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Acostumado com a organização dos terreiros de Candomblé, vê na estrutura
da “macumba” uma pobreza oriunda da cultura banto
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Mas não se trata aqui de “pobreza cultural”. Não podemos esquecer que as
casas de Candomblé que tem como modelo as casas da Bahia ou a macumba
do Rio de Janeiro era pouco cultuado em São Paulo. Aqui predominavam as
formas de culto voltadas ao espiritismo, com fortes tradições banto (que
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O movimento de reafirmação da identidade negra, iniciada por volta da década de 50 em
diferentes frentes, como já citado, criou no imaginário das comunidades religiosas e na sociedade
nacional a idéia de que a etnia iorubá é a legitima detentora das raízes das religiões afro-brasileiras,
em especial do Candomblé, quando outras etnias participaram ativamente deste processo, como a
bantu. A construção da idéia de etnia para o povo africano, como mostra Lopes, foi uma criação do
europeu, sendo essencializadas e naturalizadas, tanto no discurso acadêmico como no popular.
Antes desse período enxergavam-se apenas como “seres humanos” e as trocas aconteciam (tanto
tecnológica como cultural) entre todas as tribos, sem esta preocupação de etnia, que acaba por
territorializar os espaços e as relações, ocasionando uma super valorização da cultura iorubá em
detrimento das outras. Ao falar da cultura acústica, em várias passagens mostra a cultura bantu, em
especial a acústica, como sendo muito rica, possuindo a faculdade de classificação, e que este
sistema é muito mais racional que o sistema indo-germânico (...) a faculdade de coordenação de que
dá provas a língua bantu é muito desenvolvida e dá-lhes notável clareza. (pag. 206) Mais a frente,
cita Henri Junod, estudioso da cultura africana que assim descreve a cultura bantu: “o espírito bantu
é extremamente sensível a todas as expressões vindas do exterior e encontra meio de exprimir essas
impressões em palavras pitorescas que dão à língua interesse e cor extraordinários. A este respeito,
os bantus são-nos muito superiores e essa é a razão pela qual tão poucos europeus podem, em boa
verdade, aprender e empregar convenientemente esses advérbios descritivos (sem falar daqueles que
os desprezam!). (pag. 213/214) Esta fala, a meu ver, reforça a idéia de que a cultura bantu, longe de
ser “pobre” foi desqualificada e desconsiderada e hoje percebemos nos grupos religiosos
umbandistas o desconhecimento desta nossa matriz, introduzindo aspectos do candomblé acima
citado, como único referencial para a cultura umbandista.