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Partindo da concepção de relação de representação, perscrutando a experiência, Peirce
(1977) definiu três elementos capazes de explicar toda e qualquer experiência, concluindo que
tudo que aparece na consciência, assim o faz numa gradação de três unidades, denominadas
por primeiridade, secundidade, terceiridade
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, ou ainda, as categorias traduzidas por Pinto
(1995) como primeireza, secundeza e terceireza. Tais categorias correspondem a entidades
mentais, modos de operação signo-pensamento, processados na mente. Sob esse aspecto,
Peirce (1977) acredita que não temos poder algum de pensar sem signos, isto é, eles são a
condição para a linguagem. Embora muitos filósofos da Idade Média tenham defendido que a
linguagem é a representação do pensamento e Saussure (2004, p.80) tenha proposto que todo
signo é uma entidade psíquica que une um conceito e uma imagem acústica, a semiótica
peirceana defende a idéia de que o signo pode ser um dado cognitivo. Nessa perspectiva, o
signo se distingue do objeto, pois o primeiro representa o segundo cognitivamente, isto é, cria
na mente outro signo. Assim, deve haver algum processo na mente que explique a relação do
signo com seu objeto. Nesse sentido, o autor concebe o pensamento humano como semiose,
ou processo de formação de signos. A interpretação de um signo é, assim, um processo
dinâmico na mente do receptor.
A primeireza, na visão dos autores, é o modo de ser das coisas, tais como elas são. É
também a qualidade percebida antes mesmo de se dar conta dela, ou seja, a categoria mais
simples que surge ao passar de um estímulo exterior a um estímulo interior. É, portanto, a
categoria da sensação ou do sentimento anterior a uma consciência, aquilo que chega aos
nossos olhos antes mesmo de qualquer análise. Pode ser considerada ainda uma identidade
que simplesmente é “a primeireza, aquilo que um eu (sujeito) consigo ver em um ele”.
(PINTO, 2005, p.8). A segundeza, por sua vez, é a constituição de um objeto que se faz
segundo sobre o primeiro. É quando nossos sentidos respondem de certa maneira à
primeireza. Segundo Pinto (1995) a secundeza corresponde àquilo que se percebe sabendo
dessa percepção, isto é, do sentido consciente. Logo, podemos inferir que somente
começamos a interpretar algo no segundo estágio, já cercados de singularidades da própria
existência.
A terceireiza, por seu lado, completa-se pela capacidade de representar o que se
percebe na secundeza. É puramente a natureza da previsão. Para Pinto (2005), a terceireza
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Em inglês, firstness, secondess e thirdness. Talvez sua melhor tradução em português seja com o sufixo -eza,
igualmente corrente como o sufixo -ness, “primeireza”, secundeza e terceireza”, evitando as indesejáveis
conotações de hierarquia que surgem com o sufixo -idade e, ao mesmo tempo, mantendo a noção de qualidade
que está implícita em -ness. Porém, respeitando a prática generalizada no Brasil, manteremos aqui as formas de
primeiridade, secundidade e terceiridade (PINTO, 1995, p.17)