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Campos de Carvalho é citado em três histórias da literatura brasileira.
Em primeiro lugar, no livro de Alfredo Bosi (2006), História concisa da
literatura brasileira, na oitava parte intitulada “Tendências Contemporâneas”. No
capítulo que leva o nome de “Outros autores intimistas”, encontra-se o parágrafo:
À parte, tentando galgar a fronteira do supra-realismo, lembro Murilo (O
Ex-Mágico, 1947), Campos de Carvalho (A Lua Vem da Ásia, 1956) e
um veterano, de raízes modernistas, Aníbal Machado (1894-1964), que
ensaiou um gênero difícil da prosa de intenções líricas em Cadernos de João
(1957) e João Ternura (1965). (BOSI, 2006, p. 421, negrito meu).
Em segundo, no livro organizado por Afrânio Coutinho, A literatura no Brasil,
Antônio Olinto, na segunda parte do quinto volume, intitulada “Estilos de época: era
modernista”, na seção “O modernismo na ficção”, no capítulo de nome “Psicologismo e
Costumismo”, escreve:
[...] e a ficção experimental de Geraldo Ferraz, Patrícia Galvão, Clarice
Lispector, Campos de Carvalho, C. Heitor Cony, Autran Dourado, Maria
Alice Barroso, Nélida Piñon e Antonio Rocha situando-se em nível diferente
do vanguardismo brasileiro de Guimarães Rosa. (COUTINHO, 1986, p. 441,
negrito meu).
Em terceiro, na obra A história da literatura brasileira, de Massaud Moisés,
aparece um comentário mais longo, no volume dedicado ao modernismo.
A brisa surrealista que perpassa muito dos ficcionistas até aqui que
examinados, notadamente os últimos, se adensaria na figura estranha de
(Walter) CAMPOS DE CARVALHO (1916), mineiro de Uberaba. Além de
Banda Forra, “ensaios humorísticos” (1941) e Tribo (1954), renegados pelo
autor, publicou A lua vem da Ásia (1956), Vaca de Nariz Sutil (1961), A
Chuva Imóvel (1963) e O Púcaro Búlgaro (1964). Iconoclasta, raivoso,
bem-humorado, mas dum humor negro, o surrealismo de Campos de
Carvalho é substancialmente revoltado: o desrespeito à verossimilhança
euclidiana, o truncamento dos planos temporais e espaciais, a rejeição do
sensato e do bem comportado resultam, na óptica do romancista, dum desejo
palpável de violência, mas de violência edificante. Surrealismo agressivo,
irônico, desmonta os ajustes convencionais da ordem para instalar o caos
gerador dum mundo menos sufocante, menos espartilhado, onde a expansão
do “eu”, por intermédio de múltiplas e livres associações, não se confundisse
com a loucura: a aparência guarda seriedade, a seriedade inerente à sátira do
tipo Elogio da Loucura. De onde o clima surreal, de náusea, à Sartre, ou de
disponibilidade dos heróis gideanos, a irreverência causticante, tudo isso
refletido na desconexão dos capítulos em favor de liames dramáticos
obedientes a uma lógica do absurdo; na ausência ou diminuição da trama; no
gosto dos paradoxos; e na linguagem sincopada, que não se contém ante o
palavrão, numa época em que ainda não está em moda fazê-lo. (MOISÉS,
1996, p. 477).