
15
relação ao prenome desse Petrônio, que ora é apresentado como Caio, ora como Públio
ou Tito, é um dos aspectos que alimentam a polêmica a respeito da identidade do autor.
Confrontemos, pois, algumas destas menções, começando pela de Tácito, em
Annales, livro 16, capítulos 18 e 19:
Tratarei um pouco mais detidamente o que respeita a Caio Petrônio.
Consagrava o dia ao sono e a noite aos deveres e prazeres da vida. Se outros
alcançam nomeada pelo trabalho, ele conseguiu-a pela voluptuosidade. E não
tinha a reputação de um homem abismado no deboche, como a maior parte dos
dissipadores, mas a dum voluptuoso, verdadeiro conhecedor do sensualismo
refinado. A indiferença mesmo e o abandono que afixava nas suas ações e nas
suas palavras davam-lhe um ar de simplicidade de que tiravam uma graça
nova. Mas viu-se, contudo, procônsul na Bitínia, e em seguida cônsul,
demonstrar vigor e capacidade. Voltando depois aos vícios, ou à imitação
calculada dos vícios, foi admitido na corte entre os favoritos de predileção.
Nela, era o árbitro do bom gosto; nada mais agradável, mais delicado, para um
príncipe embaraçado na escolha, do que o que lhe era recomendado pelo
sufrágio de Petrônio. Tigelino teve ciúme deste favor: julgou ter um rival mais
hábil do que ele na ciência das voluptuosidades. Dirige-se, pois, à crueldade do
príncipe, contra a qual não podiam alcançar primazia outras paixões, e
denuncia Petrônio como amigo de Cevino: um delator tinha sido comprado
entre seus escravos, sendo outros, a maior parte, lançados nos ferros, e
proibida a defesa ao acusado.
O imperador achava-se então na Campânia, e Petrônio tinha-o seguido até
Cumas, onde recebeu ordem de ficar. Não quis definhar-se entre o temor e a
esperança; e, todavia, não quis também lançar fora bruscamente a vida. Abriu
as veias; depois fechou-as; voltou a abri-las, falando com os seus amigos e
escutando-os: nessas conversas, nada de grave, nenhuma ostentação de
coragem; nenhumas reflexões sobre a imortalidade da alma ou máximas de
filósofos; não queria ouvir senão versos joviais, e poesias ligeiras.
Recompensou alguns escravos, castigou outros; saiu mesmo de casa; por fim,
entregou-se ao sono, para que a sua morte, ainda que forçada, parecesse
natural. Não procurou, como a maior parte dos que pereciam, lisonjear por seu
codicilo ou Nero, os nomes de jovens impudicos e de mulheres perdidas,
traçou a descrição dos deboches de Nero, com os mais monstruosos
refinamentos, e enviou-lhe este escrito fechado com o seu sinete; depois
quebrou o anel, receando que mais tarde viesse a servir para fazer vítimas.
21
Plínio-o-Velho, em Naturalis historia, capítulo 37, versículo 20:
Tito Petrônio, membro do consulado, a ponto de morrer por causa da inveja de
Nero, tendo sido deserdado de seu círculo predileto, quebrou uma preciosa
taça de fluorita adquirida pelo preço de trezentos mil sestércios.
22
Plutarco, em Quomodo adulator ab amico internoscatur:
(...) quando se culpam os devassos e esbanjadores por uma vida feita de
maldades e obscenidades (como Tito Petrônio fez com Nero).
23
21
Tradução direta do latim ao português por Manuel Losa (PARATORE, 1983: 637-638).
22
Tradução minha a partir do texto latino estabelecido por C.D. Fisher (1906).
23
Tradução minha a partir do texto latino estabelecido por Goodwin (1878).