pouca acessibilidade dada a configuração do espaço interno, como
degraus, roleta, janelas, poltronas; a vida útil ultrapassada dos
veículos e a falta de manutenção; a hostilidade de motoristas,
cobradores e fiscais.
Os conflitos no trânsito decorrem dessa disputa que opõe o
automóvel – representante do transporte de maior impacto negativo
sobre o espaço urbano – e as outras formas de deslocamento, sejam
as tradicionais, como ônibus e metrô, sejam as alternativas, como a
bicicleta ou o pedestrianismo, além dos existentes entre os próprios
condutores. Alcântara Jr. (2007) observou esses conflitos através
das manifestações predominantes no trânsito de São Luis/MA: verbais
(xingamentos, reclamações e bate-bocas), gestuais, visuais (flertes
e sorrisos), feitas através dos recursos que o carro oferece (luz alta
e buzina), além de infrações.
A zona metropolitana de São Luis do Maranhão é peculiar
neste sentido, pois sofreu o impacto da urbanização tardia mas
acelerada. O fato de ser entrecortado pelos rios Anil e Bacanga
contribuiu para a manutenção das características e feições originais
do núcleo urbano inicial, atualmente denominado Centro Histórico.
O acervo arquitetônico – cerca de 3,5 mil construções que ocupam
área aproximada de 250 hectares – foi tombado pelo Instituto do
Patrimônio Histórico e Artístico Nacional em 1955 (Silva, 2006)
Até a construção da barragem do Bacanga e da primeira ponte
sobre o rio Anil, no final dos anos 60 e início dos 70, a expansão fez-
se quase exclusivamente no sentido leste-oeste, para as áreas como
Camboa-Liberdade, Monte Castelo, Fátima, João Paulo e Alemanha,
e de maneira ainda agregada, pela proximidade com o Centro, visto
que o número de automóveis circulando ainda era relativamente
baixo para uma população urbana estimada em 205 mil habitantes
(IBGE, 1970). A dinâmica de ocupação urbana de caráter espraiado,
de baixa densidade populacional e expansão suburbana ou periférica,
foi potencializada com a construção da primeira ponte sobre o rio
Anil, o que permitiu o desenvolvimento da zona litorânea oeste-
noroeste, nas áreas denominadas São Francisco, Ponta da Areia,
Renascença, Calhau, Olho d’Água e, posteriormente, Araçagy. Paralelo
à zona litorânea, na parte interior, foram ocupadas as áreas do
Cohama e Turu. Além disso, a zona urbana continuou expandindo
no sentido leste-oeste, para o Anil, Cohatrac, Coroadinho, Bequimão
e Angelim. No lado oposto da barragem do Bacanga, sentido sul do
Mobilidade urbana nos Códigos de Postura
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A legislação tardia do tema, em âmbito nacional, reflete parte
do descaso legislativo brasileiro com questões que envolvam
propriamente a mobilidade urbana, a relação entre veículos
motorizados e não-motorizados, o transporte de cargas e passageiros
coletivos e individuais, as vias e logradouros públicos, os
estacionamentos, terminais e conexões, a sinalização, equipamentos
e instalações, os instrumentos de controle, fiscalização, arrecadação
de taxas e tarifas e a difusão de informações, temas ainda na pauta
de discussão através da PL 1687/2007 (art. 3º, § 1º, 2º e 3º).
Historicamente, os Poderes Públicos postergaram o debate
porque priorizam o transporte particular individual da minoria em
detrimento ao transporte coletivo da maioria, algo que pode ser
constatado nos investimentos vultosos de obras viárias que atendem
o automóvel acima de outras formas de circulação, como ônibus,
bondes, bicicletas ou mesmo o andar a pé. Ao invés de calçadas,
ciclovias, trilhos ou corredores exclusivos, as cidades brasileiras, de
maneira geral, asfaltaram ruas, rasgaram largas avenidas,
construíram viadutos. Uso inadequado do solo urbano coletivo que
potencializa enormemente os conflitos no trânsito, fazendo com que
o pêndulo da balança sempre aponte para aqueles que detêm veículos
próprios, a minoria que ocupa a maior parte do espaço público de
circulação (Vasconcellos, 1996, 1999).
A própria configuração da maioria das cidades brasileiras é
reflexo da centralidade do automóvel como modo de deslocamento
principal. Brinco (2005) explica que a dependência resultante do
uso do automóvel conduz a uma dinâmica de ocupação urbana de
caráter espraiado, de baixa densidade populacional, exigindo a
expansão suburbana ou periférica. O resultado desse tipo de ocupação
espraiada é a hostilidade com relação aos que dependem de
transporte público, comprometendo, inclusive, sua mobilidade, devido
à ineficiência dos serviços, normalmente dados como concessão.
O desprezo com relação ao transporte coletivo pode ser visto
em Caiafa (2003), que descreve aspectos do cotidiano das viagens
de ônibus urbanos, na cidade do Rio de Janeiro. Questões que
envolvem a necessidade do motorista desrespeitar o tempo mínimo
do itinerário para poder descansar no ponto de parada; a quase
imposição de carregar expressivo número de passageiros; a baixa
solidariedade por conta da generalização da violência, como o medo
dos assaltos ou badernas; as brigas decorrentes da falta de troco; a
Jeferson Francisco Selbach
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