Download PDF
ads:
0
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
1
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO TECNOLÓGICO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM URBANISMO, HISTÓRIA E
ARQUITETURA DA CIDADE – PGAU-CIDADE
Angelina Camargo Rodrigues Wittmann
A FERROVIA NO VALE DO ITAJAÍ
Dissertação submetida ao Programa de Pós-
Graduação em Urbanismo, História e Arquitetura
da Cidade, PGAU-CIDADE da UFSC, como
requisito parcial para a obtenção do título de
Mestre em Urbanismo, História e Arquitetura da
Cidade, Área de Concentração em Urbanismo,
História e Arquitetura da Cidade, Linha de
Pesquisa LP2.
Orientador: Prof. Dr. Vilmar Vidor da Silva.
Co-Orientador: Prof. Dr. Nelson Popini Vaz.
FLORIANÓPOLIS
2008
ads:
2
A dissertação intitulada A Ferrovia no Vale do Itajaí, de autoria de Angelina Camargo
Rodrigues Wittmann, foi submetida ao processo de avaliação conduzido pela Banca
Examinadora instituída pela Portaria _______, para obtenção do título de Mestre em
Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade, tendo sido aprovada sua versão final
em ___ de ______________ de _____, em cumprimento às normas da Universidade
Federal de Santa Catarina e ao Programa de Pós-Graduação em Urbanismo,
História e Arquitetura da Cidade, PGAU-CIDADE.
Presidente: ___________________________________
Prof. Dr. Vilmar Vidor da Silva
Membro: _____________________________________
Prof. Dr. Nelson Popini Vaz
Membro: _____________________________________
Prof. Dr. Lino Fernando Bragança Peres
Membro: _____________________________________
Prof. Dr.Luiz Alberto de Souza
Florianópolis, 22 de fevereiro de 2008.
3
Dedico este trabalho ao meu companheiro, amigo, conselheiro,
cúmplice e amor, Roberto Wittmann.
4
AGRADECIMENTOS
Quando iniciamos um trabalho, outros seres iniciam este trabalho conosco.
Ao lembrá-los, emito meu agradecimento.
À minha família, pela compreensão, carinho, paciência e apoio.
Aos professores, colegas de turma e funcionários do Programa de Pós-
Graduação em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade, PGAU-CIDADE.
Ao professor Vilmar Vidor da Silva, que vem acompanhando e orientando
meus trabalhos desde minha graduação, durante o estágio no IPPUB (Instituto de
Pesquisa e Planejamento Urbano de Blumenau) e em atividades exercidas no
Escritório de Arquitetura, por sua dedicação, paciência, incentivo e amizade.
Ao professor Nelson Popini Vaz, Co-Orientador e Orientador-Docente, pela
dedicação, incentivo e amizade.
Aos membros da Banca de Qualificação, formada pelos professores Vilmar e
Popini e Lino Fernando Bragança Peres, pelas ótimas contribuições ao trabalho.
Ao professor convidado a compor a banca de defesa, Dr. Luiz Alberto de
Souza, da Universidade Regional de Blumenau FURB, pela pronta disponibilidade,
atenção e valiosas contribuições.
A Luiz Carlos Henkels, membro ativo da ABPF (Associação Brasileira de
Preservação Ferroviária), que representa uma legião de anônimos voluntários que
efetuam atividades voltadas à preservação da memória ferroviária.
Ao Arquivo Histórico de Blumenau “Ferreira da Silva”, pelo apoio e
contribuições prestadas por intermédio da Professora Sueli Petry, filha de antigo
ferroviário da EFSC.
Ao Arquivo Público Histórico de Rio do Sul, pelas contribuições prestadas
pela historiadora Catia Dagnoni.
Aos meus filhos, Jorge e Isabel Wittmann e genro Luiz Carlos Cavalcanti,
pela contribuição na arte final, revisão, tradução, apoio e carinho.
Às amigas Izildinha Ramos Accetta e Rochele Figueiredo Cardoso, pela
revisão metodológica e de apresentação final, e pelo apoio, dedicação, grande
amizade e carinho.
À Madalena, anjo bom que revisou este trabalho com grande
desprendimento, amizade, competência e doação.
A todos aqueles que de maneira direta ou indireta contribuíram para o
desenvolvimento desta pesquisa.
E a toda a equipe do Plano Invisível que tem estado ao nosso lado.
5
O presente é a sombra que se move separando o ontem do amanhã.
Nela repousa a esperança.
Frank Lloyd Wright.
6
RESUMO
WITTMANN, Angelina. A Ferrovia no Vale do Itajaí. 2008. Dissertação (Mestrado
em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade) Programa de Pós-Graduação em
Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade, Universidade Federal de Santa
Catarina, Florianópolis, 2008. Orientador: Prof. Dr. Vilmar Vidor da Silva; Co-
Orientador: Prof. Dr. Nelson Popini Vaz.
Linha de Pesquisa: LP2 - Estudo das cidades e regiões com base nas inter-
relações entre a formação social, processo de urbanização, introdução e
desenvolvimento das inovações técnico-científicas e a formação dos espaços
industriais. Planejamento regional e urbano. Estudo dos impactos da urbanização
sobre o território e o ambiente. Estudo das relações intra e interurbanas.
O tema desta dissertação é uma análise dos fatos históricos relacionados ao
processo de implantação e à posterior desativação da EFSC no Vale do Itajaí,
destacando os principais agentes do processo e a conseqüência de suas ações no
domínio geográfico e social. Esta pesquisa tem sua relevância social e acadêmica
como instrumento de pesquisa e de memória baseado na organização dos fatos
históricos desencadeados em torno dos transportes no Vale do Itajaí, com foco para
o transporte ferroviário, uma vez que há pouca publicação e pesquisa sobre a EFSC.
O trabalho foi referenciado pela análise das relações sociais sob os conceitos de
Santos (1991), de fatos históricos registrados em periódicos, documentos escritos,
fotográficos e cartográficos, entrevistas e, quando necessário, pela busca da
contextualização dentro dos acontecimentos nacionais e internacionais, para melhor
esclarecimento dos fatos em escala local e regional. Além disso, esta pesquisa usou
como referência a análise e os conceitos de Mumford, em sua obra A Cidade na
História, abordando o processo de transformações urbanas decorrente do
desenvolvimento das cidades e seus principais agentes. Conceitos de outros
autores, como Villaça, Lefebvre e Halbwachs são igualmente suportes teóricos deste
trabalho. A ferrovia fez parte dos planos das lideranças locais, desde as primeiras
décadas de história da fundação dos núcleos urbanos na região da bacia do Itajaí,
como questão básica para o desenvolvimento econômico da região.
Palavras-chave: Ferrovia. Vale do Itajaí. Transporte. Cidades. História.
7
ABSTRACT
WITTMANN, Angelina. The Railway in the region of Vale do Itajaí. 2008. Dissertation
(Master Degree in Urban Planning, History and City Architecture) - Post-Graduate
Program in Urban Planning, History and City Architecture, Universidade Federal de
Santa Catarina, Florianópolis, 2008. Supervisor: Prof. Dr. Vilmar Vidor da Silva, Co-
Advisor: Prof. Dr. Nelson Vaz Popini.
Research Area: LP2 - Study of cities and regions based on the interrelations among
the social system, urbanization process, introduction and development of technical
and scientific innovations; and industrial areas rise. Regional and urban planning.
Study of the urbanization impacts on the territory as well as on the environment.
Study of intra and interurban relations.
The theme of this thesis is an analysis of historical facts related to the process of
implantation and further disabling of EFSC (Estrada de Ferro Santa Catarina) in the
region of Vale do Itajaí, State of Santa Catarina, highlighting the main agents of the
case and the consequences of their actions both on geographical and social domain.
This research has a social and academic relevance as a tool for further search and
memory since it presents the organization of historical facts regarding transport in the
region of Vale do Itajaí, with a focus on railway transportation, especially EFSC, from
which little research sources and publications can be found. The work is referenced
by an analysis of social relations according to the concepts of Santos (1991);
historical facts recorded in journals, written, photographic, cartographic documents;
and interviews. It includes, also, some search on the context of national and
international events in order to offer a better understanding of the facts in a local and
regional scale. Additionally, this research used as a reference to the concepts shown
an analysis registered by Mumford in his book “A Cidade na História”, around the
process of urban transformations resulting from the development of cities and their
key players. Concepts of other authors, as Villaça, Lefebvre and Halbwachs are also
devices of this theoretical work. The railway took part of the local leaders’ plans since
the first decades of the history of the foundation of urban areas located at the basin
of the Itajaí River. It was, at that time, a basic need for the economic development of
the region.
Key words: Railway. Vale do Itajaí. Transportation. Cities. History.
8
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Configuração Geográfica atual do Vale do Itajaí com o traçado da EFSC ........... 20
Figura 2 - Foz do Ribeirão da Velha e foz do Ribeirão Garcia ............................................. 21
Figura 3 - Bacia do rio Itajaí-Açu.......................................................................................... 22
Figura 4 - Trecho da EFSC – Indaial, 1935.......................................................................... 23
Figura 5 - Mapa do Vale e da Bacia do Itajaí-Açu.......
...
.......................................
...
..............26
Figura 6 - Rio do Sul cada de 50 Detalhe para a placa comercial - Loja de autopeças
FNM..................................................................................................................................... 34
Figura 7 - Em frente à estação de Salto Weissbach – Década de 50................................... 38
Figura 8 - Mapa da antiga Colônia Blumenau ...................................................................... 40
Figura 9 - Localização da Bacia do rio Itajaí-Açu ................................................................. 41
Figura 10 - Mapa da Região do Vale do Itajaí...................................................................... 42
Figura 11 - Detalhe do mapa anterior por Emil Odebrecht – 1874 ....................................... 42
Figura 12 - Localização do Vale do Itajaí, no Estado de Santa Catarina.............................. 43
Figura 13 - Estação de Lontras recém-inaugurada (1932) ................................................... 44
Figura 14 - Bacia hidrográfica do rio Itajaí-Açu (1)............................................................... 45
Figura 15 - Bacia hidrográfica do rio Itajaí-Açu (2)............................................................... 46
Figura 16 - Caminho entre Lages e Laguna, aberto logo após a fundação de Lages........... 50
Figura 17 - Chegada dos primeiros 17 imigrantes à foz do Ribeirão da Velha ..................... 52
Figura 18 - Travessia com canoa no Rio Itajaí do Sul, cavalos à margem (Rio do Sul)........ 54
Figura 19 - Traçado dos primeiros lotes coloniais da Colônia Blumenau (1864) .................. 55
Figura 20 - Stadplatz da Colônia de Blumenau e as vias fluviais no Vale do Itajaí............... 56
Figura 21 - Carroção de transporte usado nas primeiras décadas na região ....................... 57
Figura 22 - Local das nucleações do Salto e Badenfurt - 1864 ............................................ 58
Figura 23 - Pousada de tropas, no caminho a Lages no Planalto Serrano........................... 59
Figura 24 - Abertura da estrada para a colônia Hammonia (atual Ibirama), posterior leito
ferroviário............................................................................................................................. 60
Figura 25 - Carta de Dr. Blumenau reivindicando a abertura da uma via ............................. 61
Figura 26 - Automóvel Ford Modelo T rodando no Alto Vale do Itajaí, em frente a um ponto
de pouso da estrada para o Planalto Serrano (início do Século XX).................................... 62
Figura 27 - Localização das picadas com destino à Colônia de Brusque e Itajaí ................. 63
Figura 28 - Mapa das estradas de cargueiros e gado na década de 1870........................... 64
Figura 29 - Local de travessia no rio, em Rio do Sul e localização do caminho que ligava ao
Planalto................................................................................................................................ 65
Figura 30 - Travessia do rio Itajaí do Sul, em Rio do Sul, atual local da Ponte Curt Hering 66
Figura 31 - Localização das primeiras nucleações no Vale do Itajaí e data dos primeiros
assentamentos .................................................................................................................... 67
Figura 32 - Balsa em Rio do Sul, início do século XX .......................................................... 67
Figura 33 - Localização das primeiras nucleações no Vale do Itajaí e data dos primeiros
assentamentos I .................................................................................................................. 70
Figura 34 - Núcleo urbano de Hammonia, final do século XIX ............................................. 72
Figura 35 - Localização das primeiras nucleações no Vale do Itajaí e data dos primeiros
assentamentos II ................................................................................................................. 73
9
Figura 36 - Relatório da lista de imigrantes que viajaram no Vapor São Lourenço .............. 77
Figura 37 - Fotografia da correspondência do diretor da colônia, Dr. Blumenau à Presidência
da Província......................................................................................................................... 78
Figura 38 - Porto Fluvial de embarque e desembarque de passageiros - Stadplatz da
Colônia Blumenau ............................................................................................................... 81
Figura 39 - Porto na foz do Ribeirão Garcia, no rio Itajaí-Açu – Blumenau .......................... 81
Figura 40 - Porto fluvial de embarque e desembarque de carga - Itoupava Seca, da Colônia
Blumenau ............................................................................................................................ 83
Figura 41 - Localização do porto fluvial de embarque e desembarque de carga e de
passageiros – Colônia Blumenau......................................................................................... 83
Figura 42 - Porto Fluvial de embarque e desembarque de passageiros – Stadplatz da
Colônia Blumenau I ............................................................................................................. 86
Figura 43 - Porto marítimo em Itajaí. Detalhe do Vapor Blumenau atracado, início do século
XX........................................................................................................................................ 86
Figura 44 - Lançamento da pedra fundamental na implantação da linha férrea. Concessão
fornecida a Friederico Von Ockel (final século XIX) ............................................................. 88
Figura 45 - Primeiro carro da região, importado por Frederico Busch (1903)....................... 99
Figura 46 - Primeiro ônibus................................................................................................ 100
Figura 47 - Localização da Colônia Hammonia e Colônia Blumenau ................................. 104
Figura 48 - Construção da ponte de ferro sobre o rio Itajaí-Açu em Hammonia, em 1909.
Mede 102 metros e foi obra da empresa alemã que construiu os primeiros 70 quilômetros da
EFSC................................................................................................................................. 106
Figura 49 - Ponte de ferro sobre o rio Itajaí-Açu, em Hammonia, 2007.............................. 106
Figura 50 - Ponte de ferro sobre o rio Itajaí-Açu, em Hammonia ....................................... 107
Figura 51 - Traçado do plano original da EFSC ................................................................. 110
Figura 52 - Equipe de Execução e Projeto da EFSC - 1907............................................... 116
Figura 53 - Locomotiva Macuca, 1908, passando escoteira sobre trilhos recém colocados
em Encano ........................................................................................................................ 121
Figura 54 - Locomotiva Macuca, 1908, transportando estrutura metálica da ponte n. 6 de
Encano. ............................................................................................................................. 121
Figura 55 - Locomotiva Macuca - 2007.............................................................................. 122
Figura 56 - Primeiro trecho da EFSC inaugurado no dia 3 de maio de 1909, Blumenau a
Warnow ............................................................................................................................. 124
Figura 57 - Trajeto entre as oficinas da EFSC e a Estação de Blumenau.......................... 126
Figura 58 - Estação de Blumenau. Estilo arquitetônico seguindo a técnica em enxaimel.. 127
Figura 59 - Chegada do trem à estação de Warnow no dia 3 de Maio de 1909 ................. 128
Figura 60 - Composição da EFSC chegando na estação de Blumenau............................. 129
Figura 61 - Trajeto entre Warnow e Aquidaban.................................................................. 130
Figura 62 - Construção Trecho Subida Lontras. Contenção do barranco - muro de arrimo
feito com pedras graníticas da região ................................................................................ 131
Figura 63 - Trajeto entre Aquidaban e o entroncamento para Hammonia.......................... 132
Figura 64 - Vista da Ponte dos Arcos – Subida.................................................................. 132
Figura 65 - Construção da ferrovia, trajeto para Hansa-Hammonia, veículos de tração animal
(carroções) em atividade na abertura da ferrovia, feita com pás e picaretas...................... 133
Figura 66 - Detalhe da localização - ramal de Hammonia e da estação da comunidade de
Hansa................................................................................................................................ 133
10
Figura 67 - Vista parcial da comunidade Hansa-Hammonia e dos construtores da ferrovia134
Figura 68 - Vista parcial do local da estação da comunidade Hansa – 2008...................... 135
Figura 69 - Moradias de trabalhadores da EFSC próximo a Rio do Sul (I) Início da
década de 30 do século XX ............................................................................................... 140
Figura 70 - Moradias de trabalhadores da EFSC – próximo a Rio do Sul (II) Início da década
de 30 do século XX............................................................................................................ 141
Figura 71 - Entroncamento para Hammonia (atual Ibirama)............................................... 143
Figura 72 - Abertura do leito à base de pás e picaretas, cortando a rocha – Subida.......... 145
Figura 73 - Abertura do leito à base de pás e picaretas – Subida ...................................... 145
Figura 74 - Remoção de material - Construção do trecho de Subida................................. 146
Figura 75 - Estrada de Ferro Lontras Sr. Carl Louis Wilhelm Hager está à direita - 1924
.......................................................................................................................................... 147
Figura 76 - Equipe de carpintaria da EFSC, entre Subida e Lontras, liderada por Carl Louis
Hager (em pé entre o trator e o reboque). Trator sem pneus............................................. 148
Figura 77 - Trecho Ferroviário entre Subida e Lontras....................................................... 149
Figura 78 - Detalhe 1 ......................................................................................................... 150
Figura 79 - Detalhe 2 ......................................................................................................... 150
Figura 80 - Detalhe 3 ......................................................................................................... 151
Figura 81 - Trajeto entre Subida e Lontras......................................................................... 151
Figura 82 - Construção do trecho Subida – Detalhes do assentamento dos trilhos provisórios
.......................................................................................................................................... 152
Figura 83 - Girador na Serraria Hager, localidade de Riachuelo (Lontras). À direita, Sr. Hager
.......................................................................................................................................... 153
Figura 84 - Ponte Número 16 em curva, com uma altura de aproximadamente 27 metros 154
Figura 85 - Início das obras de construção da ponte de pedra com arcos duplos, em 31 de
julho de 1924..................................................................................................................... 155
Figura 86 - Ponte de Pedra................................................................................................ 155
Figura 87 - Vista da ponte, a uma altura de 104 metros..................................................... 156
Figura 88 - Inauguração Ponte dos Arcos - 1929............................................................... 156
Figura 89 - Ponte de pedra localizada em Atafona ............................................................ 157
Figura 90 - Equipe de carpintaria da EFSC, estrutura Da passagem superior em Subida -
1924 .................................................................................................................................. 158
Figura 91 - Primeiro túnel .................................................................................................. 158
Figura 92 - Linha de trem assentada no corte efetuado na montanha rochosa Salto Pilão
.......................................................................................................................................... 159
Figura 93 - Ponte de ferro Aldo Pereira de Andrade - 1934 ............................................... 161
Figura 94 - Detalhes da ausência das cabeceiras na Ponte de ferro Aldo Pereira de Andrade
- 1934 ................................................................................................................................ 161
Figura 95 - Estação de Blumenau - 1939........................................................................... 162
Figura 96 - Vista Aérea de Blumenau – Final da década de 30 – Séc. XX......................... 163
Figura 97 - Os dois planos do traçado ferroviário para a área central de Blumenau .......... 164
Figura 98 - Fotografia aérea da área central de Blumenau Início da dec. de 70 do século
XX...................................................................................................................................... 164
Figura 99 - Ponte Eng. Antônio Vitorino Ávila Filho, Ponte dos Arcos................................ 165
Figura 100 - Ponte Eng. Antônio Vitorino Ávila Filho, Ponte dos Arcos (I) 2008................. 165
11
Figura 101 - Túnel – Blumenau.......................................................................................... 166
Figura 102 - Ponte dos Arcos e vista parcial do elevado (Ligação reconstitda)............... 166
Figura 103 - Elevado localizado no pátio de uma fábrica - Blumenau................................ 167
Figura 104 - Ponte Eng. Antônio Vitorino Ávila Filho, Ponte dos Arcos (II)......................... 168
Figura 105 - Núcleo Urbano de Rio do Sul, início do século XX......................................... 169
Figura 106 - Trecho ferroviário entre Lontras e Rio do Sul................................................. 170
Figura 107 - Trajeto entre Lontras e Rio do Sul ................................................................. 170
Figura 108 - Estação de Matador....................................................................................... 171
Figura 109 - Armazém da Estação de Rio do Sul, onde funcionou a primeira estação por
breve período, até que o prédio da estação de fato estivesse pronta ................................ 171
Figura 110 - Dia da inauguração do trecho ferroviário até Rio do Sul Local onde está
localizado atualmente o Armazém ..................................................................................... 172
Figura 111 - Estação de Rio do Sul, durante a visita das filhas de Dr. Blumenau ao Vale do
Itajaí em 1937 – chegaram de trem em Rio do Sul. ........................................................... 173
Figura 112 - Trecho ferroviário entre Rio do Sul e Barra do Trombudo.............................. 174
Figura 113 - Trajeto entre Rio do Sul e Barra do Trombudo............................................... 174
Figura 114 - Ponte dos Arcos em dois momentos – Em construção e em 2008................. 175
Figura 115 - Vista parcial de Rio do Sul - Ponte dos Arcos – Década de 40 do Séc. XX . 175
Figura 116 - Terminal de cargas Trombudo Central - 2008................................................ 176
Figura 117 - Estação de Barra do Trombudo..................................................................... 176
Figura 118 - Vista Panorâmica de Trombudo Central na década de 50............................. 177
Figura 119 - Trombudo Central.......................................................................................... 177
Figura 120 - Estação de Cargas da EFSC – Trombudo Central, 1970............................... 178
Figura 121 - Local da Estação de Cargas da EFSC – Trombudo Central, 2008................. 178
Figura 122 - Trecho ferroviário entre Barra do Trombudo e Trombudo Central.................. 179
Figura 123 - Localização, no mapa, da imagem anterior.................................................... 179
Figura 124 - Solenidade de inauguração do trecho ferroviário entre Barra do Trombudo e
Trombudo Central.............................................................................................................. 180
Figura 125 - Plano criar a malha ferroviária em território catarinense ................................ 182
Figura 126 - Locomotiva 301 (Locomotiva do trem inaugural de Rio do Sul) ..................... 182
Figura 127 - Fotografia tirada da Praça Juscelino Kubitschek em frente ao porto fluvial de
Blumenau .......................................................................................................................... 184
Figura 128 - Inauguração da fábrica Mercedes-Benz, em 1956 – Kubitschek dirige caminhão
.......................................................................................................................................... 185
Figura 129 - Encontro com a família Trapp – Agrolândia - SC ........................................... 188
Figura 130 - Estação de Indaial. Da direita para a esquerda: Júlio Espindolla, Domingos da
Costa, Joaquim dos Santos, Pedro Cidral, José Paulo, Germano Amorim (mestre da oficina),
Liberato Xuxu, Leandro dos Santos, João Cardoso e Pedro Mello (maquinista) - 1962..... 190
Figura 131 - Ferroviários nas oficinas da EFSC................................................................. 191
Figura 132 - Oficina Mecânica de Itoupava Seca, Blumenau. (Locomotiva do trem inaugural
de Rio do Sul). Início de 1971 - Primeira locomotiva da EFSC, à esquerda: 301............... 192
Figura 133 - Estação de Indaial - Última viagem (I) - 1971 ................................................ 193
Figura 134 - Estação de Indaial - Última viagem (II) - 1971................................................ 193
Figura 135 - Estação de Indaial - Última viagem (III) - 1971............................................... 194
Figura 136 - Estação Warnow............................................................................................ 196
12
Figura 137 - Estação Warnow (I) Detalhes das paredes internas...................................... 197
Figura 138 - Estação de Lontras........................................................................................ 198
Figura 139 - Estação de Matador....................................................................................... 198
Figura 140 - Detalhes do Armazém de Rio do Sul ............................................................. 199
Figura 141 - Estação de Rio do Sul (fundos) ..................................................................... 199
Figura 142 - Estação de Barra do Trombudo..................................................................... 200
Figura 143 - Elevado entre a estação de Mosquito e Trombudo Central............................ 200
Figura 144 - Estação de Trombudo Central ....................................................................... 201
Figura 145 - Elevado em Trombudo Central ...................................................................... 201
Figura 146 - Estação de São João – Detalhes das ruínas ................................................. 202
Figura 147 - Locomotiva restaurada pela empresa do Sr. Germano Purnhagen (camisa
branca), com apoio da ABPF/TREMTUR........................................................................... 203
Figura 148 - Trabalho de voluntários no restauro da estação de Matador.......................... 203
Figura 149 - Locomotiva 232 restaurada, descansando na estação de Matador............... 205
Figura 150 - Relatório da Estrada de Ferro Santa Catharina ............................................. 229
Figura 151 - Estação de Vereza ........................................................................................ 260
Figura 152 - Construção da primeira estação de Blumenau, usando a técnica construtiva
enxaimel (estrutura de madeira e fechamento em tijolo maciço) - 1908............................. 261
Figura 153 - Tropas de Getúlio Vargas na Estação de Blumenau – Revolução de 1930 ... 262
Figura 154 - Segunda Estação de Blumenau..................................................................... 263
Figura 155 - Segunda estação de Blumenau em pleno funcionamento e último trem em
12/03/1971......................................................................................................................... 263
Figura 156 - Estação de Salto Weissbach ......................................................................... 264
Figura 157 - Estação de Encano - 1910............................................................................. 265
Figura 158 - Primeira estação de Indaial............................................................................ 266
Figura 159 - Segunda estação de Indaial........................................................................... 266
Figura 160 - Estação de Warnow, na inauguração do primeiro trecho ferroviário da EFSC267
Figura 161 - Segunda estação de Warnow........................................................................ 267
Figura 162 - Estação de Apiúna......................................................................................... 268
Figura 163 - Armazém ferroviário Apiúna........................................................................... 268
Figura 164 - Estação de Subida......................................................................................... 269
Figura 165 - Lontras - Primeira estação, inaugurada em 1928........................................... 270
Figura 166 - Lontras, segunda estação.............................................................................. 270
Figura 167 - Estação de Lontras........................................................................................ 271
Figura 168 - Estação de Matador....................................................................................... 271
Figura 169 - Estação de Rio do Sul, na década de 30 do século XX ................................. 272
Figura 170 - Estação de Rio do Sul – Lado da Plataforma de embarque e desembarque . 272
Figura 171 - Estação de Barra do Trombudo..................................................................... 273
Figura 172 - Estação Mosquito .......................................................................................... 274
Figura 173 - Estação de Trombudo Central ....................................................................... 274
Figura 174 - Ruínas da Estação São João......................................................................... 275
Figura 175 - Estação de Hansa ......................................................................................... 275
Figura 176 - Ramal - Local da estação principal de Hammonia (Ibirama) .......................... 276
13
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – País de origem dos capitais das empresas estrangeiras no Brasil (1860-1875)108
Tabela 2 – Investimento estrangeiro por setor de destino, Brasil (1876-1885)................... 109
14
LISTA DE ANEXOS E APÊNDICES
ANEXO A - ENTREVISTA DO SR. OTTO ROHKOHL – PRIMEIRO DIRETOR DA EFSC. 221
ANEXO B - ANUÁRIO DE ITAJAÍ - 1949........................................................................... 226
ANEXO C - RELATÓRIO EFSC – ANO 1920 .................................................................... 229
ANEXO D - E-MAIL LUIZ CARLOS HENKELS.................................................................. 239
ANEXO E - CORRESPONDÊNCIAS – ATOS ADMINISTRATIVOS .................................. 241
ANEXO F - DISCURSO DEPUTADO FERREIRA LIMA .................................................... 243
ANEXO G - CARTA (1879) DR. BLUMENAU AO PRESIDENTE DA PROVÍNCIA ............ 252
ANEXO H - ENTREVISTA LUIZ CARLOS HENKELS........................................................ 254
APÊNDICE A - EXTINÇÃO DA RFFSA – MAIO 2007 – PELA AUTORA........................... 258
APÊNDICE B - AS ESTAÇÕES – PELA AUTORA ............................................................ 260
15
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABPF – Associação Brasileira de Preservação Ferroviária
ACIB – Associação Comercial e Industrial de Blumenau
AMMVI - Associação dos Municípios do Médio Vale do Itajaí
AW – Angelina Wittmann
DNIT – Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes
EFSC – Estrada de Ferro Santa Catarina
FURB – Universidade Regional de Blumenau
IPT – Instituto de Pesquisa e Tecnologia
NuRVI – Núcleo Regional Vale do Itajaí
PGAU-Cidade – Pós Graduação em Urbanismo, História e Arquitetura da Cidade
RFFSA – Rede Ferroviária Federal Sociedade Anônima
RVPSC – Rede Viação Paraná – Santa Catarina
SC – Santa Catarina
TCC – Trabalho de Conclusão de Curso
VFPSC – Viação Férrea Paraná Santa Catarina
16
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 18
1.1 APRESENTAÇÃO ......................................................................................................... 20
1.2 METODOLOGIA ............................................................................................................ 24
1.3 TEMA E DELIMITAÇÃO ................................................................................................ 25
1.4 OBJETIVO..................................................................................................................... 27
1.5 JUSTIFICATIVA............................................................................................................. 28
2 REFERENCIAL TEÓRICO ............................................................................................... 31
3 O VALE DO ITAJ.......................................................................................................... 38
3.1 SÍTIO – VALE DO ITAJAÍ .............................................................................................. 39
3.1.1 Localização................................................................................................................. 40
3.1.2 Condicionantes físicos ................................................................................................ 43
3.1.2.1 Hidrografia ............................................................................................................... 45
3.2 CONTEXTO HISTÓRICO ANTES DA IMPLANTAÇÃO DA EFSC................................. 46
3.2.1 Europa........................................................................................................................ 47
3.2.2 Santa Catarina............................................................................................................ 49
3.3 NUCLEAÇÕES E MEIOS DE TRANSPORTES NO VALE DO ITAJAÍ, ATÉ A
INAUGURAÇÃO DO PRIMEIRO TRECHO DA EFSC -1909....................................... 52
3.3.1 Localização estratégica............................................................................................... 56
3.3.2 Abrindo caminhos ....................................................................................................... 60
3.3.3 Os primeiros empreendimentos .................................................................................. 68
3.3.4 Injunções políticas ...................................................................................................... 70
3.3.5 O transporte fluvial...................................................................................................... 75
4 ESTRADA DE FERRO SANTA CATARINA – EFSC ....................................................... 89
4.1 A CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DO TRANSPORTE FERROVIÁRIO ANTES DA
EFSC............................................................................................................................. 89
4.1.1 O primeiro veículo automotor a vapor ......................................................................... 89
4.1.2 A primeira locomotiva.................................................................................................. 89
4.1.3 A locomotiva a vapor .................................................................................................. 90
4.1.4 A primeira ferrovia no Brasil........................................................................................ 90
4.2 IDEALIZADORES E TRAMITAÇÕES LEGAIS............................................................... 91
4.2.1 Associação Comercial e Industrial de Blumenau – ACIB ............................................ 96
4.2.1.1 O perfil de dois representantes das novas lideranças blumenauense ...................... 97
4.2.1.1.1 Frederico Guilherme Busch................................................................................... 98
17
4.2.1.1.2 Pedro Christiano Feddersen ............................................................................... 100
4.2.2 Companhia Colonizadora Hanseática....................................................................... 103
4.3 A CONSTRUÇÃO DA EFSC........................................................................................ 107
4.3.1 Os construtores e trâmites oficiais ............................................................................ 111
4.3.1.1 Exigências da S.A. Estrada de Ferro Santa Catarina............................................. 114
4.3.1.2 A Caixa Econômica de Empréstimos ..................................................................... 118
4.3.2 Primeiras locomotivas............................................................................................... 119
4.3.3 Primeiro trecho ferroviário Blumenau a Warnow ....................................................... 123
4.3.4 Trecho – Warnow e Aquidaban (atual Apiúna).......................................................... 130
4.3.5 Trecho - Aquidaban e Hammonia (atual Ibirama)...................................................... 131
4.4 O GOVERNO FEDERAL E A I GUERRA MUNDIAL.................................................... 135
4.5 NOVOS CONSTRUTORES E NOVOS PROJETOS.................................................... 137
4.5.1 Vale do Itajaí: Centro Econômico Estadual ............................................................... 138
4.5.2 Especulações fundiárias: prolongamento ferroviário ................................................. 139
4.5.3 Agentes da EFSC envolvidos nos negócios fundiários.............................................. 139
4.5.4 Variante do prolongamento....................................................................................... 142
4.6 CONSTRUÇÃO DA SEGUNDA ETAPA ...................................................................... 144
4.6.1 Trecho - Subida e Lontras......................................................................................... 149
4.6.2 Início das obras do trecho - Blumenau e Itajaí .......................................................... 159
4.6.2.1 Mudança do trajeto da EFSC na área central de Blumenau................................... 162
4.6.2.1.1 Ponte dos Arcos.................................................................................................. 167
4.6.3 Trecho - Lontras a Rio do Sul e Rio do Sul a Barra do Trombudo............................. 168
4.6.4 Trecho - Barra do Trombudo a Trombudo Central e acontecimentos intermediários. 176
4.7 MUDANÇA DO MODAL FERROVIÁRIO PARA O MODAL RODOVIÁRIO - DECLÍNIO
.......................................................................................................................................... 180
4.8 A EFSC APÓS A DESATIVAÇÃO ............................................................................... 194
4.8.1 Associação Brasileira de Preservação Ferroviária - ABPF........................................ 204
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................ 206
REFERÊNCIAS................................................................................................................. 213
ANEXOS ........................................................................................................................... 220
APÊNDICES...................................................................................................................... 257
18
1 INTRODUÇÃO
O tema desta dissertação é uma análise dos fatos históricos relacionados ao
processo de implantação e à posterior desativação da Estrada de Ferro Santa
Catarina – EFSC no Vale do Itajaí.
A EFSC foi o meio de transporte mais entusiasticamente construído, tendo
sido, entretanto, desativada em curto espaço de tempo (1909–1971), quase sem
deixar vestígios no espaço urbano atual, exceto quanto a algumas edificações
(residências de ex-funcionários, oficinas, armazéns e estações ferroviárias) e pontes.
Além de ser um dos elementos estruturadores da rede de cidades da região do Vale
do Itajaí, o transporte ferroviário fez parte da memória coletiva de uma ou mais
gerações, sendo que sua história é praticamente desconhecida pela mais recente
geração, com raras exceções.
No desenvolvimento de trabalhos acadêmicos durante o curso de Arquitetura
e Urbanismo, detectamos a ausência de pesquisas, registros e publicações sobre a
história da EFSC, a não ser a presença de alguns trabalhos de pesquisadores
membros da Associação Brasileira de Preservação Ferroviária – ABPF, entidade que
busca resgatar a memória e mantém materiais e documentos da antiga ferrovia.
Com base no foco que abrange o objeto inserido em um recorte de tempo
passado e de espaço, cuja interferência está contida na paisagem urbana atual do
Vale do Itajaí, surgiu o questionamento que estruturou esta pesquisa:
a) O que levou as lideranças do Vale do Itajaí, no início do século XX, a
adotarem a ferrovia como meio de transporte, ícone da Revolução
Industrial Européia? Por que foi adotada a tecnologia ferroviária alemã,
uma vez que todas as ferrovias nacionais eram construídas com
tecnologia inglesa?
b) O que, realmente, motivou o investimento de capital alemão e a adoção
de tecnologia alemã em um meio de transporte no Vale do Itajaí,
idealizado anteriormente pelo fundador Hermann Blumenau, no culo
XIX, quando todas as ferrovias nacionais utilizavam equipamento
ferroviário inglês?
c) Quais foram os impactos gerados pela adoção do sistema ferroviário na
região, cuja povoação era recente seis décadas e somente 50 anos
19
após a inauguração da primeira ferrovia no Brasil?
d) Quais foram os agentes e ações responsáveis pela desativação da
ferrovia no Vale do Itajaí?
Para compreender o processo e a evolução dos meios de transporte na
região decorrentes do módulo ferroviário, a pesquisa foi dividida em três etapas,
coincidindo com os períodos: anterior à construção; durante o funcionamento da
ferrovia; e posterior à sua desativação. É ilustrada por: mapas, fotografias e textos
produzidos com base no levantamento de dados em documentos oficiais, pequenas
publicações de periódicos locais e em referências de historiadores locais, entrevistas
e visitas aos locais e áreas adjacentes à primitiva linha ferroviária.
Na primeira etapa do trabalho, que abrange o período entre a data de
fundação da Colônia de Blumenau e o início do século XX, são enfocadas na
apresentação e a estruturação do sítio por meio de suas vias de acessibilidade. Esta
parte da pesquisa tem o objetivo de introduzir a paisagem formada pelos inúmeros
núcleos urbanos da região e as vias de acessibilidade, no momento em se iniciou a
construção da EFSC.
Na segunda parte do trabalho, foram descritos os fatos históricos
relacionados à implantação e à desativação da EFSC e na terceira etapa da
pesquisa sobre a Ferrovia no Vale do Itajaí, foi feito o levantamento parcial da
situação do que restou do patrimônio ferroviário local; através de imagens
levantadas in loco acompanhadas de descrições textuais.
O objetivo da pesquisa foi o de destacar após a análise dos fatos históricos
relacionados ao processo de implantação e desativação da EFSC no Vale do Itajaí
, os principais atores do processo e suas ações no domínio geográfico e social,
com o intuito de contribuir para a dialética do espaço urbano do Vale do Itajaí. E
também suprir a ausência de pesquisa e/ou publicações sobre o tema ferroviário na
região. Além disso, foram efetuadas análises das relações sociais conceituadas por
Santos (1991), baseadas em fatos históricos registrados em periódicos e outros
documentos escritos, fotográficos e cartográficos, bem como em entrevistas e,
quando necessário, efetiva contextualização no cenário nacional e internacional.
20
1.1 APRESENTAÇÃO
Nosso primeiro contato com a história da ferrovia Estrada de Ferro Santa
Catarina - EFSC aconteceu na Graduação do Curso de Arquitetura e Urbanismo, no
ano de 1995, ao desenvolvermos uma pesquisa para elaboração do Trabalho de
Conclusão de Curso (TCC)
1
, enfocando a inauguração do primeiro trecho dessa
linha férrea de 30 quilômetros cobrindo a distância entre Blumenau e Warnow
(localidade de Indaial). Nesse momento, detectaram-se a ausência de pesquisas,
registros e publicações sobre a história da EFSC. Foi percebido nesta data, que a
ferrovia foi um dos principais e importante agente estruturador das principais cidades
do Vale do Itajaí, e um ícone da memória coletiva de uma ou mais gerações. Muitos
representantes das gerações mais recentes desconhecem a existência do sistema
ferroviário na região.
Figura 1 - Configuração Geográfica atual do Vale do Itajaí com o traçado da EFSC
Fonte: Adaptado de SANTA CATARINA – Atlas de Santa Catarina. 1986
1
Estação Ferroviária / Museu Ferroviário de Blumenau – 1996.
21
Na primeira metade do século passado houve a troca gradual do módulo de
transporte ferroviário pelo módulo de transporte rodoviário, no País, por meio de
ações políticas e de ordem econômica, com ecos no Vale do Itajaí.
Historicamente, em cada período do desenvolvimento da região do Vale do
Itajaí houve destaque para a adoção de um determinado tipo de transporte, ou
mesmo dois, complementando-se. A conformação geográfica da região, mais
precisamente junto à foz do ribeirão da Velha, no rio Itajaí-Açu, pouco acima do local
onde aportaram os primeiros imigrantes, foi importante para a definição do tipo de
ocupação do solo na região, e igualmente determinante para a definição das vias de
penetração por terra, para o interior.
Figura 2 - Foz do Ribeirão da Velha e foz do Ribeirão Garcia
Fonte: Elaborado por WITTMANN, 2008.
Acima do ponto, localizado no mapa a seguir, o rio Itajaí-Açu não
apresentava navegabilidade e os caminhos eram abertos a facão, delineando as
baixadas do vale do rio e de seus inúmeros afluentes, que apresentavam topografia
plana.
22
Figura 3 - Bacia do rio Itajaí-Açu
Fonte: Adaptado de SANTA CATARINA – Atlas de Santa Catarina. 1986
Os meios de transporte na região nordeste do Estado no século passado e
no início deste consistiam em picadas, estrada para carro de bois e rios. As
picadas e estradas foram construídas pelos próprios imigrantes, no que
Seyferth determinou de “trabalho acessório’’. (VIDOR, 1995, p. 34).
Nos primeiros trinta anos de colonização do Vale do Itajaí, a via fluvial foi o
único meio de comunicação entre a região e o litoral. Nesse período existia somente
uma picada à margem direita do rio Itajaí-Açu, ligando Blumenau a Itajaí. Mais
tarde, surgiram outros caminhos, picadas e a construção, efetivação e desativação
de um novo e moderno (para a época), sistema de transporte: o ferroviário.
A implantação da ferrovia na região teve inspiração nas novas idéias e
revoluções ocorridas na Europa no século XVIII e XIX e suas conseqüências, aliadas
a ações econômicas e políticas brasileiras adotadas para a região Sul do País. A
EFSC foi construída com capital alemão, diferentemente de outras ferrovias
nacionais, que foram construídas com tecnologia e capital inglês. Melhor detalhada
ao longo da dissertação.
A história da EFSC, quase esquecida no Vale do Itajaí por ausência de
memória e publicações, igualmente não consta das publicações históricas de alguns
órgãos federais ligados aos transportes, como o DNIT Departamento Nacional de
Estrutura de Transportes. (BRASIL, 2006).
23
Figura 4 - Trecho da EFSC – Indaial, 1935
Fonte: HIENDLMAYER, 1935.
O sítio da antiga colônia passou por transformações políticas, sociais,
econômicas e espaciais durante seus 157 anos. Em períodos distintos sucederam-
se transformações, adequando o espaço físico ocupado ao novo uso, de acordo com
as relações sociais nele desenvolvidas. A estrutura material e a ferrovia, como
elemento estruturador, surgiram em um determinado período para dar suporte e
atender às novas exigências dos núcleos urbanos, estes, embriões urbanos
formadores da rede de cidades do Vale do Itajaí.
Em muitos paises, o advento do automóvel e a adoção das novas idéias
rodoviaristas não ocasionaram a paralisação do uso do sistema ferroviário. Ao
contrário, houve, sim, a adequação ferroviária aos novos tempos de acordo com a
evolução da técnica aos novos anseios sociais. Teóricos como Mumford (1998)
fizeram fortes críticas àqueles que optaram para somente um tipo de transporte
urbano ou interligando regiões em deslocamentos maiores.
No Brasil, ações políticas, sociais e econômicas interferiram diretamente na
desativação de muitas linhas férreas, como também na do Vale do Itajaí. Este
trabalho dissertou sobre estas ações na região, através da exposição de fatos
históricos. Com isto, pretende-se colocar à disposição da comunidade, bases para
pesquisas e projetos para o retorno da ferrovia como opção atual de transporte e
24
comunicação inter-regional e regional do Vale do Itajaí, desafogando as vias
rodoviárias estaduais e federais.
1.2 METODOLOGIA
Para facilitar a compreensão do processo histórico-evolutivo dos meios de
transporte no Vale do Itajaí baseado no dulo ferroviário, o trabalho é dividido em
três etapas, compreendendo os períodos antes da construção ferroviária; durante o
funcionamento da ferrovia; e após a sua desativação. A apresentação desta
dissertação é feita através de mapas, fotografias e texto produzido com base em
pesquisa de documentos oficiais, em pequenas publicações de periódicos locais e
em referências de historiadores locais, entrevistas e visitas aos locais e áreas
adjacentes à linha ferroviária.
Na primeira etapa, período abrangente entre a datas: de fundação da
Colônia de Blumenau e o início do século XX, é mostrada a estruturação de
ocupação do sítio do Vale do Itajaí, por meio das vias de penetração. Esta parte do
trabalho tem o objetivo de introduzir a história da ferrovia com a apresentação do
contexto formado pelos inúmeros núcleos urbanos da região e as vias de
penetração, no momento em que ela foi implantada.
Na segunda etapa, foram descritos os fatos históricos da implantação e da
desativação ferroviária no Vale do Itajaí. Para o desenvolvimento desta parte da
pesquisa, seguiu-se uma seqüência de procedimentos:
a) pesquisa em referências relacionadas ao tema: ferrovia, transporte,
urbanismo, sociologia do espaço, geografia social e economia regional;
b) pesquisa em teses e dissertações desenvolvidas sobre o mesmo sítio:
Vale do Itajaí;
c) coleta de informações na ABPF
2
, local em que um pequeno acervo da
memória da EFSC, coletado por voluntários amantes da memória
ferroviária e antigos ferroviários. Participação de um passeio de trem,
promovido pelo Museu Dinâmico – Trajeto Rio Negrinho-Natal (segmento
da antiga estrada de ferro em funcionamento em caráter de passeio)
Levantamento fotográfico e entrevistas com antigos ferroviários;
2
Associação Brasileira da Preservação Ferroviária A entidade será apresentada de maneira
detalhada no corpo do trabalho.
25
d) levantamento da documentação histórica, no Arquivo Histórico de
Blumenau, Arquivo Histórico de Rio do Sul, na Biblioteca da UFSC e em
famílias antigas de Blumenau, contemporâneas à ferrovia;
e) levantamento cartográfico antigo;
f) levantamento de correspondência sobre o tema ferroviário nos órgãos
públicos e famílias;
g) entrevistas com usuários do trem, antigos ferroviários, sócios da ABPF e
historiadores;
h) coleta de dados em órgãos oficiais, como IBGE, prefeituras de Blumenau
e de Rio do Sul e outras localidades menores.
E, finalmente, na terceira etapa da pesquisa sobre a Ferrovia no Vale do
Itajaí, foi feita o levantamento da situação do que restou do patrimônio ferroviário
local; através de imagens levantadas in loco acompanhadas de descrições textuais.
1.3 TEMA E DELIMITAÇÃO
O tema apresentado neste trabalho, através da dissertação, enfoca a
ferrovia no Vale do Itajaí - Estrada de Ferro Santa Catarina. Trata-se de um sistema
de transporte implantado no início do século XX, no vale formado pela bacia do rio
Itajaí-Açu e as serras Moema, do Mirador e do Itajaí, na região nordeste do Estado
de Santa Catarina, sítio de uma rede de cidades oriundas das nucleações urbanas
fixadas pelos primeiros imigrantes.
0
Figura 5 - Mapa do Vale e da Bacia do Itajaí-Açu
MAPAS de Santa Catarina - Guia geográfico , 2006. (Modificado por WITTMANN).
26
27
1.4 OBJETIVO
O objetivo deste trabalho é o de analisar os fatos históricos relacionados ao
processo de implantação e à posterior desativação da EFSC no Vale do Itajaí,
destacando os principais agentes do processo e a conseqüência de suas ações no
domínio geográfico e social.
No mais, fora das gravuras e dos livros, na sociedade de hoje, o passado
deixou muitos traços, visíveis algumas vezes, e que se percebem também
na expressão dos rostos, e nos aspectos dos lugares e mesmo nos modos
de pensar e sentir, inconscientemente conservados e reproduzidos por tais
pessoas e dentro de tais ambientes, nem nos percebemos disto,
geralmente. Mas basta que a atenção se volte para esse lado para que nos
apercebamos que os costumes modernos repousam sobre antigas camadas
que afloram em mais de um lugar. (HALBWACHS, 1990, p. 68).
O sociólogo francês Halbwachs (1990)
3
afirma que continuamos convivendo,
muitas vezes de maneira despercebida, com os fatos, ações, contextos que
aparentemente fizeram parte de um passado remoto das relações sociais de uma
cidade, mas que continuam no “tempo presente”, por meio da memória coletiva. Esta
memória, segundo Halbwachs, é formada por indivíduos, cuja memória individual,
por sua vez, é formada por fatos e experiências individuais convividas com pessoas
residentes do espaço, porém noutros períodos históricos. O geógrafo Santos (1991)
afirma que o passado passou e o presente é real, mas a atualidade dos espaços
tem isto de singular: é formada de momentos que passaram, estando cristalizados
como objetos geográficos atuais; essas formas-objeto do tempo passado são,
igualmente, o tempo dado pelo fracionamento da sociedade total. O momento
passado está morto como “tempo”, mas não como espaço.
A rede urbana do Vale do Itajaí atual é resultado da evolução dos antigos
núcleos da Colônia Blumenau, cuja coesão é explicada pelo grau de integração das
atividades exercidas no seu espaço, durante os “tempos” passados e que se
encontram cristalizadas no presente, por meio de uma infra-estrutura e
equipamentos implantados em uma escala regional. A ferrovia, parte desta rede
infra-estrutural em uma época, representa valiosa fonte de informações para se
construir o processo histórico da evolução urbana da rede no Vale do Itajaí.
Portanto, soma-se ao objetivo deste trabalho o estabelecimento de respostas aos
questionamentos listados e que motivaram a presente pesquisa.
3
Halbwachs foi um sociólogo francês que escreveu sobre a memória coletiva.
28
1.5 JUSTIFICATIVA
“Essa sociedade urbana pode ser concebida ao final de processo em
curso do qual explodem as antigas formas urbanas, herdadas de transformações
descontínuas”. (LEFEBVRE, 1999, p. 15).
O espaço urbano, como mais um elemento da dialética materialista, está
muito além de ser um simples antagonismo entre classes sociais de um cenário de
produção capitalista.
Enunciamos um objeto virtual, a sociedade urbana, ou seja, um objeto
possível, do qual teremos que mostrar o nascimento e o desenvolvimento,
relacionando-os a um processo e a uma práxis (uma ação prática).
(LEFEBVRE, 1999, p. 16).
Este conceito não é uma teoria geral que se propõe explicar quaisquer
objetos de uma forma dedutiva, mas torna-se uma possibilidade de compreensão de
um "objeto real", levando-o em conta desde o início. A síntese entre o conceito
"objeto real" é "objeto virtual", "possível", que é a própria sociedade urbana do
Vale do Itajaí, decorrente de um período histórico formado por elementos que não
existem mais, mas que permanecem presentes na paisagem real atual, ou seja, o
"objeto real" se define com base no movimento dialético.
Estamos, certamente, muito próximos da célebre definição enunciada por
Marx e Engels, presente na quinta tese sobre Feuerbach e sintonizada com as
posições de Halbwachs.
“[...] a essência do homem não é uma abstração inerente ao indivíduo
isolado. Na sua realidade, ela é o conjunto das relações sociais”. (MARX, 2002, p.
101).
Sob este aspecto, o espaço não é uma realidade imutável que o homem
apreende passivamente, mas uma "construção real", na medida em que é uma
"construção do real" em decorrência de uma prática. O espaço, então, e, mais
precisamente, o urbano, é fruto das relações sociais ali praticadas em diferentes
períodos históricos.
O transporte e as comunicações são elementos estruturadores espaciais
implantados em um determinado período pelas forças sociais dominantes, e, dentro
desse período, atendem às aspirações da sociedade naquele momento ou das
lideranças que compõem essa sociedade. A paisagem atual é “fruto das relações
29
sociais”.
O intuito de contribuir para a dialética do espaço urbano do Vale do Itajaí, e
a ausência de pesquisas e publicações sobre o tema avivaram a iniciativa para a
realização deste trabalho dissertativo.
Houve grande dificuldade na busca de referências bibliográficas,
documentos e publicações oficiais e acadêmicas sobre o assunto, principalmente
quanto à pesquisa sobre o tema “ferrovia” na região, efetuada durante o
desenvolvimento de um TCC (1995) na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da
FURB (Universidade Regional de Blumenau). Existiam breves relatos em alguns
trabalhos e projetos, elaborados para descrever ou complementar outros temas
pesquisados. Os arquivos históricos de Blumenau e Rio do Sul, como também os da
ABPF mantêm um bom acervo fotográfico e documental, porém isoladamente, e
guardados de forma que nem sempre a população local e os pesquisadores
conseguem tomar conhecimento de sua existência.
Além de fazer parte da memória coletiva local e regional, conforme
conceituado pelo sociólogo Halbwachs, a via ferroviária e as vias fluviais da grande
bacia do rio Itajaí estruturaram, fizeram desenvolver e propiciaram o surgimento de
inúmeras cidades da rede do Vale do Itajaí, nas primeiras décadas do século XX.
Defende-se, neste trabalho, a importância do esclarecimento histórico das
ações que envolveram a ferrovia e seus reflexos no espaço urbano, como
contribuição para a dialética do urbanismo do Vale do Itajaí. O traçado e a hierarquia
das comunicações entre os núcleos urbanos locais chegaram aos dias atuais em
decorrência de adaptações realizadas por meio de intervenções adequadas às
mudanças sociais ao longo dos períodos históricos. Santos (1996) lembrava que
as estradas de ferro e rodovias chamavam a atenção de historiadores e geógrafos
em outros contextos e períodos, fato que ainda não ocorreu com a ferrovia do Vale
do Itajaí.
As técnicas têm sido, com freqüência, consideradas em artigos e livros de
geógrafos, sobretudo em estudos empíricos de casos. Mas é raro que um
esforço de generalização participe do processo de produção de uma teoria
e de um método geográfico. As estradas de ferro, e depois as rodovias,
chamaram a atenção de historiadores e de geógrafos. (SANTOS, 1999, p.
27).
O sociólogo francês Halbwachs (1990) afirma, também, que continuamos
convivendo, muitas vezes de maneira despercebida, com os fatos, ações, contextos
30
que aparentemente fizeram parte de um passado remoto das relações sociais de
uma cidade, mas que permanecem no tempo presente, por meio da memória
coletiva (formada pelas memórias individuais). O geógrafo Santos (1991), por sua
vez, diz que o passado passou e só o presente é real, mas os espaços atuais são
formados de objetos geográficos criados em outro quadro social.
“O urbano é acumulativo de todos os conteúdos, seres da natureza,
resultado da indústria, técnicas e riquezas, obras da cultura, aí compreendidas
maneiras de viver, situações, modulações ou rupturas do cotidiano”. (LEFEBVRE,
1999, p. 112).
Portanto, entende-se que o tema deste trabalho a ferrovia tem sua
relevância social e acadêmica como instrumento de pesquisa e de memória, com
base na organização dos fatos históricos desencadeados em torno dos transportes
no Vale do Itajaí até a implantação da EFSC.
31
2 REFERENCIAL TEÓRICO
Para dissertar sobre a efetivação e a desativação da ferrovia no Vale do
Itajaí, este trabalho analisa as relações sociais mencionadas por Santos (1991), com
base em fatos históricos registrados em periódicos, documentos escritos,
fotográficos e cartográficos, entrevistas e, quando necessário, busca a
contextualização dentro dos acontecimentos nacionais e internacionais, para melhor
esclarecimento dos fatos em escala local e regional. Além disso, esta pesquisa usa
como referência a análise e os conceitos de Mumford, em sua obra A Cidade na
História, abordando o processo de transformações urbanas decorrentes do
desenvolvimento das cidades e seus principais agentes. Desenvolvimento que age
na forma urbana assumindo novas funções do espaço. Mumford (1998) destaca que
somente apreenderemos a forma presente da cidade, não importando os seus
agentes estruturadores, quando retrocedermos ao início de sua formação e
apurarmos sua evolução compreendendo as várias camadas sobrepostas no modo
de ocupação, relações sociais e deslocamento no espaço. Conceitos de outros
autores, como Villaça, Lefebvre e Halbwachs, são igualmente suportes nesta
dissertação: a Ferrovia no Vale do Itajaí.
Observando o conceito sobre a dialética do espaço urbano efetuado por
Lefebvre, podemos afirmar que a história do urbano se produz e se torna visível pela
dominação e transformação dos espaços. As marcas desta dominação estão
presentes em todos os espaços. Segundo Lefebvre, estas marcas não devem ser
vistas como simples reflexos espaciais de um determinado modelo de civilização ou
modo de produção, mas elas são a própria dominação, em decorrência da qual deva
se desenvolver em algum grau a estrutura física. O espaço no pensamento não é
uma mera abstração, mas parte ativa do próprio movimento dialético. Para isto, faz-
se necessário o conhecimento dos fatos e ações que se desenvolveram no espaço
em um determinado recorte de tempo. Já Santos afirma que toda vez que surgem
novos alicerces dentro de um processo de mudanças, a economia, as relações
sociais e políticas também mudam.
Cada vez que a sociedade passa por um processo de mudança, a
economia, as relações sociais e políticas também mudam em ritmos e
intensidades variados. A mesma coisa acontece em relação ao espaço e à
paisagem, que se transforma para adaptar as novas necessidades da
sociedade. (SANTOS, 1991, p. 37).
32
Por sua vez, para compreender o processo estruturador e apreender o
espaço construído atual, é fundamental a análise das ações e dos agentes
responsáveis por essas mudanças. Mumford (1998) afirma que para se obter a
melhor visão atual da cidade deve-se observar sua história, para, desta forma,
delinear suas estruturas mais antigas e de funções ainda primitivas.
[...] a cidade é uma forma amadurecida. Em nossa tentativa de obter
melhor visão do seu atual estado, devemos espreitar por sobre a linha do
horizonte histórico, a fim de vislumbrar os obscuros traços de estruturas
ainda mais antigas e de funções ainda mais primitivas [...]. Quando, afinal,
atingirmos nossa época, verificaremos que a sociedade urbana chegou a
um ponto em que são dois os caminhos. Então, com uma consciência maior
do nosso passado e uma visão mais clara das decisões tomadas muito
tempo, decisões que muitas vezes ainda nos controlam, estaremos em
condições de enfrentar a decisão imediata que ora se apresenta ao homem
e que, de um ou de outro modo, acabará por transformá-lo [...].
(MUMFORD, 1998, p. 10).
Em sintonia com Mumford (1998), pode-se afirmar que a ferrovia foi um dos
principais agentes estruturadores na região do Vale do Itajaí, e sabe-se que ela,
nesse sentido, fez parte dos primeiros projetos para os núcleos urbanos do Vale, nos
primórdios de sua história. O fundador da Colônia Blumenau, que mantinha ligações
estreitas com filósofos europeus que disseminavam as novas idéias durante a
Europa pós-revolução industrial, trouxe consigo o desejo e os planos de implantar o
novo meio de transporte no Vale do Itajaí.
A formação dos primeiros cleos urbanos na região esteve relacionada à
acessibilidade por via fluvial, ainda que alguns trechos do rio apresentassem
dificuldade para a navegação. Esta estruturação primária, por meio dos primeiros
assentamentos mais as características geográficas, definiu a localização do leito
ferroviário da EFSC. Após a inserção da linha ferroviária na paisagem, surgiram
outros núcleos urbanos, o que acelerou o desenvolvimento dos primeiros núcleos.
A falta de meios de transporte no município de Blumenau tornou-se sensível
e premente, quando a Companhia de Colonização Hanseática, em 1900,
começou a lotear os terrenos de sua concessão nas margens do rio
Hercílio, ou seja, Itajaí do Norte.
Desde 30 anos vinham-se fazendo tentativas de construir alguma
estrada de ferro em Santa Catarina. (CENTENÁRIO DE BLUMENAU, 1950,
p. 253).
Todos os que colaboraram de forma direta ou indireta para a construção da
EFSC nem sempre tinham o mesmo objetivo, mas estavam inseridos no mesmo
processo mencionado por Villaça (2001) e participavam da elite conceituada por
33
Santos (1991). Os idealizadores da ferrovia EFSC eram banqueiros alemães,
empreendedores da colonizadora Hanseática, políticos locais que representavam os
comerciantes ou eram os próprios comerciantes e chefes de comunas, que
distribuíam mercadorias para os núcleos da colônia situados ao longo do Vale do
Itajaí.
O espaço urbano é produzido e consumido por um mesmo e único
processo. A sua estrutura interna, entretanto, se processa sob o domínio
de forças que representam os interesses de consumo (condições de vida
das camadas de mais alta renda). (VILLAÇA, 2001, p. 328).
Os construtores do espaço não se desembaraçam com a ideologia
dominante quando concebem uma casa, uma estrada, um bairro, uma
cidade. O ato de construir está submetido a regras que procuram nos
modelos de produção e nas relações de classe suas possibilidades atuais.
(SANTOS, 1991, p. 24).
A Colônia de Blumenau foi um projeto individual do Dr. Blumenau e durante
algumas décadas foi administrada por ele e por pessoas próximas a ele. A ferrovia já
fazia parte dos projetos desses primeiros administradores. Mumford (1998) diz que o
urbanismo é, por natureza, um processo abrangente, que envolve o intercurso de
muitas necessidades, finalidades e funções. Um planejamento feito pelo
empreendedor individual é um esforço em pequena escala, tendo em vista seus
próprios fins limitados. Somente uma atividade municipal, além da ampliação de ruas
e quarteirões, era necessária para os fins: a construção de linhas de transporte.
As lideranças locais, bancos e empreendedores alemães investiram e
usaram suas influências para que a ferrovia fosse construída no Vale do Itajaí. O
empreendimento trouxe benefícios, não somente aos seus investidores, mas a toda
a comunidade da região. Esses benefícios foram propagados e incentivados ao
momento em que a elite nacional e internacional manifestou o desejo, não importa o
motivo neste momento, de que outro meio de transporte fosse adotado pelo Estado
como módulo oficial de transporte de passageiros e produtos, cerca de seis décadas
após a inauguração do primeiro trecho ferroviário da EFSC. Esta era uma ferrovia
isolada e não fazia parte de uma rede ferroviária, ou seja, não estava ligada a outras
linhas férreas, promovendo a conexão de diversas regiões e viabilizando as
comunicações e transportes de pessoas e produtos com maior fluidez em uma área
territorial maior.
Na década de 30 do culo XX, aconteceu a expansão do mercado interno,
o desenvolvimento industrial, com seu crescimento voltado para o interior e,
34
conseqüentemente, foi dado início ao transporte da produção industrial nacional
entre regiões produtoras e os mercados consumidores regionais. A integração das
várias regiões brasileiras passou a ser feita pelas vias rodoviárias. A partir de então,
a cota orçamentária federal destinada aos meios de transporte passou a ser
direcionada para a construção e melhoria das estruturas rodoviárias.
Simultaneamente, foram dados incentivos à indústria automobilística. Mumford
(1998) afirma que nos casos em que há a interferência do Estado, este, como uma
instituição pública na escolha dos módulos estruturais urbanos de acordo com a
determinação da elite, passa a ser também uma aventura comercial privada. A elite
são os agentes que detêm e, produzem e distribuem o capital na esfera local,
regional, nacional e internacional.
Figura 6 - Rio do Sul década de 50 – Detalhe para a placa comercial - Loja de autopeças FNM
4
Fonte: Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Quando se tratava de lucros, o interesse particular tinha primazia, dentro da
teoria capitalista clássica, sobre o interesse público. Na verdade, os poderes
do Estado ou da municipalidade jamais foram inteiramente rejeitados pelas
empresas capitalistas. O capitalismo cobiçosamente exigia grandes
4
FNM Fábrica Nacional de Motores, fundada no Estado Novo. A criação da fábrica, junto com a da
Companhia da Siderúrgica Nacional, Companhia Nacional de Álcalis, Companhia Hidrelétrica do São
Francisco, visava transformar o Brasil em uma economia industrializada. A FNM foi erguida com
capital do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico em 1942, como uma empresa Estatal na
Baixada Fluminense, em Duque de Caxias.
35
subvenções e subsídios, vastas doações, como aquelas que
originariamente promoveram as ferrovias do oeste, e agora, de maneira
igualmente imprevidente, subvencionam os transportes privados por via
aérea e motorizados. (MUMFORD, 1998, p. 461)
5
.
Dentro desse novo período econômico demarcado pelas lideranças e
investidores da Nova República, o automóvel foi apresentado como a solução ideal
para o transporte, desprovida de qualquer reflexão. Esta ação teve ecos em todo o
território nacional, até mesmo no Vale do Itajaí. O trem foi preterido, como opção de
transporte, pelo automóvel.
O erro da mentalidade comercial progressista foi dar exagerada importância
àqueles modos de circulação que prometiam os mais elevados lucros
financeiros: isso levou o planejador a passar por cima do papel do
caminhante e da necessidade de conservar a flexibilidade de movimentos
de massa, que a circulação de pedestres pode assegurar. Ao mesmo
tempo, obrigou-o mais tarde à solução unidimensional do transporte
particular por meio do automóvel, e a dar ao próprio transporte prioridade
sobre muitas outras funções urbanas, igualmente essenciais à existência de
uma cidade. (MUMFORD, 1998, p. 466).
Nas últimas décadas ocorreu o adensamento dos espaços urbanos da
região do Vale do Itajaí. Este adensamento não aconteceu na mesma proporção em
que aumentou a frota automobilística. A infra-estrutura rodoviária não foi adequada
aos novos números da frota atual. Lefebvre (1999) afirma que “contrastes, oposições
e justaposições substituem os distanciamentos, as distâncias espaço-temporais”.
Segundo o autor, “o espaço (espaço-tempo) muda com os períodos, as esferas, o
campo e a atividade dominante”. As ações dos grupos formados pelas lideranças e
investidores tiveram interferência tanto na implantação da ferrovia quanto na sua
desativação. As lideranças econômicas e políticas locais, nacionais e mesmo
internacionais, agem nas relações sociais que ocorrem no espaço urbano, estando
este em constantes mudanças. Lefebvre (1999), diz que “as diferenças que
emergem e se instauram no espaço não provêm do espaço como tal, mas do que
nele se instala reunido, confrontado pela realidade urbana”.
Seria utópico apreender todos os agentes responsáveis por estas ações,
contrastes, superposições e justaposições, uma vez que as modificações são
permanentes e constantes neste organismo vivo que é a cidade. Delimitar-se-á esta
pesquisa assimilando o contexto espaço/temporal do funcionamento da ferrovia na
5
Mumford explana sobre a ferrovia construída no oeste norte americano, que atingiu quase 400 mil
quilômetros de linha construída, no início do século XX.
36
região do Vale do Itajaí, com estudos dos fatos históricos que antecederam a sua
implantação e desativação na região. Santos (1991), afirma que “somente o estudo
da história dos modos de produção e das formações sociais nos permitirá conhecer
o valor real de cada coisa no interior das totalidades”.
A ferrovia foi um instrumento dos modos de produção, estruturador espacial
da rede urbana e responsável pela geração de pontos focais na paisagem, ao longo
da linha do trem, no Vale do Itajaí. De acordo com Rochefort (1998) a rede urbana é
um conjunto de nucleações urbanas cuja coesão é definida pelo alto grau de
integração das atividades exercidas na escala regional. Esse sistema utiliza, então,
infra-estruturas e equipamentos implantados na escala regional.
A compreensão dos processos relacionado à ocupação territorial na escala
regional não pode dispensar a análise dos mapas, que conduzem à visualização de
núcleos urbanos dispersos, interligados pelas vias de circulação, como a ferrovia o
fez no Vale do Itajaí.
A idéia de rede é normalmente associada a essa configuração. A rede
urbana é formada por um conjunto de nucleações que estabelecem relações de
semelhança física e abrigam atividades urbanas caracterizadas pela
complementaridade.
No artigo “Região Território e Meio Ambiente”, Leila Christina Dias e Gislene
Aparecida dos Santos definem região como referência associada à localização e à
extensão de um certo fenômeno. O regional estaria entre o nacional e o local. A
região também tem o sentido de “classe de área”, resultado de um processo de
regionalização. As novas cnicas de informação e comunicação contribuem para a
reestruturação da ocupação territorial na escala regional, conforme a tendência de
passagem de uma antiga polarização do tipo zona para uma polarização do tipo
rede, com a formação de uma metrópole-rede no dias atuais.
As redes sendo técnicas e sociais tornam-se, ao mesmo tempo locais e
globais, simultaneamente concentradas e dispersando os produtos e os serviços. A
produção reduz progressivamente o seu espaço, mas alarga o intercâmbio das
mercadorias, num processo em que a maior fluidez é constantemente buscada,
valendo-se das redes infra-estruturais tecnicamente aperfeiçoadas. Na região do
Vale do Itajaí, o processo teve início no momento da escolha do sítio físico para
assentar a sede da Colônia Blumenau, prosseguiu com a abertura de caminhos
importantes que promoviam a ligação do Vale a outras regiões circunvizinhas e por
37
meio da construção da EFSC e, depois, pela implantação da malha rodoviária.
Ferrari (1977) explana sobre as mudanças estruturais, após a adoção das
melhorias técnicas nos meios de transportes e o que estas influem na reestruturação
de ocupação territorial na escala regional.
O sistema de transporte coletivo (trem de vapor, bonde elétrico, etc) permitiu
que as cidades crescessem ao longo de suas vias, ficando amplos espaços
entre as mesmas. Daí, a forma clássica de estrela de todas as grandes
cidades do mundo, dotadas de transportes coletivos, até o advento do
automóvel. Nos estudos de Ecologia Urbana e de Engenharia de Tráfego, o
automóvel desempenha os mais significativos papéis. Gerou autêntica
revolução na urbanização dos espaços.
Os possuidores de automóvel, não tendo necessidade de residir nas
proximidades das vias de transportes, passaram a ocupar os espaços
vazios entre as pontas das “estrelas urbanas”, mais próximos da zona
central. [...] Tais facilidades, aliadas a outras causas, fizeram com que as
cidades crescessem desmesuradamente, criando uma série de dificuldades
ou problemas, dentre os quais avulta o do trânsito. As vias tornaram-se
insuficientes pelo obsoletismo de seus traçados, pela incompreensão de
suas funções e, sobretudo, pela crescente motorização da população.
(FERRARI. 1977. p.428).
Após 36 anos sem a presença da ferrovia no Vale do Itajaí, e com o
aumento constante da frota de automotores nas rodovias da região, tomamos
emprestadas as palavras de Mumford diante da questão da atual hegemonia do
transporte rodoviário. Há condições físicas para o pleno funcionamento e integração,
por meio da presença simultânea do transporte aéreo, fluvial e, principalmente,
ferroviário no Vale do Itajaí. Tal assunto poderá vir a ser desenvolvido,
eventualmente, em uma tese.
Nossos engenheiros rodoviários e nossas autoridades municipais,
hipnotizados pela popularidade do automóvel particular, sentindo-se na
obrigação de contribuir para a prosperidade da General Motors (Motores
Gerais), mesmo que o resultado seja o Caos Geral, têm-se entregue a uma
aberta conspiração para desmantelar todas as diferentes formas de
transportes necessárias a um bom sistema, e reduzido nossas facilidades
ao automóvel particular (para fins de prazer, conveniência ou cargas), e ao
avião. Duplicaram mesmo as linhas férreas e repetiram todos os erros dos
antigos engenheiros ferroviários, do mesmo passo que empilharam nas
cidades terminais uma população que o automóvel particular não pode
transportar a menos que a própria cidade seja arrasada, a fim de permitir o
movimento e a armazenagem destes veículos. (MUMFORD, 1998, p. 549).
38
3 O VALE DO ITAJAÍ
A ferrovia no Vale do Itajaí, conhecida por Estrada de Ferro Santa Catarina –
EFSC foi uma ferrovia isolada, desprovida de entroncamentos
6
regionais, que partia
do litoral no sentido da serra (leste-oeste). Teve seu primeiro trecho inaugurado no
dia 3 de maio de 1909 e desativado em 12 de março de 1971. Mesmo isolada, teve
sua importância, que sedescrita pelos principais fragmentos de sua história, cuja
fonte é composta de depoimentos de antigos ferroviários, registros oficiais,
fotografias, mapas antigos e partes de trabalhos de pesquisadores, em geral ligados
à geografia econômica.
Figura 7 - Em frente à estação de Salto Weissbach – Década de 50
Foto: HENKELS, [195?].
[...] na Região do Vale do Itajaí, com a Estrada de Ferro Santa Catarina, e
no Nordeste catarinense, com o Ramal São Francisco. Finalmente, conclui-
se que essas estradas de ferro foram muito mais importantes para a
transformação da pequena produção mercantil em relações capitalistas do
que para o extrativismo. (SILVEIRA, 2000).
Nos primeiros trinta anos de colonização do Vale do Itajaí, a penetração da
região era possível somente pela via fluvial. O rio foi, assim, a primeira via, antes de
surgirem outros caminhos, picadas, ferrovia e rodovias.
6
A EFSC tinha um braço que entrava em Hammonia (Atual Ibirama) que não era reconhecido como
entroncamento.
39
No decorrer da pesquisa, o tema será apresentado e desenvolvido a partir
dos períodos históricos, subdivididos em capítulos e subcapítulos.
Inicialmente, mostrando o sítio físico onde foi construída a Estrada de Ferro
Santa Catarina – EFSC – Vale do Itajaí.
[...] no Vale do Itajaí, a construção de estradas de ferro foi uma “exigência
natural”, para a não-estagnação econômica das colônias implantadas.
Por conseguinte, a capitalização da pequena produção mercantil
caracterizou o desenvolvimento catarinense e as ferrovias tiveram
destacada participação. (SILVEIRA, 2000).
3.1 SÍTIO – VALE DO ITAJAÍ
O Vale do Itajaí é o sítio do objeto de estudo desta pesquisa, região em que
foram implantados os 180 quilômetros de extensão da Estrada de Ferro Santa
Catarina EFSC, ligando o porto marítimo à serra. O ponto mais afastado do mar
(Itajaí), que recebeu a última estação ferroviária – a São João estava localizado na
atual cidade de Agrolândia. O sentido da ferrovia leste-oeste veio confirmar a
afirmativa de Siebert (1996), de que a rede urbana de Santa Catarina, como também
no Vale do Itajaí, desenvolveu-se nesse sentido, acompanhando inicialmente a
colonização do litoral, seguindo, posteriormente, para o vale e para a serra.
A Rede Urbana catarinense desenvolveu-se como o restante do País, no
sentido leste-oeste, acompanhando, inicialmente, a colonização do litoral,
seguindo, posteriormente, para os vales e para o planalto e, finalmente, nas
últimas décadas, avançando para a fronteira agrícola do Oeste do Estado.
No entanto, diferentemente dos demais Estados, onde ocorre a
macrocefalia urbana, a Rede Urbana de Santa Catarina caracteriza-se por
não apresentar dominância absoluta de uma única cidade, mas sim uma
distribuição multipolarizada de núcleos urbanos de médio porte. Evitam-se,
assim, os problemas urbanísticos derivados da existência de apenas uma
cidade-pólo com primazia absoluta sobre as demais. (SIEBERT, 1996, p.
28).
Antes da chegada das grandes levas de imigrantes, a região tinha poucas
propriedades rurais isoladas ao longo do rio Itajaí-Açu e de seus afluentes. Os
primeiros imigrantes chegaram, no início da década de 50 do século XIX, utilizando
embarcações fluviais. Aportavam na sede do primeiro núcleo urbano da Colônia
Blumenau, no porto da foz do ribeirão Garcia, no rio Itajaí-Açu.
Infelizmente, a Estrada de Ferro Santa Catarina, da Rede Ferroviária
Federal, situada, toda ela, nos seus 180 quilômetros de extensão, no
território da Bacia do Itajaí e que foi excelente auxiliar no transporte da
40
produção agrícola e industrial da região para o porto de embarque, foi
erradicada em 1971, por ter sido considerada deficitária. (SILVA, 1972, p.
9).
Figura 8 - Mapa da antiga Colônia Blumenau
Fonte: SANTA CATARINA, 1986; AMARAL, 1950.
* Mostra a antiga Colônia Blumenau (1950) local onde está o traçado de linha da EFSC.
3.1.1 Localização
O território do Vale do Itajaí está situado no vale formado pelo rio Itajaí-Açu e
seus afluentes, que formam a bacia do rio Itajaí-Açu e as serras do Mirador, Itajaí e
Moema. A região foi povoada por imigrantes europeus, sendo, em sua maioria,
alemães e italianos, e durante aproximadamente 80 anos parte de seu território,
conhecido atualmente como Alto e Médio Vale do Itajaí era praticamente o território
da Colônia de Blumenau, que até 1934 ocupava uma área de 10.610 quilômetros
quadrados. Mais tarde, em períodos distintos, ocorreram sucessivos
desmembramentos, resultando em 38 novos municípios do Vale do Itajaí.
41
Figura 9 - Localização da Bacia do rio Itajaí-Açu
Fonte: COMITÊ DO ITAJAÍ, 2006.
Os primeiros colonizadores efetuavam descrições precisas da região em
documentações cnicas, cartográficas, fotográficas e em cartas. Em seus relatos e
mapas, é visível a importância que destinavam às localizações dos cursos de água e
seus posicionamentos dentro da paisagem natural, com requinte de detalhes.
42
Figura 10 - Mapa da Região do Vale do Itaj
Fonte: ODEBRECHT, 2006.
* Feito pelo engenheiro Emil Odebrecht em 1874.
Figura 11 - Detalhe do mapa anterior por Emil Odebrecht – 1874
Fonte: ODEBRECHT, 2006.
43
3.1.2 Condicionantes físicos
Siebert (1996), afirma que o suporte físico condiciona as atividades humanas
de maneira decisiva. De acordo com o mencionado, os primeiros imigrantes e os
idealizadores da EFSC também tinham esta compreensão e efetuavam relatórios
detalhados dos condicionantes físicos desde o primeiro contato com a região do
Vale do Itajaí. Alguns pesquisadores afirmam que não foi de maneira aleatória que o
fundador da Colônia Blumenau deu início a ela no último ponto navegável do rio
Itajaí-Açu.
De acordo com Lago (1968), os numerosos núcleos criados no interior da
colônia mantinham constante articulação com a sede, graças à posição dela na
bacia do Itajaí, e destaca três aspectos essenciais.
Figura 12 - Localização do Vale do Itajaí, no Estado de Santa Catarina
Fonte: Site Wikipédia, 28 out. 2007 14h25. Alterado por WITTMANN.
O primeiro aspecto a destacar é que a bacia do rio Itajaí-Açu (Figura 3), por
ser muito grande, propiciava bons negócios em curto e médio prazo. Tudo devido à
presença de vários tributários, que exploravam diferentes tipos de terrenos
geológicos penetrando nos sedimentos antigos, alcançando a superfície do Planalto
Oriental e estabelecendo uma comunicação natural, aproveitada, posteriormente,
para a construção da EFSC e rodovias que convergem para a calha do rio.
44
Figura 13 - Estação de Lontras recém-inaugurada (1932)
Fonte: Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
O segundo aspecto era o local de implantação da sede da Colônia
Blumenau. Um pouco acima da sede, o leito do rio Itajaí se apresenta estrangulado,
impedindo a navegação a montante, fundamental para o transporte fluvial. Os
núcleos isolados adotavam, então, a sede (Stadplatz)
7
como um entroncamento
obrigatório, com “parada obrigatória” para escoamento de seus produtos ou chegada
de encomendas do porto fluvial. O local tornou-se um entreposto comercial do Vale
do Itajaí. Isto aconteceu durante praticamente um século, até a construção do trecho
da EFSC que chegasse até o porto marítimo, e a melhoria na estrada de
caminhantes e depois rodoviária, até o litoral.
O terceiro aspecto é que o rio Itajaí-Açu, após aproximadamente 50
quilômetros a jusante de Blumenau, percorrendo uma planície relativamente ampla,
com pequeno desnível, facilitava a navegação vinda do porto flúvio-marinho de
Itajaí.
7
Stadplatz é um termo da língua alemã, cujo significado é centro da cidade.
45
Os aspectos físicos territoriais definiram as acessibilidades, instalações dos
primeiros núcleos e construções dos caminhos rodoviários e, principalmente, do
objeto deste estudo, a EFSC.
3.1.2.1 Hidrografia
A bacia hidrográfica do rio Itajaí-Açu é a maior bacia da Vertente do
Atlântico, no Estado, e seus cursos de água totalizam 24.171 quilômetros de
extensão.
Figura 14 - Bacia hidrográfica do rio Itajaí-Açu (1)
Fonte: SANTA CATARINA, Atlas de Santa Catarina (1986) - Alterado por WITTMANN.
O
Vale do Itajaí está localizado na vertente do litoral, cujo principal rio é o
Itajaí-Açu, formado pelas águas dos rios Itajaí d’Oeste, cuja nascente ocorre nos
maciços das serras do Espigão; Mirador e Trombudo; rio Itajaí do Sul, cujas
cabeceiras se encontram no vale situado entre as serras Geral, do Itajaí e das
Tijucas; pelo rio Itajaí do Norte, também chamado de Hercílio, que é o mais extenso
46
e nasce na serra do Espigão, entre a Serra do Mar e a do Mirador e sua bacia
hidrográfica abrange uma área de 15.500 km
2
. Os divisores de água desta bacia,
que faz parte da Vertente do Atlântico, são a Serra Geral, a sudoeste, fazendo divisa
com o Planalto de Lages as serras da Boa Vista, Faxinais e do Tijucas, a
sudoeste; e, ao norte, as serras do Espigão e Moema, fazendo divisa com o
Patamar de Mafra; e a de Jaraguá.
Figura 15 - Bacia hidrográfica do rio Itajaí-Açu (2)
Fonte: GOOGLE MAPS, 2006 - Alterado por WITTMANN.
Os rios da bacia hidrográfica do Rio Itajaí-Açu apresentam um perfil
longitudinal bastante acidentado no curso superior, onde a topografia é acidentada.
No curso inferior, os rios formam meandros, apresentando perfis longitudinais de
baixas declividades, caracterizando-se como rios de planície. Por este motivo, o rio
Itajaí-Açu é navegável de sua foz até Blumenau, a partir de onde apresenta saltos e
corredeiras.
3.2 CONTEXTO HISTÓRICO ANTES DA IMPLANTAÇÃO DA EFSC
Milton Santos dizia que a partir da noção de espaço como um conjunto
indissociável de sistemas de objetos e sistemas de ações, podem-se reconhecer
suas categorias analíticas internas, ou seja, a paisagem, a configuração territorial, a
divisão territorial do trabalho, o espaço produzido ou produtivo, as rugosidades e as
formas-conteúdo.
47
“O conteúdo geográfico do cotidiano também se inclui entre esses conceitos
constitutivos e operacionais, próprios à realidade do espaço geográfico, junto à
questão de uma ordem mundial e de uma ordem local”. (SANTOS, 1996, p. 19).
3.2.1 Europa
Antes da chegada dos primeiros imigrantes ao Vale do Itajaí, na metade do
século XIX, praticamente inexistiam povoações, exceto propriedades isoladas de
famílias oriundas do litoral da Província e de grupos indígenas nativos.
8
No século XVIII, sob os questionamentos iluministas e o fortalecimento da
pequena burguesia, a Europa acelerou seu processo capitalista e entrou na era
moderna.
A renovação das técnicas de transporte com a substituição das forças vitais
pelas forças mecânicas, iniciou-se no crepúsculo do século XVIII ou,
praticamente, nos começos do século XIX, com o carvão-de-pedra e a
invenção da máquina a vapor, que inauguram a revolução industrial.
(AZEVEDO, 1953, p. 17).
Quase no final do século XVIII, os industriais descobriram uma forma de
fundir minério de ferro usando carvão mineral em lugar de carvão vegetal. Outros
industriais utilizaram a energia a vapor para mover as máquinas que até então eram
movidas manualmente, por tração animal ou por força dos ventos ou das águas.
Estas novas tecnologias fizeram com que as pequenas oficinas inglesas dessem
lugar a fábricas de produção em massa. A partir da segunda metade do século XIX,
o aperfeiçoamento das máquinas, a utilização mais proveitosa da matéria-prima e a
adoção de novas tecnologias e processos industriais deram início a um processo de
rupturas e mudanças na produção social. Estas mudanças desencadearam a
acumulação rápida de bens de capital, interferindo diretamente no espaço das
cidades ocidentais e nas suas relações sociais, propiciando a formação de novas
cidades, inclusive em outros continentes, e o adensamento das cidades existentes.
Até esse momento, não existia o Estado alemão, mas um conjunto de
estados e cidades de origem germânica. A Prússia foi o país de maior relevância e
influência para a unificação dos estados germânicos, e responsável pela formação
8
De acordo com o historiador local, José Ferreira da Silva, antes da chegada dos primeiros
imigrantes, habitavam na região índios das tribos, Kaigangs, Xoklengs e Botocudos.
48
do Estado alemão no século XIX
9
. Existia na Prússia uma pré-disposição latente
para a assimilação das novas mudanças na produção social, espacial, econômica e
tecnológica. A burguesia local se fortalecia e estava atenta ao que vinha
acontecendo na Inglaterra desde o século XVIII. O fluxo imigratório da Europa para
outros continentes, iniciados na metade do século XVIII, prosseguiria no século XIX.
Entre os vários destinos da imigração européia (em especial a imigração alemã
originária da Prússia), estava o Vale do Itajaí, sítio do objeto de estudo deste
trabalho.
A tardia chegada da Revolução Industrial, 40 anos após a Inglaterra ter
inventado a máquina a vapor, provocou uma grande transformação dos
aspectos socioeconômicos até então reinantes na Alemanha. As
companhias de oficio que reuniam os artesãos, sucumbiam à chegada das
máquinas e da produção em larga escala. Este movimento fez com que
grande parte, dos camponeses e artífices se tornasse assalariada, fazendo
surgir o proletariado. (SANTIAGO, PETRY, FERREIRA, 2001, p. 11).
Segundo Vidor (1995), “a construção social do Vale do Itajaí não teve, in
loco, nenhum processo econômico anterior ao capitalismo. Não houve, como
sugerem alguns autores, o modo de produção feudal, anterior à revolução industrial.”
No projeto de ocupação do território elaborado pelo Dr. Blumenau, estava explícito o
modo de produção capitalista com influência da escola iluminista fisiocrática de
Quesnay
10
, por meio do desenvolvimento da agricultura, cuja produção seria
beneficiada industrialmente.
Inspirado pelo novo ideário que envolvia a Europa, Dr. Blumenau veio para o
Vale do Itajaí convicto da necessidade de se construir uma ferrovia.
O pesquisador local, Sr. Frederico Kilian entrevistou, em dezembro de
1957
11
, o Sr. Otto Rohkohl, primeiro diretor da EFSC, e foi informado que nos
primeiros anos de colonização de Blumenau o fundador reconhecia a necessidade
de construção de uma ferrovia que ligasse o centro da colônia (porto fluvial mais
avançado do rio Itajaí-Açu) com o “Hinterland”
12
. (ANEXO A).
9
Em 1850, através da Convenção de Olmutz, a Confederação Germânica de 1815, é restabelecida
através da unidade nacional em benefício da Prússia, através da obra de Bismark. É efetuada em
duas partes: a eliminação da Áustria e oposição à França. Em 1870, a França e Prússia entram em
guerra. Uma série de sucessos militares confirma a superioridade prussinana, e a vitória confirma a
unidade alemã. (Enciclopédia Abril, n.1, Alemanha, p. 118).
10
François Quesnay é economista francês adepto da Fisiocracia, ou seja, destaca a agricultura como
sendo a fonte de riquezas da nação.
11
A entrevista na íntegra encontra-se anexa.
12
Hinterland é uma área ou distrito junto às bordas de uma costa ou rio. Especificamente, pela
Doutrina do Hinterland, a palavra é aplicada à região (em terra) junto a um porto.
49
Os imigrantes alemães e italianos aportaram à Província de Santa Catarina,
onde residiam imigrantes açorianos e seus descendentes submetidos à Igreja de
Roma, que ditava regras de boa conduta de acordo com dogmas medievais.
Os padres pregavam que era pecado mortal dançar por que eles levavam
dinheiro para pagar a cota de entrada e isso fazia falta para eles. Isso era
pecado mortal para eles. Em vez de dar dinheiro para a igreja, davam para
as festas. Houve lugares onde as famílias tiveram que se mudar. O sujeito
que tocava gaita e fazia baile, eles obrigavam o fulano a se mudar do lugar.
Cheguei a conhecer a conhecer dois casos desses. O padre não queria que
ele ficasse mais no lugar. Ela fazia o sermão e pedia para o povo não
dançar. Quem for dançar no baile daquele fulano lá, que toca, vai pro
inferno, vai ser excomungado. O cara então peneirava daquele lugar. E se
pagava uma ninharia, uma bagatela para dançar.
A Igreja mandava em tudo, naquela época. Era a principal autoridade. A
igreja falava alto, mais alto do que tudo. Eles estavam por trás de tudo.
(CASCAES, 1997, p. 34).
3.2.2 Santa Catarina
O contexto histórico de Santa Catarina do século XVIII nos permite
compreender o processo de imigração no Vale do Itajaí, iniciado na metade do
século XIX, como também entender o processo de produção social, reflexo das
mudanças que vinham ocorrendo mais de um século, nos países de origem
desses imigrantes. Isto tudo para contextualizar a implantação ferroviária no Vale do
Itajaí, que ocorreu 60 anos após a chegada dos primeiros imigrantes alemães ao
Vale do Itajaí.
No período que antecede a chegada dos primeiros imigrantes ao Vale do
Itajaí, a Europa passou por inúmeras revoluções, adotando novas tecnologias. A
Província de Santa Catarina era um caminho que ligava as pastagens do Rio
Grande do Sul ao planalto paulista e ao território das povoações de Laguna, de
Nossa Senhora do Desterro (atual Florianópolis), e de São Francisco do Sul.
O Governo Imperial, na década de 40 do século XVII, objetivando assegurar
sua soberania na costa sul do país até a embocadura do rio da Prata, fez a
partir de São Vicente alguns grupos açorianos. Estes, por sua vez,
fundaram, em 1645, o povoamento de São Francisco do Sul; um pouco
mais tarde, o de Florianópolis e, em 1676, o povoamento de Laguna.
(VIDOR, 1995, p. 16).
Em 1766, foi fundada Lages, o primeiro núcleo de povoação no interior do
Estado, sem comunicação com o litoral.
Após a fundação de Lages, mais tarde, a Câmara da Vila de Laguna
50
determinou a abertura de uma estrada que a ligasse ao Planalto, acompanhando o
curso do rio Tubarão, hoje conhecida como Estrada do Rio do Rastro.
Figura 16 - Caminho entre Lages e Laguna, aberto logo após a fundação de Lages
Fonte: GOOGLE MAPS, 2006 - Alterado por WITTMANN.
No século XVIII, Santa Catarina recebeu 4.612 pessoas em 1748, 1.666 em
1749, 860 em 1750 e 679 em 1753, um século antes da chegada dos primeiros
imigrantes alemães ao Vale do Itajaí. As pessoas nessa época viviam da agricultura
de subsistência, com base na fabricação da farinha de mandioca, da salga do peixe
e da pesca de baleias.
Toda a capitania enfrentou, na segunda metade do século XVIII, um período
de estagnação, devido ao desempenho da agricultura e dos inúmeros conflitos de
fornecimento de produtos às tropas. Relatos de viajantes que aportavam ao litoral
catarinense informam que a situação melhorou um pouco no início do século XIX,
meio século antes. Enquanto isso, na Europa a Revolução Industrial chegava à
Alemanha unificada.
Em Santa Catarina, a primeira presença dos imigrantes alemães é registrada
a partir de 1829, na Colônia São Pedro de Alcântara, na região do Vale do Imaruí.
No Vale do Itajaí é registrada a presença do imigrante a partir do momento em que
as leis provinciais estabelecem colônias nos rios Itajaí Grande e Mirim, bem como
51
passam a permitir a colonização por empresa particular, companhia brasileira ou
estrangeira
13
.
A marcha da revolução industrial foi muito variável entre os países europeus
e, em suas fases iniciais estava muito longe de possibilitar ampliação de
serviços urbanos numa proporção equivalente à espetacular procura,
alimentada por desequilíbrios na vida rural e pela homogenia velocidade de
crescimento populacional observada em todos os países europeus. (LAGO,
1968, p. 95).
Em que pese a diluição de indivíduos imigrados pelas comunidades
envolventes e tradicionais, os grupos imigrantes criaram ambientes próprios,
decidindo eles mesmos seus destinos e configuração. Isolados numa vasta
região de economia praticamente estagnada, onde núcleos antigos se
arrastavam, sem contar com fatores de impulsão localizados nos mercados
internos ou externos, os colonos criaram e desenvolveram “colônias”.
(LAGO, 1968, p. 97).
Um dos principais motivos do incentivo para a imigração européia para o
Brasil foi a substituição da mão-de-obra escrava e o interesse do Estado em criar
mecanismos para povoar o território e promover economicamente a exploração da
terra, com o intuito de tirar a economia da estagnação.
De acordo com a historiadora Petry (2004), o governo brasileiro, para
estimular a vinda dos imigrantes europeus desenvolveu intensa campanha
propagandista. O Brasil vivenciava, nesse tempo, as dificuldades de um país recém-
declarado independente, que buscava a sua consolidação política. Era necessário
colonizar áreas no Sul do Brasil, como também preencher os grandes vazios
demográficos nas regiões de fronteiras, as quais assegurariam a manutenção da
integridade geográfica do Império.
13
PETRY, Suely. Os Pioneiros: imigração alemã, 180 anos. Jornal de Santa Catarina, Blumenau,
20, jul. 2004. Edição n.10101.
52
Figura 17 - Chegada dos primeiros 17 imigrantes à foz do Ribeirão da Velha
Fonte: FUNDAÇÃO CULTURAL DE BLUMENAU - Arquivo Histórico José Ferreira da Silva.
Nesse contexto de âmbito mundial, nacional e estadual chegaram, em uma
embarcação pelo rio Itajaí-Açu, no dia 2 de setembro de 1850, 17 imigrantes
alemães acompanhados do Dr. Blumenau pouco menos de 59 anos antes da
inauguração da EFSC.
3.3 NUCLEAÇÕES E MEIOS DE TRANSPORTES NO VALE DO ITAJAÍ, ATÉ A
INAUGURAÇÃO DO PRIMEIRO TRECHO DA EFSC -1909
Nas terras que as populações iam invadindo pouco a pouco, carroça
passava aos trancos e barrancos, ao sabor das protuberâncias e das
concavidades, das pedras ou da turfa; um riacho era um grande obstáculo.
Assim nasceram os caminhos e as estradas, à beira da água, construíram-
se as primeiras choças, as primeiras casas, os primeiros burgos; as casas
se alinhavam ao longo dos caminhos das mulas. Colocaram ao redor um
muro fortificado, e um paço municipal no interior. Legislaram, trabalharam,
viveram e respeitaram os caminhos das mulas. (SANTOS, 1996, p. 18).
Santos (1991, p. 37) afirma que cada vez que uma sociedade passa por um
processo de mudança, a economia, as relações sociais e políticas também mudam.
53
O espaço e a paisagem da cidade igualmente mudam ao se adequar à nova
sociedade. Portanto, ao mostrarmos os meios de transporte existentes até a
construção da via férrea na região, estaremos sucintamente delineando as
movimentações e agentes que formaram o contexto social do período histórico do
objeto desta pesquisa.
Somente aos transportes dera Marx um papel fundamental no circuito
econômico, como liame indispensável entre a produção e o consumo.
Contudo, o que distingue as épocas históricas é justamente a mudança de
papel, ou seja, de valor relativo dos elementos de um sistema. (SANTOS
1991, p. 12).
Nos primeiros anos de povoação na região, a maioria dos moradores do Vale
do Itajaí chegava em embarcações pelo rio Itajaí-Açu; outros, em sua minoria,
chegavam por picadas temporárias, oriundos do Planalto Serrano.
Colonos estrangeiros vão chegando à Colônia Blumenau e se fixando às
margens do rio Itajaí-Açu e seus afluentes. Os que querem ir mais para o
interior encontram dificuldades, porque o rio torna-se inavegável, as
florestas são muito densas e perigo de ataque dos índios. (KITA, 2000,
p. 7).
Antes da chegada dos primeiros imigrantes europeus à região, na metade do
século XIX, existiam propriedades isoladas de famílias oriundas do litoral da
Província e de grupos indígenas nativos
14
.
Em 1845, o engenheiro belga Van Lade adquiriu uma légua
15
quadrada de
terras à margem direita do rio Itajaí-Açu, e fundou uma colônia belga (atual Ilhota).
Depois de criar a Companhia Belgo-Brasileira de Colonização, Van Lade
trouxe da Bélgica, para as terras que adquirira, 90 colonos, dando com eles
início à Colônia Belga. Van Lade faleceu em sua terra natal, antes de poder
completar os trabalhos de organização de sua empresa. Esta não
prosperou; ao contrário, extinguiu-se pouco a pouco e os colonos
confundiram-se com os demais moradores da região. A sede da Colônia
Belga passou a denominar-se Ilhota, (nome atual) sede de florescente
município. (SILVA, 1972, p. 18).
Após essa iniciativa de Van Lade, as próximas nucleações do Vale do Itajaí
aconteceram após a demarcação dos lotes coloniais traçados por agrimensores
alemães, como José Deeke, August Wunderwald e Emil Odebrecht, também
14
De acordo com o historiador local, José Ferreira da Silva, antes da chegada dos primeiros
imigrantes habitavam a região índios das tribos Kaigangs, Xoklengs e Botocudos.
15
Uma légua é uma medida itinerária equivalente a 5 quilômetros, 3 milhas ou 3000 braças,
aproximadamente. O mesmo que légua de sesmaria.
54
responsáveis pelas primeiras picadas oficiais e estradas abertas entre os núcleos do
Vale do Itajaí e entre essa região e outras.
Durante os primeiros anos de povoação na região, os colonos foram
instalados em suas propriedades, ocupando os lotes coloniais ao longo dos leitos
fluviais da grande bacia do Itajaí-Açu. Os rios foram as primeiras vias de penetração
e as canoas – primeiros meios de transporte – geralmente eram confeccionadas com
troncos de árvores. As canoas eram úteis e eficientes para trajetos de curta
distância, mas não eram viáveis para alcançar todos os lugares, ou mesmo para
percorrer maiores distâncias, inviabilizadas por corredeiras ou outros obstáculos
naturais. Devido à centralidade exercida pela sede da colônia, era importante para o
desenvolvimento econômico a ligação das propriedades instaladas em toda a região
circundante. Na sede da colônia também ficava o porto fluvial que escoava para o
porto marítimo. Pela necessidade e importância de promover a ligação de suas
propriedades ao centro de distribuição da produção para o litoral, os próprios
colonos abriram os primeiros caminhos até o Stadplatz.
Figura 18 - Travessia com canoa no Rio Itajaí do Sul, cavalos à margem (Rio do Sul)
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
55
Figura 19 - Traçado dos primeiros lotes coloniais da Colônia Blumenau (1864)
Fonte: FUNDAÇÃO CULTURAL DE BLUMENAU - Arquivo Histórico José Ferreira da Silva.
* Mapa feito por José Deeke, 1864 - Alterado por WITTMANN.
Vidor (1995, p. 34) faz uma análise desse processo, o qual interpretava o
papel do colono como principal agente nas construções dos primeiros caminhos.
56
Este vínculo de prestação de serviços está oficializado no Decreto Imperial de 17 de
janeiro de 1876, que dita as normas das colônias no Estado (artigos 32 ao 35).
Os meios de transporte na região nordeste do Estado no século passado e
no início deste consistiam em picadas, estrada para carro de bois e os rios.
As picadas e estradas foram construídas pelos próprios imigrantes, o que
Seyferth determinou “trabalho acessório”, ou seja, os imigrantes deveriam
ter um tempo livre e encarregar-se deste trabalho nas adjacências de sua
propriedade. Caso não realizassem esta tarefa, o acesso ao centro de
comercialização estaria bloqueado. Inexistindo ainda estradas vicinais,
corredores para a comercialização da produção, eles participavam na
execução de trabalho de caráter público, que consistia na construção de
estradas, pontes e outras benfeitorias em troca de um salário medíocre. Não
obstante este baixo salário e o tempo dispensado, ele deveria redobrar o
trabalho em sua propriedade para que a venda da produção lhe
proporcionasse saldar a dívida do terreno. (VIDOR, 1995, p. 34).
Figura 20 - Stadplatz da Colônia de Blumenau e as vias fluviais no Vale do Itajaí
Fonte: SANTA CATARINA - Atlas de Santa Catarina, 1986 - Alterado por WITTMANN.
3.3.1 Localização estratégica
As colônias eram quase sempre localizadas ao longo dos rios e ribeirões,
onde eram abertos caminhos a facão, no mato, para o interior do vale. Estas
primeiras picadas e caminhos influenciavam nos traçados de novos lotes coloniais,
de maneira a que pudessem ter acessibilidade à água. A estrutura urbana das
primeiras ocupações foi resultante da geografia (dos cursos de água e as serras),
57
mais a divisão de lotes coloniais
16
. As primeiras picadas abertas se transformaram
em caminhos, depois em estradas para cavalos e estradas carroçáveis, e, mais
tarde, em rodovias e leito ferroviário para a EFSC.
Os meios de locomoção nesses caminhos e picadas eram feitos a cavalo,
carroções, carros de mola, mulas e a pé.
Figura 21 - Carroção de transporte usado nas primeiras décadas na região
Acervo: WITTMANN.
Nos primeiros tempos de povoação, muitos eram os obstáculos a serem
vencidos para se percorrer o trajeto de deslocamento de uma localidade a outra ou
mesmo para preparar o local para um novo assentamento. Muitas vezes, os
caminhos eram abertos no ato da viagem, pois não existiam. As pessoas se
orientavam pelo fluxo das águas fluviais da bacia do Itajaí, e estas muitas vezes não
permitiam prontamente a travessia de uma margem à outra.
De acordo com Dagnoni (2000), no ano de 1856 o capitão Ricardo Pinto e
sua equipe percorreram a distância entre a atual Alfredo Wagner e Blumenau em 22
dias, levantando informações para a posterior construção do caminho até o Planalto
Serrano. A ligação entre a colônia e o planalto fazia parte dos planos do fundador.
Novas expedições e estudos foram realizados para a efetivação desse caminho, o
que somente alguns anos mais tarde se concretizou.
Na década de 60 do século XIX, a ocupação das terras subia o vale. Nas
margens do rio Benedito e do rio do Cedro e seus afluentes surgiu a povoação de
16
Os lotes coloniais eram faixas de terra estreitas e compridas, paralelas entre si e perpendiculares
às picadas abertas nos fundos do vale.
58
Carijós, que deveria ser a sede da atual cidade de Indaial, e que, por inúmeros
motivos, foi posteriormente transferida para a margem direita do rio Itajaí-Açu. Em
1861, o assentamento de novos imigrantes originou novas nucleações ao norte da
sede da colônia. Surgiram as nucleações de Salto e Badenfurt (atuais bairros de
Blumenau). São nucleações que surgiram próximas, porém em margens distintas e
por isto segregadas pelo rio Itajaí-Açu.
A chegada contínua de novos imigrantes fez o núcleo de colonização
expandir-se em direção ao norte. Em 1861, diversas famílias recém-
chegadas ocuparam os locais que passaram a chamar-se Salto e Badenfurt,
este último por ter recebido alemães vindos de Baden. (SANTIAGO, 2001,
p. 18).
Figura 22 - Local das nucleações do Salto e Badenfurt - 1864
Fonte: FUNDAÇÃO CULTURAL DE BLUMENAU - Histórico José Ferreira da Silva.
* Mapa feito por José Deeke, 1864 - Alterado por WITTMANN.
Também em 1861 foi criada, sob a Lei 509, de 25 de abril, a Freguesia de
São Paulo Apóstolo, com sede na povoação de Gaspar. Ainda em 1861, Dr.
Blumenau novamente solicitou ao Imperador a abertura da via de comunicação com
o Planalto Serrano.
59
então o Dr. Blumenau tomava providências concretas para a realização
dos planos que desde a fundação do estabelecimento vinha acalentando,
da exploração e abertura do caminho que ligaria a Colônia ao Planalto de
Lages, para além da Serra Geral, onde floresciam grandes fazendas de
criação de gado, atravessando terras ubérrimas, cobertas de magníficas
florestas, banhadas pelos braços formadores do grande Itajaí. (SILVA,
1972, p. 63).
Segundo Vidor (1995, p. 34), em 1862 a região tinha 165 quilômetros de
estradas carroçáveis, e em 1864, como visto no mapa desenhado por José Deeke
(FIGURA 20), a Colônia Blumenau estava com lotes demarcados e ocupados na
margem direita do rio Itajaí-Açu, até em frente à confluência do Rio Benedito, sítio do
atual município de Indaial.
Em 1863, o engenheiro Emil Odebrecht
17
, juntamente com mais oito
homens, fez sua primeira expedição com o objetivo de estudar a bacia do Itajaí-Açu
e encontrar melhor traçado para construir uma estrada que ligasse a Colônia
Blumenau ao Oeste de Santa Catarina e ao Planalto Serrano.
Figura 23 - Pousada de tropas, no caminho a Lages no Planalto Serrano
Acervo: WITTMANN.
17
Engenheiro formado pela Universidade de Geifswald, na Prússia. Imigrou para o Vale do Itajaí em
1856, com 21 anos de idade. Participou e coordenou expedições de demarcação de terras, de
levantamentos topográficos e da construção de estradas na região do Vale do Itajaí e desta ligando a
outras regiões.
60
3.3.2 Abrindo caminhos
Os primeiros caminhos abertos no Vale do Itajaí eram picadas no meio da
mata, que forneciam acessibilidade aos locais do vale onde não existiam vias
fluviais. As picadas foram as primeiras ligações da região com outras regiões, como
a ligação de Blumenau a Curitibanos, por exemplo. Mais tarde, com ferramentas
rudimentares, os próprios colonos transformaram inúmeras dessas picadas em
estradas carroçáveis; estas, posteriormente; estruturaram a malha viária da região.
Figura 24 - Abertura da estrada para a colônia Hammonia (atual Ibirama), posterior leito
ferroviário
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
O primeiro caminho por terra ligando a sede da Colônia Blumenau a Itajaí,
uma picada na margem direita do rio Itajaí-Açu, foi aberto em 1865. De acordo com
Santiago (2001, p. 20), esta picada foi o embrião da estrada que ligaria os dois
municípios por terra mais tarde e, atualmente, ainda segue este primeiro traçado.
Silva (1972, p. 69) diz que este caminho, por muitos anos, serviria somente para uso
de pedestres, cavaleiros e para a passagem de tropas oriundas do litoral, que
abasteciam a colônia de leite e gado de corte e de montaria.
O caminho da sede da Colônia para a vila e porto de Itajaí, com cerca de 10
léguas foi terminado. Era, entretanto, como bem se pode imaginar, pouco
menos que uma picada aberta pela margem direita do Itajaí-Açu, com
pontilhões muito primitivos, com estivados e desvios a cada passo. (SILVA,
1972, p. 69).
61
Em 1867, após voltar da Guerra do Paraguai, Odebrecht iniciou a abertura
da picada de ligação da Colônia Blumenau ao Planalto Serrano. A ocupação da
colônia aumentava com a vinda sucessiva de levas de imigrantes e o aumento de
produtos disponíveis para comercialização com os tropeiros do trajeto Curitibanos-
Blumenau.
Figura 25 - Carta de Dr. Blumenau reivindicando a abertura da uma via
Fonte: Biblioteca da UFSC - Setor de Documentos Raros.
Transcrição (ipsis litteris)
[...] e ainda (ilegível) ficar intelligível e bem compreendido, o muito que sobre muitos e
muitos argumentos concernentes teria que dizer.
O tempo aqui continua chuvoso e os caminhos vão cheios de lama; talvez, que a lua
nova do dia 21 traga o melhoramento desejado e desejável. O Sr. Odebrecht, que muito ouso
recommendar à benevola protecção de Vª Eª, ainda está em Curitibanos ou visinhança da
serra.
Digno-me finalmente Vª Eª, de receber, os protestos do meu profundo respeito e da
(ilegível) consideração e estima, com que tenho a honra de ver.
Il
mo
. e Ex
mo
. Snr.
De Vª Eª
H. Blumenau
O diretor também solicitou ao governo central a abertura de uma via de
comunicação com a região do Planalto Serrano. Ele acreditou ser vital a
importância para a economia local de uma ligação com as grandes fazendas
de gado de Lages. (SANTIAGO, 2001, p. 20).
A picada aberta foi usada para a passagem de tropas e concluída no ano de
1878. Dagnoni (2000, p. 7) afirma que por mais de 50 anos trilharam este caminho
62
animais cargueiros e tropas de gado. Quando surgiram os primeiros veículos
motorizados, surgiram igualmente os conflitos gerados entre as duas formas de
transporte. Predominou o espaço urbano para ocupação dos automotores, em
detrimento do transporte por tração animal.
Em abril de 1867, [...] Emílio Odebrecht foi até a capital da Província e de
seguiu para Lages. Durante três meses, ele e sua equipe desceram em
direção a Blumenau, demarcando terras e abrindo uma picada que mais
tarde seria transformada em caminho de carroças e tropas. Estava iniciada
a tão acalentada ligação com o Planalto. (SANTIAGO, 2001, p. 21).
Figura 26 - Automóvel Ford Modelo T
18
rodando no Alto Vale do Itajaí, em frente a um ponto de
pouso da estrada para o Planalto Serrano (início do Século XX)
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Ainda em 1867 foi aberto o caminho que ligava a Colônia Blumenau à
Colônia de Brusque, esta fundada em 1860. O caminho acompanhava a margem
direita do ribeirão Garcia (passando pela atual Rua Progresso, em Blumenau).
18
Ford Modelo T, conhecido no Brasil como Ford de Bigode - construído pela indústria automobilística
norte-americana. Este modelo popularizou o automóvel e revolucionou a indústria automobilística; por
isso foi escolhido como o Carro do Século XX. O Ford Modelo T foi produzido por 19 anos, entre 1908
e 1927.
63
Figura 27 - Localização das picadas com destino à Colônia de Brusque e Itajaí
Fonte: http://www.mapainterativo.ciasc.gov.br/sc.phtml - Alterado por WITTMANN.
Como foi narrado, o caminho para o Planalto Serrano foi traçado por Emil
Odebrecht e se estendia a Trombudo Central e Taió, atravessando o ponto de
pouso Braço do Sul (Rio do Sul atual), onde o Dr. Blumenau estabeleceu uma
povoação, mais tarde conhecida como Humaitá
19
. Nessa localidade, grande
obstáculo natural para os passantes era a travessia do rio Hercílio. Os viajantes
(1878 e 1892) utilizavam o raso de Rio do Sul, 8 quilômetros acima da confluência,
para que os cargueiros e viajantes pudessem atravessar o rio quando as águas
estavam baixas. Os rios primeiras e importantes vias de penetração igualmente
tornavam-se, em alguns trechos, em grandes obstáculos para o comércio regular
entre o Planalto Serrano e o Vale do Itajaí. Por que o destaque para esta questão?
Porque a partir dessas dificuldades e obstáculos os comerciantes, colonos,
empreendedores de terras, buscaram uma alternativa de transporte para toda essa
região. Uma modalidade de transporte que efetuasse a ligação desses muitos
núcleos que “pipocavam” no Vale do Itajaí, escoando a produção até a sede, no
porto fluvial, e deste ao porto marítimo.
19
Silva (1972, p. 100), comenta que o Dr. Blumenau batizava as povoações que ia delimitando, com
os nomes de Timbó, Ascurra, Aquidabã, Riachuelo, Humaitá. Era uma homenagem às vitórias
brasileiras em localidades do mesmo nome, no território do Paraguai, na guerra de 1864 a 1879, da
qual muitos moradores de toda a região participaram.
64
Figura 28 - Mapa das estradas de cargueiros e gado na década de 1870
Fonte: ODEBRECHT, 2006.
.
65
Figura 29 - Local de travessia no rio, em Rio do Sul e localização do caminho que ligava ao
Planalto
Fonte: SANTA CATARINA - Atlas de Santa Catarina, 1986. Alterado por WITTMANN.
66
Figura 30 - Travessia do rio Itajaí do Sul, em Rio do Sul, atual local da Ponte Curt Hering
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
No final da década de 60 do século XIX, a Colônia Blumenau tinha uma área
ocupada explorada de 1.034 quilômetros quadrados, com 63 quilômetros de
estradas “carroçáveis” e 220 quilômetros de estradas para cavaleiros e pedestres. Já
existiam assentamentos de imigrantes nas localidades de Timbó, Rio dos Cedros,
Indaial e Gaspar, com povoações nas duas margens do rio Itajaí-Açu. Em 1880
surgem assentamentos de colonos na região que desenvolveria, mais tarde, a
nucleação de Warnow, em Indaial.
67
Figura 31 - Localização das primeiras nucleações no Vale do Itajaí e data dos primeiros
assentamentos
Fonte: SANTA CATARINA - Atlas de Santa Catarina, 1986 - Alterado por WITTMANN.
Figura 32 - Balsa em Rio do Sul, início do século XX
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Ainda na entrada da década de 70 do século XIX, os assentamentos
seguiam para as serras de Jaraguá. A comunicação destas nucleações com a sede
da colônia era muito difícil. Alguns trechos do rio Itajaí-Açu apresentavam grandes
corredeiras ou mesmo largas distâncias das margens para a travessia com
68
segurança. Foram colocadas grandes balsas
20
em alguns pontos do rio.
3.3.3 Os primeiros empreendimentos
Os administradores da colônia, líderes políticos e econômicos locais,
representados pelos principais e bem-sucedidos colonos e comerciantes,
questionavam o repasse de recursos e o gerenciamento de obras públicas por parte
do governo imperial brasileiro e do governo provincial, argumentando que eram
preteridos em favor de outras regiões. Em 1871, representantes de todos os
interesses da comunidade colonial elaboraram uma correspondência contendo um
abaixo-assinado com assinaturas de 130 colonos, requisitando à Assembléia
Legislativa a abertura urgente de uma estrada “carroçável” na margem esquerda do
rio Itajaí-Açu. A colônia aumentou sua ocupação vale acima do leito do rio Benedito,
em direção a Jaraguá do Sul atual, fazendo com que surgissem empreendimentos
locais, fortalecendo seus comerciantes e fornecedores de produtos. Mas estavam
insatisfeitos com as dificuldades para escoar seus produtos pelos caminhos
rudimentares existentes. Isto levou as lideranças a traçarem planos para a
efetivação das melhorias das vias de comunicação com outras regiões.
A Sociedade de Cultura, em suas reuniões mensais, a que regulamente
estava presente o próprio fundador da Colônia, juntamente com os colonos
mais dedicados ao seu desenvolvimento, continuava insistindo na solução
de problema da navegação a vapor, entendendo que este seria o único
meio de apressar o incremento das possibilidades econômicas da Comuna.
(SILVA, 1972, p. 94).
A paisagem, assim como o espaço, altera-se continuamente para poder
acompanhar as transformações da sociedade. A forma é alterada,
renovada, suprimida para dar lugar a uma outra forma que atenda às
necessidades novas da estrutura social. (SANTOS, 1991, p. 38).
O consenso das lideranças locais para a melhoria da situação do transporte
e da comunicação na região se resumiu a uma primeira iniciativa, que foi a proposta
de implantação de um vapor que trafegasse pelo rio Itajaí-Açu até o porto marítimo
20
Embarcação de fundo chato, com pequeno calado, para poder operar próximo às margens e em
águas rasas, e grande boca, utilizada para transporte de veículos.
69
de Itajaí. Segundo Santiago (2001, p. 22), o Kulturverein
21
fez esta reivindicação ao
Dr. Blumenau em 1871, época em que o engenheiro Odebrecht fazia a demarcação
das terras no Alto Itajaí.
Em 1876 chegaram os primeiros colonos italianos à região, oriundos do Tirol
austríaco. Estes colonos foram acomodados em lotes próximos, entre a confluência
dos rios dos Cedros e Benedito, caminho que, rumando ao sul, voltava à margem do
Itajaí-Açu e da estrada que, da mesma confluência, acompanhava o rio dos Cedros.
Foram esses colonos que povoaram a conhecida “colônia italiana”, formada, no
princípio, pelas nucleações de Rio dos Cedros, Ascurra e Aquidaban (atual Apiúna).
A cidade de Rodeio também teve início nesta colonização.
Com esses colonos povoou-se a chamada “colônia italiana”, com
comunidades em Rio dos Cedros, Ascurra e Aquidaban. A cidade de Rodeio
originou-se também dessa colonização, em local, entretanto, que o havia
sido determinado pela direção da Colônia, mas que surgira, naturalmente,
em torno da uma capela levantada pelos imigrantes em honra à Madona
Addolorata. (SILVA, 1972, p. 98).
A direção da Colônia Blumenau, em 1879, contratou José Beje de Siqueira e
seus dois genros, José Antônio da Cruz e Antônio Bernardo, para abrirem um
estabelecimento de passagem sobre Braço do Sul, na estrada para Curitibanos. Os
contratantes receberam, por arrendamento, um lote de 25.000m2, primeiro passo
para a fundação de Humaitá, mais tarde sede do Distrito Bella Aliança e atual cidade
de Rio do Sul.
Em 1887 foi criada a sociedade Companhia Construtora da Estrada
Blumenau-Curitibanos, para que melhorasse a antiga picada e a tornasse uma
estrada carroçável, esta ligando o Vale do Itajaí ao Planalto Serrano.
21
Kulturverein Sociedade da cultura, fundada em 19 de julho de 1863. Tinha como finalidades
sociais prescritas em seus estatutos: “(1) Melhorar a economia rural, bem como as condições sociais,
morais e científicas da Colônia de Blumenau. (2) Para conseguir essas metas, a sociedade
“promoverá” reuniões periódicas nas quais haverá: (a) Conferência sobre assunto instrutivo; (b) troca
de idéias e consultas mútuas sobre os diversos problemas; e (c) deliberações referentes a esses
mesmos problemas.” Havia reuniões mensais, de que participavam convidados, colonos e
comerciantes de destaque na Colônia de Blumenau, como também os administradores da Colônia.
70
Figura 33 - Localização das primeiras nucleações no Vale do Itajaí e data dos primeiros
assentamentos I
Fonte: SANTA CATARINA - Atlas de Santa Catarina, 1986 - Alterado por WITTMANN.
Os produtos vindos do interior como fumo em rolo, pêlo de cavalo, erva-
mate, couro, queijo e frutas eram comercializados na colônia. Os animais
voltavam com produtos comprados em Blumenau, como úcar, café,
araruta vinho de laranja, farinha de mandioca, fazendas, sal, trigo, arroz,
cachaça, polvilho, vinagre, ferragens, miudezas e outros produtos das
indústrias.
A estrada sempre pelo lado direto do Rio Itajaí-Açu. Em 22 de dezembro de
1890 a estrada carroçável até atual Praça Getúlio Vargas (Rio do Sul)
estava pronta. Em Lontras chegou em 1894.
De Lontras até Braço do Sul, ou mesmo Taió, o tráfego fluvial era intenso e
por isso ninguém criticava a lentidão dos trabalhos do acesso terrestre. Em
1908, a estrada para carroças estava pronta até a atual Alfredo Wagner. Em
1911 chegou a Trombudo Central e em 1923, alcançou Lages.
(DAGNONI, 2000. p. 9).
3.3.4 Injunções políticas
Nesse período, década de 90 do século XIX, houve grandes movimentações
nas elites nacionais, estaduais e locais, em conseqüência das mudanças sociais. O
Brasil passava por uma crise econômica que desestabilizava a política do Império.
Na região, um coletor de impostos, José Henrique Flores Filho, assumiu o lugar do
fundador (1883), que tinha como principal meta integrar os interesses da economia
local à economia do País. A abolição da escravatura, em 1888, incendiou os ânimos
71
dos republicanos, fortalecendo-os e culminando com a proclamação da República,
que, segundo Petry (2000, p. 102), surpreendeu os moradores do Vale do Itajaí.
O Partido Republicano estabeleceu-se na cidade, tendo com líderes José
Bonifácio da Cunha, Hercílio Pedro da Luz e Victorino de Paula Ramos. A
República conquistou inúmeros simpatizantes no meio produtivo, entre eles
Hermann Hering, da indústria têxtil que leva o nome da família, e
proeminentes comerciantes como Pedro Christiano Feddersen e Gustav
Salinger. (PETRY, 2000, p. 102).
Por que estes fatos políticos nacionais e locais são colocados à luz desta
pesquisa? Estes novos personagens políticos saem fortalecidos após essas
mudanças, e são agora os novos representantes das lideranças econômicas e
políticas locais e os grandes atores nas ações para promoção do desenvolvimento
social local e realizações no Vale do Itajaí, no início do século XX.
Alguns acontecimentos, como o término da escravatura no Brasil, as
instabilidades dos primeiros momentos do regime republicano e a queda na
arrecadação de impostos neste novo regime de governo refletiram, naturalmente, na
redução de melhorias na infra-estrutura de uma maneira geral, com reflexos na
região do Vale do Itajaí. O republicano engenheiro Hercílio Luz
22
, chefe da Comissão
de Terras e Colonização de Blumenau
23
, assumiu o governo do Estado em 1893,
após a proclamação da República. Em seu governo iniciou-se a construção da ponte
do Salto; mas somente se iniciou.
O governo de Hercílio Luz concedeu a quantia de 150 contos de réis, em
1896, para a construção dos pilares da ponte do Salto. Porém, os repasses
para a ex-colônia de Blumenau eram escassos e o atendiam as
necessidades de obras públicas. (PETRY, 2000, p. 112).
Petry (2000), afirma que a arrecadação da receita municipal de 1898 foi de
75 contos
24
, insuficiente para atender a população de 32 mil habitantes e manter as
22
Na denominada “Aventura Federalista” foi eleito o Dr. Hercílio Pedro da Luz governador do Estado,
cargo no qual tomou posse a 28 de setembro de 1894. Esse ilustre político procurou ser grato ao
apoio dos blumenauenses nos difíceis momentos de que o País e o Estado emergiam, não apenas
dando toda a colaboração dos poderes públicos aos seus companheiros de lutas, como beneficiando
o município com vários melhoramentos, entre os quais, é de justiça salientar, a construção da grande
ponte metálica sobre o Itajaí-Açu, no lugar do salto. (SILVA, 1972, p.148)
23
Criado em 1886, órgão responsável pelos assuntos relacionados com a divisão, demarcação e
venda das terras compreendidas no território da Bacia do Itajaí e que haviam sido destinadas à
colonização. (SILVA, 1972, p. 121).
24
Câmbio (1898) = US$ 0,54 / 1$000 Rs. ou 1$852 Rs / US$ 1,00
1 conto = 540,00 US
75 contos de réis = equivale a 40.496,76 US$
Fonte: http://www.ocaixa.com.br/bancodedados/dolaranualmedio.htm. Acesso em 15 dez. 2007.
72
longínquas milhas de estradas vicinais, que, devido à sua precariedade, geravam
problemas para o escoamento da produção agrícola, da produção extrativista e da
produção industrial que estava surgindo na região.
Hercílio Luz fez com que ocorresse com mais freqüência a distribuição de
concessão de terras na bacia do Itajaí-Açu a Empresas Colonizadoras
25
. Uma
destas empresas teve grande importância e influência na construção da ferrovia na
região a Colonizadora Hanseática (com sede em Hamburgo)
26
. Esta empresa foi
responsável pela colonização de uma das áreas mais ricas e desenvolvidas da zona
da bacia do Itajaí, banhada pelo rio Itajaí do Norte ou rio Hercílio, em 1897,
iniciando-se a nucleação urbana de Hammonia (atual Ibirama). No início, esta
colonização encontrou dificuldade em atrair colonos para a região, devido a
questões de acessibilidade.
Figura 34 - Núcleo urbano de Hammonia, final do século XIX
Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE IBIRAMA.
25
Companhia Colonizadora ou de Colonização - “Denominava-se toda empresa de colonização que
tentava obter um contrato de colonização do governo de um país de imigração e, em troca,
comprometia-se a introduzir neste país certo número de imigrantes e instalar os serviços públicos
necessários. Em contrapartida, o governo interessado concedia uma área de terra à Companhia e a
subvencionava. Esta, por sua vez, empregava agentes recrutadores e fazia acordos com empresas
de transportes. Empregava capital nas obras iniciais de colonização e cedia aos colonos terras e
equipamentos gratuitamente ou pelo preço de custo. Na medida em que esta progredia, tornava-se
mais fácil atrair colonos e a terra se valorizava. Com a venda da terra por preços cada vez mais
elevados, recuperava o capital investido e obtinha lucros”. (MORETTI, 2006. p. 60)
26
Melhor detalhada nas próximas páginas.
73
Até bem pouco tempo, quando se pretendia ir para Hammonia de carro ou
carroça, era necessário no Morro Pelado, atravessar de balsa o Rio e então
na margem esquerda sobre o Morro-Coxo tentar chegar lá. Tentar, digo
assim por que em tempo bom era difícil e com chuva carro ou carroça
atolavam com certeza. Quem ia de trem, também chegava até a estação
Hansa e depois caso não encontrasse carro deveria caminhar mais ou
menos uma hora para chegar ao destino. Hoje é diferente, por que desde
janeiro de 1934 o trem nos leva até quase o centro da cidade. (JORNAL
DER URWALDSBOTE, 1986, p. 130).
De acordo com Silva (1972), o sistema de empresas colonizadoras apressou
a colonização de grandes extensões de terras no planalto, que foram responsáveis
pelo surgimento de outras nucleações no Alto Vale do Itajaí, às margens dos rios do
Sul, do Oeste e de seus afluentes. Surgiam as nucleações de Rio do Sul,
Ituporanga, Taió, e Rio do Oeste, originados do primitivo distrito de Bella Aliança.
Figura 35 - Localização das primeiras nucleações no Vale do Itajaí e data dos primeiros
assentamentos II
Fonte: SANTA CATARINA - Atlas de Santa Catarina, 1986 - Alterado por WITTMANN.
Nessa década de 90 do século XIX foi publicada no Der Immigrant, em 14 de
setembro, a Ata da Assembléia do Kulturverein do dia 24 de agosto, analisando as
expectativas e melhorias na Colônia Blumenau. Nesse artigo já especulavam a
construção de uma ferrovia entre Blumenau e Curitibanos. O Sr. Paul Schwarzer
74
havia publicado, na revista Export, de 1883, este trajeto ferroviário
BlumenauCuritibanos.
[...] A realização deste projeto seria não de grande influência no
desenvolvimento do vale do Itajaí, mas de toda a província. Com ela
finalmente se ligaria o alto Vale do Itajaí com suas maravilhosas terras e
riquezas e seria aberta para uma próspera colonização.
O Sr. August Mueller, presidente do Kulturverein, comenta sobre as
facilidades que esta ferrovia traria para o comércio. “Os principais artigos que viriam
da região serrana não seria somente gado, mas também fumo, queijo, carne seca,
peles e erva mate. Ao contrário, daqui seriam transportados nossos produtos
agrícolas, tais como açúcar, aguardente, vinho de laranja, arroz, farinha de
mandioca, etc.” O projeto ferroviário e a melhoria do escoamento dos produtos
faziam parte das discussões das lideranças locais. Enquanto a ferrovia, não
podendo por vários motivos ser viabilizada ainda no século XIX, prosseguiam as
melhorias nas estradas e caminhos.
No ano de 1893, Gumercindo Saraiva, no comando de revolucionários,
venceu o itinerário LagesCuritibanosBlumenau, e no ano de 1895 o governo do
Estado destinou verba para melhorias da estrada até Lontras. Em 1908 é construída
uma estrada para carroças, nas proximidades do rio Itajaí do Sul (Ituporanga); e, em
1911, a construção do trecho da estrada Trombudo-Rio do Sul ficou pronta,
transformando-se no entroncamento de duas estradas e permitindo a intensificação
dos povoamentos com pessoas do Planalto, Litoral e Médio Vale. Dagnoni (2000, p.
8) relata que geralmente os trabalhadores das estradas se fixavam nas redondezas,
criando novos núcleos de ocupação.
As distâncias entre as nucleações e a sede da colônia continuavam sendo
percorridas por terra, por meio destes primeiros caminhos rudimentares, picadas
para cavalo, veículo com tração animal, mula, ou a pé, em partes, e, quando o rio
permitia, a canoa.
De acordo com dados citados por Silva (1972, p. 112), em 1882 existiam na
Colônia Blumenau 252 carroças de 4 rodas, com capacidade de transporte de 900 a
1.500 quilos, 68 carros de bois e 9 carros de mola.
Nesse período, final da década de 70 e início da década de 80 do século
XIX, carroças, cavaleiros, bestas de carga, gado vacum e cavalar em tropas
oriundas da Serra ocupavam a extensa rede de estradas e caminhos do Vale do
75
Itajaí. A principal via de comunicação estava situada à margem direita do Itajaí-Açu,
da sede da Colônia até o passo de Braço do Sul, de onde seguia uma trilha para
cavaleiros e tropas até o planalto de Curitibanos e Lages. Ao longo da estrada
principal, conforme visto, já existia um grande número de nucleações.
Dagnoni (2000, p. 9) diz que os produtos produzidos no interior, como fumo
em rolo, pêlo de cavalo, erva-mate, couro, queijo e frutas eram comercializados e
transportados até a sede da Colônia. Os animais que transportavam os produtos até
a sede voltavam com produtos comprados em Blumenau, tais como açúcar, café,
araruta, vinho de laranja, farinha de mandioca, fazendas, sal, trigo, arroz, cachaça,
polvilho, vinagre, ferragens, miudezas e outros produtos da indústria. Quando era
possível, utilizavam o transporte fluvial, de certa maneira mais tranqüilo, ágil e
eficiente, mas nem sempre viável, devido aos obstáculos geográficos.
3.3.5 O transporte fluvial
A via fluvial foi a mais importante e única via de acesso às primeiras
nucleações do Vale do Itajaí, durante os primeiros 30 anos de sua história. Núcleos
urbanos como Testo, Ribeirão Branco, Passo Manso, Encano e Mulde surgiram às
margens de rios e ribeirões locais que tinham o mesmo nome. Silva (1972, p. 20) diz
que este primeiro surto colonizador é responsável pela fundação e desenvolvimento
dos municípios de Pomerode, Indaial, e, um pouco mais tarde, de Timbó, Rodeio,
Rio dos Cedros e todas as comunidades banhadas pelo ribeirão Benedito e
confluentes.
O principal meio de acesso a Blumenau continuava sendo o Rio Itajaí-Açu,
escoadouro da produção para o porto de Itajaí. Para atender ao aumento do
movimento, adquiriu-se na Alemanha o Vapor Progresso, com hélice na
lateral, adaptado para enfrentar os obstáculos e a instabilidade do rio, que
em determinados pontos impediam a passagem. Um grupo de comerciantes
locais e da vizinha cidade de Itajaí constituiu a Companhia de Navegação a
Vapor Itajaí-Blumenau, administrando a embarcação. Anos mais tarde,
adquiriram o Vapor Blumenau. (PETRY, 2000, p. 62).
O rio Itajaí-Açu é navegável de sua foz em Itajaí até Blumenau, e nos trinta
primeiros anos da colonização do Vale do Itajaí foi a principal via de comunicação
com o exterior. Jo Deeke, citando uma antiga “Conversa de um velho colono
blumenauense”, assim resumiu a importância desse rio: Nos primeiros anos da
Colônia, o rio Itajaí-Açu foi a rua principal de Blumenau.
76
[...] mais um rio navegável e a facilidade da saída dos produtos que combina
com fertilidade do solo garantem a prosperidade do lavrador e um
extensíssimo sertão de ubérrimas terras devolutas, acomodação e
estabelecimento de ainda muitos milhares de família. Estas extensas terras
devolutas e incontestadas formam, na realidade, um precioso tesouro, que
então boa situação não se acha em muitas partes no Império. (MATTOS, p.
98).
Nos primeiros tempos, na ausência de caminhos por terra, as pessoas se
deslocavam pelos leitos fluviais com canoas e depois balsas. Mesmo depois, quando
a região foi munida de alguns quilômetros de caminhos, esta via era freqüentemente
usada, complementando o transporte e deslocamentos das vias por terra.
O primeiro barco a vapor a navegar o rio Itajaí-Açu foi o Dom Pedro, da
Marinha de Guerra do Brasil, em 1857. Em 1871, conforme visto, algumas lideranças
locais, sob a associação do Kulturverein, decidiram que também era o momento de
colocar um vapor que fizesse a ligação do ponto final de navegabilidade do Itajaí-
Açu, sede da colônia de Blumenau, até o porto marítimo, pois os negócios locais
estavam sendo prejudicados pela dificuldade de escoamento da produção. Esta foi a
primeira iniciativa das primeiras lideranças locais, entre muitas ações com a
pretensão de melhorias nas vias de comunicações entre a região do Vale do Itajaí e
outras. Mais tarde, foi complementada pela efetiva implantação da Estrada de Ferro
na região, interligando todos estes núcleos urbanos distribuídos na bacia do Vale do
Itajaí.
Seguindo esta primeira decisão das lideranças locais, surgiu o primeiro
barco a vapor para fazer o trajeto regular entre Blumenau e Itajaí. Segundo notícias
de Blumenau em Cadernos, tomo XXI 10, outubro de 1980, página 284, o barco
foi adquirido pelo Sr. Eduardo Schadrack, do Sr. Brestlein, de Joinville, em agosto de
1871. Este navio, batizado de São Lourenço, veio sem as máquinas, estas
montadas em Blumenau, e inaugurou suas viagens regulares como rebocador de
lanchas de carga.
77
Figura 36 - Relatório da lista de imigrantes que viajaram no Vapor São Lourenço
Fonte: Biblioteca da UFSC - Setor de Documentos Raros.
Transcrição (ipsis litteris)
Colonia Blumenau
Relação
dos imigrantes, transportados pelo vapôr São Lourenço e entrados n’esta colonia em 30 de
outubro de 1879.
Nº corrente
Nomes Idade Nação Profissão Observações
1. Augusto Fäpelt 28 Alemanha (Saxonia)
Lavrador
2. Marcia 19 mulher d’elle
3. Traugott Metzler 52 Lavrador
4. Guilhermina 44 mulher d’elle
5. Luiza 14
6. Emma 13
7. Ricardo 8
8. Hermann 7
9. Clara 4
10. Lina 1 ¾
filhos d’elles
Colonia Blumenau, 31 de Outubro de 1879.
O Director
H. Blumenau
78
O trajeto de Blumenau a Itajaí, rio abaixo, era feito em 5 horas, e de rio
acima em 10 horas. Mais tarde, São Lourenço fazia as viagens irregulares entre a
capital da Proncia e outros pontos da costa catarinense. Segundo Silva (1972 p.
101), subia o Itajaí-Açu até Belchior, onde corredeiras impediam-no de ir até
Blumenau. A seguir, fotografia de uma correspondência do Dr. Blumenau, solicitando
verbas para a retirada de pedras do leito do rio, nas proximidades de Belchior, para
permitir a passagem do vapor pelo rio Itajaí-Açu até Blumenau.
Figura 37 - Fotografia da correspondência do diretor da colônia, Dr. Blumenau à Presidência
da Província
Fonte: Biblioteca da UFSC - Setor de Documentos Raros.
Transcrição (ipsis litteris)
Il
mo
. e Ex
mo
. Snr.
Pelo aviso do Ministério da Agricultura - communicado também mutatis mutandis, à essa
Presidência - e 27 de janeiro de 1875, foi posta à minha disposição a importancia de cinco contos de
reis, por conta da verba de Terras Públicas e colonisação para preceder a remoção de algumas
pedras de uma corredeira do rio Itajahy, afim de tornar-se franca a navegação do mencionado rio, de
sorte que o vapor da empreza subvencionada pelo Estado, que serve para a communicação entre a
colonia Blumenau e a Capital, possa chegar ao porto d’aquella.
Ora, não sendo então, nem hoje praticavel, tornar franca a alludida navegação para um
vapor do genero do São Lourenço e seu calado de cerca de seis pés inglezes - em mesmo com o
emprego de dezenas de contos, e não querendo eu esbanjar com serviços infructiferos aquelle
79
credito, restringi-me a alguns ensaios e a remover do canal algumas pedras, das mais perigosas, e
grande numero de troncos.
Despendi assim a quantia de Rs358,810, mas por conta da receita ordinaria da Diretoria,
achando-se esta despeza exarada no balanço do primeiro trimestre – Julho a Setembro – do
exercício de 1876-77, no seu tempo apresentado à Thesouraria, e tendo portanto ficado intacto o
alludido credito de Rs 5:000,000.
Actualmente as circomstancias estão completamente mudadas, sendo adiantada a
construção.
“O diretor da Colônia conseguira verba para remover os escolhos. Tão
minguada, porém, fora a importância que os trabalhos tiveram de ser interrompidos
poucos depois de encetados”. (SILVA, 1972, p. 101).
O governo provincial liberou uma quantia de 5 contos, para desobstruir o rio
Itajaí-Açu nas corredeiras de Belchior, e no dia 10 de agosto de 1878 foram
aprovados os estatutos da “Companhia de Navegação Fluvial a Vapor Itajahy-
Blumenau”.
Mesmo com as dificuldades encontradas pela companhia, ocasionadas pela
desconfiança do sucesso do empreendimento, foi encomendado um navio a vapor
de rodas, construído nos estaleiros de Schlicksche Flussdampfwerke, em Dresden,
Alemanha. O navio, adquirido com um capital inicial de 30 contos de réis, dividido
em títulos de 100 mil réis, atravessou o Atlântico a reboque de outro barco e
transportaria passageiros, pequenas cargas, e rebocaria grandes lanchas,
destinadas unicamente a carga pesada, entre a sede da colônia e o porto de Itajaí.
O vapor, a que foi dado o nome de “Progresso”, construído em Dresden,
chegou, efetivamente, a Blumenau em meados de 1879, tendo-o a
população recebido com música, foguetes e júbilo geral. Era um barco de
rodas laterais, de 22 e meio metros de comprimento por 3,34m de largura,
calado de 70 centímetros. (SILVA, 1972, p. 103).
Tendo chegado o navio na região chamado de forma mais íntima de vapor
– foi batizado de Progresso. O nome escolhido refletia toda a expectativa dos líderes
locais no cumprimento de seu papel, e a certeza da melhoria do transporte da
produção local desde o porto fluvial do Vale do Itajaí até o porto marítimo. O
transporte efetuado entre o porto fluvial e o último núcleo do vale acima permanecia
rudimentar e precário, utilizando veículos a tração animal, ou somente animal ou a
pé, inquietando a elite local e provocando-a a buscar uma alternativa para suprir e
efetivar o escoamento da produção com maior agilidade e segurança nesse trajeto.
80
[...] chegaria a Blumenau o vapor Progresso, com 22,5 metros de
comprimento, 3,34 metros de largura e calado de 70 cm.
Muito festejada, a chegada do barco ocorreu juntamente com a abertura dos
primeiros trechos das estradas entre Blumenau e Lages, por onde começou
a chegar o gado e sair produtos agrícolas e manufaturados. A colônia
passou a ser um entreposto comercial entre o litoral e o planalto.
(SANTIAGO, 2001, p. 24).
Lembrando que, nesse período, coincidindo com a chegada do Progresso, a
região passava também a ser entreposto comercial entre o litoral e o planalto, graças
à abertura da estrada que ligava a região ao Planalto Serrano estrada Blumenau–
Lages.
Emil Odebrecht mostrou sua impressão aos companheiros Fritz Mueller,
Wilhelm Friedenreich, Carl e Teodoro Kleine:
“[...] Blumenau é tão somente um elo importante na imensa cadeia, por ficar
junto ao porto marítimo natural de todas aquelas regiões [...] as distâncias
deixarão de ser entrave e no que concerne às despesas de transporte,
serão ínfimas, possibilitando relativa prosperidade ao colono”.
Com o crescimento da produção colonial e industrial, reforçou-se a busca
deste canal de escoamento da produção. Em 1881, colonos, comerciantes e
industriais comemoraram a chegada a Trombudo Central da estrada que
ligaria Blumenau a Curitibanos. Faltavam apenas 41 quilômetros do total de
170 quilômetros previstos. Enquanto isso, a ligação por terra com Itajaí
continuava precária e não era uma prioridade, pois a utilização do rio
parecia ser muito mais fácil, rápida e barata.
Meio de chegada do fundador e dos primeiros colonos, o rio Itajaí-Açu
continuou sendo a porta de entrada e saída de Blumenau por muitas
décadas. A ida e vinda de pessoas e mercadorias era feita entre a cidade e
o porto de Itajaí em canoas ou pequenos barcos até 1879, quando passou a
operar o vapor Progresso. (SANTIAGO, 2001, p. 35).
Por esses tempos, igualmente, foram colocadas inúmeras balsas em vários
trechos do rio Itajaí-Açu, para travessia, no local onde atualmente ficam Itoupava
Norte, Badenfurt, Passo Manso, Carijós e Ascurra; e balsas que proporcionavam
acesso às nucleações da margem esquerda, como Itoupava, rio do Testo, Mulde,
Benedito, Cedros, São Pedro, Guaricanas, São Paulo, Rodeio, entre outras.
Com o fortalecimento econômico da região, resultado do aumento das
transações comerciais, o Progresso não atendia mais à demanda do transporte de
cargas e passageiros. Em 1893, a Companhia de Navegação Gustav Ferdinand
encomendou um navio maior, na mesma fábrica alemã construtora do vapor
Progresso. Sua construção foi concluída em 1894, e tinha 28 metros de
comprimento, 4,40 metros de largura e 2,10 de altura. Foi batizado de Vapor
Blumenau. Navegou pela primeira vez em 1895, tendo a bordo o governador Hercílio
Luz.
81
Figura 38 - Porto Fluvial de embarque e desembarque de passageiros - Stadplatz da Colônia
Blumenau
Fonte: FUNDAÇÃO CULTURAL DE BLUMENAU - Arquivo Histórico José Ferreira da Silva.
Figura 39 - Porto na foz do Ribeirão Garcia, no rio Itajaí-Açu – Blumenau
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul - Alterado por WITTMANN.
82
Curiosamente, a citação abaixo foi extraída do Anuário de Itajaí de 1949,
afirmando que a construção do navio Vapor Blumenau data de 1897, contradizendo
historiadores locais, como Petry e Silva, os quais, após verificação de datas e fatos
históricos, estão corretos (ANEXO C).
É importante a participação da Companhia Fluvial na história da ferrovia na
região. Logo que foi inaugurada a implantação da EFSC, esta incorporou a
Companhia Fluvial, que foi munida de uma chata
27
de ferro para o transporte do
material rodante e outras peças pesadas, para a construção da ferrovia no Vale do
Itajaí.
Ao Progresso seguiu-se anos depois um vapor maior, também de rodas,
chamado Blumenau. Todo o material foi importado, fazendo-se aqui a
armação apenas.
A construção deste navio data de 1897. Assim que se fundou a Estrada de
Ferro Santa Catarina, para realizar a construção do trecho Blumenau e
Hammonia, ela incorporou a Companhia Fluvial e tratou de provê-la de
melhor material, além de uma grande chata de ferro para o transporte do
material rodante e de outras peças pesadas. (KONDER e SILVEIRA
JÚNIOR, 1949, p. 29).
A Estrada de Ferro Santa Catarina construiu um segundo porto na sede da
Colônia Blumenau, para que o material pesado para a construção da ferrovia não
precisasse passar pelo centro da cidade e separar os embarques e desembarques
de pessoas e produtos. O porto situado na Itoupava Seca foi um local estratégico
para fazer a baldeação entre os dois meios de transporte que se complementavam,
durante pelo menos 45 anos (entre 1909 a1954 data da inauguração do trecho
ferroviário de Blumenau a Itajaí). Anexas ao porto da Itoupava Seca localizavam-se
as oficinas da EFSC.
27
Chata é um tipo de embarcação de pequeno calado e fundo chato que podem ter sua própria
propulsão ou não. São conhecidas também de chata as embarcações de serviço em portos, seja para
a dragagem, carga e descarga de navios ou abastecimento de óleo.
83
Figura 40 - Porto fluvial de embarque e desembarque de carga - Itoupava Seca, da Colônia
Blumenau
Fonte: GERODETTI; CORNEJO, 2005.
Figura 41 - Localização do porto fluvial de embarque e desembarque de carga e de
passageiros – Colônia Blumenau
Fonte: GOOGLE MAPS, 2006 - Alterado por WITTMANN.
84
De acordo com a narração de Marcos Konder, no anuário de Itajaí de 1949,
a Companhia Fluvial teve concorrente. A empresa, de propriedade de Henrique
Grewsmühl, de Blumenau, e Luiz Altenburg, de Gaspar, tinha um rebocador
chamado “Jahn” (1889) e diversas peruas de reboque. Mais tarde, a Companhia
Fluvial incorporou esta empresa e ficou sozinha em campo.
No dia 9 de setembro de 1904 foi comemorado o Jubileu de Prata do vapor
Progresso, celebrando seus 25 anos de viagens entre Itajaí e Blumenau. Todo
embandeirado e ornado com palmitos e flores foi recebido com grande festa, no
porto do Stadplatz de Blumenau.
Mesmo com a presença da estrada de rodagem entre Itajaí e Blumenau, de
apresentação muito rudimentar e em condições precárias, a empresa de navegação
fluvial não sentia a concorrência com o transporte por terra. O transporte fluvial ainda
era mais econômico, rápido e seguro. Esta afirmativa é avalizada pelo Sr. Marcos
Konder, no anuário de Itajaí de 1949, conforme citação abaixo. A Empresa de
Navegação Fluvial complementava o transporte ferroviário para o escoamento da
produção. A ferrovia promovia a ligação entre as principais nucleações do vale
acima e destas ao porto fluvial da sede da colônia. Esta parceria aconteceu até
1954, data da inauguração da ferrovia até Itajaí.
Surgiu então a estrada de rodagem entre Itajaí e Blumenau, a princípio com
condições precárias, dando passagem apenas a fordecos antigos, mas essa
concorrência terrestre não fazia mossa à navegação fluvial, porque
conduzia apenas passageiros continuando a carga com o rio, que era
sempre a via de comunicação mais barata. Tanto assim que se formou outra
empresa fluvial: Juvêncio Tavares d´Amaral e Cap. Adolfo Germano de
Andrade, para a condução de carga. (KONDER e SILVEIRA JÚNIOR, 1949,
p. ??).
Quando a estrada de rodagem sofreu melhorias e aumentou a frota de
caminhões de carga e ônibus, “a via fluvial, embora mais em conta, começou a sentir
os efeitos da concorrência terrestre, mesmo porque o transporte da mercadoria era
feito da casa do vendedor à do comprador, não ficando sujeito a avarias, faltas e
roubos”. (ANUÁRIO DE ITAJAÍ, 1949).
De acordo com o relatório de Marcos Konder, no Anuário de Itajaí de 1949,
(ANEXO C) houve um incremento no negócio de madeiras para a Argentina; tudo se
reajustou e surgiu a necessidade de criar linhas de navegação fluvial para o
transporte desse produto extrativo, de Blumenau ao porto de Itajaí. Apesar disso, o
transporte terrestre continuou com intensidade, uma vez que era buscada madeira
85
até no oeste catarinense, especialmente em Caçador. A situação se agravou para as
empresas de navegação quando o governo argentino cessou os negócios de
madeira e as empresas fluviais se encontraram em dificuldades para manter seu
tráfego. Algumas ações foram usadas para tentar baixar as tarifas da madeira, mas
um poder mais alto se levantou:
a) a alta dos salários dos tripulantes;
b) o aumento do número da tripulação;
c) a intervenção da estiva em Blumenau e Itajpara as empresas fluviais,
que jamais estiveram sujeitas a semelhante regime;
d) a concorrência do transporte feito por caminhões e ônibus, e melhorias
nas rodovias.
Exceto a Companhia Fluvial da Estrada de Ferro Santa Catarina, que
permanecia atuando com o transporte ferroviário embora este estivesse sendo
apontado como deficitário todas as demais empresas de transportes fluviais
pararam suas atividades.
[...] amarram as suas lanchas e as suas embarcações de reboque para
deixá-las apodrecer e converter-se em lenhas e sucatas. Encerrou-se talvez
para sempre uma página gloriosa do nosso rio, fadado a ser agora uma
simples correnteza a levar ao mar aguapés e à cidade pequenas
embarcações com lenha, e servir de elemento para as redes de espinhel
dos pescadores ribeirinhos [...].(KONDER e SILVEIRA JÚNIOR, 1949, p.??).
Será mais bem detalhada, na seqüência deste trabalho, a relação existente
entre a Empresa de Navegação Fluvial e a Estrada de Ferro Santa Catarina.
86
Figura 42 - Porto Fluvial de embarque e desembarque de passageiros – Stadplatz da Colônia
Blumenau I
Fonte: FUNDAÇÃO CULTURAL DE BLUMENAU - Arquivo Histórico José Ferreira da Silva.
Figura 43 - Porto marítimo em Itajaí. Detalhe do Vapor Blumenau atracado, início do século XX
Fonte: http://adventismo.blogspot.com/2006/03/captulo-3-em-terras-tupiniquins.html
O transporte fluvial foi uma extensão, por longo tempo, do transporte
ferroviário na região do Vale do Itajaí. E durante um período o Vale do Itajaí tinha em
funcionamento os transportes rodoviário, ferroviário e fluvial.
87
Conforme relatado, a elite local viabilizou o escoamento da produção
partindo do porto fluvial ao porto marítimo, pelo transporte de cargas e passageiros
em vapores que trafegavam no Rio Itajaí-Açu. Situação que não foi resolvida para as
distâncias a serem percorridas entre núcleos urbanos situados acima da sede da
Colônia. Desde os primeiros anos de existência da Colônia, a elite local tinha planos
de efetivar um meio de transporte eficiente, seguro e moderno para a época, para
promover o desenvolvimento econômico por meio do pronto escoamento da
produção e a fácil locomoção entre os vários núcleos urbanos do Vale do Itajaí.
Em 1898, a Lei 392, de 20 de setembro, concedeu a construção de uma
ferrovia ligando a sede da Colônia Blumenau à nucleação urbana de Aquidaban
(Apiúna) ao engenheiro Friederico Von Ockel. Vem a Blumenau o engenheiro
alemão Soliz, para estudar o projeto. A Lei 430, de 11 de outubro de 1899,
prorrogou o prazo para a assinatura do contrato de construção da ferrovia até 31 de
dezembro de 1900. O engenheiro, certo do prazo para início, lançou a primeira
estaca da construção no dia 18 de dezembro de 1899, em um evento solene, com a
presença de representantes das lideranças locais, estaduais e do público em geral.
Depois de ter sido assegurado todo o apoio possível, por parte do Estado e
da Câmara Municipal, do Cônsul Geral da Alemanha Von Zimmer e da
Companhia Colonizadora Hanseática e depois de muitos esforços,
conseguiu-se a fundação, em Berlin, de um sindicato, a cuja frente estavam
os bancos de Bleichroeder e Warschauer que puzeram à disposição um
capital de 9 milhões de francos para a construção do “tram-way” a vapor
Blumenau-Aquidaban e da Estrada de Ferro Saguaçu-Joinville-Jaraguá. A
confecção dos trabalhos técnicos foi confiada à firma Arthur Koppel, de
Berlin. Como representante do Sindicato deverá chegar, nos próximos dias,
o senhor Conselheiro Von Hagen, que já embarcou em Hamburgo, a 30 de
novembro, no vapor “Paranaguá”. Engenheiro Friederico Von Ockel.- No ato
do lançamento da estaca inicial. (SILVA, 1969, p. 87).
Por falta de capital, o prazo da concessão caducou e as obras não passaram
da estaca inicial.
88
Figura 44 - Lançamento da pedra fundamental na implantação da linha férrea. Concessão
fornecida a Friederico Von Ockel (final século XIX)
Fonte: PETRY, 2000.
A ferrovia sempre fez parte dos planos e projetos dos primeiros
administradores e das lideranças locais do Vale do Itajaí. Apresentamos esta
cronologia de maneira reduzida, com o intuito de ilustrar a narrativa e apresentar um
preâmbulo sobre a construção e depois, no decorrer de sua história, a desativação
da EFSC, resultado de uma seqüência de ações pretéritas na história do
assentamento dos imigrantes e a formação das várias nucleações na região. Mesmo
que os núcleos urbanos, aparentemente, estivessem isolados, tinham ligações
econômica, social, cultural e espacial muito fortes com a sede da Colônia Blumenau.
Em 1895, quando a Sociedade Colonizadora Hanseática foi agraciada com a
concessão de 600 mil hectares compreendidos em toda a bacia do Rio Hercílio, teve
início a colonização do Vale do Itajaí do Norte. Foi determinante essa decisão,
diante da certeza da construção de uma ferrovia que promovesse a ligação entre
aquela vasta zona, ponto de convergência de vultoso número de novos imigrantes, e
a sede da Colônia Blumenau.
89
4 ESTRADA DE FERRO SANTA CATARINA – EFSC
4.1 A CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DO TRANSPORTE FERROVIÁRIO
ANTES DA EFSC
O advento da locomotiva a vapor foi a mais revolucionária das conquistas
tecnológicas do século XIX. O traçado das linhas férreas fez surgir outras
tecnologias oriundas da engenhosidade do homem, como túneis, viadutos e pontes.
A ferrovia influenciou direta e indiretamente o desenvolvimento tecnológico e o
desenvolvimento em diversos setores: dos transportes, sistema urbano, áreas
econômica, social e política.
4.1.1 O primeiro veículo automotor a vapor
Muitos anos antes da publicação do uso da máquina a vapor em um veículo
de transporte, o homem vinha desenvolvendo pesquisas para o uso desse
engenho (inventado por James Watt) nos transportes terrestres. Diferentes
publicações indicam a data de 1796 como o momento em que o francês Nicolas
Cugnot construiu um veículo automotor, hoje reconhecido como o precursor das
locomotivas. Este invento, na prática, não teve qualquer utilidade, mas teve sua
importância para o início do desenvolvimento dos estudos para o aperfeiçoamento
de um veículo automotor a vapor, no transporte de pessoas e mercadorias. Foi com
o invento de Cugnot que pela primeira vez o homem conseguiu movimentar-se sem
a ajuda da tração animal.
4.1.2 A primeira locomotiva
Em 1803 ou 1804 (as datas se alternam nas fontes bibliográficas), na Grã-
Bretanha, Richard Trevithick combinou a tração a vapor com rolamento sobre trilhos
de ferro, construindo a primeira locomotiva da história. Trevithick construiu a New
Castle, destinada a puxar vagões de minério sobre uma linha férrea de 15
quilômetros de extensão. Em um teste, próximo de Merthyr, no País de Gales, New
Castle transportou 10 toneladas de ferro, 5 vagões e 70 homens sobre uma via em
Pennydarran.
90
Quatro anos mais tarde, em Londres, Trevithick montou uma linha férrea
circular, na qual colocara a nova locomotiva, nomeada Catch me who can (segure-
me quem puder). Ela puxava uma carruagem. Foi usada como entretenimento, ao
preço de 1 shilling o passeio de uma volta. O fato atraiu muitos interessados e
curiosos em experimentar a novidade.
4.1.3 A locomotiva a vapor
A locomotiva a vapor foi um dos engenhos oriundos da grande motriz da
Revolução Industrial a máquina a vapor. Na época em que surgiu, no início do
século XIX, era a novidade tecnológica que impressionava tanto quanto as viagens
espaciais no fim do século XX. Muitas pessoas se assustavam, temendo que viajar a
uma velocidade maior que um cavalo a galope fizesse mal à saúde. Por volta do
início do século XX, o trem a vapor se firmava como o mais sofisticado meio de
transporte terrestre.
4.1.4 A primeira ferrovia no Brasil
A notícia do sucesso do trem e das ferrovias na Europa não demorou a
chegar ao Brasil. Ao Vale do Itajaí chegou com os primeiros imigrantes.
Esse instinto de mobilidade e de avanço para o interior, por terra e por
água, pelos trilhos, veredas e estradas, as gerações contemporâneas da
invenção do caminho de ferro deviam recebê-lo, intato, das gerações dos
sertanistas e bandeirantes que, por sua vez, o haviam recolhido dos índios,
e cuja sêde de riqueza, de conquista e dominação concorreu para estimular
as correrias e incursões pelo sertão, inaugurando uma fase histórica das
mais fecundas para a unidade nacional. Diego Feijó, paulista, com sua lei
de 31 de outubro de 1835, foi o profeta e o anunciador dessa nova geração
de bandeirantes; e o Barão Mauá, o primeiro realizador que, pôr sua própria
iniciativa, deu o impulso inicial à obra de penetração, lançando em 1854,
rumo à Serra do Mar, os primeiros trilhos de estrada de ferro. (AZEVEDO,
1953, p. 36).
No dia 31 de outubro de 1835, o Regente Diogo Antônio Feijó baixou um
decreto assegurando privilégio exclusivo, pelo prazo de 40 anos, para as
companhias que se interessassem em construir uma estrada de ferro da capital do
Império para as Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Bahia. A idéia não foi levada
adiante, pois não houve ninguém que aceitasse o desafio.
91
Em 1852, o Governo concedeu a Irineu Evangelista de Sousa, o Barão e,
posteriormente, Visconde de Mauá, o privilégio de construir uma ferrovia entre a
praia da Estrela (atual estação de Barão de Mauá) e a Raiz da Serra de Petrópolis.
Em maio de 1854 inaugurou-se o trecho inicial, da praia da Estrela até a localidade
de Fragoso. Nesse período, a colônia de Blumenau estava em franca expansão,
com a proliferação de núcleos ao longo dos leitos fluviais que compunham a bacia
do Itajaí-Açu.
A febre de construção de novas linhas era intensa nas primeiras décadas do
século em todo o território nacional. A importância política e econômica de um
município era evidenciada pelos trilhos do trem em seu território.
E não foi diferente no Vale do Itajaí, onde as lideranças locais buscaram
meios de concretizar o projeto da ferrovia, desde as primeiras cadas de
colonização, efetivada, finalmente, no início do culo XX, como resultado da ação
de vários fatores.
Quisera volver ao saudoso passado, quisera ter um casco novo, uma
máquina em bom funcionamento, para fazer um pouco mais pela grandeza
de sua amada Blumenau. Sente-se acanhado com as facilidades de
trabalho e cooperação dos dias hodiernos. Nos idos tempos de navegação
fluvial era ele verdadeiro ídolo das populações de Blumenau e Itajaí. Era
nosso trem de ferro, transportando em seu bojo as riquezas desta
fluorescente região, era nosso ônibus principal, conduzindo em sua cabine
os passageiros apressados, que tinham a necessidade de chegar a Itajaí no
mesmo dia; era nosso caminhão reboque, puxando atrás de si meia dúzia
de lanchas carregadas de madeiras, que, nos longínquos países
importadores, serviam de seta indicatória do progresso que selava o futuro
das regiões exportadoras. (MATTOS, 1968, p. 83).
4.2 IDEALIZADORES E TRAMITAÇÕES LEGAIS
Até o momento da chegada dos primeiros 17 imigrantes à foz do ribeirão
Garcia
28
, em 1850, não existiam nucleações urbanas organizadas, exceto o
assentamento de uma ou outra família oriunda do planalto serrano ou do litoral.
Ainda nos tempos da colônia, Dr. Blumenau apontava o isolamento como
um dos fatores restritivos ao crescimento econômico e fazia diversos
esforços para ver aberta uma estrada ligando a cidade às grandes fazendas
de gado de Lages e Curitibanos. (SANTIAGO, 2001, p. 35).
Foram abertas as primeiras picadas e feito o reconhecimento do sítio da
bacia do Vale do Itajaí por meio de expedições próprias, sob o comando de
28
Local do porto fluvial no Stadplatz.
92
engenheiros e agrimensores alemães. Pela necessidade de fazer antes os caminhos
para a acessibilidade dos colonos e viajantes às áreas em que não existiam rios e
ribeirões, principais vias de acesso e estruturadoras
29
fundiárias durante o processo
de assentamento dos primeiros núcleos urbanos.
Segundo Lago (1968, p. 201), a colônia nasceu como uma empresa agrícola
com vistas ao desenvolvimento industrial. Nasceu impregnada dos “novos tempos”.
A localização determinou sua função desde o início, de entreposto comercial e de
centro preferencial de investimentos aplicados no setor da economia industrial. O
fundador, desde os primeiros anos de fundação, tinha planos de criar vias de
escoamento da produção das propriedades rurais e promover a ligação da região
com outras regiões e com o porto marítimo. Passados alguns anos após a fundação,
a colônia apresentava certo desenvolvimento econômico, pela comercialização do
excedente agrícola das propriedades coloniais e o surgimento de pequenas
indústrias familiares. A divisão do trabalho sempre esteve presente na colônia. Vidor
(1995, p. 37) afirma que o objetivo socioeconômico da implantação dos núcleos era
o de produzir (produção agrícola x transformação industrial) e inserir esses grupos
no mercado nacional. Silva, igualmente, comenta sobre o perfil social dos primeiros
anos de fundação da colônia.
Foi pensamento do Dr. Blumenau, [...] e retornou aos propósitos, que
haviam inspirado a sua vinda ao Brasil, e que consistiam na idéia de
organizar uma grande colônia com imigrantes alemães, que fossem
proprietários dos lotes por eles escolhidos, dedicando-se ao cultivo da terra
e, sempre que possível, industrializando os produtos da sua lavoura e
criação, por conta própria, com absoluta liberdade e iniciativa. (SILVA, 1972,
p. 205).
É pertinente, para o entendimento dos fatos aqui expostos, a análise de
Vidor (1995, p. 37) sobre a espacialização dos representantes das classes sociais na
colônia, nos primeiros anos de fundação.
Em Blumenau a hierarquia social foi estabelecida desde o início e as
pessoas eram designadas para o espaço geográfico de acordo com seu
aporte profissional pela administração local: os agricultores colocados longe
da sede administrativa, os artesãos, os comerciantes e os burocratas no
centro da colônia. (VIDOR, 1995, p. 37).
29
De acordo com Siebert (1996, p 54), a caracterização geomorfológica da bacia do Itajaí-Açu, com
vales íngremes e multidigitados, a imperiosa necessidade de assegurar ao agricultor o acesso à água
e o interesse em manter cada lote o mais próximo possível da sede da colônia condicionaram a
estrutura fundiária da região, baseada em estreitos lotes coloniais.
93
Com o desenvolvimento social e econômico da região, segundo Vidor (1995,
p. 38), a estratificação socioeconômica se torna mais complexa com a sedimentação
do colono, do comerciante e do industrial. Após um período relativamente curto,
surge toda a hierarquia que reflete a divisão social do trabalho, pela oposição
cidade/campo.
Fica evidenciada a conclusão de Vidor nesta publicação do periódico de
Blumenau em Cadernos, tomo XXII, n.4, maio de 1981.
“O COLONO E O AUTOMÓVEL (VISÃO MIÓPICA)”.
O malfadado colono no Vale do Itajsempre foi uma vítima dos pseudo-
progressistas.
O colono, diga-se de passagem, foi o verdadeiro esteio, o moto-propulsor de
todo o progresso do Vale do Itajaí. Vitima de toda série de contingências,
sobreviveu, porque a sua própria resistência ao meio era a condição básica
para a sobrevivência do vale. Apreciado um certo exagero, achava-se, em
outras épocas, que o colono deveria ser limitado a um trabalho exaustivo,
andar de no chão, não permitir-se que se educassem, a fim de jamais
haver o perigo de faltar alimento na cidade.
Com o aparecimento do automóvel, naturais eram as aspirações de todos
de poderem possuir um carro. Os negociantes das colônias eram os
primeiros a adquirir, ou sob forma de carro ou sob forma de caminhão. Aos
poucos os colonos mais abastados também tentavam entrar na posse do
veículo.
Estranha, entretanto, foi a reação de certos citadinos, principalmente alguns
mais ilustrados, e, entre esses, inclui-se um cidadão da época que, devido à
relativamente pouca capacidade, era favorecido com um cargo público.
Este senhor declarou, certa vez, na presença do articulista, o seguinte: É
preciso que se crie uma associação de classe que exerça pressão para que
os colonos deixem de ter as manias de certos modernismos, como é o caso
de possuírem automóvel. Esta mania de modernismo põe em perigo a
sobrevivência da cidade de Blumenau. Sem comentário... (O COLONO,
1981, p. 152).
Atuando por um lado, junto ao mercado, por outro a Associação Comercial
buscava formas de melhorar o escoamento dos produtos locais. No dia 20
de dezembro de 1907, uma locomotiva importada da Alemanha testou os
trilhos da estrada de ferro do bairro Altona. A previsão era que em um ano
estivesse concluído o trecho Blumenau-Indaial. Naquele ano, Blumenau
tinha 45.089 habitantes. A população urbana era de apenas 1.516 pessoas.
(SANTIAGO, 2001, p. 47).
Em 1907, quando se iniciaram as obras da EFSC, com a construção do
primeiro trecho ferroviário de Blumenau a Warnow, Blumenau tinha 45.089
habitantes. Destes, somente 1.516 formavam a população urbana, da qual faziam
parte os representantes da elite da época. 96,64% da população total da Colônia
Blumenau era de colonos. E nesta fatia de 3,36% estavam as lideranças que
efetivamente buscaram meios para a implantação da ferrovia no Vale do Itajaí,
94
inseridas em um recorte de tempo que refletia mudanças sociais na região. O que,
conforme Santiago observa, igualmente ocorreram em outras regiões, e também na
Europa.
A euforia da virada de século embalava o mundo. A Europa vivia um
período de franco desenvolvimento econômico, fruto da definitiva
consolidação da Revolução industrial. A cultura do velho continente também
fervilhava no rastro das mudanças sociais, buscando alternativas para o
crescente distanciamento econômico entre a burguesia dominante e o
proletariado que surgira com a urbanização e as indústrias. (SANTIAGO,
2001, p.38).
Dentro desse novo contexto social e econômico, o comércio entre a cidade e
o campo aumenta por meio da comercialização de produtos, como ferramentas,
banha, açúcar, tábuas, carne de porco e conservas, charutos, farinha de mandioca,
erva-mate, produtos têxteis e confecção, manteiga, sementes, utensílios, sal, entre
outros.
Paul Singer, em excerto de seu livro publicado na revista Blumenau em
Cadernos, tomo XXVII, 4, abril de 1986, diz que o setor industrial ligado
diretamente à produção agropecuária cresceu em ritmo célere entre 1883 e 1897
30
,
e no período entre 1890 e 1910 (quando ocorreu todo o processo da implantação
ferroviária no Vale do Itajaí) o desenvolvimento industrial foi mais lento que o da
década anterior. Singer afirma que uma das causas desse declínio é a saturação
relativa do mercado, enfatizando que o primeiro surto industrial esgotou as
possibilidades imediatas de mercado. Singer afirma que o crescimento de Blumenau,
como acentuamos, passou a depender cada vez mais do aumento vegetativo da
população. Havia o mercado das demais colônias.
Outro aspecto do mesmo problema é que algumas economias externas,
indispensáveis ao desenvolvimento industrial, vão sendo criadas neste
período, preparando o terreno para o avanço a partir de 1910. Uma destas é
o sistema viário. Uma indústria cujo mercado se estende por vasta extensão
geográfica (só o município de Blumenau tinha mais de 10.000 km2) e que
conta, como clientes, com pequenos camponeses que não se agrupam em
aldeias, mas vivem em suas propriedades, só pode expandir-se à base de
uma bem articulada rede de transportes. É interessante assinalar que esta
foi sempre uma das preocupações principais das autoridades do município,
que o adotaram, no dizer do Prefeito Paulo Zimmermann (em 1921) da
“maior e melhor rede de estradas de todos os municípios do Brasil,
tomando em consideração a extensão e população do município”). Em 1928
30
As cervejarias passaram de 8 para 13; os engenhos de açúcar, de 150 para 262; e as serrarias, de
38 para 46; olarias de 12 para 29; e houve o surgimento da indústria tipicamente urbana: tecelagens,
gráficas, fábricas de sabão, de meias.
95
havia, em Blumenau, 3.864,7 km de estradas de rodagem, 45 pontes de
mais de 30 metros, 800 de 15 a 30, 2.400 de menos de 15 m, etc. Em 1945
iniciou-se a construção da E.F. Santa Catarina, a qual ficou pronta em 1909
e depois foi prolongada, desempenhando papel de destaque na interligação
de Blumenau com o Vale do Itajaí. (SINGER, 1986, p.128).
Este efervescer comercial, o surgimento do embrião da indústria urbana e o
desejo de ampliar o mercado conectando comercialmente os núcleos urbanos do
Vale do Itajaí motivaram as lideranças locais e situadas no Stadplatz, formadas
pelos principais comerciantes, artífices, industriais e alguns poucos colonos mais
bem-sucedidos que tinham interesses. Passaram a buscar ações concretas para
melhorias mais acentuadas e efetivas no sistema de transportes. As novas
lideranças oriundas deste novo momento social, a exemplo das antigas lideranças
que estavam organizadas na Kulturverein (formada por colonos e comerciantes)
Sociedade de Cultura, fundam, então, a Associação Comercial e Industrial de
Blumenau ACIB. Essa entidade representou os interesses da nova elite
blumenauense do início do século XX, no momento em que é bem definida a
segregação social e a dicotomia campo/cidade, no surgimento da indústria e no
fortalecimento do comércio local.
No início da povoação, as lideranças locais apresentavam planos voltados
para as melhorias da rede de estradas e picadas, perspectiva da adoção do
transporte a vapor via fluvial e a implantação do transporte ferroviário. Porém, parte
destes planos não foi viabilizada de imediato, como a implantação da ferrovia ainda
no século XIX, porque não havia recursos necessários.
Houve outras ações de melhorias nos meios de transporte, movidas pela
ambição de promover o desenvolvimento econômico da região. Entre elas, a
implantação de empreendimentos particulares, como no caso da construção do cais
do porto fluvial, em 1898
31
, e a concessão fornecida a Friederico Von Ockel para a
implantação de uma linha férrea entre a sede da Colônia Blumenau e Aquidaban
(atual Apiúna), ainda no século XIX.
A ACIB e a Companhia Colonizadora Hanseática tiveram uma participação
relevante na efetivação da ferrovia no Vale do Itajaí.
32
31
O superintendente Otto Stutzer criou bônus, sob a forma de empréstimos, em cédulas nos valores
de 100, 200, e 500 réis, para aplicar na melhoria de obrasblicas, dentre elas, a construção do cais
do porto fluvial no centro da cidade. (PETRY, 2000, p. 112).
32
Este comentário e a história de ACIB tem relevância nesta pesquisa, pois trata-se de um dos
agentes que acompanharam a história da EFSC , durante o período de funcionamento e erradicação.
96
4.2.1 Associação Comercial e Industrial de Blumenau – ACIB
Com o fortalecimento comercial e industrial na colônia, a Kulturverein
Sociedade de Cultura, associação dos principais colonos fundada em 1869, não
atendia mais às expectativas da nova elite blumenauense.
Mesmo existindo a divisão de trabalho na colônia desde a fundação,
um momento em que fica mais nítido o papel do produtor, mão-de-obra (colono,
agricultor), o comerciante (atravessador) e o industrial (transformador), sem contar
agora com a formação de uma massa de trabalhadores que passam igualmente a
trabalhar na indústria que emerge. Com a distinção de classes sociais mais
evidenciada, e a definição da estrutura social para a produção do capital, surge a
necessidade de mudar o perfil da associação que representa esta nova liderança
econômica e política na Colônia Blumenau. As novas lideranças da colônia fundam,
então, em 5 de novembro de 1901, a ACIB - Associação Comercial e Industrial de
Blumenau, atual Associação Empresarial de Blumenau. Esta associação tinha,
naquele momento, início do século XX, como principais objetivos:
a) aumentar os lucros sobre a compra de produtos adquiridos dos colonos a
um custo menor
33
;
b) desenvolver o comércio dentro dos núcleos urbanos afastados, por meio
da venda de utensílios domésticos e para a lavoura;
c) padronizar, aumentar a qualidade do produto industrializado na indústria
local e fiscalizar a qualidade da matéria-prima oriunda dos colonos,
atrelando esta condição ao seu valor;
33
De acordo com Santiago (2001, p. 44), esta questão foi debatida na época pela imprensa escrita. O
primeiro presidente da ACIB Sr. Salinger tentou dissipar os rumores de que a iniciativa da criação
da associação era uma conspiração dos comerciantes com a finalidade de pagar ainda menos aos
colonos pelos seus produtos. A preocupação dos agricultores era traduzida pelo jornal Blumenauer
Zeitung, que em uma de suas edições daqueles dias relatava: “Hoje é preciso trabalhar o dobro para
ter o mesmo ganho que o agricultor tinha diariamente, três anos”. Os colonos tinham razão sobre
sua desconfiança, ao analisarmos esta narrativa de Santiago (2001, p. 46): Em 1904, por exemplo, os
fabricantes de manteiga atravessavam grande crise. Além das geadas, que prejudicavam a produção
do leite, o preço do produto vinha sofrendo séria concorrência, e sua cotação no mercado caía. A
Associação empenhou-se no sentido de obter melhores preços junto aos colonos, solicitando que
estes se esforçassem para oferecer um produto impecável. No ano seguinte, houve grande
dificuldade em comercializar a manteiga produzida em Blumenau nos mercados do Rio de Janeiro e
São Paulo. A entidade decidiu reduzir o preço do produto, passando a pagar aos colonos Rs1$500
em vez de Rs1$800 por quilo.
97
d) melhorar os caminhos e estradas entre os vários núcleos urbanos da
colônia e desta para outras regiões, para o rápido escoamento dos
produtos industrializados;
e) viabilizar a construção de uma ferrovia na região;
f) inserir representações políticas locais no cenário político estadual e
nacional.
Participaram dessa primeira assembléia de fundação, como sócios-
fundadores, os senhores Herman Sachtleben, Henrique Probst, Alwin Schrader
(Prefeito), Ricardo Scheeffer, Friederich Blohm, Bruno Hering, Hermann Hering, Paul
Husadel, Ferdinand Schrader, Caetano Deeke, Wilhelm Nienstedt, G. Arthur Koehler,
Pedro Christiano Feddersen e Gustav Salinger.
A principal motivação que reuniu as lideranças locais foi a possibilidade de
juntas poderem ter mais força para reivindicar ao governo a abertura e
manutenção de melhores vias de escoamento da produção local, fixar bons
preços de compra junto aos colonos e de venda dos produtos
manufaturados nos mercados externos. (SANTIAGO, 2001, p. 45).
O primeiro presidente da ACIB foi o cônsul alemão Gustav Salinger, sócio do
Cel. Feddersen. A associação teve no ato da fundação a adesão de 34 empresas
associadas.
Pedro Christiano Feddersen viajou em 1904 para a Europa, onde entrou em
contato com possíveis interessados no projeto da ferrovia, mostrando e destacando
a estes todas as vantagens da sua construção no Vale do Itajaí. Teodoro Lüders
elaborou estatísticas para Feddersen levar para apresentar aos pretensos parceiros
europeus.
De acordo com Santiago (2001, p. 41), a primeira missão dos novos
diretores da ACIB foi a de buscar entendimento com os líderes da Kulturverein, pois
se tratava da sociedade associativa mais forte da cidade, que unia agricultores e
comerciantes, e nesta última estavam somente os comerciantes.
4.2.1.1 O perfil de dois representantes das novas lideranças blumenauense
Finalmente, a estratificação sócio-econômica se torna mais complexa com
a sedimentação do agricultor, do comerciante e do empresário industrial.
Assim, dentro de um período bastante curto, toda a hierarquia,
compreendendo a divisão social do trabalho, estava implantada pela
oposição cidade/campo. (VIDOR,
1995, p. 38).
98
Surgem lideranças em Blumenau, no período que antecede a construção da
EFSC, no final do século XIX e início do século XX, e a descrição de suas ações,
ilustrando o desenvolvimento dos fatos analisados neste trabalho. Alguns nomes se
destacaram como empresários e depois como políticos atuantes no interesse
econômico da região. Escolhemos as biografias dos senhores Busch e Feddersen,
dois atores co-responsáveis pelo momento de mudança social, em que os
comerciantes e industriais “rompem” com os colonos. O Sr. Busch foi o empresário
pioneiro que explorou comercialmente o primeiro ônibus público em Santa Catarina e
Blumenau, como também a pessoa que importou o primeiro automóvel na região, no
início do século XX, e o Cel. Feddersen foi o mentor político da implantação da
ferrovia EFSC.
4.2.1.1.1 Frederico Guilherme Busch
Busch chegou a Blumenau em 1888, com 22 anos, tendo nascido em Santo
Amaro da Imperatriz.
Ao se instalar na cidade, abriu um comércio que exportava manteiga, queijo,
banha e outros produtos oriundos da produção das propriedades coloniais
localizadas nos núcleos urbanos. Após um período atuando como comerciante na
cidade, Busch investiu o excedente do comércio na indústria, criando fábrica de
fósforo, charutos, manteiga e banha.
Com a intenção de automatizar a manufatura de sforo, instalou a primeira
usina hidrelétrica da cidade e do Estado. O excedente da produção de energia
elétrica ele passou a comercializar e vender a outros industriais, comércios e até
para a administração pública.
Em 1903, Busch adquiriu o primeiro automóvel, importado dos Estados
Unidos da América.
99
Figura 45 - Primeiro carro da região, importado por Frederico Busch (1903)
Fonte: SANTIAGO, 2001.
Foi publicada uma nota, na revista Blumenau em Cadernos, tomo IX, maio
de 1968, n.5, p. 100, comentando sobre o primeiro automóvel e o desejo de ter uma
ferrovia no Vale do Itajaí. Transcrição a seguir.
Foi nas ruas de Blumenau que começou a rodar o primeiro automóvel que
Santa Catarina viu. Isso foi em 24 de setembro de 1903. E quem importava
o revolucionário veículo da América do Norte fora o senhor Frederico
Guilherme Busch. A respeito, o “urwaldsbote” nº13 daquele mês e ano
publicava a seguinte nota: “os modernos meios de comunicação estão
invadindo o sertão. Na semana passada, podemos ver pela primeira vez,
nas ruas de Blumenau, um veículo automotor. O proprietário desse meio de
transporte é o Sr. Frederico Busch, que adquiriu na América do Norte. A
nossa civilização está progredindo. Ainda bem pouco tempo, o
velocípede era, aqui, uma curiosidade e agora temos inúmeros dêles. Até
nos acostumamos a ver senhoras montadas em velocípedes. Do
velocípede passamos agora para o automóvel. Infelizmente ainda falta o
mais necessário: a estrada de ferro. Quando será que ouviremos seu
apito?”
Com o objetivo de melhorar o transporte dos produtos que importava e
exportava e aumentar seus lucros, Busch colocou em operação, em 1913, o primeiro
barco com motor de combustão a trafegar entre Blumenau e Itajaí, o Gustav. Esta
embarcação transportava passageiros e fazia a viagem em menor tempo que os
concorrentes a vapor. Realizava a viagem de ida e volta a Itajaí no mesmo dia.
100
Figura 46 - Primeiro ônibus
Fonte: MUSEU VIRTUAL DO TRANSPORTE URBANO, 2007.
Em 1914, Busch colocou em funcionamento o primeiro ônibus da cidade e
do Estado. O ônibus tipo Jardineira tinha 12 lugares para passageiros sentados e
mais um em pé, fazendo a ligação entre o Stadplatz e o bairro Altona, atual Itoupava
Seca.
Frederico Guilherme Busch foi um dos gestores da Empresa Industrial
Garcia, entre 1901 e 1906, uma das maiores empresas têxteis do País nesse
período. Faleceu em 1943, aos 77 anos. Os negócios foram assumidos pelo filho,
Júnior, que mais tarde foi prefeito da cidade nos anos de 1945 a 1946, 1947 a 1951
e 1956 a 1961, permanecendo como membro importante da elite regional e local.
4.2.1.1.2 Pedro Christiano Feddersen
Segundo Silva (1972, p. 104), Pedro Christiano Feddersen chegou à Colônia
Blumenau como colono, em 1879. Zuege (1975, p. 36) menciona que o Cel.
Feddersen havia se estabelecido comercialmente em Santos e São Paulo, e que lá,
por motivos desconhecidos, não teve sucesso, resolvendo mudar-se para a Colônia
Blumenau em 1879.
Em Blumenau, Feddersen foi funcionário da Companhia Sallinger Indústria e
101
Comércio, situada na Itoupava Seca. Em poucos meses, o Sr. Sallinger colocou O
Cel Feddersen para dirigir um de seus negócios. Os negócios prosperaram e se
diversificaram por toda a Colônia Blumenau, atendendo os vários núcleos urbanos.
Os ramos das empresas “Sallinger” eram: fábrica de charutos, marcenaria, latoaria,
exportação de manteiga, beneficiamento de arroz, atafona, oficina mecânica, e
posteriormente fundição e serraria.
Mais tarde, a fonte não cita datas, Feddersen assumiu a direção geral dos
negócios das empresas. Seu sócio afastou-se e faleceu.
Feddersen instalou filiais nos distritos (núcleos mais desenvolvidos) da
grande colônia de Blumenau. registro de filiais em Timbó, gerenciada
alternadamente pelos filhos August e Max Feddersen; Fortaleza Blumenau;
Warnow; Rio do Texto; Hammonia; Nova Breslau; Taió, entre outras. As lojas do Cel.
Feddersen comercializavam desde bicicletas, brinquedos, fazendas, até artigos de
ferragem, e atendiam consumidores da sede colonial e Itoupava Seca, e também
grande parte de todo o Vale do Itajaí. Faziam-se necessárias melhorias nos
caminhos para o transporte dos produtos.
Feddersen também fabricava produtos para os colonos, como moendas de
ferro para a fabricação de açúcar, tachos de cobre para o cozimento de
garapa e alambiques para a obtenção da cachaça. Ele importava
centrífugas de leite, máquinas de cortar ferragens, arados, grades e toda a
sorte de utensílios agrícolas. O empreendedor também desenvolvia
atividades creditícias e instalou filiais em diversos pontos da cidade,
chegando a 16 unidades.
O sucesso empresarial o levou à política, elegendo-o deputado estadual em
sete legislaturas. Foi Ferddersen que conseguiu negociar um acordo entre o
governo e a Companhia Hanseática de Colonização de Hamburgo para que
esta financiasse a construção de uma estrada de ferro entre Blumenau e o
Alto vale, onde a Companhia tinha negócios de assentamento de colonos
alemães. A linha pretendia estender-se até Curitibanos e Lages, sempre
com o incentivo do empresário. (SANTIAGO, 2001, p.95).
Com o passar do tempo, os negócios das filiais o tinham mais lucros com
antes e nem o mesmo desempenho da matriz, na sede da colônia, conhecida como
Casa Matriz. Por volta da década de trinta do século XX seus negócios foram
sucumbindo, até a falência.
Recebeu o título honorário de “coronel”, por serviços prestados à causa
pública e, “principalmente, pela incansável colaboração nos vários setores
econômicos, dos quais Blumenau ainda está colhendo os frutos e que é a atual
pujança do Vale do Itajaí”. (ZUEGE, 1975, p. 39).
102
Participou da equipe que construiu e viabilizou a Usina do Salto, primeira
Hidrelétrica de Santa Catarina, conhecida Empresa de Força e Luz Santa Catarina
S.A. e a Ponte Lauro Muller, Ponte do Salto, situada no bairro do Salto, por debaixo
da qual a ferrovia passava em direção às oficinas da Estrada de Ferro no bairro
Altona, atual Itoupava Seca.
Na área da política, filiado ao Partido Republicano
34
, foi vereador, sendo por
três vezes presidente da Câmara Municipal de Vereadores, e também foi Deputado
Estadual.
Na política de então teve também participação, e foi figura exponencial e
correligionário do Partido Republicano, fazendo mais a política na surdina
do que pessoalmente aparecendo, sendo contudo um dos mais influentes
membros do cenário blumenauense e catarinense. Amigo pessoal do
grande político teuto-brasileiro Marcos Konder, e dos “Konder” em geral.
(ZUEGE, 1975, p. 39).
Como um dos idealizadores da construção da EFSC, Zuege (1975) comenta
sobre sua importância na viabilização da construção da EFSC no Vale do Itajaí.
Também teve ele voz ativa na construção da extinta Estrada de Ferro Santa
Catarina, a qual, como todos devem estar lembrados, prestou incalculáveis
serviços à região, e que por muitos anos foi o único meio de transporte,
além das carroças, do qual o grande celeiro do Vale se servia, levando seus
produtos a Blumenau, e daqui ao porto de Itajaí, onde foram despachados
para os mais diferentes centros do país e exterior. Não é de época remota a
sua erradicação, e todo catarinense deve se lembrar disso. Falar sobre a
EFSC S.A. seria um capítulo à parte e desperdício de tempo pouco
interessante, haja vista os fatores que levaram as nossas autoridades
governamentais de sua re-implantação, mas, nós sinceramente jamais
acreditamos na sua re-abertura, achando que não há, pelo menos nesta
década, condições capazes que garantam lucro àqueles que se lançaram
nesta aventura. Somos de opinião, que por hora, é a vez do automóvel e
dos caminhões, e que os mesmos influíram decididamente no seu
prematuro fechamento. (ZUEGUE, 1975, p. 40).
Estes dois representantes das novas lideranças blumenauense do início do
século XX apresentam características desta e tinham ligações diretas com as
melhorias da comunicação entre a sede da Colônia Blumenau e os demais núcleos
urbanos do Vale do Itajaí, sobre a ferrovia ou outros meios de transporte. Isto ilustra
bem o perfil das novas lideranças do Vale do Itajaí, agentes importantes na
construção da ferrovia na região, independentemente dos interesses que os
motivaram.
34
O Partido Republicano (PR) foi fundado por Artur Bernardes em 1945, sucedendo ao antigo Partido
Republicano Mineiro. Foi extinto pelo Regime Militar, através do Ato Institucional Número 2 (AI-2), de
27 de outubro de 1965.
103
Pedro Christiano Feddersen que, como deputado estadual, como
Conselheiro Municipal e como chefe político, foi sempre ardoroso
incentivador do progresso de Blumenau, pondo-se à frente de iniciativas
que trouxeram grandes benefícios à Comuna, pôs todo seu entusiasmo e o
seu prestígio a serviço da solução de tão premente problema. (SILVA, 1969,
p. 82).
4.2.2 Companhia Colonizadora Hanseática
Muitos dos imigrantes que vieram para a região o fizeram por intermédio de
companhias colonizadoras, empresas que se comprometiam a assentar determinado
número de imigrantes em uma região e a dotá-los de áreas providas de serviços
públicos necessários, por meio de contratos de colonização com o governo
brasileiro, em troca de uma gleba de terra. As companhias faziam investimentos em
meios de transporte, nas obras iniciais de colonização e cediam aos colonos terras e
equipamentos gratuitamente ou pelo preço de custo, além de também empregarem
agentes recrutadores. Gradativamente, a colônia em expansão se desenvolvia
urbanisticamente e ficava mais cil atrair novos interessados em nela residirem,
pois a terra se valorizava cada vez mais. Por meio da valorização, o empreendedor
recuperava o capital investido e obtinha lucro sobre as transações.
Por volta de 1895, uma das áreas mais valorizadas da bacia do Itajaí,
segundo Silva (1972, p. 23), banhada pelo rio Hercílio começou a ser colonizada,
por meio da concessão dada à Sociedade Colonizadora Hanseática, sediada em
Hamburgo, Alemanha. A concessão era de 600 mil hectares e compreendia toda a
área da bacia do rio Hercílio. Embora a área fosse munida de potencial geográfico,
estava isolada da sede da colônia e, por conseguinte, do porto fluvial. O agrimensor
José Deeke assumiu a direção da colônia, conhecida como Colônia Hansa-
Hammonia
35
ou somente como Colônia Hammonia, e mantinha ligações diretas com
as lideranças do Stadplatz da colônia do Dr. Blumenau.
Assim que começou a assentar os imigrantes em um dos pontos de
convergência de grande número de imigrantes, bem como a instalação da sede da
35
“Hammonia” significa “Hamburgo”, cidade e porto alemão em que era situada a sede da “Sociedade
Colonizadora Hanseática”, fundadora e responsável pelas Colônias Hanseáticas: “Hansa-Hammonia”
(Ibirama), “Hansa-Humbolt” (Corupá), Itapocu”, em Joinville, e um núcleo colonial em São Bento do
Sul. “Hammonia” foi a denominação dada pelos invasores romanos, no início da era cristã à mais
importante das cidades hanseáticas da Alemanha. (Blumenau em Cadernos, Tomo XXII, n. 7, julho de
1981, p. 195).
104
colônia, percebeu-se a urgente necessidade de se construir uma ferrovia que ligasse
a Colônia Hammonia à sede da Colônia Blumenau.
Figura 47 - Localização da Colônia Hammonia e Colônia Blumenau
Fonte: SANTA CATARINA - Atlas de Santa Catarina, 1986 - Alterado por WITTMANN.
Os caminhos, na época em que os primeiros imigrantes se assentaram na
Colônia Hammonia eram rudimentares e com acesso somente até Aquidaban (atual
Apiúna).
Face aos precários meios de transportes estaduais, na época, o caminho
aberto até Aquidaban, e o trajeto entre Blumenau e a sede da nova Colônia
Hansa Hammonia eram difíceis e penosos, mormente se se considerar que
os imigrantes eram, em geral, portadores não só de ferramentas e utensílios
indispensáveis ao desbravamento de seus lotes, mas ainda de grandes
caixas de roupas, objetos caseiros e até peças de mobiliário. (SILVA, 1972,
p. 152).
Aproveitando essa dificuldade de acesso às terras da bacia do rio Hercílio, a
ACIB e a administração pública da Colônia Blumenau fizeram lobby junto à
colonizadora Hanseática, para que esta viabilizasse a implantação de uma linha
férrea entre as duas colônias, Blumenau e Hammonia. As vantagens dessa linha
férrea, para a colonizadora Hanseática, entre outras, seria a facilidade de acesso à
região, o que resultaria na valorização das terras a serem negociadas; a principal
vantagem aos colonos já instalados seria a disponibilidade de um meio de transporte
105
rápido e seguro até o porto fluvial, sede da colônia de Blumenau - o Stadplatz, sem o
freqüente ataque dos índios. Sede em que estavam localizados os centros cultural,
econômico e social de todo o Vale do Itajaí; e, finalmente, a principal vantagem para
os comerciantes e industriais seria a concretização do intento que buscavam de
longa data: as melhorias dos meios de transporte na região. Concretizando antigo
desejo do fundador e do desbravador Emil Odebrecht, teriam a vantagem de
transportar os produtos comercializados entre a sede da colônia e os vários núcleos
localizados próximo ao leito ferroviário, bem como a facilidade de escoamento dos
produtos a um mercado mais afastado.
A Colonizadora Hanseática, ciente das dificuldades de acesso, da
necessidade de melhorias da acessibilidade para o desenvolvimento da colônia,
estimulada e incentivada pela lideranças locais e com o ,apoio do Banco Alemão,
decide pela execução do projeto de implantação ferroviária no Vale do Itajaí, em um
primeiro momento interligando a sede da Colônia Blumenau à sede da Colônia
Hammonia.
A Estrada de Ferro nasceu em função da criação da Hanseática (Ibirama),
seria um consórcio alemão de Hamburgo. Adquiriu uma grande extensão de
terras às margens do Rio Norte. Sendo que a colonização no Vale do Itaj
seria viável mediante a construção de uma estrada de ferro, para
transportar as mercadorias. A luta por esta Estrada de Ferro agitou até a
política internacional. A Alemanha fez então o empréstimo a Blumenau.
(DAGNONI, 2006, p. 9).
Segundo Vidor (1995, p. 35), no ano de 1899, na cidade de Berlim, foi
fundada uma empresa na qual o Banco de Bleischroeder e Warschauer aplicou nove
milhões de francos para a construção de uma ferrovia a vapor no Vale do Itajaí. Em
1904 foi assinado um decreto estadual concedendo autorização para a construção e
exploração de uma via férrea no Vale do Itajaí, para o engenheiro Skinner que tinha
ligação com a Companhia Colonizadora Hanseática, e que viabilizou todo o
processo de construção da ferrovia entre a sede da colônia do Dr. Blumenau e a
Colônia Hammonia ou Hansa (atual Ibirama), posteriormente. No dia 13 de abril de
1912, a nucleação urbana de Hammonia é elevada a sede distrital, na qual está
localizada a administração da Sociedade Colonizadora Hanseática, 4 anos após a
inauguração do primeiro trecho ferroviário.
106
Figura 48 - Construção da ponte de ferro sobre o rio Itajaí-Açu em Hammonia, em 1909. Mede
102 metros e foi obra da empresa alemã que construiu os primeiros 70 quilômetros da EFSC
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Figura 49 - Ponte de ferro sobre o rio Itajaí-Açu, em Hammonia, 2007
Fotografia: WITTMANN, 2008.
107
A falta de meios de transporte no município de Blumenau tornou-se sensível
e premente, quando a Companhia de Colonização Hanseática, em 1900,
começou a lotear os terrenos de sua concessão nas margens do rio
Hercílio, ou seja, Itajaí do Norte.
Desde 30 anos, vinham-se fazendo tentativas de construir alguma estrada
de ferro em Santa Catarina.
Em 18 de dezembro de 1899, foi construída a ‘tram-via a Vapor Blumenau -
Aquidaban’, de que era concessionário Von Ockel. (CENTENÁRIO DE
BLUMENAU, 1950, p. 253).
Figura 50 - Ponte de ferro sobre o rio Itajaí-Açu, em Hammonia
Fotografia: WITTMANN, 2008.
* Foi batizada Altamiro Guimarães, chegou a ser vendida como sucata, mas a comunidade impediu.
4.3 A CONSTRUÇÃO DA EFSC
A implantação da ferrovia na região do Vale do Itajaí foi resultado de uma
seqüência de fatos históricos. Entre eles, o resultado das novas idéias e revoluções
ocorridas na Europa, no século XVIII e XIX, juntamente com as ações políticas
brasileiras adotadas na região Sul do País, como o incentivo à ocupação de terras
devolutas pelos imigrantes europeus que chegaram ao Vale do Itajaí na segunda
metade do século XIX. A ferrovia, como um dos ícones dos novos tempos, sempre
esteve presente nos projetos desses pioneiros. Sua construção somente foi
viabilizada seis décadas após a chegada dos primeiros imigrantes, no ano de 1909.
108
Logo que o Dr. Blumenau conseguiu dar progresso expressivo a sua
colônia, sentiu ele a necessidade de construção de uma ferrovia que
interligasse a sede da Colônia, Blumenau, com os diversos povoados que
começavam a surgir ao longo do Rio Itajaí-Açu. O Dr. Blumenau tinha
preferências pelo transporte ferroviário porque conhecia o sistema na
Europa, que lá funcionava bem, e ele mesmo, numa de suas viagens, havia
verificado a possibilidade de conseguir recursos para tal obra, recursos
estes que naquela época não existiam, e assim não veria o Dr. Blumenau
concretizado seu ideal. (HENKELS, s.d.).
A construção da ferrovia no Vale do Itajaí é contemporânea ao período de
domínio econômico inglês nas atividades do comércio exterior, corretagem e
transporte e nos serviços financeiros nacionais no Brasil, que ocorriam desde a
vinda da família real portuguesa para o Brasil, em 1807-1808. De acordo com
Almeida (2003, p. 123), a Inglaterra foi responsável por 93,6% do estoque de
investimentos estrangeiros realizados nos setores ferroviário, bancário, de seguros,
e nas companhias de créditos e financiamentos no Brasil. Ao contrário do Vale do
Itajaí, em que o desenvolvimento econômico se processava de forma quase
independente do governo central brasileiro. O Vale do Itajaí, que abrangia toda a
Colônia Blumenau, mantinha relações comerciais e econômicas com a Alemanha,
país de origem da maioria dos imigrantes que povoaram a região.
Tabela 1 – País de origem dos capitais das empresas estrangeiras no Brasil
(1860-1875)
País de empresas
Capital investido
pela empresa
%
Inglaterra 44 24.852.927 93,6
Alemanha 4 1.255.084 4,7
França 1 387.387 1,4
Argentina 1 40.000 0,1
Portugal 3 4.308 -
Total 53 26.539.706 100.0
Fonte: CASTRO, 2003, p. 38.
109
Tabela 2 – Investimento estrangeiro por setor de destino, Brasil (1876-1885)
Setores de empresas
Capital investido
pelas empresas
%
1. Serviços Básicos 21 15.163.213 75,80
1.1. Ferrovias 14 11.755.334 58,80
1.2. Companhias de gás - 20.000 0,00
1.3. Iluminação 1 481.786 2,40
1.4. Telégr. e Telefones 1 400.000 2,00
1.5. Portos 1 200.000 1,00
1.6. Obras públicas 3 2.088.093 10,50
1.7. Serviços particulares 1 218.000 1,10
2. Bancos 1 360.000 1,80
3. Mineração 2 200.000 1,00
4. Seguros 11 146.670 0,7
5. Comércio Exterior 2 2.009.466 10,10
6. Ind. de transformação 9 2.132.990 10,60
Total 46 20.012.339 100,00
Fonte: CASTRO, 2003, p. 55.
A ferrovia foi inserida na região para atender às necessidades de melhoria
da comunicação entre os vários núcleos urbanos distribuídos na extensa Colônia
Blumenau, sentido litoralinterior e lesteoeste, principalmente entre as colônias
Blumenau e Hammonia (atual Ibirama). Os planos originais da EFSC eram
audaciosos. O ramal da colônia Hammonia se estenderia serra acima, até a cidade
de Rio Negro, ao Norte do Estado de Santa Catarina e, pelo Oeste, chegaria à
cidade na nucleação de Itapiranga (também povoada por imigrantes alemães),
situada no Extremo Oeste do Estado, fazendo divisa com a Argentina.
110
Figura 51 - Traçado do plano original da EFSC
Fonte: GOOGLE MAPS, 2006 - Alterado por WITTMANN.
A princípio, promovendo a primeira etapa da ferrovia, foram três os principais
fatores que impulsionaram sua construção: (1) a necessidade de um meio de
transporte moderno que ligasse a colônia Hammonia e a sede de Blumenau
(distância de aproximadamente 70 quilômetros), com o objetivo de impulsionar os
negócios da venda de terras no Vale do Hercílio, no Alto Vale do Itajaí, pertencentes
à Colonizadora Hanseática; (2) seria oportuno à nova elite blumenauense, que
desde os primeiros anos de fundação da colônia almejava a construção da ferrovia
na região. Essas lideranças locais do início do culo XX elegeram o projeto
ferroviário como um dos prioritários para a região e pressionaram a Colonizadora a
assumir o empreendimento, que o fez com o investimento de capital dos bancos
alemães e de companhias de navegação também alemãs. A ferrovia traria
benefícios, pois facilitaria o escoamento dos produtos comercializados entre os
núcleos urbanos do Vale do Itajaí e deste para outras regiões e o mundo. A maior
parte dos que formavam essa elite eram comerciantes, políticos locais e industriais
que reivindicavam melhorias nas estradas e caminhos, para melhorar os
escoamentos dos produtos manufaturados, além de exportar e importar; e,
finalmente, (3) a estrada de ferro traria benefícios aos colonos, que trafegavam
naqueles caminhos à velocidade do cavalo ou a pé, expondo-se a perigos e às
111
vicissitudes das intempéries. Suas viagens passariam a ser seguras, confortáveis,
ágeis e periódicas, independentemente das intempéries. Além do que poderiam se
deslocar com mais freqüência à sede da colônia, centro comercial, cultural e social
da colônia de Blumenau.
4.3.1 Os construtores e trâmites oficiais
Interessada em promover melhorias na comunicação entre a Colônia
Hammonia e a Colônia Blumenau, juntamente com o lobby das lideranças locais, a
Colonizadora Hanseática enviou o engenheiro Harry Von Skinner
36
à Província de
Santa Catarina, a fim de verificar as reais condições, junto aos órgãos oficiais, para a
construção de uma ferrovia ligando as duas colônias. O engenheiro, vislumbrando a
viabilidade da construção da linha rrea, oportunamente reivindica a concessão
para a construção da ferrovia e a recebe do governo catarinense sob o Decreto
Estadual nº 227, de 26 de setembro de 1904, no período republicano do governo
Lauro Muller
37
.
Por Decreto Estadual do dia 27 de Setembro, do governador do Estado, foi
dada concessão ao Sr. Harry von Skinner ou empresa por ele organizada,
para a construção de uma Estrada de Ferro, da cidade de Blumenau até o
território da Colonizadora Hanseática, e do ramal até a margem esquerda
do Rio Negro, em frente da cidade do mesmo nome, bem como partindo de
um adequado ponto da linha principal, atinge a linha de Curitibanos segue
para Rio Negro. (BLUMENAU EM CADERNOS, 1980, p. 35).
[...] concede ao engenheiro, ou à empresa que organizar, privilégio para a
construção de uma estrada de ferro que, partindo da cidade de Blumenau,
se dirija à povoação de Hammonia, daí à margem esquerda do Rio Negro,
em frente à Vila do mesmo nome e de um ramal que, partindo do ponto
mais conveniente da estrada concedida, encontrar o caminho que de
Curitibanos se dirige ao rio Negro, tudo de conformidade com o contrato que
fora lavrado do contencioso do tesouro do Estado. - Parte da lei 226-.
(SILVA, 1969, p. 87).
Ficou acertado, nesse momento da emissão da concessão, que a Câmara
36
Von Skiner foi mandado a Blumenau para sondar a possibilidade da construção de uma ferrovia na
região e buscou, junto ao governo estadual, a concessão para a sua construção.
37
Assumiu em 28 de setembro de 1902, porém permaneceu no cargo apenas 44 dias, por preferir o
cargo de Ministro de Viação e Obras Públicas, de Rodrigues Alves. Assumiu o vice, que permaneceu
até 28 de setembro de 1906.
112
Municipal autorizaria a emissão de um empréstimo de 100:000$000
38
para a
aquisição dos terrenos para a construção das estações de Blumenau, Indaial e
Aquidaban e para outras desapropriações. Segundo Silva (1969, p. 87), a Resolução
nº 29, de 24 de novembro, determinava que a Câmara quitasse a metade das
despesas das desapropriações necessárias. O senhor Alwin Schrader, também
membro da ACIB e prefeito na época, deixa registrada, no Relatório do
Superintendente Municipal, a afirmativa de que no dia 11 de outubro de 1904 a
Câmara autorizou, sim, um empréstimo para a compra de terrenos para duas
estações e para desapropriações. Porém esse fato não se materializou, e no dia 14
de novembro de 1905 a Câmara foi obrigada a quitar a metade da conta com as
desapropriações dentro do município de Blumenau. Interessante foi a conclusão do
Sr. Schrader, afirmando que as duas resoluções somente aconteceram porque as
lideranças políticas locais teriam assumido tais compromissos para que esta ação
tranqüilizasse e atraísse efetivamente os empreendedores alemães para
construírem a ferrovia no Vale do Itajaí.
A Câmara, a 11 de outubro de 1904 autorizou um empréstimo para a
compra de terrenos para duas estações e para desapropriações. Isso não
foi concretizado, visto como a 14 de novembro de 1905 a Câmara se
obrigou a pagar a metade das despesas com as desapropriações dentro do
território do Município. Ambas as resoluções foram feitas para, também,
provar aos capitalistas acionistas da Companhia como que a Câmara estava
disposta a auxiliar o empreendimento dentro das suas possibilidades.
Palavras de Alwin Schrader. (SILVA, 1969, p. 89).
Em janeiro de 1906 Von Skinner vendeu, então, a concessão para a
construção da EFSC à Colonizadora Hanseática. Em fevereiro desse mesmo ano, a
Colonizadora passou a concessão a Eisenbahn Santa Catharina A.G. (Sociedade
Anônima Estrada de Ferro Santa Catarina). A sociedade foi constituída em Berlim,
com base em uma cooperativa de empresas e bancos alemães sediados nessa
cidade: a própria Colonizadora Hanseática, empresas de navegação, Banco Alemão,
por outros bancos menores e por pequenos investidores. Em Blumenau fez parte
desse grupo, entre outros, o comerciante, político e representante da ACIB, Cel.
38
100 contos de réis = 100 Mil-réis ou 100:000$000 Rs (6 milhões de réis)
Câmbio (1907) = US$ 0,31 / 1$000 Rs.
1 conto de réis = 310,07 US$
100 contos de réis equivalem a 31.007,00 US$
Fonte: http://www.ocaixa.com.br/bancodedados/dolaranualmedio.htm
113
Pedro Christiano Feddersen
39
.
As esperanças de restabelecimento da situação financeira continuavam
assentadas na construção da estrada de ferro projetada, mas ainda o
iniciada, e que ligasse Blumenau, atravessando todo o Município, com a
região serrana. Esse Projeto tinha uma longa história: em 1904, chegara
aqui um perito representando um grupo de interessados, o engenheiro Von
Skinner, para sondar o ambiente e proceder aos estudos. Foi bem- sucedido
e conseguiu do Governo do Estado uma concessão em seu nome, que ele
ofereceu à venda aos comitentes. Viu-se a Sociedade Colonizadora
Hanseática obrigada a comprar a concessão, de posse da qual mandou os
estudos. Novamente foram mandados dois técnicos, o assessor Dr. Ortwein
e o arquiteto do governo, Paul, para examinarem os trabalhos de Skinner.
De acordo com o parecer dos mesmos, organizou-se a Companhia Estrada
de Ferro Santa Catarina da qual, mais tarde, se veio a saber ser a mesma
sociedade de estudos de pequeno capital. (SCHRADER, Relatório do
Superintendente Municipal).
Silva (1969, p. 88), diz que em 1906 a Companhia Colonizadora Hanseática
teve que pagar ao Tesouro do Estado de Santa Catarina, em Florianópolis, a quantia
de 15:000$000
40
em selos, para oficializar o contrato. Fez o pagamento para
assegurar o empreendimento e iniciar em breve os trabalhos de execução, não
esquecendo que a primeira concessão dada a Friederico Von Ockel fora revogada
pelo governo. A Colonizadora Hanseática, então, exigiu do governo federal brasileiro
garantia de juros, não sendo atendida nesse momento. Terminando os estudos e
projetos, fechou seu escritório na região.
Mais tarde, a Bremen Loyd
41
enviou o procurador Föhr para fazer um
relatório sobre os potenciais econômicos da região, especialmente os da Colônia
Hammonia. Em seguida, o senhor Föhr foi à capital do Brasil, na época o Rio de
Janeiro, para obter garantias do governo federal de que a colonização seria
subvencionada
42
. Com esta ação, o procurador buscava proteger igualmente os
interesses da estrada de ferro e a segurança nos negócios e transações comerciais.
Nesse ínterim, o governo do Estado de Santa Catarina prorrogou a concessão até o
39
Com os poucos imigrantes vindos nesse ano de 1879, chega também, como colono, Pedro
Christiano Feddersen, que, mais tarde, teve atuação destacada na vida político-administrativo e social
de Blumenau, e cujo nome aparece com freqüência nas páginas do fasto desta Comuna. (SILVA,
1972, p.104). Sr. Feddersen, na época do início da construção da EFSC era, além de forte
comerciante, o deputado estadual que intermediou toda a tramitação oficial e política da obra.
40
15 contos de réis = 15.000 Mil-réis ou 15:000$000 Rs (15 milhões de réis)
Câmbio (1906) = US$ 0,33 / 1$000 Rs.
1 contos = 330,03 US$
15 contos de réis equivalem a 4.959,45 US$
Fonte: http://www.ocaixa.com.br/bancodedados/dolaranualmedio.htm.
41
Nome de uma companhia de navegação de Bremen.
42
A Companhia Colonizadora Hanseática havia recebido, também, a concessão das terras do Vale
do Braço Oeste.
114
dia 27 de janeiro de 1907, ainda que, em 19 de janeiro de 1906, por meio do
consulado alemão em Florianópolis, a construção da Estrada de Ferro Santa
Catarina fosse um fato concreto e seus trabalhos tivessem iniciado em 2 de
dezembro desse ano
43
. Também nesse ano de 1906, no Rio de Janeiro, o
Congresso aprovou uma verba de 6:000$000
44
para a colonização da região, valor
incluído no orçamento da União para o ano de 1907.
4.3.1.1 Exigências da S.A. Estrada de Ferro Santa Catarina
O diretor da S.A. Santa Catarina, Dr. Góes, chegou a Blumenau em maio de
1907 e fez novas exigências à Administração Municipal de Blumenau para efetuar a
construção da EFSC, sob o argumento de que as condições outorgadas aos
empreendedores, anteriormente, eram insuficientes. Entre suas exigências,
encontravam-se:
a) um auxílio fixo de 100:000$000
45
para desapropriações;
b) isenção de impostos municipais;
c) construção e conservação, pela administração pública por intermédio da
Câmara, das vias de acesso aos pontos de paradas dos trens;
d) garantia de juros para um capital de 2.000:000$000.
46
Os interesses econômicos locais, muito grandes, e o desejo, de longa data,
da construção da ferrovia fizeram com que as lideranças locais aceitassem
prontamente as exigências feitas à municipalidade pela S.A. Estrada de Ferro Santa
Catarina. Quanto ao quarto quesito, de acordo com Silva (1969, p. 89), após muitas
negociações, as lideranças locais ponderaram um pouco e apresentaram a seguinte
43
De acordo com Dagnoni (2006, p. 09).
44
6.000 contos de réis = 6.000 mil-réis ou 6.000:000$000 Rs (6 milhões de réis)
Câmbio (1907) = US$ 0,31 / 1$000 Rs.
1 conto de réis = 310,07 US$
6.000 contos de réis equivalem a 1.860.465,11US$
Fonte: http://www.ocaixa.com.br/bancodedados/dolaranualmedio.htm 14 dez – 15h54.
45
100 contos de réis = 100 Mil-réis ou 100:000$000 Rs (6 milhões de réis)
Câmbio (1907) = US$ 0,31 / 1$000 Rs.
1 conto de réis = 310,07 US$
100 contos de réis equivalem a 31.007,00 US$
Fonte: http://www.ocaixa.com.br/bancodedados/dolaranualmedio.htm.
46
2.000 contos de réis = 2.000 Mil-réis ou 2.000:000$000 Rs (2 milhões de réis)
Câmbio (1907) = US$ 0,31 / 1$000 Rs.
1 conto de réis = 310,07 US$
2.000 contos de réis equivalem a 620.140,00 US$
Fonte: http://www.ocaixa.com.br/bancodedados/dolaranualmedio.htm.
115
contraproposta: a S.A. Estrada de Ferro Santa Catarina receberia 1% de juro anual
sobre o capital de 1.400:000$000 durante o período de 25 anos, enquanto os
dividendos distribuídos não fossem maiores de 5%. Dr. Goes não concordou com a
contraproposta, argumentando que o valor seria insuficiente para atrair capitais dos
bancos interessados em investir na Associação. Sem muita saída, as lideranças
aceitaram as imposições feitas pelo diretor da S.A. Estrada de Ferro Santa Catarina.
Ele partiu da região no dia 5 de julho de 1907 em meio a homenagens e garantindo,
finalmente, a construção da EFSC. Antes de partir, indicou o engenheiro Musika
para o cargo de engenheiro-chefe.
Sexta feira, 5 de julho de 1907, o Dr. Góes, encarregado da supervisão da
Construção da Estrada de Ferro, despediu-se, numa reunião de amigos
realizada no Hotel Holetz, de seus colaboradores e amigos de Blumenau,
tendo comparecido as autoridades locais, engenheiros e funcionários da
Estrada de Ferro e amigos do engenheiro. Em seu discurso de despedida,
disse o Sr.Dr. Góes que durante os meses em que teve a felicidade de estar
em Blumenau, teve oportunidade de melhor conhecer a sua gente, o que
lhe servirá muito quando vier assumir o cargo de Diretor da Estrada de
Ferro Santa Catarina. Agradeceu a acolhida que teve e afirmou que a
construção da Estrada de Ferro estava garantida. Disse que o alemão
(referindo-se às empresas financiadoras da Alemanha) demora em tomar
uma decisão definitiva, porém, tomada esta, a execução se segue de
imediato e sem vacilação. Em nome do Superintendente falou o deputado
Pedro Christiano Feddersen, expressando sua satisfação por saber que
todos os empecilhos estavam vencidos e que Blumenau terá em breve a tão
desejada e necessária estrada de Ferro. Para o cargo de engenheiro-chefe
foi nomeado o Sr. Musika, que nos próximos dias embarcaria na Alemanha
para o Brasil. (Blumenau em Cadernos Tomo XXII n.4, maio de 1981, p.
98).
O governo federal isentou a S.A. Estrada de Ferro Santa Catarina dos
impostos alfandegários sobre a entrada do material importado, finalmente podendo
ser iniciada a construção da EFSC no Vale do Itajaí.
A Sociedade Anônima Estrada de Ferro Santa Catarina iniciou os trabalhos
em 2 de dezembro de 1906, contratando a firma Hermann Bachstein & Arthur
Koppel, de Berlim. Seus engenheiros chegaram ao Vale do Itajaí em 2007.
Sábado chegaram os engenheiros, senhores Meyer e Schwingt, que, como
soubemos, farão os pré-estudos para a continuação da estrada de ferro
para Curitibanos e Rio Negro. Para Florianópolis seguiram o diretor Gehr,
da Cia. Hanseática e o engenheiro-chefe Dr. Kroeber e família. Os senhores
igualmente fizeram o estudo da barra de Itajaí e pronunciaram-se
favoravelmente. Mesmo nas atuais condições é possível despachar o
material para a ferrovia diretamente para Itajaí, como constatou o diretor do
Morddentscher Loyd, que estava presente aos estudos. Com a construção
da ferrovia que agora vai começar em breve, caminhamos a passos largos
para uma nova era. (BLUMENAU EM CADERNOS, 1988, p. 249).
116
Os estudos e projetos foram dirigidos pelo engenheiro-chefe Rudolf
Kroeber
47
. Kroeber faleceu algumas semanas depois, permanecendo na
coordenação dos trabalhos o engenheiro Muzika, que chegou a Blumenau em
agosto de 1907. Faziam parte da equipe, ainda, o Sr. Otto Rodkol, como diretor
comercial; o Sr. Phoetig, como tesoureiro e guarda-livros; engenheiros da sessão,
Mayer, Schwingt, Weitmann e Knappe.
Na sexta feira ocorreu a triste notícia pela cidade, que o engenheiro-chefe
da ferrovia Blumenau-Hammonia, senhor Dr. Rudolf Kroeber, havia falecido.
Chegado a esta cidade somente algumas semanas, sentiu uma
indisposição alguns dias passados, e que se agravou rapidamente no
hospital; os médicos viram-se impossibilitados de operá-lo, devido a seu
estado geral. Todos que o conheceram ou tiveram oportunidade de
conhecê-lo melhor lamentaram a sua perda, pois reconheceram nele um
verdadeiro cavalheiro. A firma Arthur Koppel, de Berlim, perde com ele um
excelente funcionário e amigo. Dr. Rudolf Kroeber, engenheiro-chefe da
ferrovia Blumenau-Hammonia era Tenente-Coronel da Reserva do Batalhão
Ferroviário imperial da Baviera. Engenheiro-Chefe da Arthur Koppel AG, de
Berlim. O nome da esposa era Louse Kroeber, que poucas semanas mais
tarde regressou à Alemanha [...] Na próxima semana deve chegar o
engenheiro-chefe senhor Muzika, que deve substituir o falecido Dr. Kroeber;
em sua companhia virão dois contadores da firma Arthur Koopel, de Berlim.
(BLUMENAU EM CADERNOS, 1988, p. 250).
Figura 52 - Equipe de Execução e Projeto da EFSC - 1907
Fonte: HENKELS.
47
Kroeber, engenheiro-chefe da ferrovia Blumenau-Hammonia por pouco tempo, era Tenente-
Coronel da Reserva do Batalhão Ferroviário imperial da Baviera e engenheiro-chefe da firma Arthur
Koppel AG, de Berlim.
117
De acordo com o jornal Blumenauer Zeitung do dia 6 de julho de 1907, Ano
26, Dr. Goes recebeu um telegrama de Berlim, contendo a confirmação definitiva da
ferrovia no Vale do Itajaí.
Como conhecido, havia sido liberado um capital de milhões, mas a
construção exige mais 7 milhões, o que agora foi garantido, porque os
capitalistas alemães concordaram em ceder o capital restante. Para o
diretor comercial da ferrovia, chegou o senhor Von Drygalski, e por parte do
governo, foi nomeado o engenheiro Oscar Castilhos, atualmente chefe da
medição de terras em Brusque, cujo trabalho é a fiscalização da ferrovia.
(Blumenauer Zeitung, Ano 26, n. , sábado, 20 de abril de 1907,
Fokalnachrichten. BLUMENAU EM CADERNOS, 1988, p. 250).
Em julho de 1907 chegou a Blumenau o Dr. Oscar Castilhos, até então
Chefe do Departamento de Terras em Brusque, para ocupar o cargo de fiscal do
governo na construção da EFSC
48
, e as obras da ferrovia tiveram início no dia de
janeiro de 1908.
A vida no município criou novo alento com os trabalhos da construção. As
previsões feitas de que pelo menos um trecho da Estrada de Ferro
estivesse funcionando, não se concretizaram. Entretanto, os trabalhos,
prosseguiam em ritmo acelerado, fazendo prever que, no próximo ano, todo
o trecho entre Blumenau e Hansa poderia ser inaugurado, se motivos de
força maior não interferissem. (SILVA, 1969, p. 89).
Ainda conforme o jornal de circulação local Blumenauer Zeitung, do dia 24
de agosto de 1907, o Dr. Muzika comunicou a este veículo que a Companhia
Ferroviária Santa Catarina S.A. passara a construção do trecho Blumenau-
Hammonia para o consórcio Ferroviário Hermann Bachstein-Arthur Koppel AG, de
Berlim, e não mais, como havia sido divulgado, somente para Arthur Koppel. O jornal
menciona, também, que o governo havia fornecido isenção a esse consórcio sobre
os produtos desembarcados no porto, oriundos da Alemanha.
Após todas as negociações com a cooperativa que viabilizaria a construção
ferroviária e acertos em relação a valores, é válido registrar que toda essa
movimentação inspirou a criação do primeiro banco do Estado de Santa Catarina e
de Blumenau, que se chamou Caixa Econômica de Empréstimos.
Em folheto anexo ao jornal, saiu publicado o Estado do sindicato Agrícola
de Blumenau, que tem por fim defender e representar os interesses dos
agricultores e fundar, filiada ao mesmo, uma caixa econômica. Os referidos
estatutos foram elaborados nos moldes do “sindicato Agrícola Joinvillense”,
(URWALDSBOTE, 1907, p. 130).
48
Blumenau em Cadernos, Tomo XXII, n.4, maio de 1981, p. 130.
118
4.3.1.2 A Caixa Econômica de Empréstimos
A Caixa Econômica de Empréstimos primeira instituição bancária no
Estado de Santa Catarina havia surgido (aparentemente) para guardar o capital
excedente da produção dos colonos organizados sob o Sindicato Agrícola de
Blumenau, que o faziam, até então, nas “Vendas”, conhecidas casas comerciais.
Além da exploração mercantil, os comerciantes absorviam a poupança local,
os depósitos dos habitantes, sendo conhecida a inexistência de bancos. As
pessoas em situação financeira mais cômoda e em condições de poupar
depositavam o dinheiro em algumas casas comerciais, que subtraiam certa
taxa de juros pelo dinheiro guardado. Entretanto, este dinheiro disperso,
recolhido e acumulado não sendo suficiente para impulsionar o processo
industrial, foi necessário a exploração dos trabalhadores, ou seja, no lugar
de um salário como forma de pagamento pelo trabalho, muito
freqüentemente, os trabalhadores percebiam a importância correspondente
a seu trabalho em forma de mercadorias, provenientes da casa de comércio
pertencente ao patrão.
[...] a utilização do capital local acumulado e a exploração da força de
trabalho não sendo ainda suficientes, os empresários precisam solicitar
empréstimos aos bancos alemães e brasileiros. E, neste aspecto a busca
de capitais, de tecnologias e outros recursos os empresários locais
sempre se mantiveram ligados à Alemanha. (VIDOR, 1995 p. 51)
Historicamente, em de setembro os sócios do Volksverein (Sociedade
Popular) aprovaram a fundação de um sindicato agrícola, com o objetivo principal de
criar uma Caixa Econômica de Empréstimos, oficializada no dia 27 de outubro de
1907. O fato foi propagado por meio de um folheto anexado ao jornal Urwaldsbote,
de agosto de 1907, anunciando o evento. Essa Caixa Econômica iniciou seus
trabalhos em janeiro de 1908.
É curioso que essa instituição financeira propagava ao seu público-alvo, os
colonos, as vantagens e a necessidade de poupar, sob o argumento de ser uma
sociedade popular, embora tivesse sido fundada por um grupo de pessoas entre as
quais representantes da ACIB, que, por sua vez, estavam envolvidos com a
construção da EFSC e precisavam de capital para viabilizá-la. De acordo com
Santiago (2001, p. 48), a iniciativa foi liderada por Bruno Hering
49
, Alwin Scharader
50
e Eugen Fouquet (jornalista), João Hennings (trabalhava na Fecularia Lorenz),
Guilherme Weise, Otto Hildelmeyer (professor de ginástica).
49
Industrial, sócio-fundador e assessor da ACIB, de acordo com a Ata de Fundação da Associação,
em 5 de novembro de 1901.
50
Comerciante membro da ACIB e prefeito de Blumenau Gestão 1903 a 1914 (período em que se
desenvolvem as principais tramitações do processo de implantação e construção dos primeiros
trechos da EFSC).
119
De acordo com a publicação da revista Blumenau em Cadernos tomo XXII
4, no mês de junho de 1908 houve uma movimentação de 18:741$000
51
de
depósitos e 863$430
52
de retiradas. Em maio, foram depositados 16:416$420 e
retirados 50$430, e em abril foram depositados 11:416$850 e retirados 277$250. O
total de depósitos até 30 de junho atingiu o valor de 94:462$700, em um total de 347
cadernetas de poupança.
Empolgado com o sucesso da Caixa Econômica de Empréstimos, o
comerciante membro da ACIB e prefeito de Blumenau, Alwin Schrader, passou
também a gerenciar a Caixa Auxiliadora Agrícola Ltda., que aceitava depósitos para
poupança a partir de três mil réis, pagando 4% ao ano de juros. De acordo com
Santiago (2001, p. 51), a atividade financeira passou a fazer parte do cotidiano de
Blumenau.
A construção da EFSC “fez” surgir a captação de capital junto à base da
estrutura social da região, que era formada principalmente de colonos.
4.3.2 Primeiras locomotivas
O navio Koblenz” ancorou no porto de Itajaí, trazendo grande quantidade
de material para a ferrovia. Inclusive chegou, com o mesmo navio, a
primeira locomotiva que já se encontra em Blumenau. O material depositado
em Itajaí é tão grande que dificilmente tudo será transportado para
Blumenau até o fim do ano.
Na sexta feira passada, dia 8 de setembro, foi feita a primeira experiência
com a locomotiva na Itoupava Seca. (Blumenauer Zeitung, Ano 26, sábado,
20 de abril de 1907, Fokalnachrichten. BLUMENAU EM CADERNOS, Tomo
XXIX, agosto de 1988, n.8, p. 250).
Ao mesmo tempo em que os trabalhos fluíam no leito em que seria
construída a futura ferrovia, chegava ao porto de Itajaí, no dia 27 de outubro de
1907, o vapor Klobenz, do Norddentscher Lloyd-Bremmen, para descarregar 800
toneladas de material para a Estrada de Ferro Santa Catarina
53
. Tratava-se dos seus
51
100 contos de réis = 100 Mil-réis ou 100:000$000 Rs (6 milhões de réis)
Câmbio (1907) = US$ 0,31 / 1$000 Rs.
1 conto de réis = 310,07 US$
18,741contos de réis equivalem a 5.811,02 US$
Fonte: http://www.ocaixa.com.br/bancodedados/dolaranualmedio.htm.
52
100 contos de réis = 100 Mil-réis ou 100:000$000 Rs (6 milhões de réis)
Câmbio (1907) = US$ 0,31 / 1$000 Rs.
1 conto de réis = 310,07 US$
0,863430 contos de réis equivale a 267,72 US$
Fonte: http://www.ocaixa.com.br/bancodedados/dolaranualmedio.htm.
53
Jornal Blumenauer Zeitung, Nº. 45 de 9 de novembro de 1907.
120
primeiros trilhos, que chegavam ao porto de Itajaí e de lá foram transportados
posteriormente, pelo rio, para Blumenau, para o porto fluvial de Itoupava Seca.
Juntamente com este material chegou a primeira locomotiva
54
, conhecida como
Macuca (0-6-0T). A Macuca foi fabricada por Grenstein & Koppel, de Berlim.
Batizaram-na, carinhosamente, com o nome de Macuca por lembrar um ssaro da
fauna local, o macuco.
A pequena grande Macuca foi muito importante na construção dos primeiros
quilômetros da Ferrovia Santa Catarina, pois puxava a composição que
transportava os trilhos para o avanço do leito ferroviário, que aconteceu
durante todo o ano de 1908. Atualmente, encontra-se exposta, de maneira
pouco recomendável para a sua boa preservação, nos jardins do prédio da
Prefeitura Municipal de Blumenau. A ABPF (Associação Brasileira de
Preservação Ferroviária) lamenta, pela importância que representa esta
locomotiva para a história ferroviária na região, que ela não tenha um
tratamento melhor e um espaço digno de sua glória. Uma das metas desta
Associação é resgatá-la e colocá-la em funcionamento em um pequeno
trecho de ferrovia, para visitação pública e, com isto, conseguir o resgate da
memória. (WITTMANN, 2001 p. 54).
No dia 8 de setembro de 1907 foram realizados os primeiros testes com a
nova locomotiva sobre trilhos
55
, em Itoupava Seca, na época bairro de Altona, e
durante todo o ano de 1908 ela transportou material no processo de construção e
assentamento do leito ferroviário da EFSC. Segundo Luiz Carlos Henkels
56
, a
locomotiva Macuca transportava o material ferroviário também com o auxílio de
mulas de carga e do trabalho braçal de inúmeros funcionários da EFSC. O início da
obra ferroviária aconteceu com a construção do trecho que ligava Itoupava Seca em
direção à sede da Colônia Blumenau, imediações da foz do ribeirão da Velha e, em
seguida, com a construção do trecho entre Itoupava Seca em direção a Indaial.
Segundo Blumenau em Cadernos, tomo XXI, agosto de 1981, nº 8, foi no dia 3 de
novembro que a primeira locomotiva atravessou o ribeirão da Velha sobre a ponte
recém-construída, fazendo o trajeto até Itoupava Seca.
54
Luiz Carlos Henkels está desenvolvendo uma pesquisa sobre as duas máquinas que vieram
posteriormente à chegada desta primeira carga de material e da Macuca, pois, segundo ele, a
Macuca foi construída no ano de 1908 e não poderia ter feito estes testes em 1907.
55
Jornal Blumenauer Zeitung, N° 52, de 28 de dezembro de 1907.
56
Idealizador do resgate da memória da EFSC e fundador do Núcleo da ABPF do Vale do Itajaí, em
1995.
121
Figura 53 - Locomotiva Macuca, 1908, passando escoteira sobre trilhos recém colocados em
Encano
Fonte: Acervo Arquivo ABPF.
Figura 54 - Locomotiva Macuca, 1908, transportando estrutura metálica da ponte n. 6 de
Encano.
Fonte: SILVA, [1972?]. (Foto original).
A atual locomotiva número 1.0-6-0T construída por Orenstein & Koppel
Alemanha, exposta na Praça Victor Konder, auxiliou na construção do
122
trecho de Blumenau a Hansa. Foi, por muitos anos, usada como manobreira
entre Itoupava Seca e Blumenau. (BERNER, 1969, p. 91).
O jornal Blumenauer Zeitung, Ano 27, de fevereiro de 1908 relata que
além do navio “Mainz”, que trouxe material também para a ferrovia, outro veleiro o
fez. O navio “Mainz” trouxe duas lanchas leves e um lanchão.
No final de 1908 chegaram outras duas locomotivas maiores, rodagem 0-6-
4T, fabricadas pela BORSIG, igualmente de Berlim. Uma dessas locomotivas puxou
o trem que fez a primeira viagem entre Blumenau e Warnow, em 1909.
Figura 55 - Locomotiva Macuca - 2007
Fotografia: WITTMANN.
O mesmo objeto inserido em uma mesma paisagem, porém em períodos,
expectativas e usos diferentes. No início do século XX, a primeira locomotiva, a
Macuca, foi sinônimo de tecnologia de vanguarda, modernidade e velocidade. No
início do culo XXI, é um monumento, objeto inerte, exposto na praça em frente ao
local em que está a representação máxima da administração pública local.
O jornal de circulação local Blumenauer Zeitung noticiava com regularidade
o processo de construção da EFSC, no início do culo XX. A seguir, citações de
suas páginas, publicadas na revista Blumenau em Cadernos:
123
O engenheiro Micke, como Novidade pública”, iniciou o trabalho de
nivelação em Itajaí para constatar a diferença do nível de água entre Itajaí e
Blumenau. Por esta ocasião, foi afixado em frente à residência do senhor
Abry, um nivelador de água que marcará o nível das marés.
Na semana passada, esteve nesta cidade o inspetor Menzel, da Companhia
de Navegação Hambur-Südamerika, para saber se os navios que
transportam o material para a ferrovia podem ancorar em Itajaí.
[...]
O navio “Desterro“ deixou a 16 de agosto o porto de Hamburgo com
material técnico e outro material destinado para a construção da via férrea,
e deve aportar em Itajaí por volta do dia 20 de setembro.
[...]
Nestes dias aportou em nosso porto o primeiro navio vindo da Europa, com
material para a ferrovia. O navio “Desterro” chegou e ancorou sem qualquer
problema, trouxe 201 toneladas de material de ferro e já partiu em direção
ao Rio grande do Sul. Os próximos dois navios anunciados são “Karthago” e
o “Koblenz”. O primeiro chegará a 10 de outubro e o segundo, a 30 de
outubro. O Karthago deverá trazer, ainda de reboque, dois lanchões para o
transporte mais rápido do material para Blumenau.
[...]
Estes próximos dias deverão chegar com um navio da linha Bremen Loyd,
vindo de Buenos Ayres, alguns lanchões destinados ao transporte do
material ferroviário armazenado em Itajaí.
[...]
Finalmente chegou o lanchão Santa Catarina” para o transporte de
material, assim os nossos dois motores ficarão mais aliviados com a pesada
carga. O navio “Mainz” aportou em Itajaí com mais material valioso e ainda
grande quantidade de mercadorias destinadas à cidade de Blumenau.
[...]
Soubemos que a construção da ferrovia não sofrerá mais nenhum atraso; os
capitais necessários foram levantados na Alemanha. O navio “Guayba”
deverá aportar com mais material nos próximos dias, em Itajaí. estão
armazenados, no porto de Itajaí, trilhos para cerca de 70 km.
[...]
Como nos foi comunicado pela direção da Cia. Ferroviária, a inauguração
do trecho Blumenau-Warnow deve acontecer em 3 de maio, dia do
descobrimento do Brasil. A tarifa estabelecida pela Cia. foi aprovada e a
fiscalização final deve ocorrer no fim do mês, assim nada mais impedirá a
inauguração. (Blumenau em Cadernos, Tomo XXIX, Agosto de 1988, n.8, p.
250).
4.3.3 Primeiro trecho ferroviário Blumenau a Warnow
Em 1909 as pontas dos trilhos alcançavam a estação de Hansa, quando
estava na direção da empresa o depois Cônsul, Otto Rohkhl. Este
empreendimento teve ampla ajuda da superintendência Municipal
57
. Esta,
para fazer face aos compromissos assumidos, relativos a garantias de juros,
etc., teve de levantar empréstimo interno, em apólices resgatáveis a curto
prazo. (SILVA, 1972, p. 153).
No final de 1908 os trilhos chegaram a Indaial, bem como mais duas
locomotivas, maiores que a Macuca, para a EFSC. As locomotivas eram do tipo 0-6-
57
O superintendente era o Sr. Alwin Schrader.
124
4T, de fabricação Borsig, de Berlim, e uma delas puxou o trem inaugural no ano
seguinte.
O primeiro trecho da ferrovia a ser colocado em funcionamento ligava o
Stadplatz da Colônia Blumenau e o núcleo de Warnow (Indaial).
A direção da Companhia Estrada de Ferro Santa Catarina, deliberadamente,
escolheu o dia 3 de maio de 1909 para a inauguração deste primeiro trecho, para
coincidir com a data de aniversário do descobrimento do Brasil (na época era 3 de
maio), lembrado posteriormente nos discursos das autoridades presentes ao evento.
Figura 56 - Primeiro trecho da EFSC inaugurado no dia 3 de maio de 1909, Blumenau a Warnow
Fonte: GOOGLE EARTH, 2006 - Alterado por WITTMANN.
As três pontes maiores no trecho entre Itoupava Seca e Indaial, isto é, as
sobre o ribeirão Stutzer em Salto Weissbach, a de Passo Manso e Ribeirão
Encano, em cujas cabeceiras foram aplicados blocos de granito do tamanho
de até um metro cúbico para o fundamento. Os trilhos da Estrada de Ferro
foram colocados até a estação de Salto Weissbach. A estrada de
rodagem, porém, nos trechos desviados pela empreza (sic) construtora ou
paralelos aos trilhos, encontrava-se em estado lastimável e em épocas de
chuva intransitável, mormente nas imediações do Salto.nos Os colonos que
precisam ir à cidade de carroça e não querem ver suas carroças quebradas
no atoleiro e os correames arrebentados, preferem dar a volta pela Velha.
(BLUMENAU EM CADERNOS, Tomo XII, n.4, maio de 1981, p. 135).
No dia da inauguração oficial, de acordo com a narrativa de Silva (1969),
havia um grande blico presente, sendo que, deste, aproximadamente 200
pessoas eram convidados que estavam hospedados em Blumenau para a data. Vale
125
destacar que entre as autoridades estavam somente pessoas relacionadas à
construção e lideranças políticas e empresariais da região, sem a presença de
alguma autoridade de Florianópolis, exceto a do Deputado Cel. Feddersen, que
residia em Blumenau. Entre as autoridades presentes merecem destaque os nomes
do Cel. Crispim Ferreira, comandante e oficial do 55º. Batalhão de Caçadores; do
Engenheiro Scheffler, representante da sociedade construtora; do Cel. Pedro
Christiano Feddersen, representante do governo do Estado; e o do engenheiro
Muzika, engenheiro-chefe. Todo o pátio da estação de Blumenau foi tomado por
pessoas da comunidade que testemunharam o evento, e grande parte delas estava
no trem da viagem inaugural entre a sede da Colônia Blumenau e Warnow.
Pelas oito e meia da manhã, a locomotiva dessa composição, soltando
largos rolos de fumo e estridentes apitos, apareceu transpondo a ponte do
“Velha”, toda ornamentada de palmas, flores, bandeiras e escudos do Brasil
e da Alemanha, vinda da estação de Itoupava Seca, onde ficavam a oficina
e os abrigos de carros e máquinas.
A banda de música do 55º Batalhão, gentilmente cedida pelo seu
comandante, à chegada dos convidados executava peças de seu repertório,
provocando admiração e aplausos gerais. (SILVA, 1969, p. 85).
Silva (1969, p.85), descreveu que, às 8 horas e 30 minutos da manhã do dia
3 de maio de 1909, uma das duas locomotivas que chegara a Blumenau após a
Macuca surgiu na ponte do ribeirão da Velha, sob festivos apitos. Ela estava
ornamentada com palmas, flores, bandeiras e escudos do Brasil e da Alemanha, e
veio até a estação principal de Blumenau das oficinas localizadas na Itoupava Seca,
onde, atualmente, se situa o Campus II da FURB.
126
Figura 57 - Trajeto entre as oficinas da EFSC e a Estação de Blumenau
Fonte: GOOGLE MAPS, 2006 – Alterado por WITTMANN.
O engenheiro Scheffler, o Cel. Feddersen e o engenheiro Muzika subiram à
plataforma do primeiro carro de passageiros, de onde o engenheiro Scheffler
discursou para todos, enaltecendo a importância da inauguração do primeiro trecho
ferroviária da EFSC. Mencionou, na ocasião, as inúmeras tentativas e projetos de se
implantar uma ferrovia do Vale do Itajaí. Abaixo, parte do discurso de Scheffer:
Referiu-se ainda o orador aos vários projetos que haviam sido elaborados e
abandonados e aos esforços que, por mais de 25 anos, vinham fazendo as
autoridades e o povo de Blumenau no sentido de concretizar uma das
maiores aspirações. Fez, por fim, votos para que os 30 quilômetros de
estrada que iam ser inaugurados servissem de fundamento para uma
grande ferrovia que, partindo do porto de Itajaí, fosse até as fronteiras com a
Argentina e o Paraguai. (SILVA, 1969, p. 85).
127
Figura 58 - Estação de Blumenau. Estilo arquitetônico seguindo a técnica em enxaimel
Fonte: GERODETTI; CORNEJO, 2005.
Após o discurso do representante da sociedade construtora da EFSC, o
representante do governo estadual, Cel. Pedro Christiano Feddersen, cortou a fita
inaugural, declarando aberto o tráfego do trecho entre a sede de Blumenau e
Warnow, em Indaial. A seguir, de acordo com a narrativa de Silva (1969, p. 85),
convidados e populares lotaram, não somente os três carros previstos no trem, como
também vários outros extras, que foram acoplados, nos quais haviam sido colocados
cadeiras e bancos para atender ao maior número possível de pessoas que
desejassem participar da primeira viagem de trem na EFSC.
O trem rumou à estação de Itoupava Seca, onde foi recebido, igualmente,
por grande festa popular, e assim se sucedeu em todas as demais estações,
58
até o
final do trecho inaugurado na localidade de Warnow, na extensão de 30 quilômetros.
Todas as estações estavam festivamente adornadas de palmas e
bandeiras. À chegada do trem, espocavam nos ares centenas de foguetes
e, em alguns lugares, conjuntos musicais faziam-se ouvir. A banda do 55º,
que também seguira num dos vagões, tocava lindas marchas e dobrados,
arrancando aplausos e admiração dos colonos reunidos ao longo da linha,
coisa que, muitos deles, nunca haviam visto nem ouvido. (SILVA, 1969, p.
85).
58
Estação Salto Weissbach, Passo Manso, Encano, Indaial.
128
Figura 59 - Chegada do trem à estação de Warnow no dia 3 de Maio de 1909
Fonte: HENKELS, [195?].
Em Warnow, o trem foi recebido não diferentemente das outras estações
do trajeto com muita festa. As crianças de todas as escolas estavam agrupadas
em frente à estação, ouvindo-se o som de foguetes e acordes musicais. Muitas
pessoas apreciavam o evento na estação e ao longo da linha férrea.
Nessa estação, ponto terminal do trecho inaugurado, desceram os
convidados, que foram saudados, com alguns cantos e recitativos, pelos
alunos da escola regida pelo professor Hoffmann, depois do que o Sr.
Leopoldo Hoeschel fez uso da palavra, para enaltecer os esforços do Cel.
Pedro Feddersen em prol da construção da ferrovia e do engenheiro
Muzika, que também foi incansável. (SILVA, 1969, p. 85).
Todos os convidados desembarcaram na estação de Warnow, que estava
com seu ambiente externo montado e ampliado com a ajuda de um toldo, sob o qual
foi servido um coquetel com sanduíches, cucas, bolos e bebidas. No interior da
estação um coquetel foi igualmente servido, reservadamente, ao Cel. Crispim
Ferreira e seus oficiais, ao Cel. Feddersen, ao vice-cônsul alemão Landmann e a
outros convidados, entre os quais engenheiros da sociedade construtora, banqueiros
e empresários locais.
O Cel. Feddersen usou da palavra para saudar o Exército Brasileiro na
pessoa de seus representantes e fez votos para que a amizade e as boas
relações entre o Brasil e Alemanha prosseguissem se estreitando cada vez
mais, para o bem e o engrandecimento das duas grandes nações. O Cel.
129
Crispim respondeu, terminando por levantar um “viva!” à Alemanha, que foi
correspondido com entusiasmo, tocando a banda militar uma canção
patriótica alemã. O vice-cônsul levantou um brinde à boa amizade brasileiro-
germânica, ao Brasil e a Blumenau.
Foram ainda encarecidos pelos oradores os esforços da diretoria da
sociedade construtora, dos banqueiros que forneceram os meios
pecuniários necessários, do engenheiro Goes, fiscal do governo, dos
demais engenheiros e empreiteiros. (SILVA, 1969, p. 86).
Figura 60 - Composição da EFSC chegando na estação de Blumenau
59
Fonte: GERODETTI; CORNEJO, 2005.
Os convidados e participantes da primeira viagem inaugural do trem da
EFSC, após a parada na estação, fizeram um passeio em Warnow e visitaram a
residência do Sr. Leopoldo Hoeschel, onde, igualmente, foram servidos doces e
bebidas. Depois, retornaram ao trem e fizeram a viagem de volta à estação de
Blumenau.
Os trens de passageiros e cargas da EFSC começaram a trafegar
regularmente, entre Blumenau e Warnow, no dia 4 de maio de 1909. Partiam da
Estação de Blumenau, na Praça Victor Konder, às 6h30 e chegavam a Warnow às
8h28, retornando às 10h e chegando a Blumenau às 11h58. Faziam o percurso de
59
Década de 20. Esta estação foi demolida em 1960. Em 1954, no quilômetro 47,4, foi inaugurada
uma nova estação. Hoje sua edificação é ocupada por uma clinica veterinária
130
30 quilômetros em duas horas. A passagem de classe custava 3 mil réis (U$
9,30), e 1$800 (U$ 5,58) a de segunda
60
.
Assim, foi inaugurado o primeiro trecho ferroviário da EFSC. As obras
prosseguiam para o interior, sentido oeste, em direção ao núcleo de Subida
(localidade de Aquidaban, atual Apiúna).
4.3.4 Trecho – Warnow e Aquidaban (atual Apiúna)
O tráfego ferroviário entre Blumenau e Warnow continuou a partir de 4 de
maio de 1909. Igualmente continuou a construção da EFSC em direção a Diamante,
núcleo urbano pertencente ao atual município de Ascurra. Este trecho foi inaugurado
em 1º de junho de 1909.
Figura 61 - Trajeto entre Warnow e Aquidaban
Fonte: MAPAS de Santa Catarina - Guia geográfico, 2006 - Alterado por WITTMANN.
A partir da estação de Diamante, precisou-se somente de mais dois dias de
trabalho para a ferrovia chegar à estação central de Ascurra, inaugurada no dia 3 de
60
3 Mil-réis ou 3$000 Rs 3 mil réis)
Câmbio (1909) = US$ 0,31 / 1$000 Rs.
1 conto de réis = 310,07 US$
3 mil réis equivalem a 9,30 US$
Fonte: http://www.ocaixa.com.br/bancodedados/dolaranualmedio.htm.
131
junho de 1909. A ferrovia chegou a Aquidaban (atual Apiúna) no dia de julho de
1909. Esta estação permaneceu como ponto terminal da linha por dez anos; a
extensão ferroviária até ela somava 51 quilômetros.
4.3.5 Trecho - Aquidaban e Hammonia (atual Ibirama)
A construção da ferrovia prosseguiu em direção à Colônia Hammonia (atual
Ibirama) e novos planos surgiram. Nesse momento, cogitou-se a possibilidade de
estender a linha ferroviária também no sentido de Rio do Sul
61
, com o plano de, em
longo prazo, a ferrovia se prolongar no sentido oeste, até a divisa com a Argentina.
Isto a partir de um entroncamento a ser construído na confluência do rio Itajaí com o
Itajaí do Norte, local em que propriamente começa o rio Itajaí-Açu.
Figura 62 - Construção Trecho Subida – Lontras. Contenção do barranco - muro de arrimo feito
com pedras graníticas da região
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
61
A administração Alemã havia elaborado vários projetos de prolongamento da EFSC, um para o
Alto Vale, na intenção de estender a ferrovia até a divisa com a Argentina, um para o porto de Itajaí e
outro ramal para Brusque, cidade em franco desenvolvimento naqueles idos. O projeto de
prolongamento de Hansa aRio Negro, no Paraná, havia sido rechaçado por políticos paranaenses
e riograndenses no Congresso Federal, os quais viam na nossa humilde ferrovia grande concorrente
para a então EFSP-RG (Estrada de Ferro São Paulo Rio Grande), cujo ramal demandava ao Porto
de São Francisco do Sul. Os demais projetos estavam liberados; porém, no período alemão as verbas
brasileiras para tais obras nunca vieram, dado o estado de beligerância que existia a partir de
1914. (Luiz Carlos Henkels).
132
Figura 63 - Trajeto entre Aquidaban e o entroncamento para Hammonia
MAPAS de Santa Catarina - Guia geográfico , 2006 - Alterado por WITTMANN.
Figura 64 - Vista da Ponte dos Arcos – Subida
Fonte GOOGLE EARTH, 2006 - Alterado por WITTMANN.
133
Figura 65 - Construção da ferrovia, trajeto para Hansa-Hammonia, veículos de tração animal
(carroções) em atividade na abertura da ferrovia, feita com pás e picaretas
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
A construção da EFSC seguia no sentido de Hammonia com a certeza de
seu prolongamento para Lontras, localizada na Serra do Mar. Estudos foram
efetuados.
Figura 66 - Detalhe da localização - ramal de Hammonia e da estação da comunidade de Hansa
Fonte: GOOGLE EARTH, 2006 - Alterado por WITTMANN.
134
Nessa região, de serra, foi onde os construtores encontraram maiores
obstáculos naturais. Em Lontras foi construída a estação ferroviária Victor Konder
(Estação de Riachuelo), em homenagem ao Ministro das Obras e Viação,
catarinense.
A ferrovia chegou a Hammonia em 1909, cobrindo uma extensão de 69.300
quilômetros de trilhos, entre Blumenau e sua estação, e foi inaugurada no dia de
outubro de 1909.
Nesta primeira etapa, na qual foram construídos os 69.300 quilômetros
entre a estação principal de Blumenau e Hammonia, a obra foi totalmente custeada
por capital e tecnologia alemã, sendo que a administração estava sediada em
Berlim.
A EFSC, ao ser aberta ao tráfego em de outubro de 1909, nos 69.300
km entre Blumenau e Hansa, promoveu uma mudança radical nas
convivências comunitárias que por estes tempos habitavam e se
instalavam ao longo do Vale do Itajaí. Estas comunidades que se
deslocavam a 5 km/h passaram a partir de então a andar nos absurdos 30
km/h, permitidos pelo trem de ferro. Não é preciso dizer que a partir de
então o progresso e o desenvolvimento da região começaram a andar a
passos largos, com o trem levando conforto e segurança a todos.
(HENKELS, [s.d]).
Figura 67 - Vista parcial da comunidade Hansa-Hammonia e dos construtores da ferrovia
Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE IBIRAMA - Alterado por WITTMANN.
135
Figura 68 - Vista parcial do local da estação da comunidade Hansa – 2008
Fonte: GOOGLE EARTH, 2006 - Alterado por WITTMANN.
Mas estava para acontecer um fato na história mundial que mudaria o rumo
da história ferroviária e dos transportes no Vale do Itajaí. E novos agentes surgiriam.
4.4 O GOVERNO FEDERAL E A I GUERRA MUNDIAL
De acordo com um Relatório da EFSC de 1920, no dia 29 de novembro de
1911 o governo federal brasileiro encampou a linha férrea da S.A. Estrada de Ferro
Santa Catarina, por meio do Decreto-Lei nº 9.155. A EFSC (cláusula XXVIII), mesmo
continuando a ser administrada pela companhia alemã, passava a ser patrimônio do
Estado brasileiro, arrendada por 60 anos.
Em 18 de março de 1914, são aprovados, pelo Decreto 10.818, os estudos
para o prolongamento ferroviário, seguindo até Trombudo Central.
Nesse ínterim, ocorre um fato na Europa que teria ecos no Vale do Itajaí e
na construção da EFSC. No dia 28 de junho de 1914, o arquiduque Francisco
Ferdinando, herdeiro do trono austro-húngaro e sua esposa foram assassinados por
um membro do grupo nacional-terrorista armado “Mão Negra”, que lutava pela
unificação dos territórios sérvios. Este assassinato deu início a um processo que
136
culminou com a Primeira Grande Guerra Mundial
62
.
Supostamente, no dia 5 de abril de 1917 o vapor brasileiro Panamá foi
atacado por um submarino alemão. Em 11 de abril, o Brasil rompeu relações
diplomáticas com a Alemanha, e no dia 20 de maio o navio Tijuca foi atacado perto
da costa francesa. Nos meses seguintes, o governo brasileiro confiscou, a título de
indenização de guerra, 42 navios alemães que estavam em portos brasileiros e
também nos portos do Vale do Itajaí. No dia 23 de outubro de 1917, o cargueiro
nacional Macau foi atacado pela Alemanha, próximo à costa da Espanha. O
governo, sob pressão popular, se posiciona contra a Alemanha e no dia 26 de
outubro de 1917 declara guerra à Aliança Germânica
63
. O Brasil passa a patrulhar o
Atlântico, sob “comando” americano.
Esta parte da história da região do Vale do Itajaí é cheia de controvérsias,
atos mal esclarecidos, lacunas abertas para serem desenvolvidas novas pesquisas.
Em janeiro de 1918, o governo brasileiro também rescinde o contrato com a
companhia alemã que administra a EFSC e a Companhia de Navegação, por meio
do Decreto 13.907, passando a administração dela a uma junta militar federal, sem
qualquer indenização. A comunidade do Vale do Itajaí se sentiu lograda em seus
direitos de posse de um patrimônio privado, e muitos afirmaram, e continuaram
afirmando, tratar-se de um roubo oficial, o que gerou protestos locais e dos
investidores. A EFSC deixou de ser um patrimônio privado e passou a ter o perfil de
um patrimônio público da Nação, o que dificultou muito sua administração a partir
desse momento. A EFSC passou a ter o perfil de uma empresa estatal.
Nesta primeira empreitada de 69 km, a ferrovia foi totalmente construída
com recursos e material de origem alemã, sendo a única ferrovia brasileira
implantada nestas condições, inclusive com sede administrativa em Berlim,
capital da Alemanha. Infelizmente, com o advento da primeira guerra
mundial, os alemães perderam a concessão de exploração da ferrovia, em
função do grande movimento nacionalista que tomou conta do Brasil nesta
época, movimento que praticamente “exigia” a retirada do capital alemão do
País. Assim, em março de 1918 a EFSC foi “tomada” pelo Governo
Brasileiro, que designou uma Comissão Militar para administrá-la.
(HENKELS, [s.d.])
62
A princípio, responsabilizavam a Alemanha e o Império Austro-Húngaro pelo conflito.
Supostamente o Império Austro-Húngaro, apoiado pelos alemães, teria atacado a Sérvia em 29 de
julho. A Alemanha também foi acusada de ter invadido a Bélgica em 3 de agosto de 1918, sendo
considerada culpada e teve que pagar as indenizações de guerra e todos os custos futuros a todos os
veteranos da Tríplice Entente, estimados em trinta bilhões de dólares.
63
A participação militar do Brasil no solo europeu não foi muito grande. Resumiu-se em algumas
ações de pilotos da Força Aérea que foram treinados na Europa, apoio médico, fornecimento de
alimentos e matérias-primas. A Marinha brasileira recebeu a incumbência de patrulhar o Atlântico.
137
Após essa movimentação política, administrativa e burocrática, somente
após o ano de 1918 foram retomados os estudos e projetos para a construção da
ferrovia até o Alto Vale do Itajaí.
4.5 NOVOS CONSTRUTORES E NOVOS PROJETOS
Apesar dos projetos e estudos efetuados em 1918, a verba necessária
somente é liberada para dar prosseguimento à construção da ferrovia no momento
do arrendamento desta pelo governo estadual, em 1921.
No ANEXO C encontra-se transcrito o Relatório do engenheiro Breves
Filho
64
aos seus superiores, como fonte de persuasão da importância da construção
do prolongamento da EFSC e, com isto, a liberação de verbas.
O prolongamento desta Estrada é providência que não deve ser mais
retardada. Basta considerar-se a vasta e rica região sobre a qual exercerá
decisiva influência, o far-west catharinense e o norte do Rio Grande do
Sul, dotado de terrenos fertilíssimos, com um clima temperado e
salubérrimo, onde se succedem as zonas agrícolas e pastoris, e que, pela
variedade de altitudes e de composição do solo, são apropriados a nelles
medrarem os productos das zonas tropicaes ora os cereaes e fructas dos
climas europeus. Esse prolongamento é uma exigência nacional, de ordem
econômica e social, para transportes fáceis à produção agrícola e
industrial, que se intensifica, e servir de valioso factor da nacionalização
dos elementos heterogêneos, que vão povoando os nossos sertões, além
de obedecer a razões estratégicas e, finalmente, financeiras. (BREVES
FILHO, 1920).
O primeiro diretor da EFSC, Otto Rohkohl, justifica a mudança de traçado da
ferrovia na área central de Blumenau (ANEXO A), pela falta de verbas do município
para quitar o montante da obra. O custo da obra se a ferrovia seguisse o primeiro
traçado (junto à margem direita do rio Itajaí-Açu) para fazer o muro de contenção
da barranca do rio entre o porto do centro e a estação de Blumenau seria superior
ao da construção de duas pontes sobre o rio Itajaí-Açú, um túnel, um elevado e uma
nova estação. O assunto será retomado com mais detalhes no decorrer deste
trabalho.
64
Joaquim José de Souza Breves Filho: engenheiro do Rio de Janeiro, de relações estreitas com a
família Konder, de Itajaí, que assumiu o comando da construção da EFSC fazendo alterações nos
projetos executados durante a segunda parte da construção da ferrovia. Muitas dessas alterações
resultaram em modificações radicais, que envolveram mudanças do trajeto da EFSC e aumentos de
construções ferroviárias. E não ficaram muito bem explicadas na documentação oficial.
138
Foram estudados vários projetos, um dos quais o de marginar o rio Itajaí-
Açu em sua margem direita, até “Vorstadt”, mediante a construção de um
muro de arrimo desde a foz do Ribeirão da Velha até “Vorstadt”. Esta obra,
por ser bem mais cara do que duas pontes, mas que por sua vez viria a
beneficiar a cidade, que com isto iria possuir um cais de vários quilômetros
de comprimento, poderia ser feita com a cooperação do governo
brasileiro, federal e municipal. Como o município era pobre e não tinha os
meios para cooperar neste plano e o governo federal nenhum auxílio queria
prestar para sua realização, foi abandonado este projeto.
O capital para este trecho da obra fora liberado pelo governo federal;
portanto, não deveriam existir problemas quanto ao valor do projeto inicial e a
disponibilidade ou não de capital por parte do município.
4.5.1 Vale do Itajaí: Centro Econômico Estadual
Nesse momento, o Vale do Itajaí era um forte centro econômico para a
economia do Estado de Santa Catarina, e o governo estadual necessitava efetuar
melhorias nas comunicações da região, sendo que a alternativa menos onerosa aos
cofres públicos, à época, seria dar prosseguimento à construção da EFSC. Para
ilustrar esta afirmativa, o professor Lago (1969, p. 201) fez uma reflexão de ordem
econômica sobre o Estado de Santa Catarina na década de 60, destacando os
seguintes números:
Quanto ao valor da produção industrial, a participação do município de
Blumenau, em todo o Estado, tem atingido 13,5%. Na Bacia do Itajaí sua
liderança é esmagadora, contribuindo com quase 50% do valor da produção
regional. O Estado participa em torno de 30% quanto ao mesmo fato e tem
absorvido 33% da mão-de-obra do setor secundário das atividades
econômicas, enquanto Blumenau, no conjunto da Bacia, absorve mais de
40% da força de trabalho industrial. (LAGO, 1969, p. 201).
O Estado de Santa Catarina se ressente das limitações contidas nas vias
terrestres de transporte que têm, assim, reduzidas suas funções
promocionais do desenvolvimento econômico. A circulação das riquezas,
indispensável para dinamizar as atividades produtivas, encontra na
deficiência das vias de transporte circunstância redutora do fluxo de renda
gerada nas diversas atividades econômicas, cujas perdas, devidas à
oneração de fretes, à danificação precoce de material rodante, à dilatação
do tempo para se conectar zonas produtoras com centros consumidores,
são apreciáveis.
Em função de peculiares características do meio físico e da localização de
mercados observa-se, como fato marcante, a frágil articulação interna em
Santa Catarina, do que emerge como questão essencial a disposição
predominantemente longitudinal dos traçados rodoviários, setor que absorve
a maior parcela na circulação de massas econômicas. (LAGO, 1968, p.
221).
139
4.5.2 Especulações fundiárias: prolongamento ferrovrio
Nessas circunstâncias, a região apresentava sérios problemas de transporte.
Segundo Cátia Dagnoni, a região de Subida era até então um grande desafio para o
tráfego entre os núcleos do Alto Vale do Itajaí e Blumenau, ao se percorrer picadas
no meio da mata, subindo e descendo a serra, e com isto dificultando muito o
desenvolvimento local daqueles núcleos.
A criação do núcleo de Riachuelo Lontras revelou-se um ato corajoso e
audacioso, devido à distância do centro da colônia, precárias condições de
transporte e comunicação, difícil assistência médica, em caso de
emergência ou acidentes graves. As dificuldades fluíam na medida em que
o movimento de tropas aumentava. O transporte era realizado em lombo de
burro, num picadão que piorava a cada dia pela passagem das mulas e
bois, o qual principalmente nos dias de chuva e nos invernos se tornava
intransitável. (DAGNONI
65
, [s.d.]).
4.5.3 Agentes da EFSC envolvidos nos negócios fundiários
A historiadora Cátia Dagnoni afirma que as condições e o movimento
migratório para as terras do Alto Vale aumentaram a partir da segunda década do
século XX, coincidentemente com a data de início da construção do trecho
ferroviário rumo a Rio do Sul. Entretanto, muitos atribuem tal desenvolvimento ao
aldeamento indígena na localidade de José Boiteaux, à presença de colonizadores
como Feddersen (propriedade do Cel. Feddersen, de Blumenau), Reif e Jensen, e
às ações do Kulturverein de Blumenau. Estas empresas colonizadoras faziam parte
dos grupos que construíam os caminhos e estradas nessa região, a exemplo do Cel.
Feddersen, que se empenhara em trazer a ferrovia para o Vale do Itajaí.
Essas empresas tornaram-se, em geral, concessionárias de terras em
pagamento de estradas construídas nessas zonas catarinenses.
Devido ao seu esforço, dentro de poucos anos povoaram-se os Vales do
Taió, Rio do Oeste, do Trombudo, das Pombas, até o Canoas. E, mais
tarde, a partir de 1913, principalmente pelo trabalho de Henrique Reif, a
colonização transformou em florescentes núcleos as terras banhadas pelo
Lauterbach, pelo Pacabach, pelo Sandbach, pelo Cotias, até os rios da
Batalha e Águas Negras. (PELLIZZETTI apud DAGNONI, [s.d]).
65
Historiadora. Especialista em Arquivologia e Museologia, Mestre em Desenvolvimento Regional.
Diretora Museu e Arquivo Histórico da Fundação Cultural de Rio do Sul.
140
Vale destacar que, mais tarde, também se tornou concessionário de terras
às margens do Rio do Oeste (atual Rio do Sul) o Dr. Gino de Lotto (mais
precisamente na parte alta de Subida e no Ribeirão dos Bugres), e o engenheiro-
chefe da EFSC, Dr. Joaquim Breves Filho. Dagnoni afirma que o engenheiro Breves
buscava no colono a mão-de-obra para a construção da estrada de ferro. Os
trabalhadores da construção ferroviária ocupavam os arredores e, muitas vezes,
recebiam como pagamento terras devolutas. Moravam de maneira inadequada, em
barracos próximos à frente de trabalho.
Ainda comenta D’Amaral (1950), conforme Pellizzetti (1981), que em 1918
também se tornou concessionário das terras nas margens do Rio do Oeste,
mais tarde transferidas ao Dr. Gino De Lotto, na parte alta da Subida e
ainda no Ribeirão dos Bugres, o Dr. Joaquim Breves Filho, que localizou
nessas terras, ao que parece, os colonos apenas como agregados seus.
(DAGNONI, [s.d.]).
Figura 69 - Moradias de trabalhadores da EFSC – próximo a Rio do Sul (I) – Início da década de
30 do século XX
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul..
141
Figura 70 - Moradias de trabalhadores da EFSC – próximo a Rio do Sul (II) Início da década de
30 do século XX
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Em depoimento dado à revista Blumenau em Cadernos (agosto, 1960,
p.154), Henrique Hacker
66
deixa claro que a interferência do novo engenheiro-chefe
da EFSC ia muito além dos assuntos relacionados à construção da ferrovia.
Sustentei nas minhas colônias, escolas e construí, por conta de minha
empresa, estradas de rodagem de grandes extensões e pontes. Mais tarde
(1916), adquiri terras ao lado direito do Rio Timbó... a Colônia Francônia...
em frente da colônia São Pedro, e comecei a povoar essa zona,
subdividindo-a e parcelando-a.
Em virtude da interferência do engenheiro Joaquim Breves Filho nas terras
da colônia Francônia, e dos entraves, por ele opostos, aos meus trabalhos,
situação que somente mais tarde foi solucionada pelo Interventor general
Ptolomeu de Assis Brasil (1931), abandonei a tarefa de colonizar, vendendo
as terras pertencentes à firma e à mesma concedidas (com exceção,
naturalmente, das terras de Francônia). (BLUMENAU EM CADERNOS,
1960, p.154).
A partir desse momento, na segunda década do culo XX, a construção da
EFSC prosseguiu, sob o comando de Breves Filho, tendo o Estado de Santa
Catarina como arrendatário. O Estado arrendara a EFSC com base no Decreto
66
Pioneiro do Vale do Rio do Peixe, fundador da firma Henrique Hacker & Cia., com sede em
Carazinho. O mais antigo colonizador no Vale do Rio do Peixe e fundador de várias colônias, como a
colônia de Bom Retiro (atual Luzerna), Herval, 5 quilômetros distante de Bom Retiro, que se
transformou em Cruzeiro e, mais tarde, em Joaçaba.
Fundador das colônias São Pedro e Santa Cruz (atual Caúna).
142
Federal 15.152, de 2 de dezembro de 1921, fato festivamente comemorado no dia
28 de dezembro desse mesmo ano.
Ficou determinado em contrato que o Estado de Santa Catarina daria
prosseguimento e viabilizaria a construção da ferrovia na direção de Barra do
Trombudo, em torno de 32 quilômetros, e de Blumenau até o porto de Itajaí mais 48
quilômetros, além de reaparelhar o trecho ferroviário existente (linha e material
rodante), para promover sua adequada manutenção.
Foi efetuada uma análise sobre qual das opções seria construída em
primeiro lugar, tendo-se decidido pelo trecho entre o entroncamento de Hammonia
até Barra do Trombudo, pois de Blumenau a Itajaí existia a opção do transporte
fluvial pela Companhia de Navegação pertencente à EFSC.
Ficou determinado que Breves Filho, além de administrar a EFSC,
acumularia também o cargo de engenheiro-chefe das obras do prolongamento
ferroviário. Foi formada uma equipe de auxiliares, pois os próximos 22 quilômetros
da linha a serem construídos seriam os mais difíceis de toda a EFSC, devido à
necessidade de se transpor a Serra do Mar, na localidade de Subida. Este trecho da
EFSC, também, seria o local de onde se vislumbrariam as mais belas paisagens de
todo o trajeto ferroviário.
4.5.4 Variante do prolongamento
Algo curioso aconteceu sob o comando de Breves Filho, em 1922. Ele
apresentou nova proposta para o entroncamento de Subida, desqualificando o
projeto existente. Seria oportuno estudar melhor este fato em pesquisa posterior.
Qual o verdadeiro e real sentido da mudança de traçado do projeto original sugerida
pelo engenheiro Breves Filho ao órgão federal que à época gerenciava o transporte
ferroviário no Brasil, antes da criação do Departamento Nacional de Estradas de
Ferro
67
? No projeto original, o entroncamento da linha existente fora projetado
para se localizar dois quilômetros antes da estação de Hammonia. Breves Filho
argumentava, em defesa de sua proposta, que este ponto, mais especificamente no
conhecido km 67, ficaria espremido entre o rio e a encosta da Serra, não tornando a
estação propícia e apta devido ao pouco espaço restante para receber
67
Autarquia Federal vinculada ao Ministério dos Transportes, constituída pela Lei 4.102, de 20 de
julho de 1962.
143
mercadorias e pessoas. Prosseguindo em sua argumentação, dizia o engenheiro
que “seria somente uma estação para formação dos trens que demandariam para o
Alto Vale e até Hammonia”. Será visto, posteriormente, que mesmo com a mudança,
foi exatamente este papel que o entroncamento cumpriu em outra localização. A
proposta de Breves Filho sugeria que o entroncamento projetado para o km 67 fosse
construído no km 63, em plena serra, na estação de Subida, edificada. Vale
esclarecer que esta estação tinha melhor acesso às estradas de rodagem. O
engenheiro afirmava, por meio de números, na tentativa de impressionar com suas
justificativas, que na nova proposta o trem poderia subir a serra em aclividade
máxima de 1,5%, numa distância de 15 quilômetros, contra 1,8% numa distância de
9 quilômetros do traçado anterior. registros de que no traçado original havia uma
exigência a ser cumprida, que era a construção de um depósito para locomotivas
que auxiliariam na tração das composições serra acima, o necessária na nova
proposta de Breves. Porém a proposta de Breves Filho foi aceita e aprovada pelo
órgão federal, passando a se chamar “variante do prolongamento”.
Figura 71 - Entroncamento para Hammonia (atual Ibirama)
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
144
4.6 CONSTRUÇÃO DA SEGUNDA ETAPA
As obras tiveram início no dia 23 de janeiro de 1923, em várias frentes de
trabalho, tendo sido executadas por diferentes empreiteiros, sob o comando de
empreiteiros subordinados a Breves Filho
68
. O escritório do comando geral da obra
foi montado em Lontras.
A construção da ferrovia era dividida em frentes de execução de trabalho. A
equipe de frente trabalhava com pás e picaretas, e, se necessário, dinamites para a
abertura e a remoção de todo obstáculo do leito ferroviário. Outra equipe
transportava o material do leito em veículos pequenos, conhecidos por tombadeiras,
que eram vagonetes basculantes e serviam para deslocar a terra e pedras para as
regiões de aterro. As tombadeiras circulavam em trilhos provisórios instalados pelos
obreiros, que formavam, então, outra equipe. Após o aterro, a linha era removida e
instalada em outra frente de trabalho.
Cada frente de trabalho era formada por um número grande de pessoas,
coordenadas por um imediato. Geralmente, os trabalhadores trabalhavam de pés
descalços, e tinham idades variadas. Alguns, muito novos, participavam da frente de
trabalho distribuindo água, ou mesmo como mensageiros entre as várias frentes.
Arlindo Fiedler, residente em Blumenau, conta que seu avô, Paul Feustel,
sempre lhe contava as histórias “do tempo em que, muito jovem, trabalhava
nas obras de construção da ferrovia da serra”. Seu trabalho era, com
baldes, pegar água no Rio Itajaí, que naquele tempo ainda era limpo, e
abastecer o exército sedento que se batia na abertura do traçado da
ferrovia. Contava o Sr. Feustel que muitas vezes os trabalhos seguiam
durante a noite para aproveitar o bom tempo reinante, ou para muitas vezes
recuperar algum atraso. Neste caso, o trabalho seguia sob a luz de tochas
feitas de troncos de palmito de cerca de um metro de altura, que,
desprovidas do miolo interior, eram enchidas com madeira, na qual era
posto fogo. A manutenção destas tochas também era trabalho feito pelos
jovens adolescentes do contingente. (HENKELS, [s.d.]).
68
Para se ter uma idéia do bom relacionamento entre o comandante da EFSC, Breves Filho, e as
lideranças políticas locais, estaduais e até federais, em dezembro de 1922 o governo federal cortou o
repasse de verbas para inúmeras obras estaduais no País, argumentando contenção de custos, o
que não ameaçou o repasse para as obras ferroviárias no Vale do Itajaí. Na época, Breves Filho
comentou que isto somente fora possível graças ao excelente relacionamento entre os governos
federal e estadual.
145
Figura 72 - Abertura do leito à base de pás e picaretas, cortando a rocha – Subida
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Figura 73 - Abertura do leito à base de pás e picaretas – Subida
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
146
Figura 74 - Remoção de material - Construção do trecho de Subida
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
A partir da variante aprovada, as obras estiveram sob o comando do
empreiteiro Erich Germer. Nesta parte da serra, por ser uma das mais acidentadas,
foi necessário maior número de obras, como o corte da rocha em vários pontos e a
retirada de pedras, aterros, construção de pontes, túneis. A obra durou 6 anos. O
empreiteiro Carl Louis Wilhelm Hager
69
, de Lontras, construiu alguns dos viadutos e
pontes de pedra-rosa em arco e bueiros ao longo deste trecho da linha.
69
Carl Louis Wilhelm Hager foi o carpinteiro responsável por toda a estrutura de madeira que
moldava o formato para a execução dos inúmeros viadutos construídos na região.
147
Figura 75 - Estrada de Ferro – Lontras – Sr. Carl Louis Wilhelm Hager está à direita - 1924
Fonte: OESTREICH, [19??].
Exímio carpinteiro, uma vez que os viadutos de pedra exigiam trabalhos
iniciais em madeira, que lhes moldariam o formato, o Sr. Hager e equipe
sempre eram vistos nos precários caminhos da serra ou depois, no leito
da ferrovia que começava a se formar, com um trator sem pneus somente
com uma espécie de garras nas rodas para facilitar a aderência
modernidade para esta época. Na carreta puxada por este trator seguia o
material necessário para as obras ao longo do trecho. (HENKELS, 1993).
148
Figura 76 - Equipe de carpintaria da EFSC, entre Subida e Lontras, liderada por Carl Louis
Hager (em pé entre o trator e o reboque). Trator sem pneus
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
A construção desse trecho de Subida teve muitos imprevistos, interrupções,
retrabalhos, desmoronamentos, vários acidentes com vítimas e casos não
esclarecidos, atualmente entendidos como lenda local.
Conta-se que este que seria o segundo túnel do trecho, com 160 m de
comprimento, ao desmoronar teria soterrado seis operários juntamente com
as tombeiras que ali se encontravam. O mais impressionante é que todos
afirmam que nem estas pessoas nem o equipamento foram retirados,
tornando-se para sempre a sepultura destes infelizes, uma vez que as obras
nunca foram retomadas e a ferrovia teve que “desviar” do tal morro onde
seria feito o túnel, cujas entradas, uma delas com acabamento concluído,
ainda se encontram. Nunca consegui encontrar, pelo menos até agora,
qualquer referência a este desmoronamento, nem de suas conseqüências
nos relatórios do Dr. Breves. Ou o fato foi tomado como “normal” e dada
pouca importância, ou foi mantido em sigilo por sua gravidade. O
interessante é que até o relatório de 1925, o Dr. Breves citava a construção
de três túneis. A partir de 1927 os relatórios descreviam apenas dois túneis
no trajeto. (HENKELS, [s.d.]).
Devido à geografia acidentada desse trecho da variante do prolongamento
próximo à Subida, foi necessário construir inúmeras pontes e extrair ferro e pedras
do local, conforme detalhado a seguir.
149
4.6.1 Trecho - Subida e Lontras
A construção do trecho ferroviário entre Subida e Lontras é uma seqüência
das obras executadas pelas frentes de trabalho sob o novo comando da EFSC, que
seguiam rumo ao Alto Vale do Itajaí. Parte deste trecho foi detalhada no item
anterior. Os trabalhos igualmente se iniciaram em janeiro de 1923, em uma das
muitas frentes arregimentadas nesse momento. As obras nesta localização
apresentavam maiores desafios aos construtores, pela necessidade de galgar os
contrafortes da Serra do Mar, em Subida. Devido à topografia acidentada da Serra
do Mar, a estação de Lontras somente foi inaugurada no dia 1
o
. de abril de 1928.
Foi denominada de Estação Victor Konder, em homenagem ao Ministro de Obras e
Viação da época. O empreiteiro das obras do trecho ferroviário entre Subida e
Lontras chamava-se Erich Germer.
Figura 77 - Trecho Ferroviário entre Subida e Lontras
Fonte: GOOGLE EARTH, 2006 - Alterado por WITTMANN.
150
Figura 78 - Detalhe 1
Fonte: GOOGLE EARTH, 2006 - Alterado por WITTMANN.
Figura 79 - Detalhe 2
Fonte: GOOGLE EARTH, 2006 - Alterado por WITTMANN.
151
Figura 80 - Detalhe 3
Fonte: GOOGLE EARTH, 2006 - Alterado por WITTMANN.
Figura 81 - Trajeto entre Subida e Lontras
MAPAS de Santa Catarina - Guia geográfico, 2006 - Alterado por WITTMANN.
152
Figura 82 - Construção do trecho Subida – Detalhes do assentamento dos trilhos
provisórios
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Neste trecho da EFSC, entre subida e Lontras foi construído o maior número
de pontes e túneis em toda a extensão da ferrovia no Vale do Itajaí. A topografia
acidentada da serra e a vegetação luxuriante foram complementadas por obras de
engenharia ferroviária ao longo da linha do trem que margeava o leito do rio Itajaí-
Açu, criando pontos focais na bela paisagem natural.
Neste trecho entre Subida e Lontras tiveram de ser construídas cinco pontes
metálicas, conhecidas pela numeração: 13, 14, 15, 16 e 17. As pontes foram
montadas no transcorrer do ano de 1928.
O material para as pontes metálicas foi importado de Dortmund, Alemanha,
da empresa Stahlunion. O material chegou ao porto de Itajaí no dia 27 de dezembro
de 1927. Luiz Carlos Henkels fez um levantamento do material ferroviário existente
do local, listando as pontes e sua rápida descrição. Todas as pontes, exceto a de
número 17, estão intactas e foram salvas pela dificuldade de acesso.
153
Figura 83 - Girador na Serraria Hager, localidade de Riachuelo (Lontras). À direita, Sr. Hager
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
A ponte conhecida como número 13 está localizada no km 7,2 da variante do
prolongamento, tem 48 metros de comprimento, com três vãos, sendo um de 14
metros, outro de 20 metros e o terceiro, também de 14 metros. Os vãos são
sustentados, nas duas cabeceiras, por pilares de pedra granítica rosa extraída da
região de Subida. Na parte central, a ponte é sustentada por duas torres de aço de
oito metros de altura. A ponte número 14 é um pequeno pontilhão de quatro metros,
e é formada por duas vigas de aço sustentado por dois pilares de pedra, muito altos,
devido às corredeiras do ribeirão. Está localizada a 700 metros da ponte 13. A ponte
número 15 tem 12 metros de comprimento, e está construída bem perto do nível da
água. Seus construtores perceberam que não haveria problemas com enxurradas e
enchentes, pois o ribeirão não tem muito desnível. A ponte número 15 jamais teve
problemas de inundação. A ponte 16 foi construída com uma altura de
aproximadamente 27 metros; tem o comprimento de 50 metros em curva,
sustentados por dois pilares de pedra rosa, e cuja parte central, por sua vez, é
sustentada por duas gigantescas torres de aço de 23,5 metros de altura. E a ponte
17 tem 15 metros de comprimento e está situada perto de Salto Pilão, vizinha à
localidade de Riachuelo, fora do trecho de serra, e logo depois da passagem pelo
túnel. Sucateada em 1982, por meio de leilão foi adquirida pela Empresa Barranco
154
Ferro e Aço. No locam restam os pilares. Segundo Henkels, a única referência a ela
é a que consta do Relatório de 1928, do engenheiro Breves.
Figura 84 - Ponte Número 16 em curva, com uma altura de aproximadamente 27 metros
Fonte: TREMTUR, 2006.
Neste trecho ferroviário, foram construídas, também, pontes de pedras
graníticas em arcos. cnica inventadas pela engenharia romana e difundidas em
todo o Império Romano, onde foram reproduzidas com o material encontrado em
abundância na região, a pedra e a madeira. A técnica exigia que fosse executada,
previamente, uma grande estrutura de madeira, que exigia habilidades de
carpintaria. Nesse trecho, como exposto, o Sr. Hager, de Lontras, coordenou o
trabalho de carpintaria.
A ponte de pedra número 1 está localizada no km 1,6 da variante do
prolongamento, tem o formato de dois arcos em curva, sendo que um deles transpõe
o ribeirão Subida e o outro, a estrada que leva à comunidade de Santa Rosa. Os
arcos têm uma altura de 15 metros. Teve o início de suas obras no dia 31 de julho
de 1924.
155
Figura 85 - Início das obras de construção da ponte de pedra com arcos duplos, em 31 de julho
de 1924
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Figura 86 - Ponte de Pedra
Foto: WITTMANN - 2007.
156
Figura 87 - Vista da ponte, a uma altura de 104 metros
Fonte: GOOGLE EARTH, 2006 - Alterado por WITTMANN.
Figura 88 - Inauguração Ponte dos Arcos - 1929
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
157
A segunda ponte de pedra fica na localidade de Atafona, no km 15,6 do
prolongamento. Foi construída sobre o ribeirão Atafona. Esta ponte possui apenas
um arco, com 15 metros de altura na sua parte central, apresentando uma leve curva
em seu traçado. As pedras foram, igualmente, extraídas da região.
Figura 89 - Ponte de pedra localizada em Atafona
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
A terceira e última ponte de pedra está localizada próximo a Salto Pilão,
possuindo um arco central também de 15 metros de altura, colocado entre dois
arcos menores, com a altura de 5 metros cada. Situa-se em uma reta da EFSC,
sendo visível a considerável distância.
Foram, também, concluídos dois dos três túneis previstos no projeto para o
trecho ferroviário SubidaLontras. Um deles desabou, causando vítimas, e não foi
terminado.
O primeiro túnel está localizado logo após a estação de Subida, no km 1,4
da variante do prolongamento. A extensão deste túnel é de 70 metros, e seu formato
é em curva. Suas paredes são revestidas de granito rosa, e na saída leste adquire o
formato de um muro de arrimo que contorna o morro; para o oeste da saída do túnel,
surge, então, a ponte de dois arcos. Formam um conjunto que Luiz Carlos Henkels
chama, com sensibilidade, de obra de arte da engenharia ferroviária.
158
Figura 90 - Equipe de carpintaria da EFSC, estrutura Da passagem superior em Subida - 1924
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Figura 91 - Primeiro túnel
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul
159
O segundo túnel da serra situa-se na localidade de Salto Pilão. Foi
construído de tal maneira que, quando o trem despontasse dele, os passageiros
tivessem imediatamente a vista de Salto Pilão.
Figura 92 - Linha de trem assentada no corte efetuado na montanha rochosa – Salto Pilão
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul
O túnel de Salto Pilão possui 110 metros de comprimento; destes, 54 metros
foram escavados na rocha. De acordo com Luiz Carlos Henkels, da ABPF, núcleo
catarinense, os dois túneis estão em ótimo estado de conservação. Também é bom
destacar os grandes esforços e desafios enfrentados nesta região devido aos
grandes lençóis de granito situados no subsolo, que dificultavam o trabalho dos
homens que abriam a estrada na serra praticamente virgem, munidos de
ferramentas rudimentares, quase sempre apenas pás e picaretas.
4.6.2 Início das obras do trecho - Blumenau e Itajaí
De acordo com Santiago (2001, p. 68), nos anos 1922 e 1923, período pós-
Primeira Guerra Mundial e no qual se iniciaram os trabalhos de construção da
segunda etapa da EFSC – Subida – Lontras – Barra do Trombudo, Blumenau
despontava como município exportador de valor per capita na região. A produção
fabril de Blumenau seguia para todo o território nacional pelo porto marítimo de
160
Itajaí, aonde chegava via fluvial. A partir destes dados, começou-se a especular
sobre a melhoria de uma ligação por terra entre os dois municípios, Itajaí e
Blumenau.
A imprensa itajaiense criticava a falta de vias de ligação por terra: “Não é
possível se permitir que dois municípios, como Itaj e Blumenau,
largamente habitados, ambos considerados desenvolvidos pela sua
exportação e importação, valendo um e outro pelas extraordinárias e
elevadas cotas com que em todos os anos enriquecem o Tesouro do
Estado, núcleos estes de populações diligentes, cultas e progressistas,
continuem por mais tempo sem uma fácil comunicação por meio de boa
estrada de rodagem!” (SANTIAGO, 2001, p. 68).
Em 1925 havia três mil contribuintes industriais, colaborando com 26% da
receita da administração municipal. Nesse mesmo ano, circulou o primeiro ônibus
entre o Centro e Itoupava Seca, conforme mencionado nos feitos do Sr. Busch. Silva
(1972, p.160) narra que no ano de 1925 os trabalhos de construção da EFSC
seguiam incansavelmente de Subida rumo a Trombudo Central, e em 1926, Victor
Konder, presidente do Conselho Municipal, saudava o novo presidente eleito. Pouco
depois, Victor Konder foi nomeado Ministro de Estado da Viação e Obras
70
,
permanecendo neste cargo até a saída de Washington Luiz
71
do poder, por ações
revolucionárias. Naquele mesmo ano de 1926, no dia 13 de maio, iniciaram-se os
trabalhos de prolongamento da EFSC, em direção a Itajaí.
Em 1929 iniciou-se a construção da ponte de ferro na região central de
Blumenau, conhecida como Ponte Aldo Pereira de Andrade. Seu material veio da
Alemanha, e foi inaugurada no ano de 1931, porém ficou sem uso a a data da
inauguração final do trecho ferroviário, em 1954. Como ilustra a figura 93, a ponte
permaneceu sem as cabeceiras por muitos anos. Tem 315 metros de comprimento e
18 metros de altura. Seus pilares são feitos em granito extraído da serra de Subida e
transportado de trem.
70
Nome anterior dado ao Ministério dos Transportes. Assim foi denominado de 1906 até 1967
quando passou a se chamar Ministério dos Transportes.
71
Os ministros militares prendem o presidente Washington Luís no dia 24 de outubro de 1930, no
Palácio do Cadete, assumindo, então, a presidência uma junta militar, entregado-a em seguida a
Getúlio Vargas, no dia 3 de novembro de 1930.
161
Figura 93 - Ponte de ferro Aldo Pereira de Andrade - 1934
Fonte: Família HAAS, [19??].
Figura 94 - Detalhes da ausência das cabeceiras na Ponte de ferro Aldo Pereira de Andrade -
1934
Fonte: Família HAAS, [19??].
162
4.6.2.1 Mudança do trajeto da EFSC na área central de Blumenau
Não se compreendia o motivo de terem sido construídas duas estações no
centro de Blumenau, sendo que a primeira era arquitetonicamente mais completa e
integrada à paisagem blumenauense do que a segunda.
Como aconteceu em Subida, com a variante do prolongamento levando à
mudança do projeto original, pelo engenheiro-chefe Joaquim Breves Filho, ocorreu
também no caso do trajeto da linha ferroviária na área central de Blumenau.
O projeto inicial previa que no centro comercial da cidade de Blumenau a
EFSC margearia o rio pela sua margem direita, sem que fosse preciso, com isto,
construir qualquer obra de engenharia a mais, de grande porte e custo. Com base
neste plano, foi edificada a estação primeira (quilômetro “zero”), em estilo enxaimel.
A localização desta estação fora projetada no futuro leito da estrada de ferro, para
quando a construção desta prosseguisse em direção ao porto fluvial e a Itajaí.
Igualmente, o porto de cargas fora construído próximo às oficinas, para evitar o
tráfego e o embarque de cargas na área central da cidade, no porto do Stadplatz.
somente deveria ser efetuado o embarque de passageiros.
Figura 95 - Estação de Blumenau - 1939
Fonte: Família HAAS, 1939.
163
Figura 96 - Vista Aérea de Blumenau – Final da década de 30 – Séc. XX
Fonte: Família HAAS - Alterado por WITTMANN.
Ao contrário disso, e ignorando o local da estação de Blumenau
construída, Breves Filho constrói a ponte de ferro Aldo Pereira de Andrade, no final
da década de trinta, fora do trajeto projetado. Mesmo tendo sido inaugurada, esta
ponte acabou ficando durante muitos anos no meio do rio Itajaí-Açu, sem as
cabeceiras.
Quando foi necessário executar a estrada de ferro, decidiu-se que o trem
passaria pela ponte, que na outra margem chegava à base de um morro. Para tanto,
foi preciso construir um túnel e, depois deste, mais uma ponte (conhecida como
Ponte dos Arcos), e mais um elevado.
Com essa mudança de traçado, a estação de Blumenau ficou fora de curso,
tornando-se necessário construir outra estação, que foi usada quando da
inauguração do trecho Blumenau a Itajaí.
A mudança de traçado não aumentou nem diminuiu o trajeto (em torno de
1,5 km). Resultou, entretanto, no fato de que a EFSC construiu a mais: uma estação
ferroviária para Blumenau; duas pontes sobre o rio Itajaí-Açu; um túnel; e um
elevado de concreto. Quem custeou estas obras?
164
Figura 97 - Os dois planos do traçado ferroviário para a área central de Blumenau
Fonte: GOOGLE EARTH, 2006 - Alterado por WITTMANN.
Breves Filho argumentou que a mudança era necessária para se evitar a
passagem da ferrovia pelo centro da cidade, que nesta época não contava ainda
com a via à margem direita do rio Itajaí-Açu (atual Av. Presidente Castelo Branco).
Figura 98 - Fotografia aérea da área central de Blumenau – Início da dec. de 70 do século XX
Fonte: Prefeitura Municipal de Blumenau – Setor de Cadastro
165
A comunidade de Blumenau, de acordo com o depoimento do primeiro
diretor da EFSC, Sr. Otto Rohkohl, acatou a mudança por entender que seria menos
oneroso aos cofres públicos, mesmo sendo de origem federal a verba destinada à
construção do trecho, conforme visto. Nesse depoimento, para justificar a mudança
de traçado, o Sr. Otto Rohkohl afirma que o custo da obra do trecho na área central
seria superior ao da construção de duas pontes sobre o rio Itajaí Açu, um túnel, um
elevado e uma nova estação.
Figura 99 - Ponte Eng. Antônio Vitorino Ávila Filho, Ponte dos Arcos
Fonte: Disponível em: http://cliczas.blogspot.com/2006/10/ponte-dos-arcos-blumenau-1950.html.
Figura 100 - Ponte Eng. Antônio Vitorino Ávila Filho, Ponte dos Arcos (I) 2008
Foto: GONZALVEZ, 2007.
166
Figura 101 - Túnel – Blumenau
Fotografia: WITTMANN, 2008.
Figura 102 - Ponte dos Arcos e vista parcial do elevado (Ligação reconstituída)
72
Fotografia: WITTMANN, 2008.
Foram estudados vários projetos, um dos quais o de marginar o rio
Itajaí-Açu em sua margem direita, até “Vorstadt”, mediante a
construção de um muro de arrimo desde a foz do Ribeirão da Velha
até “Vorstadt”. Esta obra, por ser bem mais cara do que duas
pontes, mas que por sua vez viria a beneficiar a cidade, que com isto
iria possuir um cais de vários quilômetros de comprimento,
poderia ser feita com a cooperação do governo brasileiro, federal e
municipal. Como o município era pobre e não tinha os meios para
72
Foto alterada por Jorge Wittmann.
167
cooperar neste plano e o governo federal nenhum auxílio queria
prestar para sua realização, foi abandonado este projeto. (Entrevista
do Sr. Otto Rohkohl concedida a Frederico Kilian) (ANEXO A).
Figura 103 - Elevado localizado no pátio de uma fábrica - Blumenau
Fotografia: WITTMANN, 2008.
Sem qualquer dúvida, a obra construída formou um conjunto de grande
plástica na paisagem urbana. A fotografia a seguir, ainda com a paisagem antiga
com características rurais, ilustra o conjunto formado pela Ponte dos Arcos (segunda
ponte construída) e o elevado.
4.6.2.1.1 Ponte dos Arcos
Ponte batizada com o nome de Eng. Antônio Vitorino Ávila Filho, foi
inaugurada no dia 28 de janeiro de 1951, com a presença do governador Aderbal
Ramos da Silva.
Segundo matéria do jornal Santa Catarina do dia 7 de novembro de 1997,
intitulada Um Lugar na História, o orçamento para sua construção foi aprovado no
dia 22 de novembro de 1941. Somente em janeiro de 1948 a firma Cumplido,
Santiago & Cia. Ltda. deu início à obra, unindo a EFSC às duas margens do rio
Itajaí-Açu. No projeto original, a ponte seria formada por um trecho em viaduto e
uma parte pênsil, com extensão de 407,50 metros. A construção teria passagem
168
para o trem e duas pistas laterais para veículos de passeio e pedestres. Foram
construídos três arcos. A obra recebeu auxílio para cravação das estacas da Cia.
Franki. Para a fixação dos pilares nas rochas do rio Itajaí-Açu foram utilizados
caixões pneumáticos, da Cia. Nacional de Construções Civis e Hidráulicas Civilhidro,
do Rio de Janeiro.
Figura 104 - Ponte Eng. Antônio Vitorino Ávila Filho, Ponte dos Arcos (II)
Fotografia: WITTMANN, 2008.
A ponte tem 160 metros de comprimento e três arcos de 41,65 metros cada.
Embora inaugurada em 28 de janeiro de 1951, para ligar o trecho ferroviário
Blumenau–Gaspar, somente no dia 18 de dezembro de 1954 o então presidente da
República, João Café Filho, fez a viagem que s em funcionamento a linha férrea
entre as duas cidades.
Paralelamente, os trabalhos de construção da EFSC em direção a Rio do
Sul prosseguiam, com inaugurações sucessivas de novas etapas findadas.
4.6.3 Trecho - Lontras a Rio do Sul e Rio do Sul a Barra do Trombudo
Rio do Sul teve sua emancipação política de Blumenau em 1931, dois anos
antes da inauguração do trecho ferroviário entre Lontras e a cidade. Este núcleo
antigo da Colônia Blumenau exerce liderança, atualmente, sobre os municípios da
169
Associação dos Municípios do Alto Vale do Itajaí.
Figura 105 - Núcleo Urbano de Rio do Sul, início do século XX
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
O núcleo antigo de Rio do Sul estava estrategicamente localizado e foi local
de pouso devido à sua posição geográfica. A cidade está localizada na foz do rio
Itajaí do Sul, no rio Itajaí-Açu, local de trajeto de vários viajantes, imigrantes,
tropeiros, pioneiros e produtos das regiões acima desta confluência. O núcleo
primitivo teve vários nomes: Humaitá, Suedarm, Braço do Sul, Bella Alliança. E sua
história esteve diretamente ligada à história de Blumenau, sede da grande colônia
que abrangia todo o Vale do Itajaí. A EFSC, ao passar por Rio do Sul, atenderia ao
transporte, não somente da população local, como também das pessoas e produtos
oriundos do Planalto Serrano.
170
Figura 106 - Trecho ferroviário entre Lontras e Rio do Sul
Fonte: GOOGLE EARTH, 2007 - Alterado por WITTMANN.
Figura 107 - Trajeto entre Lontras e Rio do Sul
Fonte: MAPAS de Santa Catarina - Guia geográfico , 2007 - Alterado por WITTMANN.
171
Figura 108 - Estação de Matador
Fonte: GIESBRECHT, 2006
A partir de 1929, os trabalhos da ferrovia seguiram rumo a Rio do Sul,
passando por Matador.
Figura 109 - Armazém da Estação de Rio do Sul, onde funcionou a primeira estação por breve
período, até que o prédio da estação de fato estivesse pronta
Fotografia: WITTMANN, 2008.
172
A estação de Matador, na localidade de Rio do Sul, foi inaugurada no dia 18
de dezembro de 1933, quatro anos após a inauguração do trecho Subida Lontras.
Esta estação dista seis quilômetros da estação central de Rio do Sul, inaugurada
dez dias após, em 28 de dezembro de 1933, passando a ser ponto terminal da linha
por quatro anos, até a inauguração do novo trecho. A estação central de Rio do Sul
localizava-se onde mais tarde passou a funcionar o armazém.
Figura 110 - Dia da inauguração do trecho ferroviário até Rio do Sul – Local onde está
localizado atualmente o Armazém
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Vale destacar aqui, em ordem cronológica, que na mesma semana de
inauguração da estação de Rio do Sul, em 23 de dezembro de 1933 chegou a
Hammonia o primeiro trem de serviço, pelo prolongamento de 3 quilômetros até o
centro desta cidade. Tal prolongamento foi inaugurado no mês seguinte, no dia 7 de
janeiro de 1934.
Com a gradativa expansão da Colônia Blumenau na direção Norte (Ibirama)
e sudoeste (Rio do Sul), os administradores públicos da época acharam por
bem expandir a comunicação ferroviária, que a partir de 1909 já existia entre
o centro de Blumenau, até a localidade de Hansa, perto do que hoje é o
centro de Ibirama, então conhecida como Hammonia. Esta expansão tomou
rumos do Alto Vale do Itajaí, Rio do Sul, terra promissora para extração de
madeira nobre e terra agricultável, de fácil manejo em virtude da topografia,
não tão acidentada como no Médio Vale, coisa valiosa para os agricultores
de então.
A escolha da ferrovia não era novidade na época, já que era esta tecnologia
que havia de mais confiável e rápido que se conhecia, e em plena expansão
pelo mundo. A Estrada de Ferro Santa Catarina, que bem cumpriu sua
173
missão colonizadora entre Blumenau e Hammonia/Hansa, em 1920, não
era administrada por uma comissão militar depois do Governo Estadual.
Uma vez decidida a ampliação da malha ferroviária no Vale do Itajaí, em
direção a Rio do Sul, as obras iniciaram em várias etapas em Subida, onde
seria o entroncamento da linha que ia para Ibirama com a que ia para Rio
do Sul, e em Lontras, onde fora instalado o escritório da construtora que
confiara os trabalhos de engenharia de terraplanagem e leito ao Engenheiro
Erich Germer, levando-se nove anos para transpor obstáculos da Serra do
Mar. Lontras, onde foi construída a majestosa Estação Ferroviária
denominada de Estação Victor Konder, em homenagem ao então Ministro
das Obras e Viação, catarinense que muito ajudou na implantação da
ferrovia até o Alto Vale. (HENKELS, [s.d.]).
Figura 111 - Estação de Rio do Sul, durante a visita das filhas de Dr. Blumenau ao Vale do Itajaí
em 1937 – chegaram de trem em Rio do Sul.
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
A estação de Matador estava localizada no km 91, a de Rio do Sul no km
97,6 e a da Barra do Trombudo, no km 153.
174
Figura 112 - Trecho ferroviário entre Rio do Sul e Barra do Trombudo
Fonte: GOOGLE EARTH, 2006 - - Alterado por WITTMANN.
Figura 113 - Trajeto entre Rio do Sul e Barra do Trombudo
Fonte: MAPAS de Santa Catarina - Guia geográfico , 2006 - Alterado por WITTMANN.
O trecho da linha entre Rio do Sul e Barra do Trombudo foi inaugurado no
dia 24 de Junho de 1937. Para a viabilização do prosseguimento deste trecho
ferroviário foi muito importante a construção da Ponte dos Arcos, sobre o Rio Itajaí
do Sul. O escoamento da madeira extraída do planalto era possível graças ao trem,
175
no qual era embarcada, então, nas estações de Trombudo Central e Barra do
Trombudo.
Figura 114 - Ponte dos Arcos em dois momentos – Em construção e em 2008
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul. Fotografia: WITTMANN, 2008.
Figura 115 - Vista parcial de Rio do Sul - Ponte dos Arcos – Década de 40 do Séc. XX
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
A madeira a ser transportada era conduzida em caminhões até o terminal de
cargas em Trombudo Central, de onde era embarcada no trem em direção a
Blumenau e ao porto marítimo.
176
Figura 116 - Terminal de cargas Trombudo Central - 2008
Fotografia: WITTMANN, 2008.
4.6.4 Trecho - Barra do Trombudo a Trombudo Central e acontecimentos
intermediários
Foi em 1904 que chegaram os primeiros imigrantes a Trombudo Central. As
terras da localidade pertenceram em um primeiro momento a Porto Belo; depois, a
Itajaí; depois, a Blumenau; e em 1933, tornaram-se distrito de Rio do Sul. Em 1958 o
núcleo emancipou-se de Rio do Sul.
Figura 117 - Estação de Barra do Trombudo
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Um alemão e um italiano foram os primeiros a chegar a Trombudo Central:
Emílio Graubner e Ernesto Prada lideraram o grupo que se instalou na
região em 1904. As terras faziam parte da gleba que Otto Blumenau
recebeu do Governo Imperial em 1850. Para que as terras se
desenvolvessem, as companhias de imigração trouxeram imigrantes
europeus experientes em agricultura. O início foi árduo: as famílias abriam
picadas nas matas, a facão, até chegarem a seus lotes. A origem do nome
177
Trombudo deve-se ao encontro dos rios do lugar, que forma a figura de
uma tromba. (SANTA CATARINA - MUNICÍPIOS, 2007).
Figura 118 - Vista Panorâmica de Trombudo Central na década de 50
Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE TROMBUDO CENTRAL.
Figura 119 - Trombudo Central
Fotografia: WITTMANN, 2008.
178
Figura 120 - Estação de Cargas da EFSC – Trombudo Central, 1970
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Figura 121 - Local da Estação de Cargas da EFSC – Trombudo Central, 2008
73
Fotografia: WITTMANN, 2008.
73
Reconstituída figura anterior, mesmo espaço nos tempos atuais por Jorge Wittmann.
179
Figura 122 - Trecho ferroviário entre Barra do Trombudo e Trombudo Central
Fonte: GOOGLE EARTH, 2006 - Alterado por WITTMANN.
Figura 123 - Localização, no mapa, da imagem anterior
Fonte: MAPAS de Santa Catarina - Guia geográfico, 2006 - Alterado por WITTMANN.
180
Enquanto as obras da EFSC seguiam para o litoral Itajaí; e para o oeste
Trombudo Central, o governo do Estado de Santa Catarina renovava o contrato de
arrendamento por mais 30 anos, conforme a Lei 771, de 21 de julho de 1948.
Entretanto, esse período de tempo não foi cumprido por parte do arrendatário, pois
ainda em 1956 o mesmo governo estadual acabou rescindindo tal contrato.
Em 1950 foi inaugurado o trecho entre Blumenau e Gaspar, seguindo a
margem direita do rio Itajaí-Açu. O trecho ferroviário entre Barra do Trombudo e
Trombudo Central foi inaugurado somente oito anos após, no dia 24 de janeiro de
1958. Foram 10 anos de construção.
Figura 124 - Solenidade de inauguração do trecho ferroviário entre Barra do Trombudo e
Trombudo Central
Fonte: PREFEITURA DE TROMBUDO CENTRAL.
4.7 MUDANÇA DO MODAL FERROVIÁRIO PARA O MODAL RODOVIÁRIO -
DECLÍNIO
Os acontecimentos no período pós-revolução de 1930 (mudanças de
natureza econômica, política, espacial e tecnológica no cenário nacional), foram
cruciais para o futuro da EFSC, a ferrovia no Vale do Itajaí.
A Nova República (1930), conhecida entre os ferroviários locais como
“Período Getulista”, tinha como meta de governo gerar o crescimento da indústria
com o seu desenvolvimento voltado para o mercado interno, por meio da
substituição de importações. Para isto, promoveram modificações no setor ferroviário
consubstanciadas em uma nova atitude dentro do ramo dos transportes.
181
Através da revolução de 30, um golpe de Estado conduziu Getúlio Vargas
ao poder. Em conseqüência, o País mergulhou numa série de turbulências
econômicas de maior e menor intensidade, causadas por motivos diversos,
mas sempre situações recorrentes. Entretanto, elas não impediram o
desenvolvimento impulsionado pelo capitalismo. A promessa do Getulismo
era “construir uma Pátria nova” para os 38 milhões de brasileiros. Para
Blumenau, o governo ditador representou literalmente o esfacelamento da
identidade do município, com a redução de seu território e a repressão ao
cultivo das tradições européias trazidas pelos colonizadores. (PETRY, 2000,
p. 164).
As vias ferroviárias, sob as novas prioridades administrativas do governo
federal, passaram a fazer “ponte” para o transporte da produção industrial entre as
regiões produtoras e os mercados consumidores regionais. Nesse período, a elite
política nacional, em sua maioria, era composta de latifundiários e pecuaristas; e a
elite econômica, de industriais.
O interesse dessas novas lideranças era fazer com que a produção nacional
chegasse a todo o território, extirpando os “arquipélagos” regionais. Esta intenção da
nova elite nacional era dificultada pela dimensão do território “continental” do País.
As ações se voltaram, então, para a multiplicação das rodovias e para tentativas de
construção de alguns ramais ferroviários regionais, derivados de ferrovias isoladas;
estas, desprovidas de alguma padronização
74
.
As novas prioridades do governo federal atingiam, igualmente, as ferrovias
do Estado catarinense. No Vale do Itajaí, a intenção era promover a ligação entre a
EFSC e a VFPSC do Tronco Sul.
As futuras conexões: embora acusando resultados financeiros
desfavoráveis, o Plano de Viação insiste na extensão de linhas férreas,
visando à interligação das estradas antigas com o Tronco Sul. É projeto,
igualmente, estender a E.F.S.C. de Trombudo Central até Ponte Alta do
Norte, conectando com o Tronco Sul, e daí até Marcelino Ramos,
estabelecendo-se novamente e ligação com a V.F.P.S.C. (LAGO, 1968. p.
230).
74
A bitola (distância entre os bordos internos da superfície dos trilhos) internacional é de 1,435 m,
conhecida como bitola larga. A bitola padrão, ou larga, é usada nas ferrovias do Canadá, Estados
Unidos da América, México e Cuba; e nas linhas-tronco da Europa Central, França, Grã-Bretanha,
Itália, países nórdicos e eslavos. No Brasil, somente 194 quilômetros da Estrada de Ferro Amapá
possuem bitola internacional. A falta de padronização das ferrovias brasileiras reflete a ausência de
uma administração centralizada e comprometida.
182
Figura 125 - Plano criar a malha ferroviária em território catarinense
Fonte: GOOGLE MAPS, 2006 - Alterado por WITTMANN.
Figura 126 - Locomotiva 301 (Locomotiva do trem inaugural de Rio do Sul)
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
As mudanças nas obras de construção da EFSC, a partir do período de
1930, quando foram priorizadas as de Rio do Sul, com o projeto de sua
183
complementação até o oeste catarinense, faziam parte dessas novas ações do
governo Getúlio Vargas. No entanto, todas as iniciativas do governo federal não
apresentavam a agilidade e os meios suficientes para acompanhar o ritmo de
expectativa da nova elite nacional, que adotou o modal rodoviário como o novo meio
de transporte deste novo tempo.
Os Blumenauenses assistiram, no início da década de 30, não somente à
agitação política do plano nacional, mas também ao surgimento de diversas
obras que mudaram o perfil urbano de Blumenau. Foram marcantes,
naquela época, os inícios da construção da ponte sobre o rio Itajaí-Açu, na
foz do ribeirão da Velha, ligando o Centro com o povoado da Ponta Aguda;
o prolongamento da Estrada de Ferro Santa Catarina, entre Lontras e Rio
do Sul; e a continuação dos trabalhos de construção do porto de Itajaí,
estratégico para o comércio e as indústrias de Blumenau. (SANTIAGO,
2001, p. 78).
Igualmente, passa o Estado a investir em novas estruturas rodoviaristas,
fazendo grandes investimentos, integrando regiões por meio de grandes obras
rodoviárias federais e estaduais, que sistematicamente foram substituindo as
ferrovias. Essa dominação do modal rodoviário iniciado no governo de Getúlio
Vargas foi consolidada no governo de Juscelino Kubitscheck. De acordo com
Santiago (2001, p. 113), em 1946 a ACIB se mobilizou, em Blumenau, para também
fazer reivindicações de melhorias de infra-estrutura, juntamente com outras
associações do Estado.
Pressionados pela falta de estradas de rodagens e linhas ferroviárias para
escoar sua produção e enfrentando a precariedade dos sistemas de
telefonia e energia elétrica, alguns líderes empresariais catarinenses
decidiram, em 1946, se unir para reivindicar melhor infra-estrutura e acesso
a crédito bancário. O encontro aconteceu em Blumenau e foi liderado pelo
presidente da Acib, Ernesto Stodieck Júnior. Ele reuniu os presidentes das
Associações Comerciais e Industriais de Itajaí, Rio do Sul e Lages, que
redigiram um documento conjunto encaminhado aos governos estadual e
federal, pedindo urgentes investimentos em infra-estrutura e abertura de
novas linhas de financiamento. (SANTIAGO, 2001, p. 113).
Vale a pena comentar e destacar, neste momento, a mudança de atitude da
associação ACIB, grupo representante de parte da elite local, que em outro
momento tanto fez para a efetivação e a construção da EFSC no Vale do Itajaí.
Outro fator local importante acontece na década de 40 do culo XX,
marcando o setor de transportes. Após quase um século, o rio Itajaí-Açu deixa de
ser o principal corredor de acesso de entrada de mercadorias e passageiros.
184
Figura 127 - Fotografia tirada da Praça Juscelino Kubitschek – em frente ao porto fluvial de
Blumenau
Acervo: WITTMANN.
Os vapores Progresso e Blumenau, que fizeram parte da EFSC, deixam de
navegar entre o porto fluvial e o porto marítimo; com isto, ocorreu também a
desativação do porto fluvial para o tráfego entre os dois portos.
Segundo Santiago (2001, p. 118), na década de 50 o Brasil passou a
experimentar uma nova fase de relacionamento entre o setor produtivo e o governo.
Iniciou-se o governo de Juscelino Kubitscheck. O governador catarinense, Irineu
Bornhausen, seguiu a trilha aberta pelo governo federal. Criou o Plano de Obras e
Equipamentos (POE), em 1951.
Vargas adotou uma política expansionista e nacionalista, reforçada
posteriormente pelo Plano de Metas de Juscelino Kubitscheck. Criou
mecanismos creditícios, tão reivindicados pelos empresários, como o Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDS) e o Banco do
Nordeste em 1953. O BNDS tinha como função financiar diretamente as
indústrias e também os investimentos de infra-estrutura básica, como
estradas, ferrovias, hidrelétricas e telefonia. (SANTIAGO, 2001, p. 118).
185
Figura 128 - Inauguração da fábrica Mercedes-Benz, em 1956 – Kubitschek dirige caminhão
Fonte: MERCEDES BENZ, 2007.
Kubitscheck solidificou o incentivo à troca das importações pelo
fortalecimento de indústria e abriu as portas do Brasil para o capital internacional.
Seu governo passa a investir maciçamente na construção de obras públicas de infra-
estrutura.
O Brasil passou a atrair capitais estrangeiros [...]. Uma complexa estratégia
de incentivos foi montada, incluindo financiamento oficial, infra-estrutura
bancada pelo poder público e a possibilidade de remessa de lucros para as
matrizes destas multinacionais. Começaram a ser instaladas no país
indústrias até então inexistentes, como as automobilísticas e a naval.
(SANTIAGO, 2001, p. 119).
No governo de Kubitscheck
75
, além do subsídio à implantação e à
solidificação da indústria automobilística, houve a entrada do capital estrangeiro por
meio de investimentos vultosos, para fortalecer definitivamente o modal
automobilístico em território nacional. Um exemplo: a construção da nova capital
brasileira no meio do cerrado, desprovida de qualquer comunicação, exceto por via
aérea.
O governo optou pela política voltada para a expansão das rodovias. E as
reservas de divisas que haviam sido acumuladas lá fora durante a II Guerra,
75
Em 1956, Juscelino Kubitschek inaugurou, em São Bernardo do Campo, a primeira fábrica de
caminhões com motor nacional da Mercedes-Benz e a fábrica da Volkswagen; em seguida, vieram
também a DKW, a francesa Simca e a americana Willys.
186
em vez de aplicadas ao reequipamento de nossas ferrovias, foram em parte
dissipadas na importação maciça de automóveis (além de eletrodomésticos
e outros bens não essenciais) e parte destinada à aquisição, pelo governo,
de ferrovias obsoletas, aqui implantadas, quase todas de propriedade
inglesa. (TORLONI, 1990, p. 223).
Em solo catarinense, o governador Celso Ramos (1961-1966)
76
criou o
Plano de Metas do Governo (Plameg), resultado de seminários promovidos pela
Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina. A Plameg investiu
fortemente em transportes. Durante o governo de Ramos, chegou-se a investir 55%
do orçamento estadual no setor de infra-estrutura.
Em 1957, para contornar a crise ferroviária nacional, o governo adquiriu as
companhias estrangeiras deficitárias, em número de 18, além de 80% das ferrovias
nacionais, e criou a Rede Ferroviária Federal S.A. - RFFSA
77
. Dois anos após, no
dia 5 de junho de 1959, no Vale do Itajaí é oficializada a rescisão do contrato de
arrendamento da EFSC pelo governo.
Apesar da criação da RFFSA e da aparente tentativa de reorganizar o
sistema ferroviário nacional, a RFFSA não poderia contar com o apoio de uma
política governamental comprometida e uma administração centralizada, ferroviária,
sob uma estrutura econômica estável. O setor ferroviário atuava predominantemente
na área de exportação e concorria em desigualdade com os caminhões, que não
tinham despesas com a construção e manutenção das rodovias, estas a cargo do
Estado.
Em Santa Catarina, segundo o professor Lago (1968, p. 229), a única
ferrovia que atravessava o Estado era a ARPSC, que seguia o Rio do Peixe em
Porto União, se bifurcava para Leste, passando por Canoinhas, Mafra, Rio Negrinho,
Jaraguá do Sul, Joinville, até o Porto de São Francisco do Sul. Não existia um
entroncamento ferroviário no Estado, embora a cidade de Porto União fosse um
ponto divergente de linhas. Havia projeto para que a EFSC fosse construída até
Canoinhas, para formar uma malha.
76
Celso Ramos foi ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado de Santa Catarina – FIESC;
portanto, um representante da elite industrial catarinense à frente do governo do Estado.
77
Criada mediante autorização da Lei 3.115, de 16 de março de 1957, e dissolvida de acordo com
o estabelecido no Decreto nº 3.277, de 7 de dezembro de 1999, alterado pelo Decreto nº 4.109, de 30
de janeiro de 2002, pelo Decreto 4.839, de 12 de setembro de 2003, e pelo Decreto 5.103, de
11 de junho de 2004. Sua liquidação, iniciada em 17 de dezembro de 1999, por deliberação da
Assembléia Geral dos Acionistas, atualmente é conduzida sob responsabilidade de uma Comissão de
Liquidação composta por até três membros. (Fonte: Ministério dos Transportes).
187
O movimento das ferrovias é bastante diminuto. Como se observa em todo
o País, a opção pelos transportes rodoviários tem reduzido o significado das
ferrovias, se bem que outros fatores, como o grau de absolutismo do
equipamento e dos meios de transporte, as contradições e desorientação do
traçado, concorram para a exaltação dos serviços rodoviários. (LAGO, 1968,
p. 229).
Enquanto isso, no dia 26 de 1959, segundo consta do livro comemorativo
dos 100 anos da Associação, página 125, a ACIB via atendida, ainda que
parcialmente, uma de suas maiores reivindicações. O governador Heriberto Hülse
inaugurou o asfaltamento do Trecho Blumenau-Gaspar da rodovia que liga
Blumenau a Itajaí, e sem qualquer reivindicação para o setor ferroviário. No dia 17
de setembro de 1960, membros da ACIB festejam a inauguração da rodovia Jorge
Lacerda, totalmente asfaltada em seus 49 quilômetros entre Blumenau e Itajaí,
comprometendo, definitivamente, o transporte ferroviário do Vale do Itajaí por meio
da concorrência rodoviária desigual dos caminhões modernos, ágeis e pontuais, de
acesso certo até as docas do porto de Itajaí.
Antes da inauguração da Rodovia Jorge Lacerda, a EFSC estava sob a
administração do governo federal, que aconteceu no dia 12 de março de 1960. A
função da RFFSA era somente a de um órgão que tentava recuperar a logística
ferroviária.
O que importava para o Governo (e continua) é o uso, quase que exclusivo
em todo o território nacional, do sistema rodoviário. Um sistema de
transporte sem dúvida vulnerável, já que não dispõe de sistemas
alternativos, salvo raras exceções. (VIDOR, 1995, p. 35)
A EFSC, segundo relatórios encontrados no Arquivo Histórico José Ferreira
da Silva, em Blumenau, era deficitária havia muitos anos, agravando mais sua
situação econômica dentro desse contexto nacional.
Em junho de 1963, a administração do governo federal incorpora a EFSC à
Rede Viação Paraná–Santa Catarina - RVPSC, alegando que tinha grande
dificuldade em administrar a ferrovia, deficitária. Por ser uma ferrovia isolada e de
pequena extensão, foi administrada diretamente de Curitiba, onde se situava a sede
da RVPSC.
Ironicamente, as inaugurações dos trechos da EFSC prosseguiam nesse
tempo. No dia 22 de junho de 1964, foi inaugurado o último trecho de 18 quilômetros
entre Trombudo Central e São João, em Agrolândia –, que funcionou por somente
três meses. A ausência de interesse pelo modal ferroviário era tão evidente por parte
188
de seus administradores, que quando ocorreu um desmoronamento no trecho de
Trombudo Central e São João, em 1964, não houve qualquer iniciativa em promover
a limpeza e o conserto da linha. O trecho foi desativado dois anos após a sua
inauguração. Segundo Luiz Carlos Henkels, da ABPF, o trecho, mal construído, não
suportou a primeira chuva torrencial na região.
Quando fomos a Blumenau de trem, três meses depois da inauguração,
fomos surpreendidos. O trem parou em Trombudo Central e não foi mais adiante.
Era o ponto final. Fazia três meses que a estação tinha sido inaugurada. Quando
nós ia (sic) a Blumenau de trem, nós aproveitava (sic) para levar “mussi”, leite,
queijo, nata, para vender lá. Acabou tudo! É uma pena! (Marcos Trapp
78
, em
entrevista informal à autora, no dia 20 de janeiro de 2008).
Figura 129 - Encontro com a família Trapp – Agrolândia - SC
Fotografia: WITTMANN, 2008.
No período entre 1964 e 1979, o capital internacional circulava livremente,
sem o empecilho das fronteiras geográficas. A indústria automobilística se instalara
78
Membro da família Trapp, descendentes de imigrantes austríacos (ínício do século XX), proprietário
das terras desde a época em que foi construída a estação ferroviária. Atualmente, a família ainda
reside no local. Marcos desenvolve atividades na agricultura, como seus antepassados. Seu pai se
chamava Frederico Trapp e sua mãe é Dona Lúcia Trapp, com a idade atual de 77 anos (filha do
imigrante Eduardo Will, pioneiro no local). Dona Lúcia alojava os trabalhadores da EFSC e lhes
fornecia refeições.
189
no Brasil, definitivamente. Após todos esses movimentos na década de 60 e 70, os
detentores do capital aumentaram suas exigências para que fossem feitos maiores
investimentos do Estado brasileiro, nos setores de energia e transportes. A indústria
automobilística exercia pressão maior sobre a expansão das vias rodoviárias em
todas as regiões. Nessa década, ocorreram planos e projetos, de Norte a Sul do
Brasil, envolvendo grandes intervenções urbanas, criando toda uma problemática
com a adoção de um sistema de transporte único, inter-regional, insuficiente para
atender à demanda de transportes e com grandes nós de conflitos estruturais
urbanos. Definitivamente, a opção adotada pelo Estado passou a ser o transporte
rodoviário. Em 1971 houve a inauguração da BR-101, cortando Santa Catarina de
Norte a Sul. Também foram pavimentadas diversas vias que ligavam o oeste ao
litoral catarinense, entre elas as BRs 116, 282 e 470. Segundo Santiago (2001, p.
135), o total de rodovias estaduais e federais asfaltadas em Santa Catarina cresceu
de 150 quilômetros, em 1960, para quase 2.000 quilômetros em 1976.
Em 1967 ocorreu a desativação do segundo trecho da EFSC o ramal de
Subida a Ibirama. Nessa ocasião aconteceu também o início das atividades com
trens mistos, devido à demanda de carga entre os anos de 1962 e 1966, que
diminuiu em razão da grande concorrência rodoviária.
Existia outro fator complicador para o transporte ferroviário local e nacional.
Com a escassez de madeira, combustível das locomotivas a vapor nas principais
ferrovias nacionais da época e da EFSC, surgiu a necessidade de trocar as
locomotivas a vapor por outras, com outro tipo de combustível. O governo brasileiro
optou pela locomotiva a diesel. Vale o comentário de que o Brasil, rico em reservas
hidráulicas e importador de derivados de petróleo, continuou dependente da
importação do combustível, ao optar pelas locomotivas a diesel, cujos motores
também eram importados. Torloni comenta sobre a opção adotada.
Significa, apenas, que houve nessa opção governamental duas distorções
altamente prejudiciais: uma, a dielização em vez da eletrificação das
ferrovias e, outra, o abandono das ferrovias, decorrente da canalização de
recursos quase que exclusivamente para o setor rodoviário.
Não se cuidou, por fim, de estimular a infra-estrutura industrial para suporte
do parque ferroviário. (TORLONI. 1990, p. 225).
190
Figura 130 - Estação de Indaial. Da direita para a esquerda: Júlio Espindolla, Domingos da
Costa, Joaquim dos Santos, Pedro Cidral, José Paulo, Germano Amorim (mestre da oficina),
Liberato Xuxu, Leandro dos Santos, João Cardoso e Pedro Mello (maquinista) - 1962
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Foi somente em janeiro de 1968, após tantos problemas, que a EFSC passa
a ser administrada pela RFFSA, sob a denominação de EF-487. Nessa época
existia a especulação sobre o futuro da ferrovia do Vale do Itajaí, fruto da união de
interesses dos pioneiros locais de outros tempos, fato que gerava grande
constrangimento ao governo federal. Lembramos, a respeito, que a EFSC (EF-487)
sequer faz parte da história ferroviária contada nas páginas do site do Departamento
Nacional de Infra-Estrutura de Transportes DNIT
79
. Nesse mesmo ano, foi
erradicado o ramal de Ibirama, e seus trilhos foram retirados e transportados para
Blumenau, a maioria deles tendo sido usada na construção civil.
79
Disponível em: http://www1.dnit.gov.br/ferrovias/historico.asp, acessado em 3 jan. 2008.
191
Figura 131 - Ferroviários nas oficinas da EFSC
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Segundo Luiz Carlos Henkels ABPF, nesse momento crítico da EFSC, em
1969, os ferroviários promoveram trabalhos de manutenção na ferrovia, por conta
própria, com o objetivo de melhorar o desempenho financeiro. Esta ação conseguiu
um superávit nos anos de 1969 e 1970, mas não impediu que no dia 18 de fevereiro
de 1971 o processo MT 11.353/70, do Ministério dos Transportes, homologasse a
suspensão do tráfego da EF-487 (ex-EFSC). E a Resolução 22/71, de 2 de março de
1971, marcou a suspensão do tráfego ferroviário da EF-487 para a zero hora do dia
13 de março de 1971.
A publicação do livro “ACIB-100 anos” contém o seguinte parágrafo sobre o
fato:
No dia 13 de março de 1971, obedecendo a determinações do governo
federal, o comboio da Estrada de Ferro Santa Catarina fez sua última
viagem de Blumenau em direção a Itajaí. A Associação reclamou da
medida e lutou para que ela não fosse implementada, alegando a franca
recuperação apresentada pela ferrovia nos últimos anos. No entanto, os
esforços das lideranças locais, que lutavam pela manutenção da ferrovia,
foram em vão. (SANTIAGO, 2001, p. 144).
192
Figura 132 - Oficina Mecânica de Itoupava Seca, Blumenau. (Locomotiva do trem inaugural de
Rio do Sul). Início de 1971 - Primeira locomotiva da EFSC, à esquerda: 301
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Teriam realmente havido esforços, por parte das lideranças do Vale do Itajaí,
na mesma medida usada para a sua construção, no início do século XX? Houve
justificativas, por exemplo:
Na opinião do ex-presidente Willecke, o que faltou para o sucesso da
Estrada de Ferro de Santa Catarina foi uma ligação do Alto Vale com a linha
nacional que passava por Lages. Em 1973 foi realizada uma campanha pela
revitalização da estrada, mas não vingou devido à falta de engajamento do
poder público. Além disso, a melhoria das rodovias contribuiu para sepultar
definitivamente a ferrovia, que transporta mais volume com menos despesa.
(SANTIAGO, 2001, p. 144).
O poder público é formado por quem e com que interesses?
193
Figura 133 - Estação de Indaial - Última viagem (I) - 1971
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Figura 134 - Estação de Indaial - Última viagem (II) - 1971
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
194
Figura 135 - Estação de Indaial - Última viagem (III) - 1971
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
O superintendente Hélio de Mello, autorizado pela RFFSA, suspendeu todo
o tráfego ferroviário em março de 1971. No dia 12 de março de 1971, às 17 horas, o
maquinista José Pacheco comandou a máquina da última viagem de trem da EFSC.
A composição era formada pela locomotiva a vapor n
o
. 331, de fabricação Baldwin,
norte-americana, de 1925, mais quatro vagões.
Os passageiros desta última viagem de trem da EFSC eram os funcionários
da estrada de ferro e seus familiares, que com lenços brancos cumprimentavam as
pessoas ao longo da ferrovia, ao som do sino e do apito do trem.
4.8 A EFSC APÓS A DESATIVAÇÃO
O patrimônio da EFSC, após a desativação da ferrovia, foi dilapidado quase
por completo. Pouco depois da última viagem, em março de 1971, iniciou-se um
processo de desmonte. A RFFSA não foi atuante quanto à sua preservação e
guarda. A instalação telegráfica, por exemplo, teve seus fios roubados
imediatamente após março de 1971. Em questão de pouco tempo, as estações
ferroviárias foram sendo cedidas às administrações municipais, que lhes atribuíram
diversos usos, como se explanará mais adiante.
195
Grande parte do leito ferroviário foi invadida pelos residentes ao longo da
linha férrea, para anexação às suas propriedades; outros trechos ferroviários foram
transformados em rodovias.
Em setembro de 1980, a RFFSA autorizou a retirada do material metálico da
linha, contando com sua erradicação, que veio a acontecer no dia 11 de dezembro
de 1981, sob a Resolução 5/81, do Conselho Nacional dos Transportes. O Conselho
argumentou que a erradicação era necessária, visto que tal patrimônio era
dispendioso e antieconômico aos cofres públicos.
A ferrovia entrou em leilão, tendo o material metálico sido adquirido pela
Empresa Barranco Ferro e Aço (de Curitiba), que iniciou sua respectiva retirada em
1982 trilhos e algumas pontes metálicas. Na serra, pela dificuldade de acesso,
algumas pontes permanecem ainda nos dias atuais, conforme demonstrado neste
trabalho.
O leito ferroviário, embora sem trilho, ainda é de propriedade da Rede
Ferroviária. Os trechos foram demarcados com marcos feitos de pedaços de trilho,
mas o são respeitados pelas edificações residenciais ou industriais que vão
surgindo.
O material rodante foi transferido para outras unidades. Carros e vagões
foram desembarcados no porto de São Francisco, onde foram alocados à Rede de
Viação ParanáSanta Catarina, ficando em Blumenau somente as locomotivas a
vapor. Estas, por não terem uso em outras unidades da Rede, ficaram encostadas
até 1973, quando foram sucateadas e seu material reaproveitado em indústrias do
Vale do Itajaí. Algumas até em bom estado de conservação.
Outros materiais utilizados nas estações e oficinas foram transferidos para a
cidade de Curitiba, onde hoje integram o acervo do Museu Ferroviário.
Ao longo do antigo leito reminiscências, e ainda existem algumas
estações cedendo seu espaço para atividades voltadas à comunidade. Outras
sucumbiram e outras, ainda, estão quase em ruínas, abandonadas ou invadidas. A
seguir, cada estação da EFSC e sua situação atual.
A estação de Engenheiro Vereza, quase totalmente descaracterizada, foi
cedida pela prefeitura de Itajaí à Fundação Genésio Miranda Lins, para abrigar o
Museu da Memória Indígena. Sofreu uma reforma em 2005.
196
Em Ilhota, de acordo com Giesbrecht, a estação foi demolida em 1982. a
estação de Gaspar, segundo René Almeida, conserva a tipologia arquitetônica e é
parte do clube dos funcionários da empresa Linhas Círculo.
A segunda estação de Blumenau, após 10 anos de desativação da estrada
de ferro, foi ocupada por uma clínica veterinária, na atual Rua Martin Luther. No local
da primeira estação de Blumenau foi construída a nova Prefeitura Municipal de
Blumenau. A primitiva estação, em enxaimel, foi demolida na década de 60.
A estação de Salto Weissbach, construída na década de 40 do século XX,
foi demolida em 1991, por ordem da administração pública municipal, no mandato do
prefeito Vilson Pedro Kleinübing. Atualmente, no local um pequeno restaurante
de beira de estrada, construído sobre a rampa de granito rosa da antiga plataforma.
A estação de Encano, após ter sido invadida inúmeras vezes, foi demolida por um
invasor do pátio da estação, em 1982.
A estação de Indaial está em perfeito estado de conservação, e nela
funciona um departamento da administração pública de Indaial. Fato curioso: em um
primeiro momento após a desativação, a estação de Indaial foi utilizada como
Terminal Rodoviário, ilustrando perfeitamente a troca do modal ferroviário pelo
rodoviário, dentro de um mesmo espaço.
A estação de Warnow continuou abrigando ferroviários por um tempo, mas
hoje não mais. Em seu terreno foi construída uma residência, na parte dos fundos.
A estação ficou no jardim da residência. Sofreu um incêndio e está em processo de
ruína.
Figura 136 - Estação Warnow
Fotografia: WITTMANN, 2008
197
Figura 137 - Estação Warnow (I) Detalhes das paredes internas
Fotografia: WITTMANN, 2008
De acordo com Giesbrecht, a estação de Subida teve uma “invasão”
autorizada. Seu estado de conservação é ruim, pois vem sendo demolida aos
poucos.
A estação de Lontras esteve durante muito tempo em perfeito estado de
conservação. Foi invadida após a desativação do trem, sendo desocupada e
restaurada pela Prefeitura Municipal de Lontras, em 1996. Abrigou o Centro de
Convivência do Idoso e, atualmente abriga a Biblioteca Pública Municipal.
198
Figura 138 - Estação de Lontras
Fotografia: WITTMANN, 2008
A estação de Matador foi totalmente recuperada pela equipe de voluntários
da Tremtur e da ABPF. Em outubro de 2004, teve início o restauro de seu prédio,
com o objetivo de ser o ponto inicial do Museu Dinâmico da EFSC.
Figura 139 - Estação de Matador
Fotografia: WITTMANN, 2008
199
A estação de Rio do Sul está em perfeito estado de conservação e funciona
como Museu e Arquivo Histórico daquela cidade. É tombada pelo Patrimônio
Histórico Municipal. O antigo armazém está em perfeito estado de conservação,
situado a 500 metros da estação.
Figura 140 - Detalhes do Armazém de Rio do Sul
Fotografia: WITTMANN, 2008
Figura 141 - Estação de Rio do Sul (fundos)
Fotografia: WITTMANN, 2008
200
A estação de Barra do Trombudo ainda faz parte do contexto urbano da
cidade. Foi restaurada em 2006, e nela são ministrados cursos de artes para a
comunidade. Para adequar seus espaços para o novo uso, sua arquitetura foi
descaracterizada com a adoção de novos tipos de janelas e portas. Foram
colocadas janelas de ferro, tipo basculante.
Figura 142 - Estação de Barra do Trombudo
Fotografia: WITTMANN, 2008
A estação da comunidade de Mosquito ainda está em condições
satisfatórias. Nesta estação reside uma família e apesar do novo uso, não sofreu
qualquer descaracterização. Apresenta somente ausência de manutenção.
Entre a estação de Mosquito e Trombudo Central foi construído um elevado,
que representa uma transição de técnica construtiva da engenharia ferroviária. Os
materiais usados são concreto armado e blocos de granito rosa. Está em boas
condições, porém sem uso atualmente.
Figura 143 - Elevado entre a estação de Mosquito e Trombudo Central
Fotografia: WITTMANN, 2008
201
As condições da estação de Trombudo Central são satisfatórias. No local
reside uma família que construiu um anexo, com função de garagem, coberto por
telha tipo eternit, na fachada do antigo acesso de passageiros. Este anexo não
comprometeu a arquitetura da estação, pois é de fácil retirada.
Figura 144 - Estação de Trombudo Central
Fotografia: WITTMANN, 2008
Seu estilo arquitetônico igualmente segue a linha art decó. Apresenta janelas
estreitas e altas, almofadadas com vidro liso incolor. Base e rampas de acesso
construídas, como as demais, em granito rosa.
Próximo à estação de Trombudo Central está situado o elevado, construído
dentro da linguagem moderna, em concreto armado, com a forma baseada em
linhas curvilíneas. Foi construído em 1964. Hoje está inserido no sistema viário e é
usado para o fluxo de uma via local.
Figura 145 - Elevado em Trombudo Central
Fotografia: WITTMANN, 2008
202
A estação de São João sofreu avarias três meses depois de sua
inauguração, causadas por uma enxurrada que varreu não somente a estação, mas
fez muitos estragos no patrimônio ferroviário local. Segundo o Sr. Marcos Trapp,
proprietário do terreno sobre o qual a estação foi construída, até bem pouco tempo
ela estava em condições satisfatórias de preservação. Encontra-se afastada, “no
meio da roça”, estando hoje em ruínas, demarcando a criação de abelhas para a
produção de mel.
Figura 146 - Estação de São João – Detalhes das ruínas
Fotografia: WITTMANN, 2008
Muito da memória ferroviária da EFSC vem sendo recuperado hoje por
diversos grupos preservacionistas, que apresentam projetos não somente do resgate
da memória por meio de documentos e recuperação do material rodante, mas
também propostas mais ousadas, como o retorno do transporte ferroviário como
opção, que poderia perfeitamente ser tema e aprofundamento de futuras pesquisas.
203
Figura 147 - Locomotiva restaurada pela empresa do Sr. Germano Purnhagen (camisa branca),
com apoio da ABPF/TREMTUR
Fotografia: WITTMANN, 2007
Figura 148 - Trabalho de voluntários no restauro da estação de Matador
Fonte: TREMTUR, 2006.
204
4.8.1 Associação Brasileira de Preservação Ferroviária - ABPF
Apaixonados pelos trens não desapareceram com o tempo. Não só em
Santa Catarina a rede ferroviária estimulou o aparecimento de inúmeros fãs
dos trilhos. No Brasil inteiro estes fãs estão reunidos, lutando pela
preservação ou pelo resgate de várias redes ferroviárias pelo País. Para
viabilizar esta luta infindável contra a corrosão do tempo e contra o descaso
para com a história, foi criada em 1977 a Associação Brasileira de
Preservação Ferroviária (ABPF). (JORNAL SANTA CATARINA, 1996).
A Associação Brasileira de Preservação Ferroviária ABPF, fundada em
1977 pelo francês Patrick Henri Ferdinand Dollinger, reúne interessados na
preservação e divulgação da história da ferrovia brasileira.
A ABPF, localizada na cidade de Campinas-SP, é composta por uma
diretoria nacional, por divisões regionais e núcleos espalhados pelo país,
destacando-se o Núcleo Regional do Vale do Itajaí.
Em Santa Catarina, a ABPF teve sua regional fundada em 20 de março de
1993, na cidade de Rio Negrinho. A Regional do Vale do Itajaí foi fundada em
outubro de 1995.
No Vale do Itajaí as metas atuais da ABPF são:
a) recuperar todo o trecho de 22 quilômetros, do início da serra em Ibirama
até o município de Lontras, construído entre 1920 e 1929, onde a última
locomotiva a vapor fabricada nos Estados Unidos em 1952, a 501,
rodava;
b) recuperar 5 quilômetros, do km 11 ao km 16 da antiga estrada de ferro
que passava por Blumenau, no trecho entre a comunidade de Encano
(Indaial) e o bairro do Passo Manso (Blumenau).
A ABPF, em parceria com a Tremtur (Fundação), está cumprindo parte de
suas metas e reimplantando o extinto trecho da EFSC, num trecho de 27 quilômetros
entre Subida e Rio do Sul. A ABPF/SC está cedendo a locomotiva e os vagões, e
efetuará a operação do trem; e a Tremtur fará a implantação do trecho ferroviário e o
agenciamento turístico das viagens.
O NuRVI Núcleo Regional do Vale do Itajaí ABPF-SC informa que a
locomotiva 232 continua sendo acesa na estação de Matador, em Rio do
Sul-SC, sempre no segundo domingo de cada mês, ocasião em que a
comunidade e turistas podem verificar o desempenho da locomotiva ao
tracionar um carro de passageiros nos 400 m de linha. Durante o passeio
são proferidas pequenas palestras acerca da importância histórica da EFSC
e de sua revitalização para uso turístico e museu dinâmico. No Dia dos Pais
o público presente foi pequeno, porém, manteve a equipe ocupada durante
205
todo o dia. O desempenho da 232 continua muito bom, enquanto a equipe
mecânica continua realizando pequenos ajustes, principalmente no sistema
de freios e na ligação do tender à locomotiva. (ABPF, 2007).
Figura 149 - Locomotiva 232 restaurada, descansando na estação de Matador
Fotografia: WITTMANN, 2007.
Do município de Indaial-SC tivemos outra boa informação. A Secretaria de
Desenvolvimento Econômico e Turismo da cidade adquiriu um rico material
fotográfico de peças ferroviárias históricas que faziam parte de uma
exposição itinerante pertencente a um particular que não mais se interessou
em levar adiante seu projeto. Com isso, o museu ferroviário de Indaial,
alocado na estação ferroviária (inaugurado em 21/03/06 com apoio do
NuRVI) será ampliado, passando a ocupar a totalidade do prédio, velho
anseio dos preservacionistas de Indaial. Estes materiais recém-adquiridos
irão passar pela nossa avaliação, no sentido de realizar correção em vários
textos para que a exposição seja fidedigna, para bem informar a quem ali
realizar pesquisas. Também de Indaial-SC vêm boas notícias acerca da
ponte de ferro sobre o ribeirão Encano, que está a aguardar dezesseis anos
pela sua restauração, após o movimento que realizamos em 1990,
impedindo seu sucateamento. No mês de julho passado a Comissão
Municipal de Turismo, liderada pelo Sr. Rogério Raul Theis e a Secretaria
de Desenvolvimento Econômico do Município, representada pelo Sr. Luis
Otávio Giovanella, começaram a tratar com empresas especializadas a
preparação de orçamentos para a restauração da ponte. (ABPF, 2007).
206
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O trabalho que aqui se encerra desvela parte dos acontecimentos históricos
que permearam a formação dos espaços urbanos do Vale do Itajaí, os quais estão
em permanente transformação. A questão do transporte ferroviário é atual, e vem
sendo apontada como uma das alternativas para a crise do transporte rodoviário no
País. Portanto, o tema, de um patamar de compilação histórica, passa a ser
importante base para a pesquisa e prévia avaliação das condições estruturadoras de
futuras pesquisas e propostas de transporte que atendam à logística da região.
Sob um ponto de vista particular, a pesquisa foi envolvente e apaixonante, e
poderá ter continuidade por meio do desenvolvimento de outros temas relacionados
ao assunto. Algumas sugestões emergem deste texto dissertativo; outras idéias
poderão, eventualmente, surgir por inspiração temática.
Os objetivos iniciais foram alcançados por meio das respostas aos
questionamentos iniciais deste trabalho, e algumas conclusões foram extraídas da
análise de fatos históricos relacionados ao processo de implantação e desativação
da ferrovia no Vale do Itajaí, tendo, inclusive, se revelado surpreendentes.
Para a obtenção de maior número de dados para a pesquisa e maior
legitimação de sua fundamentação, grande parte do antigo leito ferroviário da EFSC
foi percorrida em dois tempos distintos (outubro de 2007 e janeiro de 2008), no
trecho entre Blumenau e Agrolândia. Este contato ampliou a compreensão do
espaço e do processo histórico de implantação da ferrovia no sítio, facilitando a
elaboração de algumas conclusões e a captação de imagens atualizadas do antigo
trajeto.
Em ordem cronológica da pesquisa, surgiram questionamentos naturais que
a compuseram. O primeiro: O que levou as lideranças do Vale do Itajaí, no início do
século XX, a adotarem a ferrovia como meio de transporte, ícone da Revolução
Industrial Européia? Por que foi adotada a tecnologia ferroviária alemã, visto que
todas as ferrovias nacionais eram construídas com tecnologia inglesa?
Pode-se afirmar que o plano de implantar a ferrovia na região do Vale do
Itajaí chegou com os pioneiros europeus na metade do século XIX, os quais, então,
haviam tido contato, em suas cidades de origem, com a revolução industrial e com o
processo econômico capitalista que propiciou o início da era moderna. Foi adotada a
207
tecnologia ferroviária alemã porque estes primeiros imigrantes, durante as primeiras
décadas no Vale do Itajaí, mantinham estreitas ligações comerciais e laços afetivos
e culturais com seu país de origem, independentemente da hegemonia da tecnologia
ferroviária inglesa presente no mundo e em especial no Brasil, nessa época,
conforme citado no corpo desta pesquisa. Este fato foi evidenciado quando na
escolha do local de assentamento da sede da colônia de Blumenau, à chegada dos
primeiros 17 imigrantes em 1850, indicado em um plano (mapa) marcando lotes
coloniais nas proximidades da foz do ribeirão Garcia.
Os núcleos urbanos no interior da colônia foram assentados nos sedimentos
antigos, alcançando a superfície do Planalto Oriental, na certeza de que existiria o
estabelecimento de uma comunicação natural, por meio de caminhos que
posteriormente foram feitos por agrimensores alemães, e em decorrência da
construção da ferrovia. Estes núcleos urbanos que pipocavam no interior da colônia
mantinham constante articulação com a sede, que apresentava sua localização
estratégica sob o ponto de vista geográfico.
A bacia do rio Itajaí-Açu, por apresentar uma grande extensão territorial, era
propícia para que nela houvesse bons negócios em curto e médio prazo, devido à
possibilidade da presença de vários tributários, que explorariam diferentes tipos de
terrenos geológicos. O local de implantação da sede da colônia Blumenau, onde se
demarcava o final de navegabilidade do rio Itajaí-Açu, foi propositalmente escolhido,
contando com o complemento de um modo de transporte, deste ponto para o
interior e deste, para o porto marítimo. Isto porque o estrangulamento do rio Itajaí
Açu, acima do local da sede de colônia, impedia a navegação a montante.
O objetivo das lideranças do Vale do Itajaí, desde a época de sua chegada
à região, sempre foi o de efetivar a ligação de Colônia Blumenau com o planalto
serrano e com a Argentina, por meio da abertura de caminhos. Isso a fim de criar
opções de escoamento comercial e interceptar o caminho das tropas que percorriam
a trilha que ligava o Rio Grande do Sul a São Paulo, próximo a Lages. Pode-se
afirmar que em 1850 se pretendia criar uma malha de caminhos possibilitando
opções do escoamento da produção e tornando a nova colônia, que emergia então,
em um entreposto comercial importante para toda a região.
Os caminhos em rede na região e a ferrovia escoariam a produção das
propriedades rurais que formavam as nucleações urbanas primárias, que deram
origem às muitas cidades atuais do Vale do Itajaí. Era comercializado, então, o
208
excedente agrícola dos produtores rurais. Com base nesses dados, pode-se
confirmar a teoria de Vidor (1995) de que a construção social do Vale do Itajaí não
teve nenhum processo anterior ao advento do capitalismo. No projeto de ocupação
do território elaborado pelo Dr. Blumenau estava explícito o modo de produção
capitalista, com influência da escola iluminista fisiocrática de Quesnay, por meio do
desenvolvimento da agricultura, cuja produção seria beneficiada industrialmente sob
inspiração do novo ideário que envolvia a Europa.
Algumas décadas após a chegada dos primeiros imigrantes, os núcleos
urbanos isolados dentro do processo de produção social estabelecido na região,
representavam a fonte primária da matéria-prima que alimentava a emergente
indústria familiar local, na virada do século XIX para o século XX. Era então
industrializado o excedente agrícola. Esta configuração social incentivou as
lideranças políticas e econômicas locais a buscarem alternativas concretas, para,
enfim, se concretizar o plano dos pioneiros a construção da ferrovia.
O segundo questionamento: O que, realmente, motivou o investimento de
capital alemão e a adoção de tecnologia alemã em um meio de transporte no Vale
do Itajaí, idealizado anteriormente pelo fundador Hermann Blumenau, no século
XIX, quando todas as ferrovias nacionais utilizavam equipamento ferroviário inglês?
É importante destacar que os imigrantes europeus nos primeiros tempos de
povoação tinham mais ligações comerciais e sociais com o seu país de origem do
que com qualquer outra região do Brasil. Não porque quisessem, mas porque a
povoação e o assentamento de seus membros significavam uma concentração de
problemas a serem resolvidos relacionados ao uso e ocupação do solo virgem, como
por exemplo, a construção de infra-estruturas compondo os espaços públicos de
responsabilidade da administração pública estadual e nacional. Geralmente, estas
primeiras nucleações urbanas eram assentadas de maneira isolada na mata virgem.
Existia, ainda, a barreira da língua na comunicação.
Quanto ao investimento na construção da EFSC, além da razão cultural e
comercial citada, outros fatores contribuíram para que ocorresse o investimento do
capital alemão e a adoção da tecnologia alemã na construção de EFSC na região.
Na virada do século XIX para o século XX, o fortalecimento do partido
republicano na região e no Brasil resultou em mudanças sociais e econômicas não
somente no País como também, especificamente, na região do Vale do Itajaí. Entre
elas, o aumento das transações comerciais de terras destinadas a imigrantes, por
209
meio do incremento da concessão de terras na bacia do Itajaí-Açu a empresas
colonizadoras, como a Colonizadora Hanseática (com sede em Hamburgo).
As colonizadoras, na época, faziam o papel do Estado no que tange a obras
de infra-estrutura primária, como a construção de pontes e estradas. As áreas
comercializadas quase sempre eram grandes glebas praticamente desabitadas.
Quando as empresas colonizadoras tomaram para si estas tarefas, isto não
significava que estivessem interessadas em construir e promover a construção e
organização espacial destes primeiros núcleos urbanos, mas sim, que vislumbravam
o aumento de sua rentabilidade e negócios por meio do aumento das vendas de
terras. Com a construção da infra-estrutura básica as terras eram valorizadas, diante
da possibilidade de ligações e comércio com outras regiões.
Em 1897, estando a cargo da Colonizadora Hanseática a negociação das
terras da zona da bacia do Itajaí banhada pelo rio Hercílio, essa empresa foi
abordada por lideranças políticas e econômicas locais e por investidores alemães
ligados ao transporte fluvial e a bancos, para que investisse na construção de uma
linha férrea ligando a região do Vale do Hercílio à sede da Colônia Blumenau. Esta
obra representava, para a Colonizadora, um aumento de sua rentabilidade,com base
nas vendas, pois a região, apesar de se encontrar muito bem localizada em um vale
com boas terras para a plantação, se encontrava isolada. Para os investidores de
empresas de navegação alemãs, representava a perspectiva de explorar a
navegação fluvial no rio Itajaí-Açu. Para os banqueiros alemães, a possibilidade de
lucros certos, advindos dos juros sobre o capital aplicado, pois, aparentemente, o
empreendimento apresentava vários pontos de negócio seguro. Para a região do
Vale do Itajaí, por sua vez, representava a chance concreta do desenvolvimento
econômico promovido pelo escoamento da produção regional para o porto marítimo.
Diante dessa chance de materializar a construção da ferrovia na região, as
lideranças vislumbravam a possibilidade concreta de criar uma malha ferroviária
na região, construindo a ferrovia até o extremo oeste do Estado.
Construída a ferrovia, o desenvolvimento da região foi evidenciado. E a sua
interferência, como elemento estruturador da construção da malha urbana destes
primeiros núcleos urbanos, embriões das muitas cidades que compõem a rede de
cidades da região metropolitana de Blumenau atual, é notória, pelo surgimento de
cidades eqüidistantes ao longo do antigo leito ferroviário. Vale destacar o
desenvolvimento econômico de Rio do Sul. Antes da construção da ferrovia era uma
210
antiga estalagem e passagem de viajantes que rumavam ao planalto serrano e
litoral, via Alfredo Wagner, e de onde vinham tropas de gado e também viajantes em
busca de produtos industrializados. Tornou-se um entreposto comercial
intermediário, por meio de um entroncamento natural de rotas comerciais. A ferrovia
permitiu que as cidades se desenvolvessem ao longo de seu traçado, mais
precisamente em torno de suas 24 estações. Novas nucleações (como Trombudo
Central, Barra do Trombudo, Lontras) surgiram ao longo da ferrovia e se
desenvolveram, possibilitando a visualização do crescimento da malha em forma de
estrela, forma essa encontrada em todas as grandes cidades do mundo, até o
advento do automóvel. O automóvel gerou autêntica revolução na urbanização dos
espaços das cidades. E não poderia ser diferente no Vale do Itajaí, pois as pessoas,
não tendo mais necessidade de residir, ou mesmo produzir, nas proximidades das
nucleações e entre as estações, passaram a ocupar os espaços vazios entre elas,
dando origem a novos bairros e ao aumento, de maneira orgânica, da malha urbana
atual (tema que poderá sem desenvolvido em outra pesquisa). Esta configuração
fez com que as cidades crescessem de maneira aleatória, fazendo surgir uma série
de problemas, dentre os quais o aumento do tráfego e o obsoletismo do traçado das
vias atuais, que não apresentam perspectiva de solução ante o aumento da frota de
automotores.
Outro questionamento: Quais foram os agentes e ações responsáveis pela
desativação da ferrovia no Vale do Itajaí?
Pode-se afirmar que a desativação da EFSC foi resultado final de um
processo criado por uma série de acontecimentos e iniciativas de ações do poder
político e econômico nacional.
O Brasil, na ânsia de desenvolver a indústria no território nacional, na
década de 1930, buscou solidificar e construir malhas ferroviárias criando caminhos
de escoamentos interligados, e terminando, assim, com as ilhas de produção
isoladas, como era o caso da região do Vale do Itajaí. A EFSC era um ramal
pequeno, isolado. Durante o “Período Getulista” houve inúmeras iniciativas para
promover o crescimento da indústria, com seu desenvolvimento voltado para o
mercado interno, substituindo as importações. Com o nacionalismo latejante, o
governo, nessa época, observava com cautela as regiões povoadas por imigrantes
europeus, dificultando mais as ações de iniciativa local,, e a região passava a
receber produtos industrializados de outras regiões, como São Paulo, competindo
211
diretamente com a indústria local. Daí em diante, a região deixou de ser uma ilha
isolada, e passou igualmente a comercializar sua produção para esses mercados
mais afastados, atendendo, desta forma, à vontade das novas lideranças nacionais,
cuja meta era que a produção nacional chegasse a todas as regiões do território
nacional, plano esse dificultado pela dimensão do território nacional.
Como a ferrovia apresentava limitações e não tinha penetração em todas as
regiões, houve ações para a construção de rodovias e de ramais ferroviários
regionais.
A abertura do País para o capital das multinacionais aconteceu no governo
de Juscelino Kubitscheck, quando a desvantagem do modal ferroviário para o modal
rodoviário aumentou. Os investidores internacionais e as lideranças locais
vislumbravam, no automóvel, rapidez e mobilidade, e o escolheram como o meio de
transporte adequado ao perfil dos novos tempos, sem qualquer reflexão sobre os
conflitos de tráfego viário que surgiriam em longo prazo nos espaços das cidades.
Também não houve uma reflexão quanto ao material e capital, investidos nas
ferrovias existentes. Muitos dos investidores eram representantes dos produtores de
petróleo internacionais e indústrias automobilísticas que buscavam ampliar seu
mercado de consumo no território brasileiro.
Diante desse contexto, a ideologia vigente no período propagava, com o aval
do Estado, “inúmeras vantagens” do transporte feito por automóveis, quer seja no
transporte público ou privado, em âmbito nacional.
A EFSC, não mais administrada na região, e sim pelo Estado brasileiro,
como outras tantas no território nacional, tornou-se economicamente inviável. As
lideranças locais, que noutro tempo tanto fizeram para sua construção, foram
seduzidas pela nova alternativa de transporte e dirigiram suas iniciativas à
construção de rodovias na região. Deixou, assim, de haver o necessário empenho
na manutenção da ferrovia, no material rodante e na estrutura ferroviária. A nova
ideologia econômica propagava a necessidade da modernização, e o automóvel
detinha esse perfil. Faltou reflexão sobre as conseqüências geradas pela troca do
modal ferroviário pelo rodoviário.
O agente responsável pela decadência ferroviária na região e no Brasil foi a
implantação, pelo Estado, de novas políticas econômicas que, sob o comando do
capital internacional adotaram o modal rodoviário como o meio de transporte dos
novos tempos, não somente no Brasil, mas globalmente.
212
Em relação ao aspecto urbano, conclui-se que a ferrovia foi um dos
elementos estruturadores da malha urbana do Vale do Itajaí, juntamente com os
primeiros caminhos feitos pelos pioneiros e as vias fluviais. A última etapa ferroviária
da EFSC a ser inaugurada e que permaneceu efetivamente em uso foi a do trecho
até Trombudo Central, no ano de 1958, e até Itajaí fora inaugurada em 1954. A
desativação de todo o trecho aconteceu em 1971; portanto, permaneceu em pleno
funcionamento somente pouco menos de duas décadas. A EFSC foi o caminho mais
efetivo para a agilidade de povoação do território, dos imigrantes europeus no Alto
Vale do Itajaí, durante seu 20 anos iniciais de funcionamento. Promoveu a ligação
da sede da colônia Blumenau com outros núcleos urbanos no Alto Vale que, mais
tarde, ao longo dos inúmeros desmembramentos, se transformaram nas cidades de:
Indaial, Ascurra, Ibirama, Lontras, Rio do Sul e Trombudo Central. Transportou
durante mais de seis cadas no Vale do Itajaí: cimento, fécula, gado, madeira,
areia, soda cáustica, correio e passageiros.
Neste trabalho, ficou, assim, evidenciado o fato de que o Vale do Itajaí já foi,
um dia, provido por uma estrada de ferro consideravelmente moderna para a época,
que funcionava de forma integrada e harmônica para o transporte rodoviário e fluvial,
e em regime de eficaz complementação. Sua desativação de certa forma
precipitada, intempestiva não consegue impedir a presença de um sentimento de
frustração, que acaba adquirindo contornos ainda mais ampliados diante dos
constantes desafios e dificuldades que a administração pública enfrenta para uma
adequada manutenção e uso das rodovias que cortam nosso País, de proporções
continentais.
Enquanto as grandes aglomerações urbanas investem fortunas para reativar
antigos ramais, construir dispendiosas e complexas redes de metrô, ou mesmo,
como no oeste do Paraná, a reconstrução do eixo Oeste-Paranaguá, o Vale do Itajaí
perdeu a excelente e moderna oportunidade de dispor de uma linha férrea ligando o
litoral ao oeste do Estado. Que poderia estar desenvolvendo a economia,
transportando pessoas e mercadorias com segurança, ao contrário das perdas e
óbitos diários e sistemáticos que ocorrem ao longo do percurso das inseguras e mal
preservadas rodovias atuais.
213
REFERÊNCIAS
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de filosofia. 4. ed. - São Paulo: Martins Fontes,
2000. 1014p.
ALMEIDA, Paulo Roberto de. Os investimentos estrangeiros e a legislação comercial
brasileira no século XIX: retrospecto histórico. Revista Justiça & história, Brasília,
v. 3, n. 5, p. 73-127, 2003.
AMARAL, Max Tavares d´. Contribuição à história da colonização alemã do Vale
do Itajaí. São Paulo: Instituto Hans Staden, 1950.
ARGAN, Giulio Carlo. História da arte como história da cidade. 4. ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1998.
ASSOCIAÇÃO DOS MUNICÍPIOS DO MÉDIO VALE DO ITAJAÍ - AMMVI.
Municípios. Disponível em:
<http://www.ammvi.org.br/municipios/?PHPSESSID=948e58c9bcc588dd0e99bedb49
71b18b#>. Acesso em: 29 nov. 2006.
AZEVEDO, Fernando de. Um trem corre para o oeste: estudo sobre a Noroeste e
seu papel no sistema de viação nacional. 2.ed. São Paulo: Melhoramentos,
1953. 222p. il.
BERNER, J. O. As locomotivas da Estrada de Ferro Santa Catarina. Blumenau em
Cadernos, Blumenau, tomo 10, n. 5, p. 91-92, maio 1969.
BRASIL. Ministério dos Transportes. Transporte ferroviário. Disponível em:
< http://www.transportes.gov.br/ProPro/FolderFerrovias.pdf >. Acesso em: 23 nov.
2006.
BRAVERMAN, Harry. Trabalho e capital monopolista: a degradação do trabalho
no século XX. Rio de Janeiro: Zahar, 1977. 379 p. (Biblioteca de Ciências Sociais).
CABRAL, Oswaldo R. Santa Catarina: história-evolução. São Paulo: Nacional, 1937.
CASCAES, Franklin. Vida e arte e a colonização açoriana. In: CARUSO, Raimundo
C.; CARUSO, Marilea Martins Leal; CASCAES. Franklin. Vida e cultura açoriana
em Santa Catarina. Florianópolis: Cultura Catarinense, 1997. 118p. Entrevista
concedida a Raimundo Caruso.
CASTRO, Ana Celia. As empresas estrangeiras no Brasil, 1860-1913. Rio de
Janeiro: Zahar, 1979. 142p.
CENTENÁRIO de Blumenau. 1850 - 2 de Setembro - 1950. Blumenau: [s.n.], 1950. -
1v.(varias paginações).il. Edição Comissão de festejos.
COMITÊ DO ITAJAÍ: Agência de água. Disponível em:
<http://www.comiteitajai.org.br/hp/index.php>. Acesso em: 12 nov. 2006.
214
CULLEN, Gordon. Paisagem urbana. Lisboa : Edições 70, 1983. 202p, il.
(Arquitetura e Urbanismo, 1).
DAGNONI, Cátia. Comunicações e transportes no Vale do Itajaí- junho 1991. Nossa
História em Revista, Rio do Sul, tomo 2, n. 4, p. 30, set. 2000.
_____. Fechamento da estrada de ferro no Vale do Itajaí. Nossa História em
Revista, Rio do Sul, tomo 8, n. 5, p. 65, nov. 2006.
_____. Uma análise em função do fechamento da estrada de ferro no Vale do Itajaí.
Nossa História em Revista, Rio do Sul, tomo 2, n. 2, p. 7, maio 2000.
DEEKE, José. Traçado dos primeiros lotes Coloniais da Colônia Blumenau.
1864. In: FUNDAÇÃO CULTURAL DE BLUMENAU. Arquivo Histórico José Ferreira
da Silva. Colônia Blumenau. Mapas.
_____. O município de Blumenau e a história de seu desenvolvimento.
Blumenau : Nova Letra, 1995. 295 p. il.
DETRAN SANTA CATARINA. Estatística de trânsito. Disponível em:
<http://www.detran.sc.gov.br/estatistica/estatistica.htm>. Acesso em: 22 nov. 2006.
DIAS, Leila Chistina. Região, Território e Meio Ambiente. Revista Brasileira de
Estudos Urbanos e Regionais v.5, n.1, 2003: Associação Nacional de Pós-
Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional; editores responsáveis
Marco Aurélio A. de Filgueiras Gomes, Henri Acselrad : A Associação, 2003.
ESTRADA de Ferro Santa Catarina. Arquivo Histórico José Ferreira da Silva,
Coleção Comunicação/Transporte, Pasta 4.2.1.1, doc 2.
FERRARI, Celson. Curso de Planejamento Integrado – Urbanismo. São Paulo:
Livraria Pioneira Editora, 1977. 631p. il.
FUNDAÇÃO CASA DR. BLUMENAU. Museu da Família Colonial. Blumenau, 1992.
31p, il. (Edição Comemorativa dos 20 anos de instalação - 1967/1987).
FUNDAÇÃO CULTURAL DE BLUMENAU. Arquivo Histórico José Ferreira da Silva.
Imigrantes. Pastas suspensas (100? Fotos); p&b, color; vários tamanhos.
GERODETTI, João Emílio; CORNEJO, Carlos. As ferrovias do Brasil nos cartões-
postais e álbuns de lembranças. São Paulo: SOLARIS, 2005. 260 p, il. +, 1 Mapa.
GIESBRECHT, Mennucci Relph. Estações ferroviárias no Brasil. Disponível em:
http://www.estacoesferroviarias.com.br/index.html> Acesso em: 31 dez. 2007.
GONZALVEZ, Marisa. Ponte Eng. Antônio Vitorino Ávila Filho, Ponte dos Arcos.
2007. 1 foto: color; Digital
GOOGLE MAPS. Disponível em: < http://maps.google.com/?mid=1164635162>.
Acesso em: 15 nov.2006.
215
HARVEY, David. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da
mudança cultural. 12. ed. São Paulo: Loyola, 2003. 349p. il.
HÁ 20 ANOS o Vale perdia sua sexagenária estrada de ferro. Jornal de Santa
Catarina, Blumenau, 17-18 mar. 1991. (Arquivo Histórico José Ferreira da Silva,
Pasta 4.2.1.6, doc. 35).
HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo : Vértice, 1990. 189p.
(Biblioteca Vértice. Sociologia e Política, 21).
HAAS, Família. Diário de Mathias Haas – Período entre a década de 30 e 50 do
século XX. Manuscrito. Blumenau – Família Haas.
HENKELS, Luiz Carlos. A Estrada de Ferro Santa Catarina – Trecho: Subida-
Lontras-Rio do Sul. Rio do Sul. Nossa História em Revista, Rio do Sul, tomo 8, n.
2, p. 68, dez. 2006.
_____. Família Sprengel. [195?]. 1 foto: p&b; 9 X 13 cm.
_____. Título. Boletim Oficial do Município de Indaial, Indaial, n.1. n. 3, p. 3-8,
ago.1993.
HIENDLMAYER, Richard. Trecho da EFSC: Indaial. 1935. 1 foto: p&b; 9 X 13 cm.
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA – IBGE. Perfil dos
municípios brasileiros. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/>. Acesso em: 22
nov. 2006.
INSTITUTO DE PESQUISAS E PLANEJAMENTO URBANO DE BLUMENAU –
IPPUB. Perfil do município de Blumenau, 1996. Blumenau: IPPUB, 1996. 284p. il.
JURGEN Berner culpa ex-políticos pelo fim da Estrada de Ferro. Jornal de Santa
Catarina, Blumenau, 28 maio 1982. (Arquivo Histórico José Ferreira da Silva, Pasta
4.2.1.6, doc. 32).
KILIAN, Frederico. A Estrada de Ferro Santa Catarina. Blumenau em Cadernos,
Blumenau, tomo 1, n. 72, p. , dez. 1957.
KOHLSDORF, Maria Elaine. A apreensão da forma da cidade. Brasília, D.F:
Editora da UnB, 1996. 253p. il.
KRAFTA, Rômulo. Desenho Urbano e Regulamentação Urbanística. In Desenho
Urbano, anais do II SEDUR. São Paulo, PINI, 1986.
LAGO, Paulo Fernando. Santa Catarina: a terra, o homem e a economia.
Florianópolis: Ed. da UFSC, 1968.
LE CORBUSIER. Urbanismo. São Paulo: Martins Fontes, 1992. 307p.
216
LEFEBVRE, Henri. Introdução à modernidade: prelúdios. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1969. 442p. (Rumos da Cultura Moderna, v.24).
_____. A revolução urbana. Belo Horizonte: Ed. da UFMG, 1999. 178p.
LUCAS, Victor. Destino de glórias. Nossa História em Revista, Rio do Sul, tomo 2,
n. 2, p. 7, maio 2000.
LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. Lisboa; Rio de Janeiro: Edições 70, 1990.
208p, il. (Arte e Comunicação, 15).
MAPAS de Santa Catarina. In: BACELAR, Jonildo. Guia geográfico. Disponível em:
<www.brasil-turismo.com/mapas/pdf/santa-catarina.pdf>. Acesso em: 29 nov. 2006.
MAPA interativo de Santa Catarina. Disponível em:
<http://www.mapainterativo.ciasc.gov.br/sc.phtml>. Acesso em: 03 nov. 2006.
MATTOS, Gercino. Símbolo de saudade e progresso. Blumenau em Cadernos,
Blumenau, tomo 9, n. 5, p. 83, maio 1968.
MARX, Karl. O Capital. Disponível em:
<http://www.marxists.org/portugues/marx/1867/ocapital-v1/vol1cap07.htm>. Acesso
em: 08 ago. 2006.
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alemã. Lisboa: Presença; [São
Paulo?]: Martins Fontes, [19-]. 457p. (Coleção Síntese, 21).
MARX, Murillo. Cidade no Brasil: terra de quem? São Paulo: EDUSP: Nobel, 1991.
143p. il. (Coleção Cidade Aberta).
MERCEDES BENZ. História da empresa no Brasil. Disponível em:
<http://www.daimlerchrysler.com.br/noticias/Setembro/Resumo_50anos/popexpande
.htm>. Acesso em: 02 dez. 2007.
MESORREGIÃO do Vale do Itajaí. In: Wikipédia. Disponível em:
< http://pt.wikipedia.org/wiki/Vale_do_Itaja%C3%AD>. Acesso em: 03 ago. 2006.
MORETTI, Silvana Maria. Fábrica e espaço urbano: a influência da industrialização
na formação dos bairros e no desenvolvimento da vida urbana em Blumenau. 2006.
265f. Dissertação (Mestrado), Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade
Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2006.
MUMFORD, Lewis. A cidade na história: suas origens, transformações e
perspectivas. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998. 741p, il.
MUSEU VIRTUAL DO TRANSPORTE URBANO. Primeiro ônibus de Blumenau:
1914. Disponível em: < www.museudantu.org.br/EStaCatarina.htm>. Acesso em: 02
dez. 2007.
NAÇÕES DO MUNDO: Brasil. Rio de Janeiro: Ed. Cidade Cultural Ltda., 1990.
217
O COLONO e o automóvel: visão miópica. Blumenau em Cadernos, Blumenau,
tomo 12, n.4, maio 1981.
O TRATADO de Madri. Disponível em:
< http://www.multirio.rj.gov.br/historia/modulo01/tratado_madri.html>. Acesso em 03
set. 2006.
ODREBRECHT, Rolf. Cartas de família: ensaio biográfico de Emil Odebrecht e
ensaio biográfico de seu filho Oswaldo Odebrecht Sênior. Blumenau: Ed. do Autor,
2006. 576 p. il. ; 28x31cm.
PELUSO JUNIOR, Victor Antonio. Estudos de geografia urbana de Santa
Catarina. Florianópolis: Secretaria de Estado da Cultura e do Esporte: Ed. da UFSC,
1991. 396p, il.
PETRY, Sueli Maria Vanzuita. A fibra tece a história: a contribuição da indústria
têxtil nos 150 anos de Blumenau. Blumenau: Sintex, 2000. - 348 p. il.
_____. 180 anos da imigração alemã: os pioneiros. Jornal de Santa Catarina.
Caderno Especial, 20 jul. 2004, p.1-7. v.1.Disponível em:
<http://www.bc.furb.br/docs/JO/04/06/277130_1_1.pdf>. Acesso em: 22 set. 2006.
PORATH, Soraia Loechelt. A paisagem de rios urbanos: a presença do Rio Itajaí-
Açu na cidade de Blumenau. 2004. 150 f. Dissertação (Mestrado), Centro
Tecnológico, Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo,
Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2004.
PREFEITURA MUNICIPAL DE IBIRAMA. Núcleo urbano de Hammonia no final
do século XIX. 1 foto: p&b; 9 X 13 cm.
REDE FERROVIÁRIA FEDERAL S.A. A empresa. Disponível em:
<http://www.rffsa.gov.br/>. Acesso em: 21 nov. 2006.
RIO DO SUL (SC). Arquivo Público Histórico de Rio do Sul. Rio do Sul. Pastas
suspensas (100? Fotos); p&b, color; vários tamanhos.
ROCHEFORT, Michel. Redes e sistemas: ensinando sobre o urbano e a região;
tradução Antonio de Pádua Danesi. -São Paulo: Hucitec, 1998. - 174p. :il.
RODRIGUES, Jorge Martins. A rivalidade comercial de norte-americanos e ingleses
no Brasil do século XIX. Revista da História da Economia Brasileira, ano 1, n. 1,
p. 73-82, jun. 1953.
ROSSI, Aldo. A arquitetura da cidade. Lisboa: Cosmos, 1977.
SANTA CATARINA – Gabinete de Planejamento e Coordenação Geral. Subchefia
de Estatística, Geografia e Informática. Atlas de Santa Catarina. Rio de Janeiro,
Aerofoto Cruzeiro, 1986. 176 p, tab, graf, col.
218
SANTA CATARINA MUNICÍPIOS. Trombudo Central. Disponível em :
<http://www.sc.gov.br/portalturismo/Default.asp?CodMunicipio=314&Pag=2>.
Acesso em: 28 dez. 2007.
SANTOS, Milton. Natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São
Paulo: Hicitec, 1996. 308p.
_____. Pensando o espaço do homem. 3. ed. São Paulo: Hucitec, 1991. 60p. il.
SANTIAGO, Nelson Marcelo; PETRY, Sueli Maria Vanzuita; FERREIRA, Cristina.
ACIB: 100 anos construindo Blumenau. Florianópolis: Expressão, 2001. 205 p, il.
SCHIAVO, Cléia; ZETTEL, Jayme. Memória, cidade e cultura. Rio de Janeiro: Ed.
UERJ, 1997.
SIEBERT, Claudia Freitas. Estruturação e desenvolvimento da rede urbana do
Vale do Itajaí. Blumenau: Ed. da FURB, 1996. 118f.
_____. A evolução urbana de Blumenau: o (des)controle urbanístico e a exclusão
sócio-espacial. 1999. 190f. Dissertação (Mestrado), Centro de Filosofia e Ciências
Humanas, Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 1999.
SILVA, José Ferreira da. Estrada de Ferro Santa Catarina Sessenta Anos
Emprestando Inestimáveis Serviços ao Vale do Itajaí e ao Nosso Estado. Blumenau
em Cadernos, Blumenau, tomo 20, n.5, p. 81-86, maio 1969.
_____. História de Blumenau. Florianópolis: EDEME, 1972. 380p. il.
SILVEIRA, Márcio Rogério. Transporte ferroviário no Brasil: da reestruturação da
década de 1990 às parcerias público-privadas. In: SILVEIRA, Márcio Rogério.
Temas de geografia econômica: as estradas de ferro no Brasil. 2000. Disponível
em: <http://br.geocities.com/f6mrs2000/great_outdoors2.htm>. Acesso em: 27 out.
2007.
TORLONI, Hilário. Estudo de problemas brasileiros. 20. ed. São Paulo : Pioneira,
1990. 267p. il.
UNIVERSIDADE DO ESTADO DE SANTA CATARINA – UDESC. GeoLab. Atlas
geográfico de Santa Catarina. Disponível em:
<http://www.faed.udesc.br/geolab/geosc.htm#1>. Acesso em: 21 maio 2006.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA. Biblioteca Universitária.
Documentos Especiais.
VIDOR, Vilmar. Indústria e urbanização no nordeste de Santa Catarina.
Blumenau: Ed. da FURB, 1995. 248p, il.
VILLAÇA, Flavio. Espaço intra-urbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel:
FAPESP: Linconl Institute, 2001. 373p. il.
219
VOLKSWAGEM DO BRASIL. Histórico. Disponível em:
<http://www.vw.com.br/default.asp> . Acesso em: 1 dez. 2006.
WEIMAR, Günter. Arquitetura Erudita da imigração alemã no Rio Grande do Sul.
Porto Alegre: Edições EST, 2004. 288p. : il.
WITTMANN, Angelina C. R. A estrada de ferro no Vale do Itajaí: resgate trecho
Blumenau-Warnow. Blumenau: Edifurb, 2001. 145p. il.
ZUEGUE, Harry. Quem era Peter Christiano Feddersen. Blumenau em Cadernos,
Blumenau, tomo 16, n. 2, p.37- 41, fev. 1975.
220
ANEXOS
221
ANEXO A ENTREVISTA DO SR. OTTO ROHKOHL PRIMEIRO DIRETOR DA
EFSC
a) Entrevistado: Otto Rohkohl
b) Local: Blumenau
c) Data: dezembro de 1957
d) Entrevistador: Frederico Kilian
Abreviações: Otto Rohkohl – O
Frederico Kilian – F
F Em que época, mais ou menos, a construção de uma estrada de
ferro foi posta em evidência pelos blumenauenses como um problema
econômico inadiável?
O nos primeiros anos de colonização de Blumenau, o seu fundador, Dr.
Hermann Blumenau, reconheceu a necessidade da construção de uma estrada de
ferro que ligasse o centro da colônia, que ao mesmo tempo era o porto fluvial mais
avançado do rio Itajaí, com o Hinterland. Mais tarde, com o avanço da colonização
para o interior, acentuava-se cada vez mais esta necessidade da ligação por meio
de uma estrada de ferro que atingisse o planalto de Santa Catarina. em fins de
1870, o engenheiro Emílio Odebrecht, abrira um traçado para uma estrada de
rodagem até o planalto catarinense, desde a sua fronteira com a Argentina, com o
Oceano Atlântico, descendo pelo Vale do Itajaí, porém este projeto não chegou a ser
realizado. Com a colonização das bacias dos afluentes do rio Itajaí, notadamente da
Colônia (página 29) Hansa (hoje Ibirama), estes planos se concretizaram mais,
tendo o engenheiro Friedrich Von Ockel feito maiores estudos. Chegou a fincar, em
ato solene, a primeira estaca, em dezembro de 1899, onde hoje se acha a Escola
Luiz Delfino, mas também ainda desta feita a construção não foi levada a efeito. A
partir de 1900, a Sociedade Colonizadora Hanseática, cujos planos de colonização
muito sofriam por falta de vias de transporte para os produtos coloniais, empenhou-
se na construção da estrada de ferro, tendo gasto para mais de 200.000 marcos, em
estudos e preparativos para a construção dela.
222
F – Quais foram as pessoas ou entidades que mais se interessaram, em
Blumenau, pela construção da estrada de ferro?
O – Para a realização da construção, os que mais se interessaram em
Blumenau foram, além da Sociedade Colonizadora Hanseática, o governo municipal,
que tinha como prefeito o Sr. Alvim Schrader, homem de larga visão comercial, e,
mui especialmente, o abnegado propulsor do progresso de Blumenau, Pedro
Christiano Feddersen, que depois de coligir aqui o necessário material estatístico,
fez várias viagens à Capital da República, para conferenciar com ministros e
políticos, e foi até a Alemanha, para despertar nos círculos econômicos o
interesse para o projeto e obter, de empresas bancárias e de navegação marítima,
bem como nos círculos do Governo Imperial, o apoio ao projeto e conseqüente
financiamento da construção.
F – Quais eram os meios financeiros ou grupos de capitalistas com que
o engenheiro Frierich Von Ockel contava ou podia contar, ao dar início (aliás,
simbólico) à construção da sua “Tram-way a vapor Blumenau-Aquidaban”, em
fins de 1899?
O O engenheiro Friedrich Von Ockel não possuía meios financeiros nem
tinha a seu lado qualquer grupo de capitalistas para custear a construção da aludida
estrada de ferro para a qual obtivera uma concessão anos antes e que estava
prestes a caducar.
F Quais foram as outras pessoas ou entidades que também se
interessaram, em Blumenau, pela construção da estrada de ferro?
O A principal iniciativa foi da Sociedade Colonizadora Hanseática, que
necessitava, para seu desenvolvimento e escoamento de seus produtos, de
transporte seguro, rápido e barato. E das empresas de navegação marítima alemãs,
que viam no desenvolvimento da colonização da bacia do rio Itajaí, e conseqüente
ampliação do porto de Itajaí, futuramente, uma importante praça de comércio
internacional para seus navios de carga e passageiros. .Então fundou-se em Berlim,
sob a direção do Banco Alemão e a cooperação financeira de outros bancos e das
ditas empresas de navegação, a Estrada de Ferro Santa Catarina Sociedade
Anônima, com sua sede social em Berlim, e com a finalidade de realizar a projetada
construção da Estrada de Ferro e sua exploração.
F – Em que época deu-se isso?
O – Esta resolução foi tomada no ano de 1906.
223
F Qual foi a empresa que ficou com a concessão dada ao engenheiro
Friedrich Von Ockel pelo governo do Estado?
O – Não houve transferência de concessão, pois aquela já havia caducado e
a Sociedade Anônima, recém-fundada, obteve nova concessão por parte do governo
catarinense.
F Quais foram os capitalistas ou empresas de Blumenau que
participaram, financeiramente, na construção da estrada de ferro?
O Nenhum grupo de capitalistas, ou empresa de Blumenau, nem mesmo
do Brasil, participou financeiramente na Sociedade Anônima ou na construção da
Estrada de Ferro Santa Catarina.
F A empresa construtora da estrada de ferro teve quaisquer
embaraços ou oposições, por parte de algum morador daqui, na execução ou
construção da estrada de ferro?
O – Ninguém opôs quaisquer embaraços ou dificuldade à execução da obra.
F Quando, mais ou menos, estavam concluídos os estudos
preliminares, inclusive as medições, para que uma firma construtora pudesse
ser encarregada da construção da estrada de ferro?
O Os estudos definitivos começaram no ano de 1906, e sofreram certa
demora com a morte do engenheiro, Sr. Krober, que veio a falecer aqui em
Blumenau, e foram terminados pela comissão de construção da firma construtora
Bachstein-Koppel, aqui chegada em fins de agosto de 1907.
F – Em que data foi iniciada a construção da estrada de ferro?
O – A construção, propriamente dita, foi iniciada em dezembro de 1907.
F Quando foi inaugurado o primeiro trecho entregue ao tráfego
regular e até que estação ele ia?
O Em 3 de maio de 1909 foi inaugurado o primeiro trecho, com tráfego
regular até a estação de Warnow.
F – Em que data foi inaugurado o trecho até a estação final de Hansa?
O – Em 1º de outubro de 1909.
F – Quem foi o primeiro diretor da Estrada de Ferro Santa Catarina?
O O primeiro diretor da Estrada de Ferro Santa Catarina foi este seu
criado. Antes de eu vir a Blumenau, achava-me na direção da Estrada de Ferro
Otavi, na África do Sul, e que fora construída pela mesma firma construtora,
Baschstein-Koppel, com uma extensão de 560 quilômetros, através de uma zona
224
inexplorada e silvestre do sudoeste da África, no curto prazo de apenas três anos.
De vim, a mando da referida firma, para assumir aqui a parte administrativa da
construção da estrada de ferro, tendo ficado, após a conclusão do trecho Blumenau–
Hansa, na direção da mesma estrada de ferro até agosto de 1913.
F Quem sucedeu V.Sª. na direção da Estrada de Ferro Santa
Catarina?
O Em 1913, a Sociedade Anônima E.F.S.C. resolveu prolongar a estrada
até o porto de Itajaí, e o engenheiro Weitnauer e eu fomos designados para fazer os
respectivos estudos, pelo que deixei o cargo de diretor da Estrada de Ferro, que se
achava em tráfego, entregando-o ao Sr. Martin Bischif, para assumir o meu novo
posto. Instalamos o nosso escritório ao do Morro do Aipim, em terreno de minha
propriedade, no local onde hoje está o Centro de Saúde, porque ficava ele entre as
duas pontes projetadas sobre o rio Itajaí-Açu.
F Então naquela época foram projetadas duas pontes sobre o rio
Itajaí-Açu, para o trecho até Itajaí?
O Foram estudados vários projetos, um dos quais o de marginar o rio
Itajaí-Açu em sua margem direita, até Vorstad, mediante a construção de um muro
de arrimo desde a foz do Ribeirão da Velha até Vorstadt. Esta obra, por ser bem
mais cara do que duas pontes, mas que por sua vez viria a beneficiar a cidade, que
com isto iria possuir um cais de vários quilômetros de comprimento, poderia ser
feita com a cooperação do governo brasileiro, federal e municipal. Como o município
era pobre e não tinha os meios para cooperar neste plano e o governo federal
nenhum auxílio queria prestar para sua realização, foi abandonado este projeto.
F – Em que data a Estrada de Ferro Santa Catarina foi entregue à
administração do governo?
O Pelo Decreto N.º 13.907, de 6 de janeiro de 1918, a Estrada de Ferro
Santa Catarina foi encampada pelo governo federal.
F – Durante a administração pela Sociedade Anônima qual foi, em
média, a porcentagem do lucro ou prejuízo acusado pelo capital aplicado?
O Na exploração de uma estrada de ferro, em zonas de desenvolvimento
lento, nunca se pode contar com uma margem de lucro do capital investido, nos
seus primeiros anos, mas apenas somente depois de decorridos rios anos. Mas
mesmo assim, apesar do pequeno movimento inicial de cargas, e relativo curto
225
trecho, as rendas da estrada sempre deram para cobrir as despesas de sua
manutenção e administração.
F – Permita-me mais uma pergunta – Acha V. Sª. que a Estrada de Ferro
Santa Catarina, em mãos de uma empresa particular, que a administrasse
segundo as normas da antiga Sociedade Anônima, naturalmente com
observância das leis trabalhistas vigentes, proporcionaria alguma
porcentagem de lucro com relação ao capital nela investido?
O Em face da atual situação inflacionária e sempre crescente em que nos
encontramos, seria um considerável êxito administrativo se as rendas da estrada
de ferro dessem para cobrir suas despesas. Em geral, em países de cotações
cambiais decrescentes, as estradas de ferro de elevado custo de construção nunca
podem ser consideradas como objetos de emprego lucrativo do capital nelas
investido. O proveito se faz sentir indiretamente e, considero, no programa das
zonas por elas servidas.
“Com esta resposta, nos damos por satisfeitos e daqui agradecemos mais
uma vez ao Sr. Otto Rohkohl por sua gentileza e a presteza com que nos atendeu”.
(KILIAN, 1957).
226
ANEXO B - ANUÁRIO DE ITAJAÍ - 1949
Alguns documentos históricos
80
foram pesquisados e úteis para a
dissertação desta pesquisa. Contêm informações valiosas da história da EFSC,
bastante importantes. A seguir, a transcrição original do texto desses documentos.
Organizado por Marcos Konder e Silveira Júnior:
Anuário de Itajaí – 1949
Composto e impresso nas Oficinas da Impressora Aurora Limitada, Itajaí S.
Catharina
Estrada de ferro S. Catarina: A via férrea de Itajaí-Blumenau, arrendada ao
Governo do Estado, atacou os seus serviços, sob a fiscalização do engenheiro
Joaquim Breves Filho, em 1926, subdividindo-os em tarefas que iam do ponto inicial
da cidade até ligar com a Estrada de Ferro Santa Catarina, em Blumenau.
O leito, em parte coberto com trilhos, as obras de arte, a estação “Dr.
Vereza”, construída em Itaipava, na bifurcação do ramal que devia ir a Brusque e até
o Ribeirão do Ouro, a drenagem e o aterro dos trechos de Ilhota ao Itajaí-mirim e
outros serviços achavam-se em pleno andamento, quando a Revolução de 1930
interrompeu os trabalhos.
Quando a Segunda República reencetou os trabalhos da Estrada de Ferro
Santa Catarina, mudou-se de orientação: os serviços do trecho de Itajaí foram
paralisados sine die, dando-se preferência ao prolongamento até Rio do Sul e ao
Planalto Serrano. Quando se voltou a cogitar da ligação com Itajaí, achou-se de
melhor alvitre construí-la de cima para baixo, dando-se início à ponte sobre o rio
Itajaí-Açu, e a construção da linha até Gaspar e Ilhota. Ultimamente é que os
serviços foram reiniciados no primeiro trecho entre a nossa cidade e o ramal de
Brusque. Mas para que esta obra de Santa Engracia possa ser concluída e atinjam
os trilhos o perímetro urbano é mister construir duas apreciáveis obras de arte: a
ponte sobre o Itajaí-mirim no lugar Boa Vista e a estação inicial do bairro Fazenda.
A Estrada de Ferro Santa Catarina possui, aliás, a sua história, digna de se
contada e comentada. Em 1915 assinou-se contrato com uma companhia alemã, à
80
Alguns destes documentos foram encontrados no Setor de Documentos Especiais de Biblioteca
Central da Universidade Federal de Santa Catarina.
227
qual se havia arrendado o trecho construído por ela de Blumenau a Hamônia e
bateu-se solenemente a estaca zero” no bairro Fazenda. Agora, decorridos 34
anos, ainda não se ouviu na cidade o apitar da locomotiva....
E, apesar destes exemplos, ainda gente que confia no regime estatal
para realizar obras de vulto. (p. 14)
[...]
Logo que se fundou Blumenau e não havendo comunicação terrestre entre
os dois municípios, cogitou-se de fundar, com capitais blumenauenses e itajaienses,
uma navegação fluvial entre Itajaí e Blumenau. Esta tratou logo de importar um
pequeno vapor de rodas, ao qual deu o nome de Progresso. Ao mesmo tempo em
que este vaporzinho transportava passageiros, rebocava lanchas peruas, assim
chamadas, para conduzir cargas. Estas chatas foram construídas nos nossos
estaleiros, que se dedicavam à construção de lanchões e barcos a vela para
nossa costa.
Ao Progresso seguiu-se anos depois um vapor maior, também de rodas,
chamado Blumenau. Todo o material foi importado, fazendo-se aqui a armação
apenas.
A construção deste navio data de 1897. Assim que se fundou a Estrada de
Ferro Santa Catarina, para realizar a construção do trecho Blumenau e Hamônia ela
incorporou a Companhia Fluvial e tratou de provê-la de melhor material, além de
uma grande chata de ferro para o transporte do material rodante e de outras peças
pesadas. A Companhia Fluvial teve em tempos passados também a sua
concorrente, uma empresa que contava com um rebocador chamado “Jahn” e
diversas peruas de reboque. Eram donos desta empresa os srs. Henrique
Grewsmühl, de Blumenau, e Luiz Altenburg, de Gaspar. Mais tarde a Companhia
Fluvial incorporou esta empresa e ficou sozinha em campo. Surgiu então a estrada
de rodagem entre Itajaí e Blumenau, a princípio com condições precárias, dando
passagem a penas a fordecos antigos, mas essa concorrência terrestre não fazia
mossa à navegação fluvial, porque conduzia apenas passageiros continuando a
carga com o rio, que era sempre a via de comunicação mais barata. Tanto assim
que se formou outra empresa fluvial: Juvêncio Tavares d´Amaral e Cap. Adolfo
Germano de Andrade, para a condução de carga.
Melhorada, porém, a estrada de rodagem e aumentada a capacidade dos
caminhões de carga, a via fluvial, embora mais em conta, começou a sentir os
228
efeitos da concorrência terrestre, mesmo porque o transporte da mercadoria era feito
da casa do vendedor à do comprador, não ficando sujeito a avarias, faltas e roubos.
Mas com o incremento do negócio de madeiras para a Argentina, tudo se reajustou e
surgiu a necessidade de criar novas linhas de navegação fluvial para o transporte
desse produto extrativo, de Blumenau ao porto de Itajaí. Apesar disto, o transporte
terrestre continuou com intensidade, uma vez que se ia buscar madeiras até no
oeste catarinense, especialmente em Caçador. Era uma luta pacífica entre o rio e a
estrada de rodagem, satisfazendo a todos, tanto aos armadores fluviais como às
empresas automobilísticas. Achavam-se as coisas nesse pé, quando, por uma das
reviravoltas e manhas do governo ditatorial argentino, cessaram-se os negócios de
madeira e as empresas fluviais viram-se em dificuldades para manter seu tráfego.
Algumas tentaram baixar as tarifas da madeira e fazer o transporte também de
outros gêneros com frete reduzido, mas um poder mais alto se levantou. Primeiro, a
alta dos salários dos tripulantes, o que seria ainda razoável; depois o aumento do
número da tripulação, o que era injustificável; e por fim a intervenção da estiva em
Blumenau e Itajaí para as empresas fluviais que jamais estiveram sujeitas a
semelhante regime. E, como conseqüência, afora a Companhia Fluvial da Estrada
de Ferro Santa Catarina, que continua a sua marcha lenta e deficitária, todas as
demais empresas amarram as suas lanchas e as suas embarcações de reboque
para deixá-las apodrecer e converter-se em lenhas e sucatas. Encerrou-se talvez
para sempre uma página gloriosa do nosso rio, fadado a ser agora uma simples
correnteza a levar ao mar aguapés e à cidade pequenas embarcações com lenha, e
servir de elemento para as redes de espinhel dos pescadores ribeirinhos...
E as leis trabalhistas festejaram assim mais um triunfo...
O Município de Itajahy
229
ANEXO C – RELATÓRIO EFSC – ANO 1920
Figura 150 - Relatório da Estrada de Ferro Santa Catharina
Fonte: Acervo Documentos Especiais da Biblioteca UFSC – Foto: WITTMANN, 2008.
Relatório da Estrada de Ferro Santa Catharina
Relatório
Apresentador ao Inspector Federal das Estradas
Dr. José Palhano de Jesus
Pelo Engenheiro Civil
Joaquim José de Souza Breves Filho
Director
Anno 1920
Typografia G.A. Koehler, Blumenau 1922
Na presente Introducção, farei uma rápida exposição sobre a Estrada,
justificando as providências, de caráter mais inmediato, para attender as
necessidades do serviço e melhorar as condições econômicas de seu trafego, como
também lembrando outras, mais amplas e radicaes, para que ella possa preencher
os importantes fins a que deva ser destinada.
A Estrada de Ferro Santa Catharina acha-se reduzida, por enquanto, a uma
pequena linha de 70 kilometros de extensão em tráfego, de Blumenau a Hansa, à
qual foi incorporado o serviço de navegação fluvial entre Blumenau e o porto de
Itajahy, de accôrdo com o Decreto n. 13.539 de 9 de Abril de 1919.
230
A sua origem data de 1905, de uma concessão estadoal, de que se resultou
a organização da Companhia Estrada de Ferro Santa Catharina, com sede em
Berlim, que construiu esta pequena linha, meramente regional, em condições as
mais econômicas. Reconhecida porém, a importancia da Estrada de Ferro Santa
Catharina, sob o ponto de vista commercial e estratégico, transformando-a em uma
linha de penetração, pelo seu alongamento até a fronteira Argentina, o Governo
Federal, para realizar este objetivo encampou os 70 kilometros, construídos e
contractou com a compampanhia concessionária os prolongamentos até foz do
Pepery Guassú e até Itajaí e o ramal de Brusque, bem como o arrendamento da
rêde assim formada, por 60 anos.
Em virtude desse contrato, adentados ja se achavam os trabalhos de
exploração e locação, por uma commissão do Governo (Página 7) Federal, que me
coube dirigir, e apparelhada devia se achar a Companhia para executar os estudos
então aprovados, quando irrompeu a tremenda guerra em 1914. em conseqüencia,
foi, decretada a nullidade do contracto, pello Decreto n. 12.907 de 6 de Março de
1918, datando d´ali a adminsitração directa da Estrada pelo governo Federal.
Situação financeira.
A Estrada de Ferro Santa Catharina custou ao governo Federal a
importancia de 6.189:874$413, paga a companhia concessionária, em virtude da
clausula XXVIII do Decreto n. 9.155 de 29 de Novembro de 1911.
Afora esta, o Governo dispendeu mais, em despesas de custeio, com
melhoramentos diversos e compra de materiaes, durante os tres últimos annos,
inclusive com a secção fluvial, depois da ocupação desta, em 1919, a somma total
de 1.545:394$355.
[...] Verificou-se que os dispêndio com que já pesa sobre o Thesouro
Nacional a Estrada de Ferro Santa Catharina, tem se elevado bastante durante os
três últimos anos, em razão de sucessivos déficits, alias accusados desde a
inauguração de seu trafego, em 1909. Página 8)
A “secção fluvial” cujo serviço é bem feito e o mais singular que desejar se
pode, seria um elemento valioso para annular o déficit desta Estrada, se não
existisse a concorrencia acirrada e systematica que lhe moveu duas empresas, com
sede em Itajahy e em Blumenau, mantendo um serviço de transportes, com infração
231
de disposições regulamentadas, conforme denunciou o meu antecessor, no
relatório de 1919.
[...] Trafego
Tem sido consideravel o desenvolvimento do trafego. O movimento de
passageiros foi de 39 em 1917, 68.408 em 1919 e 76.792 em 1929, veriifcando-se,
portanto, um accrescimo de 12% relativamente ao anno passado, e de 96,65 no
intervallo de um quinquennio. (página 10)
Em 1920 foram transportado 13.815 toneladas de mercadorias, contra
10.002 em 1916, resultando um accrescimo de 32,18%, durante o último
quinquennio.
Como conseqüência do aumento da locomoção, augmentando o material de
transporte e de tracção e melhoramento as officinas.
Locomoção
Material de transporte Durante o ultimo quinquennio o material de
transporte foi aumentado com 2 carros de classe que entraram em curculação
em outubro e novemvro do anno próximo findo, e com 2 vagões de 20 toneladas,
que estão em serviço desde janeiro do corrente anno, todo esse material adquirido
por conta do crédito esxtraordinario de 5000.000$000, a que se refere o Decreto n.
13.444 de 29 de Janeiro de 1919.
A estrada dispõe actualmente do seguinte material de transporte:
3 carros mixtos,
2 carros de 2 classe,
1 carro de administração,
3 vagões de animais,
2 vagões de correio-bagagens,
31 vagões de mercadorias,
5 plataformas de lastro.
Esse material é insuficiente como passo a demonstrar.
Para o transporte de passageiros são indispensáveis 4 carros , dois em
cada trem, nos horários de quartas e domingos. Se um carro achar-se em
reparações, como é freqüente, nesses dias será impossível a composição de um
trem extraordinário ou mesmo addicionar mais um carro em um dos trens de horário,
232
quando o exigir a disponibilidade dos lugares a offerecer.
A necessidade de adquirir maior numero de carros de passageiros, pode
também ser avaliada pelo coeficiente de utilização, verificando durante o anno
próximo passado, de 50,10%, numero este, que, segundo a ultima Estatística
publicada, de 1915 não fora atingido por nenhum de nossas estradas durante aquele
anno.
Igualmente, são insufficientes os vagões disponíveis para mercadorias, cujo
numero diminuiu no ultimo quinquennio, sendo actualmente de 31, ou de 0,44
vehiculos por kilometro.
Essa carência é comprovada pelo trabalho exigido durante o anno de 1920,
de 461 toneladas por vagão, numero excessivo se o compararmos com as médias
apresentadas por outras estradas. (Página 11)
Assim, por exemplo, no anno de 1920, em que foi exigido da Estrada de
Ferro Central um trabalho muito intenso para o transporte de mercadorias, a média
verificada foi de 509 toneladas por vagão.
A nossa média, próxima a esta, foi também muito alta. Se o percurso médio
de cada vagão da Estrada de Ferro Central foi cerca de 4 vezes maior, em que
compensação os seus vagões attingiram a lotação de 45 toneladas, quando os da
Estrada de Ferro Santa Catharina, que trafegaram em 1920, tiveram apenas a de 10
toneladas.
Pode-se também verificar a falta de vagões, pela taxa de utilização, que
chegou a 46 %, número bastante elevado, se considerarmos, as quantidades de
mercadorias transportadas, geralmente de grande volume em relação ao peso.
Reduzido é também o numero de vagões de correio-bagagem e o de
plataformas para lastro.
Em resumo, é excessivo o trabalho do material rodante disponível tornando-
se necessário o augmento do seguinte:
2 carros mixtos,
4 vagões de mercadorias;
1 carro de correio-bagagem,
6 plataformas.
Material de tracção A Estrada dispõe de 7 locomotivas, incluindo nesse
número as quatro, adquiridas durante o anno, da “Baldwin Locomotive Works”, por
233
conta do credito concedido pelo Decreto 13.444 de 29 de Janeiro de 1919.
Existe portanto uma locomotiva para cada 10 kilometros. As três antigas, de
fabricação alemã, duas Borsig e a terceira Orenstein & Koppel, estão todas
necessitadas de uma reforma completa das tubulações, além de outras reparações.
Das quatro americanas, duas do tipo American, para trens de passageiros,
representam uma excellente acquisição. As outras, devido a reduzida força tractiva,
de 2676 kgr por toneladas, com um peso adherente de 16.125 kgr.
A sua capacidade de reboque fica limitada a 65 toneladas brutas nos trechos
mais pesados da linha.
Attendendo, pois, a necessidades próximas do trafego, julgo conveniente
adquirir mais duas locomotivas, uma para trens mixta, do tipo Mogui ou Ten-Wheel,
e outra para trem de carga, “Consolidation”.
De acordo com a resistencia da linha, podem ser escolhidas com
especificações convenientes para rebocarem uma carga bruta mínima de 150
toneladas.
Das 7 locomotivas existentes, 5 não dispõem de apparelhos (Página 12)
detentores de fagulhas, o que é obrigatório nas estradas de ferro, conforme
determina o Decreto n. 4.201 de 1º de dezembro de 1920.
Officinas As officinas, situadas na estação de Itoupava Secca, vão
satisfazendo soffrivelmente as necessidades das reparações e montagem do
material.
Instaladas, porém, sob condições as mais modestas, em local acanhado,
faz-se mister introduzir-lhes diversos melhoramentos, para attender a exigências
crescentes do material rodante e diminuir a dependência constante de officinas
particulares, em que tem estado esta Estrada.
Os mais urgentes são: os augmentos da secção de carpintaria e do abrigo
para reparações do material de transportes e as installações de um pequeno forno
de fundição e de uma plaina para desdobrar madeira em espessura.
Parece-me, aliás, preferível, na previsão do contínuo desenvolvimento dos
serviços, proceder-se a um projecto geral para remodelação dos velhos e
insufficientes galpões, aproveitando-se as machinas ferramentas existentes, mas
introduzindo melhoramentos e ampliações, de modo a attender as condições mais
econômicas de seu funccionamento.
234
Via Permanente
A linha possui para sua conservação 53 homens, ou 0,76 por kilometro,
numero diminuto, visto ter sido reduzido de 10 para 8 horas o trabalho diário, sem a
compensação de um augmento do numero de operarios.
Por esse motivo, o lastramento e a subtituição de dormentes foram
deficientes, e, não permittindo a verba actual manter numa turma extraordinária até
regularisar o serviço, é necessário attender a tal despesa, no orçamento do credito
supplementar de que deve ser pedido, para complemento do custeio do corrente
ecercício. (Página 13...termino)
Melhoramento das condições technicas e fechamento da linha A linha
merece especial attenção no sentido de melhorar as suas condições de tracção e
segurança, executando-se deiversas modificações em planta e perfil.
Requer, outrosim, o augmento da largura da plataforma e da faixa
desapropriada, e, finalmente, o fechamento completo da estrada e suas
dependencias.
Relativamente a esses trabalhos, peço vênia para transcrever a ultima parte
do meu officio n. 15, de 23 de Fevereiro ultimo, em que prestei as informações
solocitadas sobre as providencias de que trata o Decreto n. 4201 de 1º de dezembro
do anno próximo findo:
,,Fechos laterais Este assumpto, constituindo embora obrigação
consignada desde o Regulamento de 26 de abril de 1857 (art. 2º), geralmente pouca
attenção mereceu em nossas estradas mais antigas, que, muitas dellas, hoje ainda
se vêem privadas desse melhoramento, a despeito de um trafego consideravel,
como são os casos de algumas linhas a cargo da “Great Western” e da “Leopoldina
Railway”. A Estrada de Ferro Santa Catharina tem cercas lateraes em quase toda
sua extensão. Devido, porem, menos ao precário estado das mesmas do que a falta
de fossos americanos ou de cancellas, na innumeras passagens de nível que
apresenta, pode-se dizer que praticamente não está fechada, sinão em limitados
trechos.
No entanto, esta estrada, por sua feição colonial, atravessando uma zona
densamente povoada, mais se resente da necessidade do melhoramento em
questão. Basta salientar-se que nos 70 kilometros em trafego existem 355
passagens de nível, de estradas ou caminhos particulares.
235
A conseqüência é que diversos accidentes tém occorrido, que mais graves e
freqüentes não tem sido, em razão de um trafego cuidadoso, com velocidades
reduzidas, e de uma constante vigilância na linha.
O orçamento para fechar-se toda a linha em trafego importa, actualmente,
em cerca de 250:000$000.
Cumpre-me ponderar, porem, que proceder a esse fechamento não é
conveniente, emquanto não forem realisados os melhoramentos da linha, que a
transformarão de verdadeiramente provisória, em linha definitiva; modificações
necessárias collocal-a acima das grandes enchentes, supprir muitas passagens de
nível, e, finalmente, augmentar as larguras da plataforma e da faixa desapropriada,
as quaes, em muitos casos não tem mais de 5 metros para esta e de 2 metros para
(Página 14) aquella! O fechamento perfeito, se fosse feito actualmente, não
podendo ter um caráter definitivo, seria portanto uma despesa que não se justificaria.
O que urge, primeiramente, e fazer-se alguma coisa no sentido de melhorar
as condições geraes da linha.
Existem cerca de 60 pequenas variantes a executar, com uma extensão total
de 18.500 km, representando portanto 26,5% da extensão em tráfego, e que, por um
rápido orçamento, incluindo as novas desapropriações e o fechamento da linha,
importando em cerca de 2.000:000$000.
Cogitando-se desde muito tempo do prolongamento desta pequena via
férrea, cujos estados e orçamentos se acham feitos em grande extensão, metida
esta muito conveniente sob qualquer aspecto que se a encare, e aliás consignada
na Lei do orçamento do corrente exercício, impõem-se ainda mais, como imperiosa e
urgente necessidade, as modificações acima referidas, que deverão ser
completadas com o fechamento da linha.”(Página 15)
Secção Fluvial
É de toda conveniência que as reparações de que estão necessitando
freqüentemente as velhas embarcações, que fazem o serviço desta secção, sejam
feitas nos próprios estaleiros de que dispomos em Itajahy, a fim, de livar-nos da
dependência de outros e da eventualidade de um novo contratempo, como
aconteceu com o resultado dos concertos das três lanchas, contractadas no anno
passado com a firma Asseburg & Cia.
236
Torna-se necessário, para isso, uma completa reconstrucção do
madeiramento dos estaleiros e a acquisição de cerca de 700 metros de cabos de
manilha, para puchar as embarcações, o que tudo importará, approximadamente,
em 8:000$000.
Estão precisando de urgentes concertos as seguintes:
Vapor Blumenau Limpeza do fundo e substituição da tubulação de
caldeira, já encommendada á fabrica Baldwin, pelo preço de 325 dollars ouro.
As lanchas Progresso, Gaspar e Itoupava exigem radicaes reparações, que
avalio em 10:000$000.
Donde, a despesa total de 25:000$000, para a reconstrucção dos estaleiros
e conservação do material flutuctuante no corrente anno. (Página 16)
Prolongamento
O prolongamento desta Estrada é providencia que não deve ser mais
retardada. Basta considerar-se a vasta e rica região sobre a qual exercerá decisiva
influencia, o for-west catharinense e o norte do Rio Grande do Sul, dotado de
terrenos fertilíssimos, com um clima temperado e salubérrimo, onde se succedem as
zonas agrícolas e pastoris, e que, pela variedade de altitudes e de composição do
solo, são apropriados a nelles medrarem os productos das zonas tropicaes ora os
cereaes e fructas dos climas europeus.
Esse prolongamento é uma exigência nacional, de ordem econômica e
social, para transportes fáceis á produção agrícola e industrial, que se intensifica, e
servir de valioso factor da nacionalização dos elementos hetereogeneos, que vão
povoando os nossos sertões, além de obdecer a rasões estatratégicas e, finalmente,
financeiras.
Segundo os estudo feitos, verifica-se que a estrada de Ferro Santa
Catharina, de Itajahy até seu ponto terminal do Pepery-Guassú, medirá cerca de 826
kilometros, assim descriminados:
De Blumenau á Subida (entroncamento do ramal Hansa) em trafego...67,123km
De Itajahy a Blumenau e de Subida à barra do Trombudo, com estudos approvados
e locação.................................................................................................83,283km
Da Barra do Trombudo Serro Verde, com exploração............................103,000km
237
Do Serroverde no rio do Peixe, com reconhecimento.............................258,000km
Do rio do Peixe no Pepery-Guassú, a estudar........................................310,000km
Total: 826,406km
Além destes estudos, estão concluídos também os do ramal de Brusque,
com estudos approvados, na extensão de 69,300km, havendo 20 kilometros
locados.
Foram seguintes, os Decretos approvandos os estudos:
Dec. N.10.724, de 4 de fevereiro de 1914, approvando os estudos definitivos
e o orçamento na importância de 6.313:627$508 do trecho de 48 kilometros,
comprhendido entre as cidades de Itajahy e Blumenau.
Dec. N. 10.810, de 18 de Março de 1914, approvandos os estudos definitivos
e orçamentos, na importância de 3.633:635$322 do trecho de 35 kilometros do
prolongamento de Hansa ao Pepery-Guassú. (Página 21)
Doc. N. 11.008, de 2 de julho de 1914, a approvados os estudos definitivos e
orçamento, na importância de 7.566:966$974, do ramal de Brusque.
O orçamento das despesas para o Ministério da Viação no exercício de
1921, de acordo com a Lei n. 4.242 de 5 de Janeiro último, em seu artigo 83, V,
autorisou o Governo:
“ A arredor ao Estado de Santa Catharina a Estrada de Ferro Santha
Catarina, na parte em tráfego de Blumenau a Hansa, a Navegação fluvial de Itajahy
a Blumenau e contractar o prolongamento da referida Estrada a a estação de
Trombudo e o Porto da cidade de Itajahy, de accordo com os estudo e locação
feitos e approvados pelo Governo, fazendo para tal fim as operações de credito que
julgar conveniente.
Se os factos tem abundantemente demonstrado, que nenhum administrador
melhor que a propria União pode gerir as suas estradas de ferro, não é menos
exacto, que relativamente debatida questão ante a administração official e por
empresas particulares, existe um meio termo, que é a estreita collaboração da União
com os Estados directamente interessados, para a construcção e trafego de nossas
vias férreas.
Esta sabida política tem o governo applicado ultimamente.
A autorização citada e, pois, auspiciosa. Os prolongamentos, de que trata,
embora tendo limitadas esxtensões, cerca de 45 kilometros para o interior e 48
kilometros para Itajahy, aproximarão o littoral de um centro de intenso
238
desenvolvimento constituído pelos valles do Itajahy do Sul e Oeste, zonas
feracissimas, cobertas de exuberantes matta, cujo rapido povoamento tem se
operado nestes últimos annos, o viver errante dos derradeiros selvícolas,
seduzidos pela civilisação esntando hoje substituido pelo trabalho intelligente do
melhor dos colonos, o brasileiro, descendente de colonos europeus, perfeitamente
affeito ao cultivo de nossa terra.
239
ANEXO D – E-MAIL LUIZ CARLOS HENKELS
a) Remetente: Luiz Carlos Henkels
b) Local: Indaial/Blumenau
c) Data: junho 2007
d) Destinatário: Angelina Wittmann
PREZADOS ROBERTO E ANGELINA
Nossas atividades ferroviárias continuam a todo vapor, apesar da aparente
falta de informações.
Nossa locomotiva (a de Rio do Sul) está quase pronta e deve apitar em
novembro ou dezembro para realizar os testes. A luta para restaurá-la demora
três anos, e quase todo sábado a equipe se desloca para a brica do Sr. Germano,
para as atividades. Vejam a foto de como ela se encontra.
Além disso, começaram as obras no tio de Matador. A estação está
com telhado novo, aguardando a restauração do interior. Foi um momento de
emoção muito grande quando finalmente pudemos entrar na estação, após a saída
das quatro famílias que estavam (cada uma delas ganhou uma casa nova, de
alvenaria). Ao lado está sendo construída a caixa d'água, para a locomotiva e
banheiros. Os recursos para isto vieram do governo estadual. O consórcio da Usina
Salto Pilão, que pelos estragos que vai causar teve que dar contrapartidas,
comprometeu-se a construir a infra-estrutura da ferrovia até Subida (28 km). Até o
momento participou da doação de chapas de alumínio (novas) para a cobertura
do galpão para abrigo do material rodante e oficina.
O próximo passo será a construção das linhas no pátio, que foi cercado e
onde podemos agora trabalhar em segurança. No final de junho colocamos as
rodas que faltavam nos carros (vide foto), trabalho que realizei junto com o Sr.
Fiedler, Charles e Marciano.
O famoso livro sobre a EFSC, que vocês me convenceram a escrever está
em andamento. Falta tempo para pesquisar. Infelizmente, nossos arquivos históricos
têm a mania de não funcionar aos sábados e domingos, que é quando se tem tempo
para pesquisar. Também pudera! Quem iria pesquisar no final de semana?
240
Na verdade, o livro será escrito a duas mãos. Tenho como parceiro na
empreitada o Sr. Rubens Habitzreuter, escritor e entusiasta ferroviário de Curitiba,
que está trabalhando nas entrevistas e na parte romanceada do livro. O importante
foi que por meio dele consegui as verbas para o livro, doação da Fundação
Votorantim, associada do Consórcio Usina Salto Pilão, de cerca de R$ 45.000,00. O
livro deve sair por volta de 2009, ano do centenário da nossa famigerada ferrovia.
No mais, continuamos trabalhando. Visitem-nos um sábado destes em Rio
do Sul.
Um grande abraço.
Luiz Carlos Henkels
241
ANEXO E – CORRESPONDÊNCIAS – ATOS ADMINISTRATIVOS
Correspondências. Atos Adminstrativos. Nossa História em Revista, Rio do Sul,
Tomo VIII, n. 02, pg 71, nov 2006.
1. Diretoria da Colônia – 10 de maio de 1878
Ilmo. Exmo. Sr.
Relativo à estrada, que desta colônia conduz à Vila de Curitibanos, e às
observações que V.Ex.
a.
se dignou fazer-me ainda de viva voz sobre este assunto,
tenho a honra de informar o seguinte:
Desde o começo de 1877 esta importantíssima estrada combinada com a
navegação fluvial, a artéria vital do Itajaí e da imensa maioria dos habitantes desta
província de acima da serra jaz em completo abandono, e como natural, pela
luxuriante vegetação, os desmoronamentos, enxurradas, chuvas, etc, tornou-se
muito arruinado quase completamente cerrada e intransitável. Os tropeiros, que
recentemente desceram, perderam pelo caminho diferentes animais, não pode mais
arriscar trânsito tão ruim, bem que ele por sua brevidade, fosse-lhes da mais bita
vantagem, se o caminho se achasse em estado sofrivelmente regular.
Do Alto da Serra até a Vila de Curitibanos nada ou pouco se fez além de
serviços preliminares de fixação e nivelamento de traço; mas ali se pode transitar
com maior ou menor facilidade ou dificuldade, entretanto que, em outras partes, nem
mesmo tão pouco atualmente é possível. Portanto, que convenientemente a parte do
Alto da Serra adiante podia e deveria ficar para mais tarde e tratar-se, com o crédito
existente de R$10:000$000, em primeiro lugar dos demais serviços, indispensáveis
para com brevidade restabelecer do trânsito, que ainda assim será algum tanto
penoso, mas pelo menos praticável. Tais serviços a meu modesto ver fundado
sobre as informações, que ainda nestes dias colhi de pessoas as mais competentes
na matéria deveriam consistir no seguinte, contando de acima da Serra para
abaixo:
- Melhoramento desde o Campo até o marco do coqueiro na ladeira da
Serra Geral...R$300$000
- Ladeira da mesma desde o dito marco até a raiz da serra, com cerca de
8 quilômetros; alargamento e melhoramento da vereda existente e remoção das
árvores, rochas, terras desmoronadas.... R$3:000$000.
242
- Extensão de cerca de 9 quilômetros, entre o rio Tayó e o Ribeirão
Pombinho, em que somente existe a picada primitiva da exploração e nivelamento,
não tendo chegado para mais os créditos; abertura do caminho, inclusive o
descortinamento do mato e feitio de 4 pontos.... R$3:000$000.
4º - Extensão entre Ribeirão Pombinho e Rio Trombudo; modificação e
melhoramento do traço do atual caminho em diferentes partes, e especialmente nas
pantanosas aproximidades deste rio, conserto estivados, estabelecimento de um vau
e construção de uma forte ponte....R$1:2000$000.
- Extensão de cerca de 13 quilômetros, entre o rio Itajaí do Sul e o
Ribeirão das Lontras; concerto dos estivados, abertura de valas de esgoto e outros
melhoramentos ...R$600$000
- Extensão de cerca de 19 quilômetros do dito Ribeirão até o da Subida
(ao pé da primeira terraça ou serra) melhoramentos no caminho, sobretudo na
ladeira da serra...R$400$000.
- Descortinamento de mato na mais necessitadas partes da extensão
total: ... R$1:000$000.
8º - Eventuais e imprevistos:....R$5000$000. (Correspondências, 2006. p
55)
243
ANEXO F – DISCURSO DEPUTADO FERREIRA LIMA
LIMA, Ferreira Dep. Discurso pronunciado pelo Deputado Ferreira Lima, na
Câmara dos Deputados, em 27 de Agosto de 1926 – A Viação Férrea de Santa
Catarina. Rio de Janeiro. Typ. Áurea, B. Aires 232 – 1926.
Sr. Presidente, procurando satisfazer a uma das maiores e mais justas
aspirações do povo de Santa Catarina, venho hoje apresentar, uma projecto, para o
qual chamo a attenção e solicito a boa vontade da Câmara, que, si o estudar e
analysar devidamente, como tenho esperança de que o faça, de chegar á
convicção de que o assumpto de que elle se occupa representa uma necessidade
indiscutível, a solução de um dos grandes problemas em que se conjugam
interesses catharinenses, e nacionaes, quer sob o ponto de vista commercial,
econômico, político ou estratégico. É um desses magnos problemas brasileiros, que
vem preocupado a attenção e o estudo das figuras de maior realce administração e
na política, desde os primeiros tempos do império e cuja solução, sempre adianda,
está sendo reclamada cada vez com maior insistência pelos interesses mais vitaes
mão do Estado a que tenho a honra de representar, como da República. O
assunto de que se occupa meu projecto, ou antes, o projeto da bancada
catharinense, é o da articulação das estradas de ferro (página 3) actualmente em
tráfego no Estado de Santa Catharina, e, conseqüentemente, a formação alli de uma
rêde ferroviária que venha pôr em communicação directa, pelo interior, a capital e os
grandes centros produtores daquele Estado, com os estados do Paraná, S. Paulo,
Rio Grande do Sul e a Capital Federal e, ipso facto”, com os Estados de Minas,
Espírito Santo, Goyaz e Matto Grosso.
Santa Catharina possui actualmente três estradas de ferro em trafego, todas
seguindo mais ou menos a mesma direcção leste-oéeste: uma, ao norte, do porto de
São Francisco á cidade de Porto união, entroncando-se com Estrada de Ferro
S.Paulo Rio Grande; a segunda a Santa Catharina, que, partindo das cidade de
Blumenau, no interior, vae até o arraial de Hansa; a ultima, a Thereza Christina, no
sul, parte de Imbituba e, tendo um pequeno ramal para o porto da Laguna, depois de
um trajecto de 106 killometros, termina em Lauro Muller.
Esta última, construída em 1882, para fins da exploração das minas de
carvão do Tubarão, foi mais tarde accrescida com um ramal que, partindo da cidade
244
do Tubarão, vae ter ao Araranguá e Urussanga, para servir as minas carboníferas,
posteriormente descobertas e situadas em Cresciuma, Urussanga, Rocinha e
Ararangua.
O Sr. Elyseu Guilherme – É uma estrada de ferro sem penetração.
O Sr. Ferreira Lima Perfeitamente. Diz, muito bem o prezado collega.
(Página 4)
Há ainda a Estrada de Ferro São Paulo – Rio Grande, que percorre o estado
de norte a sul, mas unicamente para estabelecer o fim visado pelo traçado, isto é, a
ligação entre São Paulo e o Rio Grande do Sul. Dahi o facto dessa Estrada
atravessar o estado em uma zona até há bem pouco tempo deserta, muito affastada
do litoral e, por isto, quase sem contacto com a região onde se desenvolve a vida
commercial, social e administrativa do Estado.
Realizados por essa maneira os traçados dessas estradas de ferro, ficou
cada uma dellas, fazendo vida isolada e servindo a certas e limitadas zonas
catharinenses, com sérios prejuízos para outras, que foram vendo sua população,
seu commercio, sua actividade se deslocarem para as servidas por via-ferreas. E
para onde esse regimen, defeituoso e illogico, acarretou maior somma de prejuízos,
foi para a capital de Sta Catharina e para os municípios com ella confinantes.
Localizada na zona centro do litoral, a proporção que as portas do norte e do sul
forma sendo servidas por linhas férreas de penetração, Florianópolis foi ficando
cada vez mais isolada e com sua vida commercial e industrial, sinão em decadência
ao menos em estagnação, tanto mais para lamentar, quanto é certo que incalculável
seria o progresso de que já estaria gosando, caso essas estradas de ferrro a
puzessem em comunicação rápida com as demais regiões do Estado beneficiadas
por ellas e com o Rio de Janeiro. (Página 5)
O Sr. Elyseu Gulherme A grande ponte do Estreito quase obriga essas
estradas de ferro a chegarem até a capital.
O Sr. Ferreira Lima Naturalmente, e para isso se faria preciso a ligação, a
articulação, o encadeamento entre si dessas linhas férreas, por meio de pequeno
dispêndio e já estudados.
Senhores. Antes de entrar nas considerações que pretendo fazer sobre a
necessidade que há, dentro da lógica, da boa razão e até da justiça, da articulação
dessas estradas entre si e dessa ligação ferro-viaria do Rio de Janeira á capital do
meu Estado, permitti que vos demonstre a iumportancia da cidade de Florianópolis
245
e da bahia onde ella se acha, importância reconhecida e proclamada desde os
primitivismos tempos da história de nossa pátria, por consenso unânime dos
entendidos, que não se modificou em tempo algum e, pelo contrário, mais e mais se
tem revigorado de geração em geração.
De facto, Sr. Presidente, dados as condições da Bahia de Santa Catharina,
onde está localizada a cidade de Florianópolis: dada a importância, sob todos os
pontos de vista, da posição considerada em todas as épocas como Chave do Brasil
meridional”, não se compreende como até o presidente se atenha deixado no
isolamento em que se acha e que tende a se aggravar, quando é sabido que desde
affastados tempos foi reconhecido a necessidade (página 6) absoluta de sua ligação
com o sul, com o norte, com a fronteira accidental do paiz e com a capital do Brasil.
E de tal ordem foi sempre ancorado, esse importante problema que, desde
que se começou a cogitar de construções ferroviárias no Brasil, foi algo projectado
pela alta administração nacional a construcção de uma estrada de ferro
estabelecendo a comunicação rápida e directa entre as antigas províncias de Santa
Catharina e Rio Grande do Sul.
Sim, Sr. Presidente, desde os primitivos tempos, quando intrépidos
navegantes portuguezes descobriram neste lado do Atlântico novas e maravilhosas
terras desconhecidas e dellas se passaram, alargando e enriquecendo assim os
domínios da Coroa portugueza, desde estes affastados tempos em que a ambição
dos outros povos começou a se aguçar, visando as novas terras de Santa Cruz, que
as costas catharinenses forma sendo visitadas, ora accidentalmente por marítimos
que alli arribavam forçados por temporaes; ora de propósito por outros que ali
aportavam, ou para se refazerem das fadigas de longas e accidentadas viagens, ou
constituindo expedições, para fins de ocupação e conquista.
E desde essa época, tão distante, Senhores, começou logo a ser olhada
com posição de xima importancia nas costas do Brasil, a Bahia denominada dos
“Perdidos”, por João Dias de Sólis,(página 7) depois pelo nome de “Porto dos
Patos”, por Christovam Jacques e finalmente pelo de “Santa Catharina” por
Sebastião Cabôto.
[...] Vimos igualmente que, pouco depois, uma nova estrada foi aberta,
communicando São Francisco com a Bahia de Santa Catharina, mais tarde, foi
iniciada uma outra para os sertões do oeste, estrada continuada no tempo do
Império e nas administrações republicanas. (página 16)
246
Durante o período monchico, dentre os primeiros projectos de estradas de
ferro que foram surgindo, appareceu logo o de uma via-férrea, ligando o porto de
Sta Catharina ao de São Francisco e á cidade de Porto Alegre. Foi em 1835, pelo
decreto n. 101, que appareceram os primeiros ensaios sobre o projecto dessa
importante via-férrea.
Em 1871 foi pedido sua concessão ao Governo imperial, e logo incorporada
a respectiva companhia em Londres. As Negociações foram, entretanto, arrastando,
morosamente, sem solução.
Em 1879, na sessão de 12 de maio na Camara de Deputados, o
representante catharinense, Silveira de Souza, apresentou e, com eloqüência,
justificou da tribuna, um projecto de construção de uma estrada de ferro que,
partindo de qualquer ponto do littoral catharinense, fosse terminar em Porto Alegre,
passando pela cidade do Desterro, Capital de Santa Catarina.
O illustre deputado catharinense, com grande elevação e brilho fez ver que a
idéia da construcção dessa estrada, era muito antiga e vinha sendo acariciado com
vivo enthusiasmo, como uma das maiores necessidade do Brasil, desde 1858.
(Página 16)
[...] Em 1880, a assembléia provincial de Santa Catharina, dirigiu ao Império
uma representação, solicitando a construção daquella estrada de ferro, mostrando-
lhe ser uma das maiores necessidades da província.
Essa representação foi indeferida pelo Presidente do conselho e Ministro da
Agricultura, Laurenço de Albuquerque, o que provocou um vehemente protesto do
então deputado provincial Elyseu Guilherme, meu prezado companehiro de
bancada, que, da Tribuna da Assembléia Provincial (Página 18) entre outras, usou
das seguintes expressões, depois de ler a representação do povo catharinenese e o
despacho do ministro.
Sr. Presidente, desde que se inaugurou no paiz a situação liberal, desde
que governa o gabinente de 5 de janeiro, parece que, apezar de ser esta província
liberal, apezar de estar saturada, permitta-se-me a expressão, das ideias deste
partido, parece que foi votada ao mais completo desprezo, a um desapreço, a um
ostracismo, digno das mais vehementes censuras. Presidiu, ao ascendermos á
governação do Paiz, um sobrinho do actual Ministro da Agricultura e parece que vem
dessa administração fato e nefasta, todas as contrariedades por que temos passado.
247
[...] O projeto da Estrada de Ferro D. Pedro II, a incorporação, em Londres,
de uma companhia que havia de construir; os vários pareceres dos technicos
militares e do conselho de Estado, sobre as vantagens e a necessidade de estradas;
a inclusão, no orçamento, de uma autorização ao Governo Imperial, para mandar
leval-a a effeito e a persistência com o assumpto, por tantos annos, foi tratado pelos
homens, mais eminentes do paiz, dão bem a idea, Sr. Presidente, da importancia e
da necessidade inlludivel dessa via de communicação que terá de ligar a capital de
Santa Catharina ao Estado do Rio Grande do (página 20)Sul e ao Rio de Janeiro.
Por esse lado, não precisamos insistir: são os dados históricos que vêem mostrar
que em todos os tempos foi reconhecida a necessidade absoluta da ligação, por via-
ferrea, da capital do meu Estado com o norte sul do Brasil.
Encaremos agora o caso pelo lado da injustiça que representa Santa
Catharina a maneira por que tem ella sido tratada e muito especialmente sua capital,
relativamente a esta sua ardente aspiração e o que louvavelmente tem sido
concedido aos damais estados co-irmãos.
Si se procurar examinar o mappa da rêde ferro-viaria brasileira, se verificará,
ao primeiro golpe de vista, que todas as capitães dos Estados marítimos estão
servidos, de muito tempo, por via-ferrea, que entre tem circulação activa e
vitalizador entre a séde do governo estadual e os pontos mais afastados do próprio
interior e de varios outros Estados. (página 21)
Projecto
Numero 196 – 1926
(Autoriza a novação do contrato de estrada de ferro na Esttrada de Santa
Catharina)
O Congresso Nacional decreta:
Art.1º - Fica o Governo autorizado a fazer a novação do contracto (Página
28) de arrendamento e de construcção celebrado com o Estado de Santa Catharina,
em virtude do decreto n. 15.152, de 2 de dezembro de 1921, no sentido de serem
executados, dentro de prazos previamente fixados, as ligações, de prolongamento e
ramaes, abaixo discrimnados, e as variantes e melhoramentos necessários na linha
em trafego de Blumenau e Hansa, podendo, para a execução dos fins previstos
248
nesta lei, emittir títulos de divida publica (obrigações ferro-viarias), de accordo com
o decreto n. 16.842 de 24 de março de 1925, e realizar as operações de credito que
se tornarem necessarias.
§ 1º - Os prolongamentos, ramaes e ligações a que se refere este artigo, são
os seguintes:
- ligações da Estrada de F. Santa Catharina á Estrada de F. D. Thereza
Christina, no Estreito (Florianópolis) e á linha de São Francisco, em Jaraguá ou no
ponto que os estudos determinarem, como o mais conveniente.
- prolongamento de Estradas de Ferro Santa Catharina de Blumenau a
Itajahy e até a foz do Pperiguassú, na fronteira da Argentina;
3º – prolongamento do ramal de Hansa até Nova Bremem;
4º - ramal do Valle do Itajahy mirim até Brusque;
5º - ligação do Rio do Sul ao Estreito (Florianópolis).
§ - Uma vez construídos as linhas a que se refere esta autorização, serão
ellas, para todos os efeitos incorporados a estrada de ferro arrendada e sujeita ao
regime de arrendamento, estabelecido no contrato firmado entre o Estado de Santa
Catharina e a União, em virtuado decreto n. 15.152, de 2 de dezembro de 1921.
Sala das Sessões da Camara dos Deputados, 27 de agosto de 1926.
Ferreira Lima – Elyseu Guilherme
JUSTIFICAÇÃO
O plano de viação acima delineado conjuga-se perfeitamente com as justas
aspirações do Estado de Santa Catharina, para attender as exigências do seu
incessante progresso.
Esse plano foi objecto de reflectivo estudo feito pelo engenheiro Joaquim
Breves Filho, director da Estrada de Ferro Santa Catharina, perfeito conhecedor das
condições topographicas e econômicas do Estado, e que o expoz e justificou em seu
relatório do anno de 1922, dirigindo ao governo do Estado.
Esse importante assumpto, além das vantagens de ordem econômicas,
commercial e estratégica que de trazer, vem satisfazer uma necessidade que
cumpre salientar, por interessar viramente ao Estado: é a de extinguir o isolamento
em que se acha a capital de Santa Catharina, situada em uma ilha, servida por um
249
porto mal apparelhado e sem ligações ferro-viarias, com as outras unidades da
Federação e com a Capital da Republica. (Página 30)
Deante dessa situação especial, e o Estado impunha-se um dilemma : ou
transferir a sua capital para um ponto conveniente no interior ou providenciar para
que Florianópolis sahisse desse isolamento, por meio de medidas garantidoras de
fáceis comunicações terrestres com outras regiões do Estado e da Republica.
Tendo predominado poderosas razões que tornavam impossível aquella
transferência e aconselhavam não abandonar-se a sua histórica e aprazível capital,
o Estado o tem poupado sacrifícios, dentre os quaes sobresae o da sua ligação
ao continente, por uma grande e majestosa ponte, inaugurada, que constitue uma
das obras de engenharia mais importantes do gênero. Para a ligação ferroviaria
que então se faz mister, o Estado recorre á União, igualmente interessada, por tratar
de um problema nacional, e que não poderá negar a Santa Catarina o que tem
concedido a quase todos os outros Estados da República.
A solução natural para satisfazer a esse justo “desideratum”, será a ligação
do Estreito (Florianópolis) á Estrada de ferro Santa Catharina, em Blumenau, e,
desta cidade, a linha de São Francisco, em Jaraguá, ou em outro ponto que for
julgado mais conveniente.
Por outro lado, ficarão assim articulados nos sistema ferro-viario nacional
duas linhas que se acham actualmente completamente isolados: a Estrada de Ferro
Santa Catharina e a Estrada de Ferro D. Thereza Christina.
Um outro aspecto que deve ser considerado, em justificação do plano
apresentado, é o da actual situação da Estrada de Ferro Sta Catharina, reduzida a
uma pequena extensão, isolada dentro de um município interior do Estado. Partindo
actualmente de Blumenau, acha-se distante 8 km do litoral, no porto de Itajahy,
resultando que a produção de uma vasta e rica região, que lhe é tributária, cujo
volume argumenta de anno para anno, fica assim na dependencia de uma
nevegação fluvial muito irregular.
É de notar, também, que o seu objectivo de alcançar o planalto e percorrel-o
até a fronteira Argentina, esta ainda muito longe de ser atingida, pois o
prolongamento em construção até a Barra do Trombudo, nem siquer alcança o
grande planalto do Estado.
Faz-se, portanto, mister prolongar-se a Estrada de Ferro Sta Catharina, até a
foz do rio Peperiguassú, na fronteira Argentina e até a cidade Itajahy. Ficará assim
250
integrada a grande linha Leste-Oeste do Estado, a artéria principal de circulação de
suas riquezas, que constituira, também, uma das linhas de penetração mais
importante do paiz.
Cumpre ponderar que já assim o reconhecia o Governo Federal desde 1911,
tanto assim que contractou a construcção dessa linha, conforme se no decreto n.
9.155, de 29 de novembro de 1911, (Página 32), que determinava sua conclusão no
prazo de cinco annos, o que deixa de ser feito por circumstancias oriundas da
grande guerra.
Decorridos dez annos, o Governo Federal, pelo decreto numero 15.152, de 2
de dezembro de 1921, contractou a construcção de uma pequena parcella dessa
grande linha, cuja construcção integral apresenta projecto visa garantir com o plano
apresentado.
Os ramaes previstos, de Hansa a Nova Bremem e pelo Valle do Itajahy-
mirim a a cidade de Brusque, bem assim a ligação do Rio Sul ao Estreito,
completarão o plano de viação proposto, atravessando regiões muito férteis, já
colonizados e densamente povoados, intensificarão sua produção e os elementos de
tráfego e de receita da rêde ferroviária.
Finalmente, as variantes e os melhoramentos do trecho em trafego, de
Blumenau a Hansa, serão muito breve uma necessidade imprescindível, por tratar-
se de uma linha construída muito economicamente, com mas condições técnicas,
trecho este que tende ser o colletor principal de uma importante rêde, não poderá
assim permanecer sob pena de graves perturbações nas condições econômicas de
seu trafego. (Página 33)
Esta autorização visa garantir a execução de uma importante rêde ferro-
viaria, de cerca de 1200 kilometros em prazos razoáveis, que serão fixados na
novação do contracto, igualmente com prioridade das linhas a construir-se
sucessivamente.
Admittindo-se o prazo de 12 annos serão construídos 100 kilometros,
annualmente. Não seria demasiado pretender a realização desse plano em período
tão longo. O augmento progressivo de população e o desenvolvimento agrícola e
industrial do Estado, que se intensifica de modo surprehendente, o exigirão antes do
desse prazo.
251
Nem a situação financeira do Paiz, qualquer que ella seja, devera deixar de
promover a construção de estradas de ferro em regiões de grande e immediatas
possibilidades econômicas, como é o caso do Estado de Santa Catharina.
Contudo, si razões político-financeiras exigirem um prazo maior, para
execução do plano de viação delineado, que se dilate este prazo, mas que não deixe
de ficar assegurada a sua completa realização, gradualmente, sem soluções de
continuidade.
A propósito, em reforço a esta justificativa, transcrevemos um trecho do
relatório da missão ingleza, referindo-se á estrada de ferro e que representa uma
verdade indiscutível: “Ficamos muito impressionados com as grandes possibilidades
do solo fertil do Brasil e com as riquezas que guardam a exploração”.
Tão forte foi essa impressão em todos nós que nos leva a confiar na
potencialidade do Paiz.
Estamos, convencidos de que o desenvolvimento do Brasil, está sendo
retardado por falta de transportes e que a produção de cereaes, a exportação de
mineraes, a distribuição da população necessaria e o emprego de a capataes
dependem essencial e principalmente da conveniente diffusão de facilidade ferro-
viarias.
Estamos convencidos de que na distribuição, dessas facilidades
ferropviarias esta a base de toda a futura prosperidade do Brasil e uma vez que
pelo seu desenvolvimento pode o Paiz livrar-se de sua dívida externa, consideramos
o prolongamento e melhoramento da estrada de ferro um assumpto cuja urgência
não precisa ser encarado.”
252
ANEXO G – CARTA (1879) DR. BLUMENAU AO PRESIDENTE DA PROVÍNCIA
Blumenau, 8 de maio de 1879.
Il
mo
. e Ex
mo
. Snr.
Como sabe, o Engenheiro Emilio Odebrecht, encarregado da
construção da nossa Estrada de Curitibanos, solicitou, por intermédio d’essa
Presidência, ao Governo Imperial um augmento na importancia de 20:000,000 do
credito de igual importancia destinado para a mesma obra no corrente exercício,
mas ficou indeferido.
Ora, estando n’este momento quase esgotado este último credito e devendo,
portanto, ser terminados ou interrompidos os respectivos serviços, ouso tão
respeitosamente, quanto encarecidamente solicitar, Vª se queira dignar, de novo
apresentar ao Governo Imperial a urgente conveniência, de se continuarem e
concluírem no próximo novo exercício e com a máxima possível brevidade, os
alludidos serviços, ficando para elles concedido um outro credito de 20:000,000.
Bem que adiantados, elles não são concluídos e assim a arteria de
communicação, de vital interesse para esta província inteira e especialmente esta
colonia, fica interceptada e imperfeita com grave prejuízo até da renda pública,
entretanto que, ficando-lhe ainda applicado o crédito solicitado, não me parece
restar alguma dúvida de que essa importantíssima estrada fique concluída de modo
satisfatório e durável.
O pedido supra da máxima possivel brevidade é motivado pela urgente
conveniência de se continuarem e, quanto possivel for, concluírem os serviços na
estação fria e a mais sadia, desde Julho ou Agosto até Novembro e no último até
Dezembro. A infeliz circunstância de que o credito do atual exercício fosse conce...
(ilegível... na estação calmosa, foi a causa (ilegível) enfermidades e até falecimentos
entre os respectivos operários, que não pouco prejudicarão e até por algum tempo
interromperão o progresso da obra.
É portanto urgente evitar essa fonte de mal e de diminuição de resultado, e
isso unicamente se poderá conseguir ficando a continuação da obra autorisada, com
toda possivel brevidade.
Deos guarde à V. Eª.
Il
mo
. E Ex
mo
. Snr.
Dr. Antonio de Almeida Oliveira
253
Presidente d’esta Província
(...) e ainda (ilegível) ficar intelligível e bem compreendido, o muito, que
sobre muitos e muitos argumentos concernentes teria que dizer.
O tempo aqui continua chuvoso e os caminhos vão cheios de lama; talvez,
que a lua nova do dia 21 traga o melhoramento desejado e desejável. O Sr.
Odebrecht, que muito ouso recommendar à benevola protecção de Eª, ainda
está em Curitibanosou visinhança da serra.
Digno-me finalmente Vª Eª, de receber, os protestos dos meu profundo
respeito e da (ilegível) consideração e estima, com que tenho a honra de ver.
Il
mo
. E Ex
mo
. Snr.
De Vª Eª
H. BLUMENAU
254
ANEXO H – ENTREVISTA LUIZ CARLOS HENKELS
a) Entrevistado: Luiz Carlos Henkels
b) Local: Blumenau/Indaial
c) Data: setembro de 2007
d) Entrevistadora: Angelina Wittmann
Abreviações: Luiz Carlos Henkels – L
Angelina Wittmann – A
A Qual a importância da EFSC no desenvolvimento das cidades no
Vale do Itajaí?
L – No início do século XX, a EFSC foi fundamental ao desenvolvimento das
colônias mais distantes de Blumenau e da própria Blumenau. Veja que naqueles
tempos de 1909 andava-se ao ritmo da carroça (+/- 8 km/h, e olha !). O trem veio
proporcionar velocidade de 30 a 35 km/h, que poderia significar a diferença entre a
vida e a morte naqueles tempos; falo no sentido comercial, ou seja, os colonos
precisavam de rapidez para colocar sua produção (fresca) no mercado de Blumenau
e mesmo no exterior. Mesmo as compras de mantimentos feitas em Blumenau ou
Itajaí precisavam de rapidez; assim, de carroça levava-se um dia apenas para ir a
Blumenau. Gastava-se um dia de viagem para ir, um dia para as compras e um dia
para voltar. Com o trem esta coisa se resolvia tudo em um dia, e ainda dava tempo
de tirar leite da vaquinha, altas horas da noite... Evidente que com a melhora desta
performance, as cidades foram evoluindo.
A Quem realmente idealizou e implantou a ferrovia? A quem
interessava, na época, a sua implantação?
L A EFSC teve vários idealizadores, entre eles o próprio Dr. Blumenau,
Emil Odebrecht, entre outros, todos voltados ao progresso e desenvolvimento da
colônia, principalmente aquele que chegou mais perto das tentativas, Friederich Von
Ockel, que era engenheiro, mas para o qual faltavam recursos para a obra. Mas
quem realmente implantou a ferrovia foi a poderosa Companhia Colonizadora
Hanseática, que estava a colonizar as terras da região de Ibirama e precisava
vender uma boa imagem do seu produto na Alemanha, aos que queriam emigrar. O
fato de ter uma boa linha de comunicação (ferrovia) era um consolo para quem
255
queria se aventurar nestas terras estranhas. No embalo da idéia, foram utilizados
dos políticos na época, Coronel Feddersen, e de empresas como a Companhia
Sallinger
81
, que era uma importadora... Na Alemanha, aderiram à causa as
companhias de navegação, que obviamente iriam ter mais mercadorias para trazer e
levar do porto de Itajaí.
Na verdade, a Hanseática, as companhias de navegação, bancos alemães e
outros endinheirados que tinham interesses no Vale do Itajaí é que constituíram a
EFSC (alemã), que funcionou até 1918, quando perderam a concessão devido à
Guerra. Portanto, a melhoria proporcionada ao povão também foi uma mera
coincidência.
A A quem interessou a erradicação e dilapidação do patrimônio
ferroviário no Vale do Itajaí?
L Pergunta difícil de responder. O governo federal, a partir de 1950, mais
ou menos, o se interessou mais pelo desenvolvimento ferroviário, e assim
ferrovias isoladas como a nossa caíram no descrédito da população que, a exemplo
de 1909, ansiava por melhorias. O transporte rodoviário proporcionou esta melhoria,
e o transporte ferroviário ficou sem cargas e passageiros. Com a desativação, a
dilapidação promovida pelas prefeituras foi imediata, para satisfazer imobiliaristas e
comércio, que precisavam de mais espaço.
A Qual foi o tipo de relação do sistema de transporte fluvial,
rodoviário, e ferroviário? Como eram estruturadas as cidades com cada tipo de
meio de transporte? Fluvial, tração animal, automóveis, ferroviário?
L No passado, os meios de transporte eram bem integrados, com o
transporte rodoviário servindo a ferrovia e esta conectada, com horários rígidos, ao
fluvial. Tudo funcionava muito bem, até vir a mania rodoviária, que acabou no caos
que hoje temos.
A Como seria o desenvolvimento físico e a estruturação das cidades
do Vale do Itajaí, hoje, mediante a adoção do sistema ferroviário nos moldes
atuais?
L – Nos moldes atuais, a ferrovia ainda incomoda os grandes centros,
infelizmente. Veja que estão investindo nos contornos ferroviários de São Francisco,
Joinville e Jaraguá. Vai se gastar uma nota preta para daqui a dez anos o local estar
81
Sallinger era a empresa do Cel. Feddersen.
256
urbanizado novamente. Enfim, apesar de toda a propaganda, a ferrovia continua não
sendo levada a sério, visto que a estruturação das cidades deveria ser sobre a
malha ferroviária e o sobre a malha rodoviária, pois esta última deveria servir ao
trem e não ser servido por ela.
257
APÊNDICES
258
APÊNDICE A – EXTINÇÃO DA RFFSA – MAIO 2007 – PELA AUTORA
82
A Rede Ferroviária Federal S.A. - RFFSA foi extinta no dia 16 de maio de
2007, por meio de uma Medida Provisória enviada pelo Poder Executivo ao Senado
Federal. Tal iniciativa fez parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)
do Governo Federal, e transferiu para a União os direitos e obrigações da RFFSA.
O processo de liquidação da Rede Ferrovria Federal S.A. (RFFSA) teve
inicio em 1999. A controvérsia diante de sua extinção contribuiu para que surgisse
novamente a dialética do modal ferroviário e as questões dos desafios desse tipo de
transporte no Brasil, nos próximos anos tais como os investimentos prioritários, a
ampliação e manutenção das ferrovias e a relação entre Estado e setor privado
nesta área.
Segundo alguns órgãos da imprensa nacional, a extinção da empresa é
resultado das ações dos últimos governos no setor ferroviário. Entre 1996 e 1998,
boa parte das ferrovias da RFFSA foi repassada à iniciativa privada, dando início ao
seu processo de liquidação.
A Medida Provisória em causa foi contestada por entidades do setor
ferroviário, que a consideraram inconstitucional, defendendo a tese de que a
empresa poderia ter importância estratégica para o fortalecimento do transporte
ferroviário no âmbito do próprio Programa de Aceleração do Crescimento. Na
interpretação do Governo Federal, a extinção da empresa traria segurança para o
fortalecimento dos investimentos no setor ferroviário, além de considerá-la
necessária, também, para fazer cessar o crescimento das bilionárias dívidas da
empresa.
Os bens operacionais arrendados às concessionárias privadas foram
transferidos para a esfera patrimonial do DNIT - Departamento Nacional de Infra-
Estrutura Terrestre, ligado ao Ministério dos Transportes. E os direitos e obrigações
da rede foram repassados à União.
Cerca de 400 servidores ativos da Rede foram transferidos à Valec -
Empresa de Engenharia, Construções e Ferrovias S.A., que também é considerada
uma estatal vinculada ao Ministério dos Transportes.
82
Fonte:http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=14193&editoria_id=7).
259
O projeto que extinguiu a RFFSA redundou na criação de 157 cargos em
comissão, destinados à realização dos trabalhos de inventário dos imóveis daquela
empresa. Na definição quanto a seus ocupantes foi dispensado concurso público. A
criação desses cargos recebeu severas críticas da sociedade.
260
APÊNDICE B – AS ESTAÇÕES – PELA AUTORA
As estações, espaço destinado aos embarques e desembarques de
passageiros e cargas, apresentando tipologias variadas somaram o número de 24
estações ao longo de todo o leito ferroviário construído da EFSC. Para efeito de
registro, serão listadas em ordem crescente, desde o quilômetro “zero”, Itajaí, até a
última estação do tronco principal, São João; listando, igualmente, as estações do
Ramal de Hammonia.
1) ITAJAÍ km “zero” Inaugurada em 1954. A estação de Itajaí
aparentemente não deixou qualquer vestígio para pesquisa ferroviária, inclusive
sobre a EFSC. Naquele município não há indícios de sua existência.
2) ENGENHEIRO VEREZA – km 9,69 –Tipologia em duas águas, com
fechamento em tijolos maciços desprovidos de reboco, estrutura de telhado em
madeira com cobertura metálica e aberturas também em madeira. As obras desta
estação tiveram início em uma das frentes de trabalho do engenheiro Breves, ainda
na década de 20. Quem comandou sua construção foi Telasco Vereza, de onde
provém seu nome. Segundo Giesbrecht, a estação ferroviária de Engenheiro Vereza
cedia à comunidade o telégrafo e o telefone da estação durante as enchentes,
comuns na região, para a comunicação com outros lugares. Esta estação foi
edificada para servir a um futuro entroncamento ligando um ramal a Brusque, que
não foi construído.
Figura 151 - Estação de Vereza
Fonte: GIESBRECHT, 2006.
261
3) ILHOTA – km 19,32 – Não há registros.
4) GASPAR – km 34,60 – Não há registros.
5) BLUMENAU PRIMEIRA km 49,50 Construída utilizando técnica
enxaimel.
Figura 152 - Construção da primeira estação de Blumenau, usando a técnica construtiva
enxaimel (estrutura de madeira e fechamento em tijolo maciço) - 1908
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Sua tipologia é composta com base na integração de vários volumes e
diferentes inclinações do telhado, dando-lhe movimento em suas fachadas, e seus
espaços eram distribuídos em dois pavimentos, com aproveitamento do sótão. O
fechamento foi feito em tijolos maciços, com reboco e caiação branca, e a estrutura
do telhado também em madeira, com telhas planas, do tipo germânico, de barro
cozido. As aberturas foram feitas em madeira com janelas de folhas almofadadas
com vidro. Há a presença de sacadas superiores com balaústres, também em
madeira. O pavimento térreo central é fechado com paredes autoportantes,
executado com tijolos maciços.
Esta primeira estação foi inaugurada no dia 3 de maio de 1909, mesma data
de inauguração do primeiro trecho ferroviário entre Blumenau e Warnow.
262
Figura 153 - Tropas de Getúlio Vargas na Estação de Blumenau – Revolução de 1930
Fonte: HAAS, 1930.
Ao ser executado o novo plano de extensão da ferrovia para o litoral, quando
foram implantadas as mudanças no plano original, desviando a ferrovia do trajeto
especificado, a primeira estação de Blumenau perdeu a utilidade, excluída que foi do
novo trajeto. Desta forma, foi desativada em 1954, no momento da inauguração do
trecho ferroviário de Blumenau a Itajaí. Segundo Giesbrecht, foi demolida na década
de 60 do culo XX. Hoje a Prefeitura Municipal de Blumenau ocupa o terreno no
qual ela fora edificada.
6) BLUMENAU SEGUNDA – km 47,46 – Inaugurada em 1954, foi construída
no estilo art decó
83
, em linhas retas, com espaços distribuídos somente em um
pavimento. Fechamento em alvenaria de tijolos, aberturas em madeira e vidro.
Fachadas adornadas de maneira simétrica. A área útil da segunda estação
aparentemente é inferior à da primeira estação de Blumenau. Esta estação teve de
ser construída devido à mudança do traçado ferroviário na área central de
83
Art Decó é um novo ecletismo que surge a partir de influências tanto do classicismo como dos
movimentos vanguardistas do início do século XX, que impressionavam, tais como o Cubismo e o
Futurismo.
263
Blumenau. Atualmente, o prédio desta antiga estação de Blumenau é ocupado por
uma clínica veterinária.
Figura 154 -
Segunda Estação de Blumenau
Fonte: Foto: LATTUF 2004, apud GIESBRECHT, 2006.
Figura 155 - Segunda estação de Blumenau em pleno funcionamento e último trem em
12/03/1971
Fonte: GIESBRECHT, 2006
264
7) ITOUPAVA SECA km 51,50 Foi inaugurada em 1909. Não indícios
de sua construção e nem registro fotográfico. Estava localizada próximo às oficinas
da EFSC.
8) SALTO WEISSBACH km 57,30 Segue a mesma tipologia da segunda
estação de Blumenau, porém mais simples, com menos detalhes. Plataforma de
embarque feita em granito oriundo de Subida. Segundo Giesbrecht, esta estação foi
construída na década de 40 do século XX, no lugar da primeira estação, que era
muito pequena. Foi demolida em 1991, durante os trabalhos de asfaltamento da Rua
Bahia, na administração do então prefeito Vilson Pedro Kleinübing, e atualmente é
ocupada por um restaurante. Dela resta apenas a plataforma em granito rosa.
Figura 156 - Estação de Salto Weissbach
Acervo: WIITTMANN, 1996
9) ENCANO km 65,60 – A estação de Encano foi construída com a técnica
enxaimel, fechamentos com tijolos maciços rebocados e caiada de branco. Estrutura
do telhado em madeira, com telhas planas do tipo germânico. Na imagem vê-se o
Sr. Rodolf Sprengel, primeiro agente ferroviário dessa estação, na qual trabalhou até
1917. Segundo Giesbrecht, a estação de Encano foi obra do engenheiro-chefe da
companhia de construção da EFSC, Sr. Muzika. Foi demolida em 1982, por um
vândalo.
265
Figura 157 - Estação de Encano - 1910
Acervo: HENKELS, [1957?].
10) INDAIAL km 70,70 Indaial também teve duas estações. A primeira,
inaugurada paralelamente à inauguração do primeiro trecho entre Blumenau e
Warnow, construída com a técnica enxaimel; e a segunda, seguindo a tipologia das
estações em estilo art decó construídas a partir da década de 40.
266
Figura 158 - Primeira estação de Indaial
Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE INDAIAL.
Figura 159 - Segunda estação de Indaial
Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE INDAIAL.
11) WARNOW km 79,40 Assim como Indaial, Warnow teve duas
estações. A primeira, inaugurada paralelamente à inauguração do primeiro trecho
267
entre Blumenau e Warnow, em 1909, registrada na foto abaixo; e a segunda,
construída seguindo a tipologia das estações com linha retas, em art decó.
Figura 160 - Estação de Warnow, na inauguração do primeiro trecho ferroviário da EFSC
Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE INDAIAL.
Figura 161 - Segunda estação de Warnow
Fotografia: WITTMANN, 2008
12) ASCURRA km 90,20 Não existe mais a edificação e não registro
de imagens.
268
13) APIÚNA km 90,20 A fotografia existente mostra que a estação de
Apiúna seguia a mesma tipologia das estações construídas, em art decó. O
armazém da estação ainda existe, mas está muito descaracterizado. Nele reside
uma família.
Figura 162 - Estação de Apiúna
Fonte: GIESBRECHT, 2006.
Figura 163 - Armazém ferroviário Apiúna
Fotografia: WITTMANN, 2008.
269
14) SUBIDA km 111,80 Na estação da Subida o trem era abastecido de
água para a máquina a vapor da locomotiva, e também eram engraxadas as
braçagens e bronzinas. O trem permanecia na estação por mais tempo e os
passageiros podiam aproveitar a parada para lanchar.
A tipologia tem semelhança à das primeiras estações. Duas águas,
cobertura de telhas de barro, fechamentos em alvenaria. A estação de Subida foi
inaugurada 10 anos após a inauguração do primeiro trecho ferroviário.
Figura 164 - Estação de Subida
Fonte: GIESBRECHT, 2006.
15) RIACHUELO km 132,00 Inaugurada em 1929, estava localizada
perto da estação Victor Konder. Não há registro de imagens.
16) LONTRAS – km 133,90 – Inaugurada em 1928 como uma estação
provisória, com fechamento em tábuas de madeira e tipologia de uma água e
cobertura em metal. A segunda estação foi construída posteriormente, numa
tipologia em duas águas com alvenaria nos fechamentos.
270
Figura 165 - Lontras - Primeira estação, inaugurada em 1928
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Figura 166 - Lontras, segunda estação
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
271
Figura 167 - Estação de Lontras
Fotografia: WITTMANN, 2008
17) MATADOR km 139,70 Inaugurada em 1933, apresenta a tipologia
das demais estações da serra, com duas águas e construída em alvenaria de tijolos,
com rampa de embarque e desembarque executada em granito, como as demais.
Figura 168 - Estação de Matador
Fonte: GIESBRECHT, 2006.
272
18) RIO DO SUL km 146,40 Primeira e única estação, inaugurada no
ano de 1933. Nos primeiros dias de funcionamento de ferrovia a estação funcionou
provisoriamente no local em que depois passou a funcionar o armazém.
Figura 169 - Estação de Rio do Sul, na década de 30 do século XX
Fonte: RIO DO SUL (SC) - Arquivo Público Histórico de Rio do Sul.
Figura 170 - Estação de Rio do Sul – Lado da Plataforma de embarque e desembarque
Fotografia: WITTMANN, 2008
273
Tipologia característica das edificações dos imigrantes da região. Toda
construída em tijolos aparentes, com detalhes rebocados. Aberturas em madeira e
vidro, bem como a estrutura do telhado. Telha plana, tipo germânico.
A estação tem dois pavimentos. Encontra-se, atualmente, em bom estado de
conservação e nela está funcionando o Museu Ferroviário.
19) BARRA DO TROMBUDO km 153,00 Inaugurada em 1937. Tipologia
característica das demais estações da serra, somente com o acabamento do
revestimento diferenciado. Parte dos tijolos do fechamento não foi rebocada, a
exemplo da estação de Rio do Sul. Edificação com duas águas, plataforma feita com
granito, o qual, como nas demais, foi extraído da região. Aberturas em madeira e
vidro e estrutura do telhado também em madeira, com telhas de barro cozido, do tipo
germânico.
Figura 171 - Estação de Barra do Trombudo
Fotografia: WITTMANN – 2008.
20) TROMBUDO CENTRAL Estação Mosquito km -- Segue a linha
arquitetônica art decó.
274
Figura 172 - Estação Mosquito
Fotografia: WITTMANN, 2008.
21) TROMBUDO CENTRAL Estação central km 165 Inaugurada em
1958. Segue a mesma tipologia das estações em estilo art decó. Plataforma feita
com granito rosa, oriundo da região.
Figura 173 - Estação de Trombudo Central
Fotografia: WITTMANN, 2008
275
22) AGROLÂNDIA – Estação de São João – km -- – Inaugurada em 1964.
Figura 174 - Ruínas da Estação São João
Fotografia: WITTMANN, 2008
23) ESTAÇÃO HANSA – Comunidade de Hammonia – Primeira estação do
ramal, inaugurada no dia 1º de outubro de 1909.
Figura 175 - Estação de Hansa
Fonte: PREFEITURA MUNICIPAL DE IBIRAMA.
276
24) ESTAÇÃO HAMMONIA – O primeiro trem chegou a esta estação no dia
23 de dezembro de 1933, por um prolongamento de 3 km da estação de Hansa até
o local. Não existe mais a edificação nem há registro de imagens.
Figura 176 - Ramal - Local da estação principal de Hammonia (Ibirama)
Fotografia: WITTMANN, 2008
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo