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Sabrina Lopes Martinez
Tradução para legendas:
uma proposta para a formação de profissionais
Dissertação de Mestrado
Dissertação apresentada como requisito parcial para
obtenção do grau de Mestre pelo Programa de Pós-
graduação em Letras do Departamento de Letras da
PUC-Rio.
Orientadora: Profa. Marcia do Amaral Peixoto Martins
Rio de Janeiro
Abril de 2007
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510566/CA
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Sabrina Lopes Martinez
Tradução para legendas:
uma proposta para a formação de profissionais
Dissertação apresentada como requisito parcial para
obtenção do grau de Mestre pelo programa de Pós-
Graduação em Letras do Departamento de Letras do
Centro de Teologia e Ciências Humanas da PUC-Rio.
Aprovada pela Comissão Examinadora abaixo assinada.
__________________________________________
Profa. Marcia do Amaral Peixoto Martins
Orientadora
Departamento de Letras – PUC-Rio
__________________________________________________
Profa. Maria Paula Frota
Departamento de Letras – PUC-Rio
___________________________________________________
Profa. Heloisa Gonçalves Barbosa
Departamento de Letras Anglo-Germânicas – UFRJ
___________________________________________________
Prof. Paulo Fernando Carneiro de Andrade
Coordenador Setorial do Centro de Teologia
e Ciências Humanas – PUC-Rio
Rio de Janeiro, _____ de _________________ de _______.
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510566/CA
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Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou
parcial do trabalho sem autorização da universidade, da autora e
da orientadora.
Sabrina Lopes Martinez
Graduou-se em Comunicação Social (habilitação Jornalismo) na
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro em 1992.
Concluiu o Curso de Formação de Tradutores inglês/português
na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro em 1994.
Cursou a Especialização em Tradução inglês-português (pós-
graduação lato sensu) na Pontifícia Universidade Católica do
Rio de Janeiro em 2002. É tradutora e revisora de filmes e
programas para televisão a cabo e DVD desde 1994.
Ficha catalográfica
CDD: 400
Martinez, Sabrina Lopes
Tradução para legendas: uma proposta para a formação
de profissionais / Sabrina Lopes Martinez; orientador: Márcia
do Amaral Peixoto Martins. – 2007.
100 f.; 30 cm
Dissertação (Mestrado em Letras) Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,
2007.
Inclui referências bibliográficas
1. Letras Teses. 2. Legendagem. 3. Tradução
audiovisual. 4. Estudos Descritivos da Tradução. 5.
Polissistemas. 6. Ensino de tradução. 7. Normas tradutórias.
I. Martins, Marcia do Amaral Peixoto. II. Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro. Departamento de
Letras. III. Título.
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Agradecimentos
Aos meus pais, Geraldo e Sheila, e ao meu irmão, Moacyr, por tudo.
À minha orientadora, Marcia do Amaral Peixoto Martins, pelo incentivo para
ingressar no Mestrado, pela orientação precisa, pelos comentários fundamentais e,
no final, pela serenidade contagiante.
A Maria Paula Frota, pelo apoio e disponibilidade demonstrados desde o curso de
Especialização em Tradução, pelas conversas estimulantes, tanto dentro quanto
fora da sala de aula, e pelo carinho.
A Monika Pecegueiro do Amaral, por ter despertado em mim a paixão pela
legendagem e pelos textos cedidos.
Aos professores que se dispuseram a participar da banca de defesa: Maria Paula
Frota, Heloisa Gonçalves Barbosa e Maria de Lourdes Sette.
A Vera Lúcia Santiago Araújo, pelas valiosas dicas dadas no início deste projeto e
pelos textos cedidos.
A Christiane Ruffier, do Departamento de Legendagem da Globosat, pela
colaboração e pelas informações compartilhadas.
Aos professores do curso de Especialização em Tradução e do Mestrado, pelos
ensinamentos.
Aos informantes da pesquisa, pelas entrevistas.
Ao pessoal da Gemini Vídeo, minha segunda casa, pela paciência e dedicação
durante meu período de ausência.
À Vice-Reitoria Acadêmica da PUC-Rio, pela bolsa de isenção de mensalidade.
Às minhas colegas de Mestrado, grandes amigas conquistadas nestes dois anos de
convivência, e a Lia Jucá, Flávia Lins e Lúcia Morgado, pelo carinho e apoio
constante.
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Resumo
Martinez, Sabrina Lopes; Martins, Marcia do Amaral Peixoto
(Orientadora). Tradução para legendas: uma proposta para a formação
de profissionais. Rio de Janeiro, 2007. 100p. Dissertação de Mestrado –
Departamento de Letras, Pontifícia Universidade Católica do Rio de
Janeiro.
O mercado de tradução para legendagem de programas de TV sofre com a
carência de profissionais, constatação que se baseia numa experiência pessoal de
doze anos de atuação nessa área. A presente dissertação busca investigar os
motivos dessa carência e propor as bases para um curso de formação de
legendadores, a partir de uma perspectiva polissistêmica e descritivista da
tradução e de uma visão pós-estruturalista do ensino. A proposta aqui apresentada
fundamentou-se em um levantamento das competências e habilidades que todo
tradutor para legendas precisa desenvolver, elaborado a partir de entrevistas
realizadas com importantes atores do polissistema de tradução para legendagem,
bem como na análise das normas, coerções e mecanismos de controle com os
quais o legendador se vê obrigado a lidar em sua atividade. A reflexão
desenvolvida contempla questões metodológicas e de conteúdo e aborda as
peculiaridades que caracterizam a tradução para legendas, procurando oferecer
uma alternativa que contraponha uma ênfase na formação ao caráter de
treinamento que costuma estar associado à maioria dos cursos atualmente
disponíveis. Pretende-se, dessa forma, garantir a maior aproximação e interação
entre academia e mercado de trabalho, o que deverá redundar em benefício para
ambos.
Palavras-chave
Legendagem, tradução audiovisual, Estudos Descritivos da Tradução,
polissistemas, ensino de tradução, normas tradutórias.
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Abstract
Martinez, Sabrina Lopes; Martins, Marcia do Amaral Peixoto (Advisor).
Translation for subtitles: a proposed syllabus for translator education.
Rio de Janeiro, 2007. 100p. MSc. Dissertation – Departamento de Letras,
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro.
The television subtitling market suffers from a shortage of professionals,
as has been attested by twelve years of personal experience in the industry. The
purpose of this research was to investigate the reasons behind this shortage and
suggest the basis for implementing a course program on subtitling for TV from a
descriptive and polysystemic perspective on translation and a poststructuralist
view on education. The proposal presented was based on a list of competencies
and abilities every subtitle translator must develop, elaborated from interviews
with important actors in the translation for subtitles polysystem, and on the
analysis of the norms, constraints and control mechanisms with which the subtitler
must deal in his or her professional capacity. The considerations brought forth
contemplate methodological and content issues and tackle the peculiarities of
subtitling, aiming to offer an alternative to the emphasis on training rather than on
education which is usually associated with most courses currently available. Thus,
this dissertation intends to guarantee a greater interchange between university and
industry, which should bring about benefits for both.
Keywords
Subtitling, audiovisual translation, Descriptive Translation Studies,
polysystems, translation teaching, translation norms.
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Sumário
1. Introdução 9
1.1. Estrutura da dissertação 10
2. Fundamentação teórica e metodologia
12
2.1. A Teoria dos Polissistemas 17
2.1.1. O polissistema de tradução audiovisual 18
2.2. Os Estudos Descritivos da Tradução 20
2.3. O ensino de tradução 25
2.4. Metodologia 28
3. A tradução para legendagem e suas peculiaridades
32
3.1. A tradução audiovisual na televisão brasileira 33
3.2. Os conceitos de tradução diagonal e diassemiótica e os problemas que
causam
35
3.3. Principais normas da tradução para legendagem 40
3.3.1. Parâmetros técnicos 40
3.3.2. Parâmetros textuais microestruturais 42
3.3.3. Parâmetros textuais macroestruturais 43
3.4. Mecanismos de controle 48
4. O profissional de legendagem: competências e mercado de trabalho
51
4.1. Habilidades valorizadas pelo mercado 51
4.1.1. Competência lingüística 52
4.1.2. Competência técnica 55
4.1.3. Competência rítmica 60
4.1.4. Competência cultural 61
4.2. A realidade do mercado 62
4.2.1. Análise dos dados 63
5. Tradução para legendagem na universidade
68
5.1. O ensino de TAV nas universidades européias: uma história de sucesso 68
5.2. Proposta de um curso de formação de legendadores 69
5.2.1. Carga horária 69
5.2.1.1. Duração das aulas 73
5.2.2. Perfil do aprendiz e pré-requisitos 74
5.2.3. Teoria e prática 75
5.2.4. O uso do Systimes 4.0 como ferramenta didática 76
5.2.5. Disciplinas propostas 80
5.2.5.1. Tradução para legendagem I 80
5.2.5.2. Tradução para legendagem II 89
5.2.6. Avaliação 89
5.2.6.1. Critérios de avaliação 91
6. Considerações finais
92
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Referências bibliográficas
95
Apêndice 1
98
Apêndice 2
99
Apêndice 3
100
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1
Introdução
A chegada da televisão por assinatura no Brasil, no início da década de
1990, suscitou uma demanda repentina por profissionais de legendagem, atividade
até então restrita ao cinema meio no qual até hoje atuam poucos profissionais,
que dão conta da tradução de todos os filmes estrangeiros lançados por mês no
Brasil e ao mercado de vídeo, no qual predominava a atuação improvisada e
não regularizada de tradutores diletantes, sem compromisso com padrões de
qualidade ou respeito às leis de direito autoral. Diante da urgência de se buscar
pessoal para exercer a atividade da legendagem, profissionais das mais diversas
formações (por exemplo Direito, Comunicação e até Belas Artes) foram
contratados no Rio de Janeiro. A convocação para o preenchimento das vagas era
feita por meio de indicação e, uma vez aprovados no exame de tradução e
português, esses profissionais recebiam um treinamento que se limitava a uma
explicação rápida sobre como funcionava o software de legendagem usado à
época.
O aumento do número de canais por assinatura disponíveis levou ao
crescimento da demanda por programas televisivos estrangeiros para preencher a
grade desses canais, e a legendagem foi ganhando destaque como opção
relativamente barata de tradução de produtos audiovisuais. Além disso, o advento
de novas tecnologias digitais, como o DVD (Digital Versatile Disc), fez aumentar
o interesse pela legendagem. Um DVD comporta versões legendadas em até trinta
e dois idiomas de um mesmo produto, o que significa que até trinta e dois
tradutores podem participar da legendagem de um único filme. A popularização
dessa tecnologia no início dos anos 2000 criou um novo e rico mercado para os
profissionais de legendagem.
Nos últimos anos, a necessidade de treinar profissionais levou as
produtoras de legendagem a investir em treinamento, seja oferecendo o curso nas
próprias dependências, seja em parceria com algum professor ou instituição de
ensino. Esses cursos são direcionados ao público em geral e têm como objetivo
familiarizar os candidatos com os aspectos técnicos do ofício e com as regras e os
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10
padrões adotados pelo mercado de legendagem, mas não abordam nem
poderiam, uma vez que são cursos de curta duração sem a pretensão de formar
profissionais capacidades que poderiam ser desenvolvidas em um curso de
formação mais abrangente.
Este é justamente o objetivo principal do presente trabalho: propor as
bases de um curso de formação de tradutores para legendas que não só aborde as
ferramentas, normas e coerções básicas envolvidas nessa modalidade de tradução,
mas também procure desenvolver outras competências e habilidades que um bom
legendador deve possuir.
1
Parto da premissa de que, como o ofício de tradução
para legendagem é altamente especializado, para produzir legendas de qualidade e
se estabelecer no mercado sem onerar os contratantes de seus serviços com cursos
e meses de trabalho monitorado, o profissional precisa desenvolver competências
específicas à atividade, além daquelas necessárias a todo tradutor.
1.1
Estrutura da dissertação
No próximo capítulo, exponho a fundamentação teórica e a metodologia
adotadas na presente dissertação. Após uma breve apresentação das modalidades
de tradução audiovisual e da minha visão de tradução, a Seção 2.1 traz um resumo
da Teoria dos Polissistemas e dos Estudos Descritivos da Tradução, abordagens
que informam todos os capítulos da dissertação. A Seção 2.2 trata do ensino de
tradução. Nela, traço um contraponto entre a visão normativa e a abordagem pós-
estruturalista de ensino para me aliar às reflexões suscitadas pela última para a
formação de tradutores. A seção final do Capítulo 2 traz a descrição da
metodologia utilizada nas entrevistas com integrantes do polissistema de tradução
audiovisual conduzidas para complementar este estudo.
O Capítulo 3 trata das peculiaridades características da tradução para
legendagem. Após traçar um panorama do ensino da modalidade na Europa e no
Brasil, apresento uma breve contextualização das modalidades de tradução
audiovisual presentes na televisão brasileira e em seguida abordo os conceitos de
1
A denominação do profissional que traduz para cinema e vídeo ainda não foi estabelecida de
forma consensual. Alguns empregam o termo “legendista”, outros, “legendador”, e no mercado de
legendagem ele é chamado simplesmente de “tradutor”. Por motivos de clareza passo a adotar, a
partir daqui, a denominação “legendador”.
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11
tradução diagonal e diassemiótica e as coerções que suscitam. Por fim, apresento
os principais mecanismos de controle e normas atualmente em vigor no mercado
de legendagem brasileiro.
As principais competências e habilidades necessárias ao legendador são
abordadas no Capítulo 4, e estão divididas em quatro categorias principais:
lingüística, técnica, rítmica e cultural. A Seção 4.2 traz um breve panorama das
diferenças entre o mercado paulista e carioca, bem como a análise dos dados das
entrevistas realizadas com profissionais e estudantes de legendagem, nas quais
foram identificadas as maiores carências apresentadas pelos candidatos a
legendadores e as dificuldades enfrentadas pelos professores dos cursos de
treinamento.
O Capítulo 5 é dedicado à proposta de programa delineada nesta
dissertação, cujo objetivo principal é promover o desenvolvimento das
competências e habilidades necessárias à formação de profissionais de tradução
para legendagem, procurando oferecer uma alternativa ao caráter de treinamento
associado aos cursos hoje disponíveis. No início do capítulo, um panorama do
ensino de tradução audiovisual na Europa destaca o sucesso da inclusão de
disciplinas dessas modalidades nos currículos de graduação e pós-graduação de
universidades européias. Em seguida, são apresentadas as bases do curso de
formação propriamente dito, abrangendo carga horária, duração das aulas, perfil
dos aprendizes e pré-requisitos necessários, além de possibilidades de integração
entre teoria e prática. Os conteúdos a serem abordados nas disciplinas de tradução
para legendagem são tratados na Seção 5.6, na qual traço os objetivos, delineio as
bases do programa e proponho algumas atividades práticas. O capítulo se encerra
com a especificação das formas e dos critérios de avaliação dos aprendizes.
Finalmente, o Capítulo 6 apresenta as considerações finais do presente
trabalho.
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2
Fundamentação teórica e metodologia
A tradução audiovisual (ou TAV) se subdivide em quatros modalidades
principais: dublagem, voice-over, legendagem aberta (ou interlingual) e
legendagem fechada (chamada também de legendagem intralingual ou closed
caption). Na dublagem, o canal acústico com a língua original do produto
audiovisual é substituído pelo canal acústico com as falas traduzidas e
interpretadas por dubladores. No voice-over, o áudio original não é apagado,
como acontece na dublagem; é apenas baixado, e a voz de um locutor é gravada
sobre ele. Na legendagem aberta é feita a inserção do texto traduzido em formato
de legendas na tela de exibição, de forma sincronizada com o áudio no idioma
original. O closed caption é uma modalidade de legendagem porém com
características técnicas distintas feita na mesma língua do produto audiovisual,
com o objetivo de auxiliar deficientes auditivos e pessoas com dificuldade de
compreensão da língua oral.
Na presente dissertação, eu me atenho à tradução para legendagem de
programas de TV, atividade que exerço há mais de doze anos no Rio de Janeiro,
primeiro como legendadora e revisora contratada da Globosat, maior
programadora de TV por assinatura do Brasil, depois como freelancer e,
atualmente, como sócia da produtora Gemini Vídeo. Desde 2000, exerço na
empresa a função de responsável por seu departamento de legendagem, traduzindo
e revisando programas, treinando e supervisionando estagiários e trainees e
fazendo o controle de qualidade do produto final. Além disso, comecei a lecionar
em 2005 a disciplina Tradução para Legendagem, incluída naquele ano entre as
optativas da grade curricular do bacharelado em Letras, habilitação Tradução
(Inglês – Português), da PUC-Rio. Essa minha experiência como legendadora,
professora, revisora, supervisora de legendadores e prestadora de serviços de
legendagem me levou a conhecer a fundo esse mercado, que sofre com um
problema crônico: a falta de profissionais bem preparados, que possuam as
competências e habilidades necessárias para oferecer um produto final de
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qualidade. Foi dessa constatação que surgiu o tema desta dissertação, já
apresentado na Introdução.
Autores como Díaz Cintas (2004), Delabastita (1990) e Gottlieb (1994b)
observam que muitos estudiosos descartam a TAV como objeto de estudo, sob a
alegação de que a modalidade não seria uma tradução propriamente dita, por ver-
se “muitas vezes restringida pelas respectivas coerções de condensação de texto e
sincronização labial”, sendo que, “em muitos casos, essas coerções ocupam uma
posição mais alta na hierarquia de prioridades do tradutor do que considerações
sobre sintaxe, estilo ou léxico”
2
(Delabastita, 1990: 99). “Outro obstáculo”,
destaca Díaz Cintas, “é a natureza polimórfica dos programas audiovisuais. Não é
tão trabalhoso lidar com dois textos escritos, nas línguas fonte e meta, quanto é
lidar com listas de diálogos, videoteipes ou DVDs, televisores, videocassetes
etc.”
3
(2004: 51). Além disso, o estudo da TAV pressupõe conhecimentos, entre
outros, de linguagem cinematográfica, televisiva e de comunicação de massa,
dificuldades que também levam alguns teóricos da tradução a situar a modalidade
fora do escopo de sua disciplina. Embora a quantidade de pesquisas acadêmicas
em TAV tenha crescido consideravelmente nas últimas duas décadas, a grande
maioria delas
se restringe ou a descrever as principais características técnicas e operacionais
dessa atividade, ressaltando as dificuldades no trabalho do tradutor, ou a relatar
casos concretos [...], destacando questões problemáticas [...] que, ainda que
ajudem a constituir um corpus de estudo nesta área [de tradução para legendas],
são de difícil generalização devido a seu caráter predominantemente empírico.
(Carvalho, 2005: 20)
Há, portanto, uma carência de fundamentos teóricos e metodológicos adequados à
elaboração de estudos sistemáticos, o que dificulta a convergência dos resultados
dessas pesquisas isoladas para a melhoria da qualidade das práticas, de métodos
de ensino especializados e do desenvolvimento da teoria (ibidem).
Se analisarmos o caso da legendagem, veremos que ela difere da tradução
textual, que se caracteriza por ser um tipo de comunicação monossemiótica, por
2
[...] often governed by the respective constraints of text compression and lip synchronicity. In
many cases these constraints occupy a higher position in the translator's hierarchy of priorities than
do considerations of syntax, style or lexicon.
3
Another obstacle lies in the polymorphic nature of audiovisual programmes. It is not as laborious
to work with two written texts, in the source and target languages, as it is to work with dialogue
lists, videotapes or DVDs, television sets, video players, etc.
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sua natureza polissemiótica, ou seja, há outros canais (ou signos) envolvidos na
comunicação, que tanto podem dificultá-la quanto facilitá-la. Esses canais são:
1) O canal acústico verbal: diálogo, vozes de fundo; às vezes letras de música
2) O canal acústico não-verbal: música e efeitos sonoros
3) O canal visual verbal: créditos e letreiros
4) O canal visual não-verbal: composição e fluxo de imagens
4
(Gottlieb, 1994b:
265)
Uma vez que o legendador não tem o controle de todos os canais envolvidos na
comunicação e precisa se adequar aos outros componentes semióticos do produto
audiovisual; e uma vez que a legendagem envolve a mudança do código oral para
o código escrito e requer uma redução substancial do diálogo original, pode-se
argumentar que a legendagem não é uma forma de tradução se adotarmos, por
exemplo, o conceito de tradução de Jakobson (1969), segundo o qual,
ao traduzir de uma língua para outra, substituem-se mensagens em uma das
línguas, não por unidades de código separadas, mas por mensagens inteiras de
outra língua. Tal tradução é uma forma de discurso indireto: o tradutor recodifica
e transmite uma mensagem recebida de outra fonte. Assim, a tradução envolve
duas mensagens equivalentes em dois códigos diferentes. (p. 65)
Quem se identifica com essa visão mais restrita da tradução alega que,
como há outros canais envolvidos na comunicação audiovisual e só um deles (o
canal acústico verbal
5
) é substituído, e de forma resumida, a mensagem não é
inteiramente traduzida no caso da legendagem. Ao perceberem que os conceitos
historicamente enunciados de tradução, texto, original e significado deixam de
funcionar quando tentam aplicá-los à TAV, alguns estudiosos preferem evitar esse
campo de estudo que, em termos quantitativos, é o tipo de tradução mais
consumido na atualidade (cf. Díaz Cintas, 2004).
No entanto, o conceito de tradução está se ampliando. Ele já deixou de
abranger apenas o texto escrito e hoje envolve atividades tão distintas quanto a
interpretação simultânea, a localização de software, a dublagem e a legendagem.
Além disso, uma publicação de referência no campo dos Estudos da Tradução, a
Routledge Encyclopedia of Translation Studies, dedica um verbete à legendagem
4
(1) The verbal audio channel: dialog, background voices; sometimes lyrics; (2) The non-verbal
audio channel: music and sound effects; (3) The verbal visual channel: captions and written signs
in the image; (4) The non-verbal visual channel: picture composition and flow
5
Há ocasiões em que o canal visual verbal (créditos e letreiros) também é substituído.
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e a apresenta como um “tipo de tradução” (Gottlieb, 1998: 245). Citando mais
uma vez Díaz Cintas (2003: 194),
[u]ma definição de tradução que exclua áreas abrangentes da atividade
profissional é claramente limitada. Vivemos numa sociedade heraclitiana, em
constante evolução. Nossas formas de comunicação mudam, assim como nossas
necessidades, e, nesse sentido, o espetacular desenvolvimento da tecnologia tem
um impacto inevitável. Portanto, é necessário encarar a tradução de uma
perspectiva mais flexível e heterogênea, que leve em conta uma vasta gama de
realidades empíricas e que seja capaz de incluir em seus limites atividades
tradutórias novas e potenciais [,...] como [a tradução] de jogos por computador,
páginas da Internet e CD-ROMs.
6
Se pretendo estudar a TAV no contexto dos Estudos da Tradução e propor
as bases de um curso de formação de tradutores para legendas, é necessário que eu
apresente a minha visão de tradução, que fatalmente se refletirá na minha visão de
ensino e na fundamentação teórica que permeará esta dissertação.
Segundo a tradição logocêntrica, o significado das palavras é estável e está
dado no texto, que permite apenas uma interpretação correta. Essa percepção de
linguagem tem efeito direto sobre a noção de tradução, que é encarada como um
processo de transferência de significados de uma língua para outra. Desde que
interprete os significados contidos no texto corretamente, um bom tradutor será
capaz de transferi-los sem dificuldades, com a ajuda de glossários e dicionários,
para a língua-meta. Se isso não ocorrer, a falha é atribuída ao tradutor.
O ideário pós-estruturalista há muito superou essa abordagem tradicional,
que ainda é o senso comum fora do meio acadêmico. Os teóricos identificados
com o pós-estruturalismo defendem que a tradução não é uma operação
meramente lingüística, mas também política, ideológica e cultural. As idéias
deixam de estar dadas no texto e prontas para serem resgatadas pelo tradutor; o
significado é visto como produto de uma construção, e o contexto em que se
produz a tradução passa a ser valorizado. Inserido em seu contexto histórico,
influenciado por seu meio social, sua ideologia e seu inconsciente, o tradutor
invariavelmente recria, interfere, transforma. Nessa moldura epistemológica,
6
A definition of translation that excludes large areas of professional activity is clearly too narrow.
We live in a Heraclitean society, in constant evolution. The ways in which we commmunicate
change, as do our needs, and in this sense the spectacular development of technology has an
unavoidable impact. Hence it is necessary to view translation from a more flexible and
heterogeneous perspective, one which allows for a broad range of empirical realities and which is
able to subsume new and potential translation activities within its boundaries[,] [...] such as
computer games, web pages and CD-ROMs.
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portanto, traduzir é uma atividade complexa, rica, criativa, produtora de
significados, e o original perde a aura de criação genial cujos significados têm de
ser protegidos.
Entretanto, essa desconstrução à qual o conceito de tradução foi submetido
levou a uma flexibilização excessiva do mesmo, que passou a ser confundido com
outros conceitos. Carvalho chega a alertar que:
em casos mais extremos esse movimento acabou por conferir às concepções
teóricas sobre a tradução uma certa falta de limites que parece legitimar como ato
tradutório toda e qualquer prática de escrita ou reescrita, intra ou inter-cultural.
Porém, se não existe original, se um texto não possui nenhum conteúdo
intrínseco, se toda escolha de palavras representa um posicionamento ideológico
e se qualquer tentativa de conceituação mais restrita da tradução é rotulada de
logocêntrica ou prescritivista, então [quais] seriam, de fato, a natureza dessa
atividade e o papel do tradutor? (Carvalho, 2005: 14-5)
Alguns dos próprios estudiosos que participaram do movimento pós-
estruturalista identificaram esse problema, como foi o caso de Umberto Eco que,
em Os limites da interpretação (2000), parte em defesa do sentido literal,
argumentando que ele é o primeiro a ser assimilado quando alguém ouve um
determinado enunciado. Para Eco,
dizer que um texto é potencialmente sem fim não significa que todo ato de
interpretação possa ter um final feliz. Até mesmo o desconstrucionista mais radical
aceita a idéia de que existem interpretações clamorosamente inaceitáveis. Isso
significa que o texto interpretado impõe restrições a seus intérpretes. (p. xxii)
Eu me identifico com esses desdobramentos mais recentes e menos
radicais do movimento pós-estruturalista, que buscam um lugar próprio e uma
identidade para o tradutor e vêem a tradução como uma representação
aproximada, uma transformação regulada — para usar a nomenclatura do
desconstrucionista Jacques Derrida — e inevitável do texto-fonte, determinada
pela comunidade interpretativa (cf. Fish, 1986) na qual se insere e por seu
inconsciente (cf. Frota, 2000).
A concepção logocêntrica de tradução também se estende ao ensino da
atividade. Nas palavras da teórica pós-estruturalista Rosemary Arrojo, “o ensino
centrado no logos é essencialmente conservador e se baseia na possibilidade de
uma transferência impessoal de um conjunto de significados privilegiados de
professor para aluno e de uma geração para outra” (Arrojo, 1993: 136). A
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estudiosa diz ainda que “a herança mais freqüente que esse tipo de abordagem
lega a seus alunos é [...] a ilusão de que, para poderem realizar traduções
satisfatórias, lhes bastará aprender as línguas envolvidas e ter em mãos dicionários
ou glossários adequados” (1992: 103). Na Seção 2.2, explorarei em mais detalhes
como é possível fugir da ilusão mencionada por Arrojo aliando-se ao ensino da
legendagem, objeto deste estudo, a visão pós-estruturalista de tradução.
Como já foi dito, o conceito restritivo de tradução de Roman Jakobson não
prevê como objetos legítimos de estudo sobre tradução categorias como a
interpretação simultânea e a tradução audiovisual, entre outras. Uma abordagem
que contempla essas manifestações no âmbito dos Estudos da Tradução é a dos
DTS (Descriptive Translation Studies) que, aliada à Teoria dos Polissistemas,
permeia todo o presente trabalho. Passo agora a apresentar os conceitos-chave
dessas duas abordagens de forma resumida.
2.1
A Teoria dos Polissistemas
A Teoria dos Polissistemas começou a ser desenvolvida entre o final dos
anos de 1960 e início dos anos de 1970 pelo israelense Itamar Even-Zohar, numa
tentativa de solucionar problemas específicos relacionados a traduções literárias
realizadas em Israel. A teoria de Even-Zohar concebe a literatura como um
sistema dinâmico e complexo inserido em outro sistema maior o cultural. O
sistema cultural, por sua vez, se relaciona com outros sistemas, como o político, o
religioso e o socioeconômico. Cada um desses sistemas é, na verdade, um
polissistema: “um sistema múltiplo, um sistema de vários sistemas que se
entrecruzam e se sobrepõem parcialmente [...], funcionando como um todo
estruturado cujos membros são interdependentes”
7
(Even-Zohar, 1990: 11), e
ocupam posições mais centrais ou mais periféricas, disputando constantemente
uma posição no centro do polissistema.
O objeto de estudo de Even-Zohar é o polissistema literário, no qual inclui
o sistema de literatura traduzida ao lado de outros, como o de literatura canônica,
de massa e infantil. No polissistema literário também atuam as editoras, os meios
7
a multiple system, a system of various systems which intersect with each other and partly overlap
[...], functioning as one structured whole, whose members are interdependent.
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18
de comunicação de massa, autores, leitores, críticos literários e livrarias, dentre
outros. Como explica Carvalho,
[o] objetivo da utilização d[o] modelo teórico [dos polissistemas] em estudos
literários consiste em investigar as relações existentes nos sistemas, a
interferência entre sistemas e os processos de mudanças provocados por pressões
exercidas da periferia para o centro e vice-versa (2005: 33),
buscando-se chegar aos princípios gerais que regem os fenômenos que constituem
os sistemas. Para identificar esses princípios que, em diferentes períodos,
governam a tradução literária, Even-Zohar, como já mencionado, propõe o estudo
da literatura traduzida como um conjunto, ou um sistema. Este estudo seria feito
através da análise da seleção dos textos a serem traduzidos, as estratégias
utilizadas pelos tradutores, as normas e coerções que regem a produção de
traduções e as traduções propriamente ditas. Ao tratar a literatura traduzida como
um polissistema próprio dentro do sistema literário, o teórico israelense propõe a
inclusão de produtos que geralmente são descartados como objetos de estudo por
não poderem ser explicados por nenhuma teoria de tradução. Ele alega que
produtos de transferência interlingual, como a adaptação e a imitação, acabam
constituindo um grupo maior do que o considerado tradução, e que podem ser
incluídos no polissistema da tradução literária se forem estudadas as relações
existentes entre um produto-alvo B e um produto-fonte A (Carvalho, 2005: 34).
Em sua dissertação A tradução para legendas: dos polissistemas à
singularidade do tradutor, Carolina Alfaro de Carvalho propõe a aplicação do
modelo teórico de Even-Zohar ao campo da tradução audiovisual e concebe o
polissistema audiovisual e o polissistema de tradução audiovisual. Através deste
último, que apresento de forma resumida a seguir, a TAV pode ser estudada com
base na Teoria dos Polissistemas.
2.1.1
O polissistema de tradução audiovisual
Um subsistema do polissistema audiovisual, o polissistema de tradução
audiovisual proposto por Carvalho (2005) reflete e submete-se à hierarquia do
primeiro, mas também possui leis e componentes próprios (p. 70). Do
polissistema audiovisual fazem parte todos os envolvidos na produção e
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19
distribuição de um longa-metragem, como, por exemplo, pesquisadores,
roteiristas, produtores, diretores, técnicos, empresários e atores. Da
comercialização do longa participam laboratórios cinematográficos,
distribuidores, patrocinadores, entre outros. Também fazem parte do polissistema
audiovisual a crítica especializada, circuitos de salas de cinema, agentes e
processos de importação e exportação de filmes e o ensino de práticas
relacionadas à área. Observe-se que a categoria longa-metragem é apenas um
exemplo. Podemos citar ainda como componentes do polissistema audiovisual
profissionais, instituições, processos e mecanismos de controle envolvidos na
produção e distribuição de programas dos mais variados gêneros exibidos nas
televisões aberta e fechada.
O subsistema de tradução audiovisual, por sua vez, é composto, entre
outros, pelos seguintes profissionais e instituições:
produtoras e laboratórios voltados para a preparação e produção dos diversos
meios e formatos de tradução audiovisual película para projeção em cinemas,
VHS, DVD, CD-Rom , além de tradutores e revisores com conhecimentos
específicos nos diferentes subsistemas legendagem, closed caption, dublagem,
voice over, sites e aplicativos na Internet, localização de programas de
computação, etc. (ibidem, p. 70)
Com essa extensão do modelo polissistêmico, passa a ser possível estudar
de forma sistêmica a tradução audiovisual no contexto dos Estudos da Tradução.
Além disso, esse modelo reconhece a natureza polissemiótica e multidisciplinar da
TAV, incluindo entre seus agentes não apenas os produtores do texto audiovisual,
seja original ou traduzido, mas todos os envolvidos na produção dos outros canais
constituintes da mensagem audiovisual, como a música, os efeitos sonoros e a
edição de imagens, além da direção e dos mecanismos de aquisição, distribuição e
controle de produtos audiovisuais.
Qualquer tentativa de propor as bases do programa de um curso de
formação de legendadores deve levar em conta a atuação dos agentes do
polissistema audiovisual, uma vez que, para produzir legendas de qualidade, é
preciso que o aprendiz esteja familiarizado com todas as forças que atuam antes,
durante e depois da finalização de seu trabalho.
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20
2.2
Os Estudos Descritivos da Tradução
O modelo dos Descriptive Translation Studies, ou DTS, foi desenvolvido
em meados dos anos de 1970 por um grupo de teóricos e pesquisadores europeus
voltados para o estudo das traduções literárias, com o objetivo de opor-se às
abordagens normativas que vinham caracterizando uma grande parte dos estudos e
do discurso sobre a tradução (cf. Martins, 1999).
Essas abordagens normativas podem ser exemplificadas em estudos de
base lingüística que, motivados pela profissionalização da atividade e a
necessidade de preparar tradutores competentes, buscavam esquematizar e
formalizar o processo tradutório através de modelos complexos. No entanto, esses
estudos acabaram por deixar de lado a análise das traduções literárias, devido,
segundo André Lefevere
8
, à dificuldade de se formalizarem textos com alto grau
de equivocidade. Alguns estudiosos foram então buscar, fora do âmbito da
lingüística, modelos alternativos que servissem de base para o estudo da tradução
desse tipo de texto (cf. Martins, 1999).
No artigo “The name and nature of Translation Studies”, publicado em
1972, James Holmes apresenta pela primeira vez as denominações “Estudos da
Tradução” e “Estudos Descritivos da Tradução”, explicando que a primeira refere-
se à disciplina em termos mais amplos, enquanto que a segunda seria um ramo da
disciplina geral dos Estudos da Tradução. Segundo Holmes,
[c]omo campo de pesquisa pura [...] os estudos da tradução têm portanto dois
objetivos principais: (1) descrever os fenômenos da atividade tradutória e a(s)
tradução(ões) conforme se manifestam no mundo da nossa experiência, e (2)
estabelecer princípios gerais através dos quais esses fenômenos podem ser
explicados e previstos
9
. (Holmes, 1988: 71)
Ele divide então os estudos da tradução em estudos descritivos da
tradução, ramo empírico que trataria do primeiro objetivo da disciplina, e estudos
teóricos da tradução, que deve usar os resultados dos estudos empíricos para
8
LEFEVERE, A. (1981) “Beyond the process: literary translation in literature and literary theory”.
Em Marilyn Gaddis Rose (org.) Translation spectrum: Essays in theory and practice. Albany:
SUNY.
9
As a field of pure research [...] translation studies thus have two main objectives: (1) to describe
the phenomena of translating and translation(s) as they manifest themselves in the world of our
experience, and (2) to establish general principles by means of which these phenomena can be
explained and predicted.
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21
atingir o segundo objetivo apontado acima. As pesquisas deixam de ser orientadas
por uma visão prescritiva e normativa, fundada em juízos de valor e que busca
alcançar traduções ideais a partir de noções rígidas de fidelidade ao texto-fonte,
para assumir uma perspectiva descritiva, voltada para a análise dos textos que
funcionam como traduções em determinada cultura.
A abordagem descritivista veio incorporar a dimensão cultural ao estudo
da tradução literária, e as principais afinidades compartilhadas pelos estudiosos
que se identificam com essa abordagem são, nas palavras de Theo Hermans
(1985: 10-1) traduzidas por Martins (1999: 30),
uma visão da literatura como um sistema dinâmico e complexo; a convicção de
que deve haver uma interação permanente entre modelos teóricos e estudos de
caso; uma abordagem da tradução literária de caráter descritivo e voltada para o
texto-meta, além de funcional e sistêmica; e um interesse nas normas e coerções
que governam a produção e a recepção de traduções, na relação entre a tradução e
outros tipos de reescritura e no lugar e função da literatura traduzida tanto num
determinado sistema literário quanto na interação entre literaturas.
Um dos grandes expoentes no campo dos DTS é o teórico israelense
Gideon Toury. Em sua obra de 1995, Descriptive Translation Studies and beyond,
que, segundo o próprio Toury, substitui In search of a theory of translation, de
1980, o teórico retoma alguns conceitos apresentados em seu livro anterior, como
a noção de “tradução presumida” (assumed translation), o foco no pólo receptor
da tradução e o conceito de normas tradutórias. Para Toury, “traduções são fatos
das culturas-meta; em certas ocasiões, fatos com um status especial, às vezes até
constituindo (sub)sistemas próprios identificáveis, mas da cultura-meta de
qualquer forma”
10
(Toury, 1995: 29). De fato, o próprio termo “tradução” só se
aplica ao sistema-meta, o qual geralmente determina a necessidade de uma
tradução, que é realizada para preencher uma lacuna nesse sistema. Ampliando
dessa forma o conceito de tradução, Toury inclui no âmbito dos Estudos da
Tradução categorias antes ignoradas pelos pesquisadores, como as
pseudotraduções, as traduções indiretas e aquelas feitas a partir de mais de um
texto-fonte (ibidem, p. 34).
O foco no sistema-meta não significa que os Estudos Descritivos se
preocupem exclusivamente com o lugar da tradução nesse sistema. Toury deixa
10
translations are facts of target cultures; on occasion facts of a special status, sometimes even
constituting identifiable (sub)systems of their own, but of the target culture in any event.
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22
claro que o texto-fonte, as operações de transferência e as relações tradutórias não
são excluídos dos DTS, apenas recebem um status diferente. O foco da
abordagem é o sistema-meta porque ele deve ser o ponto de partida da
observação. O trabalho do pesquisador não deve de forma alguma se esgotar nele
(ibid., p. 36). Isso nos leva ao já mencionado conceito de tradução presumida.
Para Toury, definições a priori de tradução,
principalmente se expressas em termos essencialistas [...], envolveriam uma
pretensão insustentável de fixar de uma vez por todas os limites de um objeto
caracterizado por sua variabilidade: a diferença entre culturas, a variação dentro
de uma cultura e a transformação ao longo do tempo
11
. (ibidem, p. 31 — grifos
do original)
Assim, os possíveis objetos de estudo do pesquisador ficam muito
limitados por essas definições essencialistas. A proposta do teórico é mudar o foco
para uma visão funcionalista, cujo objetivo é analisar o lugar sistêmico que as
traduções ocupam na cultura receptora. Portanto, desde que um texto funcione
como tradução na cultura-meta, ou seja, desde que seja recebido, aceito e circule
como tal, é um objeto válido de estudo para o pesquisador de tradução, segundo
Toury.
É esta definição funcionalista de tradução que adoto no presente trabalho,
no qual defendo que a legendagem é um tipo de tradução e constitui um objeto de
estudo legítimo, uma vez que é apresentada, recebida e aceita na cultura brasileira
como sendo uma tradução. Além disso, a minha visão de ensino em geral e do
ensino de tradução para legendagem em particular, bem como as bases do curso
proposto por este estudo, se fundamentam na abordagem descritivo-explanatória
dos DTS, focada no processo tradutório e centrada no pólo receptor.
Outro conceito central do pensamento de Toury é o de norma tradutória.
Tomando como base o conceito geral de norma, bastante difundido entre as
ciências sociais, e adaptando-o ao campo da tradução, o estudioso defende que a
tradução deve ser encarada como um fato cultural (1995: 53-5). Portanto, a
capacidade de traduzir corresponde, em primeira instância, à capacidade do
tradutor de interpretar um papel social e de cumprir uma função atribuída a ele
pela sociedade de forma apropriada. Para isso, precisa internalizar um conjunto de
11
especially if couched in essentialistic terms [...], would involve an untenable pretense of fixing
once and for all the boundaries of an object which is characterized by its very variability:
difference across cultures, variation within a culture and change over time.
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normas que determinam o grau de adequação de seu desempenho e dar conta
satisfatoriamente dos vários fatores que podem representar coerções à sua
atividade.
No contexto da Sociologia e da Psicologia, as normas são valores ou idéias
gerais compartilhados por uma comunidade, especificando o que é recomendado e
proibido, tolerado e permitido. As normas são adquiridas pelo indivíduo durante a
sua socialização e são vitais para o estabelecimento e a manutenção da ordem
social. No entanto, não há necessariamente uma identidade entre as normas e as
formulações verbais das mesmas. Segundo Toury, o seu grau de explicitude pode
variar, e quanto mais explícitas forem, mais perto estarão de serem consideradas
regras. Dessa forma, a escala geral de coerções às quais a tradução está sujeita
tem, como pólos extremos, de um lado as regras e, do outro, as idiossincrasias.
Toury destaca ainda que as próprias regras e idiossincrasias podem ser redefinidas
em termos de normas, ressaltando que as regras seriam normas (mais) objetivas, e
as idiossincrasias, normas (mais) subjetivas, (ou menos intersubjetivas) (ibidem).
Toury define norma como um tipo de coerção comportamental
internalizada, ou seja, trata-se de valores e idéias compartilhados por uma certa
comunidade mas que não são formulados como regras explícitas. Dentro dessa
comunidade, as normas tradutórias também servem como critério para a avaliação
de instâncias de comportamento (ibid.). As coerções, por sua vez, situam-se em
um âmbito mais geral. Para Toury, em sua dimensão sociocultural, a tradução está
sujeita a coerções de diversos tipos e graus de intensidade. Além das já
mencionadas coerções comportamentais, que recebem a denominação de normas,
existem outras que são explícitas — ou mesmo físicas — e que também influem
no resultado final das traduções. As coerções se estendem muito além do texto-
fonte, das diferenças sistêmicas entre as línguas e das tradições textuais
envolvidas. No caso do objeto de estudo desta pesquisa, a legendagem, um
exemplo de norma seria a tendência a amenizar a linguagem de baixo calão, e uma
coerção explícita pode ser exemplificada pelo número máximo de caracteres
permitido por linha de legenda.
Segundo Toury, a tradução é uma atividade que envolve pelo menos duas
tradições culturais e dois sistemas diferentes de normas, que representam duas
fontes de coerções, na maioria das vezes incompatíveis entre si. “Não fosse a
capacidade regulatória das normas, as tensões entre as duas fontes de coerções
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teriam de ser sempre resolvidas caso a caso, sem que se pudesse adotar um padrão
claro de comparação”
12
(p. 56 — grifo do original). Entretanto, Toury alerta que
não é isso que acontece: o comportamento tradutório é marcado por regularidades,
e desvios costumam ser facilmente reconhecidos pelo público receptor da
tradução. É essa regularidade, cuja identificação se dá pela análise das normas,
que possibilita o estudo da tradução como um fenômeno cultural.
A primeira categoria proposta por Toury é a das normas preliminares. Elas
dizem respeito à escolha de textos a serem traduzidos e às estratégias globais
adotadas para sua realização e aceitação no sistema-meta, que implicam
determinar, por exemplo, se a tradução indireta é permitida, ou então, caso uma
tradução seja indireta, se esse fato costuma ser explicitado, ignorado, camuflado
ou negado. Outra questão é saber de que idiomas e períodos é permitido ou
proibido traduzir. Essas decisões, na maioria das vezes, não são tomadas pelo
tradutor, mas por outros agentes envolvidos no polissistema.
Ao iniciar uma tradução, o tradutor deve fazer uma escolha básica entre
um dos sistemas. Essa escolha é chamada de norma inicial. Se o tradutor escolher
privilegiar o sistema-fonte, adotando as normas e as relações textuais vigentes no
texto-fonte, fará uma tradução adequada; se, por outro lado, privilegiar as normas
e as relações textuais da cultura-meta, produzirá uma tradução aceitável. Esta
decisão por parte do tradutor não é necessariamente consciente nem excludente. É
possível adotar uma estratégia híbrida, ora mais voltada para a adequação, ora
para a aceitabilidade. Toury faz questão de esclarecer que a noção de norma
inicial foi proposta para servir principalmente como ferramenta para auxiliar o
pesquisador a medir a regularidade das decisões tradutórias, mas não
necessariamente regularidades absolutas, que, segundo ele, não devem ser
esperadas em nenhum domínio do comportamento humano (p. 57).
As normas operacionais, por sua vez, constituem a terceira e última
categoria, e referem-se às decisões tomadas durante a tradução. Subdividem-se em
normas matriciais, que dão conta de omissões, alterações e acréscimos feitos no
texto traduzido, e em normas textuais, que tratam das opções lingüísticas e
estilísticas feitas pelo tradutor.
12
Were it not for the regulative capacity of norms, the tensions between the two sources of
constraints would have to be resolved on an entirely individual basis, and with no clear yardstick
to go by.
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25
O teórico André Lefevere (1992), do ramo belga dos DTS, refinou o
conceito de coerção adicionando-lhe a dimensão do poder. Para Lefevere, o
polissistema — literário, no caso das reflexões do estudioso — opera sob
mecanismos de controle que podem ser internos e externos. Os fatores internos
tentam controlar o sistema literário de dentro, a partir dos parâmetros
estabelecidos pelo fator externo (p. 14), e são representados por críticos, revisores,
professores, tradutores e clientes. Esses profissionais podem exercer seu controle
reprimindo certas obras que se opõem ao conceito de literatura (poética) ou de
sociedade (ideologia) em vigor em um dado sistema, ou, principalmente, segundo
Lefevere, adaptando obras para que fiquem de acordo com a poética e a ideologia
daquele sistema (ibidem). O mecanismo de controle externo ao polissistema
literário foi denominado patronagem por Lefevere. A patronagem pode ser
exercida por pessoas ou instituições, como órgãos de censura, meios de
comunicação e o sistema educacional, no sentido de facilitar ou impedir a leitura,
escrita ou reescrita da literatura (p. 15), e está mais interessada na ideologia do
que na poética, já que, em relação à manutenção desta, seus agentes delegam
autoridade aos profissionais representantes dos mecanismos de controle internos.
No Capítulo 3, voltarei a abordar os conceitos de norma tradutória e
patronagem e explorarei os conjuntos de normas, coerções e mecanismos de
controle que permeiam o trabalho dos legendadores.
2.3
O ensino de tradução
Como já foi dito na Seção 2.1.2 deste capítulo, as abordagens normativas
do estudo da tradução preocupadas com a formalização do processo tradutório não
conseguiram dar conta das traduções literárias. A busca pelo cientificismo leva ao
desejo de dominar os mecanismos mentais da tradução e de se instituírem critérios
objetivos para sua avaliação e seu ensino (cf. Arrojo, 1994). A idéia de que é
possível estabelecer uma teoria geral da tradução é duramente criticada pelas
reflexões pós-estruturalistas, com as quais me identifico, que se esforçam para
demonstrar a impossibilidade de um conhecimento sistemático e científico dos
processos mentais envolvidos em empreendimentos tais como a tradução, que
requerem leitura e interpretação. Nas palavras de Arrojo,
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26
a desconstrução promovida pela crítica pós-moderna traz como uma de suas
conseqüências mais destacadas a desistência de se tentar atingir uma narrativa-
mestra que pudesse, algum dia, determinar, para todo o sempre e em todas as
circunstâncias, o que deve conter e realizar, e como deve ser fiel e se comportar
toda e qualquer tradução. (ibidem, p. 101)
Os reflexos da visão pós-estruturalista no ensino da tradução são óbvios.
Se não existe uma teoria geral da tradução nem normas gerais que possam ser
aplicadas a todo ato tradutório, também não há como encarar o ensino dessa
atividade de forma prescritiva e normativa. Portanto, o professor que se alinha à
reflexão pós-estruturalista enfrenta o desafio duplo de ensinar tradução de forma
não-prescritiva e livrar os aprendizes ou a grande maioria deles da
expectativa irreal de que o significado é estável, levando-os a perceber que
diferentes caminhos e escolhas podem gerar traduções igualmente aceitáveis.
No artigo “O ensino da tradução e seus limites: por uma abordagem menos
ilusória” (1992), Rosemary Arrojo descreve o caso de uma aluna que a procurou
pedindo a tradução de uma lista de palavras e expressões descontextualizadas em
inglês. Essa atitude, que reflete uma postura teórica logocêntrica, é muito comum
entre aprendizes de tradução, e uma das tarefas do professor, a meu ver, é
desconstruí-la. A abordagem “menos ilusória” que propõe Arrojo
é decorrente de uma postura teórica que desconfia de qualquer fôrma de
significados supostamente mumificados, já que tem como base o questionamento
da possibilidade de qualquer significado absolutamente estável ou inerente à
palavra, ou em sentido mais amplo, ao próprio texto. (p. 103)
A estudiosa pós-estruturalista defende que aprender a traduzir é um processo
complexo que, além da elaboração de glossários, listas de dúvidas e consultas a
dicionários, inclui a familiarização com “as formas de leitura praticadas pelas
comunidades que produzem e consomem” (p. 104) o tipo de texto a ser traduzido.
Essa familiarização fatalmente envolve interpretação, e é só dessa forma, segundo
Arrojo, que os aprendizes começam a acumular conhecimento para assumir a
responsabilidade pelo texto de chegada, que será uma representação do texto de
partida. Arrojo conclui dizendo que é impossível que esse aprendizado ocorra
exclusivamente dentro dos limites da sala de aula, mas que é possível, num curso
de formação de tradutores, conscientizar os aprendizes em relação a essa
responsabilidade que estarão assumindo (p. 105).
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27
Uma proposta para a formação de tradutores críticos e competentes que
julgo pertinente é a apresentada por Martins (1992). A autora propõe uma
pedagogia estruturada sobre um tripé: maior integração entre teoria e prática;
maior ênfase no caráter interdisciplinar da tradução, e uma abordagem pedagógica
que também enfoque o processo tradutório, e não apenas o produto final da
tradução (p. 50).
Muitos professores de tradução desprezam a teoria, julgam-na
desnecessária e dissociada da prática, sem se dar conta da indissolubilidade entre
ambas
13
. Citando o artigo no qual Rosemary Arrojo relata o caso de sua aluna que
reuniu em uma lista palavras e expressões descontextualizadas em inglês, Quental
(1995) chama atenção para o fato de que
toda prática (a atitude e as decisões da aluna com relação ao texto a traduzir) traz
implícita uma teoria, ou uma perspectiva teórica [...]. Em outras palavras,
enquanto as proposições [dos professores entrevistados pela pesquisadora],
mesmo as mais favoráveis à teoria, implicam que a tradução funciona ou pode
funcionar sem uma teoria correspondente, de acordo com a concepção de Arrojo
a teoria da tradução é o conjunto de crenças que orientam e, até, determinam a
atividade propriamente dita, celebrando com ela um vínculo indissolúvel. (p. 76)
Em outras palavras, a simples forma como o processo tradutório é encarado revela
a perspectiva teórica do professor de tradução. Ele pode ver a tradução de forma
essencialista e julgar que basta ensinar a “única” interpretação possível do texto
(ou a “correta”) para que os aprendizes a assimilem, refletindo nesse caso uma
perspectiva teórica logocêntrica, ou encará-la de forma não-essencialista e
sistêmica, discutindo diferentes soluções e traduções possíveis e contextualizando
a tradução através da definição de seu público-alvo, de seu objetivo e do veículo
em que será divulgada. Dessa forma, estará privilegiando o fazer tradutório, o
processo no sentido do conjunto de procedimentos adotados pelo tradutor outra
base do tripé proposto por Martins.
Afinando-se com Arrojo, Martins defende uma abordagem pedagógica do
ensino de tradução na qual a teoria esteja presente o tempo todo, “numa
perspectiva de total integração à prática” (1992: 50). Essa presença constante da
teoria se daria em um nível mais amplo, como em discussões sobre os limites da
tradução, de questões como conteúdo vs. forma, literalidade, fidelidade, o papel
13
Para uma visão mais detalhada de como os professores de tradução encaram a teoria, ver
Quental (1995).
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28
do tradutor etc., inclusive com base na leitura e discussão em sala de textos
teóricos, até atividades e exercícios como a
identificação de um problema específico (a tradução de um determinado termo
num dado contexto, por exemplo), a enumeração das várias opções possíveis, sua
avaliação levando em conta a língua-meta e o leitor visado, a escolha de [soluções]
e, em seguida, a discussão da generalidade do problema para o futuro. (p. 51)
Não tenho dúvida de que a abordagem pedagógica não-essencialista aqui
apresentada leva à formação de tradutores mais capacitados, críticos e
responsáveis. Noto freqüentemente em minha prática do ensino de tradução para
legendagem que, quando desestimulo os alunos a fazerem perguntas do tipo:
“Como se traduz isso?” ou “Como fica melhor?”, levando-os a refletir sobre o
contexto e as diferentes opções possíveis, bem como incentivando-os a justificar
seus critérios e defender suas escolhas, eles se tornam mais seguros e passam a
demonstrar cada vez mais independência em relação ao professor nas atividades
propostas. É essa abordagem pós-estruturalista do ensino da tradução que adoto
no presente trabalho, e que estará refletida nas bases do curso de formação de
legendadores proposto por mim no Capítulo 5.
2.4
Metodologia
Para complementar e enriquecer os capítulos 4 e 5, conduzi entrevistas
com alguns dos atores mais importantes do polissistema de tradução audiovisual
(modalidade legendagem), dividindo-os em três categorias: diretores de
produtoras, professores de legendagem e alunos e ex-alunos de cursos de
legendagem.
A escolha da entrevista como técnica de pesquisa se deveu principalmente
aos seguintes fatores: ao contrário da aplicação de questionários, por exemplo, na
qual se cria uma relação hierárquica entre pesquisador e informante, “na entrevista
a relação que se cria é de interação, havendo uma atmosfera de influência
recíproca entre quem pergunta e quem responde” (Lüdke e André, 1986: 33).
Além disso, “a entrevista permite a captação imediata e corrente da informação
desejada” (ibidem) e há mais espaço para correções, esclarecimentos e
aprofundamento de certas questões. E uma vez que o meu objetivo era acumular
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29
mais dados qualitativos do que quantitativos, principalmente nas entrevistas com
os diretores de produtoras e os professores, a entrevista me pareceu o método de
pesquisa mais adequado.
O primeiro contato com os diretores das três maiores produtoras que
oferecem o serviço de tradução para legendagem no Rio de Janeiro foi feito
através de correio eletrônico. Dos três contatados, um não respondeu aos dois e-
mails enviados e dois se dispuseram a me receber para uma entrevista. No entanto,
por problemas de agenda, a entrevista com um dos diretores não aconteceu. Sendo
assim, entrevistei pessoalmente apenas um representante da categoria “diretores
de produtoras”, que, por motivos éticos, será identificado como Diretor A.
Fiz um primeiro contato via correio eletrônico com nove professores de
legendagem: seis deles lecionam no Rio de Janeiro e três, em São Paulo
14
. Pelo
fato de estar inserida no mercado de legendagem carioca há muitos anos e ser
sócia de uma empresa potencialmente contratante dos serviços de legendadores
saídos de cursos, conheço pessoalmente os seis professores contatados que atuam
no Rio de Janeiro. Cheguei aos nomes dos professores de São Paulo através de
listas eletrônicas de tradutores que divulgam cursos e também através de
currículos enviados à Gemini Vídeo. Um professor de São Paulo retornou o meu
primeiro contato solicitando um prazo maior para responder às perguntas, que foi
concedido. No entanto, mesmo após um segundo contato via e-mail, não recebi
resposta de nenhum dos três professores de legendagem de São Paulo. Em
contrapartida, entrevistei cinco dos seis professores contatados no Rio de Janeiro,
dois pessoalmente (esses informantes serão identificados como Professores A e
B), um via conversa telefônica gravada (Professor C) e dois por e-mail
(Professores D e E).
As entrevistas com o Diretor A e com os cinco professores foram semi-
estruturadas, ou seja, seguiram um roteiro básico pré-estabelecido, mas tanto a
entrevistadora quanto os informantes tinham liberdade para fazer perguntas e
comentários que fugissem do roteiro quando julgassem pertinente
15
. As
entrevistas com o Diretor A e os professores A e B foram conduzidas
pessoalmente e gravadas em áudio com o auxílio do editor de áudio Audacity, um
14
Embora haja professores e professoras entre os entrevistados, figuram todos aqui no masculino
em razão do sigilo.
15
Para o roteiro básico das entrevistas com o diretor, os professores e os alunos ver, respecti-
vamente, os apêndices A, B e C.
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software baixado gratuitamente da Internet, e de um microfone ligado a um
laptop. A entrevista com o Professor C foi conduzida via Skype, um programa
que realiza ligações telefônicas e videoconferências pela Internet. O programa
PowerGramo, também baixado gratuitamente da Internet, se associa ao Skype e
permite que as conversas telefônicas sejam gravadas em um arquivo de áudio no
computador. Utilizei portanto o PowerGramo para registrar a entrevista realizada
via Skype com o Professor C. Posteriormente, ouvi as gravações e transcrevi os
trechos que julguei mais relevantes aos propósitos deste estudo.
Nas entrevistas realizadas por correio eletrônico, enviei aos professores D
e E o mesmo roteiro de perguntas feitas aos professores A, B e C. Como a
entrevista semi-estruturada prevê esclarecimentos posteriores, após ter recebido as
respostas dos professores D e E fiz novas perguntas ao Professor D, cujo
depoimento inicial ensejou um maior aprofundamento de algumas questões.
Dos cinco professores entrevistados, quatro lecionam em cursos livres e
conduzem oficinas de legendagem no Rio de Janeiro. Dois deles também dão
aulas em módulos de tradução para legendagem em programas de pós-graduação
lato sensu oferecidos por universidades cariocas. Somente um tem perfil um
pouco diferente: dá aulas particulares apenas sobre os softwares utilizados no
mercado, além de dicas de timing, spotting e algumas convenções básicas que
hoje vigoram no mercado da TV fechada. Em suas próprias palavras, “[n]ão
leciono bem legendagem, e sim técnica de legendagem. Se dividirmos o ensino de
legendagem em parte lingüística e técnica, trato apenas da parte técnica
(softwares, erros de timing, spotting, velocidade de leitura)”.
Sem dúvida, as entrevistas realizadas pessoalmente se revelaram muito
mais ricas em informações e detalhes sobre o programa dos cursos, os métodos
utilizados por cada professor e as competências e habilidades que julgam
necessárias a um bom legendador. As respostas dos professores entrevistados por
e-mail foram mais sucintas. Por esse motivo, não há no presente trabalho
nenhuma citação atribuída ao Professor E. Mesmo assim, acredito que a entrevista
realizada com ele também serviu aos meus propósitos, pois suas respostas
corroboraram as declarações dos demais professores.
A terceira categoria de informantes foi a de alunos e ex-alunos dos cursos
de legendagem. Reuni, entre ex-alunos meus, alunos e ex-alunos de três
professores entrevistados e candidatos a colaboradores da Gemini Vídeo que
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31
mencionavam no currículo ter feito algum curso de legendagem, 139
entrevistados. Diante desse número considerável, tive de decidir entre enviar
questionários totalmente estruturados, com respostas em múltipla escolha — que
gerariam dados eminentemente quantitativos mas facilitariam o trabalho de
tabulação —, ou entrevistas com respostas livres — que produziriam dados
quantitativos e qualitativos, mas levariam a uma análise de dados mais trabalhosa.
Optei então por uma solução mista: enviei entrevistas com respostas livres, porém
mais estruturadas do que aquelas feitas com os professores e o diretor, pois meu
objetivo principal com a entrevista aos alunos era acumular dados quantitativos,
sem no entanto fechar a porta para possíveis reflexões por parte deles. De fato, as
23 respostas recebidas (16,5% do total de entrevistas enviadas) geraram alguns
dados qualitativos, que se fazem presentes em forma de depoimentos nos
capítulos 4 e 5. Apesar do baixo retorno, a tabulação dos dados quantitativos das
entrevistas com os alunos revelou alguns dados interessantes, que também são
analisados no Capítulo 4.
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3
A tradução para legendagem e suas peculiaridades
Segundo o teórico espanhol Jorge Díaz Cintas (2004), em termos
numéricos, a tradução audiovisual é a atividade tradutória mais importante do
nosso tempo, uma vez que atinge através principalmente do cinema, da TV e
do DVD um público infinitamente superior àquele consumidor de qualquer
outro tipo de tradução. Paradoxalmente, a atenção dispensada ao ensino dessa
modalidade de tradução pela academia até pouco tempo era quase inexistente,
embora o número de pesquisas feitas na área nos últimos anos esteja em franco
crescimento. Na Europa, esse quadro vem mudando desde a criação da União
Européia e, hoje, pelo menos 24 universidades do continente oferecem disciplinas
de tradução audiovisual (cf. Díaz Cintas & Orero, 2003). No Brasil, poucas
universidades possuem alguma disciplina de tradução audiovisual em seu
currículo, seja em nível de graduação ou de pós-graduação, apesar do crescente
interesse dos alunos pela modalidade
16
.
Fora do âmbito acadêmico, o que existem são cursos de curta duração,
como já foi mencionado na Introdução, voltados para o público em geral que
deseja ingressar no mercado audiovisual. Esses cursos abordam as noções básicas
de legendagem e/ou dublagem e as especificidades técnicas do ofício, além de
alguns padrões e regras adotados pelo mercado. Não é, portanto, objetivo dos
professores dos cursos existentes formar legendadores. Como veremos nos
depoimentos apresentados no Capítulo 4, a expectativa dos professores é que os
alunos se familiarizem com os programas específicos usados em legendagem o
suficiente para serem aprovados nos testes de seleção das produtoras. No entanto,
devido às peculiaridades dessa modalidade de tradução, muitos alunos desistem de
tentar uma vaga no mercado antes mesmo do fim das aulas. O fato de os cursos
livres serem abertos a quaisquer interessados, e não somente a tradutores
profissionais, gera outro problema: ao final, os aprendizes dominam o programa
de legendagem, mas produzem traduções inaceitáveis para os padrões do
mercado. Por esses motivos, dificilmente um ex-aluno dos cursos de treinamento
16
Até onde consegui verificar, essas universidades são PUC-Rio, UGF, UnB, UECE, UFBA e
Universidade de Franca.
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oferecidos hoje consegue se estabelecer sem que passe ao menos por uma
reciclagem de português e um treinamento longo e intensivo nas produtoras para
as quais prestará serviço. Além disso, devido à carga horária reduzida desses
cursos — que varia entre 10 e 40 horas —, são abordadas apenas as normas e
coerções mais óbvias, aquelas cujo desconhecimento leva a problemas técnicos
graves. Sendo assim, o novato não desenvolve a independência necessária para
solucionar um problema mais complexo, seja tradutório ou técnico.
Neste capítulo, após uma breve contextualização das modalidades de
tradução audiovisual presentes na televisão brasileira, abordarei algumas
características específicas da tradução para legendagem e as coerções que
suscitam. Por fim, apresentarei os principais mecanismos de controle e normas
que atualmente vigoram no mercado de legendagem brasileiro.
3.1
A tradução audiovisual na televisão brasileira
Como explica o estudioso dinamarquês Henrik Gottlieb (1998), a tradução
audiovisual nasceu em 1929, quando os primeiros filmes falados atingiram o
público internacional. Desde então, duas modalidades se destacaram: a dublagem,
que consiste na substituição do canal de áudio com o som original por um canal de
áudio com a tradução; e a legendagem, ou inserção de legendas com o texto
traduzido de forma sincronizada com as falas na língua original. No verbete
“Subtitling”, da Routledge Encyclopedia of Translation Studies, Gottlieb divide o
mundo da tradução audiovisual em quatro blocos:
a) Países de língua-fonte, falantes de inglês, com raras importações não-
anglófonas. Por serem escassos, os filmes importados tendem a ser legendados
em vez de dublados. São muitas vezes filmes de “arte”, cujo público-alvo é
uma audiência letrada.
b) Países adeptos da dublagem, falantes principalmente de alemão, italiano,
espanhol e francês, tanto na Europa quanto fora dela. Nesses países, quase
todos os filmes e programas de TV importados são dublados.
c) Países adeptos do voice-over, a saber Rússia, Polônia e outras comunidades
lingüísticas de grande ou médio porte que não podem pagar a dublagem
sincronizada. No processo de gravação de voice-over de um filme de longa-
metragem, um narrador interpreta as falas de todo o elenco (todo o diálogo); o
volume do canal de áudio original é baixado enquanto ele/ela fala.
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34
d) Países adeptos da legendagem, incluindo inúmeras comunidades lingüísticas
não-européias, assim como vários países europeus pequenos com altos níveis
de instrução, nos quais a legendagem tem preferência sobre a dublagem.
17
(1998: 244)
No Brasil acontece um fenômeno interessante. Aqui, dublagem e
legendagem são igualmente bem-aceitas; cada modalidade tem seu público cativo
e seu espaço garantido. Com o advento da TV a cabo, o voice-over, antes usado
quase que exclusivamente por repórteres televisivos na tradução de depoimentos e
entrevistas em língua estrangeira, também foi ganhando espaço. A grande
vantagem do voice-over é o custo, muito mais baixo que o da dublagem
sincronizada (que chega a ser quinze vezes mais cara do que a legendagem). À
exceção dos longas-metragens de animação ou voltados para o público infantil,
que são dublados, na cultura brasileira, tradicionalmente, os produtos estrangeiros
veiculados no cinema são legendados, enquanto que aqueles exibidos na TV
aberta são dublados.
Um dos motivos que levaram a essa hegemonia da dublagem na TV aberta
foi um decreto assinado em 1962, durante o governo João Goulart, que obrigava a
dublagem dos filmes a serem exibidos pela televisão (Souza, 1999: 17). A
promulgação dessa lei sugere uma motivação política, uma tentativa de proteger a
cultura e a língua locais da impregnação estrangeira. Mas o monopólio da
dublagem na TV aberta brasileira também possui uma motivação socioeconômica:
o nível geral de instrução da população é baixo. Isso descarta o uso da
legendagem de programas destinados a esse público, uma vez que, para
acompanhar as legendas de forma natural e sem um esforço cognitivo muito
grande, o espectador deve ser capaz de ler com rapidez, o que é difícil para
pessoas pouco instruídas. O advento da TV por assinatura acabou por reproduzir a
17
a) Source-language countries, English-speaking, with hardly any non-Anglophone imports. Few
as they may be, imported films tend to be subtitled rather than dubbed. They are often ‘art’
movies, aimed at a literate audience.
b) Dubbing countries, mainly German-, Italian-, Spanish- and French-speaking in and outside
Europe. In these countries, nearly all imported films and TV programmes are dubbed.
c) Voice-over countries, namely Russia, Poland and other large or medium-sized speech
communities which cannot afford lipsynch dubbing. In doing the voice-over for a feature film, one
narrator interprets the lines of the entire cast (the entire dialogue); the volume of the original
soundtrack is turned down while s/he is speaking.
d) Subtitling countries, including several non-European speech communities as well as a
number of small European countries with a high literacy rate, where subtitling is preferred to
dubbing.
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preferência pela legendagem observada no mercado brasileiro de cinema, pois,
além de ser uma modalidade muito mais barata e rápida de tradução audiovisual,
como a assinatura naquele primeiro momento era muito cara e portanto só
acessível à elite, a aposta das distribuidoras foi a de que os assinantes prefeririam
a legendagem.
De certa forma, a hipótese das distribuidoras se confirmou, e a legendagem
ainda prevalece na TV fechada. No entanto, com o barateamento das assinaturas
de TV a cabo gerado pela concorrência e a criação de pacotes básicos para classes
sociais menos favorecidas, começou a surgir uma demanda por programas
dublados. Hoje, como explica Carvalho (2005),
[h]á canais especializados em determinados gêneros de programas que empregam
a dublagem enquanto outros semelhantes preferem a legendagem. O mesmo
ocorre com os canais de entretenimento. A maioria dos canais dedicados à
exibição de filmes tende a preferir a legendagem, porém recentemente vem-se
abrindo espaço para a dublagem a pedido dos assinantes (p. 94).
3.2
Os conceitos de tradução diagonal e diassemiótica e os problemas
que causam
No Capítulo 2, apresentei de forma resumida o conceito de norma
tradutória, desenvolvido por Gideon Toury, segundo o qual, dentro da escala de
coerções às quais qualquer tipo de tradução está sujeita, em um pólo estão as
regras — mais explícitas e geralmente enunciadas do que as normas — e, no
outro, as idiossincrasias — mais subjetivas e individuais. As normas preencheriam
o amplo espaço entre um pólo e outro e, como vimos, os próprios conceitos de
regra e idiossincrasia também podem ser redefinidos em termos de normas,
respectivamente mais ou menos objetivas. A título de simplificação, adotarei
doravante a seguinte adaptação da nomenclatura proposta por Toury para abordar
as normas e coerções que regem o trabalho dos tradutores no mercado de
legendagem brasileiro: chamarei de coerções as limitações físicas impostas pelo
meio televisivo e de normas as convenções formais, tanto técnicas quanto
lingüísticas, adotadas pelos clientes em potencial dos legendadores, entre os quais
se destacam laboratórios de legendagem, produtoras e canais de TV fechada.
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36
A legendagem é uma forma muito especializada de tradução, que, como já
foi mencionado no Capítulo 2, envolve diferentes canais semióticos, é governada
por coerções espaciais e temporais e possui características peculiares. Um
conceito-chave para entendermos melhor toda a complexidade da legendagem é o
de tradução diagonal, cunhado por Henrik Gottlieb (1994a). Segundo ele, a
legendagem é um tipo de tradução diagonal porque o discurso falado é lido em
outra língua pelos espectadores. Na tradução de um texto escrito ou na
interpretação simultânea, por exemplo, não ocorre uma mudança de código, ou
seja, traduz-se do código escrito para o código escrito no caso da tradução de
textos, e do código oral para o código oral no caso da interpretação, como
demonstrado no quadro abaixo.
Tradução escrita
e interpretação
Língua-fonte Língua-meta
Código oral Fala Fala
Código escrito Escrita Escrita
No caso da legendagem, além da língua, o código também muda, do oral para o
escrito, o que fica claro no quadro abaixo:
Legendagem
Língua-fonte
Língua-meta
Código oral Fala (áudio)
Código escrito Escrita (legendas)
Conforme explica Schwarz (2002), essa mudança gera alguns problemas
para o legendador: o principal é causado pela diferença entre a velocidade da
língua falada e a velocidade de leitura. Uma transcrição completa do roteiro
original nunca é possível na legendagem. As limitações físicas de espaço na tela e
o ritmo da palavra falada exigem uma redução considerável do texto, uma vez que
o que rege o tempo de permanência de uma legenda na tela é o áudio original.
Sendo assim, no momento em que identifica um enunciado oral na língua original,
o telespectador dirige o olhar para a parte inferior da tela à procura da tradução
daquele enunciado. Por isso, o ideal é que a legenda com a fala traduzida surja na
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37
tela cerca de 1/4 de segundo depois do início da fala original — tempo que o
cérebro humano leva para identificar o som da fala e guiar a visão para o local
onde a legenda deve aparecer (cf. Karamitroglou, 1998) — e desapareça no
máximo um segundo após o final da fala correspondente (desde que não haja corte
de cena nem outro enunciado oral que se inicie nesse segundo adicional). O
surgimento precoce da legenda na tela causa incômodo e distrai o telespectador,
desviando sua atenção dos outros canais comunicativos. Estudos indicam que o
texto legendado é em média um terço mais enxuto do que o original, mas há casos
em que essa redução chega a ultrapassar 50%
18
. Portanto, os telespectadores de
um programa legendado têm uma experiência muito diversa da que tem o público
que assiste à versão original. O esforço cognitivo que o espectador de um
programa legendado faz é bem maior, pois, além de ler as legendas, tem de
assimilar os outros três canais semióticos presentes no produto audiovisual (o
canal acústico verbal, o canal acústico não-verbal e o canal visual não-verbal). Ao
contrário do que acontece na dublagem, em que um canal ou código é substituído
por outro, na legendagem o original não é alterado. Em vez disso, acrescenta-se
um elemento ao canal visual verbal do produto. Nesse aspecto, Gottlieb (1994b)
faz ainda outra distinção entre a tradução para legendagem e para dublagem.
Embora as duas modalidades sejam exemplos de comunicação polissemiótica, na
dublagem o canal acústico com os diálogos originais é substituído pelo canal
acústico com os diálogos traduzidos e interpretados por dubladores, ou seja, o
canal de comunicação não muda. Isso faz dela um exemplo de tradução
isossemiótica. Já na legendagem, a tradução do canal acústico verbal é adicionada
ao canal visual não-verbal, configurando-a assim como uma tradução
diassemiótica, em que há o envolvimento de diferentes canais. Nas palavras de
Souza (1999: 35), a tradução no formato de legendas
[a]parece ao lado dos signos verbais transmitidos acústica e visualmente como
parte das imagens que acompanham este “texto”, podendo se constatar uma
interação entre estes sistemas de significação que é percebida pelo espectador e
que deve ser observada pelo tradutor.
Essa característica diassemiótica nos leva a outra particularidade da legendagem:
a de estar sujeita a críticas por parte de qualquer pessoa com um conhecimento
18
Para mais detalhes, ver Souza (1999).
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mínimo da língua-fonte (cf. Gottlieb, 1994a). Isso acontece exclusivamente na
legendagem e em edições bilíngües de livros.
Outra peculiaridade é o caráter efêmero das legendas. Uma legenda com
duas linhas cheias de texto deve permanecer na tela durante no mínimo quatro e
no máximo seis segundos
19
. Após esse tempo, o telespectador começa a reler a
legenda, o que não deve acontecer. No entanto, o tempo médio de permanência de
uma legenda na tela varia entre dois e três segundos, dependendo do gênero do
programa, do ritmo de sua edição e da quantidade de caracteres utilizados em cada
legenda. O fato é que não há replay, portanto, se o espectador não assimila o texto
da legenda naqueles dois ou três segundos em que permanece na tela, sua
compreensão do conteúdo geral do programa fica prejudicada. Por isso, o ideal é
que cada legenda seja um bloco coeso de significado, uma unidade inteligível e
completa, com no mínimo uma linha e no máximo duas linhas de texto traduzido.
Para isso, o legendador deve ter a capacidade de decidir como vai traduzir o texto-
fonte e seus elementos constituintes e o que vai deixar de fora com base no tempo
e no espaço que tem disponível. No Brasil, de uma forma geral, trabalha-se com o
parâmetro de quinze caracteres por segundo (CPS)
20
.
Além dessas duas coerções de caráter temporal e espacial , o aspecto
gráfico das legendas deve corresponder ao aspecto fonético do diálogo que está
sendo traduzido. Ou seja, é importante que as legendas tentem, na medida do
possível, reproduzir a estrutura da língua-fonte e palavras facilmente
identificáveis pelos telespectadores da língua-meta. Isso facilita a compreensão
das legendas, principalmente no caso da tradução de línguas muito difundidas,
como o inglês, ou muito parecidas com o português, como o espanhol. No
entanto, como Gottlieb (1994a) ressalta, a incompatibilidade entre os subcódigos
oral e escrito e as diferentes estruturas sintáticas das línguas podem representar
obstáculos a essa correspondência. Segundo ele, algumas das principais
características que distinguem o código oral do escrito são:
19
Os sistemas de legendagem de programas televisivos mais utilizados no Brasil comportam no
máximo 32 caracteres com espaços por linha de legenda.
20
Adaptações a esse parâmetro devem ser feitas na legendagem de programas infantis ou de
versões para culturas não habituadas às legendas.
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(i) no código oral, o contato direto entre os interlocutores produz uma
linguagem implícita que dispensa explicações. No caso de textos
escritos, é preciso explicar e estender a mensagem;
(ii) na linguagem falada, a localização de certos aspectos estilísticos no eixo
do correto/incorreto e do formal/informal é diferente;
(iii) no discurso espontâneo, o legendador tem de lidar com pausas,
hesitações, autocorreções e interrupções; construções gramaticalmente
inaceitáveis; lapsos e contradições; e situações nas quais várias pessoas
falam ao mesmo tempo (pp. 105-6).
Portanto, além de traduzir de uma língua para outra, na tradução diagonal
traduz-se do código oral, muito mais livre e rebelde, para o código escrito, muito
mais rígido. Se essa mudança de código não acontecesse, o público ficaria
espantado ao ler as estranhezas do discurso oral. O público já está acostumado
com essa recodificação, e só reage quando a outra dimensão da legendagem a
tradução em si lhe parece imperfeita (ibidem, p. 106).
Afora as coerções e normas listadas até aqui, a tradução para legendagem é
regida por uma série de convenções e, apesar de o legendador não ter influência
alguma sobre a maioria delas, é necessário que as conheça e respeite para manter
uma boa relação tanto com seus clientes quanto com o público e não sofrer
sanções negativas. Devido ao grande número de normas existentes nessa
modalidade de tradução, na próxima seção tratarei apenas das mais relevantes,
desde as técnicas até as voltadas para questões de estilo, com o objetivo de
demonstrar que só é possível abordar todas em um curso extenso de formação de
legendadores. Para tal, vou adaptar para a realidade brasileira — a partir da minha
experiência de doze anos de serviços prestados a diversos clientes, principalmente
à Globosat, maior programadora de TV por assinatura do Brasil — o conjunto de
convenções reunidas por Fotios Karamitroglou em seu artigo “A proposed set of
subtitling standards in Europe” (1998).
Vale lembrar que, devido à natureza dinâmica do polissistema de tradução
audiovisual, o grau de influência das diversas normas nele vigentes é variável:
algumas têm mais força em dado subsistema do que em outro e, dentro de um
mesmo sistema, a força de dada norma pode aumentar ou diminuir com o tempo.
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40
3.3
Principais normas da tradução para legendagem
Podemos dividir as normas gerais que orientam a produção de legendas no Brasil
em duas categorias principais: parâmetros técnicos (espaciais e temporais) e
parâmetros textuais, subdivididos em micro- e macroestruturais.
3.3.1
Parâmetros técnicos
¾ número de caracteres por linha como já foi dito, o número máximo de
caracteres por linha de legenda permitido no mercado brasileiro fica entre 30
e 35, ou 610 pixels, dependendo do equipamento e do tamanho da fonte
utilizados na legendagem;
¾ duração de uma legenda de duas linhas cheias se estivermos trabalhando
com um máximo de 30 caracteres permitidos por linha, uma legenda de duas
linhas cheias (com 60 caracteres no total) deve, de acordo com o parâmetro de
15 caracteres por segundo mais amplamente adotado pelo mercado,
permanecer na tela por no mínimo 4 e no máximo 6 segundos. Na
legendagem de programas infantis e de versões para idiomas de culturas
pouco familiarizadas com a leitura de legendas, o tempo de permanência das
legendas na tela deve ser maior;
¾ duração de uma legenda de uma única palavra (duração mínima) de acordo
com o padrão sugerido por Karamitroglou, uma legenda, por menor que seja,
não deve permanecer na tela durante menos do que 1 segundo e meio. No
entanto, esse parâmetro leva a problemas sérios de “vazamento” de legendas
para outra cena em alguns casos, como, por exemplo, o de um longa-
metragem com edição nervosa, uma vez que certas expressões e interjeições
podem ser proferidas em menos de meio segundo. No Brasil, o parâmetro
mais utilizado para a duração mínima de uma legenda é de 1 segundo. Se
houver corte de cena durante esse 1 segundo, deve-se inserir a legenda alguns
quadros antes da fala original, evitando assim que ela vaze para a cena
seguinte;
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41
¾ tempo de entrada da legenda como vimos na Seção 3.2, as legendas não
devem ser inseridas simultaneamente ao início da expressão oral, mas 1/4 de
segundo depois, para que o cérebro tenha tempo de identificar o som e
conduzir os olhos em direção à parte inferior da tela. Quando o surgimento da
legenda na tela coincide com o início do enunciado oral, ou pior, quando
surge antes do início da fala original, o olhar do telespectador é surpreendido
pelo flash da legenda, o que causa incômodo e distração. Além disso, uma
legenda que entra adiantada pode acabar com o suspense de uma cena,
revelando uma informação antes do tempo;
¾ tempo de permanência de uma legenda na tela assim como deve entrar 1/4
de segundo depois da expressão oral, a legenda deve permanecer na tela no
mínimo 1/2 segundo e no máximo 1 segundo após o final da fala
correspondente, desde que, como já foi dito, não haja corte de cena nem outra
fala se iniciando nesse tempo adicional. Se a legenda continua em exibição
muito tempo depois de a fala correspondente ter se encerrado, polui a tela,
desloca a atenção dos outros canais envolvidos na comunicação e deixa de ser
uma representação do original. Por outro lado, se a legenda desaparece da tela
antes da hora, ou seja, antes do final da fala correspondente ou assim que a
mesma termina, o telespectador muitas vezes não consegue lê-la até o fim;
¾ intervalo entre duas legendas consecutivas no parâmetro proposto por
Karamitroglou, cerca de 1/4 de segundo (ou seja, entre 6 e 7,5 frames) deve
ser inserido entre legendas consecutivas para evitar que uma legenda “grude”
na seguinte. No entanto, na configuração padrão do sistema de legendagem
mais utilizado na Europa (Cavena), esse intervalo é de 4 frames, que cumpre
perfeitamente a função de fazer com que o espectador perceba que houve a
mudança de legenda. Quando o tempo de saída de uma legenda é igual ao
tempo de entrada da seguinte, ou seja, quando não há este intervalo mínimo
de 4 frames, o olho humano não percebe a mudança, principalmente se a
composição estética das duas legendas for semelhante;
¾ relação das legendas com os cortes de cena
as legendas devem respeitar
cortes de cena que marquem uma mudança temática no produto audiovisual, e
portanto devem desaparecer antes desses cortes.
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42
3.3.2
Parâmetros textuais microestruturais
¾ uso de reticências não há uma padronização para esse item no mercado
brasileiro. Alguns clientes recomendam o uso de reticências no início e no
final de cada legenda, para indicar que a oração legendada não está completa.
Outros recomendam a inclusão de reticências apenas no final da legenda
incompleta. Porém, o padrão mais utilizado é a ausência das reticências em
legendas incompletas. Karamitroglou recomenda o uso das reticências no
início e no final de legendas incompletas, argumentando que, com a ausência
dessa pontuação, o cérebro leva mais tempo para processar a nova legenda,
que aparecerá inesperadamente. Quem defende a ausência das reticências para
marcar legendas incompletas argumenta que não se pode desperdiçar o espaço
que seria ocupado por elas (relativo a três caracteres), e que a ausência de
pontuação final já é uma indicação bastante clara de que o período está
incompleto naquela legenda. Outra desvantagem do uso das reticências nesse
caso é que elas perdem sua função original (e primordial) de marcar
hesitações, pausas e interrupções;
¾ uso de hífen o hífen deve ser utilizado como substituto do travessão para
marcar o diálogo entre duas personagens numa mesma legenda e para separar
orações apositivas, lembrando que, em legendagem, não se separam sílabas.
Quando o hífen é utilizado na função do travessão, a maioria dos clientes
recomenda que não se insira um espaço entre ele e o primeiro caractere de
cada linha de legenda. No Brasil, cada linha deve conter, obrigatoriamente, a
fala de uma personagem apenas;
¾ uso de parênteses, asterisco, negrito e sublinhado esses recursos e
convenções não são amplamente utilizados no mercado de legendagem
brasileiro;
¾ uso de itálico o itálico deve ser utilizado para marcar uma fonte de
expressão oral que esteja fora do ambiente no qual a cena principal se
desenrola, bem como para vozes filtradas (vozes provenientes de dispositivos
eletrônicos como microfones, telefones, megafones, televisores, rádios,
gravadores, interfones, computadores, ou as falas de robôs), músicas e falas
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43
de narradores. O itálico também é usado para sinalizar pensamentos de
personagens e destacar palavras estrangeiras;
¾ palavras grafadas em caixa-alta a tradução de faixas, cartelas, cartazes,
placas, bilhetes, letreiros e afins que sejam relevantes para o acompanhamento
do enredo do produto audiovisual deve ser incluída sempre em caixa-alta.
Nesse caso, o número máximo de caracteres por linha de legenda cai
consideravelmente, pois letras maiúsculas ocupam uma quantidade muito
maior de pixels do que letras minúsculas;
3.3.3
Parâmetros textuais macroestruturais
¾ diagramação das legendas (ou spotting) o ideal é que cada legenda
contenha um período inteiro, ou pelo menos uma idéia coerente e completa.
Se for necessário dividir o período em duas legendas, o texto legendado deve
ser segmentado de forma a manter juntos os sintagmas de ordem mais alta na
estrutura da sentença (divide-se primeiro em orações, depois em sujeito e
predicado, depois em sintagma nominal e sintagma verbal e assim por diante).
Vejamos um exemplo adaptado do artigo de Karamitroglou de como
diagramar internamente uma legenda (operação conhecida no meio como
spotting interno):
A oração “A destruição da cidade era inevitável” possui 37 caracteres, o
que significa que teria que ocupar obrigatoriamente duas linhas de legenda. Um
primeiro nível de divisão se dá entre sujeito e predicado da oração (ou entre
sintagma nominal e sintagma verbal), o que resultaria na seguinte legenda:
A destruição da cidade
era inevitável.
A oração usada como exemplo é simples o bastante para que
identifiquemos um spotting interno ruim, como é o caso das legendas listadas a
seguir:
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A destruição da
cidade era inevitável.
A destruição da cidade era
inevitável.
A destruição
da cidade era inevitável.
Ainda no item diagramação, devemos destacar que as legendas são lidas
mais rapidamente em blocos menores de duas linhas do que em uma linha longa
(de mais de 26 caracteres). Segundo Karamitroglou, o olho está mais acostumado
a ler textos em formato retangular (em colunas ou páginas), e não triangular, ou
seja, a segmentação das legendas deve buscar um equilíbrio entre sintaxe e
geometria e, se for preciso sacrificar um dos dois, deve-se priorizar o aspecto
sintático;
¾ mais de uma oração na mesma legenda Karamitroglou é categórico ao
afirmar que não se devem incluir mais do que duas orações numa única
legenda. No mercado brasileiro, isso não é uma norma explícita, apenas uma
recomendação;
¾ omissão e manutenção de itens lingüísticos do original
de uma forma geral,
a decisão de quais itens lingüísticos devem ser mantidos e quais devem ser
omitidos depende do bom senso do tradutor; no entanto, mesmo que o espaço
e o tempo permitam, nunca se deve tentar uma correspondência total dos itens
lingüísticos, para que o telespectador tenha tempo de apreciar os elementos
não-lingüísticos e visuais do produto. Portanto, o tradutor deve ter em mente
que alguns itens são dispensáveis na legendagem, seja devido à natureza
polissemiótica desse tipo de comunicação, seja por se tratar de expressões
sem carga semântica. Entre os itens que podem ser omitidos sem que o
entendimento geral do produto audiovisual fique prejudicado estão expressões
como “eu acho”, “você sabe”, “bem”, “bom”, “quer saber” etc.;
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intensificadores como “muito”, “super” e “hiper”; pronomes demonstrativos,
onomatopéias e respostas curtas e facilmente identificáveis pelos
telespectadores da língua-meta, como “ok”, “sim”, “não” e “tchau”. Por outro
lado, os itens mais carregados de significado que são facilmente identificáveis
na língua-meta, seja por se assemelharem foneticamente a palavras dessa
língua, seja por terem um significado conhecido, não devem ser omitidos,
uma vez que o telespectador tende a procurar essas palavras na tradução para
verificar se ela é “confiável”. Entre os exemplos estão os topônimos e
palavras cognatas, como “matemática” (em inglês: mathematics; em francês:
mathématique; em italiano: matemàtica) ou “necessidade” (em inglês:
necessity; em francês: necessite; em italiano: necessità).
¾ estruturas sintáticas preferenciais estruturas sintáticas simples, por serem
mais curtas e de mais fácil entendimento, são preferíveis. Como destaca
Carvalho (2005: 117-8), as simplificações mais recomendadas em cursos e
manuais de legendagem são: (i) componentes sintáticos em ordem direta, em
vez de inversa ou intercalada; (ii) orações coordenadas, em vez de
subordinadas; (iii) construções ativas, em vez de passivas; (iv) construções
positivas, em vez de negativas; (v) verbos simples, em vez de compostos; (vi)
elipses, em vez de sujeitos ou verbos repetidos na mesma oração; (vii)
interrogações, em vez de perguntas indiretas e (viii) imperativo, em vez de
solicitações indiretas.
Em relação à norma inicial, o fato de o telespectador ter acesso simultâneo
ao original e à tradução faz com que o legendador, muitas vezes, tenha de optar
por uma tradução adequada, ou seja, mais orientada para o sistema-fonte, mesmo
que isso gere um texto traduzido pouco fluente. Não devemos nos esquecer de que
as legendas não são lidas como um texto corrido, mas em blocos mais ou menos
independentes. Assim sendo, o leitor não tem a possibilidade de voltar para reler
um trecho que tenha ficado obscuro na primeira leitura. As legendas devem ser
claras e diretas, mas sempre subordinadas à estrutura original. Como explica
Gottlieb (1994b: 268), o feedback do original, fornecido pela natureza
polissemiótica da legendagem, tanto na forma de palavras reconhecíveis e
aspectos prosódicos quanto em gestos ou imagens de fundo, não raro é tão óbvio
que uma versão mais idiomática torna-se contraproducente. Muitas vezes, os
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46
espectadores preferem uma tradução direta do que está sendo dito a uma
reconstrução do diálogo na língua-meta. Isso significa que uma tradução
idiomática, ou aceitável, orientada para a língua-meta, pode não ser bem-aceita.
Segundo o estudioso, uma tradução idiomática não é bem-aceita
quando a distância entre o efeito da legenda e o efeito total do texto original
multicanal — no sentido polissemiótico [...] — fica grande demais. Nesses casos,
a fricção entre o original e a legenda causa ruído, e a ilusão da tradução como o
alter ego do original é quebrada.
21
(ibidem)
Essa fricção fica clara no exemplo a seguir:
Timing Duração Original
10:16:38:00
10:16:42:08
04:08
And did a number of the married men
who you had sexual relations with
10:16:42:13
10:16:45:08
02:25
have wives who knew
they were bi-sexual?
No trecho acima, uma tradução que respeitasse a estrutura sintática
original, ou seja, que fosse adequada, se revelaria um tanto truncada. Vejamos: “E
alguns dos homens casados com quem o senhor manteve relações sexuais tinham
esposas que sabiam da bissexualidade deles?” Um exemplo de tradução mais
aceitável seria: “As esposas dos homens com quem o senhor manteve relações
sexuais sabiam que eles eram bissexuais?” No entanto, se escolhermos a segunda
opção, estaremos revelando na primeira legenda uma informação (wives) que a
personagem só menciona na segunda legenda. Se a tradução ficasse como mostra
o quadro a seguir, causaria estranhamento ao telespectador, quebrando a ilusão
mencionada por Gottlieb
22
.
21
This happens when the distance between the effect of the subtitle and the total effect of the multi-
channel original text — in the poly-semiotic sense [...] — becomes too great. In such cases the
friction between original and subtitle causes noise, and the illusion of the translation as the alter
ego of the original is broken.
22
A coluna do meio exibe o número máximo de caracteres que a legenda traduzida deve ter para
que o telespectador tenha tempo de lê-la.
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47
Original # Tradução
And did a number of the married men
who you had sexual relations with
62
As esposas dos homens com quem
o senhor manteve relações
have wives who knew
they were bi-sexual?
45
sabiam que
eles eram bissexuais?
Uma tradução menos fluente mas mais eficiente nesse caso seria
23
:
Original # Tradução
And did a number of the married men
who you had sexual relations with
62
Em relação aos homens com quem
o senhor manteve relações,
have wives who knew
they were bi-sexual?
45
as esposas sabiam
que eles eram bissexuais?
¾ referências culturais e geográficas — este item está entre os que trazem mais
dificuldades para qualquer modalidade de tradução. No caso da legendagem,
essas dificuldades são ainda maiores, já que o legendador não pode lançar
mão de notas nem de traduções explicativas extensas. Embora a forma de se
lidar com referências culturais e geográficas na tradução para legendas
dependa, além das restrições espaço-temporais, do contexto, do público-alvo,
do gênero do material e das normas explicitadas pelo cliente, as estratégias
que podem ser utilizadas nesse caso são: (i) manutenção da referência na
cultura de origem, (ii) transferência para uma referência equivalente ou
semelhante na cultura de chegada, (iii) neutralização ou generalização, (iv)
explicação, ou (v) omissão (Carvalho, 2005: 121).
23
A título de ilustração, a tradução dessas duas legendas para o francês ficou assim: “En ce qui
concerne les hommes mariés avec qui vous couchiez, / les épouses connaissaient-elles leur
bisexualité?”
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48
3.4
Mecanismos de controle
Da mesma forma que a tradução de uma seqüência de legendas que se
afaste muito da estrutura do texto original pode causar problemas de compreensão
por parte do telespectador, como vimos no penúltimo item da seção anterior, a
escolha da estratégia tradutória para lidar com referências culturais também pode
suscitar problemas. É o que mostra a crítica a seguir, feita pelo jornalista Artur
Xexéo (2006) em sua coluna semanal no “Segundo Caderno” do jornal O Globo.
O filme “Os infiltrados”, de Martin Scorsese, ainda está no começo, quando
surge a cena fatal: o personagem de Leonardo DiCaprio entra num bar barra-
pesada e, confiante, faz seu pedido no balcão:
A cranberry jus [sic].
Espanto geral no ambiente. O efeito é parecido com o da cena-clichê de filme
de faroeste, quando o mocinho entra no saloon, onde todos bebem uísque puro, e
pede um copo de leite.
Não é fácil traduzir cranberry. Os Estados Unidos são pródigos em frutinhas
vermelhas das mais variadas, todas terminando em berry (cranberry é uma delas).
Aqui, a gente sabe o que é uma amora e olhe lá. O tradutor poderia buscar um
pedido equivalente, um pedido que causasse espanto no bar, algo como uma
groselha, um coquetel de frutas, um suco de abacaxi... Mas a tradução foi fiel, e a
gente, num cinema carioca, fica mais espantado do que toda a clientela do bar
barra-pesada, quando lê que o Leonardo DiCaprio pediu:
Um oxicoco
24
.
Como é que é? Oxicoco? Não sei dizer o que achei do filme de Scorsese. Passei
todo o resto da projeção tentando adivinhar o que seria oxicoco. Cheguei em casa
e fui direto a um dicionário de inglês para saber se o tradutor tinha pisado na bola.
Estava lá:
Cranberry: oxicoco, arando, uva-do-monte. É, o dicionário não ajudaria muito o
tradutor. Ele tinha que improvisar mesmo. Mas, afinal, o que é oxicoco?
Corri ao Aurélio. Decepção: não consta. Procurei no Houaiss e, enfim, pude
ficar sossegado:
Oxicoco Arbusto da família das ericáceas, nativo de regiões temperadas do
Hemisfério Norte, de folhas revolutas e frutos vermelhos, comestíveis e um
pouco ácidos.
Pelo que entendi, Leonardo DiCaprio pediu um suco de oxicoco. Amora não
teria sido muito diferente.
De fato, “oxicoco” não é uma palavra corriqueira em português. O
jornalista defende o uso da estratégia (ii), de transferência para uma referência
com função equivalente na cultura de chegada, e sugere opções como “acabaxi”,
“groselha” ou “amora”. Dessa forma, segundo ele, o pedido da personagem de
24
Na verdade, na versão legendada do filme Os infiltrados exibida nos cinemas brasileiros, a fala
“A cranberry juice” foi traduzida como “Suco de oxicoco”, e não “Um oxicoco”, como informou
Xexéo em sua coluna.
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49
Leonardo DiCaprio continuaria sendo esdrúxulo em um bar “barra-pesada”, mas
não causaria tanto estranhamento aos espectadores do filme.
Temos aqui um exemplo claro de mecanismo de controle externo em ação.
É sabido que críticas a legendas abundam nos meios de comunicação e, mais
recentemente, na Internet. O motivo principal disso é a já mencionada
característica diassemiótica da legendagem. Visto que o público tem acesso ao
original e à tradução simultaneamente, as legendas tornam-se vulneráveis a
críticas por parte de qualquer pessoa com algum conhecimento da língua-fonte.
No entanto, caso o filme Os infiltrados estivesse sendo legendado para
exibição em um dos canais da Globosat Programadora, as saídas propostas por
Xexéo entrariam em conflito com uma norma explícita do cliente, segundo a qual
nenhum tema deve ser nacionalizado. Isso significa que uma adaptação como
“suco de abacaxi” ou “groselha” não seria aceita. Nesse caso, a orientação que o
legendador recebe desse cliente é usar ou a estratégia (i) ou a (iii), ou seja, manter
a referência, o que resultaria na tradução “suco de cranberry”, ou generalizá-la,
usando, por exemplo, “suco de fruta”, ou simplesmente “suco”.
A crítica acima ilustra um conflito muito comum no caso da legendagem
entre um mecanismo de controle interno e outro externo. Não raro, o legendador,
para manter uma boa relação com seu cliente, deve cumprir normas explícitas que
podem vir a desagradar críticos e telespectadores. Um exemplo curioso disso
aconteceu no quadro “Sem Controle” do programa Armazém 41, exibido pelo
canal GNT, no qual os apresentadores Marcelo Madureira e Arthur Dapieve agem
como ombudsmen, comentando e criticando a programação do canal. No episódio
do programa que foi ao ar no dia 3 de maio de 2004, Madureira criticou a escolha
do legendador para traduzir a palavra whore, no episódio “Lady Lisa” da série
inglesa Tudo é possível! (Faking it). O tradutor, seguindo a norma de amenizar a
linguagem em todas as situações, optou pelo uso de “vadia”, o que levou
Madureira a argumentar que a palavra whore em inglês tem uma carga semântica
muito mais pesada do que “vadia”, chegando inclusive a chamar a atenção dos
tradutores por amenizar palavras de baixo calão nos programas do canal, sem
saber que essa é uma orientação passada aos legendadores pelo próprio GNT
25
.
25
As palavras de Marcelo Madureira foram: “Você não pode botar legenda que não corresponde
ao diálogo verdadeiro e real.”
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50
Recorrer a generalizações, não nacionalizar referências e amenizar a
linguagem são apenas três das inúmeras normas impostas pelos grandes clientes e
com as quais os legendadores têm de lidar. Existem ainda várias outras, como não
fazer merchandising nem apologia ao consumo de drogas; não datar referências na
tradução, e evitar palavras rebuscadas e de uso raro na linguagem popular. Diante
de tantas normas e mecanismos de controle que regulam a tradução para
legendagem, uma das tarefas do professor é apresentá-los aos aprendizes e discutir
em sala as soluções possíveis, fornecendo dessa forma aos futuros profissionais o
aparato crítico para levá-los a inferir que tipo de estratégia deve ser empregada
para resolver problemas tradutórios (Arrojo, 1993: 147). No próximo capítulo,
apresentarei ainda outras normas de caráter lingüístico que vigoram no mercado
de legendagem brasileiro.
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4
O profissional de legendagem: competências e mercado de
trabalho
As peculiaridades da legendagem descritas no capítulo anterior sugerem
que, além das competências necessárias a todo tradutor, como excelente domínio
das línguas envolvidas na tradução e das ferramentas de pesquisa, conhecimento
das técnicas e das diferentes estratégias tradutórias, e cultura geral, o aprendiz de
legendador deve desenvolver certas habilidades e competências específicas.
Neste capítulo, examino essas habilidades e competências, tomando como
base a minha experiência, que é complementada por entrevistas realizadas com
professores e alunos de cursos de legendagem e o diretor de uma das três maiores
produtoras de legendagem do Rio de Janeiro.
4.1
Habilidades valorizadas pelo mercado
Yves Gambier (2003), um dos autores mais respeitados da área da
tradução audiovisual ao lado de Henrik Gottlieb e Jorge Díaz Cintas, cita na
introdução a um volume especial da revista The Translator, organizado por ele e
inteiramente dedicado à tradução audiovisual, as habilidades necessárias a um
tradutor para legendas:
Legendadores devem [...] ser capazes de trabalhar pressionados por prazos muito
curtos e lidar com o estresse; têm de desenvolver a competência especial de
escrever para a mídia (ter noção de timing e ritmo); têm de ser competentes em
análise, paráfrase, síntese e pós-edição (respeitando coerções temporais e
espaciais) [...]; têm de se adaptar a novas tecnologias e, por fim, têm de ter uma
grande capacidade de se auto-avaliar para tomar decisões rápidas e assumir a
responsabilidade pela qualidade de seu trabalho
26
. (p. 184)
26
Screen translators have to [...] be able to work under intense time pressure and cope with stress;
they have to develop special competence in writing for the media (sense of timing and rhythm);
they have to be competent in analysis, rewriting, condensing, post-editing (within time and space
constraints) [...]; they have to adapt to new technology and, finally, they have to have a strong
capacity for self-evaluation in order to make fast decisions and to take responsibility for the quality
of their output.
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52
Além das características apontadas por Gambier, eu destacaria ainda que o
legendador deve ter noções de linguagem cinematográfica, ser capaz de se
expressar nos diferentes registros da língua de tradução, saber identificar e
interpretar todos os canais envolvidos na comunicação polissemiótica, dominar as
ferramentas de pesquisa específicas ao seu trabalho, desenvolver a atenção aos
detalhes, ser capaz de adequar-se às normas e saber estabelecer prioridades. Para
tratar dessas habilidades e competências, classifiquei-as em quatro categorias
principais, listadas a seguir.
4.1.1
Competência lingüística
A maioria dos autores que tratam do ensino de legendagem defende que a
ênfase principal do curso deve ser no aspecto lingüístico, uma vez que os
aprendizes demonstram as maiores dificuldades nesse campo (Sponholz, 2003:
35). De fato, as demandas particulares da tradução para legendagem apresentam
muitos desafios ao aprendiz no nível lingüístico, mas eu diria que a dimensão
técnica do ofício também o faz, o que me leva a defender a criação de um curso
que enfatize igualmente tanto a dimensão lingüística quanto a dimensão técnica da
legendagem, que será abordada na Seção 4.1.2.
Uma das maiores dificuldades da tradução para legendas provém de sua
natureza diagonal, que exige a mudança do código oral para o escrito. Em relação
ao grau de formalidade que se deve adotar no texto das legendas — se uma
linguagem-padrão, mais próxima da norma culta, ou uma linguagem que tente
reproduzir características do discurso oral, como o uso de contrações, interjeições
e marcas de oralidade, como por exemplo a mistura, na mesma fala, do pronome
de tratamento “você” com o pronome pessoal oblíquo “te” —, de uma maneira
geral os estudiosos concordam que o compromisso maior deve ser com o código
escrito. Essa preferência se deve a vários fatores, o principal deles sendo o já
mencionado estranhamento que a reprodução da linguagem oral causaria. Há
ainda outros fortes argumentos em favor do uso da norma culta na legendagem.
Segundo Ivarsson & Carroll (1998), “a linguagem [das legendas] deve ser
(gramaticalmente) ‘correta’, uma vez que as legendas servem de modelo para o
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53
letramento”
27
, e algumas pesquisas mostram que programas legendados ajudam na
alfabetização da população local e de estrangeiros residentes na cultura de
chegada (cf. Carvalho, 2005). Além disso, os grandes clientes (Globosat, HBO e
Fox são alguns exemplos) explicitam em manuais de padrões, às vezes de forma
pormenorizada, suas exigências em relação às normas gramaticais. Vejamos dois
exemplos retirados do manual de Padrões da Globosat (2007: 3-4, 13-4),
desenvolvido pelo Departamento de Legendagem da programadora com a
colaboração do professor Sérgio Nogueira Duarte:
linguagem informal
aceitáveis:
- contração da preposição de com pronome pessoal reto, artigo ou pronome
demonstrativo
exemplo: Chegou antes dele voltar.
- contração da preposição em com artigo indefinido: num, numa
- contração da preposição para: pra
- preposição omitida antes da conjunção integrante que
exemplos: certificar-se que; ter medo que; chegar à conclusão que
- pronome átono em início de frase
exemplo: Me faça um favor.
- verbo precisar sem a preposição de
exemplo: Ela tem o que precisa.
(artigo o como complemento do verbo ter)
pronomes
- em programas informais, evitar construções com nome pessoal oblíquo
átono (quando possível)
exemplo: Alguém os está chamando.
preferível: Alguém está chamando vocês.
exemplo: Esta cultura as está seduzindo.
preferível: Esta cultura está seduzindo as meninas.
- com pronome relativo que – não omitir a preposição antes
exemplo: na vez em que
- não misturar pronomes da 3ª pessoa com pronomes da 2ª (você e te), a
não ser em contextos muito informais e específicos
Os exemplos acima mostram até que ponto a Globosat permite o uso da
linguagem informal na tradução de seus programas. Nota-se que uma marca clara
de oralidade, como a mistura de pronomes de tratamento, é permitida apenas em
contextos específicos. Outra orientação presente no mesmo manual revela que
uma linguagem mais rebuscada também deve ser evitada:
27
The language should be (grammatically) “correct” since subtitles serve as a model for literacy.
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54
Linguagem
- Em filmes e programas mais populares, evitar termos raros (ex: altercação,
perpetrar, quiçá). Optar sempre pelas formas mais usuais.
- Em documentários como “Quebrando o Código Da Vinci”, do GNT, termos
mais eruditos são aceitáveis. (ibidem, p. 24)
Como se vê, cabe ao legendador analisar o conteúdo do programa para
então julgar se deve utilizar uma linguagem mais sofisticada ou mais popular, sem
“abusar” das marcas de oralidade nem utilizar construções cuja formalidade
excessiva possa causar rejeição por parte do público telespectador. Um exemplo
disso é o emprego do futuro do presente e do pretérito mais-que-perfeito, formas
verbais bastante utilizadas em legendagem pelo fato de ocuparem menos espaço
do que as formas compostas (“trarei” é mais curto do que “vou trazer” e
“trouxera” é mais curto do que “tinha trazido”, por exemplo).
Os exemplos apresentados nos levam a concluir que a norma lingüística
mais amplamente adotada no mercado de legendagem brasileiro é o uso do
discurso semiformal, ou seja, de um registro que incorpora algumas marcas de
oralidade sem no entanto desrespeitar as regras do português padrão. Faz-se
necessário, portanto, que o aprendiz de legendador desenvolva o domínio dos
diferentes registros do português.
No Capítulo 3, vimos que as legendas são regidas por restrições espaciais e
temporais. Em conseqüência disso, há casos em que até 50% do texto original tem
de ser excluído da tradução, o que deixa claro que o poder de síntese é uma das
competências mais importantes a serem desenvolvidas por um bom legendador. A
habilidade de traduzir já de uma forma resumida também é necessária para que o
tradutor ganhe agilidade, uma vez que os prazos do mercado de legendagem são
sempre exíguos. Não é prática corrente, por exemplo, traduzir por completo um
roteiro e só depois, com base no tempo disponível para cada legenda, resumir o
texto. Essa habilidade de descartar as informações que não são essenciais ao
entendimento durante a tradução pode ser trabalhada através de atividades que
auxiliem o aprendiz a desenvolver poder de síntese, a discernir o que é mais
importante e a identificar os diferentes ritmos de fala e estilos de programas.
Gambier (2003) aponta a necessidade de o legendador desenvolver a
competência de escrever para a mídia. De fato, é crucial que o aprendiz seja
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55
apresentado às técnicas de redação para telejornalismo, pois, assim como a
legendagem, o texto telejornalístico é marcado pela instantaneidade, restringido
por coerções temporais e deve ser claro, conciso e conter predominantemente
orações em ordem direta e coordenadas. Por outro lado, como algumas estratégias
adotadas na redação telejornalística são completamente diferentes daquelas
utilizadas em legendagem, é necessário que o legendador conheça essas diferentes
estratégias e saiba aplicá-las. Tratarei desse assunto de forma mais aprofundada
no Capítulo 5.
4.1.2
Competência técnica
Conforme defendi na seção anterior, as competências técnica e lingüística
devem ter o mesmo peso no esboço de curso de formação de legendadores
proposto nesta dissertação. Tanto a minha experiência pessoal quanto os
depoimentos dos professores de cursos de legendagem reunidos nas seções 4.2 e
no Capítulo 5 confirmam que, sem um conhecimento profundo da dimensão
técnica do ofício, a formação do tradutor para legendas fica incompleta,
dificultando sua inserção no mercado.
Atualmente, um dos maiores problemas enfrentados pelas produtoras de
legendagem é a dificuldade de convencer os legendadores a respeitarem o limite
máximo de caracteres por segundo. Essa dificuldade se dá por vários motivos,
sendo o principal deles a flexibilidade oferecida pelos programas de legendagem
mais utilizados no Brasil. Explico: esses softwares ou são estrangeiros —
Systimes/Subtitler é venezuelano; o Subtitle Workshop, uruguaio; o Cavena,
sueco — ou baseados em sistemas estrangeiros — o Horse, brasileiro, foi
desenvolvido com base nas configurações de limite de caracteres do Systimes 6.0.
Como são utilizados por legendadores do mundo todo, o número máximo de
caracteres permitidos por segundo é configurável, pois esse limite varia muito de
cultura para cultura. No Brasil, hoje, trabalha-se principalmente com a
configuração básica de 15 caracteres por segundo. Em sua dissertação de
Mestrado, Souza (1999) fornece um breve panorama das discussões sobre o tempo
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56
ideal para a leitura de legendas. Ele explica que Gonçalves
28
chegou ao valor de
10,67 caracteres por segundo tomando como base estudos europeus sobre
velocidade de leitura. Em 1994, o dinamarquês Gottlieb falava em 10 caracteres
por segundo (1994a: 111). Já em 1998, o mesmo Gottlieb incluiu no verbete
“Subtitling” da enciclopédia da Routledge, organizada por Mona Baker, a
informação de que “valores maiores do que 12 caracteres por segundo (cps) não
são aceitáveis”
29
(1998: 247). Apesar disso, a configuração padrão do programa
Subt-It, desenvolvido pelo tradutor venezuelano Carlos Contreras, é de 20
caracteres por segundo. Depois de apresentar o parâmetro “ideal” de 10,67
caracteres por segundo, o próprio Souza ressalva que “as TVs por assinatura
brasileiras estão operando com padrões discrepantes e pouco rígidos e com
legendas que exigem uma leitura bem mais rápida que a apresentada por esses
parâmetros” (1999: 51), para logo em seguida comentar que, em um curso
oferecido à época por uma produtora carioca, os professores trabalhavam com o
parâmetro de 15 caracteres por segundo.
É bem provável, embora não se possa afirmar de forma indiscutível, que
esse parâmetro tenha sido herdado da configuração do Systimes 4.0, o software
adotado pela Globosat quando da criação de seu departamento de legendagem.
Baseada em linguagem DOS, essa versão do programa era “engessada”, e só
permitia que o legendador extrapolasse o número máximo de cerca de 14
caracteres por segundo caso o fizesse deliberadamente. O que acontecia era que o
programa emitia um sinal sonoro quando o limite máximo de caracteres era
extrapolado, advertindo o tradutor. Se este quisesse manter o erro, teria de dar um
comando para que o programa ignorasse tal erro, digitando manualmente o tempo
de saída, o que resultaria em uma legenda com o tempo de leitura comprometido.
Aquela legenda fora do padrão constaria do relatório final fornecido pelo
programa como uma legenda com “erro de mínimo”, ou seja, estaria extrapolando
o limite de caracteres máximo permitido por segundo. Esse recurso do Systimes
4.0 era muito útil, pois forçava os tradutores a já pensarem na forma mais sintética
de traduzir o original para driblar o “apito” do programa e evitar o esforço
adicional de ter de digitar o tempo desejado para a saída da legenda.
28
GONÇALVES, J.L.V.R. (1998) Processos inferenciais relacionados à priorização de
informações na tradução de legendas de filmes: o redundante e o relevante sob a ótica do
princípio de relevância. Dissertação de Mestrado. Universidade Federal de Minas Gerais.
29
presentation rates of more than 12 characters per second (cps) are not acceptable.
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57
A versão 4.0 do Systimes é considerada obsoleta, pois, entre outras
limitações, não possui precisão de frames. Isso significa que só é possível marcar
o tempo de uma legenda em segundos “cheios”, sem indicar as frações (os
frames), o que muitas vezes leva à dessincronização da legenda em relação à fala
a que se refere. A explicação ficará mais clara através do exemplo abaixo:
Tempo de entrada/saída Fala Duração
10:16:53:16/10:16:54:14 Not at all. 00:28
Para que a legenda ficasse perfeitamente sincronizada com a fala acima, ela
deveria surgir na tela no tempo de entrada indicado no roteiro (10 horas, 16
minutos, 53 segundos e 16 frames) e desaparecer no tempo de saída indicado (10
horas, 16 minutos, 54 segundos e 14 frames), permanecendo na tela durante 28
frames (dois frames a menos do que um segundo completo, uma extrapolação
aceitável do limite mínimo de permanência na tela de uma legenda composta por
uma palavra apenas). Como o Systimes 4.0 reconhece somente minutos e
segundos, o legendador teria de escolher entre duas opções para marcar — ou
timear — sua legenda traduzida:
Opção Tempo de
entrada/saída
Legenda Duração
1 16:53/16:54 Não. 1 segundo
2 16:54/16:55 Não. 1 segundo
Escolhendo a primeira opção, a legenda surgiria na tela meio segundo antes do
início do enunciado oral correspondente (“Not at all”) e desapareceria meio
segundo antes do final do enunciado. Se o legendador ficasse com a segunda
opção, a legenda entraria meio segundo depois do início do enunciado oral e sairia
meio segundo depois do fim do mesmo. Nos dois casos, a legenda ficaria
dessincronizada em relação à fala correspondente, o que, além de causar
incômodo ao telespectador, poderia produzir um “efeito cascata”, levando à
dessincronização de várias legendas subseqüentes.
Devido principalmente a essa limitação, a versão 4.0 do Systimes foi aos
poucos sendo substituída por versões mais avançadas ou por outros programas, e
deixou definitivamente de ser utilizada por volta do ano 2000, quando a precisão
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58
de frames passou a ser uma exigência do mercado. No entanto, ao contrário do
Systimes 4.0, os novos programas não impedem, por exemplo, que uma legenda
cheia de duas linhas (com cerca de 60 toques) permaneça apenas dois segundos na
tela, o que seria um tempo insuficiente para que fosse lida, até mesmo pelo mais
ágil dos leitores. Conseqüentemente, os aprendizes que começam a legendar
utilizando um desses softwares têm dificuldade de entender e respeitar o limite
máximo de caracteres por segundo. Portanto, é necessário que em um curso de
formação de legendadores o professor insista na importância de se respeitarem as
coerções espaço-temporais e dê ênfase especial ao desenvolvimento da
competência técnica para que, uma vez no mercado de trabalho, o tradutor não
produza legendas fora dos parâmetros, desrespeitando assim as normas vigentes.
Segundo Carvalho (2005),
[v]iolar alguma das regras [...] — não cumprir o prazo combinado, empregar
palavras censuradas ou exceder o espaço ou o tempo permitido para as legendas,
por exemplo —, principalmente quando elas são fornecidas por escrito, pode
trazer conseqüências graves ao tradutor, visto que afetam as atividades
subseqüentes do processo e, desse modo, prejudicam os compromissos assumidos
pela produtora ou laboratório local com seu cliente. (p. 87)
Gambier (2003) também aponta como habilidade necessária ao legendador
a agilidade para se adaptar a novas tecnologias. De fato, os equipamentos de que o
tradutor para legendas deve dispor mudaram muito na última década. Em 1998, os
tradutores da Globosat e da HBO Brasil operavam um computador com monitor,
além de um televisor e um aparelho de videocassete. Os tradutores da HBO
usavam um controle remoto para operar o videocassete, enquanto que os
tradutores da Globosat contavam com a facilidade de um pedal adaptado ao
aparelho. Esse pedal permitia que os comandos play, fast-forward e rewind
fossem dados com o pé, deixando as mãos livres para digitar
30
. Em pouco menos
de dez anos, muita coisa mudou. O processo de gravação de uma fita VHS a partir
da fita Betacam foi substituído pela digitalização dos arquivos de vídeo, o que
acabou por aposentar o videocassete e o televisor. Com os arquivos digitalizados,
o único equipamento necessário para a elaboração de legendas passou a ser o
computador, com os programas próprios para legendagem instalados. Quando a
precisão de frames passou a ser exigida pelos clientes e o Systimes 4.0 foi
30
Dados fornecidos por Souza (1999).
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59
substituído por versões mais avançadas ou por novos programas, no Rio de
Janeiro, o departamento de legendagem da Globosat já havia sido extinto, e a
maioria dos legendadores estava trabalhando em casa, por prestação de serviço,
ainda utilizando o Systimes 4.0. Como os novos softwares não eram fornecidos
gratuitamente pelas empresas contratantes dos serviços dos legendadores, vários
deles preferiam finalizar o trabalho (timear e revisar seus programas) nas
dependências das produtoras, para não ter de arcar com o alto custo dos novos
softwares. O primeiro momento dessa transição foi bastante traumático, pois
alguns tradutores demonstraram resistência às novas tecnologias, principalmente
porque o treinamento oferecido pelos desenvolvedores se limitava a uma
apresentação superficial dos novos programas. Para contornar esse problema e não
perder tradutores com vasta experiência em legendagem, as produtoras cariocas
começaram a contratar marcadores, também chamados de “timeadores”,
profissionais que apenas marcam a entrada e a saída das legendas elaboradas pelos
tradutores.
Esse sistema de marcação das legendas por outro profissional é o mais
comum no mercado de São Paulo. No entanto, ele só funciona bem se as legendas
são produzidas por legendadores experientes, com uma noção de ritmo apurada e
um ótimo poder de síntese, pois os marcadores geralmente não têm autorização
para modificar o conteúdo das legendas.
O alto custo dos softwares mais modernos criou um outro problema.
Segundo um dos informantes desta pesquisa, o Professor B,
devido às leis de proteção de direitos autorais, os alunos têm poucos programas
disponíveis para apreciação. Embora eu já tenha tentado obter licenças
específicas para fins didáticos, os autores dos softwares mais utilizados não
disponibilizaram as licenças.
A conseqüência disso, em um primeiro momento, foi que os professores de
legendagem, tão importantes naquela fase de transição, só podiam contar com o
Systimes 4.0, já obsoleto, ou simplesmente não apresentavam nenhum programa
de legendagem aos alunos, o que gerava insatisfação, como veremos mais adiante,
uma vez que os cursos não preparavam os aprendizes para a realidade do
mercado.
Esse problema só foi solucionado com o advento do Subtitle Workshop,
software desenvolvido pela empresa uruguaia Urusoft, o qual pode ser baixado
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60
gratuitamente da Internet. Mais uma vez, produtoras, legendadores e professores
tiveram de se adaptar a uma nova tecnologia, prova de que essa é uma
característica intrínseca do mercado de legendagem. As facilidades que o Subtitle
Workshop oferece o transformaram em um dos softwares mais utilizados em
cursos de legendagem. Como o programa é gratuito, os aprendizes podem baixá-lo
em casa para praticar. Assim, o professor pode dividir a parte prática do curso
entre atividades em sala e exercícios para casa, o que dá mais dinamismo às aulas
e produz resultados mais rápidos. Além do software uruguaio, alguns professores
também utilizam o Horse, programa que tem a vantagem de ter sido desenvolvido
pela brasileira Juliana Freire, que lança versões atualizadas com base nas
necessidades apontadas por seus clientes. No entanto, o Horse acabou perdendo
espaço no mercado para o Subtitle Workshop pelo fato de sua desenvolvedora não
disponibilizar uma versão para uso didático.
O breve histórico que acabei de apresentar deixa claro que, num mercado
em que novos programas e mídias se apresentam constantemente, a capacidade de
adaptação a novas tecnologias por parte dos profissionais é indispensável.
4.1.3
Competência rítmica
Segundo Mary Carroll (2004), o legendador geralmente traduz e elabora
legendas levando em conta três ritmos: (i) o ritmo visual do filme, definido pelos
cortes; (ii) o ritmo das falas dos atores; e (iii) o ritmo de leitura do público.
Aprendendo a identificá-los, o aprendiz ganha em agilidade, pois, na hora de
sincronizar as legendas elaboradas, não precisará fazer tantas adaptações para que
elas caibam no tempo disponível. Além disso, o bom legendador deve ter noções
de edição de áudio e vídeo, saber identificar os canais envolvidos na comunicação
e os diferentes formatos e gêneros de programas (aventura, romance, musical,
comédia, documentário, infantil, jornalístico, talk show e reality show, entre
outros).
A razão entre o tempo de duração de cada legenda e o número máximo de
caracteres que ela deve conter varia em função do público-alvo. Como já vimos,
no mercado brasileiro de legendagem para TV predomina a norma de que um
telespectador adulto médio lê no máximo quinze caracteres por segundo. Pouco se
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510566/CA
61
fala sobre o ritmo de leitura de crianças e o de consumidores de programas
legendados em inglês americano, por exemplo, não acostumados à leitura de
legendas. Os estudos que tratam da velocidade de leitura de legendas costumam
recomendar que se adapte ao público-alvo o número máximo de caracteres
permitidos por segundo, sem no entanto sugerir um valor. É necessário que o
professor do curso de formação de legendadores conscientize os aprendizes sobre
as diferentes estratégias de que lançarão mão na tradução de programas para
públicos-alvos distintos, uma vez que os clientes, principalmente os eventuais,
como pequenas produtoras que encomendam versões legendadas de seus produtos
para línguas estrangeiras, nem sempre estão familiarizados com as normas de
legendagem, deixando a responsabilidade pela qualidade do produto final
totalmente a cargo do legendador. No Capítulo 5, proponho alguns exercícios para
o desenvolvimento da competência rítmica.
4.1.4
Competência cultural
Entre as quatro competências básicas necessárias ao tradutor para
legendas, a cultural é sem dúvida a mais difícil de ser desenvolvida. Em seu artigo
Teaching subtitling at university
31
(2001), Díaz Cintas sugere que “o cenário ideal
é que os estudantes possam escolher [o] módulo [de legendagem] quando voltam
do exterior, depois de passarem um ano mergulhados na língua e na cultura do
país estrangeiro”
32
(p. 8). Já Barbara Schwarz (2002) alerta que os produtos
audiovisuais são repletos de mensagens implícitas, tanto nos diálogos quanto nas
imagens presentes na tela. O legendador deve ser capaz de reconhecer essas
mensagens para decidir o que deve ou não ser explicitado para seu público-alvo.
Entre as mensagens visuais que podem aparecer na tela, a autora destaca marcos
geográficos ou arquitetônicos, como a Torre Eiffel; ícones da cultura de massa,
como da música pop ou da televisão (Jimi Hendrix, Bart Simpson); eventos
políticos ou históricos (o assassinato de John F. Kennedy) e símbolos de
importância política ou religiosa, como a suástica e a cruz católica. O legendador
31
Também publicado em: Training Translators and Interpreters in the New Millennium. Cunico,
S. (ed.), Porstmouth: University of Portsmouth.
32
[T]he ideal scenario is that students should be able to choose this module when they come back
from their year abroad, having been immersed in the language and culture of the foreign country.
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62
deve ser capaz de identificar essas mensagens e interpretá-las. Citando Katan
33
,
Schwarz ressalta que, nesse sentido, o legendador é um “mediador cultural”, pois,
além de conhecer a geografia, a história social e política recente da cultura-fonte e
de ter certa familiaridade com personalidades e produtos da cultura popular, ele
deve ter consciência de sua própria identidade cultural e da forma como ela pode
influenciar sua interpretação e tradução.
No contexto brasileiro, não são todos os aprendizes de tradução que têm
condições de passar algum tempo estudando no exterior, nem isso é um pré-
requisito dos bacharelados em Tradução, como parece ser na Roehampton
University of Surrey, na qual Jorge Díaz Cintas leciona. De qualquer forma,
apesar de ser uma experiência muito enriquecedora, parece ser consenso entre os
formadores que ter contato direto com a cultura da qual se traduz não é
imprescindível para que um aprendiz se torne um legendador de sucesso. Creio
que a competência cultural pode ser estimulada através de exercícios de análise
das referências presentes nos diferentes canais que compõem a mensagem
audiovisual.
4.2
A realidade do mercado
No presente trabalho, eu trato da realidade da tradução para legendagem
no Rio de Janeiro, mercado no qual estou inserida. No âmbito nacional, os
tradutores que trabalham com legendagem se concentram no Rio e em São Paulo,
mas o perfil dos dois mercados é bastante diferente. No Rio, predominam as
empresas que oferecem o serviço de tradução para legendagem em grande escala.
Essas empresas contam com equipes próprias de tradutores e revisores,
geralmente freelancers, e a finalização do serviço, ou seja, a gravação de uma fita
Betacam legendada, é feita na própria produtora. Em São Paulo existem poucas
empresas que oferecem esse serviço. No entanto, vários canais da TV fechada,
como TNT, MGM, Sony, AXN, WBTV e a rede HBO, trabalham com tradutores
autônomos residentes principalmente em São Paulo e em Miami, e contam apenas
com uma equipe interna que faz o controle de qualidade das traduções. Ao
33
KATAN, D. (1999) Translating cultures - an introduction for translators, interpreters and
mediators. Manchester: St. Jerome Publishing.
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63
contrário da Globosat, que ainda utiliza o processo de gravação das legendas em
fitas Betacam para a exibição de seus programas, as legendas dos canais acima
mencionados são transmitidas via satélite, o que dispensa a etapa de gravação das
mesmas em ilhas de edições especiais, equipadas com os hardwares e softwares
específicos para a legendagem.
Embora seja difícil reunir dados precisos sobre que parcela do mercado
cada cidade detém, e apesar de o Rio de Janeiro concentrar as empresas de
legendagem, segundo um dos entrevistados, o Diretor A,
mais ou menos metade das legendas produzidas no Brasil é feita em São Paulo e a
outra metade é feita no Rio. Muitos canais trabalham com tradutores brasileiros e
legendam seus programas em Miami, Los Angeles ou na Venezuela também.
Mas, no Brasil, Rio e São Paulo dividem o mercado mais ou menos igualmente.
Sendo assim, acredito que o mercado carioca, que concentra cerca de 50%
de toda a tradução para legendagem feita no Brasil, seja bastante representativo da
realidade brasileira.
Passo agora à análise dos dados obtidos por meio das entrevistas.
4.2.1
Análise dos dados
Como já foi dito na Introdução, os cursos de treinamento de legendadores
hoje existentes não têm como objetivo formar profissionais de legendagem, e sim
familiarizar os alunos com os aspectos técnicos, as regras e os padrões adotados
no mercado. Segundo o Professor A,
nenhum aluno que saia [do curso] tendo legendado umas duzentas legendas está
pronto para o mercado, porque eles demoram vinte horas pra traduzir duzentas
legendas, [o que] é completamente inviável profissionalmente. Não existe esse
tipo de prazo no mercado. Então eu sempre digo que eles precisam treinar mais.
[...] Eu aviso que o meu objetivo é passar nos testes [das produtoras]. Depois, há
um treinamento complementar com o software, as preferências e as normas das
produtoras.
O Professor B complementa:
Aqueles alunos que se destacam, se tiverem um monitoramento, podem, sim,
atuar no mercado. Até hoje, por causa da dinâmica do mercado, dos prazos
curtíssimos e das exigências das produtoras, ainda não vi um aluno sequer sair de
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64
um curso de vinte ou trinta horas e começar a trabalhar imediatamente [...]. O
monitoramento é essencial para que esse aluno se torne um profissional atuante
no mercado.
Todos os outros professores consultados mencionaram o treinamento
complementar na produtora como essencial para a formação de legendadores. O
motivo mais freqüentemente apontado por eles para a necessidade de
monitoramento foi a carga horária reduzida dos cursos que ministram, o que os
leva a ter de priorizar a parte técnica e as coerções da atividade, em detrimento de
uma atenção maior ao aspecto lingüístico da legendagem (cf. Seção 4.1.1).
Durante a análise das respostas dos alunos
34
, notei alguns dados curiosos.
Diante da pergunta 8 — “Você se sentiu preparado(a) para atuar no mercado de
tradução para legendagem após o término do curso?” —, doze informantes (52%)
responderam que não se sentiram preparados após o término do curso, cinco
(21,7%) mencionaram que se sentiram inseguros mas mesmo assim procuraram as
produtoras, e quatro (17,4%) se declararam preparados para atuar no mercado.
Vale lembrar aqui que esses números não são uma indicação de que os cursos de
legendagem existentes sejam falhos. Como os próprios professores declararam, o
objetivo deles é familiarizar os aprendizes com os conceitos básicos da tradução
para legendagem e prepará-los para os testes nas produtoras, e não propriamente
formar profissionais.
A tabulação das entrevistas revelou um outro dado interessante: na
resposta à pergunta 8, 18 alunos (78%) justificaram o fato de não terem se sentido
prontos para o mercado dizendo que os cursos dão apenas uma introdução, uma
base, e que a melhoria da qualidade do trabalho só acontece na prática da
atividade. Esse é um lugar-comum que se aplica a qualquer profissão, o que de
forma alguma significa que não tenha plena validade. Nenhum universitário deixa
a faculdade pronto para atuar no mercado de trabalho sem passar por um estágio
ou treinamento. No entanto, no caso específico do mercado de legendagem, o
problema da falta de preparo profissional é antigo e crônico, e o depoimento do
Diretor A fornece algumas pistas para entendermos o motivo:
34
Assim como ocorre no caso dos professores, embora haja alunos e alunas entre os entrevistados,
figuram todos aqui no masculino em razão do sigilo.
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65
As pessoas não levam a legendagem a sério, é um mercado ainda muito amador.
Como o nível da tradução para legendas no Brasil é baixo — já melhorou muito,
principalmente na parte técnica, mas ainda é baixo —, qualquer pessoa que saiba
um pouquinho mais de inglês pega erros de tradução [nas legendas]. Então, essa
pessoa, que fez dois anos de curso de inglês, acha que pode fazer melhor e se
inscreve num curso de legendagem. A gente sabe que esses cursos tratam da parte
técnica, ensinam a mexer nos softwares e ensinam a timear. A qualidade da
tradução como um todo não é avaliada. Então, essas pessoas chegam ao mercado
dizendo que sabem legendar, e até sabem, mas não sabem traduzir. Muitas vezes
não sabem nem português. Aliás, o nível geral de português é baixíssimo,
baixíssimo mesmo. É um problema até maior do que encontrar quem saiba
traduzir [...]. Também é muito comum recebermos currículos de pessoas que
querem trabalhar nas horas vagas para complementar o orçamento, porque têm as
tardes livres ou algo assim. São geralmente professores de inglês também sem
nenhuma experiência em tradução. É raro uma pessoa com esse perfil conseguir
trabalhar com legendagem, porque os nossos prazos são sempre curtos, e
precisamos de pessoas dedicadas e ágeis, que consigam trabalhar sob pressão,
com prazos apertados. Temos aqui vários casos de tradutores bons que desistiram
da legendagem porque não conseguiram se acostumar com os prazos.
De fato, na época do advento da TV por assinatura, em que a demanda por
legendadores aumentou muito, os cargos eram preenchidos por indicação, como
vimos na Introdução deste trabalho, e um curso superior de Letras, Tradução,
Comunicação ou áreas afins não era exigido dos candidatos. Hoje em dia, a
formação acadêmica, apesar de preferencial, continua não sendo uma exigência
das produtoras que contratam os serviços de legendadores. Sendo assim, pessoas
das mais diversas formações, de arquitetos a psicólogos, se aventuram no mundo
da legendagem sem ter nenhuma base teórica ou experiência em tradução e,
muitas vezes, com um conhecimento bastante deficitário do português. Nos cursos
de treinamento disponíveis, ter experiência tradutória comprovada não é uma
exigência, nem mesmo nos módulos de legendagem incluídos em programas de
pós-graduação lato sensu, pois pressupõe-se que os candidatos dominem as duas
línguas envolvidas na tradução e saibam identificar as diferenças entre os registros
oral e escrito, o que nem sempre acontece. O Professor A mencionou em sua
entrevista uma dificuldade que enfrenta devido à falta de experiência tradutória de
alguns de seus alunos.
A minha principal dificuldade é que eu acho que a pessoa tem que ter uma boa
dose de autonomia em tradução para depois fazer legendagem, e muitas vezes não
é o caso. Tem aluno que tem dúvidas básicas de tradução [...], mas isso acaba
tendo que ser contornado. [...] Quem não tem experiência não consegue, ao longo
das vinte ou quarenta horas, desenvolver muito a legendagem por problemas de
tradução. Tem gente que, no final, faz cinco minutos, legenda e sincroniza, mas a
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66
tradução está completamente inaceitável, ou seja, não poderia entrar no mercado,
não por questões técnicas, mas porque não está apto a traduzir.
A heterogeneidade do perfil dos candidatos que procuram os cursos ou as
produtoras leva ao amadorismo mencionado pelo Diretor A. Como geralmente
nenhum pré-requisito é exigido, é o próprio candidato quem avalia se o seu
conhecimento das duas línguas envolvidas é suficiente para que almeje se tornar
legendador. Por esse motivo, é muito comum que alguns deles recebam com
grande surpresa a notícia de que foram reprovados nos testes, seja porque
apresentam traduções inaceitáveis ou porque têm um nível de português
insatisfatório.
Na Gemini Vídeo, os candidatos a legendadores submetem-se a uma
seleção dividida em duas fases: a primeira, escrita, envolve tradução e português;
na segunda, prática, o candidato deve traduzir um trecho de quatro minutos de um
programa, respeitando as coerções espaço-temporais da legendagem. Para a
tradução dos primeiros dois minutos, o candidato tem o auxílio do roteiro original.
O restante do teste deve ser tirado de ouvido. Mesmo após serem aprovados
nessas duas fases, noto nos cursos que ministro na empresa que os aprendizes
muitas vezes demonstram falta de intimidade tanto com as regras do português
quanto com as ferramentas de pesquisa em geral, como dicionários, gramáticas,
manuais e a Internet.
O Diretor A mencionou em seu depoimento que um dos maiores
problemas que as produtoras enfrentam na hora de recrutar novos legendadores é
a deficiência em português demonstrada pelos candidatos. O Professor A também
comentou a dificuldade que alguns aprendizes apresentam no que se refere a
diferenciar o registro oral do escrito.
Se eu tivesse muitas horas de curso, muito antes de entrar com legendagem, de
falar em legendas, um bom exercício é transpor um texto oral em forma escrita.
Então, transcrição é uma coisa que parece simples mas não é. Perceber que é você
quem decide como redigir, como pontuar, como interpretar aquilo na forma
escrita. Tem uma linguagem que é escrita e uma linguagem que é oral. Isso é um
problema sério da legendagem, do qual as pessoas não se dão conta.
Eu acredito que esses dois problemas — a falta de experiência tradutória e
o pouco domínio do português demonstrado pela maioria dos aprendizes — sejam
os principais motivos da falta de preparo dos legendadores no nível lingüístico.
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67
Como veremos no Capítulo 5, uma maneira de contornar esses problemas seria
inserir o curso de formação de legendadores na grade curricular de um
bacharelado em Tradução. Dessa forma, as competências acima mencionadas
poderiam ser desenvolvidas em outras disciplinas do curso.
Em relação à pergunta 9 — “Você conseguiu se inserir no mercado após a
realização do curso?” —, dos 23 respondentes, apenas dez (aproximadamente
43%) conseguiram inserção imediata no mercado de legendagem; cinco destes
através de estágios em produtoras, com duração que variou entre seis meses e um
ano. Entre os outros cinco, um desistiu por ser um tradutor lento e, portanto, não
se adequar a uma das exigências do mercado; o segundo trabalha com revisão de
legendas; o terceiro é professor de inglês e aceita trabalhos de legendagem nas
horas vagas para complementar o orçamento; e os dois últimos enfrentaram meses
de trabalhos monitorados. Dos treze restantes, seis não conseguiram se inserir no
mercado, dois ainda não terminaram o curso, outros dois estão em fase de testes
nas produtoras e três precisaram fazer um curso de reciclagem de 30 horas
oferecido pela produtora aos legendadores cujos trabalhos estavam abaixo do
padrão exigido pelos clientes.
Esses números espelham a realidade do mercado. Vinte e dois por cento
dos alunos e ex-alunos consultados entraram no mercado através de estágios em
produtoras, um sinal de que a parceria entre as universidades e o mercado de
trabalho pode render bons frutos. Porém, a grande maioria dos ex-alunos de
cursos que conseguem se estabelecer no mercado só o faz após meses de testes e
trabalhos monitorados, o que onera as produtoras, obrigadas a destacar
profissionais já sobrecarregados para o treinamento dos novos legendadores,
treinamento esse que pode durar até um ano e nem sempre consegue aproveitar
um bom número deles.
Tendo identificado as maiores carências apresentadas pelos candidatos a
legendadores e as dificuldades enfrentadas pelos professores entrevistados, no
próximo capítulo proponho as bases para um curso de tradução para legendagem
que tem como objetivo principal desenvolver as competências e habilidades
necessárias para a formação de profissionais dessa modalidade de tradução,
procurando oferecer uma alternativa ao caráter de treinamento associado aos
cursos hoje disponíveis.
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5
Tradução para legendagem na universidade
A proposta de programa esboçada no presente trabalho está voltada para a
universidade, não só por acreditar que este seria o locus ideal para a formação de
tradutores em geral e de legendadores em particular, mas também porque o
programa de uma disciplina de tradução para legendagem vinculada à
universidade será distinto daquele de um curso livre. Como mencionei no final do
Capítulo 4, no curso inserido num bacharelado em Letras com habilitação em
Tradução, algumas habilidades necessárias ao legendador, como domínio dos
diferentes registros do português e competência tradutória, seriam desenvolvidas
também em outras disciplinas. Em um curso livre, ou essas competências teriam
de ser trabalhadas durante as aulas, o que demandaria uma carga horária maior do
que a da disciplina inserida na universidade, ou os candidatos sem tais pré-
requisitos teriam de ser eliminados no processo de seleção. Ressalto ainda que não
se trata de um programa fechado, com plano de aulas completo, como é o caso do
livro Traduzir com autonomia — estratégias para o tradutor em formação, de
autoria de Fábio Alves, Célia Magalhães e Adriana Pagano. Nele, os autores
apresentam, de forma detalhada, atividades para o desenvolvimento de estratégias
de busca de subsídios e análise textual e propõem um modelo didático do
processo tradutório a ser utilizado na formação de tradutores. O meu objetivo com
uma proposta em linhas gerais é apontar caminhos para a definição de uma
possível didática para a formação de legendadores que vá além de um simples
treinamento focado nos aspectos técnicos da legendagem e nos padrões vigentes
no mercado.
5.1
O ensino de TAV nas universidades européias: uma história de
sucesso
Já vimos que a situação do ensino de tradução audiovisual na Europa
mudou muito nos últimos anos. Segundo Díaz Cintas & Orero (2003), enquanto
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510566/CA
69
até recentemente a TAV só podia ser aprendida na prática e com pouco apoio da
academia, o quadro hoje é bem diferente, e pelo menos 24 universidades
européias oferecem módulos inteiros dedicados a alguma modalidade de tradução
audiovisual, inseridos no currículo de seus cursos de Tradução (pp. 371-2). A
maior parte das disciplinas é voltada para estudantes do último ano da graduação,
porém a Universidade Autônoma de Barcelona, o ISTI (Institut Supérieur de
Traducteurs et Interprètes) e as universidades de Lille, Manchester, Surrey, Leeds,
Bruxelas, Copenhague e Lampeter também oferecem cursos em nível de pós-
graduação
35
.
5.2
Proposta de um curso de formação de legendadores
5.2.1
Carga horária
É difícil determinar a carga horária ideal de um curso de formação de
legendadores. Experiências européias demonstram que a procura pelas disciplinas
de tradução audiovisual é tão grande que várias instituições de ensino superior
desenvolveram programas de pós-graduação para atender à crescente demanda
dos estudantes de Tradução por um maior aprofundamento. Em Maastricht, na
Holanda, a disciplina, originalmente ministrada no quarto ano, foi transferida para
o terceiro ano com o objetivo de abrir espaço para um curso avançado aos
interessados. Em Lampeter, no País de Gales, universidade pioneira no ensino de
legendagem, o curso de pós-graduação foi introduzido para complementar um
programa de graduação de sucesso (Sponholz, 2003: 60). O mesmo aconteceu na
Universidade Autônoma de Barcelona (UAB), como relatam Jorge Díaz Cintas e
Pilar Orero no artigo “Postgraduates courses in audiovisual translation”, no qual
examinam os programas de dois cursos de pós-graduação criados na UAB: o
primeiro, introduzido em 2001, é presencial, e o segundo é oferecido on-line
desde 2003. Segundo os autores,
35
Lista compilada a partir de Díaz Cintas & Orero (2003) e Sponholz (2003).
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70
[i]ncentivados pelo sucesso da experiência [na graduação] e pelo feedback
extremamente positivo que recebemos dos estudantes, decidimos que era hora de
embarcar numa aventura mais desafiadora: desenvolver e lançar um curso de
especialização em tradução audiovisual
36
. (2003: 374-5)
No Brasil, até onde pude verificar, nenhuma universidade possui em seu
currículo uma disciplina regular de tradução audiovisual em nível de graduação.
Na PUC-Rio, por exemplo, Tradução para Legendagem é uma disciplina optativa
do currículo da habilitação em Tradução do Bacharelado em Letras e faz parte de
um grupo integrado também por outras seis disciplinas: Técnicas de Tradução,
Tradução de Informática, Tradução Juramentada/Jurídica, Tradução Técnico-
Científica Avançada, Tradução Literária Avançada e Versão. A matéria de quatro
créditos, ou 60 horas-aula, entrou para a grade curricular no segundo semestre de
2005 e, apesar da grande procura, só voltou a ser oferecida no primeiro semestre
de 2007, por motivos de ordem econômica. Também inexiste no Brasil um
programa de pós-graduação em tradução audiovisual nos moldes europeus. O que
existem são módulos práticos de tradução para cinema e/ou para TV e vídeo nos
cursos de especialização em Tradução de algumas universidades, como PUC-Rio
e, mais recentemente, Universidade Gama Filho e Universidade de Franca,
trabalhando basicamente com os pares de línguas inglês/português (PUC-Rio e
Universidade de Franca) e espanhol/português (Gama Filho). No entanto, os
alunos que procuram esses cursos de especialização não estão necessariamente
interessados em tradução audiovisual.
De fato, quando cursei a especialização em Tradução da PUC-Rio, em
2002, que conta com dois módulos de tradução para legendagem — um de cinema
e outro de TV e vídeo —, notei que poucos colegas se interessavam por essa
modalidade de tradução. Mais tarde, como participante de dois dos painéis com
profissionais de tradução organizados anualmente pela Coordenação do curso para
discutir o mercado de trabalho (2003 e 2006), a pequena quantidade de perguntas
dirigidas a mim, representante do mercado de legendagem, revelou que o
entusiasmo dos alunos pela atividade não era grande. Um dos prováveis motivos é
a idade média dos estudantes de pós-graduação, sem dúvida bem mais alta do que
a da graduação. Os alunos de faixa etária mais alta, principalmente aqueles que já
36
Encouraged by the success of the whole experience and the extremely positive feedback we
received from students, we dicided it was time to embark on a more challenging adventure:
designing and lauching a specialized postgraduate course on audiovisual translation.
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71
têm experiência em tradução literária, depois de serem apresentados às coerções
espaço-temporais, aos softwares específicos, aos preços praticados e aos prazos da
legendagem, com freqüência desistem de tentar se inserir nesse mercado. Esses
alunos costumam ter menos conhecimento de informática, o que acaba gerando
frustração, tanto neles próprios quanto entre os mais jovens, já que o professor é
obrigado a investir tempo de aula com explicações desnecessárias para quem tem
maior intimidade com o computador. Gottlieb (1994b) também notou isso em suas
aulas de legendagem:
Analisando os resultados das minhas duas primeiras turmas de legendagem, que
somaram um total de 58 alunos, o único fator estatístico significante que leva a
bons resultados na legendagem é a “idade”. Os alunos mais jovens da
Universidade Aberta, com idade entre 25 e 39 anos, saem-se melhor do que seus
colegas de 40 a 59 anos. Na prática da tradução tradicional, maturidade costuma
ser considerada uma vantagem, mas, no caso da legendagem, nem a experiência
em tradução (literária) nem título(s) acadêmico(s) são indicativos seguros de
sucesso
37
. (p. 274)
Outro motivo do desinteresse dos tradutores mais maduros pela
legendagem é o conteúdo da programação da televisão fechada. Se na época do
advento da televisão por assinatura os programas internacionais exibidos nos
canais a cabo brasileiros eram mais sofisticados, com predominância de produtos
com mais conteúdo, como documentários jornalísticos, biografias de políticos,
celebridades e personagens históricas, hoje abundam desde seriados adolescentes
repletos de gírias e reality shows que acompanham participantes nas mais variadas
situações — do primeiro ano de faculdade de jovens ricos da Califórnia ao
trabalho de paranormais que supostamente livram casas mal-assombradas de
espíritos maléficos — até programas que mostram aprendizes de diversas
profissões disputando algum prêmio e humorísticos de “pegadinhas”, cujo
conteúdo dificilmente atrai uma faixa etária mais alta.
O fato de, como visto acima, os melhores candidatos a legendador não
serem os tradutores mais experientes, pelo contrário, é mais um motivo que me
leva a defender de uma formação de legendadores que se inicie na graduação.
37
Looking at the achievements of my first two subtitling classes, containing a total of 58 students,
the only statistically significant factor guiding good results in subtitling is ‘age’. Younger Open
University students, aged 25-39, fare better than their would-be colleagues in their forties or fifties.
In traditional practical translation, age is often considered a plus, but in the case of subtitling
neither previous (literary) translation experience nor academic title(s) are safe indicators of
success.
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72
Dessa forma, a competência tradutória e a discussão sobre os limites entre
precisão vocabular e tradução literal poderão ser desenvolvidas em outras
disciplinas específicas da habilitação. É essencial que o legendador saiba
identificar esses limites, pois a boa legenda é sintética, criativa e clara, ou seja, é
aquela que passa despercebida na medida do possível, uma vez que
inevitavelmente causa incômodo por cobrir parte da imagem. No nível lingüístico,
passar despercebida significa que quanto mais claro o texto traduzido for, e mais
próximo da estrutura sintática do original estiver, menos esforço cognitivo exigirá
do telespectador, principalmente daquele que possui algum conhecimento da
língua original. Uma das formas de se alcançar isso é tentar manter na tradução
palavras latinas facilmente identificáveis, para que a ilusão de que a tradução é o
alter ego do original seja mantida. No entanto, é muito arriscado dizer ao tradutor
aprendiz que não se deve, por exemplo, traduzir “complicated” como “difícil” sem
que ele interprete a dica como uma defesa da tradução literal, estratégia fadada ao
fracasso no caso da legendagem, cuja característica mais fundamental é tratar-se
de uma tradução centrada no conteúdo, na qual “as intenções e os efeitos são mais
importantes do que elementos lexicais isolados”
38
(Gottlieb, 1998: 247).
Pelos motivos acima descritos, e por acreditar que primeiro é preciso que
as universidades brasileiras reconheçam as diferentes modalidades de tradução
audiovisual como disciplinas que merecem inserção no currículo regular dos
bacharelados em Tradução, o curso que proponho foi pensado especificamente
para ser oferecido em nível de graduação, através de uma disciplina básica de
tradução para legendagem com 60 horas de carga horária, complementada por
uma disciplina optativa avançada de mais 60 horas, que teria como pré-requisito a
disciplina básica. O cálculo dessa carga horária se baseou principalmente em
minha experiência como professora da disciplina Tradução para Legendagem da
PUC-Rio e instrutora do curso de treinamento de quarenta horas oferecido pela
Gemini Vídeo.
Cabe aqui uma ressalva: estou propondo disciplinas de tradução para
legendagem por esse tratar-se do meu campo de atuação. No entanto, julgo a outra
modalidade principal de TAV, a dublagem, tão especializada quanto a
legendagem e, portanto, também merecedora de reconhecimento por parte da
38
intentions and effects are more important than isolated lexical elements.
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73
academia. A meu ver, só existem dois motivos que poderiam dificultar a inclusão
da tradução para dublagem como disciplina universitária regular. Primeiro, a
modalidade não desperta tanto interesse por parte dos estudantes quanto a
legendagem, pelo menos no momento atual; segundo, não oferece amplas
possibilidades de inserção no mercado de trabalho.
5.2.1.1
Duração das aulas
Estou ciente de que, para se encaixar no currículo de um bacharelado em
Letras com habilitação em Tradução, as disciplinas aqui propostas terão de se
adequar ao regime de horas de aula das universidades. Nos cursos diurnos de
graduação da PUC-Rio, por exemplo, cada aula é composta por dois tempos de
cinqüenta minutos e, nos noturnos, os tempos são de quarenta minutos. Na
Especialização, a quantidade de tempos fica a critério de cada curso,
resguardando-se as diferenças entre a hora-aula diurna e a noturna. Mesmo assim,
julgo ser relevante registrar a duração ideal de uma aula de tradução audiovisual.
No curso de treinamento da Gemini Vídeo, essencialmente prático, as
quarenta horas de aula são distribuídas em quatro semanas, totalizando dez horas
de aulas por semana, que são divididas em dois encontros de três horas durante a
semana e outro de quatro horas aos sábados. Em princípio, tanto as aulas de três
quanto as de quatro horas teriam intervalo, mas, nas duas últimas edições do
curso, os aprendizes preferiram dispensar o intervalo das aulas de três horas,
tamanho eram o interesse e entusiasmo que os exercícios despertavam. Portanto, a
duração média de três horas e meia (210 minutos, ou cerca de quatro tempos
seguidos de aula diurna na PUC-Rio) provou ser muito eficaz para o ensino de
tradução audiovisual, pois, apesar de parecer um tempo longo, os próprios alunos
preferem não “perder tempo” com intervalos.
Essa hipótese é confirmada por Díaz Cintas & Orero (2003), para quem a
duração de três horas consecutivas para aulas de módulos práticos de TAV é vital
para que os aprendizes tenham tempo suficiente para traduzir um trecho
substancial de um programa a cada encontro. Segundo os autores, os aprendizes
legendam em média cerca de cinco minutos de filme ou programa em duas horas.
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74
Assim, o professor tem uma hora para apresentar o tópico a ser estudado e
comentar as diferentes soluções propostas pelos alunos (pp. 377-8).
O Professor A, que dá aulas de dez horas seguidas nos fins de semana,
compartilha da mesma opinião: “Acho que três horas e meia é um ótimo tempo de
aula, com intervalo, e dá para absorver, ler e fazer exercícios em casa de uma aula
para outra.”
Para concluir, proponho que as aulas das disciplinas de tradução para
legendagem inseridas em universidades brasileiras sejam oferecidas em um
encontro por semana com duração aproximada de 200 minutos, o que equivaleria
a quatro tempos seguidos de 50 minutos.
5.2.2
Perfil do aprendiz e pré-requisitos
Idealmente, assim como acontece na grande maioria das universidades
européias, as disciplinas de tradução audiovisual devem ser oferecidas no terceiro
e quarto anos dos bacharelados em Tradução (ou equivalentes), que costumam ter
duração de oito semestres letivos em média. Dessa forma, os aprendizes já teriam
sido suficientemente expostos tanto às práticas quanto às teorias de tradução, e
também possuiriam os pré-requisitos listados no Capítulo 4 como necessários para
que as peculiaridades da tradução audiovisual pudessem ser mais bem exploradas
nas disciplinas específicas. Entre esses pré-requisitos estão competência tradutória
e domínio das técnicas de tradução, noções gerais de informática e profundo
conhecimento tanto do português — e de seus diferentes registros — quanto da
língua e da cultura fontes. Como foi dito na Seção 4.1.4, autores como Díaz
Cintas e Sponholz sugerem que os alunos se matriculem em disciplinas de
tradução audiovisual depois de passarem um ou dois semestres estudando no
exterior e “possuírem um profundo conhecimento da cultura a partir da qual farão
as legendas”
39
(Sponholz, 2003: 68), “uma vez que a maioria dos programas
audiovisuais é infestada de coloquialismos”
40
(Díaz Cintas, 2001: 8). É claro que
não se pode comparar a realidade socioeconômica européia à brasileira, nem
exigir como pré-requisito do universitário brasileiro um intercâmbio estudantil ou
39
possess a profound understanding of the culture from which they will mainly subtitle.
40
since most audiovisual programmes are plagued with colloquialisms.
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75
vivência no exterior, mas os aprendizes que puderem passar por tal experiência
provavelmente terão uma vantagem em relação aos colegas. No entanto, volto a
lembrar que essa vantagem pode ser substituída pela curiosidade, atenção aos
detalhes e sensibilidade a referências culturais. Frota (2006), refletindo sobre erros
e lapsos de tradução, resume bem como o professor pode estimular essas
habilidades. Segundo ela, o professor de tradução deve “desmistificar possíveis
idealizações de que o bom tradutor tudo sabe” (p. 142). E completa:
[o]s alunos de tradução precisam encarar com naturalidade [...] situaç[ões] de
ignorância e desenvolver ao máximo os recursos de consulta ou pesquisa.
Precisam ter consciência do benefício da dúvida, devem ser incentivados a
questionar os limites do conhecimento que supõem ter e a aprender onde e como
encontrar informações que possam ajudar nos seus trabalhos (ibidem).
Essa reflexão sem dúvida revela uma visão pós-estruturalista do ensino
que, como vimos no Capítulo 2, leva à formação de tradutores mais críticos,
seguros e independentes.
5.2.3
Teoria e prática
Em uma dissertação que investiga o ensino de tradução audiovisual na
Europa, Christine Sponholz (2003) dedica um capítulo ao exame do conteúdo dos
cursos oferecidos em diferentes universidades européias, concluindo que todos
têm forte orientação prática, sendo que a proporção média de teoria e prática é de,
respectivamente, 25% e 75% (p. 55). A estudiosa esclarece que a parte teórica dos
cursos cobre os princípios da legendagem, outras modalidades de tradução
audiovisual, estratégias específicas de tradução para legendagem, incluindo
aspectos lingüísticos, e o caráter polissemiótico da atividade. Alguns professores
entrevistados por Sponholz também apontam como pertencentes à parte teórica de
seus cursos exercícios de criação de roteiro e análise de diálogos de filmes (p. 56).
As afirmações de Sponholz revelam uma lógica dicotômica que vê a
prática como dissociada da teoria, o que, a meu ver, não é possível. A própria
descrição do que os professores europeus chamam de “parte teórica” dos cursos
sugere que, para eles, a teoria se limita a questões de âmbito mais restrito, como
os aspectos lingüísticos e as especificidades da legendagem, deixando de lado
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76
questões de cunho filosófico, no nível mais amplo proposto por Martins (1992) e
já apresentado no Capítulo 2.
Diferentemente dessa postura teórica que considero limitadora, adoto neste
trabalho uma abordagem de integração total entre teoria e prática. Essa abordagem
se manifesta de inúmeras formas. Primeiramente, o professor deve contextualizar
cada exercício proposto, definindo público-alvo e objetivos. Essa contextualização
servirá de base para as discussões das soluções e estratégias adotadas pelos
aprendizes (Martins & Frota, 1997). Estes, por sua vez, são estimulados a
justificar suas opções tradutórias e apontar as dificuldades identificadas durante a
tradução. A ênfase no processo do fazer tradutório leva os aprendizes a
desenvolver sua capacidade de (auto)crítica e de reflexão, dando-lhes maior
segurança e independência (ibidem). Incentivando as discussões em sala, o
professor estará mostrando aos aprendizes que não existe sempre uma única
tradução correta, mas diferentes opções — excetuando-se, obviamente, as
escolhas que não dão margem a questionamento na avaliação do grupo (cf. Frota,
2006) —, as quais devem ser julgadas de acordo com critérios previamente
definidos, e não isoladamente.
No curso de formação esboçado aqui, a teoria está presente o tempo todo,
fornecendo uma base para a experiência prática e complementando-a. Como
forma de promover essa integração, os aprendizes devem ser apresentados logo no
início do curso ao polissistema de tradução audiovisual, para que tomem
conhecimento de quem são os agentes envolvidos em todas as etapas do processo,
desde a contratação do serviço de tradução até a exibição do produto legendado.
Assim, estaremos privilegiando o processo tradutório como um conjunto de
procedimentos dos quais participam inúmeros profissionais e mostrando aos
aprendizes a importância de se contextualizar a tradução, definindo e
considerando o seu público-alvo, o seu objetivo e o veículo no qual será
divulgada.
5.2.4
O uso do Systimes 4.0 como ferramenta didática
Na Seção 4.1.2, destaquei a importância de se respeitarem as coerções
espaço-temporais características da legendagem. Os professores entrevistados,
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77
apesar de concordarem que a compreensão da relação espaço/tempo é essencial
para que o aprendiz tenha um bom desempenho num curso de legendagem,
divergem em relação à melhor forma de ensinar essas coerções. Vejamos o
depoimento do Professor C:
Não tenho tempo para usar o Systimes. Para que eu vou apresentar um programa
em DOS, que não é nada intuitivo, que não usa o mouse nem tem precisão de
frame? Vou perder um tempo absurdo explicando todos aqueles comandos, F1,
F2, F5... para depois virar para eles e dizer: “Agora esqueçam isso tudo, porque
ninguém mais usa esse programa.”
O Professor A revelou uma opinião semelhante:
Não chego nem perto do Systimes. Nem digo que ele existe. Primeiro, o Systimes
é zero amigável para aprender a usar e ele tem pouquíssimas funções, ele é chato.
Mas eu ando pela sala o tempo todo e apito o tempo todo. Eu vou olhando e
dizendo: “Isso aqui não cabe, isso aqui não dá para ler, conta de novo.” Eu peço
para eles voltarem umas dez legendas e vou dizendo o que está certo e o que não
está. Tudo acaba sendo monitorado. Realmente, o Subtitle Workshop te dá a
liberdade de fazer um absurdo se você quiser, mas eu estou ali para dizer que o
programa deixa, mas o cliente, não. Eu não tenho tempo para ensinar a usar um
programa e depois ensinar a usar outro.
A opinião dissonante é a do Professor B:
Eu costumo dizer que o Systimes 4 equivale ao caderno de caligrafia. Ele é a
melhor forma de fazer o aluno assimilar os padrões de tempo e caracteres, porque
não permite que ele extrapole o limite. Eu não ensino o F5
41
logo de cara. Deixo
que eles fiquem bem desesperados tentando resumir para caber tudo em 13, 14
caracteres por segundo e depois digo que tem uma saída, mas insisto que ela deve
ser usada com muita parcimônia. Eu uso o Systimes porque, sem a menor dúvida,
a maior habilidade necessária para que o aluno seja um bom tradutor de legendas
é a capacidade de síntese. Mas, por incrível que pareça, muita gente ignora isso,
inclusive autores dos softwares atuais. Se eu começo apresentando um Subtitle
Workshop, por exemplo, fica muito mais difícil fazer com que os alunos
respeitem a duração mínima da legenda, porque o programa permite qualquer
coisa.
O argumento dos professores A e C, de que não dispõem de tempo em
seus cursos para apresentar um programa pouco intuitivo e obsoleto, é forte. Por
outro lado, a liberdade oferecida pelos novos sistemas de legendagem significa
que os aprendizes têm de redobrar a atenção para não criarem legendas rápidas
demais, já que o programa não acusa isso durante a tradução (cf. Seção 4.1.2). Ao
41
F5 é o comando do Systimes 4.0 que permite que uma duração menor do que a indicada pelo
programa seja utilizada na legenda.
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78
longo do curso, os professores monitoram os aprendizes e, na avaliação, dão peso
maior às legendas que extrapolam o limite máximo de caracteres permitido por
segundo, mas, no dia-a-dia da profissão, os novatos deixam de dar atenção a essa
orientação. Faço essa afirmação porque apesar de um programa como o Horse,
utilizado pela maioria das produtoras cariocas, oferecer um relatório final com
vários tipos de erros, inclusive os “de mínimo”
42
, muitos legendadores o ignoram,
ou por não terem conhecimento desse relatório, ou por não saberem configurar o
programa de forma a não permitir que se ultrapasse o limite de 15 caracteres por
segundo, uma vez que a configuração padrão do Horse “importou” um erro do
Systimes, como explica o Professor D:
O Systimes 6.0 utiliza o conceito de spread, que pode ser traduzido como
"tolerância", para marcação de tempo. É possível especificar como aceitável o
timing de 13 caracteres por segundo com spread de 20%. Ora, isso é o mesmo
que dizer que o tempo aceitável é o de 15,6 caracteres por segundo, pois do ponto
de vista prático, o que interessa são os erros de mínimo. [...] O Horse, que foi
criado com base nos Systimes 4.0 e 6.0, transportou esse mesmo equívoco e de
maneira que induz a erros maiores. No Horse, o usuário especifica o tempo, [por
exemplo] como 13 + ou - 5 [ou] 20 + ou - 10. Ora, se o que interessa são os
valores mais altos, 13 + ou - 5 poderia ser substituído por 18, e 20 + ou - 10
poderia ser substituído por 30. Muitas pessoas marcam tempo com 20 + ou - 10
achando que estão marcando com 20 caracteres por segundo. Quando verificam
seu timing, não encontram nenhum erro de mínimo. É óbvio que não, pois estão
timeando com o parâmetro de 30 caracteres por segundo, o que é um absurdo.
Se um legendador faz seu primeiro trabalho para uma produtora usando a
configuração de 30 caracteres por segundo, o dobro do parâmetro vigente no
mercado brasileiro, dificilmente receberá um segundo trabalho. Na condição de
potencial contratante dos serviços de legendadores, recebo muitos candidatos que
fizeram cursos de legendagem, têm domínio do software, mas produzem legendas
tecnicamente inaceitáveis. Isso indica que simplesmente sinalizar ao aprendiz que
uma legenda não tem tempo suficiente de leitura é um recurso inócuo, pois ele vê
sua legenda entrando na tela e saindo dela de forma sincronizada com a fala
original e consegue lê-la, uma vez que o autor sempre lê sua tradução com mais
rapidez do que o telespectador. Além disso, o aprendiz tem à sua disposição o
recurso de simular as legendas quantas vezes julgar necessário, aumentando assim
sua familiaridade com a própria tradução.
42
Assim como o Systimes, o Horse também fornece um relatório de erros, e acusa como contendo
“erro de mínimo” as legendas que extrapolam o limite de caracteres por segundo, limite esse que
deve ser configurado pelo legendador de acordo com a orientação do cliente.
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79
Sem dúvida, falta ao mercado de legendagem um programa que reúna as
funções do Systimes e dos softwares mais recentes. Quando ele for desenvolvido,
a ênfase do curso de formação poderá ser maior no aspecto lingüístico da
atividade. Enquanto isso não acontece, os professores dos cursos com carga
horária reduzida devem continuar mostrando aos aprendizes a importância de se
respeitar o limite máximo de caracteres por segundo.
Outro ponto que gera polêmica entre os professores de legendagem é a
questão do momento do curso em que os softwares devem ser introduzidos. É
claro que, em treinamentos de curta duração, os professores geralmente
apresentam os softwares mais atuais logo nas primeiras aulas. Quando não o
fazem, ou quando usam um programa que não é mais aceito pelo mercado, os
alunos costumam demonstrar insatisfação, como pode-se notar nos depoimentos
de dois ex-alunos de cursos de legendagem.
Não tivemos a oportunidade de praticar com o computador em sala, apenas
discutimos as soluções encontradas. Mesmo assim foram necessárias aulas
particulares para solucionar questões que surgiram com a prática e não puderam
ser resolvidas durante o curso (sobre timing, spotting, otimização do trabalho,
recursos do programa etc.).
Acho que a primeira coisa a ser abordada num curso deveria ser os softwares,
pois com poucas horas de estudo se aprende a usá-los. Fazer um curso de
legendagem e só aprender a usar os softwares de legendagem no final do curso
equivale a fazer um curso de redação e só aprender a escrever no final do curso. É
muito melhor estudar legendagem tendo a possibilidade de fazer as próprias
experiências. O curso que fiz abordava os softwares no final. Senti que muitos
alunos se sentiram desestimulados por isso.
Um risco que os professores correm ao apresentar os softwares
prematuramente, ou seja, antes que os aprendizes tenham desenvolvido a
capacidade de síntese no nível extremo exigido pela legendagem, é que eles
adquiram o vício de produzir legendas com tempo de leitura insuficiente, uma vez
que, como vimos, os programas hoje disponíveis permitem isso. Portanto, é
essencial que os exercícios de síntese sejam trabalhados antes da introdução da
prática de tradução com os programas de legendagem.
O curso delineado por esta dissertação exalta o caráter didático do
Systimes 4.0 e defende a sua utilização em sala de aula, como uma ferramenta útil
— além de gratuita — para formar legendadores mais completos e cientes das
exigências do mercado. É importante destacar, no entanto, que a utilização do
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80
Systimes 4.0 de maneira alguma dispensa a apresentação dos softwares utilizados
atualmente, uma vez que um dos objetivos do curso proposto aqui é dar subsídios
para que os legendadores cheguem mais bem preparados ao mercado de trabalho.
Vejamos agora brevemente os conteúdos que podem ser abordados nas
duas disciplinas propostas.
5.2.5
Disciplinas propostas
5.2.5.1
Tradução para legendagem I
1) Objetivos
Essa disciplina introdutória propõe-se a dar aos aprendizes subsídios para
decidirem se a tradução audiovisual é um campo profissional que gostariam de
explorar após sua formação acadêmica básica. Ao longo do semestre letivo,
espera-se que as competências lingüística, técnica, rítmica e cultural listadas no
Capítulo 4 sejam desenvolvidas por meio das atividades propostas. Ao final do
curso, após terem tido contato com todas as etapas básicas do processo de
legendagem, os aprendizes deverão ser capazes de: (i) utilizar os softwares
específicos de legendagem e suas funções de edição de texto e marcação de
legendas; (ii) traduzir e sintetizar as falas originais de programas audiovisuais de
diversos gêneros; (iii) sincronizar as legendas traduzidas com as falas originais,
respeitando o ritmo do discurso das personagens, os cortes de cena e o ritmo de
leitura dos telespectadores.
2) Programa
As aulas devem envolver leitura e discussão de textos teóricos e de críticas
de legendas, atividades práticas visando o desenvolvimento das habilidades e
competências específicas da tradução para legendas e análise de soluções
tradutórias de produtos audiovisuais legendados, como filmes, seriados,
documentários e musicais. Seriam abordadas ainda, nessa disciplina básica com
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81
carga horária de 60 horas, as especificidades das diferentes modalidades de TAV,
como legendagem, dublagem, voice-over e closed caption.
O curso seria dividido em quatro módulos, ou unidades, de
aproximadamente 15 horas (ou 4 aulas) cada um. O primeiro módulo seria
dedicado ao desenvolvimento das competências básicas necessárias ao
legendador, como poder de síntese, noção de ritmo e domínio dos diferentes
registros do português. Para isso, o professor lançaria mão, antes de entrar nos
exercícios de legendagem propriamente ditos, de atividades que serão propostas
mais adiante, entre elas transcrição, síntese, paráfrase, tradução, análise da edição
de programas audiovisuais e de soluções adotadas pelos legendadores
profissionais.
A introdução aos softwares deve ser feita no início do segundo módulo.
Para isso, é necessário que o curso seja sofisticado tecnologicamente, ou seja,
cada aprendiz deve ter acesso a um computador equipado com acesso à Internet,
aos programas computacionais que serão usados nas aulas e a fones de ouvido. As
universidades não precisarão arcar com a compra de licenças de softwares, pois
tanto o Systimes 4.0 quanto o Subtitle Workshop são gratuitos. Os aprendizes
seriam primeiramente apresentados ao Systimes 4.0, para que assimilassem de
forma mais rápida e eficaz as coerções espaço-temporais envolvidas na
legendagem. Após 15 horas utilizando o Systimes para a realização de exercícios,
eles passariam a trabalhar, nas últimas 30 horas do semestre letivo, com o Subtitle
Workshop, que atualmente é um dos softwares mais utilizados no mercado de
legendagem brasileiro, adquirindo assim prática em todas as etapas da tradução
para legendas: timing, spotting interno e externo, simulação das legendas
produzidas e revisão final. A interação com novas tecnologias e o uso de arquivos
de vídeo, diferentes softwares e ferramentas de pesquisa on-line incrementam as
habilidades computacionais dos aprendizes que, dessa forma, teriam uma
experiência bem próxima da realidade do mercado de trabalho.
O terceiro módulo de 15 horas abrangeria exercícios de tradução e
legendagem de diversos gêneros de produtos audiovisuais e técnicas de tradução
para voice-over. Como foi exposto no Capítulo 4 (ver Seção 4.4.1), o texto
telejornalístico apresenta semelhanças e diferenças em relação ao texto de uma
tradução para legendas. Ao mesmo tempo em que as duas modalidades de redação
devem ser marcadas pela clareza e concisão, além de serem regidas por coerções
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82
temporais, o texto telejornalístico é escrito para ser falado, ao contrário do que
ocorre no caso das legendas, que são escritas a partir da fala mas são lidas em
silêncio. O legendador deve conhecer essas semelhanças e diferenças e dominar as
estratégias de redação utilizadas no telejornalismo, pois alguns canais de TV por
assinatura, como o GNT, adotam um sistema híbrido de tradução de programas
documentários: as entrevistas são legendadas e a narração é traduzida em um
arquivo separado, em formato de texto corrido, dividido em blocos com a
marcação do tempo relativo ao início e ao fim de cada bloco. Para isso, os
tradutores usam uma lauda que se assemelha à utilizada nas redações de
telejornalismo. O texto traduzido é lido por um apresentador numa cabine de
locução e, posteriormente, na ilha de edição, o canal de narração original do
programa é substituído pelo canal com a narração em português. Em casa, os
telespectadores cujos televisores são equipados com a tecla SAP
43
geralmente
podem escolher entre assistir ao programa com a narração original ou a traduzida.
Uma vez que, como na dublagem, o canal de áudio com a narração na língua
estrangeira é apagado, o tradutor tem muito mais liberdade para modificar a
estrutura do texto original, liberdade essa que seria bastante limitada caso
estivesse traduzindo para o formato de legendas. Ele deve adaptá-lo para ser
falado pelo apresentador, atentando para a sonoridade e o ritmo do texto traduzido
e levando em consideração técnicas de redação telejornalística, como evitar
cacófatos e palavras em seqüência com a mesma terminação (Paternostro, 1999:
70). Por incrível que pareça, apesar de a redação para telejornalismo possuir
regras muito bem definidas e ser altamente especializada, pelo que conheço dos
cursos de legendagem existentes, nenhum deles aborda as especificidades da
tradução para narração. As poucas instruções que os legendadores recebem de
como traduzir para narração são aquelas contidas em manuais de padrões
disponibilizados pelas produtoras e programadoras. Portanto, a inclusão de aulas
sobre tradução para narração em um curso de formação de legendadores é
essencial dentro da proposta esboçada aqui, que busca desenvolver nos aprendizes
as competências necessárias para que cheguem ao mercado mais bem preparados
e cientes das habilidades que serão exigidas deles.
43
Sigla para Secondary Audio Program, ou Programa Secundário de Áudio.
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83
Conforme foi visto na Seção 4.1.2, a utilização do Subtitle Workshop
permite que o professor passe exercícios para casa, ficando com mais tempo de
aula para aprofundar, no módulo final do curso, alguns assuntos relacionados à
TAV, como edição de cinema e TV e a natureza polissemiótica e diagonal da
legendagem, e para convidar palestrantes a discorrerem sobre temas como
tradução teatral, dublagem, legendagem para cinema e mercado de trabalho.
Durante o curso, além de desenvolverem as habilidades características da
tradução para legendagem, os aprendizes aperfeiçoam sua competência tradutória,
pois as coerções espaço-temporais típicas da atividade os forçam a se concentrar
na parte essencial do conteúdo a traduzir. Conseqüentemente, perdem o mau
hábito muito comum entre estudantes de tradução de traduzir palavra por palavra
ou oração por oração, como observa Sponholz (2003: 66), e passam a pensar em
unidades semânticas maiores.
Passo agora a propor alguns exercícios práticos que visam auxiliar o
professor a montar seu curso de formação de legendadores. Os exercícios
propostos não são estanques. Mais de uma atividade pode ser realizada em uma
aula de aproximadamente 200 minutos, enquanto outras poderão tomar mais de
uma aula. Vale ressalvar ainda que o programa delineado aqui não é fechado, pois
claro está que cada turma tem suas especificidades e limitações; cabe ao professor
identificá-las e fazer as adaptações e modificações que julgar necessárias.
3) Exercícios
De acordo com as orientações presentes na literatura referente ao ensino de
legendagem, reunidas por Sponholz (2003), a escolha dos textos e do material
audiovisual a ser trabalhado em sala de aula é decisiva para o sucesso das
atividades. Os trechos de longas-metragens, documentários, seriados, entrevistas,
reality shows, musicais etc. devem ser tematicamente independentes, demandar
várias estratégias de tradução diferentes e apresentar potenciais dificuldades aos
aprendizes, como diferentes dialetos, falsos cognatos, humor e registros especiais.
A análise das soluções dadas pelos aprendizes estimulará a discussão, além de ser
uma forma de levá-los a se dar conta de que diversas soluções tradutórias podem
ser igualmente aceitáveis.
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Faz-se necessário aqui um esclarecimento em relação à lei brasileira de
direitos autorais, número 9.610, sancionada em 19 de fevereiro de 1998. O
capítulo IV da referida lei trata das limitações aos direitos autorais e reza que não
constitui ofensa aos mesmos a utilização de passagens de obras audiovisuais nos
estabelecimentos de ensino para fins exclusivamente didáticos (Cabral, 2000:
195). Portanto, desde que utilize trechos de produtos audiovisuais e não os
distribua aos alunos fora do ambiente acadêmico, o professor não estará violando
a lei de direitos autorais ao adotar as atividades propostas a seguir.
Atividade 1
Após a apresentação do polissistema de tradução audiovisual e todos os
profissionais e etapas que dele fazem parte, o professor deve introduzir os
conceitos de tradução diagonal e diassemiótica para, logo em seguida, propor uma
atividade de análise e síntese de um texto. Essa atividade ainda não envolve
tradução e deve ser feita sem a utilização de recursos audiovisuais. O texto
trabalhado pode ser uma matéria de jornal impresso que aborde, por exemplo, as
características técnicas da legendagem, a criação de legendas por fãs de seriados
estrangeiros, os valores praticados pelo mercado ou críticas a legendas (como a
presente na coluna de Artur Xexéo transcrita na Seção 3.4). Dessa forma, além de
desenvolver o poder de síntese, o exercício serviria de base para que o professor
explorasse outros aspectos da legendagem. Uma vez que o texto traduzido para
legendas sofre uma redução de até 50% em relação aos diálogos originais, no
exercício o professor deve pedir que os aprendizes resumam o texto nessa mesma
proporção, utilizando para tal os recursos de síntese e paráfrase.
Atividade 2
Na Seção 4.1.1, vimos que a capacidade de transpor um texto falado para o código
escrito é uma competência essencial a um legendador. Uma atividade eficaz para
desenvolvê-la consiste em utilizar o trecho de uma entrevista e pedir que os
aprendizes o transcrevam. Novamente, a língua da atividade é o português. É
importante que o programa audiovisual escolhido seja uma entrevista, por tratar-se
de um gênero rico em vícios de linguagem, hesitações, autocorreções e por ser o
exemplo mais genuíno de discurso espontâneo, sem script. Conforme o Professor
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85
A ressaltou em seu depoimento na Seção 4.2.2, através da transcrição, os
aprendizes perceberão que quem decide como redigir, pontuar e interpretar o texto
são eles próprios, e também poderão desenvolver a competência relacionada ao
entendimento da língua falada. Após a transcrição, a etapa seguinte do exercício é
sintetizar o texto produzido, reduzindo-o à metade do seu tamanho original, de
modo a manter as informações mais importantes. Fazendo isso, os estudantes
estarão se concentrando no conteúdo a ser transmitido e, conseqüentemente,
desenvolvendo a capacidade de interpretar e priorizar informações. A diferença
entre as atividades 1 e 2 é que a transcrição do discurso oral em texto escrito
revela que a fala é rica em redundâncias, repetições, contradições e interrupções
que, se reproduzidas em forma escrita, tornam o texto confuso, quando não
impossível de ser decodificado. Com esse exercício, os aprendizes notarão as
diferenças mais comuns entre as modalidades oral e escrita e reunirão subsídios
para decidir o que é informação redundante.
Atividade 3
Ainda com uma entrevista em português, a atividade 2 pode ser repetida na aula
seguinte, tendo seu grau de dificuldade aumentado. Enquanto o programa
escolhido para a atividade 2 deve ser uma entrevista no estilo pingue-pongue, ou
seja, em formato de perguntas e respostas e com um só entrevistado, nesta terceira
atividade um trecho de uma mesa-redonda, com vários entrevistados comentando
um tema ao mesmo tempo, pode ser utilizado. Através desse exercício, os
aprendizes vivenciarão uma realidade do mercado, que foi recentemente inundado
de reality shows e programas voltados para adolescentes nos quais vários
personagens falam simultaneamente, ao se verem obrigados, entre várias falas
sendo proferidas ao mesmo tempo, a escolher no máximo duas para reproduzir em
cada legenda.
Atividade 4
O próximo passo é associar o exercício à tradução. Neste caso, a tradução deve ser
feita sem o auxílio do roteiro original, para que os aprendizes desenvolvam
também a compreensão auditiva. Se a língua da qual traduzem for o inglês, por
exemplo, os estudantes notarão que o texto traduzido cresce. Nessa etapa, o
professor deve pedir que já traduzam o texto sintetizando-o de uma maneira
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natural em sua língua, sem que a tradução entre em conflito com as imagens e as
falas originais (Díaz Cintas, 2001: 4).
Atividade 5
Como já vimos, ter noção de ritmo também é uma habilidade essencial ao
legendador. Um bom exercício para que os estudantes aprendam a identificar os
ritmos dos diferentes gêneros é exibir trechos de programas com edição lenta e ir
progressivamente aumentando o ritmo da edição dos trechos selecionados e a
relevância dos outros sistemas semióticos (além do verbal) envolvidos no texto
audiovisual, como imagens, música, letreiros (bilhetes, manchetes de jornais,
placas, créditos) e interação entre as personagens. Segundo Gottlieb (1998: 247), a
interação entre todos os signos que compõem o texto audiovisual gera uma
relação de redundância, principalmente a interação entre o canal visual não-verbal
(as imagens) e os componentes prosódicos do diálogo (entonação, gestos,
expressões). Essa redundância auxilia o legendador em sua tarefa de reduzir os
signos verbais, e por isso é essencial que os alunos aprendam a identificá-la.
O mesmo exercício pode ser aplicado para que os alunos aprendam a
distinguir os diferentes ritmos de fala dos personagens. Pode-se exibir a abertura
de uma entrevista, na qual o repórter apresenta o entrevistado lendo um texto
redigido de antemão, ou um documentário apresentado por um narrador. Nos dois
casos, tanto o narrador quanto o jornalista seguem um roteiro rígido, e sua leitura
é sempre vagarosa, pausada e livre das hesitações e autocorreções presentes no
discurso improvisado. Em seguida, o professor pode usar o trecho de um filme do
diretor Woody Allen, por exemplo, cujo discurso é marcado por hesitações,
repetições e gaguejos, e em seguida exibir o monólogo de abertura do programa
Late Show with David Letterman, que, para o legendador inexperiente, pode
representar um verdadeiro pesadelo tradutório devido à velocidade de fala de seu
apresentador. Atividades dessa natureza estimulam os estudantes a discutirem as
diferentes estratégias que podem ser usadas para contornar vícios de linguagem e
um ritmo de fala muito acelerado. Exercícios de tradução e legendagem de
canções também são uma forma simples, eficaz e agradável de desenvolver nos
aprendizes a noção de ritmo.
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87
Atividade 6
Esta atividade marca o início do segundo módulo do curso e deve se repetir ao
longo de todo o módulo. Após a apresentação dos diferentes ritmos de edição de
imagens e de fala de personagens feita através da atividade 6, o professor deve
usar o mesmo recurso nos exercícios de tradução para legendagem que os
aprendizes farão utilizando o Systimes 4.0, isto é, escolher trechos de programas
com um ritmo de edição e de fala mais lento e ir progressivamente aumentando o
grau de dificuldade dos trechos selecionados.
Outras atividades
Nos dois últimos módulos, conforme previsto no esboço do programa da
disciplina, os aprendizes passariam a utilizar o Subtitle Workshop para realizar os
exercícios de legendagem, o que lhes daria a chance de explorar todas as etapas do
trabalho, como timing, spotting, simulação das legendas e revisão, tanto de suas
traduções quanto das feitas pelos colegas. Nessa etapa o professor também deve
introduzir exercícios de tradução para voice-over e algumas atividades
complementares, como as que proponho a seguir.
Todo legendador tem de ser versado em análise sintática para escolher a
melhor maneira de quebrar períodos dentro da legenda e, se for necessário, entre
legendas (cf. Seção 3.3.3), uma vez que “a quebra de linhas com motivação
semântica aumenta a velocidade de leitura”
44
(Gottlieb, 1994a: 113). Em um curso
ministrado num bacharelado em Letras — Tradução, essa competência seria
desenvolvida em disciplinas como Sintaxe e Português Padrão.
Independentemente disso, uma atividade útil é pedir que os aprendizes ouçam o
trecho do programa escolhido para o exercício e marquem no roteiro como acham
que o conteúdo original deve ser dividido. Feito isso, o mesmo trecho com as
legendas gravadas deve ser exibido para comparação e discussão das soluções
mais adequadas.
Na Seção 4.1.2, tracei um breve histórico de como a tecnologia envolvida
na atividade da tradução para legendagem avançou nos últimos anos. Hoje, o
legendador não usa mais o televisor nem o videocassete em seu trabalho, tem à
sua disposição programas que lhe permitem marcar o tempo de entrada e saída de
44
Semantically motivated line breaks enhance reading speed.
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legendas com mais rapidez e precisão, bem como baixar os arquivos de vídeo
diretamente da Internet, em servidores privados FTP (File Transfer Protocol).
Novas tecnologias surgem a cada dia, e o legendador precisa ter agilidade para se
adaptar a elas. Para desenvolver essa agilidade, o aprendiz deve aumentar sua
intimidade com o computador, aprendendo a utilizar outras ferramentas além dos
programas para legendagem. Isso cria nele uma intuição para solucionar
problemas por conta própria. Em um bacharelado em Tradução ou equivalente,
essa habilidade geral de pesquisa é desenvolvida em outras disciplinas, como
Tradução de Informática e Tradução Técnico-Científica, e o professor da
disciplina específica de legendagem que fizesse parte do currículo desse
bacharelado ficaria livre para apresentar as ferramentas essenciais ao legendador,
como os softwares próprios e dicionários on-line, e para explorar em sala técnicas
de pesquisa na Internet, dando dicas sobre ferramentas de busca, conversores de
moedas, como avaliar fontes de informações etc.
A competência cultural também pode ser estimulada através de algumas
atividades, como exibir em sala trechos de um programa — já legendado — rico
em referências culturais
45
e pedir que os aprendizes anotem as soluções dadas
pelos tradutores para posterior discussão e análise das estratégias mais comumente
adotadas.
A mesma atividade, porém com um gênero diferente de programa, pode
ser usada para que os aprendizes desenvolvam a capacidade de tomar decisões
tradutórias rápidas sem o apoio de traduções consagradas. O programa utilizado
nesse caso deve ser um documentário jornalístico que aborde um assunto cuja
nomenclatura ainda não esteja definida em português. Entre os exemplos mais
recentes estão a grafia de termos como “Talibã”, “Hezbollah” e “Al-Qaeda”, o
gênero de palavras como “tsunami” e a tradução de termos como “Ground Zero”.
Para justificar suas escolhas tradutórias, é necessário que o legendador desenvolva
o domínio das ferramentas de pesquisa e saiba avaliar suas fontes. A última
atividade proposta é uma ótima forma de desenvolver essa aptidão.
Atualmente, são comuns no mercado de legendagem brasileiro programas
oriundos de outros países de língua inglesa além dos Estados Unidos e da
Inglaterra, como a Austrália, a Nova Zelândia e o Canadá. Os legendadores que
45
Uma sugestão seria o talk show Late Show with David Letterman, exibido no Brasil pelo canal a
cabo GNT.
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tiverem familiaridade com sotaques, coloquialismos e gírias não só desses países
como das mais diferentes regiões e comunidades lingüísticas terão mais chances
de se inserir no mercado. Através da atividade de transcrição de programas sem o
auxílio do roteiro original, os aprendizes treinam o ouvido aos diferentes sotaques
da língua-fonte.
5.2.5.2
Tradução para legendagem II
Caso os currículos das universidades permitam, o ideal seria que a
disciplina introdutória fosse complementada por esta disciplina avançada de
tradução para legendagem, com a mesma carga horária da disciplina básica. Seria
dirigida aos estudantes que quisessem se aprofundar no estudo da modalidade,
tendo como pré-requisito obrigatório a disciplina anterior. Nessa disciplina, o grau
de dificuldade das atividades aumentaria, os aprendizes lidariam com gêneros de
programas diferentes e mais desafiadores para o legendador, fariam os exercícios
de tradução e legendagem sem o auxílio do roteiro original, trabalhariam tendo de
respeitar prazos mais curtos, numa forma de simular o ambiente profissional, e
aprenderiam a legendar para públicos especiais, como crianças e culturas não
familiarizadas com a leitura de legendas, por exemplo.
Ao final do curso, os aprendizes com um bom aproveitamento teriam
desenvolvido satisfatoriamente todas as competências necessárias a um
legendador, quais sejam, identificar e condensar as informações essenciais do
original, explorar a interação entre imagem, som e texto e acompanhar a
velocidade do diálogo (Sponholz, 2003: 59), e estariam prontos para ingressar no
mercado de trabalho sem onerar os contratantes de seus serviços com meses de
treinamento e tarefas monitoradas.
5.2.6
Avaliação
Dentro de uma proposta de ensino não-prescritivo alinhada às reflexões
pós-estruturalistas, como a deste trabalho, avaliar torna-se um trabalho ainda mais
difícil, mas não impossível. Autoras como Arrojo (1993 e 1994), Martins & Frota
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(1997) e Tavares de Souza
46
defendem a descentralização do poder avaliatório do
professor como forma de dar voz ao aprendiz, levando-o a assumir maior
responsabilidade por seu trabalho, através da fundamentação e da crítica do
mesmo. Essa descentralização pode acontecer na forma de auto-avaliações e de
avaliações conjuntas, feitas por toda a turma.
A auto-avaliação se daria no nosso curso de formação de legendadores da
seguinte forma: ao longo do período letivo, os exercícios feitos pelos aprendizes
deverão ser acompanhados de comentários sobre as dificuldades enfrentadas e as
estratégias adotadas no processo tradutório. Assim, durante a projeção dos
exercícios em sala, eles terão a chance de justificar suas escolhas. Com base na
discussão e nos comentários do professor e dos colegas, os aprendizes terão
elementos para avaliar os próprios trabalhos.
Na metade do semestre letivo, a turma seria dividida em grupos, que
preparariam seminários sobre temas relevantes à TAV a partir das questões
teóricas sugeridas nas atividades do curso, aprofundadas por textos teóricos
indicados pelo professor. As apresentações dos grupos seriam avaliadas tanto pelo
professor quanto pelos colegas, e comporiam 50% da nota final da primeira
avaliação do curso. Os outros 50% da nota seriam compostos pela média simples
dos exercícios auto-avaliados pelos aprendizes e revisados pelo professor.
A segunda avaliação, com peso maior, seria realizada no fim do semestre
letivo sob a forma de uma prova prática de legendagem de um pequeno trecho de
programa televisivo, que poderá ser escolhido entre três opções oferecidas pelo
professor
47
. Nessa prova, os aprendizes realizariam todas as etapas do trabalho:
tradução, spotting, timing e revisão final das legendas. A exemplo do que terá
acontecido durante todo o semestre, eles deverão entregar juntamente com a
avaliação final um relatório com comentários que justifiquem e fundamentem,
sempre que julgarem necessário, suas escolhas e estratégias adotadas diante das
dificuldades enfrentadas durante a tradução.
Mesclando dessa forma a auto-avaliação, a avaliação conjunta e a
avaliação feita pelo professor, creio que estaremos suavizando o inevitável papel
46
TAVARES DE SOUZA, V. (1994) “Avaliação da aprendizagem”. Ensaio: avaliação e políticas
públicas em Educação. Rio de Janeiro: Fundação Cesgranrio, v. 1-3, abr/jun, pp. 13-20.
47
O tamanho do trecho e o nível de dificuldade do programa, assim como a profundidade dos
textos indicados para a realização dos seminários, seriam maiores na disciplina avançada de
legendagem.
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de juiz que todo docente desempenha e que dele é esperado, e dando subsídios
para que os aprendizes encarem de forma mais crítica o seu trabalho, mostrando-
lhes que não devem esperar do professor respostas definitivas e imediatas, pois,
nas palavras da pós-estruturalista Rosemary Arrojo (1993),
o objetivo final do ensino deve ser a formação de alguém que possa aprender a
conquistar suas “resistências” à busca do conhecimento e que possa, portanto,
aprender a aprender e desistir do desejo impossível de dominar e controlar tudo
que supostamente há para ser conhecido. (p. 145)
5.2.6.1
Critérios de avaliação
As avaliações, nas três formas propostas acima, devem ser realizadas
levando-se em conta dois critérios principais, que devem ser explicitados aos
aprendizes no início do semestre letivo: o lingüístico e o cnico. Os dois critérios
têm o mesmo peso, compondo, cada um, 50% do total da nota, e o avaliador deve
observar os fatores indicados a seguir para calcular as mesmas.
Critério lingüístico: diz respeito ao conteúdo das legendas. Para verificá-lo, o
avaliador deve levar em consideração se as informações mais importantes do
original estão presentes na tradução e se os elementos omitidos são mesmo
dispensáveis (25% do total da nota); se o registro utilizado na tradução está
apropriado e se as regras do português foram obedecidas (25% do total da nota).
Critério técnico: diz respeito à forma das legendas. Para avaliar o critério técnico,
deve-se verificar se a divisão das legendas levou em conta o ritmo de fala dos
personagens, o ritmo dos cortes do programa e o ritmo de leitura dos
telespectadores (25% do total da nota); se a marcação das legendas está bem
sincronizada com as falas originais e se as legendas estão divididas em blocos
coesos de significado, respeitando o número máximo de caracteres por linha (25%
do total da nota).
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6
Considerações finais
A partir da constatação de que o mercado de tradução para legendagem
brasileiro sofre com a carência de profissionais, e de que a ênfase dos cursos
atualmente disponíveis é no treinamento, o objetivo principal deste trabalho foi
propor as bases para um curso de formação que abordasse todas as competências e
habilidades que um legendador deve desenvolver.
Buscando demonstrar as complexidades envolvidas no processo de
tradução para legendagem, apresentei o polissistema de tradução audiovisual e as
peculiaridades características dessa modalidade de tradução, concentrando-me na
legendagem de programas de televisão. Entre essas peculiaridades destaca-se o
fato de a legendagem ser um tipo de tradução diagonal e diassemiótica, o que leva
o legendador a ter de lidar com limitações espaciais e temporais e com a crítica,
principalmente por parte de leigos, crítica esta que pode ser feita “em tempo real”,
uma vez que o telespectador tem acesso ao original juntamente com a tradução.
Em seguida, apresentei as normas, coerções e os mecanismos de controle em
vigor no mercado brasileiro, os quais o legendador deve conhecer e aos quais deve
se adequar para ter sucesso no exercício da profissão. Finalmente, tracei o perfil
do legendador valorizado pelo mercado e identifiquei as maiores carências
demonstradas pelos legendadores iniciantes.
O Capítulo 5 tratou da proposta do curso propriamente dita. Nele,
especifiquei a carga horária ideal do curso, o tempo de duração das aulas, os pré-
requisitos necessários, a importância da integração entre teoria e prática e sugeri a
divisão entre uma disciplina básica e outra avançada de tradução para legendagem
na universidade. Não foi meu objetivo, no entanto, apresentar uma proposta
totalmente estruturada, que previsse um plano de aulas completo. Este me parece
ser um desdobramento natural da presente pesquisa: a elaboração de material
didático específico para a formação de legendadores. Sendo assim, julgo ter
cumprido os objetivos propostos e demonstrado que a tradução para legendagem é
um mercado em pleno crescimento que merece mais atenção, não só da academia
como do próprio mercado, que ainda seleciona legendadores de forma amadora,
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com base em indicações ou em candidatos encaminhados por cursos de
treinamento que, apesar de cumprirem seu papel de familiarizar os alunos com os
conceitos básicos da legendagem, não formam legendadores competentes e
seguros.
Um curso de formação nos moldes propostos na presente dissertação
resultaria em benefícios a todos os envolvidos: às empresas, que teriam à sua
disposição profissionais mais bem preparados e se isentariam do custo de ter de
promover longos treinamentos para legendadores novatos; aos telespectadores,
que receberiam um produto de maior qualidade e conseqüentemente
aperfeiçoariam de forma mais eficaz seu conhecimento de línguas estrangeiras,
uma vez que os programas legendados oferecem a oportunidade única de
comparação entre o que é ouvido na língua original e o que se lê na tradução; à
academia, que estaria satisfazendo uma demanda dos estudantes, incluindo no
currículo uma modalidade de tradução criativa e empolgante, que possivelmente
atrairia mais candidatos às faculdades de Letras; e aos aprendizes, que teriam uma
formação mais completa como tradutores, pois nas disciplinas de tradução para
legendagem desenvolveriam habilidades gerais como poder de síntese, análise
textual, domínio de ferramentas tecnológicas promovido pelo contato constante
com computadores, arquivos de imagens, diferentes programas computacionais e
a Internet, e aprenderiam a identificar diferentes sotaques e registros lingüísticos.
Além disso, trabalhar em um ambiente tecnologicamente sofisticado, muito
próximo da realidade do mercado de trabalho, é uma experiência rara na
universidade, que mune os aprendizes da prática necessária a uma maior
segurança para enfrentar os desafios do mercado de trabalho.
A parceria entre a universidade e o mercado poderia se dar também de
forma mais sistemática, através de programas de estágio nas produtoras para os
estudantes matriculados nas disciplinas de legendagem. Dessa forma, os
aprendizes teriam contato com todas as etapas do processo de legendagem,
conheceriam os softwares mais avançados para a produção de legendas e
poderiam garantir um lugar no mercado de trabalho após a formatura. Por seu
turno, os programas de estágio também beneficiariam as empresas de legendagem,
que teriam mais voz no planejamento dos cursos, dando conselhos em relação às
habilidades que procuram na hora de recrutar novos legendadores (Díaz Cintas &
Orero, 2003).
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Finalmente, a própria profissão de legendador seria valorizada, pois, com o
aumento da qualidade dos produtos legendados, os profissionais poderiam
reivindicar melhores condições de trabalho e remuneração mais compatível com o
seu nível de especialização.
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Apêndice 1
Roteiro básico para a entrevista com o Diretor A
1) Que tipo de profissional procura a sua empresa oferecendo serviços de
tradução?
2) Geralmente os interessados têm formação em Letras, Tradução ou áreas
afins? O senhor acha que essa formação é importante? Por quê?
3) A empresa admite estagiários? De que áreas de formação?
4) Há algum tipo de triagem ou prova anterior ao treinamento oferecido pela
empresa?
5) Todos os candidatos a tradutor devem passar pelo treinamento?
6) O fato de um interessado não possuir familiaridade com os programas de
legendagem utilizados atualmente é um impedimento para que ele se torne
prestador de serviços da sua empresa?
7) O senhor diria que, após o treinamento, o percentual de tradutores
aproveitados pela sua empresa é alto ou baixo?
8) Se a resposta à pergunta anterior foi “baixo”, como o senhor acha que essa
situação poderia ser revertida?
9) Os tradutores que hoje atuam na sua empresa dão conta de todo o volume
de trabalho?
10) O senhor acha que um curso mais extenso de formação de tradutores para
legendagem seria benéfico para o mercado? Que competências e
habilidades necessárias a um bom tradutor para legendas poderiam ser
desenvolvidas num curso de formação?
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Apêndice 2
Roteiro básico para a entrevista com os professores
1) Há quanto tempo você leciona tradução para legendagem?
2) Em que instituição/produtora/instituto você leciona?
3) Fale um pouco sobre a sua formação e experiência com tradução para
legendagem.
4) Qual é a carga horária do curso que ministra?
5)
O candidato deve cumprir algum pré-requisito para se inscrever no seu
curso ou ele é aberto a todos os interessados?
6)
Qual é o conteúdo programático do seu curso?
7) Qual é o método utilizado nas aulas e que línguas são abordadas?
8) Os alunos têm acesso aos softwares utilizados atualmente no mercado?
Quais?
9) Na sua opinião, quais são as competências e habilidades necessárias a um
tradutor para legendas?
10) Quais dessas competências e habilidades descritas podem ser
desenvolvidas e quais delas os interessados já devem possuir antes de
ingressar no curso?
11) Como você avaliaria o aproveitamento geral dos alunos ao final do curso?
Aqueles que se destacam estão prontos para atuar no mercado ou ainda
necessitam de um monitoramento?
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Apêndice 3
Roteiro básico para a entrevista com os alunos
1) Qual é a sua formação profissional?
2) Que curso(s) de tradução para legendagem você já fez?
3) De/para que línguas você traduz?
4) Com que objetivo você se inscreveu no(s) curso(s) que fez?
5) Qual era a carga horária do(s) curso(s)?
6) Na sua opinião, quais são as competências e habilidades que um bom
tradutor para legendagem deve ter?
7) Quais dessas competências e habilidades você acha que podem ser
desenvolvidas num curso de tradução para legendagem? Elas foram
abordadas no(s) curso(s) que você fez ou isso ocorreu já no exercício
profissional da atividade?
8) Você se sentiu preparado(a) para atuar no mercado de tradução para
legendagem após o término do curso?
9) Você conseguiu se inserir no mercado após a realização do curso?
10) Se você presta serviço para alguma produtora de legendagem, quantas
horas de programação por mês você recebe para traduzir em média?
PUC-Rio - Certificação Digital Nº 0510566/CA
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