Download PDF
ads:
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Centro de Ciências Sociais Aplicadas
Programa de Pós – Graduação em Educação
Base de Pesquisa: Gênero e Práticas Culturais – Abordagens
Históricas, Educativas e Literárias
A prática docente de Myriam Coeli na década de 1960
Amélia Cristina Reis e Silva
Orientadora: Profª Drª Maria Arisnete Câmara de Morais
NATAL – RN
Novembro/2005
ads:
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
U
U
n
n
i
i
v
v
e
e
r
r
s
s
i
i
d
d
a
a
d
d
e
e
F
F
e
e
d
d
e
e
r
r
a
a
l
l
d
d
o
o
R
R
i
i
o
o
G
G
r
r
a
a
n
n
d
d
e
e
d
d
o
o
N
N
o
o
r
r
t
t
e
e
Centro de Ciências Sociais Aplicadas
Programa de Pós – Graduação em Educação
Base de Pesquisa: Gênero e Práticas Culturais – Abordagens
Históricas, Educativas e Literárias
A prática docente de Myriam Coeli na década de 1960
Amélia Cristina Reis e Silva
Orientadora: Profª Drª Maria Arisnete Câmara de Morais
NATAL – RN
Novembro/2005
ads:
U
U
n
n
i
i
v
v
e
e
r
r
s
s
i
i
d
d
a
a
d
d
e
e
F
F
e
e
d
d
e
e
r
r
a
a
l
l
d
d
o
o
R
R
i
i
o
o
G
G
r
r
a
a
n
n
d
d
e
e
d
d
o
o
N
N
o
o
r
r
t
t
e
e
Centro de Ciências Sociais Aplicadas
Programa de Pós – Graduação em Educação
Base de Pesquisa: Gênero e Práticas Culturais – Abordagens
Históricas, Educativas e Literárias
A prática docente de Myriam Coeli na década de 1960
Amélia Cristina Reis e Silva
Orientadora: Profª Drª Maria Arisnete Câmara de Morais
NATAL – RN
Novembro/2005
Catalogação da Publicação na Fonte. UFRN / Biblioteca Setorial do CCSA
Divisão de Serviços Técnicos
Silva, Amélia Cristina Reis e.
A prática docente de Myriam Coeli na década de 1960 / Amélia Cristina Reis e Silva. – Natal,
2005.
130 p.
Orientadora: Profª. Drª. Maria Arisnete Câmara de Morais
Dissertação (Mestrado em Educação) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Sociais
Aplicadas. Programa de Pós-Graduação em Educação.
1. Educação - Tese. 2. Professora – Tese. 3. Myriam Coeli - Tese. 4. Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte –
Tese. I. Morais, Maria Arisnete Câmara de. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.
RN/BS/CCSA CDU 371.13 (81) (043.3)
Dissertação apresentada como exigência parcial à
obtenção do título de Mestre em Educação, à
Banca Examinadora do Programa de Pós-
graduação em Educação da Universidade Federal
do Rio Grande do Norte, sob a orientação da Profª
Drª Maria Arisnete Câmara de Morais.
A prática docente de Myriam Coeli na década de 1960
Dissertação defendida em: _____/_____/_____
Mestranda: Amélia Cristina Reis e Silva
Banca Examinadora
______________________________________________________
Profª Drª Maria Arisnete Câmara de Morais – Orientadora / UFRN.
______________________________________________________
Profª Drª Rosanália de Sá Leitão Pinheiro/UFRN – (Titular).
______________________________________________________
Profª Drª Raquel Lazzari Leite Barbosa/UNESP – (Titular).
______________________________________________________
Profª Drª Ilane Ferreira Cavalcante/UNP – (Suplente).
A
A
G
G
R
R
A
A
D
D
E
E
C
C
I
I
M
M
E
E
N
N
T
T
O
O
S
S
A Deus pela graça da vida.
À professora Maria Arisnete Câmara de Morais, não apenas pela
orientação deste trabalho, mas pelo acolhimento e amizade desde a Iniciação
Científica.
À professora Rosanália de Sá Leitão Pinheiro, figura marcante na minha
formação.
Aos componentes da Base de Pesquisa: Gênero e Práticas Culturais –
abordagens históricas, educativas e literárias, amigos e amigas de estudo e
discussões durante a trajetória acadêmica.
A todos os que formam o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande
do Norte, pela disponibilização do arquivo.
Aos familiares, em especial ao meu pai Egídio, por ter estado sempre
presente na minha caminhada.
Aos amigos Daniela Fonsêca Vieira e Manoel Pereira da Rocha Neto,
pela amizade e partilha de angústias e vitórias.
A todos os informantes, indispensáveis para a construção desta
pesquisa a quem eu agradeço sem citar nomes, com o receio de que a
memória me deixe cometer a injustiça de esquecer alguém.
À família de Myriam Coeli, na pessoa do seu filho, o professor Eli Celso
de Araújo Dantas da Silveira, pela disponibilização do acervo da família.
À memória de Myriam Coeli de Araújo Dantas da Silveira, professora
cuja prática docente analiso neste trabalho.
Ao Instituto de Educação e Reabilitação de Cegos do Rio Grande do
Norte, onde a convivência passou a ser não apenas de um local de trabalho,
mas de aprendizado para conviver com as diferenças.
Dedico à memória de minha mãe,
Rita Alzira dos Passos, presença
viva que a distância física não afasta.
R
R
E
E
S
S
U
U
M
M
O
O
O presente trabalho tem como objetivo reconstituir o perfil biográfico e as
práticas pedagógicas da professora Myriam Coeli de Araújo Dantas da Silveira,
na Escola Profissionalizante da Rede Federal de Ensino do Rio Grande do
Norte, na década de 1960. A escolha do período é justificada por ser esse um
tempo de importantes mudanças na Educação, a exemplo da implementação
da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, a 4.024/1961. Essa
professora contribuiu para a formação da sociedade letrada potiguar, atuando
na imprensa, no jornalismo e no magistério, atividade que analisei neste
estudo. Como se davam as suas práticas pedagógicas na década de 1960?
Este questionamento norteou a pesquisa e, na busca para respondê-lo, utilizei
como fonte o acervo do Arquivo Público do Rio Grande do Norte, do Instituto
Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, os jornais da época,
fotografias, cadernos de apontamentos de Myriam Coeli e entrevistas com
familiares, ex-alunos e contemporâneos dessa mestra. Verifiquei que a sua
atuação esteve sempre pautada nas mudanças educacionais por ela
vivenciada, realizando uma série de atividades na escola como: elaboração do
programa anual de Língua Portuguesa, organização de concursos literários e
uma prática alicerçada nas normas vigentes sem deixar de aliar o respeito e a
compreensão pelos seus alunos. Dessa forma, a análise não se resume
apenas à prática de uma professora, mas a configuração, em parte, da história
da educação do Rio Grande do Norte em um período determinado, a década
de 1960.
Palavras-chave: Educação. Professora. Myriam Coeli.
A
A
B
B
S
S
T
T
R
R
A
A
C
C
T
T
The present work has as objective to reconstitute the biographical profile and
pedagogical practices of the teacher Myriam Coeli de Araújo Dantas da Silveira,
in the Professionalizing scholl of the Federal Net of the Rio Grande do Norte, in
the 60’s years. The choice of the period is justified by being this the time of
important changes in the Education, as an example we have the
implementation of the Law of Lines of direction and Bases of the National
Education, the 4.024/1961. This teacher contributed for the formation of the
potiguar’s society scholar, acting in the press, the journalism and the teaching,
activity that I analyzed in this study. How the pedagogical practices of her had
happened in the 60’s years? This question guided the research and, in the
search to answer it I used as source the Public Archive of the Rio grande do
Norte, the Historical and Geographic Institute of the Rio grande do Norte, the
periodicals of the time, photographs, sketch books of Myriam Coeli and
interviews with familiar, former-pupils and contemporaries of this master. I
verified that her performance always was based in the educational changes
lived deeply for her, carrying through a series of activities in the school as:
elaboration of the annual program of Portuguese Language, organization of
literary competitions and an practice based on the effective norms without
leaving to unite respect and the understanding for the pupils. Of this form, the
analysis is not summarized only to the practices of a teacher, but the
configuration, in part, of the Rio Grande do Norte educational history in a
determined period, the 60’s years.
Key-words: Education. Teacher. Myriam Coeli.
S
S
U
U
M
M
Á
Á
R
R
I
I
O
O
1. O encontro com o objeto: por que Myriam Coeli? p. 10
2. Caminhos metodológicos p. 26
3. Quem é Myriam Coeli? p. 38
4. A importância de Myriam Coeli na sociedade p. 54
5. Configurando a década de 1960 p. 66
6. A Escola Profissionalizante da Rede Federal de Ensino do
Rio Grande do Norte: palcos de uma atuação
7. A prática docente de Myriam Coeli na década de 1960
p. 89
p. 99
8. Tecendo considerações p. 118
9. Referências p. 123
O
O
e
e
n
n
c
c
o
o
n
n
t
t
r
r
o
o
c
c
o
o
m
m
o
o
o
o
b
b
j
j
e
e
t
t
o
o
:
:
p
p
o
o
r
r
q
q
u
u
e
e
M
M
y
y
r
r
i
i
a
a
m
m
C
C
o
o
e
e
l
l
i
i
?
?
1. O encontro com o objeto: por que Myriam Coeli?
proposta deste trabalho é reconstituir o perfil biográfico, investigar
e analisar as práticas pedagógicas desenvolvidas pela
professora, escritora e jornalista Myriam Coeli de Araújo Dantas da Silveira,
bem como a sua contribuição para a construção da sociedade letrada norte-rio-
grandense, durante a década de 1960, na Escola Profissionalizante da Rede
Federal de Ensino do Rio Grande do Norte, hoje Centro Federal de Educação
Tecnológica do Rio Grande do Norte – CEFET/RN.
A
Expondo desta forma a delimitação do objeto que proponho desenvolver,
pode sugerir, aos olhos dos que lêem, uma decisão imediata e que de pronto
se pôs à minha frente. No entanto, um longo e algumas vezes árduo caminho
se delineou no trilhar da construção dessa pesquisa.
Muitas vezes não sabemos como algo acontece e surge em nossas
vidas. O caminho é incerto e nem sempre o desejado. No meu caso, tive a
oportunidade de enveredar por um espaço que sonhava ter um dia a
oportunidade: o da pesquisa. Esse mundo da pesquisa é instigante, exige dos
que o acolhem dedicação, persistência e, acima de tudo, paciência e
humildade para lidar com as dificuldades encontradas.
O início de todo esse contexto se deu quando do meu ingresso na
Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, no ano de 1999 no
curso de Pedagogia. O convívio com a comunidade acadêmica oportunizou-me
conhecer pessoas e espaços novos e, principalmente, professores que, em sua
grande maioria, falavam entusiasmadamente sobre seus trabalhos, eventos
científicos e as bases de pesquisa de que faziam parte.
Comecei a alimentar, no âmago, o desejo de também fazer parte de
algum desses grupos de estudo. Naquele momento, não sabia qual deles e
nem a verdadeira importância que aquilo teria na minha vida.
Posteriormente, fui amadurecendo a idéia, mas ainda não sabia ao certo
o que queria realmente estudar e se teria a oportunidade, tendo em vista que
nem todos têm esse privilégio. Eram várias as temáticas que, através dos
professores do curso de Pedagogia, eu ia tomando ciência de que eram
estudadas no Programa de Pós-Graduação em Educação
1
. Mas, logo no
primeiro semestre do ano de 2000, mesmo que ainda inconscientemente, a
temática de estudo a que iria me dedicar futuramente foi-me apresentada. Esse
encontro ocorreu através da Professora Marta Maria de Araújo com a disciplina
História da Educação Brasileira, que tinha como objetivos compreender as
finalidades gerais da educação escolar no Brasil e promover a integração do
ensino com a iniciação na investigação da educação brasileira, sob a
perspectiva histórica.
Deste modo, passei a me interessar pela História da Educação
Brasileira, indo ter consciência de que esse era o meu núcleo de interesse ao
cursar a disciplina Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1º e 2º graus,
ministrada pela professora Rosanália de Sá Leitão Pinheiro, que propunha em
seu programa a análise da dimensão pedagógica e política dos princípios
normativos da organização e prática da educação escolar brasileira.
1
O Programa de Pós-Graduação em Educação do Centro de Ciências Sociais Aplicadas –
CCSA, conta com oito linhas de pesquisa a saber: Práticas Pedagógicas e Currículo, Formação
e Profissionalização Docente, Educação Matemática, Corporeidade e Educação, Política e
Práxis da Educação, Cultura e História da Educação, Didática de Línguas e Literatura e Meios
de Comunicação e Educação.
A partir de então, aumentou o desejo de fazer parte de uma base de
pesquisa. Foi então no segundo semestre de 2000 que tive a oportunidade de
conhecer a professora Maria Arisnete Câmara de Morais e passar a fazer parte
da Base de Pesquisa Gênero e Práticas Culturais: abordagens históricas,
educativas e literárias, vinculada ao Núcleo de Estudos e Pesquisas em
Educação, Política e Cultura – NEPEPC. Iniciei já na condição de Bolsista de
Iniciação Científica do Conselho Nacional de Pesquisa – CNPq para fazer parte
do Projeto Integrado História dos Impressos e a Formação das Leitoras,
aprovado pelo CNPq no ano de 2000.
A referida base, tendo como referência o atual projeto, objetiva contribuir
para a historiografia da educação, a partir do século XVIII, tendo, dentre os
seus propósitos: investigar a participação de mulheres na construção de uma
sociedade letrada brasileira, especialmente a norte-rio-grandense; práticas de
professoras, literatas ou participantes ativas na sociedade que associavam
seus nomes ao esforço de educar gerações e de conquistar espaços e cargos
sociais.
Observando também as linhas de pesquisas desenvolvidas,
encontramos algumas delas assim distribuídas: educação, gênero e literatura;
história das práticas de leitura a partir do século XVIII; história da educação e
movimentos sociais; história dos impressos (livro e jornal) e a formação das
leitoras e dos leitores; a mulher educadora e escritora: no passado e no
presente. Procurando identificar a linha de pesquisa a que mais se adequava o
meu trabalho, inseri-me na que versa sobre a mulher educadora e escritora no
passado e no presente.
Abriu-se, então, um leque de oportunidades para que adentrasse
definitivamente no aprendizado do universo da pesquisa, através do convívio
com professores pesquisadores e estudantes de pós-graduação – tanto no
nível de mestrado quanto de doutorado – advindos de diferentes áreas de
estudo como: Letras, Pedagogia, Jornalismo, Sociologia, História e Serviço
Social. Essa diversidade na formação do grupo conduzia para um estudo mais
dinâmico e participativo, em que a colaboração de todos convergia para o
crescimento da coletividade.
Outro ponto que contribuiu significativamente para a minha formação foi
a possibilidade de participar dos seminários e estudos na disciplina Gênero,
Educação e Literatura ofertada pelo programa de Pós-graduação em
Educação.
As discussões decorridas dos estudos ali realizados, possibilitou-me o
engajamento na temática proposta, assim como também subsidiou a
introdução de novos conceitos teóricos e metodológicos necessários para a
formação do conhecimento no campo científico.
Este aspecto me fez conhecer autores como Roger Chartier, Pierre
Bourdieu, Michelle Perrot, Antônio Nóvoa, Clarice Nunes, Câmara Cascudo,
entre outros, que me fizeram perceber a diversidade de objetos que poderiam
ser estudados, assim como a ampliação das fontes utilizadas.
Chartier (1990, p.14) enfatiza o surgimento de novos objetos para
análise histórica. Para ele, esses objetos têm tanta importância quanto os
considerados tradicionais, “as atitudes perante a vida e a morte, as crenças e
os comportamentos religiosos, os sistemas de parentesco e as relações
familiares, os rituais, as formas de sociabilidade, as modalidades de
funcionamento escolar, etc.” Com esta abertura para novos objetos, a história
estabelece diálogos com outras disciplinas, como, por exemplo, a sociologia, a
psicologia, e a lingüística, possibilitando a utilização de novas fontes. Isto
representa a formação de novos campos para o historiador, por meio da
interlocução com os territórios correlatos.
Nesta mesma linha de raciocínio, Bourdieu (1989) diz que a
grandiosidade da pesquisa não está relacionada à extensão da figura
estudada, mas às relações que o historiador estabelece com conexões
maiores. Não se tem mais a idéia do objeto menor e insignificante. Toda a
riqueza de sentido desse objeto está muito mais atrelado à maneira como a
sociedade e o historiador destacam o referido objeto.
O fato ou sujeito histórico estudado não têm, desse modo, por si só,
maior ou menor relevância. Mas, configurar-se-á a partir das conexões que o
pesquisador for estabelecendo com a sociedade e analisando o contexto que
permeia o objeto abordado.
Como exemplo desses objetos considerados sem importância para a
pesquisa histórica, Perrot (1998, p.212), aponta as mulheres na sociedade
ocidental do século XIX que, gradativamente, foram conquistando oportunidade
no espaço público. Pois, na sua opinião, “as mulheres não são passivas nem
submissas. A miséria, a depressão, a dominação, por reais que sejam, não
bastam para contar a sua história. Elas estão presentes aqui e além. Elas se
afirmam por outras palavras, outros gestos.”
Nóvoa (1995, p.15) aponta para essa diversidade de objetos, quando
pontua que pesquisas que versam sobre a história de vida de professores são
uma ampliação para um novo modo de construção no campo científico.
Segundo o autor, “trata-se de uma produção heterogênea, de qualidade
desigual, mas que teve um mérito indiscutível: recolocar os professores no
centro dos debates educativos e das problemáticas da investigação.”
Desta forma, analisar práticas de professoras e suas histórias de vida,
proporciona o conhecimento mais próximo da realidade da educação. A partir
de então, torna-se compreensível a forma como o percurso de vida influencia
na ação docente do professor, uma vez que o pessoal e o profissional estão
intrinsecamente relacionados.
Um outro argumento que ratifica a importância deste tipo de estudo é a
histórica discrepância que o país tem apresentado entre as leis que tem regido
o ensino no decorrer dos anos, e a verdadeira prática desenvolvida nas
instituições escolares. Caso se parta da análise das práticas, pode-se
vislumbrar, de maneira mais efetiva, como acontecia o fazer pedagógico num
determinado período.
Corroborando com o pensamento de todos esses autores, Nunes (1990,
p.38) reflete sobre o processo de construção da pesquisa histórica.
Discorrendo inicialmente sobre os arquivos, revela uma situação compartilhada
pela grande maioria dos pesquisadores: a ânsia de encontrar um novo dado e
a angústia de ver esses mesmos dados destruídos pela ação impiedosa do
tempo.
Da mesma forma, o autor chama a atenção para a igual importância de
todo objeto de estudo, mesmo que se trate de um tema já estudado. A
originalidade destes está no diálogo estabelecido entre o pesquisador e o
objeto, uma vez que “o passado é inacabado, no sentido que o futuro o utiliza
de inúmeras maneiras. Daí a possibilidade, e para nós exigência, de que cada
geração reescreva a ou as histórias daqueles que a antecederam.”
É através desta reescrita que se busca aspectos do passado e se torna
possível identificar nossas raízes, sendo necessário, portanto, conhecer
diversos aspectos antes de selecioná-los. E, a partir dessa seleção, construir a
narrativa histórica, expressando, mesmo de forma não-intencional, a nossa
marca cultural.
Foi com esse intuito de conhecer a história passada que recorro a
Cascudo (1999, p.33) no livro História da Cidade do Natal. Ele mostra esta
cidade desde a sua fundação e construção das primeiras escolas, acrescido de
nomes que contribuíram para o processo de seu crescimento cultural e social.
Além das informações sobre o processo de desenvolvimento urbano e
social da cidade, encontro, logo nas páginas iniciais da obra, uma reflexão de
Cascudo que se remete diretamente para todos nós que escrevemos a história.
Isto significa o cuidado que se deve ter para não emitir juízo de valor. Diz ele:
“O precioso da História é a documentação para o futuro e não o juízo decisivo e
peremptório. Todos nós julgamos a História quando apenas escrevemos para a
História.”
Além do acesso a essas leituras, a assídua participação em encontros,
seminários, eventos acadêmicos e científicos, colaboraram para a minha
construção e avanço, como iniciante na pesquisa.
Durante esses encontros, participei de discussões pertinentes à História
da Educação, bem como assisti à apresentação de trabalhos que já estavam
sendo desenvolvidos, o que me proporcionava conhecer a metodologia, as
possíveis fontes a serem utilizadas e qual referencial teórico-metodológico
norteava todos os trabalhos.
Esses fatos me fizeram perceber a importância que tem para um futuro
pesquisador fazer parte da iniciação científica, provavelmente só os que
tiveram essa oportunidade poderão reconhecer. É um tempo de inquestionável
aprendizado, oportunidades e algumas vezes repreensões do orientador que,
só mais tarde, entendemos como momentos tão importantes quanto os outros
para o nosso amadurecimento intelectual.
Dentre essas ocasiões de aprendizado, destaco, no meu percurso, o da
ida aos arquivos. Na busca por informações para colaborar nas pesquisas
desenvolvidas pela minha orientadora, que estava realizando um estudo sobre
a professora e jornalista Francisca Nolasco Fernandes (Dona Chicuta) e Isabel
Urbana de Albuquerque Gondim
2
, tive oportunidade de visitar o Arquivo Público
do Estado, o Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte, a
Biblioteca Central Zila Mamede da UFRN, a Biblioteca da Escola Doméstica de
Natal, além do acervo particular da Professora Maria Arisnete Câmara de
Morais.
Nesse movimento de busca por algum dado histórico que pudesse
contribuir para a pesquisa, fui compreendendo o valor de temas que antes
considerava pequenos, mas que tinham um significado inquestionável. Aprendi,
também, a me emocionar, quando descobria alguma informação ainda não
revelada. Cheguei a vibrar quando depois de dias e dias debruçada sobre
jornais desgastados e empoeirados pelo tempo, localizava uma pequena nota
2
Essa pesquisa teve o seu resultado publicado no livro Isabel Gondim, uma nobre figura de
mulher, com edição de 2003 pela Terceirize Editora e Gráfica, integrando a Coleção
Mossoroense, Série Educação e Educadores do Rio Grande do Norte.
de fim de página, mas que sem ela não seria possível confirmar uma
informação.
No entanto, a busca nos arquivos nos traz também grandes decepções.
Decepção, ao ver que, muitas vezes, o material ali guardado não recebe o
tratamento adequado. Em alguns casos, isso acontece pela própria falta de
informação dos que ali trabalham, ou em outros casos pela ação maldosa dos
que numa atitude egoísta e desrespeitosa rasgam trechos, riscam e até
arrancam páginas dos livros e jornais ali guardados.
Decepção também, quando o próprio tempo se encarrega de destruir e
nos
negar aquela informação que tanto almejamos, mas que, depois de uma busca
incessante, temos que ter a humildade e utilizar aquilo que temos em mão,
tendo a consciência de que a pesquisa histórica nunca está acabada e que o
seu objeto
nunca estará esgotado, deixando margem para que outros pesquisadores
percebam outros caminhos, ou outro enfoque não contemplado para darem
continuidade ao seu trabalho.
Mesmo indo aos arquivos, continuava com outras atividades na base de
pesquisa e conhecendo outros trabalhos que estavam ali sendo desenvolvidos.
Assistindo seminários e defesas de teses e dissertações pude adquirir pistas e
dicas para desenvolver uma pesquisa futura.
Transcorridos alguns meses, precisava encontrar um objeto para
desenvolver minha pesquisa, algo que estivesse de acordo com os objetivos
propostos pelo Projeto Integrado já mencionado a que todos nós estávamos
ligados. Tendo consciência da imensidão de temas sobre os quais poderia me
deter mais detalhadamente, era preciso encontrar aquele com o qual tivesse
uma certa afinidade, pois tinha claro ser necessário uma identificação pessoal,
para que conseguisse enfrentar os entraves que, naturalmente, surgiriam por
todo o percurso.
Diante dessa busca, o vasculhar dos arquivos para mim já não era tão
inocente na procura por um único dado. Com o passar do tempo, o
pesquisador aprende a se deter em aspectos que inicialmente podem passar
desapercebidos, mas que muitas vezes revelam informações fundamentais
para a configuração de um período estudado. Como diz Mignot (2000, p.129) “é
uma educação do olhar em um insistente exercício de busca do visível no
invisível.”
Foi desta maneira que passei a observar mais detalhadamente aspectos
como propagandas, colunas sociais, avisos e a menção de nomes que
estavam presentes nas páginas de livros e jornais de um outro período
histórico. Nos jornais, verifiquei que os nomes de algumas figuras, a exemplo
do Presidente do Conselho de Contabilidade Paulo Lira Tavares, do Deputado
Federal José Arnaud, eram constantemente noticiados na imprensa local, fosse
por motivo de aniversário, fosse na participação de algum evento social, ou
ainda, escrevendo colunas jornalísticas como Ana Maria Cascudo (filha do
historiador Luís da Câmara Cascudo) que em 1960 escrevia uma coluna diária
intitulada Nota Musical, no jornal A República.
Percebi, que durante o século XIX e primeiras décadas do século XX, a
presença masculina era predominante no espaço público e que as mulheres
eram, na maioria das vezes, mencionadas geralmente em colunas sociais. Ou
seja, o nome das mulheres mencionadas aparece atrelado à importância do
marido e não pelo seu próprio prestígio. O que merece destaque é o atributo de
ser a mulher de um chefe político, de algum funcionário de alto gabarito, entre
outros casos como o que registra o jornal A República, na coluna intitulada
Sociais, registrando os aniversariantes do dia:
- Sra. Alice Godoi Bezerra de Medeiros, esposa do dr. José Augusto
Bezerra de Medeiros, Deputado Federal pela UDN, e ex Governador
do Estado.
(A REPÚBLICA, 05 de janeiro de 1950, p.6)
Ou ainda,
-
Sra. Darcilia Lima Caldas da Silva, esposa do des. Carlos Augusto,
ilustre membro do egrégio Tribunal de Justiça.
(A REPÚBLICA, 19 de janeiro de 1950, p.6)
No entanto, nem todas aceitaram apenas essa condição e muitas
mulheres romperam com o espaço privado e buscaram não só figurar em um
papel coadjuvante e desempenharam profissões como as de professora e
escritora. Almejavam assumir, então, o seu próprio espaço no meio social,
como pude constatar nessa mesma coluna com outras mulheres ao serem
mencionadas. Aqui um exemplo de uma figura feminina que é felicitada pelo
seu natalício e apontada uma de suas atividades e não a do pai ou do marido:
Faz anos hoje:
- Srta. Carolina Wanderley, membro da Academia de Letras do Rio
Grande do Norte.
(A REPÚBLICA, 04 de janeiro de 1950, p.6)
As mulheres da família Wanderley tiveram uma importante contribuição
na construção da sociedade letrada no cenário potiguar, destacando-se no
contexto das letras. Um outro exemplo é Sinhazinha Wanderley (tia de Carolina
Wanderley), educadora do Vale do Assú que viveu no período de 1876 a 1954.
Sua prática pedagógica foi analisada em Tese de Doutorado pela Professora
Rosanália de Sá Leitão Pinheiro no ano de 1998. Segundo a autora:
D. Sinhazinha era uma mulher diferente das outras
mulheres do seu tempo de sua condição sócio-cultural,
que ficavam limitadas ao espaço doméstico; ela usava as
possibilidades latentes que a cultura ofereceu, saindo do
anonimato doméstico e impondo-se enquanto
profissional, conseguindo o respeito e reconhecimento da
sociedade assuense. (p. 289).
Um outro exemplo é a figura da Professora Isabel Urbana de
Albuquerque Gondim que dedicou sua vida ao magistério e extrapolou até as
fronteiras do Rio Grande do Norte com a publicação de livros de sua autoria
que eram destinados à educação e boa conduta de jovens moças. De acordo
com Morais (2003, p.23), “Isabel Gondim é uma intelectual múltipla, com
produção em diversas áreas do conhecimento como a História, a Literatura, a
Dramaturgia e a Educação.”
Muitos outros exemplos poderiam ser enumerados aqui. Todavia, na
impossibilidade de elencar todos os nomes dessas mulheres que romperam
com o tradicional e ficaram, de certo modo, à frente dos costumes de sua
época, lutando para que hoje pudéssemos nós, mulheres, ocupar um lugar de
destaque no meio em que vivemos, apenas registro o agradecimento a essas
mulheres que tanto contribuíram para a formação de uma sociedade letrada.
Elas poderiam estar em uma escola, escrevendo poesias, livros, seus diários
íntimos ou participando de eventos sociais. O importante é que cada uma delas
deixou para nós, mulheres, um exemplo de luta e de conquistas na busca pelo
seu espaço.
Foi em um desses momentos de ida aos arquivos que se deu o meu
encontro com Myriam Coeli, embora algumas vezes já tivesse ouvido o seu
nome mencionado entre os membros da referida Base de Pesquisa e visto
algumas de suas obras em livrarias que guardam os poetas norte-rio-
grandenses. Quando algum livro novo é publicado, geralmente causa
curiosidade. Foi através dessa curiosidade, indo ao Instituto Histórico e
Geográfico do Rio Grande do Norte, que fui levada a folhear o título 400 nomes
de Natal, publicado em 2000 pela Prefeitura Municipal de Natal que encontrei
Myriam Coeli de Araújo Dantas da Silveira.
Várias figuras despontavam naquele espaço, tanto homens como
mulheres, como forma de reconhecimento à contribuição que todos ali contidos
tinham prestado à sociedade potiguar: fosse na política, educação, jornalismo,
literatura, ou de quaisquer outra forma, mas que, de uma maneira ou de outra,
tinham dado sua parcela de contribuição. Dentre esses nomes, um me chamou
especial atenção e o interesse foi quase que instantâneo. A página 569 deste
livro trazia o perfil de uma mulher que tinha conquistado um espaço como
jornalista, poetisa e professora. Essa mulher é Myriam Coeli de Araújo Dantas
da Silveira. Todavia, o que encontrei naquela obra não era suficiente para
conhecer quem tinha realmente sido essa figura. O que ali se encontrava era
apenas um pequeno relato biográfico.
A partir desse momento, a curiosidade foi crescendo. Quem foi Myriam
Coeli? O que fez? Onde atuou? Como foi sua atuação docente? O que e onde
escreveu? Esses questionamentos foram surgindo e se tornando uma
investigação cada vez mais aprofundada.
Comecei, então, timidamente, na procura por dados que viessem
colaborar para este estudo. Recolhi material, indo aos Arquivos encontrei
crônicas, poesias, relatos sociais e outros em jornais como A República, Diário
de Natal e Tribuna do Norte, publicações estas realizadas em diferentes anos,
era a Myriam Coeli jornalista. Visitando bibliotecas e sebos da cidade, descobri
alguns de seus livros. Percebi que encontrara a escritora. Por fim, pude
constatar, em todos os relatos biográficos a que tive acesso, que apesar de
Myriam Coeli ser muito mais conhecida como poetisa e jornalista, ela tinha
desempenhado uma outra função durante maior parte de sua vida: o ofício do
magistério. Fosse como professora ou técnica de educação, essa tinha sido a
função a que dedicara maior número de anos de sua vida.
Tive então a certeza de que encontrara o meu objeto de estudo. Voltei a
ler o Projeto Integrado História dos Impressos e a Formação das
Leitoras/CNPq (2000/2004) observando os seus objetivos e desenvolvendo o
estudo de acordo com a linha que estava relacionado.
No trilhar desse objetivo, continuei na busca de dados e, mesmo que
timidamente, apresentando os resultados em Congressos e Seminários. Na
condição de bolsista, participei de Congresso de Iniciação Científica, nos
Seminários do Centro de Ciências Sociais Aplicadas ou até mesmo em
grandes encontros como o XVI Encontro de Pesquisa Educacional do Norte e
Nordeste – EPENN, realizado na Universidade Federal de Sergipe em 2003 ou
o no 14º Congresso de Leitura do Brasil – COLE nesse mesmo ano na
Universidade de Campinas – SP.
A partir da construção desses artigos e das discussões durante as
apresentações em seminários, escrevi a minha monografia de final do curso de
Pedagogia, com o título Myriam Coeli: uma presença na educação natalense
na década de 1960. Compreendi que a atuação dessa mulher tinha sido ampla,
tanto no magistério quanto no jornalismo, e, por se tratar de um trabalho de
caráter inicial, realizei um recorte temporal assim como ressaltei aspectos de
sua vida. Percebi que a atuação profissional de Myriam Coeli tinha ocorrido
predominantemente no magistério. Como se tratava de um trabalho inicial,
trouxe relatos sobre os livros publicados, onde tinha atuado e um pouco da sua
atividade docente.
Na monografia, analisei a década de 1960, por se tratar de um momento
de efervescência nacional em todos os setores sociais, estando a educação
como um dos principais aspectos de mudanças. Dentre as transformações, um
destaque para a promulgação da 1ª Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional, a 4.024 de 20 de dezembro de 1961. Desse modo, assim como
várias outras regiões do país, o Estado do Rio Grande do Norte também foi
contagiado por todo esse processo de inovação.
Chegado o momento em que era preciso colocar um ponto final no texto,
considerando o tempo que se tem a cumprir, vem junto a aflição de não se ter
conseguido contemplar outros aspectos desejados em sua pesquisa. Mas, é
preciso ter a humildade de que é necessário parar em um certo momento e
depois, com a mesma persistência, retomar à investigação tendo a consciência
que sempre restará espaços para novas abordagens e novos olhares.
Com esse intuito, retomo nesta Dissertação a pesquisa sobre Myriam
Coeli, na qual pretendo analisar a sua prática pedagógica durante a década de
1960, na Escola Profissionalizante da Rede Federal de Ensino do Rio Grande
do Norte.
C
C
a
a
m
m
i
i
n
n
h
h
o
o
s
s
M
M
e
e
t
t
o
o
d
d
o
o
l
l
ó
ó
g
g
i
i
c
c
o
o
s
s
2
2
.
.
C
C
a
a
m
m
i
i
n
n
h
h
o
o
s
s
M
M
e
e
t
t
o
o
d
d
o
o
l
l
ó
ó
g
g
i
i
c
c
o
o
s
s
análise da História da Educação através de práticas de
professoras resulta em um estudo tão importante quanto qualquer
outro objeto histórico, tornando-se uma renovação dos modos de conhecimento
científico.
A
Abre-se, para o historiador uma ampliação de objetos a serem
pesquisados. Junto com essa diversificação de objetos, está atrelado o
interesse pela vida e fatos cotidianos, o que leva também, a se buscar novas
fontes que retratam o dia-a-dia de um período estudado e que, geralmente, não
é descrito nos documentos oficiais escritos. Segundo Galvão (1996, p.202),
As fontes não mais se restringem aos documentos
oficiais escritos, ganhando tanta importância quanto
esses a fotografia, a pintura, a literatura, a
correspondência, os móveis e objetos utilizados, os
depoimentos orais, etc. Qualquer indício de uma época
pode ser utilizado como fonte pelo historiador.
Por outro lado, Morais (1996, p.3) registra:
Pequenos gestos, os sentimentos, os valores, a mulher, a
infância, a morte, a loucura, o corpo, a festa, a fotografia,
a pintura, a maneira de ler, escrever, por exemplo, são
práticas culturais que não estão perdidas para a história.
Esses objetos de análise são tão importantes no estudo
histórico quanto os tradicionalmente analisados, como
por exemplo, a luta de classes, as grandes revoluções,
os grandes homens, os modos de produção, etc.
Nessa perspectiva, na contemporaneidade, são analisadas como objetos
de estudo os sujeitos que no decorrer de vários anos foram excluídos da
historiografia tradicional, destacando-se no campo da educação, a partir do
século XVIII, as pesquisas que versam sobre a criança, o deficiente e a mulher,
conforme Cambi (1999).
No que se refere às crianças, foi principalmente a partir do século XX
que as pesquisas procuraram conhecer sua história. Todavia, os estudos que
voltam sua abordagem para as crianças ainda se apresentam de forma
limitada, uma vez que geralmente se reportam a certas classes sociais e
generalizam a violência sofrida pelos menores.
De acordo com Fontana e Cruz (1997, p.19), os estudos que se
detiveram na reflexão das abordagens de aprendizagem da criança é um
exemplo da observação e generalização de um só grupo. A abordagem
inatista-maturacionista definiu um padrão de comportamento infantil a partir de
pesquisas realizadas nas primeiras décadas do século XX, com grupos de
crianças francesas e norte-americanas, estabelecendo padrões de normalidade
para as demais.
Já os deficientes, sejam estes portadores de deficiência leve ou grave,
foram objeto de estudos pedagógicos desde o século XVIII. A exemplo das
técnicas de recuperação desenvolvidas por Maria de Montessori (1965, p.27),
entendendo que “o problema da educação dos deficientes era mais de ordem
pedagógica do que médica”. Desse modo, durante dois anos, preparou
professores para observar e educar crianças excepcionais, adotando métodos
especiais. Posteriormente, seguiram-se as contribuições da psiquiatria infantil,
que desenvolveu um trabalho interativo entre deficiente e terapeuta ou
professor, com a utilização sobretudo de jogos.
As mulheres começam a figurar, mesmo timidamente, no século XVIII,
como Teresa Margarida da Silva e Orta, primeira mulher a escrever e a publicar
em Língua Portuguesa, analisada por Flores (2004).
No século XIX, a presença da mulher lutando pela instrução feminina e
educação, reivindicando a atenção de toda a sociedade é crescente. Morais em
seu livro Leituras de mulheres no século XIX (2002, p.76), mostra o processo
de formação da leitora, através de suas representações e que a reivindicação
das mulheres nesse século era pela instrução e, para tanto, usavam diferentes
táticas para conquistarem seus objetivos. A criação de espaços por parte
dessas mulheres não aconteceu de forma uniforme, mas com perdas, lutas, de
forma lenta e um desses caminhos foi aberto através da leitura. A autora
acrescenta: “As leitoras na verdade, não só buscavam caminhos, mas abriam-
nos. Não se limitavam apenas a ser mães de família e cultivar somente a
leitura de romances, mas também conquistavam diploma de médica e as
páginas dos jornais”
Cambi (1999, p. 390), enfatiza a emergência desses novos sujeitos.
O despertar das marginalidades exige uma ampliação da
educação e uma reconstrução da teoria, implica a
abertura de uma nova fronteira e a identificação de novos
itinerários e horizontes da educação e da formação.
A sociedade vai sofrendo modificações, o que proporciona o surgimento
de novos sujeitos como objeto de análise. Percebe-se a necessidade de
estudar os novos elementos, atribuindo-lhes tanta importância quanto os
anteriormente observados.
A pertinência ou não do estudo, não está diretamente relacionada à
extensão do objeto estudado, mas sim, às relações que o historiador e a
sociedade vão estabelecendo com estruturas maiores.
Abre-se, então, nesta linha de raciocínio, espaço para o desenvolvimento do meu objeto de estudo.
Conhecer a história da educação e os atores que contribuíram para a sua efetivação através das práticas de uma
professora: Myriam Coeli.
Para tanto, a investigação se amplia para que não seja analisada apenas a figura estudada, de forma
linear, mas todo o contexto social que perpassa sua prática.
Pretendo, dessa forma, vincular o nome de Myriam Coeli à estrutura das
relações que permearam o seu contexto social, levando em consideração o
momento de mudanças nos segmentos da sociedade potiguar, com destaque
para a educação, durante a década de 1960, que corresponde ao período
investigado.
Assim, nada melhor para se compreender a História da Educação do
que trazer as práticas de professores para a pesquisa, uma vez que a
educação brasileira no decorrer de sua história e até a atualidade tem
apresentado uma discrepância bastante acentuada entre as leis que a regem e
o fazer na sala de aula. Conforme, Pinheiro (1997, p.285), “investigar o que
ocorre no dia-a-dia e nos lugares onde se dá a prática educativa escolar é de
fundamental importância para se entender questões maiores da educação.”
Todavia, são salutares a humildade e a consciência de que o resultado
mostrado pelo pesquisador é limitado. Nóvoa (2001, p.173), considera que o
estudo historiográfico da educação deve também abrir espaço para a análise
de vida de professores e suas práticas. Ratificando que
O historiador não é um fotógrafo do passado, é um produtor de
sentidos sobre o passado. E, por isso, está sempre confrontado com
diferentes narrativas, quantas vezes opostas e contraditórias, que
procuram explicar os mesmos factos. A sua busca intelectual tem
lugar uma ‘arena de conflitos’, ocupada por ideologias e identidades
várias.
O autor sugere que o pesquisador tente se despir de juízos pré-
elaborados, e tendo consciência de que a realidade é contraditória por
natureza, não eleja uma fonte ou um dado como absoluto. Mas saiba que,
diante da pluralidade de fontes que podem ser pesquisadas, os dados podem
se apresentar contraditórios. Nenhum deles deve ser eleito ou privilegiado, mas
devem ser expostos os conflitos que se configuram.
Mas, como proceder a busca pelas informações? Onde encontrá-las?
Como selecioná-las? Esses e outros questionamentos marcam o início e o
transcorrer da pesquisa para possibilitar os caminhos metodológicos mais
apropriados a uma investigação.
Parto, então, para garimpar esses tesouros, percorrendo os arquivos de
Natal. Públicos ou privados, todos possuem uma parte de nossa história, de
nossas vidas.
Nesse momento, mais uma vez a Iniciação Científica vem me subsidiar.
Pois, algumas dessas dificuldades já foram parcialmente superadas, como, por
exemplo, os arquivos públicos disponíveis, horário de funcionamento, quando e
como se pode fazer uso do material.
Retorno ao Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte –
IHGRN, onde encontro o maior acervo disponível do Estado, dos documentos
oficiais escritos. Lá estão guardados, à espera do pesquisador, instrumentos
que configuram uma época, demonstrando as transformações processadas no
decorrer do tempo.
Nesse local, tenho o meu olhar voltado para os jornais, especialmente
Tribuna do Norte, Diário de Natal e A República. Estes, não apenas por trazer
os acontecimentos do período estudado, mas porque Myriam Coeli escreveu
em todos eles, durante distintos períodos de sua vida.
Vasculhando entre os jornais, que algumas vezes se desfazem em
frangalhos, pela ação impiedosa do tempo, deparei-me na República do ano de
1957 com a coluna diária Registro Social, tendo como responsável Myriam
Coeli. Surpreendi-me com o perfil de escrita da coluna. Apesar de o título
sugerir um conteúdo mais limitado, esta não se limitava apenas aos eventos
sociais diários como festas, aniversários e casamentos.
Nesta coluna, Myriam Coeli sempre trazia para os seus leitores um texto
de estilo variado e, em seguida, os acontecimentos sociais. A autora também
ocupava esse espaço com questões voltadas para a comunidade, de interesse
da coletividade, demonstrando uma preocupação especial com os assuntos
culturais, como evidencia ao escrever sobre a construção do prédio da
Academia Norte Rio-grandense de Letras.
Foi lançada a pedra fundamental da Academia Norte Rio-grandense
de Letras e esse acontecimento assegura a continuidade dos
trabalhos que vem desenvolvendo a atual diretoria no sentido de
assegurar, um prédio próprio, a principal instituição de cultura em
nossa terra. Nesse particular salientaremmos o esforço envidado
pelo seu presidente, acadêmico Manoel Rodrigues de Melo, que,
movido mais pelo entusiasmo e pelo idealismo que por
possibilidades de recursos materiais, leva à concretização um velho
plano da Academia.
(A REPÚBLICA, 08 de janeiro de 1957, p.6)
Ela registra que as instituições culturais são expressões de uma
sociedade, tendo como objetivo zelar, incentivar e apoiar todo movimento
cultural. Então, seria justo que a Academia Norte Rio-grandense de Letras, que
já contava com vinte anos de serviço prestado às letras, tivesse a sua sede
própria. Percebo a preocupação com a cultura e educação do Estado, uma vez
que essa construção não representava apenas uma estrutura física, mas a
materialização de um ambiente cultural.
Continuando na busca pelos documentos, empreendi uma investigação
no Arquivo Público do Rio Grande do Norte, por ser este o local onde se
encontram os registros da Secretaria Estadual de Educação do Estado.
Deparei-me com outro aspecto comum aos pesquisadores: a dificuldade de
acesso ao acervo. Isto porque nem sempre o que desejamos consultar ainda
possui condição de manuseio. Outro agravante enfrentado foi a mudança do
local desta instituição, o que a fez ficar fechada por algum tempo. Até o
primeiro semestre de 2004, o Arquivo Público do Estado funcionava à Rua
José Aguinaldo de Barros, 2872 no Conjunto Parque das Colinas, no bairro de
Neópolis. Atualmente, funciona na Avenida Coronel Estevão, 1720, no Alecrim.
Estas dificuldades já fazem parte do cotidiano do pesquisador. Nunes,
(1990, p.38) afirma que:
Todos nós que nos dedicamos à pesquisa histórica já
passamos pela angustiante experiência de não encontrá-
los pelo descuido intencional, sistemático e criminoso
com que os acervos da História e da memória da Cultura
e da Educação brasileiras vêm sendo dilapidados em
nosso país. No entanto, paradoxalmente, poucos de nós
viveram outra angústia: a de vasculhar os arquivos
existentes, organizados e disponíveis. Seja por
desconhecimento, impaciência, preguiça, desinteresse,
descuido ou até falta de oportunidade, muitos pequenos
grandes tesouros permanecem escondidos numa vasta
gama de documentação ‘perdida’ nos arquivos privados
ou públicos, ‘tagarelando’ e assustando o pesquisador,
acuado justamente pela quantidade de informação aí
reunida.
Sabendo da necessidade de continuar, segui sempre em frente. A
decepção vinha, mas era preciso buscar forças e continuar. Enquanto
aguardava a liberação do arquivo, segui para os sebos da cidade. Esses locais
que parecem aos olhos de alguns como um espaço apenas para serem
negociados “objetos velhos”, contêm verdadeiras relíquias esperando para
serem encontradas. No caso específico desta pesquisa, localizei livros que não
encontrei nas livrarias. Exemplos destes, foi o livro A arte poética de Myriam
Coeli (1988), de José Jácome Barreto. O autor, além de fazer um relato
biográfico de Myriam Coeli, faz uma análise do conjunto da sua obra literária.
Um outro livro adquirido no sebo, de autoria da professora investigada,
foi Inventário (1981), em que se apresenta uma coletânea de poesias com
dedicatórias a diferentes pessoas do seu convívio de amizade e pessoal. Entre
as pessoas desse convívio estão Djalma Maranhão, Zila Mamede e Franklin
Jorge.
Figura 1: Fotografia de Myriam Coeli com Zila Mamede e amigos [19 – ?]
Fonte: Acervo particular da família Silveira.
A partir de então, volto o olhar para aspectos que me encaminharam
para as práticas educativas de Myriam Coeli. Caminhei para a escola que
recebe o seu nome. A esperança de algumas pistas foram desfeitas, pois
alguns poucos funcionários da escola que souberam de quem se tratava a
patronesse da escola era apenas através de um pequeno relato biográfico
deixado pela família, quando da inauguração da instituição. Outra referência
mencionada, foi feita pelo vice-diretor a uma foto que fui encontrar esquecida
em uma das paredes que dava acesso à direção. O que me restou da visita foi
apenas uma fotografia da faixada e de uma placa alusiva à criação da escola.
Recorro, então, ao Centro Federal de Educação Tecnológica do Rio
Grande do Norte – CEFET/RN, onde a professora Myriam Coeli atuou
enquanto esta instituição de ensino ainda era a Escola Técnica Federal do Rio
Grande do Norte – ETFRN. Nesta escola, recebi uma significativa colaboração.
Inicialmente porque, para minha surpresa, o Professor a quem fui
encaminhada, após conhecer o meu objetivo com a visita, falou-me que tinha
sido aluno da “Professora Myriam” como ele mesmo falou. Trata-se do
Professor Erivam Sales do Amaral, que gentilmente passou a colaborar como
informante, recorrendo à sua memória e trazendo para o presente fragmentos
do seu período de aluno e o cotidiano da sala de aula.
Um segundo ponto positivo, foi que, por intermédio desse mesmo
professor, pude ter acesso a nomes e telefones de alguns outros professores e
colegas de trabalho que tinham mantido um contato mais direto com Myriam
Coeli, como as professoras Maria Selma da Câmara Lima Pereira
3
e Expedita
Oliveira de Medeiros
4
.
Recebi, ainda, o apoio do seu filho o Professor da UFRN, Eli Celso de
Araújo Dantas da Silveira que, mostrando-se sempre prestativo, cedeu-me
fotos, arquivos que a família detém e prestou algumas entrevistas. Nessas
entrevistas, ele me confirmou que eu tinha enveredado pelo caminho certo: “Na
verdade, mamãe foi professora a vida toda, antes mesmo de ter alguma
formação já ajudava a nossa tia Carminha que era professora.” E mesmo
assim, como já mencionei anteriormente, o perfil mais conhecido é o da
jornalista e da poetisa.
Outro membro da família com quem mantive contato e que se mostrou
disponível foi o seu esposo, o escritor Celso da Silveira. Mantendo guardado
tudo quanto se refere a Myriam Coeli, ele me respondeu inicialmente, que não
tinha muita coisa que se reportasse a sua prática pedagógica.
Esse poderia ser um motivo para desânimo, para enveredar por outro
caminho. Mas, refletindo, lendo outros exemplos de pesquisas que tratam de
um período remoto, verifiquei que as dificuldades estão presentes em todos os
trabalhos. Este fato passou então a ratificar ainda mais o meu interesse pela
pesquisa.
Prossegui procurando identificar nomes de antigos alunos e outros
contemporâneos que pudessem me subsidiar nesta investigação. A ânsia de
3
Maria Selma da Câmara Lima Pereira é atualmente professora aposentada do Centro Federal
de Educação Tecnológica do Rio Grande do Norte – CEFET/RN, onde atuou como professora
de Língua Portuguesa.
4
Expedita Oliveira de Medeiros, nasceu em Itabaiana – PB em 18 de fevereiro de 1915.
Formada em Letras, foi professora de francês da Escola Técnica no período compreendido de
25 de agosto de 1964 à 30 de abril de 1980.
ouvir a todos me empolgava. Tinha a consciência que era preciso estabelecer
um eixo norteador para prosseguir nesse caminho, pois,
Para o pesquisador que se utiliza das fontes orais, o importante é
ouvir o bom senso e fazer prevalecer o respeito e a atenção,
assumindo deliberadamente uma postura metodológica que não
pressupõe a tão propalada neutralidade acadêmica e científica por
ser impossível não envolver-se naquilo que escuta e com aquele que
conta.
(ALMEIDA, 1998, p.55)
Sabia que era impossível deixar de me envolver e até intervir algumas
vezes durante os depoimentos. Mas, ouvir se mostra como o melhor caminho,
pois todos os esclarecimentos são de suma validade para que junto com os
documentos escritos pesquisados sejam feitos o cruzamento das informações.
Essa relação enriquece as informações obtidas, uma vez que os documentos
escritos foram durante muito tempo, restritos a uma pequena camada social
que dominava a leitura e a escrita, não representando, portanto, o dia-a-dia da
população.
Conforme Almeida (1998, p.106),
As fontes escritas, apesar do universo que abrem para o
pesquisador de história, possuem também suas
limitações, principalmente aquelas derivadas do fato de
que a leitura e a escrita, durante todas as épocas,
sempre pertenceram a uma minoria privilegiada.
Deste modo, observando todas as fontes nas mais diversas formas
como elas me surgiram no entrecruzamento, pude estabelecer a relação entre
estas e o contexto social em que viveu Myriam Coeli, durante a década de
1960, entendendo-a como um sujeito histórico que ocupou um espaço público
num determinado lugar e período, relacionando-a às suas atuações pela busca
de um ideal almejado, e não apenas de forma isolada.
Q
Q
u
u
e
e
m
m
é
é
M
M
y
y
r
r
i
i
a
a
m
m
C
C
o
o
e
e
l
l
i
i
?
?
3. Quem é Myriam Coeli?
Myriam (forma grega: Maria), ‘senhora’ em língua
semítica. E também ‘excelsa’, ‘sublime’ (na antiga
forma hebraica Maryán; do ugarítico). ‘Predileta de
Javé’ (ou Jeovah).
(SILVEIRA, 1984, p.9)
Figura 2: Fotografia de Myriam Coeli [19 – ?]
Fonte: Arquivo pessoal da família Silveira
.
P
ara falar um pouco sobre quem foi Myriam Coeli, (digo um pouco
porque sua figura não me permitiria resumi-la em algumas
poucas páginas) inicio recorrendo à pluralidade de significados que seu próprio
nome representa. Encontro, então, determinadas palavras que resumem o que
dizem vários depoimentos e opiniões de seus contemporâneos: senhora,
excelsa, sublime e predileta de Javé.
Myriam Coeli de Araújo, este era o seu nome de batismo. Nascida aos
dezenove dias do mês de novembro de 1926 em Manaus – AM, foi registrada
no Acre. No entanto, o destino lhe havia reservado o Estado do Rio Grande do
Norte para ser a terra que passaria, praticamente, toda a sua vida.
Figura 3: Certidão de nascimento de Myriam Coeli (2ª via)
Fonte: Arquivo pessoal da família Silveira
Ressalto que apesar de ter vindo ainda “de colo” para o Rio Grande do
Norte e de ter prestado relevantes serviços a esse Estado, Myriam Coeli só foi
contemplada com o título honorífico de cidadã norte-rio-grandense dezenove
anos após sua morte. A solenidade de entrega do título ocorreu no dia 12 de
dezembro de 2001, dirigida pelo Deputado Álvaro Dias, presidente da
Assembléia Legislativa do Estado.
A mudança de cidade ocorreu logo aos dois meses de idade em
decorrência da morte do seu pai José Silvino de Araújo, que faleceu acometido
de febre tropical. A morte do pai decidiu a sorte de Myriam Coeli, uma vez que
sua mãe Maria Esther de Araújo, viúva e sem ter condições financeiras para
cuidar dos três filhos, decide entregá-los à custódia das cunhadas que residiam
em São José de Mipibu, município do Rio Grande do Norte. Nessa cidade,
residiam as irmãs de José Silvino de Araújo. Desse modo, Pedro, Helena e
Myriam Coeli – esta a filha caçula – passaram a ser criados pelas tias Maria do
Carmo Araújo, Maria das Candeias e Ana Carolina, irmãs de José Silvino.
As tias paternas, assim como grande parte das senhoras de sua época,
possuíam um caráter religioso muito forte, dedicando-se às atividades da igreja
com tamanho fervor que a cada uma delas cabia a responsabilidade e o
cuidado de um dos altares da Matriz da cidade.
Essa formação religiosa se tornou uma marca sempre presente na
personalidade de Myriam Coeli desde a sua infância até à idade adulta. Sobre
este aspecto da vida de Myriam Coeli, Newton Navarro escreveu a poesia A
primeira comunhão de Myriam Coeli, para falar de um dos momentos religiosos
vividos por ela. Esta poesia está no livro Ave, Myriam (1984), organizado por
Celso da Silveira.
Minha mãe me contou:
“Certo dia,
numa clara manhã mipibuense,
vestia branco e flores
e um círio iluminava teus olhos.
As tias escondiam a cruz dos terços
e debulhavam contas de ventura e amor
para os teus dias...
Era o teu primeiro encontro com o Cristo.
(SILVEIRA, 1984, p.196, 197).
Assim como a religião católica, as letras logo cedo passaram a fazer
parte da vida de Myriam Coeli. A pequena São José de Mipibu serviu de
cenário para toda a sua infância e foi lá que fez os seus primeiros estudos.
O espaço formal por onde tudo começou foi o Grupo Escolar Barão de
Mipibu. Recordando o ambiente escolar naquela instituição, Myriam Coeli
escreveu o poema Infância no qual registra o cotidiano da sala de aula; ao
mesmo tempo, fornece pistas acerca da iluminação da cidade, quando
relembra os exercícios relidos ao lampião.
O alfabeto na lousa
desafia a memória.
A lição explorada
no caderno escolar.
O livro com figuras
e de linhas tão puras,
mas de linhas tão certas
para idéias incertas.
No ritmo das palavras
e na cor das estampas
meridianas lavras
para futuras searas.
O mistério no mapa
vivas cores exprime
com nomes imperfeitos
à lucidez dos versos;
mas olhado direito
traz concreto cansaço,
parco e sério repasto
para o traje e o pão
não lidos, consumidos
por nossos corpos e mãos.
O cansaço nos olhos
e na trêmula mão,
já máquina o corpo.
Nas palavras, o ofício,
a metáfora e o chão,
mas na voz, mansidão.
O consciente lirismo,
domiciliar abrigo
de cantigas e versos
de ilusória razão
- não livres, consumidos
por nossa arte e ação.
O alfabeto na lousa,
liberto mapa ao lado
era outra dimensão.
Era um mundo inventado;
domínio colorido,
janela transtornada.
Nós, sonhos matinais,
íamos de terra em terra
a ignorado reino
que, por distração única,
não estampava o jornal.
Pra todos a lição.
O enfeite da palavra
era o exato enigma,
que a língua falava
e escrevia à mão.
A lúcida certeza
que o desafio atesta
das coisas repetidas,
como risos em festa:
– No caderno, exercícios
relidos ao lampião.
(...)
(SILVEIRA, 1984, p. 112 – 114)
Ainda bem pequena, Myriam Coeli já demonstrava amor pela leitura. A
agulha e a linha (2003), conto de Machado de Assis, muito a encantou e
despertou-lhe a vontade de também escrever, uma vez que achou o estilo de
escrita desse literata admirável.
Figura 4: Fotografia de Myriam Coeli, (1941).
Fonte: Acervo particular da família Silveira
Contagiada por esse desejo, logo aos oito anos fez seus primeiros
versos, que foram publicados em um pequeno jornal que circulava no Grupo
Escolar Barão de Mipibu onde estudava
5
. Posteriormente, passa a estudar em
Natal no Colégio Estadual do Atheneu Norte Rio-grandense, cursando nessa
instituição o ginásio e o curso clássico. Com o apoio dos professores,
principalmente do professor Edgar Barbosa
6
, produzia enquanto estudava
nessa escola seus escritos e enviava para que fossem lidos pelo historiador
5
Celso da Silveira forneceu-me esta informação, mas não encontrei o registro dos referidos
versos.
6
Edgar Barbosa, formado em Direito no Recife, em 1932, trabalhou em vários jornais, entre
eles: A República, O debate, A ordem. Foi fundador da Faculdade de Filosofia de Natal. diretor.
Escreveu, entre outros livros, História de uma campanha (1936), Três ensaios (1960) e
Imagens do tempo (1966).
(HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE – fascículo 14, [199 – ?])
Luís da Câmara Cascudo. Assim sendo, sentia uma constante necessidade de
melhoria de seus textos. Lia freqüentemente até a madrugada, tendo iniciado
por todos os clássicos gregos e romanos a que teve acesso, como: Platão
Cícero e Aristótoles.
Essa paixão pela literatura fez com que Myriam Coeli partisse para
Recife – PE, e ingressasse na Faculdade de Filosofia da Universidade do
Recife (Faculdade de Filosofia São José, das Irmãs Dorotéias), recebendo os
diplomas de Bacharelado e Licenciatura em Letras Neolatinas, em dezembro
de 1949 e 1950, respectivamente.
Figura 5: Myriam Coeli em sua formatura, (1949).
Fonte: Acervo particular da família Silveira.
Voltando à Natal, dedicou-se ao magistério ensinando no Atheneu (1954
– 1980), na Faculdade de Filosofia (1966), na Faculdade de Jornalismo Eloy de
Souza (1969) – ambos da Fundação José Augusto – e na Escola Técnica
Federal do Rio Grande do Norte – ETFRN (de 1965 a 1974). Lecionou ainda no
Ginásio Municipal de Natal (1959) e foi Técnica de Educação do Centro de
Estudos e Pesquisas Educacionais da Secretaria de Educação e Cultura do Rio
Grande do Norte (1962).
Além das atividades educacionais, assume a função de jornalista,
profissão esta que até então era predominantemente ocupada pelo sexo
masculino, sendo poucas as mulheres que ocupavam espaço na imprensa.
Uma de suas primeiras atividades foi elaborar uma coluna diária que circulava
no jornal Tribuna do Norte intitulada Revista da Cidade. A coluna tratava de
acontecimentos da cidade noticiando, por exemplo, palestra sobre o alcoolismo
proferida por Onofre Lopes da Silva
7
, durante a sessão de encerramento da 5ª
Semana de Higiene Mental, realizada em 1º de novembro de 1952 no edifício
da Escola Doméstica de Natal.
Além da coluna, continuou escrevendo contos, poemas e poesias que
algumas vezes eram publicadas no jornal em que trabalhava. Data dessa
época Contos do Natal, publicado no jornal Tribuna do Norte em 23 de
dezembro de 1953.
7
Onofre Lopes da Silva nasceu em 13 de julho de 1907 num lugarejo conhecido por Comum,
em São José de Mipibu. Concluiu o curso de medicina no Rio de Janeiro retornando à natal em
1932., onde fundou a 1ª Faculdade de Medicina do Estado. Dedicou parte de sua vida ao
Hospital que hoje leva o seu nome. Morreu em 13 de julho de 1984, mas ainda hoje é lembrado
como o homem que lutou pela saúde e pela educação do Rio Grande do Norte.
(http://www.cabugi.com/rnonline/resultadopersonalidades.asp/codigo
– personalidade=35)
Foi pensando nas alegrias do natal, a alegria despreocupada dos
presentes do Papai Noel e da árvore de Natal, que notei o contraste
de minha gente que só encontra tristeza e decepção nesse dia. São
esperas de um ano, entremeadas de sonhos e de quase felicidade.
Esperas que se evolam como éter para o passado. A festa do Natal
em vez de adquirir um cunho humano de fraternização torna-se uma
festa egoísta. Enquanto se desperdiça com brinquedos e roupas
inúteis que só incentivam vaidade, milhares de crianaças sofrem em
sua inocência, fome e tristeza. Elas não tem carinho, nem
brinquedos. Papai Noel desconhece os seus endereços.
Mas as mudanças em sua vida não parariam. Conseguindo uma bolsa
de estudos no Instituto de Cultura Hispânica parte para a Espanha, onde
obteve o diploma de Jornalista pela Escuela del Periodismo de Madrid, em
1954.
Figura 6: Myriam Coeli em viagem a Espanha, (1954)
Fonte: Acervo particular da família Silveira.
Sobre esse período que residiu fora do Brasil, Myriam Coely falou, em
entrevista a Auxiliadora Guedes, que aprendeu a amar entre outros, o poeta
Garcia Lorca
8
e participava, mesmo como mera expectadora, dos movimentos
culturais do país àquela época. “Conheci Salvador Dali. Estes dois anos de
estudo foram de grande importância, de grande conhecimento com outra
civilização”. (SILVEIRA apud MACHADO,1992, p.23)
Regressando a Natal em 1955, volta a ensinar no Colégio Estadual
Atheneu Norte Rio-grandense e a escrever no jornal A República. Durante a
sua atuação, muitas vezes tendo que trabalhar até a madrugada para encerrar
o jornal, assumindo inclusive o setor policial na função de repórter. Além deste,
trabalhou em todos os outros jornais da cidade, no Diário de Natal (1952 a
1954), na Tribuna do Norte (de 1955 a 1956) e na República (de 1956 a 1958).
Foi durante esse período que conheceu o também jornalista Celso da
Silveira, com quem casou-se em dezembro de 1958. A partir de então, passa a
se chamar Myriam Coeli de Araújo Dantas da Silveira. Segundo Auxiliadora
Guedes “para ganhar a simpatia de sua colega, Celso da Silveira repartia com
ela o lanche que trazia todas as noites para a redação, além de contar estórias
e discutir fatos.” (GUEDES apud SILVEIRA, 1984, p.173).
Fruto do matrimônio, nasceram dois filhos: Eli Celso de Araújo Dantas
da Silveira e Cristiana Coeli de Araújo Dantas da Silveira, a quem Myriam Coeli
dedicou em seu livro Inventário (1981) um poema intitulado Meus brinquedos
de
8
Federico Garcia Lorca nasceu na região de Granada, na Espanha, em 05 de junho de 1898 e
faleceu nos arredores de Granada no dia 19 de agosto de 1936, assassinado pelos
"Nacionalistas". Poeta e dramaturgo espanhol é considerado um dos mais importantes
escritores modernos de língua espanhola.
(http://www.e-biografias.net/fglorca_menu.asp).
cartão, no qual se percebe a admiração pelos filhos e a constatação de
perceber que o tempo já passou e que os filhos cresceram.
Meus brinquedos de cartão
todos trocados estão:
Meu El-Rei cavaleiro,
por homem verdadeiro.
A bela dama antiga,
por uma amiga.
Todos cavalos pintados
por outros ajaezados.
meus brinquedos de cartão
desfeitos todos estão:
meu El-Rei cavaleiro
fugiu-me bem ligeiro;
A bela dama antiga
já morreu de coriza.
Todos cavalos pintados
já foram esquartejados.
Meus brinquedos de cartão
perdidos na infância estão.
(SILVEIRA, 1981a, p. 38)
Como se vê, a maior força de expressão de Myriam Coeli foi marcada
pela escrita. Uma característica que acompanhou a professora até seus últimos
dias. Mesmo doente, escrevia sempre que as dores físicas permitiam.
Pelo seu trabalho, Myriam Coeli foi condecorada por algumas
instituições nacionais e estrangeiras, a saber: Membro Honorário do Grupo
Americano de Intelectuais, filiado à UNESCO; Dama do Lazo Azul e Celeste da
Ordem Imperial de Santa Helena – Madrid – Espanha e Membro de Honra da
Assozione Internacionale per la Compressione Lingüística de Morale e Popoli
Salermo, Itália.
Sua produção foi vasta. Escreveu livros de poesia que mereceram
destaque na sociedade. O seu primeiro livro de versos, Imagem virtual escrito
em parceria com Celso da Silveira chegou ao público em 1961 através da
Imprensa Oficial, da coleção Jorge Fernandes.
Figura 7: Capa do livro Imagem Virtual, (1961)
Fonte: Arquivo particular da família Silveira
Alguns anos mais tarde, em 1980, publica Vivência sobre vivência em
que conforme Luiz Carlos Guimarães, Myriam Coeli “ganha aquela altura da
poesia em que nada existe a acrescentar. Não há mais espera, mas encontro.
Não há mais partida, mas chegada” (GUIMARÃES apud BARRETO, 1988,
p.41). Um ano depois, publica Cantigas de amigo. Este rendeu à autora o
primeiro lugar no Concurso Othoniel Menezes, da Prefeitura Municipal de
Natal.
Figura 8: Capa do livro Vivência sobre vivência, (1980) . Figura 9: Capa do livro Cantigas de amigo,
(1981)
Fonte: Arquivo Amélia Cristina Reis Fonte: Arquivo Amélia Cristina Reis
O livro Cantigas de Amigo foi objeto da Dissertação de Diva Sueli Silva
Tavares (1999), com o título: Cantigas de ontem e de hoje: um estudo
comparativo entre Cantigas de amigo de Myriam Coeli e as cantigas medievais
de D. Dinis, na qual ela lamenta a ausência de Myriam Coeli nas antologias ou
manuais de literatura brasileira. E justifica que este trabalho,
Surgiu da necessidade de resgatar e trazer ao
conhecimento do público acadêmico essa poetisa, não só
pela vertente lírica de suas poesias como pela
contribuição que deu, em termos de poesia feminina,
para o Estado do Rio Grande do Norte e as letras
nacionais. (1999, p. 12)
No mesmo ano, em 1981, lança o livro Inventário, a sua última
publicação em vida. Esta publicação foi premiada pela Fundação José Augusto
recebendo o prêmio Auta de Souza como o melhor livro de poesia entre os
inscritos. Nesta obra, observo uma demonstração de dor e do estado
emocional pelo qual a autora passava. Em uma das poesias, Elegia da vida
breve, percebo os seus temores e aflições.
Figura 10: Capa do livro Inventário, (1981)
Fonte: Arquivo de Amélia Cristina Reis e Silva
Tento reconstruir nos consumidos instantes
a pretensa eternidade de minha permanência,
a instância fiel e secreta de onde a voz se solte,
o gemido gema, o grito grite,
a abissal inquietação inquiete com sua profundez.
E eu animal e arcanjo, com reinações e liberta
fira no meu próprio seio
a controversa condição.
Se sabendo-me contudo caminhante para a morte
enquanto a vida brame e clama e cala na sua esplendidez
e me toma os gestos e a fala
para que eu a modele com o meu barro e o meu sopro.
E tenho em mim e em torno, a cada instante
o epifenômeno da morte presente e já pretérita a memória.
E sendo agora passos que me avançam
já cobrem espaço entre meu ser e a terra
_ duas arcanidades que se entranham
e me enterram.
Perfeita. Pretérita. Eterna
(SILVEIRA, 1981a, p. 40).
Neste mesmo ano em 1981, a escritora é novamente premiada, desta
vez pela Secretaria Municipal de Educação e Cultura da Prefeitura de Natal,
pelo livro Catarse, que apesar de inédito lhe rendeu o prêmio de poesia
Othoniel Menezes.
Em 1992, foi publicado o seu último último livro Da boca do lixo à
construção servil: o livro do povo, obra póstuma publicada em Natal. Este livro
traz uma coletânea de poesias que mostram, na maior parte delas, a
preocupação da autora com a condição social dos menos favorecidos
economicamente, a exemplo dos catadores de lixo e dos operários.
Figura 11: Capa do livro Da boca do lixo à construção servil – o livro do povo (1992)
Fonte: Arquivo da biblioteca do CEFET – RN.
Assim, por meio dos livros , das crônicas e poesias, pude perceber que a
escrita era a forma em que Myriam Coeli mais abertamente se utilizou para
comunicar seus sentimentos, angústias e aflições.
A
A
i
i
m
m
p
p
o
o
r
r
t
t
â
â
n
n
c
c
i
i
a
a
d
d
e
e
M
M
y
y
r
r
i
i
a
a
m
m
C
C
o
o
e
e
l
l
i
i
n
n
a
a
s
s
o
o
c
c
i
i
e
e
d
d
a
a
d
d
e
e
4. A importância de Myriam Coeli na sociedade
Figura 12: Fotografia de Myriam Coeli, [19 – ?]
Fonte: Acervo particular da família Silveira
yriam Coeli teve oportunidade de receber homenagens, ainda
em vida, que se estenderam após sua morte. Intelectual de peso
na sociedade, embora simples, como simples foi sua vida.
Mesmo doente, escrevia quando as dores físicas permitiam.
M
Aos 65 anos de idade, Myriam Coeli veio a falecer em Natal/RN no dia
21 de fevereiro de 1982, num domingo de carnaval. O cenário de morte foi a
sua própria casa na Avenida Alexandrino de Alencar, 1262, onde depois de
nove anos em que apareceram os primeiros sintomas da doença, o seu corpo
miúdo e já cansado não mais resistiu e foi vitimada por um câncer
generalizado.
Percebendo que não mais permaneceria tanto tempo entre nós, utilizou-
se da sua arma mais forte, a palavra, para expressar a sua dor, o seu
sofrimento, o seu desejo. E faltando apenas dezessete dias para partir
definitivamente, escreve uma carta que reproduzo sem medo de me alongar.
O meu Calvário é feito de pedaços menos gloriosos. O que me
flagela não é a conseqüência de salvar o mundo, mas de viver nele,
sentir as suas dores, carregar uma cruz que me ridiculariza, suportar
os escarros e os escárnios.
Não há grandeza quando a gente não se suporta sozinha e se deixa
arrastar para fora de suas possibilidades e contenções. Eu queria
deixar uma grandeza que falasse da eternidade que eu carrego com
tanta sensibilidade e consciência. Mas, só vejo em mim pedaços de
Cristo, deformados pela minha dor e pela visão que se tem deles.
Eu me consumo na fidelidade de meu silêncio, a parva palavra
fenecendo na garganta entre espadas de aço árido e amargo. Frágil
entre as eventualidades, eu sou simples. É o que eu sei ser. A
simplicidade da aceitação. O meu frêmito. Humanidade.
Pensem que eu saí a passeio. Não é preciso chorar. O pranto
entristece. Só quero tudo simples, como vivi. Não quero que os
amigos se enganem dizendo coisas supérfluas a meu respeito. A
minha vida foi sem grandeza, mas com muita correção e esperança
em Deus, embora às vezes, humana como fui, desesperasse.
Que todos me perdoem pelo que não pude ser ou dar. Mas não me
chorem.
Aqui estou ainda ao sabor da luta. A minha vida tem sido
uma perene batalha, embora conserve a serenidade do
rosto. Desde criança pela posse do anjo, para quem,
todas as noites, guardava a sua parte. Só a Ele contava,
como mensagem a Deus, todas as minhas dúvidas e
tristezas que se anteciparam no tempo. Depois que a luta
ensandeceu e, transcendente, me abriu feridas, igual ao
soldadinho de Rilke, ergui bandeiras. Morri muitas vezes
abraçada com elas. Mas como não era a morte maior,
voltava à luta sem me desencorajar. Contudo, que força
me faz agora tão tranqüila nesta luta que me leva à
morte? Sei que para o mundo esta será uma batalha
perdida, porém penso também que será a porta para o
descanso da guerreira.
(SILVEIRA, 1984, p.57,58)
Analisando esta parte, percebe-se a luta de Myriam Coeli pela vida e, ao
mesmo tempo, a resignação face ao inevitável. Mulher religiosa, via nessa
batalha a esperança final do descanso da guerreira.
Figura 13: Certidão de óbito de Myriam Coeli
Fonte: Acervo particular da família Silveira
Pela fala de seus contemporâneos, é fácil perceber que a vida de
Myriam Coeli foi realmente marcada pela correção, esperança em Deus e até
simplicidade. No entanto, quando os seus amigos ou outras pessoas que não a
conheceram falam ao seu respeito, não estão dizendo coisas supérfluas, mas
manifestando de alguma maneira reconhecimento ou gratidão.
A imprensa norte-rio-grandense registrou a morte de Myriam Coeli e a
lacuna que a sua presença provocava no meio afetivo e cultural da cidade.
Vicente Serejo em sua coluna Cena Urbana, publicada no Diário de Natal
demonstra esse pesar:
Mais do que o jornalismo, perdeu a poesia do Rio Grande
do Norte, a cultura do Rio Grande do Norte. Resta-nos
aguardar a publicação dos seus dois livros premiados e
inéditos. O seu Inventário de poesia que fez para o seu
marido, seus filhos e seus amigos e o Catarse. Na
humildade, na humildade imensa em que viveu.
Despojada dos títulos, dos bens e de vaidades. Humana
e grande como só ela conseguiu ser.
(DIÁRIO DE NATAL, 25 de fevereiro de 1982)
Dos dois livros citados por Vicente Serejo, um deles, Inventário teve a
sua publicação já no ano de 1981 e foi o último publicado em vida por Myriam
Coeli, conforme já registrei. Em apresentação para esta obra Ivan Maciel de
Andrade diz que “a poesia de Myriam Coeli nos posiciona no centro de
emoções e preocupações que somente nos são suscitadas pelas grandes e
verdadeiras obras de arte” Já Catarse, foi o único deixado realmente inédito.
Através do jornal Tribuna do Norte, Nei Leandro de Castro relembra a
luta contra a doença:
No Domingo do carnaval que passou, Myriam Coeli morreu.
Foi uma luta de nove longos anos. Foi um duelo fatal
entre a Santa Guerreira e o Dragão da Maldade. Myriam
perdeu a batalha, teve o corpo destruído pelos golpes do
câncer, esse dragão que se compraz em matar
lentamente, muito lentamente. Ou às vezes em assaltos
fulminantes.
(TRIBUNA DO NORTE, 27 de fevereiro de 1982)
Também por meio da Tribuna do Norte Enélio Lima Petrovich, presidente
do Instituto Histórico do Rio Grande do Norte, registra a notícia:
Desde Domingo já não pertence à vida dos vivos Myriam
Coeli, poetisa das melhores, simples, humana, cordial,
resignada e, ultimamente, refugiando-se no seu próprio
sofrimento, também sentido pelo seu esposo Celso da
Silveira.
E, assim, Myriam Coeli já se entronizou no Alto e lá de
cima atendeu ao convite de São Pedro, o dono das
chaves celestiais.
(TRIBUNA DO NORTE, 28 de fevereiro de 1982)
Myriam Coeli foi também homenageada através de uma escola da rede
estadual de ensino. A Escola Estadual Myriam Coeli fica localizada a Rua dos
Caroás, s/n, Conjunto Nova Natal – Natal/RN. Inaugurada no mês de março de
1984 na administração do então governador do Estado José Agripino Maia, sob
o Ato de Criação – 8829 de 23 de dezembro de 1983, tendo como Secretário
de Educação do Estado o professor Hélio Xavier de Vasconcelos. Esta
instituição escolar é destinada aos ensinos fundamental e médio (antigos 1º e
2º graus).
Figura 14: Foto da fachada da Escola Estadual Myriam Coeli, (2003).
Fonte: Amélia Cristina Reis e Silva
A respeito desta escola, o escritor Eli Celso seu filho escreveu na revista
Educação em Questão (1992, p.192–194) a poesia A escola Myriam Coeli,
levando o leitor a refletir sobre as homenagens prestadas, geralmente, apenas
após a morte.
A Escola Defuntíssima Myriam Coeli está lá no fim, tomando um
assopro e arrotando com a alma empanturrada de salame.
Na minha terra, todas as escolas são Defuntas,
todos os patronos são póstumos,
A minha terra, antes de não ser a minha terra,
É a terra das homenagens póstumas.
Coitada de mãe, debaixo da areia,
careca descabelada, despida, desfiada, mostrando o busto que já
não tinha
e seus dentes. O riso franco, nada. Aqui e acolá na sua mandíbula,
nenhum dente de prata.
E a diretora, muito boazinha, certamente pedagoga de clientela farta,
nos mostrava suas salas, os banheiros, a cozinha.
Na primeira sala, eu disse: Aqui joãozinho vai conhcer mariazinha e
um dia quando estiverem casados, com prole constituída, ele dará
um tiro na mulher e enforcará as criancinhas.
Na segunda sala, eu disse: Nesta sala estudará joana rosa, aplicada
nos estudos e de família por demais modesta, quando estiver maior
descerá para a cidade, fazer o que não presta.
Na terceira sala, eu disse: Neste lugar estudará pedrão, que se
masturbilhonará na frente de D. Firmina, que será um grande cabo
de polpicia nordestina e nunca esquecerá a tara de ser menina.
Na quarta sala, eu disse: Aqui sinto o cheiro do Anti-Cristo, se
cahamará Joaquim Apolinário Dos Anjos, filho de mendigos, neto de
ciganos.
Deflorará joana rosa e pedrão e será o primeiro a trair joãozinho, no
próprio banheiro feminino da Escola Defunta Myriam Coeli, minha
mãe, sem requintes, sem carinhos.
Todos os outros estudantes da Escola Myriam Coeli, com muita
honra, serão ladrões e poetas.
Mas todas essas criancinhas assistirão à primeira missa da vida de
cada uma. – Seria ótimo uma missa para comemorar o feliz
aniversário de morte da Defuntíssima patrona da escola, diz a
secretária, enquanto olha para meu brinco e me acha com ares de
bicha.
Continuei com as vaticinações: Ninguém será feliz para sempre, nem
quem compra nem quem vende. Desse lado os defensores de
Perón, e do outro os de Allende. E mãe no meio do fogo cerrado, no
seio da comunidade. Mãe tá virada pasto de minhoca, sabe, e o que
faço então, é cópia de sua mão.
Escola, exclusa, uma nau, um canhão
Lápis, giz, palavras em vão.
Além da escola uma outra menção pública foi a atribuição ao nome de
uma das artérias da cidade de Natal. Através do Decerto nº 657, de 15 de abril
de 1982, publicado no Diário Oficial do Município a rua situada no Bairro Dix
Sept Rosado, antes conhecida por São Miguel, passou a ser denominada Rua
Escritora Myriam Coeli.
Diante desse ato, um questionamento, ou muito mais uma curiosidade
se antepõe. Será que os moradores dessa rua sabem de quem se trata? Ou é
assim como falou o escritor Eli Celso em relação à escola, apenas mais uma
rua que leva o nome de uma pessoa já falecida, mas que seus moradores não
sabem de quem se trata.
Todavia, nem todas as homenagens rendidas a Myriam Coeli
aconteceram no meio de pessoas que não fizeram parte do seu convívio.
Algumas representam uma forma de lembrança daqueles com quem tanto
tempo conviveu, estabelecendo vínculos afetivos e profissionais, como é o
caso da Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte – ETFRN.
Através de ofício emitido em 01 de abril de 1982, Marcondes Mundim
Guimarães, então diretor da escola, presta homenagem a Myriam Coeli,
justificando que o referido estabelecimento cultua valores e preserva a
memória de pessoas que se destacaram no cumprimento do dever. Desta
forma, resolve dar o seu nome à sala de estudos dos professores, uma
simbólica homenagem à profissional e à intelectual que Myriam Coeli foi.
Myriam Coeli foi professora desta Escola. Aqui demonstrou
competência e dedicação constante. A esse desempenho
profissional soube aliar qualidades pessoais admiráveis:
simplicidade, humildade, espírito de solidariedade e disposição para
a convivência sadia. Por tudo isso (e por muito mais que poderia ser
dito) faz-se credora da amizade de quantos aqui trabalham.
(SILVEIRA, 1984, p.85)
Durante a cerimônia no dia 24 de maio de 1982, Celso da Silveira falou,
agradecendo à comunidade escolar e lembrando do amor e da alegria que sua
esposa tinha sentido naquele ambiente de trabalho.
Ao diretor, professores e alunos desta escola, rogo que a volta de
Myriam Coeli seja recebida como uma presença de vida.
Ela ingressou nesta escola através de concurso público.
Aqui ministrou conhecimentos da língua nacional por oito
anos seguidos. Foi aqui que por suas mãos passaram
alguns milhares de alunos – hoje cidadãos espalhados
por este país.
Devo lembrar a alegria de Myriam pela sua escola. O seu orgulho
pela organização. Um certo ufanismo, que abrangia desde a higiene
dos seus compartimentos – da coisa miúda, do detalhe ao principal –
o estudo.
(SILVEIRA, 1984, p.63)
No ano de 1983, no salão da Biblioteca Pública Câmara Cascudo, da
Fundação José Augusto uma outra homenagem foi organizada pela sua amiga
Zila Mamede
9
. Na ocasião, o público pode visitar a Exposição Bibliográfica
Myriam Coeli, que mostrou aos visitantes além da sua obra bibliográfica,
objetos pessoais, manuscritos, documentos, cartas, recortes jornalísticos e um
registro iconográfico.
Em alusão à homenageada, Zila Mamede escreveu no catálogo da
exposição que os livros e manuscritos de Myriam Coeli serão transformados
em fonte de estudos e pesquisas para as novas gerações de poetas e críticos
literários do Rio Grande do Norte.
Partindo tão cedo da convivência com sua terra e o seu povo,
Myriam deixou a força da sua presença na grandeza de sua arte
poética e da delicadeza, profundidade filosófica e humana de sua
prosa, manifestada nos livros que publicou e nos artigos que
escreveu para revistas e jornais.
(ZILA MAMEDE apud BARRETO, 1988, p. 37)
Hoje, no ano de 2005, vinte e dois anos depois da exposição organizada
por Zila Mamede, vejo que o que a mesma dizia naquela data se concretiza.
Todos os documentos da exposição se tornaram fontes e além destes a sua
própria fala é retomada e utilizada não por um poeta ou crítico literário, mas
como instrumento para a construção de uma pesquisa histórica.
Quem seria então essa mulher que às vezes surge aos nossos olhos
querendo parecer tímida, frágil e indefesa? Quem seria essa mulher que as
9
Zila da Costa Mamede nasceu em Nova Palmeira – PB em 15 de setembro de 1928 e faleceu
em 1985. Foi poetisa, bibliotecária, Mestre em Biblioteconomia e Membro do Conselho Federal
de Biblioteconomia. Participou das antologias: A novíssima poesia brasileira (1962), organizada
por Walmir Ayala; Antologia de Geração de 45 (1966), organizada por Milton de Godoy
Campos. Dentre os livros escritos, podemos mencionar: Navegos (1978), Rosa de Pedra
(1953), Salinas (1958), O arado (1959), Exercício da palavra (1975), A herança (1984).
(CASTRO, 2004)
evidências apontam para uma pessoa forte, guerreira, que não se acomodou e
buscou alçar vôos?
Portadora de títulos honoríficos, honrarias e vários diplomas, Myriam
Coeli nunca ostentou todas essas condecorações; ao contrário, sempre se
portou com humildade. Os que a conheceram descrevem-na como uma pessoa
simples, tímida e reservada em relação à vida pessoal. Segundo seus
contemporâneos, tinha uma única vaidade feminina: não gostava de mencionar
a idade.
Além da repercussão do seu nome no próprio Estado em que Myriam
Coeli viveu, hoje, seu nome se encontra na Rede Mundial de Computadores,
no site www.jornaldepoesia.com.br
, ao lado de escritores como Machado de
Assis, Manoel Bandeira, Mário de Andrade, Zila Mamede, entre outros. Na
referida página, encontram-se aspectos biográficos e poesias de Myriam Coeli,
como, por exemplo, Fundamentos, poesia esta que também faz parte do livro
Cantigas de Amigo (1981).
Naqueles campos distantes
Cristãos e mouros lutavam
Só nascia flor vermelha
De corpos que arrebentavam:
Vermelhos rios vermelhos
Que os campos alagavam.
E os delgados cavaleiros
Pelas vias inda andavam,
Pela Fé e pela Espada
Suas honras adestravam.
Longe, outros, pelas águas
Aventura aventuravam.
Velhos castelos distantes
Cavaleiros visitavam
Cantando gestas de amor
Que poetas lhes legavam.
Naqueles tempos de antanho
Paixões a todos bruxavam.
Todos tinham na lembrança
As mulheres que sonhavam
— Flores morenas ou alvas —
Nos campos que se alagavam.
Outros, com esperança e o sonho
Nas vias e águas que andavam
Tinham no peito cantares,
Desejos que despontavam
Da lonjura ser presente
Daquelas por quem tristavam.)
(http//www.jornaldepoesia.com.br)
Além das poesias de Myriam Coeli, existem textos que se referem à sua
produção literária, a exemplo da obra de José Jácome Barreto (1988), intitulada
A arte poética de Myriam Coeli. Nela, o autor apresenta e analisa a obra
poética de Myriam. Para esse escritor, Myriam Coeli se impôs como “um rico
patrimônio cultural das letras potiguares, em cujo cenário – tão profundamente
amado por ela – sua voz se projetou vibrante, comovedora e, sobretudo,
fraternal e reflexiva.” (1988 p.35).
A exemplo, ainda, do livro organizado pelo escritor Celso da Silveira,
intitulado Ave, Myriam (1984). Nesse livro, encontram-se fotos de diferentes
fases da vida de Myriam Coeli: documentos e títulos pessoais, além de uma
coletânea de depoimentos publicados na imprensa sobre esta professora e
sobre o seu falecimento. Dentre eles, o comentário de Veríssimo de Melo que
registra sua morte com pesar e saudade.
De Myriam Coeli sempre falaremos com admiração verdadeira e até
de exaltação. De agora em diante, todavia, que ela virou anjo e o
lugar de anjo é no céu, continuaremos a falar sobre ela com
profunda saudade.
(SILVEIRA, 1984, p.51).
Naturalmente o tempo passou, as mudanças ocorreram, muitos outros
caminhos foram trilhados. Nesse percurso, o nome de Myriam Coeli aparece
sempre presente. Neste trabalho, ela é uma presença que ressurge após a
escrita de alguns textos, construídos e apresentados em eventos. Geralmente
lembrada por outras pessoas como poetisa e jornalista, tem agora um foco
voltado para um outro objetivo: analisar suas práticas pedagógicas durante a
década de 1960, na Escola Profissionalizante da Rede Federal de Ensino do
Rio Grande do Norte, atualmente Centro Federal de Educação Tecnológica do
Rio Grande do Norte.
C
C
o
o
n
n
f
f
i
i
g
g
u
u
r
r
a
a
n
n
d
d
o
o
a
a
d
d
é
é
c
c
a
a
d
d
a
a
d
d
e
e
1
1
9
9
6
6
0
0
5. Configurando a década de 1960
urante a década de 1960, Natal apresentava-se como uma
cidade em franco crescimento populacional. Segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, em decorrência da II Guerra
Mundial, há nesse período um crescimento em torno de 80% da população.
Enquanto na década de 1940 estava estimado em 54.836 mil pessoas, já no
início da década de 1950 o número de residentes é de 103.215 mil habitantes,
passando para 162.537 moradores no censo de 1960. Assim, a cidade do Natal
quase duplicou sua população fixa e em trânsito, com milhares de militares
brasileiros da Marinha, Aeronáutica, Exército e civis seduzidos pela força de
trabalho de grandes obras como a construção da estrada Natal-Parnamirim; da
Base Americana de Parnamirim; da Base Naval do Refoles; e construções de
quartéis e instalações militares. Com esse aumento do número de moradores,
que ocorreu em um pequeno espaço de tempo, a cidade foi necessitando de
nova estrutura urbana, desenvolvimento da economia de modo a atender às
necesidades da população.
D
Santos (2002, p. 177) afirma:
Não há dúvida de que, terminada a II Guerra Mundial,
aqui ficaram novos hábitos, não só no trajar, no alimentar
da sociedade, mas também, na maneira de pensar do
empresariado no tocante ao progredir e crescer. Um bom
acervo de conhecimentos e de unidades produtivas
ficaram aqui para impulsionar a nossa economia.
No entanto, ainda era um crescimento lento, e uma das preocupações
do prefeito Djalma Maranhão
10
. Em mensagem enviada à Câmara de
Vereadores no ano de 1962, ele evidencia que Natal cresce, “apenas
horizontalmente, sem indústria, sem aumento de riqueza social, com uma
população ativa concentrada na atividade comercial e de setores de serviços,
com renda per capita das mais reduzidas” (MARANHÃO apud GÓES, 1991,
p.22).
Pensando nessas dificuldades, o Governador do Estado do Rio Grande
do Norte, Dinarte de Medeiros Mariz
11
ofereceu incentivos fiscais para as
empreas que viessem se instalar no Estado. O ramo de indústria de
transformação era o mais relevante. Contava com o maior número de
estabelecimentos, empregando dois terços dos operários. Entre essas
indústrias, as que se sobressaíam eram as de produtos alimentares, a têxtil, a
química, couros e peles e a de minerais metálicos. Isso pela maior quantidade
de mão-de-obra que concentrava e pelos valores de suas produções
respectivas (SANTOS, 2002).
Assim, o cotidiano da capital modifica-se gradativamente. Em Natal, a
rotina dos trabalhadores, das fábricas já começa a fazer parte do cotidiano da
cidade. Myriam Coeli registra as transformações do seu cotidiano na Avenida
Alexandrino de Alencar.
A voz de um galo quebra os cristais da madrugada. O céu se
ruboriza, retalhos de sombra fogem desordenados daqui e dali e, em
breve, a manhã surge na graça do tempo, banhada de sol tépido.
Em minha rua homens passam para o trabalho. Humildes
e alegres, engrenagens de fábricas, almas de
construções, vão se incorporar às suas funções. Seguem-
se os pregões.
(A REPÚBLICA, 28 de novembro de 1957).
10
Djalma Maranhão nasceu no dia 27 de novembro de 1915 em Natal – RN. Sua militância
política teve início na década de 1930, quando se filiou ao Partido Comunista do Brasil (PCB),
desenvolvendo ação política no sul do país. Em 1954, é eleito deputado estadual,
desempenhando o mandato até 1956 , quando é nomeado pelo governador Dinarte Mariz,
prefeito da cidade de Natal. Em 1960, foi eleito prefeito de Natal pelo Partido Trabalhista
Nacional (PTN), assumindo a Prefeitura em 1961. A passagem de Djalma Maranhão pela
Prefeitura foi assinalada por inúmeras obras: Palácio dos Esportes, Estação Rodoviária,
Galeria de Arte, Concha Acústica, etc. Com o golpe militar de 1964, foi deposto, preso e teve
seu mandato cassado. Em 30 de julho de 1971, vítima de uma parada cardíaca, faleceu em
Montevidéu.
(http//www.cabugi.com/rnonline/resultado personalidades.asp?codigo_personalidade)
11
Dinarte de Medeiros Mariz, natural de Serra Negra do Norte, no Seridó do Rio Grande do
Norte nasceu a 23 de agosto de 1903, foi produtor de algodão, ingressando na vida pública na
década de 1930. Mais tarde, participou da fundação no Estado da União Democrática Nacional
(UDN). Foi eleito senador em 1954 e governador do Rio Grande do Norte dois anos depois.
Retornou ao Senado em 1962, implantou a Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(UFRN). Faleceu em 9 de julho de 1984, na cidade de Brasília.
(http//www.cabugi.com/rnonline/resultado personalidades.asp?codigo_personalidade)
Myriam Coeli continua. Avisa que o dia vai se enchendo de vozes e
Natal se anima com as bênçãos de luz desse verão.
E eu penso que os homens humildes e alegres que
passaram por minha rua, a estas horas compõem a
harmonia do progresso enquanto em seus corações
algum sonho bom deve sobreviver para sustentá-los em
suas canseiras e afazeres, como um vidro capitoso que
alegra e comunica.
(A REPÚBLICA, 28 de novembro de 1957).
Atenta, a escritora vai registrando o dia-a-dia da cidade. Além dos
operários das fábricas outros trabalhadores faziam parte da mão-de-obra
informal, em atividades diárias que proporcionavam aos moradores através dos
anúncios de suas mercadorias, uma melodia para os que apreciam as
características das pequenas cidades. São os verdureiros, os compradores de
garrafa e diariamente os vendedores de comida.
Em Natal ainda há dessas gostosas vozes enchendo a manhã
nascente de uma récita de poesia. Vendedora de cuscuz, de
manguzá, de tapioca.
Verdureiros desfilam cestos coloridos onde os tomates se
amontoam entre os verdes pimentões e as laranjas, e as
espirituais folhas de alface contrastam com as robustas
cenouras. Os garrafeiros desfilam um mundo de vidros
coloridos e latas que brilham incididos pelo sol, tudo
misturado, criando uma nova melodia entre tilins tilins e a
voz grossa do pregão servindo de solista.
(A REPÚBLICA, 28 de novembro de 1957).
As pessoas ainda caminham calmamente pelas ruas da cidade, o que
permite que costumes ainda sejam preservados. A conversa na calçada com
parentes e vizinhos, para desfrutarem da agradável brisa que sopra e como um
momento de integração das famílias. A própria Myriam Coeli deixa registrado
esses momentos de lazer ao ser fotografada em uma dessas ocasiões.
Figura 15: Fotografia de Myriam Coeli ao lado de Celso da Silveira [ 19 – ?]
Fonte: Acervo particular da família Silveira
Entretanto, o progresso exige outras opções para os seus habitantes. Os
moradores do bairro do Tirol exigem transporte coletivo que atendam as suas
necessidades.
Os moradores do bairro de Tirol e adjacências estão
clamando por providências dos poderes públicos no
sentido de que seja atenuado o grave problema de
transporte coletivo naquela área natalense.
A população prejudicada está apelando para o órgão
competente da Prefeitura a fim de que adote severa
fiscalização, propiciando um transporte mais compatível
com o progresso de nossa cidade.
(A REPÚBLICA, 31 de março de 1960, p.3)
No aspecto cultural, a reforma do Teatro Alberto Maranhão foi também
um acontecimento. A reestruturação desse teatro, com o intuito de comportar
grandes espetáculos, o fez passar por uma mudança total, com moderna
estrutura física e ambiente confortável.
Teatro Alberto Maranhão será reaberto nos princípios do
próximo mês de março.
As obras de restauração integral que vêm sendo
executadas no Teatro Alberto Maranhão, estão
caminhando aceleradamente e tudo indica que por todo
este mês os serviços serão concluídos. As poltronas
estofadas já chegaram. A Casa Holanda iniciará na
próxima semana os serviços de decoração. Assim a
direção de nossa principal casa de espetáculos já está
tomando as providências necessárias no sentido de
organizar a grande programação de reabertura de nossa
principal casa de espetáculos.
(A REPÚBLICA, 08 de janeiro de 1960, p.5)
Com a nova estrutura pronta, o teatro passou a contar com setecentos e
dez lugares à disposição do público. A reabertura ocorreu no dia 24 de março
de 1960, inaugurando oficialmente a restauração integral do espaço. Na
oportunidade, no Salão Nobre algumas pessoas foram agraciadas com a
Medalha de Mérito Alberto Maranhão. Entre essas pessoas, o Ministro Clóvis
Salgado, Luís da Câmara Cascudo, o Prefeito José Pinto Freire, Dr. Edmundo
Moriz, diretor do Serviço Nacional de Teatro, além do governador Dinarte
Mariz.
Apesar dessas iniciativas, nem todos tinham oportunidade de ir ao
teatro. E não só a cultura, mas a educação ainda não era disponível a toda a
população. O Estado não conseguia oferecer escola para todos e a camada
menos favorecida economicamenente não tinha acesso ao ensino.
Figura 16: Fotografia de Myriam Coeli em visita ao prefeito Djalma
Maranhão [196?]
Fonte: Acervo particular da família Silveira
No campo educacional, uma das preocupações centrava-se na
educação para os operários e sua família. Possuindo pouca instrução
restavam-lhes apenas alguns empregos, percebendo pequenos salários que
mal davam para comprar o alimento da própria família. Myriam Coeli reflete
essa preocupação ao dedicar uma poesia ao prefeito Djalma Maranhão,
intitulada Medida de Construção. Eis alguns versos:
Com quantas fomes
famas e nomes
faz o operário
o seu andaime?
E quanto medo
paga em segredo
o seu salário?
O seu ofício:
riscar o chão
subir depressa,
como uma prece,
a construção.
(E quem lhe reza
uma oração?)
Com que doenças
aplaina o chão
da construção
se não repousa
em lar ou chão?
Quantos tijolos
desempilhados
toda semana
preparam a cesta
de um operário?
– Pilham seu pão.
(…)
Qual o salário
– sal e sudário –
que compra o pão?
(…)
Com quantos riscos
no ar suspende
estranho pássaro
quase esqueleto
– pobre operário …
(Nenhum proveito,
só mau salário).
(…)
Que construção
resgata o pão?
Que condição
faz comunhão
com seu salário
– pobre operário?
(SILVEIRA, 1981a, p. 11-16)
Consultando as pessoas residentes nos bairros periféricos, o prefeito
descobriu que a necessidade primordial era também o desejo de todos: escolas
para crianças. Como Djalma Maranhão era ligado às reivindicações populares,
compreendeu a necessidade dos operários. Aceitou o desafio e designou o
professor Moacyr de Góes
12
para planejar, organizar e executar a campanha
12
Moacyr de Góes foi Secretário Municipal de Educação de Natal na administração do Prefeito
Djalma Maranhão (1960-1964) quando coordenou a campanha De Pé no Chão Também se
para acabar o analfabetismo em Natal. Para tanto, a escola deveria fornecer
tudo: o professor, a carteira, o material escolar e, inclusive, a merenda. A
educação, seria um caminho pelo qual os meninos pobres poderiam ter
oportunidade de melhores trabalhos na idade adulta.
Em abril de 1961, através de uma carta, Djalma Maranhão mostrava o
porquê dessa campanha:
Há momentos decisivos na vida dos povos. É a hora em que a
História marca as suas encruzilhadas. Acreditamos que o povo
brasileiro vive um desses momentos. Na sua luta contra o
subdesenvolvimento ele precisa se erguer do solo e ganhar a sua
independência de ação. E só poderá fazer isso se for alfabetizado e
tiver uma educação mínima que o faça afirmativo na sociedade.
Acreditamos que chegamos nessa encruzilhada: ou o povo se
alfabetiza ou se escraviza.
(HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE – fascículo 12, [199 – ?])
Surgia, então, a Campanha de Pé no Chão Também se Aprende a Ler,
divulgando através do seu hino que
Quem não sabe neste mundo vive como quem não ver, agora
chegou a vez para quem quiser aprender. Grave bem aquela frase
do Prefeito Maranhão: De Pé no Chão Também se Aprende a Ler.
Este era parte do hino da campanha que era cantado nos
acampamentos escolares e divulgado através da Rádio Nordeste em um
programa semanal feito pelo prefeito Djalma Maranhão, com o nome O prefeito
presta contas ao povo.
13
O prefeito mostra o andamento do seu projeto educacional.
Aprende a Ler. Foi professor do Ateneu e fundador das disciplinas de História da América e de
História Econômica das Faculdades de Filosofia e Ciências Econômicas da UFRN. Preso
político em 1964, esteve destituído de cargos e funções oficiais até a anistia em 1979.
Secretário Municiapl de Educação do Rio de Janeiro no período de 1987-1988, voltando à
Secretaria Municipal de Educação de Natal na administração da Prefeita Wilma Maria de Faria,
em 1989.
(GÓES, 1991)
13
Esta informação me foi concedida pelo historiador Cláudio Pinto Galvão, sócio efetivo do
Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte.
O número de 'Escolinhas' já está em 205. Mas são precisas 1.878
para erradicar o analfabetismo da Cidade. Presentemente estamos
ensinando a ler até debaixo de palhas, pois nas Rocas construímos
cinco pavilhões de 8 metros por 30, cobertos de palhas de coqueiros,
com piso de barro batido, onde estudam cerca de 1.200 crianças e
300 adultos. Bem justificado é o nosso slogan: ‘DE PÉ NO CHÃO
TAMBÉM SE APRENDER A LER’.
(HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE – fascículo 12, [199 – ?])
Figura 17: Imagem de divulgação da Campanha de Pé no chão, (1961)
Fonte: Diário de Natal – Educação de Jovens e Adultos, 2005
A campanha de combate ao analfabetismo cresceu de maneira
extraordinária passando por várias fases. A das Escolinhas Municipais, que
recebia este nome uma vez que funcionavam em salas cedidas, gratuitamente,
pela comunidade onde funcionava uma classe de alfabetização. Depois, os
Acampamentos Escolares, escolas rústicas com piso de barro batido e
cobertas por palhas de coqueiros. Para os adultos que não queriam estudar
nos acampamentos, o ensino era feito na sua casa, onde se reunia um grupo
não superior a seis pessoas. Os professores eram recrutados entre meninos e
meninas do Grupo Escolar Isabel Gondim, que se apresentavam para ensinar
sem receber salário.
Figura 18: Campanha De Pé no Chão – Acampamento das Rocas, (1961)
Fonte: Diário de Natal – Educação de Jovens e Adultos, 2005
Um fato importante foi sem dúvida a construção do Centro de Formação
de Professores, cuja direção foi entregue à professora Margarida de Jesus
Cortês. O Centro passou a ser o cérebro da campanha. Além do Centro, a
Secretaria de Educação também continuava a dar as orientações gerais aos
professores do Estado. Dentre os que pertenciam ao quadro funcional, estava
Myriam Coeli como Técnica de Educação do Centro de Estudos e Pesquisas
Educacionais. Os técnicos da Secretaria organizavam cursos de capacitação
para professores de todo o Estado.
Curso de treinamento para Professores não Diplomados, próximo mês.
No período de 1º a 27 de fevereiro, terá início na Capital e nas cidades de Mossoró e
Caicó, cursos de Treinamento para elementos não diplomados para as funções do
magistério, com a finalidade de instruir e ajustar o professorado primário do Estado, as
novas técnicas educacionais, adotadas pela reforma de ensino.
O Curso de Treinamento é promovido pela Secretaria de Educação, através do seu
órgão técnico Centro de Estudos e Pesquisas Educacionais.
(A REPÚBLICA, 13 de janeiro de 1960, p.6)
Foi desse modo, que no Estado do Rio Grande do Norte, em 1961 a
Prefeitura Municipal de Natal iniciou a campanha de alfabetização chamada De
Pé no Chão Também se Aprende a Ler. O método didático seguia as propostas
do pernambucano Paulo Freire, que se propunha a alfabetizar em quarenta
horas adultos analfabetos. A experiência teve início na cidade de Angicos –
RN, prolongando-se, posteriormente, ao vizinho Estado de Pernambuco
recebendo a denominação de Movimento de Cultura Popular.
Havia uma preocupação em aumentar o número de escolas não apenas
na capital, mas em todo o Estado.
O plano educacional da Administração Dinarte Mariz compreendeu,
no ano de 1959 e através da Secretaria de Educação e Cultura, a
construção de seis novos Grupos Escolares distribuídos no interior
do Estado. Essas obras foram levadas a efeito através de convênios
assinados entre o Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP)
e o Governo do Estado.
O Rio Grande do Norte pode louvar-se, nos dias de hoje,
de ser um dos Estados da Federação que vem
recebendo maior atenção por parte do D. Anísio Teixeira,
Diretor do INEP. Dele recebe o Governo Estadual todo o
apoio necessário ao programa de reorganização do
sistema pedagógico, cuja estrutura foi completamente
reformada no sentido de adaptar-se as exigências da
Nova Escola.
O Professor Grimaldi Ribeiro, Secretário de Educação e
Cultura tem mantido constantes contactos com as
autoridades educacionais do País, a fim de sustentar, em
seus detalhes, a planificação elaborada para os negócios
da Educação no Estado.
(A REPÚBLICA, 07 de fevereiro de 1960, p.1)
As cidades beneficiadas de que fala a notícia foram: Currais Novos,
Afonso Bezerra, José da Penha, São Miguel, Luiz Gomes, Canguaretama e
Alexandria. A quantidade de municípios agraciados comprovam que a
educação no Estado tendia a se multiplicar.
Outros acontecimentos na educação mereceram destaque. Entre esses
fatos vale ressaltar a criação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte
(inicialmente estadual), em julho de 1958. Só mais tarde, no ano de 1960, foi
federalizada pelo Presidente da República Juscelino Kubistchek de Oliveira.
Criou ainda o Instituto Educacional de Mossoró, Assu e o de Caicó, apoiou a
educação de adultos e implantou o serviço médico nas escolas da rede
estadual de ensino.
As orientações feitas na administração de Dinarte Mariz através da
Secretaria Estadual de Educação e Cultura, tendo a época como seu secretário
Tarcísio de Vasconcelos Maia foram sistematizadas através da Lei nº 2.171, de
06 de dezembro de 1957. Esta tinha como objetivo geral organizar e fixar as
bases da Educação Elementar e da Formação do Magistério Primário do
Estado.
A proposta de educação pretendia estar em consonância com uma
sociedade em mudança, em modernização, com práticas que pretendiam
oferecer aos alunos o preparo para a vida do trabalho, cooperação social e
política. A referida proposta buscava atender às novas exigências
educacionais, capacitando professores com uma formação continuada para
àqueles que não eram diplomados. Em relação ao aluno, o mesmo era visto
em sua totalidade como ser humano. Para isso, seriam ministrados, sempre
que possível, educação integral, considerando o aluno não só em função da
estrutura escolar.
Em relação à formação dos professores, é dada a seguinte orientação,
na Lei nº 2.171/1957 em seu Art. 1º:
A formação do magistério elementar, através das escolas normais e
seus cursos, visará a preparação do professor, de acordo com as
necessidades e mudanças socias da vida do Estado e do País,
atendendo às exigências culturais básicas e gerais, e a
especialização profissional determinada pela carreira.
(RIO GRANDE DO NORTE, 1957)
Competia, pois, ao Estado a formação contínua dos professores
primários, organizada através de cursos oferecidos pela Secretaria de
Educação que ficava na cidade de Natal. A capacitação constante dos
docentes permitia-lhes que os mesmos estivessem sempre se adaptando a
novas circustâncias e a novas necessidades.
Para tanto, o magistério primário deveria ser exercido por professores
com formação pedagógica. Na inexistência de professores diplomados, era
necessário que fosse feito um exame de habilitação, sendo oferecido
posteriormente, treinamento em serviço para que se tornassem aptos ao
desempenho da função.
Os estabelecimentos de educação elementar em que os professores
atuariam foram designados como Escola Isolada, Escolas Reunidas, Grupo
Escolar, Escolas ou Cursos Supletivos.
As Escolas Isoladas eram as que reuniam de 02 a 04 turmas
heterogêneas de alunos e número equivalente de professores; as Reunidas, da
mesma forma contavam com 02 a 04 turmas heterogêneas de alunos e número
correspondente de professores; já os Grupos Escolares possuíam 05 ou mais
turmas de alunos distribuídos por séries e tinham número igual ou superior de
docentes inclusive um Diretor. Por fim, os Cursos Supletivos eram
caracterizados como todos os que ministrassem educação supletiva,
independente do número de turmas e de professores.
Além dos centros de Formação de Professores e de todos os
estabelecimentos de ensino, outra escola de Natal se destacou na história
educacional do Estado, durante esse período. Era o Ateneu Norte-Rio-
Grandense, centro cultural de grande importância. Fundado em 03 de fevereiro
de 1834, é segundo Cascudo (1999, p.192), um dos mais antigos educandários
do Brasil, anterior ao Colégio Dom Pedro II, modelo na espécie.
Acrescido de todos os estabelecimentos mantidos pelo poder público, a
cidade possuia os particulares. Estas escolas deveriam, de acordo com a Lei
2.171/1957, observar as disposições desta e os seus regulamentos. Ficariam
sujeitos a registro prévio, mediante o preenchimento de condições
estabelecidas em regulamento.
Algumas delas tinham sua base curricular voltada para a formação
feminina, apresentando divulgação dos serviços prestados, como é o caso do
Colégio Nossa Senhora das Neves, localizada na Praça Pedro II, no bairro do
Alecrim.
Mantém os cursos: pré-primário, primário, comercial,
ginasial e colegial.
Para completar a esmerada educação que V.S. vem
dando a suas filhas, matricule-as neste modelar
estabelecimento, onde lhes serão ministrados
ensinamentos que as habilitarão para a sua nobre missão
feminina, no LAR, na SOCIEDADE e na PÀTRIA.
Abertura da matrícula no curso primário: 15 de janeiro.
(A REPÚBLICA, 12 de janeiro de 1960, p.02)
O alto custo das mensalidades cobrado pelas escolas particulares e a
insuficiência da pública para todos gerava grande preocupação entre os pais
que tinham filhos em idade ecolar.
Povo sem Escolas, povo sem destino
Os dramas vividos pelos pais de família nesta época do ano para a
matrícula dos filhos num educandário de nível primário ou secundário,
só se compara as vicissitudes que os mesmos passam para fazer
semanalmente a feira ou para alugar uma casa. No que atestam o
tríplice abismo da vida brasileira pelas ‘metas esquecidas’ – as metas
humaníssimas da escola pública da produção alimentar e da
habitação popular.
(A REPÚBLICA, 26 de fevereiro de 1960, p.2)
No período de discussões da Lei 2.171/1957, Myriam Coeli trabalha
como jornalista no jornal A República e ministra aulas de língua portuguesa e
literatura no Atheneu Norte-Riograndense. Os professores deste Colégio
possuíam o hábito de conversar sobre sua prática, uma forma de estarem
sempre atualizados sobre as novas temáticas educacionais. O professor
Protásio de Melo
14
relembra o tempo em que trabalhou com Myriam Coeli
naquele establecimento de ensino.
14
Protásio Pinheiro de Melo nasceu em Natal aos 03 de julho de 1914. Foi aluno do Ateneu
Norte-Rio-Grandense. Cursou Direito (1933-38) na Faculdade de Recife. Como bacharel em
Convivemos na velha casa de ensino e ali, entre aulas e conversas
sobre autores, livros e poetas, recebi de Myriam Coeli uma bela
tradução do ‘Corvo’ de Poe, de Péricles Silveira, que guardo em meu
arquivo carinhosamente.
Sempre a via calma e sorridente, mesmo quando alguns alunos mais
ousados tentavam perturbar suas aulas. Ao Diretor, nunca uma
queixa ou reclamação. Era sempre uma presença agradável, um
‘lago sereno no fim da tarde’, como já disseram de uma pessoa. Vida
e poesia se juntavam e partilhavam do seu dia-a-dia.
(A REPÚBLICA, 07 de março de 1982)
Em meio a todas essas discussões, durante o início da década de 1960,
o Estado do Rio Grande do Norte assim como os demais do país passa por um
novo momento, onde surgem as massas populares urbanas, propondo uma
nova maneira de se fazer política.
Nesse contexto, tendo em vista a eleição para governo no ano de 1960,
acontece o rompimento do então governador Dinarte de Medeiros Mariz,
liderança da União Democrática Nacional – UDN, com o deputado federal
Aluízio Alves, também da UDN.
Pertencente originalmente aos setores da oligarquia, Aluízio Alves,
manifesta nas eleições idéias modernizadoras e a nova mentalidade que se
tentava impor no Nordeste.
Em todo o Estado, a campanha eleitoral se desenrolou com grande
entusiasmo, especialmente dos que defendiam a candidatura de Aluízio Alves,
o que gerava um radicalismo em ambas as partes. Simpatizantes de Aluízio
Alves (os aluizistas como eram chamados) usavam a cor verde e os
simpatizantes de Djalma Marinho, a cor vermelha. A cidade de Natal, que
contava com cerca de 162.537 mil habitantes, tinha suas ruas repletas de
bandeiras verdes e vermelhas.
Uma vez candidato, Aluízio Alves assumiu a liderança do seu grupo,
organizando uma coligação partidária com a denominação de Cruzada da
Esperança, formada pelos seguintes partidos: Partido Social Democrático
(PSD), Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), Partido Comunista Brasileiro
(PCB), Partido Republicano Paulista (PRP), Partido Trabalhista Nacional (PTN)
e dissidentes da União Democrática Nacional (UDN). Para vice-governador foi
indicado o Monsenhor Walfredo Gurgel, uma das mais importantes lideranças
do PSD da região do seridó potiguar. Os acontecimentos demonstravam o
momento de mudanças que ocorriam no país inteiro.
Eleito o novo governador, ao tomar posse no ano de 1961 com mandato
até 1966, Aluízio Alves adotou como uma de suas primeiras medidas assinar
um decreto, modificando o nome do Palácio do Governo de Potengi para
Palácio da Esperança.
Ciências Jurídicas exerceu a função de Promotor Adjunto da Comarca de Natal. Em 1953
participou da fundação da Sociedade Cultural Brasil-Estados Unidos, de Natal, da qual foi
Diretor Cultural por 25 anos. Durante a II Guerra Mundial lecionava Português para os Oficiais
americanos residentes em Parnamirim. Na UFRN, foi tradutor oficial em quatro reitorados;
ensinou Literaruta Norte-Americana e Inglesa; e, por último, dirigiu o Museu Câmara Cascudo.
Dentre as ações modernizadoras realizadas na sua administração,
destacam-se a energia de Paulo Afonso, a criação da COSERN (Companhia
de Serviços Elétricos do Rio Grande do Norte) e a implantação da TELERN
(Companhia Telefônica do Rio Grande do Norte).
Outras ações relacionadas à agricultura, por exemplo, foram
implementadas e, para que a população tomasse conhecimento de sua
atuação
governamental, Aluísio Alves publicou
15
logo no segundo ano de mandato o
livro 150 dias de governo (1961) que contemplava as obras que vinham sendo
realizadas por todo o Estado nos seus diversos departamentos. Ele ainda
restaurou diversos estabelecimentos de ensino, transformou o grupo escolar
Padre Miguelinho, situado no bairro do Alecrim, no Colégio Estadual Padre
Miguelinho, construiu e inaugurou o Instituto Presidente Kennedy.
Segundo Mariz e Suassuna (2002, p.353),
O período de governo de Aluízio Alves foi repleto de fatos
políticos importantes, o que servia para ajudá-lo a
manter-se sempre em contato com as lideranças do
interior. Seu principal erro foi acirrar a divisão política,
beneficiando às vezes em excesso, correligionários e
perseguindo adversários.
No âmbito da educação e cultura, mudou o nome do Teatro Carlos
Gomes para Alberto Maranhão e criou as faculdades de Jornalismo e
Sociologia, que funcionaram na Fundação José Augusto até serem
incorporadas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em 1975. Em
relação aos cursos mantidos pela Fundação, foi de grande valia para o
reconhecimento feito do curso de Jornalismo Eloy de Souza realizado pelo
Conselho Federal de Educação, o diploma de jornalista de Nível Superior da
Professora Myriam Coeli.
O fato da incorporação dos cursos da Faculdade de Filosofia, Letras e
Artes de Natal, e da Faculdade de Joranlismo Eloy de Souza, pela
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, fez com que, segundo Celso da
Silveira, Myriam Coeli fosse por duas vezes injustiçada profissionalmente. Em
ambos os casos, a sua vaga foi preenchida por pessoa estranha ao quadro
funcional e Myriam Coeli não foi absorvida pela UFRN.
Em meio a todos os acontecimentos, campanhas e movimentos de
educação popular despontaram em todas as regiões do país, com destaque
15
Além dessa obra Aluízio Alves publicou os seguintes livros: A primeira campanha popular do
Rio Grande do Norte (1976), A verdade que não é secreta (1976), Angicos (1997), Breve
história do palácio da esperança (1961), Cadernos populares 1, voltar para lutar (1982),
Mensagens às elites (1961), O governo em Mossoró (1989), Resposta ao desafio do nordeste
(196 –?), Sem ódio e se medo (1969), O que eu não esqueci: reminiscências políticas 1933-
2001 (2001).
(MORAIS;OLIVEIRA, 2005)
para o Nordeste, onde traziam propostas de cunho de consciência política e
social para o povo.
No Rio Grande do Norte, despontou um movimento populista, sendo
influenciado pela atuação da Igreja Católica que de acordo com Germano
(1994, p.50) estava, também preocupada com a situação social e política e,
temendo perder o seu rebanho, organizou e instalou sindicatos rurais e criou
um sistema de radiodifusão educativa com o Movimento de Educação de Base
(MEB). Essas campanhas de educação popular contribuíram ao mesmo tempo
para acelerar o processo de politização das camadas mais humildes.
Outro movimento de educação popular que se destacou foi à ação
popular de Paulo Freire, por ter trazido significativas contribuições para a
construção do pensamento educacional brasileiro. Nas raízes de sua proposta,
pode-se notar o empenho em difundir entre o povo brasileiro o ideal do
desenvolvimento nacional. Imbuído do desejo de despertar na população um
novo modo de pensar a existência, perante as condições nacionais que
enfrentavam.
A alfabetização de adultos, no pensamento de Paulo Freire, se dava não apenas como forma de
aquisição da leitura e da escrita, mas como uma prática conscientizadora da existência humana no mundo.
Acrescido a isso, o despertar para as relações entre opressores e oprimidos, e para uma consciência crítica capaz
de atuar perante a sociedade e até transformá-la. É a formação do educando como um sujeito histórico e não
apenas a aplicação de uma educação bancária, pois este último tipo para o educador Paulo Freire (1996) deforma
a necessária criatividade tanto do educador, quanto do educando.
Para Freire (1996, p.159), ensinar exige querer bem aos educandos e
acrescenta:
E o que dizer, mas sobretudo que esperar de mim, se, como
professor, não me acho tomado por este outro saber, o de que
preciso estar aberto ao gosto de querer bem, às vezes, à coragem
de querer bem aos educando e à própria prática educativa de que
participo.
Entretanto, no dia 31 de março de 1964, com um golpe, os militares
destituíram o presidente da República, João Goulart. Com esse golpe, os
militares extinguiram os partidos políticos criados em 1946, censuraram os
meios de comunicação, limitaram o Legislativo e impuseram uma forte
repressão que resultou em cassação, prisão, tortura e assassinato de muitos
brasileiros, opositores dos militares. Entre os natalenses ilustres que foram
presos e depois exilados encontra-se o então Prefeito Djalma Maranhão.
O golpe militar de 1964 se caracterizou, no Rio Grande do Norte, pelas
perseguições a jovens e intelectuais da terra, como Moacyr de Góes, Djalma
Maranhão, Mailde Pinto
16
e outros. Djalma Maranhão, exilado, com saudade do
seu povo, morreu no Uruguai. Aluízio Alves, Garibaldi Alves e Agnelo Alves
tiveram seus direitos políticos cassados pelo Ato Institucioanal nº 5.
Depois do golpe de 1964, muitos educadores passaram a ser
perseguidos em função de posicionamentos político ideológicos. O Regime
Militar refletiu na educação o seu caráter anti-democrático: professores foram
presos e demitidos,
alguns mortos ou exilados, universidades foram invadidas, estudantes foram
presos, feridos, nos confrontos com a polícia, e alguns foram mortos; até que
fossem calados. A prática do Regime Militar defendia que os estudantes
deviam apenas estudar e não participar de outros movimentos sociais.
Em meio a todos os acontecimentos, Myriam Coeli direciona as suas
atividades para atuar como professora na Escola Profissionalizante da Rede
Federal de Ensino do Rio Grande do Norte, tendo sido admitida nessa
instituição de ensino em 1º de janeiro de 1965 para exercer a função de
professora de português.
Assim como em todo o Brasil, as instituições de ensino, passaram, na
década de 1960, por discussões e possíveis mudanças propostas para a
educação brasileira a partir da implementação da Lei de Diretrizes e Bases da
Educação – LDB.
16
Em relação a esse difícil período vivido por todos Maílde Pinto Galvão que durante o início
dos anos de 1960 ocupou o cargo de Diretora do Departamento de Documentação e Cultura da
Secretaria de Educaçãoe Cultura, publicou pela Editora Clima, em 1994 o livro 1964:
aconteceu em abril.
A LDB, depois de 13 anos de acirradas discussões, foi promulgada em
20 de dezembro de 1961, ficando conhecida como a Lei 4.024. Sua publicação
foi o resultado de várias estudos e encontros que vinham sendo realizado nos
Estados, a exemplo da Lei 2.171/1957 que, no Rio Grande do Norte, já havia
fixado as suas diretrizes para a Educação. E não só professores, como os
alunos estavam atentos às modificações que viessem a surgir, como foi
debatido em Natal em um encontro nacional com estudantes do Ensino
Secundário.
Desde ontem estão reunidos num dos salões do Colégio
Estadual do Ateneu Norte-riograndense, estudantes de
vários estados da Federação, num conclave que objetiva
debater os problemas da reforma de ensino, face ao
Projeto de Diretrizes e Bases.
O conclave é promovido pela União Brasileira dos
Estudantes Secundaristas, cuja secção é agregada à
Associação Potiguar dos Estudantes.
(A REPÚBLICA, 05 de janeiro de 1960, p.6)
Os grupos envolvidos com a educação esperaram ansiosos pela Lei,
fossem os pertencentes aos grupos particulares, ao ensino público e até
mesmo os religiosos. No entanto, a sua aprovação não atendeu às
expectativas:
O texto aprovado não correspondeu plenamente às expectativas de
nenhuma das partes envolvidas no processo. Foi, antes, uma
solução de compromisso, uma resultante de concessões mútuas
prevalecendo, pois, como vem sendo assinalado, a estratégia de
conciliação. Daí porque não deixou de haver também aqueles que
consideraram a lei então aprovada pelo Congresso Nacional como
inócua. Ilustra essa posição a definição espirituosa enunciada por
Álvaro Vieira Pinto: É uma lei com a qual ou sem a qual tudo
continua tal e qual.
(SAVIANI, 2001, p.20).
Desse modo, se as discussões sobre a Lei de Diretrizes e Bases para a
Educação Nacional foi um fato marcante, por outro lado muitas outras
iniciativas assinalaram este período como, talvez, o mais fértil da História da
Educação no Brasil.
Sancionada a Lei nº 4.024 (LDB), que tinha como objetivo principal dar
uma unidade ao ensino nacional através das Diretrizes e Bases da Educação,
é completada integralmente a equivalência entre o ensino técnico e o ensino
secundário, ambos passando a denominação de ensino médio.
Em 02 de fevereiro de 1964, uma Portaria do então Diretor do Ensino
Industrial, Armando Hildebrand, relaciona os estabelecimentos de ensino
industrial legalmente autorizados a funcionar já a partir do dia 02 de janeiro de
1964. No Estado do Rio Grande do Norte, dois estabelecimentos: a Escola
Doméstica de Natal
17
e a Escola Industrial de Natal – esta, mantendo em
funcionamento o Ginásio Industrial e os cursos técnicos de Mineração e
Estradas.
Para Gonçalves (1990, p.45,46)
A Lei de Diretrizes e Bases de 1961 foi uma oportunidade que a
sociedade brasileira teve para organizar formalmente seu sistema de
ensino atendendo às necessidades determinadas pelo estágio de
desenvolvimento social da época. No entanto, não contemplou a
necessária democratização da escolaridade, já reclamada pelos
educadores brasileiros nas década de 30, e depois, de 60, em
decorrência, inclusive, dos parcos mas palpáveis progressos
propiciados pelo avanço da industrialização e da urbanização.
Desse modo, mesmo com todos os embates após a sua promulgação,
foi a partir da LDB (Lei maior para educação) que o país, com uma única Lei
pôde concentrar todos os níveis de ensino, tendo validade ao mesmo tempo
em todo o território nacional.
É nesse contexto que Myriam Coeli se insere. Num momento em que
Natal, a exemplo do que acontecia nas demais regiões do país, passa por
mudanças sociais para atender a nova demanda da poulação. No âmbito
educacional, onde ações foram implementadas e discussões estabelecidas
17
De acordo com Duarte (2000, p. 216), a Escola Doméstica foi registrada na Diretoria do
Ensino Industrial, publicada no Diário Oficial da União em 24/12/63.
antes e após a LDB. Os acontecimentos estão inseridos em uma época e, junto
a esse tempo e espaço formavam a Natal da década de 1960. E é a partir
desse cotidiano que se inserem as práticas pedagógicas de Myriam Coeli.
A
A
E
E
s
s
c
c
o
o
l
l
a
a
P
P
r
r
o
o
f
f
i
i
s
s
s
s
i
i
o
o
n
n
a
a
l
l
i
i
z
z
a
a
n
n
t
t
e
e
d
d
a
a
R
R
e
e
d
d
e
e
F
F
e
e
d
d
e
e
r
r
a
a
l
l
d
d
e
e
E
E
n
n
s
s
i
i
n
n
o
o
d
d
o
o
R
R
i
i
o
o
G
G
r
r
a
a
n
n
d
d
e
e
d
d
o
o
N
N
o
o
r
r
t
t
e
e
:
:
p
p
a
a
l
l
c
c
o
o
s
s
d
d
e
e
u
u
m
m
a
a
a
a
t
t
u
u
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
6. A Escola Profissionalizante da Rede Federal de Ensino do Rio Grande
Norte: Palcos de uma atuação
onhecer a prática docente de uma professora extrapola os limites
de uma sala de aula. Nesse sentido, quando me proponho a
estudar as práticas de Myriam Coeli, sinto a necessidade de
conhecer o espaço de sua atuação. A Escola Profissionalizante
da Rede Federal de Ensino do Rio Grande do Norte foi a que a
professora dedicou maior parte de suas atividades durante o decênio de 1960,
período objeto desse estudo. Conhecê-la, pois, tornou-se fundamental com seu
histórico e regimentação.
C
A história do ensino técnico no Estado do Rio Grande do Norte remonta
há quase um século de seu início, quando foi criada no dia 23 de setembro de
1909 a Escola Industrial Federal do Rio Grande do Norte. Através do Decreto
nº 7.566/1909, assinado pelo Presidente Nilo Peçanha, instituiu-se o ensino
profissional no país, com a denominação aqui no Estado de Escola de
Aprendizes Artífices de Natal.
A instalação se deu no ano seguinte, em 1910, sob a administração do
Diretor Sebastião Fernandes de Oliveira, no prédio do antigo Hospital da
Caridade, onde, em seguida, funcionou o quartel da Polícia Militar do Estado e,
posteriormente a Casa do Estudante, situada à Rua da Misericórdia – s/n , na
Cidade Alta.
A Escola tinha como fim fornecer instrução primária e profissional aos
filhos de trabalhadores carentes, sendo constituída de cinco oficinas:
Marcenaria, Sapataria, Alfaiataria, Serralharia e Funilaria. Cada uma dessas
oficinas tinha um mestre responsável que formava o quadro dos primeiros
servidores juntamente com mais dois professores, um escriturário e um porteiro
contínuo, assim distribuídos:
x Professora Primária – Maria do Carmo Torres Navarro
x Professor de desenho – Abel Juvino Pais Barreto
x Mestre Serralheiro – Silvino Domingos da silva
x Mestre Marceneiro – Joaquim de Paula Barbosa
x Mestre Alfaiate – João Máximo Barbosa Filho
x Mestre Sapateiro – Pascoal Romano Sobrinho
x Mestre Funileiro – João Viterbino de Leiros
x Escriturário – Pedro Soares de Araújo Filho
x Porteiro contínuo – Virgilio Vieira de Melo
Observando os cursos oferecidos aos alunos matriculados, pode-se
confirmar os objetivos das escolas de Aprendizes de Artífices que, segundo o
Professor Rivaldo Pinheiro,
Eram escolas destinadas ao aprendizado de arte, e não a
uma verdadeira instrução técnica, especializada.
Visavam antes munir o aluno de uma arte que habilitasse
a ganhar a vida e a manter, como artífice, do que
preparar os quadros técnicos de que já começava a
ressentir-se a nascente indústria brasileira. Não
representavam um plano de ação educacional, mas antes
uma tentativa de caráter social, de que foi tão fecundo o
curto governo de Nilo Peçanha, visando amparar os filhos
dos trabalhadores, que se encontravam nos centros
urbanos.
(PINHEIRO apud MELO, 1967, p. 3,4)
Cinco anos depois de sua criação, 1914, o estabelecimento de ensino
passou a denominar-se Liceu Industrial, mudando-se para o prédio da Av. Rio
Branco – nº 743, onde funcionou a TV Universitária. Mais tarde, na década de
1940, o Liceu recebe a denominação de Escola Industrial de Natal, passando a
incorporar o Ginásio Industrial aos cursos oferecidos.
A Escola Industrial tinha como missão primordial a preparação de
técnicos para a indústria que, mesmo lentamente, começava a despontar na
Região Nordeste. Esse desenvolvimento era um esforço da coletividade e a
escola deveria participar ativamente, ampliando a quantidade de mão-de-obra
especializada, aumentando ano a ano o número de matrículas.
Durante esse período, a Instituição adquire por um custo de 810 mil
cruzeiros, uma área de 90 mil m
2
no Bairro de Morro Branco, local onde seria
realizada posteriormente a construção do novo prédio da escola. A obra,
extremamente cara, foi considerada arrojada para a época, sendo principiada
mesmo assim. O início se deu em 1947 e levou 20 anos para sua conclusão.
A necessidade de prédio maior, para instalação de novas
e modernas oficinas, novos cursos, campos de esporte, –
era problema velho, que tinha inquietado várias
administrações.
Determinações da diretoria do Ensino Industrial
clamavam, ano a ano, pelo aumento das matrículas,
tendo a Escola atingido o teto máximo no prédio velho,
dentro de suas precárias instalações.
(MELO, 1967, p.8)
No ano de 1959, a Lei Federal nº 3.552, outorga às Escolas Técnicas
autonomia administrativa, didática e financeira. A escola passa, então, a ser
administrada por um Conselho de Representantes da Comunidade. É
reformulado o Ensino Industrial, havendo um deslocamento para o nível de 2º
grau e é nesse processo que surgem as Escolas Técnicas Federais.
Na cidade de Natal, em março de 1967, a escola inaugura o novo prédio
e no ano seguinte, 1968, recebe o nome de Escola Técnica Federal do Rio
Grande do Norte – ETFRN. Já, em 1969, cria o Curso Colegial Técnico
Industrial de Eletromecânica e o curso de Edificações.
Para os que desejavam fazer parte do quadro de funcionários, o
Regimento da ETFRN no final da década de 1960 em seu Art. 24, p. 8 diz que
“A admissão de qualquer servidor só poderá ser feita por concurso, mediante
contrato regido pela consolidação das Leis do Trabalho, o qual indicará o órgão
em que o mesmo deverá servir e a função que nele exercerá.”
Assim sendo, foi que através de concurso Myriam Coeli foi admitida na
então Escola Industrial Federal no dia 01 de janeiro de 1965, para exercer a
função de Professora de Português com vigência do contrato a partir desta
data. Neste ano, a escola era administrada por Luís Carlos Abbott Galvão,
presidente do Conselho de Representantes.
Até então, os cursos eram destinados apenas a alunos do sexo
masculino como regulamenta o referido regimento em seu Art. 27 (p.9) no que
trata dos Cursos oferecidos.“A escola manterá cursos ordinários do primeiro e
segundo ciclos, para candidatos do sexo masculino, e poderá promover cursos
extraordinários previamente programados, mediante aprovação do Conselho
de Representantes”.
Só mais tarde, no ano de 1975, é pela primeira vez registrada a
presença feminina nessa Instituição de Ensino, com a matrícula da aluna
Nelma Sueli Marinho, no curso de Edificações.
Para os que desejavam ingressar no Ginásio Industrial, era necessário
se submeter a realização de uma prova, com o objetivo de verificar se o
candidato possuía Educação Primária satisfatória. Para efetivar a inscrição,
algumas exigências eram postas:
I- Prova de idade em que se verificasse ter o candidato onze anos
completos ou a completar até o dia 31 de dezembro do ano escolar
respectivo;
II- Prova de sanidade física e mental e de vacinação antivariólica, ou
outras que venham a ser exigidas pelas autoridades sanitárias;
III- Prova de quitação com o serviço militar, para os maiores de 19 anos;
IV- Prova de quitação eleitoral, para os maiores de dezoito anos;
V- Fotografias.
Entre os professores que ficavam responsáveis pela elaboração dessas
provas estava Myriam Coeli. No ano de 1969, foi designada através de portaria
para constituir comissão encarregada de elaborar estudos relacionados com o
programa adotado para o Exame de Admissão da disciplina de Português.
A matriz curricular do curso Ginásio Industrial se organizava em quatro
núcleos. Os das disciplinas obrigatórias que compreendia Português,
Matemática, Geografia, História e Ciências; as Disciplinas optativas que incluía
uma língua estrangeira moderna e a disciplina de Desenho; as Disciplinas
Específicas com Desenho e Prática de Oficina e por fim as Práticas Educativas
que compreendia Educação Física, Artes Industriais, Educação Moral e Cívica
e Educação Religiosa.
No caso do ensino da Língua Portuguesa, disciplina que a Professora
Myriam Coeli ministrava, apresentava uma carga horária de quatro horas
semanais durante as quatro séries que totalizavam o curso, conforme
preconizava a LDB 4.024/1961 para a organização da matriz curricular.
No cotidiano da Escola Técnica Federal do Rio Grande do Norte, um dos
aspectos observados no seu regimento era a disciplina, apregoando em seu
Art. 70 que:
Tendo em vista a impossibilidade de serem alcançados
os objetivos sociais e educacionais da escola, sem que
predomine, no estabelecimento, um ambiente de ordem e
disciplina indispensáveis ao alcance daqueles fins, exige-
se dos alunos um comportamento compatível com a
orientação nele adotado pela sua administração.
(ESCOLA TÉCNICA FEDERAL DO RIO GRANDE DO
NORTE, 1969, p.20)
Para que tais objetivos educacionais fossem alcançados, era
continuamente promovido o entrosamento com a família do aluno, cabendo ao
professor o uso da autoridade para manutenção da disciplina e da ordem.
De acordo com Foucault (1998, p.149), a punição, o controle e a
disciplina se instituíram na escola e em outras esferas sociais como forma de
repreender e regulamentar os comportamentos que eram considerados
inadequados. Para ele, “a disciplina traz consigo uma maneira específica de
punir, e que é apenas um modelo reduzido do tribunal. O que pertence à
penalidade disciplinar é à inobservância, tudo que está inadequado à regra,
tudo o que se afasta dela, os desvios.”
Na Escola Profissionalizante, algumas normas e regras eram
estabelecidas. Exemplo dessas normas era uso completo do fardamento e a
sua composição, por exemplo, foi fixado e definido através da portaria nº
193/1967. Para o curso Ginasial, deveria ser composto por uma camisa caqui
com escudo, calça caqui com frizo azul e sapato preto com meia preta. Na
escola em que Myriam Coeli trabalhava, as normas regimentares eram
istituídas através de regras que ajudavam a manter a disciplina no ambiente. Já
as punições eram normalmente aplicadas aos alunos que desrespeitassem
algum professor ou funcionário, ou ainda aos que trouxessem leituras
consideradas inadequadas para aquele ambiente. Desse modo, a vigilância e a
punição eram sistematicamente realizadas não apenas na sala de aula, mas
em todos os ambientes.
Sendo assim, uma das atividades que mais despertavam a preocupação
dos educadores eram as regras de disciplina que estendiam-se também ao tipo
de leitura indicada para os alunos.
Apesar desse relacionamento formal exigido pela escola, a Professora
Myriam Coeli não teve problema de relacionamento com seus alunos; mesmo
com os mais ousados que tentassem perturbar as aulas, repreendendo-os com
calma e seriedade.
Esse tipo de postura em sala de aula deixou sua marca para alguns dos
que com ela conviveu. É o caso do professor Erivan Sales do Amaral,
pertencente ao quadro de funcionários do CEFET e que foi aluno da antiga
ETFRN, no Ginásio Industrial no ano de 1969. Ele lembra que entre o quadro
docente tinha alguns professores que o marcaram. Entre eles, a professora de
Língua Portuguesa e Literatura: Myriam Coeli. No seu depoimento, desenha a
imagem de uma professora dedicada, mas exigente e que cobrava bastante.
Conseguia empolgar os alunos pela caridade e os controlava apenas
pela forma de expressão.
Chamava a atenção pela bondade com que se portava em sala de
aula e mesmo quando já estava debilitada pela doença nunca
demonstrava cansaço ou insatisfação
.
(
ERIVAN SALES DO AMARAL)
A exigência de que fala o professor era para o momento considerada
necessária e por isso bastante comum entre os profesores. Todos envoltos em
uma perspectiva de melhor preparar os seus alunos para o seu
desenvolvimento satisfatório.
Em conjunto com essa rigidez, a escola também apregoa a idéia de
amor à pátria. O civismo presente na educação através das festas cívicas,
causavam nos alunos um sentimento patriótico e a formação de uma
identidade nacional. Aos alunos, era permitida a formação dos grêmios
estudantis e dos clubes cívicos, desde que não viessem a contrariar a
disciplina da escola e não fossem contrários às leis do país.
Figura 19: Foto da ETFRN (1969)
Fonte: Arquivo do CEFET/RN
Esse ideário pode ser constatado inclusive no convite enviado a
comunidade pelo Diretor Executivo o Professor João Faustino Ferreira Neto,
por alusão ao aniversário de 60 anos da Escola. Comemorado no dia 23 de
setembro de 1969, durante os preparativos das festividades, fica evidente o
momento partriótico que estava presente no fazer da educação naquele
momento.
A patriótica ação do Governo Federal, nos últimos anos, vem dotando
o Ensino Industrial dos recursos necessários ao desempenho de sua
missão na era tecnológica, postulando o surgimento de uma mística
do ensino técnico-profissional, como instrumento de progresso e
engrandecimento nacional.
(ESCOLA TÉCNICA FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE, 1969)
Nesse sentido, é a partir das orientações gerais para o funcionamento
da escola que se desenvolvia o ensino da disciplina Língua Portuguesa. Busco
então conhecer esse processo de ensino-aprendizagem para compreender a
prática de Myriam Coeli.
A
A
p
p
r
r
á
á
t
t
i
i
c
c
a
a
d
d
o
o
c
c
e
e
n
n
t
t
e
e
d
d
e
e
M
M
y
y
r
r
i
i
a
a
m
m
C
C
o
o
e
e
l
l
i
i
n
n
a
a
d
d
é
é
c
c
a
a
d
d
a
a
d
d
e
e
1
1
9
9
6
6
0
0
7. A prática docente de Myriam Coeli na década de 1960
ivenciando uma realidade educacional em que o Brasil tinha, pela
primeira vez, diretrizes gerais para o ensino, a disciplina Língua
Portuguesa seguia, também, as orientaçãoes indicadas pela Lei
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, que entrara em vigor no ano de
1961 (LDB 4.024/1961).
V
De acordo com as recomendações do Conselho Federal de Educação
para atender ao que fixava a LDB 4024/1961, cada disciplina seguiria preceitos
a fim de alcançar satisfatoriamente os objetivos propostos para cada uma
delas. O ensino da Língua Portuguesa era entendido como instrumento de
expressão do povo brasileiro e elemento básico da unidade nacional. Nas duas
últimas séries do Ensino Médio, a disciplina deveria ser encarada nos seus
aspectos culturais e artísticos relacionados com a formação e desenvolvimento
da civilização brasileira.
A finalidade do ensino da Língua Portuguesa tinha em vista,
primordialmente, proporcionar ao educando adequada expressão oral e escrita.
Todas as atividades com ele relacionadas deveriam, portanto, visar a esse
objetivo. Sendo que, segundo o Conselho Federal de Educação, os estudos
teóricos de gramática e de estilística seriam meramente subsidiários e, por
conseqüência, constituiriam apenas o meio para desenvolver, no discente, a
sua capacidade de expressão. Na exposição da gramática, o ensino deveria
ser acentuadamente prático e derivado de exemplos concretos, fluindo, tanto
quanto possível, dos textos.
Conhecendo assim os objetivos propostos para disciplina na qual
Myriam Coeli dava suas aulas, o contexto das relações dentro do ambiente
escolar foi se tornando evidente. No intuito de conhecer aspectos mais práticos
do fazer desta professora, outros questionamentos surgiram para melhor
proceder nessa busca: Como eram elaborados os programas das disciplinas?
Quem era responsável por essa elaboração? Que conteúdos eram
privilegiados em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira? Como eram
realizadas as avaliações?
Pelas análises realizadas, constatei que os programas das disciplinas
eram organizados pelas Escolas de Nível Médio e pelos próprios professores,
levando em consideração as recomendações do Conselho Federal de
Educação. Nesse contexto, Myriam Coeli juntamente com os professores
Josué Gonçalves
18
e Mitsi Nesi Simonetti
19
foram designados para elaborar
estudos relacionados com o programa adotado para o Exame de Admissão
20
na escola em que lecionavam. Além disso, participou como elaboradora do
programa da disciplina para ser desenvolvido a cada ano letivo.
De acordo com Mitsi Nesi Simonetti, que formava mais diretamente o
grupo da área de Linguagem com Myriam Coeli e Josué Gonçalves, eles se
18
Josué Gonçalves nasceu em Caiçara – PB em 28 de agosto de 1935. Graduado em Letras
pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte foi professor da Escola Técnica do Rio
Grandedo Norte desde o dia 14 de agosto de 1968 até a sua aposentadoria em 10 de junho de
1991.
19
Mitsi Nesi Simonetti nasceu em Natal – RN aos vinte dias de junho de 1938. Obteve os títulos
de bacharelado e licenciatura em Letras neolatinas pela Faculdade de Filosofia, Ciências e
Letras Santa Úrsula, atuando como professora de Língua Portuguesa na Escola Técnica do Rn
de 15 de maio de 1967 até 18 de fevereiro de 1991.
20
O Exame de Admissão era um exame obrigatório para ingresso no ginásio, mesmo quando o
candidato provasse, mediante exibição de certificado, haver realizado com proveito os estudos
primários de quatro ou cinco anos em estabelecimento reconhecido.
reuniam, semanalmente, para discutirem sobre a elaboração de material
didático a ser utilizado. Quando não adotavam algum livro didático, os
professores elaboravam apostilas que contemplassem os conteúdos a serem
trabalhados, pois todos deveriam se voltar para a área técnica, obedecendo
sempre as normas instituídas pelo Conselho Federal de Educação.
Ao buscar vestígios nas orientações dadas para a época investigada,
parto dos cadernos de planejamento, denominados por Myriam Coeli como
Cadernos de apontamentos. Esse diálogo estabelecido com o material
encontrado foi ganhando proporção à medida que os lia.
A partir do depoimento dos ex-alunos e dos manuscritos guardados, foi
possível ir tecendo os procedimentos didáticos metodológicos presentes. As
aulas de Myriam Coeli se desenrolavam sempre com seriedade. Professora
calma, às vezes tímida, encarava sua profissão com bastante
responsabilidade. Nos momentos em que, por problema de saúde, precisava
faltar, justificava sempre ao seu diretor a ausência no horário.
Vestida de forma discreta, com saias longas, chegava para sua aula,
cumprimentava seus alunos e punha-se no seu fazer. Não costumava falar de
sua vida pessoal ou de temas que tratavam de assuntos externos. Só dava as
explicações dos conteúdos, como falou Maria da Conceição Rocha de Oliveira,
uma de suas alunas.
Ela chegava dava as horas, dava a aula, explicava tudo direitinho.
Nós tínhamos um livro era a Gramática Portuguesa, parece que era.
Ela passava muito no quadro, escrevia muito no quadro, nós
passávamos para o caderno. Ela escrevia muito no quadro, tinha a
letra boa, o livro parece que era só para responder.
Myriam Coeli durante as aulas se detinha basicamente ao ensino dos
conteúdos, voltados para o conhecimento da norma culta, não comentando
sobre outros assuntos que viessem a desviar a atenção dos seus alunos.
Como ainda não existiam os instrumentos tecnológicos presentes no século
XXI, usava os recursos que lhe eram permitidos. O quadro, o giz, o livro de
exerício dos alunos e as fichas de planejamento era o que se utilizava.
Segundo o que encontrei nos seus cadernos, as aulas se iniciavam
geralmente com uma revisão do que tinha sido visto anteriormente. Em um
desses apontamentos, encontrei uma aula sobre os estudos gramaticais. Como
revisão, define a gramática como “uma disciplina de natureza didática, que tem
por fim determinar a língua culta.”
Figura 20: Capa do caderno de planejamento de Myriam Coeli (196?)
Fonte: Acervo particular da família Silveira
Figura 21: Capa do caderno de planejamento de Myriam Coeli (1968)
Fonte: Acervo particular da família Silveira
Como Maria da Conceição Rocha de Oliveira falou, era uma aula
convencional. Myriam Coeli escrevia os assuntos no quadro, explicava todo o
conteúdo. Posteriormente, caso não tivessem dúvidas, os alunos responderiam
aos exercícios. As explicações eram feitas com seguraça do que era proposto
para cada aula, mas sempre com voz baixa e tranqüilidade.
Embora a informante não consiga lembrar-se do livro que era utilizado e
mencionar uma Gramática portuguesa, Myriam Coeli deixa vestígios em seu
caderno de apontamentos do uso do livro Estudo Dirigido de Português
21
de
21
A edição do livro Estudo dirigido de Português: língua e literatura , publicado pela editora
ática, a que tive acesso, é certamente posterior a que Myriam Coeli utilizava, uma vez que data
de 1984, já em sua 8ª edição.
autoria de J. Milton Benemann e Luís Agostinho Cadore, livro este destinado ao
estudo de Língua Portuguesa e Literatura para o 2º grau.
Figura 22: Capa do livro Estudo dirigido de Português (1984)
Fonte: Arquivo de Amélia Cristina Reis e Silva
O livro enfatiza o estudo da Literatura Brasileira, com proposições de
atividades que conduzissem os alunos a um aprofundamento dos temas
gramaticais específicos, levando-os ao terreno da comunicação prática e
funcional. Partindo do princípio de que o exemplar a que tive acesso já estava
em sua 8 edição, pressuponho ter tido o mesmo uma ótima aceitação do
público leitor. Luís Agostinho Cadore – um dos autores – em apresentação a
este volume justifica a sua reimpressão dizendo que “diante da boa acolhida
que Estudo dirigido de Português vem obtendo, mais uma vez apresentamo-la
reformulado e ampliado, dentro daquela linha prática, objetiva e dinâmica das
edições anteriores”.
Com o intuito de proporcionar aos professores e alunos teoria e prática
da comunicação em Língua e Literatura os autores desta obra apresentam
textos selecionados entre os escritores mais representativos de cada
movimento literário, indo do Romantismo ao Pré-modernismo, como Gonçalves
Dias, José de Alencar, Álvares de Azevedo, Castro Alves, Machado de Assis,
Aluísio Azevedo, Euclides da Cunha, entre outros. Apresentam, ainda, diversas
proposições de atividades, estudo do código lingüístico através de revisões
gramaticais, lembretes, exercícios e testes de fixação. Isso tudo de acordo com
o Conselho Federal de Educação que orientava que os estudos teóricos de
gramática e estilística deveriam ser meramente subsidiários e, por
consequêcia, constituir apenas o meio para desenvolver no discente a sua
capacidade de expressão.
Ensinando nas quatro séries ginasiais, Myriam Coeli utilizava uma
metodologia que estava em consonância com o que era proposto na obra.
Mesmo nas atividades de Gramática, em exercícios sobre verbo, esta
professora as interelacionava com a Literatura, trazendo excertos de obras
literárias de autores como, Castro Alves, Taunay, Luís de Camões e Olavo
Bilac, como pude observar em um dos exercícios contidos em seu caderno:
Diga o emprego dos verbos nas frases:
Nas águas barrentas as sombras das margens deitavam-se longas
(Catro Alves).
Encarregado de pastorear, por trinta dias, trinta tordilhas negras, o
Negrinho adormeceu (Bilac).
Desperta então o viajante, esfrega os olhos, distende
preguiçosamente os braços (Taunay).
Estava o Padre ali sublime e dino (Camões).
(SILVEIRA, 1968)
A tarefa solicita aos alunos a identificação de que tempo a ação verbal é
realizada e, ao mesmo tempo, traz autores clásicos da literatura para o
(re)conhecimento de suas obras.
Em relação ao estudo de textos, este se dava obedecendo a um critério
de disitribuição por séries: nas duas primeiras séries ginasiais, os textos
escolhidos para leitura deveriam ser simples, em prosa ou verso, descritivos,
com real valor literário, de autores brasileiros dos séculos XIX e XX; na 3ª e 4ª
séries ginasiais, textos não só descritivos e narrativos, mas também
dissertativos, de prosadores e poetas modernos, brasileiros e portugueses, a
exemplo dos citados na atividade anterior: Castro Alves, Olavo Bilac e Luís de
Camões.
O Conselho Federal de Educação orientava que o ensino de Língua
Portuguesa no Curso Secundário teria como meta primordial proporcionar ao
educando adequada expressão oral e escrita. Nesse sentido, os textos usados
por Myriam Coeli mostram a preocupação em trabalhar a oralidade e
expressão dos alunos através, por exemplo, da leitura em voz alta.
Esse porém não era o único objetivo dessa professora; procurava
sempre selecionar obras que levassem os seus alunos a refletirem sobre os
problemas sociais que eram discutidos. Isso se evidencia quando a professora
trabalha com trechos do romance O cortiço, de Aluísio Azevedo, mostrando o
nascimento, a vida e a morte de um cortiço, onde estão presentes o vício, a
miséria e o cotidiano de pobreza desse povo.
Texto: E o rolo fervia
[...]
Em torno de Rita já o povaréu se reunia alvoroçado; as lavadeiras
deixaram logo as tinas e vinham, com os braços nus, cheios de
espuma de sabão, estacionar ali ao pé, formando roda, silenciosas,
sem nenhuma delas querer meter-se no barulho. Os homens riam e
atiravam chufas às duas contendoras, como sucedia sempre quando
no cortiço qualquer mulher se disputava com outra.
- Isca! Isca! gritavam eles.
Ao desafio da mulata, Piedade saltara ao pátio, armada com um dos
seus tamancos. Uma pedrada recebeu-a em caminho, rachando a
pele do queixo, ao que ela respondeu desfechando contra a
adversária uma formidável pancada na cabeça.
E pegaram-se logo a unhas e dentes.
[...]
E o rolo a ferver lá fora, cada vez mais inflamado com um terrível
sopro de rivalidade nacional. Ouviam-se, num clamor de pragas e
gemidos, vivas a Portugal e vivas ao Brasil. De vez em quando, o
povaréu, que continuava a crescer, afastava-se em massa, rugindo
de medo, mas tornava logo, como a onda no refluxo dos mares. A
polícia apareceu e não se achou com ânimo de entrar, antes de vir
um reforço de praças, que um permanente fora buscar a galope!
E o rolo fervia.
(AZEVEDO Apud BENEMANN; CADORE, 1984, p.121-122).
O livro o Cortiço faz parte do movimento naturalista e o seu autor Aluísio
Azevedo traz à tona os problemas sociais e morais da sociedade brasileira do
seu tempo. Desse modo, o preconceito da cor, da classe, a ganância do lucro
fácil são temas que fazem parte de sua obra. Como a temática é sempre
recorrente Myriam Coeli usava para discussão trazendo à tona os aspectos
socioeconômicos da época, a condição de inferioridade com que é vista a
população de um cortiço e a linguagem utilizada pelo autor, nesta caso
bastante objetiva.
Precedida da leitura expressiva do texto e da exposição oral resumida, as observações de caráter
gramatical vinham em seguida, após o esclarecimento de todas as dificuldades referentes ao texto. Se a unidade
deste não fosse completa, como era o caso do texto extraído do livro O cortiço, a professora situava a obra de que
foi extraído, a fim de que o aluno pudesse bem compreendê-la e apreciá-la.
As atividades que se seguiam à leitura dos textos englobavam a interpretação textual, estudo do
vocabulário, revisão da gramática. Quanto ao vocabulário, era objeto de exercícios freqüentes, seja na sua forma,
seja na sua significação, no contexto a que pertencia.
No caso do texto apresentado anteriormente, os exercícios trazem
estudos do vocabulário e interpretação textual, como se vê em parte deles.
Vocabulário
- Correlacione as palavras com seus significados:
(1) alvoroçado ( ) cofre de guardar dinheiro
(2) chufas ( ) inquieto, sobressaltado
(3) cortiço ( ) vaias, ditos picantes
(4) mossa ( ) habitação coletiva das classes pobres
(5) burra ( ) vestígio de pancada ou pressão
[...]
I
I
n
n
t
t
e
e
r
r
p
p
r
r
e
e
t
t
a
a
ç
ç
ã
ã
o
o
- Responda:
a) Quem iniciou a contenda?
b) Com que frase?
- O texto enquadra-se perfeitamente dentro do Realismo-Naturalismo.
Baseado na leitura, que razões você invocaria para justificar esse
ponto de vista?
(BENEMAN; CADORE, 1984, p. 123 – 126)
Outro exemplo de textos atuais utilizados por Myriam Coeli, é o que trata
da temática da utilização da máquina e da preocupação da possibilidade de
que esta pudesse substituir a mão-de-obra humana.
A discussão dessa temática encontrei em um dos seus planos. O texto a
que a atividade faz referência não pôde ser identificado, mas a atividade
proposta aponta para direção de uma abordagem bem presente – a utilização
da máquina em substituição ao homem.
Eis a atividade que foi proposta a partir da leitura do texto, assim como
era indicado para o ensino de Língua Portuguesa.
Atividade de interpretação textual
1) Você acha que o autor é um homem integrado na problemática
atual?
Sim Não
Justifique o seu ponto de vista.
2) Destaque a idéia em que o autor demonstra a substituição do
homem pela máquina.
3) Você acha que esta substituição representa uma cooperação da
técnica às atividades humanas ou a escravização do homem pela
máquina?
4) O autor do texto nos apresenta a desumanização do homem ou a
eficiência da máquina (informação atual).
5) O texto é escrito em tom:
Dramático sério lírico
Categórico irônico
(SILVEIRA, 1968)
O uso de textos que retratam o cotidiano, ratifica a fala do seu filho Eli
Celso de Araújo Dantas da Silveira que lembra o dia-a-dia da mãe professora,
quando estava em casa. Apesar de bem pequeno, lembra que, por algum
tempo, a Escola Técnica tinha entre os costumes dos professores, o uso de
fichas de apontamentos. Todo professor tinha uma delas. No entanto, um
detalhe chamava-lhe a atenção sobre essas fichas. Elas eram sempre
renovadas, pois a mesma estudava diariamente e sempre acrescentava algo, o
que deixava o seu material bastante rabiscado.
O reflexo desses estudos se faziam presentes na sala de aula, pois
Myriam Coeli citava em suas aulas ou levava em seus exercícios, exemplos de
autores nacionais e estrangeiros. Prova disso, é a menção que ela faz a
Thomas Wolf
22
com a seguinte frase: “O homem nasceu para viver, para sofrer,
e para morrer, e o que lhe cabe é trágico”. Essa passagem foi retirada de um
dos cadernos de planejamento da professora e a mesma não faz referência a
que livro pertence, dando a indicação apenas do autor.
No que concerne à expressão escrita eram propostos exercícios de
fixação, onde procurasse levar o aluno à utilização correta das palavras. Ao
realizar atividades sobre vocabulário, Myriam Coeli procurava mostrar que se
aprende o significado relacionando a situações concretas da vida diária/real.
Na aula sobre verbo, a professora costumava dizer:
Aprendemos os significados de todas as palavras não mediante
dicionários ou definições, mas porque ouvimos ruídos que
22
Thomas Alexander Wolf realizou estudos em ciências políticas e letras em Nottingham,
trabalhando depois como repórter na agência US – americana UPI em Londres e depois como
correspondente da UPI em Den Haag, New York, Washington e Los Angeles. Entre 1994 e
1996 foi correspondente para vários jornais alemães e austríacos em Bangkok. Desde 1998 o
jornalista de origem alemã vive em São Paulo, onde trabalha pelo Seminário Brasil-Prost e
como freelancer para vários jornais alemães e para um programa de televisão na RTL.
(http://www.martiusstaden.org.br/eventos/cabeca-turco.ttm)
acompanham situações reais da vida e porque aprendemos a
associar determinados ruídos com determinadas situações. Dando
como exemplo a seguinte situação: a criança aprende o significado
da palavra jornal. Uma coisa que o jornalista traz, o pai lê e serve
para a gente embrulhar o lixo
(SILVEIRA, 1968)
E continua falando do uso adequado do vocabulário.
É grande erro considerar completamente uma definição de dicionário.
A palavra sugere, é conotado pela nossa cabeça. As palavras vivem
mudando de significação. Observem o exemplo:
Acredito em você (tenho confiança)
Acredito em Papai Noel (na minha opinião Papai Noel existe)
(SILVEIRA, 1968)
A indicação do Conselho Federal de Educação para a expressão escrita
era de que os exercícios procurassem levar o aluno à utilização correta,
ordenada e eficaz das palavras, a fim de que pudessem alcançar uma
expressão clara do pensamento. O professor deveria resguardar e até
estimular a liberdade de expressão individual, dentro das possibilidades
permitidas pelo idioma. Ao progredirem no domínio da sintaxe, os alunos teriam
ampla liberdade na eleição dos temas para redação, abrindo-se oportunidade à
prática da análise literária.
Nas aulas de Literatura, pude perceber uma sintonia entre a professora
e os conteúdos, principalmente, quando faz uso da poesia. Essa sintonia é
estabelecida pelo aflorar da intimidade que essa professora tinha com a poética
literária, uma vez que a mesma era também poetisa. Em uma de suas aulas de
literatura em que tratava de conotação temporal, fala dos tempos objetivo,
subjetivo e psicológico. Para tanto, exemplifica trazendo uma citação de
Virgínia Wolf, indicando que o trecho pertencia a página 98 do capítulo II, sem,
no entanto, mencionar o título da obra. Eis a passagem:
O tempo que faz medrar e decair animais e plantas com famosa
pontualidade, tem efeito menor sobre a mente humana. A mente
humana opera com igual irregularidade sobre a substância do tempo.
Uma hora uma vez fixada na mente humana, pode abarcar cinquenta
ou cem vezes o tempo cronométrico; universal. Uma hora pode
corresponder a um segundo no tempo mental. Esse maravilhoso (?)
do tempo do relógio como no tempo da alma não é bastante
conhecido e mereceria uma investigação profunda
(SILVEIRA, 196?)
Em outro registro de uma aula, Myriam Coeli faz uma ligação entre a
Literatura e a escrita de textos em verso, mostrando que uma das grandes
conquistas dos versos livres foi a utilização do silêncio como recurso
expressivo; a liberdade de criação sem necessariamente construir versos com
rimas e métricas. Traz como exemplo versos de Manoel Bandeira
23
.
Santa Clara, clareai
Estes ares.
Daí-nos ventos regulares
De feição.
Estes mares, estes ares
Clareai.
(BANDEIRA apud SILVEIRA, 1968)
Após a aplicação dos conteúdos, a fixação dos assuntos era feita
através da resolução de exercícios. Indicados para serem resolvidos no livro ou
copiados no quadro pela professora e transcritos para o caderno pelos alunos,
os assuntos eram sempre reforçados. Myriam Coeli demonstra sempre o
cuidado para o uso correto da ortografia de forma adequada ao uso da língua
culta, como no exemplo a seguir:
23
Manoel Bandeira (1886-1968) nasceu em Recife, fez outros estudos secundários no Rio de
Janeiro e, iniciou o curso de Arquitetura em São Paulo. No entanto, foi obrigado a abandoná-lo
em virtude da tuberculose. Viveu grande parte da sua vida isolado por causa da doença, mas
mesmo assim era grande apaixonado por tudo o que fazia parte do seu mundo: vida, morte,
amor, erotismo, solidão, cotidiano e a infância. Manoel Bandeira viveu 82 anos. Sua obra é um
rico testemunho da poesia brasileira do século XX envolvendo criações que vão de um pós-
parnasianismo e de um pós-simbolismo.
(http://www.brazcubas.br/professores/sdamy/mubc09.html).
Faça o plural:
Baixo-relevo
Caneta-tinteiro
Médico cirurgião
Laranja cravo
Oficial de gabinete
Escreva com G ou J.
___íria ___eringonça
___eca can___ica
(SILVEIRA, 1968)
Nas aulas sobre o uso de iniciais maiúscula, dá uma série de regras de
quando os alunos deverão usar. Da mesma forma, enuncia normas para
acentuação de palavras a partir da classificação das sílabas tônicas e sua
classificação em oxítona, paroxítona e proparoxítona. Elenca ainda, sobre os
sinais de pontuação indispensáveis para inteligibilidade do texto.
Acentue, se necessário:
Retrogrado
Misantropo
Pegada
Recem
Item
Juizo
Decano
Anatema
Estrategia
(SILVEIRA, 1968)
Dentro do programa anual trabalhado por Myriam Coeli, estava também
o ensino de Correspondência Técnica. No livro já mencionado, utilizado pela
professora, esse conteúdo aparece na sua última unidade, com a seguinte
mensagem para os leitores.
Da linguagem literária, artisticamente trabalhada, passemos, agora,
à linguagem apropriada à redação técnica, vazada em termos
objetivos, corretos, concisos, claros e polidos.
Na comunicação falada, o emissor dispõe de muitos recursos para
bem expressar-se: a mímica, os gestos, o timbre de voz, a
entonação etc. Na expressão escrita, porém, tais recursos precisam
ser substituídos, à guisa de compensação, por outros cuidados
especiais.
(BENEMANN; CADORE, 1984, p. 177).
Myriam Coeli orientava aos seus alunos que a comunicação escrita entre
duas ou mais pessoas (cartas, ofícios, circulares, memorandos, bilhetes,
telegramas e outros papéis) precisava ter clareza, concisão, precisão,
correção, polidez. Pois, ao contrário da comunicação falada em que se dispõe
de vários recursos que auxiliam na expressão como: a mímica, os gestos, o
timbre de voz e a entonação; na expressão escrita, ao contrário, todos esses
recursos precisam ser substituídos cuidadosamente de forma que a
comunicação seja realizada com eficiência.
Analisando a prática de Myriam Coeli, observo que, além do ensino dos
conteúdos, merece destaque o relacionamento que ela estabelecia com seus
alunos. Apresentando sempre um comportamento calmo, não significava falta
de imposição da professora, prática tão apregoada durante esse período. Ao
contrário, essa relação com os alunos despertava uma certa admiração.
Digamos que, até certo ponto, uma certa estranheza. Parecia, para alguns
alunos, curioso como Myriam Coeli conduzia as aulas sem que fosse preciso
alterar sua voz.
Essa cobrança vigente durante a atuação de Myriam Coeli refletia no
seu processo de avaliação. Uma das formas aplicadas que os alunos
pensavam ser a mais complexa eram as provas orais. A comunicação e
expressão era abordada nas aulas de Myriam Coeli não apenas na leitura dos
textos, mas também através das avalições, as provas orais como eram
identificadas. De acordo com a sua ex-aluna Maria da Conceição Rocha de
Oliveira, muitas vezes a professora chegava na sala e fazia essa prova de
surpresa.
Todo mês tinha a prova pra ter a nota. Só não lembro... fazia a prova
escrita, e as vezes não fazia escrita e fazia oral. Às vezes pegava a
gente até assim de surpresa, sabe? Ela não avisava e pegava a
gente de surpresa
.
(MARIA DA CONCEIÇÃO ROCHA DE OLIVEIRA)
As provas orais eram geralmente relacionadas aos assuntos que
estavam sendo estudados, com predominância dos aspectos gramaticais. Na
Escola Industrial, em fevereiro de 1967, esse tipo de avaliação foi intensificada
diante da necessidade de encerrar todas as atividades do Setor de
Escolaridade para mudança para o novo prédio, na Avenida Salgado Filho.
No capítulo VI do regimento da ETFRN (1969, p.14), a indicação para a
apuração do rendimento escolar expressa que a avaliação do aproveitamento
do aluno será feita de maneira contínua e acumulada, preponderando os
resultados obtidos durante o ano letivo. Para promoção de série, o aluno teria
que satisfazer as exigências de freqüência escolar e obter nota final em cada
disciplina igual ou superior a quatro; era dispensado da prestação do exame
final o aluno que obtivesse o grau sete como média de rendimento escolar.
Outra forma de avaliação era a escrita de textos. Dentre os guardados
de Myriam Coeli, encontrei uma ficha que indica ser essa uma das práticas
utilizadas pela mesma. A referida atividade foi destinada aos alunos do Colégio
Estadual da 1ª série do Curso Ginasial, referindo-se a uma prova parcial. A
avaliação assinada por uma aluna traz como objetivo a descrição de um
passeio.
As formas de avalição eram, portanto, bem diversificadas. Além das
provas escritas e das orais, era também feito trabalhos em equipe. Esse tipo de
metodologia era organizada previamente por Myriam Coeli, fazendo a divisão
do grupo e distribuindo-os de acordo com os conteúdos a serem estudados.
Em uma dessas avaliações na disciplina de Língua Portuguesa, retoma
o assunto, figuras de palavras, e divide a turma em cinco grupos distribuindo os
conteúdos pelos quais cada um ficaria responsável por estudar e apresentar.
Grupo A
1) Metáfora 6) Silepse
2) Perífrase 7) Onomatopéia
3) Anástrofe 8) Ironia
4) Antítese 9) Eufemismo
5) Metonímia 10) Apóstrofe
Grupo B
1) Antítese 6) Metonímia
2) Hipérbole 7) Pleonasmo
3) Apóstrofe 8) Onomatopéia
4) Metáfora 9) Anástrofe
5) Pleonasmo 10) Sinédoque
Grupo C
1) Metonímia 6) Eufemismo
2) Catacrese 7) Antítese
3) Silepse 8) Prosopopéia
4) Sinédoque 9) Hipérbole
5) Antítese 10) Onomatopéia
Grupo D
1) Pelonasmo 6) Hipérbole
2) Metonímia 7) Apóstrofe
3) Eufemismo 8) Elipse
4) Ironia 9) Perífrase
5) Onomatopéia 10) Sinédoque
Grupo E
1) Perífrase 6) Silepse
2) Metáfora 7) Metáfora
3) Apóstrofe 8) Prosopopéia
4) Pleonasmo 9) Hipérbole
5) Onamatopéia 10) Antítese
(SILVEIRA, 1968)
O resultado do desempenho dos alunos era acompanhado através de
registros, anotando em uma página de caderno o primeiro nome do aluno, o
seu número no diário de classe, turma e série de origem e as notas
correspondentes.
Muitas vezes, de acordo com Celso da Silveira, Myriam Coeli se afligia
com a situação de carência de um ou outro aluno que, mais pobre, tinha que se
deslocar de longe utilizando mais de um transporte.
Para ele,
Ela era uma pessoa que igualava aos seus, os filhos de outras mães.
E, como professora, colocava-se no lugar de mãe de alunos, a
começar pelo mais necessitados de recursos e de carinhos. Seu
aluno, assim, não era aluno somente na permanência em sala de
aula, porque ela o acompanhava na extensão de sua vida para
compreendê-lo e amá-lo.
(SILVEIRA, 1984, p.64)
Essa era a Myriam Coeli em suas práticas pedagógicas. Professora que
conhecia, pelos nomes, os seus alunos com quem, a cada ano, convivia. De
alguns deles conhecia a família e suas dificuldades.
T
T
e
e
c
c
e
e
n
n
d
d
o
o
c
c
o
o
n
n
s
s
i
i
d
d
e
e
r
r
a
a
ç
ç
õ
õ
e
e
s
s
8. Tecendo considerações
ealizar uma pesquisa no campo da história da educação
significou um grande desafio. No decorrer da investigação pude ir
percebendo que, para entender como se deu o processo
educativo num determinado período, teria que conhecer o que propunha
educadores conhecidos ou projetos educacionais. Senti assim o desejo de
penetrar no dia-a-dia de uma escola, entender como se davam as relações
interpessoais, os métodos de ensino e o material utilizado.
R
Foi então com este olhar para a história que mergulhei no fazer de uma
mestra: Myriam Coeli. Para conhecer a prática dessa educadora, fiz uma
viagem de volta ao tempo. Emprendi uma busca às fontes o que me reportava
para um período não vivido e lugares desconhecidos. Inicialmente, a angústia
em encontrar os dados que muitas vezes pareciam se esconder diante de um
olhar inexperiente. Em seguida, a dúvida de como utilizar cada uma delas de
maneira que entrecruzadas me possibilitassem mostrar a trajetória de Myriam
Coeli, não deixando de estabelecer um constante diálogo com o seu contexto
social e, principalmente, revelando aspectos da educação potiguar. Esses
momentos estiveram presentes na construção deste trabalho.
As fontes, no entanto, não causaram apenas angústias. Nessa
perspectiva de investigação histórica em que adentramos na intimidade do
sujeito pesquisado, acabei por estabelecer um vínculo afetivo. A
impessoalidade que se exige do pesquisador é, por vezes, deixada de lado
quando a emoção enche nossa alma. Minha admiração por Myriam Coeli não
poderá deixar de ser percebida nas entrelinhas e nas adjetivações que por
mais que procurasse evitá-las ainda permaneceram na minha escrita.
Conhecer e manusear objetos pessoais que pertenceram a ela se
constituiu em um momento de prazer que as palavras não me permitem
revelar. Remexendo objetos guardados, manuscritos atados por fitas que se
esfarelavam pelo tempo, ler suas orações, tudo isso parecia nos unir em um
presente. Estaríamos unidas pela nossa história? Duas mulheres, duas
professoras?
Os aspectos concernentes à sua prática de sala de aula foram-me
revelados através de entrevistas e dos seus planejamentos que permaneceram
guardados em seus cadernos, denominados por ela mesma de cadernos de
apontamentos. A análise me revelou uma professora que estava sempre
preocupada em estar permanentemente estudando, mantendo-se sempre
atualizada com o que propunha as mudanças educacionais por ela vivenciada.
O porquê de não ter encontrado o seu nome ligado a momentos em
comemorações públicas, discursando, por exemplo, é justificado por seus
contemporâneos pela sua timidez. Por outro lado, através da escrita, Myriam
Coeli se revela para os seus leitores e faz uso da palavra para revelar suas
emoções, sentimentos, angústias, escrevendo até que a morte a tirasse do
convívio terreno.
Na tessitura deste texto, a constatação de como é difícil manusear as
palavras e de como estamos ao seu serviço como a própria Myriam Coeli falou
ao escrever a poesia Ode à palavra.
A palavra trabalha com hábeis mãos.
Dela me sirvo à mesa
com esses poucos gestos que saciam meus segredos.
Por menos que me baste, a ela servindo estou
e lhe ofereço o disfarce da ordem e da compreensão.
Através dela me armo e soletro caminhos incertos
com seus ardis tão certos.
Mas, animal, dela sou presa
e me resumo na proeza
de lhe dar formas libertas
– pois meu ofício é dar à palavra, invenção.
Palavra é abismo, é infinito.
É lirismo e é blasfêmia.
É amor e vômito.
É o fel e a fez.
Antropófaga e artesã. Ave de asa tensa no cobalto.
Queda no duro asfalto.
Cristo que se crucifica nos quatro infinitos cardeais
Ela inquieta e perturba o equilíbrio de minhas intimidades,
o chão e o âmago, o sonho e a agonia,
a vida que explode, a morte que desafia.
E me convoca para o Sermão da Montanha
que é o ato de lirismo,
embora incompleto o inútil gesto.
Com ela eu faço a humilde doação
e o mundo faz sentido e aceitação.
(SILVEIRA, 1980, p. 31,32)
A exigência do cumprimento de um tempo me faz parar. Sei que muito
poderia ser dito, no entanto diversas lembranças foram perdidas na memória
dos informantes, os arquivos foram sendo desfeitos pela ação do tempo. Para
alguns, Myriam Coeli continuará sendo uma desconhecida que teve o seu
nome atribuído a uma rua ou a uma escola; outros, dirão que foi a primeira
mulher a exercer o jornalismo como profissional da imprensa no Rio Grande do
Norte.
A observação mostrou-me uma mulher atuante que não se acomodou
diante dos obstáculos. Buscou vencer os desafios, alçou vôos não muito
comum para alguém do sexo feminino em sua época, quando foi estudar na
Espanha. Jornalista, escritora, professora, Myriam Coeli, em múltiplas versões,
foi acima de tudo uma mulher que contribuiu para a formação da sociedade
letrada no Rio Grande do Norte.
Uma coisa me conforta para pôr um ponto final nesse momento: saber
que o passado nunca é completamente apreensível em sua totalidade e que
nenhum tema é esgotado na pesquisa.
R
R
e
e
f
f
e
e
r
r
ê
ê
n
n
c
c
i
i
a
a
s
s
9. Referências
Entrevistas
AMARAL, Erivan Sales do. Entrevista concedida a Amélia Cristina Reis e Silva.
Natal/RN; novembro de 2002.
GALVÃO, Cláudio Pinto. Entrevista concedida a Amélia Cristina Reis e Silva.
Natal/RN; junho de 2005.
OLIVEIRA, Maria da Conceição Rocha de. Entrevista concedida a Amélia
Cristina Reis e Silva. Natal/RN; abril e maio de 2005.
SILVEIRA, Celso da. Entrevista concedida, por telefone, a Amélia Cristina Reis
e Silva. Natal/RN; novembro de 2002.
SILVEIRA, Eli Celso de Araújo Dantas da. Entrevista concedida a Amélia
Cristina Reis e Silva. Natal/RN; outubro de 2002 e abril de 2005.
SIMONETTI, Mitsi Nesi. Entrevista concedida a Amélia Cristina Reis e Silva.
Natal/RN; agosto de 2005.
Obras de MyriamCoeli
SILVEIRA, Myriam Coeli de Araújo Dantas da; SILVEIRA, Celso da. Imagem
Virtual. Natal: Edição Imprensa Oficial do Rio Grande do Norte, 1961.
SILVEIRA, Myriam Coeli de Araújo Dantas da. Caderno de planejamento.
Natal, 1968. Manuscrito.
SILVEIRA, Myriam Coeli de Araújo Dantas da. Caderno de planejamento.
Natal, [196?]. Manuscrito.
SILVEIRA, Myriam Coeli de Araújo Dantas da. Vivência sobre Vivência. Natal:
Editora Universitária, 1980.
SILVEIRA, Myriam Coeli de Araújo Dantas da. Inventário. Natal: Editora
Achimaé, 1981a.
SILVEIRA, Myriam Coeli de Araújo Dantas da. Cantigas de Amigo. Natal: Clima
Editora, 1981b.
SILVEIRA, Myriam Coeli de Araújo Dantas da. Da boca do lixo à construção
servil: o livro do povo. Natal: Boágua, 1992.
L
L
i
i
v
v
r
r
o
o
s
s
e
e
R
R
e
e
v
v
i
i
s
s
t
t
a
a
s
s
ALMEIDA, Jane Soares de. Mulher e educação: a paixão pelo possível. São
Paulo: Fundação Editora da UNESP, 1998. (Prismas).
ALVES, Aluízio. 150 dias de governo. Natal: Assessoria de Imprensa, 1961.
ARIÉS, Philippe. O tempo da história. Tradução de Roberto Leal Ferreira. Rio
de Janeiro: Francisco Alves, 1989. (Coleção Ciências Sociais).
ASSIS, Machado. A agulha e a linha. São Paulo: Eraodito editora, 2003.
AZEVEDO, Aluísio. O cortiço. 6 ed. São Paulo: Ática, 1978.
BARRETO, José Jácome Barreto. A arte poética de Myriam Coeli. Natal: Clima,
1998.
BENEMANN, J. Milton; CADORE, Luís A. Estudo dirigido de português. 8 ed.
São Paulo: Ática, 1984. (volume 2).
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.
BURKE, Peter (Org.). A escrita da história: novas perspectivas. Tradução de
Magda Lopes. São Paulo: Editora da UNESP, 1992. (Biblioteca Básica).
CAMBI, Franco. História da pedagogia. Tradução de Álvaro Lorencini. São
Paulo: Unesp, 1999.
CARDOSO, Rejane (Coord.). 400 nomes de Nata. Natal: Prefeitura Municipal
de Natal, 2000.
CASCUDO, Luís da Câmara. História da cidade do Natal. Natal: RN
Econômica, 1999.
CATANI, Denice Bárbara et al (Orgs.). Docência, memória e gênero: estudos
sobre formação. São Paulo: Escrituras Editora, 1997.
CHARTIER, Roger. A História Cultural: entre práticas e representações.
Tradução por Manuela Galhardo. Lisboa: Difel, 1990.
DUARTE, Constância Lima; MACÊDO, Diva Cunha Pereira de (Org.). Literatura
do Rio Grande do Norte: antologia. Natal: Fundação José Augusto, Secretaria
de Estado da Tributação, 2001.
DUARTE, Eulália Barros. Uma escola suiça nos trópicos. Natal: Offset gráfica,
2000.
DUBY, Georges. A história continua. Tradução Clóvis Marques, revisão técnica
Ronaldo Vainfas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed.; Ed. UFRJ, 1993.
Educação de Jovens e Adultos. Natal, anos 60: Dé pé no chão também se
aprende a ler e Círculos de leitura. Cadernos especiais do jornal Diário de
Natal. Fascículo 1. 2005
ESCOLA TÉCNICA FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE. Regimentos.
Natal, 1969. (Caderno 1).
FONSECA, Celso Suckow da. História do ensino industrial no Brasil. Rio de
Janeiro: [s.n.], 1962.
FONTANA, Roseli; CRUZ, Maria Nazaré da. Psicologia e trabalho pedagógico.
São Paulo: Atual, 1997. (Série educador em construção)
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir – nascimento da prisão. Tradução de
Raquel Ramalhete. 18. ed. Petrópolis: Vozes, 1998.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática
educativa. 17 ed. São Paulo: Paz e Terra, 1996. (Coleção Leitura).
FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,
1987.
GALVÃO, Ana Maria de Oliveira. Problematizando fontes em História da
Educação. In: Educação e Realidade. Porto Alegre, v. 21, n. 2. jul/dez. 1996.
GALVÃO, Maílde Pinto. 1964: aconteceu em abril. Natal: Clima, 1994.
GERMANO, José Willington. Lendo e aprendendo: a campanha de Pé no
Chão. São Paulo: Autores Associados; Cortez, 1982. (Coleção teoria e práticas
sociais).
____, José Willington. Estado militar e educação no Brasil. 2. ed. São Paulo:
Cortez, 1994.
GÓES, Moacyr de. De pé no chão também se aprende a ler, 1961-64: uma
escola democrática. 2. ed. São Paulo: Cortez, 1991. (Coleção educação
contemporânea).
GONÇALVES, Carlos Luiz. Revendo o ensino de 2º grau: propondo a formação
de professores. São Paulo: Cortez, 1990.
HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE. Cadernos especiais do jornal
Tribuna do Norte. Fascículo 12. [199_?].
HISTÓRIA DO RIO GRANDE DO NORTE. Cadernos especiais do jornal
Tribuna do Norte. Fascículo 14. [199_?].
LIMA, Pedro de. Natal século XX: do urbanismo ao planejamento urbano.
Natal: EDUFRN, 2001.
LOPES, Eliane Marta Teixeira; GALVÃO, Ana Maria de Oliveira. História da
Educação. Rio de Janeira: DP&A, 2001. (O que você precisa saber sobre).
MACHADO, Inês Kaúla S. Myriam Coeli: um testemunho de fé. Natal: Boágua,
1992.
MARIZ, Marlene da Silva; SUASSUNA, Luiz Educardo B. História do Rio
Grande do Norte. Natal: Sebo Vermelho, 2002.
MELO, Veríssimo de. A nova escola industrial federal do Rio Grande do Norte.
Natal: Imprensa Universitária, 1967.
MIGNOT, Ana Chrystuna Venâncio. Editando o legado pioneiro: o arquivo de
uma educadora. In: MIGNOT, Ana Chrystuna Venâncio et al. Refúgios do eu:
educação, história, escrita autobiográfica. Santa Catarina: Mulheres, 2000.
MONTESSORI, Maria. Pedagogia científica: a descoberta da criança. Tradução
de Aury Azélio Brunetti. São Paulo: Flamboyant, 1965.
MORAIS, Maria Arisnete Câmara de (Org.). A mulher em nove versões. Natal:
EDUFRN, 2001.
____. Leitura de mulheres no século XIX. Belo Horizonte: Autêntica, 2002.
____. Isabel Gondim, uma nobre figura de mulher. Natal: Terceirize editora,
2003. (Coleção Mossoroense. Série Educação e Educadores do Rio Grande do
Norte. v.1)
MORAIS, Maria Arisnete Câmara de; OLIVEIRA, Caio Flávio Fernande de.
Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Norte: história e acervo.
Natal: DEI, 2005.
NÓVOA, António. Vida de professores. 2 ed. Portugal: Porto Editora, 1995.
NÓVOA, António. Tempos da escola no espaço Portugal-Brasil-Moçambique:
dez digressões sobre um programa de investigação. In: Revista brasileira de
História da educação. Campinas (SP): Autores Associados, n. 1, jan/jul. 2001.
NUNES, Clarice. História da educação: espaço do desejo. In: Em aberto.
Brasília, v. 9, n. 47. jul/set. 1990.
PAIVA, Vanilda Pereira. Paulo Freire e o nacionalismo-desenvolvimentista. Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira, 1980. (Coleção Educação e Transformação
2).
PERROT, Michelle. Os excluídos da história: operários, mulheres e
prisioneiros. Tradução de Denise Bottmann. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1998.
PINHEIRO, Rosanália de Sá Leitão. Sinhazinha Wanderley: a poesia na prática
escolar. In: STAMATTO, Maria Inês Sucupira; ARAÚJO, Marta Maria de (org.).
Encontro de pesquisa educacional do nordeste: história da educação. Natal:
EDUFRN, 1997.v.1 (Coleção EPEN).
PIRES, Meira. Teatro Alberto Maranhão e seu patrono – síntese histórica.
Natal: CERN, 1975.
RIBEIRO, Maria Luisa Santos. História da Educação Brasileira: a organização
escolar. 16 ed. Campinas: Autores Associados, 2000. (Coleção memória da
educação).
SANTOS, Paulo Pereira dos. Evolução econômica do Rio Grande do Norte
(século XVI ao XXI): 500 anos da história econômica do Rio Grande do Norte.
2. ed. Natal: Departamento de Imprensa do Estado, 2002.
SAVIANI, Dermeval. A nova lei da educação: trajetória, limites e perspectivas. 7
ed. Campinas (SP): Editores Associados, 2001 (Coleção Educação
Contemporânea).
SILVA, Amélia Cristina Reis e Silva. A contribuição da mulher para a educação
potiguar: Myriam Coeli, professora e jornalista. In: XVI Encontro de Pesquisa
em Educação do Norte e Nordeste. 2003. Educação, pesquisa e diversidade
regional. São Cristóvão: UFS, 2003.
____. Myriam Coeli: contribuindo para a construção da sociedade letrada
potiguar. In: 14º Congresso de Leitura do Brasil. 2003. Campinas (SP):
Assossiação de Leitura do Brasil, 2003.
SILVEIRA. Celso da (Org.). Ave, Myriam. Natal: Ed. Universitária/Clima, 1984.
____ (Org.). Myriam Coeli. Natal: Boágua, 1997.
SILVEIRA, Eli Celso Araújo Dantas da. A escola Myriam Coeli. Revista
Educação em Questão. Natal: Editora Universitária. N. 1/2. Jan. a dez. 1992.
THOMPSON, Paul. A voz do passado: história oral. Tradução Lólio Lourenço
de Oliveira. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
WANDERLEY, Rômulo C. Panorama da poesia norte-rio-grandense. Rio de
Janeiro: Edições do Val, 1965.
Documentos
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB 4.024/1961. 3 ed. Rio
de Janeiro: Olímpica editora, 1968. (Coleção AEC).
RIO GRANDE DO NORTE. Atos e Decretos do Governo. Lei nº 2.171, de 06 de
dezembro de 1957. Natal (RN), 1957.
ESCOLA TÉCNICA FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE. Convite
comemorativo aos 60 ano da escola. Natal (RN), 1969.
RIO GRANDE DO NORTE. Instituto brasileiro de geografia e estatística –
IBGE. Cenco Demográfico. 1940, 1950 e 1960.
Obras acadêmicas
CASTRO, Marize Lima de. Uma mulher entre livros: Zila Mamede e o silencioso
exercício de semear bibliotecas. Natal: Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. Dissertação (Mestrado em Educação), 2004.
FLORES, Maria da Conceição Crisóstomo de Medeiros Gonçalves Matos. Uma
mulher e um livro: Teresa Margarida da Silva e Orta e as aventuras de
Diófanes. Natal: Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Tese
(Doutorado em Educação), 2004.
MORAIS, Maria Arisnete Câmara de. Leituras femininas no século XIX (1850-
1900). Campinas: Faculdade de Educação da Universidade Estadual de
Campinas. Tese (Doutorado em Educação), 1996.
____. Projeto Integrado História dos impressos e a formação das
leitoras/CNPq. Natal (RN), 2000. Período de vigência: 2000-2002 /2002-2004.
PINHEIRO, Rosanália de Sá Leitão. Sinhazinha Wanderley: o cotidiano do
Assu em prosa e verso. Natal: Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Tese (Doutorado em Educação), 1998.
SILVA, Amélia Cristina Reis e Silva. Myriam Coeli: uma presença na educação
natalense na década de 1960. Natal: Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. Monografia (Graduação em Pedagogia), 2003.
SILVA, Amélia Cristina Reis e; VIEIRA; Daniela Fonsêca Vieira. Estudos de
gênero: uma construção social, histórica e cultural. In: Da Vinci. Textos
Acadêmicos. Diário de Natal. Natal, 30 de novembro de 2002.
TAVARES, Diva Sueli Silva Tavares. Cantigas de ontem e de hoje: um estudo
comparativo entre Cantigas de amigo, de Myriam Coeli e as cantigas medievais
de D. Dinis. Natal: Universidade Federal do Rio Grandedo Norte. Dissertação
(Mestrado em Letras), 1999.
Jornais
A República. Periódico republicano, fundado no dia 01 de julho de 1889, por
Pedro Velho. Atualmente circula como Diário Oficial do Rio Grande do Noirte.
Diário de Natal (1924-1932). Folha matutina de propriedade do Centro de
Imprensa Católica. O seu primeiro número circulou no dia 19 de outubro de
1924. Em 1947, um outro jornal intitulado O Diário (1939), passou a se chamar
Diário de Natal, que circula diariamente.
Tribuna do Norte. Jornal diário fundado por Aluízio Alves, em 24 de março de
1950.
Sites pesquisados
http://www.cabugi.com/rnonline/resultadopersonalidades.html
. Acesso em:
15/02/2005
http://www.e-biografias.net/fglorca-menu.asp
. Acesso em: 20/04/2005
http://jornaldepoesia.com.br
. Acesso em: 11/04/2005
http://www.martiusstanden.org.br/eventos/cabeca-turco.ttm
. Acesso em:
25/05/2005
http://www.brazcubas.br/professores/sdamy/mubc09.html
. Acesso em:
20/04/2005
http://ibep-nacional.com.br/mundo/default.asp
. Acesso em: 27/07/2005
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo