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RENATA BOUTIN
ASPECTOS PEDAGÓGICOS DO DESENHO ANIMADO
INFANTIL BOB ESPONJA
Universidade Metodista de São Paulo
Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social
São Bernardo do Campo, 2006
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RENATA BOUTIN
ASPECTOS PEDAGÓGICOS DO DESENHO ANIMADO
INFANTIL BOB ESPONJA
Dissertação apresentada em cumprimento
parcial às exigências do Programa de Pós-
Graduação em Comunicação Social, da
Umesp Universidade Metodista de São
Paulo, para obtenção do grau de Mestre.
Orientadora: Profa. Dra. Elizabeth Moraes
Gonçalves.
Universidade Metodista de São Paulo
Programa de Pós-Graduação em Comunicação Social
São Bernardo do Campo, 2006
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2
F
OLHA DE
A
PROVAÇÃO
A dissertação de mestrado sob o título Aspectos pedagógicos do desenho animado
infantil Bob Esponja”, elaborada por Renata Boutin, foi defendida e aprovada em 27 de abril
de 2006, perante a banca examinadora composta por Elizabeth Moraes Gonçalves, Liana
Gotlieb e Cicília Peruzzo.
Declaro que a autora incorporou as modificações sugeridas pela banca examinadora, sob a
minha anuência enquanto orientadora, nos termos do Art.34 do Regulamento dos Programas
Pós-Graduação.
Assinatura da orientadora: _____________________________________________________
Nome da orientadora: Profa. Dra. Elizabeth Moraes Gonçalves
São Bernardo do Campo, 26 de junho de 2006.
Visto do Coordenador do Programa de Pós-Graduação:_______________________________
Área de concentração: Processos Comunicacionais.
Linha de pesquisa: Comunicação Especializada.
Projeto temático: Linguagens e Discursos Especializados na Comunicação.
3
Para meu pai, minha mãe, minha irmã e meu
noivo. Amo vocês profundamente.
4
Malogramos sempre ao falar do que amamos.
Roland Barthes
5
A
GRADECIMENTOS
A Deus, sobre todas as coisas;
A minha orientadora Beth: a gratidão e a admiração que sinto não cabem aqui e
ultrapassam os limites acadêmicos;
A Adriana Azevedo que na graduação me encantou com suas aulas, despertando em
mim o desejo de ser professora. Orientando meu estágio docente me deu a oportunidade de
sentir o gosto da sala de aula e definitivamente me apaixonar por ela;
Ao Daniello, que no primeiro semestre de faculdade nos propôs um projeto de
pesquisa sobre programas infantis que resultou na minha primeira apresentação em congresso
e no meu amor pelo tema;
Ao PET (Programa Especial de Treinamento), a nossa primeira tutora, Cicília Peruzzo,
e a turma de “PETianos”: com vocês experimentei momentos únicos de pesquisa e
amadurecimento acadêmico e pessoal;
Aos amigos Ana Lúcia, Carlos, Everton, Franz, Grego, José Augusto, Taís, Lílian,
Lislei e Sara, companheiros de jornada;
A Universidade Metodista de São Paulo, minha casa desde a graduação;
A CAPES pela oportunidade de cursar o mestrado, realizando um sonho.
6
S
UMÁRIO
I
NTRODUÇÃO
09
1. Metodologia 13
2. Quadro teórico de referência 16
C
APÍTULO
I
C
ONSIDERAÇÕES SOBRE O MEIO E A CRIANÇA
31
C
APÍTULO
II
O
MEIO É A LINGUAGEM
42
1. O meio 42
2. A linguagem audiovisual do Bob Esponja 46
2.1. A imagem em movimento 48
C
APÍTULO
III
O DESENHO ANIMADO INFANTIL
“B
OB
E
SPONJA
55
1. A televisão por assinatura 55
2. O canal de transmissão Nickelodeon 57
3. A cena enunciativa de “Bob Esponja” 60
4. O ethos dos personagens fixos 63
4.1. Bob Esponja Calça Quadrada 64
4.2. Patrick Estrela 65
4.3. Lula Molusco 66
4.4. Seu Siri Queijo 67
4.5. Exemplos do ethos dos personagens em diálogos 68
C
APÍTULO
IV
L
EITURA DOS EPISÓDIOS SELECIONADOS
71
C
ONSIDERAÇÕES FINAIS
79
R
EFERÊNCIAS
81
A
NEXOS
7
R
ESUMO
Este estudo teve como objetivo refletir sobre a importância de se entender o desenho
animado para público infantil para além do entretenimento, como rica fonte de apreensão de
significados. O desenho animado escolhido para análise foi o infantil “Bob Esponja”, que
apresenta elementos típicos da comédia como simplicidade, exagero, inconveniência e
irreverência. O trabalho foi construído pela escolha de quatro episódios, selecionados por
apresentarem enredos que tratavam dos temas família (Beijos da vovó); mentira (Chocolate
com nozes); doença (Espuma) e disputa (Jogos do mestre-cuca) e sua intersecção com a
fundamentação teórica oferecida pela análise do discurso; aspectos da linguagem audiovisual
e considerações sobre as relações existentes entre o público infantil e a TV. Através da leitura
do discurso dos episódios selecionados foi possível a verificação da presença de traços de um
discurso pedagógico fundido no macro discurso do entretenimento.
Palavras-chave: Comunicação – Linguagem – Desenho animado – Discurso.
8
A
BSTRACT
This study had the objective of thinking about the importance to understand the
cartoons for children public besides entertainment, as a rich space to learn the meanings. The
cartoon chosen to analysis was “Spongebob Squarepants”, that shows typical elements of
comedy as simplicity, exaggeration, inconvenience and irreverence. The work was built by
the chosen of four episodes, because of their themes: family (Grandma kisses); lie (Chocolat
with nuts); illness (Spume); dispute (The games of master cook) and by the dialogue between
these episodes; the basis of the theory offered by the discourse analysis; aspects of media
language and studys about the relations that exists between the children public and the TV
media. Through the analysis of chosen episodes discourse, it was possible to verify the
presence of a pedagogical discourse made in a macro speech of entertainment.
Key words: Comunication – Language – Cartoons - Discourse analysis.
9
I
NTRODUÇÃO
A televisão é um meio muito eficaz de divulgar uma mensagem a um grande número
de pessoas. A dificuldade está em definir que tipo de mensagens e para quem. Na prática, é
qualquer mensagem para qualquer pessoa que esteja em frente ao aparelho de TV.
Considerando-se que grande parte da audiência televisiva é formada por crianças ou jovens
que, de acordo com a ONU os menores de dezoito anos constituem 37% da população
mundial (FEILITZEN, 2000, p. 54) torna-se de extrema importância que a Comunicação,
como campo científico, conta de pesquisar as várias abordagens do fenômeno televisivo
relacionado ao público infantil.
Recente pesquisa (CASTRO, 2004b) realizada pelo Instituto Ipsos em dez países
afirma que as crianças e adolescentes brasileiros são provavelmente os que mais vêem
televisão no mundo, e ainda, são os que têm menos hábito de leitura. Os resultados apontam
que no Brasil, cerca de 57% as crianças vêem televisão por no mínimo três horas por dia. A
pesquisa foi realizada em grandes centros urbanos (São Paulo, Rio de Janeiro, Belo
Horizonte, Recife e Porto Alegre) e, apesar de não retratar todo o universo da audiência
infantil, são dados preocupantes e que esquentam o debate acerca do papel social que a
televisão pode (e deveria) exercer junto a este público.
Atentos ao fenômeno da relação entre a televisão e as crianças diversos autores, como
Joan Ferrés (1996), Ana Lúcia e Nauro de Rezende (2002), Elza Dias Pacheco (1998), Rosa
M. Bueno Fischer (2003), José Manuel Moran (1991), Maria Aparecida Baccega (2003),
Maria Luiza Belloni (2001), entre outros, concordam com Ulla Carlsson (2002, p.13) quando
ela afirma que “não é exagero dizer que os indivíduos mais vulneráveis neste mundo da mídia
globalizada são nossas crianças. As mudanças que presenciamos atuais e futuras
influenciam profundamente suas vidas”. Assim, estes pesquisadores desenvolvem trabalhos
buscando compreender os mecanismos da televisão, seus conteúdos e sua apreensão pelo
público infantil principalmente porque as crianças, ao mesmo tempo que aprendem a interagir
com a televisão, estão aprendendo a interagir com o mundo e formando sua identidade. A
exposição ao conteúdo televisivo é entendida como um dos fatores de influência na formação
da personalidade infantil, uma vez que a criança na maioria das vezes tem mais contato com a
televisão que com a escola ou até mesmo com seus pais. Moran (1991, p. 61) afirma que
“uma criança chega à vida adulta depois de ter assistido a 15 mil horas de televisão e mais de
350 mil comerciais, contra menos de 11 mil horas de escola”.
10
Alguns estudos produzidos, porém, buscam objetos que exemplifiquem os malefícios
que a programação televisiva pode causar, ou exploram o excesso de modelos considerados
“ruins” para seus receptores. Muitas vezes são privilegiados nestes estudos conteúdos de
extrema violência, disputa, e maniqueísmo bem delimitado e exacerbado, por exemplo. Sérgio
Macleimont, no artigo “Televisão e crianças novas perspectivas de relação” (2002) ressalta
que “diante do fenômeno social da televisão, três posturas costumam ser adotadas: aquela que
considera a TV como causa de todos os males, aquela que a concebe apenas como uma fonte
de entretenimento e, finalmente, a que acredita que a TV pode ser um veículo de cultura” (p.
13).
Em relação a primeira postura citada, Arlindo Machado comenta em seu A televisão
levada a sério” (2003, p.20):
É impressionante o esforço de tantos analistas para tentar provar que o
programa de televisão não pode ter qualidades, que ele não pode elevar-se
acima do nível ‘mediano’ e que, por ser um produto ‘de massa’, ele não pode
ser avaliado com os mesmos critérios que se utilizam para a abordagem de
outros meios.
Jesus Martín-Barbero e Germán Rey, no livro Os exercícios do ver” (2001), dedicam
o subcapítulo “O ‘mal-olhado’ dos intelectuais” para criticar este foco de análise. Dialogam
com Arlindo Machado, também denunciando a crítica vazia contra a televisão e ressaltando o
papel da programação televisiva na dinâmica cultural:
Pois, encante-nos ou nos asco, a televisão constitui hoje,
simultaneamente, o mais sofisticado dispositivo de moldagem e deformação
do cotidiano e dos gostos populares e uma das mediações históricas mais
expressivas de matrizes narrativas, gestuais e cenográficas do mundo
cultural popular, entendido não como as tradições específicas de um povo,
mas a hibridação de certas formas de enunciação, de certos saberes
narrativos (p. 26).
Reconhecendo estas características da televisão, o público infantil como diferenciado e
considerando que este tem como principal produção televisiva os desenhos animados, este
trabalho realizou-se na contramão dos enfoques das pesquisas criticadas, partindo de um
objeto que, em uma análise superficial, não apresentava características consideradas
“negativas” para seu público alvo, como exploração da violência, desrespeito ou reforço de
preconceitos, por exemplo.
11
Este estudo buscou problematizar o desenho animado infantil “Bob Esponja” enquanto
capaz de transmitir mensagens que podem ser apreendidas pelo seu público, colaborando com
o campo de estudos das relações entre “mídia e criança” e, especificamente, com os estudos
sobre os desenhos animados para público infantil. Para tanto, pretendeu reconhecer elementos
constituintes no nível da mensagem sem desconsiderar outros aspectos que constituem a
enunciação, como expressões faciais, cenário, interação dos personagens, cortes de cena, entre
outros. Pretendeu desvelar a unidade do discurso e, conseqüentemente, a produção de
sentidos. Para tanto teve que considerar o meio televisão como interferência direta na
linguagem e conseqüentemente na produção de sentidos do “Bob Esponja”.
Foi destacado o seguinte problema: O desenho animado “Bob Esponja”, tratado como
gênero discursivo, constitui-se apenas por um discurso de entretenimento ou permite a fusão
de outros discursos, como o pedagógico?
Para responder a esta questão, foi desenvolvida uma hipótese prevendo que sempre
uma mensagem subjacente ao que está explícito e que no desenho animado “Bob Esponja”
isso não é diferente. Conforme as tramas são desenvolvidas, o discurso do entretenimento é
fundido com outros discursos de maneira inesperada, promovendo discursos de teor
pedagógico. Este discurso, de caráter implícito ou subentendido, pode ser recuperado pelo
receptor porque a construção discursiva do desenho animado constrói sua verossimilhança
1
,
ou seja, estrutura seus significados permitindo a “aparência de verdade” a despeito do gênero
ficcional em si e de seu afastamento da realidade concreta vivenciada por seu público alvo.
Os objetivos deste trabalho foram assim divididos:
Objetivo geral: Refletir sobre a importância de se entender o desenho animado além do
entretenimento puro, mas como rica fonte de apreensão de significados para o público infantil
observando seu papel social na formação deste público através da análise dos discursos que
emergem de sua linguagem.
Objetivos específicos:
a) Observar como os personagens do desenho animado infantil “Bob Esponja” se
comportam e interagem;
b) Observar se no desenho animado o discurso do entretenimento pode se fundir com
outros, como o pedagógico, oferecendo ao receptor um produto simbólico
1
Chama-se verossímil” aquilo que é semelhante à verdade, que tem aparência de verdade. Por exemplo, o
personagem “Super-homem” não existe na realidade e contudo é verossímil.
12
carregado de conhecimentos importantes que podem ser apreendidos e recuperados
em seu cotidiano;
c) Observar quais significados emergem do discurso do desenho quando são
trabalhadas situações ou conceitos
2
de família; mentira; doença e disputa.
d) Compreender se o conteúdo das mensagens dos desenhos e a forma através da qual
as situações se desenvolvem permitem que haja verossimilhança, gerando alguma
referencialidade com as experiências cotidianas do receptor.
O primeiro capítulo “Considerações sobre o meio e a criança” traz uma breve revisão
bibliográfica que resgata considerações feitas sobre a relação entre o público infantil e a
mídia, com objetivo de atingir maior compreensão de como um produto audiovisual pode se
relacionar com o público infantil e como eles podem interagir. O capítulo dois, “O meio é a
linguagem”, faz uma leitura do meio televisão, ressaltando o poder que tem de encantar sua
audiência. A seguir trata de sua linguagem, fazendo uma ponte entre a linguagem do cinema,
da televisão, e conseqüentemente de um dos produtos da televisão, que é o desenho animado
infantil “Bob Esponja”. O terceiro capítulo, “O desenho animado infantil ‘Bob Esponja’”, o
contextualiza enquanto produto de uma emissora específica, de veiculação específica, para
então compreender sua cena enunciativa e o ethos” de cada um dos personagens. Isto pode
ser superficialmente chamado de “características comportamentais” de cada um deles, o que
implica em contratos de leitura com seu público, aceitação de comportamentos diversos e
explica o modo de agir de cada um deles nos episódios selecionados para estudo. O último
capítulo traz uma leitura dos episódios selecionados, ressaltando o teor das mensagens que
são transmitidas para seu público e desvelando discursos considerados pedagógicos na medida
em que servem de modelos ou exemplos de conduta para seus espectadores que têm uma
maneira particular de se relacionar com a mídia.
2
“O conceito é uma atividade mental que produz um conhecimento, tornando inteligível não apenas esta pessoa
ou esta coisa, mas todas as pessoas e coisas da mesma espécie [...] é o meio que o indivíduo tem para reconhecer
esta coisa (ou outra qualquer da mesma espécie), compreendendo-a, tornando-a inteligível para si [...] Os
conceitos, que alguém atualmente possui, não apareceram de repente, de uma só vez, mas foram formados
progressivamente e o processo de sua formação continua [...] Um dos pontos mais fundamentais para o
desenvolvimento intelectual do ser humano consiste no alargamento, aperfeiçoamento e aprofundamento dos
conceitos, dando ao indivíduo uma visão, cada vez mais precisa e adequada, de si e do mundo em que vive”
(RUDIO, 2003, p.23-24).
13
1.
M
ETODOLOGIA
Diversos autores como Luna (2002), Rudio (2003) e Santaella (2001), por exemplo,
ressaltam em suas obras que uma pesquisa pesquisa pode tornar-se uma experiência frustrante
caso o se saiba, desde o princípio, o onde se quer chegar, mas principalmente como
chegar. Face ao caráter exploratório da pesquisa e à definição do problema, hipótese e
objetivos, a análise do discurso foi escolhida por ter como objetivo compreender como
objetos simbólicos produzem sentidos, que artifícios utiliza o enunciador para que seus
objetivos interpretativos sejam alcançados. Ela vai além da interpretação lexical e da
construção de enunciados interdependentes, aprofundando a interpretação ao emergir
mecanismos e marcas que permitiram a compreensão do fenômeno da transmissão de alguns
significados.
Não existe, porém, uma única maneira de aplicar os pressupostos da análise do
discurso. Foram utilizadas balizas conceituais que fundamentaram o desenvolvimento da
pesquisa, processo explicado por Eni Orlandi, em “Análise de discurso: princípios e
procedimentos” (2003):
Face ao dispositivo teórico da interpretação, uma parte que é da
responsabilidade do analista e uma parte que deriva da sua sustentação do
rigor do método e no alcance teórico da Análise de Discurso. O que é de sua
responsabilidade é a formulação da questão que desencadeia a análise [...] é
essa responsabilidade que organiza sua relação com o discurso levando-o à
construção de ‘seu’ dispositivo analítico, optando pela mobilização desses
ou aqueles conceitos, esse ou aquele procedimento, com os quais ele se
compromete na resolução de sua questão. Portanto, sua prática de leitura, seu
trabalho com a interpretação, tem a forma de seu dispositivo analítico [...] o
dispositivo teórico, que objetiva mediar o movimento entre a descrição e a
interpretação, sustenta-se em princípios gerais da Análise de Discurso
enquanto uma forma de conhecimento com seus conceitos e método. [...]
Feita a análise, e tendo compreendido o processo discursivo, os resultados
vão estar disponíveis para que o analista os interprete de acordo com os
diferentes instrumentais teóricos dos campos disciplinares nos quais se
inscreve e de que partiu (p. 27-28, grifo nosso).
A primeira etapa da investigação, naturalmente, constituiu-se por uma aproximação
com o objeto pesquisado e investigação teórica. O desenho animado infantil “Bob Esponja” –
criado por Stephen Hillenburg, um ex-professor de Biologia Marinha é produzido e
transmitido pelo canal de TV por assinatura Nickelodeon. Foi criado em 1998, nos Estados
Unidos e chegou à programação da Nickelodeon Brasil no ano 2000, sendo exibido
diariamente. Sua exibição, nos meses de janeiro, fevereiro e março de 2005 era assim
14
distribuída: de segunda a quarta-feira às 2h, 12h30 e 19h30; de quinta a sexta-feira às 2h e
12h30 e aos sábados e domingos às 6h e 13h30.
Horário Segunda Terça Quarta Quinta Sexta Sábado Domingo
02h00
Bob Esponja Bob Esponja Bob Esponja Bob Esponja Bob Esponja
06h00
Bob Esponja Bob Esponja
12h30
Bob Esponja Bob Esponja Bob Esponja Bob Esponja Bob Esponja
13h30
Bob Esponja Bob Esponja
19h30
Bob Esponja Bob Esponja Bob Esponja
Disponível em: <http://www.mundonick.com.br>. Acesso em 05 jan. 2005.
Cada um destes blocos dura trinta minutos e são apresentados dois episódios,
entrecortados por comerciais. Cada episódio do “Bob Esponja” tem aproximadamente onze
minutos considerando o tempo de exibição linearmente. Nos meses de fevereiro e março de
2005 foi feita a gravação diária dos episódios: durante a semana ao meio dia e meia e aos
finais de semana às treze horas e trinta minutos (sublinhados na tabela acima). Esta decisão de
gravar apenas um bloco por dia deveu-se ao fato de que os mesmos episódios eram
transmitidos nos diferentes horários. No total foram 59 (cinqüenta e nove) dias de gravação,
que resultaram em 118 (cento e dezoito) episódios. Muitos deles, porém, eram repetidos, o
que resultou em um total de 74 (setenta e quatro) episódios diferentes. Este processo permitiu
que fossem observadas as características gerais do objeto e que fosse feita uma pré-análise de
seu conteúdo, permitindo a seleção do material empírico.
Por motivações teóricas e analíticas, optou-se por utilizar a “amostra intencional”, ou
seja, para execução da pesquisa, foram selecionados quatro episódios que representassem
situações que a pesquisadora julgou representativas e pertinentes ao objetivo do estudo.
Procurou-se buscar enredos que tratassem de situações ou conceitos que pudessem ser
vivenciadas pelo público infantil. O assunto em torno do qual o enredo se desenvolveu foi
chamado de tema.
Os episódios escolhidos foram:
a) Beijos da vovó – tema família;
b) Chocolate com nozes – tema mentira;
c) Espuma – tema doença;
d) Os jogos do mestre-cuca – tema disputa.
Esta seleção intencional da amostra é considerada válida pela análise do discurso, uma
vez que:
15
A delimitação do corpus não segue critérios empíricos (positivistas) mas
teóricos. [...] Não se objetiva, nessa forma de análise, a exaustividade que
chamamos horizontal, ou seja, em extensão, nem a completude, ou
exaustividade em relação ao objeto empírico.[...] A exaustividade almejada –
que chamamos vertical deve ser considerada em relação aos objetivos de
análise a à sua temática. Essa exaustividade vertical, em profundidade, leva a
conseqüências teóricas relevantes e não trata os ‘dados’ como meras
ilustrações. Trata de fatos’ da linguagem com sua memória, sua espessura
semântica, sua materialidade lingüístico-discursiva. Assim, a construção do
corpus e a análise estão intimamente ligadas; decidir o que faz parte do
corpus é decidir acerca de propriedades discursivas. Atualmente,
considera-se que a melhor maneira de atender à constituição do corpus é
construir montagens discursivas que obedeçam critérios que decorrem de
princípios teóricos da análise de discurso, face aos objetivos de análise, e
que permitam chegar a sua compreensão. Esses objetivos,em consonância
com o método e os procedimentos, não visa a demonstração mas a mostrar
como um discurso funciona produzindo (efeitos de) sentidos (ORLANDI,
2003, p. 62-63, grifo nosso).
Optou-se por utilizar no corpo do trabalho frames dos episódios que colaboravam com
a compreensão de sua linguagem não-verbal e por transcrever na íntegra os diálogos dos
quatro episódios selecionados. A transcrição proporcionou maior aproximação com os
discursos e ilustrou etapas do trabalho, uma vez que “é na superfície dos textos que podem ser
encontradas as pistas ou marcas deixadas pelos processos sociais de produção de sentidos que
o analista vai interpretar” (PINTO, 2002, p. 26). Este procedimento foi importante para a
compreensão do contexto interpretativo do infantil Bob Esponja” e tornou possível observar
como esse produto audiovisual apresenta seus significados e quais discursos emergem de sua
linguagem.
Importante ressaltar que não foram selecionados episódios que tratassem da questão
escolar porque nenhum dos personagens freqüenta a escola. Bob Esponja freqüenta apenas a
escola de pilotagem, mas esse mote não é freqüente, que dos setenta e quatro episódios
diferentes, apenas três eram relacionados à escola de pilotagem e neles o que se privilegia não
é o contexto escolar, mas algumas confusões que o personagem causa quando está tentando
pilotar um barco. Seus pais também não fazem parte da análise diretamente porque Bob
Esponja mora sozinho. Seus pais apareceram apenas em um episódio, “Lar doce abacaxi”, no
qual o abacaxi onde Bob Esponja mora é devorado por vermes. A tentativa de morar com o
amigo Patrick foi frustrada (pois este mora sozinho em uma pedra porque é uma estrela-do-
mar) e no instante em que seus pais estacionam o barco em frente ao que restou da casa para
levá-lo (único momento em que eles aparecem) um novo abacaxi “brota”, porque havia
restado uma semente que foi germinada instantaneamente com uma lágrima do Bob Esponja.
16
2.
Q
UADRO TEÓRICO DE REFERÊNCIA
Ao abordar os temas pesquisa” ou “conhecimento científico”, uma série de
pressuposições e estereótipos vêm à mente: o cientista louco, fórmulas incríveis em uma
lousa, teorias de compreensão quase impossível...Na realidade, porém, a pesquisa faz parte do
dia a dia e está presente nos mais simples ensinamentos da escola e atividades domésticas até
nos complexos trabalhos científicos. Cabe, então, diferenciar a pesquisa do cotidiano da que
gera conhecimento científico. Rudio (2003, p.9) esclarece que:
“Pesquisa”, no sentido mais amplo, é um conjunto de atividades orientadas
para a busca de um determinado conhecimento. A fim de merecer o
qualificativo de científica a pesquisa deve ser feita de modo sistematizado,
utilizando para isto método próprio e técnicas específicas e procurando um
conhecimento que se refira à realidade empírica. Os resultados, assim
obtidos, devem ser apresentados de forma peculiar.
A realidade empírica é entendida como aquela que pode ser verificada através da
experiência e que é revelada por meio de fatos, termo aqui entendido como qualquer coisa que
exista na realidade. São considerados fenômenos empíricos, além dos físicos e fisiológicos
também os psíquicos, e qualquer outro que possa ser observado direta ou indiretamente
(RUDIO, 2003, p.9-12).
A questão do método é determinante para a execução de uma pesquisa científica. Gil
(1999, p.26) e Rudio (2003, p. 17) concordam que o método pode ser definido como o
caminho que o pesquisador irá percorrer para a execução de sua pesquisa. Este caminho, mais
do que um “modelo de procedimentos” a serem seguidos determinará a orientação do
pensamento reflexivo do pesquisador.
Metodologia é o nome normalmente dado ao conjunto de métodos e técnicas utilizadas
para a realização de determinada pesquisa. Luna (2002, p. 13-14) afirma que o sentido da
palavra metodologia tem mudado com o passar do tempo, juntamente com o status conferido
a ela no contexto da pesquisa. O que antes era visto como uno foi desmembrado e hoje pode-
se falar em “Métodos e Técnicas” para a disciplina instrumental e Quadro Teórico-
Metodológico” para a orientação do pensamento reflexivo do pesquisador citado no parágrafo
anterior. “Em outras palavras, abandonou-se (ou vem-se abandonando) a idéia de que faça
qualquer sentido discutir a metodologia fora de um quadro teórico que, por sua vez, é
condicionado por pressupostos epistemológicos” (LUNA, 2002, p.14).
17
O quadro “teórico de referência”, também chamado de teórico-metodológico” ou
“teórico-epistemológico” deve nascer das exigências que o objeto pesquisado e os objetivos
pretendidos criam e não apenas da simpatia do pesquisador por determinada linha ou qualquer
outra razão menos relevante. “Problemas específicos exigem soluções específicas, do mesmo
modo que soluções específicas podem ser encontradas por meio do auxílio de teorias que
se adequam às soluções buscadas” (SANTAELLA, 2001, p.183). O pesquisador é um
intérprete da realidade pesquisada segundo seu método e sua postura teórico-epistemológica,
como caracteriza Luna (2002, p.14). A teoria orienta, restringindo a amplitude dos fatos a
serem estudados; conceitualiza e classifica conceitos; resume conhecimentos existentes sobre
o assunto; prevê fatos e conseqüências; indica lacunas no conhecimento do pesquisador
(GOODE; HATT, 1989, p. 13-18).
Para o presente estudo, o enquadramento teórico mais relevante é a análise do
discurso. O interesse pelos estudos interpretativos tem suas origens na antiga cultura grega,
inicialmente utilizada para a interpretação de oráculos e práticas retóricas. Pouco a pouco,
estendeu-se para os textos de uma maneira geral. Uma das primeiras práticas interpretativas
utilizada para os textos literários foi a hermenêutica, que era especializada na interpretação de
quaisquer textos (PINTO, 2002, p. 14-15). Assim, traz algumas semelhanças conceituais e de
pressupostos com a análise do discurso (que será evocada em todas as etapas da análise do
objeto), especialmente na sua origem interdisciplinar e no trato com a questão da linguagem e
da interpretação. Nesta etapa, se buscará compreender do que trata a hermenêutica.
Paul Ricoeur, em sua coletânea de artigos publicados nos anos setenta e oitenta
intitulada “Do texto à ação”, de 1986, defende que a hermenêutica, sendo uma teoria
filosófica da interpretação, elaborada e desenvolvida primeiramente na sua aplicação a signos,
símbolos e textos, pode revelar-se igualmente eficaz e produtiva em relação à ação humana e
suas estruturas temporais (RICOEUR, 1989, p.05). Ele relaciona texto, ação e história, sem
enxergar nenhum destes elementos (nem a própria hermenêutica) como estática ou imutável.
Pode-se inferir que, para ele, trata-se de um processo. O discurso, aqui entendido como o
texto, a fixação do acontecimento de linguagem, é autônomo e através dele é possível
“descobrir” a intencionalidade do produtor deste discurso e o contexto no qual estava inserido
(RICOEUR, 1989, p.04-06).
[...] a linguagem mais do que descrever a realidade, revela-a e cria-a. A
nossa relação como o real não é direta, mas sempre mediatizada por
‘configurações’ e ‘refigurações’. São elas que ordenam, criam congruência e
dão forma, sentido e ordem à experiência humana (RICOEUR, 1989, p.09).
18
A interpretação do receptor deste discurso é uma grande ocupação desta linha de
pensamento, mas como este estudo não trata sobre a recepção e sim sobre a produção, não
discorrerá sobre este aspecto.
Ricoeur propõe a existência de uma “unidade funcional entre os múltiplos modos e
gênero narrativos” (1989, p.24), sobre a qual trata Bakhtin (autor da análise do discurso) e
também o que, com os conhecimentos de análise do discurso pode-se chamar de polifonia,
quando julga importante “[...] pôr à prova a capacidade de seleção e organização da própria
linguagem, quando esta se estrutura em unidades de discurso mais longas que a frase a que
podemos chamar textos” (RICOEUR, 1989, p. 25).
Para este estudo, a afirmação a seguir foi transportada para o campo da comunicação
mediada, indo além da escrita e mais especificamente para a construção discursiva do desenho
animado infantil “Bob Esponja”, embasando o caráter ideológico, contextual e passível de
interpretação presentes nesta produção: “Graças a escrita, o discurso adquire uma tripla
autonomia semântica: em relação à intenção do locutor, à recepção pelo auditório primitivo,
às circunstâncias econômicas, sociais, culturais da sua produção” (RICOEUR, 1989, p. 42). A
seguir, define a “tarefa” da hermenêutica:
Uma vez liberta do primado da subjetividade, qual poderá ser a primeira
tarefa da hermenêutica? É procurar, no próprio texto, por um lado, a
dinâmica interna que preside à estruturação da obra, por outro lado, o poder
de a obra se projetar para fora de si mesma e engendrar um mundo que seria,
verdadeiramente, a ‘coisa’ do texto. Dinâmica interna e projeção externa
constituem aquilo a que eu chamo o trabalho do texto. A tarefa da
hermenêutica é a de reconstruir este duplo trabalho do texto (RICOEUR,
1989, p. 43).
Sua outra obra, Interpretação e Ideologias”, de 1990, também colabora para o maior
entendimento da “apropriação” da hermenêutica na orientação do pensamento reflexivo deste
trabalho. Ele deixa claro a saída do nível do texto (semântico) para o nível do discurso
propriamente dito, no qual a referência (entendida aqui como o contexto) de produção e
recepção passa a ser considerado, e a importância deste contexto no ato interpretativo.
O que interessa, na presente discussão, é que a polissemia das palavras recorre, em
contrapartida, ao papel seletivo dos contextos relativamente à determinação do valor atual que
adquirem as palavras numa mensagem determinada, veiculada por um locutor preciso a um
ouvinte que se encontra numa situação particular. [...] Produzir um discurso relativamente
unívoco com palavras polissêmicas, identificar essa intenção de univocidade na recepção das
19
mensagens, eis o primeiro e mais elementar trabalho da interpretação (RICOEUR, 1990, p.
19).
Este livro é dividido em quatro partes. A primeira, “Funções da hermenêutica”, é
dividida em dois capítulos, sendo o segundo “Função hermenêutica do distanciamento”, mais
relevante para este estudo e flagrante das congruências com a análise do discurso.
Primeiramente ele propõe a organização da problemática da noção do texto em cinco
temas: a efetuação da linguagem como discurso, a efetuação do discurso como obra
estruturada, a relação da fala com a escrita no discurso, a obra do discurso como projeção de
um mundo, o discurso e a obra de discurso como mediação da compreensão de si. Define que
todos estes critérios juntos constituem os critérios da textualidade (RICOEUR, 1990, p.44).
Apesar de num primeiro momento realizar a lingüística imanente”, a análise do texto no
texto, logo extrapola estas condições e determina, citando Austin e Searle (importantes
também para a análise de discursos), os “atos de discurso”, divididos para melhor
compreensão em três níveis: nível do ato locucionário (ato de dizer); nível do ato
ilocucionário (aquilo que fazemos ao dizer) e nível do ato perlocucionário (aquilo que
fazemos pelo ato de falar).
Ricoeur levanta três questões que podem adaptar-se ao contexto cotidiano de trocas
simbólicas mediadas: primeiro o “distanciamento que a ficção introduz em nossa apreensão
do real”, que “um relato, um conto ou um poema não existem sem referente. Mas esse
referente estabelece uma ruptura como o da linguagem cotidiana. Pela ficção, pela poesia,
abrem-se novas possibilidades de ser-no-mundo na realidade cotidiana” (RICOEUR, 1990,
p.56); segundo que a apropriação faz parte do processo de comunicação e está ligada ao
distanciamento citado acima. A apropriação é a “compreensão pela distância, compreensão a
distância” (RICOEUR, 1990, p.58), e responde ao texto, o ao autor, ou seja, o processo de
compreensão não dependerá somente das aspirações do produtor, mas do universo sócio-
cultural no qual está inserido o receptor e a própria mensagem. Terceiro, que é impossível
distanciar a hermenêutica das ideologias presentes em todo ato discursivo.
Thompson (2002, p. 355-356) discute a “Metodologia da Interpretação” e a
“Hermenêutica de Profundidade”. Esta, segundo ele, é um eficiente referencial metodológico
para tratar de construções simbólicas, considerando que estas construções simbólicas estão
inseridas em contextos sociais e históricos variados:
[...] a HP [hermenêutica de profundidade] apresenta, não tanto uma
alternativa aos métodos de análise existentes, mas um referencial
20
metodológico geral, dentro do qual alguns desses métodos podem ser
situados e ligados entre si [...] Ela nos possibilitará mostrar como diferentes
enfoques da análise da cultura, ideologia e comunicação de massa podem ser
inter-relacionados de uma maneira sistemática, combinados dentro de um
movimento de pensamento coerente, que iluminará diferentes aspectos
desses fenômenos multifacetados (THOMPSON, 2002, p.356).
A hermenêutica também define que o “campo-objeto” da investigação social é um
“campo-sujeito”, que apresenta uma lógica” própria, ou seja, os desenhos animados além de
objetos são sujeitos, inseridos em determinado contexto, em determinada tradição histórica
(THOMPSON, 2002, p.359-360). Thompson critica Ricoeur quando lembra que uma análise
que se detém apenas aos “textos” é muito parcial, sendo indispensável a questão do contexto
sócio-histórico específico no qual as formas simbólicas estão construídas “A produção, a
circulação e recepção de formas simbólicas são processos que acontecem dentro de contextos
ou campos historicamente específicos e socialmente estruturados” (THOMPSON, 2002,
p.368). Mas pondera que a HP também trabalha com o caráter ideológico das formas
simbólicas:
A análise da produção e transmissão é essencial à interpretação do caráter
ideológico das mensagens, pois ele lança uma luz sobre as instituições e as
relações sociais dentro das quais essas mensagens são produzidas e
difundidas, bem como sobre as afirmações e pressupostos dos produtores
(THOMPSON, 2002, p.395).
Ao esclarecer quais são as três tradições de pensamento particularmente relevantes
para seus estudos, este autor define a hermenêutica como segue:
A hermenêutica ensina que a recepção das formas simbólicas incluindo os
produtos da mídia sempre implica um processo contextualizado e criativo
de interpretação, no qual os indivíduos se servem dos recursos de que
dispõem, para dar sentido às mensagens que recebem. Ela também chama a
nossa atenção para o fato de que a atividade de ‘apropriação’ faz parte de um
processo mais extenso de formação pessoal, através do qual os indivíduos
desenvolvem um sentido, para eles mesmos e para os outros, de sua história,
de seu lugar no mundo e dos grupos sociais a que pertencem. Ao enfatizar o
caráter criativo, construtivo e socialmente vinculado da interpretação, a
hermenêutica converge com alguns estudos etnográficos sobre a recepção
dos produtos da mídia, enquanto ao mesmo tempo enriquece este trabalho
com os recursos de uma tradição interessada no elo de ligação entre a
interpretação e a formação do eu (THOMPSON, 2004, p.17).
21
Portanto, ela poderia ser fundamento para um estudo de recepção (que não é o caso) e
para o estudo do produto audiovisual em si, como demonstra a tabela a seguir que resume as
três fases do enfoque da hermenêutica de profundidade com seus diferentes tipos de análise:
Situações espaço-temporais
Campos de interação
Análise sócio-histórica Instituições sociais
Estrutura social
Meios técnicos de transmissão
Referencial Análise semiótica
metodológico da Análise formal ou Análise da conversação
hermenêutica de discursiva Análise sintática
profundidade Análise narrativa
Análise argumentativa
Interpretação/
re-interpretação
Formas de investigação hermenêutica (THOMPSON, 2002, p.365)
Este estudo tratou, portanto, de duas das etapas citadas na tabela: a Análise sócio-
histórica (quando considera as particularidades da televisão como o meio técnico de
transmissão”) e a Análise formal ou discursiva. Para esta etapa, no entanto, utilizou a análise
do discurso como referencial teórico, considerando-a como uma “evolução” da prática
interpretativa da hermenêutica, pois de acordo com Milton José Pinto (2002, p. 15) esta, ao
buscar interpretar quaisquer tipos de textos reconstituindo seu sentido semântico original
buscava impor uma interpretação privilegiada. A análise do discurso é extremamente
preocupada com os processos interpretativos, porém de maneira mais abrangente e sem a
preocupação com literalidades: interessa o processo, o todo discursivo. Como o que se quer
dizer é dito e interpretado, dentro de condições de produção, emissão e recepção bastante
específicas. O sentido não é anterior à decodificação, mas constituído por ela (KOCH, 1984,
p. 26).
A Análise de Discurso (AD daqui para frente) restitui ao fato de linguagem
sua complexidade e sua multiplicidade (aceita a existência de diferentes
linguagens) e busca explicitar os caracteres que o definem em sua
22
especificidade, procurando entender o seu funcionamento. Isto porque a AD
trabalha não com as formas abstratas, mas com as formas materiais da
linguagem. E todo processo de produção de sentidos se constitui em uma
materialidade que lhe é própria. Assim, a significância não se estabelece na
indiferença dos materiais que as constituem, ao contrário, é na prática
material significante que os sentidos se atualizam, ganham corpo,
significando particularmente (ORLANDI, 1996, p. 461).
Esta perspectiva teórica tem no russo Mikhail Bakhtin seu fundador, mas suas origens
remetem aos estudos da semiótica e da lingüística. Esta, inaugurada por Ferdinand de
Saussure em seu “Curso de Lingüística Geral” (resultado de anotações de aulas reunidas e
publicadas por dois de seus alunos) de 1916, entendia o texto como ambiente de análise que
supera a gramática normativa, mas considerava como “linguagem” apenas a verbal, oral e a
escrita. A linguagem era entendida como um sistema de signos, como uma estrutura
sistemática, e estabeleceu-se uma dicotomia fundamental: a distinção entre “língua” (âmbito
social) e “fala” (âmbito pessoal).
Até a década de 60 os estudos de linguagem preocupavam-se somente com a estrutura
da língua, com sua constituição, e partia-se do pressuposto de que o significado estaria no
código. Era a “lingüística imanente”. Esta, porém, desconsiderava fatores importantes quando
se objetiva total compreensão do processo lingüístico.
As tentativas de explicar o funcionamento da linguagem somente ao nível da
lingüística imanente, ou seja, condicionar os fatores de uso aos fatores
internos ao sistema lingüístico, se mostram parciais e não satisfazem um
olhar mais abrangente e mais explicativo sobre a linguagem (ORLANDI,
1987, p. 88).
A lingüística estava sedimentada no estruturalismo, e com o passar do tempo e a
amplitude das necessidades de novas explicações para os fenômenos lingüísticos, passou a
não dar conta da análise de um texto. Percebeu-se que era importante entender o processo da
linguagem, que “enquanto ‘língua’ se refere exclusivamente à linguagem verbal,
‘linguagem’ se refere a qualquer tipo possível de produção de sentido, por mais ambíguo,
vago e indefinido que seja esse sentido” (SANTAELLA, 1996, p.312). Foram introduzidos
outros elementos, como as características do enunciador, do enunciatário e as condições nas
quais determinado discurso é emitido, ao observar-se que esses fatores interferiam
diretamente no processo de significação. Porém, na lingüística e nas contribuições que
recebeu de outras ciências posteriormente, a noção de estrutura não se desfez, passou-se ao
chamado pós-estruturalismo, isto porque:
23
Cada elemento do sistema, além de revelá-lo, adquire sentido no interior
do sistema e por referência a outros elementos. Nada tem significação por si
só, mas sim por não ser outro. O princípio de diferenciação está na base
deste tipo de pensamento. A coisa não vale pelo que ela é, mas por sua
relação opositiva com outros elementos, pelo que ela não é (ARAÚJO, 1998,
p.121).
Essa relação opositiva múltipla somada às interferências que a realidade social do
falante causa em sua linguagem gerou um dos marcos da análise do discurso, a obra
“Marxismo e filosofia da linguagem” (BAKHTIN, 1981), cuja primeira edição é de 1929, na
qual são apontadas essas relações sociais como agentes transformadores dos processos de
linguagem e reapresentada a questão da ideologia como inerente a qualquer processo
comunicacional. O signo é ideológico por excelência e a realidade é determinada pelo signo,
que reflete e refrata a transformação desta realidade (BAKHTIN, 1981, p. 32). Relaciona-se
com o conceito de “língua viva”, em constante transformação e ressignificação, e quer dizer
que as construções simbólicas que o homem utiliza para se expressar podem tentar espelhar
uma realidade, e até refleti-la, mas não sem alterar um pouco sua angulação.
A análise do discurso é, então, uma convergência de disciplinas, pois se fundamentou
na Lingüística, no Marxismo e na Psicanálise. Além disso, ela praticou uma renovação de
práticas de estudos e desta forma vem preencher uma lacuna representando um grande avanço
nos estudos de linguagem, que extrapola o texto, capta as diferentes significações e
intencionalidades que permeiam o texto e interferem na apreensão de seu todo. Orlandi (2003,
p.15) explica melhor:
muitas maneiras de se estudar a linguagem: concentrando nossa atenção
sobre a ngua enquanto sistema de signos ou como sistema de regras
formais, e temos então a Lingüística; ou como normas de bem dizer, por
exemplo, e temos a Gramática normativa. [...] A análise de discurso, como
seu próprio nome indica, não trata da ngua, não trata da gramática, embora
todas estas coisas lhe interessem. Ela trata do discurso. E a palavra discurso,
etimologicamente, tem em si a idéia de curso, de percurso, de correr por, de
movimento. O discurso é assim palavra em movimento, prática de
linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem falando.
Muitos autores passaram a embasar seus estudos sobre processos de linguagem na
corrente teórica da análise do discurso, escapando da citada “análise imanente” que, em um
mundo em constante transformação, não responde satisfatoriamente às necessidades dos
estudos porque isola a socialização da linguagem e seu processo interno (psíquico e
ideológico) de produção.
24
A fronteira que separa o lingüístico e o discursivo é sempre colocada em
causa em toda prática discursiva, e é próprio da relação entre língua e
discurso que as regras fonológicas, morfológicas e sintáticas que são as
condições materiais de base sobre as quais se desenvolvem os processos
discursivos sejam objeto de recobrimentos e de apagamentos parciais. Daí
a proposta da AD de uma teoria não subjetiva da enunciação, pois o
lingüístico e o discursivo se comunicam (ORLANDI, 1987, p. 101).
A análise do discurso configura-se, portanto, como um campo de pesquisa, uma
prática metodológica e um viés epistemológico. Apresenta uma rie de pressupostos, e um
dos principais é a noção do discurso como prática social. Isto implica que tanto a linguagem
verbal quanto outras semióticas com as quais são construídos os textos estão inseridas num
contexto sócio-histórico mais amplo e não se encerram em si.
O analista de discursos é uma espécie de detetive sociocultural. Sua prática é
primordialmente a de procurar e interpretar vestígios que permitem a
contextualização em três níveis: o contexto situacional imediato, o contexto
institucional e o contexto sociocultural mais amplo, no interior dos quais se
deu o evento comunicacional (PINTO, 2002, p.26).
O significado de uma palavra não estará no sistema da língua, enquanto estrutura, mas
na sociedade que a criou, reelaborou seu significado, a utilizou num determinado contexto,
numa determinada formação ideológica ou discursiva.
A linguagem não é mero instrumento do homem, é ela que constitui o
homem. As línguas carregam uma história, trazem nelas as marcas de uso
anteriores, e essa carga de passado entrava a renovação do homem e as
mudanças em sua história. Não basta, pois, usar a linguagem com o intuito
de comunicar sentidos novos, é preciso trabalhar suas formas, libertá-la do
que ela tem de estereotipado, de velho. Nenhuma linguagem é transparente
ou inocente, e as que assim se propõem são suspeitas: toda linguagem que se
ignora é de má fé (BARTHES, 1988, p. 19).
Barthes (1978, p. 11-12) entende o viés ideológico da linguagem como a intersecção
desta com o “poder”, que estaria presente em todo e qualquer mecanismo de intercâmbio
social, não sendo inerente apenas ao Estado:
[...] mas ainda nas modas, nas opiniões correntes, nos espetáculos, nos jogos,
nos esportes, nas informações, nas relações familiares e privadas [...] o poder
é o parasita de um organismo trans-social, ligado à história inteira do
homem, e não somente à sua história política, histórica. Esse objeto em que
se inscreve o poder, desde toda a eternidade humana é a linguagem ou,
para ser mais preciso, sua expressão obrigatória: a língua.
25
Santaella (1996), Orlandi (1987), Koch (1984) e Pinto (2002) concordam que nenhum
discurso está desvinculado de intencionalidade, mas carregado de ideologias
3
, havendo
sempre um sentido oculto a ser desvelado, um “querer-dizer”. Este trabalho se apropria deste
conceito quando pressupõe que o discurso do desenho animado, permeado pela ideologia de
seus produtores, pode apresentar uma fusão de discursos e acabar incorrendo em uma
mensagem final de caráter ideológico. Não discurso neutro, não nem postura analítica
neutra, visto que a seleção dos termos utilizados, o caminho percorrido, os objetivos, a
construção textual estão sempre permeados pela ideologia do produtor do enunciado. A
ideologia caminha entre as interações sociais.
Por outro lado, por meio do discurso ação verbal dotada de
intencionalidade tenta influir sobre o comportamento do outro ou fazer
com que compartilhe determinadas de suas opiniões. É por esta razão que se
pode afirmar que o ato de argumentar constitui o ato lingüístico
fundamental, pois a todo e qualquer discurso subjaz uma ideologia, na
acepção mais ampla do termo. A neutralidade é apenas um mito: o discurso
que se pretende ‘neutro’, ingênuo, contém também uma ideologia a da sua
própria objetividade (KOCH, 1984, p. 19).
Pinto (2002, p. 26) observa também que é na análise direta dos textos que se pode
encontrar os indícios que levarão a compreender com que intenções eles foram produzidos e
como eles produzem sentidos.
A análise de discurso visa fazer compreender como os objetos simbólicos
produzem sentidos, analisando assim os próprios gestos de interpretação que
ela considera como atos no domínio simbólico, pois eles intervêm no real do
sentido. A análise de discurso não estaciona na interpretação, trabalha seus
limites, seus mecanismos, como parte dos processos de significação
(ORLANDI, 2003, p. 26).
A principal contribuição da análise do discurso é de ser uma ferramenta metodológica
que fornece balizas conceituais e fez emergir do discurso do desenho animado estudado os
elementos buscados para que fosse compreendida sua linguagem, considerando as
especificidades do veículo onde este é exibido, do conteúdo do desenho e do público
pretendido. Não basta entender apenas o que determinado episódio do desenho “disse”.
3
“A ideologia é um conjunto lógico, sistemático e coerente de representações (idéias e valores) e de normas ou
regras (de conduta) que indicam e prescrevem aos membros da sociedade o que devem pensar e como devem
pensar [...]. Ela é, portanto, um corpo explicativo (representações) e prático (normas, regras, preceitos) de caráter
prescritivo, normativo, regulador [...]” (CHAUI, 2003, p. 108).
26
A análise do discurso o procura compreender o que o texto diz ou mostra, mas como ele
o diz ou o mostra (PINTO, 2002, p. 27).
[...] a análise de discursos procura descrever, explicar e avaliar criticamente
os processos de produção, circulação e consumo dos sentidos vinculados
àqueles produtos na sociedade. Os produtos culturais são entendidos como
textos, como formas empíricas do uso da linguagem verbal, oral ou escrita,
e/ou de outros sistemas semióticos no interior de práticas sociais
contextualizadas histórica e socialmente (PINTO, 2002, p. 11).
Dessa forma, a análise do discurso pode ser considerada como a análise dos processos
de construção de significados. Interessa-se em observar e despreender dos textos – lembrando
que, para a análise de discurso tudo que produz significado, seja verbal ou não verbal,
intencional ou o é considerado um texto – sua materialidade significante e ideológica.
Pretende desvelar a intencionalidade atingindo um enunciatário (receptor) e exigindo dele um
esfoço de interpretação e ressignificação. A completude dos significados, como apontado em
outras teorias, está em quem recebe a mensagem, não em quem a emite.
Outros dois importantes aspectos que as linguagens necessariamente
envolvem estão, primeiro, no seu poder de referencialidade do qual
decorrem os graus de aplicabilidade da linguagem a algo que está fora dela,
o chamado referente, e que ela, de modo mediato, torna presente. Segundo, o
poder interpretativo da linguagem, quer dizer, os efeitos de interpretação que
ela está apta a produzir no receptor (SANTAELLA, 1996, p. 316-317).
Torna-se evidente que o significado de uma palavra não se encontra inerente a ela,
dependendo (no mínimo) das condições de sua produção, da intencionalidade de seu
enunciador e da propensão deste receptor a apreender determinada ideologia, determinado
conceito. Na prática analítica isto não é tão simples assim. A análise de discurso fornece,
então, alguns conceitos e pré-determinações que sistematizam e favorecem a atividade de
pesquisa do analista.
Assim, apresenta alguns termos próprios, como enunciador (que emite a mensagem);
enunciatário (o receptor); enunciação (o momento histórico no qual o enunciador emite a
mensagem); campo discursivo (diferentes orientações discursivas que se equilibram dentro de
um mesmo contexto discursivo, “oposição de ideologias”); cena de enunciação (espaço onde
ocorre a enunciação e que influencia em todo o processo significativo por ser parte do
contexto de produção); postos, pressupostos e subentendidos do enunciado; entre outros
(PINTO, 2002; ORLANDI, 1987; KOCH, 1984, MAINGUENEAU, 2004).
27
O termo condições de produção representa o momento histórico e social no qual
determinada enunciação foi realizada. É indissociável de qualquer estudo em análise de
discurso, pois determina as implicações inerentes à produção do significado e sua
interpretação. “Enunciação é o ato de produção de um texto e se opõe a enunciado, que é o
produto cultural produzido, o texto materialmente considerado” (PINTO, 2002, p. 32). As
condições de produção determinam o terreno no qual a enunciação será realizada.
A Teoria da Enunciação tem por postulado básico que não basta ao lingüista
preocupado com questões de sentido descrever os enunciados efetivamente
produzidos pelos falantes de uma ngua: é preciso levar em conta,
simultaneamente, a enunciação - ou seja, o evento único e jamais repetido de
produção do enunciado. Isto porque as condições de produção (tempo, lugar,
papéis representados pelos interlocutores, imagens recíprocas, relações
sociais, objetivos visados na interlocução) são constitutivas do sentido do
enunciado: a enunciação vai determinar a que título aquilo que se diz é dito”.
(KOCH, 1995, p.14).
O texto apresenta um contexto, que é tudo que o cerca. Engloba os elementos
lingüísticos da mensagem (verbais e não-verbais) e os não lingüísticos, como sua sustentação
sócio-cultural, a emissora na qual é transmitido o desenho animado e o fato de ser uma
produção para televisão. O contexto pode ser observado de duas maneiras: o contexto
situacional imediato - mais restrito, referente às características da mensagem do produto
audiovisual em si, por exemplo - e o contexto situacional ampliado - que valoriza as
condições de produção, tudo o que cerca o produto e possibilita sua transmissão
(CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2004, p. 124).
Intrínseco ao conceito de condições de produção eso de contrato de comunicação,
que é empregado para designar “o que faz com que o ato de comunicação seja reconhecido
com válido do ponto de vista do sentido. É a condição para os parceiros de um ato de
linguagem se compreenderem minimamente e poderem interagir, co-construindo o sentido
[...]” (CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2004, p. 130).
Possivelmente, é o contrato de comunicação estabelecido entre os desenhos animados e
as crianças que colabora na apreensão de sentidos, na fidelidade com o conteúdo, na
construção da verossimilhança no caso do Bob Esponja, por exemplo. Isto pode ser chamado
também de leis do discurso”, ou seja, regras previamente estabelecidas, porém não
necessariamente explicitadas que permitem a significação no processo comunicacional.
O simples fato de entrar em um processo de comunicação verbal implica que
se respeitem as regras do jogo. Isso não se faz por meio de um contrato
28
explícito, mas por um acordo tácito, inseparável da atividade verbal. Entra
em ação um saber mutuamente conhecido: cada um postula que seu parceiro
aceita as regras e espera que o outro as respeite (MAINGUENEAU, 2001,
p.31).
Essas leis são definidas por Maingueneau (2001, p. 34-37) como lei da pertinência
implica que uma enunciação deve interessar ao destinatário e estar vinculada ao contexto em
que se desenvolve; lei da sinceridade que espera o envolvimento do enunciador no ato de
fala que realiza. Relaciona-se com a importância que o enunciador deve dispensar à sua
mensagem para que esta possa transmitir credibilidade:
A segunda fase do enunciado, que lhe determina a composição e o estilo,
corresponde a necessidade de expressividade do locutor ante o objeto de seu
enunciado. A importância e a intensidade desta fase expressiva variam de
acordo com as esferas da comunicação verbal, mas existe em toda parte: um
enunciado absolutamente neutro é impossível.A relação valorativa com o
objeto do discurso (seja qual for esse objeto) também determina a escolha
dos recursos lexicais, gramaticais e composicionais do enunciado
(BAKHTIN, 1997, p.308).
Lei da informatividade determina que o conteúdo das mensagens devem ter
elementos novos ao destinatário. Do contrário, ele terá que realizar inferências para buscar a
compreensão do tema e talvez o processo comunicacional não seja realizado com fidelidade;
lei da exaustividade o enunciador deve ser capaz de avaliar de se expressar sem que haja
exagero, um excesso de informação que leve ao descaso com sua mensagem ou falta de
informação, que não atende às necessidadesdo destinatário. Em ambos extremos, pode ocorrer
a não-comunicação; lei da modalidade esclarece que deve haver clareza e economia no
conteúdo das mensagens e que esta, para fazer sentido, deve encarnar uma materialidade que
permita ao destinatário desprender seu significado.
Aprendemos a moldar nossa fala às formas do gênero e, ao ouvir a fala do
outro, sabemos de imediato, bem nas primeiras palavras, pressentir-lhe o
gênero, adivinhar-lhe o volume (a extensão aproximada do todo discursivo),
a dada estrutura composicional, prever-lhe o fim, ou seja, desde o início,
somos sensíveis ao todo discursivo que, em seguida, no processo da fala,
evidenciará suas diferenciações (BAKHTIN, 1997, p.302).
A postura que o enunciador e o destinatário irão assumir em cada uma dessas leis
passará pelo gênero de discurso no qual estará sendo realizada a troca de significados. Na
análise de discursos, cada texto pertence a um gênero de discursos ou a uma espécie de
discursos e em cada um deles, a construção da enunciação é diferente, determinada por
29
diferentes contextos de produção, posições ideológicas ou lugares de fala (PINTO, 2002,
p.32). Estes neros são determinados por diferentes tipos de discursos, presentes em
condições sócio-históricas determinadas. Pode-se dizer, por exemplo, que o desenho animado
configura-se como um gênero de discurso no interior da tipologia discursiva da televisão
(MAINGUENEAU, 2004, p. 63). Este quadro favorece a manutenção do contrato
comunicacional, pois enunciador e enunciatário estabelecem uma relação dialógica, ou seja,
uma interação entre enunciador e enunciatário no espaço do discurso, na qual o dialogismo
representa a troca, a interação, a condição do sentido do discurso, “em outros termos,
concebe-se o dialogismo como o espaço interacional entre o eu e tu, ou entre o eu e o outro no
texto” (BARROS, 2003, p. 02-03).
De fato, o ouvinte que recebe e compreende a significação (lingüística) de
um discurso adota simultaneamente, para com este discurso, uma atitude
responsiva ativa: ele concorda ou discorda (total ou parcialmente), completa,
adapta, apronta-se para executar, etc., e esta atitude do ouvinte está em
elaboração constante durante todo o processo de audição e de compreensão
desde o início do discurso, às vezes nas primeiras palavras emitidas pelo
locutor (BAKHTIN, 1997, p.290).
Toda significação é entendida como conseqüência de um acordo entre enunciador e
enunciatário, socialmente organizados em um processo de interação. Dessa forma, o processo
comunicacional é condicionado tanto pela organização social dos participantes quanto pelas
condições em que a interação acontece, em uma condição de produção e em um gênero
discursivo específico.
A linguagem instituída define um campo de compreensão. A comunicação é
a relação que se estabelece entre dois sujeitos situados neste campo,
fornecendo-lhes um domínio comum de referência, pano de fundo
relativamente ao qual a sua relação momentânea se destaca em primeiro
plano (GUSDORF, 1995, p. 56).
Em meio ao processo de interação social, ocorre um fenômeno conceituado pela análise
de discurso como polifonia. Esta também acontece no cotidiano das produções artísticas,
profissionais e acadêmicas, ou seja, em todos os âmbitos da produção de significado. Está
acontecendo, por exemplo, na execução deste estudo quando a pesquisadora, após ler diversos
textos, de diferentes autores passa a produzir enunciados que não são dela, mas que se
constituem como um emaranhado de outros discursos, apreendidos em diferentes momentos.
30
Vozes de outros enunciadores que, por aceitação ideológica e outros processos mentais de
aceitação, passam a constituir uma nova voz, carregada de todos eles:
[...] a compreensão de um enunciado é sempre dialógica, pois implica a
participação de um terceiro que acaba penetrando o enunciado na medida em
que a compreensão é um momento constitutivo do enunciado, do sistema
dialógico exigido por ele. Isso significa que, de alguma maneira, esse
terceiro interfere no sentido total em que se inseriu. Esse jogo dramático das
vozes, denominado dialogismo ou polifonia, ou mesmo intertextualidade, é
uma forma especial de interação, que torna multidimensional a representação
e que, sem buscar uma síntese do conjunto, mas ao contrário uma tensão
dialética, configura a arquitetura própria de todo discurso (BRAIT, 2003, p.
25).
As múltiplas vozes com as quais se preocupa a análise do discurso não dizem respeito
apenas a “falas” de outras pessoas. VERÓN, apud KOCH (2002, p.47), classifica a
intertextualidade profunda, que ocorre nos processos de certos universos discursivos como o
dialogismo entre a TV e o cinema. Além deste exemplo claro, no processo de produção de um
discurso “há uma relação intertextual com outros discursos relativamente autônomos que,
embora funcionando como momentos ou etapas de produção, não aparecem na superfície do
discurso ‘produzido’ ou ‘terminado’”. O estudo destes textos pode oferecer uma maior
compreensão do processo de produção em si, sendo importante, por exemplo, para este estudo
sobre a linguagem de um desenho animado. No decorrer do trabalho estes e outros conceitos
serão retomados, de maneira mais ou menos explícitas, uma vez que “[...] a análise de
discurso tem um procedimento que demanda um ir-e-vir constante entre teoria, consulta ao
corpus e análise. Esse procedimento dá-se ao longo de todo o trabalho” (ORLANDI, 2003, p.
67).
31
C
APÍTULO
I
C
ONSIDERAÇÕES SOBRE O MEIO E A CRIANÇA
A televisão invade o campo existencial da criança, tendo em vista que “atualmente,
mais de 85% dos lares brasileiros possuem pelo menos um aparelho de TV e estima-se que
em cada um desses lares haja aproximadamente duas crianças. Mais de 32% da população
está na faixa dos 0 aos 14 anos” (CARMONA, 2002, p. 332).
Diante deste fato, são importantes estudos que busquem compreender melhor a relação
entre o público infantil e a televisão, pois “se para o adulto a tevê tem aberta toda a riqueza de
potencialidades, é de fundamental importância considerar a audiência do telespectador
infantil. Milhões de crianças, no Brasil, passam em média quatro horas diárias diante de um
aparelho de tevê” (REZENDE; REZENDE, 2002, p. 4).
Este turbilhão de imagens que preenche o cotidiano das crianças e
adolescentes vai formando sua personalidade ao mesmo tempo (mas
provavelmente não da mesma forma) que suas experiências do mundo
exterior, real, concreto. É importante lembrar que a televisão é um objeto
técnico absolutamente integrado ao cotidiano das crianças que com ela
interagem “naturalmente” da mesma forma como elas interagem com o
gatinho ou com seus brinquedos. Esta presença constante de imagens
fictícias, que ocupam partes cada vez maiores do tempo livre das crianças,
rouba-lhes (ocupando-o) o tempo da não-escola, dedicado ao brinquedo e á
imaginação, à vida social cheia de experiências interativas com seus pares e
com os adultos (BELLONI, 2001, p.65).
A primeira premissa que deve ser abandonada no início de uma pesquisa com este
intuito é a idéia de que programas infantis possuam, necessariamente, caráter educativo e que
este público tenha mais contato com a programação voltada a ele.
Conforme estudo feito pelo instituto MultiFocus (CASTRO, 2004a), especializado em
comportamento infanto-juvenil, sob encomenda da ONG Midiativa
4
, os programas mais
vistos por crianças de zero a nove anos em março de 2004 eram: Globo Repórter (Globo); Big
Brother Brasil (Globo); Da cor do pecado (Globo); Celebridade (Globo); Canavial de paixões
(SBT), Jornal nacional (Globo); SPTV- 2ª edição (Globo); Roda a roda (SBT); Chocolate com
pimenta (Globo) e Fantástico (Globo). Observa-se que nenhum destes programas é
originalmente produzido para o público infantil. Pfromm Netto (2001, p. 125) ressalta que um
dos fatores que faz com que seja constatada esta maior audiência de programas para adultos é
o fato de que na maioria dos lares apenas um aparelho de televisão, normalmente
4
Midiativa é uma ONG que tem como objetivo desenvolver pesquisas sobre a questão mídia e criança” e
educar novas gerações para o relacionamento com os meios.
32
“controlado” por um adulto e que, além disso, basta observar a grade de programação da
televisão aberta para perceber que a oferta de programas infantis é muito pequena.
Desta forma, a preocupação em torno do conteúdo dos programas para público infantil
fica ainda maior, pois, uma vez que as crianças têm um contato menor com estas produções
espera-se que, pelo menos com elas, a criança possa ter acesso a um conteúdo que traga
algum tipo de benefício para sua formação pessoal, educacional e cidadã. Ou, ao menos, que
não transmita valores e conceitos prejudiciais para o bom desenvolvimento infantil.
Dentre os programas infantis preferidos por crianças, es o gênero “desenho
animado”, que é o produto principal da programação infantil de TV em todos os países, tendo
seu apelo comprovadamente baseado em representações simplistas, por exemplo, do bem e do
mal (JEMPSON, 2002, p.125). Normalmente, os desenhos animados são definidos por seus
produtores como um produto de entretenimento, assim como a maioria dos programas para
público infantil. Giroux (apud PILLAR, 2001, p. 50) questiona as implicações e tudo que
pode envolver a idéia do “puro entretenimento” inclusive nos desenhos animados e afirma que
“Disney é de fato um dos maiores educadores do século XX, e não existe uma educação isenta
de valores, de posições ideológicas implícitas ou explícitas”.
De maneira geral, os estudos sobre produções para crianças seguem caminhos
diversos. É comum entre a maioria dos pesquisadores que os desenhos e outros programas
influenciam sim a formação das crianças, mas uma linha adota uma visão mais negativista,
focando essencialmente os aspectos prejudiciais dos conteúdos, como a dependência
psicológica que a criança pode desenvolver, os aspectos negativos e positivos da exposição à
mídia, o conteúdo da programação, ou ainda o excesso de conteúdo violento oferecido.
Outros estudam buscam compreender os porquês deste tipo de conteúdo ser tão
freqüente, por exemplo, nos desenhos animados. Rezende e Rezende (2002, p. 37) concordam
que a maioria dos conteúdos dos desenhos animados atuais remetem à violência e afirmam
que a enxurrada de desenhos violentos deve-se ao fato de que pouca ou nenhuma
resistência dos países subdesenvolvidos ao que lhes é imposto pelas grandes potências, ou
seja, que as crianças brasileiras já se familiarizaram com a necessidade de “ação” nos enredos,
que acompanha o “boom” de filmes de ação e violência, especialmente dos norte americanos.
Assim, a audiência elevada desses desenhos o se deveria à necessidade de ver atos
violentos, mas sim à necessidade de ação, da profusão de imagens proporcionada por eles e à
grande oferta destes conteúdos. Pfromm Netto (2001, p. 117) concorda esta linha de
pensamento lembrando que grande parte da programação diária das emissoras é composta por
produções estrangeiras, e assim “a violência é também um componente habitual dos desenhos
33
animados, todos produzidos no exterior, pois praticamente inexiste no Brasil a produção de
desenhos animados destinados ao público infantil”.
Outras linhas ocupam-se de verificar que tipos de mensagens os produtos audiovisuais
transmitem, separando seus aspectos positivos e negativos e defendendo a urgência de
preparar este público infantil para o contato com o meio, não restringi-lo; reiterando o papel
da escola e dos pais, como o meio social no qual estes receptores estão incluídos, para que a
criança tenha subsídio para desenvolver seu senso crítico diante das mensagens.
Existem provas cabais de que, se maus programas (e também maus
comerciais, hoje abundantes na nossa televisão) podem envenenar a mente
da criança, bons programas são comprovadamente eficazes para ajudá-la a
crescer e a ser feliz, para desenvolver nela a cooperação, a autoconfiança, o
altruísmo, o respeito mútuo, a tolerância, a consciência de responsabilidades
sociais, a socialização civilizada – enfim, os efeitos que os especialistas
denominam “efeitos pró-sociais (PFROMM NETTO, 2001, p. 154).
Os estudos demonstram, porém, que o que prevalece no dia-a-dia são as influências
negativas, como a tendência á imitação, submissão, isolamento, apatia. O desenvolvimento do
consumo exagerado, da violência, da falta de organização, da atividade sexual precoce e
diminuição da comunicação familiar. A diminuição da capacidade crítica, dificuldade para
ordenar o pensamento, dispersão e surgimento de respostas estereotipadas (LOBATO,
MORAES, VANNUCHI, 2003, p. 57). Ferrés (1996, p. 19-20) destaca outros aspectos
negativos que podem ser detectados na televisão, como a visão fragmentada da realidade que
apresenta, a super exposição de assuntos que não deveriam fazer parte do repertório infantil e
a chamada cultura-mosaico, na qual se sabe pouco sobre muito, sem nenhuma profundidade.
Diante deste quadro, fica um pouco difícil imaginar a quantidade de aspectos positivos
inerentes à televisão. É uma via dupla, pois muitas vezes, características que poderiam
configurar-se como negativas, se bem trabalhadas, passam a se converter em aspectos
positivos. Por exemplo, crianças que vêem muita televisão têm melhores aptidões para
construir conceitos de relações espaço-temporais, para compreender as relações entre o todo e
suas partes e até para identificar os ângulos das “tomadas de imagens”, o que significa um
reforço das faculdades de abstração. A televisão também teria a habilidade de desenvolver na
criança o vocabulário, o raciocínio matemático, de instigar a capacidade de resolução de
problemas, de estimular a criatividade. E pode ir além, pois quando a criança tem contato com
um material de boa qualidade, pode ter estimulada além da criatividade, o senso crítico, a vida
em sociedade, a cooperação, a solidariedade, a amizade, o esforço escolar, entre outras
qualidades (LOBO, 1990; CARLSSON, FEILITZEN, 2002 ).
34
De acordo com os pesquisadores, estes efeitos positivos ocorrerão se a criança for
preparada para lidar com a simulação imposta pela televisão, desenvolvendo habilidades para
isso através do conhecimento dos aspectos técnicos da produção e transmissão das
mensagens, compreensão dos diferentes tipos de programação, capacidade de distinção entre
o real e a ficção, compreensão dos objetivos (consumo) e os modos de funcionamento
(persuasão) das mensagens publicitárias. De acordo com diversos estudos, a criança precisaria
entender e aceitar que as mensagens televisuais influenciam sentimentos, valores, auto-
representação, opiniões e comportamentos. Ela deveria ser capaz de desenvolver uma visão
crítica a respeito da violência e, principalmente, perceber como o mesmo fato pode ser
passado de maneiras diferentes em diferentes programas ou emissoras (BELLONI, 2001;
BACCEGA, 2003; CARLSSON, FEILITZEN, 2002). É indispensável desenvolver a
autonomia, competência e o senso crítico desta criança para que ela usufrua as boas
influências da televisão e possa aproveitá-la como fonte e facilitadora da apreensão de
conhecimento pertinente e agradável de ser assimilado.
São diferentes enfoques de pesquisa, e de acordo com Ferrés (1996, p. 12), “a atitude
mais adequada é a aceitação crítica, o equilíbrio entre o otimismo ingênuo e o catastrofismo
estéril, um equilíbrio que assuma a ambivalência do meio, as suas possibilidades e limitações,
as suas contradições internas”.
Todavia, dentro da complexidade do fenômeno da audiência infantil há um ponto
pacífico entre a maioria dos estudos, que é a preocupação com os efeitos que podem causar
nas crianças a capacidade que a televisão tem de influenciar, ditar posturas, transmitir
conhecimento, fornecer padrões e modelos de comportamento ao gerar um processo de
identificação com o público infantil que pode fazer com que quaisquer mensagens midiáticas
sejam apreendidas.
Esse processo identificatório tem nas crianças os seus melhores agentes. De
fato, as observações sociopsicológicas têm localizado, na infância, uma
facilidade toda especial para imitar os comportamentos e as atitudes vistos
no vídeo, como se a representação televisiva da presença sica
desencadeasse um processo equivalente ao efeito da presença real (SODRÉ
2000, p. 51).
Uma das hipóteses para a aprendizagem que pode ser proporcionada por conteúdos
televisivos é a “aprendizagem por observação” (BANDURA, 1969), que defende que a
criança aprende por experimentação e observação, fenômenos inconscientes e que assim as
reações de adesão ou rejeição aos personagens tendem a ser produzidas mais por
35
envolvimentos emotivos que por considerações ideológicas ou éticas. As reações emotivas
provocadas pelos personagens induziriam as crianças a assumir ou rejeitar os valores por eles
representados (BANDURA, 1969, p. 74-75).
Um dos modos fundamentais pelos quais novos tipos de comportamento são
adquiridos e padrões existentes são modificados envolve modelação e
processos vicários [nos quais imitação”, “identificação”, contágio” ou
“aprendizagem por observação”]. [...] Assim, por exemplo, uma pessoa pode
adquirir complicados padrões de respostas simplesmente observando o
desempenho de modelos apropriados; respostas emocionais podem ser
condicionadas por observação das reações afetivas de outras pessoas
enquanto passam por experiências dolorosas ou agradáveis; comportamentos
de medo ou esquiva podem ser extintos vicariamente através da observação
do comportamento de aproximação modelado em direção aos objetos
temidos, sem que nenhuma conseqüência adversa ocorra para o sujeito
envolvido; inibições podem ser induzidas pela observação da punição do
comportamento de outros; e, finalmente, a expressão de respostas bem
aprendidas pode ser acentuada e socialmente regulada através de ações de
modelos influentes (op. cit., p. 69).
Aproximando as considerações de Bandura (1969, p. 70) dos objetivos deste trabalho,
pode-se supor que a exposição de espectadores ao comportamento de personagens de
determinado programa pode fazer com que este adquira novos conhecimentos e padrões de
respostas que não existiam antes em seu repertório comportamental ou ainda ter reforçados
padrões apreendidos na coletividade mas ainda inativos, algo como um “despertar” para idéias
ou modos de agir que estavam latentes.
Entende-se que a exposição freqüente aos desenhos animados, por exemplo, permite
que a criança adquira um conhecimento do comportamento, da personalidade e do modo
como os conflitos são habitualmente solucionados por seus personagens. Esse “saber o que
esperar” colabora com o processo de modelagem ou de aprendizado, uma vez que para que
isto ocorra não basta a exposição, é necessária a apropriação de padrões de comportamento
que se tornam cristalizados no espectador.
Ao internalizar as experiências fornecidas pela cultura, a criança reconstrói
individualmente os modos de ação realizados externamente e aprende
organizar os próprios processos mentais. O indivíduo deixa, portanto, de se
basear em signos externos e começa a se apoiar em recursos
internacionalizados (imagens, representações mentais, conceitos, etc.)
(REGO, 2003, p. 62).
Mas, evidentemente, esta “internacionalização de significados” é bem menos simples
do que parece, não se como defendia a teoria da agulha hipodérmica (lembrando que cada
36
teoria pode fazer sentido no momento histórico no qual se insere), quando sugeria uma
objetividade suprema da mídia e a ocorrência de um fenômeno de “estímulo-resposta” no qual
“todo membro do público de massa é pessoal e diretamente ‘atacado’ pela mensagem”
(WRIGHT, apud WOLF, 2003, p. 4) independentemente de outros fatores ou interferências.
Bandura (1969, p. 71-77) considera o processo em sua complexidade e lembra que não
a exposição determina a aprendizagem por observação, mas também o que chama de
reforço. Não haverá a simples aceitação das mensagens, o processo passa pela intersecção
destas com as respostas internas geradas pelo espectador para então e talvez haver a
aprendizagem por observação. As características dos observadores como auto-estima, nível de
competência perante o meio, status social e sócio-econômico, estado emocional, entre outros
irão determinar o grau e a profundidade da aprendizagem por observação (BANDURA, 1969,
p. 79-80). Ou seja, espectadores diferentes construirão sentidos diferentes e conseqüentemente
diferentes apreensões e aprendizados.
Vygotsky afirma que o desenvolvimento do indivíduo está relacionado com o contexto
sócio-cultural em que ele está inserido, e que se instaura um movimento de recepção e
reelaboração de conteúdos fornecidos (REGO, 2003, p. 58). O aprendizado, que se dá na
interação entre este indivíduo e o mundo que o rodeia, é determinante para seu
desenvolvimento (REGO, p. 76).
É importante então a noção de mediação, que supera o conceito de receptor passivo e
passa a encará-lo como ativo no processo de construção de sentidos.
Apesar da criança não ter mecanismos de defesa iguais aos dos adultos, ela
assiste televisão num jogo de interações e constrói a realidade atribuindo
significado àquilo que vê, conforme sua experiência, seus filtros culturais, os
códigos assumidos e os seus esquemas conceituais (MEDEIROS, 2002, p.
21).
A recepção televisiva seria um processo de duração mais extensa que a efetiva
audiência ao programa, sendo anterior e posterior a este momento (GÓMEZ, 1991, p. 10,
tradução nossa). Estudos mais recentes focam a importância do meio no qual o indivíduo está
inserido e o papel dos pais e educadores na orientação que darão às crianças para que elas se
relacionem com a mídia. A televisão é consumida principalmente no âmbito familiar
(FERRÉS, 1996) e daí a importância de que a família prepare um contexto que garanta uma
experiência enriquecedora como telespectadores. Mesmo sabendo-se que as preferências dos
programas de crianças dependem de variáveis como idade, sexo ou nível cultural, muitos
autores destacam a importância da influência da família nas escolhas da programação das
37
crianças. Considerar a importância da família nos remete à cautela necessária ao se falar de
“criança”, pois facilmente pode-se esquecer que elas não são uma massa homogênea:
[...] não se pode falar da ‘criança’ em abstrato, mas dos filhos de uma classe
ou de outra. O ser criança está profundamente enraizado em um tempo e um
espaço, influenciando e sendo influenciado pelo meio sociocultural. A
criança, como sujeito, vai se constituir na interação com o meio; ao mesmo
tempo em que se constrói, reconstrói o mundo para se apropriar dele. Deste
modo, quando falamos em criança, pensamos num sujeito marcado pelos
atravessamentos culturais, políticos e ideológicos de uma determinada classe
social, numa determinada sociedade, numa certa época (PILLAR, 2001, p.
22).
Pesquisadores como BELLONI (2001), FERRÉS (1996), GÓMEZ (1991) e LOBO
(1991), por exemplo, concordam que é muito importante que os pais discutam o conteúdo dos
programas. Que perguntem para este mini-telespectador o que o atrai tanto em determinado
quadro, como ele o entende, se os coleguinhas da escola também o assistem. Os pais devem
orientar a criança, estando presentes durante a exibição do programa e preparados para
responder e estimular que sejam feitas perguntas.
Concordam também que se deve considerar que a televisão é um canal de
comunicação face a face, embora não permita o diálogo. Na medida em que a criança percebe
que está recebendo mais (ou até melhores) informações na TV do que através de conversas ou
de leitura, deixa de “ter tempo” para estas atividades e passa a dedicar-se mais a televisão,
desinteressa-se por parentes, amigos e livros, que perdem importância. Por isso é decisiva a
participação dos pais ou responsáveis.
Porém, é preciso ponderar que é muito difícil crer que todos os pais tenham condições
de dar este tipo de suporte aos seus filhos. Muitas vezes eles também não sabem como lidar
com a televisão. Assim como as diferenças entre crianças”, é imprescindível diferenciar os
contextos familiares.
As crianças socialmente favorecidas, cujas famílias podem proporcionar-lhes
lazer e estímulos variados, têm na tevê mais uma fonte de entretenimento.
Certamente essas crianças têm oportunidade de comentar, ou até mesmo de
discutir, com seus familiares e amiguinhos as mensagens televisivas. [...]. O
mesmo não se pode dizer das crianças que não têm outra opção além da
companhia da tevê. Crianças que ficam sós grande parte do dia, sem amigos,
com parcos e quase sempre os mesmos brinquedos que não oferecem
desafios, confinados em apartamentos pequenos [...] vêem te e não
programas de tevê (REZENDE; REZENDE, 2002, p. 20, grifo nosso).
38
Assim, além do papel dos pais, é extremamente debatida e cobrada por especialistas a
introdução, nas escolas, de atividades que ensinem as crianças a se relacionar com a mídia. É
na escola que a criança passa boa parte de seu dia e troca experiências (positivas ou não) com
seus colegas. É o ambiente onde acontece a interação e, muitas vezes, é retransmitido o
conhecimento e o comportamento transmitido pela televisão e que já foi absorvido. Ferrés
defende inclusive que uma escola que não ensina a assistir à televisão é uma escola que não
educa” (1996, p. 7)
Caberia à escola integrar a televisão ao seu cotidiano, trazê-la para a sala de aula de
modo criativo, critico, competente. Deveria-se estimular a mediatização do processo de
ensino/aprendizagem aproveitando ao máximo as potencialidades comunicacionais e
pedagógicas dos recursos técnicos: criação de materiais e estratégias, metodologias, formação
de educadores (professores, comunicadores, produtores, tutores); produção de novos
conhecimentos (BELLONI, 2001, p.10).
Estes fatores são importantes porque o que ocorre no processo da audiência infantil (e
provavelmente em outras faixas etárias também) é a leitura negociada (GOMÉZ, 1991, p.
10), ou seja, vários fatores externos influenciarão a aprendizagem, que poderá se dar em
forma de aceitação, rejeição ou ainda em um meio termo que seria uma reelaboração de
conteúdos. E a própria mídia faz parte deste processo de leitura negociada, complexidade
destacada por Thompson (2004):
[...] com o desenvolvimento das sociedades modernas, o processo de
formação do self [eu] se torna mais reflexivo e aberto, no sentido de que os
indivíduos dependem cada vez mais dos próprios recursos para construir
uma identidade coerente para si mesmos. Ao mesmo tempo, o processo de
formação do self é cada vez mais alimentado por materiais simbólicos
mediados [...] (p. 181).
Assim ocorre um fenômeno interessante: a aprendizagem, ainda que mediada e
negociada dependerá tanto das particularidades dos espectadores envolvidos quanto dos
próprios conteúdos da mídia, que também faz parte da mediação nas quais os espectadores
estão envolvidos.
Na proporção em que o ambiente social do indivíduo vai crescendo em
complexidade (em parte através da maciça oferta de formas simbólicas
mediadas), os indivíduos vão construindo sistemas de conhecimento prático
(extraídos em parte de materiais mediados) que lhes permitem enfrentar esta
complexidade e as demandas da vida no mundo moderno. A mídia assim
tanto contribui para o crescimento da complexidade social quanto
39
proporciona uma fonte constante de conselhos sobre como enfrentá-la
(THOMPSON, 2004, p. 190).
De qualquer forma, não é difícil observar o poder que a televisão tem perante seu
público, uma vez que ela “alimenta o imaginário infantil com todo o tipo de fantasias e
contos. É um refúgio nos momentos de frustração, de tristeza ou de angústia. [...]. Ela
sentido (?) [sic] à realidade. Decide o que é e o que não é importante” (FERRÉS, 1996, p. 7).
Em diferentes níveis, uma apropriação de conteúdos, que acontece porque as
mensagens da televisão também agem por impregnação, de modo quase subliminar, pois o
“conteúdo” é mascarado pela forma, por apelos comunicacionais muito eficazes, tais como
alusões arquetípicas, situações humorísticas ou de grande dramaticidade, personagens vividos
por galãs ou atrizes muito apreciadas (BELLONI, 2001, p. 40). Bandura, em 1965 (apud
BANDURA, 1969, p. 74-75) observou em estudo que as respostas dadas pelas crianças aos
estímulos de um filme depende do comportamento dos personagens, da forma como o
conteúdo é exibido e principalmente das recompensas recebidas pelos personagens por cada
ação ou atitude. Além disso, os “apelos comunicacionais” com os quais se preocupa Belloni
também são determinantes para manter o nível de atenção das crianças durante a exibição do
filme (BANDURA, 1969, p. 78-79).
Uma das características da programação televisiva que mais desperta encanto e
fascínio é o “efeito de real” que ela introduz, passando a ser este um termo recorrente nos
estudos sobre mídia e criança, pois elas têm um modo particular de receber os discursos que
lhes são passados.
Ferrés (1996, p. 47) pondera que, apesar do tratamento de “janela para a realidade”
comumente oferecido à televisão, esta “realidade” é discutível. E para ele é preocupante a
confusão entre a imagem e a realidade feita pelas crianças, inclusive em programas de ficção.
“Se elas [as crianças] são especialmente vulneráveis às mensagens da televisão é devido
exatamente à sua incapacidade de distinguir entre a imagem e a realidade. [...] Para as
crianças uma história possui vida própria. Inclusive quando admitem a existência de
simulação em alguma história, as incorporam de alguma forma à realidade” (op. cit., p. 47).
Pillar (2001, p. 14-15) ratifica esta afirmação, defendendo que inicialmente a criança
tende a considerar tudo o que na televisão, inclusive desenhos animados como reais. O
conceito de realidade estaria relacionado às vivências com pessoas e objetos reais, em
situações concretas. E como a televisão faz parte do cotidiano da criança torna-se difícil para
ela delimitar o real e a fantasia porque ambos se misturam na tela. Para a autora, os primeiros
40
indícios do que seria “ficção” surgem em relação a monstros, magos ou duendes, personagens
que ela não vê fora da tela. (PILLAR, 2001, p. 14).
Sodré (2000, p. 33) caminha por outro raciocínio, afirmando que quando não uma
realidade externa que possa se assemelhar ao conteúdo de determinado programa, por
exemplo, é criado o “simulacro”, que é a não diferenciação entre o real e o imaginário, entre o
“verdadeiro” e “falso”.
O simulacro, construção ficticiamente substitutiva no confronto com a
realidade, tem o valor de contiguidade e de contemporaneidade em relação
ao objeto substituído. A linguagem simula sempre, embora em diferentes
gradações: pode aproximar-se de seu referente, pode simular sem qualquer
referente [...] (BENTZ, 1998, p. 285).
Para a criança inexiste a necessidade de referência de um modelo externo ao vídeo
para que haja aceitação. Isso acontece porque este programa passa a impor seu “próprio real”,
que se sobrepõe a experimentação e vivência do real (SODRÉ, 2000, p. 33). Assim, se pode
supor que o desenho animado infantil Bob Esponja”, embora sem referentes no mundo da
criança, é apreendido e compreendido dentro de seu contexto, sendo assim verossímil.
Outro termo que passou a ser recorrente nos estudos sobre mídia e criança é o de
“qualidade” (da televisão ou da programação). Arlindo Machado (2003, p. 13) lembra os
múltiplos sentidos que esta expressão pode conter e que, ao utilizá-la está se atestando que
televisão e qualidade caminham separadamente, o que nem sempre é verdade. Geoff Mulgan
(apud MACHADO, 2003, p. 24-25) enumera sete diferentes acepções pra o conceito de
“qualidade”, que pode se referir puramente à técnica; à capacidade de detectar as demandas de
audiência; à competência de exploração da linguagem televisiva; aos aspectos pedagógicos
(valores e modelos); à capacidade de mobilizar a população em torno de temas de interesse
coletivo; à valorização de individualidades ou à existência de diversidade.
Independentemente da significação que o termo qualidade possa ter, não se pode
deixar de discutir o assunto (op. cit. p. 25). Pfromm Netto (2001, p. 157) afirma que a busca
pela qualidade na programação permitio conhecimento do que é oferecido atualmente, pois
é necessário que se saiba:
quais são os valores, as convicções, a atitude perante os semelhantes, os
padrões de conduta, a visão do mundo, a filosofia de vida, a ética que,
voluntária ou involuntariamente estamos transmitindo ao público infantil e
que as crianças estão incorporando às suas personalidades, à sua maneira de
ser, de viver e encarar a sociedade?
41
Atenta a importância deste conhecimento, a ONG Midiativa criou o “Prêmio
MídiaQ
5
”, com intuito de valorizar a qualidade da programação televisiva destinada a crianças
e adolescentes.
Para poder concorrer a este prêmio, os programas infantis foram avaliados por pais e
deveriam se encaixar na maioria das categorias criadas por educadores e psicólogos para
determinar se um programa é de qualidade. São elas: 1) Confirmar valores (transmitindo
conceitos como respeito à família e ao próximo); 2) Incentivar a auto-estima (não reforçar
preconceitos nem estereótipos); 3) Preparar para a vida (propor temas importantes para a
futura vida profissional e social); 4) Gerar curiosidade (despertar o gosto pelo saber); 5) o
ser apelativo (não banalizar a sexualidade nem a violência e não incentivar o consumismo); 6)
Ser atraente (ter música, ação, humor); 7) Despertar o senso crítico (fazer a criança e o jovem
refletir); 8) Mostrar a realidade (apresentar a vida como ela é, apontando os limites e as
conseqüências de cada ação); 9) Gerar identificação (mostrar situações próximas da vivência
das crianças e dos jovens); 10) Ter fantasia (estimular a brincadeira e fazer sonhar). O
desenho animado Bob Esponja foi o campeão na categoria de oito a onze anos,
demonstrando que ele o apresenta características consideradas negativas pelos pais e
reforçando a escolha deste desenho para este trabalho.
5
Disponível em: <http://www.midiativa.org.br/index.php/midiativa/content/view/full/2595> . Acesso em 15 jan.
2006.
42
C
APÍTULO
II
O
MEIO É A LINGUAGEM
1.
O
MEIO
A televisão no Brasil completou cinqüenta e cinco anos e muitas pesquisas vêm
sendo desenvolvidas na expectativa de “decifrar” este grande fenômeno. Concepções teóricas
e focos de análise são aprimorados constantemente, buscando compreender a televisão seja
considerando-a como fenômeno tecnológico, seja tentando depreender características de sua
programação, ou ainda realizando pesquisas de audiência. Dentro de cada um destes itens
ainda pode-se abrir um leque muito grande de vieses, o que faz do meio TV um objeto de
pesquisa extremamente rico e ao mesmo tempo muito difícil. “Televisão é um termo muito
amplo, que se aplica a uma gama imensa de possibilidades de produção, distribuição e
consumo de imagens e sons eletrônicos [...]” (MACHADO, 2003, p. 19).
A televisão não pode ser entendida como um “simples” meio transmissor de
informações ou de mensagens de entretenimento. Ela vai muito além disso, podendo reforçar
ideologias, induzir comportamentos, servir de modelo, reformular a realidade, operar no
controle social. Maingueneau (2004, p.72) afirma que nenhuma mídia é um simples meio”.
Sua constituição, suas bases de funcionamento e as intenções dos produtores de seu conteúdo
imprimem um certo aspecto às mensagens, um certo modo de funcionamento.
Capparelli e Lima (2004, p. 07) entendem a televisão como um objeto complexo de ser
analisado, porque se encontra nas tensões entre mercado e cultura, entre o político e o
econômico, entre o coletivo e o individual. Silverstone (2002, p. 16-17) concorda,
acrescentando que a mídia deve sempre ser entendida como um processo social,
historicamente constituído.
Muniz Sodré (2000, p. 10-11) também entende a televisão como uma forma de
relacionamento social, definida por fatores políticos e econômicos que instituem novas formas
de ver, de falar, de interagir. Considerando o sistema televisivo como parte de uma estratégia
política e econômica global, ele funciona como um dispositivo de mobilização e integração de
suas audiências, e assim, como “um tipo de administração ou gestão da vida social”, fazendo
com que os meios de comunicação de massa sejam dissimuladamente político-pedagógicos”
(op. cit.,p. 32).
43
De fato, a análise dos diversos aspectos do fenômeno televisivo tem
mostrado que a televisão (o sistema de broadcast e suas extensões
industriais) não pode ser pensada como um mero esquema técnico de
transmissão de imagens, mas como a ponta de um sistema complexo,
articulado com todas as instâncias sociais de uma economia de mercado (op.
cit., p. 09).
Como participante dos mecanismos político e econômico, a televisão depende do
estabelecimento de uma relação de poder com seus espectadores, comportando-se como
possuidora de um discurso legitimado. Uma das maneiras que utiliza para isso é a distinção
muito clara entre emissor e receptor. Este pode contar com uma “ilusão” de participação no
processo, mas não pode responder diretamente a programação. O poder está no ou”: “ou se é
emissor ou se é receptor” (op. cit., p. 11). Algumas vezes, por exemplo quando é realizada
uma pesquisa de audiência, e um autor de telenovelas “muda” alguns planos em relação a
determinado personagem para permitir sua aceitação perante seus espectadores, pode haver
uma ilusão de mudança de papéis, pode-se acreditar que o público realmente possua o poder
de dialogar com o meio e, mais que isso, ser ouvido. Essa aceitação” da opinião pública,
porém, é relacionada com a necessidade da televisão de manter níveis de audiência que
permitam sua manutenção econômica (mantendo investimentos publicitários) e que crie no
receptor uma maior identificação, mantendo o poder sobre ele (op. cit., p. 39).
Outro ponto que pode ser destacado como determinante na manutenção do poder da
televisão refere-se ao “efeito de real” proporcionado pelo fascínio que a TV impõe,
especialmente em virtude da profusão de suas imagens.
Esta “fascinação” pelas imagens na tela é explicada por Sodré (2000, p. 11-14) com
apoio de aspectos mitológicos e psicanalíticos. A fascinação do ser humano pelo “olhar” pode
remeter à lenda de Narciso ou de Eros e Psiquê, construções mitológicas que o destaque à
postura do indivíduo em relação às questões do olhar de si mesmo e do outro. Em Narciso, é
abordada a questão do simulacro, considerado aqui como imagens que podem tomar
autonomia face à realidade externa, construindo o “duplo de si mesmo”, a impressão de
retrato fiel. Em Eros e Psiquê “o olhar é tido como suscetível de evocar sentimentos de temor,
mistério e amor [...]” (op. cit., p.13) e assim é trabalhado o poder do olhar, a crença de que o
olhar possa permitir uma fusão entre os seres, o que olha e o que é olhado.
Na televisão, porém, um descompasso entre estes elementos. Suas produções
refletem um olhar particular sobre determinados fenômenos e não permitem um processo
interacional. O receptor, além de ver sem ser visto, não consegue exprimir o olhar que
desejaria lançar sobre aquilo que lhe é mostrado. “Quando há desequilíbrio de poder na
44
relação, o olhar de um pode objetivar, congelando o movimento livre do outro [...]. No
imaginário, o olhar do outro é capaz de nos congelar como objeto, objetivar-nos e, por aí
mesmo, dominar” (op. cit., p. 14). Essa dominação responde a uma relação organizada de
poder, onde aquele que detém o poder sobre o olhar do outro, o se deixa ver. E esse poder
permite a retenção do olhar do outro, captando sua atenção (op. cit., p. 44) e construindo uma
aura de credulidade na imagem mostrada intencionalmente.
É preciso ter em mente que jamais lidamos com um real em si’,
independente da elaboração realizada pelos sistemas de representação
socialmente gerados. O que chamamos de ‘real’ (o vivido, real-histórico,
estrutura globalmente determinada pela Histórica) é o resultante de um
modelo de representação que o opõe a imaginário (para onde acorrem as
diferenças projetadas do real). O real conhecido (a realidade) é algo
socialmente produzido (op. cit., p.09).
O real, então, não é representável, somente demonstrável. Ele não pode ser atingido e
escapa a qualquer discurso (BARTHES, 1978, p. 22), mas os mecanismos da televisão
acabam impondo uma realidade que não existe e a programação da TV elabora um universo
simulado, construindo-se assim um real imaginário. Juremir Machado da Silva (2003, p. 09)
define “imaginário”:
Num sentido mais convencional, o imaginário opõe-se ao real, na medida em
que, pela imaginação, representa esse real, distorcendo-o, idealizando-o,
formatando-o simbolicamente. Numa acepção mais antropológica, o
imaginário é uma introjeção do real, a aceitação inconsciente, ou quase, de
um modo de ser partilhado com outros, com um antes, um durante e um
depois (no qual se pode interferir em maior ou menor grau). [...] O
imaginário é uma rede etérea e movediça de valores e de sensações
partilhadas concreta ou virtualmente.
As imagens e os discursos oferecidos pela televisão podem, assim, operar mutações na
estrutura psíquica e nos modos de percepção do espectador. Sua linguagem é determinante
neste processo, pois gera o efeito de “aparência” da verdade, de reprodução fotográfica da
realidade quando utiliza elementos como a montagem e os movimentos de câmera para
construir um sentido “à primeira vista, parece que toda representação (significante) coincide
de maneira exata e unívoca com a informação conceitual que veicula (significado)”
(MARTIN, 1990, p. 18).
Assim, o que acontece pode ser chamado de representação da realidade, e portanto o
raciocínio seguinte é o de que não pode haver uma linguagem “neutra”, pois ela esta
sempre carregada de ideologias, que não serão compreendidas em uma relação causa-efeito,
45
porque a ideologia não é inerente ao produto audiovisual, mas fruto de seu confronto com o
espectador. Espectadores diferentes constróem sentidos diferentes. “Assim, a imagem
reproduz o real, para em seguida, em segundo grau e eventualmente
, afetar nossos
sentimentos e, por fim, em terceiro grau e sempre facultativamente
, adquirir uma significação
ideológica e moral” (op. cit., p. 28, grifo nosso).
A significação é possível porque o discurso do audiovisual se apresenta fechado em
uma estrutura, em uma linguagem que permite sua inteligibilidade, seu “fazer sentido”, que é
cada vez mais fabricado pelos dispositivos ideológicos de mercado, pelos mecanismos de
representação dessa ordem social (op. cit., p. 09). Complementando o pensamento de Martin,
Sodré (2000, p.35) acrescenta:
Incorporando todas as cnicas de reprodução desenvolvidas na
modernidade, mas também todo o ethos moderno de organização da vida
social em termos de simultaneidade e novidade, ela invade, com projetos de
absorção, o campo existencial do espectador, oferecendo-lhe um espaço e
um tempo simulados.
Estes são alguns fatores que demonstram a grande importância da televisão. Ela é
muito mais que um ‘meio de informação’, é uma estrutura, uma forma específica de
organização de conteúdos. Independentemente do programa que se assista ou da emissora (ou
das intenções desta), a linguagem televisiva se afina na “produção de um mesmo real
imaginário e fascinante”, que pode determinar novas maneiras de ver a si e ao outro (SODRÉ,
2000, p. 11).
46
2.
A
LINGUAGEM AUDIOVISUAL DO
“B
OB
E
SPONJA
Em âmbitos técnicos, pode-se dizer que a animação é a arte de conferir a ilusão de
movimento a desenhos estáticos. A animação em duas dimensões (2D) é a mais comum e
caracteriza-se, em princípio, por desenhos feitos em folhas de acetato que são dispostos sobre
uma mesa de animação (ou caixa de luz) e filmados um a um por uma câmera de animação,
que imprimirá à seqüência de imagens uma velocidade de dezesseis ou mais quadros por
segundos. Como toda técnica audiovisual ela evoluiu e, por exemplo no caso do desenho
animado “Bob Esponja”, as imagens são desenhadas a mão, escaneadas e no computador
recebem toda a pós-produção, como a colorização, a animação e a inserção de áudio. Mas a
animação, que hoje abarca diferentes técnicas como o stop motion, conhecido como
animação em “massinha”; a animação em 3D, toda feita no computador; a pixilation, na qual
pessoas fazem poses como bonecos e são filmadas quadro a quadro começou há muito mais
tempo, com técnicas rudimentares que foram sendo aperfeiçoadas a partir da invenção do
cinema.
A elaboração dos primeiros desenhos animados tinha muitas semelhanças com a
linguagem do cinema, uma vez que se pode afirmar que as duas expressões artísticas
caminharam juntas: em 1908 foi exibido o primeiro desenho animado em um projetor de
filmes moderno, Fantasmagorie, de Émile Courtet
6
. em 1928 os estúdios Disney
produziram o primeiro desenho animado sonorizado: “Steamboat Willie”, que marcou a
estréia do personagem Mickey Mouse, famoso desde então. Em 1932 a Disney lançou “Flores
e Árvore”, o primeiro a usar technicolor e em 1937, o primeiro longa-metragem de animação,
“Branca de Neve e os Sete Anões”
7
.
A partir da invenção de televisão, o desenho animado passou a ter outro espaço de
veiculação, o que implicou em novas construções. Não seria possível, por exemplo, manter o
mesmo tempo de duração, ou o mesmo nível de tensão que são indispensáveis nas telas dos
cinemas. Então, uma nova categoria de desenhos animados passou a ser produzida: os
desenhos animados para televisão. Com isso, pode-se dizer que a linguagem do desenho
animado “Bob Esponja” é uma fusão das linguagens televisiva e cinematográfica
8
.
6
Disponível em: <http://www.marel.pro.br>. Acesso em 14 nov. 2005.
7
Disponível em: <http:// www.guiadoscuriosos.com.br/index.php?cat_id=50007>. Acesso em 14 nov. 2005.
8
A utilização do termo “linguagem” refere-se a maneira própria que o cinema e a televisão tem de se expressar,
de construir suas narrativas representando a realidade.
47
Cabe então, compreender melhor alguns elementos dessa linguagem que colaboram
com o processo de significação das imagens audiovisuais.
O cinema também serviu de inspiração para a linguagem televisiva, uma vez que
“permitiu a criação de protocolos ritualísticos para a televisão” (METZ, 1971, p. 35). Apesar
de manter semelhanças de linguagem com o cinema, a televisão é muito diferente dele,
porque ao mesmo tempo em que incorpora os aspectos técnicos da imagem em movimento,
responde a outras motivações político-econômicas. Metz (1971, p. 279) define as diferenças
entre estes meios como de ordens tecnológicas; sócio-político-econômicas; psicossociológicas
e de gêneros oferecidos.
Porém, em termos de compreensão e análise, as características da linguagem
cinematográfica podem ser transportadas para a linguagem televisiva, pois estas utilizam os
mesmos traços materiais (como tipos de planos, movimentos de câmera ou iluminação).
Entre o cinema e a televisão, os empréstimos, adaptações ou reutilizações de
figuras são muito numerosos, mas o fato resulta principalmente de que os
dois media constituem, pelo menos em seus traços físicos essenciais, uma
única e mesma linguagem (METZ, 1971, p. 279).
A seguir serão descritos, tendo como base as obras “A linguagem cinematográfica”, de
Marcel Martin (1990) e “Da criação ao roteiro”, de Doc Comparato (2000), alguns aspectos
da linguagem cinematográfica com a intenção de relacioná-los com a linguagem do desenho
animado, que também se apropria destes elementos para criar suas cenas. Por tratar o desenho
animado como unidade de discurso, se faz necessária a compreensão de todo o sistema que
colabora com a construção do implícito dos enunciados. A forma como se apresenta o
discurso é tão importante quanto ele e caminha junto com sua compreensão.
48
2.1.
A
IMAGEM EM MOVIMENTO
Os movimentos das imagens aproximam o espectador dos personagens e do enredo.
As linguagens como close ups, afastamentos, cortes, tomadas isoladas, planos gerais,
acelerações, ampliações e reduções proporcionam ao espectador a “experiência do
subconciente visual” (COMPARATO, 2000, p. 313) e assim, ajudam a contar a estória.
Os enquadramentos de câmera podem ser usados com diversas finalidades, como
deixar certos elementos da ação fora da cena; evidenciar detalhes significativos ou
simbólicos; direcionar a leitura da cena; modificar o ponto de vista do espectador ou ainda
obter efeitos de movimento significativos para o desenrolar da estória (MARTIN, 1990, p. 35-
36). Os diversos tipos de planos, bastante explorados no “Bob Esponja”, colaboram com a
clareza da narrativa.
O plano geral mostra os personagens envolvidos na cena e/ou o cenário completo no
qual a estória irá se desenvolver (COMPARATO, 2000, p. 314):
Este frame, do episódio “Os jogos do mestre cuca” mostra o lugar onde vai se
desenvolver a estória, o “Coliseu fast food”. O plano geral aqui funciona como ambientação,
fazendo com que o espectador, habituado com outros cenários, consiga rapidamente entender
o “tom” do episódio, sabendo que a trama não se desenvolverá nos arredores da casa do Bob
Esponja. Quando o plano geral é usado com essa finalidade o espera a entrada” dos
personagens em cena: a câmera se movimenta rapidamente para acompanhar o
desenvolvimento da estória, normalmente em um travelling para frente (que será explicado
adiante). Pode-se inferir que quando usado com essa finalidade, o plano geral colabora com o
contrato enunciativo, significando “estamos em outro cenário, mas não se preocupe que
você vai entender”, e cria um ar de suspense, de interesse pela mensagem totalmente nova que
está por vir.
49
Isso porque os episódios de Bob Esponja”, em sua absoluta maioria, se desenvolvem
nos arredores da casa de Bob Esponja, muitas vezes começando com uma imagem que mostra
uma ilha enquanto o narrador saúda “Bem vindos à Fenda do Bikini”. O espectador sabe que
em poucos segundos a imagem será cortada para o ambiente submarino no qual as estórias se
desenvolvem, normalmente começando com um plano geral das casas de Patrick, Lula
Molusco e Bob Esponja, da esquerda para a direita.
Este é um dos planos menos explorados no desenho, limitando-se quase que
completamente a abertura dos episódios, porque Bob Esponja” é composto por “episódios
seriados” - nos quais se repetem os personagens e a estrutura narrativa, mas cada episódio
apresenta começo, meio e fim, não interligando-se com os demais (MACHADO, 2003, p. 84-
85). Ou seja, o é necessária uma ambientação recorrente. O espectador já sabe onde o
episódio está se passando, mesmo que a cena comece com um close, por exemplo.
Os planos americano que ‘corta’ o personagem na altura dos joelhos; e médio que
apresenta o personagem da cintura para cima (COMPARATO, 2000, p. 314) têm
praticamente a mesma função no “Bob Esponja”, mesmo porque, por tratar-se de animação de
formas o humanas é muito difícil distinguir os limites entre a “cintura” e o “joelho” destes
personagens. Esse enquadramento ajuda a narrar a estória, servindo para acompanhar os
personagens; para mostrar simultaneamente os personagens conversando ou ainda para
simplesmente evidenciar a expressão corporal do personagem ou uma ação dele.
50
Os frames anteriores ilustram este plano: o primeiro é um diálogo entre Bob Esponja e
Patrick (Chocolate com nozes) e o segundo o registro da gestualidade de Patrick ao se
preparar para cuidar do Bob Esponja, que está doente (Espuma). Neste caso, o sentido se
complementa pela fala de Patrick “Não me toque, estou esterilizado!” e pelo contexto do
episódio.
Este plano também é utilizado em situações de “ping-pong”, quando os personagens
são mostrados separadamente enquanto seu diálogo caminha para um momento de tensão ou
ainda quando, sem diálogo, a expressividade corporal dos personagens se encarrega de
denotar a eminência de um embate. Normalmente estas situações são seguidas por closes ou
big closes.
O ‘closeou o ‘big close’ servem para evidenciar expressões faciais do personagem,
ressaltando seu papel na estória e aproximando-o do espectador. Assumem assim um papel
psicológico preciso (MARTIN, 1990, p. 35-36), expressando o pensamento do personagem a
respeito da situação que está sendo desenvolvida.
Este tipo de plano pode ter uma duração rápida, significando ação imediata após o
momento de tensão ou pode ter uma duração mais lenta, quando o objetivo é que o espectador
possa se aprofundar no momento psicológico que o personagem atravessa, criando
expectativa na audiência.
A sequência abaixo faz parte do episódio “Os jogos do mestre cuca”. Ela demonstra
através dos planos citados acima, sem a necessidade de diálogos, o nível de tensão existente
entre os dois personagens. Eles irão se enfrentar em uma competição e estão com muita raiva
um do outro o só por causa da competição em si, mas porque acreditaram em mentiras que
seus técnicos inventaram nas cenas anteriores com a intenção de inflamá-los e incitá-los a
competir de maneira agressiva. A montagem estabelece um ritmo tenso, e tem início com a
imagem dos dois frames abaixo. Trata-se do fim de uma discussão verbal entre Bob Esponja
e Patrick e o início de uma sequência não verbal carregada de significados.
51
A seguir, os planos de close” e “big close continuam a seqüência, evidenciando
ainda mais a aura de tensão e criando uma relação de suspense, de querer saber qual será o
desfecho da seqüência ao mesmo tempo que já se espera a ação, a luta.
A sequência formada pelos seis frames acima é entendida como uma unidade de
discurso, pois ela significa com uma linguagem o verbal que esclarece o que o espectador
deve compreender: independentemente de sua amizade, Bob Esponja e Patrick estão bravos e
irão se enfrentar violentamente. Os olhos de Bob Esponja estão exageradamente grandes, o
que pode denotar que, além da raiva, ele está sentindo surpresa e estranhamento pela situação
de combate nunca vivenciada (este é o único episódio no qual eles brigam, e no final fazem as
pazes, saindo abraçados). Patrick demonstra sua raiva através das sobrancelhas, que ficam
arqueadas, em uma referência à linguagem das histórias em quadrinhos, fonte de muitas
contribuições à expressividade de desenhos animados. O formato da boca é o mesmo, em
posição contrária ao sorriso, e no big close a boca de ambos aparece exageradamente aberta,
aproximando o espectador da expressão facial dos personagens e marcando a passagem de um
momento psicológico no qual havia dúvida quanto ao embate para a demonstração da
disposição de ambos para a luta.
Os ângulos de filmagem também são utilizados no desenho animado. Com o uso da
contra-plongée na qual a tomada do personagem é feita de baixo para cima cria-se uma
ilusão de superioridade, exaltação e triunfo (MARTIN, 1990, p. 41), pois faz com que os
personagens pareçam mais altos, mais importantes. No Bob Esponja” esse recurso é
utilizado para demonstrar que o personagem teve uma grande idéia, resolveu determinado
problema ou vivencia uma situação psicológica na qual se sente superior, como é o caso do
personagem Lula Molusco no frame a seguir, que o mostra fazendo uma manifestação contra
o “abuso” de seu patrão, Seu Siri Queijo.
52
na angulação contrária, a plongée, o efeito é, evidentemente, o oposto. Esta tomada
tem o poder de humilhar o indivíduo, de caracterizar sua inferioridade perante os demais. No
desenho costuma denotar que o personagem fez algo de errado, que está “levando bronca” ou
então que está se sentindo triste por algum motivo. Aqui o erro cometido por Bob Esponja ao
não querer mais o carinho de sua avó (pois ele considerava-se muito “adulto” para isso) é
evidenciado no instante em que ele pede perdão com esta perspectiva de angulagem.
Além dos enquadramentos, a elaboração do desenho animado respeita “movimentos de
câmera”, que servem para acompanhar um personagem ou um objeto em movimento; criar a
ilusão de movimento de um objeto estático; descrever um espaço ou uma ação; definir
relações espaciais entre elementos da ação ou personagens; realçar aspectos dramáticos de um
personagem ou objeto e expressar o ponto de vista de um personagem ou sua tensão mental
(MARTIN, 1990, p. 45-46). “Podemos dizer que uma função encantatória dos movimentos
de câmera que corresponde, no plano sensorial (sensual) aos efeitos da montagem rápida no
plano intelectual (mental)” (op. cit., p. 47).
São vários os movimentos de mera, mas nem todos são utilizados na linguagem do
desenho animado, como o “Process shot” quando se projeta uma cena pré-filmada por trás
dos personagens; ou a “desfocagem” que foca um personagem ou objeto, privilegiando-o
perante os demais constituintes da cena (COMPARATO, 2000, p. 316-317).
outros o imprescindíveis. O “travelling” é feito quando a câmera acompanha o
movimento de um personagem ou objeto com a velocidade que este se move. “O travelling
consiste num deslocamento da câmera durante o qual permanecem constantes o ângulo entre o
53
eixo óptico e a trajetória do deslocamento” (MARTIN, 1990, p. 47). É o travelling que a
sensação de movimento da imagem. Ele pode ser vertical (embora quase não seja utilizado)
ou horizontal. Horizontalmente pode se mover mantendo a distância do objeto ou personagem
ou ainda “para frente” ou “para trás”, com intenções narrativas específicas.
O “travelling para trás” (op. cit., p. 47-48), costuma ser utilizado para concluir uma
cena; promover afastamento no espaço; acompanhar um personagem que avança (quando o
Bob Esponja corre em direção a algum lugar, por exemplo); desligamento psicológico ou
impressão de solidão ou desânimo (quando a imagem “vai se afastando” de Bob Esponja que
está sentado em seu sofá refletindo sobre algum problema, ou sobre algo de errado que fez).
Mais comum é o “travelling para frente”, movimento mais natural, que ao
espectador a sensação de aproximação da cena e normalmente é acompanhado de mudanças
no plano da imagem quanto mais para frente, maior o objeto ou o personagem fica. Ele
também tem funções expressivas, como introdução (muito utilizada no começo de episódios,
a imagem sai de um plano geral que mostra as casas do Patrick, Lula e Bob e vai se
aproximando da casa de algum deles); realce de um elemento dramático importante (quando a
imagem vai se aproximando de um rolo de fita-crepe que Patrick vai usar para tampar os furos
no corpo do Bob Esponja causando-lhe desconforto, por exemplo); passagem à interioridade
ou à tensão mental (quando a imagem vai se aproximando de Patrick criando uma lógica com
a próxima cena, que é uma recordação, por exemplo).
A “panorâmica”, é outro movimento de câmera importante e de mais simples definição
e compreensão. Ela acontece quando a câmera se move horizontalmente (conhecido como
“pan”) ou verticalmente (conhecido como “tilt”) sobre seu eixo, sem permitir alterações no
plano da imagem. Serve normalmente para seguir um personagem ou explorar um espaço,
mostrando o cenário.
A linguagem cinematográfica também conta com efeitos óticos. No desenho animado,
muitos deles o são utilizados, como o “fade in” e “fade out” (a imagem vai ficando mais
clara ou mais escura); o encadeamento” com ou sem desfocagem (fusão de duas imagens); o
“freezing” (congelamento da imagem); a “câmera lenta”, entre outros (COMPARATO, 2000,
p. 317-320).
O encadeamento é utilizado nesta sequência, que pretende dar ao espectador a
sensação de estar entrando” no cérebro do Bob Esponja. Em movimento, estes frames (e
outros mais) vão se fundindo enquanto significam:
54
Outro efeito ótico muito utilizado é o “corte”, que é a passagem direta de uma cena
para outra, indispensável para estruturar e significar a narrativa. O corte também pode ser
feito com o efeito de tela múltipla” a tela é dividida em partes, mostrando ações
simultâneas (COMPARATO, 2000, p. 317) e costuma ser utilizado quando, por exemplo, os
personagens estão conversando ao telefone e é possível ver os dois ao mesmo tempo, cada um
na sua casa.
O entendimento do mecanismo dos movimentos de câmera (ou no caso deste trabalho,
de sua apropriação pelo desenho animado) colabora com o entendimento da imagem como
linguagem, que evoluiu progressivamente do ponto de vista estático para o dinâmico enquanto
ampliava suas possibilidades significativas. Em outras palavras, pôde-se destacar o potencial
da imagem em colaborar na construção discursiva, ao imprimir nos enunciados formas não
verbais de significar, diferentes modos de mostrar enunciados que são apropriados por quem
elabora o discurso e que conduzem a determinada leitura, determinada compreensão do
espectador. Como afirma a análise do discurso (PINTO, 2002, 36-43) o entendimento de uma
mensagem pode envolver o não-verbal. Observou-se que no caso do desenho animado “Bob
Esponja” essas estratégias são eficazmente utilizadas, fazendo parte de sua unidade
discursiva.
55
C
APÍTULO
III
O DESENHO ANIMADO INFANTIL
“B
OB
E
SPONJA
1.
A
TELEVISÃO POR ASSINATURA
A televisão divide-se hoje entre os canais de sinal aberto (que podem ser sintonizados
por qualquer aparelho de TV) e os de sinal pago (captados mediante o pagamento de uma
assinatura). A TV por assinatura surgiu nos Estados Unidos na década de 40 como forma de
pequenas comunidades receberem os sinais de TV aberta que o chegavam a suas casas com
boa qualidade. As pessoas associavam-se e adquiriam uma antena de alta sensibilidade.
Depois, com o uso de cabos, levavam o sinal aas residências. Esse sistema ficou conhecido
como CATV, termo que é até hoje sinônimo por cabo.
No Brasil, foi em 1991 que os grandes grupos de mídia iniciaram este processo, com a
criação da TVA pelo grupo Abril (operando com MMDS) e da Globosat pelas Organizações
Globo (operando via satélite de banda C). Foi coma a promulgação da Lei de TV a Cabo em
1995 que o sistema passou a funcionar de uma maneira melhor
9
.
A televisão por assinatura tem hoje, no Brasil, 3,8 milhões de domicílios assinantes e
16 milhões de espectadores em potencial:
Disponível em: <http://www.abta.org.br/site/content/midia/images/MidiaFatos2005-2006-Port-English.pdf >.
Acesso em 14 jan. 2006.
9
Disponível em: <http://www.abta.com.br/site/content/panorama/>. Acesso em: 15 maio 2005.
56
Com quase doze anos de vida, a televisão paga mostra um perfil muito diferente das
outras mídias. Os picos de audiência, durante a semana, estão em torno das 22h e a divisão
por canais é mais equilibrada do que na TV aberta, em que poucos detêm toda a audiência.
Nos finais de semana, o público é maior e o pico acontece às 18h
10
. Praticamente todos os
canais oferecidos em sistemas de assinatura são produzidos nos EUA e têm, além disso, uma
diferença fundamental em relação à TV aberta: a segmentação de sua audiência. “Novas redes
pessoais assumem cada vez mais as características da mídia de massa tradicional. Essas redes
servem, coletivamente, a grandes públicos com necessidades de informação específicas”
(DIZARD, 2000, p.259).
Um dos públicos mais valorizados por estas empresas é o infantil, que hoje conta com
sete canais voltados a elas (Cartoon Network, Disney Channel, Boomerang, Jetix,
Nickelodeon, Discovery Kids, e TV Rá-Tim-Bum – único de produção nacional) e é o público
que mais dedica tempo à TV por assinatura, conforme dados da ABTA (Associação Brasileira
de TV por Assinatura).
Faixa etária Tempo dedicado à TV por assinatura
4-11 anos 2h39
12-17 anos 1h56
18-24 anos 1h53
25-34 anos 2h02
35-54 anos 2h08
55 ou mais anos 2h10
Tabela produzida com dados disponíveis em:
<http://www.abta.org.br/site/content/midia/images/MidiaFatos2005-2006-Port-English.pdf> Acesso em: 10 jan.
2006.
10
Disponível em: <http://www.abta.com.br/site/content/panorama/>. Acesso em: 15 maio 2005
57
2.
O
CANAL DE TRANSMISSÃO
N
ICKELODEON
Para a análise do discurso, tão importante como o enunciado em si é a sua enunciação.
E isto se aplica aos dois âmbitos de enunciação, tanto o imediato quanto o ampliado. Para
compreender o conceito de contexto imediato, tome-se por exemplo a seguinte fala do Bob
Esponja (episódio Beijos da vovó) ao chegar no restaurante: Não é ótimo? Todo mundo está
de bom humor hoje!”. A significação deste enunciado, seu “fazer sentido” se completa
dentro do contexto do episódio, formando uma relação de dependência direta com os
acontecimentos anteriores, com a entonação do enunciador e com a imagem do desenho. No
caso, os clientes do restaurante estão rindo muito desde que Bob Esponja entrou, mas não
porque “estão de bom humor”. O que acontece de fato é que uma marca do beijo de sua
avó em sua testa e as pessoas estão zombando dele, que na sua ingenuidade só entende o que
está acontecendo quando Lula Molusco explica ironicamente: Eu adoro cortar o seu barato,
Bob Esponja! Eles estão rindo de você e não com você!” (ênfase dada pela entonação do
personagem). Ou seja, o desenvolver da história, a entonação, as imagens (entre outros
elementos) são indispensáveis para a compreensão dos enunciados. Em um texto entendido
como discurso, todos os elementos constituintes são indissociáveis.
Podemos considerar as condições de produção em sentido estrito e temos as
circunstâncias da enunciação: é o contexto imediato. E se as consideramos
em sentido amplo, as condições de produção incluem o contexto-histórico,
ideológico (ORLANDI, 2003,p. 30).
O contexto ampliado, por sua vez, envolve os elementos que estão além do “Bob
Esponja” em si, mas que determinam suas condições de produção, seu “querer dizer” dentro
de determinada condição social e histórica.
Sua produção, portanto, passa pela ideologia do canal e por todo o contexto da
produção televisiva. E neste âmbito e produção também tem particularidades, pois se trata de
um canal por assinatura.
O animado infantil Bob Esponja” é exibido e produzido pela Nickelodeon, e
provavelmente pelo perfil de sua audiência, a emissora não disponibiliza em seu site oficial
(http://www.mundonick.com.br) informações institucionais. O site fornece informações sobre
a programação; jogos; e espaços interativos, nos quais a criança pode responder a uma
pesquisa, votar no desenho preferido, enviar fotos para que sejam publicadas ou ainda
escrever mensagens. Estima-se que a página receba aproximadamente 2,8 milhões de visitas
58
mensais e que a Nickelodeon seja a segunda colocada no ranking de audiência dos canais por
assinatura para público infantil
11
, perdendo para a concorrente direta, Cartoon Network.
Apesar de fazer parte do rol de “canais para crianças”, a programação da Nickelodeon
é para um público bem variado, o que pode ser demonstrado por uma análise superficial de
sua grade de programação.
Na maioria dos horários são exibidos desenhos animados produzidos pela emissora.
Entretanto, a programação conta com muitos seriados para público jovem (de produção
própria também) e em fevereiro deste ano passou a exibir, a partir das 22h, seriados antigos
como “Alf, O é Teimoso” e A Feiticeira”, que fizeram parte da programação da televisão
aberta e visam, provavelmente, atender os 21% de sua audiência que tem mais de trinta e
cinco anos e já conhecem estas séries.
Distribuição da audiência da Nickelodeon por sexo e faixa etária:
Disponível em: < http://www.lamac.org/_pt/nick_2.php>. Acesso em 10 jan. 2006.
11
Disponível em:
<http://www.maxpressnet.com.br/noticia.asp?TIPO=PA&SQINF=209810&EDIT=IN>.Acesso em 10 jan. 2006.
59
São exibidas apenas duas produções nacionais: “Patrulha Nick” e “Nick Tônico”,
apresentados por adolescentes que discutem temas diversos, como a programação da
emissora, escolha de profissão, comportamento, música pop, entre outros. No decorrer dos
blocos inserção de desenhos animados, normalmente os mais votados em pesquisas pelo
site.
Como não havia informações institucionais no site da emissora, recorreu-se a outros,
como o da ABTA (http://www.abta.com.br) e da LAMAC
12
(http://www.lamac.org).
Os discursos encontrados são semelhantes:
É um canal de entretenimento para crianças e uma das maiores produtoras de
programas infantis do planeta. Oferece uma programação variada, de alta
qualidade e repleta de novidades, incluindo séries e curtas produzidos
exclusivamente para crianças. No Brasil, Nickelodeon está disponível para
quase 3 milhões de assinantes e é transmitida pela TVA, Net, Sky e
DirecTV, entre outras. Entre os destaques da programação estão sucessos
como: Bob Esponja, Rocket Power, Rugrats, Jimmy Neutron e Patrulha
Nick. A Nick fala com a criança e não como criança
13
.
Na LAMAC a emissora é assim caracterizada:
Nickelodeon não é um canal infantil, é para criança. A Nick é uma marca
dedicada para crianças, colocando-as em primeiro lugar e guiada pela
missão: Conectar-se às crianças e conectá-las ao seu mundo através do
entretenimento! Mais do que feito para a criança, a Nick é um canal feito
pela criança. Somos comprometidos com a criação de um ambiente
televisivo que seja divertido e seguro para elas
14
.
Supõe-se que estas informações tenham sido fornecidas a essas empresas pela
assessoria de imprensa da emissora. É curiosa a importância dada ao “falar para criança e não
como criança”. Acredita-se que este enunciado da emissora diga respeito a sua preocupação
em não perder sua audiência adulta, que compõe 42% do total. Talvez isso explique também o
fato de que, em uma emissora que exibe essencialmente desenhos animados e que tem 42% de
sua audiência concentrada no público infantil, se proponha apenas a conectar as crianças ao
entretenimento”, o apresentando nenhuma preocupação em produzir programas de gênero
educativo.
12
“A LAMAC, Conselho Latino-Americano de Publicidade em Multicanais, é uma associação formada por 30
redes de televisão por assinatura, cujo propósito é desenvolver agressivamente o investimento publicitário em
multicanais (cabo, MMDS e DTH) na América Latina. Em parceria com seus canais associados, busca superar os
obstáculos da indústria, desenvolver recursos para medir a efetividade da publicidade em TV por assinatura e
criar plataformas de comunicação que apoiem a parcela justa do investimento publicitário em TV paga”.
Disponível em: <http://www. http://www.lamac.org/_pt/index.php>. Acesso em 25 jan. 2006.
13
Disponível em: <http://www.abta.org.br/site/content/midia/images/MidiaFatos2005-2006-Port-English.pdf>.
Acesso em: 10 jan. 2006:
14
Disponível em: <http://www.lamac.org/_pt/nick_1.php>. Acesso em 10 jan. 2006.
60
3.
A
CENA ENUNCIATIVA DE
"B
OB
E
SPONJA
"
A enunciação, momento que atribui a cada enunciado uma orientação de leitura, uma
significação almejada, é diretamente ligada ao contexto no qual essa enunciação é feita.
Assim, enunciados e situações vivenciadas no desenho animado “Bob Esponja” podem não
“caber” em outro desenho animado. Cada texto, cada construção significativa, responde a uma
estrutura interna que lhe confere sentido, que permite além de sua inteligibilidade, sua
compreensão (determinada pelas construções discursivas em si, dos elementos fornecidos
durante os episódios de Bob Esponja”, por exemplo) e sua interpretação (que dependerá de
outros fatores, como predisposição a aceitação do conteúdo, mediações familiares e escolares,
experiências pessoais da audiência).
A análise do discurso confere a esta estrutura interna o nome de “cena de enunciação”,
na qual defende-se que a enunciação acontece em um espaço instituído, que é definido de
maneira mais ampla pelo gênero de discurso (desenho animado), e também pela dimensão
construtiva de determinado discurso (como o específico do desenho animado infantil “Bob
Esponja”). Esses espaços, o instituído e o construído, colocam-se em cena instaurando um
espaço próprio de enunciação (CHARAUDEAU; MAINGUENEAU, 2004, p. 95).
O desenho animado infantil “Bob Esponja Calça Quadrada” (tradução fiel do inglês
“Spongebob Squarepants”) é uma produção da Nickelodeon que faz muito sucesso:
Bob Esponja é visto por 58 milhões de pessoas a cada mês nos EUA, recorde
de público para o segmento infantil na televisão a cabo. O personagem deu
ainda origem a uma linha de produtos licenciados que movimenta mais de
US$ 700 milhões
15
.
Sua ambientação se em uma cidade chamada “Fenda do Bikini”. Em alguns
episódios o desenho começa com uma narração em “off”, e nessas costuma-se dizer que a
“Fenda do Bikini” está no fundo do Oceano Pacífico. O nome da cidade é uma tradução feita
do original “Bikini Bottom”, que em uma tradução literal seria algo como “Fundo do Bikini”.
Todos os personagens do desenho são marinhos, com exceção da Sandy, que é uma
esquila e não é uma personagem fixa. Ela pode ir à Fenda do Bikini” porque usa uma roupa
especial com um “capacete” para poder respirar. Sua casa é uma espécie de “redoma”, que
tem duas comportas separando o oceano da terra firme:
15
Disponível em: < http://www.lamac.org/_pt/nick_2.php>. Acesso em 05 dez. 2005.
61
Casa da Sandy, episódio “Espuma”
Os personagens marinhos a visitam em poucos episódios e, para tanto, usam um
capacete que costuma ser um aquário ou um vidro de pickles cheios de água. Nenhum
episódio se preocupa em explicar como ou por que existe esse “espaço de terra firme” no
fundo do mar, o que fica implícito é que ela, buscando por aventuras, decidiu morar nesta
“redoma”. Os episódios se desenvolvem naturalmente e dentro do contexto, essa situação faz
sentido, pois “a ‘verdade’ lugar à ‘credibilidade’ do enunciado. [...] Nos modernos mass-
media, o fato (referencial descrito) não pode ser avaliado independentemente de sua
veiculação. Em outras palavras, o fato é construído pelo discurso que o enuncia
(SODRÉ,
2000, p. 42, grifo nosso).
A maioria dos episódios desenvolve-se nas proximidades da casa do personagem
principal “Bob Esponja”. Entende-se este “bairro” seja um pouco afastado do centro, porque
não apresenta movimentação de transeuntes, sinalização de trânsito, fluxo de barcos ou
“prédios”, como foi demonstrado no episódio “A lagartinha” (não selecionado para este
trabalho), no qual uma borboleta “escapa” da redoma de Sandy e invade a “Fenda do Bikini”
apavorando os cidadãos que acabam destruindo quase toda a cidade tentando fugir do
“monstro”.
A casa do Bob Esponja fica em uma grande avenida, e ele tem como vizinhos Lula
Molusco e Patrick, como mostra este frame do episódio “Chocolate com nozes”:
62
Patrick mora em um buraco na areia, embaixo de uma pedra. Ele não tem móveis (são
todos feitos de areia), mas tem uma televisão. E uma antena para ela, “instalada” em cima da
pedra.
Lula Molusco mora em uma espécie de capacete de armadura, provavelmente caído no
mar, e sua casa é um “sobrado” totalmente mobiliado, com televisão também.
Bob Esponja mora em um abacaxi que também tem dois andares. É totalmente
mobiliada e é a casa mais explorada nos episódios. Muitas vezes parte dos episódios se
desenvolvem dentro da casa do Bob, como por exemplo o episódio “Espuma”, considerado
neste trabalho. Ele tem televisão e em alguns episódios Bob é flagrado assistindo ao Jornal
da Fenda do Bikini”, que tem um peixe como apresentador ou ainda assistindo filmes de
terror, como no episódio “Siri Borg”, cujo enredo não foi considerado para este trabalho:
Deu-se destaque ao fato de que os personagens vêem televisão porque talvez essa ação
sirva para aproximar a realidade fantástica do desenho animado com a realidade vivenciada
por seus espectadores. É um momento no qual a criança pode se ver” no desenho. No frame
destacado acima, Bob Esponja TV com Gary, seu caracol de estimação, com uma
expressão facial e corporal muito semelhante a que as crianças assumem quando estão
fazendo isso.
A casa do Seu Siri Queijo, dono do restaurante “Siri Cascudo” é em formato de âncora
de navio, porque ele se apresenta como um ex-marinheiro. São raros os episódios em que se
mostra sua casa. No final da avenida onde mora Bob Esponja, fica o restaurante “Siri
Cascudo” (abaixo) onde muitos episódios se desenvolvem:
63
4.
O
ETHOS DOS PERSONAGENS FIXOS
Ethos” é a terminologia que se dá em análise do discurso para a revelação da
personalidade do enunciador através de seus enunciados. Barthes (apud MAINGUENEAU,
2004, p. 98) define ethos:
São os traços de caráter que o orador deve mostrar ao auditório (pouco
importa sua sinceridade) para causar boa impressão: são os ares que assume
ao se apresentar. [...] O orador enuncia uma informação, e ao mesmo tempo
diz: eu sou isto, eu não sou aquilo.
Isso não quer dizer, no entanto, que o conceito de ethos esteja restrito às escolhas
conscientes e pré-determinadas que o enunciador possa fazer de como se comportar ou
estruturar seu discurso buscando unicamente seduzir sua platéia. O processo, na maioria das
vezes é intrínseco, talvez possa se dizer “nato”.
O ethos não se reduz aos atos de fala, compreendendo também as determinações
físicas e psíquicas inerentes ao enunciador. Maingueneau (2004, p. 98) as distingue em caráter
e corporalidade:
O “caráter” corresponde a uma gama de traços psicológicos. a
“corporalidade” corresponde a uma compleição corporal, mas também a uma
maneira de se vestir e de se movimentar no espaço social. [...] O universo de
sentido propiciado pelo discurso impõem-se tanto pelo ethos como pelas
“idéias” que transmite; na realidade, essas idéias se apresentam por
intermédio de uma maneira de dizer que remete a uma maneira de ser [...]
(grifo nosso).
Buscou-se assim comprender o ethos de cada um dos personagens fixos (utilizando
nesta etapa o conhecimento acerca de todos os episódios gravados), considerando para tanto
as considerações feitas acima por Maingueneau. Após a descrição, foram destacados trechos
de diálogos dos episódios selecionados que exemplificassem o modo de ser, agir ou interagir
dos personagens. Isso não foi feito separadamente, personagem por personagem, porque o
diálogo é interação, é um espaço onde o ethos de cada um dos personagens pode se
manifestar. O conhecimento do ethos dos personagens fixos é importante pois colabora com o
“fazer sentido” do desenho, uma vez que o personagem “[...] por meio de sua fala, confere a si
próprio uma identidade compatível com o mundo que ele deverá construir em seu enunciado”
(op. cit., p. 99).
64
4.1.
B
OB
E
SPONJA
C
ALÇA
Q
UADRADA
Bob Esponja é uma esponja do mar amarela. Ele é o personagem principal do desenho
animado e, junto com Patrick, desenvolve as situações que permitem que este desenho
animado seja caracterizado como uma comédia, abusando do exagero, da inconveniência e da
irreverência (COMPARATO, 1995, p. 458). Está sempre vestindo uma pequena camisa
branca e suas “calças quadradas” e usa meias e sapatos (o único personagem da estória que
faz isso). Como dito acima, trabalha como mestre-cuca, atividade que lhe muito prazer.
Sempre se esforça para ser o funcionário do mês e o é dois anos consecutivos (como
demonstrado no episódio “Funcionário do mês o selecionado para este trabalho). Sua
atividade preferida, depois de trabalhar, é brincar com seu melhor amigo, Patrick. Possui um
animal de estimação, o Gary, que é uma lesma que não fala, mas é capaz de se fazer
compreender por Bob que trava diálogos interessantes com ele. Sua personalidade é marcada
pelo otimismo. Ele acredita que vive no melhor dos mundos, e demora a perceber quando está
sendo ludibriado, de tão bom chega a ser extremamente ingênuo. Parte do pressuposto que as
pessoas são boas, é amigo de todos, extremamente simpático e dificilmente se irrita com
alguma situação, sempre mantendo o bom-humor. É inteligente (muito mais que Patrick) e sua
principal frase é “Estou pronto!”, que repete em voz alta toda vez que sai de casa, seja para
trabalhar ou para brincar. Na tentativa de fazer tudo da maneira mais certa possível e de
agradar a todos acaba de envolvendo em confusões, mas tudo sempre certo no final. É o
personagem que mais utiliza expressões faciais, demonstrando sentimentos como espanto ou
alegria.
Imagem disponível em:
<http://www.nick.com/all_nick/tv_supersites/characters.jhtml?show_id=spo&character=Spongebob> Acesso
em: 23 jan.2006.
65
4.2.
P
ATRICK
E
STRELA
Patrick Estrela é uma estrela-do-mar. É o melhor amigo de Bob Esponja e aceita
participar com ele de qualquer situação. Veste-se apenas com um shorts e é todo cor-de-rosa.
Enquanto Bob Esponja é ingênuo, Patrick é agradavelmente bobo. Tem dificuldade de
compreender algumas coisas e freqüentemente perde-se o meio do próprio raciocínio.
Esquece ade comer, mas costuma ter o desejo de “resolver” os conflitos e agir como se
“soubesse das coisas”. Acaba dando conselhos e fazendo afirmações que não são as mais
acertadas, como no episódio “Espuma”, que será melhor detalhado adiante. Patrick é tão
pouco inteligente que o consegue trabalhar e espera que Bob chegue do serviço para que
possam brincar. Também se esforça para ser amigo de todos e acredita em tudo que lhe é
falado. Seus pais aparecem em um episódio (não selecionado para este trabalho), Sou pelos
idiotas”, no qual, aterrorizado por receber uma carta dos pais informando a visita, confessa a
Bob Esponja que “a seus pais o acham idiota”. Bob resolve ajudá-lo, fingindo que é um
“empregado doméstico” de Patrick, agindo da maneira mais idiota possível achando que, se
os pais de Patrick conhecerem um verdadeiro idiota, passarão a considerar o filho o mais
inteligente dos seres”. Evidentemente, as coisas o correm como eles esperavam, mas acaba
dando tudo certo.
Imagem disponível em:
<http://www.nick.com/all_nick/tv_supersites/characters.jhtml?show_id=spo&character=Patrick> Acesso em: 23
jan.2006.
66
4.3.
L
ULA
M
OLUSCO
Lula Molusco é uma lula azul. Mora entre Bob Esponja e Patrick a contragosto (pois
vive reclamando dos vizinhos) e trabalha como caixa no restaurante Siri Cascudo. Usa apenas
uma camisa marrom, mas pode ser visto de terno em situações especiais, por exemplo no
episódio “O retorno de Squilliam” (não integrante deste trabalho) no qual Lula resolve fingir
que é o dono do restaurante para impressionar um antigo colega de escola que obteve
“sucesso na vida”. É o personagem mais mau-humorado e chato da estória. Nada está bom
para ele, nunca. Está sempre resmungando pelos cantos, reclamando do emprego, da sua vida,
das brincadeiras de Bob e Patrick, enfim. Implica com eles e, quanto mais implica piora sua
situação porque Bob e Patrick não têm discernimento e sempre ficam buscando “desculpas”
para as grosserias de Lula. Assim, acabam querendo agradá-lo ou distraí-lo sendo mais
inconvenientes ainda. Um dos motivos da personalidade hora agressiva, hora depressiva de
Lula é sua frustração profissional. Ele se considera um artista, tentando inclusive em um
episódio (“Artista desconhecido”) abrir uma escola de artes. Mas seu primeiro aluno é Bob
Esponja, que se mostra capaz de fazer obras de arte muito melhores que as de Lula, fazendo-o
desistir da idéia e ficar mais arrasado. Outra “aptidão” de Lula é a clarineta, mas só o Bob tem
paciência para ouvi-lo tocar. É convidado freqüentemente por Bob e Patrick para participar de
suas brincadeiras, mas procura manter uma postura distante e desinteressada. Acaba sempre,
porém, espiando a brincadeira deles de sua janela, morrendo de vontade de participar. É o
único personagem que não alcança obrigatoriamente seus objetivos no final dos episódios que
protagoniza. Independentemente da trama, o final de Lula Molusco não costuma ser feliz.
Imagem disponível em:
<http://www.nick.com/all_nick/tv_supersites/characters.jhtml?show_id=spo&character=Squidward> Acesso em:
23 jan.2006.
67
4.4.
S
EU
S
IRI
Q
UEIJO
Seu Siri Queijo é um siri vermelho. Usa uma calça pescador e uma camisa azul. Ex-
militar, busca ter um comportamento exemplar. Mas age muito mal quando o assunto é
dinheiro, porque é extremamente avarento. Ele tem uma filha chamada Pérola, uma baleia que
raramente aparece nos episódios porque está sempre “passeando com amigas”. É o
proprietário do “Siri Cascudo”, embora seu único prazer com o restaurante seja ganhar
dinheiro. Guarda como amuleto sua primeira moeda e tem um “termômetro” em seu
restaurante para detectar “dinheiro saindo”, ou seja, baixo número de fregueses. Explora seu
melhor funcionário, que é o Bob Esponja, mas este não percebe isso e trabalha mais e mais,
acumulando funções (feliz por isso, inclusive). É viúvo e apaixonado por uma personagem
que aparece raramente, a Srta. Puff, que é professora do Bob Esponja na escola de pilotagem.
Tem um temperamento agitado, fica o tempo todo dando ordens aos funcionários e contando
seu dinheiro. Gosta do Bob Esponja e busca passar ensinamentos a ele. É o único personagem
que tem um inimigo, Plâncton, dono do restaurante “Balde de lixo” que quer roubar a receita
secreta do hambúrguer de siri. Mas não situações violentas e os episódios não giram em
torno deste mote. Dos setenta e quatro episódios diferentes gravados, em apenas três o
Plâncton aparecia, sempre tentando bolar planos” para roubar um hambúrguer de siri, sem
sucesso.
Imagem disponível em: <http://www.nick.com/all_nick/tv_supersites/characters.jhtml?show_id=spo&character=
Mr.%20Krabs> Acesso em: 23 jan.2006.
68
4.5
E
XEMPLOS DO ETHOS DOS PERSONAGENS EM DIÁLOGOS
Episódio: Espuma
“B” corresponde a Bob Esponja; “P” a Patrick”.
Patrick toca a campainha e Bob Esponja atende vestindo cachecol e blusa de lã.
“[...]
P – Oi, Bob Esponja! Você vai esquiar?
B – Eu tô doente, Patrick, vou pro médico!
P – O quê? Você não pode ir!
B – Por que não, Patrick?
P Eu conheço o cara que conhece o cara que foi pro dico uma vez. O consultório
do médico é horrível, um lugar horrível.
B – Não pode ser tão horrível quanto a espuma! Atchum!
P – Ah, é sim, Bob Esponja! Primeiro eles fazem você sentar na saaaala de espeeeeera.
B – Essa é a parte horrível, Patrick?
P – Não fica pior, eles fazem você ler revistas velhas!
B – Ai!
P – Aí, o médico vai logo puxando o estetoscópio!
B – Nããão!
P – Sim!
É um aparelho tão sinistro, tão gelado que quando ele toca na sua pele indefesa ele...
B – Ahhhhh!
B – Não, não, não, nada de estetoscópio, nada de médico, nada de revistas velhas, nada
de pssiii [som do estetoscópio gelado tocando no corpo quente]. Não, não, não!
Patrick, eu não quero ir pro médico!
P – Exatamente!
[...]”.
Episódio: Beijos da vovó
“B” corresponde a Bob Esponja; “L” a Lula Molusco, “C” a cliente do restaurante e
“TC” a Todos os Clientes.
Bob Esponja acaba chegar ao Siri Cascudo para mais um dia de trabalho após ter ido
visitar sua avó. Quando ele entra no restaurante, todos começam a rir.
69
“[...]
B – Não é ótimo? Todo mundo está de bom humor hoje!
L Eu adoro cortar o seu barato”, Bob Esponja! Eles estão rindo de você e não com
você!
B – Eu fiz alguma coisa engraçada?
L – A sua testa!
B – Minha testa é engraçada?
C – Ei, menininho da vovóó, beijinho, beijinho, beijinho...
B ãão! Parem com isso! Não tem nada de errado em ganhar um beijo da vovó da
gente!
C Ó não, principalmente se você é um bebezão que usa fraldas...e chupa o dedão e
deixa eu ver, e brinca com bonecas e usa pijama do tipo macacão e carrega o cobertor por e
também...
TC – Agora já chega!
L – Não esquenta, Bob esponja, conheço alguém que ainda gosta de você...
B – É mesmo? Conhece Lula Molusco?
L – É, é a sua avó!
TC - Riem
[...]”.
Episódio: Chocolate com nozes
“B” corresponde a Bob Esponja; “L” a Lula Molusco e “C” a Cliente.
Bob Esponja e Patrick estão lendo uma revista que mostra pessoas que têm muito
dinheiro.
“[...]
B – Lula Molusco, como as pessoas dessa revista ganham todo esse dinheiro?
L – São empreendedores, vendem coisas para as pessoas!
B – Que tipo de coisa?
L Eu sei lá! Coisas que as pessoas têm que comprar! E tirem as patas do meu
correio!
B – É isso aí, Patrick! Nós temos que virar empreendedores!
P – E isso aí vai doer?
B Vamos, Patrick, pensa pido: Se você pudesse ter o que quisesse agora mesmo, o
que seria?
70
P – Ai...Mais tempo pra pensar.
B – Não, uma coisa de verdade, um artigo, uma coisa que é preciso pagar.
P – Uma barra de chocolate?
B – É uma grande idéia, Patrick! Vamos ser vendedores ambulantes de chocolate!
Vida boa, aí vamos nós!
P – Abram alas para uma dupla de empreendedores!
[...]
B o estamos indo muito bem, Patrick. Precisamos de um novo método! Uma
tática nova!
P – Eu já sei! Vamos ficar pelados!
B Não, vamos deixar isso pra vender imóveis...Deve haver alguma coisa. Por qual
motivo compramos aquelas bolsas?
P – Ele disse que éramos medíocres.
B – É isso! Fez a gente se sentir especial!
P – É verdade...Eu vou voltar e comprar mais bolsas!
B – Não, espera Patrick!Por que não tentamos ser legais?
P – Ah...tá bom.
B – Lembre-se, Patrick, elogie os fregueses, faça eles se sentirem bem.
C – Olá!
P – Eu amo vocêê...
[...]”
Episódio: Os jogos do mestre cuca
“B” corresponde a Bob Esponja e “S” a Siri Queijo.
Bob Esponja está se preparando para a competição nos jogos do mestre cuca.
“[...]
B Esse pode ser o maior dia da minha juventude, seu Siri Queijo! Eu o acredito
que estou representando o Siri Cascudo nos jogos do mestre-cuca! Levar o ouro pra casa é
levar honra e glória para o Siri Cascudo!
S – E toda essa propaganda grátis vai atrair os fregueses, então não perca!
B – ‘Xá comigo, seu Siri Queijo! Siri Cascudo, Siri Cascudo, Siri Cascudo...
[...]”
71
C
APÍTULO
IV
-
L
EITURA DOS EPISÓDIOS SELECIONADOS
Todo discurso é marcado por algum grau de heterogeneidade. Isso quer dizer,
simplificadamente falando, que nenhum discurso é essencialmente novo. Ele carrega no seu
contexto significativo outros discursos, e até outras ideologias que podem aflorar de maneira
mais ou menos clara.
Para a análise de discursos, todo texto é híbrido ou heterogêneo quanto à sua
enunciação, no sentido de que ele é sempre um tecido de ‘vozes’ ou citações,
cuja autoria fica marcada ou não, vindas de outros textos preexistentes,
contemporâneos ou do passado (PINTO, 2002, p. 31).
Charaudeau e Maingueneau (2004, p. 231) e Pinto (2002, p. 31) estabelecem uma
diferenciação entre a heterogeneidade mostrada e constitutiva. A heterogeneidade mostrada
caracteriza-se pela manifestação localizável de um discurso dentro de outro. a
heterogeneidade constitutiva interessa mais a este trabalho, pois trata das relações
interdiscursivas entre o discurso que se apresenta e os outros que colaboraram para sua
construção.
[...] heterogeneidade constitutiva ou interdiscurso, constituído pelo
entrelaçamento no texto presente de vestígios de outros textos preexistentes,
muitas vezes independentemente de traços recuperáveis de citação ou alusão
e segundo restrições sócio-histórico culturais sobre as quais o(s) autor(es)
empíricos(s) do texto não tem controle (PINTO, 2002, p. 31).
O discurso do desenho animado “Bob Esponja” também apresenta traços de outros
discursos ou ideologias como explicado acima. Acredita-se que a mescla de discursos
cristalizados e compreendidos pelo público favorece o processo de apreensão de significados
de novos discursos, pois estará estabelecida uma relação de proximidade, de conhecimento.
Uma das maneira de atingir o nível do interdiscurso de um texto sugeridas pela análise
do discurso é a compreensão dos postos, pressupostos e subentendidos dos enunciados.
Posto é o conteúdo que está disponível no discurso, é o conteúdo latente. Pressupostos
e subentendidos dão dois tipos de conteúdos implícitos que desempenham um papel essencial
na construção de significados, e para a análise do discurso, que caminha entre o dito e o não
dito, a observação dos implícitos do enunciado são essenciais.
dois tipos de implícitos: o subentendido e o pressuposto. [...] o
subentendido é inferido de um contexto singular e sua existência é sempre
72
incerta; já o pressuposto é estável. O primeiro é tirado do enunciado, o
segundo da enunciação (MAINGUENEAU, 1996, p. 92).
O entendimento do pressuposto no caso do desenho animado passará, portanto, pelas
competências do espectador, pelas relações de inferência que ele fará entre os enunciados de
determinado episódio.
Oswald Ducrot (1981, p. 10-11) afirma que “existem, em certos enunciados da
linguagem comum, relações de inferência, tais que se admitimos uns somos obrigados a
admitir os outros”. Essa estrutura narrativa imprime a coerência textual, que “para
progredir, um texto se baseia numa informação colocada que converte depois em pressuposto”
(Maingueneau, 1996, p. 100). O autor explica que, se não fosse dessa maneira, o que teríamos
seriam apenas enunciados.
Pressupostos e subentendidos permitem que os locutores digam sem dizer,
adiantem um conteúdo sem assumir completamente sua responsabilidade.
No caso do pressuposto, existe um recuamento desse conteúdo; no do
subentendido, trata-se de uma espécie de adivinhação colocada ao co-
enunciador (op. cit., p. 105).
A análise do discurso, como já foi mencionado, não se preocupa em entender o que o
discurso diz, qual o seu conteúdo. O que interessa nesse tipo de análise é compreender de que
forma o texto significa, quais são os artifícios, como são feitas as construções enunciativas
para que o sentido seja alcançado. Este trabalho observou de que forma os elementos da
linguagem audiovisual e do comportamento dos personagens colaboram para a apreensão de
sentidos. Neste momento, pretende-se verificar de que modo os enredos estruturados dos
episódios selecionados produzem sentidos e se é possível destacar a presença do discurso
pedagógico.
B
EIJOS DA VOVÓ
Este episódio trata do tema família, e apresenta um conflito vivido pelo personagem
principal, o Bob Esponja. Após ser humilhado em seu ambiente de trabalho por estar com
uma marca do beijo de sua avó na testa, decide junto com Patrick que não irá mais admitir que
sua avó o trate como criança, pois ele “já é um adulto”. Sua aaceita isso muito bem, ao
desviar todo seu carinho e atenção para Patrick (que rapidamente esquece de todas as
“vantagens” de ser adulto). Bob Esponja entra em crise, dividido entre a certeza de que não é
73
mais um bebê e a vontade de receber os carinhos da vovó. No final, em uma crise de choro
decide que não quer ser um adulto e sua avó explica a ele que “não precisa ser um be
para receber o amor da vovó”.
Os trechos abaixo merecem destaque:
“[...] P – Eu lamento o que aconteceu com você, Bob Esponja.
B – Eu também...
P – Você é a pessoa mais adulta que eu conheço!
B – Obrigado, Patrick.
P – Sabe como são as avós, elas adoram bebês, você não pode bancar o bebê perto dela.
B – Você tem razão, Patrick!
P – E alguma vez eu não tive razão, é? Você é um homem agora, Bob Esponja! E já é hora de
agir como o Patrick!
B – Éééé!!! Ô...Mas eu não sei como fazer isso...
P – Permita que eu te mostre. Primeiro, encha o peito. Agora diga: isento de imposto!
B – Isento de imposto!
P – É, agora você tem que adquirir um gosto pelo jazz livre!
Bob esponja, você tá pronto!
P – É isso aí, o que que você vai dizer para sua avó agora?
B – Eu sou adulto!
P – E nada de se ou mas a respeito disso!
B – Um homem tem que fazer o que um homem tem que fazer!
P – E aí você vai atrás dela e eu empurro!
B – Não precisa exagerar!
P – Ah...é mesmo...[...]”
Observa-se que Patrick, de forma diferente da habitual vem desenvolvendo um diálogo
no qual parece inteligente, conhecedor da “maneira de transformar uma pessoa em um adulto”
e que no desenho animado o estereótipo do adulto é o do sujeito sério que trabalha, não recebe
o carinho dos familiares, preocupa-se muito com questões financeiras (“isento de imposto”) e
que deve, necessariamente, possuir um gosto cultural requintado (“você tem que adquirir um
gosto pelo jazz livre”). O ritmo no discurso de Patrick é quebrado pelo enunciado “e você
vai atrás dela e eu empurro!”, que demonstra a exaltação do personagem e marca
74
explicitamente a volta do discurso habitual do personagem, quase sempre desconexo e
absurdo.
O público infantil pode perfeitamente reconhecer-se em uma situação como essa e
realizar operações de inferência, como a de que é natural passar por uma fase de conflitos,
onde são misturados comportamentos de criança com de adulto, mas que o é necessário
abrir mão de alguns comportamentos prazerosos considerados infantis para os outros
percebam que não se é mais um bebê. E sobretudo, que não há “nada de errado em ganhar um
beijo da vovó da gente!”, como afirma Bob Esponja.
E
SPUMA
O episódio Espuma trata do tema doença, no qual Bob Esponja pega “espuma”, que
seria semelhante a um resfriado. Bob Esponja decide ir ao médico, julgando ser a melhor
opção. No entanto, como é de costume, Patrick faz uma idéia assustadora de médicos e passa
a tentar convencer Bob Esponja de que consultórios são lugares horríveis e que não é nunca
uma boa idéia procurar um dico. Patrick então tenta “resolver o problema”, tampando
todos os furos do Bob Esponja para impedir que ele espirre. A tentativa de curar Bob em casa
faz com que ele piore, e Sandy precisa brigar com Patrick para conseguir “arrastar” Bob ao
hospital da Fenda do Bikini. Bob chega no hospital com medo, mas recebe o tratamento na
hora e fica curado, exclamando “eu adoro ir ao médico!”. Recebe um pirulito de presente do
médico e Patrick, que também quer um pirulito, “inventa” que também es doente. Este,
porém, recebe um tratamento diferenciado como castigo por ter impedido Bob de procurar um
médico assim que adoeceu e não ganha o pirulito.
Neste episódio também es representado um receio comum das crianças, ir ao
médico. Através de sua identificação com Bob Esponja, que também teme, mas aceita ir assim
mesmo e atinge um resultado positivo, a criança pode apreender o significado de que não se
deve ter medo de hospitais e tampouco tentar se medicar em casa.
O
S JOGOS DO MESTRE CUCA
Este episódio trata do tema disputa, quando Bob Esponja e Patrick vão competir no
campeonato anual do mestre-cuca. Bob Esponja representará o restaurante Siri Queijo e
Patrick o Balde de lixo, cujo dono é Plankton, inimigo do Siri Queijo. A primeira discussão
75
entre eles é o que motiva a entrada do Patrick na competição. Ela começa quando Patrick
encontra Bob Esponja dentro do “Coliseu Fast-food”, estádio no qual acontecerá o
campeonato. Pode-se observar o quão superficial e tola é a discussão através dos enunciados e
deduzir que, como se trata de um desenho cujo mote principal o é a violência, não
estabelecido um “jeito de brigar” entre os personagens. Eles simplesmente não sabiam como
reagir diante desta situação nova e começaram a tentar atingir o outro, que recebia cada
ofensa como gravíssima:
“[...] B – Qual é, Patrick? Eu estou tentando treinar para os jogos!
P – Jogos? Posso jogar?
B – Desculpe, Patrick, você teria que ser um mestre-cuca.
P – Ser um mestre-cuca é só o que eu preciso fazer e isso vai ser fácil!
B – Como assim, vai ser fácil?
P – Será que é tão difícil assim?
B – Não é qualquer um que é um mestre-cuca, somos um grupo de elite.
P – Ah, qual é Bob Esponja? Você só frita hambúrguer...
B Ei! Fritar não é tão fácil quanto parece! Por que você não vai pra casa, Patrick?
Você pode competir nos jogos de ficar o dia todo embaixo de uma pedra.
P – Pelo menos eu não faço as minhas unhas!
B – Aaaaah! Retire já o que disse!
P – Faz as unhas, faz as unhas!
B – E você nem ao menos tem unhas!
P – Aaaai! Eu não posso acreditar no que estou ouvindo!
B – Como você pode ouvir, você não tem orelhas também!
P – E você tem buracos, buracos!
B – Cabeça de cone!
P – Amarelo!
B – Cor-de-rosa!
P – Aaaah! Eu vou arrumar um emprego como mestre-cuca e vai ser fácil!
B – Ótimo! Siri Cascudo, Siri Cascudo, Siri Cascudo...[...]”
Os dois donos de restaurantes rivais começaram a colocar um amigo contra o outro,
inventando mentiras e fazendo suposições. Assim, os dois que nunca brigaram ficam com
muita raiva um do outro e passam a competir com agressividade. A última prova é uma luta
76
de boxe no pão e, enquanto brigam, iniciam um diálogo agressivo que vai se desenvolvendo
até o momento em que começam a questionar os motivos daquilo, a lembrar o quanto são
amigos e percebem que a situação na qual se envolveram é ridícula. Começam a chorar no
ringue e desistem da luta, saindo abraçados e combinando nunca mais brigar” porque são
“melhores amigos”.
Esse episódio pode servir para mostrar para as crianças, especialmente as mais novas
em virtude do tipo de ofensas que foram levantadas, que é natural em determinados momentos
brigar com um amigo, o desejar a presença dele por perto, sem querer ofender e/ou ser
ofendido. Mas isso não tem que significar o fim de uma amizade verdadeira, desde que os
dois conversem e se esforcem para que haja entendimento. Mostra também que não nada
errado em chorar ou em abraçar um amigo.
C
HOCOLATE COM NOZES
O tema deste episódio é a mentira. Bob Esponja e Patrick recebem por engano uma
revista de “celebridades” que Lula Molusco assina. Observam que essas pessoas são muito
ricas e questionam de onde vem todo o dinheiro delas. Lula afirma que são empreendedores,
pessoas que vendem produtos que outras pessoas precisam. Bob e Patrick decidem que
também se tornarão empreendedores, embora mal compreendam o que isso quer dizer, e
compram muitos chocolates para vender de porta em porta. Já começam sendo enganados por
um experiente vendedor que os convence a comprar muitas bolsas. Ao visitar as casas,
percebem que não estão tendo sucesso e se questionam: “se outras pessoas fazem sucesso
vendendo coisas que não são tão gostosas, por que nós não estamos conseguindo?”. Patrick
então exclama: “Ah, vai ver se não exagerassem a verdade, não venderiam tanto, né?”. Bob
Esponja concorda e ambos passam a inventar uma série de mentiras para seus clientes: que o
chocolate rejuvenesce, faz ficar mais inteligente, faz crescer cabelo... Eles começam a vender
muito.
“[...] B Se continuarmos exagerando a verdade vamos conseguir a vida boa em
pouco tempo!
P – E viva a mentira! [...]”
Conforme as vendas aumentam, a profundidade das mentiras também, até que eles
fingem ter sofrido um acidente para venderem mais, comovendo os clientes. Porém, o cliente
77
da próxima casa é um enganador profissional (o mesmo que vendeu o monte de bolsas a eles e
que acompanhava, de longe, os passos dos dois) e usa a mesma tática contra eles, fingindo
estar muito doente, usando muletas e com o corpo todo enfaixado. Bob e Patrick ficam
comovidos e arrependidos e resolvem ajuda-lo. O enganador diz a eles que também vende
chocolate para pagar a conta do hospital e faz com que usem todo o dinheiro que ganharam
comprando seus chocolates. Assim, eles voltaram à estaca zero, com muitos chocolates para
vender e nenhum dinheiro. O episódio, porém, tem um desfecho feliz, mesmo depois de tudo
que os dois aprontaram: um cliente que estava correndo atrás deles durante o dia inteiro (eles
pensaram que era um ladrão) compra todo o estoque de chocolates.
“[...] B – Muito obrigado pelo seu apoio.
P – Já podemos ter uma vida boa, Bob Esponja.
B – Ainda não, amigo. Primeiro temos que gastar todo o dinheiro.
P – Mas no que que a gente vai gastar, hein? [...]”
A cena é cortada para um restaurante fino, no qual Lula Molusco tenta conseguir uma
mesa:
“[...] L – Ah, boa noite senhor, uma mesa para um, por favor.
Garçom – Lamento, mas o restaurante todo foi alugado para uma festa particular.
L Mas, ia ser a minha única noite chique! Puxa, quem tem condições de alugar o
restaurante todo?
Garçom – Ah, uma dupla de empreendedores ricos e suas companhias [...]”
Corta para a cena que mostra Bob esponja e Patrick sentados a mesa do restaurante
chique com duas das clientes que enganaram:
“[...]B – Bom, e desde quando vocês duas se conhecem?
Cliente idosa – O quê? O que foi que ele disse?”.
Este episódio é um exemplo de significação que dependerá das relações implícitas
para ser compreendido. Não fica claro como eles pretendiam gastar o dinheiro e na última
cena, não são mostrados todos os clientes que foram enganados. se compreende que eles
convidaram todos os clientes enganados quando se realiza a operação de inferência entre o
fato de o restaurante todo ter sido alugado para uma festa particular e a última cena que
mostra Bob e Patrick com duas das clientes enganadas. Ou seja, uma primeira leitura pode ser
a de que eles foram compensados mesmo agindo mal. Além disso, diferentemente do que
acontece em outros desenhos animados ou até mesmo em episódios de “Bob Esponja” (nos
78
quais, por exemplo, Lula Molusco erra), a “redenção” do personagem não é promovida por
terceiros. Bob Esponja e Patrick, sozinhos, decidem proporcionar um jantar chique para todos
com intenção de se desculparem (leitura que pode o ser feita por todos que assistirem ao
episódio). A conduta errada que eles tiveram durante o episódio não é claramente condenada
em nenhum momento, ficando a cargo do espectador estabelecer relações e emitir uma reação
de repúdio ou aceite.
79
C
ONSIDERAÇÕES FINAIS
Recuperando as relações estabelecidas entre os episódios, a análise do discurso e
algumas afirmações a respeito das relações que a criança pode estabelecer com o meio
televisão e sua linguagem, pode-se afirmar que, de fato, o desenho animado Bob Esponja”
apresenta traços de um discurso pedagógico. Isso porque seus conteúdos são envolvidos por
uma estrutura significante que lhes conferem sentido e orientam suas leituras, normalmente
oferecendo modelos de conduta positivos que podem ser apropriados e utilizados no cotidiano
da criança. E isto acontece a despeito de intencionalidade por parte de sua produtora/emissora,
que não tem preocupações educacionais, pretendendo apenas entreter seu público.
Quando este trabalho aborda o “discurso pedagógico”, refere-se a mensagens
transmitidas pelo desenho animado que além de entreter seu público ou seduzi-los, deixa uma
carga de significados, de modelos comportamentais que podem influenciar seu público e se
constituem como parte do leque de experiências com as quais a criança reconhece seu lugar
no mundo e constrói suas imagens de mundo e de si. Os valores e conceitos trabalhados nos
episódios podem ser apropriados e reelaborados pelo público infantil sem dificuldades
principalmente devido à linguagem do desenho. Enredos simples, objetivos e construídos
dentro de uma perspectiva de enunciados inseridos em um contexto sócio-histórico mais
amplo permitem que sejam recuperados, nas falas dos desenhos, elementos interdiscursivos.
O “modo de mostrar” do desenho também demonstrou ser decisivo na construção de sua
verossimilhança, assim, embora “Bob Esponja” esteja em um contexto situacional muito
diferente do público que o assiste, suas características e suas estórias são de compreensão
simples e fazem sentido tanto internamente quando no momento de recepção.
Como se esperava, a compreensão absoluta do audiovisual se no confronto entre as
linguagens, especialmente entre os diálogos estabelecidos e as imagens. Os diálogos desvelam
características dos personagens e junto com as expressões corporais e faciais compõem o
universo significativo dos personagens, que apresentam características bem marcadas com as
quais o público pode se identificar, ao aprovar a conduta ou repudiar, quando não houver
nenhum tipo de identificação. O objetivo do trabalho foi alcançado quando consegue
demonstrar o modo de dizer do desenho, formado por imagens expressivas que respeitam os
elementos da linguagem audiovisual
,
por diálogos que envolvem conseguindo ser, ao mesmo
tempo, simples, interessantes e essencialmente argumentativos.
80
Talvez “Bob Esponjafaça sucesso entre os pais e as crianças porque atende às três
funções básicas do espetáculo que, segundo Ferrés, determinam o fascínio exercido pela
televisão (1996, p. 35). A primeira é a “gratificação sensorial, proveniente de um bombardeio
de estímulos visuais e sonoros. As luzes, as formas e as cores tornam-se gratificações em si
mesmas, como as músicas e os sons”. A segunda seria a “gratificação mental, derivada das
fábulas e das fantasias, que satisfazem uma necessidade básica [...] a pessoa precisa dos mitos
como precisa do ar para respirar” e a terceira (op. cit., p. 36) seria a “gratificação psíquica,
advinda da liberação catártica provocada pelos processos de identificação e projeção, os quais
permitem ao telespectador elaborar seus conflitos internos”. Estes últimos são mecanismos
psicológicos através dos quais o espectador se envolve emocionalmente com o espetáculo,
assumindo o ponto de vista de determinado personagem.
Acredita-se que, de fato, Bob Esponja” seja uma boa escolha para a audiência
infantil, embora tenha se sentido falta de um personagem que o apresentasse problemas de
conduta, um personagem cujas atitudes pudessem efetivamente servir na construção de um
modelo no imaginário infantil, sem que ela tivesse que filtrar o comportamento de todos os
personagens ou se apropriar apenas das características positivas que cada um deles pode ter.
Essa questão é levantada porque se entende que alguns aspectos do comportamento do Bob
Esponja, que é o protagonista, como os fatos de não freqüentar a escola, a obsessão que
apresenta pelo trabalho, sua ingenuidade excessiva que o faz acreditar em tudo e todos ou
ainda a não existência de uma relação familiar constante nos episódios não são elementos que
deveriam ser entendidos pelo público como habituais. Contudo alguns modelos positivos,
como seu otimismo, a amizade sincera que tem com Patrick, a responsabilidade no trabalho, a
postura equilibrada mediante as provocações do Lula Molusco, o cuidado com seu animal de
estimação, o prazer de brincar.
81
R
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Anexo 1
Transcrição dos diálogos do episódio “Beijos da vovó”
B – Bob Esponja
V – Vovó
L – Lula Molusco
C – Cliente do restaurante Siri Cascudo
P – Patrick
B está ela, a casa da vovó, que maravilhas me aguardam hoje? Biscoitos fresquinhos, a
hora da história, um suéter com amor em cada ponto, óóó, pelo quê estou esperando? Vovó,
vovó, vovó!!!
V – Bob Esponja!
B – Oi vovó!
V – Entre e sente-se um pouco.
V – Coma um biscoito, Bob Esponja.
B Vovozinha, você faz os melhores biscoitos do mar azul profundo. Hum...é... Biscoitos da
vovó!
V – Bom, e quem quer lamber a colher?
B – Eu, eu, eu, eu!
V – E aí, nós voltamos para casa de carro com a janela aberta no frio congelante...
B – Me conte outra história de quando eu era um bebezinho, vovó?
B – Oh! Três horas, eu vou me atrasar pro trabalho!
V – Entra no carro e eu te dou uma carona.
B – Obrigado, vovó!
V – Bob Esponja, esqueceu do meu beijinho!
B – Ah! É verdade!
B – Tchau, vovó, obrigado pela carona!
B – Obrigado Lula Molusco!
B – Não é ótimo? Todo mundo está de bom humor hoje!
L – Eu adoro “cortar o seu barato”, Bob Esponja! Eles estão rindo de você e não com você!
B – Eu fiz alguma coisa engraçada?
L – A sua testa!
B – Minha testa é engraçada?
C – Ei, menininho da vovóó, beijinho, beijinho, beijinho...
B – Nããão! Parem com isso! Não tem nada de errado em ganhar um beijo da vovó da gente!
C Ó não, principalmente se você é um bebezão que usa fraldas...e chupa o dedão e deixa eu
ver, e brinca com bonecas e usa pijama do tipo macacão e carrega o cobertor por aí e
também...
Todos – Agora já chega!
L – Não esquenta, Bob esponja, conheço alguém que ainda gosta de você...
B – É mesmo? Conhece Lula Molusco?
L – É, é a sua avó!
Todos – riem
B – Já cheeega!!!
Eu fui humilhado em público pela última vez!
P – Eu lamento o que aconteceu com você, Bob Esponja.
B – Eu também...
P – Você é a pessoa mais adulta que eu conheço!
87
B – Obrigado, Patrick.
P – Sabe como são as avós, elas adoram bebês, você não pode bancar o bebê perto dela.
B – Você tem razão, Patrick!
P – E alguma vez eu não tive razão, é?
Você é um homem agora, Bob Esponja! E já é hora de agir como o Patrick!
B – Éééé!!! Ô...Mas eu não sei como fazer isso...
P – Permita que eu te mostre. Primeiro, encha o peito. Agora diga: isento de imposto!
B – Isento de imposto!
P – É, agora você tem que adquirir um gosto pelo jazz livre!
Bob esponja, você tá pronto!
P – É isso aí, o que que você vai dizer para sua avó agora?
B – Eu sou adulto!
P – E nada de se ou mas a respeito disso!
B – Um homem tem que fazer o que um homem tem que fazer!
P – E aí você vai atrás dela e eu empurro!
B – Não precisa exagerar!
P – Ah...é mesmo...
B – Só precisamos pôr cobertura no bolo da maturidade!
Eu deixei estas belezinhas crescendo há anos!
B e P – Costeletas!!!
V Óh, olá, Bob Esponja! Mas que surpresa mais agradável, venha e um beijinho na
sua vovózinha, anda!
B – Eu lamento vovó, mas esta beijação tem que parar.
P – É isso aí, Bob Esponja! Conta pra ela como é que é. Chega desse negócio de bebê...
B – É, ele tem razão, vovó. Beijos são para bebês, e eu não sou mais, eu já cresci, é a regra da
natureza.
V – Você está absolutamente com toda a razão.
B – Estou? Quer dizer, é claro que eu estou...
V – Definitivamente, você não vai mais ser tratado como um bebê aqui. Nunca mais.
B – Ainda bem que percebe meu propósito, vovó!
V – Ainda bem que está resolvido! Mas o que eu vou fazer com todos estes biscoitos
fresquinhos?
B há, lamento vovó, nós os adultos não tomamos parte do consumo de doces, o é
mesmo, Pa...trick...
P – Pode continuar trazendo, vovó!
B – E aquele papo furado de deixar de ser bebê?
V – Ah, e não se esqueça do chapéu para acompanhar os biscoitos...
V e P – Riem...
B – Ei! É o meu chapéu de comer biscoitos! Ah, quer dizer, era, quando eu era criança.
V – Ei, olha quem está aqui, é o meu querido neto já adulto!
B – Ouça vovó, eu preciso ter uma conversinha bem madura com o senhor Patrick!
O que esfazendo? Biscoitos? Leite quente? O babador de “eu amo a vovó” e uma marca de
beijo na sua testa! Nós temos que ser adultos!
V – Ah...não é pra ficar discutindo com a barriga cheia!
P – Ri...
V – Quem é bebê?
P – Eu sou bebê, eu sou bebê...
B – Ar, ar...
P – Ser adulto é uma chatice! Eu adoro ser bebê, e além do mais, eu me livro do jazz...
88
B Ô...Pobre Patrick...Eu sinto tanta pena de você. Preso na desajeitada fase dos dias de
fraldas, para nunca conhecer as ricas recompensas de ser um adulto maduro.
V – Aqui está, mais uma fornada de biscoitos...
P – Beleza!
Recompensas, não é?
B – Vejamos: uma das coisas é o jazz...
P – Ô vovó, eu tô legal!
V – Mais biscoito!
B – Acho que está na hora do meu lanche. E os adultos têm que comer também, acho que isso
deve servir...
V Sinto muito, Bob Esponja. Você o vai querer comida de bebê, que tal um belo pedaço
de coral cozido?
B – Bom...é...ótimo...nutritivo...
V – Hora da história!
P – Que legal! Hora da história, hora da história, hora da história!
B - Hora da história...
V – Você vai adorar, Patrick. É uma história maravilhosa sobre um duende mágico do mar.
Bob Esponja, você não está interessado neste livro de historinhas. Aqui está o manual técnico
de manutenção rotineira.
B – É... ótimo...fascinante...sem gravuras, do jeitinho que eu gosto.
P – Au, au, meu pobre dedinho...
V – Calma, calma...melhorou?
P – Melhorou, mas esse outro dedinho tá doendo também...
V – E que tal eu dar um presente pra você?
P – Que legal! Tomara que seja biscoito!
Legal! É um chapéu.
B – Ahh??
V – Não Patrick, é um suéter. E com muito amor em cada ponto!
B – Nãããão!
E eu? Não ganho presente vovó?
V – Ô...eu quase me esqueci! Aqui tem material de escritório. Eu nem embrulhei, você não se
importa não é?
Óó. Três horas. Hora dos adultos irem trabalhar. Até logo, Bob Esponja!
E aposto que você está pronto para uma soneca, não é, Patrick?
Você ainda está aí, Bob Esponja?
B – É...eu não preciso ir ainda, eu posso chegar atrasado.
V – Não não não. Não seria o comportamento certo de um adulto.
B Tudo bem, eu acho que eu vou agora, eu tenho um monte de negócios de adulto para
cuidar...eu já vou indo.
V – Certo, e obrigado por passar aqui, Bob Esponja.
B – É, é isso aí, lá vou eu...
V– Volte outra vez, se tiver tempo.
B – Agora para o mundo frio dos adultos. Sozinho, sem suéter...
V – Nana nenê...
B – Eu não sei quando eu vou voltar, hein?
V – Eu sei como você é ocupado.
B – Então é isso aí...
V – Xxx...ele já dormiu...
B – Tchauuu....
89
Eu o quero ser adulto! Eu quero biscoitos! E leite! Eu quero usar um suéter com amor em
cada ponto! Eu quero usar fraldas! Eu quero andar no meu carinho! Eu quero poder abraçar
meu ursinho de pelúcia! E eu quero balançar no meu cavalo marinho! Eu quero chamado de
chuchu...
V – Fica calmo aí, Bob Esponja! Bob Esponja, Bob Esponja...
Você não precisa ser um bebê para ganhar o amor da velha vovozinha...
B – Não preciso?
V – Claro que não! o importa o quanto você fique adulto, você vai ser sempre o bebezinho
da vovó. E lembre-se, você pode ganhar um beijo da sua avó e continuar um adulto.
B – Ah, obrigado, vovó...
Vovó, pode não dizer nada disso pro pessoal lá do Siri Cascudo?
V – Sem problema.
Todos olhando pela janela riem.
90
Anexo 2
Transcrição dos diálogos do episódio “Chocolate com nozes”
B – Bob Esponja
P – Patrick
L – Lula Molusco
C – Clientes
B – Oi, carteiro! Falou, até amanhãã!!!
P – Ó, o correio chegou! O que que veio, hein?
B – Vejamos...Gary, Gary, Gary, Gary, Gary, Gary, Gary, ei, uma revista! Engraçado, eu não
me lembro de fazer assinatura da revista “Boa vida”.
P e B – Uau!!!!
B – Olha só estas descrições incríveis de gente de vida melhor, olha esse cara tão rico que tem
uma piscina dentro da piscina!
P – Olha, esse cara tem sapato!
L Me isto aqui! Roubando meu correio, hein? Sorte de vocês não denunciá-los para as
autoridades!
B – Lula Molusco, como as pessoas dessa revista ganham todo esse dinheiro?
L – São empreendedores, vendem coisas para as pessoas!
B – Que tipo de coisa?
L – Eu sei lá! Coisas que as pessoas têm que comprar! E tirem as patas do meu correio!
B – É isso aí, Patrick! Nós temos que virar empreendedores!
P – E isso aí vai doer?
B Vamos, Patrick, pensa rápido: Se você pudesse ter o que quisesse agora mesmo, o que
seria?
P – Ai...Mais tempo pra pensar.
B – Não, uma coisa de verdade, um artigo, uma coisa que é preciso pagar.
P – Uma barra de chocolate?
B – É uma grande idéia, Patrick! Vamos ser vendedores ambulantes de chocolate!
Vida boa, aí vamos nós!
P – Abram alas para uma dupla de empreendedores!
B Certo, Patrick, é isso aí. O primeiro passo para nossa pretensão de viver bem, então faça
como eu.
Boa tarde senhor! Por acaso não está interessado em chocolates?
C1 – Chocolate, você disse chocolate?
P – Sim senhor, com ou sem nozes?
C1 – Chocolate, chocolate, chocolate, chocolate, chocoolaaaate!!!!
B Ah, o primeiro cara não conta, agora vamos dar o primeiro passo. Bom dia, senhor, você
gostaria de comprar chocolate?
C2 – Tabletes de chocolate?
B – Sim, senhor! Somos vendedores de chocolate.
C2 Ah, uma dupla de vendedores medíocres se querem saber. Isto o é jeito de levar a
mercadoria. Não, não, não, errado! Vocês querem ser bons vendedores, não querem?
B e P – Ah, com toda certeza, senhor!
C2 – Bom, nenhum vendedor de chocolate de respeito pode ser visto por aí sem uma dessas.
B – Legal! O que é isso?
C2 É uma bolsa para doces, seus patetas. Especialmente projetada para acomodar cada doce
num forro de veludo confortável. Mas...estou perdendo meu tempo, não precisam disso.
B e P – Precisamos, precisamos!
91
C2 – Até logo, rapazes! Boa caçada! Há, há, há.
B e P – Vida boa, aí vamos nós, lá, lá, lá!
B – Vamos tentar nesta casa.
C2 – Sim?
B – Ããh? Escuta, você não é o mesmo cara que nos vendeu estas bolsas para doces?
C2 Eu não estou lembrado. Mas está me parecendo que vocês dois têm muitas bolsas aí. Os
dois são bons demais pra ficarem sem minhas bolsas patenteadas vermelhas e bonitas.
P – Vamos querer vinte.
C3 – O que posso fazer por vocês, dois belos jovens?
B – Vendemos tabletes de chocolates. A senhora quer comprar um?
C3 – Parece coisa divina! Vou ficar com um.
B – Um tablete de chocolate saindo!
Hehehe...Ããh? Ai... Hehehe...Ããh? Hehehe...Ããh? Eu sei, eu sei que está aqui em algum
lugar!
C3 – Não tenho tempo pra isso!
B – Achei! Um tablete de chocolate pra bela senhora!
C1 – Chocolate! Chocolate! Chocolate! Chocolate!
B – Não estamos indo muito bem, Patrick. Precisamos de um novo método! Uma tática nova!
P – Eu já sei! Vamos ficar pelados!
B Não, vamos deixar isso pra vender imóveis...Deve haver alguma coisa. Por qual motivo
compramos aquelas bolsas?
P – Ele disse que éramos medíocres.
B – É isso! Fez a gente se sentir especial!
P – É verdade...Eu vou voltar e comprar mais bolsas!
B – Não, espera Patrick!Por que não tentamos ser legais?
P – Ah...tá bom.
B – Lembre-se, Patrick, elogie os fregueses, faça eles se sentirem bem.
C4 – Olá!
P – Eu amo você.
B – Eu acho que você exagerou um pouquinho, amigão. Deixa eu tentar.
C5 – Por favor, vão embora.
B – É...como é que vai?
C5 – Como é que vou?
B – Quer comprar chocolates?
P – Agora ganhamos ele!
C5 – Desculpe, chocolate tem açúcar e açúcar vira gordura. Não está certo, garoto bolhudo?
P – Faz cosquinhas...
C5 Como podem ver, eu e o chocolate não nos damos mais. Pode ficar com isso por cinco
pratas.
P – Eu quero dez.
B Não vendemos um tablete de chocolate sequer. Eu acho que nós nos distraímos
facilmente. Vamos fazer um pacto de nos concentrarmos em vender na próxima casa, Patrick?
P – Ããã?
B – Vamos selar o pacto.
P – Disse alguma coisa?
B – Não se esqueça, Patrick: concentração.
C6 – Que é?
B – Boa tarde, senhor, vendemos tabletes de chocolate.
C6 – Por que o gorducho aí ta me encarando?
P – Eu tô concentrado.
92
C6 – Que hora você vai sair, cara?
P – Bela casa você tem, hein?
B – Não entendo o que estamos fazendo de errado.
P – É, e eu não consigo entender mais nada.
B – Deve haver alguma coisa nesse jogo de vendas que não estamos captando. Outras pessoas
fazem isso, olha só aquilo, Patrick!
P – Coma mexilhões fritos, são uma delícia.
B – Com toda certeza, não são uma delícia.
P – Não do jeito que eu uso eles.
B – Mesmo assim, vendem milhões por dia!
P – Ah, vai ver se não exagerassem a verdade, não venderiam tanto, né?
B – É isso aí, Patrick! Temos que exagerar a verdade!
C1 – Chocolate!!!!
B – Vamos trabalhar em equipe. Primeiro eu vou esquentando o freguês, e aí você aparece pra
matar.
P – Pra matar.
C7 – Siiim?
B – Olá, como vai jovem senhora? Estamos vendendo chocolate. Sua mãe está em casa?
C7 – Mãe!
C8 O quê, o quê? Pra quê toda essa gritaria? Você não a hora de eu morrer, não é
mesmo?
C7 – Eles estão vendendo chocolate.
C8 – Chocolate?
C7 – Ééé!
C8 – O que eles tão vendendo?
C7 – Chocolate.
C8 – O quê?
C7 – Chocolate!
C8 – Não estou te ouvindo!
C7 – Estão vendendo chocolaaaate!
C8 – Estão vendendo chocolate?
C7– Éééé!!!!
C8 Chocolate, eu me lembro quando inventaram o chocolate. O bom e velho chocolate. Eu
nunca gostei!
B – Bom, mas esse chocolate não é pra comer! Ele é pra...
P – Você esfrega na pele e com isso você vai viver pra sempre!
C7 – Não, não, não...
C8 – Você disse pra viver pra sempre? Vou ficar com um!
Vamos mulher preguiçosa, começa a me esfregar com o chocolate!
C7 – Eu odeio vocês!
B – Se continuarmos exagerando a verdade vamos conseguir a vida boa em pouco tempo!
P – E viva a mentira!
B – Faz o cabelo crescer!
C9 – Ótimo, a minha mulher quer ter barba.
B – Vai te deixar inteligente.
C10 – Eu vou ficar com vinte!
P – O chocolate não vai deixar você ficar mais feio!
C11 – Na hora certa!
B – Vão te fazer voar!
P – Você vai se apaixonar!
93
B – Vão trazer paz ao mundo!
P - Vai atravessar paredes!
B – Você vai dominar o mundo!
P – Vamô fazer ainda melhor.
B – É...esse cara vai sentir tanta pena de nós que vai comprar todo o chocolate!
C2 – O que posso fazer por vocês, rapazes?
B – Olá, senhor, gostaria de comprar chocolate? Precisamos de cirurgia.
C2 – Ó...que mundo pequeno. Qual o problema com vocês dois?
B – Estamos com ferimento na cabeça e hemorragia eterna.
C2 Ó...algumas pessoas têm sorte. Eu nasci com ossos de vidro e pele de papel. Todas as
manhãs eu quebro as pernas e toda tarde eu quebro os braços. A noite eu não durmo de dor até
que um ataque do coração me faz dormir. Ou não...Ai...
B – Depressa, vamos ajuda-lo! Com cuidado, põe ele no chão com carinho.
C2 – Au...
B – Ai, coitadinho. Tem alguma coisa, qualquer coisa, que possamos fazer pra ajudar?
C2 Tem uma coisa sim. Como podem imaginar minhas contas médicas são extremamente
altas. Mas por sorte eu consigo me manter vendendo tabletes de chocolate.
Que rapazes bonzinhos. Faz bem para o meu coração enganar uma dupla estúpida de idiotas e
imbecis como aqueles dois, há, há, há.
B – Não me entenda mal, Patrick. Foi muito bom ajudar aquele cara mas não sobrou ninguém
mais na cidade para comprar chocolate. Encaremos os fatos, Patrick: somos fracassados.
P – Eu posso conviver com isso.
B – Vamos mudar nossos nomes pra “quem” e “liga”.
C1 – Chocolate!
B e P – Ó não, por favor, tenha piedade, não, não!
C1 – Há, há, há, finalmente. Eu procurei vocês o dia inteiro, e agora que eu tenho vocês aonde
quero eu...quero comprar todo o seu chocolate.
B – Muito obrigado pelo seu apoio.
P – Já podemos ter uma vida boa, Bob Esponja.
B – Ainda não, amigo. Primeiro temos que gastar todo o dinheiro.
P – Mas no que que a gente vai gastar, hein?
L – Ah, boa noite senhor, uma mesa para um, por favor.
Garçom – Lamento, mas o restaurante todo foi alugado para uma festa particular.
L – Mas, ia ser a minha única noite chique! Puxa, quem tem condições de alugar o restaurante
todo?
Garçom – Ah, uma dupla de empreendedores ricos e suas companhias.
B – Bom, e desde quando vocês duas se conhecem?
C8 – O quê? O que foi que ele disse?
94
Anexo 3
Transcrição dos diálogos do episódio “Espuma”
B – Bob Esponja
G – Gary
S – Siri Queijo
S2 – Sandy
P – Patrick
M – Médico
B – Roncando. Ah! Está chovendo hambúrguer de siri. Êêêêê!
Um lanchinho a meia noite e de volta pra cama!
G – Miau.
B – Durma bem, meu anjinho.
Ah! Aqui está! Nada como creme de amêndoas do mar e sanduíche de água-viva para ajudar a
dormir. Nhoc!
B – Ahaha. A geladeira! Ai...Uh...
Oh, Gary, eu não me sinto como sempre.
G – Miau.
B – Não seja bobo Gary. Eu não pego resfriado, eu pego espuma.
G – Miau.
B – Não, Gary, se eu tivesse com espuma sairiam bolhas de mim! Atchim!
G – Miau!
B – Eu não posso pegar espuma, senão aí eu vou ter que faltar ao trabalho!
Atchim!
G – Miau!
B – Não, Gary! Eu gosto de usar a cueca deste jeito!
G – Miau!
B – Eu não tô doente, eu vou trabalhar!
Off: O Siri Cascudo.
B – Atchim!
S – Bob Esponja, porque o hambúrguer está demorando?
B – Já vai, senhor.
S – Bob Esponja, o que você tem, está mais pálido que um cavalo marinho.
G – Miau!
S - Ãh? Espuma?
B – Aqui está o hambúrguer que queria, seu Siri Queijo.
Atchim!
S – Tudo bem, Bob Esponja, está doente pra trabalhar.
B – Não, seu Siri Queijo, eu estou bem, é sério.
S Agora vai pra casa e descanse um pouco. Não é nada pessoal rapaz, mas não quero você
espirrando na minha comida.
Clientes – Ah, blerc...
S – Não, esperem, esperem!
B – Oh, Gary! Eu me sinto mal, atchim!
Quem eu estou querendo enganar, Gary, eu estou com espuma sem nenhuma dúvida!
Atchim!
É melhor eu me tratar antes que fique fora de controle.
S2 – Alôô!
B – Sandy, tô doente. Pode me acompanhar até o médico?
95
S2 Oh, claro, Bob Esponja, eu vou chegar mais rápido do que um coelho descalço numa
pista de sabão quente no meio de agosto.
B – Tá legal, Sandy, obrigado! Atchum!
B – Tô indo!
P – Oi, Bob Esponja! Você vai esquiar?
B – Eu tô doente, Patrick, vou pro médico!
P – O quê? Você não pode ir!
B – Por que não, Patrick?
P Eu conheço o cara que conhece o cara que foi pro médico uma vez. O consultório do
médico é horrível, um lugar horrível.
B – Não pode ser tão horrível quanto a espuma! Atchum!
P – Ah, é sim, Bob Esponja! Primeiro eles fazem você sentar na sala de espera.
B – Essa é a parte horrível, Patrick?
P – Não fica pior, eles fazem você ler revistas velhas!
B – Ai!
P – Aí, o médico vai logo puxando o estetoscópio!
B – Nããão!
P – Sim!
É um aparelho tão sinistro, tão gelado que quando ele toca na sua pele indefesa ele...
B – Ahhhhh!
B Não, o, não, nada de estetoscópio, nada de médico, nada de revistas velhas, nada de
pssiii. Não, não, não!
Patrick, eu não quero ir pro médico!
P – Exatamente!
B – Atchim!
Você tem que me ajudar a melhorar, Patrick, por favor.
Você gostaria de ser o meu médico, Patrick?
P – Claro, pra que servem os amigos?
B – Atchim, atchum!
P – Parece que nós vamos ter que tapar todos estes buracos. Isso deve resolver o caso.
Oh...e aí?
B – Ahhhh!
P – Tá melhor?
B – Eu não sei!
Atchim, atchim, atchim!
P – Socorro, eu tô encolhendo! Não, por favor, não me machuque!
B – As bolhas, Patrick, o seu tratamento está funcionando!
P – Você acha?
B Claro, se continuar assim logo, logo eu estou curado! Eu vou até ligar pra Sandy e falar
pra ela não vir!
Obrigado, doutor Patrick!
P – É, e diziam que eu nunca ia conseguir ser alguém na vida!
B – Meus dedos estão grandes demais pras teclas.
Doutor Patrick, pode ligar pra Sandy pra mim.
P – Claro, paciente Bob Esponja.
Alô, Sandy?
S2 – E aí, Patrick.
P – Eu estou ligando em nome do meu paciente, o Bob Esponja.
S2 – Ah, eu estou a caminho para levar ele ao hospital.
96
P – Mas isso não é mais necessário, Sandy. A partir de hoje eu cuido ele.
S2 Bom eu vou dar uma olhada. Eu vou chegar mais rápido que o coelho descalço
numa pista...
P – Eu sei!!!Eu sei!!!! O coelho!!!! Não se preocupe, Sandy.
Bob Esponja rápido, a Sandy vindo aí. Você precisa parecer bem ou ela vai levar você pro
médico!
Não me toque, estou esterilizado!
O pé, por favor!
Sente-se melhor?
B – Nã, nã.
P – Ainda não se sente melhor?
B – Ainda não.
P – E que tal agora?
B – Eu acho
que não!
P – Sente-se melhor?
B – Não.
Ah!
P – E que tal agora?
B – Não.Ai, ai, ai.
P – E que tal agora?
B – Nã, nã. Ai! Ai!
S2 – Ai, é a Sandy!
B – Atchu!
P – Não tem ninguém em casa!
S2 – Patrick, abre essa porta. Ai, Patrick, às vezes eu não consigo entender você!
B – Atchim!
S2 – Ah! Muito bem, Patrick, onde está o Bob Esponja?
P – Ele não está no momento, favor deixar sua mensagem após o bip. Biiip.
S2 – Tudo bem, me explica uma coisa: desde quando tem duas casas?
P – Desde que eu preciso de espaço pra guardar as minhas coisas.
S2 – E desde quando sua casa tem pés?
P – Ah, esta é a minha casa móvel.
B – Atchim!
Oi, tudo bem, Sandy.
P – É, a minha terapia parece estar funcionando muito bem.
S2 – Patrick, o Bob Esponja precisa de um médico de verdade.
P – Não! Nada disso, eu estou cuidando dele! Mostra pra ela, Bob Esponja, fale: Ah!
B – Ahhh...
S2 – Viu, ele está pior do que eu pensava!
P – Você está enganada, ele está bem!
B – Eu estou bem, Sandy, é verdade. Atchim, atchim!
S2 – Eu vou te levar pro médico agora mesmo!
P – Ei, ele é o meu paciente!
Você não pode levar ele pro médico!
S2 – Não seja ridículo Patrick!
P – Ele é meu!
S2 – Bob Esponja, você vai ficar bom!
P – Eu vou te salvar!
97
B – Eu já to melhor! Pe-pe-pessoal, é mesmo!
S2 – Olha só o que você fez, Patrick!
P – O que eu fiz? Tudo tava indo bem até você aparecer!
S2 – E você devia ser preso por se passar por médico, ouviu!
P – Eu sou um bom médico, não é, Bob Esponja? Bob Esponja?
B – Eiiiii! Eu não consigo paraaaaar! Socorrro!
S – Patas brilhantes (...)
B – Seu Siri Queijoooo...Ah, ah!
S – (...) Bob Esponja...Pára, Bob Esponja, Pára!
B – A....A....Atchu!!!!!
Hospital – Emergência.
M Bem, senhor Calça Quadrada, parece que pegou a espuma. Está pronto para o
tratamento?
B – Você não vai me fazer ler revistas velhas, vai?
M – Não, seu bobo. Nós vamos tratar de você.
Ô, Hanz!
B – Faz cócegas! Uhu! Posso cheirar de novo! Ê! Uhu!
Estou me sentindo novo em folha, eu adoro ir ao médico!
M – Toma o seu pirulito!
P – Ah, um pirulito!
Ei, doutor, eu também tenho espuuuma!
M – Ó, sei, doutor Patrick! Temos um tratamento especial para você!
P – Ei espera, ai, isso machuca, machuca, ei, isso não ta certooo!
98
Anexo 4
Transcrição dos diálogos do episódio “Os jogos do mestre-cuca”
N – Narrador
B – Bob Esponja
S – Siri Queijo
P – Patrick
Pl – Plâncton
N – Bem vindos, s do esporte, para a vigésima primeira edição dos jogos do mestre-cuca da
Fenda do Bikini!
Eu declaro oficialmente abertos os jogos do mestre-cuca!
Por favor, aguardem.
Eu declaro oficialmente abertos os jogos do mestre-cuca!
E aqui começa a vigésima primeira edição dos jogos do mestre-cuca. Eu sou uma cabeça de
peixe de verdade e está fazendo um belo dia aqui no “Coliseu Fast-food” da Fenda do Bikini.
Eles vêm de todas as partes. A chapa com hambúrguer fritando. Lâmpadas para aquecer, tudo
isso mantém o espírito do fast-food quente e parado. Mas a verdadeira história é a rivalidade
ferrenha entre antigos competidores, seu Siri Queijo do Siri Cascudo e o Plâncton, do Balde
de Lixo. Quem consegue esquecer o ano em que o seu Siri Queijo ganhou o ouro pelo
levantamento de quinhentos quilos de picles? o o Plâncton. Ou quando o Plâncton ganhou
o coração de milhões ao fazer esta apresentação perfeita nas argolas de cebola com uma
antena quebrada? Seu Siri Queijo não se deu por vencido. E agora a última notícia é que neste
ano o Siri Cascudo será representado por um novo competidor e eu imagino que este pode ser
o maior dia para este jovem.
B – Esse pode ser o maior dia da minha juventude, seu Siri Queijo! Eu não acredito que estou
representando o Siri Cascudo nos jogos do mestre-cuca! Levar o ouro pra casa é levar honra e
glória para o Siri Cascudo!
S – E toda essa propaganda grátis vai atrair os fregueses, então não perca!
B – ‘Xá comigo, seu Siri Queijo! Siri Cascudo, Siri Cascudo, Siri Cascudo...
P – Olá, Bob Esponja!
B – Olá Patrick! Siri Cascudo, Siri Cascudo, Siri Cascudo...
P Você tentando empurrar o chão? Nunca vai conseguir desse jeito, você tem que entrar
em baixo dele!
B – Qual é, Patrick? Eu estou tentando treinar para os jogos!
P – Jogos? Posso jogar?
B – Desculpe, Patrick, você teria que ser um mestre-cuca.
P – Ser um mestre-cuca é só o que eu preciso fazer e isso vai ser fácil!
B – Como assim, vai ser fácil?
P – Será que é tão difícil assim?
B – Não é qualquer um que é um mestre-cuca, somos um grupo de elite.
P – Ah, qual é Bob Esponja? Você só frita hambúrguer...
B Ei! Fritar não é tão fácil quanto parece! Por que você não vai pra casa, Patrick? Você
pode competir nos jogos de ficar o dia todo embaixo de uma pedra.
P – Pelo menos eu não faço as minhas unhas!
B – Aaaaah! Retire já o que disse!
P – Faz as unhas, faz as unhas!
B – E você nem ao menos tem unhas!
P – Aaaai! Eu não posso acreditar no que estou ouvindo!
B – Como você pode ouvir, você não tem orelhas também!
99
P – E você tem buracos, buracos!
B – Cabeça de cone!
P – Amarelo!
B – Cor-de-rosa!
P – Aaaah! Eu vou arrumar um emprego como mestre-cuca e vai ser fácil!
B – Ótimo! Siri Cascudo, Siri Cascudo, Siri Cascudo...
S – Que cheiro estranho é esse no ar? Eu estou cheirando a Plâncton.
Pl – A é, é? Eu estou cheirando a fábrica... Ele está certo!
Pl – Eu adoro aprontar uma confusão.
Está pronto para agir ou morrer?
S – Sempre pronto, Plâncton! Sempre pronto!
Pl – Ótimo, porque hoje o balde de lixo vai chutar a sua... Trapaça!
S- Isso é o que você pensa. Eu tenho um campeão. Bob esponja, mostra pra ele!
B – Ua.......
S – Olha ele aí, em pleno vigor! Você não tem nenhuma chance!
Pl – É onde você se engana, Siri Queijo! Porque eu também tenho um campeão!
Senhoras e senhores! Prestem atenção no corredor do sudoeste! Do outro lado, imbecis! E
pára, perfeito, representando o Balde de Lixo uma criatura tão terrível, tão terrível, tão
impressionantemente grande que alguns de vocês de constituição mais fraca podem querer
deixar o estádio.
N – Eu tenho que sair daqui!
Pl – Tarde demais, prontos ou não, lá vem ele! Tremam de medo seus idiotas mortais!
Curvem-se perante o poder impressionante desse cara enorme! Que está carregando o
verdadeiro competidor, Patrick Estrela!
B – O quê? Patrick, o que está fazendo aqui? Você nem é mestre-cuca!
P Ah, sim, sou sim, sr. “Bob Esponja Calça Superior” uma olhada, eu estou trabalhando
para o Balde de Lixo há quase cinco minutos!
B – Bom, isso também não importa, porque você vai comer minha poeira!
P – Ahhh, vou comer minha própria poeira!
B – Não se eu comer primeiro!
P – Amarelo!
B – Rosa!
Não acredito, seu Siri Queijo. Eu pensei que o Patrick fosse o meu amigo!
S – Amigo? Não, aquele não é!
B – Mas como assim?
Pl - Ele não é seu amigo de verdade.
P – Ele não é?
Pl - Ele está planejando a sua derrota agora mesmo!
B – Está?
S – Ele vai te esfaquear pelas costas!
P – Não pode ser!
Pl – É claro que pode, olha só pra ele, ele é quadrado! Esse é o formato do mal!
S – Ele está ridicularizando sua profissão! Você vai deixar que um fingido tire o que pertence
ao Siri Cascudo?
B – Nãããão!
Pl – Então fique furioso!
P – Tô furioso!
S – Fique bravo!
B – Estou bravo!
Pl – Pode ir lá agora...
100
S – e ganhe...
Pl – aquela...
S – medalha!
N – Nossa primeira prova, o salto com vara sobre fritura!
S – Ganhe essa pelo Siri Cascudo!
B – Pelo Siri Cascudooooooo!
Pl – Ganhe esta porque eu te pedi!
P – Porque você me pediiiiuuu!
N – A próxima prova: o mergulho no chocolate!
B – Deixe isso pro verdadeiro mestre-cuca.
N Neste mergulho, Bob Esponja vai tentar o de banana caramelada completa com duas
varas!
E agora, silêncio completo!
B – Eu grito pelo sorvete de palitoooooo!
N – Entrada perfeita, e amêndoas crocantes, e o inesperado, ele espetou! Olha só, que camada
perfeita!
B – Faça melhor, rosinha!
Pl Amêndoas? Grande coisa, isso é bom, mas é sofisticado demais para esse povo. Ele acha
que é melhor que todos?
P – Iéééé!
Pl - Melhor do que você!
P – Iéééé!
Pl - Agora vai lá e mostra pra ele como um homem comum prepara o verdadeiro sorvete!
P – Ééééééé!
N – Patrick vai ressuscitar a favorita, a casquinha de morango com uma só bola e cobertura de
chocolate. Vejam quanta concentração. Ó, perdeu um ponto na entrada, mas olha o
formato!
P – Viu só, ô garoto amarelo?
B – Ria enquanto pode, rosinha! Ainda não acabou!
P – É o que você pensa, porque ainda não acabou!
N Ainda não acabou, com os dois empatados vamos agora para a prova final: a luta no pão.
Quem vai levar o ouro para casa? Seu Siri Queijo do Siri Cascudo...
S – Não se esqueça, ele te chamou de amarelo!
N – Ou o Plâncton, do Balde de Lixo?
Pl – Não esqueça que ele te chamou de rosinha!
Ambos gritam enquanto lutam.
P – Esqueça o Balde de Lixo, isto é pessoal!
P – Aaaaaai! Meu nome não é Rick!!!!!!
B – Eu não gosto de você!
P – Eu não gosto mais de você!
B – Eu nunca gostei de você!
P – Mil vezes eu nunca gostei de você!
B – Rosa!
P – Amarelo!
B – Aaaah! Amarelo!
P – Aaaah! Rosa?
P e B – Você liga siiiiim...
Choram
B – Vamos prometer que nunca mais lutaremos, amigo!
P – É amigão, vamos pra casa!
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Platéia vaia.
S – Ei, aonde vão?
Pl – Voltem aqui e matem um ao outro!
P – Você é o meu melhor amigo, Bob Esponja!
B – Você também, Patrick!
P – Olha, isso aqui era branco quando eu comprei...
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