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que um afastamento, jamais um abandono, das questões relativas ao “elemento feminino
puro” em contrapartida de uma apropriação cada vez mais sólida e unívoca dos aspectos
existenciais que dizem respeito ao “elemento masculino puro”, ou seja, o fazer, a
objetivação do objeto, o agir, o intervir, etc.
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Não se trata, pois, de priorizar a mãe ou o pai nos cuidados com o bebê, mas de
compreender que o tipo de ambiente (cuidados) que o bebê precisa encontrar ao nascer,
como pré-requisito para um amadurecimento saudável, faz parte mais genuinamente da
natureza do ser da mulher. No texto, “Esse Feminismo”, Winnicott dirá: “Todos nascem
com tendências hereditárias para a maturação, mas para que elas se concretizem é
necessário que exista um ambiente facilitador satisfatório. Isso significa uma adaptação
inicial sensível da parte de um ser humano. Esse ser humano é a mulher, e geralmente a
mãe” (1986g, p. 192).
A qualidade de ser materna, isto é, capaz de uma profunda identificação, de ser e
de deixar ser, nessa profunda adaptação às necessidades do bebê, é um atributo que diz
respeito à íntima relação que uma pessoa guarda com o elemento feminino puro e que é,
em termos gerais, mais natural à mulher, principalmente quando em estado de
“preocupação materna primária”; além disso, pelo fato de sua própria constituição
orgânica, pela possibilidade de gerar um ser dentro de si, pelos nove meses de gravidez,
pela simplicidade e constância da técnica que advém mais naturalmente às mulheres que
tiveram esse preparo de nove meses (1988, p. 132), pela possibilidade de, na maior parte
dos casos, poder alimentar seus filhos ao seio,
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por ter sempre brincado de ser mamãe.
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Em um artigo denominado “Sobre o significado da palavra democracia”, Winnicott fala sobre um
possível “temor oculto da mulher” que todos os indivíduos guardariam devido ao fato de que, na história
pessoal de cada um, houve um primeiro momento de vida em que estiveram totalmente nas mãos de uma
mulher, no fundo, dependeram em alto grau dos cuidados maternos. Esse temor explicaria, em certa
medida, a grande desconfiança que comumente as mulheres geram, e também por isso, o pouco acesso
que freqüentemente elas têm na ocupação de importantes cargos políticos. Winnicott diz: “As fundações
da saúde mental de cada indivíduo são lançadas no início de sua vida, quando a mãe encontra-se
simplesmente devotada a seu bebê e este se acha num estado de dupla dependência por não ter sequer
consciência de sua dependência. Já com o pai não se estabelece nenhuma relação dotada dessa mesma
qualidade, de modo que um homem colocado à testa da organização política pode ser compreendido pelo
grupo com muito mais objetividade do que o poderia uma mulher situada na mesma posição” (1950a, p.
241).
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Embora Winnicott sempre deixe claro que a amamentação ao seio não é condição de saúde e que o uso
de mamadeira seja, em muitos casos, o mais adequado, ele não deixa de ressaltar as importantes
diferenças entre as duas formas de alimentação e suas conseqüências. Dar o peito possibilita ao bebê ter
uma série de experiências que o uso da mamadeira não permite: o contato direto com o corpo da mãe e a
não existência de um intermediário nesse contato, são alguns exemplos (Veja também 1964a, cap. 8, e
1969b, p. 27). Além disso, tem-se que levar em conta a satisfação que a mãe do bebê encontra ao poder
utilizar seu próprio corpo para alimentar o filho. Winnicott diz: “Qualquer que seja o modo de alimentar o
bebê, e por mais satisfatório que possa ser, a satisfação da mulher capaz de usar uma parte do próprio
corpo desta forma [oferecendo o leite que sai do seu próprio seio para acamá-lo] é algo totalmente