
INTRODUÇÃO
Uma das questões proeminentes na filosofia refere-se à concepção de pessoa. A
categorização do ser humano, no que consiste a sua diferenciação em relação aos outros
animais, a natureza do agente, seu estatuto moral e legal e, nesse caso, o modo como o
homem se insere na sociedade e define suas relações; compõem questões relacionadas à
concepção de pessoa que participam das indagações – pode-se pensar – irremediáveis num
discurso filosófico. A história da filosofia apresentou inúmeras respostas a tais questões, de
modo a compor diferentes pensamentos filosóficos.
Imbuída dessa questão, a pesquisa buscará a estruturação da concepção expressivista
de pessoa
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a partir do pensamento do filósofo Charles Taylor
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, no sentido de buscar novos
elementos às questões antropológicas, éticas e políticas, que estão presentes na filosofia do
autor e se expressam na sua concepção de pessoa. Ao se tomar o expressivismo
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enquanto
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O vocábulo pessoa juntamente com outros que serão largamente empregados na pesquisa, como indivíduo, eu
(self), sujeito, ser humano, possuem na filosofia um significado peculiar. Segundo Lalande, indivíduo (latim
individuum) “[...] é um objeto de pensamento concreto, determinado, que forma um todo reconhecível, e consiste
num real dado quer pela experiência externa, quer pela experiência interna.” (LALANDE, André. Vocabulário
técnico e crítico da filosofia. Tradução de Fátima Correia, Maria Aguiar, José Torres, Maria de Souza. São
Paulo: Martins Fontes, 1999, p.556) Sujeito (latim suppositum) é o suporte ou substrato de certos atributos, no
sentido lógico e metafísico é “[...] o ser ao qual é atribuído predicado e é, por assim dizer, o seu suporte [...] Por
conseqüência, o ser real considerado como algo que tem qualidades ou exerce ações.” (Id. Ibid., p.1090). Pessoa
(latim persona, grego prosópon) representava para os gregos a máscara com a qual os atores representavam
papéis no palco de teatro. Embora os vocábulos tenham significados expressivos para a filosofia, Taylor utiliza-
os sem atender às restrições filosóficas impressas nos termos. Por isso, na pesquisa não iremos estabelecer
diferenciações quanto aos vocábulos sujeito, pessoa, eu (self), ser humano. A única exceção feita pelo autor está
na palavra agente que para o autor pode não carregar a dimensão reflexiva avaliativa ideal para a composição do
ser humano.
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Taylor (1931) é um filósofo canadense influente na filosofia contemporânea. O autor versa sobre inúmeros
campos do pensamento: na psicologia, nas ciências sociais, na religião e, principalmente na ética e na política.
Além de pensador, foi membro ativo no cenário político canadense, no qual defendeu, enquanto partidário do
NPD (New Democratic Party) políticas contrárias à fragmentação política do Canadá decorrentes de tendências
neo-liberais. O seu pensamento recebe a influência de inúmeros filósofos, entre os quais, pode-se destacar:
Aristóteles, Herder (juntamente com a tradição romântica e expressivista), Hegel, Wittgenstein, Merleau-Ponty,
Heidegger. A partir desse legado, Taylor desenvolve seu ideal de sujeito situado pela linguagem e corpo nas suas
avaliações perceptivas, o que serve de base para o seu pensamento ético-político, impondo, assim, a idéia de um
sujeito engajado na comunidade. Entre suas inúmeras obras, pode-se destacar: Hegel, 1975; Sources of the self,
1989 (tradução brasileira: As fontes do self, 1997); Le Malaise de la Modernité, 1991; Multiculturalism, 1994
(tradução portuguesa: Multiculturalismo e tradução brasileira de parte da obra: Política do Reconhecimento in:
Argumentos Filosóficos, 2000); além de outros ensaios contidos em coleções como Philosophical Papers vol 1,2
1985, e Philosophical Arguments, 1995 (tradução brasileira: Argumentos filosóficos, 2000).
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Taylor resgata o movimento do Sturm und Drang (tempestade e assalto, ou tempestade e ímpeto), que foi um
prelúdio ao romantismo na Alemanha, e cujos teóricos Herder, Goethe, Schiller, Hamann, Humboldt fizeram um
primeiro contraponto ao iluminismo. Isaiah Berlim, assim como Taylor, é um autor que resgata a filosofia de
Herder e o expressivismo. O autor afirma de modo geral na idéia de expressionismo uma “doutrina baseada em
que a atividade humana em geral, e a arte em particular, expressam a personalidade completa do indivíduo ou do
grupo, e são inteligíveis unicamente até o limite em que elas assim o fazem.” (BERLIN, Isaiah. Vico e Herder.
Tradução de Juan Antonio Gili Sobrinho. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 1982, p.139)