acomplamento que embora agindo de modo contraditório, favorece uma visão maior dos
conflitos. Maturana descreve o que acontece quando assim se age, da seguinte maneira:
Há maneiras de produzir, em laboratório, uma interação preferencial com o
hemisfério esquerdo e direito do cérebro em separado. Esses experimentos se
baseiam na anatomia do sistema visual, no qual tudo o que vemos com o lado
esquerdo estimula neurônios que se encontram no córtex direito e vice-versa. Desse
modo, se fixamos o olhar de um indivíduo e controlamos a localização em seu
campo visual das imagens-estímulos, podemos escolher entre interagir
preferencialmente com o córtex direito ou o esquerdo.
Nessa situação experimental, descobrimos que é possível encontrar distintos
comportamentos, caso a interação com a pessoa ocorra pela direita ou pela esquerda.
Por exemplo, um indivíduo se senta diante de uma tela, com a instrução de escolher,
entre vários objetos — que não pode ver — aquele que corresponde à imagem
projetada. Se no lado esquerdo (hemisfério direito) projetamos a imagem de uma
colher, ele não terá dificuldade para encontrar, pelo tato, a colher que está sob sua
mão e mostrá-la. Mas se agora, em vez da imagem de uma colher, mostramos a
palvara ‘colher’, o indivíduo não reage. Quando questionado, confessa que não viu
nada. Interações faladas ou escritas que só envolvem o córtex direito são, em geral,
ininteligíveis para adultos depois da secção do corpo caloso. Nesses casos, eles não
podem interagir com o córtex esquerdo na linguagem escrita, do mesmo modo que
um bebê ou um macaco. Contudo, pessoas assim são perfeitamente capazes de
participar, pelo campo visual esquerdo, de outros domínios lingüísticos, como
mostram os mesmos experimentos.
Imaginemos agora que em vez de mostrar a essa pessoa uma colher, em seu
hemisfério direito, lhe mostremos a imagem de uma bela modelo nua, diante da qual
ele se ruboriza. Ato contínuo, perguntamos: ‘O que aconteceu?’ A resposta do
indivíduo é: ‘Mas doutor, que máquina divertida essa sua...’ Ou seja, a pessoa com
quem estamos conversando por meio de e perguntas e da linguagem falada, em
interações que só envolvem seu hemisfério esquerdo, simplesmente não é capaz de
fazer descrições orais das interações que ocorreram no seu hemisfério direito, do
qual o esquerdo está desconectado.
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(Grifou-se).
O princípio da identidade implica assim o princípio do terceiro excluído. O que destoar
dos objetivos comumente esperados de uma formulação testada, não seria aceita. As
incertezas não teriam vez ou consideração num tal sistema. Não ocorridas as conseqüências
de uma pesquisa, tal como esperado, o estudo estaria “furado” e só por isto já mereceria ser
descartado. Esta é uma visão que desatende a compreensão das contrariedades tão próprias do
ser humano quanto os conflitos.
A mediação de contrariedades é recurso inafastável para as pessoas envolvidas. Pode-se
perceber que os pensamentos vêm ao cérebro de modo dual. As pessoas, principalmente as em
conflito, pensam os problemas por vertentes duplas: “consigo” / “não consigo”; “posso” /
“não posso”; “isto me ofende” / “não me ofende”.
Com as representações mentais ocorre assim. E com as emoções também. Sente-se em
fluxo polarizado. Pode-se percorrer uma via que vai de uma emoção de raiva até uma emoção
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MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. A árvore do conhecimento. Tradução de Humberto Mariotti
e Lia Diskin. 5. ed. São Paulo: Palas Athena, 2005. p. 248-250.