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Um reflexo da excitação política que contagiava a maçonaria pernambucana nessa
fase foi o da proliferação de oficinas e a volta de vários adeptos que estiveram por algum
tempo afastados da instituição. Raimundo Arrais nos fornece um quadro importante para
entendermos o clima vivido pelo Recife, durante a Questão Religiosa:
Qualquer que seja a proporção vista no embate que ocorreu, no Recife na década de
1870, entre o clero e a maçonaria, não se deve deixar de levar em conta o quadro
das peculiaridades locais[...]as idéias ultramontanas imperavam na Faculdade de
Direito até a posição materialista começasse a se impor para fundar uma escola
filosófica e jurídica com a entrada, no seu quadro de professores, de Tobias Barreto,
ardoroso polemista[...] essa discórdia inicial se transformará, na década de 1870, em
ódio acirrado, cujos frutos serão colhidos pelo sucessor de Cardoso Ayres, o bispo
capuchinho Frei Dom vital Maria Gonçalves e Oliveira[...] dessa forma, no final de
1872, o bispo passa ordem aos vigários e exorta as irmandades das diversas
freguesias a fazer com que maçons participantes de qualquer das seitas proscritas
pelo papa abjurassem, retornando ao seio da igreja. Á recusa das irmandades
sucede, em 1873, a reação do bispo, que depois de alguns gestos de admoestação,
lança, sem hesitar a pena da interdição sobre a irmandade do Santíssimo
Sacramento da freguesia de Santo Antônio, medida que importava na suspensão do
culto naquele templo e na privação de uma série de direitos [...] mantendo-se em
guarda contra o bispo romanizador, a maçonaria pernambucana retemperou suas
forças com a união das lojas existentes na província. Com o espírito incendiado
pelo ódio aos jesuítas, intelectuais liberais difundiram um aluvião de escritos que
resvalavam facilmente para os insultos e as acusações maliciosas, desencadeando
campanhas infamantes contra os padres da companhia, contra o prelado e os
clérigos em geral, vergastando os dogmas da infalibilidade papal e da Imaculada
Conceição. De modo geral, esse furor anticlerical combinou-se, no plano local com
uma primorosa qualidade gráfica, nas páginas da revista O Diabo a Quatro.
Difundido pelos anticlericais, o mito de um jesuitismo satânico e conspirador,
mancomunado com o bispo, não deixou de servir ao Partido Liberal, que contava
com considerável penetração entre as massas urbanas, sobretudo através de seu
tribuno José Mariano. José Mariano foi visto À frente de uma série de tumultos de
multidão nas ruas da cidade, instigando atos de agressão física nos eventos que
marcam a Questão Religiosa no Recife, como a invasão do Colégio dos Jesuítas, o
espancamento de padres e o empastelamento do jornal católico A União
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Pelo quadro acima, podemos atestar as condições em que se desenrolaram a Questão
Religiosa e a marca que deixou nas relações entre Maçonaria e Igreja a partir de então.
Resolvido este episódio, a maçonaria pernambucana continuou o seu processo de
desenvolvimento, propiciado pela Questão Religiosa, que reativou e deu um choque de
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Cf. ARRAIS, Raimundo. O pântano e o riacho: a formação do espaço público no Recife do século
XIX.São Paulo:Humanitas/FFLCH/USP, 2004.pp.258,259,260 e262.