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Danmole enfatizou o uso de amuletos pelos mudjadeens do emirado de Ilorin na
Iorubalândia setentrional.O recurso desses artefatos era comum na Nigéria pré-colonial e
na África Ocidental em geral. Em Ilorin os mallans estavam profundamente envolvidos
com os negócios da guerra.
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Os religiosos confeccionavam os artefatos chamados ondè
yfunpá, assim como outros amuletos para os guerreiros.
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Todos os amuletos eram feitos
com textos corânicos. Além desses amuletos, os soldados de Ilorin carregavam um
calabash contendo remédios que assegurariam a vitória das tropas islâmicas (al-jamat
islamiya). Outros amuletos eram enterrados por espiões em território inimigo com o
objetivo de inutilizar suas armas. Uma substância líquida chamada hantu era também
espalhada para enfraquecer os inimigos. As preces e outras atividades espirituais
aparentemente contribuíram de forma decisiva na performance militar do exército de Ilorin
e de outras regiões da Nigéria. Através das preces o moral das tropas atingia o ápice.
Essas poções sujas são cura para todos os males, presentes e por vir, e são chamadas pelo povo de dua.
Alguns de seus guerreiros confinam-se em suas casas por trinta ou quarenta dias, jejuando durante o dia, e só
bebendo e lavando-se com essa coisa suja. Se um homem é afortunado, ou faz algum ato acima do comum,
isso é atribuído à du’á, ou remédio; nem sua perspicácia nem a graça de Deus ganham qualquer coisa para o
homem." Aqui eu queria apenas dar uma amostra, mais uma, do enraizamento africano de uma prática dos
malês que aflora na crise de 1835. Prática que, no entanto tinha sutilezas rituais que escaparam tanto a
Clapperton como à polícia baiana. À polícia até menos, porque pôde contar com Albino para decodificar um
pouco que fosse do universo malê. O nosso Sanim, por exemplo, certamente faz melhor figura na devassa da
revolta do que o mallam de Borno na narrativa de Clapperton, embora ambos se dedicassem a escrever sobre
walas, palavras que seriam bebidas pelos que buscavam proteção mística.” REIS, op. cit.
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DANMOLE, H.O. “Crises, Warfare, and Diplomacy in the Nineteenth-Century Ilorin”, in: FALOLA,
Toyin. Warfare and diplomacy in precolonial Nigeria. African Studies Program (University of Winsconsin-
Madison), 1992, p. 52 See J.F.A. AJAYI, J.F A. “The Aftermath of the Fall of Oyo”, in AJAYI, J.F.A. &
CROWDER, M. History of West Africa II. London: Longman Publishing Group, 1987, pp. 129-166.
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Ondè é um amuleto costurado em uma bolsa de couro colocada em volta da cintura. Yfunpà é um amuleto
de couro usado no braço. A pele de qualquer felino podia ser usada na confecção desses amuletos por causa
da habilidade desses animais de se moverem furtivamente. No depoimento do forro nagô-ibo Lobão em 1835,
ele descreveu os amuletos encontrados pela policia em sua casa: “Foi perguntado para que fim tinha elle
respondente tres anneis de metal branco, e trez voltas de cordão coberto de coiro, com varios patuaes em
ponto pequeno coberto de couro tão bem = Respondeo que reconhecia ser tudo seo, pois tinha pendurado ao
seo pescoço donde Ihe foi tirado na ocasião da sua prizâo = Foi perguntado qual hera o fim para o que elle
trazia aquillo, cujos Patuaes, ou embrulhos de coiro forão abertos neste acto descozeado-se com hum canivete
de aparar penas, onde se achou varios fragmentos de couzas insignificantes, como seja algudão, embrulhado
em hum pouco de pó e outros até com bocadinhos de lixo e o saquinho com huns poucos de buzios dentro,
envolto em hum dos embrulhos de couro hum pequeno papel escripturado com letras harabicas, ao que elle
respondente, declarou, que trasia aquillo para o livrar do vento, e que os buzios servia-se delles para untar
sabão na cabeça quando lavava.” Devassa do Levante, vol. 53, p. 112. Leão, o africano na Granada
muçulmana do final do século XV, descreveu os amuletos como sendo pequenas bolsas de couro contendo
escritos misteriosos para proteção contra a inveja e doenças. “Os puristas consideravam essas pratica
contrárias à religião. No entanto, seus próprios filhos freqüentemente usavam amuletos porque os primeiros
não logravam fazer suas esposas e mães escutarem a razão. Eu não posso negar a utilização de amuletos por
mim mesmo. Fui presenteado no meu primeiro aniversario com um desses artefatos com desenhos
cabalísticos que nunca pude decifrar. Eu não acreditava no seu poder mágico, mas o homem é tão vulnerável
ao Destino que não pode resistir à atração de objetos envoltos em mistério. Poderá Deus, que me criou tão
fraco, um dia reprovar-me pela minha fraqueza?” MAALOUF, Amin. Leo Africanus. Lanham (MD): New
Amsterdam books, 1988, p. 30.