contribuir na compreensão e aceitação de sua finitude no objetivo de construir uma iluminada
e ordenada sociedade harmônica – o touro incontrolável precisava manter-se cercado de pos-
turas, valores e conceitos, antes que acabe ferindo algo ou alguém.
A finitude do homem apresenta o abismo que lhe é proibido saltar, a linha que ja-
mais poderia cruzar – organizando, controlando, limitando o homem num conjunto fechado,
finito, como na teoria dos conjuntos. Se na política e na educação de Rousseau, a necessidade
de um fim, um limite em nome do bem-estar comum assegura a finitude de um homem – que
no entanto não aparece claro nas representações, assim como o rei e a rainha no quadro Las
meninas, de Velásquez –, na biologia, na economia e na filologia de fins do século XVIII,
conforme aponta Foucault, a finitude se caracterizará pelo limite de conhecimento do homem,
que enfim começa a aparecer mais claramente.
É na superfície de projeção da biologia que o homem aparece como um ser que tem
funções – que recebe estímulos (fisiológicos, mas também sociais, inter-humanos,
culturais), que responde a eles, que se adapta, evolui, submete-se às exigências do
meio, harmoniza-se com as modificações que ele impõe, busca apagar os desequilí-
brios, age segundo regularidades, tem, em suma, condições de existência e a possibi-
lidade de encontrar normas médias de ajustamento que lhe permitem exercer suas
funções. Na superfície de projeção da economia, o homem aparece enquanto tem
necessidades e desejos, enquanto busca satisfazê-los, enquanto, pois, tem interesses,
visa a lucros, opõe-se a outros homens; em suma, ele aparece numa irredutível situa-
ção de conflito; a esses conflitos ele se esquiva, deles foge ou chega a dominá-los, a
encontrar uma solução que apazigúe, ao menos em um nível e por algum tempo, sua
contradição; instaura um conjunto de regras que são, ao mesmo tempo, limitação e
dilatação do conflito. Enfim, na superfície de projeção da linguagem, as condutas do
homem aparecem como querendo dizer alguma coisa; seus menores gestos, até em
seus mecanismos involuntários e até em seus malogros, têm um sentido; e tudo o
que ele deposita em torno de si, em matéria de objetos, de ritos, de hábitos, de dis-
curso, toda a esteira de rastros que deixa atrás de si constitui um conjunto coerente e
um sistema de signos. Assim, estes três pares, função e norma, conflito e regra, sig-
nificação e sistema, cobrem, por completo, o domínio inteiro do conhecimento do
homem (FOUCAULT, 1995, p. 374).
Na religião, será na explicação do universo, da maneira como funciona, com seus
firmamentos, planos de diferentes escalas evolutivas, que aceitaremos o limite do desconheci-
do, o finito do infinito. O homem aprenderá sobre tudo o que o cerca: em todos os mistérios,
os deuses estarão no centro destas questões, serão sempre a verdade oculta e a luz em que