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De Decasségui a Emigrante
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MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES
Ministro de Estado Embaixador Celso Amorim
Secretário-Geral Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães
FUNDAÇÃO ALEXANDRE DE GUSMÃO
Presidente Embaixador Jeronimo Moscardo
INSTITUTO RIO BRANCO (IRBr)
Diretor Embaixador Fernando Guimarães Reis
A Fundação Alexandre de Gusmão, instituída em 1971, é uma fundação pública vinculada ao Ministério
das Relações Exteriores e tem a finalidade de levar à sociedade civil informações sobre a realidade
internacional e sobre aspectos da pauta diplomática brasileira. Sua missão é promover a sensibilização
da opinião pública nacional para os temas de relações internacionais e para a política externa brasileira.
Ministério das Relações Exteriores
Esplanada dos Ministérios, Bloco H
Anexo II, Térreo, Sala 1
70170-900 Brasília, DF
Telefones: (61) 3411 6033/6034/6847
Fax: (61) 3411 9125
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Brasília, 2007
De Decasségui a Emigrante
João Pedro Corrêa Costa
Direitos de publicação reservados à
Fundação Alexandre de Gusmão
Ministério das Relações Exteriores
Esplanada dos Ministérios, Bloco H
Anexo II, Térreo
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Impresso no Brasil 2007
Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional conforme Decreto n° 1.825 de 20.12.1907
Equipe Técnica
Coordenação:
Eliane Miranda Paiva
Programação Visual e Diagramação:
Cláudia Capella e Paulo Pedersolli
Originalmente apresentado como tese do autor no LI CAE (Curso de Altos Estudos), Instituto
Rio Branco, 2007
Costa, João Pedro Corrêa.
De decasségui a emigrante / João Pedro Corrêa Costa. – Brasília : Fundação
Alexandre de Gusmão, 2007.
328 p.
ISBN 978-85-7631-084-6
1. Emigração – Brasil. 2. Imigração – Japão. 3. Decassegui. I. Título
CDU 314.742/.743(81:520)
Sumário
Introdução .............................................................................................. 15
PARTE I – MUKASHI: O PASSADO ........................................................... 25
Capítulo 1 - O Contexto Histórico da Emigração Brasileira
para o Japão .......................................................................................... 27
1.1 – A Imigração Japonesa e a Comunidade Nikkei no Brasil...................... 28
1.2 – A Emigração Brasileira e a Comunidade Burajirujin no Japão .............. 34
PARTE II – GENZAI: O PRESENTE ............................................................ 49
Capítulo 2 - A População Brasileira no Japão ....................................... 51
2.1 – A Base Estatística ............................................................................... 51
2.1.1 – A Dimensão da População Brasileira .................................... 53
2.1.2 – A Localização no Território Japonês .................................... 56
2.1.3 – A Distribuição Etária............................................................ 57
2.1.4 – A Composição por Sexo ...................................................... 60
2.1.5 – A Comunidade Brasileira entre as Colônias Estrangeiras
no Japão .............................................................................. 61
2.2 – A Análise Qualitativa .......................................................................... 64
2.2.1 – A Ascendência Étnica.......................................................... 67
2.2.2 – A Origem no Brasil .............................................................. 69
2.2.3 – A Localização da Comunidade no Japão.............................. 71
2.2.4 – O Grau de Escolaridade....................................................... 73
2.2.5 – A Razão da Ida para o Japão ................................................ 74
2.2.6 – A Migração Circular ............................................................ 75
2.2.7 – O Visto Japonês .................................................................. 77
2.2.8 – Estado Civil, Idade e Sexo .................................................... 79
2.2.9 – Filhos e a Educação dos Jovens Brasileiros no Japão............ 82
2.2.10 – O Emprego no Japão ......................................................... 84
2.2.11 – O Patrimônio Adquirido pela Comunidade ........................ 87
2.2.12 – A Poupança e as Remessas Financeiras .............................. 90
2.2.13 – A Intenção – ou não – do Retorno ao Brasil ....................... 93
Capítulo 3 – O Enfrentamento e a Superação de Obstáculos na
Sociedade Japonesa .............................................................................. 95
3.1 – A Educação dos Brasileiros no Japão .................................................. 97
3.1.1 – O Sistema Educacional Japonês ......................................... 100
3.1.2 – As Escolas Brasileiras no Japão .......................................... 101
3.2 – A Razão da Ida: o Arubaito .............................................................. 114
3.2.1 – A Mão-de-Obra Estrangeira no Modelo Industrial Japonês 114
3.2.2 – Os Haken Gaisha – As Empreiteiras, ou Recrutadores
de Trabalhadores .............................................................. 119
3.2.3 – A Vida nas Fábricas ........................................................... 124
3.3 – A Proteção Social – Previdência e Saúde ........................................... 125
3.4 – A Vida fora das fábricas: O Jeito Brasil” no Japão ............................ 128
3.4.1 – Produtos e Serviços ........................................................... 129
3.4.2 – Comunicação e a Mídia Brasileira no Japão ....................... 132
3.5 – As Remessas Financeiras .................................................................. 135
3.6 – Quem sou eu? O imaginário e o identitário do burajirujin ................ 138
Capítulo 4 – Os Direitos e os Deveres Civis ........................................ 145
4.1 – A Nacionalidade Brasileira ................................................................ 145
4.2 – O Casamento no Japão .................................................................... 157
4.3 – O Divórcio no Japão......................................................................... 162
4.4 – A Criminalidade na Comunidade Brasileira ....................................... 169
4.5 – O Voto no Exterior ........................................................................... 173
Capítulo 5 – A Atuação Diplomática e Consular ................................. 179
5.1 – As Reuniões de Coordenação Consular ............................................ 185
5.2 – Os Encontros Setoriais: Educação e Previdência ............................... 198
5.2.1 – Grupo de Trabalho sobre Educação ................................... 198
5.2.2 – Grupo de Trabalho sobre Previdência Social ...................... 202
5.3 – A Cooperação Judiciária................................................................... 207
5.4 – A Atividade Consular ....................................................................... 217
5.5 – Os Foros Paralelos de Ação e Debate sobre a
comunidade burajirujin ................................................................... 230
5.5.1 – A Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Emigração . 231
5.5.2 – O Serviço de Assistência aos Brasileiros no Japão – SABJA . 233
5.5.3 – O Instituto de Direito Comparado Brasil-Japão................... 235
5.5.4 – A Assembléia das 18 Cidades com Concentração de
Estrangeiros ...................................................................... 239
PARTE III – SHORAI: O FUTURO ............................................................ 245
Capítulo 6 – Propostas para a Interação Estado-Comunidade
Expatriada ............................................................................................ 247
6.1 – O Debate sobre as Comunidades Brasileiras no Exterior.................... 248
6.2 – O Alcance da Rede Consular ............................................................ 256
6.3 – O Programa JET................................................................................ 262
Conclusão .............................................................................................. 269
NOTAS .................................................................................................. 277
BIBLIOGRAFIA ....................................................................................... 301
ANEXO .................................................................................................. 319
Tabela 1 – População Brasileira Residente no Japão 1986-2005............................... 54
Tabela 2 – Estimativa de Brasileiros que Retornam ao Brasil .................................... 55
Tabela 3 – Distribuição da População por Província 1994-2005............................... 57
Tabela 4 – Distribuição da População Brasileira por Faixa Etária 1990-2005........... 58
Tabela 5 - População Economicamente Ativa - Brasil e Comunidade
no Japão 1990-2005 e projeção 2015 .................................................... 59
Tabela 6 – Proporção de Homens por cada 100 Mulheres da População Brasileira . 61
Tabela 7 – Populações Estrangeiras no Japão 1995-2005 .......................................... 63
Tabela 8 – Populações de Origem Estrangeira Residentes no Japão 2005................. 64
Tabela 9 – Ascendência Étnica da Comunidade Brasileira no Japão .......................... 68
Tabela 10 – Origem da Comunidade Brasileira no Japão por Estado da Federação .. 70
Tabela 11 – Origem da Comunidade Brasileira no Japão por Município/Estado ...... 71
Tabela 12 – Localização da Comunidade Brasileira no Japão por Província ............. 72
Tabela 13 – Grau de Escolaridade da Comunidade Brasileira no Japão ..................... 73
Tabela 14 – Declaração do Motivo de Emigração para o Japão ................................. 74
Tabela 15 – Declaração de Regresso para Residir no Brasil ....................................... 75
Tabela 16 – Declaração de Freqüência de Regressos ao Brasil................................... 76
Tabela 17 – Situação Legal da Comunidade Brasileira no Japão ................................ 78
Tabela 18 – Distribuição por Sexo da Comunidade Brasileira no Japão .................... 81
Tabela 19 – Atividade Econômica da Comunidade Brasileira no Japão ..................... 85
Tabela 20 – Atividade Econômica no Brasil antes de Emigrar para o Japão .............. 86
Tabela 21 – Propriedade de Automóveis na Comunidade Brasileira no Japão .......... 89
Tabela 22 – Destino do Dinheiro Enviado para o Brasil pela
Comunidade no Japão ............................................................................. 91
Tabela 23 – Destino do Dinheiro Poupado no Japão pela Comunidade .................... 91
Tabela 24 – Declaração de Intenção de Regressar Definitivamente ao Brasil ............ 93
Tabela 25 – Casamentos de Brasileiros transcritos na Repartições Consulares
no Japão 2000-2005 ...........................................................................160
Tabela 26 – Estimativa de Taxa de Nupcialidade da
Comunidade Brasileira no Japão ........................................................ 161
Tabela 27 - Resumo da Atividade Consular nos Consulados-Gerais
no Japão 2000-2006 .............................................................................220
Lista de Tabelas
Glossário de Termos Japoneses
Ao longo do trabalho, serão utilizadas várias palavras e expressões japonesas.
As mais recorrentes, com seus respectivos significados, estão listadas a seguir:
Expressão Significado
Decasségui deru = sair; kasegu = lucrar – aquele
que sai de casa para
trabalhar e voltar
Issei i = primeiro, um; sei = geração –
japonês de primeira geração
que vive fora do Japão.
Nissei ni = segundo, dois; sei = geração –
descendente de japonês de
segunda geração
Sansei san = terceiro, três; sei = geração –
descendente de japonês de
NN terceira geração
Yonsei yon = quarto, quatro; sei = geração –
descendente de japonês de
quarta geração
Nikkei ni(tchi) = Japão; kei = linhagem –
japonês ou descendente no
exterior
Nikkeijin ni(tchi) = Japão; kei = linhagem; jin =
pessoa – estrangeiro
descendente de japonês
Gaijin gai = fora; jin = pessoa – estrangeiro
Burajirujin burajiru = Brasil; jin = pessoa –
pessoa de nacionalidade
brasileira
Mukashi o passado
Genzai gen = estar, ficar; zai = agora, no
momento – atualidade ,
presente
Shorai o futuro
Koseki ko = porta, entrar; seki = tornar
membro – registro de família
Haken gaisha haken = recrutar, contratar; gaisha =
empresa – empreiteiro ,
intermediário de mão-de-obra
Shakai Hoken shakai = social, do povo; hoken =
seguro – previdência social
Kokumin Kenko Hoken kokumin = nacional, do povo; kenko =
saúde; hoken = seguro -
seguro nacional de saúde
Todoke pedido, solicitação, notificação
INTRODUÇÃO
17
Em 2008, será comemorado o centenário da imigração japonesa
para o Brasil, uma celebração em torno da maior comunidade nipônica
fora do Japão e cujos integrantes marcaram, ao longo de quase um
século, valiosa presença na vida econômica, cultural e social brasileira.
O ano de 2008 marcará, também, outro aniversário, a maioridade legal
de Alexandra Tinami Sakai e Thiago Ryuichi Kuniyoshi, jovens
brasileiros que cresceram no Japão, mas cujas afinidade e ligação com
o país que lhes dá a nacionalidade são tão remotas quanto a distância
que os separa de suas origens culturais.
Esses dois adolescentes fazem parte de uma comunidade
brasileira residente no Japão de mais de 300.000 nacionais, que já
supera o número de japoneses que se fixaram no Brasil no século XX,
cerca de 250.000. Resta saber se esta nova colônia também se
assentará e será assimilada como a de seus antepassados, cuja ligação
contemporânea com o Japão, para muitos, se resume hoje apenas aos
distintos traços raciais e ao nome de família oriental. Será que, daqui a
oitenta anos, ela estará também festejando, com a mesma intensidade,
o centenário da chegada dos primeiros brasileiros ao arquipélago? Ou
restará às suas gerações futuras tão somente uma vaga lembrança de
uma longínqua terra tropical, com a qual o único elo talvez seja um
nome ou sobrenome não-japonês?
São estas as perguntas que o presente estudo pretende enfocar
e, em torno delas, avaliar o papel e o interesse do Estado brasileiro em
INTRODUÇÃO
18
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
preservar os vínculos com seus cidadãos expatriados, por meio de
políticas especificamente direcionadas não só àquela, mas também a
todas as outras concentrações de brasileiros no exterior, espalhadas
principalmente pelas Américas do Sul e do Norte e pela Europa
Ocidental.
A emigração desses brasileiros para o Japão poderia representar,
no contexto da chamada “era das migrações”, uma experiência rara, por
ser composta majoritariamente por um grupo étnico específico e definido,
que retorna, num espaço geracional relativamente curto, à terra de sua
ascendência, num processo que alguns chamam de return migration.
São poucos os exemplos similares encontrados no quadro dos mais de
190 milhões de migrantes que se estima haver hoje no mundo, entre os
quais se pode mencionar a volta de alemães étnicos da Europa Oriental
à Alemanha reunificada, ou dos holandeses étnicos que retornam das
Índias Ocidentais e do Suriname aos Países Baixos. Não é esse, contudo,
o objetivo central do trabalho, que abordará também os problemas de
integração social, de identidade cultural e de assimilação engendrados
pela aspiração prévia e rejeição posterior do “retorno às origens” da
comunidade nikkei brasileira ao Japão.
A par de acontecimentos como guerras, fome, perseguições
políticas ou religiosas, os grandes movimentos migratórios da
humanidade tiveram como força propulsora dois elementos essenciais:
a atração e a repulsão, os chamados pull e push factors, de natureza
primordialmente econômica. De um lado, em determinada região, há
uma demanda por trabalhadores, especializados ou não, que o mercado
de mão-de-obra local, por motivos conjunturais ou estruturais, não
reúne condições de abastecer. Do outro, há excesso de oferta deste
mesmo fator de produção, trabalho, relativo à capacidade do mercado
regional de absorvê-lo. Enquanto a remuneração pelo trabalho, e
portanto a atração, do primeiro mercado aumenta, no segundo ela é
corroída, e impele parte de sua população à busca de melhores
oportunidades de emprego e de condições de vida alhures.
INTRODUÇÃO
19
Esta é, sem dúvida, uma generalização simplificada para explicar
o porquê das migrações. Muitos outros fatores entram em jogo, com
maior ou menor peso, nos movimentos transnacionais – históricos,
culturais, geográficos, étnicos e sociais – , mas invariavelmente sob a
motivação maior das forças econômicas. Num segundo momento, estes
deslocamentos humanos podem também criar suas dinâmicas próprias,
à medida que a população emigrada se assenta no destino e gera redes
independentes de atração de novos membros, por meio de laços
familiares e sociais que mantêm com sua origem.
Do ponto de vista institucional, as motivações e os primeiros
anos da migração de brasileiros para o Japão, o chamado “fenômeno
decasségui”, foram discutidos e analisados no estudo da então
Conselheira Maria Edileuza Fontenele Reis, apresentado no XXXVI
Curso de Altos Estudos do Ministério das Relações Exteriores em
1998, intitulado “Brasileiros no Japão – O Elo Humano das Relações
Bilaterais”. Não se pretende aqui repassar, com a mesma profundidade
da autora, esta fase inicial da formação da colônia brasileira no Japão,
mas sim avaliar em que medida seus prognósticos se confirmaram nos
quase dez anos subseqüentes e, sobretudo, lançar novas previsões
sobre o destino daquela comunidade, com base em dados e tendências
recentemente coletados e observados. A partir deste levantamento,
que inclui os principais aspectos demográficos, econômicos e sociais
da colônia brasileira no Japão, o trabalho procurará discutir as possíveis
medidas que o Estado, por intermédio do reforço, ou mesmo inovação,
de diretrizes políticas, poderá contribuir para preservar e assegurar os
direitos civis fundamentais daqueles brasileiros. A estrutura do trabalho,
portanto, divide-se em três partes principais, correspondendo às três
fases temporais do processo migratório brasileiro para o Japão: o
passado, mukashi, em japonês, o presente, genzai e o futuro, shôrai.
A especificidade da emigração de brasileiros para o Japão foi
determinada, em grande parte, pela composição étnica, ou racial, de
seus integrantes, ou seja, sua ascendência nipônica. Assim, na parte
20
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
introdutória do trabalho, “o passado”, serão sinteticamente descritos
os contextos históricos que determinaram, no início do século XX, a
vinda de imigrantes japoneses para o Brasil. Ver-se-ão, em seguida, as
condicionantes mais recentes que levaram, a partir do final dos anos
80, à reversão desse fluxo populacional e à consolidação da comunidade
brasileira no Japão, os burajirujin (em japonês, burajiru = Brasil, jin
= estrangeiro, o estrangeiro de origem brasileira) .
A segunda parte do trabalho, denominada “o presente”, enfocará
o que efetivamente constitui a comunidade burajirujin no Japão neste
início de século XXI, sob vários aspectos. Será apresentado, no
Capítulo 2, um levantamento pormenorizado de dados demográficos e
sociais da comunidade e de sua evolução recente, na expectativa de se
encontrarem possíveis tendências para o futuro. A partir desta
macroanálise estatística, proceder-se-á a um levantamento de natureza
qualitativa da vida dos brasileiros no Japão, com base, sobretudo, em
pesquisa de campo realizada pelo autor, que procurou reunir
informações atualizadas sobre, entre outras, origem geográfica e étnica
no Brasil, grau de escolaridade, condição familiar e emprego, educação
dos filhos, destino de seus rendimentos no Japão e aspirações quanto
a um eventual retorno ao Brasil.
No Capítulo 3, será visto como a população brasileira, na
condição de emigrante, se adaptou e procurou contornar as dificuldades
que encontrou na culturalmente distinta, complexa e, por que não,
exclusivista sociedade japonesa. Nesta análise, serão tratadas as questões
da educação dos jovens brasileiros no Japão, dos sistemas de
recrutamento e de emprego naquele país, da proteção social, da formação
e expansão do comércio e serviços direcionados especificamente à
comunidade, a mídia brasileira e as remessas financeiras.
Passando da análise descritiva à normativa, o Capítulo 4
enfocará a incidência, ou influência, das normas jurídicas e dos preceitos
legais dos dois países sobre a comunidade brasileira no Japão. Será
analisada, neste sentido, a aplicação extraterritorial dos direitos e
INTRODUÇÃO
21
deveres civis básicos do cidadão brasileiro, como nacionalidade,
casamento e divórcio, o voto e também a faceta menos desejável de
qualquer movimento migratório, a delinqüência e a criminalidade.
No rol de competências institucionais do Ministério das
Relações Exteriores, a atuação política de representação e defesa dos
grandes interesses nacionais no exterior esteve, tradicionalmente, isolada
da função consular, tópica e de essência cartorial. A presença, cada
vez mais visível e permanente, de uma expressiva comunidade expatriada
brasileira, no entanto, gerou a necessidade, a partir da última década
do século passado, de uma nova vertente da ação diplomática,
amalgamando essas duas diretrizes, na formulação de uma política de
defesa e assistência dos nacionais radicados além-mar. Assim, o Capítulo
5 enfocará sob o prisma dessa nova política a atuação governamental
nas principais áreas de interesse da comunidade no Japão, tais como
os encontros bilaterais de coordenação consular, realizados em 2003
e 2005, as tratativas sobre cooperação judiciária que têm, recentemente,
assumido importante lugar na agenda bilateral, e os encontros técnicos
oficiais nas áreas de educação e previdência. Além da ação política,
será feita uma avaliação da prestação de serviços consulares à
comunidade brasileira no Japão e de sua adequação e correspondência,
em termos humanos e materiais, às necessidades de um contingente
populacional que se mostrou, desde sua formação inicial, crescente e
diversificado em sua demanda e localização.
As evidências coletadas ao longo do trabalho mostrarão uma
característica predominante: a do progressivo enraizamento da
comunidade brasileira no Japão. Este fenômeno não é exclusivo ao
movimento migratório dos nikkeis para o Oriente; ao que tudo indica,
está ocorrendo o mesmo nas comunidades brasileiras nos Estados
Unidos e na Europa.
Da perspectiva do Estado, portanto, é preciso perguntar qual
o rumo que suas ações devem tomar com relação à população
expatriada, objeto da terceira e conclusiva parte do trabalho, “o futuro”.
22
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Na contabilidade atual de perdas e ganhos desse movimento
migratório para o País, haverá mais a acrescentar na coluna de crédito
do que na de débito. Sob o enfoque financeiro, a presença de uma grande
comunidade expatriada representa uma importante fonte de divisas, tal
como refletida nos expressivos volumes de remessas que ingressam
anualmente nas contas públicas (ver seção 3.5). Esses recursos, além de
complementar a renda do destinatário, geram negócios comerciais e
imobiliários nas regiões de origem dos emigrantes, lá incrementando a
atividade econômica com evidentes efeitos multiplicadores. Em menor
escala, ganhos também são percebidos pelo País na exportação de
produtos nacionais de consumo destinados especificamente às
comunidades expatriadas; apenas no caso do Japão isso representa algo
em torno de US$ 100 a US$ 200 milhões por ano.
Poder-se-ia contestar esses ganhos imediatos se fossem
deduzidas, pelo Estado, as perdas em termos de impostos e outros
tributos diretos que deixa de captar com a saída do emigrante. Embora
impostos tenham deixado de ser coletados, reduziu-se também a
demanda por serviços públicos financiados por essa tributação, como
educação, saúde e segurança. Num país com níveis de desemprego
ainda relativamente altos como o Brasil, alivia-se, também, a pressão
sobre o mercado de trabalho doméstico, reduzindo o número de
candidatos às oportunidades de trabalho que se abrem.
No futuro, continuará o País a se beneficiar dessa maneira de
uma comunidade de nacionais crescentemente enraizada no exterior?
A julgar por outros exemplos históricos, os ganhos, ao menos os
contabilizáveis, irão gradativamente deixando de ter importância relativa
para o país expulsor, à medida que o imigrante, ao ser assimilado pela
sociedade estrangeira, for perdendo os laços sociais e familiares com
a terra natal.
A preservação dos vínculos da pátria com suas comunidades
expatriadas por meio de políticas públicas deliberadas, contudo, pode,
a longo prazo, vir a render benefícios para o País, em função, por
INTRODUÇÃO
23
exemplo, do eventual retorno e aproveitamento de nacionais qualificados
e treinados no exterior.
No Capítulo 6, o trabalho proporá medidas específicas que
poderão ser tomadas pelo Estado, mormente por intermédio do
Ministério das Relações Exteriores, com vistas à preservação dos
vínculos com seus nacionais expatriados, não apenas para garantir-
lhes seus direitos fundamentais à cidadania, mas também para assegurar
ou até mesmo encorajar o seu retorno ao País, caso as condições
futuras assim o determinem.
Entre estas medidas incluem-se, por exemplo, a ampliação e
descentralização da atuação consular, já iniciada, no caso do Japão,
com a criação de conselhos de cidadãos regionais. A utilização mais
efetiva da rede de consulados honorários seria uma alternativa,
constituindo eles centros regionais de captação e entrega de demandas
por serviços consulares, que desincumbiram o cidadão de ter de ir até
a sede para obter o serviço que requer. Tais iniciativas não apenas
agilizariam o processamento da burocracia documental necessária ao
cidadão, como poderiam propiciar condições para que aqueles
brasileiros melhor se organizassem política e administrativamente, na
defesa de seus interesses imediatos junto às esferas governamentais
japonesas e brasileiras.
Por sua dimensão e importância, o destino da população
expatriada merece um debate amplo na sociedade brasileira. No âmbito
do Ministério das Relações Exteriores, a relevância do tema traduziu-
se, ao longo dos dez últimos anos, na ampliação e elevação institucional
das unidades encarregadas do atendimento aos brasileiros no exterior,
como a recente criação da Subsecretaria-Geral das Comunidades
Brasileiras no Exterior (SGEB), que centraliza, na esfera governamental,
a formulação e execução das políticas nessa área. Outros países com
grandes populações emigradas, como o México e as Filipinas, por sua
vez, adotaram mecanismos distintos, extra ou intergovernamentais
(Instituto de los Mexicanos en el Exterior e Commision for Filipinos
24
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Overseas, respectivamente) como foros de interação com seus
nacionais emigrados. O trabalho analisará, sob estes diferentes
enfoques, qual seria a melhor alternativa para o caso brasileiro.
O presente trabalho é, ao mesmo tempo, um estudo
retrospectivo, atual e perspectivo sobre a comunidade brasileira no
Japão. Abordará, seqüencialmente, suas origens, sua condição presente
e os possíveis caminhos que se abrem para seu futuro. Não tem ele a
pretensão, e nem poderia ter, de esgotar a discussão de tão singular,
complexo e variado assunto, composto de múltiplas facetas,
condicionantes e variáveis - econômicas, sociais e políticas. Assim como
há trinta anos poucos imaginariam que hoje haveria centenas de milhares
de brasileiros residindo permanentemente no exterior, não se pode agora
antecipar qual será o cenário desses brasileiros e seus descendentes
daqui a mais trinta. Qualquer que seja, tem o Estado um papel
importante a desempenhar, por meio da ação político-diplomática, no
sentido de garantir-lhes, pela preservação da sua cidadania brasileira,
a oportunidade de livremente optar por seu destino.
PARTE I
MUKASHI: O PASSADO
27
Para situar e compreender as origens e motivações da
emigração brasileira em direção ao Japão, convém repassar, de
início, os respectivos contextos históricos, econômicos e sociais
que impulsionaram esse movimento humano transcontinental a
partir do final da década de 1980.
Essa trajetória moderna teve início há quase cem anos,
na chegada a São Paulo dos primeiros imigrantes japoneses, cuja
descendência étnica constitui a razão principal da presença de
mais de trezentos mil brasileiros no Japão.
A primeira parte do capítulo enfocará sucintamente o
processo da imigração japonesa para o Brasil, desde seus
primórdios, oriundos das profundas transformações ocorridas
na conjuntura sociopolítica daquele país no final do Século XIX,
passando por distintas fases até terminar nos anos 1970.
Na seqüência, serão examinadas as condicionantes que
determinaram a reversão do fluxo humano entre os dois países,
desta feita de brasileiros rumo ao Japão. Assim como a anterior
imigração japonesa, a emigração brasileira contemporânea
também foi condicionada pelo surgimento de novas realidades
nos cenários econômicos dos dois países nos anos 1980, que,
em conjunto, propiciaram as condições para a atração e
consolidação da comunidade no Japão neste início de Século
XXI.
CAPÍTULO 1
O CONTEXTO HISTÓRICO DA EMIGRAÇÃO
BRASILEIRA PARA O JAPÃO
28
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
1.1 – A IMIGRAÇÃO JAPONESA E A
COMUNIDADE NIKKEI NO BRASIL
A história da imigração e assentamento da comunidade japonesa
no Brasil a partir do início do século passado guarda em suas origens
muitas semelhanças com a que hoje se observa no sentido contrário, o
chamado “fenômeno decasségui”. Tão relacionada está ao movimento
recente de nipo-brasileiros para o Japão, que essa expressão japonesa,
cuja tradução literal é “sair do lar para trabalhar” (dekasegi - deru =
sair; kasegu = ganhar dinheiro, lucrar) já até ganhou o neologismo
português “decasségui”, grafia que será utilizada ao longo do trabalho.
Afirmar, no entanto, que tal fenômeno define e se restringe à ida de
brasileiros ao Japão é esquecer que os primeiros nipônicos que
desembarcaram em terras brasileiras também nutriam o objetivo do
decasségui. Como observa o professor Percy Galimbertti, “vieram para
voltar, para retornar ao seu país, a seu imperador, levando ... o dinheiro
rapidamente acumulado, em um ou dois anos”
1
.
Os grandes deslocamentos migratórios da população japonesa
tiveram início na Restauração Meiji de 1868, quando aquele país
embarcou num ambicioso processo de “ocidentalização” e
modernização industrial. Não objetivavam as autoridades japonesas
apenas promover o desenvolvimento econômico acelerado após séculos
de isolamento e feudalismo, mas também evitar, desta forma, a
ingerência e controle das potências estrangeiras da época, cuja presença
se firmava no resto da Ásia.
No campo sócio-demográfico, esse esforço conduziu, entre
outros avanços, à melhoria de condições sanitárias e de vida que, por
sua vez, resultou num rápido crescimento populacional; no espaço de
duas gerações, o número de habitantes do Japão aumentou 60%, de
34,86 milhões em 1872 para 55,96 milhões em 1920
2
. O deslocamento
do sistema de produção de bens de consumo, antes elaborados por
artesãos nas aldeias, para as fábricas nos centros industriais urbanos,
O CONTEXTO HISTÓRICO DA EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O JAPÃO
29
aliado a um intenso programa de substituição de importações, gerou
grande desemprego de pequenos produtores e comerciantes. Na
agricultura, até então o esteio da economia japonesa, a queda do preço
do arroz e a elevação da carga tributária para financiar a expansão do
Estado conduziram a um processo de falências e de concentração
fundiária, engrossando as fileiras de desempregados em direção às
cidades.
As condicionantes macroeconômicas foram, sem dúvida, a
grande força por trás dos movimentos migratórios japoneses, primeiro
internamente e depois para o exterior. A pesquisadora Ellen Woortman
chama atenção, no entanto, para outro importante fator que também
contribuiu para aquele êxodo, qual seja, a revisão do Código Civil
japonês entre 1895 e 1898. O novo conjunto de leis formalmente aboliu,
entre outros, o sistema de castas e estendeu o princípio da primogenitura
na sucessão para toda a sociedade, não apenas às classes dominantes.
Assim, o patrimônio paterno, que anteriormente podia ser dividido entre
todos os filhos, passou a ser reservado unicamente ao primogênito,
aumentando a concentração de terras e de riqueza e forçando os demais
herdeiros a buscarem meios de sustento alternativo, fora do berço
familiar
3
.
Este quadro de explosão demográfica e redução de
oportunidades de emprego gerou um excedente de população que a
conjuntura econômica da época não tinha condições de absorver. O
Japão comparava-se a “um tanque cheio d’água na iminência de
transbordamento”
4
. Era pois preciso encontrar uma válvula de escape
para a pressão demográfica, sob risco de agravar a pobreza e a
insatisfação e fomentar a revolta popular contra os interesses políticos
predominantes.
Os primeiros emigrantes japoneses para o exterior, conduzidos
e incentivados pelo Estado, dirigiram-se inicialmente ao Havaí, a partir
de 1885, para trabalhar na produção de açúcar e, em seguida, à costa
oeste norte-americana, da Califórnia até a Colúmbia Britânica no
30
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Canadá. Ao todo, cerca de 220.000 japoneses desembarcaram na
América ao longo de mais de 30 anos, embora muitos tenham
posteriormente regressado ao país natal ou mandado seus filhos de volta
para estudarem no Japão. Em razão do crescente ressentimento, nos
EUA, contra a colonização nipônica – tanto em função de aversões raciais
da maioria de origem européia, como do melhor desempenho econômico
dos orientais, sobretudo na agricultura intensiva – a imigração foi suspensa
em 1907, salvo para reunião familiar ou casamento
5
. Em 1924, foi
passado o Immigration Act no Congresso Norte-Americano, que
efetivamente suspendeu a entrada de asiáticos no território estadunidense.
Paralelamente, e já diante das incipientes dificuldades de
continuidade do fluxo emigratório para a América do Norte, as
autoridades japonesas no final do século XIX iniciaram contatos
diplomáticos no sentido de tentar assegurar outros destinos no Novo
Mundo para seus nacionais. Assim, uma primeira tentativa exploratória
de acordo com o governo brasileiro foi feita em 1892, a partir da
promulgação da Lei no. 97, na presidência de Floriano Peixoto, que
permitiu a imigração de asiáticos para o Brasil. Teve também início,
com êxito, a emigração para o México em 1897 e para o Peru em
1899. Entrementes, em 1895, o Brasil e o Japão assinaram em Paris o
Tratado de Amizade, Comércio e Navegação, que estabeleceu “as
condições necessárias à promoção da corrente migratória”
6
.
No Brasil do final do século XIX, por sua vez, a expansão da
indústria cafeeira requeria, na ausência do abolido trabalho escravo,
volumes crescentes de mão-de-obra agrícola, sobretudo para as
plantações que desbravavam o oeste paulista. Esta demanda vinha sendo
suprida, em grande parte, pela imigração italiana desde a década de
1870. A recessão na indústria no final do século, provocada pela
natureza cíclica da produção, aliada à imposição aos colonos europeus
de um regime de trabalho muitas vezes desumano, levou a uma
significativa redução do número daqueles imigrantes, que abandonavam
as fazendas em direção às cidades ou outros destinos, como a Argentina.
O CONTEXTO HISTÓRICO DA EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O JAPÃO
31
A convergência de interesses brasileiro e japonês, portanto,
conduziu à implementação de medidas concretas que visavam o envio
de agricultores nipônicos para as fazendas brasileiras. Em 1908, atracou
em Santos o navio Kasato Maru, trazendo 781 nacionais japoneses,
membros de 165 famílias, que foram conduzidos para trabalhar como
agricultores assalariados em fazendas de café no interior de São Paulo.
Deu-se início assim ao que se pode chamar de primeira fase
da imigração japonesa, compreendida entre 1908 e 1924, durante a
qual desembarcaram no Brasil quase 35.000 nipônicos. Ao contrário
da emigração para os EUA e para o Peru, constituída majoritariamente
por homens solteiros, os japoneses que vieram naquele momento eram
necessariamente formados, por exigência do lado brasileiro, de famílias
de pelo menos três pessoas com mais de 12 anos e em condições de
trabalhar nos cafezais. Em muitos casos, incapazes de se reunirem sob
este critério, muitos emigrantes formavam “famílias de papel” (koosei
kazoku) de pessoas não diretamente aparentadas, conforme registra a
acadêmica norte-americana Keiko Yamanaka: “Typically, a married
couple incorporated relatives, friends and neighbours into their
family unit and travelled together. Upon their arrival, many paper
families were dissolved and members reverted to their original
relationships”
7
. Conforme assinala o sociólogo e professor Hiroshi
Saito, “a diferença, no caso brasileiro, tornou-se decisiva na posterior
evolução do grupo japonês, garantindo crescimento populacional
normal, continuidade das gerações e uma relativa estabilidade da vida
familial”
8
.
A suspensão da imigração japonesa para o Peru, em 1923, e
logo em seguida para os EUA, em 1924, levou a uma marcada
aceleração do ingresso de japoneses no Brasil, no que se pode chamar
de segunda fase
9
. Além desses fatores, contribuíram para a aceleração
da emigração japonesa a Revolta do Arroz, de 1918, e o grande
terremoto na região de Kanto, em 1923, que arrasou a cidade de
Tóquio, deixando dezenas de milhares de pessoas desabrigadas. De
32
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
1925 até a entrada do Japão na Segunda Guerra Mundial, em 1941,
desembarcaram no Brasil outros 150.000 imigrantes nipônicos, com
concentração no período de 1928 a 1934, quando chegaram cerca de
103.000 japoneses, elevando a presença da colônia no Brasil a quase
190.000 pessoas. A redução da imigração japonesa a partir do final
de 1934 até a eclosão da Segunda Guerra na Ásia em 1941 deveu-se
à chamada “lei dos 2%” adotada pelo Governo de Getúlio Vargas na
Constituição de 1934, que estabeleceu esse percentual, limitando a
3.800 – ou 2% da população japonesa já radicada – o número de
novos imigrantes a cada ano, além de outras medidas restritivas
10
. Ao
mesmo tempo, o aumento da demanda por mão-de-obra para a
indústria bélica japonesa e a expansão de seu exército e dos domínios
ultramarinos também contribuíram para reduzir a pressão emigratória
japonesa para o Brasil. Nestes sete anos, houve uma média de 3.461
ingressos de japoneses por ano no Brasil, contra uma média anual de
14.700 entre 1928 e 1934.
A terceira e última fase da imigração teve início com o final
da Segunda Grande Guerra. A devastação do território japonês, a
desordem institucional que se seguiu à ocupação norte-americana, o
retorno de quase sete milhões de ex-combatentes e colonos e uma
economia na qual se registravam altos índices de inflação e falta de
empregos pressionaram novamente a saída de nacionais em busca de
melhores condições de vida. Tais adversidades e a notícia delas
divulgadas entre a colônia foram, também, um importante fator de
desestímulo ao retorno dos imigrantes iniciais a sua pátria, consolidando
ainda mais a comunidade nikkei no Brasil.
Os laços familiares e sociais com os colonos já estabelecidos
no Brasil, bem como a continuada demanda por trabalhadores agrícolas,
foram importantes fatores de atração daquelas novas levas, a partir de
1952, quando a imigração de japoneses foi novamente autorizada. O
perfil do imigrante japonês, no entanto, começou a mudar naquele
período, caracterizando-se por uma predominância de homens solteiros,
O CONTEXTO HISTÓRICO DA EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O JAPÃO
33
muitos dos quais recrutados para trabalhar nas colônias agrícolas
japonesas estabelecidas em São Paulo e no Paraná e também nas novas
fronteiras que se abriam na região amazônica, responsáveis pela
introdução de culturas como a pimenta-do-reino e da juta
11
. Cerca de
35.000 japoneses chegaram nos anos 50 do século XX, mas o fluxo
de trabalhadores começou a diminuir a partir da década seguinte,
quando foram registrados pouco mais de 25.000 imigrantes nipônicos.
Os anos 70 marcaram o fim do movimento migratório para o Brasil em
sua faceta tradicional, com a última viagem do navio Nippon Maru
para Santos, em 1973. Naquele ano, foram registrados apenas 472
japoneses como imigrantes.
Os quase 70 anos de movimento migratório do Japão para o
Brasil resultaram numa população residente de cerca de 250.000
nipônicos – isseis – cujos descendentes hoje totalizam cerca de um
milhão e meio de pessoas.
Praticamente um quarto da comunidade nikkei reside na grande
São Paulo. Os demais estão espalhados nos outros municípios daquele
Estado, Paraná, Mato Grosso do Sul, Pará e, em menor quantidade,
pelo resto do território nacional. Como se verá adiante, a colônia
japonesa, com a importância atribuída à educação de seus filhos,
alcançou rápida mobilidade social positiva, para ocupar posições de
proeminência na sociedade brasileira, nos mais diversos campos. De
um fluxo imigratório pouco qualificado, que se destinou originariamente
ao campo, a colônia japonesa no Brasil acompanhou o êxodo rural
para as cidades, motivada pelas aspirações de ascensão social e de
recompensa pelo sacrifício de ter deixado a terra natal.
A redução do fluxo de imigrantes nipônicos nos anos 1960 e
1970 coincidiu com o crescimento econômico do Japão, que
despontava, rapidamente, como potência industrial mundial. Passado
o período de ocupação pelos Estados Unidos (1945-52), o país
experimentou elevadas taxas de crescimento do PIB, de 8% a 9% ao
ano entre 1953 e 1973. Os choques do petróleo de 1973 e 1979, que
34
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
elevaram os custos da produção industrial e fomentaram um período
de inflação e desaceleração econômica, ao mesmo tempo, promoveram
uma guinada no perfil produtivo japonês, em direção aos setores de
alta-tecnologia, engenharia de precisão e serviços, ao lado das
tradicionais indústrias automobilística, naval e de eletrônicos. Contribuiu
decisivamente para este movimento o alto grau de educação e
qualificação técnica da população japonesa. Havia, portanto, demanda
por mão-de-obra interna, que, aliada à sensível elevação do padrão
de vida e bem-estar domésticos, eliminou muitas das motivações que
antes impulsionaram a emigração.
Já começavam então a ser notadas na sociedade japonesa
tendências demográficas que, poucos anos mais tarde, iriam transformar
o país de exportador em importador de mão-de-obra. A taxa de
natalidade
12
que em 1965 era de 18,6, em 1980 baixara para 13,6.
Em 1975, pela primeira vez a taxa de fecundidade foi inferior a 2,0
(1,91), prenunciando o comportamento demográfico que se observa
desde então, de estagnação do crescimento populacional e redução
na proporção de jovens trabalhadores necessários para sustentar uma
economia dinâmica e população cada vez mais envelhecida.
1.2 – A EMIGRAÇÃO BRASILEIRA E A
COMUNIDADE BURAJIRUJIN NO JAPÃO
Enquanto a economia japonesa dos anos 1980 continuava a
crescer, alavancada pela expansão de seu comércio externo, pela
especulação imobiliária e pela expansão do mercado consumidor, no
Brasil os efeitos dos mesmos choques do petróleo, aliados, entre
outros fatores, ao endividamento externo e à elevação das taxas de
inflação, conduziram a uma prolongada crise econômica interna.
Enquanto o crescimento do PIB brasileiro no período do chamado
“milagre”, de 1964 a 1980, foi, em média, de 7,8% a.a., de 1981 a
1993 o índice foi de apenas 1.6%
13
. A inflação brasileira, nesse
O CONTEXTO HISTÓRICO DA EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O JAPÃO
35
segundo período, chegou a níveis historicamente altos, variando entre
87,88% a.a. e 2.579% a.a., indicadores que planos econômicos
heterodoxos e Ministros da Fazenda sucessivos foram incapazes de
reverter. Tal conjuntura refletiu negativamente sobre o mercado de
trabalho brasileiro, onde a taxa de desemprego oficial passou de 4,3%
em 1981 para 6,2% em 1993
14
.
Formavam-se assim as forças expulsoras, ou push factors, de
brasileiros em direção ao exterior, em busca de melhores oportunidades
de vida e de empregos que o País já não encontrava condições de
oferecer no ritmo necessário. Esse movimento, na verdade, já se iniciara
na década de 1960, com o assentamento no oriente paraguaio de
agricultores brasileiros, em sua maioria desalojados de seus minifúndios
da região Sul pela mecanização da lavoura e pela adoção em grande
escala do modelo de agricultura extensiva. O que caracterizou a
emigração brasileira a partir dos anos 1980 foi a saída de uma população
essencialmente urbana em direção aos países desenvolvidos, para
ocupar postos de trabalho comparativamente mais bem remunerados
que lá se abriam nos setores manufatureiros e de serviços. Como
sintetizou o Secretário-Geral das Nações Unidas em seu recente
Relatório à 60ª. Assembléia Geral, sobre Migração Internacional e
Desenvolvimento:
The lure of a well paid job in a wealthy country is a powerful
driver of international migration. The attraction has
intensified as income differentials among countries continue
to grow … Many advanced and dynamic countries need
migrant workers to fill jobs that cannot be outsourced and
that do not find local workers willing to take them at going
wages. Population aging also underlies this growing
demand, as it gives rise to deficits of workers relative to
dependants. And as younger generations become better
educated, fewer in their ranks are content with physically
demanding jobs
15
.
36
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Por falta de estatísticas oficiais precisas sobre as saídas de
brasileiros ao longo da década de 1980, decorrente, sobretudo, da
grande participação de emigrantes ilegais e da ausência de mecanismos
eficazes de controle do registro de entradas e saídas nas fronteiras, é
difícil estimar quantos conterrâneos terão efetivamente deixado o país
naquele período. Utilizando dados dos censos nacionais do início e
final da década (população em 1980 e a então estimada para o final do
decênio contra a contabilizada em 1990), o demógrafo José Alberto
Magno de Carvalho calculou um saldo migratório negativo de 1,8 milhão
de brasileiros ao longo desses dez anos
16
. O movimento em direção
ao Japão, no entanto, só teve presença notada no final dos anos 1980.
Os primeiros registros oficiais de brasileiros residentes no Japão
datam de 1960, mas seu número era ainda inexpressivo, um total de
240
17
. Muitos destes, ou destas, eram cônjuges de nacionais japoneses,
isseis, que retornavam àquele país na época da aposentadoria, para lá
usufruírem as melhores condições de vida que aquele país apresentava.
Nos anos subseqüentes, o número de brasileiros cresceu paulatinamente,
mas não em ritmo que pudesse ser caracterizado como significativo.
Em 1980, alcançava 1.492 o total de residentes brasileiros no Japão.
Naoto Higuchi, professor da Universidade de Tokushima, adota
o ano de 1980 como ponto de partida para a classificação cronológica
da imigração brasileira no Japão, dividida em cinco fases
18
. A primeira
fase, de 1980 a 1984, caracteriza-se por um reduzido número de
brasileiros, em sua maioria cônjuges de japoneses que residiram por
mais tempo no Brasil. Como foi visto acima, a imigração nipônica no
pós-guerra (1952-1973) contou com uma predominância de homens
solteiros, muitos dos quais se casaram com brasileiras e, ao final de
suas vidas de trabalho, regressaram com suas famílias para o Japão.
Este mesmo perfil poderia aplicar-se aos executivos e empresários
japoneses que passavam temporadas nas filiais de suas empresas no
Brasil a partir dos anos 1970 e aqui se casavam com brasileiras,
levando-as posteriormente para residir no Japão
19
. Como diz Higuchi:
O CONTEXTO HISTÓRICO DA EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O JAPÃO
37
First temporary return migration from Brazil to Japan began in
the early 1980s. Most returnees in this period were first generation
immigrants, with Japanese nationality, fluency in Japanese and
familiarity with Japanese society”
20
.
A segunda fase vai de 1985 a 1989 e tem como ponto
referencial a publicação do primeiro anúncio em jornal japonês no Brasil
oferecendo oportunidade de emprego no Japão, indicativo, talvez, de
que as empresas japonesas haviam “descoberto o Brasil como reserva
de mão-de-obra”
21
. Nos anos que se seguiram, cresceu rapidamente o
número de tais anúncios, principalmente nos jornais da comunidade nikkei,
o São Paulo Shimbum e o Paulista Shimbum, chegando a mais de
cem em 1987 e superando mil em 1990. No Japão já começavam a
surgir, na mesma época, as primeiras agências de recrutamento
direcionadas especificamente aos nikkeis latino-americanos, várias das
quais administradas pelos pioneiros isseis e nisseis brasileiros que lá se
estabeleceram. Ademais, outros nipo-brasileiros também foram atraídos
pelas ofertas de emprego no Japão. Como relatou a Vice-Presidente da
Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa, Reimei Yoshioka, em audiência
pública em São Paulo à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito sobre
a Emigração, em dezembro de 2005:
A partir de 87, 88, pela falta de mão-de-obra no Japão, que estava
atravessando o boom econômico, a demanda começou a crescer
e já não satisfazia apenas os japoneses. Então, iam os brasileiros,
nisseis … e sanseis. Só que iam na qualidade de ilegal, porque o
Japão não permite o trabalho braçal, trabalho temporário para os
estrangeiros. Então, iam de uma certa forma dando o jeitinho deles,
como visita a parentes. Ficavam lá por seis meses, renovavam
por mais seis meses e continuavam trabalhando na ilegalidade
22
.
Esses imigrantes ilegais brasileiros juntavam-se a milhares de
outros trabalhadores estrangeiros descredenciados no Japão. A
continuada queda nas taxas de natalidade, o esgotamento dos processos
38
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
de migração interna do campo para as zonas urbanas e de recrutamento
de mulheres e idosos evidenciaram um hiato cada vez maior entre o
número de trabalhadores nativos disponíveis e demanda por mão-de-
obra não qualificada naquele país.
Prenúncios das disparidades entre a oferta e a demanda no
mercado de trabalho já haviam sido sentidos nos anos 70 do século
XX, mas estas foram contornadas, à época, pela recessão causada
pelos choques do petróleo
23
. A retomada do rápido crescimento
econômico na década seguinte, no chamado Heissei Boom, com taxas
de crescimento anual de mais de 5%, contudo, voltou a exercer pressão
sobre a procura por trabalhadores para a indústria japonesa. Os
Acordos Plaza de 1985, que realinharam as taxas de câmbio entre os
membros do G-5 para tentar conter os crescentes superávites
comerciais do Japão, sobretudo com os EUA
24
, tornaram o iene muito
mais atraente para trabalhadores estrangeiros, principalmente asiáticos.
Segundo a pesquisadora Lisa Bornstein, da Universidade de McGill,
no Canadá, houve quatro momentos distintos da imigração ilegal no
Japão: dos anos 1950 a meados dos anos 1970, com a entrada maciça
de coreanos para trabalhar no setor extrativo e também dentro da já
estabelecida comunidade coreana; a partir dos anos 1970, em que se
destacou a imigração de mulheres do sudoeste asiático – Tailândia e
Filipinas – agenciadas como “hostesses” ou prostitutas; a terceira a
partir de 1985, com predominância de homens provenientes da
Tailândia, de Bangladesh, do Irã e do Paquistão, para trabalhar na
construção civil e em pequenas fábricas e, finalmente, a quarta, que se
segue ao lado da imigração legalizada desde 1990, composta
majoritariamente por visa overstayers da China e Malásia
25
.
No final dos anos 1980, portanto, encontrava-se o Japão diante
do problema de como conciliar a demanda de sua indústria por mão-
de-obra com uma lei de imigração que permitia apenas a entrada
rigidamente controlada de trabalhadores especializados e técnicos. O
crescente número de imigrantes ilegais trazia também preocupações
O CONTEXTO HISTÓRICO DA EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O JAPÃO
39
de natureza social. Temia-se que a presença descontrolada de
estrangeiros levasse à desestabilização dos padrões de conduta e
organização, a um aumento da criminalidade, além de ameaçar a
preservação do conceito de homogeneidade racial, tão arraigada na
sociedade japonesa
26
.
Para contornar esse dilema, decidiu o Governo japonês, após
intenso debate interno entre lideranças do executivo, legislativo e
empresariais, promover uma reforma da Lei de Controle de Imigração
e de Reconhecimento de Refugiados (LCI), que datava de 1952.
Objetivou a reforma da lei, por um lado, impor severas penalidades
aos empregadores de operários ilegais e, por outro, garantir a entrada
controlada de trabalhadores que a indústria reclamava. De modo a
assegurar o imprescindível equilíbrio entre os fatores econômicos e
sociais que essa nova legislação teria de incorporar, foram estabelecidas
três categorias para permitir a permanência de estrangeiros no Japão
além dos três meses concedidos a turistas: a) os impedidos de trabalhar
– estudantes, turistas e dependentes; b) os especialistas e técnicos –
jornalistas, funcionários de empresas multinacionais e de governos
estrangeiros, médicos, pesquisadores, artistas etc.; e c) aqueles para
os quais não haveria limitação quanto à atividade exercida: residentes
permanentes e seus dependentes diretos, esposas e filhos de nacionais
japoneses, residentes permanentes especiais (para contemplar
essencialmente a terceira geração de coreanos nascidos no arquipélago)
e, finalmente, os “residentes de longo prazo”. Esses “residentes de
longo prazo” são definidos, na referida lei, como “those who are
authorized to reside in Japan with designation of period of stay by
the Minister of Justice in consideration of special circumstances”.
Tais circunstâncias especiais limitavam-se, na prática, aos descendentes
de japoneses de segunda geração, os nisseis, e os de terceira, os
sanseis, bem como seus respectivos cônjuges e filhos. Dentro dessa
classificação mais ampla, aos filhos de nacionais japoneses seriam dados
vistos de três anos e aos netos, de um ano. Em ambos os casos, as
40
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
autorizações de permanência poderiam ser automaticamente renovadas
por igual período ou ampliadas, no caso de sanseis e dependentes
não-nikkeis. A acadêmica Elisa Massae Sasaki chama atenção para
um outro importante componente embutido neste visto de longo prazo,
que era a “permissão de reentrada”, a qual assegurava a possibilidade
de saída e reingresso dos nikkeis durante a vigência de seus vistos,
propiciando, assim, as condições para uma mobilidade efetiva de
trabalhadores entre o Brasil e o Japão
27
.
Ao descrever as motivações que teriam levado o Governo
japonês a reformular a lei de imigração, para contemplar a autorização
de trabalho não especializado aos nikkeis brasileiros, a diplomata Maria
Edileuza Fontenele Reis enfatizou a influência que teria sido exercida,
no Japão, por parlamentares brasileiros de origem japonesa e pela
Liga Parlamentar Latino Americana da Dieta nipônica
28
no sentido de
privilegiar os nikkeis do hemisfério sul como beneficiários destes vistos
de longo prazo. O professor Wayne Cornelius compartilha esta mesma
opinião:
Numerically, the most important of Japan’s side-door
mechanisms for labor importation has been the policy of
allowing descendents of the Japanese emigrants to Latin
America to immigrate to Japan… The policy of highly liberal
immigration opportunities for the Nikkeijin from Latin
America is seen by Japanese officials as a politically low-
cost way of helping to solve the labor shortage”
29
.
Naoto Higuchi, no entanto, tem outra interpretação menos
conhecida e curiosa dos fatos que levaram a esta modificação da lei de
imigração. Segundo o autor, desde a tomada da Coréia pelo Japão em
1910, os cidadãos coreanos passaram a ser tratados como nacionais
do Império Nipônico. Muitos se beneficiaram dessa condição e
emigraram para o Japão nos anos subseqüentes, além dos que foram
para lá forçosamente levados na época da Segunda Guerra. Em 1947,
O CONTEXTO HISTÓRICO DA EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O JAPÃO
41
no entanto, a reforma da “Alien Registration Law” estipulou que esses
coreanos passariam a ser considerados estrangeiros, ou “ex-nacionais
japoneses”. O tratado que normalizou as relações políticas do Japão
com a República da Coréia em 1965 concedeu a permissão de
residência permanente aos coreanos já estabelecidos no Japão desde
a época da guerra e determinou que, até 1991, o status da terceira
geração de coreanos residentes naquele país seria regulamentado. Esta
geração já “sociologicamente japonesa”, nascida e criada no
arquipélago, tinha escassos vínculos com a terra de sua nacionalidade.
Ao promulgarem, em 1991, a “Lei Especial de Controle de Imigração
daqueles que Haviam Perdido a Nacionalidade Japonesa”, as
autoridades japonesas também voltaram sua atenção para os que eram
considerados “etnicamente japoneses”, mas que não tinham a
nacionalidade japonesa. Para equiparar a condição dessa terceira
geração de coreanos residentes no país à dos descendentes de
japoneses residentes nas ex-colônias imperiais, deixados para trás
quando da desocupação da Manchúria na China, Filipinas, Indonésia
e Coréia, teria sido criado, argumenta aquele autor, o visto de residência
de longo prazo para os nikkeis, condição da qual se beneficiaram, em
grande escala, os brasileiros e peruanos. Conclui Higuchi:
This is why a long term status of residence was established
in 1990 for the third generation descendents of Japanese
emigrants. Therefore, the de facto introduction of third-
generation Latin-Americans to the Japanese labor market
can be regarded as a by-product of dealing with the negative
consequences of Japanese imperialism
30
.
Qualquer que tenha sido a motivação para a adoção desse
novo regime de controle de imigração – e pesam mais os argumentos e
fatos em favor da primeira hipótese – a verdade é que a entrada em
vigor da Lei de Controle da Imigração em junho de 1990 assegurou a
possibilidade de uma rápida recuperação da oferta de mão-de-obra
42
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
para a indústria japonesa, sem qualquer conotação ostensiva de que o
Japão estaria admitindo trabalhadores não-qualificados. Ao mesmo
tempo, e para aplacar resistências de setores nacionalistas mais radicais
da sociedade, privilegiou, também sem chamar atenção para qualquer
elemento étnico ou racial da medida, a entrada de nikkeis latino-
americanos, na expectativa de sua mais fácil adaptação e integração
ao modo de vida japonês.
A promulgação da LIC em 1990 marcou, na cronologia de
Higuchi, o início da terceira fase da emigração brasileira para o Japão
(1990-1992). Embora desde o final da década anterior se verificasse
o incremento perceptível do número de brasileiros, esses eram, em sua
maioria, isseis com dupla nacionalidade e nisseis. A abertura do mercado
de trabalho japonês para, além destes, os sanseis, a terceira geração
de descendentes, efetivamente consolidou o pull factor de brasileiros
ao Japão, e com ela a possibilidade de que cônjuges não-descendentes
de japoneses também tivessem permissão para trabalhar,.
No Brasil, ao mesmo tempo, persistiam a instabilidade
econômica e a redução de oportunidades de emprego formal. Se a Lei
de Controle de Imigração pode ser considerada, do lado japonês,
como o marco histórico desse movimento, do lado brasileiro muitos
consideram o Plano Collor, de março de 1990, como tendo tido o
mesmo efeito, dando grande ímpeto ao push factor. Em conversas
mantidas pelo autor com brasileiros espalhados pelo Japão, não foi
incomum ouvir a referência àquelas drásticas medidas de congelamento
da liquidez financeira da população como razão para a primeira leva
em direção ao arquipélago. Pequenos e grandes negócios faliram por
falta de capital de giro, poupanças reservadas para despesas correntes
e futuras desapareceram, afetando sobremaneira a classe média, onde
se concentrava grande parte da colônia nikkei no Brasil. O antropólogo
norte-americano Daniel Linger chama atenção para o episódio:
The so-called Plano Collor, initiated when the new president
assumed office in March, administered a violent shock through
O CONTEXTO HISTÓRICO DA EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O JAPÃO
43
a package of drastic measures. Middle-class Brazilians
especially resented Collors move to block bank accounts, a
prohibition that left many small businesses in jeopardy and
rendered significant personal expenditures difficult or
impossible. The prolonged economic malaise, now aggravated
by gross governmental mismanagement, induced hundreds of
thousands of Brazilians – not just nikkeis – to leave the country.
But unlike most Brazilian emigrés, nikkeis now had the attractive
option of legal immigration to a First World country, and they
left Brazil in disproportionately high numbers. Time after time I
met nikkeis … who still spoke bitterly of Collor
31
.
A cineasta Tizuka Yamazaki, em seu segunda longa-metragem
sobre a saga da migração entre o Japão e o Brasil, “Gaijin 2 – Ama-
me como sou”, de 2005, bem ilustra esse acontecimento, ao descrever
a súbita ruína em 1990 do até então rico fazendeiro Gabriel, casado
com a neta da imigrante japonesa e personagem principal da história,
Titoê. Na seqüência, curiosamente, é esse gaijin não-nikkei que
embarca para o Oriente para trabalhar nas fábricas japonesas, na
tentativa de refazer a fortuna perdida quando foi confiscado o produto
da venda de sua fazenda no Paraná.
O fictício Gabriel, e com ele dezenas de milhares de brasileiros,
embarcaram para o Japão nesses dois primeiros anos da década de
1990. O crescimento do número de residentes brasileiros no Japão foi
vertiginoso: de 14.528 em 1989, para 56.429 em 1990, 119.333 em
1991 e 147.803 em 1992, um aumento de 162% em três anos.
Segundo Elisa Sasaki, outro indicativo desse movimento foi a mudança
do número de vôos comerciais entre os dois países. Em 1988, foram
registrados 42.681 vôos por empresas aéreas regulares entre o Brasil
e o Japão e em 1992, esse número chegou a 89.029
32
.
Uma característica importante desses pioneiros era o tipo e
local de emprego. Com uma ainda significativa demanda das indústrias
44
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
japonesas por mão-de-obra, muitos trabalhadores brasileiros eram
direcionados, por intermédio dos agenciadores ou “empreiteiros”, às
fábricas maiores, nos ramos automobilístico e de produtos eletrônicos.
Não eram estes empregados contratados diretamente pelas fábricas,
mas sim como complementos à força de trabalho japonesa existente.
Não se beneficiavam, portanto, das garantias e da segurança trabalhistas
estendidas aos trabalhadores nativos, representada pelo trinômio
“emprego vitalício - promoção por antigüidade - sindicato da empresa”
sobre o qual se estruturavam as tradicionais relações de trabalho no
Japão. Considerações mais aprofundadas sobre o regime, tipo e
características dos empregos dos brasileiros no Japão serão vistas no
Capítulo 3.
Em 1992-93 abateu-se sobre Japão o início de uma longa
recessão econômica, provocada pelo estouro da “bolha” da década
anterior, ou Heissei boom, com marcada redução dos níveis de
atividade econômica e de consumo internos
33
. O índice da bolsa de
valores japonesa, o nikkei index, baixou de 31.940 em junho de 1990
para 14.517 cinco anos mais tarde; em 1993, o PNB registrou queda
de 0,4%, e as exportações japonesas caíram de US$ 314 bilhões, em
1990, para US$ 268 bilhões, em 1993. É esse o cenário que Higuchi
define como o início da quarta fase da imigração brasileira (1993-
97). Com efeito, a partir daquela época, desacelerou-se o ritmo de
chegada de brasileiros ao arquipélago, reduzindo-se seu crescimento
a taxas entre 3% e 4% ao ano, mesmo com um aumento do desemprego
no Japão de 2,1% em 1991 a 3,4% em 1997
34
. Nessa conjuntura
negativa, aparentemente pouco favorável à geração de novas
oportunidades de trabalho, como explicar o número crescente de
brasileiros que sediriam para lá? Haveria, segundo o autor, duas
respostas: a) a adaptação dos nikkeijins a uma força de trabalho
altamente flexível e móvel, de rápida reação às freqüentes variações
de produção das empresas japonesas ao longo daquela década. Os
trabalhadores japoneses eram tradicional e culturalmente ligados às
O CONTEXTO HISTÓRICO DA EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O JAPÃO
45
empresas por contratos e benefícios vitalícios e tinham menos disposição
ou desejo de abandonar seus ambientes familiares e residências. Os
brasileiros, por seu turno, mostraram-se mais dispostos e propensos,
pela ausência de laços contratuais formais ou sociais, a aceitar mudanças
ocasionais de emprego, sem que isso representasse qualquer ônus
adicional para empresas que os demitissem; e b) a expansão dessa
força de trabalho brasileira pelo território japonês, tanto em termos de
tipo de emprego, nas fábricas menores, que alimentavam as grande
indústrias, como de localização, saindo do eixo Aichi-Shizuoka-Gunma
para outras regiões mais distantes, como Nagano.
A crise econômica japonesa, contudo, não deixou de ter algum
efeito sobre o número de brasileiros que lá chegavam. Em 1997, pela
primeira vez desde o início do processo migratório, houve uma redução
de 5,2% no tamanho da comunidade. Os salários também reduziram-
se ao longo do período, sendo necessárias mais horas de trabalho
para que se mantivessem os mesmos níveis de rendimento/poupança.
Para aqueles que tinham objetivos maiores para o regresso, como a
compra de um imóvel ou a abertura de negócio próprio, isto
representaria a necessidade de um prolongamento de sua estada no
Japão, de modo a acumular o necessário capital para a volta.
Na quinta e última fase descrita por Higuchi, que vai de 1998
até o presente, predomina o que o autor chama de “generation
change”. O número de brasileiros com visto temporário, a maior parte
dos quais sansei, ultrapassou a categoria de “filhos ou cônjuges de
japonês”, o nissei. Esta transformação no perfil da população trouxe
dois reflexos importantes: o aumento relativo no número de crianças e
jovens, que engendrou questões de sua educação no Japão, como
será visto mais adiante, e também a percebida redução nos níveis de
escolaridade da população.
A consolidação da rede migratória entre os dois países abriu as
portas para um tipo de emigrante diferente daquele que caracterizou
as primeiras levas. Mais jovens nikkeis, de 15 a 20 anos, deixavam o
46
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Brasil em busca de salários nas fábricas para satisfazer demandas de
consumo imediatas, como automóveis ou outros bens. Destacou-se
ainda a crescente presença de mulheres, não só acompanhando
maridos, mas também solteiras, atraídas pela disponibilidade de
empregos no Japão.
Ao longo dos últimos anos, a população brasileira continuou a
crescer ininterruptamente, chegando, em 2005, a mais de 300.000, de
acordo com os registros oficiais. Agregue-se a esse valor o número de
brasileiros que já adquiriram a dupla nacionalidade e a cifra pode alcançar
mais de 330.000. Uma visão mais pormenorizada sobre estes últimos
anos do processo migratório será mostrada nos capítulos que se seguem.
A cronologia de Higuchi e demais fatos e observações acima
oferecem uma descrição sucinta do que constituiu o chamado “fenômeno
decasségui”, de suas origens aos dias de hoje. Este mesmo fenômeno
pode ser visto à luz de outras teorias sobre deslocamentos do fator de
produção trabalho e migração, cujos fundamentos contribuem também
para a sua compreensão.
Keiko Yamanaka em seu estudo sobre a diáspora circular entre
o Brasil e o Japão recorre, nesse sentido, à teoria de sistemas mundiais
(world systems theory) e a de sistemas migratórios (migration systems
theory) para explicar as forças primordiais e secundárias inerentes aos
movimentos populacionais transnacionais
35
.
A primeira corrente de pensamento enfoca a economia global
moderna como uma unidade complementar de divisão do trabalho entre
o centro e a periferia, em constante transformação na medida em que
as forças capitalistas incessantemente buscam a maximização do lucro.
Assim, prossegue a autora:
International labor migration occurs as part of the internal
dynamics of the world system as capitalists’ drives for profit
maximization and surplus accumulation incorporate outlying
areas and populations into the mechanisms of trading
capital, goods and labor at the transnational level
36
.
O CONTEXTO HISTÓRICO DA EMIGRAÇÃO BRASILEIRA PARA O JAPÃO
47
A maneira como as unidades do centro encontrarão,
mobilizarão, transportarão e utilizarão a força de trabalho disponível
na periferia dependerá não apenas da remuneração oferecida a esse
fator de produção, mas também de vínculos políticos, sociais e culturais
que mantenham com os exportadores de mão-de-obra. Se a teoria de
sistemas mundiais pode explicar o porquê do início de um processo
migratório, em termos das vicissitudes da globalização econômica, ela
não define claramente as condições em que esse movimento se sustenta
diante da mutação dos parâmetros que lhe deram origem e das decisões
individuais dos migrantes que o compõem. Segundo Yamanaka, é
preciso analisá-las com base na teoria de sistemas migratórios, que:
... pays major attention to participation of migrants in the
process of constructing their own systems for sustaining the
flow of migrants between two countries over time. While
driven by the push-pull factors specific to a particular
historical context, the migrants actively mobilize individual,
family and community resources, all of which are under their
control and beyond the reach of outside forces
37
.
Criam-se, dessa maneira, redes pessoais, familiares e
informacionais entre os dois países que conduzirão, ao longo do tempo,
à formação de enclaves comunitários no destino, com suas próprias
instituições, associações e empreendimentos. Estes saberão adaptar-
se às alterações de normas e regulamentos, ciclos econômicos e às
reações da população nativa no país hospedeiro em função de sua
resistência e flexibilidade próprias, desenvolvidas e consolidadas ao
longo do tempo, motivadas pela sua aspiração maior de melhoria de
condição de vida. Funcionarão também para absorver melhor as levas
posteriores de imigrantes que chegarem, além de servir de canal de
informação ao país de origem sobre a vida no novo destino.
Os dois princípios acima resumidos por Yamanaka vão, em
grande medida, ao encontro dos fundamentos essenciais que
48
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
determinaram a migração dos nikkeis brasileiros para o Japão no final
do século XX, tal como categorizada por Naoto Higuchi. Foi visto
como aquele país, na condição de integrante do centro, confrontado
pela escassez de mão-de-obra não qualificada essencial à manutenção
de sua competitividade econômica, foi buscar, na periferia, este fator
de produção. O Japão, constrangido por resistências históricas, culturais
e etnocêntricas contra a importação de trabalhadores da vizinhança
asiática que se ofereciam para ocupar este espaço, empregou a
habilidosa alternativa de se valer de laços consangüíneos com uma
força de trabalho disponível oriunda das margens do sistema. Num
segundo momento, este contingente humano, identificado sobretudo
na figura do nikkei brasileiro, consolidou, no Japão, o seu próprio
modus vivendi de relacionamentos intra-comunitários e externos com
a origem no Brasil, que lhe permitiu enfrentar as adversidades naturais
de adequação a uma nova sociedade e adaptar-se às variações no
panorama econômico do país hospedeiro.
PARTE II
GENZAI: O PRESENTE
51
CAPÍTULO 2
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
2.1 – A BASE ESTATÍSTICA
Na parte introdutória do trabalho, foram examinadas as
principais razões que ocasionaram o movimento migratório de
brasileiros para o Japão a partir do final dos anos 1980. Foi visto
como a saída em grande número de emigrantes se deveu, de um
lado, aos push factors no Brasil – a instabilidade econômica, o
desemprego e o Plano Collor de 1990 – e aos pull factors no
Japão – a falta de mão-de-obra no setor industrial e a atração de
salários comparativamente mais vantajosos em relação aos padrões
brasileiros. Distinguiu-se esse fluxo de outros movimentos
migratórios de brasileiros para o exterior no final do século XX
pelo direcionamento de um contingente específico da população –
os descendentes dos imigrantes japoneses – sob um arcabouço de
legalidade, como resultado da reforma da Lei de Controle da
Imigração japonesa, também em 1990.
A presente seção enfocará o que representa e como evoluiu
quantitativamente a população brasileira no Japão, tendo como fonte
primária estatísticas oficiais do Governo japonês sobre estrangeiros
em seu território. Mais adiante, serão analisados dados sobre a
população coletados de fontes secundárias e oficiosas, com enfoque
mais qualitativo, e cuja principal expressão é a pesquisa realizada
pelo autor entre abril e agosto de 2006 entre a comunidade brasileira
52
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
residente naquele país. Reunidas e cotejadas estas informações,
será avaliado ainda se existem, ou não, indícios significativos que
poderiam atestar para o progressivo enraizamento, ou permanência,
de brasileiros no Japão, ou seja, se, de fato, se pode dizer que essa
comunidade está passando da classificação de “decasségui” para
“emigrada”. Como afirma a pesquisadora do National Institute of
Population and Social Security Research do Japão, Yoshimi Chitose,
ao referir-se às evidências de assentamento (settlement) de
estrangeiros no Japão:
although the answer to this question is still ambiguous
and it may be too early to answer, the demographic profiles
of foreign nationals in Japan at the macro-level, such as
age distribution and sex ratios may provide us with some
important implications for their lengths of residence in
Japan
38
.
As estatísticas populacionais no Japão são extremamente
abrangentes e pormenorizadas. Há dados precisos sobre todos
os aspectos demográficos. A publicação Population Statistics
of Japan 2006 do National Institute of Population and Social
Security Research, por exemplo, cataloga em 11 capítulos, 164
tabelas e 31 gráficos, dados quantitativos sobre crescimento
populacional, estrutura etária, nascimento e longevidade,
fertilidade, mortalidade, nupcialidade, moradias/domicílios, força
de trabalho, educação, estrangeiros e migração interna, cada
um com dispersões individuais em termos de sexo, idade,
distribuição geográfica, incrementos percentuais, etc. Muitas
dessas estatísticas populacionais datam da Era Meiji, quando
começaram a ser compiladas a partir da instituição do koseki,
ou registro familiar obrigatório. Outra importante fonte de
informações é o Statistics Bureau & Statistical Research and
Training Institute (www.stat.go.jp) do Ministério de Assuntos
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
53
Internos e Comunicações do Japão, que compila dados coletados
de órgãos governamentais centrais e regionais. A série histórica
contém 31 seções e 838 tabelas, referentes ao período 1868 a
2002.
No que se refere à população estrangeira no Japão, existem
fontes específicas de pesquisa estatística. Yoshimi Chitose aponta
algumas, como Statistics on Foreigners Registered in Japan, da
Japan Immigration Association; The Annual Report on Statistics
of Legal Migrants; o Censo Demográfico Qüinqüenal do Japão e
The Report on the Employment Conditions of Foreigners
39
.
Assim como aquela pesquisadora, o autor também baseou seu
levantamento quantitativo da população brasileira essencialmente
no primeiro conjunto de dados oficiais, o Statistics on Foreigners
Registered in Japan, pois este oferece um registro numérico preciso,
segundo vários critérios: idade, sexo, tipo de visto, domicílio, entre
vários outros, dados nem sempre presentes nos demais compêndios.
As estatísticas são publicadas anualmente, em japonês, e delas
podem-se derivar as seguintes características da comunidade
brasileira no Japão.
2.1.1 – A DIMENSÃO DA POPULAÇÃO BRASILEIRA
Quando se fala da ida de brasileiros para o Japão, geralmente
dá-se como referencial histórico a revisão da Lei de Controle da
Imigração de 1989, posta em vigor em junho do ano seguinte, que
concedeu aos nikkeis a possibilidade de trabalho legal naquele
país
40
. Foi, sem dúvida, aquele marco legal que impulsionou e
acelerou o movimento emigratório, mas, desde a década de 1980,
notava-se um incipiente deslocamento de nacionais em direção ao
Oriente, atraídos pelas ofertas de emprego e pelos altos salários
oferecidos pela indústria japonesa. Temos, assim, o seguinte quadro
do crescimento da população brasileira naquele país:
54
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Tabela 1 – População Brasileira Residente no Japão 1986-2005
Fonte: Statistics on Foreigners Registered in Japan
Observa-se no gráfico acima o grande impacto que teve a
reforma da Lei de Imigração em 1990. Naquele ano, o número de
brasileiros aumentou 288% em relação ao período anterior e continuou
crescendo de forma acelerada nos anos subseqüentes, até 1997,
quando chegou, oficialmente, a 233.254, um aumento médio de 26,2%
ao ano nos primeiros sete anos. A partir de então, a taxa de crescimento
da população cresceu a ritmo menos acelerado, para, em média, 3,4%
ao ano, a despeito de uma queda real de 4% nos anos 1998-99.
Estas cifras, tomadas de forma isolada, e principalmente a partir
de 2000, poderiam representar forte indicativo de assentamento,
traduzido por um crescimento vegetativo da população. No entanto,
como foi visto anteriormente – e o será outra vez mais adiante – a
comunidade brasileira no Japão caracteriza-se igualmente por um
elevado índice de mobilidade, seja internamente no território japonês,
seja de e para o Brasil, na chamada migração circular.
Para tentar quantificar esse movimento circular, o autor utilizou
as estatísticas referentes aos vistos de entrada de brasileiros no Japão
nos últimos anos, para tentar determinar o quantitativo de novos
migrantes e aqueles que estariam retornando depois de passar uma
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
55
temporada no Brasil. Tal aferição é possível pelo fato de a imigração
japonesa exigir, de portadores estrangeiros de vistos temporários ou
permanentes uma “autorização de reentrada” (re-entry permit) para
que possam reingressar no Japão durante a validade de seus respectivos
vistos. Apurados esses dados para o período 2000 a 2004 (não estão
computados os vistos de turista, negócios ou diplomáticos/oficiais),
ter-se-á o seguinte quadro, que leva a uma “Estimativa do Número
Retornando ao Brasil Definitivamente” (ENRBD), ou seja, de quantos
brasileiros regressam ao Brasil com a intenção de uma temporada mais
prolongada:
Tabela 2 – Estimativa de Brasileiros que Retornam ao Brasil
Fonte: Ministério da Justiça do Japão
As reentradas referem-se a pessoas que deixam e regressam
ao Japão num espaço relativamente curto de tempo (três meses), por
isso não influem no número total da população brasileira. Assim, se
tomarmos, por exemplo, a população brasileira registrada em 31 de
dezembro 2003, que era de 274.700, a ela acrescentarmos o número
de ingressos de portadores de vistos novos concedidos pelos
consulados japoneses no Brasil no ano seguinte – 41.764, chegaremos
1999 222.299
2000 254.394 58.577 42.936 101.513 28.482 11,2
2001 265.962 38.533 42.267 81.800 27.965 10,5
2002 268.332 33.326 38.467 71.763 30.956 11,5
2003 274.700 41.101 38.591 79.962 34.733 12,6
2004 286.557 41.764 38.196 79.960 29.907 10,4
Ano
População
Total
Re-
entrada
Visto
Novo
Total de
entradas
ENRBD %
56
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
a uma população total de 316.464. Subtraindo desta cifra a população
total em 31 de dezembro de 2004 – 286.557, haveria uma diferença
de 29.907, que seria uma estimativa do número de brasileiros que
retornaram definitivamente em 2004.
Mesmo com todas as reservas que este tipo de aferição
necessariamente tem de levar em conta – o “visto novo” pode ser
concedido a alguém que já tenha vivido no Japão e cuja autorização
para reentrada tenha expirado enquanto no Brasil – ela permite inferir
que o número de brasileiros que vai ao Japão pela primeira vez a cada
ano continua sendo significativo, pois, se, em média, 11,3% do total da
população regressa definitivamente, e assim mesmo, a comunidade
cresce a uma taxa de 3,4% ao ano, o índice de newcomers representa
em torno de 14,7% do total da população por ano.
2.1.2 – A LOCALIZAÇÃO NO TERRITÓRIO JAPONÊS
A população brasileira está hoje dispersa por todas as 47
províncias do território japonês. Sua densidade por região
administrativa, no entanto, varia significativamente, desde 71.004 em
Aichi, a apenas 22 em Yamaguchi, refletindo a natural concentração
em torno das principais áreas industriais do país (dados de 2005). Há
dez províncias que contam, cada uma, com mais de 10.000 brasileiros
residentes: Aichi, Shizuoka, Mie, Gifu, Gunma, Nagano, Kanagawa,
Saitama, Shiga e Ibaraki e que, em conjunto, abrigam 81% da
comunidade. A cidade de Hamamatsu, província de Shizuoka, é a que
congrega o maior número de brasileiros: 18.000, mas é em Oizumi,
província de Gunma, que reside a maior população proporcional: 10%
dos habitantes do município são brasileiros.
Em termos de mobilidade interna da população brasileira, os dados
revelam que, desde o início dos anos 1990, houve marcado movimento
em direção à região sudoeste do Japão, principalmente para as províncias
de Aichi, Gifu, Mie, Shiga e Shizuoka. Entre 1994 e 2005, a participação
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
57
dos residentes nessas cinco províncias aumentou de 42% para 58% do
total da população brasileira, ao passo que nas províncias mais próximas e
ao norte de Tóquio (Gunma, Nagano, Kanagawa, Saitama e Ibaraki),
estes mesmos percentuais diminuíram de 28% para 26% .
Tabela 3 – Distribuição da População por Província 1994-2005
Fonte: Statistics on Foreigners Registered in Japan 1994-2005
2.1.3 – A DISTRIBUIÇÃO ETÁRIA
Como foi visto no início deste trabalho, o primeiro ideal dos
brasileiros que se deslocaram para o Japão, no começo da década de
1990, era o de amealhar, no menor tempo possível, recursos financeiros
suficientes que lhes permitissem regressar ao País para refazer ou
melhorar sua situação sócio-econômica. Caracterizou as levas iniciais
dos chamados decásseguis, portanto, uma forte predominância de
homens adultos, solteiros ou que deixaram para trás suas famílias no
Brasil, com o objetivo de reduzir ao mínimo os gastos não-essenciais,
em ienes, para a sobrevivência no que esperavam ser o curto tempo
de permanência no exterior. Com efeito, as estatísticas mostram que,
58
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
em 1990, apenas 4% da população brasileira que se estabelecia no
Japão eram de crianças de 0 a 14 anos (no Brasil o mesmo índice de
crianças na população daquela época era de quase 35%). O percentual
de idosos (acima de 65 anos) também era insignificante.
Com o passar dos anos, no entanto, este perfil alterou-se
progressivamente, em direção a uma composição reveladora de uma
permanência mais longa, e que trouxe também uma série de outros reflexos
para a vida e para as atividades da comunidade brasileira no Japão.
Tabela 4 – Distribuição da População Brasileira por Faixa Etária 1990-2005
Fonte: Statistics on Foreigners Registered in Japan 1990-2005
Como se pode observar pelo gráfico acima, a população
brasileira no Japão vem, gradativamente, apresentando uma
distribuição etária mais equilibrada, como demonstram os números
crescentes de crianças e pessoas acima de 40 anos. A faixa de 15 a
39 anos, para a qual há tradicionalmente maior oferta de emprego e
que era absolutamente majoritária nos primeiros anos da emigração,
com 76% do total em 1990, em 2005 participava com apenas 56%.
A população de crianças alcançou uma média de 15% nos primeiros
anos do milênio e a de mais de 40 anos subiu de 20% para 29% nos
anos sob exame.
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
59
A maior presença de crianças na população suscitou a questão
de sua educação, principalmente para aqueles que lá chegaram já em
idade escolar e impulsionou, como será visto no Capítulo 3.1, a formação
de uma rede de escolas brasileiras que hoje já chega a mais de cem
estabelecimentos. Já o gradativo envelhecimento da comunidade
brasileira trará consigo a questão da proteção social e da previdência
e assistência médica, objeto do Capítulo 3.3.
Em comparação com a população urbana residente no Brasil,
esses percentuais, de acordo com o censo de 2000 do IBGE, foram
de 28% para crianças de 0 a 14 anos, 44% para o grupo 15 a 39 anos
e 22% para o resto da chamada população economicamente ativa
(p.e.a), dos 40 aos 65 anos. Caso se mantenham essas tendências das
duas p.e.as, a do Brasil e a dos brasileiros no Japão, é possível que,
dentro de 10 anos, estejam elas muito semelhantes, na faixa dos 70%
do total dos respectivos grupos, conforme mostra o gráfico a seguir:
Tabela 5 - População Economicamente Ativa - Brasil e
Comunidade no Japão 1990-2005 e projeção 2015
Fontes: Statistics on Foreigners Registered in Japan 1990-2005; Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE Projeção da População do Brasil por
Sexo e por Idade para o período 1980-2050, Revisão 2004; a projeção da população
brasileira no Japão foi derivada de cálculo linear.
60
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
O que se pode deduzir, para a população brasileira no Japão,
a partir das tendências acima? De um lado, verifica-se que a faixa
mais jovem da população se estabilizou no patamar de 15% a 16%
do contingente total, o que estaria em linha com a perspectiva mundial,
sobretudo nos países desenvolvidos, de continuada queda das taxas
de fecundidade. Tal queda decorre do custo relativamente alto de se
criar uma criança no Japão, em termos de moradia, vestuário,
alimentação e, sobretudo, educação superior, razão pela qual tal
percentual não deverá alterar-se significativamente no futuro. Do
outro, os dados apontam para um relativo envelhecimento da
comunidade brasileira que, a par da questão da proteção social,
poderá continuar encorajando a vinda de jovens trabalhadores nikkei
nos próximos anos, principalmente para as tarefas fisicamente mais
exigentes nas fábricas das quais um grupo mais idoso tenderá,
naturalmente, a se afastar.
2.1.4 – A COMPOSIÇÃO POR SEXO
Como foi visto acima, a migração de brasileiros para o Japão a
partir de 1990 foi, nos primeiros anos, caracterizada por uma presença
predominante de homens adultos. Nos anos que antecederam a revisão
da Lei de Controle de Imigração, no entanto, a proporção era inversa,
com um percentual maior de mulheres, o que pode ser explicado por
casamentos de brasileiras com cidadãos japoneses que residiram no
Brasil (em 1981, havia 131.363 nacionais japoneses residentes no
Brasil, número que, em 2004, havia caído para 69.019)
41
. Até 1988,
havia um total de pouco mais de 4.000 brasileiros residindo no Japão.
Em 1990, conforme mostra a tabela abaixo, o diferencial por
sexo (número de homens por cada 100 mulheres) na comunidade
brasileira era de 160. Dois anos mais tarde, já estava em 150 e, desde
então, vem diminuindo progressivamente até estabilizar nos últimos 4
anos em torno da faixa de 122-124.
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
61
Tabela 6 – Proporção de Homens por cada
100 Mulheres da População Brasileira
Fonte: Statistics on Foreigners Registered in Japan 1988-2005
A regressão do diferencial por sexo na comunidade, conquanto
ainda seja superior ao das médias das respectivas populações nativas
(o do Japão é de 95,4 homens por mulher e o do Brasil 96,9
42
), pode
também apontar na direção de um gradual assentamento da população
brasileira naquele país. É preciso ter em mente que estas cifras revelam,
majoritariamente, dados referentes aos primeiros emigrantes, os
pioneiros, entre os quais a presença masculina, tradicionalmente, sempre
foi maior. Se forem computados os diferenciais relativos às crianças
brasileiras lá residentes, no entanto, a proporcionalidade entre os sexos
estará mais próxima às médias nacionais: de 2001 a 2005, para a
população brasileira de 0 a 14 anos no Japão, os números variam de
104 a 106 meninos por cada 100 meninas.
2.1.5 – A COMUNIDADE BRASILEIRA ENTRE AS
COLÔNIAS ESTRANGEIRAS NO JAPÃO
Finalmente, nesta seção de macro-análise estatística da
comunidade brasileira no Japão, conviria uma palavra sobre sua
62
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
posição vis-à-vis as outras grandes colônias de estrangeiros naquele
país.
Até princípios da década de 80, havia apenas duas grandes
comunidades estrangeiras residindo no Japão: a coreana e a
chinesa. A primeira, com uma média de 600.000 cidadãos desde
a Segunda Guerra, quando muitos coreanos foram forçados a ir
trabalhar na indústria bélica nipônica. Desde a ocupação japonesa
da península coreana em 1910, os coreanos eram considerados
súditos do Império Japonês e muitos adquiriram a cidadania
japonesa, em muitos casos emigrando voluntariamente para o
território nipônico. Em 1952, contudo, a lei de imigração foi revista
no Japão e a cidadania japonesa retirada da colônia de origem
coreana (ver capítulo 2.2, pág. 17), que passou então a residir no
Japão com o visto especial (exceptional permanent resident).
Em razão do conflito na península coreana entre 1953 e 55, muitos
preferiram permanecer no Japão e desde então lá se fixaram.
A origem da população chinesa advém essencialmente dos
mesmos fatores – a expansão do Império Japonês na Ásia, a
tomada da Manchúria e a ida de muitos trabalhadores chineses
para integrarem, compulsoriamente, o esforço de guerra nipônico.
O número de chineses, no entanto, era bem menor do que o de
coreanos – pouco mais de 37.000 em 1948 e 48.000 em 1975.
A reforma da lei de imigração em 1990 alterou
sobremaneira este quadro. Conquanto permanecem
preponderantes as colônias oriundas dos vizinhos asiáticos, hoje
quase 19% dos estrangeiros no Japão são de origem sul-
americana, sobretudo brasileiros, com (15,3%) e peruanos
(2,8%). Ao mesmo tempo, a colônia coreana vem diminuindo
progressivamente desde 1991, enquanto a chinesa praticamente
triplicou desde 1989, para mais de 519.000 nacionais. É grande
também o número de filipinos (170.000), tailandeses (35.000) e
norte-americanos (49.000).
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
63
Tabela 7 – Populações Estrangeiras no Japão 1995-2005
Fonte: Statistics on Foreigners Registered in Japan 1995-2005
Como se observa pelo quadro acima, a população coreana
vem progressivamente diminuindo, o que pode ser explicado pela longa
permanência no arquipélago, pela adoção de hábitos e costumes
japoneses – inclusive as baixas taxas de fecundidade – pelos
casamentos com nipônicos e pelo não-ingresso de novos cidadãos
daquele país. Inversamente, a comunidade chinesa, originária tanto do
continente como de Taiwan, cresceu 132% desde 1995. A grande
maioria dessa população emigrou também para compor a deficiente
demanda de mão-de-obra industrial do Japão a partir dos anos 1980,
mas sob um diferente regime de trabalho dos brasileiros, pois seus
vistos de permanência são geralmente de menor duração.
A comunidade brasileira, por sua vez, após o primeiro grande
surto emigratório no período 1990-95, tem crescido a taxas mais
regulares na última década, numa média de 3,4% ao ano e mantém a
posição de terceira maior colônia estrangeira no Japão. A população
peruana, como a brasileira, composta majoritariamente por nikkeis, é
também significativa, quase 58.000, mas seu crescimento tem diminuído
nos últimos anos, em razão do menor número relativo de descendentes
64
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
de japoneses naquele país, bem como de um rigor maior aplicado pelas
autoridades japonesas na concessão de vistos para peruanos. Em
termos proporcionais, a distribuição das populações estrangeiras no
Japão teve, em 2005, a seguinte configuração:
Tabela 8 – Populações de Origem Estrangeira Residentes no Japão 2005
Fonte: Statistics on Foreigners Registered in Japan 2005
2.2 – A ANÁLISE QUALITATIVA
Os números descritos na seção anterior são reveladores de
algumas tendências e características predominantes da comunidade
brasileira no Japão. São, no entanto, apenas quantitativos
decorrentes de uma macro-análise que denotam uma situação
demográfica específica em determinado momento ou período, da
qual se podem deduzir certas presunções ou estimar projeções de
comportamento. É, por assim dizer, uma radiografia estática de uma
realidade humana.
Essa realidade, porém, não é composta apenas de números e
gráficos. É formada por desejos e aspirações individuais, relações
familiares, sociais e de trabalho, motivações pessoais e coletivas, enfim,
toda sorte de condicionantes que, aliados às forças maiores das
sociedades em que o indivíduo vive e de onde veio, contribuirão para
determinar o seu destino.
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
65
Assim, considerou o autor necessário e conveniente buscar
essas informações diretamente na origem, junto aos brasileiros que
hoje vivem no Japão. Para tanto, recorreu à realização de uma pesquisa
por amostragem entre abril e agosto de 2006, que resultou no
recebimento de 1587 respostas a um questionário simples, porém
detalhado, que solicitava esses dados complementares sobre a
população. O original do questionário encontra-se no Anexo.
A fim de abarcar respostas representativas da população
distribuída por todo o Japão, o questionário foi colocado, em formato
eletrônico, na página principal dos sítios na Internet dos Consulados-
Gerais em Tóquio e Nagóia. Paralelamente, foi distribuído nos balcões
de atendimento das mesmas repartições, para ser manualmente
preenchido enquanto os participantes aguardavam o processamento
do serviço consular, e também em alguns consulados itinerantes dos
quais participou o autor. Colaborou igualmente na coleta de dados o
Banco do Brasil, distribuindo e recebendo formulários de clientes em
suas agências naquele país. Assim, a pesquisa incorporou respostas
tanto daqueles com familiaridade e acesso à comunicação eletrônica,
bem como daqueles que, por falta de meios ou conhecimento, não
puderam fazê-lo por aquela via. Do universo total de respostas, 357
resultaram do preenchimento eletrônico e 1.230 por meio manual.
Com o propósito de extrair respostas as mais próximas possíveis
da realidade individual do inquirido, o questionário foi elaborado de
maneira anônima, para evitar qualquer constrangimento ou receio
pessoal da parte do entrevistado. A maior parte dos questionários,
ademais, não foi preenchida diante da presença física de um
entrevistador, mas pelos próprios membros da comunidade em seus
computadores, nas salas de espera das repartições consulares, em
empreiteiras e bancos, o que ocasionou muitas respostas em branco e
outras talvez não condizentes com a efetiva realidade dos inquiridos.
É importante frisar, antes de se passar à descrição e
interpretação dos resultados, que a pesquisa foi preparada e analisada
66
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
sem o rigor dos critérios científico, estatístico ou sociológico que
costuma embasar enquetes ou recenseamentos dessa natureza. Seu
propósito primordial foi o de buscar, em grandes linhas, informações
sobre a vida pessoal da comunidade, suas famílias, seu modo de vida
e seus planos para o futuro.
As perguntas foram divididas da seguinte forma: descendência;
origem geográfica no Brasil; residência no Japão; motivação da
emigração, tempo de permanência no Japão e retorno temporário ao
Brasil; situação legal no Japão (tipo de visto de permanência); imóveis
e carros adquiridos no Japão; tipo de emprego no Japão; grau de
escolaridade; estado civil e família; número e escolaridade de filhos; e
finalmente, finalidade de remessas financeiras e poupança e intenção
ou não de retorno definitivo.
Como ponto inicial de análise, foi preciso determinar o grau de
coincidência de algumas dessas informações com os dados oficiais
japoneses relativos a 2005, de modo a atestar a confiabilidade das
demais respostas fornecidas. Havendo coincidência nas proporções
aferidas nas estatísticas oficiais com as da pesquisa em determinados
quesitos, pode-se então presumir que os demais dados também serão
representativos da população como um todo.
Assim, o primeiro item a ser cotejado foi o da distribuição da
população brasileira no Japão. De acordo com as estatísticas oficiais,
dez províncias japonesas abrigam cerca de 81% da população brasileira:
Aichi, Shizuoka, Mie, Gifu, Gunma, Nagano, Kanagawa, Saitama,
Shiga e Ibaraki. Na pesquisa, as respostas oriundas de pessoas que
declararam morar nessas mesmas dez províncias somaram 82,03%. A
província com o maior número de brasileiros no Japão é Aichi, com
23,51% da população, segundo o Ministério da Justiça daquele país;
na pesquisa, o percentual foi de 27,41%. A cidade de Hamamatsu,
por sua vez, é a que mais tem brasileiros, um total de 18.000, ou 5,96%
do total da população emigrada; na pesquisa, 6,24% das respostas
originaram de pessoas residentes naquela cidade. Neste primeiro critério,
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
67
portanto, pode-se dizer que a pesquisa é precisa com relação à
distribuição geográfica da população.
Um segundo parâmetro de comparação foi o da composição
por sexo. Como a pesquisa foi respondida quase que totalmente por
adultos (e algumas crianças mais inquisitivas e informatizadas), foi
derivada, inicialmente, a proporção por sexo da população brasileira,
de acordo com as estatísticas oficiais japonesas, relativa a indivíduos
acima de 14 anos, que resultou numa distribuição de 128 homens por
cada mulher. Na pesquisa, a proporção aferida foi de 126, novamente
reforçando a validade dos dados apurados na amostragem.
Assim, com base nesta ampla e genérica premissa de que as
informações prestadas nas respostas ao questionário correspondem,
com aceitável grau de confiabilidade, à realidade da comunidade
brasileira residente no Japão, pôde-se, então, passar à análise dos
outros itens do levantamento realizado.
2.2.1 – A ASCENDÊNCIA ÉTNICA
O visto de permanência para trabalhar no Japão é concedido,
nos termos da Lei de Controle de Imigração de 1990, aos descendentes
de cidadãos japoneses até a terceira geração, isto é, aos nisseis e
sanseis, seus cônjuges, independentemente de etnia, e filhos. A maior
parte dos japoneses que emigraram para o Brasil o fizerem no período
antes da Segunda Guerra Mundial, cerca de 190.000 dos quase
250.000 que aqui se assentaram. É de esperar, portanto, que a
incidência de nisseis seja inferior à de sanseis na comunidade brasileira
no Japão.
A pesquisa revelou que, de fato, predomina na composição da
população brasileira a classificação da terceira geração de descendente,
o sansei. Alguns declararam-se pertencer à quarta geração, yonsei.
Embora não haja previsão legal para a concessão de vistos de
permanência para esta categoria, a imigração japonesa pode conceder
68
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
a permissão para filhos de sanseis que já tenham residido no Japão por
um período mais longo. A distribuição segundo a ascendência étnica
foi assim tabulada:
Tabela 9 – Ascendência Étnica da Comunidade Brasileira no Japão
No questionário, foi também incluída uma outra classificação
étnica, “mestiço”, termo usado por muitos brasileiros descendentes
de japoneses. Ao observar as salas de bate-papo em sítios da
Internet especificamente direcionadas à comunidade decasségui
(como por exemplo www.batepapo.uol.com.br/brasileiros no
exterior/dekasegui, com 18 “salas”), podem-se encontrar internautas
que participam com apelidos como “mestiço de hamamatsu”, ou
“mestiço.shiga”. É curiosa esta constatação, na medida em que, em
termos de classificação racial no Brasil, a quase totalidade da
população pode ser considerada “mestiça”, resultado da
miscigenação de mais de 60 nacionalidades e raças ao longo da
história. São raros, contudo, os brasileiros que se referem a si
mesmos com tal denominação. Esta curiosidade poderia estar
associada a questões de identidade pessoal, que serão vistas com
mais profundidade adiante, tanto decorrentes da resistência cultural
Classificação Número Percentual
Nissei 488 30,75
Sansei 727 45,81
Não-descendente de japonês 270 17,01
Yonsei 5 0,32
Mestiço 73 4,6
Em branco/não respondido 24 1,51
TOTAL 1.587 100,00
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
69
inicial da comunidade nikkei no Brasil em aceitar casamentos e
filhos com não-nikkeis, como também – e inversamente – de uma
afirmação de “brasilidade”, em reação à discriminação que sofrem
no Japão e a não quererem associar-se à cultura que os reprime em
função da ostentação da importância de preservação da
homogeneidade racial. Do lado oposto desta última auto-percepção
étnica, no entanto, está a descrição que alguns nikkeis fazem de
seus cônjuges não-nikkeis: “casei com um(a) brasileiro(a)”, ou seja,
permanece, até hoje, a distinção subconsciente de alguns
descendentes de japoneses no Brasil quanto a suas origens raciais,
embora compartilhem uma única nacionalidade com os demais
“brasileiros”.
Quanto às faixas etárias da comunidade, a pesquisa revelou,
entre os adultos, uma idade média de 32,8 anos. Por categoria, as
médias foram: nissei, 39,4 anos; sansei, 28,9; yonsei, 25,2, não
descendente, 33,5; e mestiço, 27. Uma divisão mais detalhada da
composição etária e subdivisão por sexo, bem como do
relacionamento entre as categorias geracionais e étnicas em termos
de casamento, será vista em seção específica a seguir.
2.2.2 – A ORIGEM NO BRASIL
A colônia japonesa no Brasil fixou-se majoritariamente na
região sudeste, principalmente no Estado de São Paulo e também no
Sul, no Paraná. Posteriormente, outros núcleos formaram-se no Mato
Grosso do Sul, no Pará e, em menor escala, pelo resto do território
nacional, quase sempre em torno dos centros de atividade agrícola.
De acordo com o Censo do IBGE de 2000
43
, 59% da população
brasileira que se autodenominou “amarela” residia do Estado de São
Paulo, 14,5% no Paraná e 2% no Mato Grosso do Sul.
A pesquisa corroborou essa dispersão geográfica da origem
da comunidade residente no Japão, conforme a tabela a seguir:
70
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Tabela 10 – Origem da Comunidade Brasileira no Japão
por Estado da Federação
Estão relacionados apenas os Estados com mais de 10 respostas.
Houve também registro de brasileiros originários de Pernabuco, Rondônia,
Paraíba, Espírito Santo, Maranhão, Piauí, Sergipe, Acre, Ceará e Rio Grande
do Norte.
Em termos de distribuição por municípios de origem no Brasil
relacionados na pesquisa, os dez primeiros, em ordem de grandeza
decrescente, foram os seguintes:
Estado de Origem no Brasil Total Percentual
São Paulo 1054 66,41%
Paraná 259 16,32%
Mato Grosso do Sul 52 3,28%
Pará 33 2,08%
Minas Gerais 29 1,83%
Rio de Janeiro 29 1,83%
Goiás 19 1,20%
Rio Grande do Sul 17 1,07%
Mato Grosso 16 1,01%
Santa Catarina 13 0,82%
Amazonas 12 0,76%
Distrito Federal 12 0,76%
Bahia 10 0,63%
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
71
Tabela 11 – Origem da Comunidade Brasileira no Japão
por Município/Estado
Deduz-se por estes dados uma dispersão da população nikkei
pelas capitais dos estados e também pelas cidades do interior, refletindo
um remanescente significativo da comunidade ainda localizada em torno
das principais áreas de produção agrícola no País.
2.2.3 – A LOCALIZAÇÃO DA COMUNIDADE NO JAPÃO
Como já foi visto, a população brasileira no Japão, de acordo
com as estatísticas oficiais, está hoje espalhada por todas as 47 províncias
japonesas. Os dados da pesquisa confirmam estes registros, bem como
o fato de estar ela concentrada em torno das principais áreas industriais
do Japão, notadamente na região sudoeste, onde se encontram as
Município Total Percentual
São Paulo-SP 415 26,15%
Londrina-PR 49 3,09%
Curitiba-PR 39 2,46%
Maringá-PR 34 2,14%
Mogi das Cruzes-SP 32 2,02%
Campo Grande-MS 26 1,64%
Suzano-SP 24 1,51%
Presidente Prudente-SP 23 1,45%
Marília-SP 22 1,39%
Campinas-SP 21 1,32%
Sorocaba-SP 21 1,32%
72
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
principais fábricas automotoras e de produtos eletrônicos, conforme
demonstra a tabela a seguir, das províncias com maior número de
residentes brasileiros:
Tabela 12 – Localização da Comunidade Brasileira no Japão por Província
Há uma pequena discrepância da tabela com os dados oficiais,
em razão do número de respostas oriundas de Tóquio, o que é explicado
pela participação ativa na enquete dos funcionários locais da Embaixada,
do Consulado-Geral e do Banco do Brasil naquela cidade. No restante,
as cifras correspondem, grosso modo, aos percentuais observados
nos registros oficiais japoneses, e em Aichi, província com o maior
número de brasileiros, as proporções, por origem geográfica no Brasil,
assemelham-se às da pesquisa de todo o universo: São Paulo, 67,9%,
Paraná, 15,8% e Mato Grosso do Sul, 3,2%.
Província de Residência Total Percentual
Aichi 435 27,41%
Shizuoka 199 12,54%
Nagano 135 8,51%
Mie 101 6,36%
Gifu 99 6,24%
Saitama 80 5,04%
Ibaraki 71 4,47%
Kanagawa 71 4,47%
Shiga 64 4,03%
Tokyo 56 3,53%
Gunma 47 2,96%
Chiba 38 2,39%
Tochigi 34 2,14%
Yamanashi 34 2,14%
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
73
2.2.4 – O GRAU DE ESCOLARIDADE
A comunidade nikkei no Brasil é considerada – e muitos
registros atestam este fato – como tendo um nível educacional
superior à média nacional, que decorre, sobretudo, da singular
importância atribuída pelos pioneiros migrantes japoneses à
formação acadêmica de seus filhos. De acordo com o Censo 2000
do IBGE, para a população brasileira acima de 25 anos (um total
de 85,5 milhões), 14,6% não tinham qualquer educação formal;
48,5% tinham o nível fundamental incompleto; 12,9%, o fundamental
completo; 16,3%, o nível médio completo e 6,4% haviam concluído
curso de graduação. Naquela parcela da população que se declarou
“amarela” no Censo, os respectivos percentuais foram de 7,3%
(sem instrução), 28,7% (fundamental incompleto), 11,9%
(fundamental completo), 25% (médio completo) e 25,7% (superior
completo)
44
. Segundo a pesquisa realizada pelo autor, estes mesmos
parâmetros revelaram os seguintes níveis de escolaridade da
população residente no Japão:
Tabela 13 – Grau de Escolaridade da Comunidade Brasileira no Japão
Grau de Escolaridade Número Percentual
Em branco/não responderam 15 0,95%
Fundamental completo 157 9,89%
Fundamental incompleto 104 6,55%
Nível médio completo 654 41,21%
Nível médio incompleto 244 15,37%
Superior completo 154 9,70%
Superior incompleto 259 16,32%
Total 1587 100,00%
74
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Os dados acima confirmam, em grandes linhas, um padrão
educacional bastante superior à média brasileira, com mais de 50% da
amostragem tendo pelo menos o nível médio completo, semelhante à
cifra detectada no Censo 2000 entre a população “amarela”. É preciso
levar em consideração, ao mesmo tempo, que o cumprimento de todos
os trâmites e regulamentos necessários à obtenção do visto japonês
exige um certo grau de conhecimento e habilidade, o que poderia
desencorajar aqueles menos aptos ou preparados academicamente a
buscarem a alternativa da emigração. É interessante observar, também,
que dos 154 entrevistados que declararam ter nível superior completo,
77 informaram estar trabalhando como operários ou em atividades
manuais afins (motorista, pintor, cozinheiro etc.).
2.2.5 – A RAZÃO DA IDA PARA O JAPÃO
Foi, sem dúvida, a busca de uma oportunidade de emprego
relativamente bem remunerado que motivou a emigração de tantos
brasileiros para o Japão. Pode ter pesado na decisão de alguns,
subsidiariamente, o desejo de conhecer e viver na terra dos
antepassados, mas a razão preponderante foi a de assegurar trabalho,
diante da carência de oportunidades no Brasil. Os dados levantados
na pesquisa confirmam essa assertiva:
Tabela 14 – Declaração do Motivo de Emigração para o Japão
Motivo da Ida para o Japão Número Percentual
Emprego/Trabalho 1186 74,73%
Acompanhando família 295 18,59%
Em branco/não responderam 96 6,05%
Estudantes 10 0,63%
Total 1587 100,00%
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
75
2.2.6 – A MIGRAÇÃO CIRCULAR
Uma das características da emigração brasileira para o Japão é a
natureza circular do movimento. É bastante significativo o número de indivíduos
que passam uma temporada naquele país, movidos, como já foi dito, pelo
“espírito decasségui” de acumular uma poupança no exterior de modo a
refazer suas vidas no Brasil. O retorno, contudo, nem sempre se revela fácil,
seja pela dificuldade de readaptação ao cotidiano brasileiro, em que se
sobressaem os índices negativos de criminalidade, desemprego e organização
social em contraste com aqueles experimentados no Japão, seja pela falta de
preparo e orientação na aplicação da poupança tão duramente obtida, que,
em vários casos, leva à perda de todos os rendimentos economizados. Muitos,
assim, se vêem compelidos a novamente tentar a vida no Japão, ou para uma
temporada mais longa, até que as condições no Brasil lhes permitam voltar
em situação mais favorável, ou para tentar recuperar, num período mais
curto, o dinheiro perdido num investimento malsucedido. As estatísticas da
imigração japonesa, como visto na seção anterior, apontam para um número
significativo de reentradas de brasileiros a cada ano, em torno de 40.000
desde 2000. Uma parcela indeterminada, evidentemente, é composta de
pessoas que vão passar férias ou uma temporada.
O questionário à população de amostragem perguntou, nesse sentido,
se ela já havia regressado ao Brasil que não por motivo de férias e, em caso
afirmativo, quantas vezes. Os resultados computados foram os seguintes:
Tabela 15 – Declaração de Regresso para Residir no Brasil
Já voltou ao Brasil? (desconsidere férias) Número Percentual
Sim 987 62,19%
Não 572 36,04%
Em branco/não responderam 28 1,76%
Total 1587 100,00%
76
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Observa-se que praticamente dois terços da população hoje
residente já regressaram, em algum momento, ao Brasil. De modo a
refinar estes dados, a fim de se derivar uma indicação mais precisa
sobre a existência da chamada migração circular, foram feitas duas
perguntas adicionais: quantas vezes já tinha ido e voltado e há quanto
tempo vivia no Japão, computado desde a primeira chegada.
Em termos absolutos, para aqueles que responderam
afirmativamente às três perguntas, o número médio de vezes que
regressaram ao Brasil foi de 2,3, durante uma permanência total no Japão
de, em média, 9,74 anos. Tomando-se apenas as cifras estatisticamente
relevantes (acima de 1%), foi apurado também o tempo médio de
permanência no Japão correspondente ao número de regressos:
Tabela 16 – Declaração de Freqüência de Regressos ao Brasil
A tabela acima revela que mais de 50% dos que já regressaram
ao Brasil o fizeram apenas uma ou duas vezes e tendem a ficar mais
tempo no Japão entre cada mudança. Os que mais trafegam na chamada
“ponte aérea” entre os dois países podem ser aqueles com dificuldades
maiores de ajuste ou assimilação nas duas sociedades, decorrentes
1 38,46% 8,27 4,13
2 24,94% 9,55 3,18
3 19,55% 10,85 2,71
4 8,43% 11,37 2,27
5 4,72% 12,41 2,06
6 2,13% 12,47 1,78
Numero de
Vezes que
voltou ao
Brasil
Percentual do total
que respondeu
afirmativamente
Tempo médio de
residência no Japão
(anos)
Tempo Médio de
Cada Temporada no
Japão (anos)
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
77
não só de problemas econômicos, mas também, possivelmente, de
uma incapacidade de resolver questões de auto-definição de identidade:
brasileiro no Japão ou japonês no Brasil?
Cerca de um terço (572) dos entrevistados afirmou que não
tinha, ainda, regressado ao Brasil, embora 41,4% deste total estivessem
no Japão por quatro anos ou menos, tempo médio para a primeira
volta ao Brasil, estimativa estatisticamente derivada da tabela acima.
Para os que declararam estar naquele país há cinco anos ou mais, a
média da permanência é de 10,8 anos, quase dois anos mais do que
para o universo dos entrevistados, cuja média de permanência total no
Japão é de 8,89 anos.
Pode-se dizer, com base nos levantamentos acima, que ainda
permanece uma marcada tendência à migração circular entre a
comunidade brasileira no Japão. Cerca de dois terços do contingente
total da amostra já regressaram pelo menos uma vez ao Brasil mas
encontram-se novamente naquele país.
2.2.7 – O VISTO JAPONÊS
Conforme visto no primeiro capítulo, foi concedido aos nikkeis
brasileiros, até a terceira geração, sansei, o chamado “visto de longa
permanência”, que os habilita a qualquer tipo de emprego no Japão.
Foi a maneira encontrada pelas autoridades japonesas de assegurar a
entrada controlada de trabalhadores em seu setor manufatureiro, sem
classificá-los formalmente como não-especializados, mas sim
privilegiando, supostamente, sua ascendência étnico-cultural. Apesar
de “longa duração”, os vistos têm validade limitada – inicialmente três
anos para nisseis e um ano para sanseis. Os dependentes não-nikkeis,
em ambos os casos, têm direito ao visto também de um ano. A
renovação das autorizações de permanência são, em sua maioria,
automáticas, dependendo, evidentemente, da observância das leis e
regulamentos japoneses. Uma permanência mais prolongada poderá
78
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
dar direito à solicitação de transformação do visto temporário em
permanente, e já há, nessa condição, 63.643 brasileiros vivendo no
Japão
45
. A alteração do tipo de visto, de temporário para permanente,
é também condicionada ao grau de ascendência, sendo facilitada para
nisseis, que só precisam comprovar residência no Japão por um ano,
enquanto para sanseis é necessária uma estadia mais longa, cinco anos,
além de impecável ficha policial. Uma mera multa de trânsito pode
inabilitá-los por um período de cinco anos a entrar com processo de
requisição de permanência definitiva. Mesmo detentor de residência
permanente, o brasileiro que deixar o Japão por mais de três anos
perderá o visto.
A pesquisa revelou a seguinte distribuição dos diferentes tipos
de visto atribuídos à comunidade brasileira:
Tabela 17 – Situação Legal da Comunidade Brasileira no Japão
Embora pessoas com dupla cidadania constem da tabela acima,
para efeitos internos no Japão, não são contabilizadas, pois se
enquadram exclusivamente na categoria de nacionais japoneses.
Verifica-se que a absoluta maioria, quase três quartos da comunidade
brasileira, tem, ainda, o visto temporário renovável. Os dados relativos
aos detentores de visto permanente (22,64%) coincidem com as
estatísticas oficiais, em que compõem 21% do total de brasileiros
registrados. Entre os que declararam sua ascendência, 46,2% dos
detentores de visto permanente são nisseis, 33,7% sanseis, 13,9% não-
Em branco/não responderam 23 1,39%
Dupla cidadania 65 4,10%
Visto permanente 359 22,64%
Visto temporário (longa duração) 1140 71,88%
Total 1587 100,00%
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
79
descendentes e 3,34% mestiços. Em conjunto, apresentam uma
permanência média no Japão de 12,4 anos. Ao mesmo tempo em que
a maioria dos brasileiros pode, até hoje, ser rotulada de Gästarbeiter,
ou trabalhador temporário, já é expressivo o número de brasileiros
que demonstram, pelo menos formalmente, desejo de se fixar no Japão
por períodos mais longos, e que seria, em princípio, o núcleo de um
grupo que poderá se assentar definitivamente naquele país. Com efeito,
no período entre 2001 e 2005, foram concedidos entre dez e onze mil
vistos permanentes a brasileiros por ano, contra apenas 8.810 nos dez
anos precedentes. Isto é explicado pela redução, a partir de 2000, do
requisito do prazo de residência mínimo para nisseis, de cinco para um
ano, bem como pela concessão mais rápida para sanseis
46
.
Comparativamente ao total de estrangeiros contra os quais foram
iniciados processos de deportação por extensão ilegal do prazo de
permanência no Japão (overstay), nacionais brasileiros figuram em
quantidade muito modesta, 2,96% de um total de 41.175 casos
registrados em 2004. Nos dados imigratórios relativos a entradas ilegais
naquele país, nem sequer figuram referências a brasileiros, o que
demonstra a absoluta legitimidade jurídica do processo migratório do
Brasil para o Japão.
2.2.8 – ESTADO CIVIL, IDADE E SEXO
Os resultados da amostragem coincidem com os dados oficiais
sobre a composição por sexo da comunidade brasileira: 127 homens
por cada 100 mulheres. Do total de entrevistados, 62,4% se declararam
casados, 29% solteiros e 7,2% divorciados ou separados. A idade
média tanto da população masculina como da feminina situou-se em
torno de 32,7 anos, a mesma idade média dos grupos de casados e de
solteiros.
Com relação ao local de casamento, 70,1% afirmaram ter
contraído matrimônio no Brasil e 29,9% no Japão, dos quais 22,6%
80
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
(59) não o registraram em repartição consular. Era de esperar que,
desses brasileiros que não transcrevam a certidão de casamento
japonesa em repartição consular, fosse a maior parte casada com
japonês, ou uma terceira nacionalidade. De acordo com a pesquisa,
contudo, quase 70% (41) destes casamentos não registrados foram
entre brasileiros e apenas 20% com nacionais japoneses, o que
pode ser interpretado como decorrência de: a) desinformação, b)
dificuldade logística de comparecer a uma repartição consular (o
registro requer a presença do interessado), ou c) indicação de que
não haveria interesse em fazê-lo por não estar nos planos um
regresso ao Brasil.
Quanto à etnia, ou ascendência, dos cônjuges, predomina o
casamento dentro da própria comunidade nikkei, com 51% dos nisseis
e sanseis declarando matrimônio com outro(a) brasileiro(a) descendente
de japonês. Os nisseis, no entanto, registram um número maior de
casamentos com nacionais japoneses (9,3%) em comparação com os
sanseis (4,9%), talvez em função da maior familiaridade e fluência com
o idioma nipônico. Inversamente, a categoria sansei exibe um percentual
mais elevado de casamentos com brasileiro(a) não-descendente de
japonês, 40,4%, contra 31,6% dos nisseis. De acordo com os registros
consulares no Japão, no entanto, o número de casamentos de brasileiros
com japoneses é bastante superior aos percentuais da pesquisa – uma
média de 25% no período 2004-2006 contra 8,5% na enquete; o
valor real deste dado para toda a população deve situar-se entre esses
dois extremos pois, como foi visto, nem todo matrimônio formal é
registrado, seja entre brasileiros seja com japoneses ou com pessoas
de outras nacionalidades. Além disso, é possível que muitos dos que
se declararam “casados” na pesquisa não estivessem de fato legalmente
casados, mas vivendo uma união estável, comportamento mais comum
entre brasileiros do que entre japoneses, o que tenderia a distorcer
esses dados estimativos em favor do casamento entre nacionais
brasileiros.
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
81
No que se refere à composição por idade e sexo, a amostragem
aponta para um relativo equilíbrio das faixas etárias tanto para homens
quanto para mulheres. Na faixa etária de 21 a 40 anos, estão reunidos
73% dos homens e 75% da mulheres, com uma média de idade entre
32 e 33 anos. Proporcionalmente, para toda a população, há mais
mulheres não-descendentes do que homens, 19,8% contra 15,9%,
praticamente o mesmo percentual de homens e mulheres entre os nisseis,
31,2% e, na classificação sansei, 47,3% de homens e 45,2% de
mulheres. Graficamente, a composição por sexo e idade revelada na
pesquisa é a seguinte:
Tabela 18 – Distribuição por Sexo da Comunidade Brasileira no Japão
Esses dados demonstram que a população brasileira no Japão
ainda é predominantemente composta por pessoas mais jovens,
habilitadas, ou dispostas, para o tipo de trabalho pesado que lhes é
oferecido nas fábricas e linhas de montagem. Por falta de elementos
anteriores comparativos, não é possível inferir tendências sobre sua
composição. No entanto, de acordo com a interpretação dos dados
oficiais japoneses, há uma incipiente tendência ao envelhecimento da
comunidade. É verdade, também, que são os mais jovens que mais
82
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
acessam computadores para responder ao questionário eletrônico e
que tendem a ter mais serviços a demandar nas repartições consulares,
onde a pesquisa manual foi realizada.
2.2.9 – FILHOS E A EDUCAÇÃO DOS JOVENS BRASILEIROS NO JAPÃO
Esta seção de análise dos resultados da pesquisa revelou-se a
mais difícil para a obtenção de resultados precisos, por vários motivos.
Inicialmente, pela necessidade de se manter o questionário simples, de
fácil preenchimento, não foram oferecidas perguntas como, por
exemplo, se os filhos residiam com os pais no Japão ou com família
(ou um dos pais) no Brasil. No critério referente à escola freqüentada,
foram colocadas duas opções: brasileira e japonesa. No caso da
primeira, é possível que algumas respostas se tenham referido a filhos
que vivem no Brasil e lá seguem seus estudos. O número de crianças
declaradas, ademais, contrasta significativamente com os dados oficiais
dos registros japoneses, de acordo com os quais somente 15% a 16%
da população total brasileira naquele país estariam compreendidas na
faixa de 0 a 14 anos. No universo da pesquisa (1587 respostas), isso
significaria aproximadamente 238 crianças. O total apurado para esta
faixa etária, no entanto, foi de 1074, o que reforça a possibilidade de
que muitas delas estejam vivendo no Brasil.
Esta hipótese é, em parte, confirmada por pesquisa realizada
em 2005-2006 pelo jornal brasileiro no Japão, o Tudo Bem, publicada
em sua edição de 17 de junho de 2006
47
. De acordo com os dados
divulgados, apenas 59% dos filhos de brasileiros residentes no Japão
vivem com os pais; 25% moram no Brasil e 14,7% migram entre os
dois países. O questionário também limitou a três o número possível
de filhos; quem tivesse quatro ou mais, não poderia contabilizá-los.
Estabelecidas estas ressalvas, os dados da pesquisa apontam
para algumas informações interessantes e não tão distantes da realidade
das estatísticas oficiais.
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
83
Com relação à taxa de fecundidade (número médio de filhos
por mulher) da comunidade brasileira, por exemplo, há na pesquisa
640 registros do sexo feminino acima de 15 anos, o que resultaria
numa taxa de 2,17 se computados todos os filhos declarados, inclusive
os maiores de idade. Esta cifra está bem mais próxima da
correspondente para o Brasil como um todo – 2,31, de acordo com
estimativa do IBGE para 2004, e distante ainda da japonesa, 1,29
referente a 2005. Ou seja, a primeira geração de migrantes brasileiros
conserva esta característica da sociedade do país natal. Pelo índice de
taxa de natalidade (número de nascimentos ao ano por cada 1.000
habitantes), extraído a partir dos registros de nascimento lavrados nos
Consulados Gerais em Nagóia e Tóquio, no entanto, as cifras recentes
na comunidade brasileira naquele país são: 12,01, em 2004, e 10,84,
em 2005, bem mais próximas e alcançando o nível do Japão (2004),
de 8,86, e distanciando-se da média brasileira de 20,6 (2004). Esta
última estatística coadunar-se-ia, portanto, com os dados oficiais
referentes à população infantil brasileira no Japão.
Quanto ao registro consular das crianças nascidas no Japão, o
índice é altamente positivo: das 618 crianças nascidas naquele país,
96,6% tiveram suas certidões de nascimento japonesas transcritas nos
consulados. Das 21 que não tinham o registro brasileiro, 10 tinham 1
ano de idade ou menos, indicativo de que seus pais poderiam estar
aguardando uma oportunidade propícia para fazer o devido registro,
haja vista a grande distância que muitas vezes separa a repartição do
local de residência. A preocupação em assegurar validade da condição
civil e o vínculo legal com o País é, portanto, muito mais evidente nos
casos de nascimento do que, como foi visto, nos de casamento da
comunidade no Japão.
Com relação ao local de nascimento das crianças brasileiras,
para todo o universo da pesquisa há um predomínio das que nasceram
no Brasil, 58%, contra 45% nascidas no Japão. Esta distinção, no
entanto, inclui filhos já adultos, muitos dos quais residentes no Brasil.
84
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Na população de 0 a 15 anos, as diferenças caem para 49,4% (Brasil)
e 50,6% (Japão) e se contabilizadas apenas as de 0 a 5 anos, os
percentuais são de 27,4% e 72,6%, respectivamente, o que poderia
indicar uma propensão maior à formação de famílias no Japão em
oposição à chegada de famílias já constituídas no Brasil.
No que tange à educação das crianças, para as que estão em
idade pré-escolar e freqüentam creches ou jardins de infância, 65%
estão em estabelecimentos japoneses e 35% em escolinhas brasileiras.
Já na faixa do ensino fundamental, a proporção é de 46% em escolas
brasileiras e 54% em escolas japonesas e, para os jovens no ensino
médio, 61% e 39% respectivamente. Este comportamento é
explicado, como será visto no Capítulo 3, pela dificuldade de inserção
de crianças estrangeiras no sistema educacional japonês, sobretudo
para aquelas que chegam ao Japão tendo iniciado sua vida acadêmica
no Brasil.
Finalmente, com relação aos filhos maiores de idade, foi feita a
pergunta sobre seu ingresso, ou não, no nível superior. Foram
relacionados 231 filhos com 19 ou mais anos. Destes, 66 (28%)
estariam cursando universidade, dos quais 52 no Brasil e 14 no Japão.
Apesar do pequeno número de universitários entre os filhos de
brasileiros residentes no Japão, a cifra não deixa de ser significante,
tendo em vista a dificuldade e a exigência dos exames de entrada para
as universidades daquele país.
2.2.10 – O EMPREGO NO JAPÃO
É desnecessário repetir aqui que a presença de um contingente
tão grande de brasileiros no Japão decorre, fundamentalmente, da
oportunidade de emprego legal que lhes é oferecida, principalmente
no setor industrial japonês. Todas as pesquisas e dados levantados
quanto ao tipo de emprego dos brasileiros apontam nesse sentido e na
enquete realizada pelo autor não foi diferente.
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
85
É o seguinte o quadro sintético das principais profissões no
Japão declaradas pelos participantes do levantamento:
Tabela 19 – Atividade Econômica da Comunidade Brasileira no Japão
A categoria “operário” engloba serviços assemelhados, como
motoristas, pintores, funcionários de limpeza, agricultores, mecânicos,
eletricistas etc. Sob o título “serviços administrativos”, estão incluídas
secretárias, servidores de prefeituras ou outras repartições públicas e
auxiliares administrativos de empresas, entre outros. O item “comércio”
inclui balconistas, garçons, vendedores, cozinheiros e representantes
comerciais.
Muitas outras profissões foram relacionadas, demonstrando a
diversidade do emprego no Japão: artista, aeronauta, enfermeiro(a),
cabeleireira, costureira, empresário, escriturário, ourives, jornalista,
pastor, massagista, caddie etc., cujos registros foram incorporadas num
dos grupos maiores acima ou não contabilizados. Na principal categoria,
operário, a distribuição por sexo revela uma participação de 64% de
homens e 36% de mulheres.
Operário/Serviços Manuais 1045 66,06%
Serviços Administrativos 83 5,25%
Do lar 54 3,41%
Intérprete/Tradutor 33 2,09%
Comércio 27 1,71%
Agente de Turismo 23 1,45%
Bancário 18 1,14%
Serviços Técnicos 18 1,14%
Estudante 17 1,07%
Educador 14 0,88%
Serviços Gerais 11 0,70%
86
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Houve também um número considerável, 184, correspondente
a 11,6% do total de questionários, em que o item “emprego no Japão”
não foi respondido, o que reflete, quiçá, um receio ou mesmo vergonha
do entrevistado em admitir a natureza braçal do seu trabalho. Esta
hipótese pode ser fundamentada pela relação de empregos que os
entrevistados declararam ter no Brasil, antes de ir para o Japão, em
que é relativamente menor o número de pessoas empregadas em
trabalhos braçais. O trabalho na fábrica representaria, assim, uma queda
do padrão social, que muitos, de fato, podem não querer admitir
abertamente. É a seguinte a tabela de empregos no Brasil levantados
pela pesquisa, por principais grupos:
Tabela 20 – Atividade Econômica no Brasil antes de
Emigrar para o Japão
Digno de nota é o elevado número de estudantes brasileiros
que migram para o Japão. Uma das explicações para este fato é a
tentação que muitos sentem de poder trabalhar legalmente naquele país
Estudante 187 26,23%
Comércio 149 20,90%
Operário/Serviços Manuais 105 14,73%
Serviços Administrativos 80 11,22%
Serviços Técnicos 69 9,68%
Do lar 56 7,85%
Autônomo 39 5,47%
Bancário 20 2,81%
Nível Superior 19 2,66%
Educador 16 2,24%
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
87
a partir dos quinze anos, por um salário de US$ 1.500,00 a US$
2.000,00 mensais, e assim rapidamente adquirir bens de consumo
duráveis, como carros, aparelhos de som, computadores etc.,
aspirações que, no Brasil, demandariam um prazo e investimento em
estudos muito maior. Segundo a pesquisa de 2005-2006 do jornal
Tudo Bem, 83,9% dos filhos de brasileiros no Japão entre 13 e 21
anos estariam trabalhando naquele país.
O índice de 66,1% na categoria de operários coincide com
outros levantamentos do gênero como, por exemplo, a pesquisa do
jornal Tudo Bem acima mencionada, que registrou a cifra de 64,7%
ou do Centro de Informação e Apoio ao Trabalhador Estrangeiro
(CIATE), publicada pelo mesmo jornal em 2002
48
, onde a cifra era de
68,4%. Estes dados mais recentes contrastam com outra pesquisa
realizada por aquele mesmo Centro em 1999
49
, na qual se registrou
um percentual de 78% de brasileiros trabalhando em fábricas no Japão.
A redução da participação de brasileiros nas linhas de montagem, de
acordo com essas estimativas, seria um sinal de que a comunidade se
está espraiando em termos de atividades econômicas, em direção ao
setor de serviços, sejam eles especificamente direcionados à própria
comunidade, principalmente no comércio ou, paulatinamente, ocupando
cargos e funções do mercado de trabalho japonês como um todo, em
que predomina o setor terciário.
2.2.11 – O PATRIMÔNIO ADQUIRIDO PELA COMUNIDADE
Entre os muitos indicadores que podem ser utilizados para
demonstrar o grau de assentamento de uma colônia estrangeira está a
aquisição de patrimônio imobiliário e de bens de consumo duráveis.
Assim, foram incluídas no questionário perguntas sobre dois itens em
particular: imóveis e carros. Antes de analisar os resultados, é importante
frisar que a compra ou financiamento de imóveis no Japão está
legalmente limitada aos portadores de vistos permanentes. A distribuição
88
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
preponderante da população em torno dos centros industriais,
geralmente localizados nas regiões interioranas do país, é um incentivo
importante à compra de automóveis, tendo em vista as carências do
transporte público nas cidades menores. Muitos relatos a respeito dos
primeiros emigrantes descreviam, no entanto, a dependência maior da
bicicleta como meio de transporte dos operários, que, além de refletir
a larga e tradicional utilização desse meio de locomoção naquele país,
era indicativo de sua vontade inicial de economizar a maior parcela
possível de seu salário.
A situação hoje, tal como revelada pelos resultados da pesquisa,
tende a mostrar uma percepção diferente desta anterior, conforme os
dados coletados, resumidos a seguir:
i) imóveis
Foram computadas 108 (6,81% do total) respostas
afirmativas à pergunta sobre propriedade de imóvel no Japão.
Destas, 64 foram de portadores de vistos permanentes, 18 de
pessoas com dupla cidadania e 26 que se dizem detentores de vistos
temporários. Seria necessário, contudo, aplicar uma certa margem
de dúvida sobre esta última categoria, vistos temporários,
principalmente pelo fato de ter-se nela incluído, por exemplo, um
jovem sansei, operário, solteiro de 21 anos, cinco dos quais no
Japão, com nível fundamental incompleto no Brasil. É possível que
estivesse ele referindo-se à casa de seus pais ou familiares em que
mora. De qualquer forma, não deixa de ser importante o número
de brasileiros que já adquiriram casas no Japão, onde o mercado
imobiliário não se tem revelado, nos últimos anos, alternativa rentável
de investimento. A compra de uma casa, acessível em razão do
longo financiamento e de baixas taxas de juros oferecidas por
agentes hipotecários, poderia constituir opção para evitar a perda
de capital despendido em aluguel ou, por outro lado, sintomática
de um desejo de permanecer naquele país.
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
89
ii) automóveis
Com relação à propriedade de automóveis, o quadro é distinto,
com uma participação muito maior dos que responderam
afirmativamente. De acordo com a pesquisa, mais da metade dos
adultos brasileiros no Japão têm carro, conforme o quadro a seguir:
Tabela 21 – Propriedade de Automóveis na Comunidade Brasileira no Japão
Esses números podem ser explicados por uma variedade de
razões. A primeira seria o baixo custo relativo de automóveis no Japão.
Por ser um país com renda per capita elevada, o mercado
automobilístico doméstico nipônico é extremamente dinâmico;
inovações tecnológicas e de desenho são introduzidas a cada novo
modelo das principais montadoras, o que impõe aos carros usados
uma obsolescência muito rápida, em termos do exigente gosto do
consumidor. Além disso, a obrigatoriedade e o alto custo da vistoria e
controle anti-poluição (chamado “shaken”) – cerca de mil dólares –
depois de três anos, induz muitos japoneses a desfazerem-se de seus
veículos antes desse prazo e a adquirirem um novo. O resultado é uma
significativa redução do preço de carros usados, preferidos, de uma
forma geral, pela comunidade.
Como foi dito acima, muitos jovens brasileiros migram para o
Japão para trabalhar em fábricas, com o objetivo principal de adquirir
bens, como carros, que, pelas suas circunstâncias econômicas no Brasil,
dificilmente conseguiriam. Assim, um jovem com o nível médio de
escolaridade, que conseguisse aqui um emprego compatível com esta
Não responderam/em branco 32 2,02%
Não têm carro 687 43,29%
Têm Carro 868 54,69%
Total 1587 100,00%
90
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
formação, no comércio ou em serviços administrativos, perceberia aqui
um salário mensal em torno de R$ 460,00 a R$ 560,00 reais
50
. Para a
compra de um carro usado no Brasil, o mais barato do mercado, um
Fiat Mille, por exemplo, de 2003, cujo preço é de aproximadamente
R$ 15.000,00 (de acordo com tabela publicada pela revista Quatro
Rodas em agosto de 2006), ele teria de economizar cerca de 30 meses
de salário. No Japão, ao contrário, o trabalho inicial numa fábrica
renderia um salário entre US$ 1.400,00 a US$ 1.800,00, dependendo
do número de horas extras. Para a compra de um carro popular usado,
um Honda Fit 2003, a despesa seria de aproximadamente US$
8.000,00, ou seja, entre cinco e seis meses de salário.
2.2.12 – A POUPANÇA E AS REMESSAS FINANCEIRAS
A última parte do questionário procurou obter dados referentes
ao direcionamento da renda disponível da comunidade brasileira.
Valores globais sobre remessas financeiras para o Brasil serão vistos
em seção específica; a intenção deste questionamento na enquete foi
no sentido de tentar verificar se, no “espírito decasségui”, o brasileiro
reserva sua poupança para aplicação ou gastos correntes no Brasil ou,
ao contrário, se planeja aplicá-la no Japão, o que indicaria uma
disposição maior em fixar-se naquele país.
A primeira constatação foi de que a grande maioria dos
brasileiros remete algum dinheiro para o Brasil: 71% declararam enviar
recursos visando pelo menos uma finalidade específica. Outros 44,7%
informaram não fazer qualquer sorte de aplicação ou investimento no
Japão, dados estes que demonstram haver ainda uma forte ligação
do contingente expatriado com seu país de origem, quantitativamente
mensurada pelas transferências financeiras unilaterais.
A qualificação do destino da poupança ou aplicação, por sua
vez, revela comportamentos que não necessariamente reforçariam a
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
91
afirmação do parágrafo anterior, conforme demonstrado nas duas
tabelas abaixo:
Tabela 22 – Destino do Dinheiro Enviado para o Brasil pela
Comunidade no Japão
Tabela 23 – Destino do Dinheiro Poupado no Japão pela Comunidade
No caso do dinheiro remetido para o Brasil, pouco mais da
metade destina-se a ajudar a família que aqui ficou. Isto pode
representar o sustento de famílias nucleares que foram deixadas para
trás, ou de filhos que voltaram para estudar ou até de pais e parentes
Brasil Respostas Percentual
Ajuda à família 842 51,37%
Aquisição de Imóveis ou outros bens 278 16,96%
Investimentos 174 10,62%
Pagamento de Dívidas 108 6,59%
Abertura de Negócios 82 5,00%
Despesas com ensino superior 55 3,36%
Outros 100 6,10%
Japão Respostas Percentual
Outros 303 24,42%
Investimentos 284 22,88%
Despesas futuras com educação 261 21,03%
Aquisição de Imóveis ou outros bens 231 18,61%
Abertura de Negócios 162 13,05%
Total 1241 100,00%
92
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
próximos que necessitam de ajuda para a sobrevivência. O segundo
maior foco das remessas é a aquisição de imóveis ou outros bens, o
que pode significar a aspiração de um futuro retorno definitivo ou,
também, para derivar uma rentabilidade maior para o capital empregado
no mercado imobiliário nacional, em comparação com as relativamente
baixas taxas de retorno vigentes no Japão. A esta última motivação,
segue-se a para “investimentos”, sem descrição específica, mas que
também pode estar relacionada às taxas de juros mais altas praticadas
no Brasil em relação ao Japão, sobretudo no atual ambiente de
estabilidade cambial. A quarta maior razão para remessas refere-se ao
pagamento de dívidas contraídas no Brasil, uma das muitas razões
apontadas para a ida ao Japão em busca de trabalho. Os objetivos de
abertura de negócios e custeio da educação superior também foram
relacionados, mas mereceram índices menores de respostas.
Quanto à poupança realizada no Japão pela comunidade, a
distribuição é mais eqüitativa entre as finalidades sugeridas no questionário.
Como, pela simplicidade que se quis manter no questionário, não houve
aprofundamento dos vários itens, as respostas referentes a “aquisição
de imóveis e outros bens” e “abertura de negócios” poderiam igualmente
representar a reserva de recursos para aplicação futura no Brasil ou no
Japão. Note-se, no entanto, que nos quesitos “despesas futuras com
educação” e “investimentos”, houve o índice importante de respostas,
estes sim mais característicos de um planejamento de vida mais dirigido
à permanência no Japão. Com relação ao item educação, por exemplo,
ao se cruzarem, de uma lado, as informações sobre poupança para
despesas futuras e, do outro, o tipo de escola freqüentada pelo primeiro
filho até quinze anos, das 163 coincidências de respostas, 65% referiam-
se a crianças matriculadas em escolas japonesas. Ou seja, haveria, desde
já, uma preocupação estatisticamente relevante de muitos pais com o
possível ingresso futuro de seus filhos para o nível superior de ensino
japonês, onde até mesmo as universidades públicas representam uma
despesa anual de cerca de US$ 10.000,00.
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
93
O número maior de respostas sobre a finalidade da poupança
realizada pelos brasileiros no Japão coube ao item “outros”, com
24,42%. Não é possível discernir quais seriam os tantos objetivos aí
incluídos, mas pode ser interpretado como uma acumulação de recursos
a serem aplicados em projetos futuros ainda não decididos ou
pensados, refletindo, talvez, o questionamento maior que muitos
membros da comunidade fazem sobre seu destino final, no Brasil ou
no Japão.
2.2.13 – A INTENÇÃOOU NÃODO RETORNO AO BRASIL
O objetivo de todo o levantamento estatístico e de análise
de tendências demográficas e comportamentais da comunidade
brasileira no Japão, realizados neste capítulo, foi o de tentar inferir
se há elementos persuasivos e claros que permitam indicar a
aspiração maior de vida daqueles cidadãos: voltar para o Brasil
ou fixar-se de forma definitiva no Japão. Para reforçar a avaliação
final que se fará sobre esta indagação, portanto, foi incluída no
questionário a simples e direta pergunta: “pretende voltar ao
Brasil?”, à qual foram sugeridas três repostas possíveis: “sim”,
“não” e “ainda não sabe”. A tabulação dos resultados consta do
quadro a seguir:
Tabela 24 – Declaração de Intenção de Regressar
Definitivamente ao Brasil
Sim 829 52,24%
Não 173 10,90%
Ainda não sabe 563 35,48%
Não responderam 22 1,39%
Total 1587 100,00%
94
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
A julgar por estes dados, há, em princípio, uma grande
probabilidade de que pelo menos cinqüenta por cento dos brasileiros
residentes no Japão regressará, algum dia, ao Brasil. Esse era, afinal, o
desejo maior e declarado do emigrante, tanto é que ao fenômeno se
deu o nome de decasségui.
É significativo, no entanto, o número de respostas indecisas,
pouco mais de um terço do total levantado. Se imaginarmos, num
exercício especulativo, uma projeção salomônica deste contingente,
ou seja, metade volta e metade fica no Japão, teremos, juntando com
os que afirmam que ficarão definitivamente naquele país, uma população
permanentemente enraizada de, no mínimo, oitenta e seis mil brasileiros.
A intenção de ficar ou voltar não será confirmada por uma disposição
declarada em algum momento espontâneo, como o da pesquisa. Essa
decisão dependerá, no íntimo de cada brasileiro, de fatores pessoais,
familiares, econômicos e sociais mas será, cada vez mais, condicionada
pelo tempo de permanência no Japão.
Nos dois primeiros capítulos do trabalho, foram descritas as
principais razões que induziram o movimento de mais de 300.000
brasileiros para o Japão e, em seguida, realizado um levantamento geral
do que constitui hoje aquela população, sobretudo em seus aspectos
demográficos.
A análise do processo migratório não se resume apenas a dados
históricos ou a estimativas e projeções quantitativas. É preciso, também,
tentar compreender como essas pessoas reagem frente aos diferentes
hábitos, costumes, leis, regras e normas de conduta e formas de
comunicação de uma sociedade tão peculiar e distinta como é a
japonesa. O grau de compreensão e assimilação destas características
pela população estrangeira terá tanta influência sobre seu futuro como
as questões econômicas ligadas ao emprego, salário e poupança.
Serão examinados a seguir alguns marcos importantes da
adaptação social e cultural da comunidade brasileira àquele país. O
primeiro destes será a questão da educação, que levou, diante das
reais dificuldades de ingresso dos filhos dos imigrantes no sistema de
ensino japonês, à formação de uma inédita rede de escolas brasileiras
no exterior, que hoje já conta com cerca de cem estabelecimentos.
Paralelamente à operação dessas escolas particulares, outra questão a
ser examinada será a experiência inédita do Governo Central e da
Secretaria de Educação do Paraná: a aplicação anual no Japão, desde
1999, dos exames supletivos nos níveis fundamental e médio.
CAPÍTULO 3
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA
SOCIEDADE JAPONESA
95
96
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
A maioria dos brasileiros no Japão está hoje empregada nas
grandes montadoras de automóveis e de produtos eletrônicos, bem
como nas indústrias subsidiárias de peças e componentes que as
abastecem, além de outros processos manufatureiros. Convém, assim,
um olhar mais enfocado sobre o regime de trabalho nos centros de
produção, bem como os regimes de recrutamento e mobilidade.
A proteção social e a adesão ao sistema previdenciário japonês,
por sua vez, estão intimamente ligadas à questão trabalhista. Ver-se-á
que, apesar de legalmente constituídos naquele país, os trabalhadores
brasileiros, por uma série de motivos, ainda se deparam com
dificuldades para se conscientizarem da importância e da necessidade
de afiliação aos sistemas de previdência e de seguro-saúde japoneses.
A comunidade no Japão não vive exclusivamente em torno do
trabalho. Seu rápido, contínuo e expressivo crescimento nas últimas
duas décadas, aliado às dificuldades de comunicação causadas pelo
desconhecimento do idioma japonês, fomentou a criação de extensa
rede de serviços e atividades comerciais próprias “de brasileiro para
brasileiro”. Essas incluem a importação e venda de produtos nacionais;
restaurantes; bares; clubes e associações; agências bancárias brasileiras;
canais de televisão, jornais, revistas e estações de rádio.
A renda gerada pelos brasileiros, seja em função do trabalho
nas fábricas, seja na área comercial, conduz ao acúmulo de significativo
capital financeiro no seio daquela população. Assim, seção específica
analisará a questão das remessas financeiras, tema que invariavelmente
vem à tona quando se discute o fenômeno decasségui.
Serão vistas, ainda, outras facetas peculiares da comunidade,
relacionadas aos problemas existenciais, ou identitários, decorrentes
da exclusão e rejeição que muitos de seus membros sentem e sofrem
no Japão. Tais problemas afloram não apenas da relativa
impermeabilidade ao estrangeiro presente na sociedade japonesa, mas
também de questões individuais mais íntimas, psicológicas, de auto-
identificação pessoal, sobretudo entre os nikkeis, que, apesar de
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
97
partirem para a terra de seus ancestrais com um sentimento de
belonging, são, freqüentemente, hostilizados por reações de
preconceito e discriminação.
3.1 – A EDUCAÇÃO DOS BRASILEIROS NO JAPÃO
A colônia japonesa no Brasil, desde sua chegada no início
do Século XX, apresentou índice de escolaridade superior à média
nacional
51
. Tal característica reflete-se hoje no elevado percentual
de nipo-brasileiros em instituições de nível superior e entre as mais
altas faixas salariais do País. De acordo com dados revelados no I
Censo Étnico-Racial da Universidade de São Paulo
52
, 12,8% dos
alunos daquela instituição em 2001/02 classificaram-se como
“amarelos”. Vale notar que o percentual de auto-denominados
“amarelos” na população do Estado de São Paulo é de
aproximadamente 1,3%, de acordo com o Censo Demográfico de
2000 do IBGE. Neste mesmo recenseamento, foi também
constatado que 13,4% da categoria “amarela” ganhavam mais de
20 salários mínimos, contra 4% para os que se declaravam
“brancos”.
Tal característica deriva, em grande parte, da importância
atribuída pelos primeiros imigrantes japoneses, e subseqüentemente
assimilada pelos seus descendentes, à educação dos filhos,
decorrente da continuidade da filosofia inerente à sociedade nipônica
desde o século XIX. Como afirma o pesquisador do Centro de
Estudos Nipo–Brasileiro, Sussumu Miyao:
A revolução social iniciada na Era Meiji, em 1868, trouxe profunda
transformação no regime da nação nipônica, dando prioridade à
difusão da educação ... O japonês ... sentia no seu âmago que a
instrução era a coisa mais importante da vida, sobrepondo-se a
qualquer outra opção. O imigrante japonês que começou a chegar
ao Brasil também foi criado nesse ambiente
53
.
98
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
De fato, segundo levantamento da Secretaria de Agricultura de
São Paulo sobre o perfil dos japoneses que chegavam ao porto de
Santos entre 1908 e 1932, verifica-se que o percentual de imigrantes
nipônicos com mais de 12 anos não-analfabetos era de 89,9%
54
.
Paralela e comparativamente, a taxa de analfabetismo no Brasil ainda
era de 56% em 1940
55
.
A maioria dos imigrantes japoneses, sobretudo no período
anterior à Segunda Guerra Mundial, acalentava o sonho de algum dia
regressar à terra natal. Para tanto, fazia-se necessária a preservação
da língua, tradições e costumes japoneses entre as crianças. Como
relata a pesquisadora Zélia Demartini:
Nas colônias japonesas essa preocupação pode ser constatada
por meio da organização de associações que tinham por objetivo,
em primeiro lugar, suprir a educação dos filhos. ... Antes mesmo
de sedes de associações ... os japoneses procuravam construir
a escola
56
.
Mesmo com a progressiva incorporação das escolas fundadas
nas colônias japonesas às redes públicas estaduais e municipais de
educação de São Paulo e do Paraná, ou seu desaparecimento, como
conseqüência das políticas nacionalistas impostas a partir dos anos
1930, os alunos de ascendência nipônica no Brasil continuaram a
apresentar um aproveitamento acadêmico muito superior ao de seus
pares não-nikkeis. Se o sonho de voltar ao Japão já ficava cada vez
mais distante, sobretudo a partir da segunda metade do Século XX, a
educação manteve sua posição prioritária na comunidade nipo-brasileira,
agora como instrumento de ascensão social e econômica.
A partir dos anos 1970, a população nikkei que, desde a
chegada dos primeiros imigrantes, esteve concentrada na área rural,
passou, como outros contingentes, a migrar para os grandes centros
urbanos. Nesse movimento, consolidou sua posição privilegiada na
sociedade brasileira, em termos de escolaridade, emprego e renda.
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
99
As dificuldades econômicas no Brasil na década de 1980,
aliadas à demanda por mão-de-obra industrial no Japão, foram o
principal motivador do início da emigração brasileira para o Oriente.
Talvez por um ainda arraigado apego à importância fundamental da
educação, as primeiras levas de migrantes nikkeis brasileiros tenham
sido integradas principalmente por homens que deixavam para trás
suas famílias, com o objetivo não só de garantir-lhes o sustento nas
difíceis condições que aqui se apresentavam, mas também para
assegurar os meios aos seus filhos para prosseguirem seus estudos nas
melhores instituições de ensino. Como descreve o jornalista e escritor
Masayuki Fukasawa:
Nessa época, o preço das universidades particulares foram
reajustados acima dos níveis da inflação. Não era raro encontrar
mensalidades acima de 600 ou 700 dólares, não incluindo os custos
de material didático. Somado o aluguel ... o gasto total se tornava
um fardo extremamente pesado para uma família de classe
média
57
.
A questão da educação dos filhos naquele momento, portanto,
colocava-se como um dos vários motivos da saída dos nikkeis para o
Japão, mas não como tema que influenciaria suas vidas naquele país.
Com o crescimento do fluxo emigratório para o Japão a partir de 1990,
a maioria nissei que, na condição de sojourner, deixara sua família no
Brasil, começou a dar lugar aos jovens sanseis, recém-casados ou
com filhos
58
. Em 1990, no universo da população brasileira no
arquipélago, contava-se cerca de 3.000 crianças com menos de 15
anos, 4% do total. O número de jovens foi crescendo anualmente,
quer pela ida de famílias inteiras, quer pelo nascimento no Japão, até
atingir, em 2005, mais de 45.000, correspondentes a 15% da
comunidade brasileira.
Afigurava-se, pois, de forma cada vez mais concreta e premente,
a questão da educação das crianças brasileiras no Japão. Eram duas
100
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
as alternativas que se lhes apresentavam: ingressar no sistema
educacional público japonês ou, de alguma forma, criar, no seio da
própria comunidade que se consolidava, os meios e modos para
assegurar a educação desses jovens. Examinar-se-ão, em seguida, esses
dois contextos.
3.1.1 – O SISTEMA EDUCACIONAL JAPONÊS
O projeto nacional de desenvolvimento e modernização do
Japão, vislumbrado pela Restauração Meiji de 1868, tinha na educação
um de seus principais alicerces. Mesmo sob a era anterior do xogunato
Tokugawa, possuía aquele país milhares de escolas denominadas
terakoya
59
. O primeiro Ministério da Educação (Mombusho) foi criado
em 1871. No ano seguinte implementou-se a chamada “Primeira
Reforma”, ou gakusei, que instituiu o ensino obrigatório mínimo de
seis anos e o sistema de três níveis – primário, médio e universitário. O
país alcançou rapidamente um alto grau de alfabetização e escolarização,
muito superior ao da maioria dos países no final do século XIX.
A chamada “Segunda Reforma” educacional foi implementada logo
após a Segunda Guerra Mundial, com a promulgação da Lei Fundamental
da Educação e da Lei Escolar, em 1947, modelo inspirado no sistema
educacional dos Estados Unidos
60
. Esse sistema, vigente até hoje, prevê
quatro etapas de ensino: primário e secundário inferior, obrigatórios, por
seis e três anos, respectivamente; secundário superior ou escolas técnicas,
de dois a quatro anos; e, finalmente, a universidade, de quatro anos. A
educação é pública e garantida pelo Estado até o final do curso secundário
inferior, nível alcançado por mais de 98% das crianças japonesas. As
melhores universidades, por sua vez, são pagas (mesmo as chamadas
“públicas”) e extremamente concorridas, razão pela qual há significativo
movimento, no nível secundário superior, em direção a escolas particulares
(cerca de 28% do total de matrículas), para o preparo intensivo de alunos
que visam os disputados exames vestibulares.
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
101
Apesar de todo o reconhecido rigor e disciplina da educação
japonesa, o sistema, paradoxalmente, apresenta características que,
sob a ótica ocidental, não necessariamente conduziriam ao que se pode
chamar de uma “boa educação”. Uma vez ingressado na escola primária
aos seis anos, o aluno já saberá que, com quinze, estará no último ano
do secundário inferior, pois não há reprovação ou repetição. Tampouco
é esperado do aluno qualquer iniciativa ou questionamento intelectual;
sua obrigação é aprender e reproduzir aquilo que o professor ensina e
que decora nos livros. No que diz respeito às crianças estrangeiras
que vivem no Japão, as leis acima mencionadas não as obrigam, ao
contrário dos nacionais, a freqüentar escolas.
Com relação à língua japonesa, onde predomina a escrita kanji,
derivada do chinês, ao final dos primeiros seis anos de escola é
esperado que o aluno reconheça e tenha proficiência em 1.006
ideogramas, alguns cuja construção requer até 23 traços distintos.
Deverá também conhecer as duas outras escritas japonesas, o hiraganá
(50 caracteres) e o silábico katakaná (também 50 caracteres). Ao
final da nona série, seu universo kanji terá de ser de 1.945 caracteres,
o chamado jooyoo kanji-hyo.
Essas particularidades do sistema educacional japonês
fortemente inibiram a entrada de crianças brasileiras, já em idade
escolar, nas escolas públicas locais, fomentando, assim, o surgimento
de rede de escolas particulares brasileiras naquele país.
3.1.2 – AS ESCOLAS BRASILEIRAS NO JAPÃO
A questão educacional é, com muita freqüência, mencionada
nos debates mais amplos acerca da presença de brasileiros no Japão.
Não é tão comum, no entanto, quando se trata dos filhos de imigrantes
brasileiros nos Estados Unidos ou na Europa, que, como o Japão,
oferecem amplo e irrestrito acesso às suas respectivas redes de escolas
públicas de nível fundamental e médio.
102
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Tal diferença pode ser explicada, em parte, pelo fato de terem
aquelas duas outras regiões experiência com fenômenos imigratórios
há mais tempo do que o Japão. Seus respectivos sistemas de ensino,
portanto, puderam melhor adaptar-se e preparar-se para a entrada de
estrangeiros. Nos Estados Unidos, por exemplo, em regiões onde há
concentrações maiores de imigrantes, a rede escolar pública oferece
aos alunos recém-chegados que não falam inglês aulas e orientação
especializadas (English to speakers of other languages – ESOL),
de modo a promover a rápida inserção daquelas crianças no resto do
currículo
61
.
No Japão, ao contrário, a presença de residentes estrangeiros
é relativamente recente
62
, sobretudo no que diz respeito aos latino-
americanos, cuja presença no país tem menos de vinte anos. É natural,
portanto, que o sistema educacional japonês ainda esteja procurando
a forma mais adequada de acolher e promover a adaptação dessas
crianças
63
. Esta, no entanto, seria apenas uma primeira consideração
de natureza conceitual. Em termos práticos o problema resume-se,
essencialmente, ao fator idioma e, paralelamente, ao sistema de ensino.
Uma das considerações que levaram à alteração da Lei de
Controle da Imigração, em 1990 foi a de que os nikkeis teriam herdado
e preservado de seus ancestrais os principais fundamentos da cultura
japonesa, cuja expressão essencial é a língua. Essa foi, como a realidade
tem demonstrado, uma presunção equivocada. O conhecimento do
idioma japonês entre os nikkeijin, tanto falado como escrito, sobretudo
os das gerações mais recentes, é, no mínimo, superficial, o que não é
difícil de compreender em razão da complexidade do kanji.
Ao contrário das crianças brasileiras que ingressaram nas
escolas americanas ou européias, que puderam rapidamente associar
a fonética e fala à escrita da nova língua, formada a partir de seu mesmo
alfabeto romano nativo, os filhos dos imigrantes no Japão depararam-
se com uma imensa dificuldade para ler e escrever japonês, sobretudo
aqueles que já tinham iniciado seus estudos no Brasil. O próprio sistema
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
103
de ensino público japonês tampouco encoraja a participação dessas
crianças na vida acadêmica, não somente em razão da falta de apoio
específico para estrangeiros na maioria das escolas, mas também pelo
método de aprovação automática, ou não-repetência, até o final do
colegial, que impossibilita a aferição do progresso ou do conhecimento
individual do aluno. Não há, portanto, estímulo ou sanção para fazer
com que o estudante se dedique aos estudos. A condição de gaijin, o
desconhecimento da língua e daquilo que está sendo ministrado em
aula leva as crianças brasileiras, em muitos casos, à desistência e ao
auto-isolamento nas escolas japonesas, quando não à discriminação,
agressão ou intimidação por parte dos alunos japoneses. Ilustra esse
ponto relato que equipe de estudantes da Connecticut College, dos
Estados Unidos, fez de sua viagem de estudos em 2002 da comunidade
brasileira em Oizumi, província de Ota:
All the children that I interviewed in this group had either dropped
out or were planning to leave the Japanese school system. When
asked why … they all had the same response: they could not
understand anything at school and the language classes were
not sufficient. The boys in this group had all been in fights due
to misunderstandings with Japanese children. A 13-year old
boy told me that every day he was taunted by Japanese students
with ‘Go back to Brazil, you dumb Brazilian
64
.
Se as barreiras da língua e do sistema educacional constituem
empecilho importante à inserção dos jovens brasileiros nas escolas
japonesas, a situação dos pais não deixa, ao mesmo tempo, de também
influenciar a vida acadêmica dos filhos. Em função das suas altas cargas
horárias de trabalho – normalmente , de dez a doze horas por dia, seis
dias por semana – há pouca oportunidade para participarem e
acompanharem os estudos de suas crianças. O mesmo desconhecimento
do idioma, por sua vez, impede a supervisão das lições ou contatos
com professores que, no Japão, são freqüentes e esperados.
104
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Diante de todas essas adversidades, não é raro o abandono
voluntário das escolas japonesas pelos jovens brasileiros, ou até mesmo
estimulado pelos pais, para que os filhos maiores tomem conta dos
irmãos menores, durante suas longas jornadas de trabalho.
Principalmente no início do processo migratório, muitos pais aliviavam
o peso de suas consciências por não estarem propiciando estudo
adequado a seus filhos com a expectativa de retorno relativamente
rápido ao Brasil, onde se recuperaria o tempo perdido fora das escolas
no Japão.
A progressiva alteração na perspectiva de permanência no
Japão, do curto para o médio ou indefinido prazo, juntamente com o
número crescente de crianças brasileiras na comunidade ao longo da
última década, acarretou, no entanto, uma redefinição das expectativas
e iniciativas da comunidade quanto à escolarização de seus filhos.
Desde o começo do processo migratório já vinham sendo
praticadas soluções informais e espontâneas com relação à orientação
dos filhos dos brasileiros. Para aqueles em idade pré-escolar, vizinhos
e amigos se organizavam para cuidar dos pequenos enquanto os pais
iam trabalhar. As próprias empreiteiras, também interessadas em dispor
do trabalho dos pais nos horários que iam além dos turnos nas escolas,
começaram a financiar ou subsidiar pequenos centros para oferecer
orientação educacional básica e também alguma ocupação, ou
passatempo, para os filhos de seus funcionários, até que estes voltassem
para casa.
A organização de creches ou day care centers foi, aos poucos,
evoluindo e se consolidando. Não faltou a alguns brasileiros, com espírito
empresarial mais aguçado, enxergar o potencial de retorno financeiro
que representaria a cobrança de mensalidades por estes serviços. A
professora Lili Kawamura descreve assim os primeiros anos das escolas
brasileiras:
Apesar de as iniciativas de escolarização terem ocorrido já no
início da migração de crianças brasileiras ao Japão, o conjunto
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
105
das escolas brasileiras teve uma visível expansão a partir de
meados dos ano 90, especialmente ... nas cidades de Hamamatsu,
Oizumi, Toyota, Toyohashi, Kanagawa, Shizuoka, Shiojiri e outras.
Uma parte das grandes escolas surgiu de pequenas experiências
de “fundo de quintal”, no início dos anos 90; outra parte instalou-
se com investimentos de uma grande organização educativa
privada, formando filiais em regiões com grande incidência de
brasileiros
65
.
Ao lado do objetivo inicial do lucro, ou da conveniência dos
pais trabalhadores, despontou, dentro da própria comunidade,
movimento paralelo de organização administrativa e orientação
pedagógica desses centros. A simples presença diária das crianças
naqueles estabelecimentos – muitos dos quais rudimentares, sem
professores qualificados ou material de ensino apropriado – não oferecia
qualquer respaldo técnico ou regulamentar em termos de certificação
para alunos que tivessem, mais adiante, de se reintegrar ao sistema
educacional brasileiro. Além disso, os obstáculos burocráticos e as
exigências financeiras impostos pelas autoridades japonesas para que
essas escolas fossem formalmente reconhecidas como centros de ensino
internacionais (entre os quais propriedade do imóvel e depósito de
garantia de seis meses da folha de pagamentos) impediam não só o
recebimento de isenções fiscais e outros benefícios, como também a
eventual migração dos alunos para o ensino universitário nipônico.
A educação dos jovens no Japão, sobretudo a partir de meados
da década de 1990, também suscitou o engajamento das
representações diplomáticas brasileiras. Nos freqüentes contatos destas
com a comunidade, verificava-se que a ausência de ações mais
assertivas nessa área poderia levar à crescente marginalização dos
jovens, seja em direção à delinqüência, seja condenando-os,
involuntariamente, a um futuro de reduzidas expectativas no mercado
de trabalho não qualificado. Essas preocupações foram resumidas em
106
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
non-paper encaminhado pela Embaixada em Tóquio ao Ministério de
Assuntos Estrangeiros do Japão (Gaimusho) em agosto de 1997 sob
o título “Educação de Brasileiros no Japão”, que ressaltou as
necessidades de alfabetização no idioma português, a adaptação nas
escolas japonesas e o acesso a cursos profissionalizantes e ao ensino
universitário
66
. Paralelamente, outras iniciativas foram tomadas, como
a obtenção de quase seis toneladas de material didático no Brasil para
distribuição às escolas brasileiras, a intermediação junto à Fundação
Roberto Marinho para a transmissão do Telecurso 2000 pelo canal de
televisão brasileiro no Japão, IPC TV e a veiculação, pela rádio NHK,
de curso intensivo de português.
Uma das primeiras manifestações de debate público sobre a
questão educacional ocorreu em novembro de 1997, com a realização
do I Simpósio sobre a Educação das Crianças Brasileiras no Japão. O
encontro foi organizado por membros do Departamento de Estudos
Brasileiros da Universidade de Tenri, em Nara, sob iniciativa do
professor brasileiro Reimei Yoshioka e contou com ampla participação
de representantes brasileiros e japoneses ligados à área de educação,
além da Cônsul-Geral Adjunta em Tóquio, Maria Edileuza Reis. Foram
discutidos temas como a adaptação às escolas japonesas, a necessidade
de extensão de cursos ou aulas complementares em português e a
reinserção dos alunos no sistema educacional brasileiro quando de seu
regresso ao Brasil. Na ocasião, o Embaixador do Brasil em Tóquio,
Fernando Reis, encaminhou carta ao Professor Yoshioka para sublinhar
os esforços empreendidos por parte dos órgãos oficiais brasileiros:
... tanto esta Embaixada como os Consulados-Gerais em Tóquio
e em Nagóia estão diretamente engajados em atividades que
visem a minimizar as dificuldades enfrentadas pela comunidade
brasileira no que tange à educação de crianças e adolescentes....
estamos criando condições para atender sempre de maneira mais
ampla à demanda de material didático do currículo nacional....
estou procurando gestionar [junto às autoridades centrais e
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
107
municipais japonesas] crescentes facilidades de espaço onde
professores voluntários possam prestar sua colaboração ... [bem
como] assegurar a melhor adaptação possível de nossos jovens
ao sistema educacional japonês, por meio da manutenção de
aulas especiais de língua japonesa em escolas que tenham alunos
brasileiros matriculados... além disso, estão sendo ultimadas as
providências para ... acesso, no Japão, à programação da TV
ESCOLA ... do Ministério da Educação, para complementar o
TELECURSO 2000 aqui transmitido regularmente
67
.
Havia, sem dúvida, uma preocupação com a questão da
educação dos jovens, mas o enfoque das discussões refletia, talvez, a
percepção, ainda prevalecente à época, da presença essencialmente
temporária, ou circular, da comunidade, corroborada, quiçá, com o
registro, naquele ano, da primeira redução absoluta do número de
brasileiros no Japão, depois de quase dez anos de contínuo crescimento.
A ênfase das discussões, portanto, abrangia a preservação do idioma
português, reforço nas escolas japonesas, o acesso a material didático
brasileiro e mecanismos de educação à distância, de modo a preparar
os jovens para a volta ao País. Ao lado da escolaridade, não faltou, na
visão governamental, a preocupação com a eventual exploração
comercial, como resumiu o telegrama do Consulado-Geral em Tóquio
sobre o Simpósio:
... a ausência de esforços (de interação das representações do
Governo com a comunidade no Japão) deixa aberto espaço para
a atuação de oportunistas engajados em projetos pessoais ...
iniciativas que, na maioria das vezes, visam o lucro financeiro às
expensas do trabalhador brasileiro
68
.
Poucos meses mais tarde, em abril de 1998, realizou-se o II
Simpósio sobre Educação do Brasileiros, na cidade de Toyota,
província de Aichi. Desta feita, os debates passaram de um caráter
108
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
essencialmente de diagnóstico para uma troca de idéias de cunho mais
propositivo, em termos de organização e disciplina das escolas
brasileiras, seus currículos e meios de encaminhamento das
reivindicações da comunidade às instâncias governamentais dos dois
países. Na ocasião, foram traçadas as primeiras linhas de ação que,
posteriormente, viriam a redundar na formação da Associação das
Escolas Brasileiras no Japão (AEBJ) e na regulamentação e validação,
pelo Ministério da Educação (MEC), dos currículos brasileiros
ministrados naquelas escolas. Tais iniciativas, que à época consistiram
na criação de grupos de trabalho para realizar um recenseamento dos
estabelecimentos de ensino existentes e para formatar a futura
associação de classe, eram vistas, também, como forma de centralizar
e canalizar as aspirações da comunidade no diálogo com as autoridades
oficiais brasileiras e japonesas.
À luz de solicitação explícita à Embaixada em Tóquio emanada
do Simpósio, formalizou-se pedido de envio de representantes do
Ministério da Educação e do Conselho Nacional de Secretários
Estaduais de Educação (CONSED) para discutir com as lideranças
comunitárias no Japão as alternativas para o reconhecimento, no Brasil,
dos diplomas emitidos pelas escolas brasileiras e japonesas, como
relatou telegrama daquela missão:
A presença dos representantes do MEC e do CONSED ... traria
uma orientação segura aos pais e aos profissionais brasileiros da
educação e serviria para colocar em evidência a prioridade
conferida pelo governo brasileiro à assistência aos nossos
nacionais no exterior
69
.
Foi ainda realizado o III Simpósio, em junho do mesmo
ano de 1998, na cidade de Hamamatsu, província de Shizuoka, em
que foram apresentados os resultados preliminares do
recenseamento de escolas e professores brasileiros, bem como
noticiadas outras iniciativas, como a utilização de salas de aula
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
109
ociosas de escolas japonesas para aulas para crianças brasileiras.
O representante da Embaixada no encontro, Conselheiro Genésio
Silveira da Costa, fez detalhada apresentação sobre a visão e as
ações do Governo brasileiro, em palestra intitulada “Educação dos
Brasileiros no Japão – Um Investimento para o Próximo Milênio”
em que sintetizou as ações governamentais que vinham sendo
empreendidas para promover o apoio aos jovens da comunidade.
Anunciou também a ida ao Japão de representantes do MEC e do
CONSED para, de um lado, explicar aos administradores das
escolas brasileiras os fundamentos da Lei de Diretrizes de Base da
Educação Nacional
70
e, de outro, para examinar maneiras de lograr
o reconhecimento dos currículos aplicados pelas escolas brasileiras.
O Presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho
Nacional de Educação (CNE) e a Chefe do Departamento de
Educação de Jovens e Adultos da Secretaria de Educação do Estado
do Paraná, membra do Conselho Nacional de Secretários Estaduais
de Educação, CONSED, estiveram no Japão no mês de maio
seguinte. Lá mantiveram reuniões com as representações
diplomáticas e consulares, com escolas brasileiras e autoridades
japonesas, com o intuito de estabelecer de normas específicas para
a regulamentação da educação brasileira naquele país. Como não
havia, no Brasil, previsão legal para o funcionamento de escolas
fora do território nacional, o representante do CNE comprometeu-
se a preparar um parecer normativo que visava a consecução desse
objetivo.
A constatação, in loco, pelos representantes da área de
educação, dos esforços que vinham sendo empreendidos pela
Embaixada e pelos Consulados, ao lado da comunidade brasileira,
resultou na formulação de parecer técnico (Parecer CNE 11/99)
que alinhavou as regras para o reconhecimento dos estudos
realizados nas escolas no Japão e estabeleceu as diretivas para a
realização do primeiro exame supletivo no exterior.
110
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Propôs o referido parecer três ações básicas: realização dos
exames supletivos; as normas para as escolas brasileiras no Japão; e
uso de instalações municipais japonesas para a criação de escolas
comunitárias brasileiras. No que se refere à regulamentação das escolas,
o MEC esclareceu que não lhe competia autorizar o funcionamento da
escola como estabelecimento educacional ou comercial no Japão, pois
essa era questão de entendimentos com as autoridades locais. Para
assegurar a continuidade dos estudos de seus alunos no Brasil, no
entanto, teriam de adequar-se às diretrizes da Lei 9.394/96 (Lei de
Diretrizes e Bases da Educação Nacional), e assim formular suas
propostas pedagógicas e estabelecerem suas estruturas técnico-
administrativas. Ficou estabelecido que as escolas teriam de preparar
suas propostas técnico-pedagógicas e encaminhá-las ao Conselho
Nacional de Educação para, caso atendidos os requisitos legais, obterem
a respectiva homologação. Obtida a homologação, os certificados e
diplomas emitidos pelas escolas, devidamente consularizados no Japão,
teriam validade para o reingresso automático e imediato dos alunos no
sistema educacional brasileiro ou mesmo para a prestação do exame
vestibular, no caso de conclusão do ensino médio
71
. O parecer foi
aprovado pelo Ministro da Educação em 22 de julho de 1999. Com
sua aprovação, além de solucionar-se a questão das escolas brasileiras,
puderam ser imediatamente iniciados os preparativos para a realização
do primeiro exame supletivo no exterior.
Essas provas, elaboradas pela Secretaria de Educação do
Paraná, foram realizadas em outubro daquele mesmo ano, em quatro
cidades (Tóquio, Nagóia, Hamamatsu e Oizumi), com inscrição de
789 candidatos, dos quais 301 compareceram. No ano seguinte a
presença foi bem mais significativa, 834 candidatos, de 1.670 inscritos,
atingindo um pico de 3.210 inscritos (1.807 comparecimentos) em
2002. A partir daquela data, tem-se verificado uma redução do número
de participantes, apesar do fato de a totalidade dos gastos com a
aplicação das provas serem, desde 2004, integralmente custeados pelo
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
111
Governo brasileiro (até aquela data, eram cobertos pela taxa de inscrição
paga pelos interessados e pela colaboração de empresas e bancos
brasileiros no Japão). De qualquer forma, os exames supletivos - que
desde 2005 também são aplicados na Suíça - constituem demonstração
clara da disposição oficial em assistir à comunidade expatriada em
matéria além da atuação consular tradicional.
Nessa mesma filosofia incluem-se os esforços empreendidos
para a regulamentação das escolas brasileiras no Japão a partir de
1999. A ativa disposição do governo brasileiro, mediante ações
concertadas dos Ministérios das Relações Exteriores e da Educação,
em procurar estimular e certificar a educação dos jovens no Japão, foi
essencial para catalisar a ação pedagógica por parte dos educadores e
dos donos de escolas, para além de uma atuação meramente comercial
e paliativa. Um resultado dessa interação governo-comunidade foi a
criação, em 2001, da Associação das Escolas Brasileiras no Japão
(AEBJ), órgão que reúne os principais estabelecimentos educacionais
brasileiros naquele país e que coordena o diálogo com a Embaixada,
Consulados-Gerais e com o próprio MEC.
Naquela época, o número de escolas brasileiras era de pouco
mais de trinta. Hoje já são 95 estabelecimentos, desde pequenas
creches até grupos com várias filiais espalhadas pelo país. Desse
total 42 escolas estão afiliadas à AEBJ, em cujos cadastros se verifica
que a maior parte dos alunos está concentrada nos níveis pré-escolar
(27%) e fundamental (65%), com apenas 7% dos alunos no nível
médio. Tal diferença pode ser explicada pelo fato de que muitos jovens
optam por ingressar no mercado de trabalho, o que é legalmente
permitido no Japão a partir dos quinze anos, ou retornam ao Brasil,
para aqui concluir seus estudos, tendo em vista a preparação para o
exame vestibular. Outra explicação poderia ser o fato de que a maioria
das escolas oferece apenas educação infantil e ensino fundamental,
não tendo o jovem o acesso ao ensino médio próximo ao local de
sua residência.
112
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Sem qualquer incentivo por parte do governo japonês, na forma
de isenção de impostos ou subsídios, as escolas brasileiras operam
exclusivamente como entidades comerciais. Assim, o valor das
mensalidades, que se situam, em média, em torno de ¥ 40.000
(US$370,00), necessariamente reflete os altos custos operacionais no
Japão, constituindo-se fator inibidor para o ingresso nessas escolas,
principalmente para as famílias com mais de um filho. Nesse sentido,
as escolas vêm pleiteando, junto às autoridades japonesas, seu
enquadramento na categoria de miscellaneous schools, ou seja, o
reconhecimento como centros de ensino e não meramente empresas,
que as habilitaria a receber alguns dos incentivos acima mencionados.
Avanços foram logrados nas tratativas oficiais bilaterais sobre a matéria
(vide Capítulo 5), como a flexibilização das exigências de propriedade
do imóvel e depósito de um semestre da folha de pagamentos. A plena
consecução deste objetivo, contudo, esbarra no fato de que, para obter
o status de miscellaneous, as escolas teriam de se transformar em
entidades sem fins lucrativos, ou fundações, o que vai de encontro à
principal razão de suas operações, que é a rentabilidade financeira.
Outra conquista importante da ação governamental junto às
autoridades japonesas foi a obtenção do reconhecimento das escolas
credenciadas pelo MEC como instituições habilitadas a emitir diplomas
de graduação do ensino médio, com validade no Japão. Os alunos
egressos dessas escolas, que hoje já são trinta e uma, poderão assim
concorrer aos exames de entrada na educação superior japonesa, sem
necessidade de comprovação de seus estudos no sistema colegial local.
Apesar de todos os avanços logrados num espaço de tempo
relativamente curto, a situação dos jovens brasileiros no Japão ainda
está longe de ser ideal. De acordo com dados do governo japonês e
estimativas dos educadores brasileiros, haveria, ainda, um percentual
grande de crianças fora do sistema escolar brasileiro ou japonês naquele
país. Esse número, no entanto, talvez esteja sobrestimado, na medida
em que um dos parâmetros utilizados pelo governo japonês é contabilizar
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
113
não o número efetivo de crianças estrangeiras matriculadas na rede
pública, mas sim aquelas que precisam de reforço no idioma nipônico.
Há portanto um número significativo de crianças brasileiras que
ingressam, desde o primeiro ano primário, na rede pública de educação
e que não precisariam, dessa forma, de orientação especial. Mesmo
assim, é provável que haja um número importante de jovens que ficam
à margem de qualquer tipo de educação, ou porque chegam ao Japão
na fase intermediária da educação fundamental e não conseguem, na
falta de uma escola brasileira local, se adaptar ao aprendizado japonês,
ou pelo fato de os pais não conseguirem pagar as mensalidades das
escolas brasileiras.
A preocupação com a ociosidade desses jovens e com o risco
que esta representa em termos do seu potencial desvio para a
criminalidade e delinqüência, tem suscitado o empenho não só das
autoridades brasileiras, mas também de algumas prefeituras japonesas
no sentido de procurar oferecer atenção mais direcionada aos alunos
estrangeiros nas escolas públicas municipais. Além das aulas de reforço
no idioma nipônico e da participação de monitores ou assistentes
bilíngües, algumas prefeituras, como a de Oizumi, editam livros didáticos
do currículo japonês em português, a fim de que os alunos possam
compreender o que está sendo ministrado nas salas de aula.
A educação das crianças brasileiras no Japão representa um
desafio em vários níveis: para os pais, no sentido de assegurar a
escolaridade de seus filhos, a fim de que tenham a oportunidade de um
futuro fora das fábricas; para as escolas, na busca de alternativas
administrativas que lhes permitam continuar operando com a necessária
orientação pedagógica e rentabilidade econômica que possibilitem a
oferta de ensino de qualidade; para as autoridades japonesas, como
instrumento para promover a harmoniosa integração dos estrangeiros
cada vez mais presentes na sua sociedade e para o Governo brasileiro,
no sentido da promoção de uma política inovadora de assistência a
seus cidadãos no exterior.
114
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
3.2 – A RAZÃO DA IDA: O ARUBAITO
Uma das expressões mais ouvidas quando se fala de emprego
no Japão é o arubaito, neologismo da palavra alemã arbeit, trabalho.
Seu uso comum refere-se ao trabalho temporário, sem vínculo
empregatício formal, correspondente, no Brasil, à expressão “fazer um
bico”. O termo é geralmente utilizado para designar o trabalho de jovens,
durante as férias, em restaurantes, lojas e outros serviços ocasionais. O
arubaito incorporou-se, no entanto, ao vocabulário cotidiano do
brasileiro no Japão, pois reflete a essência da sua condição de emprego:
temporário e sem a perspectiva de afiliação permanente ou ascensão
profissional na empresa. A presente seção enfocará o trabalhador
brasileiro no Japão sob três aspectos: sua inserção no modelo industrial
japonês, o sistema de recrutamento e o cotidiano nas fábricas.
3.2.1 – A MÃO-DE-OBRA ESTRANGEIRA NO MODELO INDUSTRIAL JAPONÊS
Como foi visto no primeiro capítulo, a demanda por
trabalhadores estrangeiros no Japão derivou, fundamentalmente, das
carências de mão-de-obra industrial, tanto quantitativa (taxas
decrescentes de natalidade) como qualitativa (alto grau de educação e
crescente rejeição da população nativa para o trabalho manual pesado).
Em outros países ou regiões de grande imigração contemporânea,
como os Estados Unidos ou Europa Ocidental, em que se nota,
ademais, um grande contingente de ilegais, os trabalhadores estrangeiros
dirigem-se predominantemente para outros setores (menos sujeitos à
fiscalização oficial), como serviços básicos (jardineiros, marceneiros,
pedreiros, garçons, etc.), construção civil e agricultura. A ausência de
imigrantes no setor industrial do Ocidente também pode, em parte, ser
explicada pela retração em suas indústrias de transformação tradicionais,
bem como pelo exclusivismo dos poderosos sindicatos industriais, que
inibem a entrada de imigrantes, mormente os ilegais.
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
115
A perda de competitividade da indústria norte-americana e
européia deveu-se, entre outros fatores, ao desenvolvimento, no Japão
do pós-guerra, de um sistema de produção e de relações trabalhistas
que fomentou um acelerado crescimento, baseado em exportações de
bens de capital e de consumo, de qualidade superior e preços inferiores
aos dos concorrentes ocidentais. Tal sistema redefiniu o modelo clássico
fordiano de padronização em série e consistiu na introdução de novos
conceitos de gerenciamento desenvolvidos por dois engenheiros da
Toyota Motor Corporation, Taichi Ohno e Shigeo Shingo, que veio a
ser conhecida como Lean Manufacturing. De um lado, foi
incorporando o princípio de Just in Time (JIT), que consistia na
eliminação de inventários, vistos como custos desnecessários e não
agregadores de valor, como no modelo empresarial e contábil
tradicional. Do outro, foi implementado um rigoroso controle de
qualidade de componentes e processos, chamado Total Quality
Management, com o objetivo de eliminar desperdícios e gargalos na
linha de produção. Para que se procedesse à eliminação dos inventários
(que, com o custo do valor imobiliário no Japão assumem proporção
ainda maior), fez-se necessário descentralizá-los por meio da criação
de uma rede confiável e diversificada de fornecedores, de modo a
assegurar a entrega dos insumos e componentes sempre e quando
necessário, “justo a tempo”. Da mesma maneira, a produção passou a
ser finamente sintonizada com a demanda efetiva, através do
estreitamento das relações comerciais com clientes e revendedores.
Esse modelo permitiu melhor absorver as oscilações do mercado e
reduzir custos, sem incorrer em despesas desnecessárias de manutenção
de grandes estoques, tanto na pré-fabricação como no atacado.
O sucesso desse conceito foi progressivamente transferido para
o fator de produção trabalho, com o mesmo objetivo de redução de
custos e aumento da competitividade. O princípio de adequação
constante entre a oferta e a demanda foi incorporado pelas grandes
empresas na contratação de seus operários. De um lado, mantinham
116
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
um quadro fixo de funcionários, treinados e incorporados às tradições
de lealdade, estabilidade e promoção por antigüidade. Do outro,
trabalhadores temporários, contratados para períodos de aumento na
produção e dispensados quando da redução da demanda.
Os trabalhadores temporários eram alocados através das
agências intermediadoras de mão-de-obra, as haken gaisha, ou
empreiteiras. Esses labor brokers já agiam no mercado desde o princípio
da industrialização japonesa, recrutando e provendo sazonalmente
equipes de trabalhadores nativos, os primeiros decasséguis. Quando
se agravou a falta de trabalhadores para as fábricas em meados dos
anos 1980, inclusive de mulheres e idosos, os haken gaisha começaram
a procurar no exterior os novos trabalhadores que a indústria reclamava,
como salientam os antropólogos Takeyuki Tsuda e Wayne Cornelius:
Japan has always had a system of labor brokers … that have
traditionally supplied companies with an informal work force
of native born, part-time, seasonal and day laborers … As
the supply of Japanese female part-timers and internal
seasonal migrants became insufficient during Japan’s severe
labor shortage in the late 1980’s, the increasing number of
immigrant workers began to supplement them. A number of
assen [sic] gaisha began to broker foreign workers as well,
while new labor broker firms were also established to deal
exclusively with foreign workers
72
.
Os primeiros contatos para recrutar trabalhadores brasileiros
foram feitos pelos pioneiros nikkeis que emigraram voluntariamente
para o Japão a partir de meados da década de 1980, aproveitando
seus contatos familiares e sociais. Esses trabalhadores eram
preponderantemente isseis e nisseis, que tinham facilidade para obter
passaporte ou visto japonês. Por também possuírem, em geral, um
conhecimento razoável da língua nipônica, puderam ser empregados
diretamente pelas grandes fábricas. As carências de mão-de-obra nas
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
117
empresas subsidiárias e periféricas eram supridas muitas vezes por
trabalhadores ilegais, principalmente asiáticos, criando uma situação
que o pesquisador e professor da Universidade de Tóquio, Takeshi
Inagami, chamou de “dualismo estruturado” (structured dualism) no
mercado de trabalho de imigrantes: “While [undocumented] Asian
workers found jobs in small-sized companies through personal
relations with others from the same ethnic origin, most Brazilians
were sent to large-sized manufacturing companies through
recruiting agencies and job brokers
73
.
Com a promulgação da Lei de Controle de Imigração, em junho
de 1990, houve uma súbita aceleração da presença de trabalhadores
brasileiros, agora com significativa parcela de sanseis. Paralelamente,
as autoridades nipônicas passaram a exercer maior controle sobre os
imigrantes ilegais, revogando acordos de isenção de vistos com alguns
países (Bangladesh e Paquistão em 1989 e Irã, 1992) e promovendo,
com maior rigor, inspeções trabalhistas nas fábricas. Aquelas que
infringissem a lei e contratassem trabalhadores ilegais estariam sujeitas
a multas (em torno de US$ 16.000) e penas criminais de até três anos
de detenção. Não obstante, foram poucas as autuações registradas,
como afirma a acadêmica Elisa Sasaki: “apesar de todo esse esforço,
na prática, apenas 350 empregadores foram penalizados por violação
da nova Lei de Imigração, em 1991 e 1992”
74
. Resultou dessa nova
conjuntura uma mudança na incorporação do trabalhador brasileiro,
progressivamente também em direção às fábricas menores, substituindo
os ilegais asiáticos. Como ressalta Naoto Higuchi: “Though migrants
from Brazil were at first substitutes for seasonal workers from rural
Japan, they were incorporated into increasingly different sectors
of the secondary labor market”
75
.
Esses setores eram, de um lado, as fábricas maiores, as grandes
montadoras de automóveis e de produtos eletrônicos, e, do outro lado,
as menores, que forneciam os insumos às primeiras. De acordo com
pesquisa realizada por Naoto Higuchi na cidade de Toyota em 2000,
118
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
entre 740 empresas manufatureiras, grandes e pequenas, foi constatado
que a maioria dos trabalhadores estrangeiros (67,9%) estava empregada
em firmas com mais de 100 funcionários. Destes, no entanto, 78,4%
eram contratados sob o regime temporário. Em contraste, nas empresas
menores, embora houvesse menos estrangeiros empregados, 53,2%
eram contratados diretos
76
. Ou seja, a participação relativa de
trabalhadores temporários aumentava de acordo com a dimensão da
empresa.
O advento da recessão econômica japonesa, que reduziu
significativamente os índices de produção industrial naquele país,
coincidiu com a chegada de dezenas de milhares de brasileiros nos
primeiros anos da década de 1990. Os trabalhadores brasileiros,
contudo, continuavam encontrando emprego, a despeito do aumento
dos índices negativos da economia japonesa. Isso deveu-se, sobretudo,
à grande mobilidade e adaptabilidade dos trabalhadores nikkeijin.
Como vislumbravam uma curta permanência no Japão, para
rapidamente acumular uma grande poupança, dispunham-se a aceitar
empregos não qualificados que os trabalhadores locais não mais
queriam, inclusive com pesada carga de horas extras. Tampouco tinham
fortes laços sociais e familiares, ou apego institucional às empresas,
que os prendessem a determinada região ou fábrica, podendo, assim,
locomover-se para locais onde houvesse vagas de trabalho.
Um outro fator que contribuiu para a continuada aceitação do
trabalhador brasileiro foi a percepção, no meio empresarial japonês,
da necessidade de se modificar o modelo de relacionamento patrão-
empregado. Tradicionalmente, esse relacionamento caracterizava-se
pela estabilidade, promoção e remuneração por antigüidade e sindicatos
internos. O gradativo envelhecimento da força trabalhadora nativa, sem
que tenha ocorrido sua substituição por gerações mais novas,
progressivamente contribui para a elevação de seu custo relativo, em
termos salariais e de encargos, ao lado de uma natural perda de
produtividade dos empregados mais idosos. A fim de absorver esse
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
119
ônus e manter a competitividade, muitas grandes empresas têm
deslocado as unidades de produção para outros países de mão-de-
obra mais barata, para a fabricação de produtos desenvolvidos no
Japão. Considerações políticas, no entanto, sobretudo com relação à
China, impedem uma migração em grande escala desses centros de
fabricação japonesa para o exterior. Assim, a tendência que se observa
é do recurso cada vez maior ao trabalhador temporário, ou com
contrato limitado, que não se vincula ao sistema de emprego perpétuo
e que pode ser facilmente dispensado ou recontratado dependendo da
conjuntura econômica
77
.
É nesse contexto de relações trabalhistas e sistemas de produção
que se enquadra o trabalhador brasileiro, um contingente de mão-de-
obra que serve de buffer para as oscilações da indústria japonesa.
Dada sua adaptabilidade, tanto em termos de disposição em aceitar as
pesadas tarefas nas linhas de montagem, como de buscar emprego
onde apareçam as oportunidades, tem logrado manter sua presença
no complexo produtivo nipônico, a despeito do aumento do
desemprego que caracterizou os anos 1990 naquele país.
3.2.2 – OS HAKEN GAISHA – AS EMPREITEIRAS, OU
RECRUTADORES DE TRABALHADORES
Conforme menção no primeiro capítulo, além de contatos
pessoais, o recrutamento ostensivo de nikkeis, no Brasil, teve início
com a publicação de anúncios nos jornais da colônia japonesa e com
propagandas em agências de viagem. Tais anúncios eram geralmente
veiculados em japonês
78
, já que a seleção de um grupo étnico específico
era proibida pelas normas da Organização Internacional do Trabalho.
Além disso, o Código Penal Brasileiro, de 1940, estipulava, em seu
Artigo 206: “Aliciar trabalhadores para fins de emigração. Pena:
detenção de um a três anos e multa” (Decreto-Lei 2.848, de 07/12/
1940). Dessa maneira, eram freqüentes as batidas de policiais federais
120
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
nas agências de viagem para apreender passaportes e bilhetes dos
potenciais emigrantes.
Não obstante as dificuldades iniciais, aumentou sobremaneira
o número de agências, principalmente em São Paulo e no Paraná, regiões
de maior concentração da comunidade nikkei beneficiada, a partir de
1990, pela reforma da Lei de Imigração japonesa. Segundo Naoto
Higuchi, eram três os tipos de empresas que intermediavam a ida de
brasileiros para o Japão:
i) agências de viagem, que apenas forneciam os bilhetes;
ii) agências recrutadoras, formalmente registradas como
companhias de viagem, mas que trabalhavam
predominantemente com os trâmites burocráticos para o
envio de trabalhadores; e
iii) intermediários (brokers) cuja função primordial era a de
recrutar trabalhadores e adquirir bilhetes nas agências de
viagem
79
.
A função desses agenciadores foi bastante criticada,
principalmente por causa do alto valor cobrado pelas passagens aéreas
para o Japão, às vezes o dobro ou triplo do valor declarado pelas
companhias aéreas. Vale lembrar, no entanto, que as empresas tinham
uma margem de lucro muito pequena com a venda de passagens apenas.
Sua rentabilidade derivava de comissões cobradas em troca da
realização de toda a tramitação burocrática para se obter a
documentação necessária no Japão (o indispensável registro de família,
que comprovava a ascendência familiar), vistos nos consulados
japoneses, cartas de garantia das empresas contratantes e despesas
iniciais na chegada (transporte e alojamento). O valor da sobretaxa
cobrada aos nikkeis foi progressivamente diminuindo, à medida em
que a demanda por trabalhadores no Japão se estabilizou com o advento
da recessão econômica a partir de 1991-92. Além disso, muitos
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
121
trabalhadores, depois da primeira ida ao Japão, não mais precisavam
desses serviços para voltas subseqüentes.
O caminho da emigração para o Japão distingue-se do fluxo
de brasileiros para outros destinos no Primeiro Mundo. Enquanto que,
para países como os EUA os emigrantes dependem, em grande parte,
de esquemas de agenciamento à margem da lei, com cobrança de
valores exorbitantes, geralmente cobertos unicamente pelos
interessados – e sem garantia de sucesso –, o sistema de intermediários
formais, o financiamento das despesas, a certeza do visto de
permanência e de contrato de trabalho no destino garantem aos nikkeis
e seus dependentes maior segurança e previsibilidade na viagem ao
Japão.
Mesmo com tais facilidades, persistiram os questionamentos
sobre a atividade desses intermediários, com denúncias de maus tratos
na chegada ao Japão. Entre outras queixas, figuravam a alocação a
empregos diferentes e piores do que os anunciados, a separação de
famílias, com marido e mulher sendo enviados a localidades distintas e
descontos desproporcionais dos salários pelos custos de passagens e
das moradias que lhes eram designadas. Suspeitava-se, inclusive, que
esses chamados akushitsu haken gaisha, ou agenciadores
inescrupulosos, mantinham ligações com o crime organizado no Japão,
a yakuza
80
.
A preocupação com a exploração do trabalhador brasileiro no
Japão levou a comunidade nikkei no Brasil a agir em busca de uma
solução normativa para aquela situação. Foi realizado, nesse sentido,
sob a égide da Sociedade Brasileira de Cultura Japonesa em São Paulo,
em novembro de 1991, o “Simpósio sobre o Fenômeno chamado
Dekasségui”. Juristas, membros da colônia e autoridades brasileiras e
japonesas discutiram os problemas que despontavam no processo
migratório e recomendaram a “...criação de uma entidade que
oferecesse orientação e apoio aos trabalhadores antes de saírem do
Brasil”
81
. Dessa iniciativa resultou a formação, no Brasil, do CIATE –
122
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Centro de Informação e Apoio ao Trabalhador no Exterior, entidade
respaldada pelos Ministérios do Trabalho dos dois países e que
começou a funcionar em 1992. No Japão, foi criado órgão
correspondente, o Centro de Assistência de Empregos para Nikkei
(que posteriormente recebeu a denominação de Tokyo Nikkei e foi
ampliada para outras cidades, como Nagóia e Shizuoka), destinado
a fornecer orientações práticas e ofertas de emprego aos
trabalhadores estrangeiros naquele país
82
. Pouco tempo depois, em
1993, foi apresentado ao Congresso Nacional, por iniciativa do
deputado nikkei Diogo Nomura, projeto de lei para modificar o Artigo
206 do Código Penal, o qual foi aprovado sob a forma da Lei 8.683,
de 15/07/1993, com a seguinte redação: “Aliciamento para o fim de
emigração: Artigo 206: Recrutar trabalhadores, mediante fraude,
com o fim de levá-los para território estrangeiro. Pena: detenção, de
um a três anos e multa.” Assim, dado o caráter legal da permissão de
trabalho no Japão, as agências puderam continuar a trabalhar
livremente.
Por apresentarem um certo revestimento oficial, no entanto, a
capacidade de atração e gerenciamento de trabalhadores daquelas duas
entidades revelou-se limitada. Assim, as empreiteiras continuavam a
servir de canal preferencial para a ida dos trabalhadores para o Japão,
justamente porque tinham melhor conhecimento da oferta de empregos
para brasileiros in loco, e por se responsabilizarem pelo financiamento
das passagens e da moradia. Ilustra esse ponto pesquisa do antrpólogo
norte-americano Takeyuki Tsuda realizada em Hamamatsu em 1998,
que apontou que cerca de 80% dos trabalhadores brasileiros dependia
dos empreiteiros para encontrar trabalho: “brokers generally offer
extensive employment, housing, and other services to nikkeijin
that few Japanese employers can match ... not only does the labor
broker system greatly facilitate the employment search in this
manner, it also provides for job security, specially in times of
depression
83
.
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
123
Em levantamento realizado pelo autor nas seções de
classificados dos principais jornais e revistas destinados à comunidade
brasileira entre agosto e setembro de 2006, foram encontradas mais
de 400 empreiteiras oferecendo empregos. Esse número deve
representar apenas uma parcela do total, pois muitas já contam com
número expressivo de funcionários próprios, até 5.000 no caso das
maiores, e prescindem de propaganda.
É curioso notar, no entanto, que toda essa atividade de
contratação e alocação de mão-de-obra temporária no Japão opera
sob nebulosa legislação que, a rigor, não a permitiria, excluídos alguns
casos restritos. Até 1986, era proibida a contratação de mão-de-obra
terceirizada, salvo em situações especiais, como serviços para o
governo. Naquele ano, foi promulgada a Lei de Alocação de Mão-de-
obra (Labor Dispatch Law), que relacionou 15 categorias de emprego
cuja terceirização passou a ser permitida, limitadas essencialmente a
serviços administrativos e de comércio. Tais restrições, no entanto,
foram progressivamente atenuadas, para, sob pressão do setor
industrial, englobar outras categorias, inclusive para as linhas de
produção nas fábricas (a última revisão da Lei foi em 2004). Mesmo
assim, permanecem ainda muitas irregularidades naquele ramo. Nos
termos da legislação em vigor, há dois tipos básicos de contratação
indireta: ukeoi, que significa “trabalho por empreitada” e haken, que
consiste apenas na alocação da mão-de-obra por determinado período.
Por este último tipo de serviço, a empresa contratante teria de propor
ao trabalhador a contratação direta após um ano. Assim, o que vem
acontecendo, na prática, é que as empresas formalmente registradas
como haken se apresentam no mercado como ukeoi, isto é, apenas
para a execução de um determinado serviço, com a finalidade de fugir
da obrigação da contratação direta.
Tal estrutura trabalhista, apesar de ir de encontro à tradição
japonesa de estabilidade no emprego, deverá prevalecer no futuro,
tendo em vista, de um lado, a relutância das empresas em assumir os
124
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
cada vez mais pesados encargos sociais que o antigo sistema impõe,
sobretudo em épocas de redução de atividades, e, do outro, o desejo
de manter flexibilidade dos custos dos fatores de produção – bens e
mão-de-obra – para prontamente responder às oscilações de mercado
globalizado e competitivo. A atividade dos empreiteiros continuará,
dessa forma, a exercer papel importante para a presença dos
trabalhadores brasileiros no Japão.
3.2.3 – A VIDA NAS FÁBRICAS
A maioria dos emigrantes brasileiros, antes de irem ao Japão,
nutria a ilusão de que, por caracterizar-se como país de primeiro mundo
e tecnologicamente avançado, encontraria nas fábricas nipônicas um
ambiente de trabalho moderno, automatizado e de fácil execução. No
entanto, a dura realidade cotidiana contrariou as expectativas iniciais.
A demanda por mão-de-obra estrangeira, a partir de meados
dos anos 1980, resultou justamente da necessidade de se preencherem
vagas no setor industrial para tarefas que os trabalhadores japoneses
não mais queriam executar. Como descreve a pesquisadora Rosa
Rossini: “é mais comum ... conceder os trabalhos mais tranqüilos aos
funcionários da empresa, restando aos decasséguis os trabalhos mais
simples, que qualquer um pode fazer, e duros, sujos e perigosos”. Essas
tarefas são denominadas pelos japoneses kitsui (pesado), kitanai
(sujo) e kiken (perigoso), ou os “3Ks”. A elas, os brasileiros agregaram
duas outras características: kibishii (exigente) e kirai (detestável)
84
.
Tais características descrevem a carga extremamente pesada
do trabalho nas fábricas japonesas, grandes ou pequenas. Constitui-
se de jornadas de trabalho de dez a catorze horas diárias, geralmente
seis dias por semana, com reduzidos intervalos para descanso e
sob um ritmo intenso de execução. Pelo desconhecimento da língua
e transitoriedade no emprego, são poucas as oportunidades dadas
aos brasileiros de progredir para tarefas menos árduas dentro das
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
125
empresas. Assim, vêem-se marginalizados às rotinas desgastantes
e cansativas, que muitas vezes podem resultar em acidentes de
trabalho.
Outro ponto que merece menção é a ostensiva discriminação
sofrida pelos trabalhadores estrangeiros, exemplificada pela cor de
seus uniformes, diferente da dos trabalhadores japoneses. Nas horas
de refeição ou descanso, tampouco há congregação entre japoneses
e estrangeiros, o que reforça ainda mais a exclusão dos nikkeijin.
Além disso, enquanto a remuneração oferecida a homens oscila em
torno de ¥ 1.200 a ¥ 1.400 por hora, para mulheres, varia entre ¥
900 e ¥ 1.000, muitas vezes para a realização da mesma tarefa. As
mulheres, no entanto, tendem a ser designadas para as funções de
controle de qualidade ou embalagem de produtos, tarefas menos
exigentes.
3.3 – A PROTEÇÃO SOCIAL – PREVIDÊNCIA E SAÚDE
A questão da proteção social do trabalhador brasileiro no Japão
insere-se no contexto da ainda incerta projeção de sua permanência
naquele país. De acordo com várias estimativas, apesar de estarem
legalmente empregados, seja diretamente nas fábricas, seja como
funcionários de empreiteiras, os brasileiros, em sua maioria, não se
afiliam a qualquer sistema de previdência ou de saúde oferecidos no
arquipélago. De um lado, isso deve-se à própria transitoriedade da
sua condição no Japão e da conseqüente relutância em pagar por um
benefício do qual não tirará proveito (no caso da previdência). Do
outro, há o fator da idade média da comunidade (em torno de 32 a 33
anos), em que as preocupações com a possibilidade de doença ou
com o planejamento para a aposentadoria ainda estão distantes.
Ademais, é claro, há o fator financeiro: evitar o pagamento de aportes
a sistemas previdenciários, de modo a não sacrificar o objetivo principal
da emigração, a poupança.
126
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
A legislação previdenciária japonesa não exclui ou estabelece
condições especiais para a participação de estrangeiros. Ao contrário,
prevê a obrigatoriedade de afiliação de todos os trabalhadores no
sistema que, à semelhança de muitos outros regimes previdenciários
oficiais no mundo, enfrentam crescentes disparidades entre receitas e
despesas.
O seguro social nacional japonês denomina-se Shakai Hoken,
ou Seguro de Saúde e de Pensão e Bem-Estar Social. Dele fazem
parte o seguro saúde, kenko hoken, de aposentadoria, kosei nenkin
hoken, de acidentes de trabalho, rodosha saigai hosho hoken, e
seguro desemprego, o koyo hoken. As parcelas de contribuição,
igualmente repartidas entre empregado e empregador, correspondem
a 11,24% do salário bruto para cada parte, sendo 4,1% para o seguro
saúde e 7,14% para a aposentadoria. Os aportes para os fundos de
seguro-desemprego e de acidentes de trabalho são de responsabilidade
exclusiva do empregador.
Alternativamente, existe um outro plano de seguridade social,
administrado localmente pelas prefeituras, mas que cobre apenas gastos
com saúde, denominado Kokumin Kenko Hoken. Visa atender ao
trabalhador autônomo, a agricultores e a outros que não detenham
vínculo contratual com empresas. A contribuição única varia de acordo
com o salário médio e o tamanho da família sendo, porém, geralmente
mais elevada do que a contribuição ao shakai hoken.
Nos dois planos, há limite para a cobertura de despesas médicas:
80% no shakai hoken e 70% no kokumin hoken. Há também um
teto mensal do valor que o assegurado terá de pagar: em torno de ¥
65.000 a ¥ 73.000 (US$ 590,00 a US$ 665,00, aproximadamente)
no caso de tratamentos mais onerosos; as despesas superiores são
reembolsadas pelo seguro.
A participação de brasileiros nesses sistemas, contudo, é
reduzida. De acordo com pesquisa realizada pela prefeitura de
Hamamatsu, por exemplo, apenas 12% dos brasileiros estavam inscritos
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
127
no kokumin hoken
85
. Os dados referentes à participação no shakai
hoken são ainda mais desalentadores. Em pesquisa realizada pela
prefeitura da cidade de Iwata, em 2004, verificou-se que apenas 28,3%
dos brasileiros tinham qualquer tipo de cobertura médica; destes, cerca
de 30% (menos de 10% do total) participavam do seguro nacional e
40%, do seguro municipal. O restante participava de outros planos
privados
86
.
Tal comportamento pode ser explicado por vários motivos. O
mais evidente é o valor da contribuição e o que ela representa no bolso
do contribuinte. Para um salário médio de ¥ 250.000, o trabalhador,
no caso do seguro nacional, teria de desembolsar, mensalmente, cerca
de ¥ 29.000, além do imposto de renda de ¥ 12.300, perfazendo um
desconto bruto de mais de 16% de seus vencimentos, sem contar a
comissão descontada pelo empreiteiro, em torno de 15% a 30%. Esses
agenciadores, por sua vez, também evitam a inscrição do trabalhador
no plano nacional, em razão do aporte de 11,4% que teriam de fazer.
Dessa maneira, encorajam ou direcionam seus trabalhadores a
inscreverem-se apenas no seguro municipal, kokumin hoken.
Outro fator inibidor da participação - principalmente no shakai
hoken - é o fato de que o contribuinte só terá direito a solicitar a
aposentadoria após 25 anos de participação no sistema. Como a maioria
dos brasileiros não vislumbra, ainda, horizonte tão distante de
permanência no Japão, opta por não se afiliar à previdência, por
considerar o pagamento um desperdício de dinheiro
87
. Na pesquisa
realizada na cidade de Iwata, foi essa a razão mais citada para a não-
participação em planos de saúde (alto custo - 31%), seguida da
dificuldade de compreensão dos regulamentos (19%), recusa do
empregador em fazê-lo (17%) e expectativa de um retorno ao Brasil
no futuro próximo (9%).
Essa situação, no entanto, vem-se aos poucos modificando.
Com a perspectiva de permanência mais longa, ou mesmo definitiva,
muitos brasileiros têm procurado empregos que oferecem esses
128
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
benefícios sociais. Da mesma forma, as autoridades japonesas,
confrontadas pelos crescentes déficits da conta previdenciária, começam
a agir com maior rigor em relação à obrigação de inscrição de
trabalhadores assalariados.
Em instrução enviada a todas as prefeituras em 1994 pelo
Ministério da Saúde e Previdência, foi recomendada a recusa de
inscrição no kokumin hoken aos estrangeiros, que deveriam ser
orientados a se afiliar ao seguro nacional. Algumas prefeituras seguiram
com maior rigor essa determinação, como a de Hamamatsu, mas outras,
como Ota e Kawasaki, também com grande concentração de nikkeijin
e talvez mais preocupadas com o retorno que estes davam à economia
local, adotaram atitude mais leniente e permitiram a permanência nesses
planos
88
.
Em fevereiro de 2006, o Jornal Tudo Bem realizou pesquisa
informal entre 14 empreiteiras de grande e médio portes e constatou
que 42,8% ofereciam o shakai hoken, principalmente em razão de as
grande fábricas o exigirem para a aceitação de contratados indiretos.
A última revisão da Lei de Alocação de Trabalhadores em 2004, que
regulamentou a função das empresas intermediadoras, condicionou a
autorização para funcionamento à inscrição no seguro nacional. Para
não perder seus funcionários que, mesmo assim, não querem pagar a
sua contribuição previdenciária, algumas empreiteiras estariam
absorvendo a contribuição do empregado ou aumentando o valor da
hora/trabalho, a fim de não reduzir o salário final
89
.
3.4 – A VIDA FORA DAS FÁBRICAS: O “JEITO BRASILNO JAPÃO
A dificuldade inicial de adaptação social e cultural de uma
comunidade migrante a um país estrangeiro, além de acentuar
sentimentos de isolamento e de saudades da família e dos amigos, é
reforçada pela inexistência de produtos e serviços que faziam parte de
seus costumes e hábitos no país de origem. Nesse contexto, criam-se
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
129
condições favoráveis para o surgimento de estabelecimentos comerciais
voltados especificamente para a colônia imigrada, que ofereçam
produtos típicos da terra natal não encontrados nos mercados locais.
A par dos aspectos meramente mercantis, o chamado comércio étnico
é valorizado pela comunidade expatriada como foco de reunião e
congregação social e reafirmação cultural, onde se pode conversar
livremente na língua materna e se inter-relacionar fora do ambiente de
trabalho. São esses os elementos que conduzem à formação de enclaves
comerciais nas áreas de concentração de imigrantes, como, por
exemplo, as Chinatowns, a Rua 46 em Nova York e a própria
Liberdade, na cidade de São Paulo. Como salienta Takeyuki Tsuda:
It is important to remember that the cross-border traffic of
commodities is not merely an economic exchange, but also a
transaction of commodified meanings and images that
constitute a transnational culture… the Japanese Brazilians
appropriate the cultural meanings attached to these products
(especially food and clothes) to articulate their Brazilian
counteridentities and consolidate their attachment to their
home country
90
.
A seguir, será examinado o que representa a rede de comércio
e serviços “de brasileiro para brasileiro” no Japão.
3.4.1 – PRODUTOS E SERVIÇOS
O comércio no Japão pode ser considerado, pela afluência de
sua população, como um dos mais sofisticados e variados do mundo.
A população do arquipélago nipônico tem acesso a produtos nacionais
e importados que atendem aos mais variados gostos e preferências:
finos chocolates belgas, artigos de moda de renomadas griffes,
restaurantes que oferecem o melhor da cozinha internacional, e até
incontáveis lojas populares, as konbinis (do inglês convenience store)
130
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
ou hyaku-en shoppu (equivalentes às dollar stores do EUA ou “lojas
de 1,99” no Brasil, que vendem produtos a ¥ 100).
Apesar de toda essa variedade, os primeiros brasileiros que lá
chegaram no começo dos anos 1990 ressentiam-se da carência de
produtos básicos a que estavam acostumados. Já eram aqueles
emigrantes, em sua maioria, plenamente abrasileirados em termos de
hábitos alimentares, vestuário e lazer, cujos correspondentes, no Japão,
lhes eram estranhos e pouco assimiláveis, sobretudo no que diz respeito
à cozinha japonesa, rica, porém peculiar ao gosto brasileiro.
Motivados por essa demanda potencial da comunidade que se
alargava no Japão, começaram a surgir pequenas lojas de produtos e
serviços para atender à clientela brasileira. Assim como as escolas,
várias eram improvisadas nas próprias residências dos emigrantes, como
salões de cabeleireiro, manicures ou depósitos para a revenda, em
pequenas quantidades, de alguns produtos brasileiros importados.
Inauguravam-se, também, churrascarias brasileiras e restaurantes de
rodízio de pizzas , inexistentes no Japão. Toda essa atividade começou
a despertar o interesse de empresários brasileiros e japoneses que
vislumbraram grandes oportunidades comerciais – afinal, já eram mais
de 150.000 consumidores potenciais em 1993.
Existe atualmente no Japão grande variedade de lojas,
restaurantes e serviços oferecidos à comunidade. Além dos
estabelecimentos fixos, situados nas localidades de maior concentração
de brasileiros, há serviços de entrega de encomendas feitas por telefone
ou Internet e unidades móveis que atendem localidades mais remotas.
Para tentar quantificar a dimensão desse mercado, e na ausência de
registros comerciais oficiais, o autor realizou levantamento, em agosto
de 2006, entre revistas publicitárias e guias de compras editados no
Japão para a comunidade brasileira
91
. Nessa pesquisa, foram
contabilizados 868 estabelecimentos comerciais brasileiros, distribuídos
em 23 províncias japonesas. O maior número desses estão registrados
nas províncias de Aichi (202 empresas), Shizuoka (144), Gunma (106),
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
131
Kanagawa (61), Mie (55), Tóquio (50) e Nagano (36), o que reflete,
como foi visto no Capítulo 2, a configuração da população brasileira
naquele país.
Em termos de empreendimentos, foram assinaladas 294 lojas
de produtos comestíveis e bebidas, açougues e vídeo-locadoras, 134
restaurantes, bares, lanchonetes e pizzarias, 96 lojas que oferecem
serviços diversos, como cabeleireiros, manicures, clínicas de estética,
academias, auto-escolas, aulas de capoeira, festas infantis e buffet,
massagens e tatuagens, entre outros. É significativo também o número
de agências de viagens, 70, atacadistas, 56 e lojas de vestuário, 35,
bem como de despachantes, 32, que intermedeiam serviços junto às
repartições consulares e autoridades japonesas (renovações de vistos,
por exemplo). Há, ainda, revendedoras de carros, lojas de produtos
de informática, empresas de mudanças, clínicas médicas e dentárias
com serviço em português, bem como cursos de línguas e outras
atividades técnicas.
A variedade de produtos e serviços brasileiros oferecidos à
comunidade lá residente é efetivamente expressiva. Três grandes
empresas dominam o setor importador/atacadista de mercadorias
brasileiras: Imai Ltd., Lead-Off Japan e IB Fox Co. Ltd, com cerca de
60% da representação de produtos. O resto do mercado é
essencialmente dividido entre outras seis empresas menores. A dinâmica
desse mercado pode também ser medida pela realização anual, desde
2003, da feira ExpoBusiness na cidade de Nagóia, que congrega
empresas brasileiras e japonesas com interesses comerciais voltados
para a comunidade no Japão. A quarta edição da feira em 2006
registrou a presença de 80 expositores e de mais de cinco mil visitantes.
Seria difícil precisar o que representa essa atividade em termos
de exportação brasileira. Estimativas situam entre US$ 200.000.000 e
US$ 400.000.000 o valor desse comércio no varejo japonês, o que
representaria, no atacado, ou importado FOB, um pouco menos da
metade desse valor. Talvez a primeira cifra esteja mais próxima à da
132
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
realidade, que corresponde a um gasto médio em produtos importados
de US$ 85,00 a US$ 100,00/mês por brasileiro trabalhador
(estimando-se que haja 200.000 a 220.000 assalariados, com uma
renda média mensal de US$ 2.200,00 a US$ 2.300,00).
3.4.2 – COMUNICAÇÃO E A MÍDIA BRASILEIRA NO JAPÃO
Os primeiros emigrantes que chegaram ao Japão, além de
internamente isolados pela sua condição de estrangeiros, pelo
desconhecimento da língua e por um regime de trabalho intenso, que
pouca oportunidade oferecia para o lazer e congregação social,
sentiam-se também alienados de suas origens em razão das dificuldades
e custos de obter informações do Brasil, tanto notícias da família quanto
sobre o que estava acontecendo no País.
Àquela época, no início dos anos 1990, não havia as facilidades
de comunicação hoje tão acessíveis e baratas. O custo de uma chamada
telefônica para o Brasil era relativamente alto – mais de US$ 2,00 por
minuto. A Internet e o correio eletrônico ainda demorariam alguns anos
para se constituírem no mais rápido canal alternativo de informação e
comunicação da atualidade.
O dinheiro gasto pela comunidade em comunicações telefônicas
naqueles primeiros anos era considerável: “by 1996, the entire
Japanese Brazilian population was spending an amazing US$ 50
million per month on international phone calls
92
. Campanhas
publicitárias eram feitas pelas principais empresas telefônicas do Japão
para atrair essa nova clientela, inclusive facilitando a compra ou aluguel
de linhas nas residências dos brasileiros. Alguns emigrantes, mais
solitários e que haviam deixado a família no Brasil, gastavam boa parte
de seus salários em telefonemas.
Essa situação começou a mudar em 1996 quando foi fundada
por um emigrante brasileiro a companhia telefônica Brastel. Atenta à
evolução tecnológica do mercado de telefonia internacional, a companhia
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
133
passou a oferecer ligações mais baratas pelo sistema call back a partir
dos EUA. Dois anos mais tarde, a empresa estabeleceu convênio com
a KDD, empresa telefônica japonesa, pelo qual arrendou linhas
internacionais e passou a oferecer ligações de baixo custo para o Brasil.
O sucesso da iniciativa levou ao lançamento dos cartões pré-pagos de
telefonia, que reduziram o custo das chamadas para o Brasil, hoje a
cerca de cinco centavos de dólar por minuto. A Brastel atende a toda
gama de comunidades estrangeiras radicadas no Japão e oferece seus
serviços em 20 idiomas diferentes. A comunidade brasileira, esteio inicial
de suas operações, hoje representa apenas cerca de 12% de seu
faturamento.
Se o emigrante, no início dos anos 1990, encontrava dificuldades
para a comunicação pessoal e direta com a pátria, também lhe faltava
informação mais ampla sobre o País. Não havia, à época, sistemas de
TV a cabo ou imprensa escrita que não em japonês ou inglês. As notícias
que chegavam resumiam-se a revistas e jornais antigos enviados pelo
correio por familiares e amigos.
Um ex-emigrante japonês, Yoshio Muranaga, que retornara do
Pará àquele país em 1990 com a expectativa de vender palmito em
conserva no Japão, abriu uma pequena representação na cidade de
Atsugi, Kanagawa, perto de Tóquio. A bandeira do Brasil na janela do
escritório atraía os primeiros brasileiros que lá chegavam e que
avidamente consumiam e reproduziam matérias de jornais e revistas
que Muranaga recebia de seus filhos no Brasil. Enxergando um mercado
promissor, assinou serviço noticiário de um grande diário paulista e
associou-se ao jornal japonês Mainichi Shinbum para lançar o primeiro
semanário brasileiro no Japão, o International Press. Em seu ensejo,
seguiram-se outros empreendimentos jornalísticos, a Folha Mundial,
de 1992, o Tudo Bem em 1993, de outro emigrante japonês no Brasil,
Masaku Shoji e o Nova Visão, já de 1995. Hoje, restam apenas o
International Press e o Tudo Bem, com tiragens de 40.000 e 20.000
respectivamente. O International Press publica, também, edição em
134
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
espanhol, voltada para a comunidade peruana, de cerca de 10.000
exemplares. A redução da variedade de jornais brasileiros deveu-se,
em parte, à impossibilidade de absorção, pela comunidade, de 4 jornais
essencialmente com o mesmo conteúdo, além dos altos custos de
produção e, mais recentemente, à concorrência dos outros meios de
informação: Internet e canais de televisão a cabo.
Além dos dois semanários, são editadas, no Japão, uma grande
quantidade de revistas, semanais ou mensais, voltadas para a
comunidade brasileira. São os chamados free-papers, de distribuição
gratuita, cuja comercialização é financiada pela enorme variedade de
anúncios de lojas, produtos, serviços e empregos. Destacam-se, entre
essas, a Revista Alternativa, a Japan Total, a A Zebra, a Gambaré,
a Revista Olho Vivo, a Acha Fácil e a Folha-e. Embora estes sejam
primordialmente instrumentos de propaganda, contam com matérias e
colunas opinativas sobre a vida da comunidade, conselhos e informações
para seu cotidiano.
Em meados dos anos 1990, finalizavam-se os estudos para o
lançamento das primeiras emissoras de televisão por satélite no Japão.
O Grupo International Press logrou ser um dos primeiros setenta canais
a operar na rede “Direct TV” japonesa, mediante a criação da IPC-
TV, em 1996, com dois canais por assinatura, o primeiro com uma
mescla de programação local e da TV Globo Internacional do Brasil, e
o outro dirigido à comunidade nikkei hispânica. O desconhecimento
do potencial de assinantes brasileiros no Japão ocasionou resistências
iniciais por parte do Grupo Globo à retransmissão de sua programação,
superadas, em parte, com a intervenção da Embaixada como facilitadora
de contatos e de informações sobre a dimensão da comunidade que se
consolidava naquele país
93
. A posterior constatação da rentabilidade
da venda dos direitos de transmissão (eram mais de 25.000 assinantes)
levou o Grupo Globo Internacional a efetuar mudanças na programação
e exigir a transmissão integral de sua programação, ocasionando o
desaparecimento do canal em espanhol e sua substituição por uma
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
135
programação produzida localmente e com correspondentes no Brasil,
destinada especificamente à comunidade brasileira no Japão. Segundo
informações da direção do Grupo IPC-TV, a empresa possui,
atualmente, 40.000 assinantes, com predominância do canal que
transmite exclusivamente a programação da Globo Internacional.
Além desses veículos, há também rádios brasileiras que
transmitem suas programações em parceria com estações japonesas
(Rádio Transamérica, ou, pela Internet, a Rádio Fênix, criada
especificamente para o público brasileiro). Existe, ainda, grande
variedade de portais na Internet com informação, anúncios ou empregos:
Braznet, Braznews, 365dias.net, 40graus, Guia-jp, além dos sítios da
imprensa disponíveis em formato eletrônico.
Tem-se verificado, progressivamente, uma migração do
conteúdo informativo dos veículos tradicionais dirigidos à comunidade
brasileira – jornais e televisão – para a Internet. Os avanços
tecnológicos do setor e a alta qualidade da transmissão digital no Japão,
além do acesso cada vez maior a computadores por parte do público
deverá, em poucos anos, levar à crescente marginalização das pioneiras
formas de comunicação para as tecnicamente mais avançadas. Já é
possível hoje acessar no Japão os canais abertos de televisão, em
formato de alta definição, por telefones celulares.
3.5 – AS REMESSAS FINANCEIRAS
Um dos temas mais recorrentes que permeiam a discussão
sobre os emigrantes brasileiros espalhados pelo mundo é o das remessas
financeiras. E com justa razão. Essas transferências unilaterais correntes,
para usar a terminologia oficial, representaram, em 2005, o ingresso
de mais de US$ 4,05 bilhões nas contas públicas, de todas as origens,
de acordo com dados do Banco Central. Nas décadas de 1970 e
1980, a média anual sob essa rubrica foi de aproximadamente US$
170 milhões. Desde 1990, no entanto, momento a partir do qual se
136
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
verificou a acelerada saída de brasileiros em busca de emprego no
exterior, a média passou a US$ 2.574,8 milhões por ano
94
.
Esses são, contudo, apenas registros oficiais de dinheiro que
entrou no País pela via da rede bancária formal. O valor real, estima-
se, foi bem maior do que os US$ 38,6 bilhões contabilizados pelo
Banco Central nesses últimos quinze anos, principalmente em razão de
remessas informais oriundas de países com maior número de brasileiros
ilegais, como os EUA ou países da Europa Ocidental, onde o imigrante
evita deixar rastro de sua presença. O Banco Interamericano de
Desenvolvimento, por sua vez, estimou que, no Brasil , o volume real
da entrada de remessas originárias dos emigrantes tenha chegado a
US$ 6,4 bilhões, ou 1,1% do PIB
95
, em 2005.
No caso do Japão, com a população brasileira legalmente
assentada e a presença de uma rede bancária brasileira diversificada
em termos de instituições, agências e serviços, o percentual de remessas
informais é proporcionalmente muito pequeno. Como ressalta o
jornalista e sociólogo Ângelo Ishi:
Despite the informal transfers, one may affirm that,
compared to other remittance markets, [in] the Japan-Brazil
route … the majority of the remittances are made through
official channels. This was made possible because both the
senders and the receivers of these money transfers are well
served by banks in Brazil and Japan
96
.
Com efeito, de acordo com apresentação do Gerente-Geral
do Banco Banespa-Santander de Tóquio, Totumo Sakoda
97
, havia,
até meados de 2006, cinco bancos brasileiros operando comercialmente
no Japão: Banespa-Santander, Banco do Brasil, com sede em Tóquio
e outras seis agências espalhadas pelo país, ABN-AMRO, Itaú e
Bradesco, estes três últimos em parcerias com os Correios ou bancos
japoneses (o Grupo Itaú recentemente adquiriu as operações do
Banespa-Santander). As modalidades de transferência variam desde
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
137
o balcão de atendimento nas agências a instruções telefônicas, fax,
caixas eletrônicos, Internet e até mesmo nas kombinis. Os bancos
também realizam plantões móveis nos finais de semana em lojas e
centros comerciais para atender a clientela fora do horário normal de
funcionamento. Outra característica que distingue o mercado de
transferências no Japão é seu relativo baixo custo, que varia de US$
9,00 a US$ 19,00 sendo até mesmo absorvido no caso de clientes
com poupanças maiores no banco (o que representa uma média de
3% do valor da remessa, contra 7% nos EUA). Assim, por todas essas
facilidades, os valores declarados pelos bancos no Japão devem estar
próximos do efetivo que de fato chega ao seu destino no Brasil.
Essa cifra, atualmente, está próxima de US$ 2,0 bilhões por
ano, mas as estimativas variam até US$ 2,6 bilhões. Tal valor baseia-
se no cálculo da renda aferida pela comunidade brasileira e de sua
propensão marginal a poupar. Segundo Sakoda, citando dados de 2004,
o rendimento bruto dos brasileiros, medido em termos da população
economicamente ativa (cerca de 75% do total) e de um salário médio
per capita de US$ 24.000,00 a.a. seria de cerca de US$ 5,0 bilhões.
Dois terços (US$ 3,0 bilhões) desse valor seriam gastos no Japão e
US$ 2,0 bilhões subseqüentemente iriam para o Brasil todo ano.
Sem realizar um minucioso rastreamento, não é possível
determinar o quantitativo exato remetido pelos brasileiros no Japão.
Nos registros do Banco Central, por exemplo, foram contabilizados
em 2005 apenas US$ 611,7 milhões oriundos daquele país sob a rubrica
“Transferências Unilaterais – Manutenção de Residentes – Ingressos”
98
.
Não estão contabilizadas, por exemplo, transferências maiores para
compra de imóveis, pagamento de impostos ou outras dívidas e dinheiro
enviado a pessoas jurídicas. Ademais, é possível que parte dos recursos
que deixam o Japão sejam, por conveniência ou necessidade dos
bancos, desviados para outros destinos, como os Estados Unidos,
antes de chegarem definitivamente ao Brasil. Como diz Sakoda: “The
portion of money (carried out) in cash is not always included in
138
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
the statistics of the Central Bank, as it can be classified under
other categories or be exchanged outside the banking system”
99
.
Quanto ao destino final no Brasil da poupança acumulada pela
comunidade no Japão, a Reunião Anual de Governadores do BID em
Okinawa, Japão, apresentou, em 2005, relatório de pesquisa realizada
pela empresa Bendixen & Associates
100
junto à comunidade latino-
americana residente no Japão (onde 82% são brasileiros). De acordo
com os dados revelados, 85% dos entrevistados faziam poupança no
Japão com os seguintes objetivos: melhorar a qualidade de vida (32%);
abrir negócio próprio no país de origem (19%); adquirir imóvel no país
de origem (14%); e educação dos filhos (13%). O valor médio das
remessas individuais era de US$ 600,00, e o total anual por pessoa de
aproximadamente US$ 6.600,00.
Uma característica importante que distingue os fluxos financeiros
originários do Japão é o seu valor proporcional mais elevado do que,
por exemplo, dos EUA (que seria de US$ 240,00, por remessa, de
acordo com a Bendixen & Associates) e o destino final, geralmente
para aplicações de médio-longo prazo (abertura de negócio, compra
de imóvel) em oposição aos objetivos de sustentar ou ajudar parentes
que tendem a caracterizar as remessas dos brasileiros nos Estados
Unidos.
3.6 – QUEM SOU EU? O IMAGINÁRIO E O IDENTITÁRIO DO BURAJIRUJIN
Em seu estudo sobre o fenômeno decasségui, Maria Edileuza
Fontenele Reis inicia o Capítulo III com o subtítulo “Issei, Nissei ...
Não-Ssei”, referindo-se à questão da auto-percepção identitária, ou
étnico-nacionalista, dos nikkei no Brasil e no Japão
101
. O tema tem
chamado a atenção de muitos estudiosos pelos peculiares sentimentos
de displacement
102
que individualmente afloram em conflitos pessoais
de etnia versus nacionalidade dos descendentes de japoneses, estejam
eles no Brasil, onde são estereotipados de “japoneses” ou no Japão,
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
139
onde vivem sob o rótulo de “brasileiros”. Esses estudos tendem a
mostrar que a alongada convivência dos burajirujin no Japão os induz,
subconsciente ou ostensivamente, a reagir às forças contraditórias da
sociedade japonesa para sua sobrevivência emocional. De um lado,
são pressionados a assimilar a cultura e o comportamento nipônicos e,
de outro, sofrem a discriminação ostensiva pela sua condição de
estrangeiros. Tais fatores criam uma renovada percepção de identidade
brasileira, que talvez mereça reconsideração daquela expressão para
“Nissei, Sansei ... Já-Sei”. A fim de tentar decifrar a razão e a possível
conclusão desse jogo identitário – japonês no Brasil e/ou brasileiro no
Japão – convém remontar, de início, à sua origem histórico-cultural.
A formação do Estado brasileiro moderno, se tomada a partir
da instauração da República, fundamentou-se, segundo a pesquisadora
Adriana Capuano de Oliveira
103
, no conceito da nacionalidade criado
a partir do chamado “mito das três raças” que, na concepção posterior
de Gilberto Freyre, corresponderia à harmoniosa miscigenação étnica
do branco europeu, do negro africano e do nativo índio. Não cabe
aqui discussão mais aprofundada sobre o tema, citado apenas para
oferecer uma possível razão para a exclusão de outras etnias da receita
de aceitação ou assimilação no identitário nacionalista do ser
“brasileiro”.
Assim, os imigrantes japoneses que se assentaram no Brasil
nas primeiras décadas do século XX foram, consciente ou
inconscientemente, alijados do amálgama racial do País, sentimento
exacerbado nos anos 1930-40 com a propagada ameaça do “perigo
amarelo” imperialista nipônico. Essa alienação, contudo, não derivou
exclusivamente de uma atitude preconceituosa por parte da majoritária
sociedade brasileira, mas também de um auto-isolamento ou
enclausuramento da própria colônia japonesa. Por alimentarem o sonho
de retorno à pátria, no ainda vivo espírito decasségui, os imigrantes
nipônicos, sobretudo até a época da Segunda Guerra, rejeitavam a
incorporação à sociedade hospedeira, no esforço de preservação da
140
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
sua língua, cultura e tradições. Forjavam-se, assim, as caracterizações
do “japonês” com relação à minoria nikkei e a do gaijin, o estrangeiro,
quanto à maioria brasileira.
A derrocada japonesa na Segunda Guerra distanciou ainda mais
os primeiros imigrantes da acalentada esperança de regresso ao Japão.
O conformismo com a permanência no Brasil encorajou, assim, o
redirecionamento da sua ambição no sentido de ascensão social e
econômica, realizada com o deslocamento em direção aos centros
urbanos. Nem mesmo o sucesso desse movimento, contudo, medido
em termos da significativa inserção dos nikkei nas camadas médias e
altas da sociedade brasileira, contribuiu para desfazer a imagem tipificada
do “japonês”. Ao contrário, levou o “japonês” a ser sinônimo bem
aceito de diligência, perseverança e qualidade, imagem reforçada pelos
rápidos avanços e expansão da economia nipônica a partir dos anos
1970.
Em sua análise da questão identitária dos brasileiros no Japão,
Takeyuki Tsuda classifica a colônia como tendo ascendido de sua
posição inicial de ostracismo ao status de “minoria positiva”, respeitada
e admirada no Brasil. Assim, a determinação de “japonês” foi
progressivamente assimilada sem conotação pejorativa, tanto pelos
próprios descendentes como pelos demais membros da sociedade,
encorajando a preservação da cultura japonesa entre os nikkeis.
Na descrição da influência da globalização sobre o movimento
migratório dos nipo-brasileiros para o Japão, Tsuda relembra que esse
processo assume duas facetas distintas: contígua e a não-contígua
104
.
A primeira refere-se ao deslocamento transfronteiriço físico de bens,
capital e trabalho e a segunda à propagação de informações e imagens
de uma região para outra. No contexto Brasil – Japão , a globalização
não-contígua levou a uma recíproca valorização da imagem seletiva de
um país pelo outro. Os nikkeis, no Brasil, incorporaram os aspectos
positivos transmitidos da vida e cultura dos japoneses, e estes, por sua
vez, revitalizaram seus laços com os nikkeis brasileiros, percebidos
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
141
como tendo superado grandes adversidades e alcançado notável
progresso em função de sua herança nipônica. Foram condicionantes
que, ao lado das forças econômicas da globalização contígua,
encorajaram a ida dos brasileiros ao Japão e, ao mesmo tempo, a pré-
aceitação dos nikkeijin pelos japoneses para suprir as necessidades
de mão-de-obra daquele país, dentro da visão de laços culturais
compartilhados pela consangüinidade Como afirma o antropólogo
Joshua Roth: “If foreign labor was necessary for the Japanese
economy, nikkeijin were perceived to be as less threatening kind
of foreigner, or not to be foreign at all
105
.
Com a chegada dos brasileiros àquele país, contudo, essas
pré-concepções de common belonging foram rapidamente desfeitas.
De um lado, os nikkeijin depararam-se com a realidade de que sua
verdadeira cultura, a brasileira, expressa em termos da língua dominada
(ou do desconhecimento do idioma nipônico), do modo de vestir e do
comportamento social, muito pouco tinha a ver com o Japão com o
qual, no imaginário, se identificavam. Os japoneses, do outro,
rapidamente enxergaram, por trás da semelhança de traços físicos dos
nikkeijin, pessoas pouco capazes de se enquadrarem nos conceitos
de homogeneidade de sua sociedade, seja pela percebida falta de
afinidade sócio-cultural, seja pelo seu status de migrante-operário.
Passaram assim a marginalizar e isolar essa nova comunidade que se
estabelecia em seu meio, tratamento também dispensado a outros
grupos étnicos estabelecidos há mais tempo, notadamente descendentes
de coreanos e chineses.
Em vez de se retraírem e aceitarem sua condição social nessa
“casta” inferior, muitos brasileiros, segundo os dois autores acima,
reavaliaram a sua identidade, por meio da dissociação dos conceitos
de raça e cultura. A difícil passagem de uma “minoria positiva”, como
eram vistos os nikkeis no Brasil, a uma “minoria negativa”, na
percepção japonesa dos burajirujin, conduziu a uma reafirmação de
sua auto-percepção interior, baseada não em etnia ou remotas ligações
142
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
com um imaginário berço comum, mas sim na realidade de sua
nacionalidade, valores e aspirações. O surgimento dessa “contra-
identidade” é, dessa forma, exteriorizada na manifestação ostensiva de
brasilidade e no não-conformismo às regras e costumes que a sociedade
nipônica lhes tenta impingir.
As demonstrações de revalorização identitária ocorrem de várias
formas: no vestuário tipicamente brasileiro, em que predominam os
jeans e as camisetas coloridas, estampadas com cores e símbolos
nacionais; na “descoberta” da cozinha tropical, em que churrasco e a
feijoada passam a figurar regularmente na dieta e na apreciação da
música popular brasileira, do pagode ao samba. Sobre este ponto,
Tsuda tem interessante observação:
Although most Japanese Brazilians never bothered to
participate in samba in Brazil (and a few even scorned it as
a lowly Brazilian activity), they suddenly find themselves
dancing samba in Japan as bona fide “Brazilians” for the
first time in their lives – and actually finding it a lot of fun”
106
.
Tais declarações de brasilidade, e de conformismo com a
condição de burajirujin no Japão, são mais freqüentes e visíveis entre
os primeiros migrantes adultos. Funcionam, também, para antecipar e
evitar críticas de interlocutores japoneses, ao previamente anunciar:
‘sou brasileiro – não espere que eu fale ou me comporte como japonês’.
Para as gerações mais novas, sobretudo as crianças brasileiras nascidas
naquele país, a pressão da sociedade majoritária tende a se impor de
forma mais contundente. Os parâmetros de identificação e associação
desses jovens são, ostensivamente, japoneses, pois têm reduzido apego
ou convivência com o Brasil; falta-lhes o elo comparativo para decidirem
o que são. Principalmente pelo fato de se estarem progressivamente se
inserindo no sistema educacional japonês, onde se acentua o temor
juvenil de rejeição e o peer pressure dos colegas nativos é mais intenso,
tendem, naturalmente, a assumir a identidade da sociedade dominante.
O ENFRENTAMENTO E A SUPERAÇÃO DE OBSTÁCULOS NA SOCIEDADE JAPONESA
143
Cria-se, assim, uma dualidade geracional na comunidade burajirujin:
os pioneiros que chegaram adultos “já-sabem” que são brasileiros,
mas seus filhos, lá nascidos e criados, “só-sabem” ser japoneses.
* * *
Caberia, neste ponto, uma pequena reflexão sobre o destino
dos brasileiros no Japão. Foi visto que as primeiras gerações que lá
chegaram souberam adaptar-se às nem sempre fáceis condições de
emprego, de convívio social, de ligação – material e emocional – com
a pátria, bem como a cuidar da educação dos filhos e administrar seus
objetivos financeiros. Se finalmente se estabelecerão de forma definitiva
naquele país ainda é uma incógnita, mas conservarão, em sua maioria,
os elementos essenciais de sua cidadania brasileira. Tal afirmação já
não é tão evidente para a segunda geração, ainda mais pelo fato de sua
absorção pela sociedade hospedeira não encontrar, na etnia, barreira
semelhante à que seus antepassados enfrentaram no Brasil do século
passado. Assim, competiria ao Estado a adoção de políticas específicas
não apenas para a manutenção de vínculos formais com sua população
expatriada, medidas no provimento de serviços notariais e consulares,
mas também como instrumento de preservação e irradiação da cultura
e sociedade brasileiras. Da mesma maneira como o Japão pôde, quando
precisou, recorrer a seus emigrantes e descendentes, poderá o Brasil
também, no futuro, se ver confrontado com a necessidade de chamar
de volta os seus. Essa hipótese será tão mais facilitada quanto o
empenho empregado agora em conservar sua cidadania, mormente no
caso dos jovens. E a primeira dessas medidas seria a revisão dos
dispositivos constitucionais determinantes da nacionalidade brasileira,
objeto do próximo capítulo.
145
CAPÍTULO 4
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
4.1 – A NACIONALIDADE BRASILEIRA
De acordo com o jurista José Francisco Rezek, a nacionalidade
constitui-se na existência de “um vínculo político entre o Estado soberano
e o indivíduo, que faz deste um membro da comunidade constitutiva da
dimensão pessoal do Estado”
107
. Existem duas formas de se adquirir a
nacionalidade: a primária, ou originária, que vem da nascença e que,
segundo o ordenamento jurídico do país, pode ser derivada de critérios
territoriais (jus solis), sangüíneos (jus sanguinis) ou uma combinação
destes; e a derivada, ou, secundária, de caráter voluntário, após o
nascimento, cujo exemplo mais comum é o da naturalização.
No Brasil, a Constituição Federal de 1998, modificada pela
Emenda Constitucional no. 03 de 7 de junho de 1994, prevê, para a
aquisição na nacionalidade originária, tanto o jus solis, para todos
aqueles nascidos no Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que
estes não estejam a serviço de seu país (Artigo 12, I, a da Constituição),
como o jus sanguinis, para os nascidos no estrangeiro, desde que um
dos pais esteja a serviço do Brasil (Artigo 12, I, b). Existe ainda uma
terceira hipótese, a chamada “nacionalidade originária potestativa”,
aplicável aos nascidos no estrangeiro, de pai ou mãe brasileira, não a
serviço do Brasil, desde que venham a residir no Brasil e optem, a
qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira (Artigo 12, I, c). As duas
primeiras são automáticas e imediatas, dependendo tão somente do
146
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
registro civil para que se adquira a nacionalidade brasileira
108
. A terceira,
no entanto, requer o ato volitivo do interessado perante a Justiça
Federal
109
, para que se adquira a personalidade jurídica de brasileiro
nato e todos os direitos e deveres dela emanados.
No caso da comunidade brasileira no Japão, é de particular
relevância uma análise mais aprofundada sobre a questão da
nacionalidade, sobretudo no que diz respeito à incidência das legislações
– brasileira e japonesa – sobre o destino e cidadania dos milhares de
filhos de brasileiros que lá nasceram a partir de junho de 1994.
De uma perspectiva histórica, as seis Constituições
Republicanas do Brasil trataram da nacionalidade dos filhos de
brasileiros nascidos no exterior de maneira distinta. Na Carta Magna
de 1891, a confirmação da nacionalidade dependia do regresso e
domicílio no País: “Art. 69 - São cidadãos brasileiros: 2º) os filhos de
pai brasileiro e os ilegítimos de mãe brasileira, nascidos em país
estrangeiro, se estabelecerem domicílio na República”.
As Constituições de 1934 e de 1937 repetiram, em essência,
a mesma previsão para a aquisição da condição de brasileiro nato,
com o acréscimo de que o interessado teria de formalmente optar
pela nacionalidade ao atingir a maioridade, tal como rezava o Artigo
106 da Carta de 1934, reiterado, ipsis literis, em 1937, em seu
Artigo 115: “b) os filhos de brasileiro, ou brasileira, nascidos em país
estrangeiro, ... se, ao atingirem a maioridade, optarem pela
nacionalidade brasileira”
110
.
No texto da Carta de 1946, foi formalmente incluída a limitação
temporal para a opção pela nacionalidade: “Art. 129 - II - os filhos de
brasileiro ou brasileira, nascidos no estrangeiro, (...), se vierem residir
no País. Neste caso, atingida a maioridade, deverão, para conservar a
nacionalidade brasileira, optar por ela, dentro em quatro anos.”
A Carta de 1967 ampliou a capacidade de aquisição da
condição de brasileiro nato ao incluir, pela primeira vez, a equivalência
do registro consular no exterior ao do registro civil no País:
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
147
Artigo 140 c) os nascidos no estrangeiro, de pai ou mãe brasileiros,
(...), desde que registrados em repartição brasileira competente
no exterior, ou não registrados, venham a residir no Brasil antes
de atingir a maioridade. Neste caso, alcançada esta, deverão,
dentro de quatro anos, optar pela nacionalidade brasileira.
A necessidade da ação volitiva do interessado, ou nacionalidade
potestativa, ainda com o limite temporal da constituição anterior,
aplicava-se tão somente àqueles que não tivessem o registro notarial
em repartição brasileira competente no estrangeiro.
A inovação da Carta de 1988, que refletia a preocupação do
legislador constituinte com o incipiente porém já expressivo número de
brasileiros que se fixavam de forma definitiva no exterior, eliminou,
apenas para aqueles que não tivessem efetuado o registro consular, a
limitação de quatro anos após a maioridade para a declaração de opção
dos nascidos no exterior, embora tenha mantido a necessidade de
fixação de residência no País até atingir da maioridade. Conservou, no
entanto, a equivalência, ou primazia, do registro consular como condição
suficiente para a aquisição da condição de brasileiro nato:
Artigo 12.I.c - os nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou de
mãe brasileira, desde que sejam registrados em repartição
brasileira competente, ou venham a residir na República
Federativa do Brasil antes da maioridade e, alcançada esta, optem,
em qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira.
Como afirma o jurista Alexandre de Moraes:
o texto original do Artigo 12.I.c, da Constituição Federal previa
a aquisição da nacionalidade originária aos nascidos no
estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que fossem
registrados em repartição brasileira competente … O assento
de nascimento lavrado no exterior por agente consular possuía a
mesma eficácia jurídica daqueles que eram formalizados no Brasil
148
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
por oficiais do registro civil das pessoas naturais, não havendo
necessidade de qualquer opção, nesta hipótese”
111
.
O continuado crescimento da emigração brasileira nos anos
subseqüentes, contudo, e o nascimento de um número cada vez
maior de filhos de nacionais no exterior, levou a uma revisão deste
preceito constitucional, na revisão prevista da Carta Magna, em
1993-1994.
Ao tentar responder à visível constatação da dificuldade que
muitos brasileiros nascidos no exterior poderiam encontrar para retornar
ao País antes de atingirem a maioridade, para assim formalizarem sua
opção pela nacionalidade brasileira, entenderam os legisladores
revisionistas que se fazia necessária uma reformulação do texto então
vigente. No primeiro turno de discussões sobre o assunto, foram
apresentadas cinco propostas de emenda: duas propunham o
restabelecimento do prazo de quatro anos após a maioridade para a
declaração volitiva, uma que dispensava totalmente a declaração,
mesmo para aqueles que não haviam sido registrados no exterior, outra
que eliminava a necessidade de residência no Brasil para a declaração
de opção e uma última, que propunha o critério simples e único de jus
sanguinis, até a terceira geração. Naquela ocasião, foi aprovada,
mediante parecer do Deputado Nelson Jobim, relator da Subcomissão
da Nacionalidade, da Soberania e das Relações Internacionais, a
primeira das alternativas, com a limitação temporal de quatro anos
para a declaração de opção, conservando, porém, o registro consular
como fato gerador da nacionalidade originária. No segundo turno de
deliberações, contudo, a Emenda Aglutinativa no. 1, apresentada pelos
Deputados Maurinho Ferreira Lima e José Maria Emayel e que foi
finalmente aprovada, novamente eliminou a restrição etária (maioridade)
para fixação de residência no Brasil e o prazo de quatro anos, mas
também suprimiu a referência ao registro consular para os nascidos no
exterior . O texto do citado Artigo 12.I.c passou então, conforme a
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
149
Emenda Constitucional de Revisão no. 3 de 7 de junho de 1994 (ECR
03/04), a ter seguinte redação alternativa: “os nascidos no estrangeiro,
de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que venham a residir na
República Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, pela
nacionalidade brasileira.
Como se observa, se o texto da revisão, de fato, concedeu
maior flexibilidade – “a qualquer tempo” – para o nascido de pais
brasileiros no exterior retornar ao País com vistas a confirmar sua
nacionalidade, ao mesmo tempo eliminou, sumariamente, a referência
à fonte primária de aquisição da nacionalidade originária no exterior
consagrada em textos anteriores, do registro de nascimento consular.
As razões para essa eliminação não estão claras; como afirmou em
2006 o Secretário-Executivo do Ministério da Justiça, Luís Paulo
Teles Ferreira Barreto, o ato foi “um equívoco”, pois “com a edição
da Emenda Constitucional de Revisão no. 3, de 1994, estabeleceu-
se uma verdadeira confusão sobre o assunto
112
.
Não só era eliminada a possibilidade de aquisição imediata
da nacionalidade originária para os nascidos no exterior, como
também criava-se a potencial e constrangedora situação de apatridia
para essas crianças nascidas a partir de junho de 1994 de pais
brasileiros no Japão ou qualquer outro país, como Itália, Alemanha
e Suíça, também destino de grande comunidades brasileiras
emigradas e que não adotam o regime de jus solis, assim como o
Japão. Conforme opina o jurista José Afonso da Silva:
a primeira crítica que merece ser comentada concerne ao
uso do termo opção. Haverá opção quando houver
possibilidade de escolha entre a nacionalidade brasileira e
outra qualquer. Ora, isso nem sempre sucede. De fato, pode
ocorrer que o filho de brasileiro tenha nascido em Estado onde
apenas o jus sanguinis é aceito como critério de atribuição
de nacionalidade. Que opção tem ele, então, entre ser
brasileiro e apátrida?”
113
.
150
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Com efeito, pela lei japonesa
114
, só adquire a nacionalidade
nipônica originária filho de pai ou mãe japonesa, ou seja, pelo princípio
do jus sanguinis. Vale notar que essa prerrogativa só foi estendida
aos filhos ou filhas de mãe japonesa a partir de 1984; até então
prevalecia exclusivamente o regime patriarcal de concessão da
cidadania nipônica primária. Assim, uma vez que impera este princípio
nipônico de nacionalidade originária por descendência, ou keito shugi,
as crianças de pais brasileiros lá nascidas a partir da promulgação da
ECR 03/94 encontram-se, a par de toda a discussão sobre sua
nacionalidade, na iminência de verem ameaçada sua permanência no
Japão ao atingirem a maioridade, pois, em teoria, não mais terão
direito ao passaporte nacional e portanto ao documento oficial ao
qual apensar seu indispensável registro de visto de permanência.
Ao ser eliminada, em 1994, a referência constitucional ao
registro consular como alternativa para a aquisição da nacionalidade
originária, criou-se também a ambigüidade sobre de que forma
documental viriam, futuramente, os filhos de brasileiros nascidos no
estrangeiro a dar entrada, perante a Justiça Federal, em seus processos
de confirmação de nacionalidade. Uma pronta solução foi
apresentada, em parecer de 6 de junho 1995, pelo agora Ministro
da Justiça, Nelson Jobim, no qual se reiterava a função notarial do
cônsul brasileiro no exterior para lavrar o nascimento de filhos de
brasileiros: “O comando inserto na alínea c, inciso I, do Artigo 12 da
Constituição, resultado da alteração constitucional, não invalida a
expedição de registro consular aos filhos de brasileiros nascidos no
estrangeiro”
115
. Remetia-se, dessa forma, a norma constitucional à
Lei 6.015, de 31/12/1973, sobre os registros públicos, que continuava
em vigor e que versa, em seus Artigos 32 e 50, respectivamente,
que:
Artigo 32: Os assentos de nascimento, óbito e de casamento de
brasileiros em país estrangeiro serão considerados autênticos,
nos termos da lei do lugar em que forem feitos, legalizadas as
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
151
certidões pelos cônsules ou quando por estes tomados, nos termos
do regulamento consular.
Artigo 50, §5: Aos brasileiros nascidos no estrangeiro se aplicará
o disposto neste artigo, ressalvadas as prescrições legais relativas
aos consulados.
Assim, ficou claramente definido o direito do nascido no
exterior, de pais brasileiros, de obter a nacionalidade brasileira
originária, condicionada, é bem verdade, ao critério de residência
no Brasil e, a qualquer tempo, à opção confirmativa. Ainda segundo
o entendimento do então deputado Nelson Jobim em 1994, a
condição de brasileiro nato seria irrestrita até o interessado atingir
a maioridade e suspensiva a partir de então, até a residência no
País e a declaração de opção perante a Justiça Federal
116
.
Para fins da operacionalização prática destas normas na
rotina consular brasileira, o Manual do Serviço Consular e Jurídico
do Ministério das Relações Exteriores estabelece que
aos filhos de brasileiro(s) nascidos no exterior (...) que
houverem sido registrados em Repartição Consular brasileira,
será expedido, até a maioridade, documento de viagem
brasileiro com a seguinte anotação: O titular deve optar pela
nacionalidade brasileira como condição para conservá-la após
a atingida a maioridade, na forma do artigo 12,I,c da
Constituição Federal
117
.
Atingida a maioridade no exterior, o interessado, na ausência
de passaporte de outra nacionalidade, como é o caso no Japão,
receberá o Passaporte de Estrangeiro, que o habilitará a regressar
ao Brasil e assim cumprir os trâmites legais previstos para a
confirmação de sua nacionalidade. Para todos os efeitos, portanto,
será ele considerado um apátrida, pois não terá qualquer
comprovação de sua nacionalidade.
152
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
A aparente contradição desta situação, ou seja, de uma
legislação pátria que concede a nacionalidade a qualquer indivíduo que
nasça em seu território, mas não a filhos de seus cidadãos que,
circunstancialmente, se encontrem no estrangeiro, não passou
desapercebida nem pelos próprios legisladores nacionais e nem pelos
diretamente interessados, os emigrados brasileiros com filhos nascidos
após a ECR 03/94.
Data de 1996 a primeira proposta de emenda constitucional
(PEC), no. 382/96, apresentada à Câmara dos Deputados pelo deputado
Luís Mainardi. Argumentou o parlamentar que a ECR 03/94 extinguiu
a possibilidade de que o nascimento feito no exterior de um filho de pai
brasileiro ou de mãe, aliado a uma condição formal, ou seja, o respectivo
registro do fato em repartição competente, fosse suficiente ao
reconhecimento da nacionalidade brasileira”
118
. Sua alternativa previa o
retorno do texto original da proposta aprovada em primeiro turno em
1994, em que se concedia a nacionalidade originária por meio do registro
consular, e, na ausência deste, a reimposição da necessidade de retorno
ao Brasil até a maioridade, com o prazo de quatro anos para a declaração
de opção “como forma de evitar a situação da atribuição de nacionalidade
sob condição suspensiva.... ad eternum
119
.
Posteriormente, em março de 1999, o deputado Jacques
Wagner apresentou nova proposta de emenda constitucional sobre o
Artigo 12 I c (PEC no. 13/99), pela qual a nacionalidade originária, ao
nascidos no exterior de pelo menos um dos pais brasileiro, seria
concedida mediante o registro consular ou, na falta deste, residência, a
qualquer tempo, no território brasileiro. Entendeu o deputado que: “a
fixação da residência no País é, segundo a nossa tradição constitucional,
justamente o fato gerador da nacionalidade brasileira e, portanto,
deveria ser condição única e suficiente para a obtenção da
nacionalidade”, pois, argumentou, “o término da exigência da opção
eliminaria o que, na imensa maioria das vezes, é uma mera formalidade
burocrática
120
.
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
153
Paralelamente, no mesmo mês de março de 1999, por iniciativa
do Senador Lúcio Alcântara, foi apresentada no Senado Federal mais
uma proposta de emenda constitucional, a de número 24/99, que como
as demais apresentadas anteriormente, reintegrava ao texto da Carta
Magna a condição de registro consular como requisito mínimo e
suficiente para a aquisição da nacionalidade brasileira. Ao contrário da
proposta do deputado Jacques Wagner, no entanto, não estabelecia o
prazo de quatro anos para a declaração de opção e a alínea “c” do
Artigo 12 I da Carta passaria a vigorar com a seguinte redação: “os
nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou mãe brasileira, desde que
sejam registrados em repartição brasileira competente, ou que venham
a residir na República Federativa do Brasil, e optem, a qualquer tempo,
depois de atingida a maioridade, pela nacionalidade brasileira”
121
.
A proposta, tendo recebido o parecer favorável da Comissão
de Constituição, Justiça e Cidadania daquela Casa, foi aprovada em
junho de 2000, por 52 dos 54 senadores presentes no segundo turno
de votação, e encaminhada à Câmara dos Deputados em 4 de agosto,
sob o número 272/2000.
Na Câmara dos Deputados, a PEC 272/2000, à qual foram
apensadas as propostas anteriores (382/96 e 13/99), foi rapidamente
aprovada por sua Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, com
base no parecer favorável do relator deputado Bispo Rodrigues, de
25/09/2001 e enviada à Mesa Diretora da Casa. Nos termos do seu
regimento interno, artigo 202, parágrafo 2, contudo, fez-se necessária
a apreciação da matéria por Comissão Especial, tendo em vista tratar-
se de emenda à Constituição. Passaram-se, no entanto, mais de três
anos entre a aprovação da proposta em 2001 e a criação desta, em
junho de 2004. Explica-se essa demora, talvez, pela prioridade
conferida por um Congresso em ano eleitoral (2003) ao exame de
outras matérias com repercussão mais direta na vida interna do país e,
ao mesmo tempo, pela natural redução de atividade legislativa em época
imediatamente anterior ao pleito. De qualquer forma, apesar de criada
154
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
a referida comissão na nova legislatura de 2004, até a redação do
presente trabalho ainda não haviam sido indicados os parlamentares
que a comporiam, conforme estipulado em regulamento. Tal morosidade
incitou, inclusive, requerimento da deputada Telma de Souza, datado
de 2 de agosto de 2006, reclamando sua pronta instalação
122
.
Se, como visto acima, a questão da nacionalidade dos
brasileiros nascidos no exterior após a Emenda 03/94 vem merecendo
a atenção do legislador nacional, embora não com a celeridade que a
importância do assunto demanda para o destino de dezenas de milhares
de jovens – por enquanto apenas potencialmente brasileiros –, os pais
destes também se-vêm mobilizando no sentido de chamar a atenção
das autoridades nacionais para a urgência de uma nova regulamentação
constitucional sobre a matéria.
Começam a surgir, entre as organizações de brasileiros
radicados no exterior, diversos movimentos com o intuito de pressionar
o Congresso Nacional a aprovar a proposta de Emenda Constitucional
272/2000. Entre estas, chama atenção o “Brasileirinhos Apátridas”,
criado na Suíça em 2006 pelo jornalista Rui Martins. Em seu sítio
eletrônico, www.brasileirinhosapatridas.org, expõe, de forma crítica
e contundente, matérias, concretas e opinativas, sobre a iminência da
perda da nacionalidade provisória dos nascidos depois de 1994. O
grupo dispõe de correspondentes na Austrália, EUA, Israel, Japão,
França e Suíça e vem promovendo intensa campanha para a
conscientização, junto à opinião pública e a autoridades nacionais, da
necessidade de uma pronta aprovação da PEC 272/2000. Outros sítios
na Internet, como www.brasileirinhosnoexterior.blogspot.com, de
Marco Antônio Miranda, ou www.bonrruquer.ch/ale/2006/03/
aptridas.html, de Ale Bonrruquer, ambos baseados na Suíça, também
se reportam ao tema. O primeiro, por exemplo, oferece modelos de
cartas e e-mails que os interessados poderão utilizar para encaminhar
mensagens a parlamentares, a órgãos do executivo e até mesmo aos
candidatos à Presidência da República, com o mesmo propósito de
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
155
acelerar a tramitação legislativa do referido projeto. No segundo, são
postados comentários de internautas sobre a questão, entre os quais o
autor selecionou dois, transcritos a seguir, que denotam o sentimento
de perplexidade e mesmo de inconformidade com a atual legislação:
esse artigo tá criando muita polêmica...mas eu me
pergunto...ninguém sabia disso antes?! a lei é de 94...pq agora
depois de quase 15 anos é que tá todo mundo se revoltando?!
Bom, mas tb acho a lei sem pé nem cabeça. Como eles podem
dizer que uma criança nascida de 2 brasileiros, não é brasileira?!?!
isso acontece mesmo se registrando a criança na embaixada?!
Eu gosto de ser brasileira, eu quero ser brasileira, eu me sinto
segura porque lá é minha casa e eu sempre posso voltar pra lá a qualquer
tempo. Eu me sentiria profundamente ameaçada e sem raízes sem minha
“pertência” a esse país.”
Entre os legisladores, há também sensibilidade para o assunto,
como denota o discurso da deputada Maninha, proferido na Comissão
de Relações Exteriores e Defesa Nacional em 29 de junho de 2006:
Outro assunto que gostaria de registrar também, senhor
presidente, é que entrei com requerimento de audiência pública
na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional para
que ela debata a questão dos brasileirinhos apátridas, e para que
a Comissão Especial criada para dar parecer à Proposta de
Emenda Constitucional sobre o assunto volte a se reunir. Esta é
uma maneira a ampliar o debate sobre a difícil situação em que
muitos pais e mães se encontram para registrar os filhos nascidos
em outros países
123
.
Especificamente no Japão, a questão da nacionalidade vem
sendo crescentemente noticiada pela mídia brasileira. O jornal
International Press, em sua edição de 16 de julho de 2006, traz a
156
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
matéria “Sem pátria e sem informação”
124
, de Flávio Nishimoria e Karina
Almeida, que relata, sucintamente, as dúvidas com que se deparam as
famílias brasileiras lá residentes: para que serve o Registro de Nascimento
feito no Consulado-Geral do Brasil no Japão? Eu registrei meus filhos e
eles têm passaporte. Essa não seria uma prova que eles são brasileiros?
Então, por que isso só aparece agora? Por que os consulados nunca nos
informaram?”, conforme o desabafo da mãe de três filhos Noriko Kutoba,
moradora de Minokamo, Gifu, há dezesseis anos. Na mesma linha,
reportagem de Antônio Carlos Bordin, da revista brasileira Total, de
julho de 2006, registrou a indignação de membros da comunidade
brasileira com a situação, como Cesar Ajiki, da província de Mie: “é
estranho o Brasil dar nacionalidade aos estrangeiros que nascem lá e
exigir que os nossos filhos residam no país para serem brasileiros”, ou de
Priscila Honda, de Maebashi: “achei um absurdo os órgãos do governo
não nos avisarem disso quando registramos nossos filhos”
125
.
Não só para os filhos de pais brasileiros no Japão, mas para
todos os que se encontram na mesma situação no seio das comunidades
emigradas em outros países, faz-se imperativo um tratamento urgente
da questão de nacionalidade. Estima-se que o número de crianças
nascidas depois de junho de 1994 pode chegar a 300.000 até 2012,
quando começarão a não mais ter direito à renovação de passaporte
brasileiro os que atingirem a maioridade. O movimento em favor da
aprovação da Proposta de Emenda Constitucional 272A-2000 deverá,
até lá, ganhar ímpeto, seja pela mobilização interna do Congresso,
seja pela pressão política que certamente será exercida pelas
comunidades expatriadas e a opinião pública.
* * *
O movimento transnacional de um grande contingente
populacional, além dos naturais desafios que a comunidade emigrada
enfrenta na adaptação ao emprego, na assimilação de hábitos, costumes
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
157
e língua e até mesmo na dieta e hábitos alimentares do país de destino,
leva também consigo questões relacionadas ao enfrentamento de leis,
normas e regulamentos de relacionamento social e civil muitas vezes
estranhos e conflitantes com os do país de origem.
Foi visto acima como a atual distinção de preceitos jurídicos
relacionados à atribuição de nacionalidade originária no Brasil e no
Japão poderá, na ausência de futuros dispositivos legais que as
modifiquem, formar toda uma geração de apátridas, de ascendência
brasileira, nascidos naquele arquipélago.
Em seguida, serão analisados dois outros aspectos da aplicação
do direito civil que diretamente afetam o cotidiano familiar da
comunidade brasileira no Japão: o casamento e o divórcio. Não se
trata aqui de aprofundar uma discussão sobre o direito de família
comparativo nos dois países, mas sim de tentar verificar, à luz das
respectivas normas civis nos dois países, se os membros da comunidade
brasileira no Japão se deparam com empecilhos para ver juridicamente
formalizada sua vontade de constituir ou desfazer-se de uma relação
matrimonial.
4.2 – O CASAMENTO NO JAPÃO
O Brasil e o Japão apresentam índices similares e decrescentes
de casamentos legais. De acordo com dados do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística, IBGE, e do Bureau Estatístico do Ministério
de Assuntos Internos e Comunicações do Japão, as taxas de
nupcialidade
126
foram, respectivamente, de 5,9% (2003) e 5,7%
(2004), em comparação às cifras de 7,2% e 6,4% registradas em ambos
os países em 1993
127
. Embora as duas sociedades demonstrem
comportamento similar ao de muitos países ocidentais e industrializados,
na direção de uma gradual diminuição do número relativo de casamentos
formais, a queda maior do índice brasileiro pode, em parte, ser explicada
pela proteção jurídica que é dada às uniões estáveis, cujos direitos, em
158
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
termos de alimentos e sucessão, se equiparam aos dos casamentos
legais
128
. No Japão, ao contrário, não há dispositivo legal semelhante
para uniões familiares não legalizadas. A ausência dessa proteção legal
reflete, em grande parte, a própria estrutura sócio-familiar nipônica,
onde, além de outros fatores culturais, os conceitos de lealdade e
compromisso formal, seja à empresa ou à família tradicional, ainda
estão firmemente arraigados e tendem a desencorajar a co-habitação
informal.
Se a cerimônia do casamento no Japão apresenta, de acordo
com a tradição budista, rituais e cerimonial extremamente ricos e
elaborados, talvez até mais do que nas sociedades ocidentais-cristãs,
administrativamente sua formalização legal é extremamente simplificada.
Nos termos do Código Civil japonês (Minpou)
129
, por exemplo, as
normas relativas ao matrimônio estão previstas em 31 artigos (Artigos
731 a 762); o Código Civil brasileiro
130
, por sua vez, as enumera em
59 artigos (Artigos 1511 a 1570).
O assentamento civil do casamento no Japão é feito no koseki,
ou Registro Familiar. Este documento, emitido pelas prefeituras
regionais, incorpora todos os registros civis pertinentes ao cidadão:
nascimento, casamento, adoção, divórcio e óbito. É lavrado a partir
do casamento; os solteiros e solteiras permanecerão, até então, no
koseki de seus pais. Os brasileiros e demais estrangeiros residentes no
Japão, no entanto, embora tenham de se registrar nas respectivas
prefeituras de sua moradia, não figuram em koseki, a não ser que se
casem com nacional japonês ou japonesa.
Para formalizarem o casamento, portanto, bastará aos
interessados estrangeiros apresentar na prefeitura local o Requerimento
para Registro de Casamento, kon-in todokesho, assinado também
por duas testemunhas, os respectivos registros de estrangeiro,
gaikokujin toroku shomeisho (equivalente à carteira de Registro
Nacional de Estrangeiro – RNE brasileira), passaporte e o chamado
“Atestado de Aptidão para Matrimônio”, dokushin shomeisho, ou
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
159
atestado de solteiro. Alguns países, por meio de suas representações
diplomáticas, emitem este tipo de declaração notarizada, mas, no caso
das missões brasileiras, diante da impossibilidade de se confirmar, no
exterior, o estado civil de seus nacionais, a emissão deste comprovante
limita-se ao reconhecimento de firma em declaração de duas
testemunhas que atestam desconhecer impedimento para o casamento,
a qual deverá ser traduzida para o japonês. Adicionalmente, as
prefeituras no Japão exigem a apresentação de segunda via da certidão
de nascimento, com menos de seis meses de emissão, ou, no caso em
que um ou ambos os noivos sejam divorciados, a certidão de casamento
brasileira, que deverá conter, nos termos da Lei 6.015/73, Capítulo
XII, a averbação de divórcio anterior, desimpedindo-o(s) para novo
matrimônio.
Reunida e aceita pela prefeitura esta documentação, o registro
de casamento é feito rapidamente na própria prefeitura, podendo o
respectivo certificado ser emitido no mesmo dia. Não há, como na
legislação brasileira, necessidade de prazos, proclamas ou agendamento
do ato
131
, pois, o casamento celebrado no Japão é uma tão somente
uma notificação (todoke, em japonês) das partes interessadas à
autoridade governamental, não uma solicitação, ou pedido de
autorização judicial para contrair matrimônio perante um representante
do poder judiciário, conforme estipulado no direito brasileiro.
De posse da certidão japonesa, o casal ou cidadã(o)
brasileira(o) necessita simplesmente de registrá-la no Consulado-Geral,
de acordo com as normas previstas
132
e, para que tenha validade no
Brasil, transcrevê-la no 1º. Ofício de Notas de seu domicílio.
Embora a legislação brasileira preveja a possibilidade da
celebração de matrimônios no exterior entre brasileiros, segundo os
procedimentos previstos no Código Civil, são raríssimos os casos no
Japão de casamentos assim realizados, nas repartições consulares. Com
efeito, nos registros dos Consulados-Gerais em Tóquio e Nagóia, há,
desde suas respectivas criações em 1995, apenas 5 assentamentos de
160
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
casamentos celebrados. A opção pelo regime japonês de casamento
pode ser encontrada não apenas na agilidade de seus procedimentos,
mas também na sua natureza prática, visto que os demais registros
necessários dos interessados na prefeitura serão automaticamente
atualizados, dispensando-se a necessidade de futura tradução e
notarização de documentos brasileiros, para que o casamento assim
realizado tenha validade no Japão.
No que diz respeito ao número de casamentos de brasileiros
realizados de acordo com a lei japonesa e registrados nas repartições
consulares, o quadro a seguir mostra sua evolução desde 2000:
Tabela 25 – Casamentos de Brasileiros transcritos nas Repartições
Consulares no Japão 2000-2005
* até 31 de julho de 2006
Fonte: Arquivos dos Consulados-Gerais em Nagóia e Tóquio.
De acordo com as estatísticas acima, e com base nos dados
oficiais do Governo japonês referentes à população estrangeira
residente no Japão
133
, foi possível determinar, também, a taxa de
nupcialidade da comunidade brasileira lá residente. Essa taxa é apenas
estimativa, baseada em dados disponíveis, pois, como se verá abaixo,
há um percentual não desprezível de brasileiros que não registram o
casamento nas repartições consulares. Desde 2000, o percentual da
população adulta brasileira (maiores de 14 anos) tem-se mantido
estável, na faixa de 85% do total, o que nos permite chegar aos
seguintes índices:
2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006* Total
Nagóia 803 808 527 679 678 1.052 732 5.279
Tóquio 538 570 381 421 454 525 290 3.179
Total 1.341 1.378 908 1.100 1.132 1.577 1.022 8.458
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
161
Tabela 26 – Estimativa de Taxa de Nupcialidade da
Comunidade Brasileira no Japão
Fonte: Arquivos dos Consulados-Gerais em Nagóia e Tóquio.
A queda nos percentuais relativos ao período de 2002 a 2004
pode, em parte, ser explicada pela instrução oficial dada aos
Consulados-Gerais no sentido de que não mais emitissem atestado ou
certificado de estado civil
134
. Esses certificados vinham até então sendo
emitidos mediante a apresentação de segunda via da certidão de
nascimento dos interessados, com validade de menos de seis meses, o
que, no entanto, não eliminava a possibilidade de falsificação de
registros no Brasil (como foi, aliás, o episódio que suscitou a referida
instrução).
Uma outra – e reveladora – característica detectada no
levantamento realizado sobre o casamento dos brasileiros no Japão
foi a nacionalidade do cônjuge. Sobre este ponto, Maria Edileuza
Fontenele Reis apontou que, em 1996 e 1997, de acordo com os
registros consulares da época, era reduzido o número de matrimônios
registrados de brasileiros com japoneses, menos de 5% do total
135
.
Com base em dados mais recentes, no entanto, este perfil mudou
sensivelmente. Em 2004, dos 454 casamentos registrados em Tóquio,
293 (65%) foram entre brasileiros, 104 (23%) de brasileiro(a) com
cidadã(o) japonês(a) e 57(12%) com terceiras nacionalidades. Em
2005, os percentuais, para um total de 525 registros, foram de,
respectivamente, 48% (250 casamentos entre brasileiros), 28% (145
com japonês) e 24% (30 com terceiras nacionalidades). Em 2006, a
mesma tendência manteve-se: de 290 registros do Consulado-Geral
em Tóquio (até 15 de agosto), 149 (51%) referiam-se a casamentos
2000 2001 2002 2003 2004 2005
6,2% 6,1% 3,9% 4,7% 4,7% 6,1%
Taxa de
Nupcialidade
162
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
entre brasileiros, 73 (25%) com japonês(a) e 68 (24%) com terceiras
nacionalidades.
Além da progressiva equalização do diferencial entre o número
de homens e de mulheres brasileiras que se vem verificando no Japão,
bem como da constatação de uma participação de crianças brasileiras
(0-14 anos) condizente com a média japonesa, (15% e 14,6% da
população total, respectivamente), o comportamento da população
brasileira em termos de casamento, com elevado número de mixed
marriages com japoneses ou terceiras nacionalidades aponta, também,
para uma tendência cada vez mais evidente de seu enraizamento no
Japão.
4.3 – O DIVÓRCIO NO JAPÃO
O processo de casamento de brasileiros no Japão é ato
administrativo de simples execução, que consiste tão somente na
notificação das partes à prefeitura de domicílio, a partir da qual é extraído
o respectivo registro legal. Para que o matrimônio tenha validade no
Brasil, basta a lavratura do registro consular correspondente e posterior
transcrição do mesmo em Ofício de Notas brasileiro. Para a dissolução
da união conjugal formal, no entanto, os procedimentos a serem
seguidos pelas partes, sobretudo em se tratando de dois nacionais
brasileiros, não encontram caminho tão direto e ágil.
Não é o objetivo da presente seção, contudo, abordar as causas
do divórcio, seja no Japão, seja entre os brasileiros que lá residem,
mas sim delinear os aspectos normativos que regem este direito. As
transformações sociais e econômicas das sociedades modernas, em
que pesam também fatores culturais e religiosos têm, sem dúvida,
contribuído para um incremento constante das taxas de divórcio. A
maior igualdade, participação e independência financeira da mulher no
mercado de trabalho, a diminuição das taxas de fecundidade e a
redefinição de costumes e valores na direção de um sentimento mais
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
163
acentuado de individualismo e de menor rejeição social do divórcio,
podem ser apontados como causas que têm levado ao aumento dessas
taxas.
No Japão, a taxa de divórcio, calculada a partir dos mesmos
parâmetros que a taxa de nupcialidade, foi de 2,15 em 2004, em
comparação com 2,1 em 2000, 1,6 em 1995 e 1,28 em 1990.
Curiosamente, durante a Era Meiji, no final do século XIX os mesmos
índices eram significativamente mais altos (3,38 em 1883) e só
chegaram a patamares inferiores (1,5 ou menos) a partir do Século
XX
136
. No caso do Brasil, nota-se a mesma tendência de aumento das
taxas de dissolução matrimonial: em 1994, foram registrados 94.818
divórcios e 84.805 separações judiciais e em 2004, os valores haviam
subido para 130.527 e 93.525, respectivamente
137
, o que
corresponderia a taxas de 1,7 e 1,8 nos dois anos sob exame. Ou
seja, atualmente em média um em cada 2,66 casamentos no Japão e
um em cada 3,27 no Brasil é dissolvido, índices, contudo, bastante
inferiores aos dos Estados Unidos (1 em cada 2)
138
.
Além de todos os fatores acima mencionados, outra razão que
pode determinar a maior incidência de divórcio no Japão,
comparativamente ao Brasil, são as normas que o regem. Para a
confirmação do divórcio, basta, a exemplo do casamento, a simples
notificação por escrito das partes à prefeitura de domicílio
139
, chamado
“divórcio por mútuo consentimento” (kyôgi rikon). Salvo a questão
da guarda de filhos, nenhuma outra condição material do divórcio
(divisão de bens, indenizações ou pensões) é comunicada, presumindo-
se que as partes tenham chegado a um entendimento a respeito. Tão
informal é este procedimento que pode até mesmo ser enviado pelo
correio.
A segunda instância a que podem recorrer as partes, na ausência
de um acordo consensual, é a chamada Corte de Família, instância
judicial que, como descreve a jurista Áurea Cristine Tanaka em seu
aprofundado estudo sobre o divórcio de brasileiros no Japão,
164
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
“caracteriza-se por ser uma instância intermediária, a meio caminho da
autonomia das partes para resolverem seus conflitos por si mesmas e
da decisão judicial propriamente dita. Seu escopo primordial é
privilegiar a composição de litígios familiares”
140
. O encaminhamento
do processo de separação a essa corte dá-se geralmente em função
da falta de acordo no que tange à divisão de bens ou à indenização
pleiteada por uma das partes. A Corte de Família é presidida por um
juiz e dois conciliadores leigos, geralmente funcionários públicos e juízes,
promotores ou advogados aposentados. Estes tentarão, em audiências
com o casal e individualmente, por meio do processo conciliatório
denominado chôtei, fazer com que ambas as partes cheguem a um
acordo consensual. Caso haja confirmação da disposição para se
separar, mas não quanto a eventuais partilhas ou guarda de filhos, o
juiz “pode conceder o divórcio e, após consulta à comissão de
conciliação, pode tomar uma decisão sobre as questões
controvertidas”
141
, decisão essa a que se dá o nome de shinpan.
Caso, finalmente, as partes em litígio não tenham concordado
nem com o divórcio consensual, nem com a decisão proferida pela
Corte de Família, poderão, individual ou conjuntamente, submeter o
caso à Corte Distrital. Esta seria, na verdade, a única instância judiciária,
para casos de divórcio, pautada por critérios bem definidos e previstos
no código civil japonês: infidelidade, abandono, ausência do cônjuge
por mais de três anos, doença mental irrecuperável e causa grave que
torne a continuidade do casamento impossível
142
. Os fatos e provas
apresentados, no entanto, são submetidos a uma avaliação subjetiva
do juiz, que poderá ou não conceder o divórcio judicial, denominado
hanketsu.
A tradição conciliatória japonesa, em que as relações
interpessoais, em qualquer nível, são regidas por um sentimento maior
de preservação da harmonia social e por uma relutância em tornar
públicas desavenças ou conflitos, leva, naturalmente, a uma enorme
preponderância de divórcios consensuais com, no máximo, alguns
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
165
poucos casos levados à Corte de Família. Antes da criação desta Corte
em 1947, 99% dos divórcios no Japão eram por mútuo consentimento.
Mesmo após a adoção desta instância intermediária, os números hoje
revelam que, desde 1990, cerca de 90% dos divórcios são consensuais,
com apenas 1% sendo decidido pelas Cortes Distritais
143
.
Como agirão, diante do ordenamento do direito de família
japonês, os brasileiros residentes naquele país, que desejem impetrar
ações de divórcio? Se, para efeito demonstrativo, forem tomadas as
estatísticas relativas a casamento e divórcio acima apuradas, pode-se
inferir (utilizando uma média das taxas japonesa e brasileira) que cerca
de um em cada três matrimônios formais será desfeito. Ou seja, pela
média de casamentos registrados nos Consulados-Gerais, haverá uma
probabilidade de cerca de 400 processos de divórcio por ano.
No caso de casamentos celebrados no Brasil, entre brasileiros
residentes no Japão, a única alternativa é a instauração de processo judicial
no País, nos termos previstos na Constituição Federal e no Código Civil.
Em razão do custo e da demora do processo, além, evidentemente, da
distância, a maioria dos brasileiros que trabalham no Japão não tem
alternativa senão a contratação de advogado, por meio de procuração,
para que seja efetivado o processo nos tribunais nacionais.
A necessidade de realizar processo judicial no Brasil, no entanto,
não se restringe aos brasileiros aqui casados. De acordo com o
ordenamento jurídico japonês, mais especificamente o Horei
144
, as regras
para a aplicação do direito de família envolvendo estrangeiros serão:
a) Article 14 Marriage: where the national law of the spouses
is the same, the effects of the marriage shall be governed by
that national law. Where that is not the case but where the
law of the spouses’ place of habitual residence is the same,
that law shall govern;
b) Article 16 Divorce: Article 14 shall apply with necessary
modifications to divorce. However, divorce shall be governed
166
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
by Japanese law where one of the spouses is a Japanese
national with habitual residence in Japan.
À primeira vista, portanto, seria possível a realização de divórcio
entre estrangeiros pelas normas japonesas. De acordo com a prática
observada, no entanto, enquanto o casamento realizado no Japão, entre
brasileiros, estaria facultado pela segunda frase do Artigo 14 do Horei,
ou seja, o “domicílio habitual”, nos casos de divórcio predomina a
interpretação primeira de aplicabilidade da lei do país de origem das
partes interessadas.
Há outros aspectos de ordem prática que conduzem os brasileiros
residentes no Japão à opção pelo divórcio no Brasil. No caso de divórcio
consensual, ou administrativo, kyôgi, realizado por notificação nas
prefeituras, é necessário que as partes estejam inscritas no registro familiar,
ou koseki. Como foi visto anteriormente, esta possibilidade de registro
não é aberta aos estrangeiros no Japão. Assim, os brasileiros casados
no Japão que queiram, efetivamente, desfazer o matrimônio contraído
naquele país, terão de apelar à segunda instância, a Corte de Família, ou
mesmo aos tribunais distritais. As dificuldades de comunicação e
compreensão do idioma japonês por parte da grande maioria dos
brasileiros no Japão seriam elementos fortemente dissuasivos a este
recurso, além dos custos envolvidos, seja em termos de contratação de
assessoria jurídica local, seja em termos de remuneração salarial perdida
pela necessidade de comparecimento aos tribunais.
Por todas estas razões, o que se observa é o recurso à
contratação de advogado no Brasil, por meio de procuração pública,
para que seja instaurado processo de separação judicial ou divórcio.
Para tanto, é necessário que tenham antes lavrado no Consulado o
respectivo registro de casamento realizado no Japão e transcrito este
documento no 1º. Ofício de Notas em seu domicílio no Brasil
145
.
Segundo levantamento realizado no Consulado-Geral em
Tóquio, em 2004 e 2005, foram lavradas 473 procurações públicas
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
167
com o objetivo específico de instauração de processos de separação
judicial e divórcio no Brasil. Se cotejarmos esta média (237 por ano,
aproximadamente) com a de casamentos registrados naquela repartição
consular nos mesmos períodos (489), teremos uma taxa média de
divórcio relativamente alta (um em cada 2,1 casamentos será desfeito).
É preciso lembrar, no entanto, que as procurações lavradas para este
fim específico também incluem aquelas para a realização de processos
judiciais de brasileiros que já chegaram ao Japão casados, o que tende
a distorcer esta interpretação simples de dados estatísticos.
Como foi visto acima, vem crescendo o número de brasileiros
que se casam com cidadãos japoneses (cerca de 25% do total dos
casamentos registrados nos dois Consulados-Gerais). É provável,
portanto, que também deva aumentar, no futuro, o número de divórcios
envolvendo brasileiros realizados pela lei japonesa, conforme o disposto
no Artigo 16 do Horei. Uma vez que estes estrangeiros podem figurar
no respectivo kosegi de seu cônjuge, eles ou elas também poderão, se
assim desejarem, divorciar-se pela via administrativa, o kyôgi rikon.
Se este casamento entre um nacional japonês e uma nacional brasileira,
por exemplo, tiver sido registrado no Consulado e transcrito no Brasil,
poderá o divórcio assim consensual e administrativo japonês ser
homologado no País?
Áurea Tanaka, em sua análise desta questão, recorda que “para
que a sentença [proferida em território estrangeiro] produza efeitos em
outro país, talvez haja necessidade de algum procedimento de revisão
... tornando-a apta a produzi-los”
146
. No Brasil, a sentença estrangeira
só terá validade se homologada pelo Superior Tribunal de Justiça
(competência que, até 2002, era do Supremo Tribunal Federal). Para
que o processo de homologação seja examinado, precisa ele obedecer
a um elenco de requisitos, entre os quais “haver sido proferida por juiz
competente”; “terem sido as partes citadas” e “ter passado em julgado
e estar revestida [a sentença estrangeira] das formalidades necessárias
à execução no lugar em que foi proferida”
147
. Ora, o divórcio consensual
168
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
japonês, a rigor, não obedeceria a nenhum desses critérios, pois não
há envolvimento do poder judiciário, as partes não são citadas e nem é
proferida sentença. Na interpretação de pedidos de homologação desse
tipo, porém, entendeu à época o Supremo Tribunal Federal que
poderiam sim ser homologados, conforme a jurisprudência do Ministro
Moreira Alves, de 1975: “É homologável, no Brasil, divórcio por mútuo
consentimento que, segundo o sistema jurídico japonês, se registra
perante a autoridade administrativa, independentemente de decisão
judicial”
148
.
Com efeito, uma análise das recentes Decisões Monocráticas
Certificadas do Superior Tribunal de Justiça
149
revela tratamento
expedito dos pedidos de homologação de divórcios registrados no
Japão envolvendo cidadãos brasileiros. No período compreendido entre
março de 2005 e agosto de 2006, por exemplo, o STJ homologou
vinte e oito divórcios realizados no Japão, alguns em menos de um ano
da efetivação da decisão naquele país. Entre estes processos, dezoito
requeriam a homologação de divórcio consensual ou administrativo,
seis emanaram de Cortes de Família japonesas e quatro de Cortes
Distritais. Tal definição da origem do processo no Japão, na falta de
uma verificação de toda a documentação, pode não ser absolutamente
precisa, pois as instâncias citadas nas decisões dos Ministros do STJ
variam, talvez de acordo com a tradução para o português da
documentação apresentada. Há referências, por exemplo, a “vara cível”,
“juizado de direito da seção cível”, “tribunal de família”, “juízo da vara
de ......”, “vara de família”, “foro familiar”. Da mesma forma, quando o
divórcio é administrativo, a autoridade japonesa, nas decisões da justiça
brasileira, é referida como “prefeitura”, “o prefeito de....” “administração
regional”, e “autoridade administrativa”. De qualquer forma, estes dados
demonstram que, nos divórcios realizados no Japão em que pelo menos
uma das partes é brasileira, há uma maior incidência de recursos às
instâncias judiciais nipônicas (64% administrativos, 22% na Corte de
Família e 14% nas cortes distritais, contra as médias japonesas de
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
169
90%, 9% e 1%, respectivamente, conforme visto acima). Tal
comportamento pode ser indicativo da necessidade de determinação
de pensão alimentícia, geralmente para a ex-esposa, comum nas
separações judiciais brasileiras, mas não previstas no divórcio
administrativo japonês ou mesmo de um papel mais assertivo e igualitário
que caracterizaria a mulher brasileira em processos de separação,
comparativamente à japonesa, tradicionalmente mais submissa e menos
contestadora.
Pelo exposto, portanto, vê-se que na aplicação do direito de
família – casamento e divórcio – não há obstáculos sérios para os
brasileiros residentes no Japão.
4.4 – A CRIMINALIDADE NA COMUNIDADE BRASILEIRA
Em agosto de 2003, realizou-se em São Paulo, sob patrocínio
do CIATE, o Seminário de Capacitação Humana para Decasséguis,
ocasião em que foram debatidos, por especialistas brasileiros e
japoneses, diversas facetas da vida da comunidade burajirujin no
Japão. Na ocasião, Hirofumi Ohkuna, cônsul encarregado da segurança
e vigilância do Consulado-Geral do Japão em São Paulo e ex-
funcionário da polícia da Província de Aichi, proferiu palestra intitulada
“Sobre a Criminalidade de Brasileiros no Japão.” Afirmou o cônsul:
“no Japão, constata-se que a cada ano tem aumentado a criminalidade
…. O aumento da criminalidade praticada por estrangeiros está sendo
considerado como a principal causa para o agravamento da situação”
150
.
Ao referir-se às estatísticas de crimes envolvendo brasileiros, agregou
que estes nacionais “ocupam um desonroso segundo lugar, depois dos
chineses, com 5.272 casos [em 2002]”. Na sua percepção, continuou,
“a polícia japonesa deduz que uma das causas para o cometimento de
crimes atrozes [referia-se a assaltos] de forma tão natural decorre de o
fato de o infrator ter sido criado convivendo com as péssimas condições
de segurança pública no Brasil, sua terra natal”
151
.
170
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
De fato, na mídia e entre a opinião pública japonesas, a
criminalidade praticada por estrangeiros tende a ser apontada como um
dos principais fatores responsáveis pelo visível aumento dos índices de
crimes e delitos registrados naquele país nos últimos anos. De acordo
com estatísticas da Agência Nacional de Polícia, em 1996 houve denúncia
de 1.812.119 casos criminais à polícia, que resultaram em 735.881
detenções. Em 2005, o número de casos reportados chegou a 2.269.293
(um aumento de 25% em dez anos), que, curiosamente, levou a um
número inferior de detenções, 649.503. Na perspectiva da comunidade
estrangeira residente no Japão, dados da Agência Nacional de Polícia
indicaram 40.615 casos de crimes ou ofensas envolvendo estrangeiros
em 2003, um aumento de 16,9% em relação ao ano anterior. Do total
desses casos, houve 20.007 detenções, mas apenas 8.725 enquadradas
sob o Código Penal Japonês (das 11.282 remanescentes, as ofensas
que não envolvem dano, trauma ou perda material ou humana, 9.211
foram por violação da Lei de Imigração). Se há evidência de aumento
da participação de estrangeiros em atividades criminais, isso também é
decorrente, obviamente, do crescimento das populações de outros países
no arquipélago. Em 1980, havia 782.910 estrangeiros residentes naquele
país (a grande maioria coreanos e chineses, como visto no Capítulo 2).
Vinte anos mais tarde, esse população já havia dobrado, para 1,69 milhão,
chegando hoje a mais de 1,9 milhão.
No caso de brasileiros, em 1996 houve 979 registros policiais,
envolvendo 304 nacionais, em comparação com 6.811 registros, do
quais participaram 1.064 nacionais, em 2005
152
. São cifras que,
dependendo do ponto de vista, corroborariam uma avaliação negativa
e crescente da participação da comunidade brasileira em atividades
criminais no Japão, mas que mereceriam, de outra parte, uma análise
mais objetiva.
De acordo com dados levantados no Consulado-Geral em
Tóquio, entre 2001 e 2005, foram informados, pela polícia local, 704
ocorrências de brasileiros detidos na área de jurisdição do posto.
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
171
Destes, 115 (16,3%) foram por porte ou consumo de entorpecentes,
85 por roubo (12,1%), 84 por furto (11,9%) e 43 por agressão física
(6,1%). Essas mesmas proporções correspondem às condenações
aplicadas aos brasileiros encarcerados na jurisdição desse Consulado-
Geral, que totalizam 160 adultos e 23 juvenis em reformatórios de
menores.
153
Nas penitenciárias localizadas na jurisdição do Consulado-
Geral em Nagóia, há registro de 217 prisioneiros brasileiros, onde
também prevalecem detidos por furto (24,3%), assalto (16,3%) e
entorpecentes (11%).
154
Há também, segundo os dados das duas
repartições, registros de casos mais graves, como homicídio (11 no
total), estupro(12), ocultamento de cadáver (5) e muitos relativos a
infrações de trânsito, como condução de veículo sob embriaguez e
acidente de trânsito com vítima (43).
Essas estatísticas, no entanto, correspondem apenas a brasileiros
condenados pela justiça, e não incluem aqueles detidos em delegacias
para averiguação ou aguardando julgamento. Precisar esses
quantitativos é extremamente difícil, uma vez que a polícia japonesa
não toma a iniciativa de informar sistematicamente as repartições
consulares sobre tais detenções, sob o argumento de que tal
comunicação deve partir da vontade do interessado, direito estabelecido
na Convenção de Viena sobre Relações Consulares, mas que os
apreendidos muitas vezes desconhecem e sobre os quais freqüentemente
não são informados.
Entre as razões mais apontadas para esses índices de
criminalidade entre os brasileiros no Japão está a questão da evasão
escolar. Muitos jovens, pelas conhecidas dificuldades de se
integrarem ao sistema educacional japonês, acabam sendo atraídos
para a delinqüência, não só pela ociosidade em que se encontram,
aliada à falta de supervisão dos pais, mas também pela própria
índole da sociedade japonesa, que, historicamente acostumada a
baixos índices de delitos, ainda não se resguarda ou se previne contra
a ação criminal como em outros países.
172
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Recorrendo novamente às estatísticas da Agência Nacional de
Polícia do Japão, o índice de criminalidade do país como um todo
(número de crimes expresso em termos da população total – dados de
2003) é de 0,34%. Dentre a comunidade brasileira, esse índice é de
0,43%. Se forem considerados apenas os dados referentes a infrações
do Código Penal Japonês (isto é, sem incluir “ofensas”), as cifras
respectivas são de 0,29% e 0,35%. Como se pode observar, por mais
que se atribua aos estrangeiros uma desmesurada participação em crimes
no Japão, os fatos concretos não tendem a corroborar esta visão.
Em termos de condenações e cumprimento de penas, o Japão
destaca-se por apresentar um dos níveis mais baixos do mundo: 62
prisioneiros por cada 100.000 habitantes (nos EUA, o índice é de
724, na Rússia, 581, Reino Unido 143, México 191 e Brasil 183)
155
.
As estatísticas de brasileiros aprisionados obtidas nos Consulados-
Gerais do Brasil no Japão revelam que 460 nacionais cumprem pena,
o que, numa população de 302.000, representaria um valor de 132
apenados por cada 100.000 da comunidade. Deve-se ressaltar, no
entanto, que as condenações de estrangeiros são proporcionalmente
mais elevadas no Japão, tanto em função do maior rigor com que são
tratados pelas cortes japonesas, como pela incapacidade desses réus
receberem adequada defesa, seja pelo desconhecimento do idioma e
do processo judicial (no Japão até hoje não existe a figura do júri
popular – o julgamento é realizado por um painel de três juízes), seja
pela dificuldade financeira de custear bons advogados de defesa (naquele
país, há um advogado para cada 10.000 habitantes; nos EUA, há 450).
Tais obstáculos enfrentados nos processos judiciais levam à aplicação
de penas proporcionalmente maiores aos estrangeiros, como foi
constatado pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da
Emigração, quando de sua visita à Penitenciária de Iocoama: “O tempo
médio de duração da pena dos japoneses é de dois anos e 8 meses;
dos estrangeiros, cinco anos.... Tivemos oportunidade de entrevistar
três presos brasileiros, um por vez, selecionados pela instituição.
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
173
Receberam condenações por roubo, as quais variam de 7 a 8 anos de
privação da liberdade”
156
.
Não é intenção do autor fazer a apologia da criminalidade dos
brasileiros no Japão, sob argumento de que, pela sua condição de
estrangeiros, são vitimados ou injusta e discriminatoriamente acusados
por delitos cometidos. Ao contrário, a infração à lei cometida pelos
burajirujin é uma realidade que deriva de fatores sociológicos,
psicológicos, econômicos e educacionais, presentes em qualquer
sociedade moderna, e deve ser punida de acordo com as normas e
regulamentos a que todos estão sujeitos naquele país.
Segundo estatísticas oficiais, as colônias estrangeiras no Japão
representam (em 2005) quase 2 milhões de habitantes, ou 1,5% da
população total, mas são responsáveis por cerca de 3,0% do total de
delitos registrados por ano. É esse o enfoque que está presente na
avaliação das autoridades nipônicas, ou seja, de que os gaijin cometem
proporcionalmente mais crimes do que seus nacionais. Inversamente,
no entanto, as mesmas estatísticas revelam que 97% dos crimes no
Japão são cometidos por cidadãos japoneses, perspectiva essa que
talvez merecesse o mesmo destaque na discussão acerca da atividade
criminosa naquele país.
4.5 – O VOTO NO EXTERIOR
Apesar da obrigatoriedade constitucional do voto, a
participação de brasileiros residentes no exterior nos processos
eleitorais nacionais tem sido, historicamente, muito baixa. Nas últimas
três eleições presidenciais, por exemplo, diante de um quadro de
aproximadamente um milhão e meio, ou mais, de potenciais eleitores
expatriados, o número de cidadãos cadastrados na chamada Zona
Eleitoral-ZZ, que administra as 315 seções fora do País, foi,
respectivamente, 47.490, em 1998, 69.640, em 2002 e 86.360, em
2006. O índice de comparecimento foi ainda mais baixo – 21.844
174
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
(45%), 38.618 (55%) e 41.388 (47%) nos três anos,
respectivamente
157
.
No Japão a situação não é diferente. No escrutínio de 2002,
quando já viviam naquele país 268.000 brasileiros (ou seja, um potencial
eleitorado de cerca de 230.000 pessoas), havia apenas 654 eleitores
cadastrados nas seções eleitorais de Tóquio e de Nagóia. Destes,
compareceram 369 (56%) no primeiro turno e 389 (59%) no segundo.
Em 2006, quando a comunidade brasileira já ultrapassava 300.000
cidadãos, dos 558 eleitores cadastrados (0,22% do eleitorado
potencial) votaram 226 no primeiro turno (41%) e 235 (42%) no
segundo
158
. Essa baixa participação é ainda mais significativa se
contrastada com os eleitores inscritos, em 2006, em países com
comunidades brasileiras menores, como Alemanha, 4.515, Canadá,
3.086, França, 2.145, Inglaterra, 3.540, Itália, 4.699, Portugal, 7.630
e Suíça, 2.639. Nos EUA, havia 32.017.
Diante dessa aparente apatia política dos brasileiros no Japão
– ainda mais se for considerado que a quase totalidade da comunidade
se encontra em situação legal naquele país, ao contrário das outras
acima mencionadas – lideranças comunitárias dos burajirujin
entregaram à Embaixada do Brasil em Tóquio, em 31 de outubro de
2005, petição solicitando a abertura de novas seções eleitorais em
sete cidades no interior do país, além das já estabelecidas na capital e
em Nagóia: Toyohashi (Aichi), Suzuka (Mie), Hamamatsu (Shizuoka),
Takaoka (Toyama), Oizumi (Gunma), Mitsukaido (Ibaraki) e Ueda
(Nagano)
159
.
Para fundamentar seu pleito, transmitido imediatamente à
Secretaria de Estado, os proponentes recordaram que a maioria dos
nacionais residia no interior do Japão, fato que certamente desestimulava
o comparecimento às zonas eleitorais existentes em Tóquio e Nagóia,
sobretudo em função dos altos custos do transporte naquele país.
Comprometeram-se, ainda, a participar da divulgação do processo de
recadastramento nas novas seções caso a Justiça Eleitoral acolhesse
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
175
favoravelmente a reivindicação. Havia, inclusive, um precedente para
o pedido – nas eleições de 2002, fora aberta seção eleitoral no interior
da China, na cidade de Dong-guan, para atender aos brasileiros que lá
se instalaram para trabalhar na indústria de calçados local.
A solicitação de abertura das novas seções eleitorais foi
encaminhada pelo MRE ao Cartório Eleitoral do Exterior no final de
novembro de 2005. A resposta daquele Cartório, no entanto, só foi
recebida em março do ano seguinte, e mesmo assim de forma
interlocutória, solicitando que se obtivesse, primeiro, autorização oficial
do governo japonês para a abertura das referidas seções no interior.
Cumpre ressaltar, a esse propósito, que o Peru, com uma comunidade
residente no Japão de quase 60.000 nacionais, abriu, em 2001, 14
seções eleitorais para suas eleições presidenciais (com comparecimento
de mais de 5.000 eleitores), processo repetido em 2005 com a inscrição
de mais de 22.000 eleitores. Em ambos os casos, não foi solicitada
qualquer anuência prévia das autoridades japonesas, fez-se apenas a
comunicação de que seriam abertas urnas naquelas 14 seções
160
.
No final de março, o governo japonês concedeu autorização
para a instalação das zonas eleitorais nas sete localidades propostas
pela Embaixada, mediante a aplicação de reciprocidade e, no melhor
estilo nipônico, condicionada a que “the preparation for voting and
the actual voting will be conducted as quietly as possible, with due
respect to the sovereignty and public order of Japan
161
.
Ofício da Diretora-Geral do Tribunal Regional Eleitoral do
Distrito Federal, Ivana Resende, de 5 de abril de 2006, ao Diretor-
Geral do Tribunal Superior Eleitoral, Athayde Fontoura Filho, no
entanto, argumentou que:
os procedimentos de criação de seções eleitorais e movimentação
de eleitores têm que ser iniciados com antecedência ampla em
relação à data do fechamento do cadastro nacional de eleitores...
o eleitorado brasileiro inscrito na intitulada zona ZZ não coincide
com o número de eleitores no exterior [que estão] inscritos em
176
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
zonas eleitorais onde residiam anteriormente ao seu deslocamento
para outro país.... assim sendo, para os eleitores efetivamente
inscritos no cadastro da Zona-ZZ, as seções eleitorais atualmente
previstas são suficientes para realizar o próximo pleito eleitoral...
no que se refere a eventual recadastramento de eleitores no
exterior, tenho que tal pretensão demandaria planejamento
exaustivo e tempo para execução, fatores que não dispomos no
momento
162
.
Além da dificuldade logística apontada no final do ofício da
Diretora-Geral, havia também a questão do prazo legal para
recadastramento, legalmente estabelecido em 150 dias antes da
realização do primeiro turno. A Embaixada havia feito pedido para
adiamento desse prazo, que formalmente se encerraria no dia 3 de
maio de 2006. Tal adiamento, ou prorrogação, no entanto, não foi
possível, em razão da impossibilidade de se alterar, em prazo tão curto,
a legislação eleitoral correspondente, Lei no. 9.504/97
163
.
Apesar de todos os óbices encontrados no caminho da
reivindicação da comunidade brasileira no Japão, o Tribunal Superior
Eleitoral finalmente autorizou, em 9 de maio de 2006 – seis dias depois
do encerramento do prazo oficial para recadastramento – a instalação,
fora das sedes das correspondentes Repartições Consulares em Tóquio
e Nagóia, de seções eleitorais naquelas sete cidades. O registro das
mesmas já se encontra formalizado no cadastro do TRE-DF
164
.
Infelizmente, só poderão ser efetivadas nas próximas eleições de 2010.
A mobilização da comunidade burajirujin na busca do
reconhecimento e ampliação efetiva de seu direito ao voto é indicativa,
também, de uma tendência à sua consolidação e permanência naquele
país. Se prevalecesse ainda na maioria a intenção de voltar ao Brasil,
certamente tal preocupação não seria tão evidente.
Mas não bastará apenas a maior conveniência de acesso às
urnas para que aquela e as demais comunidades de brasileiros no exterior
OS DIREITOS E OS DEVERES CIVIS
177
venham a participar de forma mais ativa da escolha de seus
representantes, por ora limitada ao Presidente da República. Será
necessário, também, que esse importante componente de sua cidadania
se traduza, no futuro, em real representatividade política, seja na
extensão do direito às eleições legislativas, seja – idealmente – na escolha
de parlamentares próprios, que representem diretamente os interesses
dessas comunidades no Congresso Nacional.
179
CAPÍTULO 5
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
As principais características da comunidade brasileira no Japão
até aqui descritas evidenciam, de forma bastante nítida, a progressiva
transformação de sua composição e perspectivas fundamentais. O que
se configurava, no início do processo migratório, como uma aspiração
de passar alguns anos fora do Brasil, para fugir da carência de
oportunidades econômicas domésticas ou para rapidamente amealhar
recursos visando a melhoria de vida, passou, gradativamente, a uma
acomodação e fixação de grande contingente de brasileiros naquele
país. Confirma-se hoje a previsão do Chanceler Luiz Felipe Lampreia,
quando discorreu, em 1995, sobre a nova política de assistência a
brasileiros no exterior, cuja implementação se iniciava naquele momento:
“a tendência previsível nos próximos anos é de consolidação dessas
comunidades, que começam a participar ativamente da vida econômica
e social de muitas cidades e regiões no exterior e parecem estar
destinadas a durar”
165
.
O reconhecimento dessa realidade provocou, no âmbito
governamental, uma mudança de filosofia, ou de política, para fazer
frente às crescentes demandas da população brasileira residente no
exterior. Deixou a atividade consular de ser mero instrumento passivo,
de execução de rotinas burocráticas, para assumir papel mais afirmativo,
saindo da repartição ao encontro do cidadão.
No caso do Japão, tanto a Embaixada como posteriormente
os dois Consulados-Gerais em Tóquio e Nagóia, que iniciaram suas
180
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
atividades em 1995
166
, empenharam-se de imediato em cumprir as
determinações da Secretaria de Estado. Foram criados, em 1996, os
Conselhos de Cidadãos nas duas cidades, que reúnem representantes
da comunidade das respectivas jurisdições, para a discussão dos
principais temas de seu interesse. Da mesma forma, iniciaram-se os
consulados itinerantes, missões em que funcionários das repartições
consulares se deslocam periodicamente nos finais de semana a cidades
de maior concentração de brasileiros no interior para o processamento
de serviços consulares, poupando-lhes viagens muitas vezes custosas
às sedes dos Consulados-Gerais.
A nova política de assistência aos brasileiros no exterior, lançada
no final de 1995, conferiu ao tema a dimensão política que a presença
de tão numerosa comunidade expatriada reclamava. Além das duas
iniciativas acima mencionadas, os postos realizaram levantamento da
estimativa da população residente no exterior, de modo a alocar com
maior eficiência os recursos humanos e materiais nos serviços de
atendimento e assistência. Na Secretaria de Estado, por sua vez, o
antigo Departamento de Assuntos Consulares e Jurídicos foi
transformado em Direção-Geral de Assuntos Consulares, Jurídicos e
de Assistência a Brasileiros no Exterior, subordinada diretamente à
Secretaria-Geral, o que lhe atribuiu maior autonomia e relevância
político-institucional.
Nesse quadro maior das iniciativas governamentais voltadas
para a assistência e preservação da cidadania dos brasileiros no exterior,
a atuação das representações no Japão – Embaixada e Consulados-
Gerais – foi favorecida por uma série de características próprias daquele
país, que permitiram o tratamento aberto e direto de suas múltiplas
facetas, tanto com a própria comunidade, como com as autoridades
nipônicas. Primeiramente, e ao contrário dos contingentes de brasileiros
residentes nos EUA ou na Europa, a população no Japão encontra-se
praticamente toda legalmente constituída. Poder-se-ia até dizer, pelas
facilidades de obtenção de vistos de trabalho e permanência, que essa
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
181
emigração foi mesmo encorajada pelo governo e indústria japoneses.
Na inexistência do dispositivo imigratório legal e da garantia de emprego,
dificilmente haveria uma comunidade brasileira tão numerosa e crescente
no Japão, em função sobretudo da distância geográfica, do alto custo
de vida e das barreiras sociais e culturais. Essa condição permitiu uma
franca aproximação desses cidadãos aos consulados, sem o receio
que muitas vezes sentem os imigrantes indocumentados em outros
países.
Em segundo lugar, observa-se, como foi visto no Capítulo 2,
uma relativa homogeneidade da população brasileira em termos de
suas origens no Brasil – majoritariamente da região Sudeste – de sua
formação sócio-econômica na classe média e, também, do seu modus
vivendi no Japão, com a predominância do emprego nas linhas de
montagem industriais. O mesmo não se poderia dizer sobre os imigrantes
brasileiros nos EUA, por exemplo, oriundos de praticamente todo o
território nacional e dos mais distintos ramos de atividade econômica e
classes sociais e lá empregados numa variedade muito maior de
ocupações e, muitas vezes, na clandestinidade.
Finalmente, a concentração dos burajirujin num espaço
geográfico de reduzidas dimensões, como é o Japão, facilita o contato
das autoridades brasileiras com a comunidade, tanto por meio dos
freqüentes consulados itinerantes, quanto pelo seu acesso às repartições
em Tóquio e Nagóia. É importante destacar ainda a relevância dos
dois jornais brasileiros, International Press e Tudo Bem, com uma
circulação conjunta de 60.000 exemplares semanais, como agentes de
difusão e irradiação de informações sobre e para a comunidade, de
forma consistente e abrangente.
As características da população brasileira no Japão permitiram
que as representações diplomática e consulares detectassem,
rapidamente, os temas para os quais deveriam canalizar sua atenção,
no sentido de dar impulso à nova política de assistência. A partir de um
diagnóstico preliminar realizado pelo Conselho de Cidadãos de Tóquio
182
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
em 1996, deu-se prioridade às áreas de educação, de questões
trabalhistas (aí incluídas a afiliação ao sistema previdenciário e o seguro
saúde) e de retenção de passaportes por empreiteiras, bem como a de
atendimento médico-hospitalar.
O encaminhamento desses temas, no entanto, não se restringiu
à esfera consular. Em 1997, a Embaixada elaborou documento, sob a
forma de non-paper intitulado “Problemas que Afligem a Comunidade
Brasileira no Japão”
167
, o qual foi entregue ao Ministério dos Assuntos
Estrangeiros japonês. Essa análise, ao relacionar as principais
dificuldades enfrentadas pelos imigrantes brasileiros (seguro saúde,
acidentes de trabalho e atendimento médico-hospitalar), afirmava
também: “Certas carências, no entanto, poderiam ser melhor atendidas
mediante o valioso apoio das autoridades japonesas”. Imprimia-se,
pois, um revestimento político-diplomático ao que, tradicionalmente,
era matéria restrita à aplicação da Convenção de Viena sobre Relações
Consulares. O grau de relevo com que o apoio à comunidade passou
a figurar no programa de trabalho da Embaixada pôde igualmente ser
medido, em setembro daquele mesmo ano, pela criação, na estrutura
organizacional da missão, do Setor de Assuntos relativos à Comunidade,
chefiado por diplomata de carreira. Patenteava-se, dessa forma, tanto
para a população imigrada como para as autoridades nipônicas, a
disposição do Governo brasileiro para conferir a mais alta prioridade
política ao tema da assistência aos já mais de 230.000 brasileiros
residentes no Japão.
O empenho do Governo em incluir na agenda bilateral Brasil-
Japão a discussão do tema comunidade não tardou a surtir efeito, como
relatou comunicação da Embaixada, na elaboração de subsídios para
a visita do Chanceler brasileiro ao arquipélago em 1998:
Com base nesse trabalho prévio, foi possível inaugurar (e
gradativamente consolidar) um diálogo mais sistemático com os
ministérios mais diretamente envolvidos nos assuntos de interesse
da comunidade, ou seja, além do próprio Gaimusho, os Ministérios
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
183
da Educação, do Trabalho e da Saúde e Bem-Estar Social. Nos
contatos mantidos com os titulares desses Ministérios, assim como
nas diversas reuniões realizadas com as instâncias intermediárias,
procurou-se assegurar a boa disposição e o empenho das
autoridades japonesas de colaborar para o correto encaminhamento
das questões assinaladas nos non papers. Em razão desse
empenho – e certamente também influenciadas pela atuação
político diplomática e consular e pelos esforços concertados da
própria comunidade brasileira – as autoridades japonesas têm
correspondido a nossas colocações através da concretização de
diversas iniciativas – entre outras – destinadas a: a) proporcionar
... informações em português ... facilitando assim a integração ao
trabalho e à sociedade; b) oferecer às crianças brasileiras aulas
de reforço .... ; c) desenvolver ... campanhas de informação sobre
a necessidade de [inscrição] no sistema securitário e previdenciário
local; e d) informações em português [nas fábricas] ... com vistas
a reduzir acidentes de trabalho ... e sobre benefícios assegurados
pela legislação local no caso de acidentes”
168
.
Na pauta dos assuntos que foram tratados pelo Ministro Luiz
Felipe Lampreia em sua visita oficial ao Japão naquele ano, constava,
ainda, a criação de um Grupo de Trabalho no âmbito do mecanismo
de Consultas de Alto Nível, no qual o tema comunidade figuraria ao
lado dos demais tópicos substantivos das relações bilaterais a serem
discutidos. Esse grupo, no entanto, só veio a ser constituído em 2001.
Àquela época, contudo, o encaminhamento político dos problemas
relacionados aos trabalhadores brasileiros e a seus dependentes no
Japão já ganhava espaço e dinâmica próprios, como testemunharam
os simpósios sobre a educação das crianças brasileiras e a edição do
Parecer 11/99 do Conselho Nacional de Educação, responsável pela
homologação das escolas brasileiras e pela realização do primeiro
exame supletivo, no final de 1999.
184
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
A educação, conquanto matéria de grande interesse para os
burajirujin e que angariou apoio e ativa participação de todos os
setores envolvidos – comunidade, representações oficiais e governo
japonês – constituía apenas um dentre vários focos de atenção do
projeto maior de assistência aos brasileiros no exterior. Em janeiro de
2001, a Secretaria de Estado solicitou a todos os postos no exterior
novo levantamento da dimensão, dos problemas e do atendimento à
população expatriada, reiterando, dessa forma, “o empenho do
Governo em garantir o exercício da cidadania, ... [que] transformou a
assistência e proteção consular em um dos objetivos prioritários da
atual política externa brasileira”
169
.
Do lado do governo nipônico, notou-se também um visível
movimento em direção a debate mais aberto sobre a comunidade
brasileira, fruto, possivelmente, de um revisionismo de sua percepção
inicial de que os burajirujin representavam um componente humano
transitório e que seriam, em função de sua ascendência étnico-cultural,
facilmente absorvidos, ou assimilados, pela sociedade japonesa. Tal
postura pôde ser evidenciada pela realização, em fevereiro de 2001,
do “I Simpósio sobre a Comunidade Brasileira no Japão”, organizado
pelo Gaimusho em colaboração com a Universidade de Sofia, de
Tóquio. Participaram do evento autoridades governamentais e
parlamentares japoneses, das prefeituras com maior concentração de
estrangeiros, como Hamamatsu, Toyota e Oizumi, acadêmicos e
representantes de empresas brasileiras. O significado político do
encontro pôde ser medido não apenas pelo patrocínio do governo
japonês ao debate público sobre o “fenômeno decasségui”, mas por
sua perceptível reavaliação do tema, como relatou o telegrama da
Embaixada sobre o evento:
Chama atenção o fato de que o presente Simpósio tenha trazido
em seu título menção à “comunidade brasileira no Japão” em
vez de nikkeijin ... como sempre ocorrera em encontros passados
sobre trabalhadores brasileiros. Esse fato, aliado à inclusão de
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
185
temas como a convivência multicultural, características
socioculturais dos brasileiros no Japão, bem como o complexo
tema da identidade do nikkei, sinalizaram a percepção de que os
nossos nacionais no Japão revelaram-se sociologicamente
diferentes do que tinham em mente as autoridades japonesas
quando arquitetaram a estratégia de suprir a carência de mão-
de-obra ... com nikkeis latino-americanos
170
.
Paralelamente à discussão, acompanhamento e aplicação de
diretrizes mais amplas de apoio aos brasileiros no exterior, foram
desenvolvidos pela Secretaria de Estado projetos específicos para a
discussão, em alto nível técnico bilateral, das particularidades das
principais comunidades expatriadas. Foram realizadas, nesse contexto,
as chamadas reuniões de Coordenação Consular com Portugal, EUA,
Guiana e Suriname, entre outros países, com enfoques diferenciados,
como, por exemplo, a questão dos dentistas brasileiros em Portugal, a
imigração ilegal e deportação, nos EUA, e a situação dos garimpeiros
brasileiros, nos outros dois países. Nesse contexto, a Embaixada em
Tóquio foi instruída, em agosto de 2002, a propor ao Gaimusho reunião
bilateral para “discutir temas afetos ao serviço consular em geral, e à
assistência a nacionais em particular, além de assuntos referentes à
cooperação judiciária”
171
.
5.1 – AS REUNIÕES DE COORDENAÇÃO CONSULAR
Por meio de aide mémoire entregue à Divisão da América
Latina do Gaimusho em 30 de agosto de 2002, a Embaixada em Tóquio
formalmente apresentou pedido para a realização, ainda no decorrer
daquele ano, da primeira Reunião de Coordenação Consular, que
abarcasse os temas acima mencionados. O nível proposto – Direção-
Geral Consular de ambas as chancelarias – causou certa resistência
inicial por parte do Gaimusho, onde encontros desse tipo se restringiam
186
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
à interlocução com a Coréia e a China, comunidades antigas no
arquipélago. Assuntos de natureza consular envolvendo as colônias
de newcomers, como Tailândia e Filipinas, eram geralmente tratados
em nível secundário pela Divisão Política, juntamente com funcionários
de escalão compatível de outros ministérios e agências. Após
reiteradas gestões da Embaixada, foi finalmente possível obter, no
início de 2003, a concordância para o encontro, inicialmente previsto
para maio, que, conforme o desejo brasileiro, seria realizado em nível
de Diretores Gerais das áreas consulares. Tal anuência pode ser vista
não apenas como derivada do peso político específico do Brasil em
suas relações mais amplas com o Japão, mas também como o
reconhecimento, pelo governo nipônico, do status de colônia
estabelecida conferido à comunidade brasileira, no mesmo patamar
que a chinesa e coreana.
A demora do Gaimusho em marcar data para o encontro
reflete, em parte, a extrema meticulosidade e necessidade de tudo
prever, que caracterizam a índole negociadora nipônica, sobretudo
diante de um novo e multi-disciplinar temário, tal como proposto
pela parte brasileira. Além disso, como ressaltou comunicação da
Embaixada, havia, de um lado, “a conhecida dificuldade de articulação
da Chancelaria com outras áreas da administração ... , que resistem
a qualquer iniciativa que possa ser vista como subordinação ao
Gaimusho”
172
. Do outro, para tentar manter um desejável equilíbrio
de temas em ambos os lados da agenda, mormente pelo fato de a
reunião realizar-se em Tóquio, aquele Ministério teve de encontrar
um elenco de temas relevantes que também pudessem ser
reivindicados à parte brasileira, tarefa não necessariamente fácil diante
do decrescente número de cidadãos e de problemas consulares afetos
aos japoneses que vivem no Brasil
173
.
Após várias reuniões informais entre a Embaixada e o Gaimusho,
a agenda tentativa do encontro foi finalmente acordada e a reunião
marcada para o dia 25 de junho de 2003, com o seguinte temário:
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
187
Temas propostos pelo Japão
- Segurança de nacionais japoneses no Brasil
- Carteiras de Habilitação
- Carteiras de Identidade e CPF
- Criminalidade juvenil de brasileiros no Japão
- Vistos
Temas propostos pelo Brasil
- Educação de brasileiros
- Informações em português sobre serviços públicos
- Acesso a presos brasileiros
- Transferência de presos
- Cooperação judiciária, civil e penal
- Localização de brasileiros
- Retenção de passaportes
- Acordo de previdência social.
As delegações foram chefiadas, respectivamente, pelo Diretor-
Geral de Assuntos Consulares, Jurídicos e de Assistência aos Brasileiros
no Exterior (DCJ) do MRE, Embaixador Adolf Westphalen, e pelo
Embaixador Yoshinori Katori, Diretor-Geral do Departamento Consular
e de Migração do Gaimusho. Do lado nipônico, participaram ainda
representantes dos Ministérios da Justiça, Educação, Saúde, Trabalho
e Bem-Estar Social e da Agência Nacional de Polícia
174
. Além da
delegação da Secretaria de Estado, participaram também, pelo lado
brasileiro, os dois Cônsules-Gerais e diplomatas da Embaixada. Durante
sua estadia no Japão, o Embaixador Westphalen e o Chefe da Divisão
de Assistência Consular do Itamaraty, Conselheiro Paulo Tarrisse da
Fontoura, aproveitaram para manter contatos com a comunidade em
escolas brasileiras, reuniões com os dois Conselhos de Cidadãos
(Tóquio e Nagóia) e visitas a fábricas e prefeituras, que serviram não
apenas para que conhecessem de perto a realidade dos brasileiros,
188
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
mas também para sinalizar a presença e preocupação do Governo
com o bem-estar de seus cidadãos no exterior.
Os temas apresentados pela delegação japonesa não eram, de
uma maneira geral, referentes exclusivamente a cidadãos nipônicos no
Brasil, mas decorrentes de dificuldades práticas e burocráticas que
estrangeiros ocasionalmente aqui enfrentam.
A preocupação com a violência urbana no Brasil, bem como a
expedição de documentos para estrangeiros eram, como respondeu a
delegação brasileira, questões mais abrangentes, para as quais as
autoridades nacionais procuravam encontrar soluções, dentro das
limitações legais e administrativas que o País enfrentava. A referência a
supostos problemas para a obtenção de vistos, especialmente de
trabalho, para empresários japoneses, foi prontamente respondida pela
delegação brasileira, que arrolou as exigências muito mais rigorosas
impostas pelo serviço consular japonês para a concessão de qualquer
tipo de visto a cidadãos brasileiros.
Alternativas para solucionar pedidos pontuais da delegação
japonesa, como a revalidação de carteiras de motorista, por exemplo,
seriam examinadas junto aos órgãos competentes brasileiros. No seu
único ponto referente à comunidade burajirujin, a parte japonesa
registrou preocupação com os crescentes índices de criminalidade entre
os jovens brasileiros, proporcionalmente muito superiores às médias
de delinqüência locais.
A abordagem da questão da criminalidade juvenil, por sua vez,
permitiu ao lado brasileiro estabelecer o vínculo deste tema com o da
educação destes mesmos jovens. Salientou, nesse sentido, o fato de
que a falta de oportunidade que se lhes apresentava, tanto para ingressar
no sistema educacional japonês, como pela carência de medidas de
apoio do governo local para diminuir os custos das escolas brasileiras,
era um dos principiais fatores que contribuíam para aquele indesejável
comportamento delinqüente. Com o intuito de solucionar esse problema
foi solicitado à parte japonesa: a facilitação para a certificação das
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
189
escolas brasileiras como miscellaneous schools, de modo a poderem
receber benefícios fiscais e doações filantrópicas; a facilitação na
concessão de vistos para professores brasileiros não-nikkeis
contratados no Brasil; a cessão de professores japoneses para lecionar
idioma e cultura nipônicos nas escolas brasileiras e maior apoio aos
alunos brasileiros nas escolas públicas municipais. Em resposta, o
representante do Ministério da Educação nipônico explicou que seu
governo estaria empenhado em prestar o possível auxílio nessa área,
sobretudo visando a integração do alunos brasileiros nas escolas
públicas japonesas.
No tocante à divulgação de anúncios públicos em idioma
português, a delegação brasileira salientou o louvável esforço de várias
prefeituras no sentido de promover a distribuição de folhetos informativos
e a instalação de placas indicativas para a comunidade. Vale mencionar,
neste particular, que muitas dessas ações partiram de iniciativa das próprias
prefeituras, preocupadas com a suposta falta de observância dos
brasileiros a normas públicas como separação e coleta de lixo,
estacionamento de veículos e pagamento de impostos municipais.
Com relação ao acesso aos brasileiros nos centros de detenção,
foram mencionadas as dificuldades das repartições consulares em obter
informações sobre a localização dos presos e de fazer com que
tomassem conhecimento de seus direitos e dos regulamentos prisionais,
em razão das dificuldades lingüísticas. A sugestão brasileira de que
fosse elaborada uma “informação aos presos”, em português, que
descrevesse seus direitos e deveres, e que se possibilitasse mais fácil
acesso às autoridades consulares, foi bem recebida pelo representante
do Ministério da Justiça, que recordou, no entanto, que a iniciativa de
procurar o serviço consular era condicionada a solicitação do
interessado, por escrito, não podendo partir do agente penitenciário,
nos termos da lei japonesa de privacidade da informação pessoal
175
.
No tocante à cooperação judiciária, foram quatro as propostas de
acordo submetidas pela delegação brasileira: Acordo Bilateral para a
190
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Transferência de Presos; Cooperação em Matéria Civil; Cooperação em
Matéria Penal e Acordo sobre Extradição. Essas iniciativas foram, naquele
momento, recebidas sem manifestação ostensiva de interesse por parte da
delegação japonesa. Tal postura resulta, basicamente, da preferência
nipônica por acordos multilaterais de regulamentação de matéria jurídica,
bem como da assimetria, acima apontada, de interesses e preocupações
dos dois países com suas respectivas populações expatriadas.
Sobre o pedido de apoio para a localização de cidadãos
brasileiros naquele país, a parte japonesa, novamente sob pretexto
das normas da lei de privacidade, limitou-se a afirmar que só poderia
atender a essas demandas por ordem judicial ou com permissão formal
do interessado.
Quanto aos problemas de retenção de passaportes, a delegação
brasileira deixou registro dos muitos problemas ocasionados por
empreiteiras menos idôneas que detinham os documentos de viagem
de seus empregados brasileiros como garantia de pagamento de dívidas
ou para evitar que abandonassem a empresa em busca de outro
emprego. Sublinhou, também, que passaportes extraviados e entregues
a autoridades policiais não eram encaminhados às repartições
consulares, como era comum em muitos outros países. Em resposta, a
delegação japonesa esclareceu que a legislação local vedava a prática
da retenção e que, nesse sentido, eventuais reclamações deveriam ser
dirigidas, pelos interessados, ao Ministério do Trabalho, para a tomada
de providências. Caso não surtissem efeito, as queixas poderiam ser
transmitidas por intermédio do Gaimusho. Mais uma vez, verificava-se
a pouca disposição japonesa para discutir a adoção de mecanismos
mais ágeis e eficientes para a resolução de problemas restritos a uma
comunidade estrangeira.
O derradeiro ponto da agenda apresentado pelo Brasil, a
proposta de acordo sobre previdência social, será visto em seção à
parte. Cumpre mencionar que foi entregue, à parte japonesa, minuta
de acordo bilateral sobre o tema, que permitisse que os valores e o
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
191
tempo de contribuição dos trabalhadores brasileiros à previdência oficial
japonesa lhes pudessem ser creditados quando de seu regresso ao
Brasil. A legislação trabalhista nipônica já permitia o reembolso de
contribuições à previdência, limitado a período máximo de três anos
de aportes. A permanência cada vez mais prolongada da comunidade
brasileira naquele país, contudo, exigiria uma abordagem mais
pragmática do assunto, tendo em vista ser essa limitação uma das razões
para a falta de disposição dos trabalhadores burajirujin para afiliarem-
se aos sistemas de proteção social japoneses.
O tratamento do tema comunidade, no formato de consultas
de alto nível entre as duas Chancelarias, cristalizou, politicamente, a
realidade da expressiva presença humana brasileira no Japão. Como
relatou o telegrama de avaliação da Embaixada sobre o encontro:
...vale destacar que a relevância política da iniciativa é
diretamente proporcional ao número de brasileiros que aqui se
têm radicado, criando um elemento adicional – sensível e
importante – na agenda bilateral. ... de pendular a transitória, a
permanência da comunidade brasileira está-se tornando cada
vez mais longa – e em crescentes casos, definitiva – criando
situações novas que requerem tratamento – ou soluções – que
levem em conta e equacionem tal premissa
176
.
Tal avaliação, por certo, coincidiu com a perspectiva do governo
japonês, ao aquiescer à realização da reunião, que, no mesmo relato
da Embaixada, revelou o “muito positivo fato de se haver alcançado o
estabelecimento de um diálogo similar ao que este governo [japonês]
mantém com apenas dois países, China e Coréia; ... apesar de todas
as resistências [iniciais].” Outro ponto indicativo da boa disposição do
Gaimusho para manter aberto esse canal de interlocução foi a aceitação
de novo encontro para o ano seguinte, no Brasil, apesar da
anteriormente declarada oposição a estabelecer calendário fixo para
tal tipo de exercício.
192
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Se no âmbito governamental a reunião de coordenação consular
representou novo e importante marco na agenda bilateral, não menos
significativa foi a sua repercussão para os cidadãos brasileiros lá
radicados. Nos contatos que o Diretor-Geral do DCJ e do Chefe da
Divisão de Assistência Consular tiveram com membros da comunidade
em Tóquio e Nagóia, “não terá escapado [à comunidade] a percepção
de prioridade que o Governo brasileiro atribui aos seus nacionais
residentes no exterior. Tal mensagem – política – já por si só teria
justificado a vinda dessas autoridades”
177
. Com efeito, sob o título
“Dekasségui em Debate”, o jornal International Press noticiou assim
o evento: “Foi uma reunião histórica. Pela primeira vez desde o começo
do fenômeno dekasségui, o governo japonês recebeu uma missão do
Brasil para discutir os principais problemas enfrentados pela comunidade
brasileira no arquipélago”
178
.
A discussão dos temas afetos à comunidade, tanto política
quanto técnica, manteve presença regular nos contatos que se seguiram
entre os dois governos. Na pauta da visita de trabalho que realizou ao
Japão, em março de 2004, o Ministro das Relações Exteriores, Celso
Amorim, voltou a enfatizar a importância que o Governo brasileiro
atribuía aos vários assuntos de interesse da comunidade:
um dos principais tópicos tratados [na reunião com a Chanceler
Yoriko Kawaguchi] foram as propostas de acordo bilateral
[apresentadas] ao governo japonês no ano passado nas áreas de
previdência social, cooperação judiciária em matéria civil,
cooperação judiciária em matéria penal, extradição e
transferência de presos ... [com ênfase no] interesse em avançar
sobretudo nas três primeiras áreas
179
.
No encontro que o Chanceler manteve durante sua visita com
lideranças comunitárias brasileiras, solicitou que elaborassem um
“memorial” , com o intuito de recolher suas opiniões e reivindicações
sobre os principais problemas que enfrentavam no Japão, a fim de
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
193
subsidiar, com a experiência concreta dos interessados, a condução
das tratativas junto ao governo japonês.
Da mesma forma, na visita oficial do Primeiro Ministro Junichiro
Koizumi ao Brasil, em setembro daquele ano, a declaração conjunta
emitida na ocasião refletiu, de forma inequívoca, a dimensão prioritária
que se consolidava em torno do tema, elevado ao mesmo patamar que
as tradicionais áreas política e econômica:
Nesse sentido, ambos [os mandatários] discutiram os laços
políticos, econômicos e humanos que estão na base das relações
Brasil-Japão e reafirmaram a disposição de envidar esforços
para intensificar ainda mais esse relacionamento ... O Presidente
Lula também expressou gratidão pela maneira amistosa pela qual
a comunidade brasileira tem tido a oportunidade de contribuir
para o desenvolvimento da economia e da sociedade japonesas
em décadas recentes. Ambos os líderes concordaram, nesse
contexto, que os laços humanos desempenham papel crucial no
aprofundamento da amizade e da compreensão mútuas. Ambos
reconheceram que o trabalho, a educação, a previdência social
e os transportes são elementos vitais neste contexto
180
.
O dinamismo da ação do governo foi mantido com a viagem
ao Japão do Subsecretário-Geral de Cooperação e das Comunidades
Brasileiras no Exterior do MRE, Embaixador Ruy Nogueira, em outubro
de 2004 . Reuniu-se, naquela oportunidade, com o Diretor-Geral de
Assuntos Consulares do Gaimusho, Embaixador Katori, a quem reiterou
o pedido de um encaminhamento urgente das propostas de acordo
apresentadas pelo Brasil, sobretudo na área previdenciária e de
cooperação judiciária. Destacou o interlocutor japonês que considerava
o tema da previdência social como de grande relevância e que precisaria
ser solucionado, sem, contudo, definir como isso poderia ser resolvido
no curto prazo. A posição aparentemente descompromissada do
governo nipônico ficou mais evidente no encontro seguinte do
194
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Subsecretário-Geral, desta feita com o Diretor-Geral para a América
Latina, Embaixador Sakaba. Este deixou clara a posição da Chancelaria
de preferência por instrumentos multilaterais para a regulamentação de
matéria jurídica (como a Convenção da União Européia sobre
Transferência de Pessoas Condenadas, de 1983). Demonstrou também
a pouca disposição em progredir na questão previdenciária, sob alegação
de que o Japão não poderia alterar o cronograma de negociações que
mantinha com outros países sobre a mesma matéria (França, Bélgica,
Canadá e Austrália) e que, ademais, precisaria obter maiores informações
e dados sobre o regime previdenciário brasileiro
181
. A resistência em
avançar substantivamente na negociação dos instrumentos bilaterais ficou
igualmente patente nos encontros realizados pelo Embaixador Nogueira
nos Ministérios do Trabalho e da Justiça japoneses. Neste último, por
exemplo, os representantes da pasta nem sequer haviam tomado
conhecimento dos textos de acordo apresentados pelo Brasil no ano
anterior, na reunião de coordenação consular
182
.
Além dos contatos oficiais, o Subsecretário-Geral participou
de reuniões com os Conselhos de Cidadãos de Tóquio e de Nagóia e
de encontros com representantes da comunidade, reforçando, dessa
forma, as duas vertentes paralelas da ação do Estado com relação à
comunidade expatriada: a busca de soluções políticas e práticas para
os problemas que enfrenta no país hospedeiro e a manutenção de um
canal de diálogo permanente e aberto com essa população.
A II Reunião de Coordenação Consular, prevista inicialmente
para a primeira quinzena de janeiro de 2005, em Brasília, teve de ser
adiada e transferida para Tóquio, em razão dos críticos desdobramentos
resultantes da calamidade do maremoto na Ásia, de 26 de dezembro
de 2004, que impediu a saída do país de funcionários da área consular
do Gaimusho.
O temário da reunião, realizada no dia primeiro de abril de
2005, repetiu, em grandes linhas, os tópicos do primeiro encontro,
negociados previamente pelas duas partes:
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
195
Temas propostos pelo Japão
- Segurança e proteção de nacionais japoneses
- Carteiras de Habilitação
- Criminalidade juvenil
- Vistos
Temas propostos pelo Brasil
- Acordo de previdência social
- Educação de brasileiros
- Acesso e assistência a presos brasileiros
- Retenção de Passaportes
- Localização de Brasileiros
- Acordo Bilateral de Cooperação em Matéria Civil
- Acordo para Isenção de Vistos
A agenda refletiu, mais uma vez, a preponderância de matéria
substantiva e específica apresentada pela delegação brasileira, chefiada
pelo novo Diretor-Geral do Departamento de Assuntos Consulares,
Jurídicos e das Comunidades Brasileiras no Exterior, Embaixador
Manoel Gomes Pereira. O lado japonês, chefiado mais uma vez pelo
Embaixador Katori, restringiu-se a salientar questões relativas à
segurança de cidadãos nipônicos no Brasil, tema que ganhou destaque
na imprensa daquele país em razão de violento assalto a turista japonesa
no Rio de Janeiro e aos preocupantes índices de criminalidade atribuíveis
a membros da comunidade brasileira, sobretudo os mais jovens. No
tocante ao pedido de facilitação de procedimentos para a revalidação
de carteiras de motorista de cidadãos japoneses no Brasil, foi explicado
que uma solução poderia ser alcançada mediante a assinatura de acordo
bilateral, cuja minuta fora antecipada ao Gaimusho
183
.
No tocante aos itens propostos pela delegação brasileira, foi
registrada a acentuada queda no número de passaportes de
trabalhadores retidos por empreiteiras, resultado do empenho com que
196
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
os Consulados-Gerais vinham agindo junto àqueles intermediários.
Foram repassados, em seguida, os principais temas na área de
educação, como o aprofundamento dos estudos para a certificação
das escolas brasileiras como miscellaneous schools, a conveniência
de um recrutamento mais amplo de participantes brasileiros no âmbito
do JET (Japan Exchange and Teaching) Programme
184
, como
contratados das prefeituras japonesas para servirem de liaison com
as escolas e comunidade e a realização de um encontro técnico entre
os Ministérios da Educação dos dois países com o objetivo, entre
outros, de examinar maneiras de reduzir a evasão escolar de crianças
brasileiras.
Com relação aos problemas dos detidos brasileiros no Japão,
foram novamente mencionadas as dificuldades de comunicação, em
português, existentes em vários estabelecimentos penais, apesar da
determinação oficial de que o diálogo com os agentes consulares se
pode dar na língua nacional do detido. Quanto à distribuição de
informações em português entre os apenados brasileiros (Carta ao
Preso), foi registrada a aprovação, pelas autoridades japonesas, do
texto preparado pelos Consulados brasileiros, mas ainda seria
necessário definir quem se incumbiria de sua distribuição nas
penitenciárias.
Os pleitos brasileiros de maior alcance, como a assinatura de
instrumentos bilaterais nas áreas de cooperação judiciária e previdência,
encontraram, mais uma vez, resistências da parte dos interlocutores
nipônicos. O DG do DCJ recordou, no tocante a questões judiciárias,
que o Japão era o maior destino das cartas rogatórias do Brasil, mas
que somente um percentual reduzido destas chegava às mãos dos
reclamados. A visível inoperância desse mecanismo judicial específico
tornava-se ainda mais grave diante do fato de que a grande maioria
dessas cartas se referiam a demandas de pensão alimentícia.
No mês seguinte à II Reunião de Coordenação Consular, em
25 e 26 de maio de 2005, o Presidente Luiz Inácio Lula da Silva realizou
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
197
visita de trabalho ao Japão, em retribuição à vista do Primeiro Ministro
Koizumi no ano anterior. Entre os diversos memoranda e acordos
assinados na ocasião, figurou o “Programa Conjunto Relativo às
Comunidades Brasileiras no Japão”. A declaração de intenções então
acordada, além de voltar a enfatizar os principais temas discutidos nas
reuniões de coordenação consular, determinou fossem estabelecidos
mecanismos de consultas técnicas bilaterais nos campos da educação
e da previdência, cujos textos pertinentes são transcritos a seguir:
... 2. Conscientes da importância da educação para as crianças
brasileiras residentes no Japão, os dois mandatários confirmaram
que seus governos continuarão a tratar este assunto positivamente
e decidiram que ambos os governos terão oportunidade de
intercambiar pontos de vista em Tóquio, em outubro próximo...
5. Os dois mandatários decidiram concentrar esforços no
fortalecimento da adaptação da comunidade brasileira à
sociedade japonesa nos campos da educação e da seguridade
social.
6. Com relação à cooperação no campo da seguridade social, os
dois mandatários decidiram estimular mecanismos de trabalho
entre as autoridades competentes dos dois países, que tratará do
tema tendo em vista os respectivos sistemas nacionais.
7. Com este propósito, foi estabelecido um grupo de trabalho.
Sua primeira reunião realizar-se-á no Brasil em 19 e 20 de
setembro de 2005 e seu relatório será oportunamente apresentado
às autoridades competentes
185
.
Além do programa conjunto que, como relatou a Embaixada,
evidenciou “a clara sinalização de que temos a expectativa de avanços
concretos em temas de interesse prioritário da comunidade brasileira
residente no Japão como, por exemplo, educação, saúde e
previdência social”
186
, o Presidente brasileiro também realizou visita a
Nagóia para encontros com a comunidade, os quais “sinaliz[aram] de
198
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
maneira concreta e expressiva o comprometimento do Governo
brasileiro com a proteção dos interesses da comunidade brasileira neste
país. A reação do público ... refletiu, de forma eloqüente, a importância
do gesto do Presidente Lula”
187
.
Conquanto não se tenha, ainda, logrado superar as resistências
maiores do governo japonês em avançar de maneira efetiva na tradução
das reivindicações brasileiras em instrumentos concretos, ou acordos
bilaterais, para a defesa dos interesses mais prementes da comunidade
residente no Japão, sobretudo nas áreas da previdência e direito civil,
as visitas oficiais, em seus vários níveis, e a criação do foro de
Coordenação Consular como mecanismo regular de consultas,
representam conquista importante da política externa nacional. De um
lado, simbolizam o reconhecimento formal, pelo governo japonês, das
características e dos problemas específicos da comunidade brasileira,
que, diante de sua condição de colônia consolidada, requer soluções
próprias para as dificuldades que enfrenta. Do outro, sinaliza, a essa
mesma comunidade, que a política de assistência aos cidadãos no
exterior vai além do mero aperfeiçoamento de rotinas e práticas
consulares, para a discussão substantiva com o governo do Japão, no
mais alto nível, de questões sociais e jurídicas que afetam o seu cotidiano.
5.2 – OS ENCONTROS SETORIAIS: EDUCAÇÃO E PREVIDÊNCIA
Com o mandato recebido dos dois Chefes de Governo em
maio, foram marcadas as reuniões técnicas sobre a educação e a
previdência social dos brasileiros no Japão. A seguir, será feito relato
sucinto desse dois encontros.
5.2.1 – GRUPO DE TRABALHO SOBRE EDUCAÇÃO
A primeira reunião bilateral sobre educação foi realizada em
Tóquio, em 25 e 26 de outubro de 2005, com uma agenda
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
199
diversificada, que tratou não apenas da questão educacional dos
jovens brasileiros no Japão, mas também de outros temas relativos à
cooperação entre os dois países nesse campo, como intercâmbio
acadêmico, o programa JET, assistência financeira para projetos no
Brasil, bolsas de estudo e programas voltados para alunos com
necessidades especiais.
Quanto à educação das crianças burajirujin no Japão, a
delegação brasileira, chefiada pela Secretária de Educação Especial
do MEC, Cláudia Dutra, fez uma avaliação geral sobre o quadro em
que se encontravam esses jovens. Destacou a importância do apoio
do governo japonês para a flexibilização das regras para que as escolas
brasileiras possam ser certificadas como miscelllaneous schools e
assim receber benefícios financeiros que lhes permitam reduzir o valor
das mensalidades e atrair mais alunos. Tal certificação requereria, entre
outras exigências, a obrigatoriedade do ensino da língua e cultura
japonesas, para o qual foi também solicitado o apoio das autoridades
nipônicas. O lado brasileiro recordou, ainda, as iniciativas que haviam
sido tomadas pelo Governo, como a homologação dessas escolas, de
modo a permitir o reingresso de alunos no sistema educacional nacional,
a aplicação dos exames supletivos, desde 1999, e a coordenação
administrativa das escolas por intermédio da Associação das Escolas
Brasileiras no Japão (AEBJ).
A delegação japonesa, chefiada pelo Diretor-Geral de Assuntos
Internacionais do Ministério da Educação, Masayuki Inoue, por sua
vez, repassou as iniciativas que haviam sido tomadas em resposta às
reivindicações brasileiras, tais como: a possibilidade de ingresso no
ensino superior japonês para alunos egressos das escolas homologadas
(já haviam sido oficialmente reconhecidas como tal 19 escolas
brasileiras), a intervenção junto a autoridades regionais para a revisão
de normas a fim de permitir a certificação das escolas brasileiras em
miscellaneous schools (destacando-se as de Nagano e Shizuoka), o
apoio de algumas prefeituras na cessão de professores para o ensino
200
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
de japonês em escolas brasileiras e a realização de pesquisas para
melhor avaliar a situação das crianças estrangeiras no país.
Finalmente, a pedido da delegação brasileira, foi acordado que
seria examinada a possibilidade de agendar visita do Ministro da
Educação do Brasil ao Japão no início de 2006, data em que nova
reunião bilateral entre os dois ministérios seria realizada.
No relato sobre o encontro, a Embaixada em Tóquio destacou
a avaliação “muito positiva e o encaminhamento dado aos temas de
nosso interesse na reunião. Houve boa receptividade do lado japonês
e claro desejo de avançar de forma concreta nas questões
levantadas”
188
.
A segunda reunião bilateral foi realizada novamente em Tóquio,
em 4 e 5 de abril de 2006, quando as delegações foram chefiadas,
respectivamente, pelo Secretário de Educação Básica do MEC e pelo
Coordenador de Assuntos Internacionais do Ministério da Educação
japonês.
O temário do encontro repetiu, essencialmente, os assuntos
discutidos na reunião anterior, mas com maior ênfase nos problemas
enfrentados pelos alunos de escolas brasileiras e possíveis soluções
para contorná-los. O governo nipônico destacou, de sua parte, o
programa de treinamento de professores para o apoio em língua japonesa
e o oferecimento de cursos de japonês a adultos e crianças; a
elaboração de material didático específico para crianças estrangeiras
no ensino primário; a contratação de professores bilíngües em escolas
japonesas e alguns projetos de bolsas de estudo e de apoio que estavam
sendo estendidos a escolas brasileiras.
A parte brasileira, mais uma vez, voltou a insistir num melhor
aproveitamento do programa JET como instrumento de apoio às
escolas brasileiras (esse tema será visto em mais detalhe no próximo
capítulo), a necessidade de continuado esforço para a certificação das
escolas em miscellaneous schools; os programas de inspeção e
homologação, pelo Governo, dessas mesmas escolas e o envio de
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
201
material didático básico. Como novidade, foi anunciado o projeto de
formação inicial e continuada para professores das escolas brasileiras,
sobretudo para aqueles que, embora com formação de nível superior,
não tenham orientação pedagógica, e também para professores sem
formação universitária. Representante da Universidade Federal do Mato
Grosso esteve no Japão, na comitiva do Ministro da Educação, para
uma primeira avaliação da viabilidade desse projeto.
Além da discussão de programas e projetos educacionais,
houve franca troca de idéias sobre um dos principais problemas das
crianças brasileiras naquele país – a evasão escolar. Na avaliação
japonesa, isso ocorreria em função da alta mobilidade da população
brasileira no território japonês e da falta de supervisão e orientação
dos pais. Para responder a essas questões, aquele governo havia
preparado um conjunto de informações sobre o sistema educacional
japonês para ser distribuído aos pais estrangeiros, bem como
implementado projeto piloto de criação de “centros escolares
especiais”, voltados para as comunidades estrangeiras. O lado brasileiro,
por seu turno, não discordou da relevância do problema, mas lembrou
que seria necessário um estudo mais aprofundado sobre a questão,
principalmente para determinar o número preciso de crianças fora da
escola
189
.
Após a conclusão da reunião técnica, deu-se início à visita de
trabalho ao Japão do Ministro da Educação, Fernando Haddad, no
dias 6 e 7 de abril, ocasião em que foi assinado, com o Ministro da
Educação japonês, Kenji Kosaka, o Memorandum Bilateral sobre
Educação. O instrumento, amplo e genérico em seus propósitos,
estabeleceu os parâmetros para a cooperação nessa área, entre os
quais: o intercâmbio de peritos dos dois países nos campos, entre outros,
de tecnologias de informação, educação à distância, treinamento de
professores e reconhecimento de currículos. No tocante à comunidade
brasileira no Japão, enfatizou a necessidade de promover, por meio da
educação, a melhor integração dos imigrantes naquele país. O Ministro
202
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Haddad esteve ainda em Nagóia para encontros com representantes
de escolas e da comunidade, para ouvir suas reivindicações, bem como
para relatar as medidas que o Governo vinha adotando a fim de apoiar
o ensino das crianças brasileiras.
O breve relato acima não pretende – e nem poderia fazê-lo,
pois não é esse o objetivo do presente estudo – abarcar todos os
temas e iniciativas adotados, pelos governos dos dois países, para
responder a um dos principais anseios da comunidade brasileira no
Japão, que é a educação de seus jovens. O registro dessas reuniões,
bem como a descrição mais pormenorizada do tema no Capítulo 3,
servem, principalmente, para ilustrar como o Estado brasileiro tem
procurado, e em larga medida conseguido, implementar medidas
inovadoras e concretas de apoio nessa área a sua população no exterior.
O empenho do Governo, tanto por intermédio de suas representações
oficiais no Japão, como ponto focal e de ligação entre a comunidade e
as autoridades locais, como na permanente colaboração do Ministério
da Educação, tem logrado fazer com que as autoridades japonesas
também encarem a questão da educação dos jovens brasileiros não
apenas como um remédio para conter o problema da delinqüência
juvenil, mas também como instrumento para promover a integração
não-impositiva de uma comunidade estrangeira em sua sociedade.
5.2.2 – GRUPO DE TRABALHO SOBRE PREVIDÊNCIA SOCIAL
Foi visto, no subcapítulo 3.3, que a baixa participação de
imigrantes brasileiros no sistema previdenciário nipônico decorre de
dois fatores principais: de um lado, a relutância dos próprios
trabalhadores e de seus empregadores diretos, os empreiteiros, em
pagar a contribuição financeira ao seguro nacional, o Shakai Hoken,
e, do outro, a falta de fiscalização efetiva por parte das empresas
contratantes e autoridades japonesas sobre o cumprimento das normas
trabalhistas no setor marginal de mão-de-obra, os empregados
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
203
temporários. A primeira iniciativa para tentar resolver a falta de amparo
previdenciário dos brasileiros no Japão data de 1996, quando foram
realizadas reuniões entre o Itamaraty e o Ministério da Previdência e
Assistência Social (MPAS), a fim de examinar a viabilidade de um
mecanismo pelo qual aqueles trabalhadores, residentes no exterior,
pudessem inscrever-se na previdência brasileira. O fundamento legal
dessa iniciativa era a Portaria MPAS no. 2.795, de 22/11/1995, que
estabeleceu, em seu artigo 1º :
O brasileiro residente e domiciliado no exterior poderá inscrever-
se na Previdência Social Brasileira, na condição de assegurado
facultativo, desde que não esteja vinculado à legislação
previdenciária do país de domicílio ou do país contratante, e não
esteja enquadrado nas disposições do art. 12 da lei no. 8.212/
91
190
.
Procedeu-se, assim, à implementação de um projeto para atrair
os brasileiros residentes no Japão à previdência brasileira, por meio de
sua inscrição, nas repartições consulares, como “assegurados
facultativos”. Os benefícios contemplados seriam auxílio-doença, auxílio
reclusão, aposentadoria por invalidez, idade ou tempo de serviço e
pensão por morte para seus dependentes. O próprio Ministro da
Previdência da época, Reinaldo Stephanes, viajou ao Japão para dar
maior divulgação à iniciativa. Rapidamente, no entanto, aquele órgão
reconheceu a inviabilidade da operação, tendo em vista que o
assegurado, sob esse plano, teria direito, por exemplo, ao auxílio
doença, ou auxílio por invalidez, que exigiriam a emissão de laudo por
médico credenciado pela Previdência. Além disso, não ficou claramente
determinado como se daria o recolhimento das contribuições mensais.
Em razão dessas limitações, o projeto foi desativado.
Em fins de 1997, a Embaixada em Tóquio começava a procurar
solução alternativa para a proteção social dos trabalhadores brasileiros.
No non-paper encaminhado ao Gaimusho em novembro daquele ano,
204
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
solicitava-se das autoridades japonesas uma fiscalização mais rigorosa
sobre empregadores, no sentido de que inscrevessem seus empregados
no seguro nacional, Shakai Hoken, ou que se permitisse aos
empregados, pelo menos, continuar contribuindo para o seguro saúde
municipal, o Kokumin Kenko Hoken. Tais reivindicações, contudo,
não encontraram eco entre as autoridades japonesas.
No final de 2002, no contexto da reunião de consultas políticas
bilaterais Brasil –Japão realizadas em Brasília, o assunto, por sugestão
da Embaixada, foi abordado sob outro enfoque, qual seja, o da
assinatura de um acordo bilateral sobre matéria previdenciária
191
. Por
esse mecanismo, seriam reconhecidos o tempo trabalhado e valores
contribuídos nos dois países e os benefícios, no caso da aposentadoria,
pagos proporcionalmente pelos sistemas para os quais houve
contribuição. A delegação japonesa, na ocasião, mencionou que seu
país já havia assinado acordos desse gênero com a Alemanha, França
e Reino Unido. À luz da reação favorável da delegação japonesa, que,
inclusive, encaminhou ao Itamaraty cópia do acordo firmado com o
Reino Unido, foi solicitada ao Ministério da Previdência Social a
elaboração de minuta de acordo para ser submetida ao governo japonês.
O Brasil, à época, já havia firmado acordos dessa natureza com
Argentina, Cabo Verde, Chile, Espanha, Grécia, Itália, Luxemburgo,
Portugal e Uruguai.
A proposta foi formalmente encaminhada ao Gaimusho por
ocasião da I Reunião de Coordenação Consular, em junho de 2003.
Mereceu, no entanto, resposta interlocutória por parte da delegação
japonesa, que se limitou a tomar nota e a afirmar que iria examinar o
texto proposto. Na visita do Subsecretário-Geral de Cooperação e
das Comunidades Brasileiras no Exterior no ano seguinte, o tema foi
novamente abordado. A resposta do Diretor-Geral da América Latina
do Gaimusho, Embaixador Sakada, na ocasião, foi a de que, embora
a proposta brasileira tivesse sido discutida com o Ministério do Trabalho,
Saúde e Previdência, já estavam programadas negociações similares
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
205
com a França, Bélgica, Canadá e Austrália e que, diante dessa “lista
de espera” não se poderia estabelecer calendário para a discussão
formal com o Brasil sobre um acordo previdenciário
192
. Tal resistência
era compreensível, pois subsistia o receio de que um acordo dessa
natureza fosse financeiramente desvantajoso para o Japão, tendo em
vista o reduzido número de potenciais contribuintes japoneses no Brasil
e o desejo da maioria dos brasileiros de algum dia para cá regressar, e
assim drenar ainda mais os cofres da previdência nipônica, já deficitária
em função da evolução demográfica negativa daquele país.
Esses mesmos argumentos foram reiterados pela delegação
japonesa na II Reunião de Coordenação Consular, realizada em abril
de 2005. Antes de entrar na discussão de facto de um texto de acordo,
manifestou que seria preciso conhecer melhor o sistema previdenciário
brasileiro. Assim como em outros encontros em que o assunto foi
discutido, e embora não declarada publicamente, era visível a
desconfiança nipônica com relação à confiabilidade e lisura dos dados
processados pelo INSS, sobretudo em função dos episódios de fraudes
e outras irregularidades noticiados no Brasil.
Com o objetivo de atender a esse questionamento inicial do
lado japonês, a delegação brasileira apresentou projeto para a criação
de uma comissão, ou grupo de trabalho, para o intercâmbio de
informações sobre o funcionamento dos sistemas previdenciários dos
dois países. Propôs, nesse sentido, um cronograma de negociação que
previa uma reunião técnica, em Brasília, no mês de setembro, com
representantes dos ministérios da previdência dos dois países, seguida
de outras duas reuniões mais amplas (novembro de 2005 e março de
2006) para concretizar o acordo (no final de 2004, o Brasil adiantara
uma segunda minuta de acordo para exame pelo lado japonês).
A proposta foi parcialmente aceita pelo Gaimusho e, no quadro
dos instrumentos que foram assinados na visita do Presidente Luiz Inácio
Lula da Silva ao Japão no mês seguinte, foi incluída no “Programa
Conjunto Relativo às Comunidades Brasileiras no Japão”, acordado
206
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
pelos dois mandatários, menção à primeira reunião técnica do grupo
de trabalho em 19 e 20 de setembro de 2005. Permanecia, no entanto,
a posição japonesa de que tal anuência em trocar informações sobre
os respectivos sistemas previdenciários não implicava qualquer
aceitação em iniciar negociações sobre um acordo formal.
Tal postura evidenciou-se, mais uma vez, na reunião do Grupo
de Trabalho, realizada em Brasília, em 19 e 20 de setembro. Logo
no início do encontro, a delegação nipônica deixou claro que seu
propósito não era o de “assinatura de acordo, mas sim o
aprofundamento das informações sobre os sistemas
previdenciários”
193
. Quando sugerida, pelo lado brasileiro, a criação
de um mecanismo para a melhor fiscalização, pelos consulados
japoneses no Brasil, dos contratos de trabalho apresentados pelos
potenciais emigrantes, com vistas a assegurar o pleno conhecimento
das normas e direitos trabalhistas naquele país, “a delegação japonesa
mostrou-se evasiva e desviou a apresentação sobre o tema a detalhes
técnicos e estatísticos sobre a concessão de vistos”
194
. Além disso,
durante a reunião trocaram-se informações sobre os sistemas
previdenciários, pagamentos de benefícios e outros dados
complementares, sem qualquer avanço quanto às linhas de um futuro
acordo bilateral e nem mesmo para o cumprimento do cronograma
de reuniões sugerido em abril, que previa novo encontro em novembro,
em Tóquio.
Em todos esses anos de discussão e de projetos para tentar
equacionar a falta de amparo previdenciário dos burajirujin no Japão,
a insistência e a prioridade política atribuídas pelo Governo brasileiro
encontraram, na contraparte nipônica, reduzida disposição para
efetuar qualquer progresso substantivo na matéria, que, visivelmente,
não era de seu interesse. É possível que tal impasse se tivesse
prolongado ainda por longo período, não fosse uma mudança na
postura japonesa sobre outra proposta de acordo apresentada pelo
Brasil, no campo da cooperação judiciária, como se verá a seguir.
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
207
5.3 – A COOPERAÇÃO JUDICIÁRIA
O primeiro instrumento bilateral firmado entre os governos do
Brasil e o Japão foi o Tratado de Amizade, de Comércio e de
Navegação, assinado em Paris em 5 de novembro de 1895, que
estabeleceu as relações políticas, diplomáticas e comerciais entre os
dois países. O segundo, quarenta e cinco anos mais tarde, foi o Acordo
sobre Assistência Judiciária entre o Brasil e o Japão, concluído por
troca de notas em 23 de setembro de 1940, no Rio de Janeiro. Rezava
o objetivo precípuo do acordo:
O Governo do Japão e o Governo dos Estados Unidos do Brasil
concordam em estabelecer entre os tribunais dos dois países
mútua assistência judiciária em matéria civil, na base de
reciprocidade e no quadro das disposições legais internas
respectivas, para efeitos de notificação de atos judiciários e da
execução das cartas rogatórias que se referem à obtenção de
provas
195
.
O instrumento visava, principalmente, agilizar as demandas
judiciais originárias no Japão destinadas à colônia de duzentos mil
nipônicos que aqui viviam àquela época, pois era quase inexistente o
movimento de rogatórias no sentido contrário. Passados outros
cinqüenta anos, e a situação invertera-se por completo. No final do
século passado, eram mais de duzentos mil burajirujin vivendo no
Japão, sobre os quais recaía número crescente de ações emanadas
dos tribunais brasileiros, principalmente na área do direito de família,
com poucos pedidos da justiça japonesa para serem tramitados no
Brasil. Apesar da vigência do Acordo de 1940, contudo, as
características peculiares do ordenamento jurídico interno do Japão
não asseguravam, a contento, a execução das cartas rogatórias
expedidas no Brasil, o que levou, como será visto abaixo, à proposta
brasileira de revisão daquele instrumento
196
. Além de buscar a
208
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
atualização desse Acordo, voltado sobretudo para a área de direito
civil, o Governo brasileiro, diante da presença de tão numerosa
comunidade naquele país, também tinha interesse em firmar instrumentos
bilaterais na área penal, inclusive um tratado de extradição e outro
para a transferência de presos.
As iniciativas brasileiras que visavam a revisão do Acordo de
1940 e a ampliação do escopo de cooperação em matéria jurídica
para incluir também a área penal foram motivadas, num primeiro
momento, pelo alto índice de cartas rogatórias que não vinham sendo
processadas pela justiça japonesa. Como destacou o telegrama da
Embaixada em Tóquio de 14 de outubro de 1998:
ocorre que o acordo bilateral sobre assistência judiciária data de
1940 e trata tão somente de matéria civil, sendo que um crescente
número de rogatórias recebidas versa sobre matéria penal.
Ademais, um grande número dessas rogatórias não é cumprido
(neste ano, até a presente data, das 164 recebidas, 73 foram
restituídas pela justiça local sem providências). Nessas condições,
permito-me sugerir que seja estudada a conveniência de
proceder-se oportunamente à atualização do instrumento bilateral
sobre cooperação judiciária em matéria civil, bem como a
negociação com o Japão de acordo com a mesma finalidade em
matéria penal
197
.
A proposta da Embaixada foi endossada pela Secretaria de
Estado, que prontamente remeteu cópias de acordos firmados pelo
Brasil com os Estados Unidos (Acordo de Assistência Judiciária
em Matéria Penal, de 14/10/1997) e com a França (Acordo de
Cooperação Judiciária em Matéria Civil, de 28/05/1996), para
embasarem a negociação com as autoridades japonesas. Defendia
a área jurídica do MRE, ademais, a necessidade de assinatura de
um novo instrumento em matéria jurídica também pelo fato de que,
a rigor, o Acordo de 1940 não mais estaria vigente. De acordo
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
209
com a interpretação da Secretaria de Estado à época: “[segundo]
o Artigo 7, Capítulo IV do Tratado de Paz com o Japão, de 08/09/
1951, são considerados derrogados os tratados bilaterais assinados
com o Japão antes da guerra e que não tenham sido objeto de
notificação no período de um ano a partir da entrada em vigor do
Tratado de Paz”
198
. A caducidade do Acordo, contudo, não se
confirmou, pois as próprias autoridades japonesas apresentaram
cópia de Nota Diplomática da Embaixada, de 23/02/1953, assinada
pelo Embaixador Julio Augusto Carneiro-Barboza, em que se
declarava que o Governo brasileiro “considera[va] em vigor” o
Acordo de 1940, nota esta que não se encontrava nos arquivos da
Embaixada ou da Secretaria de Estado
199
.
A gestão da Embaixada junto ao Gaimusho foi, dessa forma,
realizada em maio de 1999, “para manifestar ... a disposição brasileira
de negociar um novo acordo de cooperação judiciária em matéria civil,
como forma de ... adequar a moldura legal bilateral específica à nova
realidade do relacionamento bilateral ... e que o momento também era
propício para a adoção de um acordo em matéria penal.” A reação
inicial do Gaimusho (representado pelo Diretor-Geral do Departamento
da América Latina e Caribe, Tomoyuki Abe) foi de que, efetivamente,
seria desejável a adoção de um novo texto na área jurídica bilateral,
mas que a preferência do governo japonês seria no sentido de preservar
o instrumento vigente e procurar contornar, de maneira casuística, os
problemas práticos decorrentes de sua aplicação, concentrados na
localização dos requeridos das cartas rogatórias
200
. Já nessa primeira
de muitas ocasiões em que o tema da cooperação judiciária seria
levantado, manifestava-se a resistência da chancelaria nipônica em
aprofundar o tratamento de um possível acordo bilateral, tornando
proféticas as palavras do Embaixador do Brasil à época, Fernando
Reis, em seu relatório sobre o encontro: “... antevejo que, caso o lado
japonês aceite rever o Acordo de 1940, esse processo será certamente
demorado”
201
.
210
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
A ausência de reação às propostas brasileiras, e as continuadas
dificuldades em fazer cumprir, no Japão, o crescente volume de
demandas judiciais (38.5% das cartas rogatórias em 2000, das quais
50% se referiam a ações de alimentos, foram restituídas sem
providências), suscitou nova instrução da Secretaria de Estado, no
final do ano seguinte, no sentido de reiterar o interesse na negociação
de novos instrumentos de cooperação judiciária, além de propor um
acordo de extradição (com base em modelo de acordo firmado com a
Austrália em 22/08/1994)
202
. Mais uma vez, o Gaimusho não
manifestou qualquer disposição para discutir a matéria na amplitude
desejada pelo lado brasileiro, conforme novo relato do Embaixador
em Tóquio: “estimo que poderá persistir a baixa receptividade das
autoridades locais... dada a tradicional resistência nipônica à negociação
de acordos internacionais e sua preferência ... no sentido de dar solução
ad hoc a esse tipo de questão”
203
.
O mesmo diálogo infrutífero repetiu-se poucos meses mais
tarde, quando, novamente instruída pela Secretaria de Estado, a
Embaixada fez gestão junto ao Gaimusho para conhecer a reação às
propostas até então apresentadas, inclusive sobre o envio de delegação
do Ministério da Justiça para tratar dos temas com seu homólogo
nipônico
204
.
A indesejável – da perspectiva brasileira – falta de progresso
nesses entendimentos contrapunha-se ao número cada vez maior de
demandas judiciais que o Brasil encaminhava aos tribunais japoneses.
De acordo com registros da Embaixada em Tóquio, de 1995 até
outubro de 2006, foram encaminhadas 2.696 cartas rogatórias para
serem executadas no Japão, das quais a maioria (1.637) se referiam a
processos de citação judicial. Menos de 10% (247) versava sobre
matéria penal ou criminal, sendo a maioria no campo do direito de
família: ações de alimentos, 1.256; divórcio, 372; separação judicial,
276; reconhecimento de paternidade, 247 e guarda de menores, 114.
Das quase 2.700 rogatórias, contudo, apenas 1.006 (37%) haviam
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
211
sido cumpridas, enquanto 1.529 (57%) não o foram (as demais
encontravam-se em tramitação).
As reivindicações brasileiras, portanto, não se pautavam num
quadro normativo abstrato em matéria de direito. Ao contrário,
visavam encontrar solução concreta para situações humanas
particulares e reais. A própria natureza do processo migratório para
o Japão impunha, em muitos casos, pressões sobre a estabilidade
matrimonial ou familiar: maridos e pais que deixavam no Brasil
mulheres e filhos com a intenção de voltar, mas que terminavam por
fixar-se Japão abandonando-os; migrantes circulares que, entre idas
e vindas daquele país geravam filhos no Brasil e não os reconheciam;
cônjuges que simplesmente desapareciam no Japão e assim obrigavam
seus dependentes a regressar ao País por falta de apoio financeiro
ou para instauração de processos de separação e divórcio, enfim,
toda sorte de situações de desfazimento de relações pessoais que
exigiam mecanismos institucionais ágeis e eficazes para assegurar os
legítimos direitos dos reclamantes.
Nesse espírito, o Governo brasileiro voltou a insistir, nas
Reuniões de Coordenação Consular de 2003 e 2005, na necessidade
de rever e atualizar o Acordo de 1940, bem como de, paralelamente,
negociar outros instrumentos bilaterais na área penal, de extradição e
de transferência de presos. As respostas nipônicas, no entanto, eram
sempre evasivas, sob o argumento de que a preferência japonesa era
por arranjos multilaterais, como as Convenções da Haia sobre
Procedimento Civil, de 1954, e sobre Notificação Judicial e Extra-
judicial, de 1965, ou a Convenção de Estrasburgo sobre Transferência
de Apenados de 1983 (ratificada pelo Japão em 2003). Com relação
a um possível acordo sobre extradição, dizia a delegação japonesa,
naquelas reuniões, que o assunto não era considerado necessário ou
premente. Com efeito, enquanto o Brasil já assinou 21 acordos bilaterais
nessa área, o Japão é signatário de apenas dois, com os Estados Unidos
(1978) e República da Coréia (2002).
212
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Passados sete anos de discussões oficiais sobre a conveniência
de se celebrarem acordos bilaterais, com o objetivo de estabelecer um
novo enquadramento jurídico que melhor assistisse e protegesse a
população brasileira no Japão, praticamente avanço algum foi registrado.
A ausência de resultados tangíveis deveu-se, além da lentidão e apego
à pormenorização que tradicionalmente caracterizam a ação
negociadora nipônica, a uma avaliação de que: a) o Japão pouco se
beneficiaria de tais instrumentos, à luz do reduzido número de seus
nacionais expatriados, e b) a comunidade brasileira não se estabeleceria
definitivamente naquele país e que, portanto, não haveria necessidade
de singularizar, ou tornar prioritário, o tratamento judicial que lhe era
imposto para além das normas consagradas domesticamente.
As relações entre países, contudo, nem sempre refletem
exclusivamente os interesses maiores, políticos ou econômicos dos
Estados, na qualidade de entidades jurídicas. Às vezes, fatos ou
episódios, ainda que menores, podem ter a força de influenciar a
maneira como se desenvolvem entendimentos entre agentes nacionais.
Um trágico acidente de trânsito ocorrido na cidade de Kosai, próxima
a Hamamatsu, província de Shizuoka, em outubro de 2005, causado
por suposta imprudência de uma motorista brasileira e que resultou na
morte de uma pequena menina japonesa de apenas dois anos, foi o
catalisador para que as negociações entre Brasil e Japão nas áreas
jurídica e previdenciária tomassem novo rumo, agora por iniciativa e
insistência daquele governo.
No dia 17 de outubro de 2005, a brasileira Patrícia Fujimoto,
segundo o relato policial, teria avançado um sinal e se chocado com o
veículo em que se encontrava a menina Riko Yamaoka, que foi jogada
para fora do carro e teve morte imediata
205
. Antes de ser intimada a
prestar depoimento, contudo, a motorista embarcou de volta para o
Brasil. Não foi o primeiro caso desse tipo. De acordo com dados da
Agência Nacional de Polícia do Japão, até 2004, setenta e um
brasileiros suspeitos de terem praticado crimes teriam deixado o país
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
213
para não serem processados. O incidente envolvendo Patrícia Fujimoto
talvez tivesse sido apenas mais uma infeliz e marginal estatística, como
as demais envolvendo brasileiros, não fosse a ação pública tomada
pelos pais da jovem vítima. Com a participação de outros parentes de
vítimas dos “fugitivos” brasileiros, o casal Yamaoka organizou o que
veio a ser conhecida como a “campanha das vítimas dos criminosos
brasileiros”, cujo objetivo principal era o de exigir do governo nipônico
a assinatura de um acordo de extradição com o Brasil, a fim de que os
acusados foragidos pudessem ser julgados naquele país. O movimento
ganhou ampla repercussão pública, inclusive no Brasil, principalmente
pelo fato de ter reunido mais de 260.000 assinaturas – entre as quais
as de muitos brasileiros – em abaixo-assinado entregue ao Ministério
dos Assuntos Estrangeiros em agosto de 2006.
Às primeiras sondagens do Gaimusho sobre a disposição do
Governo brasileiro para celebrar um acordo de extradição, a
Embaixada, formal e informalmente, respondeu que: a) a Constituição
Brasileira, assim como a Lei de Extradição do Japão, vedam a
extradição de nacionais
206
e b) o Brasil, que jamais defendeu a
impunidade de seus cidadãos, vinha propondo, desde 2000, a
celebração de um instrumento dessa natureza, para definir as formas
em que foragidos pudessem ser julgados no país de sua nacionalidade,
por crimes praticados no outro, sob a forma do modelo proposto
naquele ano (Acordo de Extradição firmado com a Austrália), que
explicitava, inter alia:
Artigo 5
Extradição de Nacionais
1. A Parte requerida não será obrigada a conceder a extradição
de uma pessoa que seja seu nacional, mas a extradição de seus
nacionais estará sujeita à legislação aplicável desse Estado.
2. Quando uma Parte recusar a extradição com base no
parágrafo 1 deste artigo, deverá submeter o caso a suas
autoridades competentes a fim de que possam ser instaurados
214
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
os procedimentos para julgamento da pessoa com relação a todos
e quaisquer crimes pelos quais esteja sendo solicitada a
extradição. A referida Parte informará à Parte requerente sobre
qualquer ação empreendida e o resultado de qualquer processo.
A nacionalidade será determinada no momento em que o crime,
pelo qual a extradição for solicitada, tenha sido cometido.
Ao mesmo tempo, nos encontros com representantes do
governo japonês ao longo de 2006, tanto em Brasília como em Tóquio,
foi reiterado aos interlocutores nipônicos que um possível acordo de
extradição precisaria, necessariamente, integrar um conjunto mais amplo
de medidas ou instrumentos formais que também respondessem aos
anseios da comunidade brasileira no Japão, principalmente nas áreas
de direito civil e previdência social. Em reunião realizada na Secretaria
de Estado, em 24 de outubro de 2006 entre diplomatas das Divisões
Jurídica (DJ) e de Assistência Consular (DAC) com diplomata da
Embaixada do Japão, foi- lhe transmitido:
o interesse brasileiro em retomar o processo de negociação de
um acordo com o Japão sobre previdência social ... [e] enfatizou
igualmente a necessidade de que futuras reuniões tenham o
objetivo concreto de chegar à conclusão de um texto final de
acordo.... Lembrou o interesse do governo brasileiro em negociar
também acordo sobre cooperação judiciária em matéria civil,
que deve ocorrer paralelamente à negociação dos acordos de
previdência social e de cooperação em matéria penal, com vistas
à assinatura conjunta de instrumentos nos três âmbitos
207
.
Em resposta, o diplomata nipônico transmitiu “a concordância
e a disposição de seu governo para negociar, simultaneamente ao acordo
de extradição, tratados de previdência social e de cooperação jurídica
em matéria civil”
208
. “Simultaneamente”, na ótica nipônica, contudo,
não visava necessariamente negociação paralela com o mesmo ritmo
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
215
ou intensidade nas três áreas, como ficou patente em nota verbal
passada pela Embaixada do Japão ao Ministério das Relações
Exteriores em 1º de novembro de 2006:
O lado japonês, devido à importância de resolver os problemas
ligados à fuga de criminosos entre o Japão e o Brasil, considera
que deve ser realizada o mais rápido possível a conversação
sobre dois temas prioritários que são: a assinatura do Tratado de
Extradição, e a persecução criminal no Brasil sobre os casos
específicos, através da cooperação entre os órgãos responsáveis
pela investigação de ambos os países. O lado japonês, levando
em consideração a concertação feita pelo lado brasileiro até o
momento, está disposto a visitar o Brasil para realizar a
conversação no período entre o dia 12 e 14 de dezembro deste
ano.
Além da extradição, o lado japonês está disposto para realizar
na conversação acima referida, uma troca de opiniões sobre as
cooperações jurídicas internacionais em outras áreas, tais como
a sobre a matéria cível, se o lado brasileiro assim desejar. Em
relação à previdência social, o lado japonês lembra que já existe
um grupo de trabalho sobre esse tema, e aguarda a proposta
brasileira sobre a data da segunda reunião prevista inicialmente
para maio deste ano, que foi adiada em razão da conveniência
do lado brasileiro, com o intuito de prosseguir a proveitosa troca
de informações no mesmo grupo de trabalho sobre previdência
social
209
.
Ficava patente, assim, o intuito negociador japonês de procurar
desvincular o tratamento do tema extradição das demais áreas de
interesse brasileiro, que, ao contrário da declarada disposição para
assinar acordo nessa área penal, limitaria a condução dos entendimentos
nas áreas de cooperação judiciária em matéria civil e previdência social
a “troca de opiniões” e “troca de informações”.
216
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
A pronta reação do Governo brasileiro, expressa por meio de
nota à Embaixada do Japão do dia 7 do mesmo mês, reiterou a posição
de que as três áreas deveriam ser discutidas no mesmo compasso e
intensidade:
a) O Governo brasileiro não considera conveniente a realização
de reunião na forma e datas propostas pelo Japão, uma vez
que a agenda tentativa é inteiramente assimétrica,
privilegiando os interesses de uma parte em detrimento dos
da outra;
b) o Governo brasileiro considera que qualquer troca de
informações sobre tratados, se ainda necessária, pode ser
feita por via diplomática ... ;
c) Como é do conhecimento da Embaixada, o Governo
brasileiro reiterou, por diversas vezes, tanto em Brasília
quanto em Tóquio, que também deve atender ao imperativo
da opinião pública, com a negociação e assinatura de
tratados na área de cooperação em matéria civil e
previdenciária
210
.
O teor das duas notas acima evidenciava, mais uma vez, as
distintas e ainda distantes posições negociadoras das duas partes no
tocante à celebração de acordos bilaterais em matéria jurídica e
previdenciária. De um lado, o Japão insistia em limitar o escopo de
ação efetiva e imediata à questão da extradição. O Brasil, do outro,
mantinha firme seu propósito de assegurar a mesma disposição para a
conclusão de instrumentos oficiais nas áreas de interesse prioritário de
sua comunidade no Japão.
Apesar do ritmo lento que tem caracterizado, desde 1999, as
tratativas nos campos jurídico e previdenciário, que só adquiriram algum
impulso visível diante da pressão da opinião pública japonesa para a
celebração de um acordo de extradição, é possível que se possa, num
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
217
prazo não muito distante, chegar a uma posição de contemporização
entre os dois governos. Outros atores na sociedade nipônica poderão
também contribuir para uma flexibilização da posição daquele governo,
entre os quais a Federação Patronal Japonesa, Nippon Keidanren,
que divulgou, em outubro de 2006, relatório que recomendava a
celebração de acordos internacionais de previdência. Nesse documento,
o Brasil é apontado como o terceiro dentre os países preferenciais
para a negociação desse tipo de instrumento, atrás da Itália e República
Tcheca
211
. Segundo a estimativa apresentada, a obrigação das
empresas japonesas de contribuírem tanto para a previdência nacional
como para a do país onde trabalham seus funcionários (dupla tributação
previdenciária) representou, em 2005 e apenas no caso do Brasil, um
ônus de ¥ 2,14 bilhões por ano (US$ 19.43 milhões), sem qualquer
retorno futuro em termos de benefícios a seus empregados quando
voltarem para o Japão.
Como avaliou a Embaixada em Tóquio, a necessidade com
que se defronta o governo japonês de responder à aparente impunidade
de estrangeiros acusados de crimes naquele país “abre uma janela de
oportunidade para que sejam negociados instrumentos que contemplem
o interesse japonês ... e as necessidades da comunidade brasileira...
Tal janela tem como horizonte a celebração do centenário da imigração
japonesa no Brasil, em 2008, que ensejará a visibilidade política e
oportunidade histórica “
212
.
5.4 – A ATIVIDADE CONSULAR
Nas seções anteriores, foram examinadas as iniciativas mais
amplas adotadas pelo Governo brasileiro para a assistência e apoio a
sua comunidade radicada no Japão, principalmente nas áreas
educacional, previdenciária e jurídica. Foram, e continuam sendo,
políticas que visam responder a uma situação particular em que se
encontram os burajirujin, em comparação com outras comunidades
218
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
brasileiras expatriadas, seja em termos das dificuldades de adaptação
e inserção na sociedade e cultura nipônicas, seja de obstáculos de
ordem trabalhista ou no cumprimento de outros processos legais
impostos pelas autoridades japonesas.
O afinco com que a atuação governamental é desenvolvida no
Japão para atender às necessidades específicas e particulares daquela
população brasileira, pode ser medida, nesse sentido, pela existência,
no conjunto de atribuições da Embaixada em Tóquio, do Setor de
Comunidades, chefiado por diplomata de carreira e incumbido, desde
1997, de coordenar e negociar, junto às autoridades japonesas, as
diversas propostas políticas em defesa dos interesses da comunidade
burajirujin. No conjunto das representações diplomáticas brasileiras
sediadas em capitais que também contam com repartição consular,
aquela missão talvez seja a única a manter um diálogo político direto e
permanente com a área consular da Secretaria de Estado.
A presença crescente da população brasileira no Japão, a partir
do começo da década de 1990, exigiu não apenas a implementação
de inovadoras políticas de assistência, tal como acima descritas, mas
também a ampliação e o aperfeiçoamento das práticas tradicionais de
atendimento consular propriamente dito. Já nos primeiros anos daquela
década, verificou-se que o setor consular da Embaixada em Tóquio,
que absorvera as funções dos Vice-Consulados em Kobe (extinto em
1985), em Iocoama (1990) e do primeiro Consulado-Geral na capital
japonesa (1985-86) e cuja principal função, até então, era a de emitir
vistos, não mais reunia condições funcionais de atender à nova demanda
por serviços notariais e outros que demandava a população brasileira
que se instalava naquele país.
Atendendo a recomendação da Embaixada, a Secretaria de
Estado determinou a tomada as medidas administrativas necessárias
para a abertura de novo ponto de atendimento consular, voltado
precipuamente para assistir à população brasileira. Decidiu-se, em 1992,
pela abertura da nova repartição, no nível de Consulado-Geral, na
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
219
cidade de Nagóia, localizada na principal região industrial do Japão.
Em função de limitações orçamentárias da Secretaria de Estado, no
entanto, as instalações só foram inauguradas, em sede própria, no ano
de 1994. Mesmo com um centro de atendimento alternativo em Nagóia
(em cuja jurisdição reside cerca de 60% da comunidade brasileira), o
setor consular da Embaixada em Tóquio continuava encontrando
dificuldades operacionais para responder, a contento, à demanda da
população presente em sua circunscrição. Como ressaltou Maria
Edileuza Reis: “Urgia, assim, equipar adequadamente as repartições
oficiais no país de forma a assistir e apoiar os nacionais em seus
problemas tão numerosos quanto complexos”
213
. Determinou a
Secretaria de Estado, dessa forma, a reabertura do Consulado-Geral
em Tóquio, que foi inaugurado em meados de 1995, no bairro de
Gotanda, estrategicamente situado em frente à estação da principal
linha ferroviária que dá acesso aos principais trens interurbanos do
país.
Não é propósito desta seção examinar, detalhadamente, a
evolução de todo o elenco de atos notariais rotineiros processados
pelas repartições consulares no Japão desde a instalação destes
Consulados-Gerais. Convém, no entanto, repassar seus números mais
expressivos, a fim de que se possa ter uma idéia da dimensão dos
serviços prestados pelos dois Consulados-Gerais ao longo dos últimos
seis anos.
Nesse período, ou seja, de 2000 a 2005, a população brasileira
no Japão, de acordo com dados do Ministério da Justiça nipônico,
cresceu quase 19%, de 254.394 para 302.080 nacionais. Conforme
assinalado no Capítulo 2, esse crescimento foi bem mais significativo
nas 30 províncias do centro-sul, sob a jurisdição do Consulado-Geral
em Nagóia, onde o crescimento registrado na comunidade burajirujin
foi de aproximadamente 30%, contra um acréscimo de apenas 1%
naquela atendida pelo Consulado-Geral em Tóquio, responsável pelas
17 províncias da região centro-norte
214
. Tal crescimento da população,
220
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
evidentemente, acarretou um aumento na demanda por serviços
consulares, como demonstra a tabela a seguir (Nagóia = NG e
Tóquio=TQ):
Tabela 27 - Resumo da Atividade Consular nos
Consulados-Gerais no Japão 2000-2006
Fonte: Arquivos dos Consulados-Gerais em Nagóia e Tóquio
Os dados acima demonstram que a atividade consular nas duas
repartições tem acompanhado o ritmo de crescimento da população
brasileira em cada jurisdição. Conquanto o volume de serviço em Tóquio
se tem mantido relativamente estável, em Nagóia o processamento de
documentos e atos notariais tem crescido, grosso modo, na proporção
da expansão da comunidade naquela região.
Dois fatos chamam atenção nas estatísticas acima. O primeiro
é o repentino aumento no número de passaportes expedidos em 2001-
2002, que reflete a natureza cíclica na demanda por este serviço, em
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
221
função do período de validade do documento. Como nos primeiros
três anos da emigração autorizada pelo governo japonês (1990-1992)
chegaram àquele país cerca de 150.000 brasileiros, a necessidade de
renovação de seus passaportes (então com validade de dez anos) deu-
se no período inicial da presente década (2000-2002), juntamente com
aqueles chegados posteriormente e sujeitos à nova vigência do
passaporte de cinco anos, instituída pelo Departamento de Polícia
Federal em 1996. A recorrência deste comportamento já se nota
também nos números preliminares relativos a 2006, projetando-se um
aumento de 28% no volume de emissões em comparação à média dos
dois anos anteriores. Pode-se dizer, também, que esse expressivo
quantitativo de expedição de passaportes no Japão (seja a renovação
ou primeira emissão para filhos nascidos naquele país) é indicativo de
uma permanência mais prolongada da população, o que corrobora,
em parte, as estimativas sobre este tema apresentadas na Seção 2.2.6.
O segundo fato que se destaca no levantamento acima é o súbito
incremento no número de procurações emitidas em 2006. Apenas no
primeiro semestre deste ano foram processados praticamente o mesmo
volume de instrumentos, públicos ou particulares, do que o total de
anos anteriores. Em Tóquio, a média no período 2000 a 2005 foi de
3.625 procurações por ano; a projeção para 2006 é de 6.568. Tal
movimento decorreu de exigência instituída pelas autoridades
imigratórias nipônicas em abril de 2006 para a renovação dos vistos
de permanência dos imigrantes nikkeis e seus dependentes. Por essa
nova regulamentação, os pedidos de renovação de vistos teriam de
ser acompanhados de atestado de antecedentes criminais, emitido no
Brasil, tanto pela Polícia Federal como pela Polícia Civil do Estado de
origem do interessado. A motivação por trás dessa norma foi o
assassinato, em novembro de 2005, em Hiroshima, de uma menina
japonesa, de sete anos, por imigrante peruano. No curso das
investigações policiais em torno do caso, foi verificado que o cidadão
em questão havia ingressado no Japão com passaporte falsificado e
222
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
que, sob registro de sua verdadeira identidade, havia cometido atos
criminosos no Peru
215
. Assim, em razão de um trágico, porém isolado,
ato praticado por um imigrante sul-americano, toda a comunidade
nikkeijin viu-se obrigada a cumprir nova e custosa exigência burocrática
para regularizar sua permanência no país, mediante a lavratura de
procurações (ao preço de R$ 20,00 ouro, ou US$ 20,00 cada) a fim
obter os referidos atestados junto às agências policiais federal e estadual.
A atividade consular, contudo, não se restringe exclusivamente
ao processamento, no exterior, das rotinas e atos notariais exigidos
pela legislação brasileira para a preservação da cidadania de seus
nacionais. A constatação, a partir do início da década de 1990, de um
expressivo contingente populacional assentado no exterior, que
enfrentava dificuldades tanto de adaptação como de acesso às
repartições governamentais, levou o Governo, no contexto do Programa
de Assistência a Brasileiros no Exterior, instituído em 1995, a
implementar inovadoras políticas de atendimento e de prestação de
serviços àquelas comunidades, cujas expressões maiores foram a
criação dos Consulados Itinerantes e Conselhos de Cidadãos.
Nos termos da regulamentação do Ministério das Relações
Exteriores, o principal objetivo do Consulado Itinerante é o de “levar
às comunidades brasileiras o serviço consular normalmente prestado
ao cidadão na sede do Posto”
216
. No Japão, tal serviço reveste-se de
particular utilidade não só pela dispersão da maioria da população
brasileira em regiões distantes das repartições consulares
217
, como
também pelo intenso regime de trabalho nas fábricas a que está sujeita
a maioria desses nacionais, o que os impede de procurar as repartições
consulares no seu horário de funcionamento normal durante a semana.
A primeira missão dessa natureza no Japão foi realizada pelo
Consulado-Geral em Nagóia, em abril de 1996, na cidade de Fukui,
em província do mesmo nome, aonde compareceram 100 brasileiros.
O Consulado-Geral em Tóquio, por sua vez, cumpriu sua missão
itinerante inaugural no ano seguinte, em Oizumi, província de Gunma,
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
223
cidade com maior percentual de brasileiros no Japão. Nesses eventos,
para onde se desloca uma equipe de servidores do Ministério e de
contratados locais, tem sido possível executar uma série de atos notariais
e expedição de documentos, como registros civis, legalizações e
procurações no mesmo dia. No caso de outros serviços, no entanto,
como passaportes, cadastramento de CPF e de títulos de eleitor,
alistamento militar etc., é apenas dada entrada no pedido do requerente,
para posterior processamento na sede da repartição.
Ao longo dos últimos dez anos, as missões itinerantes dominicais
empreendidas pelas duas repartições – entre 3 e 9 por ano – têm
recebido o reconhecimento e apoio das comunidades atendidas. Nas
cidades onde residem mais brasileiros, estas missões chegam a receber
a presença de mais de mil pessoas. Foram também realizados itinerantes
em cidades mais remotas, desde a ilha de Okinawa, no extremo sul do
arquipélago, até a de Hokkaido, ponto setentrional do país, onde foram
atendidas não mais do que 30 ou 40 pessoas. Nesses últimos dez
anos, o Consulado-Geral em Tóquio promoveu 53 missões itinerantes
e o de Nagóia, 52, atendendo, no total, mais de 40.000 cidadãos.
A realização do Consulado Itinerante, contudo, não se
circunscreve apenas à execução de rotinas consulares. Constitui,
também, valiosa oportunidade de interação mais próxima dos agentes
governamentais com a comunidade, para dela ouvir seus problemas,
sua percepção das carências e obstáculos que enfrentam no cotidiano
japonês e também sugestões sobre como aprimorar o atendimento
consular. Além disso, e sobretudo nos últimos anos, têm-se agregado
aos itinerantes outras modalidades de prestação de serviços ao público
que a eles comparece. As próprias prefeituras nipônicas – em cujas
dependências muitas vezes se realizam as missões – têm enviado
representantes para oferecer aos brasileiros, em português, informações
sobre normas municipais, recolhimento de impostos e serviços sociais
a que podem recorrer. Organizações não-governamentais voltadas para
a comunidade burajirujin, como o Serviço de Assistência aos
224
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Brasileiros no Japão (SABJA) e a Criativos (entidade voltada, desde
1994, para a sensibilização de educadores e adolescentes nas questões
de prevenção das doenças sexualmente transmissíveis) também
acompanham essas “caravanas consulares” nos finais de semana para,
gratuitamente, prestar aconselhamento e orientação médica e
psicológica à população por meio de voluntários e especialistas
brasileiros. Cabe mencionar, ainda, a iniciativa recentemente
implementada pelo Consulado-Geral em Tóquio de, paralelamente à
atividade documental levada a cabo no itinerante, prestar, por meio de
palestras, informações mais abrangentes sobre a realidade da
comunidade expatriada. Entre os temas já abordados constam, por
exemplo, a questão da nacionalidade brasileira das crianças nascidas
no exterior a partir de 1994, a regulamentação das escolas brasileiras
e a certificação de diplomas escolares e normas brasileiras e japonesas
aplicáveis ao registro de casamento e processos de separação ou
divórcio. Em algumas ocasiões, também têm sido convidados
representantes de bancos brasileiros para orientar a comunidade sobre
formas de aplicação, no Brasil, dos recursos financeiros poupados no
Japão, para, por exemplo, a abertura de negócios próprios ou compra
de imóveis.
Foi introduzido, pelo Consulado-Geral em Tóquio, em julho
de 2002, um recurso de atendimento consular à população que se
pode chamar de intermediário, denominado “Posto Avançado”.
Identificadas três cidades próximas à capital de maior concentração
de brasileiros – Mitsukaido, na província de Ibaraki, Ota, em Gunma e
Ueda, em Nagano – foi estabelecida uma parceria com o Banco do
Brasil pela qual dois ou três funcionários do Consulado-Geral fazem,
uma vez por mês, plantão de um dia (geralmente às quartas-feiras) nas
agências bancárias naquelas cidades, apenas para recolher pedidos de
serviço, bem como entregar documentos solicitados no mês anterior.
Esses “mini-itinerantes” contribuem significativamente para reduzir o
afluxo de pessoas à sede da repartição em Tóquio (em cada Posto
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
225
Avançado são atendidos, em média, de 70 a 150 nacionais), ao mesmo
tempo em que poupam ao usuário uma onerosa viagem à capital, tanto
em termos dos custos de transporte como de perda de um dia de
trabalho.
A outra importante vertente da atuação consular para além do
balcão de atendimento foi a instauração, em 1996, dos Conselhos de
Cidadãos, em Tóquio e Nagóia. Institucionalmente, esses órgãos
deliberativos “constituem foro informal e apolítico de aconselhamento
… com o objetivo de encurtar as distâncias ainda existentes entre os
nacionais que vivem no exterior e a rede consular, estabelecendo a
ponte Governo/Sociedade Civil no exterior… devendo sua composição
refletir, tanto quanto possível, o universo da comunidade”
218
.
A evolução do trabalho dos dois conselhos ao longo de seus
dez anos de existência tem sido instrumento importante para a troca de
impressões e sugestões a respeito da realidade da comunidade no
Japão. Numa primeira fase, tal como apontado por Maria Edileuza
Fontenele Reis, suas atividades estavam voltadas para “estabelecer
um diagnóstico – que até então não existia – sobre as reais condições
da comunidade e suas carências em áreas como saúde, educação e
questões trabalhistas, entre outras, [porém] sem limitar a problemática
a ser tratada [que] produzisse, desde logo, resultados palpáveis”
219
.
Com efeito, aquelas primeiras deliberações e estudos promovidos,
sobretudo pelo Conselho de Tóquio, redundaram em pormenorizado
levantamento das origens das principais dificuldades enfrentadas pela
população burajirujin no Japão e que, por sua vez, vieram a embasar
os non-papers apresentados pela Embaixada ao governo japonês no
ano seguinte, “Problemas que Afligem a Comunidade Brasileira no
Japão”, conforme descrito na introdução do presente capítulo.
Nos anos que se seguiram, os Conselhos de Cidadãos de Tóquio
e Nagóia mantiveram reuniões periódicas, geralmente duas vezes por
ano, para a continuada discussão de temas afetos à comunidade.
Sediados em cidades com reduzida presença proporcional de
226
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
brasileiros, no entanto, nem sempre a representatividade desses órgãos
refletia a condição típica do nacional que vive no Japão. A maioria dos
membros do Conselho de Tóquio era de funcionários de bancos
brasileiros, ou de empresas como a Varig e Vale do Rio Doce, diretores
de escolas, representantes da mídia brasileira, estudantes universitários
bolsistas e também das entidades assistenciais, como o Serviço de
Assistência aos Brasileiros no Japão – SABJA. Raras eram as presenças
de líderes de associações comunitárias, de trabalhadores e operários
ou de comerciários brasileiros.
Essa constatação levou o Conselho de Tóquio, em particular, a
buscar, em 2006, um novo caminho para sua atuação. Como frisou o
relato da reunião de fevereiro, transmitido pelo Cônsul-Geral em Tóquio,
Renato Prado Guimarães, Presidente do Conselho:
… salientei a importância da contribuição passada do Conselho
para um mais preciso diagnóstico dos problemas da comunidade
brasileira. Vencida essa fase, e já estabelecido o virtual consenso
em torno da natureza e dimensão daqueles problemas, importante
seria agora o Conselho orientar-se para a discussão do que pode
ele fazer com vista à respectiva solução… Julgo em verdade
essencial dar uma vocação mais prospectiva e operacional ao
Conselho, evitando-se seu estancamento em discussões
repetitivas e estéreis
220
.
Sobre a questão da representatividade, o Presidente do
Conselho foi igualmente enfático:
… a referência à composição do Conselho … deu ensejo a que
se colocasse em discussão a questão de o Conselho, composto
basicamente de representantes residentes em Tóquio, ser ou não
ser representativo da comunidade brasileira disseminada em todas
as 17 províncias da jurisdição deste Consulado (tenho recebido
incômodos reparos a propósito, durante minhas visitas às
províncias, uma vez que em Tóquio se encontram apenas 4 a 5
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
227
mil dos aproximadamente 110.000 brasileiros da jurisdição). Como
não poderia deixar de ser, os membros do Conselho
reconheceram, sem hesitação e unanimemente, não serem
expressão cabalmente representativa de toda a comunidade de
brasileiros. Admitiram francamente faltar-lhes a sensibilidade e
informação adequadas para traduzir as necessidades e os anseios
dos compatriotas disseminados nas províncias
221
.
Com o propósito de buscar alternativas que pudessem corrigir
a reconhecida falta de representatividade do Conselho, foi proposta,
na mesma ocasião, sua ramificação, mediante a criação de conselhos
locais, ou provinciais, nas cidades de maior concentração de brasileiros.
Estes órgãos setoriais teriam por objetivo congregar, sempre sob
comando e orientação da autoridade consular, os representantes
efetivos da comunidade local, conhecedora, de fato, dos problemas e
aspirações daquela parcela específica de brasileiros. A reação da
Secretaria de Estado às duas propostas acima foi imediata e positiva,
comunicada ao Consulado-Geral nos seguintes termos:
A atribuição de uma feição mais institucional ao Conselho de
Cidadãos dessa jurisdição … bem reflete o espírito de
aproximação do Governo brasileiro para com as comunidades
brasileiras no exterior. Contribuirá, certamente, para que as
reuniões do Conselho produzam resultados práticos, que
ultrapassem o plano dos debates. Para esse fim, parece de todo
conveniente ampliar a representatividade do Conselho ao nível
regional
222
.
Sob esse novo horizonte de trabalho, o Consulado-Geral em
Tóquio, com o aval do Conselho de Cidadãos, buscou implementar
novas formas de ação para promover a aproximação com a
comunidade. Entre essas iniciativas, podem ser mencionadas:
228
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
i) a reformulação do sítio eletrônico da repartição na Internet
(www.consbrasil.org), tornando-o mais dinâmico e interativo,
com a prestação de informações sempre atualizadas a respeito
das atividades empreendidas, tais como consulados itinerantes,
encontros com autoridades provinciais japonesas e outros
eventos afins. Foram igualmente incluídos o recurso técnico
de preenchimento eletrônico de formulários consulares, a
criação de uma seção de “dúvidas freqüentes”, com
explicações detalhadas sobre o requerimento e processamento
de serviços e elaborada uma seção especial para crianças,
com jogos, brincadeiras e links temáticos;
ii) o início do programa de visita a Tóquio de alunos de escolas
brasileiras e japonesas, ocasiões em que, além de conhecerem
a capital do país (Museu de Tóquio e outros marcos históricos
e turísticos da cidade), são recebidos no Consulado-Geral e
na Embaixada, onde recebem informações sobre como se
processa a atividade consular e dados mais amplos sobre o
Brasil, que, em razão da longa permanência de várias dessas
crianças no Japão, muitos desconhecem, e
iii) a elaboração de uma “Cartilha Consular”. A preocupação
com a disseminação na comunidade de informações básicas
sobre serviços consulares e de recomendações essenciais à
adaptação no novo país já constava do programa de trabalho
do Consulado-Geral em Tóquio desde a década passada,
como o “Guia de Apoio ao Brasileiro no Japão”, folheto de 4
páginas lançado em 1996
223
. Desta feita, aquela repartição
buscou consolidar, em forma de livro, ou manual, todas as
informações necessárias à vida do brasileiro no Japão, tanto
no que se refere aos serviços consulares propriamente ditos,
como inclusão de listas de contatos úteis, entidades
assistenciais, normas trabalhistas, previdenciárias e fiscais,
regime de educação, entre outras. Essa publicação,
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
229
denominada “Cartilha Consular – Serviços Consulares e Guia
de Apoio aos Brasileiros no Japão”, em formato de bolso,
com 88 páginas, foi lançada em setembro de 2006. O texto
da cartilha também foi incluído no sítio eletrônico do
Consulado-Geral.
No que se refere aos conselhos regionais, vários contatos foram
mantidos, ao longo do primeiro semestre de 2006, com representantes
das comunidades das províncias de Gunma e de Nagano, com vistas a
definir a composição e atribuições dos novos órgãos deliberativos. O
primeiro desses Conselhos Regionais foi instalado na cidade de Oizumi,
em cerimônia realizada em 15 de julho, que contou também com a
presença do prefeito do município, Hiroshi Hasegawa.
Cabe aqui um aparte sobre a participação dessa autoridade
máxima do governo de Oizumi. O Prefeito Hasegawa foi eleito, para
seu primeiro mandato em 2001 sobre plataforma que advogava o
controle, e mesmo a redução, da presença de estrangeiros – sobretudo
brasileiros – naquela jurisdição, vistos, à época, como
“desestabilizadores” da harmonia social local. O progressivo
reconhecimento da contribuição dos nikkeijin à atividade econômica
da região (na qual se destacam as fábricas da Sanyo e da Subaru),
aliado a um paciente trabalho, pelo Consulado-Geral em Tóquio, de
aproximação política com aquele governo, redundou numa revisão da
visão oficial do prefeito em sua campanha de reeleição em 2006, na
qual defendeu os benefícios trazidos à coletividade pelos estrangeiros.
Relatou assim o Consulado-Geral em Tóquio a presença do prefeito
Hasegawa na sessão inaugural daquele Conselho de Cidadãos Regional:
O prefeito Hasegawa, notório por sua antipatia aos brasileiros (elegeu-
se com a plataforma acintosamente crítica de nossa presença na
cidade), parece haver consumado, na ocasião, sua “conversão” à
causa decasségui – o que pode contribuir significativamente para o
bem-estar futuro dos residentes em Oizumi
224
.
230
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
O Conselho de Oizumi foi incumbido de designar seus próprios
coordenadores para as diversas áreas de interesse daquela comunidade,
entre as quais educação, assistência social e relações com a prefeitura,
e seus membros foram designados em função de sua representatividade
e trânsito naquele meio regional: empresários, educadores, religiosos,
operários, além da Presidente da Associação das Escolas Brasileiras
no Japão, Julieta Yoshimura.
Ainda é cedo para medir a eficácia e capacidade de atuação
dessa pioneira iniciativa de arregimentação comunitária e mesmo de
conscientização política de um pequeno, porém emblemático, contingente
da população brasileira assentada no Japão. O sucesso do projeto – e
sua eventual expansão para outros centros – dependerá da consolidação
dos três objetivos a que se propõe este exercício: estabelecer um canal
institucional de comunicação entre a comunidade e as representações
do Governo brasileiro; facilitar e encorajar, mediante o respaldo oficial
conferido ao Conselho Regional, a discussão de temas e tópicos locais
atinentes aos burajirujin junto à autoridade municipal ou provincial e
fomentar, entre aqueles nacionais, um sentimento de auto-organização e
de defesa de seus próprios interesses, sem ter de necessariamente
depender da tutela ou intervenção de agentes diplomáticos ou consulares.
Poderá, finalmente, constituir o conceito de conselho regional o embrião
de outras propostas de assistência e de execução de serviços consulares,
que serão vistos no próximo capítulo.
5.5 – OS FOROS PARALELOS DE AÇÃO E
DEBATE SOBRE A COMUNIDADE BURAJIRUJIN
Nas seções anteriores deste Capítulo foram examinadas as
principais medidas que vem adotando o Executivo brasileiro, tanto na
esfera política como na consular, a fim de assistir e apoiar seus cidadãos
residentes no Japão diante das dificuldades com que se deparam em
seu cotidiano. O tratamento, o estudo e a busca de soluções para os
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
231
problemas percebidos no “fenômeno decasségui”, contudo, também
encontra, fora do âmbito do Ministério das Relações Exteriores,
entidades, grupos e associações que trabalham na busca de soluções
para os problemas de assimilação e adaptação dos burajirujin naquele
país. Selecionaram-se alguns exemplos, públicos e não-governamentais,
dessa atuação paralela que, de distintas maneiras, também contribuem
para a compreensão dessa realidade humana.
5.5.1 – A COMISSÃO PARLAMENTAR MISTA DE INQUÉRITO DA EMIGRAÇÃO
Por meio de requerimento datado de maio de 2005,
apresentado ao Presidente do Congresso Nacional pelo então
Senador Hélio Costa (PMDB/MG) e pelo Deputado João Magno
(PT/MG), foi solicitada a instauração de Comissão Parlamentar Mista
de Inquérito (CPMI) para “apurar os crimes e outros delitos penais
e civis praticados com a emigração ilegal
225
de brasileiros para os
Estados Unidos e outros países, e assegurar os direitos de cidadania
aos brasileiros que vivem no exterior”
226
. De iniciativa desses dois
parlamentares de Minas Gerais, cuja região de Governador Valadares
ganhou desditosa notoriedade como pólo de expulsão de emigrantes
– muitos dos quais ilegais – para os Estados Unidos, a CPMI estendeu
seu escopo de trabalho para incluir também as comunidades
brasileiras emigradas na Europa, Paraguai e Japão. A inclusão do
Japão nessa investigação legislativa é, até certo ponto, curiosa, na
medida em que o movimento emigratório para aquele país, salvo em
raríssimos e isolados episódios, sempre se realizou sob o regime da
legalidade e mesmo da indução oficial por parte do governo nipônico.
Não é o propósito do presente estudo examinar todo o trabalho
daquela Comissão – um relatório de 577 páginas (disponível no sítio
http://www.senado.gov.br/web/comissoes/CPI/Emigracao/
RelFinalCPMIEmigracao.pdf), mas sim aquilo que foi tratado com
relação à presença de brasileiros no Japão.
232
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
A CPMI iniciou essa análise com um breve histórico dos
movimentos migratórios dos japoneses para o Brasil no começo do
Século XX e as motivações, econômicas e políticas, que determinaram
a reversão desse fluxo, notadamente a partir da promulgação da revisão
da Lei de Controle da Imigração japonesa de 1990. Além de estudos
acadêmicos e registros oficiais brasileiros e japoneses, a Comissão
valeu-se também de audiência pública realizada em São Paulo, em 2
de dezembro de 2005, para ouvir de representantes da comunidade
nikkei sua percepção do “fenômeno decasségui” e da situação em
que se encontravam seus compatriotas no Japão. Em março de 2006,
representantes da Comissão, chefiados pelo seu Presidente, Marcelo
Crivella, realizaram missão ao Japão, onde participaram de reunião
com o Conselho de Cidadãos de Tóquio, com a presença do
Embaixador do Brasil, André Amado, de almoço de trabalho com
parlamentares nipônicos, de encontro com o Vice-Ministro da Justiça
e também com representantes dos Ministérios do Trabalho e da
Educação, além da Agência Nacional de Polícia japonesa
227
. Nessas
oportunidades, os parlamentares brasileiros, acompanhados por
membros da Embaixada ou do Consulado-Geral, essencialmente
reiteraram a posição e reivindicações brasileiras que constavam da
pauta de assuntos que já vinham sendo tratados pelas representações
diplomáticas e consulares, sobretudo nas áreas de educação, saúde,
relações trabalhistas, previdência social e criminalidade.
Além dos encontros oficiais, a missão parlamentar manteve
contato com a comunidade, em dois contextos opostos: realizou
audiência pública em Nagóia, para ouvir e debater questões sobre a
vida dos brasileiros no Japão, que contou, inclusive, com a presença
de professora e empreiteiro japoneses, e visitou detentos brasileiros
na Escola de Disciplina de Menores de Kurihama e nas Penitenciárias
de Iocoama e de Nagóia. Nesses centros de detenção, chamou a
atenção dos membros da Comissão a aplicação de rígidas normas
disciplinares internas aos apenados, tais como a exigência de
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
233
comunicação exclusivamente no idioma japonês, a restrição de apenas
uma visita de familiares por mês, a obrigação de trabalhar 40 horas
por semana e até a proibição de contato telefônico e mesmo da
“chamada visita íntima”
228
.
Uma interessante observação feita pela Comissão a respeito
dos processos de recrutamento e contratação de brasileiros no Japão,
referiu-se à modificação do Artigo 206 do Código Penal brasileiro, em
1993, que passou a incluir a expressão “mediante fraude” na previsão
do crime de aliciamento de trabalhadores. Como foi visto na Seção
3.2.2, essa modificação foi proposta pelo Deputado nikkei Diogo
Nomura, com o objetivo de respaldar a atuação das empresas
agenciadoras que operavam no movimento decasségui. Segundo o
relatório da CPMI, no entanto, seria “curioso notar que, anos depois,
essa alteração traria dificuldades para a repressão dos agenciadores
que enviam emigrantes ilegais para os EUA via México, justificando a
apresentação do Projeto de Lei do Senado no. 15, de 2006”
229
.
A ida da Comissão Parlamentar ao Japão, embora inserida num
contexto menor e diferenciado daquele que se propôs o foco central
daquela investigação – os delitos e aspectos criminais praticados na
origem e no destino do movimento emigratório brasileiro em geral –
serviu para ampliar a visão sobre a comunidade burajurijin que, no
Brasil, se limita essencialmente à órbita de alguns órgãos do executivo,
ao debate acadêmico e à colônia nikkei.
5.5.2 – O SERVIÇO DE ASSISTÊNCIA AOS BRASILEIROS NO JAPÃO – SABJA
No final de 1996, foi criado no Consulado-Geral em Tóquio
um “Centro de Atendimento”, financiado por empresa privada e
“voltado para a prestação de assistência [à comunidade] na área
trabalhista, especialmente quanto a seguro-saúde, indenizações,
demissões e acidentes de trabalho, entre outras questões”
230
,
basicamente por meio de consultas telefônicas. A falta de patrocínio,
234
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
no entanto, determinou seu cancelamento formal depois de um ano.
Apesar disso, foi dada continuidade ao serviço de atendimento à
população brasileira, graças ao trabalho conjunto daquela repartição
consular e de dedicado grupo de voluntários.
Dessa origem nasceu, em 1998, o “Serviço de Assistência aos
Brasileiros no Japão”, mais conhecido como SABJA, que reunia, nas
instalações do Consulado-Geral, um grupo de profissionais,
coordenados pela religiosa brasileira Irmã Yoshico Mori e composto
de universitários e outros especialistas (nas áreas de medicina, normas
trabalhistas, entre outras), para prestar aconselhamento e orientação à
comunidade. Esses voluntários começaram também a participar dos
consulados itinerantes, oferecendo seus serviços pessoalmente nas
localidades fora da capital. A ampliação das atividades do SABJA, já
não mais na sede do Consulado-Geral, levou, em 2003, à sua
transformação em entidade não-governamental, oficialmente
reconhecida pelo Governo de Tóquio, que passou a ser subsidiada
por contribuições de bancos e empresas brasileiras e também
japonesas.
Hoje, a gama de atividades do SABJA inclui, além da orientação
à comunidade sobre os diversos assuntos acima mencionados, visitas
a brasileiros em reformatórios e penitenciárias, acompanhamento e
tradução em hospitais e prefeituras, aconselhamento psicológico e
contatos com familiares, no Brasil, de cidadãos detidos ou não
localizados no Japão.
Um dos feitos mais significativos daquela instituição tem sido a
promoção dos “Festivais da Juventude de Oizumi”, que, em 2006,
realizou sua quinta edição (e também no mesmo ano a primeira edição
da cidade de Hamamatsu). Havia, em Oizumi, uma incidência
proporcionalmente alta de adolescentes brasileiros envolvidos em
atividades criminosas, sobretudo relacionadas a drogas e furtos, que
desacreditava a comunidade burajirujin local. A criação, pelo SABJA,
de oficinas de música, dança e teatro, em colaboração com as escolas
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
235
brasileiras da região e com a ONG Oizumi Kokusai Kyouiku Gijutsu
Fukyu logrou tirar os adolescentes das ruas e praticamente acabar
com a delinqüência juvenil na cidade
231
, ensejando inclusive a ativa
cooperação da própria prefeitura da cidade nos festivais.
O SABJA constitui, pois, exemplo de exitosa parceria governo
– sociedade civil em projetos de apoio e assistência à comunidade no
Japão. Nascido de iniciativa do Consulado-Geral em Tóquio, o serviço
hoje alcança e ajuda a resolver dificuldades cotidianas daquela
população que, por falta de meios – humanos e financeiros – as
repartições oficiais não lograriam desempenhar.
5.5.3 – O INSTITUTO DE DIREITO COMPARADO BRASIL-JAPÃO
Criado em 1986 em São Paulo, o Instituto de Direito
Comparado Brasil – Japão tem como objetivo principal o debate
acadêmico e a promoção de cursos comparativos em torno dos sistemas
jurídicos dos dois países, reunindo professores, magistrados e graduados
na área de direito. A emigração e consolidação da comunidade brasileira
no Japão a partir da década de 1990 trouxe para esse debate, então
acadêmico, o caso concreto da aplicação extraterritorial das respectivas
leis nacionais, sobretudo a questão dos direitos da comunidade
burajirujin diante do ordenamento jurídico nipônico.
Nesse contexto, o Instituto promoveu, em agosto 2002, o
“Simpósio Internacional de Direito Comparado: Trabalhadores
Brasileiros no Japão”, no qual foram apresentados os resultados de
um ano de discussões em mesas-redondas e um “Fórum dos
Decasséguis” entre professores, pedagogos, juízes, médicos, estudantes
e trabalhadores retornados do Japão
232
. O simpósio foi realizado
durante seis dias e contou com a participação de vinte expositores
japoneses e trinta e seis brasileiros, que emitiram, ao final do encontro,
o que veio a ser chamada a “Declaração de São Paulo e Londrina”,
cidades onde foram anunciadas as principais conclusões dos trabalhos.
236
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
O preâmbulo da Declaração afirma: “Fortalece-se, cada vez
mais, a percepção de que esse movimento migratório (do Brasil para o
Japão) terá, mercê de vários fatores, quando não um caráter perene,
uma duração no tempo maior do que a inicialmente suposta.”
233
Conviria,
aduziu, que fossem assim enfocadas e tratadas várias questões para
promover a efetiva adaptação da comunidade brasileira e o respeito a
seus direitos como integrantes da sociedade japonesa. As áreas que
mereceram as recomendações dos dois encontros foram:
a) Condições de Trabalho: destacou a necessidade de um
regime de contratação de trabalhadores preferencialmente
pela via direta da empresa ou, no caso do agenciamento
pelas “empreiteiras”, maior rigor na fiscalização de suas
operações, sobretudo no respeito às normas trabalhistas e
previdenciárias;
b) Seguridade Social: propôs, diante do quadro de limitada
afiliação dos trabalhadores brasileiros à previdência social
japonesa, a eficiente fiscalização sobre empregadores, a
obrigatoriedade de filiação automática ao sistema, a
assinatura de um acordo previdenciário bilateral e maior apoio
nos hospitais para o tratamento de imigrantes, mediante a
presença de intérpretes ou profissionais poliglotas;
c) Educação: advogou a liberdade de escolha entre os sistemas
educacionais brasileiro e japonês presentes naquele país (a
Declaração antecedeu a regulamentação implementada
naquele ano pelo MEC – vide Capítulo 3), a redução dos
custos das escolas brasileiras, por meio do repasse de
recursos ou concessão de bolsas e a participação da
sociedade civil, e a sugestão de que a concessão ou
renovação dos vistos de permanência dos pais fosse
vinculada à comprovação de matrícula escolar dos filhos;
d) Direito de Família e Cooperação Judiciária: à luz das
dificuldades com que se deparam os brasileiros residentes
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
237
no Japão nesse campo, como casamento, regime de bens,
divórcio, alimentos etc., recomendou a celebração de
acordos bilaterais de cooperação e adoção de medidas
administrativas e judiciárias correspondentes;
e) Delinqüência entre jovens brasileiros: sugeriu um programa
de conscientização dos pais diante da presença crescente
de jovens brasileiros nos centros de detenção resultante,
entre outros fatores, da desagregação familiar e da evasão
escolar, bem como apoio para sua desinternação e
recuperação social;
f) Entidades de apoio aos trabalhadores brasileiros no Japão
e aos retornados ao Brasil: expôs a relevância dos trabalhos
realizados pelas entidades de apoio (recorde-se o CIATE e
o Tokyo Nikkeis) como instrumentos de orientação e
readaptação dos migrantes e propôs maior envolvimento
de órgãos governamentais na coordenação das atividades
de empresas e outras entidades não governamentais ligadas
às questões maiores envolvendo os burajirujin.
Os temas abordados naquele Simpósio corroboraram, em
grandes linhas, aqueles que, desde meados da década de 1990, já
vinham sendo encaminhados pelo Governo, seja por meio da adoção
do Programa de Assistência aos Brasileiros no Exterior, seja, no caso
particular do Japão, pelas iniciativas empreendidas pela Embaixada
em Tóquio e pelos dois Consulados-Gerais, como visto no início deste
capítulo.
Outra participação do Instituto digna de nota deu-se no contexto
das discussões acerca da cooperação judiciária entre os dois países,
mais especificamente com relação à proposta de celebração de um
acordo bilateral de extradição. Por iniciativa do Prefeito de Hamamatsu,
Yasuyuki Kitawaki, em cuja jurisdição ocorreu o incidente que trouxe
à tona a pressão do Governo japonês de tomar para si a proposta
238
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
original brasileira de celebração desse instrumento (vide Seção 5.3
acima), foi solicitada ao Instituto, em abril de 2006, a elaboração de
uma minuta de acordo que especificasse as condições para o julgamento
de foragidos, no país de origem, por crimes praticados no outro país.
Diante da premissa fundamental de que a Constituição brasileira
proíbe a extradição de seus nacionais (Artigo 5o. Inciso LI), o Instituto
organizou comissão interna, integrada por professores de direito,
magistrados, promotores de justiça e advogados, com o intuito de
estudar as possíveis alternativas jurídicas que permitissem o julgamento
daqueles foragidos entre os dois países. Dessas deliberações, que
contaram com visita de missão de advogados da província de Shizuoka
a São Paulo no início de setembro, resultou a elaboração de um projeto
de acordo bilateral intitulado “Tratado entre a República Federativa
do Brasil e o Japão sobre Assistência Jurídica Recíproca em Matéria
Criminal”. O referido projeto fundamentava-se no princípio da
extraterritorialidade da lei penal previsto no Artigo 7o. do Código Penal
Brasileiro, que possibilita a instauração, no Brasil, de processo criminal
por crimes praticados no exterior, observados determinados requisitos
(como, por exemplo, que o crime seja punível no país onde foi
praticado, de estar incluído entre aqueles em que a lei brasileira admitiria,
em tese, a extradição). A minuta de acordo estabeleceria mecanismos
de cooperação judiciária entre os dois países que agilizariam tais
processos, os quais, no ordenamento atual, podem ser extremamente
lentos e burocráticos, em razão, por exemplo, da necessidade de coleta
de provas por meio de carta rogatória.
O documento foi formalmente apresentado ao público em Painel
Jurídico Internacional realizado em Hamamatsu no dia 24 de setembro
de 2006, que contou com a presença de membros do Instituto, da
Associação de Advogados de Shizuoka, do Ministério dos Assuntos
Estrangeiros do Japão e do Governo brasileiro (Embaixada do Brasil
e Consulado-Geral em Nagóia). Na ocasião, a representante da
Embaixada reiterou a posição de que tal acordo, por maior que fosse
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
239
seu mérito de evitar a impunidade de criminosos foragidos, não poderia
ser visto de forma isolada, fora do quadro maior de estreitamento das
relações entre os dois países, sobretudo nas áreas previdenciária e
matéria civil. De qualquer forma, a contribuição do Instituto de Direito
Comparado Brasil – Japão, neste particular, mantém a sua relevância
na medida em que cria uma base jurídica para a futura discussão desta
questão de matéria penal, na eventualidade, obviamente, em que o
Governo japonês revele real disposição para adiantar as discussões
sobre aquelas duas outras áreas de interesse do Governo brasileiro.
5.5.4 – A ASSEMBLÉIA DAS 18 CIDADES COM
CONCENTRAÇÃO DE ESTRANGEIROS
A cidade de Hamamatsu é freqüentemente mencionada ao longo
deste trabalho, mormente pelo fato de abrigar a maior concentração
de brasileiros no Japão, hoje mais de 18.000 burajirujin. Em todo
contexto da discussão interna nipônica sobre a questão imigratória e
sobre o tratamento de estrangeiros, o município também se destaca
por adotar uma postura positiva com relação a essas comunidades,
em contraste à posição mais ambígua e até por vezes hostil demonstrada
por alguns segmentos da sociedade e das autoridades centrais nipônicas.
Por iniciativa do prefeito daquela cidade, Yasuyuki Kitawaki,
foi convocada, em outubro de 2001, reunião de lideranças municipais
de outras cidades japonesas
234
que também contavam com visível
presença de estrangeiros, para propor linhas de ação junto ao governo
em Tóquio, visando a melhor integração dessas comunidades. Desse
encontro resultou o que veio a ser conhecida como a “Declaração de
Hamamatsu” (Hamamatsu Sengen). Em sua introdução, o referido
documento declara:
estabelecemos a Assembléia das Cidades com Concentração
de Estrangeiros com o objetivo de trabalharmos juntos na solução
de diversos assuntos que se tornam cada vez mais evidentes
240
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
dentro da comunidade, além de possuirmos um grande anseio
para que se forme uma sociedade de coexistência entre os
cidadãos japoneses e os cidadãos estrangeiros
235
.
O consenso gerado na reunião pelas então treze cidades que
participaram daquele primeiro encontro resultou da elaboração de um
elenco de propostas para as questões resumidas a seguir:
a) Educação: confrontar os problemas da evasão escolar,
causada principalmente pelo desconhecimento do idioma
japonês, pelas deficiências das escolas em saber receber
estudantes estrangeiros e pela falta de orientação aos pais
sobre a importância da escola. Recomenda-se assim melhor
ensino da língua japonesa para estrangeiros, aulas no seu
idioma nativo para as crianças, alocação dos alunos de
acordo com a habilidade e conhecimento e não simplesmente
a idade cronológica e presença de conselheiros da mesma
nacionalidade dos alunos. Recomenda ainda a criação de
escolas especiais para estrangeiros, apoio às escolas
estrangeiras, apoio à criação de miscellaneous schools e
apoio para a matrícula de crianças fora do sistema escolar
b) Previdência Social: estabelecer mecanismo para desvincular
o plano nacional de previdência (shakai hoken) e de
aposentadoria (nenkin hoken) do seguro saúde (kenko
hoken), para que os residentes que não se fixem
permanentemente ao menos tenham a cobertura médico-
hospitalar. Ao mesmo tempo, prever mecanismos para que
aqueles migrantes que retornem possam recuperar os
recursos contribuídos à previdência oficial (o que foi
parcialmente implementado a partir de 2003). As empresas
deverão ser fiscalizadas e as que não inscreverem seus
empregados em algum tipo de seguro poderão ser
responsabilizadas legalmente (por exemplo, mediante a
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
241
exigência para que empresas que contratam funcionários por
meio de empreiteiras condicionem tal contratação à inscrição
dos trabalhadores no sistema previdenciário). Recomendar
também maior apoio em língua estrangeira em hospitais,
clínicas e entidades de assistência social.
c) Registro de Estrangeiros: promover a harmonização dos
sistemas de registro municipal de estrangeiros com o de
nacionais japoneses, de modo a que todos tenham
conhecimento dos seus direitos e obrigações e que sejam
tratados de forma igual. Criar um mecanismo pelo qual a
autoridade central de migração informe diretamente à
municipalidade a saída do país do nacional estrangeiro. Além
disso, estudar outras leis que atendam à realidade dos
residentes estrangeiros.
A Assembléia voltou a reunir-se no em 2002 – e
subseqüentemente a cada ano – com o intuito principal se continuar
pressionando o governo central a tomar medidas em defesa dos
interesses das comunidades estrangeiras, com base nas linhas acima
descritas, sob o quadro geral de “formação de uma sociedade de
coexistência multicultural”. Esses princípios foram reiterados em novo
manifesto do grupo, em 2004, resumidos na “Declaração de Toyota”
no qual a Assembléia asseverou: “o governo japonês não alterou sua
posição passiva em relação à reforma do sistema, e este foi o motivo
para que esta Assembléia levantasse a voz para propor ao país as
medidas necessárias e urgentes … para a formação de uma verdadeira
sociedade de convívio”
236
.
Em entrevista coletiva concedida no Foreign Press Center of
Japan em 22 de junho de 2006, o Prefeito de Hamamatsu reforçou o
ponto de vista das cidades, a respeito da inoperância das autoridades
centrais em lidar adequadamente com a situação dos trabalhadores
estrangeiros:
242
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
I want to mention the government reactions to the appeals that
we have put forth to date. Regrettably, those responses have
been extremely sluggish, with little if any constructive change
occurring in our cities … the current social systems fail to
adequately support the lifestyles of foreigners. I believe the cause
of this can be traced back to the revisions of the Immigration
Control and Refugee Recognition Law of 1990, which assumed
that the foreigners characterized as “newcomers” were in fact
“migrant workers” who would return to their countries of origin
after short-term stays … this revised legislation was not
accompanied by policymaking geared to deal with the trend for
such foreigners to settle permanently in Japan
237
.
Essa mesma avaliação foi corroborada pela Embaixada em
Tóquio, cujo representante à reunião da Assembléia das 18 Cidades,
que teve lugar na capital em 21 de novembro de 2006, assim resumiu
a tônica dos debates:
Os prefeitos, que convivem de perto com as comunidades
brasileiras, parecem ter noção concreta dos benefícios trazidos
por sua presença, identificam com mais clareza os problemas e
mostram-se dispostos a procurar ativamente alternativas para
solucioná-los. As autoridades do Governo Central, por sua vez,
aparentam ter uma perspectiva mais abstrata – e nem sempre
positiva – da questão. Um bom exemplo disso foi a afirmação
do representante do Ministério da Educação de que o Governo
brasileiro não apóia as escolas brasileiras neste país. Recebeu a
resposta do Prefeito de Hamamatsu … que afirmou ser dever
do país receptor fornecer educação às crianças estrangeiras
238
.
No contexto maior de uma sociedade que tende, de modo
ambivalente, a se distanciar e a hostilizar a presença de estrangeiros
naquele país, o foro das 18 Cidades com Concentração de
A ATUAÇÃO DIPLOMÁTICA E CONSULAR
243
Estrangeiros, cujo escopo de atuação e de interlocução com o Governo
Central vem aumentando a cada ano, representa, dessa forma, um
canal importante de interlocução para as representações brasileiras
que poderia ser explorado no quadro mais amplo do programa de
assistência e defesa dos interesses dos nacionais residentes no Japão.
* * *
Ao longo deste capítulo, foram examinadas, com enfoque no
caso do Japão, as ações que o Estado brasileiro vem empreendendo,
desde a confirmação da realidade do assentamento de expressiva
parcela de sua população no exterior, no sentido de assegurar a
preservação de seus direitos de cidadãos, bem como no de lhe prover
o necessário apoio e assistência na condição particular em que se
encontram como expatriados. Esta política, no entanto, não se deve
limitar a uma situação ou a uma percepção de uma conjuntura hermética,
estanque. Ao contrário, assim como o próprio dinamismo do fenômeno
migratório, deverá ela evoluir no sentido de antever possíveis
desdobramentos futuros e assim buscar diretrizes e meios para fomentar
nos brasileiros que hoje vivem no exterior o sentimento de segurança,
autonomia e responsabilidade cívica que lhes permita livremente optar
por seu destino. O próximo capítulo proporá, dessa forma, algumas
novas linhas de ação governamental que poderiam ser estudadas com
esse propósito.
PARTE III
SHORAI: O FUTURO
247
O fenômeno da emigração de brasileiros para o exterior, que
se caracterizou, a partir de meados dos anos 1980, como um movimento
humano essencialmente transitório para escapar de dificuldades
conjunturais domésticas, vem, progressivamente, assumindo contornos
mais definitivos, com a fixação permanente dessas populações,
principalmente nos Estados Unidos, Europa, Paraguai e Japão. A
percepção desse fenômeno pelos diversos setores da sociedade
brasileira vem ensejando o incremento de discussões e propostas, tanto
na opinião pública e no meio acadêmico, como no executivo e no
legislativo, no sentido de que sejam efetivamente estendidos e garantidos
a esses cidadãos expatriados seus direitos à cidadania.
O presente capítulo examinará algumas das propostas que já
vêm sendo debatidas nesse contexto. Apresentará ainda outras idéias
para subsidiar a análise futura de projetos e políticas especificamente
dirigidas às comunidades no exterior, sobretudo no âmbito do
Ministério das Relações Exteriores. Tais ações visam não só assistir e
preservar a cidadania dessas populações como também fomentar sua
capacidade de melhor se organizar e efetivamente participar, ao lado
das instituições oficiais, da cada vez mais sólida consolidação de todos
esses “Brasis” espalhados pelo mundo.
Esse exame será feito em diversos âmbitos: discussões mais
amplas sobre a comunidade emigrada; alternativas para a participação
do Itamaraty como órgão condutor da política de assistência e canal
CAPÍTULO 6
PROPOSTAS PARA A INTERAÇÃO ESTADO-COMUNIDADE EXPATRIADA
248
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
de ligação direta com os expatriados; e, por fim, uma proposta de
ação voltada especificamente para a comunidade burajirujin, qual
seja, o recurso ao programa do governo japonês chamado Japan
Exchange and Teaching (Programa de Intercâmbio e Ensino do
Japão).
6.1 – O DEBATE SOBRE AS COMUNIDADES BRASILEIRAS NO EXTERIOR
O Brasil hoje encontra-se na posição de país que ainda
recebe um contingente importante de imigrantes, sobretudo
originários dos vizinhos latino-americanos e asiáticos, e que conta,
ao mesmo tempo, com um grande contingente de nacionais
emigrados, principalmente nos países desenvolvidos do hemisfério
norte. Não existem, à luz do caráter de ilegalidade que muitas vezes
os caracteriza, estatísticas precisas sobre esses quantitativos
migratórios. Estima-se, no entanto, que haja no Brasil entre
640.000
239
e 836.000
240
estrangeiros e que no exterior residam em
torno de 3 milhões de brasileiros.
No meio acadêmico, são inúmeros os trabalhos,
dissertações, estudos e pesquisas que avaliam o processo migratório,
cada vez mais voltados para a presença de brasileiros no exterior.
Como afirmam as pesquisadoras Neide Patarra e Rosana Baeninger:
A problemática das migrações internacionais de e para o Brasil
contemporâneo tem recebido cada vez mais atenção dos
especialistas, principalmente depois da Conferência sobre
População e Desenvolvimento no Cairo, em 1995. Dada a
constatação de que os movimentos de brasileiros para o exterior
passaram a constituir uma nova questão social no país a partir
dos anos de 1980, desde então é crescente, também, o número
de estudos e pesquisas voltadas ao tema, que aparece com
freqüência na mídia e adquiriu uma dimensão expressiva nos
programas de governo e no delineamento de políticas sociais
241
.
PROPOSTAS PARA A INTERAÇÃO ESTADO-COMUNIDADE EXPATRIADA
249
Vários desses estudos, especialmente aqueles sobre a
emigração para o Japão, foram relacionados no presente trabalho, tanto
aqueles de autores brasileiros, entre os quais Elisa Sasaki, Lili
Kawamura, Ester Rossini, Maria Edileuza Reis, como os de
estrangeiros, principalmente norte-americanos: Takeyuki Tsuda, Keiko
Yamanaka, Joshua Roth, apenas para citar alguns. No Brasil, o tema
dos emigrados é foco de seminários e encontros, entre os quais as
assembléias bienais da Associação Brasileira de Estudos da População
ABEP (www.abep.org.br), os programas de pesquisas do Núcleo
de Estudos da População – NEPO (www.nepo.unicamp.br) e do
Centro de Estudos de Migrações Internacionais (www.unicamp.br/
cemi), ambos da Universidade Estadual de Campinas. Merecem nota
ainda o “Seminário Internacional Políticas Migratórias” realizado em
junho de 2000 no Instituto de Estudos Econômicos, Políticos e Sociais
de São Paulo (IDESP), o “Seminário Internacional: Migrações
Internacionais - Contribuições para Políticas Públicas”, realizado em
Brasília, em 2001, o seminário “Migrações: Exclusão ou Cidadania”,
promovido pelo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento, em 2003,
também na capital federal, entre vários outros.
Igualmente, no exterior, são realizados encontros para discutir
as comunidades brasileiras emigradas. Nos Estados Unidos, na Europa
e no Japão, foram várias as reuniões e simpósios com o objetivo de
avaliar a condição das respectivas comunidades brasileiras naquelas
regiões: a First Brazil Week, na Universidade de Harvard, em abril de
2003; o Congresso Nacional sobre Imigração Brasileira para os
Estados Unidos, igualmente realizado em Harvard, em março de 2005;
três seminários sobre a Comunidade Brasileira no Japão, desde 2001,
patrocinados pelo Ministério dos Assuntos Estrangeiros e a
Universidade de Sofia daquele país; ou ainda o I Encontro Ibérico da
Comunidade de Brasileiros no Exterior, promovido pela Procuradoria
Regional dos Direitos do Cidadão do Distrito Federal, em Lisboa, em
maio de 2002. Os exemplos acima constituem apenas uma pequena
250
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
amostra da intensidade e difusão dos debates sobre as comunidades
brasileiras radicadas no exterior, voltados para os múltiplos problemas
e dificuldades que enfrentam e ao papel que pode e deve desempenhar
o Estado brasileiro na assistência e proteção a seus cidadãos
expatriados.
Foi apresentada no I Encontro Ibérico da Comunidade de
Brasileiros no Exterior, mencionado acima, uma síntese abrangente de
toda essa temática, consubstanciada na chamada “Declaração de
Lisboa”, cuja introdução afirma:
Constata-se que, distantes da pátria, os brasileiros e brasileiras
têm sua cidadania comprometida. Sejam eles estudantes,
trabalhadores, turistas ou detentos, independentemente de sua
situação regular ou irregular, de sua condição pessoal ou
profissional, enfrentam situações e problemas os mais variados.
Há registros de graves violações de direitos humanos, de natureza
criminal, com envolvimento de máfias de agenciamento de mão-
de-obra e de prostituição, tráfico de crianças, discriminação,
excessos das polícias de fronteira, trabalho escravo, entre outros
casos de flagrante desrespeito à dignidade de brasileiros. É uma
realidade que nos desafia a buscar caminhos e soluções do ponto
de vista jurídico, econômico, trabalhista, sociocultural e religioso.
Sabe-se que o exercício dos direitos civis de brasileiros nos países
de acolhimento depende de sua situação jurídica (regularizado
ou não) e do grau de desenvolvimento local das liberdades
democráticas. Espera-se que o Estado brasileiro lhes garanta
incondicionalmente seus direitos de cidadania, preferencialmente
por meio de políticas públicas voltadas para sua defesa
242
.
O documento arrolou propostas e recomendações ao Governo
brasileiro, entre as quais a formulação de políticas públicas para a
emigração, a representação política para os emigrantes brasileiros, a
atuação de consulados e embaixadas brasileiras e respectivos
PROPOSTAS PARA A INTERAÇÃO ESTADO-COMUNIDADE EXPATRIADA
251
orçamentos, o cadastramento e censo dos emigrados, a assessoria
jurídica, os registros civis e até mesmo facilitação de taxas e serviços
bancários. A partir desse diagnóstico preliminar da Declaração de
Lisboa, serão apresentadas, a seguir, proposições, ou reflexões, sobre
como essas matérias poderiam ser exploradas sob o enfoque
diplomático-consular, com vistas à expansão e aperfeiçoamento de
políticas públicas que visem a preservação da cidadania do brasileiro
residente no exterior.
A primeira sugestão do Documento de Lisboa refere-se à
criação de um órgão específico para a elaboração de políticas públicas,
na forma de um Grupo Interministerial ou de uma Secretaria para
Assuntos de Emigração. Em junho 2005, realizou-se reunião no
Ministério das Relações Exteriores, com representantes dos Ministérios
da Educação, da Fazenda, da Cultura, da Previdência Social e da
Justiça, além do Departamento de Polícia Federal e da Secretaria de
Direitos Humanos da Presidência da República. Discutiu-se, na ocasião,
uma minuta de decreto para constituir um Grupo de Trabalho
Interministerial Permanente para temas da emigração, iniciativa que,
no entanto, não teve prosseguimento.
Convém recordar, porém, que, como premissa básica, o Estado
não tem o que se pode chamar de “política para emigração”. O
movimento recente de brasileiros para o exterior, sobretudo a partir da
década de 1980, foi conseqüência das adversidades econômicas
domésticas que, aliadas à atração de oportunidades de emprego em
outros países, estimularam esse fluxo humano espontâneo para além-
mar, processo que jamais teve a presença deliberadamente
encorajadora ou cerceadora do Estado. Poder-se-ia, dessa forma,
pensar na formulação de “políticas para a comunidade emigrada”. Uma
sutil, porém significativa distinção.
Apesar de numeroso, tal contingente emigrado representa pouco
mais de um e meio por cento da população nacional (presumindo-se
uma comunidade de três milhões de brasileiros de uma população total
252
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
de 190 milhões). Comparado a outros países em desenvolvimento com
expressivas comunidades expatriadas, esse número é relativamente
pequeno. Estima-se, por exemplo, que há hoje cerca de oito milhões
de emigrantes filipinos espalhados pelo mundo (9% da população total
do país) e aproximadamente dezoito milhões de mexicanos apenas
nos Estados Unidos (16% da população). Essas duas comunidades
remetem anualmente a seus países de origem cerca de US$ 7 bilhões
(filipina) e US$ 10 bilhões (mexicana)
243
, contra um volume estimado
de US$ 4 bilhões no caso brasileiro, cifras que representam 7,14%,
1,3% e 0,5% dos Produtos Internos Brutos dos três países,
respectivamente
244
. O peso relativo das comunidades expatriadas
naqueles dois outros países encorajou seus respectivos governos a
criarem instituições específicas para tratar dessas realidades em seus
mais diferentes contornos: The Commision on Filipinos Overseas, que
data de 1980, e o Instituto para los Mexicanos en el Exterior, mais
recente, de 2003, são modelos que talvez estejam por trás de propostas
de entidade independente semelhante para o caso brasileiro.
O Ministério das Relações Exteriores, contudo, já dispõe, na
opinião do autor, além de histórica competência institucional, dos meios
necessários para a definição e execução de políticas, ou diretrizes,
para as comunidades emigradas. Reflexo disso e da prioridade que o
Estado atribui a essa realidade é a mais recente reformulação da estrutura
regimental do Ministério, definida pelo Decreto no. 5.979, de 06/12/
2006. A antiga Subsecretaria-Geral de Cooperação e das Comunidades
Brasileiras no Exterior (SGEC), responsável, além do Departamento
das Comunidades Brasileiras no Exterior (DCB), pelos Departamentos
de Temas Científicos e Tecnológicos (DCT) e de Promoção Comercial
(DPR), passou a chamar-se Subsecretaria-Geral das Comunidades
Brasileiras no Exterior (SGEB) e a tratar, exclusivamente, dos assuntos
ligados a migração, com competência para “cuidar dos temas relativos
aos brasileiros no exterior e aos estrangeiros que desejam ingressar no
Brasil, incluindo a cooperação judiciária internacional”. No seu
PROPOSTAS PARA A INTERAÇÃO ESTADO-COMUNIDADE EXPATRIADA
253
organograma interno, no entanto, permanece essencialmente a mesma
configuração subordinada de divisões que prevalecia no tempo da
Subsecretaria anterior: o Departamento das Comunidades Brasileiras
no Exterior, responsável pela Divisão de Assistência Consular (DAC),
agora Divisão das Comunidades Brasileiras no Exterior; e a Divisão
de Passaportes (DPP), Divisão de Documentos de Viagem; o
Departamento de Estrangeiros é a única unidade que foi acrescentada
à nova estrutura, cujas divisões mantiveram os mesmos nomes e
atribuições do passado: Divisão Jurídica (DJ), Divisão de Atos
Internacionais (DAI) e Divisão de Imigração (DIM).
A instância de que talvez ainda careça a nova Subsecretaria
seria uma unidade própria de planejamento e coordenação para interagir
tanto internamente com outras áreas do Ministério, como com órgãos
externos no executivo, no legislativo e no meio acadêmico, com o intuito
de estabelecer políticas gerais ou específicas para as comunidades no
exterior. Já foi visto, por exemplo, que, no caso do Japão, há intensa
atividade no campo da educação, como o programa de homologação
das escolas brasileiras e a realização de exames supletivos, que é levada
a cabo primordialmente pela Divisão de Cooperação Educacional da
Secretaria de Estado em colaboração com o Ministério da Educação.
Da mesma forma, as negociações sobre acordos de cooperação
judiciária ou de previdência social com o Japão recaem sobre as
Divisões Jurídica e de Assistência a Brasileiros, também em
coordenação com os respectivos Ministérios, da Justiça e da
Previdência. A questão da nacionalidade dos filhos de brasileiros
nascidos após a Emenda Constitucional de Revisão 03/94 e sua
tramitação no Legislativo seria, a rigor, da alçada da Assessoria de
Relações Federativas e Parlamentares do MRE. Esses temas constituem
apenas uma fração dos múltiplos questionamentos e situações que a
Secretaria de Estado recebe regularmente dos postos e para os quais
poderia ser benéfica a centralização de seu tratamento em torno de
uma potencial “Coordenação-Geral para Políticas Migratórias” no
254
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
âmbito da nova Subsecretaria-Geral. Nas outras Subsecretarias-Gerais
do Ministério, estão previstas unidades temáticas desse tipo, como as
Coordenações-Gerais do Fórum de Diálogo Índia – Brasil – África e
de Seguimento da Cúpula América do Sul – Países Árabes, no âmbito
da Subsecretaria-Geral Política II ou da Coordenação-Geral de
Acompanhamento de Mecanismos Políticos Multilaterais, dentro da
Subsecretaria-Geral da América do Sul.
Outra reivindicação mencionada na Declaração de Lisboa
referia-se à representação política das comunidades expatriadas. Pela
legislação em vigor, os residentes no exterior têm esse direito limitado
ao voto apenas para o Chefe de Estado: “Nas eleições para Presidente
e Vice-presidente da República, poderá votar o eleitor residente no
exterior, desde que tenha requerido sua inscrição ao Juiz da Zona
Eleitoral do Exterior até cento e cinqüenta e um dias anteriores ao dia
da eleição” (Código Eleitoral, Lei no. 4.737/65, art. 225; Normas para
Eleições, Lei nº. 9.504/97, art. 91). O fundamento dessa legislação,
no entanto, baseava-se numa realidade em que não se configurava tão
expressivo número de brasileiros residentes no exterior (o Código
Eleitoral data de 1965). Assim, não se pode dizer que haja uma
verdadeira representação desses cidadãos, visto que não contam, no
Parlamento, com voz ativa para o atendimento de suas reivindicações.
Quatro estados da região Norte do País – Acre, Amapá, Rondônia e
Roraima contaram nas eleições de 2006, em conjunto, com um
eleitorado de cerca de 1.273.000 cidadãos
245
e com oito deputados
federais cada no Congresso Nacional. Os brasileiros no exterior, que
somam mais de 3 milhões de nacionais, no entanto, não têm tal
representação, o que pode ser uma das principais razões da baixa
participação de eleitores residentes fora do País.
Há, no Congresso Nacional, duas propostas para a revisão
destas normas: Projeto de Lei no. 398/2003, da Senadora Ideli
Salvatti (PT-SC), que propõe a extensão do voto para Governador,
Vice-Governador e Senador e a proposta de emenda à Constituição
PROPOSTAS PARA A INTERAÇÃO ESTADO-COMUNIDADE EXPATRIADA
255
no. 05/2005 de autoria do Senador Cristovam Buarque (PDT-DF),
para a inclusão do seguinte texto: “Artigo 45, parágrafo 3. A lei disporá
sobre a instituição de circunscrições eleitorais especiais para a eleição,
pelo sistema majoritário, de representantes de brasileiros residentes
no exterior”
246
. Vale lembrar que outros países com expressivas
comunidades expatriadas já contam com representação parlamentar,
como a Itália, onde o Congresso conta com 12 deputados e 6
senadores (divididos, por representação proporcional, entre quatro
áreas: Europa, América do Sul, Américas Central e do Norte e África,
Ásia e Oceania) eleitos pelos 12 milhões de cidadãos com
nacionalidade italiana no estrangeiro. Na França, também há
representação política dos expatriados, com 12 senadores eleitos
indiretamente por um conselho de expatriados de 150 membros; até
a Croácia reserva 4 cadeiras em sua assembléia nacional para
deputados eleitos pelos cidadãos residentes no exterior. Esse seria
mais um debate que, sob a iniciativa do Itamaraty, como agente de
ligação com a comunidade emigrada, mereceria um aprofundamento
junto ao Congresso e a especialistas na área jurídica, para concretizar
uma justa aspiração a um dos princípios fundamentais da cidadania
que é o direito ao voto e à representação política.
Esses são apenas alguns aspectos de temas correntes que
versam sobre os brasileiros emigrados. Assim, convém ao Ministério
das Relações Exteriores, do ponto de vista institucional, assumir papel
decisivo nesse debate mais amplo com a sociedade sobre a comunidade
expatriada e as políticas que se fazem necessárias para a promoção e
a defesa dos interesses desses cidadãos. Tal papel não se restringe
apenas à modernização ou ao aperfeiçoamento das tradicionais rotinas
consulares, mas também à formulação, a partir de sua posição
privilegiada de captador da realidade e experiência dos brasileiros no
exterior, de diretrizes públicas que efetivamente traduzam seus direitos
constitucionais em ações consistentes, pragmáticas e eficazes para a
preservação de sua cidadania.
256
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
6.2 – O ALCANCE DA REDE CONSULAR
A estrutura de uma rede consular é, tradicionalmente,
condicionada pela necessidade de o Estado defender os interesses e
prover a realização de serviços demandados por seus nacionais no
exterior. Nos primeiros três quartos do século passado, a estrutura
consular brasileira foi primordialmente determinada pela necessidade
de auxiliar o desembaraço alfandegário das exportações brasileiras
em seus portos de destino e prestar assistência às tripulações dos navios
cargueiros, bem como de realizar a tramitação burocrática dos
emigrantes que ainda se dirigiam ao Brasil. A primeira consolidação do
regulamento consular da República, Decreto 3.259, de 11/04/1899,
definia assim a rede consular brasileira:
Art. 9º Os Consulados remunerados pelo Thesouro Federal
devem ser os seguintes:
Consulares Geraes de 1ª classe: Hamburgo, Nova-York, Buenos-
Aires, Antuerpia, Genova, Liverpool, Lisboa, Montevidéo e Pariz;
Consulados Geraes de 2ª classe: Trieste, La Paz, Valparaiso,
Copenhague, Barcelona, Rotterdam, Assumpção, Iquitos e
Genebra;
Consulados: Salto, Cayenna, Havre, Bordéos, Marselha, Napoles,
Porto, Londres, S. Pertersburgo, Montreal, Vera-Cruz,
Georgetown, Posadas, Cardiff, Stockolmo, Yokohama e Kobe;
Vice-Consulados: Baltimore, Rosario, Nova-Orleans, Francfort
S/M, Bremen, Vigo, S. Thomé e Libres
247
.
Observa-se que a maioria das repartições consulares (ao todo
43) se localizavam em cidades portuárias, por onde transitiva o comércio
bilateral brasileiro e de onde embarcavam os migrantes para o Brasil:
Hamburgo, Gênova, Lisboa, Trieste, Estocolmo, Barcelona, Porto,
Frankfurt e, no Japão, Kobe e Iocoama, estes criados, respectivamente,
em 1898 e 1897.
PROPOSTAS PARA A INTERAÇÃO ESTADO-COMUNIDADE EXPATRIADA
257
A estrutura consular ampliou-se ao longo das décadas seguintes,
mas sempre dentro dos objetivos maiores de promoção dos interesses
comerciais e de atendimento aos viajantes brasileiros, que se dirigiam
principalmente às capitais e aos grandes centros urbanos de outros
países. A relevância dessas repartições como centros de seleção de
emigrantes foi paulatinamente decrescendo à medida em que os fluxos
migratórios para o Brasil diminuíam, após a Segunda Guerra Mundial.
Tal comportamento pode ser observado ao se descrever a
história das repartições consulares brasileiras no Japão, sintetizada a
seguir
248
:
- 1897: Criação do Consulado-Geral em Iocoama (Decreto
no. 2.495, de 14/04/1897)
- 1898: Criação do Consulado-Geral em Kobe (Decreto no.
2.786, de 05/01/1898)
- 1919: Criação do Consulado em Nakasaki (Decreto no.
13.458, de 05/02/1919)
- 1928: Criação do Consulado Honorário em Tóquio (Decreto
no. 18.422, de 09/10/1928)
- 1931: Extinção do Consulado Honorário em Tóquio
(Decreto no. 19.657, de 03/02/1931)
- 1947: Extinção do Consulado em Nakasaki (Decreto no.
24.071, de 18/11/1947)
- 1976: Alteração da categoria do Consulado-Geral em
Iocoama para Vice-Consulado (decreto 77.256, de 04/03/
1976)
- 1977: Alteração da categoria do Consulado-Geral em Kobe
para Vice-Consulado (Decreto no. 80.430, de 28/09/1977)
- 1978: Criação da Rede de Consulados Honorários no Japão
nas cidades de Fukuoka, Hiroshima, Naha, Nagasaki, Kyoto
e Sapporo (Decreto no. 81.193, de 09/01/1978)
- 1983: Criação do Consulado-Geral em Tóquio e do
Consulado em Osaka (Decreto no. 88.408, de 20/06/1983)
258
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
- 1985: Extinção do Vice-Consulado em Kobe (Decreto no.
91.325, de 13/06/1985)
- 1986: Extinção do Consulado-Geral em Tóquio (Decreto
no. 93.371, de 09/10/1986)
- 1990: Extinção do Vice-Consulado em Iocoama (Decreto
no. 99.564, de 09/10/1990)
- 1992: Criação do Consulado-Geral em Nagóia (Decreto
no. 0-004, de 18/02/1992)
Extinção do Consulado-Geral em Osaka (Decreto no. 0-
003, de 18/02/1992)
- 1995: Criação do Consulado-Geral em Tóquio (Decreto
no. 1.373, de 17/01/1995).
A representação consular no Japão pode ser caracterizada em
três fases. A primeira, a partir da assinatura do Tratado de Comércio,
Amizade e Navegação em 1895, que levou à criação dos Consulados-
Gerais em Iocoama, Kobe e, mais tarde, Nakasaki, para exercer
fiscalização sobre a emigração japonesa para o Brasil. A segunda, a
partir do final da Segunda Guerra, com a extinção do Consulado em
Nakasaki e, posteriormente, com a redução no fluxo de emigrantes,
do rebaixamento dos Consulados-Gerais em Kobe e Iocoama à
categoria de Vice-Consulados e, paralelamente, a abertura de alguns
Consulados Honorários (em cidades mais distantes da capital Tóquio).
Na terceira fase, para responder à inversão no fluxo migratório, desta
feita de brasileiros rumo ao Japão, foram criados os Consulados-Gerais
em Nagóia e Tóquio na década de 1990.
Enquanto as representações consulares no início do século
passado foram estabelecidas nas cidades portuárias para onde
convergiam os emigrantes japoneses, Kobe e Iocoama, as instalações
atuais estão, na verdade, distantes de seu público alvo. Nagóia abriga
hoje pouco mais de cinco mil brasileiros residentes e Tóquio, cerca de
quatro mil e setecentos. Como foi visto acima, a maioria dos brasileiros
PROPOSTAS PARA A INTERAÇÃO ESTADO-COMUNIDADE EXPATRIADA
259
naquele país reside nas cidades em torno dos complexos industriais –
Hamamatsu, Toyohashi, Shizuoka, Ota, Oizumi, Ueda – condição que
os obriga, em circunstâncias normais, a realizar viagens longas aos
Consulados-Gerais, o que resulta em perda de um dia de trabalho,
além do alto custo do transporte, para ver atendidas suas demandas
por serviços.
A solução encontrada para contornar, parcialmente, essa
dificuldade prática enfrentada pela comunidade foi a criação, a partir
de 1996, dos Consulados Itinerantes que, periodicamente, prestam
serviços notariais e assistenciais diretamente nas cidades de maior
concentração de brasileiros. Hoje, no entanto, até mesmo este serviço
já alcança o limite de sua capacidade de bem atender, principalmente
nas cidades maiores. Não é rara a presença de mais de quinhentos ou
seiscentos nacionais nesses eventos realizados aos domingos e que,
diante de um público diário médio de duzentas ou trezentas pessoas
nas sedes, realça a sobrecarga de trabalho que enfrentam os funcionários
consulares para poder processar toda a documentação no mesmo dia,
como espera e exige a população.
Sob a ótica puramente administrativo-gerencial, portanto,
haveria argumentos técnicos para se recomendar a revisão da atual
estrutura consular no Japão, no sentido de descentralizar os postos de
atendimento em direção àquelas localidades onde a comunidade mais
se faz presente. Tal metodologia operacional foi adotada, por exemplo,
pelo Banco do Brasil no Japão. Além da antiga sede em Tóquio,
inaugurada em 1972, o Banco recentemente abriu agências em Nagóia
(Aichi), Hamamatsu (Shizuoka), Ota (Gunma) e sub-agências em
Mitsukaido (Ibaraki), Minokamo (Gifu), e Ueda (Nagano) e realiza,
ainda, plantões em várias outras cidades japonesas nos finais de semana
em lojas e centros comerciais que congregam brasileiros.
A ação administrativa do Ministério das Relações Exteriores,
no entanto, está condicionada a diversos outros fatores que não o
comercial, motivo das ações do Banco do Brasil. O MRE, como órgão
260
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
da Administração Pública Direta, sujeita-se a limitações orçamentárias,
contingenciamento de recursos, flutuações negativas em taxas de câmbio
que afetam seu orçamento destinado a despesas no exterior, além de
regulamentos de pessoal que prevêem a movimentação de servidores
do quadro a cada três ou cinco anos. Nesse cenário, seria difícil
conceber a criação de uma rede consular no Japão que estabelecesse
mais quatro ou cinco repartições de carreira – consulados ou vice-
consulados menores – que pudessem dar vazão de forma mais eficiente
à demanda dos trezentos mil brasileiros residentes naquele país. Vale
lembrar, a esse respeito, a resistência que muitos servidores do quadro
do Ministério – tanto diplomatas como oficiais e assistentes de
chancelaria – demonstram em servir no Japão, em razão, entre outras,
da distância do Brasil, do alto custo de vida (que afeta sobremaneira
os custos da educação dos filhos) e da dificuldade de adaptação cultural
e de aprendizado do idioma nipônico, fatores responsáveis, certamente,
pela lotação das duas repartições existentes aquém do previsto no
organograma do MRE
249
.
Uma alternativa para essa situação, qual seja, a prestação de
serviços consulares de forma descentralizada, já vem sendo utilizada
pelo Consulado-Geral em Tóquio, no chamado “Posto Avançado”,
visto no Capítulo 5. Esta prática poderia ser expandida, a custo
relativamente reduzido, para oferecer à população residente longe das
atuais repartições um “balcão de atendimento” permanente, mediante
a contratação de funcionários locais para trabalharem no interior nas
cidades onde estão majoritariamente assentados os brasileiros, como
Hamamatsu, Shizuoka, Ota-Oizumi ou Ueda (aquelas, por exemplo,
para onde foi proposta a criação de novas seções eleitorais). Esses
funcionários, institucionalmente subordinados às respectivas sedes,
teriam a incumbência de receber e conferir a documentação entregue
pelos residentes locais e encaminhá-la para processamento nas
repartições centrais. Não só haveria uma sensível diminuição do público
nas atuais sedes, como certamente o cidadão se sentiria mais bem
PROPOSTAS PARA A INTERAÇÃO ESTADO-COMUNIDADE EXPATRIADA
261
atendido. Isto evitaria, sobretudo, a perda de dias de trabalho e a
despesa com viagens a Tóquio ou Nagóia. Quanto às instalações destes
postos avançados, negociações poderiam ser empreendidas junto às
prefeituras japonesas com vistas à cessão de espaço em prédios
públicos locais. Para aqueles documentos que requerem a presença
da autoridade consular e do interessado (tais como registros de
nascimento, casamento ou procurações), um servidor habilitado, Cônsul
ou Vice-Cônsul, poderia fazer missões periódicas aos postos apenas
para a formalização (assinatura) destes processos.
Para o mais longo prazo, dependendo, evidentemente, do êxito
desse tipo de projeto piloto, medidas ainda mais ambiciosas poderiam
ser consideradas. Caso a idéia do Conselho de Cidadãos Regional,
visto no item 5.4, venha a consolidar-se como instrumento de real
utilidade para a representação localizada dos interesses da comunidade,
poder-se-á imaginar a designação – dentre os membros desses
conselhos, avaliados em termos de sua capacidade, integridade e
disposição – de Cônsules Honorários com poderes para a realização
de vários serviços adicionais, como reconhecimento de firmas e
legalizações. Nos termos dos regulamentos vigentes, notadamente a
Convenção de Viena sobre Relações Consulares de 1963, Capítulo
III, Artigos 58 a 68, e o Manual do Serviço Consular e Jurídico, Tomo
I, Capítulo 2º, que versam sobre a Repartição Consular Honorária,
estão arroladas as várias funções que atualmente podem ser atribuídas
a esses agentes, entre as quais: prestar assistência aos brasileiros
residentes em sua jurisdição; proceder à matrícula de brasileiros; expedir
atestados de vida; e reconhecer firmas em documentos expedidos ou
autenticados por autoridades locais.
A atual rede de Consulados Honorários no Japão, estabelecida
pela Portaria Ministerial no. 699, de 06/12/2006
250
, no entanto, não
reflete a realidade da dispersão da população brasileira no Japão: estão
situados nas cidades de Sapporo, Província de Hokkaido (75 brasileiros
na cidade e 213 na província); Hiroshima, Província de Hiroshima (714
262
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
brasileiros na cidade e 4.708 na província), Kobe, Hyogo (717 e 3.550);
Kyoto, Kyoto (152 e 585), Nagasaki, Nagasaki (11 e 40), Naha,
Okinawa (717 e 3.550), e Tosu, Saga (4 e 25 brasileiros residentes)
251
.
Além da dissonância entre a localização espacial desses Consulados
Honorários e a distribuição da população brasileira naquele país, as
funções até hoje desempenhadas pelos Cônsules nomeados – em sua
maioria cidadãos japoneses com algum vínculo com o Brasil – resumem-
se, essencialmente, a atividades de representação, sem competência
real para agir na qualidade de agente consular. O que se recomenda,
em suma, é a modernização e profissionalização da instituição do
Consulado Honorário, para servir, em primeiro lugar, aos interesses da
comunidade brasileira do interior do país.
6.3 – O PROGRAMA JET
Em 1987, o governo japonês criou o Japan Exchange and
Teaching Programme, mais conhecido como JET Programme, com
o propósito de incrementar o “mutual understanding between the
people of Japan and the people of other nations
252
. O projeto era,
na verdade, uma ampliação de programa anterior, de 1978, chamado
English Teaching Recruitment Programme, voltado exclusivamente para
bacharéis britânicos, contratados para apoiar e reforçar o ensino da
língua inglesa em escolas japonesas (por isso a grafia da palavra
programme no inglês britânico, em oposição a program, no inglês
norte-americano, mais comum no Japão). Além de ajudar a promover
o ensino de inglês por native speakers, haja vista a conhecida
dificuldade fonética e gramatical que tem o japonês de se expressar
nesse idioma, havia também, segundo o antropólogo David McConnel,
um componente político por trás da decisão:
Conceived during the height of the US-Japanese trade war
in the mid 1980’s, the proposal for the Japan Exchange and
Teaching (JET) Program(me) was first presented as a “gift”
PROPOSTAS PARA A INTERAÇÃO ESTADO-COMUNIDADE EXPATRIADA
263
to the American delegation at the Ron-Yasu summit in 1986
between US President Ronald Reagan and Japanese Prime
Minister Yasuhiro Nakasone. At considerable expense, the
Japanese government would invite young people from the
United States and several other English-speaking countries
to “foster international perspectives by promoting
international exchange at local levels as well as intensifying
foreign language education”… At a time when conflict about
economic policy seemed never-ending, the JET Program(me)
would provide tangible evidence of good faith efforts being
taken to open up the Japanese system at local levels and to
rectify the imbalance in the flow of goods and personnel
253
.
Em sua estrutura básica, o programa, com rubrica orçamentária
anual de US$ 400 milhões, é coordenado por três ministérios: dos
Assuntos Estrangeiros; da Educação, Cultura, Esportes e Ciência e
Tecnologia; e do Interior e Comunicações, juntamente com o “CLAIR”,
Council of Local Authorities for International Relations, órgão
responsável por reunir e analisar os pedidos de governos regionais
para a alocação dos participantes estrangeiros em suas províncias ou
cidades.
Esses participantes, em sua grande maioria (cerca de 90% do
total), são contratados por períodos de até três anos para a função de
Assistant Language Teachers (ALT) nas escolas públicas japonesas,
como auxiliares ou mesmo titulares de aulas de inglês. As outras
categorias de contratados são a de Coordinators for International
Relations (CIR) e a de Sports Exchange Advisor (SEA), que podem
ser de qualquer nacionalidade e que geralmente trabalham na sede das
prefeituras ou governos provinciais no atendimento geral às populações
estrangeiras lá residentes.
Para o ano de 2006, estavam inscritos 5.508 estrangeiros, dos
quais, em razão do objetivo principal do ensino de inglês, 5.056 eram
264
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
anglófonos, todos na categoria ALT (EUA 2.879 participantes, Reino
Unido 717, Canadá 685, Austrália 387, Nova Zelândia 274 e Irlanda
114). Brasileiros havia apenas 15 contratados, como coordenadores
internacionais. Essa baixa participação é histórica: nos vinte anos de
existência do programa, já passaram por ele mais de 80.000 estrangeiros,
mas do Brasil, apenas 174, desde os primeiros sete em 1995
254
e
jamais ultrapassando vinte por ano. Com o foco primordial do programa
direcionado para o ensino de inglês, será até natural a participação
marginal de brasileiros dentre as outras 37 nacionalidades que fazem
parte do JET.
A presença de uma comunidade tão expressiva de burajirujin
no Japão não parece ser fator que pese na decisão das autoridades
nipônicas – centrais ou provinciais – na contratação e mesmo
distribuição dos “Jets”, como são chamados esses jovens universitários.
Com efeito, dos 15 brasileiros contratados para 2006, apenas sete
foram designados para províncias com grande concentração da
comunidade, em Mie (20.000 brasileiros), Gifu (19.000), Nagano
(17.000), Saitama (14.000) e Ibaraki (11.000), e nenhum em outras
como Aichi (70.000), Shizuoka (49.000) ou Gunma, (17.000), província
esta onde se encontra a cidade mais “brasileira” do Japão, Oizumi
(vide seção 2.1.2). Os demais participantes do programa encontravam-
se em Hokkaido (213 brasileiros residentes), Ishikawa (1.900),
Yamanashi (5.200), Toyama (40), Hyogo (3.100), Fukui (4.700).
O descompasso entre a realidade da distribuição da comunidade
e a designação dos “Jets” brasileiros é tema que vem sendo abordado
com freqüência, tanto pela Embaixada, junto às autoridades centrais
japonesas, como pelos Consulados-Gerais, nos contatos mais recentes
com os governos provinciais. Na última reunião técnica bilateral na
área de educação, realizada em abril de 2006, diante do pedido
brasileiro para maior representatividade no programa, os agentes do
Ministério da Educação japonês reconheceram que: “os CIRs ...
poderiam ser utilizados pelas autoridades regionais em atividades para
PROPOSTAS PARA A INTERAÇÃO ESTADO-COMUNIDADE EXPATRIADA
265
auxiliar na adaptação da comunidade brasileira, especialmente ao
sistema escolar local”
255
. A questão também foi abordada, entre outras
oportunidades, em reunião mantida por missão do Consulado-Geral
em Tóquio com representantes das prefeituras de Oizumi e Ota em
março de 2006, a fim de instá-las a reforçar solicitações, por intermédio
do CLAIR, para a designação de mais brasileiros no programa JET
para trabalharem diretamente com a comunidade
256
.
Até o presente, essa estratégia não tem prosperado de maneira
significativa no sentido de tirar proveito efetivo da existência do JET
como instrumento paralelo de assistência e apoio à comunidade
brasileira no Japão. Um novo enfoque de atuação por parte do governo
brasileiro poderia modificar esse quadro, nas seguintes linhas:
a) solicitar ao governo japonês que a designação de
participantes brasileiros inclua também as categorias de
Assistant Language Teachers e não exclusivamente
Coordinators for International Relations, que tendem a
ser alocados para funções administrativas mais genéricas.
Pesa a favor dessa reivindicação o fato de que à China e à
República da Coréia, que também contam com grandes
comunidades no Japão, são oferecidas vagas de ALTs (11
e 3, respectivamente, em 2006). A presença de brasileiros
trabalhando nas secretarias ou departamentos regionais de
educação e nas escolas japonesas poderia contribuir
sensivelmente para ajudar na adaptação e melhor
desempenho das crianças burajirujin no sistema educacional
naquele país.
b) realizar um trabalho de esclarecimento e conscientização mais
amplo e sistemático junto às entidades regionais, para que
incrementem seus pedidos ao governo central no sentido de
que mais brasileiros sejam incluídos no planejamento anual
do JET Programme. Sem prejuízo do tratamento do tema
nas instâncias oficiais (os Ministérios responsáveis e o
266
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
CLAIR), ações poderiam ser desenvolvidas, por exemplo,
junto à Assembléia das 18 Cidades com Concentração de
Estrangeiros, entidade que congrega os municípios com
grande presença de estrangeiros. Essas autoridades locais
conhecem melhor os problemas práticos que enfrentam os
estrangeiros em suas respectivas jurisdições e poderiam
direcionar o trabalho dos “Jets” brasileiros àquelas áreas –
educação, normas trabalhistas, seguro social etc. – onde
fossem detectadas as maiores carências da comunidade. Tal
direcionamento das gestões do governo poderiam surtir efeito
mais imediato do que o tratamento pulverizado e isolado
nas prefeituras individuais.
c) promover no Brasil, com a prévia anuência e em coordenação
com o governo nipônico, a divulgação mais abrangente da
existência e dos propósitos do JET Programme. Essa
divulgação hoje é realizada, formalmente, por intermédio
da embaixada e dos consulados japoneses, bem como por
meio de algumas associações culturais nikkeis. De acordo
com informações colhidas pelo autor junto aos atuais
participantes do programa – a maioria descendente de
imigrantes japoneses – muitos deles tomaram conhecimento
do programa de maneira informal e aleatória. Tal como hoje
estabelecido, no recrutamento de potenciais candidatos a
demanda é que cria a oferta, pois, além da limitada
divulgação, não há clara definição do número de vagas
disponíveis. Se, ao contrário, houvesse um comparecimento
mais pronunciado de candidatos, em número
significativamente maior do que hoje, poder-se-ia chegar a
uma situação na qual a oferta criaria a demanda e, quiçá,
encorajaria o governo japonês a rever, positivamente, o
número de brasileiros que anualmente participam do
programa. Tendo em vista, ademais, a preocupação
PROPOSTAS PARA A INTERAÇÃO ESTADO-COMUNIDADE EXPATRIADA
267
manifestada reiteradamente nos meios oficiais japoneses com
a necessidade de se dedicar mais atenção aos problemas
das comunidades imigradas, como educação, saúde,
impostos etc., a divulgação do programa poderia ser
direcionada a universitários brasileiros nas áreas de
pedagogia, assistência social e administração, entre outras,
sobretudo nas universidades localizadas em regiões onde
mais se concentra a população nipo-brasileira (São Paulo,
Paraná, Mato Grosso, Minas Gerais e Pará), haja vista o
requisito de proficiência no idioma japonês para candidatar-
se ao JET.
* * *
As idéias apresentadas acima derivam, essencialmente, da
experiência e observações coletadas pelo autor ao longo de seu tempo
de serviço na carreira diplomática e da pesquisa efetuada para a
elaboração do presente trabalho. Não são, e nem poderiam ser,
exaustivas ou ideais. Constituem, para tomar emprestada um expressão
inglesa, food for thought, de modo a que a prioridade política à
assistência aos brasileiros que vem sendo atribuída pelo Estado, por
intermédio do Ministério das Relações Exteriores, se transforme num
exercício constante de reflexão e aperfeiçoamento das práticas e
procedimentos voltados para a preservação da cidadania dos hoje
três milhões de expatriados.
269
O título do trabalho, “A Comunidade Brasileira no Japão: de
Decasségui a Emigrante”, traduz a avaliação do autor a respeito do
movimento de centenas de milhares de brasileiros em direção àquele
país ao longo do último quarto de século, qual seja, a de que tal
fenômeno não deve mais ser visto como temporário, na acepção literal
da palavra japonesa “decasségui”, mas sim como um deslocamento
humano com crescente e real perspectiva de permanência duradoura,
na definição clássica do termo “emigrante”.
A escolha do subtítulo: “A Política do Estado para a Preservação
de sua Cidadania”, por sua vez, traz a reflexão sobre qual deve ser a
orientação de políticas públicas para lidar com essa realidade. Os
nacionais que embarcaram para o Japão fazem parte de uma população
expatriada de cerca de três milhões de brasileiros que residem no
exterior, de acordo com a estimativa do Ministério das Relações
Exteriores. A saída de tão expressivo contingente do País, no entanto,
não derivou da vontade expressa do Estado, mas sim de uma
multiplicidade de reações, individuais ou coletivas, a fatores endógenos
e exógenos – econômicos, sociais, culturais e familiares – sobre os
quais o poder público nacional teve interferência apenas indireta.
Cabe, assim, a pergunta sobre de que maneira deve o Estado
formular políticas especiais e empregar recursos para assistir e proteger
essa população que, no caso específico do Japão e conforme a premissa
inicial, poderá não voltar ao País. Para responder a essa pergunta, foi
CONCLUSÃO
270
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
preciso determinar primeiro se havia indicadores concretos e suficientes
que atestassem a tese de enraizamento da comunidade brasileira no
Japão. Tal determinação foi analisada sob duas perspectivas: a histórica
e a empírica.
Se compararmos as motivações conjunturais e as aspirações
individuais dos processos migratórios que resultaram na vinda de mais
de 250.000 japoneses para o Brasil ao longo do século XX e, mais
recentemente, no movimento em número superior a este de brasileiros
para o Japão, veremos que há uma série de semelhanças entre ambos.
Tanto no Japão do final do século XIX como no Brasil dos anos 1980,
a adoção de políticas econômicas ortodoxas ou heterodoxas levou à
marginalização de grandes segmentos das respectivas populações dos
sistemas produtivos, de emprego e da riqueza nos dois países e épocas.
A alternativa de meio de vida que muitos desses excluídos encontraram
foi buscar no exterior novas oportunidades, com a diferença de que no
Japão do passado tal saída foi ativamente encorajada e patrocinada
pelo Estado, enquanto que no Brasil moderno esse fator push não
contou com o aval oficial. Já a atração dos imigrantes, o fator pull,
resultou, nos dois casos, de necessidade doméstica – e conseqüente
introdução de políticas oficiais – que visavam o suprimento externo de
mão-de-obra não-qualificada para o setor dominante das respectivas
economias: o agro-exportador no início do Brasil republicano e o
industrial no Japão do final do século passado.
Em termos da motivação pessoal do emigrante japonês e de
seu descendente contemporâneo brasileiro, pode-se dizer que a
aspiração inicial ao deixarem suas respectivas pátrias era a de passar
apenas alguns anos no exterior para, com os recursos poupados, algum
dia voltar e se restabelecer na terra natal em melhores condições. No
primeiro caso, a presença de cerca de 1,5 milhão de nikkeis no Brasil
de hoje mostra que tal ambição foi deixada para trás, na medida em
que a adaptação ao novo país e a ascensão social foram superando a
incerteza no novo país e o desejo de regresso ao Oriente. A julgar por
CONCLUSÃO
271
todos esses antecedentes históricos, portanto, é grande a probabilidade
de que a primeira geração de emigrantes brasileiros no Japão, os
burajirujin, também vá adiando, indefinidamente, o planejamento para
o retorno, mormente se continuarem persistindo no Brasil os indicadores
negativos de emprego, de distribuição de renda e de segurança, os
quais contrastam vivamente com as condições inversas e positivas que
encontram na sociedade japonesa.
Para testar a validade dessa hipótese, ou seja, de que a história
se poderá repetir nesse movimento migratório de quase um século
entre o Brasil e o Japão, o autor buscou, em dados empíricos sobre
a comunidade brasileira naquele país, elementos que pudessem
reforçar tal conjectura. O primeiro a sobressair foi o fato de que, a
despeito da estabilização econômica no Brasil a partir de 1994 e da
longa recessão que se abateu sobre a economia japonesa desde o
princípio daquela década, a população brasileira no Japão exibiu
tendência constante de crescimento, sinal de que as vantagens de
permanência naquele país se sobrepunham à aparente melhoria de
condições no Brasil. Na análise demográfica, foi visto que o perfil da
população também se vem modificando, assumindo cada vez mais
características de assentamento em oposição às de transitoriedade,
entre as quais: maior paridade entre o número de homens e mulheres
na comunidade, aumento progressivo do percentual de crianças e de
idosos, o fato de mais de 20% dos brasileiros já terem o visto
permanente japonês, um pequeno, porém perceptível, deslocamento
de nacionais do trabalho nas fábricas para o setor de serviços e a
aquisição de patrimônio imobiliário.
À luz dessas evidências históricas e conjunturais, portanto,
defende o autor que a população brasileira no Japão pode, de fato, ser
classificada como emigrante, isto é, um contingente humano que se
assentará de forma definitiva naquele país, em oposição à rotulação de
residente temporário, Gastarbeiter ou decasségui, como é mais
freqüentemente chamada, termos imbuídos de um ostensivo desejo de
272
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
regressar à pátria. Aceita essa assertiva, é preciso, pois, determinar o
papel e a responsabilidade do Estado diante dessa realidade.
Ao longo dos últimos vinte anos, o Brasil vem passando por
uma fase de transição, saindo da posição histórica de destino para a
de fonte de migrantes. Ao contrário do período que vai do final da era
imperial até os anos 1970, durante o qual houve, no País, uma política
deliberada de atração de imigrantes, que para cá trouxe mais de cinco
milhões de estrangeiros, o observado êxodo de mais de três milhões
de nacionais desde então se deu de forma espontânea, acelerada e, o
que é significativo na presente discussão, sem qualquer incentivo ou
intervenção oficial direta.
Talvez por essa razão tenha o Governo demorado a reagir ao
fenômeno emigratório, em termos da adoção de medidas práticas
voltadas especificamente para o atendimento das necessidades da
população expatriada. No caso do Japão, por exemplo, passaram-se
cinco anos desde a abertura formal do mercado de trabalho nipônico
aos nikkeis até a abertura dos Consulados-Gerais em Tóquio e Nagóia,
em 1995, quando já se contavam mais de 175.000 nacionais no
arquipélago. Coincidentemente, data desse mesmo ano o lançamento
formal, por intermédio do Ministério das Relações Exteriores, da
“Política de Assistência aos Brasileiros no Exterior” que, além de
promover a melhoria e ampliação do atendimento consular, introduziu
novos mecanismos de interação com aqueles nacionais, entre os quais
se destacaram o Conselho de Cidadãos e os consulados itinerantes.
O fato de os brasileiros no Japão, ao contrário de muitos de
seus compatriotas nos Estados Unidos e na Europa, viverem na
condição de legalidade foi igualmente importante nesse processo de
aproximação e diálogo Estado – cidadão naquele país. Reflexo disso
foram, por exemplo, os debates públicos ocorridos desde 1997, tanto
na área de educação, iniciativa que partiu num primeiro momento da
própria comunidade, quanto sobre problemas que enfrentavam os
brasileiros em outras áreas, como as de previdência, de saúde e
CONCLUSÃO
273
trabalhista, nos quais houve ativa participação da Embaixada em Tóquio
e dos Consulados-Gerais.
A ampliação e o aprofundamento das discussões e ações nessas
áreas trouxeram resultados extremamente positivos, tais como a inédita
criação e subseqüente homologação oficial de extensa rede de escolas
brasileiras naquele país e o reconhecimento, pelo governo japonês, do
primeiro destes estabelecimentos como centro educacional local, ou
miscellaneous school, em novembro de 2006. Os entendimentos que
se vêm realizando sobre os outros pontos de interesse da comunidade
também adquiriram, mais recentemente, renovado impulso e dinamismo
e é possível que se chegue, num futuro próximo, a uma definição
normativa bilateral para a situação previdenciária e de amparo jurídico
à população no Japão.
Em que pesem as linhas mestras e a orientação geral definidas
pelo Governo para a política de assistência aos brasileiros no exterior
implementadas a partir de 1995, os avanços que se têm logrado em
benefício da comunidade no Japão em muito se deveram, também, à
iniciativa da Embaixada e dos Consulados-Gerais e da participação
solidária e ativa das entidades representativas daquela população, como
as associações e a mídia brasileiras naquele país. A criação do Setor
de Comunidades na Embaixada e do sistema de atendimento consular
in loco concebido pelo Consulado-Geral em Tóquio – o posto
avançado semanal, exemplificam essa disposição das missões oficiais
de buscar e encontrar soluções inovadoras para o encaminhamento
político e prático das questões afetas aos burajirujin.
Esses são apenas dois exemplos de como o Governo, por
intermédio das missões no Japão, tem reagido à demanda e às
necessidades de sua população residente no exterior. Certamente
haverá outros, igualmente relevantes e eficazes, adotados por
Embaixadas e Consulados nos países que também contam com grandes
comunidades brasileiras. Paralelamente, como este trabalho procurou
mostrar, existe um intenso e rico debate sobre a emigração brasileira
274
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
em vários setores da sociedade – em outras esferas do executivo, no
meio acadêmico, no legislativo, na mídia – cujas propostas e idéias
poderiam ser de grande valia para o aperfeiçoamento da política oficial
de assistência executada pelo Itamaraty.
É nesse contexto que o autor defende a criação, na estrutura
regimental do MRE, de uma unidade administrativa específica para a
formulação, a coordenação e o planejamento institucional de uma
política geral para as comunidades no exterior. Tal unidade, entre outras
atribuições, poderia incumbir-se de realizar e manter atualizado um
levantamento quantitativo da população expatriada – cuja dimensão
hoje não é mais do que uma estimativa –, de, além desses dados
estatísticos, receber dos postos e difundir entre os demais novos
modelos de atendimento consular que se revelem úteis à população e
de organizar e centralizar, por meio de encontros setoriais, seminários
etc., o debate sobre a questão emigratória. Reforçar-se-ia, dessa forma,
o papel do Ministério como órgão condutor de políticas nessa área.
A par do enfoque conceitual sobre a responsabilidade
institucional para a promoção e a defesa dos interesses e direitos da
comunidade expatriada, entende o autor que também há necessidade
de revisão de algumas práticas consulares tradicionais. Nesse sentido
sugere, entre outras, a transformação das funções dos consulados
honorários, definidas histórica e essencialmente em termos de atividades
protocolares e de atendimento ocasional ao cidadão brasileiro, para
uma rede descentralizada e operacional de processamento de rotinas
consulares para uma população que, na maioria dos países onde reside,
se encontra localizada longe das repartições existentes nas grandes
cidades. Não deve faltar, igualmente, recurso a oportunidades ainda
subutilizadas que se apresentam nos países hospedeiros para melhorar
o atendimento aos brasileiros, tal como o JET Programme japonês.
No exemplo da interação entre o Estado e a comunidade
burajirujin, relatado em suas várias facetas ao longo do presente
trabalho, procurou o autor demonstrar que, a despeito do dinamismo
CONCLUSÃO
275
e caráter relativamente novo do acelerado processo emigratório nacional
vivenciado nos últimos vinte e cinco anos, pode o Governo responder
de forma adequada à sua missão de garantir e preservar os direitos
fundamentais à cidadania de seus nacionais no exterior. O desafio que
se apresenta agora para esta vertente específica da política externa, no
entanto, é com as novas gerações de brasileiros que vão nascer e
crescer pelo mundo, para as quais se devem voltar as diretrizes públicas
de assistência, de atendimento e, por que não, de promoção da
cidadania. Quanto mais eficazes forem, melhores serão as condições
desses cidadãos de optarem livremente por seu destino e de o País a
eles recorrer se a conjuntura futura assim o recomendar.
NOTAS
NOTAS
1
GALIMBERTTI, Percy. O caminho que o Dekassegui sonhou. Editora PUC,
São Paulo, 2002, p. 103.
2
Population Statistics of Japan, National Institute of Population and Social
Security Research, Tokyo, 2006
3
WOORTMAN, Ellen. Japoneses no Brasil/Brasileiros no Japão: tradição e
modernidade. Universidade de Brasília. Série Antropológica, no. 183. Brasília,
1995.
4
Os Nikkeis e a Sociedade Brasileira nos próximos 20 anos. Relatório da
Comissão da JICA – Japan International Cooperation Agency. São Paulo,
2003. p. 20
5
Gentleman’s Agreement de 1907-1908. Acordo por troca de notas entre os dois
países pelo qual o Japão concordou em não mais emitir passaportes válidos
para os Estados Unidos em favor de seus cidadãos. Em troca, o Presidente
Theodore Rooselvelt logrou reverter medida discriminatória das autoridades
educacionais de São Francisco que confinara alunos asiáticos a escolas
segregadas.
6
REIS, Maria Edileuza Fontenele. Brasileiros no Japão: O Elo Humano das
Relações Bilaterais, 2a. Edição, São Paulo, Kaleidus Primus, 2002. p. 44.
7
YAMANAKA, Keiko, “I will go home, but when?” Labor migration and
circular diaspora formation by Japanese Brazilians in Japan”, in DOUGLASS,
Mike & ROBERTS, Glenda, eds. Japan and Global Migration – Foreign
Workers in the Advent of a Multicultural Society, University of Hawaii Press,
2003, p. 128.
279
280
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
8
SAITO, Hiroshi. A Presença Japonesa no Brasil, Editora Universidade de São
Paulo, 1980, p. 82
9
Hiroshi Saito, em sua cronologia da imigração japonesa para o Brasil, define as
três fases como sendo i) de 1908 a 1941, ii) de 1952 a 1962 e iii) a partir de 1963
(SAITO, Hiroshi, op.cit. pp 83-85). O presente estudo adota a cronologia distinta
para as três fases: i) 1908-23, ii) 1924-41 e iii) 1952-73. Evidencia-se, dessa forma,
o impacto da suspensão da imigração nos EUA e Peru sobre o fluxo migratório
japonês destinado ao Brasil (1923-24) e por considerar que o que Saito afirma
ser o movimento emigratório japonês da terceira fase baseado no trinômio
“capital-tecnologia-empresário”, composto de “pessoal empresarial....cuja
permanência no país é de duração mais ou menos limitada e cuja carreira está
mais ligada à sociedade de origem” não se deu unicamente no Brasil, sendo
mais resultado da expansão da indústria e comércio nipônicos por todo o mundo.
A divisão cronológica utilizada por Saito é também assinalada por Keiko
Yamanaka (op. cit. pp 128-129).
10
GERALDO, Endrica. A ameaça vem do Oriente – A imigração na Constituinte
de 1933/34, in www.unicamp.br/cecult/texto_endrica.pdf. A legislação foi
incorporada à Constituição de 1934 no Artigo 121, §6º: “A entrada de imigrantes
no território nacional sofrerá as restrições necessárias à garantia da integração
étnica e capacidade física e civil do imigrante, não podendo, porém, a corrente
imigratória de cada país exceder, anualmente, o limite de dois por cento sobre o
número total dos respectivos nacionais fixados no Brasil durante os últimos
cinqüenta anos”.
11
Comovente relato da colonização japonesa na região Norte pode ser encontrado
no livro ‘Canção da Amazônia – Uma Saga na Selva’ (Amazon no Uta) de
Fusako Tsunoda, Editora Francisco Alves, 1988, que descreve a contribuição
singular daqueles colonos na introdução do cultivo da pimenta e da juta, que
transformou o País de importador a exportador desses produtos.
12
Taxa de Natalidade: numero de nascimentos vivos por cada 1.000 habitantes.
13
LISBOA Marcos de Barros. A Agenda Perdida: diagnósticos e
propostas para a retomada do crescimento com maior justiça social.
Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade, http://www.undp-
NOTAS
281
povertycentre.org/publications/economics, Rio de Janeiro, 2002 p.8,
acessado em 27/05/2006.
14
Fonte: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, Pesquisa Mensal
de Emprego (PME), in ibge.gov.br, acessado em 15/06/2006. Estas taxas, no
entanto, podem ter sido mais elevadas se utilizados, por exemplo, os critérios
de aferição do DIEESE – Departamento Intersindical de Estatística e Estudos
Sócio-Econômicos – cujos resultados, publicados desde 1998, apontam para
níveis de desemprego metropolitano no Brasil de 60% a 100% maiores do que
as estatísticas oficiais.
15
United Nations General Assembly, 60th Session. International Migration
and Development. Report of the Secretary General. Maio 2006A/60/871,
p.12.
16
CARVALHO, José Alberto Magno de e CAMPOS, Marden Barbosa de. A
variação do saldo migratório internacional do Brasil. Estud. av. [on line].
2006, vol. 20, no. 57 pp.55-58, in www.scielo.br, acessado em 02/10/2006.
17
Registered Aliens by Nationalities and Status of Residence, 1948-2002,
Ministério da Justiça do Japão in Population Statistics of Japan 2006,
National Institute of Population and Social Security Research, 2006.
18
HIGUCHI, Naoto. Brazilian Migration to Japan – Trends Modalities and
Impact. Expert Group Meeting on International Migration and
Development in Latin America and the Caribbean. United Nations
Secretariat. UN/POP/EGM-MIG/2005/11. 2006.
19
De fato, a Irmã Yoshico Mori, Presidente da ONG SABJA (Serviço de
Apoio aos Brasileiros no Japão) que vive no Japão há mais de 20 anos
prestando assistência à comunidade brasileira recordou, em entrevista com
o autor, que seus primeiros trabalhos naquele país eram voltados sobretudo
para o amparo de mulheres brasileiras casadas com japoneses que não se
adaptavam às rígidas regras e costumes locais ou eram severamente
discriminadas ou assediadas por suas famílias japonesas.
20
HIGUCHI, Naoto. op. cit. p. 2.
21
Os dados foram coletados por Koichi Mori, no estudo Change Migration
from Brazil to Japan, Ijuu Kenkyu, Tokyo 1992, in. HIGUCHI, Naoto, op. cit.
282
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
22
Relatório Final da Comissão Parlamentar Mista sobre a Emigração, Senado
Federal, Brasília, 2006, p. 210.
23
WEINER, Michael. Japan in the Age of Migration, in DOUGLASS, Mike &
ROBERTS, Glend., op. cit., p. 52
24
A taxa de câmbio que antes do Acordo Plaza estava flutuando em torno de ¥
240 = US$ 1,00, chegou a ¥ 120 = US$ 1,00 em 1988.
25
BORNSTEIN, Lisa. From Carioca to Karaoke: Brazilian Guestworkers in Japan,
Berkeley Planning Journal, vol. 4, 1992, California, p. 72.
26
Relevante, a esse respeito, é o comentário de John Lie sobre a suposta
homogeneidade japonesa: “Most Japanese believe that Japan is ethinically
homogeneous. When asked about Japan’s ethnic minorities, many people
seem puzzled and confused. The virtual equation between the state, nation
and ethnicity (as well as class and culture) has rendered Japan as a
distinctively homogeneous country. When confronted with the fact of ethnic
diversity, many Japanese either ignore or deny it.” LIE, John, The Discourse
of Japaneseness, in Japan and Global Migration – Foreign Workers in the
Advent of a Multicultural Society, DOUGLASS, Mike & ROBERTS, Glenda
op. cit., p. 81.
27
SASAKI, Elisa M. Trabalhadores Migrantes Nipo-Brasileiros no Japão, Textos
NEPO no. 39, Núcleo de Estudos de População (NEPO), UNICAMP, Campinas
2000. p. 17.
28
REIS, Maria Edileuza Fontenele, op. cit. pp. 68-69
29
CORNELIUS, Wayne A. Japan: The Illusion of Immigration Control, in
Controlling Immigration: A Global Perspective, CORNELIUS, W, MARTIN,
P. & HOLLIFIELD J., eds. Stanford University Press, California, 1994, pp. 395-6,
apud HIGUCHI, Naoto, op, cit. p. 7.
30
HIGUCHI, Naoto, op.cit. p.8.
31
LINGER, Daniel Touro, No One Home – Brazilian Selves Remade in Japan,
Stanford University Press, California, 2001, pp. 23-24.
32
SASAKI, Elisa M. op. cit., p. 13. As cifras citadas por Sasaki, no entanto,
devem se referir a passagens e não vôos. Os 89.029 vôos que ela cita para o ano
de 1992 representariam 244 vôos diários entre os dois países.
NOTAS
283
33
REIS, Maria Edileuza Fontenele, op. cit., pp. 51-56.
34
Labor Force Survey, Ministério de Assuntos Internos e Comunicação do
Japão, Bureau Estatístico, 31/01/2006 – http://web-japan.org/stat/stats/
09LAB31.html, acessado em 29/09/2006.
35
YAMANAKA, Keiko, op. cit. pp. 124-127.
36
Idem, p. 125.
37
Idem, p. 125.
38
CHITOSE, Yoshime, Demographic Profiles of Brazilians and their Children
in Japan. The Japanese Journal of Population, Vol. 4, No. 1, March 2006, p. 94.
39
Idem p. 95.
40
Há quem afirme que os primeiros brasileiros a irem trabalhar como operários
no Japão foram pedreiros e marceneiros isseis e nisseis, recrutados para as
obras de construção de arenas esportivas e de infra-estrutura para os Jogos
Olímpicos de Tóquio de 1964.
41
Population Statistics of Japan, op. cit.. p. 119.
42
Population Statistics of Japan, op. cit; Censo Demográfico do Brasil 2000 in
www.ibge.gov.br.
43
Fonte: www.ibge.gov.br/home/estatisticas/populacao/censo2000/tabulacao,
acessado em 23/10/2006
44
Censo Demográfico do Brasil 2000 in www.ibge.gov.br.
45
Statistics on the Foreigners Registered in Japan, Japan Immigration
Association, 2005.
46
Jornal International Press, edição 671, 21-27/01/2006, caderno Comunidade,
matéria assinada por Claudio Endo “Visto Permanente: Regras mais difíceis”.
47
Jornal Tudo Bem, edição 692, 17-23/06/2006, caderno Comunidade, matéria assinada
por Claudia Emi: “98 Anos de Imigração. Brasileiros que não foram ao Brasil”.
48
Estatísticas Gerais sobre Brasileiros no Japão – Jornal Tudo Bem, Tóquio,
2002, mimeo.
49
Resultado de Questionários Sobre Dekasseguis, Centro de Informação e
Apoio ao Trabalhador no Exterior - CIATE, dezembro de 1999, mimeo.
50
Estimativa extraída do estudo “Variação do Salário Médio dos Admitidos no
Brasil, Paraná e Região Metropolitana de Curitiba. Primeiro Bimestre de 2004”.
284
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Secretaria de Estado do Trabalho, Emprego e Promoção do Paraná, Curitiba,
2004.
51
De acordo com dados do Censo Demográfico de 2000, a população que se
declarou “amarela” tinha a mais alta taxa de escolaridade do Brasil: a alfabetização
de pessoas com mais de 15 anos de idade era de 95,1%; a média de estudos 9,0
anos e a escolarização das crianças entre 7 e 14 anos era de 96,4%. Fonte: Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, Censo Demográfico de 2000.
52
Comissão Permanente de Políticas Públicas para a População Negra,
Universidade de São Paulo, Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas,
Departamento de Sociologia. São Paulo, 2002.
53
MIYAO, Sussumu. Posicionamento social da população de origem japonesa,
in DEMARTINI, Zélia de Brito. Relatos orais de famílias de imigrantes japoneses:
Elementos para a história da educação brasileira. Educação e Sociedade., ago.
2000, vol.21, no.72, p.43-72.
54
UCHIYAMA K et al. Emigração como política de Estado, in Sociedade Brasileira
de Cultura Japonesa. Uma epopéia moderna: 80 anos da imigração japonesa no
Brasil. São Paulo: HUCITEC; 1992. p.137-246.
55
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE: Censo Demográfico de
2000.
56
DEMARTINI, Zélia de Brito. op. cit. p.48.
57
FUKUSAWA, Masayaki. Um Mundo Paralelo – A vida da comunidade
brasileira em Oizumi, Japão. Topbooks Editora, Rio de Janeiro, 2002, p.45.
58
HIGUCHI, Naoto. op. cit. p. 5.
59
As terakoya eram escolas que surgiram a partir do Século XVII nos templos
budistas, inicialmente para as crianças da classe samurai, mas foram
gradativamente expandidas para incluir filhos de mercadores e outros cidadãos.
60
ISHIZAKA, Kazuo. Educação Escolar no Japão. International Society for
Education Information. Série de Referência no. 5. Tóquio, Japão (sem data). p. 3-8.
61
O representante do MEC que visitou o Japão verificou essa realidade: “Em
países de língua inglesa, como os Estados Unidos, onde existe o maior
contingente de brasileiros fora das nossas fronteiras, tem havido um processo
menos penoso de adaptação à situação lá enfrentada. Afinal, o alfabeto é
NOTAS
285
praticamente o mesmo e o aprendizado até mesmo da escrita torna-se empreitada
que o próprio convívio na nova cultura não se reveste de dificuldade
insuperável. O mesmo pode ser dito em relação a outros países ocidentais”
Parecer 11/99 do CNE/CEB, de 07/07/1999 p.13.
62
Há, como foi visto, grandes colônias de coreanos e chineses, mas estas têm
sua origem no período pré-guerra e já podem ser consideradas “culturalmente
japonesas”. Só mantêm a condição de “estrangeira” em função da lei de
nacionalidade nipônica, determinada pela ascendência e não pelo local de
nascimento. As crianças oriundas dessas comunidades estão, em sua maioria,
integradas no sistema educacional daquele país.
63
Situação esta reconhecida pelo Vice-Ministro da Educação do Japão, Teiichi
Sato, em visita que lhe fez o Embaixador do Brasil em 06/03/1998: “... ao longo de
nossa conversa, o principal responsável pela burocracia do Mombusho
reconheceu, com louvável franqueza, que o governo japonês se ressente de
sua ‘falta de experiência’ para lidar com a questão da educação para estrangeiros,
sobretudo no caso de crianças e de jovens”. Telegrama confidencial da
Embaixada em Tóquio, no. 205, de 10/03/1998.
64
http://www.conncoll.edu/academics/departments/transnat/children/
raisedbra.html, acessado em 30/09/2006
65
KAWAMURA, Lili. Para Onde vão os Brasileiros? – Imigrantes Brasileiros
no Japão, 2ª. Ed. Rev. Editora Unicamp, Campinas, 2003, p. 224.
66
Fonte: Texto datado de 26 de agosto de 1997. Arquivo da Embaixada do Brasil
em Tóquio.
67
Fax 247, da Embaixada do Brasil em Tóquio, de 25/11/1997, que transmite a
carta do Chefe do Posto ao Professor Yoshioka.
68
Telegrama no. 732, ostensivo, do Consulado-Geral do Brasil em Tóquio, de
21/11/1997.
69
Telegrama no. 355, ostensivo, da Embaixada do Brasil em Tóquio, de 18/05/
1998.
70
Lei No. 9.394, de 20/12/1996.
71
Para o reingresso de outros alunos ao sistema educacional brasileiro (de
qualquer parte do mundo), normalmente são exigidos, além da tradução e
286
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
consularização dos documentos pertinentes, a realização de exames ou outro
tipo de complementação.
72
TSUDA, Takeyuki & CORNELIUS, Wayne A. Labor Market Incorporation
of Immigrants in Japan and the United States: A comparative analysis. Center
for Comparative Immigration Studies, University of California, San Diego,
Working Paper no. 50, Abril 2002, p. 14.
73
INAGAMI, Takeshi & KUWABARA, Yasuo. Foreign Workers in Japan and
Small Company (Gaikokujin roudousya wo senryokuka suru chuusyou kygyou),
Chuusyou Kygyou Research Center, Tokyo 2003, apud TAKENOSHITA,
Hirohisa, The Differential Incorporation into the Japanese Labor Market: A
Comparative Study of Japanese Brazilians and Professional Chinese Migrants,
The Japanese Journal of Population, Vol. 4, no. 1, March 2006, p.61.
74
SASAKI, Elisa Massae, op. cit. p. 18, apud CORNELIUS, Wayne A. Japan,
The Illusion of Immigration Control in CORNELIUS, Wayne A, Martins Phillip
L & HOLLIFIELD, James F, eds. Controlling Immigration? A Global
Perspective, Stanford University Press, California, 1995, pp. 375-415.
75
HIGUCHI, Naoto, op. cit, p. 10.
76
Idem.
77
Para uma análise do mercado de trabalho e relações trabalhistas no Japão, ver
SCHOPPA, Daniel, Race to the Bottom? Japanese Multinational Firms and the
Future of the Lifetime Employment System. 21/02/2006 in http://
www.japanfocus.org/products/topdf/1682, acessado em 12/10/2006.
78
ROTH, Joshua H. Brokered Homeland, Japanese Brazilian Migrants in Japan,
Cornell University Press, EUA, 2002, p. 66. Entre as normas da Organização
Internacional do Trabalho, ver Convenção 97 da Organização Internacional do
Trabalho, Migration for Employment, em particular o Artigo 6, alínea 1: “Each
member for which this Convention is in force undertakes to apply, without
discrimination in respect of nationality, race, religion or sex, to immigrate
lawfully within its territory…”. em www.ilo.org, acessado em 10/10/2006 .
79
HIGUCHI, Naoto, op. cit. pp 8-9.
80
Para um relato mais aprofundado sobre este ponto, ver REIS, Maria Edileuza
Fontenele, op. cit. pp. 134-136
NOTAS
287
81
Relatório da Comissão Parlamentar Mista sobre Emigração, op. cit. p. 253,
depoimento de Reimei Yoshioka na audiência pública realizada em São Paulo
em 2 de dezembro de 2005.
82
REIS, Maria Edileuza Fontenele, op. cit. pp. 76-81 e 139-141.
83
TSUDA, Takeyuki & CORNELIUS, Wayne A, op. cit. p. 16 .
84
ROSSINI, Rosa Ester. O Brasil no Japão: A Conquista do Espaço dos Nikkeis
do Brasil no Japão, in www.abep.nepo.unicamp.br/site_eventos_abep/PDF/
ABEP2004_270.pdf, acessado em 08/09/2006.
85
Jornal Tudo Bem, edição de 28/09/2005, caderno Comunidade.
86
KOJIMA, Hiroshi. Foreign Workers and Health Insurance in Japan: The
Case of Japanese Brazilians, The Japanese Journal of Population, Vol. 4, no.
1, March 2006, p. 39 in www.ipss.go.jp/web-ad/webjournalfiles/population/
2006_3/kojima.pdf, acessado em 23/08/2006.
87
Uma emenda à Lei de Seguridade Social do Japão, de março de 1995, no
entanto, permite ao trabalhador estrangeiro que regresse definitivamente ao
país de origem o reembolso de até três anos de contribuição.
88
ROTH, Joshua H. op. cit. pp. 71-72.
89
Jornal Tudo Bem, edição de 28/02/2006, Caderno Comunidade.
90
TSUDA, Takeyuki. Strangers in the Ethnic Homeland – Japanese Brazilian
Return Migration in Transnational Perspective, Columbia University Press,
Nova York, 2003, p. 233.
91
O levantamento principal foi feito na publicação “Guia Japão 2006”, da editora
brasileira International Press Japan Co. Ltd., de abril de 2006. Sendo gratuito o
registro da empresa, presume-se que reflita um número aproximativo de
estabelecimentos voltados ao mercado de brasileiros no Japão.
92
SELLEK, Yoko. Migrant Labor in Japan, New York, Palgrave, apud TSUDA,
Takeyuka, op. cit. p. 229
93
Entrevista com Arthur Muranaga, Presidente da IPC TV em 04/10/2006
94
Fonte: Banco Central do Brasil in www.bcb.gov.br/sgspub/consultarvalores,
acessado em 09/10/2006.
95
Banco Interamericano de Desenvolvimento. Remittances 2005
Promoting Financial Democracy, Washington 2006, p. 22, in
288
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
www.iadbdocs.iadb.org/wsdocs/getdocument.aspx?docnum=697487,
acessado em 12/10/2006.
96
ISHI, Angelo, Remittances from Japan to Brazil: Transnational Connections
of “Dekassegui” Migrants, Joint Conference on Remittances, Asian
Development Bank, Manila, 2005, p. 5. Ver também SASAKI, Elisa M. op. cit. p.
51, que estima em 80% o volume de remessas por vias bancárias, apud
KLAGSBRUM, Victor H.
97
SAKODA, Totumo. The Case of Japan and Brazil – Economic and Financial
Aspects in www.iadbdocs.iadb.org/wsdocs/getdocument.aspx?docnum=556306,
acessado em 08/09/2006.
98
Fonte: Banco Central do Brasil - SISBACEN/DW.
99
SAKODA, Totumo, op. cit. p. 6.
100
Fonte: Remittances from Japan to Latin America – Study of Latin American
Immigrants living and working in Japan, in www.iadb.org/mif/v2/files/
bendixen_jp05.pdf, acessado em 14/09/2006.
101
REIS, Maria Edileuza Fontenele, op. cit. p. 85.
102
Displacement: em psicologia, é considerado um mecanismo de defesa
subconsciente onde a mente direciona uma ameaça externa a um cenário
substituto mais aceitável.
103
OLIVEIRA, Adriana Capuano de. Japoneses no Brasil ou Brasileiros no Japão?
A Trajetória de uma Identidade em um Contexto Migratório, Anais do XI Encontro
Nacional de Estudos Populacionais, 1998, pp. 799-818, in http://www.abep.nepo.
unicamp.br/docs/anais/PDF/1998/a152.pdf, acessado em 26/07/2006.
104
TSUDA, Takeyuki, op. cit., p. 356.
105
ROTH, Joshua K, op. cit. p.139.
106
TUSDA, Takeyuki, op. cit. p. 170.
107
REZEK, José Francisco. Direito Internacional Público – Curso Elementar, 6ª.
Edição, Editora Saraiva, São Paulo, 1996, p.181.
108
No caso de filho de brasileiro a serviço do País, nascido no exterior, é necessária
a transcrição do registro de nascimento consular no 1º. Ofício de Notas da
residência futura do interessado.
109
Constituição Federal, Artigo 109.X.
NOTAS
289
110
Nenhuma das duas Constituições do período Vargas previa prazo para a
declaração de opção, o que só foi estabelecido pelo Decreto-Lei no. 389, de
1938, que o fixou em um ano após atingida a capacidade civil.
111
MORAES, Alexandre. Direito Constitucional, 19a. Edição, Editora Atlas, 2006,
São Paulo, pp. 194-195
112
Artigo publicado no jornal O Globo, em 23.02.2006.
113
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros
Editores, 2001, 19ª. Edição, p. 332.
114
Lei de Nacionalidade, no. 147 de 1950, emendada pelas Leis no. 268 de 1952,
Lei no. 45 de 1984 e Lei no. 89 de 1993.
115
Diário Oficial da União, Seção 1, de 07/07/1995, página 10.055.
116
“…alcançada a maioridade essas pessoas passam a ser brasileiras sob
condição suspensiva, isto é, depois de alcançada a maioridade, até que optem
pela nacionalidade brasileira, sua condição de brasileiro nato fica suspensa.
Nesse período, o Brasil os reconhece como nacionais, mas a manifestação
volitiva do Estado torna-se inoperante até o acontecimento previsto, a opção.
É lícito considerá-los nacionais no espaço de tempo entre a maioridade e a
opção, mas não podem invocar tal atributo porque pendem da verificação da
condição” JOBIM, Nelson, Deputado Federal, Congresso Revisor – Relatoria
da Revisão Constitucional – Pareceres Produzidos, Senado Federal, Tomo I,
Brasília – 1994, p.36 in MORAES, Alexandre, op. cit p. 194.
117
Manual do Serviço Consular e Jurídico do MRE, Tomo I, capítulo 5, versão 2,
de 20/10/2005.
118
Diário da Câmara dos Deputados, de 15 de junho de 1996, p. 17.140.
119
Diário da Câmara do Deputados, op. cit, p. 17.141.
120
Proposta de Emenda Constitucional no. 13/99, de 25/03/1999, extraída do
sítio www.camara.gov.br.
121
Diário do Senado Federal, 27 de junho de 2000, p. 13.769.
122
Requerimento no. 4266/2006, Câmara dos Deputados.
123
http://www.maninha.com.br/maninha/newsman.php, acessado em
30/10/2006.
124
International Press, caderno Comunidade, p. A5, 15.07.2006.
290
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
125
Revista Total, Ano II, no. 61, 21-27/07/2006, pp. 10-12 .
126
A taxa de nupcialidade é obtida pela divisão número de casamentos registrados
pelo de habitantes e multiplicando-se o resultado por mil. No caso brasileiro, é
tomada como referencial a população acima de 15 anos de idade.
127
Fontes: www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/registrocivil/2003/
comentarios.pdf e www.stat.go.jp/english/data/handbook/c02contt.htm
acessados em 29/09/2006.
128
Constituição Federal, Artigo 226, parágrafo 3: “Para efeito da proteção do
Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade
familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.” Ver também a
respectiva regulamentação, Lei 8.971/94 e Lei 9.278/96.
129
O Código Civil do Japão, Lei no. 89, de 27.04.1896 e subseqüentes emendas.
130
Código Civil Brasileiro, Lei no. 10.406, de 10.01.2002.
131
Código Civil Brasileiro, op. cit., Art. 1.533: “Celebrar-se-á o casamento, no
dia, hora e lugar previamente designados pela autoridade que houver de presidir
o ato, mediante petição dos contraentes, que se mostrem habilitados com a
certidão do art. 1.531.”
132
Manual do Serviço Consular e Jurídico do MRE, 2003, Tomo I, Capítulo 4.
133
Immigration Control 2005, Immigration Bureau, Ministry of Justice of
Japan. p. 191.
134
Despacho telegráfico 043, ostensivo, para o Consulado-Geral em Nagóia, de
25/02/2002.
135
REIS, Maria Edileuza Fontenele. op. cit p. 175.
136
Population Statistics of Japan 2006.
137
Fonte: www.ibge.gov.br.
138
Para uma análise mais aprofundada sobre o divórcio no Japão, veja ONO,
Hiroshi. Divorce in Japan – Why it happens, why it doesn’t. EIJS Working
Paper Series no. 1, revised edition, January 2006.
139
Código Civil do Japão, Artigos 763 a 771.
140
TANAKA, Áurea Cristine. O Divórcio dos Brasileiros no Japão: O Direito
Internacional Privado e os Princípios Constitucionais. Kaleidos Primus
Consultoria e Comunicação Integrada, São Paulo, 2005, p. 162.
NOTAS
291
141
TANAKA, Áurea Cristine. op. cit. p. 187.
142
Código Civil do Japão, Artigo 770.
143
Population Statistics of Japan 2006.
144
Lei no. 10, de 1898, “Act on the Application of Laws”, que estabelece os
procedimentos, no Japão, para o julgamento de conflitos de leis internacionais
no direito internacional privado.
145
A transcrição da certidão japonesa pode ser feita diretamente em Cartório
brasileiro, mas para tanto exige a tradução juramentada do documento.
146
TANAKA, Áurea Cristine. op. cit. p. 242.
147
Decreto-Lei 4.657/1942, Lei de Introdução ao Código Civil, Artigo 15.
148
STF, SE 2251, Japão, j 15.10.75, rel. Min. Moreira Alves, RTJ 77/389, in
TANAKA, Áurea Cristine, op. cit. p. 246.
149
Pesquisa realizada no sítio eletrônico do Superior Tribunal de Justiça:
www.stj.gov.br/scon/decisoes acessado em 05/09/2006.
150
Anais do Seminário de Capacitação de Decasséguis, Centro de Informação e
Apoio ao Trabalhador no Exterior-CIATE, Topan-Press, São Paulo, 2004, p. 64.
151
Idem p. 71.
152
Fonte: http://web-japan.org/stat/stats/14CRM21.html e www.npa.gov.jp,
acessados em 18/11/2006.
153
Fonte: Arquivos do Consulado-Geral em Tóquio – dados relativos a
novembro de 2006.
154
Fonte: Arquivos do Consulado-Geral em Nagóia, extraídos em 23/11/2006.
155
Fonte: International Centre for Prison Studies, in http://kcl.ac.uk, acessado
em 12/11/2006.
156
Relatório da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Emigração, op. cit.
p. 263.
157
Fonte: Tribunal Superior Eleitoral, in www.tse.gov.br. Os dados de
comparecimento referem-se ao primeiro turno das eleições nos três anos citados.
158
A redução do número de eleitores entre 2002 e 2006 no Japão deveu-se, em
parte, ao fato de o Cartório Eleitoral da Zona-ZZ ter deixado de processar, por
problemas administrativos, muitos pedidos de recadastramento encaminhados
pelos dois Consulados-Gerais no início de 2006.
292
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
159
Carta assinada em 31/10/2005 pela Associação das Escolas Brasileiras no
Japão, Associação de Brasileiros de Hamamatsu, Associação de Brasileiros de
Toyohashi, Associação dos Brasileiros Residentes no Japão, Câmara de
Comércio Brasil-Japão e Centro Internacional de Desenvolvimento Técnico e
Educacional de Oizumi. Fonte: Arquivo da Embaixada em Tóquio.
160
Telegrama no. 263, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 13/03/2006.
161
Nota Verbal no. 1231/LAC/-SA, no Ministério dos Assuntos Estrangeiros
do Japão, de 28/03/2005. Arquivo da Embaixada em Tóquio.
162
Fonte: Arquivo da Embaixada em Tóquio.
163
Despacho telegráfico no. 224, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio, de
14/04/2005.
164
http://www.tre-df.gov.br/eleicoes_exterior/arquivos/secoeseleitoraisexterior
2006.pdf, acessado em 02/11/2006.
165
LAMPREIA, Luiz Felipe P, apud REGO BARROS, Sebastião, A Nova Política
de Assistência aos Brasileiros no Exterior, Revista Brasileira de Política Externa,
vol. 5, no. 3, dezembro de 1996, in www.mre.gov.br/portugues/politica _externa/
discursos/discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=1716, acessado em 13/08/2006.
166
Para um descrição histórica dos antecedentes que culminaram na criação
dessas duas repartições consulares, ver REIS, Maria Edileuza Fontenele, op.
cit. pp. 121-127.
167
“Problemas que Afligem a Comunidade Brasileira no Japão”. Texto na forma
de non-paper datado em 26 de agosto de 1997, arquivo da Embaixada em Tóquio.
168
Telegrama no. 763, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 18/11/1998.
169
Circular Telegráfica 40.446, ostensiva de 12/01/2001.
170
Telegrama no. 121, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 14/02/2001.
171
Despacho telegráfico no 364, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio, de 29/
08/2002.
172
Telegrama no. 702, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 30/02/2002.
173
Em 1981, o Brasil era o país com o maior número de cidadãos japoneses
residentes fora do Japão, 131.363 e São Paulo a cidade com a mais expressiva
colônia nipônica no mundo – 28.851 pessoas. Em 2004, o Brasil , com 69.019
cidadãos nipônicos, já estava na terceira posição, atrás dos EUA (339.387) e
NOTAS
293
China (99.179). São Paulo, por sua vez, passou a ocupar a 11ª. colocação, com
apenas 15.855 cidadãos japoneses registrados, atrás de cidades como Nova
York, Los Angeles, Vancouver, Cingapura e Sydney. Fonte: Population Statistics
of Japan, op. cit. p. 119. Populations Statistics of Japan, op. cit.
174
Telegrama 599, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 02/07/2003.
175
Artigo 35 da Constituição japonesa: “o direito de todas as pessoas de
estarem seguras em seus lares, papéis e bens contra entradas, buscas e
apreensões não será infringido salvo mediante mandado emitido por justa
causa” (tradução informal do autor) e Lei para a Proteção de Dados Pessoais
Processados Eletronicamente por Órgãos Administrativos, de 1988, que
governa o uso de informações pessoais em arquivos eletrônicos mantidos
por agências oficiais. Essa proteção foi posteriormente ampliada por meio de
legislação de 2003 e 2005 que regulamentou o sigilo da informação no setor
privado.
176
Telegrama no. 613, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 02/07/2003.
177
Idem.
178
Jornal International Press, edição de 02/07/2003, Caderno Comunidade.
179
Telegrama no. 335, da Embaixada em Tóquio, ostensivo, de 07/04/2004.
180
Comunicado Conjunto por ocasião da visita oficial ao Brasil do Primeiro
Ministro Junichiro Koizumi, 14-16 de setembro de 2004. Fonte: Arquivo da
Embaixada em Tóquio.
181
Telegrama no. 1.034, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 08/10/2004.
182
Telegrama no. 1.037, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 22/10/2004.
183
Telegrama no. 198, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 19/04/2005.
184
Uma explicação mais pormenorizada deste assunto será feita no Capítulo 6.
185
“Programa Conjunto relativo às Comunidades Brasileiras no Japão” assinado
por ocasião da visita do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao Japão. Tóquio,
26 de maio de 2005. Arquivo da Embaixada em Tóquio.
186
Telegrama no. 651, confidencial, da Embaixada em Tóquio, de 02/06/2005.
187
Idem.
188
Telegrama no. 1.131, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 31.10.2005.
189
Telegrama no. 457, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 28/04/2006.
294
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
190
Fonte: Relatório do Ministério da Previdência e Assistência Social sobre
Negociação de um Acordo Internacional Brasil Japão, de abril de 2003. Arquivo
da Embaixada em Tóquio. A Lei 8.212, de 24/07/1991 é a Lei Orgânica da
Seguridade Social. O artigo 12 refere-se aos trabalhadores cuja inscrição no
sistema previdenciário nacional é mandatória: empregado, empregado
doméstico, empresário, autônomo etc.
191
Memorandum DAOC-II/16, de 26/11/2002. Fonte: Arquivo da Embaixada em
Tóquio.
192
Telegrama 1.034, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 08/10/2004.
193
Despacho telegráfico no. 506, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio, de
23/09/2005.
194
Idem.
195
Acordo sobre Assistência Judiciária entre o Brasil e o Japão. Fonte:
wwww.mre.gov.br/dai/b_japa_04_1383.htm, acessado em 15/10/2006.
196
Além das distinções nos ordenamentos jurídicos nos dois países, havia,
segundo relato da Embaixada em Tóquio, uma diferença de interpretação do
Acordo de 1940, que dificultava a tramitação de cartas rogatórias no Japão:
“Esse ponto tem causado dificuldades ao cumprimento das rogatórias por parte
da justiça local ... os representantes (da Corte Suprema japonesa) se queixam de
que a parte brasileira não estaria preparando as rogatórias dirigidas à justiça
japonesa em conformidade com o acordo em vigor.... entende, que em casos de
citação, por exemplo, o órgão requisitante deve ‘encaminhar’ junto com a carta
rogatória ... o mandado de citação, o que raras vezes acontece. Ocorre que o
texto brasileiro não se refere, em nenhum momento, a ‘encaminhamento de
documentos’. .. a frase do texto em português relativo a “para efeito da
notificação de atos judiciários e da execução de cartas rogatórias que se referem
à obtenção de provas”; em japonês, lê-se ‘para efeito de encaminhamento de
documentos e do exame de provas’”. Fonte: Telegrama no. 211, ostensivo, da
Embaixada em Tóquio, de 27/04/1999.
197
Telegrama no. 668, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 14/10/1998.
198
Despacho Telegráfico no. 131, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio, de
19/04/1999.
NOTAS
295
199
Telegrama no. 211, ostensivo, da Embaixada em Tóquio.
200
Telegrama no. 269, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 26/05/1999.
201
Idem.
202
Despacho telegráfico no. 427, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio, de
15/11/2000.
203
Telegrama no. 871, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 12/12/2000.
204
Despacho telegráfico no. 46, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio, de 09/
02/2001.
205
Fonte: matéria “Brasileiros foragidos mobilizam Shizuoka” postada no sítio
eletrônico do Jornal International Press (www.ipcdigital.com) em 29/06/2006.
206
Constituição Federal, Artigo 5º alínea LI: “Nenhum brasileiro será extraditado,
salvo o naturalizado, em caso de crime comum praticado antes da naturalização, ou
de comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, na
forma da lei”. Lei de Extradição do Japão, no. 68, de 1953, Artigo 2 fugitive shall not
be surrendered in any of the following circumstances, provided that this shall not
apply, in cases falling under items 3, 4, 8 or 9, when the treaty of extradition
provides otherwise … item (9): when the fugitive is a Japanese national.
207
Despacho telegráfico no. 553, reservado, para a Embaixada em Tóquio, de
03/11/2006.
208
Idem.
209
Nota Verbal no. 377/2006, da Embaixada do Japão em Brasília, transmitida à
Embaixada em Tóquio pelo fac-símile no. 109, de 07/11/2006.
210
Nota verbal no. DJ/DAC/DAOC II/179, de 07/11/2006, transmitida à
Embaixada em Tóquio pelo fac-símile no. 109, da mesma data.
211
Pleiteando a Celebração de Mais Acordos Previdenciários, documento da
Nippon Keidanren, Japanese Overseas Enterprises Association e Japan Foreign
Trade Council, de 17/10/2006. Fonte: Arquivo da Embaixada em Tóquio.
212
Telegrama no. 1095, reservado, da Embaixada em Tóquio, de 08/11/2006.
213
REIS, Maria Edileuza Fontenele. op. cit. p. 127.
214
Em 1995, o Consulado-Geral em Nagóia era responsável por cerca de 57% da
comunidade brasileira; em 2005, sua jurisdição já abarcava 67% do total daquela
população.
296
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
215
Telegrama 68, confidencial, do Consulado-Geral em Tóquio, de 08/02/2006.
216
Manual de Serviço Consular e Jurídico, 2003, Tomo I, Capítulo 3o., Seção 3a.
217
Segundo dados do Ministério da Justiça do Japão, em Tóquio residem apenas
4.725 brasileiros e em Nagóia 5.796, de um total de cerca de 100.000 e 200.000
nacionais que vivem, respectivamente, nas duas jurisdições
218
Manual de Serviço Consular e Jurídico, 2003, Tomo I, Capítulo 3o., Seção 2a.
219
REIS, Maria Edileuza Fontenele, op. cit. p. 133.
220
Telegrama no. 79, ostensivo, do Consulado-Geral em Tóquio, de 16/02/2006.
221
Idem.
222
Despacho telegráfico no. 87, ostensivo, para o Consulado-Geral em Tóquio,
de 03/03/2006
223
REIS, Maria Edileuza Fontenele, op. cit. p. 237.
224
Telegrama no. 362, ostensivo, do Consulado-Geral em Tóquio, de 18/07/
2006.
225
Na apresentação do relatório da Comissão, seu Presidente, Senador Marcelo
Crivella (PL/RJ) notou que: “na medida em que os trabalhos eram divulgados
pelos órgãos de imprensa, a Comissão passou a ser conhecida pelo nome de
“CPMI da Emigração Ilegal” muito embora tenhamos preferido designá-la
simplesmente como “CPMI da Emigração”, para afastar estereótipos que
freqüentemente recaem sobre os emigrantes não documentados”. Na verdade,
a emigração em si, a liberdade de ‘ir e vir’ garantida pela Constituição Federal,
não constitui qualquer “ilegalidade”, situação jurídica que só se confirma quando
da entrada do cidadão em outro país sem a devida permissão ou autorização.
226
Requerimento no. 02/2005-CN, de 05/05/2006.
227
Telegramas nos. 238 e 239, ostensivos, da Embaixada em Tóquio, de 08/03/
2006.
228
Relatório da Comissão Parlamentar Mista de Inquérito da Emigração, op. cit.
p. 263.
229
Idem, p. 253. O Projeto de Lei do Senado no. 15, de 23/01/2006 propõe a
alteração do Código Penal para criminalizar o tráfico internacional de pessoas
para fins de emigração, e a Lei nº. 9.613, de 3 de março de 1998, e para inserir a
mencionada conduta entre os crimes antecedentes da lavagem de dinheiro.
NOTAS
297
230
REIS, Maria Edileuza Fontenele. op. cit. pp. 158-159.
231
A esse respeito, a Sra. Shoko Takano, da referida ONG Oizumi Kokusai
Kyouiku Gijutsu Fukyu Center, prestou o seguinte depoimento: “ela achou
importante o depoimento de um dependente químico pela entidade japonesa
DARC, que mantém unidades de recuperação em diferentes províncias do Japão.
O rapaz falou em tom de desespero e emocionante porque confessou que não
estava conseguindo largar as drogas... No ano seguinte, a Delegacia Central de
Gunma informou que o índice de criminalidade de brasileiros menores com
drogas ficou praticamente nulo”. Jornal Tudo Bem, Caderno Comunidade, de
24/09/2006.
232
Instituto de Direito Comparado Brasil-Japão. Declaração de São Paulo e
Londrina e Declaração de Hamamatsu. São Paulo, 2004, p. 5.
233
Idem, p. 10.
234
As cidades são: Ota, Oizumi, Iwata, Kosai, Fuji, Hamamatsu, Yokkaichi,
Suzuka, Ueno, Minokamo, Kani, Ogaki, Iida, Toyohashi e Toyota.
235
Instituto de Direito Comparado Brasil-Japão. Declaração de São Paulo e
Londrina e Declaração de Hamamatsu. São Paulo, 2004, p. 21.
236
Fonte: Tokyo-Nikkeis. Declaração de Toyota, in www.tfemploy.go.jp/htdocs/
port , acessado em 18/11/2006
237
Fonte: Foreign Press Center of Japan, in www.fpcj.jp/e/briefingreport/
bfr_221.html. acessado em 18/11/2006
238
Telegrama no. 1.160, ostensivo da Embaixada em Tóquio, de 22/01/2006.
239
Fonte: Population Division of the Department of Economic and Social
Affairs of the United Nations Secretariat. Trends in Total Migrant Stock 2005
Revision, in http://esa.un.org/migration/p2k0data.asp, acessado em 30/08/2006.
240
Fonte: Ministério da Justiça do Brasil. Matéria sobre o II Seminário
Internacional de Políticas Migratórias, in www.mj.gov.br/notícias/2006/julho/
RLS130706seminario.htm, acessado em 02/11/2006.
241
PATARRA, Neide L. & BAENINGER, Rosana. Mobilidade Espacial da
População no Mercosul – Metrópoles e Fronteiras. Revista Brasileira de
Ciências Sociais, Vol. 21, no. 60, fevereiro de 2006 p. 87. Disponível em
www.scielo.br.
298
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
242
Fonte: www2.camara.gov.br/comissoes/credn/publicacao/
notatecnicabrasilerosexterior.html, acessado em 23/08/2006.
243
MELLYN, Kevin. Worker Remittances as a Development Tool – Opportunity
for the Phillipines, in www.adb.org/documents/reports/consultant/
worker_remittances_phi.pdf, acessado em 14/10/2006.
244
Fonte: Banco Mundial, in http://siteresources.worldbank.org/
DATASTATISTICS/Resources/GDP.pdf, acessado em 14/10/2006.
245
Fonte: www.tse.gov.br.
246
Fonte: www.senado.gov.br.
247
Fonte: www. http://www6.senado.gov.br/legislacao/ListaPublicacoes.
action?id=63975, acessado em 15/11/2006.
248
Fonte: www6.senado.gov.br/legislacao. As datas referem-se à criação da
repartição, não necessariamente coincidentes com sua efetiva entrada em
operação.
249
A Portaria no 138, de 10/06/2005, publicada no Boletim de Serviço no. 110/
2005 do MRE, prevê, para o Consulado Geral Tóquio uma lotação de um Chefe
do Posto, quatro Conselheiros ou Secretários, nove Oficiais de Chancelaria e
dois Assistentes de Chancelaria. Para Nagóia, a previsão é de um Chefe do
Posto, três Conselheiros ou Secretários, cinco Oficiais de Chancelaria e dois
Assistentes de Chancelaria. As lotações atuais (segundo semestre de 2006)
revelam a carência de dois Conselheiros ou Secretários nos dois Consulados-
Gerais, três Oficiais de Chancelaria em Tóquio e dois em Nagóia e um Assistente
de Chancelaria em Tóquio. Curiosamente, é inferior a expectativa de lotação do
Consulado-Geral em Nagóia, que atende ao dobro do público de Tóquio (200.000
e 100.000 brasileiros residentes nas duas jurisdições, respectivamente) .
250
Diário Oficial da União de 06/12/2006, Seção 1, pág. 70.
251
Fonte: Statistics on The Foreigners Registered in Japan 2005.
252
Fonte: www.jetprogramme.org/e/introduction.
253
McCONNELL, David L. Importing Diversity: Inside Japan’s JET Programme,
University of California Press, 2000, p. 1.
254
REIS, Maria Edileuza Fontenele. op. cit. pp. 155-156. A autora indica que o
aumento de 7 para 15 participantes brasileiros em 1995 e 1996 decorreu de
NOTAS
299
gestões empreendidas junto aos governos das províncias com maior número
de brasileiros residentes.
255
Telegrama no. 461, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 06/05/2006.
256
Telegrama no. 122, ostensivo, do Consulado-Geral em Tóquio, de 15/03/
2006.
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Correspondência Oficial do Ministério das Relações Exteriores
Despacho Telegráfico n. 131, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio,
de 19/04/1999.
Despacho telegráfico n. 427, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio,
de 15/11/2000.
Despacho telegráfico n. 46, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio, de
09/02/2001.
Despacho telegráfico n. 43, ostensivo, para o Consulado-Geral em Nagóia,
de 25/02/2002.
312
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Despacho telegráfico n. 364, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio,
de 29/08/2002.
Despacho telegráfico n. 224, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio,
de 14/04/2005.
Despacho telegráfico n. 506, ostensivo, para a Embaixada em Tóquio,
de 23/09/2005.
Despacho telegráfico n. 87, ostensivo, para o Consulado-Geral em Tóquio,
de 03/03/2006.
Despacho telegráfico n. 553, reservado, para a Embaixada em Tóquio,
de 03/11/2006.
Telegrama n. 732, ostensivo, do Consulado-Geral do Brasil em Tóquio,
de 21/11/1997.
Telegrama n. 205, confidencial, da Embaixada em Tóquio, de 10/03/
1998.
Telegrama n. 355, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 18/05/1998.
Telegrama n. 668, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 14/10/1998.
Telegrama n. 763, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 18/11/1998.
Telegrama n. 211, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 27/04/1999.
Telegrama n. 269, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 26/05/1999.
Telegrama n. 871, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 12/12/2000.
BIBLIOGRAFIA
313
Telegrama n. 121, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 14/02/2001.
Telegrama n. 702, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 30/02/2002.
Telegrama n. 599, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 02/07/2003.
Telegrama n. 613, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 02/07/2003.
Telegrama n. 335, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 07/04/2004.
Telegrama n. 1034, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 08/10/2004.
Telegrama n. 1037, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 22/10/2004.
Telegrama n. 198, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 19/04/2005.
Telegrama n. 651, confidencial, da Embaixada em Tóquio, de 02/06/
2005.
Telegrama n. 1131, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 31/10/2005.
Telegrama n. 1160, ostensivo da Embaixada em Tóquio, de 22/01/2006.
Telegrama n. 79, ostensivo, do Consulado-Geral em Tóquio, de 16/02/
2006.
Telegramas n. 239, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 08/03/2006.
Telegramas n. 238, ostensivos, da Embaixada em Tóquio, de 08/03/2006.
Telegrama n. 263, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 13/03/2006.
314
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Telegrama n. 122, ostensivo, do Consulado-Geral em Tóquio, de 15/03/2006.
Telegrama n. 457, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 28/04/2006.
Telegrama n. 461, ostensivo, da Embaixada em Tóquio, de 06/05/2006.
Telegrama n. 362, ostensivo, do Consulado-Geral em Tóquio, de 18/07/
2006.
Telegrama n. 1095, reservado, da Embaixada em Tóquio, de 08/11/2006.
Circular Telegráfica n. 40.446, ostensiva, de 12/01/2001.
Fac-símile n. 247, da Embaixada do Brasil em Tóquio, de 25/11/1997.
Fac-símile n. 109, para a Embaixada em Tóquio, de 07/11/2006
Arquivo da Embaixada do Brasil em Tóquio
Carta de Solicitação de Abertura de novas seções eleitorais no Japão,
assinada em pela Associação das Escolas Brasileiras no Japão,
Associação de Brasileiros de Hamamatsu, Associação de Brasileiros
de Toyohashi, Associação dos Brasileiros Residentes no Japão,
Câmara de Comércio Brasil-Japão e Centro Internacional de
Desenvolvimento Técnico e Educacional de Oizumi, de 31/10/2005.
Comunicado Conjunto por ocasião da visita oficial ao Brasil do Primeiro
Ministro Junichiro Koizumi, 14-16/09/2004
Nota Verbal n. 1231/LAC/-SA, do Ministério dos Assuntos Estrangeiros
do Japão, de 28/03/2005.
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Foreign Trade Council, de 17/10/2006
Problemas que afligem a Comunidade Brasileira no Japão. Texto na
forma de non-paper datado de 26/08/1997. Fonte: arquivo da
Embaixada em Tóquio
Programa Conjunto relativo às Comunidades Brasileiras no Japão
assinado por ocasião da visita do Presidente Luiz Inácio Lula da
Silva ao Japão. Tóquio, 26/05/2005
Relatório do Ministério da Previdência e Assistência Social sobre
Negociação de um Acordo Internacional Brasil Japão, de abril de
2003. Arquivo da Embaixada em Tóquio.
Artigos de Jornal
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Comunidade, matéria assinada por Claudio Endo “Visto Permanente:
Regras mais difíceis”.
Jornal International Press, Caderno Comunidade, p. A5, 15/07/2006
Jornal Tudo Bem, edição 692, 17-23/06/2006, Caderno Comunidade,
matéria assinada por Claudia Emi: “98 Anos de Imigração.
Brasileiros que não foram ao Brasil”.
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JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Jornal Tudo Bem, Tóquio, 2002, Estatísticas Gerais sobre Brasileiros no
Japão.
Jornal Tudo Bem, edição de 28/09/2005, Caderno Comunidade.
Jornal Tudo Bem, edição de 28/02/2006, Caderno Comunidade.
Jornal International Press, edição de 02/07/2003, Caderno Comunidade.
Jornal O Globo, edição de 23.02.2006.
Revista Total, Ano II, no. 61, 21-27/07/2006
Sítios na internet
Banco Central do Brasil: www.bcb.gov.br.
Câmara dos Deputados da República Federativa do Brasil:
www.camara.gov.br.
Connecticut College http://www.conncoll.edu/
Deputada Maninha: http://www.maninha.com.br/maninha/
Foreign Press Center Japan. www.fpcj.jp
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE: www.ibge.gov.br
Japan Exchange and Teaching Programme: www.jetprogramme.org
Jornal International Press: www.ipcdigital.com
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International Centre for Prison Studies: http:://kcl.ac.uk.
National Institute of Population and Social Security Research of
Japan: http://www.ipss.go.jp/
Tribunal Superior Eleitoral: http://www.tre-df.gov.br
Tokyo-Nikkeis: www.tfemploy.go.jp
ANEXOS
321
1. Descendência:
( ) nissei ( ) sansei ( ) mestiço ( ) não-descendente
2. Origem no Brasil:
Estado: ………………….
Cidade: …...…………….
3. Residência no Japão:
Província: …………………..
Cidade: …………………….
4. Razão da primeira vinda para o Japão:
emprego/trabalho ( ) acompanhando família ( )
Já regressou ao Brasil e voltou ao Japão:
( ) sim ( ) não. (não considere férias)
Em caso de “sim”, quantas vezes?: ……….
Quantos anos, no total, já viveu no Japão, incluindo idas e vindas
ao/do Brasil? …………….
Qual o sua situação legal no Japão:
( ) visto temporário ( ) visto permanente ( ) dupla cidadania
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
QUESTIONÁRIO (VERSÃO MANUAL)
322
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
Tem imóvel no Japão?:
( ) sim ( ) não
Tem carro próprio
( ) sim ( ) não
Pretende voltar ao Brasil para morar definitivamente?
( ) sim ( ) não ( ) ainda não sabe
Emprego/Profissão:
No Brasil: ………………………………
No Japão ………………………………………
5. Escolaridade:
( ) fundamental (1o. grau) ( ) completo ( ) incompleto
( ) nível médio (2o. grau) ( ) completo ( ) incompleto
( ) superior : ( ) completo ( ) incompleto
Curso: ………………….…………
6. Estado Civil e família
Idade: ……….
Sexo: ( ) masc. ( ) fem
( ) solteiro/a ( ) casado/a ( ) separado/a-divorciado/a
Se casado/a, o/a cônjuge é:
( ) descendente ( ) não-descendente
( ) japones/a ( ) outra nacional.
b) casaram-se
no Brasil ( )
ANEXO
323
no Japão ( ) - casamento registrado no Consulado-Geral:
( ) sim ( ) não
c) filhos
Idade Nascido no Frequenta Escola
1 …….. ( ) Brasil ( ) Japão ( )Brasileira ( ) Japonesa
2 …….. ( ) Brasil ( ) Japão ( )Brasileira ( ) Japonesa
3 …….. ( ) Brasil ( ) Japão ( )Brasileira ( ) Japonesa
d) filhos maiores de 18 anos:
frequentam universidade/curso técnico?
( ) sim ( ) não
Em caso positivo, onde?
( ) Brasil ( ) Japão.
Para os filhos nascidos no Japão, foi feito o registro de nascimento no
Consulado-Geral?
( ) sim ( ) não
7. Remessas Financeiras e Poupança
Você poupa dinheiro no Japão?
( ) sim ( ) não
Voce remete dinheiro regularmente para o Brasil
( ) sim ( ) não
324
JOÃO PEDRO CORRÊA COSTA
( ) aquisição de imóveis ( ) aquisição de imóveis
ou outros bens ou outros bens
( ) abertura de negócios ( )abertura de
negócios
( ) pagamento de dívidas ( )despesas futuras
contraídas no Brasil com educação
( ) custeio de despesas ( ) investimentos
com ensino superior
( ) investimentos ( ) outra
( ) ajuda à família
( ) outra
Finalidade da poupança/envio
para o Brasil:
Finalidade da poupança no
Japão
ANEXO
325
A POPULAÇÃO BRASILEIRA NO JAPÃO
QUESTIONÁRIO (VERSÃO ELETRÔNICA)
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
Baixar livros de Administração
Baixar livros de Agronomia
Baixar livros de Arquitetura
Baixar livros de Artes
Baixar livros de Astronomia
Baixar livros de Biologia Geral
Baixar livros de Ciência da Computação
Baixar livros de Ciência da Informação
Baixar livros de Ciência Política
Baixar livros de Ciências da Saúde
Baixar livros de Comunicação
Baixar livros do Conselho Nacional de Educação - CNE
Baixar livros de Defesa civil
Baixar livros de Direito
Baixar livros de Direitos humanos
Baixar livros de Economia
Baixar livros de Economia Doméstica
Baixar livros de Educação
Baixar livros de Educação - Trânsito
Baixar livros de Educação Física
Baixar livros de Engenharia Aeroespacial
Baixar livros de Farmácia
Baixar livros de Filosofia
Baixar livros de Física
Baixar livros de Geociências
Baixar livros de Geografia
Baixar livros de História
Baixar livros de Línguas
Baixar livros de Literatura
Baixar livros de Literatura de Cordel
Baixar livros de Literatura Infantil
Baixar livros de Matemática
Baixar livros de Medicina
Baixar livros de Medicina Veterinária
Baixar livros de Meio Ambiente
Baixar livros de Meteorologia
Baixar Monografias e TCC
Baixar livros Multidisciplinar
Baixar livros de Música
Baixar livros de Psicologia
Baixar livros de Química
Baixar livros de Saúde Coletiva
Baixar livros de Serviço Social
Baixar livros de Sociologia
Baixar livros de Teologia
Baixar livros de Trabalho
Baixar livros de Turismo