sabe da historia externa do Cancioneiro da Ajuda. As suas folhas são
de pergaminho, a duas columnas, com pauta para a musica das canções
que se deveria escrever em seguida, e com varias vinhetas separando os
diversos grupos de canções de cada trovador e com letras historiadas.
O cancioneiro está truncado, pois que começa na folha 41, e não existe
o final, não só por incuria dos possuidores, que o baralharam
encadernando-o tumultuariamente com o Nobiliario, grudando algumas
folhas ás capas, mas tambem por que o estado da copia, sem assignatura
ou designação dos trovadores, letras historiadas incompletas, e falta
de notação musical, nos revelam que o codice não foi dado por acabado.
Esta collecção começou-se ainda no reinado de D. Diniz, por que
juntando-se as folhas lê-se escripto no córte d'ellas: _Rei Dom
Diniz_, e d'isto tambem se pode deduzir, que se não perderam muitas
folhas do principio e do fim. D'este codice foram encontradas mais 24
folhas avulsas na Bibliotheca de Evora, e é tradição corrente que na
de Coimbra existiam algumas outras tambem.
A inspecção do Codice da Ajuda, confrontado com outros Codices
europeus, mostra-nos que elle pertencia indubitavelmente a diversos
trovadores; Varnhagem notou que existiam dezaseis vinhetas
imperfeitamente coloridas, que estão desenhadas junto ás canções 2,
36, 37, 149, 157, 170, 173, 184, 190, 231, 233, 249, 253, 255, 259 e
fragmento _h_. (Notas ás _Trovas e Cantares_, p. 348.)
Alem d'este vestigio paleographico, o confronto com o Codice da
Vaticana levou a achar os seguintes trovadores, communs aos dois
Cancioneiros: Pero Barroso, Affonso Lopes Baião, Mem Rodrigues
Tenoyro, João de Guilhade Estevam Froyam, João Vasques, Fernão Velho,
Ayres Vaz, D. João de Aboim, Pero Gomes Charrinho, Ruy Fernandes,
Fernam Padrom, Pero da Ponte, Vasco Rodrigo de Calvelo, Pero Solaz,
Pero d'Armêa, e João de Gaia. Todos estes nomes são de fidalgos
grandes privados de el-rei D. Diniz, e alguns já figuram em doações de
D. Affonso III, como D. João de Aboim e Affonso Lopes Baião; Mem
Rodrigues Tenoyro vivia na côrte de D. Affonso IV, e foi entregue a
Pedro cruel em troca dos assassinos de Inez de Castro.[1] A parte não
assignada e que não se encontra no Cancioneiro da Vaticana será por
ventura o corpo das canções escriptas durante o tempo em que a côrte
de D. Affonso III esteve fixa em Santarem. Alem d'isso a parte commum
tem a particularidade de conservar a mesma ordem nas canções, e ao
mesmo tempo as variantes mais fundamentaes n'essas lições. D'aqui se
conclue, que já existia um Cancioneiro formado, d'onde este da Ajuda
estava sendo trasladado, mas que d'esse cancioneiro existiam
differentes copias formadas, não directamente sobre elle, mas por meio
dos cancioneiros particulares que o constituiram. A parte não commum
ao codice de Roma, prova nos tambem que alguns d'esses cancioneiros
parciaes se perderam, ou eram já tão raros que não chegaram a ser
encorporados na collecção. Admittida a hypothese de que o Cancioneiro
da Ajuda, pelo facto de ter pertencido a el-rei D. Diniz e de andar
encadernado junto do Nobiliario do Conde D. Pedro, fosse o proprio
_Livro das Cantigas_, como primeiro quiz Varnhagem, o facto de
apparecerem aí outros trovadores prova-nos a nossa hypothese, que o
Conde D. Pedro compilara sob esse titulo as canções dos trovadores
seus contemporaneos. O numero de vinhetas imperfeitamente coloridas do
cancioneiro da Ajuda são dezaseis; isto leva a inferir que esse codice
era formado de dezeseis corpos de canções que pertenciam a dezassete
trovadores. De facto a coincidencia aqui é pasmosa: o numero dos
trovadores communs ao Cancioneiro da Ajuda e da Vaticana é de
dezesete! Note-se que este numero é o que se perfaz com os nomes de
_Fernam Padrom, João de Gaya, e Pero d'Armêa_, que achámos alem
d'aquelles que primeiro descobriu Varnhagem. D'este numero se tira a
conclusão que o Cancioneiro da Ajuda pertence exclusivamente a esses
dezessete trovadores, e que as cincoenta e seis canções communs ao
Codice da Ajuda eram as que andavam por cancioneiros parciaes, como as
mais conhecidas, e pelas variantes que appresentam, as mais repetidas.
Alem d'isso, pode suppor-se que o Cancioneiro da Ajuda não foi