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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA
SANTA PAULINA, RECONQUISTA E TERRITORIEDADE:
Uma história em Nova Trento-SC
JOSÉ DO NASCIMENTO
Florianópolis, março de 2006
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA
CENTRO DE FILOSOFIA E CIÊNCIA HUMANAS
DEPARTAMENTO DE HISTÓRIA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA
SANTA PAULINA, RECONQUISTA E TERRITORIEDADE:
Uma história em Nova Trento - SC
José do Nascimento
Dissertação orientada pelo Professor
Dr. Orientador: Valmir Francisco Muraro e
apresentada à Banca Examinadora
como requisito parcial para obtenção do
título de Mestre em Hisria
Florianópolis, março 2006.
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SANTA PAULINA,
RECONQUISTA E TERRITORIEDADE:
Uma história em Nova Trento - SC
JOSÉ DO NASCIMENTO
Esta dissertação foi julgada e aprova em sua forma final para obtenção dotulo de
MESTRE EM HISTÓRIA CULTURAL
BANCA EXAMINADORA:
____________________________________________________
Prof. Dr. Valmir Francisco Muraro – Orientador (UFSC)
______________________________________
Prof. Dr. Luiz Alberto Costa (UFSC)
______________________________________
Pro. Dra. Maria de Lourdes de Souza (UFSC)
_______________________________________
Profa. Doutoranda: Silvana de Gaspari -Suplente – (UFSC)
_______________________________________
Profª. Dra. Maria Bernardete Ramos Flores
Cordenador do PPGH/UFSC
AGRADECIMENTOS
O agradecer, nas atuais circunsncias, pode se apresentar como um ato generoso e,
ao mesmo tempo, ingrato, pois não consegue atingir efetivamente a todos que auxiliaram
direta ou indiretamente para que esta pesquisa chegasse a bom termo. Mas alguns nomes
devem ser citados:
Aos meus pais (in memóriam) e aos pais dos meus pais.
Aos meus irmãos e irmãs, Catarina, Fernandes, Francisco, Gregória, Luciene, Maria
do Carmo, Neves, Pedro,Terezinha e seus respectivos maridos.
À Capes, pela bolsa concedida, de 12 meses.
Ao orientador, Prof. Dr. Valmir Francisco Muraro.
À professora Renata, pela ajuda prestada ao longo desta pesquisa.
Aos professores do Programa de Pós-Graduação em História da Universidade
Federal de Santa Catarina, em especial às professoras Joana Pedro, Bernadete, e ao
professor Rampinelli.
À Nazaré, secretária do PPGH, pela sua diligência e disponibilidade.
Aos professores Jonas, Luiz Alberto, Maria de Lourdes e Silvana, pela leitura atenta
e sugestões preciosas na qualificação e defesa.
À professora Maria das Graças, por ter despertado em mim o gosto pela história no
ensino fundamental.
À Elza, pelas inquisições e esmulos.
À Karine, pela amizade e ajuda em todo o processo de aquisição desta dissertação.
À Cida, pelo seu “suporte técnico”.
Às amigas de longa data Elvira, Elza, Zilhah, com suas respectivas famílias.
Aos iros de caminhada Antonio, Davide, Fábio, Fabrizio, Giorgia e Lorenza, pela
amizade, companheirismo e paixão.
À Enizete, Ivan e Maria Cristina, da Secretaria de Turismo de Nova Trento.
À Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição.
Aos amigos e conhecidos que passaram e estão passando pela minha existência:
Aires, Amauri, Arnaldo, Atair, Beti, Camila, Débora, Dilma, Diógenes, Diogo, Edmilson,
Estela, Fabiana, Gerson, Gilberto, Gisele, Helena, Holga, Iara, Ivonete, Jana, Janaina,
Jeferson, Katiane, Keli, Leon, Luiz, Mancha, Marcelo, Maria Clara, Mirena, Nanci, Nataly,
Paulo, Ramom, Rosangela, Salazar, rgio, Umberto, Thiago, Vanessa, Zélia.
Aos meus entrevistados pela paciência e disponibilidade.
Às Bibliotecas: da UFSC; da UDESC; blica Estadual especialmente a Maida,
Carlos, Machado, Mercedes; da Assembléia Legislativa e do Centro de Memória da
Assembléia Legislativa de Santa Catarina; de Nova Trento; de Brusque; à da Casa da
Cultura de Brusque; do ITESC, na pessoa de Adriana; à do Instituto Histórico e Geográfico
de Santa Catarina, Arquivo Público, Arquivo da Arquidiocese, Arquivo dos Jesuítas, no
Rio Grande do Sul e à secretária da paróquia de Nova Trento.
Ao staff das livrarias: Catarinense, Livros e Livros, Vozes, Paulus e Convivência.
Nesta perspectiva de agradecimento, vem ao nosso encontro Rubem Alves: “aquilo
que está escrito no coração não necessita de agendas porque não esquece. O que a memória
ama fica eterno”.
Dessa forma, fica registrado o agradecimento a todos que passaram, estão passando
e passarão por mim.
O futuro não precisará de potica e religião,
mas de ciência e espiritualidade.
(Jawaharlal Nehru, 1889-1964)
RESUMO
Esta dissertação trata de um estudo sobre a relão entre turismo e religiosidade a partir do
estudo de caso do Santrio de Santa Paulina do Coração Agonizante de Jesus, em Nova
Trento, no período de 1991 a 2005. Foi adotado o método de História Oral com a
participação de diferentes atores, destacando-se os peregrinos ou passantes mais
comumente denominados de turistas e os residentes no Município. De modo complementar,
foram consultadas outras fontes, como jornais, documentos dos Arquivos Públicos e
Eclesiásticos, Dissertões, Teses e outras referências de estudos acadêmicos. O estudo foi
construído com um suporte teórico acerca da religiosidade e da constituição mercantil – fé e
espaço comercial. As informações constrdas com os dados obtidos foram sistematizadas
em três capítulos que tratam de alguns aspectos da unificão italiana, buscando analisar os
aspectos religiosos e a interfencia da Igreja Católica no dia-a-dia dos camponeses e a
vinda destes para o Brasil, no grande êxodo italiano, no final do século XIX, para fazer la
Merica. No segundo capítulo, Os passantes em busca de néctar: no Santuário de Santa
Paulina, foi dada visibilidade aos peregrinos que visitam o local, a fim de perceber as
motivações que os levaram a tal ação. Foi tratada também a religião na pós-modernidade e
o seu empoderamento pelas Irmãzinhas da Imaculada Conceição, construindo uma
cenografia do sagrado. No terceiro e último capítulo, a Imagem de Santa Paulina: como sal
da terra, procurou-se analisar a atuação da prefeitura e dos empresários para identificar o
turismo como fonte econômica para o munipio e os seus vizinhos, afirmando-se como um
local para que os descendentes de italianos fizessem a cuccagna.
Palavras-chave: Imigração, turismo religioso, economia.
ABSTRACT
This dissertation presents a study about the relation between tourism and religiosity in the
case of study of the Sanctuary of Holy Paulina of the Dying Heart of Jesus, in Nova Trento,
in the period of 1991 to 2005. It is adopted the approach of Oral History with the different
actors, as the pilgrims or people passing by known as tourists and the residents in town.
A complementary bibliography is explored, as newspapers, the Ecclesiastical and Public
Files, Dissertations, Thesis and other references of academic studies. The study is based in
a theoretical support about the religiosity and the mercantile constitution – faith and
commercial space. The information obtained is systematized in three chapters describing
some aspects of the Italian unification, analyzing the religious issues and interferences of
the Catholic Church in everyday life of peasants who arrived in Brazil, during the big
Italian exodus, in the end of the XIX century, to la Merica. On the second chapter , Os
passantes em busca do nectar: no Satrio de Santa Paulina”, is given visibility to the
pilgrims that visit the place, in order to perceive the motivations that caused them to such
action. It is also described the religion in the pos-modernity and its power by the little
Sisters of the Immaculate Conception, constructing a scenography about the sacred . On
the third and last chapterA imagem de Santa Paulina: como sal da terra, is analyzed the
action of the city hall and businessmen, in order to identify the tourism as economic
support to town and its neighborhood, affirming itself as a place for Italians descendants
and giving to them the possibility to construct the cuccagna.
Key-words: Imigration, religious tourism, economy
SURIO
APRESENTAÇÃO 10
CAPÍTULO I
OS FIOS CONDUTORES: na trama da formação do Santuário de Santa Paulina 16
O ultimatum do Piemonte na Questão Romana 23
A Ilia está feita: agora é preciso fazer os italianos 27
O início da Odisséia italiana fora das colunas de Hércules 29
Rumo à cuccagna 31
Os risomas dos Jesuítas em Nova Trento 33
Uma flor alpina desabrocha em terrae brasilis 41
CAPÍTULO II
OS PASSANTES EM BUSCA DE NÉCTAR: no Santuário de Santa Paulina 49
Biografia de Santa Paulina 52
A cenografia do Santuário 62
Trajetórias de empoderamento: peregrino e turista 74
Os passantes 77
A fluidez líquida no mundo contemporâneo 84
CAPÍTULO III
SANTA PAULINA: como sal da terra 94
Os primeiros passos do turismo 94
A fé como trade 105
Santa Paulina: o ponto alto de Nova Trento 120
Santa Paulina: a cuccagna 129
CONSIDERAÇÕES FINAIS 133
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Fontes 140
Periódicos e revistas 141
Sites 142
Bibliografia 143
Entrevistas 153
ANEXOS 156
APRESENTAÇÃO
Os verdadeiros intelectuais ou são alinhados com o poder,
tentam abrir seu caminho no mundo, ou têm uma relação
crítica com o poder e precisam testá-lo, interrogá-lo e, sobretudo,
expor as conseqüências propositais ou inconscientes do poder.
(Stuart Hall)
A idéia principal desta pesquisa é investigar a relação entre turismo e religiosidade
a partir do estudo de caso do Santuário de Santa Paulina do Coração Agonizante de Jesus,
em Nova Trento, no período de 1991 a 2005.
Pesquisar um evento histórico no momento em que ele acontece é um exercio
acadêmico fascinante e que requer consulta a diferentes fontes. Envolver-se com as fontes,
geralmente mais acessíveis que as encontradas pelos historiadores de épocas distantes,
conduz o pesquisador por entre caminhos até recentemente pouco explorados. Nesse
trajeto, os grandes mistérios quanto à interpretação da linguagem são abolidos, uma vez
que os símbolos são conhecidos e vivenciados pelo pesquisador, de modo geral inserido no
contexto que pretende apreender. Conforme Roger Chartier,
o pesquisador é contemporâneo do seu objeto e divide com os que fazem a
história, seus atores, as mesmas categorias e referências. Assim, a falta de
distância, ao invés de um inconveniente, pode ser um instrumento de
auxílio importante para um maior entendimento da realidade estudada, de
maneira a superar a descontinuidade fundamental, que ordinariamente
separa o instrumento intelectual, afetivo e psíquico do historiador e aqueles
que fazem a história
1
.
A história do presente, que tem como característica básica a presença de
testemunhos vivos, suscita crescente interesse e vários debates, cujos objetivos são os de
definir uma metodologia, fundamentos e princípios desse enfoque historiográfico, e
justifica-se pela vontade de entender os impactos das transformações aceleradas das
últimascadas
2
e reagir a eles.
1
CHARTIER, Roger. O olhar do historiador modernista. Citado por: FERREIRA, Marieta de Moraes;
AMADO, Janaína. Apresentação. In: FERREIRA, Marieta de Moraes; AMADO, Janaína. (orgs). Usos e
abusos da história oral. 2ª ed. Rio de Janeiro: Fundão Getúlio Vargas, 1998. p. XXIV.
2
Como exemplo ver: CHAUVEAU, A. (org.) Questões para a história do presente. Bauru: EDUSC, 1999.
11
A história sobre os planos, as ações e as experiências referentes ao turismo e
religiosidade no Santuário de Santa Paulina constitui-se, sem dúvida, numa história do
tempo presente, pois seu cerne se encontra nas duas últimas décadas. Se por um lado as
facilidades são grandes, devido à farta documentação, por outro, o compromisso ético do
pesquisador neste estudo foi o de dar sentido às leituras bibliográficas e ao corpus
documental, comparando-os com as vivências dos peregrinos e turistas que visitam a região.
Para alcançar tal meta, buscamos o conhecimento na pesquisa bibliográfica,
fizemos a leitura dos planos para o turismo das administrações públicas estaduais e
municipais do estado de Santa Catarina, que se mostraram fundamentais, sobretudo
aqueles referentes aos últimos 14 anos, quando começa a surgir de forma mais relevante a
preocupação com o turismo religioso no Estado. Assim, esquadrinhamos, nos periódicos
estaduais e municipais, as tessituras e seus possíveis diálogos, certamente conflituosos,
como marco inicial para dar visibilidade às contradições e mostrar os embates ideológicos
sobre o tema. As análises dos arquivos da Congregão das Irmãzinhas da Imaculada
Conceição e dos padres Jesuítas tornaram-se importantes para compreender os objetivos do
clero quanto à implantação e manutenção do Santuário, bem como para perceber como se
davam as relações entre a ria, o Santuário, a prefeitura e os empresários, e entre esses e
os peregrinos. A fim de alcançar o objetivo anteposto, os subsídios das referências
bibliográficas indicadas foram utilizados para dar corporeidade à pesquisa. Através da
história oral, uma das formas de captar a experiência dos peregrinos e habitantes de Nova
Trento, que muito têm a dizer sobre o Santuário, documentamos e analisamos as vivências,
os desejos e os impulsos pessoais que motivaram a procura pelos lugares santificados.
As fontes escritas, como os jornais, foram pesquisadas no Arquivo Público do
Estado, na Biblioteca Pública de Florianópolis e na do Município de Brusque. Na Cúria
Metropolitana de Florianópolis, na Matriz de Nova Trento e no Santuário, procuramos os
registros documentais, enquanto que no Arquivo da Assembléia Legislativa, estão os
documentos referentes às Mensagens de cada Governador em relação ao município
abrangido nesta pesquisa.
No uso da metodologia da história oral, não se pretende radicalizar e entender o
relato dos testemunhos como “aquilo que realmente aconteceu”; tampouco se tem a
pretensão de preencher os vazios que a tradição historiográfica, eclesiástica ou não, deixou
em Santa Catarina. Usar as fontes orais e atribuir a elas condições para desvelar a verdade
12
seria dar uma visão muito simplista para a complexidade do uso da história oral. Antes,
essa é entendida como “uma fonte documental a mais para o trabalho do historiador e,
como tal, sujeita aos mesmos cuidados que dedicamos a outros materiais, reconhecendo
suas potencialidades e colocando sempre as questões advindas de nossas problemáticas de
investigação
3
. Portanto, mais do que buscar informações, dados, confrontos de idéias com
o fim de uma aproximação dos fatos, a análise dos relatos de peregrinos, turistas e
habitantes de Nova Trento tem como prioridade torná-los inteliveis e coerentes, a par das
diferentes versões sobre os acontecimentos.
O uso da história oral colocou em evidência diferentes atores pois, segundo Marieta
Ferreira, “dá atenção especial aos dominados, aos silenciosos e aos excldos da história
(por exemplo: mulheres, proletários, marginais), à história do cotidiano e da vida privada
[...], à história local e enraizada”
4
. O que a autora quer dizer é justamente que não se pode
crer que exista uma maior confiabilidade na documentação escrita e uma menor
confiabilidade na constrão oral; ambas as fontes devem ser vistas com cuidado. Nesse
processo, as relações entre o passado e o presente são revisitadas, de forma a entender o
primeiro como uma construção que segue as necessidades do segundo, chamando a
atenção para os usos políticos deste passado. Observamos que nenhuma construção
historiográfica, seja ela advinda de quaisquer tipos de fontes, dirá “o que realmente
aconteceu.o se achará a verdade do passado e nem do presente, por muitos motivos: o
olhar que o historiador lança sobre o acontecimento está banhado pela sua própria
subjetividade, por suas convicções, por mais que se esforce para distanciar-se delas.
Justifica-se assim a escolha pelo testemunho oral dos passantes do Santrio e seus anfitriões
5
.
A renovação dos estudos históricos que ganharam força a partir da Escola dos
Annales justificou o uso da micro-história, que entre outras coisas, pretende compreender
as relações entre um objeto individual ou particular dentro de um meio mais geral.
3
FERREIRA, Marieta de Moraes. História Oral e Tempo Presente. In: FERREIRA, Marieta de Moraes;
AMADO, Janaína. (orgs.). Op. cit. p. 20.
4
FRANÇOIS, Etienne. A fecundidade da História Oral. In: FERREIRA, Marieta de Moraes; AMADO,
Janaína. (orgs.). Op. cit. p. 04.
5
No total, foram realizadas 33 entrevistas, sendo 13 homens e 20 mulheres, entre o período de 02/02/2005 a
14/12/2005. Os/as entrevistados/as autorizaram-me a utilizar o conteúdo das entrevistas na própria fita em
que foram gravadas. No entanto, optei por transcrevê-las, buscando respeitar a linguagem do/a entrevistado/a.
A cópia desse material pode ser encontrada no arquivo do Laboratório de História Oral da Universidade
Federal de Santa Catarina. Sobre teoria e metodologia da História Oral, veja-se FERREIRA, Marieta de
Moraes; AMADO, Janna. Op. cit. 1998; MEIHY, José Carlos Sebe Bom (org.). (Re) introduzindo a
História Oral no Brasil. São Paulo: Xamã, USP, 1996.
13
Seguindo o pensamento de Giovanni Levi, tem-se que a Micro-históriao procura
“sacrificar o conhecimento dos elementos individuais a uma generalização mais ampla, e
de fato acentua as vidas e os acontecimentos individuais. Mas, ao mesmo tempo, tenta não
rejeitar todas as formas de abstração, pois fatos insignificantes e casos individuais podem
servir para um femeno mais geral
6
”.
Pretendemos, nesta pesquisa, compreender o processo particular da crião do
santuário de Santa Paulina dentro da perspectiva do turismo no Estado. A descrição entre
turismo e religiosidade a partir do estudo de caso do Santuário de Santa Paulina do
Coração Agonizante de Jesus, em Nova Trento, no período de 1991 a 2005, tem a ver com
o paradigma de mercado. A visão de mundo volta-se para a religiosidade, na qual encontra-
se um novo filão de consumo e alavancamento do Munipio através dotulo da primeira
santa do Brasil. Com isto, podemos perceber em Baudrillard o termo da “mensurabilidade
da felicidade no mundo moderno, em busca de meios que se legitimam no “espelho” e
vitrine”, onde o homem fica absorto na imagem refletida do espelho e contemplativo na
vitrine. Com o turismo, os territórios nacionais e internacionais se reconhecem e se
relacionam, as migrações se multiplicam, os modos de vida se padronizam. A mobilidade
social no espaço torna-se uma condição de existência. Dessa forma, observamos a
influência do planejamento turístico sobre o desenvolvimento da urbanizão de Nova
Trento, já que essa atividade exerceu influências determinantes para o progresso
socioeconômico da região.
Devido ao curto espaço de tempo e à complexidade do tema, optamos por limitar o
estudo ao Santuário de Santa Paulina, visto que a canonização e a criação desse santuário,
em 2002, fez com que a região adquirisse maior imporncia no cerio nacional,
proporcionando um maior fluxo de pessoas que procuram o Estado.
Foram excldos outros Santuários, como o de Nossa Senhora de Azambuja, em
Brusque, e o de Nossa Senhora do Bom Socorro, em Nova Trento, não por serem
considerados pouco importantes, pelo contrário: acreditamos que, por serem os mais
antigos do Estado, carecem de estudos mais aprofundados que permitiriam a compreensão
de fenômenos ligados à colonização italiana da região, sob a ótica da religião. Além disso,
a imporncia do Santuário de Azambuja para a Arquidiocese passa pela construção do
6
LEVI, Giovanni. Sobre a micro-história. In: BURKE, Peter. A escrita da história: novas perspectivas. 2ª
ed. São Paulo: UNESP, 1992. p.158.
14
Seminário, do Hospital, da Gruta, do Asilo, do Hoscio e do Morro do Rosário,
importantes para a propagação Mariana e a romanização
7
da população, realizada em sua
maioria pelo clero enviado pela Sé romana. Os padres estrangeiros, como franciscanos,
jesuítas e do Sagrado Coração de Jesus, tamm atuaram em outras regiões do Estado,
além de Brusque. O mesmo se pode dizer com relação aos padres teuto-catarinenses
formados em São Leopoldo e Pareci Novo, no Rio Grande do Sul
8
.
Na ambiidade das ações governamentais, os administradores públicos têm se
preocupado em demonstrar interesse no Santuário, mas com pouca praticidade quanto ao
que compete a ele, principalmente com relação às vias de acesso ao monumento. A
economia do munipio e de seus circunvizinhos, até indiretamente no âmbito regional,
esperam da imagem de Santa Paulina a solução para seus problemas econômicos. Por outro
lado, constitui-se em motivo de orgulho para os neotrentinos ter em sua “casa” a primeira
santa brasileira como mola propulsora para alavancar o município e, desta maneira, a
cidade toma pequenas decisões particulares. Com isso, se resumem alguns capítulos de
glórias e conquistas, nos quaiso haveria espaço para homens e mulheres comuns
participarem do grande espetáculo da história como sujeitos ativos.
É proposto aqui, não preencher essas lacunas, mas mostrar as possibilidades de
outras versões para a história do Santuário de Santa Paulina, pois “o cronista que narra os
acontecimentos, sem distinguir entre os grandes e os pequenos, leva em conta a verdade de
que nada do que um dia aconteceu pode ser considerado perdido para a história”
9
.
Para fins didáticos, a pesquisa foi dividida em três capítulos. No primeiro, Os fios
condutores na trama da formação do Santrio de Santa Paulina, foram abordados alguns
aspectos da unificação italiana, buscando analisar os aspectos religiosos e a interferência
7
Do descobrimento à Proclamação da Reblica, o catolicismo foi a religião oficial do Brasil, devido ao
acordo conhecido como Padroado, firmado entre o Papa e a Coroa portuguesa. Neste tipo de acordo, todas as
terras que os portugueses conquistassem deveriam ser catequizadas, mas tanto as igrejas quanto os religiosos
se submeteriam à Coroa portuguesa em termos de autoridade, administração e gencia financeira. Com a
Proclamação da República, foi declarada a independência do Estado em relação à Igreja e foi instituída a
liberdade de culto, sendo o Brasil declarado um estado laico. A partir da segunda metade do século XIX, a
Igreja no Brasil busca fortalecer-se com a romana, separando-se cada vez mais do Estado, segundo um
modelo inspirado no Concílio de Trento e do Vaticano I. Esse processo é conhecido como romanizão. Ver:
SILVA Júnior, Alfredo Moreira da. Catolicismo, poder e tradição: um estudo sobre as ações do
conservadorismo calico brasileiro durante o bispado de Dom Geraldo Sigaud, em Jacarezinho (1947
1961). Assis, 2002.
8
ALVES, Elza Daufenbach. 45 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do Nascimento. 02/02/2005.
9
BENJAMIM, Walter. Magia e Técnica, Arte e Política: ensaios sobre literatura e história da cultura. São
Paulo: Brasiliense, 1995. p. 223.
15
da Igreja Católica no dia-a-dia dos camponeses e a vinda destes para o Brasil, no grande
êxodo italiano, no final do século XIX, para fazer la Merica. Abordamos, também, a
formação da Capela de São Jorge, logo em seguida mudada para Nossa Senhora de
Lourdes por questão devocional e imposição dos padres Jesuítas, mantendo suas raízes até
na data presente em Nova Trento. A fim de compreender os motivos e o processo de
instalação desse centro religioso, foram utilizados autores como Roselys dos Santos, Renzo
Maria Grosselli, Rovílio Costa, Michel Lacree, Michel Foucault.
No segundo capítulo, Os passantes em busca de néctar: no Santuário de Santa
Paulina, atras da História Oral, foi dada visibilidade aos peregrinos que visitam o local,
a fim de perceber as motivações que os levaram a tal ação. Foi tratada tamm a religião
na pós-modernidade e o seu empoderamento pelas Irzinhas da Imaculada Conceição,
construindo uma cenografia do sagrado. Procuramos caracterizar a constituição e a
complexidade do campo religioso local com interferência da New Age, em uma fé
desprovida de rótulos e filiação indefinida. Para tanto, autores como Mircea Eliade, Trigo
G. Godoi, Maurice Merlau-Ponty, Roger Chartier e outros foram abordados.
Por fim, no terceiro e último capítulo, Imagem de Santa Paulina: como sal da terra,
procuramos analisar a atuação da prefeitura e dos empresários para identificar o turismo
como fonte econômica para o município e os seus vizinhos, afirmando-se como um local
de alavancamento para que os descendentes de italianos fizessem a cuccagna.
O entrelaçamento entre história e religo, há algum tempo, despertou, no
pesquisador, por experiências pessoais, buscar essa relação; fé e turismo, como quando
grupos de peregrinos pernoitavam em Gênova – Itália para seguirem até Lourdes, na
França. Desde então, tornou-se inquietação sobre as diversas razões que levam as pessoas a
realizar essas viagens. Ao identificar esse fenômeno também no Brasil, em Santa Catarina,
especialmente no Santuário de Santa Paulina, encontramos um vasto campo ainda pouco
explorado pela historiografia. Com a consciência de que a história é um tipo de
conhecimento humano e, como tal, sujeita a erros e acertos, arriscamos buscar alguma luz
por além da neblina que encobre a trilha do conhecimento, com a certeza de que “articular
historicamente o passado o significa conhecê-lo como de fato foi. Significa apropriar-se
de uma reminiscência, tal como ela relampeja no momento de um perigo
10
.
10
BENJAMIM, Walter. Op. cit. p. 224.
16
1 OS FIOS CONDUTORES NA CONFECÇÃO DO SANTUÁRIO DE SANTA PAULINA
Como os pássaros vão de um continente a outro, no mudar das estões assim o homem
deixa sua terra para descobrir em outros países a felicidade e a melhoria da própria existência.
Porém, enquanto os animais migram sem obstáculos,
os homens nem sempre são livres para deixarem as suas casas.
Finardi &Buzzi, A colonização italiana de Ascurra
Esta jornada começa com a metáfora das ervas daninhas de Gilles Deleuze e Felix
Guattari, não simbolizando aqui que os emigrantes italianos fossem danosos, mas para
demonstrar como eles sram da Itália e se adaptaram por estes recôncavos, como foram
transportados nas asas do tempo e teceram os seus fios e rizomas em novas paragens.
É curioso como a árvore dominou a realidade ocidental e todo o
pensamento ocidental. O Ocidente tem relação privilegiada com a floresta
e o desmatamento. O Oriente representa uma outra figura: a relação com a
estepe e o jardim. Não existiria no Oriente algo como um modelo
rizomático que se opõe sob todos os aspectos ao modelo ocidental da
árvore? O rizoma, ao contrário da árvore que é fixa e rígida, é uma cultura
de tubérculos que procede por fragmentação e multiplicidade. No
Ocidente, a árvore plantou-se nos corpos, endureceu e estratificou até os
sexos. Ao contrário, no Oriente, o rizoma é uma libertação da sexualidade,
o somente em relação à reprodução, mas também em relação à
genialidade. Nós do Ocidente perdemos o rizoma ou a erva. E conforme
Henry Miller, a erva daninha é amesis dos esforços humanos. Entre
todas as exisncias imaginárias que nós atribuímos às plantas, aos animais
e às estrelas, é talvez a erva daninha aquela que leva a vida mais sábia [...],
a erva existe exclusivamente entre os espaços não cultivados. Ela preenche
os vazios, ela cresce entre e no meio das outras coisas. A flor é bela, o
repolho útil, a papoula enlouquece. Mas a erva é o transbordamento, ela é
uma lição de moral
11
.
Essa mefora, com a qual iniciamos este capítulo, sintetiza a vinda desses
imigrantes e pode ser aplicada no estudo dessa primeira fase, destacando-se alguns
fenômenos da construção do Santuário de Santa Paulina, em Vígolo – bairro de Nova
Trento. E há que se recordar que o solo nesta localidade do Estado de Santa Catarina, é
11
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix. Mil platôs: capitalismo e esquizofrenia. Vol. 5. Rio de Janeiro:
Editora 34, 1996. p. 29.
17
local de enraizamento de um grande número de retirantes trentinos, lombardos, poloneses e
tantos outros.
Nova Trento situa-se no Vale do Rio Tijucas, distante aproximadamente 84
quilômetros da capital catarinense, Floriapolis. Os maiores centros urbanos ao seu redor
são Brusque, 21 quimetros ao Norte e, a Nordeste, Tijucas, distante 31 quilômetros, pela
rodovia SC 411 e Balneário Camboriú, 60 quilômetros, pela rodovia SC 411 e BR-101.
A sua extensão territorial é de 431 quilômetros quadrados, e é situada nas seguintes
coordenadas geográficas: 27º17’09’ de latitude sul e 48º5517’ de longitude oeste. O
munipio é composto por três distritos: Distrito Sede, Distritos de Aguti e Claraíba. Eles
possuem respectivamente uma área urbana de aproximadamente 39 quilômetros, além de
391.52 quilômetros de área rural. A altitude média de Nova Trento é de 30 metros acima
do nível do mar. Sua população, segundo censo de 2000, é de 9.853 habitantes, sendo 63%
urbana e 37% rural, com uma densidade demográfica de 23.99%.
Limita-se ao Norte com Botuverá e Brusque, ao Sul com Major Gercino e o João
Batista, a Leste com Canelinha e a Oeste com Leoberto Leal e Vidal Ramos. A maioria dos
limites geográficos do Munipio é natural: rios e montanhas. A comunicação terrestre se
dá pela ligação entre os Vales do Rio Tijucas e Rio Itajaí.
Localização geográfica do município de Nova Trento.
Fonte: Neotur – Associação Neotrentina do Turismo.
18
O município é considerado um dos três principais pólos de colonização italiana do
Estado de Santa Catarina
12
. Porém, é preciso apontar, antes, alguns fenômenos da história
da Itália
13
nos anos que precederam a vinda dos emigrantes italianos para o Brasil. Para
compreender historicamente a emigração italiana no final do século XIX, não basta estudar
a história política da Itália mas, também, deve-se conceber alguns elementos do cotidiano
dos italianos por volta de 1861, ano da Proclamação do Reino da Itália.
No contexto de transformões políticas, a doutrina cristã romana ocupava papel
central na vida e no imaginário da sociedade; tal ocupação se dava pelo clero para
combater os males e a imoralidade na sociedade
14
. Para Bronislawo Baczko, o imagirio
serve como referencial de controle da vida coletiva e de exercício da autoridade e do poder.
Ele acrescenta que a representação do imaginário social é sustentada pela sua hegemonia, e
que “qualquer poder procura desempenhar um papel privilegiado na emissão dos discursos
que veiculam os imaginários sociais, do mesmo modo que tenta conservar um certo
controle sobre os seus circuitos de difusão”. Essas práticas eram um elo de sustentação,
“representações da ordem social, dos atores sociais e das relações recíprocas [...], das
instituões sociais em particular que dizem respeito ao exercício do poder
15
.
A formação do Estado Italiano trouxe consigo medos, intranqüilidades e utopias
16
.
Nesse mundo de crise, Rovílio Costa relata que “os imigrantes italianos, em sua terra natal,
eram protegidos pelos párocos. Tinham igrejas organizadas, com coral, orquestra, local de
encontro
17
. Mediante esses signos organizativos de união, os italianos se revelam
portadores de simbologias dentro da corporeidade do significado maior que é a Igreja
12
Informações coletadas no Sebrae Nacional - Plano Integrado de Desenvolvimento de Turismo Sustentável:
Nova Trento. Nova Trento, 2005. p. 11.
13
Torna-se complexo traduzir, da língua italiana para o português-brasileiro, certos conceitos geográficos, pelo
que apresentam e representam. Será adotado nesta dissertação o vocábulo regione(i) em vez de Estado(s), e
provincia(e) como circunscrição administrativa constitda de um conjunto de pequenos centros menores, sendo
o mais importante desses o Capoluogo(ghi) (capital); paese(i) será adotado como vilarejo ou aldeia.
14
SANTOS, Roselys Isabel Correa dos. A terra prometida - emigração italiana: mito e realidade. 2ª ed.
Itajaí: UNIVALI, 1999. p. 217.
15
Cf. BACZKO, Bronislawo. Imaginação Social. Enciclopédia Einaudi. Lisboa: Imprensa Oficial - Casa da
Moeda, 1985. p. 309 e 313.
16
Utopia: do grego ου = nenhum e τοπς = lugar. Segundo alguns teóricos da sociologia, as utopias estariam
relacionadas “a uma insatisfação com uma determinada situação e o desejo de romper com o presente, com o
fim de operar transformação na sociedade.” (tradução própria). MORSELLI, Emilio. Dizionario di filosofia
e scienze umane. Milano: Signorille, 1981. p. 211.
17
COSTA, Rovílio. Imigração italiana: vida, costumes e tradões. Porto Alegre: EST, 1981. p. 90.
19
Católica, que se outorga a verdadeira representante de Deus na Terra, como Igreja
Militante
18
.
Diante de incertezas políticas e sociais do Regime Monárquico Italiano (1861 a
1946)
19
, a vida dos camponeses continha muitos obstáculos tais como uma alimentação
pobre e à base de milho, crise e praga na uva e bicho-da-seda, o aumento da população que
agravou a falta de produtividade dos terrenos montanhosos já de difícil manuseio. Juntam-
se a esses fatores, os altos impostos cobrados pelo governo central, a industrialização
tardia, que trouxe novos elementos e aboliu antigas tradições e impeliu os camponeses a
buscarem outras formas de sobrevivência, as exaustivas jornadas de trabalho de 13 horas
ou mais. Diante dessa realidade, o refúgio para a grande maioria foi a busca pelo consolo
divino que se dava de muitas formas, através da intensa presença do clero. A busca mais
comum era a religiosidade como experiência pessoal, aberta para novos horizontes de
maneira relativamente autônoma em relação à realidade social, através da qual o Papa Pio
IX encontrou, nas devões religiosas como o Sagrado Coração de Jesus e Mariana, um
vasto campo para combater as idéias do liberalismo nascente na Itália e também em toda
Europa, sendo um subterfúgio concreto para continuar a hegemonia do clero
20
.
Tanto a Cidade Eterna como muitas outras cidades, que abrigavam Santrios,
estavam presentes no imaginário popular. Assim, Roma se transforma em lugar de crião
teológica
21
. Além disso, assume uma dimensão catequética, combatendo as formas
políticas consideradas negativas, tais como o liberalismo e o progresso, que iam contra o
poder constituído da Igreja Militante. Dessa forma, a busca pelo sagrado se reflete nos
lugares já pré-determinados pela ação sagrada e, concomitantemente, histórica, sendo Jesus
18
Segundo o Catecismo Católico do Vaticano I, os fiéis que eso na terra devem ainda lutar pela sua
salvação eterna; formam a Igreja Militante. Os santos do céu já alcançaram a coroa da vitória; constituem a
Igreja Triufante. As santas almas do purgatório devem ainda sofrer as penas da purificação; constituem a
Igreja Padecente. In: Catecismo Católico. São Paulo: Herder, 1963. p. 110-111. no Catecismo do
Vaticano II, a definição de Igreja Militante, Triunfante e Padecente se encontra de forma implícita. In:
Catecismo da Igreja Calica. São Paulo: Loyola, 2003. §. 1180, 1185, 1186, 2691.
19
A atual Itália que conhecemos, que se encontra em quinto lugar na economia mundial, não era assim
compacta antes da sua unificação. Ao sul compunha-se o Reino das duas Sicílias, compreendendo Sicília e
poles, sob o domínio dos Bourbons. No centro, os Estados Pontifícios, governado pelo Papa e, ao norte, o
Reino do Piemonte-Sardenha, governado pela casa Savóia e Parma, sob o comando dos Bourbons do Reino
das duas Sicílias. O Vêneto era domínio do Império Austro-húngaro; Módena e Toscana eram dirigidas por
duques que defendiam os interesses austríacos. In: CAPPELLI, A. Cronologia, Cronografia e Calendario
Perpetuo: dal principio dell’era cristiana ai nostri giorni. Milano: Hoepli, 1988. p. 287.
20
LIBANIO, J. Batista. As lógicas da cidade: o impacto sobre a fé e sob o impacto da fé.o Paulo: Loyola,
2001. p. 14.
21
MADRE MATILDE. História da Congregação. São Paulo, 1919. Apud MARQUES, Ana Maria. Nova
Trento in Canto de Fé. Itajaí: UNIVALI, 2000. p. 50.
20
Cristo fonte de Água Viva, que restaura a vida e sacia a sede de cada um dentro da
fraternidade e da solidariedade.
A busca pelo divino se dava não somente nas horas mais necessitadas, como na doença
ou na seca, mas também quando ocorriam quaisquer fenômenos fora da compreensão dos
camponeses, no seio da família ou no meio da comunidade. Estes fenômenos se refletiam no
cotidiano, pois além de o dia-a-dia ser revelação do mistério divino, a doutrina católica era tida
como transposição da ordem cósmica e das necessidades materiais e espirituais dos crentes.
Tal doutrina, em geral, subvertia as relações de confiança dos campesinos. Essa subversão se
dava mediante a ótica da devão, principalmente com a imitão da vida dos santos, porque
eles “ensinam que sofrendo, com resignação, as contrariedades, as perseguições, santifica-se a
alma”
22
. As confissões eram outra maneira de controle, já que por elas os padres sabiam o que
ocorria ao seu redor e estavam prontos para condenar e advertir (in)diretamente do púlpito,
através dos sermões, com base no que fora ouvido nos confessionários, constituindo-se tal
prática em uma espécie de rede de informações.
O camponês, como indivíduo, projetava na Igreja e esperava dela o fio condutor até
o Paraíso. A recompensa viria através da prática da religião, como bem último. A Igreja
aproveitou-se dessa dependência psicológica refoada pela fé religiosa, apoiada pelo clero
em geral e resumida no lema dos Jesuítas, Ad maiorem Dei gloria - para a maior glória de
Deus. Este moto era utilizado em todos os documentos e falas da congregação jesuítica,
sendo usado em circunstâncias nas quais era necessária a intervenção da Instituição Católica.
A religiosidade camponesa é fruto da imagem reproduzida da “densidade dos
problemas que atacam a condição rural”
23
, e mantida pelo sistema da não-compreeno ou
até mesmo pela ingenuidade de se perceber a ação sacralizadora da Igreja, dado que aquele
que estivesse fora da sociedade perfeita, desse invólucro institucional, era condenado à
excomunhão.o estar em comunhão com o outro era estar fadado à danação eterna.
Enfim, se alguém estivesse fora dessa promessa da religião cristã no seu dia-a-dia, seria
condenado e, sendo subjugado, haveria repercussões nas relações afetivas e no ambiente
natural onde se vivia. Daí a importância de seguir a doutrina e, através dela, ter um vínculo
com o mundo sobrenatural.
22
BERTELLI, Bruno et al. Cultura e Sviluppo: Un’indagine sociologica sugli immigrati italiani e tedeschi
nel Brasile meridionale. (Org. Renzo Gubert). Milano: Franco Angeli, 1995. p. 30.
23
FIORES, Stefano de; GOFFI, Tullo. Dicionário de Espiritualidade. São Paulo: Paulina, 1989. p. 1153.
21
As práticas religiosas dos camponeses advinham da instituição Católica, que era
responsável por eles e por isso se deixavam controlar pelos padres. A Igreja era tida como
sociedade perfeita e que se contrapunha às idéias liberais.
Com as transformações políticas e sociais que estavam acontecendo na Itália e no
mundo europeu, na metade do século XIX, os camponeses, sem a segurança da bênção dos
agentes sacralizadores, estariam fora da comunhão, da protão divina, pois era atras dos
atos litúrgicos, como a missa e os atos devocionais, que eles poderiam salvar tanto a si e
aos seus, como também aos bens materiais. Por isso, a necessidade de imitar a vida de
Jesus Cristo e a dos Santos
24
. Assim, o homem se tornaria co-participante da crião e
membro dependente dessa sociedade perfeita. Toda essa catequese estava presente nos
sermões e na atividade missionária da prédica em (re) evangelizar os fiéis através da
metodologia direta de se ser observado: Deus nos vê, Ele escuta os corações em uma
espécie de panóptico foucaultiniano
25
.
Na referida forma de manipulação do sagrado
26
, a população era compreendida com
importância pelo sistema político vigente proposto pelo liberalismo e pelo progresso. A
Igreja, com os seus códigos e representações, daria à população sustentação nas creas
tradicionais feitas e constrdas nos vários Concílios realizados dentro do seio dela, visto
que ela estaria mais próxima da vida camponesa e medieval
27
, de onde brotou, desenvolveu
24
Leão XII. Enciclica Rerum Novarum: 1891. 3º ed. Petrópolis: Vozes, 1959.
25
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: história da violência nas prisões. 10ª ed. Rio de Janeiro: Vozes, 1984.
26
Por sagrado se entende a faculdade natural que o homem tem de idealizar, substituir o mundo da realidade
por um mundo diferente para onde se transporta pelo pensamento. Apenas o homem tem a faculdade de
conceber o ideal e de o acrescentar ao real. O que define o sagrado, e também o ideal, é o fato de ser
acrescido ao real, ao profano. Essa dicotomia entre o sagrado/profano assegura a sólida ligação entre os
homens e torna possível a ordem social. Cf.: DURKHEIM, Émile. As Formas Elementares da Vida
Religiosa. São Paulo: Martins Fontes. 2000. p. 19-21.
27
A Idade Média não existe. Foi criada a posteriori, pelo século XVI, que se via como responvel pela
retomada da cultura greco-latina. O termo medium aevum foi empregado pela primeira vez por humanistas
italianos para designar o período entre a Antiguidade Clássica e o Renascimento do séc. XVI. Tais
humanistas afirmavam ser esse um período de tenebrae, marcado pela suspensão do progresso iniciado pelos
gregos e romanos: estava criado o mito historiográfico da idade das trevas, um período intermediário,
caracterizado pela barbárie, ignorância e superstição. Felizmente, a Nova História vem libertando a época
medieval de todos os rótulos que a haviam deformado. Naturalmente, nesse estudo será utilizado o termo
Idade Média o no seu sentido original, dado pelos Renascentistas, mas como um período com
características próprias, que propiciou, entre outros elementos, o nascimento das línguas neolatinas e das
literaturas, a criação das universidades e das instituições bancárias e o surgimento de cidades e de uma arte
com características renovadoras. Ver: FRANCO JUNIOR, Hilário. A Idade Média: nascimento do Ocidente.
ed. São Paulo: Brasiliense, 1996.
22
e permaneceu com seu tradicionalismo
28
e, portanto, conseqüentemente ligada à
manifestação do sagrado que se revela, ou seja, a hierofania.
Na nação emergente italiana, fragmentada e impregnada pela religo católica
romana, a Igreja, com todo o seu aparato, e com a maneira de representar a sua totalidade e
poder, fincada na tradição, por sua vez, era em si um conjunto de regras estabelecidas e
absorvidas pelos aldes, pela vida religiosa e litúrgica, ou pelos anciãos ou reis que
estavam no poder. A modernidade
29
substituiu as regras da política, da ideologia e,
principalmente, as do âmbito da cultura e da estética, pelo surgimento das rotinas da vida
de fábrica ou dos regulamentos da organização burocrática
30
. Na ótica de Dominique Julia,
os sociólogos do começo do século [XX] constatavam a decadência das crenças
tradicionais frente ao desenvolvimento do pensamento científico, mas retornavam,
ao mesmo tempo, de maneiras variadas, à velha iia de Augusto Comte, segundo
a qual as sociedades só podem manter estrutura e coerência por meio de crenças
comuns que reúnam os membros da comunidade
31
.
Em 1847, um ano as a eleição do Pontífice Pio IX, Giovanni Mastai Ferretti
(1792-1878) se contrapôs ao Estado. Nesta contraposição, a Igreja usou a ferramenta das
crenças como forma de manter a sua hegemonia, como prinpio para atuar e participar da
vida política, e seu magistério para legitimar-se. Por meio dessas crenças manteve-se a
herança que pesa sobre o seu domínio político, no ambiente em que se fazia detentora e
defensora de seus limites geográficos. O Estado Pontifício estava minado de corrupção e
abandono, provocados pelas divisões internas da Igreja e também pelos meeiros, que
tomavam as terras cuja posse outrora era da Igreja. Tal modo de agir refletiu e se
fundamentou nos seus procedimentos, bem como no discurso contra a unificação política,
administrativa e espacial da Itália, num espaço sociocultural impregnado de dúvidas e
incertezas.
28
Por tradicionalismo entende-se, em geral, uma postura conservadora comprometida unilateralmente com a
tradição, ou seja, com o passado. Ver: ZILLES, Urbano. O problema do conhecimento de Deus. Porto
Alegre: EDIPUCRS, 1989. p. 34.
29
O termo modernidade tem uma hisria longa, vem do termo latino modernus, e já aparece no V século
d.C., para distinguir o cristão oficial presente do romano pao passado. LYON, David. Op. cit. p. 35.
30
LYON, David. Op. cit. p. 37.
31
LE GOFF, Jacques; NORRA, Pierre. História: Novas Abordagens. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1995.
p. 107-108.
23
No início de 1861, a Câmara do Novo Parlamento Italiano, composta de 443
deputados, aprovou a lei de um só artigo: o rei Vitorio Emanuel II (1820-78), como soberano
da Sardenha (1849-61) e da Itália, assumiu para si e para os seus descendentes otulo de
regente da Pensula
32
. Segundo Antonio Bracanti, no mesmo ano, a lei foi sancionada pelo
soberano que acrescentou a fórmula: re d’Italia per grazia di Dio e volontà della Nazione -
rei da Itália pela graça de Deus e vontade da Nação. O regente tomou para si o título de
Vitorio Emanuel II, ao invés de Vitorio Emanuel I, para sublinhar a continuidade da
monarquia. A unidade da Ilia não tinha sido finalizada ainda, faltavam Roma e Veneza. O
Conde Camillo Benso Cavour (1810-1861), primeiro ministro do reino do Piemonte,
representante dos grupos liberais e progressistas, em 1852, tornou-se o artífice da unidade
italiana
33
. Um debate provocado na Câmara, pelo mesmo ministro, em meados de 1861,
concluiu-se com o voto da opinião pública, que aclamava Roma como capital nacional.
Além disso, houve um grave dissídio entre Cavour e Giuseppe Garibaldi (1807-
1882) a propósito da organização das tropas voluntárias que zarpariam de Gênova-Quarto
e desembarcariam na Sicília, com a spedizione dei Mille
34
. A denominação dei Mille dada à
expedição ocorreu em razão de que mil homens vieram de todas as partes do norte da
Itália, principalmente de Bergamo-Lombardia, para se juntar a Giuseppe Garibaldi. Esta
expedição entraria no Regno delle Due Sicilie (poles e Sicília) e iria em direção ao
Estado Pontifício para conquistá-lo, dando-se a Questão Romana.
1.1 O ultimatum do Piemonte na Questão Romana
Unida com o Papa, a França filha mais velha” da Igreja Católica, veio em socorro
do Estado Pontifício. Porém, mesmo com a participação francesa e de grupos dirigentes
peninsulares, Roma foi tomada pelos revolucionários. Giovanni Visconti Venosta (1831-
1906), Ministro do Exterior do jovem reino, reconheceu que a Questão Romana foi o vínculo
que diminuiu a liberdade de ação para tornar dependente a política italiana da francesa
35
.
A Questão Romana foi colocada no dia seguinte à proclamação do Reino da Itália,
no fim de outubro de 1861. Camillo Benso, conde de Cavour, declarou-se confiante de que
o exercício da liberdade esperada por todos e lealmente praticada produzirá uma grande
32
MONTI, Aldino. I bracianti. Bologna: Il mulino, 1998. p. 15.
33
ROMANO, Sergio. Storia d’Italia dal Risorgimento ai nostri giorni. Milano: Longanesi & C., 1998. p. 17-20.
34
MONTI, Aldino. Op. cit. p. 86.
35
BRACANTI, Antonio. Op. cit. p. 530.
24
manifestação no espírito, nos sentimentos, com respeito à sociedade civil
36
. Ele tentou
influenciar o pontífice Pio IX (1792-1878) de modo a reconciliá-lo com a sociedade
nascente e, em vista dessa coexistência, em Roma, o papado seria transformado, assumindo
uma posição pacífica em relação ao poder político
37
.
Por outro lado, segundo Guido Zagheni, “a Questão Romana está ligada não
somente a uma questão jurisdicional e a um problema territorial, mas também a um
problema religioso”
38
. Em março de 1861, Cavour repetia:Roma, Roma deve somente ser
capital da Itália. Declarava, todavia, que Roma “ia de encontro com a França” e que “sem
a união de Roma com o resto da Itália, esta poderia ser interpretada, por partidos católicos,
da Itália e fora dela, como sinal de submissão à Igreja
39
.
Houve um embate entre as duas conceões do mundo político na Itália: de um lado
o Ministro Cavour, que morreria em 06 de junho de 1861 e, do outro, o Papado com o seu
representante, Pio IX. Nessa dicotomia, encontrou-se a legitimação do chefe do Estado
Pontifício, remanescente do poder temporal da Igreja Católica na Idade Média. O poder do
Estado, então, foi constituído por direito pela família Sabóia.
No impasse entre o papa Pio IX e a unificação italiana, nota-se que Cavour se
legitima como libertador, de acordo com o pensamento dos liberais, no qual o indivíduo tem
poder de escolha. Ao falar-se de indivíduo, fala-se de modernidade, de redes, de contatos. A
Igreja, ao contrário, se coloca no coletivo, ou seja, de volta às suas origens camponesas,
fixando-se no tempo e na tradição. Como o novo era visto como não consagrado, abusivo e
depreciativo, evidentemente ela fez-se prudente diante da modernidade e da industrialização.
Esse momento se vê muito bem retratado na fala do jornal Le Scle:
Colocamos como princípio que a indústria é essencialmente protestante:
ora, vós o sabeis, todo protestante entra no martírio do fogo. O
catolicismo, do qual somos os mais ilustres representantes na terra, gosta
apenas do trabalho agcola, e isto pode ser compreendido: o camponês é
ignorante, supersticioso, fácil de conduzir. Ele crê sem dificuldade em
todos os nossos milagres. Ao passo que vossas cidades, vossas usinas, são
locais de perdição
40
.
36
CAVOUR, Camillo Benso. La questione romana negli anni 1860: 1861 - vol. I. Bologna: Zanichelli, 1929. p. 54.
37
JUNKES, Lauro. De Pedro a João Paulo II: 2000 Anos da Igreja de Jesus Cristo. Florianópolis: L&TJ
Paróquia Ssma. Trindade, 2000. p. 95.
38
ZAGHENI, Guido. A Idade Contemporânea: Curso de História da Igreja IV.o Paulo: Paulus, 1999. p. 128.
39
CAVOUR, Camillo Benso. Op. cit. p. 54.
40
LACREE, Michel. A guerra dos deuses e tecnologia: a benção de Prometeu. In: O tempo das paixões:
praguejadores e turiferários (1830-1914). Bauru: EDUSC, 2002. p. 35. Cf. Le Siècle, 24 nov. 1854.
25
A investida prosseguia, através de ataques, para dar cada vez mais visibilidade à
força dos anti-liberais, na figura do Papa, e, assim, satisfazer o leitor do jornal Le Siècle. O
Ministro, depois de ter tentado inutilmente um acordo com o Papa, quando este na
realidade parecia replicar politicamente as declarações daquele no parlamento, não chegou
a uma conclusão definitiva sobre a inserção de Roma no novo reino. Em 18 de mao de
1861, Cavour declarava aos cardeais que “já há muito tempo se pede ao Sumo Pontífice
que se reconcilie e se ajuste com o progresso e com o liberalismo, como vem sendo
chamada a ‘moderna civilização
41
. Também um acordo semelhante com o socialismo
emergente seria impossível, já que este era visto pela religo Católica como pai e
propagador fecundo de infinitos e intermináveis erros, como instrumentos do demônio.
O desencontro entre as aspirões italianas e a tenacidade da defesa papal do poder
temporal não era realmente uma mera disputa territorial, mas assumia o caráter de uma
batalha, uma luta entre duas concepções de mundo. Cavour tinha afirmado as principais
idéias universais do liberalismo, e tinha a capacidade para conquistar também os ânimos de
seus adverrios. A Igreja fazia sua contraposição, mediante sua tradição e seu milenário
magistério. Em sua defesa estava o poder temporal,o somente do Papa, mas também dos
Bispos de todo do mundo. Reunidos em Roma, em junho de 1862, estes estabeleceram uma
condição irrenunciável para a defesa da Igreja e, segundo Earle Cairns, uma declaração de
inefabilidade papal no Concílio Vaticano I, assinalando o ápice da obra de Pio IX
42
.
no modelo para a sociedade política, como podemos observar, a contraposição à
civilização moderna’, enunciada por Pio IX, é solenemente proclamada na encíclica
Quanta Cura publicada em 1864, trazendo em anexo o syllabus
43
. Este ia além dos
problemas pontifícios relacionados ao poder temporal. Não era somente uma garantia para
a independência do Papa, era também o modelo de um governo que, com suas particulares
instituições e com a sua ação de combater a propagação de uma cultura condenada pela sua
incredulidade e pelos infinitos erros, fazia-se inconcilvel com a doutrina Católica.
41
VIVANTI, Corrando. Elementi di Storia 3: Il mondo contemporaneo. Milano: Marietti, 1982. p. 101.
42
CAIRNS, Earle E. O cristianismo através dos séculos: uma história da Igreja cris. São Paulo: Vida
Nova, 1995. p. 336.
43
PIO IX. Encíclica Quanta Cura Syllabus: sobre os erros do Naturalismo e Liberalismo. 3ª ed. Petrópolis:
Vozes, 1959. p. 19-27.
26
Ainda podemos observar que a Igreja sabia oferecer a alternativa entre a Monarquia
nascente e o Despotismo, nos quais as classes dirigentes da sociedade ficavam cada vez
mais longe da fé e procuravam manter a ordem, observando e seguindo a desdivinização
do quotidiano e introduzindo, no meio social, as vantagens da industrialização, trazida da
Inglaterra com a Revolução Industrial:
tu, indústria, qualquer sejas; tu, arte associada ao homem, qualquer que seja
o nome que te dão; tu, invenção de alguma necessidade; tu, processo
revelado por certo cálculo e certo acaso; tu, todo que elogiamos ainda
poucos dias; tu, produto que não devias ter rival; tu, enfim, conjunto geral
dos recursos do homem, comparece diante do Juiz. O momento chegou
44
.
O Socialismo, o Comunismo e o clero-liberal, principalmente na França e na Itália,
eram considerados sumariamente como pestilência, sendo reprovados em documentos
pontificais como erros com “gravíssimas expressões”
45
. Tais erros eram todos julgados,
evidentemente, dentro do syllabus, porque ele, por si só, regia o que a Igreja Calica
queria. Por outro lado, esta mostrava a preocupação de atingir um por um aqueles que eram
considerados os chefes da ‘moderna civilizão’, e repelia a todos sem remissão.
O embate de posições e de ideais, que separou a Igreja da vida italiana, teve
conseqüências graves também no plano político. O endurecimento das opiniões do Papa
em relação ao liberalismo impossibilitou a negociação e, com maior razão, aumentou a
oposição e o compromisso das partes.
De fato, parecia difícil a possibilidade de Roma chegar a ter as duas condições
colocadas por Cavour: consentimento francês em deixar Roma e retornar para França ou
aceitação por parte do Pio IX. A política italiana acabou por encontrar-se em um impasse:
atacar Roma ou não
46
.
Em tal sentido agiu Giuseppe Garibaldi, em agosto de 1862, quando se movimentou
com algumas centenas de voluntários da Sicília em marcha contra Roma. A tentativa se
voltou contra as forças regulares, sobre os montes da Calábria, onde o revolucionário dos
dois mundos foi ferido e não poucos dos seus homens morreram no campo de batalha.
44
LACREE, Michel. Op. cit. p. 30.
45
CAIRNS, Earle E. Op. cit. p. 15.
46
ROMANO, Sergio. Op. cit. p. 17-22.
27
Seguiram-se, ao ocorrido, duríssimas pomicas, não abrandadas nem pela anistia.
A aventura garibaldina foi completada sem o consentimento do rei e do primeiro ministro,
Urbano Rattazzi (1808-73, presidente del Consiglio, 1862-1867). A partir desse
acontecimento, é feito um acordo com a França, em 1864, para a retirada das suas tropas
de Roma, fato conhecido como a Convenção de Setembro. Com o atraso da unificação
italiana, surge, para o camponês, pela quase ausência do aparato governativo, a
possibilidade da emigração, porque uma coisa eram as batalhas para a unificação nos
grandes centros, outra era a realidade dos camponeses abandonados nos Alpes, Apeninos,
planícies do Norte, Centro e Sul da Pensula.
1.2 A Itália está feita: agora é preciso fazer a sua população
O movimento migratório na Europa aconteceu em vários pses. Em geral, pode-se
afirmar, primeiramente, que os países que se demonstraram capazes de atuar em um
relevante desenvolvimento industrial nos últimos anos do século XIX tiveram um forte
aumento da população, com uma alta taxa de natalidade
47
. A emigração e a imigração
foram femenos típicos da fase de passagem de uma estrutura essencialmente agrícola a
outra, lenta e essencialmente industrial. Em segundo lugar, a migração se esgotou porque a
industrialização chegou a um nível de determinação de forte absorção de mão-de-obra e
diminuição da taxa de nascimentos.
Os países que sofreram um desenvolvimento industrial tardio e insuficiente tiveram
um aumento dos nascimentos de filhos em razão do trabalho agrícola, posto que os pais
precisavam de mão-de-obra e os filhos eram uma saída legítima, aprovada pela Igreja
Católica, que dizia que a prole era o sinal da benção de Deus sobre os homens. Tal fato era
uma característica de muitas famílias que, com isso, permaneciam fornecendo produtos
humanos para a imigração. “Sadios, laboriosos e moralizados
48
, estas eram as exigências
feitas pelos agentes imigrarios e a Itália fez parte substancial deste contexto.
Para avaliar com clareza o caso italiano, deve-se antes de tudo lembrar que, no
momento da Unificão, a Itália sofria um desequilíbrio populacional bastante intenso.
Grosselli relata que “os camponeses europeus emigraram porque a sociedade em que
viviam tinha assumido características tais que não mais permitiam a sobrevivência de
47
LAZZAROTTO, Danilo. História do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: Sulina, 1971. p. 56.
48
MADRE MATILDE, Op. cit. p. 2.
28
formas de vida e de valores que tinham sido deles durante séculos”
49
, e os meios
relativamente limitantes da sua economia ainda prevaleciam atrasados e rudimentares.
Além do desequilíbrio econômico, apresentavam-se outras circunstâncias de caráter
local, como a língua, observando-se que o italiano standard - oficial - ou, comumente, a
língua de Dante Alighieri, não era muito praticado pela população, com poucas exceções.
Mais utilizados eram os dialetos. A falta de estradas que ligassem os Paesi às Provincie
dava oportunidade à migração temporária de operários como: carpinteiros, pedreiros, entre
outros
50
. Tais trabalhadores eram provenientes sobretudo das zonas alpinas e pré-alpinas,
migrando em direção à França, Suíça e aos países da Europa Central
51
.
A esta migração, essencialmente por trabalho de temporada, se acrescenta, nos
trinta ou quarenta anos precedentes a 1861, uma limitada emigração permanente, podendo-
se ver, com isso, que a Itália já conhecia o processo migratório dentro do seu contexto.
Como afirma Zuleica Alvim, a grande duração da imigração, que levou à formação dos
cleos relativamente consistentes de imigrantes italianos na França, na Tunísia, no Egito,
na Argentina, no Brasil e no Uruguay (sic)
52
, ocasionou a diminuição da população local,
ou seja, no país de origem houve um esvaziamento populacional.
No rastro dessa velha corrente, a emigração se intensificou, em torno de 1870, a
partir da movimentação de grupos de trabalhadores das zonas alpinas e pré-alpinas e dos
mais desfavorecidos do Mezzo giorno peninsular - o sul da Itália. Ainda, depois de 1880,
quando se acentuou o crescimento demográfico, este fato coincidiu com uma grave crise
agrária. Movimentaram-se, então, migrantes de todas as regioni, mas sobretudo daquelas
setentrionais. Segundo Frosi, vieram netos, lombardos, do Trentino-Alto Ádige e do
Friuli-Venezia Julia
53
. Ao mesmo tempo, cresceu consideravelmente a emigrão
transoceânica, a qual se tornou ainda maior no período entre 1870 e 1895, anos caracterizados
por uma grave crise econômica geral. Simultaneamente, mas em medida menor, crescia a
migração temporária, em direção à França e depois em direção à Alemanha e a outros países
europeus, para trabalhos edilícios, viários e ferroviários e também industriários.
49
GROSSELLI, Renzo Maria. Vencer ou Morrer: Camponeses trentinos (vênetos e lombardos) nas
florestas brasileiras. Florianópolis: UFSC, 1987. p. 12.
50
ALVIM, Zuleika. M. F. Brava gente! Os italianos em São Paulo: 1870-1921. ed. São Paulo: Brasiliense, 1986. p.12.
51
GROSSELLI, Renzo Maria. Op. cit. p. 75. Ver: MASTRONI, Giovanni. La società italiana
dall’unificazione alla Grande Guerra. Roma-Bari: Laterza, 2002.
52
ALVIM, Zuleika. M. F. Op. cit. p. 26.
53
FROSI, Vitalina; MIORANZA, Ciro. Dialetos Italianos: um perfil lingüístico dos ítalo-brasileiros do
nordeste do Rio Grande do Sul. Caxias do Sul: EDUCS, 1993. p. 54-59.
29
O grave femeno econômico e social intensificou-se depois de 1895, e alcançou
proporções gigantescas de expatriados, no período do final do século XIX e início do
século XX
54
, no Brasil e em outros países.
Na base de tudo isto - como já se acenou anteriormente - agiram numerosas causas.
Entre as principais, destaca-se o contínuo e forte aumento da população italiana, com uma
densidade por quilômetro quadrado inferior somente àquela da Inglaterra, da Bélgica e da
Holanda, pses economicamente muito mais progressistas e ricos. Ressalta Roselys Isabel
Correa dos Santos o “atraso da indústria italiana e do comércio, incapazes de absorver a
excedência de mão-de-obra”
55
. Fulvio Finessi destaca que “o aumento demográfico,
seguido da falta de territóriosrteis e das altas taxas de impostos, foram motivos que se
juntaram ao desejo de melhorar a condição de vida e conseguir a emancipação
financeira”
56
. Além disso, havia as “pestes que atacavam as produções agrícolas,
aumentando consideravelmente a pobreza”
57
. Assim, a opção foi, em certas localidades, a
emigração como solução dos problemas naturais e políticos.
1.3 O início da Odisséia italiana fora das colunas de Hércules
Com o Decreto nº 6.663, de 17 de junho de 1874
58
, entre o Governo Imperial e
Joaquim Caetano Pinto, autorizava-se a odisséia dos imigrantes europeus para o Brasil, que
se iniciou em grande escala por volta da década de 70, em direção ao Sul do Brasil, embora
fosse observado um pequeno fluxo de italianos e outros estrangeiros em terrae Brasilis,
anteriormente. Mas, antes de chegarem à sua nova Ítaca, onde “corre leite e mel”
59
, os
italianos precisavam sair do ‘território de batalha’ que eram os portos europeus.
No contexto italiano, Gênova era um dos portos mais procurados, por estar ali a
sede da emigração, e, lá, a partida da terra natal era muitas vezes dilacerante. Pode-se
conhecer, com Grosselli, um desses momentos: “Esta manhã às 5 horas e meia vi uma
54
FROSI, Vitalina; MIORANZA, Ciro. Op. cit. p. 54.
55
SANTOS, Roselys Isabel Correa dos. Op. cit. p. 40-45.
56
FINESSI, Fulvio. Apud SIMONI, Karine. Sonhar, Viver e Recordar: Merias dos Nonos de Xavantina
(1920-1950). Florianópolis: Insular, 2002. p. 29.
57
Idem. ibid.
58
MADRE PAULINA. Biografia Comentada. Vol. 1. Positio sobre a vida e as virtudes. Roma, 1986. p. 39.
59
NARDONI, Fulvio. La Sacra Bibbia – traduzione Italiana dai testi originali: Êsodo. Cap. 33. Ver. 3.
Italia: Libreria Editrice Fiorentina, 1960. p. 132.
30
multidão de gente vagueando pela cidade; uns cantavam, outros blasfemavam, outros
arrastavam mulheres e crianças chorando, em suma parecia o fim do mundo
60
.
Com a saída das suas terras, os imigrantes vendiam o que tinham ou deixavam tudo
para trás e seguiam de trem até os portos que as Companhias de Imigração indicavam.
Os trentinos do Tirol Austaco zarparam dos portos de Gênova, norte da Itália
61
,
enquanto outros partiam do porto frans de Le Havre, norte-ocidental da França
62
. E
assim foram os trentinos do Mare Nostrum em direção às colunas de Hércules, em busca
de um mundo desconhecido e rico de fantasia, a terra prometida: cuccagna
63
.
Os imigrantes navegavam pelo Oceano Atlântico numa viagem que, se tudo
corresse bem, duraria em torno de 30, 40 dias ou até mais. Assim, os degredados filhos de
Eva iam em busca da sua rica, com sua sina e sonhos, esperando aportar em beos
esplêndidos, utopias estas construídas a partir das promessas dos agentes migratórios na
Itália, como Pietro Tabacchia e o mais famoso dentre eles, Joaquim Caetano Pinto Junior.
Segundo Giralda Seyferth, este último era “agente encarregado de recrutar emigrantes
europeus, que tinha como finalidade colonizar o Sul do país e, em São Paulo, suprir as
necessidades de mão-de-obra enfrentadas pelas grandes fazendas de café por ocasião da
abolição da escravatura”
64
.
Conforme Agenor Neves Marques, os agentes tinhamplenos poderes para alistar
as famílias que quiseram emigrar e encaminhá-las para o Vale do Itaj
65
. A Colônia de
Blumenau mantinha em Trento, Norte da Itália, o agente Joaquim Caetano Pinto, para a
imigração trentina. Anos se passaram e se intensificou a imigração, como relata Roselys
Isabel Correa dos Santos: “se observam deslocamentos individuais de pessoas destas
regiões, ou mesmo nada comparável com o que viria a acontecer a partir principalmente do
60
GROSSELLI, Renzo Maria. Op.cit. p. 229. Apud Jornal: Voce Cattolica de 12/12/1878.
61
SERPA, Ivan Carlos. Os engenhos de Limeira: história e memória da imigração no Vale do Itaj. Itaj:
UNIVALI, 2000. p. 22-23.
62
LORENZI, Guido. La Beata Madre Paolina: fra carisma e obbedienza. Milano: Editrice Ancora, 1991. p. 179.
63
Cuccagna significa um lugar fabuloso onde se come, se bebe e se diverte à vontade, lugar de prazer e de
riqueza, abundância de tudo; vida prazerosa e alegre; nas festas de interior, pau de sebo na qual se sobe para
se apoderar de um prêmio colocado no topo do mesmo. Cf. Dizionario Garzanti di Italiano: con una
grammatica essenziale in appendice. Bologna: Garzanti, 1994. p. 340. [Tradução própria].
64
SEYFERTH, Giralda. Imigração e cultura no Brasil. Brasília: UnB, 1990. p. 22.
65
MARQUES, Agenor Neves. Imigração italiana: edão comemorativa do Centenário de Urussanga 1878-
1978. Urussanga, 1978. p. 45.
31
referido ano de 1875”
66
. Esta data é considerada a da grande leva de imigrantes por estas
paragens e para tantos outros continentes.
1.4 Rumo à cuccagna
Do continente europeu vieram muitos imigrantes. Do Norte da Itália vieram
netos, lombardos e trentinos, habitantes das regiões de onde afluíram os maiores
contingentes de almas, que seguiam para o Sul e Sudeste do Brasil. Os do Sul da Itália
foram para outros países e, em menor escala, para o solo brasileiro. A maneira como eles
vieram foi um tanto desastrosa, conforme relata Renzo Grosselli. A desorganização
imperava nos portos brasileiros, sem uma estrutura adequada para recebê-los: “faltavam
intérpretes para prestar as devidas informações sobre a disponibilidade de terras nas
colônias de Santa Catarina, Paraná, Espírito Santo e Rio Grande do Sul, ou para indicar a
disponibilidade de trabalho assalariado, nas fazendas de café, em São Paulo
67
.
Segundo Nelma Baldin, aqueles que desembarcavam no porto de Santos eram
destinados ao estado de São Paulo, para trabalhos agrícolas, e os que desembarcavam no
porto do Rio de Janeiro seguiam para os diversos pontos do Brasil
68
. Assim, os emigrantes
com destino à Côlonia Itajahy Príncipe Dom Pedro aportavam no Rio de Janeiro e seguiam
por mar até Desterro, a capital, hodierna Florianópolis, e daí para Itajaí, cidade portuária,
porta de entrada para os vales de Itajaí-Mirim com o Itaj-Açu e o Vale do Rio Tijucas.
A colonização européia em Brusque fez parte do projeto de ocupação do Vale do
Itajaí-Mirim e seus vales, e se intensificou em torno da segunda metade do século XIX.
Para esse fim, o Governo Imperial incentivou a vinda de imigrantes de origem européia,
principalmente alemães, italianos e poloneses, vistos como trabalhadores ideais para
promover o desenvolvimento da rego.
A fundação de Brusque data de 04/08/1860, quando um grupo do Sul da Alemanha
chegou a Vicente Só, antigo nome do município. Deu-se, então, início à Côlonia Itajahy
que, em 17/02/1890, ganhou oficialmente a denominação que tem hoje, em função do
nome do seu diretor, Francisco Carlos de Araújo Brusque
69
.
66
SANTOS, Roselys Isabel Correa dos. Op. cit. p. 63.
67
GROSSELLI, Renzo Maria. Op. cit. p. 432.
68
BALDIN, Nelma. Tão fortes quanto a vontade. Florianópolis: Insular/UFSC, 1999. p. 60-62 .
69
CAMPOS, Custodio Francisco de. Achegas para a história de Brusque. In: Álbum do Centenário de
Brusque. Sociedade Amigos de Brusque, 1960.
32
Os trentinos partiram de Brusque, e se estabeleceram temporariamente no quilômetro
16, atual distrito de Claraíba em Nova Trento. Os imigrantes que ficaram em Brusque
instalaram-se em barracos de pau-a-pique no porto de Itajaí. Observa-se também, nos escritos
de Madre Matilde, CIIC
70
, que “quando nossos pais chegaram da Europa ficaram três meses
em Brusque, fazendo estradas nestas terras desertas, onde os animais silvestres tinham livre
domicílio
71
.
Enquanto isto, para o grupo trentino foram assinaladas terras para colonizar em
Alferes, antigo nome de Nova Trento, no Vale de Tijucas, que foram imediatamente
povoadas e nomeadas com a ressignifição dos nomes das terras deixadas: Vígolo,
Bezenello, Valsugana e tantos outros. Quando os imigrantes trentinos tomaram posse de
suas terras, já existiam presentes no local assentamentos indígenas, uma madeireira norte-
americana, instalada ali entre 1833 e 1838, e ocupantes de outras nacionalidades
72
.
A vida dos imigrantes era árdua e laboriosa, mas na colônia de Nova Trento houve uma
perspectiva de funcionalidade superior a de Brusque. Segundo Grosselli, havia “a viabilidade
do rio do Bro
73
, em cujas margens se desenvolveu o centro urbano de Nova Trento, afluente
do rio Tijucas
74
. A navegabilidade do rio do Braço fez com que esta se destacasse das outras
colônias. Foi também, no entanto, rao do seu enfraquecimento econômico, devido ao
assoreamento do rio e às secas, e por causa das autoridades que não viam com bons olhos a
abertura de estradas “entre os dois centros vizinhos”
75
, de Nova Trento a Tijucas. Toda a
dificuldade vivenciada não estava no contrato firmado com Caetano Pinto, que prometia terras
para cada família e subvenção do governo para abertura de estradas e espaços para casas e
lavouras nas colônias. As complexidades relacionadas à nova terra, aos costumes, à língua, ao
clima sub-tropical e a todos os obstáculos na instalação da conia e adaptação dos colonos
76
eram imensas. No transferimento de pátria, se observa o fator agregador dos imigrantes
italianos, caracterizados pela forte religiosidade. O significado da religião, para eles, era o de
70
A sigla CIIC significa: Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição.
71
Madre Matilde. História da Congregação. São Paulo, 1919. p. 21.
72
GROSSELLI, Renzo Maria. Op. cit. p. 432.
73
Rio do Bro banha Nova Trento e sua extensão é de 115 quilômetros. Nasce no munipio de Leoberto
Leal, passa por Nova Trento, São Batista e desemboca em Tijucas.
74
GROSSELLI, Renzo Maria. Op. cit. p. p. 483.
75
Idem. p. 485.
76
Ao chegarem ao Brasil, os imigrantes foram chamados de colonos pelo Governo Imperial. O termo designa
aquele que cultivava a terra. Ver: BOSI, Alfredo. Colônia, culto e cultura. In: Dialética da colonização.
ed.o Paulo: Cia das Letras, 2000. p. 11.
33
uma âncora em meio a um mar de turbulência diante do desconhecido e o de apoio para a
transposição/transformação de uma nova vida num outro país.
1.5 Os risomas dos Jesuítas em Nova Trento
Nova Trento dependia administrativamente da Colônia Itajahy até 1881. Quanto
à questão religiosa, pertencia à paróquia de São Luiz Gonzaga, em Brusque que, por
sua vez, estava subordinada à arquidiocese de Curitiba
77
. Segundo o texto manuscrito
de Madre Matilde, os padres eram responsáveis pelas almas dos neo-trentinos, sendo
apenas um deles alemão: “[...] Padre Alberto Gattone foi que disse a primeira missa na
recente colônia, na localidade Alliança, a 12 quilômetros de Nova Trento [...]
78
. Madre
Matilde afirma ainda que:
Sucedeu-lhe o padre Arngelo Ganarini, tirolês da Diocese de Trento [...].
Porém, ficou pouco tempo [...]. Em 1879 chegou do Colégio São Luis de Itu,
enviado pelo Reverendo padre Vicente Cogumelli, Superior da Missão dos
padres da Companhia de Jesus da
Província Romana, o padre Augusto
Servanzi, com ordem de abrir uma residência [convento] em Nova Trento
79
.
Os religiosos da Companhia de Jesus, presente no Vale do Rio Tijucas, eram de
nacionalidade italiana pertencentes juridicamente à “Província romana, [em Nova Trento] que foi
administrada até 1913 [...] depois passou a ser atendida por representantes da missão ale.
Então, o Município foi elevado à dignidade de Província, em 1927”
80
,
situação que perdura até os
dias atuais. Isso ocorreu “em razão do fechamento da casa em Floriapolis e os jesuítas foram
transferidos, em janeiro de 1879, para a vila que surgia, na foz do ribeirão dos Alferes”
81
.
77
O Papa Leão XIII, com a Bula Ad universas Orbis Ecclesiae, em 27 de abril de 1892, criou o Bispado do
Paraná e Santa Catarina, com sede em Curitiba, sufragânea da Sé Metropolitana do Rio de Janeiro, com o
território do Para desmembrado do Bispado de São Paulo e o de Santa Catarina, do Bispado do Rio de
Janeiro. O 1º Bispo de Curitiba foi Dom Jo de Camargo Barros. E a 19 de março de 1908, pela Bula Quum
Sanctissimus Dominus Noster, do Papa Pio X, era criada a Diocese de Florianópolis, desmembrada da de
Curitiba. O 1º Bispo de Santa Catarina foi Dom João Becker. Cf.: MATOS, Enio de Oliveira. Arquidiocese
de Florianópolis: preservando a sua história. Florianópolis, 1996. p. 10-14. Ver: A Arquidiocese de
Cvritiba (sic): na sva (sic) história, 1956. p. 20.
78
MADRE PAULINA. Op. cit. p. 54.
79
MADRE MATILDE. Op. cit. p. 22.
80
LUTTERBERCK, Jorge Alfredo. Jesuítas no sul do Brasil. São Leopoldo: UNISINOS, 1977. p. 80.
81
MARCHIORI, Tarcísio. Madre Paulina. Floriapolis, [1989]. p. 5.
34
Desde 1879, ano de entrada dos Jesuítas em Nova Trento, o retiro de Santo Icio era
realizado, todos os anos, por homens e mulheres, mos e moças
82
. Observa-se que a religião
era perpetuada pelos Exercícios Espirituais, seguindo o método de Santo Inácio de Loyola,
pregado aos neotrentinos. Estes exercícios serviam de controle político, econômico e social.
Nova Trento, comomunicípio se deu a sua elevação em 1892, e em 1875, foi
criado como distrito colonial, e em 1885 com a lei nº 1.074, criaria a freguesia e o distrito
de paz que foi um passo”
83
para a sua elevação. Quando da sua criação, o município era
conhecido como um convento municipalizado pela existência de três congregações
religiosas
84
- uma feminina: a Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição
(CIIC)
85
, e duas masculinas: os Irmãos da Congregação do Santíssimo Corão de Jesus,
CSCJ
86
,
que eram conhecidos como Robertinos, e os próprios padres Jesuítas, assinando
como S.J
87
, que atendiam espiritualmente os dois Institutos e todos os munícipes católicos,
como também os da região circunvizinha. Por isso a alcunha de Convento Municipalizado,
que outros municípios eram desprovidos espiritualmente do clero, e assistidos pelos
“padres leigos ou “padres da capela”, como eram chamados no Rio Grande do Sul. Em
Santa Catarina, eram conhecidos como “Capelão”, “Sacristão” ou “Ministro”. Estes eram
os colonos que sabiam ler ou que tinham certo carisma para tal função
88
.
Em vários pontos de Nova Trento se observam construções de edifícios religiosos
que, “em brevíssimo tempo, os Jesuítas fizeram surgir no munipio como igrejas, capelas,
oratórios, dois institutos religiosos”
89
e santuários
90
que, sob a ótica eclesiástica, não eram
82
Idem. p. 10. Cf.: DALLABRIDA, Norberto. A fabricação escolar das elites: o ginásio catarinense na
Primeira República. Florianópolis: Cidade Futura, 2001.
83
PIAZZA, Walter Fernando. Nova Trento. Florianópolis, 1950. p. 23-25.
84
MARCHIORI, Tarcísio. Op. cit. p. 05-06.
85
A CIIC foi fundada por Abile Lúcia Visintainer (Santa Paulina do Coração Agonizante de Jesus) e
Virgínia Rosa Nicolodi (Madre Matilde da Imaculada Conceição) em 12 de julho de 1890, aceita pela Igreja,
através do Bispo Dom Jo de Camargo Barros, em 18 de dezembro de 1895, e reconhecida definitivamente
pelo papa Pio XII, em 27 de outubro de 1947.
86
A CSCJ foi fundada em 1900 por Roberto Facchini e seis companheiros, conhecidos como Robertinos.
Eles tiveram apoio espiritual do Pe. Luis Rossi, SJ. A sua supreso foi feita em 1904 pelo Bispo Dom José
de Camargo Barros. Como carisma: Contemplação e Mendicância. Cf.: PIAZZA. F. Walter. A igreja em
Santa Catarina: notas para sua história. Florianópolis: UFSC, 1987. p. 452.
87
S.J, em latim, Societas Jesu. Em português, Irmãos e Sacerdotes da Companhia de Jesus ou, como
conhecidos popularmente, Jesuítas.
88
GROSSELLI, Renzo Maria. Op. cit. p. 452.
89
DALL’ALBA, João Leonir. Imigração italiana em Santa Catarina: documenrio. Caxias do Sul:
EDUCS/ EST/ co-edição LUNARDELLI, 1983. p. 94.
90
O Direito Canico conceitua Santuário como: Cân. 1330 - a igreja ou outro lugar sagrado, aonde os fiéis,
em grande número, por algum motivo especial de piedade, fazem peregrinações com a aprovão do
35
reconhecidos como tal pelo Ordinário local, e sim pelo povo, por devoção. Eram dois: o de
Nossa Senhora do Bom Socorro, no Morro da Onça, que logo em seguida foi denominado
Morro da Cruz, por ter sido posta uma cruz pela comemoração da virada do século XIX
para o século XX; e o Santuário de Nossa Senhora de Lourdes, em Vígolo. Ambos os
Santuários foram eleitos pela devoção popular, primeiramente, e depois pelo Ordinário
local, ou seja, pelo Bispo.
O Santuário de Nossa Senhora do Bom Socorro, no Morro da Cruz, conhecido
popularmente como o “da Santa”, tem as suas festas nos dias três de maio e quinze de agosto.
A sua construção se deu mediante o desejo do Pe. Alfredo Russel, S.J, que, a 24 de mao de
1901, ao benzer a Cruz do culo, plantada no cimo do Morro da Onça, pronunciara uma
oração na qual lembrou o “Santuário de Nossa Senhora do Bom Socorro de Ruem na França e
das grandes graças que aí dispensava a Santa Virgem aos seus devotos”
91
.
Relata Piazza que “os colonos se coligaram e por 300$000 (sic) adquiriram do
Governo as terras (236,485m²) onde se ergueu, primeiramente, modesta capela e, hoje, se
ergue o imponente santuário”
92
. Enio de Oliveira Matos ressalta que “em 1905, Dom
Duarte Leopoldo e Silva, então Bispo Diocesano de Curitiba, sob cuja jurisdão estava
todo o estado de Santa Catarina, oficializou-o como ponto de peregrinações”
93
. Mas o
santuário foi elevado a tal categoria somente em 1988, em ocasião do Ano Mariano, no dia
15 de junho, por Dom Afonso Niehues, arcebispo de Florianópolis (1967-1991), que
oficializara e decretara a criação e previu que o Pároco da Paquia de São Virgílio, de
Nova Trento, exerceria também as fuões de Reitor do Santuário.
Já o santuário de Vígolo, que vigolanos e Jesuítas denominaram de Nossa Senhora
de Lourdes, deu-se primeiramente como Capelinha, dedicada a São Jorge, celebrando-se a
sua festa em 23 de abril
94
, no vale do Alto Alferes, a seis quilômetros da Sede; mais tarde o
Ordinário local, o Bispo. Ou, ainda, lugar sagrado ou manifestação do sagrado, onde mora a presença de
Deus. De acordo com a Bíblia, o Santuário era o lugar santíssimo (Lv. 16,16), quer dizer, a parte mais interna
e reservada ao tabernáculo no templo de Jerusalém, embora a palavra se aplicasse também, em sentido
genérico, a todo o edifício. Em sentido figurado, chama-se santuário o povo de Deus (Sl. 114, 2), porque
Deus mora nele. Por outro lado, também Deus é santuário do seu povo (Is. 8, 14).
91
PIAZZA, Walter Fernando. Nova Trento. Florianópolis, 1950. p. 84.
92
Idem. p. 84.
93
MATOS, Enio de Oliveira. Arquidiocese de Florianópolis: preservando a sua história. Florianópolis,
1996. p. 142-144. Ver: PIVA, Claúdio José. O Santuário Carregado às Costas. São João Batista: Gráfica
Guarany, 1999.
94
o Jorge não vem sendo mais comemorado pela Igreja Católica por ser incerta a sua origem. Ver:
BOITEUX, H. Carlos. Esboço Biográfico. Rio de Janeiro: Oficina Industrial Graphica, 1929. p. 42. Porém a
imagem do santo continua no Santrio, sendo venerada.
36
lote foi denominado Vígolo. Assim explica-se tal origem toponímica da Capelinha: como o
santo patrono na terra natal dos moradores de Vigolo Vattaro na Itália era São Jorge,
também aqui os imigrantes colocaram o nome em homenagem a ele.
Podemos observar que a construção da Capelinha se deu em forma de mutirões
95
,
entre os anos de 1876 e1879, como nos relata Madre Matilde: “A primeira missão pregada
pelo padre Servanzi, S.J, foi no Vale de Vígolo, na Capelinha de São Jorge [...] e no fim da
missão benzeu com grande solenidade a mesma [...]”
96
. A Madre afirma ainda que “o povo
[os vigolanos] trabalhou alguns anos na construção da Igreja
97
. A dedicação do santuário a
Nossa Senhora de Lourdes deve-se ao sentimento devocional dos Jesuítas, por Nossa Senhora
ter aparecido a Bernadette de Soubirou, em Lourdes, na França, que faz parte da definição dos
dogmas da Imaculada Conceição, desde 1854. E a benção se deu em 11 de fevereiro de 1895.
Segundo o relato do Diário da Residência,
bem cedo, muita gente foi à festa da Virgem de Lourdes. [...] Benzeu-se o
novo Santuário, levou-se em procissão a Estátua da Imaculada. [...]
Entrados na Igreja, o Pe. Rocchi disse algumas palavras ao colocar a
estátua no nicho da Gruta. Todo o povo replicou três vezes ‘Evviva Maria’.
Depois, no Evangelho, pregou o Pe. Manardi. Depois da Missa, seguiu-se a
nção do Ssmo Sacramento
98
.
Para os vigolanos, a devoção à Maria já vem desde a sua terra natal, no âmbito
mediterrâneo, e está ligada a um sentimento materno, à imagem do feminino, de proteção,
porquela mamma è sempre la mamma”, simbolizada pela figura arquetípica da Virgem
como forma de expressão. Ela é aquela que perdoa, provê tudo e está próxima dos filhos. A
e de Jesus Cristo, sob o título de Nossa Senhora de Lourdes, vem ao encontro de seus
filhos degredados numa atitude de mansidão. Como apareceu a Bernadette de Soubirous
99
,
95
Darcy Ribeiro define o “mutirão” como “uma instituição soliria que permite dar e obter a colaboração de outros
núcleos nos empreendimentos que exigem maior concentração de esforços. O mutirão institucionaliza o auxílio
mútuo e a ação conjugada pela reunião dos moradores de toda uma vizinhança para execução de tarefas mais pesadas
[...] é uma forma de associação para o trabalho, mas também uma oportunidade de lazer festivo. RIBEIRO, Darcy. O
povo brasileiro. A formão e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 381.
96
Madre Matilde. Op. cit. p. 22.
97
Idem. p. 24.
98
Diario della Residenza del Sacro Cuore di Gesù: 11.2.1895 apud MADRE PAULINA. Biografia
Comentada. Vol. 1. Positio sobre a vida e as virtudes. Roma, 1986. p. 70-71.
99
Bernadette Soubirous (1844? - 1879). Conhecida pelas aparições de Nossa Senhora de Lourdes, em 11 de
fevereiro de 1858 foi seguida por mais 17 aparições. Cf.: RAVIER, André; LOOSE, Helmuth Nils. Madre
Matilde. Op. cit. p. 22. Bernadette Subirous. Paris: Le Centuriom 1979. p.17.
37
uma jovem necessitada como eles, os peregrinos acalentavam através dela a nostalgia dos
parentes distantes, buscando superar as dores e as provações na nova terra, e conquistar as
graças que tanto almejavam para os seus pedidos. Enfim, o mito da Grande Mãe. Assim,
percebemos aqui não uma providência e fé que acolhe, mas uma conveniência como a da
futura teologia da prosperidade
100
, ou seja, Do ut des, em que separa receber do
sobrenatural alguma coisa em troca.
Com a permanência dos Jesuítas em Nova Trento, observamos fortemente que, no
cotidiano das famílias dos imigrantes, a religião se faz mediante uma rede de solidariedade
101
em
que os colonos se doavam em formas de compadrio, ou seja, em ajuda a compadre necessitado
que, futuramente, o ajudaria quando por sua vez precisasse. E, a cada vez que participavam de
mutirões, existia a alegria de estarem juntos, entrelaçados pelos laços de amizade.
Vale lembrar que as palavras não surgem ao acaso e guardam em si não apenas a
origem etimológica, mas também resquícios do tempo no qual surgiram. Nesse sentido, a
palavra religião – do latim re-ligare - significa unir o céu e a terra, o espiritual e o material
102
.
No contexto da imigração italiana para o Brasil, no final do século XIX, a religião era o ponto
de ligação entre a Itália - mundo antigo, berço da sua cultura - e a nova Pátria, símbolo de um
futuro promissor. As práticas religiosas também serviam como elo de comunicação com o
sobrenatural, dando força aos colonos principalmente nos momentos iniciais na nova terra.
Nesta, o sofrimento humano se assemelha ao de Cristo, na medida em que a própria vida era
oferecida a um lugar desconhecido, sempre na esperança de fare l’America.
Ver também: Disponível em http://www.autorescatolicos.org/felipesantossantabernardita.htm. Acesso em
15 fev. 2005.
100
A Teologia da Prosperidade, de origem norte-americana além desse nome, é rotulada por seus cticos de
Health and Wealth Gospel, Faith movement, Faith Prosperity Doctrines, Positive Confession, entre outros.
Reunindo crenças sobre cura, prosperidade e poder da fé, essa doutrina surgiu na década de 40. Mas só se
constituiu como movimento doutrinário no decorrer dos anos 70, quando encontrou guarida nos grupos
evangélicos carismáticos dos EUA, pelos quais adquiriu visibilidade e se difundiu para outras correntes
cristãs. Cf.: MARIANO, Ricardo. Neo-pentecostais: sociologia do novo pentecostalismo no Brasil. São
Paulo: Loyola, 1999. p. 151.
101
O dicionário Houaiss conceitua solidariedade (S) como “caráter, condição ou estado de solidário. 1) JUR.
compromisso pelo qual as pessoas se obrigam umas às outras e cada uma delas a todas. 2) Laço ou ligação
mútua entre duas ou muitas coisas ou pessoas, dependentes umas das outras (a S entre o vento e o moinho) (a
S entre a corda e os montanhistas). 9) SOC estado ou condição grupal que resulta da comunhão de atitudes,
sentimentos, de maneira que o grupo venha a construir uma unidade sólida, capaz de oferecer resistência às
forças externas e, até mesmo, de se tornar firme ainda em fase da oposição procedente de fora”. HOUAISS,
Antônio et al. Dicionário Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004. p. 2602.
102
EICHER, Peter. Dicionário de Conceitos Fundamentais do Cristianismo.o Paulo: Paulus, 1999. p.
694; WILGES, Irineu. Cultura religiosa.o Paulo: Vozes, 1983.
38
A Igreja, como instituão, era o ponto que culminava não somente no sobrenatural,
mas no político, porque os padres eram conhecidos como os intelectuais orgânicos na
concepção gramsciana, e que controlavam a sociedade civil
103
. A organicidade se dava de
maneira prática, como na interpretão da moral e da fé e no modo como esta última
poderia ser realizada, e numa visibilidade pela qual a Igreja buscava restaurar o seu
domínio junto ao espo público, devido à marginalização sofrida pela sua separação do
Estado
104
. Por isso que “o sacerdote vinha de manhã, para a missa, e ficava até de tarde
105
.
Tem-se relatos de que os padres, antes ou depois da missa, além das confissões, acudiam
os fiéis nas mais variadas ocupações. Como escreve Pe. Ganarini:
Além da velha ponte que une as duas margens do Ribeirão Alferes, mais
para baixo, vi uma outra que dá passagem a quem vai para a outra margem
do Rio do Braço, sobre o qual existe uma terceira ponte com correntes de
ferro, para pedestres. Essas duas últimas pontes devem-se à iniciativa dos
RR. PP Jestas que se puseram à testa do povo o qual com prestação de
serviços e contribuições em dinheiro ou/de conduzir a bom fim estas duas
obras de utilidade pública
106
.
Neste contexto, os Jesuítas fazem parte da romanização, também conhecida como
ultramontanismo, como destaca Elza Daufenback Alves ao afirmar que “os Padres eram
construtores, empreendedores socializados na tradição seminarística e religiosa trentina (ou
romanizada). Assim, não era incomum entre os padres de mentalidade romanizada
construírem igrejas, pontes, escolas paroquiais, enfermarias, asilos, hospitais, e outros”
107
.
Nesta perspectiva, “a igreja devia ser compreendida como uma sociedade hierarquizada e
autônoma, sob a chefia direta do Pontífice Romano
108
.
Em Nova Trento, contando sempre acompanhado dos serviços prestados pelas freiras
dos institutos religiosos por eles fundados, Elza Daufenback Alves ressalta também que os
103
PORTELLI, Hugues. Gramsci et la question religieuse (Préface par Jean Pierre Cot). Paris: éditions Anthropos,
1984. p. 69.
104
ANTONIAZZI, Albert et al. Nem anjos nem denios. Interpretões sociológicas do Pentecostalismo.
Petrópolis: Vozes, 1994. p. 34.
105
MARCHIORI, Tarcísio. Op. cit. p.11.
106
GANARINI, Angelo. Nova Trento: impressões de viagem pelo padre Arcangelo Ganarini. Apud Walter
Fernando Piazza. Op. cit. p. 142.
107
ALVES, Elza Daufenbach. Discurso religioso católico e normatizacão de comportamentos: o
Ludgero - SC 1900-1980. Florianópolis: UFSC. Dissertação de Mestrado em História, p. 28.
108
AZZI, Riolando. A crise da cristandade e o projeto liberal: história do pensamento católico no Brasil-II.
o Paulo: Paulinas, 1991. p. 226.
39
Jesuítas faziam cumprir o papel que um líder religioso deveria – dentro de tal mentalidade –
fazer, por caridade e também para dar visibilidade à Igreja Católica romanizada
109
.
Dentro do processo de romanização, o Jesuitismo triunfa e foi fato marcante no
município de Nova Trento. Tanto que o munipio era conhecido pelos administradores,
em Desterro, como Convento Municipalizado, pela força administrativa dos religiosos
apesar de existirem três entidades: Apostolado da oração, Congregação das Irmãzinhas da
Imaculada Conceição e Banda Musical Padre Sabbatini Sociedade Filarnica
Neotrentina. Eles deram continuidade à sustentação da submissão campesina a uma
realidade social e política que os imigrantes estavam acostumados a receber na sua terra
natal. Esta relação bilateral convinha a ambos os lados; aos imigrantes numa subordinação
- já que eram de “índole bondosa e religiosa
110
, e aos Jesuítas, pela condição de
mantenedores da ordem e dos bons costumes. Esta índole bondosa e religiosa dos
imigrantes dava-se não por serem naturalmente cordiais, mas sim por se tratar de uma troca
de favores, e por terem vindo dos países europeus que passaram pela Reforma e Contra-
Reforma, tendo um catolicismo ligado à figura do padre, à capela e à escola paroquial. E,
como fala Sérgio Buarque de Holanda, “a vida em sociedade é, de certo modo, uma
verdadeira libertação do povo que ele sente em viver consigo mesmo, em apoiar-se sobre si
próprio em todas as circunstâncias da existência
111
.
Essa “proteção” vem também manifestada na Banda Musical Padre Sabbatini
112
,
através da religo católica, com os seus símbolos e seus organizadores, que eram os padres
Jesuítas e as Irmãzinhas da Imaculada Conceição, como meio de se renovar e de ir ao
encontro do processo de aculturação
113
, embora com pequeníssimas variantes por parte dos
imigrantes, e suas repercussões na identidade e na alteridade estabelecida na comunidade.
São com os elementos religiosos e sociais destas transposições de cultura que eles
vivificaram e transpuseram para cá o seu modo de viver. Conforme Maurice Halbwachs
109
AZZI, Riolando. Op. cit. p. 28.
110
DALL’ALBA, João Leonir. Op. cit. p. 94.
111
HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. 26ª ed. o Paulo: Companhia das Letras, 2005. p. 147.
112
A Banda Musical fundada pelo padre Angelo Sabbatini, S.J, em 1890. Ver: CADORIN, Jonas. Nova
Trento outra vez ... Nova trento: Prefeitura Municipal, 1992. p. 68-72.
113
A aculturação é o processo de interação entre duas ou mais culturas mediante o qual se uma
transposição de símbolos, significados, produzindo uma perda de elementos das culturas de origem e gerando
uma outra sincrética. BRIGHENTI, Agenor. Por uma evangelização inculturada. São Paulo: Paulinas
1998, p. 31. Cf.: EICHER, Peter. Dicionário de Conceitos Fundamentais de Teologia. o Paulo: Paulus,
40
os habitantes assemelham-se ao quarteirão ou à casa [...] uma estreita relação entre os
bitos, o espírito de um grupo e o aspecto dos lugares onde ele vive”
114
.
Observa-se, assim, a importância da figura dos Jesuítas, que percorriam os vales
catarinenses e que, desde o final do século XIX, fixaram-se em Nova Trento, onde
encontravam grande receptividade por parte dos trentinos, lombardos, bergamascos e de outras
nacionalidades. Por onde eles passavam, qualquer palavra de conforto era bem-vinda.
Contudo, a religiosidade popular da época expressava-se ainda pela devoção à Madonna, ao
Rosário, aos santos devotos, procissões e Via Crucis. Esta forma simplificada de religiosidade
– de desprendimento e abandono – dos imigrantes dava sempre margem a “estratégias de
poder como: o poder disciplinar, o bio-poder”
115
e a governabilidade da Igreja.
As inúmeras viagens que os Jesuítas fizeram, em suas andanças por Nova Trento e
arredores, uma vez que eles eram os olhos do Papa onde ele não podia estar, tinham o
intuito de dar governabilidade e estratégias de poder à Igreja Católica Apostólica Romana
dentro do processo de romanização. Eles se fizeram detentores das vidas dos neotrentinos.
Segundo Ana Maria Marques, quando os padres faziam alguma espécie de visita às
comunidades e, por conseqüência, às famílias “diziam: por que esse não pode ir pro
seminário? Já indicando!
116
. Existe também um ditado popular em Nova Trento, segundo
o qual se repetia “quando nasce um filho, se joga na parede, se colar é pedreiro, se cair no
chão é padre. Então saiu daqui tamm muito padre e muita freira
117
. Com esses
elementos se observa a religiosidade e o domínio da Igreja através dos Jesuítas, como fala
Dall’Alba, criticando-os como aproveitadores da índole bondosa e religiosa dos imigrantes
e apontando-os como a causa da esterilidade de Nova Trento
118
.
Com efeito, e segundo essa perspectiva, Gilberto Freire nos informa:
Em oposição aos interesses da sociedade colonial, queriam os padres fundar no
Brasil uma santa república de ‘índios domesticados para Jesus’ como os do
1993. p. 395. Ver: MOSCONI, Luis. Santas missões populares: uma experiência de evangelização voltada
para as massas. São Paulo: Paulinas, 1996. p. 20-22.
114
HALBWACHS, Maurice. A cultura popular na Idadedia e no Renascimento. São Paulo: Vértice,
1990. p. 69.
115
FOUCAULT, Michel. Da arqueologia do saber à estética da existência. Rio de Janeiro: NAU/
Londrina, PR: CEFIL, 1998. p. 104.
116
MARQUES, Ana Maria. Nova Trento em Canto de Fé. Itajaí: UNIVALI, 2000. p. 20.
117
ORSI, Agostinho José. 45 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova Trento,
17/09/2005. p. 2.
118
DALL’ALBA, João Leonir. Op. cit. p.94.
41
Paraguai; seráficos caboclos que só obedecessem aos ministros do senhor e só
trabalhassem
nas suas hortas e roçados. Nenhuma individualidade nem
autonomia pessoal ou de falia. Fora o cacique, todos vestidos de camisola
de menino de dormir como num orfanato ou num internato. O traje dos
homens igualzinho ao das mulheres e das crianças
119
.
Dentro do enraizamento religioso dos neotrentinos, engendrado paradoxalmente no
imaginário dos Jesuítas, no período do icio da colonização, quando eles ditavam a moral
sob a égide da Igreja, é cultivada Amabile.
1.6 Uma flor alpina desabrocha em terrae brasilis
Diante do poder dos Jesuítas em Nova Trento, os camponeses italianos tinham para
com os religiosos uma atitude de submissão e de espera na religo. Esta religiosidade se
torna vivificante, dentro da espiritualidade dos trabalhadores do campo, com os seus atos
devocionais “e é vivida com espontaneidade, mas com sentido acentuado de passividade
diante do Deus criador, e estreitamente ligada aos ritos
120
. Começam, então, a nascer
desejos mais profundos de seguir os Conselhos Evangélicos
121
, como diz Madre Matilde:
Quando as duas meninas Amábile Lúcia Visintainer, de 14 anos, e Virgínia
Nicolodi, de 15 anos, já unidas em intimidade espiritual e desde então com
uma resolução firme de servirem a Deus, entrando, com o tempo, numa
congregação religiosa, tinham elas, por certo, a idéia de tais congregações
vistas em sua terra natal. Mas, como esperar, no meio daquele mato, a
realização de tão santo desejo?
122
.
Elas esperaram muitos anos, “e cresciam as duas meninas, bem obedientes e
piedosas no seio de suas famílias”
123
. Assim, preparavam-se para se entregar à consagração
religiosa, mediante os Conselhos Evangélicos de pobreza, castidade e obediência. Como a
pobreza do lugar não permitia trazer uma congregação da Europa, segundo o padre
Servanzi, S.J, são elas mesmas que fundam uma, com a ajuda dos padres Jesuítas, ao pé da
Capelinha de Nossa Senhora de Lourdes, na valada degolo, para a qual deram o nome
de Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição. Desta forma, a Congregação
119
FREYRE. Gilberto. Casa-grande & senzala: introdução à hisria da sociedade patriarcal no Brasil-1.
45ª ed. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2001. p. 96.
120
FIORES, Stefano de; GOFFI, Tullo. Dicionário de Espiritualidade. São Paulo: Paulina, 1989. p. 1154.
121
RODRIGUEZ, Angel Aparício; CASAS, Joan Canals. Diciorio Teológico da Vida Consagrada. São
Paulo: Paulus, 1994. p. 1192.
122
Madre Matilde. Op. cit. p. 22-23.
123
Idem. p. 23.
42
teve como fundadora Abile cia Visintainer (em religião, Irmã Paulina do Coração
Agonizante de Jesus), e, como co-fundadoras, Virgínia Rosa Nicolodi (em religião, Irmã
Matilde da Imaculada Conceição) e Teresa Maule (em religião, Irmã Inês de São Jo)
124
.
Seguindo as diretrizes eclesiásticas da época, elas mudam de nome
125
, em razão do que
vem dito na vida religiosa: elas estão no mundo, mas não com o mundo.
Assim, foi formado o duo fundacional: Ir. Paulina, Ir. Matilde e logo em seguida
veio juntar-se ao grupo nascente a Ir. Inês, que se costuma ver no quadro, tomou o hábito
religioso com o duo, por isto é considerada, em sentido largo, como co-fundadora, assim
formando o trio fundacional. E eis que está feito o trio devocional da congregação Jesus,
Maria e José. É o carisma
126
do novo Instituto: “Sensibilidade para receber os clamores da
realidade e disponibilidade para servir aos mais necessitados e aos que eso em situação
de maior injusta”
127
, segundo a Constituição e Diretórios promulgados em 1997.
A fundação da Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição se
materializou por causa de uma cancerosa terminal, Lúcia Ângela Viviani Zoner. Sendo ela
um fardo para a família, alguns vigolanos intervieram e elegeram Paulina e Virgínia as
mais aptas para cuidarem da doente. Assim, a Congregação nasceu sob os auspícios da
comunidade e com as orientações dos padres Jesuítas, que levaram algumas religiosas para
o Paulo. Junto com elas, a Madre Paulina, dando continuidade à sua propagação. Hoje,
124
CONSTITUIÇÕES E DIRETÓRIO: Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição. São Paulo:
Casa Geral, 1997. p. 111.
125
Na Igreja Católica romana, quem entra em uma Ordem, Congregão ou Instituto religioso, segue o
costume de mudar de nome civil para um religioso, significando uma separação: estar no mundo mas não
com o mundo. A mudança ocorre quando o/a candidato/a entra no noviciado quando o/a noviço/a começa a
fazer parte da comunidade. Hoje, a mudança de nome está mais ligada à vida monástica. A formação na vida
religiosa se divide assim: o postulantado de seis meses, o noviciado de dois anos, profissão temporária de ts
a nove anos (simples, ou juniorista) e profiso perpétua, com o que o/a candidato/a faz parte integral da
instituição onde entrou.
126
O uso atual do conceito de carisma está marcado pela sociologia da religo. Max Weber dava a definição:
carisma designa uma qualidade de uma pessoa, considerada fora do comum, pela qual esta é valorizada como
dotada de forças ou propriedades sobrenaturais, supra-humanas ou pelo menos especificamente fora do
cotidiano, não acessíveis a qualquer outra, ou como enviada por Deus ou exemplar e, em conseqüência, como
líder. Ver: CASTRO, Anna Maria de; DIAS, Edmundo Fernandes. Sociologia: Durkheim; Weber; Max e
Parsons. In: Introdução ao pensamento sociológico. 5ª ed. Rio de Janeiro: Eldorado, 1977, p. 147-148. Cf.
WEBER, Max. Sociologia. São Paulo: Ática, 1991. p. 134-141. Ver também o 2º parágrafo do nº 12 da
Lumen Gentium. a significado permanentemente atual, o escopo e a utilidade dos carismas, são “graças
especiais” - diz - que o Espírito Santo dispensa entre os fiéis, “pelas quais os torna aptos e preparados para
assumir vários trabalhos e encargos, úteis para a renovação e uma maior expansão da Igreja”. Afirma também
sua variedade, falando de “carismas extraordinários ou também mais simples e comuns” e admoesta que o
“julgamento sobre sua genuidade e seu uso correto pertence à autoridade eclesiástica”. BORRIELLO: et al.
Dicionário de Mística.o Paulo: Paulus, 2003. p. 201.
127
Constituições e Diretório: Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição. São Paulo: Casa Geral,
1997. p. 14.
43
as Irmãzinhas contam com 500 membros aproximadamente, espalhados em vários países
com mais de 100 comunidades
128
. Madre Paulina do Coração Agonizante de Jesus fora
eleita Superiora Geral da sua Congregação Ad Vitam, em 02 de fevereiro de 1903, no primeiro
Capítulo Geral, e destituída deste cargo no dia 29 de agosto de 1909
129
.
A Congregação teve a sua aprovação diocesana, provisória, em 1895, pelo Bispo de
Curitiba, Dom Duarte, quando de sua visita pastoral a Nova Trento, com a benção do Papa
Leão XIII
130
. Torna-se Direito Pontifício, em 19 de maio de 1933, e recebe a aprovação
definitiva do Papa Pio XII
131
aos 27 de outubro de 1947.
Madre Paulina faleceu em 09 de julho de 1942, em São Paulo, deixando uma vasta
fama de santidade, fundamentada no exercio de virtudes heróicas. Aos 23 anos da morte,
em 03 de setembro de 1965, foi iniciada a Causa de Beatificação
132
de Madre Paulina, com
o Processo Ordinário.
Com o centenário de fundação da Congregação, as Irmãzinhas vêem-se na
obrigação de (re)construir símbolos que lembrassem a Fundadora, como a casa paterna;
uma estátua da Madre Paulina com uma enxada e uma cruz nasos, simbolizando ora et
labore - orão e trabalho; a reforma da Igreja de Nossa Senhora de Lourdes; uma réplica
do casebre onde Santa Paulina começou sua vida de consagrada; um teatro de bonecos,
com todos os elementos de fé e devoção, que lembrassem a vida da Madre, na caminhada
em direção à Igreja Triunfante.
Com a beatificação de Madre Paulina, em 1991, pelo Papa João Paulo II (1978 a
2005), o munipio, que era predominantemente agrícola, sem representatividade na
indústria, experimenta um desenvolvimento. Segundo Walter F. Piazza, as madeiras; a
viticultura; a sericicultura; os cereais; os feculentos; a cana-de-úcar; o café; o fumo; as
128
Santa Paulina do Coração Agonizante de Jesus: A Primeira Santa do Brasil. Florianópolis: Letras
brasileiras, 1991. p. 5.
129
BESEN, José Artulino. Madre Paulina: uma surpresa de Deus. Florianópolis: Mundo e Miso, 1999. p. 40.
130
MADRE PAULINA. Op. cit. p. 7-8.
131
CONSTITUIÇÕES E DIRETÓRIO. Op. cit. p. 112.
132
“Beatificação significa que a pessoa viveu sua vida de acordo com a proposta do Evangelho, de maneira
exemplar. Nada se descobriu de contradição entre fé e vida. O fato, depois de estudos meticulosos sobre a
vida da pessoa, deve ser corroborado por um autêntico milagre reconhecido como tal por rigoroso exame do
caso apresentado. É o primeiro passo para a declaração maior, a canonização. Canonização significa que a
pessoa está incluída oficialmente na lista (cânone) dos santos da Igreja”. A celebração da beatificação é a
declaraçãoblica e oficial da Igreja, de que Madre Paulina tem todas as condições requeridas para chegar à
canonização, e abre-se outro processo que exige novo milagre. Cf.: NEGRI, Terezinha Santa; et al. Bem-
Aventurada Madre Paulina do Coração Agonizante de Jesus: Fundadora da Congregação das Irmãzinhas
da Imaculada Conceição. Anrio 1991 Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição. São
44
plantas oleaginosas, como, por exemplo, amendoim e mamona; as plantas medicinais; as
frutas e verduras; o gado e a indústria de transformação
133
constituíam-se as principais
fontes ecomicas. A instria de transformação, ligada à natureza, ofereceu aos
neotrentinos os alicerces econômicos.
Quanto à indústria têxtil, era fundamentalmente caseira. O bicho da seda, trazido
com os imigrantes em 1875, estimulou a fiação de seda e a plantação de algodão. A
primeira atividade foi premiada e reconhecida tanto nacionalmente quanto no exterior,
entrando em colapso com as mortes dos bichos da seda e por não ter recebido auxílio
governamental ou privado. Tendo falido esse empreendimento, mais uma vez Nova Trento
mergulhou num período de obscurantismo. O único farol a brilhar nessa escuridão foi a
fiação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição, mas esta também sucumbiu na névoa
densa do abandono, em 1945.
A indústria de algodão Renaux, em Brusque, absorvia a mão de obra da região. No
entanto, como relata Maria Luiza Renaux Hering, “em Santa Catarina, onde ainda não se
inaugurara nenhuma tradição econômica de destaque maior, o quadro em que deveria
nascer e se impor a indústria era bem diferente
134
. Mas, no ambiente neotrentino, a
economia seguiu outros rumos: o da uva e do vinho, do plantio de fumo, da construção
civil e o do comércio, montando a identidade da cidade.
Nova Trento pertence a uma tradão agrícola e de construção civil, sem um modo
aparente para dar corporeidade à conquista da cuccagna para os seus descendentes. As
autoridades civis e religiosas e os comerciantes não sentiram de imediato, em Madre
Paulina, um filão para promover o desenvolvimento econômico da cidade. Evidentemente,
com o aumento de fluxo de pessoas na cidade, viram nela um elemento agregador das
necessidades materiais e espirituais dos que para lá acorriam para pedir ajuda, graça,
proteção e saúde. Com isso, tanto as Irmãzinhas como os empresários locais e, também, os
poderes municipal e estadual, perceberam algo novo e fundamental para desabrochar a
singularidade do Munipio, por terem a prerrogativa da primeira Santa brasileira
135
, mas
Paulo: Loyola, 1991. p. 16. BERTOLINI, Jeferson. Paulina: a primeira santa do Brasil. Jornal de Santa
Catarina/ Diário Catarinense. Florianópolis, 19 maio 2002. Guia da Canonização. p. 1-40.
133
Cf.: PIAZZA, Walter Fernando. Op. cit. p. 55-72.
134
HERING, Maria Luiza Renaux. Colonização e Indústria no Vale do Itaj: o modelo Catarinense de
desenvolvimento. Blumenau: FURB, 1987. p. 81.
135
MADRE Paulina. Op. cit. p. 5.
45
também a primeira nascida no trentino. São Vigilio, o santo padroeiro de Trento, que viveu
noculo XVI, é natural da Capadocia (Turquia).
Com o fluxo crescente de peregrinos
136
e de turistas
137
à cidade, é forçoso abrir
espaço para eles e suas representações. A Igreja local, sob a direção do então Arcebispo
Metropolitano de Florianópolis, Dom Eusébio Oscar Scheid, SCJ
138
(1991-2001), decreta a
Capelinha Nossa Senhora de Lourdes a Reitoria ou Capelania Especial em 19 de março
1997, com o Registro n. 046/97 L. Prot. nº 16
139
.
Com a canonização de Santa Paulina, em 19 de maio de 2002, em cerimônia
presidida pelo Papa João Paulo II, no Vaticano, a região do Vale de Tijucas, no município
de Nova Trento, adquiriu maior importância no cenário nacional, o que proporcionou um
aumento no fluxo de peregrinos e turistas que procuram o Estado de Santa Catarina. O
Ordinário local, Dom Eusébio Oscar Scheid, SCJ, que outorgara a Reitoria ou Capela
Especial de Nossa Senhora de Lourdes, em Vígolo, em 1997, a decreta Santuário Madre
Paulina, com o Reg. Nº 152/98 L. Prot. nº 17.
Por sua vez, o Estado promulga a declaração de Estância Turístico-Religiosa,
reconhecida pela Lei Estadual nº 10.568, de 07 de novembro de 1997
140
. Com tal
declaração, a intervenção do Estado no órgão que o representa é Santa Catarina Turismo –
SANTUR. Foram feitas seis reuniões, com o título Comissão Governamental de
Acompanhamento e Implantação do Plano de Turismo Religioso – Projeto Madre
Paulina
141
.
136
Peregrinão vem do termo peregrinus, “uma substantivação do advérbio peregre (de per e ager).
Etimologicamente, indica aquele que se encontra per agros, isto é, pelos campos, fora do lugar de residência.
Posteriormente, o termo peregrinus também foi usado para indicar ‘aquele que saía de sua casa ou de sua
pátria’ por um motivo qualquer. Durante os primeiros séculos do cristianismo, peregrinus se referia ao
estrangeiro, em oposição ao civis, cidadão que tem o direito à cidade”. Cf.: BALBENOT, Egídio. Liturgia e
política. Chapecó: Grifos, 1998. p. 78.
137
A palavra turista é recente e é associada ao viajante. Inicialmente era grafada como tour-ist, no início do
culo XIX, e o primeiro registro da palavra sigh-seeing é de 1847, já acompanhando o agente turista,
definido como aquele que “expects everything to be done to him and for him(“espera que todas as
providências da viagem sejam tomadas por outrem com vistas ao seu bem-estar”). Cf.: BANDUCCI Jr,
Álvaro; BARRETTO, Margarita. (orgs). Turismo e Identidade Local: uma visão antropológica. 3ª ed.
Campinas: Papirus, 2003. p. 54.
138
SCJ, em latim, Sacerdotum Cordis Jesu. Em português, Sacerdotes do Coração de Jesus. Explicação
completa: Congregação dos Padres do Sagrado Coração.
139
Ver no anexo 1.
140
Ver na anexo 3.
141
Ver no anexo 2.
46
Observamos o fato de que a religião e o poder governamental se unem e agem
concomitantemente. Ao darem-se as mãos, eles possibilitam a teatralização das romarias
142
para que se possa usar a cidade “inventada para a acumulação capitalista, não mais a
cidade do século XIX que esquadrinhava seus habitantes e os constituía em sujeitos
produtores de mercadorias. A cidade é ela própria mercadoria à venda”
143
.
A mercantilização da cidade se dá pelo viés da imagem de Santa Paulina, pela
questão ambiental, com seus múltiplos recursos, e por uma outra característica original: a
culinária italiana. Esse empreendimento é também incentivado por diversos segmentos
gastronômicos que, com isso, apropriam-se da cidade de Nova Trento. Os dotes culinários
italianos, como a comida “típica”, e a cultura italiana vem como valor agregador aos
atrativos da região. É fato interessante que os promoters da festa In canto Trentinoo a
tinham incluído no trem da alegria das festas de outubro, mantendo-a isolada no mês de
agosto. Com isto, a sua característica de cunho familiar é predominante.
É, ainda, e principalmente, “considerada capital do turismo religioso
144
e, nos
últimos anos, a segunda Estância Turístico-Religiosa do país, perdendo apenas para a
cidade de Aparecida do Norte”
145
, no interior de São Paulo, com a primeira Estância
Religiosa do Brasil, o Santuário Nacional de Nossa Senhora Aparecida, considerado uma
‘Meca’ “para as peregrinões do catolicismo sul-americano”, segundo Cristian D.
Monteiro Oliveira
146
. A sua localização próxima à rodovia Presidente Dutra, que liga as
142
Romarias ou ramagens constituem uma tradição constante na ptica religiosa do povo brasileiro. De
origem medieval, as romarias chegaram no Brasil através da cultura lusitana, e têm a finalidade de exprimir a
fé e homenagear o santo cultuado. Com muita freqüência, essa expressão de fé se manifesta pelo pedido de
uma gra ou cumprimento de uma promessa. Deste modo, visita-se o santo tanto para pedir como para
agradecer os favores recebidos do céu. “Romaria provém dos termos romerus, romerius, romipeta ou
romarius, nomes dados aos peregrinos que a partir do século VI se dirigiam para Roma, devido à expano
muçulmana na Terra Santa, interrompendo de certo modo o fluxo de peregrinos que para lá se dirigiam”.
AZZI, Riolando. O catolicismo popular no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1978. p. 77. Cf.: L’Osservatore
Romano, Roma, 2 de junho de 1994. p. 12, citado por BO, Vicente. As peregrinações na comunidade Cristã.
Ver também: SCHWIKART, Georg. Dicionário ilustrado das religiões. Aparecida, São Paulo: Editora
Santuário, 2001. p. 98; AZEVEDO, Manuel Quitírio. O culto a Maria no Brasil: história e teologia.
Aparecida-SP: Ed. Santrio/ Academia Marial, 2001. p. 93.
143
FLORES, Maria Bernadetes Ramos. Oktoberfest: Turismo, Festa e Cultura na Estação do Chopp.
Florianópolis: Letras Conteporâneas, 1997. p.11.
144
Segundo Maria A.Vilhena, “ O termo turismo religioso possui uma conotação secularizada e nos remete a uma
estrutura de significado que se afirma de fora para dentro do campo religioso. Ou seja, o turismo religioso é
externo e vem usado preferencialmente em contextos político-administrativos. Cf.: ABUMANSSUR, Edin Sued.
(org.). Turismo religioso: ensaios antropológicos sobre religião e turismo. Campinas: Papirus, 2003. p. 35.
145
XU, Daniela. Cidade aposta no turismo religioso. Diário Catarinense. Florianópolis, 6 de abril de 1999.
Cidade, p. 3.
146
OLIVEIRA, Cristian D. Monteiro. Basílica de Aparecida: um templo para a cidade-e. São Paulo:
Olho d’Água, 2001. p. 11. Ver também: BASSETTI, José Eduardo Pioli. Basílica de Aparecida: Santrio
47
grandes metrópoles do país, é estratégica, além do fato de ser um Santuário urbano,
enquanto o de Santa Paulina é localizado em uma paisagem rural. Seja como for, não é
nosso objetivo traçar um paralelo entre os dois Santuários.
Hoje, a religião está contida numa troca de crenças imediatistas, em que o fiel é
tratado como consumidor e disputado por diversas igrejas, irmãs separadas, que lidam com
estratégias de marketing
147
para angariar novos seguidores.
Através da procura pelas diversas religiões ou empresas religiosas, como alternativas
de fé para resolver seus problemas do dia-a-dia, os fis atendem ao apelo do sacrifício, da
promessa e do cumprimento de dívidas com o Ser Supremo, que os leva a vários
deslocamentos, como missas a céu aberto, no estilo de megaespetáculos de rock, romarias e
procissões, acompanhados de grandes esforços físicos para a contemplação da mística e
visitas a lugares sagrados, como forma de agradecer e manifestar a Deus o desejo esperado.
Assim, através da dinâmica dos fatos ocorridos durante o século XIX, que tiveram
como protagonistas a Igreja e os Estados liberais, observa-se a complexidade dos problemas
e a dificuldade de contorná-los com atitudes dignas de ambas as partes
148
. Por outro lado,
havia uma demanda por conta de carências econômicas, uma vez que as pessoas não foram
favorecidas como o prometido em suas novas conquistas. A maneira encontrada foi partirem
paro o trabalho fora dos seus comuni e provincie, fora dos confins territoriais onde viviam
em situações de privão. Essa maneira de proceder provocou um espantoso processo de
migração. E, assim, o homem migrante, acreditando no progresso, encontrou como saída a
busca por novas paragens. O seu destino era a tão desejada cuccagna. Esse movimento
ampliou enormemente os limites da vida e satisfez uma gama cada vez mais ampla de
necessidades. Uma vez realizados, e tendo tornado suas vidas mais repletas, continuam seus
descendentes a fazer la Merica na figura de Santa Paulina. Esgotando-se a busca pela
satisfação das necessidades financeiras ditadas por interesses econômicos, os neotrentinos
viram-se favorecidos pela beatificação canonização de Santa Paulina.
do Brasil. Florianópolis: Aventura Brasileira, 2004. SOLIMEO, Gustavo Antônio; SOLIMEO Luiz Sérgio.
Rainha do Brasil: a maravilhosa história e os milagres de Nossa Senhora da Conceão Aparecida. ed.
São Paulo: Diário das Leis LTDA. 1992. WOBETO, Afonso. Santuários: onde Deus se encontra com os
homens. São Paulo: Loyola, 1982. FRANÇA, Maria Cecília. Pequenos centros paulistas de função
religiosa. Vol I-II. São Paulo: Universidade de o Paulo, 1975.
147
Segundo Mário Carlos Beni,Marketing é “a totalidade de estudos e medidas que determina a estratégia de
lançamento e a sustentação de um produto ou serviço no mercado consumidor, garantindo seu êxito
comercial. É mais do que a mera comercialização de um produto qualquer”. BENI, Mário Carlos. Análise
estrutural do turismo. 10ª ed. o Paulo: SENAC São Paulo, 2004. p. 207.
148
ZAGHENI, Guido. Op. cit. p. 138.
48
Como somos herdeiros de uma tradição judaica-cristã, a religião nasce no momento
em que o homem começa a sentir a morte como problema individual. Aqui se entende que
a sustentação da religião não é a espiritualidade, autenticidade existencial,o é a coragem
de arriscar a liberdade, não é a individualidade ou a existência profética, mas o coletivo em
forma de clube e de folclore tradicional
149
. A religião está no humano e é necessária
porque, para responder questões absolutamente humanas, precisamos de uma base que a
natureza não oferece. Não significa aqui que o ser humano seria um resultado experimental
ou ensaio da natureza, mas sim a condição que nos deu de questionamento, para o qual ela
mesma não tem respostas
150
.
Assim, a religião constituiu um marco fundamental do início da ocupão,
colonização, exploração e urbanização, não só de Nova Trento, mas também das regiões
circunvizinhas. E como afirma Nietzsche “[...], foi a moral que protegeu a vida do
desespero e do assalto no nada, naqueles homens e classes que foram violentados e
oprimidos por homens”
151
. Neste contexto, temos todo o processo da diáspora italiana, pelo
empoderamento
152
da cuccagna contraída nos moldes do catolicismo romanizado.
149
DREWERMANN, Eugem. Religião para quê?: Buscando sentido numa época de gancia e sede de
poder. Em diálogo com Eugem Drewermann. São Leopoldo: Sinodal, 2004. p. 27-28.
150
Idem. p. 27-28.
150
Idem. ibedem.
151
NIETZSCHE, Friedrich. NIETZSCHE: Vida e Obra. São Paulo: Nova Cultural, 1999. p. 434.
152
Quanto à categoria empoderamento, vem do ings empowerment, e tem sido utilizada por autores que
estudam formas de desenvolvimento alternativo. Empoderamento significa fornecer a outros o poder para
tomar alguma ação. Na visão sociológica, este procedimento enfatiza a habilidade para lidar com seu
contexto, de indivíduos ou grupos. O empoderamento inclui componentes psicológicos, (pessoas
esclarecendo seus objetivos e desenvolvendo o sentido de eficácia e desenvolvendo habilidades),
componentes sociais, (pessoas ou grupos entendendo o contexto no qual eso operando e desenvolvendo
inflncias e técnicas de poder efetivos). Ver: FRIDMANN, John. Empowerment: uma política de
desenvolvimento alternativo. Oeiras: Celta, 1996; STARK, Wolfgang. Empowerment: neue
handlungskompetenzen in der psychosozialen praxis. Freiburg und Breisgau: Lambertus, 1996, apud
LISBOA, Teresa Kleba. Gênero, Classe e Etnia: trajetórias de vida de mulheres migrantes. Florianópolis:
Ed. da UFSC; Chapecó: Argos, 2003. p. 23.
49
2 OS PASSANTES EM BUSCA DE NÉCTAR: no Santuário de Santa Paulina
Milho de pipoca que não passa pelo fogo
continua a ser milho de pipoca para sempre.
Ditado popular
Hoje em dia, adentrando no município de Nova Trento, destacam-se de súbito a
imagem de Santa Paulina e as cores verde, branca e vermelha pintadas nos postes da rede
elétrica a meio metro, representando, desta maneira, a bandeira italiana, e simbolizando
que a cidade, se assim pode-se dizer, visibilidade àquela cultura
153
.
E vem-se reforçando essa italianidade
154
, ppria a Nova Trento, na imagem da
primeira santa brasileira que “jamais perdeu o sotaque estrangeiro”
155
, vinda da Itália como
um farol aceso para a religiosidade e a economia da cidade. Enfim, estamos nos confins de
uma cidade penetrada pelos valores simbólicos da identidade cultural cuja permeação es
sendo constituída pelo conceito de raça/etnia, que até pouco tempo esteve ligado às
diferenças biológicas e fisionômicas. Aqui se discute com a proposta da concepção
relacional de identidade formulada por Barth, na qual a identificação étnica de um
determinado grupo é o resultado de sua capacidade em manter simbolicamente as
fronteiras de diferenciação que o distinguem dos grupos vizinhos
156
.
É uma experiência inusitada e oportunizada quando se continua a caminhar pelo
centro da cidade, sentindo o clima subtropical e vendo, em volta de si, os montes, a
natureza presente. Os moradores ficam a olhar o murmúrio e o tráfego dos ônibus e carros
que serpenteiam nas ruas de paralelepípedos, vindos de lugares de perto ou de longe, que
153
O termo cultura foi aqui utilizado a partir da análise de Peter Burke, que a entende como “um sistema de
significados, atitudes e valores partilhados e as formas simbólicas em que eles o expressos ou emanados”.
In: BURKE, Peter. Cultura popular na Idade Moderna. ed. Trad. Denise Bottmann. São Paulo: Cia das
Letras, 1999. p. 25.
154
Termos como italianidade, europeidade e brasilidade utilizados nesta dissertação designam qualidades e
signos representativos de uma determinada cultura.
155
BARROS, Willians. Santa de casa. Seleções Reader’s Digest. Rio de Janeiro, p. 13, jul. 2003. Ver
tamm: BARROS, Willians. O milagre (econômico) de Santa Paulina. National Geografhic. São Paulo, nº
35, p.120-125, mar. 2003.
156
BARTH apud MONTEIRO, Paula. Globalizão, identidade e diferea. Novos Estudos CEBRAP, nº.
49, nov. 1997. p. 62.
50
passam em frente às suas moradias ao encontro de uma graça ou simplesmente a passeio
pelo local no qual, outrora, viveu a “primeira santa brasileira.
Observamos os visitantes que caminham pelas ruas, os quais se abrigam nas
sombras das novas e antigas arquiteturas do final doc. XIX, sem uma predominância que
evoque uma cidade italiana e sim, um espaço aculturado. E, com isto, faz-se cortejo à
história, desembocando, deste modo, com o seu protótipo do espaço urbano religioso no
seu tricêntrico – sede administrativa do município. Em torno da Igreja-Matriz, dedicada a
o Virgílio, giravam os interesses e necessidades religiosas. Na praça principal, lugar de
encontro da vida social, circulavam as notícias, os bens (comércio), as informações sobre o
mundo. Nas casas, a família se reservava para atos de intimidade
157
. E tantos outros
elementos do cotidiano que ecoam e evocam a voz do passado.
As placas sinalizadoras de trânsito mostram o trajeto que se deve seguir para ir ao
Santuário de Santa Paulina do Coração Agonizante de Jesus, em Vígolo, pela cidade, e
fazem ver a mais ilustre cidadã do Município em outro tempo, quando caminhava por
aquelas paragens, no final do século XIX e início do século XX, vinda da Ilia juntamente
com seus pais e compatriotas na grande diáspora italiana (1875). Ali permaneceu até a sua
ida para o Paulo, como Superiora Geral da Congregação das Irmãzinhas da Imaculada
Conceição, para a propagão da recente obra fundada por ela e pela Madre Matilde
Nicolodi. Por lá ficou até a sua morte, de diabetes, em 1942.
E segue-se a trajetória. Sai-se da sede e, a seis quilômetros do Município, em direção a
Brusque pela SC-411, dá-se início à viagem ao bairro de golo. Observamos, já na sua
entrada, um capitel
158
que se configura como uma porta descortinando-se ao visitante e dando
passagem para Vígolo, cerca de cinco quilômetros da sede de Nova Trento, significando o
limite que separa os dois espaços e indicando, ao mesmo tempo, a comunicação, a passagem
do espaço profano para um ambiente permeado de religiosidade
159
.
Num ambiente harmoniosamente rural, com uma atmosfera híbrida entre
brasilianidade e italianidade, é mantida pelos moradores uma tradição fincada nos moldes
dos avós. Mas as suasões quotidianas estão em um presente bem concreto e se ouve, não
157
LIBÂNIO, João Batista. MARTINS Filho, Miguel. A busca do sagrado. São Paulo: FTD, 1991. p. 39.
158
Na cidade de Nova Trento existem 35 capitéis, capelas minúsculas que se colocam na frente da casa para que
a vizinhança se reúna para rezar. Diário Catarinense. Florianópolis, 4 de abril de 2005. Cidade, p. 15. Ver
também: SEIBEL, Nelci Terezinha. A Notícia. Florianópolis, 30 de abril de 2003. AN turismo, p. E2 –E3.
159
Por religiosidade entende-se, aqui, as formas concretas, espontâneas e variáveis por meio das quais a
religião é vivenciada pelas pessoas e pelos grupos.
51
raramente, vozerios de alguns vigolanos em língua dialetal, podendo-se perceber e
visualizar o modo lingüístico nostálgico da velha Itália
160
.
Continuando a caminhada, adentramos no palco do santuário, e nesta
territorialidade, por sua vez, as Irmãzinhas constroem um conjunto de práticas tais como
monumentos que remontam à vida de Santa Paulina: procissões, datas comemorativas
relacionadas à fundadora e em tempos litúrgicos como Natal e Páscoa, embelezamento do
Santuário e tantas outras. Essas são desenvolvidas pela Igreja Católica na direção das filhas
espirituais de Santa Paulina. Nas representações do santuário, tanto os edifícios construídos
como toda a infra-estrutura física implantada são cenários que representam, como numa
vasta ilustrão, espaços reais e místicos necessários à ação evangelizadora e missionária
para a comunidade e para os peregrinos, seguindo as orientações da arquidiocese de
Florianópolis e o plano pastoral da paquia de São Vigílio, com um critério contundente,
para que os usuários compreendam a sua natureza espiritual
161
.
As Irmãzinhas, percebendo as necessidades físicas e espirituais dos freqüentadores
do Santuário, utilizam-se de espaços comerciais e edificações que representam a vida da
Santa, conforme apresentado no anexo 3. Como propõe Pierre Bourdieu, “o espo é
também um campo social porque nele as posições formam um sistema de relações baseado
em apostas (poder) quem sentido e são desejadas pelos que ocupam as posições no
espaço social
162
. Eis porque se constrói um ambiente que pode ser caracterizado como
cenografia teatral do sagrado, cuja analogia nos remete a um palco que foi constrdo de
maneira tal para os atores que, neste caso,o os usuários do Santuário que desempenham
os seus papéis, cena por cena, como num filme que nos remete a uma nova cena, e esta nos
remete a uma outra subseqüente, tornando-se um fluxo contínuo como as águas correntes
de um rio que afluem ao encontro do mar
163
, que se justificam na perspectiva da
160
Para a questão do bilingüismo em Nova Trento, ver BOSO, Ivete. Entre passado e futuro: bilingüismo
em uma comunidade trentino-brasileira. Florianópolis: 1991. Dissertação (Mestrado em História - UFSC).
161
Observamos, nas diretrizes da Ação Evangelizadora do Santrio Madre Paulina, p. 2. (fotocópia), da criação
de um ambiente de silêncio, de recolhimento, de oração, favorecendo o encontro pessoal e comunitário com
Deus, despertando para o sentido do Sagrado, na contemplação das maravilhas da natureza e dos diversos locais
que evocam a vida e a obra de Madre Paulina. Esse ambiente também oferece um espo e um clima favorável
à comunhão, à fraternidade, à partilha entre o/as peregrino/as, para que sejam evangelizado/as e evangelizem
atras de gestos de acolhida, de solidariedade e de relações fraternas e amigas.
162
LECHTE, John. 50 Pensadores Contemporâneos Essenciais do Estruturalismo à pós-modernidade.
In.: Pierre Bourdieu. Trad. bio Fernandes. 2ª ed. Rio de Janeiro: DIFEL, 2002. p. 62.
163
BITENCOURT, Amauri Carboni. Merleau-Ponty: Leitor da história da Arte. Florianópolis, 2006. p. 57.
NASCIMENTO, Jo do. I verbi nella poesia i fiumi di Giuseppe Ungaretti. Florianópolis, 09 dez. 1997.
52
religiosidade, e, dentro desse desenrolar cenogfico, a Igreja se faz detentora privilegiada
da memória e da tradição.
Frente a isso, Marilena Chauí afirma que “tomar a experiência como inicião ao
misrio do mundo significa reconhecer que o sair de si é o entrar no mundo. Resta saber,
no entanto, como e por que esse entrar no mundo é também nossa volta a s mesmos
164
.
Nesta perspectiva, a ação de sair de si mesmo e ver o outro, seja pelos artefatos construídos
pelas Irmãzinhas ou pela natureza, faz com que o visitante busque no subconsciente toda a
sua bagagem empírica e emocional que, por sua vez, volta para si, mas em nível diferente,
porque a ação de sair e retornar cria um terceiro ente (elemento). Para Ronald H. Forgus,
de modo geral, a percepção pode ser definida como o processo pelo qual um organismo
recebe ou extrai informações acerca do ambiente”
165
.
2.1 Biografia de Santa Paulina
166
A constrão do Santuário como cenografia se deu mediante o processo de
beatificação e canonização de Amabile Lúcia Visintainer, nome de batismo de Madre
Paulina do Coração Agonizante de Jesus.
Amabile nasceu aos 16 de dezembro de 1865, em Vígolo Vattaro, norte da Itália,
Provincia de Trento, que naquele tempo era região do Sul-Tirol, subjugada à Áustria.
está a casa de seus pais, Napoleão Visintainer e Ana Pianezzer, onde Amabile viveu até os
10 anos. Como quase toda a gente do paese, eram cristãos praticantes. E, como conta Irmã
Elmentrudes, nome civil Leonor Orsi oriunda de Ponta Fina - Nova Trento, que entrou na
Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição, com 10 anos de idade, em 1905.
ocupando vários cargos na congregação, e que conheceu a Santa Paulina pessoalmente:
p. 12. Ver também: ALLORDI, Ettore; BUTI, Giovanni. Storia della letteratura italiana. Firenze: Sandron,
1964. p. 158.
164
CHAUÍ, Marilena de Souza. Experiência do pensamento. In.: Obra de arte e filosofia. São Paulo:
Martins Fontes, 2002. p. 166.
165
FORGUS, Ronald H. Percepção: o processo básico do desenvolvimento cognitivo. São Paulo: EPU, 1981. p. 3.
166
Os autos pesquisados para o biografia de Santa Paulina foram: Sacra Congregatio pro causis sanctorum,
Canonizations Servae Dei Paulinae a Corde Iesu Agonizante (Amabilis Visintainer) Fundatricis parvarum
sororum Immaculatae Conceptiones: (1865-1942): Positio super vita et virtibus, Roma, 1986, vol. 2.;
MADRE PAULINA. Biografia Comentada. Vol. 1. Positio sobre a vida e as virtudes. Roma, 1986;
MADRE MATILDE. Op. cit.; MARCHIORI, Tarcísio. Op. cit.; CANDIDO, Edinei da Rosa. O milagre do
Amor: vida, milagre e beatificação de Madre Paulina. Florianópolis: Papa-livro, 1991; BARBOSA, Fidelis
Dalcin. A Coloninha. ed. São Paulo: Loyola, 1990; LORENZI, Guido. Op. cit.
53
Quando ela nasceu, era de uma família muito pobre, e o pai sempre quis trabalhar
fora aliás, como os nossos aqui, quando estavam em Trento. E quis trabalhar para
poder ganhar alguma coisa para sustentar a mulher. Eles tinham muito pouca terra,
tinha muita gente e pouca terra. Só tinha um lotezinho atrás de casa. Então ele ia
trabalhar, a mulher com a menina
167
com apenas 8 anos, ficavam em casa
trabalhando no pedacinho de terra. E aí a menina ainda trabalhava numa fábrica de
seda para ajudar a mãe. Mas o serviço dela eraescolher casulo. Porque os
casulos, quando ficam velhos, porque aborto as larvas, a larva dele começa a criar
asa, então não pode mais tirar a seda, né? Então, elas recolhiam esses casulos, ela
com duas coleguinhas. Elas iam de manhã, e a tarde ela ainda tinha a avó que ficou
doente. A mãe não dava conta de tomar conta, então ela se ofereceu pra tomar
conta da. A mãe dava sempre fazia um lanche pra ela levar para fabrica. E as
outras duas coleguinhas que ela tinha – uma era até bem conversadeira, bem
companheira dela, e uma outra que era mais pobre que ela. Então ela pegava o
lanche dela e distribuía para as outras, e ela não comia nada. E com pouco tempo, a
mãe percebeu que ela estava ficando assim, mais fraca. Então ela disse: “Esse teu
trabalho é muito pesado?” Não,e, não é pesado”, “É muito pesado para você
cuidar da minhae, vou arranjar uma senhora para tomar conta dela”. “Não mãe,
o faça isso, eu quero tomar conta da vovozinha. E a, também quando a mãe
falou, começou a chorar, e disse: “Não me tira esse anjinho daqui, porque só a
bondade dela, só o carinho dela me ajuda muito.” Então, ela ficou tomando conta
da, a que a morreu. E ai, ela cresceu um pouco, com 09 anos. Então o pai
começou a querer vir para o Brasil, ficar na esperança daqui. Mas quando ele falou
que ia sair da casa, naquele tempo ele passava mais tempo fora de casa, porque ele
queria trazer o dinheiro que possibilitasse a vinda de todos eles para cá. Apesar do
governo daqui já pagar lá a viagem, mas não dava o necessário para eles. Então ele
ficou fora uns 05 meses da última vez, e elas em casa rezando, porque aqui eles vão
trabalhar, massabem onde é, né?o, tinha que levar os apetrechos de
pedreiro para procurar serviço, e as vezes muito longe. Eno, ele ficou fora
durante 05 meses e quando veio trouxe um pouco de dinheiro mais e deu pra vir
pra cá. E elas, com outras tantas, não sei se 07 ou 08 famílias, eles resolveram
mesmo vir. Então, eles pegaram o navio e vieram até Brusque, eles atracaram em
Itajaí. Depois, em Brusque, ficaram na casa de imigrante, as crianças e as mulheres.
E os homens, num dia, iam até o lote deles, cada um tinha os seus papéis prontos
com o seu nome; mas, tinha que ir procurando no meio do mato. Eles iam
desbravando o mato com o machado, com a foice, com o facão, e iam a caça. Eles
caçavam muito, traziam do mato alguma coisa, e desbravavam o mato. Fazia um
casa de pau-a-pique cada um. Cada um fazia uma casa de pau-a-pique. E eles se
ajudavam um ao outro, e quando estava cumprido, e quando a casa ficava pronta, e
para o colchão era folhas secas no chão, né? Eles se ajeitavam e dormiam e eles
ficavam lá, né? Eles ainda plantavam milho e abóbora para quando viessem porque
o governo dava alimentação para eles até quando tivesse a primeira colheita. Eno,
eles plantavam milho, abóbora. E depois que o milho estava grande, a casa tudo,
então foram buscar as famílias em Brusque., vieram com as famílias traziam o
que podiam. Tinha que ser a pé, né? Aí, eles vieram e ficaram na sua casinha, e
depois os outros companheiros dele, que fazia os alicerces da casa que fazia bem.
Eles faziam de pedra, e cortava boa madeira e faziam o resto da casa. Então, ele
ficava trabalhando. Fez a casa dele, o alicerce, né? E os outros fizeram a parte de
167
Em 1870 existiam no Trentino 162 fiações ativas; 195 Municípios (sobre 365) são classificados “ricos”:
a mão-de-obra empregada (na sua maioria feminina) é de aproximadamente 8 mil unidades. O número das
fiações cai a 111 em 1880 e a 19 em 1892. Ver: Provincia Autonoma di trento. Colana di monografie “La
patria d’origine. Vol. 7. Gli ultimi duecento anni. Trento: Casa editrice Panorama, 1994. p. 152.
54
carpinteiro. E ele fez pros outros, até que tiveram todos suas casinhas prontas, cada
um na sua casinha. Aí, veio a tristeza deles - não tinha igreja, não tinha padre.
Vinha o padre de Brusque,[Pe. Alberto Gattone, vigário de Brusque] de vez em
quando, e tinha uma família, Dallabrida, que tinha uma senhora que mais ou
menos, sabia ler, porque professor não havia naquele tempo. Então ela começou a
ensinar as crianças, se as outras crianças queriam; mas, Amábile não havia jeito:
ela estudava, estudava, se esforçava, mas não conseguia assimilar nada, ela
conhecia todas as letras, mas não conseguia soletrar. Quando chegou aos 12 anos,
ela fez a primeira comunhão. Veio o padre, aí fizeram a primeira igrejinha que é de
Claraíba de São José, não aquela que está, mas (aquela que estava em cima do
morro, não sei se vos chegaram a conhecer). Então, ela fez a primeira comunhão
lá. E quando ela comungou, ela pediu a Nosso Senhor, e entre as outras graças que
ela pediu, ela pediu a graça de aprender a ler bastante. “Que posso fazer sem saber
ler?”. Dizem que depois da comunhão, ela foi no banco, abriu o livrinho, [Máximas
Eternas, de Santo Afonso Maria de Ligório] e leu corretamente. Aprendeu a ler por
milagre, né? Aí, ela chegou em casa toda contente assim: “Mãe, eu já sei ler!”,
“Mas, como você sabe ler, pois ontem não sabia nada e agora você sabe ler? Então,
abre o livro e lê, que eu quero ver!” Abriu o livro e leu corretamente, né? E a
coleguinha dela [Virnia Nicolodi], a Dallabrida, foi falar com o pai dela e disse
que ela teve um milagre mais ou menos assim, na Itália, né? Ela tinha 05 anos e
o podia andar. Então, a mãe contou pra ela: “A tua coleguinha também teve um
milagre” disse mais ou menos “Quando ela tinha 05 anos, não podia andar, e então
fizeram uma novena a Nossa Senhora de Lourdes, e depois que acabar a novena,
começou a andar e a correr com 05 anos”. Só que ela era gorcundinha, né? Ela
ficou desde... Até quando morreu. Mas, as duas tiveram um milagre, quase né?
Tanto a primeira, quanto a segunda. Depois, sempre com aquela idéia de ser Irmã,
mas só tinha Irmãs no Rio de Janeiro, e ela para ir até lá era impossível. E os
padres sempre diziam que iam trazer padres. Mas depois vieram os padres jesuítas.
Eles foram expulsos de Florianópolis, e então vieram se instalar aqui. E aquele
padre de Brusque já tinha arrumado uma casinha para eles, e depois eles vieram,
eles fizeram a Igreja do Sagrado Coração de Jesus, aquela primeira igreja que tem.
A primeira igreja na praça onde que mora o Zanluca.
Tinha a primeira , mas é de São Virgílio, né? A igrejinha pequena, depois que os
padres jesuítas vieram, fizeram a capela do Coração de Jesus, e foi derrubada
quando estavam fazendo uma outra. O padre só tem aqui... Eles diziam que
mandavam ela pra lá, ou traziam irmãs pra cá, mas nunca foi possível. Aí, foi indo
ela e a colega dela sempre falando nisso, rezando e pensando como é que se
podia fazer ... Eles fizeram uma igrejinha de são Jorge (esta que está agora Nossa
Senhora, mas o primeiro padroeiro foi São Jorge). Então, elas começaram a pensar:
“olha, já que não dá pra nós irmos pro convento, e as Irmãs não virem aqui, nos
retiramos numa casinha, pedimos pros pais fazer uma casinha lá na frente da igreja
pra nós, e ficamos lá, assim, né?” Então elas queriam ... Aí tinha né? Tinha uma
casinha lá, onde tem a nossa casa agora. Então, elas queriam essa casinha, porque
elas queriam entrar lá. Porque elas queriam visitar os doentes, e elas encontraram
uma doente que tinha vindo com uma família morar aqui. Dizem que era muito
ruim e era cancerosa. Então, elas foram onde estavam cuidando dela. Não queria
mais cuidar dela. “Nós pegamos aquela doente lá e tomamos conta dela. E vamos
ensinar catecismo para as crianças”. Então, a primeira vez que elas tentaram entrar
lá, uns malandros que não deixaram. Fecharam a casa e mandaram embora e não
conseguiram ficar. No dia 12 de julho, o pai da Madre Fundadora, Amabile decidiu
ir imediatamente para o casebre. Pegou o carro de boi e foi buscar a cancerosa.
Levou o filho e as duas moças. Foram lá, abriram a casa, puseram a doente dentro e
55
elas. Aí, elas ficaram tomando conta da doente; que a doente era ruim mesmo. Mas
o que elas faziam mais ela reclamava. Então, quando elas ajoelhavam para rezar,
então a doente abria a boca e começava a xingar. Mas, elas continuaram até que
conseguiram convertê-la. E um belo dia dizem que ela chamou a Amabile, e disse:
“olha, me chama o padre que eu quero me confessar, e acho que vou morrer”.
Então Amabile chamou o padre. O padre foi lá, confessou, deu a santa Unção [dos
Enfermo] e morreu contente. Chegou violenta, uns 15 a 20 dias, mas boazinha,
agora não xingava mais, morreu. E quando ela morreu, então os pais disseram:
“Agora elas vem embora, né? Não tem mais serviço lá”. Mas elas: Não. Agora
que nós estamos começando”. E começaram a ajudar as pessoas. (Teve uma outra,
o me lembro o nome dela Irmã Ines) Isso foi em 1890, e ficaram a 95 assim lá,
as ts. Quase morrendo de fome, porque os pais o queriam dar comida, porque
queriam que elas fossem pra casa; e elas insistindo que não queriam ir pra casa.
Ficaram lá, né? E aí depois veio primeiro Bispo, o Bispo de Curitiba [Dom José de
Camargo Barros]. Veio fazer uma visita e tal. E elas pensaram: “Agora nós vamos
pedir ao Bispo, pra dizer pros padres para começar a congregação”. No dia em que
o bispo veio, e o nosso padre Fundador Luiz já tinha chegado, então ele falou com
o Bispo, que pediam essas moças, que elas já estavam morando (aquela primeira
casinha). O provincial dos Jesuítas chegou, viu elas lá. Era de 24 metros quadrados
. Não tinha mais nada. Então ele pediu pro João Vale, então ele começou. Pegou
um pedacinho de terreno aí, e começou a fazer uma casa. Depois os padres foram
vindo, que o provincial mandou, comaram a enviar donativos, até que puderam
fazer a primeira casinha aí, e depois mandaram que elas viessem pra baixo [de
golo a sede do Município]. Aí quando o Bispo veio, elas já estavam morando
aqui, eles foram lá pedir pro Bispo se ele dava licença e ele olhou pra elas e
disse:que eu vou fazer com essas coloninhas que não sabem nada? Eu vou
mandá-las pra casa”. E então, ele não disse pra ir para casa naquele dia, ó disse:
“amanhã eu vou visitar vocês lá na casinha”. Quando ele chegou aí na porta da casa
pra entrar, ele teve uma inspiração: Não mande embora não, que isso é vontade de
Deus”. Aí, ele falou com elas, viu que eram moças piedosas, e tudo e então falou
que ele dava a autorização para começar a congregação. E que fizessem um hábito,
e que podia fazer uma procissão, quando elas tivessem o hábito pronto. E elas
fizeram uma bonita procissão no dia 07 de dezembro de 1895. Aí é que
começaram. Que a madre fundadora, logo em seguida
168
, ela teve um sonho, que
Nosso Senhora dizia pra ela começar a congregação, e ela não tinha coragem e
dizia sim, né? Então, na terceira noite Nossa Senhora perguntou: Escuta, como é?
Vai fazer ou não vai fazer?”. Na última noite ela disse: “Sim, minha Mãe, vou
fazer. Você me ajuda né?”. Porque eu nada sei”. Então Nossa Senhora disse assim,
ainda disse no sonho, que ela tinha muitas Irmãs pois entraram, meninas vestidas
de branco, de baixo de um parreral e Nossa Senhora dizia: “Olha, essas meninas
aqui são todas aquelas que vem te ajudar. De vez em quando ela olhava pra uma
Irmã e ela dizia: Eu te vi debaixo do parreral”. E aí conseguiu; fizeram os
primeiros votos, depois ficaram um tempo aqui [Nova Trento], ainda trabalhando
assim aqui né? Depois a madre Fundadora, chegou um tempo que ela não sabia
mais como manter as colegas, não tinha terra e nada. Então foi daqui a Brusque a
pé, pra ir lá no Renaux, pra ele mostrar os teares, mostrar as coisas né? Diz que a
senhora do Renaux ficou uns dois, três dias, e ela pegou explicação. Ela veio e
chamou o carpinteiro. Ela mostrando como devia fazer; fizeram o primeiro tear
168
Sobre a questão do sonho descrita pela Ir. Elmentrudes, há um equivoco da parte da entrevistada. Tal fato
aconteceu antes que Santa Paulina fundasse a Congregação e não depois, quando ela se encontrava na casa
paterna. O ocorrido está pintado em azulejos e edificado na rua Madre Paulina, em Vígolo.
56
assim, ela era inteligente, né?. Aí começaram a trabalhar com seda. Foi com o que
ela pode continuar, e depois – não sei quantos anos depois – nosso padre
[fundador] foi para o Paulo, transferido pra lá. E um dia estava passeando com o
provincial dele no Ipiranga, então ele tinha uma capelinha lá apadroada por São
José, então o provincial falou pra ele: "Olha que lugar bonito aqui, para suas Irmãs
virem aqui trabalhar”. Então foram à procura do dono do terreno, tudo. Era um
grande capitalista lá, tinha a intenção de fazer um asilo lá para os filhos dos
escravos. Então, ele cedeu essa capelinha, e deu um bom lote de terreno. E
começaram. E quando elas foram pra lá, no princípio não tinha nada. Elas
moravam na casa com as Irmãs do Divino Pastor, e ficaram um tempo, até que
arrumaram uma casinha lá perto. Depois passaram pra lá. Comiam em cima de
caixotes, não tinha cama, não tinha nada. Depois, um dia, o Bispo foi fazer uma
festa por lá perto; aí, apareceu uma benfeitora [Ana Brotero de Barros] e ela disse
ao Bispo: “Eu vou ajudar essas Irmãs”. Aí, ela começou a dar uniformes para as
meninas, e a madre Fundadora fez um empréstimo, e comprou uma casa aqui do
lado, que era uma casa de diversão, um baile ou cabaré. Aí, ela comprou aquela
casa e fez o primeiro asilo das meninas até hoje; as Irmãs se desenvolveram
também e fizeram uma casa e depois transformaram em colégio
169
.
Na impossibilidade de realizar sua vocação, fazendo-se religiosa no lugar onde
vivia, seguindo conselho e consentimento do Pe. Augusto Servanzi S.J, começa um
apostolado caritativo, ao se transferir para um casebre com uma companheira para assistir e
cuidar de uma desprovida cancerosa, abandonada pelos seus familiares. Isso aconteceu a
12 de julho de 1890, data que é considerada como aquela da fundação da obra de Madre
Paulina, extraordinariamente nascida e desenvolvida da e na humilde barraca. Em 1895, à
obra de Amabile Visintainer e de suas primeiras companheiras, Virgínia Rosa Nicolodi e
Teresa Maule, foi concedida a aprovação Diocesana como comunidade religiosa pelas mãos
de Dom José de Camargo Barros, Bispo de Curitiba, diocese que compreendia as Províncias
do Paraná e Santa Catarina, por ele chamada de Pia União da Imaculada Conceição.
Com a aprovação, Amabile e duas companheiras suas tomaram o nome, escolhido pela
Visintainer, de Filhas da Imaculada Conceição, segundo sonhos que Amabile tivera quando
ainda morava com sua família. Eis que Maria, sob o título de Maria Imaculada Conceição,
dava à jovem Amabile a incumncia da salvação de suas filhas, começando uma obra
170
.
Em dezembro de 1895, Amabile e as suas co-irmãs fizeram os votos religiosos,
orientados por Jestas, especialmente Pe. Marcello Rocchi e Pe. Luiz Maria Rossi, quando a
169
Orsi, Eleonor (Elmentrudes, irmã da CIIC), 66 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a Ramon
Tridapalli. Nova Trento, 16/4/1981. p. 7-13.
170
AGUIAR, José da Costa. Madre Paulina do Coração Agonizante de Jesus. São Paulo: Casa Geral, 1962. p. 27.
57
fundadora recebe o nome de Irmã Paulina do Coração Agonizante de Jesus; Virgínia recebe o
nome de Irmã Matilde da Imaculada Conceição e Teresa Maule, o de Irmã Inês de São José.
Em 1903, no primeiro Capítulo Geral da Congregação, Madre Paulina foi eleita
Superiora Geral ad vitam. Depois da primeira fase de desenvolvimento, o Instituto nascente
tinha duas casas: uma em Vígolo e outra em Nova Trento. A Superiora, no mesmo ano,
recebeu incentivos do Pe. Luigi Maria Rossi, S.J, que fora transferido para a capital
paulistana e era o padre espiritual da Congregação, chamado padre fundador, escrevendo a
Geral para que fosse para lá com algumas irmãs: Serafina da Santíssima Trindade, Luiza de
Jesus Crucificado e a postulante Josefina Pereira Gonçalves, que era brasileira. Desta forma,
fundou a sua primeira Casa de Misericórdia em o Paulo, no Ipiranga e, mais tarde, outra
em Bragança Paulista, no interior, posteriormente às de Nova Trento e Vígolo.
Em São Paulo, a fundadora governou durante seis anos quando, por motivos de
intriga interna de uma religiosa da comunidade, Madre Serafina (Linda Tomazini), e de
uma benfeitora do Instituto, Ana Brotero de Barros, Madre Paulina foi deposta do cargo de
Superiora Geral pelo Arcebispo de o Paulo, D. Duarte Leopoldo e Silva
171
. O que
observamos nos autos são duas pessoas responveis pela deposição do cargo da Geral. A
primeira seria D. Ana que, nomeada “presidente das obras da Sagrada Família”, anexa à
casa das irmãs, se intrometia no governo da Congregação e na distribuição dos cargos, e a
segunda, uma religiosa da mesma Congregação, Madre Serafina, por inveja e ciúme, e que
mais tarde saiu do Instituto recebendo a secularização.
De 1909 a 1918, trabalhou como simples religiosa, ou seja, sem direito a nenhuma
incumncia oficial dentro da Congregão, por mais ou menos nove anos, na Santa Casa
de Misericórdia (hospital) e, por oito anos, no Asiloo Vicente para anciãos, em
Bragança Paulista. o obstante a deposição, o Capítulo Geral de agosto de 1909 decretou
que à Madre Paulina fosse reconhecida, na Congregação, o título de Veneranda Madre
Fundadora. Como tal, e pelos exemplos que dava, em 1918, foi chamada pela Superiora
171
Far-se-á necessário explanar que, em 1904, Dom Duarte Leopoldo e Silva era bispo de Curitiba, vindo a
substituir D. Cândido de Alvarenga, bispo de São Paulo, falecido a primeiro de abril de 1903. E em agosto de
1906, D. José de Camargo Barros, ao regressar de Roma da Visita ad liminam, morre tragicamente no
naufrágio do navio Sírio, nas costas da Espanha. Com isto, a cátedra paulista fica vacante. A Santa Sé
transfere D. Duarte Leopoldo e Silva de Curitiba para São Paulo, tomando ele posse a 14 de abril de 1907.
No ano seguinte, 1908, São Paulo é elevada à categoria de Arquidiocese pelo Papa São Pio X. Ver: A
Arquidiocese de Cvritiba: na sva (sic) história (sic). 1956. p. 20-24. Ver também: CANDIDO, Edinei da
Rosa. Op. cit. p. 32-33.
58
Geral Madre Vincia, sua sucessora, com o consentimento do Arcebispo de São Paulo, à
Casa Madre, no Ipiranga, para escrever a história da Congregação, ali permanecendo até a morte.
Teve uma vida pessoal retirada, tecida de oração e trabalho. Nos últimos quatro
anos, ela viveu fazendo trabalhos manuais. Porém, como “Veneranda Madre Fundadora”,
muitas vezes foi colocada em destaque pela Superiora Geral, seja para cumprir o ofício de
visitadora geral, seja na ocasião do Decreto de Louvor e aprovação da Constituição,
concedida pelo Papa Pio XI em 1933, ou ainda na celebração do cinqüentenário da
fundação, em 1940. Em 1947, o Santo Padre Pio XII concedeu-lhe a aprovão definitiva
das Constituições Direito Pontifício, garantindo, assim, união com a Igreja Local e,
especialmente, com a Igreja Universal, de maneira a poder abrir casas no exterior,
conforme desejo de Madre Paulina.
A partir de 1938, Madre Paulina comou a passar por graves distúrbios em razão
da diabetes. As duas cirurgias, na primeira sofrendo a amputação do dedo e, na segunda,
do braço direito, passou os últimos meses vítima da cegueira total, vindo a falecer a nove
de julho de 1942.
Com a morte de Madre Paulina, foram atribuídos a ela muitos milagres. A Ir
lia Bastiana Cadorin, postuladora no processo de beatificação e canonização de Madre
Paulina (que atualmente postula nos casos do frei franciscano Antônio de Sant’Ana
Galvão, falecido em 1822, que poderá ser o primeiro santo nascido no Brasil), conta, em
entrevista ao jornal A Nocia, que “vários foram os milagres
172
atribuídos à Madre
Paulina, especialmente relacionados com a cura do câncer”
173
, e que ela própria foi curada
pela intervenção de sua Veneranda Madre. Um outro milagre atribuído à santa é de Ademir
Voigth que nos relata juntamente com a sua esposa Irene:
172
A palavra “milagre” traduz aproximadamente o sentido de dois termos do original hebraico e seus dois
equivalentes gregos (hb.: ‘ôt; gr.: meion; “sinal” e hb.: môfet; gr.: teras “prodígio”), e é compreendida
como uma exceção às leis da natureza, atribuída à divindade porque inexplicável de outra maneira. Para
Santo Agostinho, é aquilo que aparece com a qualidade de insólito e excede tudo o que aquele que dele se
admira, que se esperava ou que se poderia fazer (De util. cred. 16, § 34). Para São Tomas d’Aquino, o
milagre é um efeito fora da ordem habitualmente seguida nos fenômenos da natureza (Praeter ordinem
comuniter servatum in rebus: Contr. Gent. 1 III, c. 101). Ver: L. Monloubou; F. M. Buit. Dicionário Bíblico
Universal. Aparecida do Norte: Santuário; Petrópolis: Vozes, 1993. p. 522; EICHER, Peter. Op. cit. p. 552-
554.; LACOSTE, Jean-Ynes. Dicionário Crítico de Teologia. São Paulo: Paulinas e Loyola, 1998. p. 1132-
1139; ROMANINI, Vinícios. A fé que move montanhas. Terra. São Paulo, nº 12, p. 46-57, dez. 2003.
173
TERNES, Apolinario. Irmã Célia: grandes entrevistas. Especial. A Notícia. Joinville, 29 de junho de
1998. A Notícia especial. G1-G4.
59
Eu sou a Irene Vinotti, e eu acompanhei ele na doea dele, então a hora
que ele entrou no quarto, entrou pra ser operado na sala, então a doutora
Andréia falou pra mim assim: ‘olha, dona Irene, euo sei se ele vai pra
UTI, porque eu não sei se ele vai pro quarto, porque o estado dele não é
muito bom’. Daí ela saiu da cirurgia, ela disse pra mim: ‘Irene, euo sei,
mas o teu marido tá nota 10, não precisa ir pra UTI, não precisa nada’. Ele
tava numa sala isolada, com o terço da Madre Paulina, eu disse pra Madre
Paulina: ‘Olha, vou deixar nas tuas os, que você sabe o que faz. E
quando ela saiu ela me abraçou assim, sabe, a doutora, ela disse: ‘Irene, eu
o sei o que te contar, eu não sei’. Não, nada, nada, nada, nada. Só a
cirurgia mesmo, sem remédios, sem quimioterapia, sem radioterapia, sem
nada. Simplesmente só aquela cirurgia. Era um câncer que travava a
garganta em cima
174
.
Como essa, muitas outras graças foram atribuídas a ela e provas disto se acham na
Casa das graças através de símbolos como placas de agradecimento, cruzes e fotografias
que representam, de uma forma ou de outra, as graças recebidas pelos devotos.
Com o passar dos anos, depois de 1950, sob o governo da nova Superiora Geral,
Madre Clarice Maria de Jesus Crucificado, iniciaram-se os trabalhos para o Processo
Informativo, começando pela biografia, dado que a Fundadora, em vida, gozava de
veneração, e que, sobretudo na morte, e depois da morte, a fama de sua santidade aumentou.
Para a realização do culto de um santo é necessário levar em consideração a
aprovação da igreja, a qual se dá mediante os seguintes critérios: coleta das atas sobre a
vida e milagres; juízo eclesiástico sobre a vida e milagres; transladão do corpo.
A primeira biografia de Madre Paulina foi escrita em 1962, pelo padre Jesuíta José
da Costa Aguiar e, no ano de 1965 – ano do centenário de nascimento – foi iniciado, na
Cúria Metropolitana de São Paulo, sob o governo do Cardeal Agnello Rossi, o Processo
Informativo sobre a Vida e Virtudes da Serva de Deus, sendo assinado o Decreto da
Constituição do Tribunal da Causa de Beatificão e Canonização da Serva de Deus Madre
Paulina do Corão Agonizante de Jesus. Em maio de 1966, na cidade gcha de Santa
Maria, instala-se o segundo Tribunal do processo, sob a presidência de D. Luís Vitor
Sartori, bispo diocesano e, no mesmo ano, na cidade de Itajaí, o terceiro Tribunal, sob a
presidência de D. Afonso Niehus, Arcebispo de Florianópolis.
A exumação ad hoc dos restos mortais da Madre aconteceu a trinta e um de maio de
1967, nas presenças das autoridades da Igreja e do Instituto Médico Legal, I.M.L., de o
174
VOIGTH, Ademir. 48 anos. Indaial-SC. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova Trento,
17/09/2005. p. 2.
60
Paulo. Nesta data, foram trasladados os seus restos mortais do Cemitério do Santíssimo
Sacramento à casa Geral da Congregação, no Ipiranga. Em 1984, foi iniciada a preparação
de três documentos: o Summarium, a Positio e o Informatio
175
.
Na Cúria Episcopal de Tubarão foi instaurado um outro processo Informativo, em
1985, em rao do milagre ocorrido com a senhora Eluiza Rosa de Souza, moradora de
Imbituba, Sul de Santa Catarina, em 24 de setembro de 1966. Desenganada pelos médicos,
foi curada de hemorragia causada por uma curetagem realizada em função de uma gestação
de risco em que o feto morreu no ventre da mãe. A recuperação da parturiente se deu
mediante a intercessão de Madre Paulina. O fato foi instantâneo, perfeito e duradouro, de
forma a ser considerado milagre. A graça alcançada foi comprovada cientificamente pelos
peritos médicos legais, provando a veracidade do ocorrido à senhora Eluiza.
No ano de 1988, foi proclamada solenemente a heroicidade às virtudes
176
de Madre
Paulina pelo então Papa João Paulo II, recebendo, assim, o título de Venerável. Com a
comprovação do primeiro milagre, passa de Venerável para Bem-aventurada, marcando,
desta forma, a sua entrada no calendário litúrgico, na data de 09 de julho.
No dia 18 de outubro de 1991, em Florianópolis, capital do estado de Santa
Catarina, durante a segunda visita ao País, o Sumo Ponfice, João Paulo II, proclama
oficialmente “Bem aventurada” a Serva de Deus, Madre Paulina do Coração Agonizante
de Jesus, levando-a à veneração universal. Esta vinda seria importante para a Igreja do
Brasil, dando visibilidade a ela através do seu representante maior com um megashow,
exaltando o catolicismo. É interessante ressaltar o fato de que as beatificações o
realizadas, geralmente, no Vaticano, sendo o caso de Madre Paulina raro, o que nos leva a
perguntar se aqui não fica evidente a preocupação da Igreja em manter os seus fiéis unidos.
Em entrevista a um jornalista, a irmã Célia B. Cadorin relata que o fato de Madre Paulina
175
Summarium é um elenco dos depoimentos das testemunhas dos dois processos, o Informativo ou
Ordinário e o Cognicional ou Apostólico, apresentado ordenadamente. Positio, por outro lado, é uma
biografia documentada cronologicamente, que constitui a vida terrena do Servo de Deus em todas as suas
circunstâncias. E o Informatio é a apresentação das suas virtudes, delineando o seu perfil espiritual. Cf.:
CANDIDO, Edinei da Rosa. Op. cit. p. 72.
176
A heroicidade de Madre Paulina está ligada à comprovação das virtudes teologais: Fé, Esperaa e
Caridade; às virtudes cardeais: Prudência, Temperança, Justiça e Fortaleza; e como religiosa, aos Conselhos
Evangélicos: Pobreza, Castidade e Obediência, prometidos na Profissão Religiosa. Com isto, Madre Paulina
pode ser apresentada como exemplo de humildade para os cristãos.
61
foi bastante incomum, pois um mesmo Papa aprovou as virtudes heróicas em 1989,
beatificou-a em 1991, comprovou o segundo milagre em 2001 e canonizou-a em 2002. Em
suas palavras este é o Papa de Madre Paulina”
177
.
Conforme nos relata Ana Ester, cuja religião é Anglicana, embora não praticante, ela
foi à cerimônia de “beatificação para assistir [...] ah, pela importância da figura dele pra
história mundial, porque mesmo eu não sendo católica o país é católico e influencia na minha
vida. Então assim, pela importância histórica do Vaticano”
178
. Como acabamos de ver, a
influência do Papa atinge uma grande gama de pessoas, pelo efeito da sua representatividade
como chefe supremo da Igreja Calica e do Estado do Vaticano, e além de Supremo Pontífice
da Igreja Universal ele acumula os títulos de Bispo de Roma, Primaz da Itália, Arcebispo e
Metropolita da Província Romana e Patriarcado do Ocidente. A celebração da Beata, “com
sessenta mil pessoas”
179
, aproximadamente, se deu em razão da interferência da Conferência
Nacional dos Bispos do Brasil, CNBB, em assembia anual, em 1987, tendo sido enviadas
cartas para o Vaticano pedindo que a cerimônia fosse realizada em território brasileiro.
Faltava o último milagre para que a Beata fosse declarada santa pela Igreja quando,
em 1992, Ilza Bruna Vieira, do estado do Acre, nasceu com meningoencéfalo celeoccipital
inflamação que atinge uma membrana do cérebro. Ela chegou a ser desenganada pela
equipe médica quando o padre Alécio Azevedo foi chamado de Rio Branco às pressas para
batizar a menina. O bebê foi para a sala de cirurgia e, com a invocação do nome da Beata
pelo padre e pela avó, foi operada com sucesso. Recuperou-se e cresceu, desenvolvendo-se
como uma pessoa normal. Segundo análises dos médicos, somente dois por cento se
salvam, mas deixam seqüelas irremediáveis como loucura, surdez, cegueira e tantas outras.
A Igreja reconhece o milagre de Ilza oficialmente em 2001, sendo sancionado por João
Paulo II. A sua canonização foi realizada durante a celebração eucarística no Vaticano,
pelo mesmo Papa que a proclamara Beata, tornando-a a primeira Santa em terrae Brasilis.
Graças se avolumam, mesmo depois da canonização, naturalmente sem passar pelas
comissões de estudos do Vaticano, órgão responvel por dizer se são vedicas ou não
muitas das graças concedidas por Santa Paulina em Santa Catarina e pelo Brasil afora. São
177
O Município. Homenagem à Irmã Célia Cadorin. Brusque, 12 jul., 2002. Nova Trento, Destaques, p. 10.
178
PITHAN, Ana Esther Balbão. 40 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do Nascimento.
Florianópolis, 04/06/2005. p. 2-3.
179
XU, Daniela. João Paulo é eterno: legado político. Diário Catarinense. Florianópolis, 04 abril 2005.
Caderno especial. p. 13.
62
vistas como ‘verdadeiros milagres’, o que se observa pelo grande fluxo de flores deixadas
no Santuário,na casa das graças”, onde ficam as placas, fotografias e muletas, deixadas
ali como sinal de graça recebida, e pelas queimas de velas e pelos depoimentos de cura de
toda a espécie. Deste modo, a construção da imagem da primeira Santa do Brasil faz do
complexo e da religo uma grande cenografia a ser visitada.
A fé em Santa Paulina manifestada em agradecimento por uma graça alcançada
Fonte: Arquivo particular de José do Nascimento
2.2 A cenografia do santuário
É este o desenrolar constante que se vê introduzido no mundo da cenografia
religiosa e, conseqüentemente, do espetáculo, a quem nele tenha real interesse. E, nesse
espaço cênico, considerado como atmosfera que atua na percepção humana, o poder
constituído da Igreja Calica, e a política governamental, estadual e municipal, geram esta
possibilidade. Em Santa Catarina, o turismo começou a ser discutido pelos governantes a
partir do início da década de 1980, quando passou a ser considerado um novo filão
ecomico, uma indústria plena de possibilidades
180
.
180
Meri Frotscher afirma que, após a enchente que assolou o Estado em 1983, inundando mais de 100 cidades,
o Governo investiu no turismo como forma de reanimar a economia e recuperar as expectativas da população
assolada pela catástrofe. Ver: FROTSCHER, Meri. Etnicidade e trabalho alemão: outros usos e outros
produtos do labor humano. Florianópolis: 1998. Dissertão (Mestrado em História – UFSC).
63
Na falta de um planejamento ordenado que estabelecesse uma oferta turística
sincronizada com o mundo contemporâneo, as melhorias e divulgações partiram da
valorização da natureza e da população catarinense. Esta passou a ser exaltada nas suas
múltiplas culturas, enfatizando-se, assim, a característica de ser catarinense como parte do
contexto mundial, enquanto descendente de grupos europeus e, como tal, propagador das
suas culturas. (Re) descobrindo a “europeidade, Santa Catarina se prepara para receber os
cidadãos do mundo. A partir de então, políticos e empresários passaram a valorizar cada
vez mais o potencial dessa atividade como incentivo para um maior desenvolvimento do
Estado. Em 2002, ano em que a Beata Madre Paulina seria canonizada no Vaticano, o
então governador Esperidião Amin “cobrou dos órgãos envolvidos na organização da
Comissão Governamental de Acompanhamento e Implementação do Plano de Turismo
Religioso – Madre Paulina maior empenho para que os visitantes levassem uma boa
imagem de Nova Trento e do Estado”
181
.
No plano de governo de Esperidião Amin, em 1983, o turismo foi incluído como
fonte de renda sustentável para a população abalada pelas enchentes e como um meio para o
Estado ser conhecido nacional e internacionalmente. Daquela data em diante, governadores
como Pedro Ivo Campos, Paulo Afonso Vieira, o próprio Amin e o atual dirigente do estado
de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira, priorizam essa atividade, buscando a força
representativa que ela oferece. Oficializando o Santuário, foi outorgado pelo então
Governador Paulo Afonso Vieira o decreto Lei nº 10.568, de sete de novembro de 1997, pelo
projeto de Lei nº PL/ 0245.0/97, do Deputado Estadual Pedro Bittencourt, com a ementa que
reconhece o Município de Nova Trento como estância turístico-religiosa.
A Igreja Católica, através do seu representante local, naquele momento o Arcebispo
Metropolitano de Florianópolis Dom Eusébio Oscar Scheid, SCJ, em 19 de março de 1998,
eleva a Capela Reitoria a Capelania Especial sob o título de Nossa Senhora de Lourdes
com o reg. nº 046/97 L. Prot. 16. E, no mesmo ano, com decreto reg. 152/98 L. Prot.
nº 17, concede-lhe a categoria de Santuário Santa Paulina, em 05 de junho.
Somos conduzidos então a laar os olhares no espaço eleito para que nele aconteça
a admiração, a que se quer assistir e participar, a uma fé que se descobre ou se materializa
naquilo que já se tem representado dentro do subconsciente de cada um. Na fala de Dom
Murilo S. R. Kriger, SCJ, arcebispo de Florianópolis, questionado sobre a importância do
181
SABINO, Débora. Amin apóia turismo religioso. A NOTÍCIA. Florianópolis, 1/5/2002. Geral, A6.
64
Santuário como local fixo para a veneração de Deus na pessoa de Santa Paulina no
contexto da modernidade:
[...] Mas, por sermos criaturas humanas, dependemos de nossos sentidos. E
justamente nesta época que alguns já chamam de hiper-moderna, mais
importantes são os sinais (veja-se a impacto que têm em nossa sociedade a
griffe, a moda, a logomarca, o símbolo, o visual, etc.). É verdade que Jesus
disse a Nicodemos que “vem a hora em que nem nesta montanha, nem em
Jerusalém adorareis o Pai... Vem a hora, e é agora, em que os verdadeiros
adoradores adorarão o Pai em espírito e verdade. Estes são os adoradores
que o Pai procura” (Jo 4, 21-24). Certamente, para muitos essa hora já
chegou, dando o seu amadurecimento na fé. Mas não podemos esperar isso
de quem ainda não amadureceu suficientemente nela
182
.
Segundo Gianni Ratto, “a tetica do ver, portanto, é fundamental para intuir.
Intuir para deduzir, para descobrir e interpretar”
183
. Nesse contexto, o Santuário vem
materializado, assim como construções, tais como, outrora, a Casa Paterna de Santa
Paulina, e, mais precisamente, na que ela viveu dos dez aos vinte anos. Nesse local,
Amabile foi chamada porMaria Imaculada, graças a uma série de sonhos
184
, os quais
atualmente estão pintados em painéis de azulejos, marcando, desta forma, o primeiro
monumento das dependências do Santuário, inaugurado em sete de julho de 1965. Em
frente a esse conjunto está uma torre, no meio da qual está o busto da Veneranda
Fundadora e, no alto, a estátua da Imaculada Conceição.
O pedido de Nossa Senhora para que Amabile desse início a uma obra
evangelizadora e de assistência aos mais necessitados, doando-se “no serviço aos
desprovidos, na catequese e no cuidado aos enfermos, numa atitude constante de busca da
vontade de Deus
185
, logo em seguida veio a concretizar-se na Congregação das
Irmãzinhas da Imaculada Conceição. Transitando pela Rua Madre Paulina, observamos as
residências e as casas comerciais, em pleno desenvolvimento, vendendo artefatos
religiosos, artesanatos e produtos típicos da rego e de fora dela.
182
KRIGER, Dom Murilo S. Ramos. Questionário. [e-mail de Dom Murilo S. R. Kriger, SCJ]. Endereço
eletrônico: dom.murilo@arquifloripa.org.br. 27/9/2005. p. 2.
183
RATTO, Gianni. Antitratado de cenografia: variações sobre o mesmo tema. São Paulo: SENAC. 2001. p. 25.
184
LORENZI, Guido. Madre Paulina: entre carisma e obediência. o Paulo: Loyola, 2001. p. 38.
185
CONSTITUIÇÕES E DIRETÓRIO: Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceão. Op. cit. p. 13.
65
Primeiro monumento comemorativo aos 100 anos da fundação da CIIC.
Neste local ficava a casa paterna de Santa Paulina. Venda de objetos religiosos em golo.
Fonte: Arquivo particular de José do Nascimento
A senhora Lurdes Pianezzer, moradora do bairro de golo, conta que “pro lugar
aqui nosso, aqui é munipio de Nova Trento, mas aqui se chama Vígolo, aqui foi um
grande milagre que deu. Porque meu Deus do céu olha que a gente daqui melhorou
bastante. Melhorou bem de vida, saiu muito emprego, surgiu muito emprego pros nossos
aqui. Isso ali mil maravilha
186
. Ladeiam a estrada roças de mandioca, milho e vinhedos.
No prosseguir da caminhada, vê-se a Escola Municipal, atendendo, assim, a educação dos
vigolanos e fazendo parte do palco do Santuário presente na comunidade antes mesmo do
nascimento da entrevistada, que conta:
A minha vida foi sofrida. Que nem eu, de oito anos, eu já tava na roça. De
oito anos tava na roça, ajudando meu pai ajuntar capim pras cabras, aquela
época a gente tinha cabra [risos]. De manhã nós vinha pra aula aqui, e de
tarde a gente ia com os balaios, pegava esses balaios feitos de cipó, essas
186
PIANEZZER, Lurdes Vinotti. 64 anos. Vígolo. Entrevista concedida a Karine Simoni. Nova Trento,
04/06/2005. p. 2.
66
coisas, arrastando, porque a gente era pequeno, não tinha foa, ajuntando
capim pras cabras, e por aí assim
187
.
Como outras crianças, a senhora Lurdes Vinotti Pianezzer concebia a sua função
como aquela ligada não somente ao serviço dostico - arrumar a casa, cuidar da roupa -,
mas também cortar capim para as cabras. Para ela, ir à escola seria mais um descanso físico
e uma maneira de fugir dos trabalhos agrícolas, embora sabendo que, ao chegar em casa,
teria que trabalhar na roça e na colheita de ração para os animais, todos os dias. Assim,
identificava-se tanto como estudante quanto trabalhadora em serviço mais braçal, porque ir
à roça era uma função masculina, visto que da lavoura provinha o maior sustento da sua
família. Ela nos conta que a sua vida era
sofrida, sofrida. Olha, eu trabalhava, na época do meu pai nós fazia farinha,
meu pai levava ali na qual que tem aquele restaurante, tinha o engenho das
irmãs, e daí eu me lembro que o meu pai e a minha mãe eles vinham ali
pras duas horas da madrugada vinha rapar a mandioca. Botava nesses
rapador, tocado à água, essas rodas, então eles rapavam essa mandioca
188
.
Dada a necessidade de mão-de-obra, a entrevistada participava ativamente das
funções masculinas, juntamente com sua mãe. Desta forma, a jornada começava antes do
nascer do sol “ali pras duas horas da madrugada
189
, evidenciando uma orientação econômica
que se regulava não pelo horário, mas pela quantidade das tarefas executadas no dia.
No relato da senhora Lurdes, como trabalhadora de sol-a-sol, sede longe
descortinar “o caráter arquitetônico do Santuário de Santa Paulina retratando a essência de
sua trajetória, mulher simples de valores sólidos e puros e de imensa espiritualidade e
bondade”
190
. Este tem capacidade para três mil pessoas, enquanto a capela de Nossa
Senhora de Lourdes pode obrigar apenas 120.
A construção era mantida em união com o Estado e a Congregação das Irmãzinhas
e aparentemente por dois motivos a Comissão Governamental de Acompanhamento e
Implantão do Plano de Turismo Religioso – Projeto Madre Paulina
191
se desfez. O
187
Idem, ibidem.
188
Idem, p. 2.
189
Idem, Idem.
190
Disponível em http:/www.santuariosantapaulina.org.br/projeto.htm. Acesso em 29/10/2004. p. 2. Ver:
SANTA PAULINA DO CORÃO AGONIZANTE DE JESUS. Op. cit. p. 38.
191
Ver no anexo 1 as atas das reuniões.
67
primeiro foi que o ex-ministro, Rafael Greca, e o governador, Luiz Henrique, apresentaram
um projeto no qual havia, abaixo do santuário, um centro de eventos. O segundo é que não
levaram em conta o plano geral de edificação inicial elaborado há mais de dois anos pelas
religiosas
192
. Com isto, a presença do Estado é nula nas melhorias das dependências do
Santuário, principalmente das vias de acesso, e do policiamento, o que faz com que em
dias de grandes movimentações o local fique intransitável.
Chegando ao dito monumento, no centro de Vígolo, pode-se encontrar um
estacionamento para os veículos motorizados; um ambulario para os primeiros socorros
dos transeuntes; a escadaria; a passarela, com cumprimento de 176,58 metros, ou 202
passos de largura de 3 metros; e outros acessos oriundos dos monumentos comemorativos,
utilizados por veículos, destinados para as ocasiões especiais e para uso de portadores de
deficiência física. A escada tem início na praça/estacionamento, levando até o hall do Santuário.
a passarela tem início na pra central, onde se encontra o antigo “casebre” no
qual morrera a cancerosa Lúcia Ângela Viviani Zoner, denominado ospedaletto San
Vigilio, ou seja, hospitalzinho São Virgílio. É exatamente nesse lugar que se iniciou a obra
de Santa Paulina, em 12 de julho de 1890, ao lado da casa das Irmãs e da Capela feita pelos
primeiros italianos que chegaram da Itália em 1875, dedicada ao Jorge, e que, mais
tarde, com a chegada dos padres Jesuítas, foi ampliada e dedicada a Nossa Senhora de
Lourdes, sendo visitada pelos padres quase todas as semanas. A mudança toponômica foi
feita a pedido dos padres jesuítas, está ligada às aparições de Nossa Senhora, em Lourdes,
na França e se constitui numa intervenção divina que vem confirmar o dogma da
Imaculada Conceição, proclamado em 1854. Tamm há a Gruta com o mesmo nome da
mãe de Jesus, que fora construída em 1876.
192
Município Dia-a-Dia: Especial 50 anos. Basílica de Santa Paulina: Gera polêmica entre lideranças e
comunidade em Nova Trento. Brusque, 26 jun. 2004. p. 73.
68
Passarela que leva ao Santuário de Santa Paulina
Fonte. Arquivo particular de José do Nascimento
Réplica do casebre onde Santa Paulina teria iniciado a sua obra.
Fonte. Arquivo da Secretaria do Turismo de Nova Trento.
No interior da Igreja uma relíquia: o osso do braço amputado da Santa Paulina.
As outras partes do esqueleto eso em São Paulo, na Casa Geral, e se pressupõe que, com
a finalizão da construção do Santuário, essas relíquias virão transladadas para a sua
69
morada definitiva. Desta forma, a antiga capela e o novo monumento se unem por meio da
passarela e da escada, ligando o palco da nova construção que desponta em meio a uma
colina verdejante. Como bem observa Peter Burke, “para entender qualquer item cultural
precisamos situá-lo no contexto, o que inclui seu contexto físico ou cenário social, público
ou privado, dentro ou fora de casa, pois esse espaço físico ajuda a estruturar os eventos que
nele ocorrem”
193
.
Como se pode observar, na utilização da escada e da passarela, essas elevam e
transportam do plano terreno para o plano do sobrenatural, tendo as duas o mesmo objetivo
de ser passagem, seja como processo indutivo para a purificação pela presença de algo
Maior, seja como simplesmente apreciação da natureza por outro plano, um bel vedere a
mais que se mostra aos turistas, pelo menos para aqueles que não têm o objetivo espefico
de alcançar graças. Pois um não crente poderia passar por todos os territórios sagrados
apenas como turista, visitando uma igreja e apreciando a beleza interior dos complexos
construídos e a da natureza como se apresentam aos seus olhos. Pode-se, assim, visitar os
monumentos providos de sacralidade, tais como a basílica de São Pedro, os afrescos de
Michelangelo na capela Sistina, as ruas de Assis trilhadas poro Francisco, o santrio de
Santa Paulina ou os monumentos do mundo criso no Oriente Médio, pelos quais reza a
tradão que Cristo tenha passado.
Ainda assim, o turista seria apenas um a mais que passa e visita o local. Mesmo que
nestas viagens fossem feitas compras de produtos religiosos, não se fosse a nenhum local
profano, não se ouvisse outra música que não a sacra, ainda assim ele seria apenas um
turista. Porque ele não crê, pelo menos não a ponto de imaginar que se pedisse uma graça
esta seria concedida, ou a ponto de pensar que ele tivesse a obrigação de agradecer ao
transcendental porque algo de bom aconteceu, ou porque nada de ruim aconteceu. Não
tendo, não seria um peregrino, mas sim um turista. Um turista maravilhado, por certo,
pom, apenas um turista.
A escada é, todavia, mais exigida pelos devotos, cuja subida pode ser feita a pé ou
de joelhos, o que se constitui em instrumento de execução, a saber, mais rígido, por um
esforçosico e penitencial. Pom, ainda no nível terreno, acompanha-se o aclive saindo
do pressuposto que, da praça, se eleva do mundo sensível à esfera sobrenatural, ou seja, ao
mundo inteligível, enquanto que a segunda oão, que é a passarela, embora construída de
193
BURKE, Peter. Op. cit. p. 162.
70
maneira um tanto quanto igual à primeira, não acompanha, contudo, o nível geográfico do
terreno, que é irregular. Ela vem apoiada por colunas fincadas no solo e, com isso, se faz, o
elo entre a aspiração humana e a procedência Divina.
A escada que leva ao Santrio de Santa Paulina: símbolo da asceno
Fonte. Arquivo particular de José do Nascimento
A ascensão, realizável inconscientemente, da purificação sob essa ótica, leva o
passante a ser orquestrado, iluminado, e eleva os instrumentos de fé que o conduzem até lá,
numa economia de expressão a qual o santuário está pronto para oferecer, como espaço de
concentração e de elementos que construirão a presença de Deus em sua vida. Embora a
eminente onipresença do Altíssimo, há locais privilegiados em que Ele se manifestou e se
faz conservar
194
. E há, ainda, o sentido dos pitagóricos, pelo qual o homem, para se salvar,
deve identificar-se com o divino, eliminando de sua vida todos os conflitos
195
. No estudo
durkheimiano se mostra que o culto possui a função primordial de estreitar os laços que
194
ROSENDAHL, Zeny. Espaço e religião: uma abordagem geográfica. Rio de Janeiro: UERJ, NEPEC,
1996. p. 27.
195
ABRÃO, Baby; COSCODAI, Mirtes (org.). Hisria da Filosofia. São Paulo: Best Seller, 2002. p. 28.
71
unem o fiel ao seu deus. Com isso, cada ser humano vivencia seu espaço sagrado de
maneira íntima ou externamente, de modo que corresponda aos seus anseios e objetivos.
Outros elementos representativos da cenografia religiosa são: os Marcos da
Beatificação; o Marco à passagem do Milênio; o Museu Colonial (com ferramentas e
equipamentos utilizados pelos imigrantes); o Marco da Canonização (ermida Santa
Paulina); a réplica do interior e da fachada do casebre, onde outrora nascera a
Congregação; a Colina de Madre Paulina, onde foi edificada uma imagem de bronze da
religiosa tendo numa mão uma enxada e na outra um crucifixo – representado, assim, o ora
et labora, ou seja, oração e trabalho; as Lojas, os Restaurantes e o Galpão do Santuário; a
Cruz da beatificação em ferro; a Capela Nossa Senhora de Lourdes
196
.
A representatividade dos elementos identitários acima foi construída para
identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma determinada realidade
social é construída, pensada e dada a ler
197
. Esses elementos são figurações do real: um
novo olhar. Como relata Sônia Mara Pedroti, balconista na loja de artigos religiosos das
Irmãzinhas no Santuário,
Porque são monumentos assim, eles têm um significado cada um. Tem o
monumento do milênio, que foi a passagem de mil anos, a cruz que o papa
rezou a missa, que tava abandonada em Floriapolis, elas trouxeram,
restauraram, entãoo coisas que marcam a vida nossa, do cotidiano, mas
foram abandonadas pelo governo. E elas recuperaram. E os monumentos
aqui são uma opção para os peregrinos verem, temos aqui, não sei se tu
visse, o presépio movimentado, que é contando a vida dela em
bonequinhos, então a passagem dela desde a Itália até quando ela foi
deposta do cargo dela. Então se tu vêo coisas da vida dela, como o
museu, como os italianos viviam, a rotina deles, então é tudo dentro do
contexto da Santa Paulina. Eu acho que é bom, porque se uma pessoa, um
peregrino vem aqui, lógico que eles querem rezar, mas também querem
olhar alguma coisa que mostra a vida dela, o que ela fez, por que ela se
tornou santa, então tu tem que ter alguma coisa pra mostrar pra eles, como
os livros. Então eles vão conhecer, eles ouviram falar, muitas pessoas
chegam aqui e dizem ‘ouvi falar mas euo sei a vida dela’. Então aqui
com os monumentos tu pode saber um pouquinho de cada coisa
198
.
196
Ver no anexo 3 uma lista dos monumentos constrdos pelas Irmãzinhas.
197
CHARTIER, Roger. A história cultural: entre práticas e representações. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil,
1990. p. 17.
198
PEDROTI, Sônia Mara. 38 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova Trento,
17/09/2005. p. 3.
72
A cenografia do Santuário não reivindica para si o estatuto de arte autônoma, pois
o construções distintas que obedecem às diretrizes dos monumentos católicos, a saber,
dos cem anos do nascimento da Congregação das Irmãzinhas da Imaculada Conceição, em
1990, e dos anos subseqüentes à beatificação. Esta foi realizada em Florianópolis, em
1991, pelo Papa João Paulo II, e a canonização, em 2002, pelo mesmo Papa, no Vaticano da
Santa.
O espaço sagrado manifesta-se sempre como uma realidade de ordem inteiramente
diferente da do cotidiano, porque é transportada para dentro da “realidade” sacral, com a
qual se parece e na qual concretiza a situação desejada. Segundo Regina Aparecida C.
Marcon, ela encontra essa sacralização na “natureza, a paz que a gente encontra aqui, o
trabalho que os funcionários e as irmãs fazem [...] eu encontro essa religiosidade aqui, fico
pensando como que uma mulher tão simples, com o seu trabalho conseguiu fazer tudo o
que conseguiu
199
.
Émile Durkheim, que publicou em 1912 a obra As Formas Elementares da Vida
Religiosa, comenta que é preciso conhecer a religião nas suas origens, na sua menor
proporção, no seucleo original, para que seja possível compreender como ela se expandiu,
se tornou complexa e diversificou. O que fez desse livro um cssico foi a fundamentação -
por ele perseguida - da reciprocidade entre religião e sociedade, bem como a definição,
depois universalmente acolhida, dos conceitos de sagrado e profano, cuja distinção permite
identificar um específico religioso, dotado de certa autonomia expressiva, sendo o sagrado
prescrito e exaltado pela garantia divina. Nesse sentido, a religião é uma representação
simbólica da consciência coletiva que toma conta do indivíduo, suscitando nele um
sentimento de submissão à religiosidade expressa através da oração e do rito. Esse autor
aborda as origens sociais e cerimoniais, bem como as bases religiosas, como um conjunto de
superstições das quais os homens se libertariam desenvolvendo seus conhecimentos,
mostrando que o fato religioso é uma das bases essenciais da sociedade. Seu principal
problema era encontrar novas formas de participação social que integrassem os indivíduos na
ordem social, de forma que, saindo de si para o grupo, se sobresssse o grupo e,
conseqüentemente, o indivíduo enquanto integrante do todo.
199
MARCON, Regina Aparecida C. 42 anos. Campo Largo-PR. Entrevista concedia a José do Nascimento.
Nova Trento, 04/06/2005. p. 2.
73
Mircea Eliade procura, no seu livro O Sagrado e o Profano, a essência das
religiões, sendo o seu conceito de sagrado e de profano autônomos em relação ao sistema
da sociedade durkheiminiana. Esse autor acredita que, de tudo o que se destaca do lugar
comum e da rotina, nem tudo que se destaca espacialmente é espaço sagrado e nem toda
interrupção da rotina é um espaço revelado
200
. É o homem quem constrói o cosmos e o caos,
isto é, o mundo dos arquétipos, como quadro de referência de sua vida. Então, é possível
distinguir dois aspectos fundamentais no Santuário: o “ponto fixo” e o seu entorno – o que, na
linguagem gestaltista, se refere à problemática da figura e do fundo, em que ambas coexistem e
interdependem para justificar as suas exisncias. No primeiro, o ponto fixo, as formas
espaciais existentes cumprem funções que estão diretamente associadas à hierofania,
materializada na imagem da santa ou no objeto milagroso. No segundo, o entorno, este possui
os elementos necessários aos transeuntes, viabilizando as práticas e o roteiro devocional.
Com isso, as coordenadoras do Santuário, percebendo que essas representações se fazem
necessárias para preencher e enriquecer um espaço vazio, constroem cenografias, empoderando-
as para que possam, assim, melhor refletir o sagrado. Expondo a natureza cenogfica com esse
olhar feminino que surge num momento oportuno – cito os eventos e celebrações eucarísticas
realizadas no localdepois da emancipação da mulher, as freiras se tornam o primeiro grupo do
sexo feminino responsável por uma administração interna e externa de um santuário no Brasil.
Este fenômeno não é exclusivo à Igreja Católica, pois calcula o sociólogo Ricardo Mariano que
dois terços dos adeptos de seitas no Brasil são mulheres
201
.
2.3 Trajetórias de empoderamento: peregrino e turista
As categorias peregrino e turistao utilizadas, nesta dissertação, para referir-se
aos passantes/transeuntes/visitantes. Uma vez que se baseiam em “um olhar meu”, deverão
ser então relativizadas. Como é mister do historiador, que imprime um olhar à realidade
passada ou presente, devemos tamm levar em consideração o modo como os sujeitos da
história pensam acerca de si mesmos.
Em termos etimológicos, peregrino vem do substantivo latino peregrinatio
viagem em terra estrangeira – uma prática devocional que consiste em se dirigir
coletivamente ou individualmente a um lugar sacro com o intuito de realizar atos
200
ELIADE, Mircea. O Sagrado e o Profano: a essência das religiões.o Paulo: Martins Fontes, 2001. p. 17.
201
PERES, Andréia. O estranho poder das seitas. Claudia. São Paulo, 12. p. 38-44, dez. 1996.
74
penitenciais
202
. Já turismo significa, segundo Trigo, “um meio um pouco mais ‘real’ de
desfrutar o mundo. Pode-se viajar, ver coisas especialmente produzidas para causar
instante de prazer aos sentidos hiperexcitados por milhares de impulsos cotidianos”
203
.
O peregrino católico, por sua vez, mantém uma relação de respeito com a tradição.
Por ela se entende o catolicismo tradicional, no qual a Igreja baseia todo o seu magistério,
tanto que, de certa maneira, tenta alavancar-se a partir da sua construção de religiosidade
popular, que perpassa pelo seu íntimo, provendo e dando sustentamento espiritual aos seus
fiéis como, por exemplo, faz o pelicano na falta de alimento, dando para os seus filhotes o
seu próprio sangue para mantê-los vivos. Entretanto, Dom Murilo comenta que a
Nossa vida é marcada por modelos, a quem seguimos consciente ou
inconscientemente. Tais modelos podem ser nosso pai, nossa mãe, um
vizinho ou um conhecido qualquer. A verdade é que, com suas palavras ou
com o testemunho de sua vida, iluminam nossa própria vida. Tal ou tais
pessoas se tornam paradigmas para nós: nós as admitimos; queremos
conhecê-las sempre mais; e vibramos com cada nova descoberta que
fazemos a seu respeito. Para muitos, essa pessoa tem sido Santa Paulina.
Após terem lido um livro sobre ela; um depoimento que deixou; uma carta
que escreveu; ou depois de ouvir falar de sua dedicação, orientação geral
de sua vida ou de um determinado comportamento numa situação concreta,
acabam dizendo para si mesmos: Gostaria de ser como ela; de fazer o que
ela fez; de imitá-laque, certamente, muito agradou a Deus”. Assim,
muitas jovens entram para a Congregação que fundou; outras, a imitam nos
mais variados estados de vida
204
.
Muitos desses visitantes admitem serem católicos não-praticantes, dando-se até mesmo
outras denominações. E corre em suas trajetórias de vida a religião dos seus ancestrais,
resistindo às intempéries de qualquer natureza, colocando-se como ser religioso, fazendo parte
do contexto socioeconômico do meio que eles estão e levando consigo certas esperanças.
Para melhor compreender os fenômenos de peregrinação e de turismo, é necessário
explanar uma breve definição dos termos, na qual se estabelece um diálogo entre ambos,
justamente porque a peregrinão é um ato devocional o imposto, mas para o qual se é
convidado a fa-lo (como, por exemplo, no islamismo) ou auto-imposto (como, por
exemplo, no catolicismo). Assim, a peregrinação aos santuários acontece “como uma
202
CORTELAZZO, Manilo; ZOLLI, Paolo. Dizionario etimologico della lingua italiana. Vol.V: P-S. Bologna:
Zanichelli, 1979. p. 27.
203
TRIGO, Luiz Gonzaga Godoi. Turismo e qualidade: tendências contemporâneas. 8ª ed. Campinas: Papirus,
2002. p. 58.
204
KRIGER, Dom Murilo S. Ramos. Entrevista cit, p. 03.
75
obrigação auto-imposta”, quer dizer, acontece quando a pessoa está em desespero ou em
dificuldades e procura uma ajuda divina para o seu problema; ou quando a pessoa fez uma
promessa na esperança de um milagre ou na resolução de um problema e, apósrecebida a
graça”, sente-se na obrigão de agradecer (pagar a promessa); ou quando a pessoa está de
bem com a vida e sente a necessidade de demonstrar agradecimento pelo “dom de possuir
a vida”, de possuir saúde e tudo o mais sobre o que a pessoa religiosa acredita que deva dar
uma satisfação a Deus, ou à Mãe de Deus, ou a um santo de sua devoção.
Nos dois últimos casos, a pessoa teme que Deus a abandone, caso não agradeça. No
primeiro, a pessoa tem esperança de que ele não irá abandoná-la, se ela implorar. Em todos
os casos, há uma crença, uma fé e uma lealdade indiscutíveis, que fazem com que a pessoa
se sintaligada ao sobrenatural”, e que a fazem pensar que ela pode intervir na vontade
divina e esta possa interferir na sua vida pessoal.
Quanto ao turismo, é uma atividade de lazer e de conhecimento. Na fala de
Merleau–Ponty, no livro A dúvida dezanne, o autor comenta que a natureza é perfeita
e queria retratá-la como ela é em sua origem, “como ocorre na visão natural, para dar a
impressão de uma ordem nascente, de um objeto que surge a se aglomerar sob o olhar
205
.
Assim, pode-se dizer que o turismo é uma busca pelo belo, um apelo humano aos sentidos
– especialmente à visão, maso só – para partilhar de modo mais aproximadamente
possível da beleza estética, ou do exótico. O turismo é uma procura pelo prazer. Ele está
para o hedonismo assim como a peregrinação está para a fé. Ambos não são mensuráveis,
posto que são subjetivos. Ambos são importantes, porque embora de maneira diferente,
produzem um efeito benéfico, um efeito de satisfação pessoal.
Entendendo o turismo como a atividade do tempo livre que consiste em visitar
lugares diversos daqueles da resincia habitual, a fim de instrução ou deleite,
distinguimos diversos tipos de turismo, como o sexual, o religioso, de estudo e tantos
outros. Ou seja, é um movimento temporário de pessoas por locais de destino externos e
diferentes dos seus lugares de trabalho, de estudo e de habitação. Esse ato de viajar,
afastando-se do local de origem – resistência, estado ou País – é uma expressão de bem-
estar, uma forma agravel de ocupar o tempo livre
206
.
205
MERLEAU-PONTY, Maurice. A dúvida dezanne. (Trad. e notas Marilena de Souza Chauí e Pedro e
Souza Moraes). São Paulo: Os pensadores, Nova Cutural, 1989. p. 307.
206
ANDRADE, José V. Turismo: fundamentos e dimensões. São Paulo: Ática, 1995. p. 7.
76
Mas o turismo relaciona o indivíduo à exterioridade. Joga-o para algo exterior ao
turista. Ele se vê numa paisagem: ele sai de si e se transforma para a paisagem e a
paisagem o devora; ele visita uma pinacoteca: ele se transporta para a tela e esta o engole;
ele experimenta uma comida diferente que lhe cativa o paladar ou o repugna: neste
momento ela o possui; o turista vai a um concerto ou a uma ópera: e ele é atraído pelos
sons e entra na música e/ou no drama, dominando-lhe os sentidos; o turista vai ao
shopping: e logo é sugado por esta ou por aquela mercadoria; ele vai à praia: e é tomado
pelo mar que o chama; ele assiste a um ritual religioso exótico: e este o seduz. Acredita
Merleau-Ponty que o “objeto visitado não fica mais coberto de reflexos, perdido em seu
intercâmbio com o ar com os outros objetos, é como que iluminado surdamente do interior,
emana a luz e disso resulta uma impressão de solidez e materialidade”
207
.
Mesmo quando não se deslumbra com o que vê, sente ou escuta, mesmo quando
detesta o que vê, sente ou escuta, o turista é sempre levado a pensar o mundo do outro. De
muitos outros ele leva consigo; afinal de contas, o outro es presente com ele através das
lembraas e situações vividas no passado. Ele é inserido no mundo do outro e vice-versa,
pois, evidentemente, ninguém vive absolutamente só. E quando retorna à sua casa ele traz
lembranças, fotografias, postais, vestuários e um monte de souvenirs que o fazem recordar,
pelo maior espaço de tempo possível, que o outro esteve coabitando o seu espaço, o que se
pode verificar e vem a se confirmar com a entrevista de Regina Aparecida, que conta que
quando eu venho pra a gente compra algumas lembrancinhas, mas o que eu compro
sempre são rosários, que o pessoal pediu lá, [...]
208
. Outra entrevistada diz que “[...] comprei,
pra mãe e pro meus filhos. Pouca coisa, porque a gente também não tem muito pra gastar”
209
.
A peregrinação é uma manifestação relacionada à interioridade do indivíduo. O
espaço do sagrado não é um mundo do outro, não do outro humano. O espaço do sagrado é
o seu próprio mundo; a paisagem do sagrado é considerada como sua própria. Com isto,
peregrinar, para o crente, é vivenciar uma experncia não compartilhada, uma experiência
solitária, mesmo quando feita em grupo. O peregrino engole a paisagem, devora a imagem
207
MERLEAU-PONTY, Maurice. Op. cit. p. 305.
208
MARCON, Regina Aparecida C. Entrevista citada, p. 3.
209
CANDIDO, Marli. 45 anos. Rio do Campo-SC. Entrevista concedida a Karine Simoni. Nova Trento,
04/06/2005.
77
e se abastece e se fortifica porque “as pessoas não se guiam mais por prescrições
dogticas. Elas querem interagir livremente entre si
210
.
O peregrino fortalece-se. O turista esvai-se
211
. Assim, estar empoderado significa
estar em posição de exercer a capacidade de escolher de acordo com seu pprio livre-
arbítrio, o que requer uma política democrática, todavia, para que as pessoas possam
usufruir das decisões sobre suas próprias vidas. O enfoque é centrado na força e na
determinação das pessoas em descobrir e desenvolver suas capacidades para vencer e
superar seus anseios tanto individuais como coletivos. Assim, por exemplo, pode-se
constatar em Cézanne, quando pintava a natureza de forma a nos levar à sensação de
estarmos “passeando”, que o artista acreditava que os objetos não deviam ser representados
sob um único ponto de vista, mas como se o observador estivesse passeando em redor
deles. Com essa concepção, Cézanne provocava uma alterão profunda na realidade,
criando uma orientação completamente nova para toda a arte futura
212
.
2.4 Os passantes
Ficamos a imaginar como se dão conta os transeuntes nos novos tempos, depois do
questionamento de Nietzsche sobre “para onde foi Deus. “Nós o matamos – vós e eu.
Deus está morto...! Respondera ele mesmo
213
. Assim, o filósofo alemão anunciara ao
mundo a morte de Deus e, conseqüentemente, o fim da religião. Como Nietzsche, outros
filósofos e estudiosos da chamada era moderna previam o fim dessa instituição chamada
Igreja e, principalmente, da Igreja Católica. Freud ligou o problema religioso à
sexualidade, culpando a religião pelos diversos desvios sexuais, pelas neuroses e psicoses
humanas. Estes e outros pensadores anunciaram o fim da religião e da Igreja. Porém, ela
continua, e continua nos mais diversos meios. E surgem “ilhas” de fé esparsas por todos os
continentes e no Brasil. Assim se tem o santrio de Nossa Senhora Aparecida em São
Paulo e de Madre Paulina em Vígolo de Nova Trento, e tantos outros.
210
DREWERMANN, Eugem. Op. cit. p. 127.
211
ALVES. Elza Daufenbach. Entrevista citada. p. 6-10.
212
CÉZANNE, Paul. Cartas e citações. In.: BARNES, Rachel (org.). Os artistas falam de si pprios:
zanne. (Trad. Maria Celeste Guerra Nogueira). Lisboa: Dina livro. 1993. p. 19.
213
NIETZSCHE, Friedrich. A gaia ciência. (Trad., notas, posfácio de Paulo César de Souza). São Paulo:
Companhia das Letras, 2004. § 108, §125 e § 343.
78
É essa a resposta diante do questionamento niilista de Nietzsche, onde a realidade é
fluida e oscilante
214
, em perscrutar as alamedas da religião que implicava o
desmoronamento dos valores morais, isto é, no seu slogan,a morte de Deus”.
Transplantando esta discussão para o contexto da pós-modernidade
215
, podemos se discutir
sobre a morte de Deus no fenômeno Nova Era, conhecido tamm como New Age (onde
não se tem a certeza de nada), detentora do fazer e do agir dos novos grupos religiosos,
como redes de muitas doutrinas, crenças, magias, esoterismos e outros princípios que
agregam elementos míticos e místicos que têm encantado a muitos.
A proliferão dessas formas de oferta religiosa responde manifestadamente à
demanda que está para se tornar dominante, configurando-se como um pipocar de religião,
um pot-pourri de idéias, que mais parece um entrelaçar humano no qual as pessoas voam
de flores em flores para absorver o seu néctar, um pouco de lá e daqui, no seu afã religioso,
usando a religiosidade do tipo utilitária, sincretista, emocional e tantas outras formas
psicológicas para o seu agrado, buscando um mercado multicolorido de denominações
religiosas em busca de vibração e energia, como nos diz a senhora Veroni Silva Campos,
uma coisa muito linda, muito boa. Uma vibração muito boa, principalmente quando eu
entrei aqui dentro [do território do Santuário]. Tranqüilidade
216
.
Desta forma, a religo está sendo vivenciada para o bem estar físico, mental e
espiritual sem pertencer a uma única denominação religiosa. Com isto vem outro fator,
“uma vibrão”, palavra que nos remete a um campo não da espiritualidade católica, mas a
uma conotação espiritualista kardecista. Também a senhora Gregória nos relata que “pela
curiosidade, falavam muito na santa aí eu fui ver de perto, realmente senti uma vibração.
Realmente, ela tem assim uma graça. [...], quando se fala nela a gente sente que toca, que
214
LYOTARD, Jean-François. A condição da pós-modernidade. Rio de Janeiro: José Olympio, 1986. p. 77.
215
O termo pós-modernidade já discutido por Jean-François Lyotard quando publicou, em 1979, a sua obra A
condição pós-moderna. (Lisboa: Gradiva, 1985). Considerando a sua chegada e fazendo uma ponte com o
aparecimento de uma sociedade pós-industrial com base numa globalização econômica, ele o define “como
incredulidade com relação às metanarrativas”. Pós-modernidade tem muitos significados e é um conceito
multifacetado, tendo em si mudanças sociais e culturais profundas. Outros autores, geralmente franceses,
foram associados a essa tendência, durante a década de 80, como Jean Baudrillard, Jacques Derrida e Michel
Foucault. Não esqueçamos que alguns deles rejeitaram, negaram ou se distanciaram do termo. Ver: LYON,
David. s-modernidade. 2ª ed. São Paulo. Paulus, 2005. p.7 e 24.
216
CAMPOS, Veroni Silva. 65 anos. Sapucaia do Sul-RG. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova
Trento, 19/03/2005. p. 3.
79
ela tem assim algum... milagre, parece ser milagroso mesmo, ela tem assim uma energia, a
gente sente uma energia boa
217
.
Panorama de Vígolo, descrito pelos entrevistados como um local de tranqüilidade e paz.
Fonte. Arquivo particular de José do Nascimento
Tanto a Senhora Veroni quanto a senhora Gregória falam de vibrão e paz,
vocábulos comuns para as duas entrevistadas que, como pessoas que praticam o
catolicismo, navegam em outras águas. Dessa maneira, elas têm uma nova escie de
conceão religiosa na qual emana, transforma e acontece a separação entre o visível e o
indivisível. Aqui, somos levados a um passeio dentro da territorialidade do sagrado e do
profano, com a apreciação do Santuário, a sua arquitetura, os entalhes na madeira do altar,
o trabalhado de um cálice e dos paramentos, que ficam dentro do espaço da emanação de
Deus. “O que sustenta a religião não é a religiosidade, autenticidade existencial, não é a
coragem de arriscar a liberdade,o é a individualidade ou a existência profética, mas o
coletivo em forma de clube e de folclore tradicional”
218
.
217
SILVA, Gregória da. 48 anos. Palhoça. Entrevista concedida a Jo do Nascimento. Florianópolis,
19/03/2005. p. 1.
218
DREWERMANN, Eugem. Op. cit. p.126.
80
E podemos ver, na fala da nossa entrevistada Luciene do Nascimento, outros
elementos concretos, embora esta não seja praticante ou participante de qualquer religião:
Sou católica ... não praticante, nasci católica e fiz a primeira comunhão e a
crisma, mas não participo da Igreja Calica, não pratico o catolicismo,
mas tenho as imagens dos santos como São Sebastião e Nossa Senhora
Aparecida em minha casa. Não que eu seja devota deles, mas o os meus
preferidos, às vezes eu penso neles, assim num momento de apuro.
[...], procuro conhecer um pouquinho da Assembléia de Deus. Já fui
também no espiritismo kardecista. Mas já fui também na Deus é Amor
porque lá, tem o Dom da cura, da revelação e às vezes eu vou em terreiro
de Umbanda por curiosidade.
[...] Ah, quem não gosta de saber um pouquinho do futuro? Todo mundo
gosta, e fui em busca disso, e por ajuda também, não fui para prejudicar
ninguém, e também não pra sair prejudicada, eu vou com certo medo, não
sei o que vou encontrar. Mas gosto, assim, de saber sobre a saúde, sobre o
emprego, sobre a vida do marido, sobre a intimidade do casal. Às vezes
eles [guias] falam, não sei se é verdade, mas às vezes fecha alguma coisa.
Mas também não é uma coisa que eu freqüentemente, porque tudo tem o
seu limite
219
.
Na fala de Luciene, vemos nitidamente esse pipocar de religo em busca do
imediato, do desenraizamento consubstancial do catolicismo, na medida em que ela
procura lugares sacralizados que possam responder a qualquer dos seus anseios, fornecer-
lhe soluções fáceis, cômodas e rápidas para as situações difíceis nas quais ela se encontra
ou pensa que esteja envolvida, para, enfim, dar sentido ao seu dia-a-dia. Na sua ida a esses
lugares, ela rompe com valores medievais, como a teocentricidade e a dependência aos
“presbíteros” que, como diz Grespi, são “funcionários de Deus os quais regeram a vida
comunitária cristã por séculos e séculos, e fizeram com que a religo, outrora soberana em
toda a existência, se limitasse ao domínio privado e fosse reduzida a um pequeno conjunto
de práticas”
220
. Nascimento continua a nos relatar:
Da Madre Paulina ouvi falar e por isso mesmo que eu resolvi ir até
por curiosidade e passeio. E por isso eu busco alguma coisa lá mas também
não me pergunte, assim, coisas a fundo, porque eu não sei. O que mais me
chamou atenção foi o museu, que tem as fotos de onde ela viajou, tem foto
dela, tem foto dela no caixão, essa foi a foto que mais me impressionou. E
também... a certidão de óbito, papéis escritos, o que aconteceu com a saúde
dela, onde ela viajou, os lugares precários onde ela viajou pra cuidar de
pessoas doentes. Ela tinha amor ao que fazia, e me impressionou a maneira
219
NASCIMENTO, Luciene do. 36 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do Nascimento.
Florianópolis, 19/03/2005. p. 1.
220
GRESPI, Franco. Op. cit. p. 23.
81
como ela morreu. Adorei também um morro que eu subi, que eu vi uma
estátua de bronze, que eu vi a cidade de cima, porque no dia que eu fui
tinha muita gente, mas só que o pessoal se aglomerava muito na igreja, em
restaurante, no museu, em outras coisas lá. E eu fiquei quase que sozinha
com a minha família, com o meu marido e com a minha filha, então a gente
ficou lá pensando como é bonito, pensando como é comércio lá embaixo
[Vígolo], os comerciantes, a rua lá que é só coisas de vender as
lembrancinhas de Madre Paulina. Eu achei muito comércio, e lá em cima
o tinha isso, em cima foi uma coisa mais espiritual. A gente desceu a
a metade do morro descalços, sentindo, assim. A gente armou um guarda-
chuva lá em cima, porque tem um sol muito quente, foi o melhor lugar
221
.
No relato acima, a senhora Luciene do Nascimento não se acha nem turista e nem
peregrina mas, sim, a passeio
222
no santuário de Santa Paulina, como curiosa, tanto quanto
no Terreiro, na Assembléia de Deus e na Deus é Amor. O que se observa é uma busca
constante por uma fé voltada a fato consciente, ao mesmo tempo em que ligada ao “mundo
sensível”. Ela busca o rompimento com o coletivo que simultaneamente zela e acalenta os
tesouros do passado, e está latente na busca do seu silêncio presente.
Assim, “o silêncio é que nos permite ouvir outra voz, uma voz que fala outra
língua, uma voz que vem de outro lugar [...] Essa ngua desconhecida de uma voz
desconhecida, essa voz ignota, se ignota qual atrás do silêncio como silêncio se esconde
qual atrás dos rdos superficiais do cotidiano”
223
. Esse silêncio, mais do que palavras,
serpenteia e se insinua na trama de buscas do seu imediato mundo.
A senhora Luciene encontrou na Colina de Madre Paulina o seu refúgio temporário
poro ter muitas pessoas ao seu redor e ao redor dos seus., eles refletiram sobre o que
está acontecendo na sua vida e no que fora ou está acontecendo como processo evolutivo
no palco cênico do Santuário, fazendo assim as suas elucubrações. Como afirma Benjamin,
um acontecimento vivido é finito, ou pelo menos encerrado na esfera do vivido, ao passo
que o acontecimento lembrado é sem limites, porque apenas uma chave para tudo o que
veio antes e depois
224
. E, ainda, Marilena Chauí: “Tomar a experiência como iniciação ao
mistério do mundo significa reconhecer que o sair de si é o entrar no mundo”
225
.
221
NASCIMENTO, Luciene do. Entrevista citada, p. 2.
222
Para o/as entrevistado/as, passear equivale fazer turismo ou até mesmo peregrinar, e se observa que o
termo “turismo religioso” não saiu ainda do âmbito acadêmico e profissionalizante da área.
223
KAVADLOFF, S. O silêncio primordial. Rio de Janeiro: José Olympio editora, 2003. p. 68.
224
BENJAMIN, Walter. Op. cit. p. 37.
225
CHAUÍ, Marilena de Souza. Op. cit. p. 166.
82
Embora a presença do sagrado se encontre em todos os lugares, segundo
Rosendahl, “há locais privilegiados em que Deus se manifestou”
226
. Consideramos aqui
que a presença é diferente de estar diante de algo, ou imaginar, como é o caso do que
acontece com um bom número de pessoas, independentemente de
serem ateus ou crentes.
Enfim, todos são um pouco como São Tomé, ou seja, ter vivências de fatos concretos,
perceber que alguém foi privilegiado e vivificou esses momentos. Desta maneira, se vêem
estimulados a freqüentar o cenário de tal ação.
Lembrando a etimologia da palavra peregrinação, originária do latim peregrinatio
(aquele que vem de viagem em terra estrangeira), peregrinar é, assim, uma prática
devocional que consiste no ir coletivamente ou individualmente a um Santuário ou a um
lugar sagrado no qual se cumprem especiais atos de religião, seja com o objetivo de
piedade, ou votivo, ou penitencial
227
. Segundo Maria Ione Cardoso Silva:
A motivação foi por a gente ser muito católico, então a gente tinha, não até
curiosidade, até uma vontade mesmo de chegar até aqui. Isso é uma coisa
do coração, eu acho. Eu trabalho e eu tô em férias. Então eu disse, um dos
meus motivos principais, que eu quero, do meu passeio, o passeio que eu
quero fazer, é ir na Madre Paulina. Isso eu quero fazer, não interessa se eu
o vou nos outros lugares, ou se euo vou viajar pra fora, se eu não vou
sair, mas na Madre Paulina eu quero ir. Porque eu senti a necessidade de
vir aqui, fiquei encantada
228
.
Silva se apresenta como enraizada e empenhada dentro da Igreja Católica Romana,
fazendo parte do ECC – Encontro de Casais com Cristo - há vinte anos, juntamente com o
seu esposo. Mas eles quiseram fazer esta romaria, segundo suas palavras, “pra conhecer
aqui, isso aqui eu vim buscar isso aqui”
229
.
A prática de peregrinação se encontra em quase todas as religiões, fazendo parte do
ato emocional de chegar mais perto de sua divindade. É natural que o homem visite os
lugares santificados pela presença da divindade ou das requias de um defunto venerável,
herói ou santo, irradiando a mais imediata e eficaz virtude divina. A peregrinação é uma
das formas devocionais mais apreciadas pelos grupos humanos, seja porque coloca em
226
ROSENDAHL, Zeny. Op. cit. p. 36.
227
DIAS, Reinaldo; SILVEIRA, Emerson J. S. da. Turismo Religioso: ensaios e reflexões. Campinas:
Editora Alínea, 2003. p. 21.
228
SILVA, Maria Ione Cardoso da. 56 anos. Porto Alegre. Entrevista concedida a Karine Simoni. Nova
Trento, 19/03/2005. p. 3.
229
Idem. p. 3.
83
jogo todas as faculdades do indivíduo, como visão, audição, locomoção e emoção,
intensificando-as em virtude da associação; seja porque exalta o vínculo coletivo para o
qual a emoção religiosa é fator potenssimo na medida em que os peregrinos percorrem
todos o mesmo itinerário, cumprem os mesmos gestos rituais, orientam a mente em direção
à idêntica idéia religiosa; seja porque aumenta o valor e prolonga a lembrança da sagrada
meta e das memórias religiosas que são conectadas sobretudo quando se trata de massas
nas quais o sentido social constitui oportuno complemento das deficiências espirituais do
indivíduo; seja, finalmente, porque, fazendo sentir e quase medir o sacrifício, faz prever e
calcular mais seguramente os afetos. Se se trata de uma religião universal, o encontro de
pessoas diferentes no mesmo centro religioso estimula demasiadamente a impor o sentido
de unidade social daquela dada religião, fora da barreira de raça e de nação.
2.5 A fluidezquida no mundo contemporâneo
O pensamento humanista e renascentista dá início à cientificidade das idéias
contrapondo com o misticismo implantado na Espanha, centro reprodutor dos conceitos de
fundamentalismo religioso que, no decorrer dos séculos, vão ser retomadas por pensadores,
com o início da modernidade. É dentro deste contexto iluminista, em que a imagem
teocêntrica e fixista se muda para uma imagem evolucionista, histórica e baseada no
antropocentrismo, que está mergulhado o indivíduo moderno na diminuição do sagrado no
entorno humano. São mudanças que irão influenciar diretamente as pessoas nos séculos
posteriores.
O século XX foi marcado, e o início do século XXI ainda está sendo, por diversas
transformações na sociedade, advindas da industrialização, da globalização, do estudo
genoma, das pesquisas em células-tronco, da robotização, do computador, da tecnologia da
informação e de tantos outros fatores. Essas mudanças direcionam os rumos da Igreja que,
embora esteja enraizada no divino (divinização esta ligada ao seu propagador, Jesus
Cristo), possui suas bases estabelecidas como Igreja Triunfante.
Um dos grandes acontecimentos para a história da Igreja foi o Concílio Vaticano II.
A Igreja passou 400 anos com suas fundamentações de fé e moral embasadas no Concílio
de Trento. Com a Revolução Industrial e outros acontecimentos no nível sociopolítico, que
teceram e foram fios condutores de grandes mudanças na vida das pessoas, principalmente
a libertação de escravos nas Américas, sobretudo no Brasil, o surgimento de uma nova
84
classe social, a dos ex-escravos, e as imigrações residuais da Europa, a Igreja se viu na
obrigão de se posicionar diante dos problemas resultantes. Surge a encíclica Rerum
Novarum, de Leão XIII, com uma conotação totalmente social-libertadora
230
. A partir
disso, há o surgimento de diversas organizações que atuam na busca de libertão para as
pessoas. Com relação à religiosidade, o povo continua vivendo sob os princípios cristãos,
mas com muito catecismo e pouco evangelho. A Bíblia é para os padres, queo ao povo
um Cristo histórico, ou seja, carnal, em vez de um Cristo-Deus. Como nos diz Deleuze, a
crença no mundo depende justamente da capacidade de suscitar acontecimentos que sejam
pequenos e escapem à percepção:
De modo que o problema não é mais fazer com que as pessoas se exprimam,
mas arranjar-lhes vacúolos de solidão e de silêncio a partir dos quais elas
teriam, enfim, algo a dizer. As foas repressivas não impedem as pessoas de
se exprimir, ao contrário, elas as forçam a se exprimir. Suavidade de não ter
nada a dizer, direito de não ter nada a dizer; pois é a condão para que se
forme algo raro ou rarefeito, que merece um pouco ser dito
231
.
Com a certeza da fragilidade, o renovado interesse pelas religiões, que cresceu em
todo o mundo ocidental, se deve não somente à desorientação produzida pela suposta crise
dos valores tradicionais – religião, família, e estado, mas também à nova abordagem
inserida na pós-modernidade, tratada por alguns autores, como Zymunt Bauman, que fala
de modernidade líquida
232
, resumida na solidez que está na liquidez e na passageridade das
coisas, fornecedora de uma experiência religiosa-pessoal; como Anthony Gilddens, Bech e
Lash que falam modernidade na modernidade, que seria o período da modernização
reflexiva, que tem consciência de si; e outros, que falam de ultramodernidade e
hipermodernidade. Um pressuposto que permeia nesses autores é que religião e
modernidade são antagônicos. na transitoriedade econômica, política e industrial, na
cultura e até nas ideologias vem afetando o fordismo, considerando não só “linha de
montagem, mas também Lei Seca e ‘puritanismo’ e a tentativa de regular a vida sexual e
familiar do trabalhador, e não apenas sua vida de trabalho
233
. Alguns autores, como
Jacques Le Goff e Stuart Hall, sobre pós-fordismo, falam que
230
ZILLES, Urbano. Op. cit. p. 30
231
DELEUZE, Gilles. Conversações. São Paulo: Editora 34, 1992. p. 161-162.
232
BAUMAN, Zymunt. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001. p. 5-9.
233
KUMAR, Krishan. Da sociedade pós-industrial à pós-moderna: Novas teorias sobre o mundo
contemporâneo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor. 1997. p. 63.
85
quanto à produção, a palavra-chave é flexibilidade de brica e
maquinaria, tanto quanto de produtos e mão-de-obra. A ênfase muda da
escala para o campo de interesse, e do custo para a qualidade. As empresas
se adaptam mais para reagir aos mercados do que para controlá-los. E são
consideradas tanto como instrumentos de controle quanto como instituições
de aprendizagem. Suas hierarquiaso mais niveladas e, as estruturas, mais
abertas. A força de guerrilheiros substitui o exército permanente
234
.
Esse é baseado na produção flexível, nos mercados de nicho e na remuneração do
trabalho baseada nos resultados.
Como diria Heráclito, as coisas são enquanto duram, e, nesta posição, o homem
contempôraneo evidencia os limites do saber, mostrando a tensão entre o inconcebível e o
indivizível, vendo que os ritos, as crenças e os mitos não são fábulas que designam uma
“história verdadeira”
235
, mas uma forma que possibilita ao ser humano relacionar-se com o
seu passado.
Ultrapassando as formas dogmáticas e contraditórias da religião institucional, torna-
se possível reinterpretar a mensagem cristã, colocando em evidência tanto as dimensões
trágicas como aquelas essencialmente libertadoras. Nesta perspectiva, a experiência
religiosa surge como convite irrecusável para que o indivíduo assuma totalmente as
contradições da existência, pois é nesse lugar que se realiza a promessa da libertação.
Consciente ou inconscientemente, as pessoas que procuram uma fé embasada fora
de si, em suma, num Cristo hisrico, vão ao encontro do seu self interior. Sendo a Igreja
auto-detentora Dele e tornando-se “funcionária de Deus, é ela mesma que faz negá-Lo, e
nega aos seus fiéis um Cristo transcedental ou, melhor dizendo, de Deus como funcionário
do homem. A transitoriedade em denominões religiosas e a necessidade da estabilização
econômica faz dele um Deus mergulhado nas vicissitudes humanas. Em certo sentido,
Leonardo Boff, assim comorios autores, fala sobre a experiência:
Podemos dizer que a experiência é o modo como nós interiorizamos a
realidade, como nos situamos no mundo e o mundo em nós. Experiência,
assim entendida, deve pois ser distinguida da vivência. A vivência é a situação
psíquica, as disposições dos sentimentos que a experiência produz na psique
humana. São as emoções e valorões que antecedem, acompanham ou
seguem à experiência dos objetos que se fazem presentes no interior da psique
234
KUMAR, Krishan. Op. cit. p. 48.
235
ELIADE, Mircea. Mito e Realidade. São Paulo: Perspectiva, 1994. p. 7.
86
humana. Vivência não é sinônimo de experiência. É conseqüência e resultado
da experiência na psique humana. Ela pertence ao fenômeno total da
experiência, mas este é mais amplo e profundo do que da vivência
236
.
Sabemos que as pessoas que vão até Vígolo procuram algo, que não encontram em
lugar nenhum, tateando a achar o que procuram. E, segundo Roger Chartier, osrios
sujeitos imersos numa situação singular fazem dela interpretações as mais diversas,
segundo o seu lugar no jogo de interesses, pois “as percepções do social não são de forma
alguma discursos neutros, [...] colocadas num campo de concorrências e de competições
cujos desafios se enunciam em termos de poder e de dominação
237
.
As representações que fazem os fiéis nesse momento encontram respaldo no
reordenamento da Nova Era. Como lembram Berguer e Luckmann, “na relação face a face
o outro é apreendido por mim num vido presente partilhado por nós dois... Meu ‘aqui e
agora’ e o dele colidem continuamente um com o outro... Como resultado, um
intercâmbio contínuo entre minha expressividade e a dele
238
.
Com o Concílio Vaticano II, há uma virada fenomenal. A Igreja começa a mudar.
Deixa de ser uma Igreja voltada para si mesma e volta-se para fora, para o povo. Aqui se
percebe uma parte dela chamada Teologia da Libertação
239
. Há um retorno à bíblia, a qual
é colocada nas mãos dos fiéis, que continuam enfrentando diversas dificuldades no âmbito
social. Nesse período, acontecem as grandes ditaduras na América Latina, que forçam as
pessoas a viverem sob a censura, o medo, a repressão. Nesta época, os encontros
continentais dos bispos, nas Américas, foram realizados em Medellin, depois em Puebla e,
por último, em Santo Domingo, e os ideais do Concílio foram sendo aos poucos colocados
em prática em algumas regiões.
Surge, assim, uma nova religião dos pobres, para a qual estes passam a ser o
elemento principal. Já não se questiona mais a existência de Deus, mas por que Ele, sendo
bom e poderoso, pode deixar as pessoas sofrerem tanto. Questiona-se, sobretudo, o papel
do padre diante dos diversos desafios da modernidade.
236
BOFF. Leonardo. Experimentar Deus hoje. Petrópolis: Vozes, 1984. p. 136.
237
CHARTIER, Roger. Op. cit. p. 17.
238
BERGUER, Peter; LUCKMANN, Thomas. A construção social da realidade. Tratado de sociologia do
conhecimento. 11º ed. São Paulo: Vozes, 1994. p. 46.
239
GALILEA, Segundo. Teologia da Libertação: ensaio de síntese. 5º ed. São Paulo: Paulinas, 1987. Ver
também TEIXEIRA, Faustino Luiz Couto. (Org.) Teologia da Libertação: novos desafios.o Paulo:
Paulinas, 1991.
87
Muitos desses padres, tal como as freiras, deixaram seus conventos e foram morar
com os necessitados nas favelas, o que é característico da Teologia da Libertão. A moda
é estar junto dos desfavorecidos. Alguns se vestem como eles; tem que se fazer índio como
índio, negro como negro e assim por diante. O marginalizado é o centro da religião. A
libertação proposta por Jesus é para os pobres, e Ele também era pobre.
Neste contexto de libertação, surgem asilhas”, e o santuário
240
é uma delas,
sustentando-se ao ocupar um espaço cada vez mais importante no universo das crenças e
no mercado simbólico. Os indivíduos buscam recursos para completar o seu crer, já que,
uma vez que não se herda mais a identidade religiosa, esta se constrói, razão da
pulverização religiosa no nosso momento hisrico, principalmente as ltiplas escolhas
que vemos na fala de dona Elza Pithan:
Olha, vou dizer que é ecumênica. É cristã, quando me perguntam. Eu fui
batizada na Anglicana, em Porto Alegre. Eu casei na Metodista, a minha
família toda era Católica e eu não podia me rotular disto ou daquilo e me
limitar nos meus conhecimentos e tudo. Então às vezes eu tava me dando
com pessoas que elas já saíam da premissa que eu era católica. Então eu
era católica. A outra premissa que eu era do espiritismo. Então tá,
espiritismo. Euo dizia que eu era, mas também o contrariava, porque
cada um dentro da sua crença. Se era o cristianismo, tô aí
241
.
E, verdadeiramente, dona Elza es aí, com a sua autenticidade e o ecumenismo de
uma senhora de 83 anos, professora de inglês aposentada. Ela vivencia o carpe diem na livre
escolha de mercado. Dentro deste contexto, encontramos marcos incomuns, o que se pode
ver, certamente, na descentralização e na diversificação. Por exemplo, no âmbito religioso,
há pessoas como dona Elza que, sendo batizada na Igreja Anglicana e transitando em todas
as religiões sem maiores problemas, também cultua santos católicos, como se vê na sua fala:
Olha, é desde a mocidade, porque eu não sou católica, tem isso, mas eu
tenho assim um respeito pela vida que eles levaram. E esses todos se tu
fores ver a biografia deles, eles tiveram uma persistência e uma crença, eles
acreditavam naquilo que eles sentiam. E tanto que a maioria morreu por
240
Aqui não se discute se as Irmãzinhas fazem parte da Teologia da Libertação ou de outros movimentos
internos da Igreja Católica, mas que agem como abertura e engajamento no mundo, dado que dentro do
Santuário existe o ativismo, o quietismo, e a contemplação interior.
241
PITHAN, Elza Balbão. 83 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do Nascimento. Florianópolis,
23/03/2005. p. 2.
88
isso, menos São José, mas Santo Expedito foi um, ele acreditava, e nessa
persistência deles é que eu tiro forças, energia
242
.
O que se observa no relato da dona Elza é que elao transita em uma só
denominação e, como ela mesma afirma, desde moça respeita a vida dos santos católicos.
Se sociólogos afirmam que a eclosão de crenças paralelas vem sendo desenvolvida de uns
30 anos para cá, como se explica o fato de que dona Elza vivencia este transitar há mais de
70 anos, sem maiores problemas? Se for possível responder a esta pergunta, será que o
meio influenciou naquilo que ela crê? Ou ela é sincrética
243
como quase todo o povo
brasileiro? O retorno ao religioso vai além do movimento já existente, como no
florescimento de crenças, práticas religiosas e devocionais, movimentos carismáticos,
religiões orientais. É próprio da pós-modernidade a falta sem vínculo obrigatório a
qualquer crença - somente passear e adquirir informação, processá-la e pegar o que se
deseja no seu íntimo. Ver e cultivar o sagrado é inerente ao ser humano, com atos e
manifestações realizadas por meio de oferendas, preces, procissões e cultos. O homem
busca e passeia por territórios antes não transitáveis. Por exemplo, ir a um santuário era
para rezar, fazer visita é moderno. Ir ao encontro da natureza, ir aonde se achar melhor não
depende exclusivamente de uma autorização divina e, muito menos, de uma dependência
do tipo eclesiástica:
Eu não fui pra procurar nada, eu fui pra receber tudo o que estava de lá.
Então eu aproveitei muito porque foi um dia muito gostoso, eu vi tudo o
que eu pude dentro da casa dela. Dá pra sentir, se tu tens uma noção do
que a criatura viveu, do que a criatura fez, se tu conhece alguma coisa, aí tu
pode ver naquele pedacinho. Aquela cama dela, por exemplo, aquela
madeira vai te dizer alguma coisa. Aquele quarto todo ali dá pra tu sentir
que uma pessoa boa, alguém bom viveu ali e usou aquelas coisas. Aí tava
muito bom. Aí depois gostei de ver aquela porção de gente, era caminhões,
ônibus, desculpe, ônibus e ônibus de pessoas, todas faceiras, alegres.
Acredito que a maioria deve ter pedido alguma coisa e conseguiu, porque
estavam todos faceiros quando eu fui
244
.
242
Idem. p. 1.
243
Por sincretismo entende-se um processo que se propõe a solucionar conflitos e problemas num dado
contexto cultural. Suas características são a mescla, a fusão e a simbiose de elementos culturais. Ver:
BITTENCOURT FILHO, José. Matriz Religiosa Brasileira: religiosidade e mudança social. Petrópolis:
Vozes; Rio de Janeiro: Koinonia, 2003. p. 63.
244
PITHAN, Elza Balbão. Entrevista citada. p. 2.
89
Isso se vê também na fala de Perci Negreiros da Costa, que diz sercatólico
cinqüenta por cento, quando lhe foi perguntado se era praticante de alguma religião. A sua
intenção de estar ali era de trazer “[...] um amigo, aproveitando um passeio de final de
semana”
245
. Ele levou um amigo evangélico de Joinville para conhecer a cenografia do
Santuário. Por sua vez, o seu hóspede também não é praticante da sua denominação
religiosa. O entrevistado caracteriza a sua estadia no local como lazer e, por este vocábulo,
Dumazedier classifica:
É um conjunto de ocupações às quais o indivíduo pode entregar-se de livre
vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se
ou, ainda, para desenvolver sua informação ou formação desinteressada,
sua participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora após
livrar-se ou desembarar-se das obrigações profissionais, familiares e
sociais
246
.
Para o autor, o lazer apresenta várias facetas como: descanso; divertimento,
recreação e entretenimento; desenvolvimento da personalidade. E vemos na fala de Aladio
que “é um passeio. Passeio e pra conhecer a história de Madre Paulina e conhecer a rego
porque a gente trabalha direto no comércio, então procurei fazer quase que um retiro, um
passeio, um descanso”
247
.
A religiosidade ultrapassou os séculos e chegou até nós. Cheia de limites, se impôs
aos diversos desafios que foram aparecendo. Em nossos dias, a apresentação do novo se
estabelece pela configuração de imagem e pela grande manifestação de atos gerando
competição e mudanças no viver, e a busca o sagrado torna-se alento para os fiéis que
absorve aquilo que ela foi apresentado. Para não perder espaço e população por novas
denominações e credos religiosos, que se aprimoram com a tecnologia visual e bem-estar
físico, a Igreja Católica corre atrás daquilo que já estava perdido e usa agora os meios
tecnológicos que às vezes questionou para poder manter domínio sobre os seus adeptos.
Hoje, a religião é midiática. Preza-se a Internet, a televisão e tantos outros meios de mass
media. Tanto que as pessoas entrevistadas no Santuário disseram que ouviram falar da
Santa pelos canais de comunicações.
245
COSTA, Perci Negreiros da. 50 anos. Joinville. Entrevista concedida a Karine Simoni. Nova Trento,
04/06/2005. p. 2.
246
DUMAZEDIER, Joffre. Lazer e cultura popular.o Paulo: Perspectiva, 1976. p. 34.
90
Cena cotidiana em Vígolo: os passantes em trânsito pelo local
Fonte. Arquivo particular de José do Nascimento
A Santa Paulina, geralmente. está na mídia falada e escrita e, com isto, vem
reconhecida e representando uma nova estrada para o turismo e a religião, tento a
SANTUR como propagadora que, por ser uma agência de fomento do turismo de Santa
Catarina, está idealizando o “caminho da fé”, cujo percurso passa por várias localidades,
começando em Sant’Amaro, passando por Angelina e desembocando em Vígolo, no
Santrio de Santa Paulina.
247
OLIVEIRA, Aladio Sebasto. 47 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do Nascimento.
Florianópolis, 27/03/2005. p. 1-2.
91
Por sua vez, o prefeito Ciro Roza, de Brusque, realiza uma cavalgada anual saindo de
sua cidade com destino ao Santuário. O mesmo prefeito deseja construir a “trilha da fé”,
saindo de Navegantes, passando pelas paróquias, pelo santuário de Azambuja, chegando até
o de Santa Paulina, utilizando sempre caminhos alternativos dentro da Mata Atlântica. Esse
projeto tem características semelhantes ao Caminho de Santiago de Compostela, na Espanha.
Em Nova Trento, o pluralismo religioso está presente em pequena escala, e talvez a
questão da pouca procura de outras denominações religiosas seja porque o nível de
estabilidade ecomica dos habitantes é elevado e se manm por ser um fator social,
enquanto que em lugares com um alto índice de pessoas desfavorecidas economicamente
se busque na religião elementos que venham a consolá-las, dar-lhes prosperidade e cura
para os seus males.
A esse respeito, encontramos na cidaderias denominações religiosas. A da
maioria da populão é a Católica (C); no distrito de Clarba encontramos Luteranos (L);
no centro da cidade está a Assembia de Deus (AD); a Espírita Kardecista (EK) também
no centro da cidade; há ainda a Adventista do Sétimo Dia (ASD); a Espírita Afro-brasileira
(EA-b); a Neo-cristã (N-C); as Orientais (O). tamm aqueles que se dizem sem
religião (SR) e aqueles queo a determinam (N D).
A tabela abaixo é baseada nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística - IBGE 1980, 1991 e 2000.
Tabela 1
1980 C L AD EK ASD EA-b N-C O SR ND Total
8.936 163 - - - - - - - - 9.099
1991 C L AD EK ASD EA-b N-C O SR ND Total
8.866 145 - - - 56 14 - 33 39 9.053
2000 C L AD EK ASD EA-b N-C O SR ND Total
9.394 433 - 4 - - - - - 5 9.852
Fonte: IBGE, Censo de religião, segundo as Regiões Metropolitana e os Municípios – Santa Catarina
O que se pode observar no quadro geral dos últimos três Censos do IBGE é que, na
terra de Santa Paulina, chegam novos ares para diversificar a hegemonia da Igreja Católica,
como a Igreja Luterana com um acréscimo de adeptos. Percebe-se também que as outras
92
denominações religiosas convivem tranqüilamente entre si, sem abalar a estrutura da igreja
dominante. O interessante é que a Assembléia de Deus está em Nova Trento há muitos anos
e não consta em nenhum Senso do IBGE. Em uma conversa informal com um integrante
desta denominação, ele comentou que veio do Rio Grande do Sul para trabalhar em uma
fábrica de calçado, aberta na cidade, e participava da sua igreja ativamente eo encontrava
problema com a presença ativa da santa na cidade. Aliás, agradece a ela por estar ali
trabalhando. Trata-se, evidentemente, de novos pensares. Não é raro ver os Adventistas do
Sétimo Dia fazendo as suas missões de porta-em-porta e os cultos realizados em uma
pequena sala alugada no centro. Porém, faz pouco tempo que se encontram na cidade e não
constam no último Censo. Assim, o cenário religioso de Nova Trento vive as
“transformações decorrentes da globalização econômica e da mundialização cultural”
248
.
Enfim, vivenciando novas experiências sob o signo dos interesses do consumo.
Poder-se-ia colocar o fenômeno religioso da pós-modernidade em uma nova Idade
Média, onde aparecem o antropocentrismo e o teocentrismo, uma vez que o homem é
senhor de si e da natureza, e com isto Deus se torna empregado e a servo dele. Buscando
a frase “Deus é fiel”, da Igreja Renascer em Cristo, observam-se questões de valor
econômico e semântico. Na primeira, se vê o pagamento do dízimo como meta principal,
pela qual entregando-se o que se tem a Jesus, Ele devolverá em dobro o que o fiel deu, e se
foi pouco, ganha a quantidade que deu, e se Deus não o atendeu é porque ele não teve fé
o suficiente Nele. A segunda questão que se levanta é como Deus pode ser fiel se este é um
vocábulo atribuído ao homem? Deus é aquilo que é, e não aquilo que se quer dele. Em
contrapartida, vem o femeno da Nova Era, que es aí com a Era de Aquário, com a
sua liquidez flexível e a sua ajustabilidade, enquanto a Era de Peixes, a do cristianismo, já
não oferece grande representatividade.
o se pode compreender as religiões mais recentes senão seguindo na história a
maneira pelas quais elas se compuseram progressivamente. Dessa forma, pode-se perceber
seus elementos constitutivos, situando-os no conjunto das circunstâncias nas quais foram
nascendo, desenvolvendo-se, tornando-se complexos. Só então, como acredita Durkeim,
podemos determinar as causas que os suscitaram e facilitar sua explicação.
Assim, são muitas as questões e desafios encontrados pelo indivíduo em busca de
uma religião. Seria a pós-modernidade o retorno da teocentricidade? No quotidiano, as
248
BITTENCOURT Filho, José. Op. cit. p. 240.
93
pessoas estão preocupadas com a sua realidade, o aqui e o agora, percebendo os reais
problemas que devem ser enfrentados. Com isto, a busca do consolo divino se configura
como uma porta; a sda é buscar dentro de si o Deus interior, e buscar adaptões em um
novo crer, como os beija-flores que vão em busca de néctar.
94
3 SANTA PAULINA: como sal da terra
Franzino, um pouco curvo, com um traje leve de pano esvoante, a sombrinha aberta sobre o
ombro e o velho panamá na mão, o senhor Aurélio partia todo dia para seu singular veraneio.
[...] Uns na montanha, uns à beira-mar, uns no campo: ele, nas igrejas de Roma. Por que não?
Não é mais fresco que em um bosque? E na santa paz que reina, também. Nos bosques, as
árvores; aqui, as colunas das naves; à sombra das copas; aqui à sombra do Senhor.
Luigi Pirandello, O velho Deus.
Em tantos passeios feitos em Vígolo, no bairro de Nova Trento, buscamos
compreender a relação entre turismo e religiosidade a partir do estudo de caso do Santuário
de Santa Paulina, uma vez que o lazer sagrado constitui-se em uma das maiores revoluções
comportamentais da sociedade contemporânea
249
. Se observarmos a história da
humanidade, veremos que viajar é uma atividade tão antiga quanto o próprio homem,
mesmo que o conceito tenha assumido significados diferentes nos mais diversos lugares e
períodos. Tal ação de deslocamento de pessoas projeta vários setores, como o econômico,
o social, o cultural, o religioso e o ambiental.
3.1 Os primeiros passos do turismo
As notícias que se têm sobre as idas e vindas dos seres humanos sobre a terrao
remotas, mas uma coisa é certa: eles se movimentavam. Sabe-se que eles fizeram tais
jornadas por veneração a locais santificados ou por razões comerciais. Os primeiros
registros sobre atividades turísticas podem ser encontrados na antiga Babilônia, Grécia,
Roma, entre outras localidades
250
. Na Grécia Antiga, havia várias formas de divertimento,
tais como atividades culturais e artísticas, festivais públicos e competições esportivas – os
Jogos Olímpicos – que justificavam viagens. A civilização romana também apresentou
inúmeros centros turísticos, como os circos e as termas, que tinham a finalidade de
promover divero e repouso. Na Idade Média, os setores ligados à arte e à ciência foram
249
Ver: ANDRADE, José Vicente de. Op. Cit.
250
ARENDIT, Edmilson José. Introdução à Economia do Turismo. 3ª ed. Campinas: Alínea, 2002. p. 15.
95
grandes propulsores de viagens de deleite. Na transição para o capitalismo, devido às
transformações culturais, sociais e artísticas, elas se tornaram um status da burguesia
251
.
O turismo é uma atividade de intercâmbio, uma vez que envolve movimento de
pessoas para cidades, estados, países, enfim, regiões diferentes de seus domicílios, em
função de um interesse, seja ecogico, cultural, climático, ou de fundo religioso. Em
suma, turismo significa movimento. Como atividade sistematizada, teve início na
Inglaterra, quando, em 1814, Thomas Cook transportou de trem um grupo de 570 pessoas
entre as cidades de Loughborough a Leicester, a fim de participar de um congresso anti-
alcoolismo. A partir de então, a atividade turística cresceu e se expandiu cada vez mais no
mundo todo, sendo hoje considerada como um fenômeno que se desenvolveu como
possibilidade de recuperação de países em crise
252
.
No Brasil, o início da atividade turística deu-se em 1922, na cidade do Rio de
Janeiro, motivada pelas festas do primeiro centenário da Independência do Brasil. Como
diz Celso Castro,
em 1923, ocorrem a inauguração do hotel Copacabana Palace e a fundação
da Sociedade Brasileira de Turismo – que, em 1926, se tornaria o Touring
Club do Brasil. No final da década, acontecem as primeiras viagens aéreas
internacionais para o Brasil, e o principal meio de transporte é, de longe, o
navio. No início da década de 1930, temos a inauguração da estátua do
Cristo Redentor (em 1931) e o início dos desfiles de Carnaval (em 1932),
marcos até hoje importantes do turismo carioca
253
.
Em Santa Catarina, o turismo começou a ser regulamentado como força da Lei
5. 516 de fevereiro de 1979, vinculado à nova Secretaria da Cultura, Esporte e Turismo, e
pelas entidades supervisionadas: a Fundação Catarinense de Cultura – FCC e a Companhia
de Turismo e Empreendimento de Santa Catarina – CITUR. Como órgãos normatizadores
existem ainda o Conselho Estadual de Cultura e o Conselho Regional de Desportos.
Porém, temos notícias de que o governador Celso Ramos, em 1961, na sua primeira
mensagem anual à Assembléia Legislativa, discursava a favor de fomentar o turismo em
solo catarinense, como se observa no trecho do discurso realizado naquela ocasião:
251
LAGE, Beatriz H. Gelas; MILONE, Paulo César. Economia do turismo. Papirus: Campinas, 1991. p. 16.
252
RODRIGO, Adyr. Turismo, Modernidade e Globalização. São Paulo: Hucitec, 1997. p. 37.
253
BANDUCCI Jr, Álvaro; BARRETTO, Margarita (orgs.). 3ª ed. Turismo e Identidade Local: uma visão
antropológica. In: A natureza turística do Rio de Janeiro. Campinas: Papirus, 2003. p. 120.
96
Temos verificado ultimamente neste Ps grande desejo de nêle (sic) criar
condições que atraiam visitantes estrangeiros e promovam internamente
deslocamento turístico. Possuímos, em Santa Catarina, além da costa
atlântica, recantos aprazíveis e diferentes no interior, afora as fontes de
água termal que poderão entusiasmar o nacional e o alienígena, que
buscam momentos de lazer ou a oportunidade de recuperar a saúde
ameaçada
254
.
É importante observar aqui que, na década de 50, o turismo não era visto como
atividade propulsora do desenvolvimento econômico do estado de Santa Catarina, um
gerador de economia, de emprego e de renda, sendo tratado apenas como um deslocamento
de pessoas. Houve, no entanto, em 1956, o Quarto Congresso Brasileiro de Turismo
ocorrido em Santa Catarina.
A grande aspiração do Estado era seu desenvolvimento econômico no setor
secundário, através da indústria e do comércio. Outro fato que vale observar é que o
Governador Celso Ramos não se limitava somente ao litoral, como fariam os futuros
dirigentes estaduais, que o colocariam em primeiro lugar até descobrir a europeidade dos
catarinenses. Pelo contrário, ele faz menção às diferentes áreas do território catarinense sob a
sua jurisdição, discutidas pelos governantes apenas a partir do início da década de 1980,
quando passam a ser consideradas um novo filão econômico, uma indústria plena de
possibilidades
255
. A partir de então, políticos e empresários passaram a valorizar cada vez
mais o potencial dessa atividade como incentivo para um maior desenvolvimento do Estado.
Em 1979, a Companhia de Turismo e Empreendimentos de Santa Catarina –
CITUR - desenvolveu as seguintes atividades especificadas na Mensagem à Assembléia
Legislativa pelo Governador Jorge Konder Bornhausen:
- Distribuiu 150.000 peças de divulgação do Programa “conha o Sul”,
em convênio com a EMBRATUR, CRTUR e PARANATUR.
- Participou do Congresso da COTAL em Assunção, Paraguai.
- Assinou convênios com diversas entidades visando o fomento de
turismo, no valor de Cr$ 9.590.000,00.
- Organizou a 1ª exposição paralela à I COBRAC, a 1ª Feira de Artigos e
Equipamentos hospitalares, II FEPEMI e a 1ª Feira Catarinense de
Alimentos, aplicando Cr$ 3.117.000.00.
254
RAMOS, Celso. Mensagem anual: apresentada à Assembléia Legislativa do Estado, em 15 de abril de
1961. Florianópolis: IOSC. 1961. p. 37.
255
Méri Frostscher afirmou que, após a enchente que assolou o Estado em 1983, inundando e deixando mais
de 100 cidades sob as águas, o Governo investiu no turismo como forma de reanimar a economia e recuperar
a expectativa da população assolada pela catástofre. Ver: FROTSCHER, Méri. Op. cit.
97
- Realizou 7 Congressos e eventos técnicos em Balneário Camboriú,
onde foram aplicados Cr$ 770.000,00.
- Realizou 7 outros eventos de várias categorias onde foram aplicados
Cr$ 1.241.000,00.
- Por delegação da EMBRATUR, a CITUR passou a executar os
serviços de registro de ancias de turismo, transportadoras,
classificação dos meios de hospedagem e controle e manutenção dos
padrões de atendimento
256
.
As prestações de contas das atividades feitas na área do turismo do então
governador Jorge Konder Bornhausen, em 1981, foram:
- Postos de informações Turísticas de Garuva, Sombrio e Dionísio
Cerqueira.
- Ampliação do Centro de Promoções da CITUR/ Balneário-Camboriú,
play-ground, quadra de esportes, estacionamento, aqrio marinho,
casa do Prato.
- Equipamento do Parque das Quedas em Brusque, Gruta do Tigre em
Rio do Oeste e Camping na Serra do Tabuleiro, em Palhoça.
- Implantão de Terminais Turísticos em Porto Belo, Rancho
Queimado e Videira.
- Implantação de posto de informações turísticas em Porto União.
- Implantação de campings em Rio do Oeste, Rio do Sul,o Carlos e
o Francisco do Sul.
- Participação em empreendimentos hoteleiros em Quilombo, Santo
Amaro da Imperatriz, São Bento do Sul, São Joaquim, São João do
Sul, Timbó, Treze Tílias, Trombudo Central e Urussanga
257
.
Assim, foi pelas décadas de 70 e 80 que começou a se concretizar tal indústria com
uma visão de turismo integrado em termos regionais, ainda que com certa timidez. O início
do turismo em Santa Catarina, quando o Governo admite tais visitantes, acontece na
década de 60. Esse início não está ligado diretamente ao turismo propriamente dito, como
trade, mas simplesmente como hospitalidade
258
, quando proprietários saíam de suas casas
e alugavam-nas com o que tinham dentro para os “veranistas”, como eram chamados.
Neste sentido, observa-se o ato doméstico de receber, no qual os gestos do anfitrião e do
spede se entrelaçam em sincronia no cerimonial da etiqueta, no dar e no receber em um
grande ágape, como um banquete de trocas de favores e gentilezas. Os hóspedes usufruíam
256
BORNHAUSEN, Jorge Konder. Mensagem à Assembléia Legislativa. Florianópolis: IOSC. 1980. p. 116.
257
Idem, ano 1981. p. 123.
258
O artigo da professora Marielys Siqueira Bueno, da Universidade Anhembi Morumbi, define
hospitalidade como o ato humano, exercido em contexto doméstico, público ou profissional, de recepcionar,
hospedar, alimentar e entreter pessoas temporariamente deslocadas de seu habitat. DENCKER, Ada de
98
do imóvel, enquanto os proprietários se retiravam para casa de parentes ou para um rancho,
isto é, uma edícula separada da casa, que normalmente servia como depósito, sem
nenhuma ou pouquíssima infra-estrutura básica (um fogão a lenha, uma cama
improvisada). Desta forma, os proprietários, em geral pescadores, passavam por certas
privações em prol de uma nova renda para agregar uma melhora de vida.
Os “veranistas” de baixa renda ou os “alternativos” traziam as suas respectivas
barracas de camping e permaneciam na frente das casas ou próximos à praia, sem muito
conforto como água encanada e banheiro, tendo que se adaptar ao meio, alojando-se por
pouco tempo, um final de semana ou mais, e depois indo embora. Já os que alugavam uma
casa traziam seus filhos para passar as férias escolares de verão. É interessante observar
que os primeiros veranistas eram gaúchos, vindos do Rio Grande do Sul, que ficavam mais
ao sul do Estado, enquanto que no norte, como em Balneário Camboriú, e também na Ilha
de Santa Catarina, as praias eram mais freqüentadas pelos argentinos, como afirma o ex-
governador do Estado Esperidião Amin:
no primeiro mandato nós vivíamos, digamos assim, uma pré-hisria. Nós
tínhamos sido descobertos, na verdade.s fomos descobertos pelos
argentinos. Naquela época, argentinos e gaúchos eram os grandes
descobridores em matéria de turismo em Santa Catarina. Eu, por exemplo,
fui descoberto. Eu descobri que o turismo tinha me descoberto em Ponta
das Canas. Eu, nativo da Ilha de Santa Catarina, quando fui comprar um
terreno para mim, em 1974, comprei de um argentino. Ou seja, eles já
tinham vindo, e já estavam vendendo terreno. E eu comprei , e por
engano, constr minha casa no terreno de um outro argentino. Tive que
desmontar a casa, e montar no terreno que era meu. Ou seja, eu estava
cercado por argentinos por todos os lados
259
.
Para demonstrar que o Estado catarinense era já descoberto pelos turistas, sejam
argentinos ou gaúchos, afirma o professor Mário Carlos Beni que
o Brasil foi um país sul-americano a competir no mercado intra-regional e
internacional com o produto sol-praia, dando início, nos anos de 1970, a
uma série de complexo turístico em sua costa, do Rio de Janeiro até Santos.
Estes atraíram sobretudo turistas argentinos, que também, ao longo de suas
Freitas Maneti; BUENO, Marielys Siqueira (org.). Hospitalidade: Cenários e oportunidades. São Paulo:
Pioneira Thomson Learning, 2003. p. 19.
259
HELOU Filho, Esperidião Amin. 57 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do Nascimento.
Florianópolis, 14/12/2005. p. 2.
99
freqüentes visitas, possibilitam a crescente expansão dos complexos
hoteleiros até Santa Catarina, nas décadas seguintes
260
.
Assim, percebe-se que o indicador maior está nas mudanças e nas variáveis e
invariáveis da hospitalidade dos lugares escolhidos, naquele momento, sem nenhum
planejamento das esferas políticas, sem uma preparação das cidades e dos que
recepcionavam os turistas. Se nos detivermos um pouco mais sobre a questão, veremos
que, naquele período (década de 80), não se falava em qualidade de vida e não se propunha
a preservação ambiental, explorando-se as regiões de maneira desordenada e comões
individuais. O fato é que os turistas vinham para as praias somente no verão e dificilmente
os proprietários se preocupavam com a qualidade do serviço prestado.
É importante ressaltar também aqui o discurso oficial feito pelo Governador Vilson
Kleinubing, no seu Plano 90, no parágrafo Meta 17 – Turismo: Fonte de Desenvolvimento,
em que diz que “o turismo é uma atividade econômica, geradora de empregos qualificados e de
rendas para a sociedade”
261
. Quanto às qualidades turísticas do Estado,Vilson Kleinubing
exe que
é dotado de recursos naturais invulgares para o turismo, a começar pelos
seus 531 km de litoral, recortado de baías, belas praias, ilhas e
promontórios. Tem ainda as estâncias hidrotermais; a beleza de cidades,
que atraem pelas marcas que guardam do seu processo colonizador, como
Blumenau, Joinville, Treze Tílias, etc.; as serras, os campos; o frio de São
Joaquim; a maçã de Fraiburgo; a Serra do Rio do Rastro, etc
262
.
A Meta do Plano 90 mostra a representatividade do turismo no contexto
econômico, dado que podia gerar novos empregos diretos e indiretos e permitir uma
qualificação através da experiência a ser agregada no dia-a-dia das pessoas. Assim,
tencionava abrir espaço à presença de pessoas oriundas de outros lugares para a região do
litoral, cuja movimentação era intensa na temporada de verão. Com isto, buscava-se
investir no lazer, com o intuito de dar visibilidade ao estado catarinense.
Em 1983, no plano de governo do primeiro mandato (1984-1988) de Esperidião
Amin, o turismo foi incluído como fonte de renda sustentável para a população abalada
260
BENI, Mario Carlos. Globalização do turismo: megatendência do setor e realidade brasileira. 2ª ed. São
Paulo: Alepp, 2003. p. 93.
261
KLEINUBING, Vilson Marcondes. Plano 90 Marcondes Kleinubing PFL, PTB, PDC: metas de
Governo para o quatriênio 87/90. Florianópolis: p. 87.
100
pelas enchentes e como um meio de o Estado ser conhecido nacional e internacionalmente.
O Governo do Estado, assim agindo, procura honrar o compromisso assumido na Carta
aos catarinenses de ‘Dispensar ao turismo tratamento semelhante ao conferido aos demais
segmentos ecomicos’”
263
. Desde então, governadores como Pedro Ivo Campos e, com
a morte do titular, o seu vice Casildo Maldaner (1988-1991) -, seguem a mesma potica;
Vilson Pedro Kleinübing (1991-1995), Paulo Afonso Vieira (1995-1998), Esperidião
Amin, no seu segundo mandato (1998-2002) e o atual governador, Luiz Henrique da
Silveira (2003- ...), na sua descentralização, priorizam essa atividade, buscando a força
representativa que ela oferece.
Pedro Ivo Campos buscou implantar novas estruturas organizacionais adequadas à
realidade de mercado, com ênfase nas áreas de promões, feiras e eventos
264
, no que foi
interrompido com sua morte após um ano de governo.
O Governo de Paulo Afonso pretendeu fazer com que o turista que buscasse Santa
Catarina se sentisse em casa, razão pela qual a SANTUR procurou melhorar cada vez mais
a qualidade do turismo no Estado. Assim, incentivou o turismo da Terceira Idade, um
importante filão, dando apoio técnico e financeiro à Associão dos Clubes da Melhor
Idade. Paulo Afonso Vieira, naquela ocaso, falava sobre a possibilidade de dar atenção à
terceira idade como fator agregador na economia local e regional, aproveitando a fonte de
renda oriunda dos aposentados. Com isto, eles poderiam contribuir no alavancamento da
indústria do turismo, que está dentro do filão da pós-modernidade. Antes disso, o
governador fez aplicações e investimentos na área social, divulgados na mídia falada,
escrita e na Internet. Tem-se a sua declaração no jornal publicado em Blumenau, em 1998,
como ilustração do seu empenho para o recrudescimento de uma grande fatia para
desenvolver o estado
foram beneficiados 1.030 idosos de 17 clubes filiados à associação, num
investimento de C$ 20 mil. Para a profissionalização do setor e
conscientização quanto à importância do turismo, foi instituída a campanha
“Você é a cara de Santa Catarina”, divulgada na mídia impressa e
eletrônica, num investimento de C$ 13 mil. Várias promoções e apoio a
262
Idem, ibidem.
263
HELOU Filho, Esperidião Amin. Mensagem à Assembléia Legislativa. Florianópolis: IOSC. 1985. p. 79.
264
CAMPOS, Pedro Ivo. Mensagem à Assembléia Legislativa. Florianópolis: IOSC. 1988. p. 327.
101
eventos de natureza turística em âmbito estadual, nacional e internacional
foram uma das prioridades de Paulo Afonso, num total de 320 eventos
265
.
Observa-se que o slogan do então governador Paulo Afonso Vieira,Você é a cara
de Santa Catarina”, faz com que a responsabilidade em receber o visitante recaia sobre o
catarinense, num jogo de marketing que, pouco a pouco, imprime um novo ritmo ao
crescimento de Santa Catarina. Entre outras ações, Paulo Afonso outorgou o projeto de Lei
do deputado estadual Pedro Bittencourt, que elevou a condição de Nova Trento à Segunda
Estância Turístico-religiosa, reproduzido no anexo 4.
Com a Lei de implantação da Segunda Estância Turístico-religiosa, sendo a
primeira a de Aparecida do Norte, o Estado dá o caráter oficializador ao Município,
enquanto a mídia propicia aos brasileiros visibilidade à Santa através dos jornais de grande
circulação. Com isto, a territorialidade neotrentina fica conhecida e a porta da
macroeconomia do turismo é aberta aos seus habitantes, pegando-os desprevenidos na falta
de um planejamento ordenado que estabelecesse uma oferta turística sincronizada com o
mundo contemporâneo. As melhorias do Município de Nova Trento-SC têm como base as
divulgações dos valores culturais daquela localidade, tornando-se com o princípio a
valorização do meio ambiente e da natureza religiosa da população local e a origem da
imigrão. Esta passou a ser exaltada nas suas múltiplas aparições, enfatizando-se assim o
ser catarinense como parte do contexto mundial, enquanto descendente de grupos étnicos
vindos da Europa e, como tal, propagador das suas culturas. (Re) descobrindo a
europeidade, alguns empresários catarinenses vêem neste novo filão, o turismo, uma porta
que se abre para os seus necios. Na fala de Esperidião Amin;
[...] Então, no nosso primeiro governo, nós procuramos transformar a
apresentação de Santa Catarina, dessa nossa variedade cultural, étnica.
Santa Catarina é um parque temático: águas termais, praias, rios,
corredeiras no primeiro mundo, euo sei falar direito, rafting - mas,
mostrar o nosso carnaval; em 84, com o surgimento da OKTOBERFEST
mostrar o Vale do Itajaí. A enchente de 83, por incrível que pareça, se
transformou num fator de simpatia por Santa Catarina. E aí, além da
descoberta que estava sendo feita pelos argentinos, gaúchos - graças a uma
rie de fatores, mas inclusive a enchente e a garra que o povo demonstrou
na reconstrução, e as características de Santa Catarina, dentre elas o Vale
265
Jornal de Santa Catarina. Suplemento Especial do Jornal de Santa Catarina. Construindo o Futuro:
ações do Governo Estadual (Paulo Afonso Vieira). Blumenau, dez. 1998.
265
HELOU Filho, Esperidião Amin. Entrevista citada. p. 2.
102
do Itaj, mas sem desprezar o Oeste, sem desprezar o Vale do Rio do
Peixe, o Vale do Uruguai, enfim, essas principais regiões – o Vale do Itaj
já tinha uma cultura turística. Eu acho que, eu não digo que explodiu, mas,
mostrou-se quase que por inteiro na década de 80. Em função do que a
região merece, e do trabalho que nós fizemos também, na Secretaria de
Cultura, Esporte e Turismo
266
.
Segundo Esperidião Amin, Santa Catarina começou a mostrar-se com mais
intensidade ao Brasil depois da enchente de 83, principalmente o Vale do Rio Itajaí, mas
também todo o Oeste. Desta forma, traçou-se um esboço da imporncia do turismo no
Vale Europeu, promovendo seu advento, com a enchente causada pelas chuvas, e a valentia
dos seus habitantes. Se de um lado proliferaram informações nos meios de comunicação
sobre as necessidades primárias da população atingida, de outro, as instituições passaram a
dar mais atenção aos seus vários públicos.
o atual governador Luiz Henrique da Silveira, no seu discurso à Assembléia
Legislativa do Estado, diz que “apóia os munipios catarinenses na elaboração de planos
para o desenvolvimento do turismo e viabiliza a implantação dos circuitos turísticos de
águas termais de turismo religioso e o eco-turismo
267
. Com a sua maneira de governar e
qualificando-se como um governo descentralizador, o que se vê na prática em Nova Trento
é a pouca contribuão desse governante, podendo-se parafraseá-lo com a letra de uma
música interpretada pela cantora italiana Mina, nos idos dos anos 70: [...] parole, parole
soltanto parole[...], ou seja, [...] palavras, palavras, somente palavras [...]. Pode-se atribuir
esta ausência do poder regional, não por questões político-partidárias, uma vez que a
prefeita de Nova Trento e o governador pertencem ao mesmo partido, mas por outras
razões, como nos esclarece Vilsom Mário Sgrott, conhecido como seu “Vita”:
[...] Alguém talvez confundiu as coisas por causa de um episódio que teve
em que elas poderiam ter recebido auxílio pra construir a nova igreja sem
grandes esforços. Só que em troca eles queriam fazer salões de convenções
no subsolo da igreja, foram de ordem política, na esfera municipal e
estadual, a federal teve interesse. Mas as irmãzinhas sentiram que depois
elas não tinham mais a liberdade de ter aquilo lá como um ambiente
reservado para a espiritualidade, eles tinham o direito de ir lá fazer
convenções, fazer reuniões, o que bem entendesse, e também com certeza
iriam fazer uma campanha política dizendo que investiram no santuário, e
eu com isso penso fazer diferente, não é por ali o caminho. Então ali houve
uma rejeição. O quê que fizeram elas? Elas não disseram “não queremos”,
266
HELOU Filho, Esperidião Amin. Entrevista citada. p. 2.
267
SILVEIRA, Luis Henrique da. Mensagem à Assembia Legislativa. Florianópolis: IOSC. Fevereiro, 2004. p. 24.
103
o agrediram ninguém.o, nós vamos pensar, vamos ver o que é
melhor. E idealizaram essa nova construção num estilo bem simples, num
sentido bem assim até religioso e pediram ao povo que ajudasse. Quem
chegar lá no futuro, e que esteve lá e ajudou, doando um tijolinho, vai
dizer: “eu também colaborei. E assim teve mais sentido, aquele sentido
próprio que é da união, de unir todos em torno de um bem comum
268
.
Por outro lado, como comenta Irmã Ilze, a falta de incentivo ao complexo do
Santuário se dá diretamente porque, segundo a Carta Magna do Brasil, a Constituição
Brasileira de 1988, no Artigo 19 inciso I, no Capítulo I sobre a Organização Político-
Administrativo “é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I
Estabelecer cultos religiosos ou igrejas, subvencioná-los, embaraçar-lhes o funcionamento
ou manter com eles ou seus representantes relações de dependência ou aliança, ressalvada,
na forma de lei, a colaboração de interesse público”
269
. De acordo com a Carta Magna
brasileira, não é permitido ao Governo ajudar qualquer instituição religiosa na sua
construção, podendo somente no seu entorno. Segundo a Irmã,
o Estado tem a SANTUR, tem esses órgãos todos, mas a gente não
resultados. Reuniões têm muitas, mas aqui parece que mais se restringe às
praias, e é lamentável que não dê um pouco mais de atenção a isso aqui.
Por exemplo, nos acessos, vias públicas, que é uma coisa urgentíssima.
Aqui por exemplo, nós precisamos nos dias de grande movimento, essa
única ruazinha aqui é um calçadão. E ali tem que transitar carros, ônibus,
tudo no meio do povo, no meio do calçao. Então já existe um projeto de
passar uma coisa pra externa, fazer um anel viário, mas tá só no papel e
o se sabe quando isso vai acontecer. Eno essa necessidade de
melhoramentos, de dar nessa parte física uma melhor estrutura para que
realmente possa acontecer o que o povo busca e o que o povo quer. Da
nossa parte [das Irmãs], fizemos o que pudemos, tem todas essas atrações,
tem todo esse parque, o santrio está dentro de um parque ecológico,
então a natureza foi toda melhorada para formar esses recantos e assim as
pessoas encontram o lazer. Veja que aqui não acontece um aglomerado
humano, nunca acontece, porque as pessoas se espalham por todo o parque,
andam pra aproveitar ver tudo, então isso é muito importante porque tem
toda essa parte da natureza que ajuda muito, bichinhos
270
.
268
SGROTT, Vilson Mário. 60 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova Trento,
17/09/2005. p. 6.
269
BRASIL. Cosntituição da Prepública Federativa do Brasil: título III da Organização do Estado
promulgada em 5 de outubro de 1988, 38ª ed. São Paulo: Saraiva, 2004. Cap. Irzinha, p. 23, art. 19.
270
MEES, Ir. Ilze. 78 anos. Vígolo. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova Trento, 17/09/2005. p. 6.
104
Esta ausência talvez seja devido ao fato de que o governador queria construir o
Santuário de Santa Paulina segundo um modelo próprio, dividindo o prédio em dois
setores, tendo o subsolo um centro de convenções destinado a reuniões e encontros e a
parte superior do prédio o espaço para a função religiosa. As Irmãzinhas o aceitaram a
proposta do Governador, por fugir ao espírito da Congregação, evitando, assim, a
ingerência do poder público nesta. Enfim, todos querem tirar proveito da situão, como
comentou Maria Cristina, “e é lógico que tem sempre o interesse político, não só a parte do
prefeito, como do governador, e muito mais, pra tá querendo entrar
271
, uma vez que,
construindo o Santuário, daria visibilidade ao seu governo.
Eno, em 2003, começou, da parte das Irmãzinhas, a construção do Santuário com
“caráter arquitetônico [que] retrata a essência da trajetória de Santa Paulina, mulher
simples, de valoreslidos e puros e de intensa espiritualidade
272
, definição esta cunhada
pelos responsáveis do projeto, entre eles a Herwig Shimizu Arquitetos, de Blumenau.
A partir da retirada das Irmãzinhas do cenário político, a presença governamental é
quase ínfima na manutenção do santuário, cujos acessos inicialmente tiveram ajuda do ex-
governador Amin, e, pelo decreto n. 912 de 18/01/2000 da Comissão Governamental de
Acompanhamento e Implementação do Plano de Turismo Religioso-Madre Paulina, houve
reuniões com várias secretarias do governo tais como: Secretaria de Estado de Transportes e
Obras - DER; Secretaria de Estado da Saúde; Secretaria de Estado de Governo; Secretaria de
Estado de Segurança Pública; Departamento Nacional de Infra-estrutura de Transportes
DNIT; e Santa Catarina Turismo S. A. – SANTUR. As benfeitorias a serem realizadas pelas
Secretarias estão dispostas nas atas das reuniões, que constituem o anexo 2 desta dissertação.
A Ir. Coordenadora do Santuário nos faz uma retrospectiva de como foi ajudado o
Santrio pelos poderes públicos:
No início até agora, nos primeiros tempos, quando começou aqui, tivemos
alguma ajuda da prefeitura. Então para o acesso, que era uma estradinha de
terra, eno já começaram esse caamento, então o prefeito se interessou.
Quando tivemos essa colina, a imagem lá em cima no alto morro nós a
instalamos aí pra comemorar o centerio da fundação da Congregação,
mas nunca podíamos imaginar que se transformaria num centro de turismo,
de peregrinação. Então quando isso foi feito recebemos iluminação
271
ADAMI, Maria Cristina. 40 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova
Trento, 17/09/2005. p. 4.
272
Em breve, um novo santuário. Diário Catarinense/ Jornal de Santa Catarina. Nova Trento, 18 maio
2003. Cultura, p. 3.
105
pública, à noite já é mais uma proteção, a prefeitura ajudou no calçamento,
um pouco de terraplanagem. E depois nessa parte o governador Amin, na
gestão dele, nos ajudou bastante. Foi no ano da canonização, 2002, então o
governador Amin melhorou a parte de telefonia, de eletricidade, mandou
instalar uma rede pública em todo esse recanto aqui, nos beneficiou com
aquele bloco de banheiros, mandou construir o posto médico, porque ele
sempre vinha atendendo, era estudante de medicina que vinha atendendo,
era todos os domingos debaixo de uma lona pra atender o povo, essas
emergências que acontecem. Então ele determinou que construíssemos ali e
foi subvencionado. E por seis meses as maquinas trabalharam pra fazer o
corte do morro. Agora, depois disso, nem um grão de areia mais
273
.
Com a intervenção do governo Amin, o bairrogolo passou por uma revitalização
e, como diz o senhor Vita, “eu conheci, [...] e vai lá agora, que conheceu, houve um
verdadeiro milagre. A rua pavimentada não era pavimentada, iluminada, não era
iluminada, tem telefone, não tinha telefone, tem hoje gastronomia, com restaurante, com
as pessoas, enfim, tudo o que fizemos foi ao longo de 91 até agora
274
.
A melhoria do bairro faz parte deste contexto e está relacionada com o nome que
designa o munipio e se faz conhecer: Santa Paulina do Corão Agonizante de Jesus, a
primeira Santa brasileira. O local está ligado aos italianos, que trouxeram na sua bagagem
a identidade religiosa nas venerações dos santos católicos, construindo igrejas, dois
Santuários, capitéis, e participando das missas e rezas. Deste modo, houve uma abertura no
campo espiritual, em Vígolo, com a canonização, propiciando um crescimento do volume
de passantes que se destinavam para lá, principalmente pela busca de cura, de conforto
espiritual, para pagar e para fazer promessas na procura tanto do sagrado quanto do divino
ou, simplesmente, por lazer.
3.2 A fé como trade
Com o Decreto nº 6.663, de 17 de junho de 1874, o Governo Imperial do Brasil e
seu representante no exterior, Joaquim Caetano Pinto, abriram as portas à odisia de
imigrantes europeus motivados pela propaganda a respeito das férteis terras brasileiras.
Essa imigração, principalmente de alemães e italianos, foi iniciada em grande escala por
volta da década de 70, do século XIX. Mas chegando no solo da sua cuccagna, os
imigrantes trentinos encontraram, em Nova Trento, um relevo constituído de superfícies
273
MEES, Ir. Ilze. Entrevista citada. p. 7.
274
SGROTT, Vilson Mário. Entrevista citada. p. 5.
106
planas, onduladas e montanhosas, cujo solo possui baixa fertilidade e acidez, com altos
teores de alumínio
275
.
Entre os pioneiros de Nova Trento a se destacarem, estão os Archer, os Battistotti,
os Battisti, os Marchi e tantas outras falias. O topônimo foi heraa desses primeiros
colonizadores que, em sua maioria, vieram da regione de Trento, norte da Itália. Em 18 de
março de 1881, pelo Decreto número 8.455, acontecia a emancipação das colônias Itajay e
Príncipe Dom Pedro, das quais Nova Trento fazia parte, sendo denominada primeiramente
como Tijucas, logo em seguida Alferes e, hodiernamente, Nova Trento.
Para uma maior organizão estadual, o Munipio integra a microrregião dos Vales
do Tijucas e Itajaí-Mirim, composta de oito municípios: Botuverá, Brusque, Major
Gercino, São João Batista, Canelinha, Leoberto Leal, Vidal Ramos e Tijucas, cujo centro
polarizador é Brusque. Faz parte da AMGRANFPOLIS – Associação dos Municípios da
Grande Florianópolis, composta de 22 municípios, com sede em Florianópolis.
A extração de madeira foi a primeira atividade a ser explorada, seguida da produção
caseira de vinho e seus derivados, como a graspa e o vinagre. Os casulos e ovos de bicho-
da-seda foram introduzidos pelos primeiros italianos, ganhandorios prêmios, nacionais e
internacionais, nos seus primórdios.
Quanto aos aspectos econômicos propriamente ditos, Nova Trento está mais
vinculada às atividades do setor primário, caminhando para o secundário e terciário, como
acrescenta Onildo, engenheiro civil e presidente do Clube dos Dirigentes Logistas - CDL
de Nova Trento: “é a agricultura depois voltou ao turismo. Seria então comércio,
agricultura e turismo. E em seguida chegou o calçado, temos aqui do lado São João Batista
que essa fábrica vem se instalar
276
. Dessa forma, temos os três setores que estão
relacionados com diferentes tipos de bens e serviços que movimentam a economia
neotrentina, assim distribuídos:
a) Setor primário: conjunto de atividades relacionadas com atividades agrícolas,
pesqueiras, pecuárias e extrativismo;
275
Programa Integrado de Desenvolvimento Sócio-econômico: Diagnóstico Municipal de Nova Trento.
Florianópolis, 1990. p. 8.
276
DALBOSCO Junior, Onildo. 35 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova
Trento, 17/9/2002. p. 3.
107
b) Setor secundário: formado pelo conjunto das atividades econômicas
relacionadas com a produção industrial (calçado e vestuário). A construção civil
também se inclui nesse setor;
c) Setor terciário ou de serviços: constituído pelo conjunto de atividades
ecomicas relacionadas com a prestação de serviços. Como exemplo temos os
bancos, o comércio, os transportes e outros.
A produção de vinho destaca-se na economia de Nova Trento. Vinícola localizada no acesso ao Santuário
Fonte. Arquivo particular de José do Nascimento
O setor primário contribui em 30% para a economia local e, dentre as culturas de
maior relevância, encontram-se: fumo, mandioca, milho, feijão, uva,ssego, banana e
laranja. Na pecuária, a exisncia de rebanhos bovinos e suínos é efêmera. O setor
secundário representa 40% com destaque para a construção civil, que gera,
aproximadamente, 800 empregos, e a indústria, que com 80 empresas, contribui com 1.000
empregos distribuídos nos setores de calçados, vestuários, mobiliários, metal-mecânico,
eletrônico, fogos de artifício e produção e venda de vinho. Os outros 30% representam o
setor terciário, através do comércio e da prestação de serviços.o 205 estabelecimentos
108
comerciais, gerando aproximadamente 1.000 empregos, e 115 empresas prestadoras de
serviços
277
. Para uma melhor visualização, ver as tabelas 2 e 3. As datas da tabela 2 são
díspares em razão de que não foi possível obter dados anteriores, por não estarem
catalogados e disponibilizados em rede. Recorremos ao senso do IBGE, como observamos
na tabela 3
278
, na qual estão agrupados os três setores; para dar uma visão geral do
crescimento econômico da região. Vale ressaltar que essa pesquisa é datada de 1991 a 2005.
Tabela 2
FLUTUAÇÃO DO EMPREGO FORMAL
ANO COMP ADMITIDOS DESLIGADOS SALDO
2005 - 2005(*) 1.400 1.065 335
2004 - 2004 1.755 1.564 191
2003 - 2003 1.506 1.235 271
2002 - 2002 1.241 1.155 86
2001 - 2001 1.350 1.283 67
2000 - 2000 1.359 1.277 82
1999 - 1999 1.187 1.008 179
1998 - 1998 1.095 1.081 14
1997 - 1997 1.138 1.275 -137
1996 - 1996 1.206 1.148 58
Total 13.237 12.091 1.146
Fonte: TEM/Caged, Sine/Santa Catarina – Sistema Nacional de Emprego. *Até 04/10/05
Observando a tabela 1, vemos que os admitidos somam um total de 13.237, e os
desligados, 12.091. O saldo positivo de flutuação de emprego, embora seja estimada uma
população economicamente ativa, é de 1.146, no período de 1996 a 2005. Já a tabela 3
mostra um aumento na indústria, corcio e serviços, no período de 1998 a 2003.
Tabela 3
1998 indústria comércio serviços total
Nova
Trento
55 53 32 140
2003 indústria comércio serviços total
Nova
Trento
65 71 61 197
Fonte: Min. Trabalho e Emprego.
277
Plano Integrado de Desenvolvimento de Turismo Sustentável: Nova Trento SC. op. cit. p. 18.
278
SINE/Santa Catarina Sistema Nacional de Emprego [e-mail de Osnildo Cardoso] Endereço eletrônico:
osnildo.mte@ig.com.br.
109
Vemos que a indústria obteve considerável crescimento no período, sendo
responvel pelas atividades de transformação de matérias-primas através do beneficiamento
de madeira e da fabricação deveis, artigos de vestuário, calçados, vinhos, queijos e fogos
de artifício. Segundo Onildo, a industrialização do município é dividida em
dois tipos de construções. São construções industriais com duas indústrias
grandes que chegaram na cidade e estão trazendo pessoas para trabalhar
nessas indústrias. Temos construções de médio porte, para pousadas, nós
devemos ter hoje quatro pousadas instaladas, bem instaladas por sinal. Mas
então o construções de médio porte. O que tem o duas indústrias
grandes na cidade [proporção de quatrocentos empregados], grandes se
comparada ao tamanho da cidade
279
.
O comércio obteve um crescimento ainda maior, de 1998 a 2003, tornando este
setor o mais dimico das atividades do Município, com mais ou menos 86
estabelecimentos comerciais. E, dentro desta perspectiva, os serviços tiveram no turismo o
grande propulsor, predominantemente para a cidade, cujo motivador é Santa Paulina,
enquanto símbolo que agrega valor religioso mas também, como alavancadora da
economia local e da vizinhaa, tanto para indústria quanto para o comércio, ligando os
ts setores da economia local. Vemos, no anexo 5, o Censo do IBGE, como era a
produção nas décadas de 70 e 80.
Analisando os números, temos 1348 pessoas empregadas, que se supõe originárias
de outros municípios. Envolvida no setor secundário, estima-se uma população
economicamente ativa para o ano 1989, por projeção. Contudo, a realidade é bem
diferente. Na atualidade, são muitos os neotrentinos que buscam apoio econômico em
outras cidades, como Brusque, Blumenau, Florianópolis e outros centros, e que ficam por
lá depois da formação, como comenta Onildo: “tinha outros. Eu posso dizer que meus
amigos da minha idade, a gente se reúne com os amigos da infância, eu sou o único que
permanece em Nova Trento, dos mais chegados
280
. E comenta, ainda, Saul Rover,
professor aposentado e ex-prefeito, Secretário de Turismo quando da realização da
entrevista e, atualmente, Secretário de Saúde, que
279
DALBOSCO Júnior, Onildo. Entrevista citada. p. 2.
280
Idem. p. 4.
110
todos os jovens estão em sala de aula estudando, isso é importante, que
haja possibilidade de todos participarem da escola, é na educação que se
prepara o futuro. Então eu acho Nova Trento, o neotrentino em si, que nós
somos especiais também. Apesar de que no primeiro momento que nós
viemos da Itália, nossos antepassados, tenham sofrido muito aqui em Nova
Trento para conseguir o que temos hoje. Mas graças a Deus estamos muito
bem, não temos do que reclamar
281
.
Porém, o que observamos é que pessoas que fazem o terceiro grau dificilmente
retornam. Somente os que não deram continuidade aos estudos, neste caso poucos,
permanecem na cidade. Mas ao-de-obra geralmente vem de outros estados, como Rio
Grande do Sul, Paraná e tantos outros, para fazer a sua Merica em terras de imigrante.
Como diz Luciano, proprietário de um restaurante na cidade e aluno de direito em
Tijucas, “elas [cozinheiras] vieram à Nova Trento atrás de trabalho de que forma? Atras
da Madre Paulina também, mas mais pela região, o só Nova Trento como São João e o
pólo calçadista. Muitos moram aqui, marido trabalha em São João, mas a esposa trabalha
na cidade de Nova Trento”
282
. Mas, para Onildo, a questão forte é que
ela [Santa Paulina] entra nisso tudo. Todo mundo vem com a esperança de
que a cidade vai crescer e que essas indústrias cresçam junto com a cidade.
Tudo em torno da Madre Paulina. Então o comércio vai crescer, a indústria
vai crescer e existe o outro comércio de produtos coloniais e de enfeites, de
vela, de santinho e que esse é um comércio localizado da basílica
283
.
Quanto às representações sociais neotrentinas, há formas variadas e, como se vê na
fala de Esperidião Amin, a representatividade da cidade com Santa Paulina
se confunde, né? A imagem de Nova Trento, quando eu conheci, era mais
forte que a imagem de Santa Paulina. Hoje, eu acho que a imagem de Santa
Paulina é mais forte do que as outras coisas que Nova Trento oferece.
Também são muito importantes. Porque, é muito... O brasileiro
personaliza: Nova Trento é a terra de Santa Paulina”, é mais fácil dizer
isso do que dizer:Santa Paulina, aquela que nasceu em Nova Trento”.
Eno, é maior. Maior do que o quê? Eu não quero dizer que será maior,
virou referência. Quer dizer, a referência de Nova Trento hoje está muito
associada à Santa Paulina; não obstante Nova Trento tenha outros valores
281
ROVER, Saul, 60 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a Jo do Nascimento. 17/09/2005. Nova
Trento. p. 3.
282
SGROTT, Luciano Ari. 28 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova Trento,
17/9/2002. p. 5.
283
DALBOSCO Junior, Onildo. Entrevista citada. p. 3.
111
que já nos encantavam antes. Mas, eu acho que com Santa Paulina, Nova
Trento ganhou muito e pode ganhar muito mais
284
.
Para conseguir este entrelaçamento, verificou-se, portanto, que as pessoas usam
Santa Paulina atras dasrepresentões coletivas mais elevadas que não m existência,
oo realmente tais senão na medida em que comandam atos”
285
, como afirma Chartier.
O autor ainda acrescenta que “são sempre determinadas pelos interesses dos grupos que as
forjam”. E continua: “As lutas de representões têm tanta importância como as lutas
econômicas para compreender os mecanismos pelos quais um grupo se impõe ou tenta se
impor, a sua concepção do mundo social, os valores que são seus, e do seu domínio
286
.
A Relação de Movimento dos Apêndices, da Prefeitura Municipal de Nova Trento,
dos anos de 1992 a 2005, nos mostra que os serviços informais, como os do camelódromo,
desenvolveram-se consideravelmente, e nota-se que nos anos subseqüentes houve uma
explosão desse tipo de comércio em Vígolo. No centro da cidade, existe somente um
camelódromo, como vemos no anexo 5.
Os números demonstram que, nos últimos anos, Nova Trento foi envolvida por um
turbilhão de pequenos negócios abertos depois da beatificão, com mais intensidade ainda
depois da canonização. Acompanha esse crescimento a construção civil e a vinicultura,
com muitas vinícolas abertas em todo o Município, principalmente em volta da rua Madre
Paulina, em direção ao Santuário. Isto porque, após 1991, houve a descoberta dessa
produção de Vígolo por um maior número de visitantes. Antes da data anteposta, eles
conheciam pouco o território vigolano e seus produtos, como diz nia Maria Girolla:
[...] antes já se vinham algumas pessoas que já conheciam, ou tinham
ouvido falar de Santa Paulina . [...] Mas naquela época não se vinha muito
turista, era um carro ou outro que vinha mais atrás do vinho. Mas naquela
época eles vinham mais atrás do vinho, pois o vinho de Nova Trento estava
ficando famoso. Então já existe cliente de vinho já de 30 anos atrás, aqui da
vinícola mesmo né? Mas era pouco. [...] Então se começaram a abrir as
portas da vinícola que era uma fábrica bem pequena que produzia na faixa
de 10 mil litros por ano, ou 5 mil litros por ano, naquela época, e logo
começou no outro ano 10, e no outro ano 15 e começou um aumento com
isso então ele [o Girolla pai] sentiu que o turista veio à procura do vinho,
284
HELOU Filho, Esperidião Amin. Entrevista citada. p. 13-14.
285
CHARTIER. Roger. À beira da falésia: a hisria entre incertezas e inquietações. Porto Alegre: UFRGS,
2002. p. 45.
286
CHARTIER. Roger. Op. cit. p. 17.
112
ele não precisou ir atrás para vender, pois vieram atrás dele. [...] Hoje a
produção da Vinícola Girolla [...] está na faixa de 550 mil litros por ano
287
.
Alguns neotrentinos, percebendo as idas e vindas destas pessoas de destinos
diferentes, procuraram absorver este filão de mercado que são os peregrinos, dando-lhes
alimentação e acolhimento. Com a presença sempre mais constante deles na procura pelo
Santuário, abre-se a possibilidade de absorver este filão de mercado, vendendo os produtos
típicos da região, como queijos, es, vinhos, licores, embutidos, mel, geléias. Esses
produtos, que até então tinham uma produção caseira e para o consumo familiar, passam a
ser produzidos para venda, tornando-se uma renda a mais para a falia. Já quanto à
alimentação, foram abertos mais ou menos quatorze restaurantes
288
, quatro confeitarias e
panificadoras. Existiam na cidade três locais de hospedagem: Hotel Viviane, Hotel
Bitencurt e o Centro de Encontros Imaculada Conceão CEIC, isto até 1989. Nos dias
atuais, a cidade possui cinco estabelecimentos para a hospedagem: Hotel Viviane,
Mosteiro Park Hotel, Pousada Cantina Italiana, Museu e arte, Sogno Mio Pousada, Pousada
Aconchego, Pousada Dalnete e Pousada do Portal dogolo.
Como se pode observar, a fé está movimentando o mercado e quem faz esse
movimento são as pessoas. Segundo a coordenadora para assuntos externos, Ir. Ilze, “tem
dias que aproximadamente 5 mil, 2 mil, 3 mil pessoas vêm ao Santuário”
289
, números estes
estimados pelo fluxo de ônibus fretados e automóveis particulares que se utilizam do
estacionamento do Santuário, como a própria coordenadora comenta. José Amilton
Fernandes dos Santos, responsável pelo estacionamento, nos diz como é executado o serviço:
Olha, os estacionamentos aqui funcionam da seguinte maneira: vamos
começar do início.s temos estacionamentos privativos, próximos à
igreja, que acho que você já notou, com cordões, ali só entra o pessoal
acima de 70 anos, pessoas com deficiência de locomoção, pessoas com
cadeira de rodas, pessoas doentes pós-operaria, e pessoas que têm que ter
um atendimento diferenciado. Então esses estacionamentos são reservados
de propósito, não é cobrado nada. Então às vezes alguém tá passando, é
bloqueado e tem que dar ré, mesmo que ele esteja entrando num
estacionamento pago ele é bloqueado e voltado imediatamente pra esses
estacionamentos gratuitos por causa dessas pessoas. Não é questão do
dinheiro, a nossa questão aqui é segurança. Os estacionamentos privativos,
287
Ver no anexo 6, a lista das vinícolas de Nova Trento. GIROLLA, Tânia Maria. 27 anos. Nova Trento.
Entrevista concedida a Jo do Nascimento. Nova Trento, 17/9/2005. p. 2-3.
288
Ver no anexo 7 as listas dos restaurantes e pousadas, e no anexo 8, confeitarias e panificadoras com os
seus respectivos endereços.
289
MEES, Ir. Ilze. Entrevista citada. p. 4.
113
os pagos, funcionam assim: pagos por enquanto nós temos quatro
estacionamentos pagos, esses estacionamentos funcionam assim: os ônibus
pagam cinco reais o dia todo, chega de manhã, ele pode sair e voltar a hora
que ele quer, se ele precisar de nota fiscal ele tem. Os estacionamentos de
veículos, de automóvel, é três reais o dia todo também, tem direito de sair
quantas vezes ele quiser e voltar, é uma taxa única. Se ele ficar o dia todo é
três, se ele ficar uma hora é três, a gente não pode diferenciar esse lado.
Tem os gratuitos também que são mais abaixo da igreja
290
.
As linhas de ônibus de passageiros inter-regionais e local são precárias, e antes da
beatificação a única a empresa de ônibus que havia era a Reunidas. No momento há, além
dela, várias outras que se estabeleceram, como a Catarinense, Santa Terezinha, Santo Anjo
e União Cascavel. Mas “foi tirado algumas linhas, porque as empresas não pensam em
pessoas, elas pensam em números”
291
. Em razão “dos números” dos passageiros, muitas
destas empresas se retiraram de Nova Trento, como se observa na fala de Márcio, agenciário
da rodoviária de Nova Trento. O serviço de transporte dentro do Munipio é feito pela
empresa Transporte Coletivo Santa Paulina, cujo trajeto vai da Rodoviária a Vígolo e vice-
versa, passando pelo bairro Trinta Reis e pelo distrito de Claraíba. Contudo, foi constatado,
in loco, que os horários para Vígolo estão diminuindo. Como se percebe pelo relato de
Márcio, o fluxo do transporte coletivo está diminuindo porque não passageiros
suficientes. A empresa Santa Paulina tem um fluxo maior no primeiro horário, quando leva
as proprietárias e recepcionistas para Vígolo, e no final do dia, quando as traz de volta.
Indiscutivelmente, a procura por Nova Trento reflete sobre e para o mercado. Aqui
se entende mercado por troca de valores ou produtos, de acordo com a definição de lia
Maria dos Santos e de Edmir Kuazaqui, segundo os quaisé um sistema de informões
que permite a milhares de agentes econômicos, produtores e consumidores tomar decisões
necessárias para que a sociedade alcance a eficiência e a satisfação desejada”
292
. E, como
explana Beni, “a estrutura do mercado turístico é definida como a parte da economia que
estuda e analisa a realidade ecomica do turismo baseada em um mercado onde confluem
a oferta de produtos e serviços turísticos e a demanda que está interessada e motivada a
consumi-los”
293
. Esta demanda mercadológica se reflete nas pessoas, que se tornam um ser
290
SANTOS, Jo Amilton Fernandes dos. 50 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a Jo do
Nascimento. Nova Trento, 17/09/2005. p. 4.
291
CAMPOS, Márcio. 36 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova Trento,
17/09/2005. p. 3.
292
SANTOS, Célia Maria dos; KUAZAQUI, Edmir. Consolidadores de turismo: serviços e distribuição.
São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2004. p. 3.
293
BENI,rio Carlos. Op. cit. p. 149.
114
economicus, isto é, que agem conforme as leis de mercado procurando maximizar a
riqueza por meio de novos métodos produtivos. Por demanda podemos considerar,
segundo Edmilson José Arendit, como “sendo a quantidade de um determinado bem ou
serviço que as pessoas estão dispostas a adquirir a um determinado preço e em um
determinado momento
294
. Sendo a localização do Santuário em Vígolo, este é mais
visitado, e com isto se expande, enquanto outras partes do Munipio permanecem um
pouco adormecidas. Como coloca Karl Marx[há] relações materiais entre pessoas e
relações sociais entre coisas [...]
295
.
Com a procura principalmente pelo Santuário de Santa Paulina, ou seja, pelo
sagrado, surge uma nova fonte de renda: o turismo religioso. Para José Vicente de
Andrade, este designa “o conjunto de atividades com utilizão parcial ou total de
equipamentos e a realização de visitas a lugares ou receptivos que expressam sentimentos
sticos ou suscitam a fé, a esperança e a caridade [as três virtudes teologais] aos crentes
ou pessoas vinculadas a religiões”
296
.
Esta prática se deu depois da beatificação, em 1991 e, com mais intensidade, em
2002, com a canonização de Santa Paulina no Vaticano. A partir desses momentos decisivos,
se tornou local de veneração e um grande centro de peregrinação, sob o controle da Filhas
Espirituais da Santa, instituídas em 1890, com o título de Irmãzinhas da Imaculada
Conceição, com Regra e Constituição própria. Já o Santuário tem um Estatuto Canônico
próprio, dividido em um preâmbulo (breve histórico), e quatro capítulos com seus artigos e
parágrafos. O primeiro capítulo se refere à denominação, natureza e finalidade; o segundo
capítulo ao governo, à administração geral, à administração local, às comissões, à relação
com a Arquidiocese, à nomeação do reitor e do capelão, bem como suas atribuições; o
terceiro capítulo versa sobre funções e competências, sobre a pastoral do Santuário (ação
evangelizadora, animação pastoral, liturgia, sacramento, cantos) e sobre devoção à Santa
Paulina e à Nossa Senhora de Lourdes; o último capítulo diz respeito à administração
econômica e financeira que rege todo o complexo na parte física, econômica e espiritual.
294
ARENDIT, Edmilson José. Op.cit. p. 56.
295
MARX, Karl. O Capital. São Paulo: Difel, 1988. p. 82.
296
ANDRADE, José Vicente de. Op. Cit. p. 77.
115
Com as aparições dos “beija-flores” em Vígolo, fez-se necessário adequar o meio
físico para recebê-los, com todo o processo de ida e vinda deles, isto no início da década de
90. Na atualidade, as coisas estão acontecendo muito rápido, como fala a Ir. Ilze:
s [Irmãzinhas] estamos sempre em cima do imprevisível. Sempre, sempre,
tudo aqui é imprevisto. Quando vieram os primeiros depois da beatificação,
não havia água, não havia telefone, não havia lanchonete, não havia nada,
nada, nada, banheiros, nada disso, não tinha infra-estrutura nenhuma. Então
o povo nos botou a correr. Por isso temos muita coisa ainda improvisada, que
pela urgência tivemos que fazer do jeito que dava na época. Não tínhamos
recursos nenhum aqui, então íamos fazendo, fazendo. Por exemplo,
comamos com dois banheiros, os primeiros banheiros eram aqueles de
fossa, de tábua, tinha atrás do botequim. Então quando fizemos três
banheiros parecia que tava resolvido. Daqui a pouco não teve mais nada,
eno vai obrigando a criar. Por exemplo, a igreja. Os primeiros se reuniam
na igreja aqui. Mas era essa igreja uma capela do interior, uma capela pra
essa comunidade aqui, o pessoal dessa localidade aqui. Tivemos que a toque
de caixa construir um salão pra receber o pessoal. Agora temos, se Deus
quiser, pro ano que vem, será inaugurado
297
.
A Ir. Ilze, que é de Luiz Alves, mora atualmente na comunidade religiosa de
golo, berço da Congregação que se propagou nos três continentes: Americano, Africano
e Europeu. Um fato interessante, que ocorreu dentro do Instituto fundado pela Santa,
depois da deposição de Madre Paulina do cargo Superiora Geral ad vitam, em 1909, pelo
bispo de São Paulo, Dom Duarte Leopoldo e Silva, foi a anulação do primeiro Capítulo
Geral, ocorrido em Nova Trento, em 1903. Uma vez anulada a eleição de Madre Paulina
como Geral por Dom Duarte, foi decretado que fosse feito um novo pleito, o qual “daria
uma veste jurídica”
298
à Congregação nascente.o esqueçamos que até então a
Congregação estava sob o direito diocesano e, para entrar em uma nova Diocese, o
Ordinário local teria que convidar as Irzinhas, o que já seria um primeiro passo para a
aceitação e reconhecimento delas, dado que teriam de estar sob a autoridade eclesiástica.
Assim, o Capítulo Geral ocorrido em São Paulo é considerado oficialmente como o
primeiro, e uma das decisões foi a demissão de Madre Paulina do cargo de Superiora Geral
e eleição para nova Superiora, sendo escolhida a Madre Vicência Teodora da Imaculada
Conceição. O tempo de permancia na direção da Congregação foi estipulado em dez
297
MEES, Ir. Ilze. Entrevista citada. p. 4.
298
LORENZI, Guido. Op. cit. p. 120.
116
anos. Depois do XXI Concílio Ecumênico Vaticano II, ficou restrito a quatro anos, com
direito a reeleição.
Em função do aumento do fluxo de passantes pelo Santuário depois da beatificação,
fez-se necessária a presença permanente de uma Irmãzinha que tivesse passado por uma
experiência de Geral, a começar pela Ir. Maria Monfort, que deixara a função de Superiora
e viera para Vígolo tomar conta das “flores” do Santuário. Ela deixou na cidade uma
grande estima, embora para alguns nem tanto. É considerada por muitos, até mesmo por
aqueles resignados, uma mulher decidida e obstinada, que muito ajudou os vigolanos a
estruturar as obras do Santuário. Atualmente, esta responsabilidade está a cargo de Ir. Ilze
Mees, tida como mulher forte e com uma ligação íntima com a terra. Ela exerceu muitos
cargos na Congregação, desenvolvendo atividades de educação e formação e, agora, uma
vez aposentada, se dedica, como ela se auto-define, aplantar flores” no Santuário. O
sistema administrativo das Irmãzinhas permite uma relação para o exercício coletivo. É
uma disciplina fechada e em movimento contínuo nos processos administrativos, tendo
seus valores pautados na razão instrumental, com ênfase no conhecimento voltado para o
espiritual, no interesse econômico, desempenho, maximização de recursos, fins e êxito.
Como diz Maria Cristina Adami, “as irmãs, elas são uma organização formada, e
uma organização que tende a crescer e a abrigar. Parece que todas pensam igual, que
querem cada vez mais, [grifo nosso] e o lado político cada um faz pra si
299
. Com isto, o eu
e o s distinguem-se dentro da vida religiosa, extirpando-se o primeiro por levar ao
individualismo e estimulando-se o segundo por levar à coletividade. Poderíamos
parafrasear com o ditado popular: “várias cabeças pensam melhor que uma”.
A administração das Irmãzinhas, louvada por muitos, possibilita as idas dos passantes
ao Santuário. Tanto a Ir. Ilze como os demais entrevistados, quase todos habitantes de Nova
Trento, são unânimes em afirmar que existem dois tipos de freqüentadores do local: o
peregrino (romeiro), e o turista. O peregrino (ou romeiro) entrelaça-se nos atos e gestos
devocionais, são constantes e vêm de ônibus, de automóvel ou a, na sua maioria em
pequenas ou médias caravanas. Como se pode observar na fala de Pedro Paulo Vargas,
comerciante de sorvete italiano, caldo de cada de açúcar, refrigerantes e outras guloseimas
em estabelecimento localizado na praça do Santuário, em Vígolo,
299
ADAMI, Maria Cristina. Entrevista citada. p. 5.
117
É porque são pessoas que vêm de ônibus, então são pessoas que têm pouco
poder aquisitivo, então têm pouco dinheiro, já vêm com o dinheirinho
contado. Então a gente já sabe, a época deles e a época de temporada de
praia, temporada de praia tu sabe que quem vai pra praia tem dinheiro. Aí
o pra lá, alugam casas, são tudo um pessoal de fora, de outros estados. Aí
chegam pra cá, pra Santa Catarina, litoral, aí nunca eles deixam de visitar a
Santa Paulina, o santuário. Mas isso acontece mais quando o tempo tá que
nem hoje, chuva. Na praia, não dá pra pegar uma praia, então o que
acontece? Aqui dentro enche
300
.
Assim, os turistas que vêm nos meses de férias escolares e visitam o Santuário são
veranistas para as praias, cuja ida ao Santuário está mais centrada como passeio, lá indo
quando chove, por não haver muita opção no local de veraneio; então eles se deslocam
com os seus em direção ao Vale do Rio Tijucas. Ou são, ainda, pessoas que vêm de outros
lugares para fazer visitas a parentes que, como ponto tustico a mais para mostrar, os
levam até a terra de Santa Paulina. O que se pode constatar é que os passantes, tanto os
peregrinos quanto os turistas, bebem da mesma fonte, direta ou indiretamente, na sua
permancia no local ou na ida até o Santuário, porque há que se levar em considerão
que a religiosidade faz parte da condição humana. O turista pode afirmar que foi apenas
fazer turismo e se considerar racionalmente ateu, rao, mas a sua alma é religiosa. Sua
esncia, na praxis, se entende em dois sentidos: o primeiro como destino - o que se vem a
ser; e o outro como caráter, dada a condição humana, que consiste de certos valores e
virtudes. Ir. Ilze, na sua experiência de coordenadora e de Superiora Geral, divide nesses
dois grupos, o peregrino e o turista, os que freqüentam o Santuário:
Existe turista que ouviu falar desse local e vem conhecer. Eno ele vem
para passear, e não é impulsionado pela fé, mas apenas curiosidade, pelo
gosto de conhecer novos lugares. Enquanto que o peregrino é aquele que
vem animado pela fé, haja vista essas caminhadas que fazem dias, semanas
inteiras, chegando aqui com os pés em bolhas, é alguma coisa. E vem
médicos do sul do estado, todos os anos um grupo de dicos fazem essa
romaria a pé. Então o senhor vê que isso atrai a todos, é como da
Espanha, de Compostela. Então é para todos os níveis sociais, e es
começando muitas romarias organizadas de 200 ou até mil pessoas, como é
a de Itajaí, que é a mais organizada, e a mais sistemática. E outros grupos,
de 100, 200 pessoas que m
301
.
300
VARGAS, Pedro Paulo. Entrevista citada. p. 2
301
MEES, Ir. Ilze. Entrevista citada. p. 3.
118
A associação do peregrino e do turista surge para os comerciantes como um novo
segmento mercadológico em que interagem a oferta e a demanda. Aqui se observam as leis
de mercado, segundo as quais o homem se torna um ser economicus, que se adapta à
realidade procurando maximizar os seus bens como numa “sociedade de risco”, de acordo
com Anthony Giddens. Frente a essa afirmação, vem ao nosso encontro Mário Carlos Beni,
para quem “[...] os mercados constituem um sistema de informação que permite a milhares
de agentes econômicos, produtos e consumidores, até certo ponto isolados entre si, tomar
as decisões necessárias para que a sociedade toda possa alcançar as três eficiências –
atributiva, produtiva e distributiva
302
.
Com tal acontecimento para o Brasil e em particular para Santa Catarina, o
Deputado Estadual Pedro Bittencourt, sentindo que o município seria por essa mola um
lo propulsor na destinação tustica depois da beatificação da Madre Paulina, encaminha
para ser votado na Assembia Legislativa do Estado o projeto visando tornar Nova Trento
a Segunda Estância Turístico-religiosa do Brasil, que vem outorgado com a Lei nº 10.568,
de 07 de novembro de 1997. Segundo Luiz Renato Ignarra, autor do livro Fundamentos do
Turismo, “é o local que o turista procura, esta destinação é classificada em atrativo
turístico, complexo tustico, área tustica”
303
. A localizão da segunda estância e seus
arredores possui atrativos turísticos, como nos relata Enizete Terezinha Cadorin,
credenciada pela Empresa Brasileira de Turismo EMBRATUR, quando questionada se
abriria um negócio em Nova Trento. Como guia turística e trabalhando na Secretaria de
Turismo no Munipio nos diz que: “a parte do turismo rural é que está começando, tá
evoluindo e no interior de Nova Trento tem muita paisagem maravilhosa que vo pode
aproveitar pra descanso, pras pessoas que são de fora, que querem praticar algum turismo
de aventura, trilhas ecogicas, e conhecesse também, vivencia”
304
.
Segundo a Organização Mundial do Turismo (OMT), a prática do turismo, nas suas
diversidades (Beni as classifica em 36 tipos
305
) é a atividade que mais cresce no mundo.
Em 2003, somavam, nos mais diversos países, aproximadamente 694 milhões de turistas,
gerando entradas no valor de 514 bilhões de dólares – e nesses números não estão
302
BENI,rio Carlos. Op. citada. p. 54.
303
IGNARRA, Luiz Renato. Fundamentos do Turismo. São Paulo: Pioneira, 1998. p. 47.
304
CADORIN, Enizete Terezinha. 38 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova
Trento, 17/09/2005. p. 1.
305
Ver no anexo 9.
119
contabilizados os turistas nacionais, ou seja, aqueles que viajam no interior dos próprios
países, o que os aumentaria ainda mais. Com o turismo, um reflorescimento de burgos
na Europa e, com as metas de peregrinação aos lugares sagrados do Oriente-Médio, como
Jerusalém, Meca e Medina, esses se tornaram conhecidos, expandindo as suas fronteiras
econômicas, fincando os seus rizomas e consolidando-se na associação do não tão novo
filão de mercado que é o turismo religioso. Doris nos coloca que a procura dos
[...] lugares religiosos se transformaram em atrações turísticas, em
detrimento da sua função espiritual, e as igrejas (não só as do terceiro
mundo) passaram a explorar o turismo em benefício próprio. Vendem
ingressos, santinhos, velas, cartões-postais e tours pagos. Várias
conferências e reuniões m ocorrido nas diversas comunidades com
atrativos religiosos, concluindo-se que há necessidades de preparar guias
especializados para os locaissantos”, de criar condições para atender
adequadamente os peregrinos e outra atividade para os turistas que visitam
o local sem motivação
306
.
Com isto, há cidades que exploram os seus santos e padroeiros através do
marketing, fazendo com que tal devão se torne meta de visitação a esses lugares,
transformando-os em mola propulsora para visualizar o sagrado através do turismo
religioso. São alguns exemplos do turismo religioso católico: São Francisco de Assis e
Santo Antônio dedua, nas cidades homônimas, na Itália; o Vaticano, sede mundial do
cristianismo, onde estão a Capela Sistina, os túmulos dos Apóstolos Pedro e Paulo e tantos
outros monumentos; Nossa Senhora de Lourdes, na cidade de Lourdes, na França; o
Santuário de São Tiago de Compostela, na Espanha; Nossa Senhora de Fátima, na cidade
de Fátima, em Portugal; e, no Brasil, os principais motes religiosos são o Círio de Nazaré,
em Belém do Pará; o Padre Cícero, em Juazeiro do Norte, no Ceará; festejos de São João,
em Campina Grande, na Paraíba; Nossa Senhora da Penha, em Vila Velha, no Espírito
Santo; Nossa Senhora Aparecida do Norte, em Aparecida do Norte - São Paulo; e Santa
Paulina, em Nova Trento, entre tantos outros espalhados por estes rincões brasileiros.
A especulação financeira em torno do turismo religioso se dá por meio da
hospedagem, da alimentação e das vendas de imagens ou do que quer que se refira aos santos
e padroeiros, tal como as fitas, os tradicionais santinhos, os terços e asblias, que dividem a
306
RUSCHMANN, Doris. Turismo e Planejamento sustenvel: a protão do meio ambiente. 11ª ed.
Campinas: Papirus, 2004. p. 49-50.
120
prateleira com artigos do catolicismo moderno
307
. Assim, a movimentação econômica faz-se
pelo alavancamento a passo de tartaruga. O peregrino quase sempre compra algo para levar,
seja para recordar a sua ida ao Santuário ou para presentear alguém e “eles fazem amigo
secreto no ônibus com o preço, muito baixo, procuram mais lembrancinhas baratinha, as
coisinhas de um, dois reais, um e noventa e nove, coisa assim
308
.
Desta forma, o passante movimenta o mercado de forma lenta. Tanto ontem como
hoje, o peregrino gasta, seja pouco ou muito e, com isto, essa conotação mercadológica
ganha um significado especial, dando, assim, lugar ao desfrutamento do religioso. Neste
sentido, os autores que tratam sobre turismo comumente usam o vobulo inglês trade, que
designa “indústria” do turismo – ou melhor, o turismo como comércio e negócio. O poder
da fé já vem explorado desde a Antigüidade, sob o pano das viagens aos lugares
privilegiados e usados como ferramenta de endomarketing pela Igreja.
3.3 Santa Paulina: o ponto alto de Nova Trento
A movimentação da demanda turística no Município de Nova Trento começou a
tomar vulto depois da Beatificação de Santa Paulina, em 1991, intensificando-se com a sua
Canonização, em 2002. Até então, a cidade não era mencionada como lo explorador do
turismo, existindo com uma renda baseada na monocultura. Contudo, o que se pode
observar é que o turismo está sendo tratado timidamente, como trade de serviço que se
coloca no recepcionar e como servo de transformação alimentar, vale dizer, os
restaurantes. Como diz Júlio César dos Santos, dono de uma pousada e presidente da
Neotur em Nova Trento: o processo de implantação do turismo em Nova Trento é
devagar, quase inexistente. A população ainda não se conscientizou que o trabalho é
constante e os resultados são a longo prazo
309
.
Depois da canonização e, com a dedicação, ou seja, a consagração do novo
Santuário, espera-se um alavancamento, sendo o único munipio no Brasil com dois
Santuários, destacando-se comolo propulsor para o mercado do turismo religioso, no
que diz respeito ao grande deslocamento de peregrinos, portanto, reservas econômicas em
potencial, que se destinam a Vígolo, centro religioso, motivados pela fé e “curiosidade.
307
DEMORI, Leandro. A que move negócios. Amanhã. Porto Alegre, nº 195, p. 20-23, jan./ fev. 2004.
308
rcia de Andrade. 17 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova Trento,
17/09/2005.
121
Assim, Nova Trento recebeu o título de Segunda Estância Turístico-Religiosa do
ps, e faz uso desse título mesmo que timidamente. Graças a ele, a cidade receberias
denominações tais como Caminho da Fé, Trilha da Fé e Rodovia da Fé, seguindo exemplos
dos Santuários europeus.
Para alguns habitantes de Nova Trento, a figura de Santa Paulina “é o carro chefe, é
ela e não adianta querer negar
310
, se tornando o sal da terra, um marco para Nova Trento.
Madre Paulina está em tudo, em toda a parte. Se o senhor andar por aí, em todo
o lugar se vê Madre Paulina, nos caminhões, nos ônibus, ao longo das estradas,
então Madre Paulina tornou-se assim uma figura nossa, do nosso meio. Uma
vida muito simples, com os pés no chão, neste chão, e acontece que isso foi,
parece que apaixonou o povo. Não é uma santa assim distante, entendeu? Mas
é nossa, aqui
311
.
Nesse contexto, o empresário Agostinho José Orsi, dono de uma pousada e de um
restaurante, além do Museu do Rádio e do Museu Italiano, nos explica como era Nova
Trento antes e depois do advento de Santa Paulina:
Nova Trento sempre foi uma cidade pacata, normal como uma cidade de
interior, mas muito bonita com área verde muito bem conservada. E Nova
Trento vivia da parte de agricultura, né? Do plantio do fumo, da
mandioca, do feijão, do milho, tinha muito colono. E também vivia muito
de mão-de-obra de pedreiros e carpinteiros. Até tem um ditado que
antigamente se dizia: “Quando nasce um filho se joga na parede, se colar é
pedreiro se cair no chão é padre”. Então saiu daqui também muito padre e
muita freira. Bom, hoje é outra realidade né? Porque passaram alguns
anos e tivemos a graça de ter em Nova Trento uma Santa. Então a realidade
é outra no aspecto rural, né? No rural o pessoal tem saído, não só em Nova
Trento, mas como em todo o Brasil. A área rural está meio devagar porque
fica mais para o sustento da família, eno hoje a mulher já trabalha fora, os
filhos ajudam também, pois há uma necessidade. E Nova Trento então com
o turismo de Santa Paulina e tem uma outra realidade.
312
Com a explanação da Ir. Ilze e do senhor Agostinho, observamos o empoderamento do
símbolo da primeira Santa do Brasil, em Nova Trento, e que transpassa o valor sagrado e entra
no marketing empresarial, gerando divisas, sendo o poder da fé um atrativo para o comércio.
309
SANTOS, Julio César dos. 36 anos. Nova Trento. Questionário. [e-mail de Julio César dos Santos].
Endereço eletrônico: julio@portaldovigolo.com.br. 12/10/2005.
310
DALBOSCO, Lílian. ? anos. Nova Trento. Entrevista concedida a Jo do Nascimento. Nova Trento,
10/09/2005. p. 5.
311
MEES, Ir. Ilze. Entrevista citada. p. 3.
312
ORSI, Agostinho José. Entrevista citada. p. 2.
122
Com a absorção Madre Paulina em uma concepção holística de Deus por parte dos indivíduos,
estes vão até o Santuário travestidos de novas formas de religiosidade. Desta maneira, não é
somente em Vígolo que acontece tal fato, mas tanto em território nacional quanto
internacional, movimentando muitos milhões pelo comércio religioso. Muitos profissionais do
setor comercial estão descobrindo que podem aproveitar todo esse filão econômico,
promovendo, até mesmo, produtos que nada tenham a ver com os rituais sagrados.
Aldo Terrin, considerando as novas definições de religião para os indivíduos,
conclui que “a procura do divino se torna fácil na Nova Era, na qual tudo está sob o signo
de Deus que age livremente, por meio da natureza, dos espíritos, dos anjos e de toda
realidade. Contudo, em vez de Deus, pode-se ter em mãos somente um ídolo”
313
. Será que
esta observação do padre italiano sobre a Nova Era não poderia ser a descriminação, os
próprios ensinamentos de que a Igreja fez uso, através de anjos, da natureza exaltada por
o Francisco de Assis, em relação a tantos outros métodos para evangelizar na Idade
Média? Disso se deduz que podem ser discriminatórios em termos de qualidade e de
intensidade com o novo que não surge do meio eclesiástico, e sim em um ambiente leigo,
sem ingerências, em que a busca pelo Ser Superior vai além da função mediadora do
agente sacralizado, o sacerdote. Toda a questão reside, mais uma vez, na possibilidade de
se retornar a praticar religo, de vivenciar as idas aos lugares santos como expressão
reconhecida pelo indivíduo, só, dentro da espiritualidade e na procura do “eu” interior
sufocado pelos dois mil anos de cristianismo. Seria mais inspirado, certamente, pensar a
peregrinação, atualmente, nos moldes da modernidade, como uma manifestação de um
catolicismo de vitrine, como fala Baudrillard. Com esse autor, podemos pensar numa
religião líquida, isto é, adaptável aos novos tempos, diferentemente daquela em que o
peregrino passava por uma preparação nos moldes do que se pregava na Idade Média,
como jejuar, dar esmola, etc. Hoje, há uma forte relação com aspectos econômicos dentro
da teologia da prosperidade, entre a religiosidade pessoal, sincrética e, neste paradigma,
manipulada pelos produtos de mercado e fins lucrativos, sendo, conseqüentemente, o
transcendental.
Empresários motivados pela canonização de Madre Paulina se dirigem para o
Município buscando alargar os seus investimentos empresariais. Temos, por exemplo, um
312
TERRIN, Aldo Natale. Nova Era: a religiosidade do pós-moderno. São Paulo: Loyola, 1996. p. 101.
123
empresário de Sorocaba, interior deo Paulo, Elias Soares que, de olho no mercado
imobiliário de Vígolo, comprou em 2002 um terreno, um mês antes da canonização,
de 1,8 mil metros quadrados situado a um quilômetro de Vígolo. Ele
pretende construir uma pousada com preços acessíveis para hospedar os
devotos das classes B e C. A idéia é oferecer diárias de R$ 10. ‘As
instalações seo simples, sem sofisticão, mas conforveis’, planeja
Soares. ‘O turismo religioso é a segunda categoria de maior movimento, só
perde para o lazer’, garante o empresário
314
.
A venda de terrenos em Nova Trento é comum neste período, tanto que os preços
das propriedades são altíssimos, mas, com o Plano Diretor, isso ficou um pouco mais
difícil. Os neotrentinos e, mais precisamente, os vigolanos, aproveitaram a canonização
para vender os seus terrenos. Mas a pergunta é: se Soares, o empresário sorocabano,
construiu a sua pousada e a diária se concretizou por R$ 10 ? A resposta evidencia-se na
fala de Pedro Paulo Vargas, vendedor de sorvetes italianos em Vígolo e que mora na sede
do Munipio, fala esta transcrita na página 117 desta pesquisa, na qual se refere ao baixo
poder aquisitivo da maioria das pessoas que visitam o Santrio.
Com efeito, o senhor de Sorocaba não construiu o seu sonho, tendo este naufragado
em águas rasas, uma vez que os peregrinos não trazem consigo uma grande soma de
dinheiro. A maioria traz de casa o pouco que economizou e utilizam o vocábulo
“dinheirinho”, que reflete a pouca quantidade, e a sua permanência no local não supera cinco
horas. Pelas mesmas razões, o dono do Mosteiro Park Hotel, construído em função dos
peregrinos, teve de vendê-lo para as Irmãzinhas por não ter recuperado a quantia gasta na
construção (mas vendendo para elas por um preçobem salgado”). O baixo poder aquisitivo
dos passantes permite apenas que comprem fitinhas, imagens, escapulários, medalhas,
chaveiros e outros pequenos souvenirs, que levam de lembrança ou para presentear seus
parentes e amigos, pois não têm muito o que gastar no que lembre a Santa Paulina. Os
turistas considerados mais abonados não permanecem muito tempo no Município, como
explica a agente administrativa da prefeitura, que trabalha na Secretaria do turismo:
[...] Vêm até Camboriú, aí eles vêm aqui com poder aquisitivo maior, só
vem com carro próprio, dar uma volta no Santuário, e volta pro local, assim
questão de duas horas no máximo. E depois a gente tem o turista que vem
314
Diário Catarinense. Soares de olho no mercado de Vígolo. Florianópolis, 18 de maio de 2002. p. 6.
124
de ônibus, que aí é o turismo religioso mesmo. Eles vêm com o ônibus, fica
o dia todo, às vezes vêm até no sábado e vão embora domingo, são
excursões. Esse é com um poder aquisitivo menor. Esse vem bastante, tem
épocas assim que chega a ter 300 ônibus em Vígolo. E daí eles vêm de
manhã, muitos até trazem alimentação de casa, eu acredito que esse é o
turismo religioso, são pessoas, ao meu ver, que eles m muitos
problemas, muitas dificuldades financeiras e vêm buscar essa benção na
Madre Paulina, então é um turismo que não vai ser muito explorado.
Entendeu? Porqueo tem. Agora, o outro, o turista esse que vem à
passeio, com poder aquisitivo maior, é que o turismo de Nova Trento
sobrevivesse desse, que até mesmo muitas vezes ficam em hotel, pousadas.
É esse, mas não é assim uma quantidade muito grande, eu não vejo
315
.
Mas a idéia é justamente atrair os turistas endinheirados, mais do que o peregrino
com pouco dinheiro, como nos conta o Secrerio:
Por enquanto é o turista romeiro, peregrino que vem e retorna. Não é um
turista que fica e que gasta. Então nós temos que fazer com que o turista
venha para cá, mas que ele permaneça aqui, dois, ts, mais dias. Esse é o
nosso trabalho em época de verão, fazer com que o turista que venha para
cá e que permaneça, pois é um turista que tem dinheiro. Pois se chover nas
praias logicamente fica sem ação, sem lazer. Eno a gente vai oferecer o
nosso produto nesse período, que o pessoal que está lá embaixo que venha
nos visitar
316
.
Todo o processo de criar e manter um clima propício para o turista na cidade é muito
efêmero; além disso, eso concorrendo com as praias. Não seria o caso de adaptar-se ao seu
público flutuante o que os neotrentinos têm para oferecer, ainda embrutecido, mas seria
necessária, antes de tudo, uma maior integração entre população, poder público e
empresariado para superar as diferenças e apostarem na coletividade, sobrepujando os pontos
fracos do município, transformando-os em fortes. Dessa forma, percebemos a importância do
turismo na urbanização de Nova Trento, já que essa atividade exerce influências
determinantes no desenvolvimento da região, mesmo que este ocorra lentamente.
Esse produto chamado fé, explorado pela atividade turística, é teorizado por Mildlik e
Middleton, que o classificam como o “conjunto dos elementos que, podendo ser
comercializado, directa ou indirectamente, motiva os deslocamentos, gerando uma
315
ADAMI, Maria Cristina. 40 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova Trento,
17/09/2005. p. 2.
316
ROVER, Saul. Entrevista citada. p. 1.
125
procura”
317
pelo produto explorado. Dentro do contexto da Comunidade Européia, vem
denominada como um receptáculo a atividade tustica. Os autores continuam a explanar que
é um amálgama de elementos tanveis e intangíveis centrados numa
actividade específica, num destino específico. Compreende e combina as
atrações actuais e potenciais de um destino, as facilidades, a acessibilidade
ao destino, dos quais o turista compra uma combinação de actividades e
arranjos
318
.
Por exemplo, o empresário neotrentino Agostinho Orsi nos diz quehoje tem mais
comércio aberto direcionado ao turismo, são vinícolas,o pontos e produtos coloniais
319
,
hotéis, pousadas, restaurantes, posto de gasolina, pessoas que batem fotos, taxistas, tudo
gira em torno do Santuário”
320
. Podemos constatar, ainda outros produtos na voz de Maria
Cristina, funcionária da Prefeitura Municipal de Nova Trento, locada na Secretaria do
Turismo: “são vendidos assim, nós temos vários locais de venda de produtos típicos. [...]
Os produtos típicos são vários produtos, e há vários pontos de venda. Geléia, o vinho já te
falei, tem o artesanal, licor, tem bastante licores aqui, eles fazem artesanalmente
321
.
Na perspicácia do espírito empreendedor
322
, o que se encontra no munipio de
Nova Trento “está relacionado como o processo de iniciar um negócio, organizar os
recursos necessários e assumir seus respectivos riscos e recompensas”
323
. Constatamos um
fato interessante: a maioria dos comerciantes que dirigem os seus respectivos negócios,
tanto emgolo quanto na sede,o mulheres. Elas trabalham para aumentar a sua renda, e
esperam ações concretas das Irmãzinhas para alavancar os seus negócios, enquanto os
maridos estão em outras cidades, trabalhando em diversas outras funções, sejam
intelectuais ou braçais. Haveria aqui um machismo no comércio,o sendo dado o valor
devido a tal função? Ou temos ainda presente o esrito dos colonizadores, em que o
317
MILDLIK; MIDDLETON apud CUNHA, Licínio. Economia e política do turismo. São Paulo: Mcgraw-
hill, 1997. p. 54.
318
Idem.
319
Ver, no anexo 10 os produtos coloniais mais vendidos em Nova Trento.
320
ORSI, Agostinho José. Entrevista citada. p. 2.
321
CADORIN, Elizete Terezinha. 38 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova
Trento, 17/09/2005. p. 1.
322
Entende-se por espírito empreendedor como um divisor de águas no mundo dos negócios. As pessoas
estão criando seus próprios negócios num ritmo sem precedentes. Isto está acontecendo no Brasil, nas
Américas e até em países como a República Checa, Hungria, Rússia e China. A magnitude da mudança é
impressionante: só nos Estados Unidos, o número de novos negócios passou de 90 mil, em 1950, para mais
de 2 milhões, hoje. PEDROSO, Ediberto Tadeu. Administração e os novos paradigmas. Rio de Janeiro:
Qualitymark, 2004. p. 117-118.
126
serviço mais leve, que o requer força bruta, era destinado às mulheres? Ou o
atendimento ao turista, seja direto ou indireto, é tido como mais um agregador para
aumentar a renda familiar, sendo a mulher por isso responsável? Ou, ainda, Nova Trento
seria uma cidade administrada/regida por mulheres, seja pela santa, pela prefeita, pelas
balconistas e tantas outras? São questões para se analisar em futuras pesquisas.
De modo geral, há um consenso compartilhado por quase todos/as neotrentinos/as
que vêem Santa Paulina como sal da terra. Ela é negócio para movimentar o mercado,
tanto que o turismo religioso, segundo Esperidião Amin, é um hot point:
Santa Paulina significa um hot point. Analisando isso no ar da economia
interna, um hot point, ou seja, o fato dela ter vivido em Nova Trento e
ter praticamente desenvolvido toda a sua vida pública. Acho que a parte da
vida pública dela foi em São Paulo. A parte boa da vida pública dela foi em
Nova Trento. Concede a Nova Trento e a Vígolo em especial, a condão
de hot point. Se é um hot point, ele é procurado, ele pode ser procurado por
pessoas que vão lá e não tem o que ver; e pode ser procurado, e as pessoas
encontrao hotel, um belo templo, um enunciado de quem foi a pessoa,
quem são as suas servas, suas seguidoras, um hospital ligado ao tratamento
dencer, câncer terminal. Não com o objetivo de cu-los, e sim cuidar
das pessoas, como era o nosso projeto, o hospital em síntese. Santa Paulina
representa para Nova Trento um presente de Deus, que pode ser bem
utilizado, muito bem utilizado ou mal utilizado. O esforço dos homens do
governo, governos, organização religiosa, a sociedade civil, prefeito... Não
precisa ser católico para perceber que Santa Paulina é um potencial de
desenvolvimento do seu munipio, de desenvolvimento de uma série de
outras conseqüências da passagem de Santa Paulina por Nova Trento.
Então, eu acho que ela é fundadora de um hot point, ou seja, de um ponto
de atração que pode ser bem aproveitado, mais ou menos bem aproveitado,
ou mal aproveitado ou muito bem aproveitado. O que eu acho é que a
nossa inteligência impõe buscar
324
.
Como um hot point, Santa Paulina é marca indevel para a cidade e região e vem
sendo usada e contextualizada por onde passou, como fonte sofisticada para a economia
local. Como bem observa Eliade Mircea, na obra Imagens e Símbolos: ensaio sobre o
simbolismogico-religioso, o espaço sagrado é concebido como uma geografia mítica
única efetivamente real, porque foi ali que nasceu e, sendo assim, o local se torna o centro,
que converge e emana religiosidade
325
.
323
PEDROSO, Ediberto Tadeu. Op. cit. p. 118.
324
HELOU Filho, Esperidião Amin. Entrevista citada. p. 5.
325
ELIADE, Mircea. Imagens e Símbolos: ensaio sobre o simbolismo mágico-religioso. São Paulo: Martins
Fontes, 1996. p. 48.
127
As pessoas buscam o consolo divino, e os neotrentinos aproveitam da oportunidade
para seu uso próprio, ganhando visibilidade em âmbito nacional ou internacional, porque
as Irmãzinhas farão catequese da sua Fundadora. Com isto, Nova Trento ganha novos
visitantes, que usufruirão do comércio que, através da Santa, ganha várias formas. Como
nos relata Ir Ilze, responvel pela administração externa do Santuário:
isso seria até interessante, na última reunião tivemos até na prefeitura,
então eles falando disso [de tirar proveito de Santa Paulina]. Porque a
prefeitura não tem como melhorar nada aqui, mas o povo reconhece, por
exemplo, uma constatação que fizeram. Não havia um restaurante em Nova
Trento, não havia um hotel, não havia uma churrascaria, essas coisas, nada.
Era apenas uma cidadezinha pacata do interior. E agora veja bem como
está tudo isso aí. Quantas pessoas, nós temos 40 barracas aqui, que são do
santuário, alugadas, já são 40 famílias ganhando o seu sustento, além dos
outros proprietários que tamm têm. Mas então estão reconhecendo, por
exemplo, por que dois, três, quatro hotéis. Nova Trento nunca teve hotel,
só um hotelzinho ali da praça, que deve ter quatro, cinco quartos, nada
mais. Então Nova Trento está se desenvolvendo assim. Não é Nova
Trento, o Vale. Esses dias eu contei ao longo da SC blocos desses pré-
moldados enormes, 21. Por que São João tá saindo da cidade pra vir pra
estrada? Então é todo o Vale beneficiado, entendeu? E não, isso vai mais
longe, por exemplo as empresas de ônibus, transporte. O que se consome
aqui em mantimentos, em carne, pros restaurantes. Tem os indiretos, vem
de longe tudo isso. Então a coisa é mais abrangente, mas o local aqui se
beneficiou muito e continua se beneficiando, Nova Trento
326
.
Neste aproveitamento da imagem da Santa, vem reforçar a sagração, em 22 de janeiro
de 2006, do seu Santuário, este dedicado a Santa Paulina, enquanto o outro é dedicado a
Nossa Senhora de Lourdes. Com isto, aparece um ponto a mais para agregar valor a Vígolo,
como mais um elemento forte para continuar a transformar Nova Trento, em especial o
bairro no qual a Santa iniciou sua obra, migrando do setor primário para o terciário, o que
fomenta serviço. Nessa linha de pensamento, temos José Vicente de Andrade: “As atividades
características do turismo levam as pessoas à utilização de bens produzidos pela natureza [...]
para que, transformados pela atividade criativa de pessoas e grupos diversificados, sirvam às
necessidades básicas e aquelas que a própria sociedade cria”
327
.
A construção do novo Santuário é um novo elemento impulsor de fé, utilizado
como um ponto a mais para o turismo, com o quê espera-se o aumento do fluxo de
passantes, por haver um lugar próprio e maior para a venerão da Santa. Atualmente, os
326
MEES, Ir. Ilze. Entrevista citada. p. 3.
128
atos litúrgicos estão sendo realizados em um local improvisado, em cima do Restaurante e
Lanchonete Madre Paulina, mantido pelas Irmãzinhas. As missas acontecem, geralmente,
às 11:00 horas, de 3ª a 6ª feira, exceto às segundas, dia de repouso dos padres e das Irmãs.
Nosbados, as missas são às 11:00, 16:00 e 18:30 horas e, nos domingos, às 08:30, 10:00
e 16:00 horas. Quanto acaba a celebração litúrgica, o almoço embaixo é servido.
O Secretário de Turismo, Saul Rover, questionado sobre a participação do poder
blico local na construção do Santuário, nos conta que está sendo feita com o dinheiro das
Irmãzinhas e das doações dos fiéis
328
:
As irmãs trabalham quase que individualmente, o poder público não pode
investir em nada lá, isso é proibido por lei. Mas ao que compete ao poder
público, os acessos, e os empresários também com os projetos de parcerias,
os empresários podem participar também junto ao poder público na
melhoria desses acessos. Existe sim união entre o poder executivo e os
empresários. Agora poder executivo, empresários junto com as irmãs não
existe. As irmãs estão trabalhando sozinhas. Estão trabalhando bem, muito
bem por sinal. Dão um show em nós. Elas têm um Patrimônio também. A
balica em si foi constrda somente por elas e pelos romeiros, pelas
contribuões entende?
329
.
Nas palavras do secretário, as Irmãzinhas o um show nos políticos e nos
empresários em organização e interesses delas em ir em frente com todas as dificuldades,
elas partem do individual enquanto seres humanos e chegam ao coletivo “elas pensam
igualzinho”, diria Cristina Adami; no contexto do poder político e empresarial eles partem
do coletivo para poderem angariar alguma benfeitoria para si próprio, com isto temos
inversão de valores, “como instância mediadora à efetividade da esfera política
330
.
Essas colocações associam-se ao ora et labora, da parte das Irmãzinhas, ou ao
provérbio popular “mente vazia, oficina do diabo”, como era sempre reiterado para as
Irmãzinhas pelos Jesuítas. A questão é trabalho e trabalho. A Ir. Ilze nos diz de onde vem
esse dinheiro:
a renda ela é uma economia da Congregação. Nós somos 500 irmãs, 570,
por aí,s temos muitas idosas. Então o trabalho, porque nós, pelo voto de
pobreza, produzimos, temos ganho, mas ninguém retém o seu salário.
327
ANDRADE, José Vicente. Op. cit. p. 99.
328
Ver no anexo 11, o formulário para as doações do Santrio de Santa Paulina.
329
ROVER, Saul. Entrevista citada. p. 1.
330
HABERMAS, Jürgen. Mudaa estrutural da esfera pública: investigões quanto a uma categoria da
sociedade burguesa. Tradução de Fvio Kothe. Rio de Janeiro: Tempo brasileiro, 1984. p. 42.
129
Então isso tudo é colocado num caixa comum, isso aí bem administrado,
bem aplicado ele rende. E uma fonte maior nossa atualmente é aluguel de
quatro grandes colégios, um em cada quarteirão, então no interior de o
Paulo ou mesmo na capital também, ondes fechamos as nossas
atividades e esses prédios são alugados. Este aluguel é um dinheiro que cai
limpo todos os meses. E isso foi formando o fundo pelo qual agora
podemos construir esse Santuário. E também a ajuda do povo, mas são
coisas queo menores, mas a parte mais forte é esse da Congregão
331
.
Ari Piffer, pedreiro e dono de um pequeno negócio, em Vígolo, de revenda de
vinhos Girolla e outros produtos típicos da região, comenta que
[...] os turistas que ajudam. Tem quem ajuda. Tem gente que vem aí
1000 reais, tem gente que dá 500 pras irmãs, por que sabe que se eles dão,
até o padre chegou aqui um dia e disse que deu 1000 reais e disse assim, se
tu desse passaria só com nota fiscal, senão sai um real. Pode dar cinco reais
de esmola, passaria de cinco reais, só com nota fiscal. Não tem caixa dois
ali, porque se nosso [...] fosse igual das Irmãzinhas, nós tava podre de rico.
Nós temos uma vergonha dos brasileiros que estão lá [Brasília]. A única
empresa qu trabalha honesto
332
.
Como não existe interesse individual das Irmãzinhas, dado o processo de formação
porque passaram e pela formação religiosa (o postulantado, o Noviciado, o juniorato e a
profissão perpétua), pelo uso da vida comunitária que levam, por trabalharem para o
mesmo objetivo e também em virtude do voto de pobreza, é propícia a canalização
ecomica. Parafraseando a Ir. Ilze, com uma boa aplicação se prospera. Desta forma, se
tem a construção do Santuário de Santa Paulina, local de culto próprio e um lugar de
peregrinação, destinado a acolher os fis em grandemero. Quanto às Irmãzinhas, vale
lembrar que, primeiramente, antes de serem consagradas, são mulheres, enquanto o
empresariado e o poder político são constitdos fundamentalmente por homens. Elas dão
um belo show em administração ou, como diria o ex-governador Amin, definindo as
mulheres: são persistentes como as crianças.
Assim, a busca permanente pelo divino é a razão maior das Irmãzinhas, em particular
na procura do Esposo, e, seguindo a regra inspirada no carisma da Fundadora, com isto
fazem um ponto alto para o coletivo, quando todos esperam da Congregação a ação
331
MEES, Ir. Ilze. Entrevista citada. p. 5.
332
PIFFER, Ari. 61 anos. Nova Trento. Entrevistado por José do Nascimento. Nova Trento, 17/09/2005. p. 5-6.
130
alavancadora. Como explanou Júlio Cesár, “Enquanto a população e os estabelecimentos
voltados aos turistas não pensarem no coletivo, não teremos bons resultados”
333
.
3.4 Santa Paulina: a cuccagna
É através da imagem de Santa Paulina, pequena camponesa vinda da Itália com
seus pais, com o propósito de fazer em terras longínquas a Cuccagna, em razão da violenta
crise econômica que assolava toda Itália no século XIX, que se realiza a própria cuccagna.
Nova Trento se torna o que é hoje, uma cidade com grande potencial turístico, em razão do
fato de ter acolhido a ela e a seus familiares. Deste modo, detém o primado do título da
primeira Santa brasileira, máquina propulsora que movimenta a economia do Munipio.
Nesta linha de pensamento, Vilson Mário Sgrott, falando da falta de preparo dos
neotrentinos em receber o turista, diz que
[...] iam embora, porque não tinha o que fazer aqui. Mas em 91 teve a
beatificação. E aí começou o fluxo turístico pra Nova Trento. E por incrível
que pareça a gente não se apercebeu e também as autoridades não levaram
isso a rio,o pensaram que isso aí seria, para o futuro, um
desenvolvimento que traria divisas para o munipio. E perderam muito
tempo nisso. Nova Trento ainda tem muito o que fazer, nós temos muitos
locais que poderiam ser explorados, o turista poderia vir aqui e ficar vários
dias e se sentir bem. Hoje ele vem, ele pode ficar um dia ou dois, aí ela já
tem que recorrer aos municípios vizinhos, que a essa parceria deve
existir, mas a grande verdade é essa: esse movimento que tá crescendo e
que vai crescer cada vez mais não deixa de ser um verdadeiro milagre.
Tudo por causa dessa jovenzinha, a Madre Lúcia Visintainer, hoje
reconhecida como Santa Paulina [...]
334
.
Assim, as Irmãzinhas acabam sendo a chave do tesouro. Sem elas não existiria o
fenômeno religioso tal como está organizado, nem a cidade se encontraria em situação de
servir de modelo para a região enquanto estrutura para receber os passantes, ganhando
grande visibilidade e efetiva possibilidade de auto-sustentação com a canonização.
Diferentemente da prefeitura e da maioria dos habitantes de Nova Trento, as Irmãzinhas,
que também passaram por esteespanto”, logo retomaram as forças e se reanimaram para
seguir em frente. Assim, a Santa propicia o desenvolvimento almejado pelos primeiros
333
SANTOS, Julio César. Entrevista citada. p. 2.
334
SGROTT, Vilson Mário. Entrevista citada. p. 8.
131
imigrantes, não somente ao município mas também a régios do Vale do Rio Tijucas, que se
desenvolvem e oferecem oportunidades de trabalho.
Dessa forma, há os que trabalham em restaurantes, próprios ou não, como patrão ou
empregado, em pequenas lojas ou como camelôs, quase todos concentrados, na Rua Madre
Paulina, beneficiando-se dos passantes que vão ao Santuário. Esses benefícios seo
mesmo de forma indireta para Nova Trento que, para manter o turista na cidade, precisa ter
infra-estrutura e condições de recebê-los, ao passo que a imagem da Santa se oferta como
oblação, dando adereços simbólicos que representem a Santa, como sinalização da estrada,
a busca da italianidade na festa Incanto Trentino, o Círculo Trentino, oferecendo também
aos passantes elementos que possam ser reutilizados pelos que o a Vígolo. A maior
preocupação dos comerciantes é que lá se torne mais importante que a sede, pelo menos no
sentido do comércio.
Em Vígolo, a situação está “boa”, o que se pode constatar pela fala de Lourdes
Pianezzer: “pro lugar aqui nosso, aqui é município de Nova Trento, mas aqui se chama
golo, aqui foi um grande milagre que deu. Porque meu Deus do céu, olha que a gente
daqui melhorou bastante. Melhorou bem de vida, saiu muito emprego, surgiu muito
emprego pros nossos aqui. Isso ali tá mil maravilha”
335
.
O mesmo se observa na fala de Sandra Bento, comerciante no Santuário:Ah, era
bem menor, não tinha tantas pessoas que vinham visitar, tinha bem menos povo que vinha,
o tinha quase lojinhas, não tinha nada
336
. Com essas visitas, abrem-se novos mercados,
como no Santuário:
quantas pessoas, nós temos 40 barracas aqui, que são do Santuário,
alugadas, já são 40 famílias ganhando o seu sustento, além dos outros proprietários que
tamm têm”
337
.
Evidentemente, fazer uma peregrinação, nos moldes da experiência urbana, é
praticar um ritual de lazer e turismo, seja por motivos de devoção e práticas eclesiásticas,
seja por curiosidade de estar em um local diferente. Em ambos os casos, se exercita uma
ação de bem estar, pois procura-se uma utilização mais significativa do tempo livre.
335
PIANEZZER, Loudes Vinotti. Entrevista citada. p. 2.
336
BENTO, Sandra. 18 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova Trento,
17/09/2005. p. 1.
337
MEES, Ir. Ilze. Entrevista citada. 17/09/2005. p. 6.
337
ELIADE, Mircea. Op. cit. p. 48.
132
A fé e os negócios em golo se dão mediante o tráfego de pessoas que circulam no
Município em busca do símbolo da cidade. Como afirma Maria Cristina Adami:
exatamente, e vinculada à Madre Paulina, apesar que hoje o turismo lá na
Madre Paulina eles já perceberam que o turismo religioso é de um poder
aquisitivo menor. Tanto é que hoje, o quê que vende mais? Vende mais
uma fitinha, que tu compra a menos de um real, uma pulserinha a menos de
um real, entendeu? Não adianta tu ir lá querer explorar numa coisa muito
cara. Então o mais caro que eu acredito que eles levam ali é o vinho, das
vinícolas próximas
338
.
Até a beatificação de Madre Paulina, a cidade era então um recôncavo longe de
qualquer atrativo. Esse se deu em razão da movimentação dos transeuntes ao Santuário da
primeira santa brasileira. “Ah, bem devagar, era bem mais calmo, existia muitos colonos,
era uma colônia, hoje o pessoal sobrevive bem mais em cima do comércio. Melhorou
bastante, mas não o que era pra tá, podia tá melhor o movimento
339
.
Nova Trento está ligada, assim, ao símbolo da representatividade religiosa e
econômica da Santa. Falar de Nova Trento é falar de Santa Paulina. O munipio foi
conhecido como celeiro das vocações para muitas congregações e seminários. Fora deste
âmbito, ou seja, do religioso, o local tinha pouca visibilidade e era, tal como qualquer outro
Município com aspecto pacato e singular do interior catarinense, atuante em outras esferas.
É a partir da exaltação de Santa Paulina que se torna possível dizer que os neotrentinos
estão começando a realizar o objetivo dos seus antepassados, vindos da Itália para fazer la
Merica ou a tão desejada Cuccagna.
338
ADAMI, Maria Cristina. Entrevista citada. p. 3.
339
DALLABRIDA, Valter. 47 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova Trento,
17/09/2005. p. 1.
133
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo desta pesquisa pretendemos mostrar os fundamentos do turismo
religioso e sua atuação no mercado, e a relação entre fiéis e aquilo em que acreditam. As
noções de turismo e seus aspectos de ofertas de produtos como fator culminante para
desenvolver Nova Trento eso em evidência na investigação, como linguagem
significativa da trajetória humana e atualmente mais forte, como um novo e promissor
filão econômico para deslanchar o munipio. O tema é envolvente; as fontes
sofisticadas, e houve uma relação visceral com o método, no entendimento
preocupações que traspassam a vio de mundo de homens e mulheres que buscam o
encontro com o eu interior, num ambiente permeado de religiosidade, num lugar
rodeado pela natureza, cujo interesse em conservá-la caracteriza-o como uma
territorialidade ecológica. Aqui se vê a natureza como aquela originária da phisis para
os pré-socráticos, e a natureza humana, como para Max, que usufrui e é usufruída.
Nova Trento, na sua origem e evolão, apresenta características que justificam
um estudo exploratório de sua realidade, até porque ainda não se tem notícia que resgate
as impressões sobre os passantes que por lá caminham em direção ao Santuário de Santa
Paulina do Coração Agonizante. A submero nesse estudo não foi apenas uma busca de
fatos inertes do passado, mortos e superados, uma vez que “a única coisa que ela (a
História) é realmente boa é em encontros”
340
. Neste viés, através das discussões da
historiografia atual a respeito da identidade, do conceito de cidadania e da redefinição
do sujeito, com base nessa revisitação filosófica, encontramos novas formas de análise.
Como afirma Nicolau Sevcenko, o ser humano é antes de mais nada histórico. Como da
carne, do sangue e dos ossos, ele é consubstancialmente feito da história e, neste
contexto, não pode ser compreendido exclusivamente por seus conteúdos físicos ou
psicológicos, mas como a “encarnação” de toda a história que o precede
341
. Vem, ao
nosso encontro, Bourdieu:
340
SCHORSKE, Carl E. A história e o estudo da cultura. In: Pensando com a história: indagações na
passagem para o modernismo. São Paulo: Cia das Letras, 2000. p. 242.
341
SAFATLE, V. A vida como reality show. In Mais! Folha de São Paulo. o Paulo, 29 fev. 2004, p. 8-9.
134
As lutas em torno da identidade étnica ou regional, quer dizer, em torno de
propriedades (estigmas ou emblemas) ligadas à origem através do lugar de
origem, bem como das demais marcas que lhe o correlatas, [...]
constituem um caso particular das lutas entre classificações, lutas pelo
monopólio do poder de fazer ver e de fazer crer, de fazer conhecer e de
fazer reconhecer, de impor a definição legítima das divisões do mundo
social e, por essa via, de fazer e desfazer os grupos
342
.
Através da imigração européia, a formão de Nova Trento compreende, ainda,
o imaginário sobre as construções religiosas. Foram apontados, na pesquisa, o histórico,
as tradições e a cultura, fazendo a identificação do povo local, observando a
participação de peregrinos e turistas, visto que são eles que estão determinando a
economia local e da região em que se concentra a valorização do evento religioso. Os
neotrentinos, que outrora vieram de um país longínquo, fazem parte de um município que
se tornou, por sua vez, um local de migração, passando a abrigar e a acolher uma população
bastante heterogênea, formada por brasileiros e estrangeiros; os co-nacionais, na sua
maioria operários, enquanto os estrangeiros como: italianos e alemães ocupam um posto
relevante na sociedade neotrentina.
A estreita ligão do Município com a Igreja Católica, sendo 95% da população
católica e 5% de outras denominações religiosas, promove, entre a população que
convive com essa realidade, uma imagem da instituição como caritativa e prestativa e
ainda faz essas “representações sobre a mesma realidade
343
. Dentro da perspectiva
política, vem ao nosso encontro Hannah Arendt: “há muitas coisas que não podem
suportar a luz implacável e crua da constante presença de outros no mundo político”
344
.
Nesse sentido, a construção da narrativa pela História Oral foi capaz de suscitar,
e não solucionar, perguntas, demonstrando práticas, estratégias e discursos, no debate
sobre o campo questionado. As conclusões não intentam ser o fim único e homogêneo
de fatos constatados ou hipotéticos, mas sim um olhar sobre mais uma página que
começa a ser escrita na de Nova Trento.
342
BOURDIEU, Pierre. A Economia das trocas lingüísticas: o que Falar quer Dizer.o Paulo: EDUSP,
1998. p. 108.
343
PATLAGEAN, Evelyne. A história do imaginário. In: LE GOFF, Jacques. A história nova. São Paulo:
Martins Fontes, 1990.
344
ARENDT, Hannah. A condição humana. ed. Tradução de Roberto Raposo. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 1991. p. 61.
135
No primeiro capítulo, Os fios condutores na confecção do Santuário de Santa
Paulina, foram vistas algumas situações existentes na Itália antes e depois da unificação
italiana, acontecida em 1861, como por exemplo, a falta de visibilidade do Estado
nascente em praticamente em toda a península. Havia também a ingerência da Igreja
Católica no dia-a-dia dos trentinos, que, por outro lado, muitas vezes era a única
possibilidade que tinham de aulio em uma conjuntura econômica e social que
desfavorecia o desenvolvimento humano, na medida em que o espaço para o cultivo da
terra era pequeno e pobre de materiais que a tornassem produtiva, sendo quase toda
Itália desfavorecida de planície, rodeada que é pelos Alpes e Apeninos.
A saída, para muitos europeus, foi a imigração para os países vizinhos e, depois,
para lugares mais distantes, na grande diáspora transoceânica, sendo a América do
Norte, Central e do Sul destino de muitos. A terra brasilis foi procurada pelas vantagens
oferecidas pelo Governo Imperial. Assim, acontece a instalão dos europeus em terras
brasileiras. Para o sul do Brasil vieram italianos, alees, poloneses e tantas outras
etnias. No caso que engloba esta pesquisa, esses vieram do Norte que, por sua vez,
naquele momento da procura da cuccagna, faziam parte do território da Áustria. Com
eles, trazem nos seus baús a sua cultura e a forma de interpretá-la, sendo a religião o
agregador maior, que norteava a sua razão de ser e de estar. Com isto, a necessidade de
algo visível para representar a sua fé, para mostrar a direção a seguir e o ponto de
reunião, de encontros, de vendas, servia para todos os fins comunitários e econômicos.
Logo, as capelas foram sendo construídas, recebendo os nomes dos padroeiros de
origem, o que servia para (re)lembrar o que ficaram para ts.
Os neotrentinos, nos primeiros momentos, foram atendidos pelo padre Alberto
Gattone pároco de Brusque. Alguns anos depois, em Nova Trento, foram estabelecidos
os rizomas dos padres da Companhia de Jesus, imprimindo um caráter religioso em
todos os âmbitos, passando o Munipio a ser conhecido em Desterro como um
município conventual. Pode-se até conjunturar a implantação de uma república jesuítica
por lá. Na leva dos primeiros desbravadores de 1875, vieram a família Visentainer, da
qual uma das suas filhas, Amabile, desabrochada nessas paragens, funda a Congregação
das Irmãzinhas da Imaculada Conceição, subindo aos altares, em 2002, para se tornar a
primeira Santa do Brasil e de Trento, na Itália.
136
Na seência, abservamos a preparação do cenário pelas Irmãzinhas para a
permanência dos passantes. Vimos, portanto, que uma grande parte dos monumentos
presentes foram elaborados e construídos, e a natureza canalizada, para propiciar aos
que visitam o lugar uma maior plasticidade dentro do território do Santuário. Aqueles
que freqüentam o local sabem que ali serão atendidos no que vieram procurar; na busca
de graças, no pagar e fazer promessas ou simplesmente na busca de lazer. Dentro do
ambiente desejado, as pessoas ficam como que transportadas pela realidade imediata de
paz e tranqüilidade, e pelas explicações do senso comum
345
. Santa Paulina, que fundou
uma congregação e fez de tudo para que ela continuasse, e que até mesmo anulou-se
recebendo o exílio e perdendo o cargo de Superiora Geral, dá exemplo de abnegação
diante de tanta miséria humana. Por ter vivido segundo os critérios da igreja, torna-se a
primeira Santa do Brasil.
Santa Paulina buscou a experiência religiosa do seu tempo como razão do seu
ser, anulando-se para que o outro aparecesse. Com a sua morte, são atribuídos a ela
muitos milagres e graças. Como mulher de fibra, com as características laboriosas de
uma imigrante italiana, pobre, uma coloninha, desprovida de qualquer meio, ela se
identifica com a realidade brasileira para alguns; para outros ela foi aquilo a que se
propôs: uma Santa. Independentemente do que as pessoas pensem ou falem sobre ela, é
um fato concreto e real que muitas pessoas passam por lá, procurando o que quer que
seja, sendo um local provido de uma grande energia que emana da natureza ou dos
artefatos construídos pelas mãos dos homens.
As pessoas que freentam o Santuário se colocam como visitantes, que vieram
conhecer o local, fazer um passeio ou apenas sair de casa, como disseram alguns. Os
termos peregrino, ou romeiro, e turista são utilizados pelo meio acadêmico. As pessoas
que estão lá não estão preocupadas com rótulos; elas somente querem estar lá,
independentemente da sua crença. Esse último, o turista, é mais presente nas férias
escolares, o que não significa que o sejam peregrinos ou romeiros. O importante é que
eles vão e muitos retornam. Nesse contexto, os passantes se tornam líquidos, ou seja,
adaptáveis, sem preocupação em pertencer a alguma denominação religiosa. Neste
sentido, pode-se ver uma questão de um simbolismo pragmático religioso.
345
MONTENEGRO, A. Torres. História oral e memória: a cultura popular revisitada. São Paulo: Contexto, 2000.
137
No último capítulo, observamos o fenômeno do início do turismo, como foi
caracterizado, sua colocação no mercado e o seu desenvolvimento, seguindo sua
trajetória passando pelos grandes centros até chegar em Santa Catarina. O turismo sai do
imaginário, se torna palpável quando, fugazmente, se coloca como uma possibilidade
de desdobramento do real: o querer ver (subjetivo) algo faz com que esse algo se
materialize através de algum elemento do real (objetivo)
346
. Desse modo, realiza-se
uma ação econômica dentro da perspectiva de trade.
Vários meios são usados para dar vulto à cidade, fazendo dela um hot point, uma
vez que, até então, não tinha, como se dar visibilidade, tornando-se conhecida do
público em geral. Era, antes, uma cidade “nostálgica com o passado”
347
, sem maior
destaque, conhecida como um lugar permeado de italianidade, mas sem
representatividade, mesmo acontecendo a cada ano a festa de Incanto trentino, que não
fazia dela um estandarte de expressividade e sim “seletiva, cuja vero é trazida a
público através de emblemas de um passado seletivo, pelos fazedores de festas”
348
, Os
neotrentinos são arraigados no apego aos seus antepassados, identificando-se nas
“maneiras de fazer constituem as mil pticas pelas quais usuários se reapropriam do
espaço organizado pelas técnicas da produção sócio-cultural”
349
.
O seu desenvolvimento no terceiro setor (serviços) se pelos investimentos
feitos por parte da prefeitura para a implantação das indústrias calçadistas na cidade,
desta forma alcançando-o e empregando pessoas oriundas de outros estados e da própria
cidade. o potencial turístico é baseado na atividade periférica, com forte índice de
feminização, na medida em que os homens geralmente vão trabalhar em vários setores e
segmentos fora da cidade, muitas vezes até morando onde trabalham e retornando no
final de semana, como é o caso dos pedreiros, enquanto as mulheres ficam no munipio
trabalhando para ajudar na renda familiar. A ação de procurar emprego longe da cidade
se dá em função da falta de trabalho, e também por estar na origem dos neotrentinos a
346
BACHELARD, Gaston. A terra e os devaneios da vontade: ensaio sobre a imaginação das forças. São
Paulo: Martins Fontes, 1991. p. 147-148.
347
LE GOFF, Jacques. História e memória. 3ª ed. Campinas: Ed. da UNICAMP, 1994. p. 220.
348
FLORES, Maria Bernadete Ramos. Op. Cit. p. 46.
349
CERTEAU, Michel de. A inveão do cotidiano: artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 1994. p. 41.
138
busca pelo meio para a sobrevivência longe das famílias, como já vimos na primeira
parte do primeiro capítulo, quando os antepassados partiram para terras estrangeiras.
O trabalho que as mulheres executam no comércio está, sem dúvida, ligado à
figura de Santa Paulina, uma mulher, em uma cidade rodeada pelos seus aspectos
bucólicos, com dois Santuários cujos padroeiros são duas santas e, também, pela
prefeitura governada por uma mulher. Além disso, são as Irmãzinhas, ou seja, mulheres
também, que dão continuidade às atividades da Madre Fundadora, reformulando os
aspectos naturais do território do Santuário, e com isto, entretendo as pessoas que por lá
passam. Sem elas não seria possível a dimensão holística do Santuário e do município.
A aparição da Santa e sua divulgação pelasdias fazem do Município um entrelaçar,
um casamento; mas este matrimônioo é perfeito, porque as pessoas não param na
sede e quase todas seguem atégolo. Por outro lado, é lá que se encontram os artefatos
cenográficos para o blico alvo, o religioso, e as Irmãzinhas fazem uso de todos os
objetos relacionados à santa, ou que a possam representar, construindo-os. Desse modo,
em Vígolo, observamos a instrumentalizão do espaço sagrado por um mascaramento
econômico, seguindo a tendência do mercado, aproveitando tudo o que se pode elaborar
para desenvolver o município através da experncia religiosa dos passantes. Dessa
forma, os neotrentinos começam a realizar, a cuccagna, tão desejada por seus
antepassados.
Chegamos ao término da jornada iniciada alguns meses ats, caminhando a
pelas ruas e vielas do município de Nova Trento em direção agolo. Sentíamo-nos
ligados” ao caminhar por lá, lembrávamos o que tínhamos lido e estudado. Depois
desse percurso, concluir a pesquisa não significa ter chegado ao seu final absoluto. Pelo
contrário. A partir da jornada “conclda”, temos a certeza de que há muito para
desvelar, construir, escrever, impulsionar. Esse concluir não significa aqui que o fim de
um dia seja ruim, não mesmo; é o momento de relembrar o que ocorreu, as caminhadas
feitas, o que se deixou de fazer e sentar para ver os beija-flores demonstrarem, ao sugar
o néctar das flores das irmãzinhas, o quanto se tem para aprender com o pôr do sol e a
espera da aurora. Assim é Vígolo, aprender a produzir construindo um cenário rico em
contribuições para o turismo e para a economia que não teria sentido sem a Canonização
de Paulina.
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152
5) ENTREVISTAS
ADAMI, Maria Cristina. 40 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do
Nascimento. Nova trento 17/09/2005.
ALVES. Elza Daufenbach. 45 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do
Nascimento. Florianópolis 02/02/2005.
BENTO, Sandra. 18 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova
Trento 17/09/2005.
CADORIN, Enizete Terezinha. 38 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do
Nascimento. Nova Trento 17/09/2005.
CANDIDO, Marli. 49 anos. Rio do Campo-SC. Entrevista concedida a Karine
Simoni.Nova Trento 04/06/2005.
CAMPOS, Márcio. 36 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a Jo do Nascimento.
Nova Trento 17/09/2005.
CAMPOS, Veroni Silva. 65 anos. Cidade Sapucaia do Sul-RG. Entrevista concedida a José
do Nascimento. Nova Trento 19/03/2005.
COSTA, Perci Negreiros da. 50 anos. Joinville. Entrevista concedida a Karine Simoni.
Nova Trento 04/06/2005.
DALBOSCO, Lílian. 37anos. Nova Trento. Entrevista concedida a Jo do Nascimento.
Nova Trento 10/09/2005.
DALBOSCO Júnior, Onildo. 35 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do
Nascimento. Nova Trento 17/9/2002.
ELI. Maria. 35 anos. São João Batista. Entrevista concedida a Karine Simoni. Nova Trento
04/06/2005.
ORSI. Eleonor (Elmentrudes, Religiosa da CIIC). 66 anos. Nova Trento. Entrevista
concedida a Ramon Tridapalli. Nova Trento 16/4/1981.
HELOU Filho, Esperidião Amin. 57 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a Jo do
Nascimento. Nova trento 14/12/2005.
GIROLLA, Tânia Maria. 27 ANOS. Nova Trento. Entrevista concedida a José do
Nascimento. Nova Trento 17/9/2005.
153
KRIGER, Dom Murilo S. Ramos. 62 anos. Florianópolis. Questionário. [e-mail de Dom
Murilo S. R. Kriger, sj.]. Endero eletrônico: Dommurilo@arquifloripa.org.br.
Florianópolis 27/9/2005.
MARCON, Regina Aparecida Camilo. 42 anos. Campo Largo-PR. Entrevista concedida a
José do Nascimento. Nova Trento 04/06/2005
MARTENDAL, Luana. 17 anos. Rio do Sul-SC. Entrevista concedida a Karine Simoni.
Nova Trento 04/06/2005.
MATOS, Clara Maria Ramos da Luz. 79 anos. São José. Entrevista concedida a Jo do
Nascimento. São José 23/03/2005.
MEES, Ir. Ilze. Religiosa da CIIC. 78 anos.golo. Entrevista concedida a Jo do
Nascimento. 17/09/2005. Nova Trento
NASCIMENTO, do Luciene. 36 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do
Nascimento. Florianópolis 19/03/2005.
OLIVEIRA. Aladio Sebastião. 47 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do
Nascimento. Florianópolis 27/03/2005.
ORSI, Agostinho José. 45 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José do
Nascimento.Nova Trento 17/09/2005.
PEDROTI, Sônia Mara. 38 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do
Nascimento. Nova Trento 17/09/2005.
PIANEZZER, Lurdes Vinotti. 64 anos. Vígolo. Entrevista concedida a Karine Simoni.
Trento 04/06/2005.
PITHAN, Ana Esther Balbão. 40 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do
Nascimento. Florianópolis 04/06/2005.
PITHAN, Elza Balbão. 83 anos. Florianópolis. Entrevista concedida a José do Nascimento.
Florianópolis 23/03/2005.
PIFFER, Ari. 61 anos. Nova Trento. Entrevistado por José do Nascimento. Nova Trento
17/09/2005.
ROVER, Saul. 60 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a Jo do Nascimento. Nova
Trento 17/09/2005.
SANTOS, Julio César dos. 36 anos. Nova Trento. Questionário. [e-mail de Julio César
dos Santos]. Endero eletrônico: julio@portaldovigolo.com.br. Nova Trento 12/10/2005.
154
SANTOS, José Amilton Fernandes dos. 50 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a José
do Nascimento. Nova Trento 17/09/2005.
SGROTT, Luciano Ari. 28 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a Jo do Nascimento.
Nova Trento 17/9/2002.
SILVA, Greria da. 48 anos. Palhoça. Entrevista concedida a Jo do Nascimento.
Palhoça 19/03/2005.
SILVA, Maria Ione Cardoso da. 56 anos. Capão da Canoa. Entrevista concedida a Karine
Simoni. Nova Trento 19/03/2005.
VARGAS, Pedro Paulo. 39 anos. Nova Trento. Entrevista concedida a Jo do
Nascimento. Nova Trento 17/09/2005.
VOIGTH, Ademir. 48 anos. Indaial. Entrevista concedida a José do Nascimento. Nova
Trento 17/09/2005.
155
6) ANEXOS
Anexo 1
Decreto de elevação do Santuário de Santa Paulina
156
157
158
159
Anexo 2
Comiso Governamental de Acompanhamento e Implantação do Plano de Turismo
Religioso – Projeto Madre Paulina
160
161
162
163
164
165
166
167
168
169
170
171
172
173
174
175
Anexo 3
176
Anexo 4
Lei que reconhece Nova Trento como estância turístico-religiosa.
177
Anexo 5
Censo do IBGE, como era a produção nas décadas de 70 e 80.
1970 1980 1989 Gênero
Estabeleci
mentos
Pessoal
ocupado
Estabeleci
mentos
Pessoal
ocupado
Estabeleci
mentos
Pessoal
ocupado
Extrão de
Minérios
02 * - - - -
Transf.
produtos
minerais e
não
metálicos
02 * 01 * 07 22
Metalúrgico - - 02 * 03 10
Madeira 33 52 16 40 09 63
Mobiliário 11 18 08 43 11 73
Papel e
papelão
- - 01 * - -
Química 03 17 01 * - -
Têxtil 01 * 01 * - -
Vest. Ca.
E art. de
Tecido
01 * 01 * 17 175
Produtos
Alimentares
03 05 05 06 - -
Material
Elétrico
- - - - 01 05
Indústria
Construção
Civil
- - - - 40 900
Total 56 235 36 125 88 1.348
Fonte: Fundação IBGE, Censo Industrial – 1970 e 1980; prefeitura Municipal (*) Dado não disponível.
178
Anexo 6
Relação de movimento dos Apêndices. (Fonte adaptada por José do Nascimento)
179
Anexo 7
VINÍCOLAS
1) Vicola Neotrentina
Rua Madre Paulina – Estrada Geral – Vígolo
2) Vinho Vô Luiz
Rua Madre Paulina – Estrada Geral – Vígolo
3) Vinhos Girolla
Rua Madre Paulina - Estrada Geral – Vígolo
4) Vinhos Onório Wolff
Rua Madre Paulina – Estrada Geral – Vígolo
(3 Km acima do Santuário Santa Paulina)
5) Vinho Colonial Wolff
Rua Marechal Deodoro, 35 – Centro
6) Vinícola Vattaro
Rua Santo Inácio, 599 – Centro
7) Vinhos Di Trento
Rua Antônio Sgrott, s/
8) Vinhos Battisti
Rua Giácomo Polli, s/nº - Bairro São Roque
9) Vinhos Visintainer
Rua Madre Paulina – Estrada Geral – Vígolo
10) Vinhos Del Vígolo
Rua Madre Paulina – Estrada Geral – Vígolo
11) Vinhos Castelinhos
Rodovia Santa Catarina 411 Próximo ao trevo do Distrito Claraíba
12) Vinhos José Wolf
Rua Geral – Vígolo – 2 km acima do Santuário Santa Paulina
13) Vinhos e Sucos Bela Vista
14) Alto da Bela Vista Vígolo – Entrada a esquerda 100m após Santuário Santa Paulina.
180
Anexo 8
RESTAURANTES
1) Pousada e Cantina Italiana
Rua dos Imigrantes, 412 Centro
2) Carlinhos Restaurantes – Comida Típica – Churrascaria
Rua Hilito Boiteux. 55 Centro
3) Restaurante e Lanchonete Madre Paulina
Complexo Madre Paulina, s/nº - Vígolo
4) Restaurante do Santuário de Nossa Senhora do Bom Socorro
Alto do Morro da Cruz
5) Restaurante do mosteiro Park Hotel
Bairro Vígolo (só com reserva)
6) Restaurante trevo
Rodovia Santa Catarina 411 – Bairro Bezenello
7) Restaurante e Lanchonete Girolla
Rua Geral - Vígolo
8) Restaurante D. Terezinha
Complexo Madre Paulina – Vígolo
9) Restaurante, Bar e Lanchonete
Complexo Madre Paulina – Vígolo
10) Churrascaria, Bar e Lanchonete Dallas
Rua Geral - Vígolo
11) Churrascaria Grelha e Brasa
Rua dos Imigrantes, s/nº
12) Pizzaria Paiol
Rua dos Imigrantes – centro
13) Bar e Lanchonete Canto das Logoas
Rua João Bayer Sobrinho – Centro
181
Anexo 9
CONFEITARIAS E PANIFICADORAS
1) Casa Marta Frehner
Rodovia Santa Catarina 411 Km 06 Entre Brusque e Nova Trento
2) Panificadora Tell
Rua Santo Inácio, 90 – Centro
3) Confeitaria e Mercado Vargas
Rua Nereu Ramos, 255
4) Trento Pan
Rua Cristóvão Gessele – Centro
5) Natalia
Rua Luiz Busnardo, S/N – Cascata
5) Panificadora Souza Sales
Rua Alferes, 1230 – Trinta reis
182
Anexo 10
Os 36 tipos e formas de turismo
1) Turismo Científico
2) Turismo Cultural
3) Turismo da 3ª Idade
4) Turismo de Compras
5) Turismo de Congressual
6) Turismo de Evento, fixos, sazonais, de oportunidades e monotemáticos
7) Turismo Virtual
8) Turismo Endógeno
9) Turismo de Jogo ou Cassinismo
10) Turismo Especializado para novos segmentos de consumo
11) Turismo Alternativo
12) Turismo Hedonista
13) Turismo Socio-familiar
14) Turismo Habitação
15) Turismo Habitacional
16) Turismo de Recreação e Entretenimento
17) Turismo Esotérico ou Esoterismo
18) Turismo Saúde
19) Turismo Megaevento
20) Turismo Urbano
21) Turismo Empresarial ou de Negócio
22) Turismo Cívico Institucional
23) Turismo Religioso
24) Turismo Excentricidades
25) Turismo Sexual
26) Turismo de Incentivo
27) Turismo Educacional
183
28) Turismo Temático
29) Turismo Étnico-Hisria-Cultural
30) Turismo Desportivo
31) Turismo Paisagístico e Hidrotermal
32) Turismo Agroturismo
33) Turismo Rural
34) Turismo Ecoturismo e Ecológico
35) Turismo Cultural
36) Turismo de Aventura
184
Anexo 11
Produtos Coloniais
As diferentes frutas in natura podem ser encontradas nos seguintes meses:ssego
(outubro à dezembro); ameixa (novembro a janeiro); uva (dezembro a fevereiro); banana
(janeiro à dezembro) e os cítricos (maio a setembro).
1) Fábrica de Lacticínios Trentolat
Localidade de Salto – Bairro São Roque
Produto: Queijo.
2) Rose & Lili
Rua Santo Inácio, - Centro
Produtos: Produtos Coloniais (queijos, geléias, salames, vinhos) frutas, verduras e arranjos.
3) Wolff Prodotti Tipici
Rua Madre Paulina – Estrada Geral – Vígolo
Produtos: Queijos, salames, cereais, geléias, vinhos, artesanato e antiguidades.
4) Produtos Coloniais e artesanatos
Rua dos Imigrantes, 412 - Centro – Anexo a Pousada e Cantina Italiana
Produtos: Produtos Coloniais (queijos, geléias, salames, vinhos) e artesanato em geral.
5) Casa dos Vinhos e Queijos
Rodovia Santa Catarina 411 Trevo de acesso ao centro de Nova Trento
Produtos: Produtos Coloniais (queijos, geléias, salames, vinhos).
6) Biscoito LG
Distrito de Aguti
Produtos: Biscoitos Caseiros.
7) Propriedades Euclides Bottamedi
Rua Alferes, 1660 – Bairro Trinta Réis
Produtos: melado de cana, cachaça, licor e graspa.
8) Propriedade Helena Bottamedi
Localidade de Salto – Bairro São Roque
Produtos: Licores.
9) Propriedade Moíses Tambosi
Rodovia Santa Catarina 411 Km 06 Entre Brusque e Nova Trento
Produtos: Cucas, pães, bolachas e biscoitos.
185
10) Propriedade Orlando Deluca
Distrito de Claraíba
Produtos: Conservas e compotas.
11) Propriedade Matilde Bernade
Estrada Tirol - Distrito de Claraíba
Produtos: Conservas, geléias e compras.
12) Propriedade Osni DEluca
Distrito de Claraíba
Produtos: Conservas e biscoitos caseiros.
13) Propriedade José Deluca
Distrito de Claraíba
Produtos: Conservas.
14) Propriedade Eliziene Franzoi
Rua Florianópolis – Bairro Ponta Fina Norte
Produtos: Licores.
15) Propriedade Inês Wederof
Rua Madre Paulina – Estrada Geral – Vígolo
Produtos: Pães caseiros.
16) Propriedade Edite Frisanco
Localidade de o Valetim
Produtos: Geléias.
17) Propriedade Laurentino Eccher
Localidade de São Valetim
Produtos: Farinha de mandioca, aguardente de cana-de-açúcar, mel de abelha, banana e
pêssego.
186
Anexo 12
Modalidade para enviar a contribuão
Livros Grátis
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