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para este trabalho. Levando-se em consideração que um dos objetivos propostos é analisar os
contatos e relações ocorridos entre os nativos e os adventícios em uma parte da costa norte
brasileira, observou-se que a característica dos ventos e correntes marítimas, imprimiu
algumas peculiaridades, as quais influenciaram no processo histórico acontecido, desde os
últimos anos do século XV ao século XVII, como será visto nos capítulos adiante. Outro
motivo para trabalhar especificamente com o termo Leste-Oeste é que ele possibilita delimitar
mais a área escolhida para o estudo, já que este termo não encerra toda a costa setentrional,
pois do Rio Amazonas em diante, a costa pende para o Norte
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.
A área mais enfocada pelo trabalho não corresponde, contudo, a toda a Costa Leste-
Oeste, e sim, a uma delimitação que inclui litoral ocidental do Estado do Ceará, todo o litoral
do Piauí e a parte oriental da costa maranhense. Esta delimitação, por sua vez, corresponde à
área de ocupação dos índios tremembés
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, conforme a maior documentação disponível sobre
esses índios, a partir do século XVII
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.
A escolha dos tremembés repousa sobre trabalhos anteriores dessa autora (BORGES,
2004, 2006)
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, realizados nos sítios arqueológicos do litoral do Piauí, nos quais foi possível,
através de pesquisa histórica e datação arqueológica, associar parte do profuso material
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Na costa do Amapá imperam outros condicionantes históricos, tal como a repartição realizada pelo Tratado de
Tordesilhas (1494) que conferia a posse das terras aos espanhóis, além da ocupação de outros grupos nativos,
como os do tronco linguístico aruaque e caribe, essa maior complexidade exigiria um trabalho a parte.
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Os etnônimos indígenas adotados no trabalho, não obedecem à convenção lingüística-antropológica, segundo a
qual os nomes próprios das etnias, quando de origem indígena são escritos em letras iniciais maiúsculas e não
flexionam. A 1ª Reunião Brasileira de Antropologia foi realizada em 1953, e estabeleceu uma padronização
para nomes das sociedades e das línguas indígenas no Brasil, a qual chamou-se Convenção para a Grafia dos
Nomes Tribais (<http://www.labeurb.unicamp.br/elb/historia_nocoes/nota_geral_grafia_indigena.htm>). Como
o nome da Convenção, “Tribais”, alguns conceitos ficaram obsoletos, e conforme se observa com o avançar
dos estudos indigenistas, muitas denominações indígenas, as quais se acreditava que eram autodenominações,
são nomeações do outro. Como dizer o que é e o que não é indígena em relação aos etnônimos, levando-se em
consideração a complexidade dos processos históricos entre os grupos ágrafos e os que dominavam a escrita?
Além do mais, cremos, como Fonteles Filho (2003, p.8), que a palavra no plural expõe a “[...] multiplicidade de
modos de existência social [...]” dos grupos indígenas, enquanto que a falta de flexão, sugere a falta de
dinâmica, sugere o engessamento que os estudos atuais sobre os indígenas pretendem demolir.
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Existem referências sobre os tremembés no litoral leste do Maranhão (barra do rio Turiaçu) até o rio Caeté, no
Pará (DOMINGUES, 1952; NIMUENDAJÚ, 1987), entretanto, Domingues mistura fatos, ocorridos no Rio
Tutóia (MA) e no Parnaíba (PI), como se tivessem acontecido na foz do rio Turiaçu. Nimuendajú em seu Mapa
Etno-Histórico (1987) apresenta os tremembés na foz dos rios Turiaçu, Gurupi, Piriá e Caeté, mas utiliza
algumas das fontes de Domingues.
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Trabalhamos com os sítios arqueológicos do litoral piauiense desde o ano 2000, dentro do quadro de pesquisas
realizadas pelo NAP – Núcleo de Antropologia Pré-Histórica da Universidade Federal do Piauí, onde
começamos como bolsista do PIBIC (CNPq) e, atualmente, dentro do quadro de professores efetivos do Curso
de Arqueologia e Conservação da Arte Rupestre da UFPI, coordenamos o Grupo de Estudos Arqueológicos do
Litoral Piauiense. Nossos trabalhos arqueológicos são, contudo, preliminares, em virtude de não terem sido
realizadas escavações sistemáticas na região litorânea. Espera-se que essa pesquisa histórica contribua para o
estudo dos sítios litorâneos, os quais possuem complicada morfologia para escavações, por se situarem em
dunas movediças, que impedem a constituição de uma estratigrafia. Na realidade, as duas disciplinas, história e
arqueologia, devem, ainda, muitas contribuições para o melhor entendimento dos grupos indígenas que viviam
no litoral setentrional brasileiro.