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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
O MINAS TÊNIS CLUBE E O ESTADO NOVO
:
moldando corpo e mente da juventude de Belo Horizonte (1935-1945)
Luciana Silva Schuffner
Belo Horizonte
2007
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Luciana Silva Schuffner
O MINAS TÊNIS CLUBE E O ESTADO NOVO
:
moldando corpo e mente da juventude de Belo Horizonte (1935-1945)
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação
em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica
de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do
título de Mestre em Ciências Sociais.
Orientadora: Lucília de Almeida Neves Delgado
Belo Horizonte
2007
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O MINAS TÊNIS CLUBE E O ESTADO NOVO: moldando corpo e mente da
juventude de Belo Horizonte (1935-1945)
Luciana Silva Schuffner
Dissertação de Mestrado submetida à banca examinadora designada pelo Programa de Pós-
Graduação em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como
parte dos requisitos necessários à obtenção do grau de Mestre em Ciências Sociais.
Belo Horizonte, 18 de junho de 2007.
Profa. Dra. Lucília de Almeida Neves Delgado
Orientadora/PUC Minas
Profa. Dra. Thaís Velloso Cougo Pimentel
UFMG / MHAB
Prof. Dr. Mário Cleber Martins Lanna Júnior
FJP
Prof. Dr. Tarcísio Rodrigues Botelho
PUC Minas
Aos meus queridos filhos,
Henrique e JoãoVitor.
AGRADECIMENTOS
Ao Fernando, pelo carinho com que me acompanhou durante todo esse tempo.
Ao Henrique e João Vitor, pelo incentivo e companheirismo tão necessários nesse momento.
À Lorena, com ela compartilhei histórias de vidas, as nossas e outras.
Aos meus pais e irmãos, que de longe torceram por mim.
Aos colegas de Mestrado, a amizade, a colaboração e as angústias vividas.
Aos professores do Mestrado, que foram fonte de inspiração, especialmente ao Tarcísio
Botelho, que me orientou desde a graduação.
À querida professora Elizabeth Parreiras, exemplo no qual me inspirei.
Ao Raul Macedo, que com sua competência me mostrou que seria capaz.
A todos os entrevistados que partilharam comigo histórias e emoções.
Ao MTC, em especial à Adriana Ávila, assistente do Acervo histórico do clube, que
disponibilizou todo o material necessário para a pesquisa. Sem o apoio fraternal dela, essa
dissertação não seria possível.
Meu especial agradecimento à professora Lucília de Almeida Neves Delgado, que, com apoio,
carinho e sabedoria me conduziu pelos caminhos da pesquisa histórica. A sua sensibilidade e
estímulos não me deixaram desistir.
A todos que colaboraram para a realização dessa dissertação.
Enfim, aos amigos que comigo participaram dessa caminhada.
RESUMO
Análise da fundação do Minas Tênis Clube em Belo Horizonte, em 1935, associando-a
ao contexto político e ideológico do Estado Novo, principalmente, no que se refere à
apropriação, por parte do clube, do discurso varguista em relação à prática esportiva e à
modernização.
Palavras-chave: Estado Novo. Minas Tênis Clube. Educação Física. Esporte.
Modernização.
ABSTRACT
Analysis of the foundation of the Minas nis Clube in Belo Horizonte, in 1935,
associating it with the ideological and political context of the Estado Novo, mainly, as for the
appropriation, on the part of the club of the varguista speech in relation to the practical
sportive and the modernization of life.
Key words: Estado Novo. Minas Tenis Clube. Physical Education. Sport.
Modernization.
LISTA DE FIGURAS
FIGURA 1 - O EDIFÍCIO DO MINISTÉRIO DA SAÚDE E EDUCAÇÃO: POR MEIO DA
MONUMENTALIDADE DA OBRA, ESTA DEVERIA SIMBOLIZAR O ESFORÇO
RENOVADOR DO ESTADO NOVO E SERIA UM MARCO NA ARQUITETURA
MODERNA INTERNACIONAL ............................................................................................47
FIGURA 2 - A ESCULTURA DA MULHER, PARA O EDIFÍCIO DO MÊS, RETRATA
UM CORPO FORTE, SADIO, SERENO, PORTANTO, APTO PARA O TRABALHO E
PARA A FAMÍLIA..................................................................................................................47
FIGURA 3 - GETÚLIO VARGAS ACLAMADO POR ESTUDANTES NO DIA DA
INAUGURAÇÃO DO EDIFÍCIO ...........................................................................................48
FIGURA 4 - A CARTILHA "GETÚLIO VARGAS PARA CRIANÇAS" (1942),
PRODUZIDA E DIVULGADA PELO DEPARTAMENTO DE IMPRENSA E
PROPAGANDA.......................................................................................................................48
FIGURA 5 - CARTÃO POSTAL EXALTANDO AS REALIZAÇÕES DO GOVERNO
VARGAS (1937/1945).............................................................................................................49
FIGURA 6 - FESTA DE COMEMORAÇÃO DO DIA DA JUVENTUDE. O PROJETO DE
MOBILIZAÇÃO DA JUVENTUDE PROCURAVA PREPARÁ-LA E AJUSTÁ-LA AOS
NOVOS PRINCÍPIOS QUE REGIAM O ESTADO NOVO ..................................................49
FIGURA 7 - A FOTO RETRATA O DESFILE DE JOVENS PELO DIA DA RAÇA. A
FRAGILIDADE FÍSICA DO BRASILEIRO ERA ATRIBUÍDA À SUA FRAGILIDADE
RACIAL (1939)........................................................................................................................50
FIGURA 8 - ESCOLAS DESFILAM NA QUINTA DA BOA VISTA COMEMORANDO O
DIA DA PÁTRIA.....................................................................................................................50
FIGURA 9 - ESTUDANTES NO DIA DA BANDEIRA (1938/1945)..................................51
FIGURA 10 - PLANTA DA CIDADE DE BELO HORIZONTE DE 1930 COM OS
PRINCIPAIS EDIFÍCIOS DA CIDADE. NA PARTE DE BAIXO ESTÁ LOCALIZADA A
PRAÇA DA LIBERDADE E À SUA ESQUERDA A ÁREA ONDE FOI CONSTRUÍDO O
MTC .........................................................................................................................................61
FIGURA 11 - PARQUE ESPORTIVO COM DESTAQUE PARA A TORRE DO
RELÓGIO, MARCO ARQUITETÔNICO DO MTC (SÉRIE DE FOTOS 1937-1945).........68
FIGURA 12 - SEDE DO MINAS TÊNIS CLUBE CONSTRUÍDA EM ESTILO ART
DECÓ, LOGO APÓS A INAUGURAÇÃO EM 1937............................................................70
FIGURA 13 - VISTA DA PISCINA OLÍMPICA E DA ARQUIBANCADA
CONSTRUÍDAS EM 1937......................................................................................................71
FIGURA 14 - INAUGURAÇÃO DA PRAÇA DE ESPORTES. REGISTRO DO JOGO
ENTRE O MINAS E O COPACABANA DO RIO DE JANEIRO, 1937...............................72
FIGURA 15 - TENISTAS DO MTC, 1939.............................................................................73
FIGURA 16 - TENISTAS DO MTC, 1940.............................................................................73
FIGURA 17 - TORNEIO INTERNO DO MTC, 1942............................................................74
FIGURA 18 - LOCAL ONDE FOI CONSTRUÍDO O MINAS TÊNIS CLUBE, TERRENO
SITUADO PRÓXIMO AO PALÁCIO DA LIBERDADE, ENTRE AS RUAS DA BAHIA E
ESPÍRITO SANTO. CONHECIDO COMO O "BURACÃO" ONDE AS CRIANÇAS DA
VIZINHANÇA BRINCAVAM................................................................................................79
FIGURA 19 - SOLENIDADE DE INAUGURAÇÃO OFICIAL DA PRAÇA DE
ESPORTES DO MINAS TÊNIS CLUBE. VÊEM-SE O MAJOR ERNESTO DORNELES
DISCURSANDO E A ESQUERDA O GOVERNADOR BENEDITO VALLADARES E O
PADRE CLOVIS SOUZA E SILVA E OUTROS EM 27/11/1937 ........................................87
FIGURA 20 - INAUGURAÇÃO DO PARQUE ESPORTIVO DO MTC EM 1937.
HASTEAMENTO DA BANDEIRA DO CLUBE PELA SENHORITA LUCIA
VALLADARES, FILHA DO GOVERNADOR BENEDITO VALLADARES .....................88
FIGURA 21- VISTA DO PARQUE ESPORTIVO E DA SEDE SOCIAL NO FINAL DA
DÉCADA DE 1930.................................................................................................................89
FIGURA 22 - EXIBIÇÃO DE GINÁSTICA INFANTIL, DO PROFESSOR MACEDO, NO
MTC, REVELA A PREOCUPAÇÃO DO CLUBE NA FORMAÇÃO FÍSICA E MORAL
DAS CRIANÇAS, ADVINDAS DA PRÁTICA DE EXERCÍCIOS (FINAL DA DÉCADA
DE 1930) ..................................................................................................................................89
FIGURA 23 – VISITA DE GETÚLIO VARGAS AO MTC (1938)......................................89
FIGURA 24 – VISITA DE GETÚLIO VARGAS AO MTC (1938)......................................90
FIGURA 25 - VISITA DE GETULIO VARGAS AO MTC EM 1940 ..................................90
FIGURA 26 - VISITA DO PRESIDENTE GETÚLIO VARGAS NA INAUGURAÇÃO DA
SEDE DO MTC EM 1940........................................................................................................91
FIGURA 27 - VISTA AÉREA DE BELO HORIZONTE TENDO AO CENTRO A PRAÇA
DA LIBERDADE E A DIREITA O MTC (DÉCADA DE 1940)...........................................91
FIGURA 28 - CAPA DA REVISTA MINAS TENIS CLUBE ..............................................92
FIGURA 29 - GINÁSTICA OLÍMPICA DO PROF. MACEDO NO MTC (1944)...............99
FIGURA 30 - O TÉCNICO DE NATAÇÃO CARLITO ENTRE AS NADADORAS
SIEGLINDA E MARIA LENK. (1937).................................................................................107
FIGURA 31 - PROVA DE NATAÇÃO DO MTC NA DÉCADA DE 1940 .......................114
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AMEG Associação Mineira de Esportes Gerais
MTC Minas Tênis Clube
MES Ministério da Educação e Saúde
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................................14
2 A EDUCAÇÃO FÍSICA NO ESTADO NOVO: MENS SANA, CORPORE SANO.........24
2.1 EDUCAÇÃO, ESPORTE E TRABALHO ........................................................................27
2.2 SAÚDE, HIGIENIZAÇÃO SOCIAL E ESPORTE..........................................................30
2.4 O PAPEL DA ELITE BRASILEIRA NO ESTADO NOVO ...........................................43
3 A FUNDAÇÃO DO MINAS TÊNIS CLUBE: A CONCRETIZAÇÃO DE UM SONHO
DE MODERNIDADE PARA BELO HORIZONTE...............................................................52
3.1 BELO HORIZONTE NAS DÉCADAS DE 1930 E 1940: ESPORTE E
MODERNIDADE ....................................................................................................................53
3.2 O NASCIMENTO DO MINAS TÊNIS CLUBE..............................................................59
3.3 O MTC E O ESTADO NOVO..........................................................................................65
3.4 LOCALIZAÇÃO DO MTC ..............................................................................................78
3.5 REVISTA MTC: A INCORPORAÇÃO DE IDEAIS DE BELEZA E ORDEM.............81
4 O MINAS TÊNIS CLUBE E O ESPORTE NA FORMAÇÃO DA JUVENTUDE DE
BELO HORIZONTE DURANTE O ESTADO NOVO...........................................................93
4.1 O MINAS TÊNIS CLUBE: AUXILIANDO NA FORMAÇÃO DOS CORPOS ÚTEIS À
PÁTRIA....................................................................................................................................94
4.2 EUGENIA, NACIONALISMO E SAÚDE NO MTC ....................................................102
4.3 O ESPORTE NA IDENTIDADE DO MINASTENISTA ..............................................111
4.4 O MINAS TÊNIS CLUBE E A TRADICIONAL FAMÍLIA MINEIRA ......................117
4.5 O ESPORTE E A MODERNIDADE DO MINAS TÊNIS CLUBE...............................128
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................137
REFERÊNCIAS .....................................................................................................................142
FONTES IMPRESSAS...........................................................................................................151
APÊNDICE A – DEPOIMENTOS ........................................................................................151
ANEXO A - O DISCURSO DO PRESIDENTE GETULIO VARGAS NA PARADA
ESPORTIVA DO MINAS TENNIS CLUBE........................................................................152
ANEXO B – ILUSTRAÇÕES.......................................................................................... 154
14
1 INTRODUÇÃO
Essa dissertação tem como tema a fundação do Minas Tênis Clube (MTC) em Belo
Horizonte, em 1935, e a colaboração do clube, por meio do esporte e do lazer, na formação
física e cívica da juventude belorizontina, no período de 1935 a 1945. A proposta norteadora
dessa pesquisa busca analisar em que os objetivos fundacionais do clube se identificam com o
caráter político e ideológico do governo Vargas para o esporte e a contribuição deste para a
modernização da sociedade. Isso tudo de acordo com o modelo proposto por Getúlio Vargas.
A ênfase em sua fundação se justifica por ser um momento que reflete, por parte do
clube, uma preocupação em incorporar em suas atividades esportivas e sociais a proposta
ideológica do Estado Novo, imbuindo-as de um aspecto educativo, no sentido de conduzir
seus associados, em especial as crianças e os jovens, a incorporarem os valores difundidos
pelo governo Vargas, tais como: esporte, disciplina, civismo, eugenia, saúde, nacionalismo,
modernidade.
O MTC, anteriormente, foi objeto de estudo para três pesquisas. Uma dissertação de
mestrado em Educação Física da UFMG, da pesquisadora Marilita Aparecida Arantes
Rodrigues (1996), intitulada Constituição do sentido moderno de esporte: pelas trilhas
históricas do Minas Tênis Clube. Essa dissertação analisou a trajetória do esporte em Belo
Horizonte pela análise das administrações do MTC, desde a fundação do clube, em 1935 até a
década de 1980, procurando compreender o sentido dado ao esporte, em cada uma delas. A
segunda publicação, Minas Tênis Clube tradição e modernidade foi encomendada pela
diretoria do clube às pesquisadoras Ávila e Miranda (1999), para a comemoração dos sessenta
anos de fundação. Esse estudo tem um caráter mais livre e faz uma abordagem histórica da
instituição de caráter informativo. A terceira é um texto publicado na Revista de Arquitetura
e Engenharia (1988), "Minas Tênis Clube: pesquisa histórica", de Cláudia Cambraia Godoy
Castro. Esse texto aborda, de forma sucinta, a fundação do MTC, ligando-a à conjuntura
brasileira da década de 1930.
A proposta dessa dissertação trilha caminhos diferentes. Busca analisar a fundação do
MTC por meio de diretrizes que se mostram fundamentais para o estudo da utilização do
esporte, como um dispositivo político e ideológico, durante o período do Estado Novo, no
Brasil. O esporte, como conteúdo da educação física, tornou-se importante, nesse contexto
histórico, para o aprimoramento do projeto de fortalecimento da nação, da modernização
15
econômica, de desenvolvimento da ideologia do trabalho e da produção, e para a construção
do "novo" homem brasileiro. O MTC, desde o momento da fundação, mostrou-se sintonizado
com as proposta do governo estadonivista, em relação ao esporte. De acordo com o estatuto
de 1937, o clube "tem por objetivo promover entre os sócios, a prática de toda sorte de jogos
esportivos, exercícios atléticos, propugnando pelo desenvolvimento físico, racional e
principalmente, da cultura física infantil". (EDIÇÃO CORRELATA, 1937, p. 3, Acervo
MTC). Dessa forma, o clube foi considerado, à época, "uma grande organização" destinada a
manter a disciplina e a ordem entre seus membros e trabalhar em prol da melhoria da raça e
do civismo, como um exemplo esportivo a ser seguido por toda a sociedade mineira.
Vargas concebeu, para o Brasil, um projeto de modernização que visava, sobretudo, a
superar o atraso econômico do país. A indústria era identificada como a principal atividade
econômica, que promoveria o desenvolvimento da nação. O projeto de Vargas, porém,
esbarrava nos interesses do setor agroexportador, o grupo político e econômico dominante, até
o fim da década de 1920. O capital agrário, contudo, era vital economicamente para o
estabelecimento da nova ordem, pautada nas indústrias. Para pôr em prática seu projeto
modernizador, Vargas passou a defender diferentes interesses de diferentes grupos, mas sem
ferir os interesses das elites agrárias tradicionais.
Para Vianna (1978), Vargas, ao assumir o poder, criou as bases para promover "por
cima" o desenvolvimento das atividades das elites. Para tanto, controlou, com vigor, a
movimentação reivindicativa de diferentes grupos sociais. As camadas médias urbanas foram
cooptadas, recrutando-as para as funções públicas. A legislação sindical não chegou a impedir
a organização dos trabalhadores, mas buscou enquadrá-los aos interesses do Estado. Assim,
durante o governo de Vargas, houve, de acordo com Vianna (1978), uma modernização
conservadora, que consistia na intervenção política para induzir a modernização econômica,
implicando, contudo, uma "conservação" do sistema político, embora promovesse rearranjos
nos lugares ocupados pelos diferentes protagonistas. A idéia central do autor não é a de que
tal processo tenha elevado a elite industrial ao poder político, mas sim a de que os interesses
da indústria tenham encontrado apoio e estímulo na nova configuração estatal.
Essa dissertação utiliza o conceito de modernização conservadora de Vianna (1978),
mas estende seu conteúdo para o aspecto cultural desse período histórico. Ao longo da década
de 1930, também, procedeu-se a conservação de valores culturais tradicionais da sociedade
agrária brasileira, ao mesmo tempo em que se procuravam incutir novos valores e atitudes
mais modernas no país, como um todo. A sociedade deveria passar por transformações, para
16
se adequar às demandas da ordem industrial, sem que os seus fundamentos fossem alterados
de forma radical. As reformas implementadas e estimuladas pelo governo previam a alteração
de hábitos e valores e a construção de um novo perfil para o cidadão brasileiro. Era necessário
moldar um "novo" homem, melhor adaptado à nova ordem, ou seja, livrar a população
brasileira das máculas atrasadas de sua origem.
Assim, a prática desportiva, à época de Vargas, tornou-se, um dispositivo pedagógico
e educativo destinado a incutir os valores cívicos predominantes nos praticantes. Do esporte
esperava-se a contribuição para o fortalecimento do sentimento de coletividade disciplinada.
Os ideólogos do Estado Novo esperavam que a disciplina, a harmonia e a obediência às
regras, atitudes que fazem parte do universo do esporte, e adquiridas pelo esportista, fossem
transplantadas para o cotidiano dos cidadãos. Elas contribuiriam para a formação da
consciência cívica pretendida naquele momento. Fortaleceriam os laços de cooperação
nacional em beneficio de uma causa comum: o desenvolvimento da nação.
O esporte também correspondia a um pressuposto funcionalista. Deveria disciplinar o
movimento corporal, de modo a fortalecer os músculos e tornar os jovens mais aptos para o
trabalho. Os indivíduos se ajustariam melhor às tarefas úteis à vida e ao desenvolvimento
social. O esporte passou a se identificado como chave para a adaptação dos indivíduos ao
meio social e político.
A prática de esporte, no Estado Novo, continha uma concepção militarista. Grande
parte dos técnicos, que compunham o quadro da Divisão de Educação Física do Ministério da
Educação e Saúde (MES), foi recrutada das instituições militares. Para eles, o esporte assumiu
papel relevante para garantir a segurança nacional. O jovem poderia adquirir, pela prática de
esporte, noções de ordem, disciplina e estratégias, e seu corpo se tornaria mais elástico,
resistente e adequado às exigências de uma ordem econômica moderna.
Vargas estimulava a educação física com a finalidade, também, de favorecer a eugenia
e o aprimoramento da raça. A regeneração da raça era parte do movimento que buscava
determinar a configuração do "novo homem" e da "nova mulher". Vargas via a formação
heterogênea do povo brasileiro como um obstáculo para o progresso. Era, portanto, preciso
buscar meios de homogeneizar os elementos heterogêneos presentes na constituição do
homem brasileiro.
O Estado passou, então, a incentivar a educação física como um instrumento de
promoção da eugenia, pois pretendia formar um "novo homem", regenerado, curado dos seus
males de origem, das doenças e da indisposição física. Os teóricos da Educação Física, do
17
Estado Novo, esperavam que os exercícios físicos aprimorassem o corpo e a saúde da
população.
O corpo saudável era importante para o projeto de nação, no sentido de reafirmar a
dignidade e a força nacionais para a formação de um povo produtivo, combativo e forte.
"Repensar a sociedade passava necessariamente pelo cuidado com o corpo como recurso
fundamental para uma juventude sadia, preparada física e moralmente para defender a pátria".
(ÁVILA, 1999, p. 16).
As iniciativas da sociedade civil, que tivessem afinidades com o projeto de
modernização de Vargas, recebiam apoio do Estado. O MTC foi um caso exemplar dessa
colaboração do governo para com a sociedade civil.
O MTC foi criado em 1935, em Belo Horizonte. Ele foi um veículo disseminador do
esporte na capital. Os cios adquiriram, desde a sua fundação do clube, o hábito da prática
esportiva. A influência do MTC, porém, se estendeu por várias cidades do interior de Minas
Gerais. Foi um clube idealizado por um grupo da elite política e econômica de Belo
Horizonte, que procurou, desde o início, obter apoio do poder público local. Os fundadores
procuraram construí-lo com uma infra-estrutura moderna, para o esporte e o lazer, que refletia
o desejo de modernizar a cidade. Desde a fundação, o clube foi dirigido e freqüentado pela
elite e pela classe média letrada local, que assumiram a função de auxiliar na edificação do
projeto político e cultural do Estado Novo. Esse grupo pretendia, por meio da difusão do
esporte na capital, contribuir para a aquisição de novos e modernos hábitos, mas o
comportamento dele oscilava entre valores conservadores e aqueles considerados modernos à
época.
O grupo que fundou o MTC era liderado pelo Dr. Necésio Tavares e pelo Dr.
Waldomiro Salles Pereira. A Prefeitura de Belo Horizonte doou, para a construção do clube, a
área onde seria construído um parque público, denominado Parque Santo Antônio, para a
população da cidade. Nesse local, a prefeitura havia começado as obras para a construção
do parque esportivo. Assim, o MTC foi contemplado com as benfeitorias pagas com dinheiro
público:
Dessa forma, uma obra idealizada, inicialmente, como um espaço público de lazer,
construída com dinheiro público, passou atender interesses particulares de um grupo
interessado em construir ali um clube para os seus associados [...]. O processo de
nascimento do MTC mostra-nos que o sonho desse clube foi desenhado em um
grande quadro sócio-cultural, que possibilitou atender à vontade de um grupo da
elite política e econômica de Belo Horizonte, que se reuniu em torno de um objetivo
18
da criação de um espaço para a prática esportiva como lazer. (RODRIGUES, 1997,
p. 485).
Na inauguração da praça de esporte do MTC, em 1937, estiveram presentes o
governador Benedito Valladares, o prefeito Otacílio Negrão de Lima, várias pessoas de
destaque da sociedade local e esportistas do Rio de Janeiro e São Paulo. Na solenidade de
inauguração da sede, em 1940, compareceu o presidente Getúlio Vargas, que, em seu
discurso, destacou "a estreita relação entre a robustez do corpo e os predicados do espírito" e
afirmou que "o Minas Tênis Clube é uma escola destinada ao aperfeiçoamento e formação do
caráter do jovem brasileiro". (REVISTA MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, s/p. Acervo MTC).
O MTC, de acordo com o discurso de Vargas, poderia auxiliar na formação da
juventude. Esse foi provavelmente o motivo mais forte do clube ter recebido o apoio estatal
para a sua construção e para o desenvolvimento do esporte em Belo Horizonte e em Minas
Gerais.
A juventude, durante o Estado Novo, representava o progresso e o futuro anunciados.
Era sobre ela que recaiam as expectativas da formação planejada do povo brasileiro. Ela
tornou-se a destinatária das atividades físicas e esportivas, pois se tinha, na época, uma
concepção de juventude sadia, forte e bela, apta a servir à pátria e que deveria estar perfilada
aos ideais do regime. As escolas, agremiações esportivas e clubes foram espaços eleitos para
auxiliar na transformação da juventude. Nesses locais, previa-se a prática de exercícios físicos
com a intenção de moldar os corpos e as mentes dos jovens. Foi, portanto, para uma parcela
da juventude de Belo Horizonte que o MTC se voltou, mas sua ação repercutiu em todo o
estado. À época, foi anunciado que essa agremiação
[...] se projetou em toda nossa vida social e esportiva e cuja influência se irradiou
por todo o Estado, preparando gerações para um futuro mais sadio. [...] O Minas
Tênis Clube continuará a sua grande obra, que é verdadeiramente patriótica e
civilizadora. (FOLHA DE MINAS, 12 nov. 1942. Acervo MTC).
Segundo Lima (1979), a educação física e o esporte, nesse período, foram objeto de
estudo e de avaliação de vários especialistas, que mantinham um eixo analítico bastante
análogo. Para eles, a educação física abarca as atividades físicas como meio educacional e se
constitui em uma parte importante da educação em geral. É uma disciplina cujo conteúdo
contempla a educação individual no sentido de desenvolver as suas potencialidades e a
19
educação social tem a função de integrar o indivíduo à sociedade, ao meio social em que
vive. A educação física, nesse período, era vista também como um elemento importante de
eugenia, capaz de desenvolver as qualidades físicas e morais do indivíduo. O esporte, como
parte integrante da educação física, apresenta as mesmas características. Ambos eram
concebidos como atividades físicas de caráter educativo e deveriam se pautar em valores
utilitários, sanitaristas, eugênicos e nacionalistas. A eles eram atribuídas as capacidades de
adestramento, de disciplina, aprimoramento físico, melhoria da saúde, de construção de
espírito cívico, enfim, tinham a capacidade de preparar a juventude para servir um Brasil
industrializado, urbanizado e moderno.
O discurso, que permeava a educação física e o esporte, apresentava-os com
significados análogos, para a socialização do corpo nos princípios nacionalistas em voga.
Havia a necessidade de espaços para o adestramento do corpo por meio dos exercícios físicos
e de disciplina conseguida pela manutenção da ordem. Vários espaços foram criados no
Estado Novo para a prática de esporte, como praças de esporte, clubes, estádios de futebol,
colônias de férias e ginásios. Em Belo Horizonte, o MTC foi um desses espaços destinados ao
desenvolvimento do esporte na cidade.
A educação física e o esporte como toda educação, seja ela moral, física, intelectual
fazem parte do processo sociocultural, portanto são criações do homem. Para Lima (1979),
esse fato os torna sinônimos no momento em que o físico, ou melhor, o corpo, será
socialmente construído de acordo com as regras sociais estabelecidas. No Estado Novo, o
corpo deveria ser exercitado, treinado, disciplinado, para nele se inscreverem os valores
compatíveis com a sociedade ou com o modelo desejado de sociedade e de homem brasileiro.
Nessa dissertação, educação física e esporte são entendidos como sinônimos, pois são
atividades físicas destinadas ao aprimoramento da juventude e da população em geral.
Os espaços destinados ao esporte deveriam possuir estrutura moderna para o seu
desenvolvimento, obedecendo a parâmetros técnicos e científicos divulgados à época. A
arquitetura esportiva foi profundamente influenciada pelas concepções higienistas, que
vigoravam entre médicos, pedagogos e teóricos da Divisão de Educação Física, órgão ligado
ao MES.
O parque esportivo do MTC foi construído de acordo com essas modernas técnicas de
engenharia e arquitetura. As dependências médicas e esportivas, dedicadas ao trato da saúde,
eram dotadas de modernos aparelhos, e suas instalações respeitavam normas de higiene e
conforto ambiental.
20
O esporte e os espaços de prática desportiva se transformaram em instrumentos de
formação cívica e física dos jovens. A imagem formada e idealizada para o jovem era a de ser
um jovem saudável, disciplinado, ordeiro e patriótico. O corpo juvenil, dessa forma, tornou-se
parte do corpo da nação. O futuro e o progresso do país eram creditados a essa juventude.
Uma nação forte e sadia era associada ao jovem de corpo esbelto, forte e também sadio. Por
decorrência, o esporte aglutinava as dimensões física e cívica da educação dos jovens. Tal
fato era evidenciado nas cerimônias oficiais, principalmente, nos desfiles organizados para o
Dia da Juventude e o Dia da Raça. Segundo Parada (2006),
[...] a preocupação com a prática desportiva, cívica e eugênica esteve, portanto,
associadas as formas monumentalizadas de intervenção do Estado na vida pública.
Pode-se dizer que as cerimônias esportivas do Estado Novo propunham um modelo
de virtude cívica e que a promoção de competições esportivas regulares por parte do
governo visavam um objeto cívico e moral, ou seja, havia uma preocupação para que
a prática desportiva fosse um veículo para o desenvolvimento do espírito de coesão
nacional e disciplina individual. (PARADA, 2006).
[...] O encontro entre a educação física e a prática desportiva com a propaganda nos
permite transitar em um campo em que as preocupações com o corpo físico tornam-
se preocupações com a formação do corpo cívico. Nas cerimônias cívicas, a
educação física torna-se uma disciplina moral fornecendo subsídios para a
construção de valores políticos e coletivos, como as idéias de disciplina,
solidariedade com a comunidade nacional, ordem, saúde e modernidade. (PARADA,
2006, p. 173-174),
A época da fundação, o MTC tornou-se para a cidade de Belo Horizonte e para
aqueles que o freqüentavam um símbolo da modernidade. Modernidade traduzida pela
arquitetura de seu parque esportivo e de sua sede social. Na busca pelo moderno, sempre
evidenciada no trabalho desenvolvido pelo clube e no investimento em esportes praticados
por seus sócios, destacava-se a natação. É inegável que o clube contribuiu para a formação do
hábito da prática esportiva entre os sócios, o que veio a modificar a visão destes em relação ao
esporte, à saúde e ao corpo. Tal hábito acabou por se difundir em Belo Horizonte,
contribuindo para a consolidação de um perfil mais modernista para a cidade.
Consolidou-se, assim, entre os sócios uma nova mentalidade, conectada com a prática
esportiva, e o esporte passou a ser um dos elos entre os associados do MTC. Rapidamente o
esporte adquiriu também uma feição identitária, ou seja, foi expressão de unidade do grupo e
de afirmação coletiva entre os associados. Certamente houve outros aspetos agregadores, mas
o mais expressivo foi o esporte.
21
Para essa pesquisa, além da pesquisa documental escrita e iconográfica, fez-se
necessário recorrer à metodologia de história oral, para se obterem informações consideradas
imprescindíveis. Assim, a oralidade foi um elemento importante para o acesso à memória e à
historia da fundação do MTC, por meio da perspectiva de quem a viveu. Pela história oral foi
possível obter informações e registrar lembranças sobre a fundação do clube, sobre o esporte à
época, sobre à auto-imagem formada pelos sócios do clube, sobre detalhes do cotidiano dos
minastenistas, enfim, aspectos que nem sempre são encontrados nas fontes documentais
tradicionais. Nas narrativas, foi possível conhecer um pouco mais sobre o processo
constitutivo da instituição. O ato de relembrar é individual, pertence a cada depoente, mas a
lembrança de cada pessoa está vinculada a um quadro social e histórico, que a insere na vida
em coletividade.
As fontes escritas e oficiais também são formas de se obter conhecimento do passado,
mas, usualmente, são mais esquemáticas e racionais. As fontes jornalísticas consultadas, em
sua maioria no Acervo Histórico do MTC, relacionadas ao clube, no período de 1935 a 1945,
têm que ser analisadas em relação ao período autoritário em que o país vivia e no qual a
imprensa sofreu rigorosa censura. A maior parte dos artigos fazia elogios ao Estado, aos seus
dirigentes e também à organização clubística do MTC, numa intenção clara de promover o
clube e suas atividades e dar respaldo político a ela.
Segundo Delgado (2006), a história oral produz documentos que contribuem para a
reconstituição do passado. É uma forma de se obter conhecimento sobre vivências, percepção
de um período histórico, sentimentos, idéias, e comportamentos individual e coletivo,
peculiares a uma época.
No MTC, os cios agiam em conformidade com os códigos do grupo social ao qual
pertenciam, compartilharam inúmeras experiências que lhes conferiram uma identidade
comum. O clube era o espaço de encontro para esse grupo, um lugar de sociabilidade, de
formação de redes sociais, onde relações foram desenvolvidas, criadas, expandidas,
contribuindo para a constituição do processo identitário.
Os depoimentos de antigos minastenistas forneceram importantes relatos sobre suas
experiências coletivas, revelaram visões de mundo e características de uma época, impressões
e imagens do clube, que, muitas vezes, não foram encontrados nos registros escritos utilizados
nessa pesquisa.
A análise do processo de constituição do MTC baseou-se em diferentes suportes e
fontes para a construção do conhecimento histórico, incorporando fontes escritas, orais e
22
iconográficas.
A pesquisa foi realizada, praticamente, em três etapas: a primeira constou da seleção e
leitura da bibliografia sobre o tema sobre a contextualização histórica e sociológica do objeto
e definição dos referenciais teóricos que deram sustentação à pesquisa.
A segunda etapa foi dedicada à investigação documental. Essas fontes são utilizadas
ao longo da pesquisa na tentativa "de desvendar uma intricada rede de significação, cujos
elementos homens e signos interagem dialeticamente na composição da realidade".
(CARDOSO; VAINFAS, 1997, p. 405). São pistas e mensagens imprescindíveis no resgate da
memória e do contexto em que foram geradas, partindo do pressuposto de que "um
documento é portador de um discurso, que assim considerado, não pode ser visto como algo
transparente". (CARDOSO; VAINFAS, 1997, p. 377). Portanto, esses documentos do passado
foram relacionados com o contexto, no que se refere aos planos ideológicos, culturais, e
políticos da entidade, procurando observar nos discursos referências às questões consideradas
indispensáveis para atingir o objetivo da pesquisa.
A fotografia é um recurso utilizado, pois como um documento é revelador de aspectos
fundamentais da dinâmica social, que o deve ser desconsiderada, além de representar "um
meio de conhecimento da cena passada e, portanto, uma possibilidade de resgate da memória
visual do homem e do seu entorno sociocultural". (KOSSOY, 2001, p. 55). É uma outra forma
de acesso à história do clube e à memória que ele quis preservar. As imagens "para além de
sua dimensão plástica, elas nos põem em contato com os sistemas de significação das
sociedades, com suas formas de representação, com seus imaginários". (BORGES, 2005, p.
79).
Na terceira etapa da pesquisa, foram realizadas as gravações das entrevistas e a
transcrição das fitas. Foram selecionadas para as entrevistas pessoas que freqüentaram o clube
no período delimitado pela pesquisa. Foram feitas cinco entrevistas, três com pessoas do sexo
feminino e duas com pessoas do sexo masculino. Entre elas, destacam-se filhos de sócios
fundadores e das famílias pioneiras, além de um antigo funcionário da agremiação. Entre os
sócios entrevistados, três praticaram natação, fizeram parte da equipe do clube e foram
laureados com medalhas. Apenas uma associada teve que parar de nadar, por problemas de
saúde.
Quanto à estruturação, a dissertação se divide em quatro capítulos. O segundo capítulo
é dedicado à contextualização histórica, que corresponde ao período do Estado Novo, e ao
pensamento hegemônico, dessa conjuntura, sobre o esporte. O projeto de modernização da
23
nação, elaborado por Vargas, incentivava a industrialização e urbanização do Brasil. Para tal,
era preciso construir um novo modelo de sociedade, mais coerente com as necessidades de
uma sociedade urbano-industrial. O atraso econômico do Brasil era atribuído, entre outras
questões, à questão racial. Para resolver esse problema, foi preciso elaborar um projeto
educacional voltado para a formação de um "novo" homem brasileiro. Esse projeto previa a
regeneração física e moral do brasileiro, considerado um tipo racial inferior, devido a sua
origem mestiça. A educação física, como instrumento educacional, foi utilizada com o intuito
de promover a melhoria física e moral dos brasileiros e incutir os sentimentos cívicos na
juventude.
O terceiro capítulo busca analisar o processo de fundação do MTC, com o objetivo de
verificar a correlação entre o discurso político e cultural do Estado Novo e as propostas do
clube. O MTC foi fundado no governo Vargas e procurou seguir as orientações
governamentais sobre o esporte. O clube foi idealizado pela elite de Belo Horizonte, portanto,
foi construído numa área residencial, correspondente aos bairros onde esse segmento social
residia. O MTC muito contribuiu para que o esporte, como prática moderna e saudável, fosse
incentivado pelas autoridades locais, que apoiaram sua fundação. De fato, o MTC foi um
marco para o desenvolvimento do esporte em Belo Horizonte, além de ter servido como
modelo para a construção de praças esportivas e clubes nas cidades do interior de Minas
Gerais.
O quarto capítulo tem como objetivo verificar como o esporte desenvolvido no MTC
contribuiu para moldar o físico e a mente dos jovens e crianças que o freqüentavam. O
esporte, no Estado Novo, era fundamentado em preceitos técnicos e científicos, e perpassados
pelas idéias eugênicas, sanitárias e nacionalistas. O MTC buscou incorporar, em suas
atividades desportivas, a concepção estadonovista do esporte. O clube se propunha a preparar
os jovens minastenistas de acordo com o ideal de modernização, difundido por Vargas.
Assim, adotou algumas posturas modernas, principalmente em relação ao esporte e,
conseqüentemente, em relação ao trato do corpo. O esporte passou a ser um forte elo entre os
associados, e colaborou para consolidar, entre eles, uma nova mentalidade, mais conectada
com a prática esportiva. Apesar de ter sido considerado um marco de civilização e
modernidade, devido às práticas esportivas ali desenvolvidas, o MTC estabeleceu um diálogo
constante entre a tradição e a modernidade. A sua imagem era sustentada por esses dois
pilares. Os valores da tradicional família mineira conviviam, lado a lado, com a modernidade
esportiva do clube.
24
2 A EDUCAÇÃO FÍSICA NO ESTADO NOVO: MENS SANA, CORPORE SANO
A chegada de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, implicou uma série de
transformações estruturais da sociedade brasileira. A República Velha, conhecida pelo
domínio das oligarquias e pela ausência de práticas de cidadania, preparou o terreno para o
governo renovador, forte e autoritário instaurado por Vargas, a partir de 1935 e aprofundado
em 1937. As propostas desse novo governo, centralizador, mostraram-se favoráveis ao
crescimento, às mudanças modernizadoras, na indústria e na cultura e ao progresso
econômico.
Vargas, por meio de forte intervenção estatal, incentivava a industrialização e o culto
às idéias nacionalistas. Em seu governo, concebeu, para o Brasil, um projeto de modernização
nacional que seria conduzido pelo Estado. Esse projeto visava, sobretudo, a industrializar e a
urbanizar o país, cujo objetivo principal era o de superação do atraso econômico.
O Brasil, até então, basicamente agrário e exportador, foi-se transformando numa
nação urbana e industrial. Promotor da industrialização e interventor nas esferas da
vida social, o Estado voltou-se para a consolidação de uma indústria de base e
passou a ser agente fundamental da modernização econômica. (PANDOLFI, 1999,
p. 10).
Esse projeto varguista, porém, pode ser caracterizado como uma modernização
conservadora, por combinar propostas arrojadas e transformadoras, no que se refere à
industrialização e à ordem social urbana. Incorporara, porém, certo conservadorismo, em
especial, no que tange à manutenção da ordem social oligárquica, no campo.
Com isso, a década de 1930 é vista, por muitos pesquisadores, como um marco de
transição para uma nova ordem no Brasil, e é apontada, como a principal mudança, a
passagem de um sistema de base agroexportadora para uma sociedade de base urbano-
industrial. (DINIZ, 1999, p. 24-25).
Desde a chegada de Vargas ao poder, em 1930, implantou-se, aceleradamente, no
Brasil, um modelo de Estado forte, planejador e intervencionista. Tal situação se intensificou
com o Estado Novo, instituído por Getúlio Vargas, em 1937, por meio de um golpe de Estado,
que perdurou até 1945. Em 1937, portanto, foi instaurado no Brasil um regime político de
cunho autoritário, que exerceu um intenso controle político, social e cultural e que também
25
promoveu mudanças significativas tais como:
Reorganização do Estado, reordenamento da economia, novo direcionamento das
esferas pública e privada, nova relação do Estado com a sociedade, do poder com a
cultura, das classes sociais com o poder, do líder com as massas. (CAPELATO,
2003, p. 113).
Cabia ao Estado, segundo o discurso oficial, o papel de dirigir os interesses nacionais e
defendê-los. O modelo nacionalista "buscava transformar a nação em um todo orgânico, uma
entidade moral, política e econômica cujos fins se realizariam no Estado".
(SCHWARTZMAN, 2000, p. 183). O Estado adotava a postura de provedor do progresso, e o
progresso da nação era o futuro, e ambos – progresso e futuro –seriam possíveis se fossem
conduzidos de acordo com a ordem estabelecida.
A noção de moderno, nessa época, estava ligada à idéia de desenvolvimento
econômico baseado na industrialização. A ênfase dada era para as forças produtivas na busca
da prosperidade, que segundo a concepção corrente, estava "fundamentada na crença dos
poderes mágicos da razão para produzir ordenamentos políticos, hábitos, costumes e uma
nova feição social". (RODRIGUES, 1999, p. 218).
O regime buscava construir uma realidade mais conformada à técnica e à razão.
Segundo Canclini (2003), a crença no conhecimento científico, a expansão industrial e dos
meios de comunicação, principalmente o audiovisual marcaram essa fase de modernização na
América Latina, como também a nacionalização e a centralização estatal, com base na
racionalização e na tecnologia aliados ao crescimento urbano.
À época do Estado Novo, introduziam-se novos hábitos e valores considerados
modernos, que auxiliariam na transformação da sociedade rural e agrária em sociedade urbano
e industrial e na adaptação do brasileiro à nova realidade do país. Não houve, todavia, uma
ruptura total com o passado, mas sim uma releitura que amalgamava conservação com a
modernização. Um passado atualizado e relevante para o moderno projeto de nação de
Vargas.
O Estado Novo implementou a modernização conservadora do país. Procurou impor à
sociedade civil o seu programa modernizador e encontrou espaço para tal. Não rompeu,
contudo, com a tradição, pois era no passado, na sua recuperação que, segundo a concepção
do pensamento autoritário que o instruía, residiam os valores verdadeiros da pátria. A
modernidade era uma inspiração, uma forma de superação do atraso econômico, no qual se
26
encontrava o país. Entendia-se, entretanto, que para atingir esse objetivo, era preciso tecer
uma rede complexa e interativa entre tradição e modernização.
Para Oliveira (1982), os ideólogos estadonovistas procuravam buscar na tradição a
legitimação para o regime.
1
Por outro lado, a modernização era apresentada como justificativa
para o reforço da autoridade do Estado. Apesar de a política cultural do Estado Novo ser toda
permeada pelo culto ao novo, as ações do governo redimensionaram as tradições culturais
brasileiras, tais como: as qualidades peculiares da colonização portuguesa, o catolicismo e o
personalismo político. Tratava-se de redescobrir o Brasil. A proposta de construção da nação,
portanto, oscilava entre o tradicional e o moderno.
O novo regime instaurado em 1937, [...], procura se apresentar na pena de seus
intelectuais como 'novo' e 'nacional'. È 'novo' na medida em que procura modernizar
o país. É novo porque, pela primeira vez, se apresenta voltado para as verdadeiras
raízes da nacionalidade. (OLIVEIRA, 2001, p. 47).
Para a consolidação do projeto de modernização nacional, o crescimento urbano se fez
necessário no sentido de estimular a criação da indústria, pois esta é uma atividade
tipicamente citadina. Para a expansão industrial, foi necessário eleger a cidade como palco das
transformações, pois é nela em que se operam as mais diversas mudanças econômicas
capitalistas. É o lugar da produtividade e da mercantilização das mercadorias. "Era o ritmo
flutuante do mercado, com seus períodos de grande demanda e os de retração, que fazia o
grande centro urbano ter tanta importância para a indústria." (MUNFORD, 1961, p. 169).
Assim, "o espaço urbano torna-se o lugar do encontro das coisas e das pessoas, da troca".
(LEFEBVRE, 2004, p.22). A troca comercial é uma função urbana e, é por isso, que as
indústrias se aproximam das cidades, para se aproximar dos capitais e capitalistas, dos
mercadores e de uma mão-de-obra mantida a baixo preço". (LEFEBVRE, 2004, p. 25).
Azevedo Amaral, teórico do Estado Novo, considerava a industrialização "sinônimo
de 'vida civilizada' superior", que faria o Brasil passar para uma "etapa superior de
organização econômica e de progresso social e cultural. As indústrias constituem a forma de
produção mais relevante na etapa da evolução econômica do Brasil". A atividade agrária, para
ele, "cria uma mentalidade acanhada", pois "o agricultor fica preso à sua órbita limitada do
trabalho agrário". (MEDEIROS, 1978, p. 82; 84-85). As atividades industriais agem de modo
1
Entre os intelectuais que atuaram durante o Estado Novo podem-se destacar os seguintes: Almir de Andrade,
Azevedo Amaral, Oliveira Viana, Francisco Campos, Alceu de Amoroso Lima, Gilberto Freyre, Cassiano
Ricardo, entre outros.
27
diferente, pois trabalham com um número maior de mercadorias, de trocas, e de mercados, e,
nesse intercâmbio de produtos, há o intercâmbio de idéias que leva à formação de uma
sociedade mais civilizada.
O progresso econômico, gerado pelo projeto de modernização de Vargas, segundo
seus idealizadores, deveria impulsionar o desenvolvimento das forças superiores da
civilização e do nacionalismo. O trabalho passou a ser valorizado. Era identificado como
importante elemento social e econômico para o avanço da sociedade brasileira. Seria preciso,
no entanto, preparar o brasileiro e ajustá-lo aos novos princípios econômicos, capazes de
impulsionar a "nova" civilização nacional. Era, portanto, necessário a implementação de
medidas voltadas para a construção de um novo homem para um novo Brasil.
2.1 Educação, esporte e trabalho
Para pôr em prática seu projeto de modernização do Brasil, o Estado necessitou de
promover a transformação da sociedade e do homem brasileiro. Vargas concebeu um projeto
moderno de educação para o Brasil, porque acreditava em seu potencial civilizador. O Estado
tomou para si o controle e a regulação das atividades educacionais e culturais. A educação
escolar passou a ser tematizada em conformidade com os objetivos ideológicos do governo,
que buscou utilizar o aparelho escolar para formar um novo homem para um novo regime. A
educação deveria se integral – moral, física e intelectual – e integradora, à medida que
preparava o homem para o compromisso com o trabalho e com a nação, uma vez que o
desenvolvimentismo e o nacionalismo eram elementos marcantes da ideologia do Estado
Novo.
O regime contava com a ação pedagógica e propagantística da música, do cinema, do
rádio, da arquitetura e da educação física. Essas instâncias foram, essencialmente,
direcionadas para a constituição do novo cidadão e da nacionalidade.
A reforma educacional de Francisco Campos (1931) introduziu a obrigatoriedade da
prática de exercícios físicos para o ensino secundário. Com a reforma do Ministério da
Educação e Saúde (MES), em 1937, foi criada a Divisão de Educação Física, subordinada ao
Departamento Nacional de Educação. A Constituição de 1937 tornou a educação física
obrigatória em todas as escolas primárias, normais e secundárias. No Art. 131 estabeleceu
28
que: "A Educação Física, o ensino cívico e o de trabalhos manuais serão obrigatórios em
todas as escolas primarias, normais e secundárias, não podendo nenhuma de qualquer desses
graus ser autorizada sem que satisfaça aquela exigência". (apud. LIMA, 1979, p. 37-38).
No Art. 132, constituiu-se o seguinte parecer:
O Estado fundará instituições ou dará o seu auxílio e proteção às fundadas por
associações civis, tendo umas e outras por fim organizar para a juventude períodos
de trabalho anual nos campos e oficinas, assim como promover-lhe a disciplina
moral e o adestramento físico, de maneira a prepará-la ao cumprimento dos seus
deveres para com a economia e a defesa da Nação. (apud LIMA, 1979, p. 38).
O Ministério do Trabalho e o MES adotaram medidas legais para preservar, recuperar
e aumentar a capacidade de produtividade do brasileiro. Esse era objetivo primordial do
Estado, pois a ele estava vinculado o progresso material e moral do país. O esporte poderia
contribuir para o crescimento da produtividade do indivíduo, e, também, para a adaptação dos
brasileiros às transformações pelas quais a sociedade passava.
Dessa forma, a educação física foi considerada de fundamental importância para o
aprimoramento do projeto de fortalecimento da nação, da sua modernização e do
desenvolvimento da sociedade como um todo. Na medida em que a prática esportiva
contribuiria para a melhoria da saúde do homem brasileiro, inspiraria seus praticantes à
obediência e à disciplina, contribuiria para aumentar a força física, além disso, exercitaria o
corpo e o disciplinaria. Isso porque, o exercício físico revigora a mente do indivíduo, e eleva o
espírito cívico, nas competições esportivas.
Nesse período, o Estado buscou utilizar o esporte como instrumento ideológico para a
educação e como meio de adaptação dos sujeitos aos princípios econômicos e políticos por ele
estabelecidos para a sociedade. O Estado foi-se legitimando pela divulgação de valores, por
ele considerados fundamentais, tais como ordem, civismo, hierarquia, trabalho e
desenvolvimento econômico. Assim, a educação física foi incorporada ao projeto de
fortalecimento da nação e de sua modernização.
A difusão do esporte, no Brasil, acelerou quando essa atividade, até então somente
voltada para o lazer, foi integrada aos projetos políticos, econômicos e educacionais do
Estado, nos anos de 1930. O Plano Nacional de Educação, elaborado pelo MES, cujo ministro
era Gustavo Capanema, tinha como objetivo "formar o homem completo, útil à vida social,
pelo preparo e aperfeiçoamento de suas faculdades morais e intelectuais e atividades físicas" e
29
para a educação física o ministro previa que "dessem orientação cientifica às atividades
esportivas". (SCHWARTZMAN, 2000, p. 198-199).
Para Rodrigues (1997), a partir dessa época, foram se definindo papéis para o esporte
como prática social integrada aos projetos de governo e à construção social como um todo. O
Estado atribuía ao esporte a possibilidade de expandir a produção industrial, à medida que
aumentava a produtividade e a disciplina dos indivíduos.
Desta forma, por intermédio do esporte, era possível que manobras ideológicas
fossem dissimuladas no sentido da dominação pretendida naquele momento
histórico, transformando-o em um dos meios e fins da busca da melhoria da raça, da
consolidação do nacionalismo e da educação da classe trabalhadora para o
desenvolvimento produtivo, baseado na racionalidade e eficiência técnica.
(RODRIGUES, 1997, p. 485).
Uma concepção dominante, no Estado Novo, era a de que a educação física e o esporte
poderiam contribuir para a consolidação de valores nacionalistas. Para que o sentimento de
nacionalidade imperasse entre a população brasileira, era preciso a atuação direta do governo
no campo esportivo. Essa orientação derivava do fato de que, desde o início do século XX, o
esporte, no Brasil, desenvolvia-se em clubes e em associações esportivas ligadas aos núcleos
estrangeiros. O governo do Estado Novo entendia ser necessário desenvolver políticas para
vincular o esporte também às instituições públicas e educacionais. Os cnicos do MES, que
atuavam na regulamentação da educação física, tiveram como tarefa formular um método
nacional para a difusão e consolidação de práticas esportivas, no país. .
A educação física, segundo o modelo nacional de educação, deveria ser integral, pois
atuaria sobre o corpo, o intelecto e os valores morais. Ao mesmo tempo, ela deveria ser
integradora, visto que "levaria o indivíduo a encontrar seu lugar na sociedade, evitando que se
criassem 'desajustados' para o mundo do trabalho e para a comunidade política nacional".
(PARADA, 2006, p. 168).
A prática desportiva, à época de Vargas, tornou-se, assim, um dispositivo pedagógico
e educativo destinado a incutir, nos praticantes, os valores cívicos. Ela também atendia a um
pressuposto funcionalista. Deveria disciplinar os movimentos, fortalecer os músculos e tornar
os jovens mais aptos ao trabalho. Os indivíduos se ajustariam melhor às tarefas úteis à vida e
ao desenvolvimento social. O esporte passou a se identificado como chave para a adaptação
dos indivíduos ao meio social e político.
Do esporte esperava-se a contribuição para o fortalecimento do sentimento de
30
coletividade disciplinada. As modalidades esportivas praticadas em equipe eram destacadas,
pois se considerava que elas imprimiriam, em seus praticantes, um sentimento de
solidariedade compartilhada. A disciplina, a harmonia e a obediência às regras deviam reger a
ação de uma equipe esportiva. Os ideólogos do Estado Novo esperavam que essas atitudes,
adquiridas pelo esportista, fossem transplantadas para o cidadão. Elas contribuiriam para a
formação da consciência cívica pretendida naquele momento. Fortaleceriam os laços de
cooperação nacional em beneficio de uma causa comum: o desenvolvimento da nação.
A prática de esporte, no Estado Novo, continha, além da concepção patriótica, uma
concepção militarista. Grande parte dos técnicos, que compunham o quadro da Divisão de
Educação Física do MES, foi recrutada das instituições militares. Para eles, o esporte tinha
contribuição relevante na garantia da segurança nacional. O jovem poderia adquirir, pela
prática de esporte, as noções de ordem, disciplina e estratégia. Seu corpo se tornaria mais
elástico e resistente. Essas qualidades poderiam ser importantes nas ações militares e na
formação do soldado/ cidadão.
O corpo saudável era importante para o projeto de nação, no sentido de reafirmar a
dignidade e a força nacionais para a formação de um povo produtivo, combativo e forte.
"Repensar a sociedade passava necessariamente pelo cuidado com o corpo como recurso
fundamental para uma juventude sadia, preparada física e moralmente para defender a pátria."
(ÁVILA, 1999, p. 16).
2.2 Saúde, higienização social e esporte
O duplo processo de urbanização e industrialização, vivenciado pelas cidades, no
século XIX, colocou em evidência distorções sociais geradas por esse movimento de
construção do progresso. As cidades tornaram-se espaços da desordem e do caos, mas,
paradoxalmente, também representavam o espaço da civilização. Diante desse quadro, os
urbanistas passaram a questionar os processos de ocupação do espaço urbano. Reuniram-se a
eles os médicos sanitaristas, cuja atuação objetivava higienizar as cidades.
O urbanismo, como uma especialização do conhecimento sobre o meio urbano, tratava
de resolver os problemas da cidade por meio de um saber técnico. A técnica, então, passou a
exercer papel importante no planejamento das cidades. Ela aparece como instrumento seguro
31
e legítimo da reestruturação da ordem social, que influenciava na organização do espaço
urbano. (SILVA, 2003).
Os positivistas pensavam a natureza como um sistema ordenado, segundo a relação de
causa e efeito, regido por leis que o método científico poderia desvendar. Essa forma de
pensar a natureza foi transplantada para segmentos da sociedade. As autoridades e os
urbanistas acreditavam que as intervenções urbanas deveriam se ater a essa concepção
racional e técnica, do positivismo, para se encontrar a solução de diferentes problemas das
cidades.
A imagem da Europa, como berço da civilização e do progresso, era forte no Brasil e
influenciou diferentes orientações da nascente república brasileira. Na Europa, também se
buscava um modelo de civilização, baseada na razão e no progresso. As intervenções
urbanísticas, em Viena e em Paris serviram de modelo para as intervenções em cidades
brasileiras, tais como a reforma do Rio de Janeiro, promovida por Pereira Passos. Essa
reforma não considerou a cidade em sua totalidade: dedicou-se apenas a algumas intervenções
localizadas, tais como: a reforma do porto, a demolições dos casebres e cortiços no centro, o
alargamento de ruas, a abertura da Avenida Beira-Mar e da Avenida Central. O centro da
cidade foi cortado por esta longa avenida, para resolver o problema dos quarteirões populares,
dos cortiços insalubres e do emaranhados de ruas tortuosas.
Essas intervenções urbanas eram normalmente elitistas, pois não consideravam as
reais necessidades dos habitantes da cidade como um todo. A organização das cidades,
segundo tais pressupostos – razão e progresso –, objetivava o avanço do capitalismo e excluía
os benefícios urbanos para a ampla maioria da população. Os espaços centrais, higienizados e
racionalizados, eram, em geral, ocupados pelos segmentos sociais mais abastados. Os
subúrbios e as áreas afastadas do centro, desprovidas de serviços urbanos, foram ocupados
pelos grupos populares. As intervenções visavam a demarcar os espaços da cidade e colocar
cada grupo populacional em seu devido lugar. O racionalismo do traçado urbano e os
pressupostos higienistas tinham também forte apelo moralizante. Moralizar significava sanear,
redefinir valores e modelos de comportamento, sintonizá-los com a vida moderna da era da
máquina.
As intervenções urbanas visavam principalmente criar uma nova imagem da cidade
em conformidade com os modelos estéticos europeus, permitindo às elites dar
materialidade aos símbolos de distinção relativos à sua nova condição. A
modernização se torna, então, o princípio organizador das intervenções. Esta
32
modernização terá, todavia, como sua principal característica a não universalidade.
De fato, as novas elites buscam desesperadamente afastar de suas vistas e das
vistas do estrangeiro o populacho inculto, desprovido de maneiras civilizadas,
mestiço. As reformas urbanas criam uma cidade 'para inglês ver. (RIBEIRO;
CARDOSO, 1994, p .81).
As elites brasileiras, no fim do século XIX, partilhavam entre si o desejo de
desenvolvimento e de ruptura com o passado colonial. Instalada a República, vislumbraram a
oportunidade de realização desse desejo, que era fortemente alimentado pela idéia de
progresso. Acreditavam na razão, na ciência e na técnica como elementos importantes para a
reorganização da sociedade. As cidades tornaram-se foco das atenções dos administradores
públicos, como espaços mais apropriados para instaurar um novo modelo civilizatório, com
ênfase na produção industrial e na intensificação das relações de trocas.
A modernização em curso no Brasil, como em outros países periféricos, refletia o
esforço das elites preocupadas em tirar o país do atraso. Não se reservava espaço para a
participação popular. O modelo de desenvolvimento implantado, mesmo que modernizante,
possuía um forte teor conservador no campo das relações sociais. A idéia predominante era a
de que a renovação da sociedade teria que estar conciliada com o passado em transformação.
A intenção não era provocar rompimento total com a antiga ordem social e política, mas sim
promover sua adaptação para um novo tempo.
Com essa perspectiva de transformação, Minas Gerais começou a se mobilizar junto
ao governo federal em torno da construção da nova capital, para dar inicio à modernização do
estado. Era uma forma de rompimento com o passado, pois Ouro Preto representava, no
estado, um passado de tradições coloniais, desprovido de sentido no sistema republicano
implantado. Belo Horizonte foi uma cidade planejada e projetada pelas elites políticas
mineiras sintonizadas com as idéias de modernidade, no fim do século XIX. Foi concebida de
acordo com os preceitos positivistas e obedecendo a padrões modernos de construção e
planejamento. A nova capital deveria ser
[...] signo de um novo tempo; centro de desenvolvimento intelectual e de novas
formas de riqueza e trabalho; foco irradiador de civilização e progresso, um lugar
moderno, higiênico e elegante, capaz de consolidar um poder vigoroso e assegurar a
unidade política do Estado. (JULIÃO, 1996, p. 50).
Essas imagens não estavam somente associadas à nova capital: elas faziam parte do
novo imaginário republicano. A república recém-instalada era a expressão da renovação da
33
sociedade brasileira, até então presa aos moldes tradicionais, de um país monárquico e
escravocrata. Belo Horizonte deveria ser, segundo os ideais positivistas que a inspiraram, a
representação do novo tempo que surgia. Cidade ordenada e projetada para o futuro, deveria,
de acordo com seus projetistas, refletir o curso da civilização, isto é, do progresso e do avanço
dentro da ordem. A construção de Belo Horizonte simbolizou, portanto, o advento de novos
tempos e a emergência de uma vida cosmopolita, racional e em constante transformação.
Para Silveira (1997), as propostas dos planejadores de Belo Horizonte correspondiam
a uma forma de interferência nos hábitos e relações estabelecidas pelos moradores da cidade,
na busca da disciplina e do policiamento de seus comportamentos. Ruas retas e largas, como
que ordenando e dirigindo os passos dos transeuntes, espaço onde tudo é exposto, tudo é
evidente, traduz o poder das ruas de vigiar e dominar o seu uso. Além disso, Belo Horizonte
foi planejada para abrigar cada grupo social em um determinado local da cidade, marcando,
com a sua geografia urbana, o espaço do poder e o espaço da exclusão. Constituiu-se,
portanto, como cidade planejada para separar, segregar, ordenar, controlar e disciplinar
através do espaço e também da arquitetura. Esperava-se que os belo-horizontinos
incorporassem o discurso dos planejadores da cidade e fizessem uma ligação entre os bens
materiais e os simbólicos. "Na cidade são criados e recriados os símbolos que regem a
sociedade. É no espaço urbano que valores, ideologias e comportamentos sociais são
construídos, a partir de seu planejamento, ou como conseqüência de suas transformações
estruturais e estéticas." (CEDRO, 2002, p. 65).
Cidade planejada, Belo Horizonte deveria ordenar seus habitantes e discipliná-los:
esperava-se que a cidade os inspirasse a novos hábitos. È certo que de alguma maneira a
cidade os induzia a vivenciar experiências inéditas e a adquirir novos padrões de
sociabilidade, mais cosmopolitas e urbanos, com privilégio para a utilização do espaço
público. A rua, portanto, ganhou destaque especial, associada ao movimento de pessoas e do
trânsito. Os moradores de Belo Horizonte, no entanto, não correspondiam por completo a
essas expectativas. Provenientes das cidades do interior e da antiga capital Ouro Preto, os
habitantes de Belo Horizonte eram adeptos da rotina, afeitos a preconceitos enraizados, muito
moralistas e provincianos. De acordo com Julião (1996, p. 52), "a cidade teria uma vida
indefinida e híbrida, hesitante entre o passado e o futuro", a cidade nasceu marcada pela
dicotomia do antigo versus moderno.
O discurso da tradição e modernidade, ao longo da sua história, manifestou-se, muitas
vezes, de forma separada ou amalgamada, apontado, por alguns pesquisadores, como uma
34
contradição histórica da cidade. Na visão da historiadora Thaïs Pimentel, essa perspectiva não
corresponde à realidade da cidade e de seus moradores. Tradição e modernidadeo se
mostram como contradição, mas sim como síntese e se constituem nos verdadeiros pilares da
existência de Belo Horizonte. Cidade que surgiu da prancheta do positivista Aarão Reis,
mostrava-se através do prisma do planejamento como ordenada, racional e moderna, mas que
devia ser a guardiã das velhas tradições mineiras. Assim, "modernidade e tradição se fundem
para conformar a personalidade do mineiro e também da sua capital". (PIMENTEL, 1993, p.
38).
No fim do século XIX e início do século XX, as idéias sanitaristas orientaram a
elaboração de medidas voltadas para a higienização das cidades brasileiras e de seus
habitantes. Algumas cidades sofreram intervenções urbanas, nesse sentido, como a construção
de Belo Horizonte, e as intervenções nas cidades de São Paulo, Rio de Janeiro, Recife,
Salvador entre outras.
A construção de Belo Horizonte, no fim do século XIX, foi perpassada por uma
concepção racionalista e higienista, que se adequava bem ao projeto político-econômico-
social subjacente à consolidação da república. A cidade foi planejada com ruas e avenidas
largas para que se evitasse a aglomeração de pessoas. Para Julião (1996), os espaços da capital
foram concebidos com base na estratificação social. Eram espaços segregadores, que
continham uma concepção hierárquica que objetivava impedir os contatos entre grupos
cultural, social e economicamente distintos e, assim, evitar a possíveis proliferações de
doenças contagiosas. "A geometria clara e arejada concorria, de acordo com as premissas
urbanísticas, para a higiene coletiva, cerceando proximidades e contágios promíscuos entre os
homens e entre esses e os elementos ambientais suspeitos." (JULIÃO, 1996, p. 57).
O Rio de Janeiro também sofreu uma intervenção orientada pelos mesmos
pressupostos. De acordo com Fabris (2000), a cidade do Rio de Janeiro, no início do século
XX, era vista pelos seus dirigentes, como um organismo doente e em crise. Eles atribuíam os
males físicos e morais do homem ao meio natural. Esses desvios naturais deveriam ser
corrigidos para que se pudesse alcançar um desenvolvimento pleno e saudável. Além disso,
destacavam a população pobre como um agente perigoso: ela deveria se sujeitar à constante
inspeção.
O presidente Rodrigues Alves e o prefeito Pereira Passos conceberam um projeto de
reforma urbana para o centro da cidade, que se iniciou em 1902. O projeto previa a
modernização, o embelezamento e o saneamento do centro. A demolição de áreas construídas
35
no centro da cidade foi saudada como elemento de regeneração da cidade e de seus habitantes.
Os novos elementos, introduzidos no centro, pela reforma urbana foram apreciados, pela
imprensa e pelos intelectuais, como arautos da higiene. Entre as reformas destacam-se: o
alargamento das ruas e avenidas, a adoção de novos tipos de calçamento, arborização,
ajardinamento, saneamento da Lagoa Rodrigues de Freitas, expulsão da população de baixa
renda do centro e eliminação dos cortiços – lugares apontado como insalubre e proliferador de
doenças.
Segundo a visão da época, os técnicos intervinham sobre o espaço urbano de diversas
maneiras.
No princípio do movimento estão[vam] o alicerce da aplicação das teorias
higienistas, que desejam[vam] impor medidas normatizadoras a todos os elementos
constituintes do espaço urbano ar, luz, água, solo, ruas, praças, casas, costumes
dos habitantes. (FABRIS, 2000, p. 43).
A cidade de São Paulo também passou por reformas higienistas. Na última década do
século XIX, a cidade começou a se desenvolver industrialmente, e essa transformação marcou
a divisão de seu espaço urbano. De acordo com Silva (2003), a primeira etapa das reformas
paulistas, no fim do século XIX, pautava-se por um urbanismo cívico-embelezador, que
projetou grandes praças, avenidas e bulevares, no centro cívico da cidade, como demonstração
do poder da nascente burguesia paulista. Ao mesmo tempo, introduziu-se, nessas
intervenções, o urbanismo sanitarista para garantir a higienização do espaço urbano da cidade,
assolado por epidemias e por pestes que atingiam todos os segmentos sociais.
Para Marins (1999), como aconteceu no Rio de Janeiro, as reformas comandadas por
Antônio Prado nas primeiras décadas do século XX, durante sua gestão na Prefeitura de São
Paulo, caracterizaram-se pelo elitismo, e visavam, principalmente, a demarcar os espaços da
cidade, de acordo com os grupos sociais. A área central deveria ser "civilizada", isto é,
deveria se ver livre da população pobre, considerada perigosa. Em consonância com essa
orientação, foram demolidas habitações populares, que foram substituídas por edifícios
monumentais, acentuando, assim, o contraste entre os quarteirões novos e os antigos.
As reformas em Recife, em 1910, inspiraram-se nas intervenções feitas em Paris, por
Haussmann. Segundo Leite (2002), elas começaram pelo porto, por ser um símbolo do
progresso econômico e da inserção de Pernambuco na economia internacional. O plano
estabelecia aterros para a ampliação da área do porto, construções de armazéns e a
36
modificação do traçado urbano do Bairro do Recife. Esse bairro, núcleo primitivo de Recife, é
uma pequena ilha portuária, onde se fixaram os primeiros habitantes da cidade. Ele se
apresentava como um ancoradouro seguro para as embarcações comerciais. Essas reformas se
fundamentavam nos princípios higienistas norteadores de outras intervenções urbanísticas no
país. Elas visavam a redefinir o traçado do antigo bairro, extinguindo as ruas estreitas e
curvas, os sobrados e os cortiços. As intervenções em Recife, para Leite (2002), foram reflexo
do ideário modernizante, do início do século XX, em Pernambuco, que podia ser observado
pelo alargamento das ruas e das avenidas, buscando-se melhorar o tráfego em direção ao
porto.
Em Salvador, também foram implementadas ações destinadas a livrar a capital das
precárias condições higiênicas a que estava submetida. De acordo com Marins (1999), o plano
de saneamento, elaborado pelas autoridades baianas, visava a incrementar as atividades
industriais e à melhoria do desempenho de Salvador como cidade portuária. O alvo
privilegiado da reforma urbana de Salvador foi a região central, apontada como local de
concentração de moléstias contagiosas, em razão das míseras condições habitacionais e de
higiene de sua população. As autoridades locais se preocupavam com a proliferação de
doenças pelo restante da cidade.
As reformas de Salvador ocorreram em 1906 e 1910 e tiveram como modelo as
reformas urbanas européias e a do Rio de Janeiro. Elas se concentraram, sobretudo, na
ampliação do cais e na abertura de avenidas. Houve várias demolições de casarios, na área
portuária, local de habitações das camadas populares. Como aconteceu no Rio de Janeiro, a
população carente foi deslocada para a periferia. As áreas centrais com ruas largas, devido ao
programa de alargamento viário, passaram a ser habitadas pela população com maior poder
aquisitivo. Esse grupo ali construiu "casas e palacetes cercados por jardins, recuos e gradis
que os afastavam do convívio direto com o movimento das ruas". (MARINS, 1999, p. 167).
Os médicos sanitaristas e as autoridades atribuíam a fragilidade da saúde do povo
brasileiro às péssimas condições de vida da população das grandes cidades brasileiras, como
também à sua fragilidade física. Assim as intervenções urbanas buscavam sanear e controlar
as epidemias. Junto a essa visão sanitária do urbanismo, cresceu no Brasil, nessa mesma
época, entre os vários especialistas ligados ao tema, a associação entre esporte e higienização.
Para eles, as práticas desportivas eram necessárias para a formação de hábitos saudáveis e de
cuidados com o corpo. Militares, médicos, higienistas e pedagogos compartilhavam a crença
do aprimoramento físico da população brasileira pela prática de esportes. Condenavam a
37
prática do esporte meramente como lazer e relacionavam o esporte a melhoria do tipo racial.
De acordo com Parada (2006), os Congressos Brasileiros de Higiene, promovidos pela
Sociedade Brasileira de Higiene, durante a década de 1920, apontavam a escola como um
local privilegiado para a educação higiênica. Os médicos higienistas e os pedagogos
buscavam utilizar a educação física, praticada nas escolas, em seus projetos de regeneração da
"raça", consolidando entre eles um olhar higienista sobre a prática do exercício físico.
Parada (2006), remonta a origem dessa concepção higienista da educação física, no
Brasil, ao período do Brasil Império. Rui Barbosa, em 1882, propôs a inserção da ginástica
nos programas escolares como matéria obrigatória, justificando essa medida com argumentos
médicos. Mostra, ainda, que no período entre a República e a Revolução de 1930, houve, no
Brasil, um desenvolvimento significativo das práticas desportivas. O momento foi marcado
pela crescente valorização do esporte, mas sempre tratado pelo viés higienista. Segundo ele,
são exemplos dessa orientação a fundação das Escolas de Educação Física e Esporte da
Marinha (1925) e do Exército (1929). Considera, porém, que foram a criação do MES, a
Reforma Francisco Campos e a Constituição de 1937 os maiores responsáveis pela
disseminação da educação física higienista no Brasil.
Com a instauração do Estado Novo e a industrialização e urbanização do país, as
idéias sanitarista ganharam um novo ritmo. Elas foram penetrando em diferentes ambientes,
como no trabalho, nas escolas, nos lares. Os grandes aliados dessas idéias foram os meios de
comunicação. O esporte se transformou em uma ferramenta útil para os sanitaristas. O hábito
cotidiano da prática de esporte, com acompanhamento de técnicos capacitados e controle
médico, apresentava o poder de melhorar a saúde do esportista.
Durante o primeiro período do governo Vargas, a associação entre o esporte e o
aprimoramento da raça cresceu entre os teóricos e burocratas do Estado Novo. A fragilidade
física do brasileiro era ainda associada à sua fragilidade racial. Os exercícios diários, de
acordo com as técnicas modernas de educação física, poderiam produzir corpos sadios. Com o
tempo, eles levariam ao aperfeiçoamento da raça brasileira.
As atividades esportivas, para os ideólogos varguistas, também poderia contribuir para
a formação de corpos mais produtivos e aptos para o trabalho. Ela deveria disciplinar os
movimentos e contribuir para a aquisição de hábitos musculares que adaptassem melhor às
aplicações úteis da vida dos indivíduos.
Segundo Sevcenko (1992), as atividades esportivas eram associadas ao incremento da
produtividade econômica desde 1920, no Brasil. Os teóricos da educação física francesa
38
acreditavam que o treinamento esportivo ao agir sobre o inconsciente, gerava automatismo no
comportamento, na percepção e na movimentação dos indivíduos, tornando-se uma segunda
natureza, independentes de conjecturas reflexivas. O automatismo do comportamento, gerado
pelo esporte, tornava as pessoas mais eficientes "no seu desempenho, quanto mais imediatas e
encadeadas fossem suas reações aos diferentes estímulos externos. A rigor se trataria de uma
outra pessoa, muito mais competitiva, muito mais ativa e muito mais pida, se comparada
com aquelas que não foram exercitadas dentro desse sistema". (SEVCENKO, 1992, p. 49).
Assim, a atividade esportiva era fundamental para criar nos indivíduos uma disposição
instintiva à ação disciplinada, que acarretaria em aumento da atividade produtiva.
Durante o Estado Novo, segundo Monteiro (2006), incentivava-se o hábito do esporte,
desde a infância, para que se formasse uma população com corpos fortes e predispostos ao
trabalho. Acreditava-se que a falta de exercícios físicos era perigosa para o próprio indivíduo.
e também para "sua descendência que factualmente nasceria enfermiça, tarada ou predisposta"
(REVISTA MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, Acervo MTC). Os exercícios físicos diários eram
considerados fundamentais também para a formação de homens e mulheres fortes, sadios e
com disposição para o trabalho e para servir a pátria.
2.3 O perfil do "novo homem" brasileiro
No primeiro governo de Vargas (1930-1945), o Brasil conheceu a emergência de
novos princípios de organização social. Surgia uma sociedade industrial e urbanizada que foi
se consolidando lentamente e que demandava a reelaboração das identidades individuais e
coletivas dos sujeitos históricos em transformação. Toda a nação brasileira se viu envolvida
em um projeto civilizador, desdobramento de um projeto unificador de nação, que buscava
atingir os anseios mais íntimos dos indivíduos.
O Brasil novo de Vargas firmou suas bases em um projeto construtivo. Pretendia-se
construir uma nova nação, preparar e educar a população brasileira para a nova ordem
moderna, que se aspirava implantar. A pretensão do Estado era construir um "novo homem"
para um "novo Brasil", "conformar mentalidades e criar o sentimento de brasilidade".
(BOMENY, 1999, p. 139). O projeto de modernização requeria, para seu sucesso,
modificações e alterações de hábitos, costumes e valores, que pudessem provocar uma
39
mudança qualitativa no modo de vida dos brasileiros e nos próprios brasileiros. Era um
projeto audacioso.
Havia uma ênfase no "novo". Cabia ao novo regime a construção da "nova nação", de
uma "nova sociedade" e a criação de um "novo homem". Conforme Capellato (2003), por
meio da propaganda, o Estado Novo procurava divulgar seu projeto político e cultural. A
propaganda política era incisiva, demonstrando a significação e a superioridade do novo
regime. Por meio de diferentes veículos de propaganda, como cartilhas escolares, programas
radiofônicos, revistas culturais e esportivas, o regime bombardeava o povo brasileiro com seu
ideário e valores. O Estado procurava induzir a população brasileira a apoiar o regime e, ao
mesmo tempo, divulgava para a sociedade a necessidade de mudança de comportamento. Os
meios de comunicação, a educação, a arte, a arquitetura do Estado Novo buscavam inserir, na
sociedade, um modelo de comportamento, que acreditavam ideal para o Brasil.
O governo buscou incorporar, na sociedade civil, um espírito de ordem, como ponto
estratégico para a mobilização controlada. Também divulgou para o grande público a
importância de conceitos como disciplina, hierarquia, solidariedade, cooperação,
aperfeiçoamento físico e moral, e o culto ao civismo. Todos voltados para o desenvolvimento
da nação.
Os teóricos do Estado acreditavam que, para a sociedade brasileira alcançar um nível
superior de civilização, a população teria que mudar suas atitudes e crenças. Essas teriam que
ser fundamentadas na ciência, na técnica e na razão. Por isso, era preciso introduzir, na
mentalidade dos brasileiros, elementos racionalizadores, conforme demanda uma sociedade
industrializada. Para que a transformação da sociedade ocorresse, no entanto, era preciso
pensar na transformação do homem brasileiro.
No início do século XX, a questão do fracasso social do Brasil estava relacionada às
origens do povo brasileiro. Intelectuais como Nina Rodrigues e Sílvio Romero, influenciados
pela teoria do darwinismo social, que atribuía ao cruzamento entre raças um potencial de
desequilíbrio e degeneração, acreditavam que os defeitos do homem brasileiro eram
decorrentes da mistura de raças: a negra, a branca e a indígena. Atribuíam a superioridade
racial ao branco, enquanto apresentavam o índio e o negro como entraves ao processo
civilizatório brasileiro. Para eles, o povo brasileiro tinha uma natureza indolente, era apático,
imprevidente, possuía desequilíbrio moral e intelectual. Essas qualidades eram apontadas
como prejudiciais ao desenvolvimento econômico e social do país. A mudança da realidade
brasileira se daria pela "utilização de técnicas de eugenia e mesmo esterilização de mestiços,
40
sempre visando, nos termos da época, a 'aprimorar a raça'." (SCHWARCZ, 1993, p. 161).
Oliveira Viana e Azevedo Amaral, teóricos do Estado Novo, compartilhavam da visão
de Nina Rodrigues sobre o povo brasileiro. Segundo eles, era um povo formado por elementos
inferiores que pouco contribuíam para o desenvolvimento do país. Era, portanto, necessário
educá-lo, para não acontecer um retrocesso da sociedade à barbárie, peculiar a esses
elementos inferiores do povo o índio e o negro, na visão desses autores. Eles defendiam o
controle estatal das políticas de eugenia, pois "o progresso e o bem-estar da coletividade
dependem da proporção em que elementos eugênicos preponderam sobre os portadores de
taras indesejáveis". (MEDEIROS, 1978, p. 91).
As idéias de regeneração da raça inseriam-se no movimento que buscava determinar a
configuração do "novo homem" e da "nova mulher". Vargas via na formação heterogênea do
povo brasileiro um obstáculo para o progresso. Era preciso buscar meios de homogeneizar os
elementos heterogêneos presentes na constituição do brasileiro típico.
À questão racial foi-se incorporando à cultural. O problema começou a tomar um
outro contorno, não deixando de enfatizar a mestiçagem como um fator de atraso do Brasil. O
Estado passou, então, a promover uma transformação cultural para adequar as mentalidades às
novas exigências do novo Brasil. "Qualidades como 'preguiça', 'indolência', consideradas
como inerentes à raça mestiça, são substituídos por uma ideologia do trabalho." (ORTIZ,
1994, p. 43).
Dessa forma, o Estado lançou mão também da função pedagógica da arquitetura.
Pretendia por meio das edificações modernas, que primavam pela eficiência técnica, pela
organização racional e obedeciam às regras da moderna engenharia sanitária, provocar
mudanças na mentalidade do brasileiro. Os novos edifícios estatais construídos deveriam
desempenhar um papel representativo do novo espírito que fluía da industrialização, como
também fazer uma articulação entre passado e futuro.
Passado como identidade de um povo e futuro como direção para o progresso dentro
da ordem. Em entrevista, o arquiteto Lúcio Costa disse que estava convencido de
que "a transformação arquitetônica e social era uma coisa e que a nova arte
floresceria em novo regime. (apud CAVALCANTI, 2006, p. 43).
A construção do novo edifício do MES, do ministério destinado a formar o homem
brasileiro, deveria "simbolizar o esforço renovador, dando formas a uma ação voltada para o
futuro". (CAVALCANTI, 2006, p. 34). Exibir uma imponência moderna, ser funcionalista e
41
destituído de ornamentos. Deveria ser o símbolo de um novo tempo. Esperava-se que a nova
arquitetura inspirasse novos comportamentos e posturas nos habitantes das cidades.
Segundo Cavalcanti (2006, p. 51), a estátua do homem brasileiro, que seria instalada
no edifico, teria que ter como "base estudos antropométricos rigorosos que previssem a feição
futura do homem nacional". De acordo com o ministro Gustavo Capanema, deveria ser
grandiosa, com cerca de onze metros,
mas seu aspecto será o da calma, do domínio, da afirmação. [...] O homem estará
sentado e deverá ser uma figura sólida, forte, de brasileiro. Nada de rapaz bonito.
Um tipo moreno de boa qualidade, com o semblante denunciando a inteligência, a
elevação, a coragem, a capacidade de criar e realizar. (apud CAVALCANTI, 2006,
p. 51-52).
A obra dedicada à mulher deveria representar dois dispositivos simbólicos: a
maternidade e a disponibilidade física para o trabalho, procurando, dessa maneira, responder
ao papel reservado à mulher pelos ideólogos do Estado Novo, o de fundar a família e
conservá-la. O programa escultórico do edifício seguia, de certa forma, as teorias eugênicas
em voga na época. Deveria exibir as formas físicas e morais idealizadas para o novo cidadão.
O tipo físico idealizado pelo Estado Novo, para o homem brasileiro, ficaria bem
próximo ao ariano. O novo cidadão deveria ter um corpo atlético, forte, ser hábil, sereno e
com capacidade de domínio e de afirmação. Seriam homens e mulheres preparados para o
trabalho, para o futuro, para dar continuidade ao projeto de modernização brasileira. O Estado
pretendia formar um "novo homem", regenerado, curado dos seus males de origem, das
doenças e da indisposição física. Assim, procurou incentivar a educação física, como uma
forma de educar e preparar o "novo" homem brasileiro. Esperava que os exercícios físicos
aprimorassem o corpo e a saúde da população.
O Estado via na educação física a possibilidade de colaborar na "fabricação" de corpos
e espíritos belos, capazes de defender a pátria. A idéia da construção de um povo moral e
intelectualmente sadio era defendida por civis e militares que compunham o quadro da
intelectualidade do Estado Novo.
O major Almeida Freitas, em um artigo para a Revista Armada, defendia a
disseminação da educação física. Para ele,
42
ninguém mais nos dias atuais, põe em dúvida a importância da educação física como
o único meio capaz de regenerar uma raça entibiada pela malaria e ainda por certas
taras hereditárias, como a tuberculose, a sífilis e o alcoolismo, fatores da calamitosa
letalidade infantil, da legião de débeis e tarados. O homem são, representa um valor
positivo na economia nacional, enquanto que o raquítico, o doente e o cretino são
sobrecarga. A prática quotidiana da educação física aperfeiçoando as funções
orgânicas, aumentando o valor intrínseco do individuo, melhora, aprimora e
seleciona a raça, tornando-a mais capaz e mais produtiva, elevando ao máximo o
nível nacional. (apud MONTEIRO, 2006, p. 136).
De acordo com Lenharo (1986), a nação passou a ser comparada a um corpo orgânico,
cada órgão do Estado funcionaria como um membro do corpo e em perfeita harmonia com o
todo. Ao lado dessa imagem da nação como corpo, proliferou-se a idéia de instrumentalização
do corpo para o desenvolvimento da nação. Os teóricos procuravam elaborar uma "pedagogia
do corpo" e divulgá-la, ou seja, ensinar o brasileiro a cuidar do corpo e tirar dele o maior
proveito para o bem pessoal e da nação.
Na Era Vargas, a transformação da sociedade brasileira deveria incorporar,
necessariamente, o cuidado com o corpo, que se tornou peça fundamental para o processo de
modernização do país.
O "novo" homem brasileiro, que o Estado Novo se propunha a formar, deveria passar
por uma transformação do corpo e da mente. Deveria mostrar vigor, coragem, orgulho e
adquirir um espírito utilitarista. O seu corpo expressaria força e valentia. Como a maioria dos
brasileiros não apresentava essas características, elas deveriam ser "fabricadas".
A saúde, a higiene e a educação física passaram a se valorizados pelo governo, no
sentido de aprimoramento do corpo e do espírito para a consolidação de um processo de
mudanças sociais controlado pelo Estado. As associações esportivas e recreativas, por isso,
eram valorizadas e incentivadas pelo poder público, como a fundação do Minas Tênis Clube
(MTC), em Belo Horizonte, em 1935. A prática de esportes deveria transformar a juventude,
deveria modelar músculos e mentes, tirar dela todo o seu potencial para servir a pátria.
A educação física, como um instrumento da civilização e do progresso, procurava
divulgar os valores caros ao Estado, isto é, cultivar, entre as crianças e jovens, o
nacionalismo, a disciplina, a moral, o valor do trabalho, o civismo como forma de preparar o
"novo homem" brasileiro. Era considerada fundamental à educação nessa conjuntura. Para
Capanema, o ministro da Educação e Saúde de Vargas, a "educação física e educação moral e
cívica lhe pareceram ser as chaves de um movimento em prol da socialização do novo homem
para o Estado Novo". (BOMENY, 1999, p. 149).
43
2.4 O papel da elite brasileira no Estado Novo
Para pôr em prática a execução do projeto político e cultural, o governo mobilizou as
elites que o apoiavam, para a difusão da propaganda e defesa do regime. Fazia-se o elogio às
elites
2
, consideradas núcleos de força e responsáveis pela ordem política do país. A elite
governamental compartilhava o ideal salvacionista e auto-atribuía-se um papel messiânico na
vida nacional. À elite caberia a orientação do povo. Acreditava-se que ela promoveria a
educação política, entendida como o desenvolvimento do espírito público, dos segmentos
mais populares, enquanto o povo estava destinado a servir à nação. (OLIVEIRA, 1982).
Nesse contexto histórico, o povo brasileiro era considerado
[...] inepto para a participação política (a grande massa de analfabetos servia de
reforço para esse argumento), os ideólogos do poder, que organizaram o Estado pelo
alto, tinham a preocupação de conquistar as elites, consideradas peças importantes
na construção de um novo país. A proposta de consenso era mais dirigida a elas.
(CAPELATO, 2003, p. 137).
Isso porque, segundo Oliveira Viana, "onde o pensamento republicano podia encontrar
campo propício era na elite cultivada" e não na "consciência das massas", que não tinham
condições de promover a unidade e o desenvolvimento do Brasil. (MEDEIROS, 1978, p.
162).
Para Azevedo Amaral e Oliveira Viana, havia no Brasil uma utopia de
confraternização das raças. Na realidade, o que acorria e deveria ocorrer para o bem do Brasil
era "a subordinação de indivíduos da própria coletividade ao império da vontade e da astúcia
de elementos intelectualmente superiores do grupo em apreço", isto é, deveria prevalecer o
"domínio da inteligência da minoria privilegiada". (MEDEIROS, 1978, p. 97). A elite, pois, é
dotada do instinto da ordem e do princípio da autoridade.
A direção da nação deveria caber às elites, mas era preciso prepará-las, pois ainda não
se encontravam prontas para as transformações necessárias ao progresso do país. Apesar de
serem consideradas as mais capacitadas para a vida política, ainda não se mostravam ativas o
suficiente para conduzir essas transformações. Era necessário aparelhar as elites, como
2
Elite, de acordo com o conceito elaborado por Noberto Bobbio, é um grupo social formado por uma minoria,
que, de várias formas, é detentora do poder em contraposição a uma maioria que dele está privada, sendo que os
poderes que ela detém, entre outros são o poder econômico, político e ideológico. (BOBBIO, 2000, p. 386).
44
representantes do grupo dirigentes, oferecendo a elas condições para se desenvolverem e para
assumirem sua missão de aperfeiçoar os mecanismos essenciais da civilização brasileira.
Era atribuída às elites a missão de promover a circulação de riquezas, moldar a
mentalidade do povo, imprimir ritmo às mudanças e trabalhar para o engrandecimento da
nação. Esperava-se que por meio do seu aparelhamento e preparo, novas elites fossem
surgindo. Elites com nova mentalidade e mais capacitadas para garantirem a continuidade de
evolução da nação.
O preparo das elites aconteceu em um nível diferente daquele reservado para as
massas. Elas foram convocadas para ocupar cargos no executivo, em postos diretamente
ligados ao poder central, que garantiam a elas participação efetiva no processo decisório
nacional. Elas ocupavam posições dominantes, que permitiam identificá-las como integrantes
do setor governamental. Segmentos da elite intelectual, como da elite burocrática, tiveram
uma forte atuação política e cultural, pois, estavam diretamente envolvidos com o projeto
político de Vargas. O valor social conferido à sua colaboração "transparece, sobretudo nas
recompensas com que foram brindados". (MICELI, 1979, p. 148). Entre essas recompensas
estão as facilidades com que o poder público brindou o grupo da elite belorizontina para
fundar o MTC. Entre elas destacou-se o arrendamento de um terreno com benfeitorias feitas
com dinheiro público.
Da mesma forma que o Estado Novo criou condições para preparar o trabalhador
brasileiro e educá-lo, o governo preocupou-se em preparar e educar as elites do país. Para o
ministro Gustavo Capanema, era mais importante preparar as elites do que alfabetizar as
massas. Com elites verdadeiramente preparadas, segundo sua concepção, o país daria um salto
civilizatório. Em entrevista o ministro Capanema defendeu a idéia de preparar a elite para o
comando do país:
[...] a elite que precisamos formar, ao invés de se constituir por essas expressões
isoladas da cultura brasileira, índices fragmentários da nossa precária civilização,
será corpo técnico, o bloco formado de especialistas em todos os ramos da atividade
humana, com capacidade bastante para assumir, em massa, cada um no seu setor, a
direção da vida do Brasil: nos campos, nas escolas, nos laboratórios, nos gabinetes
de física e química, nos museus, nas fábricas, nas oficinas, nos estaleiros, no
comércio, na indústria, nas universidades, nos múltiplos aspectos da atividade
individual, nas letras e nas artes, como nos postos de governo. Elite ativa, eficiente,
capaz de organizar, mobilizar, movimentar e comandar a nação. (apud
SCHWARTZMAN, 2000, p. 222).
Assim, foi elaborado um projeto educacional voltado para o aprimoramento das elites
45
nacionais, cujo objetivo era o de prepará-las para participar da direção da nação. O ensino
secundário era praticamente voltado para a elite. A Lei Orgânica do Ensino Secundário,
elaborada na cada de 1940, apontava a sua importância para o país. Capanema, na sua
exposição referente à Lei Orgânica, ressaltou o sentido do ensino secundário: "ele deve ser
patriótico por excelência e patriótico no sentido mais alto da palavra" e esclareceu que o
ensino secundário tinha um sentido elitista por ser destinado à preparação "[...] dos homens
que deverão assumir as responsabilidades maiores dentro da sociedade e da nação, dos
homens portadores de concepções e atitudes espirituais que é preciso infundir nas massas,
mas que é preciso tornar habituais entre o povo". (apud PEREIRA, 2001).
Valores como o civismo, disciplina, hierarquia, ordem eram constantemente
repassados para a elite. Era uma tentativa de atraí-las para colaborar com o Estado na
implementação do processo de modernização nacional, cujo núcleo central seria a construção
da nacionalidade e da valorização da brasilidade.
A socialização das elites, em concordância com os valores políticos e culturais
divulgados pelo Estado Novo, visava à internalização desses valores por esse grupo social. As
elites deveriam ser uma espécie de modelo para os outros segmentos sociais. Esses setores as
seguiriam, internalizariam e incorporariam os valores cívicos difundidos pelas elites, que se
tornariam legítimos aos olhos de toda a sociedade brasileira.
Segmentos importantes das elites brasileiras, durante o Estado Novo, compartilharam
com o governo uma postura domesticadora em relação às camadas populares. Eles passaram a
se ver como guia do povo e como responsáveis pelas verdadeiras expressões da política e da
civilidade superiores, ainda contribuíram para imprimir direção construtiva à vida da nação,
por meio da adoção de novas atitudes, da elaboração de novos valores e costumes, ou seja,
adotaram um novo modo de viver.
Isso significava também que junto à questão cultural, desenvolvia-se um movimento
de transformação da mentalidade e do comportamento do povo brasileiro, visando à criação
de um modelo civilizador: nacionalista, modernizante, hierarquizante e pautado pela harmonia
social. O Estado pretendia por meio da propaganda política, da educação moral e cívica e da
educação física moldar um novo homem, um novo estilo de vida para o brasileiro, mais em
conformidade com a nova ordem urbano-industrial que surgia.
A disciplina adquirida com o esporte, a modelagem dos músculos, a alegria, a
agilidade, o aprimoramento físico, tudo isso poderia contribuir para transformar a elite
brasileira em uma nova elite, com mais disposição para o trabalho, mais hábil, mais moderna,
46
mais apropriada à direção da nova nação. A elite auxiliaria também na preparação do povo
para o exercício cotidiano de tarefas relativas ao trabalho, considerado elemento nuclear da
cidadania. De acordo com Capelato (1998, p. 173), "o trabalho, antes forma de escravidão,
passava a ser visto como forma de emancipação da personalidade, algo que valorizava o
homem e tornava-o digno do respeito e da proteção da sociedade". Para ela, durante o regime
varguista, ser cidadão era ser trabalhador, possuir uma carteira de trabalho e compreender o
trabalho como um dever cívico.
A educação física, obrigatória e regulamentada pelo Estado, era uma forma de ação
governamental sobre o preparo físico e mental do cidadão. Como foi dito, pretendia-se
alcançar a moralização do corpo pelo exercício físico e o aprimoramento eugênico
incorporado à raça. Previa-se a repercussão desse condicionamento físico no mundo do
trabalho e para toda a população brasileira, inclusive para a elite.
Por meio do esporte, o povo seria adestrado para o trabalho, e a elite seria preparada
para o comando da nação. A prática do esporte, para os teóricos do Estado Novo, poderia
controlar os nervos, dar firmeza ao espírito e produzir vontade forte, qualidades necessárias
aos dirigentes do país.
Em Belo Horizonte, o MTC tornou-se um local de congraçamento e de preparação das
elites. Ali, pelo lazer e pelo esporte, as elites da cidade foram preparadas e disciplinadas para
atuar em uma sociedade capitalista em pleno avanço. Adquiriam hábitos novos em relação ao
corpo e à saúde, pois o esporte era entendido como um meio de incutir no espírito das elites a
disciplina, o respeito às regras, o instinto da ordem, a cooperação, o valor das organizações
hierárquicas da sociedade e da conquista, ou seja, imprimir um ritmo moderno à formação
psicológica da elite.
Assim, "a idéia de uma nação na qual 'os corpos são refletem as mentes sãs'
permaneceu e frutificou além dos espaços autoritários, com o fomento de competições, clubes
particulares e valorização geral do esporte". (ÁVILA, 1999, p. 17). A fundação do MTC, um
espaço recreativo e esportivo para as elites belorizontinas, estava, portanto, alinhada com as
propostas do Estado Novo.
47
Figura 1 - O Edifício do Ministério da Saúde e Educação: por meio da
monumentalidade da obra, esta deveria simbolizar o esforço renovador do Estado Novo
e seria um marco na arquitetura moderna internacional
Fonte: CPDOC.
Figura 2 - A escultura da mulher, para o edifício do MÊS, retrata um corpo forte, sadio,
sereno, portanto, apto para o trabalho e para a família
Fonte: CPDOC.
48
Figura 3 - Getúlio Vargas aclamado por estudantes no dia da inauguração do Edifício
do MES (1945)
Fonte: CPDOC.
Figura 4 - A cartilha "Getúlio Vargas para crianças" (1942), produzida
e divulgada pelo Departamento de Imprensa e Propaganda
Fonte: CPDOC.
49
Figura 5 - Cartão postal exaltando as realizações do governo Vargas
(1937/1945)
Fonte: CPDOC.
Figura 6 - Festa de comemoração do dia da juventude. O projeto de mobilização da
juventude procurava prepará-la e ajustá-la aos novos princípios que regiam o
Estado Novo
Fonte: CPDOC.
50
Figura 7 -
A foto retrata o desfile de jovens pelo dia da raça. A fragilidade
física do brasileiro era atribuída à sua fragilidade racial (1939)
Fonte: CPDOC.
Figura 8 - Escolas desfilam na Quinta da Boa vista comemorando o dia da
pátria
Fonte: CPDOC.
51
Figura 9 - Estudantes no dia da bandeira (1938/1945)
Fonte: CPDOC.
52
3 A FUNDAÇÃO DO MINAS TÊNIS CLUBE: A CONCRETIZAÇÃO DE UM
SONHO DE MODERNIDADE PARA BELO HORIZONTE
O esporte, como prática social, não pode ser desvinculado do contexto sócio-cultural
no qual está inserido. O esporte moderno, especialmente, no Ocidente, foi se integrando ao
capitalismo e, como fenômeno tipicamente urbano, foi aos poucos se incorporando aos
elementos de construção e evolução das cidades, marcado pelas influências sócio-econômicas,
políticas e culturais de cada época.
Segundo Rodrigues (1996), nos anos de 1920, Belo Horizonte começou a vivenciar,
gradativamente, um movimento em prol da difusão do esporte e da educação física. Ambos
eram impulsionados por um caráter lúdico e eram voltados para o lazer, pois o divertimento
era a própria essência e característica dos jogos. A sociedade ainda não havia absorvido os
valores de uma sociedade industrializada, por isso não buscava, no esporte, os atributos para a
melhoria do rendimento e da produtividade.
Nessa época, existiam poucos clubes na cidade. Neles, o esporte ainda era muito
incipiente. A partir da adoção do esporte, como um conteúdo da educação física, as escolas
começaram a se mobilizar para implementar sua prática entre os alunos. Até então, a
educação física, praticada nas escolas, era voltada para a ginástica, que apresentava
características, marcadamente, militares.
Para Rodrigues (1996), a visão do esporte em Belo Horizonte, na década de 1920, era
mais formativa do que competitiva: o desejo de ganhar não se sobrepunha às regras do jogo.
A competição com o outro não se apresentava de forma acirrada: privilegiava mais o
processo, as jogadas construídas visando ao lazer. Para as instituições militares e
educacionais, o esporte se vinculava à sua missão educativa e cívica. Nessas instituições, o
esporte foi incorporado aos fins e aos objetivos higienistas e de preparação de homens para a
defesa da pátria.
Assim, nas duas primeiras décadas do século XX, em alguns colégios da capital,
muitas moças preferiam substituir as atividades físicas por trabalhos manuais. Os colégios
femininos tinham, pois, como missão preparar as futuras mães e zeladoras da família. "A
educação progressista dos colégios metodistas, como, por exemplo, Colégio Isabella Hendrix,
alarmou a cidade, quando anunciou, naquela época, a construção de uma piscina para as
alunas." (RODRIGUES, 1996, p. 53).
53
No Ginásio Mineiro, escola pública de ensino secundário onde estudavam jovens do
sexo masculino, oriundos da elite, e nos colégios religiosos, os rapazes eram desobrigados de
praticar atividades físicas, e a maioria não se interessava por elas, pois "esses educandários
visavam à formação de jovens da elite para desempenhar, na sociedade, funções que
dispensam a força física e a disciplina dos quartéis". (RODRIGUES, 1996, p. 52).
3.1 Belo Horizonte nas décadas de 1930 e 1940: esporte e modernidade
Na década de 1930, acentuou-se o debate sobre a necessidade de modernização do
país. Com a chegada de Getúlio Vargas ao poder, em 1930, e sua permanência até 1945, Belo
Horizonte começou uma nova fase de modernização. A industrialização, promovida por
Vargas, no Brasil, que projetava a modernização do país, refletiu fortemente na sociedade de
Belo Horizonte nos aspectos não, somente econômicos, mas também políticos, sociais, morais
e comportamentais, ou seja, provocou uma mudança em seu modo de vida.
O espaço urbano em Belo Horizonte, nesse período, viveu um processo de mutação
direcionado ao progresso e ao futuro. Aconteceu um surto de construção civil que deu à
cidade "ares de metrópole". As obras faziam parte do projeto de reforma urbana do prefeito
Otacílio Negrão de Lima. No âmbito nacional, elas se enquadravam nas estratégias política de
desenvolvimento do Estado Novo.
Surgiram, então, os primeiros arranha-céus. Os habitantes passaram a experimentar
maior velocidade nos deslocamentos, possibilitada pelas aberturas de grandes vias e, depois,
pelo asfaltamento das principais ruas e das avenidas centrais da cidade. Apesar de o
surgimento desses ícones modernos, na cena urbana, a sociedade belorizontina, dessa época,
oscilava entre velhos e novos valores e costumes. Ao mesmo tempo em que pretendia ser
moderna, a cidade conservava ainda valores considerados tradicionais.
Apesar de todas essas transformações, no entanto, a imagem vinculada a Belo
Horizonte, na década de 1930, era a de uma grande cidade vazia, que não tinha a intensidade
de atividades e fluxos urbanos, que poderiam caracterizá-la como metrópole. A capital
mineira precisava se industrializar e promover uma revolução urbana para se tornar uma
metrópole e assim atingir o objetivo que a ela havia sido destinada desde a fundação. Para
cumprir o papel de se transformar em metrópole moderna, porém, Belo Horizonte precisava
54
promover seu desenvolvimento comercial e industrial e não mais se manter como uma cidade,
exclusivamente, de burocratas. Precisava, também, aumentar sua densidade populacional,
intensificar seu ritmo de vida e proporcionar aos habitantes uma vida mais confortável e
frenética, pois a vida social era mínima e ainda envolvida por valores conservadores e práticas
provincianas. Era preciso mudar sua imagem para: uma cidade povoada e ágil, pois a imagem
da multidão nas ruas remete à idéia de metrópole.
Otacílio Negrão de Lima assumiu a Prefeitura de Belo Horizonte, em 1935, e tinha a
intenção de preparar a capital para a implantação da industrialização. Procurou, então,
remodelá-la. Promoveu o crescimento da construção civil. Seu mandato, por isso, foi marcado
por constantes mudanças no cenário urbano. Essas medidas "reiteravam a idéia de que, para a
realização de sua função civilizatória, a cidade deveria 'caracterizar-se industrialmente'."
(CASTRIOTA, 1998, p.130). A cidade, então, deveria se preparar para sediar uma economia
industrializada, considerada como inerente a um grau elevado de civilização. Mesmo que
mais tarde Belo Horizonte viesse a ser realmente industrializada, foi por meio das novas
construções que os belo-horizontinos começaram a internalizar um espírito mais moderno.
Esperava-se que essas novas construções trouxessem novas e ricas possibilidades para o
progresso e para o futuro, pois elas eram demonstrações de modernização. (CHACHAM,
1996).
Nesse sentido, a fisionomia arquitetônica da cidade começou a sofrer transformações
para se adaptar aos novos tempos que surgiam. O estilo eclético, característico da construção
da capital, começou a ser substituído por um estilo com características mais modernas.
Apareceram no cenário urbano "uma série de edificações em 'estilo moderno', que com sua
ornamentação geométrica e arrojados jogos de volumes, queriam ser contemporâneos das
transformações em curso". (CASTRIOTA, 1998, p. 144).
O estilo moderno, que mais tarde ficou conhecido como art déco, em Belo Horizonte,
foi denominado, inicialmente, de arquitetura cubista, futurista ou moderna. Ele surgiu pelo
movimento de ruptura com o academiscismo e com o ecletismo classicizante, estilos
arquitetônicos do início do século XX, que eram predominantes nos primeiros tempos de Belo
Horizonte. Esse novo estilo se mostrava aberto para o futuro e para as necessidades de uma
sociedade industrial e moderna. Nas construções, onde esse etilo foi adotado, predominava a
ausência de motivos clássicos, simplificação das formas, ortogonalidade e jogos de volumes.
Havia uma aproximação entre o que propunha o estilo déco com o discurso predominante na
época, higienista, racional e enfatizador do progresso. A linguagem era a mesma para a
55
sociedade e para as edificações, e ambas deveriam apresentar atitudes e elementos modernos,
racionais, funcionais e eficientes.
Para Castriota (1998), o estilo art déco ligou-se, desde o início, à idéia de
modernidade. Passou a expressar as necessidades e desejos de uma sociedade que vizualizava
a modernidade em edifícios verticalizados, indústrias, estações e outras construções
expressivas dos novos tempos. Representava uma ruptura com o passado e se inseria nos
parâmetros estabelecidos pela estética da máquina, marca da era industrial. O MTC foi
concebido e construído de acordo com esse modelo arquitetônico.
O arquiteto Ângelo Murgel previa que Belo Horizonte se tornaria uma metrópole.
Breve veremos tudo mudado: Estas ruas cheias de veículos rápidos, de povo, dessa
massa anônima das metrópoles, de grandes magazins abrindo vitrines vistosas, de
luz intensa e faiscante. Os prédios altos afogarão com suas linhas retas e suas massas
impressionantes a paisagem bucólica e "vergel" de hoje. E os nossos hábitos também
mudarão, seremos mais alegres, iremos mais ao cinema, ao teatro, às casas de chá,
aos footings, aos clubes, faremos sport e seremos standartizados como todos os
habitantes das grandes cidades. Tempo virá [...] (apud CASTRIOTA, 1998, p. 128.
grifos nossos).
3
Conforto, mecanização, higiene, despojamento e economia eram a tônica das
edificações que correspondiam ao pensamento hegemônico do Estado para a modernização do
país. Esse novo ciclo de construções servia para marcar, para a população da época, o
ingresso da capital na condição de metrópole moderna. Esperava-se que essas novas
edificações trouxessem uma mudança na fisionomia e nos ambientes urbanos, e, também
novos modos de organização do trabalho (edifícios de salas de escritórios), das moradias
(surgem os novos prédios para apartamentos) e do lazer (cinemas, teatros, clubes, etc.).
A inserção dos brasileiros à sociedade industrial, onde prevalecia o domínio das
máquinas, precisava passar por uma reformulação educacional que se refletiu nas linhas
geométricas e funcionalistas dos estabelecimentos educacionais de Belo Horizonte. Para esse
projeto educacional, um ponto importante a ser considerado era a necessidade de cuidado com
o corpo. A educação física, ao lado do ensino cívico, tornou-se obrigatória em todo o país.
Dessa forma, o interesse pelo esporte também aumentou. Como exemplo, pode-se citar o
começo da organização da prática de voleibol em Belo Horizonte. Em 1933, alguns clubes e
colégios da cidade sentiram a necessidade de organizar campeonatos de voleibol, pois até
3
Correio Mineiro, Belo Horizonte, p.1 e 8, 22 jun. 1933. Em todas as citações das fontes é mantida a ortografia
da época.
56
então eram realizados somente jogos amistosos.
Esse interesse pelo voleibol levou essas instituições a fundarem, no antigo Café Íris,
situado na avenida Afonso pena, n.462, no dia 15 de março de 1934, a Associação
Mineira de Esportes Gerais (AMEG), para dirigir os esportes especializados em
Belo Horizonte. Faziam parte dessa entidade os clubes: América, Paysandú, Glória,
Florestina. ASA, e os colégios: Izabella Hendrix, Escola Normal, e Santa Maria.
(RODRIGUES, 1996, p. 165).
Houve também, em Belo Horizonte, a preocupação, por parte das autoridades, em criar
espaços de lazer associando-os às práticas esportivas. Assim, o MTC foi fundado em 1935, de
acordo com essa proposta, pois o esporte passou a ser considerado como elemento crucial na
formação educacional e cívica para a juventude brasileira. O governador Benedicto
Valladares, considerado um grande incentivador do esporte em Minas Gerais, deixou um
registro das realizações na capital, em mensagem à Revista "Montanheza" em 1937:
Finalmente no que se toca ao saneamento e embelezamento da Capital, ponto natural
do turismo, grandes realizações m assinalado a atual administração, como a
pavimentação de extensa avenidas e ruas, a canalização do Arrudas e seus afluentes,
a construção de esgotos sanitários e pluviais, coletores, jardins, parques,
'playgrounds', passeios, novas linhas de ônibus e bondes, praças de esportes,
tornando Belo Horizonte, com seu clima adorável, uma grande cidade [...].
(REVISTA MONTANHEZA, 1937, p. 30, grifos nossos).
A prática de esporte, como acreditava o arquiteto Ângelo Murgel, era considerada
elemento importante para a formação de novos hábitos saudáveis e modernos. Os estímulos
que o prefeito Otacílio Negrão de Lima e o governador Benedito Valladares deram para a
construção de praças de esportes e clubes recreativos e esportivos, em Belo Horizonte e no
interior do estado, estavam diretamente ligados à necessidade de modernização dos costumes
dos mineiros e dos moradores da capital.
Em uma matéria publicada sobre a inauguração do MTC, o prefeito Negrão de Lima
revelou a intenção do governador Benedito Valladares: "Disse ainda o governador da cidade
que o Sr. Benecdito Valladares pensa em crear praças de sports perfeitamente idênticas a que
vinha de ser inaugurada, em varias cidades do Estado, incrementado assim, a educação
physica da mocidade mineira." (O JORNAL, 28 nov. 1937, Acervo MTC).
Ao esporte era atribuído o papel de educar, preparar e adaptar a população aos novos
princípios econômicos e políticos da modernidade. Era, portanto, necessário trazer para Belo
57
Horizonte outros tipos de esportes, que não fossem o futebol. Nesse sentido, o cinema norte-
americano foi de grande valia, pois divulgava ao público brasileiro a prática de diferentes
modalidades esportivas.
A transformação da sociedade brasileira deveria passar também pelo trato do corpo.
Um corpo higienizado, eugenizado, uma raça forte, bela e disciplinada, eram sem dúvida,
vistos como instrumentos de transformação social do Brasil e por decorrência da capital de
Minas Gerais. O esporte seria um dos instrumentos para essa transformação.
O prefeito Octacílio Negrão de Lima, imbuído do espírito modernizador, declarou:
"Tem-nos preocupado a escassez dos logradouros que ornamentando a cidade, acresça, a essa
vantagem a de oferecer à população pontos de recreio." (RELATÓRIO DE 1935/36, Belo
Horizonte, 1937, p.61/62. Arquivo Público da Cidade). Como parte do projeto de reforma
urbana e da política modernizante, o prefeito vislumbrou a possibilidade de construir um
parque na Rua da Bahia, o Parque Santo Antônio. O projeto estava de acordo com a
concepção de que os espaços de recreação deveriam, além de serem um espaço para a prática
de esporte e lazer, ornamentar a cidade. Nesse local, todavia, foi construído o MTC, um
espaço destinado à prática de esporte e também um novo espaço de sociabilidade para os
freqüentadores, oriundos de segmentos elitizados da sociedade mineira.
Em entrevista à imprensa, o prefeito Otacílio Negrão de Lima defendeu a construção
do parque e o associou á prática de esporte, citando-o como algo imprescindível à vida
moderna:
O parque Santo Antônio é citado como obra sumptuária. Analysemos o caso
seriamente. Não posso acreditar que fosse acceitavel deixar aquelle local, a um
quarteirão da Praça da Liberdade, já rodeado de bellas residências no estado em que
se encontrara. Era preciso embellezar aquelle local. Mas dir-se-á, a piscina é um
luxo dispensável. Não creio que a prática dos esportes seja um luxo. Antes me
parece uma exigência da vida moderna. (FOLHA DE MINAS, 24 maio 1936, grifos
nossos).
Os contatos sociais, no início do século XX, na capital, eram mais freqüentes nos
espaços privados. As autoridades se empenharam ao máximo, durante as primeiras décadas do
século XX, para mudar esse panorama. Para Andrade (2004), que analisa escritos de alguns
membros do grupo de modernista de Belo Horizonte, a capital mineira era descrita por eles
como moderna e, ao mesmo tempo, provinciana, estratificada, elitizada e pouco diversificada
tanto no plano social como no econômico. Eram poucos os espaços públicos existentes
58
destinados ao encontro das pessoas: o Bar do Ponto, a Praça Sete, o Parque Municipal, a Praça
da Liberdade, alguns cafés e livrarias.
A partir de 1930, esse panorama começou a se modificar. Era o começo de
transformações profundas em Belo Horizonte, inclusive no que diz respeito à sociabilidade.
Houve "um surto de construções e demolições que tomava conta da cidade com novos prédios
e novos espaços". (CHACHAM, 1996, p. 207).
Nas décadas de 1930 e 1940, a cidade, paulatinamente, foi criando para si outra
imagem e deixando para trás os traços que a ligavam à antiga capital Ouro Preto. A
administração de Negrão de Lima foi considerada, na época, "intelligente, moderna e
honesta". (REVISTA BELLO HORIZONTE, 1935, s.p). Várias obras foram iniciadas durante
a sua gestão, como a barragem da Pampulha, o prédio da prefeitura, o viaduto da Floresta e,
entre elas, a piscina pública do Bairro Santo Antonio, espaço cedido depois para a construção
do MTC.
A administração municipal de Juscelino Kubitschek (1940-1945) também foi marcada
por elevado número de reformas urbanas. Essas reformas
[...] já procuram associar a noção de moderno a um modelo de desenvolvimento. Ao
mesmo tempo esse é um modelo que vai se solidificando apenas quando projetado
em obras e apenas quando essas obras são capazes de transmitir a disposição do
modelo e alterar radicalmente valores, critérios, costumes e instituições tradicionais,
atingir o maior número de pessoas e tentar incutir em cada morador da cidade, a
convicção de ser moderno, antes de mais nada, significa viver integralmente o tempo
presente. (STARLING, 2002, p. 35).
Para Cedro (2002), as reformas e construções, em Belo Horizonte, durante a
administração de JK, proporcionaram bem-estar e progresso para a cidade e um maior
controle sobre a população.
O planejamento da Pampulha, do Sion e da Cidade Jardim como bairros burgueses
modernos, eliminavam qualquer possibilidade de moradia da classe menos
favorecida naqueles locais. [...] A modernidade empreendida por Juscelino que
atendia a população em geral restringia-se à abertura de ruas e avenidas, para o
mais abastados criou-se um complexo turístico de entretenimento. (CEDRO, 2002,
p. 16).
A obra mais famosa de JK, como prefeito, foi o Complexo Arquitetônico da
Pampulha. O que se pretendia, com a criação da Pampulha, era incutir no belo-horizontino o
59
sentimento de pertencimento à era moderna. Durante a sua permanência à frente da Prefeitura
de Belo Horizonte, Juscelino Kubistchek criou espaços modernos e requintados, sintonizados
com os interesse das elites da capital.
Novamente, a arquitetura foi utilizada como símbolo da modernidade e como sedução
e culto ao novo. O período de Juscelino Kubitschek, como prefeito da capital, foi marcado por
realizações de obras voltadas para a promoção do progresso e era, por meio dessas obras, que
as mudanças deveriam ocorrer e se sedimentar. As obras modificariam a paisagem da capital,
que, por sua vez, levariam a uma alteração no modo de vida dos habitantes e correspondiam
aos esforços dos governantes para convencê-los a viver, intensamente, o presente e de se
tornarem pessoas modernas.
O que se buscava, nessa época, era ser moderno, e ser moderno em todos os sentidos, a
começar pelo traçado urbano, passando pela arquitetura que deveria refletir a modernidade.
Entendia-se que o modo de viver dos belo-horizontinos não poderia continuar tão provinciano
como era até então, pois, com todas as transformações ocorridas em Belo Horizonte, nos anos
de 1940, "a cidade parecia antiga e os modos de vida dos seus moradores eram vistos como
ultrapassados". (PIMENTEL, 2002, p. 19).
Ser moderno significava,
[...] entre muitas coisas, um desejo irresistível de morar em casas de apartamentos,
de convidar a namorada para desfrutar a beleza do luar que iluminava o ainda pouco
povoado bairro do Cruzeiro, então o mais alto da cidade, de freqüentar restaurantes e
tomar xi, de chamar os amigos para apreciar um filet tournedour junto ao encanto
da maionese. moderníssimo e proibidíssimo: usar maiô cavado e freqüentar
boate. (STARLING, 2002, p. 35).
3.2 O nascimento do Minas Tênis Clube
Em 1935, Belo Horizonte contava com um pequeno número de clubes sociais e de
lazer onde se praticava quase que, exclusivamente, o futebol. De acordo com a documentação
existente no Acervo do MTC, destacavam-se o América Futebol Clube, o Clube Atlético
60
Mineiro e o Palestra Itália (hoje Cruzeiro Esporte Clube). Havia as associações amadorísticas
como a Associação Mineira de Atletismo, o Paissandu Esporte Clube, a Associação Atlética
Florestina e mais algumas outras onde o basquete e o voleibol eram praticados. A natação era
exercitada no Clube Atlético Mineiro e no América Futebol Clube. No Parque Municipal e em
quadras particulares, alguns grupos jogavam tênis.
Diante dessas acanhadas iniciativas esportivas, um grupo de moradores do Bairro
Serra tentou organizar um clube que atendesse à demanda dos amigos e dos moradores do
bairro, que carecia de um local apropriado para a prática de esporte. O grupo, então, resolveu
criar o Serra Tênis Clube. Havia uma quadra de voleibol, que era utilizada por esse grupo de
amigos, construída no terreno do Dr. Necésio Tavares, que passou a liderá-los para a
construção do clube. Uma turma de tenistas, que utilizava a quadra do Parque Municipal,
encabeçada pelo Dr.Waldomiro de Salles Pereira, também pensava em fundar um clube para a
prática do tênis: este seria o Belo Horizonte Tênis Clube.
O MTC nasceu da fusão desses dois grupos que se uniram para construir um clube que
atendesse às suas expectativas. Esse grupo, após a fusão, procurou o então prefeito Otacílio
Negrão de Lima para propor um possível arrendamento de uma área destinada à construção
do Parque Santo Antônio, na Rua da Bahia.
A princípio, o local da construção do Parque Santo Antônio seria destinado a um
zoológico. De acordo com Barreto (1995, p. 252-253), o zoológico seria construído na seção
XI da planta geral, que corresponde hoje ao quarteirão formado pela Rua da Bahia, Rua
Antônio de Albuquerque, Rua Professor Antônio Aleixo (antiga Rua Emboabas) e Rua
Espírito Santo, num grande terreno baldio localizado atrás do Palácio do Governo. Devido a
sua localização, como bairro residencial da elite e a sua proximidade com o Palácio do
Governo e a Praça da Liberdade, a edificação de um zoológico nesse local ficou inviável.
61
Figura 10 - Planta da cidade de Belo Horizonte de 1930 com os principais edifícios da cidade. Na
parte de baixo está localizada a Praça da Liberdade e à sua esquerda a área onde foi construído o MTC
Fonte: PANORAMA DE BELO HORIZONTE: Atlas Histórico, 1997.
A sugestão para o aproveitamento do terreno, segundo Ávila (1999, p. 20) partiu de
dona Geni, esposa do prefeito Otacílio Negrão de Lima. Certa vez, ela teve acesso a uma
revista que narrava um fato semelhante em uma cidade norte-americana. Um local parecido
com o da capital mineira foi aproveitado de forma brilhante, criando-se nele um centro
esportivo.
O prefeito aceitou, então, arrendar o terreno para um grupo de belorizontinos construir
o MTC. Como haviam, porém, começado as obras de construção da piscina e das quadras
esportivas, o clube seria beneficiado por elas. De acordo com a documentação existente no
Acervo do MTC,
[...] o prefeito Octacílio Negrão de Lima concedeu o arrendamento da área pela
quantia de dois contos de réis por prazo indeterminado. Mais tarde a 24/02/1937,
durante a gestão do Major Ernesto Dornelles Vargas, na presidência do clube,
62
procedeu-se a rescisão do arrendamento do terreno, ficando o mesmo incorporado ao
patrimônio do clube
4
.
A reunião para oficializar a fundação do MTC aconteceu no Automóvel Clube de
Minas Gerais, no dia 15 de novembro de 1935. Em 1936, Gerson Sabino foi contratado para
conhecer clubes de outras cidades e trazer para o MTC a experiência dessas organizações
esportivas. Ele elaborou um relatório baseado na experiência de três clubes o Ginásio y
Esgrima, de Buenos Aires, o Esperia, de São Paulo e o Fluminense, do Rio de Janeiro
5
. Os
fundadores do MTC se espelharam nesses clubes para organizar o que seria um clube
moderno, em Belo Horizonte. Além de planejar a estrutura administrativa e a parte
burocrática do clube, coube a Gerson Sabino a contratação de profissionais e técnicos
esportivos competentes. Ele deveria trazer o que houvesse de melhor para colaborar na
formação e fundação do MTC.
O estatuto do MTC, editado em 1937, estabeleceu da seguinte forma a sua finalidade:
"tem por objetivo promover entre seus sócios, a prática de toda sorte de jogos esportivos,
exercícios atléticos, propugnando pelo desenvolvimento da cultura física, racional e
principalmente, da cultura física infantil". (EDIÇÃO CORRELATA, 1937, p. 3, Acervo
MTC). Os fundadores do MTC pretendiam transformar o clube em um espaço onde fosse
possível unir a prática do esporte ao aprimoramento e aperfeiçoamento físico e moral do
cidadão.
A inauguração da praça de esportes aconteceu, dois anos depois, em 27 de novembro
de 1937. Ela contou com a presença do governador Benedito Valadares, do prefeito Octacílio
Negrão de Lima, de pessoas de destaque da sociedade. A srta. Lúcia Valadares, filha do
governador hasteou a bandeira do clube, para marcar o ato de inauguração. Foram convidados
autoridades esportivas locais, do Rio de Janeiro e de São Paulo. Piedade Coutinho, Carmem
Dias, Maria Lenk e Sieglinda Lenk foram convidadas para a inauguração da piscina
6
. Houve
intensa programação esportiva, assistida por uma enorme platéia, o que se configurou em
grande acontecimento para a cidade
4
Acervo MTC/ Datilografado -Documentos Avulsos.
5
Acervo MTC
6
Piedade Coutinho conseguiu o 5
º lugar nos Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936. Maria Lenk e
Sieglinda Lenk também participaram, tendo como técnico Carlos de Campos Sobrinho, que foi técnico
do MTC. Sieglinda Lenk, posteriormente, fez parte da equipe do MTC (RODRIGUES, 1996).
63
Perante uma assistência numerosíssima, que foi calculada em 15.000 mil pessoas,
foi inaugurada, sabbado ultimo, a majestosa piscina do Minas Tennis Club, que é a
maior da América do Sul. Nunca na capital mineira, um facto sportivo causou tanta
sensação como este. (A NOTA, 29 nov 1937, Acervo MTC).
Em 1939, foi concluída a sede do clube, e a solenidade oficial de inauguração foi em
1940, com o comparecimento do presidente Getúlio Vargas. Em seu discurso, o presidente
discorreu sobre a importância do clube para a juventude mineira e brasileira, revelando,
assim, o interesse do poder público pela instituição. Vargas também destacou "a estreita
relação que existe entre a robustez do corpo e os predicados do espírito" e afirmou que "o
Minas Tênis Clube é uma escola destinada ao aperfeiçoamento e a formação do caráter dos
jovens brasileiros". (REVISTA MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, s.p, Acervo MTC). A missão
do MTC não estava circunscrita apenas aos jovens que o freqüentavam, mas o esporte que ali
era praticado deveria ser exemplo para toda a juventude brasileira.
O projeto político e cultural elaborado, pelo Estado Novo, era bastante articulado, de
forma a convencer da real necessidade de construção de uma nova nação centrada no
fortalecimento do Estado. O regime buscava estabelecer uma nova relação com a sociedade.
O Estado penetra nos domínios da sociedade civil, assumindo claramente o papel de
direção e organização da sociedade. [...] O que se verifica, portanto, é um
deslocamento de atribuições, onde o Estado assume funções que até então estavam
sob o encargo de diferentes grupos sociais. (VELLOSO, 1982, p. 72).
O MTC é um exemplo desse tipo de ação do Estado: foi tutelado pelos governos
estadual e municipal. Os presidentes do MTC eram nomeados pelo governador do estado e
suas prerrogativas eram estabelecidas a fim de atender aos interesses do poder público, apesar
de ser um clube particular que favorecia aos interesses de um grupo da sociedade local.
"Fundou-se então o Terra Tennis Clube, hoje denominado Minas Tennis Clube, por motivo de
apoio official que elle recebeu, pois todas as obras foram custeadas pelos governos municipal
e estadual." (ESTADO DE SÃO PAULO, 28 nov. 1937, Acervo MTC).
O Estado, na busca de estabelecer garantias para a produtividade da população,
interferiu no processo disciplinando o espaço social, mediando as relações sociais, tomando
para si a esfera da sociedade. Para Lenharo (1986), essa prática corporativista do regime foi
estendida para a educação física. O Estado passou a incentivar a moralização do corpo pelo
exercício físico, imprimindo um sentido de consciência social ao aprimoramento físico.
64
Segundo esse autor, a nova higiene do corpo responsabilizava o indivíduo a desenvolver uma
consciência de bem estar coletivo. Segundo Gomes (2000), ao publicizar a ordem privada, o
Estado reafirmava o seu papel diretivo e arbitral da sociedade e a encaminhava para a
realização do bem público.
Um clube é uma associação de caráter privado, os sócios, para serem admitidos, têm
que preencher determinados requisitos e passar por uma sindicância, pagar por uma cota e ter
obrigatoriedade de seguir o regulamento próprio, estabelecido em assembléia. Não é,
portanto, aberto à população local e nem de domínio público. Durante a vigência do Estado
Novo, porém, os assuntos ligados à sociedade civil passaram a ser de interesse do Estado, que
se imiscuiu em uma esfera que não lhe era própria, porém necessária para o seu projeto de
nação, como é o caso do MTC. O Estado penetrou nos domínios do MTC, auxiliando na sua
edificação e nomeando seus presidentes, em troca, as propostas de atuação do clube deveriam
estar em confluência com as do Estado para o esporte e lazer orientados para a sociedade em
transformação. O MTC se incluía nesse modelo de agremiação, que tinha por finalidade
contribuir para o aprimoramento da juventude por meio do esporte. Por isso, o clube foi
tutelado e apoiado pelo governador de Minas Gerais, Benedito Valladares, e pelo prefeito da
cidade, Otacílio Negrão de Lima.
A contribuição do poder público para a fundação do MTC (o arrendamento do terreno
com as benfeitorias) demonstra a estreita aliança entre o MTC e o Estado. Foi uma aliança
pautada pelos ideais de modernização, exaltação da nação, pelo adestramento do corpo e pela
valorização da saúde. Houve, de certa forma, uma dupla aliança: o MTC precisava do governo
para ser construído e o grupo que o idealizou sabia disso. Esse grupo, por isso, procurou desde
o início, obter o apoio dos governantes, que, por sua vez necessitavam de um espaço como o
MTC para afirmar as suas convicções modernizadoras e higienistas por intermédio do esporte.
De acordo com o Sr. Orlando Martins Vieira,
[...] o Minas tentou fazer a fundação com mil sócios, não conseguiu. Fundadores são
quinhentos. Foi uma ninharia. Tanto que não agüentou fazer. O governo teve de
entrar, o governo é que dava o dinheiro para fazer o negócio. No começo, era o
governo, nós custamos para ficar independentes. (Depoimento Informal).
7
O clube foi idealizado por um grupo da elite política e econômica de Belo Horizonte,
que procurou construir um clube com uma infra-estrutura moderna. Essa iniciativa pode ser
7
Dados da entrevista concedida pelo Sr Orlando Martins Vieira. Pesquisa de campo realizada em 24 abr. 2006.
65
apontada como reflexo do desejo de modernização da sociedade e da também da cidade. Na
inauguração, a imprensa ressaltava suas qualidades "marco decisivo do progresso e da
civilização da cidade com installações que se equiparam às mais perfeitas do continente,
inaugura-se hoje em Belo Horizonte a praça de esportes do Minas Tennis Clube". (FOLHA
DE MINAS, 27 nov. 1937, Acervo MTC).
O MTC era dirigido e freqüentado pela elite e pela classe média letrada da cidade. O
comportamento desses grupos oscilava entre valores conservadores e aqueles considerados
modernos, mas que assumiram a tarefa de edificação e difusão dos valores da pátria o e do
projeto político e cultural do Estado Novo. Não foi por acaso que o chefe da polícia local,
Ernesto Dornelles Vargas, primo de Getúlio Vargas, foi presidente do clube de 1936 a 1942.
No Livro de Ouro do MTC
8
, Getúlio Vargas, em visita ao clube em 1938, deixou sua
declaração sobre a organização: "O Minas Tênis Clube é uma instituição benemérita,
colaborando com o Governo de Minas Gerais, de um modo eficiente e patriota, na educação
da juventude.
9
" Essa fala de Vargas revela a sincronia que existia entre as propostas de
atuação do clube e as principais orientações do governo, no que tange ao civismo e à
educação física. Dessa forma, a fundação do MTC, em 1935, não pode ser considerada
somente uma realização de um pequeno grupo da elite mineira que necessitava de um espaço
para a prática de esporte e lazer. Ela é também representativa de uma conjuntura política
vivida pelo Brasil, na década de 1930, na qual iniciativas que promovessem o esporte e o
lazer eram bem recebidas e incentivadas pelo poder público.
3.3 O MTC e o Estado Novo
Os ideólogos do Estado Novo valorizavam o esporte como um instrumento útil para a
formação de uma juventude vigorosa e sadia, apta a trabalhar pelo progresso da pátria e
pronta para defendê-la. O MTC nasceu alinhado com essas propostas do governo federal, no
que se refere ao esporte e ao lazer, pois ambas as categorias, nesse momento histórico, tinham
que apresentar um princípio educativo e formativo para a juventude nacional.
Durante a vigência do Estado Novo, deu-se destaque à pedagogia dos jovens. "Ao
8
Livro com pareceres e assinaturas de visitantes e colaboradores ilustres do MTC.
9
Acervo MTC.
66
Estado caberia a responsabilidade de tutelar a juventude, modelando seu pensamento,
ajustando-a ao novo ambiente político, preparando-a, enfim, para a convivência a ser
estimulada no Estado totalitário." (BOMENY, 1999, p. 147).
O MTC mostrou-se como um espaço ideal para a mobilização da juventude,
proveniente de um segmento específico da sociedade belorizontina. Ali, em vista disso, lazer
e esporte estavam comprometidos com o programa de governo. O ministro Gustavo
Capanema, em visita ao clube, deixou registrada a impressão que teve: "Este estabelecimento
impressiona o visitante pela esperança que dá, de uma juventude forte e bela, construtora do
Brasil de nossos sonhos”.
10
A educação física e educação moral e cívica, oferecidas pelo clube, eram chaves para a
socialização dos jovens nos moldes ditados pelo Estado. As organizações recreativas e
esportivas, como o MTC, deveriam criar nos sócios a disposição para internalizar os novos
saberes divulgados pelo Estado, na busca da formação de uma nova mentalidade. Elas
deveriam colaborar na consolidação dos sentimentos de nacionalidade e afirmar, por meio do
esporte, a importância do princípio da autoridade e da ordem, conceitos importantes para
projeto de desenvolvimento do Brasil. Assim, lazer e esporte, no MTC, serviam de
instrumentos de transformação social, ao trabalhar em defesa da cultura e da civilização
brasileira.
O Estado, dessa maneira, buscou incentivar todas as formas de organização da
sociedade, que tivessem afinidades com as diretrizes do governo, incluindo associações
recreativas e esportivas. O MTC é um exemplo desse incentivo e nasceu em um contexto
político e cultural de crescente valorização da saúde e do adestramento do corpo, como uma
forma de educar a juventude e prepará-la para o novo Brasil que surgia. De acordo com a
imprensa da época,
O Minas Tennis Clube [...] é uma associação desportiva 'sui-generis' no Brasil. Não
cogita de vitórias nos campeonatos desportivos e não se preocupa com campeonatos
[...]. Mas a preocupação do club é cuidar do aperfeiçoamento físico da infância e da
juventude mineira, de acordo com os melhores métodos científicos. (A NOITE, 23
dez. 1942, Acervo MTC).
Os jornais da época e a própria revista do clube o caracterizavam como uma escola de
patriotismo destinada ao "aperfeiçoamento e a formação do caráter do jovem". (REVISTA
10
Livro De Ouro, Acervo MTC.
67
MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, s.p., Acervo MTC). Havia uma preocupação, explicitada pelo
discurso de seus fundadores, com um conjunto de valores morais de importante significado
para o Estado Novo, que deveriam ser passados para a juventude, como: tradição, família,
pátria, disciplina, hierarquia, ordem, civismo, aliados ao culto à ciência, à técnica, à eugenia, e
também à educação física e à modernização da sociedade.
Em sua praça de esportes encontrará o associado e sua família todo e conforto e
attractivos, tanto para as creanças como para todos em geral, dentro do mais puro
ambiente de decencia, da ordem e da moral e da disciplina. (ESTADO DE MINAS,
28 nov. 1937, Acervo MTC).
Outro artigo trazia a seguinte manchete: "Uma escola para a grandeza racial" no qual
completava: "não poderiam aos animadores e realizadores de tão empolgante feito
contribuirem de um modo mais direto, mais firme, para a nossa emancipação racial".
(FOLHA DE MINAS, 25 dez. 1937, Acervo MTC).
Como um espaço útil para a mobilização dos jovens, o MTC tinha entre as suas
atribuições formar atletas e monitores para o ensino e o treinamento de exercícios físicos e
esportes em geral para atuarem em diferentes cidades do interior de Minas Gerais, que
[...] fossem capazes de inculcar nos jovens valores cívicos e morais, inerentes à
organização social que se pretendia legitimar. Por intermédio da colaboração da
policia militar [...] o clube formou monitores e distribuiu em todo o estado para
atuarem nas Praças de Esportes. Assim, valores ligados à ordem, disciplina,
obediência e civismo seriam assegurados. (RODRIGUES, 1997, p. 486).
Os fundadores do clube, atentos aos ideais de formação dos jovens divulgados pelos
teóricos do Estado Novo, propunham-se a trabalhar também para o aprimoramento físico da
juventude pelo esporte.
Efetivamente, a existência do Minas Tênis Clube tem sido em padrão de vigor e
juventude, jamais se afastando do seu objetivo de proporcionar a mocidade mineira
todos os meios possíveis de um completo aprimoramento físico. (DIÁRIO DA
TARDE, 15 nov. 1944, Acervo MTC).
Com o objetivo voltado para propiciar aos sócios os benefícios do esporte, o MTC
construiu um parque esportivo moderno, que, segundo a imprensa da época, foi modelo para
68
outras localidades.
É mirando-se no Minas, tomando-o como exemplo, que os construtores dos
magníficos estádios que m nascido nas cidades do interior trabalham cada detalhe
de organização, todas a mínimas facetas servem de espelho, compondo um todo
perfeito para receber a mocidade do interior. (O DIÁRIO, 12 nov. 1944, Acervo
MTC).
As instalações do MTC obedeciam a um rígido padrão de modernidade, de beleza,
higiene e racionalidade, que causou sensação na imprensa. O projeto arquitetônico do parque
esportivo foi matéria de jornal.
Assim é que o engenheiro Romeo De Paoli, apresentou seu projecto de construção,
obedecendo à topographia accidentada e o aproveitamento racional do terreno. [...]
A archibancada que forma uma linda fachada para a Rua Espírito Santo tem a sua
localização também racional porque veio aproveitar a topographya existente no
terreno para a construção ainda da casas de machinas, em um mesmo prédio com
grande economia para as obras. O vestuário é um sumptuoso edifício de architectura
moderna e aspecto imponente e alegre que obedecem a todos os preceitos de hygiene
e regulamentos internacionais para a pratica de natação. [...] Execução
verdadeiramente interessante em que foram necessários empregar os mais sérios
cuidados e trabalhos technicos da mais moderna engenharia. [...] O Tennis, Baskett,
e Volley-Ball foram também localizados obedecendo a mais moderna technica,
orientação e regulamentação internacionais. No play-ground para creanças foram
installados apparelhos de gynnastica e recreio alem de tanque de vadiagem, onde as
creanças encontrarão o mais efficiente meio de desenvolvimento e aperfeiçoamento
do seu organismo. A construção destes últimos trabalhos esteve a cargo diretamente
da Prefeitura Municipal. (ESTADO DE MINAS, 28 nov. 1937, Acervo MTC).
Figura 11 - Parque esportivo com destaque para a torre do relógio, marco
arquitetônico do MTC (série de fotos 1937-1945)
Fonte: Acervo MTC
69
O clube, no entanto, acabou se configurando também como um espaço rico para a
interação social. De acordo com o estatuto de 1937, o MTC "vinha preencher uma sensível
lacuna em nossa vida social e esportiva". (EDIÇÃO CORRELATA, 1937, Acervo MTC),
pois Belo Horizonte era carente de espaços de encontro. Cabe ressaltar, portanto, que o clube
foi um reflexo do esforço modernizador e cosmopolita que contagiou Belo Horizonte, nessa
época, e foi considerado um "marco decisivo do progresso e da civilização da cidade com
installações que se equiparam às mais perfeitas do continente". (FOLHA DE MINAS, 27 nov.
1937, Acervo MTC).
O MTC foi criado para ser grande no tamanho e nos objetivos e para ter um espírito
moderno e belas e racionais linhas arquitetônicas. Essa fórmula foi tomada como empréstimos
aos ideólogos do Estado Novo, que queriam construir um país moderno, belo e grande em
riquezas e espírito. Como já foi dito, o parque esportivo foi de autoria do engenheiro Romeo
De Paoli, e a sede social foi projetada pelo arquiteto Raffaello Berti. Ela foi construída em
estilo déco, que se tornou hegemônico à época. "Essa construção [...] obedece à arquitetura
moderna, de linhas sóbrias e aspecto majestoso, devendo ficar concluida em fins do próximo
anno". (ESTADO DE MINAS, 28 nov. 1937, Acervo MTC). Para Castriota (1999), o déco
estava ligado à idéia de modernidade por seus aspectos funcionais e decorativos e atendia às
exigências da sociedade que começava a entrar, no cotidiano dela, em contato com as
máquinas. As instalações do clube, compostas do parque esportivo e do edifício da sede, logo
se tornaram importantes para a vida social da cidade e identificadas como signo da
modernidade de Belo Horizonte.
A sede social do MTC transforma-se em um marco e referência para a cidade. O
destaque da solução tanto se pelas fachadas, quanto pelas plantas. O arquiteto,
posicionando a entrada pela diagonal, obtém visão completa do restaurante e, em
seguida, da varanda de onde se descortina todo o parque aquático. No andar
superior, o salão de festas domina o espaço completado pela varanda, os volumes
curvos dominam a composição e, através do tratamento transparente da vidraçaria, o
prédio transpira sua leveza e magia atraindo o desejo incontido de desfrutá-lo. A
fachada interna, a mais contemplada pelos freqüentadores do clube, apresenta
composição rica plenos e vazios – resultante do recuo conseguido pela localização
das varandas, o que imprime movimento à composição. Recuos e torres compactas e
retilíneas, contrastantemente leves uma presença forte fixam o prédio ao solo.
(BERTI, 2000, p. 101).
70
Figura 12 - Sede do Minas Tênis Clube construída em estilo Art Decó , logo após a
inauguração em 1937
Fonte: Acervo MTC.
O clube foi planejado para atender a todos os regulamentos da época de higiene e de
prática de esportes.
Com a inauguração do sumptuoso estádio do MINAS TENNIS CLUB, Minas Gerais
se colloca na vanguarda das realizações esportivas em nosso paiz. Verdadeiramente
o estádio do bairro Santo Antonio é o maior parque esportivo do Brasil e quiçá da
América do Sul onde se reunem todas as differentes modalidades do esporte e cujo
exercício esta regulamentado por leis e preceitos salutares da hygiene, da boa saude
e educação physica orientado por technicos competentes contractados especialmente
para este fim. (ESTADO DE MINAS, 28 nov. 1937, Acervo MTC).
A área de piscina foi divulgada pela imprensa e pelo próprio clube como a maior, mais
bela e bem tratada da América do Sul. O Jornal do Rio de Janeiro publicou matéria sobre a
inauguração da piscina do MTC, em que dizia:
[...] Refiro-me agora à sua bella e maravilhosa piscina. Não erra-se em dizer ser a
primeira do Brasil e talvez da América do Sul. Com seus 50 metros de comprimento
e 25 de largo, com suas dez raias confortaveis, sua illuminação enormissima interna
(systema dos mais modernos), o tanque natatorio de Santo Antonio, attrae os que
vão porque possue tudo de grandioso e porque acha-se encravado num valle
verdejante e cheio de flores. Possue os mais modernos requisitos e installaçoes. (O
JORNAL, 27 nov 1937, Acervo MTC).
71
Figura 13 - Vista da piscina olímpica e da arquibancada construídas em 1937
Fonte: Acervo MTC.
Assim, mirando-se no exemplo do MTC, outras piscinas foram construídas: "O Rio de
Janeiro construirá uma piscina a exemplo de Belo Horizonte, a piscina do Minas Tênis
Clube". (O RADICAL, 18 dez. 1937, Acervo MTC).
A organização interna e administrativa do clube, segundo Rodrigues (1996) muito
contribuiu para a institucionalização do esporte em Belo Horizonte. Foi a partir da experiência
inovadora de organização interna do clube que surgiram as federações e ligas esportivas na
capital mineira. Na história da constituição do esporte, os clubes tiveram um papel
significativo para o seu desenvolvimento como um fenômeno sóciocultural. O MTC muito
contribuiu para a infra-estrutura organizacional do esporte em Belo Horizonte, pois foi, a
partir da sua criação, que as associações, agremiações e federações surgiram com o objetivo
de organizar e consolidar diversas modalidades esportivas. O clube investiu em especialistas
que procuravam difundir o esporte na capital. Trouxe de São Paulo profissionais como o
Carlos Campos Sobrinho, técnico de natação e Augusto Gaggeti, técnico de tênis. Eles
contribuíram para a criação de algumas federações esportivas em Belo Horizonte.
Antes da criação do MTC, a natação era praticada nas piscinas do América e do
Atlético, e no interior do Estado, apenas em Uberaba e Uberlândia. A vinda de
Carlos Campos Sobrinho, o Carlito, para Belo Horizonte foi um marco para o
desenvolvimento da natação em Minas Gerais. Além de promover cursos para
formação de técnicos de natação e distribuí-los em todo o Estado, Carlito foi o
idealizador da Federação Aquática Mineira. Criada em 9 de dezembro de 1937,
contou com o apoio incondicional do major Ernesto Dornelles e de José Mendes
72
Junior, sendo este aclamado como o primeiro presidente dessa federação. O Minas
iniciou, assim, a sua contribuição para a formação de uma infra-estrutura
organizacional do Esporte enquanto um sistema burocrático. (RODRIGUES, 1996,
p. 136).
Outras federações também surgiram com base na fundação do MTC e que se
espelhavam em sua infra-estrutura organizacional: a Federação Mineira de Bola ao Cesto,
como era conhecido o basquete, a Federação Mineira de Tênis e a Federação Mineira de
Atletismo. Todas foram criadas em 7 de dezembro de 1937: "sendo as duas mais antigas a de
futebol e a de pugilismo”. (O DIÁRIO, 12 de dez. 1937, Acervo MTC).
O clube era dividido por departamentos: cada um tinha um responsável técnico e
correspondia a uma modalidade esportiva. Os esportes praticados no clube obedeciam aos
cânones da educação física divulgada pelo governo federal. "Dotado de modelares
departamentos de natação, volley-ball, basket, tennis e um extenso parque infantil, o "'Minas'
vae contribuir, decisivamente para o desenvolvimento da cultura physica no paiz." (FOLHA
DE MINAS, 28 nov. 1937, Acervo MTC).
Figura 14 - Inauguração da praça de esportes. Registro do jogo entre o Minas
e o Copacabana do Rio de Janeiro, 1937.
Fonte: Acervo MTC.
73
Figura 15 - Tenistas do MTC, 1939
Fonte: Acervo MTC.
Figura 16 - Tenistas do MTC, 1940
Fonte: Acervo MTC.
74
Figura 17 - Torneio interno do MTC, 1942.
Fonte: Acervo MTC.
O departamento médico e o de fisioterapia eram equipados com aparelhos modernos.
Os consultórios médicos e dentários tinham por objetivo o controle da saúde dos sócios que
freqüentavam a piscina do clube e praticavam esportes. Esses departamentos, em especial,
foram medidas tomadas pelo clube, que espelham o cuidado que a sociedade passou a ter com
o corpo e com a saúde. Os equipamentos fisioterapêuticos do MTC foram considerados
modernos à época com "secções de duchas, banhos de luz ultra-violeta, massagens, etc. o que
o torna um dos mais completos da América do Sul". (O DIÁRIO, 15 nov. 1944, Acervo
MTC).
O departamento de educação física infantil tinha como função primordial a "formação
corporal e espiritual das crianças sob a influência da disciplina harmônica dos bons hábitos e
bons exemplos". (REVISTA MINAS TÊNIS CLUBE, s.p., Acervo MTC), preparando-as para
desempenharem uma função no futuro para o bem da nação.
O MTC criou, também, o departamento de educação física feminina com o intuito de
oferecer às associadas um "trabalho em prol de um programa completo de eugenia de nossa
gente e fugindo à unilateralidade que infelizmente ainda encontra apoio em alguns meios".
(REVISTA MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, s.p., Acervo MTC). Esse departamento também
era novidade em um clube e era um dos mais movimentados, demonstrando a carência na
cidade em relação à atividade física para as mulheres.
Ao mesmo tempo em que revolucionou o ambiente da capital, o clube procurou zelar
75
pela preservação de costumes do passado. Interessava-se em reforçar hábitos e instituições,
considerados valiosos para a construção da nação, como a família, a pátria, o respeito à moral,
o pudor em relação à exposição do corpo, principalmente o da mulher. Havia um rígido
controle do comportamento dos sócios em suas dependências, para não correr o risco de perda
da moral e dos bons costumes.
O estatuto do MTC, de 1937, discorria sobre os deveres do clube e dos sócios. Ao
clube cabia aplicar aos sócios as penalidades admissíveis àqueles que cometessem faltas
disciplinares, infringissem as disposições do estatuto ou procedessem incorretamente nas suas
dependências. Os sócios deveriam "cumprir fielmente os presentes Estatutos, o Regimento
Interno e as resoluções da Diretoria e do Conselho Deliberativo e cooperar, sempre, direta e
indiretamente, para o engrandecimento e o bom nome do 'Minas Tênis Clube'". (EDIÇÃO
CORRELATA, Art.12, p. 9. Acervo MTC).
O poder disciplinador, presente nas práticas esportivas, segundo Foucault (1987), não
é um aparelho nem uma instituição, é uma técnica, um instrumento de poder que controla as
operações do corpo, trabalha o corpo dos homens, orienta-os a agir de determinada forma,
fabrica um comportamento, e origem a um tipo de pessoa necessária ao funcionamento da
sociedade capitalista industrial e à sua manutenção. Segundo Foucault (1987), a sanção
normalizadora é imposta de várias formas inclusive pelo olhar e, apesar de ser um poder
menor se comparado a outros, ela exerce um grande controle sobre os indivíduos. Todos estão
sujeitos a essas técnicas de adestramento corporal inspiradas, sobretudo, nas práticas
militares, que procuram dotar o corpo de mais docilidade e utilidade, ao que Lenharo (1986)
denominou de "militarização do corpo" na Era Vargas.
O MTC foi um local de disseminação de poder disciplinador por meio do esporte, do
olhar inspecionador e do seu regimento interno. Existia uma vigilância e um controle
constante no interior do clube. Os cios e funcionários se auto-regulavam e se vigiavam. O
regulamento do MTC era conhecido e seguido pelos sócios. Dessa forma, transformou-se em
um "operador de adestramento". (FOUCAULT, 1987, p. 145), dos corpos e do
comportamento dos seus jovens freqüentadores.
O rádio, o cinema e o teatro no Estado Novo foram também utilizados como
instrumentos educativos. O MTC, como uma associação de caráter recreativo e esportivo, foi
um instrumento educativo e um local onde se podia desfrutar de um convívio social,
considerado, saudável. Ele se transformou em um instrumento socializador, na medida em que
contribuía para formar bons hábitos por meio do esporte, incentivar a cordialidade, a
76
cooperação e a disciplina entre seus membros. Essas condutas, como demonstradas, eram
incentivadas pelos ideólogos do Estado Novo.
O MTC acolheu também o discurso do Estado Novo, que propunha o esforço
organizado e coletivo para a transformação do Brasil. O clube nasceu de um trabalho conjunto
e organizado de um grupo de senhores da sociedade de Belo Horizonte.
À frente desta iniciativa encontram-se entre outros, os srs. Necésio Tavares, Jose
Mendes Junior, Major Ernesto Dornelles e Gamaliel Soares. Assim teve seu
nascimento o Minas Tênis Clube com o desprendimento e boa vontade de um
pugillo de esforçados que se empenharam na propaganda intelligente e patriotica dos
modernos processos de educação physica, tendentes a valorizar os homens de
amanhã através do desenvolvimento da mocidade actual. (ESTADO DE MINAS, 28
nov. 1937, Acervo MTC).
A idéia de harmonia era marcante no clube. A juventude, além de receber noções de
educação física, deveria se sentir parte de uma grande família: a família minastenista. Ali os
jovens receberiam cuidados como recebiam da própria família, aprimorando-se na moral e no
embelezamento do físico. O clube pretendia contribuir
na educação da juventude em sua
totalidade.
Fomos os primeiros nadadores, da primeira turma do Minas. A minha mãe, quando
saía para fazer compras, o chofer parava o carro na porta, e a gente descia. Ela nos
entregava para o Minas e para o porteiro ela gritava: 'tomam conta'. Porque nós
fomos criados mesmo aí, todos fomos criados no Minas. Para nós, foi uma casa de
família. Nós fomos criados, crescemos aí.
(
Depoimento Informal).
11
De acordo com a Srª Alzira César, outra associada, todos que freqüentavam o MTC ou
lá trabalhavam eram conhecidos.
A gente era vizinho do Minas e conhecia todos os porteiros. Os porteiros chamavam
a gente pelo nome, a gente chamava os porteiros pelo nome, os funcionários eram
conhecidos. Eles sabiam quem você era... Então, você era conhecido. Era quase uma
segunda família, o Minas. (Depoimento Informal).
12
Ao clube cabia, pois, a responsabilidade de orientar os jovens freqüentadores, e lhes
11
Dados da entrevista concedida pela Srª Avani Santana de Castro. Pesquisa de campo realizada em 05 abr.
2006.
12
Dados da entrevista concedida pela Srª Alzira César. Pesquisa de campo realizada em 07 abr. 2006.
77
oferecer uma educação completa, física e moral.
Nas suas festividades, o clube adotava alguns rituais e mbolos oficiais. Os
campeonatos esportivos, inaugurações, festas, jantares e outras festividades eram perpassados
por manifestações de civismo e de patriotismo, na tentativa de incutir nos associados os
sentimentos de nacionalidade. Essas cerimônias eram abertas pelo hasteamento da bandeira e
pelo canto do hino nacional. Autoridades eram convidadas a discursar e a louvar o trabalho do
clube em prol da nação, como demonstra o texto a seguir: "Antecedendo a prometida
competição, todos os nadadores, juntamente com os seus técnicos, desfilarão perante as altas
autoridades presentes, entoando, em seguida, o Hino Nacional." (FOLHA DE MINAS, 27 de
nov. 1942, Acervo MTC).
O MTC também comemorava as datas cívicas: "Associando-se ao Dia da Bandeira, o
Minas Tênis Clube fará hastear hoje, terça-feira, às 12 horas, o Pavilhão Nacional, pelos seus
escoteiros, que escutarão a cerimônia". (JORNAL MINAS GERAIS, 19 nov. 1940, Acervo
MTC).
Os concursos de beleza, as missas dançantes, os campeonatos, algumas datas cívicas,
troféus, as festas de aniversários do clube são exemplos da ritualística e dos símbolos
utilizados pelo MTC, marcados pela sintonia com o Estado Novo e que, muitas vezes, tiveram
inspiração na ritualística de comemorações governamentais. Na comemoração do nono
aniversário do MTC, saiu a seguinte nota:
Por tudo isso, a festa desta noite se reveste para nós do significado de uma cerimônia
cívica e, obedientes ao espírito de brasilidade, que nos norteia ao homenagearmos o
nosso governador, aqui inauguramos o retrato do Presidente Getúlio Vargas,
fazendo-o com o pensamento e os corações voltados para a causa da unidade
nacional. (ESTADO DE MINAS, 28 de nov. 1940, Acervo MTC).
No MTC, o atleta, a criança e os sócios trabalhavam o adestramento do corpo pela
prática diária de esporte. Passavam por rigorosos exames médicos, para certificarem da sua
condição física e de saúde, ao mesmo tempo em que trabalhavam seu espírito. Com isso, o
clube acreditava estar contribuindo para o aprimoramento da raça e da robustez do corpo, por
meio do esporte e da convivência harmoniosa entre os sócios, que eram pessoas pertencentes
às famílias tradicionais e de destaque da sociedade de Belo Horizonte. O Correio de Minas,
de Juiz de Fora, publicou um elogio ao MTC e um apelo dirigido às outras localidades: "O
78
exemplo de Belo Horizonte merece ser imitado. O poder público construindo praças sportivas
para que nellas se aprimore o physico de uma raça que se forma, aprimoramento
indispensável à grandeza do Brasil". (CORREIO DE MINAS, 29 de nov. 1937, Acervo
MTC). Havia uma crença em que o esporte praticado, conforme era no MTC, poderia
contribuir para a formação do "novo" homem brasileiro idealizado por Vargas e,
principalmente, para a formação da juventude nacional, a quem cabia o futuro do país.
3.4 Localização do MTC
A localização espacial do MTC é reflexo dos valores de um grupo social específico e
de um tempo histórico. Como já foi dito, Belo Horizonte nasceu com a marca da modernidade
ancorada nos preceitos positivistas da ordem e do progresso, cuja expressão pode ser
observada na sua configuração urbana, em suas ruas e esquinas retas marcadamente
delimitadas. O traçado urbano ou o desenho espacial de uma cidade planejada, como Belo
Horizonte, representa os ideais de seus fundadores. Na época, eles se preocuparam com as
questões da ordem, da hierarquia, da higiene, entre outras. Assim, para cada segmento social
seria destinado um espaço da cidade.
O local onde o MTC foi construído era um local privilegiado da cidade, onde havia um
grande vazio, que prejudicava a paisagem urbana. Era um lugar onde, segundo alguns
depoimentos de sócios, as crianças que moravam nas redondezas brincavam, apesar de ser
considerado perigoso. O MTC localiza-se na Rua da Bahia com a antiga Rua Emboabas, hoje
Rua Professor Antônio Aleixo, nas proximidades da Praça da Liberdade. No local, havia uma
grande depressão: "O mais impressionante contraste: Uma grande área perdida, com buracos e
brejos, hoje o mais moderno e completo parque esportivo de toda a América do Sul".
(FOLHA DE MINAS, 25 dez. 1937, Acervo MTC).
79
Figura 18 - Local onde foi construído o Minas Tênis Clube, terreno situado próximo ao Palácio da
Liberdade, entre as Ruas da Bahia e Espírito Santo. Conhecido como o "Buracão" onde as crianças
da vizinhança brincavam
Fonte: Acervo da autora.
A Praça da Liberdade foi projetada para abrigar o poder político da jovem capital. Por
sua localização privilegiada em patamar mais alto da cidade e para onde se convergiam
algumas das principais avenidas que ligavam o centro do poder ao centro comercial e uma
bela arquitetura eclética, logo se transformou, no entanto, em um espaço de lazer para os
jovens bem nascidos da cidade. Tornou-se um dos principais espaços públicos da cidade e
indutor de sociabilidades.
No entorno da praça, foram construídos o Palácio do Governo e os edifícios de suas
secretarias e, próximo ao poder do Estado, foi edificado o Palácio Episcopal. A Praça da
Liberdade, portanto, acolheu o poder político e o poder religioso, que agrupados em um
mesmo espaço, expressavam a sintonia entre o Estado e a Igreja, bastante comum na história
brasileira.
A Praça da Liberdade, como o lócus privilegiado do poder, tinha uma função
simbólica bem definida. Ela deveria representar o poder temporal e ainda expressar os valores
dos grupos dirigentes da sociedade mineira. Tornou-se a expressão da organização social que
se almejava como modelo da vida coletiva organizada, através de uma estrutura hierárquica
80
que procurava estabelecer a ordem e a harmonia social. Transformou-se, portanto, em uma
"síntese das instâncias política e econômica, através daquela topografia imaginária, cuja
proposta parece extrapolar o visível e imediato da proposta urbanística". (GROSSI, 1997, p.
20).
A Rua da Bahia, onde se localiza o MTC, desde a fundação da cidade, abrigava as
residências dos notáveis, cafés, livrarias, teatros, casas comerciais de alto luxo. Era a rua que
ligava o centro comercial ao centro do poder, destinada a um grupo mais elitizado da cidade.
Consolidou-se, dessa forma, "como lócus da difusão de modismo na arquitetura,
comportamento e moda". (LEMOS, 1994, p. 34).
Considerada a mais elegante da cidade, a Rua da Bahia continha importantes símbolos
de civilidade, "encarnava a síntese do ambiente cosmopolita. Para ali convergiam o comercio,
o cinema, o burburinho da multidão, o café. Era a artéria por onde transitavam homens e
mulheres elegantes, automóveis e bondes". (JULIÃO, 1996, p.67-68). Era o palco de
acontecimentos considerados mais próximos aos da vida moderna. Era freqüentada por
intelectuais, políticos, jornalistas, estudantes, empresários, em suma, por personagens que
tinham um poder de influenciar o comportamento e o pensamento da sociedade local.
A localização do MTC, na Rua da Bahia e próximo à Praça da Liberdade, mostrou-se
adequada para o segmento que o freqüentava: as elites locais e a classe média letrada, que
fizeram do clube seu principal local de congraçamento e convívio.
Os construtores de Belo Horizonte buscaram estabelecer a melhor forma de dispor o
seu traçado urbano. A esse traçado vinculava-se à imagem de um espaço ordenado, fundado
em preceitos técnicos que se justificavam por questões de salubridade, funcionalidade,
eficiência, disciplinarização e racionalidade no uso, na ocupação, na constituição e na
expansão do espaço urbano. Era a ciência, impondo-se no campo de estudo e no planejamento
das cidades. Marcando o traçado urbano pela racionalidade, esperava-se que o uso desse
espaço timbrado pela razão levasse os homens, que nele se instalaram, a conformar suas
vidas pela razão. Era, portanto, um discurso e um espaço dominadores e autoritários para o
uso e a vida dos habitantes.
Inseridas na lógica que orientava a construção da capital, a Praça da Liberdade e a Rua
da Bahia se transformaram em espaços simbólicos para a cidade. Era o local ideal para a
construção de um clube elitizado. O MTC, também, se transformou em um símbolo de lazer
saudável e moderno, portanto, representava a modernidade da cidade e inspirava aqueles que
o freqüentavam a se tornarem também modernos.
81
De acordo com Foucault (2002), a questão do poder perpassa, além das relações
estabelecidas entre os habitantes da cidade, a própria geografia do seu espaço. Assim, o
espaço se transforma em um lugar de exercício e visibilidade das relações de poder. Para ele,
o poder não é um objeto, mas relações, ou melhor, um feixe de relações. O poder é algo que
se estabelece no interior das relações entre os homens. É no espaço (elemento fundamental em
qualquer vida comunitária) que boa parte das relações entre os indivíduos são estabelecidas e
é a partir das relações e do próprio espaço que serão determinados seus usos e
comportamentos adequados. Nesse sentido, as pessoas inseridas em um espaço no qual
estabelecem relações internalizam o discurso da dominação, vigiando seus pares e se
deixando vigiar.
O MTC foi construído na Rua da Bahia, próximo à Praça da Liberdade e se
transformou em símbolo de poder de um segmento social importante e de uma época de
investimento na modernidade. A sua arquitetura foi coerente com o mesmo propósito. Em
ambos, localização espacial e arquitetura, o discurso técnico estava presente, destacando a
higiene, a racionalidade, a eficiência. Dessa forma, acabou por solidificar entre seus sócios
uma identidade vivenciada pelas experiências partilhadas, em um espaço que adquiriu
significado especial.
3.5 Revista MTC: a incorporação de ideais de beleza e ordem
Nos anos de 1930 cresceu no Brasil a circulação de revistas que versavam sobre a
educação física
13
e, portanto, cresceu a sua contribuição para a melhoria da saúde e dos
hábitos higiênicos da população. As revistas e jornais publicavam artigos que faziam
referências sobre a importância do esporte para a população, sobre o cuidado com o corpo e
ensinavam práticas higiênicas. Enfim, o objetivo era incutir nos brasileiros a necessidade de
eles incorporarem esses novos hábitos, que redundariam em bem-estar pessoal e melhoria do
rendimento no trabalho. Além de valorizar o esporte, como um requisito para o equilíbrio
entre o desenvolvimento do físico e do espírito, pois, o corpo educado fisicamente favorece as
faculdades morais. (LENHARO, 1986).
13
Como Revista de Educação Física; Educação Física; Revista Brasileira de Educação Física; Boletim de
Educação Física, entre outras.
82
Essas revistas, no entanto, foram se transformando em veículos de propaganda, na
medida em que contribuíam para a divulgação doutrinária do regime varguista através dos
artigos esportivos. As revistas especializadas de educação física procuravam divulgar a
prática de esporte como um ideal de desenvolvimento nacional. Dessa forma, a propaganda
doutrinal estatal podia "ser percebida pelo papel das revistas e jornais direta ou indiretamente
ligados ao governo". (OLIVEIRA, 1982, p. 11).
Desse modo, a Revista MTC representou, em certa medida, um instrumento de
expressão de idéias harmonizadas aos objetivos de Vargas e do Estado Novo. Como toda
publicação da época, na revista, havia um tom patriótico em quase todos os artigos, mesmo
naqueles referentes ao MTC. Lembrando que o Estado Novo tinha sob seu controle a
imprensa, os espaços dos veículos de comunicação eram usados para a propaganda do regime
das mais variadas formas. A Revista MTC também se transformou em um instrumento de
divulgação do regime em relação ao esporte de acordo como os moldes ditados pelo Estado
Novo, permitindo ao leitor afirmar as suas convicções nacionalistas por meio de um conteúdo
social útil e um sentimento firme de dedicação ao bem comum.
A concepção que norteava a produção dos textos e das fotos era a de mostrar a
presença na cidade de um clube moderno, alinhado com os setores médios e altos da
sociedade local e que tinha um papel fundamental para o desenvolvimento do esporte em Belo
Horizonte, seguindo as orientações governamentais. O clube, portanto, demonstrava a sua
posição elitista, em sincronia com as idéias estatais sobre o papel das elites na reconstrução
nacional.
A Revista MTC foi organizada por Francisco Fernandes e Gastão Fernandes dos
Santos e surgiu, em 1941, para enfocar a contribuição do clube para o desenvolvimento do
esporte em Minas Gerais. Ela se propunha a mostrar ao leitor como era o MTC, qual a sua
finalidade e esclarecia que o clube não era apenas um parque esportivo como outros que
existiam no Brasil. Segundo os seus organizadores, no entanto, era
[...] uma organização de caráter educativo. É uma escola de civismo. Dentro das
suas salas e de seus campos de treinos, a mocidade se apura e se requinta. Prepara-se
o cidadão perfeito, o homem sadio, útil ao seu meio e a sua pátria. (REVISTA
MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, s.p., Acervo MTC).
A intenção dos organizadores da revista era de que ela fosse uma publicação
informativa sobre o MTC, mas que também tratasse de temas sobre a importância do esporte
83
para o desenvolvimento físico e moral da juventude, como outras existentes no Brasil.
'MINAS TENIS CLUBE' é uma publicação que se fazia necessária e que aparece
agora, para focalizar a contribuição valiosa do Clube que lhe empresta o nome, na
formação sadia do nosso povo. A certeza de que se poderia fazer uma publicação do
gênero, rivalizando com as mais estimadas revistas do país, encorajou-nos e fez-nos
sentir a responsabilidade moral que nos prende a esse álbum [...]. (REVISTA
MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, s.p., Acervo MTC).
Tecia alguns artigos e comentários sobre a cidade de Belo Horizonte e possuía
inúmeras propagandas do comércio local, que, de acordo com os editores, contribuíram para a
confecção da revista.
Em um plano mais "oficial", a revista não somente publicava o perfil dos políticos da
época, como também suas realizações e suas respectivas fotos. Os homenageados foram o
governador Benedito Valladares e os seus secretários, o prefeito Juscelino Kubitschek e o
presidente Getúlio Vargas. Desse último, reproduziu-se um trecho do seu discurso
pronunciado na inauguração do MTC
14
e fotos da sua visita ao clube.
A maior parte da revista, todavia, foi dedicada ao MTC. Exaltava a sua organização
moderna, os seus fundadores e o trabalho deles na direção clubística. O clube, na visão da
revista, representava a modernidade em Belo Horizonte. Essa modernidade podia ser vista
nas suas linhas arquitetônicas, no parque esportivo, na divisão do clube em departamentos
esportivos, de medicina e de fisioterapia modernamente equipados, nas festas marcadas pela
alta distinção, nos torneios esportivos, na sua piscina e também pela sua administração,
considerada, à época, admirável.
Os textos e as fotos, que os acompanhavam, serviam como suporte publicitário para a
atuação do clube e os benefícios que o esporte, ali praticado, estava trazendo para os sócios.
Não visava a uma discussão analítica, o conceito presente nesses artigos era o de mostrar o
clube como um esforço de um grupo em trazer a modernidade do hábito da prática de esportes
para a capital. As imagens fotográficas buscavam reforçar o seu caráter de objetividade e de
irrefutabilidade da prova fotográfica nos eventos do clube, fazendo valer a sua qualidade
visual de dar credibilidade à ação fotografada.
Os organizadores pensavam em transformá-la em uma revista educativa para os
mineiros.
14
Ver p. 152.
84
E no dia em que apresentar-mos aos leitores de toda Minas, uma revista periódica
que deverá ser editada sob nossa responsabilidade, sentiremos na obrigação de
afirmar que manteremos o bom nome e o progresso da imprensa brasileira,
aprimorando-a cada vez mais, focalizando na sua parte literária os nomes mais
destacados da intelectualidade mineira e tornando-a o espêlho da cultura física de
nossa gente. (REVISTA MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, s.p., Acervo MTC).
Na primeira página, traz um artigo de Luiz de Bessa sobre os benefícios do esporte: "O
esporte há de participar do programa quotidiano de cada um como uma atividade normal, uma
prática salutar, um diversivo útil". (REVISTA MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, s/p, Acervo
MTC). O clube procurava, assim, divulgar entre os sócios a necessidade da prática de
esporte.
Ela publicou também trechos retirados do livro "A Função Social dos Desportos" de
João Lyra Filho, presidente do Conselho Nacional dos Desportos, órgão que tinha como
função orientar, fiscalizar e incentivar a prática dos desportos em todo o país. De acordo com
esse autor,
[...] os desportos constituem instrumento útil ao Poder Público, para acordar o
sentimento de confraternização social e situar o nivelamento das camadas populares,
além de propagar a sua própria organização. [...] Afugentam o desânimo, diluem
preocupações nocivas, combatem o tédio, o desencanto, o desinterêsse pela vida. [...]
E se isso não bastasse, mais do que isso, o relêvo da sua expressão social importará a
certeza de que eles arregimentam os sentimentos da juventude, que se prepara para a
compressão cívica de que as energias que os desportos vitalizam e os entusiasmos
que retemperam são captados, em aura do otimismo fecundo e confiança espontânea,
para a defesa da Pátria, que a juventude também trabalha, de alma sacudida na
esperança, no espírito mobilizado no ideal e corpo treinado para os combates de
qualquer luta. (REVISTA MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, s/p, Acervo MTC).
Artigos sobre o clube e suas atividades esportivas reproduziam o espírito que norteava
o Estado Novo. O artigo abaixo sobre a descrição do MTC, escrito por um autor anônimo, é
revelador da introjeção de um espírito nacional que privilegiava a ordem e a disciplina e que
também marcava Belo Horizonte.
Quem visita o Minas Tênis Clube, recebe a impressão forte de disciplina e ordem.
Cada departamento com o seu responsável; cada secção com seu técnico. Não
energias perdidas e forças desaproveitadas. Cada qual na sua esfera de ação, age
com absoluta independência. A diretoria, atenta às menores necessidades, e ao
reparo de tôdas as falhas, é um órgão de comando e fiscalização. Esse
aparelhamento impressiona pelo trabalho de todas as suas peças e pela ordem que
em tudo se observa. Cabe à diretoria, todos os louros desta organização modelar. Os
seus membros escolhidos entre os vultos de maior destaque de nosso meio social
85
empregam todas as suas energias no engrandecimento desta obra de grande alcance
educacional e patriótico. [...] As suas instalações modernas, as linhas elegantes do
edifício principal, os traçados do seus campos de jogos, a auteridade das suas salas
de recepção e festas, são um atestado do bom gosto do povo mineiro. [...] Não
fadigas naquela casa em que se trabalha pelo aprimoramento da nossa raça e pela
robustez da nossa gente. Sob o ponto de vista cultural tem sido inestimável o
concurso do Minas Tênis Clube. As festas de arte que ali freqüentemente se realizam
têm sempre um cunho de alta distinção e marcada elegância. (REVISTA MINAS
TÊNIS CLUBE, 1941, s.p., Acervo MTC).
O MTC estava, portanto, em sintonia com o elogio da alegoria do corpo saudável.
Essa idéia era divulgada pelos teóricos do Estado Novo, que associavam o corpo saudável ao
desenvolvimento da nação
[...] a uma totalidade orgânica, à imagem do corpo uno, indivisível e harmônico; o
Estado também acompanha essa descrição, suas partes funcionam como órgãos de
um corpo tecnicamente integrado; o território nacional, por sua vez, é apresentado
como um corpo que cresce, expande, amadurece; as classes sociais mais parecem
órgãos necessários uns aos outros para que funcionem homogeneamente, sem
conflitos; o governante, por sua vez, é descrito como uma cabeça dirigente e, como
tal, não se cogita em conflituação entre cabeça e o resto do corpo, imagem da
sociedade. (LENHARO, 1986, p. 16-17).
Analisando os artigos acima, percebe-se uma semelhança muito grande entre os dois
discursos, que privilegiam a ordem e a disciplina a partir de um todo no qual as partes agem
com independência, mas em perfeita harmonia. Como o corpo humano em que a cabeça é o
guia e as partes lhe devem obediência, seguindo critérios biologicamente estabelecidos. A
cabeça seria representada pela diretoria que era escolhida entre as pessoas ilustres de Belo
Horizonte, e, portanto, capacitadas para o comando firme e seguro do clube. Os outros
membros do corpo seriam representados pelos diversos departamentos, que trabalhavam em
parceria, numa cooperação mútua entre esses, a diretoria e os sócios, para alcançar a sua
missão patriótica e educacional. Essa revista se constituiu em mais um dispositivo de
alinhamento entre o MTC e as orientações do Estado Novo em relação ao corporativismo,
como forma de reordenamento da sociedade.
Na proposta corporativista, caberia ao Estado, por intermédio das elites dirigentes,
definir novas formas de organização e de participação. Os partidos e demais organizações
políticas eram concebidos como responsáveis pelos conflitos e por isso deveriam ser
substituídos por organizações que produzissem consenso. Todos tinham que colaborar para o
engrandecimento do país e abandonar divergências políticas e ideológicas. O governo se
86
encarregaria de dirigir a nação e a população deveria colaborar nesse sentido, por meio das
atividades cívicas e econômicas e não da política. Os sindicatos ficaram subordinados ao
governo e o Ministério do Trabalho seria o agente regulador dessas organizações ligadas aos
trabalhadores e empresários.
Para Lenharo (1986), a dinâmica da sociedade era comparada ao funcionamento do
corpo humano, pelos ideólogos do Estado Novo. Passava-se a mensagem para a população de
que a ordem material e a ordem política encontrariam o progresso por meio da cooperação
harmoniosa entre os diferentes grupos sociais e as atividades produtivas, como acontecia com
os órgãos do corpo. O Estado era comparado à cabeça que comanda o corpo. A ele cabia
intervir na dinâmica da sociedade, como instituição reguladora, para sanar as deformidades,
que poderiam afetar o progresso social. O governo deveria formular as diretrizes para a nação
e a população colaboraria nesse sentido. A idéia do corporativismo era manter a harmonia
entre a hierarquia social. Para Lenharo (1986), o corporativismo de Vargas propunha a
cooperação entre os grupos, como uma forma de manter a solidariedade entre eles e
neutralizar os conflitos sociais.
Capelato (2003) também propõe uma análise nesse sentido, mas chama a atenção para
outras propostas de análise desse período. A propaganda foi amplamente utilizada para
difundir a cooperação entre os grupos. Vargas procurava divulgar a imagem de cooperação
entre as partes, do trabalho conjunto e harmonioso e valorizar o sentimento de agregação e
pertencimento através da associação entre Estado, Nação, Pátria e povo. No livreto, o "Brasil
é bom", a lição três tem a seguinte narrativa: "Se todos os brasileiros são irmãos, o Brasil é
uma grande família. Realmente, é uma grande família feliz. Uma família é feliz quando
paz no lar. Quando os membros não brigam. Quando não reina a discórdia". (apud
CAPELATO, 2003, p. 124).
Para Capelato (2003), os elementos que constituem essa narrativa como família, paz,
amor, felicidade, concórdia implicam em cooperação entre o povo, visto como irmão. Esses
elementos "compunham a estrutura afetiva organizada para propor a unidade em torno de um
todo harmônico. Ao estimular esses sentimentos, pretendia-se neutralizar os conflitos através
da formação da identidade coletiva". (CAPELATO, 2003, p. 125). A política varguista tinha
como principal objetivo "a concretização do progresso dentro da ordem". (CAPELATO,
2003, p. 117).
O objetivo de Vargas era absorver a sociedade como um todo, suprimir as oposições e
incorporar ao Estado os grupos de pressão que a ela passam a se subordinar. A forma de
87
incorporação dos grupos, de natureza corporativista, era uma tentativa de remover, prevenir e
neutralizar os conflitos sociais, econômicos e ideológicos da sociedade. A integração dos
trabalhadores, nesse moldes, tinha o caráter de dádiva, concessão de um estado benevolente.
A relação que se estabeleceu entre Vargas e o povo tinha como modelo a família patriarcal: o
pai, como chefe da família, tem que disciplinar e compensar os filhos, que estão sob sua
tutela.
O artigo da Revista MTC também faz menção à preservação da ordem no clube e à
cooperação entre seus membros. A idéia presente nesse artigo é a mesma divulgada pela
propaganda estadonovista.
Figura 19 - Solenidade de inauguração oficial da praça de esportes do Minas Tênis Clube.
Vêem-se o Major Ernesto Dorneles discursando e a esquerda o Governador Benedito
Valladares e o Padre Clovis Souza e Silva e outros em 27/11/1937
Fonte: Acervo MTC.
88
Figura 20 - Inauguração do parque esportivo do
MTC em 1937. Hasteamento da bandeira do
clube pela senhorita Lucia Valladares, filha do
Governador Benedito Valladares
Fonte: Acervo MTC.
Figura 21- Vista do parque esportivo e da sede social no final da
década de 1930
Fonte: ACERVO MTC.
89
Figura 22 - Exibição de ginástica infantil, do professor
Macedo, no MTC, revela a preocupação do clube na
formação física e moral das crianças, advindas da prática de
exercícios (final da década de 1930)
Fonte: Acervo MTC.
Figura 23 – Visita de Getúlio Vargas ao MTC (1938)
Fonte: Acervo MTC.
90
Figura 24 – Visita de Getúlio Vargas ao MTC (1938)
Fonte: Acervo MTC.
Figura 25 - Visita de Getulio Vargas ao MTC em 1940
Fonte: Acervo MTC.
91
Figura 26 - Visita do Presidente Getúlio Vargas na inauguração da sede do MTC em
1940
Fonte: Acervo MTC.
Figura 27 - Vista aérea de Belo Horizonte tendo ao centro a Praça da Liberdade e a
direita o MTC (Década de 1940)
Fonte: Acervo MTC.
92
Figura 28 - Capa da Revista Minas Tênis Clube
Fonte: Revista Minas Tênis Clube (1941).
93
4 O MINAS TÊNIS CLUBE E O ESPORTE NA FORMAÇÃO DA JUVENTUDE DE
BELO HORIZONTE DURANTE O ESTADO NOVO
A fundação do MTC, em Belo Horizonte, em 1935, veio a desenvolver o esporte na
cidade e em Minas Gerais. A partir da sua inauguração, várias federações esportivas foram
criadas no estado, além de servir como modelo para a construção de outras praças esportivas
nas cidades do interior.
O clube procurava seguir as normas estabelecidas para o esporte, que foram
elaboradas pelos teóricos da educação física durante o Estado Novo. As atividades físicas
eram indicadas como instrumento de eugenia e para a melhoria da saúde. Por meio do esporte,
os especialistas esperavam desenvolver também os sentimentos cívico e patriótico dos
brasileiros.
A primeira diretoria do MTC foi composta praticamente pelos fundadores do clube.
Ela buscou incorporar, na prática desportiva do clube, os preceitos científicos e modernos
propostos para o esporte, naquele momento histórico. Isso teve início pelo projeto
arquitetônico da praça de esporte, que procurou seguir os padrões científicos e de higiene da
época, previsto para a adequada prática de esporte. Os técnicos esportistas foram selecionados
com rigor. Os profissionais contratados deveriam ser competentes, com experiência
comprovada na modalidade esportiva em que atuavam e ter conhecimento profundo sobre
esporte.
Os fundadores do MTC e as autoridades, que apoiaram a sua fundação, esperavam que
com essas medidas, os sócios, pela prática esportiva diária, viessem a internalizar os valores
agregados ao esporte como disciplina, coragem, espírito de competitividade, vigor físico,
melhoria da saúde, entre outros. O clube estaria dessa forma preparando a juventude que o
freqüentava para servir a pátria.
O esporte tornou-se um componente significativo para os minastenistas. Era
considerado uma prática moderna, que veio a alterar o modo de viver dos jovens da capital,
que, de certa forma, ligava-os à vida moderna e urbana. O MTC se transformou, por
excelência, em um espaço destinado ao esporte, mas também incrementou a vida social da
pacata capital mineira. As atividades esportivas e sociais do clube fizeram dele um local
moderno, sem, contudo, ser um local desligado totalmente dos valores tradicionais da
sociedade. Ali a modernidade e a tradição se fundiram e por meio dessa a fusão que os sócios
94
passaram a incorporar os valores modernos e nacionalistas caros aos dirigentes do país.
Aos jovens eram destinados as maiores atenções do clube, pois considerava-se que o
futuro da nação estava na juventude, que deveria ser preparada para dirigi-la. Seguindo essa
linha de ação do governo, o clube da elite de Belo Horizonte procurou, por meio do esporte e
das cerimônias cívicas ali realizadas, incutir nos jovens atletas o espírito patriótico e
pragmático. Segundo D. Terezinha Vargas, "o Minas desempenhou um papel fantástico nessa
juventude. Tão dedicado ao esporte, tão saudável!". (Depoimento Informal).
15
4.1 O Minas Tênis Clube: auxiliando na formação dos corpos úteis à Pátria
A educação e o esporte, no período que abrange os anos de 1920 a 1930, no Brasil,
careciam de uma abordagem moderna, tecnicamente racional e fundamentada em bases
científicas. Esse quadro começou a mudar com a reforma educacional do Distrito Federal,
empreendida por Fernando de Azevedo, em 1928, que propôs a criação da Escola Profissional
de Educação Física. Essa proposta visava a
[...] instrumentalizar os professores de Educação Física para a realização de uma
prática pedagógica fundamentada em bases técnicas (dadas no currículo pelas
disciplinas como teoria e prática de ginástica, dos jogos e do esporte) e científica
(Anatomia e Fisiologia Aplicadas ao Exercício, Fisiologia da Fadiga, Higiene,
Antropemetria Pedagógica, Didática). (PAGNI, 1995, p. 151)
Esperava-se que a moderna educação física, amparada por preceitos técnicos e
científicos, colaborasse para a melhoria física e moral do brasileiro. Desde o fim do século
XIX e nas primeiras décadas do século XX, estudos intelectuais procuravam explicar o atraso
brasileiro a partir de dois parâmetros: o homem e a terra, destacando a raça e o clima. Esses
fatores explicariam a "natureza indolente do brasileiro, as manifestações tíbias e inseguras da
elite intelectual, o lirismo quente dos poetas da terra, o nervosismo e a sexualidade
desenfreada do mulato". (ORTIZ, 1994, p. 16).
Assim, os organizadores da educação física no Brasil passaram, cada vez mais, a
relacioná-la aos processos de higienização social e eugenia desenvolvidos no país. Para
15
Dados da entrevista concedida pela Sr
a
Terezinha Vargas. Pesquisa de campo realizada em 10 abr. 2006.
95
Sant'Anna (2001, p.107, grifos nossos), a partir do momento em que a educação física foi
pensada como uma ciência, o corpo humano começou a ser concebido como "um organismo
que precisava receber uma formação para bem orientar seus gestos, corrigir o que é julgado
defeituoso em sua aparência e transformar potências em virtudes". Inseriram-se na educação
física ações médicas e pedagógicas, pois se acreditava que, por meio do desenvolvimento
saudável do corpo, educar-se-ia o caráter do indivíduo e fortaleceria a nação com cidadãos
saudáveis e moralmente preparados.
Os mecanismos internos do corpo passaram a despertar o interesse de médicos e
educadores, no sentido de obterem conhecimento para a transformação da aparência física e
da moral. Recomendavam a prática de exercícios físicos para os adultos, mas principalmente
para os jovens e as crianças, que eram considerados corpos em formação. A prática da
educação física, desde a mais tenra idade, poderia combater a fragilidade corporal e espiritual.
Na década de 1930 e 1940, mais precisamente durante o Estado Novo, com a
obrigatoriedade da educação física no ensino primário e secundário, a disciplina passou a ter
caráter pragmático e nacionalista, além da característica higienista que possuía. Procurava-
se inserir na sociedade, pela prática regular de exercícios físicos, a dupla necessidade de
adestramento do corpo, para o trabalho nas indústrias que estavam se formando e para servir a
Nação de acordo com as idéias de "segurança nacional". O jovem se prepararia para defender
a Pátria pela educação física. Essa especialidade permitia o contato com estratégias voltadas
para a competição e para a vitória, imprimia disciplina aos praticantes, fornecia noções de
trabalho em equipe e aperfeiçoava os sentidos humanos.
Durante o Estado Novo, o esporte e a educação física foram fundamentados em
preceitos técnicos e científicos e dessa forma, poderiam colaborar no desenvolvimento do
Brasil. Prestavam-se, pois, a preparar as novas gerações para o engrandecimento da nação e
corrigiriam as graves deficiências físicas e morais do brasileiro.
A Constituição brasileira de 1937 reafirmou a importância da educação física,
tornando-a parte integrante da política de educação do novo regime. Com essa medida, de
acordo com Inezil Marinho (1944), um dos teóricos da educação física no Estado Novo,
esperava-se:
[...] proporcionar aos alunos o desenvolvimento harmônico do corpo e do espírito,
concorrendo assim para formar o homem de ação, física e moralmente sadio, alegre
e resoluto, cônscio do seu valor e de suas responsabilidades, e preparar a mulher
para a sua ação no lar, dando-lhe ainda a possibilidade de substituir o homem em
96
trabalhos compatíveis com o sexo feminino, tornar cada brasileiro, de ambos os
sexos, apto a contribuir eficientemente para a economia e defesa da Nação. (apud
LIMA, 1979, p. 38).
Os ideólogos do Estado Novo viam o corpo como um objeto passível de adestramento,
segundo os diferentes segmentos sociais. Esperavam que o corpo fosse utilizado como uma
metáfora para a formação da nacionalidade. Peregrino Júnior, outro especialista da educação
física desse período, concebia-a como uma arma poderosa que auxiliaria na edificação da
nacionalidade e da formação do "novo" homem brasileiro.
O problema brasileiro e no caso particular da nossa terra e da nossa gente, neste
grave momento de introspecção brasileira, em que um dos grandes problemas do
Brasil é o de criar a consciência nacional do povo, a Educação Física é um elemento
principal dessa grande obra de construção cultural e formação espiritual do povo
brasileiro.
Sendo impossível, e além disso ilógico, dissociar o corpo do espírito, cuja unidade,
no pensamento de Carrel, é cada vez mais íntima e compacta, se pode cogitar de
melhorar as condições do homem brasileiro cuidando ao mesmo tempo de sua
cultura, de sua saúde, da sua estruturação moral, e isto se poderá conseguir com uma
sabia 'política biológica', como quer Pende, utilizando como elemento fundamental a
Educação Física, que nas múltiplas conseqüências morfológicas, fisiológicas,
espirituais e éticas permitir-nosaperfeiçoar os valores dirigidos e criadores das
elites e as aptidões produtoras das massas. Utilizando essa grande arma moderna da
estruturação humana, pelo esforço simultâneo nesses dois sentidos – o da preparação
cultural das elites e o da formação eugênica das massas, é que se poderá realizar
afinal o milagre da formação integral do Homem Brasileiro forte de corpo, claro
de espírito – puro de coração! (apud LIMA,1979, p. 21-22).
Nesse discurso, está presente à preocupação dos especialistas da educação física com a
formação do "novo" homem brasileiro, que foi idealizado de acordo com os valores
nacionalistas divulgados pelos ideólogos do Estado Novo: a ordem, a disciplina, a
cooperação, o patriotismo, o valor do trabalho, entre outros. A educação física, segundo o
pensamento da época, era um dos instrumentos que auxiliaria na tão idealizada
homogeneização do povo brasileiro cuja composição étnica se deu pela mistura das raças
branca, negra e indígena e na formação da sua consciência nacional. Esse "novo" homem
não teria, por sua vez, um tratamento idêntico durante sua formação. Observa-se que para
cada destinatário havia um projeto especifico com objetivos diferenciados. As elites deveriam
se aperfeiçoar nos valores dirigentes e criadores, para cumprirem seu papel de governantes da
nação e guias das massas. Para as massas, ficariam reservadas as aptidões produtoras e, para
97
elas, foi criado um programa de formação eugênica que se realizaria por meio da educação
física nos mais variados lugares nas escolas, nas casas, nos locais de trabalho. Assim, o
Estado esperava operar a transformação física e moral do trabalhador e sua família. Para
Peregrino Júnior, cabia à educação física a realização do milagre da formação integral do
homem brasileiro.
Diniz Osvaldo Magalhães, um dos colaboradores da Revista de Educação Física,
criada durante o Estado Novo, escreveu nesse periódico, em 1940, que a
[...] Educação Física é indiscutivelmente uma das bases para a formação de uma
nacionalidade forte e disciplinada. Em todos os lares, nas escolas, nos clubes, e em
toda parte, a Educação Física merece o apoio geral, pelo que ela prestara à raça
brasileira. (apud LIMA, 1979, p. 28).
Nesse período, foram criados e instituídos espaços para a educação física, à medida
que crescia, entre os intelectuais do Estado Novo, a possibilidade de utilizá-la como um
instrumento formador da consciência nacional e ser capaz de homogeneizar e combater a
fraqueza do povo brasileiro. Nas escolas, foram construídos espaços para a realização da aula
de educação física ou houve o reaproveitamento de áreas livres procurando adequá-las para
atender à moderna e científica disciplina curricular. Também foram construídos ginásios,
praças de esporte, estádios de futebol, associações esportivas, clubes. Essas construções
públicas ou privadas receberam apoio estatal, conforme previsto na Constituição de 1937, no
Art. 132.
O Estado fundará instituições ou dará o seu auxílio e proteção às fundadas por
associações civis, tendo umas e outras por fim organizar para a juventude períodos
de trabalho anual nos campos e oficinas, assim como promover-lhe a disciplina
moral e o adestramento físico, de maneira a prepará-la ao cumprimento dos seus
deveres com a economia e a defesa da Nação. (apud, LIMA, p. 38).
Getúlio Vargas, de acordo com Horta (1994), pretendia utilizar o sistema educacional,
e tudo aquilo que a ele estivesse ligado, para desempenhar a função de ajustar a juventude aos
moldes estabelecidos pelo Estado e inculcar nos jovens o espírito nacionalista.
O Estado passou então a fomentar a criação de espaços esportivos, incluindo os clubes
privados, cujas propostas de atuação se mostrassem confluentes com a do Estado para o
98
esporte. A fundação do MTC, em Belo Horizonte, deu-se nesse clima ideológico em que o
Estado apontava a educação física e a saúde como requisitos básicos para o fortalecimento da
nação. Para Horta (1994), durante o Estado Novo, houve uma forte ligação entre educação e
saúde, que foi traduzida pela ênfase cada vez maior na importância da educação física e dos
esportes, inicialmente voltados para o desenvolvimento físico individual, mas logo
relacionados ao fortalecimento da raça.
A ata de fundação do MTC é datada de 1935, porém o seu funcionamento aconteceu
de fato em novembro de 1937, após a construção do parque esportivo e no ano da instauração
do Estado Novo. A construção desse clube, pela elite belorizontina, recebeu o apoio estatal,
pois seus objetivos se enquadravam nas propostas do Estado para o esporte. A associação
esportiva e recreativa do MTC tinha por finalidade contribuir para o aprimoramento da
juventude e da infância por meio do esporte.
A juventude, pelo esporte desenvolvido em associações esportivas, preparava-se para
as obrigações da vida adulta. Tornar-se-iam jovens fortes, vigorosos e moralmente educados
para dirigirem e trabalharem para o engrandecimento do Brasil, ou seja, o esporte seria um
dos meios para operar a transformação desses jovens. Por isso, o Estado apoiava a construção
de associações esportivas, como o MTC, pois acreditava no potencial transformador desses
espaços para os jovens.
O esporte praticado no MTC deveria ser um instrumento capaz de educar as crianças e
jovens, que o freqüentavam, para servir o Estado em diversas situações: no trabalho, na
política, no comando do país, na guerra. Assim, esperava-se que os jovens minastenistas,
estimulados pela prática dos esportes de acordo com as normas e técnicas cientificas e
modernas estabelecidas pelos especialistas – tivessem sua natureza dominada e moldada,
conforme os ideais divulgados pelo Estado Novo.
Na época, o MTC se tornou o lugar onde os jovens minastenistas aprendiam a fazer o
correto uso da força física e moral, por meio dos esportes praticados e da ginástica. Ele passou
a ser um local onde ocorriam verdadeiros "espetáculos" de demonstração de força física e de
destreza.
99
Figura 29 - Ginástica Olímpica do Prof. Macedo no MTC
(1944)
Fonte: Acervo MTC.
Os campeonatos eram esperados com grande entusiasmo pelo público da cidade. A
imprensa carioca fazia constantemente elogios à organização do MTC e a sua contribuição
para o esporte brasileiro. O jornal O Globo o considerou um "prelúdio de uma obra
gigantesca" para o fortalecimento do esporte em Minas Gerais.
O certo é que o desenvolvimento esportivo de Minas Gerais se iniciou com a criação
do Minas Tennis Clube, sem nenhum favor, a instituição especializada mais perfeita
da América do Sul. Isso sem exagero, porquê na verdade, nem na Argentina, onde o
esporte básico alcançou rápido progresso, é possível conhecer uma obra semelhante.
Segundo a perfeição de suas linhas arquitetônicas, segundo, também, o moderno de
seus aparelhamentos médicos e de caráter preparatório.(...) Mas o Minas não ficou
naquilo que se deu a conhecer – um ponto preferido da aristocracia belo-horizontina.
Ele foi levantado em um buraco horrendo e se transformou em um templo de força e
de vida. Hoje, sob a direção do Sr. Olinto da Fonseca filho, ex-diretor da Imprensa
Oficial e ex-oficial do gabinete do Governador Olegário Maciel, sua carreira
continua brilhante não mais uma academia de nadadores e atletas perfeitos apenas
– mais palco de exibição, ou melhor, a primeira banca examinadora para todos
aqueles que se revelam devotos da cultura física no interior do progressista Estado.
(O GLOBO, 29 dez 1942, Acervo MTC, grifos nossos).
100
Várias atividades relacionadas ao esporte ali ocorriam: treinos, campeonatos, entregas
de medalhas e troféus, reuniões das federações esportivas do estado, etc. Havia também uma
forte preocupação com a saúde dos sócios e dos esportistas. As comemorações esportivas do
clube, muitas vezes, eram realizadas em datas cívicas, que acabavam por se transformar em
atividades de cunho patriótico, como previsto pelos idealizadores do regime varguista.
Os desfiles oficiais, durante o governo de Vargas, transformaram-se em verdadeiras
demonstrações de força física e saúde da juventude. De acordo com Parada, a figura do jovem
nacional deveria ser sadia, forte e disciplinada, para fazer dele um padrão de civilidade e
civismo. A educação física se transformou em um instrumento de revigoramento da raça e de
preparação do futuro cidadão. "O ideal do jovem encontrava sua plena realização nos desfiles
públicos, momento em que a educação física tornava-se educação cívica." (PARADA, 2006b,
p. 58).
Os campeonatos de esporte do MTC eram iniciados com o canto do hino nacional,
hasteamento da bandeira brasileira, discurso proferido por autoridades, que aproveitavam a
ocasião para ressaltar a importância do esporte para o desenvolvimento das futuras gerações e
o papel delas para a Nação. Esse foi o modelo de festa de inauguração da sede social do clube,
em 1940. Nessa festa, compareceu o presidente Getúlio Vargas. Houve um desfile dos jovens
e das crianças no MTC para o presidente. A Folha de Minas noticiou que cerca de três mil
atletas desfilaram, nesse dia, no clube.
Hoje finalmente o presidente Getulio Vargas terá ocasião de receber da parte da
mocidade forte de Minas Gerais uma grande consagração que deverá constituir uma
das mais significativas festas de caracter cívico realizadas em Bello Horizonte.
Cerca de 3.000 atletas, moços e moças da nossa Capital concentrar-se-ão no
magnífico parque de esportes do Minas Tennis Clube onde o presidente da
Republica, acompanhado do governador Valladares, secretários de Estado e varias
outras altas autoridades presentemente em Bello Horizonte assistirá o grande
espetáculo cívico esportivo que a juventude mineira preparou para demonstrar sua
sympathia e seu respeito pelo Magistrado do Paiz. (FOLHA DE MINAS, 12 maio
1940, IEPHA).
Essas festividades do clube se transformaram em momentos de propagação de valores
cívicos, conforme a nota do jornal. Em discurso de inauguração da sede do MTC, o presidente
ressaltou a importância do esporte e do clube para as novas gerações.
101
Ao inaugurar as installações do Minas Tennis Clube expressão de nosso carinho pela
cultura physica, quis exprimir o meu louvor a tão feliz iniciativa, não apenas com a
minha presença, mas através de palavras que desejo sejam ouvidas por todos os
brasileiros como estímulo a empreendimentos semelhantes. Bem compreendo o
alcance e a importância immediata do problema de melhoria das condições physicas
do homem. Os vossos administradores não cessam de empenhar-se pela obtenção
dos meios adequados ao aperfeiçoamento e empenho das novas gerações. A
construção do moderno e amplo estádio que inauguramos feita pelo próprio
Governo, exemplifica esse louvável empenho que se traduz no levantamento de 35
praças de jogos atheticos nas principais cidades do Estado.(...) Impulsionar, o mais
largamente possível, a cultura physica é obra sadia de brasilidade. A educação dos
corpo, na ampla acepção da palavra significa também o cultivo de nobres e
exellentes atributos do espírito. Não a robustez e a saúde physicologica a
conseguem nos gramados e quadras desportivas. A agilidade, a destreza, a
resistência muscular estimulam e fortalecem aptidões intelectuais de alta
ascendência no desenvolvimento harmônico da personalidade. (FOLHA DE
MINAS, 14 maio 1940, p. 14).
Para uma participante da festa esportiva, que contou com a presença do presidente
Vargas, o número alto de jovens na comemoração decorreu da imposição das autoridades da
época.
Eles resolveram trazer o Getulio Vargas para fazer a inauguração do Minas e
queriam encher o Minas de gente no dia da chegada do Getúlio. E o que passou pela
cabeça deles? Eu não posso dizer com certeza, porque eu era menina. Eu tenho a
impressão que obrigaram as freiras dos principais colégios daqui a encher aquelas
arquibancadas. E na inauguração nós tivemos que fazer aquela volta olímpica na
piscina. Ia os petizes na frente, depois os juvenis, depois os adultos moças e rapazes.
(Depoimento Informal).
16
Dessa forma, o MTC se mostrava sintonizado com as propostas estabelecidas pelo
Estado Novo para o esporte e sua contribuição para a sociedade brasileira, na formação de
corpos úteis à pátria. Eram valorizadas, nesse período, as práticas esportivas que estivessem
respaldadas pelo rigor da ciência e da técnica moderna. Práticas que pudessem responder aos
desafios da construção racial do brasileiro, resultassem em ações úteis à sociedade, e
atendessem à necessidade de fortalecimento do patriotismo e da nacionalidade.
16
Dados da entrevista concedida pela Sr
a
Célia Laborne Tavares. Pesquisa de campo realizada em 13 mar. 2006.
102
4.2 Eugenia, nacionalismo e saúde no MTC
Os pressupostos que norteavam a educação física, durante do Estado Novo, eram
recortados pelas idéias eugenistas, sanitaristas e nacionalistas. O esporte se transformou em
uma ferramenta por excelência para se desenvolver práticas voltadas para a purificação social,
racial e nacional.
O esporte quando sintetiza a defesa do prestígio de uma bandeira, tem as cintilações
puríssimas das cruzadas cívicas. É uma centelha divina a deflagrar faíscas de
patriotismo. Envolve no manto da esperança todo o sentimento nacionalista de um
povo. É por isso mesmo de uma doçura e de uma grandeza sem par. Todo o país tem
a mística da vitória. Todo povo tem seus sonhos de glória. Em cada ser humano vive
latente o ideal do triunfo. (REVISTA SPORT ILUSTRADO, 1941, s.p.,. Acervo
MTC).
A juventude tornou-se o alvo das atividades físicas e esportivas, pois se tinha, na
época, uma concepção de juventude sadia, forte e bela, apta a servir à pátria e que deveria
estar perfilada aos ideais do regime.
O MTC, como uma organização desportiva e recreativa, buscou incorporar em seus
discursos as intenções higienistas e eugenizantes propagadas pelo Estado. Assim, a fundação
do MTC foi marcada por idéias e representações sociais vinculadas aos sinais do ideário
civilizatório varguista, que era composto, entre outras, pelas idéias higienistas, sanitaristas,
eugenistas e nacionalistas. O MTC buscou desenvolver o esporte baseado em métodos
científicos para o aperfeiçoamento físico dos sócios, como comprova a nota jornalística.
Minas Tennis Clube, ponto de referência do programa de educação física do governo
das alterosas. Formando atletas e educando a infância e a juventude mineira.
Dirigentes e técnicos a serviço exclusivo da eugenia. [...] A preocupação do club é
cuidar do aperfeiçoamento físico da infância e da juventude mineira, de acordo com
os melhores métodos científicos. (A NOITE, 23 dez 1942, Acervo MTC, grifos
nossos).
Como a juventude representava o progresso anunciado, era sobre ela que recaiam as
expectativas da formação planejada do povo brasileiro. Foi para uma parcela da juventude de
Belo Horizonte, portanto, que o MTC se voltou, mas sua ação teve repercussão em todo o
estado. À época, foi anunciado que essa agremiação
103
[...] se projetou em toda nossa vida social e esportiva e cuja influencia se irradiou
por todo o Estado, preparando gerações para um futuro mais sadio. [...] O Minas
Tênis Clube continuará a sua grande obra, que é verdadeiramente patriótica e
civilizadora. (FOLHA DE MINAS, 12 nov 1942, Acervo MTC, grifos nossos).
Os sócios fundadores do MTC tomaram algumas medidas para pôr em prática o
ideário civilizatório divulgado pelo Estado Novo. Eles tiveram o cuidado de contratar técnicos
esportivos especializados, médicos, fisioterapeutas, tudo em conformidade com os preceitos
científicos e modernos do esporte e segundo as orientações governamentais. O MTC passou a
figurar como uma entidade capaz de atuar na formação da juventude que o freqüentava,
preparando-a para o compromisso de construção nacional. Interessava aos dirigentes
estadonovistas o corpo jovem, belo e forte, mas também a conformação de um espírito
disciplinado e inteligente. Corpo e espírito preparados para os projetos de construção
nacional.
O esporte do MTC se revestia dessa intenção, como sugere a nota jornalística sobre a
festa em homenagem ao Major Ernesto Dorneles, chefe da polícia local, no MTC, e que
ganhou destaque nos jornais da cidade. O major foi lembrado pela sua contribuição para a
educação da mocidade de Belo Horizonte, pelo incentivo de um programa educativo,
esportivo e social durante a sua gestão administrativa no MTC. O major Ernesto Dorneles, ao
discursar, reafirmou a importância do trabalho do governador Benedito Valladares para a
educação física e do clube para a juventude. Segundo foi noticiado, o major
[...] exaltou a figura do Governador Benedito Valadares, acentuando a importância
extraordinária de sua obra no sentido de aprimorar a educação física da nossa
mocidade. O Minas Tênis era um documento do desvelo governamental pela nossa
juventude e, por isso, todos os que tiveram responsabilidades na direção daquela
praça de Esportes constantemente rendiam o testemunho do seu apreço ao Chefe do
Governo Mineiro. (JORNAL MINAS GERAIS, 1 nov 1942, Acervo MTC, grifos
nossos).
O chefe da delegação do Palestra Itália de São Paulo Dom Antonio D'Ângelo Netto fez
elogios ao MTC, destacando o apoio da entidade para o desenvolvimento da cultura física e
do aprimoramento da raça.
Minas Tennis Club, realização digna dos centros mais adiantados do mundo. Minas
Gerais, berço do primeiro grito da independência política do Brasil, inaugura uma
nova fase da cultura phyfica para a independência da raça. (FOLHA DE MINAS, 2
dez 1937, Acervo MTC).
104
Os teóricos da educação física, do Estado Novo, se preocupavam com juventude por
considerá-la um momento da vida perigoso, sujeito a desvios. Uma forma de impedir os
desvios dos jovens seria pelo controle dos seus corpos e ideais. Criou-se, então, uma estreita
relação entre os médicos e os professores de educação física e técnicos esportistas. O objetivo
era aproximar o esporte da Biologia e da Psicologia na busca da melhoria física e moral das
futuras gerações de atletas.
O MTC procurou associar a sua atividade esportiva aos conhecimentos médicos e
fisioterápicos, para melhor aproveitamento das forças físicas dos atletas e na procura da
melhoria da saúde dos sócios. Procurou implantar simultaneamente as atividades médicas e
esportistas, com a intenção clara de promover um trabalho esportivo e sanitário mais
completo para os jovens minastenistas. Havia por parte do clube uma rigorosa observação às
regras técnicas do esporte e a moral da época, para disciplinar os jovens, de acordo, com os
valores morais e cívicos do momento.
Nesse momento histórico, o professor de educação física assumiu um papel
significativo na educação formal da juventude. A sua função consistia em auxiliar, de forma
edificante, a formação e preparação física, cívica e moral das novas gerações, por meio das
atividades físicas. O seu papel teria que ser o de reformador dos corpos e espíritos dos jovens,
que serviram à nação.
Para Lima (1979), a Divisão de Educação Física do MES, em 1938, realizou um curso
de preparação e qualificação do professor de educação física. O objetivo desse curso era
estabelecer as qualidades e obrigações do profissional de educação física, isto é, capacita-lo,
no campo da técnica e no da moral, para atuar em qualquer espaço esportivo, e, seguindo as
orientações cientificas para a disciplina.
Inezil Marinho, em 1941, escreveu um artigo para o Boletim de Educação Física, no
qual esclarecia as qualificações que deveria apresentar o profissional de educação física.
O professor de Educação Física de hoje impõe-se pela dose de conhecimentos
científicos de que está dotado. A sua formação não é empírica, autodidática; ciências
básicas a alicerçaram; os seus conhecimentos provieram da biologia educacional, da
psicologia educacional e sociologia educacional. (apud LIMA, 1979, p. 75).
E ainda, segundo Marinho, esse profissional deveria possuir qualidades pessoais:
deveria ter firmeza de caráter, vitalidade, domínio pessoal, alegria, disposição mental para o
trabalho, tato, boa atitude e apresentação, voz. Deveria ter preparo técnico pra ministrar,
105
organizar e administrar o desenvolvimento físico, moral e intelectual das crianças e jovens. E
mais: organizar desfiles, demonstrações coletivas e solenidades cívicas. (LIMA, 1979, p. 76-
77).
Os teóricos da educação física, do Estado Novo, esperavam ao privilegiar essas
características nos professores e técnicos ligados às atividades físicas, que ao ministrarem
suas aulas ou coordenarem os treinos, que as suas características pessoais fossem repassadas
para as crianças e jovens e que estas as inspirassem. Assim, eles estariam atuando como
reformadores do físico e da mente dos atletas e estudantes. O profissional do esporte, dotado
de conhecimentos biológicos, psicológicos e sociológicos estaria apto a trabalhar em conjunto
com os médicos, pedagogos e outros, na busca da melhoria da saúde das novas gerações.
O MTC, ao aproximar as atividades médicas, fisioterápicas e a esportista, passou a se
constituir em um local de práticas esportivas e de lazer orientadas para a socialização
nacionalista e moderna do corpo e da mente dos minastenista. A sua proposta se mostrava em
sintonia com um conjunto de enunciados elaborados para o esporte, durante o Estado Novo,
para a construção do "novo" homem brasileiro. São eles: saúde, esporte, educação, higiene,
eugenia, civismo, disciplina, ordem entre outros. Esses enunciados, a princípio dispersos,
foram agrupados no MTC, sob a regência dos médicos, técnicos esportistas e funcionários que
procuravam incorporá-los às atividades diárias do clube. Era função desses profissionais
fazerem os sócios assimilarem esses conceitos durante a permanência no clube, por meio das
atividades esportivas e sociais.
O clube, para os freqüentadores, era uma escola, onde se aprendia a praticar esportes e
a seguir a moral da época.
O clube sempre primou pela honestidade. Eles chamaram até a gente de muito
rigorosos, porque tudo que não fosse muito correto, muito educativo não era
permitido. O Minas foi uma escola para Belo Horizonte naquela época. Tinha
sempre um funcionário que controlava as pessoas se o comportamento não estivesse
de acordo com a época. Tinha um treinamento muito programado. Os treinadores
eram duros ali, para a gente fazer a coisa direito. (Depoimento Informal).
17
Gerson Sabino foi o responsável por organizar o MTC e também o primeiro técnico de
basquete de Belo Horizonte. Ele trabalhou no clube treinando atletas por anos. Segundo
RODRIGUES (1996), Gerson Sabino era considerado um amante do esporte e uma das
pessoas mais bem informada sobre basquetebol. Ficou a cargo dele contratar pessoal
17
Dados da entrevista concedida pela Sr
a
Célia Laborne Tavares. Pesquisa de campo realizada em 13 mar. 2006.
106
especializado para a gerência do MTC e para coordenar as atividades esportivas, pois em Belo
Horizonte, nessa época, não havia especialistas na área esportista, estes deveriam vir de fora.
Ele procurou contratar profissionais qualificados e especializados para trabalharem no clube.
Assim, ele trouxe Carlos Joel Neli para gerenciar o MTC. Para Sabino, ele era
dinâmico, disciplinado e tinha grande conhecimento sobre esportes e "tinha acabado de voltar
das Olimpíadas de Berlim e eu achei que ele poderia fazer aqui aquele colosso". (apud,
RODRIGUES, 1996, p. 112). O fato de ele ter sido chefe da Gazeta Esportiva de São Paulo,
um dos primeiros jornais a dar ênfase ao esporte no Brasil, também lhe dava muita
credibilidade. Por seu intermédio, foram criadas em Minas Gerais as federações
especializadas de basquete, vôlei, natação e tênis. Para Hugo Werneck, o MTC deve muito a
Joel Neli.
A mentalidade que existia naquele tempo era dada pelo major e por um sujeito
chamado Carlos Joel Neli. Era um paulista extremamente sério nas coisas dele, era
quase germanicamente... o Minas andava que era uma beleza [...]; ele colocou aquilo
quase como uma estrutura. Quando a gente entrou para o Minas, a gente esbarrava
com aquela figura austera, simples, e amiga. (apud RODRIGUES, 1996, p. 113).
Seguindo as orientações de seus fundadores, O MTC deveria investir em especialista
que pudessem desenvolver o esporte entre os associados do clube. De São Paulo, Gerson
Sabino trouxe também o técnico de natação Carlos de Campos Sobrinho (Carlito) e o técnico
de tênis Augusto Gaggeti, profissionais reconhecido na época.
Carlito foi contratado como técnico de natação, mais tarde, com a saída de Joel Neli
assumiu também a gerência do clube. Ele foi técnico da Federação Paulista de Natação entre
1933 e 1936, e, durante os Jogos Olímpicos de Berlim, comandou a equipe brasileira de
natação. Incentivou a criação da Federação Mineira de Natação e teve um papel importante na
organização e desenvolvimento da natação em Minas Gerais. Para o MTC, ele se tornou uma
figura lendária. A disciplina, um dos componentes do projeto de ordem social no período, era
muito exigida no comportamento dos nadadores do MTC pelo Carlito. Para D. Avani Santana,
o Sr. Carlito era um cnico exigente durante os treinos: "O nosso técnico era fabuloso, o
Carlos, o seu Carlito. Ele foi anos e anos nosso técnico. Aprendi a nadar com ele. A gente não
podia nem fazer assim com a mão... tinha que nadar direito. Espetacular". (Depoimento
Informal).
18
18
Dados da entrevista concedida pela Sr
a
Avani Santana. Pesquisa de campo realizada em 05 abr. 2006.
107
Figura 30 - O técnico de natação Carlito entre as nadadoras
Sieglinda e Maria Lenk. (1937)
Fonte: Acervo MTC.
O professor Augusto Gaggeti era técnico da família Matarazzo, em São Paulo, quando
foi contratado pelo MTC. Ele permaneceu por quase quarenta anos no clube e era considerado
paciente, competente e persistente em seus objetivos.
O professor Macedo era responsável pela ginástica no MTC e antes de ser contratado
por Gerson Sabino, dava aulas de ginástica no Parque Municipal. No clube, ele cuidava da
ginástica infantil, masculina e feminina. Era considerado o melhor da ginástica no Brasil e um
profundo conhecedor do esporte e da psicologia.
Ele conseguia reunir 'bandos' de crianças em seu gramado. Como, naquela época, as
demonstrações de ginástica que envolviam um grande número de executante eram a
tônica de qualquer comemoração oficial, em que se mostrava a juventude sadia,
ordeira e patriótica, vamos encontrar as crianças do professor Macedo em todas as
festas do Minas, desde a sua inauguração. As revistas da época, como, por exemplo,
a Revista de Educação Física, publicavam constantemente fotos das atividades
'extraescolares' de Educação Física desenvolvidas no MTC. (RODRIGUES, 1996, p.
121).
108
Gerson Sabino contratou o Dr. Hélio Tavares para dirigir o departamento médico,
muito elogiado pela imprensa, em função do trabalho desenvolvido em conjunto com o
esporte.
Também o Minas Tennis Clube possue modelar Departamento Medico a direcção
está entregue ao médico Helio Tavares especialista em Educação Physica.
Opportunamente faremos commentarios sobre o Departamento do elegante clube-
padrão. (SPORT ILLUSTRADO, 7 dez 1939. Acervo MTC).
Os médicos Drs. Jair Roiz Pereira e Jacy Roiz Pereira também foram contratados e
receberam a missão de desenvolver a fisioterapia no clube. Em depoimento a Rodrigues
(1996), Gerson Sabino relatou que se deparou com uma publicação estrangeira que falava
sobre a fisioterapia e massagens. Logo em seguida, procurou os dois médicos e entregou a
eles o livro para que estudassem a possibilidade de implantação da técnica no MTC. Dessa
forma, segundo o depoente, nasceu a fisioterapia em Belo Horizonte. O MTC foi apontado,
mais tarde, como o pioneiro na medicina esportiva em Belo Horizonte. Esses médicos eram
respeitados pelo trabalho de pesquisa que realizavam: "Dr. Jair Roiz Pereira – dedica-se desde
1939 ao estudo da hipertensão arterial e ele e o irmão dirigem o departamento de fisioterapia
do Minas Tênis Clube". (A MANHÃ, 2 nov. 1943, Acervo MTC).
Os sócios, para freqüentarem a piscina, deveriam passar apelo exame médico, que era
rigorosamente controlado. Segundo D. Alzira César,
[...] o que tinha na época que era muito rígido era o exame de saúde. Ele valia, eu
acho, por três meses, depois você tinha que renovar para freqüentar a piscina. Tinha
que olhar se tinha ferida se não tinha, tirava a pressão, olhava o coração. O exame de
saúde era um tormento, porque se você vinha para o Minas no dia que seu exame
estava vencido, chegava você não podia entrar na piscina. Então você tinha que ir
no prédio de cima, para fazer o exame de saúde e freqüentar a piscina
(Depoimento Informal).
19
Todos esses especialistas eram apontados, à época, como conhecedores profundo das
áreas em que atuavam e deveriam estar atentos às mais recentes publicações nacionais e
internacionais sobre esporte e saúde. Dessa forma, o MTC, mais uma vez, mostrou-se
convergente com as propostas do Estado Novo para o esporte. Os profissionais
especializados, que o MTC contratou, apresentavam características similares às do professor
19
Dados da entrevista concedida pela Sr
a
Alzira César. Pesquisa de campo realizada em 07 abr. 2006.
109
de educação física, conforme descritas por Enezil Marinho: eram amáveis, competentes e
rigorosos quanto às regras de higiene, moral, disciplina e ordem.
Como pretendia Marinho, eram educadores com conhecimento nas suas respectivas
áreas e conhecedores da estrutura biológica e psicológica humana. E ainda: os técnicos
esportistas participavam, no clube, como organizadores das comemorações, durantes os
torneios e campeonatos, perante as autoridades convidadas, que, de certa, forma revestiam-se
de um aspecto cívico.
No MTC, o controle e a vigilância às regras do esporte moderno e higienizado foram,
exemplarmente, garantidos. Tal garantia foi conseguida não apenas pelos profissionais
especializados contratados, mas também pela construção racional de espaços específicos para
cada atividade, seguindo os preceitos técnicos da moderna engenharia sanitária.
A praça de esporte do MTC, inaugurada em 1937, foi considerada um marco decisivo
para o desenvolvimento do esporte em Belo Horizonte e em Minas Gerais, como se pode
observar pelo trecho de artigo de jornal da época.
O Minas Tennis Club veio ainda de encontro com as aspirações e necessidade
esportivas da capital. O Minas Tennis Club aparece, pois como uma das expressões
máximas de desenvolvimento e progresso esportivo do nosso Estado, vindo
preencher uma lacuna em nossa organização esportiva. (ESTADO DE MINAS, 28
nov.1937, Acervo MTC).
O clube era apontado pela imprensa e pelas autoridades como uma obra educativa e
destinada a trabalhar "em prol da raça, da civilização e cultura da cidade". (FOLHA DE
MINAS, 25 dez. 1937, Acervo MTC). Ele dispunha de uma moderna piscina, para os padrões
da época, para o desenvolvimento da natação no estado. Possuía quadras de tênis, basquete,
voleibol, aparelhos de ginásticas, modernos vestiários, biblioteca adulta e infantil, consultório
médico e dentário, sala de fisioterapia e vários outros espaços destinados ao conforto e lazer
dos sócios.
As dependências destinadas aos consultórios médico e dentário e a sala de fisioterapia
receberam tratamento especial por parte dos construtores do clube. Esses espaços foram
dotados dos mais recentes modelos de aparelhos e com as melhores condições de higiene e
conforto. Para usar a piscina, havia um ritual de higienização que deveria ser seguido: "O
Minas sempre foi muito rigoroso com tudo. Não podia nadar sem primeiro tomar o banho,
passar pelo lava pé. Tinha um lava em volta da piscina. Isso a gente era obrigado a fazer
110
mesmo". (Depoimento Informal).
20
Para a construção do MTC, os fundadores tiveram o cuidado de seguir um conceito
arquitetural que estava em voga no período. As edificações desse momento eram voltadas
para refletir a modernidade desejada e continham uma certa dose de concepções higienistas e
sanitarista, presentes também entre os especialistas da educação física.
Magali Lima, em uma pesquisa sobre as formas arquiteturais esportivas no Estado
Novo, observou como os discursos dos teóricos e promotores da educação física, nesse
momento, regeram:
[...] a construção e determinam a utilização da arquitetura desportiva ou formas
arquiteturais (praças de esportes, colônias de férias, piscinas, clubes, Escolas de
Educação Física, parques infantis, etc) necessárias para dar conta de uma 'prática' de
'Educação Física' (como uma das formas de socialização do corpo), que possui
técnicas específicas, caracterizadas por sua sutileza e dissimulação, ao valorar locais
e relações sociais supostamente qualificadas de 'naturais' e 'livres', enquanto
disciplina e incute as representações oficiais (aperfeiçoamento da raça, integração
nacional, sentimento nacionalista, etc...) da sociedade brasileira do período
1937/1945. Propondo uma plástica ao corpo, em um ambiente concebido e
construído especificamente, procura adequar os indivíduos a um modelo oficial
representativo da sociedade, ou seja, a de um modelo de "Homem Brasileiro".
(LIMA, 1979, p. 2, grifos nossos).
A arquitetura do MTC foi marcada pela forte preocupação com as questões de higiene,
saúde, estética, cultura e gênero existiam espaços distintos para homens e mulheres e
horários diferenciados para o uso da piscina, que era cercada por lava pé. A estrutura física do
clube foi o resultado de uma concepção que prevalecia sobre como deveria ser o espaço
destinado à prática de esporte, um local onde deveria imperar a limpeza, a higiene e a ordem.
Assim, os espaços do clube, adequadamente, construídos, deveriam incutir, sutilmente, nos
usuários os conceitos de higiene e eugenia e levarem a fortalecer os sentimentos nacionalistas
e progressistas do Estado Novo. Obviamente que naquele momento, as crianças e jovens não
tinham uma percepção da prática esportiva do MTC, como uma forma de socialização nos
moldes ditados pelos dirigentes nacionais.
O conteúdo higienista, sanitarista e nacionalista do esporte do MTC,como
ressaltados, indicava um estreitamento entre seus pressupostos e os anseios de aprimoramento
racial, civismo e modernização anunciados por Getúlio Vargas, no período. O esporte no
MTC visava, sobretudo, a desenvolver qualidades físicas e morais como saúde, vigor, força,
20
Dados da entrevista concedida pela Sr
a
Avani Santana. Pesquisa de campo realizada em 05 abr. 2006.
111
resistência, audácia, persistência, disciplina, solidariedade, além da harmonia das formas e
beleza. A idéia corrente "era a de que, através da aplicação de uma série de princípios
educativos, seria possível reestruturar a sociedade, que precisava urgentemente, na avaliação
dos dirigentes, médicos e educadores, de ser medicalizada, curada e remediada". (PEREIRA,
2001, p. 118).
O MTC não atribuía a si a responsabilidade de remodelar a sociedade, mas os
dirigentes nacionais viam as associações esportivas como possíveis instituições capazes de
contribuir para mudanças coletivas. Em Minas Gerais, o governo estadual criou várias praças
de esportes se espelhando na organização e estrutura do MTC. O objetivo do governo era
formar a consciência nacional da juventude mineira por meio do esporte e tinha, como
exemplo, o esporte educativo do MTC.
De acordo com o ideário estadonovista, o corpo deveria receber as atenções de
médicos, políticos e educadores. O esporte, como o praticado no MTC, deveria ser
especializado para agir sobre o corpo tornando-o saudável, atlético e forte e ser
perpassado pelos valores patrióticos e cívicos. Assim, o MTC, por meio do esporte, estaria
preparando os jovens da elite de Belo Horizonte que o freqüentava, para o comando futuro do
Brasil.
O esporte no MTC era elitista, pois atendia a uma parcela social economicamente mais
alta da capital mineira, o que favoreceu a apoio governamental (estado e município) para a
sua construção. De acordo com o pensamento hegemônico da época, a elite deveria se
preparada para dirigir a nação. O MTC se transformou em uma escola de patriotismo e de
formação física e moral para a juventude. Ali, por meio do esporte os jovens minastenistas
poderiam se transformar em atletas orientados pelo sentimento de cidadania. À cada cidadão,
segundo os ideólogos do Estado Novo, cabia uma parcela de responsabilidade pela segurança
e pelo engrandecimento da Pátria.
4.3 O esporte na identidade do minastenista
A identidade é constituída por sistemas simbólicos compartilhados por um grupo ou
por uma sociedade. Ela produz um sentimento de pertencimento e sentido às relações entre
seus membros.
112
Como o processo de construção de identidade supõe o contraponto da alteridade, é
necessário recorrer a referências exteriores, isto é, àquilo que não faz parte do seu universo
simbólico, para reforçar os próprios traços identitários. O processo de construção da
identidade passa, portanto, por dois momentos antagônicos e complementares: o da
identificação e o da diferenciação, mantendo com eles uma relação de afirmação entre o eu e
o outro.
As marcas de identificação e de diferenciação são produtos da experiência vivida
cotidianamente e em coletividade, que se transformam em referências simbólicas e sociais
para o grupo. Por sua vez, essas referências se constituem em instrumentos de coesão grupal e
de interpretação e compreensão da situação vivida. Dotam o grupo de normas e valores
definidos, ou seja, o modo de agir e pensar dos seus membros são orientados por padrões de
normas e o, por isso, semelhantes. Os processos identitários fazem também com que cada
um se perceba como um membro, como um entre seus pares, em comparação com o outro que
é diferente.
Para Castells (1999, p. 22), a identidade é "a fonte de significação e experiência de um
povo". Forma-se pelas relações vividas cotidianamente e compartilhadas, estabelece
gradualmente valores e códigos que são legitimados e transformados em símbolos
representativos do grupo, como, por exemplo: modo de vestir, de comer, datas
comemorativas, direitos, deveres, e língua comum. Essas convenções, uma vez, transformadas
em símbolos aceitos socialmente pelos integrantes do grupo, constituem-se como substratos
da identidade, que é construída ao logo do tempo.
Castells (1999, p. 22) entende a identidade como o "processo de construção de
significado com base em um atributo cultural, ou ainda em um conjunto de atributos culturais
inter-relacionados, o(s) qual(is) prevalece(m) sobre outras fontes de significados". Para ele, as
identidades são originadas e construídas pelos próprios atores, que, por sua vez, a elas
atribuem valores. Também, se constituem em fontes de significados importantes para eles,
como construtores da sua identidade. A história do grupo, a sua memória coletiva e
individual, entre outros, são processos pelos quais se reconhecem as construções das
identidades, tanto individuais quanto coletivas.
Para Delgado (2006, p. 47), "o trabalho da memória é especialmente frutífero para o
reconhecimento desses laços identificadores, que contribui para a internalização de
significados e experiências" de um grupo, de uma comunidade ou de uma nação.
Em todos os depoimentos colhidos, para essa pesquisa, o esporte foi lembrado como a
113
atividade que mais unia o grupo. Para cada modalidade esportiva, no MTC, formavam-se
grupos, cuja coesão se dava a partir do esporte praticado. Existia um sentimento de união e de
homogeneidade que era atribuído ao esporte e também à camada social a qual pertenciam.
Praticar esporte era quase que uma condição para ser um minastenista. Ser minastenista
significava ser adepto da prática esportiva, em uma ou mais modalidade e ter amor pelo
esporte.
No esporte, o sócio encontrava um ótimo recurso para canalizar suas energias, era uma
alternativa de adaptação aos tempos mais velozes da modernidade e ainda contribuía para a
aquisição de atitudes mais apropriadas às novas exigências da época. Corpo e mente se
transformavam, as pessoas se tornavam mais fortes, mais saudáveis, mais otimistas e mais
alegres. Como bem atestado pelo depoimento a seguir, que associa a juventude saudável à
freqüência ao clube.
[...] eu tenho que ressaltar que em toda essa época era uma juventude saudável, sabe.
Todo mundo praticava esporte. Eu não tinha notícias, a grande maioria não tinha
notícia de vícios. Eu posso atestar isso, porque meus irmãos também praticaram. [...]
A gente tinha uma turma muito grande e que convivia muito, sem dúvida, também
era uma forma de atualizar e isso acontecia com todo mundo no Minas. A gente
tinha notícias dos eventos esportivos, das coisas, mesmo por aquela turminha que se
encontrava. E cada um tinha seu grupo. Eu acho que além da parte física, acontecia a
atualização normal de saber o que ia pelo mundo, o que acontece com todo o grupo,
né?. (Depoimento Informal).
21
Foi, principalmente, em torno do esporte que a maioria dos sócios do MTC se
mobilizou e que se criou e se reproduziu à identidade minastenista.
Dos seis entrevistados, para essa pesquisa, cinco eram sócios do MTC e todos
praticaram a natação. Isso não implicava que não atuassem em outra modalidade esportiva,
mas a natação era por eles a preferida. Atribuía-se à natação a qualidade de ser o esporte mais
completo e por isso deveria ter a preferência sobre os outros esportes. A piscina era a grande
atração do clube e explica em parte essa preferência. Fernando Sabino foi nadador do MTC,
em seu livro O Encontro Marcado, descreveu a experiência do jovem Eduardo (seu alter
ego) na piscina do clube.
21
Dados da entrevista concedida pela Srª Terezinha Vargas. Pesquisa de campo realizada em 10 abr. 2006.
114
Eduardo e a vida sadia. Seu Marciano tornou-se sócio do clube, o filho praticava
natação.
_ Por que você não joga basquete? – sugeria Letícia – Natação é tão sem graça ...
_ Porque natação não depende de ninguém, só de mim.
Em seis meses era o melhor nadador de sua categoria, e ameaçava o récorde dos
adultos. Uma espécie diferente de emoção a de poder contar consigo mesmo, e de
saber, numa competição, antecipadamente vencedor. Os entendidos sacudiam a
cabeça, admirados:
_ Quem diria, esse menino ...
Era uma espécie de êxtase: fazer de simples prova de natação, a que ninguém
obrigava, uma disputa em que parecia empenhar o destino, fazer da arrancada final
uma luta contra o cansaço, em que a vida parecia querer prolongar-se além de si
mesma. (SABINO, 2001, p. 34).
Figura 31 - Prova de natação do MTC na década de1940
Fonte: Acervo MTC.
De acordo com a srª Célia Laborne Tavares, existiam três categorias de nadadores: os
petizes, os juvenis e os adultos. À medida em que o nadador progredia, ele poderia alcançar a
categoria superior. Foi a partir da fundação do MTC que as competições de natação se
disseminaram em Belo Horizonte. Minas Gerias ganhou o campeonato brasileiro durante doze
anos consecutivos. O sr. Orlando Martins atribui essas vitórias à diretoria fundadora do MTC:
115
[...] a hegemonia da natação infanto-juvenil ficou em Minas Gerias durante doze
anos. Graças à fundação do Minas e principalmente da Diretoria de Esporte. A
Diretoria de Esporte era quase tudo no Minas. Tinha a turma do Minas que disputava
e a gente (o clube) captava também elementos de outros clubes de Belo Horizonte e
de fora. A Diretoria do Esporte fez o basquete, fez o vôlei, aumentou outros
esportes, mas o que aumentou mesmo significativamente foi a natação. O Brasil
tinha um campeonato de natação, que comumente vinha o Rio Grande do Sul para
disputar com o Rio de Janeiro. Minas Gerais antes do Minas nem mandava, não
tinha nadador para ir. Vinha uns do Ceará, porque eles estavam na beira mar.
Aprendiam a nadar e ia para o campeonato. O campeonato brasileiro era
fraquíssimo. No campeonato brasileiro infanto-juvenil, o primeiro que o Minas
Gerais participou tirou segundo lugar. Rio e São Paulo eram grandes, e ai chamou
Santa Catarina e eles começaram a reagir. O governo Vargas que fez esse negócio.
No segundo campeonato Minas Gerais venceu e daí em diante venceu doze anos
consecutivos. (Depoimento Informal).
22
No MTC, segundo a srª Célia Laborne Tavares: "[...] os outros esportes foram muito
bem cuidados também. Por exemplo, meu irmão mais velho foi do basquete, do time de
basquete". (Depoimento Informal).
23
A referência ao time é uma forma de identificar o irmão como um esportista de
destaque, pois nem todos os jovens conseguiam participar dos times, somente aqueles que
tivessem um desempenho melhor. Segundo ela, todos os quatro irmãos se dedicaram a um
esporte, a irmã fazia ginástica feminina, ela natação, um irmão basquete e o outro vôlei.
Assim a família ia se agrupando no clube em torno do esporte.
A srª Avanir Santana de Castro foi da primeira turma de nadadores, que permaneceu
competindo por anos consecutivos. Ela relembrou com nostalgia as competições.
A gente viajava nesses campeonatos, quando nós voltávamos... Você precisava ver.
Até era de trem! Não era de avião nem de ônibus não, a gente vinha de trem. E o
cozinheiro do Minas ia com a gente. Éramos muito bem acompanhado. E quando a
gente voltava campeões... era aquela festa! Começava a festa na estação. Eu tenho
uma medalha de natação de 1939, foi o Benedito Valadares que nos deu como
prêmio. (Depoimento Informal).
24
Para a srª Alzira César, o clube era muito familiar. Em função das famílias àquela
época serem normalmente numerosas, o modo de identificar algum de seus membro era pelo
esporte:
22
Dados da entrevista concedida pelo Sr. Orlando Martins. Pesquisa de campo realizada em 24 abr. 2006.
23
Dados da entrevista concedida pela Srª Célia Laborne Tavares. Pesquisa de campo realizada em 13 mar. 2006.
24
Dados da entrevista concedida pela Srª Avanir Santana de Castro. Pesquisa de campo realizada em 05 abr.
2006.
116
[...] os pequenos seguiam o passo, o caminho aberto pelos irmãos mais velhos. E ali
se você não era conhecido pessoalmente, você era conhecido familiarmente, 'ele é
irmão de fulano, ela é irmã de Renato que joga basquete' ... Na minha casa todos os
homens foram jogadores de basquete do Minas. Família de dez, seis mulheres e
quatro homens, todos os homens seguiram carreira esportiva. Eu joguei vôlei até os
treze anos, podia ter feito uma carreira muito boa dentro do esporte profissional no
Minas. Mas na moral da época, na educação da época, uma coisa assim...E na
natação nós tivemos medalha, eu nunca tive de primeiro, mas de segundo e terceiro
aos montes. (Depoimento Informal).
25
Assim, a identidade de grupo construída no MTC foi se constituindo e se fortalecendo
pelos laços estabelecidos pelas práticas desportivas. Esse era o atributo social e cultural que
prevaleceu sobre outros e se transformou em fonte de significação para os minastenistas.
Outros dois atributos importantes e significativos se somaram ao esporte, como
elemento da identificação minastenistas. Dentre eles se destacavam: o morar próximo ao
clube e pertencer aos segmentos médios e altos da sociedade de Belo Horizonte.
Nas entrevistas, foi sempre mencionado o fato de se morar próximo ao MTC e que
isso era um sinal de distinção social, pois eram famílias que possuíam um nível sócio-
econômico médio ou alto, que moravam na região do clube ou nas adjacências. A localização
residencial era também uma estratégia para se selecionar os sócios e para confirmar sua boa
procedência. Essa seleção social proporcionava aos pais a certeza de que os filhos, ao
freqüentarem o MTC, estariam convivendo diariamente com pessoas conhecidas o que,
também, não deixava de ser mais uma forma de controle sobre os jovens.
O esporte no Minas era um esporte elitizado, era um esporte familiar. O Minas
sempre foi um lugar da classe média alta, da elite da época, não pela localização
física Bairro Santo Antônio, Lourdes, mas todo mundo que morava ali tinha um
nível socioeconômico já estabelecido. Era um ambiente de amigos, vizinhos,
família. Quem freqüentava o Minas era quem morava entorno do Minas e ali se
desenvolvia toda a sua sociabilidade em treinar esportes e em conversar, namorar,
dançar, tudo você aprendia ali. (Depoimento Informal).
26
A localização do MTC, assim, atendia aos interesses dos fundadores, que eram
pessoas de uma camada social abastarda.
De acordo com sr. Orlando Martins Vieira, morar perto do MTC facilitava a
freqüência ao clube: "Nós morávamos perto do Minas I, na Rua Tomás Gonzaga 272. No 271
morava o Milton Campos. Ficou perto para ir ao Minas, onde eu fiz amizades. Gostei muito e
25
Dados da entrevista concedida pela Srª Alzira César. Pesquisa de campo realizada em 07 abr. 2006.
26
Dados da entrevista concedida pela Srª Alzira César. Pesquisa de campo realizada em 07 abr. 2006.
117
eu comecei a nadar". (Depoimento Informal).
27
A srª Terezinha Vargas se referiu aos sócios que moravam nas proximidades do MTC
como os "aficcionados":
Eu me baseio nos moradores da Rua Espírito Santos que eram os aficcionados.
Bastava abrir o portão, já estavam dentro do Minas. Os Mendes moravam ali na Rua
da Bahia, os Corrêa também, que eram os campeões, eles nadavam. Era tudo ali em
torno. Naquele tempo o Minas reunia a elite de Belo Horizonte, então eles
costumavam dizer que o minastenista era fruta, fruta era um privilégio. E acho
mesmo como localização e como um clube era um privilégio. Pois tinha recurso
físico melhor, uma piscina melhor, um campo de basquete melhor. (Depoimento
Informa)
28
.
4.4 O Minas Tênis Clube e a tradicional família mineira
A imagem do MTC, já ressaltada, sustentava-se, em dois pilares: o da modernidade e o
da tradição. Ambos estiveram presentes no processo de construção da identidade dos
minastenistas.
A representação não é uma copia do real, mas é uma construção feita a partir da
realidade material. Os indivíduos e os grupos reconhecem o sentido do mundo, em que estão
inseridos, por meio das representações que constroem sobre determinada realidade. Essas
representações têm grande valor simbólico e muito dizem sobre a realidade concreta,
"carregam sentidos ocultos, que, construídos social e historicamente, se internalizam no
inconsciente coletivo e se apresentam como naturais, dispensando reflexão". (PESAVENTO,
2003, p. 41). A força da representação não se constitui pelo seu valor de correspondência da
imagem com a realidade, mas, sim pela sua capacidade de mobilização e de produzir
reconhecimento e legitimidade social. As representações são expressas por normas,
instituições, discursos, imagens e ritos entre outros, que geram condutas e práticas sociais que,
por sua vez, transformam-se em força integradora e coesiva para indivíduos e grupos. As
representações são símbolos, imagens mentais construídas sobre uma determinada situação,
que envolve uma série de valores e, por isso, são construtoras de identidades e orientadoras de
práticas sociais.
27
Dados da entrevista concedida pelo Sr. Orlando Martins Vieira
28
Dados da entrevista concedida pela Srª Terezinha Vargas. Pesquisa de campo realizada em 10 abr. 2006.
118
O MTC, apesar de ter sua fundação relacionada ao sopro da modernidade da década de
1930, surgiu, paradoxalmente, para ser também um espaço de reprodução da tradição. Após
alguns anos de funcionamento, era identificado pela imprensa como um clube tradicional
de Belo Horizonte.
A data de aniversário do Minas Tênis Clube incorporou-se ao calendário social de
Belo Horizonte, pela sua grata significação o brilho das festas que se assinalou já
se impôs definitivamente à crônica dos nossos acontecimentos anuais. Dentre essas
festas, se consagrou, por exemplo, como uma das noites mais encantadoras da
vida belorizontina, o grande baile comemorativo, cujo prestigio e beleza já lhe
confere força de tradição, no programa das festas da cidade. O que marcou as
comemorações de 41, realizadas ontem, confirma esses merecimentos, reunindo no
'decor' moderníssimo que é a sede do grande clube, a sociedade mais seleta e mais
elegante, para uma legitima parada de distinção e refinamento. (FOLHA DE
MINAS, 16 nov. 1941, Acervo MTC, grifos nossos).
Esse trecho de artigo da Folha de Minas revela a relação entre tradição e modernidade
no MTC. Quando foi escrito, o MTC tinha seis anos de fundação e quatro de inauguração.
Portanto, em um curto espaço de tempo foi identificado como um local de tradição. É preciso
lembrar que Belo Horizonte foi construída em 1897 e, que, em 1937, ano da inauguração do
parque esportivo do MTC, a cidade tinha apenas quarenta anos de existência. Era uma cidade
jovem, que carecia de referências de tradição, que precisaram ser inventadas, e o MTC
correspondeu a essa demanda.
Para Hobsbawm e Ranger (2002), a tradição inventada é formada por:
[...] um conjunto de práticas normalmente reguladas por regras tácitas ou
abertamente aceitas, tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar
certos valores e normas de comportamento através da repetição, o que implica,
automaticamente, uma continuidade em relação ao passado. Aliás, sempre que
possível, tenta-se estabelecer continuidade com um passado histórico apropriado.
(HOBSBAWM; RANGER, 2002, p. 9),
O MTC se transformou em um caso exemplar de tradição inventada. O clube, apesar
de novo, passou a ser uma referência para a cidade, como local tradicional e aristocrático. Ele
se estabeleceu, assim, como um espaço de sociabilidade da capital, restrito a um determinado
segmento social, um local de reprodução do modelo de práticas tradicionais estabelecidas na
sociedade. O rigor na observação das normas morais, da época, significava que havia uma
relação de continuidade com o passado. Também, à medida que as suas atividades sociais e
119
esportivas se repetiam e se afirmavam, ganhavam respeito e asseguravam a condição de
tradição que a repetição lhes conferiam. As festas do MTC eram esperadas com entusiasmo
pelos sócios:
[...] é cada vez maior o interesse com que nossa sociedade aguarda o baile de gala
que o Minas Tênis Clube realizará sábado próximo, em seus luxuosos salões. é
uma tradição do Minas a elegância de suas festas, que se notabilizam pelo cunho de
alta distinção de que se revestem, constituindo acontecimentos marcantes em nossa
crônica social. (JORNAL MINAS GERAIS, 19 nov 1942, Acervo do MTC).
As reproduções das tradições, em conjunturas de transformações, são reações às
situações novas, que se manifestam fazendo referências às circunstâncias anteriores. É uma
forma de dar uma roupagem antiga a algo que é novo. Quando os valores e costumes
tradicionais começam a sofrer modificações impostas pelas forças modernizadoras, é comum
uma reação conservadora vinda da sociedade. Os agentes inovadores passam a ser vistos
como potenciais destruidores dos alicerces da tradição, daquilo que é considerado antigo e
consagrado como certo.
No período de 1930 a 1940, o cenário urbano, político e cultural de Belo Horizonte
passou por grandes transformações, mas a sociedade manteve costumes tradicionais. A
manutenção desses costumes delongava o avanço progressista da cidade, mas não o impedia
de ser implantado. Belo Horizonte, nessa época, vivia entre o passado e o futuro, entre a
tradição e a modernização. De forma, que a modernidade e a tradição interagiam e moldavam
a sociedade e a capital mineira. De acordo com Pimentel (1993), os discursos do moderno e
do tradicional o se apresentavam como oposição ou ruptura. Eles passaram a existir como
complementaridade e estão presente no discurso da mineiridade.
As transformações pelas quais passam as sociedades não as transformam
completamente. Geralmente, essas sociedades tecem um emaranhado de arranjos para
resguardarem símbolos do passado de grande significados para elas. Para a manutenção da
identidade, as sociedades mesmo vivendo momentos de transformação atém-se a
referências do passado, que vão interagindo com as forças inovadoras da modernidade.
Em geral, as forças conservadoras e as tradições detém forças suficientes de
persistência e resistência ao moderno. Na realidade, não existe sociedade que seja capaz de se
renovar totalmente ou de permanecer estática. As mudanças e permanências usualmente são
simultâneas. Segundo Mayer (1987), os elementos tradicionais que permanecem nas
120
sociedades combinam capacidade de permanência e capacidade de renovação e adaptação às
novas realidades. Essas sociedades primam por ingerir, adaptar, e assimilar de maneira
seletiva novas idéias e práticas, sem ameaçar seriamente a sua perspectiva tradicionalista.
Como aconteceu em Belo Horizonte. As sociedades, de uma maneira geral, mantêm aspectos
tradicionalistas mesmo nos momentos de ruptura, logicamente, uma mais que as outras.
Para Bornheim (1987), geralmente, liga-se a tradição à idéia de herança, ao ato de
passar algo de uma geração a outra, existindo nesse ato de transmissão uma dose de
previsibilidade e de segurança. À medida que a tradição é o princípio organizador da
coletividade, ela se fundamenta na necessidade de viver sem grandes percalços.
Estão reservados ao campo da tradição os costumes que possuem o seu conteúdo
ligado a um passado idealizado. O prestigio da tradição reside na sua antiguidade, na
profundidade de seu passado. É a antiguidade e a permanência da tradição que lhe garantem
autoridade. A autoridade, a fidelidade, a obediência, a previsibilidade e a segurança são
elementos fundamentais para a perpetuação da tradição nas sociedades. O valor das práticas
tradicionais, na sociedade, é, usualmente, medido pelo seu passado: quanto mais longínqua no
tempo, mais autoridade as práticas carregam.
A tradição está associada à idéia de passado, sendo formada em um processo de longa
duração, mas tal fato não significa que ela é estática, permanente e imutável. Pelo contrário,
incorpora mudanças, que, muitas vezes, adaptam-se ao novo. As transformações, para as
tradições, fazem-se necessárias para a sua própria sobrevivência, para a sua adequação ao
momento presente. Mesmo as sociedades mais tradicionalistas vivenciaram ou vivenciam
algum tipo de modificação, que pode ocorrer de várias formas e em tempos também variados.
Assim, a tradição pode ser compreendida como
[...] o conjunto de valores dentro dos quais estamos estabelecidos; não se trata
apenas das formas de conhecimento ou das opiniões que temos, mas também da
totalidade do comportamento humano, que se deixa elucidar a partir de conjuntos
constitutivos de uma determinada sociedade. (BORNHEIM, 1987, p. 20).
A sociedade de Belo Horizonte, nos anos de 1930 a 1940, ainda guardava resquícios
da sociedade mineira dos séculos anteriores. Uma sociedade adepta a costumes e preconceitos
enraizados, presos às rotinas estabelecidas, e estruturada em raízes rurais, que conferiam à
estratificação social um símbolo de respeito. Eram ainda os antigos latifundiários das cidades
do interior que monopolizavam a política, e as famílias eram o esteio da sociedade.
121
No caso do MTC, o que lhe conferia a marca da tradição eram as famílias que o
fundaram e as que se associaram inicialmente ao clube. Elas levaram para o MTC o peso do
nome, da origem e da posição social e eram provenientes das camadas média letrada e das
elites política, econômica, social e intelectual de Belo Horizonte. Para o sr. Orlando Martins
"o que dava tradição ao Minas foram os que o fundaram e os que logo foram para lá".
(Depoimento Informal).
29
Segundo Gomes (2005), a feição da organização familiar mineira não era diferente das
que existiam em outras regiões do Brasil. A organização familiar era, basicamente, ancorada
no senhorio da terra e se desdobrava em diferentes relações de poder. A solidariedade que
fundava a autoridade na província de Minas Gerais era marcada pelo "orgulho de linhagem" e
"interesse de família". Essa é uma característica marcante na História do Brasil. Para Gomes
(2005, p. 80), a República não alterou esse "traço privatista e familísta do poder". Botelho
(2001), analisando os modelos nacionais e regionais de família no pensamento social
brasileiro, descreve, com precisão, um fenômeno que ocorre em Minas Gerias e que Amoroso
Lima denomina de grupalismo. Para ele, a montanha limitava o horizonte do mineiro,
produzindo uma sociedade de linhas orgânicas e concentradas. Essa ambiência alimentou o
grupalismo, uma forma de organização social cujos fundamentos se encontram nos grupos,
que passam a ser os intermediários entre o indivíduo e o Estado. Esse espaço grupal ou
familiar proporciona ao mineiro o sentido de coletividade. A família se constitui o grupo
social nuclear da sociedade mineira.
Na análise sobre as famílias governamentais mineiras, Horta (1957) constatou a
persistência de um mesmo grupo dominante, as grandes famílias nucleares proprietárias de
terras. Ele associou esse fenômeno à continuidade da estrutura econômica e política em Minas
Gerais. No tempo da mineração e mesmo depois, com a emergência dos grandes latifúndios, o
poder estava ligado ao senhorio da terra.
A história de Minas é, pois, num largo sentido, a história de suas grandes famílias
que fazem o jogo da cena política desde a Colônia. Vimos como se formaram em
torno das 'datas' e, depois, das grandes propriedades rurais. Constituídas do
entrelaçamento de três e mais 'famílias nucleares', as 'famílias extensas' mineiras
formavam como que círculos endogâmicos. Cada círculo era a área social de uma
vasta parentela contígua num largo domínio de terra. Num círculo, por mais fechado
que fosse, sempre apareceria um membro mias ousado que ia ligar-se, por laços de
casamento, com outro círculo socialmente vizinho. Formou-se, dessa forma, no
tempo, uma verdadeira cadeia de círculos familiares, ou parentelas, cujos membros
29
Dados da entrevista concedida pelo Sr. Orlando Martins. Pesquisa de campo realizada em 24 abr. 2006.
122
ora se sucedem nas tarefas da chefia política local e regional, ora se alteram. É a
constelação governamental de Minas Gerais. (HORTA, 1957, p. 61).
Assim, pertencer a uma família que dispunha de algum tipo de autoridade e
reconhecimento tradicional, conferia valor positivo ao indivíduo ou às instituições às quais
estava ligado, constituindo-se em capital social importante. O MTC é um caso exemplar de
reprodução dos valores tradicionais da família e das elites econômica e governamental de
Minas Gerais.
As famílias fundadoras do MTC eram reconhecidas por sua importância e seu perfil
tradicional na capital de Minas Gerais. Na maior parte das vezes, havia extração rural. A
oligarquia rural urbanizada de Belo Horizonte colocava em prática todo tipo de estratégias de
distinção e de poder, para demarcar bem os privilégios, as hierarquias e as distâncias sociais.
Procuravam valorizar as tradições adquiridas durantes gerações e legadas à família como sinal
de nobreza de linhagem social e poder. O bom comportamento, aquele considerado elegante e
nobre, era associado à educação recebida no seio das famílias e também na aprendizagem
cotidiana de valores herdados dos antepassados.
A imagem conservadora do povo mineiro, apegado às tradições e avesso às mudanças,
acompanhou-o desde a Colônia. Quando Alceu Amoroso Lima (1983) escreveu, em 1944, A
Voz de Minas, descreveu a sociedade mineira como conservadora, preservadora de valores
morais, contrária às possibilidades de mudança e com uma economia basicamente agrária.
O imaginário da mineiridade, segundo Arruda (1999), é marcado por uma forte
dimensão de temporalidade, cuja tendência é a valorização do passado, isto é, possui um forte
apego a sua história, que é vista como reprodutora da tradição. Os mineiros são reconhecidos
por suas qualidades como bom senso, moderação e equilíbrio, consideradas essenciais para
promover acordos políticos. Também o mineiro possui caráter libertário, é cordial, tem gosto
pela política, agudeza e comedimento para promover mudanças. A mineiridade incorpora
valores paradoxais como provincianismo e universalismo, tradicionalismo e desenvolvimento,
ordem e liberdade, que ora se chocam, mas que também se transformam e se preservam, em
uma projeção do futuro, que resguarda o passado.
Para Holanda (1963), prevaleceu no Brasil, mesmo no regime republicano, uma
tendência a recrutar entre os antigos senhores rurais, portadores de mentalidade e
características do meio rural, os candidatos às funções públicas e administrativas das cidades,
permanecendo, assim, uma certa dependência da cidade em relação aos domínios e costumes
123
agrários.
A Belo Horizonte dos anos de 1930 se encontrava a meio caminho entre a
possibilidade da "aventura da modernidade" e o respeito às tradições. Belo Horizonte nasceu
para romper com o passado, representava uma abertura para o novo, para o moderno, para o
desenvolvimento da riqueza, e como um instrumento pedagógico, cujo propósito era incutir
novos hábitos urbanos nos habitantes da capital. Quase todos, porém, eram provenientes das
cidades do interior e da antiga capital Ouro Preto e trouxeram consigo, para a nova capital,
hábitos e costumes moralistas e provincianos. A mentalidade e o modo de viver típica do
meio rural foram transplantados para a capital à medida que ia sendo habitada.
Belo Horizonte foi oficialmente inaugurada em 1897, mas sua construção estendeu-se
por mais alguns anos. Para Andrade, "somente a partir de 1915 a cidade pôde oferecer a seus
habitantes reais condições para o desenvolvimento de uma vida social e intelectual típicas do
meio urbano". (ANDRADE, 2004, p. 85). A crise econômica, porém, decorrente da Primeira
Grande Guerra, inibiu a vida social da cidade. Assim, por muitos anos, o modo de vida e a
cultura os antigos belorizontinos continuaram vinculados à herança interiorana. De fato, a
cidade não lhes oferecia vida social cosmopolita, peculiar a uma capital moderna, que conta
com cafés, confeitarias, ruas movimentadas, praças, parques e clubes.
A partir de 1920, começaram acanhadas iniciativas para o incremento da economia e
da vida social e cultural de Belo Horizonte. Mesmo assim, a nova capital estava longe de
cumprir a sua missão civilizadora moderna. Demandava das elites urbanas transformações nas
relações sociais, as quais deveriam abandonar os modos provincianos e "caipiras" de ser, para
se tornarem mais pragmáticas, utilitárias e modernas. A cidade, porém, não estimulava a
interação social, o seu espaço constantemente vazio constrangia a sua vida pública. A reclusão
familiar a que seus habitantes estavam acostumados precisava ser deslocada para as ruas, para
o espaço público.
Em 1930, Belo Horizonte passou por mais transformações em sua estrutura urbana.
Houve um surto de construções que deram à cidade "ares" de metrópole. Nesse período, a
capital passou a contar com mais lugares de sociabilidade para seus habitantes, mais ainda
persistia a carência de espaços para o desenvolvimento de formação de redes sociais
característicos da moderna vida urbana.
O MTC foi construído em 1937 não para ser um espaço dedicado ao esporte e ao
culto ao corpo, mas também para suprir em parte a lacuna existente na vida social
belorizontina. Ele representou inovação em alguns aspectos ao possibilitar, a princípio, o uso
124
da piscina para os jovens de ambos os sexos, o que favorecia a exposição do corpo feminino.
Após a inauguração de sua sede social, o clube passou a organizar bailes, saraus de música,
concursos de beleza, recepções a políticos e intelectuais, horas dançantes após as missas.
Essas atividades traduziam a adesão à modernidade sem, contudo, significar total rompimento
com a tradição. Diante das forças inovadoras, era preciso estabelecer uma continuidade
histórica entre elas e o passado. Para a srª Alzira César, quem freqüentava o MTC eram
pessoas que
[...] moravam ali por perto. Quem freqüentava foi descendente dos fundadores, dos
primeiros habitantes de Belo Horizonte. Isso é importante, dos primeiros habitantes
de Belo Horizonte, dos fundadores de Belo Horizonte e do Minas. Houve uma
continuidade de pessoas que são sócias e que faziam questão de continuar.
(Depoimento Informal).
30
O MTC além de buscar nas famílias que o fundaram e que o freqüentavam o vínculo
com o passado, por meio delas assegurou também respaldo social. Por exemplo, ser sócio do
MTC era sinal de boa procedência familiar, pois se conhecia a origem da pessoa. Nesse
sentido, havia uma rigorosa sindicância para a seleção de sócios.
Também no sentido de permanência e de continuidade dos padrões morais, nos
eventos festivos eram exigidos dos sócios comportamentos adequados aos padrões da época.
Muitos fiscais atuavam nas horas dançantes para garantir o bom comportamento dos jovens.
Além disso, as moças não iam aos bailes e às missas dançantes desacompanhadas dos pais. As
palavras da sAlzira César demonstram essa preocupação do clube com o comportamento
dos sócios: "Você não podia dançar de rostinho colado. Tinha os fiscais que batiam nas suas
costas. Quando não eram os fiscais, eram os pais. Você tinha que ter um comportamento."
(Depoimento Informal).
31
É comum o apelo a valores conservadores, quando costumes tradicionais começam a
se modificar, como aconteceu em Belo Horizonte, nas décadas de 1930 a 1940. A sociedade
local, várias vezes, condenou a força inovadora, considerada ameaçadora aos valores
tradicionais. As moças do MTC foram muitas vezes reprimidas nos colégios porque usavam
maiô na piscina. Este comportamento era considerado inadequado para as jovens provenientes
das famílias tradicionais de Belo Horizonte:
30
Dados da entrevista concedida pela Srª Alzira César. Pesquisa de campo realizada em 07 abr. 2006.
31
Dados da entrevista concedida pela Srª Alzira César. Pesquisa de campo realizada em 07 abr. 2006.
125
Nós nadávamos pelo Minas e, naquela época, a gente estudava no Colégio Sacre
Couer de Marie, que era um colégio exigente. Quando tinha festa no Minas, assim
Dia da Bandeira, os colégios eram obrigados a ter uma parte, a vim assistir. E a
gente vinha de maiô, para nadar. Nós não vínhamos pelo colégio, nos vínhamos pelo
Minas. Aí, a gente passava desfilando, dava adeus para as meninas que estavam nas
arquibancadas. As Irmãs faltavam nos matar, porque era pecado naquela época
pôr maiô. (Depoimento Informal).
32
Para não causar tanta polêmica em torno do uso do maiô, o clube estipulou horários
diferenciados para o uso da piscina para homens e para mulheres. Foi uma forma de
conciliação encontrada para evitar o contato entre moças e rapazes na piscina. Dessa maneira,
a postura moderna assumida pelo clube seria abrandada, e a administração estaria preservando
a moral e o comportamento típicos das famílias mineiras. Essa medida, também, buscava
resguardar o bom nome da instituição e estabelecer uma continuidade histórica entre o
presente, carregado de modernidade, e o passado já estabelecido.
A família tradicional mineira é aqui considerada como aquela que reproduz
permanências e mantém política, econômica e socialmente algum tipo de domínio durante
uma ou mais gerações. O MTC buscou nas famílias tradicionais de Belo Horizonte, no seu
passado histórico, o suporte para a sua legitimação. Recrutou seus sócios junto às camadas
altas da sociedade, trazendo coesão ao grupo e garantia de legitimidade à associação recém-
inaugurada. O clube era para essa camada social um lugar de sociabilidade, de novas idéias e
comportamentos, mas sempre com o respaldo das famílias mais importantes da época.
Segundo a sCélia Laborne Tavares, havia uma real seleção para o ingresso do sócio ao
clube. De acordo com ela, a diretoria do clube se reunia sempre para apreciação de novos
sócios.
Toda quarta-feira tinha reunião da diretoria. Todo os diretores procurava
comparecer. Tinha a diretoria em si do Minas e tinha, ainda tem hoje, os
conselheiros, que fazem a apuração se a pessoa pode entrar ou não pode no clube.
Isso desde aquele tempo era assim. Eles também se reuniam e ficavam muito
amigos. (Depoimento Informal).
33
Para a srª Avani Santana, havia uma sindicância rígida para a entrada de sócios.
Aquele que desejava comprar uma cota "tinha que ser apresentado por uma pessoa, um outro
sócio. Como até hoje também existe isso, mas antigamente era mais complicado".
32
Dados da entrevista concedida pela Srª Avani Santana. Pesquisa de campo realizada em 05 abr. 2006.
33
Dados da entrevista concedida pela Srª Célia Laborne Tavares. Pesquisa de campo realizada em 13 mar. 2006.
126
(Depoimento Informal).
34
A tradição do MCT se expressa, de acordo com a srª Alzira César, por ser um local de
reunião das famílias pioneiras da capital mineira.
O Minas sempre foi um lugar da classe média alta, da elite da época, dos primeiros
moradores de Belo Horizonte, as primeiras famílias, cujos pais eram todos do
interior. Por exemplo, meu pai era de Diamantina e minha mãe de Ponte Nova, mas
casaram e vieram morar em Belo Horizonte em 1920 a 1930. Então, quem
freqüentava o Minas eram os filhos da famílias mineiras de Diamantina, Ponte
Nova, Ouro Preto, Mariana, São João Del Rei, das cidades históricas, que vieram
então para a capital. [...] Eram pessoas na época importantes, as famílias
tradicionais. Tradicionais importantes, que ocupavam cargos públicos. Os que não
ocupavam cargos públicos eram profissionais liberais separados do Estado.
(Depoimento Informal).
35
Em todos os depoimentos colhidos encontram-se referências às famílias tradicionais
que eram sócias do MTC. Para a srª Avanir Santana, elas
[...] eram as verdadeiras famílias, famílias inteiras que freqüentavam o Minas. Eram
nós os Santanas, os Mendes Júnior, que eram os Mendes, os Quintino dos Santos, os
Rodrigues, e era essa turma toda. Era nossa turma, a primeira turma. Que ficou
anos competindo. (Depoimento Informal).
36
O respeito às regras a aos bons princípios que essas famílias cultivavam e levaram
para o clube, era outro aspecto que imprimia tradição ao MTC. A família mineira era
considerada mais conservadora do que a sua vizinha, a família carioca. As moças mineiras
ainda estavam presas a um estilo de vestir mais composto e formal: as partes dos corpos
deveriam ficar mais escondidas. As cariocas eram mais avançadas e mais despojadas no modo
de vestir. A diferença de comportamento era bem marcante, como narra a srª Alzira César.
Bem houve uma época, vamos dizer quando... isso não foi no Minas,
principalmente em Minas Gerais. Minas Gerais era uma sociedade mais fechada,
uma educação mais fechada. Nós nhamos tios que moravam no Rio, e a gente ia
passar férias no Rio. Era uma diferença assim absurda de comportamento, de roupa.
para te dar um exemplo. Nós para irmos ao Rio ficar na casa dos tios, nos
levávamos malas de anáguas, de luvas, de brinco, de colar [...] Chegava lá, você via
34
Dados da entrevista concedida pela Srª Avani Santana. Pesquisa de campo realizada em 05 abr. 2006.
35
Dados da entrevista concedida pela Srª Alzira César. Pesquisa de campo realizada em 07 abr. 2006.
36
Dados da entrevista concedida pela Srª Avanir Santana. Pesquisa de campo realizada em 05 abr. 2006.
127
aquelas menininhas da sua idade queimadinhas de sol. (Depoimento Informal).
37
(Grifos nossos).
Para a manutenção do bom comportamento, aquele considerado adequado para a
época, havia uma rígida fiscalização interna. A srª Célia Laborne Tavares, relembrando os
velhos tempos, relatou:
[...] tinha sempre um [funcionário] que rodeava e controlava as pessoas. E se o
comportamento não tivesse muito de acordo com a época, com a educação do
momento e tudo, ele chamava no canto, no vestiário e depois com muita distinção
falava que no Minas não era permitido determinado comportamento. (Depoimento
Informal).
38
O sr Abraham, funcionário do clube desde 1943, acompanhou a construção dele
através do pai, que nele trabalhou. Como um dos fiscais mais antigos da agremiação, ele disse
que todos os funcionários do clube, nessa época, tinham responsabilidade de zelar pelo
comportamento dos jovens que freqüentavam o MTC.
Todo o quadro de funcionários sempre teve essa responsabilidade. Se o sócio estava
errado, ele passava para o superintendente. o superintendente fazia a cassação
dele, dava sua chamada de atenção. Ele chamava a atenção na sala [dele]. Mas,
sempre o clube viu o comportamento da garotada, da rapaziada. (Depoimento
Informal).
39
Além da fiscalização do próprio clube que zelava pelo bom comportamento dos
jovens, havia a vigilância dos pais sobre os filhos nas festas, campeonatos, nas horas
dançantes, etc. Havia sempre uma mãe que acompanhava as moças nos campeonatos
femininos, agindo como supervisora e fiscal de comportamento.
Assim, por meio desses mecanismos, foi se construindo para o MTC uma imagem de
tradição. Tradição recém-adquirida, mas que remetia a um passado histórico das famílias e do
bom comportamento. O zelo pela tradição, contudo, convivia com a construção de uma
imagem de clube moderno.
37
Dados da entrevista concedida pela Srª Alzira César. Pesquisa de campo realizada em 07 abr. 2006.
38
Dados da entrevista concedida pela Srª Célia Laborne. Pesquisa de campo realizada em 13 mar. 2006.
39
Dados da entrevista concedida pelo Sr. Abraham. Pesquisa de campo realizada em 25 abr. 2006.
128
4.5 O esporte e a modernidade do Minas Tênis Clube
O Minas Tênis Clube, à época da sua fundação, tornou-se para a cidade de Belo
Horizonte e para aqueles que o freqüentavam um símbolo de modernidade. Modernidade
traduzida pela arquitetura de seu parque esportivo e de sua sede social. Modernidade muito
evidente no trabalho desenvolvido pelo clube e no investimento em esportes praticados por
seus sócios, destacando-se a natação. É inegável que o clube contribuiu para a formação do
hábito da prática esportiva entre os sócios, o que veio a modificar a visão destes em relação ao
esporte, à saúde e ao corpo. Tal hábito acabou por se difundir em Belo Horizonte,
contribuindo para a consolidação de um perfil mais modernista para a cidade.
Consolidou-se, assim, entre os sócios uma nova mentalidade, mais conectada com a
prática esportiva, e o esporte passou a ser um dos elos entre os associados do MTC.
Rapidamente o esporte adquiriu também uma feição identitária, ou seja, foi expressão de
unidade do grupo e de afirmação coletiva. Certamente, houve outros aspetos unificadores,
mas o mais expressivo foi o esporte.
A modernidade do MTC estava mais associada ao esporte. Era o espaço para se
dedicar às atividades físicas e cultuar o corpo. Tornou-se um lugar para cultuar o ideal de
beleza e saúde dos jovens da "boa sociedade" mineira. Ao longo dos anos, o MTC foi se
constituindo como um espaço rico para a prática de esporte, que remetia à idéia do culto ao
corpo. Vinculava-se ao clube a imagem de que ali se podia realizar o ideal de beleza física e
saúde para os jovens "bem nascidos" da sociedade de Belo Horizonte. Desse modo, o esporte
foi se constituindo como um elo unificador do grupo. Era entre os jovens que havia uma
aceitação maior do esporte, que proporcionava a eles a sensação de estar em contatado com os
indícios de um novo estilo de vida. De alguma forma, o esporte os desembaraçava de alguns
dos valores e dos costumes do passado, sem comprometer os padrões morais que eram
significativos à época.
A modernidade se caracteriza pela abertura ao novo e valorização da mudança.
Segundo Habermas (1990, p. 18), "o mundo moderno se distingue do antigo pelo fato de se
abrir ao futuro, o começo do novo epocal repete-se e perpetua-se a cada momento do presente,
o qual a partir de si gera o que é novo". Para o pensador alemão, a modernidade tem uma
característica singular: no ato de se renovar sempre, o novo torna-se obsoleto pela novidade
do estilo seguinte.
129
A modernidade tem distintas relações com o tempo e com a tradição, pois ela extrai
seu significado tanto do que nega quanto do que afirma, do passado e do futuro. Está sempre
ligada ao presente e, portanto, ao contexto em que é gerada.
A relação do moderno com a tradição permite combinações variadas. O moderno pode
significar tanto uma volta à tradição para renová-la, como uma negação da própria tradição. E
mais: pode ser um desligar-se da tradição, não mais aceitando o passado como um modelo a
ser imitado, dele abstraindo, de forma crítica, os elementos que possam fundamentar o novo.
O processo de desligamento da tradição é lento e gradual e é uma possível forma de afirmação
do presente por meio do passado. A modernidade na sua essência é, portanto, ambígua, está
aberta para o futuro, mas não nega completamente o passado, e este é o alicerce, não poucas
vezes, na qual se apóia.
Os processos de modernidade pelos quais passam uma sociedade são, em parte,
determinados por ela mesma, pelo modo como ela se constituiu e pela conjuntura na qual se
afirma, possibilitando ajustes com as múltiplas temporalidades. É possível a convivência, lado
a lado, de atitudes e de conceitos modernos com valores e costume tradicionais e
conservadores.
O processo de industrialização, que teve início na década de 1930 no Brasil,
desencadeou a necessidade de engendrar mecanismos de transformação da sociedade, no
sentido de conduzi-la a um novo modelo civilizatório, conforme proposto por Getúlio Vargas.
A efervescência cultural, vivida em Belo Horizonte, nas décadas de 1930 e 1940, foi reflexo
dessa transformação, que tanto o país quanto a cidade estavam passando para um estágio
industrial, que demandava novas formas de vida.
A cada de 1930, no Brasil, é considerada um marco de passagem entre duas épocas
históricas, de uma sociedade agro-exportadora para urbano-industrial. Todo o processo de
mudança foi conduzido pelo Estado e pelas elites dirigentes. Ocorreu no Brasil, nesse
momento, uma modernização conservadora, uma mudança conduzida de cima para baixo,
pois as camadas populares estavam alijadas do processo. Houve, contudo, uma alteração no
modo de viver dos brasileiros. As políticas sociais se modificaram, os valores foram alterados,
e práticas tradicionais, provenientes do Brasil rural, começaram a incomodar. Era necessário
promover mudanças no sentido de conduzir a sociedade brasileira rumo à modernidade. O
rádio, o cinema, o jornal interferiam na vida das pessoas, incutindo nelas um estilo de vida,
um modo de agir e comportar diferentes das épocas anteriores. Ditava modas,
comportamentos e regras de condutas para a nação brasileira. A Era Vargas promoveu uma
130
transformação nos hábitos, na economia, nos costumes e nos quadros culturais. O Estado por
meio da ideologia política nacionalista, autoritária e modernizante passou a ditar novas
normas sociais, regulando-as para as exigências históricas daquele momento: a
industrialização e a urbanização.
Como ressaltado, o governo Vargas pretendia, por meio do seu projeto de
modernização do país, forjar um "novo" homem brasileiro, uma nova nação, uma nova
mentalidade mais urbana e pragmática. Esse projeto se assentava sob o cientificismo e o
tecnicismo para a promoção do progresso e industrialização do Brasil.
Na sociedade brasileira ainda perdurava uma economia agrária, que conformava a
mentalidade, o estilo de vida e a política. Getulio Vargas não propôs a eliminação total das
formas tradicionais de dominação política e econômica, cuja representante era a elite agrária.
Ele procurou cooptar a elite agrária para o âmbito do projeto, para que ao lado das novas
elites que surgiam, desempenhasse, sob a tutela do Estado, o papel de guia das massas. No
Brasil, a dificuldade em industrializá-lo esbarrava nesse aparato sociocultural tradicional da
sociedade marcadamente agrária. Para alterar esse quadro mental, social e político, houve
necessidade de introduzir elementos que fossem capazes de alterar essa condição decorrente
de culos de dominação colonial. O Estado procurou operar um conjunto de instrumentos
capazes de alterar esse quadro predominantemente rural. O esporte foi um deles.
O projeto de modernização de Vargas promoveu a reorganização do Estado, mudanças
políticas, econômicas ideológicas e de valores. A industrialização, até então incipiente no
país, tomou novas diretrizes. O cotidiano do brasileiro se modificou com a introdução de
novas tecnologias. A cultura urbana que foi se instaurando, passou a exigir da sociedade
valores e normas mais impessoais. Conceitos como disciplina, ordem, cooperação,
nacionalismo deveriam ser incorporados pela população. O esporte foi apontado como um
instrumento para modificar o estado de ser do brasileiro. As atividades físicas poderiam
aumentar o vigor físico e a produtividade, melhorar a saúde, proporcionar capacidade de
comando, dar noções de higiene, de disciplina e de competição, enfim poderia auxiliar na
formação do "novo" homem brasileiro.
Em Belo Horizonte, também se sentiu o peso dessas mudanças, apesar de a cidade ter
se industrializado, de fato, nas décadas posteriores ao Estado Novo. A elite local, nesse
momento de transformação, sentiu a necessidade de ajustar o seu modo de vida às exigências
provenientes da modernização da economia. A cidade, de um modo geral, precisou se adequar
às novas instituições, às novas atividades e ao poder industrial, que tudo isso estava apenas
131
principiando. Belo Horizonte viveu um momento de forte ambivalência e de oscilações
culturais, ao mesmo tempo em que preservava valores tradicionais, buscava incorporar novos
hábitos.
O MTC pode ser apontado como uma iniciativa para mudar o panorama pacato da
cidade. Ele incrementou a vida social e esportiva da capital. O grupo que o fundou e o
freqüentava teve que se reajustar e se adaptar aos valores modernos, aos valores dos "novos
tempos" que surgiam, entre eles o da prática esportiva. O esporte, como uma atividade
moderna e urbana, engendrava nas famílias tradicionais os novos conceitos de vida da
modernidade como disciplina, adestramento corporal, coragem, competição, trabalho em
equipe, harmonia, determinação, cuidados com a saúde e o corpo. Pelo esporte, apesar das
tradições que ainda as caracterizavam, as famílias tradicionais procuravam construir uma
imagem de modernidade, de progresso, de otimismo, de cosmopolitismo, não somente em
relação à cidade ou à sociedade em geral, mas dela mesma como um grupo privilegiado da
sociedade.
Para Bermam (1986), são vários os fundamentos da modernidade. Ele aponta dentre
eles as grandes descobertas das ciências físicas; a industrialização; a tecnologia; a aceleração
do ritmo de vida; a explosão demográfica; o crescimento urbano; a formação dos estados-
nações e seu crescente poder; os movimentos sociais de massa e nações e o mercado
capitalista mundial. Todas estas variáveis invadem a vida cotidiana das pessoas, envolvendo-
as com o ideal de modernidade. As pessoas passam a desejar, acreditar e buscar o progresso, o
novo, a prosperidade.
O MTC era um clube que apresentava aspectos considerados modernos à época.
Possuía um parque esportivo com equipamentos avançados, uma piscina com o melhor
tratamento de água do país, profissionais e técnicos especializados, que conferiam ao clube a
marca da modernidade. Por isso, tornou-se um objeto de desejo de muitas famílias de Belo
Horizonte. Ser sócio do MTC simbolizava estar em sintonia com o mundo moderno.
Com espírito aberto ao novo, os sócios procuravam ser freqüentadores assíduos do
clube e participar das diversas atividades por ele oferecidas. As medidas adotadas,
relacionadas à saúde e à higiene eram apontadas como afirmação de modernidade do clube e
foram bem aceitas pelos sócios, pela credibilidade que passavam os profissionais a elas
ligadas e pelas técnicas e aparelhagem modernas que o clube utilizava. A saúde dos sócios era
em aspecto bem fiscalizado e não se podia usar a piscina do clube sem antes passar pelos
exames médicos.
132
A gente nadava, freqüentava o clube, mas ninguém freqüentava a piscina sem
primeiro passar pelo exame medico. Dr. Jair e Dr. Jaci Roriz Pereira são os dois
médicos que começaram com a gente no Minas. (Depoimento Informal).
40
Além da saúde, a beleza corporal também passou a ser valorizada nesse período. Para
sr Abraham, "[...] as pessoas eram atraídas para o MTC, porque era o lugar de "gente
bonita, é gente bonita. Quem não quer uma menina bonita, quem não quer um rapaz bonito.
Só gente bonita e bacana". (Depoimento Informal).
41
No MTC, os associados procuravam pela prática esportiva diária modelar os músculos
e o físico. A natação, por exemplo, era considerada uma modalidade esportiva completa, pois
melhorava a condição física e de saúde do nadador e ainda conseguia modelar o corpo,
tornando-o atlético. A piscina, para os jovens, era utilizada para a natação, como uma
modalidade esportiva e a tudo aquilo que a ela estava ligada: disciplina, coragem, vigor físico,
melhoria da saúde. Também era considerada a praia de Belo Horizonte, onde se adquiria a cor
morena, revelando uma mudança de atitude em relação também à estética, como anunciado
pela Revista MTC.
Belo Horizonte tinha sol um sol imenso. Mas o povo se escondia medroso sob as
roupas espessas. E era como se não houvesse sol. Foi o Minas Tênis Clube que
trouxe o sol para Belo Horizonte. O sol e a piscina que ficou fazendo as vezes de
mar. E na piscina apareceram as primeiras carnes procurando a natureza, desejosa de
sol e de água, buscando a saúde na prática de esporte.
Os músculos foram ficando rígidos, a pele foi ficando morena, veio uma alegria
simples que ainda não havia. Esporte até então era futebol brigas, canelas
quebradas, paixão, grosseria, deselegância. A piscina do Minas Tênis clube teve a
função moral: mostrou que o esporte é amável diverte e estimula, disciplina e
alegra. (REVISTA MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, s.p., Acervo MTC).
Em outro artigo da Revista MTC, o autor Hugo Vieira falou sobre a inveja que as
garotas de Belo Horizonte sentiam pela cor das garotas cariocas e o papel que o MTC
desempenhou para modernizar o comportamento das moças de Belo Horizonte.
alguns anos, o moreno típico praiano era uma 'virtude' irresistível que a garota
mineira invejava quasi ao desespero da garota carioca. Por ser um moreno
'diferente', enfeitado e iluminado sempre por um sorriso amplo e belo. Moreno
liberal, espontâneo, espetacular, tropical.
40
Dados da entrevista concedida pela Srª Avani Santana. Pesquisa de campo realizada em 05 abr. 2006.
41
Dados da entrevista concedida pelo Sr Abraham. Pesquisa de campo realizada em 25 abr. 2006.
133
Nossos recursos de maquilage (delas) não eram suficientes para a exata imitação do
matiz. depois de graves e acaloradas discussões e controvérsias (!) que o sol
sim senhores, os raios solares bem dosados nos intervalos de alguns mergulhos,
dão uma tez abafante, de moreno hawaiano. Ora, o Minas Tênis Clube solucionou
cientificamente o problema e a garota de Belo Horizonte deixou de ser clorótica e
nevrálgica. Evoluiu, tem 'savoir-faire' aquático, os modelos de piscina caem-lhe
às mil maravilhas e não surgem apenas para exibições decorativas. Desapareceu
aquele tradicionalismo impecável, o medo invencível do ridículo, aquele exagero
senso de equilíbrio e aquele virtuosismo domestico. (REVISTA MINAS TÊNIS
CLUBE, 1941, s.p., Acervo MTC).
O uso constante da piscina, para a recreação ou para a natação, desembaraçava as
moças do constrangimento em exibir seus corpos e dava uma cor bronzeada aos jovens
membros do clube. A cor era componente fundamental para os padrões de beleza da época,
conforme apontou a s Alzira César: "No Minas era obrigatório você ter cor. Quem não
tivesse na nossa época cor ... Então você tinha que ir ao Minas, você tinha que ficar queimada.
Era a apologia do corpo moreno mesmo, não é? E era no Minas que a gente conseguia isso."
(Depoimento Informal).
42
Havia também outro tipo de espaço destinado para os cuidados relativos à estética.
Existia um salão de beleza que era divido em duas alas. Uma para atendimento feminino e
outra para o masculino. A srª Alzira César relembra o salão de beleza: "Era ali que você
cortava seu cabelo. Era ali que você fazia seu cabelo para as festas do Minas, para os
casamentos e as festas nas casas das famílias. Você ia a onde? No Minas. Eu me lembro das
meninas todo sábado de manhã fazendo unha." (Depoimento Informal).
43
O MTC promovia concursos de beleza feminina, de acordo com o modelo, o
referencial da época. Segundo Schpun:
[...] durante toda década de vinte, generalizam-se os concursos de beleza. Eles fazem
parte desse movimento mais geral, pelo qual os corpos femininos se tornaram mais
visíveis no espaço público, tanto quanto nas telas de cinema e nas páginas da
imprensa. Eles constituíam manifestação privilegiada do olhar social sobre a beleza
feminina. (SCHPUN 1999, p. 122).
Nesses concursos, sempre se destacava a beleza física, ligando-a também ao objetivo
de eugenia, conforme demonstra o artigo abaixo sobre o concurso de Miss Minas Gerais de
1937, que teve a primeira etapa realizada na piscina do MTC:
42
Dados da entrevista concedida pela Srª Alzira César. Pesquisa de campo realizada em 07 abr. 2006.
43
Dados da entrevista concedida pela Srª Alzira César. Pesquisa de campo realizada em 07 abr. 2006.
134
Nesta época em que a cultura physica ocupa lugar de relevo entre as iniciativas do
governo, tendentes a formar uma geração forte e sadia, movimentos como este
devem interessar a quantos almejar para o Brasil um typo racial puro e extreme de
caldeamentos nocivos. (ESTADO DE MINAS, 06 nov. 1938, Acervo MTC).
O autor tinha um olhar estritamente higienista: o lado mais mundano do concurso não
lhe interessava. Os higienistas propagavam que as mulheres deveriam ser fortes, viver ao ar
livre e cultivar o corpo para o aprimoramento físico e para a maternidade. Buscava-se a
aparência sã. O discurso oficial do Estado Novo buscava estabelecer um modelo de beleza no
qual prevaleciam algumas características em relação às outras. Assim, a mulher jovem, branca
e esbelta, próxima ao tipo ariano, formava esse ideal de beleza.
Os concursos de beleza eram uma forma de valorizar e preservar traços físicos dos
jovens
,
que eram importantes para a política de eugenia do governo federal e que passou a ser
considerado o ideal de beleza do momento. A juventude, a pele clara e a esbeltez, de acordo
com Schpun (1999), eram critérios de beleza femininos nesses concursos. Também o físico
trabalhado pelo esporte, a pele bronzeada, foram aos poucos sendo incorporados como
categorias definidoras do belo para as jovens sócias do MTC. Elas procuravam obter com o
uso da piscina a cor da carioca, com a prática de esporte, o corpo esbelto, no salão de beleza,
faziam a unha e penteavam os cabelos.
Os discursos ligados à oficialidade do Estado associavam os concursos de beleza às
preocupações higiênicas, eugênicas, médicas e disciplinares. A exposição do corpo feminino
nos concursos de beleza era destituída, pela visão oficial, de qualquer conotação sexual ou de
desrespeito à moral e aos bons costumes. A jovem, para se apresentar, deveria observar os
códigos de comportamento corporal da época.
A exposição do corpo feminino era algo novo para a jovem capital mineira. Nessa
época, ainda não era aceita com naturalidade como no dias atuais, nem mesmo encarada,
como propagava o discurso oficial, como necessário para o aprimoramento físico do
brasileiro. As jovens que freqüentavam o MTC sentiam o peso da moral mineira quando elas
apareciam de maiôs, seja na piscina, nos concursos que o clube promovia, nos campeonatos,
nos desfiles das festas do clube, em jornais e revistas. Em todos os depoimentos femininos
colhidos, relatos sobre as recriminações das freiras dos colégios, em que essas jovens
estudavam, por usarem maiô e nadar. Dessa maneira, fica evidente que, por parte da Igreja
Católica, havia certa restrição ao MTC, principalmente, em relação às moças. O colégio, onde
a srª Terezinha Vargas estudava, fez advertências a ela por usar maiô no clube. De acordo
135
com o depoimento dela,
[...] eu achava que no tempo do colégio existia, pelo menos quanto a mim, uma
crítica por usar maiô naquela época. Também de ter sido Miss Minas, eu sofria um
pouco. Um dia uma freira falou: 'Bem, você está em evidencia fora, vamos ver as
notas aqui'. Sabe, foi aí que meu pai foi ao colégio e disse que minha vida particular,
fora do colégio dizia respeito a ele. (Depoimento Informal).
44
Mesmo essas restrições mais conservadoras foram, portanto, enfrentadas pelos sócios,
pois o MTC fazia parte do cotidiano dessas pessoas e era no clube que eles praticavam
parte da sua sociabilidade. De certa forma, ali eles se iniciaram na aventura da modernidade.
De acordo com Hugo Vieira, cronista da Revista MTC, o clube contribuiu para a
mudança de comportamento das jovens minastenistas: elas se modernizaram.
Nisso é que reteve e aperfeiçoou sua personalidade maior, porque deslumbra, agora,
com esse encanto característico dos caprichos que variam do 'crochet' ao tênis. Troca
a agulha pela raquete ou ajusta um 'maillot' frente única sem nenhum atentado ao
equilíbrio. Torce no futebol e adora as rosas da Praça com igual veemência.[...]
Talvez esse novo roteiro social feminino possa parecer essencialmente anti-mineiro,
mas não o é. Tem que obedecer a um imperativo moderno, a um culto
necessariamente 'up-to-date'. [...] Finalmente, a garota, a minha, a sua, a nossa
garota, mesmo a garota neutra ganhou o senso da pressa e sabe (importantíssimo!)
que sem os esportes não conseguira ser tão linda por tanto tempo. Anda
esportivamente para a missa, esportivamente para a 'matinée', esportivamente para o
Minas Tênis e esportivamente para o seu bem [...] (REVISTA MINAS TÊNIS
CLUBE, 1941, s.p., Acervo MTC).
A exposição do corpo feminino na piscina, a prática de várias modalidades esportivas,
os departamentos modernamente equipados, a arquitetura, as festas e jantares, as horas
dançantes imprimiam ao clube ares de modernidade espelhada no Rio de Janeiro. Era uma
modernidade, porém, que manteve um diálogo constante com os valores da tradicional família
mineira.
Com base nessas duas imagens a da modernidade e a da tradição que foi se
construindo a imagem do clube. Este deveria se pautar por essas duas referências, que eram
pilares dos valores tradicionais dos mineiros, todavia, ao mesmo tempo era preciso estar
conectado com as inovações e atitudes modernas. O esporte foi se constituindo no elo
unificador do grupo e transitava entre o tradicional e o moderno.
As festas, os bailes de carnaval, as horas dançantes, eram atividades que atraiam os
44
Dados da entrevista concedida pela Srª Terezinha Vargas. Pesquisa de campo realizada em 10 abr. 2006.
136
associados para o clube, mas o esporte era a principal atividade agregadora. É interessante
observar que em todos os depoimentos, as horas dançantes foram lembradas, mas o esporte
foi descrito como a atividade que mais unia o grupo. Era importante para os sócios a prática
de alguma atividade física. O sócio encontrava no esporte um novo recurso para despertar
suas energias, como uma alternativa de adaptação aos "novos tempos". Foi em torno do
esporte que os sócios do MTC se mobilizaram e que se criou a família minastenista.
Dos depoimentos colhidos, apenas um dos entrevistado não foi esportista e sim
funcionário do MTC. Os outros eram sócios e praticaram algum tipo esporte. Todos nadaram,
e somente um entre eles o conseguiu participar de campeonatos por problemas de saúde. O
esporte que mais atraía, segundo eles, era a natação, por causa da piscina. A piscina era a
grande atração do MTC: ela simbolizava a praia e a modernidade de Belo Horizonte.
137
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo dessa dissertação é analisar a fundação do MTC em Belo Horizonte, no ano
de 1935, procurando associá-la ao contexto político e ideológico do Estado Novo,
principalmente, no que se refere à apropriação, por parte do clube, do discurso governamental
em relação à prática esportiva e à modernização.
O esporte era visto, pelos teóricos do Estado Novo, como um instrumento educativo,
fundamental para a formação cívica da juventude brasileira. Foram atribuídas ao esporte
qualidades educativa e formativa. Para essa dissertação, basicamente, escolhemos trabalhar os
aspectos do esporte que poderiam contribuir para a construção do "novo" homem brasileiro,
concebido pelos ideólogos do Estado. Os aspectos mais relevantes da pesquisa recaíram sobre
elementos e questões que pudessem melhor elucidar o discurso construído e amplamente
divulgado, pelo Estado Novo, sobre a necessidade de o aprimoramento da força física e do
dever cívico dos jovens. Ser forte e também comprometido com os ideais de nação eram
considerados pré-requisitos para aumentar a produtividade econômica. Como carro-chefe da
economia, a escolha recaiu sobre a indústria, considerada como atividade capaz de promover
o desenvolvimento do Brasil.
A prática da educação física poderia contribuir para a melhoria da saúde da população,
pois se considerava à época que o brasileiro possuía uma predisposição para contrair
moléstias. O esporte teria também uma função disciplinar capaz de moldar a mente dos
atletas. A disciplina e a capacidade de auto-superação eram qualidades identificadas, pelo
pensamento hegemônico da época, como fundamentais a um contexto de mudanças
modernizadoras. Fazia-se, portanto, necessário incutir na sociedade valores e atitudes
condizentes com a nova ordem que se queria implantar.
Os teóricos da educação física, do Estado Novo, esperavam que a atividade física
atuasse no corpo e na mente dos esportistas, provocando uma transformação corporal e
mental. Além disso, acreditavam que o esporte possuía em caráter cívico, que poderia servir
aos interesses de legitimação do novo regime instaurado por Vargas, à medida que fosse um
instrumento para educação dos jovens nos moldes estabelecidos pelo Estado.
A conjuntura de fundação do MTC foi marcada pela busca constante do "novo". O
ideal de renovação passou a impulsionar as reformas sociais, econômicas e políticas. Isso não
significou que Vargas promoveu uma mudança radical na sociedade brasileira. O arranjo
138
institucional, político e cultural arquitetado por Getúlio Vargas amalgamava novas e antigas
posturas, procurando atender a diferentes interesses políticos e econômicos. Dessa forma, as
oligarquias agrárias e as novas elites urbanas encontraram espaços para manifestar seus
interesses.
O Estado buscou impulsionar a industrialização e a urbanização, por considerá-las
importantes para o desenvolvimento do Brasil. Para tanto, concebeu um projeto
modernizador, que procurava transformar a nação brasileira em uma nação industrializada.
Considerava-se ser necessário introduzir na sociedade brasileira novos hábitos e valores, para
adequá-la às transformações pelas quais o Brasil estava passando. Projetou-se a formação de
um "novo" homem nacional, com maiores condições de atuar na construção e
desenvolvimento de uma "nova" nação.
É com esse significado que o esporte é analisado nessa dissertação, ou seja, o esporte
era considerado um elemento chave para o projeto de modernização de Getúlio Vargas.
Assim, a partir da relação estabelecida entre a sociedade e o Estado, o governo procurou
incutir na população a necessidade de adesão à causa nacional e a desejar o novo. A
propaganda e a educação foram, amplamente, utilizadas com essa finalidade. A educação
física, como um conteúdo da educação formal, também serviu a esse objetivo, o de aprimorar
a mente e o físico dos jovens brasileiros.
A relevância política da prática de esportes decorria da crença, compartilhada pelos
teóricos, governantes e pela população de que os valores a ela inerentes eram fortemente
educativos, no sentido de contribuir para fortalecer o civismo e do amor à pátria. Outro fator
que dava proeminência à educação física, era a possibilidade que ela oferecia para a abertura
de novos espaços de mobilização social e de participação social sob controle de alguma
autoridade, educacional e/ou governamental.
Aos jovens e às crianças era conferido um papel, extremamente, dinâmico no projeto
político do Estado Novo. Daí a necessidade de o Estado incentivar a construção de espaços
para mobilização ordeira da juventude. Os clubes, as ligas esportivas, as praças de esportes,
escolas, oficinas, colônias de férias deveriam funcionar como espaço para educação e para a
preparação física da juventude, tornando-a mais forte, sadia e bela. As atividades
desenvolvidas nesses locais deveriam agregar um sentido cívico, capaz de despertar o
interesse dos jovens pela causa nacional.
Em conjunto com a prática esportiva, foram valorizados o culto à bandeira brasileira e
o canto do hino nacional nas escolas, agremiações esportivas, as cerimônias oficiais, nos
139
torneios esportivos. O governo federal buscava, com determinação, fortalecer o sentimento
nacionalista na população brasileira. Era comum aos atletas participarem dos desfiles oficiais
em datas cívicas. Assim, pelo somatório da educação física, com disciplina e espírito
combativo, procurava-se aprofundar a formação da consciência patriótica dos jovens
brasileiros. Podemos, portanto, constatar que o propósito político da educação física era o de
contribuir para o reforço em cada criança e em cada jovem do sentimento de amor à pátria,
além de demonstrar que cada cidadão tinha uma parcela de responsabilidade pelo
crescimento, pela ordem e pela segurança do país.
O modelo de nacionalismo, propagado por Getúlio Vargas, buscava transformar a
nação em um todo orgânico – moral, político e econômico. A valorização extrema do
nacionalismo conferia à nação supremacia sobre o Estado, que, todavia, era considerado como
principal instrumento de realização do ideário da nacionalidade. O Estado procurou, então,
utilizar o esporte como um meio eficaz de desenvolvimento do sentimento de identidade
nacional e passou a incentivar e a financiar a construção de praças e parques esportivos.
O MTC nasceu nessa conjuntura política e ideológica, em que se privilegiava o novo,
e o esporte era apontado como meio de preparação moral e física da juventude.
O clube foi fundado pelo setor médio letrado e pelas elites da sociedade de Belo
Horizonte, com objetivo de desenvolver o esporte na cidade, além de contribuir para o lazer
de seus sócios. Sua orientação era plenamente compatível com pensamento ideológico dos
teóricos do Estado Novo. Nesse sentido, o esporte praticado, na agremiação, deveria ser
patriótico, sadio, otimista e coerente aos apelos da modernidade.
A abordagem estadonovista do esporte era fundamentada em bases científicas,
modernas e racionais. Ações médicas e pedagógicas foram inseridas no esporte, para melhor
contribuir para o desenvolvimento saudável do corpo, da moral e do caráter do individuo.
O projeto de fundação do MTC obteve o apoio estatal, pois seus objetivos para o
esporte se enquadravam nas propostas do Estado Novo. O esporte praticado no MTC seguia
os preceitos modernos, científicos e racionais estabelecidos pelo Estado e era também
perpassado por pressupostos sanitaristas e eugênicos. No Estatuto do MTC, de 1937, ficou
estabelecida a sua finalidade: "promover entre os sócios, a prática de toda sorte de jogos
esportivos, exercícios atléticos, propugnando pelo desenvolvimento da cultura física, racional
e principalmente, da cultura física infantil". (EDIÇÃO CORRELATA, 1937, p. 3, Acervo
MTC).
Assim, é possível inferir que a pretensão dos fundadores do clube não era somente a
140
de criar um espaço de lazer para a elite local, mas de construir um clube onde fosse possível
unir a prática do esporte ao aprimoramento e aperfeiçoamento físico e moral do cidadão. O
apoio governamental recebido se deveu, provavelmente, a esse fato, pois as iniciativas
privadas que estivessem em sintonia com as orientações políticas e ideológicas de Vargas em
relação ao preparo da juventude, de acordo com o Art.132 da Constituição de 1937, poderiam
receber apoio do Estado. A contribuição do poder público, portanto, para a fundação do MTC
(o arrendamento do terreno com as benfeitorias) demonstra a estreita aliança entre o MTC e o
Estado. Foi uma aliança pautada pelos ideais de modernização, exaltação da nação, pelo
adestramento do corpo e pela valorização da saúde. Houve, de certa forma, uma dupla aliança:
o MTC precisava do governo para ser construído e o grupo que o idealizou sabia disso. Esse
grupo, por isso, procurou desde o início obter o apoio dos governantes, nas esferas federal,
estadual e municipal. Por outro lado, estava explícito que os governantes necessitavam de
espaços similares ao MTC para difundir e afirmar suas convicções modernizadoras e
higienistas.
A educação física e educação moral e cívica, oferecidas pelo clube, eram peças chaves
para a socialização dos jovens nos moldes ditados pelo Estado. As organizações recreativas e
esportivas, como o MTC, deveriam criar nos sócios a disposição para internalizar os novos
saberes divulgados pelo governo central, na busca de formação de uma nova e moderna
mentalidade no Brasil. Elas deveriam colaborar para a consolidação dos sentimentos de
nacionalidade e afirmar, por meio do esporte, a importância do princípio da autoridade e da
ordem. Assim, lazer e esporte, no MTC, serviam de instrumentos de transformação social, ao
trabalhar em defesa da cultura e da civilização brasileira.
A influência do MTC no esporte em Minas Gerais se fez sentir logo de imediato. O
clube foi modelo para a construção de outras praças esportivas no estado e preparou
instrutores para atuarem em outras localidades. Em Belo Horizonte, sua contribuição para o
desenvolvimento do esporte foi, sem dúvida, muito grande. Foi a partir da sua fundação que
muitas associações, agremiações e federações surgiram, na capital, com o objetivo de
organizar e consolidar diversas modalidades esportivas.
Segundo o discurso pronunciado por Getúlio Vargas, na inauguração da sede social do
clube, em 1940: o "Minas Tênis Clube é uma escola destinada ao aperfeiçoamento e formação
do caráter dos jovens brasileiros". (REVISTA MINAS TÊNIS CLUBE, 1941, s/p, Acervo
MTC). Esperava-se, assim, que as práticas esportivas adotadas pelo MTC pudessem servir de
exemplo para toda a juventude brasileira.
141
Belo Horizonte mudou a sua fisionomia com a construção do MTC, que passou a ser
ponto de referência para a cidade, local onde se reunia a elite da sociedade belorizontina. Era
o ponto de encontro de políticos, intelectuais, jornalistas, jovens, enfim de pessoas ilustres da
capital de Minas Gerais. O clube, desde a sua fundação e ao longo dos anos, consolidou-se
como um local de congraçamento e convívio das elites e da classe média letrada.
Pode-se deduzir, portanto, que o MTC foi um agente importante para o
desenvolvimento do esporte em Belo Horizonte e que contribuiu para formação de uma
mentalidade mais moderna, conectada com as práticas desportivas e a valorização da saúde.
142
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(Acervo MTC).
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ESTADO DE MINAS. Belo Horizonte, 28 nov. 1940. (Acervo MTC – CLI 00008).
ESTADO DE MINAS. Belo Horizonte, 06 nov. 1938. (Acervo Histórico MTC, CLI 00004).
ESTADO DE SÃO PAULO, São Paulo, 28 nov. 1937. (Acervo MTC – CLI 00001).
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 24 mai. 1936 (IEPHA)
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 02 nov. 1937. (Acervo Histórico MTC, CLI-00002).
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 27 nov. 1937 (Acervo MTC – CLI 00001).
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 28 nov. 1937 (Acervo MTC – CLI 00001).
149
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 02 dez. 1937. (Acervo Histórico MTC, CLI-00002).
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 25 dez. 1937 (Acervo MTC – CLI 00003).
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 12 mai. 1940. (IEPHA).
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 14 mai. 1940. (Gerencia do Patrimônio Histórico
Urbano – PBH. Processo 01-053210-95.66, pasta 00192).
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 16 nov. 1941. (Acervo Histórico MTC, CLI-00010).
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 12 nov. 1942. (Acervo Histórico MTC, CLI-00012).
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 27 nov. 1942 (Acervo MTC – CLI 00013).
FOLHA DE MINAS. Belo Horizonte, 15 nov. 1944 (Acervo MTC – CLI 00017).
FOLHA DE SÃO PAULO. São Paulo, 28 nov. 1937 (Acervo MTC – CLI 00001).
JORNAL MINAS GERAIS. Belo Horizonte, 19 nov. 1940. (Acervo MTC – CLI 00008).
JORNAL MINAS GERAIS. Belo Horizonte, 01 nov. 1942. (Acervo Histórico MTC, CLI-
00012).
JORNAL MINAS GERAIS. Belo Horizonte, 19 nov. 1942. (Acervo Histórico MTC, CLI-
00012).
LIVRO DE OURO. (Acervo MTC).
O DIÁRIO, Belo Horizonte, 12 dez. 1937. (Acervo MTC – CLI 00003).
O DIÁRIO, Belo Horizonte, 12 nov. 1944. (Acervo MTC – CLI 00016).
O DIÁRIO, Belo Horizonte, 15 nov. 1944. (Acervo MTC – CLI 00017).
O GLOBO, Rio de Janeiro, 29 dez. 1942. (Acervo MTC, CLI-00013).
O JORNAL, Rio de Janeiro, 27 nov. 1937.(Acervo MTC, CLI 00001).
150
O JORNAL, Rio de Janeiro, 28 nov.1937. (Acervo MTC, CLI 00001).
O RADICAL. Rio de Janeiro, 18 dez. 1937. (Acervo MTC – CLI 00003).
SABINO, Gerson. Relatório da organização do Minas Tênis Clube. Belo Horizonte, set. 1937
(Acervo MTC Documentos Avulsos/datilografado.)
REVISTA BELLO HORIZONTE, Belo Horizonte, 5 set. 1935, s/p. (IEPHA).
REVISTA SPORT IlLUSTRADO, Rio de Janeiro, n.158, 3ºAnno, 17 abr. 1941. (Acervo
Histórico MTC, CLI-00009).
REVISTA MINAS TÊNIS CLUBE. Belo Horizonte, jul, 1941.(Acervo MTC)
REVISTA MONTANHEZA, ano III, n. 39, jul/ago. 1937, p.30 (IEPHA).
SPORT ILLUSTRADO, Rio de Janeiro, 07 dez. 1937. (Acervo Histórico MTC, CLI-00006).
151
APÊNDICE A – DEPOIMENTOS
CASTRO, Avani Santana de (05 abr 2006). Nasceu em 1929. Morava próximo ao MTC e fez
parte da primeira turma de natação. Em 1939 ganhou uma medalha do Governador Benedito
Valadares. Assistiu a inauguração do clube e era freqüentadora assídua do clube e das festas.
PASSOS, Abraham da Silva (25 abr.2006). Nasceu em 1924 na Bahia e, veio para Belo
Horizonte em 1941. Seu pai trabalhou na construção do MTC e foi por intermédio do pai que
ingressou no clube. Casou-se com uma funcionária do MTC, trabalha no MTC desde 1943, é
um dos funcionários mias antigo. Começou como roupeiro, foi fiscal, trabalhou em carnavais
e recepções para autoridades.
REBELO, Alzira de Almeida César (07 abr. 2006). Nasceu em 1937, filha de lson César
Pereira da Silva, sócio fundador do MTC, juntamente com o irmão Gil César Pereira da Silva.
Graduada em administração de empresa e com especialização em sociologia. Morava a um
quarteirão do MTC. Praticava o vôlei e a natação no clube, foi laureada com medalhas pela
natação.
TAVARES, Célia Laborne (13 abr 2006). Nasceu em 1925, filha do Dr. Cazimiro Laborne
Tavares, médico oftalmologista, sócio fundador e diretor do MTC. Foi nadadora do clube
laureada por medalhas. Participou do desfile para o Presidente Vargas, quando este foi
inaugurar a sede social do MTC.
VARGAS, Terezinha (10 abr. 2006). Filha de industrial começou a freqüentar o MTC no
início da década de 1940, morava próximo ao clube. Começou a nadar e a competir muito
pequena, mas devido a problemas de saúde não pode continuar. Os irmãos praticaram esporte
no MTC. Foi eleita Miss Minas em 1948, atualmente não é sócia.
VIEIRA, Orlando Martins (24 abr 2006). Nasceu em 1925, filho do Dr. Joaquim Martins
Vieira, sócio fundador e diretor do MTC, graduado em engenharia. Morava próximo ao MTC.
Era nadador, laureado por medalhas. Ganhou sua primeira medalha em 1938 e ganhou a
travessia a nado em Lagoa Santa pelo MTC em 1940. Atualmente preside o Conselho
Deliberativo do MTC.
152
ANEXO A - O DISCURSO DO PRESIDENTE GETULIO VARGAS NA PARADA
ESPORTIVA DO MINAS TENNIS CLUBE
confortador reconhecer que a acçao pessoal do Governador Benedicto Valladares,
sempre attento aos múltiplos aspectos de uma administração inteligente e progressista, se faz
sentir, com especial desvelo, nesse sector pouco desenvolvido na educação nacional".
Disse o chefe da nação, referindo-se ao interesse actual do governe mineiro pela
solução do problema da cultura physica.
Foi o seguinte o discurso do presidente Getulio Vargas na festa esportiva de ante-
hontem no Minas Tennis Clube:
- Ao inaugurar as instalações do MTC, esplendida [...] de nosso carinho pela cultura
physical, quis exprimir o meu louvor a tão feliz iniciativa, não apenas com a minha presença,
mas através de palavras que desejo sejam ouvidas por todos os brasileiros como estímulo a
empreendimentos semelhantes.
Bem compreendo o alcance e a importância immediata do problema de melhoria das
condições physicas do homem, os vossos administradores não cessam de empenhar-se pela
obtenção dos meios adequados ao aperfeiçoamento das novas gerações. A construção do
moderno e amplo estádio que inauguramos feita pelo próprio Governo, exemplifica esse
louvável empenho que se traduz no levantamento de 35 praças de jogos athleticos nas
principais cidades do Estado.
É confortador reconhecer que a acção pessoal do governador Benedicto Valladares,
sempre atento aos múltiplos aspectos de uma administração inteligente e progressista, se faz
sentir, com especial desvelo, nesse sector pouco desenvolvido na educação nacional e ahi
como nos demais, sabe mostrar-se perfeitamente identificada com as diretrizes renovadoras
do regime de 10 de novembro.
Impulsionar, o mais largamente possível, a cultura phisycal e obra de sadia
brasilidade. A educação do corpo, na ampla acepção da palavra significa também o cultivo de
nobres e excellentes atributos do espírito. Não a robustez e a saúde physicologica se
153
conseguem: nos gramados e quadras desportista. A agilidade, a destreza, a resistência
muscular estimulam a fortalecem aptidões intelectuais de alta ascendência no
desenvolvimento harmônico da personalidade. A percepção rápida e o sentido exacto das
reações não constituem as únicas qualidades que temos de elogiar no athleta, porque [ ]
também adquire a firmeza nas decisões, a segurança da acção, o habito sallutar da disciplina
consciente e o espírito de solidariedade e cooperação desinteressada.
Dos resultados immediatos do esforço dos esportistas já recolhestes, jovem mineiros, o
merecido premio, através dos torneios e campeonatos em que saístes vitoriosos.Mas, acima
dessas satisfações transitórias deveis colocar o objectivo mais alto da preparação para as
missões que o futuro nos queira reservar. Como defensores do nosso patrimônio moral e da
civilização que estamos construindo, tenaz e pacificamente, ao lado dos povos irmãos da
América.
O espetáculo deste desfile, dessa admirável parada da juventude não é felizmente, uma
imagem solitária a refletir-se na minha memória. Desperta e evoca a lembrança de outros
idênticos assistidos em outras partes do nosso vasto território. Por isto [ ] destas montanhas,
próprias a devassar os largos horizontes pátrios num transporte de emoção cívica, pressinto e
antevejo a marcha, rumo ao futuro das legiões moças do Brasil, [ ] e destemerosas, levando
nas mãos ágeis e no animo viril o glorioso destino dos jogadores de uma nova pátria."
(Digitado pela autora da dissertação)
154
ANEXO B – ILUSTRAÇÕES
Estatuto do Minas Tênis Clube
Fonte: Acervo MTC.
155
Aniversário do Minas Tenis Clube
Fonte: Revista Minas Tenis Clube, 1941.
156
Noite de gala no Minas Tênis Clube
Fonte: Revista Minas Tênis Clube (1941)
157
Instantâneos
Fonte: Revista Minas Tênis Clube (1941)
158
Departamento Feminino
Fonte: Revista Minas Tênis Clube (1941)
159
Departamento Infantil
Fonte: Revista Minas Tênis Clube (1941)
160
Fisioterapia
Fonte: Revista Minas Tênis Clube (1941)
161
Departamento Médico
Fonte: Revista Minas Tênis Clube (1941)
162
Piscina
Fonte: Revista Minas Tênis Clube (1941)
163
O Minas Tênis Clube no conceito do Presidente da República
Fonte: Revista Minas Tênis Clube (1941)
164
Livro de Ouro
Revista Minas Tênis Clube (1941)
165
Reportagem sobre a Drogaria Araújo
Fonte: Revista Minas Tênis Clube (1941)
166
Reportagem "Como se deve praticar o esporte"
Fonte: Revista Minas Tênis Clube (1941)
.
167
Reportagem do Jornal Folha de Minas, 28 nov. 1937
Fonte: Acervo MTC.
168
Reportagem do Jornal Folha de São Paulo, 27 nov. 1937
Fonte: Acervo MTC.
169
Folha de Minas, 14 de maio de 1940, p.14
Fonte: Acervo MTC.
170
Parque infantil do MTC (1942)
Fonte: Acervo MTC.
Parque e tanque infantil do MTC (1942)
Fonte: Acervo MTC.
171
Inauguração da praça esportiva do MTC (1937)
Fonte: Acervo MTC.
Crianças no parque infantil do MTC
(final da década de 1930)
Fonte: Acervo MTC.
172
Piscina do MTC e trampolim (década de 1940)
Fonte: Acervo MTC.
Nadador Orlando Martins Vieira (1939)
Fonte: Acervo MTC.
173
Trampolim da piscina década de 1940
Fonte: Acervo MTC
O técnico de natação Carlito e a nadadora
Sieglinda Lenk na inauguração da praça de esporte em 1937
Fonte: Acervo MTC.
174
Exibição da ginástica do prof. Macedo no MTC (1944)
Fonte: Acervo MTC.
Exibição da ginástica do prof. Macedo no MTC (1944)
Fonte: Acervo MTC.
175
Exibição da ginástica do prof. Macedo no MTC (1944)
Fonte: Acervo MTC.
Exibição da ginástica do prof. Macedo no MTC (1944)
Fonte: Acervo MTC.
176
Exibição da ginástica do prof. Macedo no MTC (1944)
Fonte: Acervo MTC.
Corridas de automóveis no MTC (1937)
Fonte: Acervo MTC.
177
Figura 62 - Baile no MTC na década de 1940
Fonte: Acervo MTC.
Baile no MTC na década de 1940
Fonte: Acervo MTC.
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