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PONTICÍFIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Marilene Moreira Feliciano
Resgate histórico do leprosário Asylo Colônia Santo Ângelo.
MESTRADO EM SERVIÇO SOCIAL
Dissertação apresentada à Banca Examinadora como
exigência parcial para a obtenção do título de MESTRE em
Serviço Social, pela Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo, sob a orientação do Profª Drª. Ursula Margarida
Karsch.
SÃO PAULO
2008
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BANCA EXAMINADORA
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São Paulo_____/_____/_____
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Dedico este trabalho a duas pessoas;
A minha irmã Maria Eugenia Feliciano in memóriam
pelos agradáveis anos de convivência amizade e
carinho, que me servem de exemplo e incentivo
diariamente.
E ao médico Abrahão Rotberg in memóriam que
infelizmente faleceu no período de elaboração este
trabalho. Agradeço pelas muitas publicações e anos de
dedicação à hanseníase.
(12/01/1912 a 01/11/2006).
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SUMÁRIO
Agradecimento………………………………………………………………………………..06
Resumos……………………………………………………………………………………....07
1.0 - Prefácio………………………………………………………………………….............09
1.1 - Introdução.……………………………………………………………………..………..10
2.0 - Desvelando a pesquisa…………………………………………….…………….............13
2.1 - Explicando o estudo………………………………………………………….........13
2.2 - O campo de realização da pesquisa……………………………………….………14
2.3 - Organizações dos dados…………….……………………………………….…….14
CAPÍTULO I - HISTÓRICO DA DOENÇA
1.1 - Definição de lepra……………………………………………………………………....16
1.2 - Causas a Prováveis da chegada da lepra ao Brasil……………………………………...17
1.3 - A lepra colocada como questão Social…………………………………………….……25
1.4 - Política de saúde pública no Brasil………………………………………………..…….31
1.5 - Exigências para a construção dos Leprosários…………………………………….…....33
CAPÍTULO II – APRESENTAÇÃO DO ASILO COLONIA SANTO ANGELO.
2.1 - Dia da inauguração do Asilo Colônia Santo Ângelo……………………………...…….36
2.2 - Crianças que moraram no Santo Ângelo……………………………………………......39
2.3 - Influencia da religião na hanseníase………………………………………………..…...40
2.4 - Mais ações filantrópicas no Asilo Colônia Santo Ângelo…………………………...….46
2.4.1 Eventos patrocinados pela caixa beneficente do Santo Ângelo..............................48
2.5 - Havia uma preocupação com a cultura e o esporte…………………………………......51
CAPÍTULO III - INSTALAÇÕES DO ASILO COLONIA SANTO ANGELO
3.1 - O portão de recepção dos pacientes……………………………………………………..56
3.2 - Acomodações para pacientes……………………………………………………………57
3.3 - Habitação para pessoas saudáveis………………………………………………..……..61
3.4 - Recursos existentes no hospital……………………..…………………………………..63
3.5 - Pacientes e também funcionários……………………………………………………….76
CAPÍTULO IV – FATORES SOCIAIS
4.1 - Destino das crianças saudáveis nascidas dentro do Santo Ângelo………………….…..80
4.2 - Década de 1940 e 1950
4.2.1 - Repressão sexual da década de 1940……………………………… ….……84
4.2.2 - Construção do 2º Cine-teatro….………………………….……………….…….86
4.3 - Visitantes das diversas épocas…………………………………………………………..88
4.4 - Tratamento ambulatorial e o fim do isolamento compulsório…………………………..92
4.5 - Conhecendo o município que foi eleito para a construção do leprosário no final da
década de 1920……………………………………………………………………..…..94
4.5.1 - Saúde Pública de Mogi das Cruzes......................................................................95
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5.0 - CONCLUSÃO………………………………………………………………………....97
6.0 - ANEXOS………………………………………………………………………..…..…99
7.0 - REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS………………………….....……………......133
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AGRADECIMENTOS
À querida orientadora Ursula Margarida Karsch, pela paciência, atenção e compreensão, pelo
carinho, além do estímulo intelectual.
Ao meu único e querido marido Wilson Roberto Storoli, pelo incentivo e dedicação.
Aos meus pais Antonio Feliciano e Maria Moreira, pelo esforço e paciência.
Aos meus filhos Rhenan e Raiane pelo apoio emocional nos momentos de dificuldades.
Aos meus irmãos ( José Moreira, Maria Antonia, Neusa, Marinalva e Marisa) e sobrinhas(os) pelo
apoio em todos os momentos.
Ao programa de Pós-Graduação em Serviço Social da PUC/SP, por possibilitar minha formação.
Aos professores-doutores do curso de mestrado que contribuíram para novas conquistas na
construção do saber.
Ao CNPq pelo apoio financeiro através da liberação de bolsa de estudos.
Aos pacientes, familiares e funcionários do Hospital Arnaldo Pezzuti Cavalcanti que,
prontamente, aceitaram participar desta pesquisa. Sem estas colaborações estariam aumentadas
minhas dificuldades na elaboração deste trabalho.
A toda a diretoria do Hospital Arnaldo Pezzutti Cavalcanti e, particularmente, a Nanci Duarte,
assistente técnica do hospital, pela sua insistência em preservar fotos e documentos antigos da
história do hospital.
Às assistentes sociais que trabalham no hospital. São elas: Leda, Lidiane, Marilia, Clara e
Julia pelas constantes trocas de conhecimentos.
Aos diretores da Caixa Beneficente, pelo interesse em buscar velhos documentos.
Ao professor-doutor Cássio Silveira, pela permissão para ser aluna especial na disciplina
“Modelos e Métodos de Avaliação em Políticas, Planejamento e Administração de Serviços
de Saúde”, no Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da Faculdade de Ciências
Médicas da Santa Casa de São Paulo.
À paciente Kátia Ribeiro de Oliveira, in memoriam, pela iniciativa de deixar registrados seus
sentimentos.
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Marilene Moreira Feliciano
Resgate histórico do leprosário Asilo Colônia Santo Ângelo
RESUMO
Trata-se de uma pesquisa qualitativa, que resgata o contexto sócio-histórico da época
da construção e inauguração do Asilo Colônia Santo Ângelo, em Mogi das Cruzes-SP, cujo
objetivo é produzir conhecimentos pertinentes às ações iniciais de Saúde Pública no Alto do
Tietê, já que o Asilo Colônia foi o primeiro hospital construído com verba pública estadual
para abrigar os portadores de hanseníase da região.
Por ser uma pesquisa documental, este estudo levantou fotografias e analisou antigos
documentos na tentativa de aproximar-se dos acontecimentos sociais, políticos e históricos da
época.
A pesquisa aprofundou-se no período de 1917, data em que o Arquiteto Adelardo
Soares Caiuby realizou o projeto do Asylo Colônia Santo Ângelo, e segue até a década de
1950, período que tem como registro principal a visita do candidato a governador do estado
de São Paulo o sr. Jânio Quadros e sua esposa.
Na década de 1920, a iniciativa da saúde pública para enfrentamento do problema
social foi a criação do Departamento Nacional de Saúde Pública, que instituiu a Inspectoria
de Profilaxia da Lepra e das Doenças Venéreas, cujas atividades tiveram início na chefia do
leprólogo professor Eduardo Rabello.
A principal política de saúde pública utilizada para conter a epidemia da hanseníase,
no período mencionado por este estudo, foi o isolamento compulsório que, em suas primeiras
décadas de implantação, caminhou a passos lentos devido as altas exigências internacionais
para construção e manutenção dos leprosários e pelas reduzidas verbas destinadas a esta
política de saúde.
A velha questão da lepra ainda é um grande problema social a ser repensado pela
saúde pública, pois, apesar da cura, ainda temos os pacientes com seqüelas e o crescente
número de novos casos, além do triste segundo lugar entre as estatísticas mundiais. A Índia é
o país mais atingido em números absolutos, seguida pelo Brasil.
Palavras-chave: Hanseníase, política pública de saúde e Asilo Colônia Santo Ângelo.
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Marilene Moreira Feliciano
Historical Recovery of the Asilo Colônia Santo Ângelo Leprosarium
ABSTRACT
The present qualitative research recovers the social and historical context of the
construction and inauguration of the Asilo Colônia Santo Ângelo Leprosarium, whose main
purpose is to produce knowledge pertaining to public health initiatives related to Hansen’s
disease. Situated in the city of Mogi das Cruzes, Alto do Tietê Region, São Paulo State,
Brazil, the Asilo Colônia Santo Ângelo Leprosarium was the first state hospital built with
public funds to house leprosy patients. Since this is a documental research, the study analyzed
photos and archive documents in an effort to understand the essence of social, political and
historical events of the time when the facility was built. The research dates back to 1917,
when the architect Adelardo Soares Caiuby designed the project for the Leprosarium, and
follows through to the mid 1950’s, when the hospital was visited by the then candidate
running for São Paulo State government, Mr. Jânio Quadros and his wife. In the 1920’s,
Brazilian public health services faced the challenges of leprosy. To tackle this social problem,
the government created the National Department of Public Health, which established the
Inspectorate for the Prevention of Leprosy and Venereal Diseases headed by the leprologist
Professor Eduardo Rabello. The main public health policy adopted to restrain leprosy
outbreak in Brazil during the period covered by this study was the compulsory isolation of
patients. The implementation of a leprosy control plan began quite slowly due to high
international demands for construction and maintenance of leprosaria, and to the reduced
amount of funds available for this health policy. The leprosy issue is still a serious social
problem that needs to be dealt with by the Brazilian public health authorities. Despite its cure,
the country still has a large number of patients with permanent sequelae and there is an
increasing number of new cases reported every year. Brazil also holds a sad record: it is the
second country in the world with largest number of leprosy cases, behind only India.
Key words: Hansen’s disease, public health policy and Asilo Colônia Santo Ângelo
Leprosarium.
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0.1 - PREFÁCIO
Hoje: Feliz!
Sei que Deus sempre esteve comigo. Jesus Cristo é uma realidade na vida de cada ser
humano. Toda criação suspira neste fim de século por um refrigério e uma razão para
continuar vivendo, perplexa diante de tanto sufoco. A pressão é forte e, em todos os sentidos,
muitos se sentem cansados, desiludidos. Haverá redenção para o homem? Há muito foram
perdidas sua imagem e semelhança com Deus.
trinta anos encontro-me neste hospital, graças a Deus. Como aprendi! A escola foi
severa, mas valeu! Em todas as aflições Jesus sempre esteve comigo. Quando tudo parecia
perdido, mesmo minha vida, sentia uma mão forte me conduzindo, dando-me forças, guiando-
me. Há 27 anos sou casada e tenho um filho de 25 anos. De todas as dores a maior foi, talvez,
vê-lo ser levado para uma creche tão logo nasceu. Minha irmã retirou o bebê e o criou. Minha
maior felicidade é vê-lo estudando e cheio de saúde. Logo serei avó. Foram mais os baixos
que os altos em minha caminhada numa vida bem penosa. Desde os quatro anos de idade sou
hanseniana. Aos onze anos, já era defeituosa de ambas as mãos e tinha os pés bem atingidos.
Em minha opinião, o sintoma característico dessa enfermidade é uma ou mais partes
anestesiadas no corpo. Na juventude tive uma pele linda, na opinião de todos que me viam.
Jamais tive um exame positivo e minha vacina sempre apresentou excelente resultado. Minha
forma é negativa, contudo sofri todos os horrores da má informação. Hoje, penso que são
coisas determinadas pelas quais cada pessoa tem de passar. O comportamento dentro daquilo
que deve acontecer é que compete ao nosso livre-arbítrio. Nem acredito ter superado tanto
sofrimento. Creio que na eternidade é assim. Sorrimos com gratidão ao pai, pela maravilhosa
oportunidade de podermos aqui, neste lindo planeta, viver para conhecê-lo, sentindo-o em
cada momento da vida.
Gostaria que minha palavra alcançasse a todos os portadores de defeitos físicos.
Crianças e jovens sofrem mais. É dolorosa a privação de movimentos, a incerteza de que
seremos amados, a impossibilidade, algumas vezes, de trabalhar, uma sensação de solidão que
dói, machuca a alma, até que esta desperta, uma porta invisível é aberta, pelas percepções
desfrutamos duma paz que somente Ele pode nos dar, e como é maravilhoso ter intimidade
com o Pai.
É bom aprender a disciplinar o pensamento, assim os olhos espirituais são abertos
para vermos que lindo é o amor de Deus. A certeza de que, a cada instante de dor há uma
compensação de felicidade, transitória agora, eterna à nossa espera.
Meu marido primeiro e único tem me ajudado bastante.
Também queria chegar até os religiosos, médicos, autoridades, pobres, ricos,
miseráveis, presidiários, sadios e doentes. A todos diria o seguinte: “Lembrem-se, ao
morrermos nada levamos, até o cadáver deixamos. Para que o desespero, a inveja, a ganância,
o ódio?”.
Amemo-nos uns aos outros, como Ele continua nos amando.
Posfácio do livro Uma estrela sobre o mar, escrito pela paciente Kátia Ribeiro de Oliveira.
São Paulo: Lúmen Editorial, 1995.
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1.1 - INTRODUÇÃO
Quando estava elaborando mentalmente o objeto desta pesquisa, pensei apenas no
histórico do hospital-colônia que existe há muitas décadas. Pesquisar fatos ao longo de oitenta
anos é um período muito longo. Sendo assim, optei por recortar dois tópicos que sempre me
intrigaram: O momento sócio-histórico da construção e a inauguração do hospital.
Trata-se uma pesquisa documental do período de construção, inauguração e das
primeiras décadas de funcionamento do hospital (1917 a 1950).
Escolhi este período por acreditar que a ausência desses dados histórico-sociais
interfere negativamente na prática profissional, criando um vácuo entre a história e a situação
atual que é de hospital-geral, que mantém pacientes residentes da época do isolamento
compulsório. Este conflito está presente nas intervenções cotidianas dos profissionais que são
jovens assistentes sociais, que não participaram deste momento histórico e não foram
devidamente treinados para atuar neste indefinido cenário social. Existem diferenças entre o
hospital-geral, que é uma organização social formal basicamente voltada para o tratamento e a
cura, e o hospital de isolamento, que é uma conflitante comunidade residencial, que exerceu o
pesado papel de colaborar para que o hospital-geral se mantivesse afastado da assistência às
doenças infecto-contagiosas, e se limitou a acompanhar portadores do mesmo diagnóstico que
moravam dentro da instituição.
A escolha do Santo Ângelo como objeto deste trabalho está diretamente relacionada
aos meus sete anos de trabalho como assistente social do hospital, atendendo os hansenianos
bem como todos os outros diagnósticos, sendo os mais comuns: portadores do vírus HIV,
AVE e tuberculose. Sentia-me incompleta pela ausência de conhecimento pertinente que
garantisse melhor acolhimento aos hansenianos a partir da compreensão do surgimento do
hospital e da evolução de sua história. Como afirma Morin (2000, p.15):
… o conhecimento pertinente é o que é capaz de situar
qualquer informação em seu contexto e, se possível, no conjunto em
que está inscrito. Podemos dizer que o conhecimento progride, não
tanto por sofisticação, formalização e abstração, mas, principalmente,
pela capacidade de contextualizar e englobar.
Trabalhar com hansenianos institucionalizados sem o conhecimento de sua história
fica impossível englobá-los, ou seja, eles já trazem uma forte carga de exclusão social, sua
história de vida foi construída à margem da sociedade mais ampla e se também o profissional
estiver descontextualizado não haverá fluência na comunicação e no acolhimento, como
afirma (Bulla 2003 p. 3):
Entender a história de vida do sujeito é também compreender
como ele se apropria de seu meio de sobrevivência, pois “A vida de
cada dia é divisão do tempo e é ritmo em que se escoa a história
individual de cada um“ (Kosik, 1976, p.69). Não há possibilidade de
entender o homem e a sociedade sem relacioná-los com a história. A
história e fator essencial para a compreensão do homem através de
seu passado, presente e futuro. Ela constitui o cotidiano, pois, em toda
sociedade, existe vida cotidiana, embora sua estrutura seja
diferenciada quanto ao âmbito, ritmo e regularidades.
Trabalhar com pacientes hospitalizados por hanseníase é o mesmo que trabalhar com
situações bastante contrastadas, o bem e o mau, a verdade e a mentira, o prazer e o ódio, a
liberdade e a prisão, o real e o imaginário, o saudável e o doente, além das dificuldades
administrativas advindas do fato de os pacientes serem também moradores do hospital. As
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atividades cotidianas são desenvolvidas nos mesmos espaços físicos, ou seja, dentro do
hospital. É o local onde se vivem todas as situações, as agradáveis e também as infelizes, se
dorme, estuda, trabalha, recebe atendimento médico, recepcionam visitas, chora, namora,
brinca, vive e morre. Como define (Goffman 1974 p.11); instituição total e o local de
residência e trabalho onde um grande número de indivíduos com situação semelhante,
separados da sociedade mais ampla por considerável período de tempo, levam uma vida
fechada e formalmente administrada. Estas pessoas acabam tendo suas vidas regradas de
acordo com as normas estabelecidas pela instituição. No caso dos hansenianos esta imposição
administrativa interferiu muito na formação dos seus valores, a ponto de encontrarmos alguns
pacientes que de fato vivenciaram o isolamento no Santo Ângelo. Com todo seu rigor, o
descrevem de forma positiva, enquanto outros, que não o vivenciaram, apenas optaram por
morar no hospital após a época compulsória, e o descrevem de forma negativa. Fatos contados
por uma parcela de pacientes disparam lágrimas nos olhos; os mesmos fatos contados por
outra parcela provocam orgulho e alegria; e ainda temos os que sentem saudades dos velhos
tempos.
Diante de tamanha contradição, pairava a pergunta: “O que aconteceu que foi sentido
de forma tão positiva por alguns e vivenciado de forma tão negativa por outros?”.
Apesar dos meus muitos anos de trabalho, reconheço que a pesquisa foi necessária
porque dentro da rotina não tinha condições e nem conhecimento para transformar dados da
vida prática como: constatações, ações, dúvidas, pensamentos e intervenções em
conhecimento intelectual e também porque, segundo alguns autores, existem diferenças entre
prestação de serviço e pesquisa:
[...] pesquisa e prestação de serviço assumem
características diferentes, no mínimo quanto ao seu ponto de
partida e chegada.
(Luna, 2006, p. 23)
Na verdade, a escolha do tema para pesquisar gerou-me um grande conflito
profissional, pois enfrentar a prática profissional é sobretudo oferecer alternativa a um fazer
melhor e não só para apreciar o como não se faz.
Para distanciar-me do pesado cotidiano do assistente social, queria um tema brando,
suave e agradável aos sentidos como, por exemplo: Qualidade de vida de uma parcela dos
usuários do SUS. Foi quanto despertei para a atual situação de miserabilidade e pobreza em
que se encontram os usuários da saúde pública. Percebi que não havia espaço para este tema,
já que a necessidade maior ainda é de ações sistemáticas que facilitem o acesso aos direitos à
saúde pública garantidos por lei e que a população possa usufruir do exercício pleno de sua
cidadania. Este é um dos dilemas do cotidiano do assistente social na saúde. Passados os dias
de conflito pessoal, surgiu a lucidez e acredito que tenha sido muito feliz na escolha do tema,
porque minha afinidade e experiência favoreceram o desenvolvimento da pesquisa.
Numa ciência, onde o observador é da mesma natureza
que o objeto, o observador. Ele mesmo é uma parte de sua
observação.
(Levi Strauss, 1975, p. 215, cit. Minayo, 2004 p.14)
A realidade social do Asilo Santo Ângelo é muito intrigante, mas é impossível, apenas
em uma dissertação, contemplar a totalidade dos seus fenômenos sociais. Sendo assim,
estabeleci como objetivos para este trabalho:
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Objetivo geral
a) Resgatar os fatos socio-históricos do período em que o hospital foi construído,
organizar e analisar as informações registradas ao longo das décadas que não
receberam tratamento analítico ou não foram anteriormentes organizadas para formar
um pequeno acervo de documentos básicos de onde poderão partir outras pesquisas
acadêmicas.
Objetivos específicos
a) Contribuir, à medida que disponibilizo o acesso aos acontecimentos históricos, com
a política cultural da região na reestruturação e reinauguração do cine-teatro, já que
existe o interesse por parte da Prefeitura local e da Secretaria Estadual de Saúde.
b) Facilitar a realização de um antigo desejo dos pacientes, que é o de resgatar suas
trajetórias de vida por meio de fotografias demonstradas em exposição.
c) Contribuir para a contextualização profissional que se realizará pelo
conhecimento dos fatos desse período histórico que poderá promover intervenções
profissionais mais qualificadas.
d) Colaborar para o desenvolvimento de políticas públicas que promovam
atenção à saúde dos pacientes hansenianos.
e) Publicar importantes e antigos documentos empregados nesta pesquisa científica.
Por ser esta pesquisa um resgate de fatos antigos, não tenho como meta bendizer ou
maldizer a decisão da saúde pública da época nem tampouco exaltar excessivamente os fatos
negativos deste momento, pois os mesmos estão registrados e à disposição de qualquer
interessado no acervo estadual de jornais da época. Também não faz parte deste estudo o
aprofundamento nos tipos de tratamento da doença. Escolhi-o porque gosto de pesquisar as
grandes epidemias e por estar entre os maiores exemplos socialmente assumidos e registrados
de exclusão social e de estigmatização da história da saúde pública.
Os desafios encontrados que dificultaram esta pesquisa:
1- É o fato de ser um resgate de décadas de consciência histórica para embasar as
ações no presente, que já se mobilizam para corresponder às novas exigências da política de
saúde: trata-se do dinamismo social.
2- São as queimadas acidentais dos papéis do arquivo morto do hospital, portanto, o
desaparecimento dos documentos.
3- Os documentos do Departamento de Profilaxia da Lepra, principal órgão da época,
não foram levados para a mesmo local. Houve uma fragmentação, uma parte está no Museu
da Saúde Pública, outra no Instituto Lauro de Souza Lima. Há documentos nas bibliotecas
públicas e alguns têm paradeiro ignorado.
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4- Grande número de fotografias era guardado pelo diretor da Caixa Beneficente, que
adoeceu, foi substituído, e sua família queimou centenas de fotos, e assim foram levados os
registros de fatos históricos.
2.0 - DESVELANDO A PESQUISA
2.1 EXPLICANDO O ESTUDO
Para Martinelli (1994), mais do que buscar índices, medianas, modas, ao optar pela
pesquisa qualitativa, o pesquisador busca significados, informações que dêem um perfil aos
sujeitos e às suas respectivas histórias. Um traçado que traga à tona a singularidade do sujeito,
ainda que ele expresse também uma coletividade.
A compreensão da natureza do homem, seu papel como ator social e sua interação com
a sociedade tem se tornado foco de atenção. A caminhada pela busca deste significado traz à
tona a necessidade de uma compreensão mais ampla e profunda da realidade, tornando-se um
vasto campo para a pesquisa qualitativa.
Optei pela pesquisa qualitativa, pois ela trabalha com
significado, motivos, percepções, crenças, valores, hábitos e
atitudes, permitindo um aprofundamento das ações e das
relações humanas, como chama a atenção Minayo (2004, p.10)
em relação às metodologias da pesquisa qualitativa. [...] São
aquelas capazes de incorporar a questão do significado e da
intencionalidade como inerentes aos atos, às relações e às
estruturas sociais, sendo essas últimas tomadas tanto no seu
advento quanto na sua transformação, como construções
humanas significativas.
A pesquisa qualitativa caminha no sentido de buscar uma maior apreensão da
realidade. Sendo assim, torna-se a mais eficiente maneira de resgatar a história do Santo
Ângelo que está sendo esquecida, e foi neste espaço físico que se deram as primeiras
iniciativas da saúde pública no controle da lepra da região.
A pesquisa qualitativa aponta a existência de, pelo
menos, três diferentes possibilidades oferecidas pela
abordagem qualitativa: a pesquisa documental, o estudo de
caso e a etnografia.
A pesquisa documental é constituída pelo exame de
materiais que ainda não receberam um tratamento analítico ou
que podem ser reexaminados com vistas a uma interpretação
nova ou complementar. Pode oferecer base útil para outros
tipos de estudos qualitativos e possibilita que a criatividade do
pesquisador dirija a investigação por enfoques diferenciados.
Esse tipo de pesquisa permite o estudo de pessoas a que não
temos acesso físico (distantes ou mortas). Além disso, os
documentos são uma fonte não-reativa e especialmente própria
para o estudo de longos períodos de tempo.
(Godoy, 1995, p
. 21).
Optei por realizar, neste estudo, um resgate documental da inauguração do hospital,
que ocorreu na década de 1920, e tenho como objetivo fazer uma análise do material
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encontrado, tentando aproximar-me dos acontecimentos, por meio que permita atingir
conhecimento além de resgatar a história do primeiro Asilo Colônia, construído com verba
pública estadual para abrigar os portadores de lepra, nome que a doença tinha na época.
Para descobrir as causas da construção deste hospital, recorri a diversas fontes de
publicações antigas para ordená-las cronologicamente e reescrever a história que já se apaga
ao longo dos anos e diante das novas exigências da saúde pública.
Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas -- NBR, 2000, a pesquisa
documental pode se valer de qualquer suporte que contenha informação registrada, formando
uma unidade que possa servir para consulta, estudo ou prova. Inclui: impresso, manuscritos,
registros audiovisuais e sonoros, imagens sem modificações, independentemente do período
decorrido, desde a primeira publicação. Sendo assim, utilizei como fontes de consultas:
antigos relatórios, escrituras de doações das terras, o projeto original de construção do
hospital, o Estatuto inicial e a ata de término da Associação Protetora dos Morphéticos,
antigas leis de isolamento compulsório, a ata de inauguração do Asilo Colônia Santo Ângelo,
o primeiro regulamento do hospital, o regime interno de funcionamento, a certidão de abertura
da Caixa Beneficente, o inventário de objetos e móveis da década de 1930, teses, dissertações
e revistas de saúde pública da época, antigas fotografias, publicações em jornais e livros de
todas as épocas.
2.2 O CAMPO DE REALIZAÇÃO DA PESQUISA
O presente estudo refere-se à história do antigo Asilo Colônia Santo Ângelo, que foi
projetado em 1917 e tinha como objetivo satisfazer as exigências internacionais para a
construção e manutenção de um leprosário-modelo. Após sua construção foi considerado o
melhor do mundo, segundo publicações dos jornais da época de sua inauguração.
Porém, o campo de realização da pesquisa foi dentro do hospital, onde encontrei
alguns documentos e fotografias. Fora de seus muros, recorri às diversas fontes de pesquisas
públicas e revistas eletrônicas na tentativa de encontrar materiais antigos.
Consultei as seguintes fontes: o Instituto Estadual de Pesquisa da Hanseníase (Laura
de Souza Lima, em Bauru-SP), o acervo do Museu da Saúde Pública, revistas eletrônicas,
Portal do Envelhecimento, pesquisa do IBGE, ficha social e prontuário dos pacientes, acervos
de jornais da Secretaria Estadual de Cultura, revistas e livros históricos específicos de lepra,
publicações bibliográficas (antigas e atuais teses e dissertações a respeito da hanseníase),
registros de congressos estaduais e internacionais, álbuns de fotografias do hospital, dos
pacientes e dos seus conhecidos, consultei pessoalmente as seguintes bibliotecas: da
Universidade de São Paulo (USP), da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-
SP), a Biblioteca Municipal de Mogi das Cruzes e de Suzano, o acervo da Faculdade de
Direito, além das bibliotecas eletrônicas.
2.3 ORGANIZAÇÃO DOS DADOS
Esta pesquisa teve início com o planejamento metodológico, obedecendo aos seguintes
critérios: primeira definição das fontes a serem consultadas.
Escolhi trabalhar também com fotografia, por acreditar que ela é um recurso
facilitador na reconstrução da história do hospital, como afirmou Malinowski (citado por
Samain):
15
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{...} O texto não basta por si só. A fotografia, também
não. Acoplados, inter-relacionados constantemente, então, sim,
ambos proporcionarão o sentido e a significação
.
http://www.ufrgs.br/ppgas/ha/pdf/n2/HA-v1n2a04.pdf acessado
em 20.12.07
Fotografias e filmagens se apresentam também como
recursos de registro aos quais podemos recorrer.
Esse registro visual amplia o conhecimento do estudo
porque nos proporciona documentar momentos ou situações
que ilustram o cotidiano vivenciado.
(Minayo, 2004, p. 63).
Segui com a classificação e organização dos dados, criação de fichários de leituras
separando-as por anos de publicação, montagens de álbuns de fotos antigas por datas dos fatos
e construção de pastas para arquivo de documentos antigos.
Por ser uma pesquisa documental, passei o primeiro semestre de 2006 fazendo o
levantamento de documentos e fotografias e o segundo semestre lendo e analisando todo o
material encontrado para a reconstrução dos fatos, além da montagem dos álbuns de
fotografias. E, no ano de 2007, procedi à organização dos fichários por décadas, realizei
resumos dos textos, selecionei e recuperei as fotografias para a elaboração deste estudo,
sempre contando com a participação e colaboração de minha querida orientadora.
Os instrumentos utilizados são dimensionais, com o emprego de fontes de informações
secundárias. São fontes secundárias as documentais que foram selecionadas durante o
processo contínuo de construção da metodologia.
CAPÍTULO I- HISTÓRICO DA DOENÇA
1.1 - DEFINIÇÃO DE LEPRA
A lepra (ou Hanseníase ou mal de Hansen, do nome de
Gerhard Hansen, que identificou o agente da doença) é uma
doença infecciosa causada pelo Mycobacterium leprae (uma
bactéria próxima do agente responsável da tuberculose) que
afeta os nervos e a pele e que provoca danos severos. Ela é
endêmica em certos países tropicais, em particular na Ásia.
O Brasil ocupa o segundo lugar no mundo.
pt.wikipedia.org/wiki/Lepra
A hanseníase ou mal de Hansen (MH) trata-se de
uma doença de evolução crônica, causada pelo
Mycobacterium leprae, descoberto em 1873 por Gerhard
Henrik Armauer Hansen, razão pela qual também é
denominado bacilo de Hansen (BH).
www.biblioteca
para questionário de pesquisa.htm acessado
em 21.02.2007
Por séculos, o mal de Hansen foi conhecido como lepra, mas hoje leva o nome de
hanseníase -- para homenagear aquele que descobriu o bacilo --, o botânico e médico
norueguês Gerhard Henrik Armauer Hansen, em 1873.
A descoberta foi um grande avanço no campo do conhecimento a respeito da
doença, mas ainda faltavam respostas que apontassem o caminho para impedir a
contaminação e controlar a epidemia. A medicina ainda não tinha descoberto quais eram as
formas de contágio, as medidas para a prevenção da doença e o seu tratamento.
Na dúvida, diversas alternativas eram suscitadas para explicar a propagação da
doença. Alguns defendiam a hereditariedade, outros acreditavam no contato direto com a
secreção dos pacientes. O fato é que foi um longo período de incertezas e, até o final do
século XIX, não havia grandes avanços em termos de controle da epidemia.
Atualmente, a doença causada pelo bacilo Mycobacterium leprae é chamada no
Brasil de hanseníase. Mas, nas primeiras décadas mencionadas ao longo desta dissertação,
ainda era utilizada a palavra lepra, por isto mantive sua utilização nos períodos em que era
permitido. Quando me referir a períodos posteriores à proibição, utilizarei a palavra
hanseníase.
Foi o respeitado médico dr. Abrahão Rotberg quem sugeriu a alteração do nome da
doença para hanseníase;
Para reduzir o estigma da doença, na década de
1970 o médico e professor de dermatologia da Escola
Paulista de Medicina Abrahão Rotberg propôs a mudança de
terminologia de lepra para hanseníase.
A proposta foi aceita pelo então secretário estadual
da Saúde, Walter Leser, que também foi conselheiro da
primeira gestão do Cremesp. Desde então, a doença passou
a denominar-se hanseníase no âmbito da Secretaria
Estadual da Saúde.
Em 1995, a Lei 9.010 tornou obrigatório em todo o
país o uso da palavra hanseníase em lugar de lepra
1
.
http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Revista&id=227
Em 1976, a sugestão foi aprovada, no item 6 da portaria abaixo demonstrada;
6 – Visando à reintegração social do doente, passam a
vigorar as seguintes normas:
6.1 – O termo “lepra” e derivados ficam proscritos da
linguagem utilizada nos documentos oficiais do Ministério da
Saúde.
(Portaria nº 165/Bsb de 14 de maio de
1976.)
1
Cito a portaria nº 165/Bsb de 14.5.1976 e apresento a Lei 9.010 de 29. 3. 1995, apenas a título de esclarecimento, pois as datas destas
alterações são posteriorres a este estudo.
LEI Nº 9.010, DE 29 DE MARÇO DE 1995.
Dispõe sobre a terminologia oficial relativa à hanseníase e dá outras providências
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA - Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º O termo "Lepra" e seus derivados não poderão ser utilizados na linguagem empregada nos documentos oficiais da Administração
centralizada e descentralizada da União e dos Estados-membros.
Art. 2º Na designação da doença e de seus derivados, far-se-á uso da terminologia oficial constante da relação abaixo:
Terminologia Oficial Terminologia Substituída
Hanseníase Lepra
Doente de Hanseníase Leproso Doente de Lepra
Hansenologia Leprologia
Hansenologista Leprologista
Hansênico Leprótico
Hansenóide Lepróide
Hansênide Lépride
Hansenoma Leproma
Hanseníase Virchoviana Lepra Lepromotosa
Hanseníase Tuberculóide Lepra Tuberculóide
Hanseníase Dimorfa Lepra Dimorfa
Hanseníase Indeterminada Lepra Indeterminada
Antígeno de Mitsuda Lepromina
Hospital de Dermatologia Leprosário Leprocômio
Sanitária, de Patologia
Tropical ou Similares
Art. 3º Não terão curso nas repartições dos Governos, da União e dos Estados, quaisquer papéis que não observem a terminologia oficial
ora estabelecida, os quais serão imediatamente arquivados, notificando-se a parte.
Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 29 de março de 1995; 174º da I
ndependência e 107º da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Adib Jatene
1.2 - CAUSAS PROVÁVEIS DA CHEGADA DA LEPRA AO BRASIL
A lepra é doença muito antiga, por isso é polêmico o assunto a respeito da história
de sua chegada ao Brasil.
Tudo faz crer que os indígenas primitivos habitantes
do país não eram acometidos de lepra e desconheciam a
moléstia. A nosso ver, a inexistência de um vocabulário na
língua desses autóctones, que se refira insofismavelmente à
lepra é um dos argumentos mais poderosos a favor dessa
crença.
Segundo Maurano os vocábulos – miritg e miraih
traduzidos por lepra. O primeiro é lepra ou bexiga; o
segundo, conforme o vocabulário da Língua Brasílica, cuja
autoria parece de Anchieta, por certo não significa a
hansenose. O próprio Anchieta refere-se em suas cartas a
uma indígena que morrera rapidamente de lepra mortal. Ora,
sabemos perfeitamente que a lepra nunca é rapidamente
mortal...
Mesmo os médicos, muito depois de Anchieta,
empregaram o termo lepra, para designar moléstias, que
nada tinham que ver com a verdadeira lepra, moléstia
causada pelo bacilo de Hansen...
Antes da descoberta do Brasil era uma terra lendária
e é natural que ao chegarem, os recém-vindos tivessem
curiosidade de verificar a realidade do que se imaginava a
respeito de suas coisas e habitantes. Se acaso vissem
leprosos, tê-los-iam registrados... No entanto, a moléstia
jamais foi descrita pelos navegadores ou pelos padres que
vieram catequizar os silvícolas.
Quanto aos africanos aqui introduzidos, sob o regime
de escravidão, para trabalhar na agricultura, a insistência de
que eles tenham introduzido a lepra...
No entanto, o prof. Juliano Moreira discorda deste
pensamento geral e dá como argumento a inexistência de
endemia leprosa nos Estados Unidos, onde a introdução dos
escravos africanos foi enorme.
[...] O argumento mais importante que se pode talvez
opor à crença da introdução da lepra pelos africanos no
Brasil é o de serem estes escravos de difícil introdução,
particularmente quando doentes de pele. Ninguém, quando
se tratava do próprio interesse, haveria de aceitar em sua
lavoura, engenho ou casa, um escravo em que a lepra se
manifestasse, ao menos abertamente...
Também médicos militares examinavam, a bordo, os
escravos para permitir-lhes o desembarque...
Não faltam bases históricas a esta afirmação de que
os portugueses tenham introduzido a lepra no Brasil, pois
enquanto a lepra se extinguira no continente no século XVI,
época do descobrimento e da primeira colonização deste
país, ela existia na ilha da Madeira, nos Açores, Possessões
marroquinas e nas Índias Portuguesas.
(Carvalho, citado por Maurano Tratado de leprologia - 1950).
Após a chegada da doença ao Brasil, sua disseminação foi facilitada pela má
condição de higiene, alimentação inadequada, ausência de ações preventivas e
miserabilidade dos negros escravos que eram submetidos a horas de trabalho
forçado, e
após a contaminação eram expulsos das fazendas e passavam a mendigar nas vilas.
As primeiras notícias de lepra no Brasil:
As notícias mais antigas sobre a lepra são as que se
referem às providencias tomadas pelos governadores em
certas capitanias e aos atos filantrópicos em outras.
A endemia foi assinalada pela primeira vez no Rio,
nos fins do século XVII; daí por diante, em outras regiões,
até a segunda metade do século XIX, a lepra já havia sido
assinalada como endemia grave no Pará, Maranhão,
Pernambuco, Bahia, Rio de Janeiro, Minas Gerais, São
Paulo e Mato Grosso...
No final do século XIX e início do século XX, a
abolição da escravatura, a imigração estrangeira e a
expansão da lavoura cafeeira agravaram a endemia em São
Paulo.
As referências feitas posteriormente em nada se
tornaram mais animadoras. Estabeleceu-se, infelizmente, a
crença de que o Brasil era um dos países mais assolados
pela lepra.
(Tratado de leprologia, 1950, p. 33-4)
Percebemos que as estatísticas são contraditórias, talvez pela falta de recursos
técnicos e de investimento em levantamentos estatísticos. Segundo o Tratado de leprologia,
as estimativas de pacientes foram:
Citado por Souza Araújo, realizada em 1921, por
Valverde: havia no Brasil 15 mil doentes.
Realizada em 1922, por Sergio de Barros Azevedo,
havia entre 13 e 15 mil doentes.
Em 1923, Eduardo Rabelo e Barros Azevedo
comunicaram que havia um recenseamento em curso e já
haviam fichado 7.224 doentes.
Em 1926, segundo Belisário Pena, o Brasil tinha
33.500 doentes.
Em 1936, ainda Souza Araújo cita a existência de
24.233 doentes fichados e 10.134 isolados.
A exclusão social em hospital teve início no período do Brasil colônia quando o
vice- rei Conde da Cunha – Rio de Janeiro e Dom Rodrigo José de Menezes decretaram
severas medidas de intenções profiláticas.
Neste hospital, o dos Lázaros, se hão de recolher
indefectivelmente todas as pessoas de qualquer estado ou
condições, que estiverem contaminadas do mal de S.
Lazaro, violentando-se ainda os que duvidarem fazê-lo
voluntariamente, porque assim o pede a utilidade pública que
deve preferir a particular.
(Cap. IV do Regulamento de 17 de fevereiro de 1776 baixado
pelo vice-rei Conde da Cunha).
(Pupo,1934, p. 7
)
Podemos perceber que, neste momento histórico, era aceitável a possibilidade de
violentar a vontade do doente em detrimento dos valores públicos que estavam acima dos
interesses particulares. Em cada momento histórico havia uma possibilidade de tratamento,
horas apenas dentro dos hospitais, horas em casa desde que acompanhados por médicos,
esta oscilação estava diretamente associada aos recursos oferecidos (número de leitos
versus número de pacientes contaminados). Com o passar dos séculos, ou seja, nos
documentos posteriores notamos que houve uma mudança nos valores sociais e já não se
aceitava mais a imposição em todos os casos, passando a existir uma pequena abertura para
os doentes que tinham condição financeira favorável.
O Inspector logo que tiver notícia que em algua parte
onde a distância o permitte há pessoa doente dáquelle mal,
mandará o médico e cirurgião examinar se está confirmado
nelle, e sendo verdade o fará recolher ao Lazareto sem
excepcão de pessoa, sem admitir-se escusa alguna, porque
seria malograr o effeito do dito Hospital, se conservasse
doente, dáquelle mal onde pudesse grassar seu contagio, e
se qualquer dos doentes recolhidos for rico e quizer tratar-se
à sua custa o poderá fazer,... más sempre dentro do hospital,
assim como nenhum será despedido delle sem estar
perfeitamente bom.
(Art.11 do Regulamento do Hospital S. Christovam dos
Lázaros da Bahia, baixado em 27.12.1787 por Dom Rodrigo
José de Menezes, Governador e Capitão General da
Capitania).
(Pupo-1934, p. 8)
Neste documento é mencionada a possibilidade daquele que tinha condição
financeira de assumir o custo do seu tratamento desde que realizado dentro do hospital,
ficando evidentes as diferenças sociais no tratamento.
Nos estados como São Paulo, onde não havia leitos hospitalares suficientes, crescia
o número de pessoas contaminadas, que eram pobres abandonados pelas famílias, que
passavam fome e andavam pelas ruas esmolando. Os doentes de lepra escondiam-se ou
eram escondidos pela família por vergonha. Ter um doente em casa era motivo de estigma e
divisão familiar.
Já os doentes de famílias dotadas de recursos financeiros ficavam escondidos em
suas residências luxuosas sendo assistidos por profissionais particulares.
A partir dos primeiros levantamentos regionais dos dados estatísticos da lepra no
século XVIII, o crescente número de doentes já preocupava as autoridades e amedrontava a
população das cidades próximas ao Alto do Tiete, região que é objeto desta dissertação.
A população solicitava providências, por meio de seu representante.
A seguir vemos o número de doentes do início do século XVIII, através do
levantamento das Villas de Serra acima, conjunto de alguns municípios que hoje compõem
o Vale do Paraíba mencionado pelo dr. Pupo:
Tendo concluído o levantamento, o marechal José Arouche de Toledo Rendon
escreveu ao sr. João Carlos Augusto de Oeynhausen solicitando providências, como consta
no neste trecho:
Não posso deixar de levar à presença de V. Exa. o
mapa incluzo dos lazarentos, q’ existem prezentemente nas
Villas de Serra acima da 2º Divisão Militar de meo
Commando. O numero de 295, q’mostra o Mapa, prova
quanto tem graçado esta moléstia: e se nelle há falta de
exacção he só por q’o numero ainda he maior doque os
capitaens móres notarão em suas Listas; pois q’m.tas
pessoas ocultão o seu mal, e nisto entra muita
condescendência.
... Para q’ levando-o á Augusta Prezença de Sua
Magestade, hajão providencias, q’ impessão o progresso do
contagio.
(São Paulo, 13 de março de 1820. )
(Pupo,1934 anexo 2)
A política pública não surge aleatoriamente; ela é resultado de uma construção
social e tem que defender os interesses públicos. Segundo Sposati (anotação de sala de aula
- 2006), só há política social quando há transmutação da necessidade individual para o
campo coletivo, ela é uma construção social a partir de alguns referenciais.
No caso da lepra, foi o medo e a ignorância que transmutaram a necessidade
individual para o campo coletivo, ou seja, bem antes da oficialização do isolamento já havia
uma forte pressão para que as autoridades isolassem os doentes, fizessem a limpeza dos
espaços públicos, portanto, a escolha da exclusão foi uma decisão tomada pela Saúde
Pública, pela pressão social, pois a sociedade sempre temeu a convivência com os doentes,
conforme consta no parágrafo abaixo:
[... ] que se parecer, justo fazer recolher estes
enfermos para as cazas próprias delles q’ há nessa cidade,
einda na Villa de Itú por me parecer fazer nisto hum grande
benefício ao publico.
(Trecho da carta escrita pelo sr. Domingos José Vieira em
Itapetininga, 1º de abril de 1820.)
(Pupo, 1934, p.40)
Na data que consta no documento acima, ainda não existia uma política de saúde
para assistir ao portador de lepra, que era amparado pelas ações filantrópicas,
principalmente da Igreja Católica.
O sr. João Carlos Augusto Oeynhausen respondeu à carta do marechal José Arouche
de Toledo, deixando clara a necessidade de proteger a sociedade da convivência com os
doentes:
Sr. capitão-mor das Ordenanças da Villa de Mogy das
Cruzes.
Sendo da maior necessidade assim por bem do público,
como por zello e caridade do próximo promover, que o mal
de elephantiese, vulgarmente chamado de Lázaro não se
estenda por toda esta Província,
onde quazi se vai fazendo
endêmica esta moléstia, Ordeno a Vm, faça examinar com a
maior exactidão possível o número de doentes,
que há no
seu Districto desta moléstia, e me participe para se procurar
algum meio de os separar da comunicação dos demais
moradores, e soccorre-los quanto poder ser na sua
infelicidade[...]
(SP, 4 de maio de 1820)
(Pupo, 1934 p.38
)
Esta parte dos documentos apresenta a ignorância da época em relação às doenças e
a dificuldade que existia de separar a lepra dos outros diagnósticos, chegando a mencioná-
la como sinônimo de elefantíase.
No trecho abaixo percebemos que, mesmo tendo transcorrido um século, pois está
enfatizando o período de 1917 a 1926, a situação ainda não havia se alterado e a sociedade
continuava solicitando medidas drásticas.
Para attender ao clamor publico que dia a dia
impunha a hospitalisação de leprosos, o governo encontrava
os mais sérios embaraços, pois o hospital de Guapira e os
numerosos asylos que a tradição piedosa da população
paulista tinha installado precariamente na capital e interior do
Estado, se achavam em condições dolorosas de
superlotação, abrigando cerca de 800 doentes.
(Pupo 1934 p. 12
)
O advogado dr. José Carlos de Macedo Soares, mordomo de 1916 a 1920 do
hospital Guapira em São Paulo, era um homem bastante envolvido com a questão da lepra,
por isso, uniu seu conhecimento profissional à força da influência do meio religioso e
fundou uma associação filantrópica, a Associação Protetora dos Morphéticos,
2
em março de
1917, sob a presidência do arcebispo de São Paulo dom Duarte Leopoldo e Silva, com a
participação das senhoras católicas de São Paulo. Esta associação tinha como objetivo
principal auxiliar a administração da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo na
assistência material e espiritual dos morféticos hospitalizados.
O prior do Convento do Carmo de Mogi das Cruzes, frei Antonio da Virgem Maria
Muniz Barreto, em 1918, representando a Ordem Carmelita Fluminense, entrou em contato
com a presidente da Associação Protectora dos Morpheticos, dona Mathilde Fonseca de
Macedo Soares, e doa-lhe um terreno no campo de Santo Ângelo, em Mogi das Cruzes,
para que nele fosse construído, pela Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, o Hospital
Asylo Santo Ângelo, que tinha projeto, mas não havia espaço físico definido, já que era
necessário um local isolado, muito distante dos grandes centros urbanos para evitar
contatos entre doentes e pessoas saudáveis.
A primeira escritura de doação foi lavrada em 13 de junho de 1918,
3
era doação da
Ordem Carmelita Fluminense a Associação Protetora dos Morpheticos, as terras foram
bem- vindas, pois estavam situadas em local afastado e de difícil acesso.
2
Veja no Anexo 1 o Estatuto da Associação Protetora dos Morféticos.
3
Veja no Anexo 2 a escritura de doação do terreno para a Associação Protectora dos Morpheticos, existente no
cartório de tabelião Leôncio Arouche de Toledo, Mogi das Cruzes, Livro 151, Autos de 628º a 638º .
Em 1918, após a definição do local, o construtor e arquiteto Adelardo Soares
Caiuby, sob a orientação dos doutores Emílio Ribas e Joaquim Ribeiro de Almeida,
desenhou o projeto da Leprosaria Modelo nos Campos de Santo Ângelo.
4
A Associação Protectora dos Morféticos elegeu o dr. Arthur Neiva, que era diretor
do Serviço Sanitário de Estado de São Paulo, para escrever a introdução no projeto
Leprosário Modelo Campos de Santo Ângelo.
5
O dr. Neiva inicia a introdução afirmando:
“Aqui renasce a esperança”.
Esta frase expressa a visão da política médica da época em relação à organização
sanitária das cidades.
O velho esquema médico de reação à lepra que é de
exclusão de exílio, de forma religiosa, de purificação da
cidade, de bode expiatório.
(Foucault, M., 2006).
[...] Penetramos um portão em arco ao alto, o lemma
expressivo, profundamente eloqüente na sua simplicidade:
Aqui renasce a Esperança. Esta phrase, vale por um suave
conselho que há de penetrar os corações para não sahir
mais. Conselho ou advertência, que cala nas almas doridas
dos que vão transpor a soleira ampla e clara do Santo
Ângelo.
(Jornal Correio Paulistano, 3. 5.1928)
Figura 01 da portaria e do
portão onde constava à frase
acima citada.
Fotografia do final da
década de 20, escaneada da
original que está no Museu da
Saúde Pública Emílio Ribas.
4
O projeto do Leprosário Modelo nos Campos de Santo Ângelo de 1918, é composta de 70 páginas.
O original deste projeto encontra-se em perfeito estado na biblioteca de medicina da USP/SP.
Sua identificação através do DEDALUS é FM/616.998: C124P^1918.
5
Veja no Anexo 3 a ” Introdução” do projeto Leprosário Modelo Campos de Santo Ângelo.
Figura 2 -- Fotografia de Arthur Neiva, do final da década de
1930. (Extraída do endereço eletrônico
http://www.biologico.sp.gov.br/paginas/v1_2/reboucas1.htm,
acesso em 18. 4.07.)
Artur Neiva tinha uma grande identificação com a pesquisa, particularmente as
ligadas à saúde pública.
Neiva acreditava que estava favorecendo os pacientes à medida que os colocasse em
uma microssociedade, construída a partir de fatores comuns como o mesmo diagnóstico e
que neste espaço não haveria discriminação e manifestações de preconceitos.
Arthur Neiva nasceu em 22 de março de 1880, em
Salvador, Bahia.
Formou-se em Medicina pela Faculdade de Medicina
do Rio de Janeiro, curso que iniciara em Salvador, atuou na
Inspectoria de profilaxia da febre amarela, participando da
campanha de erradicação do mosquito transmissor dessa
doença, promovida a partir de 1903, por Osvaldo Cruz,
Diretor-Geral de Saúde Pública. Mais tarde, chefiou uma
campanha de saúde na abertura da Estrada de Ferro
Noroeste do Brasil, cuja área era totalmente desabitada[...].
Além de expedições que lhe deram notoriedade, Neiva é
convidado para instalar a Seção Zoologia Médica do Instituto
de Bacteriologia de Buenos Aires, Argentina.
Texto extraídos da Internet pelo endereço eletrônico
http://www.biologico.sp.gov.br/grandes_nomes/arthur_neiva.
htm, acessado em 20. 5.06.
[...] Em Santo Ângelo os lázaros formarão a sua sociedade
à parte. Haverá para as creanças, mulheres, homens e
velhos o convívio, a troca de idéias, as diversões, o trabalho.
O mundo para elles, depois que foram attingidos pelo mal, só
terá que melhorar. O repudio que tanto os tortura e
horrorisava, vae cessar. Os seus corações se abrirão para
todas as esperanças e novamente poderão sentir, no amparo
para onde foram, toda a gloria de viver, da qual tão afastados
se achavam. Oh! como nos eleva o bem que se sente pelo
conforto moral que se vem trazer aos infelizes e quanto nos
engrandece a felicidade de termos sido, em algum momento
da nossa curta existência, útil aos nossos semelhantes!...
(Neiva, 1918)
(extraído do documento Leprosaria Modelo, p. 6)
Esta frase, além de camuflar a idéia de higienização do espaço urbano através da
exclusão social, deixa clara a intenção de criar um mundo isolado ou, no mínimo, construir
uma comunidade por causa da lepra.
[…] Do verdadeiro mundo só lhes restará a
melancholica saudade e a esperança de a elle regressar.
Mas para essa tristeza, a grande maioria de crente que alli
se vai abrigar, encontrará lenitivo no balsamo que a religião
lhes vae proporcionar com a construcção de um templo, que
poderão encher com a uncção das suas preces. Campanário
de onde também ecoará, pelo mundo afora, a sonora
vibração dos que ali vivem mitigados no soffrer, alliviados da
sua dor, a bem aventurar os nomes dos que lhes
proporcionaram o abrigo – Onde Renasce a Esperança.
(Neiva, 1918)
(extraído do documento Leprosaria Modelo p. 7)
1.3 - A LEPRA COLOCADA COMO QUESTÃO SOCIAL
Uma parte dos estudiosos e analistas da questão social na
América Latina defende que ela surge como tal, no momento
do início da industrialização e das primeiras políticas
econômicas para encaminhá-las...
(Castel 2007, p. 107
).
O processo de industrialização no Brasil, que teve início no final do século XIX, foi
impulsionado pela substituição de importações e pela possibilidade de contar com a mão de
obra de imigrantes. Com a chegada desses imigrantes, a população de algumas cidades
aumentou, sendo que São Paulo, mesmo antes deste período, já apresentava problemas com
a questão habitacional.
A falta de moradias para os imigrantes trabalhadores gerou a expansão dos
loteamentos e fez surgir novos bairros, que geralmente eram localizados em regiões
periféricas, que apresentavam falta de serviços de infra-estrutura essencial como água e
saneamento básico.
Por estar entre os maiores pólos industriais do período, a capital do estado de São
Paulo sofreu com o rápido crescimento, sem planejamento, enfrentou vários problemas
ligados à urbanização acelerada e à superpopulação da área central e dos bairros operários
que começavam a se formar. Os núcleos operários dos centros urbanos e o desenvolvimento
das comunicações ferroviárias e rodoviárias, associados às fragilidades provocadas pela
pandemia da Gripe Espanhola de 1918, serviram de facilitadores para a expansão das
moléstias como a lepra e a tuberculose, que além de se tornarem mais visíveis, aumentaram
sua incidência, em virtude da maior proximidade física entre os moradores de imóveis
quase sempre insalubres.
Este fato foi demonstrado pelas estatísticas a respeito da freqüência da Lepra no
estado de São Paulo, que saltou de 300 casos em 1912, para 8.424 em 1930, conforme foi
divulgado nos jornais da época:
1912 – 300 casos, sem indicação nominal, verificados em 14 municípios do estado,
pelo dr. Enjolras Vampré.
1916 – 1.711 casos, sem indicação nominal, comunicados pelo dr. Emílio Ribas,
quando commissionado pelo Governo do Estado para estabelecer as bases para a
solução do problema da lepra no Estado.
1921 – 1923 – 3.287 casos com residências conhecidas, verificadas pelo dr.
Benigmo Ribeiro.
1925 -- 3.787 casos constantes das estatísticas de leprosos apresentadas pelo dr.
Geraldo Paula Souza.
1930 – 8.424 casos constantes de 4.493 fichas clínicas e bacteriológicas registradas
na Inspectoria da Lepra e 3.931 notificações médicas a serem verificadas pelos
Inspectores sanitários.
A maneira desrespeitosa e autoritária como se deram as relações entre trabalhadores
e industriais favoreceram a hospitalização compulsória dos doentes de lepra, qualquer
acontecimento social que fugia do controle era ma vindo, até a classe trabalhadora era vista
como ameaça à ordem pública.
Idéia de proteção de um povo imaturo, sem interligação entre
si e com o resto da sociedade, sem vocação para a
universalidade e incapaz de solidariedade e de ação coletiva;
de outro lado, o perigo que representam quando, em seu
protesto, formam a “ralé” e a “população” sem raízes culturais
onde ancorar alguma legitimidade.
(Paoli,1989, p. 45, citado por Castel, 2007 p.111).
A industrialização teve, como conseqüência, maior concentração de renda em
algumas regiões, isto porque, segundo Galeano:
A riqueza que gera não se irradia sobre o país inteiro
nem sobre a sociedade inteira, mas consolida os desníveis
existentes e inclusive os aprofunda. Nem sequer os próprios
operários, os “integrados” cada vez menos numerosos, se
beneficiam em medida igual ao crescimento industrial; são os
estratos mais altos da pirâmide social os que recolhem os
frutos, amargos para muitos, dos aumentos de produtividade.
(1978, p. 269-270 citado por Castel, 2007, p. 112).
Esse período da história marca a decadência da oligarquia cafeeira e a transição
entre o rural e o urbano. Essa transição é desigual e descontínua, levando em conta a
extensão do território nacional e a diversidade cultural. Assim, temos a passagem de uma
economia exclusivamente rural, centrada na dominação patrimonialista, para uma economia
industrial que traria como conseqüência a urbanização.
Este momento de transição sociopolítica foi escrito no governo de Altino Arantes,
eleito presidente do estado de São Paulo, cargo que ocupou entre os anos de 1916 e 1920,
Julio Prestes, presidente de estado 14.7.1927, quando tomou posse a 24.10.1930 e
Washington Luís, que viria a ser presidente do Brasil em 1926.
Além destes políticos, temos também Getúlio Vargas e o governador Adhemar de
Barros, que muito contribuíram para a manutenção das ações de isolamento compulsório,
pois foram governadores nestas décadas.
Altino Arantes Marques nasceu no dia 29 de
setembro de 1876, em Batatais, filho de Francisco Arantes
Marques e Maria Carolina de Arantes. Terminou seus
estudos preparatórios em Itu, formando-se bacharel na
Faculdade de Direito do Largo São Francisco. No ano de
1899, casou-se com Maria Teodora de Andrade Junqueira,
na França. A partir de então começou a participar da vida
pública de uma forma mais contundente. Em 1906 elegeu-se
deputado federal pelo Partido Republicano Paulista (PRP),
sendo reeleito para o cargo no ano de 1909.
Após 1915, ano do falecimento de sua esposa Maria
T. de Andrade, Altino Arantes foi eleito presidente do Estado
de São Paulo, cargo que ocupou entre os anos de 1916 a
1920. Ainda em seu mandato de presidente de Estado
casou-se pela segunda vez com Gabriela Junqueira (1919).
Durante 14 anos, Altino Arantes foi presidente da
Academia Paulista de Letras. Foi também membro do
Instituto Histórico Geográfico de SP.
Altino Arantes morreu em São Paulo no dia 15 de
julho de 1965.
(Texto extraído do arquivo Altino Arantes do acervo da
Secretaria Estadual de Cultura.)
Julio Prestes, homem bem nascido, filho do político
Fernandes Prestes de Alburqueque e aparentado com a
família do ex-presidente Arthur Bernardes, o titular atesta o
costume da época, que alçava determinadas famílias, por
várias gerações, ao comando de relevantes cargos
administrativos e executivos. Sua família possuía um amplo
capital de relações nas mais altas esferas da vida política
brasileira. Ligado aos grupos voltados para a agricultura, a
chamada “oligarquia paulista”, Prestes foi também fazendeiro
em Itapetininga, sendo, portanto, conhecedor dos interesses
dos agricultores, identificados com as propostas da Primeira
República. Ao mesmo tempo, manteve contato com
empresários ligados à nascente indústria nacional como
Matarazzo e Simonsen.
Seguiu a carreira de advogado, tendo cursado a
Escola de Direito do Largo São Francisco, que reunia futuras
lideranças, uma geração importante, com quem Prestes
atuou na política e na advocacia...
Ligou-se também ao grupo de intelectuais e artistas de
vanguarda, atuantes no Movimento Modernista da década de
1920[...].
Vida e atuação política e profissional
Formação 1882 – 1909
Deputado Estadual 22. 7.1909 (diplomação no cargo) a
16. 2.1924.
Deputado Federal 17. 2.1924 a 13. 7.1927.
Presidente de estado 14. 7.1927 a 24.10.1930
Exílio 25.10.1930 (pedido de asilo no Consulado inglês) a
20. 8.1934.
Pós-exílio 21. 8.1934 (retorno ao Brasil) 9. 2.1946
(falecimento).
(Texto extraído do Fundo Júlio Prestes, do acervo da
Secretaria Estadual de Cultura)
Washington Luís, embora nascido no estado do Rio, toda a
sua carreira política foi ligada ao PRP (Partido Republicano
Paulista). Eleito deputado estadual em 1904, foi Secretário
da Justiça de 1906 a 1912. Em 1913 foi nomeado prefeito da
Capital Paulista, por votação interna da Câmara Municipal e,
em 1917, foi reeleito por voto direto, permanecendo na
Prefeitura até 1919, quando se candidatou ao Governo do
Estado. Foi eleito e governou de 1920 a 1924, sucedendo a
Altino Arantes, com quem colaborou politicamente, enquanto
prefeito. Destacou-se por sua cultura acadêmica e seu
espírito progressista. Entre as disciplinas que Washington
Luís privilegiava, destaca-se a Estatística. Durante sua
passagem pelos governos municipal e estadual incentivou o
conhecimento de realidades sociais a partir de métodos
quantitativos, favorecendo a pesquisa científica e as
soluções técnicas, para problemas sociais e epidemiológicos.
Outro dado importante, no caso de São Paulo é o surgimento
de uma burguesia industrial, competindo em algumas áreas
com os barões do café. Além disso, pela primeira vez o
Brasil conheceu as classes médias, constituídas por
pequenos empresários e incorporando funcionários públicos
e profissionais liberais.
A desigualdade, fruto da má distribuição de renda e a concentração de mão-de-obra
nas zonas urbanas foram consideradas, pelas autoridades da época, como necessárias para a
higiene pública e para o controle da ordem social. Isto está presente na frase atribuída a
Washington Luís:
[...] a questão social é uma questão de polícia. O que trouxe
por conseqüência a postura de criminalização do pobre e do
vagabundo, e posteriormente a qualificação dos
trabalhadores como constituindo as “classes perigosas”.
Fruto das lutas dos trabalhadores internos e das influências
vindas do exterior, os operários progressivamente adquiriram
as mesmas formas de proteção social e de assistência
operadas em outros países.
(Castel 2007, p.113).
Adhemar de Barros era Médico, de formação
humanista, priorizou enfrentar o problema da saúde pública,
um dos mais graves no estado, realizando gigantesca obra
de saneamento básico e programas de erradicação das
principais endemias como a tuberculose, o pênfigo foliáceo,
lepra e outras.
Em 1938, anunciou também que a "criação do
Departamento de Saúde obedeceu à necessidade urgente
de colocar nosso aparelhamento de defesa da saúde pública
à altura das exigências atuais". Suas obras de saneamento,
as campanhas de educação sanitária e de profilaxia das
enfermidades endêmicas - como tuberculose, lepra, pênfigo
foliácio – tornaram habitável uma das cidades de pior
qualidade de vida no estado.
[...] Governou São Paulo durante 12 anos: quatro como
Interventor e oito como governador, eleito e reeleito pelo voto
popular. E ainda foi deputado estadual e prefeito da capital.
São Paulo elegeu o seu primeiro prefeito somente em
1954, quando conquistou a emancipação política. Até então,
os responsáveis pela administração eram os próprios
Governadores, que nomeavam seus Prefeitos. Adhemar foi
responsável pela administração de São Paulo quando foi
interventor, de 1938 a 1941, como governador eleito, de
1947 a 1951, e finalmente, de 1957 a 1961, eleito prefeito
por eleição direta.
http://www.adhemar.debarros.com.br/obras.htm
O presidente do estado de São Paulo, dr. Altino Arantes, em 20 de dezembro de
1917, promulgou a Lei n. 1.582,
6
que autorizou o governo do estado a fazer acordo com
a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo para o controle da Lepra.
6
LEI Nº. 1.582 , de 20. 12. 1917.
Autoriza o Governo a entrar em accôrdo com a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, para a prophylaxia da lepra.
No levantamento histórico da lepra, esta lei aparece como o marco da passagem da
assistência filantrópica para a política pública de saúde.
Cumprindo o art. 5º, da lei citada, o estado liberou crédito no valor de mil contos de
réis, em cinco prestações anuais, para a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo construir
o Hospital Modelo Leprosário Santo Ângelo. Fato que demonstra que a construção dos
hospitais estaduais em São Paulo é recente, mas surpreendidos ficamos com o enorme
investimento público para a construção de um hospital específico para uma patologia que
não representava alto índice de contaminação.
A Associação Protetora dos Morpheticos, que exercia uma atuação meramente
filantrópica na assistência aos doentes, não concordou com a utilização que a Santa Casa
fazia da verba federal que recebia. Sendo assim, em 15 de abril de 1919, a diretoria da
Associação Protetora dos Morpheticos deu por terminada sua missão
7
Tendo, porém, a Santa Casa resolvido confiar ao Governo do
Estado a Execução do grandioso plano que lhe offereceu a
Protectora e que nas suas linhas geraes e insubstituíveis é
obra exclusivamente sua, é evidente que se acha terminada,
com motivos de júbilo para nós, a missão que em boa hora
nos propuzemos. De facto: o benemérito e patriótico
Governo do Estado merece certamente todas as nossas
sympathias, pois com o prestigio e amplos recursos de que
dispõe vai executar um plano que era nosso, para o qual
contribuímos largamente com generosidade e dedicação
pessoal, mas absolutamente não precisa do nosso apoio
material. Sabem as Sras. Conselheiras como e por que
deixou a Associação de receber a verba de cem contos de
réis, votada pelo Congresso Federal em favor dos nossos
infelizes protegidos. Acrescente-se, para perfeito
O doutor Altino Arantes, Presidente do Estado de S. Paulo. Faço saber que o Congresso Legislativo decretou e eu promulgo a
lei seguinte:
Art.1º - Fica o Governo auctorizado a entrar em accôrdo com a Santa Casa de Misericórdia de S. Paulo para o fim de
promover prophylaxia da lepra neste Estado.
Art.2º - As construcções que forem necessárias para esse fim serão executadas de accôrdo com o plano e precripções do
Serviço Sanitário.
Art.3º - A organização technica dos serviços será feita de accôrdo com a Secretaria do Interior, à qual competirá egualmente a
fiscalização do funccionamento dos mesmos.
§Único – A manutenção e a direcção interna dos serviços ficam a cargo da Santa Casa.
Art.4º - O Governo poderá doar à Santa Casa terrenos vagos, de sua propriedade, e que forem necessários para as construcções
de que trata o art. 2º.
Art.5º - Para a execução da presente lei, fica o Governo auctorizado a despender até a quantia de mil contos de réis, em cinco
prestações annuaes, podendo, para esse fim, abrir os créditos necessários.
Art.6º - Revogam-se as disposições em contrario.
O Secretario de Estado dos Negócios do Interior, assim o faça executar.
Palácio do Governo do Estado de S. Paulo, 20 de dezembro de 1917.
Altino Arantes Oscar Rodrigues Alves.
(Publicado na Secretaria de Estado dos Negócios do Interior, em 26 de dezembro de 1917 – Tiburtino Mondim Pestana, servindo de
diretor-geral).
7
Veja no Anexo 4 a ata da 5ª sessão ordinária da Associação Protetora dos Morféticos, de 15 de abril de
1919.
conhecimento da situação, que circumstancias também
sabidas, cuja responsabilidade absolutamente não nos cabe,
e que facilmente poderiam ser removidas, privam os nossos
pobres enfermos de uma contribuição superior a cem contos
de réis já subscrita por diversos benfeitores, e ainda de outra
muito mais avultada que, por motivos óbvios, não consta
officialmente das nossas actas.
Fazendo os mais sinceros e calorosos votos para que
o Governo do Estado, removendo a mancha que tanto enfeia
e envergonha a civilização paulista, leve a termo o projecto
da nova Leprosaria, propõe sua Excia. Revma. Que a
“Associação” se dê por dissolvida, mandando entregar à
administração da Santa Casa todo o saldo existente em
caixa, para que seja empregado, exclusivamente, em
melhoramentos indispensáveis ou urgentes no Hospital do
Guapira.
(ata da reunião 15. 4.1919)
( Pupo, 1934. p. 15-16 )
Como a Associação dos Morpheticos havia terminado, sua diretoria doou as terras
situadas no Campo de Santo Ângelo, para a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo
construir o leprosário e, assim, temos a 2ª escritura lavrada em 6 de setembro de 1918.
8
1.4 - POLÍTICA DE SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL
As ações do dr. Emilio Ribas são destacadas no início do século XX e marcaram a
história da hanseníase no Brasil. Foi colaborador no hospital Guapira e orientador deste o
projeto de construção do Asylo Colônia Santo Ângelo, além de ser considerado o precursor
da saúde pública brasileira.
A história da saúde pública brasileira inicia-se no
começo do século, com Emílio Ribas em São Paulo, e
Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. No interior da escola
pasteuriana, estes cientistas tinham como meta superar a
teoria miasmática a partir da introdução da teoria
bacteriológica, considerando mais adequada para organizar
a intervenção no campo da saúde. Nesta perspectiva, tanto a
saúde como a doença passaram a ser vistas como um
processo coletivo, resultado da agressão externa que o
corpo biológico sofria de um meio social natural insalubre. A
descoberta e o isolamento dos indivíduos doentes,
contagiantes, o saneamento do meio, a destruição dos
vetores biológicos e a proteção dos sadios consistiam nos
principais objetivos desta perspectiva.
(Merhy , 1993, p. 3).
8
Veja no Anexo 5 a 2ªescritura de doação das terras para a Santa Casa de Misericórdia do Estado de São Paulo.
No século XIX, os hospitais eram conhecidos como “refúgio da morte”. Eram
mantidos por meio de ações filantrópicas que abrigavam principalmente os doentes que
viviam abaixo da linha da pobreza.
Algumas mudanças ocorreram no início do século XX, apesar de que, neste
período, no Brasil ainda não existia uma política de saúde pública estruturada, o que havia
eram ações isoladas e emergenciais, os estados que contavam com inexpressivas estruturas
de serviços voltavam a maioria das suas ações para grupos selecionados da população que
representavam risco de contaminação como o portador de tuberculose, de hanseníase e de
gripe espanhola entre outras epidemias. Dependendo da gravidade do caso, o socorro era
realizado pela chamada “polícia sanitária”, que nem sempre utilizavam métodos
convencionais de adesão ao tratamento. Sua finalidade, segundo o Código Sanitário de
1918:
Artigo 88 - A polícia sanitária tem por fim a observância das
leis sanitárias relativamente à preservação e repressão de
tudo quanto possa comprometer a saúde pública.
§ Único - Esta polícia será exercida pela auctoridade
sanitária, que terá sempre livre ingresso em todas as
habitações particulares e collectivas, estabelecimentos de
qualquer espécie, terrenos cultivados ou não, logares e
logradouros públicos, onde, além de attender ás suas
condições hygienicas, asseio, conservação e estado de
saúde dos moradores, verificará mais o estado dos
reservatórios de água potável e seu abastecimento, a
integridade e funcionamento das installações sanitárias,
banheiros, tanques, lagos, esgottos e boeiros etc., e, bem
assim, o asseio, conservação e condições hygienicas das
áreas, quintaes, pateos, cocheiras, estrebarias, estábulos,
gallinheiros, observando sempre as leis federaes, estaduaes
e municipaes.
A exemplo do que aconteceu na inauguração do Santo Ângelo, a maioria dos
serviços de saúde eram subsidiados com verba pública e administrados pelas ações
filantrópicas, onde destacamos a presença das Santas Casas.
A década de 1920 foi marcada por grandes mudanças e pela ampliação da iniciativa
pública sobre os problemas sanitários e de saúde com a criação do Departamento Geral da
Saúde Pública (DGSP). Este departamento, entre outros, criou a Inspectoria de Profilaxia
da Lepra e das Doenças Venéreas, que tinha como atividade principal a divulgação sobre a
situação real da lepra no país no seu interior, foi a primeira política pública nacional de
controle da endemia, este departamento apesar de bem intencionado, suas ações ficaram
abaixo das expectativas por falta de recursos financeiros e interesses políticos. No período
de sua existência este departamento foi bastante criticado pelos sanitaristas da época, não
apenas pela permissão de isolamento domiciliar, como também pelo tratamento conjunto
com as doenças venéreas e pelas suas discretas ações.
Também temos no início do século XIX, avanços da tecnologia das ciências
biológicas, houve descoberta dos agentes causadores de uma série de doenças graves como:
tuberculose, a gripe espanhola e a sífilis.
A década de 1920 foi marcada por sua efervescência dos movimentos culturais e
políticos que revolucionaram a sociedade brasileira. Temos nas artes a Semana de Arte
Moderna, em 1922, que levantou questionamentos sobre a realidade brasileira, no aspecto
social e econômico. Marca o inicio do vínculo com as políticas de previdência social,
através da criação da caixa de aposentadoria e pensão, a CAP, que representou a primeira
modalidade de seguro para trabalhadores do setor privado.
A intervenção do estado na área do seguro social
para assalariados urbanos do setor privado data de 1919,
com o seguro de acidente de trabalho, sendo a década de
1920 a criação das Caixas de Aposentadorias e Pensões
(CAP). O decreto-lei nº 4682/23 cria a primeira CAP, dos
ferroviários, tendo-se este modelo de seguro social
rapidamente multiplicado nos anos subseqüentes.
(Cohn, Nunes, Jacobi e Karsch, 2006, p.14.)
As transformações sociais e econômicas que o País estava vivendo, contribuíram
para a evolução na formulação de novas teorias sobre prevenção de doenças e organização
dos sistemas de saúde.
Na década de 1930, a assistência médica ainda era pautada na filantropia e na
prática liberal, porém as rápidas transformações econômicas e políticas advindas do
processo de industrialização impulsionaram algumas mudanças, como a vigilância do
exercício profissional e a realização de campanhas de saúde embora fossem discretas e
pontuais ações.
A Caixa de Aposentadoria e Pensão (CAP) conhecida como Lei Eloi Chaves e,
mais tarde, os Institutos de Aposentadorias e Pensões, fragmentado por categorias
profissionais, eram contratos compulsórios entre empresa, trabalhadores e estado. Após
suas criações tivemos, como conseqüência, a divisão de responsabilidade. Ao estado
ficaram reservadas as medidas coletivas de saúde, particularmente as de controle das
endemias que se configuram como sério obstáculo para o florescimento das atividades
econômicas agroexportadoras, enquanto o atendimento individual ao trabalhador ficava a
cargo do setor privado através dos credenciamentos médicos. Neste período histórico, a
saúde não se constituía como direito do cidadão e dever do estado, mas, sim:
[...] Assistência médica como um serviço ao qual se tem
acesso a partir da clivagem inicial da inserção no mercado
de trabalho formal e para a qual se tem que contribuir com
um percentual do salário.
(Cohn, Nunes, Jacobi e Karsch, 2006, p.15)
As décadas de 1940 e 1950 são marcadas pela consolidação dos direitos trabalhistas
do período Getúlio Vargas. As ações de serviços de saúde eram financiadas pelas categorias
de trabalhadores sindicalizados, ou seja, somente as mais organizadas categorias
profissionais tinham acesso a serviços de saúde.
Para Cohn (2005, p. 230) datam, portanto, desta época as raízes da privatização da
assistência médica no Brasil sob a égide da política previdenciária instituída pelo estado e
sem ônus para os cofres públicos.
Em 25.07.1953, com a Lei nº 1.920, houve o desdobramento do Ministério da
Educação e Saúde: Ministério da Saúde e Ministério da Educação e Cultura.
Este ministério passou a encarregar-se das atividades que eram de responsabilidade
do Departamento Nacional de Saúde (DNS), mantendo a mesma estrutura. O Ministério
limitava-se à ação legal e à mera divisão das atividades de saúde e educação, antes
incorporadas num só ministério.
Em 1956, o Ministério cria o Departamento Nacional de Endemias Rurais, que
tinha como finalidade organizar e executar os serviços de investigação e de combate à
malária, leishmaniose, doença de Chagas, febre amarela e outras endemias existentes no
país.
Enfim, a Saúde, no inicio do século XX, tinha a função de assistir ao paciente
pecador que gerou a doença, sendo que a saúde pública ficou quase que exclusiva ao
atendimento aos pobres e desempregados.
1.5 – EXIGÊNCIAS PARA A CONSTRUÇÃO DOS LEPROSÁRIOS
Durante os séculos XVIII e XIX, quase toda a Europa adotava o isolamento como
tratamento para os hansenianos e constatava uma lenta e gradativa diminuição no número
de doentes. Essa diminuição pode ter ocorrido principalmente pelo distanciamento dos
doentes, dificultando a transmissão. O isolamento compulsório em São Paulo foi uma
decisão que demorou a ser tomada, pois em outros estados já era uma prática comum e
havia uma tendência mundial, que foi reforçada após sugestão feita pela mesma pessoa, que
visualizou o bacilo de Hansen. O dr. Gehard Hansen, na I Conferência Internacional de
Leprologia, realizada em outubro de 1897 na cidade de Berlim, onde fez recomendações
sobre a conduta para com os doentes, ressaltando a importância do isolamento, afirmou
que:
1) O isolamento dos doentes, em sua própria casa,
contribuirá para um combate mais eficaz à doença.
2) Onde existem muitos pobres hansenianos, o
isolamento feito apenas em casa não será suficiente. Nestes
casos, o governo terá de tomar providências e isolá-los,
assim como se responsabilizar pelo cuidado e tratamento
destes.
3) Cada caso dever ser examinado individualmente e
então se decidir pelo isolamento facultativo ou obrigatório
(Hansen, 1897, citado por Cunha, p. 8).
Mas foi só após a II conferência Internacional da Lepra, de Bergen, Noruega, que a
segregação foi oficialmente recomendada em 1909.
[...] A execução precária dos leprosários e
conseqüente desperdício do patrimônio público tem sido
motivada em parte, pela falta de estudos preliminares, de
projetos satisfatórios e orçamentos precisos. A técnica
moderna de construções, especialmente a de hospitais e
leprosários, não se limita hoje a uma questão puramente de
estabilidade e de estética de fachada, bem como simetria e
uniformidade de disposição dos elementos architetonicos.
Ela exige ainda um conhecimento acurado dos serviços a
que se destinam as construções: e impõe ao autor do projeto
a condição de estar integrado com os serviços.
(Continentino, 1934)
9
Essas conferências eram o caminho internacional de orientação das ações
pertinentes à hanseníase, porém as leis nacionais caminhavam paralelas às sugestões
internacionais.
Já no Código Sanitário do Estado de São Paulo, Decreto nº 2918
10
de 9. 4.1918,
estava previsto o isolamento obrigatório, mas não era praticado pela ausência de locais
apropriados:
Artigo 654 - Notificado um caso de lepra, a
auctoridade sanitária procederá como nos casos de
tuberculose aberta, e de accôrdo com as instrucções
especiais, emquanto o Governo do Estado não dispuzer de
colônias para leprosos, montadas de accôrdo com os
modernos preceitos de hygiene e offerecendo conforto e
attractivos necessários para o isolamento obrigatório.
Apesar da indicação existente nos artigos do Código Sanitário e da recomendação
das conferências, o isolamento em São Paulo não era praticado pela ausência de locais
apropriados, e o Hospital Guapira estava superlotado. Na década de 1920, poucos
estabelecimentos forem construídos por falta de investimentos na saúde.
A maioria dos antigos documentos aponta a Lei 2.416 de 31.12.1929 como a que
claramente regulamentou o isolamento compulsório e a única que mencionou a
possibilidade de o estado construir hospitais segundo as exigências internacionais.
A construção de um leprosário implicava não só em altos investimentos financeiros,
bem como a preocupação com o espaço físico. Para satisfazer as necessidades do medo
social, do isolamento, e ser um bom projeto, era preciso estar afastado dos centros urbanos,
mas com possibilidade de comunicação, espaço para construção de posto policial, casas
para os profissionais administrativos, para os médicos, para o prefeito, padre e para as
freiras, matadouro, depósito de gêneros alimentícios, padaria, cozinha e refeitório,
9
Eng. Lincoln Continentino, inspetor de engenharia sanitária da diretoria de saúde pública do estado de Minas.
Este trecho foi extraído de sua tese apresentada no Congresso para uniformização do combate à lepra, em
1934.
10
O Decreto nº 2.918 de 9. 4. 1918 dá execução ao Código Sanitário do Estado de São Paulo na gestão do presidente dr.
Altino Arantes. Este código era composto de oitocentos artigos.
laboratório, hospício, cadeia, gabinete dentário, cemitério, necrotério, lavanderia, piscina,
hortas e pomares, estábulo, olaria, oficina mecânica de costura e de carpintaria, comércio
interno, casa de força e luz, centro telefônico, farmácia, cine-teatro, sede de associação
beneficente, pequenas indústrias, templos religiosos, escolas, quadras de diversão e
esportes, além da reserva de terra para a parte arborizada e para as diversas formas de
habitação dos doentes.
O desenvolvimento dos leprosários deve ser adstrito
a um plano geral racional de urbanismo, estudado
conveniente e demoradamente por autoridades médicas,
engenheiros sanitários e urbanistas. Estes planos não
podem sofrer alteração em suas linhas gerais pelos
administradores eventuais.
(Continentino, 1933).
Em nenhum momento desta história percebemos a intenção de convidar o paciente
para manifestar seu desejo, ou para participar do processo de decisão do seu futuro. Nota-se
um acentuado autoritarismo que impedia até mesmo os administradores do hospital de
fazerem alterações, mesmo que estas fossem interessantes para os pacientes.
As regras de construção eram universais e rigorosamente respeitadas -- a maioria
bastante excludente -- e geraram clima de pânico interno, como por exemplo: os leprosários
eram divididos em zonas para doentes e para funcionários. Entre as duas zonas deveria
haver, ao menos, uma faixa neutra de 300 metros de largura para evitar a contaminação.
O medo era tanto, que o paciente deveria ser enterrado em cemitério exclusivo para
seu diagnóstico. O cemitério deveria ser construído em local que estivesse no sentido
oposto ao leprosário, de forma que as águas das chuvas não fossem drenadas para o
hospital.
Também os que estavam fora do hospital eram perseguidos pelo pavor social.
Quando um doente passava nas ruas as pessoas costumavam usar galhos de árvores para
limpar suas pegadas com medo de contaminação.
CAPÍTULO II - APRESENTAÇÃO DO ASILO COLÔNIA SANTO ÂNGELO
2.1 DIA DA INAUGURAÇÃO DO ASILO COLÔNIA SANTO ÂNGELO
Em 3. 5.1928, deu-se a inauguração do Asilo Colônia Santo Ângelo, um dos
maiores e mais modernos do mundo. Foi motivo de vitória e orgulho da Saúde Pública e da
Santa Casa de São Paulo. Este evento foi coberto pelos maiores e melhores jornais
nacionais da época, e foi um grande acontecimento histórico. Era comum a impressa
publicar profundos elogios. A seguir, temos recortes de algumas coberturas jornalísticas:
(Correio Paulistano, 3. 5.1928).
Inaugura-se hoje o Leprosário Santo Ângelo – a significação
dessa iniciativa em face da saúde pública paulistana.
(Folha da Manhã, 3. 5.1928).
(Correio Paulistano, 4. 5.1928)
Onde renasce a esperança – A inauguração, hontem, do
modelar asylo-colonia de Santo Ângelo.
(A Platéa, 4. 5.1928)
[…] Precisamente às oito horas, o sr. dr. Júlio
Prestes, acompanhado do dr. Lazary Guedes, secretário, e
do commandante Marcilio Franco, chefe da casa militar da
presidência, deixava o palácio dos Campos Elyseos com
destino ao Santo Ângelo [...].
(Correio Paulistano, 4. 5.1928)
Segundo consta do jornal Correio Paulistano de 4. 5.1928, no ato inaugural
estiveram.
Presentes diversas autoridades, além das já citadas. Compareceram também o dr. Fabio de
Sá Barreto, secretário no interior e seu oficial de gabinete, o dr. Marcos Ribeiro do Santos,
Rolim Telles, da secretaria da Fazenda, Fernando Costa, secretário da Agricultura, dr.
Bacon Cruz, chefe de polícia, dr. João Pupo Aguiar, diretor de serviço de profilaxia da
lepra, dr. Waldomiro de Oliveira, diretor geral do serviço sanitário, senador Paduo Salles,
provedor da Santa Casa de Misericórdia e, entre outros, o dr. Sinesio Rangel Pestana,
diretor clínico da Santa Casa de Misericórdia.
Figura 3 - Fotografia da
solenidade de inauguração do
Hospital Santo Ângelo.
(Extraída do jornal Correio
Paulistano, 4.5.1928 que está
em microfilmagem no acervo
da Secretaria de Cultura do
estado de São Paulo.
Hoje não existem mais pacientes, dos que foram transferidos, que tenham lucidez
para relatar os sentimentos do momento de chegada à nova morada, mas algumas
lembranças estão registradas nos mais velhos, que conviveram por longo período com os
que chegaram do Guapira.
A inauguração do hospital foi aguardada pacientemente pelos que viviam em
precárias condições no Hospital Guapira, porém a transferência demorou três meses para
acontecer. Somente em 2 de agosto de 1928 partiram os primeiros doentes com destino ao
Asylo Colônia Santo Ângelo. Por isso, até hoje se comemora o aniversário do hospital em 2
de agosto e não em sua data oficial de inauguração, 3 de maio.
A transferência dos doentes foi feita em jardineiras de quatro bancos, coberta com
cortinas laterais para não criar transtorno pelo caminho por onde passava, ou seja, para mais
uma vez não incomodar a
sociedade com a presença dos
doentes. Primeiro foram
transportados os casados,
depois os solteiros e,
finalmente, os das enfermarias.
Na Figura 4 consta a fotografia
de uma jardineira, que foi
utilizada no transporte dos
doentes (Foto da década de
1920, escaneada da original
que está no Museu da Saúde
Pública.)
O Código Sanitário do Estado de São Paulo, de 9. 4.1918, afirmava:
Artigo 579 - É proibida a remoção dos enfermos de
doenças transmissíveis em vehiculos que não sejam os do
Serviço Sanitário.
Pena de Multa de trinta a cinqüenta mil reis e desinfecção do
vehiculo.
Os portadores de lepra foram excluídos do convívio social e confinados na colônia
onde envelheceram. Dentro do hospital o sistema administrativo era fechado e bastante
rigoroso. Quando um jovem fugia para rever a família, ou tentava voltar para a sociedade,
se capturado com vida, era jogado na cadeia e tinha pena que variava de 3 a 12 meses de
reclusão, não escapando moças, nem mesmo as grávidas.
Na inauguração do hospital, os jornais publicaram que havia um prédio para as
crianças doentes:
[...] O Pavilhão de meninos, producto de um donativo
do Sr. Augusto de Oliveira Camargo, possue
accommodações para cerca de cem crianças[...].
(Correio Paulistano, 4. 5.1928).
Após a inauguração do Santo Ângelo, mesmos pacientes que tinham boa situação
financeira eram levados para o Asylo Colônia.
Com o avanço na construção dos prédios, um deles foi reservado para os pacientes
que tinham recursos financeiros comprarem, através da Caixa Beneficente, a hospedagem,
já que este pavilhão oferecia melhores instalações e a alimentação diferenciada da oferecida
pelo estado, pois havia um restaurante que pertencia à Caixa Beneficente (Figura 12).
Havia a perda da condição de paciente passando a ser pensionista, criando assim
uma ruptura entre ricos e pobres.
§ 1º - Os doentes que se depuserem de recursos poderão se
internar nos asilos-colônia como pensionistas, ficando
sujeitos à disciplina do estabelecimento.
(Lei Nº 2.416 de 31.12.1929)
Os doentes pensionistas poderão habitar casas
bastante confortáveis, cujo grau de comodidade seja variável
de acordo com a classe de habitação. Pode haver em geral
ter classes. Pode-se prover ao financiamento de construção
dessas casas, com renda proveniente das quotas mensais
pagas pelos doentes pensionistas.
(Lincoln, 1933, p.278)
Percebemos que houve uma mudança nas ações, pois em décadas anteriores o
paciente que tinha melhor condição econômica era tratado em casa por médicos
particulares. Após a inauguração do Santo Ângelo, esta prática deixou de ser realizada com
o aval das autoridades.
2.2 - CRIANÇAS QUE MORARAM NO SANTO ÂNGELO
No bloco das crianças, a diretora do pavilhão infantil feminino era Balbina Pimenta
que, segundo comentários dos pacientes, fazia jus ao nome. Era uma mulher rígida, que
pisava forte no chão amedrontando as meninas.
Figura 5 -- dos alunos que
eram crianças dos blocos,
ou seja, pacientes que
estavam internadas no
Asilo Santo Ângelo.
O professor e o
assistente eram também
pacientes.
(Fotografia escaneada da
original, que pertence ao
acervo do hospital.)
Figura 06 fotografia dos
neninos do bloco,
recebendo sapatos e roupas
que vinham do Estado.
(Fotografia escaneada da
original que pertence ao
acervo do hospital.)
O isolamento de creanças era composto por duas
salas para isolados, um quarto para enfermeira, uma sala
para tizanas e dois banheiros completam este edifício.
Está situado na zona do retiro das irmãs não longe da
creche.
E comquanto a creche, esteja dotada de uma
enfermaria para creanças, a possibilidade sempre existente
de um caso de moléstia infecciosa, impoz a necessidade de
um isolamento.
(Caiuby, 1918 p.33)
2.3 - INFLUÊNCIA DA RELIGIÃO NA HANSENÍASE
Além do estigma, em todos os tempos, a epidemia de Hansen trouxe consigo dois
conceitos socialmente incorporados, que geraram passividade e aceitação:
1º - Tinha uma ligação muito estreita com a pobreza, e o pobre era entendido como
um eleito de Deus, a imagem viva de Cristo, voluntariamente encarnado numa
natureza pobre.
2º - Relaciona-se à forma como era vista a doença; como castigo divino e não como
conseqüência da miséria e da desnutrição, era maldição dos deuses, e apresentava-se
associada à visão punitiva cristã, fato que contribuiu muito para o aumento da exclusão. Foi
apresentada na Bíblia
11
sempre de forma pecaminosa, embora os historiadores afirmem que
o diagnóstico citado não é a doença que conhecemos.
O que atualmente chamamos de hanseníase foi confundido com outras doenças de
pele, assim como a elefantíase, a sífilis e as demais dermatoses. Durante décadas, o nome
lepra significava lesões de pele que poderiam ser provocadas por queimaduras, escamações,
escabiose, câncer de pele, lúpus, escarlatina, eczemas e sífilis.
[...] A estes doze enviou Jesus, dando-lhes as seguintes
instruções:
Curai enfermos, ressuscitai mortos, purificai leprosos, expeli
demônios[...].
(A Bíblia Sagrada, 1969 Mat. 10,5-8)
[...] A lepra relacionava-se com uma fraqueza oriunda de
pecados e devia ser combatida através de sacrifícios,
purificações e rituais que incluíam desde a queima de
objetos pessoais, até o contato direto do doente com o que
se julgava puro, assim como um pássaro, a manjerona, a
água ou a madeira de cedro.
(Churoraqui, 1978)..
Até o nome muito usado no passado, “mal de Lázaro”, estava associado à influência
religiosa. Acreditavam haver seres misteriosos que habitavam os céus, capazes de provocar
doenças. Sendo assim, convinha tratar com respeito os que eram responsáveis por sua saúde
ou doença, prosperidade ou miséria.
Algumas doenças receberam o nome de santos e, assim, temos a gangrena, que era
conhecida como “fogo de Santo Antonio” e a hanseníase “mal de São Lázaro”.
Como percebemos, pelas citações acima, o diagnóstico comum do Santo Ângelo
tinha uma estreita ligação com a religião, não só no seu surgimento, bem como na busca da
cura, já que não existia tratamento eficiente e nem avanços nas práticas da medicina
11
No Antigo Testamento, em Levítico, Capítulo 13, encontra-se toda uma orientação sobre a doença, seus sinais
para identificação e cuidados em relação aos doentes, mas dificilmente se pode comprovar que se tratava de
hanseníase. É possível que se tratassem de manchas dermatológicas de outra etiologia.
brasileira, as alternativas eram as práticas de banhos de lama, choques elétricos e até
picadas de cobras. Havia também o uso das plantas medicinais, que tinham uma forte
influência da medicina indígena. Depois, acrescentaram-se as influências da medicina
empregada pelos jesuítas e africanos, que também utilizavam as plantas nativas.
Os portugueses e, de um modo geral, os europeus,
introduziram um pequeno número de medicamentos
importados, que compunham a "caixa de botica", porém, a
quantidade era extremamente limitada e a falta de
medicamentos passou a ser um grande empecilho para a
prática da medicina européia em terras coloniais
(Santos, 1960, apud Cunha, p. 8)
O forte envolvimento da hanseníase com as fraquezas humanas gera também o
desejo dos que se julgam “não pecadores” tentarem libertar os pecadores e, assim, surgem
as ações filantrópicas.
A prática da filantropia no Brasil está estreitamente ligada à Igreja Católica, desde
o período colonial, quando sociedades católicas fundaram organizações voluntárias, como
hospitais, orfanatos e asilos, patrocinados por fundos patrimoniais e doações. Por volta da
época da Independência do Brasil, nos fins do século XIX, surgiram novos tipos de
organizações voluntárias, de prestação de serviços e ajuda mútua.
A filantropia tem sua ratificação na história das Santas Casas, que exercem uma
grande representatividade até hoje na saúde pública.
O envolvimento das Santas Casas no problema da lepra no Brasil se deu com sua
expansão, provavelmente impulsionados pelo sentimento de caridade e solidariedade
humanas, ou seja, de forma empírica e filantrópica, tratam-se dos antecedentes ao sistema
de saúde no Brasil onde havia apenas o assistencialismo à saúde prestado pelas Santas
Casas, o estado não possuía serviços ambulatoriais permanentes.
Segundo a CMB (Confederação das Misericórdias Brasileiras):
“Não há ninguém que estude a história do Brasil ou que esteja ligado à área da saúde
que não tenha notícia do papel secular das Santas Casas, hospitais beneficentes e
filantrópicos. Em nosso país, as Santas Casas surgiram logo após seu descobrimento,
precedendo a própria organização jurídica do estado brasileiro. Brás Cubas, em 1543,
fundou a primeira delas em Santos, São Paulo.” Foi o primeiro hospital do Brasil, onde,
segundo informações do Conselho Regional de Serviço Social do Estado de São Paulo
(CRESS), este é considerado o primeiro local onde se praticou assistência social no país.
[...]
Em 1582 a armada de Diogo Valdez atracou no
porto do Rio de janeiro, com diversos feridos e doentes. No
local, onde os pacientes foram atendidos pelo padre José de
Anchieta, erigiu-se a Santa Casa de Misericórdia do Rio de
Janeiro. A partir daí, outras Santas Casas foram inauguradas
em Vitória, Olinda, Salvador, São Paulo e Santa Catarina
(http://www.cress-sp.org).
Na reconstrução da história do Santo Ângelo percebemos ações religiosas, antes e
depois de sua inauguração. Antes, pelas ações pontuais de grupos de caridade que atendiam
os doentes desabrigados e, depois, pela estratégia de administração da Santa Casa.
No início do século passado, em 1904, a Santa Casa de São Paulo planejou e
construiu o Hospital dos Lázaros, na Chácara do Guapira, no Jaçanã. O diretor clínico deste
hospital era o dr. José Lourenço de Magalhães, e tinha como assistente o dr. Emílio Ribas.
A assistência religiosa foi confiada às irmãs de São José.
Este hospital ainda não apresentava as mesmas características dos futuros hospitais-
colônias. Os doentes apenas eram recolhidos para o repouso noturno quando estavam
esmolando e roubando nas estradas e periferias da capital; eram livres, podendo entrar e
sair do hospital de acordo com sua vontade. Apesar de não ser o ideal, este hospital era a
única alternativa de acompanhamento da doença do começo do século XX em São Paulo.
Washington Luís, que governou de 1920 a 1924, no ano de 1920 reverteu a Santa
Casa às obras do Leprosário, deixando o empreendimento apenas começado pelo
governador anterior Altino Arantes. O estado continuou repassando verba para a Santa
Casa dar continuidade às obras. Por questões políticas, as obras caminharam lentamente,
além da discordância entre estado e diretoria da Santa Casa, havia também a crise
econômica e as péssimas condições de habitação fruto da migração advinda do
desenvolvimento das ferrovias e das rodovias que faziam aumentar o número de novos
casos e superlotar o Hospital Guapira.
O número de pacientes do Hospital Guapira aumentava anualmente e o hospital não
dispunha de recursos para assistir à grande quantidade de pacientes. Por isso, era urgente a
construção e transferência dos pacientes para outro local, que fosse mais adequado e que
oferecesse melhores condições de habitação e controle da doença.
Foi só na administração de Júlio Prestes, em 1928, que de fato as obras foram
concluídas e o hospital foi inaugurado.
12
O Santo Ângelo foi administrado pela Santa Casa desde sua inauguração, em 3.
5.1928 até 7. 7.1933.
Além da influência religiosa atrelada à hanseníase, o Asilo Colônia Santo Ângelo
ainda contou com uma administração baseada na visão fenomenológica de entrega a Deus,
que foi exercida pela Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Os pacientes, em suas angústias constantes, buscavam um milagre, que fosse
realizado através de um grande “Deus”, que pudesse livrá-los, e isto era reforçado pela
Igreja Católica.
É bom aprender a disciplinar o pensamento, assim os
olhos espirituais são abertos para vermos que lindo é o amor
de Deus, à certeza que, a cada instante de dor, há uma
compensação de felicidade, transitória agora, eterna à nossa
espera.
(Bíblia Sagrada, 1969)
O estigmatizado pode, também, ver as privações que
sofreu como uma bênção secreta, especialmente devido à
12
Veja no Anexo 6, a ata da inauguração do hospital.
crença de que o sofrimento muito pode ensinar a uma
pessoa sobre a vida e sobre as outras pessoas.
(Goffman, 1963, p. 13).
A igreja marcou sua presença atuando em todos os setores da vida humana, e teve
um papel muito importante, mesmo antes de o estado ser cobrado na sua responsabilidade
em relação à saúde como política pública.
A prática da filantropia na assistência ao portador de hanseníase também é muito
antiga, antecede a criação da política de isolamento compulsório.
Já no projeto do Hospital
Santo Ângelo estava presente a
construção da igreja católica,
conforme consta no desenho ao
lado;
(Caiuby, 1918 p.55) era uma
proposta audaciosa para a época.
O início da construção da
igreja foi em 1930, dois anos após
a inauguração oficial do hospital.
A obra foi paralisada em
1932, por falta de verba e
retomada em 1954, com a ajuda
financeira dos pacientes. Sua
conclusão se deu em 1956. No período de construção, os pacientes não ficaram sem
assistência, havia uma pequena capela.
A inauguração do Santo Ângelo marcou uma nova fase na epidemia, pois a partir de
sua construção o Estado assumiu oficialmente sua função social em relação à política de
saúde, ocupando o espaço que estava sendo preenchido pela Igreja.
A Santa Casa continuou marcando sua presença religiosa na administração do Santo
Ângelo, que era exercida por freiras, em decorrência dos próprios estatutos da irmandade
que impunham rituais religiosos à totalidade dos pacientes, sob pena de punição a quem
desobedecesse:
O Estado de São Paulo, neste ato representado pelo
senhor Secretário dos Negócios do Interior, senhor Fabio
Barreto e a Santa Casa de Misericórdia de S. Paulo,
representada pelo Irmão Provedor, Dr. A. de Pádua Salles,
celebram entre si o seguinte acordo sobre o Asilo-Colonia de
Santo Ângelo:
Art. 8º -- Os doentes attenderão as visitas em local
apropriado, não podendo os visitantes percorrer o interior do
Estabelecimento senão em caso especial, com licença da
Irmã Superiora.
Art.13º -- Todo o prejuízo causado no Asylo-Colonia
por desleixo, incúria, má índole ou accidente dos doentes ou
empregados resultará em penas disciplinares.
Art. 14º -- São penas disciplinares: a reprehensão em
particular ou na presença de outros doentes, a reclusão nos
quartos por 3 a 5 dias ou em cela por 24 horas, com o dobro
do tempo na reincidência e a expulsão do Asylo-Colonia. São
competentes para apelidar as penas: o Mordomo, os
Médicos, a Irmã Superiora e as Irmãs.
(Trecho do regimento interno 1928).
13
Art.18º -- Salvo nova deliberação da Irmã Superiora,
será observado, no Asylo-Colonia, o seguinte horário:
Às 6 horas levantar
Às 6 ½ horas será realizada a Santa
Missa
Às 7 horas café
Das 7 ½ às 8 ½ h limpeza geral, que deverá
ser feita em cada quarto
pelos respectivos
moradores, salvo
determinações em
contrário da Irmã
Superiora.
Das 8 às 11 h. trabalhos de lavoura, sob a
diretor do feitor
Às 11 horas almoço e descanso
Às 14 horas lanche
Das 14 ½ às 17 horas trabalho
Às 17 horas jantar
Às 18 horas terço
Às 19 horas chá e oração da noite
Às 21 horas silêncio absoluto
Das 8 às 11 e das 15 às 17 horas neste horário, os doentes
poderão tomar os banhos
quentes, sem prejuízo dos
serviços que lhes forem
atribuídos.
S. P. 1º. 9.1928.
Paralelamente ao rigor das normas, em que eram impostas rigorosas deliberações,
havia também a presença constante de capelães, que pertenciam à Ordem dos Padres
Carmilianos, cujo objetivo era prestar assistência no campo da saúde. Eles moravam no
hospital. Eis a relação dos primeiros padres:
13
Veja no Anexo 7 o regulamento interno do Asilo Colônia Santo Ângelo e no anexo 8 o acordo feito entre a
Santa Casa e a Saúde Estadual.
Pe. Carlos Quagliarolli - in memoriam
Pe. Ludovico Zanol - in memoriam
Pe. José Garzotti - in memoriam
Pe. Sílvio Silvestri - in memoriam
Pe. Afonso Gutierres - in memoriam
Pe. Albino Doná - in memoriam
Pe. Albino Barreto - in memoriam
(Fonseca, 1978, p. 35)
Apesar de a Santa Casa ter apenas prestado serviço na administração do Santo
Ângelo, seus princípios religiosos marcaram suas ações.
No início da irmandade da misericórdia, a cura da alma era a ação priorizada no
tratamento aos males do corpo.
A irmandade de Nossa Senhora da Misericórdia foi
criada em Portugal, no ano de 1498, por dona Leonor, irmã
de d. Manuel, sob a influência do freitrinitário Miguel de
Contreiras. A irmandade organizava-se em torno das
chamadas 14 obras de caridade, sete espirituais e sete
corporais, inspiradas pelo Evangelho, consignado segundo
São Mateus, e no primeiro Compromisso de 1516, a saber;
Ensinar os ignorantes, dar bons conselhos, punir os
transgressores, consolar os infelizes, perdoar as injúrias
recebidas, suportar as deficiências do próximo, orar a Deus
pelos vivos e mortos, resgatar cativos e visitar prisioneiros,
tratar os doentes, vestir os nus, alimentar os famintos, dar de
beber aos sedentos, abrigar os viajantes e os pobres,
sepultar os mortos.
(Russell-Wood, citado por Gandelman, 2001 p. 2).
A administração do Santo Ângelo, exercida pela Santa Casa, não foi baseada em
ações caridosas, mas sim em parceria entre Estado e instituição filantrópica. O Estado
liberava verba para a Santa Casa; tratava-se de uma administração da verba pública,
portanto, uma prestação de serviço de utilidade pública, conforme consta no regulamento
do Asilo Colônia Santo Ângelo de 1º de setembro de 1928.
A organização dos serviços médicos será
estabelecida de comum acordo entre a Santa Casa de
Misericórdia e a Inspetoria de Profilaxia da Lepra.
Para o custeio do Asilo-Colônia, o governo auxiliará
mensalmente a Santa Casa com a importância necessária
para a manutenção dos doentes que forem recolhidos e que
excederem a lotação dos que existiam no Asilo do Guapira.
Na década de 1930 a natureza política e o poder cada vez maior das instituições
filantrópicas levaram o estado a fazer melhor controle nas atividades sem fins lucrativos.
Segundo (Brava, p. 3)
14
[ ...] a sociedade brasileira, a partir da década de 1930, tem
como indicadores mais visíveis o processo de industrialização, a redefinição do papel do
Estado, o surgimento das políticas sociais, além de outras repostas às reivindicações dos
trabalhadores, por isso, em 1930, a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo começou a
perder o controle do hospital, o qual havia administrado por cinco anos, era um período de
grande turbulência social e política, que solicitava mudanças na questão de saúde no Brasil.
Estávamos vivendo uma grande transformação ecumênica. Com a queda no valor da saca
de café, que, segundo os historiadores, a saca caiu de 200 mil reis em agosto de 1929 para
21 mil réis em janeiro de 1930. A crise financeira se alastrou, atingiu diretamente a
economia no Brasil, muitas fábricas encerraram suas atividades em São Paulo e Rio de
Janeiro. No final de 1929 já tínhamos em São Paulo mais de dois milhões de
desempregados, fato que disparou miséria e fome para a maioria da população que vivia em
precárias condições de higiene, saúde e habitação, fato que contribuiu para o aumento da
epidemia da doença.
Washington Luís era presidente da República. Contrariando os interesses políticos,
ele não apoiou o mineiro Antônio Carlos de Andrade para sua sucessão, mas sim o paulista
Júlio Prestes, que não assumiu a Presidência do Brasil, pois vinte e dois dias antes de
terminar o mandato de Washington Luís a revolução de 1930 havia eclodido.
Os estados ficaram na mão de interventores, sendo que havia contradições entre os
interesses do interventor do estado de São Paulo, o tenente João Alberto, que tentou
transferir a responsabilidade da administração do hospital para o estado, porém a
administração da Santa Casa não tinha interesse nesta transferência. As mudanças sociais e
políticas refletiram diretamente na administração do hospital que, neste período, sob
protesto, ocorreu o afastamento da irmã Emerenciana pela irmã Maria do Patrocínio.
Em 7.7.33 a diretoria geral do Serviço Sanitário do Estado de São Paulo
15
dispensou
a cooperação da irmandade, que se pronunciou colocando condições básicas para entregar a
administração ao estado:
[...] Já demonstramos, em parecer anterior, que a Santa
Casa não está impedida, pelo seu Compromisso, de
transferir a administração de qualquer instituto de
beneficência, desde que haja conveniência para o seu
serviço e não se verifique a alienação da propriedade.
(Compromisso, art. 2º, parágrafo único).
( Pupo, 1934, p. 21)
2.4 - MAIS AÇÕES FILANTRÓPICAS NO ASILO COLÔNIA SANTO ÂNGELO
14
BRAVO, Maria Inês de Souza. Política de saúde no Brasil,
http://www.fnepas.org.br/pdf/servico_social_saude/texto1-5.pdf
acesso em 30.10.07.
15
Veja no anexo 9 o documento oficial de encerramento do acordo feito entre a Santa Casa e a Saúde
Estadual.
Os anos de 1930 representaram a consolidação de novos interesses industriais e a
questão social deixa de ser só uma questão de polícia, como afirmou Washington Luís, para ser
também de políticas. O estado assumiu algumas políticas públicas, como educação e saúde ao
separar a igreja do estado, fato que desestimulou a colaboração do estado nas instituições
religiosas onde prevalecia primordialmente a filantropia.
Fez-se tarde este compromisso estadual se levarmos em consideração que, em 1920, foi
criado o Departamento Nacional de Saúde Pública e instituída a Inspetoria de Profilaxia da
Lepra e das Doenças Venéreas. As atividades da Inspetoria foram iniciadas na chefia do
leprólogo professor Eduardo Rabello.
Como a doação de verba em prol de causas nobres sempre esteve presente na cultura do
Brasil, não podia ser diferente com os portadores de uma doença infecto-contagiosa como
hanseníase, diversas famílias deixavam parte dos seus bens doados em testamento, em favor do
socorro aos lázaros. Segundo os políticos da época, a maioria desta renda era desvirtuada,
sendo assim o dr. Francisco de Salles Gomes, em 15 de abril de 1934, fundou a Caixa
Beneficente do Sanatório Santo Ângelo-Instituição de Assistência Sócia,l
16
que em 15. 1.1971
foi registrada no Cartório de Registro de Imóveis e Anexos de Mogi das Cruzes, no protocolo
1, às fls. 398, sob o nº 8.111 e averbado no livro A-1, matriculada sob nº 299, declarada de
Utilidade Pública de acordo com as leis oficiais.
A Caixa Beneficente tem por finalidade defender os direitos e interesses dos pacientes
do Hospital Santo Ângelo e eventualmente de egressos. Foi reconhecida oficialmente como a
única associação com direito a solicitar donativos em favor dos pacientes moradores do
hospital.
Apesar de contar, em sua administração, com o apoio da diretoria do hospital, o
objetivo da Caixa Beneficente sempre foi social e filantrópico, pois seu faturamento era
repassado para os pacientes através da manutenção de escolas para crianças e adultos. Na parte
recreativa realizavam-se festas de Carnaval, Páscoa, Dia do Trabalho, com churrasco no Parque
da Represa, Dia das mães, Festa Junina, comemoração do aniversário do hospital, além das
luxuosas festas de final de ano. Semanalmente eram promovidas partidas de futebol, com
grandes campeonatos entre os hospitais com igual característica, além de prestar assistência
financeira aos pacientes por meio de empréstimo, muitas vezes sem juros, e compra de
remédios, prótese, órtese, cigarros, roupas e sapatos, além de auxílio mensal em dinheiro aos
pacientes inválidos.
Documentos confirmam que famílias de classe alta costumavam deixar toda sua herança em
doação para a Caixa Beneficente.
Em 1947 a Caixa Beneficente recebeu um legado
deixado em testamento pela benemérita Senhora Francisca
Sampaio Monteiro da Silva, falecida na capital no dia 10 de
fevereiro de 1945, com a avançada idade de 80 anos,
constante de inúmeras casas bem situadas na Capital
Paulista, “resultado de antigos sentimentos, além do intenso
desejo de ser útil ao próximo”, conforme consta do seu
testamento. Esses prédios, na sua maioria conservados pela
Entidade, enriquecem substancialmente o seu patrimônio
imobiliário…
16
Veja no anexo 10 cópia da Certidão dos Estatutos da Caixa Beneficente
(Fonseca, 1978, p.35).
Temos exemplos de outras famílias que deixaram em testamento doação de todos seus
imóveis. Algumas foram homenageadas com seu nome nos pavilhões do hospital, como
Virginia Mayer Leite, que por muitos anos teve seu nome em um dos prédios do ambulatório
do hospital, e também Rafaela Labrusgata, que não teve seu nome homenageado, embora tenha
feito grande doação.
O valor deixado era tão expressivo que despertou interesse na Santa Casa, que pleiteou
judicialmente, como proprietária do Hospital, o recebimento de legados feitos ao leprosário
Santo Ângelo. A última palavra foi dada pelo tribunal, que reconheceu o direito da Caixa
Beneficente, com as seguintes palavras:
Os beneficiados diretamente pelo legado deixado por
dona Rafaela Labrusgata são os lázaros assistidos no
Hospital Santo Ângelo e não a pessoa jurídica que o mantém
e sustenta. Esta apenas poderia recolher o legado para dar-
lhe o destino previsto no testamento…
(Carta Precatória – 1983 p. 8).
2.4.1 EVENTOS PATROCINADOS PELA CAIXA BENEFICENTE DO SANTO ÂNGELO
Na Figura 7 temos uma
fotografia que mostra o
animado baile de Carnaval
que acontecia no salão de
festas.
Tratam-se de
pacientes fantasiados,
brincando no baile de
Carnaval.
(Fotografia da década de
1930, escaneada da original,
que pertence ao acervo do
hospital.)
Na Figura 8 temos outra
fotografia do baile de
Carnaval que era tão
animado que tinha início
dentro do salão de festas e
arrastava-se pelas ruas da
colônia convidando os outros
pacientes a participar.
(Fotografia da década de
1930, escaneada da original,
que pertence ao acervo do
hospital.)
Na Figura 9 temos outra
festa de comemoração do
aniversário do hospital, com
premiação acontecendo no
Salão de Festas, que era
utilizado o ano inteiro e não
apenas nos bailes de
Carnaval.
(Fotografia da década de
1940, escaneada da original,
que pertence ao acervo do
hospital.)
Figura 10 a Caixa
Beneficente investia
também em educação.
Construiu a primeira escola
do hospital, a “Escola
Atheneu”.
(Fotografia da década de
1940, escaneada da
original, que está no Museu
da Saúde Pública.)
Na Figura 11 temos a
fotografia da animada festa
junina, que acontecia
anualmente na Represa, e
patrocinada pela Caixa
Beneficente. Os pacientes
divertiam-se muito.
(Fotografia escaneada da
original, que pertence ao
acervo do hospital, da
década de 1940.)
Na figura 12 temos o
restaurante da Caixa
Beneficente do Asilo Santo
Ângelo.
A Caixa
Beneficente era a mais
desenvolvida e bem
organizada do final da
década de 1930. Isto
porque era uma instituição
administrada pela diretoria
do hospital, juntamente
com os pacientes e, na
medida do possível,
cumpria seu compromisso
social com os doentes, de proporcionar esporte, lazer, atividades de convivência, além de
reduzir o custo de algumas taxas.
Fotografia escaneada da original, que pertence ao acervo do hospital, da década de 1930.
Ya hemos visto los diversos departamientos que
tienen las Cajas Beneficientes de las diversas Colônias.
Santo Ângelo junto com Pirapitinguy son las que tienem
mejor desarrollados sus diversos Departamientos.
(Schujman, 1937)
O restaurante da Caixa beneficente ficava próximo ao armazém e oferecia serviço
especializado e de boa qualidade, além de ter um ambiente agradável onde os pacientes
podiam desfrutar de saborosos pratos a baixo custo.
La pension mensual (almuerzo y cena) es
aproximadamente unos 10 pesos nuestros.
(Schujman, 1937).
Na Figura 13 temos a
fotografia dos pacientes
almoçando no restaurante da
Caixa Beneficente.
(Fotografia escaneada da
original, que pertence ao
acervo do hospital, da década
de 1940).
Na Figura 14 temos o
armazém construído com as
doações recebidas pela Caixa
Beneficente, que abastecia
todas as casas da colônia, já
que nenhum paciente podia
sair do hospital.
(Fotografia escaneada da
original, que pertence ao
acervo do hospital, da década
de 1940.)
Na Figura 15 temos o Salão
de Festas e a Biblioteca Dr.
Francisco Salles Gomes
Junior, homenagem feita
pela diretoria da Caixa
Beneficente e dos pacientes
ao diretor do departamento
de lepra. Era um salão muito
bem ventilado, com
decoração bastante refinada e
moderna. Possuía um grande
palco para apresentação das
orquestras e móveis
construídos para armazenar
os livros que, em poucos
minutos, eram retirados do
ambiente deixando-o totalmente livre para as animadas festas orquestradas.
(Fotografia escaneada da original, que pertence ao acervo do hospital, da década de 1940.)
Na Figura 16 temos
alguns casais fantasiados
para o baile de Carnaval.
A primeira
pessoa da esquerda para a
direita é o paciente
P.G.(in memoriam) e sua
esposa A.S.I.
(Esta fotografia, da
década de 1930, foi
escaneada da original que pertence à paciente.)
2.5 - HAVIA UMA PREOCUPAÇÃO COM A CULTURA E COM O ESPORTE
Na Figura 17 temos a
foto de 1934 do primeiro
cine-teatro construído no
asilo-colônia Santo
Ângelo. As acomodações
eram bancos e mesas de
madeira, que foram
fabricados na oficina de
carpintaria movida a
eletricidade existente no
hospital.
Anos mais tarde,
foram substituídas por
cadeiras de madeira.
(Fotografia escaneada do livro do dr. Pupo, 1934.)
Na Figura 18 temos outra
fotografia do primeiro
cine-teatro. Anos mais
tarde, em 1937, ocorre a
substituição dos bancos de
madeira pelas cadeiras,
além das alterações na
decoração. Neste espaço
havia um moderno
equipamento sonoro. Nele
passavam dois filmes por
semana, sendo um grátis e
o outro cobrado pela Caixa
Beneficente, porém, o
valor era simbólico e
acessível a todos os
pacientes.
(Fotografia escaneada da original, que está no Museu de Saúde Pública – década de 1930.)
A Caixa Beneficente do Santo Ângelo, em parceria com o Jornal Correio
Paulistano, disparou uma campanha para arrecadar fundos para construção do que seria um
clube recreativo, conforme consta na matéria abaixo do jornal da época;
...A propósito, recebemos nos a carta que, abaixo
transcrevemos na íntegra:
“Santo Ângelo, 5 de novembro de 1934 – Ilmo. sr. Redactor-
chefe do “CORREIO PAULISTANO” – Saudações.
A “Caixa Beneficente do Asylo Colônia Santo Ângelo”,
pessoa jurídica de direito privado, em nome de mais de mil
hansenianos seus associados, no desempenho de uma de
suas finalidades, que tem por fim pleitear e defender todos
os direitos e interesses dos doentes do mal de hansen
instalados neste Asylo-Colonia proporcionando-lhes conforto
moral e material, trabalho, intrucções e diversões vêm
solicitar diretamente do povo paulista, por intermédio deste
conceituado jornal – além dos intermediários já por ella
expressamente autorizados – auxílio de qualquer espécie
para construção do Clube Recreativo em que ora está
empenhada, procurando realizar um centro de distração e
diversões aos doentes internados no Asylo Colônia Santo
Ângelo, a maneira do que já possue o “Asylo Colonia
Pirapitinguy”.
O projeto que hoje anima a vontade e prende a
attenção da “Caixa Beneficente” e de todos os doentes
isolados do convívio social neste “Asylo Colônia”, certamente
terá o apoio material do povo paulista que nunca negou seu
valioso concurso às iniciativas humanitárias.
Para a construcção deste centro de diversões, cuja
planta incluímos a esta a “Caixa Beneficente do Asylo
Colônia Santo Ângelo, por intermédio neste jornal solicita
auxílios em dinheiro, materiaes para construção e
acabamento (cal, cimento, telhas, madeiramento, tintas,
óleos, lustres, vidros, etc.) de qualquer material, emfim, que
possa ser empregado nessa construcção.
As empresas companhias, sociedades e particulares
que desejarem auxiliar essa obra poderão, por especial
obsequio, entrar em prévios entendimentos com a Caixa
Beneficente do Asylo Colônia de Santo Ângelo (Estação de
Santo Ângelo E.F. Central do Brasil), por intermédio da
directoria deste Asylo Colonia.
Aqui fica, pois aos cuidados do povo paulista mais
esse emprehendimento altruístico.
Figura 19 - os
pacientes são os de
roupas claras. Os de
roupas escuras são os
profissionais
contratados que vinham
da Federação Paulista
de Futebol; o técnico e
os massagistas.
Fotografia escaneada
da original, que
pertence ao acervo do
hospital – década de
1950.
A Caixa Beneficente contratava profissionais da Federação Paulista de Futebol para
treinar os jovens para competições entre leprosários. A maioria dos pacientes treinava para
ter oportunidade de sair do hospital. No período do campeonato, esta era a única forma
permitida de passeios externos, os atletas tinham privilégios, uma alimentação melhor e
mais atenção médica para não adoecerem.
As ações das entidades filantrópicas não constroem direitos sociais. A Caixa
Beneficente do antigo Santo Ângelo durante anos consecutivos preocupou-se com a boa
qualidade na proteção social aos pacientes. Nada do que existiu transformou-se em direitos
conquistados pelos pacientes. Hoje as poucas ações existentes são exercidas em forma de
favor ao paciente carente.
A Caixa Beneficente, como entidade filantrópica de defesa dos interesses dos
pacientes, se não defendê-los, no mínimo deveria denunciar as violações dos direitos.
Há alguns anos, houve a retirada da diretoria do hospital da administração da Caixa
Beneficente, fato que representou perda de oportunidade de tomada de decisão conjunta, foi
uma quebra de parceria.
Acredito que esta decisão não tenha levado em consideração a necessidade e
dependência que o setor da saúde tem em relação às outras políticas públicas. A
preservação da saúde não depende apenas de sua equipe técnica. Cabe ao sistema de saúde
fazer a articulação e integração com outros setores, que também determinam as condições
de vida e saúde. No momento em que a saúde está convidando para sentar-se à mesa de
negociação, seus parceiros que são as secretarias municipais, os diversos segmentos sociais
como Ongs, igrejas, universidades e lideranças de bairro, o hospital se distancia da Caixa
Beneficente que tem uma grande representatividade social e histórica na trajetória dos
pacientes.
Este rompimento não está de acordo com a Certidão dos Estatutos da Caixa
Beneficente, e é possível que tenha havido uma modificação no texto inicial, mas até nesta
alteração está prevista no documento original e tem critérios para acontecer:
Capitulo II Da Administração. Artigo 2º - A Caixa
Beneficente do Sanatório Santo Ângelo será administrada
por uma diretoria composta do Diretor do Sanatório, de um
presidente, um secretário, um tesoureiro e quatro
conselheiros. Todos os doentes e internados, com exceção
do diretor, competindo ao presidente designar seu eventual
substituto dentre os membros da Diretoria.
A participação da diretoria do hospital na composição da diretoria da instituição
garantiria melhor aproveitamento dos recursos que pertencem à Caixa Beneficente.
Este estudo não se interessou pelo levantamento atual dos bens imobiliários que
pertencem a esta instituição, apenas estamos nos baseando nos estudos e publicações
existentes. O trecho abaixo está relacionado ao levantamento do patrimônio da Caixa
Beneficente em 1978
:
[...] na atual administração da instituição, sofre um processo
de renovação e recuperação dos imóveis, permitindo melhor
conforto dos que são utilizados pela Entidade e maior renda
dos alugados. Promoveu bem organizado cadastramento de
seu Patrimônio Mobiliário, constante de 1.400 peças.
(Fonseca, p. 36).
Se a Caixa Beneficente cumprisse os artigos de seu Estatuto inicial, haveria
profissionalização das ações e contribuiria muito com a administração do hospital. Como
exemplo temos o Artigo 26º:
Para maior eficiência da Administração da Caixa
Beneficente e de seu patrimônio, ficam creados os seguintes
departamentos: “recreativo”, “esportivo”, “de assistência
social”, ”do ensino”, “agropecuário e comercial e industrial”.
O isolamento não permitiu a participação dos pacientes na história dos movimentos
sociais. Eles não foram treinados para a participação social, conseqüentemente, não cobram a
realização das sessões ordinárias e extraordinárias previstas no artigo 8º do estatuto inicial, não
têm interesse em votar nem na constituição da nova diretoria no período de eleição. Por isso,
este poder apenas é transferido de marido para esposa, de secretário para diretor, e não efetiva
mudança.
O paciente não consegue perceber que ele tem potencialidade e direito de fazer
representa-se nas decisões tomadas pela administração da Caixa Beneficente.
Capitulo IIIINSTALAÇÕES DO ASILO COLÔNIA SANTO ÂNGELO
3.1 - O PORTÃO DE RECEPÇÃO DOS PACIENTES.
[...] O leproso era alguém que, logo que descoberto, era
expulso do espaço comum, posto fora dos muros da cidade,
exilado em um lugar confuso onde ia misturar sua lepra à
lepra dos outros.
O mecanismo da exclusão era o mecanismo do exílio, da
purificação do espaço urbano. Medicalizar alguém era
mandá-la para fora e, por conseguinte, purificar os outros. A
medicina de exclusão.
(Foucault, 1979 p. 42)
Logo após a inauguração do Asilo Colônia Santo Ângelo, Júlio Prestes estabelece o
isolamento compulsório de forma obrigatória, porém a ausência de hospitais específicos
para esta finalidade impediu o cumprimento da lei
17
.
Apresentação das instalações, iniciando por uma foto das muitas portarias que
existiam. Nesta, era feito todo o controle de entrada e saída de carros e também das pessoas
saudáveis que entravam e dos doentes de tinham autorização da madre superiora para sair.
Figura. 20. Final da
década de 1920.
Escaneada da
original, que pertence
ao acervo do hospital.
17
Em 1929, pela lei 2416 de 31 de dezembro – Julio Prestes de Albuquerque – Fábio de Sá Barreto
– ficou claramente estabelecido o isolamento obrigatório dos leprosos, em todo o Estado, assim como o
tratamento. Esta medida poderá ser tomada em domicílio, em sanatórios, hospitais e asilos-colônia. Na lei
estão especificadas as exigências para o isolamento domiciliar. Para tornar efetivas as medidas de isolamento,
o Estado organizará estabelecimentos em número suficiente.
Em 1931 o Decreto 5027 de 16 de maio – João Alberto Luiz de Barros – Theodoro Ramos – Marcos
de Souza Dantas – suspendeu temporariamente a execução da artº- 16 da Lei nº 2416 de 31 de dezembro de
1929, que proibia a internação de doentes de lepra em hospitais, policlínicas e casas de saúde para doenças
comuns.
Isto por considerar que a construção dos leprosários regionais era morosa e demandava grandes
somas para construí-los.
(Parágrafo extraído do texto da lei 2416 de 31.12.1929, existente no Instituto Lauro de Souza Lima)
3.2 -
ACOMODAÇÕES PARA PACIENTES
Na figura 21, vê-se o
pavilhão de habitação
para homens. Eram
cinco pavilhões,
exclusivos dos
pacientes do sexo
masculino. Este, da
fotografia, era
composto por três
corpos unidos por uma
galeria, e tinha
capacidade para abrigar
aproximadamente 250
pacientes.
Na figura 22 vemos os
pavilhões 7 e 8,
específicos para
pacientes do sexo
masculino. Era
composto por dois
corpos: a parte da
esquerda, destinada aos
casos avançados, e o da
direita, para os cegos e
os muito mutilados.
Escaneada do
acervo do hospital.
Década de 1930.
Na figura 23 temos a
parte interna do
pavilhão masculino.
Foto escaneada do
acervo do hospital, da
década de 1930.
Na figura 24 temos o
Pavilhão Santista. Era
o maior de todos e lhe
deram este nome
porque foi construído
com doações da
Prefeitura de Santos
para abrigar
unicamente os
pacientes nascidos em
Santos. Tinha
capacidade para 150
pacientes, ainda havia outros tipos de atendimentos exclusivos para homens, como
ambulatório masculino e hospital com a ala masculina, pois o Pavilhão Santista e os outros
pavilhões abrigavam pacientes bacilíferas apenas como dormitório, quando apresentavam
alguma reação leprosa intensa eram internados no hospital, que servia de porta de entrada a
todos os pacientes. Dentro deste hospital existia uma sala de cirurgia.
Fotografia escaneada da original, que pertence ao acervo do hospital.
Na figura 25 temos a
foto do laboratório e do
manicômio do hospital.
Com este recurso, a
Inspetoria favoreceu a
transferência dos
pacientes com
problemas mentais que
estavam internados no
Hospital Juqueri.
Foto escaneada
da original, que
pertence ao acervo do
hospital.
Na figura 26 temos a
fotografia do Pavilhão
de Mulheres Solteiras.
Foto escaneada
da original, que
pertence ao acervo do
hospital.
Figura 27. Fotografia da
parte interna das
acomodações das
mulheres solteiras,
escaneada da original que
pertence ao acervo do
hospital.
Figura 28. Habitação
para mulheres mutiladas.
Fotografia escaneada da
original, que pertence ao
acervo do hospital.
Na figura 29. Colônia
onde ficam as casas dos
pacientes casados, que
necessitavam de maior
privacidade.
As casas foram
construídas após a
inauguração oficial do
hospital. O primeiro
grupo de casas surgiu
próximo ao campo de
esportes e,
posteriormente, os outros bairros foram crescendo.
O Departamento de Profilaxia da lepra, por um período, assumiu 50% do custo da
construção para os casais que não tinham condições financeiras. Havia também o apoio
financeiro da Caixa Beneficente para os casais que queriam ampliar ou construir sua casa
por ocasião de casamento.
O número de casamentos aumentava bastante, a ponto de uma empresa construtora
ter sido contratada para acelerar a expansão da Colônia. A mobília e a construção das casas
eram assumidos pelo estado, nos casos de impossibilidade financeira. Quando o casal tinha
condições construía com seus recursos próprios.
Figura extraída da apostila do dr. Schujman, p.88, da década de 1930.
Na Figura 30 temos a
fotografia da parte
interna de uma casa
para famílias doentes.
A construção era
realizada com recursos
próprios dos pacientes,
pelo estado ou, ainda,
por construtoras
particulares, com baixo
custo. Fotografia
escaneada da original,
que está no Museu da
Saúde Pública.
Figura 31. Hospital
para pacientes do sexo
masculino. Quando
tinham reação intensa
ou uma infecção,
ficavam na entrada das
colônias.
Havia salas
reservadas para
pacientes operados,
com reações da doença,
para intercorrências e
também para o
oculista.Todos os médicos deveriam visitar os internos deste hospital antes de atender nos
ambulatórios.
.
3.3 -
HABITAÇÃO PARA PESSOAS SAUDÁVEIS
Existiam diferenças na qualidade do acabamento das casas dos funcionários em
relação às casas dos pacientes, bem como em sua localização, isto porque dentro da
instituição era muito comum a equipe dirigente sentir-se diferente dos pacientes.
Havia separação entre a zona saudável e a contaminada, com uma distância de, no
mínimo, 500 metros. Os médicos só podiam se locomover dentro de carros para não haver
contato direto.
Figura 32. Década de
1940. Foto escaneada da
original, que pertence ao
Museu de Saúde Pública.
Destacam-se a central
telefônica e a parte
externa do escritório da
diretoria e administração.
A usina elétrica
funcionava com a energia
que vinha da cidade de
Mogi das Cruzes. Na
colônia havia
transformadores em uma sala especialmente construída para esta finalidade.
A central telefônica ficava em sala à parte, de onde se podiam comunicar com os
diversos seguimentos do hospital. Os funcionários podiam falar com qualquer localidade do
estado de São Paulo.
Na figura 33 temos a sala
que ficava à parte e se
comunicava com os
diversos seguimentos do
hospital. Era o gabinete
de radiotelefonia.
Foto escaneada do
livro do dr. Pupo, da
década de 1930.
A figura 34 são as
residências das
pessoas saudáveis
que moravam
dentro do hospital e
prestavam serviços
indispensáveis,
entre eles os
médicos, que foram
e são reconhecidos
pelos mais antigos
pacientes pela sua
dedicação e
coragem e assim
descritos;
Dos primórdios do Hospital Santo Ângelo pacientes
remanescentes dessa época, recordam médicos que exerceram
a medicina no mais elevado do juramento hipocrático feito no ato
de sua formatura. Homens abnegados e cheios de amor ao
próximo que vinham de São Paulo, em cansativas viagens de
trem que duravam cinco horas-ida e volta-até duas vezes por
semana para cuidarem de seus pacientes.
(Revista Hospital Santo Ângelo Jubileu de Ouro
- p.
19)
Na figura 35 temos a
fotografia da casa do
padre, pois este
residia dentro do
hospital e era
responsável pelas
missas da igreja
católica.
Fotografia da
década de 1940,
escaneada da original,
que está no Museu de
Saúde Pública.
Na figura 36 temos a
casa onde moravam
as irmãs, que eram
responsáveis pela
disciplina do hospital.
Fotografia
escaneada da original,
que está no Museu
da Saúde Pública, na
década de 1930.
3.4 - RECURSOS EXISTENTES NO HOSPITAL.
Figura 37. Fotografia
da primeira sala de
cirurgia que ficava
dentro do hospital
para homens.
Escaneada do livro do
dr. Pupo, da década
de 1930.
Figura 38. Foto
da estufa de
desinfecção, que
era parte
complementar da
sala de cirurgia.
Escaneada do livro do
dr. Pupo, da década
de 1930.
A Figura 39 foi
escaneada da original,
que está no Museu
da Saúde Pública.
Década de 1930.
Trata-se da parte
interna do escritório
da diretoria e da
administração, que
era uma pequena
casa, dividida em
sala do diretor,
sala para o
administrador e
duas mesas para
as secretárias, além do arquivo onde ficavam armazenados os
prontuários dos pacientes.
Na figura 40, fotografia
escaneada da original
que está no Museu da
Saúde Pública. Trata-se do
escritório
administrativo da
década de 1930.
.
Na figura 41 temos o
gabinete dentário, que
atendia 100% dos
pacientes, com
modernos recursos.
Havia um
dentista que trabalhava
de segunda a sexta-
feira, que tinha um
salário de 12:000$000
na década de 1930.
(Foto escaneada do livro do dr. Pupo.)
Figura 42, os prédios da
cozinha e do refeitório.
Foto escaneada do livro do
dr. Pupo, da década de
1930.
Figura 43. Foto da parte
interna da cozinha, que era
a vapor e tinha instalação
Senking.
Fotografia escaneada do
livro do dr. Pupo, 1934.
Figura 44. O hospital
mantinha esta lavanderia
a vapor, para as roupas
hospitalares dos
pacientes que eram
proibidos de sair do
hospital. Esta era uma
proibição do Código
Sanitário da época.
Código Sanitário do Estado de São Paulo, 1918:
Artigo 498 – É terminantemente prohibido às lavanderias
receber roupas que tenham servido a doentes de hospitaes
ou provenientes de habitações particulares onde existam
pessoas atacadas de doença transmissível.
Na Figura 45 temos a
oficina de costura, onde
eram confeccionados os
uniformes e todas as roupas
utilizadas pelos pacientes
do hospital. Fotografia
escaneada da original que
pertence ao acervo do
hospital.
Figura 46. Datada de
1930. Paciente da
colônia.
Tratam-se das
trabalhadoras da oficina
de costura movida a
eletricidade.
Notamos que,
apesar da boa qualidade
dos produtos fabricados
e da união das pacientes
para o funcionamento
das oficinas e das
fábricas existentes
dentro do hospital, a
história não aponta para
nenhum tipo de
cooperativa que pudesse gerar lucros e independência financeira às mulheres
hansenianas, e tampouco uma produção de nova consciência operária libertadora,
como afirmou Merhy.
Marx, anticapitalista convicto, entendia que
um trabalhador ao atuar em uma linha de produção
dentro de um estabelecimento fabril, por exemplo,
estava totalmente subordinado, no seu agir, à
lógica do modo duro e estruturado que a produção
impunha por meio dos vários processos
capturantes da sua capacidade de trabalhar, isto
é, o grau de liberdade de um operário agir a seu
modo nas atividades produtivas era zero, e a
possibilidade de pensar sua libertação estava dada
por “algo” que, influenciando sua consciência, a
tornasse uma consciência de classe
anticapitalista, abrindo, então, chance de uma
atuação organizada, como a de um grupo de
trabalhadores consciente, que imporia resistências
aos processos de exploração do capital. Marx
apostava na força determinante do capital para
organizar as atividades do trabalhador, e
imaginava que sua libertação estaria marcada pela
chance de desamarrar essa determinação pela
produção de uma consciência operária, que
permitiria possibilidades de descaptura do
trabalhador em relação à dominação capitalista.
(Merhy, 2002, p. 53)
Havia pequenas
indústrias dentro do
hospital. Na figura 47
temos a fotografia da
torrefação de café.Tudo
era consumido
internamente.
Fotografia escaneada
do livro do dr. Pupo, da
década de 1930.
Na figura 48 temos a
fotografia da oficina de
mecânica e carpintaria,
que, para a época, era
moderna, movida a
eletricidade. Entre
outras máquinas, havia
serra e plaina elétricas.
Competentes
mecânicos, carpinteiros
e ajudantes reformavam
móveis e também
fabricavam mesas,
sofás, armários de cozinha, janelas e até caixão funeral. O nome deste pavilhão era
Sociedade de Assistência aos Lázaros. Fotografia escaneada do livro do dr. Pupo, da década
de 1930.
Figura 49. Padaria a
vapor, que preparava
deliciosos pães, bolos e
doces apenas para o
consumo interno. Foto
escaneada do livro do
dr. Pupo, 1934.
Exigências do Código Sanitário do Estado de São Paulo,
1918:
Artigo 298 – As padarias e mais estabelecimentos
constantes desta secção terão o piso revestido de material
liso, impermeável e não absorvente, e nos locaes de
trabalho a declividade conveniente para ralos ligados à
rede de esgotos.
Artigo 299 – As paredes serão pintadas até o forro, com
cores claras e com material que resista a freqüentes
lavagens e no local de trabalho serão revestidas de
material liso, impermeável, resistente e não absorvente,
até a altura de dois metros.
Figura 50. Foto do
Posto Policial, com
policiamento para
garantir a ordem, o
respeito e a
disciplina impostos
pela administração
da Santa Casa. O
paciente que
desobedecesse o
regulamento interno
ficava preso por
alguns dias, ou seja,
reclusão dentro de
um espaço de isolamento. Isto era contratualmente legal, pois constava no acordo
estabelecido entre a Santa Casa e o Estado.
VI - Disposições Geraes
Art. 27º Para as necessidades do policiamento, o
governo manterá no Asylo-Colonia uma guarda
official.
Art. 28º Poderá o governo manter annexo ao
Asylo-Colônia um presídio destinado aos doentes
criminosos, organizado de accordo com a Meza
Administrativa da Santa Casa.
Posto policial, projetado pelo arquiteto Caiuby:
Este edifício compõe-se de três prisões, uma
sala para o corpo da guarda, dois dormitórios, uma
cozinha e um gabinete sanitário para os soldados.
Na frente há um terraço, como característico do
estylo.
Este edifício está localizado fora da
Leprosaria, e dispõe de acomodações para uma
guarda de seis soldados. O seu projecto obedeceu
mais ao desejo de dotar-se o estabelecimento com
tal apparelho, do que mesmo à necessidade da
sua funcção.
(Caiuby, 1918, p. 28)
Figura 51 temos a
fotografia do
estábulo. Foto
escaneada do livro
do dr. Pupo, da
década de 1930.
Os pacientes
cuidavam dos
animais, orientados
por um veterinário
contratado pelo
estado.
O leite
abastecia algumas
regiões próximas ao
hospital, sem que o consumidor soubesse de sua origem.
Figura 52. Criação de
aves, que também eram
cuidadas pelos pacientes,
sob a orientação do
veterinário. Foto
escaneada da original que
está no Museu da Saúde
Pública.
Figura 53. Apresentação
artística em um espaço
aberto dentro do hospital.
Os cavalos serviam
também para os pacientes
passear entre os prédios
que existiam no Santo
Ângelo.
Figura 54. Carro que
transportava os animais.
Estes eram funcionários
que cuidavam dos
animais. Fotografia de
1949, escaneada da
original que pertence a ex-
paciente.
Figura 55. Fotografia
escaneada da original que
pertence ao acervo do
hospital.
Temos o ônibus,
que era conhecido
como jardineira e está
entre os primeiros
carros existentes no
hospital.
Vemos também
o parlatório, que era o
limite entre os
pacientes e as pessoas
saudáveis, local onde se dava o encontro dos pacientes com seus familiares.
Havia bancos simples, de madeira, com uma distância de um metro e meio
entre eles, um de frente para o outro. Nada poderia ser passado do paciente para
seu familiar sem ter sido desinfetado, até mesmo dinheiro. Anexo ao parlatório
ficava um banheiro exclusivo para os visitantes saudáveis.
O processo de desinfecção das correspondências e dos objetos era rigoroso:
havia uma caixa do correio projetada e construída nas oficinas do próprio
hospital, que consistia em uma grande caixa de metal cujo fundo era perfurado
por pequenos orifícios. Embaixo ficava uma grande bandeja com formol, que era
aquecida com lamparina a álcool. Quando o formol estava aquecido, desprendia
vapores que penetravam por todos os orifícios da caixa do correio onde estavam
as cartas e outros objetos.
Esta caixa do correio ficava na parede divisória da colônia e tinha três
aberturas para os pacientes colocarem as cartas e os objetos e, do lado de fora,
apenas uma abertura para o carteiro retirar diariamente as correspondências
desinfetadas.
Projeto do parlatório desenvolvido pelo arquiteto Caiuby:
Estes edifícios, situados na entrada da
Leprosaria, são destinados à visitação dos
doentes. Uma separação de vidro no centro
de cada compartimento, subindo até uma
certa altura, permitte que visitantes e
visitados se vejam, mas impede que se
toquem. A tela de arame completando a
altura do vidro permite que passe o som da
voz, mas impede que passem objectos de um
para outro lado.
As amplas varandas que os circundam
servem de salas de espera. Pela planta
geral, vê-se que um desses edifícios é
destinado aos homens e outro às mulheres.
(Caiuby, 1918, p.39)
Figura 56.Temos outros
meios de transporte dos
pacientes. Eram os carros
mais modernos que havia
na época e foram
utilizados por pacientes
que tinham autorização
para sair do hospital e fazer
compras no comércio local.
Foto escaneada da original, que pertence ao acervo do hospital.
Figura 57. Foto
escaneada da original,
que pertence ao acervo
do hospital.
Rádio Santo
Ângelo, que
permaneceu no ar até
1974. Foi administrada
por pacientes.
A Figura 58,
extraída da
apostila do dr.
Schuman, da
década de 1930.
Trata-se da
farmácia, que
tinha laboratório
anexo. Era uma
ampla sala, para
depósito dos
remédios e para
o preparo dos
medicamentos
manipulados.
Ao lado,
temos o movimento
da farmácia do Santo
Ângelo, na década de
1930. O nome do
primeiro
farmacêutico que
trabalhou no hospital
era Ângelo Furegatti.
Em frente à igreja foi
construído um monumento
comemorativo que homenageava as
pessoas mais importantes na
construção do hospital. Era um
pedestal composto por quatro lados,
sendo que cada um continha uma
placa de bronze com nomes de
pessoas expressivas dentro do
processo histórico da construção do
hospital.
Este monumento foi de intenso
valor cultural não só como registro
dos acontecimentos da saúde pública,
bem como resgate histórico de Mogi
das Cruzes.
Figura 59. Monumento
evidenciado publicamente pela
impressa da época.
Foto do jornal Correio Paulistano,de 4.5.1928, que consta do acervo da
Secretaria de Cultura do Estado de São Paulo.
Nas Figuras 60 a 63, fotos do monumento, com o texto nos quatro lados
(Norte, Sul, Leste e Oeste).
Texto da placa que estava voltada para o Norte:
Texto da placa que estava voltada para o
leste;
Texto da placa que estava voltado para o Sul:
1917
A ASSOCIAÇÃO PROTETORA DOS
MORPHETICOS
sob os auspicios de sua Exa. Revma.
D. DUARTE LEOPOLDO E SILVA
e presidente da Exma.
D. MATHILDE MELCHERT DA FONSECA
DE MACEDO SOARES
fez doação à
SANTA CASA DE MISERICORDIA DE
SÃO PAULO
dos terrenos para o leprosário de Santo Ângelo
e do projeto elaborado pelo Architecto
ADELARDO SOARES CAIUBY sob a
orientação dos drs.
EMILIO RIBAS E JOAQUIM RIBEIRO DE
ALMEIDA.
1919
A SANTA CASA DE MISERICORDIA DE
SÃO PAULO
tendo como Provedor – Senador ANTONIO
DE LACERDA FRANCO
mordomo do Hospital dos Lazaros – DR.
JOSÉ CARLOS DE MACEDO SOARES
Director-Clinico- Prof. DR. ARNALDO
VIEIRA DE CARVALHO
quando presidente do estado de São Paulo, o
Exmo. DR. ALTINO ARANTES .
Secretario do Interior O Exmo Sr. DR.
OSCAR RODRIGUES ALVES,
Diretor do Serviço Sanitário DR. ARTHUR
NEIVA
Obteve do governo o ínicio das obras que
foram entregues aos engenheiros Dr. Dácio
de Moares, Dr. Guilherme Winter e
Posteriormente Dr. Francisco de Paula
Ramos de Azevedo.
Texto da placa que estava voltado para o Leste:
Texto da placa que ficava voltada para Oeste:
1927
Em 1º de setembro, quando o presidente do
Estado de São Paulo, o Exmo. Sr. Dr.
JULIO PRESTES DE ALBURQUERQUE
Secretario do Interior Dr. FABIO DE
BARRETO.
Diretor do Serviço Sanitário
DR. WALDOMIRO DE OLIVEIRA
Inspector-chefe da Prophylaxia da Lepra
Prof. DR. João de Aguiar Pupo.
O Governo auctorisou a conclusão das obras,
tendo-as confiado ao auctor do projecto –
architecto
ADELARDO CAIUBY
1928
Em 3 de maio foi pelo presidente do estado
de São Paulo DR. JULIO PRESTES DE
ALBUQUERQUE inaugurado o leprosário
de Santo Angelo com a sua abertura aos
primeiros doentes e entregue à administraçã
da Santa Casa de Misericordia quando o
Provedor – Senador Dr. ANTONIO DE
PADUA SALLES
Mordono – Com. ALBERTO DA SILVA E
SOUZA
Diretor Clínico – Dr. SYNESIO RANGEL
PESTANA
Destacando ente os Bemfeitores FREI
ANTONIO DA VIRGEM MARIA MUNIZ
BARRETO Prior do Convento do Carmo
Condessa de Alvares Penteado Augusto de
Oliveira Camargo Dr. Diogo Teixeira de
Faria
SOCIEDADE DE ASSISTENCIA AOS
LAZAROS E DEFESA CONTRA A
3.5 – PACIENTES E TAMBÉM FUNCIONÁRIOS
Na figura 64, foto
escaneada da original, que
pertence ao acervo do
hospital, temos
os
trabalhadores recebendo
seus salários, isto
porque na administração
do dr. Francisco Salles
Gomes Junior, inspetor-
chefe da Profilaxia da
Lepra do Estado, foram
criados novos
organogramas a serem
seguidos pelos
leprosários. Houve
contratação de médicos
pesquisadores para atuar
na rede pública,
implantação da laborterapia e criação das Caixas Beneficentes.
Laborterapia era o ato de aproveitar a mão-de-obra do doente, que já tinha
profissão, e desejasse exercê-la dentro do hospital ou os pacientes fisicamente
comprometidos que pretendiam aprender nova profissão, receberiam as
gratificações pagas pelo estado, porém o valor do salário era menor que o do
funcionário público sadio, no exercício da mesma função.
Segundo Goffman (p.21), em algumas instituições totais existe uma
espécie de escravidão, e o tempo integral do internado é colocado à disposição
da equipe dirigente; neste caso, o sentido de eu e de posse do internado pode
tornar-se alienado em sua capacidade de trabalho.
O trabalho para os indivíduos estigmatizados do Santo Ângelo era um
esforço individual ao domínio de áreas de atividade considerada perigosa,
além de representar ação de caridade, mas havia também pacientes que fizeram
escolhas diferentes, optando pela eterna condição de limitado, como afirmou
Goffman em seu livro Estigma:
A criatura estigmatizada usará,
provavelmente, o seu estigma para “ganhos
secundários”, como desculpa pelo fracasso a que
chegou por outras razões.
(Goffman, 1963, p. 12).
Na figura 65 temos
uma foto da década
de 1930, dos
pacientes que eram
também
funcionários e
trabalhavam na
equipe de
enfermagem do
hospital, com
exceção do
padre
Albino (roupa
escura) e dos três
médicos que estão
usando avental.
Eles
moravam na
colônia, recebiam
salários do estado,
através da Caixa Beneficente. Esta era uma estratégia de favorecimento dos
pacientes mais despojados; em troca o estado contava com o trabalho de
qualidade, além de reduzir o valor da força de trabalho. Era uma alternativa para
amenizar a dificuldade de contratação de profissionais para lidar com pacientes
portadores de lepra.
Mas não havia somente os que recebiam remuneração. A história deste
hospital é marcada por grandes exemplos de trabalho voluntário anônimo,
que
segundo Roberto Passos Nogueira (p.20) a força de trabalho em saúde deve
abranger, ademais aqueles que, mesmo sem uma remuneração definida,
trabalham com regularidade
18
e associam-se ao contingente dos ocupados
remunerados.
Neste contingente de trabalhadores anônimos, é tradição dentro do
hospital, em todas as épocas, o paciente poder contar com a ajuda de outro
paciente nas horas de grandes dificuldades.
18
Segundo Roberto Passos Nogueira, a força de trabalho em saúde compõe-se:
a) dos ocupados remunerados, estabelecidos legalmente como autônomos ou assalariados;
b) dos ocupados não remunerados, trabalhando regularmente acima de um dado número de horas diárias em
uma instituição de saúde;
c) dos não-ocupados, que tenham procurado ocupação no setor ao longo de um período recente.
Figura 66.
Foto pertencente a ex-
interno, escaneada da
original.
Na década de 1940 o
hospital não era mais
administrado pela Santa
Casa de Misericórdia e sim
pelo estado. No entanto,
esta idéia de
aproveitamento da força de
trabalho já era uma prática
que estava contemplada no
acordo firmado entre a
Santa Casa de Misericórdia
de São Paulo e o Governo do Estado, em 1928, e se manteve mesmo depois da
alteração administrativa.
III DO PESSOAL TECHNICO
Art. 9º
A Direcção technica, nomeada pela Mesa
Administrativa da Santa Casa, por indicação do seu
director clinico, compor-se-á da seguinte maneira:
A) Um médico interno (cirurgião e parteiro) que residirá
obrigatoriamente no Asylo.
B) Um chefe de clínica dermatológica.
C) Um adjunto de clínica dermatológica.
D) Um chefe de clínica medica.
E) Um adjunto de clínica médica.
F) Um oculista.
G) Um bacteriologista.
H) Um pharmaceutico que residirá obrigatoriamente no
Asylo.
I) Um dentista.
J) Um enfermeiro-chefe e tantos enfermeiros auxiliares
quantos se fizerem necessários.
Art. 14º O serviço de enfermagem será feito pelos
próprios doentes, sob a direção do enfermeiro-chefe.
IV Dos Vencimentos
Os vencimentos do pessoal administrativo serão fixados
pela Mesa da Santa Casa, de acordo com o mordomo e
os do pessoal technico pela mesma Mesa, de accordo
com o mordomo e com o diretor clínico.
Não era permitida a atuação profissional de menores.
Art. 20º -Paragrapho 1º Não será permittido o trabalho
de pessoas sãs, menores de vinte e um annos.
As atribuições, o limite de atuação e a jornada de trabalho destes
pacientes eram estabelecidos pela equipe técnica da Santa Casa, apoiada
pela Estado.
Paragrapho 2º A lista dos cargos reservados ao
pessoal endemico de lepra bem como as determinações
das suas atribuições deverão ser estabelecidas pela
Santa Casa de accordo com a Inspectoria de Prophylaxia
da Lepra.
Art. 21º - Os doentes válidos serão obrigados a regime
de trabalho diário e remunerado, durante seis horas em
média.
Paragrapho 1º O trabalho será distribuído segundo as
aptidões e tendências de cada um. A tabela de salários e
vencimentos será organizada pelo mordomo.
Aos pacientes ainda era imposta a obrigação de colaborar com a família,
fato que era visto como positivo para alguns e negativo para outros.
Paragrapho 2º Dos salários e vencimentos dos doentes
será reservado a quota de cinqüenta por cento para
auxílio às suas famílias ou para a formação de um
pecúlio próprio, a juízo do mordomo.
Apesar do poder de compra destes pacientes, o contato com o comércio
externo era proibido.
Art. 22º - Os doentes não poderão fazer commercio com
pessoas estranhas ao Asylo-Colônia nem com quaesquer
estabelecimentos exteriores.
CAPÍTULO IV - FATORES SOCIAIS
4.1 - DESTINO DAS CRIANÇAS SAUDÁVEIS NASCIDAS DENTRO DO SANTO
ÂNGELO
Art 19º - Os filhos dos casais leprosos serão separados dos
pais logo depois do nascimento e internados na creche
anexa ao estabelecimento ou entregues à família residente
fora do Asilo-Colônia, a juízo dos pais.
(Anexo nº 08 - regulamento do Asilo-Colônia de Santo
Ângelo. Reprodução de documento encontrado na Biblioteca
do Instituto Lauro de Souza Lima.)
As crianças nascidas dentro do Santo Ângelo eram retiradas do convívio dos pais e
levadas para os parentes saudáveis. Já no caso dos pacientes que não tinham referência
familiar externa, o bebê era entregue ao Preventório.
Assim que a mãe sentia as contrações, era imediatamente levada para o centro
cirúrgico. Após o nascimento, acionavam duas pessoas: o padre e a cegonha.
O padre, que morava nas dependências do hospital, para fazer o batismo, e a
cegonha, que eram mulheres saudáveis que moravam na área administrativa, para levar o
bebê do centro cirúrgico para a igreja. Após o batismo seguiam imediatamente para o
preventório, em Jacarey ou para o Santa Terezinha, em Carapicuíba, e lá ficavam até a alta
hospitalar dos pais ou até atingirem a maioridade.
Uma vez por mês os pais podiam visitar as crianças no preventório.
Não se deve perder de vista que, à luz da ciência
moderna, a lepra não é considerada moléstia
hereditária e assim os filhos de leprosos, ainda
não contaminados, devem ser separados dos pais.
A segregação dos leprosos implica a proteção a
seus filhos menores que, do contrário, ficariam
abandonados, quando não fossem os doentes
dotados de recursos próprios ou de família.
As crianças filhas de leprosos devem ser
abrigadas em preventórios.
Os preventórios devem ser construidos com
bastante conforto, embora sem luxo. Devem ser
situados ao lado de vias de comunicação rápida e
eficiente (estradas de ferro e de rodagem, vias de
navegação fluvial ou marítima) que assegurem
transporte fácil e rápido aos grandes centros de
que dependam, para sua administração.
Os preventórios devem ser localizados a distância
regular dos leprosários, a fim de que, embora
dificultando a visita dos leprosos aos filhos sãos,
torne contudo possível, sob certas circunstâncias
especiais e a intervalos prefixados, a visita dos
pais aos filhos.
Direção – Deve ser adstrita a um médico residente
que habitará em casa separada.
Educação das crianças – Escolas – os filhos de
leprosos podem ser abrigados nos preventórios a
a idade de 14 anos, quando se deve procurar
colocação para os mesmos. Até esta idade devem
ser educados nos preventórios, onde devem existir
escolas primárias e profissionais, que habilitem as
crianças à luta pela vida.
(Continentino, 1933 p. 16.)
Figura 67. Preventório de
Jacarey, para onde foi
levada a maioria das
crianças nascidas dentro do
hospital Santo Ângelo. Foto
da década de 1940,
escaneada da original, que
está no Museu da Saúde
Pública Emílio Ribas.
Fotografia de ângulo
diferente do Preventório de
Jacarey .
Figura 68. Datada da década
de 1940, foi escaneada da
original, que está no Museu
da Saúde Pública Emílio
Ribas.
Figura 69. Parte interna do
Preventório de Jacarey, em
São Paulo .
Foto da década de
1940, escaneada da original
,que está no Museu da Saúde
Pública Emílio Ribas.
Figura 70. Refeitório do
Preventório.
Foto da década de
1940, escaneada da original
que está no Museu da Saúde
Pública Emílio Ribas.
Figura 71. Acomodações das
crianças do Preventório.
Foto da década de
1940, escaneada da original,
que está no Museu da Saúde
Pública Emílio Ribas.
Figura 72. Meninos no
preventório de Jacarey- SP
Foto da década de 1940,
escaneada da original do
Museu da Saúde Pública
Emílio Ribas.
Figura 73. Meninas no
preventório de Jacarey-SP.
Foto da década de
1940, escaneada da original
que está no Museu da
Saúde Pública Emílio
Ribas.
A manutenção dos
preventórios era tarefa
difícil, não só do ponto de
vista de trabalhar com as
questões emocionais das
crianças, bem como a
preocupação com o
desenvolvimento
educacional, a situação ficava mais complicada pela ausência de recursos financeiros, por
isso em 1949 o Governo Federal autorizou uma campanha semanal para levantar fundos
em benefício dos filhos sadios dos hansenianos.
LEI Nº 909, DE 8 DE NOVEMBRO DE 1949.
Autoriza a emissão especial de selos em benefício dos
filhos sadios dos lázaros.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, faço saber que o
CONGRESSO NACIONAL decreta e eu sanciono a
seguinte Lei:
Art. 1º É o Poder Executivo autorizado a realizar,
anualmente, por intermédio do Ministério da Viação e
Obras Públicas, a partir de 1950, durante uma semana,
que se denominará Semana do Combate à Lepra, a
emissão de selos da taxa adicional de 10 (dez)
centavos para serem aplicados à correspondência que
transitar pelo território nacional.
Parágrafo único. O produto da venda dos selos, a que
se refere esta Lei, será entregue à Federação das
Sociedades de Assistência aos Lázaros, integrada na
Campanha Nacional Contra a Lepra, em virtude do
Decreto-lei nº 4.827, de 12 de outubro de 1942, em
benefício dos filhos sadios dos lázaros.
Art. 2º Esta Lei entrará em vigor na data da sua
publicação.
Art. 3º Revogam-se as disposições em contrário.
Rio de Janeiro, 8 de novembro de 1949; 128º da
Independência e 61º da República.
EURICO G. DUTRA, Clóvis Pestana, Guilherme da
Silveira, Clemente Mariani.
4.2 - DÉCADA DE 1940 e 1950
4.2.1 - REPRESSÃO SEXUAL ERA TRAÇO MARCANTE DESTE PERÍODO
Art. 18º Os doentes que sejam casados de acordo com a lei,
poderão viver no regime conjugal.
§ único: Será permitido o casamento entre os doentes
internados, a juízo do médico interno e do mordomo, os
quais, nas suas deliberações a esse respeito, deverão
considerar o estado da moléstia dos pretendentes, a
antiguidade destes no estabelecimento, o procedimento que
têm tido e a capacidade dos alojamentos para casados.
(Anexo12 - Regulamento do Asilo Colônia Santo Ângelo
Reprodução do documento encontrado na Biblioteca do
Instituto Lauro de Souza Lima.)
O tema sexualidade é muito polêmico e apresenta conseqüências sociais e de saúde
hoje, bem como nas mais antigas décadas.
Dentro do hospital, sempre houve um controle intenso para evitar contato sexual
entre os jovens casais de namorados, os que desrespeitavam as ordens eram severamente
punidos.
Apesar de todos os castigos na tentativa de controlar a vida sexual, as freiras não
conseguiam impedir os partos de pacientes solteiras que engravidavam dentro do hospital.
Às 22 horas tocavam três toques de recolher. Após o terceiro os guardas passavam
trancando, por fora, todos os quartos. Este ato não impedia os namoros e até os
relacionamentos sexuais que aconteciam em local escondido, normalmente durante o dia,
nos horários que o controle era menor.
As mulheres casadas que eram levadas para o Santo Ângelo, mesmo estando longe
do marido, o casamento era mantido com direito a visitas esporádicas.
Este encontro representava um momento delicado pelas diferentes posições, como
afirma Goffman em seu livro Estigma:
Quando normais e estigmatizados realmente se
encontram na presença imediata uns dos outros,
especialmente quando tentam manter uma conversação,
ocorre uma das cenas fundamentais da sociologia porque,
em muitos casos, esses momentos serão aqueles em que
ambos os lados enfrentarão diretamente as causas e efeitos
do estigma.
(Goffman, 1963, p. 15)
O distanciamento gerava insegurança e carência afetiva, mas quando uma mulher se
envolvia com alguém, se esta traição fosse descoberta pelas freiras, a paciente era expulsa
para a “Casa cor-de-rosa”, que ficava em local afastado, mas dentro das terras do Santo
Ângelo.
Esta era uma forma de punição e exposição das pacientes que respeitavam as
ordens.
O marido deixava de comparecer quando ficava sabendo que sua esposa estava na
“Casa cor-de-rosa”. Não dá para afirmar que o término da relação era apenas pela traição
ou se representava um desejo de ambos, pois muitos outros casamentos foram desfeitos
sem este episódio de transferência para a “Casa cor-de-rosa”, segundo Goffman em seu
livro Estigma:
[...] Os momentos em que os estigmatizados e os
normais estão na mesma “situação social”, ou seja, na
presença física imediata um do outro, quer durante uma
conversa, quer na mera presença simultânea em uma
reunião informal.
A simples previsão de tais contatos pode, é claro,
levar os normais e os estigmatizados a esquematizar a vida
de forma a evitá-los. Presumivelmente, isso terá maiores
conseqüências para os estigmatizados, à medida que uma
esquematização maior de sua parte será sempre necessária.
Faltando o feedback saudável do intercâmbio social
cotidiano com os outros, a pessoa que se auto-isola
possivelmente torna-se desconfiada, deprimida, hostil,
ansiosa e confusa.
(Goffman, 1963, p. 14.)
É possível que as mulheres rejeitadas pelos maridos estivessem com estes
sentimentos negativos e buscassem apoio em outras formas de relacionamento, por isso
passavam a atender aos hansenianos que as procuravam sexualmente.
Sem ter a intenção, as freiras estimularam as primeiras ações de profissionais do
sexo dentro do hospital.
O regime disciplinar imposto pelas irmãs de São José era bastante rigoroso, não
permitia a aproximação de internados de sexo oposto.
Aos noivos eram permitidas serenatas feitas na janela do Pavilhão Feminino no
período noturno.
As ações punitivas representavam o pensamento da época em relação à submissão
feminina e à organização social - sociedade disciplinada - para cada problema social era
designado um espaço especializado que estabelecia suas condutas, assim a “Casa cor-de-
rosa” era o espaço das mulheres infiéis.
Não sabemos quando esta ação repressora começou, mas podemos afirmar que foi
praticada na década de 1940 e terminou na década de 1950, com a demolição da “Casa
cor-de-rosa”.
Fotografia
escaneada da original
que pertence ao
acervo do hospital,
das décadas de 1940
e 1950.
Na figura 74 temos a
Pérgula, onde os
solteiros podiam
namorar sempre
acompanhados de
alguém para tomar
conta. Era permitido
apenas segurar na
mão da namorada; o casal que desobedecia ficava impedido de passear dentro do hospital
por alguns dias.
A construção deste bonito espaço estava diretamente associada à vigilância. Os
pacientes ficavam agrupados no mesmo local, e impedidos de ter contato sexual.
As atividades conjuntas, por um lado, favoreceram o contato afetivo entre os
internados e, por outro, contribuíam no controle das ações exercidas pelas irmãs.
[...] quando as pessoas se movimentam em conjunto,
faz com que todos façam o que foi claramente indicado como
exigido, sob condições em que a infração de uma pessoa
tende a salientar-se diante da obediência visível e
constantemente examinada dos outros.
(Goffman,1963, p. 16)
4.2.2 - CONSTRUÇÃO DO SEGUNDO CINE-TEATRO
Com o crescimento do número de pacientes, o primeiro cine-teatro ficou pequeno.
Em agosto de 1940, a Caixa Beneficente, atendendo aos apelos dos pacientes, disparou uma
intensa campanha a fim de angariar fundos para a edificação do segundo cine-teatro.
A Caixa Beneficente do Asilo-Colônia, que está
localizada na cidade paulista de Santo Ângelo, promoveu
uma intensa campanha a fim de angariar fundos para a
edificação do seu Cine-Teatro. O apelo dos 1.600
hansenianos desse modelar estabelecimento empolgou o
povo paulista, que contribuiu generosamente para esse
humanitário movimento.
Como intermediário dos internados em Santo Ângelo,
colocaram à frente dessa campanha, que teve início em
agosto de 1940 e se prolongou até setembro, os srs.
Homem de Melo, o dr. Sólon Fernandes, dr. Cyro de Souza e
Silva, dr. Aulo Viana e sra. Norina Perez.
Em benefício da construção do Cine-Teatro foram
promovidos festivais, espetáculos teatrais, jogos desportivos
e organizaram-se bandos precatórios que nas ruas de São
Paulo solicitavam donativos.
Esta campanha encontrou o mais decidido apoio do
povo e do governo paulista, e tudo fizeram para o seu bom
êxito. Abrindo o “Livro de Ouro”, o dr. Adhemar de Barros,
interventor Federal no Estado, assinou a quantia de 10
contos de réis. Houve, como o Chefe do Executivo Paulista
donativos vultosos de elementos destacados da sociedade,
tendo até um anônimo contribuído com doze contos de réis.
Entre os mais interessantes movimentos realizados
em favor dessa Campanha desejamos salientar o dos vales-
tijolo, que foram largamente distribuídos entre os colegiais
dos grupos escolares, com ótimos resultados.
Inúmeros clubes esportivos, recreativos e operários
promoveram festividades. A colônia Italiana realizou
grandioso festival sob o patrocínio do sr. embaixador da
Itália.
Também o “Estado de São Paulo”, o grande “leader”
da opinião paulista e que sempre se colocou ao lado das
grandes causas que visam o amparo da coletividade,
cooperou de maneira eficientíssima na campanha, tendo as
quantias o total de 7:319$500.
Graças à dedicação de seus dirigentes e à
generosidade do povo paulista, a campanha conseguiu
arrecadar quantia aproximada a 300:000$000.
(Revista de Combate à Lepra, 1941, p.247 .)
Notamos o sucesso da campanha que facilitou a construção do segundo cine-teatro
que foi inaugurado em 9. 5.1948 com o filme Os melhores anos de nossas vidas.
Por mais de vinte anos, foi palco de apresentações ilustres com shows de Hebe
Camargo, Simplício, Raul
Gil e Agnaldo Rayol, além
de shows da Rede Record.
A Figura 75 mostra-
nos a parte externa do
segundo cine-teatro, que hoje
está fechado, aguardando
apoio financeiro público ou
privado para restauração.
Fotografia escaneada
do jornal Moginews
15.10.05.
Figura 76. Parte interna do
cine-teatro extraída do
jornal da cidade Moginews,
15.10.05.
4.3 - VISITANTES DAS DIVERSAS DÉCADAS
Foi manchete do jornal a visita do Interventor Federal o dr. Adhemar de Barros ao
Santo Ângelo em 1938.
O Asylo Colônia Santo Ângelo recebeu no dia 24 pela
manhã a visita do Interventor Federal o dr. Adhemar de
Barros, que teve magnífica impressão da modelar
organização que é aquelle serviço de combate à lepra em
São Paulo.
(Jornal A Nota, 26. 6.1938).
Em commemoração de mais um anniversário da
fundação do asylo-colonia de Santo Ângelo, o director
daquelle estabelecimento, dr. Manuel de Abreu, organizou
um interessante programa de festejos que foram realizados
com toda solennidade domingo. A essa festa compareceram
numerosas pessoas não só desta capital como também de
Mogy das Cruzes, decorrendo todos os números da mesma,
dentro da mais completa ordem.
[...] À chegada no Asylo Colônia, foram recebidos
pelo sr. director e vice-director, respectivamente drs. Manuel
de Abreu e Itagiba Martins Villaça.
[...] Nesse almoço estiveram presentes pessoas de
destaque social desta capital, Mogy das Cruzes e de outras
localidades do Estado. Além dos médicos pertencentes ao
Departamento de Prophylaxia da Lepra. Notamos a presença
do dr. Salonón Schujman, médico argentino, commisionado
pelo governo de seu paiz para estudar a organização
paulista do combate ao mal de hansen, sacerdote do
estabelecimento: tenente João Franco Madia, da força
pública, instructor de gymnastica dos internos: diversas
senhoras e senhoritas e outros convidados.
Notamos enorme movimento, estando o lindo campo
de esportes completamente cheio de assistentes. De uma
das archibancadas destinadas aos visitantes, porém
pudemos assistir a todas as provas, que attestaram a
capacidade dos doentes alli asylados. Deram entrada no
campo, em formação militar, precedidos por uma banda de
tambores. Desfilaram perante as archibancadas para, logo
após, formarem ano centro do gramado, onde executaram
diversas provas de gymnasticas. (conforme a fotografia 77
que foi escaneada da original que pertence ao Museu da
saúde pública).
Terminados os números de gymnastica houve um
descanso até o início do jogo de futebol, uma banda de
musica de Mogy das Cruzes executou durante esse intervalo
vários números, momentos depois entraram em campo os
dois quadros, sendo recebidos com uma salva de palmas. O
jogo decorreu sempre animado, sahindo victoriosa a turma
do Santo Ângelo, pela contagem de dois pontos a um. O
quadro do padre Bento foi chefiado pelo director daquele
sanatório, dr. Lauro Souza Lima. ( conforme a fotografia nº
78 abaixo).
Esporte era fundamental dentro do Santo Ângelo. Havia uma oficina de cultura
física onde eram registrados todos os pacientes não mutilados. Dentre as atividades
oferecidas, cada paciente escolhia a de sua preferência.
La gimnasia se pratica en invierno a las 4 de la tarde
y en verano a las 6 de la mañana.
Se pratican tambien en Santo Angelo todos los
desportes y especialmente foot-ball, tennis, carreras,
lanzamiento de balas, jabalinas, levantamiento de pesas etc.
(Shujman, 1937, p. 93)
Todos os esforços dos pacientes, provavelmente, devem estar associados à
necessidade de mostrar para outras pessoas que eram capazes de superar as limitações da
doença, como afirmou Goffman:
O indivíduo estigmatizado pode, também, tentar
corrigir a sua condição de maneira indireta, dedicando um
grande esforço individual ao domínio de áreas de atividades
consideradas, geralmente, como fechadas, por motivos
físicos e circunstanciais, a pessoas com o seu defeito.
(Goffman 1963, p .12)
Na Figura 78, que foi
escaneada da original,
que pertence ao
acervo do hospital, da
década de 1930,
temos a visita do dr.
Lauro de Souza Lima
e mons. Luiz Câmara
no dia da festa de
aniversário.
Figura 79. Visita
da vereadora
Conceição da Costa
Neves ao hospital .
Fotografia
da década de 1950,
escaneada da
original, que
pertence a uma ex-
paciente.
Figura 80. Foto
escaneada da
original, que
pertence ao acervo
do hospital.
Temos o sr.
Jânio Quadros,
governador do
Estado em visita ao
hospital colônia em
12. 4.1956. O dr.
Carlos Braga, e o
padre Albino, que
já morava dentro do hospital.
Na Figura 81,
fotografia escaneada da
original, que pertence
ao acervo do hospital,
em 12. 4.1956.
Temos o sr.
Jânio Quadros, e sua
esposa visitando o asilo
colônia Santo Ângelo.
Após esta visita, o
governador aprovou o
regulamento dos
sanatórios do
Departamento de
Profilaxia da Lepra, da Secretaria de Estado dos Negócios da Saúde e da Assistência Social,
através do decreto nº 30.233 de 27.11.1957, além de repassar uma expressiva quantia em
dinheiro para ampliação dos setores do hospital.
Na Figura 82 vemos
a fotografia do diretor
do Asilo Colônia
Santo Ângelo, dr.
José Augusto
Moreira (primeiro à
direita) recebendo
autoridades, entre as
quais o professor José
Limongi Sobrinho, da
Secretaria da
Educação do Estado
(segundo à esquerda).
A visita se deu para
oficializar a
inauguração da já existente escola, dentro do hospital.
(Texto e fotografia de meados da década de 1950 foram retirados do jornal O Diário de
Mogi da Cruzes, s/d.)
4.4 – TRATAMENTO AMBULATORIAL E O FIM DO ISOLAMENTO
COMPULSÓRIO.
A década de 1930 foi marcada pela construção de outros leprosários. No estado de
São Paulo já haviam diversos hospitais semelhantes ao Santo Ângelo, como o Sanatório
Padre Bento, construído em 1931, o Asilo Colônia Pirapitingui, em 1931, o Asilo Colônia
Aimorés, em 1934 e o Asilo Cocais, em 1934, além de muitos em funcionamento no
Brasil.
Estes novos hospitais abafaram o destaque que o Santo Ângelo teve na década
anterior. De 1940 até 1950 houve poucas publicações jornalísticas, além da diminuição dos
investimentos públicos, o que gerou insatisfação aos pacientes, que sofreram perdas de
direitos como: redução na qualidade da alimentação, pouco investimento em lazer entre
outros. Estas alterações, reflexo das mudanças políticas na área da Saúde, estavam
diretamente ligadas ao crescimento da medicina privada e do direito à saúde mediante
contribuições aos fundos de pensões.
Nestas décadas os pacientes puderam contar com um importante apoio político
oferecido pela deputada Maria da Conceição da Costa Neves, que realizou algumas
campanhas em favor dos doentes, encaminhou diversos projetos de lei que favoreceram os
pacientes chegando a ser elogiada pelo dr. Lauro de Souza Lima, que era diretor-geral do
Departamento de Profilaxia da Lepra na época.
DEPARTAMENTO DE PROFILAXIA DA LEPRA
Gabinete do Diretor
São Paulo, 27 de julho de 1953
Exma. sra. deputada
Conceição da Costa Neves
A bem da verdade e cumprindo elementar dever de
justiça, testemunhamos a V. Excia. os agradecimentos do
Departamento de Profilaxia da Lepra do Estado de São
Paulo, pelos numerosos benefícios que sua atuação na
Assembléia Legislativa e, fora dela, como presidente da
Associação Paulista de Assistência ao Doente de Lepra, tem
proporcionado ao aperfeiçoamento de sua organização e à
solução dos múltiplos problemas sociais inerentes à
campanha de profilaxia da lepra.
Bastaria para consagrá-lo o pesado encargo,
inteiramente sob sua responsabilidade, por intermédio da
Associação de que é presidente, da recuperação social dos
egressos dos nossos sanatórios, até que consigam superar
as dificuldades decorrentes do isolamento a que se
submeteram, por força da lei, e as oriundas da reação do
meio hostil a que retornam.
Mas, há, ainda, uma legião de internados dos nossos
sanatórios que auferem benefícios materiais, sob as mais
variadas formas, distribuídos por V. Excia., notadamente, o
fornecimento de aparelhos ortopédicos de elevado custo e o
suficiente para o sustento de suas famílias, deixadas na
penúria e a totalidade deles que recebe o conforto moral da
certeza da sua paciente bondade para com eles e da sua
irrestrita solidariedade.
Ao aperfeiçoamento da organização profilática do
Estado, tem contribuído V. Excia. Por meio de oportunas
emendas aos orçamentos do Departamento e utilíssimos
projetos de lei. Daquelas e destes, permita-me enumerar
alguns dos que ocorrem no momento:
1) emenda dotando o DPL de Cr$ 15.000.000,00, para
aquisição de medicamentos sulfônicos;
2) emenda destinando Cr$ 120.000,00 para a assistência
social aos filhos sadios dos internados, recolhidos ao
Educandário de Jacareí;[...]
5) emenda dotando o DPL de verba para acabamento das
obras da cozinha geral do sanatório “Santo Ângelo”; [...]
13) emenda ao orçamento, elevando os vencimentos dos
trabalhadores doentes, que prestam serviços ao Estado,
aos sanatórios.
[...] É-nos, assim, fácil poder expressar a V. Excia. os
nossos agradecimentos por essa valiosa cooperação que
vem prestando ao departamento e reafirmar-lhe nossa
integral solidariedade.
Aproveitamos o ensejo para saudá-la, muito
cordialmente.
Dr. Lauro de Souza Lima
Diretor-geral
(Neves, 1965 p. 43.)
Se, por um lado, nas décadas de 1940 e 1950 os pacientes hansenianos sofreram
com a desmontagem dos direitos, por outro, foi um período de avanços no tratamento,
surgiram eficientes alternativas em relação ao controle da doença, com a descoberta das
sulfonas, na década de 1940, que possibilitou o tratamento em regime ambulatorial e
posteriormente a Clofazimina, que ratificou o tratamento ambulatorial. Sendo assim, no
início da década de 1960 não se recomendava mais o isolamento compulsório, que foi
abolido em 1962.
A cura foi oficializada na década de 1970, com a descoberta da Rifampicina. Estas
importantes evoluções no tratamento eliminaram o isolamento compulsório no Brasil.
Hoje, o tratamento é realizado através da PQT, distribuída nas Unidades Básicas
de Saúde e segundo o Cremesp:
A PQT é doada ao Brasil pela OMS e deve estar disponível
em todos os municípios gratuitamente.
(http://www.cremesp.org.br/?siteAcao=Revista&id=227).
4.5 – CONHECENDO O MUNICÍPIO QUE FOI ELEITO PARA A CONSTRUÇÃO
DE UM LEPROSÁRIO NO FINAL DA DÉCADA DE 1920
O Asylo Colônia Santo Ângelo está situado nos Campos de Santo Ângelo, em Mogi
das Cruzes.
Mogi das Cruzes está situado na Região Leste da grande São Paulo,
aproximadamente a 50 quilômetros da nascente do rio Tiete, que fica no município paulista
de Salesópolis.
Demografia:
Acolhe colônias de todos os cantos do mundo, com destaque especial para a
colonização japonesa, com uma grande quantidade de japoneses e seus descendentes, que já
estão em sua terceira geração na cidade.
População (estimada p/ 31 –XII – 1945)
do município 60.988 habitantes
do Estado 8.051.658 habitantes
% sobre o total do Estado: 0,76.
(IBGE - Instituto Brasileira de Geografia e Estatística Sinopse
Estatistica do Município de Mogi das Cruzes, RJ, 1948).
Está situada em local privilegiado na Região Leste da Grande São Paulo e pertence
às cidades que compõem o Alto do Tietê
:
A Região do Alto Tietê - setor cabeceiras - (ou
simplesmente Alto Tietê), é a denominação aplicada aos
municípios da microrregião de Mogi das Cruzes e da
microrregião de Guarulhos. A região recebe esse nome por
causa da localização geográfica das cidades. O rio Tietê
nasce na cidade de Salesópolis e percorre parte desses
municípios antes de chegar à capital. Todos os municípios
fazem parte da Associação dos Municípios do Alto Tietê –
AMAT.
O Alto Tietê possui uma produção variada e
riquíssima, que vai desde artigos manufaturados até
verduras e legumes, passando pelas flores e pela água que
abastece milhares de pessoas na região e na zona leste de
São Paulo. Na região há pólos industriais e estâncias
turísticas.
(http://pt.wikipedia.org/wiki/Regi%C3%A3o_do_Alto_Tiet%).
As onze cidades que compõem o Alto do Tiete são: Arujá, Biritiba Mirim, Suzano,
Guarulhos, Mogi das Cruzes, Itaquaquecetuba, Guararema, Santa Isabel, Poá, Ferraz de
Vasconcellos e Salesópolis.
O município é servido pelos trens da linha E da Companhia Paulista de Trens
Metropolitanos e conta com quatro de suas estações ferroviárias: Jundiapeba, Brás Cubas,
Mogi das Cruzes (centro) e Estudantes (acesso aos principais prédios das universidades
mogianas.
O correto é Moji' pois prescreve-se o uso da
letra "j" para a grafia de palavras de origem tupi-
guarani. O nome vem do tupi M'Boiji (ou M'Boîj), Rio
das Cobras (referindo-se ao Tietê, o qual em seu alto
curso cruza o município). Ao longo dos anos, a grafia
M'Boijy foi alterada para Boigy, depois para Mogy,
Mogi e finalmente para Moji.
Na ortografia da língua portuguesa, prescreve-
se o uso da letra "j" para palavras de origem tupi-
guarani. Assim, tanto o dicionário Houaiss como o
IBGE usam a grafia moji. Historicamente, no entanto,
o uso mais comum, apoiado pela administração
pública é Mogi para o nome da cidade. Dois outros
municípios que usam o nome de Mogi são Mogi
Guaçu e Mogi Mirim.
http://pt.wikipedia.org/wiki/MogidasCruzes
É polemica a data da fundação de Mogi das Cruzes,
porém é mais comum afirmar que foi fundada em 1560 por
Gaspar Vaz. Após ter aberto o primeiro caminho de acesso a
São Paulo, dando início ao povoado, que foi elevado a Vila,
em 17 de agosto de 1611, com o nome de Vila de Sant'Anna
de Mogi Mirim. A oficialização ocorreu em 1º de setembro,
dia em que se comemora o aniversário da cidade.
Em 1822, Mogi recebe o príncipe regente d. Pedro,
em 9 de setembro, após a Proclamação da Independência.
Hospeda-se no Convento do Carmo - propriedade dos
carmelitas instalados na cidade desde 1633, com a
construção da Igreja de Ordem 1ª do Carmo. Depois, segue
viagem levando um documento dos mogianos, que reitera
apoio à Independência do Brasil.
Texto extraído de http: www. pmmc. com.br.
4.5.1 - SAÚDE PÚBLICA DE MOGI DAS CRUZES
O prefeito anualmente apresentava à Câmara Municipal de Mogi das Cruzes um
relatório das principais ações sociais.
O relatório apresentado pelo prefeito tenente Manoel Alves dos Anjos, em 1929, um
ano após a inauguração do Santo Ângelo, consta que o Inspetor do Serviço de Profilaxia da
lepra o dr. Nestor Soriano Pereira montou um laboratório em uma das salas da Prefeitura.
Não houve, felizmente, durante todo anno p.p.
alteração sensível no estado sanitário em todo o Município.
Diversas solicitações feitas a esta Prefeitura pelo Serviço
Sanitário do Estado, todas ellas como medidas de
prophylaxia e preventiva, foram immediatamente attendidas.
Pelo Exmo. Sr. Dr. Ubiratan Pamplona, digno
Inspector Sanitário deste Districto, está sendo organizado um
trabalho sobre a nossa cidade, tendo esta Prefeitura o
auxiliado nas medidas ao seu alcance.
Esteve também nesta cidade, installado com
laboratório em uma das salas da Prefeitura, o Exmo. Sr. Dr.
Nestor Soriano Pereira, Inspector do S. de Prophylaxia
contra a Lepra, e mais um auxiliar technico.
A ambos esta Prefeitura dispensou o melhor
acolhimento, auxiliando-os no desempenho da árdua missão
da qual se achava encarregado entre nós.
(Alves, 1929, p. 16)
No relatório apresentado pelo prefeito Carlos Alberto Lopes, em 1930, existe
negação ou ignorância em relação ao número de casos de lepra assistidos neste município.
Como era possível estar tudo bem se os documentos mostram que nesta época já existiam
mais de 1.500 pacientes no Santo Ângelo?
Saúde Pública
O estado sanitário do município, durante todo o anno
não soffreu alteração digna de registro, pois não houve
nenhum caso de moléstia suspeita, não havendo também
surto algum de epidemia. Como medida preventiva e de
prophylaxia, uma turma de guardas sanitários destacados
nesta cidade, com auxílio de pessoal e material que esta
prefeitura fornece, fez uma limpeza geral nos diversos
terrenos baldios vizinhos à cidade e intimando também todos
os moradores da cidade, para que fosse feita a remoção de
todo o lixo, latas e mais objectos que pudessem auxiliar a
proliferação dos mosquitos entre nós, e isto tudo porque na
capital da república appareceram alguns casos de febre
amarella.
Com as medidas postas em prática não só na cidade
como também em todo o município, tivemos o prazer de
constatar que a saúde da população não foi alterada.
Passada a epocha do terror, a occasião em que se temia do
mal da visita terrivél, nem por isso deixou-se de lado esse
importante serviço qual sejam o da hygiene, base sólida
sobre a qual repousa a saúde de cerca de 20.000 habitantes
da nossa cidade, que continua merecendo especial cuidado
em sua limpeza e saneamento. Foram lisonjeiras as palavras
que tiveram para com a nossa cidade em materia de
hygiene, os illustres medicos que exercem os cargos de
inspectores do Serviço Sanitário do Estado.
Relatório apresentado à Câmara Municipal de Mogy
das Cruzes pelo prefeito municipal Carlos Alberto Lopes –
durante a sua gestão como chefe do executivo municipal no
anno de 1929.
Mogy das Cruzes, 15 de janeiro 1930.
Mogi das Cruzes aprendeu a conviver pacificamente com as limitações físicas dos
pacientes, acredito também que, por conta da história do Santo Ângelo, o diagnóstico de
hanseníase adquiriu visibilidade nas três faculdades particulares existentes no município,
que mantém cursos na área de saúde.
5.0 CONCLUSÃO
Como demonstram as ciências sociais e humanas, o
fenômeno saúde-doença, enquanto uma questão humana e
existencial compartilhada por todos os segmentos sociais,
remete a relação com o corpo, com a dor e o prazer, com a
vida e a morte. Para todos os grupos sociais, saúde e
doença envolvem uma complexa interação entre dimensões
físicas, psicológicas, sociais e ambientais da condição
humana.
(Minayo, 2004 p 10).
Ainda hoje refletir sobre a hanseníase enquanto um desafio para a saúde coletiva
nos coloca inúmeras e complexas questões que interessam a todos que estão atuando no seu
enfrentamento e principalmente os que atuam nos antigos hospitais colônias.
Concluímos que a velha questão da lepra ainda é um grande problema social a ser
enfrentado pela saúde pública. O Brasil é o único país da América Latina onde a doença
ainda não foi eliminada e temos grande número de pacientes seqüelados e o crescente
número de novos casos, além do triste segundo lugar entre as estatísticas mundiais. A Índia
é o país mais atingido em números absolutos e, em segundo lugar, vem o Brasil com 50 mil
novos casos por ano.
A hanseníase foi e continua sendo uma doença que atinge principalmente os pobres,
ou seja, este diagnóstico está intimamente relacionado com a condição de miserabilidade
que vive uma grande parcela da população brasileira, apesar do progresso da medicina e da
possibilidade de cura. A erradicação só será possível com investimento em infra-estrutura
para gerar melhoria das condições de vida. Sendo assim, eliminar a hanseníase não é um
desafio que possa ser solucionado apenas pela Secretaria de Saúde, é um grande problema
social que exige envolvimento de todas as secretarias; eliminá-la é comprometer-se com a
mudança social, proporcionando melhor distribuição da riqueza produzida no Brasil.
O peso da história do antigo Santo Ângelo interfere muito na interpretação do
cotidiano e nas intervenções profissionais. Na maioria das ações está presente um terrível
sentimento de culpa que faz com que a política de saúde assuma sozinha toda
responsabilidade em relação às conseqüências negativas do processo de envelhecimento
dos pacientes hansenianos institucionalizados.
Muito diferente do que aconteceu nas primeiras décadas de inauguração do hospital,
onde a saúde fez parceria com instituição particulares e privadas e com a sociedade civil
para dar conta da cultura, do lazer, da segurança, do transporte, da habitação e da educação
dos pacientes. Hoje, apesar do avanço e organização das outras políticas públicas e da
profissionalização das ações dentro do hospital, a diretoria não conta com o apoio de
muitos parceiros.
A hanseníase foi uma grande questão social no início do processo de
industrialização no país, após a descoberta das sulfonas, na década de 1940, e da
Clofazimina na década de 1960. O tratamento passa a ser realizado em ambulatório, e já no
início da década de 1960 não se recomendava mais o isolamento compulsório, que foi
abolido em 1962.
Na década de 1970 a cura foi oficializada com a descoberta da Rifampicina,
acabando assim com o isolamento compulsório, mas não com o estigma em relação à
doença, como foi no passado. Ainda hoje, é comum o paciente tentar encobrir as marcas
que caracterizam o estereótipo estigmatizante, com o apoio da família e longe dos serviços
oficiais de saúde.
Após o surgimento da medicação eficaz que impedia a proliferação da doença, os
hansenianos internados havia vários anos foram convidados a sair do hospital. Os que
optaram viver fora dos muros hospitalares, conquistaram o direito de a ele retornar a
qualquer momento, mediante valiação psicossocial.
Estas mudanças históricas impulsionaram uma revisão no rumo do hospital, que
perdeu seu sentido inicial, por isso o nome Asilo Colônia Santo Ângelo foi alterado na
gestão do governador Paulo Salim Maluf para Hospital Dr. Arnaldo Pezzuti Cavalcanti, em
homenagem a um dermatologista que era um grande amigo dos pacientes, que apoiava
todas as iniciativas de esporte e lazer dos pacientes.
A Lei abaixo citada foi a que oficializou a alteração de nome do hospital, foi
publicada no Diário Oficial de 28. 8. 1981.
Lei Nº 2.959, de 28 de agosto de 1981
Publicação: Diário Oficial v.91, n.165, 29/8/1981.
Gestão: Paulo Salim Maluf
; Denominação
Da denominação de “Dr. Arnaldo Pezzuti Cavalcanti” ao Hospital Santo Ângelo, de Jundiapeba em Mogi
das Cruzes.
Esta alteração teve uma implicação na função social do hospital, deixando
oficialmente de ser específico de hanseníase passando a ser hospital geral. Tal decisão
marcou o início de uma nova fase na história do hospital e na vida dos pacientes e na região
do Alto do Tiete.
O hospital, em um espaço de tempo de aproximadamente cinqüenta anos passou de
um sistema asilar, planejado e construído em torno da noção da lepra, no qual a totalidade
dos pacientes tinha a condição de residente permanente, a um sistema de hospital geral,
onde os antigos moradores tiveram de se ajustar a uma nova situação: abandonaram a
prática de residentes com assistência exclusiva para assumirem a condição de pacientes que
disputam espaços físicos e acessibilidade com os demais usuários do SUS.
Enquanto ainda comemoramos os avanços da medicina na cura da hanseníase e a
evolução da saúde pública, que transformava o antigo leprosário em hospital geral, somos
surpreendidos com o HIV e a Aids que, como a hanseníase, se configuram como um
complexo problema tanto médico como psicossocial.
Hoje o hospital retoma suas origens à medida que se prepara para ser uma boa
alternativa de assistência aos novos desafios do HIV e da Aids, e assim a história da saúde
pública no Alto do Tietê se repete, sem perder de vista seu objetivo inicial, assistir aos
hansenianos isolados compulsoriamente, o antigo Asylo Colônia Santo Ângelo e atual Dr.
Arnaldo P. Cavalcanti busca adaptar-se às novas exigências da saúde pública.
Ao fazer o atendimento desta patologia, mais uma vez o hospital está resgatando a
assistência a portadores de diagnóstico que gera preconceito, estigma e exclusão social.
6.0 - Anexos
Anexo Nº 01 - Estatuto da Associação Protectora dos Morpheticos
Art.1º-A Associação Protectora dos Morpheticos é uma Associação de caridade
christan, com sede na Capital do Estado de S.Paulo cujos fins são os seguintes:
§1º - Socorrer os morpheticos asylados ou não, que reclamarem a sua
assistência;
§2º - Abrigar e amparar as famílias dos morpheticos hospitalisados;
§3º - Proporcionar aos morpheticos casados que, por motivos sempre
respeitáveis, não queiram ou não possam separar-se, habitação modesta e confortável, sem
prejuízo das exigências da hygiene publica social;
§4º - Asylar e educar os filhos dos morpheticos de modo a preservá-los,
quanto o possível, do contagio paterno;
§5º - Prestar, quando preciso e possível, assistência judicial aos morpheticos
hospitalizados que não possam administrar directamente os seus bens;
§6º - Congregar e methodizar os esforços da caridade christan em beneficio
dos morpheticos, afim de torná-los mais efficazes e productivos;
§7º - Impedir, por todos os meios ao seu alcance, a propagação da morphéia,
tornando conhecidos e exeqüíveis os meios prophylaticos aconselhados pela hygiene;
§8º - Proporcionar aos infelizes morpheticos todos os soccôrros e
consolações da religião christan;
§9º - Auxiliar, quanto possível, e por medida que for desejada, a
administração da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, na assistência material e
espiritual dos morpheticos por ella hospitalisados.
Art.2º - São membros da Associação todas as pessoas que para ella contribuírem
com um donativo annual e espontânea, realizável nome de julho de cada anno;
§ Único – São membros beneméritos, a juízo da diretoria, os que lhe fizerem
qualquer donativo importante em dinheiro ou em espécie.
Art.3º - A Associação é dirigida por uma presidente, uma vice-presidente,
primeira e segunda secretaria, uma thesoureira e doze conselheiras, nomeadas, de três em
três annos, pelo arcebispo metropolitano.
§1º - A Associação é representada em juízo e fora delle, em geral nas suas
relações com terceiros, pela sua presidente;
§2º - A Diretoria reúne-se, ordinariamente, na primeira dominga do mez de
Março, Junho, Setembro e Dezembro, sob os auspícios do arcebispo.
Art.4º - O regimento interno será organizado pela Diretoria, à proporção que
o exigirem as circunstancia e a divisão do trabalho.
Art.5º - Os membros da Associação não respondem, nem mesmo
subsidiariamente, pelas obrigações contrahidas em seu nome.
Art.6º - Na sessão de Dezembro de cada anno, a presidente apresentará um
relatório geral dos trabalhos annuaes, com o respectivo balancete e prestação de contas
approvadas pela auctoridade ecclesiastica.
Art.7º - Os presentes estatutos só podem ser modificados, no todo ou em
parte, pela maioria de votos da diretora e com approvação da auctoridade ecclesiastica.
Art.8º - Em caso de extinção ou dissolução, todos os bens as Associações
serão transferidos para a Santa Casa de Misericórdia de S. Paulo que delles só poderá
dispor em beneficio de obras similares, com approvação e beneplácito da auctoridade
ecclesiastica.
Anexo 02 - 1ª ESCRIPTURA DE DOAÇÃO
1ª TABELIÃO DE NOTAS DA COMARCA DE MOGÍ DAS CRUZES
OUTORGANTE DOADORA: FREI ANTONIO DA VIRGEM MARIA MUNIS
BARRETO PRIOR DO CONVENTO DO CARMO
OUTORGADA DONATARIA: ASSOCIAÇÃO PROTETORA DOS MORFÉTICOS,
COM SEDE NA CAPITAL DE SÃO PAULO.
DATA: 13 DE JUNHO DE 1918
LOCALIZAÇÃO: SITUADO NO CAMPO DE SANTO ANGELO
VALOR: Rs 10:000$000
DESTINO DO IMOVEL: CONSTRUÇÃO DO LEPROSÁRIO
Tabelião Leoncio Arouche de Toledo. Cartorio: R. José Bonifacio, 37 telephone nº29 Mogy
das Cruzes. Certidão pedida da sercretaria do Interior. Livro 151. Autos de 628º a 638º
Data 11/02/926.
Leonice Arouche de Toledo, serventuario vitalicio do officio do 1º tabellião de notas, com
o annexo do civil e do commercio, dos orphãos ausentes, da provedoria e do crime da
Comarca de Mogy das Cruzes, Estado de São Paulo – Brasil.
Certifico a pedido verbal de pessoa interessada que revendo em meu cartório, os livros de
notas nelle existentes, em o de numero cento e cincoenta e um a folhas sessenta e dois verso
a sessenta e três verso consta a escriptura seguinte: Escriptura de doação. Saibam quantos a
presente escriptura de doação virem que sendo no anno do Nascimento de Nosso Senhor
Jesus Christo de mil novecentos e dezoito, aos trese dias do mês de Junho do dito anno,
nesta cidade, Districto e Comarca de Mogy das Cruzes, em meu cartorio perante mim
Tabellião compareceu como ortogante doador Frei Antonio da Virgem Maria Muniz
Barreto, Prior do Convento do Carmo desta Cidade, de accordo com o Provincial da ordem
Carmelitana Fluminense, domiciliado nesta Cidade e como outorgada donataria da
Associação Protectora dos Morpheticos, com sede na Capital deste Estado de São Paulo,
neste acto representada por sua Presidente Dona Mathilde Fonseca de Macedo Soares,
representada neste acto por seu bastante procurador Doutor José Carlos de Macedo Soares,
conforme procuração que exhibe, a qual fica archivada neste Cartorio e registrada no livro
competente sob o numero nove a folhas sete, domiciliado este na Capital deste Estado de
São Paulo, todos reconhecidos pelos proprios de mim Tabellião e das duas testemunhas no
fim nomeadas e assignadas do que dou fé, perante as ques pelo outorgante doador me foi
dito que sendo legitima senhora possuidora da ordem Carmelitana de um terreno site no
Campo de Santo Angelo, Freguesia desta Cidade e Comarca de Mogy das Cruzes, terreno
este que estimam no valor de Dez contos de reis, e se acha livre e desembaraçado de
quaesquer onus e hypothecas, inclusive hypothecas legaes, pela presente escriptura de sua
livre e expontanea vontade e, de acordo sem Provincial da ordem Carmelitana Fluminense,
doa como de facto doado tem o terreno abaixo descripto, a outorgada Associação Proctetora
dos Morpheticos, para o fim de nelle ser construido o Leprosario Modelo, que a Santa Casa
de Misericordia de São Paulo vae construir, com a condição de ser sempre conservada pela
outorgada a cerca de arame que em varios trechos, todas, abaixo descripto, fica servindo de
divisa. O terreno doado tem as seguintes confrontações: começando na estrada de
rodagem, vae de Mogy das Cruzess ao Campo Grande no ponto mais alto do espigão onde
divisa com terras de Dona Iria Cardoso, filha de Antonio Olegario de Santos Cardoso,
seguem pela linha de espigão até encontrar um capão grande de Matto derrubado, segue
beirando campo até encontrar o brejo, continuando pelo meio deste até um capãozinho onde
encontra um valle, continua valle abaixo até encontrar a varzea, seguindo pela varzea,
confrontando-a até aqui com o Doutor Francisco de Paula Medina Ramos; continua pela
varzea continuando de Campo de Santo Angelo, cercando, toda a parte enxuta, até bater
numa cerca de arame que termina na varzea, confrontando desde a terminação da divisa
citada de Medina até esta cerca e do lado, da varzea com terras devolutas, subindo pela dita
cerca numa extensão em linhas recta de mil e cem metros no fim da qual tomando a direita
existe outra cerca de arame medindo cento e noventa e seis metros de extensão que termina
num corrego, sóbe este corrego até as suas cabeceiras onde começa uma cerca de arame que
em linha recta vae bater na estrada da rodagem referida, seguindo por esta na extensão de
duzentos e trinta e seis metros até o ponto que principiou a descripção da presente
confrontação, sendo que em toda esta ultima linha da varzea a estrada é confrontante á
doadora; que dentro destas divisas existe dois capões grande de Matto, que fazem parte da
presente doação. Pelo que desde já cedem e transfere a donataria a posse direito e dominio
que tinham no alludido immovel obrigando-se a fazer certar doação e não revoga-la por
motivo algum. Pela outorgada por seu procurador foi dito perante as testemunhas que
acceitava esta escriptura tão inteiramente como nele se contem e me apresentou os
conhecimentos do pagamento do imposto terretorial e da sisa dos theores seguintes:
Imposto territorial nº000081 Lançamento a Fes. Exercicio de 1918. Imposto de 0,2%
20$000 addicional 2$000. Soma total 22$000.1º 2º Semestr. Certifico que o Sr. Associação
Protectora dos Morpheticos, deve a quantia de Rs. 22$000 e o imposto territorial de sua
propriedade immovel rural denominada Campo de Santo Angelo situada, Campo Grande do
valor/venal de Rs. 10,000$000 referente ao exercicio de 1918. Collectoria de Rendas do
Estado digo Rendas de Mogy das Cruzes, em 13 de Junho de 1918. O Escrivão Narciso de
Mello Franco. Recebi, 13 de Junho de 1918. O Escrivão Narciso de Mello Franco. Recebi,
13 de Junho de 1918. O collector Gardino Pinheiro Franco. Imposto de transmissão
intervivos. Exercicio de 1918. nº 041 Rs. 671$000 A fls. De Livro Caixa fica debitado o
Collector pela quantia de seiscentos a setenta e um mil reis, recebida da Associação
Protectora dos Morpheticos, com sede na Capital deste Estado de São Paulo, representada
por sua presidente Dona Matilde Fonseca de Macedo Soares. 6% 1/10 % de 10 % sobre reis
10,000$000 por quanto lhe foi doado pela ordem Carmelitana, representada pelo seu prior
do Convento de Carmo desta Cidade, Frei Antonio da Virgem Maria Muniz Barreto, um
terreno com dois capões de Matto, site no Campo de Santo Angelo desta Comarca Guia do
1º Tabellião Arouche. Collectoria de Rendas do Estado de São Paulo em Mogy das Cruzes,
13 de Junho de 1918. O Collector Galdino Pinheiro Franco. O Escrivão Narciso de Mello
Franco. A pedido das partes lavrei esta escriptura a mim hoje distribuida a qual feita lhes
sendo lida por mim Tabellião perante as testemunhas, aceitarem, ourtogaram e assignam do
que dou fé, com as mesmas testemunhas que são / Cel. Francisco de Souza Farnco,
Honorato José Rodrigues Gomes, Dr. Diogo de Carvalho, Francisco Affonso de Mello,
Candido Amabis; excepto o Dr. José Carvalho que reside em São Paulo os demais são
domiciliados nesta cidade e meus conhecidos que dou fé. Pelas partes me foi dito digo
apresentado mappa, relatório do terreno doado, mappa este que faz parte integrante desta
escriptura o qual fica archivada neste Cartório para os fins de direito. Esta escriptura está
isenta de pagamento do sello proporcional de accordo com a circular n. 10 de 16 de
Fevereiro de 1914 do Ministério da Fazenda da União. Eu Leôncio Arouche de Toledo, 1º
Tabellião a escrevi, Mogy das Cruzes, 13 de Junho de 1918. Frei Antonio da Virgem Maria
B. digo Maria Muniz Barreto, Jose Carlos de Macedo Soares, Francisco Affonso de Mello,
Candido Arnabis. Era o que continha em dita escriptura para a que vem fielmente
transcripta por certidão e da qual em meu cartório em dito livre, me reporto e dou fé. Mogy
das Cruzes, 11 de Fevereiro de 1926. Eu Leôncio Arouche de Toledo. 1º Tabellião Sub.
Conf e na (a) Leoncio Arouche de Toledo.
Em tempo. Resalva entremunhar entre a terceira e a segunda linha a fls. 6 que diz “José
Carlos de Macedo Soares”. Data Supra. (a.) Leôncio Arouche de Toledo.
Anexo 03 - Introdução escrita pelo Dr. Arthur Neiva -Diretor do Serviço Sanitário do
Estado de São Paulo em 1918.
“Aqui Renasce a Esperança”: eis o lemma que se deverá collocar á entrada do
Leprosário que em breve estará erguida nos campos de Santo Ângelo, próxima á cidade de
S.P., em situação de magnífico pitoresco.
Um mundo melhor seguramente vae raiar para os infelizes lázaros, aqui, nas terras
paulistas, creado pelo concurso de particulares e instituições, todos preocupados em chegar
por vários caminhos a um fim único, qual o de erigir um dos maiores monumentos de
caridade construídos em nossa Pátria. Para longe os dias de horror que se antolhavam ao
enfermo ao sentir o vácuo em torno de si, logo que victimado pela doença. Não mais o
sofrimento infindável, sem a menor esperança de tranqüilidade e de repouso.
Estas linhas, á guiza de prefacio, a mim pedidas pela associação Protectora dos
Morféticos, cujo concurso tem sido dos mais valiosos nesta campanha bemfaseja e
caridosa, podem e devem ser escriptas com palavras altisonantes, sem que haja mais o
perigo, tão brasileiro, de serem lançadas ao ar como uma expressão de rhetorica sonora e
oca. Em Santo Ângelo vae se abrir um remanso de paz e de suavidade para muitas
centemas de infelizes que saberão bemdizer os nomes dos que tem contribuído de qualquer
modo para uma obra que tanto dignifica a quem della se occupa.
As plantas que adiante se desdobram, falam por si, quase sem necessidade de
explicação, proclamando o bem, o allivio e felicidade para tantos desesperados. Por ellas se
advinha que dentro da noite, onde se encontra immersa toda a vida de um lázaro, abre-se
um recanto luminoso onde resplandece a chamma vivida e brilhante de uma grande
promessa. Agora é licito tudo esperar. Nas nossas plagas, onde o lazaro vive escorraçado e
como que fustigado por anathema celeste, perambulando pelo interior das nossas terras, a
mendigar em cavalgadas macabras, de município em município, quaes nômades
phantasticos a levar o horror por onde passam, surgiu um abrigo cheio de bonança e de fé
em melhores dias, onde, o menos, o sentimento de sociedade, o convívio, o socego, a paz
de espírito, finalmente, um próprio paraizo intimo, poderá ser creado, dando-lhe a illusão
suprema e venturosa de que o mundo não mais o repelle e que o direito á vida foi
novamente encontrado.
Como foi profundamente consolador verificar a existência, na nossa gente, de um
sentimento de philantropia tão desenvolvido. Sabíamos o muito que a caridade privada
fizera em todo o Brazil com as Santas Casas. O regime do governo mudou, as instituições
desapareceram; o espírito de caridade, no emtanto, continuou patente como em outras
épocas, talvez mais profundo porque agora o Governo não dispõe mais das condecorações
que tantos prodígios realizaram em mãos de Clemente Pereira, quando foi da construcção
de um dos nossos grandes hospitaes.
O appello realizado pelo Governo do Estado, em época tão difícil, ás
municipalidades, solicitando o seu concurso para se levar á cabo construcção da leprosaria,
foi attendido unamimente e com uma promptidão que muito honra a perfeição de
sentimentos do nosso povo. O estado solicitou o credito de mil contos, destinados á Santa
Casa para que esta construísse a Leprosaria. O terreno para a sua edificção foi obtido e
doado pela Associação Protectora dos Morféticos. As plantas foram delineadas e estudadas,
e ao Serviço Sanitário delegada, por ambas as instituições, a funcção de construir o
estabelecimento.
Pairando acima das competições, em uma atmosphera serena e piedosa,
permaneceram todos aquelles que concorreram para a resolução de um problema tão
importante para nós. E se assim falo, é porque tenho plena convicção de que a obra gora
está realizada. Dentro de alguns dias ella será iniciada e depois nada mais a poderá deter no
seu progresso.
“Aqui Renasce a Esperança”. Esta certeza há de tocar o coração de todos os
attingidos pelo mal, ricos e pobres, humildes e poderosos. No plano da leprosaria Modelo o
Governo vae dar especial attencção ao estudo da therapeutica da lepra. Um programa de
pequizas será traçado. As investigações serão favorecidas e, permanentemente, technicos,
que habitarão a colônia, se encarregarão de orientar a administração para que seja applicada
a medicação que melhor resultado realize aqui ou alhures.
Actualmente o mal ainda é incurável, porém já certos elementos therapeuticos
conseguem realizar evidentes melhorias em grande numero de casos. Ao menos. O ferido
do mal saberá que, doravante, não viverá mais desamparado; onde surgir a possibilidade de
uma nova substancia curativa, elle terá a certeza de que esse novo meio de cura será
tentado. Isto facilitará immenso o isolamento obrigatório que o Serviço Sanitário, em
virtude do art. 654, do código sanitário, estatue nas seguintes palavras: “Notificado um caso
de lepra, a auctoridade sanitária procederá como nos casos de tuberculose aberta, e de
accôrdo com as instrucções especiaes, enquanto o Governo do Estado não dispuzer de
colônias para leprosos, montadas de accordo com os modernos preceitos de hygiene e
offerecendo conforto e attractivos para o isolamento obrigatório”.
Quantos são os atacados de lepra no Estado de São Paulo? Ao certo, ninguém sabe
informar. Há duas tendências que se entrechocam: dos que crêem em um pequeno numero
de doentes e a dos que affirmam que a sua existência é em grande proporção. Os extremos
são tão discordes que a procura do termo médio não se pode fazer com segurança. Não
importa porem o numero. A obra vae começar. As construcções só pararão quando tiverem
obrigado todos os sofredores. O dinheiro não faltará. A própria mulher paulista já se
ingressou vivamente pelo commettimento. A dádiva generosa que entre nós acorre
abundantemente para vir ao encontro quando for pedida para trazer um pouco de allivio aos
torturados que vivem debaixo do mesmo céu.
Em Santo Ângelo os lázaros formarão a sua sociedade parte. Haverá para as
creanças, mulheres, homens e velhos o convívio, a troca de idéias, as diversões, o trabalho.
O mundo para elles, depois que foram attingidos pelo mal, só terá que melhorar. O repudio
que tanto os torturava e horrorisava, vae cessar. Os seus corações se abrirão para todas as
esperanças poderão sentir, no amparo para onde foram, toda a gloria de viver, da qual tão
afastados se achavam. Oh! Como nos eleva o bem que se sente pelo conforto moral que se
vem trazer aos infelizes e quanto nos engrandece a felicidade de termos sido, em algum
momento da nossa curta existência, útil aos nossos semelhantes!
Não se sabe ao certo como se transmitte a lepra. O estado de SP. Abandonou todas
as discussões bysantinas e procurou agir. Todas as maneiras do contagio ou de transmissão,
acoimadas por uns e outros como sendo as responsáveis pela disseminação da moléstia,
foram tomadas em toda a consideração. E mesmo se alguém surgir á vida ali, na planície de
Santo Ângelo, ver-se-á amparado logo ao primeiro vagido e definitivamente arrancado á
possibilidade de ser attingido pelo mal. Que exemplo vae ser para as outras regiões
brazileiras assoladas e mesmo para paizes sul-americanos, a iniciativa tomada por S.P. que,
ao resolver o seu problema, apressará seguramente a sua solução em outros logares.
A certeza que terão os que ali viverem de que o Estado, a todo o transe, procura
encontrar o elemento prodigioso que lhes venha trazer a cura, a sensação de terem voltado á
communhão humana donde se sentiam arrancados por todos e por tudo, darão ao preceito
forças para viver na esperança da redempção final. Do verdadeiro mundo só lhes restará a
melancholica saudade e a esperança da a elle regressar. Mas para essa tristeza, a grande
maioria de crente que alli se vai abrigar, encontrará lenitivo no balsamo que a religião lhes
vae proporcionar com a construcção de um templo, que poderão encher com a uncção das
suas preces. Campanário de onde também ecoará, pelo mundo afora, a sonora vibração dos
que ali vivem mitigados no seu soffrer, alliviados da sua dor, a bem aventurar os nomes dos
que lhes proporcionaram o abrigo – Onde Renasce a Esperança.
São Paulo 07.10.1918
Anexo n° 04 -Acta da 5º Sessão ordinária da Associação Protectora dos Morpheticos
de 15 de abril de 1919
O Revmo. Sr. Arcebispo Metropolitano expõe a situação em que ficou a Associação
Protectora dos Morpheticos, diante da atitude do Governo do Estado de São Paulo,
chamando a si a construccão da leprosaria Modelo.
Sua Excia. O Revmo. Sr. Arcebispo lembra como a pedido do benemérito mordomo
do Hospital de Guapira, Sr. Dr. José Carlos de Macedo Soares, nasceu e se organisou
definitivamente a Associação Protectora dos Morpheticos, acolhida com testemunhos de
franca e religiosa sympatia por toda a sociedade paulista. Consignando nos seus estatutos o
propósito de collaborar efficazmente com a Santa Casa na hospitalisação de seus
morpheticos, trabalhando parallelamente com esta instituição sem preensão alguma, sem
jamais fazer questão dos seus projectos e iniciativas que, entretanto, foram adotados e
aprovados, sem embaraçar ou fazer sombra a quem quer que seja na pratica da caridade,
antes deixando lealmente à Santa Casa todo o beneficio e proveito dos seus esforços, a
Protectora cumpriu a sua missão e como a cumpriu sabem-no todas as Sras. Conselheiras,
e podem sabel-o quantos quizerem consultar as nossas actas e rever o nosso archivo.
Tendo, porém, a Santa Casa resolvido confiar ao Governo do Estado a Execução do
grandioso plano que lhe offereceu a Protectora e que nas suas linhas geraes e
insubstituíveis é obra exclusivamente sua, é evidente que se acha terminada, com motivos
de jubilo para nós, a missão que em boa hora nos propuzemos. De facto: o benemérito e
patriótico Governo do Estado merecem certamente todas as nossas sympathias, pois com o
prestigio e amplos recursos de que dispõe vai executar um plano que era nosso, para o qual
contribuímos largamente com generosidade e dedicação pessoal, mas absolutamente não
precisa do nosso apoio material. Sabem as Snras. Conselheiras como e porque deixou a
Associação de receber a verba de cem contos de réis, votada pelo Congresso Federal em
favor dos nossos infelizes protegidos. Acrescente-se, para perfeito conhecimento da
situação, que circumstancias também sábidas, cuja responsabilidade absolutamente não nos
cabe, e que facilmente poderiam ser removidas, privam os nossos pobres enfermos de uma
contribuição superior a cem contos de réis já subscrita por diversos bemfeitores, e ainda de
outra muito mais avultada que, por motivos óbvios, não consta officialmente das nossas
actas.
Fazendo os mais sinceros e calorosos votos para que o Governo do Estado,
removendo a mancha que tanto enfeia e envergonha a civilisação paulista, leve a termo o
projecto da nova Leprosaria, propõe sua Excia. Revma. que a Associacão se de por
dissolvida, mandando entregar à administração da Santa Casa todo o saldo existente em
caixa, para que seja empregado, exclusivamente, em melhoramentos indispensáveis ou
urgentes no Hospital do Guapira.
Justificando esta Segunda parte da sua proposta, pondera Excia. Que a leprosaria de
Santo Ângelo, pela vastidão do projecto, de sua natureza complexa e custosa, não poderá
ser construída com a necessária rapidez. No entanto os pobres morpheticos serão forçados a
esperar dois ou três annos, ou mais ainda, por um abrigo rasoavelmente humano e
caritativo, continuando a soffrer durante esse período, para elles interminável, todo o
desconforto que sabemos e temos presenciado.
Com alguns melhoramentos no Guapira, a Protectora não somente habilita o
Governo do Estado a executar, sem precipitações sempre inconvenientes ou prejudiciaes, o
plano já estudado, como também auxilia a Santa Casa a minorar, desde logo, os sofrimentos
de seus hospitalisados.
As Snras. Conselheiras, cuja caridade não se tem limitado ao socorro material, mas
se extende até ao carinho de suas piedosas visitas, bem comprehendem que, poupar a esses
enfermos, por alguns mezes que seja, os soffrimentos de um martyrio inominável, é um
acto de grande e verdadeira caridade, e isso devem ter presente na votação da proposta que
ora lhes é feita.
Abundando nas mesmas considerações, lembra a Exma, Snras. Presidente que a
Associação tem diversos filhos de morpheticos asylados em estabelecimento de caridade,
após o indispensável exame medico. Soccorre ainda algumas famílias de enfermos
hospitalizados no Guapira, as quaes vivem na mais extrema penúria e em completo
abandono.
Propõe, à vista do exposto, que se reserve uma parte do saldo existente para auxilio
dos filhos e famílias de morpheticos, entregando-se o excedente à Santa Casa.
Ouvidas as Snras. Conselheiras foram tomadas, por unanimidade de votos, as
seguintes deliberações:
I – Dando por terminada a sua caridosa missão, após uma serie de longos e
criteriosos esforços de que resultou o projecto definitivo de uma Leprosaria Modelo, a ser
construída nos campos de Santo Ângelo, doados em parte à Associação ou por ella
adquiridos e transferidos à Santa Casa, a Associação protectora dos Morpheticos, com sede
e exercício nesta capital declara-se legalmente dissolvida para todos os fins de direito.
II – A Exma. Snra. Presidente fica autorizada a retirar até a importância de dezessete
contos de réis (17:000$000), que será entregue aos estabelecimentos de caridade, onde se
acham asylados os filhos de morfeticos, deduzidos o necessário para o soccorro immediato
das famílias abandonadas, as quaes serão recommendadas à Caixa Pia ou qualquer
associação de caridade.
III – O Saldo restante em caixa será entregue de acordo com os Estatutos da
Associação Protectora dos Morpheticos, a Santa Casa de Misericórdia de São Paulo para
ser applicado exclusivamente em melhoramentos no Hospital do Guapira, de accordo com
o mordomo daquella Leprosaria e approvacão do Exmo.sr. Arcebispo, afim de que os seus
enfermos possam esperar, com algum conforto e menor soffrimento, a construccão
definitiva da Leprosaria de Santo Ângelo.
IV – As importâncias subscriptas pelas Snras. Conselheiras e mais bemfeitoras da
Associação para construccão de casas para casados, conforme a planta em execução, e
ainda outras a quantia superior a cem contos de réis, não serão exigidas de nossos
contribuintes, uma vez que cessaram de todo os fins da Associação.
V – Todos os livros, documentos e mais papeis pertencentes á “Associação
Protetora dos Morpheticos” serão entregues á Cúria Metropolitana e ficarão archivados
naquella repartição ecclesiastica.
VI – Esta acta, para que tenha vigor e força jurídica, será assignada por todas as
Snras. Conselheiras presentes á sessão e apresentada ás demais ausentes que q queiram
subscrever.
Anexo 05 - 2ª ESCRIPTURA DE DOAÇÃO
11º Tabellionato. São Paulo. Rua de São Bento, 36-A Phone Cent. 9 e 218.
A, Gabriel da Veiga, Juiz de Direito em disponibilidade, serventuário vitalício do
undécimo Officio de Tabellião de Notas desta cidade, município e comarca de São Paulo,
capital do Estado do mesmo nome, Republica dos Estados Unidos do Brasil etc.
CERTIFICO a pedido verbal de parte interessada, que, revendo os livros de notas
do cartório a meu cargo, no numero de trinta e sete (37), a folhas noventa e dois (92),
consta a escriptura do têor seguinte: Escriptura de doação Rs. 35,000$000. Saibam quantos
este publico instrumento de escriptura virem, que no anno do Nascimento de Nosso Senhor
Jesus Christo de mil novecentos e dezoito, (1918), aos seis dias do mez de Setembro, nesta
cidade de São Paulo, o meu cartório, perante a mim Tabellião e as duas testemunhas diante
nomeadas e no fim assignadas compareceram partes entre si justas e contractadas, sendo: de
um lado, e como outorgante doadora a Associação Protectora dos Morpheticos,
com sede
nesta capital, neste acto representada por sua Presidente Dona Mathilde Fonseca de Macedo
Soares, e, de outro lado, como outorgada donatário a Santa Casa de Misericórdia de São
Paulo com sede nesta capital, neste acto representada por seu provedor Senador Antonio de
Lacerda Frabeo, os presentes meus conhecidos e reconhecidos pelas próprias de que trato
de mim e de duas testemunhas, do que dou fé. E, perante estas, pela outorgante doadora
Associação Protectora dos Morpheticos – por sua referida representante, me foi dito que a
justas títulos e livres e desembaraçados, mesmo legaes, é senhora e legitima possuidora dos
bens abaixo descriptos, situados no logar denominado Campo de Santo Ângelo, freguesia,
município e comarca de Mogy das Cruzes, deste Estado, a saber: cento e noventa e quatro
alqueires e seiscentos e noventa e dois milésimos de alqueire de terra, que foram doados
pelo Convento do Carmo, por seu Prior, para a construção do Leprosário Modeli, de
accordo com a mesma doação, constante da escriptura lavrada nas notas do primeiro
Tabellião de Mogy das Cruzes, em treze de junho de mil novecentos e dezoito, no livro
cento e cincoenta e um á folhas sessenta e dois, construção aquella que, como se vê da
citada escriptura, deveria ser feita pela outorgada, mais hoje devera ser feita pelo Governo
do Estado; mais noventa e cinco alqueires e sessenta e oito milésimos de alqueire de terras
havidas por compra feita a Doutor Francisco de Paula Medina Ramos, conforme escriptura
lavrada das notas do sétimo Tabellião desta capital, em vinte e três de julho de mil
novecentos e dezoito, no livro sessenta e cinco, á folhas trinta e seis verso; e mais cincoenta
e oito alqueires e setecentos e vinte milésimos de alqueire de terras havidas por compra
feita ao Coronel João Baptista dos Santos Cardoso e sua mulher conforme escriptura
lavrada nas notas do primeiro Tabellião de Mogy das Cruzes, em vinte e sete de julho do
corrente anno, livro numero cento e cincoenta e um, as folhas noventa e três verso; que
essas terras supra referidas perfazem o total de trezentos e quarenta e oito alqueires e
quatrocentos e noventa milésimos de alqueire comprehendidos dentro dos seguintes
perímetro e divisas: sob o rio Jundiahy na estrada que vae de Mogy das Cruzes ao Rio
Grande, seguindo por essa estrada afora até enfrentar a cabeceira de um córrego, que fia al
lado direito, entre os marca kilometricos oito e nove, divisando até ahi, pela estrada com os
irmãos Cardoso; desce em rumo á cabeceira do referido córrego, por uma cerca de arame
depois pelo córrego abaixo até encontrar uma outra cerca de arame, um pouco acima de um
capão de matto, que fica do lado de fóra, sobe por esta cerca de arame que fica á direita, até
o canto da mesma na distancia de cento e noventa e seis metros, d’onde tomando á
esquerda pela cerca abaixo até a várzea, na extensão de mil e cem metros, divisando até
aqui com terras da Ordem Do Carmo, depois tomando á direita pela linha que separa a
várzea firme do brejo até um pequeno córrego, e da ponta do referido valle em rumo a uma
lagoa próximo ao rio Jundiahy, até o meio de um banhado divisando até aqui com terras
devolutas, depois por este banhado acima até o rio Jundiahy, divisando com terras
pertencentes aos herdeiros do Tenente Lima e, finalmente pelo Jundiahy acima até a ponte
onde tiver o inicio essas divisas, confrontando do lado do rio com Antonio Olegário Dos
Santos Cardoso estimando ella outorgante as referidas terras em trinta e cinco contos de réis
(35:000$000) que, possuindo outras recusas sufficientes para sua manutenção, ella
outorgante – Associação Protectora dos Morpheticos tem justo e contractado com a
outorgada – Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, doar-lhe como facto por esta
escriptura, de sua livre vontade, doado-lhe tem, as terras supra retro descriptas, com a
condição e para o fim exclusivo, de ser nellas construído pela outorgada donataria, hoje
pelo Governo do Estado o “Leprosario Modelo”, e ainda com a condição da outorgada
conservar sempre as cercas de arame que servem de divisa aos terrenos ora doados com
terrenos das respectivas confrontantes, e actualmente existentes; que com as condições
acima cede e transfere a outorgada toda á posse, juz, domínio, direito, acção e servidão que
tinha em ditos bens para que delles use e goze com o seus que são por força desta
escriptura, alegando a outorgante a fazer esta doação sempre bôa e valiosa na forma da lei,
e alerigando-se a outorgada a construir o referido “Leprosário Modelo” para cujo fim
exclusivo é feita a presente doação digo outorgada a ter sempre conservada as referidas
cercas de arame, tudo conforme ficou estipulado acima. Então, pela outorgada donataria –
Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, - por seu referido representante, ante as
testemunhas me foi dito, que agradecia, acceitava esta escriptura em todos os seus termos
obrigando-se a cumprir as condições nella estipuladas pela outorgante doadora; e que se
achava isenta do pagamento das pastas estaduaes como se vê do seguinte officio: “(armas
da Republica) Directoria Geral nº 1.077. Secretaria da Fazenda e do Thesouro do Estado de
São Paulo, em 6 de setembro de 1918. Recebedoria da Capital. O Director Geral da
Secretaria da Fazenda e do Thesouro do Estado comunica ao Sr. Administrador da
Recebedoria da Capital que, por despacho desta data, do Sr. Dr. Secretario da Fazenda, foi
deferida a petição em que a Santa Casa de Misericórdia da Capital solicitava a isenção de
imposto sobre a doação de trezentos e quarenta e oito alqueires e quatrocentos e noventa
milésimos de alqueire de terras situadas no logar denominado “Campo de Santo Ângelo, no
valor de 35:000$000. O Diretor Geral, Theophilo M. Nóbrega.”. E por estarem assim
contractadas e de como o disseram dou fé, pediram-me e lhes lavrei esta escriptura, a mim,
hoje distribuída, a qual, feita, lhes sendo por mim lida perante as testemunhas acharam
conforme acceitaram, outorgaram, do que dou fé e assigna com essas testemunhas que são:
João de Camargo Rodrigues e Heitor Martins Pimenta, meus conhecidos e domicilliados
nesta Capital; dou fé. Eu Antonio Salviano, escrevente habilitado, o escreverei. Eu A.
Gabriel da Veiga, tabellião a subscrevo. (aa) Mathilde de Fonseca Macedo Soares. A. de
Lacerda Franco – João de Camargo Rodrigues – Heitor M. Pimenta (Estão colladas e
devidamente inutilisadas quatro estampilhas federaes no valor total de dois mil e
quatrocentos reis) É o q contem em dita escriptura, da qual fiz extrahir a presente certidão
que está em tudo conforme ao próprio original, ao qual me reporto em meu poder e
cartorio, do que dou fé. São Paulo, 11 de Agosto de 1925. Eu José Rodrigues Machado.
Tabellião interino, subscrevo e assigno José R. Machado.
Anexo nº 06 - ACTA DE INAUGURAÇÃO DO ASYLO-COLONIA DE SANTO
ANGELO
Aos trez dias do mez de Maio de mil novecentos e vinte e oito, presentes os senhores
doutores Julio Prestes de Albuquerque, Presidente do Estado, Fabio de Sá Barreto, Antonio
Carlos de Salles Junior, Fernando de Souza Costa, Mario Rollin Telles e José de Oliveira
Barros, respectivamente, Secretários d’Estado dos Negócios do Interior, da Justiça e
Segurança Publica, da Agricultura, Industria e Commercio, da Fazenda e Thesouro do
Estado, da Viação e Obras Publicas, Waldomiro de Oliveira, Director Geral do Serviço
Sanitário, João de Aguiar Pupo, Inspector chefe da Inspectoria de Prophylaxia da Lepra,
Mario Bastos Cruz, Chefe de Policia, sua Excellencia Reverendíssima D. Duarte Leopoldo
e Silva, Arcebispo Metropolitano, a Mesa Administrativa da Santa Casa de Misericórdia de
São Paulo compostas dos senhores doutores Antonio de Pádua Salles, Augusto Meirelles
Reis e Commendador Alberto da Silva e Souza, e o seu director clinico, doutor Synesio
Rangel Pestana, mordomos das secções dependentes e outras pessoas, procedeu-se a
inauguração e entrega do Asylo-Colonia de Santo Ângelo áquella instituição de caridade.
As obras do Leprosário de Santo Angelo, projectadas no anno de mil novecentos e
dezessete, sob os auspícios da Associação Protectora dos Morpheticos, foram iniciadas em
mil novecentos e dezenove, pelo Governo do doutor Altino Arantes, em cooperação com a
Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, que, por decisão daquella associação de senhoras
catholicas, desde Setembro de mil novecentos e dezoito, se tornou donataria dos terrenos
situados nos campos de Santo Ângelo, município de Mogy das Cruzes.
Continuadas as obras na administração do doutor Washington Luiz, não puderam,
entretanto, ser concluídas por motivo de falta de recursos econômicos.
Na administração do doutor Carlos de Campos, foi celebrado um accordo entre o
Governo e a Santa Casa de Misericórdia, em onze de Março de mil novecentos e vinte e
sete, em virtude do qual o Governo se comprometteu a executar as obras necessárias a
conclusão do Leprosário, entregando-o á Santa Casa com as installações indispensáveis ao
seu funcionamento, obrigando-se a Santa Casa, por seu lado, a mante-lo sob a sua
administração, subordinando-se às disposições da lei numero dois mil e vinte e seis e outras
consubstanciam medidas destinadas á prophylaxia da lepra, bem assim ás instrucções nesse
sentido expedisse a Directoria Geral do Serviço Sanitário.
Reconhecendo o alcance humanitário do emprehendimento, bem como a influencia
primordial de tão nobre projecto na realisação da campanha da lepra em São Paulo, decidiu
o actual Governo concluir as obras iniciadas e realizar outras construcções necessárias,
fasendo as installações precisas para a imediata utilisação do Leprosário de Santo Ângelo.
Dando, assim, integral cumprimento ás clausulas do accordo que assignou com a
Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, em onze de Março de mil
novecentos e vinte e sete, bem como ás disposições das leis estadoaes números mil
quinhentos e oitenta e cinco de vinte de Dezembro de mil novecentos e dezessete e dois mil
cento e sessenta e nove, de vinte sete de Dezembro de mil novecentos e vinte e seis, o
Governo do Estado faz nesta data a entrega do Asylo-Colonia de Santo Ângelo á Santa
Casa De Misericórdia de São Paulo, proprietária do immovel, estabelecendo ao mesmo
tempo um accordo para a administração do Leprosário, com a cooperação do Serviço
Sanitário, de modo a satisfazerem-se plenamente os altos fins humanitários e
prophylacticos a que se destina. E para constar foi lida e achada conforme esta acta, que vae
assignada pelo Senhor Presidente do Estado e Secretários, por parte do Governo, e pela
Mesa Administrativa da Santa Casa, por parte desta, bem como pelas demais pessoas
presentes. Esta acta ficará archivada na Secretaria d’Estado dos Negócios do Interior ,
sendo della extrahidas trez copias, sendo uma para a Santa Casa de Misericórdia de S.
Paulo, outra para a directoria Geral do Serviço Sanitário e a terceira para a Inspectoria de
Prophylaxia da Lepra.
(aa) Julio Prestes de Alburquerque.
Fabio de Sá Barreto.
Mario Rolim Telles.
Fernando de Souza Costa.
José Oliveira Barros.
Mario Bastos Cruz, por si e pelo dr. Salles Junior, Secretario da Justiça.
A. de Pádua Salles, provedor da Santa Casa.
Augusto Meirelles Reis, Escrivão da Santa Casa.
Jayme Loureiro – Thesoureiro.
Sampaio Vianna.
Alberto da Silva e Souza, Mordomo.
Cantidio de Moura Campos.
Synesio Rangel Pestana.
Arthur Pequeroby de Aguiar Whitaker, Presidente da Câmara dos Deputados.
Waldomiro de Oliveira, Director Geral do Serviço Sanitário.
J. de Aguiar Pupo, Inspector-chefe da Inspectoria de Prophylaxia da Lepra.
Pedro Dias da Silva.
A. Lazary Guedes.
Armando Prado.
Tte. Cel. Marcilio Franco.
Alice de Toledo Tibiriçá.
Felicidade Perpetua de Macedo.
Fausto Ferraz.
João Lopes.
Clélia Pacheco e Silva.
Adelardo Soares Caiuby.
Francisco Arruda Tibiriçá.
Dr. Carlos Pereira de Castro.
Roberto Moreira.
F. Borges Vieira.
Tte. Dely Câmara, pelo Coronel Pedro Dias de Campos.
Bento Bueno.
Luiz Honorato de Oliveira.
José Odilon de Amaral.
Flaminio Ferreira.
Caio Machado de Oliveira.
Paulo Rego Freitas Cruz.
Deodato Wertheimer.
Irineu Moretzohn.
Ross Hisserck Glankirchen.
Adolpho M. Normanha.
J. Coimbra de Macedo.
Edmundo Pereira Leitão.
Honório de Silos – do “Correio Paulistano”.
M. Riter, do “Estado de S. Paulo”.
Marcos Ribeiro dos Santos.
Nelson de Meirelles Reis.
Fernando Prestes Neto.
Raul Castello Branco.
Marcilio J. Mendes – da “A Platéa”.
Bento Camargo Filho.
Adolpho da Silva Guimarães.
Lino de Barros.
Mario Roxo Sobrinho.
Bento Camargo.
Bráulio Jorge.
Fernando Ribeiro Santos Camargo”.
NADA MAIS CONTEM.
(a). Candido O. Barbosa.
Anexo nº 07 - REGIMENTO interno Asylo Colônia Santo Ângelo
São Paulo: s.c.p., Setembro 1928.
CAPITULO I
Da Entrada e sahida dos doentes
Art. 1º -- Só terão entrada no Asylo-Colônia de Santo Ângelo os doentes que
apresentarem a guia da inspetoria de Prophylaxia da Lepra.
Art. 2º-- Todo doente deve guardar a sua roupa no armário que a Irmã lhe indicar,
mas sempre em ordem e fechado a chave.
Art. 3º -- São proibidas as armas de fogo e as armas brancas. Nenhuma dellas deve-
se admittir no Asylo-Colonia.
Art. 4º -- Os doentes só poderão sahir com alta do medico interno que para esse fim
consultará a Inspectoria de Prophylaxia da Lepra.
Art. 5º -- Os menores
devem ainda pedir consentimento dos paes ou tutores,
prevalecendo à vontade do pae em caso de divergência.
CAPITULO II
Das visitas
Art. 6º -- Os doentes do Asylo – Colônia, poderão receber visitas todos os domingos
desde as 9 horas até às 14 ½ horas.
§ único – O Sr. Mordomo poderá permittir, em caso particulares, visitas à qualquer
ora do dia, nos demais dias.
Art. 7º -- Durante o tempo das visitas, os doentes são obrigados a seguir o horário da
Casa para as refeições.
Art. 8º -- Os doentes attenderão as visitas em local apropriado, não podendo os
visitantes percorrer o interior do Estabelecimento senão em caso especial, com licença da
Irmã Superiora.
Art. 9º -- Não serão permittidas as visitas de pessoas menores de 15 annos,
exceptuando filhos que visitem os paes doentes.
CAPITULO III
Da disciplina
Art. 10º-- Os doentes são obrigados:
1º) A conservar-se de um modo decente em todas as dependências do Asylo-
Colonia, obedecendo rigorosamente a todas as ordens do Mordomo, Médicos, da Irmã
Superiora e demais irmãs.
2º) A tratar com respeito todas as autoridades do Asylo-Colonia, cumprindo
rigorosamente todas as ordens emanadas do pessoal superior, notadamente do Mordomo,
Médicos, Irmã Superiora e Irmãs.
3º) A não altercar, gritar ou fazer qualquer barulho que possa encomodar os demais
doentes. A não passar repartição das mulheres, sem uma licença especial.
4º) A não fumar senão ao ar livre, salvo para os acamados, com licença especial da
Irmã Superiora.
5º) Permanecer respeitosamente nos quartos quando se administrar o Santo Viatico
ou tiver logar qualquer acto religioso.
6º) A não perturbar o silencio nem ausentar-se do Pavilhão, depois das 9 horas da
noite.
7º) A cumprir rigorosamente as prescripções dos Médicos e das Irmãs,
relativamente à medicação, alimentação, hygiene e conducta moral.
8º) A manter em rigoroso asseio os seus repectivos quartos e salas.
9º) Todo e qualquer tratamento dos doentes só poderá ser feito mediante indicação
especial dos médicos do Estabelecimento, sendo vedado o uso de remédios secretos.
Art. 11º -- São expressamente prohibidas em qualquer dependência do Asylo-
Colonia, os jogos de azar.
Art.12º -- É expressamente prohibida a entrada ou uso de bebidas alcoólicas em
qualquer dependência do Asylo-Colonia.
Art.13º -- Todo o prejuízo causado no Asylo-Colonia por desleixo, incúria, má
índole ou accidente dos doentes ou empregados resultará em pena disciplinares.
Art. 14º -- São penas disciplinares: a reprehensão em particular ou na presença de
outros doentes, a reclusão nos quartos por 3 a 5 dias ou em cela por 24 horas, com o dobro
do tempo na reincidência e a expulsão do Asylo-Colonia. São competentes para apelidar as
penas: o Mordomo, os Médicos, a Irmã Superiora e as Irmãs.
CAPITULO IV
Disposições geraes
Art.16º -- A habitação, a alimentação, o vestuário e o tratamento médico são
absolutamente gratuitos.
Art.17º -- Na medida de suas forças, todos os doentes, homens e mulheres são
obrigados a prestar serviços estabelecidos pela administração, no limite de 6 horas diárias.
Art.18º -- Salvo nova deliberação da Irmã Superiora, será observada no Asylo-
Colonia o seguinte horário:
Às 6 horas -- levantar
Às 6 ½ horas -- será realizada a Santa Missa
Às 7 horas -- café
Das 7 ½ às 8 ½ h -- limpesa geral, que deverá ser feita em
em cada quarto pelos respectivos moradores salvo
determinações em contrario da Irmã Superiora.
Dás 8 ás 11 horas -- trabalhos de lavoura, sob a direção do feitor.
Ás 11 horas -- almoço e descanso
Ás 14 horas -- lanch
Ás 14 ½ ás 17 horas -- trabalho
Ás 17 horas -- jantar
Ás 18 horas -- terço
Ás 19 horas -- chá e oração da noite
Ás 21 horas -- silencio absoluto
Dás 8 ás 11 e 15 ás 17 horas -- neste horário, os doentes poderão tomar
os banhos quentes, sem prejuízo dos
serviços que lhes forem atribuídos.
o Paulo, de Setembro de
1928.
(a.) A. de Pádua Salles.
Provedor
Anexo 08- ACCORDO CELEBRADO ENTRE A SANTA CASA E O GOVERNO DO
ESTADO
O Estado de S. Paulo, neste ato representado pelo senhor Secretário dos Negócios
do Interior, senhor Fabio Barreto e a Santa Casa de Misericórdia de S. Paulo, representada
pelo Irmão Provedor, DR. A. De Pádua Salles, celebram entre si o seguinte acôrdo sobre o
Asilo-Colonia de Santo Ângelo:
Em obediência ao convencionado entre as mesmas partes, em 11 de março de 1927,
clausula IV, o Estado de S. Paulo restitui á Santa Casa de Misericórdia o Leprosário de
Santo Ângelo, sito no município de Mogi das Cruzes, definitivamente construído e
aparelhado para funcionar.
A Santa Casa de Misericórdia, que recebeu os terrenos onde o Leprosário foi
construído, para o fim especial de utilizá-los em obras de proteção aos morféticos, entra a
executar nesta data, em sua plenitude, as obrigações que lhe forem impostas pelos
doadores, isto é, põem o leprosário ao serviço dos morféticos existentes no Estado de São
Paulo.
Para os serviços de utilidade publica que vai iniciar, a Santa Casa de Misericórdia
de São Paulo contará com o auxilio direto e permanente do Estado de S. Paulo nas formas e
nas condições que se seguem:
a)A administração geral do estabelecimento caberá a Santa Casa de Misericórdia,
inclusive na parte médica.
b)A organização dos serviços médicos será estabelecida de comum acôrdo entre a
Santa Casa de Misericórdia e a Inspetoria de Profilaxia da Lepra.
c)Os donativos sem discriminação especiais oferecidos aos doentes de Santo Ângelo
serão aplicados a juízo da administração do Estabelecimento.
d)A organização administrativa constará de um regulamento aprovado pela Mesa
Administrativa da Santa Casa e pela inspetoria de profilaxia da lepra.
e)Para o custeio do Asilo-Colônia, o governo auxiliará mensalmente a Santa Casa
com a importância necessária para a manutenção dos doentes que forem recolhidos e que
excederem a lotação dos que existiam no Asilo do Guapira
18
.
Fica aprovada pelo Estado de São Paulo e pela Santa Casa de Misericórdia de São
Paulo o seguinte regulamento para disciplinar a vida interna do Estabelecimento desde esta
data:
I
DA ORGANISAÇÃO E FINS DO ASILO
Art. 1º O Asilo-Colônia de Santo Ângelo, fundado e organizado pela Santa Casa de
Misericórdia de São Paulo com o auxilio do Governo do Estado, destina-se ao
Abrigo e tratamento de doentes de lepra, domiciliados no Estado.
Art. 2º De acordo com as leis estaduais e federais em vigor, o Serviço Sanitário do Estado
exercerá a fiscalização higiênica do estabelecimento e fiscalisará as entradas e saídas de
doentes, que constarão de guias fornecidas pela Inspetoria de Profilaxia da Lepra.
II
DA ADMINISTRAÇÃO
18
Foi estabelecido pelo Governo, que a Santa Casa entrará mensalmente, de seus cofres, com a verba de
trinta contos para o custeio do estabelecimento.
Art. 3º A administração do Asilo-Colonia de Santo Ângelo caberá privativamente à Santa
Casa de Misericórdia de S. Paulo, proprietária do imóvel, que a exercerá por intermédio:
a) de um Mordomo, eleito pela usa Mesa Admninistrativa;
b) de Irmãs religiosas;
c) de um Capelão;
d) de um Feitor e quantos auxiliares se fizerem necessários.
Art. 4º As irmãs religiosas, que ficarão subordinadas ao Mordomo, competirá à
administração e disciplina interna dos seguintes estabelecimentos do asylo-colonia:
a) Casinha, padaria, dispensa e refeitório;
b) Lavanderia, rouparia e oficinas de costura;
c) Casas e pavilhões destinados ao alojamento dos doentes;
d) Hospitais e pavilhão de anatomia-patologica;
e) Cinema e outras salas de diversões.
Art. 5º Ficará também a cargo das Irmãs a administração dos serviços gerais de dispensa,
cosinha, refeitório, lavanderia e rouparia do pessoal são da colônia, serviços esses que serão
completamente separados dos que destinam aos doentes.
Art. 6ª As irmãs são obrigadas a atender as prescrições dos médicos e outros técnicos do
Asilo-Colonia em tudo quanto se refira à higiene, à assistência médica e regime diético os
doentes.
Art. 7º Ao Capelão compete a assistência religiosa aos enfermos e todos os demais atos do
seu sagrado ministério.
Art. 8º Ao feitor que, como os demais auxiliares, será designado pelo Mordomo, compete
auxiliar a manutenção da disciplina interna do estabelecimento na forma que lho
determinarem as Irmãs religiosas e ficará encarregado especialmente da direção das
seguintes secções:
a) Portaria e escritório;
b) Centro de força, luz, e telefone;
c) Almoxarifado e garage;
d) Serviço de arborização e conservação das matas;
e) Oficinas;
f) Campo de cultura, creação de secções anexas;
g) Necrotério e cemitério.
III
DO PESSOAL TECNICO
Art. 9º A direção técnica do estabelecimento ficará subordinada à orientação do diretor
clinico da Santa Casa de Misericórdia.
Art. 10º O pessoal técnico, nomeado pela Mesa Administrativa da Santa Casa por indicação
do seu diretor clinico, compor-se-à da seguinte maneira:
a) Um médico interno (cirurgião e parteiro) que residirá obrigatoriamente no Asilo;
b) Um chefe de clinica dermatologica;
c) Um adjunto dermatológico
d) Um chefe de clinica médica;
e) Um adjunto de clinica médica;
f) Um oculista;
g) Um bacteriologista;
h) Um farmacêutico que residirá obrigatoriamente no Asilo;
i) Um dentista;
j) Um enfermeiro chefe e tantos enfermeiros auxiliares quantos se fizerem
necessários
19
.
Art. 11º O pessoal técnico que residirá fora do estabelecimento devera comparecer no
Asilo-Colonia nos dias e horas determinados pelo diretor clinico da Santa Casa.
Art. 12º O tratamento especifico dos doentes será obrigatório de modo que os médicos
terão de obedecer aos métodos de rigorosa orientação cientifica e não poderão fazer uso de
remédios secrétos.
Art. 13º Os médicos do estebelecimento ficam obrigados a fornecer os meios e material de
estudo que lhes forem solicitados pela Inspetoria de Profilaxia da Lepra.
Art. 14º O serviço de enfermagem será feito pelos próprios doentes sob a direção do
enfermeiro chefe.
IV
DOS VENCIMENTOS
Art. 15º Os vencimentos do pessoal administrativo serão fixados pela Mesa da Santa Casa
de acordo com o Mordomo e os do pessoal técnico pela mesma Mesa de acordo com o
Mordomo e o diretor clinico.
§ único: - O quadro do pessoal tanto administrativo como técnico, poderá ser alterado para
mais ou para menos conforme as necessidades do serviço.
V
DOS DOENTES
Art. 16.º – Os doentes invalidos terão residencia permanente na secção hospitalar do
Asylo.
Paragrapho único: - Serão obrigados a baixar ao hospital os doentes que forem
acommetidos de crises agudas da molestia de infecções intercorrentes ou parasitaria e todos
os que, a juizo do medico interno do estabelecimento, necessitem do regime especial que é
o do hospital.
19
Por necessidade imperiosa de serviço, a Mesa Administrativa da Santa Casa creou mais um logar de médico
cirurgião.
Art. 17.º – Os doentes que não precisarem de ser internados no hospital serão
distribuidos pelos differentes alojamentos do Asylo-Colonia, a juizo do medico interno.
Para determinar a distribuição este deverá attender não só ás exigencias do caracter
hygiennico quanto á lotação dos alojamentos, como tambem, ás condições de sexo, de
edade, estado civil, de forma clinica e grau de evolução da molestia nos doentes.
Art. 18.º – Os doentes, que sejam casados de acordo com a lei, poderão viver no
regime conjugal.
Paragrapho único: - Será permitido o casamento entre os doentes internados, a juizo
do medico interno e do Mordomo, os quaes, nas suas deliberações a esse respeito deverão
considerar o estado da molestia dos pretendentes a antiguidade destes no estabelecimento, o
procedimento que têm tido e a capacidade dos alojamentos para casados.
Art. 19.º – Os filhos dos casaes leprosos serão separados dos paes logo depois do
nascimento e internados na creche annexa ao estabelecimento ou entregues a família
residente fora do Asylo-Colonia, a juizo dos paes.
Paragrapho único: - As Creanças internadas na creche do estabelecimento, serão
transferidas a partir de dois annos de edade, para o Asylo da Santa Therezinha ou entregues
a família da confiança dos paes .
Art. 20.º – Os doentes poderão cooperar nos serviços internos da colonia, ficando
limitada á cifra de cinco por cento a contribuição de pessoal não contaminado para o
trabalho do Asylo, calculada essa porcentagem sobre o numero de doentes internados.
Paragrapho 1.º – Não será permitido o trabalho de pessoas sans, menores de vinte e
um annos.
Paragrapho 2.º – A lista dos cargos reservados ao pessoal indemne de Lepra bem
como a determinação das suas attribuições deverão ser estabelecidas pela Santa Casa de
accordo com a Inspectoria de Prophylaxia da Lepra.
Art. 21.º – Os doentes validos serão obrigados a regime de trabalho diario e
remunerado, durante seis horas em media.
Paragrapho 1.º – O trabalho será distribuido segundo as aptidões e tendencias de
cada um. A tabella de salarios e vencimentos será organisada pelo Mordomo.
Paragrapho 2.º – Dos salarios e vencimentos dos doentes será reservada a quota de
cincoenta por cento para auxilio ás suas familias ou para a formação de um peculio proprio,
a juizo do Mordomo.
Art. 22.º – Os doentes não poderão fazer commercio com pessoas extranhas ao
Asylo-Colonia nem com quaesquer estabelecimento exteriores.
Paragrapho único: - A pratica do commercio interno entre os doentes dependera de
concessão especial do Mordomo e será por este regulada.
Art. 23.º – Os doentes terão direito gratuitamente a alimentação, vestuario e
assistência medica além de alojamento.
Paragrapho único: - A administração do Asylo adoptará padrões uniformes de
vestuario para lhe diminuir o custo.
Art. 24.º – Os doentes que dispuzeram de recursos poderão, com licença da Santa
Casa e sob a direcção desta mandar construir casas para a sua residencia e nellas se
manterem e se tratarem á propria custa.
Paragrapho único: - As casas feitas pelos doentes reverterão por morte delles á
propriedade da Santa Casa sem pagamento por esta de qualquer indenisação.
Art. 25.º – Os doentes poderão receber visitas de accordo com o regimento interno
estabelecido pela administração do Asylo. A esse regimento bem com ás disposições do
presente regulamento ficarão sujeitos sem excepção e restricção alguma.
Art 26.º – Para a execução do plano da prophylaxia da lepra e de accordo com a
legislação em vigor poderá a administração do Asylo, a pedido do governo, manter os
doentes no regime de isolamento compulsorio.
VI
DISPOSIÇÕES GERAES
Art. 27.º – Para as necessidades do policiamento, o governo manterá no Asylo-
Colonia uma guarda official.
Art. 28.º – Poderá o governo manter annexo ao Asylo-Colonia um presidio
destinado aos doentes criminosos, organisado de accordo com a Meza Administrativa da
Santa Casa.
Art. 29.º – Os productos agricolas ou manufacturados do Asylo-Colonia, quando
não são aproveitados pelos doentes poderão ser vendidos a outros estabelecimentos
congeneres do Estado ou de fóra.
Art. 30.º – No Asylo-Colonia havera livros especiaes para o registro de doentes e
para fiscalisação dos serviços technico e administrativo.
Desses livros serão extrahidos boletins mensaes para a Mesa da Santa Casa e para a
Inspectoria de Prophilaxia da Lepra.
5.º
O regulamento ora approvado poderá ser modificado em qualquer tempo, mediante
accordo entre o governo do Estado e a Santa Casa de Misericórdia.
(a. a.) Antonio de Padua Salles
Augusto Meirelles Reis
Jayme Loureiro
Anexo 09 – Encerramento do acordo feito entre a Santa Casa e o Estado.
Santa Casa de Misericordia de São Paulo
O Asylo Colonia de Santo Angelo
Atendendo a insistentes apelos do governo do Estado, por intermedio da Inspetoria
de Profilaxia da Lepra, para que Santa Casa de Misericordia de S. Paulo lhe transferisse a
administração do Asilo Colonia de Santo Ângelo, no interesse da uniformisação dos
elementos para a luta contra a Lepra em nosso Estado, resolvera a Mesa Administrativa da
Irmandade estudar o assunto para dar-lhe uma solução justa e acertada.
Para isso nomeou uma comissão composta dos irmãos mesarios, professor dr.
Cantidio de Moura Campos, mordomo do Asilo Colonia de Santo Ângelo, dr. Synesio
Rangel Pestana, diretor clinico dos seus hospitais e dr. Plinio Barreto, 1.º procurador da
Irmandade.
Essa comissão reuniu-se por diversas vezes para discutir o assunto que lhe fôra
proposto e concertar os termos do parecer que devia apresentar á Mesa Conjunta.
Examinada a questão sob todos os aspectos, juridico, sanitario, social, economico e
moral, chegaram os seus membros á conclusão de que, não podendo a Santa Casa, por
clausula expressa das doações a ela feitas pela Provincia Carmelitana de São Paulo e Pela
Associação Protetora dos Morfeticos, alienar ou arrendar as instalações do Asilo Colonia de
Santo Angelo e não desejando embaraçar a ação do governo na campanha contra a lepra,
pois com êle vem colaborando desinteressada e dedicadamente, desde 1779, no trabalho
porfiado e penoso de dar combate ao mal e abrigar as suas infelizes vítimas, o unico meio
de alcançar um acôrdo seria a transferência da administração do Leprosario de Santo
Angelo ao governo, por um contrato com prazo limitado e com clausulas explicitas
acauteladoras dos direitos e interesses da Santa Casa.
Nessa ordem de idéias foi lavrado o parecer que abaixo transcrevemos e que foi
unanimemente aprovado pela Mesa Conjunta depois de ampla discussão entre os irmãos
mesarios.
Parecer
A Diretoria Geral do Serviço Sanitario do Estado de S. Paulo propõe á Santa Casa
de Misericordia que lhe passe a direção tecnica e administrativa do Asilo Colonia Santo
Ângelo afim de unificar os serviços de profilaxia da lepra. Declara aquela diretoria que,
uma vez feita a transferência desse serviço á Inspetoria da Lepra, o Estado assumirá,
sozinho, a responsabilidade por todas as despesas de manutenção e conservação do
Leprosario, exonerando a Santa Casa do encargo que, presentemente, lhe cabe de contribuir
mensalmente com trinta contos de réis para as despesas de Santo Ângelo.
A Diretoria do Serviço Sanitario invoca uma razão de ordem publica para obter da
Santa Casa a transferência que almeja. Se assim é, só nos resta fixar as clausulas essenciais
para que a transferência se opere.
II
Como se sabe, os terrenos de Santo Ângelo vieram á propriedade da Santa Casa por
doação que lhe foi feita pela antiga Associação Protetora dos Morfeticos, representada
devidamente pela distante sra. d. Mathilde Melchert da Fonseca de Macedo Soares. Os
terrenos foram doados para o fim especial de ser utilisados em beneficio do leprosos e
mediante certas condições que estão sendo observadas. Nele se construiram, com o auxilio
do Estado, os pavilhões que constituem o Asilo. Terminada a construção, foi celebrado um
contrato entre a Santa Casa e o governo para a manutenção do novo hospital, reconhecendo
o governo, nesse contrato, a plena propriedade da Santa Casa sobre todos os imoveis onde
se acha aquele leprosario e comprometendo-se a dar á Santa Casa um auxilio, diréto e
permanente, para manutenção dos serviços de proteção aos morfeticos que ela ia executar
naquele estabelecimento. Por esse contrato a administração geral de Santo Ângelo ficou
pertecendo á Santa Casa, muito embora ela só tivesse de concorrer para as despesas com a
verba mensal de trinta contos. Tudo quanto excedesse dessa verba, seria pago pelo governo
do Estado pelas verbas destinadas ao serviço de profilaxia da lepra.
Nessa situação é que Santo Ângelo se encontra, presentemente. O que deseja a
diretoria do Serviço Sanitário é, portanto, no fundo, uma alteração do contrato existente
para os seguintes fins:
1.º – para que a Santa Casa abra mão, em beneficio dele, por um prazo determinado,
da administração geral do estabelecimento;
2.º – para que todos os serviços do Leprosario corram exclusivamente, sob a direção
e responsabilidade do governo do Estado;
3.º – para que a Santa Casa fique exonerada da obrigação de contribuir,
mensalmente, com a importancia de trinta contos para as despesas de Santo Ângelo.
III
Já demonstramos, em parecer anterior, que a Santa Casa não está impedida, pelo seu
compromisso, de transferir a administração de qualquer dos seus departamentos ao
governo, ou a qualquer instituto de beneficencia, desde q haja conveniencia para o seu
serviço e não se verifique a alienação da propriedade (compromisso, art. 2.º, paragrafo
único).
Alienação de propriedade não haverá. O governo não á pleiteia. Está respeitada,
portanto, uma das condições basicas para que a transferência seja admissivel.
A outra condição, a de conveniencia para o serviço da Santa Casa será respeitada
tambem? A administração de Santo Ângelo é irrepreensivel. As irmãs de São José, que lá
trabalham, imprimiram á vida interna do estabelecimento, como era de esperar, uma
disciplina rigorosa mas humanitaria. Os doentes não pódem ser tratados com mais carinho e
solicitude. O corpo clinico, por sua vez, se tem revelado de uma dedicação e competencia
fóra do comum. Sob esses dois aspectos, o da assistencia medica e o da direção interna,
Santo Angelo pode ser considerado, sem exagero, um hospital modelo.
Todavia, é força reconhece-lo, a Santa Casa não dispõe de recursos proprios para
manter no pé em que se encontra aquela casa de caridade. Sem o auxilio do Estado, ela teria
que fechar Santo Ângelo ou que reduzir muito o numero dos seus doentes. Se o governo se
propõe a custear, sozinho, as despesas do estabelecimento e não se propõe a dar-lhe destino
diverso daquele que a Santa Casa lhe deu e é obrigada a dar-lhe, parece-nos que ha
conveniencia para a Santa Casa na proposta que a diretoria do Serviço Sanitario lhe faz.
Ocorrem, portanto, todas as circunstancias previstas no Compromisso, para a transferencia
de qualquer serviço da Santa Casa ao governo ou a instituição de caridade. Não vemos, por
isso, inconveniente algum na transferência de administração de Santo Ângelo ao governo
de São Paulo.
IV
Como, porém, essa transferência não deverá ser feita por tempo indeterminado e
sem garantias expressas dos direitos da Santa Casa e de terceiros, somos de opinião que se
aceite a proposta da Diretoria do Serviço Sanitário mediante as seguintes condições:
1.ª) a transferência constará de contrato assinado com o secretario de Estado
competente, isto é, o da Educação e Saúde Publica, pelo prazo de dez anos, prorrogável se
houver conveniência para as partes e havendo aviso prévio de uma a outra, com seis meses
de antecedência, no mínimo;
2. ª) o governo assumirá a obrigação de restituir á Santa Casa, findo o contrato, os
edificios do leprosário no estado em que os recebeu, bem como todo o mobiliário, aparelho
e outro objeto pertencente á Santa Casa e que se encontram, a um minucioso inventario de
todas essas coisas feito por um representante do governo e outro da Santa Casa;
3. ª) o governo deverá manter, onde se encontram e como ali se encontram, todas a
placas, dísticos e nomes, por via dos quais a Santa Casa procurou prestar homenagem ás
pessoas que, de qualquer modo, contribuíram para a edificação existência de Santo Ângelo;
4. ª) o governo não poderá suprimir o culto católico em Santo Ângelo, conservando,
sempre, um sacerdote desse culto a residir no asilo, sendo-lhe permitido, porém, fornecer
socorros espirituais de outras religiões quando reclamados por doentes internados ali;
5.ª) o nome de ´´Asilo Colônia Santo Ângelo`` não poderá ser alterado e o asilo
poderá ser utilisado em beneficio dos leprosos;
6.ª) a obrigação, por parte do governo, de entregar á Santa Casa, para ser
incorporadas ao patrimônio desta, todas as construções, aparelhos e mobílias com que,
depois de assinado o contrato, e na vigência deste, dotas Santo Ângelo;
7.ª) tendo em consideração aos serviços dos médicos e auxiliares que,
presentemente, trabalham em Santo Ângelo, o governo ou os conservará nos cargos que
ocupam com os vencimentos que percebem ou lhes dará compensação equivalente;
8.ª) o governo, no fim do contrato, restituirá á Santa Casa, reconhecendo como dela
, não só os edifícios e demais bens enumerados no item 2, como todas as terras que, pelos
títulos de domínio, são da propriedade da Santa Casa ou que, não constante desses títulos,
estão sendo, entretanto, utilisadas por ela no serviço de Santo Ângelo, sem oposição de
terceiros;
9.ª) a Santa Casa ficará, durante o prazo do contrato, exonerada não só de contribuir
mensalmente para o serviço de Santo Ângelo com a quantia de trinta contos como de
qualquer outras obrigações oriundas da administração do asilo e nenhuma indenização terá
que pagar ao governo no fim do contrato, pelas novas construções e melhoramentos que o
governo fizer em Santo Ângelo ou em qualquer parte da área de terrenos pertencentes á
Santa Casa, devendo tudo isso entrar para o patrimônio desta, sem outras formalidades,
pura e simplesmente, com a terminação do contrato;
10.ª) a obrigação de custear, sozinho, as despesas de Santo Ângelo não dará ao
governo do Estado o direito de reduzir, direta ou indiretamente, na mínima parcela que seja,
a subvenção que, atualmente, fornece á Santa Casa para os outros serviços de caridade de
que ela se encarrega, pois que as despesas de Santo Ângelo nunca estiveram compreendidas
nessa subvenção, correndo por verbas especiais destinadas ao serviço de profilaxia da lepra.
São Paulo, 20 de Janeiro de 1933. - Cantidio Moura Campos, Plinio Barreto, dr.
Synesio Rangel Pestana.
Levada ao governo do Estado a copia do parecer aprovado, recebeu a Santa Casa a
minuta do contrato a ser lavrado entre o mesmo e a Santa Casa e que é do seguinte teôr:
“Termo de acôrdo que fazem o Governo do Estado e a Santa Casa de Misericordia
de S. Paulo, para a administração do Leprosario de Santo Ângelo – O governo do Estado de
S. Paulo, por intermédio da Secretaria de Estado da Educação e da Saúde Publica, neste áto
representada pelo respectivo diretor geral e encarregado do seu expediente, sr. dr. Augusto
Meirelles Reis Filho, devidamente autorizada pelo sr. General Waldomiro Castilho de
Lima, interventor federal no Estado de S. Paulo e a Santa Casa de Misercordia de S. Paulo,
representada pelo seu irmão provedor, sr. dr. Antonio de Pádua Salles, devidamente
autorizado pela respectiva Mesa, conforme documento que fica fazendo parte deste termo,
resolvem celebrar o presente acôrdo, nas condições abaixo, pelo qual a administração geral
do Leprosario de Santo Ângelo é transferida para a Inspetoria de Profilaxia da Lepra”:
I – Durante o prazo de dez (10) anos, a contar da presente data, a direção geral,
técnica e administrativa do leprosario de Santo Ângelo, fica exclusivamente a cargo da
Secretaria de Estado da Educação e da Saúde Publica, por intermédio da Inspetoria de
Profilaxia da Lepra.
II – O prazo estabelecido na clausula anterior pode ser prorrogado, se houver
conveniencia para as partes e havendo avisos prévios, escritos, de uma a outra, com seis
meses de antecedencia, no mínimo.
III – A Santa Casa de Misericoria de S. Paulo, durante o prazo deste acôrdo, ficará
exonerada de quaisquer obrigações oriundas da administração do Leprosario.
IV – O governo do Estado assume a obrigação de restituir á Santa Casa, findo o
contrato, as terras e os edificios do leprosario, no estado em que os recebeu – bem como
todo o mobiliario, aparelhos e outros objetos pertencentes á Santa Casa e que se encontram
no Leprosario.
V – Para o fim do disposto na clausula anterior, e antes da assinatura do presente
contrato, será procedido a um minucioso inventario, feito por um representante do governo
do Estado e outro da Santa Casa, de todas as coisas existentes no Leprosario, de que se
extrairão três vias, pelos mesmos representantes rubricadas e assinadas, ficando uma
fazendo parte deste contrato, outra em poder da Inspetoria de Profilaxia da Lepra e a
Terceira com a Santa Casa.
VI – O governo do Estado deverá manter onde se encontram e como ali se
encontram, as placas dísticas e nomes, por via dos quais a Santa Casa procurou prestar
homenagem ás pessoas que, de qualquer modo, contribuíram para a edificação e existência
do Leprosário de Santo Ângelo.
VII – O governo do Estado não poderá suprimir o culto católico no Leprosario de
Santo Ângelo, permitindo que resida no asilo um sacerdote desse culto, podendo, porém,
permitir tambem a administração de socorros espirituais de outras religiões quando
reclamados por doentes ali internados.
VIII – O nome de “Asilo Colonia Santo Angelo” não poderá ser alterado e o asilo só
poderá ser utilizado em beneficio dos leprosos.
IX – Tendo em consideração os serviços dos médicos e auxiliares que,
presentemente, trabalham em Santo Ângelo, o governo os conservará nos cargos que
ocupam, enquanto bem servirem, com os vencimentos estabelecidos para cargos idênticos
nos demais Leprosarios do Estado.
X – Durante a vigencia deste contrato, o governo do Estado terá plena autonomia na
administração, em geral, do Leprosario de Santo Angelo, organizando-a livremente, dentro
do estabelecido neste contrato.
XI – Estando as partes contratantes de acôrdo com tudo o que se contém no presente
termo, é o mesmo, depois de lido e achado conforme, assinado pelos representantes acima
nomeados, além dos srs. Francisco Marrone e Pedro Soares, que servem de testemunhas. -
Secretaria de Estado da Educação e da Saúde Publica, aos sete de Julho de mil novecentos e
trinta e três. Eu, José C. Abreu e Castro, 1.º escriturario, que o escrevi, dato e assino. São
Paulo. 7 de Julho de 1933. (Assinados): José C. Abreu e Castro, Augusto Meirelles Reis
Filho, Antonio de Padua Salles. Testemunhas: (aa.): Francisco Marrone, Pedro Soares.
Era o que continha o termo supra. Lavrado a pagina 133 a 134 verso do livro
competente, sob n.º 16, fielmente copiado por mim, em 8 de Julho de 1933”.
Em virtude desse contrato cessou a responsabilidade da Santa Casa na direção do
asilo Colonia de Santo Ângelo desde 30 de Junho do corrente ano. De 1.º de Julho em
diante assumiu o governo do Estado, por intermédio da Inspetoria de Profilaxia da Lepra, a
direção cientifica e administrativa do Asilo, que deve durar pelo espaço de dez anos,
segundo a clausula I do aludido contrato.
Desde essa data a Santa Casa não receberá mais donativos para o Asilo de Santo
Ângelo, devendo as pessoas generosas que quiserem continuar a prestar auxílios aos
leprosos, enviar seus donativos dirétamente ás diretorias do diferentes leprosarios dirigidos
pelo Estado ou á Inspetoria de Profilaxia da Lepra.
O que foi a cooperação da Santa Casa de Misericordia de S. Paulo para a campanha
contra a lepra e para o caridoso tratamento e asilamento dos leprosos de S. Paulo, desde o
remoto ano de 1779 até 30 de junho de 1933, di-lo melhor do que nós a interessante
memoria apresentada pelo professor dr. João de Aguiar Pupo, conhecido e reputado
leprologo paulista á Conferencia Nacional para uniformisação da Campanha contra a lepra,
reunida no Rio de Janeiro, no fim de Setembro corente, desenvolvendo o 7.º têma da
conferencia – Da cooperação privada e sua importancia na profilaxia da lepra, e que
publicámos em nossa edição de 1.º do corrente.
(Do “Estado de S. Paulo” de 4 de Outubro de 1933).
Anexo 10 - Cópia de certidão dos estatutos da Caixa Beneficente
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