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Hermínio Bello de Carvalho
Ilustração sobre foto Prensa 3
São Pixinguinha
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Cada cultura ou religião tem seus mitos e fundamentos.
Faço parte de uma confraria quase religiosa que cultua um
Santo de pele negra, que tinha por hábito – e talvez
missão – enternecer e melhorar a vida dos homens com
sua arte divinal. Falo de Alfredo da Rocha Vianna Junior,
mais conhecido por Pixinguinha. Para mim, seu devoto,
será sempre São Pixinguinha.
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trumentista, arranjador. Dificil. Mais realista e objetivo é o
crítico Ary Vasconcellos:“Se você tem 15 volumes para falar
de toda a música popular brasileira, fique certo de que é
pouco. Mas se dispõe do espaço de uma palavra, nem tudo
está perdido; escreva depressa: Pixinguinha”.
To cou desde criança em tudo que era lugar,em teatros e
circo,e na verdade aperturas financeiras não as conheceu por
falta de trabalho. Quando seu pai morreu em 1917 (ano em
que era gravado o samba “Pelo telefone”), Pixinguinha já se
sustentava. Dois anos depois estreiaria no Cine Palais o con-
junto que celebraria uma época da nossa música: Os Oito
Batutas. Lá estava Pixinga, lá estavam Donga, China e
Nelson Alves negros como ele. Na Companhia Negra de
Revistas foi que conheceu Beti, que tomaria como sua
mulher para toda a vida. Negro: era negro numa sociedade
racista que contestaria sua ida a Paris com seus companhei-
ros em 1922, para representar o Brasil. Imagine, que desafo-
ro! Mas sua genialidade venceria todos esses preconceitos.
Villa-Lobos era um de seus admiradores, e o musicólogo-
compositor Basilio Itiberê ensinaria que o contraponto de
Pixinguinha (e é só ouvir suas gravações com o flautista
Benedito Lacerda) era coisa de mestre. E já que falamos em
Benedito Lacerda, convém lembrar que sua parceria com
Pixinguinha era meramente simbólica. Pixinga precisava de
dinheiro e projeção, que o duo – e mais a parceria que foi
consagrada contratualmente – acabou lhe garantindo.
Único luxo a que se permitia: beber. E bebericava seu
sagrado uisquinho de segunda a sexta no Gouveia”, na
Tr a v e s s a d o O u vidor – onde existe hoje sua estátua em
bronze. Era o templo onde seus amigos iam adorá-lo, ele Rei
Mago. Lá estavam João da Bahiana e Donga, e também
Antonio Carlos Brasileiro de Almeida Jobim, que o conside-
rava um santo e um gênio e foi lá um dia pedir-lhe a bênção.
Não dá para dizer qual a música mais bonita de
Pixinguinha: se Carinhoso”,“Ingênuo”,Sofres porque que-
res”,Rosa,Lamentos”. Porque ele foi um escultor de belas
melodias que, hoje, continuam modernas – com aquele
toque de eternidade que os gênios conferem àquilo que
a verdade veio ao mundo na Cidade de São
Sebastião do Rio de Janeiro em 23 de abril de
1897 (e não em 98, como durante algum tempo
se acreditou), dia em que, aliás, se celebra um Santo
Guerreiro de nome Jorge. Também, já se vê, não era à tôa
que Di Cavalcanti o chamava de “Meu irmão em São Jorge,
meu irmão Pixinguinha!”.
(Posso afirmar,embora alguns afirmem que é delírio, que
sou testemunha de um belo retrato de Pixinga feito por Di.
Estava lá, em seu atelier na rua do Catete, onde o pintor era
meu vizinho).
Quando acharam por bem criar o Dia do Choro, outra
data não poderia ser escolhida: a do nascimento desse
homem que nasceu para enobrecer o gênero, dar-lhe forma-
to e linguagem própria,cheia de melodias ondulantes e ricas
de modulações. Quem na vida já não se pegou assoviando
o “Carinhoso”? Pois é.
Antes de conhecer fisicamente Pixinguinha, eu ouvia
Pixinguinha nas rádios e, sobretudo, o vi, em carne e osso,
uma primeira vez, tocando no carnaval na antiga Galeria
Cruzeiro, vizinha ao Café Nice, na Avenida Rio Branco.
Década de 40.
Depois, pra valer mesmo, foi na década de 50 que o
conheci – e aí o grande acontecimento se deu na casa de
Jacob do Bandolim, em Jacarepaguá. Pixinga já triscado nos
uísques, tocando como gostava seu saxofone perolado, os
dedos que eram feito estalactites de tão longos e bonitos e
transparentes, as unhas alabastradas e a máscara africana
esculpida em estanho ou ônix ou num piche platinado – e
aqueles dedos corriam o corpo do instrumento e dele
extraíam sons absurdamente maravilhosos. Já abandonara a
flauta, por essa época. Problemas de embocadura: a boca
fibrilava, os lábios já não obedeciam ao contato da flauta – e
o sax entrou na sua vida, definitivamente. Mas Beti, sua
mulher, não se conformava. Afinal, tinha o sopro mais boni-
to entre todos os flautistas.
Aliás, essa é uma das grandes dúvidas de seus biográfos:
como enquadrá-lo em sua multiplicidade: compositor, ins-
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fazem. Inventou também belas introduções para melodias
por vezes pobres que lhe entregavam para orquestrar. Em
tudo que tocava (e tocar,aí, tem o duplo sentido) virava ouro
puro.Seu sentido de arranjador precedeu o que modernistas
como Radas Gnattali fariam depois. Fez trilhas para
cinema, depois de esgotar seu talento como arranjador e
autor de todo tipo de música para os teatros de revista da
época.
Pode mos dizer um pouco mais : ele tinha um agudo sen-
tido pictórico, diria mesmo cinematográfico, ao elaborar cer-
tas músicas. Ele fazia um humor descritivo em obras como
“O gato e o canário”, Marreco quer água”, “Um a zero”.
Nessa última, sua narrativa musical corresponde aos dos
comentaristas de futebol,descrevendo as firulas e os mágicos
passes dos jogadores. Gênio. Erik Satie não faria melhor.
Sim, acho que deveria falar de nossa relação pessoal. Ela
foi inaugurada com um surpreendente pedido para que
fosse seu parceiro num Festival Internacional de Música –
nascendo ali o “Fala, baixinho e uma série de composições
que ampliariam os elos de nossa amizade, consolidada nos
muitos encontros que marcava no Bar Gouveia,ou para par-
tilhar com ele a carne assada ao molho de ferrugem (“ferru-
ginosa”,corrigia) preparada magistralmente por sua mulher,
Beti. Lembrá-lo em minha casa, passando uma tarde comi-
go, é algo que me comove às lágrimas.
Tive a honra também de ter produzido seus últimos dis-
cos: o Gente da Antiga(com Clementina de Jesus e João da
Bahiana) e “Som Pixinguinha”, ambos na Emi-Odeon. E
ainda pude levá-lo ao estúdio para gravar com a Divina
Elizeth Cardoso um samba que fizemos – o “Isso é que é
viver”.
Quando Mário de Andrade quis saber tudo sobre feiti-
çaria, candomblé e adjacências para escrever “Macunaima”,
não só consultou Pixinguinha, como o tornou personagem
daquela rapsódia: é o Olelê Rui Barbosa,Ogan bexinguento,
tocador de atabaques. (Não, pelo que se sabe, Pixinguinha
nunca tocou atabaques, e no final da vida era um católico fer-
voroso).
E tão fervoroso que, vou lhes contar agora, que naquele
dia acordou cismarento : imagino tenha se persignado, lem-
brando com prazer a visita que Jacob do Bandolim, amigo e
devoto, lhe fizera há alguns dias. Preparava-se para ser padri-
nho de um batismo numa igreja em Copacabana, e deixara
recado para que eu comparecesse. Mostrou-se surpreso
quando apareci, antes, em sua casa, sem avisar, apenas com
a saudade apertando o coração.Tocou, que milagre! a flauta
que há tanto tempo abandonara. Despedimo-nos.
“Morreu como um santo”, repetiriam todos, horas
depois, quando se despediu de todos nós em 15 de fevereiro
de 1972, em plena Igreja Nossa Senhora da Paz, em
Ipanema.
Bibliografia :
Pixinguinha,Vida e Obra (Ed.Funarte,1978) (Lumiar Edit. 1997).
Filho de Ogum Bexinguento (Marilia T.Barbosa/Arthur Filho.Ed.
Funarte, 1978 e Ed. Griphus, 1997).
Hermínio Carvalho
Na área de rádio e televisão, produziu, a partir de 1958, centenas de
programas para a Rádio MEC (“Violão de ontem e de hoje”,
“Reminiscências do Rio de Janeiro”,“Orquesta de Söpros”) e, também, já
ná década de 70, para a TVE. Podemos destacar as séries televisivas
“Água Viva”, “Mudando de Conversa”, “Lira do Povo e “Contra-Luz”.
Como diretor-roteirista de espetáculos, sua carreira foi pontuada por
diversos sucessos: o musical “Rosa de Ouro (1965), que lançou
Clementina de Jesus e Paulinho da Viola; o concerto (1968) que reuniu
Elizeth Cardoso, Jacob
do Bandolim, Zimbo Trio e o Época de Ouro.
Podemos ainda citar os shows “ Festa Brasil” (Europa, EE.UU.e
Canadá); “Face à Faca (1974), Com Simone ; “ Te pego pela palavra
(1975), com Marlene;“ Caymmi em Concerto (1985),Chico Buarque
de Mangueira (1998)e outros espetáculos com Luiz Gonzaga,
Herivelto Martins, Radamés Gnattali & Camerata Carioca. Em 1999
dirigiu os espetáculos “Clássicas” (com Zezé Gonzaga e Jane Duboc) e
“Sessão Passatempo”, com Carol Saboya. Preparou em 2002 o musical
“O samba é minha nobreza”.
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