
mais respeito e as pessoas evitam beber demais nas paradas e nos 
pousos. Em outras, o respeito é menor. E aí um acidente, uma vela 
queimar a toalha do altar, um folião cair do cavalo, qualquer coisa 
pode acontecer. É castigo certo. Não se ouve falar em brigas na Folia 
do Divino, porque ela é muito temida. Porque, quando alguém entra 
numa Folia, tem que cumprir sua obrigação. Não pode parar o giro, 
nem morrendo um parente. A obrigação é cantar e dançar com a Folia 
até o seu arremate, quando começa a festa. 
É pondo sentido nessas obrigações que os foliões vão virando ser-
ras, de uma casa a outra, até a próxima parada. Lá, tudo volta a se 
repetir, a saudação, o pedido de esmola, a bênção da bandeira, a 
cantoria, a comida, o café, a cachaça, a curraleira. E os foliões tor-
nam a seguir, até a próxima casa, a próxima parada, o próximo 
pouso, no fim do dia. E assim será pelo dia seguinte, e o outro e o 
outro, até poderem arrematara Folia. Geralmente, o lugar da chega-
da é marcado por um cruzeiro erguido em frente de uma casa, com 
uma vela em cada ponta, e por quatro ramos verdes, formando um 
arco. Passando pelo arco, o alferes da bandeira e o caixeiro, troan-
do a caixa, entram na casa. Os outros foliões seguem adiante. 
Debaixo do arco estão colocados bolos, mas só o derradeiro a pas-
sar é quem deve pegá-los. Ele coloca os bolos no pandeiro e vai 
então se juntar aos outros foliões, para repartir o agrado. Na casa, 
quando termina a cantiga, o alferes coloca a bandeira de volta no 
altar. A Folia chegou ao seu destino. Já vai começar a festa que ela 
saiu para anunciar. 
Mas, muito antes da chegada da Folia, os preparativos já vão adiantados 
no lugar em que irá acontecer a festa. No Kalunga, existem três gran-
des espaços sagrados, especialmente destinados para as festas, no 
Vão de Almas, no Vão do Moleque e no Sucuri. São lugares distan-
tes, à beira de algum afluente do Rio Paranã. Eles ficam longe das 
moradas, quase no meio do nada. Mas em cada um desses lugares, 
desde tempos muito antigos, existe uma pequena capela, para onde 
o povo Kalunga se dirige a cada ano, fielmente, religiosamente, para 
celebrar suas festas maiores. Estas festas são o Império de Nossa 
Senhora d'Abadia, no Vão de Almas, o Império de São Gonçalo do 
Amarante, Nossa Senhora do Livramento e São Sebastião, no Vão do 
Moleque, e a festa de São João no Sucuri que, até poucos anos atrás, 
costumava ter também um Império. 
Para a festa, as pessoas vão chegando de todos os lugares. Os que 
vêm de mais perto chegam mesmo a pé, subindo e descendo serras, pe-
las estradinhas à cavaleira, carregando todos os seus pertences. Outros, 
vindos de mais longe, chegam a cavalo e as bruacas penduradas nas 
selas vêm cheias. Porque quem vem para a festa traz de tudo, a 
comida e a panela de cozinhar, a muda de roupa, as redes, as cober-
tas de dormir. Quem vem, vem para ficar por muitos dias, trazendo 
toda a família. Até os cachorros, acompanhando os donos, vêm parar