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Universidade Estadual do Ceará
Simone dos Santos Machado
LINGUAGEM FORMAL E MODELOS COGNITIVOS
IDEALIZADOS: UM ESTUDO SÓCIO-COGNITIVO NA
TRADUÇÃO PARA LEGENDAS
Fortaleza – Ceará
2007
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Universidade Estadual do Ceará
Simone dos Santos Machado
LINGUAGEM FORMAL E MODELOS COGNITIVOS
IDEALIZADOS: UM ESTUDO SÓCIO-COGNITIVO NA
TRADUÇÃO PARA LEGENDAS
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado
Acadêmico em Lingüística Aplicada da
Universidade Estadual do Ceará, como requisito
parcial para obtenção do grau de mestre em
Lingüística Aplicada. Área de Concentração:
Estudos da Linguagem - Lexicologia e Tradução,
linha 3.
Orientador(a): Profª Drª Paula Lenz Costa Lima
Fortaleza – Ceará
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2007
Universidade Estadual do Ceará
Curso de Mestrado Acadêmico em Lingüística Aplicada
Título do Trabalho: Linguagem formal e modelos cognitivos idealizados: um estudo
sócio-cognitivo na tradução para legendas
Autor(a): Simone dos Santos Machado
Defesa em: 28/08/2007 Conceito obtido:__________________
Banca Examinadora
____________________________________
Paula Lenz Costa Lima, Profª Drª.
Orientadora
_________________________________ ______________________________
Emilia Maria Peixoto Farias, Profª Drª. Soraya Ferreira Alves, Profª Drª.
1ª Examinadora 2ª Examinadora
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, que por toda sua vida, em meio a
tantas dificuldades criaram a mim e ao meu irmão
com o melhor que tinham e podiam nos dar, além
da grande admiração que manifestam por mim; ao
meu irmão, que me muito me incentivou; ao meu
esposo, Levi, que, em todos os momentos, está ao
meu lado, acreditando em mim e nos meus sonhos,
e me ajudando na luta por alcançá-los; e
finalmente, ao meu filho de onze meses, Ruan
Guilherme, que, sem sequer saber, é a minha
maior alegria e inspiração.
AGRADECIMENTOS
Este trabalho é o desfeche de uma caminhada que dará início a outra. Na
trajetória percorrida, percalços foram encontrados. Contudo, uma força maior me fez
continuar e não desistir. Esse poder que nos levanta, e às vezes, nos faz cair, a fim de
sempre nos permitir alcançar o de melhor, torna realidade os nossos sonhos, satisfaz os
desejos do nosso coração e sempre está a nossa disposição quando nela confiamos. Em
minha vida, essa força propulsora é chamada Jesus Cristo. A Ele, o autor e o
consumador da minha fé, a minha gratidão, a honra, a glória e o louvor para sempre.
A minha orientadora, Paula Lenz Costa Lima, pela grande contribuição em
cada passo dado rumo ao amadurecimento e efetivação desta pesquisa, a partir das
discussões e sugestões sempre prazerosas, além do gratificante aprendizado adquirido
com a mesma enquanto pessoa, com o qual pude ser enriquecida.
À Professora Vera Lúcia Santiago Araújo pelo apoio e disposição
evidenciados quando, sem medida, cedia-me fontes de pesquisa que foram
fundamentais para o alicerce teórico desta dissertação.
Às amigas Luciana do Amaral Brilhante e Márcia Socorro F. de Andrade
pelo estímulo e companheirismo na jornada acadêmica, bem como pela amizade que
excedia o espaço universitário.
À FUNCAP pelo apoio financeiro durante todo o curso, permitindo-me
dedicação exclusiva a esta pesquisa.
À Coordenação e aos alunos do Núcleo de Línguas Estrangeiras da UECE
pela participação na pesquisa.
Aos professores do CMLA pelo conhecimento e crescimento que me
proporcionaram ao longo do curso.
A Maria do Carmo, Secretária do CMLA, que sempre se mostrou prestativa,
atenciosa e simpática às minhas necessidades acadêmicas.
E, finalmente, aos meus colegas de curso que me proporcionaram momentos
de descontração e alegria, mesmo diante de tantas preocupações em torno daquilo que
era o nosso objetivo final, enquanto alunos de mestrado.
RESUMO
Esta dissertação analisou a influência dos modelos cognitivos idealizados (MCIs) no tipo de
linguagem utilizada na tradução de fraseologias e clichês de raiva (palavrões) em inglês para
legendas no português do Brasil. À luz de teóricos sobre Estudos Descritivos de Tradução,
Tradução Audiovisual e Lingüística Cognitiva, nosso objetivo foi mostrar que a tradução para
legendas é resultado da influência desses modelos. Acreditamos que a linguagem formal e a
suavização ou corte de palavrões, estratégias comumente utilizadas na tradução para as
legendas brasileiras, sejam influenciadas por MCIs para a escrita e que, por essa razão, a
linguagem utilizada nas legendas seja natural para os espectadores brasileiros, qualquer outro
tipo de linguagem utilizada na tradução seria recebido como estranho e não natural. A fim de
verificar as hipóteses levantadas, esta pesquisa ficou dividida em três momentos: primeiro,
realizamos um experimento para a elaboração dos MCIs relacionados às legendas (escrita,
linguagem formal e palavrões); depois, selecionamos expressões típicas da cultura americana,
a saber: clichês de raiva e fraseologismos a partir dos filmes americanos 10 coisas que eu
odeio em você e Meninas malvadas, e analisamos o tipo de linguagem utilizada em sua
tradução para o português do Brasil, tentando relacionar as traduções aos MCIs para escrita,
linguagem formal e palavrões. Por último, verificamos a aceitação do público em relação às
traduções baseadas em tais modelos e àquelas baseadas em modelos diferentes. Os dados do
segundo experimento revelaram que tanto legendas formais quanto legendas informais foram
aceitas pelo público. Embora os dados não tenham sido conclusivos, atribuímos o resultado
aos MCIs elaborados, segundo os quais a linguagem formal se identifica com a escrita e a
informalidade e os palavrões com os adolescentes.
ABSTRACT
This thesis analyzed the influence of idealized cognitive models (ICMs) in the language used
in the translation of American phraseologisms and clichés of fury (swearwords) for Brazilian
subtitles. Based on Descriptive Studies, Audiovisual Translation and Cognitive Linguistics
authors, we intended to show that subtitle translation is affected by those models. We believed
that formal language and the minimization of swearwords used in the translation of Brazilian
subtitles were influenced by ICMs related to writing. For this reason, the language usually
used in subtitles might seem natural to Brazilian viewers, and any other different language
might seem strange and unnatural for them. In order to verify our hypothesis, we divided our
research into three parts: firstly, we made na experiment to build the ICMs related to subtitles
(writing, formal language and swearwords); the second part was to select expressions which
were particular to American culture, that is, phraseologisms and clichés of fury. We took the
expressions away 10 things I hate about you and Mean girls films, analyzed the language
used to translate each expression into Brazilian portuguese, and related each translated
expression to the ICMs for writing, formal language and swearwords. In the last part of our
work, we made another experiment to check the preference of the audience concerning the
subtitles based on those models and the subtitles which were different from those ones. The
last experiment showed that both formal and informal subtitles were well received by the
audience. Although the results did not contribute to a conclusion, we related them to the ICMs
previously elaborated. According to them, the formal language is closely related to the
wrinting while the informal language and swearwords are related to adolescents.
SUMÁRIO
Lista de Quadros ...................................................................................................... 10
Lista de Gráficos ...................................................................................................... 11
Introdução ................................................................................................................ 12
1. Tradução e legendas: uma questão de adaptação cultural ................................... 15
1.1 Fidelidade e equivalência: uma tradição histórica e cultural .......
.................. 16
1.1.1 A teoria Lingüística e seus conceitos ....
.................................................. 19
1.1.2 Os Estudos Descritivos e a questão da adaptação cultural ................... 22
1.1.3 A categorização e a noção de prototipicidade nos estudos de
tradução ................................................................................................ 27
1.2 A tradução audiovisual: técnicas e estratégias de tradução ........................... 31
1.2.1 A tradução para legendas na Europa .................................................... 34
1.2.2 A tradução para legendas no Brasil ...................................................... 37
1.2.2.1 A tradução de fraseologismos e clichês: a necessidade
de adaptação cultural ................................................................. 40
2. Cognição e linguagem: aspectos teóricos e práticos ..........
................................... 46
2.1 A metáfora cognitiva e sua influência na linguagem do dia-a-dia ................ 46
2.2 A metáfora do canal e a expressão da linguagem ..............
............................. 54
2.3 Os modelos cognitivos idealizados e sua relação com a linguagem
formal escrita na sociedade .......................................................................... 65
2.4 Experimento I: a construção de um MCI para fala e escrita na
sociedade brasileira ...................................................................................... 69
2.4.1 Análise dos dados – língua oral/escrita e linguagem
formal/informal .................................................................................... 73
2.4.2 Uma proposta de MCIs para escrita,
linguagem formal e palavrões ................
............................................... 82
3. Analisando as estratégias de tradução nas legendas de 10 coisas que eu odeio
em você e Meninas malvadas............................................................................... 87
3.1 Os filmes ...................................................................................................... 88
3.2 As listas de palavras: análise preliminar ..................................................... 90
3.3 O uso da linguagem formal nas legendas de 10 coisas que eu odeio em
você e Meninas malvadas .......................................................................... 96
3.3.1 Verbos ............................................................................................... 97
3.3.2 A posição do pronome oblíquo na frase ........................................... 98
3.3.3 O uso de preposições ........................................................................ 99
3.3.4 O uso de vocabulário não comum na oralidade .............................. 100
3.4 Fraseologias em 10 coisas que eu odeio em você e Meninas malvadas.... 101
3.5 Os clichês de raiva – palavrões – em 10 coisas que eu odeio em você.
......104
3.6 Os clichês de raiva – palavrões – em Meninas malvadas ................
...........117
3.7 Síntese das estratégias utilizadas na tradução dos clichês de raiva –
palavrões.....................................................................................................128
4. Legenda formal ou informal: pesquisando a preferência do público................ 131
4.1 Amostra do filme........................................................................................ 132
4.2 As novas legendas....................................................................................... 133
4.3 Questionário .............................................................................................. 135
4.4 Participantes .............................................................................................. 136
4.5 Procedimentos ............................................................................................ 137
4.6 Análise dos resultados: a recepção do público em relação às legendas...... 138
Considerações Finais ............................................................................................. 149
Referências Bibliográficas ...................................................................................... 152
Anexos.................................................................................................................... 157
Anexo 01................................................................................................................ 158
Anexo 02................................................................................................................. 163
Anexo 03................................................................................................................. 168
Anexo 04.................................................................................................................. 172
Anexo 05.................................................................................................................. 177
LISTA DE QUADROS
Quadro 01: Funções da linguagem ......................................................................... 30
Quadro 02: Aspectos inerentes à fala e à escrita descritos na literatura ................. 70
Quadro 03: Aspectos inerentes à linguagem informal/formal descritos
na literatura ......................................................................................... 71
Quadro 04: Resultado sobre as características relacionadas à
linguagem informal ............................................................................ 74
Quadro 05: Resultado sobre as características relacionadas à
linguagem formal ................................................................................ 75
Quadro 06: Resultado sobre profissões vs. nível de formalidade e
de prestígio social ................................................................................ 76
Quadro 07: Resultado sobre as características mais relacionadas à fala ................ 77
Quadro 08: Resultado sobre as características mais relacionadas à escrita ............ 78
Quadro 09: Resultado sobre a (in)tolerância dos sujeitos em relação
ao uso de palavrões .............................................................................. 80
Quadro 10: MCI para língua escrita ....................................................................... 83
Quadro 11: MCI para linguagem formal ................................................................ 84
Quadro 12: MCI para palavrões ............................................................................. 85
Quadro 13: Quadro comparativo das listas dos textos em inglês ........................... 93
Quadro 14: Quadro comparativo das listas dos textos em português ..................... 95
Quadro 15: Exemplos de tempos verbais usados nas falas dos personagens e suas
legendas correspondentes – DC .......................................................... 97
Quadro 16: Exemplos de tempos verbais usados nas falas dos personagens e suas
legendas correspondentes – MM ........................................................ 98
Quadro 17: Exemplos de pronomes usados nas falas dos personagens e suas
legendas correspondentes – DC........................................................... 99
Quadro 18: Exemplos de pronomes usados nas falas dos personagens e suas
legendas correspondentes – MM ........................................................ 99
Quadro 19: Exemplos de preposições usadas nas falas dos personagens e suas
legendas correspondentes – DC .......................................................... 99
Quadro 20: Exemplos de preposições usadas nas falas dos personagens e suas
legendas correspondentes – MM ...........................................
..............100
Quadro 21: Exemplos de vocabulário não comum na oralidade – DC ................. 100
Quadro 22: As estratégias de tradução nas legendas de DC ............................... 129
Quadro 23: As estratégias de tradução nas legendas de MM .....................
.............129
Quadro 24: Comparação entre as legendas originais e as novas legendas .............134
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 01: Nível de conforto dos informantes quanto à linguagem
usada pelos personagens ..................................................................... 139
Gráfico 02: Nível de conforto dos informantes quanto à tradução
dos diálogos nas legendas ................................................................... 140
Gráfico 03: Nível de conforto dos informantes quanto ao uso de
palavrões pelos personagens ............................................................... 141
Gráfico 04: Nível de conforto dos informantes quanto ao uso de
palavrões nas legendas ........................................................................ 141
Gráfico 05: Intuição dos participantes quanto ao nível de naturalidade
nas legendas ......................................................................................... 144
Gráfico 06: Nível de ocorrência de palavrões caso o filme fosse
em português ...................................................................................... 146
INTRODUÇÃO
Dentre as várias funções assumidas pela tradução audiovisual (doravante,
TAV) nos meios de multimídia, oferecer a pessoas de diferentes países a oportunidade
de assistir a filmes estrangeiros é uma de suas funções de destaque. Segundo Araújo
(2004:161), ambos dublagem e legendagem são as técnicas de TAV mais comumente
utilizadas no Brasil. Enquanto a primeira é preferencialmente usada em programas
abertos da televisão e filmes destinados ao público infantil, a segunda é mais usada em
programas de TV a cabo, no cinema, DVDs e em grande parte de filmes destinados a
vídeo cassete. Através da legenda, o espectador ouve a voz do ator enquanto lê a
tradução simultânea escrita na parte inferior da tela.
A tradução para a legendagem
1
de um filme é um processo bastante
complexo que envolve peculiaridades não apenas do ponto de vista tradutório (a
relação entre línguas distintas que tem sido alvo de estudo há décadas), mas também
por parte do processo técnico da legendagem. Durante este processo, o tradutor precisa
atender a algumas especificidades das legendas tais como a limitação de tempo e
espaço, por exemplo, o que algumas vezes acaba por interferir no resultado da
tradução.
Este tipo de tradução envolve a adaptação de um código oral em um código
escrito e o tratamento dispensado às legendas, atualmente, ainda obedece à antiga
dualidade existente entre fala e escrita. Segundo essa visão, a fala é geralmente
informal, ao passo que a escrita deve ser cercada de cuidados com a gramática formal
da língua. Dessa forma, os tradutores não têm outra saída senão recorrer à linguagem
formal como sistema lingüístico em suas traduções, independentemente do tipo de
filme. O uso da linguagem formal fica entendido aqui como o uso de expressões
baseadas em regras gramaticais da norma padrão culta da língua.
1
Neste trabalho, o termo “legendagem” será usado para referir-se ao produto final da tradução, momento em que
o filme está pronto para o mercado.
Um aspecto envolvido na tradução de legendas está associado à tradução de
palavras e expressões consideradas tabu pela sociedade, as quais, normalmente, não
podem aparecer nas legendas. A não tradução ou a suavização de tais expressões pode
dar ao espectador a falsa impressão de que os falantes de língua inglesa não falam
palavrões, ao passo que os filmes brasileiros são repletos deles.
Segundo Araújo (2004:166), o resultado da tradução baseada em tais regras
são expressões não naturais para os espectadores brasileiros. Isto porque os filmes
tendem a mostrar situações do dia a dia, com pessoas comuns conversando de maneira
informal. No entanto, a tradução de tais situações é geralmente feita sob os padrões da
gramática formal, diferente da maneira corrente normalmente utilizada pelos falantes,
contribuindo para uma total ausência de naturalidade na tradução. Isto acontece,
principalmente, tratando-se de clichês, expressões próprias a certo idioma e que
aparecem comumente em filmes norte-americanos.
Ao contrário de Araújo (op.cit.), acreditamos que o uso da linguagem formal
e a suavização, ou corte, de palavrões nas legendas brasileiras sejam resultados das
expectativas do público em relação às próprias legendas, ou seja, estas devem
apresentar um texto elaborado seguindo a norma padrão culta da língua e sem
expressões consideradas ofensivas pela sociedade, sob pena de parecerem estranhas ao
espectador.
Desse modo, pareceu-nos razoável supor que a opção pela linguagem formal
nas traduções seja motivada por questões intrínsecas à sociedade e cultura brasileiras e
que, portanto, modelos cognitivos idealizados (MCIs) exerçam um papel importante na
sua motivação. Os demais aspectos da linguagem utilizada nas legendas também
podem ser motivados por um MCI para a língua escrita e, nesse sentido, ao contrário
do que supôs Araújo (op.cit.), não seriam recebidos como estranhos ou artificiais pelos
espectadores brasileiros.
Considerando tais aspectos, nossa pesquisa teve como objetivo investigar o
papel dos modelos cognitivos idealizados na escolha do tipo de linguagem utilizada na
tradução de clichês para as legendas. Mais especificamente, procuramos analisar os
MCIs subjacentes ao tipo de linguagem escolhida para a tradução nas legendas e
investigar o impacto de traduções, com diferentes tipos de linguagem (formal e
coloquial), em sujeitos habituados a assistir a filmes americanos com legendas.
Esta pesquisa de caráter analítico-descritivo investigou os aspectos orais e
informais no processo de legendagem de dois filmes americanos: 10 coisas que eu
odeio em você e Meninas malvadas. Desta forma, nossas leituras e reflexões foram
voltadas para as teorias e métodos de tradução que têm como foco o processo de
legendagem.
Os procedimentos realizados a fim de desenvolver esta pesquisa foram
divididos em quatro etapas principais, que constituem o corpo deste trabalho: primeiro,
o levantamento e a leitura da bibliografia sobre clichês, tradução audiovisual, modelos
cognitivos, linguagem formal e tópicos relacionados ao assunto. Segundo, a elaboração
de MCIs para fala, escrita, linguagem formal, linguagem informal e palavrões a partir
de um experimento aplicado a falantes nativos do português do Brasil. Terceiro,
analisamos as expressões selecionadas nos dois filmes, tentando estabelecer uma
relação com os MCIs construídos na etapa anterior. Por último, realizamos uma
pesquisa de recepção de público com o objetivo de verificar que tipo de linguagem tem
melhor aceitação pelo público: aquelas que seguem os modelos identificados ou
aquelas que divergem deles.
Acreditamos que uma análise da TAV sob a perspectiva da Lingüística
Cognitiva, como processo influenciado pelos modelos cognitivos idealizados (MCIs)
da sociedade brasileira é bastante enriquecedora para os estudos de tradução, uma vez
que ela ajuda a esclarecer a motivação de certas estratégias de tradução, a refletir sobre
a estreita relação entre cultura e tradução e a discutir questões relacionadas à ideologia
e sociedade brasileiras.
1. TRADUÇÃO E LEGENDAS: UMA QUESTÃO DE ADAPTAÇÃO
CULTURAL
Neste capítulo, apresentamos uma breve explanação a respeito das teorias de
tradução e sua relação com os conceitos de fidelidade e equivalência que, ainda hoje,
influenciam a forma como o público leitor ou espectador de textos traduzidos, de um
modo geral, entendem a atividade tradutória. Apresentamos também, um resumo sobre
a legendagem, enquanto técnica de tradução audiovisual, e as estratégias de tradução
utilizadas para a elaboração das legendas. Para isso, dividimos o presente capítulo em
duas partes centrais: a primeira aborda os conceitos de fidelidade e equivalência na
teoria Lingüística e nos Estudos Descritivos de tradução como também sua relação
com os princípios de categorização propostos pela Lingüística Cognitiva. A segunda
parte discute a atividade tradutória inserida no processo de legendagem no Brasil e na
Europa e, para encerrar, trata de uma das estratégias de tradução utilizada nas
legendas, o uso da linguagem formal, e sua influência em fraseologismos e clichês.
Em relação à tradução, as fontes pesquisadas mostraram que ela tem sido
uma atividade corrente e necessária desde que o homem começou a ampliar suas
fronteiras territoriais e culturais nos tempos mais remotos de sua história. A
aprendizagem de uma nova língua, imposta ou não, e a busca pelo conhecimento de
artes e ciências desconhecidas por um povo foram atividades, quase sempre,
facilitadas pela tradução, mesmo que informal, entre línguas distintas.
Do ponto de vista histórico-bíblico, a partir do fato conhecido como “a torre
de Babel”, mencionado no livro do Gênesis capítulo 11, a confusão das línguas teria
sido o cenário propício ao desenvolvimento e prática da tradução como mediadora da
compreensão entre os homens. Estudos históricos mostram que o fato teria ocorrido na
pré-história e relatado por Moisés por volta de 1.400 a.C.
2
. Vê-se, então, que a
tradução é uma atividade bastante antiga, quase tão antiga quanto a própria civilização.
Derrida (2002:70), em um ensaio de título bastante semelhante ao fato bíblico Torres
2
Conforme a Bíblia de Estudo de Genebra, p.03.
de Babel, menciona que “Babel é a lei imposta pelo nome de Deus que pela mesma
ação vos prescreve e vos interdita traduzir, mostrando-vos e despojando-vos do
limite”.
1.1 FIDELIDADE E EQUIVALÊNCIA: UMA TRADIÇÃO HISTÓRICA E
SOCIAL
Por ser assim tão necessária, a tradução passou, desde cedo, a despertar o
interesse de estudiosos, os quais passaram a dedicar tempo e esforço para compreender
os processos envolvidos nesta atividade. De acordo com Bassnett-McGuire (1980), os
romanos já desenvolviam estudos sobre a tradução, tentando estabelecer as estratégias
mais apropriadas no processo: tradução “palavra por palavra” ou “sentido por sentido”.
Regra geral, até a década de 70
3
do último século, sustentou-se a idéia de
que a tradução seria uma simples operação envolvendo duas línguas, na qual o texto
traduzido deveria ser “equivalente” e “fiel”
4
ao texto de partida, este considerado texto
original e de qualidade superior àquele. Os conceitos de equivalência e fidelidade
divergiram muito entre os estudiosos das teorias de tradução que defendiam uma
perspectiva sociológica para o processo tradutório. Essas divergências levantaram
questões as quais serviram, e ainda servem, de base para diversos estudos na área.
Nos estudos de tradução, segundo afirma Wilss
5
(apud Rodrigues 2000:18),
“não se pode determinar o momento preciso de emergência do termo equivalência de
tradução, contudo, presume-se que tenha advindo da matemática”. Talvez por esse
motivo o termo ‘equivalência’ seja dotado de um caráter tão impessoal e relacionado
mais diretamente a uma coisa ou objeto. Em seus estudos, Rodrigues (2000:15) analisa
os conceitos de equivalência nas diversas teorias da tradução e menciona que, na
3
Na década de 80, Toury surge fazendo parte de uma nova escola conhecida como Estudos Descritivos, muito
difundida entre os estudos de tradução. Algumas de suas idéias serão abordadas mais à frente neste trabalho.
4
“Equivalência” e “fidelidade” não serão pontos primordiais no desenvolvimento deste trabalho, entretanto, sua
discussão se faz necessária para mostrarmos em que aspectos o pensamento tradicional para tradução difere da
teoria a qual recorremos durante a realização da pesquisa.
5
WILSS, W. The science of translation: problems & method. Tübingen: Gunter Nar, 1982.
literatura analisada sobre tradução, existem discussões e oposições intimamente
relacionadas:
É o caso da distinção entre tradução “palavra por palavra” e “sentido por
sentido” [...] essa oposição tem assumido diferentes formas na literatura,
desde a tradução “literal” oposta à “livre”, a “fiel” oposta à “criativa”, até,
mais recentemente, a “equivalência formal” oposta à “equivalência
dinâmica” (Rodrigues, 2000:15).
Essas dicotomias estão relacionadas à direção que uma tradução deve tomar
no sentido de ser estranha ou natural ao público receptor. Alguns autores, como
Bassnett-McGuire (op.cit), relacionam a naturalidade e a fluência da tradução à
adaptação do texto de partida aos termos lingüísticos e culturais da língua-meta, ao
passo que a literalidade está associada à cultura geradora do texto. Por sua vez, Venuti
(1986) trata essa dicotomia como domesticação em oposição à estrangeirização, ou
seja, a adaptação da tradução aos aspectos culturais do público-alvo (domesticação)
em oposição ao estranhamento gerado pela tradução feita sob os padrões da cultura de
partida e não daquela que receberá o texto traduzido (estrangeirização).
Essa oposição entre conceitos recebe críticas de Snell-Hornby (1995:19).
Segundo ela, “as tentativas feitas para repensar o conceito, para qualificá-lo e
classificá-lo, levaram ao que só pode ser descrito como uma explosiva proliferação de
tipos de equivalência”, e ainda salienta que “a falta de simetria entre as línguas torna
impossível postular a equivalência como relação necessária para a tradução”. Além
disso, Snell-Hornby (1995:16-18) mostra quão enganosa é a defesa do conceito de
equivalência nos estudos de tradução. Segundo a autora, os termos equivalence (do
inglês) e Äquivalenz (do alemão) podem, a priori, parecer equivalentes, simétricos e
perfeitos em um processo tradutório, entretanto, isto não é verdade. Uma investigação
mais detalhada e aprofundada desses dois itens lexicais mostrou diferenças cruciais,
tanto do ponto de vista do desenvolvimento histórico de cada palavra, quanto das
respectivas funções que cada uma exerce dentro de seu sistema lingüístico e sócio-
cultural.
O conceito de fidelidade, por sua vez, está intimamente relacionado ao
conhecido epigrama “traduttore, traditore
6
. Uma vez que o texto fonte é considerado
superior à tradução, ou que a tradução feita pelo autor do texto fonte seja melhor do
que qualquer outra tradução, o conceito de fidelidade se aplica em preservar a intenção
do autor. A esse respeito, Wyler (2003) afirma que:
[...] o texto de partida seria um objeto definido, congelado, receptáculo de
significados estáveis, em geral identificados com as intenções de seu autor.
Caberia ao tradutor transportá-lo, fielmente, para o seu próprio texto na
língua-receptora (Wyler, 2003:18).
Em outras palavras, a missão do tradutor seria não trair por meio de
mudança ou omissão, ou qualquer outro recurso, o sentido e/ou a forma dada ao texto
“original”.
Apesar de renegadas pelos Estudos Descritivos, “fidelidade” e
“equivalência” são termos ainda valorizados pelo público leitor no tocante às
traduções de um modo geral. Desconhecedor dos processos envolvidos pela atividade
tradutória, o público confere à tradução uma posição inferior e desprestigia seus
tradutores ao renegar seu status de profissional da linguagem, conferindo-lhes salários
baixos e pouco tempo para a realização de seu trabalho (Wyler, 2003). Segundo Arrojo
(2003:72), uma das faces mais visíveis e conhecidas em relação à tradução é:
[...] o preconceito generalizado com que se considera qualquer tradução,
olhada de soslaio até mesmo pelos profissionais da área. A tradição tem
sido, portanto, inclemente em relação à atividade do tradutor, atribuindo-
lhe, freqüentemente, um caráter de precariedade, de remendo, de “mal
necessário”, em oposição a um “original” sempre pleno e completo em si
mesmo (Arrojo, 2003:72).
Além da constatação feita pelas autoras supracitadas, essa visão
tradicionalista ainda pode ser encontrada na definição de dicionários, como o Oxford
Dictionary (2000:1438), onde consta que “tradução é o processo de mudar algo escrito
ou falado em uma outra língua”
7
. Definições como esta tratam a tradução como um
6
“Tradutor, traidor”.
7
“Translation is the process of changing something that is written or spoken into another language” (essa
tradução é da autora, assim como todas as demais, quando não houver edição disponível em português).
processo isolado e independente dos aspectos culturais próprios de um povo, como se
o texto fonte encerrasse em si um significado único a ser resgatado na língua-alvo.
Em suma, tradicionalmente, a relação entre o autor e seu tradutor deve ser
marcada pela harmonia e fidelidade. Sendo fiel, a tradução pode, então, ser
considerada “perfeita”, porém não original, pois originalidade é um atributo legado
somente ao texto fonte.
Com base nesses pressupostos, as dicotomias tradução literal vs. tradução
livre e fidelidade vs. originalidade foram centro de discussão nas teorias tradutórias
que se seguiram. Ora defendendo, ora negando as noções de fidelidade e equivalência,
cada teoria apresenta uma abordagem em relação ao texto original e ao texto traduzido.
A seguir, apresentaremos algumas das teorias de tradução que tratam de fidelidade e
equivalência em seus estudos.
1.1.1 A TEORIA LINGÜÍSTICA E SEUS CONCEITOS
Em seus primeiros passos na busca de uma teoria tradutória, os romanos
iniciaram seus estudos acreditando que a tradução era um processo automático. Para
eles, cada palavra do texto fonte deveria ser trocada pelo seu equivalente na língua-
alvo, ou seja, o sentido era inerente à palavra enquanto unidade semântica.
A lingüística contrastiva utiliza a equivalência de tradução como base para
comparação de determinados aspectos entre duas ou mais línguas. Segundo Halliday et
al.
8
(apud Rodrigues, 2000:29), a realização de estudos comparados depende do
estabelecimento da equivalência no uso real da língua, ou seja, o que denominam
“equivalência contextual”, pois “não é a correspondência formal que aceitamos como
tradução”.
Embora não forneça de maneira clara uma definição para equivalência, o
equivalente contextual mencionado pelos autores seria uma estrutura em uma língua
capaz de substituir outra em uma língua diferente. A partir do equivalente contextual
8
HALLIDAY, M. A. K. Et al. Comparação e tradução. In: ______. As ciências lingüísticas e o ensino de
línguas. Trad. Myriam Freire Morau. Petrópolis: Vozes, 1974, p.136-161.
seria possível estabelecer as semelhanças e diferenças entre as línguas estudadas e se
chegar à conclusão se há ou não correspondência formal.
Em sua proposta para uma teoria lingüística da tradução, Catford (1980) se
propõe a analisar e descrever os processos da tradução a partir de uma teoria baseada
na lingüística geral. No entanto, parece limitar-se a uma sistematização das
semelhanças e diferenças entre as línguas, isto é, questões sobre sistemas lingüísticos,
tal qual os defensores da Lingüística comparada.
Assim como Halliday et al. (op.cit.), Catford (op.cit.) não define o que
entende por equivalência. Trata o termo como algo transparente, como se o conceito
de equivalência fosse um consenso entre todos os autores que utilizam o termo em
seus estudos sobre tradução. Catford (1980) preocupa-se em definir os tipos de
equivalência: a equivalência textual e a equivalência formal. Segundo ele, “um
equivalente textual é qualquer texto ou porção de texto da LM
9
que [...] se observe ser
numa ocasião específica o equivalente de determinado texto ou porção de texto da
LF”. Por outro lado, um equivalente formal “é qualquer categoria da LM que se possa
dizer que ocupa, tanto quanto possível, na ‘economia’ da LM o ‘mesmo’ lugar que
determinada categoria da LF ocupa na LF” (Catford, 1980: 29).
Para a determinação do tipo de equivalência encontrada, o autor sugere o
recurso a um informante tradutor bilíngüe competente, conhecedor dos sistemas
lingüísticos envolvidos.
Após a identificação do equivalente textual, Catford (1980: 32) propõe “um
levantamento quantitativo de itens recorrentes, que poderia ser tratado em termos de
porcentagem ou de probabilidade”. Se essa análise estatística fosse feita com uma
amostra de textos bastante variada, as probabilidades encontradas poderiam ser
generalizadas para o estabelecimento de regras de tradução. O que Catford (op.cit.)
não parece levar em consideração é o caráter dinâmico da língua. Mesmo que se
chegasse a ponto de concluir a sistematização das regras para a tradução, elas seriam
válidas apenas naquele tempo e lugar em questão, pois os sistemas lingüísticos não são
estáticos, estão em constante mudança dentro de uma mesma língua.
9
LM seria a língua meta, enquanto que LF seria a abreviação de língua fonte.
O fato de considerar a tradução um processo entre duas línguas faz com que
o autor ache necessário estabelecer “uma teoria de língua, uma teoria lingüística geral”
(Catford, 1980: 01). Essa teoria seria uma sistematização das possibilidades
lingüísticas de tradução, ou seja, do que é possível ou não traduzir. Ao fazer isso, o
autor avalia a tradução como um processo mecânico, como se os tradutores pensassem
todos da mesma forma e recorressem a regras predeterminadas para a seleção dos itens
que comporiam seus textos. Catford (op.cit.) parece rejeitar os demais processos
envolvidos na tradução, o que “torna duvidosa a possibilidade de construção de regras
de tradução ou de equivalência a partir dos resultados de uma pesquisa do gênero”
(Rodrigues, 2000:45).
Diferentemente de Catford (1980), que busca sistematizar a tradução a partir
de fundamentos lingüísticos, Nida
10
(apud Rodrigues, 2000:62) apóia-se nos conceitos
da gramática transformacional e se propõe a usar a lingüística como um meio para
análise e solução de problemas na tradução. Apesar de discutir enfaticamente sobre os
problemas enfrentados na tradução da Bíblia, o autor menciona que as soluções
propostas também se estendem às traduções de outros tipos de textos. Essa
generalização é complicada porque a Bíblia é um livro escrito em uma época, cultura e
estilo de linguagem específicos que envolvem problemas particulares, problemas que
dificilmente seriam encontrados em textos de diferentes estilos, épocas ou culturas.
Isto sem falar que o propósito para o qual a Bíblia foi escrito não pode ser estendido à
grande variedade de textos existentes nas sociedades do planeta.
Nida (op.cit.) não define ao longo de seus textos o que entende por
equivalência, entretanto, no glossário de um de seus livros consta que equivalência é
“uma similaridade muito próxima em significado, oposta à similaridade em forma”.
Fica difícil dizer, no momento, se essa definição foi dada pelo próprio autor ou se foi
elaborada por outra pessoa que leu o texto e preparou o glossário para esclarecer
dúvidas de futuros leitores. Segundo Rodrigues (2000: 65), “a equivalência em si não
é, entretanto, definida. Assim como faz Catford, Nida apenas repete o termo, em vez
de explicá-lo”.
10
NIDA, E. A. Principles of translation as exemplified by Bible translationg. In: BROWER, R. A. On
translation. Oxford: Oxford University Press, 1966, p. 11-31.
Quanto à tradução, Nida (apud Rodrigues 2000: 65) a define como “a
produção de mensagens equivalentes”. Segundo ele, o sentido de um texto pode ser
resgatado durante o processo e transferido para outra língua com o mínimo de perda ou
distorções. Nessa transferência o conteúdo tem total primazia em relação à forma. O
conteúdo pode ser resgatado a partir da identificação de núcleos, que seriam as
menores unidades do texto e portadoras da mensagem em si. A mensagem deveria ser
então transferida para a língua alvo por meio destes núcleos. Isso garantiria, de acordo
com seu ponto de vista, o total resgate da mensagem original, ou seja, das intenções do
autor do texto fonte.
Catford (1980) e Nida (apud Rodrigues 2000), tratados anteriormente, foram
os representantes da teoria lingüística para os estudos de tradução. Ambos defendiam a
primazia do texto fonte em relação à tradução e a importância da fidelidade e da
equivalência para a produção de um bom texto na cultura de chegada. A seguir,
trataremos dos Estudos Descritivos de tradução e o tratamento dispensado à tradução
pelos seus teóricos.
1.1.2 OS ESTUDOS DESCRITIVOS E A QUESTÃO DA ADAPTAÇÃO
CULTURAL
A teoria dos Estudos Descritivos de Tradução difere da anterior por rejeitar
o conceito de equivalência defendido pelos lingüistas. Enquanto estes acreditam que a
tradução é um ideal a ser atingido e submisso às regras determinadas pelos teóricos,
aqueles partem para a análise das soluções dadas pelo tradutor, ou tradutores, de um
certo texto.
De acordo com Rodrigues (2000), Lefevere desenvolve seus estudos com o
intuito de:
[...] dedicar-se a analisar o comportamento tradutório, relacionando-o às
instituições, ao poder e à ideologia. Seu objetivo é estudar a tradução
literária e pesquisar os fatores que influenciam a produção de traduções em
certos períodos ou culturas (Rodrigues, 2000:104).
Para este autor a tradução é entendida como uma reescritura, que pode ser
ao mesmo tempo “inovadora e subversiva” e “repressiva e conservadora”. Inovadora
no sentido de que pode introduzir novos parâmetros na tradução e na literatura a partir
do poder modelador de uma cultura sobre a outra. E repressiva porque pode manipular
as obras para que se adaptem à ideologia ou estilo literário estabelecido.
Lefevere (1992b) acredita que as obras literárias estão localizadas dentro de
um determinado sistema, de forma que algumas obras ficam localizadas no centro, ao
passo que outras ficam localizadas na periferia. À reescritura cabe o papel de afetar a
“interpenetração de sistemas literários” (Lefevere, 1992b: 15), fazendo com que obras
da periferia possam ser deslocadas da periferia para o centro.
Em seus trabalhos, o autor refuta o pensamento de que somente os textos
que se mostram “equivalentes e fiéis ao original” sejam representantes adequados de
traduções, ou seja, aqueles textos que apresentam todos os segmentos substituídos em
outra língua. Tal pensamento exclui da categoria de tradução, e do corpus de análise
dos lingüísticas, textos que envolvam estratégias de tradução, tais como: omissões,
acréscimos, resumos, adaptações e outros recursos. Estes últimos seriam, segundo
Lefevere (1992b), os textos essenciais na constituição de um corpus para a análise de
tradução.
Entretanto, um problema apontado por Rodrigues (2000:119) na teoria
desenvolvida por Lefevere, é o fato de ele ter publicado em 1981 que a teoria não
abrange todos os tipos de textos. Embora tenha tentado refazer sua afirmação em
artigo publicado no ano posterior, o autor deixa transparecer em seus textos que a
informação semântica ou locucionária é traduzível sem maiores problemas. Sendo
assim, textos de caráter informativo são fáceis de traduzir e não oferecem atrações para
pesquisas acadêmicas. Por outro lado, os textos literários, por necessitarem de forma e
conteúdo para transmitir mensagens, deveriam receber mais atenção por parte dos
tradutores e pesquisadores.
Essa colocação faz Rodrigues (2000) considerar que Lefevere acredita no
resgate de informações de um determinado texto original se o texto em questão for um
texto informativo, o que implica, portanto, a admissão do conceito de equivalência
defendido por muitas das teorias lingüísticas. Ademais, Rodrigues lembra que o autor
usa expressões como: reproduzir, repetir, imitar e estas não se adequam ao modelo
proposto por sua teoria.
É interessante o tratamento dispensado ao termo “fidelidade” nos trabalhos
de Lefevere & Bassnett (1990). Para os autores, os tradutores conseguem ser fiéis
“quando recuperam aquilo que querem os que subsidiam suas traduções” e ainda que
“a fidelidade é apenas uma estratégia tradutória que pode se inspirar na aplicação de
uma certa ideologia a uma certa poética” (Lefevere & Bassnett, 1990: 08). Sob esse
novo ponto de vista, o tradutor não está obrigado em relação ao texto fonte, porém,
antes de tudo, às exigências de quem contratou os seus serviços.
Tal qual Lefevere (1992b), Toury (1995) define como objeto de estudo a
tradução literária. Neste tipo de tradução, o autor dá prioridade ao pólo receptor da
tradução e busca descrever os passos realizados durante o processo em busca de uma
explicação sistemática da atividade tradutória. Em relação ao processo tradutório, o
autor explica que:
As atividades de tradução deveriam, até certo ponto, ser consideradas como
portadoras de um significado cultural. Conseqüentemente, as traduções
antes de qualquer coisa estariam aptas a representar um ato social, a fim de
satisfazer a função designada por uma comunidade [...] de um modo
apropriado aos seus próprios termos de referência
11
(Toury, 1995:53).
Segundo a concepção de Toury (op.cit.), o sistema receptor não só
influencia o produto final da tradução, como também interfere no próprio processo de
transferência
12
. Por meio dos Estudos Descritivos, o autor tenta compreender como as
traduções se adequam para atender aos objetivos do grupo que receberá a tradução, ou
seja, como os tradutores se comportam para satisfazer às particularidades da cultura na
qual trabalham. Isto porque:
Os tradutores estão, normalmente, inseridos em um determinado ambiente
cultural e são levados a suprir certas necessidades dela, e/ou exercer certas
“funções” nela. Conseqüentemente, é exigido dos tradutores que operem
11
“Translation activities should rather be regarded as having cultural significance. Consequently, ‘translatorship’
amounts first and foremost to being able to play a social role, to fulfil a function allotted by a community (...) in
a way which deemed appropriate in its own terms of reference”.
12
Uma das críticas de Rodrigues a Toury é que seus trabalhos dedicam grande atenção à transferência
relacionada aos estudos de aquisição de uma segunda língua, e que não tratam com clareza a respeito de seu
papel em uma teoria de tradução.
primeiramente e, antes de tudo, para atender aos interesses da cultura na
qual trabalham, embora não concordem com tais interesses
13
(Toury,
1995:12).
Ao entrar em contato com o pólo receptor (a cultura de chegada), os
aspectos culturais freqüentemente trazem problemas aos tradutores. Segundo Toury
(1995:55), os tradutores enfrentam muitas restrições em suas comunidades no que diz
respeito aos processos de tradução em geral. Para o autor, essas restrições podem ser
transformadas em estratégias apropriadas, relacionadas ao que é adequado ou
inadequado em determinadas situações durante o processo de tradução. De acordo com
a teoria dos Estudos Descritivos, a regularidade de tais estratégias em textos traduzidos
permite uma análise que originaria as normas de tradução. Contudo, essas estratégias
só seriam consideradas normas se contassem com um corpus suficientemente grande,
capaz de abranger grande parte de um gênero textual.
Na proposta de Toury (op.cit.), as normas de tradução não são regras, mas
instruções geradas a partir de certos elementos envolvidos na tradução, a saber: o
cliente e suas preferências, o público para o qual se destina a tradução e a cultura de
chegada, entre outros. As normas podem ser mais ou menos rígidas dentro de um
determinado sistema; sua função é estabelecer um comportamento apropriado para o
grupo de tradutores, com o intuito de manter a ordem social.
É pertinente salientar que essas normas não seriam tidas como universais,
pois o caráter dinâmico da língua, do tradutor (enquanto indivíduo social) e da cultura
não permitiria tal atitude. As normas estabelecidas diriam respeito ao tipo de texto
pesquisado, bem como à época e lugar dos textos selecionados. As normas são
instáveis, ou seja, estão em constante mudança devido a sua própria natureza
dinâmica. Algumas normas mudam com maior rapidez, outras, entretanto, levam quase
o período de uma vida para sofrerem qualquer mudança.
Naturalmente, os tradutores não são passivos diante dessas mudanças, como
se fossem meros espectadores. Ao contrário, por meio de seu trabalho, auxiliam na
modelagem do processo da mesma forma que os críticos de tradução, a ideologia
13
“Translators always come into being within a certain cultural environment and are designed to meet certain
needs of, and/or occupy certain ‘slots’ in it. Consequently, translators may be said to operate first and foremost
in the interest of the culture into which they are translating, however they conceive of that interest.”
tradutória (incluindo as tendências acadêmicas geradas pela teoria vigente), as escolas
formadoras de tradutores, bem como a sociedade de um modo geral (Toury, 1995:62).
De acordo com Rodrigues (2000:140), os problemas de Toury começam em
sua definição de tradução, que seria a “capacidade de substituir TFs [textos-fonte] por
Tas [textos-alvo] sob certas condições de invariância”. Para ela, essa definição revela,
em Toury, tendências para o pensamento tradicional de hierarquia entre os textos
envolvidos no processo tradutório e que, portanto, o autor considera a possibilidade de
uma produção literal.
Diferentemente de Rodrigues, concordamos com Toury (1995) ao
considerar que os textos tenham certas marcas estáveis que podem ser transpostas para
outra língua. Se um texto não apresentar um mínimo de marcas estáveis, seria
praticamente impossível a tradução de um texto humorístico, por exemplo. Neste caso,
uma das marcas estáveis seria o humor. Afinal de contas, uma tradução não surge do
nada, ela nasce de um outro texto anterior, o qual serve, no mínimo, de inspiração para
a produção de um texto traduzido.
Não cabe no momento, discutir o quanto de marcas estáveis um texto
carrega em sua estrutura. O comentário foi feito apenas para mostrar que, em estudos
de tradução, não se pode radicalizar e renegar completamente o texto fonte, pois sem
ele não haveria razão para traduzir.
Apesar das críticas feitas aos Estudos Descritivos, parte da fundamentação
teórica e da metodologia desta pesquisa se apóia em seus pressupostos, sobretudo no
tocante à teoria desenvolvida por Toury (1995). Graças a ela, foi possível descrever as
estratégias
14
utilizadas na tradução do corpus escolhido. No entanto, reconhecemos
que, como teoria, os Estudos Descritivos não abrangem todos os aspectos a serem
analisados nesta pesquisa. Por esta razão, nos apoiaremos também na Lingüística
Cognitiva, disciplina a qual recorremos para a fundamentação teórica e metodológica
de parte desta pesquisa. A seguir, mostraremos como os estudos de tradução e
cognitivos podem se relacionar na teoria e na prática.
14
De acordo com a teoria dos Estudos Descritivos de tradução, as normas só podem ser estabelecidas mediante a
análise de um grande número de textos de um mesmo tipo, ou gênero. Assim, devido à limitação do nosso
corpus, de dois filmes apenas, não foi possível nos referirmos às normas de tradução identificadas nas legendas.
Por esse motivo, “estratégia” é o termo utilizado para descrever o produto final da tradução nas legendas dos
filmes escolhidos.
1.1.3 A CATEGORIZAÇÃO E A NOÇÃO DE PROTOTIPICIDADE NOS
ESTUDOS DE TRADUÇÃO
De acordo com Snell-Hornby (1995:26), a categorização é uma capacidade
inata ao ser humano. É a forma utilizada pelo nosso aparato cognitivo para organizar a
grande quantidade de conceitos construídos em nossa mente. Segundo a autora, as
definições e descrições apresentadas anteriormente (sobretudo as noções de fidelidade
e equivalência e o estabelecimento de dicotomias na tradução) baseiam-se em
categorias distintas. As dicotomias, enquanto categorização, aparecem nos trabalhos
desenvolvidos a partir do século XX, com a distinção entre forma e substância
trabalhada por Saussure (apud Snell-Hornby 1995:26) na Lingüística. Essa distinção
saussuriana influencia diretamente tanto a dicotomia da equivalência formal vs.
equivalência dinâmica de Nida (apud Snell-Hornby 1995:26), bem como a dicotomia
de correspondência formal vs. correspondência textual de Catford (Snell-Hornby,
1995:26).
Snell-Hornby (1995:26) acredita que essas dicotomias estão diretamente
relacionadas à teoria de categorização que é parte de nossa cultura ocidental. A
validade dessa teoria se baseia nas ciências cognitivas, sobretudo naquelas
desenvolvidas no campo da psicologia (por Eleanor Rosch) e na lingüística (por
George Lakoff).
Os estudos de Lakoff (2002), que ganharam força a partir da década de 70
15
,
tentam desmistificar a teoria Objetivista de Chomsky (1955, apud Snell-Hornby,
1995:58), um de seus principais defensores, que afirmava ser “a linguagem [..] um
sistema modular independente do resto da cognição”. Este ponto de vista perdurou por
muito tempo e se tornou base de vários trabalhos na filosofia da linguagem de autores
como: Richard Montague, Donald Davidson, David Lewis dentre outros.
O primeiro dos conceitos definidos por Lakoff em Women, Fire and
Dangerous Things é o de efeito prototípico na linguagem. Segundo o autor, os
15
Até então, a visão Objetivista predomina nos estudos sobre linguagem, especialmente no que diz respeito à
interpretação da razão. Esta visão apresenta uma visão baseada no objeto, acreditando que ele determina o
mundo real. Assim sendo, a razão é transcendental e independente do corpo, tudo pode ser entendido e descrito
sem metáfora, pois a razão não tem qualquer relação com a emoção; o pensamento é literal e a linguagem
convencional (Lima em aula expositiva durante o seminário em Lingüística Cognitiva no CMLA, 2005.1).
protótipos “são importantes para a estrutura conceitual porque eles definem
expectativas normais, necessárias a fim de caracterizar o significado de certas
palavras”
16
(Lakoff, 1987:81). Com esta afirmação, Lakoff (op.cit.) mostra que a
linguagem usada diariamente pelos falantes de uma língua é diretamente influenciada
pela cognição e não “um sistema modular independente” dos processos cognitivos
realizados na mente humana, como acreditava Chomsky (apud Snell-Hornby, 1995:
26).
De acordo com Lakoff (1987:81), o protótipo nos auxilia na categorização
do mundo que nos cerca, fazendo-nos compreender a realidade ao nosso redor. Esta
categorização nos permite simplificar a grande variedade de elementos e fatos do dia-
a-dia, pois, do contrário, poderia haver uma sobrecarga mental com a repetição de
informações afins. Caso não houvesse uma categorização, nada do que existe ao nosso
redor faria sentido e, desta forma, não haveria pensamento.
Parafraseando as idéias do mesmo autor, o protótipo é o representante
central de uma categoria X. Para que esse representante se torne central dentro de uma
categoria, é necessário que ele possua todas as características necessárias a um
elemento para pertencer a tal categoria. Os outros elementos que, por ventura, não
possuam alguma ou algumas das características essenciais do protótipo são
considerados periféricos e, portanto, colocados à margem da abrangência da categoria
em questão. Em outras palavras, quanto menos características necessárias os elementos
possuírem, mais periféricos serão.
É importante mencionar que o protótipo de uma categoria é estabelecido
socialmente e, por isso, pode variar de cultura para cultura. As características
necessárias a um elemento para pertencer a tal categoria são definidas de forma
convencional pelos indivíduos de uma cultura específica. No entanto, a imagem
mental de cada protótipo pode ser diferente entre os indivíduos e variar em aspectos
tais como: tamanho, cor, formato e substância em alguns casos. Para melhor ilustrar o
que foi mencionado, tomemos como exemplos os possíveis protótipos de ave
construídos em uma sociedade como a brasileira e a da Antártida, por exemplo. Para
16
“The second way in which stereotypes are important for conceptual structure is that they define normal
expectations. Normal expectations play an important role in cognition, and they are required in order to
characterize the meanings of certain words.” (Esta e todas as traduções sem referência são da autora).
os brasileiros, o representante central da categoria AVE seria um pássaro como um
pardal ou um periquito, ambos animais que voam, têm penas, bico e põem ovos. Um
pingüim, por outro lado, estaria mais afastado do centro por não apresentar
características tais como: voar e ter penas, além de não ser uma ave típica do país.
Dificilmente o pingüim seria o primeiro recurso mental de um falante brasileiro ao
ouvir a palavra “ave”. No entanto, para as pessoas que vivem na Antártida, este
esquema seria exatamente ao contrário: um pingüim seria, possivelmente, a ave mais
prototípica por ser a mais comum da região. Por outro lado, a imagem mental que cada
indivíduo constrói do protótipo pode variar quanto a cor, tamanho, peso etc.
Ainda em relação ao conceito de protótipo, Rosch (1978, apud Lakoff,
1987: 79) afirma que “os efeitos prototípicos são um fenômeno de superfície”
17
. Neste
ponto do seu trabalho, Lakoff limita-se à citação e não esclarece o que seria
“fenômeno de superfície”, entretanto, em Introducción a la lingüística cognitiva, por
Cuenca e Hilferty (1999:36), os autores tratam com maior clareza e detalhe esta
questão. Segundo eles, “para cada categoria construímos uma imagem mental que
pode corresponder de forma mais ou menos exata a algum membro pertencente a uma
categoria”
18
. Tal imagem pode se parecer com mais de um ou nenhum membro da
categoria de forma concreta, ou seja, não é uma imagem fixa nem tão detalhada a
ponto de representar um membro na sua forma real.
A teoria de categorização proposta por Lakoff (op.cit.) centraliza suas idéias
nos aspectos experienciais do ser humano com o mundo a sua volta: a imagem mental,
a memória, as funções sociais, as intenções humanas, tudo existe em função da
interação do indivíduo com o mundo. “A linguagem é parte do mundo”
19
(Snell-
Hornby, 1995:29) – esta noção é de suma importância para esta pesquisa e será
retomada mais adiante – essa declaração representa o ponto de partida da visão que
orientou a teoria de tradução baseada na análise lingüística.
Além da influência da categorização na construção das dicotomias,
discutidas anteriormente, a noção de protótipo é uma ferramenta útil na categorização
17
“Prototype effects are surface phenomena.”
18
“Para cada categoria construímos uma imagem mental, que puede corresponderse de manera más o menos
exacta con algún miembro existente de la categoria, com más de uno o com ninguno en concreto”.
19
“Language is part of the world”.
de textos. Reiss (1971, apud Snell-Hornby, 1995:30) desenvolveu um estudo pioneiro
com o intuito de estabelecer critérios objetivos para avaliar a qualidade das traduções.
A partir das três funções da linguagem (informativa, expressiva e
apelativa
20
), Reiss (op.cit.) estabeleceu as dimensões da linguagem e os tipos de textos
correspondentes. Sua divisão pode ser representada pelo diagrama a seguir
21
:
Quadro 01:
FUNÇÕES DA LINGUAGEM
Função da Representação Expressão Apelo
linguagem
Dimensão da lógica estética dialógica
linguagem
Tipo de texto informativo expressivo operacional
Com base nesse esquema, Reiss (apud Snell-Horny, 1995:31) propõe um
critério para tradução de acordo com a tipologia de texto. Segundo a autora, uma
metáfora em um texto “expressivo”, por exemplo, deve ser traduzida por uma outra
metáfora no TM, no entanto, isso não é necessário se o texto for do tipo “informativo”.
Isso aconteceria porque, no texto expressivo, o mais importante é a forma, ou seja, a
maneira como a informação é transmitida. No texto informativo, por sua vez, o mais
importante é a informação e não a forma como é transmitida, consequentemente, sua
linguagem deve ser a mais direta e literal possível.
A pesquisa de Reiss (op.cit.) foi criticada pelo seu caráter prescritivo que
criava a ilusão de objetividade na tradução das teorias tradicionais. No entanto, foi um
trabalho pioneiro que abordou a teoria da categorização quando os alicerces
defendidos por Lakoff ainda começavam a serem construídos.
Naturalmente, a linguagem, em sua realização concreta no mundo não pode
ser reduzida a um sistema estático de categorias claramente definidas (Snell-Hornby,
1995:31). Por outro lado, a noção de protótipo desenvolvida por Lakoff (1987) e
Rosch (apud Lakoff, 1987) pode ser útil, não na avaliação ou prescrição de traduções,
mas na construção de corpora para análise de estratégias de tradução à luz dos Estudos
20
No original consta: “representation, expression and appeal”.
21
O diagrama apresentado é uma adaptação do que foi mostrado por Reiss pois os termos constantes foram
traduzidos neste trabalho.
Descritivos. Como mencionado anteriormente, a identificação de estratégias, e,
conseqüentemente, o estabelecimento de normas, dá-se a partir da análise de textos de
tipologias semelhantes, que podem ser agrupados com base na categorização de
protótipos trabalhada pela lingüística cognitiva.
Até o momento, discutimos as teorias de tradução e os conceitos de
fidelidade e equivalência trabalhados em cada uma delas. Também vimos que tais
conceitos são categorizações cognitivas influenciadas pelo meio cultural em que se
estabeleceram. A seguir, trataremos da tradução audiovisual e sua relação com os
conceitos discutidos anteriormente.
1.2 A TRADUÇÃO AUDIOVISUAL: TÉCNICAS E ESTRATÉGIAS DE
TRADUÇÃO
A tradução audiovisual (TAV)
22
tem sido freqüentemente utilizada desde
que a produção doméstica de filmes e programas televisivos passou a ser divulgada em
países estrangeiros e disponibilizada para cegos e surdos. Nestes casos, as técnicas de
TAV utilizadas são a dublagem, o voice over, a interpretação simultânea, a legenda
aberta, a legenda fechada
23
, a audiodescrição
24
e a adaptação fílmica.
Segundo Cintas (2005:03), a TAV passou a receber atenção de acadêmicos e
profissionais da área para estudos sistemáticos somente a partir da década de 90. Até
então, a TAV era ignorada como tradução por obedecer a limitações que alteravam o
resultado final do texto traduzido, não sendo, portanto, considerada “tradução
autêntica”. De acordo com o autor, o desenvolvimento tecnológico dos meios
22
De acordo com Cintas (2005:03), a tradução audiovisual tem sido sistematicamente estudada por acadêmicos e
profissionais da área desde a década de 90. Desde então, diferentes nomenclaturas têm sido propostas: tradução
para a tela (screen translation), tradução de multimídia (multimedia translation) e tradução multidimensional
(multidimensional translation). Neste trabalho, no entanto, adotaremos o termo tradução audiovisual por ser o
mais difundido neste campo da tradução.
23
Desde 1997, algumas emissoras brasileiras têm disponibilizado as legendas fechadas (closed captions) em
alguns programas da televisão para surdos e pessoas com dificuldades auditivas. Entretanto, não serão
consideradas para efeito de estudo nesta pesquisa por constituírem um tipo diferente das legendas abertas.
24
Tradução oral de imagens para cegos.
audiovisuais nos últimos anos e a diversificação, cada vez maior, do público espectador
têm contribuído para o crescente interesse pelos estudos nesta área.
Dentre as várias funções assumidas pela TAV nos meios de multimídia,
oferecer a pessoas de diferentes países a oportunidade de assistir a filmes estrangeiros é
uma de suas funções de destaque. Segundo Araújo (2004:161), ambos dublagem e
legendagem são as técnicas de TAV mais comumente utilizadas no Brasil. Enquanto a
primeira é preferencialmente usada em programas abertos da televisão e filmes
destinados ao público infantil, a segunda é mais usada em programas de TV a cabo, no
cinema, DVDs e em grande parte de filmes destinados a vídeo cassete. Por meio da
legenda, o espectador ouve a voz do ator enquanto lê a tradução simultânea escrita na
parte inferior da tela.
Gottlieb (1998:247) distingue lingüisticamente dois tipos de legenda:
legenda intralingual e legenda interlingual. Enquanto o primeiro tem como foco a
língua materna, oferecendo legendas de programas domésticos, filmes para surdos e
pessoas com dificuldade auditiva, o segundo tipo, foco de nosso interesse neste
trabalho, mostra a tradução do texto falado em uma língua para o texto escrito em
outra língua diferente. De acordo com autor (Gottlieb, 1998:247), as “legendas [...] são
transcrições de um filme ou diálogos de TV apresentados simultaneamente na tela”
25
.
Ao tratar a respeito de fala e escrita, Marcuschi (2001) menciona duas
operações distintas: a transcrição e a retextualização. Transcrever a fala seria passar
um texto de sua realização sonora para uma forma gráfica com base em uma série de
procedimentos convencionalizados. As mudanças que por ventura ocorram durante o
processo devem ser de ordem a não interferir na natureza do discurso produzido do
ponto de vista da linguagem e do conteúdo.
Tal procedimento não se aplica às legendas, porque as legendas possuem
uma limitação de tempo e espaço que não permite uma tentativa de transcrição.
Qualquer tentativa nesse intuito ocasionaria um descompasso entre imagens, falas e
legendas no filme. A idéia de transcrição também não se aplica nas legendas
interlinguais, objeto de estudo desta pesquisa, porque elas envolvem a adaptação
25
“Subtitles (...) are transcriptions of a film ou TV dialogues presented simultaneaously on the screen”.
escrita em uma segunda língua, diferente daquela utilizada nos diálogos pelos
personagens.
A retextualização, por outro lado, apresenta interferência maior e mudanças
mais sensíveis, em especial no caso da linguagem. Segundo Marcuschi (op.cit.), a
relação oral-escrito é afetada, levando-se em consideração quatro parâmetros de
análise, a saber: forma e substância; conteúdo e expressão
26
. O que ocorre na
retextualização é, na realidade, uma transcodificação, isto é, uma mudança nos códigos
envolvidos na relação oral-escrito. No nível da substância da expressão, por exemplo,
a correspondência entre letra e som é afetada; no nível da forma da expressão, há a
distinção entre signos falados (fonemas e sua pronúncia) e signos escritos (grafema); já
no nível da forma do conteúdo, a interferência ocorre entre as unidades significantes
orais e suas correspondentes unidades significantes na escrita; e, finalmente, no nível
da substância do conteúdo, a questão pragmática das realizações lingüísticas pode
variar.
Em relação às legendas, acreditamos que esses mesmos parâmetros de
análise, apresentados por Marcuschi (2001), também influenciem a relação oral-escrito
durante o processo de tradução. Isso porque nas legendas há uma interferência na
correspondência entre letra e som, entre signos falados e signos escritos, entre
unidades significantes do oral e do escrito e entre as questões pragmáticas das
realizações lingüísticas da oralidade e da escrita.
Baseando-nos nesses argumentos, discordamos do termo “transcrição”
utilizado por Gottlieb (1998:247), pois acreditamos que tal definição não se aplica às
legendas. Por esta razão, optamos pela definição de Araújo (2000:54). De acordo com
a autora, a legenda é o produto final da “tradução em forma de texto escrito dos
diálogos de um filme ou programa de TV, apresentada simultaneamente com o
original”. Em outras palavras, a legenda é a “transcodificação” de um texto oral para
um texto escrito que aparece concomitantemente com as cenas do filme e
acompanhando as falas dos personagens. Além disso, Rosa (2001:213) lembra que a
legendagem é uma tradução intersemiótica porque transfere para a linguagem escrita
26
Esses parâmetros apresentados por Marcuschi são baseados nos trabalhos da lingüista francesa Rey-Debove,
de 1996.
no TM aquilo que, na maioria dos casos, é envolvido pela comunicação oral: a
mudança do meio – a passagem da fala e dos gestos, ambos visuais e audíveis, para a
escrita; a mudança do canal – do auditivo vocal para o visual; mudança na forma dos
signos – do fônico para o gráfico; e, finalmente, a mudança no código – passa da
linguagem verbal e não-verbal para a linguagem escrita.
Resumindo, do ponto de vista lingüístico, podemos dizer que as legendas
são o resultado de uma retextualização, ou transcodificação, e do ponto de vista
tradutório, as legendas são resultado de um processo intersemiótico.
As legendas da TAV, normalmente, consistem de uma ou duas linhas. A
linha possui, no máximo 35 caracteres e permanece entre 1,5 e 2,5 segundos na tela
(Gottlieb, 1998:247). Esta limitação de tempo e espaço, por vezes, faz com que o
tradutor exclua expressões que julgue “desnecessárias”, a fim de que a legenda
acompanhe o ritmo da fala do ator e das passagens de uma cena à outra. O número de
caracteres e o tempo de permanência das legendas na tela, mencionados por Gottlieb
(op.cit.), podem variar dependendo do laboratório que realiza a tradução. Tais aspectos
também podem variar dependendo do meio audiovisual utilizado para a exibição do
texto traduzido. No caso do DVD, por exemplo, as legendas podem permanecer até 4
segundos na tela e exibir uma legenda de duas linhas com até 64 caracteres.
Além dos aspectos técnicos acima mencionados, os quais proporcionam
mais ou menos tempo e espaço para as traduções, os aspectos culturais de cada país
também influenciam as estratégias de tradução utilizadas nas legendas. Em virtude da
variação cultural entre alguns países, estudos têm sido realizados com o propósito de
identificar as estratégias utilizadas na tradução para as legendas.
1.2.1 A TRADUÇÃO PARA LEGENDAS NA EUROPA
Em relação aos aspectos técnicos no processo de legendagem, existem
diferenças entre sua produção no Brasil e na Europa. Segundo Araújo (2000:57), no
continente europeu, o processo de legendagem é realizado da seguinte forma: primeiro,
é feito o registro de informações a respeito do filme a ser legendado em uma folha de
papel ou disquete. As informações dizem respeito ao título, à data da legendagem, o
distribuidor etc. A seguir, examina-se a fita de vídeo com a qual se realizará o trabalho
de tradução. Logo após, o filme é copiado para a fita examinada já com o time code.
27
Feito isto, passa-se para a marcação do filme, determinando-se o momento em que
cada legenda deve aparecer e desaparecer. Após o processo de tradução, adaptação e
confecção das legendas, o texto é transferido para um disquete ou software onde é feita
a revisão e as correções necessárias. Caso sejam aprovadas pelo cliente, as legendas
estarão prontas para o público por ocasião da exibição do filme.
Os passos mencionados por Araújo (op.cit.) são uma breve explanação do
que acontece no processo de legendagem europeu. Em seu trabalho sobre a
legendagem na Europa, Cintas (2003:75) detalha o processo em dezoito passos entre a
contratação do serviço e a exibição do produto final, portanto, maiores detalhes podem
ser apreciados em sua obra.
Em relação às estratégias de tradução utilizadas nas legendas, não podemos
generalizar, uma vez que cada país possui suas preferências individuais em relação às
legendas. Todavia, para oferecermos uma noção das estratégias utilizadas, apontamos
algumas pesquisas realizadas nesta área.
Plouïdy e Ashour (2005:30) fazem um estudo a respeito das legendas de
filmes americanos na Suíça. Devido ao multilingüismo do país, as legendas são
apresentadas em duas línguas diferentes: a primeira linha mostra a tradução em
alemão, ao passo que a segunda exibe a tradução em francês. Para isto, dois tradutores
realizam a atividade tradutória, e, por esse motivo, um tradutor depende do trabalho do
outro, a fim de que não haja discrepâncias entre um e outro idioma. Segundo as
autoras, como os espectadores dos filmes americanos legendados, geralmente,
conhecem a língua inglesa e utilizam as legendas apenas como um apoio para
compreender as situações e não como uma transcrição completa dos diálogos do filme,
as legendas podem ser mais condensadas e ocupar menos espaço na tela. Quanto ao
tipo de linguagem utilizada, as legendas suíças tendem a refletir o estilo da linguagem
falada no filme. Desta forma, o registro lingüístico utilizado pelos personagens é o
27
Marcação do tempo em que cada legenda deve aparecer e desaparecer.
padrão que orienta os tradutores na decisão de como traduzir palavrões e gírias e
determina o grau de vulgaridade a ser empregado nas legendas.
Nikolić (2005:33) expõe diferença entre os programas legendados na
televisão popular e nos canais privados de TV a cabo exibidos na Croácia. O autor
aproveita sua experiência com legendador (tradutor) e legendista (profissional que
grava as legendas no filme) no país para fazer um estudo a respeito dos tipos de
linguagem utilizados nas legendas croatas. Segundo ele, embora a televisão popular e a
televisão privada pareçam a mesma coisa para o espectador, elas são bastante
diferentes:
A TV popular tem a função de educar, informar, promover a cultura e a
variação de grupos na sociedade. A língua Croata padrão deve ser utilizada
e as variações regionais devem ser evitadas sempre que possível, inclusive
nas legendas. Já os canais privados da televisão [...] não dão muita atenção à
linguagem padrão, pois seu principal objetivo é obter lucro
28
(Nikolić,
2005:34).
Na Croácia, o tradutor que trabalha para os canais pagos não precisa se
preocupar em seguir as regras da linguagem padrão exigida nas legendas da televisão
popular. A “linguagem comum das ruas” pode ser utilizada sem nenhum problema.
Por outro lado, os tradutores contratados pela televisão popular precisam se preocupar
em resolver problemas como: utilizar a língua padrão com toda a delicadeza possível e
substituir palavras e expressões consideradas ofensivas mesmo que o filme exija o uso
de tais expressões. Essa experiência vivida pelos tradutores em canais pagos da TV
croata, leva-nos aos seguintes questionamentos: o registro lingüístico coloquial
utilizado nas legendas poderia, de alguma forma, ser justificado pela informalidade
profissional deste meio? Ou há alguma influência cultural motivando o registro
informal da língua nas legendas? Acreditamos que tal recurso seja resultado da
influência cultural exercida sobre os processos tradutórios naquele país.
Fenômeno semelhante ao da Croácia acontece em Portugal. Rosa
(2001:113) constata que a linguagem formal é o padrão lingüístico utilizado nas
28
“Public television must educate, inform, promote culture and various groups in society. The language used
should be standard Croatian and regional variations should not be used unless necessary, therefore in subtitling
as well. Commercial TV stations (...) do not pay much attention to the standard of the language. The primary
goal of these stations is to make a profit”.
legendas dos programas e filmes portugueses. Os sistemas de televisão, principalmente
dos canais populares, exigem o uso da língua portuguesa gramaticalmente correta e o
corte de marcas regionais e expressões consideradas tabu pela sociedade. Segundo a
autora:
Essa escolha causa alguns problemas, os quais resultam do modo como os
falantes nativos valorizam as características dessas duas modalidades – oral
e escrito – e as características de seus respectivos registros lingüísticos. A
atitude dos falantes nativos organiza as variações de sua língua materna de
tal forma que o centro de maior prestígio é reservado à língua padrão, à
língua formal escrita
29
(Rosa, 2001:215).
Como podemos observar neste caso, a estratégia utilizada na tradução de
legendas é reflexo da preferência dos próprios espectadores, não uma simples
imposição dos contratantes da tradução (fato que ocorre no Brasil, como veremos a
seguir). A autora ainda ressalta que esta preferência pode ser resultado de uma
motivação inconsciente e, portanto, motivada socialmente.
Até este momento, apresentamos e discutimos a respeito da tradução para as
legendas em alguns países da Europa. Por meio das pesquisas mostradas, foi possível
verificar o tipo de linguagem utilizada nas legendas de filmes em cada país e alguns
dos fatores que influenciam tal escolha. No próximo tópico, tratamos do processo de
legendagem no Brasil e os aspectos envolvidos durante a tradução.
1.2.2 A TRADUÇÃO PARA LEGENDAS NO BRASIL
No Brasil, estudos sistemáticos em TAV têm sido realizados por Araújo. A
autora (2004:161) aborda a questão da falta de naturalidade na tradução de clichês,
responsabilizando, em parte, as companhias legendadoras brasileiras que,
normalmente, não disponibilizam ao tradutor o software de legendagem
30
. O tradutor
29
“This choice also poses a few problems rising from the way native speakers value the characteristics of these
two media – speech and writing – and those of their respective registers. The attitudes of native speakers
organise the different varieties of their mother tongue in a centre of prestige mostly occupied by standard, formal
written language.
30
Digo “normalmente” porque em alguns casos, especialmente quando se trata de um tradutor mais conceituado,
a companhia dispensa os outros profissionais e permite que o tradutor trabalhe no software oficial (Araújo, na
faz o seu trabalho em um programa, similar ao oficial, com o mesmo tamanho e tipo
de letra em um formato aproximado ao programa de legendagem. No entanto, a edição
oficial da legenda é feita por um outro profissional não tradutor e, na maioria dos
casos, desconhecedor da língua estrangeira, autorizado a fazer mudanças em qualquer
expressão que por acaso não se adeque às especificações do programa estabelecidas
pelos contratantes da tradução.
Além desses problemas técnicos de legendagem, Araújo (op.cit.) relata que,
ao investigar a tradução de clichês do inglês americano para o português do Brasil em
cinco filmes dublados e legendados, verificou serem mais freqüentemente utilizadas as
seguintes estratégias:
a) a criação de expressões gramaticalmente corretas, as quais não soam
naturais em português; b) a tradução de clichês em expressões que não são
clichês no português do Brasil; c) a suavização de palavras consideradas
palavrões; d) o uso da linguagem formal na legendagem, o que não adequa o
aspecto oral de um filme
31
(Araújo, 2004:166).
Uma questão envolvida nas legendas brasileiras, que acontece de forma
semelhante em Portugal, é que, tratando-se da adaptação da modalidade oral para a
modalidade escrita, a norma culta padrão é requerida nas traduções,
independentemente do tipo de filme. Conforme Araújo (2004:162), isto é imperativo
porque “a legenda é exibida em forma de linguagem escrita, o que faz os profissionais
envolvidos acreditarem que ela deve seguir as mesmas regras da linguagem escrita”
32
.
Entretanto, mesmo que os tradutores não pensassem dessa forma, seria “difícil
convencer distribuidores e companhias legendadoras de que a linguagem usada para a
tradução de um filme é a coloquial”
33
.
disciplina de Tópicos Especiais em Tradução, Lexicologia e/ou Processamento da Linguagem – Tradução
Audiovisual, CMLA, 2006.1)
.
31
“a) the creation of grammatically correct expressions, which do not sound nativelike in Portuguese; b) the
translations of clichés into some expressions that are not clichés in Brazilian Portuguese; c) the minimisation of
taboo words; d) the use of formal language in subtitling, which does not suit the oral aspect of a film dialogue.”
32
“(...) subtitling is exhibited in the form of written language, which makes the professionals involved believe
that it must follow the same rules of written language”.
33
“(...) it is hard to convince distributors and subtitling companies that the language used to translate a film is
usually colloquial”.
Ao utilizar a linguagem formal na tradução para as legendas, os tradutores
estão sendo fiéis segundo a concepção de Lefevere, pois a fidelidade, para o autor,
também se baseia em atender àquilo que querem os que subsidiam suas traduções.
Dessa forma, a tradução pode não ser fiel ao “texto original”, mas o é em relação à
cultura de chegada, ou seja, à cultura brasileira.
Quanto ao processo de legendagem, é interessante observar que as
exigências daqueles que subsidiam as traduções se identificam, até certo ponto, com as
expectativas dos indivíduos que receberão o produto final traduzido. Isto é, os
subsidiários exigem o uso de certos padrões procurando atender às exigências dos
espectadores. A linguagem formal, por exemplo, é usada nas legendas porque os
espectadores esperam que a tradução escrita apresentada seja exibida dessa forma, do
contrário, elas poderiam causar estranheza ao público e, conseqüentemente, uma
rejeição ao produto vendido, o filme.
Ora, se a linguagem formal é uma estratégia exigida pelos contratantes e
esperada pelos espectadores na tradução das legendas, podemos dizer que ela é uma
prática social, comum aos indivíduos da cultura brasileira. Sendo a legenda um texto
escrito, acreditamos que o uso da linguagem formal esteja relacionado a uma crença,
cultivada socialmente, para a língua escrita, ou seja, à crença de que o texto escrito
deva sempre seguir à norma culta da língua.
A crença é um fenômeno aprendido socialmente, compartilhado pelos
sujeitos de um grupo e acionada automaticamente pela mente do sujeito sempre que
este se depara com o objeto central dessa crença. Em relação à linguagem formal, não
é necessário que ninguém fique lembrando o falante dos valores sociais que ela
representa, pois os conceitos, crenças e valores relacionados a esse tipo de linguagem
emergem na mente do indivíduo sempre que ele se encontrar em qualquer situação em
que a linguagem formal seja usada, ou se espere que ela seja utilizada.
Assim, acreditamos em uma possível relação da formalidade da língua e a
escrita com a metáfora conceitual e com os modelos cognitivos idealizados propostos
pela Lingüística Cognitiva, discussão que retomaremos oportunamente. A seguir,
apresentamos a respeito das unidades fraseológicas e dos clichês, expressões
particulares a determinada cultura, que trazem dificuldades aos tradutores brasileiros,
especialmente aqueles usados em situações informais.
1.2.2.2 A tradução de fraseologismos e clichês: a necessidade de adequação cultural
A necessidade de se utilizar a linguagem formal nas legendas aumenta ainda
mais os desafios a serem superados pelo tradutor durante o processo. Isso porque os
filmes norte-americanos comumente apresentam personagens vivendo o dia-a-dia de
pessoas comuns utilizando uma linguagem cotidiana. Este tipo de linguagem é
impregnado do que, neste trabalho, designaremos “fraseologismos” e “clichês”.
Conforme Gurillo (1997:14), os fraseologismos são combinações fixas de
palavras que apresentam um certo grau de rigidez e, eventualmente, idiomaticidade.
Eventualmente, porque os fraseologismos, ou “unidades fraseológicas”, não são
necessariamente idiomáticos, contudo, são obrigatoriamente fixos. Essa rigidez de
estrutura é em demasia forte e essencial aos fraseologismos que são, freqüentemente,
descritos da mesma forma que as palavras, isto é, como unidades do vocabulário com
significados mais abrangentes do que os de seus constituintes básicos. O termo em
questão abrange combinações lingüísticas tais como “modismos, locuções, provérbios,
refrões e fórmulas situacionais”
34
(ou clichês).
Os fraseologismos são unidades complexas e irregulares da língua que não
correspondem aos processos sistemáticos presentes em outras unidades lingüísticas. No
entanto, devido a sua freqüência de uso entre os usuários da língua, tais expressões
devem ser estudadas como um fenômeno lingüístico detentor de suas próprias regras.
Outra particularidade das unidades fraseológicas é que elas poupam o
falante de ter que elaborar improvisações durante a fala. Seus componentes não se
combinam simultaneamente com os diálogos de uma conversa, são, antes de tudo,
estruturas que se encontram previamente estabelecidas na mente do falante. A
combinação dessas expressões tem sua origem na tradição. Elas são aprendidas
culturalmente por meio de repetição e usadas sob condições específicas.
34
“... modismo, locución, frase proverbial, refrán y fórmula pragmática”.
De acordo com Isačenko (1948, apud Gurillo, 1997:57), os fraseologismos
são constituídos de “clichês frásticos” (clichês-phrases) e “clichês de réplica” (clichês-
répliques). Estes pressupõem uma resposta ao interlocutor enquanto aqueles incluem os
provérbios, as gírias, expressões de estilísticas etc.
Considerando parte constituinte das unidades fraseológicas, os clichês são
expressões particulares a um certo idioma ou cultura. Estas expressões são comumente
encontradas na linguagem oral, e podem receber diferentes nomenclaturas: Tagnin
(1989:57-58) denomina-os fórmulas situacionais; Lindenfeld (1993:151) define-os
como rotinas lingüísticas; para Coulmas (1979:239), são fórmulas de rotina (routine
formulae); nos textos de Benda (1981:31), aparecem como expressões estereotipadas
(stereotyped expressions), porém “clichês” é como essas expressões são mais
conhecidas e, portanto, esta será a forma como as denominamos em toda a pesquisa.
Tagnin (2005:76) lembra que clichê é um termo pejorativo, por isso deve ser
evitado quando em referência às fórmulas situacionais, porém, ressalta a importância
destas expressões na comunicação social e a necessidade de se evitar uma atitude
preconceituosa em relação a todo tipo de expressão fixa e consagrada pelo uso. Para a
autora (op.cit.), os clichês são expressões permanentes que envolvem desde formas de
polidez a provérbio, citações e fórmulas de rotina. Contudo, alguns deles estão longe de
seguirem regras gramaticais – alguns exemplos são as expressões em Português “me
deixa em paz” ou “te vejo depois”, e ainda a expressão I ain’t talkin’ to you em inglês.
Araújo (2004:162) menciona que os clichês “são expressões que perderam
seu sentido original e passaram a representar uma função social na comunicação e
interação pessoal”
35
. A autora cita como exemplo o clichê inglês God bless his soul
cujo significado original era pedir a Deus que abençoasse a alma de alguém.
Atualmente, esse significado praticamente desapareceu. Ao usar essa expressão, as
pessoas normalmente se referem a alguém que já morreu. No Brasil, entretanto, a
expressão Que Deus o abençoe ainda mantém o sentido original, quando usada por
pessoas mais velhas e cristãs ao abençoar, em nome de Deus, a vida de uma criança ou
mesmo de um adulto que tenha pedido a benção. Um tradutor menos atento às funções
sociais envolvidas no uso dos clichês, poderia deixar-se levar pela correspondência
35
“Have lost their original meaning, acquiring a function in social interactions and comunication”.
formal aparentemente semelhante entre as duas expressões. Neste caso, o clichê inglês
seria traduzido por uma expressão não clichê em português, uma vez que as duas
expressões apresentam sentidos distintos. O clichê português usado em situações
semelhantes ao clichê God bless his soul seria “Que Deus o tenha”.
Nos exemplos anteriormente citados, o uso de clichês está intimamente
ligado a situações sociais específicas e o seu significado condicionado por aspectos
pragmáticos. A expressão “Tudo azul” em português, por exemplo, é um clichê usado
para dizer que tudo vai bem na vida de alguém, que está muito feliz e sem problemas.
No entanto, o clichê To be blue em inglês é usado para expressar a idéia
completamente diferente da primeira. Ela transmite a idéia de que alguém está
deprimido, triste, “pra baixo”. Nesse caso, deparamo-nos novamente com a aparente
correspondência entre expressões semelhantes, porém portadoras de sentidos
semânticos particulares.
Alguns dos palavrões, por exemplo, podem ser entendidos como clichês de
raiva
36
, pois são proferidos pelos falantes em situações de extrema irritação e
indignação. Por vezes, são utilizados com a intenção de ofender aquele ou aquela a
quem é dirigido, “filho-da-puta”, em outras, dizem respeito à própria situação “que
droga”, ou são usados, simplesmente, como forma de extravasar a raiva “porra”.
Os palavrões são considerados clichês porque, além de serem expressões
próprias de uma cultura, perderam o sentido original para o qual eram usados no
passado. Ao xingar alguém, o falante não está de fato transportado o sentido literal do
palavrão para a pessoa. Sua intenção primeira é ofender a outra pessoa e, também,
extravasar sua raiva e não compará-lo ou compará-la à coisa em si. Por exemplo,
quando um indivíduo A chama B de “filho-da-puta”, não está querendo ofender a mãe
de B, mas ofender B. Assim, quando alguém chama outrem de “cadela” não está
lembrando do animal, feminino de “cachorro”. A real intenção é que a outra pessoa se
sinta ofendida e quem conferiu o palavrão se sinta aliviado(a) em sua raiva.
Da mesma forma que outros tipos de clichê, os clichês de raiva exigem uma
condição pragmática específica para serem usados, ou seja, não podem ser usados por
36
Referimo-nos a alguns dos palavrões como clichês de raiva porque os palavrões também podem ser utilizados
para expressar uma imensa alegria ou satisfação.
qualquer pessoa, nem ditos a qualquer pessoa tampouco em uma situação qualquer. No
capítulo 2, a seguir, mostramos que a sociedade é, normalmente, intolerante quanto ao
uso de clichês de raiva, ou palavrões, no entanto, eles podem ser utilizados, sob certas
circunstâncias, pelos adolescentes. Mostramos também que os palavrões são usados,
normalmente, entre amigos e em situações informais.
Outro exemplo de clichê bastante interessante é mostrado por Coulmas
(1979:253), em que os falantes da língua inglesa tendem a dizer Bless you! sempre que
alguém espirra. Os japoneses, entretanto, tendem a ignorar o espirro e não mencionam
nada a respeito. Sendo assim, o que seria mais apropriado na tradução de um filme
japonês, que apresentasse a situação mencionada para legendas em inglês: apresentar a
expressão Bless you! e fugir à sincronia entre fala e texto escrito, típica das legendas;
ou não exibir expressão alguma e correr o risco de que o espectador obtenha uma
visão equivocada a respeito dos japoneses, fazendo-os parecer um povo rude e mal
educado?
O exemplo apresentado por Coulmas (op.cit.) deixa bastante clara a
influência dos aspectos sócio-culturais nos clichês e ainda refere-se ao fato de que os
falantes nativos de um idioma dominam eficazmente o uso dos clichês. Isto é tão claro
que chegam a usá-los quase que automaticamente, não precisam parar para refletir
sobre seus significados ou para pensar em qual vão usar durante a conversa. A esse
respeito, Coulmas menciona que:
Para todo falante nativo de uma língua as condições de uso das FRs
[Fórmulas de Rotina] parecem ser bastante simples e evidente [...] FRs são
conceitualizadas como estruturas porque são entendidas como parte de
estruturas
37
(Coulmas, 1979:253).
Em outras palavras, o falante sabe exatamente em que situação usar um
clichê. Conhece também a combinação dos fatores para os quais o uso do clichê é
adequado ou inadmissível, ou se é apropriado em uma determinada comunidade.
Todos esses aspectos envolvendo o uso de clichês são acionados inconscientemente
pelo falante devido ao sistema conceitual em sua mente. Esse sistema é resultado das
37
“For every native speaker of a language the conditions of use of its RFs [Routine Formulae] seem quite simple
and obvious...RFs are analyzable in terms of frames because they are understood as parts of frames”.
experiências vividas pelo indivíduo em interação com o ambiente físico e cultural onde
vive.
De acordo com Araújo (2000:20), os clichês se tornam parte da tradição
cultural de um povo porque “englobam as experiências e observações das gerações
passadas, antes vigorosas, engenhosas e originais, mas que depois foram se tornando
velhas e usadas por meio do uso repetitivo”. Por meio desta declaração, é possível
constatar que os clichês são resultado da interação dos falantes com o meio físico e
cultural em que vivem, são convencionalizados via repetição e conceitualizados
cognitivamente, o que permite sua ativação inconsciente durante uma conversa.
Firmados nestes aspectos, é possível relacionar a estrutura e o uso dos
clichês à organização cognitiva existente na mente de cada falante. Em seu estudo
envolvendo a metáfora cognitiva, Lakoff & Turner (apud Lima, 2003:157) afirmam
que várias palavras e expressões idiomáticas dependem da metáfora conceitual para
serem compreendidas durante uma conversa. Isto porque o sistema conceitual humano,
compartilhado pelos membros de uma comunidade lingüística, contém metáforas
conceituais. Essas metáforas são sistemáticas, inconscientes e altamente convencionais
na língua.
A partir do estudo de Lakoff & Turner (apud Lima, 2003), não podemos
afirmar categoricamente que os clichês dependam das metáforas conceituais para sua
manifestação na linguagem ordinária, pois sua pesquisa diz respeito às expressões
idiomáticas e não aos clichês. Além disso, não foi encontrada nenhuma pesquisa que
confirme tal suposição, tampouco, é este o objetivo desta pesquisa. Todavia,
acreditamos que, dadas as suas características, os clichês tenham alguma relação com
o sistema conceitual humano e que sejam motivados por algum aspecto da
categorização humana (tratado no item 1.1.3) ou pressuposto da Lingüística Cognitiva.
Neste capítulo, discutimos algumas das teorias de tradução e os conceitos de
fidelidade e equivalência trabalhados em cada uma. Também abordamos a influência
desses conceitos na tradução audiovisual, particularmente na legendagem. Além disso,
tratamos das estratégias freqüentemente utilizadas na tradução das legendas brasileiras,
especialmente a linguagem formal, e sua motivação sócio-cultural. O uso da
linguagem formal nas legendas causa dificuldades aos tradutores, especialmente,
quando encontram expressões particulares à cultura do texto fonte, fraseologismos e
clichês, que muitas vezes não obedecem à norma padrão da língua. Como exemplo de
expressões que não obedecem à norma culta da língua, apresentamos os clichês de
raiva, ou palavrões, os quais são normalmente rejeitados pelos falantes e considerados
tabu no meio social.
O uso da linguagem formal e de tais expressões parece ser motivado
cognitivamente e influenciado por aspectos sócio-culturais. Em decorrência disto,
trataremos, no capítulo seguinte, da metáfora cognitiva e dos modelos cognitivos
idealizados, ambos pressupostos da Lingüística Cognitiva desenvolvidos por Lakoff &
Johnson (2002). A metáfora cognitiva é responsável pela produção grande parte das
expressões que utilizamos diariamente. Ela também influencia na construção dos
modelos cognitivos, responsáveis pela categorização das crenças valorizadas
socialmente por um grupo de falantes. Acreditamos que o uso da linguagem formal nas
legendas seja resultado da influência desses modelos em relação ao que entendemos
por escrita e linguagem formal e à valorização que dispensamos socialmente a cada
uma.
2. COGNIÇÃO E LINGUAGEM: ASPECTOS TEÓRICOS E
PRÁTICOS
Neste capítulo, apresentamos um breve relato a respeito da metáfora
cognitiva e sua influência na linguagem usada pelos falantes em conversas comuns do
dia-a-dia. Além de apresentar relação direta com a linguagem e a forma como a
compreendemos, a metáfora também atua na categorização de conceitos construídos
socialmente, os modelos cognitivos idealizados. Acreditamos que tais modelos
influenciem as estratégias utilizadas na tradução para legendas: o uso da linguagem
formal e a suavização ou corte dos clichês de raiva, ou palavrões.
Este capítulo está dividido em quatro partes: na primeira, encontra-se
resumida a teoria da metáfora conceitual, ou metáfora cognitiva, desenvolvida por
Lakoff & Johnson; na segunda, resumimos a metáfora estudada por Reddy, a metáfora
do canal, a qual, de acordo com o autor, é responsável pelas expressões usadas pelos
falantes relacionadas à forma como eles entendem a comunicação. Na terceira parte,
tratamos dos modelos cognitivos idealizados e sua influência nas crenças sociais em
relação à linguagem formal e à escrita. Na quarta e última parte, apresentamos uma
proposta de modelos cognitivos idealizados para a linguagem formal, a escrita e os
clichês de raiva, construídos a partir de um experimento realizado com falantes nativos
da língua portuguesa.
2.1 A METÁFORA COGNITIVA E SUA INFLUÊNCIA NA LINGUAGEM DO
DIA-A-DIA
“No princípio era a metáfora, e a metáfora estava na poesia, e a metáfora era
a poesia”. É assim que Lima (2003:155) inicia seu trabalho com o intuito de mostrar
que a metáfora foi tratada, durante séculos, como um elemento do discurso com fins
retóricos ou literários. O estudo da metáfora via Lingüística Cognitiva desfez, ao longo
dos últimos 20 anos, a crença de que a metáfora seria um recurso lingüístico próprio
das poesias e dos textos literários. Essa crença deriva do pensamento de que a poesia é
sentimento e, por isso, procede do coração. Ora, se a poesia tem origem no coração,
ela não pode estar na mente, pois a mente é guarida da razão e, portanto, literal e sem
qualquer relação com o metafórico. De acordo com Lima (op.cit.), a visão
tradicionalista defende uma distinção entre a linguagem poética e a linguagem comum.
Esta seria a linguagem racional, ordinária, de todos, sem qualquer intimidade em
relação à metáfora. A linguagem poética, em contrapartida, ocuparia lugar de
primazia, em relação à anterior, por ser vista como um dom particular, reservado a
poucos, aptos a utilizar a metáfora com total propriedade.
Diferentemente da teoria tradicional, a visão cognitiva mostra que “a
metáfora não é apenas uma figura de linguagem, mas um mapeamento mental
específico que influencia grande parte a maneira como as pessoas pensam, raciocinam
e imaginam na vida diária”
38
(Lakoff & Johnson, apud Gibbs 1997:145). Assim, a
metáfora passou a ocupar um espaço de grande relevância nos estudos lingüísticos da
cognição e a contribuir para pesquisas e discussões na área.
Gibbs (1997) explora as implicações oriundas da afirmativa de que a
metáfora é conceitual. Segundo o autor, os pesquisadores e estudiosos da metáfora
cognitiva afirmam que os mapeamentos metafóricos estão representados na mente dos
falantes de uma determinada língua. A partir disto, o autor passa a discutir a metáfora
e sua relação com o pensamento como teias cognitivas que se estendem além das
mentes dos indivíduos, manifestando-se no mundo cultural.
Para Gibbs (op.cit.), o pensamento metafórico e a linguagem fazem parte do
mundo cultural da mesma forma que fazem parte da mente humana. Ambos são
influenciados e/ou moldados tanto por aspectos internos quanto externos ao ser
humano, ou seja, as experiências corpóreas do indivíduo com o mundo exterior
também contribuem para a constituição da metáfora conceitual e sua manifestação na
linguagem. Quanto a isso, o autor enfatiza que:
38
“Metaphor is not merely a figure of speech, but is a specific mental mapping that influences a good deal of
how people think, reason, and imagine in everyday life”.
Não se pode falar sobre ou estudar cognição sem considerar nossas
interações corporais com o mundo, em que os aspectos físico e cultural são
indissociáveis, porquanto aquilo que percebemos de importante e
significativo no mundo é limitado pelos nossos valores e nossas crenças
culturais (Gibbs, 1997:153).
39
Este pensamento combate a idéia de que as metáforas conceituais existiriam
previamente na mente humana, independentemente da interação do indivíduo com o
mundo exterior. Ao contrário, as experiências vividas no mundo físico junto às crenças
culturais de um grupo ou sociedade estão estreitamente relacionadas à cognição.
Segundo o autor, cognição e cultura são tão inseparáveis quanto mente, corpo e
mundo. Neste caso, cultura e mundo constituem os elementos externos à mente
humana também importantes na emergência da metáfora conceitual.
Para apoiar a idéia de que a metáfora não é uma propriedade pré-existente
na mente humana independente do mundo externo, Gibbs (1997:157) menciona um
estudo feito com crianças asiáticas e americanas. Na Ásia, as crianças aprendem
operações aritméticas utilizando um ábaco como material de apoio. Por ocasião da
pesquisa, solicitou-se às crianças que realizassem operações aritméticas mentalmente.
O pesquisador observou que, durante o desenvolvimento das operações, elas seguiam
os mesmos procedimentos realizados quando utilizavam o ábaco. As crianças
americanas que, por outro lado, aprendem aritmética utilizando lápis e papel,
apresentaram uma performance mental como se calculassem utilizando lápis e papel.
Até mesmo os erros cometidos pelas crianças de ambos os países foram semelhantes
aos perpetrados utilizando seu material de apoio. Com este exemplo, Gibbs tenta
mostrar que a cognição é fortemente influenciada pelo mundo externo.
Além da influência exercida pelo mundo externo na emergência da metáfora
conceitual, Lakoff & Johnson (apud Lima, 2003:159) lembram que os conceitos
também são “resultado da forma como o cérebro e o corpo são estruturados”, ou seja,
grande parte das metáforas conceituais emerge no nosso sistema cognitivo pelo fato de
termos um corpo como o que temos. As metáforas orientacionais – ALEGRIA É
39
“One cannot talk about, or study, cognition apart from our specific embodied interactions with the cultural
world (and this includes the physical world which is not separate from the cultural one in the important sense
that what we see as meaningful in the physical world is highly constrained by our cultural beliefs and values)”.
PARA CIMA, TRISTEZA É PARA BAIXO – por exemplo, são conceitualizadas
devido aos movimentos que fazemos com o nosso corpo, como ficar em pé, deitar para
descansar e dormir etc. Daí existirem manifestações lingüísticas do tipo: “Hoje estou
me sentindo pra cima”, “Estou na fossa” e “Ele está completamente pra baixo” (Lima,
2003:158). Expressões como estas têm sua origem nas experiências sensório-motoras
humanas ou na interação de experiências corpóreas e aspectos culturais valorizados
socialmente.
De acordo com Lima (op.cit.), as metáforas que emergem com base em
experiências diretas (como as experiências sensório-motoras) e relações cognitivas
básicas, “com pouca ou quase nenhuma influência cultural, são chamadas de metáforas
primárias”. Como as metáforas primárias praticamente não sofrem influência cultural
e, partem de experiências universais, deve haver grandes semelhanças em suas
manifestações nas várias línguas. As metáforas primárias podem se unificar sob
circunstâncias de base cultural e metáforas compostas, que por serem motivadas
culturalmente, devem manifestar-se de forma variada nas diversas línguas.
Na conceitualização da metáfora usamos mapeamentos entre domínios
conceituais, ou seja, “levamos de um domínio para outro nossos extensos
conhecimentos sobre o domínio-fonte e todas as inferências que podemos fazer nesse
domínio para o domínio-alvo”(Lima, 2003:160) e representamos esses mapeamentos
metafóricos na estrutura DOMÍNIO-ALVO É DOMÍNIO-FONTE, em caixa alta. Por
exemplo, nas metáforas DIFICULDADES SÃO PESOS, ALEGRIA É PRA CIMA,
TRISTEZA É PRA BAIXO, DESEJAR É TER FOME e ANALISAR É CORTAR, os
termos DIFICULDADES, ALEGRIA, TRISTEZA, DESEJAR e ANALISAR são
domínios-alvo, enquanto PESOS, PRA CIMA, PRA BAIXO, TER FOME e CORTAR
são domínios-fonte. Quanto às características desses domínios, Lima (op.cit.) coloca
que:
Enquanto o domínio-fonte é mais concreto, no sentido de ser uma
experiência mais física, mais consciente, o domínio-alvo é mais abstrato, no
sentido de envolver produtos de operações cognitivas para os quais não
conseguimos formar uma representação direta (Lima, 2003:162).
Em outras palavras, na metáfora DIFICULDADES SÃO PESOS não há
dúvidas de que peso seja um produto com o qual estabelecemos uma experiência
física: não vemos o peso diretamente, mas podemos visualizá-lo por meio de números
em uma balança ou senti-lo ao tentar sustentar determinados objetos. Dificuldade, em
contrapartida, é um elemento abstrato: não podemos vê-la, tocá-la ou senti-la
fisicamente. Por esse motivo, nosso aparato cognitivo transfere para o domínio-alvo
DIFICULDADES todos os nossos conhecimentos e inferências a respeito do domínio-
fonte PESOS. Porque temos esta metáfora conceitualmente, DIFICULDADES SÃO
PESOS, produzimos expressões lingüísticas do tipo: “Não agüento esse trabalho” e
“Essa teoria é muito pesada pra idade dele”.
Contrário à idéia defendida por Gibbs (1997), Lakoff & Johnson (2002) e
Lima (2003), de que o pensamento metafórico e a linguagem fazem parte do mundo
cultural da mesma forma que fazem parte da mente humana, muitos estudiosos da
cognição humana defendem que os modelos culturais, mesmo aqueles para conceitos
abstratos, existem sem intervenção metafórica. Conforme descreve Kövecses
(1997:169), para esses estudiosos, os modelos culturais se constituem a partir da
compreensão de um conceito literal.
A visão da emergência literal para conceitos abstratos é defendida sob duas
perspectivas: a primeira afirma que o conceito abstrato, ou modelo cultural, emerge
como uma nova configuração de conteúdo e estrutura, independente de configurações
de conteúdo e estrutura mais concretos (Kövecses,1997:169). Como exemplo,
Kövecses (op.cit.) menciona conceitos específicos, como empresa, sociedade, governo,
teoria, economia etc. Todos esses conceitos podem ser incluídos nos casos genéricos
de sistemas complexos (ou organizações), pois representam casos nos quais diferentes
partes interagem de forma complexa para constituir um conceito. Assim, expressões
do tipo: o mal da sociedade, o cérebro da companhia, cabeças do Estado, coração da
cultura, construir uma relação sólida, a carreira de alguém está em ruínas ou o
florescimento de uma nação ou civilização (Kövecses,1997:169), são usadas para
expressar lingüisticamente conceitos abstratos incluídos nesses sistemas complexos.
Conforme essa visão, tais expressões sugerem que aplicamos a organizações, ou
sistemas complexos, as seguintes propriedades:
-podem estar em uma condição apropriada ou inapropriada (e.g. mal, deficiência)
-têm uma estrutura (e.g. cabeça, coração, cérebro)
-podem ser criadas (e.g. construir)
-podem ser temporárias (e.g. sólida, em ruínas)
-podem se desenvolver (e.g. florescimento)
Segundo a visão da emergência literal, embora as expressões lingüísticas
mencionadas anteriormente sejam metafóricas, as propriedades são mais literais que
propriamente metafóricas. Para cada uma das propriedades, temos uma série de
conhecimentos extras sobre organizações em geral. Por exemplo, a propriedade podem
se desenvolver possui o seguinte conhecimento extra:
1- Alguém é responsável pelo desenvolvimento de um sistema complexo abstrato.
2- Alguém cria e dá início ao sistema complexo abstrato.
3- O sistema apresenta estágios iniciais de desenvolvimento.
4- O sistema percorre um certo número de estágios.
5- O sistema complexo pode se desenvolver de forma apropriada ou inapropriada.
6- Alguém cuida do sistema complexo para que ele se desenvolva de forma apropriada.
7- O sistema complexo atinge seu ápice no curso de seu desenvolvimento.
8- O sistema complexo produz certos benefícios.
9- O sistema começa a falir e, eventualmente, deixa de existir.
De acordo com Kövecses (1997:170), nessa visão, quanto mais detalhado o
conhecimento extra envolvido, mais literal ele tende a ser. Como resultado, a
linguagem utilizada pelos falantes ao se referirem às organizações também tende a ser
literal. Por esta razão é que falamos em desenvolvimento de companhias, em
desenvolvimento apropriado ou inapropriado de uma sociedade, em ápice e declínio de
uma civilização ou teoria, em benefícios produzidos pela economia, e outros.
A segunda visão da emergência literal apóia a primeira, apondo que os
modelos culturais emergem diretamente de alguma experiência pré-conceitual, ou seja,
a partir de uma experiência básica humana (físico-corpórea ou cultural), porém sem a
intervenção de nenhuma metáfora (Kövecses, 1997). Quinn (apud Kövecses,
1997:171), grande defensora dessa visão, afirma que a metáfora simplesmente reflete
modelos culturais
40
pré-existentes de duas formas: primeiro, os conceitos abstratos
podem ser entendidos de forma literal e, segundo, a cultura consiste da compreensão
literal dos modelos culturais (tanto para conceitos concretos quanto para abstratos).
40
Lakoff e Kövecses (1987, apud Kövecses, 1997) afirmam que as metáforas “constituem” (não apenas
refletem) em grande parte os modelos culturais.
Quinn (op.cit.) desenvolve seu argumento baseando-se no estudo do
casamento enquanto conceito abstrato, o qual envolve conceitos de relacionamento e
emoções humanas. A autora entende o amor (sentimento principal responsável pela
união de duas pessoas) como uma re-definição do sentimento envolvido nas
experiências vividas entre um bebê e sua mãe. Além disso, defende que a essência do
casamento pode ser caracterizada pelas expectativas de ambos os cônjuges, tais como:
a compatibilidade com o(a) companheiro(a), o sucesso do relacionamento e,
conseqüentemente, o proveito de benefícios para ambos e a estabilidade do
relacionamento matrimonial. Tais expectativas podem ser entendidas como literais e,
neste caso, nenhuma metáfora seria necessária para a emergência do conceito abstrato
casamento.
Em contrapartida, Kövecses (1997:173) define a análise de Quinn como
incompleta e problemática, visto não podermos entender a estrutura das expectativas
para o casamento como sendo literal. Para que o “amor” fosse considerado a base
estrutural para o casamento, Quinn deveria mostrar como o conceito de “amor” é
estruturado além de sua estrutura motivacional. Outra questão é: o conceito de “amor”
envolvido no casamento é de fato resultado das experiências infantis básicas? O
conceito de “amor”, neste caso, pode emergir literalmente a partir dessas experiências
básicas? Para Kövecses, as experiências infantis desempenham um papel importante
na emergência deste conceito, contudo, não são suficientes para uma caracterização
detalhada, pois o conceito de “amor” em adultos é bem mais amplo e complexo do que
o conceito em crianças.
Kövecses (op.cit.) defende a idéia de que os modelos culturais para
conceitos abstratos, ao contrário da visão da emergência literal, são constituídos via
metáfora conceitual. A emergência metafórica é apresentada sob dois pontos de vista:
no primeiro, os conceitos abstratos emergem metaforicamente, todavia influenciados
por conceitos concretos (Kövecses, 1997:174); e, no segundo ponto de vista, os
conceitos abstratos emergem metaforicamente influenciados por bases físico-culturais
metafóricas (Kövecses, 1997:181).
Para tratar a questão, o autor retoma o conceito de sistemas complexos (ou
organizações) e sugere que a metáfora SISTEMAS COMPLEXOS ABSTRATOS
SÃO OBJETOS FÍSICOS COMPLEXOS (incluindo O CORPO HUMANO,
EDIFÍCIOS, MÁQUINAS e PLANTAS) seria a responsável pela emergência do
conceito abstrato para sistemas complexos. Tomando a metáfora SISTEMAS
COMPLEXOS SÃO PLANTAS, Kövecses destaca as seguintes propriedades:
- a planta é um sistema complexo
- as partes da planta são as partes dos sistemas complexos
- o crescimento biológico da planta é o desenvolvimento abstrato não biológico dos sistemas
complexos
Para ilustrar lingüisticamente a metáfora citada, o autor recorre ao Cobuild
English Guides 7: Metaphor, um dicionário de metáforas da língua inglesa,
estruturado a partir de dados de uso real compilados no Bank of English, um corpus
eletrônico de linguagem escrita e falada do inglês cotidiano, com as seguintes
sentenças metafóricas: “Please turn to the local branch of the organization
41
e “She
has grown a lot as a scholar lately
42
(Kövecses, 1997:175). Assim, a emergência
metafórica para conceitos abstratos se desenvolve da seguinte maneira: as partes e
propriedades de objetos concretos constituem as propriedades abstratas de objetos
concretos que, finalmente, originam os conceitos abstratos.
Além de serem parte do mundo cultural, os diferentes tipos de pensamentos
metafóricos, ao menos em parte, explicam porque muitas metáforas e expressões
idiomáticas significam o que significam para os falantes de uma determinada cultura
em um determinado espaço de tempo. Tomando como exemplo a metáfora conceitual
A RAIVA É UM FLUIDO AQUECENDO EM UM RECIPIENTE, expressões do
tipo: explodir de raiva, estar cheio de alguém, fazer o sangue ferver, fazem sentido
para os falantes em virtude do contato com líquidos em recipientes, os quais, sob altas
temperaturas ou em grandes quantidades, transbordam do interior do recipiente em que
estão contidos (e.g. panela de pressão, chaleira). Para os falantes, o corpo humano é
considerado um recipiente cheio de fluidos (o sangue, de forma concreta, e os
sentimentos, de maneira abstrata) o qual, sob certas circunstâncias (pressão
psicológica, por exemplo), explode, liberando seu conteúdo.
41
Por favor, volte à filial da organização.
42
Ela cresceu muito como estudante ultimamente.
Os pensamentos discutidos até o momento, tiveram sua origem nos
trabalhos de Lakoff (1987) e Lakoff & Johnson (2002), abordados no capítulo anterior,
sobre a emergência da metáfora conceitual no pensamento humano e sua manifestação
na linguagem. Lakoff e Johnson, por sua vez, basearam-se nos trabalhos de Reddy
(1993) que, por meio de uma análise minuciosa de enunciados lingüísticos, investiga a
forma como conceitualizamos metaforicamente a comunicação.
Nosso trabalho trata exatamente da questão da comunicação, mais
especificamente, do uso da linguagem oral nos filmes e da linguagem escrita nas
legendas. Particularmente, interessamo-nos por algumas expressões específicas – o
palavrão, que igualmente é falado pelos personagens, mas, normalmente, não
aparecem nas legendas. Para entender parte do que tratamos aqui, é necessário
compreender um pouco a força das palavras e como conceitualizamos o processo da
comunicação. Voltamos, assim, aos primórdios da Lingüística Cognitiva, com o
trabalho de Reddy, mostrando sua análise da forma como a sociedade anglófona
expressa este processo.
2.2 A METÁFORA DO CANAL E A EXPRESSÃO DA LINGUAGEM
Em seus estudos, Reddy (1993) parte da seguinte citação de Wiener (apud
Reddy, 1993:164), a qual lhe faz refletir a respeito dos aspectos envolvidos em uma
comunicação: “a sociedade só pode ser compreendida por meio de um estudo das
mensagens e dos facilitadores que fazem parte da comunicação”.
43
Essa passagem diz
respeito aos processos envolvidos em uma comunicação humana, isto é, a como os
interlocutores agem e que tipo de sinais eles usam durante uma conversa, bem como a
quando e onde os interlocutores são bem sucedidos ou fracassam.
Reddy (op.cit.) considera os aspectos comunicativos extremamente
importantes na vida de uma comunidade, de tal forma que chegam a ser relacionados
43
“Society can only be understood through a study of the messages and communications facilities which belong
to it”.
aos problemas sociais, governamentais e culturais de um povo. O autor chega a
afirmar que os problemas de uma comunidade tendem a agravar-se caso existam
muitas falhas ou tipos sistemáticos de falhas na comunicação. Por outro lado, “uma
sociedade de falantes bem sucedidos, não obstante continue a enfrentar conflitos de
interesses, tende a evitar muitos dos problemas destrutivos e partidários”.
44
Destarte,
as dificuldades sócio-culturais poderiam ser, ao menos parcialmente, resolvidas
mediante uma melhor comunicação entre seus indivíduos.
Contudo, Reddy (op.cit.) enfatiza que o objetivo de seu trabalho não é
resolver os problemas envolvidos na comunicação, tampouco melhorá-la. Seu intento
gira em torno do estudo de como os problemas envolvidos na interação entre os
falantes se apresentam na linguagem. Procurando alcançar seu objetivo, Reddy tenta
responder duas perguntas: “Que tipo de histórias as pessoas contam sobre seus atos de
comunicação? Quando esses atos sofrem qualquer desvio, como as pessoas descrevem
‘o que está errado e o que precisa de conserto’?”
45
(Reddy, 1993:165).
Tentando responder essas perguntas, o autor prova que as histórias contadas
pelos ingleses a respeito da comunicação estão, em grande parte, relacionadas às
estruturas semânticas que possuem da linguagem em si. Sua prova parte do princípio
de que os ingleses possuem uma estrutura preferida para conceitualizar a comunicação.
Cada um pode aceitá-la ou rejeitá-la, embora nada, além do senso comum, seja
necessário para melhorar ou criar outra estrutura. Baseando-se nesses princípios,
Reddy acredita que, no simples fato de abrir a boca e falar inglês, o falante pode
envolver-se em um conflito genuinamente sério e que tal conflito exerce um impacto
sensível nos problemas sociais e culturais de sua comunidade.
A partir do pressuposto desse “conflito lingüístico”, Reddy analisa a
linguagem do ponto de vista da “metáfora do canal”
46
. Em primeiro lugar, o autor
44
“A society of near-perfect communicators, though it would no doubt still face conflicts of interest, might well
be able to avoid many of the destructive, divisive effects of theses invitable conflicts”.
45
“What kinds of stories do people tell about their acts of communication? When these acts go astray, how do
they describe “what is wrong and what needs fixing”?”.
46
Em nota introdutória do livro Metáforas da vida cotidiana – tradução brasileira da obra de Lakoff & Johnson,
de 1980, Metaphors we live by, no qual surgiu pela primeira vez a teoria da metáfora conceitual – Zanotto,
Moura, Nardi e Vereza (Lakoff & Johnson, 2002) traduzem e expressão The conduit Metaphor, em inglês, por
metáfora do canal. Contudo, os autores esclarecem que, na tradução de um artigo de Reddy, os autores
Holsbach, Gonçalves, Migliavaca e Garcez (2000) traduziram a mesma expressão por metáfora do conduto.
investiga que tipo de expressões os ingleses usam para falar da comunicação quando
existe falha, e.g.:
1. Try to get your thoughts across better. (Tente passar melhor seus pensamentos.)
47
2. None of Mary’s feelings came through to me with any clarity. (Nenhum dos sentimentos da
Maria me pareceram claros.)
3. You still haven’t given me any idea of what you mean. (Você ainda não me deu nenhuma
idéia do que você quis dizer.)
Com base nestes enunciados, Reddy fez o seguinte questionamento: será que
literalmente “passamos nossos pensamentos” quando falamos? E continua sua análise,
fazendo as seguintes considerações: aparentemente, essa expressão sugere que a
comunicação transfere pensamentos fisicamente de alguma forma. Se refletirmos a
respeito, ninguém recebe os pensamentos de uma outra pessoa diretamente em sua
mente por meio da linguagem. Os sentimentos da Maria, no exemplo 2, só podem ser
percebidos claramente por Maria e por mais ninguém. Não é possível que os
sentimentos de Maria apareçam de fato para qualquer outra pessoa enquanto ela fala,
tampouco, que qualquer pessoa possa nos “dar uma idéia” pois estes são processos que
ocorrem dentro da mente humana sem qualquer manifestação física. Apesar disso, os
exemplos apresentados por Reddy anteriormente envolvem a idéia figurativa de que a
linguagem transfere pensamentos e emoções humanas.
Ora, se a linguagem é capaz de transferir pensamentos e emoções, uma
pessoa que não fala adequadamente não sabe utilizar a linguagem para enviar seus
pensamentos; em contrapartida, um indivíduo que tenha o pleno domínio das palavras
em uma língua sabe, perfeitamente, transmitir seus pensamentos por meio da
linguagem (Reddy, 1993:167). Assim, o que um falante medíocre deve fazer para
conseguir transferir seus pensamentos via linguagem de forma mais eficaz? As
soluções apresentadas pelos ingleses concernentes aos problemas de comunicação
foram as seguintes:
4. Whenever you have a good idea practice capturing it in words. (Sempre que você tiver uma
boa idéia, tente prendê-las em palavras.)
5. You have to put each concept into words very carefully. (Você tem que ter cuidado em
colocar cada conceito em palavras.)
Neste trabalho, adotaremos a primeira tradução por acharmos mais adequada a nossa análise sobre a pesquisa de
Reddy.
47
As traduções dos exemplos são desta autora. Algumas das traduções podem parecer estranhas no português
porque tentamos deixá-las parecidas com a estrutura do inglês, no intuito de levar o leitor a entender as
explicações dadas pelo autor em questão.
6. Try to pack more thoughts into fewer words. (Tente colocar seus pensamentos em menos
palavras.)
7. Insert those ideas elsewhere in the paragraph. (Ensira aquelas idéias em outro lugar no
parágrafo.)
8. Don’t force your meanings into the wrong words. (Não force seus significados nas palavras
erradas.)
Por meio da fala e da escrita, o ser humano é capaz de exteriorizar seus
pensamentos e emoções internos usando signos externos da linguagem (Reddy,
1993:168). Obviamente que, se a linguagem é capaz de transferir pensamentos para
outras pessoas, como vimos anteriormente, o transporte ou recipiente mais apropriado
para esses pensamentos é a palavra, ou grupo de palavras (a saber: a oração, o período,
o parágrafo ou o texto). Com base nos exemplos coletados, Reddy (1993:167) ressalta
que a grande dificuldade do falante pode estar em saber realizar o “processo de
inclusão” apropriadamente. Por exemplo, o falante pode fracassar em colocar a
quantidade correta de significado no recipiente (exemplo 6) ou colocar o significado
correto em locais errados (exemplo 7).
Acompanhando o pensamento de Reddy (op.cit.) em relação à metáfora do
canal, podemos dizer que as palavras são recipientes que possuem um lado interno e
outro externo. Os pensamentos podem ser “inseridos” no espaço que há no “interior”
das palavras, lugar onde reside o significado. Os significados e as idéias, por sua vez,
são entendidos como “conteúdo”.
Estendendo sua análise a um grande número de enunciados utilizados pelos
ingleses para falar da comunicação, Reddy percebeu que tais enunciados podem ser
organizados em quatro grupos constituintes do “arcabouço principal” da metáfora do
canal. Segundo Reddy, os enunciados analisados evidenciam que:
(1) a linguagem funciona como um canal, transferindo pensamentos
corporeamente de uma pessoa para outra; (2) na fala e na escrita, as pessoas
inserem seus pensamentos nas palavras; (3) as palavras realizam a
transferência ao conter pensamentos e sentimentos e conduzi-los às outras
pessoas; (4) ao ouvir e ler, as pessoas extraem das palavras os pensamentos
e os sentimentos novamente (Lakoff & Johnson, 2002:16).
Reddy conclui seu trabalho confirmando que a metáfora do canal é uma
estrutura semântica real e poderosa da língua inglesa, capaz de influenciar os
pensamentos e as atitudes dos falantes daquela comunidade.
É a partir dessas análises de Reddy, portanto, que Lakoff & Johnson (2002)
desenvolvem seus estudos e demonstram que os enunciados analisados por ele são
manifestações lingüísticas de metáforas conceituais (como por exemplo: IDÉIAS OU
SENTIDOS SÃO OBJETOS, PALAVRAS OU EXPRESSÕES LINGÜÍSTICAS
SÃO RECIPIENTES, COMUNICAR É ENVIAR OU TRANSFERIR A POSSE e
COMPREENDER É PEGAR OU VER) ligadas a uma metáfora complexa, a metáfora
do canal.
Como mencionamos anteriormente, as metáforas conceituais fazem parte do
mundo cultural e apresentam forte implicação no significado de muitas das expressões
lingüísticas utilizadas por uma comunidade de falantes. Gibbs (1997:154) lembra que:
Os modelos culturais não são epifenômenos, mas presume-se que prestam
real serviço a indivíduos e comunidades ao definir as crenças, as atitudes e a
linguagem das pessoas a respeito do mundo e de suas próprias experiências
(Gibbs, 1997:154).
48
Ou seja, as metáforas conceituais ainda são responsáveis pela constituição
de uma outra forma de entender o mundo à nossa volta, uma vez que elas estruturam
os modelos culturais, dentre eles os modelos cognitivos idealizados (MCIs) para
conceitos abstratos, responsáveis pela origem de outras formas de entendermos a
linguagem (Gibbs, 1997:146).
Tomemos como exemplo as metáforas conceituais, de Lakoff e Johnson
(2002), identificadas a partir da metáfora do canal e mencionadas anteriormente. A
nosso ver, essas metáforas exercem uma influência direta na forma como entendemos
e tratamos, social e culturalmente, o uso de expressões como os palavrões.
Primeiramente, os palavrões são portadores de uma mensagem particular: o insulto.
Assim, podemos dizer que os palavrões são recipientes que carregam objetos
específicos (os insultos); esta relação existente entre palavrões e insultos é gerada a
partir das metáforas PALAVRAS OU EXPRESSÕES LINGÜÍSTICAS SÃO
RECIPIENTES e IDÉIAS OU SENTIDOS SÃO OBJETOS.
48
“Cultural models are not epiphenomenal, but are presumed to do real work for individuals and collective
communities in shaping what people believe, how they act, and how they speak about the world and their own
experiences”
Em segundo lugar, temos o envio desses objetos (o insulto) a outra pessoa
por meio de um recipiente (o palavrão) e o resultado que isto pode causar em quem o
recebe, ou seja, espera-se que o ouvinte fique de fato ofendido em decorrência do
palavrão que lhe fora dirigido. Se considerarmos o envio do insulto uma forma de
comunicação que, inclusive, pode gerar um feedback por parte do ouvinte: um outro
palavrão ou, até mesmo, uma agressão física, então podemos sugerir a influência da
metáfora COMUNICAR É ENVIAR OU TRANSFERIR POSSE e, uma vez recebido
o pacote, entra em cena a metáfora COMPREENDER É PEGAR. Contudo, esta
relação metafórica envolvendo o uso dos palavrões não se esgota nos pontos
apresentados, antes, envolve aspectos sócio-culturais alicerçados por um ou mais
MCIs.
Os MCIs envolvidos na metáfora COMUNICAR É ENVIAR OU
TRANSFERIR POSSE em relação ao uso dos palavrões, por exemplo, englobam
aspectos, tais como: a quem é permitido o usufruto desses recipientes, a quem os
objetos contidos neles podem ser entregues, em que ocasiões e sob quais
circunstâncias. Na prática, um adolescente poderia usar um palavrão? Como uma
pessoa idosa veria ou entenderia o palavrão dito por um adolescente? Existem locais e
momentos, nos quais os palavrões seriam mais ou menos aceitos?
Além dos palavrões, os MCIs parecem exercer forte influência na forma
como entendemos e valorizamos os tipos de linguagem em relação à fala e à escrita
bem como à informalidade e à formalidade da língua. Da mesma forma que os
palavrões, a fala, a escrita, a linguagem formal e a informal envolvem questões sociais
que determinam como a língua deve ser usada em certas circunstâncias, quem pode
usá-la e os resultados decorrentes de seu uso. Os brasileiros, enquanto falantes nativos
do português e membros de uma cultura específica, também possuem modelos
cognitivos relacionados à fala e à escrita, por exemplo, sujeitos às crenças e aos
valores construídos socialmente; uma dessas crenças diz respeito à visão dicotômica
entre fala e escrita.
Do ponto de vista lingüístico, podemos dizer que vários autores rejeitam a
tradicional dicotomia entre fala e escrita, isto é, o pensamento de que existem
características intrínsecas à fala e outras particulares à escrita. Originalmente, pensava-
se que a fala, por exemplo, era um texto não-planejado, redundante, pouco elaborado e
de linguagem informal, ao passo que a escrita era um texto planejado, condensado,
elaborado e de linguagem formal.
Autores como Kato (1987), Koch (1997), Marcuschi (2001) e Neves (2004)
defendem a idéia de que as diferenças existentes entre fala e escrita se dão dentro de
um conjunto tipológico das práticas sociais de produção textual e não na relação
dicotômica, como se ambas estivessem em dois pólos opostos. Assim, fala e escrita
são diferentes se avaliadas na perspectiva do uso e não do sistema. Conseqüentemente,
poderíamos dizer que existem vários tipos de fala e vários tipos de escrita, os quais
podem, inclusive, compartilhar traços de semelhança.
Vivendo em sociedade, precisamos aprender a utilizar apropriadamente
esses diferentes tipos de linguagem em situações específicas. Vanoye (2003:23), por
exemplo, admite diferentes linguagens a partir da língua falada: a linguagem comum, a
linguagem cuidada (ou tensa), a linguagem oratória, a linguagem familiar e a
linguagem informal (ou popular). Além da língua falada também existe a escrita e,
para cada uma dessas variações da linguagem, é mister, por parte do falante um
conhecimento específico que inclua particularidades como: o momento e a ocasião
próprios para seu uso, o tipo de pessoas com quem se pode ou deve falar daquela
maneira, as estruturas e padrões gramaticais adequados etc.
Observe-se, então, que segundo o parecer lingüístico, “os estudos sobre
norma também se baseiam na assunção de que existem duas direções de investigação:
‘a norma em relação à própria língua’ e ‘a norma em relação à sociedade’”(Neves,
2004:59). Nessas duas linhas de investigação, a questão da norma é entendida de
formas diferentes: a norma em relação à língua é a regularidade de uso da linguagem
em um determinado grupo social; a norma em relação à sociedade é o “bom uso” da
linguagem segundo os parâmetros do padrão culto da língua, o qual é, normalmente,
associado à escrita.
Neves (op.cit.) chama a atenção para o fato de que o desconhecimento
desses aspectos mascara as diferentes visões relacionadas à norma e “o que vemos é,
por exemplo, tratada como lingüística a noção do erro”, em outras palavras, o erro é
visto exclusivamente como um fenômeno de desvio lingüístico. No entanto, essa
noção é diretamente social e não encontra guarida no interior do processamento
lingüístico. A noção de erro na sociedade é um pensamento tradicional e, conforme
Neves:
O que é mais interessante, na própria visão do povo, que, como percebemos
claramente nos dias de hoje, fala como pode, mas considera e aceita que não
fala como deve, quando não tem o padrão autorizado (Neves, 2004:48).
Como podemos notar, o pensamento do “falar correto” e do “falar errado” é
uma crença cultivada na sociedade, na qual os falantes reconhecem que existe um ideal
a ser atingido: a forma padrão. A partir do momento em que o indivíduo acredita que
fala como pode, porém não como se deve, ele adota a idéia de que fala errado porque
está fora do que é exigido em termos de comunicação. Trata-se, portanto, de
aceitabilidade social e não de qualidades lingüísticas.
Esse pensamento é uma ideologia cultivada socialmente, pois o erro não é
absoluto, contudo é um desvio referente ao meio ou ao grupo social que dita as normas
a serem seguidas. De acordo com Aléong (2001:155), “o erro é essencialmente um uso
que, num dado momento, vem se opor a um outro uso até então dominante”.
Esse uso dominante a que o autor se refere parte de falantes investidos de
autoridade e de prestígio em matéria de linguagem que, mesmo sem intenção,
prescrevem “o certo” e “o errado” em gramáticas, dicionários e obras afins. Além
disso, o uso dominante é difundido e imposto constantemente em locais estratégicos
como a escola, a imprensa escrita e audiovisual e a administração pública, incluindo os
tribunais (Aléong, 2001:164). Bagno (2001:21) vai ainda mais longe em sua ousadia e
afirma que:
Numa promoção nitidamente ideológica, o Estado é promovido à categoria
de superfalante, que elimina a retroação da conversação, o feedback, mas
que condiciona as produções lingüísticas de todos os cidadãos pela
onipresença do aparato administrativo que impõe um modelo lingüístico
protocolar, radicalmente distinto do modelo vernacular (Bagno, 2001:21).
O interessante em relação à noção do erro, enquanto aspecto lingüístico que
se submete a questões sociais, é que não cabe aos lingüistas combater a existência de
pressão social sobre os usos lingüísticos, pois a língua é um dos instrumentos
essenciais nas relações da sociedade. Talvez por essa razão, muitos lingüistas prefiram
abster-se do estudo das idéias difundidas na sociedade em torno das noções de
correção lingüística e dediquem-se com muito mais afinco às tarefas descritivas
(Bagno, op.cit) dos fatos lingüísticos, sem levar em consideração as causas.
Em seus estudos sobre a linguagem, Neves (2000, 2001, 2004 e artigo no
prelo) tem dedicado grande atenção à questão dicotômica entre língua falada X língua
escrita, além de relacionar o assunto ao ensino da língua portuguesa no Brasil.
Segundo a autora, o uso da língua escrita é normalmente relacionado à formalidade
padrão da língua, criando a impressão de que a comunicação é genuinamente efetiva
apenas quando baseada na norma padrão da língua:
Obviamente o bom uso se fixou na modalidade escrita, entendendo-se a
linguagem falada como território que, por menor, podia abrigar todas as
tolerâncias e “transgressões”, como se a língua falada não tivesse norma,
quase como se não tivesse gramática (Neves, 2004:44).
O bom uso, mencionado pela autora, é o uso da linguagem regrada, como
modalidade “sabida” por alguns, mas não por outros. A partir do momento em que o
bom uso é dominado por uns e desconhecido por outros, a sociedade passa a apontar
para a discriminação, criando-se exclusões e estigmas.
Até a década de 70, acreditava-se que esta forma de pensar era fruto das
normas prescritivas elaboradas pelos gramáticos estudiosos da língua, os quais
acreditavam que as formas lingüísticas utilizadas pelos grandes escritores, autores de
amplo prestígio na sociedade, deveriam reger as normas do “bem dizer” no padrão
culto e, portanto, “correto” da sociedade. A partir dos estudos sociolingüísticos
mencionados por Neves (Labov, 1972; Cedergren e Sankoff, 1974 e 1988; e Naro,
1981), a crença de que “a língua baseada em regras gramaticais é a correta por ser uma
linguagem neutra, um modelo ideal que paira acima de toda diversidade e qualquer
outra forma de manifestação lingüística é errada” (Neves, 2001:322) começa a mudar.
Em Gramática e gramáticas, Neves (no prelo) lembra que “não é
exatamente pelos gramáticos que a valorização da boa linguagem é, hoje, mantida [...]
entre nós. É o povo que tem fascínio pela boa linguagem, sempre que um pouco de
contato com padrões cultos lhe tenha sido permitido”. Além disso, as gramáticas
normativas “não se fazem, hoje, como peças de uma luta de preservação de padrões
ameaçados. Pelo contrário, elas respondem ao que a sociedade reclama, e até
respondem insuficientemente: o povo queria mais e mais lições de norma de
prestígio”. Isso acontece porque, segundo a autora, o falante comum tem verdadeiro
fascínio pela força e pelo poder sociais concedidos pela variação formal da língua e “é
o acesso à linguagem prestigiada que permite o domínio de papéis na sociedade, já que
entre eles está o de ‘dominação política’” (Camacho, apud Neves, 2001:233).
O mesmo pensamento que enfatiza o caráter elitista e aristocrático da
norma-padrão também é compartilhado por Aléong (2001). O autor menciona em seu
texto que o domínio dos padrões cultos da língua é uma fonte de prestígio na
sociedade, principalmente, pelo fato de serem inacessíveis à maioria dos falantes.
Desta forma, a norma-padrão é “o código lingüístico em que o prestígio é um trunfo
importante” (Aléong, 2001:173).
Em A gramática na escola, Neves (1990:10) relata os resultados de uma
pesquisa realizada entre professores de língua portuguesa no ensino fundamental de
escolas públicas em São Paulo e mostra que é predominante, entre os professores, a
idéia de que o acesso à forma padrão da língua oferece aos alunos maiores chances de
ingresso na universidade e sucesso na carreira profissional. A linguagem formal
oferece possibilidades de um prestígio social a que, dificilmente, os alunos teriam
acesso sem o conhecimento da norma padrão culta da língua. De acordo com a autora:
Foi à escola, como espaço institucional privilegiado de parametrização
social, que tradicionalmente se confiou o papel de guardiã da norma regrada
e valorizada, daquele bom uso que tem o poder de qualificar o usuário para
a obtenção de passaportes sociais, e, portanto, para o trânsito ascendente
nos diversos estratos (Neves, 2004:44).
Esse mesmo pensamento também se estende aos pais dos alunos, os quais
“mandam seus filhos buscar na escola a chave do acesso a padrões lingüísticos
socialmente valorizados”. Visto que os pais não esperam que a escola ensine seus
filhos a falar (habilidade que já possuem antes de entrar na escola), mas a escrever, a
linguagem formal fica quase que restrita à língua escrita. Como conseqüência,
podemos afirmar que língua falada e língua escrita possuem diferentes valores sociais
em que a escrita constitui “o portal de entrada da modalidade-padrão e território
legítimo e exclusivo de estruturas formais” (Neves, 2001:330).
Baseando-nos no exposto até o momento, podemos perceber que a estreita
relação entre língua escrita e linguagem formal não é uma questão de escolha pessoal
do indivíduo. Pelo contrário, ela é resultado da visão sócio-cultural da língua por parte
de seus usuários que compartilham crenças e pensamentos a respeito da língua. Neves
(2000) admite que, em uma comunidade lingüística, a “existência natural” de uma
norma de prestígio pode e deve ser buscada a fim de que seja alcançado o sucesso nas
relações sociais. Essa “existência natural”, aliada às questões sócio-culturais da
linguagem, permite-nos pensar em aspectos cognitivos de um povo relacionados à
linguagem. Isso é possível por duas razões: primeiro, porque a “existência natural”
pressupõe a não imposição desta norma de prestígio, caso contrário, os indivíduos não
a receberiam como natural. Entenda-se imposição pelo uso da força porque, no caso da
norma lingüística, a imposição se dá de forma dissimulada. Segundo, porque os
aspectos sociais e culturais abrangem, ao menos, grande parte dos indivíduos da
sociedade garantindo uma convencionalidade à norma de prestígio adotada e, neste
caso, a linguagem formal escrita.
De acordo com Marcuschi (2001), é necessário construir um modelo para
analisar o grau de consciência dos usuários da língua a respeito das diferenças entre
fala e escrita. Assim, a seguir, trataremos dos MCIs enquanto teoria da Lingüística
Cognitiva e apresentaremos nossa proposta de modelos para fala, escrita, linguagem
informal e formal, construídos com base em uma pesquisa realizada com falantes
nativos do português do Brasil.
2.3 OS MODELOS COGNITIVOS IDEALIZADOS E SUA RELAÇÃO COM A
LINGUAGEM FORMAL ESCRITA NA SOCIEDADE
De acordo com Feltes (2007:53), a teoria dos MCIs, desenvolvida por
Lakoff (1987), são sinônimos de modelos culturais. A autora apresenta uma definição
para os modelos em tela baseada nos estudos de McCauley (1987, apud, Feltes,
2007:54), segundo o qual MCIs são estruturas mentais simples, responsáveis pela
organização dos conceitos construídos a partir das experiências que temos, enquanto
seres humanos, com o mundo ao nosso redor. Essas estruturas são simplificadas
porque, dentre a grande variedade de aspectos envolvidos nessa relação mundo-ser
humano, elas selecionam apenas aqueles significativos social ou culturalmente.
Em outras palavras, os MCIs são resultados da capacidade de categorização
humana, com o objetivo de facilitar o armazenamento de informações cognitivas em
nossas mentes. Os MCIs categorizam, ou seja, selecionam os traços mais marcantes
para a construção de conceitos, sobretudo aqueles construídos socialmente.
Para Fauconnier (apud Lakoff, 1987:125), os MCIs são cognitivos porque
“são caracterizados em relação a aspectos experienciais da psicologia humana”
49
e
“idealizados porque não necessariamente representam o mundo ‘corretamente’”.
50
Isto
significa, como coloca Lakoff (1987:126), que os MCIs são idealizados porque
proporcionam um modo convencionalizado de compreender nossas experiências de
uma forma mais simples, por esta razão, não contêm informações completas nem são
precisos, mas , ao contrário, contêm apenas as informações significativas e recorrentes
a respeito do que foi categorizado.
Devido à sua extrema simplificação, é difícil identificá-los com clareza na
sociedade, de acordo com Feltes (2007:56), é preciso um estudo cuidadoso para
abstrair tais modelos. Em outras palavras, os MCIs existem na mente dos falantes,
influenciam sua forma de pensar e comportar-se em grupo, no entanto, não são
conscientemente percebidos por esses mesmos falantes. Esses modelos são abstratos e,
49
“They are characterized relative to experiential aspects of human psychology”.
50
“They do not necessarily fit the external world ‘correctly’”.
portanto, precisam ser identificados e construídos por meio de estratégias específicas
como, por exemplo, uma pesquisa feita com os indivíduos influenciados por esses
mesmos modelos cognitivos.
Segundo Feltes (op.cit.), o aspecto idealizado dos MCIs se justifica sob dois
aspectos: primeiro, porque eles são resultado da interação entre o nosso sistema
cognitivo e o mundo cultural que nos cerca. Dessa forma, os aspectos contidos em um
determinado MCI são determinados pelas crenças, valores, propósitos e necessidades
do grupo em que ele se desenvolve. O modelo cognitivo para fala e escrita na
sociedade brasileira, por exemplo, é resultado dos interesses e dos valores ditados por
aqueles que têm o poder de ditar a norma. Em segundo lugar, os MCIs podem não ser
iguais ou até contradizerem-se, ainda que façam referência a uma mesma situação.
Como os MCIs são decorrentes de uma interação entre a categorização
humana e os aspectos culturais de uma determinada sociedade, eles são aprendidos e
estabelecidos na mente humana a partir de conhecimentos partilhados, frutos de
esquematizações coletivas, não de estruturas individuais e internas. Parafraseando
Feltes (2007:54), detalhes particulares, relativos ao que é percebido como aspectos
importantes de normas ou formas culturais, são agregados durante a construção dos
esquemas cognitivos de cada indivíduo. Isso quer dizer que esses esquemas não são
internalizados de forma fixa, mas construídos e reconstruídos dependendo das
situações ou circunstâncias nas quais os indivíduos se apresentem. Por essa razão, os
MCIs não são únicos ao representar um determinado modelo; podem variar entre
grupos sociais e, até mesmo, serem conflitantes no que diz respeito ao entendimento
de uma mesma situação. Pelo fato de serem originados socialmente, os MCIs estão
ligados a padrões de interação e comunicação.
Como exemplo de um MCI, Lakoff cita o conceito de terça-feira. Esta
palavra apenas faz sentido se relacionada ao modelo idealizado de uma sociedade em
que o tempo está organizado em dias que iniciam e terminam em função do
movimento do sol, formando um calendário cíclico de sete dias (a semana). Por sua
vez, neste modelo cognitivo, a semana é o todo de sete partes organizadas em uma
seqüência linear, em que cada parte é chamada dia, e o terceiro dia é a terça-feira. Da
mesma forma, o conceito final de semana requer a noção de dias úteis (os cinco dias
de trabalho) seguidos pelo intervalo de dois dias de folga semanais, também ordenados
em função de um calendário organizado em semanas de sete dias.
Note-se que esse conceito de semana é idealizado, pois a semana de sete
dias não existe concretamente na natureza. Ela é criada pelos indivíduos das culturas
que se organizam em função do mesmo tipo de semana.
Além dos pontos discutidos ao momento, Lakoff (1987) também
relaciona aos MCIs o efeito prototípico de categorização (Lakoff, 1987 – maiores
detalhes ver capítulo 1). Para o estabelecimento de um protótipo, o indivíduo “elege”
cognitivamente um elemento mais representativo em uma determinada categoria, isto
é, aquele que possua o maior número de características relativas àquela categoria. Um
exemplo clássico de um MCI gerado a partir de um protótipo, construído por Fillmore
(apud Lakoff, 1987:70), é a categoria definida pela palavra inglesa bachelor, a qual
traduziremos por “solteirão”.
A palavra “solteirão” é definida considerando-se um MCI de uma sociedade
matrimonial, normalmente monogâmica, em que existe uma idade típica para os
jovens se casarem. Por conseguinte, “solteirão” seria o adulto do sexo masculino que
não é casado. Note-se que o MCI para “solteirão” não menciona nada a respeito de
padres, papas, homossexuais, os quais, embora sejam adultos do sexo masculino e não
casados, certamente não fazem parte da categoria dos “solteirões”. Ou seja, o MCI em
questão não representa o mundo de maneira precisa, mesmo assim os indivíduos que
compartilham este conceito são capazes de distinguir os casos que fazem ou não parte
da categoria. Seria bastante improvável que um indivíduo nativo de tal cultura se
referisse a um padre ou homossexual como “solteirão”.
Outro aspecto tratado por Lakoff (1987:74) em relação aos MCIs, é o que
ele chama de Cluster Models. Segundo o autor, os Cluster Models seriam formados
por vários MCIs, os quais combinados entre si, formam uma estrutura que,
psicologicamente, é mais facilmente entendida se analisada no todo, ou seja, sua
estrutura geral é mais básica do que cada um dos MCIs que formam os Cluster
Models. Lakoff cita como exemplo o conceito cognitivo idealizado para a palavra
“mãe”. As diferentes estruturas familiares existentes na sociedade do século corrente
tornam difícil a elaboração de uma definição que englobe as características gerais do
que seja uma mãe: existe a mãe adotiva, a mãe genética, a mãe de aluguel (barriga de
aluguel), a madrasta etc. Consequentemente, cada um desses tipos de mães gera um
MCI diferente: a mãe adotiva, por exemplo, é aquela que cuida, cria e educa o filho,
mas que não compartilha de nenhum traço genético com o filho; por outro lado, a mãe
genética pode ter gerado, compartilhado genes e dado à luz um filho, mas não ser a
pessoa que cuida, protege e sustenta a criança. Mesmo que cada um destes conceitos
pareça divergir do outro, existe um conceito mais forte, mais importante para o
indivíduo, que da relação vivenciada com a mãe quando criança.
Dentro do Cluster Model de “mãe” há um sub-modelo que poderíamos
chamar de estereótipo da “dona-de-casa”. Este estereótipo é um segmento do MCI de
“mãe”, no entanto, socialmente, o conceito de “dona-de-casa” representa toda a classe
do que seria considerada uma boa mãe. Em outras palavras, uma boa mãe seria aquela
que não trabalha fora de casa, que dispensa tempo na criação dos filhos e está sempre
em casa acompanhando seu crescimento. Este estereótipo se opõe ao estereótipo de
“mãe trabalhadora” que, socialmente, seria considerada menos prototípica que a
primeira. A “mãe trabalhadora” embora ainda possa ser considerada mãe, não
representa o todo que poderíamos chamar de “mãe ideal” porque trabalha fora de casa
e deixa seus filhos aos cuidados de outra pessoa que não é a mãe das crianças.
Como podemos observar, ainda que variem de pessoa para pessoa, os
modelos discutidos anteriormente são construídos socialmente e, por isso, apresentam
certa generalidade que se estende a toda a sociedade por meio da cultura vigente. Os
MCIs podem não corresponder à realidade, contudo representam as crenças, os valores
e as normas convencionais. Eles podem variar entre os diferentes grupos sociais ou
modificarem-se de acordo com as situações. Considerando todos estes aspectos, não
seria incoerente pensar que o nosso comportamento quanto à linguagem pode ser
influenciado pelos MCIs.
É possível que os MCIs para fala e escrita, que apresentamos a seguir, sejam
organizados cognitivamente em formato de Cluster Model, pois, além dos aspectos e
valores intrínsecos a cada um (como, a fala ser improvisada e suscetível a erros, ao
passo que, a escrita é planejada e correta segundo os padrões da norma culta padrão),
outros modelos se unem aos primeiros: o modelos de linguagem informal e linguagem
formal, normalmente, ligam-se aos modelos de fala e escrita, respectivamente.
2.4 EXPERIMENTO I: A CONSTRUÇÃO DE UM MCI PARA FALA E
ESCRITA NA SOCIEDADE BRASILEIRA
Em uma investigação em textos científicos sobre linguagem, foi-nos
possível identificar várias crenças e diversos valores atribuídos à fala e à escrita, à
formalidade e à informalidade da língua enquanto elementos dicotômicos. Muitas
dessas crenças e valores, por vezes, coincidiam em textos de diferentes autores,
contudo, não era possível afirmar que tais características ou funções atribuídas à
fala/escrita ou à linguagem formal/informal pudessem, de fato, constituir o que
tratamos anteriormente por MCIs. Isso se deve ao fato de nenhum dos autores em
questão ter apresentado dados que pudessem estender tais crenças a um modelo
construído socialmente. Por esta razão, era possível que as características conferidas à
linguagem escrita ou falada, por exemplo, fossem fruto de uma observação individual
ou restrita a um pequeno grupo, os lingüistas.
Destarte, fez-se necessário seguir o conselho de Marcuschi (2001): construir
um modelo para analisar o grau de consciência dos usuários da língua a respeito das
diferenças entre fala e escrita. Com este objetivo, fizemos um levantamento das
características relacionadas à fala e escrita e à linguagem formal e informal, apontadas
nos textos lidos durante o levantamento bibliográfico. Em seguida, elaboramos um
questionário a fim de verificar se tais características se confirmariam ou não na mente
das pessoas. Finalmente, baseados nos dados revelados, apresentamos nossa proposta
de MCI para cada um dos tipos de linguagem, objetos de estudo nesta pesquisa, a
saber: fala, escrita, linguagem formal, linguagem informal e palavrões.
Os instrumentos utilizados na metodologia aplicada para a realização deste
experimento foram: o levantamento das crenças e dos valores atribuídos à fala/escrita e
à linguagem informal/formal e um questionário aplicado a um grupo de falantes
nativos do português, com o objetivo de verificar se tais crenças se confirmariam para
a elaboração dos MCIs. Para o levantamento das crenças e dos valores relacionados à
linguagem, consultamos textos científicos de autores da área, como Neves (2004),
Aléong (2001), Bagno (2001), Haugen (2001), Marcuschi (2001) e Padley (2001).
Os aspectos inerentes à fala e à escrita, apontados pelos autores, estão
representados no quadro a seguir. Procuramos apresentar as características de forma
clara e objetiva, como também fornecer a fonte de cada aspecto identificado. Alguns
pontos sem referência, apontados no quadro, foram acrescentados por esta autora a fim
de confrontar as características para as quais não foram encontradas as respectivas
dicotomias. O Quadro 02, para fala e escrita, ficou organizado da seguinte maneira:
Quadro 02:
ASPECTOS INERENTES À FALA E À ESCRITA DESCRITOS NA LITERATURA
FALA ESCRITA
Língua informal (Haugen, 2001:101)
Língua que abriga todas as tolerâncias e
“transgressões” (Neves, 2004:44)
Língua pouco guarnecia de regras ou não-
normatizada (Marcuschi, 2001:27)
Língua sujeita a mudanças e corrupções
Língua mais expressiva (Padley, 2001:77)
Não-planejada, natural, espontânea, não-
monitorada (Marcuschi, 2001:27)
Língua heterogênea, com marcas de grupos
sociais
Aprendida em casa por meio da repetição,
antes de ler ou escrever (Haugen, 2001:108)
Dominada pela grande maioria dos usuários
da língua
Contextualizada (Marcuschi, 2001:27)
Implícita (Marcuschi, 2001:27)
Redundante (Marcuschi, 2001:27)
Fragmentária (Marcuschi, 2001:27)
Identificação com a norma culta, linguagem
formal (Bagno, 2001:09)
A língua certa, pura, refinada (Bagno,
2001:09, Padley, 2001:58)
A língua baseada nas normas gramaticais
(Padley, 2001:57)
É permanente, preserva o uso de ser
corrompido (Haugen, 2001:108, Padley,
2001:58)
Língua menos expressiva (Padley, 2001:77)
Exige o uso refletido, monitorado, planejado
da língua (Aléong, 2001:153)
Língua homogênea, neutra (Aléong,
2001:166; Neves, 2001:322)
É aprendida na escola (Aléong, 2001:167;
Corbeil, 2001:186; Neves, 2004:44)
Utilizada por um menor número de
indivíduos (Neves, 2004:43; Aléong,
2001:168)
Descontextualizada(Marcuschi, 2001:27)
Explícita (Marcuschi, 2001:27)
Condensada (Marcuschi, 2001:27)
Completa (Marcuschi, 2001:27)
Em relação ao grau de formalismo da língua, podemos destacar os seguintes
aspectos conforme o Quadro (03) a seguir:
Quadro 03:
ASPECTOS INERENTES À LINGUAGEM INFORMAL/FORMAL DESCRITOS NA
LITERATURA
LINGUA INFORMAL LINGUA FORMAL
Identificação com a fala
Mais difundida e freqüente entre os usuários
da língua
Língua heterogênea, com marcas de grupos
sociais
Língua pouco guarnecia de regras
Língua pobre
Língua da classe baixa ou rural (Haugen,
2001:101), língua da massa, do povo.
Não tem qualquer relação com o prestígio
social
Língua “vulgar”
Usos oficiais, na imprensa escrita e
audiovisual, no sistema de ensino e na
administração pública (Bagno, 2001:10)
Não-planejada, natural, espontânea, não-
monitorada (Marcuschi, 2001:27)
Identificação com a escrita (Neves, 2004)
Utilizada por um menor número de
indivíduos (Neves, 2004:43; Aléong,
2001:168)
Língua homogênea, neutra (Aléong,
2001:166; Neves, 2001:322)
A língua baseada nas normas gramaticais
(Padley, 2001:57)
Língua ideal (Britto, 1997:56 apud Bagno,
2001:09)
A fala dos socialmente dos segmentos
socialmente favorecidos (Britto, 1997:56
apud Bagno, 2001:10, Aléong, 2001:145)
Língua que oferece prestígio social (Haugen,
2001:112)
Língua-padrão (Haugen, 2001:107)
Usos cotidianos, na família, entre amigos
Exige o uso refletido, monitorado, planejado
da língua (Aléong, 2001:153)
É importante mencionar que, embora essas crenças, esses valores e essas
funções para fala/escrita e linguagem formal/informal tenham sido identificados nos
trabalhos dos autores mencionados, não significa dizer que eles defendam tais
aspectos. Na maioria dos casos, tais propriedades são citadas como forma de ilustrar o
pensamento comum na sociedade.
No que diz respeito às dicotomias identificadas, é interessante observar que
grande parte das crenças relacionadas à escrita é também relacionada à linguagem
formal. Conseqüentemente, as crenças e funções inerentes à fala são também inerentes
à linguagem informal.
Com base nos quadros apresentados, os quais indicavam ser o pensamento
da maioria das pessoas em relação à língua, elaboramos um questionário (vide Anexo
01) com o propósito de averiguar quais crenças, valores e/ou funções inerentes à
fala/escrita e à linguagem formal/informal seriam confirmadas e quais não seriam.
Em virtude de os Quadros 02 e 03 sugerirem estreita relação da linguagem
formal com a modalidade escrita e da linguagem informal com a modalidade fala, as
perguntas versaram sob três aspectos: a formalidade da língua, os aspectos da língua
escrita e o uso de palavrões na sociedade.
Os participantes foram orientados a utilizar a escala de 1 (um) a 7 (sete) para
responder cada item apresentado, permitindo alguma avaliação mais elaborada dos
dados. As características representadas por cada número variaram de questão para
questão, por este motivo, sempre que tais características eram alteradas, um novo
quadro era mostrado para ajudar os participantes a escolherem o número mais
adequado ao seu modo de pensar.
Para a realização deste experimento, contamos com a colaboração de 111
informantes, dos quais 62 eram mulheres e 49, homens, todos com faixa etária a partir
de 12 anos, destes, 64 tinham entre 19 e 25 anos. Em relação à escolaridade do grupo,
71 pessoas, quase 64% do total, eram graduadas ou cursavam o nível superior; 01
cursava ou cursou o ensino fundamental; 28, o ensino médio e 11, a pós-graduação.
Todos os participantes eram alunos do Núcleo de Línguas Estrangeiras da
UECE, nos cursos de inglês (54), francês (19) e espanhol (28). No entanto, o idioma e
o semestre cursados não foram levados em consideração para a análise do
questionário, visto o objetivo primordial ter sido verificar a compreensão da língua de
uma formal geral dos participantes enquanto falantes nativos do português.
Os procedimentos realizados para a aplicação do questionário foram
bastante simples. Primeiro, foi solicitada permissão para a realização da pesquisa no
espaço do Núcleo de Línguas junto à coordenação geral e às respectivas coordenações
de línguas. Em seguida consultamos os professores das turmas escolhidas e os
respectivos alunos. O único critério utilizado na escolha das turmas foi o
desconhecimento do objeto de estudo desta pesquisa, portanto, alunos de professores
colegas do curso de mestrado ou que já tivessem tido qualquer conhecimento prévio a
respeito do nosso estudo por meio de apresentações ou conversas informais não foram
convidados a participar da pesquisa.
Recebido o aval do professor e dos alunos, o questionário foi aplicado, pela
pesquisadora, na própria sala de aula ou no laboratório de pesquisa 01 do CMLA. Esta
parte da pesquisa se deu em dias diferentes da semana; contudo, em alguns casos, o
questionário foi aplicado a duas turmas simultaneamente.
Antes, porém, de procederem à leitura das questões, foi solicitado aos
alunos que não levassem muito tempo refletindo sobre as respostas. Eles deveriam ler
cada item e marcar a primeira impressão que lhes viesse à mente. Também foi pedido
que não ficassem conferindo as respostas marcadas nas questões anteriores a fim de
que não houvesse manipulação dos dados e as respostas fossem o mais natural
possível.
Para a análise dos questionários respondidos, a contagem se deu de forma
bastante simples: foi feito um levantamento para se saber quantas vezes cada item
tinha sido marcado. Assim foi possível identificar a porcentagem representativa para
cada item. A análise dos números será apresentada a seguir.
2.4.1 ANÁLISE DOS DADOS – FALA/ESCRITA E LÍNGUA
INFORMAL/FORMAL
A análise dos dados se encontra dividida em três partes: a primeira
apresenta os aspectos referentes à linguagem formal e informal; a segunda trata dos
aspectos identificados em relação à fala e à escrita; a terceira, e última parte, aponta os
aspectos relacionados ao uso dos palavrões.
Em princípio, procuramos verificar os aspectos relacionados às linguagens
formal e informal no tocante a: os aspectos gerais e suas manifestações na língua
portuguesa (questão 04) e em diversos gêneros textuais e situacionais (questões 05 e
06), suas influências no tocante ao prestígio social e à valorização dada pela sociedade
mediante seu uso (questões de 07 a 11).
Em relação aos aspectos gerais do grau de formalismo da língua, foi
possível constatar que as características relacionadas à linguagem informal (Quadro
04) foram confirmadas com maioria percentual em todos os casos:
Quadro 04:
RESULTADOS SOBRE AS CARACTERÍSTICAS RELACIONADAS À
LINGUAGEM INFORMAL
ESCALA
1 a 3 4 5 a 7
DEFINIÇÃO DA ESCALA
ITENS ANALISADOS
Tende a
informal
Neutro Tende a
formal
Linguagem comum usada pela
maioria das pessoas.
88% 7% 5%
Linguagem utilizada por pessoas não-
alfabetizadas.
93% 3% 4%
Linguagem que sai naturalmente
durante uma conversa.
71% 19% 10%
Linguagem mais parecida com a
forma que as pessoas falam.
73% 21% 6%
Linguagem aprendida desde criança.
61% 18% 21%
Linguagem falada.
69% 20% 11%
Esse levantamento revela que, segundo a opinião dos informantes, a
linguagem informal é o tipo de linguagem mais utilizado pelas pessoas de um modo
geral, ou seja, é a linguagem utilizada pela massa, pelo povo em suas conversas
ordinárias. O desconhecimento da língua escrita por parte do indivíduo, obriga-o a
comunicar-se por meio da linguagem informal. Isso porque este tipo de linguagem é,
normalmente, associado à fala e, portanto, mais semelhante à forma como falamos
correntemente. Por sua vez, a linguagem formal é marcada por diferentes aspectos,
mostrados no Quadro 05, a seguir:
Quadro 05:
RESULTADOS SOBRE AS CARACTERÍSTICAS RELACIONADAS À
LINGUAGEM FORMAL
ESCALA
1 a 3 4 5 a 7
DEFINIÇÃO DA ESCALA
ITENS ANALISADOS
Tende a
informal
Neutro Tende a
formal
A língua dos grandes escritores.
4% 1% 95%
Linguagem que obedece às regras da
gramática.
4% 3% 93%
Linguagem usada em discursos,
palestras e conferências.
6% 1% 93%
Linguagem utilizada por pessoas
cultas.
9% 5% 86%
A língua correta, livre de erros.
7% 12% 81%
Linguagem das pessoas mais ricas.
13% 31% 56%
Linguagem utilizada por um menor
número de pessoas.
19% 3% 78%
Linguagem considerada mais
elegante, mais chique.
3% 4% 93%
A língua aprendida com o auxílio de
livros e professores.
5% 4% 91%
Linguagem aprendida na escola.
15% 24% 61%
Linguagem escrita.
8% 8% 84%
A linguagem formal (Quadro 05), por sua vez, foi largamente relacionado à
escrita, ela é, conseqüentemente, a língua própria dos grandes escritores, aqueles
considerados cultos e referência no campo da literatura, das gramáticas e dos
dicionários. A linguagem formal é concebida como a forma de expressão correta, livre
dos erros comuns à linguagem informal, por esta razão é a indicada para situações
oficiais e de destaque na sociedade (este aspecto também foi confirmado pelas
questões 05, 08 e 09 do questionário).
Tal qual a escrita, a linguagem formal não é acessível à maioria das pessoas
pois sua aprendizagem, normalmente, acontece na escola com o auxílio de livros e
professores. Entretanto, a realidade do nosso país é que muitas pessoas, principalmente
aquelas que vivem na zona rural, não têm acesso à escola e, portanto, desconhecem a
natureza regrada deste tipo de linguagem.
Além dos aspectos gerais envolvendo o caráter formal ou informal da
língua, os informantes foram questionados em respeito ao prestígio social, decorrente
do uso da linguagem formal. Nossa intenção foi verificar se as profissões das quais se
espera o uso da linguagem formal são as mesmas profissões mais valorizadas pela
sociedade.
Para avaliar estes aspectos foi necessário compararmos os resultados
encontrados nas questões 06 e 07 (Quadro 06). Na 6ª questão, os informantes foram
inquiridos a respeito das profissões as quais eles, freqüentemente, associam ao uso da
linguagem formal em suas atividades. Em seguida, eles deveriam estabelecer o grau de
valorização social para as mesmas profissões.
Quadro 06:
RESULTADOS SOBRE AS PROFISSÕES vs.
NÍVEL DE FORMALIDADE E DE
PRESTÍGIO SOCIAL
Nível de formalidade Grau de prestígio
social
Escala 5 a 7 5 a 7
Definição da escala
Profissões
Tende a formal
Tende a valorizada
Jornalista 92% 84%
Contador 61% 51%
Professor* 88% 32%
Médico 90% 96%
Juiz 96% 99%
Presidente da República
84% 93%
Político 80% 74%
Arquiteto 69% 73%
Conforme os resultados apresentados no Quadro 06, as profissões apontadas
como aquelas ligadas ao uso da linguagem formal, de um modo geral, confirmaram
seu prestígio social com pequenas variações. Do jornalista, por exemplo, espera-se o
uso da linguagem totalmente formal ao exercer sua profissão, no entanto, é uma
profissão menos valorizada que a do médico, juiz e presidente da República. É
possível o nível de exigência formal para o jornalista se deva ao fato de ser uma
profissão estreitamente relacionada ao uso da escrita, também ligada ao uso da
linguagem formal.
Fato interessante, entretanto, diz respeito ao caso do professor. Ele é o
profissional responsável pelo ensino da linguagem formal e da escrita (o professor de
língua portuguesa) na sociedade, domina (ou pelo menos deve dominar) com maestria
as normas gramaticais da língua, no entanto, não é valorizado pela sociedade;
tampouco possui qualquer prestígio social em decorrência disso. A sua soma na escala
da valorização social atingiu uma porcentagem bastante baixa (32%) se comparada aos
88% de exigência para o uso da linguagem formal. Seria um estudo de cunho sócio-
cultural bastante interessante verificar as razões desse resultado.
Com exceção do professor, já mencionado, as demais profissões
relacionadas ao nível informal da língua (a saber: taxista, pedreiro, gari, feirante,
faxineiro e agricultor) tiveram suas maiores marcas nos graus de desvalorização social.
Ainda no tocante ao prestígio social concedido pelo domínio e uso da
linguagem formal, o levantamento dos questionários mostrou que um indivíduo recebe
melhor tratamento e maior credibilidade por parte da sociedade desde que seja capaz
de utilizar com aptidão a escrita e o tipo de linguagem inerente a ela.
Conforme foi mostrado, por ocasião da mostra das duas dicotomias tratadas
nesta pesquisa, linguagem formal e escrita compartilham crenças, valores e funções
sociais. É isto que procuramos confirmar na segunda parte do questionário.
Quadro 07:
RESULTADOS SOBRE AS CARACTERÍSTICAS MAIS RELACIONADAS À FALA
ESCALA
1 a 3
OUTROS
DEFINIÇÃO DA ESCALA
ITENS ANALISADOS
Tende às
características da
fala
_____
As pessoas aprendem antes de ler e escrever. 93% 7%
Apresenta frases mais curtas. 63% 37%
É natural e muitas vezes não segue a gramática. 88% 12%
As palavras mudam, podem ser diferentes. 72% 28%
Linguagem repetitiva, com frases incompletas. 87% 13%
É cheia de rodeios para dizer uma coisa. 59% 41%
Linguagem resumida, direta. 60% 40%
Os gestos também transmitem mensagem. 84% 16%
Só dura um momento, poucos instantes. 88% 12%
Baseados no Quadro 07, que mostra as características mais relacionadas à
fala, podemos constatar que as características apresentadas nos textos científicos
relacionados à linguagem se confirmam na mente do falante comum. Para ele, a fala é
a forma de expressão da linguagem aprendida quando criança e desenvolvida antes da
capacidade de ler e escrever. A fala é momentânea, pois sua duração é equivalente ao
tempo de produção das palavras. Pelo fato de o indivíduo elaborar seu discurso no
decorrer da conversação, a fala é, freqüentemente, redundante e não regrada pela
norma-padrão culta da língua (aspecto também confirmado na questão 13 do
questionário). Finalmente, ela também é instável no sentido de mudar seu aparato
lingüístico com mais facilidade e rapidez que a escrita.
A única propriedade que esperávamos confirmar na escrita e que foi
atribuída à fala foi o item “linguagem resumida, direta”. É possível que isto tenha
ocorrido por dois motivos: primeiro, má elaboração do item, o que pode ter
contribuído para confundir os informantes; ou, segundo, falta de atenção dos
participantes, que pode ter gerado uma contradição, pois uma mesma forma de
linguagem não pode ser, ao mesmo tempo, repleta de rodeios e direta ou resumida.
Além desses aspectos, os informantes também associam à fala o uso de
determinadas expressões tais como: expressões regionais, palavrões e gírias.
Quadro 08:
RESULTADOS SOBRE AS CARACTERÍSTICAS MAIS RELACIONADAS À
ESCRITA
ESCALA
5 a 7
OUTROS
DEFINIÇÃO DA ESCALA
ITENS ANALISADOS
Tende às
características da
escrita
_____
É aprendida na escola.
70% 30%
Apresenta frases mais longas.
72% 28%
Obedece às regras da gramática.
93% 7%
As palavras não mudam com o tempo, são
as mesmas.
77% 23%
Linguagem mais organizada, sem
repetições.
91% 9%
No tocante à escrita, conforme o resultado apresentado no Quadro 08, o
falante entende que seja a modalidade da língua aprendida na escola com o auxílio dos
livros (gramáticas e dicionários, entre outros) e do professor. Por esta razão, a escrita
deve obedecer às regras da gramática. Ao contrário da fala, a escrita é uma linguagem
planejada e, portanto, mais organizada. A escrita conta com um meio material para sua
veiculação, o papel, que permite seu registro e sua estabilidade em relação ao tempo.
Um outro aspecto investigado foi referente ao uso de palavrões na
sociedade. Esta verificação foi importante por duas razões: primeira, eles constituem
um tipo de clichê importante para esta pesquisa; segunda, o uso dos palavrões possui
uma relação, mesmo que inversa, com o uso da linguagem formal na sociedade.
Inversa porque, quanto mais formal a situação, menos aceitável é o uso desses termos.
Essa crença não foi identificada em nenhum dos textos lidos, contudo,
revelou-se por meio de um fato verídico ocorrido em Fortaleza, Ceará, em março deste
ano
51
. A casa de show “Siará Hall” realizaria um show na cidade com os cantores
Marcelo D2 e Pitty. Para tornar público o evento, foram espalhados outdoors por toda
a cidade divulgando o dia e o local do evento. No outdoor constava parte de uma
música do cantor Marcelo D2 dizendo o seguinte: “Vamos fazer barulho, porra!”. Não
demorou muito para que o Ministério Público (MP) entrasse com uma ação judicial
contra a casa de show, exigindo a retirada, em caráter urgente, dos outdoors, em
virtude do palavrão exibido. Segundo o MP, o palavrão “feria a lei e atentava contra a
moral e os bons costumes da sociedade fortalezense”. Como resultado, o termo “porra”
foi coberto por adesivos em todos os outdoors e o show acabou não acontecendo
52
.
Como indivíduos integrantes da sociedade, sabemos que os palavrões são
comumente utilizados, aos menos, informalmente. Entretanto, o fato ocorrido em
Fortaleza mostrou que a sociedade considera seu uso público ofensivo e prejudicial aos
“bons costumes”.
Com base nestes fatos, esta terceira e última parte do nosso questionário
esteve, pois, ligada ao caso dos palavrões. As três perguntas envolvendo o assunto,
51
http://www.liberdadedigital.com.br/?p=534. Acesso em: 02/04/07.
52
De acordo com as notícias divulgadas, o show não aconteceu devido o atraso dos repetidos problemas gerados
pelos controladores de vôo, o que impossibilitou a chegada de um dos cantores em Fortaleza. Mesmo assim,
acreditamos que o fato mencionado em relação ao palavrão tenha contribuído de alguma forma para o
cancelamento do show.
levaram os informantes a refletirem, ao menos rapidamente, a respeito da aceitação ou
rejeição ao uso de palavrões pelas pessoas em diversas situações.
Na questão 14, cada sujeito deveria avaliar o uso dos palavrões
considerando sua opinião pessoal, individual. Surpreendentemente, o uso de palavrões
foi tido como inaceitável em quase todas as situações apresentadas conforme mostra o
Quadro 09, a seguir:
Quadro 09:
RESULTADOS SOBRE A (IN)TOLERÂNCIA DOS SUJEITOS EM RELAÇÃO
AO USO DE PALAVRÕES
ESCALA
1 A 3
OUTROS
DEFINIÇÃO DA ESCALA
ITENS ANALISADOS
Tende à
intolerância
_____
Os palavrões de um modo geral
66% 44%
Os palavrões quando escritos em um local
público
89% 11%
Os palavrões quando escritos em um local
privado
47% 53%
Os palavrões quando falados por alguém
81% 19%
Os palavrões ditos por alguém conhecido
48% 52%
Os palavrões ditos por alguém
desconhecido
75% 25%
Em relação ao uso de palavrões (Quadro 09), 66% dos participantes
acharam que os palavrões, de um modo geral, são inaceitáveis; 89%, que são
inaceitáveis quando escritos em um local público, confirmando a rejeição do outdoor
no caso mencionado anteriormente (do cantor Marcelo D2). Oitenta e um por cento
dos informantes acharam que os palavrões são inaceitáveis quando falados por uma
pessoa qualquer e, 75%, quando ditos por alguém desconhecido.
O único caso em que parece haver uma intolerância menor em relação ao
uso de palavrões é quando ele é proferido por alguém conhecido, com quem se tenha
certo grau de intimidade. Neste caso, as opiniões ficaram bastante divididas: 40%
apresentaram uma tendência à aceitação, enquanto 48% tenderam à intolerância
quanto ao uso desses termos. Na realidade, isto ocorre não apenas com os palavrões,
porém com o comportamento de um modo geral: as pessoas, normalmente, tendem a
relaxar na presença de amigos e esquecer um pouco as convenções sociais.
Na penúltima questão do questionário, os participantes analisaram situações
e lugares específicos nos quais eles acham que a sociedade tolera ou aceita o uso dos
palavrões. Neste caso, o fator “intimidade” parece ter estreita relação com o uso dos
palavrões. Na questão anterior, a pesquisa mostrou que o palavrão é tolerado
socialmente quando proferido por alguém conhecido. Na penúltima questão, a
intimidade parece exercer influência novamente quanto ao uso de palavrões no teatro,
em filmes, livros e músicas. Os itens: amigos, júri, jornal televisivo, outdoor, discurso
político, sermão de igreja e sala de aula, tiveram uma tendência à intolerância, com
porcentagens superiores a 50%. Por outro lado, o uso de palavrões no teatro, em
filmes, em livros e em músicas teve uma variação muito grande e, portanto, sem
qualquer tendência.
Escolhemos o termo “intimidade” para justificar esta ocorrência porque:
primeiro, não foi possível verificar se as respostas sofreriam uma variação dependendo
da presença de outras pessoas em cada uma das situações. É possível que as pessoas se
sintam à vontade para ouvir um palavrão em um filme desde que estejam sozinhas,
pois a presença de mais alguém poderia gerar certo desconforto. Segundo, as peças
teatrais e os filmes da atualidade tendem a representar a vida cotidiana de pessoas
comuns, o que causa uma identificação com o espectador. O espectador enquanto
indivíduo tem consciência de que os palavrões fazem parte da vida comum e que, por
conseguinte, podem ser usados no teatro e em filmes. Terceiro, os livros e as músicas,
considerados obras artísticas, possuem o que chamamos “licença poética” e, por este
motivo, podem apresentar qualquer tipo de linguagem em seus textos.
Os cidadãos, sobretudo os mais jovens, parecem não se importar com o uso
de palavrões em músicas. Basta observarmos o grande público de cantores como
Marcelo D2, Gabriel O Pensador e os falecidos Mamonas Assassinas, por exemplo, os
quais costumam utilizar tais termos em suas músicas.
Observa-se, pois que o uso de palavrões está relacionado ao nível de
formalidade/informalidade das situações nas quais o falante se encontra. Por esta
razão, os palavrões são proibidos em audiências jurídicas, jornais, outdoors, discursos
políticos, sermões de igreja e em sala de aula.
Apesar do que foi revelado pelos questionários até o momento, no que diz
respeito ao uso dos palavrões: aceitos desde que usados por alguém com quem se
tenha um certo grau de intimidade e tolerados em teatros, filmes, livros e músicas, os
informantes revelaram ser aceitável o uso de palavrões pelos adolescentes.
Coincidência ou não, o corpus desta pesquisa é constituído por dois filmes acerca do
mundo adolescente.
2.4.2 UMA PROPOSTA DE MCIS PARA ESCRITA, LINGUAGEM FORMAL E
PALAVRÕES
Com base nos dados revelados pela pesquisa realizada, foi possível
elaborarmos três modelos cognitivos idealizados: um para língua escrita, outro para
linguagem formal e mais um para os palavrões. É importante lembrarmos que os MCIs
apresentados a seguir podem não corresponder à realidade, contudo, representam as
crenças e valores dos participantes enquanto falantes nativos do português e enquanto
integrantes de um meio cultural particular.
O primeiro MCI elaborado a partir dos resultados revelados pelos
questionários foi o modelo para a escrita. Este MCI mostra que a escrita recebe certo
grau de prestígio em relação à fala porque é aprendida em um lugar especial, a escola,
lugar reservado àqueles que têm a chance de freqüentá-la, pois não está ao alcance dos
que a querem, porém dos que conseguem ter acesso a ela. Da mesma forma, a escrita
exige o domínio de um tipo de linguagem que não é acessível a todos os indivíduos da
sociedade, apenas àqueles que conseguem freqüentar a escola.
A língua escrita é superior à fala porque é capaz de conservar a pureza da
língua apesar do tempo. A pureza está relacionada à norma padrão culta utilizada pela
escrita e que permanece intocável e imutável por meio de materiais impressos. A
escrita não carrega a marca pessoal do falante, antes, por meio de regras generalizadas,
faz com que ele fique incógnito entre tantos outros que dela se utilizam.
A escrita é a forma de expressão da língua mais elaborada, mais rebuscada.
A ela são dispensáveis todas as redundâncias, repetições, reformulações e exageros
atribuídos à fala.
Aquele ou aquela que domina a escrita com propriedade tem mais acesso à
informação, ao conhecimento, a outras culturas e, portanto, recebe mais chances de
acender socialmente se comparado (a) àqueles que a ignoram. Em síntese, o MCI para
escrita (Quadro 10) fica representado da seguinte maneira:
Quadro 10:
MCI PARA LÍNGUA ESCRITA
A LÍNGUA ESCRITA É:
a língua aprendida na escola, fora do seio familiar, com o auxílio de livros e professores
a língua que obedece às normas gramaticais ditadas pelas gramáticas e dicionários
a linguagem mais organizada em termos de texto e pensamento
estável em relação ao tempo, ou seja, mantém o padrão “ideal” da língua, a salvo das
constantes mudanças da fala
o tipo de linguagem neutra, sem marcas pessoais, particulares a um certo indivíduo, ou grupo
social
é explícita e, portanto, independente do contexto
a língua que oferece certo grau de prestígio social, pois seu desconhecimento pode
desvalorizar o indivíduo
No MCI construído para linguagem formal (Quadro 10), foi possível
identificar vários valores atribuídos também à escrita. Isto mostra que, para o falante, a
escrita e linguagem formal estão estreitamente relacionadas em suas funções e valores.
O MCI apresentado para linguagem formal revela a crença na superioridade
deste tipo de linguagem em relação a outros tipos, principalmente, a linguagem
informal. Esta é tida como a expressão da linguagem suscetível a “erros” e “desvios” e
isto faz com que ela fique em uma posição inferior quando comparada à linguagem
“correta”, considerada “ideal” para a comunicação. Assim como a escrita, a linguagem
formal é aprendida na escola, com o auxílio de livros e professores.
No Brasil, o acesso à escola não é realidade na vida de muitos e a aquisição
de livros mais restrita ainda, como conseqüência, a linguagem formal é uma forma de
expressão dominada por poucos usuários da língua. Estes são considerados pessoas
cultas e, portanto, falantes superiores em relação aos demais. O domínio da linguagem
formal oferece oportunidades a empregos melhores, a estudos em graus mais
avançados e acesso a diversos grupos sociais aos quais um falante considerado
anódino dificilmente teria acesso. Resumindo o que foi discutido, o MCI para
linguagem formal fica representado no Quadro 11, a seguir:
Quadro 11:
MCI PARA LINGUAGEM FORMAL
A LINGUAGEM FORMAL É:
a língua perfeita, “ideal”, correta, livre de erros
uma linguagem melhor, se comparada aos demais tipos
regida pelas normas gramaticais
associada à língua escrita
o tipo de linguagem apropriada para ocasiões oficiais e importantes
a língua usada pelos grandes escritores
a língua utilizada por pessoas cultas
aprendida na escola com o auxílio de livros e professores
utilizada e acessível a um menor número de pessoas
a língua que confere prestígio social aos seus usuários
É pertinente salientar que, como mostramos no início deste capítulo, os
MCIs podem não corresponder à realidade. Na pesquisa realizada, os informantes
associaram a linguagem formal à escrita, retomando a idéia de perfeição,
freqüentemente, associada às obras literárias. No entanto, essa correspondência entre
escrita e linguagem formal não ocorre com tanta exclusividade. Como exemplo,
podemos citar o caso dos bilhetes e das conversas via messenger (MSN), dentre
outros, que se manifestam na forma da língua escrita, porém com grande tendência ao
uso informal da língua.
Após a discussão a respeito dos MCIs identificados para escrita e linguagem
formal, finalmente, chegamos ao último modelo proposto: o MCI para palavrões
(Quadro 12). Enquanto o uso e domínio da escrita e da linguagem formal estão
relacionados a valores como polidez, perfeição e valorização social, o uso de palavrões
fica mais restrito às imperfeições da linguagem e, portanto, à fala e à informalidade.
Quadro 12:
MCI PARA PALAVRÃO
O PALAVRÃO É:
termo ou expressão tabu na sociedade
usado para insultar ou ofender outras pessoas
usado para expressar extrema raiva ou alegria
inaceitável em ocasiões, locais e meios públicos
associado à intimidade do indivíduo em relação a si mesmo e aos outros
inaceitável em situações oficiais e importante
inaceitável se utilizado por crianças ou pessoas mais velhas, independentemente de sua
posição social
aceitável se utilizado por adolescentes
O uso de palavrões, motivado por qualquer que seja a razão – muita raiva ou
muita alegria –, é considerado tabu social, ou seja, publicamente, seu uso é
considerado inapropriado, ou mesmo, inaceitável. Pessoas que ocupam posições de
destaque em qualquer instituição ou grupo social não devem fazer uso de tais
expressões sob pena de ofender até mesmo pessoas às quais o termo não foi dirigido.
O uso de palavrões está mais relacionado ao grau de intimidade e
privacidade em que o indivíduo se encontra. Por exemplo, um palavrão pode ser aceito
se proferido por um amigo, porém rejeitado se for usado por outra pessoa; ele pode ser
usado sem causar constrangimento ao ouvinte em ambientes mais íntimos ou em um
grupo reduzido de amigos ou conhecidos, por outro lado, pode ofender ou constranger
outrem caso seja usado em lugares públicos ou entre pessoas estranhas.
Normalmente, o uso de palavrões é rejeitado e inaceitável no discurso de
qualquer pessoa, no entanto, seu uso é aceitável quando se tratar de adolescentes. É
possível que a sociedade, de um modo geral, esteja acostumada às “infrações”
acometidas pelos adolescentes em virtude de sua dificuldade em aceitar as convenções
sociais, então, torna-se comum e, conseqüentemente, aceitável o uso destes termos
nesta faixa etária.
Neste capítulo, discutimos a influência da metáfora conceitual na linguagem
ordinária utilizada pelos falantes de uma língua. Também vimos como ela auxilia na
forma como categorizamos a comunicação e como nos expressamos lingüisticamente
em relação a ela. Além disso, comentamos sobre os MCIs e sua função na formação e
propagação de crenças e valores sócio-culturais. Finalmente, propusemos MCIs para
escrita, linguagem formal e palavrões a partir de uma pesquisa com falantes nativos do
português do Brasil. Em nosso próximo, e último capítulo, analisaremos como esses
modelos interferem na tradução de fraseologismos e clichês de raiva para as legendas
de dois filmes americanos: 10 coisas que eu odeio em você e Meninas malvadas.
A análise foi feita com base na comparação entre o texto oral em inglês de
cada filme e a tradução dada nas legendas para cada termo ou expressão. Para
finalizar, aplicamos um outro experimento com o propósito de verificar que tipo de
linguagem o espectador prefere encontrar nas legendas: a linguagem formal,
obedecendo ao MCI de linguagem formal escrita, ou a linguagem informal,
contrariando os MCIs construídos neste capítulo.
3. ANALISANDO AS ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO NAS
LEGENDAS DE 10 COISAS QUE EU ODEIO EM VOCÊ E MENINAS
MALVADAS
Este capítulo mostra os resultados encontrados na análise das legendas dos
filmes 10 coisas que eu odeio em você e Meninas malvadas e na pesquisa de recepção
do público em relação às novas legendas. Na análise das legendas, identificamos as
estratégias utilizadas na tradução de fraseologismos e clichês de raiva utilizados pelos
personagens de ambos os filmes. Também procuramos relacionar tais estratégias aos
MCIs construídos no capítulo anterior. A pesquisa de recepção foi realizada para
verificar se o público prefere legendas em concordância ou que contrariem os MCIs
para escrita, linguagem formal e palavrões identificados no capítulo anterior.
Com o objetivo de melhor organizar os nossos dados e torná-los mais
compreensíveis, optamos apresenta-los em dois capítulos. A partir dos filmscripts e
das legendas dos filmes, realizamos várias análises, dentre as quais, comparação entre
as listas de palavras originadas do corpus para verificar aspectos inerentes à fala e à
escrita que pudessem ser revelados por meio da freqüência das palavras em cada texto;
comparação entre as expressões selecionadas nos filmes e suas respectivas traduções
nas legendas; e associação das traduções analisadas aos MCIs propostos
anteriormente. No próximo capítulo, relatamos os resultados da pesquisa de recepção
do público. Neste, apresentamos a análise das estratégias de tradução dos
fraseologismos e clichês de raiva identificados nos dois filmes.
3.1 OS FILMES
Dez coisas que eu odeio em você
Dez coisas que eu odeio em você (Ten things I hate about you –1999) é um
filme dirigido por Karen McCullah Lutz & Kirsten Smith, baseado na obra de
Shakespeare Taming of the Shrew (A Megera Domada) – também adaptada pela rede
Globo de televisão para a novela O Cravo e a Rosa. Para o corpus desta pesquisa foi
utilizada uma cópia em DVD, com legendas em português feitas pela Dolby Digital.
Esse filme foi escolhido por apresentar um enredo
simples, com situações bastante semelhantes à vida ordinária
comum, ou seja, situações informais. Em conseqüência
disso, os personagens também utilizam uma linguagem do
cotidiano e, portanto, informal.
No filme, Cameron (Joseph Cordon-Levitt) é um
aluno novato em Padua High School e Michael (David
Krumholtz) é o encarregado de lhe mostrar as dependências
e os alunos da escola. Durante um passeio no pátio da escola, Cameron vê Bianca pela
primeira vez e se apaixona. Bianca Stratford (Larisa Oleynik) é aluna do primeiro ano
e faz o tipo garota rica mimada. É irmã de Kat (Julia Stiles), aluna do último ano que
faz o estilo garota rebelde. Bianca é imatura e adora ser bajulada pelas pessoas,
enquanto Kat, independente, sonha em estudar na costa leste dos Estados Unidos e
formar uma banda de rock.
Ao saber do interesse do amigo por Bianca, Michael trata de explicar que as
Stratford não podem namorar por proibição do pai, um obstetra viúvo que vive
aterrorizado pela idéia de que as filhas adolescentes engravidem. Para evitar que seu
pesadelo se torne realidade, o senhor Stratford proíbe que as filhas saiam com garotos.
Kat, a filha mais velha, não se incomoda com as proibições do pai, porque está
decidida em não arrumar namorado; Bianca, por outro lado, é louca para namorar.
Em uma das discussões em família, o pai resolve voltar atrás em suas
proibições e estabelece uma nova regra: Bianca pode começar a namorar se a irmã
também arranjar um namorado. Ao saber da nova regra, Cameron e Michael se
empenham em conseguir um candidato adequado para Kat. Durante suas
investigações, Cameron e Michael encontram Patrick Verona (Heath Andrew Ledger),
um australiano cheio de mistérios, no estilo rebelde perigoso.
Para convencê-lo a sair com Kat, os garotos organizam um plano: Michael
procura Joey (Andrew Keegan) – um modelo muito vaidoso e também interessado em
sair com Bianca – e convence-o a pagar um rapaz para sair com Kat; assim, ele
poderia sair com Bianca. Joey aceita o conselho e contrata Patrick para fazer o serviço.
Cameron e Michael ficam encarregados de ajudar o rapaz a se aproximar de Kat,
enquanto Cameron arranja desculpas para ficar perto de Bianca.
Depois de repetidos contatos com Kat, Patrick se apaixona, mas não conta
nada a Kat sobre o pagamento que recebera para sair com ela. Tudo corria muito bem
até que, durante o baile de formatura, tudo vem à tona: Joey descobre que foi passado
para trás e Kat fica sabendo que o namorado fôra pago para conquistá-la. Após brigas
e discussões, Bianca enamora-se de Cameron, e Kat faz as pazes com Patrick, indo
estudar em Sarah Lawrence, uma universidade na costa leste americana.
Meninas malvadas
No mesmo estilo de Dez coisas que eu odeio em você, o filme Meninas
malvadas (Mean Girls) é uma adaptação do livro Queen bees and wannabes (sem
versão para o português), de Rosalind Wiseman.
Dirigido por Mark Waters, Meninas malvadas (2004) conta a história de
Cady (Lindsay Lohan), uma garota que tenta se adaptar em uma nova escola depois de
viver anos no safári da África com os pais. Tentando encontrar seu lugar entre
adolescentes com os mais variados estilos de vida, Cady cruza o caminho da descolada
e calculista Regina (Rachel McAdams), líder do grupo de garotas mais famoso da
escola, conhecido como “As Poderosas”.
A linguagem informal também predomina em todo o
filme, da mesma forma que as situações de conversas, brigas e
discussões familiares e entre amigos.
A princípio, a garota novata e Regina parecem ser
boas amigas, entretanto, quando Cady se apaixona por Aaron
Samuels (Jonathan Bennett), ex-namorado de Regina, a guerra
começa. Regina se oferece para ajudar Cady a conquistar o
garoto, porém, durante uma festa de Halloween, Regina retoma
o namoro apenas para ferir a nova amiga. Furiosa por causa da traição de Regina,
Cady e seus amigos, Janis Ian (Lizzy Caplan) e Damian (Daniel Fanzese), arquitetam
um plano para arruinar a vida social da traidora. Assim, Cady passa a investir seu
tempo em uma guerra que acaba envolvendo todo o colégio em uma grande confusão.
Primeiro, Cady e seus amigos fazem com que Regina perca o namorado,
Aaron. Depois, descobrem uma forma de fazê-la engordar sem que perceba; em pouco
tempo as roupas “transadas”, da moda, já não servem, e Regina começa a se vestir
como pode. Sem um namorado popular e sem um corpinho bonito, Regina logo perde
o poder sobre suas seguidoras: Gretchen e Karen. Ao descobrir-se arruinada e vítima
de um plano elaborado, Regina resolve dar o troco: tornar público o “Livro do Arraso”
(livro em que “As Poderosas” colavam fotos e escreviam fofocas a respeito das
pessoas que não gostavam). Como resultado, todo o colégio entra em guerra e Cady é
a principal suspeita de ser a autora do livro. Para resolver a situação, Cady precisa
pedir desculpas a todos que magoara, inclusive Regina.
3.2 LISTAS DE PALAVRAS: ANÁLISE PRELIMINAR
Para uma primeira aproximação com os dados do gerados pelo corpus,
utilizamos o programa para análise de corpus lingüístico eletrônico Wordsmith 3.0,
que, a partir dos filmscripts e das legendas dos filmes, forneceu uma lista das palavras
que apareceram em cada uma desses textos. As listas de palavras foram elaboradas
para facilitar a localização das expressões a serem analisadas, bem como suas
respectivas traduções. Além disso, essas listas também possibilitaram uma análise
preliminar, a partir da comparação entre a freqüência de palavras em textos orais
(filmscripts) e textos escritos (legendas).
Inicialmente, foram elaboradas quatro listas: duas forneceram a freqüência
das palavras que apareceram nos textos orais em inglês, dos dois filmes em inglês, Dez
Coisas que eu odeio em você e Meninas Malvadas; as outras duas listas apresentaram a
freqüência das palavras que constavam nas legendas em português de cada um dos
filmes.
Posteriormente, para comparação entre a freqüência das palavras das listas,
duas outras listas foram elaboradas: uma de um texto oral em português e outra de um
texto escrito em inglês. Esta foi comparada às listas dos textos orais (filmscripts) em
inglês de 10 coisas que eu odeio em você e Meninas malvadas, enquanto aquela foi
comparada com as listas das legendas dos mesmos filmes.
As listas dos textos orais em inglês foram contrastadas com a lista de um
texto escrito na mesma língua; e as listas dos textos escritos em português, das
legendas, com um texto oral também em português. A análise foi feita desta forma
com o propósito de verificarmos as semelhanças e/ou diferenças mostradas no corpus
em relação aos aspectos da fala e da escrita.
Uma comparação direta entre as listas não seria viável por duas razões:
primeiro, inglês e português possuem aspectos diferentes relacionados à fala e à
escrita, ou seja, a presença ou ausência de determinadas palavras não se justifica da
mesma forma nas duas línguas, por exemplo, “would you” e “could you” podem ser
usados para pedidos tanto na oralidade quanto na língua escrita. Em português, “você
poderia” (mais característico da escrita) e “você podia” (mais relacionado à oralidade)
são usados em modalidades diferentes da língua. Segundo, uma comparação entre as
listas de idiomas diferentes levaria à busca de “equivalentes” textuais, idéia rejeitada
em nossa fundamentação teórica ao falar em teorias da tradução. Por essas razões,
optamos por comparar textos orais e escritos do mesmo idioma e averiguar os aspectos
envolvidos entre as modalidades falada e escrita da língua.
A priori, nossa tentativa foi de examinar se os termos de maior freqüência
nas listas de palavras geradas a partir dos filmes eram diferentes ou não quando
comparados a um respectivo texto oral ou escrito. Isto é, as duas listas do inglês oral
(filmscrpts dos filmes 10 coisas que eu odeio em você e Meninas malvadas) foram
comparadas a uma lista feita com base em um outro texto do inglês escrito (A Young
Girl’s Diary)
53
, também em inglês. As duas listas do português escrito (legendas dos
filmes 10 coisas que eu odeio em você e Meninas malvadas) foram comparadas a uma
lista elaborada a partir de um outro texto do português oral (Diálogo entre dois
informantes)
54
. Em relação ao número de palavras diferentes em cada texto, temos o
seguinte: 10 coisas que eu odeio em você utiliza 1.586 palavras diferentes em inglês e
1.781 em português; Meninas malvadas apresenta 1.683 palavras diferentes em inglês,
e 1.778 em português; o texto escrito em inglês, A Young Girl’s Diary, possui 329
palavras diferentes; e o texto oral em português, Diálogo entre informantes, 642.
Nessa análise inicial, nossa intenção foi de explorar as listas de palavras
geradas pelo corpus e verificar possíveis semelhanças e/ou diferenças entre os textos
orais e escritos do inglês e do português. Contudo, as análises não são conclusivas, e as
observações realizadas apenas poderão ser confirmadas por meio de um estudo mais
amplo, que contemple um leque maior de textos orais e escritos em diferentes gêneros.
As listas também foram utilizadas para localizarmos os termos e expressões
de nosso interesse, como também suas respectivas traduções. Depois de devidamente
localizadas, expressões e traduções foram separadas para análise posterior. Sempre que
necessário, a ferramenta de concordância (concord), também do programa Wordsmith
3.0, foi utilizada para a identificação do contexto em que cada expressão havia sido
usada.
Para a análise dos termos em inglês, sobretudo dos clichês de raiva,
contamos com o auxílio de dicionários (impressos e on-line), corpus eletrônicos (BNC
e Bank of English) e do site Google. Quanto às traduções, a escassez de material fez
53
FREUD, Sigmund. A Young Girl’s Diary. Editora Virtual Books Online M&M Editores Ltda, 2000.
www.virtual books.com.br. Cited: 20/04/07.
54
KOCH, Ingedore Villaça. A inter – ação pela linguagem. Coleção Repensando a Língua Portuguesa. São
Paulo: Editora Contexto, 4ª edição, 1998, pp. 79-91.
com que as analisássemos com base em nossas intuições enquanto falantes nativos do
português e em pesquisa de freqüência de palavras no Google.
Após a reflexão sobre o processo tradutório das expressões selecionadas,
elaboramos quadros-resumo para melhor delinear as estratégias de tradução
identificadas nas legendas dos filmes 10 coisas que eu odeio em você e Meninas
malvadas.
Comparando-se as listas em inglês (Anexo 02), foi possível observar que
dentre as dez palavras de maior freqüência em cada lista, 07 (sete) – the, I, to, and, a,
that e it – coincidiram nas três listas. No entanto, este pequeno universo de apenas dez
palavras (ver Quadro 13) ainda revelou alguns aspectos interessantes em relação a
oralidade e a escrita dos textos em inglês. O pronome you, por exemplo, foi a palavra
de maior freqüência em 10 coisas que eu odeio em você (freq. 429; 5,23%) e a segunda
palavra em Meninas malvadas (freq. 415; 3,98%), porém foi a 23ª palavra em
freqüência em GD (freq. 635; 0,69%)
55
. Este fato pode ser explicado pelo fato de a
interação entre locutores ser bem maior em um texto oral que em um texto escrito.
Quadro 13:
QUADRO COMPARATIVO DAS LISTAS DOS TEXTOS EM INGLÊS
TEXTO ESCRITO –
INGLÊS
TEXTO ORAL – INGLÊS –
MM
TEXTO ORAL – INGLÊS –
DC
N Word Freq. % N Word Freq. % N Word Freq. %
1 THE 2.901 3,16 1 I 415 3,98 1 YOU 429 5,23
2 I 2.897 3,15 2 YOU 415 3,98 2 I 336 4,1
3 TO 2.775 3,02 3 TO 217 2,08 3 A 180 2,2
4 AND 2.719 2,96 4 THE 207 1,98 4 THE 178 2,17
5 SHE 1.811 1,97 5 IT 191 1,83 5 TO 173 2,11
6 A 1.782 1,94 6 A 188 1,8 6 THAT 131 1,6
7 THAT 1.632 1,78 7 THAT 134 1,28 7 ME 114 1,39
8 IT 1.540 1,68 8 AND 133 1,27 8 AND 98 1,2
9 IS 1.293 1,41 9 SHE 133 1,27 9 IT 96 1,17
10 OF 1.241 1,35 10 ME 110 1,05 10 KNOW 81 0,99
Em 10 coisas que eu odeio em você, por exemplo, a palavra que ocupa o 10°
lugar no hanking das freqüências é know (freq. 81; 0,99%), a primeira palavra de
conteúdo da lista. Combinado com o pronome you, o verbo know forma um marcador
55
Em GD, por ser um texto mais extenso e, evidentemente, com maior número de palavras, a freqüência
mostrada é bem maior em relação às freqüências encontradas em 10 coisas que eu odeio em você e Meninas
malvadas. Contudo, sua porcentagem é menor quando considerada em relação ao todo do texto.
conversacional bastante freqüente em diálogos. Como marcador conversacional, you
know apareceu 34 vezes ao longo do texto de 10 coisas que eu odeio em você. Além de
combinar com you, know também apareceu bastantes vezes acompanhado por I (freq.
336; 4,1% - segunda palavra mais freqüente em 10 coisas que eu odeio em você).
Desta combinação surge outro marcador conversacional, I know, que apareceu 21
vezes durante os diálogos.
Em Meninas malvadas, o pronome you aparece com a mesma freqüência de
I (freq. 415; 3,98 – primeira palavra da lista). Neste caso, a primeira palavra de
conteúdo na lista é was (freq. 85; 0,81% - 16° lugar na ordem de freqüência), verbo
que acompanha I e she (9ª posição na lista). Como forma de interação comunicativa
mais significativa entre os personagens, you aparece em situações de perguntas diretas
a outras pessoas acompanhado de are (are you – 18 vezes), do (do you – 25 vezes),
have (have you – 05 vezes) e did (did you – 15 vezes).
Outro aspecto também revelado pelas listas de palavras em inglês foi em
relação aos palavrões. Provavelmente, por ser um texto escrito, GD não apresenta
nenhum palavrão, ao passo que 10 coisas que eu odeio em você e Meninas malvadas
apresentam vários deles, os quais serão analisados na próxima seção.
Em relação às legendas e o texto oral em português – DI – (Anexo 03), o
uso de palavrões foi o oposto do esperado: DI não mostrou nenhum palavrão, mesmo
sendo um texto oral, enquanto as legendas, textos escritos, exibiram vários deles.
Neste caso, é pertinente salientar que o texto oral utilizado para esta análise inicial não
representa uma conversa do dia a dia por dois motivos: primeiro, porque os turnos de
fala não são equilibrados, isto é, uma pessoa fala por um longo período de tempo,
enquanto a outra apenas ouve ou faz pequenos comentários. O tema da conversa gira
em torno das atividades diárias de duas mulheres nas diversas funções que
desempenham ao longo do dia (mãe, esposa, dona-de-casa, funcionária, mulher etc.).
Elas falam a maior parte do tempo de uma terceira pessoa (do marido, dos filhos, do
patrão etc.) e não de si ou do ouvinte, por esse motivo, a freqüência dos pronomes
“eu” e “me”, por exemplo, são menores do que o esperado. O pronome “você” não
aparece uma única vez, conforme mostrado no Quadro 14, a seguir:
Quadro 14:
QUADRO COMPARATIVO DAS LISTAS DOS TEXTOS EM PORTUGUÊS
TEXTO ORAL –
PORTUGUÊS
LEGENDAS – PORTUGUÊS
MM
LEGENDAS – PORTUGUÊS
DC
N Word Freq. % N Word Freq. % N Word Freq. %
1 NÃO 79 3,87 1 NÃO 256 2,93 1 QUE 252 3,88
2 É 70 3,43 2 É 248 2,84 2 NÃO 251 3,86
3 DE 56 2,74 3 QUE 244 2,79 3 É 162 2,49
4 A 55 2,69 4 DE 226 2,59 4 DE 144 2,21
5 E 53 2,59 5 A 225 2,58 5 O 138 2,12
6 QUE 51 2,5 6 O 179 2,05 6 A 113 1,74
7 O 40 1,96 7 VOCÊ 163 1,87 7 VOCÊ 103 1,58
8 ENTÃO 37 1,81 8 EU 128 1,47 8 E 101 1,55
9 AHN 36 1,76 9 ELA 125 1,43 9 UM 83 1,28
10 SE 35 1,71 10 E 108 1,24 10 ME 74 1,14
O segundo motivo que nos leva a considerar DI um texto não representativo
de uma conversa cotidiana do português do Brasil é a não naturalidade do discurso em
vários momentos. Os informantes apresentam um discurso parcialmente monitorado,
com o uso de tempos verbais o comuns na oralidade (futuro e pretérito do futuro do
indicativo), a não contração de preposições (pra, pro, num) e a conjugação dos verbos
na primeira pessoa do plural (nós) em vez de “a gente” acompanhado do verbo na
terceira pessoa do singular. Contudo, em virtude da dificuldade encontrada em
localizarmos um outro texto oral em português, optamos pela sua utilização.
Quanto aos aspectos orais identificados em DI, destacamos o uso da palavra
“então” (freq. 37; 1,81%) e da interjeição “ahn” (freq. 36; 1,76%). Embora seja
também utilizada na língua escrita para expressar relação de conseqüência entre
orações, “então” aparece repetidas vezes durante o discurso oral, para mostrar a
seqüência de fatos apresentados pelo interlocutor. Seu uso é tão freqüente na fala que,
algumas vezes, ela é usada apenas para dar continuidade à conversa, sem,
necessariamente, apresentar qualquer relação com o que foi dito anteriormente; por
exemplo: “Com as crianças então esperamos que não haja maiores problemas” e
Então eu tenho muita muita tarefa também fora” (trecho de DI). A interjeição “ahn”,
bastante freqüente em DI, é marca típica da oralidade e aparece como marca de
interação entre os interlocutores, isto é, aquele que ouve usa esta expressão para
mostrar sua atenção em relação ao que está sendo dito.
Em 10 coisas que eu odeio em você, “então” aparece na 99ª posição (freq.
18; 0,28%) e a interjeição “ahn”, na 53ª (freq. 07; 0,11%). Em Meninas malvadas,
“então” aparece na posição 25 e a interjeição não aparece. Em outras palavras, é
possível perceber que os aspectos da oralidade presentes em DI não aparecem com a
mesma freqüência nas legendas dos filmes, embora estas últimas sejam textos que
representam a fala dos personagens.
Para concluir esta parte da análise, verificamos que, nos textos utilizados,
oralidade e escrita apresentam aspectos diferentes quanto à utilização de palavras e
expressões durante sua realização: os textos orais tendem a manter, principalmente, as
marcas de interação com o interlocutor, ao passo que, nos textos escritos, esta
característica tenha uma tendência a desaparecer.
A seguir, analisamos o uso da linguagem formal nas legendas dos filmes
escolhidos e sua influência na representação da oralidade na escrita.
3.3 O USO DA LINGUAGEM FORMAL NAS LEGENDAS DE 10 COISAS QUE
EU ODEIO EM VOCÊ E MENINAS MALVADAS
As expressões apresentadas a seguir foram traduzidas a partir da linguagem
informal no inglês americano para a linguagem formal no português do Brasil. As
regras gramaticais envolvidas nas traduções foram: a conjugação dos verbos em
tempos não comuns à língua falada; a posição do pronome oblíquo na frase, não
freqüente em situações informais; a rejeição à forma contraída de algumas
preposições, bastante comuns à língua falada; e o uso de vocabulário não comum na
oralidade.
Pawley e Syder (1983:193; apud Araújo, 2001:06) afirmam que os falantes
de uma língua usam somente um pequeno número de estruturas durante sua fala. Estas
estruturas dizem respeito às combinações gramaticais e a um determinado conjunto de
vocabulários aos quais o falante nativo de uma língua recorre quase que
inconscientemente durante uma conversa. Por outro lado, o vocabulário utilizado na
escrita, por exemplo, procura fugir do trivial e recorre a palavras consideradas mais
rebuscadas para a elaboração de um texto.
Nas legendas do filme 10 coisas que eu odeio em você, a tradução
acompanhou os padrões da escrita e adotou o uso de vocabulário não comum à língua
falada como recurso de elaboração para o seu texto.
Nos exemplos mostrados a seguir, e em todos os outros desta seção, os
exemplos foram colocados em quadros onde a primeira coluna corresponde ao texto
oral do filme indicado, enquanto, na segunda coluna, aparecem as legendas
correspondentes ao trecho em inglês. É importante mencionar que as legendas dos
quadros, nem sempre, correspondem às linhas do texto oral devido a sua formatação.
Um espaço maior entre uma linha e outra, indica que houve mudança de legendas na
tela, enquanto a ausência deste indica a exibição simultânea das linhas. Os grifos em
algumas palavras dos exemplos são apenas ilustrativos, não constam nas legendas
originais. Vejamos os dados, conforme o item observado.
3.3.1 VERBOS
Quadro 15 – DC
56
:
Exemplos de tempos verbais usados na fala dos personagens e suas legendas correspondentes
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
You won’t find
Você não achará
You could give me a ride home?
Você me daria uma carona?
Would you do that, for me?
-E faria isso por mim?
Oh, I don’t know.
Maybe we should ask Kat.
Não sei. Seria melhor
perguntarmos pra Kat.
I thought you could use it.
Achei que gostaria de usá-la
The night I take you to places you've
never been before.
Será a noite que te levarei
a lugares que nunca viu antes.
You’re going to pay me to take out some chick?
Você me pagaria para
sair com uma garota?
56
10 coisas que eu odeio em você.
Quadro 16 – MM
57
:
Exemplos de tempos verbais usados na fala dos personagens e suas legendas correspondentes
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
You wouldn’t buy a skirt without asking your
friends first.
Você não compraria uma saia
sem pedir a opinião das amigas.
Then everybody would see what she really is.
Todo mundo saberia
que ela é nojenta.
Why would we get you into trouble. We’re your
friends.
Acha que criaríamos problemas
para você? Somos seus amigos.
I’ll be the warthog.
Eu serei o javali.
A little slice like you will get socialized.
Para uma gata como você, será fácil.
Don’t worry, we’ll find out who did it.
Não se preocupe.
Descobriremos o responsável.
Em inglês, os verbos não sofrem grandes mudanças se usados na fala ou na
escrita, no entanto, é possível observar alguns aspectos quanto usados em situações
informais. Nos Quadros 15 e 16, observamos construções do tipo “won’t”, “you’re”,
“you’ve” e “I’ll”, cujas contrações são mais usuais em textos orais e em textos
informais
A conjugação dos verbos principais no futuro simples e no futuro do
pretérito do indicativo não é comum na oralidade de falantes nativos do português do
Brasil, principalmente durante uma conversa informal. Nestes casos, o falante,
normalmente, opta pelo uso de um auxiliar (vou, vai, ia – forma abreviada de “iria”)
seguido do verbo principal no infinitivo (“achei que ia gostar de...”, “vai ser a noite
que vou te levar”, “você vai me pagar”) ou usa o verbo principal no presente simples
(“você ma dá uma carona?”, “é melhor perguntarmos”).
3.3.2 A POSIÇÃO DO PRONOME OBLÍQUO NA FRASE
Os pronomes oblíquos utilizados nas legendas aparecem após o verbo,
portanto em situação de ênclise. Esta é uma norma trazida nas gramáticas, segundo as
quais não devemos começar orações com esse tipo de pronome sob pena de incorreção
gramatical. Os casos apresentados a seguir foram retirados dos filmes estudados:
57
Meninas malvadas.
Quadro 17 – DC:
Exemplos de pronomes usados na fala dos personagens e suas legendas correspondentes
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
We’re making our visits a weekly ritual
Patrick Verona! Suas visitas
tornaram-se um ritual semanal
Tell me something true
Diga-me algo verdadeiro
I thought you could use it
Achei que gostaria de usá-la
Follow the love
Guie-se pelo amor
So you’re just gonna start wearing them now?
E agora vai usá-las?
He was gonna nail you tonight.
Ia levá-la pra cama hoje.
Just make sure she gets to the prom.
Leve-a ao baile.
Turn. Explain.
Vire-se.
Explique-se.
Get up, you little punk!
Levante-se, idiota.
Quadro 18 – MM:
Exemplos de pronomes usados na fala dos personagens e suas legendas correspondentes
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
Yeah, I’ll call you Caddy.
Vou chamá-la de Caddy.
Come on! We could publish it.
Podemos publicá-lo.
I know. Just get rid of her.
Eu sei. Livre-se dela!
Focus on your studies for a while.
Concentre-se nos seus estudos.
Than tell me what in the world that Regina says.
Depois conte-me tudo o que ela falar.
Give me it.
Deixe-me ver.
All right, have a good time, everyone.
Divirtam-se a valer.
Em relação ao pronome oblíquo, podemos dizer que, oralmente, não é
comum o uso da ênclise no português do Brasil. Durante uma conversa, o falante tende
a usar o pronome antes do verbo ainda que seja início de frase. Este comportamento
dos falantes, em relação ao uso do pronome oblíquo, é particular a nossa cultura e não
ocorre em inglês, que, normalmente, utiliza o pronome após o verbo.
3.3.3 O USO DE PREPOSIÇÕES
Quadro 19 – DC:
Exemplos de preposições usadas na fala dos personagens e suas legendas correspondentes
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
To get you out of detention
Para te livrar do castigo
He’s rumored to have a big tube sock ad
Coisas locais, mas parece que
sairá em um comercial de meias
I didn't pay you to take out Kat
Não te paguei para convidar a Kat,
You were paid to take me out!
-Foi pago para sair comigo...
No. Daddy found them in a drawer last week.
Não. Papai as encontrou
em uma gaveta na semana passada.
Quadro 20 – MM:
Exemplos de preposições usadas na fala dos personagens e suas legendas correspondentes
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
She tells everybody.
Ela conta para todo mundo.
That is for yor feet.
É creme para o pé.
I hope you do join mathletes.
Espero que entre para os matletas.
Diving into a pile of girls.
Mergulhar em um monte de meninas.
You’ve never been to a real school before?
Então nunca esteve em uma escola?
Ex-boyfriends are off-limits to friends.
Ex-namorados são proibidos
para as amigas.
Wait, I have this really good skin stuff I’ll bring
you.
Tenho um creme para a pele
incrível para você.
Outro aspecto bastante comum na oralidade é que os nativos procuram a
forma mais simplificada para se expressar durante uma conversa. Desta forma, não é
raro encontrarmos a supressão de “s” finais ou a junção de preposições e artigos, como
“pra” (para + a), “num” (em + um) e “numa” (em + uma). Em inglês, essas contrações
entre preposição e artigo não acontecem, além de haverem vários casos nos quais os
verbos não são preposicionados, enquanto os verbos, utilizados para situações
semelhantes em português, pedem o uso de preposição.
3.3.4 O USO DE VOCABULÁRIO NÃO COMUM NA ORALIDADE
Quadro 21 – DC:
Exemplos de vocabulário não comum na oralidade usados na fala dos personagens e suas
legendas correspondentes
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
‘Cause I read about this place that rents out
boats...
um lugar que aluga barcos...
You've had me on the bench for years.
Você anos me deixa na reserva.
Yup, see, there’s a difference between “like” and
“love”.
É, mas uma diferença
entre gostar e adorar.
Follow the love
Guie-se pelo amor
He was an abusive, alcoholic misogynist.
Era um alcoólatra e misógino.
O verbo “haver”, por exemplo, não é recorrente na oralidade da mesma
forma que “ter” ou “existir”; “guiar-se” também é mais freqüente na escrita enquanto
“seguir” é mais comumente utilizado na fala. “Misógino” é uma palavra praticamente
desconhecida em português, caso o espectador não saiba que misógino é “aquele que
tem aversão a mulheres e a relações sexuais”
58
, provavelmente ficará sem
compreender a crítica feita por Kat ao famoso escritor Ernest Hemingway durante uma
aula de literatura. No entanto, nesse caso, o uso de vocabulário incomum parece ter
sido usado em função da personagem ter utilizado uma linguagem mais rebuscada e
não, propriamente, como estratégia de tradução. O uso de vocabulário não comum na
oralidade não foi observado na tradução das legendas do filme Meninas malvadas.
3.4 FRASEOLOGIAS EM 10 COISAS QUE EU ODEIO EM VOCÊ E MENINAS
MALVADAS
O exemplo a seguir é bastante interessante por dois motivos: primeiro
porque “shit” aparece em uma expressão fixa, sendo, portanto, uma fraseologia;
segundo porque “shit” é utilizada no sentido mais literal de todos os exemplos
mencionados anteriormente, ou seja, no sentido de excremento (“excrement” – AS),
substância fisiológica eliminada pelo corpo dos seres vivos – fato não ocorrido antes; e
terceiro porque, embora a palavra seja utilizada em seu sentido mais literal, a situação
para a qual ela foi usada é metafórica, no sentido de “a barra sujou”.
De acordo com Harper (2001), a expressão “the shit hits the fan” tem
relação com uma piada antiga, e pode ter se originado a partir dela. Segundo o autor,
um homem estava em um bar lotado e, de repente, sentiu vontade de defecar. Como
não conseguiu encontrar o banheiro, subiu as escadas e resolveu o problema em um
buraco que encontrou no chão. Ao descer, não havia mais ninguém no bar, exceto o
garçom escondido por detrás do bar. Quando o homem perguntou aonde estava todo
mundo, o garçom respondeu: “The shit has hit the fan”.
58
Definição do Dicionário Ilustrado Urupês.
Exemplo 01 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- ...didn't pay you to take out Kat so that some
little punk could snake me with Bianca. -
Nothing in it for you, huh?
- The shit has hit the the fan
...eth.
Não te paguei para convidar a Kat,
e um idiota me tirar a Bianca.
Então não ganhou nada?
A bosta bateu
...
no ventilador
.
Considerando que a expressão tenha se originado dessa piada, podemos
dizer que “the shit has hit the fan” é um clichê porque, ao ser usada por um falante, ela
não se refere mais à piada, porém à situação em si. A expressão serve de alerta para
que a pessoa saia de cena antes que a situação se complique.
O termo usado em português também refere-se à substância fisiológica
excretada pelos seres vivos e também possui um sentido metafórico no caso em
questão – não havia “bosta” nem havia ventilador de verdade. No entanto, a tradução
não é clichê em português nem tampouco uma expressão usada comumente por
falantes nativos do português do Brasil. Em uma situação semelhante, a expressão
usada seria “a barra sujou” ou, até mesmo, “o troço fedeu”.
A seguir, apresentamos uma expressão correntemente utilizada no inglês. O
interessante é que, a partir das situações verificadas no filme, ela parece ter adquirido
um outro significado do comumente usado pelos falantes da língua inglesa.
Inicialmente, esta expressão era usada apenas com o sentido mais literal, ou seja, de
pedir ou ordenar que alguém parasse de falar, no entanto, não é esse o significado que
a expressão adquire no filme. Todas as vezes em que esta expressão foi usada, ela
expressava a idéia de surpresa ou incredulidade diante de alguma situação.
Na primeira situação, Cady conversa com Regina e suas amigas em seu
segundo dia de aula na nova escola. Regina olha para Cady e, sem que a novata tenha
dito qualquer coisa, fala “shut up”. Cady fica surpresa com a atitude de Regina e diz
que não tinha falado nada; mesmo percebendo que Cady não tinha entendido o
significado da expressão, Regina não se dá ao trabalho de explicar e muda de assunto.
No segundo momento, Cady elogia a blusa de um colega sem ele ter falado
nada antes dela.
Exemplo 02 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
-Shut up.
-Shut up! I didn’t say anything.
Quieta!
Quieta!
Eu não disse nada.
Shut up. I love that shirt on you.
Quieto. Adorei a sua camisa.
A tradução dada para as situações mencionadas foi “quieta” e “quieto”,
respectivamente. Em programa destinado ao público adolescente exibido pela rede
Globo, conhecido por “Malhação”, os personagens costumam utilizar a expressão
“quieto(a)” para as mesmas situações apresentadas no filme, portanto, podemos
afirmar que o tradutor adaptou o texto da legenda levando em consideração a cultura
brasileira e o público espectador do filme: adolescentes, na grande maioria.
Outra expressão freqüentemente utilizada no inglês é “what has somebody
been up to”. Esta expressão é uma fraseologia e é usada para saber como alguém está e
o que tem feito desde a última vez que esteve junto com o interlocutor. Durante um
encontro da garota com as amigas, a mãe de Regina entra no quarto, tentando se
entrosar e puxar conversa. Para isso, ela usa gírias que julga serem do mundo
adolescente.
Exemplo 03 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
What has everybody been up to?
O que vocês estão aprontando?
A tradução aqui, novamente, foi adaptada para uma linguagem adolescente,
porque a mãe de Regina age como uma adolescente, tentando se aproximar da filha. A
expressão “o que estão aprontando”, é usada em português quando um adulto quer
saber se uma criança ou adolescente, por exemplo, está fazendo alguma danação,
porém sem exigir dela explicação; seria apenas uma tentativa de aproximação.
Na mesma situação mencionada no exemplo anterior, a mãe de Regina
também usa a expressão “what is the 411”, entretanto, não encontramos em nenhum
dicionário o significado dela. Possivelmente, este seja o número de um informador de
fofocas, ou disque-namoro, ou algo parecido, que leva os pais à loucura quando
recebem a conta telefônica.
Exemplo 04 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
So, you guys, what is the 411?
Então, meninas qual é a parada?
Assim como ocorreu no exemplo passado, este caso recebeu uma adaptação
na tradução para a linguagem “descolada” dos adolescentes.
Outras fraseologias foram identificadas em ambos os filmes, contudo, os
casos que mais despertaram nosso interesse foram os mencionados nos exemplos desta
seção. A seguir, tratamos dos clichês de raiva identificados nos filmes e suas traduções
para as legendas.
3.5 OS CLICHÊS DE RAIVA – PALAVRÕES – EM 10 COISAS QUE EU
ODEIO EM VOCÊ
No filme 10 coisas que eu odeio em você, foram encontrados 31 clichês de
raiva, no entanto, escolhemos para trabalhar somente aqueles com freqüência superior
ou igual a dois. Entre os palavrões selecionados, foram escolhidos para a análise
foram: “shit”, “bitch”, “suck” e “punk”.
“Shit” e “bitch” foram os casos mais abundantes, ou seja, com maior
freqüência (7) e maior variedade de exemplos. Com o auxílio de dicionários de
clichês, expressões idiomáticas e gírias do inglês, estabelecemos o sentido usado em
cada uma das situações localizadas no corpus.
a) O caso de “shit”
De acordo com os dicionários pesquisados, a palavra “shit” pode ser usada
em uma variedade de sentidos.
Como é possível observar, “shit” (freq.07; 0,09%) é uma palavra rica em
sentidos, podendo ser utilizada em variadas situações. Contudo, além dos sentidos
indicados pelos dicionários, outros usos foram observados nos diálogos do filme 10
coisas que eu odeio em você:
Exemplo 01 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Sweet love, renew thy force!
- Hey, man! Don't say shit like that to me.
People can hear you.
- Look. You embarrassed the girl.
“Doce amor, renove tuas forças”.
Não diga essas besteiras.
Alguém pode ouvir.
Você envergonhou a garota.
No exemplo mencionado, Patrick, Cameron e Michael conversam a respeito
das investidas de Patrick na conquista de Kat, considerada a garota mais difícil da
escola. Tentando impressionar a garota, Patrick se nega a beijá-la na noite anterior,
fato que deixa Kat furiosa. Tentando aconselhar o amigo, Michael cita um trecho da
obra de Shakespeare em pleno refeitório e deixa os amigos bastante constrangidos.
Neste caso, a palavra “shit” foi usada no sentido de bobagem, besteira,
conversa falsa, falas absurdas ou insolentes (“nonsense, pretentious talk, bold and
deceitful absurdities” – AS
59
). Por meio deste exemplo, é possível notar que, embora
continue sendo um clichê de raiva, ou seja, um palavrão, “shit” não está sendo usada
para ofender ninguém, porém para referir-se ao tipo de conversa que alguém está
tendo. A tradução “besteiras” também se refere à frase poética proferida pelo
personagem e considerada asneira e constrangedora pelo amigo.
O que oferece mais força enfática ao texto oral em inglês é o fato da palavra
usada possuir a mesma forma escrita e pronúncia do palavrão “bitch”. Em português, a
força do sentido dado à conversa é suavizada, pois “besteira” não é considerado um
palavrão. Em situação semelhante, provavelmente, um adolescente usaria a palavra
“merda”.
No próximo exemplo, o sentido é outro, o personagem expressa sua raiva
por meio de uma exclamação de desgosto, descontentamento diante da situação
enfrentada (“an exclamation of disbelief, disgust, disappointment, emphasis” – AS).
Nestas ocasiões, o clichê em tela é, normalmente, traduzido por “droga” nas legendas
59
(AS) – CHAPMAN, Robert L. American Slang. New York: Perennial Library, Ed. Harper & Row, Publishers
– Cambridge, Philadelphia, San Francisco, Washington, London, Mexico City, São Paulo, Singapore, Sydney,
1987.
de filmes americanos ou fica sem tradução, como aconteceu nos exemplos 02 (dois) e
03 (três), respectivamente.
Esse trecho (exemplo 02) ocorre no final do filme quando Kat descobre que
Patrick havia recebido dinheiro de Joey para conquistá-la e assim ajudar Bianca, a
irmã mais nova, a namorar. Joey fica furioso ao descobrir que, após investir dinheiro
para poder sair com Bianca, a garota se apaixona por Michael. Querendo vingar-se,
Joey bate em Cameron e ofende Bianca que, em resposta, acerta um soco no nariz do
agressor.
Exemplo 02 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Shit, Bianca! I’m shooting a nose spray ad
tomorrow!
- That's for making my date bleed... That's for my
sister... And that's for me.
Droga, Bianca!
Gravo um comercial amanhã!
Isso foi por machucar meu amigo.
Isto é pela minha irmã.
E este é por mim.
“Shit” é a resposta de Joey tanto pela dor quanto pelo prejuízo estético que
tivera por conta do soco, visto que o personagem gravaria um comercial no dia
seguinte. Por estas razões a palavra mencionada possui uma carga muito forte de
sentimento de raiva, sentimento este extravasado no momento da fala. “Droga” é um
clichê de raiva em português podendo ser utilizado em situações semelhantes a
anterior, contudo possui uma carga semântica mais amena. Além disso, “droga” é mais
bem aceito socialmente do que “porra”, por exemplo, que seria naturalmente usado na
situação.
No exemplo de número 03 (três), Cameron é o monitor de francês de Bianca
que, frustrada em suas expectativas, profere um “palavrão” como protesto. “Shit” é a
exclamação de descontentamento utilizada por Bianca. Note-se que a carga semântica
carregada por “shit” neste caso não é tão forte quanto no caso anterior, no entanto, ela
possui uma função na comunicação bastante específica: mostrar a uma pessoa a
indignação de outrem.
Exemplo 03 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- That, that’s not on this page.
- Let me ask you a question, Cameron. When are
you going to ask me out? Shit.
Espera aí.
Isto não está nesta página.
Uma pergunta, Cameron.
Quando vai me convidar pra sair?
Em português, nenhuma expressão é usada para a situação em questão. Na
sociedade brasileira, é comum ensinar-se às crianças que “meninas bem-educadas não
falam palavrões”. Talvez, o fato de Bianca ser uma adolescente do gênero “menina
meiga” tenha influenciado a omissão de um clichê de raiva nesta situação.
Na cena seguinte, Kat e seus colegas assistem à aula de literatura, na qual o
professor pede aos alunos para escreverem sua própria versão do poema lido. É
importante mencionar que o professor em questão é um jovem homem negro de ideais
socialistas, revoltado com as injustiças sociais impostas pelos brancos “burgueses de
classe média-alta”. É um professor bastante descontraído, informal, em suas aulas e de
fala repleta de gírias. Nesta ocasião, o professor lê o trecho de uma poesia de
Shakespeare e tece comentários a respeito do autor e sua obra:
Exemplo 04 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Now, I know Shakespeare’s a dead white guy.
But he knows his shit, so we can overlook that. I
want you all to write your own version of this
Sonnet.
Sei que Shakespeare é branco
e morreu, mas entendia das coisas...
portanto, deixem pra lá.
Quero que escrevam
a sua versão deste soneto.
Um dos sentidos localizados nos dicionários para esta palavra é o de algo de
pouco valor ou qualidade inferior (“Something of little value” – WR
60
; “anything of
shoddy and inferior quality” – AS). Tratando-se de Shakespeare, é pouco provável que
o professor tenha se referido ao seu trabalho como algo de pouco valor, muito embora
criticasse o fato do autor ser branco e falecido. Preferimos considerar que, neste caso,
a palavra “shit” não foi traduzida. Talvez o fato de ter sido proferida pelo professor,
uma autoridade de quem se espera comportamento e fala “politicamente corretos”,
60
(WR) – Word Reference Online Dictionary: www.wordreference.com. Acessado em 12/02/07.
tenha levado o tradutor a omitir a tradução. Isto porque seria estranho ouvir um
professor falando um palavrão em sala de aula, na frente de seus alunos.
A expressão a seguir poderia ser enquadrada no caso das expressões
fraseológicas, contudo, o fato de conter a palavra “shit” em sua formação nos fez
colocá-la junto dos clichês de raiva. “Shit-for-brains” é a expressão utilizada pela
diretora da escola ao referir-se, com desdém, aos alunos da escola. A diretora é uma
senhora escritora de histórias pornográficas e com profundo interesse pelas partes
íntimas do herói de sua história. Sua forma de se expressar impressiona até mesmo o
aluno novato com quem conversa na diretoria.
Exemplo 05 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- That’s enough. I'm sure you won't find Padua
any different than your old school. Same little
asswipe shit-for-brains everywhere.
- Excuse me. Did you just say... Am I in the right
office?
- Not anymore you’re not.
Garanto que Pádua não será
diferente das outras escolas.
Os mesmos idiotas pra todo lado.
Desculpe? Você disse?!
Estou no escritório certo?
Não está mais.
É interessante observar que, neste caso, o aluno novato, Cameron, fica
perplexo por ouvir a diretora referir-se aos alunos como “shit-for-brains”. Seu espanto
é tanto que chega a questionar se está na sala correta. Em português, a palavra
utilizada na legenda é “idiota”, um clichê de raiva, porém não considerado “palavrão”,
ou seja, sua carga semântica é bem mais suave e, da mesma forma que “droga”, é
aceito socialmente sem a censura das expressões consideradas tabu.
b) O caso de “bitch”
O clichê de raiva “bitch” (freq.07; 0,09%) é também uma das palavras que
aparece comumente no filme 10 coisas que eu odeio em você. É uma palavra bastante
recorrente na linguagem oral inglesa e, da mesma forma que “shit”, recebe sentidos
diferentes dependendo do contexto em que está sendo utilizada. De acordo com o
Dictionary of the Vulgar Tongue
61
, “bitch” é a maior ofensa que uma mulher pode
61
Dictionary of the Vulgar Tongue. In: Dictionary.com. www.dictionary.com. Sited: 30/05/07.
receber, ou seja, é o clichê de raiva de maior carga semântica se comparado aos
demais – “whore”, por exemplo.
Na situação mostrada a seguir, Kat conversa com a diretora a respeito do
que as pessoas pensam em relação a Kat. Sem cerimônia, a diretora usa novamente um
termo nada apropriado para a posição que ocupa. Diferentemente de Cameron, o aluno
novato, Kat não estranha o termo utilizado pela diretora e recebe como natural. Dois
fatos podem ter contribuído para a naturalidade de Kat ao ouvir o termo empregado:
primeiro, o fato de ser aluna veterana e conhecer o estilo pouco ortodoxo da diretora e,
segundo, a indiferença de Kat com relação ao que as pessoas pensam e falam a
respeito dela.
Exemplo 06 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- People perceive you as somewhat ...
- Tempestuous?
- "Heinous bitch" is the term used most often.
As pessoas a acham um tanto...
Tempestuosa?
Cadela infame
é a expressão usada.
Seria bom trabalhar nisso.
Neste exemplo, o termo “bitch” é usado para uma mulher odiada ou
reprovável no comportamento, principalmente se for considerada uma mulher má e
sem coração. Em inglês, esta palavra pode ser considerada o equivalente feminino de
bastard, termo geralmente utilizado para expressar desonra (A woman one dislikes or
disapproves of, esp a malicious, devious, or heartless woman - the equivalent of the
masculine bastard as a general term of opprobrium” – AS), para referir-se a uma
pessoa reprovada pelas outras pelo seu comportamento devasso e/ou extremamente
malévolo. De todas as definições localizadas para o termo, este é o que apresenta,
semanticamente, o sentido mais forte, é um clichê de raiva utilizado exclusivamente
com a intenção de ofender àquela a quem o termo é dirigido.
Kat se enquadra nesta definição: é uma garota rebelde, intransigente e de
poucos amigos. Sempre que pode, adora frustrar as expectativas das pessoas à sua
volta, por este motivo é odiada ou temida pelos que a conhecem. Nenhum dos garotos
da escola se atreve a cortejá-la, o único com coragem suficiente para “domar a fera”,
Patrick, só se envolve com a garota porque recebe dinheiro de Joey, um modelo
interessado em sair com a irmã mais nova, Bianca.
A tradução apresentada nessa situação é “cadela” e, embora este seja um
termo de insulto em português, “puta” ou “filha-da-puta” seriam as expressões usadas
em situações semelhantes no Brasil.
O adjetivo que acompanha “bitch” na situação em questão é “heinous”, uma
palavra do inglês formal que expressa algo moralmente muito ruim (“formal – morally
very bad” – OD
62
). Sendo uma palavra formal da língua inglesa é pouco provável que
tenha sido utilizada pelas “pessoas” que se referiram à Kat por “bitch”. É possível que
o adjetivo tenha sido acrescentado pela diretora, uma escritora de vocabulário
excêntrico, que parece também não gostar muito de Kat.
Novamente em sala de aula, o professor responde a uma provocação de
Joey:
Exemplo 07 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Is there any chance we could get Kat to take
her Mydol before she comes to class?
- Some day you’re gonna get bitch-slapped and
I’m not gonna do a thing to stop it.
Será que Kat não poderia tomar
um Midol antes de vir à aula?
Um dia desses você levará
a sua e eu não vou impedir.
Da mesma forma que ocorreu no exemplo 05 (cinco) em relação à palavra
“shit”, “bitch-slapped” também não é traduzido, pelo menos não de maneira explícita.
Digo explícita porque “levar a sua”, em português, é uma fraseologia comumente
utilizada para alertar ou ameaçar alguém de que algum dia receberá o castigo
merecido. Assim, um complemento possível para a expressão seria “levar a sua
punição, correção”. “Slap”, em inglês, também concebe a idéia de castigo, de ser
espancado ou surrado. Entretanto, não é ser espancado de qualquer forma, é ser
“slapped” como uma “bitch”. “Bitch” funciona como um adjetivo, um modificador de
“slap” então a idéia seria de “apanhar como uma vagabunda”, de modo humilhante e
vergonhoso.
62
OD - HORNBY, A.S (2000). Oxford Advanced Learner’s Dictionary of Current English. Oxford New
York, Ed. Oxford University Press, 6
th
ed.
Acreditamos que a suavização na tradução de “bitch-slapped”, se
considerarmos que houve uma tradução implícita, tenha sido motivada pelos mesmos
motivos apresentados no exemplo 05 (cinco): o fato de ter sido proferida pelo
professor, uma figura sacralizada na posição de educador a quem não se admite a
utilização de um vocabulário rude ou ofensivo.
Nos três exemplos seguintes, é possível que em uma primeira análise, o
leitor chegue à conclusão de que são todos casos em que a suavização foi utilizada
como estratégia na tradução da palavra “bitch”. Parece-nos ser verdade para os
exemplos 10 (dez) e onze (11), contudo não é o que ocorre no exemplo 08 (oito).
Nesse exemplo, Bianca conversa com Cameron a respeito da irmã, Kat, e se
refere a ela como “bitch”:
Exemplo 08 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- There is a [bet] as to why, but I’m pretty sure
she’s just incapable of human interaction. Plus,
she’s a bitch.
Há teorias sobre o motivo, mas sei
que é incapaz de interação humana.
E ela é um saco.
A situação vivida por Bianca e Kat no filme é bastante característica, um
retrato do que ocorre no relacionamento entre irmãos. No dia a dia, é comum que
irmãos briguem e até xinguem um ao outro, contudo, existem alguns termos pré-
estabelecidos no xingamento entre eles: “Você é um saco”, “Seu chato”, “Sua boba”,
“Você é idiota”, etc. isso porque, em muitos casos, os próprios pais não permitem que
os termos saiam deste nível. No caso de Bianca e Kat, as duas irmãs se amam, muito
embora vivam em conflito recíproco. Kat censura Bianca por querer aparecer e fazer
tudo o que as pessoas esperam que ela faça. Bianca, por sua vez, critica Kat por ser
rebelde e não querer envolver-se com os que estão a sua volta. Seria uma contradição
Bianca chamar a irmã de “vagabunda”, “galinha”, “piranha” ou “puta” sabendo que a
irmã não tinha namorado e que raramente saía de casa.
É possível que, em um primeiro momento, um espectador brasileiro, falante
do inglês como língua estrangeira, seja levado a pensar que a palavra “bitch” não
recebeu a tradução esperada, pois as traduções mais freqüentes desta palavra em filmes
são “cadela”, “vagabunda” e “vaca”. No entanto, como mencionado anteriormente,
esta é uma situação particular de uso em que o termo “bitch”, apesar de ser insulto, é
empregado em seu sentido mais suavizado.
O mesmo não acontece nos exemplos que se seguem, nos quais o insulto é
proferido como conseqüência de uma grande raiva ou indignação. Isso acontece
quando Joey estaciona sua Ferrari atrás do carro de Kat, impedindo que ela saia do
estacionamento. Contrariada, a garota passa a ré no carro e bate no carro de Joey. Pego
de surpresa pela reação de Kat e indignado pelo estrago no carro, Joey xinga Kat.
Exemplo 09 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- What is it? Asshole day? Hey! Do you mind?
- Not at all. You bitch!
É o dia dos idiotas?
-Você se importa?
-Nem um pouco.
Sua nojenta!
Neste caso, “bitch” é usado em uma situação de extrema raiva e vontade de
ofender o causador da raiva. A tradução “nojenta” em português ameniza a seriedade
da situação porque, em uma situação semelhante, um brasileiro possivelmente
recorreria aos piores palavrões conhecidos para xingar a outra pessoa.
Logo em seguida a esta cena, Joey conversa com Patrick e menciona o
ocorrido no estacionamento onde Kat estragara seu carro. Além da indignação pelo
estrago do carro, Joey se aborrece por ter dado dinheiro a Pat para sair com Kat e este
ainda não ter conseguido nada. Assim sendo, Kat é a culpada por tudo o que vai de
errado na vida de Joey e o insulto é proferido novamente.
Exemplo 10 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- When I shell out fifty, I expect results.
- Yeah, I'm on it.
- Watching the bitch violate my car doesn't
count as a date. If you don’t get any, I don’t get
any. Let’s go get some.
-Pago $50, mas quero resultados.
-Estou tentando.
Ver essa doida amassar meu carro
não conta como encontro.
Se você não consegue nada,
eu não consigo nada.
Por isso, consiga algo.
A tradução realizadada é “doida” e, da mesma forma que o ocorrido no
exemplo anterior, há uma suavização do clichê “bitch”.
Quando, finalmente, consegue convencer a irmã a sair de casa, Bianca vai a
uma festa com Joey e sua melhor amiga, Chastity. Aborrecida, por não ser o centro das
atenções de Joey, Bianca decide ir embora e recusa um convite de Joey para ir até a
casa de um colega onde um grupo iria namorar, beber e dançar. Vendo a recusa da
amiga, Chastity se oferece para acompanhá-lo, mesmo sabendo do interesse de Bianca
pelo rapaz. Achando-se traída pela melhor amiga, Bianca desabafa sua raiva em um
indignado “bitch”.
Exemplo 11 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Chastity!
- Hey, you passed.
- Bitch.
- Hey. Have fun tonight?
-Chastity!
-Ei, você não quis.
Nojenta.
-Você se divertiu?
Em uma situação semelhante entre duas adolescentes brasileiras, “galinha”
seria o mais suave dos insultos proferidos à traidora em questão. Entretanto, seria uma
palavra demasiadamente rude para alguém como Bianca (nos parâmetros brasileiros),
uma “patricinha” doce a educada.
“Galinha”: esse é o termo traduzido para a seguinte situação: Joey descobre
que perdera o dinheiro investido em Bianca ao encontrá-la no baile com Cameron.
Furioso por descobrir que tudo não passava de um plano para que Cameron ficasse
com Bianca, Joey decide tirar satisfações e vingar-se de Cameron e Bianca.
Exemplo 12 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Listen... You messed with the wrong guy, and
now you’re gonna pay. You, and that little bitch.
Você se meteu com o cara errado.
Você me paga.
Você e essa galinha.
Ao sentirem-se traídos pelo objeto de seu desejo, os homens normalmente
escolhem denegrir a imagem daquela pela qual foram largados. O alvo mais comum é
a integridade da moça, sugerindo que ela não é digna de confiança, que é volúvel e
muda, com freqüência, de companheiros.
c) O caso de “suck”
Comparando com os casos anteriores, “suck” (freq.04; 0,05%) não foi um
caso tão recorrente nos diálogos do filme 10 coisas que eu odeio em você. No entanto,
além de sua freqüência superior a dois, este termo apresenta situações de uso bastante
peculiares.
Assim como “shit” e “bitch”, “suck” pode ser usado com sentidos mais ou
menos agressivos. Além de seu sentido mais literal: sugar com a boca (draw into the
mouth by creating a practical vacuum in the mouth – WR), “suck” também pode ser
usado no sentido mais metafórico de sugar (como, por exemplo, “Alguns políticos se
elegem apenas para mamar nas tetas do governo”.). No sentido mais pejorativo, temos
desde enganar alguém (“to deceive someone” – NTC’s
63
), ser rude a ponto de merecer
repreensão ou nojento (“to be disgusting or extremely reprehensible, be of wretched
quality – AS) até o sentido de sexo oral no homem (“to do fellatio – AS).
A situação a seguir é a mesma apresentada no exemplo 12, em que Bianca
vai à festa com Joey e fica aborrecida por não receber a atenção esperada por parte do
seu acompanhante.
Exemplo 13 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Okay, I’ll show you.
- Is it just me, or does this party all of a sudden
suck?
Olhem, vou mostrar.
Será que sou eu
ou a festa está uma droga?
Neste caso, “suck” foi usado no sentido de “to be wretched” e traduzido por
“droga”, um clichê do português brasileiro com aplicações em um grande número de
situações, podendo inclusive ser usada na situação mencionada. Além de “droga”,
“melou”, “fedeu”, “está um saco” e “está uma merda” também seriam opções para
descrever a festa que tinha tudo para ser legal e, de repente, perdeu a graça.
Como em tantos outros momentos do filme, Kat e Bianca discutem pelo fato
de Bianca estar tão interessada em Joey, um “cachorro e galinha” na opinião de Kat.
Sem saber que a irmã teve um relacionamento com o rapaz no passado, Bianca
63
SPEARS, Richard A. NTC’s American Idioms Dictionary – The most practical reference to the everyday
expressions of the contemporary American English. Illinois, USA: National Textbook Company, 1987.
questiona a implicância de Kat com o namoro e, em respota, xinga a irmã mais velha
que devolve o mesmo insulto em tom de provocação.
Exemplo 14 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Looks like you’ll just have to miss out on the
witty repartee of Joey “eat me” Donner.
- You suck.
- You suck.
Desculpe. Vai perder o papo esperto
do Joey “Coma-me” Donner.
Sua chata!
“Sua chata”.
Conforme comentamos anteriormente no exemplo 09, a briga entre irmãos é
um caso bastante singular que, normalmente não envolve xingamentos de sentidos
pejorativos extremos. Entretanto, expressões do tipo “você é um saco”, “se foda” e
“você é foda” também poderiam ser usadas se a situação acontecesse no Brasil.
Novamente, “chata” foi o termo escolhido para ser a tradução da situação mostrada
entre Kat e Bianca.
Como podemos observar, nenhum dos exemplos apresentados envolvendo a
palavra “suck” recorreu ao seu sentido mais pejorativo, como resultado, as traduções
também resultaram em expressões mais amenas, no sentido de não serem
extremamente rudes ou ofensivas.
d) O caso de “punk”
Na pesquisa realizada em dicionários de clichês e expressões americanas,
“punk” (freq.02; 0,02%) apresentou uma variação semântica maior que o caso anterior.
Entretanto, nas duas situações em que foi utilizado no filme DC, “punk” foi usado com
o mesmo sentido: alguém inferior ou insignificante, incapaz de se defender durante
uma briga (“any inferior, insignificant person, like an ineffective fighter” – AS) e
inexperiente (“any young or inexperienced person” – AS). O adjetivo “litlle”, usado
nas duas situações, contribuiu para rebaixar ainda mais a figura do agredido.
Ambas as cenas, dos exemplos 16 e 17, acontecem no final do filme quando
Joey descobre a armação de Cameron e Michael para conquistar Bianca usando o
dinheiro que ele dera a Patrick. Querendo recuperar a sua honra de garanhão valente,
Joey chama Cameron para brigar.
Exemplo 15 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Hey! What's Bianca doing here with that cheese
dick? I didn't pay you to take out Kat so that
some little punk could snake me with Bianca.
O que a Bianca faz aqui
com esse imbecil?
Não te paguei para convidar a Kat,
e um idiota me tirar a Bianca.
Exemplo 16 – DC:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Alright, that’s enough! Okay? You crossed the
line.
- Oh come on! Get up, you little punk!
- Shit, Bianca! I’m shooting a nose spray ad
tomorrow!
Agora chega.
Passou dos limites.
Vamos.
Levante-se, idiota.
Droga, Bianca!
Gravo um comercial amanhã!
Comparando os rapazes, Joey é bem mais alto, forte e agressivo; Cameron é
o tipo “bom garoto”, magro, baixo e muito disciplinado. Como resultado, Cameron é
agredido no baile, e teria levado a pior se Bianca não se revelasse uma heroína dando
uma surra em Joey.
Em ambos os casos, “idiota” foi a tradução dada para “punk”, ou melhor,
“little punk”. Em português, um idiota é o mesmo que um tolo, alguém sem
inteligência, porém não necessariamente incapaz de se defender durante uma briga.
Um homem pode ser alto, forte, saber brigar e, ainda assim, ser um idiota.
Em uma situação semelhante no Brasil, quando um rapaz chama outro para
brigar, uma forma de inferiorizar o adversário é ofender a masculinidade do outro, ou
seja, “seu mulherzinha”, “seu frutinha”, “você não é de nada” são as expressões
usadas. A seguir, apresentamos os clichês de raiva identificados no filme Meninas
malvadas.
3.6 OS CLICHÊS DE RAIVA – PALAVRÕES – EM MENINAS MALVADAS
Em relação aos clichês de raiva, o filme Meninas malvadas apresentou uma
freqüência e uma variação de palavrões maior do que as identificadas no filme 10
coisas que eu odeio em você. É possível que este aumento no número de clichês de
raiva no filme Meninas malvadas esteja relacionado ao tipo de relacionamento
apresentado pelos personagens.
No filme 10 coisas que eu odeio em você, a trama envolve duas irmãs (Kat e
Bianca) e outros personagens sem nenhum elo forte de ligação anterior entre eles.
Cameron é novato no colégio, ou seja, possui uma amizade recente com as pessoas
com as quais se relaciona. Patrick é um mistério para todos a sua volta e passa a ter
contato com os outros personagens com o desenrolar da história. A situação mais tensa
vivida pelos personagens centrais é no final do filme quando a negociação feita entre
Joey e Patrick é revelada.
No filme Meninas malvadas, o relacionamento entre Cady, Regina e os
demais personagens centrais é um tanto diferente. O enredo central do filme gira em
torno dos conflitos existentes no “mundo das garotas”, dentro dos grupos de amigas
adolescentes. As brigas são, normalmente, causadas por invejas, fofocas e namorados.
O fato das meninas falarem mal umas das outras constantemente faz com que os
palavrões sejam usados com mais freqüência durante o filme.
Seguindo o mesmo critério utilizado para a análise dos clichês de raiva
identificados no filme 10 coisas que eu odeio em você, os clichês apresentados a seguir
são os de maior freqüência identificados no filme Meninas malvadas.
a) O caso de “bitch”
Em Meninas malvadas, “bitch” (freq.08; 0,08%) aparece com freqüência 07,
a mesma freqüência identificada em 10 coisas que eu odeio em você. No entanto, o
contexto desta palavra nas situações a seguir e a estratégia utilizada em sua tradução é
bem diferente dos aspectos abordados em 10 coisas que eu odeio em você.
Neste filme, o termo “bitch” foi utilizado por pessoas de posições sociais
distintas – o professor de Kat, a diretora da escola e alguns alunos – e por pessoas que
tinham um relacionamento íntimo diferente do tipo de relacionamento vivido com as
demais pessoas – as irmãs Kat e Bianca, por exemplo. É possível que tais aspectos (a
posição social e o tipo de relacionamento entre os personagens) tenham influenciado
as estratégias utilizadas na tradução de “bitch” em cada uma das 07 (sete) situações
identificadas em 10 coisas que eu odeio em você. Por estas razões, o termo foi
adaptado (exemplos 06, 08 e 12 – DC), suavizado (exemplos 09, 10 e 11 – DC) e até
mesmo cortado (exemplo 07 – DC) nas traduções analisadas.
Em Meninas malvadas, embora “bitch” apareça em diversas situações, o
sentido utilizado pelos personagens é o mesmo: uma mulher extremamente odiada (ao
menos no momento do insulto) por seu comportamento devasso, cruel ou desleal (“a
woman one dislikes or disapproves of, esp a malicious, devious, or heartless woman” –
AS).
Na primeira situação em que o termo é usado, Jason resolve dar as boas
vindas à Cady de uma forma não convencional. Aproveitando-se da ingenuidade da
novata, o rapaz faz algumas perguntas obscenas do tipo: “Já tem alguém molhando o
biscoito?” e “Quer que alguém molhe o seu biscoito?”. Indignada com a atitude do
rapaz, Regina resolve entrar na conversa e defender a garota. Irritado com a
intervenção de Regina, Jason resolve xingá-la de “bitch”.
Exemplo 01 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- No, thank you.
- Good. So it’s settled.See? Could you shave your
back now. Bye, Jason.
- Bitch.
Não. Muito obrigada.
Ótimo. Resolvido.
Vá depilar as costas.
Tchau, Jason.
Vaca.
O mesmo clichê de raiva em inglês, “bitch”, é usado quando Cady e seus
amigos resolvem entrar em guerra contra Regina. Revoltados pelas atitudes desleais da
garota, Cady, Janis e Damian tentam sabotá-la em tudo o que lhe é mais importante:
sua beleza, seu namorado e suas amigas.
Exemplo 02 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Can you do it?
- I can do it.
- OK, let’s rock this bitch.
O que acha?
Pode deixar.
Tudo bem. Vamos pegar essa vaca.
Segundo o plano de sabotagem, Cady deveria andar com Regina e suas
amigas (As Poderosas), sem revelar suas verdadeiras intenções. Para isso, Cady
deveria pensar, falar e agir como uma Poderosa. Deixando-se levar por um momento
de raiva, Cady deixa escapar um desentendimento com a professora (Ms. Norbury).
Solidárias ao sentimento da nova “amiga”, as Poderosas oferecem o “Livro do Arraso”
para Cady escrever suas suspeitas de que a professora era traficante de drogas. Mesmo
sem querer, Cady escreve contra a professora, sabendo que o fato era mentira.
Exemplo 03 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
It may look like I’d become a bitch, but that’s
because I was acting.
Pode parecer que me tornei uma vaca,
mas eu estava só fingindo.
Com o passar do tempo, Cady parece esquecer-se do plano de vingança e se
deixa influenciar pelas atitudes egoístas e autoritárias de Regina. Mesmo depois de
conseguir destruir socialmente a rival, Cady isola os verdadeiros amigos em troca de
popularidade e bajulação.
Com raiva pela atitude da amiga e querendo chamá-la de volta à realidade,
Janis desabafa tudo o que sente e ofende a garota chamando-a de “bitch”.
Exemplo 04 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
So why are you messing with Regina? ‘Cause you
are a mean girl! You’re a bitch!
Por que você ainda
se importa com a Regina?
Eu sei por quê. Porque você é malvada!
Você é uma vaca!
Nos quatro exemplos mostrados anteriormente, o clichê de raiva “bitch”
recebe uma única tradução: “vaca”. Este termo é também um clichê em português e
usado para ofender uma mulher. Contudo, quando alguém diz “Ela é uma vaca!”, uma
das idéias mais salientes em tal expressão é a de que a garota ou a mulher tem seios
grandes, tão grandes que parece o animal quando produz leite. Embora a idéia de
alguém extremamente má, desleal, rejeitada pela sociedade em virtude de sua maneira
de ser também seja contemplada pela expressão, “Filha-da-puta” ou, simplesmente,
“puta” seriam os clichês comumente utilizados em situações de extrema raiva no
Brasil.
Na situação seguinte, a confusão é geral no colégio, porque o “Livro do
Arraso” vai a público revelando os segredos mais íntimos de muita gente. Vendo sua
intimidade exposta, as garotas envolvidas passam a desconfiar de suas próprias
amigas, as únicas capazes de revelar tais segredos. Junto com a desconfiança, vêm os
palavrões e “bitch” é novamente usado.
Exemplo 05 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Did you write this?
- No, I swear.
- Then you told somebody.
- She told.
- You little bitch!
- You’re a bitch!
-Você escreveu isso?
-Não, eu juro.
-Então, você contou a alguém.
-Ela contou.
-Sua vadia!
-Vadia é você!
Após um período de agressões e xingamentos, o diretor da escola tenta
contornar a situação. Constrangido por ouvir certas explicações, o diretor pede à
professora Norbury para conversar com as garotas e tentar resolver os problemas.
Entendendo que todas eram ao mesmo tempo vítimas e culpadas pela
situação na qual se encontravam, a professora fez com que as garotas pedissem
desculpas umas às outras. Devido à imensa sinceridade ou ingenuidade das garotas, os
palavrões apareciam novamente, até mesmo durante os pedidos de desculpas.
Exemplo 06 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
Ms Norbury had us write out apologies to
people we’d hurt. Alyssa, sorry I called you
a gap-toothed bitch. It’s not you fault you’re
so gap-toothed.
A Sra. Norbury fez com que pedíssemos
perdão para quem magoamos.
Alyssa, me desculpe se a chamei
de vadia de dentes separados.
Nesse exemplo, a palavra “bitch” também foi traduzida por “vadia” em
ambas as situações. Embora “vadia” seja um clichê de raiva no português do Brasil,
usado para insultar e denegrir a honra de uma mulher, o termo não é usado na mesma
freqüência de “vagabunda”, por exemplo.
Esta foi a tradução recebida por “skank bitch” no exemplo seguinte. Nessa
situação, Regina resolve vingar-se de todos que tentaram prejudicá-la. Para conseguir
atingir a todos ao mesmo tempo, resolve tornar público o “Livro do Arraso”, revelando
o segredo de muita gente. Para não ser incriminada como autora do livro, Regina
refere-se a si mesma escreve no livro como “skank bitch”, assim, quando a confusão
começasse ninguém a culparia, pois teria a prerrogativa de que ela também estava no
livro e, desta forma, era vítima como todos os outros.
É interessante observar que “skank” é o adjetivo que acompanha o termo em
questão. Em AS, “skank” é sinônimo de prostituta (“a prostitute = hooker”). Portanto,
o termo é usado com a intenção de intensificar o insulto, tornando-o ainda mais
agressivo.
Exemplo 07 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
This girl is the nastiest skank bitch I’ve ever met.
Do not trust her.
Essa garota é a pior vagabunda...
que eu já conheci.
Não confiem nela!
Em uma pesquisa no Google (Internet)
64
, foi possível verificar que, das três
traduções encontradas para “bitch” – vaca, vadia e vagabunda – “vagabunda” é a mais
freqüente em português (338.000 ocorrências)
65
.
b) O caso de “slut”
Outro clichê de raiva bastante recorrente nos diálogos de Meninas malvadas
é “slut” (freq.10; 0,1%). Aparentemente, seria uma palavra de uso recente, pois não
64
Entendemos que o Google não é considerado, cientificamente falando, um banco de corpus lingüístico da
mesma natureza que o BNC ou o Bank of English. Contudo, não podemos ignorar o caráter dinâmico deste site
em relação à língua devido à grande variedade de textos e estilos de linguagem contidos em suas pesquisas.
65
O termo “vaca” obteve 11.400.000 ocorrências, no entanto, descartamos este número pelo fato de grande parte
dos exemplos se referirem ao animal a não ao clichê de raiva. Para ter uma noção da freqüência deste termo
enquanto insulto, tentamos as entradas “Sua vaca”, que obteve 22.900 ocorrências, e “Você é uma vaca”, com
6.060 aparições. “Vadia” apareceu 271.000 vezes, um número de ocorrências bastante significativo, porém com
uma diferença de 67.000 ocorrências em relação a “vagabunda”.
consta em nenhum dos dicionários de clichês e expressões lingüísticas pesquisados
anteriormente. Além disso, aparece com poucas ocorrências no banco de corpus
lingüístico eletrônico BNC; apenas 93 ocorrências. Contudo, em Online Etymology
Dictionary
66
, consta que o termo teve sua origem entre 1375 e 1425, referindo-se à
mulher desmazelada, suja e sem higiene. Somente no século XIX, o termo passa a ser
usado em referência ao animal feminino de cachorro (cadela) e a mulheres de moral
duvidosa.
Observando as situações disponibilizadas pelo BNC, pode-se constatar que
“slut” é uma palavra de insulto dirigida a mulheres. Ocasionalmente, ela aparece
próximo à palavra “bitch”, indicando que ambas pertencem à mesma categoria. De
acordo com o dicionário Oxford Advanced Learner’s Dictionary (2000), “slut” é uma
palavra de caráter reprovável e ofensivo dirigida à mulher que possui muitos parceiros
sexuais, o termo é usado como sinônimo de prostituta.
O primeiro exemplo, a seguir, é parte da situação mencionada no exemplo
07, em que Regina revela o “Livro do Arraso”. “Bitch” e “slut” são as palavras usadas
pelo “suposto escritor” para ofender Regina. A primeira palavra, como mencionado
anteriormente, foi traduzida por “vagabunda”, “slut” foi traduzida por “vagaba”.
Vale salientar que “vagaba”
67
é a forma diminuída de “vagabunda”,
tradução dada para “bitch” na seção anterior. Assim, podemos dizer que “bitch” e
“slut” foram tratadas como sinônimos na tradução.
No exemplo 08, Regina escreve mal de si mesma no “Livro do Arraso”
antes de tornar suas anotações públicas. Em seguida, o diretor interroga Gretchen,
Karen e Cady, querendo saber o nome do(a) responsável pela revelação dos segredos
contidos no livro.
66
HARPER, Douglas. Online Etymology Dictionary. In: Dictionary.com, 2001. www.dictionary.com. Sited:
30/05/07.
67
No Google, o termo aparece em 125.000 situações; não é freqüente como o seu correspondente, porém sua
recorrência por parte dos usuários não para ser ignorada.
Exemplo 08 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
This girl is the nastiest skank bitch I’ve ever met.
Do not trust her. She is a fugly slut!
Essa garota é a pior vagabunda...
que eu já conheci.
Não confiem nela!
Ela é uma mocréia vagaba!
“Fugly” é a palavra que acompanha “slut” em inglês. Em português, ela foi
traduzida por “mocréia” no exemplo 08, contudo não aparece no exemplo a seguir.
Acreditamos que o que levou o tradutor a omitir sua tradução, neste caso, tenha sido a
necessidade de economia de espaço gerada pela relação tempo/espaço das legendas em
relação ao ritmo do filme.
Exemplo 09 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
Ms Wieners, why would Regina refer to herself
as a “fugly slut”?
Srta. Wieners, por que Regina
iria dizer que ela era uma “vagaba”?
Outra tradução encontrada para o termo “slut” foi “piranha”
68
(exemplos 10,
11 e 12), também usado em português para referir-se a uma mulher de conduta
reprovável e moral duvidosa. Chama-se de “piranha” a mulher que anda com vários
homens, aquela a quem se rotula “desfrutável” (e.g. “Fulana é uma tremenda
piranha”). Mesmo assim, as ofensas envolvendo o termo mencionado são menos
freqüentes do que aquelas que envolvem o termo “vaca”. Comparando os termos
mencionados, entendemos que, em relação ao nível de xingamento, “piranha” é tão
ofensivo quanto “galinha”, ou seja, possuem a mesma carga semântica, diferente do
termo “vaca”.
No exemplo a seguir, Cady está na expectativa de que Regina ajude-a a
namorar Aaron (ex-namorado de Regina). Cady aguarda à distância enquanto a amiga
conversa com o garoto. Tudo corria bem até que, de repente, Regina beija na boca de
Aaron e voltam a namorar.
68
Na pesquisa realiza no Google, “piranha” revelou a mesma questão que a palavra “vaca”. A ocorrência é bem
maior por tratar-se de um animal do que pelo fato de também ser um clichê de raiva. Para a entrada “sua
piranha” a freqüência foi de 2.020 e para “você é uma piranha”, foi de 777.
Exemplo 10 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
How could Janis hate Regina? She was such a
good... Slut.
Por que Janis odiava Regina?
Ela era uma ótima...
Piranha!
Da mesma forma que o caso mencionado anteriormente, o exemplo a seguir
também ocorre durante a festa de Halloween. Cady aparece fantasiada de “noiva-
zumbi” enquanto todas as outras garotas, na festa, estavam fantasiadas com roupas
curtas e sensuais.
Exemplo 11 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
In Girls World, Hallowe’en is the one night of the
year when a girl can dress like a total slut and no
other girls can say anything about it.
No Mundo das Garotas,
elas se vestem como piranhas...
mas ninguém pode criticá-las.
Após o “Livro do Arraso” se tornar público e causar o caos na escola, a
professora Norbury conversa com as garotas na tentativa de solucionar o problema.
Preocupada com a repercussão das brigas nos garotos, a professora pede que as
meninas parem de xingar-se mutuamente.
Exemplo 12 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
You’ve got to stop calling each other sluts and
whores. It makes it OK for guys to do the same.
Who here has ever been called a slut?
mas vocês têm de parar
de se chamar de piranhas e vadias.
Isso incentiva os homens
a fazerem o mesmo.
Quem já foi chamada de vadia?
Além de “vagaba” e “piranha”, o termo “vadia” também aparece como
tradução. Isso reforça a idéia de que “slut” e “bitch” foram tratadas como sinônimos ao
serem traduzidas.
Nos exemplos 13 e 14 (MM), “slut” aparece nas legendas como “galinha”.
Pelos termos traduzidos que foram discutidos até o momento, é possível observar que,
em português, os insultos com nomes de animais são bastante comuns e quase todos
transmitem o mesmo sentido: uma mulher desfrutável e de comportamento indecoroso
– vaca, cadela, cachorra, piranha, galinha, por exemplo.
Nas situações seguintes, as meninas fazem conferências pelo telefone:
primeiro, Regina conversa com Cady enquanto Gretchen escuta tudo sem participar da
conversa. Depois, Gretchen liga e conta para Karen o que Regina disse a respeito dela,
enquanto Cady e Regina esperam na linha para conversar com as “amigas”.
Exemplo 13 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
The Spring Fling Queen is always pretty. It
should be Karen, but people forget about her
‘cause she’s such a slut.
A Rainha da Primavera
tem de ser bonita.
Devia ser a Karen, mas ninguém
vota nela porque ela é uma galinha.
Exemplo 14 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Regina says you’re such a slut.
- She said that?
- You didn’t hear it from me.
Regina disse que você é uma galinha.
-Ela disse o quê?
-Não diga que eu contei.
Cady está conversando com seus novos amigos, Janis e Damian, quando ela
vê Regina George pela primeira vez. Impressionada pela popularidade da garota, Cady
pergunta quem é a loira. Nesta ocasião, Janis fornece maiores detalhes a respeito de
Regina e “slut” aparece pela primeira vez no filme.
Nas legendas, a palavra que aparece é “perua”. Diferentemente dos casos
anteriores, “perua” se refere a uma mulher que gosta de chamar a atenção das outras
pessoas, especialmente dos homens, pelo modo de se vestir. Comparando às traduções
dadas à palavra em inglês, poderíamos afirmar que esta é uma tradução que suaviza o
sentido de “slut”. Contudo, esta suavização pode ter sido proposital, uma tentativa de
preservar a verdadeira personalidade de Regina que se revela apenas na festa de
Halloween. Por meio da legenda, o espectador pode pensar que, a princípio, a loira é
apenas uma patricinha rica e metida que gosta de ser paparicada; a verdadeira “slut” só
se revela mais tarde.
Exemplo 15 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- And evil takes a human form in Regina George.
- Ah, before she may seem like your typical
selfish, back-stabbing slut, but in reality, she’s so
much more than that.
E Regina George é a maldade
em forma de gente.
Ela pode parecer uma perua-típica,
egoísta e traiçoeira...
mas na verdade,
ela é bem pior que isso.
Para concluir esta seção, passemos ao último caso em que “slut” aparece.
Neste exemplo, Cady reflete sobre o comportamento das meninas na festa de
Halloween. Em seu pensamento, Cady estabelece as diferenças entre o mundo comum
e o “Mundo das Garotas” no tocante às fantasias usadas em um e outro meio. Ela
lamenta o fato de não ter sido avisada sobre as fantasias que faziam das garotas
verdadeiras “piranhas” (exemplo 11). Neste caso, “slut rule” não foi traduzido para as
legendas.
Exemplo 16 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
Unfortunately, no one told me about the slut rule,
so I showed up like this.
Infelizmente, ninguém me avisou.
Então fui à festa assim.
É possível que o tradutor tenha omitido a tradução para economizar espaço,
pelo fato de uma informação semelhante já ter sido mencionada nas legendas
anteriores apresentadas no exemplo 11 – MM. Como o objetivo primordial das
legendas é a economia de espaço, a informação nas legendas do exemplo 16 seria
redundante.
c) O caso de “whore”
Antes de concluir a análise dos clichês de raiva em Meninas malvadas,
passemos a “whore” (freq.03; 0,03%). Este termo aparece com freqüência 03 (três) na
lista de palavras do filme e, semelhantemente às palavras anteriores, foi usado com a
intenção de ofender a quem era dirigido.
De acordo com o Oxford Advanced Learner’s Dictionary (2000), “whore” é
uma palavra de uso retrógrado, talvez por esse motivo tenha sido menos freqüente na
lista de palavras que “bitch” e “slut”. Ainda segundo o mesmo dicionário, “whore” é
“uma palavra ofensiva usada para referir-se a uma mulher que possui diversos
parceiros sexuais”
69
dos quais recebe dinheiro, ou seja, uma prostituta. Interessante
observar que no dicionário Collins Gem (2001) – inglês/português – “puta” é a
tradução dada para a palavra em questão, contudo, esta não foi a tradução que
apareceu nas legendas.
No exemplo a seguir, Gretchen conta para Karen que Regina falara mal
dela, chamando-a de “slut” (exemplo 14 – MM). Em seguida, Regina liga para Karen e
a convida para sair. Querendo livrar-se da falsa amiga, Karen finge estar doente como
pretexto para não acompanhar Regina. Percebendo a mentira de Karen, Regina se irrita
e insulta a amiga.
Exemplo 17 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- I can’t go out... I’m sick.
- Boo! You whore!
Não posso sair.
Estou passando mal.
Sua vadia!
Nesse caso, a tradução recebida foi “vadia”, a mesma recebida por “bitch”
(exemplos 05 e 06 – MM) e “slut” (exemplo 12 – MM). A tradução também coincide
com os clichês de raiva discutidos anteriormente no caso seguinte.
Depois de seu primeiro encontro com as Poderosas, Cady acha que Regina é
uma pessoa muito legal e não entende porque Janis a odeia tanto. Indignada com a
ingenuidade de Cady, Janis “detona” a loira.
Exemplo 18 – MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
She’s not sweet! She’s a scum-sucking whore.
She ruined my life!
Ela não é gentil!
É uma vagabunda!
Ela acabou com a minha vida.
69
“An offensive word used to refer to a woman who has sex with a lot of men.”
Como mencionamos, o termo “vagabunda” também apareceu nas legendas
como tradução de “bitch” (exemplo 07 – MM) e “slut” (exemplos 08 e 09 – MM –
nestes casos, “vagaba” é a forma abreviada de “vagabunda”).
A seguir, o diretor descobre o “Livro do Arraso” e fica chocado com as
expressões encontradas. Seguindo o mesmo passo das situações anteriores, “whore” é
traduzida por “piranha”, termo já utilizado anteriormente para a tradução de “slut”
(exemplos 10, 11 e 12 – MM).
Exemplo 19 –MM:
TEXTO ORAL EM INGLÊS LEGENDAS
- Good Lord. What’s that say? “Caitling is a...”
- “... fat whore.”
Meu Deus.
-O que diz aqui? “Caitlin é uma...
-Piranha gorda”.
Como foi possível observar pelos exemplos apresentados nesta seção,
“whore” foi traduzida de forma idêntica às palavras “bitch” e “slut”. Por este motivo,
podemos afirmar que as três palavras em inglês foram tratadas como clichês de raiva
sinônimos, de usos semelhantes.
3.7 SÍNTESE DAS ESTRATÉGIAS UTILIZADAS NA TRADUÇÃO DOS
CLICHÊS DE RAIVA – PALAVRÕES
Após as análises apresentadas, a respeito das traduções feitas para as
legendas dos filmes escolhidos para corpus nesta pesquisa, elaboramos dois quadros –
um com o levantamento das estratégias utilizadas na tradução dos palavrões em 10
coisas que eu odeio em você (Quadro 22) e outro com o levantamento daquelas usadas
no filme Meninas malvadas (Quadro 23).
Na primeira coluna de cada quadro, destacamos o clichê analisado seguido
de suas respectivas traduções. Em seguida, relacionamos cada tradução e um tipo de
estratégia e, finalmente, indicamos o exemplo em que aparecem para quaisquer
verificações.
Quadro 22:
AS ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO NAS LEGENDAS DE DC
CLICHÊ DE RAIVA TRADUÇÃO NA
LEGENDA
ESTRATÉGIA
UTILIZADA
SITUAÇÃO
Sem tradução
Não tradução ou corte Exemplos 03 e 04
Droga / idiotas
Suavização Exemplos 02 e 05
Shit
Besteiras
Adaptação Exemplo 01
Sem tradução
Não tradução ou corte Exemplo 07
Nojenta / doida
Suavização Exemplos 09, 10 e 11
Bitch
Cadela / saco / galinha
Adaptação Exemplos 06, 08 e 12
--------
Não tradução ou corte Não ocorre
--------
Suavização Não ocorre
Suck
Droga / chata
Adaptação Exemplos 13 e 14
--------
Não tradução ou corte Não ocorre
Idiota
Suavização Exemplos 15 e 16
Punk
--------
Adaptação Não ocorre
Quadro 23:
AS ESTRATÉGIAS DE TRADUÇÃO NAS LEGENDAS DE MM
CLICHÊ DE RAIVA TRADUÇÃO NA
LEGENDA
ESTRATÉGIA
UTILIZADA
SITUAÇÃO
----------
Não tradução ou corte Não ocorre
Vaca / vadia
Suavização Exemplos de 01 a 06
Bitch
Vagabunda
Adaptação Exemplo 07
Sem tradução Não tradução ou corte Exemplo 16
Vadia Suavização
Exemplos 12
Slut
Vagaba / piranha /
galinha / perua
Adaptação
Exs 08 a 11 e 13 a 15
Não tradução ou corte Não ocorre
Vadia
Suavização Exemplo 17
Whore
Vagabunda / piranha
Adaptação Exemplos 18 e 19
Se compararmos as estratégias utilizadas para a tradução dos clichês de
raiva em 10 coisas que eu odeio em você e Meninas malvadas, mostradas nos Quadros
22 e 23 respectivamente, é possível observar que, embora apresente mais palavrões
que aquele, a suavização é mais utilizada enquanto estratégia de tradução nas legendas
de Meninas malvadas. Isso porque consideramos que “piranha”, “vadia”, “vaca”, não
obstante serem termos de insulto em português, apresentam uma carga semântica
menos ofensiva que o termo “puta”
70
ou a expressão “filha-da-puta”
71
, as quais não
foram utilizadas em nenhuma das traduções. Por outro lado, os clichês de raiva
“galinha”, “vagabunda” e “vagaba”, por serem mais freqüentes, foram consideradas
adaptações para o português do Brasil nas ocasiões em que apareceram nas legendas
de Meninas malvadas.
Neste capítulo, apresentamos nossa análise sobre a tradução das expressões
selecionadas nas legendas dos filmes 10 coisas que eu odeio em você e Meninas
malvadas. Descrevemos as cenas em que cada uma apareceu e consideramos os fatores
que podem ter influenciado as traduções. Finalmente, sintetizamos as estratégias
utilizadas e fizemos relação aos termos utilizados para situações semelhantes no
Brasil. No próximo capítulo, relatamos os resultados do experimento aplicado na
verificação do tipo de legenda mais aceito pelo público: as legendas formais, sem a
tradução de palavrões; ou as legendas informais, com a adaptação de palavrões
comumente utilizados no Brasil.
70
Em pesquisa no site Google, o termo “puta” apareceu 26.000.000 vezes; em combinação com outras palavras,
como “Sua puta” e “Você é uma puta”, o termo apareceu 24.000 e 11.100, respectivamente. Comparando com os
termos “vaca”, “vadia”, “vagabunda”, “piranha” e “galinha”, discutidos anteriormente, com a palavra “puta”,
podemos dizer que ele é mais freqüentemente usados que os demais.
71
No mesmo site, a fraseologia “filha-da-puta” aparece 25.000 vezes; “filho-da-puta”, 340.000; e “puta-que-
pariu”, 184.000 vezes.
4. LEGENDA FORMAL OU INFORMAL: PESQUISANDO A
PREFERÊNCIA DO PÚBLICO
Até o momento, procedemos à elaboração dos MCIs de língua oral/escrita e
à análise das traduções nas legendas dos filmes 10 coisas que eu odeio em você e
Meninas malvadas. Como mencionado no capítulo anterior, a elaboração do MCIs de
escrita foi importante para relacionarmos o uso da linguagem formal à escrita e,
conseqüentemente, às legendas. A análise das legendas, por sua vez, foi importante
para verificarmos se os MCIs identificados a priori exerceram qualquer influência no
tipo de linguagem utilizada na tradução legendada dos filmes escolhidos.
Com a conclusão destes dois procedimentos iniciais, realizamos um outro
experimento para tentar verificar que tipo de linguagem (formal ou informal) os
espectadores brasileiros mais apreciam nas legendas de filmes americanos.
Nesta última parte da pesquisa, utilizamos apenas um trecho do filme 10
coisas que eu odeio em você de duas formas: um com as legendas originais e outro
com as legendas elaboradas pela pesquisadora. Além do trecho, foi aplicado um
questionário para verificar a intuição da audiência quanto às duas legendas: as novas e
as originais.
Os passos percorridos para a realização deste experimento foram os
seguintes: primeiro, selecionamos o trecho a ser exibido durante a pesquisa. Em
seguida, gravamos o trecho em duas mídias – a primeira, em DVD, com o áudio em
inglês e as legendas originais em português; a segunda mídia, em CD, recebeu a cópia
do trecho ripada para mpg, também com áudio em inglês. Enquanto aguardávamos a
finalização das mídias, copiamos as legendas originais em um arquivo do Word e, por
meio de comparação entre as legendas originais e o filmscript (texto oral em inglês),
elaboramos o que seria um esboço das novas legendas. Após esses procedimentos,
trabalhamos a cópia em mpg e as legendas elaboradas anteriormente no programa para
legendagem Subtitle Workshop. Durante a utilização do programa foram realizadas
todas as modificações necessárias para a adequação das legendas ao trecho exibido:
alteração de vocabulário, quebra de legendas em linhas ou quadros de exibição
diferentes, alteração no tempo de exibição do texto etc. Finalizado o trabalho no
programa Subtitle Workshop, visualizamos o produto por meio de outro programa
eletrônico, chamado BS Player (leitor de mídias), e procedemos às alterações
necessárias.
Paralelamente à elaboração das legendas, dedicamo-nos à elaboração do
questionário a ser aplicado após a exibição do trecho escolhido. Uma vez concluídos o
questionário e as legendas, passamos ao desenvolvimento prático da pesquisa junto aos
informantes.
Vejamos, a seguir, informações mais detalhadas sobre o trecho do filme
utilizado, a elaboração das novas legendas, a aplicação do experimento e os resultados
obtidos.
4.1 AMOSTRA DO FILME 10 COISAS QUE EU ODEIO EM VOCÊ
Como mencionado em outra ocasião, o filme 10 coisas que eu odeio em
você apresenta um enredo bastante simples, ou melhor, comum. É encenado,
principalmente, por adolescentes em situações do dia a dia com uma linguagem
informal. Optamos por trabalhar com 10 coisas que eu odeio em você em vez de
Meninas malvadas, porque acreditamos que o primeiro mostre situações mais
semelhantes àquelas cotidianas vividas por adolescentes reais. Afinal, não é todo dia
que uma garota vinda da África, e sem nunca ter ido a uma escola antes, aparece para
fazer amizades em um novo colégio (Meninas malvadas).
O trecho selecionado para a realização deste experimento foi de
aproximadamente 10 minutos, com áudio em inglês. Um novo DVD foi preparado
contendo apenas o trecho escolhido, com o propósito de facilitar sua exibição durante
a realização da pesquisa.
No trecho escolhido, Cameron e Michael tentam colocar em prática um
plano para que Patrick saia com Kat. Inicialmente, os dois garotos conversam a
respeito de Pat e chegam à conclusão de que ele seria o rapaz ideal para sair com Kat.
Os dois tentam uma aproximação, mal sucedida, com Patrick e concluem que a única
forma de fazê-lo colaborar seria por meio de um generoso pagamento. Sem dinheiro,
Cameron e Michael decidem envolver Joey, um modelo esnobe, com muito dinheiro e
que também está interessado em Bianca. Michael faz Joey acreditar que, pagando
alguém para sair com Kat, seria mais fácil sair com a irmã, Bianca. Empolgado pela
possibilidade de conseguir sair com Bianca, Joey procura Patrick para as negociações.
No trecho em questão, são apresentadas situações como: tentativa de aproximação
entre adolescentes estranhos (Cameron e Patrick, Patrick e Kat), apresentação entre
dois adolescentes desconhecidos (Patrick e Kat, Joey e Patrick), discussão entre pai e
filha (sr. Stratford e Kat), briga entre irmãs (Kat e Bianca) e briga entre colegas de
escola (Kat e Joey, Joey e Patrick). Considerando as situações mencionadas,
acreditamos que o trecho seria propício para o uso da linguagem informal e dos
palavrões.
4.2 AS NOVAS LEGENDAS
As legendas consideradas originais são as legendas, em português, oficiais
do DVD, elaboradas pela Dolby Digital e disponíveis no mercado para a apreciação do
público em geral. Essas legendas apresentam a linguagem formal, a suavização e o
corte de palavrões como estratégias de tradução, conforme mostramos no capítulo
anterior. Em relação ao uso da linguagem formal, as legendas exibiram construções
lingüísticas baseadas na norma culta padrão, tais como: conjugação de tempos verbais
não comuns na oralidade (futuro simples e futuro do pretérito do indicativo); uso de
ênclise para pronomes oblíquos e não contração de preposições e artigos também
comuns na oralidade (para a, para o, em um etc. em lugar de pra, pro, num etc.). No
tocante aos palavrões, quando não foram omitidos, tais termos foram substituídos por
outros considerados menos ofensivos.
Para a elaboração das novas legendas (vide anexo 04), procuramos construir
um texto o mais informal possível (Quadro 24). Para isso, utilizamos as seguintes
estratégias: o uso da linguagem informal e a adaptação dos palavrões utilizados pelos
personagens. No que diz respeito à linguagem informal, as legendas foram elaboradas
a partir da utilização de expressões e construções lingüísticas comumente usadas
durante uma conversa do dia a dia, tais como: adaptação de vocabulário, ou seja,
palavras e expressões que se identificam ao estilo e idade dos personagens; conjugação
dos verbos em tempos comuns à língua oral (verbo “ir” seguido de infinitivo e
utilização da forma “ia” em lugar de “iria”); contração de preposições e artigos e uso
de próclise para pronomes oblíquos. Em relação aos palavrões, procuramos adaptá-los
e utilizar os termos provavelmente utilizados em situações semelhantes no Brasil.
Quadro 24:
COMPARAÇÃO ENTRE AS LEGENDAS ORIGINAIS E AS NOVAS LEGENDAS
TEXTO ORAL EM
INGLÊS
LEGENDAS ORIGINAIS NOVAS LEGENDAS
He sold his own liver on
the black market for a new
set of speakers.
Vendeu o fígado no mercado negro
para comprar uns amplificadores.
O cara
72
vendeu o fígado pros traficantes
pra comprar uns amplificadores.
He’s our guy. É nosso homem. Esse é o cara.
Hey, how ya doin’? Oi. Tudo bem? E aí, mano?
How do we get him to date
Kat?
Como faremos
para que saia com a Kat?
O que a gente faz pra ele
sair com a Kat?
Yeah, I'm on it. -Estou tentando. - tentando.
People wouldn’t know
what to think.
Ninguém saberia o que pensar. Ninguém ia saber o que pensar.
Yeah, well, what we need is
a backer.
Bem, precisamos de um aval. Precisamos de umlaranja”.
What is it? Asshole day? É o dia dos idiotas? É o dia dos pé-no-saco?
You bitch! Sua nojenta! Filha-da-puta!
Watching the bitch violate
my car doesn't
count as a date.
Ver essa doida amassar meu carro
não conta como encontro.
Ver aquela puta amassar
meu carro não é encontro.
Como podemos observar no Quadro 24 apresentado, as novas legendas
oferecem aos espectadores um tipo de linguagem diferente daquela utilizada nas
legendas originais: vocabulário típico de adolescentes (e.g. cara, mano, laranja, a
gente), conjugação dos verbos semelhante à da fala (e.g. ia saber, tô), contração de
preposições e artigos (e.g. pros, pra) e adaptação na tradução dos palavrões usados
72
O grifo, e todos os seguintes, serve apenas de ilustração para os exemplos apresentados no quadro, não
aparecem nas legendas.
pelos personagens (e.g. pé-no-saco, filha-da-puta, puta). Estas foram as estratégias de
tradução para as novas legendas. A seguir, tratamos do questionário aplicado nesta
parte da pesquisa.
4.3 QUESTIONÁRIO
O questionário (vide anexo 05) para este experimento foi elaborado com o
objetivo de se verificar o grau de receptividade ou rejeição dos espectadores em
relação ao tipo de linguagem utilizada na tradução das legendas, a saber, a linguagem
formal ou informal. Este foi um questionário curto a fim de não enfadar os
informantes, uma vez que já constava do tempo para o teste a exibição dos 10 minutos
de filme.
Elaboramos três questões, para as quais os participantes foram orientados a
utilizar uma escala de 1 (um) a 7 (sete) para responder cada item apresentado. As
características representadas por cada número variaram de questão para questão, por
este motivo, sempre que tais características eram alteradas, um novo quadro era
mostrado para ajudar os participantes a escolherem o valor mais adequado ao seu
modo de pensar.
Essas questões nos permitiram verificar a hipótese central desta pesquisa, ou
seja, que tipo legenda obteria maior aceitação por parte do público: a legenda de
linguagem formal ou a de linguagem informal, com palavrões explícitos. Sendo assim,
as perguntas versaram sobre três aspectos: o grau de conforto dos participantes em
relação à linguagem dos personagens e das legendas, a naturalidade das legendas em
relação à fala e a quantidade de palavrões exibidos caso o trecho fosse em português.
Na primeira questão, perguntamos aos participantes como eles se sentiram
(confortáveis ou desconfortáveis) em relação a alguns aspectos do trecho exibido, tais
como: a linguagem dos personagens, a tradução dos diálogos nas legendas, o uso de
palavrões pelos personagens e o uso de palavrões nas legendas. Com intenção de evitar
que os quatro itens revelassem o foco de nosso interesse, acrescentamos outros itens
apenas para desviar a atenção dos informantes. Nesta questão, cada participante
deveria marcar 1 (um) caso se sentisse muito desconfortável em relação ao item
mostrado, 2 (dois) para o fato de se sentir desconfortável, 3 (três) se sua sensação fosse
meio desconfortável, 4 (quatro) para um estado neutro, 5 (cinco) caso se sentisse meio
confortável, 6 (seis) se sua sensação fosse confortável e, finalmente, 7 (sete) se o
informante se sentisse totalmente confortável em relação ao item em tela.
A questão seguinte versou sobre a naturalidade das legendas, ou seja,
perguntamos o nível de semelhança entre as legendas exibidas e maneira como
falamos normalmente. Os informantes deveriam escolher o número 1, caso as legendas
fossem muito estranhas, muito diferentes da linguagem oral, e 7, se as julgassem muito
naturais. Na última questão indagamos sobre a freqüência de palavrões em um trecho
semelhante exibido em português. Dessa vez a escala variava de “menos palavrões”
(1) a “mais palavrões” (7). Para essas últimas questões, os participantes tiveram a
oportunidade de fazer comentários, caso achassem necessário.
4.4 PARTICIPANTES
Para este experimento, contamos com uma amostra de 99 informantes de
ambos os sexos, com idade a partir de 12 anos, e escolaridade variando do ensino
médio até pós-graduação. Dos 99 informantes totais, 89 eram alunos do Núcleo de
Línguas Estrangeiras da UECE (42 do inglês, 19 do francês e 28 do espanhol); os
outros 10 eram colegas, graduados em diferentes universidades. Nenhum dos
informantes havia tido qualquer contato anterior com o objeto de estudo desta
pesquisa.
Embora o objetivo deste experimento fosse verificar a aceitação das
legendas em português, era possível que o conhecimento prévio do inglês como língua
estrangeira interferisse nas respostas dos participantes. Desta forma, é importante
mencionar que foi feito um levantamento a respeito do nível de conhecimento da
língua inglesa por parte dos informantes.
Quarenta e oito pessoas assistiram ao trecho com as legendas originais.
Deste total, 22 eram homens e 26, mulheres. Esse grupo contou com a participação de
alunos do Núcleo de Línguas Estrangeiras da UECE dos cursos de espanhol (07),
francês (15) e inglês (16) e mais 10 pessoas as quais não tiveram qualquer contato
anterior com esta pesquisa. A idade dos participantes variou da seguinte maneira: 05
pessoas tinham entre 12 e 18 anos, 24, entre 19 e 25 anos, 10 tinham entre 26 e 35 e 09
pessoas tinham acima de 35 anos. Em relação à escolaridade, 10 participantes
cursaram (ou cursavam) o ensino médio, 28 cursaram (ou cursavam) a graduação e 10,
a pós-graduação.
Em relação ao conhecimento da língua inglesa, 36 sujeitos admitiram
estudar ou ter estudado o idioma: 04 deles, há um ano; 05, há dois anos; 13, há três
anos e 14 pessoas estudavam inglês há quatro anos ou mais.
No segundo grupo, 51 pessoas assistiram ao trecho com as novas legendas.
Deste total, 23 eram homens e 28, mulheres. Todos os participantes eram alunos do
Núcleo de Línguas Estrangeiras da UECE dos cursos de espanhol (21), francês (04) e
inglês (26) dos quais, 16 cursaram o ensino médio, 33 cursaram (ou cursavam) a
graduação e 02, a pós-graduação. A idade dos sujeitos que formaram este segundo
grupo variou da seguinte forma: 11 pessoas tinham entre 12 e 18 anos, 31, entre 19 e
25 anos, 07 tinham entre 26 e 35 e 02 pessoas tinham acima de 35 anos.
Em relação ao conhecimento da língua inglesa, 33 sujeitos admitiram
estudar ou ter estudado o idioma: 04 deles, há um ano; 05, há dois anos; 13, há três
anos e 14 pessoas estudavam inglês há quatro anos ou mais.
4.5 PROCEDIMENTOS
Para a realização do experimento, solicitamos permissão à coordenação
geral, e às respectivas coordenações de línguas, do Núcleo de Línguas da UECE. Em
seguida, consultamos os professores das turmas escolhidas e os respectivos alunos. O
único critério utilizado na escolha das turmas foi o desconhecimento do objeto de
estudo desta pesquisa, portanto, alunos de professores colegas do curso de mestrado ou
que já tivessem tido qualquer conhecimento prévio a respeito do nosso estudo por
meio de apresentações ou conversas informais foram descartados. O mesmo critério
foi usado para os dez participantes que não eram alunos do Núcleo de Línguas.
Recebido o aval do professor e dos alunos, o experimento foi realizado, sob
a supervisão desta pesquisadora, no Laboratório 01 do CMLA ou na sala 13 (de áudio
e vídeo) do Núcleo de Línguas, conforme a disponibilidade de cada turma.
Os participantes foram convidados a se deslocarem de suas salas até os
locais mencionados e receberam instruções para assistirem ao trecho do filme
escolhido como se estivessem em suas casas, isto é, sem se preocuparem com o que
seria perguntado no questionário. Os informantes assistiram ao trecho do filme e, logo
a seguir, receberam o questionário e procederam ao seu preenchimento. Antes, porém,
a pesquisadora solicitou que os participantes não dispensassem muito tempo na
reflexão das respostas, mas que procurassem responder às questões de acordo com sua
primeira impressão. A partir daí, procedemos ao levantamento estatístico dos
questionários respondidos com o auxílio do programa Excel (tabelas e gráficos
dinâmicos) e do programa Epiinfo versão 6.1B. O último passo realizado foi a análise
(mostrada a seguir) das informações fornecidas pelos dois programas.
4.6 ANÁLISE DOS RESULTADOS: A RECEPÇÃO DO PÚBLICO EM
RELAÇÃO ÀS LEGENDAS
Conforme mencionado anteriormente, os participantes foram alertados a não
dispensarem muito tempo na reflexão das respostas; era importante para o resultado da
pesquisa que os informantes marcassem sua primeira impressão a respeito de cada
aspecto perguntado.
Após a aplicação dos questionários, realizamos análises estatísticas, como,
ANOVA, para testar a variância dos grupos, e qui-quadrado, para testar a
dissemelhança entre os mesmos. Como resultado, nenhum dos dados obtidos foi
conclusivo, estatisticamente falando. Basicamente, analisamos os grupos,
considerando: se houve diferença na intuição dos sujeitos, como um todo, quanto às
legendas novas e originais; se homens e mulheres tiveram intuições diferentes quanto a
essas legendas; e, por fim, se informantes que estudaram inglês julgaram as legendas
(novas e originais) de forma diferente. Para detalhar alguns aspectos verificados,
passamos a mostrar o levantamento realizado.
Quanto à sensação de conforto ou desconforto causada pelos aspectos
lingüísticos do filme e das legendas, os questionários mostraram que 86% dos
informantes se consideraram de meio confortável a muito confortável no que diz
respeito à linguagem utilizada pelos personagens do trecho exibido com as legendas
originais (Gráfico 01).
Gráfico 01
Nível de conforto dos informantes quanto à linguagem usada pelos personagens,
por tipo de legenda
Total
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
1234567134567
nova original
Total
item 6-1 (Tudo) item 6-5 (Tudo) item 6-4 (Tudo) item 6-3_2 (Tudo) sexo (Tudo)
Contagem de sujeito
legenda item 6-3
Escala variando de 1, muito desconfortável, a 7, muito confortável.
Conforme o gráfico anterior, em relação às novas legendas, a porcentagem
foi um pouco menor, mas não significativa, 73% dos sujeitos se sentiram entre meio e
muito confortável ao analisar a linguagem utilizada pelos personagens.
73% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
86% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
No tocante à tradução dada para os diálogos nas legendas (Gráfico 02), 76%
dos participantes revelaram sentir-se entre meio confortável a muito confortável. O
resultado foi o mesmo para os dois grupo, fato curioso que contrariou a hipótese de
que as legendas informais poderiam causar desconforto aos participantes por
contrariarem o MCI para escrita.
Gráfico 02
Nível de conforto dos informantes quanto à tradução dos diálogos nas legendas,
originais e novas
Total
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
12345671234567
nova original
Total
item 6-1 (Tudo) item 6-5 (Tudo) item 6-3_2 (Tudo) sexo (Tudo) item 6-3 (Tudo)
Contagem de sujeito
legenda item 6-4
Escala variando de 1, muito desconfortável, a 7, muito confortável
O uso de palavrões pelos personagens sofreu uma variação menor, se
comparado aos outros itens (Gráfico 03). Nesse caso, 58% das pessoas que assistiram
às legendas originais sentiram-se entre meio confortável a muito confortável contra
36%, no mesmo grupo, que se sentiram de muito desconfortável a meio
desconfortável.
76% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
76% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
Gráfico 03Nível de conforto dos informantes quanto ao uso de palavrões pelos personagens
Total
0
2
4
6
8
10
12
14
1234567134567
nova original
Total
item 6-1 (Tudo) item 6-3_2 (Tudo) sexo (Tudo) item 6-4 (Tudo) item 6-3 (Tudo)
Contagem de sujeito
legenda item 6-5
Escala variando de 1, muito desconfortável, a 7, muito confortável
Do grupo que assistiu às novas legendas, 54% admitiram sentir-se
confortável em relação aos palavrões utilizados pelos personagens (Gráfico 03).
Em relação ao uso de palavrões nas legendas originais, 74% dos informantes
revelaram sentir-se entre meio confortável a muito confortável (Gráfico 04). Enquanto
55% dos que assistiram às novas legendas disseram ter se sentido confortável quanto à
tradução dos palavrões para as legendas.
Gráfico 04
Nível de conforto dos informantes quanto ao uso de palavrões nas legendas
Total
0
2
4
6
8
10
12
14
16
12345671234567
nova original
Total
Contar de legenda
legenda item 6-6
Escala variando de 1, muito desconfortável, a 7, muito confortável
54% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
58% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
55% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
74% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
Essa diferença mostrada entre o grupo das legendas originais e das novas
legendas pode ser indício de que o palavrão escrito pode incomodar mais que o falado,
visto terem sido pronunciados pelos personagens, em inglês. Mesmo os participantes
que conheciam inglês, e que assistiram às legendas originais sem palavrões (ou com
suavização), não se incomodaram em ouvi-los, no entanto, os sujeitos das novas
legendas se sentiram mais incomodados que os primeiros.
O conforto dos participantes em relação às legendas originais pode ser
atribuído às seguintes possibilidades: primeiro, os palavrões não estarem escritos e não
terem sido ouvidos pelo espectador; segundo, terem sido ouvidos pelo sujeito, mas não
estarem escritos nas legendas; terceiro, terem sido ouvidos, não lidos nas legendas e
serem percebidos como naturais pelo espectador. Por envolverem aspectos inerentes à
fala e à escrita, fica clara a influência dos MCIs mencionados anteriormente na relação
do público com os palavrões.
É importante mencionar que, para os informantes leigos no conhecimento de
língua inglesa, os itens “a linguagem dos personagens” e “a tradução dos diálogos nas
legendas”, assim como “o uso de palavrões pelos personagens” e “o uso de palavrões
nas legendas” não deveriam apresentar resultados diferentes, pelo fato de não
conseguirem estabelecer relações de semelhanças e/ou diferenças entre áudio e
legendas, este em português, aquele em inglês. Assim, buscamos verificar se o
conhecimento da língua inglesa por parte dos informantes foi uma variável interferente
no resultado desta primeira questão analisada. Os sujeitos não estudantes da língua
inglesa, e que assistiram às legendas originais, apresentaram uma variação sensível em
relação aos gráficos gerais apresentados anteriormente. Nos gráficos mostrados, os
maiores números oscilaram entre meio desconfortável (para o uso de palavrões pelos
personagens) e meio confortável (para os outros três aspectos). Um levantamento
considerando apenas os não estudantes de língua inglesa mostrou que as maiores
pontuações chegaram a confortável e muito confortável.
Ainda em relação ao mesmo aspecto, os dados revelaram que o
comportamento dos sujeitos não estudantes de inglês, que assistiram às novas
legendas, foi semelhante ao do grupo anterior. O único aspecto que obteve maior
inclinação para o desconforto foi o item relacionado aos palavrões ditos pelos
personagens, os demais não tiveram tendência alguma devido à grande variação de
opiniões.
O levantamento por sexo, sem levar em consideração o nível de
conhecimento em língua inglesa, mostrou que, em relação ao uso de palavrões pelos
personagens, as mulheres das novas legendas apresentaram uma grande variação de
opiniões, enquanto aquelas que assistiram às originais revelaram uma tendência ao
conforto. Os homens, de uma forma geral, sentiram-se confortáveis no tocante aos
palavrões proferidos pelos personagens.
Em relação ao uso de palavrões, podemos fazer as seguintes considerações:
primeiro, os participantes desta pesquisa, embora, não fossem estudantes de inglês,
tinham um vago conhecimento da língua, o que lhes permitiu uma compreensão dos
palavrões em inglês proferidos no trecho (“bitch” e “asshole”, bastante comuns em
filmes). Isto gerou uma variação bastante equilibrada entre os números da escala. Uma
vez que os palavrões das legendas originais foram suavizados ou suprimidos, isto
gerou um conforto maior por parte dos espectadores.
A questão de número 07 procurou investigar a naturalidade das legendas em
relação à oralidade. Nesse caso, a pesquisa mostrou que 6%, dos que assistiram às
legendas originais, consideraram as legendas originais muito estranhas, 4% que elas
eram estranhas, 12% consideraram que as legendas eram um pouco estranhas, 17%
acharam que elas não eram estranhas nem naturais, 27% dos informantes avaliaram as
legendas originais como sendo um pouco naturais, 23% como naturais, e 23%
consideraram as legendas como muito naturais em relação à forma como falamos
correntemente.
Gráfico 05Intuição dos participantes quanto ao nível de naturalidade das legendas
Total
0
2
4
6
8
10
12
14
16
1345671234567
nova original
Total
item 6-8 (Tudo) item 6-3 (Tudo) item 6-4 (Tudo) item 6-7 (Tudo) item 6-2 (Tudo) item 6-1 (Tudo)
Contar de sujeito
legenda item 7
Escala variando de 1, muito estranho, a 7, muito natural
Contrariando à hipótese levantada no início de nossa pesquisa, o gráfico
mostra que o grupo das novas legendas apresentou uma grande tendência para a
aceitação das legendas reelaboradas (75%) como sendo naturais. No entanto, o
levantamento estatístico, levando em consideração o sexo dos participantes revelou
uma diferença estatística relevante no grupo masculino: os homens das legendas
originais variaram muito em suas respostas, enquanto os homens do grupo das novas
legendas revelou uma tendência a achá-las naturais, com significância estatística
(F=3,744; p=0,05).
Alguns dos participantes fizeram comentários para justificar sua opinião em
relação à naturalidade das legendas originais exibidas:
Sujeito 39 marcou 6 (natural) para a naturalidade nas legendas: “As legendas fazem com que o
filme tenha alguma similaridade com a fala dos jovens brasileiros.”
Sujeito 41 marcou 4 (neutro): “Normalmente, toda legenda de um filme tende a ser muito
formal.”
Sujeito 43 marcou 7 (muito natural): “Elas parecem expressar exatamente o que se passa e o
que se fala.”
75% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
73% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
Conforme foi mostrado pelo Gráfico 05, parte de nosso hipótese foi
comprovada ao constarmos que 73% do público consideraram as legendas, feitas sob
os padrões da linguagem formal, naturais. Isto pode ser confirmado pelas opiniões
manifestadas por alguns dos informantes no questionário. Para o sujeito 41, a
formalidade nas legendas é natural dada a sua freqüência, o uso constante de
determinado padrão faz com que, mais cedo ou mais tarde acabe sendo aceito como
natural, por meio da repetição. Para os sujeitos 39 e 43, as legendas formais são tão
naturais que eles não chegam a fazer qualquer distinção entre as legendas escritas e a
fala dos personagens.
Quanto à naturalidade das novas legendas, os comentários realizados foram
os seguintes:
Sujeito 01 marcou 7 (muito natural) para a naturalidade nas legendas: “Para mim a legenda é
bem natural, porém como não sei inglês muito bem, não dá para saber se o que eles falam é
traduzido corretamente.”
Sujeito 03 marcou 7 (muito natural): “Devido a tamanha naturalidade acaba-se tornando
estranho pelo fato de ser filme (natural de mais).”
Sujeito 34 marcou 1 (muito estranho): “Pois as legendas estavam aparecendo de acordo com
a fala do personagem.”
Sujeito 47 marcou 5 (um pouco natural): “É natural este problemas entre jovens, mas os
termos são péssimos, horríveis, deploráveis.”
A satisfação dos participantes também se verificou no depoimento daqueles
que assistiram às novas legendas, os quais acharam que essas legendas representavam
de forma eficaz a fala dos personagens, sem causar qualquer estranheza pelo seu tipo
de linguagem.
Além dos aspectos abordados até o momento, também verificamos a opinião
dos participantes em relação ao uso de palavrões em português. Perguntamos se o
número de palavrões seria maior ou menor caso o mesmo trecho fosse exibido com
áudio em português. O resultado, mostrado no Gráfico 06, mostrou que 80% dos
informantes (que assistiram às legendas originais) acreditavam que, se o trecho exibido
fosse em português, haveria mais palavrões do que o original em inglês. No grupo que
assistiu às novas legendas, o gráfico atinge os maiores picos nas escalas 3 e 5, portanto
uma variação equilibrada entre um pouco menos e um pouco mais de palavrões caso o
trecho fosse em português. Essa diferença entre os grupo foi representativa, com uma
estatística de freqüência F igual a 5,864 e p igual a 0,01.
Gráfico 06
Nível de ocorrência de palavrões caso o filme fosse em português
Total
0
2
4
6
8
10
12
14
16
18
1234567134567
nova original
Total
item 6-6 (Tudo)
Contar de legenda
legenda item 8
Escala variando de 1, menos palavrões, a 7, mais palavrões
O levantamento por idade mostrou que os indivíduos, que assistiram às
novas legendas, com idade entre 26 e 35 anos, apresentaram grande variação em suas
opiniões, portanto, com tendência à indiferença, enquanto aqueles de outras idades
mostraram uma inclinação para acharem que haveria mais palavrões.
O levantamento por sexo mostrou uma diferença estatisticamente relevante
no grupo das mulheres: F = 3,953 e p = 0,05. As que assistiram às novas legendas
apresentaram uma variação muito grande nas respostas, enquanto aquelas que
assistiram às originais mostraram uma inclinação para “mais palavrões” se o mesmo
trecho fosse exibido em português. Para os homens, os dados apontaram uma
inclinação para “mais palavrões”, mas sem diferença estatisticamente relevante,
portanto sem possibilidade de qualquer conclusão.
Esses resultados podem ser indícios de que as pessoas, ao assistirem a um
filme, baseiam-se muito mais nas legendas do que no áudio do filme. Pensamos nessa
possibilidade por dois motivos: primeiro, devido à declaração feita pelo informante 48,
mostrada no quadro a seguir. Este acredita que, nos Estados Unidos, não há liberdade
de expressão e que, por isto, os personagens do filme não falavam palavrões; segundo,
53% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
80% dos
informantes
marcaram de 5 a 7.
em nossa pergunta, não fizemos qualquer referência às legendas ou ao áudio
especificamente, no entanto, pareceu-nos que grande parte dos participantes
considerou a quantidade de palavrões, baseando-se apenas nas legendas. Se não fosse
assim, os participantes com conhecimento prévio na língua inglesa perceberiam que o
áudio apresentou palavrões que, provavelmente, apareceriam nas mesmas
circunstâncias para o trecho em português.
É interessante refletir a respeito deste aspecto porque duas das estratégias de
tradução utilizadas nas legendas originais é a suavização e o corte de palavrões. Isso
pode fazer com que o espectador tenha a impressão de que os filmes em inglês não
utilizam palavrões ao passo que os brasileiros estão repletos deles. Tal pensamento
pode ser um dos aspectos que, durante muito tempo, contribuiu para a depreciação do
cinema nacional.
Os comentários feitos em relação ao uso de palavrões em um trecho em
português foram os seguintes, para o grupo das legendas originais:
Sujeito 39 marcou 7 (mais) para o uso de palavrões caso o trecho fosse em
português: “Porque estamos vendo relações entre jovens.”
Sujeito 44 marcou 4 (o mesmo): “Em português o filme é mais natural e os
palavrões apareceriam e nas legendas vimos pouco, não expressando as falas
do filme.”
Sujeito 45 marcou 7 (mais): “Em filmes nacionais o uso de palavrões é
globalizado.”
Sujeito 48 marcou 7 (mais): “Aqui no Brasil, devido a força de expressão dos
palavrões e o poder de se ter o direito de liberdade de expressão, com certeza
este trecho teria tido muitos palavrões.”
A declaração feita pelo informante 39 mostra a influência do MCI para
palavrões no uso e aceitação dessas expressões. O MCI indica que os adolescentes
podem usar palavrões e, se o trecho fosse em português, seria natural ouvirmos mais
palavrões devido à idade dos personagens (adolescentes).
O grupo de informantes que assistiu às novas legendas fez os seguintes
comentários:
Sujeito 23 marcou 5 (um pouco mais): “Eu não me incomodaria de ver alguns
palavrões até porque eu os uso diariamente, mas o público em geral talvez não
aceite.”
Sujeito 35 marcou 5 (um pouco mais): “É uma realidade da vida, pois no dia a
dia os amigos se tratam desta forma ou talvez muito pior.”
Os pensamentos apresentados por esse grupo se assemelha ao anterior.
Ambos acreditaram que um trecho em português apresentaria mais palavrões que o
trecho em inglês.
Com base no que apresentamos até o momento, podemos afirmar que, de
um modo geral, não obtivemos resultados estatisticamente significativos, ou seja,
nenhum dado foi conclusivo. Em decorrência disto, não foi possível dizer se o uso da
linguagem informal e de palavrões nas legendas, de fato, são naturais na mesma
medida que as legendas formais. Mesmo assim, podemos mencionar três crenças dos
espectadores em relação às legendas originais do trecho exibido: primeiro, o uso da
linguagem formal nas legendas não causa estranheza aos espectadores; segundo, a
linguagem utilizada nas legendas (a linguagem formal) é natural para os espectadores
brasileiros, ou seja, no que diz respeito às expectativas dos informantes, a linguagem
formal consegue representar, de forma satisfatória a oralidade dos diálogos, pelo
menos no tocante aos filmes; e por último, o uso de palavrões é mais comum em
filmes brasileiros do que em filmes em inglês.
Em relação às novas legendas, nossa hipótese inicial não foi confirmada, ou
seja, os espectadores consideraram o uso da linguagem informal também natural. É
possível que isto tenha acontecido devido ao gênero do filme: comédia romântica
adolescente. Como foi mostrado na elaboração dos MCIs, os adolescentes são um
grupo especial de falantes que possuem certos privilégios lingüísticos concedidos pela
sociedade: eles podem falar palavrões sem serem repreendidos por isso, enquanto os
demais são proibidos.
Portanto, é possível que, se a mesma pesquisa fosse realizada com um outro
gênero de filme, a reação dos informantes se manifeste de uma maneira diferente da
que foi revelada nesta pequisa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho, pretendemos verificar se as legendas interlinguais de filmes
americanos feitas sob os padrões da norma culta do português do Brasil eram naturais
ao espectador brasileiro. Esses padrões, fruto das estratégias utilizadas na tradução dos
diálogos dos filmes, baseiam-se nas regras da gramática normativa e de censura para
expressões consideradas ofensivas pela sociedade.
Em nossa pesquisa, trabalhamos com a hipótese de que os espectadores
preferem esse tipo de legendas em razão das crenças relacionadas à língua escrita e à
língua falada cultivadas socialmente. Destarte, fundamentamo-nos nos MCIs, teoria da
Lingüística Cognitiva desenvolvida por Lakoff (1987). Em outras palavras,
acreditamos que os brasileiros prefeririam assistir a legendas feitas sob os padrões da
norma culta devido aos MCIs para fala/escrita e linguagem informal/formal
valorizados culturalmente.
Partindo desse pressuposto, nossa pesquisa foi desenvolvida em três fases:
na primeira, fizemos um levantamento das crenças envolvendo fala/escrita e
linguagem formal/informal apontadas em textos científicos acerca da linguagem. por
meio de um experimento, procuramos verificar se essas crenças seriam confirmadas
por falantes nativos do português do Brasil a ponto de constituírem MCIs para cada
um dos tipos de linguagem mencionados. Após a contagem dos questionários
aplicados no experimento, fizemos nossa proposta de MCIs para fala, escrita,
linguagem formal, linguagem informal e palavrões.
Na segunda fase, fizemos um levantamento de unidades fraseológicas e
clichês de raiva usados nos filmes 10 coisas que eu odeio em você e Meninas
malvadas, como também suas respectivas traduções nas legendas. Por meio da
comparação entre as expressões selecionadas em inglês e suas traduções, foi possível
verificar se a linguagem formal e a suavização ou corte de palavrões foram estratégias
utilizadas na tradução de cada expressão. Constatado o uso dessas estratégias,
analisamos se o seu uso poderia ser justificado por algum dos MCIs propostos na fase
anterior.
Após relacionar as estratégias de tradução, identificadas nas legendas dos
filmes mencionados, aos MCIs, passamos para a terceira fase: a realização da pesquisa
de recepção do público. Nessa última fase, nosso objetivo foi confirmar ou não a
hipótese levantada no início da pesquisa. Sendo assim, realizamos um experimento em
que um grupo de indivíduos assistiu a um trecho do filme 10 coisas que eu odeio em
você com as legendas originais, enquanto outro grupo assistiu às legendas elaboradas
pela pesquisadora. Essas legendas foram elaboradas com base nos MCIs de fala e
linguagem informal, portanto, contrariando o modelo padrão das legendas em
português. Após assistirem ao trecho, todos os participantes responderam a um
questionário direcionado a impressão de cada espectador em relação às legendas
apresentadas no trecho.
De acordo com os dados revelados na pesquisa, o grupo de participantes que
assistiu ao trecho com as legendas originais apresentou, em suas respostas, uma
tendência a aceitá-las como naturais. Isto quer dizer que o uso da linguagem formal e a
suavização ou corte dos palavrões, estratégias correntemente utilizadas nas legendas
em português, não causaram estranheza aos espectadores. Esse resultado permitiu-nos
comprovar parte de nossa hipótese em que as legendas feitas sob os padrões da norma
culta brasileira são naturais para os espectadores que assistem a filmes com legendas.
O segundo grupo de participantes, que assistiu às novas legendas,
apresentou o mesmo comportamento do grupo anterior. Isto fez com que nossa
hipótese inicial fosse comprovada apenas em parte. Inicialmente, esperávamos
confirmar a rejeição do público em relação às legendas elaboradas fora dos padrões
apresentados pelos MCI para escrita e linguagem formal. No entanto, os dados
revelaram o contrário: a aceitação do público para com a linguagem informal e os
palavrões traduzidos nas novas legendas.
Atribuímos os resultados encontrados aos MCIs propostos na primeira fase
desta pesquisa. A aceitação das legendas originais, por exemplo, pode ser justificada
pelos MCIs para escrita e para linguagem formal. Segundo esses modelos, a escrita é
relacionada à linguagem formal, ou seja, o texto escrito deve seguir os padrões
normativos da língua. Por serem escritas, as legendas também devem apresentar o
mesmo tipo de linguagem. O MCI para palavrões também revelou rejeição a esses
termos quando escritos em locais públicos, principalmente, e, uma vez que as legendas
são textos escritos de acesso público, a suavização ou o corte de palavrões é esperado
nas traduções.
A aceitação das novas legendas também se justifica pelos MCIs, porém,
nesse caso, o gênero fílmico exerceu certa influência nos resultados encontrados. O
trecho exibido para os participantes foi do filme 10 coisas que eu odeio em você, uma
comédia romântica adolescente. Em relação aos clichês de raiva, por exemplo, o MCI
para palavrões mostrou que as pessoas costumam ser toleráveis com os adolescentes.
Em outras palavras, os palavrões são, normalmente, rejeitados socialmente, mas
podem ser usados com certa liberdade se proferidos por adolescentes. Embora não
tenhamos dirigido o primeiro questionário aplicado no sentido de verificar se o mesmo
acontece em relação à linguagem informal, acreditamos que as pessoas sejam
inclinadas a um comportamento semelhante.
Diante do exposto, consideramos alcançados os objetivos propostos para a
pesquisa em tela, entretanto, reconhecemos a limitação dos resultados apontados e a
possibilidade de um maior aprofundamento em um novo estudo guiado por diferentes
perspectivas. Futuras pesquisas podem ser realizadas no sentido de verificar a recepção
do público em relação às legendas de diferentes gêneros fílmicos. Também seria
interessante verificar a existência de algum outro MCI envolvido na relação público-
legendas, como, por exemplo, um MCI específico para legendas.
Além dos pontos sugeridos, seria válido para os estudos de tradução uma
análise da possível relação dos MCIs com outras técnicas de TAV, a saber, a
legendagem para surdos, a dublagem e o voice-over.
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ANEXOS
Anexo 01
QUESTIONÁRIO
Este questionário faz parte de uma pesquisa que desenvolvemos sobre
alguns aspectos da linguagem. Não se trata de um teste; estamos interessados em
entender como você, falante nativo do português, entende a língua de uma forma geral.
Agradecemos desde já sua participação e pedimos que responda todas as perguntas de
forma sincera e objetiva.
01. Sexo: ( ) F ( ) M
02. Idade: ( ) 12-18 ( ) 19-25 ( ) 26-35 ( ) acima de 35
03. Escolaridade:
( ) Ensino fundamental
( ) Ensino médio
( ) Curso técnico
( ) Graduação
( ) Pós-graduação
Avalie os itens a seguir em uma escala de 1 (um) a 7 (sete), conforme as instruções
dadas. Não leve muito tempo pensando; marque os itens de acordo com sua primeira
impressão. Você pode marcar qualquer número de 1 a 7.
Em uma escala da 1 (um) a 7 (sete), em que 1 representa a linguagem totalmente
informal e 7 representa a linguagem totalmente formal, escreva nos parênteses à
esquerda de cada item o número que reflete sua opinião em relação às perguntas
04, 05 e 06.
1.................2.................3.................4.................5.................6.................7
Totalmente Um pouco Um pouco Totalmente
informal informal formal formal
04. Em que nível da escala, você acha que cada item abaixo caracteriza a
linguagem formal e/ou a linguagem informal?
( ) Linguagem comum usada pela maioria das pessoas.
( ) A língua dos grandes escritores.
( ) Linguagem que obedece às regras da gramática.
( ) Linguagem usada em discursos, palestras e conferências.
( ) Linguagem utilizada por pessoas não-alfabetizadas.
( ) Linguagem utilizada por pessoas cultas.
( ) Linguagem que sai naturalmente durante uma conversa.
( ) A língua correta, livre de erros.
( ) Linguagem das pessoas mais ricas.
( ) Linguagem mais parecida com a forma que as pessoas falam.
( ) Linguagem utilizada por um menor número de pessoas.
( ) Linguagem considerada mais elegante, mais chique.
( ) A língua aprendida com o auxílio de livros e professores.
( ) Linguagem aprendida desde criança.
( ) Linguagem aprendida na escola.
( ) Linguagem falada.
( ) Linguagem escrita.
05. Que nível de formalidade da linguagem você julga necessário em cada uma
das situações abaixo?
( ) Reunião de negócios
( ) Reunião de amigos
( ) Cerimônia de formatura
( ) Festa de aniversário
( ) Entrevista para emprego
( ) Em casa
( ) Sala de Júri (julgamento)
( ) Jogo de futebol
( ) Jornal televisivo (TV)
( ) Novelas modernas
( ) Livro de atas
( ) Músicas
( ) Restaurante
( ) Sermão na igreja
( ) Jornal impresso
( ) MSN Messenger
( ) Na feira
( ) Testamento
( ) Carta pessoal
( ) Carta comercial
( ) Diário
( ) Artigo científico
06. Em que nível de formalidade da linguagem, você, normalmente, associa as
pessoas abaixo?
( ) Jornalista
( ) Taxista
( ) Pedreiro
( ) Contador
( ) Gari
( ) Professor
( ) Médico
( ) Feirante
( ) Faxineiro
( ) Juiz
( ) Presidente da República
( ) Político
( ) Agricultor
( ) Arquiteto
07. Em uma escala da 1 (um) a 7 (sete), em que 1 representa muito desvalorizada
e 7 representa muito valorizada, escreva nos parênteses à esquerda de cada item o
número que reflete sua opinião.
1.................2.................3.................4.................5.................6.................7
Totalmente Um pouco Um pouco Totalmente
desvalorizada desvalorizada valorizada valorizada
Em que nível da escala, você acha que a sociedade valoriza as profissões abaixo?
( ) Jornalista
( ) Taxista
( ) Pedreiro
( ) Contador
( ) Gari
( ) Professor
( ) Médico
( ) Feirante
( ) Faxineiro
( ) Juiz
( ) Presidente da República
( ) Político
( ) Agricultor
( ) Arquiteto
Em uma escala da 1 (um) a 7 (sete), em que 1 representa totalmente inadequado e
7 representa totalmente adequado, escreva nos parênteses o número que reflete
sua opinião em relação às situações apresentadas a seguir.
1.................2.................3.................4.................5.................6.................7
Totalmente Um pouco Um pouco Totalmente
inadequado inadequado adequado adequado
08. Um colega de praia usando palavras difíceis durante uma conversa.
1( ) 2( ) 3( ) 4( ) 5( ) 6( ) 7( )
09. Um escritor famoso usando palavras difíceis durante uma conversa.
1( ) 2( ) 3( ) 4( ) 5( ) 6( ) 7( )
10. Em uma escala da 1 (um) a 7 (sete), em que 1 representa um péssimo
atendimento e 7 representa um atendimento excelente, escreva nos parênteses à
esquerda de cada item, o número que reflete sua opinião em relação às situações
apresentadas a seguir.
1.................2.................3.................4.................5.................6.................7
Péssimo Ruim Bom Excelente
Em uma loja, que tipo de atendimento você acha que a pessoa abaixo receberia?
( ) “Bom dia, moça! Por gentileza, quanto custam os sapatos pretos na segunda
prateleira?” “Por favor, você poderia trazer um par número 40 para eu
experimentar?” “Obrigada.” (Algum tempo depois...) “Estes não ficaram bons, você
não teria um outro modelo mais confortável?”
( ) “Ô, moça! Quanto é aquele sapato? Aquele ali, ó, perto das calça jeans.” “Traz
um 40 pra mim?” (Algum tempo depois...) “Não gostei desse negócio. Ele aperta
meus pé. Você tem outro tipo mais melhor que esse?”
11. Em uma escala da 1 (um) a 7 (sete), em que 1 representa nenhuma
credibilidade e 7 representa total credibilidade, escreva nos parênteses à
esquerda de cada item o número que reflete sua opinião em relação a quanta
credibilidade as pessoas abaixo receberiam em um julgamento:
1.................2.................3.................4.................5.................6.................7
Nenhuma Pouca Alguma Total
credibilidade credibilidade credibilidade credibilidade
( ) Um faxineiro não-alfabetizado
( ) Um faxineiro alfabetizado
( ) Um médico
Em uma escala da 1 (um) a 7 (sete), em que 1 representa as características
exclusivas da fala e 7 representa as características exclusivas da escrita, escreva
nos parênteses à esquerda de cada item o número que reflete sua opinião em
relação às perguntas 12 e 13.
1.................2.................3.................4.................5.................6.................7
Características Características da fala Características da escrita Características
exclusivas da fala com algumas com algumas exclusivas da escrita
características da escrita características da fala
12. Em que nível da escala, as afirmativas abaixo apresentam características da
FALA e/ou da ESCRITA?
( ) As pessoas aprendem antes de ler e escrever.
( ) É aprendida na escola.
( ) Apresenta frases mais longas.
( ) Apresenta frases mais curtas.
( ) Obedece às regras da gramática.
( ) É natural e muitas vezes não segue a gramática.
( ) As palavras mudam com o tempo, podem ser diferentes.
( ) As palavras não mudam com o tempo, são as mesmas.
( ) Linguagem mais organizada, sem repetições.
( ) Linguagem repetitiva, com frases incompletas.
( ) É cheia de rodeios, muitas palavras para dizer uma coisa.
( ) Linguagem resumida, direta.
( ) Tudo é dito só por palavras.
( ) Os gestos também transmitem mensagem.
( ) Só dura um momento, poucos instantes.
13. Em que nível da escala, as frases abaixo apresentam características de um
texto falado e/ou de um texto escrito?
( ) “Uma palavra que eu não sei o significado.”
( ) “Você poderia me dar uma carona?”
( ) “O Paulo, eu vi ele no cinema.”
( ) “Porra! Dá pra me ouvir?”
( ) “Uma palavra cujo significado eu não sei.”
( ) “Vende-se picolé.”
( ) “Cê podia me ajudar?”
( ) “Televisão, não, me conta uma história.”
( ) Expressões regionais (“Ave Maria”, “Arre Égua”, “Botar boneco”)
( ) Palavrão (“Porra”, “Merda”, “Galinha”)
( ) Expressões com preposições: em um, de uma, para o, ao.
( ) Conjugações verbais do tipo: tu vais, eu iria, vós falastes.
( ) Gíria (“Bro”, “É TDB”, “Mano”)
( ) Vocabulário rebuscado (“Misógino”, “Indumentária”, “Parcimônia”)
Em uma escala da 1 (um) a 7 (sete), em que 1 representa totalmente inaceitável e
7 representa totalmente aceitável, escreva nos parênteses à esquerda de cada item
o número que reflete sua opinião em relação às perguntas 14, 15 e 16.
1.................2.................3.................4.................5.................6.................7
Totalmente Um pouco Um pouco Totalmente
inaceitável inaceitável aceitável aceitável
14. Em que nível da escala, você aceita ou não o uso de palavrões nas situações
abaixo?
( ) Os palavrões de um modo geral.
( ) Os palavrões quando escritos em um local público.
( ) Os palavrões quando escritos em um local privado.
( ) Os palavrões quando falados por alguém.
( ) Os palavrões ditos por alguém conhecido.
( ) Os palavrões ditos por alguém desconhecido.
15. Em que nível da escala, você acha que a sociedade aceita ou não o uso de
palavrões nas situações abaixo?
( ) Palavrões entre amigos
( ) Palavrões num júri
( ) Palavrões num jornal televisivo (TV)
( ) Palavrões num filme
( ) Palavrões no teatro
( ) Palavrões num livro
( ) Palavrões numa música
( ) Palavrões num outdoor
( ) Palavrões num discurso político
( ) Palavrões num sermão de igreja
( ) Palavrões em sala de aula
16. Em que nível da escala, você acha aceitável ou não o uso de palavrões pelas
pessoas abaixo?
( ) Um adolescente
( ) Um idoso
( ) Um homem
( ) Uma mulher
( ) Uma criança
( ) Um político
( ) Um jornalista
( ) Um professor
( ) Um artista de TV
( ) Um policial
( ) O Presidente da República
( ) Um juiz
( ) Um galego
( ) Um vendedor
ANEXO 02
TEXTO ESCRITO – INGLÊS
TEXTO ORAL – INGLÊS – MM
TEXTO ORAL – INGLÊS – DC
N Word Freq. %
N Word Freq. %
N Word Freq. %
1 THE 2.901 3,16 1 I 415 3,98 1 YOU 429 5,23
2 I 2.897 3,15 2 YOU 415 3,98 2 I 336 4,1
3 TO 2.775 3,02 3 TO 217 2,08 3 A 180 2,2
4 AND 2.719 2,96 4 THE 207 1,98 4 THE 178 2,17
5 SHE 1.811 1,97 5 IT 191 1,83 5 TO 173 2,11
6 A 1.782 1,94 6 A 188 1,8 6 THAT 131 1,6
7 THAT 1.632 1,78 7 THAT 134 1,28 7 ME 114 1,39
8 IT 1.540 1,68 8 AND 133 1,27 8 AND 98 1,2
9 IS 1.293 1,41 9 SHE 133 1,27 9 IT 96 1,17
10 OF 1.241 1,35 10 ME 110 1,05 10 KNOW 81 0,99
11 IN 1.238 1,35 11 IS 105 1,01 11 WHAT 81 0,99
12 NOT 1.062 1,16 12 IN 97 0,93 12 FOR 77 0,94
13 FOR 1.054 1,15 13 MY 92 0,88 13 OF 77 0,94
14 BUT 1.051 1,14 14 THIS 92 0,88 14 NOT 71 0,87
15 HER 1.012 1,1 15 HER 90 0,86 15 IS 69 0,84
16 WE 1.008 1,1 16 WAS 85 0,81 16 NO 69 0,84
17 WAS 959 1,04 17 OF 83 0,8 17 SO 64 0,78
18 SAID 816 0,89 18 WE 82 0,79 18 WE 59 0,72
19 HE 800 0,87 19 SO 77 0,74 19 MY 57 0,7
20 SO 731 0,8 20 WHAT 75 0,72 20 THIS 56 0,68
21 ME 683 0,74 21 DO 72 0,69 21 DO 52 0,63
22 ONE 648 0,71 22 NO 72 0,69 22 SHE 52 0,63
23 YOU 635 0,69 23 NOT 70 0,67 23 IN 51 0,62
24 AT 628 0,68 24 REGINA 70 0,67 24 YOUR 50 0,61
25 WITH 622 0,68 25 FOR 69 0,66 25 JUST 48 0,59
26 HAVE 621 0,68 26 YOUR 69 0,66 26 BUT 47 0,57
27 ALL 596 0,65 27 LIKE 66 0,63 27 DON 46 0,56
28 HAD 587 0,64 28 HAVE 62 0,59 28 YEAH 46 0,56
29 HELLA 568 0,62 29 ON 61 0,58 29 HAVE 44 0,54
TEXTO ESCRITO – INGLÊS
TEXTO ORAL – INGLÊS – MM
TEXTO ORAL – INGLÊS – DC
N Word Freq. %
N Word Freq. %
N Word Freq. %
30 MOTHER 517 0,56 30 WITH 61 0,58 30 OUT 44 0,54
31 DORA 503 0,55 31 ARE 54 0,52 31 GO 43 0,52
32 ABOUT 481 0,52 32 BUT 53 0,51 32 LIKE 43 0,52
33 WHEN 475 0,52 33 DON 52 0,5 33 WITH 43 0,52
34 ON 462 0,5 34 KNOW 52 0,5 34 ARE 42 0,51
35 BE 461 0,5 35 BE 50 0,48 35 OKAY 42 0,51
36 FATHER 459 0,5 36 CAN 50 0,48 36 CAN 39 0,48
37 AS 439 0,48 37 OK 49 0,47 37 WAS 39 0,48
38 CAN 429 0,47 38 ALL 48 0,46 38 OH 38 0,46
39 HAS 424 0,46 39 OUT 48 0,46 39 THINK 38 0,46
40 WHAT 412 0,45 40 UP 47 0,45 40 WELL 36 0,44
41 DAY 404 0,44 41 JUST 45 0,43 41 HEY 35 0,43
42 ARE 400 0,44 42 ABOUT 43 0,41 42 UP 35 0,43
43 THEN 376 0,41 43 OH 42 0,4 43 WANT 35 0,43
44 REALLY 372 0,41 44 GET 41 0,39 44 BE 34 0,41
45 WOULD 337 0,37 45 CADY 39 0,37 45 HE 34 0,41
46 MY 322 0,35 46 AT 38 0,36 46 ABOUT 33 0,4
47 BECAUSE 314 0,34 47 OH 42 0,4 47 ON 33 0,4
48 IF 306 0,33 48 GET 41 0,39 48 GET 30 0,37
49 THERE 306 0,33 49 CADY 39 0,37 49 HER 30 0,37
50 ONLY 299 0,33 50 AT 38 0,36 50 THERE 30 0,37
51 DID 293 0,32 51 WHY 38 0,36 51 WHO 29 0,35
52 KNOW 291 0,32 52 HEY 37 0,35 52 I'M 28 0,34
53 US 287 0,31 53 WHO 37 0,35 53 KAT 28 0,34
54 THEY 286 0,31 54 HOW 35 0,34 54 RIGHT 28 0,34
55 QUITE 281 0,31 55 GOOD 31 0,3 55 LOOK 27 0,33
56 SAYS 280 0,3 56 ONE 31 0,3 56 ALL 26 0,32
57 DO 279 0,3 57 RIGHT 31 0,3 57 REALLY 25 0,3
58 GO 268 0,29 58 THERE 31 0,3 58 DID 24 0,29
59 LIKE 263 0,29 59 THEY 31 0,3 59 LET 24 0,29
60 DON 252 0,27 60 DID 30 0,29 60 UH 24 0,29
TEXTO ESCRITO – INGLÊS
TEXTO ORAL – INGLÊS – MM
TEXTO ORAL – INGLÊS – DC
N Word Freq. %
N Word Freq. %
N Word Freq. %
61 ALWAYS 246 0,27 61 LL 30 0,29 61 AT 23 0,28
62 SUCH 246 0,27 62 THINK 30 0,29 62 HERE 23 0,28
63 MUST 241 0,26 63 WHEN 30 0,29 63 IF 23 0,28
64 WERE 237 0,26 64 AARON 29 0,28 64 NOW 23 0,28
65 BEEN 236 0,26 65 HE 29 0,28 65 ONE 23 0,28
66 NO 236 0,26 66 IF 28 0,27 66 THEY 23 0,28
67 WILL 236 0,26 67 YEAH 28 0,27 67 GOING 22 0,27
68 HIM 235 0,26 68 REALLY 27 0,26 68 LL 22 0,27
69 OUT 235 0,26 69 VE 27 0,26 69 THEN 22 0,27
70 OR 234 0,25 70 HAD 26 0,25 70 YOU'RE 22 0,27
71 UP 229 0,25 71 HERE 26 0,25 71 BIANCA 21 0,26
72 TOO 227 0,25 72 WANT 26 0,25 72 HOW 21 0,26
73 VERY 224 0,24 73 BACK 25 0,24 73 SISTER 21 0,26
74 GOING 217 0,24 74 FROM 25 0,24 74 WHEN 21 0,26
75 NEVER 216 0,24 75 GO 25 0,24 75 HIM 20 0,24
76 FRAU 211 0,23 76 PEOPLE 25 0,24 76 SEE 20 0,24
77 FROM 205 0,22 77 GIRL 24 0,23 77 SOME 20 0,24
78 TIME 204 0,22 78 GOD 23 0,22 78 WHY 20 0,24
79 ANYTHING 200 0,22 79 NOW 23 0,22 79 AS 19 0,23
80 SAY 199 0,22 80 BECAUSE 22 0,21 80 DON'T 19 0,23
81 THIS 193 0,21 81 COULD 22 0,21 81 GOT 19 0,23
82 AN 192 0,21 82 EVERYBODY 22 0,21 82 VE 19 0,23
83 COURSE 187 0,2 83 TELL 22 0,21 83 BECAUSE 18 0,22
84 MORE 179 0,19 84 DIDN 21 0,2 84 HATE 17 0,21
85 NOW 179 0,19 85 GOT 21 0,2 85 PEOPLE 17 0,21
86 CAME 178 0,19 86 GRETCHEN 21 0,2 86 SAY 17 0,21
87 AWFULLY 173 0,19 87 LOVE 21 0,2 87 HI 16 0,2
88 COULD 168 0,18 88 SOME 21 0,2 88 JOEY 16 0,2
89 OUR 168 0,18 89 US 21 0,2 89 ALRIGHT 15 0,18
90 MUCH 166 0,18 90 WOULD 21 0,2 90 COULD 15 0,18
91 SHOULD 164 0,18 91 HIM 20 0,19 91 DATE 15 0,18
TEXTO ESCRITO – INGLÊS
TEXTO ORAL – INGLÊS – MM
TEXTO ORAL – INGLÊS – DC
N Word Freq. %
N Word Freq. %
N Word Freq. %
92 TOLD 161 0,18 92 SAY 20 0,19 92 EVEN 15 0,18
93 GOT 159 0,17 93 SCHOOL 20 0,19 93 NEVER 15 0,18
94 HIS 159 0,17 94 SEE 20 0,19 94 TAKE 15 0,18
95 SCHOOL 159 0,17 95 THANKS 20 0,19 95 WOULD 15 0,18
96 WENT 159 0,17 96 GIRLS 19 0,18 96 DADDY 14 0,17
97 ANY 158 0,17 97 GOING 19 0,18 97 GUY 14 0,17
98 AFTER 156 0,17 98 MAKE 19 0,18 98 HAS 14 0,17
99 WELL 156 0,17 99 MEAN 19 0,18 99 LISTEN 14 0,17
100 SHALL 154 0,17 100 MOM 19 0,18 100 OR 14 0,17
101 DOKTOR 152 0,17 101 LET 18 0,17 101 SHOULD 14 0,17
102 FRIGHTFULLY 150 0,16 102 TALK 18 0,17 102 TELL 14 0,17
103 JUST 149 0,16 103 THEN 18 0,17 103 CAMERON 13 0,16
104 WHO 147 0,16 104 GONNA 17 0,16 104 GIRL 13 0,16
105 THEM 145 0,16 105 HOME 17 0,16 105 GUYS 13 0,16
106 THINK 145 0,16 106 LOOK 17 0,16 106 LITTLE 13 0,16
ANEXO 03
TEXTO ORAL – PORTUGUÊS
LEGENDAS – PORTUGUÊS – MM
LEGENDAS – PORTUGUÊS – DC
N Word Freq. %
N Word Freq. %
N Word Freq. %
1 NÃO 79 3,87 1 NÃO 256 2,93 1 QUE 252 3,88
2 É 70 3,43 2 É 248 2,84 2 NÃO 251 3,86
3 DE 56 2,74 3 QUE 244 2,79 3 É 162 2,49
4 A 55 2,69 4 DE 226 2,59 4 DE 144 2,21
5 E 53 2,59 5 A 225 2,58 5 O 138 2,12
6 QUE 51 2,5 6 O 179 2,05 6 A 113 1,74
7 O 40 1,96 7 VOCÊ 163 1,87 7 VOCÊ 103 1,58
8 ENTÃO 37 1,81 8 EU 128 1,47 8 E 101 1,55
9 AHN 36 1,76 9 ELA 125 1,43 9 UM 83 1,28
10 SE 35 1,71 10 E 108 1,24 10 ME 74 1,14
11 MAS 27 1,32 11 PARA 103 1,18 11 EU 69 1,06
12 PORQUE 27 1,32 12 UMA 89 1,02 12 SE 69 1,06
13 EU 26 1,27 13 POR 87 1 13 UMA 67 1,03
14 TEM 26 1,27 14 UM 79 0,9 14 POR 64 0,98
15 PARA 25 1,22 15 COM 78 0,89 15 PARA 59 0,91
16 UM 21 1,03 16 ESTÁ 76 0,87 16 COM 57 0,88
17 MAIS 20 0,98 17 ISSO 76 0,87 17 ESTÁ 57 0,88
18 COM 18 0,88 18 SE 76 0,87 18 BEM 46 0,71
19 ELES 18 0,88 19 REGINA 68 0,78 19 MAS 46 0,71
20 ELA 17 0,83 20 ME 65 0,74 20 ELA 44 0,68
21 UMA 17 0,83 21 DA 61 0,7 21 ISSO 38 0,58
22 MUITO 16 0,78 22 MAS 59 0,68 22 COMO 36 0,55
23 QUER 16 0,78 23 EM 56 0,64 23 TE 36 0,55
24 ESTÁ 14 0,69 24 DO 52 0,6 24 EM 35 0,54
25 AGORA 13 0,64 25 COMO 51 0,58 25 DA 34 0,52
26 JÁ 13 0,64 26 BEM 49 0,56 26 DO 34 0,52
27 NA 13 0,64 27 NA 47 0,54 27 TEM 34 0,52
28 DIZER 12 0,59 28 AS 44 0,5 28 MAIS 32 0,49
29 OU 12 0,59 29 ELE 38 0,44 29 SIM 31 0,48
TEXTO ORAL – PORTUGUÊS
LEGENDAS – PORTUGUÊS – MM
LEGENDAS – PORTUGUÊS – DC
N Word Freq. %
N Word Freq. %
N Word Freq. %
30 TUDO 12 0,59 30 FOI 38 0,44 30 NA 29 0,45
31 CASA 11 0,54 31 PODE 38 0,44 31 KAT 28 0,43
32 DO 11 0,54 32 CADY 36 0,41 32 SEI 28 0,43
33 ELE 11 0,54 33 SÓ 36 0,41 33 SEU 26 0,4
34 ASSIM 10 0,49 34 OS 35 0,4 34 TUDO 26 0,4
35 EM 10 0,49 35 TUDO 35 0,4 35 MUITO 25 0,38
36 NÉ 10 0,49 36 SOU 34 0,39 36 SUA 25 0,38
37 DA 9 0,44 37 QUEM 33 0,38 37 NO 24 0,37
38 DEPOIS 9 0,44 38 MAIS 32 0,37 38 OS 24 0,37
39 ESCOLA 9 0,44 39 VOU 32 0,37 39 VAI 24 0,37
40 FOI 9 0,44 40 NO 31 0,35 40 AS 23 0,35
41 POR 9 0,44 41 OI 31 0,35 41 MEU 23 0,35
42 QUANDO 9 0,44 42 MUNDO 30 0,34 42 BIANCA 22 0,34
43 AINDA 8 0,39 43 VAI 30 0,34 43 MINHA 22 0,34
44 NO 8 0,39 44 MINHA 29 0,33 44 SÓ 22 0,34
45 NÓS 8 0,39 45 AARON 28 0,32 45 QUEM 21 0,32
46 OS 8 0,39 46 SER 28 0,32 46 PAI 20 0,31
47 OUTRO 8 0,39 47 VOCÊS 28 0,32 47 PODE 20 0,31
48 ANOS 7 0,34 48 MUITO 27 0,31 48 QUER 20 0,31
49 AS 7 0,34 49 SEI 27 0,31 49 PRA 19 0,29
50 DOIS 7 0,34 50 SUA 27 0,31 50 QUANDO 19 0,29
51 ESTÃO 7 0,34 51 OBRIGADA 25 0,29 51 QUÊ 19 0,29
52 GENTE 7 0,34 52 VAMOS 25 0,29 52 VAMOS 19 0,29
53 SÃO 7 0,34 53 CERTO 24 0,27 53 ATÉ 18 0,28
54 AH 6 0,29 54 ESTOU 24 0,27 54 ENTÃO 18 0,28
55 COISA 6 0,29 55 MEU 24 0,27 55 ESTOU 18 0,28
56 DIA 6 0,29 56 QUANDO 24 0,27 56 FOI 18 0,28
57 FAZ 6 0,29 57 FAZER 23 0,26 57 IRMÃ 18 0,28
58 FILHOS 6 0,29 58 JÁ 23 0,26 58 NADA 18 0,28
59 MÃE 6 0,29 59 SÃO 23 0,26 59 NEM 18 0,28
60 QUEM 6 0,29 60 SEU 23 0,26 60 PORQUE 18 0,28
TEXTO ORAL – PORTUGUÊS
LEGENDAS – PORTUGUÊS – MM
LEGENDAS – PORTUGUÊS – DC
N Word Freq. %
N Word Freq. %
N Word Freq. %
61 REALMENTE 6 0,29 61 ERA 22 0,25 61 QUERO 18 0,28
62 SEMPRE 6 0,29 62 NOS 22 0,25 62 ISTO 17 0,26
63 SER 6 0,29 63 ALGUÉM 21 0,24 63 MIM 17 0,26
64 TENHO 6 0,29 64 DELA 21 0,24 64 SABE 17 0,26
65 UHN 6 0,29 65 PORQUE 21 0,24 65 SAIR 17 0,26
66 AQUELE 5 0,24 66 QUÊ 21 0,24 66 ALGUÉM 16 0,25
67 ÀS 5 0,24 67 TODO 21 0,24 67 JÁ 16 0,25
68 BEM 5 0,24 68 MÃE 20 0,23 68 JOEY 16 0,25
69 CERTO 5 0,24 69 ESSA 19 0,22 69 NUNCA 16 0,25
70 CINCO 5 0,24 70 ESTAVA 19 0,22 70 ACHO 15 0,23
71 CORRE 5 0,24 71 GRETCHEN 19 0,22 71 AO 15 0,23
72 DÁ 5 0,24 72 NÓS 19 0,22 72 AQUI 15 0,23
73 DAS 5 0,24 73 QUER 19 0,22 73 FAZER 15 0,23
74 DELA 5 0,24 74 TEM 19 0,22 74 ODEIO 15 0,23
75 ESSA 5 0,24 75 CASA 18 0,21 75 SÃO 15 0,23
76 ESTAMOS 5 0,24 76 ESSE 18 0,21 76 SER 15 0,23
77 FAMÍLIA 5 0,24 77 TER 18 0,21 77 SOU 15 0,23
78 FAZER 5 0,24 78 AQUI 17 0,19 78 ASSIM 14 0,22
79 GRANDE 5 0,24 79 FALAR 17 0,19 79 CAMERON 14 0,22
80 MANHÃ 5 0,24 80 NINGUÉM 17 0,19 80 DISSE 14 0,22
81 MARIDO 5 0,24 81 DIZER 16 0,18 81 FESTA 14 0,22
82 MENOS 5 0,24 82 LIVRO 16 0,18 82 IR 14 0,22
83 SABE 5 0,24 83 À 15 0,17 83 POSSO 14 0,22
84 SEI 5 0,24 84 ÁFRICA 15 0,17 84 TÃO 14 0,22
85 TAMBÉM 5 0,24 85 ASSIM 15 0,17 85 VOU 14 0,22
86 TÊM 5 0,24 86 COISA 15 0,17 86 CERTO 13 0,2
87 TER 5 0,24 87 ESCOLA 15 0,17 87 OLÁ 13 0,2
88 TRABALHO 5 0,24 88 JANIS 15 0,17 88 TENHO 13 0,2
89 CORRENDO 4 0,2 89 LEGAL 15 0,17 89 BOGEY 12 0,18
90 DEPRESSA 4 0,2 90 MIM 15 0,17 90 EI 12 0,18
91 DIZ 4 0,2 91 POSSO 15 0,17 91 ELE 12 0,18
TEXTO ORAL – PORTUGUÊS
LEGENDAS – PORTUGUÊS – MM
LEGENDAS – PORTUGUÊS – DC
N Word Freq. %
N Word Freq. %
N Word Freq. %
92 DOS 4 0,2 92 TÃO 15 0,17 92 AGORA 11 0,17
93 EH 4 0,2 93 TENHO 15 0,17 93 AÍ 11 0,17
94 ESSES 4 0,2 94 VIDA 15 0,17 94 AMIGO 11 0,17
95 ESTOU 4 0,2 95 ACHO 14 0,16 95 BAILE 11 0,17
96 EXATAMENTE 4 0,2 96 MENINAS 14 0,16 96 GAROTA 11 0,17
97 FEZ 4 0,2 97 ONDE 14 0,16 97 LEGAL 11 0,17
98 FORA 4 0,2 98 ELAS 13 0,15 98 NINGUÉM 11 0,17
99 HORA 4 0,2 99 ENTÃO 13 0,15 99 ONDE 11 0,17
ANEXO 04
LEGENDAS ORIGINAIS NOVAS LEGENDAS
Vendeu o fígado no mercado negro
para comprar uns amplificadores.
É nosso homem.
Oi. Tudo bem?
Ouça, eu...
Até mais.
Como faremos
para que saia com a Kat?
Não sei.
Podíamos pagar...
mas não temos dinheiro.
Bem, precisamos de um aval.
Como assim?
Alguém com dinheiro e burro.
Ah, sim!
Esse rolinho é de pêssego?
Não se vêem muitos...
Normal.
Legal. Tudo bem.
-Está perdido?
-Não.
Na verdade, vim conversar.
-Nós não conversamos.
-Bem, eu...
queria conversar com você
e ver se você se interessa.
-Não.
-Ouça primeiro.
Você se interessa
pela Bianca, certo?
Mas não pode sair com ela
porque a irmã...
é um caso mental
e ninguém sairá com ela, certo?
Esta conversa
tem algum propósito?
Eu acho que você devia...
contratar um cara
para sair com ela.
Alguém que não se assuste
facilmente.
Aquele ali?
-Soube que comeu um pato vivo.
-Tudo, menos o bico e as patas.
O cara vendeu o fígado pros traficantes
pra comprar uns amplificadores.
Esse é o cara.
E aí, mano?
Ei, eu...
Falou.
O que a gente faz pra ele
sair com a Kat?
Não sei.
A gente podia pagar...
mas não temos grana.
Precisamos de um “laranja”.
Como assim?
Um babaca com dinheiro.
Ah, tá!
É enroladinho de frutas?
É difícil encontrar desses...
Copiei.
Tá, bem.
-Anda perdido?
-Não.
Vim bater papo.
-A gente não bate papo.
-É que eu...
queria falar uma coisa
e ver se te interessa.
-Não.
-Primeiro, ouça.
Você tá a fim
da Bianca, né?
Mas não pode ficar com ela
porque a irmã...
é louca e ninguém
sai com ela, né?
Aonde você
quer chegar?
Acho que você devia...
contratar alguém
pra sair com ela.
Alguém que não
tenha medo dela.
Aquele ali?
-Soube que comeu um pato vivo.
-Tudo, menos o bico e as patas.
Obviamente,
é um investimento sólido.
-O que você lucra?
-Ei...
passo pelo corredor, eu te cumprimento,
você me cumprimenta.
Sim, já entendi.
Você fica popular por tabela.
Vou pensar.
Já terminamos.
-Por que meteu ele nisso?
-Calma. Fica frio.
Fingiremos que ele manda.
Enquanto está ocupado se organizando,
você terá tempo com a Bianca.
É uma boa idéia.
Tudo bem.
Tenho um Bráulio na cara, não?
Lembrem, pessoal...
Segurem e mandem ver.
Ei, tudo bem?
Comi um pato
delicioso ontem.
Eu te conheço?
Está vendo aquela garota.
É Kat Stratford.
Quero que saia com ela.
Até parece, fresco.
Olha, não posso sair com a irmã
até que Kat comece a sair.
O pai dela é meio maluco.
Tem uma regra que...
É uma história comovente.
No duro. Mas não é problema meu.
Seria problema seu
se recebesse um cachê legal?
Você me pagaria para
sair com uma garota?
-Quanto?
-Vinte dólares.
Está bem, $30.
Vejamos.
Se formos ao cinema
são 15 dólares.
Compremos pipocas, são $53.
E se ela quiser doce?
Ficaria uns $75.
Como vê,
é negócio certo.
-O que você ganha?
-Ah...
a gente se cumprimenta
quando passar pelo corredor.
Ah! Entendi.
Você fica popular por tabela.
Vou ver.
-Fim de papo.
-Tá.
-Por que meteu ele na parada?
-Não esquenta.
Vamos fingir que ele manda.
Enquanto ele se ocupa com o cara,
você ganha tempo com a Bianca.
Boa idéia.
Ta certo.
Tô com um pau na cara, né?
Escutem, pessoal...
segurem e metam bronca.
E aí, cara?
Comi um pato
delicioso ontem.
Te conheço?
Tá vendo aquela garota?
É Kat Stratford.
Quero que saia com ela.
Até parece, frouxo.
Olha, não dá pra ficar
com a irmã até que a Kat saia.
O pai dela é meio doido.
Tem uma regra que...
É comovente, mas...
No duro, não é da minha conta.
Seria da sua conta
se pintasse uma grana legal?
Vai me dar dinheiro pra
sair com uma mina?
-Quanto?
-Vinte paus.
Tá bem, $30.
Olha só.
Se vamos ao cinema
São 15 paus.
Com as pipocas, são $53.
E se ela pedir doce?
Fica uns $75.
Isso não é uma negociação.
É pegar ou largar, vira-lata.
Cinqüenta dólares e trato feito, Fábio.
Divirtam-se!
-Belo ataque, Stratford.
-Obrigada, Sr. Chapin.
Oi, gata.
-Tudo bem?
-Suando feito perco. E você?
É assim que se chama
a atenção de um rapaz.
Minha função na vida.
Mas vejo que funcionou com você.
O mundo voltou a fazer sentido!
-Então, te pego na sexta.
-Sim. Na sexta.
Será a noite que te levarei
a lugares que nunca viu antes.
Como a loja de conveniência da
Broadway? Você sabe meu nome, tonto?
Sei mais do que imagina.
Duvidoso. Muito duvidoso.
-Estamos perdidos.
-Não quero atitudes derrotistas.
-Quero ouvir seu otimismo.
-Estamos perdidos!
Assim.
Corra, Bogey!
Nunca quis um visual novo?
É sério. Debaixo dessa hostilidade
há um grande potencial enterrado.
Não sou hostil.
Sou perturbada.
Por que não tenta ser legal?
Ninguém saberia o que pensar.
-Não me importo com o que pensem.
-Importa-se, sim.
Não, não me importo.
Nem sempre precisa ser
quem querem que você seja.
Gosto que me idolatrem, obrigada.
Onde arrumou as pérolas?
Eram da mamãe.
E você as escondeu
por três anos?
Não. Papai as encontrou
em uma gaveta na semana passada.
Não vou discutir.
É pegar ou largar, sem-vergonha.
$50 paus e trato feito, Fábio.
Valeu, pessoal!
-Bela jogada, Kat!
-Valeu, Professor.
Oi, gata.
-Como vai?
-Suando feito porco. E você?
É assim que se conquista
o coração de um rapaz.
Minha sina na vida...
mas funcionou com você.
Tudo faz sentido agora!
-Bom, te pego na sexta.
-É. Na sexta.
Vou te levar a lugares
Que você nunca foi antes.
Como a loja de grife do shopping?
Sabe quem eu sou, bobo?
Sei mais do que pensa.
Duvido muito.
-A gente tá ferrado.
-Não seja pessimista.
-Quero ver seu otimismo.
-A gente tá ferrado!
Isso!
Corre, Bogey!
Já pensou em mudar o visual?
Sério. Por trás dessa rebeldia
se esconde um grande talento.
Não sou rebelde.
Sou perturbada.
Por que não tenta ser legal?
Ninguém ia saber o que pensar.
-Não ligo pro que os outros pensam.
-Liga, sim.
Não, não ligo.
Nem sempre precisa ser
o que os outros esperam.
Gosto de ser paparicada,
obrigada.
Onde conseguiu o colar?
Era da mamãe.
E aí escondeu ele
por três anos?
Não. Papai achou numa
gaveta, semana passada.
E agora vai usá-las?
Ela não virá reclamar!
E ficam bem em mim.
Acredite, não ficam.
Belo automóvel.
Pára-choques clássicos.
Está em seguindo?
Estava na lavanderia,
vi seu carro e vim dizer oi.
Oi.
Você não fala muito, não é?
Depende do assunto. Meu pára-choque
não me provoca um frenesi verbal.
-Não tem medo de mim, não é?
-Por que eu teria?
-A maioria tem.
-Pois eu não.
Talvez não tenha medo, mas garanto
que já me imaginou pelado, não?
Está tão na cara?
Te desejo, te quero.
Ah, querido. Ah, querido.
É o dia dos idiotas?
-Você se importa?
-Nem um pouco.
Sua nojenta!
Meu seguro não cobre
tensão pré-menstrual!
-Diga que tive uma convulsão!
-É por causa de Sarah Lawrence?
Está me castigando porque
quero que fique perto de casa?
Você não me castiga
porque a mamãe se foi?
-Podemos deixá-la de fora?
-Então não tome decisões por mim.
Sou seu pai, tenho direito.
Então, o que eu quero não conta?
Tem 18 anos.
Você não sabe o que quer.
Não saberá até ter 45 anos,
e aí será tarde demais.
Quero estudar na costa leste
e que confie nas minhas decisões.
Que pare de controlar minha vida
só porque não pode controlar a sua.
Sabe o que eu quero?
-Continuaremos mais tarde.
E agora vai usar?
Ela não vai reclamar!
E fica bem em mim.
Não, não fica.
Carro bonito.
Pára-choques clássicos.
Tá me seguindo?
Tava na lavanderia,
vi seu carro e vim dizer oi.
Oi.
Você não fala muito, né?
Depende do assunto./
Meu pára-choque não me
provoca um delírio verbal./
-Não tem medo de mim, né?
-Devia ter?
-A maioria tem.
-Pois eu não.
Talvez não tenha medo, mas aposto
que já me imaginou pelado, né?
Tá tão na cara?
Te desejo, te quero.
Meu querido. Meu amor.
É o dia dos pé-no-saco?
-Se importa?
-Nem um pouco.
Filha-da-puta!
Meu seguro
não cobre TPM!
-Diz que tive uma convulsão!
-É por causa da Sarah Lawrence?
Tá me castigando porque
não quero que vá pra longe?
Você não me castiga
porque a mamãe se foi?
-Dá pra deixar ela de fora?
-Então não decida por mim.
Sou seu pai, tenho direito.
E o que eu quero
não conta?/
Tem 18 anos.
Não sabe o que quer.
E não vai saber até ter 45,
aí vai ser tarde demais.
Quero estudar na costa leste
e que confie em mim.
Pára de controlar a minha vida
só porque não pode controlar a sua.
Sabe o que eu quero?
-Falamos mais tarde.
-Esperarei ansiosa.
Você bateu no carro do Joey?
Sim. Acho que você terá
que pegar ônibus.
Será que não percebe que é
totalmente louca?
Pai!
-Pago $50, mas quero resultados.
-Estou tentando.
Ver essa doida amassar meu carro
não conta como encontro.
Se você não consegue nada,
eu não consigo nada.
Por isso, consiga algo.
Acabo de subir meu preço.
Quê?
Cem dólares o encontro,
adiantado.
Esquece.
Então, esqueça da irmã.
É melhor ser tão esperto
Quanto pensa que é, Verona.
-Vou esperar ansiosa.
Você bateu no carro do Joey?
É. Agora vai ter
que andar de ônibus.
Você não percebe que é
louca varrida?
Pai!
-Pago $50, mas quero resultados.
-Tô tentando.
Ver aquela puta amassar
meu carro não é encontro.
Se você não consegue nada,
eu não consigo nada.
Por isso, te vira!
Acabo de subir meu preço.
Quê?
Cem paus o encontro,
adiantado.
Esquece.
Então, esqueça a irmã.
É melhor você se
garantir, Verona. Se não...
ANEXO 05
QUESTIONÁRIO
Este questionário faz parte de uma pesquisa que desenvolvemos sobre
filmes. Não se trata de um teste; estamos interessados em estudar a impressão que o
trecho do filme exibido causou em você. Agradecemos, desde já, sua participação e
pedimos que responda todas as perguntas de forma sincera e objetiva.
01. Sexo: ( ) F ( ) M
02. Idade: ( ) 12-18 ( ) 19-25 ( ) 26-35 ( ) acima de 35
03. Escolaridade:
( ) Ensino fundamental
( ) Ensino médio
( ) Curso técnico
( ) Graduação
( ) Pós-graduação
04. Estuda inglês: ( ) sim ( ) não
05. Se sua resposta anterior foi sim, responda: há quanto tempo estuda inglês?
( ) menos de um ano
( ) há um ano
( ) há dois anos
( ) há três anos
( ) há quatro anos
( ) há mais de quatro anos
Avalie os itens a seguir em uma escala de 1 (um) a 7 (sete), conforme as instruções
dadas. Não leve muito tempo pensando; marque os itens de acordo com sua primeira
impressão. Você pode marcar qualquer número de 1 a 7.
06. Em uma escala de 1 (um) a 7 (sete), em que 1 representa muito desconfortável
e 7 muito confortável, escreva nos parênteses, à esquerda de cada item, o número
que reflete como você se sentiu durante a exibição do trecho do filme em relação
a:
1.................2.................3.................4.................5.................6.................7
Muito Meio Meio Muito
desconfortável desconfortável confortável confortável
( ) a história.
( ) o estilo dos personagens.
( ) a linguagem dos personagens.
( ) a tradução dos diálogos na legenda.
( ) o uso de palavrões pelos personagens.
( ) o uso de palavrões nas legendas.
( ) as imagens relativas a sexo.
( ) o relacionamento dos personagens entre si.
( ) o cenário em que se passa a história.
( ) outro: ___________________________________________________________.
07. Em uma escala de 1 (um) a 7 (sete), em que 1 representa muito estranho e 7
muito natural (ou seja, do jeito que a gente fala normalmente), marque o número
que representa a sua opinião quanto à naturalidade das legendas:
1.................2.................3.................4.................5.................6.................7
Muito Um pouco Um pouco Muito
estranho estranho natural natural
1( ) 2( ) 3( ) 4( ) 5( ) 6( ) 7( )
Comentários (opcional): _________________________________________________
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
08. Em uma escala de 1 (um) a 7 (sete), em que 1 representa menos palavrões e 7
mais palavrões, marque o número que representa o que você acha se o trecho
exibido fosse em português: apareceriam mais ou menos palavrões?
1.................2.................3.................4.................5.................6.................7
Menos Um pouco Um pouco Mais
menos mais
1( ) 2( ) 3( ) 4( ) 5( ) 6( ) 7( )
Comentários (opcional): _________________________________________________
_____________________________________________________________________
_____________________________________________________________________
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