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A Questão do Negro no Curso de Formação em Serviço
Social da Universidade Fedral Fluminense.
José Barbosa da Silva Filho
Niterói – RJ, 2004.
Licença: Creative Commons License--><a rel="license"
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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE – UFF
CENTRO DE ESTUDOS GERAIS APLICADOS
ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL
MESTRADO EM POLÍTICA SOCIAL
Orientadora: Profª Drª: Iolanda de Oliveira
3
JOSÉ BARBOSA DA SILVA FILHO
A QUESTÃO DO NEGRO NO CURSO DE GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL
DA UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
Dissertação apresentada ao Curso de Pós-
Graduação em Política Social da Escola de
Serviço Social da Universidade Federal
Fluminense como requisito para obtenção
Do Grau de Mestre.
Orientadora: Profa. Dra. IOLANDA DE OLIVEIRA.
Dezembro
2004
4
JOSÉ BARBOSA DA SILVA FILHO
A QUESTÃO DO NEGRO NO CURSO DE GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL
DA UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em
Política Social na Escola de Serviço Social da
Universidade Federal Fluminense, como requisito
para a obtenção do Grau de Mestre.
Aprovada em dezembro de 2004.
BANCA EXAMINADORA
_____________________________________________________________
Profa. Dra. Iolanda de Oliveira – Orientadora
Faculdade de Serviço Social - UFF
_____________________________________________________________
Profa. Dra. Regina Pahim Pinto
Fundação Carlos Chagas
_____________________________________________________________
Prof. Dr. André Augusto Pereira Brandão
Faculdade de Serviço Social - UFF
Niterói
Dezembro 2004
5
... existiria a verdade/ Verdade que ninguém ver/ Se
todos fossem
no mundo iguais a você. (Vinicius de Morais)
Para minha preta, esposa, amante e eterna
namorada, Márcia, sem a qual este momento não existiria,
pois sua dedicação, seu incentivo, seu colo e seu amor foram,
são e serão as molas impulsoras das realizações da minha
vida;
Aos meus filhos, Laucio Antonio e Laura
Angélica, pela perpetuação da origem;
Para meus netos Luan, Laiana e Rayza, se
orgulharem da negritude que os constitui
José Barbosa da Silva Filho
6
AGRADECIMENTOS
Ao Deus ocidental, aos Orixás africanos e brasileiros e aos Espíritos de Luz pela
inspiração;
Ao pessoal do PENESB, - Eliezer, Rômulo, Ana Paula, Tiago pela paciência e
colaboração;
A Lúcia, nossa super-secretária, sempre solicita e pronta minorar os nossos dramas e
desanuviar nossos pesadelos, quando o Prof. João Bosco dá um tempo;
As amigas e companheiras de jornada Perses Canela pelo afeto e perseverante
incentivo; Claudia Regina pelo apoio e bons papos entre as nuvens e estradas dos
Congressos e Encontros; Ana Lole pelo incomparável despreendimento e Rosely Rocha
pelo sorriso e eterna sede de viver e aprender.
Aos professores do Mestrado em Política Social pelos momentos de reflexão e de
apreensão de saberes;
Aos professores-pesquisadores do PENESB pela fraterna convivência e salutar
aprendizagem;
Aos companheiros professores do GP 409 pela compreensão e pelos momentos no
‘café fofoca’ que me faziam relaxar da tensão pré-mestrado;
A Profa. Dra. Regina Pahim Pinto pela sapiência, paciência e meiguice com que nos
conduz ao aprimoramento do “ser pesquisador”;
Ao Prof. André Augusto Pereira Brandão pela co-orientação libertária, porém
inspiradora da busca, de questionamentos e de efetivação das nossas idéias;
Aos Docentes: Profa. Ana Ventura; Profa. Cenira Duarte; Profa. Elaine; Profa.
Lenaura Lobato; Profa. Maria das Graças; Profa. Miriam Reis; Profa. Rita de Cássia; Prof.
Serafim Paz; Profa. Suely Gomes Costa; Profa. Teresa Meneses, pelas entrevistas que muito
auxiliaram as minhas reflexões.
A minha orientadora Profa. Dra. Iolanda de Oliveira, a musa inspiradora
dos penesbianos e eterno exemplo de sabedoria, competência, perseverança e nos
ideais;
7
Que Deus os abençoe e que Oxóssi energize a todos.
8
RESUMO
A pesquisa “A Questão do Negro no Curso de Graduação em Serviço Social da
Universidade Federal Fluminense” pretende colaborar com o debate em torno das questões
que diz respeito a situação da população negra na sociedade brasileira, vitimada pela
violência do preconceito histórico-cultural, da discriminação sócio-racial e da exclusão
econômica na sua interação com os outros segmentos da população brasileira. Nosso
trabalho se baseia na hipótese de que as posturas racistas e racialistas ainda existentes na
nossa sociedade são reforçadas pelo desconhecimento das origens históricas-culturais-
sociais e religiosas do negro africano da diáspora e do negro brasileiro por parte dos
profissionais que lidam cotidianamente com este segmento da população. No caso
específico da nossa reflexão, estudaremos os profissionais em Serviço Social formados pela
Universidade Federal Fluminense – UFF.
A questão que nos interessava esclarecer era: sendo profissionais que
invariavelmente interagem com parcelas da população onde é grande o percentual de pretos
e pardos, os conhecimentos que os Assistentes Sociais graduados pela UFF recebem em seu
processo de formação, contemplam e problematizam temas relacionados com as questões
que dizem respeito ao negro na sociedade brasileira? Em caso negativo, por que isso
ocorre?
Para materializar esse intento foram realizadas análises: a) nos Trabalhos de
Conclusão de Cursos (TCCs) dos graduados em Serviço Social pela UFF de 1948 a 2002;
b) em publicações direcionadas para os Assistentes Sociais; c) nas grades curriculares dos
Cursos de Formação em Serviço Social da UFF, da UERJ, da UFRJ e da PUC-RJ. Também
foram utilizadas entrevistas com Docentes da ESS-UFF e questionários distribuídos entre
as formandas. Esses procedimentos metodológicos responderam a nossa questão e,
infelizmente, a premissa negativa tornou-se verdadeira. As razões e os porquês encontram-
se explicitados nesse texto.
9
ABSTRACT
The research "The Question of the Black Man in the Course of Graduation in Social
Service of Fluminense Federal University" intends to collaborate with the debate around
the questions that respect says the situation of the black population in the Brazilian society,
victim for the violence of the description-cultural preconception, the partner-racial
discrimination and the economic exclusion in its interaction with the other segments of the
Brazilian population. Our work if bases on the hypothesis of that still existing the racist and
racialistas positions in our society are strengthened by the unfamiliarity of the historical-
culture-social and religious origins of the African black of the ‘diáspora’ and of the
Brazilian black on the part of the professionals whom they daily deal with this segment of
the population. In the specific case of our reflection, we will study the professionals in
Social Service formed by Fluminense Federal University - UFF.
The question that in interested them to clarify age: being professional that most
invariable percentage of black color and mediums brown interact with parcels of the
population where are great, the knowledge that the Social Assistants graduated by the UFF
receive in its process of formation, contemplate and problemate subjects related with the
questions that say respect to the black in the Brazilian society? In negative case, why this
occurs?
To materialize this intention analyses had been carried through: a) in the Works of
Conclusion of Courses (TCCs) of graduated Social Service for the UFF of 1948 at 2002; b)
in publications directed for the Social Assistants; c) in the curricular gratings of the Courses
of Formation in Social Service of the UFF, the UERJ, the UFRJ and the PUC-RJ. Also
interviews with Professors of the ESS-UFF had been analyzed and in the questionnaires
distributed between students. These metodology procedures had answered our question and
the negative premise became true. The reasons and the reasons meet explain in this final
report.
10
SUMÁRIO
. INTRODUÇÃO ..........................................................................................................12
. CAPÍTULO I
.A QUESTÃO DO NEGRO NA SOCIEDADE BRASILEIRA............................. 23
1.0 – O Racismo: Origens e Desenvolvimento ................................................25
1.1 – Teorias Raciais ....................................................................................... 27
1.2 – O Discurso Jesuítico na Construção do Imaginário Negativo sobre
o Negro no Brasil ............................................................................... 31
1.3 – O ‘Ser Negro’ na Sociedade Brasileira................................................... 36
. CAPÍTULO II
.O SERVIÇO SOCIAL............................................................................................ 43
2.1– O Serviço Social no Brasil....................................................................... 47
2.2 – O Profissional em Serviço Social na Atualidade ................................... 50
. CAPÍTULO III
.O NEGRO E O SERVIÇO SOCIAL DA UFF ...................................................... 56
3.1 - A UFF e a Escola de Serviço Social ...................................................... 56
3. 2 - Análise dos dados encontrados................................................................57
3.2.1 – Trabalhos de Conclusão de Curso ...................................................58
3.2.2 – Publicações .........................................................................................63
3.2.3 – Grades Curriculares ....................................................................... .....67
3.2 4 - Questionários discentes ........................................................................68
3.2.5 – Entrevistas Docentes............................................................................77
. CAPÍTULO IV
.TEM ESPAÇO PARA O NEGRO NO CURSO DE GRADUAÇÃO EM
11
SERVIÇO SOCIAL DA UFF ....................................................................................... 85
4.1 - As teorias curriculares .................................................................................. 86
4.2 – O Currículo do Curso de Serviço Social da UFF ........................................ 90
4.3- Conteúdos para serem incluídos entre os saberes dos graduandos em
Serviço Social da UFF .................................................................................................103
. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 107
.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................ 114
.ANEXOS ................................................................................................ 129
12
INTRODUÇÃO
A pesquisa “A Questão do Negro no Curso de Graduação em Serviço Social da
Universidade Federal Fluminense”, tem como objetivo geral auxiliar na reflexão sobre a
questão do negro na sociedade brasileira colocada na pauta dos movimentos sociais,
juntamente com as preocupações políticas, sociais e econômicas que envolvem a sociedade
brasileira da atualidade. Nosso trabalho se norteia pela hipótese de que as posturas racistas
e racialistas
1
presentes no cotidiano dos brasileiros são em grande parte reforçadas pelo
desconhecimento das origens históricas, culturais, sociais e religiosas dos negros africanos
e dos negros brasileiros
2
, por parte dos diferentes profissionais que lidam diretamente com
este numeroso segmento da população nacional, 46% segundo o IBGE. No caso específico
da nossa reflexão, estudaremos os profissionais em Serviço Social em formados pela
Universidade Federal Fluminense, UFF.
Apesar de compreender que outros processos culturais educativos, além da
formação escolar, co-participam da ocultação do conflituoso inter-relacionamento entre
brancos e não-brancos em nossa sociedade, busquei averiguar entre as/os Assistentes
Sociais formadas/os na ESS-UFF, por serem profissionais que invariavelmente interagem
com segmentos da população onde é grande o número de pretos e pardos, se os
conhecimentos que recebem em seu processo de formação contemplam e problematizam
temas relacionados com as questões que dizem respeito ao negro na sociedade brasileira?
3
Em caso negativo, porque isso ocorre?
Essa questão é tanto mais pertinente dado que, de acordo com os dados preliminares
do Censo Étnico-Racial realizado na UFF em 2002, o curso de graduação em Serviço
1
Para TODOROV (1985: 107), o termo racismo designa um comportamento antigo e de extensão universal,
enquanto racialismo refere-se a uma ideologia, um movimento de idéias nascido na Europa Ocidental entre
os séculos XVIII e XIX. Podemos dizer que o racialismo é uma convicção da existência de raças distintas
biologicamente, enquanto o racismo se baseia nesta afirmação para hierarquizar as raças, naturalizando as
diferenças e produzindo a desigualdade.
2
Poderia utilizar os conceitos ‘afro-brasileiro e afrodescendentes’, porém eles são focos de discussões entre
os estudiosos das relações raciais. Para alguns, além de parecer cópia de um termo dos negros norte-
americanos, eles explicitam uma negação do conceito “negro”, para outros é uma afirmação da nossa
brasilidade e africanidade. (ver SISS, 2003; BARBOSA&SILVA&SILVÉRIO, 2003; NASCIMENTO, 2003).
Por isso utilizaremos ‘negro brasileiro’, ‘população negra’ e/ou ‘pretos e pardos’ acompanhando o IBGE.
3
Utilizo essa expressão por acreditar que ela pode constituir um sentido mais abrangente, ou seja, além do enfoque histórico-cultural,
também os aspectos sócio-econômicos (pobreza, saúde, qualidade de vida, desemprego, etc) que fazem parte do cotidiano profissional
dos Assistentes Sociais e que pode auxiliar na compreensão da complexidade que envolve as relações raciais na sociedade brasileira, quer
no aspecto positivo (os feitos dos negro ao longo da história) quer no aspecto negativo (as discriminações, os estereótipos, etc.).
13
Social, assim como outros cursos de menor “prestígio”,
4
conta com um expressivo
contingente de alunos negros, como comentaremos em outro capítulo desse estudo.
Diante dessa realidade, especificamente, nosso estudo tem como objetivos: 1.
Detectar, a partir de uma amostra específica, os conhecimentos acerca das questões que
dizem respeito ao negro na sociedade brasileira adquiridos pelas/os Graduandas/os em
Serviço Social da UFF em sua formação superior; 2. Averiguar entre os Docentes da ESS-
UFF seus posicionamentos acerca da necessidade da inclusão dessa temática na formação
dos Assistentes Sociais; 3. Investigar se na grade curricular e nos conteúdos programáticos
das disciplinas dos Cursos de Graduação em Serviço Social da UFF, as questões que dizem
respeito ao negro na sociedade brasileira estão presentes e, em caso positivo, como são
concebidas, problematizadas e transmitidas aos estudantes, no caso negativo, porque não o
são; 4. Analisar em que medida o negro e a questão que lhe diz respeito estão presentes nos
trabalhos monográficos das/os alunas/os graduadas/os pela ESS-UFF e nas publicações
específicas para os Assistentes Sociais; 5. Apontar espaços na grade curricular do Curso de
Graduação em Serviço Social da UFF que possibilitem a inclusão de estudos que abordem
essas questões.
O estudo constará de dois momentos complementares: uma pesquisa documental e
uma pesquisa de campo.
Na pesquisa documental contemplamos:
a) Estudo histórico-bibliográfico sobre o Negro na História e na Sociedade
Brasileira, onde buscaremos demarcar a trajetória das teorias raciais européias do século
XIX, sua entrada no Brasil e suas conseqüências no cotidiano dos negros africanos da
diáspora e da população negra brasileira atual. Tentaremos também vincular os discursos
oralizados nos púlpitos eclesiásticos pelos padres jesuítas, com destaque para o Padre
Antonio Vieira, a essas teorias e à forma de reconhecimento e de representação do negro
como construtor da sociedade e participe da produção cultural brasileira.
Esse estudo foi colocado com o intuito de aproximar o Assistente Social, para quem
a pesquisa é direcionada, desta discussão não encontrada em sua formação como
comprovado pela pesquisa.
4
4. Alguns cursos das áreas de Humanas e Técnicas (Serviço Social, Arquivologia, Pedagogia, Biblioteconomia, Geografia, etc) são
assim considerados por não terem o ‘status’ histórico e econômico de outros (Medicina, Engenharia, Arquitetura, Direito, etc), porém
para os familiares e para entorno de vizinhança daqueles que são aprovados a influência é imensurável por quebrar a ‘ordem das coisas’
(BORDIEU). Ver TEIXEIRA, 2003; SILVA e SILVÉRIO, 2003.
14
b) Estudo bibliográfico sobre a história do Serviço Social no Brasil. Os estudos que
abordam essa questão (VIEIRA, 1978; CASTRO, 1984; AGUIAR, 1984; LIMA, 1987;
NETTO, 1990/1992; IAMAMOTTO e CARVALHO, 2001; IAMAMOTTO, 2003; COSTA,
1989/1990), assim como os debates, as polêmicas e as dissidências (COSTA, 1994/1995;
GÓIS, 1993/ 2001; SÁ, 1995), certamente serão de grande importância tanto para aqueles
que estudam a questão do negro no Brasil como para aqueles que militam no Movimento
Negro, os outros alvos deste trabalho, e que desconhecem a realidade da formação teórico-
metodológica e profissional dos Assistentes Sociais.
c) Seleção, leitura e análise das monografias de final de curso (TCC) das/os
graduadas/os da Escola de Serviço Social da UFF (ESS-UFF) de 1948 a 2002, período
abrangido pelas monografias existentes na Biblioteca Central da UFF. As monografias
elaboradas pelos/as alunos/as constituem uma fonte importante para se conhecer o curso,
não porque indicam os temas em pauta em determinados momentos como o interesse e
sensibilidade dos/as aluno/as para com as questões que dizem respeito ao negro, dado que
os temas são de sua escolha;
d) Análise de publicações (periódicos) específicas para a área de Serviço Social e
utilizadas pelos alunos/as durante o curso de graduação;
e) Análise da grade curricular/fluxograma do curso de graduação em Serviço Social
da UFF em comparação com as grades de outros cursos da mesma área existentes no Rio de
Janeiro: UFRJ; UERJ e PUC-RJ.
A pesquisa de campo é composta por:
a) Aplicação de questionários para os alunos/as do período da ESS-UFF. Optou-
se pela utilização deste instrumento por uma questão de logística, dado que ele possibilita
atingir um número maior de alunos. O objetivo é aferir o grau de conhecimento das
questões que dizem respeito ao negro por parte dos alunos que estão em fase de elaboração
do TCC, última etapa da formação profissional, e também averiguar a pertinência da
introdução de disciplinas específicas a respeito da questão do negro ou o direcionamento de
conteúdos nas disciplinas já existentes na grade sobre esses temas.
b) Realização de entrevistas com professores da ESS-UFF. A intenção é, além de
conhecer a opinião dos docentes sobre a questão da pesquisa, averiguar as possibilidades de
inclusão de conteúdos e/ou disciplinas que abordem a questão do negro no Brasil no
currículo da graduação em Serviço Social.
15
Este esforço investigativo se justifica porque, como é do conhecimento de todos que
estudam a questão do negro no Brasil, o Presidente Luís Inácio Lula da Silva sancionou a
lei 10639 de 09/01/2003, que torna obrigatório o ensino da História e da Cultura afro-
brasileira nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio dos sistemas educacionais,
público e privado, do Brasil. Para aqueles que anos vinham lutando para que isto
ocorresse, a noticia foi deveras prazerosa e demonstrou a validade da luta para almejar o
reconhecimento da existência do negro fora do contexto escravista no plano educacional,
que certamente reverberá no cotidiano social da população.
Porém, embora concorde que a referida lei diz mais respeito ao trabalho dos
profissionais em Educação
5
, surge outra preocupação. E quanto àquelas pessoas que se
afastaram da escola e que tem o seu cotidiano marcado pelos seculares estereótipos criados
contra o negro e sua cultura? Quem os orientará quanto ao respeito à alteridade, a
representação social, a identidade, a história e a cultura dos negros, conceitos fundamentais
para que a lei realmente tenha o efeito esperado? Provavelmente uma das respostas será: os
outros profissionais graduados da área de Ciências Humanas e Sociais que trabalham em
contato direto com a coletividade, caso dos Assistentes Sociais que, por força da sua
profissão, invariavelmente interagem com segmentos da população onde é grande a
concentração de pretos e pardos. Mas, como é possível ensinar, transmitir, orientar ou atuar
sobre algo que desconhecemos ou que sabemos existir, porém não dominamos a sua
essencialidade?
Infelizmente, a grande maioria dos profissionais brasileiros que teriam maior
possibilidade de garantir o respeito na interação com o diferente, seja em sala de aula ou
fora dela, se inserem em uma dessas duas situações: não conhecem ou não dominam
conhecimentos mínimos sobre a questão racial que envolve o ‘ser negro’ na sociedade
brasileira (VALENTE, 1987; SOUZA, 1983; SANTOS, 2002; REIS, 2002).
Um dos fatores que pode concorrer para este desconhecimento histórico-
pedagógico é o fato dos cursos de Graduação da área de Ciências Humanas e Sociais
Aplicadas (História, Sociologia, Antropologia, Filosofia, Serviço Social, Psicologia, Letras,
Pedagogia, entre outras), com raras exceções,o contemplarem em seus currículos e nos
conteúdos programáticos das disciplinas oferecidas aos graduandos, estudos e discussões de
5
Por isso, juntamente com outros programas em instituições públicas e privadas brasileiras, o Programa de Educação sobre o Negro na
Sociedade Brasileira (PENESB) localizado na Faculdade de Educação da UFF, campus do Gragoatá em Niterói, RJ, oferece cursos de
Extensão e Especialização para professores do ensino básico, médio e superior sobre as relações raciais na sociedade brasileira. Destaco
este programa por minha vinculação a ele.
16
temas sobre a milenar história africana e acerca da riqueza cultural que herdamos dos cerca
de quatro milhões e quinhentos africanos escravizados e trazidos para o trabalho forçado
em nosso país. Esta medida poderia contribuir para uma melhor compreensão dos
problemas que o negro enfrenta em nossa sociedade, devido ao seu pertencimento étnico-
racial ou pela cor da sua pele (SOUZA, 1983; VALENTE, 1987; SILVA, 1995; CHAGAS,
1996; FRENETTE, 2000; REIS, 2002).
Constatei este problema entre os/as Assistentes Sociais durante o II Congresso
“Relações Raciais e Educação”, promovido pelo Programa de Educação sobre o Negro na
Sociedade Brasileira (PENESB), na Faculdade de Educação da UFF. Ao dialogar com
algumas estudantes de Serviço Social, percebi o desconhecimento que estas possuíam em
relação à questão racial que permeia o relacionamento sócio, cultural, político, econômico e
religioso da nossa população. A idéia de classe e do poder econômico como determinantes
para a explicação do preconceito, da discriminação e da exclusão sócio-econômica latente
contra a população negra, assim como a certeza da existência de uma “democracia racial” e
da culpabilização do negro pela situação que orienta o seu cotidiano e a sua relação social
com os outros membros da sociedade brasileira, foram concepções percebidas nas
entrelinhas das falas dessas alunas. Aquilo que Pierre Bourdieu denomina de ‘poder
simbólico das palavras’
6
, caracterizava-se nessas falas.
Posteriormente, sendo aprovado para o Mestrado em Política Social oferecido pela
Escola de Serviço Social da UFF, entrei em contato mais aprofundado com a dinâmica
histórica-teórico-metodológica e profissional da formação dos/as Assistentes Sociais, o que
reforçou a impressão obtida no meu diálogo com as citadas alunas.
Eu concordo com o ponto de vista de que devemos privilegiar as crianças, os jovens
e adolescentes que se encontram nas escolas, mas também precisamos trabalhar com
aqueles adultos, crianças, adolescentes que se encontram fora das salas de aula, por n’
motivos e, como foi dito, o profissional que interage com grande parte destes indivíduos
em seu lócus de atuação é o Assistente Social.
Ora, tratando-se também de profissionais que lidam diretamente com as parcelas
mais pauperizadas da população brasileira, constituída em sua maioria por pretos e pardos,
(BARROS, 2000; BRANDÃO, 2002/2003; HENRIQUES, 2001; JACOUD e BEGHIN,
6
“Poder de constituir o dado pela enunciação, de fazer ver e fazer crer, de confirmar ou de transformar a visão do mundo
e, deste modo, a ação sobre o mundo, portanto o mundo; poder quase mágico que permite obter o equivalente daquilo que
é obtido pela força (...) O que faz o poder das palavras , poder de manter a ordem ou a subverter é a crença na legitimidade
das palavras e daquele que as pronuncia, crença cuja produção não é da competência das palavras”. (BOURDIEU, Pierre
– O Poder Simbólico. 3ª edição, Rio de Janeiro: 2000, p.14/15).
17
2002; PAIXÃO, 2003), acredito que o domínio de conhecimentos sobre a história e da
cultura afro-brasileira pelos Assistentes Sociais seja imprescindível, tanto para um melhor
aprimoramento pessoal como para um desempenho profissional mais consciente e crítico de
intervenção diante da realidade social e econômica que diz respeito à população negra e faz
parte do seu dia-a-dia profissional.
Frente a esse processo de ocultação da realidade histórica da população negra que
norteia o cotidiano do povo brasileiro como um todo, como coibir práticas preconceituosas
e discriminadoras, que certamente ocorrem, entre os indivíduos e os vários grupos com os
quais o Assistente Social interage em seu cotidiano de trabalho? Como perceber, em sua
atuação pessoal e profissional, comportamentos racistas e/ou racialistas, considerados
naturais pelo imaginário
7
popular, no trato com os usuários negros? Como agir quando
ocorrer comportamentos, atitudes, ações racistas entre seus usuários ou entre seus pares?
Em seu estudo acerca da relação entre os Assistentes Sociais e os usuários negros,
realizado em 1986, em Campinas, Elisabete Aparecida Pinto percebeu que,
no nível do discurso todos defendem a igualdade dos homens, sem distinção de cor,
raça, sexo ou credo religioso, conforme os ensinamentos de Cristo. Entretanto no
contato face a face, utilizando um discurso ambíguo e sutil, fazem questão de
colocar o negro em uma categoria diferenciada do ser humano, feita para a
submissão e subserviência (PINTO, 2003, p.118).
Creio que apesar dos 17 anos que separam a pesquisa da Assistente Social Elisabete
Pinto dos dias atuais, esse tipo de visão sofreu poucas alterações. A atitude neutra ou de
invisibilidade diante da realidade dos usuários que procuram a Assistência Social, de
acordo com a análise dos trabalhos de conclusão do curso (TCCs) das/os graduandas/os da
UFF e das grades curriculares dos cursos de graduação em Serviço Social da UFF e das
outras Universidades analisadas, continua a existir porque ao que parece a vinculação do
conceito biológico de raça - como origem genética (PENA 2002) - e o desconhecimento
sobre a influência do conceito sociológico de ‘raça’ incorporado a cor da pele do
indivíduo (NOGUEIRA, 1985; GUIMARÃES, 2002), na explicação das desigualdades
sociais existentes na sociedade brasileira, permanece inalterado. Essa falsa interpretação
deve ser discutida para propiciar o envolvimento dos Assistentes Sociais na luta contra a
desigualdade secular que norteia o relacionamento sócio-cultural-racial do povo brasileiro.
Portanto, concordo com PINTO (2003, p. 28) quando diz,
7
Imaginário é tudo que não existe; uma espécie de mundo oposto à realidade dura e concreta resultado de uma força criadora radical
própria à imaginação humana, fundamental para a constituição identitária do indivíduo. (BARBIER, René Sobre o Imaginário. Em
Aberto. Brasília, nº 61, Jan/mar. 1994. p.15 – 23)
18
“Uma vez que o racismo e o preconceito fazem parte das relações de dominação e
exploração, é o assistente social que tem como principal função trabalhar as
relações sociais através de uma ação educativa, visando à consciência e à
participação um profissional indispensável para a eliminação das situações de
discriminação em que vivemos (negrito meu)
E assim sendo, para que não tenhamos mais uma “lei para inglês ver”, seria
importante que os profissionais que lidam diretamente com a população, mesmo fora das
salas de aula - caso dos Profissionais em Serviço Social - recebam uma formação que lhes
subsídios para entender a complexidade das relações raciais no nosso cotidiano e
possuam autonomia crítica para intervir, elucidar e desnaturalizar esta problemática em
seus inter-relacionamentos sócio-culturais-profissionais.
Se compreendermos que a questão do negro, pela crescente desigualdade sócio-
econômica que gera entre os estratos sociais, facultando a uns e privando a outros do acesso
aos bens sociais disponibilizados para todos os cidadãos, origina uma Questão Social.
Aceitando a definição de Política Pública como uma intervenção do Estado na
sociedade, mediatizando conflitos latentes ou reais entre os diversos sujeitos sociais “a
partir da emergência política de uma questão” (FLEURY, 1994, p.130), certamente
incorporaremos a questão racial, geradora da exclusão sócio-política-cultural e econômica
dos negros brasileiros de direitos fundamentais para a pessoa humana, como uma questão
deão política para a resolução pacífica desse problema, ou seja, uma questão de Política
Pública.
Se ainda nos fundamentarmos na concepção finalista de Política Social como “um
esforço sistemático para reduzir as desigualdades entre os seres humanos” e/ou “conjunto
de orientações normativas relativas as relações Estado-Sociedade, dirigidas para garantir o
padrão de solidariedade vigente entre grupos e indivíduos numa sociedade concreta”, que
FLEURY (1999) denomina de concepção funcional, concluiremos que a questão do negro
na sociedade brasileira se apresenta como uma Questão Social, uma questão de Política
Pública e de Política Social.
Sabendo que essas categorias, Questão Social/Proteção Social, Política Social e
Política Pública, formam o eixo de sustentação profissional do Assistente Social,
logicamente as questões que afetam o cotidiano da população negra brasileira deve ser
parte das preocupações desses profissionais e a sua intervenção para resolução desse
problema e se faz muito necessária. Nas palavras de uma Assistente Social
É preciso rever um conjunto de conhecimentos consagrados que usualmente
explicam as situações de ‘desproteção’ e de exclusão social a que milhares de
19
brasileiros teriam sido relegados em tantos séculos de história. (COSTA, 1995,
p.120).
Para isso creio ser essencial que eles dominem conhecimentos histórico-culturais
que dizem respeito ao segmento negro no Brasil, capazes de fazê-los compreender o
momento histórico da arquitetação, o porquê da criação, o efeito da ação e como intervir
freando a propagação das idéias estereotipadas e ideologizadas, presentes no imaginário
nacional e que dão origem às ações discriminadoras e posturas preconceituosas contra a
população negra. O curso de Graduação em Serviço Social da UFF, delega essas
capacidades aos seus graduandos?
Não pretendemos discutir profundamente a existência do racismo, do preconceito e
da discriminação contra o negro em nossa sociedade, por estes fatos serem amplamente
comprovados. Nossa preocupação é fomentar o debate, dar visibilidade e procurar desvelar
as causas que impedem os graduados em Serviço Social da UFF, e, quiçá, de outros cursos
de graduação em Serviço Social do Rio de Janeiro e do Brasil, de conhecer a realidade
subjetiva que permeia as relações desses profissionais com os usuários de seus serviços, em
sua maioria pretos e pardos, nas diversas instituições, públicas e privadas, onde exercem
seu ‘metier’.
O Serviço Social é uma profissão que tem características singulares. Ele não atua
sobre uma única necessidade humana (tal qual o dentista, o médico, o pedagogo ...)
nem tampouco se destina a todos os homens de uma sociedade, sem distinção de
renda ou classe. Sua especificidade está no fato de atuar sobre toda as necessidades
humanas de uma dada classe social, aquela formada pelos grupos subalternos,
pauperizados ou excluídos dos bens, serviço e riquezas dessa mesma sociedade.
(RIBEIRO, 2002, p.151).
Para a estudiosa isto torna patente, “a necessidade de inserção da população negra
sob o viés político, social e econômico, dentro de um projeto de desenvolvimento da
Nação” e a intervenção do Serviço Social na “elaboração de políticas públicas específicas
para este grupo é importante” (RIBEIRO, 2002, p.152). Mas para isso, saber o como, o para
quê e o porquê da exclusão é fundamental.
Neste propósito, no CAPÍTULO I – A QUESTÃO DO NEGRO NA SOCIEDADE
BRASILEIRA, discutiremos conceito “científico” de ‘raça’, utilizando como base da
discussão as novas pesquisas em genética molecar e da genética de população sobre o
20
‘homo brasilis’ (PENA, 2002), suas variáveis em relação ao saberes transmitidos para nossa
população e a sua implicação nos problemas que afetam negro na nossa sociedade
Estando o trabalho ostensivamente direcionado para os Assistentes Sociais, creio ser
essencial que conheçam: o que motivou a exclusão de fatos positivos sobre o negro da
nossa História? Qual a influência da forma como foi escrita a História do Brasil para nossa
questão de pesquisa? O que significa ‘ser negro’ no Brasil?
Para responder a estas indagações, realizaremos uma análise historiográfica da
trajetória do negro africano na História e na sociedade brasileira, buscando mostrar como
essa história foi construída e ideologicamente transplantada para o livro didático, para a
cabeça do professor, para a sala de aula e para uma visão de mundo, preponderante entre a
elite dominante daquela época, ainda presente hoje em parte da nossa população.
Para nós, se no currículo, nos conteúdos programáticos e nos livros didáticos, as
presenças quando as imagens e as representações negativas existentes nos textos,
transmitem a idéia “de desvalorização do negro do ponto de vista físico, intelectual e
cultural” (PINTO, 1987, p.19), as ausências ao não ressaltarem “a sua participação nos
acontecimentos históricos e sociais do País, os fatores históricos e políticos que
contribuíram para a sua situação atual e os movimentos de resistência que os negros vêm
desenvolvendo desde a escravidão até os dias atuais” (PINTO, op.cit.) intensificam os
estereótipos incorporados ao imaginário coletivo, levando-se em conta que os alunos, em
todos os níveis, aceitam e repassam o que lhes é dito em sala de aula.
Neste capítulo, também pretendo iniciar uma reflexão, a ser aprofundada no futuro,
acerca da importante participação das pregações jesuíticas, ocorridas durante os séculos
XVI-XVII, na deflagração de uma série comportamentos preconceituosos, atitudes
discriminadoras, símbolos depreciativos e de imagens estereotipadas dos negros ainda
presentes no inconsciente coletivo
8
da população brasileira.
Como historiador acredito que não devemos refletir sobre fatos fora do contexto
onde ocorreram. Assim, no CAPÍTULO II O SERVIÇO SOCIAL, buscaremos explicitar
as seguintes questões. Quais as origens do Serviço Social? Como essa profissão chegou ao
Brasil e quais os seus pressupostos? Que propostas teóricas-metodológicas caracterizavam
a formação dos Assistentes Sociais de ontem e quais orientam a formação dos profissionais
8
Não consciente, porque faz parte dos dados imutáveis da natureza; idéias recebidas, lugares comuns; códigos
de conveniências e de moral, conformismo e proibições, expressões admitidas, impostas ou excluídas dos
sentimentos, comum a toda sociedade em determinado momento. ARIÉS, Phillipe História das
Mentalidades. in, LEGOFF, Jacques – A História Nova. São Paulo: Martins Fontes, 1990. (154-175).
21
em Serviço Social da atualidade? Que mudanças são possíveis de serem focalizadas na
história do Serviço Social e quais as suas possíveis implicações na minha questão de
pesquisa?
Esses dois capítulos têm sua relevância no fato desta pesquisa dirigir-se a dois
públicos que, apesar de próximos se desconhecem. Os pesquisadores e o Movimento
Negro, com seu foco direcionado para as questões político-educacionais-econômicas, sem
avaliar a importância da incorporação do Serviço Social na luta pelo reconhecimento da
importância sócio-cultural dos negros e pela sua integração econômica na nossa sociedade,
e os profissionais em Serviço Social desconhecendo a questão do negro na sociedade
brasileira, quer as razões para a sua ocorrência quer a luta e as armas necessárias para o seu
combate.
O CAPÍTULO III O NEGRO E O SERVIÇO SOCIAL DA UFF, cerne da
pesquisa, se iniciará com um histórico da ESS-UFF. Posteriormente, realizaremos a
apresentação e a análise dos dados coletados nos Trabalhos de Conclusão de Curso (TCC);
nos questionários aplicados aos discentes do 9º período em Serviço Social; nos fluxogramas
das Universidades UFF; UFRJ; UERJ e PUC; nas Publicações e nas entrevistas com o
corpo docente da ESS-UFF.
No CAPITULO IV TEM ESPAÇO PARA A QUESTÃO DO NEGRO NO
CURSO DE GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL DA UFF? Realizaremos uma
discussão sobre o Currículo em geral e o de Serviço Social, procurando explicação para a
não inserção da temática racial na formação em Serviço Social e as conseqüências advindas
desse fato, quer para o/a Assistente Social quer para aqueles usuários que buscam o seu
atendimento.
Após essa discussão, apresentaremos os conteúdos que consideramos essenciais
para serem incluídos entre os conhecimentos com possibilidades de dotar os futuros
Assistentes Sociais, formados pela UFF, de autonomia sobre a questão que diz respeito ao
negro, que divide a nossa sociedade entre brancos no cume da pirâmide e negros na base.
Nas CONSIDERAÇÕES FINAIS faremos um levantamento das ações, dos
procedimentos metodológicos realizados e da conclusão que chegamos em relação a nossa
indagação sobre a apreensão de saberes acerca da questão do negro pelos profissionais em
Serviço Social.
22
Seja qual for a resposta encontrada, a desigualdade sócio-econômica é uma
realidade identificada num simples olhar mais aguçado, assim como também é identificável
a cor daqueles que se encontram do lado mais precarizado da sociedade. Esta realidade,
juntamente com as construções históricas, gera representações negativas sobre o outro que
necessitam serem abolidas da mente e da prática. Esta é uma das pretensões das
resignificações simbólicas de aspectos fisionômicos, sociais, culturais e religiosos de
origem africana e/ou negra brasileira que inserimos no final desta dissertação.
23
CAPITULO I
A QUESTÃO DO NEGRO NA SOCIEDADE BRASILEIRA
.Século VII em sua expansão para o Oeste, quando chegam até a Península
ibérica, os árabes muçulmanos iniciam o tráfico de africanos, escravizando e transportando
africanos do Norte, do Sudão e do Mahgreb, para o trabalho cativo no próprio Continente
e/ou nos reinos euro-asiáticos. (MEILLASSOUX, 1995; FAGE, 1995).
.Século XV em busca de um novo caminho de acesso para as áreas comerciais
asiáticas pelo Oceano Atlântico, os portugueses iniciam a exploração do Continente
Africano, capturando e transportando negros para o cativeiro na Europa. Tem início a maior
transmigração compulsória da história da Humanidade (BOXER, 1963/ 1967; SILVA,
2002).
.Séculos XVI/XIX para viabilizar a exploração econômica do Novo Mundo,
portugueses, espanhóis, ingleses, franceses, holandeses retiram cerca de 15 milhões de
habitantes da África subsaariana e os trafica para o trabalho escravo na cana de açúcar, nas
minas e/ou nas plantações de fumo e algodão no Continente Americano. Desses 15
milhões, cerca de 4.5 milhões ficaram no Brasil. (FLORENTINO, 1997; ALENCASTRO,
2000)
.Século XIX – baseados na idéia de “raça” desenvolvida por Lineu, Buffon e Batton
e na teoria da evolução das espécies de Charles Darwin, alguns “pregadores científicos”
europeus: Artur de Gobineau, Herbert Spencer, Lapouge, Edward Chamberlain, Louis
Agassiz, entre outros divulgam teorias racistas, pregando a superioridade racial, cultural,
intelectual, moral e religiosa dos povos europeus, com destaques para os arianos, sobre os
povos dos outros Continentes. Para eles os negros encontravam-se no último estágio, a
“barbárie”, do processo civilizatório. (SEYFERTH: 1985/1995; SCHWARCZ:
1993/1996/1998; SANTOS: 2002). Estes argumentos orientaram o processo neo-colonial
ou o imperialismo ocorrido na África a partir de 1880 (WESSELING: 1998).
.Século XX em 1994 nos EUA, foi lançado o livro “A Curva do Sino” (The Bell
Curve) onde os autores, Charles Murray e Richard Hernstein, em protesto contra as ações
afirmativas em benefício dos afro-americanos, pregavam a superioridade intelectual dos
24
brancos sobre os negros baseados no QI. Para eles os americanos brancos possuíam QI
entre 90120, enquanto os negros ficavam abaixo de 75, no nível de retardamento mental.
(CARONE, 2002).
Estes fatos históricos, pseudo-científicos e literários, num processo histórico de
longa duração, foram extremamente danosos para a cultura africana em geral e para
representação, a subjetividade e a identidade dos negros africanos e seus descendentes
brasileiros em particular, como destacamos na Introdução deste trabalho investigativo.
A partir daí, idéias e imagens estereotipadas do Continente Africano, de seus povos
e dos indivíduos que habitavam, foram inventadas e disseminadas em tal quantidade e
vigor que se tornaram verdades absolutas para os outros habitantes do Planeta. A
heterogeneidade natural dos seres humanos é transformada em símbolo da desigualdade
sócio-político-econômico e cultural, viabilizando o domínio e a exploração de uns, tidos
como superiores, sobre os outros considerados inferiores. A sociedade brasileira se integra
neste contexto.
A imagem do africano na nossa sociedade é a do selvagem acorrentado à miséria.
Imagem construída pela persistência das representações africanas como a terra dos
macacos, dos leões, dos homens nus e dos escravos. Quanto aos povos asiáticos e
europeus as platéias imaginam, castelos, guerreiros e contextos históricos, sociais e
culturais. (...) um bloqueio sistemático em pensar a África diferente das
caricaturas presentes no imaginário social brasileiro. (CUNHA Jr. 1997: 58).
Assim sendo, os negros brasileiros foram e são vitimados pelas idéias e teorias
européias disseminadas a partir do Período Colonial pelos Padres Jesuítas e defendidas
pelos “homens de Letras e de Ciência” do século XIX-XX: Euclides da Cunha, Nina
Rodrigues, Oswaldo Cruz, Silvio Romero, entre outros, (GOMES, 1996), sendo utilizadas e
re-elaboradas pelas elites Monárquicas e Republicanas e depois, transmitidas e
interiorizadas pelo povo através dos púlpitos das Igrejas (VIEIRA, 1998; VAINFAS, 1996;
MIRA, 1983), da Escola (SILVA, 2000; HANSEN, 2001; FONSECA, 2002; FAZZI, 2004),
dos Meios de Comunicação (ARAÚJO, 2000; CARRANÇA & BORGES, 2004), da
Literatura (BROOKSHAW, 1983; GOMES,1988), das Artes (MENDES,1983;
FLORES,1995) e da Legislação e Medicina (SCHWARCZ, 1993). Essa interiorização
deixa marcas invisíveis no imaginário, que vão interferir no processo de construção da
identidade do ser negro individual e coletivo, da representação social e da auto-estima da
população negra. A História escrita e ensinada nas salas de aula, quer no ensino básico quer
25
no superior, reforça estes pressupostos ao omitir a real idealização da História do Brasil e
os interesses que conduziram a essa omissão (WEHLING, 1994/1999; MATTOS, 2000).
Esses enfoques, baseados nos padrões prescritos pela teoria da evolução, inventada
pelos próprios europeus, originaram imagens ideologizadas das sociedades não-européias
ocidentais, sejam africanas, asiáticas ou sul-americanas, passíveis de conhecimento
através do olhar ocidental (SAID, 1990; APPIAH, 1997). Esses padrões atuam fortemente
nos olhares direcionados para aqueles seres humanos de epiderme negra em qualquer parte
do planeta. São olhares depreciativos, inquisidores, penalizados e/ou ameaçadores.
Dificilmente de naturalidade.
Se o saber gera o poder e este a dominação, a apreensão de saberes críticos gera a
reação para a libertação. Como nos transmitiu Paulo Freire,
fazer história é estar presente nela e não simplesmente nela estar representado.
Quanto mais conscientemente o povo faça a sua História, tanto mais o povo
perceberá com lucidez as dificuldades que tem que enfrentar no processo
permanente de libertação. (FREIRE, 1982, p.47)
Sendo assim, acredito ser importante para os Assistentes Sociais apreender como foi
composto o imaginário sobre o negro no Brasil \e as conseqüências que esse conhecimento
produz nas relações sócio-culturais-econômicas da nossa população, principalmente entre
os negros e os demais grupos sociais, podendo interferir inclusive em seu desempenho
profissional. É isto que almejamos com este capítulo.
1.0 - RACISMO: ORIGENS E DESENVOLVIMENTO .
Uma das alegações daqueles contrários as políticas de ação afirmativa em favor dos
negros é a inexistência do conceito de raça como determinador da proeminência de uns
seres humanos sobre os outros. Uma outra alegação para essa oposição é a alegada
dificuldade em apontar quem é ‘negro’ no Brasil. Além dessas duas posições contrárias
mais contemporâneas, uma outra, mais antiga, ainda faz parte dos argumentos utilizados
para desmerecer a adoção de políticas públicas que beneficiem a população negra
brasileira: a de que a questão que afeta o cotidiano e dificulta a inserção sócio-econômica
do negro na nossa sociedade é um problema de classe e de poder econômico e não racial
como apregoam aqueles defensores das políticas de ação afirmativa.
26
Neste texto encetaremos uma discussão acerca das teorias raciais e sua implicação
na representação do ‘ser negro no Brasil’, e a sua junção com o imaginário construído a
partir do discurso eclesiástico do período colonial.
1.1 – AS TEORIAS RACIAIS.
Somos seres simbólicos e assim sendo, temos tendência em classificar, comparar,
enumerar, distinguir todas as coisas conhecidas, inclusive os seres humanos. Idade, sexo,
religião, posição social, opção sexual, nacionalidade, cor de pele, entre outras
características, são utilizadas para diferenciar um indivíduo ou grupos do outro. Uma das
variáveis classificatória mais utilizada é a divisão dos seres humanos por RAÇA.
Do ponto de vista científico, o termo raça possui duas acepçõessicas. A
primeira refere-se a seu uso sociológico: designa um grupo humano ao qual se
atribui determinada origem e cujos membros possuem características mentais e
físicas comuns. (...) Na segunda acepção, de cunho biológico, a palavra raça
designa um grupo de indivíduos que têm uma parte importante de seus genes em
comum e que podem ser diferenciados dos membros de outros grupos a partir
desses genes. Entende-se raça, pois, como uma população que possui um estoque
ou patrimônio genético próprio. (BORGES, 2002: 44).
Assim como as definições conceituais, a classificação para diferenciar os seres é
uma atitude comum. Porém quando esta classificação passa a ser utilizada para
hierarquizar indivíduos ou grupos visando o domínio, a exploração e a opressão, tirando-
lhes a dignidade humana, dentro do pressuposto da superioridade de uns e a inferioridade
de outros, então se estabelece o racismo.
Relações conflituosas, buscando afirmações hegemônicas entre seres humanos ou
grupos sociais são registradas pela história desde os mais remotos tempos. No processo
evolutivo da humanidade, com o fim do nomadismo e a divisão das “famílias” comunitárias
em tribos ou grupos autônomos, estas relações conflituosas se acirram, seja por questões
religiosas, de espaço agrícola ou disputa do poder, porém não estavam orientadas por
pseudo-superioridade de uns sobre outros pela coloração epitelial ou racial. Os bárbaros”,
termo usado pelas civilizações grega e romana, na verdade refere-se ao outro diferente na
cultura e na civilidade, sem conotação fenotípica. Da mesma forma, no mundo cristão
medieval até a modernidade, “o termo bárbaro, acrescido de mais um sinônimo selvagem
27
era aplicado, num sentido étnico, aos o-cristãos e a todos que não viviam de acordo
com as normas sociais e culturais européias.” (SEYFERT, 2002 : 19).
A partir do século XVIII, alguns naturalistas: desenvolveram teorias que
classificaram os seres humanos baseadas na idéia de “raças” . Lineu dividiu a espécie
humana em quatro raças:
o homem europeu:, engenhoso, inventivo, branco, sanguíneo, governado pelas
leis; o homem americano: satisfeito com sua condição, gostando da liberdade,
pardo, irascível, governado pelos costumes; o homem asiático:avarento, amarelo,
melancólico, governado pela opinião e o homem africano: manhoso preguiçoso,
negligente, negro, governado pela vontade arbitrária de seus amos. (BORGES,
2002: 45). (negrito meu).
Claro que o europeu era o indicado para dominar as outras raças, por ser superior,
como bem apontam as qualidades descritas por Lineu e corroboradas por outros naturalistas
europeus. Da mesma forma, percebe-se que características até então sugestionadas para as
cores branca e preta, num sentido simbólico de representação opositiva do “bem” e do
“mal”, do “puro e do pecador”, do dia (luz) e da noite (escuridão) passa a caracterizar os
seres humanos.
No século XIX, a palavra raça começou a mudar de significado. De representante da
diversidade passa a determinar a desigualdade biológica, indicativa da superioridade
cultural, social, econômica de grupamentos humanos sobre outros. À classificação
continental utilizada por Lineu são acrescidas outras características fenotípicas: cor da pele,
tipo de cabelo, forma do nariz e dos lábios, formato do crânio e facial, como critérios
exteriores indicativos da desigualdade e fomentadoras de teorias geradoras e justificadoras
da exclusão, da exploração, da escravização de grupos humanos ditos inferiores, por outros
grupos considerados superiores.
O iluminismo, o evolucionismo, o positivismo, o determinismo geográfico e o
darwinismo social, teorias baseadas em princípios hoje comprovadamente falsos, somadas
as novas Ciências: frenologia, antropometria e eugenia, deram escopo para a naturalização
dessas idéias, originando o racismo (SANTOS, 2002; SEYFERTH, 1995; SCHWARCZ,
1993).
Para Tzvetan Todorov, o vocábulo racismo designa dois conceitos muito diferentes
em sua terminologia,
trata-se de um lado de um comportamento feito, o mais das vezes de ódio e
desprezo com respeito as pessoas com características físicas bem definidas e
diferentes das nossas; e por outro lado, de uma ideologia, de uma doutrina referente
as raças humanas. (TODOROV, 1993:107).
28
O primeiro caso, enquanto comportamento, ele chama de racismo, um
comportamento antigo e de extensão universal; o segundo termo, enquanto doutrina
ideológica, ele denomina racialismo que, para Antonio Sérgio Guimarães é “uma crença na
determinação biológica de qualidades morais, psicológicas e intelectuais, ao longo da
transmissão de caracteres fenótipicos que definem ‘raças’ “(GUIMARÃES, 2002:51).
Dentro desse ponto de vista, o Prof. Munanga (1995) subdivide o racismo em três
elementos: 1. enquanto ideologia uma doutrina, uma visão de mundo, uma filosofia da
história, e que às vezes se apresenta como uma teoria científica, mas que nada tem a ver
com a Ciência. Tem sim uma função importante: legitimar uma ação”. 2. enquanto
preconceito, “uma atitude, uma disposição afetiva imaginária, uma opinião, que pode ser
verbalizada ou não. Pode se transformar numa verdadeira crença comparável a uma crença
religiosa. pessoas que crêem mesmo que os negros são inferiores aos brancos.” 3.
Enquanto discriminação que é um comportamento coletivo observável ... até mensurável,
ligado a certos modos de interação social e que remete ás medidas de exclusão, suscetíveis
de serem abolidas ou modificadas”.
Ainda segundo Kabengele Munanga, “esses três elementos são interligados, porque
para discriminar alguém concretamente, tem que se ter preconceito e a ideologia racista
enquanto doutrina reforça e legitima as práticas discriminatórias” (MUNANGA, 1995). Ou
seja, imaginemos uma pessoa que possuía disposições preconceituosas, lendo um livro
ou assistindo um outro veículo de comunicação cultural considerados confiáveis e neles
encontrar elementos ditos científicos, afirmando a hierarquização das raças e que umas são
superiores (branca européia, ocidental) e outras inferiores (negra africana, amarela asiática
e ameríndia) e que essa herança genética tem relação com a inteligência, com a cultura,
com a moral individual ou grupal, dos seres humanos. Essas afirmações racialistas vão
legitimar os preconceitos e estereótipos já existentes, adquiridos no cotidiano familiar ou de
vizinhança, tornando esse indivíduo um racista convicto da legitimidade das desigualdades
raciais, e, por conseguinte, da aceitação de sua manifestação no social, econômico, cultural,
religioso, político e demais sistemas da sociedade.
Essa visão de mundo ideologizada,
9
gera as teorias raciais e o Brasil é inserido neste
contexto como um grande laboratório experimental (SCHWARCZ, 1993). Nas Faculdades
de Medicina e de Direito, os Homens de Sciência, (NINA RODRIGUES, SILVIO
9
- Ideologia no sentido marxista do termo, como mistificação de uma dada realidade.
29
ROMERO, EUCLIDES DA CUNHA, OLIVEIRA VIANA, entre outros) se esforçam para
demonstrar a inferioridade dos negros e os prejuízos que a mestiçagem trazia para o povo
brasileiro, “defendendo arduamente os argumentos biológicos, segundo os quais o destino
dos povos é determinado por sua raça.” (SANTOS, 2002: 47). É o parto a fórceps do
racismo à brasileira, representado pela tentativa de branqueamento físico e mental da
população.
O avanço dos estudos e experiências no campo da GENÉTICA, comprovam a
inexistência das raças como bio-determinante da superioridade/inferioridade dos seres
humanos, com base no principio de
“que a diversidade humana é tão grande que não se pode falar em raças. Ou seja, os
seres humanos pertencem todos à mesma e única raça; a Espécie humana.( ...) pelo
Projeto GENOMA foi constatado que, em média, a diferença entre um negro, um
branco e um asiático é de pouco mais de 0,01%. Isso significa que todos os seres
humanos são 99,99 % idênticos do ponto de vista biológico. São portanto falsas, as
pretensas correlações entre a cor da pele ou o formato do rosto e as capacidades
mentais ou qualidades morais de um indivíduo ou de um grupo humano. Tais
capacidades ou qualidades... têm origem cultural. São provocadas pela educação e
moldadas pela aprendizagem.”.( BORGES, 47). (grifo meu)
Da mesma forma uma pesquisa desenvolvida por FABRICIO DOS SANTOS e
SERGIO PENA, Retrato Molecular do Brasil’, publicada no periódico Ciência Hoje”
159/ Abril 2000, utilizando “conhecimentos de genética molecular, genética das
populações, filogenética, demografia e geografia histórica”, demonstra que o DNA do
brasileiro branco, embora possuindo cerca de 90%, do cromossomo Y (patrilinhagens) de
origem européia, basicamente portuguesa, na sua composição genética, possui 60% de
matrilinhagens ameríndias e africanas, comprovados através do DNA mitocondrial (PENA,
2002, p.25), desmitificando a decantada brancura brasileira.
Justificando historicamente esta composição genética, Sergio Pena argumenta que:
Os primeiros imigrantes portugueses não trouxeram suas mulheres, e registros
históricos indicam que iniciaram rapidamente um processo de miscigenação com
mulheres indígenas;. Com a vinda dos escravos, a partir da segunda metade do
século 16, o processo de miscigenação se estendeu às africanas.(PENA, 2002,
p.27).
Para confirmação ele cita a carta de Padre Manuel da Nóbrega solicitando ao Rei de
Portugal, o envio de mulheres brancas para a Colônia e também o Alvará de Lei emitido
pelo Marquês de Pombal, em 1755, estimulando casamentos entre portugueses e índias, o
que já é um indício de discriminação em relação às mulheres negras.
30
No século XIX, com a Independência e com o fim da escravidão, o Brasil se
transforma num verdadeiro ponto de encontro étnico-cultural:
O Brasil recebeu enormes levas de imigrantes, destacando-se portugueses e
italianos, seguidos de espanhóis, alemães, japoneses e sírio-libaneses. Embora
muitos imigrantes tenham vindo com suas famílias, havia um excesso significativo
de homens. Como eram, em geral, pobres, casavam-se com mulheres pobres, o que
no Brasil significava mulheres de pele escura (por causa da correlação entre cor da
pele e classe social) (PENA, 2002, p.27).
Sem dominar ainda esse tipo de conhecimento, ocorre no mundo do século XIX o
que a Profªlia SCHWARCZ (1993) chama de naturalização da desigualdade ou seja,
os homens que sempre se souberam diferentes porém pertencentes a uma mesma raça, a
HUMANA, agora criam uma ciência determinista, o darwinismo social, estabelecendo
teorias que transformam essa diferença em desigualdade, até em perda da humanidade.
Baseados nos princípios da evolução da espécie e da seleção natural, os darwinistas
acreditavam na formação de uma raça pura, mais forte e sábia, a branca, que eliminaria as
raças mais fracas e menos sábias. Hitler e o nazismo são as comprovações do quanto essas
crenças podem atingir e dos danos que podem causar.
Ainda agora no Brasil do século XXI, por desconhecimento das origens destas e de
outras teorias, produto da ausência da temática racial no processo ensino-aprendizagem nos
diversos níveis do sistema de ensino brasileiro, a população permanece aceitando como um
processo natural à teoria de que a diferença de epiderme implica desigualdade sócio-
econômica-cultural-intectual e mental e que essa diferença epitelial determina a noção de
inferioridade/superioridade, naturalizando também os conceitos históricos de dominação,
exploração, opressão de um indivíduo/uma classe e/ou um povo/uma Nação sobre a outra.
No caso do branco sobre o negro.
Não se nasce racista. O indivíduo torna-se racista, preconceituoso, discriminador
porque recebe isso através do processo de socialização. O meio social com o qual ele
convive é quem determina a aceitação ou não das diferenças e características naturais de
cada indivíduo, seja pela essência humana ou pela aparência exterior.
Para o senso comum o racismo enquanto preconceito é uma conseqüência da
ignorância, da falta de conhecimento. Embora, para o Prof. Kabengele Munanga (2005), o
racismo seja uma ideologia e não se corrige ideologia através da Educação, eu acredito que
a apreensão de conhecimentos que demonstrem a factualidade das idéias racialistas, além
de potencializar a reação contra as práticas racistas, são passíveis de modificar
31
comportamentos e formas de “ver o mundo” (PAULO FREIRE), desmistificando a
realidade ilusória contida na concepção ideológica destas idéias. Idéias que, com outra
roupagem, foram colocadas no imaginário do povo brasileiro bem antes do século XIX. É o
que apresento a seguir.
1.2 O DISCURSO JESUÍTICO NA CONSTRUÇÃO DO IMAGINÁRIO
NEGATIVO SOBRE O NEGRO NO BRASIL.
Antes do discurso histórico, presente nos livros literários e didáticos, e das teorias
raciais, um outro discurso tão influente quanto o escolar, dos meios de comunicação e do
científico, atuou de uma forma violentamente eficiente na formação do imaginário negativo
sobre o negro: o pronunciado nos púlpitos eclesiásticos pelos Padres da Companhia de
Jesus, os Jesuítas.
A Companhia de Jesus foi fundada no século XVI, por Ignácio Lopes de Recalde,
nascido em 1534 na cidade de Loyola, no contexto da Contra-Reforma Católica, com o
propósito de impedir a proliferação do Protestantismo. Os Jesuítas representavam o modelo
do novo Clero ansiado pela Igreja Católica, orientado pelo Concílio de Trento, para a
recomposição, renovação e crescimento do seu rebanho (LUIZETO, 1989).
Desta forma, o Brasil Colônia, com seus exóticos habitantes com as vergonhas de
fora’ (CAMINHA, 1999), foi eleito como um dos melhores laboratórios (SCHWARCZ,
1993) para a execução das teses e práticas eclesiásticas dos Jesuítas, pois os índios parece-
me gente de tal inocência que, se homem os entendesse e eles a nós, seriam logo cristãos,
porque eles, segundo parece, não têm, nem entendem nenhuma crença” (CAMINHA, 1999).
O projeto do império marítimo português
10
além de encontrar o caminho para as
Índias e da conquista de novos territórios, tinha também como um dos seus objetivos a
conquista de almas pagãs para serem incorporadas ao patrimônio da Igreja Católica,
expandindo a Doutrina
11
e fazendo frente ao crescimento do Protestantismo, que avançava
avassaladoramente pela Europa Ocidental. Como diz Gilberto Freire (1981, p.196) na falta
10
Os portugueses chegaram a dominar territórios nos 4 continentes:Europa (Portugal); África (Angola,
Moçambique e Cabo Verde/Príncipe); Ásia (Goa, Timor Leste); América (Brasil). (ver BOXER, 1977)
11
Também participavam do projeto português outras Ordens Religiosas como os Franciscanos, os
Beneditinos, os Carmelitas. Porém no Brasil a presença Jesuítica foi hegemônica até o século XVIII (1759),
quando foram expulsos pelas artimanhas do Marquês de Pombal.
32
de sentimento ou da consciência da superioridade da raça, tão saliente nos colonizadores
ingleses, o colonizador do Brasil apoiou-se no critério da pureza da Fé.”
Inicialmente a preocupação dos Jesuítas era com a conversão e proteção dos
silvícolas e com a adequação dos costumes dos colonos europeus às regras civilizatórias da
Cristandade. Posteriormente, com a implantação do sistema escravista africano e com o
desenvolvimento do projeto agrícola açucareiro exportador, o negro africano é incluído no
discurso evangelizador da Companhia de Jesus no Novo Mundo.
Para o historiador Ronaldo Vainfás (1996), os Jesuítas passaram a se preocupar com
a escravidão africana a partir do século XVII, pós-República de Palmares. Até então,
paradoxalmente, enquanto a escravidão negra africana era aceita - várias instituições
cristãs, católicas e/ou protestantes (BARBOSA, 2002) e os próprios religiosos possuíam
escravos - o cativeiro nativo era combatido com denodo. Assim, não se pregava a libertação
do cativeiro para os negros mas o conformismo e a esperança de uma vida melhor após a
morte. É neste contexto que o discurso jesuíta vai atuar e as idéias emitidas por eles
trezentos anos repercutem até os dias de atuais.
Uma das afirmações mais danosas para o imaginário contra o negro, foi sem dúvida
a condenação divina dos negros a escravidão. É a Maldição de Cam, episódio citado no
Antigo Testamento (Gênesis 9: 18-27), que relata um incidente ocorrido entre Noé e seus
filhos Cam (Canaã) Sem e Jaffé. Segundo a Bíblia, Noé excedeu-se no vinho e dormiu
despido. Cam vendo-o naquele estado, chamou os irmãos para também observa-lo. Sem e
Jaffé porém, munidos de um lençol foram de costas e cobriram a nudez do pai. Noé ao
acordar e saber do ocorrido, ficou encolerizado, expulsou Cam de casa e o condenou, junto
com seus descendentes e com a intercessão de Jeová, a escravidão eterna:
Maldito seja Canaã! Que ele seja, para seus irmãos, o último dos escravos. Bendito
seja Iahweh, o Deus de Sem e que Canaã seja seu escravo! Que Deus dilate a Jaffé,
que ele habite nas tendas de Sem e que Canaã seja seu escravo!. (BOSI, 1992:,
p.57)
Alguns membros da Igreja inferiram e proliferaram a teoria de que os negros
africanos eram descendentes de Cam/Canaã, podendo assim serem escravizados: “...camitas
seriam ao povos escuros da Etiópia, Arábia do Sul, da Núbia, de Trípoli, da Somália ...
(BOSI: 1992, p.257).
33
Para VAINFÁS (1996) o autor da divulgação dessa idéia no Brasil foi o Padre
Jesuíta Jorge Benci, que andou por aqui no século XVII e é autor do livro Economia
Cristã dos Senhores no Governo dos Escravos” , onde afirma que,
os escravos deviam andar todos despidos, visto que a servidão e o cativeiro tiveram
sua origem no ludibrio que fez Cam da nudez de Noé ... e em castigo deste
abominável atrevimento foi amaldiçoada toda a sua descendência, que no sentir de
muito é a mesma geração dos pretos que nos servem, e aprovando Deus esta
maldição, foi condenada a escravidão e ao cativeiro.... (apud, VAINFAS, 1986:,
p.95) – grifo meu.
O outro pregador católico com bastante destaque e divulgador de teorias que vão
balizar vários comportamentos preconceituosos contra o negro nos dias de hoje, foi o Padre
Antonio Vieira. Considerado um dos maiores pregadores católicos dos séculos XVI-XVII, ele
utilizou a sua verve oratória com o intuito de apascentar os negros escravos. Diante disso, o
tema principal dos Sermões, XIV/ XVI/ XX /XXVII, é a escravidão negra.
O Sermão XIV de 1633, ele prega no dia de São João Evangelista para uma
irmandade de pretos de um engenho na Bahia. Nessa pregação, após analisar o fato de Maria
haver parido Jesus e manter-se virgem, ele passa a comentar sobre os outros partos atribuídos
a Ela: o parto propriamente dito, na manjedoura; um outro, aos pés da cruz, quando adota
João representando a humanidade e um terceiro, quando ela “dá a luz” aos pretos, os filhos
do Coré ou do calvário (da dor):
... de maneira que vós, os pretos, que tão humilde figura fazeis no mundo e na
estimação dos homens, por vosso próprio nome e por vossa própria nação, estais
escritos e matriculados nos livros de Deus e nas Escrituras Sagradas, e não com
menos título nem com menos foro que de filhos da Mãe do mesmo Deus. (VIEIRA,
1998: 134).. (grifo meu)
Apesar da Sagrada Escritura, base dos sermões proferidos por Antonio Vieira, afirmar
que, pela Criação, todos são semelhantes e iguais perante Deus, o Padre pregador
desqualifica os negros africanos retirando deles essa condição ao vinculá-la ao seu local de
origem, a cor da sua pele e com a sua profissão de Fé, ou seja, nascer na África, ser negro e
não aceitar o catolicismo, implica em ser inferior aos demais seres humanos.
Buscando minorar esta implicação, o Jesuíta tenta convencer os escravos que a saída
da África e a aceitação do cativeiro são as chaves para a sua salvação:
Oh! Se a gente preta, tirada das brenhas de sua Etiópia e passada ao Brasil,
conhecera bem quanto deve a Deus e a sua Santíssima Mãe por este que pode
parecer desterro, cativeiro e desgraça, e que não é senão milagre, e grande milagre.
(VIEIRA, 1998, p.18).
34
e então, como forma de intensificação desse ‘presente do céu’, numa imagem metafórica de
extrema criatividade e maldade, ele busca justificar o cativeiro dos negros africanos,
comparando o trabalho nos engenhos de açúcar ao Sacrifício de Cristo no Calvário:
Não há trabalho nem gênero de vida no mundo mais parecido com a cruz e Paixão de
Cristo que o vosso em um desses engenhos. Em um engenho sois imitadores de
Cristo crucificado, porque padeceis em um modo muito semelhante ao que o mesmo
Senhor padeceu na cruz e em toda a sua paixão. Também ali não faltaram as canas,
porque duas vezes elas entraram na Paixão: uma vez servindo para o cetro de
escárnio e outra vez para a esponja em que lhe deram fel. A Paixão de Cristo parte foi
de noite sem dormir, parte foi de dia sem descansar e tais são as vossas noites e dias.
Cristo despido e vós despidos. Cristo em tudo maltratado e vós maltratados em tudo.
Os ferros, as prisões, os açoites, as chagas, os nomes afrontosos, de tudo isto se
compõe a vossa imitação, que se for acompanhada de paciência também terá
merecimento de martírio. (VIEIRA, 1998, p.318)
No Sermão XX, pronunciado na Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Pretos,
o padre Antonio Vieira busca contemporizar a misericórdia divina em relação a condição de
seus ouvintes, chamando a atenção para o fato da própria Mãe de Jesus, ao ser anunciada
pelo Anjo da escolha bendita, aceitou e declarando ‘escrava’: “eis aqui a escrava do
Senhor...”. Em seguida, torna sublime a condição do ‘ser escravo’ ao dizer que Jesus também
passou por essa condição:
... na traição de Judas, vendido como escravo por vilíssimo preço; na remissão a
Caifás, manietado como escravo; no Pretório, açoitado como escravo ... ; no
Calvário, como escravo despido e, finalmente, como escravo pregado na cruz e morto
em uma cruz, que era suplício próprio de escravo. Bem-aventurados aqueles escravos
a quem o senhor no fim da vida achar que foram vigilantes em fazer a sua obrigação.
(VIEIRA, 1998, p.323).
Após demonstrar para os escravos as ‘virtudes’ do ‘ser/estar escravo’, ele inicia um
discurso sobre as virtudes do ‘ser preto’:
... ninguém haverá que o reconheça e venere na cor preta duas prerrogativas
notáveis. A primeira, que ela encobre melhor os defeitos, os quais as brancas
manifesta e o faz mais feios; a segunda, que ela não se deixa tingir de outra cor,
admitindo a branca a variedade de todas. (VIEIRA, 1998, p.223)
Então o Jesuíta associa a cor preta dos escravos à Maldição de Cam ao pregar que,
“por espaço de dois mil anos foram da mesma cor todos os homens, até que habitando a
Etiópia, os descendentes do segundo filho de Noé, começaram muito deles a serem pretos
(VIEIRA, 1998: 324). A partir desse momento perderam o céu, ganhando a escravidão.
No Sermão XXVII, o grande orador católico aborda a diáspora africana e a compara a
transmigração israelense para a Babilônia e assim como o povo de Israel conseguiu liberdade
e encontrou Jeová, da mesma forma para os negros “é particular a providência de Deus que
35
vivais de presente escravos e cativos, para que por meio do mesmo cativeiro temporal
consigais muito facilmente a liberdade eterna” (VIEIRA, op. cit, p.56). Neste Sermão ele
prega também a obediência dos escravos aos senhores, donos de seus corpos, pois assim
procedendo estariam obedecendo a Deus, senhor de suas almas.
Em nenhum momento o Pe. Antonio Vieira proclama a favor do fim do cativeiro, que
constitui a realidade objetiva dos escravos (BERGER e LUCKMAN, 2002). A intenção era
realmente de desenvolver no negro escravo a passividade, a submissão e a aceitação do
cativeiro como algo ‘natural’ e com o qual ele deveria conviver com a resignação, visto que,
em última estância, a culpa era da sua hereditariedade camita. Ocorre o que BERGER e
LUCKMAN, 2002) chamam de alternação. Ou seja,
sendo relativamente mais fácil inventar coisas que nunca aconteceram do que
esquecer aquelas que realmente aconteceram, o indivíduo pode fabricar
acontecimentos e inseri-los nos lugares adequados, sempre que forem necessários
para harmonizar o passado lembrado com o passado reinterpretado.
(BERGER/LUCKMAN, 2002, p.212).
São sabidas a força simbólica e a credibilidade que possuem as palavras pronunciadas
por uma pessoa ocupando um púlpito, um quadro de giz, uma tribuna ou as páginas de um
veículo de comunicação. Assim sendo, quando os Padres Jesuítas utilizam-se do púlpito para
pregar contra o negro, numa época em que a religiosidade era latente e onde o temor do
pecado, o pavor do inferno e a busca da salvação no céu eram epidêmicos, todos os
estereótipos contra o negro veiculados pelos outros segmentos da sociedade são reforçados e
tomam fundo de verdade. Conseqüentemente, além da amplitude, eles adquirem uma
aceitação no senso comum que perpassa o momento em que ocorreram, caracterizando o
poder simbólico das palavras na criação das desigualdades e preconceitos.
Assim, a relação negro=escravo< >escravo=negro é naturalizada pela população e
admitida até hoje em conjunto com a culpabilização do negro pela sua condição de escravo.
Da mesma forma a alegada incapacidade biológica de ação e reação do negro se reflete
atualmente na inserção deste no mercado de trabalho e na aceitação de sua ausência no
quadro das profissões de maior reconhecimento social que possibilita o poder de mandar.
Além disso, o episódio da Maldição de Cam foi o inspirador de um quadro pintado
pelo pintor Modesto Broccos e Gómez, em 1895, denominado “A Redenção de Cam”
(fig.1) e que foi levado por João Batista de Lacerda para o Congresso Universal de
Raças, realizado em 1911 em Londres, representando a modificação epitelial que iria
ocorrer na população brasileira. O quadro, onde aparece uma idosa negra num gesto de
agradecimento aos céus pelo fato de seu neto, fruto da miscigenação entre sua filha mulata
36
e um branco português, haver nascido branco, possui a seguinte legenda: Le négre
passant au blanc, a la troisieme generation, par l’efect du croisemente dês
races”(SEYFERTH, 1985). Para o negro, tornar-se branco seria a solução para os seus
problemas. Este quadro é a representação visual e simbólica da teoria do branqueamento e
do que é ser negro na nossa sociedade.
1.3 - O ‘SER NEGRO’ NA SOCIEDADE BRASILEIRA
Mesmo depois de abolida a escravidão/ Negra é a mão de quem faz a limpeza/
Lavando a roupa encardida, esfregando o chão/ Negra é a mão, é a mão da pureza/
Negra é a vida consumida ao do fogão/ Negra é a mão nos preparando a mesa/
Limpando as manchas do mundo com água e sabão/ Negra é a mão de imaculada
nobreza. (A Mão da Limpeza - Gilberto Gil)
Todo brasileiro tem conhecimento que durante três séculos (XVI-XIX) oficialmente
o Brasil era uma Nação escravocrata e que o tráfico negreiro africano era o principal
sustentáculo da economia colonial. É assim que o negro se insere na sociedade brasileira:
através da diáspora africana, quando milhões de africanos foram transladados
compulsoriamente para o trabalho cativo nos canaviais, algodoais, nas minas, nas casas
grandes e nas mais diversas atividades em todo Continente Americano, sendo que o maior
número deles concentrou-se no Brasil.
12
Durante séculos, falar em escravidão no Brasil era falar do negro africano. O negro
Bantu, Malê/Sudanês, Mandinga, Sonrai, Haussá, Peul, Moçambique, Angola, Mina,
Ashanti, entre outras etnias africanas, ao chegar,
era uma mercadoria, objeto das mais variadas formas de transações mercantis;
venda, compra, empréstimo, doação, transmissão por herança, penhor, empenho,
seqüestro, embargo, arremate, Era uma propriedade. (FLORENTINO, 1997, p.31).
Esta condição relacional negro=escravo >< escravo=negro ficou indelevelmente
marcada na nossa história - tanto que os indígenas escravizados eram denominados “negros
da terra” (MONTEIRO, 1974) - e transformou tráfico e o trabalho compulsório de seres
humanos num fenômeno natural em lugar de histórico no imaginário coletivo. Essa
naturalização, reforçada pelas formas citadas acima, gerou atitudes preconceituosas e
12
Os números exatos sobre os negros trazidos para o Brasil são muitos controversos e podem ser encontrados
em: RODRIGUES, 1977; MATOSO, 1982; FLORENTINO, 1997; FLORENTINO e GÓES, 1997;
GORENDER, 1988; ALENCASTRO, 2000; KARASCH, 2000; COSTA E SILVA, 2003, entre outros.
37
práticas discriminadoras contra o negro africano e posteriormente contra os seus
descendentes pretos e pardos brasileiros, e ainda hoje se encontram presentes na
imaginação e nas práticas de boa parte da sociedade. ‘O negro nasceu para ser escravo’ é
uma expressão ainda utilizada sempre que alguém discute com uma pessoa negra, por
variados motivos, especialmente em relação ao trabalho ou posição social.
É comum os meios de comunicação e de informação associar o “jeito de ser” do
brasileiro, principalmente no sentido positivo, à herança dos imigrantes europeus (italianos,
alemães, ibéricos...), usurpando as heranças bem mais aparentes oriundas da África, que
fica do outro lado da rua, mais nos parece mais distante que o pólos (PANTOJA, 2004). A
presença africana nas nossas manifestações sócio-culturais não ocorre unicamente nas
manifestações esportivas e/ou de entretenimento, mas em todas as instâncias: na linguagem
falada, escrita e gestual; no vestuário; nas artes; na mentalidade; na filosofia de vida; nos
sentimentos; na religiosidade; nas relações pessoais e familiares. Não é reconhecida, mas é
vivida, sentida e transmitida, principalmente pelas camadas populares, numa forma de
resistência ao esmagamento sócio-cultural-histórico a que foram relegadas todas as
heranças africanas apropriadas pelos brasileiros.
Porque e como isto aconteceu?
Em 1838 é criado o Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) com a
missão de escrever a nossa História e potencializar a criação da Nação Brasileira. Em
ambas criações, uma coisa fica explicitada: a historia que irá definir a Nação Brasileira,
enquanto representante da idéia de civilização
13
, vai definir também aqueles que ficarão
excluídos deste projeto por não serem portadores da noção de ‘civilização’: os índios e os
negros.
O conceito de nação operado é eminentemente restrito aos brancos sem ter ,
portanto, a abrangência que o conceito se propunha no espaço europeu. Construída
sob o ponto de vista dos letrados, a nação brasileira traz consigo forte marca
excludente, carregada de imagens depreciativas do ‘outro’ e cujo poder de
reprodução e ação extrapola o momento histórico preciso de sua construção.
(GUIMARÃES, 1988, p.6). (grifo meu).
Bem, concordando com Stuart Hall (1997) que o sentido de nação ou cultura
nacional atualmente constrói identidades, deixando ela de ser “apenas uma entidade
política, mas também e sobretudo, uma entidade simbólica que produz sentidos profundos
13
Devemos ressaltar o fato do Brasil formar o único Império do Continente Americano, estando assim
ombreado com as Cortes européias, que representavam a idéia de civilização, diferenciando-se das ‘repúblicas
que nos ladeava.
38
de pertencimento, (MEYER, 2001, p. 373), ao negar-se visibilidade ao negro na História,
excluindo-o ou silenciando sobre a sua ativa participação na construção desse ideário
nacional, ou ainda, depreciando a sua figura como indivíduo e como grupo social, retira-se
a sua percepção de pertencimento a uma determinada cultura nacional, a qual nos lega
representatividade. Ao negro coube uma representação negativa. Como ocorreu?
Enquanto a escravidão era parte integrante do sistema econômico-social-cultural e
ideológico brasileiro, o fato de ser/estar escravo, por si só, implicava na inferioridade da
raça negra, assim como do cativo, como indivíduo e ser humano. O negro tinha o seu lugar
e não era uma ameaça para a coletividade embranquecida”. A partir da Abolição e com a
Proclamação da República, o negro inicia a luta para a sua identificação, representação
social e inserção na nova sociedade.
A 13 de maio de 1888 ele deixa de ser oficialmente escravo e a 15 de novembro de
1889, ele assume a condição de cidadão como os demais membros da sociedade. E agora?
Como encarar o fato de que aquele ontem inferior de direito, hoje seja um igual, um
competidor de direito e de fato? Formula-se então uma maneira de manter a desigualdade.
Se a violência física institucionalizada não pode ser adotada, utiliza-se a linguagem, a
mentalidade, o imaginário e a ideologia para criar palavras e imagens estereotipadas,
formas endemoniadas e teorias pseudocientíficas que desprestigiem esses que querem ser
considerados iguais, perpetuando e reforçando a situação anterior. Neste contexto a
desumanização naturalizada sofrida pelo negro escravo é transformada em
desqualificação, incapacidade, inferioridade, marginalidade ideologizada do negro
cidadão.
Isto é concebido apropriando-se de biologização da idéia de raça desenvolvida na
Europa e que classificava os seres humanos em três raças hierárquicas: branca, amarela e
negra associada à noção da superioridade ariana desenvolvida por Artur de Gobineau
que defendia a impossibilidade de um povo mestiço ou com uma maioria populacional
negróide atingir a civilização e o progresso (RAEDERS, 1988) e com o apoio das teorias
deterministas, positivistas e evolucionistas que influenciavam o pensamento dos
intelectuais do século XIX. Esta junção ideológica auxiliou na divulgação de idéias e
teorias sobre o atraso cultural e histórico (pela selvageria natural da raça negra) e da
deficiência mental (pela anatomia craniana) dos povos africanos (SCHWARCZ, 1993;
SANTOS, 2002).
39
Após três séculos de cativeiro, raiou a liberdade para o negro escravo. Porém, como
cantaram seus descendentes mangueirenses, estavam livres do açoite da senzala, mas
presos na miséria da favela” (GRES Mangueira, 1988). Na verdade, a liberdade virou
prisão, pois, ao assinar a Lei 3353 de 13 de maio de 1888, declarando extinta a
escravidão no Brasil, o Governo Imperial não a faz acompanhar-se de medidas que
facultasse realmente a inclusão sócio-econômica e política do ex-escravo. Analfabeto em
sua maioria, sem uma profissão reconhecida, sofrendo discriminações e preconceitos pela
sua antiga condição e, principalmente, sem terra para possibilitar a sua subsistência e
dignidade, os negros vão para os centros urbanos serem perseguidos e vitimizados
cotidianamente em sua relação com aqueles que, de várias formas e durante várias
gerações, se beneficiaram, se beneficiam e se beneficiarão da sua força de trabalho.
Isto e outras verdades da nossa História são silenciadas pela História idealizada pelo
IHGB
14
e que encontrou no Colégio Pedro II e em seus catedráticos (GASPARELLO,
2004; MATTOS, 2001) os dinamizadores dessas premissas, logo assimiladas pelos
intelectuais em suas obras literárias, e pelos autores dos livros didáticos, sendo ainda hoje,
transmitida pelos professores e apreendida pelos alunos nas salas de aulas do ensino básico
até o universitário.
Alguns estudiosos dos problemas da sociedade brasileira Jacques Lambert, Roger
Bastide, Roberto daMata, Hélio Santos,
15
entre outros relataram a existência de dois
brasis, a Belíndia - uma Bélgica rica com uma Índia extremamente pobre - separados sócio-
econômica e culturalmente pela enorme diferença de renda que sempre caracterizou a
sociedade brasileira desde a Colônia. De um lado a superabundância e do outro a absoluta
escassez de tudo. Porém dos quatro estudiosos citados, apenas um, SANTOS (2002)
associa essa construção sócio-econômica com a diferença epitelial. Do lado dos que tem
tudo a maioria da população é ‘branca’, enquanto do lado daqueles que nada tem, o
predomínio absoluto é de negros e pardos. Como diz o citado estudioso;
o abismo não é somente social e não separa apenas ricos de pobres. É também, e
fundamentalmente, um fosso que isola negros e brancos. (...) Uma doméstica que
viva em Guaianases (SP) ou Bangu (RJ) ao vir trabalhar na zona sul de uma dessas
14
Fruto de um concurso que premiava aquele que melhor dissertasse sobre como deveria ser escrita a nossa
História. O vencedor foi o naturalista austríaco Karl Friedrich P. von Martius com a dissertação ‘Como se
Deve Escrever a História do Brasil’ (Revista Trimestral do IHGB, 24, jan.1845). Ver também MARTIUS,
1982.
15
LAMBERT, Jacques Os Dois Brasis. São Paulo: Ed. Nacional, col. Brasiliana 335, 1971; BASTIDE,
Roger Brasil, Terra de Contrastes. São Paulo: Difel, 1976; DAMATTA, Roberto - O Que Faz o Brasil,
Brasil? Rio de Janeiro: Rocco, 1994: DAMATTA, Roberto Carnavais, Malandros e Heróis. Rio de Janeiro:
Zahar, 1978; SANTOS, Hélio – Em Busca de um Caminho para o Brasil. São Paulo: Senac, 2001.
40
cidades, utilizará um transporte precário. Cachorros de madame e cavalos de
corrida com certeza, viajam melhor. Ao chegar, usará o elevador de serviço para ir
até o andar onde trabalha (seus patrões utilizam outro elevador chamado social).
Adentrará ao local onde ganha seu pão pela porta de serviço. Se pernoitar no
trabalho, permanecerá apartada num cubículo apelidado de quarto de empregada.
uma certa incomunicabilidade entre esses dois brasis e a nossa doméstica
transita de um Brasil para o outro sem contaminar o primeiro. (SANTOS, 2002).
Devo ressaltar algo que o autor não citou no texto: a empregada em 90% dos casos
é negra ou parda e sua patroa em 99% é branca. Essa é a síntese da pobreza, da
desigualdade social e da exclusão sócioracial existente no Brasil. A pobreza brasileira tem
cor: é negra. Como comenta TELLES (2003. p. 17) - “a exclusão dos negros passou a ser
considerada como uma característica da sociedade brasileira, uma vez que os pobres são,
em percentuais desproporcionalmente altos, majoritariamente negros”. (grifo meu)
Uma pesquisa para o Doutorado “Os Novos Contornos da Pobreza Urbana: Espaços
Sociais Periféricos na Região Metropolitana do Rio de Janeiro”, realizada por BRANDÃO
(2002) em dois bairros de dois municípios da região metropolitana do Rio de Janeiro
16
,
torna patente a existência dessa realidade mesmo em áreas de situações extremas de
pobreza coletiva, desmontando a teoria que afirma ser esta desigualdade uma questão de
classe ou poder econômico e não de raça. Segundo o Prof. André Brandão,
... mesmo entre grupos populacionais que habitam áreas extremamente pobres e
degradadas que compõem a malha metropolitana, é possível identificar diferenças
que refletem uma situação pior para os negros (...) os dados que coletamos nos
dizem que mesmo entre os segmentos populacionais homogeneamente pobres,
onde brancos e negros dividem as mesmas ruas sem calçamento e com esgoto a céu
aberto, na mesma e degradada periferia, os mecanismos de desigualdade racial
operam mantendo os índices de escolaridade e ocupação dos pobres negros em
patamares piores do que os dos pobres brancos.(...) Se tomarmos a área que possui
o maior número de ruas urbanizadas, veremos que os chefes e cônjuges brancos
são 46,94% e os chefes e cônjuges afrodescendentes são 51,02%. na área que
tem a pior caracterização urbanística dentre as outras, os chefes e cônjuges brancos
são somente 28,44%, enquanto os chefes e cônjuges afrodescendentes chegam ao
enorme montante de 68,81%. (BRANDÃO, 2002, p. 6/7).
Para este estudioso da questão do negro, a materialidade empírica é quem faz o
imaginário “você pode colocar 100 auto-falantes gritando que o negro na é inferior
intelectualmente ao branco, mas enquanto negros forem vistos carregando caixotes, a
sensação de inferioridade irá permanecer” (ESE-UFF, 14/06/2003)
Vem daí a necessidade de se criar formas de modificar este “status quo” secular.
Facultar a inserção sócio-político-econômico e cultural desse imenso contingente humano,
16
Os bairros foram Jardim Catarina em São Gonçalo, considerado o maior loteamento em área contínua do
Brasil, e o bairro Gebara em Itaboraí. Esses municípios localizam-se no entorno da Baia de Guanabara e
distam cerca de 20/40 Km, respectivamente,do Município do Rio de Janeiro.
41
46% da população segundo o IBGE, tornou-se uma medida legal e moralmente necessária e
indispensável para unir as duas partes historicamente separadas. Eis a razão maior para a
formulação e implementação das Políticas de Ação Afirmativa (SISS, 2003; SANTOS e
LOBATO (orgs), 2003; GOMES, 2001; SILVA E SILVÉRIO (orgs), 2003).
Urge mostrar para a população a discrepância entre um discurso que realça a
participação de três etnias na formação de uma Nação, mas que ao mesmo tempo
marginaliza, exclui, emudece duas delas e defende a hegemonia para a outra através do
silencio, da eugenia ou da exclusão. E, como foi colocado anteriormente, é essencial que
aqueles em cujo cotidiano o ‘tête-à-tête’ com os grupos sociais é mais intenso e que.ainda
mantém o poder de modificar comportamentos, adquiram autonomia sobre este assunto. É
o caso dos Educadores e, no contexto desse trabalho, os Assistentes Sociais.
Daí nosso interesse em averiguar se a questão racial faz parte da formação
acadêmica cultural e profissional dos graduandos em Serviço Social da UFF.
42
CAPÍTULO II
O SERVIÇO SOCIAL
Assistente Social: sou escrava do dever! Praticando o ideal/ De aos meus
semelhantes socorrer. Onde quer que eu encontre um problema, estarei para as
causas sentir/ Hei de dar toda a minha atenção/ Pois minha missão é somente
servir! Meu trabalho tem que ser consciente e cordial!/ Farei tudo, hei de vencer,
com muito carinho, sem igual. (Hino do Assistente Social, apud, COSTA, 1995).
Durante muito tempo o Serviço Social fundamentou-se nos aspectos: paliativo,
como auxilio aos necessitados; curativo, para minorar sofrimentos; preventivo para evitar a
‘tentação' e promocional, para integrar o homem na sociedade. Por isso, ainda hoje, para o
senso comum, Assistente Social é aquele profissional que assiste aos pobres, aos enfermos,
aos idosos, aos abandonados e desajustados. Auxiliares dos médicos, consoladores dos
aflitos e dos oprimidos.
O Serviço Social seria um serviço prestado à sociedade e se desenvolveu a partir de
duas fontes ambivalentes: de um lado, a caridade, e de outro a noção de que os
problemas sociais eram uma espécie de doença, advindo daí a denominação de seus
agentes, ‘Assistentes Sociais’ que tem o significado de ‘colocar-se à disposição’ .
(VIEIRA, 1978, p.57).
Este preconceito contra os profissionais em Serviço Social no Brasil se originou e se
perpetua em torno do entendimento popular acerca da prática profissional dos Assistentes
Sociais, o assistencialismo, comum até os anos 70, associado ao desconhecimento dos
aspectos históricos-teóricos-metodológicos que norteiam os conteúdos temáticos ofertados
no curso de formação em Serviço Social e das questões, discussões e pesquisas
epistemológicas encontradas na alentada bibliografia de seus pesquisadores e docentes, nos
dias atuais.
Outras idéias cristalizadas no imaginário popular em torno do profissional em
Serviço Social no Brasil, além do assistencialismo, são: a ligação umbilical com a Igreja
Católica e a condição feminina e de “boa família” exigida para aqueles que desejassem
exercer a profissão.
A hegemônica presença da ótica cristã na assistência ou proteção aos necessitados é
um fenômeno histórico de longa duração. Inicia-se com a elevação do Cristianismo a credo
religioso oficial do Império Romano, no século IV (391). A partir daí, praticar caridade
ajudando aos que sofrem passa a ser uma virtude, um meio de atingir a Santidade e uma
43
demonstração de amor a Deus, embora, paradoxalmente, a aceitação do sofrimento, da dor,
da pobreza fosse considerada um dos méritos para alcançar o reino dos céus.
Antes de prosseguir com a histórica influência cristã na Proteção/Assistência Social,
devemos frizar que a idéia de ajudar o próximo, ao outro, encontra-se presente nas
coletividades humanas a partir da sua organização em clãs, quiçá desde o surgimento da
raça humana na superfície terrestre (LEAKEY,1995; NESTURJ, s/d). Sendo o ser humano
naturalmente um ser dependente, pleno de necessidades e carecimentos (SPOSATI et alli,
2003), o auxilio mútuo é vital para a sobrevivência da espécie. Entre os povos primitivos a
proteção aos anciãos e crianças constituía-se como uma responsabilidade de todos, ação
que podemos constatar ainda hoje, entre os índios brasileiros e os aborígines australianos,
assim como entre asrias etnias e povos africanos. O mesmo acontecia entre os povos da
Antiguidade Clássica Greco-romana, “onde uma série de regras religiosas comandavam as
atitudes a serem observadas em relação as viúvas, pobres, crianças, doentes, prisioneiros,
escravos e viajantes” (VIEIRA, 1978: 28). Da mesma forma, diversos livros do Antigo
Testamento Êxodos, Levítico, Deuteronômio dão testemunho da preocupação dos
Hebreus com os anciãos, pobres, servos e para a prática da ajuda ao próximo, vista como
obrigação cuja falta seria passível de castigo por Jeová. A partir de Jesus Cristo, o ‘amar ao
próximo como a si mesmo’ transforma-se no mandamento fundamental para o bom cristão.
Retornando para a influência do cristianismo na proteção social e acatando a linha
do tempo histórico inventada pelos europeus, veremos que,
durante toda a Idade Média, a Igreja manteve o privilégio da administração das
obras de caridade. Era nos Mosteiros ou junto a eles, que funcionavam
dispensários, hospitais, leprosários, orfanatos e escolas... nos séculos XIII e XIV,
surgiram congregações religiosas dedicadas especialmente à existência social e
hospitalar, auxilio material e ajuda aos pobres. (VIEIRA, 1978, p.31).
A Modernidade e o Renascimento facultam um novo entendimento da pobreza. Esta
deixa de ser vista como provação ou penitência para ser uma das conseqüências do
processo de evolução das sociedades e assim cabe a essa sociedade minorar a situação
daqueles desassistidos. A filantropia amor pela humanidade entre os gregos, “a intenção
de que o ser humano tenha garantido uma condição digna de vida” (MESTRINER, 2001,
p.14) transmuta-se em benemerência, caridade, proteção para os velhos, às viúvas, os
órfãos e doentes. Também nessa época surge JUAN LUIS VIVES, segundo VIEIRA (1978:
35), autor do primeiro tratado de Serviço Social, Da Assistência aos Pobres”
(Subvencione Pauperum) de 1526. As idéias de Vives transformaram-se em parâmetros
44
para outros dois paladinos da Assistência Social: SÃO VICENTE DE PAULA e LUIZA DE
MARILLAC.
Em 1617, os dois criaram as Damas de Caridade, grupo formado por Senhoras da
sociedade que tinham como missão: “visitar os doentes nos hospitais e os pobres em suas
casas, para levar-lhes os socorros necessários; cada dama se encarregava de um certo
número de famílias” (VIEIRA, 1978, p. 37), e também as Filhas de Caridade, formadas por
jovens camponesas instruídas para, praticar a paciência, tendo em vista a agressividade dos
pobres em vista das circunstâncias com que se defrontam; a doçura para falar-lhes; a
persuasão para que sigam os conselhos; a perseverança para leva-los a reabilitação e o
amor, vendo em cada um deles a imagem do Salvador. (VIEIRA, 1978, p.38).
Como para perceber, a Assistência Social era vista como um sacerdócio, uma
missão para aqueles que possuíam bens em prol daqueles considerados com dificuldades
para manter a sobrevivência. A benemerência vai se constituir na ação do dom, da
bondade, da caridade e do favor (MESTRINER, 2001). E um papel para a mulher.
No século XIX, o advento da Revolução Industrial e das relações capitalistas traz
em seu bojo o incremento da exploração do trabalhador, deteriorando as condições de vida
de um número bem maior de indivíduos, principalmente nos centros urbanos. A voracidade
das máquinas por matéria prima e de seus donos por produtos, em conjunto com a crescente
ideologia do lucro, necessita de o-de-obra abundante e com baixa remuneração.
Mediante essa situação e para prover o sustento da família não conseguido pelo pai, a mãe e
a prole o cooptados a também se inserirem no mercado de trabalho. Assim mesmo, os
parcos rendimentos auferidos aumentam o nível de empobrecimento dessas famílias e
fortalece a sua luta por melhores condições de vida. Surgem as idéias e práticas socialistas
utópicas e científicas em prol dos trabalhadores. É a Questão Social, que tem relação com a
dinâmica de crescimento do Estado, da evolução capitalista e da exploração da força de
trabalho (IAMAMOTO e CARVALHO, 1982/ 2004; SPOSATI et alli, 2003)
problematizando a realidade social.
A partir daí, a Burguesia, o Estado e a Igreja premidos pelas inúmeras manifestações
dos trabalhadores se unem e criam mecanismos de controle social, visando manter a ordem
quebrada por aqueles que, visceralmente indignados pela danosa exploração capitalista,
lutavam para não serem explorados e vilipendiados em sua luta pela sobrevivência.
Fantasiada com a máscara da prática humanitária ou de proteção social, na verdade essas
45
medidas buscavam defender os interesses do capital, sob o manto caritativo–filantrópico-
assistencial da Igreja e sob o poder repressor-controlador do Estado. Na realidade brasileira,
essa pregação era direcionada para conter o avanço das teorias socialistas em franca
ascensão na Europa e também dos Sindicatos que defendendo os trabalhadores, pregavam o
enfrentamento aos donos do capital.
Em busca de solucionar o conflito, a Igreja, em 1891, através da Encíclica Rerum
Novarum, de autoria do papa Leão XII impõe a submissão a um e a caridade ao outro. Aos
homens de boa vontade caberia: “não considerar os operários como escravos, respeitar
neles a dignidade da pessoa e a nobreza que esta agrega ao chamado caráter de cristão“
(CASTRO, 1989, p. 53). A conciliação e o amor fraterno entre as classes seria o fim
almejado, para isso, “aos ricos se tinha de inculcar os deveres de justiça e caridade; aos
pobres dar-lhes consolo para aceitarem a sua condição de despossuídos” (CASTRO, 1989,
p. 53). Era a transformação da filantropia em assistencialismo. Para transformar a intenção
em realidade, foi a criada a Ação Católica que se internacionaliza e recebe sustentação
ideológica com a criação da União Internacional Católica de Serviço Social (UCISS) e da
Conferência Internacional de Serviço Social (CISS). Em 1899 é criada a primeira Escola de
Serviço Social do mundo em Amsterdã, Holanda.
É nesse contexto histórico que o Serviço Social chega à América Latina (Santiago
do Chile, 1925) e ao Brasil. Este também é o ponto de partida da nossa análise sobre o
Serviço Social no Brasil e da sua relação com a proteção social, com a política social e
pública e com a questão do negro latente na sociedade brasileira.
2.1 – O SERVIÇO SOCIAL NO BRASIL .
Durante os períodos Colonial e grande parte do Imperial, a existência de ‘laços de
proteção’ entre a população mais carente (COSTA, 1995), se apresentava mais como
sistema de “proteção primária família, vizinhança, relações de trabalho, religiosas, etc” -
do que de proteção secundária instituições estatais e privadas prestadoras de cuidados
diversos desaguando em muitas políticas protecionistas...”(COSTA, 2002, p.301).
Com a República, a idéia da ‘Ordem e Progresso’ domina o pensamento político-
social. Os movimentos reivindicatórios por melhores condições de vida e trabalho,
liderados principalmente por imigrantes, interferem na ‘ordem’ e buscam se incluírem no
46
‘progresso’ produzindo a emergência deões para coibi-los e essas se apresentam de dois
tipos: repressivas e apaziguadoras. Uma que morde a polícia - outra que assopra a
Igreja. A prisão e a oração seriam os remédios para a questão social emergente.
Institucionalmente, as ações ou leis de proteção/assistência social vêm a serem
problematizadas entre nós com o advento do processo de urbanização ocorrido a partir da
segunda metade do século XIX, com o final da Guerra do Paraguai e a Abolição da
Escravatura, recebendo um grande impulso com a imigração européia. O crescente número
de homens livres, ex-escravos e escravos perambulando pelas ruas, conduz a elite
aristocrática e governante, a tomar medidas para sua proteção individual e familiar. O
estabelecimento da ‘ordem’ impulsiona a criação de leis para a proteção física e material da
‘boa sociedade’ (MATTOS, 1991) que irão violentar os direitos dos ‘outros’, do pobre.
A proteção secundária se torna realidade a partir da década de 20, ainda
capitaneada pela Igreja Católica, “dentro de uma perspectiva embrionária de assistência
preventiva, de apostolado social” (IAMAMOTO, 1982, p.166). Esse envolvimento
eclesiástico obscureceu a participação laica, embora ela tenha ocorrido de fato na Ação
Social Católica através da formação de grupos reunidos na Juventude Católica e nas ligas
de Senhoras. Conduz também à formação dos Centros de Ações Sociais com a idéia de
assistencialismo, de dádiva governamental com fins políticos eleitorais e de controle do
operariado. Também originou a proeminência feminina na Assistência Social, pois “a
mulher foi feita para compreender e ajudar. Dotada de grande paciência ocupa-se
eficazmente dos seres fracos, das crianças, dos doentes. A sensibilidade torna-a amável e
compassiva” (MARIA KIEL apud IAMAMOTO, 1982, p. 172).
Políticas governamentais nas áreas de saúde, previdência, educação, saneamento
básico e suplementação alimentar, são consideradas Políticas Sociais Públicas e expressão
da universalização de atendimento, conseguida através da intervenção do Estado, em
Assistência, Ação ou Proteção Social
Neste contexto, só nos anos 30 o Estado Brasileiro, no bojo das transformações
ocorridas com o movimento revolucionário liderado por Getúlio Vargas, monta um sistema
organizado de assistência social. Esse sistema tem como destaques a criação dos Institutos
de Aposentadoria e Pensão (IAPC; IAPI; IAPM ...etc), a CLT e do Ministério da Saúde e
Educação. Novas mudanças acontecem a partir dos anos 60, infelizmente, como sempre
47
em novo período autoritário antidemocrático, com o FGTS, o PIS-PASEP, o FUNRURAL e
outros instrumentos de política pública em assistência social.
Ocorre na sociedade brasileira que estas ações de política social, que por definição
“tem a finalidade de alcançar o Bem-Estar para toda a população (VIEIRA, 1979, p. 15),
no mais das vezes, além de não atender a todos, tomam um cunho clientelista e
corporativista ou ‘de favor a ‘ideologia da outorga’ citada em COSTA (2000, p.13) - por
parte de seus autores e isso desenvolve uma dependência e subalternidade em face ao
doador, desmobilizando o potencial de cidadania que deveria desenvolver, reproduzindo
não a pobreza material de base econômica, mas também a pobreza política, que mantém
o pobre na condição de objeto manipulado e alienado
Mesmo assim, essa população precisa ser apassivada e apascentada. Mais uma vez é
a Igreja Católica, por meio da Ação Social, que lidera a criação de instituições voltadas para
apaziguar esse contingente desatendido pelo Poder Público. E assim, em 1936, com as
bênçãos do Centro de Estudos e Ação Social (CEAS), órgão ligado a Igreja Católica, é
fundada a Escola de Serviço Social de São Paulo, a brasileira. No ano seguinte, ungida
pelo Grupo de Ação Social (GAS) e pelo Cardeal Leme, é criado o Instituto Social do Rio
de Janeiro, ambas hoje integradas as PUCs SP e RJ (LIMA, 1977; SÁ, 1995; IAMAMOTO
E CARVALHO, 2001; PINTO, 2003).
Como se nota, a vinculação umbilical do Serviço Social com a Igreja Católica,
normatizada na Europa, prossegue aqui entre nós. Tanto que, entre as primeiras Escolas de
Serviço Social criadas no Brasil, sete delas foram fundadas e administradas por obra e
graça da Congregação das Missionárias de Jesus Crucificado
17
, fundada em Campinas, SP,
em 03 de maio de 1928 (PINTO, 2003; VIEIRA, 2004).
Influenciadas pela teoria da Escola franco-belga, “tendo a função de ajustar o
indivíduo ao meio e este ao indivíduo”(PINTO, 2003, p.38), o Serviço Social é visto
“como uma forma de ação social ou restauração da ordem social exercido por um
especialista por meio de um trabalho prático, técnico para difundir os ensinamentos da
doutrina da Igreja em matéria social, que formaria apóstolos sociais.”(LIMA, 1987, p.44).
A década de 60 patrocina as primeiras modificações estruturais, nesta longa h
17
Faculdades de Serviço Social de: Campinas; Lins (SP); Santa Catarina (Florianópolis); da UFSe (Aracaju);
da UFJF (Juiz de Fora, MG); Curso de Serviço Social de João Pessoa (UFPa); Curso de Serviço Social da
UNB (DF). (PINTO, 2003, p.54)
48
egemonia eclesiástica no Serviço Social. As primeiras discussões sobre a necessidade de
reconceituação têm como data base o ano de 1965. Em março de 1967 acontece o
Seminário de Araxá, MG, onde se questiona a prática profissional e se busca teorizar e
reconceituar o Serviço Social afim de inseri-lo nas novas correntes ideológicas que se
apresentava. Mesmo criticado este encontro é considerado um marco, pois deu inicio ao
Movimento de Reconceituação do Serviço Social no Brasil, buscando “superar o Serviço
Social tradicional, que foi transplantado da Europa e dos Estados Unidos e adequá-lo à
realidade latino-americana” (AGUIAR, 1984, p.120). Em 1970, foi realizado o Seminário
de Teresópolis onde se discutiu a metodologia e o objeto do Serviço Social no Brasil e
“nele, o moderno triunfa completamente sobre o tradicional, cristalizando-se operativa e
instrumentalmente e deixando na mais secundária zona de penumbra (...) o texto produzido
em Araxá” (NETTO, 2002, p.178).
Embora ocorrendo em um momento crucial do cotidiano político-sócio-cultural e
ideológico da Nação Brasileira, o final dos anos 60 e inicio dos 70, é no bojo do
Movimento de Reconceituação que o grupo vinculado ao pensamento marxiano e
marxista,
18
introduz a perspectiva dialética na formação do Assistente Social e a idéia de
‘classe’ como explicação para o contraste social que historicamente aflige o povo brasileiro.
A partir do Seminário de Teresópolis, o Serviço Social procura se afastar de sua função
tipicamente assistencialista-filantrópica para buscar se transformar num agente
“interveniente, dinamizador e integrador do desenvolvimento da sociedade” (NETTO,
2002, p. 154)
19
.
Para NETTO (1996, p.112) “a década de oitenta assinalou a maioridade do Serviço
Social no Brasil no domínio da elaboração teórica”, acentuando a decisiva influência do
pensamento marxista nesse desenvolvimento, chegando a influenciar na circulação de
produções de intelectuais brasileiros em relação a estrangeira.
A Constituição de 1988, ao institucionalizar a Assistência Social na categoria de
Política Pública, também propiciou condições para que em 7/12/1993 fosse sancionada a
Lei Orgânica da Assistência Social 8742/93 (LOAS), que coloca a assistência social
como “direito do cidadão e dever do Estado, é Política de Seguridade Social não
18
Marxiano é o termo utilizado por vários estudiosos para indicar as idéias baseadas nos estudos, teorias,
idéias e escritos de Karl Marx e Friedrich Engels; Marxistas são aqueles cujas idéias se baseiam nas
interpretações veiculadas por estudiosos das teorias destes dois socialistas alemães.
19
Para aprofundamentos sobre o Movimento de Reconceituação: AGUIAR, 1984; FALEIROS, 1993;
IAMAMOTO, 2001; NETTO, 1991/ 2002; PINTO, 2003.
49
contributiva ... para garantir o atendimento às necessidades básicas” (LOAS, Art. 1º) e
deverá ser realizada “de forma integrada ... visando ao enfrentamento da pobreza, à garantia
dos mínimos sociais e à universalização dos direitos sociais” (LOAS, § único). O
profissional em Serviço Social deve se adequar a essa nova realidade. Deixar de ser “um
profissional executivo para ser um profissional propositivo” (IAMAMOTTO, 2004, p.20).
Atualmente o Brasil possui 140 cursos de Graduação em Serviço Social estando
presente em todos Estados brasileiros, sendo que a região Sudeste se destaca com cerca de
40% da oferta. Além desses, vários cursos de Especialização, 16 cursos de Mestrado e 8 de
Doutorado, completa a estrutura acadêmica da profissionalização do Assistente Social
ofertado à sociedade brasileira (ABEPSS, 2004).
2.2 - O PROFISSIONAL EM SERVIÇO SOCIAL NA ATUALIDADE.
Como dito acima, algumas versões acerca do profissional em Serviço Social fazem
parte do imaginário popular: a ligação com a Igreja, o trabalho para o Governo, a
feminilização, a origem familiar de seus profissionais e o trabalho com os pobres.
]
“Desde sua origem o Serviço Social atua, em última análise, no vasto e complexo
campo da pobreza, parecendo ser a carência, em sua dimensão socioeconômica e
política, o elemento unificador das diferentes nomeações atribuídas à sua
‘clientela’.” (JUNCÁ, 2000, p.93).
Vimos que nos primórdios do Serviço Social no Brasil, a ótica religiosa configurada
na Europa encontrava apoio na prática profissional, visto seus objetivos se direcionarem
para o atendimento da pobreza – percebida como uma doença, um ‘caso’ - para a filantropia
e os conhecimentos recebidos por seus profissionais basearem-se na moral, na filosofia e na
religião. Na década de 40 a influência norte-americana se faz presente e ‘ser pobre’ passa a
ser um problema de incapacidade individual de adaptação às mudanças sociais. O
profissional em Assistência Social passa a ser o agente dessa integração ou adaptação. Nos
anos 50, os cursos de Serviço Social, cujos profissionais passavam por uma crise de
identidade, adquirem o status de Curso Superior e, aquelas escolas que eram destinados à
“profissionalização em torno de práticas assistenciais, localiza-se no espaço universitário na
50
expectativa de responder à necessidade de dominar, pelo conhecimento, a realidade social a
enfrentar e os recursos profissionais adequados a desenvolvê-la” (COSTA, 1989, p.2),
notando-se já “a presença de elementos que irão impulsionar o movimento de
reconceituação nas décadas seguintes” (COSTA, 1989, p.3).
E então, como explicitamos, a partir do Movimento de Reconceituação esses
objetivos se deslocam do indivíduo para a comunidade e a doutrina social da Igreja até
então inconteste, busca se adaptar, mas também cede espaço para novos tipos de
paradigmas e abordagens, com ênfase na visão materialista da sociedade.
No sentido do trabalho profissional, o vínculo governamental ainda se mantém pelo
poder empregador do Estado em seus três níveis: Municipal, Estadual e Federal. Porém
novas opções profissionais no mercado privado, nos movimentos sociais e nas
Organizações Não-Governamentais (ONG) formadoras dosetor, encontram-se em franca
expansão, ensejando novos sentidos para a prática profissional.
A presença feminina nas hostes da Assistência Social permanece hegemônica,
embora tenha perdido a sua vinculação burguesa. De acordo com os dados preliminares do
Censo Étnico-Racial da UFF (TEIXEIRA e BRANDÃO, 2003), o curso de Graduação em
Serviço Social da ESS-UFF, conta com 431 alunos e apresenta entre suas especificidades,
uma destacada maioria feminina, 399 alunas ou 92% do seu corpo discente. Essa
característica histórica de longa duração pode ser notada empiricamente, no simples olhar,
nos locais onde os profissionais em Serviço Social são mais utilizados.
Fica uma questão: sabendo que o Serviço Social se inicia em 1936, como explicar
que numa época em que o trabalho feminino externo era condenado e os afazeres
domésticos eram, e ainda são, considerados um dever ou obrigação, e onde a deificação da
maternidade e o espírito sacerdotal no cuidar do marido e dos filhos eram dogmas e
também “a Igreja e outros segmentos da burocracia estatal e da sociedade eram contrários
ao trabalho feminino” (GÓIS, 1993, p.19), a maioria de seus profissionais fosse mulheres?
E ainda, que o Estado e a Igreja, através do Serviço Social, utilize a mulher para viabilizar o
seu projeto de atuação na sociedade, como comenta COSTA (1988, p.V): “como parte da
minha formação de assistente social, à época um curso destinado, principalmente, para
mulheres das camadas médias urbanas para o trato das questões da pobreza”. (grifo meu). A
tradição da missão do ‘cuidar vista como destinação natural da mulher, como salientamos
na Introdução, seria a resposta.
51
Na busca de esclarecer esse assunto, GÓIS (2001), baseado em depoimentos
colhidos entre as ex-alunas da ESSERJ, aponta como motivações para a mulher buscar o
Serviço Social, além do caráter missionário e do patriotismo: a sobrevivência, devido a
endêmica baixa remuneração e pelo grande número de mulheres ‘chefes de família’; a auto-
afirmação pessoal e profissional e, em alguns casos, a penetração no espaço
público”(GÓIS, 2001, p.126) fugindo do destino social que os homens traçaram para elas.
No tocante a vinculação com setores abastados da sociedade, ele encontrou depoente que
afirma: fui para o Serviço Social porque precisava comer...” e também “registros de
carência financeira em vários alunos, expressa, por exemplo, no condicionamento de
obtenção de bolsa de estudos para realizar o curso”. (GÓIS, 1993, p.14).
Feminino ou masculino, em seu estudo “Relações Sociais e Serviço Social no
Brasil”, Marilda Iamamoto e Raul de Carvalho, municiados analiticamente pelas idéias de
Marx e Engels, comentam que o profissional em Serviço Social durante muito tempo fez
uma ponte entre capital x trabalho x poder público x sociedade, buscando harmonizar as
relações contraditórias entre estas instituições socioeconômicas e política. Por isso, segundo
os citados estudiosos, o profissional em Serviço Social tem em si um intelectual orgânico
gramsciano” (IAMAMOTO/ CARVALHO, 2001, p. 87) e, ao mesmo tempo, pela gênese da
criação das Escolas de Serviço Social, fazem parte de um “Aparelho Ideológico de Estado”,
formalizado por Allthuser, por “situar-se no processo de reprodução das relações sociais ...
como auxiliar e subsidiária no exercício do controle social e na difusão da ideologia da
classe dominante junto à classe trabalhadora”. (IAMAMOTO/CARVALHO, 2001, p. 94)
20
.
Isto cria, no meu entender, um conflito de origem no Serviço Social, pois, sendo
criado para proporcionar igualdade na busca de melhores condições de vida para aqueles
com maiores dificuldades para auferi-la, deve exercer essa função numa sociedade
capitalista onde o primado é a desigualdade. Da mesma forma, seus profissionais convivem
com um outro paradoxo: embora busque dar autonomia a sua clientela, sua condição de
estar a serviço do Estado e/ou de empresas privadas pode concorrer para inibir esta ação.
...na empresa, o Assistente Social pode participar do processo de reprodução da
força de trabalho e/ou criação da riqueza social, como parte de um trabalho
coletivo, produtivo de mais valia. Já na esfera do Estado ... seu trabalho se inscreve
no campo da defesa e/ou realização de direitos sociais de cidadania, na gestão da
coisa pública. (IAMAMOTO, 2004, p. 24).
20
Para uma crítica a esta obra, GÓIS, João Bosco Hora – A Dissolução do Monolítico: persistências e
mudanças na História do Serviço Social. in, Cadernos de Serviço Social I, ESS-UFF. (p.8-25) .
52
A partir dos anos 80, como comentado, no bojo do Movimento de
Reconceituação, o Serviço Social passa por uma reformulação teórico-metodológica-
ideológica e profissional. Logicamente, esta mudança gerou debates, discussões e revisões
curriculares buscando adequar a profissão aos novos tempos e as novas expectativas,
possibilidades e desafios de/para seus profissionais gerados na sociedade. Nas palavras de
LIMA (1982, p.42) “a reconceituação não é um bloco monolítico de idéias e posições,
senão o contrário, é uma onda veemente na qual se movem tendências e correntes nem
sempre factíveis entre si”. Para Suely Gomes Costa, o movimento foi bem-vindo, porém a
forma como a teoria do materialismo-dialético foi absorvida gerou problemas práticos no
trabalho profissional, pois,
a enunciação do projeto ideal de sociedade, nessa abordagem, passou a servir para
a seleção de conhecimentos a adquirir cm vistas às estratégias de mudança da
sociedade real e para a delimitação do ‘domínio’ do conteúdo critico de
conhecimento sobre a sociedade. Meia dúzia de conceitos gerais sobre as relações
de dominação na sociedade de classes, verdadeiras palavras de ordem passaram a
ser aplicadas a toda e qualquer situação sob análise. Tal conduta levou a idealização
profissional a níveis extremos, aprofundando distâncias em relação às condições
históricas reais. (Costa, 1989, p.10)
Atualmente o perfil proposto para o profissional em Serviço Social tem conexão
direta com a conjuntura sócio-econômica e com a evolução crítico-ideológica e
participativa da sociedade brasileira.
Embora sem investir na discussão do acelerado crescimento da pobreza em nosso
País
21
, essa realidade obriga uma nova postura do Assistente Social em sua relação com os
usuários, principalmente saindo do assistencialismo e adotando uma postura voltada para a
autonomia da população que necessita de seus préstimos. Dar o peixe e também dar a vara,
o anzol e mostrar o caminho para o rio.
Concomitantemente, a emergência de novos sujeitos, gerados pela dinâmica das
transformações vegetativas e societárias da população: o envelhecimento e a nova
juventude, as questões de gênero e sexual, as novas doenças, o desemprego e o crescente
debate envolvendo o neoliberalismo, os excluídos, o Terceiro Setor e a cidadania, projetam
21
Para aprofundamento nesta questão, remeto a BARROS, Ricardo et alli – Desigualdade e Pobreza no Brasil:
retrato de uma estabilidade inaceitável. São Paulo: Revista Brasileira de Ciências Sociais, v.15/nº42/fev.2000;
BRANDÃO, André Miséria da Periferia: desigualdades raciais e pobreza na metrópole do Rio de Janeiro.
Rio de Janeiro, Pallas, 2004.
53
a necessidade de uma mobilização mutante na formação dos novos Assistentes Sociais
capazes de influenciar na formulação e implementação de políticas sociais, porque,
ninguém tem dúvidas de que o período histórico em que estamos situados marca-se
por transformações societárias que afetam diretamente o conjunto da vida social e
incidem fortemente sobre as profissões, suas áreas de intervenção, seus suportes de
conhecimento e de implementação, suas funcionalidades, etc (NETTO, 1996, p,87),
por isso, para José Paulo Netto, a nova formação do profissional em Serviço Social deve
ser contínua, capacitando-o para uma intervenção localizada ou ação focal “à base de uma
compreensão estrutural da problemática focalizada.
Assim, nos anos 80/90, as Escolas de Serviço Social, historicamente concebidas
como instituições de ensino graduado e profissionalizante, sem muito nculo com a
pesquisa para a extensão, o trifundador da Universidade brasileira, são reformuladas em
suas dimensões teórico-metodológicas, ético-histórico-político e técnico-operativo
(ABESS/CEDEPS, 1995) através da LOAS e das revisões curriculares que envolveram as
Escolas de Serviço Social em todo território nacional, assunto do próximo capítulo, tendo
as novas configurações da questão social brasileira como eixo central.
A mais importante questão social na atualidade brasileira é a secular pobreza,
geradora da crescente exclusão socioeconômica que assola boa parte da nossa população
principalmente nas áreas urbanas. Exclusão que leva o trabalhador, em sua luta pela
sobrevivência, à mendicância, a prostituição, a delinqüência ou, numa dramática opção, ao
trabalho como lixo (JUNCÁ, 2000).
Nesses novos campos de trabalho, o Assistente Social tem que construir uma nova
identidade, fugindo daquela que historicamente lhe foi atribuída, a assistencialista, para
intervir na realidade vivenciada, consciente da sua capacidade de transformar seus usuários
de objetos em sujeitos históricos, com condições de modificar o seu cotidiano excludente.
Neste contexto, ele deve desenvolver alternativas para que sua prática profissional,
quer no Governo quer na empresa privada, fortaleça a concepção da Assistência Social
como Política Pública, promotora do desenvolvimento social, fundamentada na
participação popular e na universalização dos direitos sociais para todos os brasileiros,
suprimindo a apartação secular que nos representa mundialmente. E que, atendendo ao
projetado por NETTO (1996, p.126), ele não seja somente “um técnico bem adestrado que
vai operar instrumentalmente sobre as demandas do mercado tal como elas se apresentam”,
mas que revele um profissional também “intelectual que, com qualificação operativa, vai
54
intervir sobre aquelas demandas a partir da compreensão teórico-crítica, identificando a
significação, os limites e as alternativas da ação focalizada”.
A questão do negro na sociedade brasileira, principal vítima da exclusão e da
pobreza sócio-econômica, se insere neste contexto. As Políticas de Ação Afirmativa, que
tem entre seus propósitos transformar a realidade através do conhecimento, requerem a
participação do profissional em Serviço Social na formulação, implementação e avaliação
de medidas em Política Pública e Social que deleguem autonomia àqueles que têm sua
cidadania subtraída por falsas interpretações do desenvolvimento histórico, cultural e
estrutural da Nação brasileira.
O Assistente Social formado pela UFF está apto para essa ‘ação focal ou
intervenção localizada”. É o que veremos a seguir.
CAPÍTULO III
O NEGRO E A ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL DA UNIVERSIDADE
FEDERAL FLUMINENSE.
3.1 – A UFF E A ESCOLA DE SERVIÇO SOCIAL
A Universidade Federal Fluminense (UFF) foi criada pela lei3848 de 18/12/1960
com o nome de Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UFERJ). Foi
inicialmente formada pela incorporação das Faculdades federais existente em Niterói
Direito, Medicina, Veterinária, Farmácia e Odontologia; da agregação de unidades
estaduais - Escola Fluminense de Engenharia, da Escola de Enfermagem do Estado do Rio
de Janeiro e da Escola de Serviço Social do Rio de Janeiro e particulares - Faculdade
55
Fluminense de Filosofia e Faculdade de Ciências Econômicas de Niterói. Em 1964 o
Hospital Municipal Antonio Pedro foi federalizado e incorporado à Universidade. Devido a
este tipo de formação, a UFF possui unidades em vários bairros da cidade, formando quatro
‘campus’: Ingá, Gragoatá, Praia Vermelha e Valonguinho, possuindo ainda unidades de
ensino nas cidades de Volta Redonda, Angra dos Reis e Campos dos Goiatacazes, no Estado
do Rio de Janeiro e um campus avançado no município de Oriximiná, no Pará.
Devido a fusão do Estado do Rio de Janeiro com o Estado Guanabara, onde desde o
século XVIII (1763) se localizava a Capital Federal e foi substituído em 1961 por Brasília,
a UFERJ teve o seu nome alterado, pela lei 4831 de 05/11/1965, para Universidade
Federal Fluminense (UFF) a fim de evitar confusão com a Universidade Federal do Rio de
Janeiro (UFRJ), sediada no antigo Distrito Federal.
A Escola de Serviço Social de Niterói foi criada em 23/08/1945, através do decreto
1397 de 06/07/1945. Sua criação se deve a pressão da então presidente da Legião
Brasileira de Assistência (LBA) Alzira Vargas do Amaral Peixoto, filha do Presidente
Getúlio Vargas e esposa do interventor e depois Governador do Estado do Rio de Janeiro,
Ernani do Amaral Peixoto. Sendo vinculada ao Conselho Estadual de Serviço Social,
diferenciava-se da maioria das Escolas de Serviço Social (GOMES, 1989) que geralmente
vinculavam-se a Igreja Católica, como foi colocada em outra parte desse trabalho.
Lembrando que nesta época o Distrito Federal (hoje cidade do Rio de Janeiro) possuía
Escolas de Serviço Social
22
. Outro tabu quebrado pela ESSN foi que na sua turma a
maioria dos assistentes sociais pioneiros era constituída de professores primários oriundas
do interior do Estado, portanto, não pertencentes às camadas mais bem aquinhoadas da
região fluminense ou de sua capital” (GOMES, 1994, p.136)
Em 1956 foi reconhecida como entidade de ensino superior e através da Lei
Estadual 3656 de 12/06/1958 foi incorporada a UFERJ, onde atualmente ocupa o Bloco
D do Campus da UFF no Gragoatá, em Niterói. Além do curso de Graduação, a ESS-UFF
possui dois cursos de Pós-Graduação ‘lato-sensu’ (Especialização) Gênero e Saúde e
Formulação e Gestão de Políticas Sociais – e um Mestrado em Política Social.
22
Escola de Serviço Social da SOS (1938); Escola Técnica de Serviço Social (1939), atual ESS da Faculdade
Veiga de Almeida; Instituto de Educação Familiar e Social Alceu de Amoroso Lima (feminino)(1937) e
Escola Masculina de Serviço Social - LBA (1943), integradas a ESS-PUC-RJ; Curso de Serviço Social da
Escola de Enfermagem Ana Néri (1937), atual ESS-UFRJ; Escola Técnica de Assistente Social Cecy
Dodsworth (1944) hoje ESS-UERJ.
56
3.2 - ANÁLISE DOS DADOS ENCONTRADOS
Como expresso na Introdução, para realizar os objetivos desta pesquisa alguns
procedimentos metodológicos se fizeram necessários. Neste item iremos apresentar as
justificativas para cada um dos procedimentos, relatar e analisar os dados encontrados e as
implicações que eles possuem na nossa questão de pesquisa.
3.2.1- OS TRABALHOS DE CONCLUSÃO DE CURSOS (TCCs).
Trabalhos de conclusão de curso (TCC) são monografias elaboradas pelas/os
graduandas/os no período do Curso de Graduação. Os temas são escolhidos pelas/os
alunos e contam com a orientação de um Professor, escolhido pela própria aluna/o ou
indicado pela coordenação do curso.
A importância do conhecimento dos temas mais freqüentes nas monografias de final
de curso em Serviço Social, se faz necessária para que detectemos quais assuntos ou temas
encontram-se entre as preocupações das futuras Assistentes Sociais. Também poderemos,
através desde procedimento, conhecer quais questões ou temas são trabalhados em aula
pelos professores, visto que estes podem influenciar os alunos na escolha dos temas
abordados nos trabalhos de conclusão do curso.
Foram encontradas 1237 monografias de final de curso, elaboradas pelas alunas (os)
da ESS-UFF, arquivadas na Biblioteca Central da UFF, no Gracoatá, abrangendo o período
de 1948 a 2002.
Para facilitar a nossa análise, dividimos os TCCs em 10 temas gerais tendo por base
os títulos das monografias Serviço Social; Saúde; Gênero/Sexualidade; Proteção Social;
Política Social; Educação; Sociedade; Cidadania; Raça e Outros, conforme relação abaixo -
e em dois períodos temporais: por decênio e por período político
23
(tabelas 1 e 2).
TEMAS DOS TRABALHOS DE CONCLUSÃO DE CURSO – TCCs
23
Períodos relacionados com as mudanças de regime político ocorridas no País. De 1948 a 1963 - após os 8 anos da
Ditadura do Estado Novo Varguista, uma nova Constituição, a 5ª, promulgada em 1946, inicio a um período
democrático, prematuramente soterrado pela violência de um novo regime autoritário concebido e exercido pelos
Militares a partir de 1964 até 1985. Em 1985, com o fim do regime Militar, se inicia um novo período democrático que
esperamos seja infinito.
57
1- SERVIÇO SOCIAL (profissional, metodologia, teoria, ...)
2 -PROTEÇÃO SOCIAL (idosos/menor/ adolescente/ moradores de rua, albergues, assistência...)
3 - POLÍTICA SOCIAL (política pública/comunidade/ habitação/ previdência/ reforma agrária ...)
4 - SAÚDE (deficiente/ AIDS/ doença/ hospital/gravidez precoce/ drogas/ fumo/ alcoolismo)
5 - GÊNERO (sexualidade/ homossexualidade/ prostituição/ orientação sexual/ mulher)
6 – EDUCAÇÃO (escola/ conhecimento/ cultura/ creche/ Ed.infanto-juvenil/ ideologia/ direito...)
7 – SOCIEDADE (planejamento familiar/ violência doméstica/ penitenciária/ favela/ ...)
8 – CIDADANIA
9 – RAÇA / NEGRO (A)
10 – OUTROS (neoliberalismo/ automação bancária/ Rotary Club)
Como podemos verificar pelas tabelas abaixo, os temas que abrangem questões
relacionadas diretamente com o Serviço Social, incluindo aqueles sobre a Proteção Social,
sobre Política Social/Pública e com a Saúde (onde o Assistente Social possui uma grande
demanda profissional), sobressaem-se frente aos demais temas. Isto se explica por serem
estes temas historicamente integrados com as ações do Serviço Social na sociedade.
Quanto a questão racial ou do negro, o resultado foi muito aquém do esperado.
Entre os anos 1948 a 2002, ou seja em um período de 36 anos ou de dois momentos
políticos distintos, apenas 6 TCCs entre os 1237 examinados ou 0,48% do total tratam
desde tema. A invisibilidade em relação aos negros e das questões que afetam o seu inter-
relacionamento com os outros segmentos sócio-culturais da sociedade brasileira, por parte
das/os formandas/os em Serviço Social da UFF, é absoluta. Esta constatação corrobora a
análise de PINTO (2003) em relação ao relacionamento das/os Assistentes Sociais com os
seus usuários, citada na Introdução: “Nessa trajetória, percebi que o assistente social
trabalha com a população negra sem ao menos ter conhecimento de sua história, de sua
cultura e dos seus problemas... (PINTO, ob.cit., p.23). E, relembrando que sua pesquisa
data de 1986, ela me auxilia ao comentar na introdução:
Um outro fator importante é que neste meio tempo período em que
produzi este estudo até a data de sua publicação a produção
intelectual da profissão cresceu em seus aspectos quantitativo e
qualitativo; porém as novas produções não incorporaram ainda a
dimensão étnico-racial. (PINTO,op.cit. p.25). (negrito meu)
Assim, em 1985 vamos encontrar o único TCC com a palavra ‘racial’ nomeando
uma monografia. A Ideologia Racial na Prisão” de CECILIA LUIZ DE OLIVEIRA,
onde a formanda retrata as relações humanas numa instituição prisional sob o prisma da
diferença epitelial entre os prisioneiros e entre estes e os outros habitantes do complexo
presidiário da rua Frei Caneca no Rio de Janeiro.
As categorias negro/negra; preto/preta foram nomeados no título de 5 (cinco) TCCs:
58
- ROSELY ROCHA Rasgando o Silêncio: debate sobre a Política de Cotas como
estratégia de inserção do negro na Universidade apresentada no semestre de 1996,
onde a graduanda discute as dificuldades que limitam o acesso dos estudantes negros ao
ensino universitário e a importância da adoção de uma política de cotas na Universidade, no
Serviço Público e em empresas privadas como forma de garantir os princípios democráticos
e combater as desigualdades existentes em nosso País.
- O TCC, A Múltipla Exclusão e Discriminação Social da Mulher Negra Idosa”, de
NEUZA TEREZINHA DA SILVA LIMA, semestre de 1998, analisa a tríplice condição
discriminadora e preconceituosa a que é submetida uma mulher negra idosa: de sexo, de
raça/cor e de idade.
Tabela I - TCCs POR DECÊNIO
TEMAS ANOS
% 1948-49 1950-59 1960-69 1970-79 1980-89 1990-99 2002-02
TOTAL
Serviço Social 15 /
71,4%
25 /
51%
30 /
37,9%
98 /
50,5%
129 /
34%
87 /
21,8%
19 /
16,9%
403 /
32,5%
Proteção Social 4 /
19%
17 /
34,6%
29 /
36,7%
46 /
23,7%
56 /
14,7%
39 /
9,79%
20 /
17,8%
211 /
17,05%
Política Social 2 /
9,5%
2 /
4,8%
6 /
7,5%
13 /
6,7%
25 /
6,59%
38 /
9,54%
11 /
9,82%
97 /
7,84%
Saúde 0 2 /
4,08%
5 /
6,32%
30 /
15,4%
69 /
18,2%
128 /
32,1%
31 /
27,6%
265 /
21,4%
Gênero 0 1 /
2,04%
2 /
2,53%
0 35 /
9,23%
32 /
8,04%
13 /
11,6%
83 /
6,70%
Educação 0 0 2 /
2,53%
4 /
2,06%
45 /
11,8%
28 /
7,03%
9 /
8,03%
88 /
7,11%
Sociedade 0 2 /
4,08%
5 /
6,32%
3 /
1,54%
17 /
4,48%
17 /
4,27%
5 /
4,46%
49 /
3,96%
Cidadania 0 0 0 0 2 /
0,52%
25 /
6,28%
4 /
3,5%
31 /
2,50%
Raça/ Negro (a)
0 0 0
(1)
0 1 /
0,26%
2 /
0,50%
(8)
3 /
2,67%
(2)
6 /
0,48%
(11)
24
Outros 0 0 0 0 0 4 /
1,0%
0 4 /
0,32%
TOTAL 21 /
1,79
49 /
3,97%
79 /
6,41%
194 /
15,7%
379 /
30,7%
398 /
32,3%
112 /
9,09%
1237/
100%
Fonte: José Barbosa, ESS-UFF, 2004
24
Número referente aos TCCs que citam a questão racial em seus capítulos.
59
Tabela II - TCCs POR PERÍODO POLÍTICO
TEMAS %
ANOS
1948 - 1963 1964 - 1985 1986 - 2002
TOTAL
Serviço Social 59 61,4% 211 42,6% 133 20,7% 403 32,5%
Proteção Social 19 19,7% 115 23,% 77 12% 77 17,5%
Política Social 5 5,2% 36 7,2% 56 8,73% 97 7,8%
Saúde 4 4,16% 72 14,5% 189 29,4% 265 21,4%
Gênero 1 1,04% 16 3,23% 66 10,2% 83 6,7%
Educação 1 1,04% 25 5,05% 62 9,67% 88 7,11%
Sociedade 7 7,29% 18 3,63% 24 3,74% 49 3,9%
Cidadania 0 1 0,2% 30 4,68% 31 2,5%
Raça 0 1 0,2%
(1)
5 0,78%
(10)
6 0,48%
(11)
25
Outros 0 0 4 0,62% 4 0,32%
TOTAL 96 7,9% 495 40,1% 641 52% 1237 100%
Fonte: José Barbosa - ESS-UFF, 2004.
- ADRIANA APARECIDA FIRMINO LUZ “Memórias de Exclusão: uma
experiência com negras idosas do Grupo Vida”, semestre de 2002. Neste TCC, a autora
retrata os dramas das mulheres negras, asiladas/abandonadas e atendidas por grupos de
apoio e de proteção social.
- TCC “A Identidade Negra e Cultura: analisando o trabalho de uma ONG” de
ILANA FEITOSA SIQUEIRA LOBO (2002), onde a graduanda analisa o trabalho da, uma
ONG, a ASAC Associação Sobrado de Arte e Cultura, que desenvolve um trabalho de
acolhimento com os jovens de São Gonçalo, onde procura impulsionar a inclusão e
desenvolver auto-estima, utilizando o HIP-HOP, o FUNK e o GRAFITTE.
- VIVIANE CARMEM DA CNCEIÇÃO SANTOS (2002), “Sexualidade da Mulher
Negra e o Mundo do Trabalho onde a graduanda busca desvelar o mito da sexualidade da
mulher negra e os efeitos danosos que os estereótipos sobre essa sexualidade ‘degenerada’,
exerce em seus locais de trabalho e no cotidiano.
25
( ) Número relativo aos TCCs que tratam da questão do negro em seus capítulos ou parágrafos.
60
Alguns trabalhos citam a questão racial ou do negro na sociedade brasileira em seus
capítulos, porém sem profundidade, como dados complementares. Encontramos 10
monografias:
- Favela: Problema Social Urbano” de MARIA CELY BRAGA (1962), que
associa a condição do negro como escravo com as dificuldades para sua inserção na
sociedade;
- A Mulher Brasileira na Atualidade” de LEILA THOMÉ VARGAS e MARIA
DA PENHA M. DA SILVA (1991), onde as autoras, ao relatar o cotidiano das mulheres no
Brasil Colonial e Imperial, cita o uso sexual das mulheres negras escravas pelos senhores e
sinhozinhos;
- Educador de Rua: de onde veio? Para onde vai? de RITA DE CASSIA DIAS
RODRIGUES (1995), que busca associar o fim da escravidão e a forma como os negros
foram tratados no pós Abolição com a gênese das populações de rua;
- “Igreja Universal do Reino de Deus: Solução ou embuste? de KATIA DE
ALMEIDA LACERDA (1996), tece comentários sobre as religiões afro-brasileiras;
- Trabalhadora: Sexo Frágil?” de SELMA GOMES DE SILVA (1997), retrata as
condições de vida da mulher negra no mercado de trabalho;
- Igreja, Assistência e Neoliberalismo”, de ALESSANDRO GOMES MENDES
(1998), faz uma breve comentário sobre as Irmandades Negras;
- Presos Portadores do rus da AIDS: convivendo com o duplo estigma” de
SABRINA DIAS BARBOSA (1998), ao analisar a massa carcerária do DESIPE-RJ,
destaca o fato da maioria serem negros e mulatos;
- Cidadania dos Excluídos” de FERNANDA DO MONTE PINTO (1999), ao
levantar o perfil da população de rua atendida pela Fundação Leão XIII – Niterói, ela utiliza
o item ‘cor – 34% brancos; 59% de negros; 7% outros.
- O Poder Discricionário dos Estereótipos” de SILVANIA DE OLIVEIRA SILVA
(1999), apesar de não tratar especificamente do negro, ao reportar-se aos estereótipos que
remetem a formação de desigualdades e dos preconceitos, ela aborda a questão racial;
- “Violência e Homossexualidade” de ZENILDA SANTANA DA SILVA (2001),
possui um sub-capítulo onde comenta o racismo e a violência contra o homossexual negro;
- O Funk Como Expressão Cultural e Produtora de Novas Identidades Urbanas”
de RAQUEL DE AGUIAR BATISTA (2002); busca demonstrar a importância do
61
movimento funk para a afirmação identitária e de auto-afirmação dos negros da periferia e
das favelas do Rio de Janeiro.
Devemos ressaltar que muitos TCCs, apesar de enfocarem temas como exclusão
social, sistema carcerário, população de rua, empregada doméstica, crianças em situação
de rua, favelas, assuntos em que a presença física de negros é uma realidade, a questão do
negro não é vislumbrada como importante vetor causal para seus objetos de pesquisa.
Esta ocorrência, pode significar um reforço para a comprovação da nossa hipótese
de trabalho: o desconhecimento por parte das alunas (os) do Serviço Social das questões
que dizem respeito ao negro na sociedade brasileira. Da mesma forma, pela exposição dos
dados encontrados nas monografias e também pelas ausências explicitadas acima, fica
patente que, embora o percentual de pretos e pardos entre as/o alunas/os e entre os futuros
usuários seja expressivo, como destacamos nesse trabalho, ‘raça’ ou a questão do negro
não está incluída entre os temas abordados, discutidos e problematizados em sala de aula
quer pelos professores quer pelas alunas (os) da ESS-UFF entre suas preocupações de
estudo e de apreensão de saberes
26
. Os resultados encontrados nos demais instrumentos
metodológicos, corrobora esta assertiva.
3.2.2 – AS PUBLICAÇÕES
Por serem veículos de divulgação de idéias, de discussões ideológicas e de novas
abordagens conceituais, metodológicas e epistemológicas, os periódicos específicos para a
área de Serviço Social são leituras fundamentais para a formação intelectual, ética e
profissional do Assistente Social. Daí a importância da sua análise.
Entre os periódicos da área de Serviço Social, escolhemos quatro (4) deles pela sua
penetração entre as alunas (os) do curso. Essa penetração foi detectada através da
observação realizada no setor de periódicos da Biblioteca Central da UFF.
26
Atualmente esta situação vem gradativamente sofrendo alteração, principalmente no inicio do novo século,
como é atestado pelo maior número de Monografias sobre o tema no período 2000-2002. Duas razões podem
ser apontadas para este fato: o destaque alcançado pelo debate em torno das ações afirmativas em prol da
população negra e a inclusão da questão do negro em sala de aula por parte de Professores da Graduação
(André Brandão/ Iolanda de Oliveira e João Bosco) envolvidos com esta temática em seus projetos de
pesquisa e de vida. O número de TCCs abordando este tema cresceu em 2003 e não constam na nossa
pesquisa em virtude de não estarem arquivados na Biblioteca Central.
62
A presença ou ausência de abordagens sobre a questão do negro na sociedade
brasileira foi identificada através da leitura dos títulos dos artigos. Assim como no caso dos
TCCs, optamos por essa técnica por acreditarmos ser o título um indicador do assunto
contido no texto e um “chamariz” para o leitor. Da mesma forma, aqueles artigos que nos
chamavam a atenção por enfocarem temas com possibilidade de articulação com a presença
da questão do negro, foram objeto de um outro olhar ou um exame mais apurado.
a) REVISTA ‘SERVIÇO SOCIAL E SOCIEDADE’.
Este periódico é publicado quadrimestralmente desde setembro de 1979. Atualmente
encontra-se na sua 79ª edição, distribuída pela Cortez Editora. Analisamos 68 números
encontrados na Biblioteca Central da UFF e outros exemplares encontrados em livrarias e
outras bibliotecas. Dentre estes números, nenhum artigo contém os vocábulos ‘negro/a’,
‘preta/o’ ou ‘raça/racial’ no título dos artigos.
A publicação de número 79, lançada em setembro de 2004, pela primeira vez edita
um artigo com o termo racial em suas páginas. Trata-se do texto As Abordagens Étnico-
Raciais no Serviço Social de MATILDE RIBEIRO (p.148-161). Devemos acentuar que a
citada autora é atualmente a Ministra da Secretaria Especial de Política para Promoção da
Igualdade Racial (SEPPIR) do Governo Federal. Neste texto, além de chamar o Serviço
Social para uma “reflexão sobre a inserção das questões étnicos-raciais na área do Serviço
Social” (RIBEIRO, 2004, p.148), ela cita algumas das produções acadêmicas nesta
temática existentes no Serviço Social, encontradas nos Anais de alguns Congressos da
categoria no 6º, 8º, 9º, 10º CBAS
27
- porém não publicados nos periódicos e publicações
ao alcance dos demais profissionais. No 1 CBAS, realizado em outubro de 2004, se
inscreveram mais 4 comunicações abordando o tema étnico-racial ou, como prefiro, a
questão do negro. (CBAS, 2004, p. 113-114).
Até então, apenas 3 (três) artigos traziam citações sobre o negro em seus parágrafos:
. Movimentos Sociais, Participação Popular e Educação de HERMAN KRAUZE,
publicada no 20 de abril de 1986 p.82-93, que contém comentários sobre a
descriminação sofrida pelos negros na sociedade brasileira.
. Dependência de Empregada (espaço da exclusão) de LEDA TELLES, publicada
no 27 de outubro de 1988 p.101-109, onde a autora considera o quarto de empregada
27
RIBEIRO, Matilde, 2004, p. 152-153.
63
das moradias brasileiras uma nova senzala e a materialização do preconceito contra o
negro no ambiente doméstico.
. Movimentos Sociais: unidade na diversidade de SAFIRA BEZERRA AMMANN,
publicada no 36 de agosto de 1991 p.84-135, cita mais não discute a especificidade do
Movimento Negro.
.b) REVISTA ‘SERVIÇO SOCIAL’.
Embora não seja mais editada desde 1954, foi publicada trimestralmente a partir de
1939, por um grupo ligado as escolas de Serviço Social Católicas e ao Centro de Estudos e
Ação Social (CEAS). Pela sua estreita ligação com a Igreja Católica seus diretores foram
Monsenhores - é uma publicação muito conservadora na preservação dos valores cristãos
e na busca da harmonia. Esta ação fica patenteada nos artigos publicados, principalmente
nos seus primeiros números. Neles é fundamentada a influência da Igreja Católica na
gênese e na orientação doutrinária e ideológica das Escolas de Serviço Social, como
argumentei no Capítulo II desta Dissertação. Tanto que em nenhum dos 44 exemplares
analisados encontrados na Biblioteca Central da UFF, a questão do negro no Brasil é tida
como digna de registro. Acredito que este fato ocorria por esta questão representar a
possibilidade de discussões acaloradas e conflito, algo que foge da busca da passividade, da
paz e da submissão à vontade do que está ‘acima’ (no plano espiritual e carnal), idealizada
pelo Catolicismo.
Convém relatar que na publicação 75, encontramos um artigo que trata de
preconceito, mas não remete ao de raça ou de cor. É um artigo de autoria de ROBERTO
SABÓIA DE MEDEIROS, S.J. Preconceitos e Padrões. (jan./fev./mar./ 1954 - p.13-45).
O autor era Monsenhor e foi diretor da Revista durante 16 anos.
c) A REVISTA ‘GÊNERO’.
É uma publicação semestral da ESS-UFF, editada desde 2000 sob a
responsabilidade do Núcleo Transdisciplinar e Estudos de Gênero (NUTEG). Dos sete
números editados, nenhum artigo foi titulado com as categorias: negra (o); preta (o) ou
raça/racial. Apenas dois entre os 67 artigos publicados tratam da questão do negro em
seus textos: Casa de Detenção da Corte e o Perfil das Mulheres Presas no Brasil durante o
século XIX de MARCELO PEREIRA MELLO, v.2, nº1, semestre de 2001 p.31-48,
64
que ao citar a cor das presidiárias chama atenção para o alto número de mulheres negras
entre as detentas e Relações Femininas em ‘The Colour Purple’ de ELIANE BORGES
BERUTTI, v.2, nº 1,semestre de 2001p.103-108, onde a autora analisando as relações
entre os personagens do romance, comenta a situação das mulheres afro-americanas que, na
minha concepção, não difere da realidade das mulheres negras brasileiras.
. d) REVISTA TEMPORALIS.
É uma publicação semestral da Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em
Serviço Social (ABEPSS). Seu número data de jan. 2000 e foi lançada para substituir os
CADERNOS ABESS, que teve a sua publicação semestral interrompida após 8 números
editados (1986 – 1998).
A Revista Temporalis, que se encontra em seu número 7 (jul dez. 2003), com dois
suplementos especiais (out. 2001 e out. 2002), tem como objetivo “debater os assuntos
que instigam, preocupam e/ou fundamentam o pensar e o fazer no âmbito da profissão”
(www.abepss.ufsc.br/publicações). Neste contexto, publicada para profissionais em cujo
cotidiano interno entre seus pares e externo - quando em contato com sua clientela - as
relações inter-raciais são preponderantes, originando relacionamentos sócio-culturais
instigantes, preocupantes e fundamentais para o exercício profissional, a existência de
apenas 1 (um) artigo relacionado com a questão do negro na sociedade brasileira, referenda
a invisibilidade da população negra como tema ou a irrelevância da questão racial como
objeto de estudo ou de preocupação para os redatores e articulistas da publicação e para o
Serviço Social.
O artigo foi publicado na Temporalis 5 jan-jul de 2002 A Discussão Ética
das Ações Afirmativas: Problematizando o Principio da Igualdade” de MIRIAM
OLIVEIRA INÁCIO onde a autora debate a questão das cotas para negros na educação e
no trabalho.
e) LIVROS
É importante salientar que num exame dos títulos e capítulos (através dos índices)
dos livros da bibliografia específica para o Serviço Social ofertados pela Biblioteca Central
da UFF, também não detectamos nenhum livro abordando a temática racial ou sobre a
65
questão do negro em nossa sociedade. O livro de PINTO (2003), já citado neste texto, ainda
não faz parte do acervo da Biblioteca da UFF.
A GRADE CURRICULAR
Na grade curricular do curso de formação em Serviço Social da UFF, analisada
através do fluxograma das Disciplinas e das Ementas de Curso, (anexo 1) não foi
encontrada a ocorrência de disciplinas envolvidas com a transmissão de conhecimentos
sobre a questão do negro na sociedade brasileira. Encontramos citação sobre o estudo de
ETNIA em ementas que abordam a Questão Social e/ou Movimentos Sociais. Acredito que
isto ocorre porque para alguns estudiosos e/ou leigos, este termo ou conceito substitui o de
RAÇA, o que discordamos acompanhando a grande maioria dos estudiosos da questão
racial no Brasil, como o Prof. Kabengele Munanga e o Prof. Antonio Sérgio Guimarães.
Para MUNANGA (2004, p.28), o conteúdo da raça é morfobiológico e o de etnia é
sociocultural, histórico e psicológico”.
O mesmo ocorre em relação às grades das outras Universidades escolhidas para
uma comparação: da UFRJ, da UERJ e da PUC-RJ , conforme anexos 2, 3 e 4.
3.2.3 - QUESTIONÁRIOS APLICADO ÀS/OS ALUNAS/OS DO 9º
PERÍODO DA ESS-UFF
Como colocado anteriormente, o objetivo deste procedimento metodológico é aferir
o grau de conhecimentos das/os formandas/os em Serviço Social da UFF em relação a
questão que baliza a nossa pesquisa. Também pretendemos averiguar a pertinência da
introdução de disciplinas específicas a respeito da História e da cultura afro-brasileira entre
os saberes transmitidos durante o Curso de Graduação.
O questionário é composto por duas partes (anexo 5): uma contendo dados da/o
graduanda/o e a outra com questões referentes aos conhecimentos que elas/eles possuem
acerca da história e da cultura afro-brasileira e a opinião das/os formandas/os a respeito da
realidade da população negra na sociedade. Dos 74 alunos inscritos para o período, 47
(63,5%) responderam ao questionário.
66
Destes, na pergunta aberta sobre cor/raça (tab. 1), 9 (19,14%) se declararam
negras/os; 24 (51,06%) se disseram brancas/os; 9 (19,14%) se disseram pardas/os; 2
(4,25%) se autodenominaram morenas/os e 2 (4,25%) mulatas/os; 1 aluna/o, 2,12%, não se
identificou, alegando não saber.
Na pergunta fechada, seguindo os critérios do IBGE, as/os mesmas/os 9 (19,14%)
formandas/os se declararam pretas/os, 23 (48,9%) brancas/os; 13 (27,6%) pardas/os e 2
(4,25%) não se identificaram, alegando não ser do interesse do pesquisador ou não saber.
Tabela III - COR E RAÇA
Aberta Negra Branca Parda Morena Mulata NI TOTAL
09
19,14%
24
51,06%
09
19,14%
02
4,25%
02
4,25%
01
4,12%
47
100%
Fechada (IBGE) Preta Branca Parda Amarela Indígena NI TOTAL
09
19,14%
23
48,9%
13
27,6%
0 0 02
4,25%
47
100%
Fonte: José Barbosa, ESS-UFF, 2004
Esse resultado confirma o dado encontrado pelo Censo Étnico-Racial da UFF,
realizado em 2003 (TEIXEIRA E BRANDÃO, 2003, p.28/30) onde 63,23% / 270 das
alunas do Serviço Social se declararam ‘afrodescendentes’, enquanto 36,53% / 156 se
definiram como brancas, embora no quesito ‘cor/raça’ as alunas brancas alcançassem
49,8% contra 44,3% de alunas negras. Lógico que relativizadas as proporções: o Censo
UFF abrangeu a totalidade da ESS-UFF, enquanto a nossa abrange apenas uma parcela dos
estudantes em Serviço Social.
No quesito ascendência, (tab. 2) detectamos que apenas 4 (8,51%) das alunas
descendem de casamentos inter-raciais, com dois destaques: a) todas as alunas ‘pretas’ têm
origem em casais pretos; b) entre as alunas brancas e pardas, a miscigenação ocorrida (4) é
focada na parte feminina; c) a ocorrência “outra” não teve especificada a origem materna.
Tabela IV - ASCENDÊNCIA
ORIGEM Preta Branca Parda Outras TOTAL
PAI 09 23 15 0 47
MÃE 09 26 11 01 47
Fonte: José Barbosa – ESS-UFF, 2004
67
Na questão do domicílio, (tab. 3) 17 (36,17%) formandas/os residem no município
do Rio de Janeiro, sendo que não ocorrência oriunda da Zona Sul ou seja, da área
considerada mais rica da cidade. Este dado também se adequa com aquele apresentado no
Censo étnico-racial da UFF/2003, onde a maioria das/os alunas/os de Serviço Social,
50,59%, segundo o rendimento familiar, se encontra na faixa entre 1 a 5 salários mínimos.
A maioria das alunas/os reside em Niterói e municípios limítrofes, 27 (57,27%), e 3
(6,38%) formandas/os são residentes em municípios da Baixada Fluminense.
Por grupo racial, entre as pretas 4 (44,4%) residem no Rio, sendo 1 (11,1%) na
Zona Norte e 3 (33,3%) no Subúrbio; 3 (33,3%) moram em Niterói e 2 (22,2%) em São
Gonçalo, não tendo ocorrência nos outros Municípios; no grupo branco, 9 (39,3%) residem
no Rio, 3 (13.4%) na Zona Norte, 2 (8,6%) no Subúrbio e 4 (17,39%) na Zona Oeste; em
Niterói habitam 8 (34,7%), em São Gonçalo residem 5 (21,7%), e em Itaboraí 1 (4,34%); 4
(13,3%) das pardas habitam no Rio, sendo que na Zona Norte e no Subúrbio residem 2
(13,3%) respectivamente; 6 (40%) se dividem entre Niterói e São Gonçalo, enquanto 1
(6,6%) moram em Itaboraí e em Marica; 3 (20%) das pardas são as únicas das participantes
do questionário a residir na Baixada Fluminense.
Partindo do principio de que os Municípios da Baixada Fluminense e aqueles
fronteiriços com Niterói são classificados como ‘dormitórios’ e a maior parte da população
residente se enquadra na faixa abaixo dos 5 salários nimos, esses dados possibilitam
além constatar um outro dado presente no Censo-UFF acerca da situação econômica dos
alunos da ESS-UFF e também admitir a veracidade de um dos preconceitos, aceito pelo
senso-comum, acerca do curso de Graduação em Serviço Social: ser um curso para aqueles
estudantes menos aquinhoados economicamente e com menor condição de disputar cursos
de maior ‘status’ sócio-econômico.
Tabela V - DOMICÍLIO
MUNICÍPIO Preta Branca Parda Outras TOTAL
RJ
Norte 11,1% 13,04% 13,3% -
Subúrbio 33,3% 8,6% 13,3% 0
Zona Oeste - 17,39% - -
36,1%
NITERÓI 33,3% 34,7% 20% 0 29,7%
SÃO GONÇALO 22,2% 21,7% 20% 0 21,2%
ITABORAI 0 4,34% 6,6% 0 4,25%
MARICÁ 0 0 6,6% 0 2,12%
BAIXADA 0 0 20% 0 6,38%
TOTAL 100% 100% 100% 0 100%
Fonte: José Barbosa – ESS-UFF, 2004
68
Como informamos, a segunda parte do questionário foi dedicada a especular os
conhecimentos e as opiniões das graduandas/os acerca de questões que afetam o cotidiano
dos negros na sociedade brasileira na atualidade.
A questão você acredita que nós vivemos em um País onde todos possuem os
mesmos direitos e usufruem as mesmas oportunidades de ascender socialmente,
independente da raça ou cor da pele? Justifique das 47 graduandas recebeu 40 (85,1%)
de resposta NÃO, distribuídos entre 9 ou 100% das formandas/os pretas/os, 21ou 91,3%
das formandas/os brancas/os e 10 ou 66,6% das formandas/os pardas/os.
A opção SIM recebeu 6 (12,7%) sendo 2 ou 8,69% das formandas/os brancas/os e
4 ou 26,6% dados pelas formandas/os pardas/os; 1 formanda/o parda/o não respondeu.
Quanto às justificativas, destaca-se a citação da desigualdade socioeconômica entre
negros e brancos que obteve 34% ou 72,3% das indicações.
Tabela VI - Você acredita que nós vivemos em um País onde todos possuem os mesmos direitos e usufruem as
mesmas oportunidades de ascender socialmente, independente da raça ou cor da pela? Justifique.
Preta Branca Parda Total
Graduando
(%)
% Graduando
(%)
% Graduando
(%)
% Graduando
(%)
%
Não 09 100% 21 91,3% 10 66,6% 40 85,1%
Sim ---- ---- 02 8,7% 04 26,6% 06 12,8%
NR ---- ---- ---- ---- 01 6,7% 01 2,1%
TOTAL 9 100% 23 100% 15 100% 47 100%
Fonte: José Barbosa, ESS-UFF, 2004
Estes dados demonstram que as formandas/os encontram-se sintonizados
empiricamente com a realidade racial da nossa sociedade. Falta-lhes o conhecimento
teórico, como veremos em outra questão.
A questão você foi vitima ou presenciou alguma prática discriminatória ou
atitude preconceituosa contra os negros ou afrodescendentes? Que atitude você tomou? -
A opção NÃO foi indicada por 15 (31,9%) das graduandas/os, divididas entre 2 ou
22,2% das graduandas/os pretas/os; 10 ou 43,4% das graduandas/os brancas/os e 3 ou
20% das pardas.
A opção SIM obteve 32 (68%) das citações, sendo 7 ou 77,7% das/os
graduandas/os pretas/os; 13 ou 56,5% das/os brancas/os e 12 ou 80% das /os pardas/os.
69
Para a segunda parte da questão que atitude você tomou?- a maioria, 30 ou
63,82%, indicaramnenhuma’. Esse dado, em conjunto com a leitura de algumas respostas
no quesito ‘conhecimento’, pode configurar um indicativo da falta de determinados saberes
para que um indivíduo reaja ás violências que a sociedade lhe impõe.
Tabela VII - Você foi vítima ou presenciou alguma prática discriminatória ou atitude preconceituosa
contra negros ou afrodescendentes? Que atitude você tomou?
Preta Branca Parda Total
Formando
(%)
% Formando
(%)
% Formando
(%)
% Formando
(%)
%
Não 02 22,3% 10 43,4% 3 20% 15 31,9%
Sim 07 77,7% 13 56,6% 12 80% 32 68,1%
NR ---- ---- ---- ---- ---- ---- ---- ----
TOTAL 9 100% 23 100% 15 100% 47 100%
Fonte: José Barbosa, ESS-UFF, 2004
A questão Você acha necessária a inclusão de conteúdos programáticos sobre a
História e a Cultura negra no currículo da Graduação em Serviço Social? Justifique.’
recebeu 8 (17,02%) da opção NÃO, sendo 4 ou 17,39% proveniente das graduanda/os
brancas/os mesma quantidade das graduandas/os pardas. Apenas 1 ou 2,12% das
graduandas/os brancas/os preferiu por não opinar; 38 (80,85) das/os graduandas/os
responderam SIM, compartilhado por 9 ou 100% das/os formandas/os pretas, 18 ou
78,26% das/os brancas/os e 11 ou 73,3% das pardas/os.
Apesar de mais uma vez o quantitativo de alunas/os pardas/os que responderam
NÃO estarem acima da nossa expectativa, uma visão geral certamente sinaliza para a
existência de um vácuo no processo de formação das Assistentes Sociais e da necessidade
de inclusão de conteúdos sobre a História e a Cultura da população negra entre os seus
saberes, para leva-los a perceber a realidade que mediatiza as relações entre os segmentos
negros e brancos na nossa sociedade. As respostas dadas as questões seguintes podem
auxiliar na comprovação dessa nossa reflexão.
Tabela VIII - Você acha necessária a inclusão de conteúdos programáticos sobre a História e a
Cultura negra no currículo da Graduação em Serviço Social? Justifique.
Preta Branca Parda Total
Formando
(%)
% Formando
(%)
% Formando
(%)
% Formando
(%)
%
Não ---- ---- 04 17,3% 04 26,6% 08 17,0%
Sim 09 100% 18 78.2% 11 73,3% 38 80,9%
NR ---- ---- 01 4,34% ---- ---- 01 2,1%
70
TOTAL 9 100% 23 100% 15 100% 47 100%
Fonte: José Barbosa, ESS-UFF, 2004
Na pergunta Qual a sua opinião sobre as políticas de Ação Afirmativa e sobre o
sistema de cotas para negros nas Universidades Públicas? essa pergunta foi colocada
apenas para obter uma avaliação acerca dessa questão entre as/os alunas/os , tendo em vista
o debate para a implantação da política de cotas na UFF em futuro próximo e esta
incorporação ser considerada uma ação de política pública e social. Embora
compreendamos que Ações Afirmativas e Cotas são coisas diferentes, apesar de imbricadas,
para o senso comum elas são sinônimos, significando a mesma coisa. Haja visto os
inúmeros artigos publicados em jornais e revistas tratando desse assunto, sem distinguir
suas especificidades.
24 (51,2%) responderam que NÃO acham necessária a adoção dessa política na
UFF, sendo 2 ou 22,2% entre as/os formandas/os pretas/os; 14 ou 60,86% entre as/os
formandas/os brancas/os e 8 ou 53,3% entre as/os formandas/os pardas/os. A resposta
SIM mereceu 5 ou 55,5% entre as/os formandas/os pretas/os; 7 ou 30,43% entre as/os
formandas/os brancas/os e 6 ou 40% entre as/os formandas/os pardas/os, perfazendo um
total de 18 (38,2%) das respostas; 5 (10,6%) optaram por não responderem, sendo 2 ou
22,2% das pretas; 2 ou 22,2% entre as brancas e 1 ou 6,6% das pardas..
É importante ressalvar que 19 (40,4%) dos optantes disseram serem favoráveis a
adoção de políticas afirmativas, porém, 10 ou 21,2% querem as cotas segundo o critério de
pobreza e não o de ‘raça’; enquanto 9 ou 19,1% citaram a melhoria no ensino de base.
O fato de mais da metade (51%) dos participantes responderem NÃO, quantitativo
também relativamente alto entre aquelas/es que NÃO RESPONDERAM, (10%)
principalmente quando avaliado por grupo racial, mostra como a desinformação sobre o
sentido real das Políticas de Ação Afirmativa ou as informações contrárias, bem mais
destacadas pelos meios de comunicação, atuam entre a população em geral, influenciando a
própria população negra, 22,2% responderam NÃO e outros 22,2% se abstiveram,
beneficiário maior dessas políticas. Demonstra também que precisamos aumentar o
volume do gramofone para nos fazer ouvir e buscar fazer a população em geral
compreender que, a nossa sociedade terá a lucrar com a redução das desigualdades,
indiretamente geradora de alguns males que assola a nossa sociedade atualmente.
71
Tabela XIX - Qual a sua opinião sobre as políticas de Ação Afirmativa e sobre o sistema de cotas para
negros nas Universidades Públicas?
Preta Branca Parda Total
Formando
(%)
% Formando
(%)
% Formando
(%)
% Formando
(%)
%
Não 02 22,2% 14 60,8% 08 53,3% 24 51,1%
Sim 05 55,6% 07 30,5% 06 40% 18 38,3%
NR 02 22,2% 02 8,7% 01 6,6% 05 10,6%
TOTAL 9 100% 23 100% 15 100% 47 100%
Fonte: José Barbosa, ESS-UFF, 2004
A questão Aponte o grau de conhecimentos que você possui sobre? Visa averiguar
os conhecimentos das/os graduandas/os a respeito de conteúdos fundamentais para entender
a questão do negro na sociedade brasileira e capacita-las/os a intervir na presença de
atitudes preconceituosas e ações discriminatórias contra a população negra em seu
ambiente de trabalho, e também para auxiliar na extinção dessa chaga secular que divide a
nossa sociedade entre incluídos, em sua maioria brancos, e excluídos, onde a população
negra predomina..
Distribuímos as respostas por dois grupos: a) pela cor da pele (tab. X) e; b) pelo
número total dos optantes de acordo com o grau de conhecimento dos conteúdos
apresentados (tab. XI). Por acreditar que a apreensão de saberes sobre a temática da nossa
pesquisa é importante para todos profissionais, independente da cor da pele, na análise
abaixo apresentamos apenas os dados da segunda tabela.
Selecionamos os seguintes conteúdos:
História da África - que é muito conhecida por apenas 1/ 2,12% das formandas/os;
pouco conhecida por 32/ 68% das/os formandas/os e 14/ 29,7% das/os formandas/os
possuem nenhum conhecimento sobre o assunto.
Teorias Raciais mostrou-se muito conhecida também por apenas 1/ 2,12% das/os
formandas/os; pouco conhecida por 31/ 65,9% das/os formandas/os e 15/ 31,9% das/os
formandas/os possuem nenhum conhecimento sobre o assunto.
Democracia Racial 5/ 10,6% das/os formandas/os declararam possuir muito
conhecimento acerca do tema; 32/ 68,08% declararam possuir pouco conhecimento e 10/
21,2% nenhum conhecimento.
72
Teoria do Branqueamento - 4/ 8,51% das/os formandas/os declararam possuir
muito conhecimento; 14/ 29,7% disseram ter pouco conhecimento e declararam possuir
nenhum conhecimento 27/ 57,4% das/os formandas/os.
Cultura Negra - declararam possuir muito conhecimento 6/ 12,7% das/os
formandas/os; 38/ 80,8% formandas/os declararam possuir pouco conhecimento; enquanto
nenhum conhecimento recebeu 3/ 6,38% .
Religião afro-brasileira 10/ 21,2% das/os formandas/os se declararam com muito
conhecimento; 32/66,08% das/os formandas/os responderam possuir pouco
conhecimento; 5/ 10,6% declararam possuir nenhum conhecimento.
Racismo/Preconceito/Discriminação com muito conhecimento se declararam 22/
46,8% da/os formandas/os; pouco conhecimento foi declarado por 25/ 53,19% das/os
formanda/os; nenhum conhecimento obteve ‘0’ declaração.
Como fica claro por estes dados, o desconhecimento dos conteúdos que dizem
respeito a questão do negro na sociedade brasileira pelas/os graduandas/os em Serviço
Social é muito alto. Apenas 14,89% (tab. XI) das/os formandas/os disseram dominar os
conteúdos considerados básicos para dotar as/os Assistentes Sociais de uma autonomia,
que os auxilie na intervenção junto aos seus usuários e que também venha a preencher o
vácuo deixado pela escola na transmissão de conhecimentos que faça os alunos aceitarem a
alteridade como norma no processo de interação social entre os seres humanos,
independente da cor da pele. Mas para que isto aconteça é necessário que esses
conhecimentos sejam integrados na grade curricular e/ou, pelos Professores, entre os
conteúdos programáticos do curso de graduação em Serviço Social.
O que pensa sobre isto os Professores da graduação em Serviço Social da UFF.
73
Tabela X – Grau de conhecimentos sobre: a)Pela cor da pele
Temas Preta/o Branca/o Parda/o TOTAL
Grau M P N M P N M P N
História da
África
01 07 01 0 13 10 0 12 03 47
% 11,1% 77,7% 11,1% -- 56,5% 43,4% -- 80% 20% 100%
Teorias Raciais 01 06 02 0 19 04 0 06 09 47
% 11,1% 66,6% 22,2% -- 82,6% 17,3% -- 40% 60% 100%
Democracia
Racial
02 04 03 01 19 03 02 09 04 47
% 22,2% 44,4% 33,3% 4,34% 82,6% 13% 13,3% 60% 26,6% 100%
Teoria do
Branqueament
o
03 02 04 0 08 15 01 06 08 47
% 33,3% 22,2% 44,4% -- 34,7% 65,2% 6,6% 40% 53,3% 100%
Cultura Negrra 04 05 0 0 22 01 02 11 02 47
% 44,4% 55,5% -- -- 95,6% 4,34% 13,3% 73,3% 13,3% 100%
Religião Afro 04 04 01 02 19 02 04 09 02 47
% 44,4% 44,4% 11,1% 8,6% 82,6% 8,6% 26,6% 60% 13,3% 100%
Racismo 04 05 0 10 13 0 08 07 0 47
44,4% 55,5% -- 43,4% 56,5% -- 53,3% 46,6% -- 100%
Fonte: José Barbosa, ESS-UFF, 2004.
Tabela XI – Grau de conhecimentos sobre: b) Geral
Temas/ / Grau Muito Pouco Nenhum Total
História da África 1 2,12% 32 68% 14 29,7% 47 100%
Teorias Raciais 1 2,12% 31 65,9% 15 31,9% 47 100%
Democracia Racial 5 10,6% 32 68% 10 21,2% 47 100%
T. Branqueamento 4 8,5% 16 29,7% 27 57,4% 47 100%
Cultura Negra 6 12,7% 38 80,8% 3 6,38% 47 100%
Religião Afro... 10 21,2% 32 68,06% 5 10,6% 47 100%
Racismo 22 46,8% 25 53,19% 0 - 47 100%
74
TOTAL 49
14,89
%
206 62,61% 72 22,49% 329 100%
Fonte: José Barbosa, ESS-UFF, 2004.
3.2.4 – ENTREVISTAS COM OS PROFESSORES.
Como informamos na Introdução, as entrevistas com os Professores têm a finalidade
de averiguar a opinião dos Docentes do curso de graduação da ESS-UFF, acerca da inclusão
de temas sobre a questão do negro no Brasil, que faculte a inserção da população negra de
forma igualitária nas políticas sociais adotadas pelo poder público e dote os Assistentes
Sociais de autonomia para intervir, entre seus usuários e/ou entre seus pares, quando na
presença de atitudes ou ações preconceituosas e/ou discriminatórias contra a população
negra.
Entrevistamos 10 professoras/es ou 33% do Corpo Docente, todas/os lecionam na
Graduação, sendo que 5 delas/es também lecionam na Pós-Graduação. Identificamos por
um código formado pelo ‘P’ de professor e uma letra do alfabeto. Apresentamos as
seguintes perguntas:
a) Você concorda com a hipótese de que o desconhecimento das origens das
teorias raciais e da história do negro na sociedade brasileira por parte dos profissionais
que lidam diretamente com a coletividade, reforça as atitudes preconceituosas e ações
discriminadoras contra a população negra na nossa sociedade? Justifique sua opção.
Embora concorde que a apreensão de saberes sozinha não resolve o problema do
racismo contra qualquer grupo racial ou étnico, esta questão objetiva verificar a
aceitabilidade da minha hipótese de pesquisa entre os docentes da ESS-UFF.
Seis (6) professores responderam SIM; duas (2) entrevistadas/o optaram pelo NÃO
e duas (2) permaneceram NEUTRAS.
Para um/a das/os entrevistadas/os, a/o ‘PA’, eu acho que não é no Serviço
Social. Acho que deveríamos aprender a História e a Cultura africana desde o Ensino
Médio. Como isto não acontece ... a Universidade deve dar conta disso”. Em outra
entrevista, a/o ‘PC’ assegura que “mais de que o desconhecimento, a falta de
reconhecimento do negro como produtor de cultura implica no reforço ao preconceito.
75
Sempre foi uma história de branco, sempre um olhar estrangeiro e um olhar estrangeiro
preconceituoso”.
Uma das entrevistadas/os utilizou a sua própria história de vida para responder a
pergunta: Graduei-me em 62. trabalhei com mendigos e em favelas, com brancos e
negros, mas nunca pensei a negritude como problema; problema para mim era a pobreza.
...No Mestrado mergulhei em estudos do trabalho escravo... então repensei o Brasil e as
relações étnicas. Nesse tempo, lecionando na ESS-UFF a partir de 84, ‘enxerguei’ pela
primeira vez, a negritude de alunos/as da Escola e também nos curso de baixo prestígio
social ... e pela primeira vez, sei agora, cruzei informes sobre negritude, pobreza e
hierarquia universitária. no inicio de 90, com o Doutorado de História, minhas
discussões sobre relações sociais de gênero no espaço doméstico no Rio de Janeiro do
século XIX, permitiram ampliar meu olhar sobre a negritude e seus significados”. (PF)
Na opinião de ‘PI’ levando-se em conta que, “... a gente lida com a questão de
gênero, velhice, adolescência, entre outras questões, a questão racial também teria que
está presente. As/os Assistentes Sociais têm uma dimensão política muito grande na sua
atuação. É que ele lida no campo dos valores, no campo da cultura, ele trabalha com a
linguagem então eu acho que realmente é uma lacuna que precisa ser preenchida.”
‘PJ’ agrega esse desconhecimento cognitivo do Assistente Social à situação
econômica vivenciada pela população negra no cenário nacional, algo já tratado nesse
texto. Para ele, qualquer desconhecimento sobre qualquer tema traz consigo alguma
implicação, tanto no saber como no fazer de um profissional. No Serviço Social vai ter
uma repercussão muito mais importante na medida em que a população usuária em geral
são segmento pauperizados e o negro, por suas condições sócio-econômicas, decorrente da
sua trajetória histórica, é na verdade um segmento que se encontra mais entre a população
usuária das Políticas Públicas do Serviço Social”.
A/o entrevistada/o que optou pelo NÃO, considera que a questão de classe é mais
determinante do que a racial. “Eu acho que tem outras determinações, eu não acho que
seja a pele. Eu não vejo isso dessa forma não. Eu acho que a sociedade capitalista tem
outras bases que são fundamentais principalmente as materiais que muitas das vezes
eliminam determinados, supostos preconceitos, que podem estar permeando”. (PD)
Para um/a entrevistada/o não existe uma relação de causalidade entre o
desconhecimento e o nível de racismo contra o negro. Eu não acho que reforce Acho que
76
pode reforçar. Acho que não existe, necessariamente, uma relação direta de causalidade,
mas pode reforçar, sim” (PE).
Na opinião de ‘PB’ isso não ocorreria, porque nós temos um estigma que é o
seguinte: o negro está associado a trabalho braçal, sujo, violento, que ninguém quer fazer.
Tem um pouco de ligação com a nossa formação cultural. Não acredito que o
conhecimento mais aprofundado atenuaria alguma prática racial, atenuaria o
preconceito”.
Como já comentamos a estigmatização da negritude entre a população brasileira
sofreu um vigoroso processo de naturalização que na mentalidade de muitos indivíduos
ganha foro de verdade. Em sua pesquisa para o Doutorado IOLANDA DE OLIVEIRA,
atesta que a negação da raça se acentua entre os negros pobres e em mestiços de ambos
estratos sociais” (OLIVEIRA,1999, p.50). Notou também, entrevistando 69 crianças de
epiderme, estrato social e idades diferentes, algo muito ameaçador, que os conduz a negar
sua ascendência negra, tendendo fortemente para o branqueamento:
...estes sujeitos apresentam evidências de comportamento que
confirmam terem assimilado a idéia da inferioridade do negro,
estando convencidos de que a solução para o problema é o tornar-se
branco. (OLIVEIRA, 1999, p.144)
A/o professor/a ‘PG’ concorda com esta posição. Em suas palavras,
na verdade o grande problema é o modo como estas questões foram
naturalizadas... A questão étnica-racial foi construída de uma forma
tão escamoteada, que você acha que não é preconceituoso, racista,
que não discrimina, que convive muito bem com o outro e a maneira
de romper com isso é quando a gente pensa acerca dessas coisas.
Acho que temos que refletir muitas sobre esta questão”.
Associando este desconhecimento à condenação feita pela população a fatos sociais
realizados por jovens favelados no Rio de Janeiro, a/o Assistente Social ‘PH’ afirma que,
A falta de uma produção sistemática sobre a raça, etnia, sobre
comunidades afrodescendentes ou sobre o negro brasileiro, faz com
que o senso-comum seja legitimado. E qual é o senso-comum que a
gente tem? É um senso-comum produzido por uma ideologia de
embranquecimento que diz que o negro não é ninguém. É o sujeito
que é fruto desse processo de desigualdade desenvolvido por uma
sociedade racista e que também desenvolveu um falso esboço de
democracia racial.”
77
b) Você considera necessária a inclusão de uma disciplina ou de conteúdos
programáticos sobre a história do negro na sociedade brasileira e das relações sócio-
raciais entre a população negra e outros segmentos da sociedade brasileira na grade
curricular da graduação em Serviço Social ? Justifique sua opção.
Esta questão, importantíssima para a nossa questão de pesquisa, mereceu a quase
unanimidade dos entrevistados. A maioria acha importante a inclusão de conteúdos
relacionados com a questão do negro na nossa sociedade. Apenas uma das/os
entrevistadas/os crê que o currículo possui abertura para o tema e que uma das
possibilidades está na discussão de etnias, raças, não como uma disciplina, mas como foco
ligado à questão social, que pode ser discutido no núcleo de formação social brasileira”
(PD), dependendo então da demanda dos alunos e interesse do professor.
Outro/a professor/a considera “que seria interessante, necessário e útil para o
profissional que sai daqui, para o profissional que a gente quer formar. Não para ele
como ser humano, como cidadão e como sujeito se posicionar, conhecer isso, como
também para ele poder lidar com os outros” (PA).
Este depoimento se ajusta a algo que salientamos no texto, o fato de uma parte
considerável das/os Assistentes Sociais serem pretos e pardos, assim como seus usuários.
Também é essa a opinião de outros depoentes, como ‘PG’, que chama a atenção para outros
temas, durante muito tempo, excluídos da sala de aula e presentes na realidade dos saberes
das/os Assistentes Sociais da UFF: eu acho que não preparar o alunado que vai estar
lidando com uma população que é majoritariamente negra é uma outra falha do curso. E
isso me remete ao fato deste tema não ser encontrado em currículo nenhum do Serviço
Social que eu conheço. Embora a UFF seja uma das mais avançadas nesse sentido, porque
pelo menos temos uma disciplina obrigatória de Gênero e uma de Família.”
O fato da o consideração do movimento negro como um movimento social é
destacado por ‘PB’“... Algumas das disciplinas nossas passam por algumas das questões
sociais, tem um destaque na ementa para a questão étnica, pobreza e tal. Mas do negro
não se menciona, não é movimento social”. Embora a situação socioeconômica da
população negra seja comprovadamente de exclusão, como demonstramos no cap. I e os
Indicadores Econômicos e Sociais do IPEA, do IBGE, da UNESCO mostraram para a
sociedade, sem uma justificativa plausível a questão do negroo é considerado um tema
acadêmico ou digno de estudos e pesquisa.
78
“... seria muito legal, mas, mais importante seria tratar da História do Brasil,
tratar do negro na História do Brasil, sabe. Como parte da História e não como uma
história particular, entendeu, uma história separada” (PE). Nestes 166 anos de ensino da
História do/no Brasil (1838 2004), isso não aconteceu. Acredito que, embora nunca seja
tarde para começar, primeiramente devemos preparar aqueles que deverão transmitir os
conhecimentos, que é algo que defendemos neste trabalho.
E esta é também a opinião de ‘PH’. Considerando a História do Brasil “mentirosa”,
ela/e comenta que, os Assistentes Sociais são chamados de profissionais a serviço da
cidadania. Que cidadania a gente pode estimular o nosso usuário a exercer se a questão
étnica-racial não es em pauta. Por exemplo: eu trabalho com meninas pobres, negras e
não negras. Obviamente a minha intervenção deve ser uma intervenção qualificada para
compreender esse mundo juvenil, que é recortado pelo gênero, étnica-racialmente e ainda
pela questão de classe ... então a gente precisa se qualificar para atender essas meninas.
Essa qualificação tem de passar pela questão étnica-racial, pela compreensão das teorias
raciais. Não porque sou Assistente Social, mas porque os sujeitos se inscrevem na
sociedade de uma forma diferenciada, a partir da sua classe, a partir do seu gênero e a
partir de sua origem racial. Para compreendermos melhor a realidade social onde a gente
está inserido, onde nosso usuários estão inseridos e onde a questão social se faz presente,
é fundamental nos apropriarmos da questão étnica-racial”.
Vai mais além, se reportando aos Parâmetros Curriculares do MEC, conclama que a
questão étnica-racial seja considerado um tema para ser discutido em um núcleo de estudo
que se aproxime de todas as disciplinas. Acho que para além de ser um parâmetro
curricular, ela tem que vir com um núcleo de estudos. Que não seja uma disciplina
opcional ou que se no ou períodos, mas que as disciplina incorporem essa
questão” ‘PH’. Esta aprendizagem ocorrendo no ensino sico é também defendido por
‘PI’, ficando para a Graduação a discussão conjuntural de como o negro se insere hoje na
sociedade? Qual a representatividade política e social que ele tem? Como estimular a sua
inserção sócio-econômica?
c) Você tem alguma opinião acerca do motivo da não inclusão de uma disciplina
ou de conteúdos programáticos sobre a história do negro na sociedade brasileira, sobre
79
as teorias raciais e sobre a cultura afro-brasileira na grade curricular da graduação em
Serviço Social da UFF? Justifique?
Inicialmente, ao elaborar a questão eu partia de duas possibilidades; uma religiosa e
outra ideológica. Porém com as entrevistas mas outras possibilidades se afirmaram,
relacionadas com a demanda da sociedade e de formação dos alunos e interesse dos
professores.
Na opinião de ‘PA’, não existe esta coisa que o Serviço Social discrimina ou que
não tem este olhar. Ela reproduz algo que, de maneira geral, a sociedade vem fazendo.
Quando você que desde o Ensino Médio o aluno não possui nenhuma informação,
nenhum conhecimento mais específico sobre a cultura negra ... Então quando chega na
Universidade, essa vai se preocupar com a formação específica para aquela área de
conhecimento”.
Para PB’ a exclusão ocorre também em outras carreiras e não somente no Serviço
Social e,“...eu tenho a impressão que essa não inclusão pode mascarar duas coisas: dizer
que a sociedade não tem significativa população negra,tipo um grupo restrito que não
merece este tipo de preocupação ou então mostrar que, como sempre afirmamos, nós não
temos preconceito racial”.
O depoimento de “PC” enlaça a exclusão com a dominação exercida pelos
conhecimentos elaborados anteriormente baseados no etnocentrismo ariano e que tinham o
negro como simples receptor do saber e não como produtor. Se eu tenho opinião sobre o
motivo da não inclusão de temas sobre a questão negra no currículo? Eu acho que parte
desse saber já cristalizado do negro como não produtor de cultura, né. Porque vai entrar a
não cultura no palácio do saber, na Academia?Estes conhecimentos começam a entrar
na Academia quando a redemocratização e os movimentos sociais começam a aparecer
e a se impor como sujeitos políticos. ... Quando as mulheres se tornaram médicas, o
conhecimento sobre o corpo feminino mudou, avançou. Assim quando os negros entraram
na Academia começaram a discutir o negro na sociedade. Mas essa dominação é tão
grande que uma boa parcela dos primeiro negros sucumbiram à dominação dos saberes
existentes. ... Como diz Bourdieu é preciso uma revolução simbólica no corpo e na mente.
Então quando o negro entra na Academia quase uma impossibilidade de romper
imediatamente com a dominação. Então você tem de fazer um reconhecimento da
existência dela (dominação) e eu acho que o movimento negro fez essa revelação. Essa
80
desconstrução e a criação de novos símbolos Zumbi, o corpo, o cabelo, as roupas as
mulheres passaram a usar roupas coloridas, largaram o bege, que é cor de branco. A
entrada dessas pessoas oriundas do movimento, faz com que a Academia, o discurso
acadêmico, comece a ruir. ... Como diz Sartre falando sobre os operários: quando os novos
personagens entram em cena, eclode de tal maneira que é impossível que passe
despercebido e a academia vai ter que incorpora-lo. ... As próprias pessoas oriundas desse
movimento, como a Iolanda, (coordenadora do PENESB) impõem determinados temas na
academia: quero discutir isto, quero falar sobre isto e as pessoas começam a ter outra
visão. Eu acredito que na próxima reforma curricular a questão do negro, do
homossexualismo, vão ter que entrar”.
A entrevistada ‘PD’ associa a ausência da questão do negro entre os saberes no
Serviço Social a falta de demanda da sociedade, na medida que: “a pesquisa é fruto da
dinâmica social. Quem tem que dar a indicação é a realidade e não o pesquisador. A
realidade é quem tem que ‘falar’. Se não vem à tona, se não é objeto de indagações da
própria população como é que você induz a pesquisa. A pergunta deveria ser: porque esse
elemento não tem sido priorizado como objeto de pesquisa?”.
Para ‘PF’, autora da ementa da disciplina “Relações de Classes, Gênero e Etnias”,
para o currículo de 1985, e também da inclusão das disciplinas “O Negro no Pensamento
Social Brasileiro” e “O Negro no Processo de Formação da Sociedade Brasileira”, na
reformulação de 1999 que hoje não constam na grade curricular:“esse silêncio acadêmico
sobre o tema é muito mais complicado do que se pode imaginar; temos construído um
saber, uma cultura que esconde, que nega a nossa negritude. A gente silencia sobre essas
relações mesmo quando sabe do assunto. Acho que isso está num dado quadro cultural a
ser mais bem examinado. A negritude é invisível na nossa cultura. Nós não a refletimos...
Tão perto e tão longe”.
Com uma fala onde não nega a sua radicalidade, ‘PH’ crítica a forma como é
desenvolvido o currículo e os problemas que essa elaboração trás para a categoria. Quem
são os professores que elaboraram esta proposta curricular? Quanto negros existiam entre
ele? Nenhum é claro! Eu tinha uma fala, muito preconceituosa confesso, mas que era
sincera. É diferente eu discutir miséria e pobreza vivenciando ou estando no meu gabinete
tomando whisky. Pensar uma proposta curricular onde seus representantes são
homogêneos, significa que não haverá heterogeneidade nem diversidade neste currículo”.
81
d) Você possui conhecimentos sobre a questão do negro na sociedade brasileira
que lhe habilite a transmiti-los para suas/seus alunas/os?
Como comentado na Introdução deste texto, a grande maioria dos 172 milhões de
brasileiros, desconhecem conteúdos mínimos acerca da secular história e da rica cultura
afro-brasileira. Entre esses podemos incluir a maior parte dos três milhões de professores,
de todos os níveis de ensino, existentes no País. A questão é, como é possível alguém
ensinar o desconhece?
Entre as/os entrevistadas/os, apenas ‘PF’ se disse possuidora de conhecimentos
sobre a questão do negro na sociedade brasileira sim, meus estudos hoje me habilitam a
debater o assunto, tenho uma enorme identidade com o tema, pesquiso-o constantemente,
mesmo porque quem disse que eu não sou mestiça?”.
‘PI’ acredita que seus conhecimentos são suficientes para fomentar discussões
dentro da questão social como um todo, porém para lecionar uma disciplina específica,
um curso, sinceramente, eu teria que me qualificar”.
Para ‘PG’, além de não se sentir capacitada, ela/e “acha que na categoria existem
poucas pessoas. No Serviço Social encontro muito pouco debate sobre isto”. ‘PH”
associa sua aproximação com o PENESB como fator de um melhor preparo sobre a questão
do negro na nossa sociedade.
‘PJ’ não se sente capacitado nem habilitado para lecionar um curso. Segundo ele,
quando estou discutindo as relações de trabalho, obrigatoriamente, a gente chega na
questão do negro na sociedade brasileira. Porém ele não é o centro da discussão, é
tangencial”
A mesma negativa se fez presente entre os outros entrevistados, demonstrando que
tem lugar para a questão do negro na formação dos Assistentes Sociais da UFF. Antes
porém teremos que atuar nos Professores, como nos foi apresentado acima.
82
CAPÍTULO IV
TEM ESPAÇO PARA A QUESTÃO DO NEGRO NO CURSO DE
GRADUAÇÃO EM SERVIÇO SOCIAL DA UFF?
Como é possível constatar pelas informações apresentadas acima, a população negra
e as questões que dificultam a sua inserção de direito e de fato na sociedade brasileira não é
incluída como uma questão social, passível de ação de política pública e social e/ou de
proteção social nos conteúdos programáticos transmitidos para as alunas/os do curso de
graduação em Serviço Social da UFF. Essa situação também foi detectada e abordada por
PINTO (2003) em sua pesquisa realizada em 1986, quando notou que “o discurso da
transformação social da realidade não inclui aspectos referentes à população negra no
processo de formação profissional” (p.162).
Essa não inserção entre os saberes apreendidos pelas/os Assistentes Sociais pode ter
ocorrido por algumas motivações, entre elas podemos elencar: 1) a origem religiosa da
profissão; 2) a vinculação teórica-metodológica marxista; 3) a demanda pela sociedade e
pelo alunado; 4) despreparo dos professores e 5) A questão do negro/racial não ser
considerada uma questão social ou de política social.
Nesta parte da Dissertação objetivamos discutir o porquê desta exclusão de saberes
sobre as origens e legados culturais da população negra brasileira, entre aqueles
apreendidos pelas alunas da ESS-UFF. Também abordaremos as Teorias Curriculares na
visão de Tomas Tadeu da Silva e outros estudiosos do currículo e a influência exercida na
última revisão curricular realizada na UFF, quando discutiremos as prováveis causas para a
inexistência de conteúdos que aborde a questão do negro na sociedade brasileira entre os
conhecimentos legados as/aos Assistentes Sociais formadas/os pela UFF.
4.1 – AS TEORIAS CURRICULARES
O legado cultural –“associado à possibilidade de reprodução e transmissão linear e
estática de um conjunto de crenças, valores, hábitos, comportamentos e tradições
83
compartilhadas, que indivíduos/grupos sociais trazem de determinados lugares” (MEYER,
2001: p.369) - dos negros africanos para os brasileiros, desde o inicio foram enquadrados
como não compatíveis ou socialmente válidos com a idéia de Nação, de civilização e de
progresso ansiada e desenvolvida pela elite brasileira, que se sentiam como europeus e
gostariam que os outros brasileiros também se sentissem. Assim sendo, foram excluídos das
nossas salas de aulas conteúdos sobre as heranças históricas, sociais, culturais e religiosas
trazidas pelos africanos da diáspora, que, no translado forçado, não transportavam malas,
roupas, armas ou utensílios domésticos, mas conduziam dentro de si séculos de
ancestralidade transmitida a viva voz pelos ‘griots’ e manifestada em sentimentos,
mentalidades, hábitos alimentares, palavras e gestos depositados na terra após a grande
‘travessia da calunga grande’
28
.
Esses conhecimentos não sendo retransmitidos na escola não reproduzem no
cotidiano a sensação de pertencimento necessária para a produção da identidade e de
representação do negro brasileiro na sociedade, algo imprescindível para o
desenvolvimento de uma auto estima positiva. E eles não eram retransmitidos porque não
constavam das diretrizes curriculares do sistema educacional brasileiro. A partir da já citada
lei nº 10639/2003, essa situação deve se alterar para aqueles que ainda se encontram ou que
vão adentrar nas salas de aula do ensino básico. Para aqueles que já se formaram ou
abandonaram a escola, urge preparar os que agora estão de saída da Universidade e que têm
seus caminhos cruzados no cotidiano. Daí a relevância deste texto.
Desenvolvido a partir do final século XVI (GOODSON, 1995) o currículo tem seu
estudo desenvolvido a partir do século XX (1918)
29
nos EUA (MOREIRA e SILVA, 1994;
SILVA, 1999). Porém, desde sua criação o controle social e o ‘poder de diferenciar
estiveram presente. Para GOODSON (1995, p.33) “Isto significava que até mesmo as
crianças que freqüentavam a mesma escola podiam ter acesso ao que representava mundos
diferentes através do currículo a elas destinadas”.
No Brasil, o complexo contexto histórico-político nacional ocorrido entre as
décadas de 20 a 80, com períodos democráticos alternando com períodos autoritários,
explica o parco desenvolvimento da teoria de currículo em nosso País.
28
“Calunga Grande é o mar, Calunga Pequeno é a tumba. Calunga Grande é a enormidade das águas salgadas,
Calunga Pequeno é a terra que recebe os corpos e os transforma em semente de uma vida diferente”
(MOURA, Carlos Eugênio Marcondes de A Travessia da Calunga Grande: três séculos de imagens sobre o
negro no Brasil. São Paulo: Edusp, 2000).
29
Em 1918 Bobbit escreve o livro, The Curriculum, que iria ser considerado o marco do estabelecimento do
currículo como um campo especializado – in, SILVA, 1999, p.22.
84
Nos anos 20, o currículo, núcleo do processo institucionalizado de educação, é
adotado pelo sistema de ensino brasileiro no bojo das reformas propostas pelo movimento
dos Pioneiros da Educação, idealizadores e implementadores do ideário da Escola Nova.
(MOREIRA, 1990). Nos ano 30, a criação do Ministério de Educação e Saúde e do
Conselho Nacional de Educação, juntamente com a ascensão de nomes como Francisco
Campos, Anísio Teixeira, Fernando de Azevedo, Gustavo Capanema e Lourenço Filho e da
criação do INEP. Nos anos 50/60
Nos anos 60/70 a teoria tradicional do currículo de matriz americana, tem como
oponente as teorias críticas de matriz européia (MOREIRA e SILVA (1995). Nos anos 90
surgem as teorias pós-críticas, acompanhando o fenômeno da globalização e trazendo
novos paradigmas de estudo e de discussão para a elaboração de um currículo condizente
com a nossa realidade.
Porém, o currículo “é sempre resultado de uma seleção: de um universo mais amplo
de conhecimentos e saberes, seleciona-se aquela parte que vai constituir, precisamente o
currículo” (SILVA, 1999, p 15). E por ser assim uma questão de poder e de saber,
“selecionar é uma operação de poder. Privilegiar um tipo de conhecimento é uma operação
de poder...” segundo este mesmo estudioso (p. 16), “o currículo está construído para ter
efeitos (e tem efeitos) sobre as pessoas... É preciso reconhecer que a inclusão ou exclusão
do currículo, tem conexão com a inclusão ou exclusão da sociedade” (SILVA,1996, p.81).
No caso do negro brasileiro, por ter o seu legado cultural invisibilizado, pois nunca teve o
poder de selecionar e/ou privilegiar conteúdos escolares, esta assertiva é verdadeira e vem
se perpetuando nas inter-relações sócio-culturais da população brasileira, desde sua
chegada na então Terra da Santa Cruz.
SILVA (1999) ao discutir a gênese das teorias tradicionais de reprodução do saber
em contraponto com as teorias críticas de resistência e espaço de poder/saber e pós-
críticas de ampliação das relações de saber/poder, dos Estudos Culturais e construção de
identidades e subjetividades, nos coloca uma questão: qual conhecimento ou saber é
considerado importante ou válido ou essencial para merecer ser considerado parte do
currículo?” (SILVA, 1999, p.14). Para os ideólogos da Nação brasileira do século XIX
esses conhecimentos seriam aqueles oriundos da Europa, (como colocamos no cap.I),
relegando ao esquecimento os originados em outras culturas consideradas ‘exóticas’ e sem
relevância civilizatória.
85
Este pensamento se integra na visão tradicional, objetivista e/ou tecnicista de
currículo, onde os saberes selecionados se direcionam para a manutenção e a reprodução
social e cultural de um determinado modo de se ver e ver o mundo baseado em um
determinado grupo social (FREIRE, 1987; APPLE, 1989; GOODSON, 1995) e para a
formação de dois tipos de indivíduos: um dominante por ter o seu capital cultural valorizado
e outro dominado por não ver contemplada a sua prática cotidiana e histórica. Segundo
YOUNG (2000, p.19),
é que, embora o currículo seja sempre concebido em parte para permitir que os
estudantes aprendam conceitos e formas de entendimento e a forma de aplicá-los em
diferentes contexto, ele é também organizado para preservar interesses dominantes e
manter o’ status quo’.
Este é o caso da escola brasileira até os anos 60, no discurso, e atualmente, na prática.
Digo isto porque até hoje os profissionais formados em nossas Faculdades e Universidades
continuam a serem preparados e enviados para um mundo onde a teoria aprendida e a prática
vivenciada não se coadunam. Haja visto que se discute e são produzidas teses, dissertações
artigos e livros abordando o currículo das outras estâncias de ensino (básico e formação de
professores), porém o currículo do ensino superior não é debatido com a mesma intensidade.
O ensino superior não olha para o seu umbigo.
A opinião dominante é que os avanços teóricos afetam pouco a prática docente:
embora conferindo maior prestígio ao campo no meio acadêmico, as discussões
travadas dificilmente chegam à escola, deixando de contribuir, como se desejaria,
para a sua renovação. (MOREIRA, 1998, p. 13)
Se no texto acima citado, substituirmos ‘prática docente’ por ‘prática profissional’ e
‘escola’ por ‘instituições assistenciais’, veremos que o Assistente Social contextualiza o
dito, como visualizado no decorrer da pesquisa.
Vários movimentos de reação às concepções burocráticas de currículo colocavam
em cheque a concepção técnica, até então hegemônica. As teorias críticas, surgidas na
agitada e mutante década de 60, se opõem as tradicionais ao questionar a imutabilidade do
currículo e a passividade dos receptores pregada pelos teóricos tradicionais. Enfocando seus
questionamentos em categorias analíticas oriundas do marxismo, como: ideologia,
reprodução, poder, classe social, capital cultural, conscientização, emancipação e
libertação, resistência e currículo oculto (SILVA, 1999) e em pensadores como Louis
ALTHUSSER (Ideologia e Aparelhos Ideológicos de Estado 1970); Paulo FREIRE (A
Pedagogia do Oprimido 1970); Pierre BOURDIEU e Jean-Claude PASSERON (A
Reprodução 1970); Michael APPLE (Ideologia e Currículo 1979/ Educação e Poder
86
1985) entre outros, a teoria crítica do currículo considera que “o importante não é
desenvolver técnicas de como fazer o currículo, mas desenvolver conceitos que nos
permitam compreender o que o currículo faz (SILVA, 1999, p.30).
Essa corrente de pensamento tem seu apogeu com a Nova Sociologia da Educação
(NSE), surgida na Inglaterra e marcada pela publicação do livro Knowledge and Control:
New Direction for the Sociology of Education’ de Michael Young (1971)
30
. A NSE tem
como questões centrais as conexões entre currículo e poder, entre a organização do
conhecimento e a distribuição do poder. Daí a discussão acerca de quais conteúdos devem
ser privilegiados no currículo.
Ela deveria perguntar como essa disciplina e o outra acabou entrando no
currículo, como esse tópico e o outro, por que essa forma de organização e o
outra, quais os valores e interesses sociais envolvidos nesse processo seletivo? Por
que se atribui maior prestígio a certas disciplinas do que a outras? Quais são as
relações entre esses princípios de organização e principio de poder? Quais
interesses de classe, profissionais e institucionais estão envolvidos nessas diferentes
formas de estruturação e organização? (SILVA, 1999, p.67-68)
Embora enfraquecido com o fortalecimento do neoliberalismo da era Reagan e
Thatcher, a NSE propiciou o desenvolvimento de “uma variedade de perspectivas analíticas
e teóricas: feminismo; estudos sobre gênero, raça e etnia; estudos culturais; pós-
modernismo, pós-estruturalismo” (SILVA, 1999, p. 70), apropriados pela teoria pós
crítica.
Como veremos, o novo currículo da ESS-UFF não se orientou por este paradigma.
4.2 – O CURRÍCULO DO CURSO DE SERVIÇO SOCIAL DA UFF.
Antes de tratar do currículo da ESS-UFF, vamos dar um rápido ‘détour sobre as
influências monolíticas (GÓIS, 1993) existentes no Serviço Social e os signos em
transformação (COSTA, 1995) que pautaram os anos 80/90 e que ainda se fizeram presentes
na reformulação curricular ocorrida na ESS-UFF em 1999.
Como argumentado no capítulo II, a influência da Igreja Católica na origem do
Serviço Social no Brasil e no mundo foi hegemônica. Este é um dos monólitos marretados no
estudo A Dissolução do Monolito: persistência e mudanças na escrita da história do
30
Para aprofundar essa discussão ver: MOREIRA e SILVA (orgs), 1995 (cap.1, p. 7-38); SILVA,1999 (cap. 2,
p. 65-76;
87
Serviço Social”, (1993). Neste texto, o Doutor em Serviço Social João Bosco Hora GÓIS,
critica esta persistente alusão ao alinhamento eclesiástico na origem do Serviço Social no
Brasil e propõe o ... questionamento da relação umbilical entre o Serviço Social e a Igreja
Católica, seja no que diz respeito ao papel da Igreja na fundação das Escolas... seja no que
tange à circulação do ideário católico em seu interior” (GÓIS, 1993, p.8). Também discute a
forma como ocorreu a expansão do pensamento marxista no Serviço Social brasileiro, na
sua opinião “com um alto grau de contaminação positivista(GÓIS, 1993, p.8) e que por
isso, “... responderiam por uma série de dificuldades no plano da produção do conhecimento
no Serviço Social ...” (GÓIS, 1993, p.7). Estas são perspectivas que podem ser utilizadas
para explicar a ausência da questão do negro no Serviço Social, como discutiremos a
posteriori.
Entretanto, embora a ESS de Niterói não tenha surgido por obra e graça do
catolicismo, seus primeiros professores vieram de São Paulo e tinham uma ligação umbilical
com a Igreja Católica (GOMES, 1994; LIMA,1987). Negar essa influência no aprendizado
das primeiras alunas é negar o óbvio, ainda mais em um País onde durante séculos a Igreja
era parte do Estado como a adoção do Padroado
31
comprova. Lógico que em algumas
instituições a influência foi maior que em outras, porém devemos ter em mente o poder que a
Igreja representava e exercia para/na população, como citado em outra parte deste texto.
Mediante isso, os currículos e conteúdos programáticos recebiam uma forte interferência da
doutrina moral, ética e humanista cristã (SÁ, 1995), refletindo na prática profissional dos
seus formandos. As fotografias de formatura das primeiras turmas da ESSRJ (fig.2)
comprovam essa interpenetração ao focar como centro da foto, representantes da Eclésia.
A respeito do currículo da Escola de Serviço Social do Rio de Janeiro, LIMA (1987,
p.61), comenta: “tratando-se de uma escola católica ... os diversos assuntos eram discutidos e
refletidos à luz da Doutrina Social da Igreja” e da formação moral e religiosa das/os
graduandas/os. Assim, matérias como Educação Familiar, Alimentação, Higiene,
Enfermagem, Vestuário, Anatomia e Fisiologia, entre outras, junto com Ética, Moral,
Psicologia, Sociologia, faziam parte do currículo até os anos 50 (SILVA, 1978; LIMA, 1987;
GOMES, 1994).
31
Padroado = Direito de conferir benefícios eclesiásticos. Prática comum nos reinos ibéricos. Acordo entre o
Império Brasileiro e o Vaticano que dava ao Imperador direito de indicar os Bispos da Igreja e esta ficava
responsável pelos registros (nascimento e morte), casamento, controle e assistência social da/para a
população.
88
Também como comentado, a partir dos anos 70/80, com o movimento de
reconceituação, o materialismo histórico-dialético se impõe e influencia alterações
curriculares e metodológicas quer no campo teórico quer na prática profissional. De um
campo teórico-prático gerador de estudantes passivos, adestrados e formador de um
profissional neutro, subserviente ao sistema e incapaz de perceber e atuar na realidade do seu
entorno sócio-econômico-cultural e humano, idealizava-se formar um profissional
compromissado, questionador e implementador de mudanças na realidade vivenciada por
aqueles que buscavam seus serviços.
Em Signos em Transformação: a dialética de uma cultura profissional” (1995) a
Assistente Social e Doutora em História, Suely Gomes COSTA, municiada pelos marcos
históricos da longa e curta duração, busca reavaliar teórica-metodológica-analítica e
profissionalmente o conceito de ‘proteção social’, denominado por ela de “velho e obscuro
signo profissional” (COSTA, 1995, p.14) e talvez por isso, vitima de um processo de
responsabilidade por uma pseudo-alienação dos trabalhadores brasileiros idealizado pelos
defensores do materialismo histórico-dialético, corroborando o dito acima por Góis. Segundo
COSTA (1995, p.126), “mesmo as correntes de pensamento situadas mais à esquerda
encaram a proteção social como a mutilação dos indivíduos, o seu efeito alienante”. Ela
rebate esta fala demonstrando como na sociedade brasileira essas práticas seculares de
assistência social podem permanecer, na medida que “as totalidades não explicam processos
sociais singulares sobre os modos de vida dos diferentes homens” (COSTA, 1995, p.134).
Isto, para a estudiosa comentando a reforma curricular dos anos 80, aconteceu porque “a
avaliação profissional foi submetida a alinhamentos teóricos pouco rigorosos, considerando a
incorporação a-crítica de marcos explicativos da profissão bastante incompletos ... e ainda
presentes nos conteúdos programáticos do curso” (COSTA, 1989, p.4). Coerente com este
pensamento, ela defendia a incorporação de novos signos entre os saberes da/o Assistente
Social oriundo da ESS-UFF, como sua participação nas discussões pré-curricular avalizam.
É neste clima que, em dezembro de 1998, foram iniciados os debates e formados
grupos de discussão para a reformulação do currículo da ESS-UFF, em vigor desde a década
de 80. Duas diretrizes foram utilizadas para a reformulação. Em 1996 foi aprovada e
assinada a Lei de Diretrizes e Base da Educação brasileira (LDB). Nela se explicitava a
necessidade de alterações nos currículos das instituições educacionais brasileiras. Em 1997, a
89
ABESS publicou as Diretrizes Curriculares para o Serviço Social (CADERNOS CBESS nº8,
1998) que buscava orientar as várias Faculdades e Escolas na elaboração dos seus currículos.
Com a justificativa de acompanhar a dinâmica da sociedade e do mercado de trabalho
na contemporaneidade, a revisão curricular do curso da ESS-UFF preconizava:
a formação de Assistentes Sociais dotados de capacitação ético-política, teórico-
metodológica e técnico-operativa para o enfrentamento da questão social no Brasil
contemporâneo ... qualificar profissionais com competência para decifrar a
(re)produção e expressões da questão social no âmbito das relações de classes e
destas com o Estado ... o propósito é formar Bacharéis em Serviço Social, dotados de
competência em sua área de atuação, generalistas em sua formação intelectual e
cultural, munidos de um amplo acervo de informações necessárias em tempo de
globalização, capazes de formular propostas de trabalho criativas e inovadoras em
seu campo de trabalho. (ESS-UFF, 2000, p.11) – (grifo meu).
Como é possível perceber pelo texto acima, a proposição de currículo formulada
pela ESS-UFF se enquadra naquela que SILVA (1999) classifica como teoria crítica do
currículo. Para este pesquisador a ênfase em questões como “a ideologia, a reprodução
cultural e social, o poder, a classe social, as relações sociais de produção, a conscientização,
emancipação e libertação” (SILVA, 1999, p.17), são características que diferem a
abordagem crítica do currículo de orientação neomarxista (SILVA, 2001, p.12) - da
abordagem tradicional humanista, baseada numa concepção conservadora da cultura e do
conhecimento (ib.ibd) e da pós-crítica que reformula a tradição crítica enfatizando o
currículo como prática cultural e prática de significação. (ib. ibd). Esta última seria a
abordagem propicia para a inserção de conteúdos abordando a temática racial ou do negro
na revisão curricular do Serviço Social da UFF. Mas não aconteceu.
Entre os grupos de discussão formados para delineamento das propostas de
alteração curricular da ESS-UFF, centralizadas na “questão social, pois é ela que funda o
trabalho do Assistente Social”(ESS-UFF, 2000, p.19), a intervenção do grupo coordenado
pelas professoras Suely Gomes Costa e Nilza Simão, é aquela que mais de perto interessa
ao nosso trabalho.
Partindo de uma realidade, comprovada pela nossa pesquisa no questionário com as
alunas do período, de que o alunado de Serviço Social é composto “sobretudo por
mulheres, oriundas das camadas sociais as mais pobres e, portanto as mais desfavorecidas
cultural, social e economicamente, impondo novos desafios didático-pedagógicos”
(COSTA e SIMÃO, 1990, p.5), a equipe, defensora do retorno da proteção social como um
fenômeno histórico de longa duração na história da assistência social que ultrapassa
modismos teóricos, defendia a inclusão de disciplinas sobre a questão do negro O negro
90
no pensamento social brasileiro e O negro no processo de formação da sociedade
brasileira (anexo 7) na sua proposta de currículo. A justificativa apresentada para a
inclusão dessa temática foi de que,
a população que busca os cursos de graduação em Serviço Social, essencialmente
feminina, negra, mestiça e pobre, será profissionalizada para a prestação de
serviços na estrutura assistencial, em sua maior parte, destinada à população negra,
mestiça e pobre ... Os conteúdos programáticos devem considerar, por isso, os
elementos da formação social brasileira que organizarão, na sua história, a
reprodução da pobreza e a formação das classes subalternas dos dias atuais
(COSTA, 1990, p.34).
Como para perceber, além da preocupação com a questão do negro, a equipe das
professoras Suely e Nilza também se preocuparam com as questões de gênero e
econômico-social tanto das discentes como do público que busca seus serviços, algo
também abordado em nosso trabalho.
No entanto, refletindo a lógica brasileira, as questões de gênero e a sócio-econômica
mereceram contemplação no novo currículo, ofertando a disciplina Relações de Gênero e
Questão Social”(ESS-UFF, 2000, p.41). Porém as sugestões para integrar as questões que
dificultam a integração do negro, de direito e de fato, na sociedade, não foram aceitas
integralmente. Apenas na ementa da disciplina A Questão Social no Brasil’ foi colocado
um conteúdo programático com um texto confuso e genérico, “expressões étnico-raciais,
políticas e de nero da questão social e sua vivência pelos sujeitos sociais” (ESS-UFF,
2000, p.41), que foi inclusive destacada por uma das docentes entrevistada (MG). Porém
ao analisarmos a bibliografia recomendada para utilização na sala de aula não encontramos
nenhum livro, publicação ou texto referente ao assunto etnia ou ‘raça’ (ESS-UFF, 2000,
p.74). Por quê isto aconteceu e acontece?
Como indicamos em outra parte do texto, algumas hipóteses podem ser
levantadas, inclusive algumas já destacadas anteriormente:
a) A histórica influência da Igreja Católica na origem do Serviço Social na Europa
e na criação das primeiras escolas brasileiras.
Como abordamos em outras partes do texto, a Igreja Católica teve uma participação
fundamental na criação das Escolas de Serviço Social no Brasil. Excetuando-se ESS-
Niterói, as primeiras escolas e as pioneiras Assistentes Sociais tinham forte ligação com a
doutrina católica e essa com o Estado. Sendo assim, embora as disputas políticas na cúpula
façam parte da sua História, o discurso da harmonia, da paz, do ‘amai-vos uns aos outros’,
91
da igualdade de todos os seres humanos perante Deus - embora na prática essa pretensa
igualdade não se corporifique, como no caso das irmãs coristas (brancas) e da oblatas
(negras) da Congregação ‘Missionárias de Jesus Crucificado’
32
- é intensamente trabalhado
entre seu “rebanho”. Rebanho que, como as ovelhas, deve ser passivo e obediente, algo
necessário também para a manutenção do poder pela elite.
Ora, a relação negro x branco no Brasil, desde o primeiro momento foi conflituosa
pela condição de senhor/opressor de um lado e de escravo/oprimido do outro, originando
desigualdade e resistência, durante muito tempo ocultadas pela história ensinada, como
acentuamos no capítulo I. Se as origens dessa desigualdade fossem ensinadas nas Escolas
de Serviço Social, onde seus ideólogos defendiam a irmandade cristã, isto iria gerar
discussões, interrogações, comparações com a realidade vivenciada originando polêmicas,
quebrando a harmonia desejada pela doutrina que se “fingia” existir no dia-a-dia da
sociedade. Outrossim, poderia induzir raciocínios, desvelando as relações discriminatórias
que ocorriam nas entranhas da própria Congregação e da Igreja como um todo (MIRA,
1983; PINTO, 2003; VIEIRA,2004; ROCHA, 1993 ).
Lembrando que a grande parte dos usuários do Serviço Social é pobre e, por
conseqüência, também negros em sua maioria; a idéia da escravidão como castigo
(VIEIRA, 1998) e da pobreza como culpa ou como falta de capacidade do indivíduo, deve
ser mantida para uma ação efetiva de controle social e de domínio, secular e profano,
exercidos pelas elites religiosas e política, e elas sabem que a apreensão de saberes
possibilita a reação.
Recorro a uma frase pronunciada no filme ‘1492: a Conquista do Paraíso’, quando
Cristóvão Colombo tem sua pretensão de cruzar o oceano Atlântico negada pela Igreja, por
que contrariava alguns dogmas eclesiásticos que era interesse da Igreja manter: sempre
temi as mentes independentes, se permitirmos eles transformam o paraíso em um bem
terrestre”. Embora presente em uma obra de ficção, a frase deixa patente o temor sentido
pelas elites dominantes contra a liberdade de pensamento e contra a autonomia intelectual
de uma população dominada. Por isso louvavam a ignorância monopolizando o saber. ‘Não
se luta contra o que não se conhece e a ignorância favorece a dominação’, estas são frases
filosóficas de domínio público.
32
As Irmãs Coristas eram brancas e utilizadas para missão direta com a população; as Irmãs Oblatas eram
negras, utilizadas no trabalho doméstico e mesmo possuindo educação superior não eram nomeadas Coristas.
(PINTO, 2003; VIEIRA, 2004)
92
As/os Assistentes Sociais formadas/os pela ESS-UFF, como foi dito, também se
inserem nesse raciocínio, desconstruído e/ou relativizado no discurso educacional e
acadêmico mas existente no imaginário popular e nas ações politiqueiras das elites.
Logicamente, as alterações no campo religioso que ocorreram na sociedade
brasileira motivado pelo elevado crescimento do Neo-Pentecostalismo, enfraquece a
hegemonia da doutrina católica no Serviço Social da atualidade, porém não podemos dizer
o mesmo em relação à questão do negro na sociedade como um todo
33
. Por isso, ressalvo
que em três das nossas entrevistas (PB/PH/PG) foi ressaltada a provável inferência da
religião na exclusão da questão do negro das salas de aula da ESS-UFF, embora ela se
encontre nas carteiras da sala de aula, no corredor e na foto de formatura.
b) A comentada e criticada adoção do materialismo histórico-dialético no pós-
movimento de reconceituação.
O enfoque dado a teoria de reprodução da força de trabalho, do materialismo
histórico-dialético e da classificação do Serviço Social como Aparelho Ideológico de
Estado a partir do Movimento de Reconceituação do anos 70/80, promoveu vigorosa
ruptura teórica com o modelo tradicional e uma esperançosa renovação na processo
epistemológico do Serviço Social buscando incorpora-lo teórico-metodológico e político-
profissionalmente no processo de transformação social. Na ótica de NETTO (1996, p.112)
“no curso dos anos oitenta, a tradição marxista se colocou no centro da agenda
intelectual da profissão: todas as polêmicas relevantes ... foram decisivamente marcadas
pelo pensamento marxista, dando o tom ao debate profissional teórico e metodológico”.
Mas, a forma como esse enfoque foi apreendido e transmitido, legou também
“reducionismos teórico-metodológicos decorrente da forma de apreensão do marxismo no
circuito profissional” (GÓIS, 1993, p.22) assim como “inúmeros equívocos e impasses de
ordem política, teórica e profissional cujas refrações até hoje se fazem presentes”
(IAMAMOTO, 2004, p.210). Entre essas refrações, incluo a abordagem da questão do
negro na nossa sociedade.
O marxismo pensa a estruturação da sociedade a partir do viés do econômico,
inferindo uma relação entre a estrutura (condições econômicas) e a superestrutura
33
Exemplifico com o discurso preconceituoso da Igreja Universal do Reino de Deus sobre a cultura afro-
brasileira, seja religiosa ou ancestral. Ver, ANTONIAZZI, Alberto et al. Nem Anjos nem Demônios:
interpretações sociológicas do Pentecostalismo. Petrópolis: Vozes, 1994.
93
(reprodução ideológica), baseado no principio do modo de produção como totalidade.
Assim as desigualdades sociais se explicam pela posição de classe. A raça, vinculada ao
fenótipo ou cor da pele do indivíduo, como fator explicativo para essa desigualdade
contraria a primazia do econômico na determinação coletiva da exploração. Daí a ênfase na
divulgação da idéia sobre inexistência de ‘raças’, no contexto biológico, pois isto reforça o
entendimento da questão do negro como uma questão de ‘classe’, uma questão econômica,
que se resolvida acarretaria o fim das desigualdades sociais. Como explanamos essa
assertiva é falsa pois entre nós, a ‘cor da pele’ prevalece.
A hierarquia social por classe existente no capitalismo, não exclui a hierarquização
dos grupos sociais e dos indivíduos por ‘raça. Acompanhando GUIMARÃES (2002, p.9);
“a idéia de que a discriminação e o preconceito de que sofrem os negros, têm um
fundamento de ‘classe’ é uma idéia que persiste apesar de todas as tentativas feitas
anteriormente, por mim ou por outros, para demonstrar seu caráter racial”.
Como discorreu uma das nossas entrevistadas: para alguns a questão racial está
envolvida com a questão econômica. Quer dizer, um negro rico não teria problema algum.
Mas isso em uma mentira, uma falácia, porque o preconceito existe independente da
posição social. Quando você tem um ‘status’ econômico, você é tolerado, você é aceito
mas não com naturalidade. Teve sorte, é o que dizem.Não é porque ele galgou cmo
qualquer outra pessoa poderia ter galgado...”(PI)
Como comentamos em outro trecho, a questão do negro na sociedade brasileira
fundamenta uma questão social, na medida em que nela se encontra o maior número dos
excluídos da sociedade. No entanto, para um dos próceres do marxismo na categoria,
a questão social, nesta perspectiva teórico-analítica, não tem a ver com o
desdobramento de problemas sociais que a ordem burguesa herdou ou com traços
invariáveis da sociedade humana; tem a ver, exclusivamente, com a sociabilidade
erguida sob o comando do capital. (NETTO, 2001, p.46). (grifo meu)
Esta vinculação profissional com a teoria materialista, além de compor uma questão
teórica, também fundamenta uma questão política, pois contém a crença na revolução
como fomentadora de transformações ou mudanças na sociedade. Esta transformação é
pensada nos termos do Manifesto Comunista: “Proletários de todo o mundo, uni-vos ...”.
Neste contexto, a análise da questão da desigualdade social pelo viés da raça, do sexo/
gênero, da orientação sexual, etc. e os movimentos sociais daí advindos esvaziariam e
fragmentariam esta pretensa unidade, prejudicando a luta do proletariado. Assim sendo, as
94
outras questões não necessitam serem discutidas ou problematizadas no currículo por não
interferirem nas relações sócio-econômicas da vida real.
Contra-argumento, citando PEDRA (2003, p.16) que, discorrendo acerca das
representações no currículo, afirma que:
o currículo não se restringe a reprodução de conhecimentos e destrezas para a
produção; ele reproduz, ou melhor, dá abrigo a um conjunto de representações que
dizem respeito não apenas ao mundo da produção, mas também às variadas
relações que os homens mantêm entre si e com seu meio. (grifo meu)
c) O secular preconceito contra cultura negra.
Retornando a fala contida em uma das nossas entrevistas, onde se destaca a suposição
de muitos que vêm o negro como não produtor de cultura. Embora algumas das principais
representações do ‘ser brasileiro’ no exterior feijoada, Pelé, samba, capoeira - estejam
enlaçadas com os negros, essas heranças não são dignas de entrar no palácio do
saber”(PC). O pesquisador Luis Alberto Oliveira Gonçalves, nos apoio ao afirmar que,
“dificilmente uma sociedade racista como a brasileira nos aceitaria como produtores de
conhecimento. E quando falo de conhecimento não me refiro apenas ao científico mas a
qualquer outro tipo de conhecimento” (GONÇALVES, 2003, p.17). Inspirando-se na
analogia feita por Guerreiro Ramos entre as relações raciais brasileiras e a divisão da
sociedade em infra e superestrutural, ele cita que, “Os problemas de não aceitação e de
descarada exclusão começam para os negros, no momento que ousam entrar no mundo da
superestrutura, no mundo dos brancos, feito pelos brancos (GONÇALVES, 2003, p.18).
Paradoxalmente, o negro brasileiro sempre foi objeto de pesquisa ou estudos para
possíveis argumentações sobre os problemas da sociedade. De José Bonifácio e João
Severiano Maciel da Costa
34
passando por Nina Rodrigues e Oliveira Vianna
35
a presença
dos negros em nosso País era considerada fonte de todos nossos males. Porém fazer a
população compreender a razão dessa associação negativa, desse sortilégio da cor era tabu.
O poder da dominação simbólica, do ‘discurso’, comentado anteriormente, atua com uma
34
Ambos foram Senadores do Império, sendo Bonifácio considerado patrono da Independência. Dois de seus
discursos no parlamento, onde tratavam da questão dos escravos, encontram-se publicados em ARQUIVO
NACIONAL – Memórias sobre a escravidão. Brasília, 1988, 222p.
35
RODRIGUES, Nina Os Africanos no Brasil. São Paulo: Ed. Nacional, 1977, 283p.; VIANNA, F. J.
Oliveira Evolução do Povo Brasileiro. São Paulo: Nacional, 1956 e Raça e Assimilação. São Paulo:
Nacional, 1934.
95
intensidade que inviabiliza qualquer outra noção contrária. Como comentou uma das
nossas entrevistadas/os: é preciso uma revolução simbólica feita no corpo e na mente”.
(PC)
Para outra entrevistada/o, ‘PI’, essa lacuna reflete a nossa organização social, o
que a gente vê, o que existe, quer dizer, o que a gente percebe é a invisibilidade. A
invisibilidade do negro, embora ele esteja na nossa frente... É como se fossemos um
apêndice que só sabemos existir quando ele dói”.
d) A falta de conhecimento específicos por parte dos professores.
Na Introdução desse trabalho acadêmico, afirmei que a grande maioria dos
profissionais não possuía conhecimentos acerca da questão do negro porque o haviam
recebido estas informações de seus professores, os quais também se encontravam na
mesma situação de desconhecimento, assim como os “lumes” que os graduaram e...
(TEIXEIRA, 2003).
Esta premissa foi comprovada nas entrevistas com os docentes da ESS-UFF, quando
apenas 2 (duas) professoras/es se declararam com conhecimentos para transmiti-los aos
seus alunos. A mesma situação, fora do âmbito do Serviço Social, foi detectada nos 4
cursos de extensão para professores e nas 4 turmas de Especialização em “Raça e Etnia”,
para graduados em Curso Superior independente da sua formação profissional, oferecidos
pelo PENESB-UFF. Repetindo o dito anteriormente, não podemos ensinar o que
desconhecemos.
Essa situação faz do professor vítima e carrasco do processo ensino-aprendizagem.
Por não possuir um conhecimento histórico crítico e abrangente sobre as relações entre
negros e brancos no cotidiano sócio-cultural brasileiro, porque não lhe é oferecido em sua
formação, quando se depara com atitudes racistas entre seus alunos, não percebendo a
situação e/ou não querendo perceber e/ou não sabendo como agir, ele, inconscientemente,
reforça estas atitudes. Como comentado em outras partes desse trabalho e presente no
estudo de uma professora-pesquisadora abordando a questão do ensino pré-escolar, que na
minha opinião produz o mesmo efeito daquele no ensino superior, pois, em ambas as
estâncias educativas, o desconhecimento gera o silêncio, que pode reforçar atitudes
preconceituosas e a passividade de quem assisti e não tem condições de intervir.
96
Após presenciar situações de discriminações entre professor e alunos,
CAVALLEIRO (2000, p.10) comenta:
...minha experiência mostrou que o silencio do professor facilita novas ocorrências,
reforçando inadvertidamente a legitimidade de procedimentos preconceituosos e
discriminatórios no espaço escolar e, com base neste, para outros âmbitos sociais.
(CAVALLEIRO, 2000, p.10). (grifo meu)
Daí, apesar da sua pesquisa enforcar a formação de professores para o Ensino
Básico, faço minhas as indagações da professora Regina Pahim Pinto, pois o professor
universitário também é carente desse tipo de conhecimento.
O professor tem consciência destas questões?Teve alguma informação durante o
curso que o alertasse para essa questão e seus desdobramentos?Tem conhecimento
suficiente para perceber e adotar uma postura mais crítica diante de materiais
discriminatórias? Conhece e tem acesso à bibliografia especifica sobre o tema?
(PINTO, 2000, p.126).
Cabe uma crítica aos estudiosos da teoria do currículo que desenvolveram uma
abundante produção analítica acerca do currículo para o ensino básico e para a formação de
professores para este nível de ensino. Porém, não têm a mesma preocupação com os
currículos do Ensino Superior.
e) A falta demanda dos alunos ou da sociedade.
Uma/um das/os entrevistadas/os citou como uma das prováveis causa para a não
inserção da questão do negro no currículo do Serviço Social, a falta de demanda pelos
alunos e pela sociedade. Creio ser possível que outras/os professoras/es pensem de forma
semelhante. Daí a necessidade de explicitar esta questão.
A busca desse conhecimento por parte das/os alunas/os cremos que é absolutamente
afirmada pelas respostas dadas ao questionário aplicado ás/os alunas/os do período. Das
consultadas, 80,8% responderam ‘SIM’ sobre a inclusão de conteúdos que tratassem da
questão do negro. Então esta demanda existe, o que invalida ao raciocínio da/o
entrevistada/o.Talvez ela não esteja sendo explicitada pelos alunos ou não seja percebida
pelos professores.
Quanto à sociedade, acreditamos que a ‘lavagem cerebral’ de longa duração,
dinamizada pelas mais diversas formas como buscamos demonstrar neste texto, pela qual
passou a nossa população negra, branca, indígena e mestiça, gerou essa insensibilidade
sobre a realidade do outro e de si mesmo. Nas palavras de ‘PG’, apoiando-se nas falas de
alguns dos seus alunos e na sua experiência de vida: “... eu acho que temos que refletir
97
muito acerca disso, principalmente porque é também uma reflexão acerca de mim mesma.
Porque o ‘outro’, na verdade, também sou eu. Sou negra mas não me coloco como negra.
Sou moreninho, marrom bombom, parda, sei o quê? E não aceito essa origem. Não
consigo me perceber enquanto negra nem como alguém que também discrimina e é
discriminada”.
Essa fala é recorrente, visto que as nossas práticas e atitudes cotidianas são
orientadas pelas representações que formamos em nossas mentes sobre quem somos e
como devemos interagir com as outras pessoas. Repetindo o dito em outra parte do texto,
um leigo, guiado pelo senso comum, não perceber a realidade subjetiva do seu entorno e
aceitar o que lhe dizem é aceitável, porém um intelectual, (Sociólogo nas palavras de
BERGER e LUCKMANN, 1985), não deve e não pode aguardar que outrem lhe indique o
caminho.
Em sua entrevista ‘PG’ rebate esta pretensa falta de demanda: Não existe uma
demanda da Sociedade para a questão do negro? Então precisava existir uma demanda
para discutir a questão de classe também ... a busca de demandas é algo que faz parte da
nossa capacidade profissional. Eu acho que existe uma demanda sim. Nós é que não
estamos preparados para olhar, para perceber. Não é esperar que a realidade olhe para
nós. Esse olhar tem que ser construído.
Acreditamos que o ‘mito da democracia racial’ tem uma participação latente tanto
no pensamento da/o entrevistada/o como na atitude da população. A convicção na
inexistência da desigualdade e de conflitos sociais provocados pela diferença epitelial entre
o povo brasileiro, embora não seja absoluta, como em outros tempos, ainda é muito forte.
Daí o estranhamento quando, por exemplo, sito a minha questão de pesquisa. Geralmente
escuto: estudar o negro? Pra quê? O que é que tem no negro para estudar?
Mas as mudanças ou ‘demandas’ se fazem sentir principalmente nos meios de
comunicação áudio-visual, como nas novelas onde os atores brancos não são mais
tingidos para representar personagens negros (NASCIMENTO, 1982/2003; ARAÚJO,
2000) - nos programas matutinos e na imprensa escrita (Revista RAÇA; FOLHA DE SÃO
PAULO, 1995), principalmente após a repercussão da Conferência Mundial contra o
Racismo, Discriminação, Xenofobia e Intolerância Correlata, realizada na África do Sul
(Durban) em setembro de 2001.
98
Nas salas de aula, um dos vetores de mudança social, incoerentemente, estas
mudanças comportamentais, pelo visto, estão demorando a chegar.
f) Não incorporação pelo Serviço Social da questão do negro ou racial como uma
questão social.
Na Introdução deste texto monográfico, tentei demonstrar que a questão que diz
respeito ao negro na nossa sociedade corporifica uma questão social, passível de proteção
social secundária e de formulação e implementação de políticas públicas e sociais
específicas. Porém, pelo que foi apresentado, o Serviço Social não aceita essa inferência.
Histórica e ideologicamente para setores influentes do Serviço Social, a questão
social encontra-se intimamente encadeada com a questão econômica deflagrada pelo
capitalismo, gerador da pobreza, da exclusão social e da subalternidade de grande parte dos
brasileiros. Para SPOSATI (2003, p.27), a questão social vincula-se visceralmente à
relação capital-trabalho”.
Para nós, algo apresentado no presente texto, aqui no Brasil a questão social, seja
velha ou nova (NETTO, 2001), gerada pela pobreza, exclusão e subalternidade, além de
econômica, é também de pele, sendo que em alguns casos esta prevalece sobre aquela,
como as pesquisas de BRANDÃO (2002/ 2004) e TEIXEIRA (2003) comprovam e a
discussão contra e a favor da implementação de políticas de ação afirmativa ratificam.
A professora PF, defensora da inclusão das disciplinas O Negro no Pensamento
Social Brasileiro” e O Negro no Processo de Formação da Sociedade Brasileira”
(anexo 7) na reformulação curricular de 1999, como citei anteriormente, em sua entrevista,
com uma certa mágoa, comenta: “diria pois que esse silêncio acadêmico sobre o tema é
muito mais complicado do que se pode imaginar. Temos construído um saber e uma cultura
que esconde, que nega a nossa negritude. A gente silencia sobre essas relações, mesmo
quando sabe do assunto. Acho que isto está num dado quadro cultural a ser mais bem
examinado. A negritude invisível na nossa cultura. Nós não a refletimos. Tão perto e tão
longe”.
Vemos mais uma vez a presença do ‘mito da democracia racial’ influenciando
posturas. Acreditamos que a informação conduz à mudança de visão de mundo e que esta
possibilita questionamentos e a oportunidade de reinterpretar atos e posturas sedentarizadas
99
no imaginário e nas ações cotidianas. Por isso, defendemos a inclusão de temas que
discutam a questão do negro entre os saberes apreendidos pelos Assistentes Sociais como
categoria profissional e pelo formados pela ESS-UFF em particular, não do jeitinho
brasileiro, de escamotear. Enfrentar querendo e sabendo como resolver e para isso não
pode ser no ‘achismo’ mas com conhecimento. Também não pode ser pelos negros mas
pelo conjunto da sociedade, senão fica segmentada ...”(PI). Tampouco ficar na
generalidade, e isso, nas palavras de ‘PJ’: “também depende muito do professor, do
conhecimento que este domina sobre determinado assunto para aborda-lo com
profundidade”.
4.3. CONTEÚDOS PARA SEREM INCLUÍDOS ENTRE OS SABERES DOS
GRADUANDOS DA ESS-UFF.
“Nos porões dos navios, além dos músculos iam as idéias, os sentimentos,
tradições, mentalidades, bitos alimentares, ritmos, canções, palavras, crenças
religiosas, formas de ver a vida, e o que é mais incrível: o africano levava tudo isso
dentro da sua alma, pois não lhes era permitido levar pertences”. (Documentário ‘O
Atlântico Negro’).
Como determinamos nos procedimentos metodológicos, listaremos alguns temas
referentes à questão do negro que acreditamos serem essenciais para a compreensão dos
problemas que afetam as relações da população negra com os demais segmentos da
sociedade. FREIRE (1992, p.17) diz que “falar do dito não é apenas redizer o dito mas
reviver o vivido que gerou o dizer que agora, no tempo de redizer, de novo se diz”. Assim
creio que uma reformulação programática nos conteúdos dos saberes adquiridos pelos
Assistentes Sociais, dotando-os de conhecimentos mais condizente com a realidade
histórica de ontem e com as pesquisas, estudos e novas interpretações de hoje, podem
aprimorar a sua capacitação profissional e sua percepção da realidade de seus usuários e, ao
mesmo tempo, contribuir para a discussão das medidas estatais emergenciais que venham
garantir uma ordem social mais justa e digna para a população negra.
100
Com a certeza de que não é simplesmente o aumento da escolaridade ou do
conhecimento que irá dirimir o preconceito racial ou de cor existente entre os brasileiros
36
e
sim a compreensão da questão do negro, esses conteúdos podem ser integrados numa
disciplina optativa, como defende ‘PJ’ em sua entrevista, ou serem incluídos na grade
curricular numa próxima reformulação ou ainda podem ser transmitidos pelos professores
nos conteúdos programáticos das aulas de diferentes disciplinas.
. HISTÓRIA DA ÁFRICA aprovado o seu ensino pela Lei 10.639/2003,
porém faço minha a indagação da Profa. Mônica Lima :
por que a necessidade de uma lei para fazer valer a presença de um conteúdo
evidentemente fundamental na História geral e em especial na História de grupos
humanos que participaram diretamente da formação do nosso País? (LIMA, 2004).
Acho que este trabalho é uma possível resposta. Como ressaltamos a História
ensinada no Brasil é pautada pelo hemisfério ao Norte do Equador, porém, os nossos
pesares, chorares, quereres, achares e viveres têm uma ligação bem mais intensa com o
nosso vizinho do Leste, a África. “A África é do outro lado da rua, nos falta coragem de
atravessa-la”( Cunha Jr. 1997, p.73).
. TEORIAS RACIAIS é de fundamental importância o conhecimento das raízes
do racismo e de como e porquê essas idéias conseguiram penetrar tão profundamente nas
mentes dos seres humanos e nas culturas dos povos em todas as partes do mundo. É
importante para os Assistentes Sociais saber como essas teorias impulsionam a exclusão
social fora do eixo da exploração capitalista. Segundo SEYFERTH (2002, p.26),
As inúmeras teorias que surgiram ao longo do século XIX e nas primeiras décadas
do século XX não o, portanto, produto do capitalismo ou do colonialismo, mas
foram úteis aos seus ideólogos para impor a dominação política e econômica aos
povos colonizados.
.DEMOCRACIA RACIAL E A TEORIA DO BRANQUEAMENTO – em
GUIMARÃES (2002) encontramos o fato que, segundo ele, foi a origem do mito de uma
democracia racial brasileira. Consta que o sociólogo francês Roger Bastide presenciou, em
1944, no Recife, algo inusitado para ele. Em suas palavras:
36
Um dos fatos que exemplifica essa premissa e citado em nossas discussões e encontros é que, para trabalhar
em um shopping center não é necessário muita escolaridade, porém, quanto negros trabalham nas lojas dos
shoppings? Recomendo a leitura de: ÁMARAL, Assunção J. P. Da Senzala à Vitrine: relações raciais e
racismo mo mercado de trabalho em Belém. Belém: Cejup, 2004. (principalmente Cap. III).
101
regressei para a cidade de bonde ... Perto de mim, um preto exausto pelo esforço do
dia, deixava cair sua cabeça pesada, coberta de suor e adormecida, sobre o ombro
de um empregado de escritório, um branco que ajeitava cuidadosamente suas
espáduas de maneira a receber esta cabeça como num ninho, como numa carícia. E
isso constituía uma bela imagem da democracia social e racial que Recife me
oferecia. (GUIMARÃES, 2002, p.143) . (grifo meu).
O conhecimento deste e de outros fatos em torno desse mito, auxilia no
desvelamento da nossa realidade social perante o público sem acesso a essas informações.
enfocamos a questão do branqueamento no interior do texto. O conhecimento
desta teoria pode ser utilizado para tratar o problema da racialidade ou da racialização da
sociedade pela branquitude ou negritude (BENTO, 2002
a
/2002b.).
. CULTURA NEGRA - durante estes mais de 450 anos da presença negra africana
no Brasil, todas as manifestações culturais originadas na África são vítimas de uma gama
inimaginável de preconceito por parte da sociedade brasileira. No entanto, as mais
conhecidas imagens do Brasil no exterior têm sua origem e/ou sua divulgação relacionada
com o negro: o Samba, a Feijoada, o Carnaval e o Futebol. Embora este último não tenha a
África como berço, seus maiores representantes, inclusive o maior de todos, Pelé, são da
cor do ébano.
Porém a presença negra em nossas representações culturais é muito mais marcante.
Ela ocorre na linguagem falada, escrita e gestual; no vestuário; nas artes; na mentalidade;
na filosofia de vida, nos sentimentos; na religiosidade; nas relações pessoais e familiares.
Não é reconhecida, mais é vivida, sentida e transmitida, principalmente nas camadas
populares, numa forma de resistência ao esmagamento sócio-cultural que esta presença
sofre entre as elites, que ainda sonham em serem/estarem europeus.
É esta presença que nos diferencia perante as outras nações, que faz o Brasil, Brasil
e que precisa ser revelada para a população.
. A RELIGIÃO AFRO-BRASILEIRA dentre as manifestações culturais africanas
e afro-brasileiras poucas foram e são tão perseguidas, estereotipadas e discriminadas
quanto as manifestações religiosas trazidas pelos negros africanos. Acusadas de feitiçaria e
bruxaria; tachadas de obra do diabo, de incorporação do demônio e veículo de satanás, a
Religião dos Orixás , praticadas nos Terreiros de várias regiões brasileiras, mantém até hoje
estas adjetivações depreciativas no imaginário nacional. Por quê?
102
Comentamos que Portugal além da conquista de novos territórios, também buscava
a conquista de almas para o rebanho católico no movimento da Contra-Reforma. Neste
contexto, todas as manifestações religiosas dos povos conquistados e colonizados foram
consideradas demoníacas e anticristãs, assim sendo passíveis de exorcização e condenação.
Isto ocorreu com as africanas, hindus, chinesas, indígenas.
Uma outra reflexão a ser considerada é acerca do fato de aceitarmos a Mitologia
Greco-romana e rejeitarmos a Mitologia Africana. O que diferencia uma/um
Sacerdotisa/Oráculo grego de uma/um Ialorixá/Babalorixá a não ser a língua, a cor da pele
e a localização geográfica? Ambas/ambos são as/os medianeiras/o, as/os orientadoras/os,
as/os guardiãs/ões dos mistérios de seus credos. O que diferencia um greco-romano de um
Nagô/Banto quando em vias de um naufrágio clamam aos céus? Enquanto aquele clama
por Zeus/Netuno esse clama por Iemanjá.
Os Assistentes Sociais precisam saber e repassar para seus usuários, que:
Candomblé não é palavrão nem prece ao demo. Significa culto, oração, invocação, reza;
entender que Orixás nada têm a ver com demônio, mas que são forças da natureza, criação
divina; Saravá quer dizer Amém, Aleluia, Salve ou outra saudação de bem-aventurança;
Nós somos a síntese. é possível ser brasileiro se puder ser a síntese. A síntese
de um conjunto amplo de cores, de povos, de línguas, de costumes, de culturas ...
(VIANNA, 1995, p.140).
103
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Eu tenho um sonho de que meus filhos um dia vivam numa nação onde não sejam
julgados pela cor da sua pele mas pelo seu caráter” (Martim Luther King).
Este é também o sonho dos brasileiros negros, brancos e mestiços, detentores de
saberes sobre natureza humana e sobre as sociedades constituídas historicamente por
diversos grupos sócio-culturais, formados pelas migrações e, por isso, afeitos a
transformações genéticas e físicas devido às condições geográficas e climáticas dos lugares
onde se estabeleceram. Também por isso, sensibilizados e revoltados pelas deploráveis
condições de existência de um numeroso segmento da população brasileira, vitimados por
um processo histórico de exploração, opressão e desigualdade sócio-econômica
naturalizado e alimentado pelo desconhecimento do porquê e da forma como esse processo
histórico foi arquitetado, implementado e mantido através dos tempos.
Este também é o principal objetivo deste exercício investigativo que por hora
finalizamos e que teve como foco os saberes sobre a questão do negro na sociedade
brasileira apreendidos pelas/os graduandas/os em Serviço Social da UFF.
Acredito ter conseguido resposta para o problema que me motivou a realizar a
pesquisa: por serem profissionais que invariavelmente interagem com segmentos da
população onde é grande o número de pretos e pardos, os conhecimentos que os Assistentes
Sociais recebem em seu processo de formação contemplam e problematizam temas
relacionados com as questões que dizem respeito ao negro na sociedade brasileira? Em
caso negativo, por que isso ocorre?
Infelizmente, comprovamos que a segunda interrogação é a verdadeira. As/os
Assistentes Sociais formadas/os pela ESS-UFF não apreendem saberes sobre a questão do
negro na nossa sociedade, embora grande parte das/os estudantes que buscam essa
formação superior sejam pretos e pardos, como constatou o Censo UFF 2003 e os dados do
questionário distribuído entre as/os formandas/os de 2004, citado no capítulo III dessa
monografia.
Conseguimos esta comprovação através da aplicação de questionário para as
formandas da ESS-UFF do ano 2004, onde percebemos que os temas sobre a cultura, sobre
104
a história e sobre as teorias raciais utilizadas para justificar a infame desigualdade a que o
negro brasileiro é submetido na sociedade, não são discutidos nem problematizados durante
o curso. A mesma situação foi detectada ao examinarmos os 1347 trabalhos de final de
curso (TCC), abrangendo o período de 1947 a 2002, onde apenas 0,48% ou 6 TCCs
abordam temas sobre a questão racial ou do negro na sociedade brasileira.
Esse silêncio também foi observado na grade curricular e nos conteúdos
programáticos constante nas ementas das disciplinas da graduação, o mesmo acontecendo
com os periódicos para as/os Assistentes Sociais formados e/ou em formação - revistas:
Serviço Social; Serviço Social e Sociedade; Gênero e Temporalis - catalogados na
Biblioteca Central da UFF e utilizados pelas/os alunas/os em leituras e pesquisas. É como
se a igualdade pregada no texto constitucional existisse na prática e a visualização dos
dados que atestam diferença de tratamento entre brancos e negros, apresentados pelos
Indicadores Sociais e Econômicos coletados pelo IBGE, IPEA. FGV e outros institutos de
pesquisa, fossem mera ilusão de ótica.
Como foi colocado no texto do capítulo I, as teorias raciais lançadas no século XIX
e a idéia de raça em conjunto com a premissa da condenação e da inferioridade do negro
pelo seu passado escravocrata/ pela sua origem geográfica/ pela cor da sua pele, veiculada
nos púlpitos eclesiásticos pelos Jesuítas no período colonial e defendida por intelectuais
brasileiros nos séculos XIX-XX, encontram-se muito sedimentadas no imaginário popular
em nossa sociedade. Embora alguns expressem o descrédito na inexistência biológica das
raças como vimos algo comprovado cientificamente - no contexto sócio-cultural e no
relacionamento diário, sua crença e prática é insofismável. E quando estes pontos de vista
não são desmentidos nas salas de aula, sua validade é reforçada.
E essas teorias e idéias sem comprovação cientifica não são desmentidas ou
discutidas nas salas de aula da ESS-UFF porque, como as entrevistas com os professores
deixaram patente, o corpo docente não se encontra capacitado para fomentar discussões
acerca desse tema. Na Introdução desse trabalho comentamos acerca do despreparo dos
Docentes de todos os níveis e a pergunta: como é possível ensinar, transmitir, orientar ou
atuar sobre algo que desconhecemos ou que sabemos existir porém não dominamos a sua
essencialidade, mostrou a sua contemporaneidade.
Esta invisibilidade temática sobre a questão do negro na sociedade brasileira no
curso de graduação em Serviço Social da UFF, assim como em outros cursos de graduação,
105
se deve a ausência desse assunto do currículo do sistema de ensino brasileiro. Como
citamos, em 2003, uma lei assinada pelo Presidente da República obrigou a
implementação, no sistema de ensino, de matéria abordando a história e a cultura afro-
brasileira. Anteriormente, em 1999, quando da divulgação dos Parâmetros Curriculares foi
recomendada a inclusão de estudos étnico-raciais como tema transversal inserido na parte
da Pluralidade Cultural. Como podemos notar, em ambos os casos o tema foi imposto e não
espontâneo como deveria ocorrer num País onde 46% da população é formada por pretos e
pardos, configurando a 2ª maior população negra do mundo. Por que isto acontece?
Baseados nas informações apreendidas na pesquisa apresentamos seis prováveis
causas para esta ocorrência no curso de graduação em Serviço Social da UFF:
1. A vinculação das escolas de Serviço Social com a doutrina católica desde suas
origens européia, latino-americana e brasileira. Como o racismo não era aceito pela
doutrina e tampouco admitida sua existência entre os brasileiros, a introdução da questão
racial no currículo ou como conteúdo programático geraria discussão e levantaria polêmica,
quebrando a harmonia desejada pela doutrina e que se fingia existir no dia-a-dia.
2. A incorporação teórico-metodológica-epistemológica das idéias de Marx e Engels
após o processo de reconceituação do Serviço Social ocorrido nos anos 80/90. O enfoque
dado a teoria de reprodução da força de trabalho e da classificação da Assistência Social
como Aparelho Ideológico de Estado associado ao conceito teórico de classe como
determinante para as paupérrimas condições de existência do proletariado, conduziram a
uma idealização profissional a níveis extremos, aprofundando distancias em relação às
condições históricas reais” (COSTA, 1989, p.10). Ou seja, numa sociedade onde a cor da
pele é referência social, econômica, identitária coletiva e individual negativa, como
discutida no capítulo II, essa ótica economicista e de totalidade prejudica a busca de novas
explicações para os problemas sociais.
3. A falta de demanda pela sociedade. A naturalização da inferioridade da população
negra aos olhos da sociedade conduz a não se achar necessário o seu estudo. Repetindo o
dito por uma das nossas entrevistadas, por que vai entrar a não cultura no palácio do
saber, na academia?” (PC). O desconhecimento dos temas considerados fundamentais para
propiciar uma mudança de comportamento da sociedade em relação a questão do negro,
citados e quantificados na análise dos questionários das alunas, comprovam o motivo para
106
esta falta de cobrança por parte do alunado, apesar de nos questionários afirmarem o
contrário.
4. O despreparo e/ou a falta de interesse dos professores. Além da razão citada
acima, o desconhecimento oriundo da não inserção de saberes sobre a história e da cultura
afro-brasileira nos ensinamentos recebidos pela população desde a pré-escola a o ensino
superior, a questão do negro não é priorizada ou tida como relevante para a prática do
Assistente Social. Embora contando com a adesão de uns poucos, nem mesmo o fato da
maioria dos usuários do Serviço Social serem pretos e pardos, mesma situação de grande
parte dos alunos, consegue desvelar a invisibilidade ou a representação negativa imposta
pela manipulação histórica em vigor desde o século XIX, como demonstrada no capítulo I.
5. A insistência de alguns setores influentes no Serviço Social, defensores da
ortodoxia, em não incorporar a questão racial ou a questão do negro como uma questão
social, passível de ser vislumbrada como uma questão de Política Social, de Proteção
Social e objeto de Políticas Públicas, como salientamos na Introdução dessa dissertação.
6. O secular preconceito contra a cultura negra. Segundo GONÇALVES (2003,
p.17) “dificilmente uma sociedade racista como a brasileira no aceitaria como produtores
de conhecimento. E quando de conhecimento não me refiro apenas ao científico mas a
qualquer outro tipo de conhecimento”. Por isso a nossa entrevistada ‘PC’ afirmou com
muita categoria que o negro não é visto como produtor de cultura, não podendo penetrar no
palácio do saber, na Academia.
Representações expressam interesses e projetos diferenciados, símbolos, sentidos,
memórias e subjetividades que influenciam a formação de identidade, da auto-estima e da
alteridade positiva. Compreender esta conexão fundamental para a vida em sociedade
significa compreender a dimensão simbólica que um sistema de saberes (linguagens,
valores, tradições, memórias, técnicas), base dos sistemas educativo e cultural, assume num
determinado momento histórico. Esse momento histórico constrói uma determinada
realidade social que, dependendo do lugar e do papel do indivíduo na sociedade, pode ser
apreendida de duas formas: primária ou realidade objetiva/ secundária ou realidade
subjetiva, para BERGER e LUCKMANN (2002, p.175),
Socialização Primária ou realidade objetiva é a primeira socialização que o
indivíduo experimenta na infância e em virtude da qual torna-se membro da
sociedade... Começa com o fato do indivíduo assumir o mundo no qual os outros já
vivem; Socialização Secundária ou realidade subjetiva é qualquer processo
107
subseqüente que introduz um indivíduo socializado em novos setores do mundo
objetivo... podemos dizer que a Socialização Secundária é a aquisição do
conhecimento.
Os mesmos estudiosos comentam que, “o homem da rua habitualmente não se
preocupa com o que é ‘real’ para ele e com o que ‘conhece’. A não ser que esbarre com
alguma espécie de problema, dá como certa sua realidade e seu conhecimento. O Sociólogo
não pode fazer o mesmo...”. Nessa perspectiva, não se pode responsabilizar as pessoas pelo
que aprendem sobre o outro, no senso comum do cotidiano familiar e de vizinhança, na
escola e/ou nos meios de comunicação, contextualizados por saberes identificados por um
determinado tempo histórico. No entanto, ao adquirir maior compreensão sobre o processo
de construção desse saberes e da realidade que orienta a desigualdade sócio-econômica
existente entre negros e brancos na sociedade brasileira, as pessoas, e não só os Sociólogos,
como apregoam Berger e Luckmann, adquirem a responsabilidade de interromper esse
ciclo gerador de representações negativas sobre o outro, seja ele negro seja branco. Isso
gostaríamos que acontecesse com os Assistentes Sociais graduados pela ESS-UFF.
Quais as informações que recebemos sobre o negro no contexto sócio-histórico-
cultural brasileiro? No contexto que explanamos no decorrer da pesquisa, nossa
socialização primária sobre o negro é objetivamente influenciada: a) pelo conhecimento
histórico, norteado pelas imagens produzidas durante o período escravocrata; b) pela
ideologia, através das idéias pseudocientificas sobre raças humanas inventadas no século
XIX; c) pela religião, presente nos sermões dos Jesuítas; d) pela linguagem, através de
conhecimentos falaciosos e das imagens estereotipadas da África, dos africanos e dos afro-
brasileiros disseminadas pela literatura e pelos meios de comunicação.
A apreensão de novos saberes é o veículo que pode introduzir o indivíduo na
socialização secundaria, é essa socialização, produzida pelo conhecimento, que deve ser a
propagadora de mudanças no imaginário brasileiro acerca das imagens que afetam a
população negra no seu relacionamento com os demais segmentos da população. O embate
maior é extirpar do inconsciente coletivo o julgamento dos seres humanos pela cor da sua
pele. É fundamental introjetar nas construções mentais da população brasileira a idéia de
que os anjos são brilhantes ou policromáticos e que o Diabo é preto porque assim o
‘pintaram’. Estas são invenções e não realidades.
Concluímos que para desestruturar as imagens que encarceram o ‘ser negro’ no
Brasil em representações que o macula enquanto ser humano, devemos estruturar uma nova
108
rede de informações que transforme o não familiar em familiar, o desconhecido em
conhecido, dando concretude e significado às imagens positivas; produzindo, provocando e
estimulando comportamentos que alterem as informações, as crenças, as opiniões e as
atitudes que constituem a representação negativa do negro brasileiro. Independente da
escolaridade, estes conhecimentos certamente concorrerão para que o indivíduo veja a si
mesmo e aos outros com novos olhares, quiçá, mais positivos.
é tempo que o povo brasileiro, na escola, nos meios de comunicação, no
cotidiano familiar e de vizinhança e na Academia, entenda que:
A cor da pele, o nariz grosso, a boca carnuda e o cabelo crespo não são marcas
comparativas ou referenciais para formulações de padrões de beleza/fealdade ou de
superioridade/inferioridade em relação ao outro, mas identificação estética e demarcadora
das diferenças fenotípica da espécie humana.
O andar bamboleante, gingado não significa convite ao sexo ou luxúria, mas
orgulho do corpo, a demonstração da perfeição das formas, a certeza de que este lhe
pertence e que é bonito sem perversão ou pecado. É saber que ‘pecado’ é uma invenção
humana, tradição judaico-cristã imposta pelos dominadores;
A espontaneidade nos gestos e no falar, o riso largo e farto, não são falta de
educação, mas a demonstração de se saber vivo e em paz consigo mesmo, com os
ancestrais e com os Orixás. É comemoração do ser/estar vivo hoje e não ser/estar vivo
amanhã, mas permanecer sempre presente nas coisas que deixou, falou e realizou.
O gosto pela cores vivas, alegres, vistosas das vestimentas não é mau gosto ou
espalhafato e sim representações simbólicas da natureza florida, colorida e festiva. É
homenagem as 4 estações presentes e vivenciadas no dia-a-dia.
O cantarolar constante, a música ritmada, os instrumentos de percussão não são
sinônimos de barbárie ou desconhecimento de teoria musical, mas antônimos de morte, de
tristeza, de silêncios não existentes na natureza. É a sinfonia pura do farfalhar das matas
virgens, do borbulhar das corredeiras e cascatas, do ronronar da fauna liberta.
O tocar, o ‘cheirar’, o ‘apalpar’, o ‘enroscar não significam falta de higiene ou
libidinagem, mas carinho, prazer pela proximidade do outro. É a explicitação do ‘amar o
próximo como a si mesmo’.
109
As comidas picantes, gordurosas, afrodisíacas, arcoirizadas não visam cirrozear o
fígado, mas apetecer as glândulas salivares e erotizar a íris. É o ‘comer nos sentidos real,
figurado e idealizado.
A religiosidade endemoniada não o foi pelo Supremo Criador. É fruto do
fundamentalismo, da incapacidade de aceitação das diferenças e das várias formas de
encontro com o Sagrado.
A poesia ignorada; a pintura, a escultura e a arquitetura manietadas e destruídas;
a literatura ridicularizada; as tradições folclorizadas; as línguas emudecidas ou
dialetalizadas foram arquitetações ideológicas de seres humanos com a intenção de matar,
não a vida vivida, mas a vida simbólica perpetuada pelo imaginário: a vida na vida.
“Será que é tudo ilusão
Será que nada vai acontecer
Será que tudo isso é em vão
Será que vamos conseguir vencer”.
(Renato Russo).
José Barbosa da Silva Filho
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COSTA, Sueli Gomes Formação Profissional e Currículo do Curso de Serviço Social:
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124
José Barbosa da Silva Filho
ANEXOS
1. Fluxograma da ESS-UFF.
2. Fluxograma da ESS-UFRJ.
3. Fluxograma da ESS-UERJ.
4. Fluxograma da FSS-PUCRJ.
5. Questões da Entrevista com os Docentes.
6. Questões do questionário aplicado às alunas do 9º período da ESS-UFF.
7. Proposta de Currículo das Profs. Sueli G. Costa e Nilza Simão para a revisão curricular
de 1999.
8. Ementa e bibliografia da disciplina “Questão Social no Brasil”.
125
126
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