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2.11 Apônio
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O autor segue a tradição origeniana, conhece o comentário ao Cântico dos
Cânticos atribuído a Hipólito de Roma (cf. acima exposto) expondo em doze livros escritos
em linguagem tosca, porém eficaz, e seguindo a Vulgata de Jerônimo. Apresenta uma exegese
cristológica do Cântico, examinado inteiramente a partir do ponto de vista espiritual e da
história da salvação. Assim, ele põe em relevo as relações entre Cristo e a Igreja desde o
começo da história.
Comentando o Cântico, Apônio afirma que não há quem desconheça que a palavra
Igreja significa em língua grega “assembléia do povo”, o que, por sua vez, se diz em hebraico
com a palavra sinagoga. Conforme as circunstâncias de lugar e de tempo, a Igreja foi
designada com diversos nomes pela Palavra de Deus. Algumas vezes é chamada “Jerusalém”;
outras, “Sião”; muitas vezes, “amiga”; seguidamente, “dileta”; e ainda, “irmã” e “bela”; ou
então, falando em nome de Cristo, os profetas a chamaram de “esposa”, “pomba”,
“imaculada” ou “perfeita”.
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Apônio também afirma que a Igreja é chamada de “Jerusalém” porque, após a
cólera de Deus todo poderoso, recebeu a paz enviada do céu pelo Pai, visto que a palavra
Jerusalém, na língua hebraica, significa “paz”. É chamada de Sião porque, desde este vale de
lágrimas da idolatria onde, em Adão, havia caído, agora se eleva de coração ao monte do
paraíso. Graças à pureza de seu coração, se oferecendo como espelho da Trindade indivisa, se
torna tão bela e excelsa que Deus se deleita em passear por ela como por um monte fértil,
espalhando as sementes da sua sã doutrina; por isso, a palavra “Sião” é interpretada como
espelho ou como “terra semeada".
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É a Igreja chamada de “amiga” porque, ao rejeitar o diabo, renovou sua amizade
com Deus. “Dileta” é chamada em razão de que, após ter experimentado o gosta amargo da
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Sob o nome de Apônio, considerado romano, talvez de origem oriental, se conserva uma Exposição do
Cântico dos Cânticos, composta, conforme senso comum, na Itália, provavelmente em Roma entre os anos 410 e
415. Não falta quem a associe a um autor irlandês do século VI. Todavia, a datação anterior corresponde melhor
ao modo como o autor combate aos hereges do século IV, ao seu interesse pela Igreja de Roma e, sobretudo, a
seu silêncio quanto à controvérsia pelagiana, apesar de que o argumento que trata, a saber, a Igreja sem mancha,
não o teria dispensado de ocupar-se dela. Cf. DI BERNARDINO, Angelo. Op.cit., p. 691-692.
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Ecclesiae autem vocábulo graego sermone congregatio nem populi quae hebraice dicitur synagoga,
interpretari, nemo qui nesciat. Quae pro loco vel tempore diuersis nominibus a verbo Dei uocitata esse probatur.
Aliquando Hierusalem, non nunquam Sion, plerumque amica, saepenumero dilecta, inter dum soror vel speciosa
dicitur; aut sponsa, columba, seu immaculada vel perfecta in Christi persona ore prophetarum appelata
cognoscitur. SCh, 420.
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Hierusalem siquIbidem dicitur quia, post iracundiam omnipotentis Dei, pacem de caelo missam a Patre
suscepit, eo quod “pax” abraea língua signetur. Sion uero quia de connualle lacrimarum idolatriae, ubi in corpore
lapsa fuerat in Adam, nunc corde ad montem paradisi reascendit, et per munditiam cordis speculum se praebendo
indiuiduae Trinitati, conpiscua et excelsa efficitur, in qua Deus omnipotens quasi in fertili monte delectetur
deambulare et beatum doctrinae suae semen spargere; propter quod “specula” vel “sêmen in ea” interpretatur.
SCh, 420.