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Não existe cidade, nem realidade urbana, sem um centro.
Mais que isso: o espaço urbano se define, como já dissemos,
pelo vetor nulo; é um espaço onde cada ponto,
virtualmente, pode atrair para si tudo o que povoa as
imediações: coisas, obras, pessoas (LEFEBVRE, 2002, p. 93).
A cidade atrai para si tudo o que nasce, da natureza e do
trabalho, noutros lugares: frutos e objetos, produtos e
produtores, obras e criações, atividades e situações. O que
ela cria? Nada. Ela centraliza as criações. E, no entanto, ela
cria tudo. Nada existe sem troca, sem aproximação, sem
proximidade, isto é, sem relações. Ela cria uma situação, a
situação urbana, onde as coisas diferentes advêm umas das
outras e não existem separadamente, mas segundo as
diferenças [...] (LEFEBVRE, 2002, p. 111).
Portanto, o urbano é uma forma pura: o ponto de encontro,
o lugar de uma reunião, a simultaneidade. Essa forma não
tem um conteúdo específico, mas tudo a ela vem e nela
vive [...]. Enquanto diversos, os conteúdos (coisas, objetos,
pessoas, situações) excluem-se, e se incluem e se supõem
enquanto reunidos. [...]. Ele se liga, de um lado, à lógica da
forma, e, de outro, à dialética dos conteúdos (às diferenças
e contradições dos conteúdos) (LEFEBVRE, 2002, p. 112).
A idéia do urbano como mais complexo e dinâmico que o rural
comparece nos estudos clássicos (comparativos) de localidades urbanas (ou
sociedades urbanas) e localidades rurais (ou sociedades rurais). Nesses
estudos, o urbano e o rural são vistos a partir de uma perspectiva dicotômica,
isto é, num sistema de oposições. Segundo Palen (s.d.):
Os termos usados para definir essa dicotomia podiam variar,
mas a idéia central era basicamente a mesma: o campo
representava a simplicidade, a cidade a complexidade. As
regiões rurais eram caracterizadas por regras, papeis e
relações imutáveis, enquanto a cidade se distinguia pela
inovação, mudança e desorganização. A cidade era o
centro da variedade, heterogeneidade e inovação social,
enquanto o campo representava a tradição, a continuidade
social e o conformismo cultural. Os habitantes da cidade
eram mais sofisticados, mas tinham menos calor humano
(PALEN, s.d., p. 140)
Conforme Castells (1999), essa: “[..] noção de urbano (oposta a rural)
pertence à dicotomia ideológica sociedade tradicional/sociedade moderna,
e refere-se a uma certa heterogeneidade social e funcional [...]” (CASTELLS,
1999, p. 24). Essa distinção rural/urbano aparece então como expressão da
divergência entre uma realidade moderna (a urbana) – identificada com o
capitalismo, o progresso da técnica e novos padrões de relações sociais e