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A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
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Programa de Pós Graduação em Comunicação
Área de Concentração: Comunicação Midiática
Linha de Pesquisa: Produção de Sentido na Comunicação Midiática
PARTE II – DISSERTAÇÃO DE MESTRADO
SUMÁRIO
A Intertextualidade Geradora de Sentido no
Gênero Desenho Animado de Núcleo
Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
Bauru/2009
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A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
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Programa de Pós Graduação em Comunicação
Área de Concentração: Comunicação Midiática
Linha de Pesquisa: Produção de Sentido na Comunicação Midiática
A Intertextualidade Geradora de Sentido no
Gênero Desenho Animado de Núcleo
Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Comunicação, da
Área de Concentração em Comunicação
Midiática, da Faculdade de Arquitetura,
Artes e Comunicação da UNESP/Bauru,
como requisito à obtenção do título de
Mestre em Comunicação.
Orientador: Prof. Dr. Marcelo
Magalhães Bulhões
Bauru
2009
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A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
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Franzão, Cláudia Regina da Silva.
A intertextualidade geradora de sentido no gênero
desenho animado de núcleo familiar “Os Simpsons" /
Cláudia Regina da Silva Franzão, 2009.
178 f.
Orientador: Marcelo Magalhães Bulhões
Dissertação (Mestrado)–Universidade Estadual
Paulista. Faculdade de Arquitetura, Artes e
Comunicação, Bauru, 2009
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
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A Intertextualidade Geradora de Sentido no
Gênero Desenho Animado de Núcleo
Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
Dissertação apresentada ao Programa de
Pós-Graduação em Comunicação, da
Área de Concentração em Comunicação
Midiática, da Faculdade de Arquitetura,
Artes e Comunicação da UNESP/Bauru,
como requisito à obtenção do título de
Mestre em Comunicação.
Data da aprovação: 24/08/2009
BANCA EXAMINADORA
Presidente: Prof. Dr. Marcelo Magalhães Bulhões
Instituição: PPG/FAAC/Unesp - Bauru
Titular: Prof. Dr. Mauro de Souza Ventura
Instituição: PPG/FAAC/Unesp - Bauru
Titular: Geraldo Carlos do Nascimento
Instituição: PPG/UNIP – São Paulo
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
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A todos os peixes que se encontram em rios
que deságuam nesse mar comunicativo do
qual fazem sua sobrevivência plena de
significação pelo exercício dialógico entre
passado e presente, nem sempre ganhando,
nem sempre perdendo, mas aprendendo a
nadar uns com os outros sempre.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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Cláudia Regina da Silva Franzão
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AGRADECIMENTOS
A vida é feita de estações, em algumas nosso trem se demora mais, por
outras apenas passamos rapidamente; tantas outras nos aventuramos a conhecer; mais
além nos detemos em pequenas nuances de algumas estações para apreciar-lhes a
beleza artística, única, de cada uma. Por toda essa viagem, chamada vida, agradeço
às pessoas especiais que me deixaram estar ao seu lado, aprender com as
experiências compartilhadas e trilhar novos caminhos, passar por novas estações.
Nessa fase de minha vida muitas foram as sementes, as flores e os frutos, dos quais
jamais me esquecerei.
OBRIGADA:
a minha pequena grande família (Alcindo, Nair, Júnior e Franzão)
por nunca cortarem as asas de meus sonhos, mas por apará-las
sempre que necessário;
às amigas Audrey Sabattini e Mayra Fernada Ferreira por darem
sentido verdadeiro à máxima um amigo é para todas as horas;
a minha amiga e madrinha acadêmica, professora Dra. Silmara
Sartoreto, pela sua paciência, orientação e compreensão
demonstradas em todas as nossas conversas e sem as quais eu não
teria começado a trilhar o caminho do Mestrado;
à professora Dra. Nelyse Salzedas que me abriu a primeira porta;
a meu orientador, professor Dr. Marcelo Magalhães Bulhões, por
acreditar que esse projeto podia se tornar realidade;
aos professores Dr. Mauro de Souza Ventura (FAAC/UNESP
Bauru), Dr. Geraldo Carlos do Nascimento (UNIP SP) e Dra.
Ana Sílvia Lopes Davi Médola, membros da banca examinadora,
por sua disposição e contribuições para o aprimoramento dessa
pesquisa.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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Cláudia Regina da Silva Franzão
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A linguagem e a vida são uma coisa só. Quem não fizer
do idioma o espelho de sua personalidade não vive, e
como a vida é uma corrente contínua, a linguagem
também deve evoluir constantemente. Isto significa que
como escritor devo me prestar contas de cada palavra e
considerar cada palavra o tempo necessário até ela ser
novamente vida. O idioma é a única porta para o
infinito, mas infelizmente está oculto sob montanha de
cinzas. (Guimarães Rosa)
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Cláudia Regina da Silva Franzão
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RESUMO
Diante dos vários aspectos que envolvem a produção de sentido, o presente estudo
tem como objeto de pesquisa a série de desenho animado Os Simpsons, na qual, por
meio da análise de sua intertextualidade como gestora da paródia “simpsoniana”,
pretende-se traçar um paralelo entre paródia e intertextualidade na construção de um
texto de entendimento aparentemente globalizado, mas que também guarda
significações e intenções mais profundas em suas entrelinhas. Ao desfiar o possível
caminho almejado pelos autores com seu texto parodístico sob o viés da produção de
sentido pela Comunicação Midiática, apresenta-se a análise de cinco episódios
(1997-2007), cuja intertextualidade, muitas vezes explícita, remete principalmente a
textos televisivos, literários, sócio-históricos e expressões lingüísticas próprias não só
da Cultura americana, mas também da Cultura ocidental como um todo. Para exame
de nosso recorte temporal sob o enfoque da Comunicação Midiática, nos servimos de
referencial teórico de várias áreas, entretanto, o texto produzido pauta-se fortemente
nas teorias da Análise do Discurso, Semiótica e Novas Teorias da Comunicação.
PALAVRAS CHAVE:
paródia – intertextualidade – televisão – produção de sentido - Os Simpsons
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
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ABSTRACT
Having in mind that meaning generation involves several aspects to be considered,
this research is developed on The Simpsons text, on which, through an intertextual
analysis of the simpsonian parodistic text, we intend to outline a parallel between
parody and intertextuality when a product of apparently globalized understanding is
built up, but which also keeps both deeper meanings and intentions between its lines.
While examining probable desired meaning by the authors of the series, we present a
five-episode analysis (1997-2007), whose intertextuality, most time shown explicitly,
reminds the viewers to television enunciations, literature texts, social-historic texts
and linguistics expressions used not only in the American Culture, but also in the
Western Culture as a whole. To exam our time patch under the Media Culture focus,
we were served theory knowledge from several related areas, however, the produced
text is based firmly on theories from Discourse Analysis, Semiotics and the New
Theories about Communication.
KEY-WORDS:
parody – intertextuality – television – meaning production – The Simpsons
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
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SUMÁRIO
Introdução .......................................................................................................... 12
Capítulo 1. A TV: sua linguagem e sua influência ........................................ 18
1.1. O ritmo da narrativa de TV no desenho animado .......................... 25
1.2. Ver TV X Assistir TV .................................................................... 30
Capítulo 2. O Mosaico Intertextual dentro do Texto Parodístico ............... 34
Capítulo 3. O gênero desenho animado ......................................................... 44
Capítulo 4. Senhoras e senhores: Os Simpsons ............................................. 48
Capítulo 5. Sobre cores e formas ................................................................... 55
5.1 Uma família em amarelo, vermelho, azul e branco ...................... 58
5.2 Um terno verde ou preto para Mr. Burns? .................................... 61
Capítulo 6. Da TV para a TV em cinco episódios ......................................... 64
6.1. Os Vários Arquivos dentro do Episódio
“Arquivo S” (1996/97) ................................................................. 65
6.1.2. “Três arquivos”, várias ligações ...................................................... 70
6.1.2.1. Arquivo 1: Sentar-se e ligar a TV. Trivial? ................................... 71
6.1.2.2. Arquivo 2: Um certo Leonard Nimoy Spock .................................. 72
6.1.2.3. Arquivo 3: Sexta-feira,a partir também de quinta, na “América
Televisiva” ....................................................................................... 75
6.1.3. Ver + Ouvir = Entender? ................................................................ 77
6.1.3.1. Novo Arquivo: a investigação ...................................................... 80
6.1.3.2 . Outro Arquivo: a hipervisibilidade ................................................. 86
6.1.4. Associações nem Sempre tão Inocentes ......................................... 91
6.2. Trinta Minutos Sobre Tóquio (Thirty Minutes Over
Tokyo - 1998/99) ........................................................................... 94
6.3. Realidade Editada (A partir do Episódio Sem Teto
Helter And Shelter – 2002/03) .................................................. 101
6.4. FRAUDCAST NEWS: O Espelho (a partir do Episódio
Guerra de Imprensa - 2003/04) ................................................... 110
6.4.1. Texto composto .............................................................................. 111
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No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
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6.4.2. O enredo de “FRAUDCAST NEWS”: da vinheta de abertura ao
“grand finale” ............................................................................... 115
6.4.3. A paródia simpsoniana e Ruppert Murdoch .................................. 118
6.4.4. De quem você está falando? ......................................................... 121
6.4.5. Nas entrelinhas do sucesso ............................................................ 126
6.5. 24 Minutos em Os Simpsons (2006/2007) – Real
e Imaginário: Distantes? ............................................................. 128
6.5.1. O bios midiático e a estesia .......................................................... 129
6.5.2. O Herói Bart Bauer ……………………………………………… 135
6.5.3. “Good work, Lisa!” ……………………………………………… 137
Capítulo 7. Um último bloco a guisa de fechamento: o discurso mascarado 138
Bibliografia consultada ............................................................... 141
Fontes Eletrônicas ...................................................................... 146
Anexos ......................................................................................... 148
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INTRODUÇÃO
Os limites de minha linguagem significam os limites
do meu mundo. (WITTGENSTEIN, Tractatus 5.6
apud IRWIN, 2004 : 45)
Ler o mundo ao nosso redor não é um ato estruturado em uma única
fala. Inscrever-se no ambiente não depende apenas de uma simples ação. que se
esculpir toda nossa atividade comunicativa com sons, gestos, imagens e letras
perante o humano que se desenvolve. Transvê-se o mundo nos atos do ser que se
emoldura, se formata e se reflete ao mesmo tempo que se refletido no e com o
outro por meio dos processos de identificação e projeção dos mitos sócio-ideológicos
de ambos, dos valores culturais, da representação de suas histórias e estórias, da
organização e das leis próprias que regem e mantêm o grupo social em que o
indivíduo se encontra ao longo do tempo.
O ser humano em seu devir social sente-se incluído ou excluído em
um determinado contexto, sente-se ser e humano ao comunicar-se. Sendo assim,
tanto os processos de identificação quanto os de projeção mitológicos, como
descritos por Barthes (2003) e Ferrés (1996), entram em cena a partir de nossa
herança cultural individual, construída ao longo de nossa leitura interativa do mundo
que nos envolve e a qual se manifesta produtivamente no uso das mais diversas
linguagens quando do diálogo entre sistemas lingüísticos criados e utilizados pelos
sujeitos envolvidos no processo comunicativo. Sentimos extrema necessidade de
tornar comum ao outro, ao nosso interlocutor, a nossa leitura de mundo por meio de
experiências interativas e o fazemos principalmente utilizando o gênero narrativo
1
.
Esse contar a vida tem acompanhado a civilização ocidental desde que o primeiro
humano decidiu registrar como “lia” a si próprio dentro da natureza.
1
Charaudeau, 2008
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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Sabendo que a narração, a necessidade humana de narrar e a
enunciação televisiva são quase um lugar comum, elas se aproximam e se enlaçam.
Logo, ver-se na telinha é ser uma celebridade, patamar gerado pelo mundo
midiatizado da sociedade da informação: existimos a partir do momento em que
somos vistos pelo outro no espelho narrativo da TV, ganhamos ao mesmo tempo
status de celebridade e de heróis mediante esse processo.
Entretanto, não podemos esquecer que ao nos comunicarmos em
nosso cotidiano, damos vazão atualizada a um tumulto de expressões que
materializam nossos papéis sociais e que regem nosso mundo interior em constante
contraste com o exterior para reconhecimentos e/ou estranhamentos inter-subjetivos.
Lemos a linguagem do outro, nosso interlocutor, a cada instante, à procura de algo
que nos pareça familiar, ambivalente ou simbologicamente reconhecível, buscando
compreender aquilo a que somos ou estamos expostos. Nessa mesma vertente de
entendimento, Barthes
2
lembra-nos que a partir do momento em que visível e
invisível se unem sob as espécies de uma igualdade quantitativa, ou seja, isto
equivale aquilo, lançamos mão do símbolo com base em nossa cultura, um registro
como no bloco de cera descrito por Derrida; enfim, procuramos o que nos é comum.
Comunicar, ler, registrar, gravar, interpretar, produzir, comunicar, ler,
registrar, gravar ... em processo sucessivo, num embate constante entre existencial e
essencial, assim entendemos haver um diálogo contínuo entre exterior e interior na
interação intersubjetiva, no qual a cada volta da espiral processual preenchem-se os
vazios entre os campos semiológicos
3
. Onde, ao mediar o diálogo entre o nível
“sublinguístico” – existencial – e o “supralinguístico” – essencial, a linguagem
apresenta-se para que o indivíduo preencha as lacunas de sentido(s) por meio de uma
ponte entre a sua existência enquanto sujeito social, psíquico e fisiológico, e a
essência conceitual-sentimental construída pela Cultura.
Também não podemos esquecer que ao externalizar a leitura que faz
do mundo ao seu redor, o sujeito tem à sua disposição todo o seu inventário cultural
particular, misto de existencial e essencial, ao qual recorre e, dentre as possibilidades
2
2003 : 89
3
Baccega, 1998
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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apresentadas, escolhe termos para construir o enunciado que considerar mais
adequado à situação sócio-histórica em que se encontra. Tal enunciado é composto
com base em estruturas já conhecidas, além de exercitadas: os gêneros textuais como
descrito por Bakhtin
4
. Entretanto, o texto
5
produzido pelo enunciador apresenta-se
não como material acabado, tanto em seu plano de expressão quanto de conteúdo,
mas sim como matéria prima perpassada por inúmeras vozes em diálogo com o
entorno sócio-cultural, a realidade e o mundo no qual o falante está inserido no
momento da enunciação. O enunciado produzido apresenta sempre uma intenção e
busca uma resposta prevista de seu interlocutor. Nesse ballet de tessitura
composicional, encontra-se a produção de sentido responsiva perante o que se
comunica. Tal resposta poderá manifestar-se em forma de sanção positiva ou
negativa àquilo que foi enunciado. Portanto, embora o enunciador arme-se do maior
número de recursos para convencer seu enunciatário, nem sempre atingirá sua
intenção da forma que planejara.
Se uma das modalidades lingüísticas mais exercitadas durante a
interação social e também a de percepção mais acentuada por parte do ouvinte é a da
linguagem verbal, por meio da qual o sujeito inscreve sua visibilidade ao utilizar
habilidades comunicativas amalgamadas em sua Cultura ao longo dos tempos, cabe
nos indagar: como nos posicionarmos diante das novas formas de registro geradas
pelas novas tecnologias? Lembra-nos Maingueneau
6
:
Ao oferecer a possibilidade de gravar a voz, ou a voz com a
mímica e os gestos do locutor, o mundo contemporâneo tornou o
oral tão estável quanto o escrito: atualmente ao gravarmos,
estamos, de certa forma, escrevendo.[...] encontramo-nos em uma
sociedade em que o oral se reveste de características de “uma
escritura” de tipo totalmente diferente.”
Ao confrontarmos as novas formas de escrita com a teoria
estruturalista bakhtiniana, segundo a qual os textos são construídos polifonicamente
por fios dialógicos de vozes do discurso familiar, da rua, do trabalho, enfim, das mais
diversas interações que perpassaram o processo comunicativo do ser em seu devir
social; vozes que abrem polêmica entre si, se completam ou respondem umas às
4
2000
5
Adotamos aqui a conceitualização de Antonini (2007, p. 144), para quem texto é “um todo de
sentido que se insere num dado momento cultural.”
6
2008 : 75
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Cláudia Regina da Silva Franzão
15
outras
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e que à luz da cultura dialogam de modo contratual e conflitante embebidos
no discurso, nos propomos a verificar nesse trabalho o imbricamento entre paródia,
humor e intertextualidade na geração de sentido no gênero desenho animado de
núcleo familiar Os Simpsons.
Entendemos que em nossa busca por êxito comunicativo, ao
produzirmos amostras textuais, alguns questionamentos afloram diante do valor e da
produção de sentido que os meios de comunicação adquirem a partir das novas
tecnologias do mundo moderno. Intriga-nos, diante dos paradigmas comunicacionais
existentes, como classificar e produzir epistemologia sobre textos sincréticos
midiáticos no formato de sitcoms; qual a intencionalidade transmitida dentro do
mosaico textual em que se configura um texto parodístico desses dentre os diversos
gêneros e formatos existentes; e, ainda, como o texto parodístico de televisão
revelaria sua colagem à luz de referencial teórico da Semiótica e Análise do
Discurso.
Estimulados por tais inquietações, decidimos pela produção de
epistemologia sobre a composição textual de natureza dialógica do desenho animado
de núcleo familiar “Os Simpsons” em uma leitura não do discurso verbal dos
personagens considerados centrais (Homer, Marge, Bart, Lisa, Marge e Mr.
Simpson), mas também do acomodamento das imagens e musicalidade consideradas
significativas na produção de sentido dentro da Comunicação Midiática.
Ao examinarmos a produção de sentido de Os Simpsons levantamos a
hipótese da existência de um perfil de base para o discurso enunciativo contido na
dialogia polifônica da obra com os valores, ideologia e Cultura de uma sociedade
constituída e parodiada em tom de humor cáustico como forma de superação do
medo ante a situação factual, sendo que o simples consumo de um produto textual
televisivo nesse formato não se mostra satisfatório nem para compreender, nem para
se abranger todas as relações dialógicas que se estabelecem na arena sincrética de
linguagens em que se constituem as obras televisivas contemporâneas em sua
geração do sentido. Portanto, procuramos examinar em nossa pesquisa, em um
primeiro momento, como a intertextualidade se manifesta no texto televisivo para
produção de sentido pelo telespectador, ao mesmo tempo em que o texto produzido é
7
Barros, 2003
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veículo e espelho da leitura dos fatos para produção de sentido dentro da narrativa.
Em Os Simpsons, por exemplo, focamos especial atenção à sucessão de elementos
presentes na paródia e no carnaval
8
, que se nutrem da intertextualidade para gerar
produção de sentido em tom humorístico nos textos sincréticos midiáticos no formato
de sitcoms, para em seguida averiguarmos qual seria a responsividade discursiva aos
fatos reais por parte dos enunciadores/produtores do texto parodístico. Em um
segundo momento, nos deteremos em qual seria a força narrativa que conduz a
longevidade de quase duas décadas de Os Simpsons, não entre os
“estadosunidenses”, mas também pelo mundo, ou seja, quais seriam os significantes
comuns utilizados na produção de sentido intertextual nos cinco episódios de nosso
corpus e que sustentam a malha narrativa desse produto parodístico duas décadas
no ar.
Como amostragem de análise, optou-se pelo recorte de cinco
episódios da série Os Simpsons nos quais se entendeu que cada narrativa apresenta a
leitura paródica de alguns gêneros televisivos pelo próprio meio em que foram
veiculados os textos de base, porém em um novo formato, em um novo texto: o texto
parodístico
9
. Para tanto, buscou-se eleger um recorte temporal que abrangesse uma
década (1997-2007) para a composição de nosso corpus, por acreditarmos que assim
delineamos um panorama mais significativo da manifestação dialógica entre textos
dentro da paródia, e também face à impossibilidade de exame de nosso objeto como
um todo, por dois motivos: primeiro, consideramos a série uma obra em aberto pelo
seu caráter de produtividade, ou seja, episódios novos são levados ao ar toda semana;
segundo, a impossibilidade de exame das dezenove temporadas produzidas até o
momento frente ao tempo disponibilizado pelo programa de Mestrado para produção
desta pesquisa.
Findos motivos e justificativas, esclarecemos que o corpus de análise
é composto pelos episódios: Arquivo S (The Springfield Files) pertencente à oitava
temporada (1996-1997); Trinta Minutos Sobre Tóquio (Thirty Minutes over Tokyo),
décima temporada (1998-1999); Sem Teto (Helter Shelter), da décima quarta
8
“Carnaval é a inversão da ordem oficial ditada pela ideologia dominante.” (ZIZEK em entrevista ao
programa Roda Vida da TV Cultura – 15.10.2008)
9
Para Santana (2004, p. 32) a paródia é um novo texto porque “(...) é um ato de insubordinação contra
o simbólico, (...). Ela mata o texto-pai em busca da diferença. É o gesto inaugural da autoria e da
individualidade.”
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temporada (2002-2003); Guerra da Imprensa ou Notícia Enganosa
10
(Fraudcast
News), da décima quinta temporada (2003-2004); e 24 Minutos (24 Minutes) da
décima oitava (2006-2007).
10
Decidimos adotar os dois títulos em português nessa sessão de nosso texto, devido às divergências
na fixação do título tanto por fontes impressas como eletrônicas consultadas; entretanto, no capítulo
dedicado a análise, manteremos o título Guerra da Impressa por entendermos que ele melhor descreve
a narrativa desenvolvida dentro do episódio.
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1. A TV: SUA LINGUAGEM E SUA INFLUÊNCIA
(...) a televisão representa para os cidadãos das
sociedades modernas aquilo que o totem representava
para as tribos primitivas: objeto de veneração e
reverência, símbolo de identificação individual e
coletiva... (FERRÉS, 1996:07).
Os estudos da área da Comunicação têm abarcado as mais diversas
manifestações tanto de leitura informativa a respeito dos fatos ocorridos no momento
sócio-histórico em que estamos inseridos quanto da leitura produzida por alguns em
forma de obras ou produtos de comunicação. Entretanto, poucos são os trabalhos
sobre o gênero desenho animado de núcleo familiar apresentados até agora. Por outro
lado, não é difícil encontrar alguém que conheça os nomes das personagens centrais
de Os Simpsons, cite alguns episódios ou sequências de cenas que lhes chamaram a
atenção, ou até mesmo façam menção à(s) cena(s) para descrever situações da vida
cotidiana pela comparação entre pessoas reais e os personagens da série.
Dentre os poucos trabalhos sobre o gênero desenho animado de núcleo
familiar, Os Simpsons tem sido tomado como objeto de pesquisa não na área da
Comunicação, mas também de outras ciências que se preocupam em entender os
fenômenos comunicacionais. Amostra disso encontra-se registrado nas afirmações de
Irwin
11
sobre a série. O autor nos lembra que, sob o enfoque da Filosofia, reconhece
o desenho como uma brilhante sátira social ao juntar elementos díspares das caóticas
vidas americanas, dando-lhes forma e estilo e forjando-os em algo significativo, e às
vezes até belo dentro de uma série de desenho animado tão pertinente para o
telespectador.
A longevidade de sucesso dessa família amarela tem sido demonstrada
em seu reconhecimento pela imprensa ao longo dos anos na forma de prêmios
recebidos
12
, por exemplo, em setembro de 2008, Os Simpson receberam pela décima
vez o Emmy de melhor seriado animado cômico do horário nobre, além de terem,
11
2004: 80
12
http://en.wikipedia.org/wiki/List_of_awards_won_by_The_Simpsons
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nesse mesmo ano, quatro episódios da 19ª temporada indicados separadamente à
categoria de melhor programa de animação. Em tempo, lembramos que o Emmy, que
é considerado o Oscar da TV americana, no ano referido acima, também indicou Os
Simpsons para melhor rie cômica ao lado de outras sitcoms de grande audiência e
estreladas por atores “reais” na TV a cabo internacional
13
.
Desde a estreia do desenho sobre essa família amarela e suas
peripécias no canal FOX em 17 de dezembro de 1989, Os Simpsons vêm
colecionando números. Talvez isso explique a grande variedade de itens referentes à
série que se encontram no mercado, ou seja, além do tempo de permanência no ar,
existe também toda uma linha de produtos a partir dos personagens centrais da série
e que é comercializada em todo o mundo pela homepage oficial dos “Simpsons”
14
.
também outras homepages criadas por fãs ao redor do mundo, os mesmos
indivíduos que se organizam em comunidades
15
dentro de um dos maiores sites de
relacionamentos da internet.
A respeito de produtos gerados a partir de obras midiáticas, Ferrés
(1996) nos lembra a importância que os cidadãos da modernidade atribuem às
mídias, mais especificamente à televisão. Tal idéia também está presente em Lopes
(2004), ao afirmar que as máquinas de comunicar são veneradas e reverenciadas,
símbolos de identificação individual e coletiva dos sujeitos e seus grupos sociais
mantidos através das redes intersubjetivas na era da informação.
Tais redes se apresentam imbuídas na arquitetura dialógica entre a
representação interior-exterior que seus membros expressam em forma de palavras,
diálogos, imagens, gestos e musicalidade ao executarem o paciente e determinado
“balé” do espetáculo comunicativo frente à produção de uma mercadoria. Em sua
coreografia evocam-se, tanto por parte da produção quanto da recepção, constantes
13
http://br.reuters.com/article/entertainmentNews/idBRSPE4B80AJ20081209
14
http://www.thesimpsons.com/index.html
http://www.thesimpsons.com.br/
http://www.simpsonshp.cjb.net/
15
http://04021a3072d8810306.comunidade.uolk.uol.com.br/
http://comunidade.mundofox.com.br/forums/256.aspx
http://www.orkut.com/Community.aspx?cmm=37919
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20
relações intertextuais e interdiscursivas por parte dos sujeitos envolvidos, como
descrito por Citelli
16
:
Quando afirmamos que é da natureza da linguagem o seu
mecanismo dialógico é porque existe uma permanente dimensão
intertextual, intratextual, interdiscursiva, intra e intersemiótica; ou
seja, não falamos apenas uma situação individual, mas exprimimos
em nossa fala uma outra seqüência de falas historicamente cifradas
pela linguagem.
A esse respeito, as afirmações Irwin e Lombardo
17
corroboram no
sentido de que Os Simpsons é um programa rico em alusões intercontextuais, as
quais se ligam tanto à chamada cultura elitista quanto à cultura popular, sendo que
ambas se reconhecem ao validar o sentido do texto mediático. Os referidos autores
ainda nos lembram que tanto os nomes de alguns personagens quanto os títulos de
episódios são alusões ou à mitologia (Homer, por exemplo, tem seu equivalente no
Português em Homero), ou a trocadilhos referentes a clássicos da literatura, cinema,
teatro e, com maior freqüência, trocadilhos com textos produzidos pela própria TV,
compondo uma esfera interdiscursiva interessante. Sendo assim, não podemos deixar
de apontar que na sociedade atual, na qual o meio televisivo nos propicia
conhecimento factual-informativo praticamente em tempo real sobre o que ocorre no
mundo, o cidadão nacional sua identidade dialogar em contraste às demais
sociedades do mundo, ou seja, o sujeito reflete-se em face do que lhe parece
“estrangeiro”
18
ao assistir uma obra produzida para outra Cultura.
O conceito de estrangeiro nos demanda a recorrência também ao de
hibridação cultural
19
na modernidade, em que a desterritorialização dos ritos e mitos
impulsionada pela comunicação midiática se faz mais presente. O encontro de
culturas antes consideradas distantes se (i)mediatiza no contato com produtos
enunciativos de outros países. Porém, ao mesmo tempo em que somos abduzidos
para dentro do discurso daquela esfera comunicativa, também tendemos a naturalizar
e adotar a sua enunciação como expressão máxima de que aquele produto é a melhor
amostragem de como todo aquele estado-nação se comporta tanto discursivamente
quanto socialmente.
16
1996: 15
17
2004: 83-93
18
DaMatta, 2005
19
Canclini, 2000.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
21
Ambos, hibridação cultural e tecnologia midiática, proporcionam
conflitos, diálogos, fundição e nascimento de novas visões de mundo, de novas
atitudes perante as mesmas situações de conflito existencial enfrentadas pelo homem
do capitalismo moderno. Entretanto, neste momento cabe lembrar Bakthin
20
no que
tange ao encontro dialógico de duas culturas a partir da incidência entre linguagens:
Na cultura, a exotopia é o instrumento mais poderoso da
compreensão. A cultura alheia se revela em sua completitude e
em sua profundidade aos olhos de outra cultura (e não se entrega
em toda sua plenitude, pois virão outras culturas que verão e
compreenderão ainda mais). Um sentido revela-se em sua
profundidade ao encontrar e tocar outro sentido, um sentido alheio;
[...] Formulamos a uma cultura alheia novas perguntas que ela
mesma não se formulava. [...] O encontro dialógico de duas
culturas não lhes acarreta a fusão, a confusão; cada uma delas
conserva sua própria unidade e sua totalidade aberta, mas se
enriquecem mutuamente.
As linhas geográficas imaginárias antes usadas para definir onde o
território de uma nação linguística terminava porque outra tinha seu início tornam-se
ainda mais abstrata em face do alcance da comunicação midiática e seus produtos. O
contato cultural acelera-se, os contrastes culturais não são o nítidos, porém as
nuances que ficam identificam-se como o surgimento de um novo platô conquistado.
Acabamos por nos tornar algo similar a uma “aldeia global” com a troca de
informações culturais propiciada pela globalização de dados e maior exposição do
cidadão aos meios de comunicação. A situação delineada requer dos meios uma
linguagem comunicativa tão híbrida em seus produtos quanto à cultura que vem se
delineando no século XXI entre todos os habitantes do planeta.
Pelas imagens televisivas, principalmente, o telespectador brasileiro
vê-se exposto mais imediatamente
21
à leitura de tudo o que acontece nos quatro
cantos do mundo ao assistir a interpretação espetacular dada pelos mais diversos
profissionais da área das comunicações às informações veiculadas. Os subsídios
linguístico-informativos usados pelo enunciador provêm de referentes textuais já
utilizados no cotidiano do enunciatário pelas mais diversas esferas discursivas de
20
2000: 368
21
A implantação da TV a cabo no Brasil a partir da década de 90; a expansão do mercado de mídia
digital, de provedores de internet, celulares, programas de incentivo a aquisição de computadores
entre outros.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
22
atuação social, ou seja, as máquinas midiáticas nos oferecem leituras discursivas
pautadas nas possíveis ligações intertextuais que o enunciatário telespectador fará e,
assim, busca atingir êxito em despertar sentimentos intencionalmente, sentimentos
que construam um segundo sistema significante e nos mantenham consumindo o
produto que nos é oferecido. Porém, nem sempre essa intencionalidade é absorvida
pela outra ponta do iceberg, provocando, consequentemente, a reformulação do
produto.
Nesse sentido, as declarações de Eugênio Bucci apud Baccega
22
,
legitimam a necessidade de se processar maior reflexão crítica a respeito dos
produtos mediáticos, principalmente os televisivos, e a sociedade que eles espelham,
pois,:
Acima dos gêneros, a crítica de televisão é a crítica de um novo
patamar das relações sociais e das relações ideológicas entre os
sujeitos, e a partir daí ela ganha seu sentido político o que
mais interessa. [..] A crítica de televisão não lida (apenas) com a
estética. Ela não tem por objetivo uma arte, mas um fato social
como a própria língua (ou como a linguagem). Portanto, deve
declarar que, discutindo a cultura, está discutindo a sociedade e
seus sujeitos.
Diante de afirmações tão pertinentes sobre o discurso do meio
televisivo, argumentamos que a identidade comunicativa do cidadão do mundo
midiatizado não pode ser percebida como inflexível, muito menos como estática,
imutável. O comunicador eficiente é aquele que faz de si próprio um camaleão
reflexivo de seus atos e dos atos ao seu redor, dentro e fora de seu habitat cultural; é
aquele que sabe reconhecer o estranho em contraste com o familiar quando exposto
nas mais diversas peças comunicativas
23
.
Em Os Simpsons, peça midiática do gênero
24
desenho animado de
núcleo familiar, simulam-se, por meio do humor de seu texto parodístico, resoluções
inusitadas para problemas frequentes dentro de culturas supostamente distintas e ao
mesmo tempo próximas, pois a identificação do espectador com o personagem dá-se
22
1999 : 37
23
Usamos o termo peça comunicativa para nos referirmos a todos e quaisquer gêneros de produtos da
Comunicação Midiática televisiva, desde chamadas, propagandas e vinhetas até telenovelas e
minissérie televisivas, bem como filmes produzidos especialmente para a TV.
24
Souza, 2004.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
23
de forma que aquele projeta suas falhas nesse, mas se resolvendo atribulações em
tempo recorde, se comparado à vida real. Nesse contexto, dada a capacidade do texto
televiso de gerar verossimilhança, a produção áudio-visual tornou-se atualmente um
dos meios de comunicação de maior influência sobre as classes sociais e também de
mais fácil acesso a todas elas.
Sendo assim, o objeto de estudo em questão abre-se criticamente pelo
exame da produção de sentido pela comunicação midiática na forma em que se
apresenta a cultura e suas obras como reflexo de uma sociedade e seus sujeitos; um
tipo de exame crítico de uma produção que [...] situa cada item estudado em termos
dos contextos culturais onde ele ocorre, sem deixar de levar em conta o fio condutor
do confronto: o seu autor e a sociedade que ele continuamente carrega nas costas e,
às vezes na cabeça
25
.
Acreditamos que, por apresentar o tom humorístico da paródia, o
discurso midiático proposto em Os Simpsons oferece para seu telespectador um
convite à libertação do medo da situação factual, amenizado pela inversão da ordem
oficial reinante no mundo factual e que, por meio da atuação paródica de seus
personagens em simulacros
26
de espaços e esferas discursivas de interação subjetiva
cotidiana, conduziria o enunciatário em um convite à superação da situação factual
parodiada. A figurativização impressa à obra configura-se em um simulacro tão
próximo do mundo factual que o telespectador firma o contrato fiduciário de
comunicação validando uma Springfield fictícia.
Dentro do texto parodístico discursivo de nosso recorte temporal de
Os Simpsons, percebemos haver uma composição textual crítica original com relação
ao mundo factual globalizado em que tanto a população americana quanto a
brasileira, de alguma forma, se encontram imersas; assistimos à orquestração de um
espetáculo narrativo fictício voltado para a vida humana em sua cotidianidade. Em
sua percepção do mundo factual, que remete à teoria de carnavalização, inversão da
ordem oficial reinante, identificamos, dentro de nosso corpus, que quatro
“categorias” fundamentais instauradas a partir do contato livre e de semelhanças: um
novo modo de relações humanas, oposto às relações hierárquico-sociais todo
25
DaMatta, 2005:09
26
Baudrillard, 1991
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
24
poderosas da vida cotidiana; a excentricidade, as personagens se abrem e se
permitem tudo aquilo que comumente está reprimido; a mésalliances, a aproximação
dos contrários; e a profanação (paródias de textos considerados sagrados ou textos
sobre situações conflitantes).
Na paródia o discurso se converte em palco de luta entre duas vozes
e, como num espelho de diversas faces, apresenta a imagem invertida, ampliada ou
reduzida arrastando o leitor para dentro ao mesmo tempo em que o põe para fora
27
.
Sendo assim, na estruturação global da paródia, segundo a autora citada no parágrafo
anterior, destacam-se cinco elementos que entram na constituição das narrativas
orais: orientação complicação avaliação resolução e moral, as quais estão
presentes nos episódios usados para esta pesquisa.
Focando especial atenção nos indicadores de interculturalidade que
nosso corpus apresenta, e que, acreditamos possibilitem às sociedades
geograficamente distantes umas das outras reconhecerem alguns de seus valores em
um contexto que lhes pareça estrangeiro e ao mesmo tempo imbuído de valor,
cremos ser possível processar maior entendimento de como a Comunicação
Midiática se (re)inventa sobre si mesma em constante diálogo intertextual
28
.
27
Fávero, 2003.
28
“O termo intertextualidade designa a transposição de um ou mais sistemas de signo em um outro.
[...] A intertextualidade constitui o trabalho de transformação e de assimilação de vários textos
operado por um texto centralizador que detém a liderança de sentido.” (Poétique 27 : 261-262 apud
BALOGH, 2002 : 79)
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
25
1.1 - O RITMO DA NARRATIVA DE TV NO DESENHO
ANIMADO
As palavras, felizmente, penetram todos os domínios,
executando o paciente e determinado mister do fazer
multidisciplinar, do invocar infindáveis relações
intertextuais e interdiscursivas. (CITELLI, 1996 : 13)
A acessibilidade, a fragmentação, a quase
onipresença das medias no nosso cotidiano gerou
exacerbamentos espantosos nos mecanismos
intertextuais conhecidos. (BALOGH, 2002: 81)
É frequente ouvirmos de nossos jovens e adultos que eles não gostam
de ler, que preferem ver um filme a ler uma obra literária, que não sabem por que
têm que ler determinada obra ou estudar determinado conteúdo. Nesse tipo de
discurso o falante deixa transparecer a descontextualização que sente em relação ao
que está diante de seus olhos. O exercício intertextual de leitura de uma obra da
grande Literatura se apresenta como árduo para um leitor acostumado à leitura de
textos televisivos, nos quais o recurso da angulação de mera na apresentação
das imagens, a presença dos traços prosódicos na fala de cada personagem, o recurso
da paisagem sonora adequada tanto ao ritmo quanto ao tipo da ação que se desenrola.
Dentro da narrativa televisiva, a construção do enunciado pelo
enunciador TV em sua intencionalidade requer escolhas composicionais adequadas
às possíveis ligações intertextuais que se queira estabelecidas pelo público alvo
daquela peça midiática, para que este mesmo público aceite as relações de sentido
que são propostas como válidas e se disponha a consumir a enunciação narrativa que
ora se desenrola. que se firmar um contrato fiduciário, como dissemos na
sessão anterior, entre a instância enunciativa de produção/transmissão e a de
recepção/interpretação. Tal contrato pauta-se pelo diálogo intertextual entre a Cultura
de ambos, a qual influenciará na produção de sentido por parte da obra midiática
frente aos valores considerados positivos pela ideologia dominante no momento
sócio-histórico da veiculação da peça midiática televisiva, pois não podemos
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
26
esquecer que a televisão/empresa vive de números contabilizados em forma de
audiência.
No tocante a Cultura, Balogh
29
declara que O meio mais
delirantemente voraz da cultura moderna é sem dúvida a televisão, posto que
inserida de modo mais contundente na era da velocidade, digerindo programa após
programa, dia após dia, ano após ano, qual um rabelaisiano Pantagruel eletrônico,
uma insaciável máquina antropofágica ... esse meio constrói sua narrativa em forma
de mosaico reconhecido rapidamente pelo telespectador para que a geração de
sentido acompanhe o ritmo da narrativa em nome de índices de audiência almejados
pela empresa por trás do produto, pois, como também afirma Santaella
30
: A televisão,
com seu apetite voraz, devoradora de quaisquer formas e gêneros de cultura, tende a
diluir, neutralizar, todas as distinções geográficas e históricas, adaptando-as a
padrões médios de compreensão e absorção.
Na ânsia pelos números, com frequência um realizador chega a
reciclar dois ou mais gêneros inteiros ao mesmo tempo; uma imensa colagem, ou
bricolagem de textos ou fragmentos textuais para tornar mais ágil à produção de
sentido no espectador. Fato que também ocorre em Os Simpsons, principalmente pela
natureza de seu gênero (desenho animado), pelo formato que lhe é impresso (sitcom)
e o tom humorístico dado no tratamento de seu tipo textual (paródia).
Matt Groening, criador e principal finalizador do texto dos
personagens do seriado, usa de vários intertextos, não só da Cultura dita popular, mas
também da chamada Cultura elitista, na condução da malha dialógica enunciadora de
seus personagens a partir do script, a fim de atribuir-lhes o tom exigido pela paródia
televisiva. Além das imagens suscitadas pela escolha vocabular para a composição
do texto discursivo, o autor tem à sua disposição não apenas recursos televisivos
fornecidos pelo discurso da comunicação não-verbal que o meio audiovisual
proporciona, mas também os recursos fornecidos pelo próprio gênero, desenho
animado de núcleo familiar. Essa gama de recursos característicos favorece os
autores da obra Simpsoniana na formulação dos episódios da série e na maneira
como envolvem o público em sua enunciação.
29
2002: 80
30
2002 : 51
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
27
A resolução rápida, bem como de forma simples e definitiva, de
problemas cotidianos numa sucessão de cenas que surpreendam o enunciatário
telespectador contribuem para o sucesso de Os Simpsons. Pois, como afirma
Ferrés
31
, o telespectador senta-se diante da TV esperando ser surpreendido a cada
sete segundos por uma situação inusitada, determinando, assim, se o programa a que
assiste é interessante ou não. O ritmo discursivo em que as imagens da programação
televisiva aparecem diante dos olhos do enunciatário telespectador capta-lhe o
interesse sem exigir-lhe o máximo de atenção e o preenche com informações que
conduzem ou ao riso ou à comoção, ao mesmo tempo em que requerem do leitor o
mínimo de atenção para traçar as ligações intertextuais cognitivas relacionadas à
narrativa. A sequência de discurso televisiva tem o desenrolar de fatos quase de
forma previsível por parte do enunciatário telespectador, o qual pode, assim, ocupar-
se de outras tarefas diversas enquanto a telinha está aberta, porém sempre retornará a
ela para checar algo que seja necessário. Entretanto, na tentativa de captar as ligações
intertextuais da lógica de conteúdo da sequência discursiva audio-visual composta
por linguagens sincréticas-interagentes verificamos que no caso do texto parodístico
de Os Simpsons, mais especificamente em nosso recorte temporal, do ponto de vista
epistemológico, que a composição narrativa se também pela intenção
iconofágica
32
, ou seja, alimenta-se de outras imagens cujos sentidos se encontram
sedimentados pela própria enunciação discursiva da TV para produzirem sentido.
Como os intertextos estabelecidos pelo desenho animado possuem
produção de sentido a partir de fatos colhidos no senso comum, o discurso superficial
enunciado pela peça é logo acolhido pelo enunciatário sem a preocupação com a
intencionalidade da mensagem crítica
33
em que está envolta, pois, como forma de
produção de sentido por verossimilhança
34
a TV em sua enunciação retórica faz crer,
31
1996
32
Não é outro o fenômeno da iconofagia: corpos tridimensionais devoram imagens (bidimensionais,
unidimensionais e nulodimensionais) em quantidade cada vez mais assustadora, em substituição a
outras apropriações sensoriais. (BAITELLO JÚNIOR, 2002)
33
"Arte ou faculdade de examinar e/ou julgar as obras do espírito, em particular as de caráter
literário ou artístico. (...) Juízo crítico, discernimento, critério. (...) Apreciação minuciosa. Ato de
censurar; censura, condenação. Julgamento ou apreciação desfavorável."(Dicionário Aurélio, 1995)
34
[...] o verossímil é uma unificação de significantes, acima dos significados estanques: apresenta-se,
assim, como uma polissemia generalizada. Poderíamos dizer que o verossímil é a polissemia das
grandes unidades do discurso. (KRISTEVA, 2005)
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
28
por veridicção, que o ícone do qual se apropria para produção de sentido na verdade
existe, firmando um contrato fiduciário com o telespectador, cujo olhar passa a ser
educado pelo meio. Devoramos os ícones que nos são apresentados como
devorávamos os relatos de viagem ou o romance estrangeiro, pois tornar verossímil
significa naturalizar as ações e seus agentes de forma socialmente aceita, de forma
que reproduzam o discurso da ideologia(s) dominante(s) no momento sócio-histórico
da produção narrativa. Ambos, gênero e formato escolhidos para Os Simpsons,
esmeram-se em conjugar de maneira harmoniosa a cumplicidade necessária para
moldar a intencionalidade da narrativa humorística em um discurso que almeja
conduzir o enunciatário telespectador ao riso pela inversão da ordem oficial reinante.
Aos olhos do pesquisador da Comunicação Midiática, o lado
provocante de Os Simpsons se quando lemos seu texto como expressão
discursivo-comunicativa de um juízo de valor a respeito da sociedade, ou seja, como
uma nova forma de registro escrito de impressões sobre um determinado fato
apreendido pelos autores de seu texto. Na malha do tecido polifônico de muitas
personagens, encontram-se indicadores interculturais de como a mensagem do texto
televisivo dialoga com o acontecimento do mundo factual. Por meio desses
indicadores abre-se a possibilidade de discussão dos juízos de valor do enunciador
por trás do texto dos personagens principais de Os Simpsons.
As imagens de televisão apresentam em sua constituição uma
amostragem cultural, em pequenas doses, de forma variada e das mais diversificadas
civilizações dentro de um único texto, como se estivéssemos a admirar um mosaico
da realidade globalizada sem levar em consideração o contexto sócio-histórico em
que cada manifestação ocorreu. Esse tipo de apresentação da informação pelo
veículo favorece o conhecimento dispersivo, incoerente e descompromissado. O
telespectador entende aquele conteúdo como sendo a única realidade existente e
coerente a ser apreendida
35
, porém está distante de sua realidade social e por isso não
o sensibiliza a ponto de que ele queira fazer algo para mudar a realidade mostrada
pelas imagens. Por outro lado, nas mãos de um telespectador crítico, as peças do
quebra-cabeça comunicativo-cultural podem servir-lhe de estímulo para sair à busca
35
Charaudeau, 2006
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
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29
de seu contexto, ampliando-lhe fronteiras de conhecimento. Instigado pela
curiosidade, o telespectador pode vir a buscar mais informações sobre o que viu.
Profissionais de diversas áreas podem valer-se da linguagem contida
no desenho animado para estudos interdisciplinares com produção de literatura
científica a respeito. Mas o que nos interessa aqui é a manifestação oral associada ao
visual como simulacro da realidade, sob enfoque principal da análise do discurso das
personagens centrais de Os Simpsons. Nosso foco de atuação restringe-se à interação
social das personagens daquele simulacro deixando transparecer a pluralidade de
textos que as habitam em diálogo intertextual com a sociedade de fato e como o tom
humorístico do texto parodístico encerra um discurso em suas entrelinhas, pois, como
escreve Citelli
36
:
[...] o problema parece residir, sobretudo, no modo de se encarar a
linguagem, particularmente, em nosso caso, a de natureza verbal.
Vista como unidade formal, a palavra corre o risco de ser objeto de
estudo descritivo, metalingüístico, quando muito recebendo aportes
interpretativos. Pensada no interior de uma concepção que esteja
atenta aos movimentos dialógicos, às tensões históricas, às
preocupações de velamento ou desvelamento de situações
enunciadas, ao cruzamento com outros códigos, a palavra ganha o
sentido que a vida possui no coração dos homens.
A vida humana é regida por informações, conhecimentos e crenças
refletidos e refratados na e pela linguagem utilizada para narrar situações de
interação subjetiva, portanto, nos parece bastante óbvio que aquele que conseguir
entender o maior número de informações presentes nas diversas linguagens será o
melhor aparelhado para identificar, lidar e interagir com o seu enunciatário na
sociedade do século XXI.
36
1996 : 13
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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30
1.2 VER TV X ASSISTIR TV
A televisão pode oferecer efetivas possibilidades de
cultura, entendida esta como relação crítica com o
ambiente. (UMBERTO ECO)
Exatamente por serem menos tensas, as manifestações
do cotidiano é que revelam mais claramente o movi-
mento da sociedade, no sentido quer da mudança,
quer da ratificação do que está. (BACCEGA, 1998 : 21)
Ler uma imagem pode suscitar muito mais interações do que se pode
dar conta nessa pesquisa. Interações entre linguagens tão diversas que algumas nos
escapam ao entendimento imediato; seja pelo ritmo próprio que impõem, seja pelos
referenciais que requerem para a efetivação de seu significado perante um contexto,
nossos olhos se configuram em instrumentos magníficos para darmos início a uma
leitura baseada em intuição e sensibilidade, moldada pelos óculos míopes de nossa
cultura, a qual possibilita uma subseqüente emissão de juízo de valor.
Embora na maioria das vezes não nos demos conta, a “leitura do
mundo” ao nosso redor começa pela imagem, seja ela concreta ou abstrata,
idealizada ou construída. Sendo assim, entendemos que a televisão exacerba
principalmente um dos nossos sentidos o olhar. Diante da imagem da narrativa
televisiva podemos tecer tantas associações de sentido intertextual quanto nosso
imaginário
37
nos permitir. A semiose parece infinita, porém o seu limite está na
ancoragem de sentido que dependerá da ideologia, cultura e história em comum que
enunciador e enunciatário possuam para estabelecerem uma ponte intertextual entre
os textos pelos quais ambos são perpassados. Um texto atinge sua
37
(...) o imaginário é um reservatório de imagens, sentimentos e experiências, visões do real e
lembranças que sedimentam um modo de pensar o mundo. O imaginário é uma distorção involuntária
do vivido que se cristaliza como marca individual ou grupal (...) é um motor que concretiza a
realidade, é uma força que catalisa, estimula e estrutura os limites das práticas. O homem age
(concretiza) porque está mergulhado em correntes imaginárias que o empurram contra ou a favor
dos ventos. (MOREIRA, 2005)
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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31
intencionalidade de sentido para o enunciatário se encontrar a mesma valoração, ou,
pelo menos, valoração semelhante àquela que lhe atribuiu o enunciador.
O sucesso do espetáculo de TV parece residir no fato de que seus
produtores o engendram a partir dos pontos de intersecção entre diálogo e
ambivalência, resultando em leitura intertextual alicerçada na cultura do
enunciatário. Diálogo entre textos fundantes para ambos e ambivalência em torno de
objetos da cultura. Trata-se da reconhecida polifonia presente nos diversos
programas televisivos ou, não raramente, dentro de um único programa, onde
observamos a intersecção entre o contexto atual e contextos anteriores para
reprodução e manutenção do discurso fundante. A multiplicidade de vozes e
consciências independentes e distintas que representam pontos de vista sobre o
mundo empresta forma à polifonia da qual falamos anteriormente. O enunciador TV
hiperestimula os sentimentos do enunciatário telespectador, a começar pela edição
das imagens, para que ele queira estar diante do texto televisivo. Por sua vez, o
enunciatário telespectador, ao perceber o dialogismo, escrita em que se o discurso
do outro, produz identificação ideológica, cultural e histórica com o texto televisivo.
A narrativa televisiva desafia o imaginário do enunciatário telespectador e conduz a
postura dos elementos da atividade simbólica que une subsídios indissociáveis:
razão, linguagem e imaginário - tanto para a produção quanto para a recepção dos
processos comunicativos, sejam eles de cunho ficcional ou não.
Vejamos o que escreve Felipe Bragança, ao comentar, criticamente, o
estilo televisivo que a repórter Ana Paula Padrão deixou transparecer em seu trabalho
tele-jornalístico “O tour dos Simpsons / Ana Paula vai à África”
38
. O autor discute
principalmente o turismo de aventura na arquitetura das imagens jornalísticas, o
processo de espetacularização feito pela mídia e a identificação pelo enunciatário
tanto com as imagens apresentadas, quanto com a fala do enunciador ao afirmar que:
Como uma "segunda era de ouro das viagens", a
contemporaneidade, sufocada em seus limites reiterativos do
cotidiano, se reconfigura em sua admiração pelo movimento, pela
presença num lugar-outro, na diminuição das distâncias e na doce
sintonia única em que as dinâmicas de vida têm adquirido em todo
o mundo. O atravessar um espaço alheio, o ter contato com uma
38
www.contracampo.com.br
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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32
atmosfera não sua (do espectador), torna-se uma prática comum no
telejornalismo, sob o domínio das imagens inéditas. Num jogo de
identidades público-jornalista, onde o espectador se vê inserido nas
imagens (inacessíveis) de um lugar distante, ocupando o corpo
presente de quem leva o microfone.
Por analogia, podemos dizer que a intenção dos autores de Os
Simpsons para com seus enunciatários/telespectadores passa pela recorrência a signos
iconográficos presentes no sistema da comunicação midiática, ou seja, os mitos
televisivos, frutos da projeção das expectativas, identificação e empatia de seus
telespectadores com o texto do enunciador/TV. O enunciatário sente-se dentro da
atmosfera mostrada pelo enunciador/TV. A força desse mito para produzir sentido e
se manter significativo dependerá da dialogia entre enunciador e enunciatário frente
não ao essencial e existencial
39
de ambos, mas também suas memórias afetivas
evocada como entrada de sentido pela comunicação midiática ao propor o contrato
fiduciário entre produção/transmissão e recepção/interpretação.
Sobre os modos de leitura e os modos de escrita na sociedade da
informação, vale observar que o texto audiovisual se inscreve em velocidade muito
próxima a do texto verbal real, praticamente, na mesma velocidade que as máquinas
de comunicar transmitem informações visuais e/ou audiovisuais. Os tempos são
outros, a velocidade de leitura também. Escreve-se com imagem e som um texto
cujos referenciais, os textos fundantes, supõem-se façam parte dos valores
culturais de seu leitor. Entretanto, também nos deparamos com o texto entrópico,
propositalmente ou ingenuamente, agindo como isca para “fisgar” o telespectador,
por meio dos mecanismos de identificação e projeção do discurso televisivo
percebemos:
O fato de que em determinadas épocas da história surjam
determinadas estrelas ou tenham sucesso alguns tipos de programas
demonstra que os mecanismos de identificação e projeção amiúde
funcionam socialmente e não em âmbito individual, não apenas
o reflexo de um inconsciente individual, mas também coletivo.
40
Por outro lado, a simples exposição do enunciatário a espetáculos de
forma desordenada e despreocupada transforma-o em terreno estéril, como se ao
39
BACCEGA, 1998
40
Ferrés, 1996.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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33
receber a semente não soubesse o que fazer para germiná-la e produzir alimento. O
enunciatário passa a copiar comportamentos e atitudes simplesmente porque os elege
como significantes de sua identidade, na tentativa de ser ao mesmo tempo único e
coletivo em seu grupo social.
Visualizamos uma mudança de paradigma comunicativo diante da
comunicação midiática produzida. Tanto Ferrés
41
quanto Maingueneau
42
discorrem a
respeito da migração da forma de comunicação cultural hegemônica de registro
escrito para a de registro áudio-visual. Tanto um autor quanto o outro nos lembram
da importância que as informações sobre o blico a que se dirige a produção
adquirem no processo comunicativo em face da comunicação midiática audiovisual.
Veredas desse novo paradigma se apresentam como possíveis caminhos para
pesquisas futuras não apenas sobre os meios utilizados para o letramento, sejam eles
digitais ou formais, mas também sobre a própria noção de competência
comunicativo-interpretativa dos diferentes textos mediáticos aos quais o sujeito da
modernidade é exposto; lembramos também a necessidade da formação do cidadão
crítico do discurso de que seu enunciador faz uso, o cidadão capaz de mudar a
realidade através de atitudes comunicativas conscientes e pacíficas à partir do uso,
produção e consumo de textos com novas formas de escrita e linguagens sincréticas.
41
1996
42
2008
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
34
2. O MOSAICO INTERTEXTUAL DENTRO DO TEXTO
PARODÍSTICO
A atividade lingüística não consiste simplesmente em
“etiquetar” a realidade. O valor dos “objetos”, das
ações é atribuído pela sociedade e circula no universo
linguístico. (BACCEGA, 1998 : 20)
A literatura midiática produzida até o momento engloba as mais
diferentes formas de expressão textual. Porém, o universo linguístico em que ela se
insere não é o da mera conceituação. Pelo contrário, código e recursos imagéticos,
sonoros e técnicos se unem para externalizar uma forma pessoal de retratar ões
com objetos valorativos, os quais encerram muito mais do significado e significante,
pois descrevem toda uma sociedade por meio de um código.
Ao observarmos o mosaico intertextual dentro do texto parodístico
produzido pela série de TV Os Simpsons, sob o ponto de vista de sua produção de
sentido discursiva como amostra opinativa, nos deparamos com a seguinte
observação oriunda de estudos do campo da filosofia:
Como sátira social, um comentário a respeito da sociedade
contemporânea, o programa freqüentemente atinge um incrível
brilhantismo; costuma ser excelente, no melhor sentido grego da
palavra. E geralmente alcança essa excelência juntando os
elementos díspares de nossas caóticas vidas americanas, dando-
lhes forma e estilo e forjando-os em algo significativo e, às vezes,
até belo. Mesmo que seja apenas um desenho animado.
(IRWIN, 2004:80)
Observe-se que o autor não se limita ao código escrito. Ele considera
toda a simulação da realidade de comunicação como significativo para produção de
sentido na releitura televisiva de fatos ocorrido em nosso cotidiano pela obra do texto
parodístico.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
35
Segundo Sant’Anna
43
, a paródia é um efeito de linguagem no qual a
própria se dobra sobre si mesma num jogo de espelhos, que está cada vez mais
presente nas obras contemporâneas. A paródia como efeito metalingüístico permite
não distinguir textos alheios ou referenciais (intertextualidade), mas também a
paródia dos próprios textos (intratextualidade), ou seja, reconhecer padrões
lingüísticos caracterizadores de seu(s) enunciador(es). Talvez seja por isso que
muitos autores, mesmo os mais contemporâneos, consideram a paródia um mero
sinônimo de pastiche, ou seja, um trabalho de ajuntar pedaços de diferentes partes
da obra de um ou de vários artistas. Porém, as obras intertextuais não são o sintoma
de uma crise cultural
44
, encaixam-se mais como produto do acaso do gosto mais ou
menos acentuado de um autor pela intertextualidade explícita ou a lembrança formal,
pela paródia ou a revolta.
A produção de sentido por um texto parodístico ultrapassa o conceito
de mero ajuntamento de partes de uma obra; pauta-se em uma leitura interdiscursiva
do cotidiano, transformando-o em um texto novo, ainda mais pleno de significação
para a instância de recepção. Como nos lembra Santaella
45
:
[...] os meios de massa não levaram as formas mais tradicionais de
cultura, a cultura superior, erudita, e as culturas populares, ao
desaparecimento. Provocaram, isto sim, recomposições nos papéis,
cenários sociais e até mesmo no modo de produção dessas formas
de cultura, assim como borraram suas fronteiras, mas não
apagaram sua existência.
O acesso aos veículos de comunicação audiovisuais e mais
recentemente a alguns dos meios de produção da comunicação midiática faz com que
o homem popular se prolongue, se estenda e se mostre mais facilmente. Se a
programação televisiva que amos nos idos de da década de 50 no Brasil era aquela
engessada nos moldes da chamada cultura erudita e mais parecia uma transposição
da escrita para os meios de comunicação de massa, com o tempo a programação
televisiva foi se transmutando em algo híbrido: guarda um pouco da velha medida da
cultura dita erudita, mas joga-se em direção ao novo. No caso do texto parodístico, a
hibridação inter(intra)textual fica mais evidente, pois, embora esteja diante de um
43
2004 : 07
44
Jenny, 1979
45
2002 : 52
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
36
novo texto, o leitor/telespectador precisa remeter-se, rapidamente em memória, ao
texto culturalmente fundante para geração de sentido perante o novo num dialogar
entre textos, portanto, a intertextualidade designa não uma soma confusa e
misteriosa de influências, mas o trabalho de transformação e assimilação de vários
textos, operado por um texto centralizador, que detém o comando do sentido
46
.
O texto centralizador não precisa necessariamente encontrar-se no
mesmo meio, o texto televisivo bebe de várias fontes para construir-se. Remetendo à
história, gostaríamos de lembrar que a televisão brasileira veio do rádio, a americana
do cinema hollywoodeano
47
, cada uma revalidou referentes mais próximos a seu
modo. Se no início tanto o texto televisivo brasileiro quanto o americano tentava
encaixar o velho dentro do novo de forma mais perceptível, numa transposição
apenas do meio, após alguns anos de experiência, percebe-se que a TV adquiriu
ritmo e linguagem próprios. Porém, continua antropofágica (a TV serve-se da
linguagem de outros meios: literatura, teatro, cinema, rádio, etc. como
centralizadores), para montar sua própria linguagem.
Voltando o olhar crítico para nosso objeto de estudo com relação à
intertextualidade, vemos que, em seu texto parodístico, Os Simpsons é ao mesmo
tempo não um programa sobre a família americana “ideal”, constituída por pai,
mãe e filhos que vivem em relativa harmonia numa casa própria e ampla, mas
também a sátira desse conceito ao comunicar na telinha as imperfeições da família
Simpson, as quais estão presentes em qualquer família de classe média de um país
ocidental capitalista. Ao reunir valores universais da família ocidental em geral num
trabalho intertextual entre conceitos fundantes, tais como relações entre pais e filhos;
escola e sociedade; empregados e patrões; governo e cidadãos; opção sexual; e
relacionamento pessoal
48
, onde a cultura de massa se apropria da linguagem oral,
traduzindo seus padrões aos arquétipos a consciência coletiva
49
o texto parodístico
46
Jeny, 1979 : 14
47
Charaudeau, 2006
48
[...] o código da cultura de massa (também estético-cognitivo) é ontologicamente o mesmo da
cultura elevada, apenas adaptado para o consumo de todas as classes sociais (um público amplo,
disperso e heterogêneo). (MUNIZ SODRÉ, 1972 : 16)
49
Muniz Sodré, 1972 : 36
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
37
de Os Simpsons amplia seu raio de alcance enunciador na produção de sentido por
parte dos enunciatários/telespectadores.
Por outro lado, principalmente, a série de TV em questão é também
um programa sobre televisão
50
num movimento intratextual significativo. Basta
lembrar que, ao findarem os créditos de abertura, os membros da família se
espremem ao redor da televisão para ver o mundo; e que os créditos finais do
programa também se valem da ligação intratextual de sentido com a telinha, pois
aparecem na tela da TV, mas não de um aparelho qualquer, é a televisão da sala de
estar da casa dos Simpsons, a mesma que apareceu na abertura. Os telespectadores
são transportados dessa maneira para dentro do universo “simpsoniano”, ou seja,
estão assistindo TV com Os Simpsons, estão vendo o mundo com e pelos olhos dos
personagens. Na criação de estados psíquicos, a TV seria dionisíaca, por entregar o
espectador (telespectador?) a si próprio, pondo-o em contato com o mundo concreto
das imagens
51
.
Enquanto outros seriados de desenho animado de núcleo familiar
raramente mostram seus personagens na frente da telinha, demonstrando, assim, que
o esse objeto possui pouca importância para produção de sentido pelo texto, os
autores de Os Simpsons invertem essa questão ao colocarem os seus personagens
frequentemente em frente ao aparelho, de onde por muitas vezes surge o mote para o
desenrolar da narrativa do episódio ao qual se assiste. Ao colocar a família Simpson,
ou membros dela, frente à telinha da forma descrita anteriormente, o enunciador TV
pretende ativar no enunciatário o processo de identificação
52
com a ficção por meio
da valorização de um ato praticado todos os dias por grande parte da população
mundial: reunir a família para assistir TV como forma de ver o mundo e o que se
passa nele.
O que acontece com os veículos audiovisuais (e estão juntos o
rádio e a televisão) é que favorecem, mais do que os veículos
escritos, os processos de projeção (o receptor desloca as suas
pulsações para os personagens do vídeo), identificação (o receptor
torna-se inconscientemente idêntico a um personagem no qual
50
Gray, 2006
51
Muniz Sodré, 1972 :56
52
Ferré, 1996
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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38
qualidades que gostaria ou julga que lhe pertençam) e empatia
(conhecimento que o receptor tem do comunicador, colocando-se
mentalmente em seu lugar). (MUNIZ SODRÉ, 1972 : 60)
O hábito de sentar-se no sofá, ou em poltronas, em frente à TV por
longas horas, ali fazer suas refeições e não se dedicar à prática de exercícios gerou
entre 1980-1985 o vocábulo “couch potato”
53
dentro da língua inglesa, em sua
variante americana. Portanto, o que estamos vendo é o reforço do estímulo visual
para produção de significado pela população do Tio Sam, que, após ter visto a
trajetória dos personagens centrais de Os Simpsons vindo para casa e se reunindo em
frente à TV, identifica-se com eles e se deixa envolver pela narrativa que vai se
iniciar.
Outro dado importante nesse primeiro momento de produção de
sentido pela vinheta na descrição de cada personagem da família Simpson e que
corrobora nossa proposição da centralização da TV como entrada para produção de
sentido é que todos os membros são mostrados se encaminhando para casa, sendo
que cada um carrega um objeto caracterizador de sua personalidade dentro da série.
Por exemplo: Bart é visto deixando a escola e atravessando Springfield de skate a
caminho de casa; Homer aparece saindo do trabalho na Usina Nuclear, de onde leva
uma barra de urânio sem saber, e enquanto dirige seu carro rosa, descarta-a
displicentemente pela estrada até chegar à residência dos Simpsons; Lisa, com seu
inseparável saxofone, é vista saindo da aula de música na escola e indo para casa de
bicicleta, ao chegar quase atropela Homer; Marge e Meggie são mostradas no
supermercado da cidade e depois aparecem indo para casa de carro, ao chegarem à
residência é pelos olhos delas que o telespectador entra na casa dos Simpsons.
Ao atingirem seu objetivo, usando meios de transporte característicos
de cada personagem, de uma forma ou de outra, todos convergem para a sala de
visitas, ou melhor, para um simulacro
54
dela, e ocupam seus lugares em frente ao
aparelho de TV. No caso do episódio “Guerra de Imprensa”, por exemplo, Os
Simpsons se encaminham para um banco de praça em um simulacro de sua sala de
53
Fonte: "couch potato." Dictionary.com Unabridged (v 1.1). Random House, Inc. 22 Jan. 2009.
<Dictionary.com http://dictionary.reference.com/browse/couch potato>.
54
Baudrillard, 1991
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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visitas, porém não usam suas roupas habituais, surgem fantasiados, cada qual como
um personagem dos desenhos animados japoneses de repercussão internacional.
Além do que foi descrito, percebe-se também nos episódios do seriado
a presença de intertextualidade com produtos, tais como doces, cerveja, brinquedos,
jogos, etc. e também a participação de personalidades do mundo artístico, político
e esportivo, que agregam maior verossimilhança ao texto do programa e ativam no
telespectador ligação intertextual mais imediata com a realidade por avivarem-lhe na
memória a persona midiática de carne e osso que foi fagocitada para dentro da obra
ficcional, devido à sua propriedade iconográfica dentro da comunicação midiática.
A respeito da produção de sentido pretendida pelos enunciadores de
Os Simpsons, Matt Groening, criador das personagens, declarou que usa o programa
para despertar consciência nas pessoas de como estamos sendo manipulados e
explorados pela Cultura americana moderna
55
ao reforçar abertamente que para isso
leva em consideração especialmente a manipulação exercida pela televisão como
tema central de seu show e nada poderia ativar a fidúcia de forma mais eficiente no
enunciatário/telespectador que colocar a produção do enunciado na fala de uma
persona midiática.
Tomemos, a título de ilustração rápida, o episódio “Arquivo S” (1996-
1997), cuja narrativa inicia-se com um seriado de TV, para depois deixar
transparecer em seu texto parodístico o valor da sexta-feira televisiva nos EUA e
“discutir” rapidamente a programação dos principais canais de televisão aberta
durante sexta à noite, dia reservado às estréias. Além disso, temos o suposto contato
imediato de Homer como o factual transformado em notícia não televisiva, mas
também impressa, para depois nos depararmos com sua transformação em
espetáculo: a cobertura pelos veículos de mídia de Springfield e a venda de
souvernirs alusivos ao suposto encontro imediato de primeiro grau de Homer com
um alienígena. Sem contar que todo o acontecido é investigado por dois agentes
fictícios do FBI, Mulder e Scully, de um seriado sci-fi premiado, Arquivos X, da rede
de TV Fox, a mesma onde são exibidos os episódios de Os Simpsons. Em Arquivo S,
grande parte dos fatos é relatada pela TV fictícia de Springfield, porém em processo
55
Gray, 2006
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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40
intertextual com programas de notícias e entretenimento, numa releitura do cotidiano
dada pelo tom humorístico da paródia.
Processos similares de intertextualidade explícita com
acontecimentos factuais e que foram noticiados pela mídia, tanto televisiva quanto
impressa, envolvendo todo um trabalho de espetacularização dado ao acontecimento
midiático, também aparecem retratados nos outros episódios de nosso recorte
temporal, sempre em forma de humor devido à configuração genérica do texto
parodístico aliado ao fantástico do gênero desenho animado.
O gênero desenho animado de núcleo familiar abre-se em seu formato
permitindo a dobra da linguagem de seu texto sobre si mesmo
56
configurando-se em
metalinguagem com relação ao mundo que o envolve. A referida afirmação encontra
consonância em Gray
57
no tocante ao texto parodístico de Os Simpsons quando
verificarmos que o autor refere-se à série como um dos exemplos mais prodigiosos e
mais bem conhecidos da televisão global pela densidade de seu texto parodístico, no
qual cada episódio em média traz em sua trama dialógica múltiplos textos centrais:
linguagem comum às culturas ocidentais, além de sua grande popularidade estar
centrada precisamente no fato de ser uma paródia crítica e irreverente à realidade da
família norte-americana de classe média frente aos problemas do cotidiano.
O discurso sócio-historicamente construído pela cultura norte-
americana de direitos e deveres
58
para o “bem da pátria” dá lugar ao discurso da
janela para o mundo, que fala a partir da rua
59
, ou seja, do cotidiano, sobre as
impressões populares de forma carnavalizada a respeito da situação oficial. Temos o
riso libertador do medo da situação real, traduzido na forma do humor livre, ao
mesmo tempo corrosivo de nossos atos cotidianos, oposto ao tom sério da atuação
oficial de forma que parece haver um segundo mundo e uma segunda vida dentro da
televisão.
56
Sant’Anna, 2004
57
Gray, 2006 : 05
58
DaMatta, 2005
59
França, 2006
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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41
Lembrando Bakhtin
60
sobre as manifestações da cultura popular,
temos que Por seu caráter concreto e sensível e graças a um poderoso elemento de
jogo, elas estão mais relacionadas às formas artísticas e animadas por imagens, ou
seja, às formas do espetáculo teatral. Ainda segundo o mesmo autor e obra, o núcleo
dessa cultura se encontra nas fronteiras entre a arte e a vida, tendo esta última como
expressão de renascimento e renovação.
Ao longo da literatura parodística deparamo-nos com figuras típicas
do circo e das festas populares: bufões e tolos, gigantes, anões e monstros, palhaços
de diversos estilos e categorias mesmo que se apresentados de forma implícita ainda
os enxergamos ali em diálogo com nosso repertório cultural. Isso também vale para o
texto parodístico de Os Simpsons, que em seu elenco de personagens mantém toda
uma gama de tipos característicos da população americana pertencentes às classes
trabalhadora e baixa com seus pontos positivos ressaltados, enquanto os personagens
que remetem à elite dominante existem em número reduzido, porém sempre em
posição antagônica à família Simpson e seus amigos. Entendemos estar frente à
comunicação produzida pelo grotesco como descrito por Muniz Sodré
61
:
[...] um estado “segundo” de consciência, essencialmente crítico.
Seria uma reflexão sobre a vida, nascida de uma comparação entre
as coisas “tais como são em profundidade e tais como nos
aparecem em superfície.
O grotesco é um olhar acusador que penetra as estruturas até um
ponto em que descobre a sua fealdade, a sua aspereza.
Da comunicação do grotesco de uma família onde a presença do
tolo e gigante em seu peso (Homer), do bufão astuto (Bart), da rainha do lar (Marge),
do intelectualismo fora de lugar (Lisa), e da aparente inocência de um bebê
(Maggie), vemos emergir uma potente força discursiva contra a personificação do
regime capitalista (Sr. Burns) ou a perfeição caricata da religião (Os Flanders).
A comunicação da luta de classes em Springfield instaura sua
produção de sentido a partir da alegoria carnavalesca do grotesco. O texto parodístico
de Os Simpsons critica a aparente democracia presente no “American way of life” da
família americana de classe média com seus problemas cotidianos.
60
1993 : 06
61
1972 : 72
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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Cláudia Regina da Silva Franzão
42
Baseada no famoso sitcom Papai Sabe-Tudo (Daddy Knows Best)
62
,
Os Simpsons carnavaliza a figura paterna de várias formas. Invertendo, por exemplo,
o referencial de reconhecimento de autoridade do conhecimento de pai para filho
entre Homer, o pai, e Lisa, a filha do casal. Nos episódios da série de desenho
animado, sempre que Homer não tem resposta para uma pergunta ele recorre ao
intelecto de Lisa, a qual personifica tanto a mãe pátria, até mesmo pela semelhança
nos traços de seu rosto e cabelo, bem como a valorização da cultura erudita ditada
pelas elites culturais dominantes desde a época da colonização do país. Dessa forma,
o texto parodístico não poderia deixar de utilizar signos como pai, mãe, Estátua da
Liberdade, o conceito de intelectual a partir do senso comum e associá-los ao
cotidiano de uma família típica da América do Norte. Entretanto, a produção de
sentido para o tom humorístico alcançado encontra-se, porém na inversão do
esperado, na carnavalização do ato de aconselhamento e orientação educacional. Não
é Lisa que recorre a Homer quando precisa tomar uma decisão considerada série, e
sim Homer que recorre à Lisa.
Outra figura feminina importante a quem Homer recorre é Marge, sua
esposa, que por vezes tem sua fala de esposa perfeita exacerbada até o ponto de
remissão à fala da mãe para com o filho. Novamente subversão da ordem
esperada, pois Homer é quem deveria chefiar a família, de acordo com os padrões
culturais americanos oficiais e propagados.
A inversão de comportamento social esperado devido ao referencial
de intertextos culturais que habitam o imaginário dos cidadãos americanos produz
sentido e se externaliza em forma de riso, um riso libertador do medo da situação
oficial: ser o chefe dessa família, aquele que tem resposta para todos os conflitos e
problemas. Como o comportamento de Homer não é o culturalmente esperado, ri-se
de sua inabilidade, ri-se de sua comunicação grotesca no enfrentamento de
problemas cotidianos pelos quais seres comuns, “de carne e osso”, passam.
62
Father Knows Best (Papai Sabe Tudo) é um seriado de televisão dos EUA. Começou a ser
transmitido no rádio, em 1949 e estreou na televisão em 1954, permanecendo no ar até 1960, num
total de 203 episódios. No Brasil, foi transmitido na década de 1960, pela TV Tupi; na década de
1970, pela Rede Globo; e na década de 1980, pela TV Cultura. Era estrelada pelo ator Robert Young,
que representava Jim Anderson, um pai simpático e sabichão de uma família feliz, composta por ele,
sua esposa Margareth, interpretada por Jane Wyatt, e seus três filhos: Betty (Elinor Donahue), Bud
(Billy Gray) e Kathy (Lauren Chapin). (fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Papai_Sabe_Tudo acesso
em 05.02.2009)
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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43
Não ter solução para tudo, a indecisão perante uma situação, a
incapacidade de controlar a si mesmo, as disputas e alianças com Bart, a presença e
cultuação de distúrbios de comportamento social condenados pela sociedade em
geral, tais como gula, ganância, luxúria e ignorância, encontram-se no plano de
conteúdo discursivo de Os Simpsons.
Também ali, no plano de conteúdo, manifesta-se a orientação do
discurso da série. Com base na ideologia capitalista vemos surgir a malha dialógica
entre ficcional e factual
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
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44
3. O GÊNERO DESENHO ANIMADO
A concepção do gênero é muito útil para introduzir os
alunos mais cedo nos estudos de televisão. Sem ela é difícil
dar qualquer tipo de ordenamento aos estudos de
programas de televisão. (SOUZA, 2004 : 31)
Desde as mais rudimentares representações pictóricas rupestres até os
atuais produtos midiáticos que congregam linguagens sincréticas, o desenho
acompanha a produção de sentido pela comunicação humana. Conduzindo a
argumentação para o campo epistemológico da produção de sentido pelo desenho
animado, encontramos o delinear de figuras em movimento inscrito em um ambiente
surreal próprio, recheado, por vezes, de cores, sons e imagens signicas ou icônicas de
uma cultura próxima à brasileira ou mesmo distante dela. Esse ambiente, descrito
aqui sucintamente, desafia o imaginário e conduz a postura dos elementos da
atividade simbólica que une subsídios indissociáveis: razão, linguagem e imaginário
- tanto para a produção quanto para a recepção dos processos comunicativos, sejam
eles de cunho ficcional ou não. Como aduz Moreira
63
:
(...) o imaginário é um reservatório de imagens, sentimentos e
experiências, visões do real e lembranças que sedimentam um
modo de pensar o mundo. O imaginário é uma distorção
involuntária do vivido que se cristaliza como marca individual ou
grupal (...) é um motor que concretiza a realidade, é uma força que
catalisa, estimula e estrutura os limites das práticas. O homem age
(concretiza) porque está mergulhado em correntes imaginárias que
o empurram contra ou a favor dos ventos.
No caso do desenho animado de núcleo familiar, o imaginário de uma
família unida, feliz e forte, sempre pronta a enfrentar todos os obstáculos impostos
pela comédia da vida humana em seu cotidiano, alimenta tanto a crença de que a
convivência cotidiana com o regime capitalista possui um significado mais amplo do
que simplesmente produzir versus consumir, quanto a crença ideológica em questões
63
2005 : 19
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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45
universais de ontologia fenomenológica que escorrem pelo vídeo e se transformam
em narrativa.
Precisar exatamente quando as questões de cunho fenomenológico
começam a adentrar o universo discursivo do desenho animado não se configura em
tarefa de fácil realização, dada a miscigenação constante que as linguagens verbal e
não verbal, produzidas para e pela humanidade, proporcionam quando nos
deparamos com um formato que reúne, em contorno de simulacro da vida factual,
características tanto do surreal, quanto do fantástico e do próprio factual como é o
caso do desenho animado produzido para o público adulto, em especial Os Simpsons.
Porém, se optarmos pelo critério cronológico, por exemplo, para estabelecermos
quando a produção de desenho animado se inicia, encontraremos registros do
ancestral Humorous Phases of Funny Faces ("Fases Cômicas das Faces
Engraçadas"), filmado pelo inglês James Stuart Blackton, em 1906, como o primeiro
desenho animado produzido para o cinema e, valendo-se ainda do critério marco
temporal, veremos que o princípio do desenho animado na TV se com a
transmissão de Donald’s Cousin Gus (O Primo Gus do Pato Donald) de Walt Disney,
em 19 de maio de 1939 pelo canal experimental NBC em Nova York.
64
O apogeu do
gênero para a TV na nação do Tio Sam, entretanto, terá início no ano seguinte,
1940, segundo fontes consultadas, principalmente com as produções dos estúdios
Disney para TV.
De 1939 para cá, muitas produções foram desenvolvidas para a TV,
mas nenhuma, até 1997, se igualara ao sucesso de permanência no ar de Os
Flintstones (1960), primeira série de desenho animado a ser exibida em horário nobre
na TV. A produção que gira em torno das aventuras da vida cotidiana de Fred, o
gorducho chefe da família Flintstone, casado com Wilma, pai de Pedrita e dono do
cachorro/dinossauro Dino, permaneceu no ar de 1960 a 1966 pela ABC. Concebida
pela Hanna-Barbera produções, a família da idade da pedra, primeira sitcom animada
a ser produzida para o público adulto, perpetuou-se pelo mundo e deu origem a
outras produções sobre o mesmo tema que, infelizmente, não atingiram a mesma
permanência no ar. Um dos exemplos a ser mencionado é Os Jetsons, primeira
64
BUTLER, Jeremy G. Cartoons Disponível em: Museum of Broadcast Communications
< http://www.museum.tv/archives/etv/C/htmlC/cartoons/cartoons.htm >
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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46
sitcom animada a estrear em horário nobre nos Estados Unidos. Produzido pelos
mesmos estúdios de animação de Os Flintstones e cujo enredo gira em torno das
aventuras cotidiano-futuristas da família Jetson no ano de 2062, a família é chefiada
por Jorge Jetson, marido de Jane, pai de Judy, uma adolescente de 17 anos, e Elroy,
um garoto de Q.I. bastante elevado para a idade de oito anos. O núcleo principal de
Os Jetsons conta ainda com o cachorro Astro e a empregada robô Rosie, porém, a
família Jetson permaneceu no ar apenas duas temporadas.
No caso de Os Simpsons, no ar desde 17 de dezembro de 1989,
veremos que as aventuras cotidianas de uma família amarela chefiada por um
gorducho careca (Homer), casado com a esposa e dona de casa exemplar (Marge),
pai de Bart, Lisa e Maggie e supervisor de segurança da Usina Nuclear de Springfield
sustenta-se no espaço televisivo mundial até os dias de hoje sem perder nem seu
frescor paródico, nem seu humor caustico frente à sociedade de consumo.
Acomodado como gênero desenho animado
65
de núcleo familiar, o
texto parodístico de Os Simpsons mescla questões universais à exuberância e
exotismo de tipos humanos de uma determinada Cultura. Se Os Jetsons projetava
uma família do futuro em plena era da corrida espacial norte-americana e Os
Flintstones revivia a idade da pedra lascada no cotidiano de uma família da década
de sessenta com todos os utensílios domésticos e costumes adaptados aos materiais
existentes na idade da pedra, em Os Simpsons toda a tecnologia que acompanhava a
década de sessenta é substituída pelo foco no devir humano e suas peculiaridades
enquanto componentes de uma família de classe média inserida na esfera discursiva
do consumo desenfreado que o sistema capitalista da nação lhes impõe e do qual os
desenvolvedores Matt Groening, James Lee Brooks e Sam Simon, propõem o lado
cômico-satírico como alívio no formato de seu produto para a TV.
O significado de formato para a filosofia baseia-se na teoria
aristotélica onde se constata
66
que a realidade consiste em várias coisas isoladas,
que representam uma unidade de forma e substância. A substância é o material de
que a coisa se compõe, ao passo que a forma são as características peculiares da
coisa. No caso dos programas de TV, a forma é a característica que ajuda a definir
65
Souza, 2004
66
Irwin, 2004 : 45
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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47
o gênero. A forma de uma peça midiática para a televisão diz tanto sobre suas
possibilidades quanto de suas limitações. Os gêneros estão para os formatos na
televisão, assim como a relação gênero(s) está para as espécies na biologia: na TV
vários formatos constituem um nero de programa e os gêneros agrupados formam
uma categoria.
Os Simpsons adota um formato híbrido (desenho animado e série de
TV do tipo sitcom
67
) para construir sua enunciação. A hibridação aproxima o
discurso narrativo produzido das concepções modernas impressas ao ato de narrar
pelo media, ou seja, narrativas mais curtas e menos densas sob o ponto de vista
psicológico, personagens de rápida absorção cognitiva e discursos comunicativos
mais elaborados do ponto de vista da criação são explorados na tentativa de alcançar
maior número de telespectadores em menor tempo. Sendo assim, no processo de
produção de sentido pelo texto narrativo, o discurso de Os Simpsons vale-se da
existência reica ou projetiva, isto é, uma outra existência que permite a projeção da
existência física na existência fenomenológica, esse cosmos projetado seria a
existência reica. A utilização das três existências anteriormente citadas (física,
fenomenológica e reica) leva o enunciatário telespectador à simples contemplação, à
fruição e é a esse ato que se chamará de existência transcendente, visto que:
...a existência transcendente é aquele algo mais que está além da
simples presença dos seres oferecidos a nossa contemplação ou
fruição. (...) se assim o desejarmos, o sentimento de um vago
mistério, de um segredo que esse propõe enigmaticamente.
Se conseguimos entender bem, podemos pensar nessa
transcendência como sendo o universo simbólico da obra; entra no
domínio da sugestão, do mito, do símbolo, do trans-verbal, ou
ainda, da trans-linguagem. Dir-se-ia que esse plano novo não
contém senão um pouco de cerração, de irradiação ou
transfiguração do sublime de nós mesmos ou da realidade.
(SOURIAU apud SILVA, 2009:6)
O texto parodístico, dessa forma, vale-se de fatos reais para
acrescentar-lhes,aqui e acolá, um pouco da cerração de que fala Souriau ao irradiar o
risível em que pode se tornar nossas vidas familiares cotidianas transfiguradas em
atos de uma família amarela ao mesmo tempo tão distante no plano sico e tão
próxima em sua transcendência que acreditamos ser possível existir em algum lugar
uma Springfield que abriga todos aqueles tipos que nos são caros.
67
Situation comedy ou situação cômica em Português.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
48
4. SENHORAS E SENHORES: OS SIMPSONS
Os Estados Unidos e o Brasil formam as duas maiores Culturas do
mundo orientadas pela televisão. O Brasil é o terceiro maior
mercado mundial de consumo de aparelhos de TV, e em primeiro
estão os Estados Unidos. Nos dois países o meio existe para o
entretenimento. Essa categoria dá o perfil dos gêneros de maior
sucesso. (SOUZA, 2004 : 68)
Jean-Paul Sartre, em sua obra Palavras, declara que a vida de uma
pessoa tem sentido quando vista a partir de suas interações com outras pessoas, e
essas interações são em grande parte estabelecidas por meio de palavras que
desenham valores e imagens ao serem associadas. Palavras que também possuem
corpo e estética. Sendo assim, é por meio de palavras evocadas e lidas na
Comunicação Midiática que vamos lendo os personagens criados para e pelo próprio
media como expressão da visão de mundo de seus desenvolvedores por meio das
ligações não só intertextuais, mas também intercontextuais.
Embora estejamos cercados de tecnologia na maior parte do tempo,
isso não é suficiente para alcançarmos a tão almejada felicidade plena, pois ainda é
no humano que se encontra a riqueza da diversidade e as perguntas que nos movem
em direção ao aprimoramento, ou seja, ainda é o homem que busca o próprio homem
dentro de si e no outro, mesmo que indiretamente a nos mover na direção de algo
maior.
Ao ler uma peça midiática é impossível não reconhecer o homem que
está tanto dentro quanto por trás dela. A maior riqueza de um americano ainda é sua
família. Ao escolher essa família em amarelo para expressar-se, a equipe de Os
Simpsons aproxima por verossimilhança tanto ações quanto valores que permeiam a
sociedade de consumo americana pela evocação de discursos e palavras, recalcando-
os, legitimando-os como expressão artística. Baseando-se em um seriado da TV
americana, sucesso da década de 1950, Dad Knows Best (Papai Sabe Tudo), cuja
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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49
temática girava em torno das ações cotidianas da família americana feliz daquela
época, o discurso de Os Simpsons pega carona em um tema universal para construir
enunciação própria: a família feliz de classe média na era da sociedade da
informação.
Homer, o chefe dessa família “maluca”, não sabe tudo, assim como o
pai do seriado de Eugene Rodney e Robert Young, porém é amoroso, ama sua
família acima de tudo, apesar de ser desastrado e considerado pela família como de
baixo Q.I. As características que Matt Groening e sua equipe lhe atribuíram
classificam-no como um herói moderno, diríamos quase à moda de um Macunaíma
de Mário de Andrade. Representante do cidadão da classe média americana,
atualmente o personagem mais amado pelo público adolescente que assiste à série
68
,
Homer não envelhece e teria 38 anos desde 1989, quando a série começou.
Gorducho, apreciador da boa mesa, ou melhor, de comida, bebedor de cerveja,
frequentador assíduo da Taverna do Moe, supervisor de segurança na Usina Nuclear
de Springfield, Homer imortalizou o significante donut
69
como identificador de sua
presença e também da Cultura americana.
O “chefe” da família Simpson costuma transgredir as regras de
etiqueta ditadas pela sociedade atual e parece o se importar muito com a opinião
que os outros têm sobre ele. Em seu diálogo existencial com o mundo, ele quer
aproveitar a vida ao máximo. Seu entusiasmo pela vida manifesta-se em seu
comportamento sem maldade e infantil ao longo dos episódios da série, porém, como
lembra Irwin
70
:
(...) o fato de Homer ser um cidadão lutador de classe “média-alta-
baixa”, que trabalha em uma empresa sob a tirania de um
capitalista cruel, e quando acrescentamos também o fato de Homer
morar em Springfield, uma cidade que deve fazer uma pessoa parar
e pensar antes de crer que a vida merece ser amada, descobrimos
68
cf, Keslowitz, 2007.
69
Donut ou doughnut é um pequeno bolo em forma de rosca (mais precisamente de toro), oriundo
dos EUA. Consiste numa massa açucarada frita, que pode ser coberta com diversos tipos de
coberturas doces coloridas, como por exemplo chocolate.Nos EUA, esta designação também pode ser
usada para bolas de Berlim, que são conhecidas como sonhos, no Brasil. A verdade quanto à origem
do donut não é consensual. Existe uma teoria que indica terem sido introduzidos na América do Norte
por povoadores holandeses. Disponível em: << http://pt.wikipedia.org/wiki/Donut
>>
70
2004 : 30
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
50
um indivíduo que tem muito a ser admirado. (...) Também
podemos admirá-lo porque vemos nele um sentido exagerado
daquilo que somos.
O amor de Homer pela vida deve ser exaltado como uma de suas
qualidades mais importantes nos dias de hoje, pois a preocupação com uma política
correta, os bons modos e a gentileza, a decisão de não julgar os outros, a obsessão
pela saúde física e o pessimismo quanto ao que é bom e agradável na vida reinam de
maneira mais ou menos suprema na sociedade em geral. Porém, quantas pessoas
conhecemos que alcançaram os patamares de perfeição descritos no período anterior?
Sendo assim, nos vemos projetados num herói prá de moderno quando assistimos
intertextos cotidianos sendo expostos e mesclados à leitura de textos clássicos
universais e também populares em versões onde se pode transver a realidade do
cidadão de classe média americano, casado e pai de família tentando driblar as
“peças” que a vida lhe prega sendo que para isso Homer conta com o apoio
incondicional de sua esposa.
Marge Simpson, 37 anos, é tanto a proprietária do corpo quanto da
alma de Homer. Nem mesmo o diabo, personificado por Ned Flanders no episódio
Treehouse of Horro IV (A Casa da Árvore do Horror IV), exibido em 1993, consegue
levar a alma de Homer que lhe fora vendida pelo preço de um donut, pois Marge
prova ao príncipe das trevas que a alma do marido lhe pertencia antes da
transação. Casada com o gorducho há pelo menos onze anos na série, e mais de vinte
e cinco no mundo factual, Marge é a personificação da dona de casa perfeita dos
anos cinquenta presente em Father Knows Best: ama os filhos e o marido
incondicionalmente; adora limpar, lavar e cozinhar para eles; seus objetos favoritos
são espoja e aspirador. Às vezes passa por boba para que sua família resplandeça.
Podemos dizer que a motivação moral dessa dona de casa de
Springfield é aristotélica: o bem que ela visa em suas decisões (morais ou outras) é o
bem estar de sua família, portanto dela mesma. Vemos em Marge que as virtudes
morais de Aristóteles
71
podem ser aplicadas com sucesso não só nas abstratas torres
71
Aristóteles compreendia que nós somos uma espécie muito social, e que nossa felicidade duradora
depende muito de nossa família e de nossos amigos, Não podemos alcançar eudaimonia sem a
contribuição dos outros, e muitas de nossas virtudes (generosidade, amabilidade e honestidade, por
exemplo) nos são valiosas justamente porque ajudam a cultivar os fortes vínculos de família e
amizade que são essenciais para um viver bem-sucedido. (IRWIN, 2004 :58)
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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de marfim do meio acadêmico, mas no desenho animado que retrata o mundo real,
pé-no-chão
72
. Sua coragem, honestidade, temperança e outras virtudes não podem ser
negadas, tão pouco sua resultante felicidade, a qual prova que as pessoas (pelo menos
nos desenhos animados) conseguem levar uma vida moral, independente de suas
convicções religiosas. A senhora Simpson, dona do cabelo azul 56 mais alto da
cidade, procura resolver seus dilemas morais simplesmente deixando a razão guiar
sua conduta, chegando a um admirável equilíbrio entre os extremos. Marge pode ser
descrita como aristotélica com toques de cristã, pois, muito diferente da esposa
americana do mundo factual do século XXI, ela casou-se apenas uma vez, não
trabalha fora, encontrou o sapo encantado e faz dele um rei em todos os episódios
produzidos até agora. Sua marca no visível atinge a função transcendente ou utópica
em sua mensagem discursiva centrada na própria família, vista como um objeto de
desejo utópico, quando não de inveja utópica
73
: ter família e amigos.
A família ideal, no senso comum, não está completa sem os filhos,
sendo assim, Os Simpsons tem Bart (10 anos), Lisa (8 anos) e Maggie (1 ano). O
primogênito, Bart, personagem mais amado pelos adolescentes até a década de
1990
74
, como não poderia deixar de ser em produções de língua inglesa, é uma
mistura de inimigo e companheiro de seu pai, Homer. Por vezes, durante os
episódios vemos o menino sendo estrangulado pelo pai por ter feito ou dito algo
desagradável, em contra partida, também episódios em que os dois se tornam
parceiros para atingirem algum objetivo em comum.
O filho mais velho dos Simpsons tem o pensamento intrinsecamente
dirigido ao mundo. Bart não é contaminado por quebra-cabeças filosóficos (...)
considera que o mundo está em seus pensamentos; considera que seus pensamentos
envolvem o mundo
75
. O garoto dono do penteado de nove fios de cabelo espetados
experiencia o mundo vivendo cada dia como se fosse único. Por conta disso,
passou por “maus bocados” nos episódios: teve hematomas e ossos quebrados em
manobras de skate, contraiu uma doença contagiosa, viveu brevemente numa bolha e
72
Irwin, 2004 : 62
73
Jameson, 1995
74
Keslowitz, 2007
75
Irwin, 2004 : 264
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tomou Ritalina
76
quando diagnosticado como hiperativo, porém o mais grave até
agora parece ser quando vendeu a alma ao capeta por cinco dólares. Enfim, Bart é
um personagem estereótipo da rebeldia e experimentação do mundo que o cerca; tem
no diretor da Escola Primária de Springfield, Seymour Skinner, seu maior inimigo e
no palhaço Krusty um ídolo a ser seguido. Com Krusty viveu várias aventuras:
salvou seu programa de TV, colocou o profissional do show business na cadeia,
tirou-o de lá, promoveu a reconciliação do palhaço com seu pai (o rabino Hyman
Krustofsky), liderou uma rebelião no acampamento Krusty e adora o fastfood do
Krusty Burger, uma paródia do MacDonald’s.
Bart está em tudo o que pensa e faz, face a face com as coisas. Ele
fica fora da ciência, mas sinceramente diante de qualquer coisa que o cative;
presente para isso como isso está presente para ele
77
. O garoto personifica, dentro da
série, a filosofia nietzschiana do ir “além do bem e do mal”, ir além da submissão, e
ter força e coragem para abraçar o caos da existência e de nossas vidas cotidianas,
criando a partir delas algo que tenha sentido. Se considerarmos o adolescente na
condição de submisso escravo da moralidade, vigiado e punido dentro dos diversos
grupos sociais que frequenta, poderemos entender melhor a glorificação que Bart
Simpson recebe por parte dos teens.
Na falta de ambiente para suas travessuras, ou nos poucos momentos
de reflexão sobre o mundo ao seu redor, Bart procura apoio em Lisa, sua irmã de oito
anos, para entender o que está acontecendo com ele. Lisa, na série, representa a
consciência moral de Bart que ora o condena, ora o acolhe, impulsionando-o para o
entendimento da situação vivida. A pequena garota de oito anos, Lisa Marie
Simpson, da boneca Malibu Stacey (paródia da Barbie) toca saxofone, é uma
pensadora analítica, ativista e defensora dos direitos humanos e da dignidade. Em
outras palavras, Lisa é uma intelectual na série e, como todos os outros intelectuais,
uma pessoa notável com necessidades e desejos, que anseia por ser aceita e se
associar tanto aos mais velhos quanto aos seus colegas.
76
Medicação usada para tratar déficit de atenção com hiperatividade e depressão.
77
Irwin, 2004 : 263
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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53
Obviamente, os roteiristas de Os Simpsons retratam Lisa de duas
maneiras bem diferentes, talvez até contraditórias. Por um lado é uma garota de oito
anos lutando para manter a cabeça acima da água na piscina cheia de idiotas de sua
cidade. Por outro é uma defensora política, vegetariana, leitora ávida da revista
Cética Mirim e membro da instituição acadêmica Mensa
78
. Encontramos refletidos
na construção identitária de Lisa Simpson, por parte dos desenvolvedores da série,
ambivalência americana em relação aos intelectuais, unindo em um só ícone a sátira
da pessoa comum que é tola demais para reconhecer a liderança dos sábios ao
mesmo tempo em que expõe a própria noção de liderança intelectual como frágil
devido à instabilidade dos sistemas das idéias dominantes das elites, por serem
geralmente mal concebidos ou constituírem, na verdade, esquemas de sede de poder
mascarando o senso comum. Ao mesmo tempo em que Springfield, a família
Simpson e o planeta midiatizado acatam Lisa como a voz da razão, eles também riem
de suas atitudes extremamente corretas em um mundo marcado pela corrupção,
hedonismo e busca de poder, revelando, assim, a ambivalência na sociedade
americana com relação aos intelectuais.
Se Lisa verbaliza e age como os intelectuais, Maggie, a filha mais
nova do casal Simpson, prefere inventar um código próprio para se comunicar com o
mundo em seu discurso na série:
A conduta afável de Maggie Simpson é viável porque ela passa
praticamente todo o tempo chupando chupeta. E por meio de sua
“chupação de chupeta”, ela consegue às vezes dizer tudo sem
pronunciar uma única palavra.(...) Maggie representa o bebê ideal:
bem intencionada, inocente e chupadora de chupeta.
(KESLOWITZ, 2007 : 80-81)
na vinheta de abertura de cada episódio, antes da célebre cena do
sofá, Maggie aparece dentro do carrinho de supermercado de Marge, misturada às
outras mercadorias. Ao passar pelo caixa, a dona de casa está em processo tão
automático que não percebe que o operador também passa a bebê Simpson pelo leitor
ótico como se ela fosse um produto. Espantosamente, o mostrador digital registra o
valor em dólares das despesas mensais que a família Simpson terá em média com
78
Keslowitz, 2007: 76
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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54
Maggie até que complete seis anos
79
. O bebê então é colocado em um saquinho de
compras e acrescido aos demais pacotes de compras.
Maggie traz em seu discurso sem palavras a miríade de mensagens
contraditórias que pontuou o discurso cultural dos Estados Unidos no final do século
XX. Máximas ditadas pela cultura como: É preciso se impor e exigir seu espaço, ter
direito à liberdade de expressão, por outro lado, o silêncio é de ouro e a palavra de
prata; conhecer é poder, mas nenhuma notícia é o mesmo que uma notícia boa;
expresse-se, mas em boca fechada não entra mosquito fazendo parte do senso
comum construído pelo povo americano a partir de sua visão de mundo. Algumas
das máximas citadas, inclusive são parte da Cultura brasileira. Podemos entender
então que tanto nós quanto os americanos raramente nos sentimos à vontade quanto à
questão de falar ou não falar, pois, no mundo moderno o grande desafio tanto para o
Ocidente quanto para o Oriente é descobrir como expressar-se criticamente em
palavras e atos perante os projetos dos outros de maneira que todas as vozes possam
ser ouvidas. Mais do que tolerantes, devemos estar atentos.
Enfim, após um passeio pela análise da constituição no discurso da
família Simpson, podemos concluir que os personagens nos mostram, por meio de
sua composição e dos textos criados para eles, como a cultura intelectualizada
interage com a cultura popular na sociedade contemporânea a partir da visão de
mundo externalizada na criação da peça midiática. Como uma narrativa constituída
por elementos aparentemente simples demonstrou apresentar-se recheada de pontes
intertextuais para produção de sentido pelo texto parodístico, reforçando e
naturalizando a situação parodiada por verossimilhança.
79
Keslowitz, 2007.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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5. SOBRE CORES E FORMAS
(...) a palavra “estética”, que também tem a ver com
o estudo da arte e da beleza, deriva do grego, “aisthetikos”
que se refere à qualidade perceptiva, ou à aparência das
coisas. Já que o mundo é uma representação, o mundo que
experimentamos à nossa volta todo dia é de fato uma
aparência. (IRWIN, 2004:67)
A forma que os objetos ganham no mundo factual vai além das
simples definições demarcatórias de seus limites de superfície mais aparentes e que
lhes proporcionam classificação categórica em quadrado, triângulo, círculo,
retângulo, losango e assim por diante. Também percebemos muito cedo que as
formas vão além da dicotomia saussureana, pois, se por um lado o significante é
dado, o seu significado é construído por meio da linguagem, instrumento que
enforma, formata, dobra-se, renova-se e informa a cada nova atualização de sentido
feita pelo enunciatário. Porém, as pontes a serem percorridas no processo de
significação apresentam caminhos similares pautados no processo intertextual quer
seja de discursos arrolados pela Cultura, quer de discursos de outras linguagens.
Algumas formas de arte, por exemplo, não possuem códigos próprios
para produção de metalinguagem, sendo assim, servem-se de elementos de um outro
código significante, no caso as estruturas lingüísticas operacionalizadas tanto na
língua falada quanto no processo de escrita, para explicar-lhes a produção de sentido.
A língua torna-se o interpretante da sociedade
80
. A verossimilização com sua
redistribuição dos significados quantitativamente limitados pela linguagem em que se
encontram, procura combinações sêmicas, significantes variados dentro das
linguagens oral e escrita para traduzir um outro sistema significante para que algo
pareça familiar tanto ao enunciatário quanto ao enunciador. Uma pintura, por
exemplo, não tem em si a propriedade de explicar a sua produção de sentido por
meio de outra pintura, nem o artista tem como explicar seu processo criativo ao
80
Benveniste, 1991
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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56
observador de sua obra por meio de outra criação. Ambos recorrem à estruturas da
língua procurando traçar pontes intertextuais de sentido que assegurem, na medida
do inteligível, que a comunicação seja feita.
Ver e compreender cores e formas como um segundo sistema
significante, inscreve tanto o enunciador quanto o enunciatário no campo da leitura
cultural dos valores e crenças latentes naquele meio social. Distanciamentos e
aproximações entre signos presentes no inventário de uma comunidade abrem o
processo de produção de sentido para um possível outro signo. O elemento
considerado estranho guarda um pouco do doce aroma das flores e combinações de
perfumes antigos que seduziram o observador no passado. Ao mostrar-se aqui e
esconder-se ali, aguça o paladar do observador ao mesmo tempo em que tenta
abduzi-lo; envolve em uma fina organza os sabores que oferece ao convidar para o
banquete: saborear com seus sentidos o significado daquilo à que se é exposto.
Somos seduzidos pela forma como algo nos é mostrado, portanto, não
seria diferente no caso de um produto midiático como Os Simpsons, cujo primeiro
formato de seus personagens, como pode ser visto na figura 1 abaixo, não nos enleva
tanto quanto o que foi produzido para a TV posteriormente, quando essa família
maluca ganhou mais tempo no ar. Com formas mais arredondadas e ícones da
Cultura americana que facilitariam a empatia por parte do público ao se reconhecer
identitariamente dentro da peça midiática, a família Simpson ganhou formas mais
amistosas (figura 2).
FIGURA 1
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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57
FIGURA 2
A opção pelas formas mais circulares e a troca de algumas cores, além
de alguns acessórios e estampas, foram pequenas adaptações que se ocuparam em
sanar alguns problemas que poderiam atravancar a comunicação do produto, pois
relativa universalidade na linguagem visual, a qual opera com signos facilmente
identificáveis, e que fala mais especificamente aos nossos sentidos
81
. As imagens de
televisão estampam o cotidiano, falando dele e de nosso mundo; criando uma relação
de proximidade e verossimilhança com a realidade, se instauram, sobretudo no
terreno do icônico (relação de semelhança com o mundo factual neutralizando a
situação e dizendo que ela simplesmente existe). A televisão, janela para o mundo,
não prima exatamente pela criação e pelo fantástico de suas imagens, mas pelo
reconhecimento e identificação de seus enunciatários com as imagens enunciativas.
Diante do exposto percebe-se que os criadores de Os Simpsons deram a devida
atenção aos personagens em suas formas iniciais reduzindo-lhes a tensão, a
agressividade e o impacto visual causado pela formas pontiagudas que as figuras
apresentavam no início da veiculação, pois na televisão o que marca o enunciatário é
o rosto amigo, um personagem que transmita emoções de fácil entendimento e franca
cordialidade, ou seja, na TV vale mais a folhetinesca vivacidade fisionômica do que
a regularidade plástica
82
, principalmente no que diz respeito à produção de sentido
pelo humor.
81
França, 2006
82
Muniz Sodré, 1972
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58
5.1. Uma família em amarelo, vermelho, azul e branco
Em todo o espaço cultural indo-europeu há uma palavra
determinada que, em cada cultura, significa “compreensão”
e “conhecimento”. Em sânscrito esta palavra é vidya, em no-
rueguês viten, em indiano vidya, em grego idé e no latim vídeo,
que para os romanos significa simplesmente “ver”.
(GAARDER apud SOUZA , 2004 : 23)
(...) é possível obter-se uma significação precisa para deter-
minada cor em determinado texto cultural. Para conseguir
tal invariante, a aplicação da informação cromática deverá
estar combinada com outros elementos signicos além da
própria cor, que possam, no texto cultural apresentado,
indicar a leitura correta. (GUIMARÃES, 2000 : 97-98)
Além do sistema enunciativo áudioverbal visualizamos também um
sistema significante cromático dentro de Os Simpsons. Matt Groening declarou em
entrevista à imprensa que escolhera a cor amarela para a pele de seus personagens
apenas porque aquela apresentara melhor contraste, porém, como aduz Guimarães
(2000), a cor carrega informação cromática que, se bem utilizada, pode sempre ser
surpreendente.
A cromaticidade amarela da pele dos personagens de Groening
cumpre dois papéis de produção de sentido: é a cor de melhor assimilação
mnemônica e em várias culturas o amarelo é relacionado à loucura, à mentira e à
traição. Em dois momentos cruciais da história mundial, a cor amarela aparece como
a cor dos excluídos e dos reprovados. Durante a II Guerra Mundial era a cor imposta
aos judeus (a estrela de Davi, amarela, que eram obrigados a aplicar nas roupas) e no
período histórico marcado pela Santa Inquisição a cor imposta aos condenados pela
igreja católica na forma de um hábito amarelo que eram obrigados a usar
publicamente. Em uma sociedade mais jovem como a nossa, a cor amarela está mais
próxima de sua atuação positiva enquanto informação. No Brasil é a cor da alegria,
do calor, do ouro, do fruto maduro e da tropicalidade.
Estamos diante de uma nova ambivalência entre informação e
discurso na produção de sentido. Para os americanos de origem judaica, inseridos
dentro da Cultura norte-americana, o amarelo em Os Simpsons pode ser lido como
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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59
traço informativo da tradição judaica da estrela de Davi, também presente nas formas
do cabelo de Lisa e Maggie, sendo que a bebê Simpson por vezes aparece vestida em
um macacão cyan que a identifica ainda mais com uma estrela. Vale lembrar que o
criador dos personagens, Matt Groening, é de origem judaica, portanto vemos
indícios de que a cor amarela guarda em si mais informação para produção de
sentido pelo produto do que apenas a constrastiva cromática. Ainda há que se
observar também que o amarelo, na pintura, é a cor da juventude, do vigor, da
eternidade divina. Todos os lexemas arrolados acima se configuram em informações
positivas que convergem para a identificação, projeção e empatia do público com o
produto.
As cores e o estilo das roupas desenhados por Groening para Os
Simpsons também contém informações para uma produção de sentido desejada. Bart,
por exemplo, não veste vermelho e azul por acaso. Essas são as cores representativas
da pátria em qualquer comemoração que aconteça nos Estados Unidos, além disso,
não devemos perder de vista a produção de sentido do azul jeans para os americanos
como expressão de liberdade e identidade. Veja também que o uso da cor como
informação se repete em Lisa com o uso de vermelho e branco.
O vermelho é a cor da alma, a da libido, a do coração. É a cor da
Ciência, do conhecimento exotérico, interdito aos não iniciados, que os sábios
dissimulam sob seu manto;
83
todas características recalcadas no discurso enunciativo
de Lisa Simpson, personagem que encerra em sua composição semiótica vários
ícones culturais de base, tais como: a estrela de Davi presente na cor de sua pele e no
desenho de seu cabelo; a Estátua da Liberdade presente em sua figura feminina e a
fusão de seu rosto com o cabelo; a posição de suas mãos como se estivesse sempre a
meditar sobre uma situação e o colar de pérolas que usa.
O colar de pérolas que orna o colo tanto de Lisa quanto de Marge
carrega a informação simbólica da iluminação e do nascimento espirituais, a unidade
cósmica do múltiplo, a integração dos elementos dissociados de um ser na unidade
da pessoa; assim como transmitem ao enunciatário que as personagens são de
perfeição angélica, que não é dada, mas adquirida por uma transmutação. A pérola
83
Chevalier, 2003 : 944
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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60
designa o Corão, a ciência, a criança.(...) No Oriente, e sobretudo na Pérsia, a
pérola tem, em geral um caráter nobre, derivado de sua sacralidade.
84
Se em Lisa e sua mãe a presença das pérolas, em Maggie, a bebê
dos Simpsons, embora sua chupeta seja do mesmo tom de vermelho do vestido de
Lisa, da camiseta de Bart e do colar de Marge, encontramos o cyan como cor
predominante. Essa cor, um derivado do azul, carrega em si a informação a oposição
do vermelho. Enquanto a cor vermelha remete ao coração e às paixões, o cyan
remete à tranquilidade do azul esverdeado da costa dos mares da Grécia (Kyanós) de
onde a cor herdou seu nome.
Homer e Marge também são marcados pela cromaticidade informativa
do azul. As calças do marido de Marge são de cromaticidade próxima ao tom de azul
dos shorts de Bart, ou seja, Homer veste jeans. A composição informativa cromática
do chefe da família Simpson remete ao cinema americano, onde Marlon Brando (Um
bonde Chamado Desejo 1951) e James Jean (Juventude Transviada 1955)
imortalizaram o jeans e a camiseta branca como significantes de uma atitude. o
cabelo da senhora Simpson utiliza um tom de azul mais intenso, cujo penteado foi
inspirado nos cabelos do filme A Noiva de Frankstein (1935), mas especificamente
na personagem que dá nome a obra. O vestido de Marge é de um tom de verde que se
aproxima do cyan da camisola de Maggie, aproximando a informação cromática das
duas personagens.
84
cf. CHEVALIER, 2003 : 713
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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61
5.2. Um terno verde ou preto para Mr. Burns?
A simbologia das cores dependerá do armazenamento
e a transmissão do seu conteúdo que pode, afinal, transpor
períodos de tempos maiores ou ter validade por um período
de tempo menor, assim como pode variar em relação ao repertório
compartilhado por aqueles que participam do processo
de comunicação. (GUIMARÃES, 2000 : 87)
Para muitos índios da América do Norte, cada um
dos setores cósmicos está associado a uma cor sagrada:
o norte é amarelo;o oeste azul; o sul vermelho; o leste branco;
o zênite (o alto) é multicor; o nadir
(embaixo), preto. (CHEVARLIER, 2003 : 276)
Nenhum desenho animado está completo sem um antagonista. No
caso de Os Simpsons, Matt Groening criou Charles Montgomery “Monty” Burns, ou
simplesmente, Mr. Burns. Graduado por Yale em 1914, ele é o homem mais em
Springfield: o mais velho (104 anos); o mais rico (dono da Usina Nuclear de
Springfield, da Companhia de Construção Burns, da Companhia de Perfuração
Burns, dono e fundador da Fábrica de Mistura Patenteada para Animais da Pequena
Lisa, inventor da Rede Onipresente de Burns, dono dos meios de comunicação de
massa de Springfield e da maioria dos imóveis comerciais); também é o mais
solitário, não tem família próxima que more com ele ou o visite; é o mais moribundo:
tem todas as doenças imagináveis e possíveis, mas como uma anula a outra, está
vivo. Mr. Burns possui a “Excalibur” do Rei Arthur; a única foto de Mark Twain nu
e aquele raro primeiro rascunho da Constituição com a palavra “otários” escrita.
Monty é também o mais odiado por 99,9% dos habitantes da cidade, apenas seu fiel
secretário particular, Smither, o ama e idolatra. A dedicação de Smither por Burns
rendeu o título de homossexual ao sacripantas, que antes pertencia apenas ao casal
Carl e Lenny na série.
Quando criança, Burns morava em uma casa simples no interior com
seus pais e seu irmão mais novo George Burns. Um dia foi convidado por seu avô,
um velho bilionário sem amor, para morar na cidade e tomar conta dele. Mr. Burns
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62
aceitou sem hesitar. Tornou-se imediatamente uma criança rica e mimada. Por fim,
herdou de seu avô a mina de átomos que mais tarde se tornaria a Usina Nuclear de
Springfield.
A voz de Burns em alguns episódios é feita pelo próprio Rupert
Murdoch, dono do maior império de media na atualidade, do qual a FOX é uma das
empresas. Murdoch pode ser considerado um dos exemplos vivos do “fazer a
América”, expressão presente na Língua Inglesa. Imigrante australiano construiu o
maior conglomerado de media que se tem notícia até o momento (Anexo III).
Naturalizou-se americano apenas em 1985 para satisfazer uma exigência das leis
americanas de que apenas cidadãos daquele país poderiam ter a concessão de um
canal de televisão.
85
Em Os Simpsons vemos que ora Burns e Murdoch se fundem, ora
Burns e premissas do capitalismo se igualam. Dando continuidade a nosso estudo da
produção de sentido intertextual pelo produto em sua linguagem não-verbal,
observemos Monty em sua composição cromática (Figuras 3 e 4).
Na composição de Burns predominam as cores verde e preto, sendo
que em algumas cenas rápidas o verde se intensifica chegado muito próximo a cor do
dólar americano, não inocentemente. De acordo com Guimarães (2000), a cromátide
verde ao se associar a fortuna remete ao símbolo contemporâneo da riqueza: o dólar,
a “verdinha”. Esse papel informativo da cor verde, anteriormente do ouro, portanto
do amarelo, cumpre o papel de informar ao enunciatário telespectador a construção
identitária que se deseja para Burns: alguém com poder econômico. Sendo assim, os
desenvolvedores de Os Simpsons também se encarregam de vestir informativamente
o milionário de Springfield com azul, pois ao tornar-se azulado a cromátide informa
que o personagem torna-se sério e como que repleto de pensamento.
Amarelo, azul, verde e verde-azulado são utilizados para compor a
indentificação não verbal de um personagem que arquiteta cada passo de sua ação em
direção ao seu objetivo. A enunciação do não-verbal prima em informar ao
enunciatário telespectador que estamos diante de um antagonista, auxiliada pelo
conjunto das formas escolhidas para Burns: seu olhar nos remete intertextualmente
85
http://en.wikipedia.org/wiki/Rupert_Murdoch e
http://www.terra.com.br/dinheironaweb/122/rupert_murdoch.htm
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63
aos antagonistas tanto de outros desenhos animados quanto dos filmes de terror da
década de 1930; a boca cheia de dentes à mostra remete a um tubarão
86
; o nariz
muito longo e fino, além da magreza quase anoréxica e uma corcunda, também são
típicos de arquétipos ligados ao sombrio. A complementação identitária da produção
de sentido virá com a escolha vocabular para o discurso do personagem ao longo dos
episódios e seu recalque de comportamento por meio de jargões como a forma que
diz Excelente quando está satisfeito com algo, assim como a sua sentença predileta:
Para que serve o dinheiro se não for para provocar terror no próximo? E ainda,
ligações intertextuais implícitas com antagonistas do cinema e da literatura
norteamericanos. Essa aproximação ao mundo real ou ao mundo fantástico acaba
por se tornar referência para o produtor da informação televisual.
87
Burns também veste preto em algumas ocasiões, para informar
culturalmente que está vinculado ao desconhecido e do que provoca medo, pois do
medo primordial da morte nasceu o simbolismo dessa cor ligando-a ao respeito,
temor e, daí,a noção de autoridade, poder de vida e morte. “EEEXXXCELENTE”(sic)
diria Burns.
Figura 3 Figura 4
86
Na língua inglesa money shark equivale ao vocábulo agiota em Português.
87
Guimarães, 2000 : 111
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64
6. DA TV PARA A TV EM CINCO EPISÓDIOS
(...) todo monólogo é réplica de um grande diálogo
(da comunicação verbal) dentro de uma dada esfera.
(BAKHTIN, 2000:345)
Como já afirmamos em seção anterior desse trabalho, por apresentar o
tom humorístico da paródia, o texto de Os Simpsons representa para seus autores
tanto a libertação do medo da situação séria amenizada pela carnavalização dos fatos
por meio de seus “atores”, espaços e esferas discursivas de atuação expressos pelo
formato parodístico da série, quanto a orquestração de um espetáculo narrativo
fictício voltado para a vida humana em sua cotidianidade, em seu aspecto popular.
Nessa percepção carnavalizada do mundo em que o riso libertador se manifesta,
Bakhtin apresenta quatro categorias” fundamentais instauradas a partir do contato
livre e de semelhanças: um novo modo de relações humanas, oposto às relações
heirárquico-sociais todo poderosas da vida cotidiana; a excentricidade, as
personagens se abrem e permitem tudo aquilo que comumente está reprimido; a
mésalliances, a aproximação dos contrários; e a profanação (paródias de textos
considerados sagrados ou textos sobre situações conflitantes)
88
.
Fávero, ao comentar Bakhtin, esclarece que “na paródia, o discurso se
converte em palco de luta entre duas vozes e, como num espelho de diversas faces,
apresenta a imagem invertida, ampliada ou reduzida arrastando o leitor para dentro
ao mesmo tempo em que o põe para fora.” Sendo assim, na estruturação global da
paródia, o mesmo autor destaca cinco elementos que entram na constituição das
narrativas orais: orientação complicação avaliação resolução e moral, as
quais podemos ver presentes nos episódios de Os Simpsons usados para esta
dissertação, bem como em outros da série e que propomos como elementos a serem
retomados posteriormente.
88
Fávero, 2003 :51
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65
Focando especial atenção aos índices discursivos que o corpus
apresenta, e que acreditamos possibilitem às sociedades geograficamente distantes
umas das outras reconhecerem alguns de seus valores em um contexto que lhes
pareça estrangeiro e ao mesmo tempo imbuído de valor, cremos ser possível
apreender como a comunicação midiática, nesse caso particular de Os Simpsons se
inventa e reinventa a partir de si mesma.
6.1. Os vários arquivos dentro do episódio “Arquivo S”
O acontecimento, no que tange à sua significação, é
sempre o resultado de uma leitura, e é essa leitura
que o constrói. O acontecimento midiático, no caso, é
objeto de uma dupla construção: a de uma encenação
levada a efeito pela transmissão, a qual revela o
olhar, e a leitura feita pela instância midiática, e a do
leitor-ouvinte-telespectador que a recebe e interpreta.
(CHARAUDEAU, 2006 : 243)
Se fôssemos peixes, a comunicação seria o mar que nos envolve e no
qual alguns atingem aprimoramento na arte de nadar, enquanto outros nadam em
círculos. Porém todos tentam dar uma volta na espiral da produção de sentido a cada
bater de nadadeiras. Alguns peixes apresentam-se dotados de maior ou menor grau
de competência comunicativa que outros por uma questão de ordem fenotípica.
Alguns mais atentos, outros nem tanto, às mudanças de estratégia(s) que se fazem
necessárias durante o processo comunicativo, levando-se em consideração quem,
para quem, quando, como e onde o enunciado é produzido, além das circunstâncias
que levaram à sua enunciação.
Entender, ou melhor, procurar entender como se estabelece e
desenvolve o que foi descrito no parágrafo anterior tem sido objeto de estudo de
várias ciências constituídas e de seus produtores e colaboradores. De um paradigma a
outro, no entanto, todos de alguma forma se comunicam, se renovam e se completam
num infinito ligar, desligar, religar, acoplar, englobar, (re)inventar, criar, tornar
comum entre sujeitos.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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66
Se o século XX foi rico em invenções, seu sucessor promete ser
igualmente afoito para entender o que se passa com essa inventividade. Dos muitos
engenhos que marcaram o período, destacamos um segmento em especial: as
máquinas comunicativas que se prestam a diminuir as distâncias terrestres entre os
homens e cujos produtos influenciam a criação de outros produtos, bem como seus
produtores, ao mesmo tempo em que são influenciados. Trata-se de uma bola de neve
onde cada pequenino floco se liga ao outro e acaba por amalgamar-se ao todo
enquanto o processo comunicativo desenrola-se infinitamente, impulsionado pela
necessidade humana de viver em sociedade com seres semelhantes.
Dentro daquela metafórica bola de neve, propomos-nos a examinar em
lâmina a composição do elemento comunicação midiática produzida para a instância
televisiva na forma de um de seus produtos em especial: o gênero desenho animado
de núcleo familiar no formato “Os Simpsons”, sitcom cujo tom humorístico é
amparado pela paródia
89
. Para tanto buscamos articular a literatura presente em
Laface
90
, a qual sintetiza que os enunciados da mídia, seja ela impressa, auditiva ou
televisiva, apresentam quatro eixos de composição básicos em seu agrupamento
lexical: modernidade; cidadania; globalização e identidade cultural; e ideologia, com
outros teóricos do estruturalismo e análise do discurso.
Norteados por essas idéias consideraremos o repertório como um
inventário aberto de unidades que se propõem a criar espaço para o eixo da
comunicação onde o texto
91
produzido é ao mesmo tempo sua manifestação e
atualização
92
de significados. Por meio de signos e seu encadeamento em estruturas
sintagmáticas maiores, as diversas linguagens televisivas recortam dados da
realidade social e cultural para produzir enunciados expressivos. Além disso, a
linguagem em si configura-se como instrumento de uso do indivíduo, e que está
disponível para manifestação interativa do discurso: poder de construção de sentidos
pelos sujeitos.
89
A classificação em gênero, formato e tom adotada neste trabalho encontra-se em Duarte, 2007.
90
2005
91
Para Antonini (2007, p. 144) texto é “um todo de sentido que se insere num dado momento
cultural.”
92
O conceito de atualização utilizado neste texto é o de uso em concordância com Laface, 2005.
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67
No discurso
93
, instância onde conhecer a linguagem e seu repertório
torna-se fator importante, pois aquele carrega a forma enunciativa dos fatos no plano
de conteúdo, o que conduz à produção do sentido por parte do enunciatário. É no
plano de conteúdo discursivo que o texto deixa reconhecer valores, crenças e
ideologia(s) dominante(s) em um determinado seguimento da esfera social de
atuação daquela produção midiática.
Ao nos manifestarmos, impressões sobre o que se vivencia são
traduzidas em idéias encadeadas num contínuo de fala
94
e compartilhadas a partir de
sua comunicação ao outro num processo sócio-interativo-produtivo em que se elege
um repertório acoplado à um código linguístico para dar vazão à linguagem:
capacidade de comunicação que constrói e introduz informação. Essa informação
tende a se transformar em conhecimento, processo este que pressupõe competência
lingüística do usuário ao criar novas situações de uso para tais informações de acordo
com a necessidade (técnica e/ou social). Competência de que necessita o homem para
expressar por meio da produção, recepção e decodificação de enunciados o seu
conhecimento de mundo de forma responsiva.
Um mundo que o comunicador traz não em sua cabeça, mas que
também o circunda, o observa, o compõe, instaura-se e faz parte da sua própria pele
antes mesmo dele nascer, pois o sentido comunicativo-discursivo de algumas
estruturas é mais velho que nossa existência biológica produtores e receptores, pois
nascemos imersos em padrões comunicativos ditados pela Cultura. A significação
que atribuímos à determinadas estruturas comunicativas ultrapassa as barreiras das
sentenças produzidas e por vezes de seu simples encadeamento. Os signos de um
contexto são disponibilizados pelo enunciador a partir de sua capacidade sígnica de
criar novos sentidos em um novo contexto. O enunciador coloca a linguagem em uso
conforme a necessidade de traduzir fatos históricos pessoais ou sociais que
organizam a interação discursiva. Os sentidos produzidos pela organização interna
das estruturas levam o texto a se re-contextualizar e tomar posição no discurso a cada
93
Adotamos o conceito de discurso contido em Fairclough (1995) no que se refere ao uso da
linguagem falada ou escrita, mas também inclui outros tipos de atividades semióticas, tais como
imagens visuais e comunicação não verbal.
94
Consideramos contínuo de fala as manifestações tanto orais, quanto escritas ou imagéticas
produzidas pelos seres-humanos durante o processo comunicativo e sua conseqüente produção de
sentido.
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68
nova produção de acordo como sentido que o enunciador deseja produzir e a
responsividade assinalada pelo enunciatário. Armado pela ou com a linguagem o
homem abre caminho para o “fazer” discursivo (“eu quero, eu sei e eu faço”).
Diante do exposto, entendemos que, ao comunicar algo, o enunciador
tenta convencer o outro de que a sua versão dos fatos é a expressão da verdade e para
isso arma estratégias de construção de sentido. Ao examinarmos com mais atenção o
texto produzido percebemos que ele carrega, em sua malha dialógica, várias
informações sobre seu enunciador e suas intenções. O grupo social, a linguagem por
ele adotada e o contexto em que se insere como instrumento de manifestação de
discurso ideológico
95
com relação às instâncias de poder vigentes no momento
sócio-histórico da enunciação produzem e reproduzem categorizações valorativas
que se constituem em material de pesquisa relacionada à visão de mundo
externalizada pela enunciação produzida. A atualização do léxico feita pelo
enunciador permite apreender como o grupo social de onde ele enuncia organiza sua
visão de mundo diante de um contexto externo em relação ao seu contexto interno, o
“tu” em relação ao “eu” e vice-versa. Sobre este aspecto, cabe lembrar o comentário
de Marcondes Filho
96
sobre o conceito de diferença elaborado por Deleuze:
o homem é capaz de constituir uma língua, imprimir
psiquicamente nos sentidos o que ele sente àquilo que o
corporifica. A marca psíquica, assim, vincula-se à articulação
lingüística. O sentido ocorre nesse momento, nessa fratura da
experiência, unidade mínima da cadeia temporal, nessa
diferança.
97
95
Para Marilena Chauí (2001, p. 85-6), a ideologia é a “transformação das idéias da classe dominante
em idéias dominantes para a sociedade como um todo, de modo que a classe que domina no plano
material (econômico, social e político) também domina no plano espiritual (das idéias)”. A autora
aponta os meios de comunicação como uma das instituições disseminadoras dessas idéias, na função
de convertê-las em “idéias comuns a todos”.
96
2004 : 230-231
97
Diferança um signo lingüístico não é apenas esse jogo de xadrez em que as palavras valem pela
sua posição, mas algo mais. O movimento de significação trabalha antes com múltiplas
temporalidades: um elemento passado e, moldando-se por essa marca, relaciona-se com o elemento
futuro. (MARCONDES, 2004, p. 227)
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69
Transferindo a discussão acima para o estudo da esfera discursivo-
midiática, propomos a análise do texto
98
produzido para e pela TV por entendermos
que sob certo aspecto o meio se configura em algo simultaneamente animado e
inanimado
99
; um ambiente propício para a composição de novos textos devido a seus
recursos técnicos, os quais podem ser utilizados tanto para comunicar a leitura do
mundo que nos cerca quanto a daquele que carregamos em nosso inventário
particular ou de momentos que avançam ora em analepse, ora em prolepse como
forma de condução da narrativa. Também favorece o texto televisivo, o fato deste
poder imprimir uma marca psíquica à expressão de seus produtos graças ao efeito de
realidade alcançado por suas imagens de natureza compósita em interação com
outras linguagens para produzir a espetacularização do real, além de poder reproduzir
todos os traços prosódicos, bem como exagerá-los se assim o desejar, para conduzir a
enunciação à produção de sentido desejada.
Na decodificação de um texto televisivo, considerado um todo de
sentido que se insere num dado momento cultural, a operação comunicativo-
receptiva não se limita ao entendimento de seu código relacionado ao repertório do
telespectador. também que se atentar às afirmações ideologicamente potentes
sobre direitos, relacionamento pessoal, comportamento social, conhecimento e
identidades que o enunciador do texto televisivo deixa transparecer por meio de
marcas, tanto sígnicas quanto melódicas, em sua produção linguajeira para em
análise chegarmos a um sentido comunicativo de horizontes mais amplos. Além
disso, devemos também considerar o momento sócio-histórico em que se encontra
esse enunciador para entendermos, enquanto pesquisadores, os intertextos que
compõem a malha dialógica de seu discurso.
98
Adotamos aqui a conceitualização de Antonini (2007, p. 144), para quem texto é um todo de
sentido que se insere num dado momento cultural.”
99
O bios midiático é uma transformação técnica do espaço-tempo, adequada às novas estruturas e
configurações da vida social. [...] uma espécie de comunidade afetiva de caráter técnico e
mercadológico, onde impulsos digitais e imagens se convertem em prática social. [...] uma “forma de
vida” duplicada, que engloba o profissional e seu público, instaurando um novo tipo de
relacionamento com o real. (Muniz Sodré, 2006 : 99-100)
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70
6.1.2 - “Três arquivos”, várias ligações
Ao produzirem um texto para se comunicar, as
pessoas utilizam a linguagem verbal e outros sistemas
semióticos (como as imagens) com três funções
básicas: mostração, interação e sedução. (PINTO,
1999 : 61)
No episósio “Arquivo S” de Os Simpsons
100
, exibido pela TV
americana em 12.01.1997
101
, observamos inicialmente Leonard Nimoy
102
narrar o
estranho conto do contato imediato de terceiro grau de Homer Simpson com um
extraterrestre. Uma noite, após beber um pouco a mais do que de costume no bar do
Moe, Homer é abordado na floresta de Springfield por uma criatura careca,
luminescente e de olhos grandes que diz para ele não ter medo. Homer conta para
todo mundo que a criatura é um ET, o fato é divulgado pelo ”Springfield Shopper”-
principal jornal impresso da cidade e isso traz os agentes fictícios do FBI, Fox
Molder e Dana Scully personagens da série de ficção científica “Arquivos X”, a
Springfield para uma investigação.
Por trás da aparente normalidade do enunciado da narrativa de
“Arquivo S” acreditamos haver em sua malha dialógica várias informações sobre seu
produtor, suas intenções comunicativas e o contexto em que o texto parodístico foi
gerado. Diante disso, propomo-nos a apontar e discutir alguns pontos desse episódio
de Os Simpsons a fim de entender melhor não só como os processos de construção
enunciativa são engendrados dentro da paródia “simpsoniana”, mas também qual
100
Série do tipo sitcom. Criada por Matt Groening em 1989, narra as peripécias da família Simpson
(Homer, Margie, Bart, Lisa e Meggie) de forma parodística. A rede de TV americana Fox detém os
direitos sobre a veiculação da série. No Brasil atualmente é distribuída em canal aberto pela Rede
Globo e por assinatura pela própria Fox.
101
< http://www.thesimpsons.com/episode_guide/0810.htm > acesso em 10.12.2007
102
Ator americano de séries de ficção científica, dentre elas “Startrek” ou Jornada nas Estrelas, onde
vive o personagem Mr. Spock pelo qual ficou conhecido no mundo todo. Jornada nas Estrelas é
considerado o melhor “cult” de TV de todos os tempos pela revista “TV Guide”, com Arquivos X em
segundo lugar na mesma categoria.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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71
seria a possível mensagem crítico-discursiva envolta em seu texto parodístico ao do
seriado de TV “The X Files” ou “Arquivo X”.
6.1.3 – Arquivo 1: Sentar-se e ligar a TV. Trivial?
No texto da vinheta de abertura da série “Os Simpsons” identificamos
a primeira entrada de produção de sentido intertextual com “Arquivos Xao vermos
que Bart Simpson escreveu várias vezes na lousa da escola primária de Springfield o
mote central da série parodiada (THE TRUTH IS OUT THERE.)
103
em um discurso
de negação (THE TRUTH IS NOT OUT THERE.).
A vinheta segue normalmente como nos outros episódios até que a
célebre cena do sofá é enquadrada; então, depois da chegada de cada um dos
membros da família Simpson ao lar, os vemos voar pela sala da casa, usando
jatopropulsores individuais. Homer, Marge, Lisa e Maggie cruzam, um a um, a tela
de nossos aparelhos de TV e “aterrissam” no sofá da família, em frente a seu
aparelho de TV. Em seguida temos um close frontal da televisão dos Simpsons em
cuja tela aparecem os créditos relativos aos desenvolvedores do episódio que será
apresentado.
A escolha de jato propulsores, somada à sentença escrita na lousa ativam
a ligação intertextual de sentido entre espaço sideral, ficção científica e modernidade
veiculada outrora em outras produções, não televisivas, mas também
cinematográficas, uma vez que a televisão nos Estados Unidos nasceu do cinema e
não do rádio como ocorreu com a brasileira. Tais produções funcionam como índices
direcionais para a produção de sentido que a narrativa do episódio assumirá no
decorrer de seus 23 minutos, ou seja, procuram adiantar para o
enunciatário/telespectador um pouco do que ele verá a seguir.
103
“A verdade está lá fora.”
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72
6.1.4 – Arquivo 2: Um certo Leonard Nimoy Spock
Logo após a cena do sofá, somos surpreendidos pela figura em close do ator
Leonard Nimoy, mundialmente conhecido como Sr. Spock do seriado de TV
”Jornada nas Estrelas” (Startrek), em um cenário composto predominantemente por
cores escuras. Sentado em uma cadeira de espaldar alto, atrás de uma escrivaninha,
sobre a qual vemos à sua direita um crânio humano ao lado de um livro e à esquerda
um castiçal com três velas usadas, Nimoy apresenta o episódio “Arquivo S” com
toda a encenação típica de um show televisivo de suspense. Nimoy enuncia a partir
da televisão da sala de estar dos Simpsons, pois ao findarem-se os créditos de
abertura, ainda permanece como moldura a “caixa” do aparelho de TV da família,
que depois ifundir-se coma narrativa sem que o telespectador perceba. Enfim, o
telespectador encontra-se diante de um simulacro: assistindo TV com os personagens
de Os Simpsons.
Voltando ao quadro da introdução de Nimoy na narrativa percebemos
que o ambiente que envolve o ator está na penumbra e os elementos que o compõem
remetem o telespectador à uma atmosfera de mistério (Sr. Spock biblioteca ou
escritório crânio humano velas - ambiente escuro) pois busca-se suscitar no
leitor/telespectador a sensação estésica
104
de medo do desconhecido.
Na sequência de quadros, o único ponto de luz clara a surgir
concentra-se em foco por trás de Nimoy, emoldurando-lhe os membros superiores.
Sua cor e forma lembram, ao surgir, a da claridade projetada por um canhão de luz
como os que são usados no teatro para direcionar a atenção do público. Em seguida,
essa projeção focal transformar-se no encadeamento lado a lado, um a um, de formas
geométricas que lembram as pétalas de uma margarida, mas que acabam, na verdade,
por aludir intertextualmente à rede de TV americana NBC
105
, cujo logo em 1997 era
104
Sobre estesia cf. Muniz Sodré, 2006, p. 44-71.
105
Wikipedia - National Broadcasting Company (NBC) é uma rede de televisão americana, cuja
central está instalada no edifício da GE no Rockfeller Center em Nova York. Às vezes referem-se a
esta estação de TV como a “rede pavão” (Peacock Network) devido a seu logo na forma de um
pavão estilizado. Fundada em 1926 pela RCA, o controle da NBC passou para a GE em 1986. A
razão social da empresa a partir de 2004 mudou NBC Universal. Seu logo é uma combinação do
pavão da NBC com o globo da Universal Studios.
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73
composto por um pavão estilizado nos mesmos moldes do foco de luz que vemos por
trás de Nimoy. A ligação intertextual se torna ainda mais relevante quando unimos
imagem e fala, pois, de 1982-1986, a NBC transmitiu a popular série “Ripley’s
Believe It or Not!” (Acredite Se Puder!) às sextas-feiras à noite, tendo como
apresentador o ator Jack Palance, cujo texto de abertura percebemos tomar corpo em
forma de paródia tanto nos traços prosódicos, quanto na escolha vocabular para a fala
de Nimoy, ou seja, o personagem expressa-se ao estilo da abertura que Jack Palance
imprimia ao apresentar seu programa na década de 80.
Poderíamos pensar em um pastiche
106
para entrada de leitura estésica
nesse instante. Entretanto, o que temos é um détournement de tipo lúdico
107
, pois o
que encontramos no script já é um novo texto a partir da ponte intertextual de sentido
proposta. Nimoy não está vestido como Spock, mas seu biotipo é associado ao
personagem de “Jornada nas Estrelas”; em seguida ouvimos a voz real do ator dar
vida ao Nimoy do desenho animado; porém os traços prosódicos em sua voz são os
de Jack Palance ao abrir o show “Acredite se Puder”; também a fala interpretada por
Nimoy não é a mesma do Sr. Spock, nem a de Jack Palance e sim uma fala nova
escrita pelos autores do episódio e de processamento de sentido mais rápido pelos
leitores/telespectadores por apresentar várias chaves de ligação intertextual com a
própria televisão.
Como pode ser comprovado na sessão de anexos desse trabalho, os
autores de Os Simpsons criam um texto parodístico de natureza compósita entre
imagem, som e fala para inserir o tema do episódio no plano de expressão: “TGIF!”,
uma acronímia da frase “Thank God It’s Friday “ (alternativamente: Thank Goodness
It’s Friday ou Terribly Gleeful It’s Friday), cujo equivalente em português seria
Graças a Deus hoje é sexta-feira!
108
. Ao inserirem índices intertextuais, os autores
do episódio provocam a possibilidade de uma nova produção de sentido embasada na
recontextualização de conteúdos anteriores (sexta-feira, “Jornada nas Estrelas”, Sr.
106
Gray, 2006 e Muniz Sodré, 2007
107
Koch, 2007 : 45 - [...] o objetivo é levar o interlocutor a ativar o enunciado original, para
argumentar a partir dele; ou então, ironizá-lo, ridicularizá-lo, contraditá-lo, adaptá-lo a novas
situações, ou orientá-lo para um outro sentido, diferente do sentido original.
108
Disponível em < http://en.wikipedia.org/wiki/TGIF > acesso em 17.01.2008.
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Spock, “Acredite se Puder”, Jack Palance, crânio, castiçal, biblioteca escura) e que
foram carnavalizados em sua ordem oficial.
Ao longo da narrativa do primeiro ato do episódio “Arquivo S”
identificamos quatro ocorrências do vocábulo TGIF” e seis do vocábulo Friday”
no script, o que colabora com nossa crença de que é o significado pré-construido
dessas palavras que direciona o tema
109
do texto televisivo da narrativa do episódio
em seu plano de expressão, pois, segundo apurado em consulta a dicionários de
língua e cultura
110
, nos países de língua inglesa a sexta-feira tem valor cultural: é o
dia em que muitos trabalhadores não profissionais recebem seu pagamento; é o
último dia de trabalho antes do final de semana e as pessoas freqüentemente ficam
felizes quando chega sexta-feira, dia em que muitos saem para jantar fora ou dançar à
noite, enfim, se divertir depois de uma semana de trabalho. Contudo, também os
que preferem ficar em casa e assistir alguma coisa na TV. Geralmente nesse dia as
emissoras preparam programação especial para tentar ganhar o maior número
possível de telespectadores.
O fato em torno da TV descrito acima se inscreve no plano de
expressão do primeiro ato do episódio “Arquivo S” por meio não da alusão a
canais americanos de TV aberta (ABC, NBC, CBS e FOX) em intertextualidade
explícita na fala de alguns personagens, mas também na intertextualidade da fala de
Bart
111
ou na intertextualidade implícita entre a figura de Leonard Nimoy com Sr.
Spock e sua fala parodiando a de Jack Palance
112
, ou , não podemos nos esquecer, da
intertextualidade com o filme “Alta Velocidade” (Speed em inglês) na fala de
Homer
113
.
109
Laface, 2005
110
Longman Dictionary of English Language and Culture. UK, Longman Group, Updated reprint,
1993.
111
Lis, when you get a little older, you'll realize that Friday is just another day between NBC's Must-
See Thursday and CBS's Saturday night Crap-o-Rama.
112
Hello, I'm Leonard Nimoy. The following tale of alien encounters is true. And by true, I mean false.
It's all lies. But they're entertaining lies, and in the end, isn't that the real truth? The answer...is no.
Our story begins on a Friday morning, in a little town called Springfield...
113
Don't worry, I have a plan. I saw this in a movie about a bus that had to SPEED around the city,
keeping its SPEED over fifty. And if its SPEED dropped, it would explode. I think it was called...
"The Bus That Couldn't Slow Down."[…]
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
75
6.1.5. Arquivo 3: Sexta-feira, a partir também de quinta, na “América televisiva”
Anteriormente, como ilustração, descrevemos de forma sucinta o valor
cultural da sexta-feira nos países de língua inglesa. Agora nos parece pertinente
esclarecer alguns pontos entre a expressão TGIF”, sua relação com a televisão
americana e o valor cultural que ambos assumem nos Estados Unidos.
De acordo com a enciclopédia eletrônica Wikipedia, tanto a acronímia
“TGIF” quanto a frase “Thank God It’s Friday” foram cunhadas pela variante
americana da língua inglesa. Elas se tornaram expressão comum de alívio para o
final de uma semana de trabalho e antecipação de relaxamento ou festa ao longo do
final de semana, sendo que sua popularidade ampliou-se a partir de 1978 com o filme
“Thank God It’s Friday” estrelado por Donna Summer. A frase também aparece em
diversos anúncios e materiais promocionais norte-americanos. Entre os estudantes
universitários, a partir da década de 70, TGIF teve seu sentido associado a festas
vespertinas regadas à cerveja e que geralmente aconteciam ao ar livre.
114
Frequentemente slogans usando a expressão “TGIF” são inseridos na
comunicação midiática, como no bloco de programação de sitcoms na grade de
sexta-feira à noite da rede de televisão americana ABC, que se vale do significado de
TGIF” para alimentar sua comunicação midiática, sendo que alguns dos
apresentadores de seus programas da grade daquela noite chegam até a usar de
trocadilho com a expressão dizendo “Thank Goodness It’s Funny” (“Obrigada, meu
Deus, isto é engraçado.”) para ativar a produção de sentido do que apresentam no
imaginário do telespectador.
O sentido da acronímia “TGIF” na grade de programação “prime
time” da rede ABC é concebido nos moldes do “Must See TV” da rede NBC que vai
ao ar na quinta-feira. O bloco de programação da NBC também é composto em sua
maioria por sitcoms. “The Cosby Show, Cheers, Seinfeld, ER, Will & Grace” e
“Friends” são alguns dos shows pertencentes ao “Must See TV” da NBC na década
de 90 e com as quais a rede conquistou os mais altos índices de audiência,
dominando a competitiva noite de estréias da quinta-feira.
114
Wikipedia, disponível em < http://en.wikipedia.org/wiki/TGIF > Acesso em 17.01.2008
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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Cláudia Regina da Silva Franzão
76
A grade de programação de “Must See TV Thursday” da NBC em
1996-1997
115
era composta por: “Friends, The Single Guy, Suddenly Susan,
Seinfeld, Sudenly Susan, The Naked Truth, ER”, sendo que “ER” era líder de
audiência em 1995/96 e o segundo em 1997, de acordo com fontes eletrônicas. O
formato de ER foi tão bem aceito pelo público americano que a FOX passou a exibir
HOUSE, mesmo gênero de programa, como concorrente a partir de 2004, e a ABC
inseriu em sua grade Grey’s Anatomy em 2005; ambas as redes, FOX e ABC,
tentavam desbancar índices de audiência obtidos por ER da NBC. A grade de
programação de “Must See TV”, exibido às quintas-feiras, permaneceu no ar durante
vinte anos, fato que reforça a aceitação dos valores transmitidos pela comunicação
midiática produzida eplos gêneros discursivo-narrativos dos programas.
Ainda com base nos dados fornecidos por fontes eletrônicas,
verificamos que a grade de programação da ABC, outra emissora citada por Bart
Simpson em Arquivo S, em 1996-1997 (ano de produção e veiculação do episódio)
empregava TGIF” como título para a reunião dos shows: “Family Matters” (20:00-
20:30), “Sabrina, The Teeenage Witch” (20:30-21:00), “Clueless” (21:00-21:30),
“Boy Meets World” (21:30-22:00) e por último “20/20”
116
um tipo de revista de
notícias
117
exibida das 22:00-22:30.
Diante do contexto histórico televisivo encontrado, argumentamos que
a partir do sentido pré-construído pela interação sócio-verbal dentro da cultura
americana em torno do sentido da expressão “Thank God It’s Friday” e suas
variações, bem como a acronímia “TGIF”, outros textos foram gerados e
recontextualizados nos termos que Fairclough (1995) descreve. Entendemos que,
com base em tipos e gêneros textuais convencionais
118
, a mídia contemporânea
apropria-se antropofagicamente
119
de características de vários enunciados pré-
existentes para gerar criativamente gêneros híbridos que melhor se prestem à
115
A TV americana tem sua temporada dividida em setembro a dezembro e fevereiro a junho, sendo
que os meses de julho, agosto e janeiro são para reprises, pois os estúdios estão em férias.
116
um programa no formato de “60 Minutes” da CBS, mas que focava mais em estórias de interesse
humano do que em matérias internacionais e política.
117
No original “news magazine”. Disponível em: < http://en.wikipedia.org/wiki/TGIF > release on
17.01.2008
118
Bakhtin, 2000
119
Baitello Júnior
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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77
transmissão de dados relevantes para a composição da mensagem informativa
destinada a uma determinada faixa de público que se pretende atingir.
6.1.3. Ver + Ouvir = Entender ?
Voltando ao enunciado de “Arquivo S” como um todo, destacamos
outro momento intertextual que nos parece relevante: o recorte de Homer no Bar do
Moe. Os autores de Os Simpsons nos apresentam, nessa sequência de cena, um
aparelho para medir o grau de embriaguês alcoólica do “chefe” da família Simpson e
vemos que um dos parâmetros, o mais alto, é representado pelo nome do ex-
presidente russo Boris Yeltsin, cuja identidade internacionalmente construída pela
mídia tratou de reforçar seu apreço por bebidas alcoólicas, enquanto a faceta de
estadista articulador da glasnost foi colocada em segundo plano.
Após ter seu alto índice de álcool no sangue comprovado pela
aferição do aparelho, Homer decide ir para casa e em seu caminho conseguimos
identificar quatro momentos de intertextualidade implícita e não verbal com quatro
enunciados veiculados pela mídia televisiva:
1. Arquivos X: quando Homer perambula de madrugada pelas ruas
desertas de Springfield à caminho de casa e os primeiros acordes do
tema musical de abertura daquele seriado são incidentalmente inseridos;
2. o filme Psicose
120
, de Alfred Hitchcock: quando o tema musical de
Arquivos X se funde com o do filme. Os sons provêm de um ônibus com
os músicos da Orquestra Filarmônica de Springfield, do qual
desembarca uma violinista executando o referido tema cinematográfico
que depois é mixado ao da série de Molder e Scully;
3. o tema musical da produção Arquivos X, ouvido quando Homer corre
pela floresta de Springfield, tropeça em uma raiz e se face-a-face
com o suposto ET pela primeira vez;
120
Psicose é considerado um clássico do cinema no gênero suspense. O filme foi exibido várias
vezes pela TV, além disso, a célebre cena do assassinato no chuveiro vem sendo usada como ponte
intertextual para produção de sentido em várias peças midiáticas audiovisuais ao longo dos anos.
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78
4. os estranhos círculos que aparecem nas plantações de trigo, cevada e
milho no centro dos EUA
121
: por meio da escrita famoso “YAH!” de
Homer que, ao fugir do suposto ET, corre por um campo de grama alta
aos berros.
Ao final do primeiro seguimento do episódio Arquivo S acreditamos
ser possível resumir o eixo de sua narrativa em torno do valor cultural da sexta-feira:
alegria, diversão, televisão (mistério, suspense, ficção científica, desenho animado,
sitcoms) e do mundo factual. Essa predicação, pertencente ao plano de conteúdo em
nosso entender, se manifesta no plano da expressão em um texto parodístico
alimentado pelo próprio objeto parodiado, ou seja, uma criação bem-humorada
formatada dentro da narrativa que ri dos bitos e crenças instaurados a partir da
enunciação televisiva ao mesmo tempo em que propõe uma sutil revisão dos hábitos
culturais instaurados com a ajuda da própria TV vista como produto comercial.
Fundamentamos nossa argumentação, sob o ponto de vista teórico,
nos valendo das funções de mostração, interação e sedução identificadas na
linguagem da propaganda por Pinto (1995), para quem a função de “mostração” é o
estágio onde se constrói o referente ou universo de discurso ou mundo do qual o
texto fala; marca-se a fronteira entre os conhecimentos que se assume, os que se
compartilha com o receptor ou os que a ele se atribuem, delineando-se uma estratégia
em torno da qual constrói-se um discurso na tentativa de conquistar a instância de
recepção, como descrito nos parágrafos anteriores.
O mesmo autor ainda sinaliza que nos textos verbais a função de
“mostração” pode ser percebida em operações marcadas pelas escolhas lexicais e
pelo emprego de operadores referenciais. A caracterização dessas pessoas ou coisas
verbalmente referidas, de acordo com Pinto (1995), se restringe à apresentação das
características necessárias e suficientes para identificação delas pelo receptor, como
exemplo temos os comentários sobre a sexta-feira e a expressão TGIF, além dos
temas musicais já mencionados; por outro lado, quando a função de mostração pauta-
se por imagens todas as características aparentes das pessoas ou coisas referidas
devem ser mostradas por mais vezes, por exemplo, no episódio “Arquivo S”, a figura
121
Isponível em << http://en.wikipedia.org/wiki/Crop_circles >> Acesso em 10.03.2009
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de Nimoy no início do seguimento ou o enquadramento no “YAH!” escrito por
Homer na grama são exemplos do estágio de “mostração” com imagens.
Tanto no verbal como no imagético, as escolhas formais descritas
acima recebem o nome de operações de enunciação (operações gico-semânticas
e/ou pragmáticas que o emissor propõe que o receptor refaça para recriar o universo
de discurso em jogo no processo comunicativo). Tais operações são mediadas nas
peças audiovisuais pelo narrador-câmera que ao mostrar em close, primeiro plano,
segundo plano, plano aberto, inteiro, fracionado ou rapidamente acaba por escolher o
enfoque narrativo que deseja do enunciatário telespectador, o qual não deve ser
tomado como receptáculo passivo, mas que se amplamente teleguiado pela
orquestração estésica que o meio faz ao produzir sua enunciação.
Do estágio da função de “mostração”, o enunciador TV conduz o
enunciatário telespectador para o de interação visando estabelecer os vínculos
socioculturais necessários para dirigir-se ao seu interlocutor: interpelar e estabelecer
relações de poder com o receptor, na tentativa de cooptá-lo e de agir sobre ele ou
sobre o mundo por seu intermédio para ao final do processo tentar seduzi-lo (função
de sedução) ao distribuir os afetos positivos e negativos, cuja hegemonia reconhece
e/ou quer ser reconhecida por meio de marcas, índices, que sinalizam pessoas, coisas
e acontecimentos referidos com valores positivos ou eufóricos e negativos ou
disfóricos, e/ou ainda demonstrar uma reação afetiva favorável ou desfavorável a
eles.
No texto escrito, a função de sedução manifesta-se na escolha lexical
de vocábulos que possam ter função avaliativa ou afetiva; no texto verbal, ela
complementa-se com traços prosódicos de entoação, ritmo e intensidade com que
determinados lexemas são apresentados pelo enunciador ao enunciatário. Ao passo
que no texto composto por som e imagens em movimento as conotações são
sugeridas por meio de técnicas de manipulação dos retratados e do cenário,
enquadramento da cena pela câmera, iluminação, profundidade do foco, utilização de
recursos pós-fotográficos como o retoque, além de recursos de edição, como a
diagramação, na tentativa de seduzir o enunciatário para que este não mude de canal,
no caso da televisão.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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80
Defendemos que os discursos engendrados pelos profissionais de
mídia e que se transformam em obras midiáticas significativas acabam por moldar
socialmente ordens do discurso adjacentes, bem como a serem moldadas por elas ao
valerem-se de funções antes atribuídas apenas a produtos de marketing, preenchendo
os requisitos tanto da TV entretenimento quanto da TV empresa. Também temos em
mente que o discurso midiático influencia práticas sociais, fornecendo modelos
conversacionais interativos para a vida privada. Tais modelos são nada mais do que
frutos de simulações dessas mesmas interações e que vêm a reformulá-las em um
constante movimento de espelho.
6.1.3.1. Novo Arquivo: A Investigação
Na segunda parte do episódio “Arquivo S”, vemos Homer chegando
em casa às duas da manhã. Ele conta a Marge o que aconteceu e ela não acredita na
estória, pois ele teria bebido demais e, cientificamente falando, pessoas alcoolizadas
podem ver e/ou imaginar coisas, ter alucinações com maior freqüência. No dia
seguinte, o assunto é comentado na cozinha com a família reunida, mas novamente
Homer não tem a atenção, nem mesmo a credibilidade, que esperava.
A próxima “tomada” se passa na usina nuclear de Springfield, onde
Homer trabalha. Ao contar sua experiência da noite anterior, ele inventa o que teria
acontecido, usando sentenças sobre testes que o alienígena teria feito com ele, numa
alusão velada a cenas e textos de filmes e programas de TV, bem como depoimentos
de pessoas que teriam sido abduzidas por extraterrestres na vida real e cujos textos
são veiculados pela mídia. Entretanto, o tom humorístico maior não se encontra
nesse encadeamento e sim no uso da palavra “physical”. Aproveitando um
détournement de substituição
122
do significado de palavras com ortografia próxima:
“physical – physicist – physician”, Homer emprega “physical”, adjetivo (físico)
relativo ao corpo humano e não a denominação que se ao profissional que estuda
o universo físico, “physicist”, ou ao médico, “physician”, para estabelecer
intertextualidade associativa entre a existência de vida fora do planeta Terra, o
seriado de TV “Arquivos X”, e o suposto contato imediato do patriarca dos
122
Koch, 2007, p. 45-62.
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Simpsons, Homer. Mais uma vez o ficcional acopla-se ao factual. Consideramos Os
Simpsons como um tipo de ficcionalidade diferente da existente em Arquivos X
porque os personagens do desenho animado adquirem vida dentro do simulacro
criado pela TV, ao passo que Mulder e Scully de “Arquivos X”, assim como Sr.
Spock de Guerra nas Estrelas, são lembrados na figura humana de seus interpretes no
mundo factual, pois pessoas de carne e osso dão vida a seus discursos na telinha.
Neste momento gostaríamos de lembrar que no episódio “Arquivo S”, Leonard
Nimoy, embora não apareça caracterizado como o personagem Dr. Spock em Os
Simpsons, mesmo assim é associado à ficcionalidade devido à exposição prolongada
que teve na mídia enquanto vivia aquele personagem.
Retomando o fio condutor da narrativa de Arquivo S, após a conversa
na “sala do cafezinho” onde Homer relata aos colegas seu contato imediato com o
suposto ET, vemos, na tomada seguinte, a delegacia de Springfield ser mostrada para
assinalar ao telespectador que o discurso mudou de espaço e que “medidas cabíveis
serão tomadas pelas autoridades competentes”. Entretanto, o que observamos e
ouvimos no relato de Homer ao chefe Wiggum sobre o que aconteceu é que a
criatura que ele vira se parece com “Urkel”
123
, o personagem de maior sucesso da
sitcom Family Matters que ia ao ar na sexta à noite na rede de TV ABC. Urkel,
sexta-feira e um alien são mosaicos na composição do todo.
Urkel é comparado ao alien por Homer atualizando o conceito popular
de que pessoas tão diferentes das outras, como acontece com Urkel em relação aos
seus “conviveres” na sitcom, são taxadas como sendo de outro planeta, ou seja, ETs.
Urkel enfrentava outros tipos estranhos na briga pela audiência. Se a ABC tinha
Family Matters nas noites de sexta, a FOX exibia a série “Arquivos X”, recheada de
figuras estranhas nas noites de domingo, mas nada engraçadas, no mesmo horário e é
nessa época que “Arquivo S foi produzido e veiculado. Trata-se de associações
aparentemente inocentes, mas que fazem todo sentido dentro do texto analisado,
pois, logo após a sequência da delegacia de Springfield temos a entrada no episódio
de “Mulder” e “Scully”, personagens principais de “Arquivos X”, exatamente como
o fazem nos episódios da série, ou seja, apresenta-se primeiro o fato, depois os dois
123
Steve Urkel é um nerd típico, com óculos grandes e grossos, calça de cintura bem alta,
suspensórios, cardigans multicoloridos, voz aguda e risada nasalada. Do mesmo modo que é altamente
inteligente, também é desastrado e socialmente desajeitado. Seu bordão na série “Family Matters” é
“Eu fiz aquilo?
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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82
protagonistas tomam conhecimento dele por meio de um veículo de comunicação e a
partir daí a fictícia investigação desenrola-se. No entanto, no episódio “Arquivo S”
um dado a mais: a ligação intertextual com o edifício real do FBI pela tomada em
close do prédio, assim como foi feito com o da delegacia de Springfield.
A identificação da série de Mulder e Scully vem não pela
“tomada”, mas também pelos caracteres impressos na tela e novamente pela música
tema de “Arquivos X”, além do close no quadro com a foto caricatural de J. Edgar
Hoover, chefe do FBI de 1924 a 1972. No quadro, Hoover aparece usando vestido
para dar o tom humorístico da paródia, reduzindo a seriedade da instituição,
subvertendo a imagem de seu chefe nacional, que numa foto real apareceria de terno
e gravata com semblante sério por ser esta a imagem de credibilidade atribuída a
homens de grande poder na cultura americana.
Também vemos que a parede ao redor da foto está toda coberta por
desenhos e reportagens a respeito de alienígenas e/ou fatos estranhos assim como
aparece no seriado “Arquivos X”. Scully está usando o computador quando Mulder
lhe apresenta um exemplar do “Springfield Shopper”, no qual, na primeira página
temos o rosto de Homer estampado ao lado da manchete “Balão Humano Disco
Voador” (Human Blimp Sees Flying Saucer).
Mulder convence Scully que eles devem viajar até Springfield para
investigar o caso, embora ela o lembre de que outro fato mais importante
124
que
deveria ser resolvido por eles. O discurso nas entrelinhas alude ao fato de que nem
sempre as autoridades competentes privilegiam o que é de interesse público e sim o
que é de interesse pessoal. Nesse movimento, entendemos haver uma crítica às
autoridades federais, manifestada em forma de subversão da ordem oficial, pois não
são Mulder e Scully que escolhem o caso que desejam investigar. Seguindo a ordem
oficial, eles receberiam um dossiê de seus superiores, ou apresentariam a eles um
caso que mereceria uma investigação e após anuência da chefia iriam a campo. A
124
MULDER - Look at this Scully. (He shows her the Springfield Shopper newspaper, with headline:
"Human Blimp Sees Flying Saucer" and a picture of Homer) There's been another unsubstantiated
UFO sighting in the heartland of America. We've got to get there right away.
SCULLY - Well, gee Mulder. There's also this report of a shipment of drugs and illegal weapons
coming into New Jersey tonight.
MULDER - I hardly think the FBI is concerned with matters like that.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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83
veridicção omite a etapa de hierarquia de poder dentro do FBI, mas isso não
enfraquece o contrato fiduciário porque o telespectador está totalmente fagocitado
pela veracidade impressa pelo seriado Arquivos X que acredita ser mesmo possível
que os agentes escolham os casos que querem elucidar. Descendo ainda mais fundo,
sob o ponto de vista cultural, a instituição FBI constantemente é apresentada em
várias outras peças midiáticas como tendo poderes acima da lei, o que contribui para
firmar a fidúcia entre enunciador/TV e enunciatário/telespectador sem quebra de
interesse.
Voltando ao enunciado de Arquivo S, verificamos que a partir da
entrada dos agentes federais Mulder e Scully na narrativa, o texto parodístico
desenvolve seu tom humorístico focando-se em críticas aos procedimentos
investigativos usados pelo FBI e retratados em Arquivo X para construir o tom de
veracidade da série. Esferas discursivas do mundo fatual e mundo ficcional se
fundem em intertextos ao longo da narrativa, resultando em associações inéditas e
hilárias como, por exemplo, a frase sobre o FBI na fachada do escritório de
Springfield: “Invadindo sua privacidade 60 anos”, ou quando os suspeitos são
apresentados para reconhecimento na delegacia e vemos que eles são Marvin - o
Marciano (personagem do desenho animado “Show do Pernalonga”), Robocop
(personagem de filme e série de TV com o mesmo nome), Chewbacca (personagem
do filme Guerra nas Estrelas), Alf (personagem principal da sitcom Alf, o ETeimoso)
e Kang ou Kodos (os aliens de Os Simpsons).
A semiose intertextual não pára por aí. Na seqüência seguinte, Homer
está olhando para o “Canceroso”, personagem enigmático de “Arquivos X”,
enquanto Scully tenta usar a máquina da verdade em Homer. Esse é outro
procedimento frequente na série televisiva onde Mulder e Scully são os
protagonistas. Eles a usam para terem acesso irrestrito à verdade. Também é
procedimento muito recorrente em filmes policiais americanos, sendo parte do
universo narrativo do gênero policial.
Em tempo, não podemos nos esquecer da intertextualidade construída
entre o Bar do Moe (diversão); o provérbio “Só trabalho e nenhuma diversão
transforma o homem em um chato.” ("ALL WORK AND NO PLAY MAKES JACK A
DULL BOY") escrito dezesseis vezes, preenchendo toda a tela, precedido do horário
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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84
e da temperatura ambiente lembrando a interface do seriado “Arquivos X”. Também
é relevante lembrar a sequência em que Homer, mentindo na reconstituição da cena
do encontro imediato diz que discutia Wittgenstein e jogava gamão com Barney
pouco antes de ver o suposto ET. O sentido produzido dentro do discurso de Homer
pretende remeter o telespectador ao da elite se divertindo (clube de cavalheiros,
filosofia, gamão), para logo depois ser corrigido pelo próprio gorducho após
repreensão de Scully, sendo assim, o chefe da família Simpson inventa que estava no
carro de Barney, comendo pacotes de mostarda.
A ponte intertextual entre Os Simpsons e procedimentos usados em
“Arquivos X” se reforça ainda mais quando Mulder e Scully acompanham Homer de
volta à floresta de Springfield à luz do dia, para reconstituição do contato imediato.
Em meio à uma entrada do vovô Simpson tentando reaver sua dentadura, Mulder
menciona um dos episódios de “Arquivos Xpara mensurar seu descontentamento
com os rumos que esta investigação tomou. Em um determinado momento, Mulder
inicia um monólogo rico em sentenças que seu personagem diz em “Arquivos X”
125
e finaliza-o, depois de horas, com o bordão da série: “The Truth ... is out there!” (A
verdade está fora!”). Reconhecemos aqui um exemplo de intertextualidade
explícita, na qual o personagem reproduz, com pouca ou quase nenhuma variação, o
discurso que encena no seriado a que pertence para em seguida sofrer a ironia da
paródia ao vermos Moe e dois caras de seu bar passarem carregando uma baleia.
Poderíamos abstrair dessa ligação hilária que as afirmações de Mulder se tornam tão
sérias que precisam ser minimizadas pelo absurdo do carnaval, o fora de lugar,
levando ao riso libertador da situação oficial como descreve Bakhtin.
Mas, voltemos ao lar dos Simpsons. Depois do descrédito da família e
principalmente de sua esposa, Homer está desolado. Bart resolve ajudá-lo a provar
que sua estória é real. No diálogo entre pai e filho percebemos intertextualidade
explícita com o canal FOX
126
onde tanto “Arquivos X” quanto “Os Simpsons” são
125
MULDER - Yeah okay. But somewhere out there, something is watching us. There are alien forces
acting in ways we can't perceive. (Scully rolls her eyes, and leaves) Are we alone in the universe?
Impossible. When you consider the wonders that exist all around us. (hours later) Voodoo priests of
Haiti, Tibetan Numerologists of Appalachia. The unsolved mysteries of...unsolved mysteries. The
truth...is out there!
126
HOMER - That's my boy. If you believe in me, then I'm not going to give up. I'll prove I'm right.
This Friday we're going back to the woods and we're going to find that alien!
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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veiculados. Gostaríamos de lembrar que esse mesmo recurso é usado no episódio
“Guerra de Imprensa” (15
ª Temporada), no diálogo de Sr. Burns com Smithers
127
quando estes falam de Rupert Murdoch, atual dono da FOX entre outras empresas de
seu império de media.
Selado o acordo entre Bart e Homer, vemos nova intertextualidade na
tela: o comercial da cerveja Budweisser, um dos patrocinadores de Os Simpsons, é
transposto para dentro da narrativa do episódio como parte dele
128
. Novamente
factual e ficcional se unem para criar efeito de realidade no simulacro construindo o
contrato comunicacional, que cresce quando instantes depois, enquanto Homer e Bart
estão na floresta de Springfield, o suposto ET aparece ao som da música tema de
“Arquivos X”. Ao vê-lo, Homer se atrapalha, o espanta e somos surpreendidos pela
fala de Bart dizendo que conseguiu filmar a criatura com a câmera de Flanders.
Nesse instante, o contínuo da narrativa é interrompido. A “realidade”
volta a seu status de ficção com o livro de estórias do começo da narrativa sendo
fechado por Nimoy, para a seguir ser reativada quando um adolescente, membro da
fictícia produção do programa apresentado por Nimoy, aparece em cena. O
telespectador é novamente conduzido a sua condição de observador. A introdução de
uma seqüência “desmistificadora”, ou seja, isso não passa de um programa de TV,
reforça a síntese realidade/não-realidade para o público telespectador, enquanto o
BART - What if we don't?
HOMER - We'll fake it and sell it to the Fox network.
BART - (chuckling) They'll buy anything.
HOMER - Now son, they do a lot of quality programming too. (Pause, then they both laugh hard) I
kill me.
127
MR. BURNS - “Well, I guess it’s impossible to control all the media. Unless, of course, you’re
Ruppert Murdoch, who is one beautiful man.”
SMITHERS - “I couldn’t agree more.” (There’s a pause with both looking to the audience.)
128
At the woods, Homer and Bart camp out. Frogs sit on lily pads in a pond.
FROG 1 - Bud...
FROG 2 - ...weis...
FROG 3 - ...er!
FROG 1 - Bud...
FROG 2 - ...weis...
FROG 3 - ...er!
And alligator surfaces and eats the frogs.
ALLIGATOR - Coors!
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lembra, por meio da fala do adolescente da produção, que ainda faltam dez minutos
para acabar o programa que Nimoy apresenta
129
.
6.1.3.2 – Outro arquivo: a hipervisibilidade
O que melhor caracteriza o contrato comunicacional de
nosso tempo é a maior entronização das
mídias[...](LOPES, 2004)
Nesta seção de nossa pesquisa nos serviremos em grande parte do
referencial teórico fornecido por Duarte (2007) no que tange à classificação dos
gêneros televisivos enquanto estratégias de comunicabilidade para apontarmos e
discutirmos brevemente as esferas discursivas que se manifestam no enunciado do
terceiro seguimento de “Arquivo S”, buscando apreender e entender como a
intertextualidade é usada para produzir sentido no gênero desenho animado de núcleo
familiar a partir do texto parodístico.
Em concomitância com a autora citada no parágrafo anterior, ao longo
de nossa argumentação tentaremos deixar mais claro que o mundo exterior não se
configura mais como a única fonte a partir da qual a televisão propõe “realidades” e
as alimenta. O meio vem desenvolvendo seus próprios recursos de acesso ao real, e
sobre os quais também constrói realidades de ordens diversas.
Dentro dos elementos determinantes na constituição dos gêneros
televisivos, Duarte (2007) aponta três tipos de realidade que hoje os compõem: a
meta-realidade, a supra-realidade e a para-realidade. Interessa-nos em particular o
conceito de para-realidade por entendermos que este se aplica ao movimento
discursivo que é tecido ao longo de todo enunciado de “Arquivo S”, mas que parece
atingir seu auge de produção de sentido principalmente no terceiro bloco do texto
parodístico.
129
[...] and we dissolve back into the storybook. Leonard Nimoy closes the book.
NIMOY - And so, from this simple man came the truth, that we are not alone in the universe. I'm
Leonard Nimoy, good night.
TEENAGER - (from off-screen) Uh Mr. Nimoy, we have ten minutes left.
NIMOY -
Oh, fine. Let me, uh, just get, uh...something out of my car. (runs off and car is heard driving away)
TEENAGER - (walking into camera shot) I don't think he's coming back.
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A para-realidade, segundo Duarte (2007), se caracteriza por não ter
como referência o mundo exterior, mas um mundo paralelo, o da própria televisão,
no caso de Os Simpsons. Nesse universo, os acontecimentos são artificialmente
construídos dentro do próprio meio, tendo por base acontecimentos provocados e
controlados pela própria televisão. Seu propósito é o de re-apresentação, o que
entendemos ocorrer com o texto parodístico; no entanto, no caso do enunciado em
questão, a paródia re-apresenta enunciados da própria televisão, em sua maioria
ficcionais, por meio de intertextualidades, para chegar ao gênero simulacional, que
opera com a para-realidade, propondo como regime de crença a hipervisibilização
como equivalência do conhecimento pleno.
A instância da enunciação do episódio propõe que a reunião entre
diversos seriados de ficção científica da TV americana possa ser integrada ao
universo de Os Simpsons para explicar os acontecimento e que vê-los dentro da
narrativa seria o suficiente para entender o contrato comunicacional proposto,
como se o universo parodístico de Os Simpsons fosse o suficiente para o
telespectador ter conhecimento da crítica contida em seu enunciado, pois aquele
teria pleno entendimento de todos os referenciais discursivo-culturais sobre os quais
se constrói o novo texto desse.
Dentro da enunciação de Os Simpsons vemos aflorar um universo
paralelo ao real, já que se acham representadas todas as esferas discursivas presentes
em nosso cotidiano por meio de personagens e lugares. Springfield tem prefeitura,
delegacia, igreja, escola, usina nuclear, rádio, jornal, televisão, museu, parques,
aeroporto, porto, trem, metrô, mercado, lojas, shopping center ... Mas em “Arquivos
S” o que mais transparece é a própria TV de Springfield em interdiscursividade com
a TV do mundo factual e seus diversos gêneros e formatos.
O terceiro bloco do episódio “Arquivo S” é aberto com Brockman,
âncora do telejornal fictício de Springfield: “Eye Witness News” (Notícias da
Testemunha Ocular), apresentando a edição do dia, assistida por Homer. No texto
lido e comentado pelo telejornalista percebemos que a passagem da sessão de
notícias é feita de um fato quase impossível: um homem acorda do coma de 23 anos,
pergunta pelo programa de TV apresentado por pessoas reais do showbiz americano,
Sonny e Cher, e morre em seguida, ao saber por Brockman que eles não estão mais
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na TV. A chamada subsequente feita por Brockman serve-se de intertextualidade
com obras do cinema (ET com a fala ET phones Homer e Contatos Imediatos do
Terceiro Grau com o trocadilho Third Encounters of the Blurred Kind) para chamar
atenção sobre a notícia a respeito do fato envolvendo Homer e o ET. Em seguida
temos o tempo dos acontecimentos resgatados pelo vocábulo sexta-feira. O humor
dessa rápida sequência de cena encerra-se por conta da conhecida incompatibilidade
de Brockman com seu operador de microfone.
Quando a fala do âncora do telejornal de Springfield termina, Bart e
Lisa trocam uma fala cada, tendo como plano de conteúdo a máxima popular de que
“é verdade porque eu vi na TV”
130
. Os vizinhos, amigos e outras pessoas da
sociedade de Springfield aparecem à porta de Homer para perguntar sobre o ET e na
construção do ambiente recortado pelo olhar de seus produtores como se fosse a lente
do narrador-câmera, vemos que boa parte da população de Springfiled está na igreja,
ouvindo o sermão do reverendo Love-joy, o qual tenta ligar intertextualmente o fato
da aparição do suposto ET a Jesus Cristo
131
, mas cujo discurso serve de escada para o
humor quando o sacerdote alude ao personagem ET do filme de Spielberg.
Em corte seco, vemos aparecer na tela a referência temporal nos
moldes de “Arquivos S”. Descobrimos ser sexta feira à noite em Springfield. A
tomada seguinte recai sobre um enquadramento da banda infantil de Springfield a
tocar o tema de Contatos Imediatos do Terceiro Grau. A partir de então, em tomadas
rápidas, percebemos que praticamente toda a população da cidade está reunida na
floresta de Springfield, para registrar um novo aparecimento do suposto ET de
Homer a qualquer momento. Inclusive Leonard Nimoy aparece para ver o alienígena.
A narrativa aqui se preocupa em produzir sentido utilizando signos
ligados às típicas comemorações e reuniões americanas: a venda de camisetas com
frases sobre Homer, a venda de comida (cachorro-quente), a presença de Nimoy
130
BART - Well, Lis. What do you think about the alien now?
LISA - I think there must be a more logical explanation. And I think the people of this town aren't
going to be won over by three seconds of videotape.
131
REVEREND LOVEJOY - I remember another gentle visitor from the heavens, he came in peace,
and then died. Only to come back to life. His name was... E.T.: The Extraterrestrial. I loved that
little guy.
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(uma pessoa famosa) e a banda infantil de Springfield para mostrar que o fato virou
um espetáculo comercial, uma forma de ganhar dinheiro.
Armado, mostrado e fidelizado todo o circo espetacular, o suposto ET,
visto por Homer e filmado por Bart, surge e quem percebe não se tratar de um alien e
sim do Sr. Burns é Lisa Simpson, personificação do logos na rie Os Simpsons.
Smither, secretário particular de Burns apressa-se em dar esclarecimentos sobre a
aparência e atuação do patrão
132
. A quebra do clímax vem na fala do Dr. Nick
(“Time for a booster! (jabs in a needle)” ) que “droga” Burns e ele começa a cantar.
Nimoy o acompanha. Eles entoam um dos temas do musical HAIR
133
: “Good
Morning Starshine”. A ligação intertextual associa o capitalismo personificado na
figura do Sr. Burns aos horrores da guerra, das drogas e a contracultura do
movimento hippie do final da década de 60.
“Good Morning Starshine” e o espírito de “Hair” contagiam a todos.
Instaura-se o clima de “Paz e Amor” apregoado pelo movimento hippie e Marge
declara estar orgulhosa de Homer porque ele cumpriu o prometido: trazer paz e amor
para sua família. O riso novamente aflora quando vemos Mulder, Scully e, em
seguida, Chewbacca (personagem de Guerra nas Estrelas) abraçados e cantando.
Percebemos a sitcom, ou domesticom como prefere Gray (2006), fechando sua
narrativa.
132
LISA - Wait! You want an alien? This is your alien!
Lisa shines her torch on it, and it is revealed to be Mr. Burns.
BURNS - Hello, children. I bring you love.
WILLY - It's a monster! Kill it! Kill it!
SMITHERS - It's not a monster, it's Mr. Burns.
WILLY - Aw, it's Mr. Burns. Kill it! Kill it!
SMITHERS - No, let me explain. Every Friday evening after work Mr. Burns undergoes a series of
medical treatments designed to cheat death for another week. (Burns is on a conveyor belt) First
Mr. Burns' chiropractors perform a slight spinal adjustment. Then a team of doctors administer his
eye drops, pain killers, and a vocal cord straightening.
DR. NICK - Don't worry, you won't feel a thing. (Holds up huge instrument) Till I jam this down
your throat!
SMITHERS - The whole ordeal leaves Mr. Burns twisted and disoriented.
(Burns wanders into the woods dazed and confused)
133
Musical de rock produzido na Broadway em 1968 e que virou filme em 1979. O enredo gira em
torno da amizade, a guerra EUA-Vietnam, o movimento hippie e as drogas. (Wikipedia) Estava em
cartaz em 1996 em Chicago.
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Ao final da música Good Morning Starshine, todos estão de mãos
dadas e as levantam em sinal de união; o sol nasce e o quadro é transformado em
ilustração de livro de conto de fadas novamente, reforçando a lembrança de que tudo
o que foi apresentado no episódio não passa de para-realidade de base ficcional,
reforçada na forma da última fala, atribuída novamente à produção por meio de sua
personificação naquele adolescente do final do segundo seguimento e que agora
aparece fechando o livro de estórias e dizendo: “E nosso conto termina assim. Eu sou
Leonard Nimoy. Boa noite, e continuem vigiando os esquis. Uh, os céus.” Ouve-se o
tema musical de “Arquivos X”, o pavão estilizado aparece por trás do adolescente
como no começo do episódio quando aparecera por trás de Nimoy; as velas se
apagam e a expressão do adolescente é de apreensão (olhos vão da direita para a
esquerda e param completamente voltados para a esquerda, o corpo levemente
voltado para este lado também), preparando-se para fugir de cena a qualquer
momento.
O tema musical de “Arquivos X” prossegue com os créditos na tela
por dez segundos, quando a música tema de Os Simpsons irrompe e se mantém até o
final da passagem de caracteres.
Vale a pena ater-se aos elementos escolhidos para fala de
encerramento (livro de estórias e conto) e seu encadeamento no enunciado, pois eles
remetem seguramente o leitor ao ficcional, ao passo que o détournement de tipo
lúdico com substituição de fonema (skis por skys) instaura a atmosfera de
relaxamento ativada pelo riso, mais uma vez assegurando a volta relaxante do
telespectador ao real.
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6.1.4. Associações nem Sempre tão Inocentes
[...] um texto (enunciado) não existe nem pode ser
avaliado e/ou compreendido isoladamente: ele está
sempre em diálogo com outros textos. (BAKHTIN
apud KOCH, 2007 : 09)
[...] qualquer texto se constrói como um mosaico de
citações e é a absorção e transformação de um outro
texto. (KRISTEVA apud KOCH, 2007 : 14)
Ao apontar e aventar não como os processos de construção
enunciativa são engendrados dentro do texto parodístico de Os Simpsons, mas
também qual seria a possível mensagem crítico-discursiva envolta pela
interdiscursividade entre o seriado de TV “X Files” ou “Arquivos X” com o episódio
“Arquivo S”, percebemos que a produção de sentido se configura a partir de
declarações e disposições organizacionais oriundas do senso comum veiculadas pelo
próprio enunciador TV em diversos formatos e gêneros de sua programação.
Com nossas lupas de pesquisadores percebemo-nos debruçados sobre
um objeto de pesquisa cujos meandros delineiam o o mundo cio-cultural e
natural que nos envolve, mas também os meios de comunicação que usamos como
extensão de nós mesmos na atualização de sentido para nossas admiráveis
imperfeições como seres humanos. É a comunicação retro-alimentando-se e sendo
alimentada por ela mesma em efeito de espelho oracular infinito. Temos plena
consciência de que não esgotamos a análise de nosso corpus, ficando para
oportunidade futura a sua retomada e ampliação, seja de nossa parte, seja de outros,
por acreditarmos que cabe o aos estudiosos da Comunicação, mas também a
outros pesquisadores de áreas tão importantes quanto essa entender a trama que
sustenta com tamanha força a linguagem e seu mecanismo de disfarce da
subjetividade na composição do mundo que carregamos tanto em nossa cabeça
quanto o que nos envolve.
Por meio do levantamento de falas e da escolha vocabular dentro do
script de “Arquivo S”, procuramos tecer a observação da construção intertextual da
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narrativa com a grade de programação da própria TV no que tange a seriados de
ficção científica (Arquivos X e Jornada nas Estrelas), personagens de outras sitcoms
(Urkel e Alf), personagens de desenho animado (Marvin, o marciano do show do
Pernalonga), personagens de ficção científica do cinema e da TV (ET, Contatos
Imediatos de Terceiro Grau e Guerra nas Estrelas) e um clássico da Broadway (Hair)
por entender que esses elementos são introduzidos no texto para construir-lhe o
sentido. Personagens fictícios que foram inculcados pelo próprio meio televisivo
no imaginário de seu público, tornam-se imagens simples e de assimilação mais
rápida para dar o tempo do humor. O elemento surpresa leva ao riso pela subversão
da ordem reinante. Um riso que liberta da opressão dos fatos da situação oficial,
séria: um perigo desconhecido que nos ameaça e que pode ser verdadeiro, até que a
razão (ciência) prove o contrário.
Ao final de nossa análise do episódio “Arquivo S” esperamos ter
demonstrado que o discurso parodístico fecha-se, no plano do conteúdo, sobre o tema
do controle do outro pelo medo do desconhecido, ao mesmo tempo em que zomba do
conteúdo da TV americana em noites de sexta-feira; da crença de que vida em
outros planetas; de que a mídia, ao transformar tudo em espetáculo, reforça o
capitalismo, produzindo a partir de um pequeno fato noticiado todo um circo
mercantil de lucro; e ao final, juntando as peças do quebra-cabeças, apreender que a
rede de TV FOX está sendo exaltada como a melhor na programação de sexta-feira à
noite por meio da intertextualidade estabelecida entre “Arquivos X” e “Os
Simpsons” em tom de humor.
Acreditamos que sobre a intertextualidade foi possível apontar no
enunciado índices de ligações discursivas, embasadas tanto no entendimento social
quanto cultural do processo comunicativo, atrelados à ordem do discurso da mídia, o
qual se ocupa em reformular a tensão entre suas contraditórias fontes públicas e
alvos, ou metas, privadas. De um lado coloca-se a “política” da emissora para a qual
se trabalha e de outro os alvos particulares que se deseja parodiar com vistas a uma
possível mudança, ou nesse caso, demonstrar o sucesso de duas séries da FOX,
fazendo com que uma interagisse com a outra.
Entendemos também que os discursos engendrados pelos profissionais
de mídia e que se transformam em obras midiáticas significativas, como é o caso de
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Os Simpsons, que acumula 20 temporadas no ar, acabam por moldar socialmente
ordens do discurso adjacentes, bem como a serem moldadas por elas. Também temos
em mente que o discurso midiático influencia práticas sociais, fornecendo modelos
conversacionais interativos para a vida privada. Tais modelos configuram-se em
frutos de diversas simulações dessas mesmas interações e que vem a reformulá-las
em um constante movimento de espelho.
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6.2. TRINTA MINUTOS SOBRE TÓQUIO (Thirty Minutes Over
Tokyo - 1998/99)
(...) a câmera, a aparelhagem, a máquina, substitui
o sujeito da enunciação, da mesma forma que o
imediatismo da visão desloca o sujeito da recepção.
(JAMESON, 1995 : 136)
Pelas lentes do narrador câmera somos conduzidos para dentro da
narrativa audiovisual, porém, não há, na verdade, câmera em um desenho animado.
Em Os Simpsons nossa enunciação audio-visual é conduzida pelos olhos dos
enunciadores que compõem a peça midiática ao desenharem as sequências de
quadros e cenas. O ethos instaura-se a partir do que os desenvolvedores escolhem
como pertinente para nossa leitura. Sendo assim, somos convidados a transver fatos
do cotidiano por meio de simulacros de situações que beiram o possível e outras
totalmente impossíveis, um misto de narrativa fantástica, factual e ficcional que o
gênero desenho animado, apoiado no formato sitcom permite que seja concretizada.
As pontes intertextuais propostas pela instância da enunciação para a
produção de sentido acionam mecanismos de leitura intertextual ora do factual, ora
do imaginário habitado por mitos, ora da simulação para conduzir o enunciatário
telespectador ao entretenimento, sem perder de vista a expressão de valores e crenças
que constroem a história americana, assim como deixam transparecer a visão de
mundo dos autores da peça midiática.
Ao produzir o episódio Trinta minutos sobre Tóquio (1998/99) os
desenvolvedores de Os Simpsons nos oferecem sua leitura de como a tecnologia
estava presente nas vidas dos cidadãos americanos no final da década de 1990. Por
exemplo, ao iniciar-se a vinheta de abertura, vemos que Bart escreveu na lousa: Eu
estou muitíssimo cansado. Mas do que estaria cansado?
A cena do sofá, que é a próxima, traz a família toda para a sala de
estar e ao se sentarem para assistir TV são engolidos pelo móvel e devolvidos como
uma foto cortada em tiras verticais, simulando a ação de um inutilizador de papéis
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usado em escritórios. A enunciação da cena se faz sobre o vocábulo descartável,
caráter que a maioria dos produtos adquire ante os avanços tecnológicos. Na busca
pelo moderno nos desfazemos do anterior e tomamos conhecimento da novidade,
principalmente, pelas imagens da TV.
A abertura da narrativa desse episódio é feita com um close da capa de
um exemplar da revista Wired, na qual o modelo lembra Bill Gates. A manchete diz:
Shorts Cibernéticos, Virtualmente A Prova De Puxões. Tanto o nome da revista
como a ilustração escolhida para a capa e o produto anunciado tem produção de
sentido pela intertextualidade com o mundo factual, no qual a revista Wired
134
,
periódico mensal que traz todas as informações mais recentes sobre tecnologia e
discute sua influência na Cultura, política e economia, é referência de credibilidade,
assim como Bill Gates é considerado um ícone da informática. O toque de humor
fica por conta dos shorts cibernéticos.
Lisa está lendo Wired atentamente quando Homer se aproxima e toma
a revista das mãos da menina pensando se tratar da Weird
135
, produzindo para o
enunciatário telespectador o reforço de que o gorducho se interessa por diversão e
a filha por assuntos mais elaborados, nesse caso avanços tecnológicos.
A pequena Lisa avisa ao pai que um cybercafé foi inaugurado em
Springfield e pede para que ele vá com ela até o local, onde poderá ensinar-lhe como
pedir pizza pela internet. Bart entra na sala e diz saber de um site muito legal onde
macacos pedem pizza; a garota fica irritada com Bart e esclarece que a internet é
mais do que uma rede de pornografia global, ela funciona como ... A menina não
conclui porque Homer e Bart já estão do lado de fora esperando por ela no carro.
No The Java Server vários personagens estão usando a internet para
diferentes propósitos. Homer usa dois computadores ao mesmo tempo e Lisa
exclama que ele parece um profissional.
136
Ao que Homer responde ter apostado um
134
Wired é uma revista americana mensal, que está disponível tanto em sua versão em papel quanto
on-line. Publicada desde março de 1993, a revista conta como a tecnologia afeta a cultura, a economia
e a política. A linha editorial da revista originalmente foi inspirada nas idéias do canadense Marshal
McLuhan, teórico de media. A revista também é famosa por seus neologismo para descrever
situações.
135
Revista de filmes de horror parodiando filmes clássicos de suspense e terror, algo equivalente ao
“terrir” no Brasil e aos filmes de terror com produção “caseira”.
136
Wow, Dad, you surf like a pro!
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Jai-lai nas Ilhas Cayman e investido em algo chamado News Corp
137
. Lisa esclarece
que o algo é a FOX e Homer apressa-se em desfazer a transação; em seguida a garota
pede que o pai consulte quanto eles têm no banco; quando os dois estão satisfeitos
porque está tudo bem com a poupança dos Simpsons, o mau caráter Snake entra no
cybercafé e rouba todas as economias da família fazendo um download da tela de
Homer.
Ao saber do acontecido por Homer, Marge diz que o dinheiro era para
as férias da família e que agora terão que começar tudo novamente. Homer promete
arrumar um segundo emprego para repor as economias. Em seguida vemos o
gorducho em trajes de larápio entrar na casa dos Flanders e roubar alguns objetos.
Ao chegar à cozinha se depara com Ned, o dono da casa, sentado à mesa, tomando
um copo de leite. O vizinho conversa com Homer e orienta-o como ele e a família
poderiam viver melhor se fizessem como os Flanders, que aprenderam na igreja,
durante um seminário do palestrante Chuck Garabedian, como ter o estilo de vida de
Burt Reynolds, famoso ator de Hollywood, com um orçamento de Matt Davis,
comediante não tão famoso na época. O chefe dos Simpson se interessa e ganha de
Ned ingressos para o Seminário Mega Economias.
No evento Os Simpsons aprendem que a aparência é mais importante
do que a qualidade da mercadoria, que se pode comprar um yatch por um bom preço
porque ele cheira a xixi de gato ou ter um smoking a preço de banana porque ele
pertenceu a um defunto. O lema de Garabedian é exprema cada centavo, ao que
Homer e Marge aderem. Também estão presentes ao evento Mr. Burns, Smithers e
Uncle Pennybags
138
, o qual pega um carro do jogo Monopólio e sai de cena dizendo
estar atrasado para um jogo.
Após a palestra a família vai fazer compras, passa por uma loja de 99
centavos, porém Marge diz que vai guardar aquela para as compras do casamento de
Lisa; eles passam então procuram por uma de 66 centavos, mas também não param;
por fim eles estacionam em uma de 33 centavos, na qual um caminhão faz a entrega
de mercadorias despejando-as pelo teto. A família é mostrada fazendo compras de
itens que na realidade não são necessários, tais como: latas de plâncton com validade
vencida e vários vestidos idênticos para Marge. nessa passagem intertextualidade
137
Conglomerado de media pertencente a Rupert Murdoch.
138
Personagem do jogo Monopólio, que simula situações de investimento.
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explícita com a crença consumista da Cultura americana, na qual ter mais significa
mais poder.
De volta à casa dos Simpson, percebemos que algum tempo já se
passou, pois todos estão ao redor da mesa da cozinha ansiosos pela abertura do cofre
de porquinho para ver quanto conseguiram economizar. O objeto tem
intertextualidade com Uncle Pennybags,pois usa uma cartola e um nonóculo
lembrando o estilo do personagem. Homer destrói o cofrinho com uma martela sob
protestos de Marge e todos descobrem que o dinheiro não é suficiente para as férias
da família. A senhora Simpson então pega um livreto de bolso de Garabedian e a
parte em que ele diz ser possível voar por preços mega baratos desde que você não se
importe para onde vai. Imediatamente, Chuck Garabedian aparece na janela da
cozinha da casa e esclarece que você apenas precisa ir ao aeroporto e esperar que
algum passageiro não apareça, para comprar sua passagem por um décimo do preço.
Todos vão para o aeroporto e torcem por seus destinos preferidos, mas
o que a família consegue são passagens para o Japão, isso depois de disputarem-nas
com os Flanders. Homer não está muito feliz com o que conseguiram e Marge tenta
consolá-lo dizendo que se ele gostou do filme Rashomon
139
, vai gostar do Japão.
Durante o vôo a inserção de ligações intertextuais de narrativa fantástica, ou seja,
situações apresentadas como absurdas mas que nos fazem pensar que poderiam
acontecer, como por exemplo estarem rodando um filme durante a viagem.
Ao sobrevoarem Tóquio o comandante informa que estão chegando ao
Japão, como é de praxe na aviação civil ele informa a hora local, porém dizendo que
é amanhã e não a hora exata.
no hotel, a enunciação do episódio apresenta o tradicional e o novo
convivendo em um mesmo quarto de hotel, pois ao mesmo tempo em que as portas
são de papel e bambu, um vaso sanitário eletrônico no banheiro, uma TV de
plasma e um sistema de monitoramento por câmeras no apartamento. Homer
encanta-se com o vaso sanitário e prepara-se para usá-lo, ao mesmo tempo, os outros
membros da família vão para a frente da TV e não tem uma experiência muito
agradável.
139
Clássico do cinema japonês, dirigido por Akira Kurosawa na década de 1950.
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Na próxima tomada vemos Lisa encantar-se com a vista e mencionar
dois pontos turísticos culturais de Tóquio e a fábrica da Hello Kitty, de onde se ouve
miados de gato e logo em seguida as chaminés expelem uma fumaça densa e escura,
o barulho para, sugerindo que os produtos são feitos com gatos mortos. A garota
volta-se para o quarto e conversa com Bart que está assistindo desenho animado
japonês na TV. O garoto pergunta a irmã se não é esse programa que causa
convulsões nos telespectadores e em seguida todos os membros da família que se
aproximam da TV começam a tê-las. A família volta ao normal assim que os
comerciais entram no ar.
Neste ponto identificamos outra ligação intertextual explícita com o
mundo factual, pois na época divulgou-se amplamente que o desenho animado
japonês da série Pokemon possuía sequência de quadros em flashes que causava
convulsões cerebrais em telespectadores infantis
140
.
No desenrolar da narrativa, a partir desse ponto, vemos a influência da
Cultura americana no Japão, bem como da tecnologia na vida cotidiana das pessoas.
Por meio de um restaurante onde o garçom fala inglês e diz que é produto do sistema
educacional americano, por isso não sabe nada, e que produz tanto carros de
qualidade inferior quanto produtos eletrônicos
141
; a compra de uma melancia
quadrada por Homer; um encontro fortuito com Woody Allen gravando um comercial
de bolinho de arroz; Homer assistindo uma luta de sumo enquanto come um pretzel
que comprara por $ 50 e que se presta nesse quadro a promover mais um choque
cultural entre Japão e Estados Unidos, vemos que as pontes intertextuais construídas
conduzem a enunciação para a crítica a um cotidiano cercado de equipamentos
eletrônicos, mas carente de entendimento cultural de ambas as partes, tanto que, por
agredirem fisicamente o imperador japonês durante a luta de sumo que assistiam
Homer e Bart vão parar na cadeia.
140
<http://veja.abril.uol.com.br/120599/p_141.html >>
141
Waiter: Howdy gangstas! I'm average American Joe Salaryman waiter.
Bart: These prices suck! 10,000 yen for coleslaw?
Lisa: Don't you serve anything that's even remotely Japanese?
Waiter: Don't ask me; I don't know anything! I'm product of American education system. I also
build poor-quality cars and inferior-style electronics.
Homer: [cackles] Oh, they got our number!
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Para libertá-los, Marge e Lisa usam quase todo o dinheiro que lhes
resta, pagando a fiança dos dois arruaceiros que agora estão mais habituados aos
costumes japoneses e até aprenderam a língua. Lisa reclama que eles não fizeram
nada tipicamente japonês ainda, Homer e Bart reclamam que eles viram o
suficiente da cultura japonesa, pois na prisão tiveram que encenar Kabuchi,
entretanto Homer se dispõe a mostrar algo japonês para Lisa produzindo um origami
para ela com a última nota de um milhão de yens que a família possui. A dobradura é
levada pelo vento e Os Simpsons ficam sem dinheiro para voltar para casa.
Diante da situação, eles vão procurar a embaixada dos Estados Unidos
no Japão, na qual o embaixador aconselha-os a arrumar um emprego. A família então
vai trabalhar limpando peixe em uma grande indústria de pescados, Osaka Seafood
Concern. Durante o trabalho aparelhos de TV ligados o tempo todo, por meio dos
quais se transmitem instruções para o trabalho. Homer agarra uma enguia e a usa
para mudar de canal. A transmissão mostra um game show japonês no qual se pode
realizar o desejo de uma família e Os Simpsons decidem participar.
Durante o programa o apresentador se mostra bastante ríspido e
explica que o diferentemente do formato americano, eles não recompensam
conhecimento, eles punem ignorância. As tarefas do programa se iniciam e
percebemos serem todas relacionadas ou a sofrimento corporal ou a humilhações. Os
Simpsons vencem todos os desafios até então e o último será pegar seu prêmio, as
passagens para casa, que estão na boca de um vulcão ativo, o que aduz
implicitamente a filmes de aventura do cinema americano.
Os Simpsons conseguem as passagens e antes de saírem do programa
Homer dirige-se ao público e ao telespectador esclarecendo que game shows não são
crueldade, eles são apenas ganância e prêmios maravilhosos como catamarãs mal
construídos, mas em algum lugar ao longo do programa você vai se perder e terá
vergonha disso
142
. A declaração de Homer retoma o mundo factual como referência
para o enunciatário telespectador, chamando o à reflexão sobre o formato impresso
142
[Homer is given the tickets, the shows theme plays, and the family is about to leave]
Homer: Before I go I want to say something. Game shows aren't about cruelty, they're about
greed and wonderful prizes like poorly-built catamarans, but somewhere along the line you lost your
way. For shame. [the audience hangs its heads; as soon as the Simpsons leave, the theme music
returns]
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aos game shows transmitidos pela televisão e o que merece crédito. nessa
passagem ligação com a sentença escrita por Bart na vinheta de abertura do
episódio
143
, deixando transparecer muito sutilmente o juízo de valor dos
desenvolvedores do desenho animado, ou seja, estamos cansados de tanta tecnologia
japonesa, consumismo e exposição de imagens, porém a mensagem crítica não se
fixa por não ser esta a comunicação a ser produzida nem pelo gênero desenho
animado, nem pelo formato sitcom, ambos se prestam ao entretenimento, a contar
com humor a estória da vida cotidiana de todos e ao mesmo tempo de ninguém para
fazer com que o homem moderno esqueça-se das mazelas às quais está exposto por
pelo menos 23 minutos, conseguindo assim aceitar a realidade em que está inserido.
143
I’m so very tired.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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101
6.3. REALIDADE EDITADA (A partir do episódio SEM TETO
Helter and Shelter – 2002/03)
Não é mais possível compreender as sociedades
contemporâneas sem considerar que, na
intimidade e em outros espaços microssociais, é
possível assistir ao “real e à verdade”
reconstruídos por essa mídia, confessar
mentalmente seus desejos e “pecados” dentro
do parâmetros morais que nela coexistem, e se
ter a sensação de pertencimento ao mundo que
nos rodeia ou ao mundo que imaginamos existir
(LOPES, 2004 : 124)
A virada do milênio nos Estados Unidos não foi marcada apenas pela
transmissão da contagem regressiva na descida da famosa e tradicional bola de cristal
na Times Square, naquele ano o país deu também as boas vindas à evolução de um
formato dentro da grade de programação televisiva: os reality shows. Parte integrante
da televisão americana desde a década de 1940, porém com menor ênfase e com
outra roupagem, os reality shows migraram do rádio norteamericano para a TV
144
.
No século XXI, mais um holandês chegava ao país do Tio Sam. Dessa
vez ele não precisou, de certa forma, visitar a velha senhora francesa que guarda a
entrada na bahia de New York. Aterrissou direto dos escritórios nas casas de cada
cidadão estadosunidensse pelos estímulos eletrônicos da CBS. O reality show
Survivor, meio-irmão do sueco Expedition Robinson, chegou aos lares dos Estados
Unidos em trinta e um de maio de 2000 e prometeu premiar o público com imagens
reais do show da vida, ou do jogo da vida como queiram, abrindo o apetite dos
americanos pelo novo formato, acompanhado do bem sucedido American Idol.
Muitos programas de formatos similares pipocaram na telinha a partir de então: Big
144
<< http://en.wikipedia.org/wiki/Reality_show >>
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Brother , MTV Fear, The Amazing Race, America’s Next Top Model, Dancing with
the Stars, The Apprentice, Fear Factor, Project Runway, MTV Cribs, The Simple
Life, Extreme Makeover, Wife Swap, Who Wants to Marry a Multimillionaire ... Os
estilos impressos a esses reality shows são os mais variados possíveis: game shows,
auto-ajuda, experiência social, namoro, câmera escondida, natureza X homem e
pegadinha.
Em abril de 2008 o reconhecimento do reality show pelo público foi
coroado com louros pelos críticos de TV americanos, quando a Academy of
Television Arts and Science anunciou que premiaria a atuação de um integrante do
formato com a estatueta do Emmy, o Oscar da TV americana. Na época o presidente
da Academia declarou que a televisão realidade se tornara parte integrante tanto da
televisão quanto da cultura americana, portanto fazia todo sentido para eles criarem
essa nova categoria, altamente competitiva, dentro da premiação do Emmy
145
.
Em meio à proliferação de reality shows pela grade americana, na
temporada 2002/2003 foi ao ar, pela FOX, um episódio de Os Simpsons parodiando
aquele formato. Sob o título de Helter and Shelter, um trocadilho fonêmico em
homenagem ao álbum dos Beatles de 1968 no qual a canção Helter Skelter, segundo
as declarações do próprio Paul McCartney, usa a simbologia do lexema helter skelter
(corre-corre, confusão) para descrever a acessão e queda, culminando na extinção, de
um sistema político similar ao do Império Romano. Matt Groening e sua equipe
narram nesse episódio como a família Simpson vai parar em um reality show, 1895
Challenge, que simula a vida cotidiana no século XIX.
Na vinheta de abertura do referido episódio, vemos Bart escrever na
lousa Milhouse não tem piolhos, produzindo associação com o problema que a
maioria das crianças em idade escolar enfrenta, caso as condições básicas de higiene
não sejam atendidas. Na sequência, observamos todos os membros da família
Simpson se encaminhado para casa como de costume. Ao adentrarem a sala de estar,
estamos diante da cena do sofá, para o qual todos correm ao mesmo tempo e ocupam
seus lugares a chamar o público para o episódio que vai começar. Homer, Marge,
Bart, Lisa e Maggie parecem hipnotizados pela TV; de repente um cursor de
computador surge, desliza pela tela até a barriga de Homer, que olha para a seta e em
145
<< http://en.wikipedia.org/wiki/Reality_show >>
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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seguida é transportado por ela para outro lugar no sofá. Na sequência o cursor aponta
para a parede e promove a mudança da cor rosa choque para verde; depois se
encaminha para um quadro, localizado logo acima de Os Simpsons, e troca-o em um
clique: de um desenho com linhas simples para uma simulação da Monalisa de
DaVinci ao estilo simpsioniano; então a TV da casa dos Simpsons aparece em close
na tela,mostrando os créditos pela criação e desenvolvimento do produto. Em corte
seco temos a abertura da narrativa com a aproximação do olhar do telespectador para
dentro de um dos corredores da Usina Nuclear de Springfield, por onde Homer
caminha tranquilamente até ser atingido por um cano que se desprende do teto.
Mr. Burns e Smithers, que observavam a caminhada de Homer pelo
sistema de monitoramento de segurança por câmeras, vão imediatamente ao local
para averiguar o estado do gorducho; no quadro seguinte a família Simpson aparece
sendo conduzida por Homer em seu carro rosa. Lisa segura quatro ingressos
enquanto seu pai comenta estar animado porque conseguiu as entradas e perdeu
apenas 20% de suas funções cerebrais, após ser atingido por um cano. Todos, exceto
Homer, olham para fora do carro e um grande estádio, do tipo arena, é mostrado ao
enunciatário. Na parte superior da construção pode-se ler: Gee your hair smells
terrific arena.
146
Homer estaciona o carro e todos estão muito felizes porque vão
assistir um jogo de basquete no mais novo, luxuoso e moderno estádio de
Springfield: o Skybox, porém Lisa os lembra que os ingressos são para o jogo de
hockey (Skybox. Event 42. Hockey 223). Imediatamente o luminoso frontal, acima
das catracas da entrada do estádio, acende-se informando Hockey Hoje à Noite”.
Todos os expectadores que se dirigiam para a entrada protestam como se tomados
por grande dor.
Os ingressos dados aos Simpsons por Mr. Burns lhes dão acesso a ala
VIP da arena com todas as suas mordomias, tais como: não esperar na fila para
entrar, ir de escada rolante até o camarote, receber perfume e serem tratados
cordialmente pelos funcionários. Ao chegarem ao camarote, deparam-se com uma
sala luxuosa que lembra um misto de salão de festas de um hotel com a primeira
classe de um Boeing: colunas romanas e arcos formando abóbadas abrigam em cada
146
Xi, seu cabelo cheira a estádio lotado.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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104
canto uma grande TV, há um tapete vermelho na entrada e carpete por todo o recinto,
além de duas filas de cinco poltronas de espaldar alto, acolchoadas e reclináveis
destinadas aos apreciadores do jogo de hockey. Complementam a paisagem dessa
sala, dois pavões com calda amarela e verde, produzindo o sentido de algo exótico,
como os trópicos, por exemplo. Marge comenta que tudo é tão chique quanto a casa
de Moby no programa Cribs, reality show exibido pela MTV em 2000, provocando
ligação intertextual.
Um pintor, vestido ao estilo francês, segurando um pincel na mão
direita e uma paleta de cores na esquerda, se oferece para pintar o quadro de Bart. O
garoto pede para ser pintado nocauteando Larry Holmes, o qual aparece para receber
alguns socos, enquanto isso o artista começa a pintar. Vemos aqui a comunicação da
máxima “seu desejo é uma ordem”, onde a totalidade dos componentes da cena se
preocupam em comunicar todo o luxo ao qual a classe mais abastada pode te acesso
quando vai a um estádio americano.
As mordomias não param por aqui. Enquanto assistem ao jogo,
acomodados em grandes poltronas, Homer é mostrado apreciando comida japonesa
usando hashis e Bart bebendo um refrigerante. Em outra sequência de cena vemos
que o gorducho recebe uma massagem enquanto fuma um charuto, Marge aprecia um
banho de espuma em uma banheira de hidromassagem enquanto degusta uma taça de
vinho e Bart, que tem apenas 10 anos, tem toda uma equipe fazendo sua barba. Em
todas as referências citadas vemos a comunicação pelo produto de que assistir ao
jogo em si, como forma de convivência social e entretenimento, deixou de existir, o
que importa são as mordomias que se consegue, os serviços que os grandes estádios
oferecem para atrair mais público. A crítica por parte do texto parodístico do
produto, vem na forma do discurso de Lisa, que passa por todos, os observando
atentamente e diz: Isso é uma piada! Vocês me encontrarão em baixo com os
verdadeiros fãs. Com cerveja e sangue até os tornozelos.
147
A garota vazão a voz
social do bom senso, embora criticada por seu pai que lhe ordena que volte a assistir
seu estúpido show do Eagles pela vidraça do camarote, ao que ela responde que é um
jogo de hockey, ou seja, vemos aqui a intertextualidade servindo como crítica: o
147
This is a joke! You’ll find me down at the real fans. Standing up ankle deep in beer and blood.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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público da ala vip nem sabe o que está acontecendo no mundo factual, pequenos
grupos se isolam em seus Skyboxes particulares e a batalha que fique para os outros.
As críticas intertextuais não param por aí. O chefe da família Simpson
e seu filho, em outra sequência, enquanto são mostrados assistindo ao jogo e
ofendendo os jogadores de hockey o tempo todo, envolvem-se em um tumulto coma
torcida. Barney, Moe e Otto que estão sentados nas arquibancadas, logo abaixo do
camarote de Homer, revoltados com os insultos decidem revidar e tentam alcançar
pai e filho. O discurso de Bart abre intertextualidade com o da classe mais abastada:
Pai, vem a escória.
148
Homer age como um defensor de seu castelo na Idade
Média: despeja um líquido quente nos revoltosos para que eles desistam de sua
empreitada. O tom humorístico para amenizar sua atitude provém de que em vez de
óleo fervente como na história, o chefe dos Simpsons usa calda de chocolate.
Em outra passagem, após um lance duvidoso na quadra, uma briga
entre jogadores se inicia e para acentuar a violência um dente é mostrado voando
como se fosse uma bola de baseball. Cletos
149
se levanta na platéia, agarra o dente e
o coloca na boca de sua filha, onde havia uma falha, dizendo que aquele era seu dia
de sorte. A menina satisfeita declara que agora está parecida com Britney Spears.
O jogo recomeça e imediatamente um ponto é marcado. A torcida
vibra e Lisa apenas observa. Ao ver o jogador Koslov arremessar duas vezes sem
sucesso, a garota decide ajudá-lo e ele marca o ponto. Koslov decide então presentear
Lisa com seu taco de hockey, no qual identificamos os ícones estilizados do regime
político da antiga União Soviética: a foice e o martelo. Marge aparece e chama a
filha para irem embora. Lisa protesta dizendo que o jogo ainda não acabou. Marge
revida dizendo que sabe o resultado e mostra um cartão que recebera na ala VIP
avisando que Spingfield vencera Shelbyville por 5 a 3.
Em casa, a família toda entroniza no quarto de Lisa o taco que ela
ganhara. Durante a noite, cupins saem do objeto e devoram a casa dos Simpson. Na
manhã seguinte, após vários dissabores mostrados de forma hilária e a constatação de
Lisa que uma infestação de cupins, a família decide chamar um exterminador, o
148
Dad, there comes the scum.
149
Personagem secundário que incorpora em seu discurso o americano abaixo da mediocridade,
desempregado, preguiçoso e com uma família enorme para sustentar.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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qual diz que precisará de algum tempo para deixar a casa em ordem novamente e
aconselha Homer e sua família a mudarem-se para outra casa nesse período, pois
pretende usar um veneno mais forte, aquele com o rótulo do Lee Marvin. nessa
passagem intertextualidade entre mundo factual e cinema, pois a atuação de Lee em
vários filmes de ação do cinema holywoodeano, não muito densos, foi associada aqui
para produzir diálogo entre veneno, exterminar e a figura icônica da imagem do ator.
Sem ter onde morar por seis meses, os Simpsons posicionam-se na
calçada em um pastiche claro ao desenho animado O Rei do Pedaço
150
, também
veiculado pela FOX e que foi inspirado no estilo da criação de Matt Groening. A
ligação completa-se quando a sequência acelera-se e ouve-se o tema da vinheta de
abertura daquele desenho enquanto se desenrola a mesma sequência que em O Rei do
Pedaço, porém com a família amarela como protagonista.
Após algum tempo, a família Simpson decide procurar um lugar para
morar. Vão a um hotel, o Ye Olde OFFRAM INN, mas não vagas. Homer decide
então pedir abrigo a Lenny, que os recebe em seu apartamento. Marge comenta sobre
o luxo e bom gosto na decoração, mas também sobre um barulho estranho e
repetitivo ao que Lenny esclarece ser de uma quadra de highlight. O amigo de Homer
explica também que mantém todo o luxo do apartamento com o dinheiro que as
pessoas lhe pagam por ele deixar que elas atirem bolas com toda força no vidro que
separa seu lar da quadra. Vemos aqui a intertextualidade com os reality shows que
expõem a vida dos participantes, além de intertextualidade com a violência praticada
contra gays, pois Lenny e Carl representam um casal gay em Os Simpsons.
Diante do exposto, a família decide sair discretamente e ir para
Springfield Arms 52577, endereço de um prédio mal conservado de kitnets onde
mora um outro amigo: Jeff Alberts, o cara da loja de gibis. Jeff os recebe com alegria
e diz estar dando uma festa para seus amigos intergaláticos, os quais vão adorar
companhia. Uma mesa com quatro figuras de “monstros” em papelão é mostrada.
Marge e Homer se olham e a cena é cortada.
150
Série de desenho animado satírica criada por Mike Judge. O enredo conta a vida cotidiana de uma
família americana que vive no Texas.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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107
Na tomada seguinte, vemos a fachada do Bar do Moe e ao
adentrarmos o recinto vemos Marge argumentando com Homer, porque esse sugere
que ali seria um bom lugar para sua família morar. Lisa intervém, lembrando que
eles precisam de um lugar e Carl sugere que eles participem de um reality show que
está sendo anunciado na TV. Os Simpsons então vão até os estúdios para se
inscreverem.
Na entrada da rede de TV, vemos que três cartazes dos reality
shows em exibição: Sucker Puncher, Mystery Injection e Tied to a Bear, pelos quais
Os Simpsons passam e se encaminham para o estúdio 2, local da seleção dos
participante para 1895 Challenge. Dentro do prédio, entre os candidatos, vemos Bill
Cosby
151
ser rejeitado pela produção e a família de Homer aceita por sua maluquices
que poderiam rende melhores índices de audiência segundo o discurso de um
membro da equipe.
Os Simpsons vão para a casa cenário do reality show, na qual o único
elo com o tempo presente é uma câmera que fica em um “confessionário”. Marge,
Homer, Bart, Lisa e Maggie estão vestidos com trajes de 1895 e terão que viver de
acordo com os padrões existente naquela época. Sendo assim, as piadas geradas
ficam por conta das longas horas para preparo das refeições; Homer cortar todo o
rosto ao fazer a barba usando navalha; a ida da família ao supermercado em um carro
movido a carvão; Marge ser proibida de comprar determinados produtos que não
existiam no século XIX: bolachas Oreo, papel higiênico e Urkelo’s
152
; a gaiola onde
Maggie dorme; e o cinto de castidade de Marge, o qual mais parece uma armadura.A
casa não possui sistema de aquecimento elétrico, os alimentos não tem conservantes
e por isso estragam facilmente, as pessoas cheiram mal devido às condições de
higiene da época, Marge tem que usar espartilho, Bart passa trotes usando o telegrafo
por que o telefone ainda não fora inventado, Homer entalha uma chupeta de madeira
para Maggie como passa-tempo, Marge dá óleo de fígado de bacalhau para Bart, Lisa
fia usando uma roca. Todos parecem ter se adaptado às condições, por outro lado, a
151
Ator, comediante e produtor de TV. Atuou no The Cosby Show, sitcom sucesso dos anos 1980,
transmitido pela NBC. Produziu, criou e atuou em outros diversos formatos para a TV.
152
Cereal do Urkel
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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108
audiência do programa junto ao público telespectador vai mal e os produtores
decidem mandar um ator dos dias atuais para viver com os Simpsons.
A idéia não alavanca os números e uma profissional da produção,
segurando o que parece ser uma mini-TV, declara que teve uma ideia e pede a todos
que sintonizem no canal 24. No próximo quadro, vemos que é noite e que todos
dormem na casa de 1895, inclusive o ator, quando um helicóptero surge e transporta
a casa. Na manhã seguinte, Homer avisa Marge que está indo ao ferreiro, abre a porta
da frente e cai em um rio de forte correnteza. Descobrimos que a casa fora jogada em
um rio e está flutuando sem controle. Marge salva Homer usando uma corda. O
gorducho vai direto ao “confessionário” reclamar da situação, Na suíte de edição um
dos produtores responde a Homer que ele assinara um contrato permitido que o
programa faça qualquer coisa com Os Simpsons.
Vemos nessa sequência intertextualidade com o mundo factual, no
qual americanos entregam-se a projetos e firmam contratos sem a total dimensão que
seu ato pode atingir, para depois arrependerem-se e processarem o contratante.
Também verificamos a presença de situações de perigo como alternativa para
alavancar índices de audiência.
Retornando ao enredo do episódio, a casa começa a bater em pedras
do leito do rio, vai para uma das margens e se desfaz em escombros. A família
Simpson lamenta o ocorrido e imediatamente dois câmeramen dizem Corta, é hora
do almoço! Mas não há almoço para Os Simpsons, que se retiram para a beira de um
lago lamentando sua sorte e tentando pensar em algo para sanar a situação. Nesse
instante, pessoas sujas, mal-vestidas e até mesmo semi-nuas aparecem saindo da
vegetação ao redor. Homer pensa que são nativos, mas um deles informa que são os
excluídos de outro reality show.
Os “excluídos” e Os Simpsons se juntam para enfrentar a equipe de
produção que está almoçando. Quebram todo o acampamento e voltam para casa.Na
sala de TV, a família toda está assistindo TV, Homer usa o controle remoto e vemos,
em tela cheia, o layout da série policial Law & Order exibido pela NBC e sucesso de
audiência desde setembro de 1990, sua estréia. Todos assistem a uma cena parodiada
do seriado mencionado e ao final Homer reclama ser a TV sua única diversão, mas
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que não consegue mais assisti-la. Lisa sugere livros e a formação de um clube,
Homer aprova e se entusiasma dizendo que poderão servir bebida. Bart sugere que
todos bebam de uma represa, a família vai para o quintal e Homer bebe água de uma
mangueira, cuja torneira é controlada por Bart. Aparecem os créditos do programa na
tela enquanto ouvimos duas falas de Homer antes do tema da série encerrando o
episódio.
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6.4. FRAUDCAST NEWS: O ESPELHO (A partir do episódio
GUERRA DE IMPRENSA - 2003/04)
[...] um texto é sempre um eterno devir![...]
percebemos a Palavra como uma espécie de signo
deslizante, uma aventura da significação, cuja
presença, uma vez lançada, voa irrevogável,[...]
( KERSKE, 2007)
Esta seção de nosso trabalho tem por objetivo fazer um breve
levantamento e argumentação sobre os diversos intertextos presentes no episódio
“Fraudcast News” ou “Guerra da Imprensa”, de Os Simpsons. Não é nossa pretensão
esgotar o assunto, pois temos muito claro que a atualização de sentido presente em
um texto se faz a cada novo olhar sobre o objeto. Por outro lado, dada a riqueza de
elementos do corpus de análise nos dispomos a suscitar a discussão mais detalhada
de alguns pontos chave sob a perspectiva da Análise do Discurso, embasada em
teóricos da comunicação que defendem haver mais de um texto dentro de qualquer
enunciação engendrada pelo(s) falante(s) em sua rede intersubjetiva, quando da
interação sociocultural.
Nessa linha de pensamento, concordamos com a postura de Marcondes
Filho (2004) quando esse argumenta que a Comunicação, como ciência, pertenceria
primeiro ao campo da Filosofia amparados na afirmação de que na busca do
entendimento mútuo mais fatores imbricados do que a mera codificação e
decodificação de signos que compõem a mensagem, como supõem alguns cientistas
da linguagem e seus fiéis seguidores.
Acreditamos que a Comunicação necessita do saber de outras ciências
que ao longo do tempo se mostraram pertinentes para o melhor entendimento das
relações fluídas comunicacionais que se infiltram tanto virtualmente quanto
concretamente em nosso devir social hodierno. Afinal, somos por natureza seres
sociais dotados de linguagem articulada, o que nos permite a pretensão de sermos
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considerados melhor aparatados para argumentar a nosso favor diante de uma
situação de uso linguajeiro.
Dentre as várias manifestações linguísticas da mídia que nos
acompanham em nosso dia-a-dia enquanto cidadãos da sociedade do século XXI,
escolheu-se a televisão como veículo midiático a ser aqui abordado, devido não só ao
fator credulidade que o meio traz em si, mas também ao valor enunciativo que os
seres humanos lhe atribuem. Lembramos que alguns grupos sociais inclusive chegam
a estabelecer uma verdadeira relação de culto
153
com as informações veiculadas por
aquele meio, ampliando-lhe o tom de veridicção que a equipe de produção procura
dar à enunciação televisiva tanto em sua composição como em suas transmissões.
6.4.1. - Texto Composto
Nem só de voz, nem de letra, nem de imagem,
mas de todo um sensório vive a cultura.(... ) Queira
ou não o valor das coisas surge em função de pontos
de vista, nos quais se incluem as linguagens e os
códigos culturais que as constituem.(MACHADO,
2000)
Nos dias de hoje, as mídias e seus produtos ocupam lugar privilegiado em
espaços cada vez mais próximos a situação real de interação face-a-face, tornando-se
extensões do próprio homem e “preenchendo”, não totalmente, é claro, nosso antigo
desejo de onipresença em diversas esferas de atuação. A paralaxe do homem
moderno com a TV intensifica-se no século XXI.
Por meio das mais inusitadas, e outras nem tanto, associações entre
linguagens e gêneros primários, desfilam pela programação televisiva as chamadas
linguagens interagentes com o intuito de melhor convencer o outro, no caso o
telespectador, de que aquela enunciação, a partir de um simulacro do fato, é
expressão de verdade. Em particular, no meio televisivo somos conduzidos ao
espelho, imbuídos do valor que atribuímos à enunciação oral de sujeitos e suas
funções sociais estereotipadas, alimentamos nossos sonhos e o de um imaginário
coletivo que nos é essencial para nossa constituição sócio-cultural identitária.
153
cf. Lopes, 2004.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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112
Firmamos um contrato comunicativo fiduciário à enunciação televisiva,
lhe atribuímos valor e status, deixamos desabrochar sua significação, como descreve
Baccega (2000):
As significações dos produtos dos meios de comunicação se
relacionam com o cotidiano do sujeito receptor, com suas práticas
culturais, com as marcas que influenciam seu modo de ver e
praticar a realidade, e que são aquelas que lhe dão segurança
necessária para estruturar, organizar/reorganizar a percepção dessa
realidade, reconstruindo-a, com destaques e apagamentos, de
acordo com sua cultura.
No privilégio da voz
154
e da imagem, a comunicação engendrada e
transmitida pela TV nos solicita uma leitura não passiva, mas crítica, para que se
entenda a real dimensão discursivo-comunicativa ao que assistimos. É preciso lançar
um olhar crítico sobre o que se vê, para entender a malha dialógica em que se apóia a
narrativa que enche nossos olhos, desperta nossos sentidos e se infiltra em nossa
pele, em nosso imaginário coletivo e individual.
Alguns gêneros televisivos apresentam-se como mais propícios que
outros para a manifestação do tecido polifônico, dentre eles escolhemos o desenho
animado de núcleo familiar. Não aquele em que se busca a formação moral do
telespectador, mas aquele em que se subvertem, sob vários aspectos, os clichês pré-
existentes.
Fomos buscar uma produção que se vale de um dos mais antigos gêneros
textuais, a paródia, para construir sua enunciação como espelho reflexivo das práticas
sócio-culturais não norte-americanas, mas também de outros países ocidentais,
dentre eles o Brasil. Características de culturas antes consideradas distantes passam a
se reconhecer umas às outras na era da sociedade da informação. É praticamente
impossível não esbarrar em características transculturais em uma época na qual é
possível saber o que acontece milhares de quilômetros de distância em apenas
alguns minutos de navegação virtual. Ao tomarmos contato com novas informações
não somos os mesmos de antes, um pouco do novo passa a fazer parte de nosso
léxico, renovamos a volta da espiral de produção de sentido à que se refere Baccega
154
Marcondes, 2004: Toda a história pregressa da civilização ocidental foi marcada pelo privilégio
da voz, a voz do chefe, a voz do soberano, que, ao falar, cria os seres, a natureza, as coisas. Voz, como
uma espécie de prolongamento de Deus sobre os homens e que, assim, atrela o poder terreno a uma
entidade espiritual numa relação metafísica.” (p. 225)
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113
(1988). Ao produzirmos peças de comunicação significativas, em nossa enunciação
deixamos transparecer como entendemos o mundo que nos envolve e qual a relação
de sentido que desenvolvemos com todo e qualquer acontecimento.
No texto parodístico de Os Simpsons, observamos que o humor corrosivo
de sua enunciação suporte para a manifestação da paródia numa leitura invertida,
da ordem oficial de nosso cotidiano. Segundo Shlonks
155
, o método da paródia é
dissimular as normas que o original tenta reforçar/impor, isto é, reduzir o que é de
status normativo no original à uma convenção ou mero dispositivo.”
156
Rir da
paródia significa o conhecimento das convenções morais e socio-históricas sob
ataque.
A enunciação desenvolvida ao longo do texto parodístico vale-se do(s)
intertexto(s), como na concepção de Jenny (1979), um “texto absorvendo uma
multiplicidade de textos, embora centrado num sentido”, ou de M. Arrivé, que
prefere se referir a um “conjunto de textos que se encontram numa relação de
intertextualidade”. Tanto um autor quanto o outro convergem para o fato de que
diálogo do texto da atualização de sentido com outro(s) texto(s) anterior(es) em torno
de um tema também anterior ao texto proferido e gerado por uma situação real de
enunciação que agora origem a um novo texto sobre o mesmo tema da
enunciação:
O tema da enunciação é na verdade, assim como a própria
enunciação, individual e não reiterável. Ele se apresenta como a
expressão de uma situação histórica concreta que deu origem à
enunciação.
157
As trapalhadas de uma família americana típica de classe média prestam-
se em “Os Simpsons” a ser o ponto de entrada para identificação do rosto amigo,
cultural. A cultura, como descrita por Garcia Canclini (2002), é dinâmica,
significando o modo como as representações do simbólico e do material se
desenrolam nas redes intersubjetivas. Sendo assim, as interações, tanto entre os
membros da família Simpson, quanto entre e com outros personagens que habitam a
série, tornam possível reconhecer o rosto amigo, entendido o vocábulo como na
155
Apud. Gray, 2006
156
Tradução nossa.
157
Bakhtin; Voloshnov, 1997, p. 128 apud Keske, 2007, p. 150-151
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114
acepção que faz Muniz Sodré (1976), e que facilita a empatia precedida pelos
processos de projeção e identificação dos anseios do telespectador em relação ao que
vê na telinha.
Nesse meio ambiente relaxante, manifesta-se a crítica à nossas caóticas
vidas, valendo-se do riso pela negação de que não somos tão grotescos quanto o que
desfila diante de nossos sentidos afoitos. Na busca pela aceitação de nossas próprias
imperfeições humanas, deparamo-nos com personagens como o gordo bonachão, o
magro demais, o narigudo, o avarento, o diferente, o mido, o fanático religioso e
tantos outros tipos que fazem parte de nosso substrato afetivo cultural e que estão
presentes na inversão da ordem oficial do mundo factual e subversão dos dados
apresentados no formato do texto parodístico de Os Simpsons. Seus personagens
extrapolam o caricatural, visto que os desenvolvedores criam um universo com
regras particulares, baseado em exageros do mundo real, mas concebido com tal
complexidade e consistência que acaba por influir decisivamente na realidade na qual
se inspiram.
Entendemos ser necessário descrever, além do enredo do episódio e
pontos chave onde a manifestação da intertextualidade fica mais clara na produção
de sentido, também se faz necessária a análise das seqüências de cena da vinheta que
compõem a abertura da exibição para TV, por verificar que ali se encontram
mensagens importantes para o entendimento do vel semionarrativo profundo, o
qual revela o(s) acontecimento(s) que deu(deram) origem ao enredo do referido
episódio.
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115
6.4.2. O ENREDO DE “FRAUDCAST NEWS”:
da vinheta de abertura ao “grand finale”
A fala ou o texto podem até mesmo não existir ou
serem secundários diante da gestualidade, da
imagem, do som, da ambiência, da motricidade e do
contexto cênico em que a comunicação se processa.
Mesmo quando a fala e o texto são centrais, de se
considerar os demais elementos não lingüísticos que
os acompanham. (LOPES,2004)
“Fraudcast News”, ou “Guerra da Imprensa”, faz parte da 15ª temporada
de “Os Simpsons” e foi ao ar nos EUA em 23 de abril de 2004. O episódio é aberto
seguindo a praxe da série: nuvens descortinam o nome da rie que aparece em
amarelo e movimenta-se em direção ao telespectador, até encher a tela, quando a
cena é cortada e Homer aparece saindo de seu carro após estacioná-lo na frente da
garagem de sua casa. Antes que Homer desça do carro, Bart passa velozmente em
um “skate” por cima do teto. Depois é a vez de Lisa, em uma bicicleta carregada com
livros e seu saxofone, quase atropelar Homer que está saindo de seu carro. Nesse
momento ouvimos famoso bordão “D’Oh!” de Homer.
Assim que a porta é fechada, o carro de Marge aparece e em seguida, em
“câmera subjetiva”, compele Homer a entrar em casa. A cena é cortada e no lugar da
típica abertura com a família Simpson correndo para o sofá, surge no centro da tela
um banco de rua em uma cidade fictícia de uma metrópole da Ásia, mais
especificamente do Japão pela identificação do Monte Fuji, cartão postal daquele
país, estilizado ao fundo da cena. A localização espaço-temporal é dada pelas
escrituras na placa do poste à esquerda, no encosto do banco ao centro e no outdoor
eletrônico ao fundo do lado direito da tela. Entretanto, ainda se identifica ser a cena
do sofá dos Simpsons pelo elemento chave colocado no canto direito da tela: o
aparelho de TV. No mesmo local também se encontra o logo da FOX, canal de TV
americana que detém os direitos de transmissão da série.
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116
Os personagens da família Simpson, vestidos como super-heróis de
desenhos animados japoneses, numa clara intertextualidade alusiva
158
ou em
pastiche
159
, começam a entrar em cena. As primeiras a surgirem na tela são Marge e
Lisa. Marge, vestida como a princesa de Batalha dos Planetas (Battle of the
Planets
160
), e Lisa, como uma Sailor Moon
161
, etapa Crescent Moon
162
. Elas surgem
em pontos opostos da tela: Marge no canto esquerdo e Lisa no direito. Sentam-se no
banco. Marge levanta e encaminha-se para o canto direito da tela, acompanhada por
Lisa. Enquanto Marge vai até a TV que emite um raio branco de dentro de sua tela,
Lisa encaminha-se para o centro da cena, da direita para esquerda e ergue uma
varinha de condão em forma de coração, gira o objeto no ar e emite coraçõezinhos
para o alto. A garota reproduz os mesmos movimentos que seu personagem alusivo
faz em cena. Nesse meio tempo, Marg senta-se ao lado de Lisa e imediatamente
percebemos um brilho forte seguido de um zumbido vindo da TV: é Meggy que sai
de dentro do aparelho, caracterizada de Pikachu
163
, para alojar-se no colo de Marge.
Agora é a vez de Homer aparecer para compor a cena. Ao fundo, no meio
da tela associamos o desenho estilizado ao Monte Fuji. De seu lado direito surge
Homer
caminhando por entre os prédios da cidade fictícia em direção à esquerda da
tela. Caracterizado como Ultraman Tiga
164
, Homer olha para Marge e Lisa, faz cara
de desaprovação, salta há uma distância impossível para um ser humano posiciona-se
em primeiro plano no canto esquerdo e executa movimentos semelhantes aos das
artes marciais japonesas, além disso, elementos mágicos são acrescentados: raios
158
Barros ( 2003 : 30): “A intertextualidade é o processo de incorporação de um texto em outro, seja
para reproduzir o sentido incorporado, seja para transformá-lo. de haver três processos de
intertextualidade: a citação, a alusão e a estilização.”
159
cf. Gray , 2006.
160
Versão Americana produzida em 1978 a partir do anime original da TV japonesa de 1972
conhecido como Kagaku ninja tai Gatchaman. A adaptação americana é em grande parte fiel ao
enredo e personagens originais de Gatchaman, mas adições e reduções significativas foram feitas afim
de aumentar o apelo para o mercado de televisão juvenil norte-americano do final da década de 70.
Disponível em: << http://en.wikipedia.org/wiki/Battle_of_the_Planets
>> Acesso em 10.12.2007.
161
Série japonesa de desenho animado, adaptada a partir de mangá japonês para a televisão americana.
162
Série japonesa de desenho animado, dublada e adaptada para a televisão americana.
163
um dos Pokemons, série japonesa de desenho animado, dublada e adaptada para televisão
americana.
164
Personagem da série Ultraman, pertencente a 12ª geração. Foi exibido entre 1996/97 pela TV
japonesa, num total de 52 episódio e 4 filmes produzidos. Nos EUA fez sua primeira aparição no
canal FOX em 14.09.2002, no FOX BOX. Apenas 26 dos 52 episódios foram dublados e exibidos
pela FOX.
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117
circulares saem de suas mãos quando estas apontam para o alto; os olhos de Homer
são ressaltados como se estivessem brilhando e em seguida o gorducho ocupa seu
lugar no canto esquerdo do banco, ao lado de Liza, mas deixando espaço suficiente
para Bart.
Quase instantaneamente após Homer se sentar, Bart, caracterizado como
Astroboy
165
, entra em cena, também voando, que de baixo para cima da tela, da
esquerda para a direita. Ele cruza o quadro impulsionado por suas botas de solado
incandescente. Bart está nu da cintura para cima, além das botas suas roupas de
super-herói se resumem a shorts e capacete pretos. O garoto vai se juntar à família
sentando ao lado de Homer, que ergue seu braço esquerdo e emite raios, não mais
circulares, em direção à TV. A cena é cortada e a tela do aparelho de TV dos
Simpsons emoldura toda a tela do telespectador, exibindo o nome do criador da série:
Matt Groening e em seguida de seus “colaboradores”
166
(James L. Brooks e Sam
Simon). A vinheta de apresentação do seriado está completa.
Toda a movimentação textual descrita acima se vale da linguagem
gestual, imagética e musical para desenvolver seu enunciado, comunicando que a
família Simpson está ligada ao universo do desenho animado japonês de alguma
forma. Seja pelo gênero, todos os personagens que apareceram no pastiche são de
séries de desenho animado adaptadas de mangás e dubladas para a TV americana,
seja pelas características da personalidade que cada um dos Simpson tem em comum
com os personagens japoneses que estão representando.
Após a apresentação da vinheta de abertura, inicia-se a ação da estória do
episódio com o aparecimento na tela, em close, de Kent Brockman, o repórter do
seriado, em transmissão ao vivo, abrindo a narrativa do episódio “Fraudcast News”
como se o telespectador estivesse assistindo à transmissão de um evento real. No
enredo de “Fraudcast News”, Lisa vai ler um poema na festa pública do monumento
natural de Springfield (“Geezer Rock”), mas Homer, que acredita estar fazendo a
coisa certa remove, um arbusto do olho do gigante de pedra, ocasionando seu
desmoronamento. O Sr. Burns, que assistia ao evento, é soterrado pelas pedras e
Smithers, seu fiel e prestativo secretário particular, teme que ele tenha morrido. Lisa
165
um garoto robô, também personagem de manga e anime japonês. Criado em 1952,é considerado a
incorporação da estética que mais tarde seria definida como anime. Exibida pela rede de televisão
NBC nos EUA.
166
A palavra colaboradores aqui aparece entre aspas porque não foi possível encontrar melhor
tradução para “developers”, a palavra usada no original.
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118
fica decepcionada, pois ninguém conseguiu ouvir seu poema e Marge sugere que ela
o publique. Para deleite de Smithers, o Sr. Burns sobrevive ao soterramento
serpenteando e esgueirando-se pelas frestas existentes entre as rochas; entretanto
Burns se sente incomodado ao descobrir que ninguém sentiu sua falta quando
pensaram que ele estivesse morto. Ele decide, então, comprar todo mercado
midiático da cidade.
Enquanto isso, Lisa distribui a primeira edição de seu próprio jornal “The
Red Dress Press” (A Imprensa de Vestido Vermelho), a qual é um sucesso. Agora ela
tem que produzir uma segunda edição e para isso recruta a ajuda de crianças amigas
suas. O Sr. Burns compra o controle de todos os veículos distribuidores de mídia de
Springfield, exceto um, o jornal de Lisa. Burns tenta seduzir Lisa a vender para ele,
mas ela não cede. A partir de então Burns promete jogar duro, e começa por cortar o
fornecimento de eletricidade da casa dos Simpsons.
O diretor Skinner oferece à Lisa um velho mimeógrafo, que a ajuda a
produzir sua última edição do jornal. Burns conversa com Homer sobre o lado não
tão heróico de Lisa, que o gorducho rapidamente confirma e Burns usa as
informações obtidas contra Lisa. Quando a menina está prestes a desistir, Homer
percebe o que fez à filha e responde escrevendo e editando um jornal ele mesmo. O
artigo de Homer sobre Lisa inspira outras pessoas a começarem a pensar por si
mesmas e em pouco tempo elas estão produzindo seus próprios jornais.
167
6.4.3. A PARÓDIA SIMPSONIANA E RUPPERT MURDOCH
Hoje torna-se claro que esse espaço social é uma
verdadeira forma de vida, não limitada ao escopo
televisivo. Na “objetualização” do comum, emerge
hoje como duplo exteriorizado, ou ecossistema
tecnológico, uma forma virtualizada de vida, a que
chamamos de “bios virtual” (cuja manifestação mais
evidente é a dimensão midiática). (MUNIZ SODRÉ,
2006)
O contrato comunicacional entre duas pessoas passa pelo filtro afetivo-
social para que seja firmado entre os falantes. É preciso haver o mínimo de
ambivalência de significação entre os envolvidos, ou seja, tanto enunciador quanto
167
O texto original da sinopse do episódio faz parte da sessão de anexos deste trabalho.
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119
enunciatário precisam validar o objeto simbólico por meio da construção do crer para
que a fidúcia desabroche. No agir comunicacional dois tipos de contratos
168
podem
ser firmados entre os envolvidos: o estratégico ou o comunicativo. No caso da TV
esse contrato é de ordem estratégica porque o enunciador TV usa de todo um
universo sígnico simbólico para gerar semiose a partir de referenciais
positivo/negativo comuns sob o ponto de vista cultural e assim tenta conquistar o
interesse da audiência.
Diante do exposto, percebemos não ser o contrato comunicacional algo
natural ou inato das relações intersubjetivas. Ele precisa ser pensado, criado,
exercitado e conduzido pelos envolvidos de modo dialógico, um diálogo continuo
entre o mundo que o cidadão carrega na cabeça e o que está ao seu redor. Um
diálogo composto de crenças, valores, ideologia, história e cultura tão antigos quanto
o primeiro homem a pisar na Terra. É o rastro do rastro como bem define Derrida.
169
Rastros são indícios, é o que permanece de algo passado ou faz
reconhecer que algo ou alguém existiu. Em si não são uma presença, mas o
simulacro da presença, que se desloca, reenvia, não tendo propriamente lugar; é puro
“apagamento”. Os rastros presentes na paródia de forma indicial fazem com que ela
adquira sentido e significação. Eles ativam na memória do leitor/telespectador
associações necessárias para que ele sinta e possivelmente compreenda o que está
vendo.
Os signos de uma determinada mensagem guardam a memória de outros
contextos; contextos em que foram engendrados e dos quais estão carregados. Na
enunciação do texto parodístico, inspirado a partir de outra voz, “lendo ela mesma,
um texto mais velho que o poema de meu corpo, que o teatro de meu gesto”
170
situações de contato entre sujeitos são reproduzidas, principalmente situações de
contato livre como as reuniões familiares, o encontro de amigos, situações cotidianas
da praça, da rua e da casa. Porém a sua reprodução ganha em amplitude, o(s)
autor(es) da ode ao acontecimento oficial, invertem seu uso em formato de carnaval.
Exagera-se aqui e ali nas linguagens para inverter a ordem social reinante, diante do
exagero inesperado provoca-se o riso a partir de um canto paralelo (para+ode).
168
cf. Lopes, 2004.
169
cf. Marcondes Filho, 2004
170
cf. Marcondes Filho, 2004
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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120
Um texto é a própria “vida real”. Tudo é escritura. Escreve Derrida,
comentado por Marcondes (2004): a própria vida são suplementos, significações
substitutivas, surgidas somente numa cadeia de reenvios diferenciais, sendo que o
que se chama “real” sobrevem, se acrescenta adquirindo sentido a partir de um
rastro, de um apelo de suplemento.
Nada existe no presente sem que se olhe para o passado. Sendo assim, o
homem como leitor/enunciador de si e de seu entorno, pode constituir-se em dois
tipos, de acordo com sua práxis, tanto do ponto de vista do ethos como imagem que o
enunciador faz e quer passar de si mesmo, quanto do pathos, a imagem que ele
pretende dar de seu enunciatário.
Um Leitor- Modelo pode estar aberto a múltiplos
pontos de vista interpretativos, cujo trabalho cooperativo exaustivo o transforma em um
leitor crítico; ou se tornar um leitor ingênuo, cuja obediência textual, ancorada unicamente
em uma semiótica lingüístico-frasal estreita, linear e mínima, lhe prive da percepção de
horizontes mais amplos nos bosques da interpretação.[...] o trabalho interpretativo de
preenchimento da incompletude que constitui o tecido textual, só pode gerar-se em conjunto
com a cooperação do leitor, seja este crítico ou ingênuo. (Antonini, p. 143)
Seja qual for o
crime, a culpa nunca é da faca e sim de quem a manipula e a aceita.
Se Derrida remete ao rastro, Charaudeau nos lembra da imagem sintoma
que pode ser também uma imagem dotada de uma forte carga semântica. São
imagens preenchidas com o que mais toca os indivíduos: os dramas, as alegrias, os
sofrimentos ou a simples nostalgia de um passado perdido. Esse tipo de imagem deve
remeter a imaginários profundos da vida. Deve ser igualmente uma imagem simples,
reduzida a traços dominantes, como sabem fazê-lo os caricaturistas, pois a
complexidade confunde a memória e impede a apreensão de seu efeito simbólico.
Portanto, se aplicarmos o conceito de rastro e/ou imagem sintoma ao texto
parodístico do episódio “Fraudcast News” de “Os Simpsons”, acreditamos ser
possível apreender uma malha dialógica intertextual de base tríplice entre: 1) a
cultura americana, mais especificamente a do sonho americano relativo ao
enriquecimento por parte dos imigrantes e que deu origem na língua a expressão
idiomática “fazer a América”; 2) o cumprimento dos direitos civis garantidos na
primeira ementa da constituição americana; e 3) a biografia do proprietário de um
império comunicacional midiático que inclui o Canal Fox, onde o desenho animado
“Os Simpsons” é veiculado há quase duas décadas.
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121
6.4.5. De quem você está falando?
Como o universo da significação é ambíguo e multi-
interpretável, muitos textos somente podem ser
plenamente atingidos em toda sua riqueza à luz de um
suficiente conhecimento intertextual, que depende da
capacidade deste leitor em manter ativado, a partir de
um determinado contexto, um grande jogo de
inferências, de modo que, mesmo o mais “fechado”
dos textos, possa reencontrar um novo viço
interpretativo na produção de uma nova cadeia
significante. (KESKE, 2007)
Ler uma imagem pode suscitar muito mais interações do que se
conseguiria dar conta esta pesquisa. Interações entre linguagens tão diversas que
algumas nos escapam ao entendimento imediato, seja pelo ritmo próprio que
impõem, seja pelos referenciais que requerem para a efetivação de seu significado
perante um contexto. Nossos olhos são instrumentos magníficos para darmos início a
uma leitura baseada em nossa intuição e sensibilidade com subseqüente emissão de
julgamento de valor, embora não nos demos conta disso na maioria das vezes. Lemos
o que nos rodeia primeiro pelos sentidos biológicos, principalmente audição e visão.
Sendo assim, a leitura do mundo midiático que nos cerca tem entrada pela imagem,
seja ela concreta ou abstrata, e pelo som. Ambos ativam nossos sentidos pela
memória afetiva que evocam, sendo a imagem a primeira a se impregnar em nossa
pele.
Diante de uma imagem podemos tecer tantas associações quanto nosso
léxico nos permitir. A ancoragem de sentido dependerá da ideologia, cultura e
história em comum que enunciador e enunciatário possuam. Uma imagem faz
sentido para o enunciatário se ela encontrar a mesma valoração ou valoração
semelhante a que lhe atribuiu o enunciador.
O sucesso de todo espetáculo de TV parece residir no fato de que seus
produtores o engendram a partir dos pontos de intersecção entre diálogo e
ambivalência, resultando em sua leitura intertextual alicerçada tanto na cultura do
enunciador como na do enunciatário. Trata-se da polifonia presente nos diversos
programas televisivos ou, não raras as vezes, dentro de um único programa, onde
observamos a interseção entre o contexto atual e contextos anteriores na tentativa de
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122
abranger várias faixas de telespectadores. A multiplicidade de vozes e consciências
independentes e distintas que representam pontos de vista sobre o mundo corpo à
polifonia da qual falamos anteriormente. O enunciador, TV, hiperestimula os
sentidos do enunciatário, telespectador, para que esse queira estar diante do texto
televisivo. Por sua vez, o enunciatário (telespectador) ao perceber o dialogismo,
escrita em que se o discurso do outro, produz a identificação ideológica, cultural e
histórica, a qual lhe proporciona a sensação de prazer diante da realidade exposta. O
telespectador passa a almejar tal realidade para seu mundo.
Assim nascem os mitos televisivos, frutos da projeção das
expectativas de seus telespectadores sobre o texto do enunciador. O enunciatário
sente-se abduzido pela atmosfera mostrada pelo enunciador TV. A natureza desses
mitos dependerá da dialogia entre enunciador e enunciatário, pois a utilidade do texto
de TV está nos olhos do enunciatário consciente da sua própria linguagem e da
linguagem do enunciador; está nos olhos de quem assiste o espetáculo, mas não o
aceita como a única verdade sobre o fato. O enunciador TV presta-se a ser a ponta do
iceberg para uma viagem muito mais interessante sobre o meio social em que se
encontra o enunciatário.
Dentro desse contexto a paródia se sobressai como gênero privilegiado
perante outros, pois, inseparável da sátira menipéia
171
e dos outros gêneros sério-
cômicos, ao mesmo tempo estranha aos gêneros classificados como elevados
(epopéia e tragédia), a paródia é um mundo por trás do espelho: inverte e distorce a
realidade que conhecemos em forma de simulacro, marcando pelo riso, que
dessacraliza e relativiza as coisas sérias, as verdades estabelecidas, o poder
dominante, reduzindo tudo ao ambiente familiar e acolhedor do exagero, do rir de si
mesmo como forma de libertação.
Servindo-se do contrastes ou das semelhanças, tal inversão constrói um
mundo complexo de relações entre si ao mesmo tempo em que instaura marcas no
visível que guardam em si um pouco do considerado ideal, utópico, onde todos têm
liberdade, igualdade, abundância e universalidade. Simultaneamente, o texto
parodístico também nos mostra a excentricidade, na qual as coisas estão as avessas
do que costumam ser. Privilegiam-se como ambiente da narrativa os lugares de
encontro e contato de pessoas diferentes: as ruas, as tavernas, as estradas, os
171
Cf. Fiorin, 2006
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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123
banheiros, as pontes, os bordéis e no caso de Os Simpsons também a sala de estar, o
bar, a escola, o mercado, a sala do café na usina nuclear de Springfield.
No início do episódio Guerra de Imprensa, o local escolhido pelos
autores é um parque ecológico, local de encontro, onde haverá a comemoração em
homenagem ao velho de pedra. Na transmissão ao vivo o repórter anuncia entre as
muitas coisas que o local é conhecido também pelo número de jovens que praticam
suicídio ali, em seguida vemos e ouvimos uma pessoa atirar-se do alto da montanha
de pedra e dizer “Por que eles cancelaram Futurama
172
?” Esta é uma das ligações
com o mundo factual.
No quadro seguinte vemos a família Simpson chegando ao parque e Bart
reclamando da convenção social que tem que participar. Após levar os costumeiros
sopapos de seu pai, Homer, a cena de Bart é cortada e aparece Mr. Burns chegando
ao local acompanhado por Smithers, seu fiel secretário pessoal. Embora distantes por
muitos ângulos, Burns e Bart reclamam da mesma coisa: terem que comparecer a
cerimônia. Entendemos ser esta a aproximação dos opostos feita pelo carnaval: o
avarento e o rebelde, o magro demais (Burns) e o fora de lugar (Bart). É o grotesco
sendo comunicado na tela. Um grotesco feito de exageros, enfatizando-se não as
partes em que o corpo é aberto ao exterior (olhos e boca têm seus traços exagerados
nos personagens da série), exagera-se também os comportamentos. E o que dizer do
que vem pouco depois? Um prefeito usando terno roxo e que anuncia a presença de
um sub-secretário do governo; o Sr. Burns sobrevivendo ao desmoronamento;
colocando seu cérebro de volta na cabeça após dar algumas batidas para tirar um
pouco de terra do ouvido; o fato de Burns ter se alimentado de baratas e leite de
toupeira para sobreviver e outras ões apresentadas são por nós entendidos como
manifestações da comunicação do grotesco (MUNIZ SODRÉ, 1972) na construção
da paródia do mundo factual em relação a uma realidade pessoal: as dificuldades
vividas por Ruppert Murdoch em sua vida.
Ruppert Murdoch, imigrante australiano, naturalizado americano desde
1985, é dono de um mercado mundial de mídia. Entre suas muitas empresas está o
canal de TV FOX, onde “Os Simpsons” é transmitido desde sua criação. A chave
172
Série de desenho animado criada, produzida e dirigida pela mesma equipe de “Os Simpsons”. Teve
sua produção/exibição cancelada a partir de 10.08.2003. Disponível em: <<
http://en.wikipedia.org/wiki/Futurama
>> Acesso em 28.07.2007.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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124
intertextual aparece no enredo do episódio “Guerra de Imprensa” por meio do
diálogo entre Burns e Smither, reproduzido a seguir:
Burns: “Bem, eu acho que é impossível controlar toda a mídia, a menos, é
claro, que você seja Ruppert Murdoch. Ele é um homem belo.”
173
(Burns olha
para Smithers, que sorri).
Smither (respondendo a Burns): “O senhor está coberto de razão.”
174
(Depois
os dois olham demoradamente para o público, como se estivessem vendo
Ruppert Murdoch do outro lado da tela.)
Ao fazer um levantamento em fontes eletrônicas seguras e que constam
nas referências eletrônicas dessa pesquisa, verificamos que o Sr. Murdoch expandira
seu conglomerado de mídia em 1993 adquirindo a STAR TV na Ásia e criou
escritórios por todo aquele continente, incluindo Singapura, China, Índia, Pakistão,
Vietnam, etc. Hoje em dia, suas empresas naquele continente compõem a maior rede
de TV via satélite da Ásia. Uma década depois, Murdoch comprou 34% da Hughes
Eletronics, operadorda da maior distribuidora americana de TV via satélite, a
DirecTV
175
. Vale lembrar que um ano depois disso, 2004, o episódio analisado foi ao
ar nos EUA. Qualquer semelhança seria mera coincidência?
As empresas de Murdoch atualmente abrangem os setores de cinema,
televisão, TV a cabo, jornais impressos, livros e revistas entre outros. Suas
propriedades incluem o “New York Post”, o canal de TV “National Geographic”, a
“Harper Collins Books” e a “20th. Century Fox”. Em 2003, o empresário comprou
34% das ações da maior operadora americana de TV via satélite, a DirectTV. Três
anos mais tarde, 2006, Murdoch adquiriu a “MySpace”, rede de internet muito
popular nos EUA, e integrou-a à “Fox Interactive Media.” Recentemente, Murdoch
comprou um canal de TV da Turquia, o TGRT, que fora previamente confiscado pela
comissão de regulamentação bancária do governo turco (TMSF). Não satisfeito,
também comprou o “Dow Jones”, índice do mercado de ações criado no séc. XIX.
176
173
“Well, I guess it’s impossible control all the media. Unless, of course, you’re Ruppert Murdoch,
who is one beautiful man.”
174
“I couldn’t agree more.”
175
Disponível em: <<http://en.wikipedia.org/wiki/Ruppert_Murdoch#Recent_activities>> Acesso
em:28.07.2007
176
Disponível em: <<http://en.wikipedia.org/wiki/Ruppert_Murdoch#Recent_activities>> Acesso
em:28.07.2007
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125
Na política foi amigo pessoal de Ronald Reagan, apoiou a candidatura de
Bill Clinton, as duas de George W. Bush, a candidatura de Hillary Clinton ao senado
entre outras. Durante a campanha de Barack Obama para a presidência dos EUA em
2008 declarou que o candidato era fantástico, uma estrela do rock em sua opinião e
que gostaria de ver se Barack conseguirá cumprir tudo o que promete.
Por todos os fatores elencados acima, argumenamos que Murdoch parece
enquadrar-se em todos os requisitos para ser o imigrante inteligente que fez a vida na
América. O que no nosso entender explica sob os óculos míopes da cultura o seu
carisma. É empresário, comunicador, extremamente poderoso e inteligente, com
aprovação fundamentada no imaginário da cultura americana do “fazer a América.”
Se nós brasileiros somos em nossa essência cultural definidos por família
e amigos, os norte-americanos são direitos e deveres.
177
No episódio “Guerra da
Imprensa” o público aceita o discurso ficcional de base real amparado na certeza de
que a sua carta magna foi mais uma vez respeitada. De que eles, americanos,
venceram o vilão que ameaçava seu bem mais precioso: a liberdade.
A primeira ementa da Constituição dos EUA, cujo texto comentado se
encontra reproduzido na seção de anexos desse trabalho, estabelece que:
“O povo não será privado ou impedido do seu direito de falar,
escrever ou expressar seus sentimentos; e a liberdade de imprensa,
um dos grandes baluartes da liberdade, será inviolável.'' (tradução
nossa)
Entendemos que a enunciação construída pelo episódio deixa claro e
assegurado o respeito a esse “mandamento” da Constituição Americana,
principalmente quando os autores nos apresentam as falas dos personagens Sr. Burns
e Smithers na forma do diálogo descrito no item 5.4.4 desse trabalho.
177
cf. DaMatta, 2005
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
126
6.4.6. Nas entrelinhas do sucesso
Em todos os casos o apelo presente é para que
conheçamos a nós mesmos, a partir do espelho
oracular da vida alheia. Suportemo-nos, porque
quem viva ou seja pior. Acreditemos no futuro, em
nossas utopias e vejamos o passado pelas lentes
míopes da cultura midiática. (LOPES, 2004)
No início da análise do episódio “Guerra de Imprensa” nos propusemos à
fazer um breve levantamento e argumentação sobre os diversos intertextos presentes
em enunciado e como o texto parodístico se vale da intertextualidade para produção
sentido. Não é nossa pretensão esgotar o assunto, por temos muito claro que a
atualização do sentido se faz a cada novo olhar sobre o objeto e que muitos outros
pontos a serem explorados dentro de nosso recorte temporal.
Tecemos nossa análise sob a ótica de teóricos da Análise do Discurso, da
Semiótica e das Teorias da Comunicação conhecidos até a presente redação por
defenderem haver mais de um texto dentro de qualquer enunciação engendrada
pelo(s) falante(s) em sua rede intersubjetiva, quando da interação sociocultural.
Em nossa exploração da malha dialógica do enunciado de “Guerra da
Imprensa” descobrimos que o discurso ancora seu sentido em três pontos chave à
saber:
a cultura americana, mais especificamente a do sonho americano
relativo ao enriquecimento por parte dos imigrantes e que deu
origem na língua à expressão idiomática “fazer a América”;
o cumprimento do direito civil de liberdade de expressão
garantido na primeira ementa da Constituição Americana; e
um breve recorte temporal da biografia do proprietário de um
império comunicacional midiático que inclui o Canal Fox, onde o
desenho animado “Os Simpsons” é veiculado quase duas
décadas.
Também validamos a afirmação de Laurent Jenny (1979) de que seja qual
for o seu suporte ideológico confesso, o uso intertextual dos discursos corresponde
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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Cláudia Regina da Silva Franzão
127
sempre a uma vocação crítica, lúdica e exploradora de seus autores/enunciadores
para com a situação oficial que veio a gerar o texto parodístico. Em tom de comédia,
calçado pela carnavalização, ao aproximar Lisa e o Sr. Burns os autores do episódio
externalizam sua leitura dos fatos oficiais que compõem parte de sua história e que
agora estão registradas em uma nova forma de escrita (MAINGUENEAU, 2008).
Lisa, como a personificação das raízes intelectuais do povo americano,
comunica neste episódio o discurso conceitual de democracia greco-romano (um
governo do povo, para o povo e pelo povo) ao vencer Burns. Por sua vez, o Sr.
Burns, personificação mais clara nessa narrativa do poder capitalista, comunica que é
tão vulnerável quanto qualquer mortal. Embora Burns personifique o discurso de que
o dinheiro no sistema capitalista é um Deus que te concede poder irrestrito, vemos
ressaltado também o discurso de que a consciência de direitos e deveres pode
sobrepujar o poder monetário, preenchendo o mito da supremacia da intelectualidade
sobre o materialismo capitalista, ou seja, como numa narrativa de cunho oral,
estamos diante da moral da estória (FÁVERO, 2003): o bem (Lisa) sempre vence o
mal (Burns).
Dessa forma a sátira social expressa pela paródia simpsoniana como um
comentário a respeito da sociedade contemporânea demonstrou ser pertinente
auxiliada em sua produção de sentido pela intertextualidade com fatores culturais e
em fatos reais da história americana. Ao juntar elementos díspares de nossa humilde
condição de seres humanos tentando sobreviver em um mundo carente de
entendimento mútuo, o texto parodístico de Os Simpsons aproxima, forma e estilo
à vida não dos cidadãos americanos, mas de muitos outros telespectadores em
outros países onde a obra midiática é veiculada, pois carrega em sua enunciação a
dualidade entre valores universais cultuados pelas sociedades que se intitulam
democráticas e conserva a ambigüidade típica dos enunciados televisivos, os quais
permitem que a peça midiática seja lida e acolhida tanto pela classe mais abastada,
sob o ponto de vista econômico, como por qualquer outra. Embora cada cidadão de
Springfield consiga produzir o seu próprio jornal e colocá-lo em circulação, como o
próprio episódio apresentou, ainda são os grandes produtores de mídia que tem a
credibilidade do público. Isso fica registrado no discurso enunciativo do episódio na
fala de Mr. Burns e Smithers dirigida ao enunciatário.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
No Gênero Desenho Animado de Núcleo Familiar “Os Simpsons”
Cláudia Regina da Silva Franzão
128
6.5. 24 MINUTOS em OS SIMPSONS (2006/07)
-
real e imaginário: distantes?
Quando estamos olhando para um objeto, antes
mesmo de conseguirmos reconhecê-lo, o
analisamos e julgamos” como devemos tratá-
lo. (GARCIA,2008)
178
Considerada uma das maiores invenções do século XX, a televisão
apresenta-se como ambiente ideal para o desenvolvimento de simulacros da interação
sócio-comunicativa, pois como afirma Charaudeau (2006), a TV é som e imagem em
movimento real. Narrativas televisivas, cujos planos de expressão estão sintetizados
na encenação da figuratividade constitutiva de valores, crenças e ideologia(s) de uma
cultura estabelecida, são apresentadas tomando-se por base o substrato esperado do
imaginário coletivo da audiência.
Por entender que o sucesso de uma obra midiática funde ao mesmo
tempo real, imaginário, virtual e latente para cooptar seu público alvo à firmar o
contrato comunicacional, esta sessão pretende traçar um paralelo entre duas obras
televisivas de gêneros distintos (drama e suspense X paródia e desenho animado de
núcleo familiar), mas cujos planos de conteúdo se mostram convergentes para a
construção de sentido em ambas. Nossa argumentação se desenvolve principalmente
a partir de referencial teórico das obras Semiótica do Discurso de Jacques Fontanille,
da Análise do Discurso das Mídias de Patrick Charaudeau e os conceitos de
polifonia, dialogismo e intertextualidade de Bakhtin e seus comentadores.
Segundo Lopes (2004), o contrato de nossa época ressalta as mídias, as
sacraliza e faz desfilar por elas personas midiáticas que nos inculcam mitos
compartilhados de beleza feminina e masculina, inclusive os ideais estéticos raciais e
corporais; os ideais de riqueza, fama e poder acreditados; parâmetros de moda e
comportamento, inclusive o sexual; desejos de consumo; e modos de pensar e
compreender o que se passa a nossa volta.
178
Rafael Garcia, Estudo liga visão à tomada de iniciativa, “Folha de São Paulo” – Caderno
Ciência, folha A12, edição de 5.02.2008.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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129
Ao representarem os papéis sociais de seus personagens, as atuais
personas midiáticas, no âmago da questão, dão vida ao mito do herói, tão antigo
quanto a história do povo que ora o encena. Embora o mundo moderno lhe nova
roupagem e forma no plano de expressão de uma narrativa temática, o mito do herói
continua presente no plano de conteúdo dessa mesma narrativa; ainda é o poder do
simbólico construído por valores que se tornaram parte da cultura de um determinado
grupo social por dar-lhes segurança e alento frente ao lado escuro de suas
personalidades enquanto seres-humanos que alimenta a produção de sentido do texto
como um todo de significado.
Parece insensato argumentar que Jack Bauer, protagonista de “24
Horas”, e Bart Simpson, o filho pentelho de Homer e Marge Simpson, façam parte
de uma mesma esfera de atuação discursiva, porém, ao longo deste texto nos
propomos a construir uma abordagem entre o sucesso de 24 Horas e a sua
releitura pela paródia simpsoniana em 24 Minutos” a partir de levantamento dos
recursos textuais usados em ambos, defendendo a premissa de que seu sucesso de
público provém da atualização
179
do mesmo suporte imaginário, assim como do
mesmo discurso ideológico gerado pelo contexto sócio-histórico da época de ambas
as produções.
6.5.1. O bios midiático e a estesia
Colocando em primeiro plano seus significantes e
alegremente deslocando-os dos significados estáveis e
previsíveis, a série permite um tipo de leitura
associativa mais rica, e traz uma sátira social mais
penetrante.(ARNOLD, 2004 : 251)
O bios midiático
180
, a vida dentro do simulacro criado para a TV e pela
mesma é uma transformação do espaço-tempo, adequada às novas estruturas e
configurações da vida social, pois vemos desfilar diante de nossos olhos mundos
distantes no espaço-tempo, assim como, costumes tão diversos que às vezes nos
escapam seu sentido maior de acontecimento. Por outro lado, este mesmo simulacro
179
Atualização: contextualização e novo sentido para leitura do texto à que se é exposto.
180
Muniz Sodré (2006 : 99)
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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130
nos aproxima, ao despertar sentimentos de medo e coragem, empatia ou antipatia,
justiça ou injustiça ... entre o que se apresenta e representa na forma de nossas vidas
sendo projetadas para dentro da obra midiática. Uma espécie de comunidade afetiva
parece se formar e sustentar-se a partir de infinitos estímulos eletro-eletrônicos que
ou fluem por filamentos óticos fibrosos ou propagam-se pelo ar em forma de ondas
invisíveis que adentram nossas vidas, provocando sensações. Sensações essas que
surgem, desaparecem, nutrem-se e geram não práticas sociais, reflexões e ações
sobre o cotidiano, mas também mercados.
Emerge uma forma de vida duplicada com características ora virtuais, ora
reais, mas sempre latente no pensamento, pronta a responder quando ativada por um
signo para ajustar-se a um contexto semelhante ao que a gerou anteriormente. Em
constante processo de produção de sentidos, obras midiáticas massificam-se em
busca da audiência, lançam mão da utilização de codificação dupla ao incorporarem
tanto os códigos altos quanto os populares em seu texto
181
midiático visando cumprir
suas metas mercadológicas. Pelas mãos de seus autores/enunciadores (re)nascem
fórmulas para (re)ler o cotidiano em forma de ficção.
Na série de TV 24 Horas”, protagonizada por Jack Bauer, vemos
desfilar diante de nossos olhos atentos, um plano de expressão cuja linguagem nos
remete às mazelas que assombram o mundo moderno do ponto de vista
‘estadosunidensse’: o medo do outro. Esse outro que pode assumir vários
significantes: desde um terrorista, cuja face ainda não está bem delineada, mas que
ganha corpo à medida que o episódio se desenrola, quanto pode vir a ser o próprio
tempo real, marca característica da série e expressa por um relógio digital similar ao
artefato de tempo de uma bomba. Acrescente-se à lista (terrorismo, bomba e tempo)
informações geopolíticas e culturais bem alicerçadas na realidade e teremos uma
obra de tom factual-ficcional
182
, que parece tão verdadeira quanto o fato histórico
real que a gerou, ou seja, o atentado terrorista 11 de Setembro, o qual serve de
substrato intertextual para o seriado.
O cruzamento de dois tipos de roteiros, o dos filmes catástrofe e das
reportagens, veiculados pelos mídia na época do atentado alimentam o diálogo de
24 Horas” com seu telespectador. Uma possível nova situação de conflito frente ao
181
O conceito de texto adotado neste trabalho está em concordância com Antonini (2007 : 144) para
quem texto é “um todo de sentido que se insere num dado momento cultural.”
182
Duarte, 2007.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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131
mundo globalizado em que vivemos entra em sua vida pelos mais diversos veículos
midiáticos (televisão, jornal impresso, revistas e transmissões de rádio) que
noticiaram o atentado ou o usam como ponte intertextual na geração de novos
significados, influenciando o sujeito do processo comunicativo ao mesmo tempo em
que é influenciado por sua responsividade. Na produção de sentido sob o regime de
crença da veridicção, a informação recebe tratamento, ganha toques aqui e ali de
espetacularização.
Charaudeau (2006) sugere haver um paralelo discursivo na mídia entre o
roteiro do filme catástrofe e a composição das notícias relativas ao 11 de Setembro
lembrando que o gênero cinematográfico é organizado sob o modo do conto popular:
inicia-se por uma contextualização para depois dar lugar a disjunção ou ruptura da
ordem, a qual exige uma ação/reação por parte dos heróis vindos de fora
(colaboradores) para promoverem o salvamento (objeto do desejo) e a restauração da
antiga ordem (devolução do poder por reparação do sistema) com sanção positiva.
Em comparação com o roteiro da reportagem, ainda com base em Charaudeau
(2006), vemos a linearidade descrita acima eclodir a partir da disjunção ou ruptura da
ordem reinante no mundo comercial até então. Resultados da disjunção o exibidos
(injustiças) e conclama-se uma ação de socorro para reparação do sistema.
Diante do exposto, o discurso da mídia vale-se de imagens sintoma
183
para firmar o contrato de veridicção ao expor o falecimento e a dissolução de algo
que representa a vida, de algo que nos é precioso, querido e almejado. Imagens que
mostram o desabamento de nossas ambições, realizações pessoais e seres queridos
impregnam-se em nossa mente e nos fazem reagir primeiro de modo instintivo e
depois racional. Tais imagens são dotadas de forte carga semântica, remetem não
a outras imagens por analogia formal ou discurso verbal, mas também a imaginários
profundos da vida (dramas, alegrias, sofrimentos ou a simples nostalgia de um
passado perdido) como o que vemos acompanhar a trajetória de Jack Bauer a cada
nova missão em “24 Horas”.
Ao dar movimento à trama do episódio em uma linha narrativa que vai
do desconhecimento ao re-conhecimento da identidade, a moral discursiva se impõe,
ou seja, a partir do popular se compreende e se expressa a opacidade e a
complexidade que revestem as novas relações sociais em boa parte reguladas pela
183
Charaudeau (2006 : 247)
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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132
negociação do tempo cronológico face ao espaço ocupado perante a interação
intersubjetiva almejada e os objetivos envolvidos, a partir dos quais se direciona o
tom que deverá ser impresso à leitura da obra midiática.
Se 24 Horas” nos conduz à uma leitura de tom predominantemente
sóbrio, por outro lado temos a produção 24 Minutos” de “Os Simpsons”, que por
meio de seu texto parodístico nos convida à leitura da situação de conflito pela ótica
do riso libertador do medo da situação disjuntiva enfrentada por Jack Bauer.
Dessacralizando a seriedade oficial unilateral e sombria gerada pelo medo, o texto
parodístico traz a situação de disjunção para perto do homem comum. A
carnavalização de ações e espaços pelos personagens de “Os Simpsons” atribui
ressignificação para o conflito. Pela mão da comunicação do grotesco na atuação dos
personagens de Matt Groening, somos libertos de nossas angústias ao percebermos
no vídeo que alguém pode ser ainda pior do que nós mesmos
184
.
No texto parodístico criado por Billy Kimbal e Ian Maxtone-Graham
para os personagens de Groening, podemos observar sua movimentação em uma
intertextualidade ao mesmo tempo estilística e lúdica
185
de tom humorístico sobre o
discurso das instituições de poder do estado-nação. As peripécias de Bart (em ação) e
Lisa (na UCV Unidade Contra Vadiagem) aliadas à duas narrativas secundárias
(Homer e Milhouse atravessando Springfield dentro de uma lixeira e Marge correndo
contra o relógio para fazer e entregar seu famoso bolo esponja com passas para a
feira anual da escola primária de Springfield) se inter-relacionam ao estilo da
narrativa de tom sóbrio de 24 Horas”, para compor o sentido carnavalesco da
paródia.
Consideramos que “24 Minutos” tem sua primeira entrada intertextual
com a série 24 Horas” quando a equipe de produção de “Os Simpsons” retira do
episódio a vinheta de abertura e a célebre cena do sofá, para reproduzir o modo como
a estória sobre Bauer entra no ar: diretamente, sem vinheta de apresentação. Em
outros episódios de Os Simpsons, tanto a sentença escrita na lousa por Bart, quanto a
cena da família sentando no sofá, adiantam para o telespectador o mote e a síntese da
estória. Entretanto, desta vez nenhum dado sobre o que acontecerá é adiantado ao
telespectador, aguçando-lhe a curiosidade.
184
Muniz Sodré, 1978.
185
Koch, 2007.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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133
A supressão é proposital, pois visa conduzir a memória do telespectador
à série “24 Horas”, cujos episódios sempre começam com o close de números de um
marcador digital dispostos similarmente aos de um dispositivo de tempo de uma
bomba. Não há uma vinheta regular de apresentação dos atores que interpretam os
personagens, apenas no centro da tela vão aparecendo aleatoriamente bastões digitais
amarelos, até comporem os números dois e quatro, enquanto isso ouve-se a “música
incidental” composta por notas agudas e em compasso que se acelera.
O telespectador é conduzido abruptamente para dentro da narrativa, onde
a urgência do tempo real é proposta por imagem e som remanescentes de associações
de sentido anteriores, ou seja, pela sensação estésica recalcada. Ao longo do episódio
informações como datas, hora e local são acompanhadas no mostrador digital que
irrompe em qualquer lugar da tela, acompanhado pela incidência repetitiva de uma
nota musical de tom grave em compasso lento e tom musical semelhante ao de
batimentos cardíacos, produzindo ligação semântica entre tempo e vida no desenrolar
da missão de Jack Bauer, a qual deve ser cumprida em um dia, ou seja, 24 horas.
Na abertura de 24 Minutos” de “Os Simpsons” os mesmos pequenos
bastões amarelos surgem na tela, acompanhados de um som ritmado e agudo, cujo
compasso se acelera até que finalmente se transforme em um efeito sonoro
semelhante ao de um deslocamento à velocidade da luz enquanto vemos a tela da TV
passar de preto para vermelho, como se estivesse em chamas. Ouve-se também o
som sintetizado de uma explosão e os bastões digitais aparecem distorcidos. O nome
“Os Simpsons” surge no centro da tela, envolto por forte luz amarela sobre fundo
preto e as letras esfacelam-se ao som de vidro se quebrando. Imediatamente
emergem as palavras “Previously on The Simpsons”, em branco, que são lidas como
“Previously on 24” pelo narrador em ato falho que reforça a ligação intertextual com
24 Horas”.
Outra entrada intertextual usada nesse texto parodístico é a apresentação
de personagens no primeiro bloco fazendo-se o congelando da imagem, diminuindo-
a na tela até lembrar o tamanho de uma foto de passaporte, para depois ser deslocada
para o canto esquerdo da tela negra. Dados sobre o personagem são exibidos à
direita, em posição centralizada. Esses dados são inscritos na cor branca e trazem
informações triviais, com vários trocadilhos, como, por exemplo: “Lisa Simpson.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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134
Love pôneis, hate phonies”
186
. Apenas Bart e Marge têm suas “fotos” posicionadas à
direita na tela. Toda essa movimentação da imagem e aparecimento de caracteres é
acompanhada por efeito sonoro que lembra gavetas de arquivos sendo abertas e
fechadas rapidamente na ligação de sentido estésico de urgência.
No caso da passagem de um quadro a outro ou de uma cena a outra,
especialmente em situações de clímax narrativo, a ação se faz com a divisão da tela
em pequenas “janelas” narrativas. Em cada uma delas percebemos um ângulo de
visão sobre a micro-narrativa que se desenrola, no entanto, o objetivo é sempre o
mesmo: ressaltar, mostrar, chamar a atenção para objetos, expressões e ações que são
importantes para o desenrolar da estória. Tomemos como exemplo a seqüência em
7’48” na qual o relógio, ao centro da tela, mostra 2:38:55 e nos primeiros quatro
pulsos aparecem uma a uma as janelas narrativas. Percebemos uma lógica em torno
da disposição do espaço-tempo, ou seja, na parte superior temos violência (Jimbo
envenena um hamster) X violência (Marge briga por um pacote de passas no
supermercado) e na inferior irresponsabilidade (Bart dirige o carro de Skinner
desatentamente) X irresponsabilidade (Milhouse e Homer atravessam a cidade em
um container para lixo) como semas de base, sendo que a janela expandida a seguir é
a de violência no supermercado.
Em dois outros momentos também se observa uma composição
quaternária da tela, contudo, nestas não parece haver repetição de conteúdo de forma
ordenada. Em uma delas, na parte superior do vídeo, temos o relógio ao centro e
janelas narrativas cujos conteúdos ressaltam medo X ansiedade e determinação X
irresponsabilidade, prevalecendo a carnavalização de um aparelho de controle do
Estado na janela expandida a seguir. Abaixo, representamos estilizadamente a
distribuição das “janelas narrativas” no vídeo, representando-as por condensações de
significado:
violência violência insegurança insegurança
instinto instinto medo ansiedade
Relógio Relógio
2:49:08 2:38:55
irresponsabilidade irresponsabilidade segurança irresponsabilidade
alienação alienação determinação alienação
186
“Lisa Simpson. Ama pôneis, odeia fofocas.”
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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135
Na próxima movimentação de divisão da tela em quatro pontos,
encontramos determinação X local público e sabotagem X medo, sem que uma das
quatro janelas se expanda como acontecera anteriormente.
determinação local público
segurança coletivo
Relógio
2:55:40
sabotagem medo
individual insegurança
Percebe-se que violência (instinto), irresponsabilidade (alienação) e
medo (insegurança) aparecem nas três situações descritas, conduzindo-nos à lógica
de que as janelas narrativas com o relógio ao centro assinalam o plano de conteúdo
de cada bloco do texto na construção do todo de sentido.
6.5.2. O herói Bart Bauer
[...] as formas da vida cultural, que se expressam em
linguagem e na capacidade de comunicação que
articula sons providos de significado, apresentam
uma variedade de manifestações que não se resumem
somente em idéias, mas também em sentimentos e
afetos. (TARDELI, 2007 : 15)
O plano de conteúdo, a narrativa figurativa, é povoado por símbolos ou
arquétipos do inconsciente coletivo, os quais facilitam o encontro do próprio sujeito
dentro da trama de forma atemporal. Heróis, vilões, vítimas e bobos estão presentes
na representação de um conteúdo mais amplo e profundo da vida que existe em nós.
A partir da simbologia do herói moderno contida em Jack Bauer,
protagonista de24 Horas”, vemos Bart Simpson passar de rebelde social a herói da
sociedade escolar de Springfield. Qualidades do garoto como coragem e ousadia,
consideradas positivas para a solução da situação disjuntiva, são mostradas como
acima da negativa rebeldia e desrespeito a todo e qualquer tipo de autoridade quando
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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136
o sucesso da feira de tortas é ameaçado pela bomba de fedor de Jimbo. Aconselhado
por Lisa, o diretor Skinner decide que Bart será o herói, o colaborador que vem de
fora para restabelecer a ordem. Um herói mais próximo do humano, com virtudes e
defeitos, da mesma forma que Jack Bauer é construído pelo texto de “24 Horas”.
Instinto e razão convivem nos atos de ambos, Bart e Bauer, assim como em nossas
vidas reais.
Real, imaginário e ficção se cruzam mais explicitamente no plano de
expressão quando, ao pedir socorro via celular, Bart se numa linha cruzada com
Bauer em ação. Cada um dos personagens tem então sua personalidade reforçada por
atos identitários de seus seriados de origem, tais como o trote que Bart passa em
Bauer, o fato de Bauer estar em meio à um tiroteio e requisitar dados a Chloe na
UCT e também serem Kief Sutherland e Mary Lynn Rajskub os dubladores de Bauer
e Chloe no desenho de “Os Simpsons”. É a TV promovendo interação entre espaços
comunicantes distintos dentro do próprio meio, ou seja, uma série ficcional de base
real (24 Horas) se fundindo à um desenho animado de base imaginária com
tendências ao fantástico, pois quantas pessoas usam uma lixeira como carro, um
iogurte estragado como principal ingrediente para uma bomba de fedor, ou se valem
de um bolo queimado para quebrar vidro ? Quantos diretores de escola têm uma
UCV? Com que freqüência se agentes secretos com armas, helicópteros e tanques
invadindo uma feira de doces na quadra de uma escola pública?
A emergência do sentido para o enunciatário telespectador provém de
que tudo o que foi descrito pela situação parodiada reside nos elementos que
compõem o regime de crença por verossimilhança tanto em Os Simpsons quanto em
24 Horas”, ou seja,
o artificial (o diferente do natural, do real) imita o real, duplica-o
(iguala-se ao real) e supera-o (marca-nos mais que o real). O gesto radical do
verossímil consiste nisto;
uma conjunção de sememas opostos, suficiente para conduzir
(o impossível) ao verdadeiro (ao princípio natural) (KRISTEVA 2005 : 136), pois
seja na sociedade pós 11 de Setembro ou na Springfield atemporal, a identificação de
nós mesmos dentro das duas narrativas nos induz à projeção de nossos anseios em
garantir que o bem prevaleça sobre o mal na performance realizada pelos
personagens. Uma conduta fortemente enraizada nos princípios culturais que nos
identificam como seres pertencentes à um determinado grupo social e com função
definida dentro de uma determinada esfera discursivo-social de atuação.
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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137
6.5.3. Good work, Lisa!
Um “contrato” envolve um pacto em que o texto
falará conosco de maneira reconhecível. E esse
diálogo, com seus elementos e suas formas fidedignas,
irá se relacionar com alguns aspectos das nossas
vidas em sociedade. (Strinati apud Baker, 1999 : 245)
Em nossa interpretação e análise do plano de conteúdo do texto
parodístico do episódio “24 Minutos” de “Os Simpsons” procuramos esclarecer
como o diálogo intertextual entre duas obras de ficção pertencentes a gêneros
distintos podem estar interligadas com o imaginário coletivo para produção de
sentido pela peça midiática.
Iniciamos nossa análise pelo exame da disposição de elementos no plano
de expressão que conduzem o telespectador à experiência estésica ativada pela
intertextualidade com o cotidiano do mundo real de forma carnavalizada.
Entendemos que esta chave de sentido é atenuante da seriedade do conflito
representado pelo medo do outro pós 11 de Setembro ao garantir ao público
telespectador que tudo pode ser resolvido na figura mitológica do herói, que na
modernidade encontra-se personificado pela celebridade midiática do momento.
Concluímos que tanto Jack Bauer como Bart Simpson são transformados
em ícones representativos da justiça no resgate da hegemonia
187
ferida do povo
americano marcado pelo atentado terrorista do 11 de Setembro, ou seja, Jack e Bart,
ambos celebridades midiáticas para a sociedade americana, dão vida ao ator social
que se quer ver formatado no imaginário da massa popular após aquela data fatídica.
Reduz-se uma prática (um teatro) a um objeto (a uma imagem plana) para reforçar e
reproduzir uma visão de mundo: nós americanos ainda temos o controle da situação.
A construção de sentido é implementada pelo diálogo intertextual entre o
mundo factual, o imaginário, o virtual e o latente a partir das atitudes de ambas as
celebridades (Jack Bauer e Bart Simpson) diante da situação de disjunção (o 11 de
Setembro e o atentado a bomba nas Escola Primária de Springfield).
187
Sobre o conceito de hegemonia cf. Strinati (1999 : 163)
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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138
7. UM ÚLTIMO BLOCO A GUISA DE FECHAMENTO:
O DISCURSO MASCARADO
As narrativas do vivido contam o social que se conta
por meio de suas práticas e fabulações. Tomam os
imperativos categóricos de uma época como
barômetros das pressões atmosféricas dominantes e
medem a vibração existencial com base nos
parâmetros das expressões contingentes. Cada aldeia
é um universo. [...] Fazem a crônica sociológica da
pulsão comunitária. Identificam as pulsões culturais.
Coletam as informações que circulam na teia social
para estabelecer mosaicos de dados (nem sempre
lançados). (SILVA, apud MOREIRA, 2005 : 81-82)
Os desenvolvedores de Os Simpsons reproduzem uma matriz discursiva
hegemônica (a família de classe média vivendo no mundo capitalista): a família e seu
viver cotidiano permeado por questões tanto existenciais quanto imediatas. A riqueza
e a diversidade fica por conta de nossas atuações na resolução de problemas que
parecem, à primeira vista, simples, mas que encerram em si indagações maiores. A
profundidade da enunciação simpsoniana localiza-se em nos fazer rir de nossa
própria imperfeição frente à seriedade da situação diante de nossos olhos.
Dentro do discurso elaborado para Os Simpsons verificamos haver um
diálogo intertextual de produção de sentido alimentado em sua primeira entrada pelo
imaginário da cultura norte-americana alicerçada no ser-em-si (fenômeno), mas que
produz êxito ao aliviar o peso do ser-para-si (consciência), como segunda entrada de
sentido, por lembrar o enunciatário telespectador que, embora sua vivência em
sociedade seja permeada por batalhas diárias, ainda existem seres ao seu redor que
estão em iguais ou piores condições de preparo ante as peças que a vida lhes prega.
A reprodução de matrizes hegemônicas do mercado internacional ou a
elas assemelhando-se inequivocamente faz com que um produto televisivo de notória
audiência seja repetido em outros formatos, dando origem a híbridos que se
enriquecem em movimento referenciais de intertextualidade, transtextualidade e
intratextualidade como forma de produção de sentido ampla pelo discurso midiático
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como aduz Da Matta (2005 : 123) ao declarar que A experiência americana, por
exemplo, mostra que a TV tem muitas caras, cada qual relacionada à sociedade na
qual atua, transforma, constrói e também ajuda a enxergar.
A paródia produzida para e pelos Simpsons configura-se em relato da
vida cotidiana a partir do momento em que considerarmos o gênero discursivo
paródia como um novo texto (SANTANNA, 2004) sobre a vida factual das
sociedades culturais do mundo globalizado. Em Fraudcast, por exemplo, o discurso
enuncia-se a partir do simulacro construído em cima da veridicção de que a
consolidação de um império de media é possível pelas mãos do empresário
Ruppert Murddock; em 24 Minutos o ataque terrorista de 11 de Setembro embasa a
enunciação de que a nação americana ainda é auto-suficiente na resolução de seus
problemas, sendo que isso se manifesta por meio da existência transcendente de dois
personagens fictícios (Bart Simpson e Jack Bauer) e seus discursos,os quais
promovem a crença em um Estado forte frente a tragédia que o abateu no fatídico
ataque; em Helter Shelter é a vez da enunciação erguer-se sobre o formato Reality
Show ao transcender a participação da família Simpson em um programa daquele
gênero; em 30 Minutes Over Tokio somos expostos a enunciação do possível juízo
de valor da sociedade americana frente a sociedade japonesa recalcada na telinha em
sua produção para a TV, seu conceito de humor e de nação produtiva no mundo do
capitalismo ocidental; em Springfield File percebemos a enunciação delineada a
partir do medo do desconhecido e suas explicações pela media e seus veículos.
Ao encerramos esse trabalho, esperamos ter contribuído para o melhor
entendimento da comunicação produzida pela e para a TV sem perdermos de vista a
plena consciência de que o assunto tratado não foi esgotado em suas possibilidades
interpretativas, pois apenas alguns pontos considerados mais relevantes dentro da
narrativa foram apresentados, ficando vários outros ainda em aberto para trabalhos
futuros.
Particularmente o que nos interessou, e procuramos produzir maior
cognição a respeito, é como se a produção de sentido nas peças midiáticas por
meio da leitura intertextual de sistemas significantes primários que se tornam
secundários dentro do texto parodístico para a TV. Por acreditarmos que a utilidade
do texto veiculado pelo enunciador TV está nos olhos do enunciatário consciente da
A Intertextualidade Geradora de Sentido
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sua própria linguagem e da linguagem do outro, seu interlocutor, verificamos que a
função de um meio de comunicação, que reúna áudio e imagem em um ambiente,
está nos olhos de quem o assiste. Cremos que o texto televisivo em seu formato
parodístico presta-se a ser a ponta do iceberg para uma viagem muito mais
interessante sobre a produção de sentido em relação ao meio social em que se
encontra o enunciatário e as tantas leituras em que se pode transver o momento
sócio-histórico vivido a ser narrado, caso enunciador e enunciatário se proponham a
preencher de forma cognitiva as lacunas de sentido discretamente abertas pelo e no
texto por seus produtores.
No Brasil os seriados vêm ganhando cada vez mais espaço nas grades de
programação das emissoras televisivas. Fórmula importada dos países de língua
inglesa, principalmente Estados Unidos, encontrou em território verde e amarelo,
onde o gênero literário crônica aliado ao gênero televisivo novela são os carros
chefes de nossa literatura
188
, terreno fecundo para se fixar. Se há mais de três décadas
rimos com as situações paródicas de A Grande Família, também nos emocionamos e
rimos com as situações mais próximas do mundo factual do século XXI sobre a atual
configuração da família brasileira retratados na “mini-série” Tudo Novo de Novo
exibida pela Rede Globo de televisão no período de abril a julho de 2009
189
. Assim
como Os Simpsons, Tudo Novo de Novo ecoa seu discurso pelo gênero sitcom, porém
com personagens interpretados por atores de carne e osso a dar fluência e/ou fruição
a necessidade humana de narrar sua história.
188
Usamos o termo literatura para definir toda manifestação de leitura de mundo registrada de forma
impressa ou pelos novos meios de comunicação de massa, como descrito em Maingueneau (2008).
189
<< http://tudonovodenovo.globo.com/Tudonovodenovo/0,30514,16907,00.html >> Acesso em
20.07.2009.
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ANEXOS
ANEXO I – Script original do episódio “Arquivo S”
THE SPRINGFIELD FILE
EPISODE 3G01 AIRED January 12, 1997 WRITTEN BY Reid Harrison DIRECTED BY Steven Dean
Moore
ACT ONE
Leonard Nimoy is sitting behind a desk in a darkened room.
NIMOY - Hello, I'm Leonard Nimoy. The following tale of alien encounters is true. And by
true, I mean false. It's all lies. But they're entertaining lies, and in the end, isn't that the real
truth? The answer...is no. Our story begins on a Friday morning, in a little town called
Springfield...
He opens a book which has a picture of Homer in it. The drawing dissolves to Homer at the
plant.
HOMER - T.G.I.F.! Guys, I'm off to Moe's.
LENNY - But Homer, it's ten in the morning!
HOMER - Don't worry, I have a plan. I saw this in a movie about a bus that had to SPEED
around the city, keeping its SPEED over fifty. And if its SPEED dropped, it would explode. I
think it was called... "The Bus That Couldn't Slow Down." First, I hook this common VCR
into the security camera system like so, then I insert this old videotape of us working on a
continuous loop. (The tape from the 1970's has Homer eating donuts in a "Sit On It" T-shirt,
and talking to Lenny. Then, the tape abruptly cuts to Lenny doing a Saturday Night Fever
style move - flares and all)
Pan out to Burns office, where he and Smithers watch the tape on the monitor.
BURNS - So, another Friday is upon us. What will you be doing Smithers? Something gay
no doubt?
SMITHERS - What? What?
BURNS - You know: light-hearted, fancy-free, mothers lock up your daughters! Smithers is
on the town! (chuckles)
SMITHERS - (laughs) Exactly, sir. (laughs nervously)
At the retirement home.
JASPER - Thank God it's Wednesday. (swallows a cup of pills)
MRS. GLICK - It's Friday.
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JASPER - Uh oh, wrong pills. (he suddenly grows hairy) Uh, little help?
At Noiseland Arcade: "Friday, Meet Donkey Kong In Person". Donkey Kong is smoking and
scratching himself, without an audience.
SARCASTIC CLERK - Sorry, Donkey Kong, but you're just not a draw anymore. (Donkey
Kong throws a barrel, and knocks him down) Hey, he's still got it!
Inside, Milhouse plays Kevin Costner's Waterworld.
MILHOUSE - (putting money in) 38, 39, 40 quarters. This better be good.
The character in the game moves two steps, and stops.
GAME - Game over, please deposit 40 quarters.
MILHOUSE - What a rip!
But he starts depositing quarters again.
DR HIBBERT - Thank God it's Friday!
He hums as he leaves, closing the door to reveal Hans Moleman stood behind an X-Ray
machine.
MOLEMAN - Hello? Hello?
At the Simpson’s home, the living room looks spotless...however it's just a picture in a
magazine entitled "Better Homes Than Yours". Santa's Little Helper chews on a chair, and
Snowball II scratches the furniture.
MARGE - Bad dog! Bad cat! (A fawn licks something off the carpet) Bad Fawn!
Hmmm...Shoo shoo!
Bart and Lisa are in the den watching television.
LISA - All right! It's time for ABC's T.G.I.F. line-up!
BART - Lis, when you get a little older, you'll realize that Friday is just another day between
NBC's Must-See Thursday and CBS's Saturday night Crap-o-Rama.
At Moe's Tavern.
MOE - Another Duff, Homer?
HOMER - Nah, it's Friday night, Moe. I want to try something special.
MOE - Sure, sure. (writes on a bottle) Here you go, Düff. From Sweden, huh huh.
HOMER - Goal! (takes a sip) Wait a minute, this is Duff!
MOE – Heh, heh, you got me, didn't you? Okay, here you go, Red Tick Beer.
HOMER - Mmm...bold, refreshing, and something I can't quite put my finger on.
At the beer processing plant, dogs are swimming in a vat of beer, a tester tastes some
TESTER - Hmm, needs more dog.
HOMER - Well, it's 1am. Better go home and spend some quality time with the kids.
MOE - Just a second, Homer. You gotta take a breathalyzer test before I let you drive home.
The machine reads Tipsy, Soused, Stinkin', Boris Yeltsin. Homer gets the latter.
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HOMER - Uh, I guess I'll walk home. (walks out, swaying) Ohh...
He walks down eerie roads. He hears scary, Psycho-esque music and a light comes towards
him. It turns out to be a bus for the Springfield Philharmonic orchestra. The bus stops and a
violinist gets off. Homer continues on his way, and comes across a billboard reading "DIE".
He screams, but then a gust of wind blows a tree out of the way to reveal it actually says
"DIET". He screams louder and runs off towards the woods. Grampa emerges from the
undergrowth.
GRAMPA - Oh, son, I'm glad to see you! I went for the morning paper and I got lost! And--
HOMER - No time for you, old man!
He pushes him over, then while running trips over a root. He becomes bathed in a green
light, and X-Files-style music is heard. A green glow moves towards him, and an alien-
looking figure can be seen.
HOMER - Please, don't hurt me!
ALIEN - (with a soft voice) Don't be afraid.
HOMER - Yahhh!
Homer runs through a field of long grass, creating the pattern "Yahhh!"
ACT TWO
Back at home, Homer bursts into the bedroom.
MARGE - Homer, it's 2am. What happened?
HOMER - It was an alien, Marge! It appeared in front of me and said, "Don't be afraid"!
MARGE - Have you been drinking?
HOMER - No! Well, ten beers.
MARGE - Hmmm...
The next morning.
HOMER - I'm telling you, I saw a creature from another planet.
LISA - Maybe you just dreamed it.
HOMER - Oh yeah? Well when I came to I was covered with a sticky, translucent goo.
Explain that!
MARGE - More sausage? (Homer drools)
LISA - Dad, according to Junior Skeptic Magazine, the chances are 175 million to one of
another form of life actually coming into contact with ours.
HOMER - So?
LISA - It's just that the people who claim they've seen aliens are always pathetic lowlifes
with boring jobs. Oh, and you, Dad. (chuckles nervously)
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Bart runs in with a water pistol, and slinky eyes.
BART - I am the thing... from Uranus!
HOMER - Ahhh! Oh, it's Bart. I can't believe it. I'm being mocked, by my own children...on
my birthday.
BART - It's your birthday?
HOMER - Yes! Remember? It's the same day as the dog's.
LISA - Santa's Little Helper, it's your birthday? Ooh, we've got to get you a present. Yes, we
do. Yes, we do! (runs to the dog)
BART - We love you.
MARGE - Good doggy, good doggy! (Lisa, Bart, Marge and Maggie all hug the dog)
HOMER - Lousy loveable dog.
At the nuclear plant, Homer tells his colleagues about the experience.
HOMER - Oh, it was awful. They sat me on a cold, metal table and probbed me with
humiliating probes. And--oh, wait, that was my physical.
CARL - Great story Homer, really.
The crowd groans and leaves. Homer takes a trip to the police station.
HOMER - The alien has a sweet heavenly voice...like Urkel! And he appears every Friday
night...like Urkel!
WIGGUM - Well your story is very compelling, Mr. Jackass, I mean Simpson. So I'll just
type it up on my invisible typewriter. (Hums and makes typing motion in the air)
HOMER - Ugh, you don't have to humiliate me.
He leaves, and another man walks in, with scorched clothing.
ARSONIST - I just torched a building downtown, and I'm afraid I'll do it again!
WIGGUM - Oh, yeah right. I'll just type it up on my invisible typewriter. (Hums and types
again) Fruitcake.
Establishing shot outside a building. Text appears on-screen as if being typed, a la The X
Files:
FBI
DIVISION OF PARANORMAL ACTIVITY
WASHINGTON, D.C.
Inside, there is a picture of J. Edgar Hoover in a dress, Scully is typing on the computer.
Mulder enters the room.
MULDER - Look at this Scully. (He shows her the Springfield Shopper newspaper, with
headline: "Human Blimp Sees Flying Saucer" and a picture of Homer) There's been another
unsubstantiated UFO sighting in the heartland of America. We've got to get there right away.
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152
SCULLY - Well, gee Mulder. There's also this report of a shipment of drugs and illegal
weapons coming into New Jersey tonight.
MULDER - I hardly think the FBI is concerned with matters like that.
Mulder and Scully visit the Simpsons home. Mulder knocks on the door, and Marge answers.
MARGE - Hello. Can I help you?
MULDER - Agents Mulder and Scully, FBI.
MARGE - Is this about that pen that I took from the post office? I swear, I didn't know I put
it in my purse, then I was going to bring it back but the dog chewed it up, and that just made
things worse. (she hyperventilates)
SCULLY - Actually, we're here to see your husband about his UFO encounter.
MARGE - (still hyperventilating) Oh...come...come in.
At the FBI Springfield Branch (Invading Your Privacy For 60 Years). A line-up takes place.
SCULLY - Mr. Simpson, look at this line-up and tell us if any of these is the aliens you saw.
The aliens are Marvin the Martian, Robocop, Chewbacca, Alf, and either Kang or Kodos.
ALF - Yo!
HOMER - No, I'm sorry.
The aliens all mutter and leave.
MARVIN - This makes me very angry!
In an interrogation room, Cigarette Smoking Man hides in a corner, while Scully prepares
tests.
SCULLY - Now we're going to run a few tests. This is a simple lie detector. I'll ask you a
few 'yes or no' questions, and you just answer truthfully. Do you understand?
HOMER - Yes! (The machine blows up)
In another lab, Scully taps Homer's knee for reflex. A very long time later, Homer feels it.
HOMER - Ow!
Next Homer is on a treadmill in just his underpants, with electrodes attached to him.
MULDER - Wait a minute, Scully. What's the point of this test?
SCULLY - No point. I just thought he could stand to lose a little weight.
MULDER - His jiggling is almost hypnotic.
SCULLY - Yes. It's like a lava lamp.
Establishing shot outside Moe's. The phrase "ALL WORK AND NO PLAY MAKES JACK A
DULL BOY" is typed over and over on screen.
MULDER - All right Homer. We want you to recreate your every move the night you saw
this alien.
HOMER - Well, the evening began at the Gentleman's club, where we were discussing
Wittgenstein over a game of backgammon.
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153
SCULLY - Mr. Simpson, it's a felony to lie to the FBI.
HOMER - We were sitting in Barney's car eating packets of mustard. Ya happy?
HOMER - (Several beers later) You are one fine looking woman, lady. If I wasn't married,
I'd go out with you like that! (stamps bottle on bar, and it fizzes over) I am so sorry.
Whatever you do, don't tell Marge. God I love her! Hey, a penny! (Dives to grab it)
MOE – So, uh, so what are you guys anyhow?
MULDER - Agents Mulder and Scully, FBI.
MOE - FBI, huh? Uh, 'scuse me. (Goes to the back room, where two guys are hosing down a
whale) All right, they're on to us. Get him back to Sea World!
HOMER - (Even more drunk) So I said, blue M&M, red M&M, they all wind up the same
colour in the end.
SCULLY - Homer, why don't you show us where you went when you left the bar?
HOMER - (In the forest) I was standing right here, when the horrible creature emerged from
the woods.
There is a rustling from a bush, and Grampa emerges.
GRAMPA - For the love of God help me! I've been here for four days, and a turtle's got a
hold of my teeth! There he is. (Chases the turtle) Come back here, you! Slow down! I'll get
you...
SCULLY - This is the worst assignment we've ever had.
MULDER - Worse than the time we were attacked by the flesh-eating virus?
The turtle bites Grampa.
GRAMPA - Ow, it bit me with my own teeth!
SCULLY - No, this is much more irritating. I've seen enough Mulder, let's go.
MULDER - Yeah okay. But somewhere out there, something is watching us. There are alien
forces acting in ways we can't perceive. (Scully rolls her eyes, and leaves) Are we alone in
the universe? Impossible. When you consider the wonders that exist all around us. (hours
later) Voodoo priests of Haiti, Tibetan Numerologists of Appalachia. The unsolved
mysteries of...unsolved mysteries. The truth...is out there!
Moe and the two guys from the bar come pass carrying the whale.
MOE - Who would have thought a whale could be so heavy? Cheese it, the Feds! (they run
off) That night at the Simpsons’ home. Homer and Marge are in bed.
HOMER Oh Marge, I've never felt so alone. No one believes me. (pause) Uh, this is the part
where you're supposed to say, "I believe you, Homer."
MARGE - I don't believe you, Homer.
HOMER - You do! Oh Marge, you've made me so happy!
MARGE - Hmm... you're not listening. You're only hearing what you wanna hear.
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154
HOMER - Thanks, I'd love an omelette right about now.
MARGE - Homer, please! I try to be supportive, but this has gone too far. Please just let it
be.
HOMER - No, I can't. This is my cause. I'm like the man who single-handedly built the
rocket and went to the moon. What was his name? Apollo 3?
MARGE - Please, let's just go to sleep.
HOMER - No, I refuse to share a bed with someone who thinks I'm crazy. Unless you're
feeling... amorous. Rrrr!
MARGE - No I'm not.
HOMER - Well then, good night.
Homer is sat in the kitchen. Bart enters.
BART - Hey Dad. What's the word from planet crackpot?
HOMER - Oh, I suppose you're going to mock me too.
BART - Well actually dad, I believe you.
HOMER - You do?
BART - Yes, I do. You seem so damn sure.
HOMER - Thank you son. And do you think you can stop the casual swearing?
BART - Hell, yes.
HOMER - That's my boy. If you believe in me, then I'm not going to give up. I'll prove I'm
right. This Friday we're going back to the woods and we're going to find that alien!
BART - What if we don't?
HOMER - We'll fake it and sell it to the Fox network.
BART - (chuckling) They'll buy anything.
HOMER - Now son, they do a lot of quality programming too. (Pause, then they both laugh
hard) I kill me.
At the woods, Homer and Bart camp out. Frogs sit on lily pads in a pond.
FROG 1 - Bud...
FROG 2 - ...weis...
FROG 3 - ...er!
FROG 1 - Bud...
FROG 2 - ...weis...
FROG 3 - ...er!
And alligator surfaces and eats the frogs.
ALLIGATOR - Coors!
BART - Yo, dad can I have a sip of your beer?
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155
HOMER - Now son, you don't want to drink beer. That's for daddies and kids with fake ID's.
Besides, it's such a beautiful night, how about a ghost story?
BART - (Sometime later) ...And that, is how much college will cost for Maggie.
HOMER - No! No! Nooo!!
BART - (later again) You know dad, it doesn't matter that we didn't see the alien. I've really
had a great time out here.
HOMER - Yeah, me too.
Suddenly, there is a green glow, and the X-Files theme is heard. The alien emerges from the
woods.
HOMER - It's him!
ALIEN - I bring you peace.
HOMER - As a representative of Planet Earth, let me be the first to say... (Steps in the camp
fire) Ahhh! (screams more)
ALIEN - Ahhh! (it runs off)
HOMER - D'oh! It's gone. And we still don't have any proof.
BART - Oh yes we do, I got it all on tape! (holds up camcorder)
HOMER - Good work son! We did it! We did it!
They high five, and we dissolve back into the storybook. Leonard Nimoy closes the book.
NIMOY - And so, from this simple man came the truth, that we are not alone in the universe.
I'm Leonard Nimoy, good night.
TEENAGER - (from off-screen) Uh Mr. Nimoy, we have ten minutes left.
NIMOY - Oh, fine. Let me, uh, just get, uh...something out of my car. (runs off and car is
heard driving away)
TEENAGER - (walking into camera shot) I don't think he's coming back.
ACT THREE
BROCKMAN - Tonight on Eye-Witness News: A man who's been in a coma for 23 years
wakes up.
MAN - (In a hospital room) Do Sonny and Cher still have that stupid show?
BROCKMAN - No, she won an Oscar, and he's a congressman.
MAN - Good night! (he dies)
BROCKMAN - But first, ET phones Homer. Simpson, that is.
HOMER - Marge, kids, they're about to show my videotape! (everyone rushes in)
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156
BROCKMAN - Local man Homer Simpson, shown here with his tongue stuck to a lamp
post (File Photo displayed), has given us this videotape. It's a close encounter, of the blurred
kind. (chuckles)
ALIEN - (on the video) I bring you peace.
BROCKMAN - The alien has appeared in the same Springfield pasture the last two Friday
nights. Will it appear again this Friday? The entire channel six news team will be there,
except for Phil, the boom mike operator, who's getting fired tomorrow. (He is hit on the head
with the boom) Ow! Very unprofessional, Phil.
BART - Well, Lis. What do you think about the alien now?
LISA - I think there must be a more logical explanation. And I think the people of this town
aren't going to be won over by three seconds of videotape.
The doorbell rings, and Homer is greeted by a large crowd.
HOMER - Uh, I'm happy to answer any questions you have about the alien. Any questions at
all. Dr Hibbert?
DR HIBBERT - Yes, is the alien carbon-based or silicon-based?
HOMER - Uh, the second one. Zillophone. Next question.
BARNEY - Is the alien Santa Claus?
HOMER - Uh, yes.
FLANDERS - Uh, were you on my roof last night stealing my weather vane?
HOMER - This interview is over! (Slams door, and the weather vane falls)
At the church.
REVEREND LOVEJOY - I remember another gentle visitor from the heavens, he came in
peace, and then died. Only to come back to life. His name was... E.T.: The Extraterrestrial. I
loved that little guy.
It is Friday night. A 'Welcome Alien' banner is in the woods, and the band plays 'Close
Encounters of the Third Kind'. Everyone is in the woods waiting for the alien. Jimbo Jones
has a sign, 'Alien Dude: Need Two Tickets to Pearl Jam'
BART - Leonard Nimoy! What are you doing here?
NIMOY - Wherever there is a mystery and the unexplained, cosmic forces shall draw me
near.
BART - (unimpressed) Uh-huh.
HOT DOG VENDOR - Hey, Spock, what do you want on your hot dog?
NIMOY - Surprise me.
He sticks a load of veg on it. Homer looks at the T-shirt sales.
HOMER - Take a look at this Lisa. (Holds up 'Homer Was Right' T-Shirt) You don't see any
"Homer Is A Dope" T-shirts, do you?
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157
T-SHIRT VENDOR - We sold those out in five minutes.
HOMER - D'oh! (Marge and Maggie are wearing "Homer is a Dope" shirts) Marge, how
could you?
MARGE - These shirts are 100% cotton, and look at the fine stitching on "Dope".
HOMER - I'll take two.
Suddenly, the clouds draw together as the alien approaches.
KRUSTY - Ahhh!
HOMER - Look. There it is!
MARGE - Oh, Homie. Homie, I'm so sorry I doubted you.
ALIEN - I bring you love!
DR HIBBERT - Is that the love between a man and a woman, or the love of a man for a fine
Cuban cigar? (chuckles)
ALIEN - Uh...I bring you love!
LENNY - It's bringing love, don't let it get away!
CARL - Break its legs!
LISA - Wait! You want an alien? This is your alien!
Lisa shines her torch on it, and it is revealed to be Mr. Burns.
BURNS - Hello, children. I bring you love.
WILLY - It's a monster! Kill it! Kill it!
SMITHERS - It's not a monster, it's Mr. Burns.
WILLY - Aw, it's Mr. Burns. Kill it! Kill it!
SMITHERS - No, let me explain. Every Friday evening after work Mr. Burns undergoes a
series of medical treatments designed to cheat death for another week. (Burns is on a
conveyor belt) First Mr. Burns' chiropractors perform a slight spinal adjustment. Then a team
of doctors administer his eye drops, pain killers, and a vocal cord straightening.
DR. NICK - Don't worry, you won't feel a thing. (Holds up huge instrument) Till I jam this
down your throat!
SMITHERS - The whole ordeal leaves Mr. Burns twisted and disoriented. (Burns wanders
into the woods dazed and confused)
DR NICK - (At the door of the hospital) The most rewarding part was when he gave me my
money.
Back at the woods.
BART - But what's with the glowing?
MR. BURNS - Um, I'll field that question. A lifetime of working in a nuclear power plant
has given me a healthy green glow. And left me as impotent as a Nevada Boxing
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158
Commissioner. And now that I'm back to normal, I don't bring you peace and love, I bring
you fear, famine, pestilence, and--
DR NICK - Time for a booster! (Jabs in a needle)
Music starts and the crowd begins to sing.
MR. BURNS - Good morning star shine. The Earth says hello!
NIMOY - You twinkle above us, we twinkle below.
EVERYONE - Good morning star shine, you meet us along...
Music and singing continues as Homer and Marge talk.
MARGE - Well, you said you'd bring them peace and love, and it looks like you did it. I'm
proud of you Homie.
HOMER - Thanks, Marge.
TEENAGER - (Closes the storybook) And so concludes our tale. I'm Leonard Nimoy.
Goodnight, and keep watching the skis. Uh, skies.
From < http://www.simpsoncrazy.com/scripts/springfield-files.php
> acesso em 15 jan.
2008.
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159
ANEXO II
GRADE DE PROGRAMAÇÃO (1996-1997) DAS EMISSORAS CITADAS
1996 - Sunday
PM
7:00 7:30 8:00 8:30 9:00 9:30 10:00 10:30
ABC
America's
Funniest
Home
Videos
America's
Funniest
Home
Videos
Lois & Clark: The New
Adventures of
Superman
ABC Sunday Night Movie
CBS
60 Minutes Touched by an Angel CBS Sunday Movies
FOX
Big Deal
The
Simpsons
Ned and
Stacey
The X-Files
Local Programming
NBC
Dateline NBC
3rd Rock
from the
Sun
Boston
Common
NBC Sunday Night Movie
Note: On FOX, the animated television series, King of the Hill premiered January 12, 1997 at 8:30.
Friday
PM
8:00 8:30 9:00 9:30 10:00 10:30
ABC
Family
Matters
Sabrina, the
Teenage Witch
Clueless
Boy Meets
World
20/20
CBS
Dave's World
Everybody
Loves
Raymond
Mr. & Mrs. Smith
Nash Bridges
FOX
Sliders Millennium Local Programming
NBC
Unsolved Mysteries Dateline NBC Homicide: Life on the Street
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160
1997
SUNDAY
PM
7:00 7:30 8:00 8:30 9:00 9:30 10:00 10:30
ABC
The Wonderful World of Disney ABC Sunday Night Movie
CBS
60 Minutes Touched by an Angel CBS Sunday Movies
FOX
The World's Funniest!
The
Simpsons
King of the
Hill
The X-Files
Local Programming
NBC
Dateline NBC
Men
Behaving
Badly
Jenny
NBC Sunday Night Movie
FRIDAY
PM
8:00 8:30 9:00 9:30 10:00 10:30
ABC
Sabrina, the
Teenage
Witch
Boy Meets
World
You Wish Teen Angel 20/20
CBS
Family
Matters
Meego
The Gregory
Hines Show
Step by Step
Nash Bridges
FOX
The Visitor Millennium Local Programming
NBC
Players Dateline NBC Homicide: Life on the Street
Fonte: Wikipedia, disponível em
< http://en.wikipedia.org/wiki/1996-97_United_States_network_television_schedule
> Acesso em
20.01.2008.
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161
ANEXO III
EMPRESAS DO CONGLOMERADO “NEWS CORPORATION
DE RUPPERT MURDOCH
(Disponível em: <<
http://en.wikipedia.org/wiki/List_of_assets_owned_by_News_Corporation
>> Acesso em
28.07.2007)
CINEMA:
Twentieth Century Fox
Twentieth Century Fox Español
Twentieth Century Fox International
Twentieth Century Fox Television
Fox Searchlight Pictures
Fox Studios Australia
Fox Studios Baja
Fox Studios Los Angeles
Fox Television Studios
TELEVISÃO
20th Century Fox Television
bTV
BSkyB
Fox Broadcasting Company
Fox Sports Australia
Fox Television Stations
Foxtel
Premiere (19,9%)
Star Group Limited
Sky Latin America
SKY Network Television New
Zealand
SKY Italia
Fox International Channels
Italy
STAR TV
Latvijas Neatkarīgā Televīzija
TV5 Rīga
Fox Kids
TV CABO
Big Ten Network (49%)
Fox Business Network
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162
Fox Movie Channel
Fox News Channel
Fox Soccer Channel
Fox Sports Channel
Fox Sports Enterprises
Fox Sports en Español
Fox Sports Net
FUEL TV
FX Networks
Fox Reality
National Geographic Channel
SPEED Channel
SportSouth
LAPTV (Latin America - co-owned with Paramount Pictures/Viacom, Metro-
Goldwyn-Mayer/MGM Holdings and Universal Studios/NBC Universal)
Telecine (Brazil - co-owned with Globosat Canais, Paramount Pictures,
MGM, Universal Studios and DreamWorks);
INTERNET
Fox Interactive Media
o AmericanIdol.com
o AskMen.com
o Fox.com
o Foxsports.com
o GameSpy
o Hulu.com
o kSolo
o IGN
o Drownedinsound.com
o MySpace
o MyNetworktv.com
o NewRoo.com
o Strategicdatacorp.com
o Photobucket.com
o Rotten Tomatoes
o Scout.com
o SpringWidgets
o WhatIfSports
REVISTAS E PERIÓDICOS
InsideOut
donna hay
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163
News America Marketing
SmartSource
The Weekly Standard
Gemstar
JORNAIS IMPRESSOS
News International
o United Kingdom
The Sun
News of the World
The Times
Sunday Times
News Corporation Ltd.
o Australia
The Daily Telegraph (Sydney)
The Sunday Telegraph (Sydney)
The Australian (national)
The Advertiser and Sunday Mail (Adelaide)
The Sunday Times (Perth)
Herald Sun (Melbourne)
Sunday Herald Sun (Melbourne)
mX (Melbourne, Sydney and Brisbane)
The Courier-Mail (Brisbane)
Geelong Advertiser
Gold Coast Bulletin
The Mercury and Sunday Tasmanian (Hobart)
Northern Territory News (Darwin)
The Sunday Territorian (Darwin)
o New Zealand
Sunday Star-Times
o Papua New Guinea
Papua New Guinea Post-Courier
o Fiji
The Fiji Times
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164
o
United States
New York Post
The Wall Street Journal
Times Herald Record
EDITORAS
HarperCollins
Zondervan Publishing
OUTROS INTERESSES
National Rugby League (NRL) (50%)
Ansett Australia, Until 2000 (50%)
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165
ANEXO VI
SINOPSE ORIGINAL DO ENREDO DO EPISÓDIO FRAUDCAST NEWS”,
disponível em:
http://www.tv.com//fraudcast-news/episode/325918/summary.html?q=&tag=search_results;more;2
Fraudcast News
First aired: 5/23/2004 Production Code: FABF18
Lisa is going to read a poem at the town's celebration of their natural landmark
"Geezer Rock," but Homer who believes he is doing the right thing removes a bush
from the landmark that causes it to fall apart. Mr. Burns is caught in the landslide and
Smithers fears he is lost. Lisa is disappointed that no one got to hear her poem and
Marge suggests that she get it published. To Smithers' delight, Mr. Burns has
survived the landslide by slithering his way out however; he is annoyed to find out
that no one missed him when they thought he was lost. He decides to buy every
media outlet in town. Lisa distributes the first issue of her own newspaper "The Red
Dress Press," which is a success. Now she has to get out a second issue and she
enlists the help of her fellow children. Meanwhile, Mr. Burns has taken control of all
the media outlets in Springfield, except one, her newspaper. Mr. Burns tries to
seduce Lisa into selling out but she won't give up. Now Mr. Burns starts to play
hardball, he cuts the power to the Simpson home. Principal Skinner offers Lisa the
use of an old mimeograph machine, which gets her latest issue out. Mr. Burns talks
with Homer to get the dirt on Lisa, that Homer readily supplies and Burns uses this
information against her. Lisa is ready to give up and Homer realizing what he's done
responds by printing a newspaper of his own. Homer's paper inspires others to think
to begin to think for themselves and soon everyone is printing their own newspaper.
Writer:Don Payne
Director: Bob Anderson
Guest star: Pamela Hayden (Milhouse Van Houten (voice))
, Tress MacNeille
(Booberella), Karl Wiedergott (Various)
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166
ANEXO V
TEXTO DA PRIMEIRA EMENTA DA CONSTITUIÇÃO DOS
ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA COMENTADO
FREEDOM OF EXPRESSION--SPEECH AND PRESS
Adoption and the Common Law Background
Madison's version of the speech and press clauses, introduced in the House of Representatives on June 8, 1789,
provided: ''The people shall not be deprived or abridged of their right to speak, to write, or to publish their
sentiments; and the freedom of the press, as one of the great bulwarks of liberty, shall be inviolable.''1
The special
committee rewrote the language to some extent, adding other provisions from Madison's draft, to make it read: ''The
freedom of speech and of the press, and the right of the people peaceably to assemble and consult for their
common good, and to apply to the Government for redress of grievances, shall not be infringed.''2
In this form it
went to the Senate, which rewrote it to read: ''That Congress shall make no law abridging the freedom of speech, or
of the press, or the right of the people peaceably to assemble and consult for their common good, and to petition the
government for a redress of grievances.''3
Subsequently, the religion clauses and these clauses were combined by
the Senate.4
The final language was agreed upon in conference.
Debate in the House is unenlightening with regard to the meaning the Members ascribed to the speech and press
clause and there is no record of debate in the Senate.5
In the course of debate, Madison warned against the
dangers which would arise ''from discussing and proposing abstract propositions, of which the judgment may not be
convinced. I venture to say, that if we confine ourselves to an enumeration of simple, acknowledged principles, the
ratification will meet with but little difficulty.''6
That the ''simple, acknowledged principles'' embodied in the First
Amendment have occasioned controversy without end both in the courts and out should alert one to the difficulties
latent in such spare language. Insofar as there is likely to have been a consensus, it was no doubt the common law
view as expressed by Blackstone. ''The liberty of the press is indeed essential to the nature of a free state; but this
consists in laying no previous restraints upon publications, and not in freedom from censure for criminal matter
when published. Every freeman has an undoubted right to lay what sentiments he pleases before the public; to
forbid this, is to destroy the freedom of the press: but if he publishes what is improper, mischievous, or illegal, he
must take the consequences of his own temerity. To subject the press to the restrictive power of a licenser, as was
formerly done, both before and since the Revolution, is to subject all freedom of sentiment to the prejudices of one
man, and make him the arbitrary and infallible judge of all controverted points in learning, religion and government.
But to punish as the law does at present any dangerous or offensive writings, which, when published, shall on a fair
and impartial trial be adjudged of a pernicious tendency, is necessary for the preservation of peace and good order,
of government and religion, the only solid foundations of civil liberty. Thus, the will of individuals is still left free: the
abuse only of that free will is the object of legal punishment. Neither is any restraint hereby laid upon freedom of
thought or inquiry; liberty of private sentiment is still left; the disseminating, or making public, of bad sentiments,
destructive to the ends of society, is the crime which society corrects.''7
Whatever the general unanimity on this proposition at the time of the proposal of and ratification of the First
Amendment,8
it appears that there emerged in the course of the Jeffersonian counterattack on the Sedition Act9
and the use by the Adams Administration of the Act to prosecute its political opponents,10
something of a libertarian
theory of freedom of speech and press,11
which, however much the Jeffersonians may have departed from it upon
assuming power,12
was to blossom into the theory undergirding Supreme Court First Amendment jurisprudence in
modern times. Full acceptance of the theory that the Amendment operates not only to bar most prior restraints of
expression but subsequent punishment of all but a narrow range of expression, in political discourse and indeed in
all fields of expression, dates from a quite recent period, although the Court's movement toward that position began
in its consideration of limitations on speech and press in the period following World War I.13
Thus, in 1907, Justice
Holmes could observe that even if the Fourteenth Amendment embodied prohibitions similar to the First
Amendment, ''still we should be far from the conclusion that the plaintiff in error would have us reach. In the first
place, the main purpose of such constitutional provisions is 'to prevent all such previous restraints upon publications
as had been practiced by other governments,' and they do not prevent the subsequent punishment of such as may
be deemed contrary to the public welfare . . . . The preliminary freedom extends as well to the false as to the true;
the subsequent punishment may extend as well to the true as to the false. This was the law of criminal libel apart
from statute in most cases, if not in all.''14 But as Justice Holmes also observed, ''[t]here is no constitutional right to
have all general propositions of law once adopted remain unchanged.''15
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167
But in Schenck v. United States,16
the first of the post-World War I cases to reach the Court, Justice Holmes, in the
opinion of the Court, while upholding convictions for violating the Espionage Act by attempting to cause
insubordination in the military service by circulation of leaflets, suggested First Amendment restraints on subsequent
punishment as well as prior restraint. ''It well may be that the prohibition of laws abridging the freedom of speech is
not confined to previous restraints although to prevent them may have been the main purpose . . . . We admit that in
many places and in ordinary times the defendants in saying all that was said in the circular would have been within
their constitutional rights. But the character of every act depends upon the circumstances in which it is done. The
most stringent protection of free speech would not protect a man in falsely shouting fire in a theater and causing a
panic. . . . The question in every case is whether the words used are used in such a nature as to create a clear and
present danger that they will bring about the substantive evils that Congress has a right to prevent.'' Justice Holmes
along with Justice Brandeis soon went into dissent in their views that the majority of the Court was misapplying the
legal standards thus expressed to uphold suppression of speech which offered no threat of danger to organized
institutions.17
But it was with the Court's assumption that the Fourteenth Amendment restrained the power of the
States to suppress speech and press that the doctrines developed.18 At first, Holmes and Brandeis remained in
dissent, but in Fiske v. Kansas,19
the Court sustained a First Amendment type of claim in a state case, and in
Stromberg v. California,20
a state law was voided on grounds of its interference with free speech.21 State common
law was also voided, the Court in an opinion by Justice Black asserting that the First Amendment enlarged
protections for speech, press, and religion beyond those enjoyed under English common law.22
Development over
the years since has been uneven, but by 1964 the Court could say with unanimity: ''we consider this case against
the background of a profound national commitment to the principle that debate on public issues should be
uninhibited, robust, and wide-open, and that it may well include vehement, caustic and sometimes unpleasantly
sharp attacks on government and public officials.''23
And in 1969, it was said that the cases ''have fashioned the
principle that the constitutional guarantees of free speech and free press do not permit a State to forbid or proscribe
advocacy of the use of force or of law violation except where such advocacy is directed to inciting or producing
imminent lawless action and is likely to incite or produce such action.''24
This development and its myriad
applications are elaborated in the following sections. The First Amendment by its terms applies only to laws enacted
by Congress, and not to the actions of private persons. Supp.15
This leads to a ''state action'' (or ''governmental
action'') limitation similar to that applicable to the Fourteenth Amendment. Supp.16
The limitation has seldom been
litigated in the First Amendment context, but there is no obvious reason why analysis should differ markedly from
Fourteenth Amendment state action analysis. Both contexts require ''cautious analysis of the quality and degree of
Government relationship to the particular acts in question.'' Supp.17
In holding that the National Railroad Passenger
Corporation (Amtrak) is a governmental entity for purposes of the First Amendment, the Court declared that ''[t]he
Constitution constrains governmental action 'by whatever instruments or in whatever modes that action may be
taken.'. . . [a]nd under whatever congressional label.''Supp.18
The relationship of the government to broadcast
licensees affords other opportunities to explore the breadth of ''governmental action.''Supp.19
Footnotes
[Footnote 1]
1 Annals of Congress 434 (1789). Madison had also proposed language limiting the power of the
States in a number of respects, including a guarantee of freedom of the press, Id. at 435. Although passed by the
House, the amendment was defeated by the Senate, supra, p.957.
[Footnote 2]
Id. at 731 (August 15, 1789).
[Footnote 3]
The Bill of Rights: A Documentary History 1148-49 (B. Schwartz ed. 1971).
[Footnote 4]
Id. at 1153.
[Footnote 5]
The House debate insofar as it touched upon this amendment was concerned almost exclusively with a
motion to strike the right to assemble and an amendment to add a right of the people to instruct their
Representatives. 1 Annals of Congress 731-49 (August 15, 1789). There are no records of debates in the States on
ratification.
[Footnote 6]
Id. at 738.
[Footnote 7]
4 W. Blackstone's Commentaries on the Laws of England 151-52 (T. Cooley 2d rev. ed. 1872). See 3
J. Story, Commentaries on the Constitution of the United States 1874-86 (Boston: 1833). The most comprehensive
effort to assess theory and practice in the period prior to and immediately following adoption of the Amendment is L.
Levy, Legacy of Suppression: Freedom of Speech and Press in Early American History (1960), which generally
concluded that the Blackstonian view was the prevailing one at the time and probably the understanding of those
who drafted, voted for, and ratified the Amendment.
[Footnote 8] It would appear that Madison advanced libertarian views earlier than his Jeffersonian compatriots, as
witness his leadership of a move to refuse officially to concur in Washington's condemnation of ''[c]ertain self-
created societies,'' by which the President meant political clubs supporting the French Revolution, and his success
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168
in deflecting the Federalist intention to censure such societies. I. Brant, James Madison--Father of the Constitution
1787-1800, 416-20 (1950). ''If we advert to the nature of republican government,'' Madison told the House, ''we shall
find that the censorial power is in the people over the government, and not in the government over the people.'' 4
Annals of Congress 934 (1794). On the other hand, the early Madison, while a member of his county's committee
on public safety, had enthusiastically promoted prosecution of Loyalist speakers and the burning of their pamphlets
during the Revolutionary period. 1 Papers of James Madison 147, 161-62, 190-92 (W. Hutchinson & W. Rachal eds.
1962). There seems little doubt that Jefferson held to the Blackstonian view. Writing to Madison in 1788, he said: ''A
declaration that the federal government will never restrain the presses from printing anything they please, will not
take away the liability of the printers for false facts printed.'' 13 Papers of Thomas Jefferson 442 (J. Boyd ed. 1955).
Commenting a year later to Madison on his proposed amendment, Jefferson suggested that the free speech-free
press clause might read something like: ''The people shall not be deprived or abridged of their right to speak, to
write or otherwise to publish anything but false facts affecting injuriously the life, liberty, property, or reputation of
others or affecting the peace of the confederacy with foreign nations.'' 15 Papers, supra, at 367.
[Footnote 9]
The Act, Ch. 74, 1 Stat. 596 (1798), punished anyone who would ''write, print, utter or publish . . . any
false, scandalous and malicious writing or writings against the government of the United States, or either house of
the Congress of the United States, or the President of the United States, with intent to defame the said government,
or either house of the said Congress, or the said President, or to bring them, or either of them, into contempt or
disrepute.'' See J. Smith, Freedom's Fetters--The Alien and Sedition Laws and American Civil Liberties (1956).
[Footnote 10]
Id. at 159 et seq.
[Footnote 11]
L. Levy, Legacy of Suppression: Freedom of Speech and Press in Early American History, ch. 6
(Cambridge, 1960); New York Times Co. v. Sullivan, 376 U.S. 254, 273
-76 (1964). But compare L. Levy,
Emergence of a Free Press (1985), a revised and enlarged edition of Legacy of Suppression, in which Professor
Levy modifies his earlier views, arguing that while the intention of the Framers to outlaw the crime of seditious libel,
in pursuit of a free speech principle, cannot be established and may not have been the goal, there was a tradition of
robust and rowdy expression during the period of the framing that contradicts his prior view that a modern theory of
free expression did not begin to emerge until the debate over the Alien and Sedition Acts.
[Footnote 12]
L. Levy, Jefferson and Civil Liberties--The Darker Side (Cambridge, 1963). Thus President Jefferson
wrote to Governor McKean of Pennsylvania in 1803: ''The federalists having failed in destroying freedom of the
press by their gag-law, seem to have attacked it in an opposite direction; that is, by pushing its licentiousness and
its lying to such a degree of prostitution as to deprive it of all credit. . . . This is a dangerous state of things, and the
press ought to be restored to its credibility if possible. The restraints provided by the laws of the States are sufficient
for this if applied. And I have, therefore, long thought that a few prosecutions of the most prominent offenders would
have a wholesome effect in restoring the integrity of the presses. Not a general prosecution, for that would look like
persecution; but a selected one.'' 9 Works of Thomas Jefferson 449 (P. Ford, ed. 1905).
[Footnote 13]
New York Times Co. v. Sullivan, 376 U.S. 254 (1964), provides the principal doctrinal justification for
the development, although the results had long since been fully applied by the Court. In Sullivan, Justice Brennan
discerned in the controversies over the Sedition Act a crystallization of ''a national awareness of the central meaning
of the First Amendment,'' id. at 273, which is that the ''right of free public discussion of the stewardship of public
officials . . . [is] a fundamental principle of the American form of government.'' Id. at 275. This ''central meaning''
proscribes either civil or criminal punishment for any but the most maliciously, knowingly false criticism of
government. ''Although the Sedition Act was never tested in this Court, the attack upon its validity has carried the
day in the court of history. . . . [The historical record] reflect[s] a broad consensus that the Act, because of the
restraint it imposed upon criticism of government and public officials, was inconsistent with the First Amendment.''
Id. at 276. Madison's Virginia Resolutions of 1798 and his Report in support of them brought together and
expressed the theories being developed by the Jeffersonians and represent a solid doctrinal foundation for the point
of view that the First Amendment superseded the common law on speech and press, that a free, popular
government cannot be libeled, and that the First Amendment absolutely protects speech and press. 6 Writings of
James Madison, 341-406 (G. Hunt. ed. 1908).
[Footnote 14]
Patterson v. Colorado, 205 U.S. 454, 462 (1907) (emphasis original). Justice Frankfurter had similar
views in 1951: ''The historic antecedents of the First Amendment preclude the notion that its purpose was to give
unqualified immunity to every expression that touched on matters within the range of political interest. . . . 'The law
is perfectly well settled,' this Court said over fifty years ago, 'that the first ten amendments to the Constitution,
commonly known as the Bill of Rights, were not intended to lay down any novel principles of government, but simply
to embody certain guaranties and immunities which we had inherited from our English ancestors, and which had
from time immemorial been subject to certain well-recognized exceptions arising from the necessities of the case. In
incorporating these principles into the fundamental law there was no intention of disregarding the exceptions, which
continued to be recognized as if they had been formally expressed.' That this represents the authentic view of the
Bill of Rights and the spirit in which it must be construed has been recognized again and again in cases that have
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169
come here within the last fifty years.'' Dennis v. United States, 341 U.S. 494, 521
-522, 524 (1951) (concurring
opinion). The internal quotation is from Robertson v. Baldwin, 165 U.S. 275, 281
(1897).
[Footnote 15]
Patterson v. Colorado, 205 U.S. 454, 461 (1907).
[Footnote 16]
249 U.S. 47, 51-52 (1919) (citations omitted).
[Footnote 17]
Debs v. United States, 249 U.S. 211 (1919); Abrams v. United States, 250 U.S. 616 (1919); Schaefer
v. United States, 251 U.S. 466
(1920); Pierce v. United States, 252 U.S. 239 (1920); United States ex rel.
Milwaukee Social Democratic Pub. Co. v. Burleson, 255 U.S. 407
(1921). A state statute similar to the federal one
was upheld in Gilbert v. Minnesota, 254 U.S. 325
(1920).
[Footnote 18]
Gitlow v. New York, 268 U.S. 652 (1925); Whitney v. California, 274 U.S. 357 (1927). The Brandeis
and Holmes dissents in both cases were important formulations of speech and press principles.
[Footnote 19]
274 U.S. 380 (1927).
[Footnote 20]
283 U.S. 359 (1931). By contrast, it was not until 1965 that a federal statute was held unconstitutional
under the First Amendment. Lamont v. Postmaster General, 381 U.S. 301
(1965). See also United States v. Robel,
389 U.S. 258
(1967).
[Footnote 21]
And see Near v. Minnesota ex rel. Olson, 283 U.S. 697 (1931); Herndon v. Lowry, 301 U.S. 242
(1937); De Jonge v. Oregon, 299 U.S. 353
(1937); Lovell v. Griffin, 303 U.S. 444 (1938).
[Footnote 22]
Bridges v. California, 314 U.S. 252, 263-68 (1941) (overturning contempt convictions of newspaper
editor and others for publishing commentary on pending cases).
[Footnote 23]
New York Times Co. v. Sullivan, 376 U.S. 254, 270 (1964).
[Footnote 24]
Brandenburg v. Ohio, 395 U.S. 444, 447 (1969).
[Footnote 15 (1996 Supplement)]
Through interpretation of the Fourteenth Amendment, the prohibition extends to
the States as well. See discussion on incorporation, main text, pp. 957-64.
[Footnote 16 (1996 Supplement)]
See discussion on state action, main text, pp.1786-1802.
[Footnote 17 (1996 Supplement)]
CBS v. Democratic Nat'l Comm., 412 U.S. 94, 115 (1973) (opinion of Chief Justice
Burger).
[Footnote 18 (1996 Supplement)]
Lebron v. National R.R. Passenger Corp., 115 S. Ct. 961, 971 (1995) (quoting Ex
parte Virginia, 100 U.S. 339, 346-47 (1880)). The Court refused to be bound by the statement in Amtrak's
authorizing statute that the corporation is ''not . . . an agency or establishment of the United States Government.''
This assertion can be effective ''only for purposes of matters that are within Congress' control,'' the Court explained.
''It is not for Congress to make the final determination of Amtrak's status as a governmental entity for purposes of
determining the constitutional rights of citizens affected by its actions.'' 115 S. Ct. at 971.
[Footnote 19 (1996 Supplement)]
In CBS v. Democratic Nat'l Comm., 412 U.S. 94 (1973), the Court held that a
broadcast licensee could refuse to carry a paid editorial advertisement. Chief Justice Burger, joined only by Justices
Stewart and Rehnquist in that portion of his opinion, reasoned that a licensee's refusal to accept such an ad did not
constitute ''governmental action'' for purposes of the First Amendment. ''The First Amendment does not reach acts
of private parties in every instance where the Congress or the [Federal Communications] Commission has merely
permitted or failed to prohibit such acts.'' Id. at 119.
From: http://caselaw.lp.findlaw.com/data/constitution/amendment01/06.html#1
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170
ANEXO VI
Thirty Minutes Over Tokyo Written by Donick Cary and Dan Greaney
Directed by Jim Reardon
Production code: AABF20 Original Airdate on FOX: 16-May-1999
Capsule revision A (22-Dec-01)
==============================================================
"TV Guide" Synopsis
=============================================================
(Canadian TV Guide) After attending a seminar on how to live beyond your
means, Homer and his clan jet off to Japan. Unfortunately, trouble ensures
when they squander all their money and must resort to desperate measures in
order to afford the flight home. George Takei guest voices. {hl}
=============================================================
> Title sequence
============================================================
Blackboard: I'M SO VERY TIRED
I'M SO VERY at cutoff
Couch: The family runs to the couch, which quickly sucks them in, and
shreds them, like a piece of paper. (It's not as gruesome as
it sounds -- the come out looking like a photograph of the
Simpsons, cut into vertical strips.)
==============================================================
[Lisa sits on the couch reading the magazine "Wired" when Homer comes in and takes it
from her, thinking it is the magazine "Weird".]
Homer: Heh-heh-heh. I love their hilarious send-ups of hit movies.
Lisa: Dad, it's not--
Homer: "Gigabyte"! [laughs] They've done it again. Gigabyte. Wait, this isn't Weird"!
[looks at cover] Why, there's no magazine *called* "Weird", is there?
Lisa: [takes magazine] This is *"Wired"*. It's about computers and technology. [Homer
stares] Hey! Look, there's a cyber-café opening here in Springfield. Will you
take me, Dad, please? I'll show you how to order pizza over the internet.
Homer: The internet? Is that thing still around?
Bart: [walks in] I know a web site that shows monkeys doing it.
Lisa: Bart, the internet is more than a global pornography network it's-- [Homer, in the car
with Bart, honks the horn]
Homer: Come on, Lisa -- monkeys!
At The Java Server, Groundskeeper Willie checks the Up-kilt Camera web site, and as it
downloads, he eventually realizes it's himself. In a chat room, Bart pretends to be Mary, a
woman who is "45, heavy, and willing to settle for less". Across the room, Lenny is
impressed by this Mary. Homer uses two computers at once when Lisa comes over to see
how he's doing.
Lisa: Wow, Dad, you're surfing like a pro!
Homer: Oh, yeah! I'm betting on Jai-alai in the Cayman Islands, I invested in something
called "News Corp"
Lisa: Dad, that's Fox!
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171
Homer: [shrieks] Undo! Undo! [hits key, sighs]
Lisa: Dad, do we have *any* money left?
Homer: Well, let's check the old bank account. [a bar graph appears on one of the monitors]
See? Even after all my cyber-squandering, we've still got $1200.
[Snake bursts in brandishing a gun and announces he's holding up the place. He notices the
bar graph of Homers money, puts in a floppy disk, and presses a key that causes the bar to
fall.]
Snake: Download to Papa! [pulls out the disk and backs out of the building] Yoink-dot-
adios-backslash-losers!
Back at the Simpson kitchen, Marge and Homer talk.
Marge: We were robbed?!
Homer: You seem to know an awful lot about this for an "innocent person".
Marge: We were saving that money for our family vacation! Now we're gonna have to start
all over again. [groans]
Homer: Oh, don't worry, sweetheart, I'll get us the money, even if I have to get a second job.
In his black thieving outfit, Homer goes around a house sacking items off of tables and
counters. He moves into the house's kitchen, turns on the light, and finds Ned Flanders
sitting at the table having a glass of milk.
Ned: Evening, neighbor. Low on funds again?
Homer: Yes, sir.
Ned: Now, Homer, we can't have you burglarizing us every time you've got a bill to pay.
Homer: I know, sir. I'm sorry, sir. [sacks some silverware behind his back. It's just that you
and Maude live like royalty in your fancy castle while I've got Marge trapped over there like
a pig in a mud beehive.
Ned: Ooh, we're not as well-off as you think. We give to eight different churches just to
hedge our bets, and the Leftorium's business has gone way downhill since Leftopolis moved
in next door.
Homer: Well, if you're not rich, then how come you have a new refrigerator, an electric can
opener, a milkshake machine?
Ned: Oh-ho, we picked them up cheap. They were evidence in a murder trial.
Homer: Sweet.
Ned: We got that tip at the Chuck Garabedian Mega Savings Seminar.
Homer: [making himself a sandwich] Go on.
Ned: He taught us how to live a Bert Reynolds lifestyle on a Matt Davis income. We've
already got tickets for his next seminar. [on the refrigerator under a Jesus fish magnet] I
think you'll find living thrifty a lot more satisfying than stealing.
Homer: Maybe you're right, Ned. Maybe you're right. [pulls the tickets off the refrigerator
and runs out, then comes back for the magnet] Why not try both?
Homer and Marge attend the Mega Savings Seminar.
Chuck: Are you tired of missing out on the good things in life family vacations, jet packs,
solid gold dancers?
Homer: [to Marge:] There's only three left in the world.
Chuck: Well, stick around, 'cause I'm gonna tell you the twelve savings secrets Wall Street
*won't* tell you. Then, I'll show you the three ways to get back to the highway, [sotto:]
including one shortcut those Wall Street fat cats don't want you to know! [audience cheers]
Mr. Burns: Oh, here we go with the fat cat bashing.
Uncle Pennybags: Well, what do you expect? These yokels are pure Baltic Avenue.
Heh-heh. [looks at watch] Uh-oh! I'm late for the Short Line Railroad! [gets in a life-size
monopoly car in the aisle and drives away]
Chuck Garabedian reveals mega secret number one: "Ya gotta squeeze every penny". He
explains that his tuxedo is the one Roy Cohn died in, and his yacht smells like cat pee. In
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172
addition, the beautiful women aboard the yacht used to be men. Soon, Chuck has the
audience chanting "squeeze every penny". Homer decides to take this literally and squeezes
a penny into his hand and it travels up his arm under his skin.
The Simpsons drive around looking for a place to shop. First, they pull up to a 99 cents
store. Marge decides to save that store for Lisa's wedding. The 66 cents store also seems too
pricey if they want to save money for their vacation. They park at a 33 cents store, where a
truck is dumping merchandise through the roof.
Inside, Bart finds a rack filled with identical Marge-style dresses. Marge, having spent
nearly double the price in the past, decides to buy several. She is shocked and disgusted
when she comes across a blue one. Meanwhile, Homer finds some 33-cent cans of plankton.
Lisa inspects the label.
Lisa: Uh, according to the "Mexican Council of Food", this expired two years ago.
Homer: Sure, by *their* standards, but we live in America. [opens the can and chokes
down some, his head turning red]
Lisa: This also says it can cause red tide poisoning.
Homer: [straining:] But it's so ... cheap! [gulps some more] Yum.
At the Simpsons' kitchen table, the family gathers to see how much money they've saved.
Homer smashes open a piggy bank with a hammer.
Marge: Homer, you could've just unscrewed the bottom.
Homer: A little late for could'ves, Marge.
Lisa: [counting money] I don't think there's enough here for a vacation.
Marge: There is for a *mega savings* vacation. [looks at pamphlet] Chuck Garabedian
says you can fly mega-cheap if you don't care where you go.
Chuck: [looks in through window] That's right! Just go to the airport and wait for some no-
shows, then you can buy their seats for a fraction of the price!
Marge: Are you going through our garbage?
Chuck: That's right! You fat cats didn't finish your plankton; now it's mine!
[runs off with cans]
In the airport, each of the Simpsons is dressed in the clothes of the place they hope to be
going.
Marge: Hawaii, here we come!
Lisa: No, no! We're going to Paris, I can feel it!
Bart: Come on, Transylvania.
Homer: No, mon, let's go home to Jamaica. I and I been in Babylon too long.
PA: Attention. Flight 605 to Tokyo is ready for departure, and has four available mega-
savers seats.
Marge: Come on, Homer! Japan!
Homer: No, no Ja-pan, Ja-maica! I want to pass the dutchie on the left-hand side!
Lisa: Never mind. Looks like the Flanders are gonna get those seats anyway.
[The Flanderses walk towards the gate]
Homer: [gets up] Oh, so Flanders thinks he can steal our vacation, huh?
Homer pulls a man of his cart and the Simpsons get on and drive past the Flanderses.
Homer: Sayonara, suckers!
Lisa: Yay! The Simpsons are goin' to Japan!
[A gong sounds when the cart drives into it as two workers were carrying it]
Man: Hey, watch the gong, jerk.
[End of Act One. Time: 6:59]
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As the airplane is about to take off, Homer is still disappointed that they're going to Japan.
Marge: Come on, Homer. Japan will be fun! You liked Rashomon.
Homer: That's not how *I* remember it. Besides, if we want to see Japanese people, we
could have gone to the zoo.
Marge: [grumbles] Homer.
Homer: What? The guy who washes the elephants is Japanese. His name is Tikashi.
He's in my book club!
Lisa: Look, Mom, the safety instructions are written in haiku. [reads pamphlet:] "Fasten
seatbelts tight / Your seat cushions float gently / Headsets five dollars".
As the plane takes off, a stewardess asks Bart to turn off his Game Boy.
"You're the waitress," says Bart as he presses the shutdown button. This somehow causes
the plane to go into a nosedive, so the stewardess frantically tells him to turn it on again.
Marge reads a pamphlet (there seem to be a lot of these today) on in-flight movies starring
Jim Belushi.
Marge: Ooh! I never knew Jim Belushi made so many movies!
Homer: Yeah, isn't it amazing? They're filming one right now in the bathroom. It's gonna
be on towards the end of the flight.
[A camera crew films Jim Belushi walking down the aisle]
Belushi: Toga! Toga! Toga 2000!
Homer: Marge! They stole my idea!
Welcome to Japan, folks. The local time is ... tomorrow.
Airplane announcement, "Thirty Minutes Over Tokyo"
The Simpsons make it to their hotel, the Royal Tokyo. When they make it to their room,
Homer walks through the paper door instead of sliding it open. Marge tries to explain that to
him, but he can't be bothered. He throws his luggage through a paper closet door and walks
through another door into the bathroom. The toilet greets him: "Welcome. I am honored to
accept your waste." It then starts an elaborate water show in its bowl. Homer gasps,
"They're *years* ahead of us!" In the other room, Bart turns on the TV and sees Homer
from the point of view of the toilet bowl. Bart calls Marge and Lisa to see Dad on TV, but
none of them is happy when Homer sits down.
Lisa checks the view out the hotel window and sees several landmarks: the Imperial
Gardens, the Meiji Shrine, and the Hello Kitty factory. Inspired, Lisa wants to explore, but
Bart is busy watching the local TV. Bart recognizes a cartoon as the one that causes
seizures. As he watches the cartoon robot's flashing eyes, Bart's eyes dilate and he falls to
the floor in convulsions. Wondering what's going on, Marge and Lisa catch sight of the TV
and also have seizures. Homer walks in, not knowing what's going on, but decides to join in
by faking a seizure. When a commercial starts, everyone gets up.
Homer: Whew. All that seizin' made me hungry.
Lisa: Me, too! Let's go to an authentic Japanese noodle house.
Homer: The toilet recommended a place called Americatown.
Lisa: Dad, we didn't come halfway around the world to eat at "Americatown".
Marge: I'd like to see the Japanese take on the club sandwich! I bet it's
smaller and more efficient.
TV: We now return to "Battling Seizure Robots".
[The four Simpsons all have seizures]
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Cláudia Regina da Silva Franzão
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Americatown is themed with a random assortment of United States politics and pop culture.
Each table is shaped like a state. The Simpsons sit at Massachusetts.
Homer: I can't believe they stuck us at Taxachusetts! [points to table] Hey, you know, I
once knew a man from Nantucket.
Bart: And?
Homer: Let's just say the stories about him are greatly exaggerated.
Waiter: Howdy gangstas! I'm average American Joe Salaryman waiter.
Bart: These prices suck! 10,000 yen for coleslaw?
Lisa: Don't you serve anything that's even remotely Japanese?
Waiter: Don't ask me; I don't know anything! I'm product of American education system. I
also build poor-quality cars and inferior-style electronics.
Homer: [cackles] Oh, they got our number!
At a fruit stand, Homer buys a square watermelon.
Marge: Oh, my goodness! Homer, those are $150!
Homer: It's worth every cent. I'm tired of fumbling with round fruit.
[the watermelon expands to its original shape and Homer accidentally drops it]
Marge: Maybe we should just head back to the hotel.
Lisa: But you promised me we'd do something Japanese!
Homer: Oh, of course, you're right! You know, I read about a Shinto tea house where
they practice the traditional -- Run, Bart! [they do]
Bart and Homer find a crew filming Woody Allen boxing a punching bag.
Oh. [ahem] Hello. [ahem] So many rice crackers claim to be low-cal, but only
Fujikawa Rice Crackers make your interiors go bananas! What did I do to deserve this? ...
Oh, right.
-- Woody Allen, "Thirty Minutes Over Tokyo"
% At Sumo Stadium, Homer and Bart are among the spectators. A sumo wrestler
% sprinkles salt on the ring. Homer eats a soft pretzel.
Homer: Mmm, fifty-dollar pretzel. Hey, what's Baby Huey doing?
Bart: [reading a folded piece of paper] It says here they throw salt
before they wrestle to purify the ring.
Homer: [looks at his pretzel, then walks in the ring to the wrestler] Spare
some salt, Tubby?
Wrestler: Tubby? [Japanese, subtitled:] The name "Tubby" is hurtful, as my weight
problem is glandular. Are you going to eat that? [takes pretzel from Homer] Yoink.
Homer: Hey, that's mine!
Homer lunges for his pretzel, but the sumo wrestler tackles him. Homer is able to reach far
enough to tag in Bart. Bart swats the wrestler with a folding chair, knocking him out.
Homer: Like we say in my country, ha-sta la vista, baby!
The emperor congratulates Homer and introduces himself. Homer introduces himself as
Clobbersaurus, then picks up the emperor and throws him in a bin of sumo thongs. The
audience boos Emperor Clobbersaurus. Dressed in traditional Japanese clothing, Homer
pours tea while Bart paints a mountain. The jail door opens.
Guard: Your wife has paid your bail, Mr. Simpson-san.
Homer: Thank God. I couldn't take another minute in this hellhole.
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Cláudia Regina da Silva Franzão
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Homer quickly finishes eating his food, then hands the empty bowl to one of three women in
the cell. Homer and the women all bow. Bart leaves the cell through the unlocked metal bar
door. Homer leaves the cell by walking through the paper wall next to the cell door. The
Simpson family walks on a footpath.
Lisa: *Now* can we do something Japanese?
Homer: Oh, I'm sick of doing Japanese stuff! In jail we had to be in this dumb kabuki play
about the 47 Ronin, and I wanted to be Oshi, but they made me Ori!
Bart: Then we had to do two hours of origami, followed by flower arranging and
meditation!
Homer: [to Bart in Japanese, subtitled:] Should we tell them the secret of inner peace?
Bart: [Japanese, subtitled:] No, they are foreign devils.
Marge: [to Lisa:] Honey, I know you want to see Japan, but we're down to our last million
yen. [takes a bill out of her hair]
Homer: [to Lisa:] Don't worry, ichiban, I'll show you something Japanese.
[takes the million yen note from Marge and folds it into a crane]
Lisa: Oh, it's beautiful, Dad!
Homer: It's a crane. The Japanese believe they bring good luck. [hands the crane to Lisa]
Marge: Be careful. We need that money to get home. [The wind carries the million-yen
crane away] No!
Homer: [Japanese, subtitled:] D'oh!
[End of Act Two. Time: 6:28 Running Time: 13:27]
At the Unites States Embassy in Japan.
Ambassador: Now, Mr. Simpson, I know you lost all your money, but don't worry,
the United States will not stand idly by while one of its citizens is stuck here like this.
[an officer hits Homer with the butt of his gun, unsticking from being crammed in a metal
detector]
Marge: But, Mr. Ambassador, how are we going to get home?
Ambassador: Beats me. Try getting a job and earning some money. That's what *I*
did. By the way, ambassador's taken. [two security men escort the Simpsons from the
embassy]
At Osaka Seafood Concern, the Simpsons (including Maggie) work knee-deep in fish.
Marge: [cheerful:] Every truckload of fish we gut brings us 31 cents closer to those tickets
home.
Bart: And I think I've finally found what I was put on this earth to do knife goes in, guts
come out, knife goes in, guts come out... [pulls out a talking fish]
Fish: Spare my life and I will grant you three
Bart: [guts the talking fish] Knife goes in, guts come out.
Lisa: Yippee! Time for the company loyalty song!
[a squid sings on a television high above the workers]
Squid: Knife-a goes in, a-guts come out [guts itself] that's what Osaka Seafood Concern is all
about. [collapses]
Homer: Well, this sucks; what else is on? [uses an eel to change the channel]
A game show is on the TV. The audience cheers as a happy family climbs into a new car.
Dad: Thank you! You have fulfilled our dreams and dreams of our ancestors!
Announcer: Tune in tomorrow when another happy family tries to win their dreams on
"Happy Smile Super Challenge Family Wish Show"!
Marge: "Family Wish Show" ... hmm, that gives me an idea.
Lisa: I think we all had that idea.
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Cláudia Regina da Silva Franzão
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Homer: I didn't. What is it? Lunch?
And so, the Simpsons get on the game show. The host and audience welcomes the family.
Wink: Now, Simpson family, have you picked a wish?
Homer: Well, I haven't talked it over with the family, but I think we'd all ike a free dinner at
Americatown.
Marge: [covers Homer's mouth] No, no, no! We want plane tickets home to
Springfield! [applause]
Wink: Now, our game shows are a little different from yours. Your shows reward
knowledge; we punish ignorance.
Homer: Ignor-what? [flames come out of his microphone and toast him]
[audience laughs]
As the game begins, the Simpsons have to choose between three categories:
"Ow, that hurts!", "Why are you doing this to me!", or "Please let me die!".
The family huddles to discuss the options, then arrive at a decision.
Marge: We'll go with "Ow, that hurts!", Skip.
Wink: My name is Wink!
[a skunk lowers in front of Marge and sprays her]
As "Ow, that hurts!" is about to begin, Marge, Maggie, Lisa, and Bart stand blindfolded,
holding up sticks. Homer, inside a giant piñata, is lowered on a rope. On Wink's command,
everyone starts hitting the Homer piñata with their sticks. After the audience has a good
laugh at the situation, Wink instructs the family to remove their blindfolds. Lisa apologizes,
saying she didn't know it was him. Homer asks for someone to whack his hernia back in.
Bart is about to, but Wink takes away his stick. Homer will be allowed down if he can
answer one question about Japan. Without the question being asked, Homer guesses "Japan".
Wink is annoyed that it is correct and yells at someone behind the stage curtain in Japanese.
Having finished "Ow, that hurts!", it is time for the lightning round. Homer is tied to the tip
of the Tokyo Tower in a lightning storm. The audience of the game show watches Homer
get struck by lightning on a monitor. "He seems okay, but he is being burned internally",
explains Wink.
Back at Moe's Tavern, Homer being repeatedly struck by lightning is on the television.
Lenny: Hey, isn't that Homer on the Japanese channel?
Moe: If that's Homer, then who the hell's been putting beers on his tab?
Barney: [wearing a Homer-like head piece] D'oh! Woo-hoo! Um ... that boy
ain't right! [runs out]
There's one more round in the game show: the Simpsons must get their tickets from above an
active volcano. The tickets rest on a bridge made of planks between two ropes. They start
climbing the volcano. It's hard work, but Homer prefers it to the lightning round. He
immediately gets struck by lightning. Noticing the relationship between what he says and
what happens, Homer hopes there is no ice cream round. His plan doesn't work; he just gets
more lightning.At the top of the volcano, Marge looks at the bridge and doesn't think it can
support much weight. Everyone looks expectantly at Lisa. Lisa is about to recommend
Maggie get the tickets, but gives in instead. Lisa carefully walks on the bridge as the game
show audience watches on monitors and chants "plummet".
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Lisa triumphantly picks up the plane tickets and starts walking back along the bridge. Wink
presses a button that makes the bridge break below Lisa's feet. She hooks her feet on one
edge of the broken bridge and hold onto the other. The tickets land on the bridge behind her.
With Lisa's hold on the bridge slipping, Marge runs on the bridge and grabs Lisa's hands just
as she lets go. Marge is holding onto the bridge with her feet also, now. Homer runs to help,
shaking the bridge and separating Marge's feet from the bridge. Homer catches Marge's feet
and lengthens the body bridge. Bart, suddenly worried about the tickets, runs along the
bridge and over his family to get the tickets. When he picks them up, he loses his balance,
falls off the bridge, but holds onto Lisa's leg. The bridge begins to loosen along one of the
edges.
Marge: I'm afraid this might be the end.
Homer: Well, at least we'll die doing what we love: inhaling molten rock.
The bridge gives way and the Simpsons fall into the lava. Back at the studio, the audience
cheers as the Simpsons slide down a chute onto the stage. Homer rolls around in the lava
hollering "It burns!"
Wink: Don't worry. That "lava" is just Orange-aid, made by our sponsor Osaka
Orange-aid Concern.
Homer: It burns! It burns!
Wink: It's loaded with wasabe! Kudos, Simpsons! You have won your freedom.
[Homer is given the tickets, the shows theme plays, and the family is about to leave]
Homer: Before I go I want to say something. Game shows aren't about cruelty, they're
about greed and wonderful prizes like poorly-built catamarans, but somewhere along the line
you lost your way. For shame. [the audience hangs its heads; as soon as the Simpsons leave,
the theme music returns]
Wink: Coming up next: a Canadian couple who say they are deathly afraid of scorpions.
[in a small fenced in area, a couple stands screaming as scorpions are dropped on them]
[laughs] Sting those Canucks!
Homer: [watching the show] I love this show. Take that, you stupid hosers!
[Marge pulls him away by the ear]
The Simpsons finally get to take their plane trip home.
Goodbye, Japan! I'll miss your Kentucky Fried Chicken and your sparkling
whale-free seas.
The plane starts shaking and two warning lights light up: fasten your seatbelts and a picture
of Godzilla holding a plane.
Uh, folks, we're experiencing some moderate Godzilla-related turbulence at this time, so I'm
going to go ahead and ask you to put your seatbelts back on. When we get to 35 thousand
feet, he usually does let go, so from there on out, all we have to worry about is Mothra, and,
uh, we do have reports he's tied up with Gamera and Rodan at the present time. Thank you
very much. [Airplane announcement]
Outside Lisa's window is a giant eyeball. Lisa closes the window shade and goes to sleep.
As the airplane gets away, Godzilla, Mothra, Gamera, and Rodan shake their arms around
angrily. Godzilla picks up a tank and throws it at the plane, but misses.
[End of Act Three. Time: 7:01 Total Time: 20:28]
The background to the end credits is one of the battling seizure robots. Instead of the normal
"Simpsons" theme, we hear the kind of music that normally plays behind Japanese anime.
The Gracie "Shh!" is heard, but instead of the 20th Century Fox fanfare, we hear Homer
shouting, "Undo! Undo!"
Released on <
http://www.snpp.com/episodes/AABF20> Accessed on 12.01.2009
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ANEXO VI
Figura 1 - ASTROBOY Figura 2 - PICACHU
Figura 3 - Untraman Figura 4 - Ruppert Murdoch
Figura 5 - Mina (Sailor Venus) Figura 6 - Serena (Sailor Moon)
Livros Grátis
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Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo