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inconsciente, o que o demarca em sua evanescência, em sua afânise. O sujeito é, sobretudo,
inconsciente. Ele é o sujeito dividido, sobre o qual a consciência nada sabe. Daí situar-se
entre dois significantes, no ponto de interseção entre eles, ou seja, no ponto de não sentido,
de hiato, de não recobrimento da cadeia significante. Lacan, no seminário 14, define o
sujeito como uma mancha, impossível de ser encontrada, pois esconde-se a cada
possibilidade de encontro.
Se, no seminário 11(1964/1998), Lacan postula a opção da alienação por “o ser ou
o sentido?”, no seminário 14 (1966-1967/2000), ele coloca essa escolha pelo cogito
cartesiano no “ou não sou ou não penso”, demarcando que ambos, Ser e sentido, já estão
perdidos. Se há alienação, é porque Ser e sentido já se perderam.
Por essa subversão do cogito, que traz em seu bojo essas duas perdas, Lacan tenta
circunscrever uma relação entre o inconsciente e o Isso. Elucida que não há um “eu sou”
ou um “eu penso”. O sujeito só existe como efeito de um discurso, sendo marcado pela
negação. Há, portanto um “não penso”, que se positiva em “ser sem eu” (ser sem sujeito),
que se articula ao Isso; e um “não sou”, que se positiva em um “pensar sem eu” (pensar
sem sujeito), que se articula ao inconsciente. Desse modo, inconsciente e Isso se articulam
a duas formas de perda.
O inconsciente se situa do lado do sentido, referenciado à impossibilidade do
significante significar a si mesmo, o que instaura a cadeia significante; e, logo, o pensar
inconsciente. Pensar que relança sempre o sujeito a um outro lugar, de modo que ele não é
representado por nenhum significante, daí o pensar sem sujeito. Donde, também, insere-se
o inconsciente como aquele que se inscreve pela falta de saber instintual, ou seja, é porque
falta esse saber inscrito no organismo vivo, que o inconsciente constitui-se como um saber,
saber à revelia do sujeito, tentando dar conta da falta de garantias, tentando construir um
sentido onde o saber falta.
O Isso, localizado do lado do Ser, relança-nos à impossibilidade da satisfação total,
à perda de gozo, não mais na vertente significante, e, sim, na pulsional. Instaura-se a
pulsão acéfala, que, contrapondo-se ao desejo, não dá cara, rosto, nome ao objeto, apenas
instaura, a partir do corpo, um circuito pulsional em torno da Coisa. O que esclarece o Ser
sem sujeito, pois, no Isso, o sujeito também está excluído, não é senhor do seu movimento
pulsional, e nem mesmo dos objetos que o satisfazem.
Se a lei de dualidade lógica de Morgan permite conservar essas duas perdas, então
o processo de separação já está presente na escolha em jogo na alienação. A separação já