
e das características dos seus ambientes.
O problema inicial girava em torno de duas questões. A primeira era: como abordar
pacientes que estão doentes, fora do seu ambiente familiar? A segunda tratava do uso do
termo privacidade nas entrevistas: este termo seria um gerador de narrativas? Assim,
tentando verificar de que forma a pesquisa poderia ser encaminhada durante as fases
seguintes, desenvolvemos uma atividade exploratória numa enfermaria hospitalar de uma
instituição de traumato-ortopedia, na cidade de Natal/RN, no período de junho de 2007.
Tratava-se de um hospital público, cujos pacientes realizavam seus tratamentos através
do SUS.
Naquele hospital, o setor de internação é composto por enfermarias com três leitos, um
armário de alvenaria e um banco de madeira para acomodar os possíveis
acompanhantes. No caso de existirem três pacientes com mais de sessenta anos, como
foi o caso da enfermaria observada, não há acomodações suficientes para as três
acompanhantes, nem mesmo espaço físico disponível para tal. banheiro em cada
enfermaria, mas este era mais utilizado pelos acompanhantes do que pelos pacientes,
pois na maior parte dos casos estes últimos encontravam-se presos ao leito em virtude
de dificuldades de locomoção.
Esta organização físico-espacial do local comprometeu aspectos relacionados à
privacidade porque tinha como elementos complicadores o tamanho do ambiente, a
disposição do mobiliário e aberturas para outros locais. Tais elementos influenciaram
diretamente as distâncias pessoais, bem como o que era visto, quem era visto, o que era
escutado e quem era ouvido. Tais fatores puderam ser observados, inclusive, numa
relação entre esta enfermaria e as demais ou entre a enfermaria e o corredor ou posto de
enfermagem.
Dentre tantos detalhes vivenciados durante os três dias de observação, serão citados os
que estiveram mais associados ao forte viés cultural da privacidade e dos hábitos
daquele grupo específico. O incômodo mais visível foi o banho no leito, pois a dificuldade
- ou a proibição - de locomoção não permitia que os pacientes utilizassem o banheiro.
Durante os banhos que presenciei, não havia biombo em volta do leito, nem a equipe de
enfermagem fechava a porta da enfermaria. As pacientes e suas acompanhantes não se
queixavam, mas por vezes colocavam a mão nos genitais tentando se resguardar.
82
Quando eu perguntei sobre o fato de ter que passar por aquela situação na frente das
outras pessoas, as pacientes e as suas acompanhantes me responderam: “não tem outro
jeito”. Quando eu perguntei sobre como o espaço físico poderia ser organizado para
ajudar naquele momento, elas me responderam: “hospital público é assim”.
As pessoas não se incomodavam com outras situações que envolviam o
comprometimento da privacidade. Pelo contrário: todos queriam saber dos problemas dos
outros e não se constrangiam em contar os seus. As acompanhantes circulavam pelas
outras enfermarias e faziam amizade com as outras pacientes e acompanhantes; abriam
e fechavam portas; acendiam e apagavam as luzes dos ambientes e mexiam nos leitos
sem pedir licença à paciente. O fato de muitas pessoas ali naquelas enfermarias serem
provenientes de cidades do interior, com costumes e valores típicos de quem vive em
pequenas cidades do interior do nordeste, fazia com que suas atitudes no hospital
repetissem seus hábitos do dia-a-dia: dividir a casa com muitas pessoas e entrar na casa
dos vizinhos a qualquer momento, correspondia ao fato de compartilhar o momento da
doença e o espaço da enfermaria e corredores do hospital com os outros pacientes e
acompanhantes. Além disso, o que as pessoas gostavam de comer e o que o hospital
servia nas refeições, refletia de modo marcante a cultura nordestina e os hábitos das
pessoas mais humildes.
O termo “privacidade”, quando usado nas conversas, não foi gerador de narrativas e
causou certo grau de estranheza por parte dos usuários daquele local. A exceção foi o
pessoal de enfermagem, que chegou a falar um pouco sobre o assunto. No caso,
segundo essas funcionárias, na maior parte das vezes não há preocupação com a
privacidade naquelas enfermarias, a não ser na presença de pessoas do sexo oposto.
Quando a conversa incluiu termos como “sentir vergonha”, “ficar à vontade na frente dos
outros” ou “guardar suas coisas num local que ninguém mexa”, pacientes e
acompanhantes emitiram suas opiniões, mas não mencionaram o termo privacidade. Tal
fato levantou a questão de que, em alguns contextos, a privacidade deve ser abordada
por outras vias, associadas à experiência de internação e ao fato de compartilhar o
espaço com outras pessoas. Em trabalhos realizados por enfermeiros, o uso do termo
“privacidade” nas entrevistas é mais freqüente quando os participantes da pesquisa são
profissionais de saúde (CHAUDHURY et. al., 2006; HEIKKINEN et. al, 2006). Em
pesquisas que contemplam a perspectiva do paciente, são utilizados outros conceitos
ligados à invasão do espaço pessoal ou territorial dos pacientes (SAWADA, 1995).
83
Com esta experiência em mãos, ficou decidido que:
A pesquisa teria natureza qualitativa (dada a relação privacidade x subjetividade)
A pesquisa incluiria entrevistas e levantamento físico/arquitetônico;
O roteiro de entrevistas incluiria questões acerca do espaço pessoal, territorialidade e
de como seria a experiência de compartilhar o determinados ambientes hospitalares.
A pesquisa se concentraria em instituições hospitalares públicas e privadas e,
preferencialmente, incluiria os setores de maior permanência do paciente - internações.
3.1.2 Universo, participantes, técnicas, procedimentos e instrumentos
a) O contexto da pesquisa
A opção por unidades de saúde voltadas para o câncer foi motivada por alguns fatores,
sendo o quadro atual de incidência de câncer, anteriormente comentado, o primeiro
deles. Em segundo lugar, foi a oportunidade de trabalhar com diferentes tipos de
ambientes de serviços públicos e privados de uma mesma rede de atenção à saúde, a
Liga Norte Riograndense Contra o Câncer. A LNRCC
9
é uma entidade filantrópica, sem
fins lucrativos, com sessenta anos de atuação no Estado do Rio Grande do Norte. Foi
fundada em 1949 com auxílio do Serviço Nacional de Câncer e atualmente oferece uma
variedade de serviços no segmento oncológico, com cerca de 80% realizado pelo
Sistema Único de Saúde – SUS, contando também com investimentos federais, parcerias
com empresários e doações da população.
Outro aspecto que contribuiu para a escolha de tais unidades foi a realização de um
projeto de reforma e ampliação de um desses edifícios, o Centro Avançado em Oncologia
CECAN. Com este projeto desenvolvendo-se no período da coleta de dados da fase
empírica da pesquisa, foi possível unir os dados obtidos em campo com as decisões de
projeto. O CECAN
10
é um estabelecimento assistencial de saúde de caráter ambulatorial,
de diagnóstico e tratamento de câncer, com uma área construída de 6.500m². Com seu
projeto de reforma e ampliação, essa área cresce para 12.500m² e irá contemplar: o
aumento das especialidades incluídas na unidade ambulatorial; o crescimento do setor de
quimioterapia; o crescimento e organização da unidade administrativa; o crescimento da
unidade de diagnóstico por imagem e a incorporação de áreas voltadas para ensino e
pesquisa. Outros dados acerca desse projeto encontram-se nos apêndices.
9
Deste ponto em diante, a Liga Norte Riograndense Contra o Câncer será substituída pela sigla LNRCC.
10
Deste ponto em diante, o Centro Avançado em Oncologia será substituído pela sigla CECAN.
84
Assim, três unidades da LNRCC foram incorporadas ao estudo: a Policlínica, o Hospital
Luís Antônio e o CECAN. Partimos do pressuposto de que existem diferenças no tocante
à privacidade e sua relação com o espaço segundo pacientes da rede pública e da rede
privada de instituições de saúde, dadas as variantes associadas ao objeto de estudo. De
acordo com o que foi explicitado anteriormente, a forma de lidar com a privacidade possui
fortes raízes culturais e seu conceito e função podem variar de acordo com crenças,
costumes e circunstâncias.
Atualmente, os serviços de saúde em oncologia estão organizados, em sua grande parte,
de modo a garantir a continuidade do tratamento do paciente desde o momento do
diagnóstico da doença. Seja através do SUS ou de uma rede particular de saúde, cada
tipo de procedimento é realizado em determinados tipos de ambientes, conforme grau de
complexidade e tipo de atividade a ser desenvolvida.
Dessa maneira, ambientes públicos e privados apresentam diferenças entre si que
podem interferir no modo como são vivenciados por seus usuários. As enfermarias
podem incluir diferentes opções de layout ou número de leitos, ao passo que as salas de
quimioterapia também podem apresentar tal variação na sua organização física e de
poltronas ou leitos. Em grande parte dos hospitais privados construídos ou reformados a
partir da última década, há uma mudança no espaço físico referente aos novos conceitos
desenvolvidos por correntes pós-modernas da arquitetura hospitalar e humanização da
saúde. Os projetos passam a ser norteados por princípios de conforto e satisfação do
cliente. Por outro lado, nos hospitais públicos, tal mudança pode ser observada ou não.
Diante dessa diversidade e da possibilidade de encontrar todas essas situações nas
unidades de saúde pertencentes à LNRCC, optou-se pela eleição dos serviços
compartilhados, ou seja, salões de quimioterapia e enfermarias hospitalares. Áreas de
tratamento de radioterapia, braquiterapia
11
e iodoterapia
12
não entraram na proposta do
estudo em virtude de serem espaços nos quais os pacientes permanecem sozinhos
durante cada sessão realizada.
11
Braquiterapia é um tipo de tratamento que utiliza pequenas partículas sólidas, contendo fontes de radiação
ionizante, implantadas no local do tumor, ou seja, dentro do paciente.
12
Iodoterapia é uma modalidade de tratamento dentro da qual o paciente recebe uma medicação com iodo
radioativo e fica internado por um determinado período nas instalações físicas da unidade de atenção à
saúde.
85
b) Participantes
No que concerne aos participantes, foram considerados sujeitos da pesquisa os
pacientes adultos, com fala preservada, quadro clínico estável confirmado pelo pessoal
de enfermagem, que aceitaram participar da pesquisa. Após fases iniciais de observação
e pré-teste, optou-se pela participação dos acompanhantes, que vivenciam a situação e
muitas vezes desejam expor seus comentários. Além disso, a inclusão dos
acompanhantes permitiu a continuidade do trabalho em diversas situações nas quais as
dificuldades geradas pelas complicações da doença impossibilitaram a participação do
paciente.
c) Técnicas, procedimentos e instrumentos envolvidos
Apesar de o pesquisador contar com o apoio de alguns profissionais do local a ser
estudado e com o suporte material e burocrático proveniente do processo de submissão
do trabalho ao Comitê de Ética
13
, a sua presença em campo, especialmente em
hospitais, exige a adoção de diversos procedimentos para atenuar possíveis problemas.
O procedimento adotado antes e durante o trabalho empírico incluiu: explicação da
pesquisa aos diretores, administradores, chefes de setores e demais funcionários;
conversas informais com os mesmos; caminhadas pelas unidades de saúde escolhidas;
observações; anotações; fotografia e croquis. Estas últimas, sempre precedidas da
devida explicação aos funcionários presentes quando num espaço sem pacientes e
precedida da permissão pacientes, quando estes se faziam presentes. O término da
etapa empírica também contou com os devidos agradecimentos aos responsáveis de
cada estabelecimento estudado
14
.
Observação
Foram observadas e registradas, em diários de campo, a rotina diária das
enfermarias e salas de quimioterapia: atitudes, comportamentos e utilização do
espaço pelos seus usuários. Foram desenhados croquis dos ambientes e
detalhamentos sobre o que foi visualizado e ouvido, por quem e de onde – quem é
visto? Quem vê? O que é visto? De onde? Quem ouve? Quem é ouvido? O que é
ouvido? De onde se ouve?.
13
Esta tese de doutoramento foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa CEP da
LNRCC.
14
O período compreendido entre a submissão do trabalho no CEP, a coleta de dados propriamente dita e o
encerramento da fase empírica teve duração de 6 meses (maio a novembro de 2009).
86
Entrevistas
Tiveram a função de captar as questões consideradas essenciais para atingir os
objetivos propostos. Sempre que possível permitido os depoimentos foram
gravados, transcritos e posteriormente analisados. As entrevistas duraram, em
média 30 minutos, tendo em vista as condições clínicas de cada paciente ou
disponibilidade dele e do seu acompanhante para conversar. Participaram 20
pessoas ao todo e a amostra foi determinada, além do caráter acidental, pelo
critério de saturação das informações. As entrevistas foram realizadas dentro das
enfermarias ou salões de quimioterapia, com exceção dos momentos em que o
respondente era o acompanhante e estava fora do local de tratamento do
paciente. A técnica de análise das entrevistas se concentrou na Análise de
Conteúdo (BARDIN, 1977), utilizada com o propósito de alcançar maiores
aprofundamentos nas questões consideradas pertinentes durante a realização do
trabalho de campo. O exercício fundamental foi descrever o conteúdo das
representações a partir das freqüências das temáticas presentes nas falas dos
profissionais e posteriormente, interpretar esses dados.
O roteiro de entrevistas
As mudanças no roteiro de entrevistas acompanharam o próprio amadurecimento
da fase empírica da pesquisa. Se a primeira idéia foi a de utilizar o termo
privacidade como gerador de um discurso mais amplo, a segunda se concentrou
em questões sobre os temas encontrados na literatura e durante o período do
estudo exploratório. Assim, as perguntas englobariam: características sócio-
demográficas; características da moradia do paciente; aspectos positivos e
negativos da internação; uso do espaço por cada usuário; territórios físicos;
incômodos ou sentimento de vergonha; relacionamento entre pacientes e entre
esses e seus acompanhantes; o ato de ver e escutar o que se passa ao redor;
possíveis mudanças no ambiente.
A opção pelo cenário da oncologia foi um aspecto que colaborou de modo
marcante no planejamento do estudo e seus aspectos metodológicos. Dentro do
contexto hospitalar, a dimensão psicossocial presente no percurso diagnóstico-
tratamento do paciente e, conseqüentemente, o cuidado com o foco da entrevista
era fator essencial. Mesmo sabendo que a doença e seus significados não faziam
parte do cerne deste trabalho e que, portanto, não seriam abordados com os
87
pacientes, a atenção foi redobrada. Havia o compromisso de que a investigação
não abalaria emocionalmente os participantes, nem tampouco o trabalho contínuo
realizado pelas equipes multidisciplinares.
A partir das primeiras visitas aos locais, entrevistas informais aos profissionais de
saúde e pré-teste, ficou evidente a constatação de que alguns aspectos,
presentes até no então no roteiro, deveriam mudar. O tempo de tratamento do
paciente e experiências anteriores em outras unidades de saúde seriam itens de
extrema importância para iniciar uma conversa e para relacionar com as próximas
respostas. Perguntas sobre a moradia do paciente poderiam se concentrar numa
só, com possíveis desdobramentos durante a entrevista. Um roteiro deveria
servir para as três unidades de saúde escolhidas e, seguindo esse raciocínio,
todos os itens sobre espaço pessoal, territorialidade e aglomeração deveriam se
encaixar nos três estudos de caso. Os itens sobre possíveis mudanças no espaço,
preferências sobre o ato de compartilhar ou não aquela situação continuariam, até
porque as descobertas sobre privacidade estariam dentro dos aspectos
envolvidos no ato de compartilhar os espaços terapêuticos. Assim, tem-se:
PARTE I
PARTE II
Tempo de
Internação
ou
tratamento
Uso do
espaço
imediato
e
arredores
Você na
frente dos
outros
Poltrona/
leito que
ocupa no
momento
Número de
pessoas no
ambiente
Possíveis
mudanças
no espaço
físico
Características
sócio
demográficas
Estadia em
outros
ambientes
hospitalares
Os outros
na sua
frente
Local para
guarda de
pertences
Opção de
ficar sozinho
Quadro 03: Principais eixos do roteiro de entrevistas
Levantamento físico
Registro das características gerais dos espaços, atualizações das plantas baixas,
localização dos ambientes em relação ao conjunto edificado, layout, aberturas
como portas, janelas, elementos vazados ou fechamentos como divisórias e
cortinas. A análise física contou com a relação entre as características do
ambiente e as representações sociais dos pacientes e foi um exercício contínuo
desde as primeiras observações e pré-teste até a etapa oficial das entrevistas.
88
OBSERVAÇÃO E LEVANTAMENTO FÍSICO
Quem é visto
Quem vê?
O que é visto?
De onde?
Quem ouve?
Quem é ouvido?
O que é ouvido?
De onde se ouve?
Localização dos ambientes em relação ao conjunto edificado
Layout
Aberturas
Fechamentos
Materiais transparentes ou opacos
Quadro 04: Aspectos a serem observados no ambiente
3.2 – A Teoria das Representações Sociais
A possibilidade de compreender a relação entre determinados ambientes hospitalares e a
privacidade dos pacientes pode trazer diferentes benefícios para as áreas dedicadas ao
seu estudo, que poderá auxiliar as discussões acerca dos sentidos atribuídos à
privacidade; das implicações que essa relação pode acarretar para o projeto arquitetônico
e dos alcances e limitações do assunto na área de arquitetura hospitalar no Brasil. Com
efeito, para conhecer mais detalhes a respeito da privacidade, é necessário conhecer o
que por trás do que é dito e do que é feito para relacionar com o espaço no qual as
coisas são ditas e feitas. Um objeto determinado por tantos envolventes, inclusive
culturais, não poderia ser verificado através de um formulário com escolha de níveis de
satisfação ou escalas de atitude. Daí a escolha pela Teoria das Representações Sociais
para fundamentar parte da pesquisa.
A forma como pensamos e agimos sofre influência direta das nossas práticas cotidianas
e da vida em sociedade e, consequentemente, nas práticas e na vida em sociedade. As
representações dos objetos - seja uma idéia, um lugar ou um acontecimento - são
influenciadas pelo que nós aprendemos, construímos e reconstruímos ao longo de
nossas vidas no contexto no qual estamos inseridos. Portanto, tem a ver com nossa
cultura, valores, símbolos, linguagem e com a maneira como fazemos uso desses
aspectos para lidarmos com novas situações. Se cada pessoa tem, a seu modo,
determinada relação com os espaços arquitetônicos e apresenta determinadas
particularidades no que diz respeito ao seu modo de pensar sobre as mais diversas
questões presentes no dia-a-dia, ela também o faz em função da coerência com o que é
socialmente compartilhado. Podemos dizer que tais aspectos fazem parte do que é
denominado por Teoria das Representações Sociais, inaugurada por Moscovici.
89
As idéias de Moscovici (2005)
15
sobre a teoria estão fundamentadas em seus
questionamentos acerca do senso comum e do modo como as pessoas representavam
conceitos ou acontecimentos em voga. Essas idéias emergiram em um contexto
específico - França, nos anos de 1950 - e tiveram como pontos norteadores outras
teorias de pesquisadores das ciências sociais e humanas. Em Psicologia, a preocupação
maior naquele momento era verificar e controlar os fenômenos e não compreendê-los na
dinâmica do cotidiano
16
. O estudo das atitudes e opiniões era visto com o intuito de
predizer e modificar o comportamento das pessoas, sem considerar seu mundo
simbólico. Também predominava a idéia de que o conhecimento científico, tido como
verdadeiro e confiável, era superior aos demais porque englobava métodos e técnicas de
verificação, controle ou replicação.
Aos olhos de Moscovici, diferentemente do que se pregava até então, alguns
acontecimentos ou informações veiculadas no dia-a-dia eram captados e transformados
pelas pessoas, de acordo com suas vivências. Assim, para ele, o senso comum passou a
ser uma forma de saber tão importante quanto as demais, porque envolvia diferentes
pontos de vista fruto de diferentes tipos de contextos. Dessa forma, ao estudar a
representação social da psicanálise para determinados grupos de pessoas, criou uma
teoria que estremeceu o alicerce existente até então na sua área de pesquisa. Ele
concluiu que todos nós utilizamos nossas experiências para transformar alguma idéia
nova - não familiar - em algo familiar, palpável, que possa ser definido ou nomeado.
Nesse sentido, fazemos uso de dois mecanismos de um processo de pensamento
baseado na memória e em conclusões passadas: ancoragem e objetivação. No primeiro
mecanismo reduzimos idéias a categorias e imagens comuns, ancoradas em nossas
referências pré-existentes; enquanto no segundo transformamos algo abstrato em quase
concreto, transformando algo que está na mente em algo que está no mundo físico
(MOSCOVICI, 2005).
Quando Moscovici fala em representações “sociais”, ele está se referindo às
representações de sujeitos que são atores e transformadores da realidade e não simples
reprodutores de ideologias, como no caso das representações “coletivas”, estudadas por
Durkeim. As representações convencionalizam os objetos, pessoas ou acontecimentos
15
A elaboração das Teorias das Representações Sociais remonta de 1961 e 1976, datas das publicações
dos trabalhos originais de Moscovici sobre o assunto. A versão citada nesta tese equivale à terceira edição
do livro traduzido para o português.
16
Apesar de esta afirmação acompanhar a obra de Moscovici e o contexto europeu da época, torna-se válido
mencionar que, no final dos anos de 1940, nos EUA, Barker e Wright (Barker, 1987) iniciaram estudos acerca
do comportamento como função da interação pessoa-ambiente.
90
que encontram, lhes dão forma, os localizam em determinadas categorias e
gradualmente os colocam como um modelo de determinado tipo, distinto e partilhado por
um grupo de pessoas. Em segundo lugar, são prescritivas, se impõem sobre nós. São
transmitidas e são o produto de elaborações e mudanças que ocorrem ao longo do
tempo. Para Moscovici, as representações são definidas como:
“Um sistema de valores, idéias e práticas, com uma dupla função: primeiro,
estabelecer uma ordem que possibilitará às pessoas orientar-se em seu mundo
material e social e controlá-lo; e, em segundo lugar, possibilitar que a
comunicação seja possível entre os membros de uma comunidade, fornecendo-
lhes um código para nomear e classificar, sem ambigüidade, os vários aspectos
de seu mundo e da sua história individual e social” (MOSCOVICI, 2005, p. 21).
O desenvolvimento da Teoria das Representações Sociais teve diferentes recepções no
cenário mundial das pesquisas em ciências humanas e sociais. Se por um lado alguns
estudiosos acreditam que a teoria é vaga e seu conceito se confunde com outros
conceitos da área, por outro lado, para outros pesquisadores, funciona como excelente
meio para construir uma ciência psicológica e social do conhecimento.
Segundo Jodelet (2001), compartilhando a linha de pensamento empreendida por
Moscovici, a representação “é uma forma de conhecimento, socialmente elaborada e
partilhada, com um objetivo prático, e que contribui para a construção de uma realidade
comum a um conjunto social” (p. 22). É diferenciada do conhecimento científico, mas tida
como objeto de estudo legítimo devido à sua importância na vida social e ao fato de que
traz à tona esclarecimentos acerca dos processos cognitivos e das interações sociais. A
esse respeito, Jovchelovitch (2001) comenta que saber científico e senso comum são
saberes distintos, mas cada um com uma racionalidade própria. Porém, segundo a
autora, Moscovici comprovou que deferentes tipos de racionalidades estavam presentes
num mesmo grupo social e até num mesmo indivíduo. Daí o conceito de polifasia
cognitiva: as pessoas vão lançar mão de diferentes tipos de saber, dependendo das
circunstâncias de um determinado tempo e de um determinado lugar.
De acordo com Jovchelovitch (2001), essa racionalidade dos saberes, a relação entre
sujeito e objeto e a própria idéia de constrão do conhecimento, estão ligados aos
paradigmas da ciência moderna e ao modo como se pensa a psicologia. No que
concerne às origens e bases teóricas da ciência, a autora aponta que o paradigma
cartesiano trouxe como conseqüências a certeza como medida do conhecimento e a
subjetividade como algo separado do resto do mundo. Por outro lado, no paradigma
hegeliano existe uma relação entre corpo e mente, indivíduo e sociedade, desenvolvida
91
na ação e na comunicação. Seria um paradigma relacional e não dualista como o
desenvolvido por Descartes.
Assim, conforme Jovchelovitch (2001), o estudo das representações sociais implica num
posicionamento específico no que diz respeito à relação sujeito-objeto. Enquanto a
psicologia cognitiva, fruto de tradições filosóficas antigas, se baseia no sujeito do
conhecimento e tenta estabelecer como processos mentais entendidos em si mesmos
são capazes de conhecer, a psicologia social das representações associa sujeito e objeto
numa relação de engajamento, o que faz do saber algo que se estabelece a partir da
nossa relação com o mundo. Ao compartilharmos esse mundo com os outros seres
humanos, aprendemos, desde bebês, determinados códigos da nossa cultura que
envolvem o que é dito, feito ou o que não é dito, como os tabus, por exemplo. É dessa
forma que uma comunidade constrói saberes sociais que tenham a ver com seus modos
de se relacionar. Na relação sujeito-objeto, o saber é ao mesmo tempo individual e social
porque está atravessado pela presença do outro.
De modo semelhante, Abric (2000) destaca que o abandono da distinção clássica entre
sujeito e objeto constitui o ponto de partida da Teoria das Representações Sociais. A
proposta é a de que não uma realidade objetiva a priori, mas uma realidade
representada ou reapropriada pelo indivíduo ou pelo grupo, integrada no seu sistema de
valores e dependente de sua história e contexto social e ideológico. A representação é
uma visão funcional do mundo que oferece condições ao indivíduo ou grupo de dar
sentido às suas condutas e compreender a realidade por meio das suas referências.
Segundo o autor, a representação é:
“(...) uma forma de visão global e unitária de um objeto, mas também de um
sujeito. Esta representação reestrutura a realidade para permitir a integração
das características objetivas do objeto, das experiências anteriores do sujeito e
do seu sistema de atitudes e de normas” (ABRIC, 2000, p.28).
Jodelet (2001) comenta que todos nós criamos representações para nos ajustar ao
mundo, dominá-lo física ou intelectualmente, saber como nos comportar, identificar e
resolver problemas. As representações servem de guias para nomear e definir os
aspectos da realidade diária, interpretar tais aspectos, tomar decisões, posicionar-se
perante eles. São fenômenos ativados e em ação na vida social, compostas por
elementos cognitivos, ideológicos, normativos, crenças, valores, atitudes, opiniões,
imagens, etc. Em sua definição, corroborando com tais afirmações, Wagner (2000) nos
chama a atenção para o fato da representação ser um conteúdo mental estruturado -
92
cognitivo, avaliativo, afetivo e simbólico acerca de fenômenos sociais relevantes,
compartilhados por membros do grupo social.
A criação da Teoria das Representações Sociais possibilitou o desenvolvimento de novos
conhecimentos nas ciências humanas e sociais e o delineamento de diferentes
perspectivas de estudo. Conforme aponta Jodelet (1984), um domínio de pesquisas se
cristalizou e delimitou diferentes formas de abordagem das representações: aquelas mais
ligadas à atividade cognitiva; as associadas aos aspectos significantes da representação;
as que se relacionam com as formas de discurso; as que estão baseadas na prática
social dos sujeitos; as que ressaltam o jogo das relações intergrupais ou ainda as que
encontram-se vinculadas a uma corrente mais sociologizante. Cada ótica diferente
corresponde a um grupo de pesquisadores envolvidos com o assunto.
Por outro lado, a teoria inaugurada por Moscovici também permitiu a incorporação de
novas direções no que diz respeito aos processos e produtos da representação, bem
como ao objetivo da pesquisa e recursos metodológicos empregados. Assim, duas
correntes distintas, mas complementares, podem ser visualizadas na área em questão:
processual e estrutural. A corrente processual estuda a gênese histórica das
representações e seus processos de construção, sendo articulada de modo mais fiel às
idéias de Moscovici ou articuladas a uma perspectiva mais sociológica. A segunda
corrente trata o conteúdo cognitivo das representações concebido como um conjunto
organizado e estruturado em um cleo central e sistema periférico. Cabe ao
pesquisador o discernimento acerca do melhor caminho a seguir para alcançar o objetivo
proposto em seus estudos (SÁ, 1998; JODELET, 2001).
De acordo com (1998), os objetos de pesquisa de representação social, para serem
denominados como tal, devem ter relevância cultural ou espessura social. Campos
(2000) esclarece o assunto apontando que o domínio do objeto de representação
favorece a identidade e coesão social do grupo que o representa. Além disso, o domínio
desse objeto é também importante para outros grupos sociais que interagem diretamente
com o primeiro. Isto posto, podemos dizer que o objeto “privacidade” pode funcionar
dessa maneira para determinados grupos de indivíduos: lhes confere identidade, coesão
social e os aproxima de outros grupos. Portanto, conforme aponta Jodelet (2001), as
representações sociais:
“(...) envolvem a pertença social dos indivíduos com as implicações afetivas e
normativas, com as interiorizações de experiências, práticas, modelos de
condutas e pensamento, socialmente inculcados ou transmitidos pela
93
comunicação social, que a ela estão ligadas. Por isso, seu estudo constitui uma
contribuição decisiva para a abordagem da vida mental individual e coletiva (...)”
(p. 22).
Wagner (2000) comenta que os campos de pesquisa em representações envolvem
essencialmente o conhecimento popular das idéias científicas socializadas, o campo dos
objetos culturalmente construídos ao longo da história e o campo das condições e
eventos sociais e políticos. A respeito das representações hegemônicas ou culturais, ou
seja, aquelas com longa tradição, enraizadas no pensamento e no comportamento do
povo, Wagner aponta como exemplos os estudos sobre papéis sexuais, mulheres, mães
e crianças, anomalias da existência humana, como doença, loucura e deficiências, e
ainda o corpo humano. Este último objeto cultural reflete a integração da experiência
pessoal subjetiva a das relações sociais. Serve de referência para estados individuais de
sentimentos, normas sociais e exigências culturais que regulam o limite individual.
Desse modo, como as representações estão baseadas na constatação de que nós
compartilhamos idéias sobre determinados objetos de forma coletiva com o grupo ou
grupos a que pertencemos, é um importante caminho para compreender os sentidos
atribuídos à privacidade no contexto hospitalar, mais especificamente na situação de
compartilhamento dos ambientes. Também é um importante caminho para compreender
que tipo de relação pode ser estabelecida entre a privacidade e o espaço físico de
enfermarias e salas de quimioterapia.
3.3 – Apresentação dos resultados
3.3.1 Caracterização dos estabelecimentos assistenciais de saúde pesquisados
a) Localização dos estabelecimentos na cidade
A Figura 46 apresenta a localização dos três estabelecimentos assistenciais de saúde
escolhidos para o estudo dentro da região metropolitana de Natal. A proximidade entre os
três edifícios e a concentração das demais unidades de saúde em alguns bairros
acompanhou o desenvolvimento natural da cidade. Conforme assinala Medeiros (2005), a
implantação dos hospitais em Natal refletiu as transformações ocorridas no cenário das
políticas de saúde do país e o próprio ritmo de desenvolvimento de Natal, seguindo
demandas sociais locais e expansão geográfica. Com exceção de hospitais patrocinados
pela igreja católica, uma variedade de empreendimentos foi construída a partir de 1856,
data de construção do primeiro hospital da cidade.
94
Figura 4
6
:
Mapa com a localização das unidades de saúde na cidade de Natal
95
b) Policlínica
A Policlínica é um hospital geral localizado no bairro do Alecrim, região central de Natal.
Seus serviços incluem ambulatório, pronto socorro, 81 leitos de internação adulto e
pediátrico centro cirúrgico com 5 salas, UTI, unidade de imagem, apoio técnico,
logístico e administrativo. Em 1944, quando foi construído, apresentava tipologia
pavilhonar e era administrado por médicos e irmãs de ordens religiosas (MEDEIROS,
2005). Com o passar dos anos e as reformas e ampliações constantes, encontra-se hoje
descaracterizado quanto aos traços de seu projeto original. O conjunto arquitetônico é
composto por um bloco único, com dois pavimentos e escassas áreas descobertas,
existentes apenas nos recuos e na área de estacionamento – parte frontal do terreno (ver
Figura 47). A Policlínica passou a fazer parte da LNRCC no ano de 2002, contando com
50% do seu atendimento voltado para a oncologia, sendo referência em oncologia
pediátrica. Com exceção desta, o restante do atendimento é direcionado para uma
clientela particular.
Figura
4
7
:
Implantação esquemática da Policlínica.
Autor do projeto original: não identificado / Projetos atuais de reforma: Arquitetura Hospitalar Projeto e
Consultoria – Natal/RN
96
4
8
:
Vista externa da Policlínica. Fachada principal, em frente ao estacionamento.
Fonte: http://www.ligacontraocancer.com.br.
c) Hospital Luís Antônio
O Hospital Luís Antônio
17
foi construído em 1949, no bairro das Quintas, por iniciativa da
LNRCC. Começou a funcionar como casa de recolhimento, espécie de albergue para
pacientes com câncer que não podiam pagar pelos serviços. Suas instalações foram fruto
de reformas e demolições das residências ao redor da primeira sede do hospital, fato que
explica a conformação atual do edifício, com diferentes características construtivas e
soluções precárias de conforto ambiental. O hospital atende exclusivamente pacientes
adultos do SUS e dispõe de ambulatório nas especialidades de cabeça e pescoço, clínica
médica, ginecologia, endocrinologia, otorrinolaringologia, dermatologia, urologia,
proctologia e cirurgias gerais. Conta com 87 leitos de internação, centro cirúrgico com 4
salas, serviço de urgência apenas para quem foi paciente do referido
estabelecimento laboratório de análises patológicas, apoio técnico, logístico e
administrativo (ver Figura 49).
17
Dentro das regulamentações que regem a Política Nacional de Atenção Oncológica do Ministério da
Saúde, o Hospital Luís Antônio está habilitado como Centro de Assistência de Alta Complexidade em
Oncologia - CACON, conforme as portarias n. 2439/GM de 8 de dezembro de 2005 e a n. 62 de 11 de março
de 2009.
97
4
9
:
Implantação esquemática do Hospital Luís Antônio.
Ausência de projeto original / Projetos atuais de reformas: Arquitetura Hospitalar Projeto e Consultoria –
Natal/RN
Figura 50
:
Vista externa do Hospital Luís Antônio. Fachada da Rua Luís Sampaio.
Fonte: http://www.ligacontraocancer.com.br
98
d) CECAN
O Centro Avançado em Oncologia CECAN é uma unidade ambulatorial localizada no
bairro de Dix Sept Rosado, situado entre as zonas sul e oeste da cidade de Natal. Suas
instalações foram inauguradas no ano de 2001 e possuem unidades de radioterapia,
quimioterapia e medicina nuclear para diagnóstico e tratamento do câncer. Atualmente
foram adquiridos mais dois aceleradores lineares
18
e um pet scan
19
, o primeiro da cidade.
Os consultórios abrigam várias especialidades, dentre as quais se destacam: mastologia,
urologia, oncologia clínica, gastroenterologia e proctologia. O setor de diagnóstico por
imagem está aparelhado para realizar tomografia, ultrassonografias, mamografias, raios-x
e ressonâncias magnéticas. Os serviços de apoio técnico incluem central de esterilização
e farmácia; os de apoio logístico incluem apenas a parte de conforto e higiene, limpeza e
zeladoria e central de administração de materiais; e os serviços administrativos incluem
salas relacionadas à demanda local. O conjunto arquitetônico é composto por um bloco
único, térreo, caracterizado pela tipologia rua hospitalar, projetada segundo uma estrutura
modulada, padronizada e expansível. Suas unidades encontram-se dispostas em zonas
funcionais interligadas que podem crescer sem interferir umas nas outras (ver Figura 52).
Figura
51
:
Vista externa do CECAN. Fachada da Rua Interventor Mário Câmara e acesso ambulatorial.
Fonte: http://www.ligacontraocancer.com.br
18
Aceleradores lineares são aparelhos utilizados no tratamento de radioterapia.
19
Pet Scan é um aparelho utilizado como modalidade de diagnóstico por imagem e funciona detectando
tumores, sua extensão ou a eficácia do tratamento oncológico.
99
5
2
:
Implantação esquemática do CECAN.
Projetos atuais de reformas e ampliações: Arquitetura Hospitalar Projeto e Consultoria – Natal/RN
3.3.2 Perfil dos participantes
Os participantes oficiais da pesquisa, conforme esclarecido anteriormente, formam um
grupo de 20 pessoas, sendo 6 da Policlínica, 8 do Luís Antônio e 6 do Cecan. Por razões
expostas no corpo deste trabalho, houve momentos em que as entrevistas
contemplaram pacientes e acompanhantes, como foi o caso dos dois hospitais. Assim, no
que diz respeito à Policlínica, participaram 3 pacientes e 3 acompanhantes, enquanto no
Luís Antônio esse número foi de 5 pacientes e 3 acompanhantes. no CECAN, em
virtude das características do local e da presença de acompanhantes apenas em casos
extremos, os próprios pacientes se encarregaram de expor suas idéias acerca do assunto
em questão.
100
As pessoas entrevistadas durante a pesquisa estão identificadas pela letra inicial do
estabelecimento hospitalar correspondente, seguida de um número que indica a ordem
cronológica das entrevistas naquele local. Dessa forma, por exemplo, pacientes ou
acompanhantes entrevistados na Policlínica estão identificados por Pol1, Pol2, Pol3, etc.,
enquanto no Luís Antônio identificados por L1, L2, L3 e assim sucessivamente. No
CECAN, os pacientes entrevistados foram identificados com C1, C2, etc. A letra “p” ao
lado de cada identificação corresponde aos pacientes, ao passo que a letra “a”
corresponde aos acompanhantes.
a) Policlínica
Entrevistado
Gênero Idade
Estado
civil
Grau de
instrução
Tempo internação
do paciente
Enfermaria
paciente
Leito do
paciente
Paciente Acompanhante
Pol 1
p
Masc 58 Casado Médio 8 dias 27 B
Pol 2
a
Fem 52 Solteira Superior 3 dias 26 C
Pol 3
a
Fem 49 Casada Médio 8 dias 25 B
Pol 4
p
Fem 68 Casada Fundam. 3 dias 25 A
Pol 5
p
Masc 60 Casado Fundam. 15 dias 24 B
Pol 6
a
Masc 62 Casado Médio 5 dias 22 A
Quadro 05: Perfil dos entrevistados da Policlínica
A tabela acima mostra que a maior parte dos entrevistados da Policlínica possui idade
entre 50 e 60 anos e é casada. O nível de instrução dos participantes variou entre
fundamental, médio e superior. O tempo de internação do paciente variou entre 3 e 8
dias, com apenas uma internação com período de 15 dias. As enfermarias e a posição
dos leitos variaram conforme disponibilidade local durante o período do trabalho de
campo (ver Figura 53 com a distribuição dos pacientes envolvidos na pesquisa por
enfermaria e por leito).
5
3
:
Distribuição dos pacientes da Policlínica por enfermaria e por leito
101
b) Hospital Luís Antônio
Entrevistado
Gênero Idade
Estado
civil
Grau de
instrução
Tempo
internação
do paciente
Enfermaria paciente
Leito do
paciente
Paciente Acompanhante
L1
a
Fem 57 Casada Fundam. 50 dias Etelvino Cunha (EC) Meio
L2
a
Fem 48 Casada Médio 3 dias E Meio
L3
p
Fem 66 Casada Fundam. 5 dias C Meio
L4
a
Fem 59 Casada Médio 25 dias N. S. Fátima (NSF) Meio
L5
p
Fem 48 Casada Fundam. 3 dias D Parede
L6
p
Masc 60 Casado Fundam. 3 dias E Meio
L7
p
Fem 44 Casada Fundam. 5 dias 1 Parede
L
8
p
Fem 35 Casada Fundam. 4 dias 7 Janela
Quadro 06: Perfil dos entrevistados do Hospital Luís Antônio
A respeito do Hospital Luís Antônio, como pode ser visto na tabela acima, a maior parte
dos entrevistados era mulher, com predominância de idade variando entre 40 a 60 anos.
Algumas pessoas moravam em Natal, em bairros da zona norte ou oeste, geralmente
regiões mais precárias da cidade. Outros entrevistados moravam no interior do Estado do
Rio Grande do Norte e sua locomoção acontecia em carros da Prefeitura do seu
município. O nível de instrução dos participantes variou entre fundamental e médio, com
predominância do primeiro. O tempo de internação do paciente variou entre 3 e 5 dias,
com dois casos em que esse período alcançou quase dois meses. As enfermarias e a
posição dos leitos variaram também conforme disponibilidade local durante o período do
trabalho de campo. Vale acrescentar que a instituição trabalha sempre com a sua
capacidade de internação no limite, quase extrapolando o número de leitos disponíveis
(ver Figura 54 com a localização, dentro do setor de internação, das enfermarias
pesquisadas. As Figuras 55 a 59 indicam distribuição dos pacientes por enfermaria e por
leito).
5
4
: Localização, dentro do setor de internação, das enfermarias dos entrevistados.
102
Figura
s
5
5
e 5
6
: Distribuição dos pacientes do Luís Antônio por enfermaria e por leito
5
7
: Distribuição dos pacientes do Luís Antônio por enfermaria e por leito
103
Figuras 5
8
e 5
9
: Distribuição dos pacientes do Luís Antônio por enfermaria e por leito
c) CECAN
Paciente
entrevistado
Gênero Idade Estado civil
Grau de
instrução
Tempo de
tratamento
Salão Poltrona/leito
C1
p
Fem 72 Viúva Fundam. 4 anos Salão B 7
C2
p
Fem 50 Casada Superior 2 anos Convênio 2
C3
p
Fem 34 Casada Médio 5 meses Salão A 21
C4
p
Fem 40 Casada Superior 1 ano Convênio 5
C5
p
Fem 70 Casada Médio 3 meses Convênio 4
C6
p
Fem 45 Casada Superior 4 anos Convênio 3
Quadro 07: Perfil dos entrevistados do Centro Avançado em Oncologia – CECAN
A tabela referente ao CECAN apresenta um número de entrevistados composto apenas
por mulheres, embora esta não tenha sido a única situação encontrada durante o
trabalho de campo. O número de homens nos salões de quimioterapia era sempre inferior
ao número de mulheres, especialmente no que diz respeito ao salão do convênio. A
presença de homens em sessões de quimioterapia caracterizou-se pela presença de
idosos, pacientes mais debilitados ou ainda pacientes desinteressados em participar da
pesquisa.
104
Assim, a maioria das entrevistadas era casada e morava em habitação do tipo casa
20
,
com a família, em bairros próximos ao CECAN zonas sul e oeste da cidade. A idade
variou entre 40 e 70 anos e o nível de instrução entre médio e superior. Pela presença de
salões de quimioterapia destinados àqueles que realizavam tratamento via planos de
saúde, esperava-se a presença de pessoas com níveis de instrução um pouco mais
alto do que no Hospital Luís Antônio. O tempo de tratamento variou entre meses e anos,
com a predominância de pessoas que realizavam sessões de quimioterapia 2 ou 4
anos. O atendimento ao SUS corresponde a 80% do atendimento ambulatorial, enquanto
os particulares correspondem ao restante. Assim, o salão referente aos convênios é
menor e possui um número menor também de poltronas. As poltronas ou leitos a serem
utilizados por cada paciente variam de acordo com os ciclos de quimioterapia e com a
disponibilidade do período, mas é comum que as pessoas se posicionem nos mesmos
locais durante suas sessões (ver Figuras 60 e 61 com a distribuição dos pacientes
entrevistados por sala de quimioterapia e por poltrona).
Figuras 60
e
61
:
Distribuição dos pacientes do CECAN por salão de quimioterapia e posição/poltrona.
20
Apesar de não constar nas tabelas expostas, este dado foi unânime entre os relatos obtidos na Policlínica,
Hospital Luís Antônio e CECAN: todos os entrevistados moravam em habitação do tipo casa.
105
3.4 - Discussão
O processo de análise das entrevistas e a verificação dos temas emergentes desses
depoimentos geraram a elaboração das categorias a partir das quais as questões da
pesquisa foram discutidas. Assim, as principais categorias presentes foram:
Relações interpessoais
Presença do acompanhante
Experiências anteriores
Doença.
No entanto, ainda nas etapas que antecederam as entrevistas, ficou evidente a existência
de duas dimensões fundamentais que sustentam as categorias mencionadas: o
compartilhamento da experiência de hospitalização ou tratamento em determinado
espaço físico e a necessidade de não compartilhar tais experiências, ou seja, a
necessidade de reserva.
COMPARTILHAMENTO
Relações interpessoais
Espaço
físico
Presença do acompanhante
NECESSIDADE DE
RESERVA
Experiências anteriores
Doença
Quadro 08: Dimensões e categorias extraídas das entrevistas
Dentro desse raciocínio, quando a necessidade por privacidade aparece em pequenos
níveis e a importância maior é dada ao fato de compartilhar o espaço e o momento da
hospitalização, chamamos essa dimensão de compartilhamento. Quando a necessidade
por privacidade assume níveis maiores e é fator de influência dentro do processo de
restabelecimento do paciente, chamamos essa dimensão de reserva, que seria
justamente um dos tipos de privacidade. A tabela abaixo apresenta, por estabelecimentos
de atenção à saúde e por dimensão verificada, os pacientes que preferiram interagir
constantemente e os que necessitaram de reserva ou de privacidade.
106
COMPARTILHAMENTO
NECESSIDADE DE RESERVA
Policlínica
Luis Antonio
CECAN
Policlí
nica
Luis Antonio
CECAN
Pol 3 a L 1 a C 1 p Pol 1 p L 2 a C 2 p
Pol 4 p L 3 p C 3 p Pol 2 a L 4 a C 4 p
Pol 5 p L 5 p C 5 p
Pol 6 a L 6 p C 6 p
L 7 p
L 8 p
Quadro 09: Entrevistados e a preferência pela interação constante ou reserva
Apesar das diferenças existentes entre os locais estudados e da experiência de cada
entrevistado com o ambiente de tratamento, as categorias encontradas nos relatos foram
as mesmas. Dessa forma, variações do tipo e tempo de tratamento, local de tratamento e
perspectiva do entrevistado, serão pontuadas ao longo do texto quando se fizerem
necessárias. Por esta razão, alguns estabelecimentos de saúde estudados encontram-se
separados em alguns trechos desta seção.
3.4.1 Relações interpessoais
Foram as relações estabelecidas entre as pessoas envolvidas em todos os cenários
dentro dos quais a pesquisa foi realizada, tanto nos salões de quimioterapia, como nas
enfermarias hospitalares. Considerando as duas dimensões de análise, os participantes
se dividiram entre os que desejaram relacionar-se com os outros e os que não
desejaram, ou pelo menos não o desejaram constantemente. Essas relações incluíram
paciente-paciente, paciente-acompanhante, paciente-equipe hospitalar, paciente-
acompanhante do outro paciente e foram relacionadas ao perfil do entrevistado e às
características do estabelecimento estudado.
Como visto nas seções teóricas deste trabalho, o estudo da proxêmica de Hall (1977)
define que as distâncias mantidas podem ser classificadas de várias maneiras. Nos
espaços estudados, a distância observada foi a pessoal, que permite trocas dentro de
uma distância maior do que a íntima. Estas últimas apareceram em alguns
procedimentos realizados pelo pessoal de enfermagem, que o toque e a manipulação
do paciente muitas vezes se fazem necessários. Distâncias íntimas também foram
observadas entre os pacientes e seus acompanhantes, nas situações em que a relação
entre ambos permitia essa aproximação corporal.
As pessoas procuraram relacionar-se através de diversos comportamentos, dentre os
quais a comunicação verbal foi o principal deles. Assim, quando o distanciamento entre
107
as pessoas permitia conversas mais íntimas, a situação era tida como a mais favorável
no caso dos que preferiam interagir.
“Aqui é bom porque a gente fica conversando e o tempo passa mais rápido” (Pol 4 p)
“Aqui a gente conversa e as pessoas são muito boas” (L6 p)
“(...) aqui a gente conversa e fica vendo tudo (...)” (C3 p)
A disposição do mobiliário também interferiu no grau de interação entre as pessoas,
que cadeiras ou leitos mais próximos e ausência de obstáculos visuais possibilitaram
essas conversas. No caso dos hospitais, por exemplo, a posição dos leitos não foi um
indicador de maiores ou menores dificuldades de interação. Entretanto, o uso
compartilhado dos equipamentos como televisão e ar condicionado mostrou a
necessidade de freqüente interação em virtude das negociações acerca da ligação,
temperatura do ar, canal desejado da televisão, etc. Segundo os entrevistados, outras
negociações tinham que ser feitas no ambiente: abrir ou não as portas e acender ou
apagar as luzes.
“(...) mas a gente gostou (da localização do leito) porque tem a televisão (...) a
gente combina alguma coisa, o horário para desligar(...)” (Pol 3 a)
“Quando ela (a senhora do leito do meio) vai para a radioterapia, a gente fecha
tudo e liga o ar condicionado durante a tarde toda. Quando ela chega, a gente
desliga. Aqui tem que cooperar” (L8 p).
A respeito do CECAN, as cadeiras em círculo do salão do SUS aumentam a interação
entre as pessoas, enquanto as dispostas lado-a-lado diminuem. No salão de
quimioterapia do convênio, as cadeiras dispostas lado-a-lado diminuem a interação e é o
que os pacientes desejam. Ainda assim, segundo alguns entrevistados, a distância entre
eles poderia ser maior.
108
Figuras
6
2
e 6
3
:
Salão B de quimioterapia, SUS, cadeiras dispostas lado a lado. Fonte:acervo próprio
Obs: deste ponto em diante, as setas dentro das plantas baixas mostram o local do
observador no momento da fotografia.
Figuras 6
4
e 6
5
:
Salão A de quimioterapia, SUS, com leitos dispostos lado a lado e cadeiras dispostas em
círculo. Fonte:acervo próprio.
109
Figura 6
6
: Salão A de quimioterapia, SUS, com visualização dos leitos. Fonte:acervo próprio.
Figuras 6
7
e 6
8
:
Salão de quimioterapia do convênio com cadeiras dispostas lado a lado. Fonte:acervo
próprio.
110
Figuras 6
9
e
70
:
Setor de quimioterapia do convênio, apartamento 1. Fonte:acervo próprio
Por outro lado, as divisórias do salão de quimioterapia do SUS, também são elementos
que promovem a interação entre as pessoas, já que sua altura permite a visualização das
mesmas quando estão em pé. Trata-se de um componente arquitetônico que divide os
ambientes, mas não completamente. Para os pacientes que estão sentados, não
contato visual com as outras pessoas que encontram-se espalhadas pelos espaços dos
salões, mas o contato auditivo e olfativo. Nesse ponto, para os que não aprovariam
ouvir o que se passa ao redor, as divisórias em meia parede pecam por não interferir na
passagem dos ruídos. No entanto, para outros pacientes e para a própria equipe de
enfermagem, este componente funciona como um aliado para ver e ouvir o que está se
passando. Um dos rdos característicos no local, por exemplo, é o sinal emitido pelos
pequenos aparelhos, como se fossem monitores, utilizados nas sessões de
quimioterapia. Eles avisam quando a medicação está chegando ao final. Além deste,
também se ouve pessoas conversando e o som das televisões.
111
71
:
Salão A de quimioterapia, SUS. Fonte:acervo próprio
Em se tratando das divisórias presentes na Policlínica, os depoimentos expressaram
unanimidade quanto à sua importância para as pessoas que desejam um mínimo de
reserva. Não evitam completamente o contato visual, auditivo e olfativo, mas dificultam a
interação.
“(...) As cortinas têm o papel de dificultar um pouco o olhar direto (...) (Pol 2 a)
Figuras
72
e 7
3
:
Enfermaria tipo da Policlínica. Visualização das divisórias. Fonte:acervo próprio
112
No hospital Luís Antônio, apenas uma enfermaria possui cortinas entre os leitos. Para um
dos entrevistados daquele local, esse item é responsável pela redução do contato visual
e do possível sofrimento que seria causado caso não existisse essa possibilidade (ver
trecho da fala de L4 na categoria doença)
Figuras 7
4
e 7
5
:
Enfermaria Nossa Senhora de Fátima do Hosp. Luís Antônio. Fonte:acervo próprio
Relacionar-se também inclui dividir o espaço para a guarda de pertences, no caso de
haver armários ou bancadas coletivas nas enfermarias ou salões de quimioterapia. Na
Policlínica existem pequenos armários individuais para a guarda dos pertences de cada
paciente, embora alguns entrevistados tenham comentado sobre o tamanho reduzido
desses armários. no Hospital Luís Antônio, a existência de uma bancada ao lado do
leito permite a guarda de poucos objetos, incluindo os de higiene pessoal. Aqui vale
salientar que nem todas as enfermarias deste hospital apresentavam local para guarda
de pertences, como foi o caso da Etelvino Cunha, por exemplo. Os objetos dos pacientes
estavam em sacos plásticos embaixo dos leitos. No CECAN, nas salas de quimioterapia,
não local para guardar os pertences dos pacientes, dado que não pareceu ser um
problema nas informações prestadas pelos participantes da pesquisa. Pelo contrário: até
preferem segurar bolsas e carteiras, com exceção dos momentos em que necessitam ir
ao banheiro.
113
Figura 7
6
(esquerda): Armário padrão das enfermarias da Policlínica. Fonte:acervo próprio
Figura 77 (direita): Bancada padrão das enfermarias do Hosp. Luís Antônio. Fonte:acervo próprio
No tocante aos territórios, conforme apontam autores citados no referencial teórico, pode-
se dizer que os dos locais pesquisados são classificados como secundários, de menor
permanência e geralmente compartilhados por pessoas ou grupos. A própria organização
espacial dos estabelecimentos de atenção à saúde, no que diz respeito às unidades de
internação, apresenta características associadas com a possibilidade de demarcações de
territórios. A RDC50, por exemplo, prevê distanciamentos entre leitos, presença da
cadeira do acompanhante e local para guarda de pertences nas internações. No caso das
salas de quimioterapia, prevê uma área mínima em torno do leito ou poltrona.
Evidentemente, esses são requisitos básicos que dependem do contexto em análise e do
alcance do projeto arquitetônico.
De todo modo, de acordo com as observações efetuadas nos locais de estudo, por mais
apertadas que as enfermarias fossem, cada parcela do espaço físico destinada ao leito e
bancada lateral funcionava como um invólucro para o paciente. Aquele era o seu
território. Dessa maneira, o fato de passar pelos outros leitos para ir ao banheiro, para os
que estavam longe dele, tornava-se um incômodo para alguns pacientes.
Estabelecendo um paralelo entre o tempo de tratamento de quimioterapia ou de
internação numa enfermaria com os territórios criados em cada local, pode-se dizer que
alguns aspectos sofrem alterações na experiência do paciente com aquele espaço. O que
114
antes não era tido como território ou território secundário pode passar a primário,
dependendo do tempo e da relação da pessoa com aquele espaço. Assim, por exemplo,
podem ser citados os casos dos pacientes que realizam suas sessões de quimioterapia
durante anos num mesmo local. Sua poltrona pode ser a mesma ou sempre as mesmas
dentro de determinado setor. Aquele espaço passa a ser familiar, assim como as pessoas
e as coisas ao redor.
Como foi dito, as relações interpessoais se dão de várias maneiras. No momento da
hospitalização, para os que consideram importante compartilhar experiências, existe o
olhar, a ajuda, as curiosidades, as perguntas. Quando existe a necessidade de reserva
por parte dos pacientes ou por parte dos acompanhantes, independente do local de
tratamento, seja uma enfermaria, seja uma sala de quimioterapia, as relações
interpessoais acontecem em menor escala, em alguns casos num nível quase
obrigatório. Quando as relações não são desejadas, as pessoas não conversam, não se
olham, fecham os olhos, viram a cabeça para o outro lado, lêem e vêem televisão. Ou
fingem estar fazendo tudo isso.
Esses comportamentos, por sua vez, podem ser enquadrados nos mecanismos para
obter privacidade, citados por Altman (1975). Associando tal bibliografia aos locais
estudados e pessoas entrevistadas, tem-se:
Mecanismos verbais: uma resposta negativa para uma possível interação;
Mecanismos não verbais: fechar os olhos, virar a cabeça;
Mecanismos ambientais, que usam espaço pessoal, territorialidade e objetos: lençóis,
travesseiros, livros e televisão para evitar a interação; barreiras arquitetônicas, como
divisórias, paredes e o fechamento de cortinas.
Mecanismos culturalmente definidos por normas e práticas: nesse caso, para quem
estava nos salões de quimioterapia do convênio, nas enfermarias da Policlínica ou do
Luís Antônio, houve o entendimento que aquele momento seria de reserva, de falar
baixo ou não olhar.
Os profissionais de saúde dos estabelecimentos estudados compartilham de uma política
dentro da qual a assistência deve ser prestada com respeito ao estado emocional de
cada paciente. Existem equipes multidisciplinares treinadas para lidar com os mais
diferentes tipos de situação. Nesse caso, sempre chamam os pacientes pelo nome e
observam os casos em que algumas mudanças são necessárias no ambiente, como por
exemplo, mudar um paciente de lugar porque algum incômodo em relação a outro
115
paciente; intervir em algumas conversas quando algum paciente está dando uma
informação errada a outro paciente e assim por diante. Esse tipo de informação foi
prestada durante as entrevistas das enfermeiras das três unidades de saúde.
Em relação aos salões de quimioterapia, quanto maior o tempo de tratamento do
paciente, mais intensa é sua relação com os profissionais de saúde. Nos hospitais isso
também aconteceu, embora a questão temporal mude consideravelmente, pois enquanto
alguém passa 3, 5 ou 15 dias internado num hospital, uma outra pessoa passa 2, 3, 4
anos fazendo quimioterapia. Se, por um lado, a relação de um paciente internado com o
profissional é mais intensa porque ocorre sem interrupção, a de um paciente de
quimioterapia ocorre por 2 horas, a cada mês, por exemplo. Por outro lado, nesta última
situação, ela se repete por muito tempo. O que está em pauta, neste caso, é que as
relações com os profissionais de saúde, conforme o que foi observado durante a
pesquisa, se baseiam numa relação de confiança, seja qual for a doença em questão.
Fazendo um paralelo entre os 5 sentidos e a vivência nesses espaços de tratamento, a
visão, a audição e o olfato sobressaem quando o assunto é a privacidade. De acordo
com os relatos dos participantes, a visão seria o mais importante dos sentidos, já que ver
os outros e ver o que esacontecendo foram frases mencionadas repetidas vezes. Para
uns, olhar o que está ao seu redor e poder interagir significa compartilhar. Para outros, o
olhar direto significa intrusão, invadir ou ser invadido. O olfato foi citado por apenas 1
entrevistado e está apresentado na categoria doença.
“(...) quem está ao lado é até uma companhia. Ajudo os vizinhos” (Pol 3 a)
“(...) aqui eu vejo todo mundo (...)” (C3 p)
“As pessoas querem fazer (quimioterapia) em locais diferenciados e, se
pudessem, nem seriam vistas e nem olhariam para os outros (...) (C2 p)
As mudanças sugeridas pelos entrevistados que buscavam privacidade incluíram a
colocação de divisórias e opções de tratamento diferenciadas, enquanto as sugestões
dos entrevistados mais interessados em interagir foram a disposição das cadeiras em
círculo também no salão A do SUS e a colocação de cadeira para o acompanhante no
Luís Antônio.
116
3.4.2 Presença do acompanhante
A importância do acompanhante foi um elemento marcante em todas as entrevistas.
Algumas pessoas se referiram a ele como a sua única companhia durante aquele
período, enquanto outras, além do aspecto anterior, falaram sobre seu conforto. Nas
unidades hospitalares pesquisadas, segundo observações efetuadas durante o período
de trabalho de campo, os acompanhantes utilizavam os espaços do hospital como
extensão das enfermarias. Eles conversavam entre si, caminhavam por diversas áreas do
hospital e sabiam de fatos ocorridos em outros locais.
No entanto, esse tipo de comportamento esteve muito mais presente no Hospital Luís
Antônio do que na Policlínica. Neste último hospital, os acompanhantes saíam pouco das
enfermarias e quase não entravam em outras. Para os que preferiam compartilhar o
momento da hospitalização, a presença dos acompanhantes foi motivo de distração para
os pacientes e para outros acompanhantes. Para os que preferiam evitar a interação
social, o contato paciente-acompanhante era a única opção aceitável, além,
evidentemente, do contato com a equipe de profissionais de saúde. O afeto e cuidado
oferecidos pela maioria dos acompanhantes é motivo de conforto para a maioria dos
pacientes.
Figura 7
8
:
Poltrona do acompanhante das enfermarias da Policlínica. Fonte: acervo próprio
117
Figura 7
9
(esquerda): Bancos dispostos nos pátios internos do Hosp. Luís Antônio são utilizados pelos
acompanhantes. Fonte: acervo próprio.
Figura 80 (direita): Cadeiras para os acompanhantes nas circulações do Hosp. Luís Antônio. Fonte: acervo
próprio.
no CECAN, nos salões do SUS, a presença do acompanhante acontece com os
pacientes que estão nos leitos, em estado mais grave ou quando se tratam de idosos. Na
maior parte dos casos, quando o paciente vem com seu acompanhante, este último fica
acomodado na sala de espera, podendo entrar no salão quantas vezes quiser para ver o
paciente. De acordo com a equipe de enfermagem, o tempo em que o acompanhante
deve passar dentro do salão de quimioterapia deve ser mínimo e as conversas breves
para evitar tumulto e possíveis mal entendidos entre os que utilizam o espaço. O salão do
convênio, com um número reduzido de poltronas e leitos, permite a presença do
acompanhante.
118
Figura
81
(esquerda): Presença dos acompanhantes no salão A de quimioterapia do SUS. Fonte: acervo
próprio
Figura 82 (direita): Cadeiras para os acompanhantes no salão de quimioterapia do convênio. Fonte: acervo
próprio
No tocante ao excesso de paciente por enfermaria no Hospital Luís Antônio, os relatos
enfatizaram muito mais o desconforto do acompanhante, quando sua presença é
obrigatória, do que outros desconfortos ambientais, como o calor, por exemplo.
“Se aqui tivesse 5 leitos (ao invés dos nove atuais), por exemplo, com todas as
cadeiras dos acompanhantes, era melhor”. (L2 a)
Não. Aqui é bom (...) a enfermaria é limpa, está arrumada (...) mas falta cadeira
para acompanhante. Hoje tem essa (cadeira), mas e chegar mais alguém
idoso que precise de acompanhante?” (L5 p)
“(...)a cadeira do acompanhante poderia ser melhor(...)” (L7 p)
119
Figura 8
3
:
Layout/excesso de leitos em enfermaria do Hospital Luís Antônio. Fonte: acervo próprio.
Sobre a figura do acompanhante e seu papel junto ao paciente, vale ressaltar um aspecto
curioso observado durante as entrevistas no Hospital Luís Antônio. Como um dos
entrevistados L6 estava sempre acompanhado por uma pessoa durante suas
caminhadas pelos corredores hospitalares, seria fácil constatar que aquele seria seu
acompanhante. Mas não foi o caso:
“(...) faço amizade com todo mundo. Olha, esse rapaz aqui eu conheci hoje e
descobri que ele conhece uns amigos meus(...)” (L6 p)
Alguns acompanhantes ainda mencionaram que a sua presença poderia incomodar
outros pacientes, como foi o caso de Pol 6:
“Eu nem gosto de ficar olhando porque os outros podem ficar constrangidos”
(Pol 6 a)
Outros entrevistados falaram sobre a necessidade de respeito dentro da enfermaria ou
sala de quimioterapia, já que o local está sendo dividido por várias pessoas.
(...) Tem que ser uma questão de respeito (...) Televisão e ar condicionado,
como é que fica?(...)” (Pol 2)
“(...) às vezes um acompanhante não respeita a individualidade do outro ou a
privacidade do outro(...)” (C6 p).
120
As mudanças sugeridas incluíram banheiros para acompanhantes; locais para refeições
ou o acréscimo de mais uma bancada para o acompanhante dentro da enfermaria;
poltronas mais confortáveis e, no caso do Luís Antônio, número de poltronas suficientes
para todos os acompanhantes.
3.4.3 Experiências anteriores
Conforme observado nos relatos, o conhecimento de outros ambientes hospitalares
refletiu de modo marcante a forma de lidar com o espaço físico atual e de compartilhá-lo
com outras pessoas. Mesmo quando o tempo de tratamento ou de internação não era
considerado extenso, embora este seja um dado subjetivo para cada um de nós e dos
entrevistados, o fato de conhecer uma realidade diferente daquela gerou algumas
comparações. Entretanto, vale salientar que o sentido atribuído ao local atual ou a um
outro local conhecido também sofreu influência da necessidade de compartilhar ou não a
experiência de hospitalização/tratamento. Ao falarem das experiências anteriores, os
entrevistados citaram os termos aqui, lá, agora, antigamente, antes, hoje, todos ligados
às questões que relacionam tempo e experiência.
a) Policlínica e Luís Antônio
Para os que estavam internados no Luís Antônio e tinham tido a experiência como
paciente ou acompanhante na Policlínica, houve a preferência por esta última em
função das divisórias nas enfermarias:
“(...) ali (Policlínica) é bom porque tem menos gente e tem divisórias entre os
leitos”. (L2 a)
Para os que estavam internados na Policlínica e já tinham tido a experiência em outro
hospital, em enfermaria com maior número de leitos, havia preferência pela primeira em
função das divisórias e do número reduzido de leitos:
“Ela ficou no Hospital(…), mas não tinha divisória. Assim é melhor” (apontou
para as divisórias). (Pol 3 a)
Para os que estavam em qualquer um dos dois hospitais, não gostavam de
compartilhar e tinham ficado num apartamento isolado em função de infecção,
preferia a segunda opção pela possibilidade de reserva:
121
A gente estava antes num quarto de isolamento porque ele estava com uma
infecção. Era melhor, mas aí ele melhorou e a gente veio para cá (...) Quando a
gente estava no isolamento, era só nós dois” (L4 a)
Para os que estavam no Luís Antônio, gostavam de compartilhar e já tinham ficado em
quarto de isolamento, estar em enfermaria junto com outros pacientes era a situação
mais confortável porque podiam conversar e ver os outros pacientes:
“Antes de ficar aqui ela ficou num isolamento. Lá eu ficava fazendo caça-
palavras, mas aqui não precisa mais” (...) a gente fica conversando (...)” (L1 a)
b) CECAN
Para os que estavam no salão do SUS e tinham realizado quimioterapia no Hospital
Luís Antônio, houve a preferência pelo primeiro, entendido como mais organizado, mais
amplo e adequado ao número de pessoas presentes no local:
“(...) gosto mais daqui porque é mais espaçoso. (Luís Antonio) era muito
apertadinho”. (C1 p)
Para os que estavam no salão do SUS com cadeiras dispostas lado a lado e
costumavam ficar no salão das cadeiras dispostas em rculo, houve a preferência pelo
segundo caso, já que podiam conversar e ver o que se passa no ambiente:
“(...) é..., aqui está tão espaçoso que não nem para conversar. Nesse salão
fiz (a quimioterapia) duas vezes. Gosto mais do de (apontou para o outro
salão) porque lá as cadeiras ficam assim, mais perto”. (C1 p)
Para os que estavam no salão do convênio e já tinham realizado quimioterapia no salão
do SUS com vista para fora, situação encontrada alguns anos, houve a preferência
pelo primeiro em função da vista para fora e pelo tamanho do local:
“(...) o espaço de (salão do SUS que anteriormente funcionava para o
convênio) é amplo, mas as cadeiras são ruins e é muito tumultuado (...) aqui é
bem melhor porque tem menos gente. (C4 p)
“(...) pois é, lá (no outro salão) tinha a vantagem de ter a vista para fora” (C6 p)
122
Observação: devido ao aumento da demanda de pacientes do SUS na quimioterapia, o
salão menor, antes destinado aos pacientes do convênio, passou a fazer parte dos
serviços SUS. Por esta razão, os pacientes do convênio foram transferidos para um salão
da antiga quimioterapia pediátrica, numa condição temporária até que outro local fosse
adaptado às suas necessidades. Porém, com a diminuição do número de pacientes
particulares, que a maior parte deles prefere fazer seu tratamento em clínicas
especializadas espalhadas pela cidade, o espaço temporário permaneceu sem reformas
ou ampliações. Essa condição tem desagradado os pacientes do convênio.
Devido a esses fatores, as sugestões de mudança nos ambientes inseridos na pesquisa
incluíram mais uma vez as divisórias, opções de tratamento diferenciadas, alteração do
layout do salão A do SUS com cadeiras dispostas em círculo e vista para o exterior
do edifício.
3.4.4 Doença
A palavra câncer não foi citada por nenhum dos entrevistados das três unidades de
atenção à saúde, ausência essa que corrobora com os dados da literatura sobre o
assunto. Dificilmente as pessoas que tem câncer mencionam esse termo. Dessa forma,
torna-se importante enfatizar que a categoria doença deve ser entendida aqui como os
diferentes estágios e estados de ausência de saúde.
Se as categorias discutidas até o momento mesclam depoimentos de entrevistados dos
três estabelecimentos inseridos na pesquisa, embora algumas particularidades tenham
sido ressaltadas para evitar a generalização das informações, a categoria doença merece
maiores cuidados. Em primeiro lugar, quando se trata do Hospital Luís Antônio e do
CECAN, existe a certeza de que o câncer ou complicações provenientes dele constituem-
se a razão do tratamento do paciente no local, mesmo quando a palavra ou a doença não
são mencionadas. Inclusive não era nosso interesse entrar no mérito dessa questão.
Ainda assim, ao falarem no espaço físico e no fato de dividi-lo com outros pacientes,
algumas idéias acerca da doença puderam ser observadas nas entrelinhas de alguns
depoimentos.
Em segundo lugar, quando o foco das atenções volta-se para os participantes da
pesquisa pertencentes à Policlínica, não a certeza do diagnóstico da doença, nem
mesmo se foi por conseqüência do câncer a internação do paciente numa daquelas
enfermarias. Em alguns casos, os entrevistados falaram a respeito de cirurgia, biópsia e
123
espera de um resultado para iniciar um tratamento. Em outros casos, nada foi dito e esse
silêncio foi respeitado. Assim sendo, as discussões a respeito dos participantes da
pesquisa da Policlínica, no tocante a esta categoria, serão apresentados separados.
a) Policlínica
Os entrevistados da Policlínica que mencionaram dados acerca da doença ou do fato de
estarem doentes, resumiram-se a duas pessoas: um paciente que havia passado por
uma cirurgia e uma senhora idosa, cuja filha concedeu a entrevista. Nos dois casos,
existe a idéia de que a recuperação do paciente depende também da estrutura física do
local e do acesso constante de outros pacientes e acompanhantes:
“(...) E quando vem uma pessoa e pergunta da doença, da cirurgia? É chato
demais (...) eu até gostaria de poder pagar mais para ficar num apartamento.
Para se recuperar é melhor (...) não vai ter gente curiosa perguntando coisas o
tempo todo”.(Pol 1 p)
O espaço aqui é muito apertado (...) cada paciente tem seu quadro de doença,
suas necessidades (...) compartilhar, como você está chamando, não muito
nesse espaço (...) Tem que ser uma questão de respeito. (Pol 2 a)
“(...) eu acho que quando a pessoa fica sozinha com o acompanhante, fica mais
tranqüila. Mas meu plano de saúde é esse, sou assalariada e não posso pagar
pelo apartamento”.
(Pol 2 a)
b) Hospital Luís Antônio
Alguns pacientes do Luís Antônio falaram apenas do motivo de sua internação no
hospital cirurgia, infecção ou colocação de cateter fazendo referência ao fato de
compartilhar aquela experiência e dividir o espaço com outras pessoas como algo
positivo durante o tempo em que é preciso estar ali.
“(...) Fico vendo televisão, é bom para distrair e esquecer a dor (...) conversar é
bom para a gente não ficar pensando naquilo” (L5 p, apontando para o lugar
da cirurgia).
Por outro lado, para outros pacientes, como foi o caso de L4a, o período de
hospitalização está relacionado com dor e tristeza. Dividir o espaço com outros pacientes
torna-se um aspecto negativo porque a doença pode causar a morte:
124
“(...) Ele é o que está melhor aqui dentro (apontou para o marido). Ontem
morreram duas pessoas aqui (...) ainda bem que a gente não porque tem
essas cortinas (...) se bem que ontem nós ouvimos tudo. Foi horrível” (L4a fez
uns gestos de repulsa com a boca, olhos e mãos).
Para esta última pessoa entrevistada, compartilhar o espaço e o momento de doença traz
muito mais tristeza do que vergonha nas situações que podem parecer constrangedoras.
“(...) pelo menos em relação a gente, eu acho que nem é vergonha, é tristeza
mesmo”.
Outros entrevistados, como foi o caso de L2, consideram os hospitais como locais de
doença, sempre desagradáveis:
“Nada é bom num hospital porque não é bom ficar em hospital”.(L2 a)
c) CECAN
no CECAN, mesmo sem usar o termo câncer, foi possível perceber que era sobre
essa doença que alguns entrevistados estavam se referindo. O uso de termos “essa
doença”, “esse tratamento”, “essa medicação” apareceu em algumas entrevistas, dentro
das quais ficou evidente a importância da percepção dos ambientes através do olfato e
da questão do tempo de tratamento, bem como da procura por justificativas para a
doença:
“Você sabe que a gente fica com os sentidos aguçados, quer dizer, muita coisa
muda quando você tem que fazer tratamentos longos e quando você tem esse
tipo de doença (...). Sinto cheiro de quimioterapia de longe. (C6 p)
“(...) a gente muita gente doente. Sabe o que eu acho? Que hoje em dia
nossa comida é toda contaminada (...)”. (C5 p)
Fazendo uma relação entre as questões de tempo de tratamento citadas com os
aspectos que envolvem a doença e o tratamento, é interessante citar que o que torna-se
familiar e natural pode também tornar-se ruim ou indesejável, como no caso de C6. O
tempo modifica o olhar e o entendimento do ambiente e dos comportamentos.
“(...) Aos poucos você vai conhecendo e compreendendo as rotinas e sabe
até quando algo está errado (...) tinha lugares que eu sabia que não eram
autorizados pela ANVISA”.
125
Percebe-se, a partir dos relatos dos entrevistados, que existe uma associação entre a
hospitalização, a doença e o fato de recuperar-se. Contudo, dentro dessa associação,
existem duas idéias diferentes. A primeira seria a do hospital como local de transição
entre um momento crítico do procedimento hospitalar e a ida para casa, local de
recuperação. Para essas pessoas não existe o sentimento de vergonha na experiência
de adoecimento com hospitalização, nem a preocupação com a exposição corporal:
“(...) aqui é bom porque o paciente vê os outros (...) Quando o paciente vê o
outro se animar, se anima também (...) Aqui a gente se acostuma com esse
negócio de ficar nua porque só tem mulher”. (L1 a)
A segunda idéia é a de que o ambiente hospitalar funciona como espaço terapêutico e
tem interferência nas condições de recuperação do paciente. Esse entendimento pôde
ser visto muito mais pelas pessoas que pagam plano de saúde ou que estiveram em
outro hospital com estrutura física melhor do que a atual. Quando falavam em doença,
tratamento, clínica ou hospital, falavam também na importância do ambiente,
especialmente daqueles com a existência de espaços individuais e com vista para fora,
fosse enfermaria ou sala de quimioterapia. Para esses entrevistados o ambiente favorece
o restabelecimento:
“Se eu pudesse, ficava num apartamento porque aqui é muito apertado”. (L2 a)
“(...) pois é, (no outro salão) tinha a vantagem de ter a vista para fora” (...) o
espaço tem que ser agradável porque essa medicação já é tão agressiva (...).”.
(C6 p)
Era esperado, com base em observações e pesquisas anteriores, que os pacientes
internados que estivessem em condições de caminhar, utilizassem mais os espaços
adjacentes às enfermarias, principalmente pacientes do Luís Antônio. Porém, como isso
só aconteceu em um caso – ver L6 – talvez as pessoas não estivessem em condições de
andar ou não se sentissem bem em se expor fora da sua enfermaria.
No tocante às crenças sobre remédios e tratamentos caseiros, nenhum entrevistado falou
sobre o assunto, apesar das entrevistas dos médicos e enfermeiras terem enfatizado a
presença constante de pacientes e acompanhantes oferecendo dicas a esse respeito. Tal
dado, inclusive, tem merecido a atenção dos profissionais dos estabelecimentos em
questão porque podem interferir de modo negativo o tratamento de algum paciente, seja
na sua condição física, seja na sua condição emocional.
126
Segundo depoimentos de enfermeiras e médicos, houve casos em que pacientes da
quimioterapia relataram fatos e quadros assustadores da doença e do tratamento aos
que estavam iniciando suas sessões. Dentre as dicas oferecidas pelos pacientes mais
antigos estavam o que deveria ser feito e o que iria acontecer aos pacientes recém-
chegados. Dessa forma, para os que iniciam um tratamento num estado bastante
otimista, perder o ânimo é o mínimo que acontece com este tipo de atitude. Nos casos
em que um paciente inicia um tratamento com bastante tensão e medo, essas
informações pioram o seu quadro. E isso acontece mais com os pacientes do SUS do
que com os do convênio, que os segundos evitam contato e não costumam confiar em
qualquer dica que recebem. Por não aceitarem bem compartilhar o espaço e as
experiências, também não aceitam interferências dos outros.
Sobre a relação profissional-paciente durante o processo de diagnóstico e tratamento da
doença, também ficou claro que as salas de quimioterapia e as enfermarias são
particularmente locais de grande concentração do pessoal de enfermagem. Por este
motivo, pode ser encontrada uma grande variedade de pesquisas, desses últimos
profissionais, sobre representações sociais do câncer e sobre privacidade no ambiente
hospitalar. São os enfermeiros que lidam diretamente com os pacientes e precisam estar
atentos às questões que podem interferir no enfrentamento da doença e
conseqüentemente no tratamento.
Outro dado sobre a doença e sobre o tratamento observado durante as entrevistas foi o
de que, quem está no início da quimioterapia, por exemplo, está visivelmente mais tenso,
mais ansioso e mais atento. Mesmo que a pessoa não tenha falado sobre seu estado
clínico ou emocional, até porque esse tipo de abordagem estava fora do contexto da
entrevista, foi possível perceber esses aspectos. A nova situação gera tensão no
paciente e na sua família. As entrevistas dessas pessoas foram mais curtas, com poucos
comentários sobre o ambiente físico, o que sugere a relação entre tempo de tratamento
ou internação e uma elaboração maior de comentários sobre o espaço. Claro está que a
falta de informações sobre o ambiente físico pode não estar diretamente ligada ao tempo
de experiência ali e pode ter diversas outras causas, mas de uma maneira geral, pelas
características da pesquisa, foi esse dado que ficou explícito. Por outro lado, alguns
entrevistados que estavam há pouco tempo internados e conseguiam fazer uma leitura
crítica do local tinham tido uma outra experiência de internação, como paciente ou
como acompanhante e por isso puderam comparar os espaços.
127
Com relação a esta categoria, as mudanças sugeridas seriam fundamentalmente as
opções de escolha do local de tratamento ou de internação, com a existência de
ambientes separados ou elementos que permitam a reserva para os pacientes com
dificuldades de compartilhar o espaço; colocação de cortinas ou divisórias nas
enfermarias do Hospital Luís Antônio para os pacientes decidirem como e quando
interagir visualmente.
Diante das reflexões apresentadas até o momento, pode-se dizer que uma série de
aspectos comentados está relacionada ao modo como a privacidade foi representada
pelos participantes da pesquisa. Apesar de não haver uma representação única acerca
do objeto proposto, dadas as suas próprias variantes e as dos entrevistados, percebe-se
claras tendências sobre o assunto nas categorias de análise.
Nas discussões sobre “Relações Interpessoais”, “Presença do Acompanhante”,
“Experiências Anteriores” e “Doença”, foi possível extrair idéias distintas acerca da
interação social, individualidade, exposição corporal, exposição das informações,
constrangimento/vergonha e respeito, elementos constituintes das representações dos
entrevistados. Paralelamente a esta observação, também ficou evidente que a
representação da privacidade, dentro do ambiente hospitalar, encontra-se diluída no
conjunto de sentidos atribuídos ao ato de compartilhar o mesmo espaço físico e a
experiência de hospitalização ou de tratamento com outras pessoas.
De acordo com Moscovici (2005), as representações funcionam como um sistema de
valores, idéias e práticas que orienta as pessoas no mundo possibilitando controle e
comunicação com membros de um grupo específico. Jodelet (2001) complementa tais
pressupostos enfatizando que todos nós criamos representações para nos ajustar a esse
mundo, para saber como nos comportar, identificar e resolver problemas. Assim, quando
algo novo aparece, lançamos mão de diferentes tipos de saberes para nos ajustarmos às
novas circunstâncias.
Nessa linha de raciocínio, observa-se que os entrevistados mais adeptos ao ato de
compartilhar o espaço físico e a experiência de hospitalização ou tratamento,
representam esse novo acontecimento como algo natural, com atitudes semelhantes às
que são tomadas no cotidiano. Aceitam a idéia de que o ambiente hospitalar provoca um
conjunto de situações com as quais é necessário lidar passivamente. Por outro lado,
conforme citado ao longo das análises por categoria, o grupo que prefere a reserva
atribui sentimentos negativos ao comprometimento da privacidade. A representação
128
característica do grupo está acompanhada por elementos como respeito à individualidade
e necessidade de controlar a exposição.
Dentro desse processo de tornar familiar algo não familiar, Moscovici (2005) também
mostra que comparar é representar, preencher algo vazio com alguma substância. A
partir de mecanismos denominados de objetivação e ancoragem, classificamos e damos
nomes às coisas desconhecidas e transformamos algo abstrato em quase concreto.
Nesse sentido, percebe-se que a categoria de análise “Experiências Anteriores expõe
muito bem esse tipo de processo. Quando os entrevistados referiram-se aos ambientes
hospitalares anteriormente conhecidos e às suas características, teceram comentários e
fizeram comparações com ambientes atuais, tornando-os mais familiares.
Para efeito de identidade e coesão social, conforme apontado dentro da Teoria, pôde-se
observar uma divisão nítida entre os entrevistados da pesquisa baseada nas
representações de cada grupo (ver Quadro 10). De um lado, os que compartilharam a
idéia de interagir, ajudar, ver e participar da vida do outro; enquanto do outro, os que
compartilharam a idéia de segregar, afastar, não participar da vida do outro, nem ter essa
participação na sua experiência atual.
Apesar de a privacidade ser considerada essencial para minimizar os níveis de estresse
e insatisfação dos pacientes em determinados tipos de ambientes hospitalares, não
significa que seja representada como tal por todos os indivíduos, mesmo porque cada um
deles convive com diferentes condições de privacidade no seu cotidiano. Por esta razão,
o entendimento do objeto representado assumiu diferentes formas quando aplicado aos
diferentes casos.
Ver
Não ver
Participar
Não participar
Ajudar
Segregar
Interagir
Afastar
COMPARTILHAMENTO
NECESSIDADE DE RESERVA
Policlínica
Luis An
tonio
CECAN
Policlínica
Luis Antonio
CECAN
Pol 3 a L 1 a C 1 p Pol 1 p L 2 a C 2 p
Pol 4 p L 3 p C 3 p Pol 2 a L 4 a C 4 p
Pol 5 p L 5 p C 5 p
Pol 6 a L 6 p C 6 p
L 7 p
L 8 p
Quadro 10: Entrevistados x entendimento da experiência hospitalar
129
3.4.5 Demais aspectos analisados
A maior parte dos entrevistados não mencionou preferência no tocante ao leito ou
cadeira. Entretanto, para os que necessitam de um pouco mais de reserva, cada posição
assumiu um significado diferente. Nos hospitais, por exemplo, para os que ficaram
próximos à parede da janela, a claridade proveniente da iluminação natural tornou-se
fator positivo, pela noção de tempo proporcionada. Além disso, o local permite que o
paciente e seu acompanhante sintam-se mais reservados porque ninguém passa por ali.
Os que ficaram no meio, por outro lado, beneficiaram-se da televisão, que tornou-se fonte
de atenção e substituta da possível interação com as outras pessoas. Quando não
televisão na enfermaria ou quando o layout desta está organizado de forma diferente,
como é o caso do Luís Antônio, os pacientes que ficaram nos leitos do meio não fizeram
comentários sobre aspectos positivos ou negativos sobre este posicionamento. No
CECAN, para os pacientes da quimioterapia do salão do convênio, o layout encontrado
obriga o contato freqüente entre os pacientes, mesmo com a disposição das cadeiras
lado a lado. Apenas quem está no quarto consegue privacidade.
Algumas unidades hospitalares estão sempre localizadas/zoneadas de modo a dificultar o
livre acesso por pessoas que não fazem parte do corpo técnico do local. Outras
unidades, como é o caso das internações, encontram-se localizadas em zonas de
transição, entre as que permitem maiores acessos, como os consultórios e salas de
exames, e as que restringem o acesso devido aos cuidados referentes aos fluxos,
segurança e assepsia. Mesmo sabendo que essas questões servem para organizar
funcionalmente edifícios com tais níveis de complexidade, acabam funcionando também
como balizadores de privacidade, com locais que apresentam diferentes características
quanto a quem circula, quando e como circula por ali.
Devido a necessidade de descanso dos pacientes que estão se recuperando nas
unidades de internação, fala-se a respeito da privacidade não dentro dos quartos e
enfermarias, mas também do setor como um todo. Conforme citado no referencial teórico
deste trabalho, é possível estabelecer uma comparação entre casa e rua e enfermaria e
corredor hospitalar, bastando, para isso, imaginarmos que a unidade de internação é um
trecho de um bairro, formado por ruas e casas. A rua seria o corredor do hospital, por
onde circulam pessoas e materiais; enquanto as casas seriam as enfermarias ou
apartamentos, local de acesso restrito somente aos pacientes, acompanhantes e o
pessoal hospitalar.
130
Porém, de acordo com o que foi observado na pesquisa de campo, as enfermarias são
locais mais acessíveis do que os apartamentos e do que as salas de quimioterapia. Este
fato se deve ao número de pessoas circulando no local – pessoal de enfermagem,
pessoal da limpeza com os carrinhos e pessoal da nutrição também com carrinhos e
também às condições de conforto térmico de cada ambiente, que, na ausência de ar
condicionado, as portas ficavam abertas. Outro fator interessante é a presença dos
acompanhantes, que movimentam constantemente o local. Eles entram e saem, vão a
outras enfermarias e a outros locais do hospital como se estivessem saindo de casa,
atravessando a rua e indo até a casa de um vizinho ou a outro local da vizinhança. Esse
comportamento reflete um perfil de hospitais voltado para o SUS, muito mais do que
hospitais com clientela de planos de saúde.
Buscando uma maior aproximação entre os componentes arquitetônicos sugeridos para a
análise e aqueles analisados de fato em cada unidade de atenção à saúde pesquisada,
torna-se válido pontuar alguns aspectos que interferiram nas condições de privacidade
dos entrevistados:
a) Localização das enfermarias ou salas de quimioterapia dentro da unidade:
Policlínica: a unidade de internação está disposta de modo a não sofrer interferência
dos outros setores. Localiza-se no primeiro pavimento, praticamente exclusiva na área
em questão.
Luís Antônio: algumas enfermarias estão localizadas em circulações gerais e os
pacientes são visualizados constantemente. Ainda neste hospital, algumas enfermarias
possuem janelas voltadas para as circulações internas do hospital, possibilitando a
visualização do paciente por quem passa pelos corredores.
CECAN: não contato visual entre as pessoas que estão dentro dos salões, nas
sessões de quimioterapia e as que estão circulando pelos corredores. Também não
passagem de ruído de fora para dentro ou de dentro para fora das salas.
131
Figura 8
4
:
Pavimento de internação da Policlínica. Visualização da sala de estar, postos de enfermagem e
enfermarias. Fonte: acervo próprio.
Figura 8
5
(esquerda): Circulação do pavimento de internação da Policlínica. Fonte: acervo próprio.
Figura 86 (direita): Sala de estar no pavimento de internação da Policlínica. Fonte: acervo próprio.
132
Figura 8
7
:
Trecho do Hosp. Luís Antônio ressaltando localização de enfermarias pesquisadas. Fonte: acervo
próprio.
Figura 8
8
(esquerda): Circulação das enfermarias A, B, C, D e E do Hosp. Luís Antônio. Fonte: acervo
próprio.
Figura 89 (direita): Circulação das enfermarias N. S. Fátima e Etelvino Cunha do Hosp. Luís Antônio Fonte:
acervo próprio.
133
Figura 90
:
Trecho do Hosp. Luís Antônio ressaltando localização de enfermarias pesquisadas. Fonte: acervo
próprio.
91
(esquerda): Ligação entre prédio mais recente e mais antigo do Hosp. Luís Antônio. Fonte: acervo
próprio.
Figura 92 (direita): Circulação das enfermarias de 1 a 7 do Hosp. Luís Antônio. Fonte: acervo próprio.
134
Figura 9
3
:
Trecho do ambulatório CECAN com circulações de acesso aos salões de quimioterapia. Fonte:
acervo próprio
Figuras 9
4
e 9
5
:
Circulações de acesso aos salões de quimioterapia do SUS e do convênio. Fonte: acervo
próprio
135
Figuras 9
6
e 9
7
:
Visualização da sala de espera geral do CECAN e seus jardins internos. Fonte: acervo
próprio
b) Layout:
Policlínica: o layout das enfermarias não permite a visualização dos leitos dos pacientes
pelas pessoas que estivessem passando pelos corredores.
Luís Antônio: a visualização de quem está dentro das enfermarias por quem está
passando fora, nos corredores é constante. O layout não favorece a organização do
espaço, pois as enfermarias estão com um número maior de leitos do que o que o
espaço comporta. Além disso, os leitos estão muito próximos. A única exceção é o
grupo de enfermaria do Cemes Centro de especialidades Médicas local destinado
aos pacientes que realizam sessões de quimioterapia.
CECAN: o layout do salão maior de quimioterapia do SUS funciona bem, com
pequenos espaços compostos por cadeiras dispostas em círculo. o salão menor,
com vista para fora, as cadeiras dispostas lado a lado não agradam os pacientes
porque não permitem interação. No salão de quimioterapia do convênio, o
acompanhante não tem lugar fixo. Como o espaço é grande e existem poucas
poltronas, é comum que alguns acompanhantes peçam uma cadeira e a coloquem ao
lado da poltrona na qual o tratamento será realizado.
136
c) Janelas e portas:
Policlínica: as portas de entrada das enfermarias interferem na abertura das portas dos
banheiros, o que gera constantes incômodos aos pacientes. Por outro lado, ao abrir a
porta da enfermaria, não é possível ver os leitos e as cadeiras dos acompanhantes.
Figuras 9
8
e 9
9
(esquerda e meio): Interferência entre as portas da enfermaria e do banheiro da Policlínica.
Figura 100 (direita): Visualização da enfermaria a partir da circulação.
Luís Antônio: em alguns casos, a visualização dos leitos é total através das portas
abertas. Em outros casos, a visualização dos leitos e dos pacientes é total também
pelas janelas que se abrem para os corredores. Em outros casos, ainda, não há janelas
nas enfermarias do hospital.
101
: Visualização de leitos através da porta na enfermaria Etelvino Cunha
Figura 102: Visualização do interior da enfermaria N. S. de Fátima através das janelas da circulação
137
CECAN: o menor salão do SUS possui janelas para o exterior, localizadas num trecho
do terreno que não há passagem de pessoas. Porém, as cadeiras estão de costas para
as janelas, perdendo-se a oportunidade de visualizar o exterior sem ser visto. De
acordo com o que foi dito, os pacientes preferem se olhar do que ver o lado externo do
edifício. No salão maior não há janelas e as portas abrem para um corredor com acesso
um pouco mais restrito do que a área de espera geral. No salão do convênio não
janelas com altura que permita a visualização do exterior. A porta também se abre para
um corredor restrito.
Figura 10
3
: Cadeiras dispostas de costas para as janelas do salão B de quimioterapia do SUS
Figura 10
4
: Salão A de quimioterapia do SUS.
138
d) Presença de divisórias ou cortinas:
Policlínica: divisórias altas, com vidro e cortina. Permitem maior separação.
Luís Antônio: divisórias inexistentes. Cortinas apenas em uma enfermaria e dificultam o
contato visual.
CECAN: divisórias baixas. Mesclam o contato constante e o casual.
Tomando como base os 20 depoimentos analisados, pode-se fazer algumas
considerações gerais. Em relação aos pressupostos teóricos acerca da privacidade e sua
divisão em tipo e função, foi verificado que, quando requerida nos locais pesquisados, a
privacidade era do tipo reserva, quando a pessoa inclui uma barreira psicológica contra a
intrusão ou ignora os outros mesmo em sua presença. Esse tipo de barreira pôde ser
observada mas não houve confirmação concreta de seus aspectos constituintes por não
ter sido este o foco da pesquisa.
a barreira física, também incluída na busca por privacidade, esteve presente tanto nas
observações realizadas pela pesquisadora, como nos relatos dos entrevistados. No
tocante às funções, havia a necessidade de autonomia pessoal, que seria o desejo de
evitar manipulação, dominação à exposição e também a limitação e proteção da
informação. Estes itens poderiam ser relacionados, por exemplo, ao grande número de
trabalhos realizados pelos profissionais de enfermagem acerca da importância da
confidencialidade. Seguindo os mesmos pressupostos teóricos, ainda foi possível
verificar, nos estabelecimentos de saúde pesquisados, as três propriedades principais da
privacidade:
Envolve unidades sociais: indivíduo x indivíduo ou indivíduo x grupo
É um processo bidirecional: dos outros em relação a mim e de mim em relação aos
outros
É um processo ativo e dinâmico: muda através do tempo e das circunstâncias
139
CAPÍTULO
IV
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Conforme visto neste trabalho, as inovações tecnológicas e científicas nas áreas de
diagnóstico e terapia provocam uma série de mudanças na estrutura física e
organizacional dos estabelecimentos de atenção à saúde. Hoje sabe-se que saúde não é
ausência de doença e que seus determinantes fazem parte de um amplo contexto
cujos fatores envolvidos são próprios de cada pessoa e do seu cotidiano. A idéia de cura
funde-se à idéia de cuidado com o paciente e inclui uma variedade de aspectos que
buscam amenizar o estresse causado na experiência de hospitalização.
Para acomodar essa nova demanda, a criação e o desenvolvimento de programas que
visam a valorização do indivíduo profissional e paciente nas práticas de saúde tem
sido uma presença marcante nas políticas públicas e privadas de assistência de vários
países. De uma maneira geral, busca-se a participação conjunta dos diferentes
envolvidos num ambiente voltado integralmente para o restabelecimento do paciente,
incluindo pessoas, comportamentos e componentes físicos.
Traçando um paralelo com a Arquitetura, a incorporação desses princípios está
fortemente vinculada aos aspectos presentes na relação entre o usuário e o seu
ambiente, fruto de estudos empíricos realizados na área a partir dos anos de 1960.
Trabalhos dessa natureza possibilitaram a observação e documentação da interferência
do sistema hospitalar no comportamento de pacientes e funcionários, bem como o
surgimento de conceitos envolvendo a relação pessoa-ambiente, dentre os quais podem
ser citados espaço pessoal, territorialidade, apropriação do espaço, aglomeração e
privacidade.
Dessa forma, considerando a ênfase dada aos estudos pessoa-ambiente no contexto
hospitalar e sua relação com o surgimento de conceitos como os de healing
environment”, supportive design ou “humanização”, chega-se a um conjunto de
recomendações projetuais baseados numa nova postura de cuidado com o paciente.
Dentro do que foi apresentado nas seções a respeito do tema, reúne-se componentes
arquitetônicos ligados ao controle dos meios e das condições de privacidade, ao suporte
social, ao conforto e às possibilidades de distração dentro do ambiente hospitalar. Tendo
em vista as discussões acumuladas pelos estudiosos no assunto e suas diferentes
140
opções de abordagem, tem-se uma variedade de conclusões, principalmente no âmbito
internacional, acerca da influência desses componentes sobre os resultados médicos.
A origem da privacidade como objeto de estudo desta pesquisa seguiu indagações
individuais e pistas encontradas nos trabalhos científicos que abordavam essa
temática, principalmente aqueles realizados pelos profissionais da área da saúde.
Observou-se, entretanto, que alguns elementos da estrutura física dos ambientes
hospitalares recebiam destaque nessas investigações, mas não o aprofundamento
necessário para análises exclusivamente arquitetônicas. Era preciso descobrir que tipo
de relação poderia haver entre determinados tipos de pacientes e tipos específicos de
ambientes e de que forma essas descobertas teriam aplicação na realidade brasileira,
especialmente aplicação projetual.
Nesses termos, o objetivo proposto foi o de verificar a relação existente entre a
privacidade dos pacientes e o espaço físico de estabelecimentos assistenciais de saúde.
Em meio a tantas possibilidades de pesquisa, tipos de instituições e usuários dos
serviços de saúde, o leque de opções foi reduzido quando decidiu-se estudar espaços
voltados para a oncologia, incluindo enfermarias e salas de quimioterapia. A escolha
pelas unidades de saúde da Liga Norte Riograndense Contra o Câncer como universo de
pesquisa significou um exercício enriquecedor e pertinente. Por um lado, porque a
parceria estabelecida gerou a oportunidade de analisar diversos aspectos de um edifício
em uso e incorporar, na sua reforma, quesitos associados à privacidade. Por outro lado,
observando dados atuais do campo da saúde sobre o aumento do número de pacientes
com câncer no Brasil e a crescente demanda por serviços de diagnóstico e tratamento, a
intensificação de estudos que envolvem o cuidado com a paciente ressalta o papel da
Arquitetura neste e em outros tipos de especialidade.
Na ausência de uma plataforma teórica única para abarcar um objeto multifacetado e um
estudo de natureza qualitativa, buscou-se teorias e conceitos da Psicologia Social e
Ambiental para dar suporte ao trabalho. Da mesma maneira, variáveis arquitetônicas
recorrentes nas pesquisas sobre privacidade em ambientes residenciais e de trabalho,
serviram como subsídio para a elaboração da proposta metodológica.
A privacidade é apenas um dos aspectos relacionados ao suporte psicossocial do edifício
hospitalar e seu estudo envolve necessariamente elementos que dizem respeito às
atitudes dos profissionais de saúde e à organização físico-funcional do local. Entretanto,
seu estudo também envolve as questões culturais presentes no cotidiano das nossas
141
relações. Assim, a realização desse trabalho implicou numa via de mão dupla: o contexto
local e o contexto dos entrevistados. O que fez sentido para um paciente durante a sua
experiência num determinado ambiente de atenção à saúde está ligado à sua história de
vida, idéias, hábitos e costumes também compartilhados com seu grupo social. Nesses
termos, a escolha pela Teoria das Representações Sociais mostrou-se adequada ao
estudo, assim como a escolha por uma entrevista que abordasse o ato de compartilhar os
espaços e não uma entrevista pautada diretamente na privacidade. Para isso, os estudos
exploratórios funcionaram como norteadores de tais escolhas metodológicas.
Dessa maneira, ainda que o estudo das representações sociais possibilite uma variedade
de abordagens e resultados dentro de amostras semelhantes a esta, entende-se que
níveis mais avançados de análise, nesta tese de doutoramento, poderiam desviar o foco
da relação privacidade x ambiente físico e necessitariam de outras opções metodológicas
para alcançar maiores aprofundamentos.
Na categorização das informações obtidas através das entrevistas, os aspectos
emergentes das falas dos participantes encaixaram-se em duas dimensões fundamentais
para o entendimento da privacidade:
A preferência pelo compartilhamento da situação internação ou sessão de
quimioterapia – e do ambiente.
A preferência pela reserva e o desejo por ambientes individualizados ou semi-
individualizados.
Apesar de a literatura apontar para a necessidade de privacidade dos pacientes em
diversas situações dentro do espaço hospitalar, uma vez que esta condição lhes
garantiria dignidade e confidencialidade, a forma como isto se é variável. Segundo
dados obtidos durante a fase de campo, pode ser variável conforme perfil da instituição e
pode ser variável conforme usuários do serviço.
O ato de compartilhar o espaço da internação ou de tratamento assumiu diferentes
sentidos dentro da pesquisa. Para alguns entrevistados, foi a chance de dividir o espaço
e as angústias e de ajudar o outro, não havendo problemas quanto à exposição corporal
ou de suas informações pessoais. Para outros entrevistados, essa mesma experiência
representou incômodo pela exposição constante, pelo olhar excessivo e pela “divulgação”
de detalhes que seriam de caráter íntimo. Para estes últimos, ser visto era ser visto
142
doente e, por esse motivo, preferiram indicar o isolamento como solução para tal
incômodo.
De todo modo, que se ressaltar que esse tipo de atitude reflete, na maior parte das
vezes, hábitos, práticas e preferências do cotidiano. As informações obtidas mostraram
diferenças culturais entre pessoas de uma mesma região geográfica, mas de diferentes
procedências em relação ao bairro, com diferentes costumes e níveis sócio-econômicos.
A partir dessas diferenças, foi possível observar que a utilização do espaço e as relações
estabelecidas com os demais tinham raízes na vida fora daqueles ambientes.
Com essas observações, também foi possível compreender o papel da estrutura física do
estabelecimento de atenção á saúde para cada grupo de pessoas. De uma maneira
geral, os indivíduos que compartilham a experiência de hospitalização e tratamento e
fazem referência a esse contato como algo positivo e desejado durante aquele período
de tempo, entendem que aquela situação é natural. Ver e ouvir o que se passa ao redor
faz parte da vivência no cenário hospitalar. A ida para casa representa o início da
recuperação. As pessoas que se referem ao compartilhamento do espaço e da
experiência como algo negativo, fundamentam suas questões em dois aspectos
diferentes. O primeiro seria o incômodo gerado pelo excesso de exposição; enquanto o
segundo seria a certeza de que o ambiente hospitalar, como um todo, influencia seu
processo de recuperação. Por essa razão, algumas dessas pessoas citaram as diferentes
opções de escolha de internação e tratamento, individuais e coletivas, como solução para
estes problemas. Também citaram a criação de locais com vista para o exterior do
edifício e locais para os familiares/acompanhantes.
Como já foi discutido, a necessidade por maiores ou menores níveis de privacidade varia
conforme circunstâncias da vida, local, atividade e pessoas envolvidas. Porém, quando
existe um desequilíbrio entre a privacidade desejada e a alcançada, os níveis de estresse
aumentam e podem ser prejudiciais ao organismo dependendo de uma série de outros
fatores. Assim, torna-se válido destacar que alguns entrevistados mais adeptos a reserva
queixaram-se mais da falta de opções para obter privacidade, que o compartilhamento
constante era condição imposta pelo ambiente. Por outro lado, para os entrevistados que
não mostraram incômodo com os ambientes compartilhados, a procura pela privacidade
foi observada apenas durante a utilização dos banheiros, local naturalmente ligado à
idéia de intimidade e, portanto, mais facilmente respeitado. Traduzindo esse tipo de
observação para o projeto arquitetônico, verifica-se que a presença de diferentes opções
143
de arranjos espaciais acomodaria de modo mais satisfatório essas condições
comentadas.
A presença de componentes arquitetônicos com características semi-fixas, como o
mobiliário, por exemplo, permitiria que algumas condições ambientais fossem moldadas,
pelo menos no que diz respeito às distâncias e ao seu posicionamento, de acordo com as
preferências dos usuários. Reforçaria a idéia das diferentes opções arquitetônicas para
internação e tratamento. Para não prejudicar a circulação de pessoas e equipamentos no
local, algumas soluções de projeto poderiam ser adotadas, como o uso de divisórias
desmontáveis ou mesmo deslocáveis e marcações no piso que permitissem diferentes
arranjos e distâncias entre pessoas e objetos.
Por outro lado, é interessante destacar que alguns pontos verificados durante o processo
de análise das entrevistas não eram esperados. Em primeiro lugar, independente do perfil
do entrevistado ou do hospital estudado, o fato de que as experiências anteriores em
outros estabelecimentos hospitalares estimulassem maiores críticas ao local atual. Em
segundo lugar, o fato de que os setores de quimioterapia, da mesma forma que os
setores de internação, também recebessem críticas quanto às condições de privacidade.
Em terceiro lugar, não havia a certeza de que a disposição das cadeiras das salas de
quimioterapia, em círculo ou lado a lado, fossem fatores determinantes para a interação
ou não entre pacientes do SUS ou dos planos de saúde. Tais dados também subsidiaram
a formação de um conjunto de idéias para projetos arquitetônicos propostos para o setor,
conforme visualizado nos apêndices.
Nesse contexto, confirma-se a hipótese de que a privacidade é valor do espaço físico e
representativa dentro do processo terapêutico. Apesar de não poder ser generalizada,
dadas as diferenças entre os indivíduos entrevistados e as variantes do objeto de estudo,
a necessidade por privacidade ficou evidente a partir dos dados coletados durante as
fases de campo. Ainda que o entendimento da privacidade e suas formas de
manifestação tenham variado conforme grupos entrevistados, como foi mencionado
anteriormente, a relação com determinados elementos do ambiente físico pôde ser
observada nas diversas etapas do trabalho empírico.
Assim, quanto aos aspectos relativos ao projeto hospitalar, pode-se dizer novamente que
os que relacionam-se à privacidade estão diretamente associados ao espaço interno ou à
interação interior-exterior do edifício, especialmente no uso de salas de exames,
tratamentos ou áreas de circulação. Nesse sentido, é interessante observar a localização
144
destes ambientes dentro das suas respectivas unidades funcionais; as possibilidades de
layout utilizadas concomitantemente; aberturas e fechamentos; uso de materiais
translúcidos ou opacos e o uso de materiais que absorvam o ruído.
No tocante aos aspectos metodológicos, torna-se necessário tecer alguns comentários.
Pesquisas da área de Arquitetura, especificamente as que são desenvolvidas em
ambientes hospitalares, revelam fases emricas voltadas principalmente para aqueles
espaços dentro dos quais a presença do(s) pesquisadore(s) não afetará a rotina local.
Entenda-se aqui os espaços de circulação, de convívio ou aqueles cuja presença de
pessoal externo se faz mediante prévia anuência da direção, sob supervisão direta de
encarregados do hospital ou dos olhares e perguntas freqüentes dos profissionais de
saúde. Não é difícil entender o cuidado permanente dos que trabalham nestes locais,
que variedade de procedimentos, equipamentos e a própria condição clínica dos
pacientes explicam a “triagem dos estrangeiros”. Somem-se a esses quesitos aqueles
referentes ao receio dos funcionários de serem mal interpretados em suas condutas
diárias ou dos responsáveis administrativos pela veiculação não autorizada de dados e
imagens do estabelecimento.
Mesmo com o documento do Comitê de Ética em mãos, as dificuldades enfrentadas
foram de diversas ordens, desde as explicações constantes do objetivo da pesquisa, até
o contato pesquisador-pesquisado, conforme apresentado no capítulo sobre a trajetória
metodológica. Nos trabalhos lidos ao longo desses anos, especificamente naqueles
dedicados à Arquitetura Hospitalar, pouco se fala a respeito dos problemas enfrentados
na fase empírica. Apenas uma pesquisa, citada no Capítulo 2 desta tese, apontou
dificuldades durante a realização das entrevistas e a solução adotada.
Por outro lado, conforme nível de detalhamento arquitetônico necessário para
determinadas pesquisas, a obtenção dos registros gráficos é sempre um item
complicador. Ambientes hospitalares em funcionamento não comportam coleta de dados
demorada, medições e fotografias. Essas últimas, então, tornam-se constrangedoras na
maior parte dos casos em que aparecem pacientes e visitantes. Nesta tese de
doutoramento, por exemplo, muitos detalhes acerca dos mecanismos comportamentais
para a obtenção da privacidade deixaram de ser mostrados porque o registro, por foto,
seria inviável. Além desses, outros aspectos relacionados ao uso do espaço pelos
pacientes e acompanhantes também não puderam ser fotografados.
145
Em relação aos componentes arquitetônicos característicos dos hospitais de oncologia,
apresentados através de um quadro no Capítulo 2, é fundamental que se faça algumas
considerações. Numa avaliação superficial dos estabelecimentos de saúde estudados,
seria fácil sugerir completa ausência dos itens dispostos em tais recomendações,
principalmente porque os hospitais pesquisados são antigos, construídos ainda nos anos
de 1940. Por outro lado, tomando como base o período de pesquisas formais e informais
nas referidas unidades, é possível estabelecer algumas relações com a literatura sobre
câncer, especialmente no tocante ao trabalho realizado por equipes multidisciplinares de
profissionais de saúde e das equipes de voluntários, sempre presentes nestas
instituições. Embora a estrutura física para abrigar essas atividades esteja longe do que
se em muitos hospitais privados do Brasil e nos hospitais de outros países, ela está
presente, mas funcionando, muitas vezes, em locais improvisados. Porém, algumas
medidas simples e de baixo custo poderiam ser tomadas quanto aos espaços destinados
aos familiares e acompanhantes, já que os estabelecimentos estudados apresentam
alguns locais, externos ou internos, ociosos ou mal aproveitados. Podem ser citados aqui:
a sala de estar do setor de internação da Policlínica e as áreas externas deste Hospital;
os pátios internos do Hospital Luís Antônio e as áreas livres do CECAN.
No que diz respeito a esta última unidade, outros aspectos devem ser levantados. Em se
tratando de um edifício recente, construído para comportar futuras expansões, o CECAN
possui inúmeras possibilidades de adequação aos princípios de atenção integrada ao
paciente, sendo, algumas delas, uma realidade da gestão atual, como o constante
treinamento dos profissionais de saúde e as reformas realizadas. Dessa forma, dando
continuidade ao projeto do ambulatório já em curso, a construção de um novo hospital, no
mesmo terreno, transformará o edifício existente num complexo hospitalar de grandes
proporções. Nesta etapa, será possível prever espaços voltados para o suporte social e
emocional do paciente, bem como espaços destinados para a informação sobre a
doença.
Nos últimos anos, as enfermidades crônicas têm recebido maior atenção de profissionais
da saúde e de instituições dedicadas ao tratamento e à pesquisa, principalmente porque,
nesse contexto, nem sempre a cura é o foco primordial do processo de recuperação.
Muitas vezes, sabendo que a cura não é possível, o cuidado com o paciente torna-se a
razão do seu restabelecimento, ou seja, uma fonte de força ou suporte durante a
experiência da hospitalização e outros tipos de tratamentos/procedimentos. Nesse
sentido, foi possível, a partir das discussões aqui apresentadas, compreender um pouco
desses aspectos e sua relação com a privacidade.
146
Se a complexidade do edifício hospitalar exige projetos que propiciem o funcionamento
eficiente das rotinas desenvolvidas no local, também se espera que permita acolher
paciente, acompanhante e funcionário. Ainda que essa não seja uma tarefa fácil,
considerar aspectos da relação pessoa-ambiente e conseguir transferir esses dados para
o projeto arquitetônico, é um exercício na procura por soluções que amenizem o impacto
gerado por rotinas e procedimentos dolorosos. Por fim, espera-se que as discussões aqui
desenvolvidas possam servir de base para novos projetos arquitetônicos e novas
pesquisas a respeito da temática.
147
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154
APÊNDICES
Andice 1 – Autorização do Comitê de Ética em Pesquisa
155
156
Andice 2 – Primeira versão do roteiro de entrevistas para pacientes
Características sócio-demográficas
1. Me fale sobre sua moradia e o fato de dividir (ou não) os espaços com outras pessoas.
2. E aqui neste hospital, o que você acha de dividir o espaço com outros pacientes?
3. Há algo que lhe incomode aqui?
4. Conversa com as outras pessoas?
5. Acha que há muita gente no mesmo quarto?
6. Tem dificuldades para dormir na presença das outras pessoas?
7. Já se sentiu constrangido (com vergonha) em alguma situação? Como foi?
8. precisou ficar sem roupa na frente dos outros? Como você se sentiu nesta
situação? E quanto aos outros pacientes, você acha que eles se incomodam?
9. Como este espaço deveria ser para ajudar nessas situações?
10. Escuta as conversas dos outros sem querer? Escuta o que se passa nos corredores e
outras enfermarias?
11. Visualiza os outros leitos? E as outras enfermarias?
12. Gostaria de ficar em outro leito? Por que?
13. Onde guarda seus pertences? O local é adequado? Divide com as outras pessoas?
14. Se pudesse ficar sozinho no quarto, escolheria esta opção? Sim, não e por que.
15. O que você mudaria nestas enfermarias?
157
Andice 3 – Versão aplicada do roteiro de entrevistas para pacientes
PARTE I
1. Há quanto tempo vc faz tratamento aqui?
2. Há quanto tempo está internado aqui?
3. Já fez tratamento em outro local? Como era?
4. Já se internou em outros hospitais? Em enfermaria ou apt? Como era?
5. Como costuma passar o tempo aqui/como usa o espaço? (Lê, vê TV, conversa, dorme,
faz trabalhos manuais, etc. No caso das enfermarias, se movimenta, anda, vai ao
banheiro?)
6. Você consegue ficar à vontade com as pessoas ao seu redor? No caso de não: e como
deveria ser esta sala/quarto para ajudar nesta situação?
7. Você acha que as outras pessoas sentem vergonha porque tem gente sempre vendo
ou escutando o que está acontecendo? Você já ouviu alguém reclamar?
8. Acha que tem muita gente neste espaço?
9. Você escolheu esse local que você está (cadeira ou leito)? Sim/não: por que?
10. Onde guarda suas coisas? Divide com outras pessoas? O local é adequado?
11. Se pudesse ficar sozinho no ambiente de tratamento, escolheria esta opção?
Sim/não: por que?
12. O que você mudaria aqui? Como você faria uma sala de quimioterapia ou uma
enfermaria? Como você faria a arrumação das cadeiras/dos leitos?
PARTE II
-
Características sócio
-
demográficas
Idade, sexo, nível de escolaridade, local de moradia, número de pessoas que moram na
casa.
Obs:
registrar enfermaria/salão e leito/cadeira do paciente e saber o motivo da
internação.
158
Andice 4 – Termo de consentimento livre e esclarecido (pacientes)
1. Título do estudo: Arquitetura e privacidade em ambientes de atenção à saúde.
2. Investigadora responsável: Luciana de Medeiros Vianna
3. Local de realização:
_______________________________________________________________________
Unidade da Liga Norteriograndense Contra o Câncer/Natal/RN
4. Natureza do estudo
Você está sendo convidado para participar de um trabalho sobre este ambiente.
Queremos saber como está sendo a experiência de compartilhar a mesma
sala/enferamaria com as outras pessoas e como este ambiente pode melhorar neste
sentido.
5. Participantes do estudo
Sua participação será voluntária e o consentimento será dado através de assinatura para
uso dos dados coletados.
6. Envolvimento dos participantes do estudo
A sua participação consiste em responder algumas perguntas a respeito da utilização
deste espaço e das suas sugestões de mudança pra este local. Você tem a liberdade de
se recusar a participar da pesquisa agora ou em qualquer outra fase sem quaisquer
prejuízos.
7. Riscos / malefícios
Os procedimentos utilizados seguem normas éticas e não oferecem risco de qualquer
natureza.
8. Confidencialidade
Todas as informações coletadas neste estudo serão estritamente confidenciais e os
resultados divulgados não apresentarão nome ou qualquer dado que possa lhe
identificar.
9. Benefícios
Você não terá nenhum benefício direto a não ser o de expressar seu entendimento sobre
este espaço. Entretanto, nós esperamos que essa pesquisa nos forneça dados que
159
possam ser utilizados em futuros projetos ou pesquisas que visem mudanças nos
espaços desta categoria.
10. Pagamento
Você não terá nenhum tipo de despesa nem receberá nenhum pagamento por participar
desta pesquisa.
Observação:
1 - A gravação das entrevistas será realizada a partir do consentimento dos
participantes.
2 - As imagens obtidas por meio de fotografias, mesmo trabalhadas digitalmente para a
não identificação das pessoas presentes, serão feitas sob permissão dos
participantes.
3 - Caso sejam necessários maiores esclarecimentos sobre esta pesquisa ou sobre sua
participação, entrar em contato com a pesquisadora pelo telefone 8817-3870 ou com o
Comitê de Ética da Liga (fone: 4009-5494).
11. Declaração de consentimento
__________________________________________________
Participante
__________________________________________________
Investigadora
Data: Natal, ____ de __________________ de 2009.
160
Andice 5 – O projeto de reforma do CECAN
O projeto de reforma e ampliação do CECAN contemplou uma área de 3.000m² dentro da
qual encontram-se os consultórios, as salas de quimioterapia e alguns ambientes de
apoio. Depois da reforma, essa área crescerá para 9.000m² e alcançará, junto com o
bloco da medicina nuclear, imagem e radioterapia, um total de 12.500m². Para acomodar
a nova demanda de atendimento, o trecho reformado e ampliado foi dividido da seguinte
forma (ver plantas baixas e volumetria):
Primeiro pavimento (térreo): consultórios para radioterapia, quimioterapia, hematologia
e equipe multidisciplinar; 2 salões de quimioterapia destinados ao SUS com aumento
do número de posições – e um para o convênio.
Segundo pavimento: consultórios, salas de procedimentos, de exames e pequenas
cirurgias para ginecologia, mastologia, clínica médica e cirúrgica, neurologia, urologia,
gastroenterologia e cabeça e pescoço. O pavimento também abrigará as atividades
administrativas.
Terceiro pavimento: livre para expansão ou passível de repetição dos módulos do
segundo pavimento. Inclui auditórios, biblioteca, laboratório de biogenética e conforto
clínico.
A realização das primeiras etapas do trabalho de campo desta pesquisa indicou possíveis
caminhos para a reforma e ampliação do setor de quimioterapia do CECAN.
Fundamentados nas entrevistas e nas informações prestadas pelos profissionais de
saúde do local, elaboramos um desenho com três salões diferentes, sendo dois para o
SUS maior demanda e um para os pacientes dos convênios (ver Figuras 5 a 9 dos
apêndices). Entretanto, seu posicionamento na planta baixa sofreu modificações em
função de dois fatores principais: adequar os ambientes ao que tinha sido sugerido pelos
participantes da pesquisa e organizá-los de acordo com os fluxos observados na rotina
da unidade.
Nesse sentido, o grande salão do SUS, dividido em A e B, voltou a abrigar os pacientes
do convênio. Estes ficaram no salão B, com vista para o exterior e com a opção de
poltronas e leitos com divisórias. As salas de espera, já existentes, direcionam a clientela
para um dos dois salões. No caso, o que recebia a denominação de salão A, continua
sendo ocupado pelos pacientes do SUS, com layout semelhante e a mesma lógica de
funcionamento: divisórias baixas e cadeiras dispostas em círculo.
161
A criação de um outro salão do SUS, em outro local, foi conseqüência da demanda
elevada de pacientes e também da possibilidade planejar uma sala com características
um pouco diferentes da do salão A. O novo salão, localizado aproximadamente no local
do atual salão do convênio, abrangeria uma área maior com outra sala de espera. Seu
layout possui posto de enfermagem centralizado e novamente as cadeiras dispostas em
círculo, além dos leitos com divisórias e a vista para o exterior do edifício. Como sugestão
dos próprios profissionais de saúde do local, este salão pode incluir grupos de pacientes
com determinados tipos de cânceres ou determinados tipos de sessões quimioterápicas.
Esse fator amenizou um pouco a desvantagem presente na distância entre o salão e o
local de manipulação dos medicamentos, e é importante lembrar que não problemas
de ordem técnica ou funcional no transporte dessa medicação entre os referidos locais.
O projeto do hospital de câncer, a ser construído atrás desta unidade ambulatorial, ainda
está em fase preliminar de planejamento, mas pode contar com algumas idéias e
croquis para possibilitar a futura integração entre as duas partes. Neste caso, espera-se
incluir elementos arquitetônicos direcionados ao suporte psicossocial que deve ser
oferecido ao paciente, conforme visto em capítulos desta tese.
162
1
A:
Planta baixa do 1º pavimento do ambulatório CECAN.
163
2
A:
Planta baixa do 2º pavimento do ambulatório CECAN.
164
3
A:
Planta baixa do 3º pavimento do ambulatório CECAN.
165
4
A:
Volumetria e fachadas do ambulatório CECAN.
166
Figur
a
5
A:
Planta baixa do trecho do ambulatório reformado e ampliado. Destaque das salas de
quimioterapia.
167
Figura
6
A:
Planta baixa dos salões do SUS e do convênio com layouts modificados. Destaque para o novo
salão do convênio.
7
A:
Perspectiva do novo salão do convênio com divisórias entre as poltronas e vista para o exterior do
edifício
168
Figura
8
A:
Planta baixa do salão n. 2 do SUS com leitos nas laterais, cadeiras dispostas em círculo e
visualização do exterior do edifício.
Figura
9
A:
Perspectiva do salão n. 2 do SUS com leitos nas laterais, cadeiras dispostas em círculo e
visualização do exterior do edifício.
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