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Segundo Candido
10
, os demais escritores contemporâneos, ao invés de
aprofundarem-se nas discordâncias estimulantes à atividade literária, optaram por traços
limitadores de que padeciam como o desequilíbrio verbal verificável no penúltimo e a
ironia superficial do último. Deste modo, os escritores como Lima Barreto e Euclides da
Cunha permanecem vozes isoladas neste período literário Pré-modernista.
Bosi esclarece que o Pré-Modernismo deu-se no âmbito da capacidade de
penetrar fundo na realidade brasileira, assim como o fizeram os escritores comentados
há pouco, na medida em que estes autores problematizaram de alguma forma nossa
realidade social e cultural. Antecipando as tensões existentes no cenário nacional e que
se efetivariam a partir do Modernismo, com o rompimento na linguagem e no conteúdo,
coroando a precedência temática e formal exercida por tais escritores em relação à
literatura modernista, considera-se pré-modernista toda manifestação que “enquanto
crítica ao Brasil arcaico, negação de todo academismo e ruptura com a Velha República,
desenvolve a problemática daqueles como o fará, ainda mais exemplarmente, a
literatura dos anos 30”
11
, cabendo aos demais escritores do período o prefixo “pré”
estritamente na acepção temporal de anterioridade.
É justamente à produção literária dos anos 30 que pretendemos chegar, pois é
neste momento que surge em livro o romance S. Bernardo, do escritor Graciliano
Ramos, de apurada elaboração estética e ideológica
12
.
10
Cf. CANDIDO, op. cit. , p. 123.
11
BOSI, Alfredo. História Concisa da Literatura Brasileira. 3ª ed. São Paulo: Cultrix, 1969. p. 346.
12
Para Karl Marx, ideologia corresponde à distorção do pensamento, que, surgido em meio às
contradições sociais, oculta as incoerências da realidade material que são os verdadeiros problemas da
humanidade, tornando-se uma projeção que atenda aos interesses da classe dominante, portanto, a
universalização da particularidade na medida em que se processa a assimilação por parte das demais
classes sociais dos valores da classe dominante, valores estes que ocultam as relações contraditórias e
invertidas da uma determinada realidade. Dessa forma, o conceito de ideologia adquire uma conotação
negativa e restrita respectivamente por ser uma representação errônea das contradições sociais reais e por
não abranger todos os tipos de erros e distorções. As distorções ideológicas, sejam elas provenientes de
relações entre idéias ideológicas ou não, só podem desaparecer se forem resolvidas na prática as
contradições que lhe deram origem. Cf. MARX, Karl. A ideologia alemã. São Paulo: Hucitec, 1986.
Em O Capital, Marx considera o mercado a fonte da ideologia política burguesa; esta burguesia em suas
relações de troca apregoa a igualdade e liberdade, todavia essa ideologia burguesa oculta a desigualdade e
a falta de liberdade proveniente das relações superficiais de troca no mercado e da concorrência nas
sociedades capitalistas. Sobre os desdobramentos do conceito de ideologia dentro dos estudos marxistas
e na obra de Marx cf. BOTTOMORE, Tom (org). Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro:
Jorge Zahar, 1988. p.183 - 187.
S. Bernardo é um romance de contornos ideológicos marcados precisamente na concepção de se
difundirem valores que turvam as contradições sociais, valores expressos no e pelo personagem Paulo
Honório. Ao elaborar S. Bernardo, difundindo os valores burgueses do narrador-personagem Paulo
Honório, Graciliano Ramos, todavia, revela as contradições da ideologia burguesa, ao expor, por
exemplo, as relações reificadas estabelecidas pelo proprietário da fazenda S. Bernardo, não sendo ele
mesmo, Graciliano Ramos, um difusor da ideologia burguesa, diferentemente do protagonista Paulo
Honório. Paulo Honório, em meio a sua ascensão, admite as contradições sociais como naturais e