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Universidade
Estadual de Londrina
LIVIA RAMOS PINTO
A ATUAÇÃO PARLAMENTAR DA MULHER NO ESTADO DO
PARANÁ E A PERSPECTIVA DE GÊNERO
LONDRINA
2008
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LIVIA RAMOS PINTO
A ATUAÇÃO PARLAMENTAR DA MULHER NO ESTADO DO
PARANÁ E A PERSPECTIVA DE GÊNERO
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado em Serviço Social e Política
Social da Universidade Estadual de
Londrina, como requisito à obtenção do
título de Mestre.
Orientadora: Profª Drª Cássia Maria
Carloto.
LONDRINA
2008
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Catalogação na publicação elaborada pela Divisão de Processos Técnicos da
Biblioteca Central da Universidade Estadual de Londrina.
Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)
P658a Pinto, Lívia Ramos.
A atuação parlamentar da mulher no Estado do Paraná
e a perspectiva de gênero / Lívia Ramos Pinto. –
Londrina, 2008.
124 f. : il.
Orientador: Cássia Maria Carloto.
Dissertação (Mestrado em Serviço Social e Política
Social) Universidade Estadual de Londrina, Centro de
Estudos Sociais Aplicados, Programa de Pós-Graduação
em Serviço Social e Política Social, 2008.
Bibliografia: f. 117-122.
1. Mulheres na política – Teses. 2. Participação política
– Teses. 3. Relações de gênero – Teses. I. Carloto, Cássia
LIVIA RAMOS PINTO
A ATUAÇÃO PARLAMENTAR DA MULHER NO ESTADO DO
PARANÁ E A PERSPECTIVA DE GÊNERO
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado em Serviço Social e Política
Social da Universidade Estadual de
Londrina, como requisito à obtenção do
título de Mestre.
Orientadora: Profª Drª Cássia Maria Carloto.
COMISSÃO EXAMINADORA
____________________________________
Profª Drª Cássia Maria Carloto.
Universidade Estadual de Londrina
____________________________________
Prof. Componente da Banca
Universidade Estadual de Londrina
____________________________________
Prof. Componente da Banca
Universidade Estadual de Londrina
Londrina, _____de ___________de _____.
AGRADECIMENTOS
A Deus, por estar presente em todos os momentos da minha vida, guiando,
orientando e iluminando todo o meu viver.
A meus pais, Julio e Vera, por todo amor e apoio na luta pelos meus ideais, em
especial à minha mãe, por compartilhar comigo sua sabedoria.
A minha irmã, Beatriz, pelas palavras de incentivo e orações.
A meu noivo, Rogério, pela paciência, amor e companheirismo ao longo desta etapa.
A Dona Elza Balan Bueno (in memorian) pelo carinho e hospitalidade em sua casa.
A meu chefe, Mohamad Ali Hanzé (in memorian), pela confiança e apoio no meu
trabalho.
As Deputadas Estaduais do Estado do Paraná, pela imensa contribuição na
realização desta pesquisa.
A Professora Dra. Cássia Maria Carloto pelo exemplo de capacidade, competência e
dedicação na vida acadêmica, e pela honra de sua valiosa orientação.
PINTO, Lívia Ramos. A atuação parlamentar da mulher no Estado do Paraná e a
perspectiva de gênero. 2008. 124 fls. Dissertação (Mestrado em Serviço Social e
Política Social) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2008.
RESUMO
O objetivo do presente trabalho foi conhecer e analisar a participação e
representação feminina das parlamentares na Assembléia Legislativa do Estado do
Paraná: dificuldades, preconceitos e avanços na perspectiva de gênero. Como
objetivos específicos, propusemo-nos resgatar a história das lutas e conquistas
femininas; conhecer e avaliar os projetos apresentados pelas parlamentares
paranaenses; verificar se há discriminação às parlamentares e em que medida elas
atuam na perspectiva de gênero, no processo de elaboração de ações e projetos
voltados aos direitos das mulheres.
Palavras-chave: Mulheres parlamentares. Gênero. Representatividade feminina.
Participação política.
PINTO, Lívia Ramos. The women’s parliamentary actuation in the State of
Paraná and the gender perspective. 2008. 124 fls. Dissertation (Master degree in
Social Work and Social Politic) - State University of Londrina, Londrina, 2008.
ABSTRACT
The purpose of the present paper was to know and to analyze the participation and
representation of the female parliamentarians in the Legislative Assembly of the
State of Paraná: difficulties, advances and challenges in the gender perspective. As
specific goals we proposed to rescue the history of the feminine fights and
conquests; to know and valuate the projects presented by the parliamentarians of
Paraná; to verify if there is prejudice against the parliamentarians and how they act in
the gender perspective, in the process of the projects and in the actions focused on
women’s rights.
Key words: Female parliamentarians. Gender. Female representation. Political
participation.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO..........................................................................................................7
CAPÍTULO 1 - RELAÇÕES DE GÊNERO................................................................12
1.1 D
ESIGUALDADE E GÊNERO .....................................................................................12
1.2 C
ONCEITO DE GÊNERO ..........................................................................................16
CAPÍTULO 2 - CONQUISTA DOS DIREITOS E DA CIDADANIA FEMININA.........23
2.1 D
IREITOS E CIDADANIA...........................................................................................23
CAPÍTULO 3 - PARTICIPAÇÃO DA MULHER NA ESFERA PÚBLICA E
PRIVADA..................................................................................................................31
3.1 M
ARCO HISTÓRICO ................................................................................................31
3.2 R
ELEVÂNCIA DO SUFRAGISMO E FEMINISMO NA CONQUISTA DOS DIREITOS DAS
MULHERES............................................................................................................37
3.3 S
UFRAGISMO E FEMINISMO NO BRASIL ....................................................................41
CAPÍTULO 4 - A PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES NA VIDA PÚBLICA E
POLÍTICA NO BRASIL.............................................................................................47
4.1 A I
NSERÇÃO DA MULHER NOS CARGOS ELETIVOS NO BRASIL....................................54
4.2 A L
EI DE COTAS E A REPRESENTAÇÃO DAS MULHERES NO PODER ............................64
4.3 A R
EPRESENTATIVIDADE FEMININA NO ESTADO DO PARANÁ .....................................68
CAPÍTULO 5 - ANÁLISE DAS ENTREVISTAS........................................................70
5.1 P
ARTICIPAÇÃO POLÍTICA: MOTIVAÇÕES, DIFICULDADES DE INGRESSO E RELAÇÃO
FAMILIAR
................................................................................................................72
5.2 A
SSEMBLÉIA LEGISLATIVA: DESCRIMINAÇÃO; CARÇOS DE REPRESENTAÇÃO................90
5.3 A
TUAÇÃO PARLAMENTAR: OS PROJETOS E A PERSPECTIVA DE GÊNERO......................98
CONSIDERAÇÕES FINAIS................................................................................... 110
REFERÊNCIAS...................................................................................................... 117
ANEXOS................................................................................................................ 123
ANEXO A – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.................................... 124
7
INTRODUÇÃO
Os eixos de poder em nossa sociedade estão estruturados pelo
sistema capitalista, o qual criou condições desiguais de exclusão, de injustiças e,
consequentemente, originou uma sociedade onde as diferenças de classes, de
grupos, de raças e de sexo não são vistas como diferenças naturais, o que acarreta
uma grande desigualdade e exclusão social.
Além disso, a sociedade é envolvida, também, pelas relações de
gênero marcado pela dominação/exploração dos homens sobre as mulheres, que
acabam sendo co-relacionadas às questões da centralidade do poder na mão do
dominante, dos homens, que, por muito tempo, usufruíram de um sistema
autoritário, excluindo as mulheres dos espaços decisórios de poder, gerando, assim,
desigualdades no campo social e político.
Nesse sentido, as mulheres foram e, de certa forma, continuam
sendo, vítimas de desigualdades e discriminações. Carregam consigo uma longa
história de submissão, privações, preconceitos, discriminações, desigualdades,
concretizadas em situações de desvalorização do trabalho, do emprego doméstico,
da dependência econômica, da diferença entre os sexos, da exclusão dos espaços
de poder e de decisão política.
Saffioti (2004) afirma que essas desigualdades geradas pelo
empoderamento individual do homem, consistente dentro do capitalismo (onde
prevalece o interesse individual e não coletivo) acaba culpando as próprias mulheres
pela então condição de inferioridade em relação aos homens. Ou seja: “se a maioria
das mulheres não conseguiu uma situação proeminente, a responsabilidade delas,
porquanto são pouco inteligentes, não lutaram suficientemente, não se dispuseram a
suportar os sacrifícios que a ascensão social impõe, num mundo a elas hostil.”
(SAFIOTTI, 2004, p. 114).
O exposto acima demonstra que o individualismo mantido pelo
capitalismo remete o sujeito a desqualificar-se, a fim de induzi-lo a acreditar que é
menos capaz e incompetente. Dessa forma, as mulheres, mesmo com as conquistas
8
alcançadas ao longo da historia , continuam com status social mais baixo do que os
homens.
Sabemos, porém, que muitas mulheres, ao contrário do que o
sistema capitalista induz, lutaram frente às situações vexatórias, discriminatória da
dominação masculina, na busca pela igualdade entre os sexos. É claro que,
inseridas num conjunto de ideologias machistas e preconceituosas, foram, por muito
tempo, mantidas no mundo privado, tendo sua cidadania negada.
Sendo assim, apesar das ações coletivas de muitas mulheres
envolvidas nos movimentos feministas, as quais serão mencionadas no terceiro
capítulo deste trabalho, a imagem da mulher, sob a égide do patriarcalismo, até os
dias de hoje tem sido reforçada como aquela que cuida dos filhos, do lar e do
marido. Já o homem é visto como provedor econômico, sujeito competente que se
insere no mercado de trabalho para sustentar a família.
A desigualdade entre os sexos pode ser observada quando nos
deparamos com a baixa representatividade da mulher nas instituições de poder, a
exemplo dos canais numéricos de participação política, os partidos e as eleições.
De acordo com AVELAR (2001, p. 48), os canais numéricos vão
desde o simples ato de votar até o envolvimento com discussões políticas, trabalhos
para candidatos em época de eleições, ir a comícios, ocupar cargos
públicos,candidatar-se a cargos eleitorais, e todas as atividades relacionadas às
eleições e ao sistema de representação.
Outro exemplo está posto nas diferenças salariais entre homens e
mulheres
1
, as quais, ao exercerem o mesmo cargo que um homem percebe um
salário inferior. Além disso, nas relações familiares, a mulher continua exercendo
maior responsabilidade nos cuidados com os filhos e com a casa, acumulando a
dupla jornada, com muitas atividades ao mesmo tempo,fato que limita sua atuação
na vida pública e política.
Scott (2002) afirma que os deveres domésticos, especialmente os
cuidados do marido e dos filhos, inerente à condição feminina, eram fortes
1
Mais conteúdo sobre esse assunto ver Pena (1981) Mulheres e Trabalhadoras.
9
impedimentos à participação política. Assim, até o final do século XIX e ainda nos
dias de hoje, presenciamos mulheres ausentes da esfera pública pela dificuldade em
conciliar as atividades domésticas com as funções públicas e políticas.
Diante de tantas desigualdades ocorridas ao longo da história da
mulher, movimentos feministas começaram a mobilizar-se em prol de condições de
igualdade para as mulheres, podendo-se identificar, nesse movimento, três fases
significativas: a luta pelo direito de voto às mulheres, a luta contra o sistema
patriarcal e as reivindicações contra todos os tipos de discriminação sexista, o
respeito à diversidade, a igualdade entre grupos e povos e a igualdade de direitos e
oportunidades.
Sendo assim, a luta das mulheres foi se intensificado cada vez mais,
no sentido de mostrar que, além dos afazeres domésticos e o cuidado com os filhos,
enfrentam o espaço público com garra e determinismo, e que sua fragilidade não
compromete sua capacidade de exercerem funções que exigem competência
técnica e teórica.
Nessa trajetória, o século XX marcou a entrada das mulheres na
esfera política, embora de maneira tímida, pois colocavam-se quase que
exclusivamente como eleitoras, emergindo posteriormente o desafio de saírem
candidatas e serem eleitas pela população.
Vale ressaltar, que no caso brasileiro, as mulheres conquistaram o
direito de votar e de serem votadas em 1932, pelo Código Eleitoral, que previa o
direito de voto apenas para as mulheres casadas com autorização dos maridos e
mulheres solteiras ou viúvas, com renda própria (RODRIGUES, 2004).
As conquistas femininas ao longo do século XX evidenciam que as
relações de poder estão sendo superadas e que a mulher do século XX entra com
uma nova persuasão no século XXI: a de enfrentar os desafios e lutar pela maior
participação da mulher na política, na tentativa de garantir e ampliar seus direitos.
Dessa forma, o gênero feminino, através dos movimentos e
organizações de mulheres, busca condições de equiparação entre homens e
mulheres no plano da representação política, visando à mudança da situação das
10
mulheres na sociedade e à construção de novas relações e representações do
feminino e do masculino que, há tanto tempo, coloca a mulher na condição de
subalternidade, ficando os homens com o domínio, principalmente, no poder de
decisão.
É na esteira histórica dessa luta que esse trabalho se insere ao
trazer uma reflexão sobre a inserção das mulheres na política e a perspectiva de
gênero que, apesar de constituírem-se ainda em minoria, cada vez mais vem
enfrentando as urnas eleitorais e sendo eleitas para cargos públicos executivos e
legislativos.
Assim, diante da história que marca a mulher como esposa e mãe,
induzida à esfera privada em prol da unidade familiar, surgiu o interesse do presente
estudo, a fim de resgatar a história da mulher num momento em que ela rompe com
o espaço doméstico e desafia o campo da política, através das reivindicações dos
movimentos e organizações feministas, os quais permitiram à mulher candidatar-se
e assumir cargos eletivos, participando efetivamente nos espaços decisórios de
poder, por exemplo, na esfera parlamentar.
Procuramos, então, analisar as relações de gênero, conhecer a
história das lutas e conquistas feministas, verificar a atuação política das
parlamentares paranaenses, além de, observar os projetos de lei propostos pelas
mulheres, no período de 1999 à 2007, a fim de avaliar se a participação política,
enquanto Deputada Estadual, proporciona condições efetivas na elaboração de
políticas públicas voltadas para a defesa e os direitos femininos.
Para a coleta de dados, foi realizada pesquisa de caráter qualitativo
a partir de entrevistas com cinco Deputadas Estaduais. Sendo quatro Deputadas em
exercício - 16ª legislatura e uma Deputada Estadual da gestão passada - 15ª
legislatura paranaense.
De acordo com Martinelli (1999, p. 27), a pesquisa qualitativa tem
uma dimensão política, uma construção coletiva, parte da realidade dos sujeitos e a
eles retorna de forma crítica e criativa.
11
Os critérios de escolha das entrevistadas foram estabelecidos a
partir da história da participação política de algumas dessas deputadas em
movimentos e organizações de mulheres e também pela facilidade de acesso às
parlamentares, ou seja, as quatro parlamentares em exercício se encontram em
Curitiba, e a deputada da gestão anterior reside na cidade de Londrina.
Desse modo, a pesquisa de campo com as deputadas da 16ª
legislatura foi realizada na Assembléia Legislativa do Estado do Paraná com data e
hora marcada antecipadamente. Já a deputada da 15ª legislatura, foi entrevistada na
Coordenadoria da Região Metropolitana de Londrina, onde a mesma ocupa cargo de
chefia.
Foi relevante, portanto, conhecer os projetos apresentados pelas
parlamentares paranaenses nos dois últimos mandatos, verificando se há
discriminação às parlamentares, em que medida atuam na perspectiva de gênero,
no processo de elaboração e defesa das políticas e projetos voltados à mulher. Além
disso, verificamos como se dá o processo de participação política dentro da
Assembléia Legislativa do Estado do Paraná e os fatores que limitam a maior
representatividade feminina nos espaços da política formal.
Nesta perspectiva, foram elencados três eixos temáticos:
participação política (motivações, dificuldades de ingresso e relação familiar); a
Assembléia Legislativa (discriminação e cargos de representação); atuação
parlamentar (os projetos e a perspectiva de gênero).
Sendo assim, iniciamos nosso trabalho com o capítulo que trata do
conceito e da desigualdade de gênero. Num segundo momento, abordamos
assuntos sobre as conquistas e a cidadania feminina. Já no terceiro capítulo,
falamos sobre a participação das mulheres na vida pública e privada. Num quarto
momento, tratamos de assuntos relacionados à participação das mulheres na vida
pública e política no Brasil e, por fim, apresentamos a análise dos dados da
pesquisa de campo.
12
CAPÍTULO 1
RELAÇÕES DE GÊNERO
1.1 D
ESIGUALDADE E GÊNERO
Ao analisarmos as questões que envolvem gênero, logo nos
remetemos às desigualdades entre homens e mulheres. Desigualdades estas
impostas tradicionalmente pela sociedade como diferenças sexuais, as quais, ao
longo da história, carregamos como verdades, classificando as pessoas em dois
grupos diferentes: o feminino e o masculino.
Segundo Izquierdo ([1990]), quando nos direcionamos a uma
mulher, estamos supondo um sexo, mas também muitas outras coisas: dona de
casa, mãe, má motorista, um ser passivo, afetivo, etc. Quando dizemos homem,
junto ao sexo, estamos atribuindo qualidades como: investigador, profissional,
racional, competente, dinâmico, etc.
Essas características atribuídas ao sexo, há muito tempo, são
marcadas por uma sociedade cujos conceitos patriarcais estabelecem uma relação
de dominação masculina. Essa dominação desfavorece o sexo feminino, pois, às
mulheres, é reservado prioritariamente o espaço privado, a esfera doméstica,
enquanto, aos homens, reserva-se a esfera pública.
Bourdieu (1998), sobre as atribuições destinadas à mulher,
correlaciona este fato à naturalização como justificativa das desigualdades, ou seja:
[...] a diferença biológica entre os sexos, isto é, entre o corpo
masculino e o corpo feminino, e, especificamente, a diferença
anatômica entre órgãos sexuais, pode assim ser vista como
justificativa natural da diferença socialmente construída entre os
gêneros e, principalmente, da divisão social do trabalho”
(BOURDIEU,1998, p. 200).
13
Em consonância com o referido autor, Izquierdo ([1990]) afirma que
“as bases biológicas do sistema sexo e gênero se definem em contato com o meio,
pois dependemos do meio. Não somos sujeitos formados apenas pelo destino
biológico, antes de tudo somos sujeitos construídos através das representações
sociais”.
Segundo Scott (2002), gênero, enquanto categoria histórica, pode
ser concedido em várias instâncias como símbolos culturais invocadores de
representações, conceitos normativos e como grade de interpretação de significados
(apud SAFFIOTI, 2004, p. 45).
Neste sentido, podemos mencionar como símbolos culturais
existentes na sociedade, as atribuições conferidas aos bebês desde o nascimento,
no que diz respeito a atividades de meninos e de meninas. Para eles, carrinhos e,
para elas, bonecas, confirmando, assim, que a sociedade impõe o que são
atividades femininas e masculinas.
Como afirma Faria e Nobre:
As crianças são levadas a se identificarem com modelos do que é
feminino e masculino para melhor desempenharem os papéis
correspondentes e as atribuições femininas não são apenas diferentes,
mas também desvalorizadas, onde a mulher vive em condições de
inferioridade e subordinação em relação aos homens. As desigualdades
entre homens e mulheres são,portanto,construídas pela sociedade e
não pela diferença biológica entre os sexos. (FARIA; NOBRE, 1997,
p.10).
Desse modo, a mulher, numa situação desigual, acaba sendo
destinada ao espaço doméstico através do papel que a sociedade lhe designa: mãe,
dona de casa, esposa. E, com isto, os valores patriarcais obrigam, proíbem e
diferenciam as oportunidades entre homens e mulheres.
Já, para os homens, são atribuídas funções do espaço público onde
produzem conhecimentos, participam da esfera política, dos espaços decisórios de
poder, produzindo e exercendo seu papel enquanto sujeito ativo na formação de
opiniões. Eles têm, assim, possibilidades de assumir posições importantes num nível
bem maior do que as mulheres.
14
Sobre o exposto acima, Izquierdo ([1990]) afirma que o sistema
sexo/gênero também está relacionado com a forma de organização da sociedade.
[...] as expectativas que a mesma tem com respeito aos indivíduos, a
distribuição desigual de poder, as aspirações, espaços sociais
ocupados e proibições em função do sexo, se fundamentam em uma
base dupla: a biologia e a divisão sexual do trabalho. (IZQUIERDO,
[1990]).
Pode-se, então, dizer que a sociedade está pautada pelas
desigualdades entre os indivíduos, as quais são construídas pelas diferenças
sexuais e diferenças culturais, inseridas num sistema capitalista formado de
restrições, obrigações, proibições, tabus, valores e preconceitos que vão contra os
princípios de uma sociedade justa e igual. Assim, muito dos atributos femininos
acabam sendo naturalizados porque já são impostos aos sujeitos desde seu
nascimento.
Izquierdo, afirma que:
A existência de gêneros é a manifestação de uma desigual
distribuição de responsabilidade na produção social da existência. A
sociedade estabelece uma distribuição de responsabilidades que são
alheias às vontades das pessoas, sendo que os critérios desta
distribuição são sexistas, classistas e racistas. Do lugar que é
atribuído socialmente a cada um, dependerá a forma como se terá
acesso à própria sobrevivência como sexo, classe e raça, sendo que
esta relação com a realidade comporta uma visão particular da
mesma. (IZQUIERDO, [1990]
).
Ainda, permanecem, na sociedade contemporânea, valores culturais
em que a mulher é vista como aquela que veio ao mundo para gerar e educar os
filhos, além de ser responsável pelo cuidado da casa e do marido. Sobre esse
assunto, Faria e Nobre (1997) apontam que estes valores já estão inseridos na vida
do ser humano de forma natural, como algo que faz parte da sua existência pelas
diferenças biológicas.
Essa naturalização dos papéis faz parte de uma ideologia que tenta
fazer crer que esta realidade é fruto de uma biologia, de uma
15
essência masculina e feminina, como se os homens e mulheres já
nascessem assim (FARIA; NOBRE, 1997, p.12).
Sobre esta naturalização, as autoras chamam a atenção sobre os
papéis dos homens e das mulheres na esfera do trabalho. Para elas,
os homens são considerados os provedores da família, por isto, o
trabalho profissional das mulheres é sempre visto como
complementar às suas ‘responsabilidades’ domésticas, estas, sim,
sua verdadeira ocupação (FARIA; NOBRE, 1997, p.14-15).
Apesar da existência desses valores, sabemos que, no decorrer da
nossa história, as mulheres vêm lutando contra a desigualdade de gênero, uma vez
que, com os conflitos sociais emergidos entre capital e trabalho (desemprego,
miséria, fome, violência), há décadas atrás elas vem inserindo-se no mundo do
trabalho para ajudar no sustento da casa, pois o salário do esposo, muitas vezes, é
insuficiente para suprir as necessidades da família.
Assim, além das atividades domésticas, a mulher também tem seus
deveres fora da esfera privada e isto faz com que ela lute pelo reconhecimento de
seus diretos enquanto sujeito capaz de inserir-se com competência e
responsabilidade na esfera do trabalho.
Faria e Nobre (1997, p.12) preleciona que tanto para desnaturalizar
quanto para “explicar os mecanismos que conformam a situação desigual das
mulheres, é importante analisarmos o papel do homem e da mulher na construção
do conjunto das relações sociais”, uma vez que já houve mudanças nos últimos
trinta anos em relação aos papéis exercidos pelas mulheres. E, em grande parte,
essas lutas pela desigualdade de gênero são frutos da ação organizada das
mulheres e dos movimentos feministas.
Desse modo, como forma de entendermos essas diferenças, iremos
desenvolver, a seguir, a categoria gênero como uma importante categoria de
análise, com a finalidade de compreender, dentro de parâmetros científicos, a
situação de desigualdade entre os sexos, buscando estabelecer como essa
16
categoria opera na realidade e interfere no conjunto das relações sociais
(CARLOTO, 2001).
1.2 C
ONCEITO DE GÊNERO
Uma discussão de gênero como categoria de análise implica
resgatar aportes teóricos sobre produção e reprodução de desigualdades. Assim,
nessas reflexões sobre a temática, é imprescindível a contribuição de estudiosas
como Saffioti, Lauretis e Izquierdo que abordaram questões sobre o surgimento e a
importância do conceito.
O termo gênero começou a ser utilizado por teóricas e estudiosas
(os) de mulheres e do feminismo, no final da década de 1970 do século passado,
momento de ressurgimento do movimento feminista em todo o mundo, na esteira
dos grandes movimentos estudantis e da contestação dos papéis e comportamentos
sexuais do final da década de 1960.
O conceito surge, então, entre as estudiosas feministas para
contrapor-se a qualquer explicação pautada no determinismo biológico, que pudesse
explicar os comportamentos de homens e mulheres, compreendendo, desta forma,
uma visão naturalizada, universal e imutável dos comportamentos que serviu, por
muito tempo, para justificar as desigualdades entre ambos os sexos, a partir de suas
diferenças físicas.
Atualmente, de forma ampla, pode-se dizer que gênero é um
conceito das Ciências Sociais, relativo à construção social do sexo. Significa a
“distinção entre atributos culturais alocados a cada um dos sexos e à dimensão
biológica dos seres” (HEILBORN, 1991, p. 23). O uso do termo gênero expressa,
assim, todo um sistema de relações que inclui sexo, mas que transcende a diferença
biológica (SCOTT, 1994).
Logo, na perspectiva das relações de gênero, o que importa é
discutir os processos de construção ou formação histórica, lingüística e social,
17
instituídas na formação de mulheres e homens, pois prender-se a gênero
relacionado ao sexo faz com que esqueçamos das vivências e culturas de uma dada
sociedade.
O ser humano, masculino ou feminino, é sujeito histórico, ou seja,
‘quem somos’ vai se constituindo através das relações com os
outros, com o mundo dado e objetivo. Cada indivíduo encarna as
relações sociais configurando uma identidade pessoal, uma história
de vida e um projeto de vida. O fato de pertencer a um gênero ou
outro, ser menina ou menino, também conformam as realidades
iniciais do mundo (CARLOTO, 2001, p.21).
Por relações sociais, Hirata (2002, p.78), afirma que se trata de
“relações entendidas como desiguais, hierarquizadas, assimétricas ou antagônicas
de exploração e de opressão entre duas categorias de sexo socialmente construídas
[...]”. Nessa perspectiva,
[...] o termo gênero é uma representação não apenas no sentido de
que cada palavra, cada signo representa seu referente, seja ele um
objeto, uma coisa, ou ser animado. O termo “gênero” é, na verdade,
a representação de uma relação, a relação de pertencer a uma
classe, um grupo, uma categoria. Gênero é a representação de uma
relação [...] o gênero constrói uma relação entre uma entidade e
outras entidades previamente constituídas como uma classe, uma
relação de pertencer [...]. Assim, gênero representa não um indivíduo
e sim uma relação, uma relação social; em outras palavras,
representa um indivíduo por meio de uma classe (LAURETIS, 1994,
p. 210).
Gênero, então, vem sendo debatido com o propósito de desconstruir
a ligação entre as mulheres e a natureza a fim de romper com os estereótipos
lançados sobre o sexo feminino ao longo dos anos. Dessa forma, é necessário
mencionarmos as limitações acerca do conceito de gênero referidos pela autora
supra citada.
A primeira limitação do conceito de ‘diferenças sexuais’, para a
autora, é que ele confina o pensamento crítico feminista ao arcabouço conceitual de
uma oposição universal do sexo (a mulher como a diferente do homem, ou a mulher
como diferença pura e simples. Dois conceitos igualmente universalizados). Essa
18
concepção dificulta e impossibilita articular a diferença entre as mulheres ou, mais
ainda, as diferenças nas mulheres.
Essa afirmação nos leva a entender que o sexo não pode ser visto
somente como uma diferença entre o masculino e feminino, pois as próprias
mulheres têm diferenças entre si, tanto nos aspectos físicos e biológicos, quanto nos
princípios e valores de cada uma.
A segunda limitação, apontada por Lauretis (1994), é que esse
conceitual tende a reacomodar ou recuperar o potencial epistemológico radical do
pensamento feminista sem sair dos limites da casa patriarcal. Por potencial
epistemológico radical, a autora entende que é a possibilidade de conceber o sujeito
social e as relações de subjetividade com a socialização de uma outra forma: um
sujeito constituído no gênero sem dúvida, mas não apenas pela diferença sexual, e
sim por meio de códigos lingüísticos e representações culturais.
Um sujeito “engendrado” não só na experiência de relações de sexo,
mas também de raça e classe: um sujeito, portanto, múltiplo em vez de único e
contraditório em vez de simplesmente dividido.
Outro aspecto relevante do texto de Lauretis (1994) refere-se à
construção do gênero enquanto produto e processo. Nesse sentido considera a
autora que:
[...] a construção do gênero é tanto produto quanto o processo de
sua representação [...] o sistema sexo-gênero, enfim, é tanto uma
construção sociocultural quanto um aparato semiótico, um sistema
de representações que atribui significado (identidade, valor, prestígio,
posição de parentesco, status dentro da hierarquia social etc.) a
indivíduos dentro da sociedade. Se as representações de gênero são
posições sociais que trazem consigo significados diferenciais, então
o fato de alguém ser representado ou se representar como masculino
ou feminino subentende a totalidade daqueles atributos social
(LAURETIS, 1994, p. 212).
Lauretis enfatiza, ainda, a relação ideologia-gênero:
[...] se o sistema sexo-gênero é um conjunto de relações sociais que
se mantém por meio da existência social, então o gênero é
efetivamente uma instância primordial da ideologia, e obviamente
19
não só para as mulheres. Além disso, trata-se de uma instância
fundamental de ideologia, independentemente do fato de que certos
indivíduos se vejam fundamentalmente definidos (oprimidos) pelo
gênero, como as feministas culturais brancas, ou por relações de
classe e raça, como é o caso das mulheres de cor (LAURETIS, 1994,
p. 216).
Assim, fica-nos claro que o gênero não pode ser limitado às
desigualdades entre o macho e a fêmea apenas pelo fato biológico, pelas diferenças
sexuais. Quando nos referimos ao gênero, podemos elencar as diferenças entre
classes sociais, raça, etnia, sexo, representações culturais, econômicas e políticas.
Desse modo, entendemos que o ser humano não é formado apenas
pelos aspectos biológicos e naturais da sua relação sexual com o outro, mas sim
pela
totalidade formada pelo corpo, pelo intelecto, pela emoção, pelo
caráter do EU, que entra em relação com o outro. Cada ser humano
é a história de suas relações sociais, perpassadas por antagonismos
e contradições de gênero, classe, raça/etnia (SAFFIOTI, 1992,
p.210).
Nessa perspectiva, para Kergoat (1996), uma mulher não se pensa
como mulher, ela se pensa também dentro de uma rede de relações sociais. Como
trabalhadora (na relação capital/trabalho, na relação salarial), como jovem ou velha,
como, eventualmente, mãe ou imigrante, a mulher constrói sua identidade a partir
das suas relações sociais, através do contato com o meio.
Dessa forma, pode-se entender que as diferenças entre os sexos se
dão no contexto em que os indivíduos se relacionam, criando normas e padrões
sociais de acordo com seus valores culturais e da sua visão de sociedade. Nesse
contexto, o fato de a mulher ser subordinada ao homem, e ser condicionada aos
deveres domésticos, estabelece uma relação cultural na qual o sexo feminino é
responsável pelos cuidados do lar e dos filhos, naturalizando-se na sociedade.
A tentativa de construir o ser mulher enquanto subordinado vai ter a
marca da naturalização, do inquestionável, já que dado pela
natureza. Todos os espaços de aprendizado, os processos de
socialização vão reforçar os preconceitos e estereótipos dos gêneros
como próprios de uma suposta natureza (feminina e masculina),
20
apoiando-se, sobretudo na determinação biológica. A diferença
biológica vai se transformar em desigualdade social e tomar uma
aparência de naturalidade (CARLOTO, 2001, p. 201).
Izquierdo ([1990]) menciona que a existência de gênero é a
manifestação de uma desigual distribuição de responsabilidades que são alheias às
vontades das pessoas, sendo que os critérios desta distribuição são sexistas,
classistas e racistas. Desse modo, a construção de gênero se dá através da
dinâmica das relações sociais.
Conforme aponta Laurettis (1994, p.211)
[...] as concepções de masculino e feminino, nas quais todos os
seres humanos são classificados, formam em cada cultura, um
sistema de gênero, um sistema simbólico ou um sistema de
significações que relaciona o sexo a conteúdos culturais de acordo
com valores e hierarquias sociais.
Portanto o conceito de gênero está fundamentado nas diversas
expressões de um sujeito, no modo como ele vive e se articula com o meio, dentro
das relações pessoais, profissionais, culturais e sociais.
Diante do exposto, somado às transformações sócio-econômicas e
culturais, ocorridas especialmente nos dois últimos séculos as quais serão
explicitadas no terceiro capítulo deste trabalho podemos afirmar que as
oportunidades para as mulheres ampliaram-se, num movimento de desmistificação
de que o fato biológico, a condição de mãe da mulher, signifique incompetência
técnica e teórica e, consequentemente, a invisibilidade da mulher como sujeito
histórico.
Este fato justifica as primeiras organizações femininas, reivindicando
melhores condições de trabalho, caracterizando o movimento feminista do Ocidente,
como um fenômeno do século XIX, que se configura pelas manifestações que
visavam à extensão do direito de voto às mulheres, meta que, uma vez alcançada,
levou a uma desaceleração, que volta a se intensificar décadas depois, quando,
paralelamente às preocupações políticas e sociais, têm início as construções
21
teóricas, que vão para o interior das universidades através das militantes feministas
do mundo acadêmico (LOURO, 2001).
Assim, o objetivo das estudiosas feministas, nos primeiros tempos,
caracterizou-se pela descrição das condições de vida das mulheres em diferentes
instâncias e espaços, apontando as desigualdades entre os sexos, denunciando a
opressão e a submissão feminina.
A necessidade de uma produção teórica especificamente feminista
originou a construção do conceito de gênero segundo o qual a desigualdade entre
homens e mulheres não se fundamenta em características sexuais, mas na
construção das representações sociais. Enfatiza-se, assim, a construção histórica do
ser feminino e masculino, ou seja, não importa exatamente o sexo do indivíduo, mas
sim o que se construiu sobre os sexos (LOURO, 2001).
Seguiu-se, então, uma produção significativa de literatura acerca da
condição da mulher nas mais diversas áreas de estudo. Muitas foram as estudiosas
que dedicaram suas pesquisas opondo-se aos pressupostos construídos com base
nas experiências e leituras masculinas.
A partir de 1970, prolifera um grande e rico debate em torno da
condição feminina, rompendo com o discurso de até então, sobre um sujeito
universal, masculino, como se as mulheres nunca tivessem existido ou participado
da História (RAGO, 1991).
Desse modo, com o advento da história das conquistas femininas, a
mulher passou a ser ‘vista’ como sujeito histórico, cheio de vivências, competências
e sentimentos que contribuem para o fortalecimento de uma sociedade.
Neste contexto, os encontros políticos e a criação ou modificação de
leis têm sido um dos focos dos movimentos feministas, com vistas a ampliarem
objetivos e assegurarem direitos.
Duas conferências mundiais foram fundamentais nesse aspecto: a
Conferência Mundial dos Direitos Humanos (Viena, 1993) que determinou sobre
direito à vida, ao tratamento igualitário, acesso à condição justa de trabalho, além da
atribuição de responsabilidade ao Estado pelas leis acerca de violências contra a
22
mulher; e a IV Conferência Mundial da Mulher ocorrida na China em 1995 que
apontou, como condição fundamental para a consolidação da democracia e da paz
na humanidade, promover a eqüidade entre homens e mulheres (COSTA, 2005).
A partir dessas conferências, ampliou-se o debate sobre a questão
de gênero, que surgiu do caminho aberto pelas organizações feministas. Os estudos
feministas foram, assim, tomando força na década de 1980, ao abordarem a atuação
das mulheres na vida social, no seu cotidiano, conferindo-lhes um papel de sujeito
histórico, de luta e de participação na construção e transformação da vida social,
econômica, cultural e política.
Segundo Rago (1991), surge a possibilidade de se recuperar a
experiência coletiva de mulheres e homens em toda a sua complexidade, no sentido
de buscar metodologias mais adequadas para recuperar as relações sociais, a
atuação e a participação da mulher no processo histórico.
Nesta perspectiva, mesmo que o caminho a percorrer para
definições concretas sobre ser mulher para os atuais estudos seja um caminho
longo e difícil, ele já contribuiu inegavelmente para se entender e explicar práticas
discriminatórias, típicas das relações de gênero e trabalho, que ainda permeiam na
sociedade contemporânea. Além de provar que o sexo feminino não acata de forma
homogênea as condições subalternas, visto que, ao longo da história, muitas
mulheres vêm se colocando contra a negação de seus direitos através de ações
coletivas que já refletiram conquistas e avanços no campo da igualdade entre os
sexos.
23
CAPÍTULO 2
CONQUISTA DOS DIREITOS E DA CIDADANIA FEMININA
2.1 D
IREITOS E CIDADANIA
Falar sobre a luta e conquista das mulheres implica entender o
espaço público versus privado e, consequentemente, as relações sociais.
De acordo com Da Matta (2000), esses espaços são muito mais do
que meros espaços geográficos. São espaços carregados de sentido, ou melhor, de
categorias sociológicas que revelam o modo de viver e pensar de uma sociedade.
Por muitos séculos, a história das mulheres desenrolou-se no
espaço privado, construída no contexto das diferenças atribuídas à natureza,
limitando a participação das mulheres no espaço público e, por isso, limitando o
exercício da cidadania plena, devido às relações de poder instaladas no transcorrer
da história da humanidade que excluiu a mulher de contribuir social e politicamente
na esfera pública.
Com o passar dos anos, visualizando as discriminações, pré-
conceitos, submissões que faziam parte da vida das mulheres, as militantes
feministas começam a entender a importância da mulher na esfera pública para o
alcance da igualdade de direitos. As lutas e reivindicações pelos direitos femininos
fortalecem os grupos e movimentos das mulheres.
Nesse sentido, Pinsky e Pinsky (2003) apontam que duas
revoluções marcaram de maneira paradoxal a história da cidadania das mulheres: a
Americana e a Francesa. A partir da Revolução Francesa, gradativamente, a luta
das mulheres foi avançando e prolongou-se por todo o século XX, evidenciando a
importância da luta feminista iniciada naquele contexto histórico para a conquista do
direito a ter direitos, pois, de 1789 até 1944, cidadãos eram apenas os homens.
24
Diversos eram os fatores para a exclusão das mulheres, a fraqueza
de seu corpo e de sua mente; a divisão física da mão-de-obra, que
as tornava aptas apenas para a reprodução e os afazeres
domésticos, e a susceptibilidade emocionais, que as impeliam a
excessos sexuais ou ao fanatismo religioso (SCOTT, 2002, p.17).
Assim, inseridas na naturalização das coisas (do ser mãe e esposa
submissa) ficavam limitadas à esfera doméstica e induzidas a acreditar que sua
função, enquanto ser humano era somente cuidar do mundo privado, contribuindo
socialmente através da criação dos filhos, dos cuidados com a casa e com o marido.
Seus desejos, enquanto ser individual deveria ser sufocado em prol dos interesses
da unidade familiar.
A individualidade segundo Scott (2002, p.36), referindo-se ao
contexto da Revolução Francesa “era reservada aos homens cidadãos, pois a
cidadania era função da individualidade” e como o sexo feminino não tinha
reconhecido sua cidadania, ela só podia ser prerrogativa dos homens.
A autora ainda alega que, com base na diferença biológica entre o
homem e a mulher, estabelecia-se que “a diferença sexual não apenas era um fato
natural, mas também uma justificativa ontológica para um tratamento diferenciado no
campo político e social” (SCOTT, 2002, p. 26).
Segundo Scott (2002), os direitos da mulher eram totalmente
contestados pelos representantes da assembléia constituinte. Governantes daquela
época, como exemplo o deputado Jean Denis Lanjuinais, entendiam que a mulher
não era capaz de raciocinar como os homens para contribuir positivamente na
política. Assim, por não serem capazes, o deputado profere as seguintes palavras “é
difícil acreditar que as mulheres sejam, algum dia, chamadas a exercer direitos
políticos” (apud SCOTT, 2002, p. 91).
O exposto é ilustrativo da conseqüência de uma cultura patriarcal.
Deixa evidente que a percepção de que o fato da mulher exercer sua cidadania,
enquanto ser ativo, podia abalar a estrutura familiar, uma vez que, o sexo ‘frágil’ era
submetido aos deveres domésticos sob o jugo de um regime patriarcalista, cuja lei
do pai era a lei que prevalecia na sociedade.
25
Assim, às mulheres não se admitia o reconhecimento do direito de
opinar, votar e de fazer valer suas vontades individuais e coletivas, enfim, não se
reconhecia sua condição de cidadã.
Nesse contexto, Olympe de Gouges, feminista e grande defensora
da democracia e dos direitos femininos no século XVIII, fortalecia suas
reivindicações pela participação política da mulher, cujo projeto feminista consistia
na emancipação política através do voto e da representação feminina nos cargos
políticos da época.
De acordo com Scott (2002, p. 67),
Gouges discutia a favor da emancipação política, contra os que
recusavam a admiti-la e os que preferiam adiar tais debates,
alegando que o sexo fraco demais e há muito tempo oprimido, estava
pronto para jogar longe o jugo de uma escravidão vergonhosa.
Para enfatizar ainda mais sua luta e fazer valer suas reivindicações,
Olympe de Gouges apelou para a negação da natureza feminina, a fim de garantir a
igualdade entre os homens. Essa negação gerou críticas por parte de alguns
historiadores da época, os quais alegaram que a mulher
apresentava uma imaginação desenfreada tentando igualar-se ao
homem, negando sua natureza que estabelecia o dom da
maternidade, perdendo, assim, o sentido da sua luta ao considerar-
se mais homem do que mulher (SCOTT, 2002, p.97).
Neste contexto, Galeotti (1995, p. 240) afirma:
[...] a distinção público/privado corresponde, de fato, à diferença de
gênero, em que o público está para o masculino e o privado para o
feminino, tal como os dois gêneros foram simbologicamente
elaborados na cultura patriarcal.
Assim, essa condição pré-estabelecida ao gênero feminino, como
aquele responsável pelos cuidados da unidade familiar, privou o seu eu individual,
seus interesses autônomos, aos de sua família “os quais eram definidos a partir dos
26
interesses e poderes dos maridos cidadãos. Essas relações ‘privadas’ contrapostas
às ‘sociais’ lhes negavam a cidadania” (SARACENO,1995, p. 209, grifo do autor).
Diante deste contexto, apesar da forte repressão sofrida pelas
mulheres dos séculos passados, as feministas, lideradas por Olympe de Gouges,
passaram a reivindicar uma série de direitos, ou mesmo o fortalecimento dos
movimentos das mulheres contra as imposições machistas e discriminatórias.
Olympe de Gouges, como forma de fortalecer a luta feminista,
enfrentou a sociedade e publicou a Declaração dos Direitos da Mulher e da Cidadã.
Nessa declaração argumentava que as mulheres eram sujeitos de direitos políticos e
sociais tanto quanto os homens, pois se tinham o direito de subir ao patíbulo, local
onde se condenavam as pessoas à pena de morte, deveriam também ter igualmente
o direito de subir à tribuna (SCOTT, 2002, p. 98).
Vale mencionar também que, na Inglaterra, o movimento das
mulheres teve grande importância no marco da história feminina. Em 1830,
fortalecidos pela vontade da efetivação do exercício da cidadania, lutavam pela
conquista dos direitos civis e políticos.
Pinsky e Pinsky (2003) afirmam que o movimento inglês (1830)
pelos direitos das mulheres serviu de modelo para outros movimentos europeus,
ganhando grandes proporções e acumulando conquistas a partir dos anos de 1870.
O movimento lutava pelo fim das leis que subordinavam as mulheres,
por uma custódia mais eqüitativa dos filhos, pelo divórcio, pelo direito
de a mulher casada controlar seus ganhos e propriedades, por
proteção contra a violência masculina, pela ampliação da educação e
da participação política das mulheres (PINSKY; PINSKY, 2003, p.
288).
Retomando a discussão da Revolução Francesa, os governantes
daquela época foram duros e não queriam abrir espaço para as mulheres.
Entendiam que a transferência da mulher da esfera privada para a pública poderia
colocar em risco a organização da sociedade, a ordem social vigente, que era
estruturada na unidade familiar na qual o sexo feminino era tido como propriedade
masculina e grande responsável pelos deveres domésticos.
Neste contexto, Saraceno (1995) menciona:
27
Desde a declaração de 1789 a família foi considerada a base natural
da existência masculina, dos cidadãos homens que se encontravam
e negociavam livremente entre si na sociedade civil, e ao mesmo
tempo uniam-se para ocultar as diferenças internas numa unidade
hierarquicamente construída por meio da exclusão dos direitos civis e
políticos de todos aqueles que, na família, não coincidem com o
chefe de família: as esposas e os filhos dependentes (SARACENO,
1995, p.207-208).
Diante deste dilema, entre preservar a unidade familiar e/ou garantir
a cidadania feminina, a sufragista francesa Jeanne Deroin posicionou-se em defesa
do respeito às diversidades, às diferenças, ao feminismo para garantir a integridade
da sociedade, considerando que, “romper com as características biológicas da
mulher não era requisito para alcançar a igualdade, por isso, as diferenças sexuais
não podiam justificar a negação da cidadania à mulher” (SCOTT, 2002, p.105).
O exposto acima, leva-nos a evolução dos direitos do homem,
teorizada por Bobbio (1992), o qual afirma que as diferenças sexuais não podem
significar desigualdade no mundo do trabalho, pelo contrário, há que se respeitar o
direito de ser diferente para atingirmos a cidadania universal.
Desse modo, conforme o pensador italiano, o respeito às diferenças
entre homens e mulheres, grupos, classes e raças contribuem para a democracia,
pois não há democracia se não existir direitos reconhecidos e protegidos, e sem o
exercício de reconhecimento não haverá condições mínimas para a solução pacífica
dos conflitos.
Outro aspecto importante para a garantia e reconhecimento dos
direitos, foi o entendimento da feminista francesa, Jeanne Deroin, sobre a
participação das mulheres. Para ela, através da participação e representação
feminina dentro dos espaços decisórios de poder, as mulheres poderiam conquistar
o respeito às diversidades e, assim, no período da Revolução de 1848
2
, Deroin
enfrenta a ideologia dominante e candidata-se ao cargo político, assumindo a
responsabilidade de cidadã na luta pela igualdade de gênero através da
representatividade feminina, afirmando que: “concorrer ao cargo político significaria
2
Momento propício para reivindicações femininas, pois os legisladores da época abrem debate sobre a
cidadania. (SCOTT, 2002).
28
cumprir um dever e reivindicar um direito [...] mas infelizmente, sua candidatura foi
considerada um ato inconstitucional [...]” (apud SCOTT, 2002, p.124).
A inconstitucionalidade da candidatura, segundo Scott (2002), foi
possível porque as mulheres ainda não tinham instrumentos legais que fossem
contra os princípios e valores machistas da época. Ao contrário, a sociedade era
respaldada por leis que infringiam a capacidade e competência feminina.
A inserção da mulher na esfera pública, portanto, era associada à
perda das características femininas que, a grosso modo, era um argumento para
manter a ordem e o poder concentrado na mão dos homens.
Outra questão levantada pela autora é que, mesmo com as leis que
tentavam garantir direitos políticos, a cidadania ainda era negada à mulher.
Cidadãos continuavam sendo os homens e isto trazia uma incoerência enorme nas
legalidades constitucionais, porque, se a cidadania era direcionada àquele que
trabalhava e, se as mulheres tinham uma legislação que garantia esse direito, não
havia justificativa para excluí-las de sua cidadania (SCOTT, 2002, p.128).
Conforme se vê, a cidadania tão almejada por Deroin e demais
feministas que marcaram a historia das mulheres
3
na França vinham na contramão
da ordem social da época, pois “os direitos políticos formais, [...] não podiam ser
estendidos à mulher, porque a universalidade masculina ficava assegurada (sob
égide da propriedade e da família) pelo direito que o homem tinha à mulher”
(SCOTT, 2002, p. 124).
Nesta perspectiva, a exclusão da mulher da esfera pública,
concretizada na ilegalidade da atuação política, fez com que emergisse a seguinte
questão, colocada por Jeanne Deroin em um de seus discursos: “os direitos e
deveres são correlativos. Contudo, para exercermos e cumprirmos nossos deveres,
é preciso que detenhamos poder” (apud SCOTT, 2002, p.125).
As palavras de Deroin, mencionadas acima, demonstram que a
representatividade feminina era mais do que necessária para garantir a igualdade. O
3
Madeleine Pelletier, Humbertine Auclert, entre outras.
29
direito ao voto seria o primeiro salto à cidadania e sua reivindicação também iria
garantir não só direitos políticos, mas civis e sociais.
Em tese, o movimento feminista considerava que esse direito seria
uma alavanca para a emancipação política da mulher. Segundo Saraceno (1995, p.
206), as necessidades das mulheres demoraram a ser reconhecidas como direitos
individuais, pois foram definidas como um limite para a capacidade de cidadania; e
os deveres das mulheres foram utilizados como razão da sua exclusão da própria
cidadania.
Portanto nota-se que a conquista da cidadania da mulher teve início
com as reivindicações dos grupos feministas que, de forma ousada, enfrentaram a
sociedade conservadora, machista e patriarcalista. Com isso, foi aberto nos espaços
decisórios de poder, como a esfera política, discussões pertinentes à igualdade de
gênero, a conquista dos direitos, ao reconhecimento, à participação e à
representatividade feminina como sujeito individual e coletivo.
Assim, Camargo (1998) enfatiza que a luta iniciada no século XVIII
continuou no século posterior, constituindo, entre avanços e recuos, um arcabouço
conceitual e as bases concretas que permitem reconhecer, na atualidade, a
existência de um movimento mundial das mulheres na luta pela cidadania
Esse fenômeno histórico articulou necessidades e contradições de
metade da humanidade em vários campos da vida social, questionou
e reviu conceitos fundantes da sociedade e adotados como
universais, como o conceito de direitos humanos, por exemplo, ou
ditas verdades científicas sobre o corpo e a natureza feminina, numa
batalha que percorreu temas da filosofia, da política, da ética, da
sexualidade, entre outros (CAMARGO, 1998, p. 121).
De acordo com Moraes (2003, p.96), a cidadania das mulheres
“denuncia os limites de seu próprio modelo. Às mulheres designa-se a função de
cuidado da família e só depois lhes é oferecida possibilidades no mercado de
trabalho e na política.” Essas possibilidades foram sendo concedidas através das
lutas que as próprias mulheres travaram em defesa dos seus direitos, pela conquista
da igualdade social, civil e política.
30
No final do século XIX, por exemplo, a busca incessante do
reconhecimento dos direitos femininos começa a mudar a trajetória de muitas
mulheres que antes eram subordinadas, privadas de sua liberdade dentro da esfera
doméstica, onde, impregnadas pelo lema revolucionário, de ‘liberdade e igualdade’,
perceberam que o sexo feminino era frágil, mas não por opção, e sim por ter sua
liberdade suprimida pela sociedade machista.
Essa percepção levou algumas feministas a protestar contra a
exclusão política da mulher, que prejudicava amplamente sua evolução enquanto
sujeito individual e coletivo, a fim de romper os paradigmas conservadores que
restringiam a liberdade e a emancipação feminina. Assim, as mulheres frente as
dominações masculinas da época manifestavam-se coletivamente em defesa da
igualdade entre os sexos.
Portanto a história da cidadania feminina remete-se à dicotomia
entre o público e o privado, justificando serem cidadãos aqueles que possuiam
poder, propriedades e trabalho.
Neste aspecto, as mulheres faziam parte de um segmento excluído
que não tinha direitos civis, sociais e políticos garantidos. É sabido que até os dias
de hoje há ainda a luta pela ampliação dos direitos das mulheres como: diminuir o
número de mulheres vítimas da violência doméstica, garantir os direitos sexuais e
reprodutivos, a igualdade de salários, a maior representatividade e participação
efetiva na elite política, entre outros.
Veremos, adiante, as ações coletivas que marcaram o campo das
conquistas e da emancipação feminina na trajetória das lutas pelos direitos sociais e
políticos.
31
CAPÍTULO 3
A PARTICIPAÇÃO DA MULHER NA ESFERA PÚBLICA E PRIVADA
3.1 M
ARCO HISTÓRICO
A identidade da mulher, historicamente, foi construída como um ser
passivo e espectador das transformações sociais, visto que, tradicionalmente, a
mulher foi excluída dos espaços públicos, não por vontade própria, mas por
conseqüência de uma ideologia dominante, cujos parâmetros se firmavam num
sistema patriarcal.
Conforme aponta Perrot (1998), desde que a história existe como
disciplina científica (século XIX), o lugar das mulheres dependeu das representações
dos homens. Dessa forma, as mulheres foram privadas dos ambientes públicos,
impossibilitadas de expressar opiniões e consideradas seres inferiores aos homens,
permanecendo invisível, na história oficial, sua participação na construção do
mundo.
Beauvoir (1949) também afirma que o não reconhecimento da
mulher como sujeito histórico, fez com que prevalecesse, por muito tempo, a idéia
de que a humanidade é masculina.
Entretanto, as mulheres sempre tiveram uma participação importante
e fundamental na sociedade, seja na organização da unidade familiar, nas lutas em
prol dos direitos civis, políticos e sociais. Mas, diante de uma organização social
autoritária, conservadora e patriarcal, os estudos mostram a mulher como sujeito
passivo, submisso e distante das lutas e conquistas.
A esse respeito Pena (1981) afirma que, consciente ou
inconscientemente, as mulheres foram apagadas de nossa história e a leitura dos
textos daqueles que se preocuparam em estudá-la provoca a impressão de que as
mulheres nunca se manifestaram contra essa condição de inferioridade e
desigualdade com os homens.
32
Se refletirmos a real posição feminina, verificamos que, apesar dos
preconceitos, discriminações e exclusões ao longo da história, sempre houve frentes
de lutas, manifestos e reivindicações contra a dominação masculina.
Neste contexto, vale mencionarmos períodos da história que
marcaram a presença das mulheres em defesa de seus direitos e da igualdade entre
os sexos.
No Movimento Renascentista (séc. XVI), por exemplo, surgiram os
primeiros escritos femininos, entre os quais podemos citar textos da francesa, Marie
le Jars de Gournay, que escreveu sobre a igualdade entre os sexos, postulando que
a mulher deveria ter maior participação social.
Ademais, a luta das mulheres tem precedentes, também, nos
séculos XVII e XVIII, na Inglaterra e na França. Nesses dois países, as mulheres
tinham mais liberdade que em outros lugares. Segundo Badinter (1993), foram as
"preciosas francesas" as primeiras a questionarem a identidade masculina e o papel
dos homens na sociedade.
Consideradas as primeiras feministas, as "preciosas" - mulheres da
aristocracia e alta burguesia, solteiras, independentes
economicamente -, defendiam a igualdade entre os sexos, o direito
ao amor e ao prazer sexual, o acesso à mesma educação intelectual
dada aos homens. Questionando a instituição casamento e os papéis
de esposa e mãe como destino da mulher, elas inverteram os valores
sociais da época. Apesar de seus opositores, elas conseguiram
algumas mudanças (BADINTER, 1993, p. 12, grifo do autor).
O auge do preciosismo francês aconteceu entre 1650 e 1660. Já na
Inglaterra ocorreu entre 1688 e 1714, época de lutas e negociações dos papéis do
homem e da mulher no casamento, na família e na sexualidade.
Ainda, no século XVIII, o contexto do Iluminismo de ideal
democrático e individualista, norteado pelo lema: “Liberdade, Igualdade e
Fraternidade”, parecia ser um momento favorável às aspirações femininas, mas não
foi o que ocorreu, pois, contraditoriamente, a Revolução Francesa negou às
mulheres o direito de cidadãs e retomou à tradicional separação entre os sexos.
33
Gradativamente, desenvolveu-se uma ideologia marcada pelas
diferenças naturais que estabelecia papéis e funções sociais segundo uma suposta
‘natureza’ de cada sexo. É possível detectar, no contexto revolucionário francês, o
surgimento de modelos e simbologias que se confrontam:
Emerge, assim, de modo preponderante, o esforço dos movimentos
femininos revolucionários para criar uma imagem de mulher presente
e participante no espaço político. Por outro lado, na referência às
imagens míticas de Eva, Pandora, a figura de traidoras, a Catarina
de Médici, símbolo de crueldade, e no apelo ao código natural para
uma representação do feminino incompatível com os valores da
cidadania política, a Revolução certamente fundou (e ao mesmo
tempo retomou uma atávica tradição) outra ordem simbólica que
impediu qualquer forma de participação ativa das mulheres na pólis
(FIORINO, 1995, p. 79-80).
A autora acima elucida que, durante a Revolução Francesa, foi se
construindo o conceito moderno de cidadania, que se consubstancia na Declaração
dos Direitos do Homem e do Cidadão. Mas cidadãos eram apenas os homens
brancos, donos de bens e propriedades.
Esse conceito de cidadania, porém, é contraditório, o universalismo
dessa declaração não diz respeito às mulheres, pois elas não foram consideradas
indivíduos. A Revolução lhes concedeu apenas direitos civis, mas nenhum direito
político. Elas tinham igualdade no ato civil do casamento, por meio do
consentimento, podendo ser dissolvido pelo divórcio, mas continuavam sendo
representadas pelos homens quando se tratava de representação política nos
espaços decisórios de poder.
Portanto permanecia a exclusão da mulher dos espaços públicos
cuja justificativa era dada por uma ‘pretensa’ natureza biológica, destinada à
procriação e ao espaço doméstico, conforme se pode constatar através de uma
publicação no periódico Révolution de Paris:
Em virtude de que princípio as nossas mulheres são privadas de
prerrogativa política? Em virtude do voto da natureza que não criou
as mulheres para as funções do corpo político. Essas funções
exigem trabalhos onerosos, uma sólida experiência, uma força de
espírito e de raciocínio que não pertencem a um sexo cuja
constituição é frágil e delicada, cuja conformação está em contraste
34
total com os trabalhos da administração e das armas, no qual a
delicadeza dos órgãos produz uma série de idéias débeis e
desconexas, e não aquelas concepções fortes e consistente,
necessárias à gestão pública. Numa palavra, as mulheres nasceram
para as virtudes e cuidados domésticos. Sua tarefa não vai além e,
quando quiserem superar este limite, só ofereceram um fenômeno,
em geral, extravagante e não autorizado pela natureza (apud
GROPPI, 1995, p. 15).
Apesar dessa concepção machista, que negava às mulheres sua
participação ativa na esfera pública, o ideário iluminista, que inspirou a Revolução
Francesa (1789), acabou propiciando o fortalecimento do movimento feminino. As
reivindicações aumentaram e, para as mulheres, “a liberdade, a igualdade e a
fraternidade” deveriam também ser estendidas a elas. Entre outros pontos,
defendiam o exercício da cidadania feminina e a revogação da legislação que
submetia a mulher ao domínio masculino (GROPPI, 1995).
Constatamos do exposto, que o pensamento machista da época
denegria a imagem feminina. Conforme afirma Godelier (1995, p. 98), para excluir é
preciso denegrir. E esse denegrimento é, antes do mais, uma operação ideal. Os
homens atribuem às mulheres no imaginário impotências que elas não têm ou
concedem a si próprios potências que não têm. Desse modo, aumentam-se
idealmente e rebaixam idealmente também o outro sexo.
Ainda, segundo o referido autor, um dos mecanismos da dominação
masculina é a ideologia, pois não se justifica ou legitima uma idéia sem trabalhar um
ideário que a torne aceita como “verdadeira”. Assim, qualquer forma de exclusão
tem que se legitimar; denegrir a imagem da mulher foi a forma utilizada para excluí-
la do espaço público e negar-lhe o acesso à cidadania.
As mudanças sociais e políticas da Revolução limitavam-se,
essencialmente, a construir o conceito de cidadão, contrapondo-se ao conceito de
súdito e o que distinguia o súdito do cidadão era a participação na esfera pública.
Reafirmava-se, portanto, o elemento masculino como ator solitário desse contexto,
em oposição à suposta passividade da esfera privada, essencialmente feminina
(GROPPI, 1995).
35
Com efeito, a noção de cidadania – que reveste um caráter simbólico
central na Revolução Francesa – não só não leva em conta o
elemento feminino no momento constitutivo, mas se define e se
constrói em oposição a ele. Não se trata, então de uma simples
“remoção” da diferença feminina do imaginário dos modernos
pensadores políticos [...] parece antes uma necessária e consciente
expulsão de um sujeito feminino que serve para confirmar por
oposição a identidade de um sujeito masculino, que procura para si
mesmo novas definições e novas relações [...]. Se o caráter
constitutivo do termo cidadão em oposição ao de súdito reside em
sua participação ativa na esfera pública, no curso da Revolução ele
se reforça em oposição à passividade da esfera doméstica e privada
que compete às mulheres (GROPPI, 1995, p. 18).
Assim, às mulheres não se admitia o reconhecimento da cidadania e
tão pouco o direito de manifestar ou exaltar qualquer tipo de posição contrária à
ideologia dominante. Aquelas que ousavam enfrentar esse autoritarismo eram tidas
como “histéricas e loucas”.
Apesar da repressão aos direitos políticos da mulher, nesse período,
qualquer questionamento dos atos revolucionários era considerado crime contra a
revolução, não impediu que algumas mulheres reivindicassem maior participação
política.
Nesse cenário, conforme apontado no segundo capítulo deste
trabalho, a francesa Olympe de Gouges lançou a Declaração dos Direitos da Mulher
e da Cidadã (1791), texto no qual argumentava que as mulheres eram sujeitos de
direitos políticos e sociais tanto quanto os homens. Essa declaração constituiu-se na
“mais orgânica crítica contemporânea ao pretenso universalismo da Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão” (GROPPI, 1995, p. 12).
Olympe, no artigo VI da Declaração, fala sobre a igual admissão a
todas as dignidades, postos e empregos públicos, segundo as suas capacidades e
sem outra distinção a não ser suas virtudes e seus talentos’. “Ou seja, o sujeito
feminino quer juntar-se ao masculino e não obliterá-lo no momento em que afirma
sua especificidade” (GROPPI, 1995, p. 14).
Portanto a luta das mulheres busca ampliar o direito a todos os
cidadãos, não como uma ameaça à ordem social e em especial da família, como
muitos dos homens acreditavam, se fossem inseridas no mundo público. Conforme o
36
pensamento masculino da época, a mulher, uma vez inserida na esfera pública,
poderia causar o fracasso da família e, sendo assim, seria mais conveniente privar-
las do mundo do trabalho, que arriscar a ordem vigente da sociedade patriarcal e
machista. Essa concepção permaneceu por mais cem anos.
Somente no século XX, as lutas feministas se fortalecem e
comportam um marco expressivo nas reivindicações contra a dominação e a
exploração da mulher. Neste contexto, podemos enfatizar o acontecimento das
guerras mundiais como fatores que impulsionaram a inserção das mulheres na
esfera pública.
Segundo Perrot (2007), a primeira Guerra Mundial (1914-1918), por
exemplo, gerou crise na identidade masculina, pois devido às dificuldades no
combate, as mulheres entram em cena e exercem muito bem as atividades
consideradas do sexo oposto.
Conduzem arados, automóveis e bondes. As “municionetes”
manipulam obuses nas fábricas de armamento. As mulheres
gerenciam seu orçamento, aprendem a lidar com dinheiro, recebem
melhores salários [...] Fazem greve por seu aumento: em 1915, em
1917,manifestam-se em Paris, por iniciativa própria. Vão e
vêm,fumam,tomam liberdades. Os homens criticam seus
gastos,olham de esguela por suas meias de seda,desconfiam de sua
fidelidade. Ruptura de hábitos e de evidência [...] (PERROT, 2007,
p.144, grifo da autora).
Após a Primeira Guerra, os homens tentam retomar a ordem
conservadora da divisão dos sexos. Incomodados com a “independência feminina”,
é baixado um decreto em 1940, excluindo as mulheres casadas da função pública.
Assim, muitas mulheres deixaram seduzir-se novamente pela
ideologia machista, retomando suas responsabilidades com o lar, com o cuidado
exclusivo para com os filhos e com o marido; outras continuaram a luta pela
igualdade nas condições de trabalho, as quais foram realmente reconhecidas após a
Segunda Guerra Mundial (1939 -1945). Nesta guerra, com a ampla atuação da mão-
de-obra feminina na esfera pública, foi possível provar que o sexo “frágil” era capaz
de exercer suas funções fora do lar.
37
Já na década de 60, sob a égide do feminismo, a luta das mulheres
ganha ainda mais visibilidade, fortalecendo-se, como um movimento social
responsável por mudanças radicais nos valores, nos costumes, nas relações de
trabalho e na família. Reivindicam questões acerca do direito á sexualidade, a
igualdade com os homens no mercado de trabalho, entre outras.
Portanto, a história mostra, através das diversas manifestações, já
mencionadas anteriormente
, que o resultado das grandes transformações sociais,
econômicas e culturais na vida das mulheres foram iniciadas no século XVII, o que
prova que as frentes de lutas feministas contra práticas e ações discriminatórias são
antigas. Ocorrem desde séculos atrás, tendo maior visibilidade e reconhecimento no
século XX, que devido às duas grandes conflagrações monodias, situadas acima,
possibilitou à mulher “dar uma demonstração prática, em circunstâncias
extremamente críticas, de sua capacidade de ação, em nada inferior à do homem,
dentro de uma variedade extremamente grande de setores de atividades”
(TABAK,1983 p. 18).
3.2 R
ELEVÂNCIA DO SUFRAGISMO E FEMINISMO NA CONQUISTA DOS DIREITOS DAS
MULHERES
É importante situarmos, neste estudo, a importância que o
feminismo e o sufragismo, tiveram no fortalecimento e na organização coletiva das
mulheres na luta pela defesa de seus direitos.
No final do século XVIII e meados do século XIX, aflora o feminismo,
movimento social e político organizado por mulheres, tendo como proposta a tomada
de consciência da opressão, subordinação e exploração das mulheres,
compreendido como um movimento social organizado e remetido ao sufragismo,
movimento pela extensão do direito universal de voto às mulheres.
As mulheres americanas foram pioneiras na luta pelo direito do voto
feminino. Pelo fato de terem lutado ao lado dos homens na Guerra da
38
Independência (1776), as mulheres foram valorizadas, mas só em 1869, quando da
Fundação da Associação Nacional pelo sufrágio das Mulheres, foi conquistado o
direito de voto feminino no país (BADINTER, 1993).
Na Europa, o movimento sufragista se fortaleceu no final do século
XIX, aliado ao intenso movimento de trabalhadores e ao movimento pacifista,
reivindicando direitos civis plenos e, especialmente, o voto para a população
feminina. Apesar disso, na maioria dos países europeus, só no século XX esse
direito foi conquistado, o que evidencia o longo processo de lutas para a conquista
desse direito pelas mulheres, sintetizado no chamado ‘movimento sufragista’,
principal característica da primeira fase do movimento feminista (LOURO, 2001).
O direito ao voto, porém, confrontou-se com obstáculos de ordens
diversas, tendo alguns desses obstáculos permanecidos até recentemente, como no
caso da França, que somente em 1944 concedeu o direito de voto feminino e da
Suíssa, que concedeu esse direito às mulheres no início da década de 70.
Segundo Tabak (1983), após a segunda Guerra Mundial (1939-
1945), tem-se início, de modo geral, um processo de ampliação da ocupação do
espaço público pela mulher, especialmente após a Declaração Universal dos
Direitos do Homem (1948), cuja discussão e aprovação de seus textos pela
Assembléia Geral da ONU (Organização das Nações Unidas) só se concretizou a 16
de dezembro de 1966.
De modo geral, no contexto mundial, uma vez conquistado o direito
ao voto, seguiu-se certa desaceleração do movimento feminista que volta a se
fortalecer décadas mais tarde, quando além das preocupações políticas e sociais,
começou a investir em construções teóricas, que penetram nas Universidades, a
partir das militantes feministas do mundo acadêmico (LOURO, 2001).
Em 1968, o movimento feminista influenciado pelas mudanças
sociais e políticas surgidas no mundo, revitalizou-se, e nas décadas seguintes,
engajou-se na esteira das reivindicações das minorias políticas.
Nesse contexto, o movimento feminista das décadas de 1960 e 1970
abalou de forma significativa a predominância da hierarquia de gênero e, assim, a
39
consagração do direito de manifestação pública veio com o apoio internacional,
evidenciado pela decisão da ONU de instituir, em 1975, o dia 8 de março como
sendo o Dia Internacional da Mulher, inaugurando, assim, uma nova etapa do
movimento feminista (RODRIGUES, 2004).
Para o movimento feminista, a década de 70, conforme aponta
Tabak (1983, p. 35), é de grande importância, pois “foi nessa época que a discussão
da problemática feminina se colocou de forma efetiva e concreta no cenário
mundial”.
Destacam-se, neste período, importantes ações e eventos sobre a
mulher, a exemplo da 30ª Assembléia Geral das Nações Unidas, na qual foi
apresentado, pela Comissão do Status da Mulher, o Programa de Ação Combinada,
cujo objetivo era integrar a mulher no processo de desenvolvimento mundial e a
Conferência do México (1975), da qual resultou um Plano de Ação Mundial, cujo
objetivo era o de eliminar todas as discriminações contra a mulher (TABAK, 1983).
Dessa forma, a década de 1970, particularmente o ano de 1975,
quando se realiza a primeira Conferência Mundial sobre a Mulher, caracteriza-se
como marco da história dos movimentos de mulheres em todo o mundo, não só por
reconhecer as situações de desigualdade e discriminação vividas pela mulher, mas
também pelo compromisso de se adotar medidas visando mudar essa situação,
através de compromissos assumidos por governos de diversas partes do mundo.
Outrossim, em 1979, as Nações Unidas, impulsionada pelo marco
do Ano Internacional da Mulher (1975), aprovou a Convenção sobre a Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, estabelecendo em seu art. 1º,
que para fins dessa convenção
[...] a expressão ‘discriminação contra a mulher’ significará toda
distinção, exclusão ou restrição baseada no sexo e que tenha por
objeto ou resultado prejudicar ou anular o reconhecimento, gozo,
exercício pela mulher,independentemente do seu estado civil, com
base na igualdade do homem e da mulher, dos direitos humanos e
das liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social,
cultural e civil ou em qualquer outro campo”
40
Na esteira desses acontecimentos, na década de 1980, foi realizada
a Conferência Mundial do Decênio das Nações Unidas para a Mulher (Copenhague–
Dinamarca), cujos objetivos foram avaliar os avanços alcançados através das
recomendações feitas pelo Plano de Ação Mundial, reajustar os programas em
execução e elaborar novas medidas para a década, além de analisar e avaliar a
situação das mulheres na África do Sul, no regime do Apharteid, elaborando-se um
plano de ação para atender às necessidades dessas mulheres.
Tendo em vista os avanços na defesa dos direitos da mulher,
sobretudo nas décadas de 70 e 80, a Organização das Nações Unidas declarou os
anos de 1976 a 1985 como a Década da Mulher
4
.
Os avanços obtidos pelas mulheres, no entanto, não foram
totalmente satisfatórios, conforme ficou constatado quando da realização da
Conferência Mundial do Final da Década da Mulher, no ano de 1985, na cidade de
Nairobi (Quênia). Essa conferência teve como objetivo avaliar os resultados obtidos
nos últimos dez anos e, apesar de ter se constatado conquistas no México e em
Nairobi, especialmente quanto à consciência de gênero, foram apresentadas
algumas pesquisas acadêmicas que apontaram que a discriminação, a violência e
opressão ao sexo feminino continuavam significativas.
Dessa forma, em que pese não ter sido superadas, na prática, todas
as formas de discriminação contra as mulheres, o século XX constitui-se num marco
de importantes conquistas femininas.
Com o crescimento da industrialização, as mulheres foram
conquistando sua liberdade, através da reivindicação de eqüidade social, igualdades
de gênero e garantia de direitos, o que resultou na mudança de suas vidas
cotidianas, já que ocorreu uma gradativa inserção das mesmas no mercado de
trabalho (embora desempenhando paralelamente as funções domésticas) e, nos
espaços públicos, ocupando, inclusive, cargos políticos.
Apesar de exercerem outras funções, que não as de apenas
domésticas, a responsabilidade pela ordem e manutenção dos lares não deixou à
4
Mais informações sobre esse assunto acessar: http://www.redemulher.org.br
41
época e tampouco atualmente, de recair sobre as mulheres, o que, muitas vezes,
impossibilita maior representatividade feminina nos espaços por elas conquistados
ao longo da história.
3.3 S
UFRAGISMO E FEMINISMO NO BRASIL
O movimento sufragista brasileiro surge como resultado da agitação
republicana de 1889, com o fim da monarquia, a possibilidade de uma estrutura
política mais aberta, à medida que estendeu o direito ao voto a todos os homens
alfabetizados.
Após a Proclamação da República, a conquista do voto tornou-se
um grande desafio para as mulheres, pois queriam sua emancipação política,
permitida através da concessão deste direito.
Grupos políticos liderados por Nísia Floresta Violante Bivar e
Velasco, Francisca Senhorinha da Motta Diniz, Leolinda Daltro,Bertha Lutz entre
outras, reivindicaram o direito ao voto feminino e lutaram contra a desigualdade de
gênero em defesa dos direitos políticos e sociais das mulheres brasileiras.
No Brasil, o movimento pelo sufrágio, apesar de ter sido constituído,
principalmente, por mulheres pertencentes à elite política e social da época, o que
levou Saffioti (1992) a denominá-lo ‘movimento pequeno-burguês’, acabou por
despertar, numa grande parcela da sociedade, não só a consciência dos seus
problemas, mas também dos problemas do mundo moderno.
Referindo-se ao movimento feminista brasileiro, Pinto (2003) aponta
serem múltiplos seus objetivos, manifestações e pretensões no país. Com isso, a
autora, ao destacar as principais tendências do feminismo brasileiro, coloca-as em
dois momentos: o do final do século XIX até 1932 e do feminismo pós-1968.
Sendo assim, o primeiro momento do feminismo brasileiro é
destacado pelo movimento sufragista liderado por Bertha Lutz, cujo caráter era
42
conservador pelo fato de não questionar a opressão da mulher dentro das relações
de gênero e, sim, focar a conquista dos direitos femininos como um complemento
para o bom andamento da sociedade (PINTO, 2003).
Quanto à segunda tendência, chamada pela autora de um feminismo
‘mal-comportado’, caracteriza-se pela heterogeneidade de seus membros
(intelectuais, anarquistas, líderes, operárias, etc.) o que faz surgir, além da defesa
de seus direitos políticos, a defesa pelo direito à educação, abordando temas
delicados para a época, como a dominação masculina, a sexualidade e o divórcio.
A negação do voto feminino era enraizada pela sociedade patriarcal
brasileira sobre argumentos injustos e preconceituosos, tais como: a inferioridade da
mulher, o perigo da dissolução familiar e outros (SEGATTO, 1987, p.11).
Ademais, se analisarmos o histórico sobre o início das lutas pelo
voto feminino, percebemos que no Brasil, essa questão já havia sido discutida na
Assembléia Constituinte de 1891, mas foi considerada como um perigo à dissolução
familiar, porquanto a mulher, uma vez inserida nas esferas de poder, poderia deixar
de exercer suas responsabilidades domésticas.
Dessa forma, Zirbel (2008) afirma que para a maioria dos deputados
da assembléia de 1891, era indiscutível e inapelável o papel da mulher no lar e na
família e o sufrágio feminino parecia-lhes uma ousadia anti-social. Abrir a
possibilidade de voto às mulheres seria admitir-lhes a capacidade de pensar os
rumos políticos da nação e de exercer atividades de cunho público, campo destinado
apenas aos homens
.
Sem se intimidar com as campanhas anti-sufragistas que se
encontravam em todas as partes, surgiu, em 1910, no Rio de Janeiro, o Partido
Republicano Feminino. Fundado pela professora Deolinda Daltro, o Partido
Republicano Feminino tinha como objetivo ressuscitar no Congresso Nacional o
debate sobre o voto da mulher (abandonado desde a Assembléia 1891). Sete anos
após sua fundação, em 1917, esse Partido chegou a organizar uma passeata na
capital do país a fim de reivindicar o direito ao voto feminino (ZIRBEL, 2008).
43
Embora o direito ao voto não tenha sido conquistado, o ano de 1917
teve sua importância no campo dos direitos femininos, pois permitiu a elas, a
conquista do trabalho, sendo a mulher, aceita no Serviço Público do Brasil
.
Em 1928, o direito de voto das mulheres foi conquistado no estado
do Rio Grande do Norte e, após essa data, estendido para outros estados
brasileiros. Em 1932, a conquista foi inserida no Código Eleitoral e, em 1934,
incorporado à Constituição Brasileira.
Nesse sentido, Avelar afirma que “assim como em outros países do
mundo, o direito de voto no Brasil estendeu-se universalmente após quase um
século de demandas, conquistas e refluxos” (AVELAR, 2001, p. 16) e enfatiza que
mesmo com o direito de votar, resguardado na constituição de 1934, as mulheres
brasileiras só votariam efetivamente em 1946, pois o golpe de 1937, que instalou a
ditadura do Estado Novo
5
, teve, entre suas conseqüências, um período de refluxo do
movimento feminista que se estende até a década de 1970.
Com a ditadura do Estado Novo, as lutas feministas parecem ter-se
fundido com a da população em geral, qual seja a de resistir ao governo autoritário.
No período, Pós-Segunda Guerra, o Brasil, seguindo uma tendência mundial,
entrava num processo de redemocratização, tendo sido desenvolvida a luta pela
anistia.
O Comitê das Mulheres Pró-democracia defendia uma participação
efetiva da mulher que resultasse na “consolidação da democracia no Brasil e se
esforçasse pela conquista da igualdade de direitos em todos os ramos da atividade
profissional, administrativa, cultural e política” (TABAK, 1983, p. 121).
E, em 1949, foi realizada, no Distrito Federal, a primeira Convenção
Feminina, a qual buscou reunir pessoas e organizações cujas atividades estavam
direta ou indiretamente ligadas às questões femininas, de modo a possibilitar um
amplo estudo e debate de todas as questões de interesse da mulher. Estas
5
Golpe de Estado promovido pelo então presidente Getúlio Vargas, instalando no país um período
ditatorial que vigorou até 1945, quando o então presidente foi deposto pelas Forças Armadas
brasileiras.
44
questões foram centradas em três pontos do temário: a defesa dos direitos da
mulher; a proteção à infância e a defesa da paz mundial (TABAK, 1983, p. 122).
A mobilização feminina continuou no Brasil e, na década de 1950,
foram realizados congressos e assembléias para discutir questões femininas,
embasadas, a partir de 1953, na Declaração de Direitos da Mulher, adotada em
Copenhague e que priorizava, além da igualdade de direitos civis e políticos para a
mulher, o cumprimento das leis trabalhistas e sua extensão às trabalhadoras do
campo. Essa mobilização das associações femininas foi intensa até o Golpe Militar
de 1964, quando desaparece a maioria dessas associações (TABAK, 1983, p. 122).
Embora, na década de 1960, os movimentos feministas brasileiros
tenham sido amenizados em razão da Ditadura Militar, na década de 1970 eles
ressurgem com mais força, sendo compostos, em sua maioria, por mulheres da
classe média.
Pinto (2003) afirma que a emergência do feminismo em plena
ditadura militar deveu-se aos cenários internacionais de grande efervescência
política, de revolução dos costumes, de radical renovação cultural.
Esse cenário internacional marca o novo feminismo no Brasil da
década de 1970, especialmente após 1975, ano em que, conforme mencionado
anteriormente, foi considerado pela ONU como o Ano Internacional da Mulher e ano
em que se deu a criação do Centro da Mulher Brasileira (CMB), cuja posição foi a de
sempre considerar que
o movimento feminista soma às reivindicações políticas, econômicas
e jurídicas do povo, o questionamento do papel tradicional da mulher,
como esposa e mãe, a sua situação de inferioridade a que foi
historicamente relegada (TABAK, 1983, p. 136).
Desse modo, o CMB dá origem ao Coletivo de Mulheres
6
em 1979,
que sobre a visão do feminismo, acreditava na idéia de autonomia do movimento e
afirmava que a opressão e a discriminação imposta às mulheres são fundadas no
6
Movimento que surgiu de um “racha” dentro do CMB,quando um grupo de associadas manifestou
sua divergência com a atuação do grupo (TABAK,1983 p.137).
45
sexo, acrescentando que “[...] cabe às mulheres conquistar espaços que assegurem
o desenvolvimento de suas próprias características, para que possam assumir-se de
forma independente, renunciando ao modelo masculino” (TABAK, 1983, p. 137).
Já, na década de 80, as pesquisas passam a apontar o caráter
relacional entre os sexos, o qual é construído socialmente a partir de relações de
poder e, conseqüentemente, apresentam hierarquias que conduzem à desigualdade
social.
Para compreender-se, portanto, a situação da mulher, é necessário
entender as complexidades das relações sociais entre os sexos. Nessa perspectiva,
os Encontros e Congressos feministas a partir de 1979 iniciam uma discussão de
temas específicos sobre a opressão e subordinação feminina. Além disso, no
período da redemocratização do país, duas questões se impunham ao movimento
de mulheres: a unidade do movimento ameaçada pela reforma partidária de 1979,
que dividiu as oposições, e a relação do movimento feminista com os governos
democráticos, que viriam a se estabelecer posteriormente (PINTO, 2003).
Na conjuntura da década de 80, um dos enfoques do movimento
feminista brasileiro foi no sentido de eliminar leis discriminatórias e dar visibilidade a
todas as formas de discriminação e à violência contra as mulheres.
Em 1980, ocorreu também o surgimento dos Conselhos nacional,
estaduais e municipais da mulher, as delegacias especializadas, os abrigos e
centros de orientação jurídica e de apoio psicossocial.
Essa década foi um período importante na vida política das
mulheres, pois as feministas começam a ocupar-se de cargos estaduais com a
eleição de alguns governadores do PMDB, principalmente em São Paulo, e federais,
com a criação do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher - CNDM, em 1985, que
teve papel decisivo na conquista dos direitos das mulheres assegurados na
constituição de 1988 (PINTO, 2003, p.79).
Adiante, década de 1990, a referida autora menciona em seu livro,
Uma História do Feminismo no Brasil, que nesta época surgem os grupos feministas
temáticos, os quais tratavam de assuntos referentes a saúde e a violência contra a
46
mulher. Além disso, abre-se espaço para o nascimento e o desenvolvimento de um
feminismo acadêmico, aberto à educação, através do surgimento de núcleos de
pesquisa em estudos da mulher em algumas grandes universidades do país,
mediado pelo Departamento de Pesquisa e Fundação Carlos Chagas da cidade de
São Paulo.
Importante frisarmos que, mesmo com toda a trajetória de lutas e
conquistas do feminismo no Brasil, mencionadas acima, as mulheres ainda não
conquistaram de forma efetiva a maior participação feminina nos cargos eletivos.
Portanto são necessárias, nesse contexto, ações afirmativas que ampliem a
representação feminina nas instâncias políticas. Segundo Tabak (1983), é
fundamental para ampliação dos direitos da mulher, eliminar todos os
remanescentes de autoritarismo ainda existentes na sociedade brasileira através da
participação ativa e consciente das mulheres nos canais políticos de poder.
47
CAPÍTULO 4
A PARTICIPAÇÃO DAS MULHERES NA VIDA PÚBLICA E POLÍTICA DO BRASIL
As mulheres brasileiras, como mencionado no capítulo anterior,
adquiriram o direito de votar e ser votadas em 1932, tendo esse direito sido
assegurado na Constituição de 1934.
Contudo, a representação feminina na política eleitoral adquiriu
maior intensidade a partir da retração do regime militar e da redemocratização do
país (1982 -1985), época em que os militares deixam de ser os principais detentores
do poder político, surgindo, nesta arena, a participação política de civis.
7
Com isso, novos partidos políticos são criados, a exemplo do Partido
do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB) e do Partido dos Trabalhadores (PT),
e as mulheres inserem-se, gradativamente, na política partidária. Assim, desde
1982, passaram a candidatar-se a cargos eletivos.
Para a disputa eleitoral de 1982, os debates políticos nos partidos
recém-surgidos tiveram a participação de segmentos organizados da sociedade,
sendo um desses segmentos o movimento de mulheres que pressionou a inclusão
de temas sobre a questão da mulher nos programas dos partidos, fazendo com que
o PMDB, em seu programa, deixasse explícito sua oposição
[...] à anacrônica legislação que impede o pleno exercício da
cidadania e da capacidade civil da mulher brasileira [...] defende
ainda, plenos direitos para as mulheres trabalhadoras: contra a
discriminação de salários de que são vítimas, pela abolição de
qualquer tipo de discriminação de emprego às casadas, gestantes,
com filhos ou idosas, luta pela obrigatoriedade de creches nos locais
de moradia ou de trabalho [...]. (TABAK, 1983, p. 143).
Da mesma forma, o PT (Partido dos Trabalhadores) ressaltava em
seu programa que “as discriminações não são questões secundárias, como não é
7
Mais detalhes sobre esse assunto ver KINZO, Maria D’Alva G. - A Democratização Brasileira - um
balanço do processo político desde a transição. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.
48
secundário o problema da mulher trabalhadora, segregada na fábrica, no campo e,
não raro, também no lar” (ibidem).
Isto posto, evidencia-se a ampliação das influências das criticas
feministas presentes nas instâncias de poder, travando debates sobre as
desigualdades relacionadas ao seu sexo. Mas sabe-se que, mesmo tendo o direito
de participar e defender os direitos das mulheres, elas ainda são minorias no campo
da representação e participação nas esferas de poder. Além disso, não se pode
afirmar que todas as mulheres investidas de um cargo político estejam à frente das
ações e projetos relacionados à desigualdade de gênero e a um projeto feminista.
A esse respeito, Avelar
8
afirma:
[...] a questão chave não é eleger mais mulheres e sim mulheres
feministas, que tenham ciência do status inferior da mulher na
sociedade e na política. O feminismo, como uma ideologia política,é
elemento crucial na construção de identidades políticas femininas
porque é um conjunto estruturado de idéias que guia a ação política.
(AVELAR, 2001, p.24).
Logo, a baixa representatividade feminina nas instâncias de poder, é
justificada por muitos estudiosos, como Avelar (2001), ao mencionar que a cultura
patriarcal restringiu por longa data o alcance dos direitos sociais.
Dessa forma, a mulher, ainda que remetida, até os dias de hoje,
como principal sujeito responsável pela esfera domiciliar, foi rotulada pela sociedade
patriarcal como frágil, incapaz de atuar em espaços de maior responsabilidade
social.
Subjugada em sua sexualidade, a mulher tornou-se o que tem sido,
uma agente reprodutora. Em torno do trabalho reprodutivo, gerando
novas crianças e mantendo-as vivas, em volta do trabalho doméstico,
ela realiza a identidade que lhe foi imposta. Mesmo o capitalismo que
a assalariou, não permitiu que essa identidade se perdesse: as
mulheres seriam duplamente úteis, como trabalhadoras e como
mães/esposas: pelo seu trabalho na produção e pelo seu trabalho na
reprodução (PENA, 1981, p. 15).
8
Em consonância com a referida autora, mais considerações acerca desse assunto será dada no
último capítulo, a partir da análise da presente pesquisa.
49
Desse modo, com o capitalismo, a mulher insere-se no mercado de
trabalho, embora com salários bem inferiores aos dos homens. A lógica dessa
desigualdade social remete-se à idéia de que o trabalho feminino é para
complementar o salário do homem, uma vez que, devido às dificuldades financeiras
emergidas do conflito entre capital e trabalho, a mulher enfrenta o mercado para
ajudar o marido no sustento da família, mas o homem não deixa de ser o principal
provedor da organização familiar.
Assim, salários menores são pagos a elas que ainda cumulam a
dupla jornada, pois continuam exercendo suas funções de mãe e esposa como
responsabilidade prioritária, ou seja, permanece o caráter feminino construído sobre
a lógica do privado, das suas habilidades como cuidadora do lar, dos filhos e do
esposo.
De acordo com Saffiotti (1976), as mulheres, em virtude da história
das exclusões, do domínio masculino, ao se integrarem no setor assalariado,
especialmente no contexto brasileiro, assumem funções mais desprivilegiadas que
as masculinas.
Em consonância com a afirmação acima, Pena (1981, p.17)
menciona que as mulheres recebem salários mais baixos (mesmo porque estes são
vistos apenas como complementares na renda familiar) em postos inferiores na
hierarquia de trabalho e em tarefas mais desqualificadas.
A referida autora argumenta, ainda, que, se levarmos em
consideração que o século passado foi o período de instalação do capital industrial
no Brasil, é importante considerar que também existem evidências de que na
organização das primeiras fábricas no país utilizou-se, fartamente, a mão de obra
feminina.
Nesse contexto, os estudos teóricos sobre a mulher, dominados pela
ideologia machista, acabam exprimindo a imagem feminina sempre numa condição
inferior, o que evidencia a necessidade de se ampliar o debate, as leituras sobre a
verdadeira condição feminina para provar que a mulher sempre esteve presente na
esfera pública, talvez de forma tímida, pela própria inconsciência do poder que as
mulheres tem em suas próprias mãos.
50
Esse fenômeno da desqualificação do trabalho feminino pode ser
explicado pelas considerações de Pena (1981), na fundamentação teórica de
Heleieth Saffiotti e Eva Blay, as quais consideram que a condição inferior das
mulheres
não são, portanto, apenas fatores de ordem individual, como o
casamento e os filhos, que excluem ou permitem à mulher participar
da vida economicamente ativa. O que determina este comportamento
são as condições de carência do mercado de trabalho para certo tipo
de mão de obra. Existe uma dupla hierarquização de ocupações,
uma relativamente ao trabalho feminino, cujas posições são
consistentemente inferiores e pior remuneradas, que na
estratificação masculina (apud PENA, 1981, p. 23).
Assim, a posição social da mulher dificulta as condições de trabalho
em igualdade com os homens, uma vez que a mulher percebe, na sociedade
autoritária e conservadora, status mais baixo que do homem, ou seja, as mulheres,
em grande maioria, encontram - se em cargos de menor prestígio e remuneração.
Segundo Avelar (2001), 78% das mulheres que trabalham no Brasil
atuam em serviços de baixa qualificação, e seus salários ficam em média 63%
menores que os dos homens para os mesmos trabalhos.
Acrescenta Blay que a posição inferior das mulheres transmite às
trabalhadoras feministas a disposição das sociedades capitalistas em conservar a
mulher como “força de trabalho de reserva” (apud PENA, 1981, p. 24).
Além disso, Pena (1981) afirma que, existem carreiras próprias para
a mulher e outras próprias aos homens e, como é esperado, as mulheres, em
maioria significativa, distinguem para as carreiras consideradas femininas.
Evidencia-se, assim, que a representação feminina na divisão sexual
do trabalho acaba tendo as mesmas linhas de representação na família, ao
inserirem-se em postos de trabalho que transportam afazeres domésticos, tais como:
cuidar de doentes, costurar, bordar, limpar a casa, cozinhar, entre outros.
Entretanto, apesar das profissões remetidas ao sexo feminino, é
importante frisarmos que as mulheres vêm buscando espaços em funções
51
consideradas eminentemente masculinas. Atualmente, temos mulheres pilotando
caminhões, aviões, diretoras de empresas, deputadas, senadoras, prefeitas etc.
Não há como esconder, todavia, que o espaço privado versus
público, ligados entre si, mostra-se como um espelho de um patriarcalismo que
imperou por muitos séculos no Brasil e no mundo.
Entre 1890 e 1950, período de intensa industrialização no Brasil, a
cultura patriarcal refletia-se no mercado de trabalho e as mulheres assumiam cargos
nas fábricas, mas continuavam sendo vistas como “trabalhadoras reservas, cuja
renda era complementar à do homem, cuja imagem era a de chefe e principal
provedor da família” (PENA, 1981, p. 31).
Ainda, conforme a autora, a ‘mística feminina’ que conforma a
mulher à família e lhe torna estranho o trabalho coletivo, o qual a levaria para o
domínio da esfera pública, as determinações sociais de seu sexo são determinações
que, em última análise, incidem sobre “o seu papel na família, sua expressividade,
seu afeto, sua capacidade de integrar, paralelamente, sua falta de qualificação, sua
irracionalidade, sua pouca instrumentalidade” (ibidem, p. 34).
A afirmação exposta acima demonstra a rotulação feminina
conceituada na diferença biológica entre os sexos, tratada, anteriormente sob, a luz
de teóricos que escrevem sob a condição feminina na visão patriarcal focada na lei
do mais forte, do homem provedor e proprietário.
Nessa perspectiva, Robert Brifault considera que
O poder crítico, analítico e criativo do intelecto está menos
desenvolvido nas mulheres que nos homens. Este caráter surge
com toda probabilidade da subordinação e sacrifício, as funções
maternais que limitam o crescimento físico da fêmea mamífera.
(apud PENA, 1981, p. 35).
Desse modo, as relações estabelecidas no mundo privado acabam
por reforçar o estereótipo feminino numa condição de submissão e exploração pelo
masculino também no mundo público. A priorização de interesses particulares e
52
individuais do marido, dos filhos, da família, organizados sob a égide patriarcal
determinou, por longo período, a história da ausência feminina no espaço público.
Mas as mulheres têm reagido a essa cultura através dos
movimentos feministas e ações coletivas e os avanços têm sido significativos na
conquista de direitos em todos os campos da vida social, ao longo dessas décadas,
especialmente no que se refere à aceitação das mulheres no mercado de trabalho e
ao seu reconhecimento profissional.
Conforme visto anteriormente, o século XX foi marco de grandes
conquistas femininas. Através dos movimentos feministas, teve início intensas
reivindicações, como o exercício da cidadania por meio direito do voto. Além disso,
com o crescimento da industrialização, as mulheres trabalhadoras foram
conquistando sua liberdade e reivindicando eqüidade social, igualdade de gênero e
garantia de direitos.
As mulheres, gradativamente, vão se inserindo nos espaços
decisórios de poder, criticando as práticas clientelistas, paternalistas,
assistencialistas que ainda permeiam o contexto das relações sociais, buscando,
através de ações estratégicas, a igualdade de direitos.
Dessa forma, frente às novas condições da sociedade
contemporânea, refletidas nas mudanças econômicas, políticas, sociais e culturais,
emergem a necessidade de novos desafios. Nesse cenário, as mulheres, deixam de
ser apenas eleitoras e desafiam as urnas pleiteando cargos políticos eletivos.
O campo da esfera parlamentar, por exemplo, torna-se um espaço
público com condições de ampliar os espaços do exercício da cidadania, efetivados
através de projetos voltados para políticas públicas que garantam o acesso de
direitos às mulheres.
No último capítulo iremos analisar se os projetos da bancada
feminina no legislativo paranaense tem sido iluminados por ações e propostas em
consonância com a luta dos direitos das mulheres, pois sabe-se que o projeto de
emancipação política deve ser mediado por ações coletivas que visem à efetivação
da igualdade entre os sexos e da cidadania feminina.
53
Avelar (2001, p. 44) afirma, então, que
o termo cidadania, para as mulheres, significa não só a sua maior
presença nas instituições políticas formais como em toda sorte de
ativismo, movimentos sociais, associações voluntárias, além de
negociações corporativas centralizadas.
Nesse sentido, argumenta referida autora que a resposta das
mulheres frente às desigualdades é, mais do que nunca, continuar lutando por uma
‘política de presença’, cuja representação política da mulher torna-se fator
fundamental para o enfrentamento das mais diversas formas de discriminação,
violência, preconceitos e exclusões.
Apesar da baixa representatividade feminina, as mulheres do século
XXI vêm ampliando sua participação política, onde se consolida de forma
representativa, e de trabalho a ampliação dos direitos voltados à igualdade das
mulheres. Através da prática feminista, iluminada por uma teoria democrática, as
mulheres vão cada vez mais avançando no espaço público e ocupando lugares de
importância na sociedade.
Quanto à participação política da mulher, essa é maior no âmbito da
sociedade civil, isso porque nos espaços decisórios de poder, as mulheres
enfrentam ainda grandes adversidades, o que reduz sua participação, embora na
esfera dos partidos políticos (porta de entrada para a política representativa), a
participação feminina tem sido crescente (RODRIGUES, 2004).
Cabe salientar, que apesar da crescente participação nos partidos,
as mulheres normalmente são excluídas de suas direções, o que reforça, nessas
instituições partidárias, a imagem da mulher como inferior ao homem. Por isso,
apesar das conquistas, as pressões machistas e conservadoras, ainda existem.
Dessa forma, as mulheres começaram a lutar pelos seus interesses
políticos no sentido de garantir sua participação nos espaços decisórios de poder. A
luta iniciada há décadas continua até hoje fazendo parte da vida das mulheres,
especialmente ao se considerar que a atuação política da mulher brasileira “não tem
seguido uma linha ascendente e contínua. [...] manifesta-se de forma episódica, com
54
altos e baixos [...] ao contrário do que tem ocorrido nas demais esferas de interação
social” (TABAK ; TOSCANO, 1982, p. 73).
Nesse sentido, conforme as autoras, a ação e participação da
mulher no mundo da política têm, entre outros, o mérito de deixar no ar uma
questão: por que a presença numérica de mulheres nos espaços decisórios de
poder é ainda tão reduzida em relação à presença masculina se são mais da metade
da população do país? A resposta à essa questão, é atribuída primeiro ao elitismo e
ao autoritarismo da sociedade brasileira e segundo, ao caráter patriarcal da cultura
nacional.
4.1 A I
NSERÇÃO DA MULHER NOS CARGOS ELETIVOS NO BRASIL
No Brasil, após 1850, surgiram as primeiras organizações de
mulheres que lutavam por direitos políticos. Nísia Floresta Violante Bivar e Velasco,
Francisca Senhorinha da Motta Diniz, Leolinda Daltro, Bertha Lutz entre outras,
foram pioneiras na luta contra a desigualdade de gênero no país e a defesa dos
direitos femininos.
Bertha Lutz teve uma participação muito importante em prol dos
direitos femininos. Desafiou a sociedade machista e, numa atitude arrojada para a
época, a bióloga “publica uma carta denunciando o tratamento dado ao sexo
feminino e propõe a formação de uma associação de mulheres, visando canalizar
todos esses esforços isolados” (LAVINAS; MELO, 1996, p.17).
Com o apoio de entidades femininas, Bertha Lutz funda em 1920 a
“Liga pela Emancipação Intelectual da Mulher, objetivando lutar não só pelo direito
do voto, mas por todos os direitos de cidadania da mulher [...]” (SEGATTO, 1987
p.15).
Na década seguinte, houve a Revolução de 30 contra a oligarquia
dominante (governo de poucos), que teve forte influência nas contestações
55
femininas. Durante a revolução, Elvira Konel
9
, figura ilustre na luta pelo voto, criou o
“Batalhão Feminino João Pessoa, alistando oito mil mulheres que trabalharam na
retaguarda do Movimento Revolucionário
10
. Com o fim da Revolução, transformou o
Batalhão em uma associação para lutar pelos direitos femininos. (PINTO, 2003, p.
27).
Além de Elvira Konel, a autora acima menciona que Julia Alves
Barbosa, também marcou a entrada do sexo feminino na política do Brasil. Em 1927
no Estado do Rio Grande do Norte, defendeu seus direitos em audiência pública,
sob a “alegação de ter qualificação de maior, solteira, com rendimentos próprios,
portanto, apta a exercer sua cidadania.” Em decorrência da sua atitude, Julia,
pioneira nos atos de emancipação da mulher e em lutas contra o preconceito
feminino, foi eleita vereadora na cidade de Natal.
O Rio Grande do Norte, portanto, foi primeiro Estado brasileiro a
conceder o voto à mulher. Também seria potiguar a primeira prefeita do Brasil, Alzira
Teixeira Soriano, eleita no município de Lages, em 1928, pelo Partido Republicano
Federal.
Mas, só em 1932, o voto feminino torna-se um direito universal, ano
em que as mulheres de todo o país adquirem o direito de votar, podendo, assim,
exercer sua cidadania política. Desde então, a mulher começa a atuar de forma mais
efetiva nos espaços de poder, candidatando-se a cargos políticos nunca antes
permitidos a elas.
Carlota Pereira de Queiróz, paulistana, médica, pedagoga, foi a
primeira mulher eleita Deputada Federal no ano de 1934, tendo como prioridade,
enquanto parlamentar, a defesa dos direitos da mulher e da criança.
Sua posição é bastante clara no discurso proferido na assembléia
constituinte:
Além de representante feminina, única nesta Assembléia, sou, como
todos os que aqui se encontram, uma brasileira, integrada nos
9
Elvira Konel foi a primeira mulher com direito ao voto, em 1928 no Estado de Minas Gerais.
Advogada, com 23 anos, abriu a primeira banca feminina de advocacia em Belo Horizonte,
envolvendo-se em movimentos contra a oligarquia dominante em sua região.
10
O Movimento Revolucionário de 30 ajudou a derrubar a Republica Velha.
56
destinos do seu país e identificada para sempre com os seus
problemas. [...] Acolhe-nos, sempre, um ambiente amigo. Esta é a
impressão que me deixa o convívio desta Casa. Nem um só
momento me senti na presença de adversários. Porque nós,
mulheres, precisamos ter sempre em mente que foi por decisão dos
homens que nos foi concedido o direito de voto. E, se assim nos
tratam eles hoje, é porque a mulher brasileira já demonstrou o quanto
vale e o que é capaz de fazer pela sua gente. Num momento como
este, em que se trata de refazer o arcabouço das nossas leis, era
justo, portanto, que ela também fosse chamada a colaborar.[...]
Quem observar a evolução da mulher na vida, não deixará por certo
de compreender esta conquista, resultante da grande evolução
industrial que se operou no mundo e que já repercutiu no nosso país.
Não há muitos anos, o lar era a unidade produtora da sociedade.
Tudo se fabricava ali: o açúcar, o azeite, a farinha, o pão, o tecido. E,
como única operária, a mulher nele imperava, empregando todas as
suas atividades. Mas, as condições de vida mudaram. As máquinas,
a eletricidade, substituindo o trabalho do homem, deram novo
aspecto à vida. As condições financeiras da família exigiram da
mulher nova adaptação. Através do funcionalismo e da indústria, ela
passou a colaborar na esfera econômica. E, o resultado dessa
mudança, foi a necessidade que ela sentiu de uma educação mais
completa. As moças passaram a estudar nas mesmas escolas que
os rapazes, para obter as mesmas oportunidades na vida. E assim
foi que ingressaram nas carreiras liberais. Essa nova situação
despertou-lhes o interesse pelas questões políticas e administrativas,
pelas questões sociais. O lugar que ocupo neste momento nada mais
significa, portanto, do que o fruto dessa evolução (CARLOTA, 2007).
Nessa mesma legislatura, a bióloga e advogada Bertha
Lutz,ingressa na vida parlamentar, após o falecimento de um deputado,tornando-se,
em 1936, a segunda mulher a assumir o cargo de Deputada Federal no Brasil.
Segundo Ribeiro (2008) o ano de 1934 foi importante na vida política
das mulheres, quando eleições realizadas em todo o país proporcionaram a entrada
do sexo feminino em instâncias de poder. A saber, na cidade de São João dos
Patos, no Maranhão, Joanna da Rocha Santos, do PSD, seria eleita prefeita por
todos os 800 eleitores do município. Para as Assembléias Legislativas, em vários
Estados da federação, as mulheres obtiveram êxito.
Em Santa Catarina, a professora, Antonietta de Barros, seria a
primeira mulher eleita deputada naquele Estado, sendo também a primeira mulher
negra em todo o Brasil a assumir um cargo político. Em Alagoas, seria eleita a
médica Lili Lages. Na Bahia, assumiria em 1935, a advogada Maria Luíza
Bittencourt. No Rio Grande do Norte, Maria do Céu Pereira Fernandes. Em São
57
Paulo, duas mulheres foram eleitas, Maria Thereza Nogueira de Azevedo, diretora
da Associação Cívica Feminina e Maria Thereza Silveira de Barros Camargo.
Posteriormente, assumiria, também, a professora Francisca (Chiquinha) Pereira
Rodrigues. A democracia brasileira seria efêmera, já que, em 10 de novembro de
1937, pelo golpe do Estado Novo, todo o Poder Legislativo seria extinto por quase
10 anos (RIBEIRO, 2008).
Em virtude dessa participação, apesar do golpe de 1937, o qual
abafou as reivindicações feministas, os anos de 1930 deixaram marcada sua
importância na conquista dos direitos políticos da mulher, pois, além de poder votar,
os mulheres participam dos principais movimentos e acontecimentos políticos,
exercendo sua cidadania.
Nesta década, Segatto (1987), menciona que a mulher participa do
Movimento Constitucionalista de 1932, da Ação Integralista Brasileira (partido
conservador e com características fascistas) da Aliança Nacional Libertadora (frente
democrática e antifascista) e de outras.
Em 1947, em São Paulo, obteve uma vaga como deputada estadual,
Conceição da Costa Neves, reconduzida mais cinco vezes, até ter seus direitos
políticos cassados pelo AI-5
11
, em 1969. Foi a primeira mulher a assumir a
presidência de uma Assembléia Legislativa em todo o Brasil. (RIBEIRO, 2008).
Ribeiro (2008) também aponta que nas eleições de três de outubro
de 1950, elegeu-se deputada federal Ivete Vargas, do PTB de São Paulo, a única
mulher neste ano na Câmara Federal, que contava com apenas 23 anos de idade.
Foi reeleita mais 4 vezes, (legislaturas: 1951-1955, 1955-1959, 1959-1963, 1963-
1967 e 1967-1971) e também cassada pelo Regime Militar, no ano de 1969. Voltara
à Câmara Federal no ano de 1983, mas falecera pouco depois
.
Em 1969, com o Governo Médice, continua o clima de ditadura
militar no país, cujo espaço para qualquer manifestação pública fora praticamente
reduzido a zero e a repressão, de acordo com Pinto (2003), chegava a níveis de
violência antes não imaginados nem sequer pelos componentes do próprio regime.
11
AI-5, foi um instrumento de poder que deu ao regime poderes absolutos e cuja primeira
conseqüência foi o fechamento do Congresso Nacional por quase um ano.
58
A autora afirma ainda que:
o espaço da política ficou reduzido a uma farsa,a censura extrapolou
a questão política e chegou com muita força a questões ditas morais
e de costumes,os estudantes de todos os níveis foram obrigados a
passar por aulas de educação moral e cívica [...] Aos opositores do
regime restou a clandestinidade,o exílio, a luta armada ou
simplesmente o silêncio.(PINTO, 2003, p. 43).
Na década de 70, tivemos a presença feminina no Senado Federal,
assumindo no ano de 1979 o cargo de senadora, a paulista Eunice Michelis,
tornado-se a primeira brasileira no senado nacional após o falecimento de um
senador.
Na década de 80, o cenário político era favorável às mulheres, pois
ampliaram-se os espaços institucionais em defesa da mulher,sendo criado
conselhos estaduais e nacional da mulher, fortalecendo o acesso do sexo feminino
junto ao Estado.
De acordo com Pinto (2003, p.68), com a institucionalização, era
plausível a possibilidade de construir instituições democráticas de cunho político,
capazes de superar as demandas represadas da sociedade ao longo dos anos do
regime militar.
Mesmo com o avanço na conquista do espaço político, somente na
década de 90, no ano de 1994, foi eleita a primeira mulher governadora no Brasil
(Roseana Sarney), no estado do Maranhão.
Constatamos, assim que, apesar dos avanços, a representatividade
feminina ainda é pequena se compararmos a representatividade masculina nas
esferas políticas, uma vez que, poucas mulheres chegaram a governar de um
Estado, e nenhuma chegou a presidência da República.
Atualmente contamos com três governadoras, Ana Júlia Carepa no
Estado do Pará, Wilma Maria de Faria no Estado do Rio Grande do Norte e Yeda
Crusius no Estado do Rio Grande do Sul.
59
A disparidade na representação pode ser observada no quadro
abaixo:
Quadro 1 – Eleições 2006-2002 – 1998-1994
Fonte: www.cfemea.org.br/eleições.
Cabe considerar que, somente através de partidos, os cidadãos
podem candidatar-se ao exercício de cargos públicos eletivos (Legislativo e
Executivo). Dessa forma, a militância partidária constitui-se como o meio exclusivo
de acesso à política representativa junto ao Estado.
Sendo assim, entende-se que os partidos deveriam constituir-se em
espaços que privilegiassem a formação política e a discussão de projetos visando
transformações sociais.
No entanto, estão longe de configurarem-se como instituições desta
natureza e, comumente, colocam-se em ação apenas por ocasião dos processos
eleitorais, que ocorrem a cada dois anos no Brasil e, por outro lado, embora as
mulheres participem dos partidos, normalmente são excluídas de suas direções, e
60
são preteridas no cotidiano partidário e nos processos eleitorais (RODRIGUES,
2004).
Para Rodrigues (2006), a reduzida representação política das
mulheres é explicada por vários motivos, entre os quais se pode destacar: a ainda
prevalente cultura patriarcal, as características do processo eleitoral e da
representação política no País, as desigualdades competitivas de gênero e a lógica
da estrutura e funcionamento dos partidos políticos.
A cultura patriarcal, conforme ressalta a autora, ainda tem
sustentáculos consideráveis, embora venha perdendo terreno na sociedade
brasileira.
A associação homem-espaço público e mulher-espaço privado ainda
permeia a mentalidade e o inconsciente das pessoas,
independentemente do gênero, da raça/etnia, da classe social. Esta
associação é continuamente reafirmada à medida que a ação
política, atividade por excelência do espaço público, é realizada por
homens, que efetivamente concentram poder político, ocupando
posições junto ao Estado, no âmbito dos Poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário. Mas, não só junto ao Estado, pois os homens
concentram posições de poder também junto aos partidos políticos e
à maioria das organizações da sociedade civil organizada
(RODRIGUES, 2006).
Sendo assim, conforme salienta Rodrigues (2006), além das
posições alcançadas por mandato eletivo, a situação se repete nos casos em que as
posições dependem de indicação política, normalmente feita por Governantes em
suas respectivas esferas (federal, estadual e municipal), e igualmente não
contemplam um número significativo de mulheres.
Outra explicação para os resultados pouco expressivos das
mulheres nesse espaço, conforme Rodrigues (2006) pode ser encontrada nas
características específicas do processo eleitoral e da representação política no País.
Isso porque conforme a autora, o processo eleitoral brasileiro ancora-se no poder
econômico e no jogo de influências, o que de acordo com Nogueira (2001), facilita a
vitória de uma política vazia de sentido e conteúdo, reduzida à arena de disputas
ocas entre candidatos de quem mal se conhece o pensamento.
61
Desse modo, o primeiro aspecto que explica essa desigualdade é o
econômico, já que a acumulação do patrimônio tende a ser feita pelo homem, os
bens disponibilizados para homens e mulheres na campanha são bastante
diferenciados, tendo as mulheres, na expressão de Avelar (2001), status social mais
baixo que o homem.
Esse aspecto se agrava diante de outro: o financiamento privado das
campanhas, pois, apesar de haver um limite para as contribuições eleitorais de
pessoas jurídicas e físicas, comumente os candidatos que angariam mais fundos
para as campanhas são os que detêm melhores possibilidades de serem eleitos, ou
seja, os homens, já que esse modelo é favorável “às lideranças políticas
consolidadas, construídas em um complexo de relações de clientelismo, influências
e de acumulação de história de vida pública” (RODRIGUES, 2006).
Dessa forma, as características inerentes à política partidária
favorecem um aprofundamento das desigualdades no processo, considerando-se
que a política tende a ser a atividade exclusiva (ou principal). No entanto, no caso
das mulheres, essa prática é normalmente associada a outras atividades
profissionais e domésticas, o que acaba por condicionar e limitar a participação
política feminina.
Concluindo essas reflexões sobre os limites da participação política
das mulheres, Rodrigues (2006) destaca “a lógica de estruturação e funcionamento
dos partidos políticos”, instituições que se configuram em “reduto masculino por
excelência”. Sendo assim, os partidos estruturam-se e funcionam segundo uma
lógica masculina, de uso e distribuição de tempo integral à política, distante de uma
lógica feminina, o que contribui para manter a pouca expressividade da mulher nos
espaços de poder.
Cabe registrar, ainda, que, para as mulheres, a política nunca foi
atividade exclusiva, pelo menos na grande maioria delas. Ainda, no século XXI, elas
acumulam uma dupla jornada de trabalho, concentrando atividades dentro e fora de
casa. Esse fator pode ser mais um dos motivos que colaboram para a pouca
representatividade feminina nos cargos políticos. Mas, não cabe aqui, afirmarmos
esta hipótese e sim discutir o assunto num outro momento oportuno.
62
O fato é que, a baixa representatividade fez com que mulheres
militantes em partidos políticos passassem a se organizar e criar instâncias ‘de
Mulheres’ (Secretaria, Coordenação, Comissão) visando ampliar a pauta partidária
em relação aos direitos das mulheres e ampliar a participação das mulheres nos
partidos e nas eleições (RODRIGUES, 2004).
Em termos de desenvolvimento político, o grande desafio é que
estas formas de ação política estejam em conexão, com suas múltiplas influências,
pressões e convergências, sem que umas submetam-se às outras. Assim, é
fundamental a autonomia de cada uma – Estado, Movimento Social e Partido
Político – para a sustentação e desenvolvimento da Democracia (RODRIGUES,
2006).
Embora até aqui tenha se dado um cunho nacional à questão, a
exclusão das mulheres da política representativa é um fenômeno mundial. Sua luta
pelo direito de votar e de serem votadas atravessou todo o século XX. Enquanto na
primeira metade do século passado, na maioria dos países, as mulheres
conquistaram o direito de votar e serem votadas, até o final desse século esse
direito ainda não tinha sido conquistado, de fato, numa parcela significativa dos
países (DUARTE, 2003).
No Brasil, conforme vimos anteriormente, o direito ao voto foi
conquistado em 1932, pelo Código Eleitoral, que previa o direito de voto apenas a
mulheres casadas com autorização dos maridos e a mulheres solteiras ou viúvas,
com renda própria. Do início ao final do século XX, as mulheres não conseguiram
ocupar espaços de poder de uma forma mais significativa (DELGADO, 1996).
Dessa forma, as mulheres continuam, ainda no século XXI,
permanecendo no campo ocupacional em cargos inferiores aos dos homens e/ou
mesmo que exercendo a mesma função masculina, recebendo salários inferiores.
Essa condição desigual é colocada por Avelar (2001) como status social baixo.
No campo da política formal, a desigualdade entre os sexos,
relacionada à representação e participação nos cargos eletivos, é alarmante, o que
reforça que nesses espaços o conservadorismo e machismo são fortemente
vivenciados.
63
Segundo dados da União Interparlamentar em Genebra -UPI (1999),
nos 178 parlamentos existentes no mundo a proporção média de deputadas é de
13,2% e a de senadoras é de 10,9% (UPI apud AVELAR, 2001).
No conjunto dos 178 países, o Brasil ocupa o 84º lugar, o que
fundamenta uma opressão significativa sobre o sexo feminino dentro das instituições
decisórias de poder. “Os preconceitos e estereótipos tradicionais a respeito dos
supostos papéis dos homens e mulheres ainda são norma em todo o planeta” (UPI
apud AVELAR, 2001 p. 30).
Sendo assim, dentro de uma sociedade, cujo sistema eleitoral é
ainda remetido com caráter assistencialista e clientelista, a condição financeira do
indivíduo, tratando-se de uma competição eleitoral, pesa sobre as urnas.
Segundo Avelar (2001, p. 33), o status baixo é um dos principais
obstáculos à ascensão do poder nos parlamentos como em cargos de decisão:
quanto mais alta a posição social de um indivíduo, maior a sua presença em altos
cargos políticos e governamentais.
Desse modo, está atrelado ao sistema eleitoral ser condicionado a
campanhas cujo investimento financeiro é elevado. Neste contexto, as mulheres,
que há muito tempo foram economicamente dependentes dos maridos por estarem
restritas ao privado, na grande maioria, possuem menos bens do que os homens. E,
assim, não obtém condições iguais ou semelhantes que os homens para investirem
financeiramente nas campanhas.
Relatório da União Interparlamentar (1999) aponta que decorridos
quarenta anos desde a “adoção dos direitos políticos da Mulher, e apesar dos
progressos inegáveis, a vida política e parlamentar continua dominada pelos
homens em todos os países” (AVELAR, 2001).
Portanto o status social mais baixo da mulher continua alarmente, o
que acarreta, conseqüentemente, sua baixa representatividade nos espaços
decisórios de poder. Assim, a sociedade permanece sobre o conceito de uma
democracia que não cumpre com o verdadeiro sentido da palavra, uma vez que,
para haver o exercício democrático, é necessário igualdade de acesso e
64
oportunidades entre todos os cidadãos, não devendo haver diferenças, em
particular, entre homens e mulheres na política formal.
De acordo com Avelar (2001, p. 37), o conceito de democracia,
conforme a resolução sobre Mulher e poder político elaborada pelo UPI de 1992, só
assumirá significado verdadeiro e dinâmico quando as políticas e legislações
nacionais forem decididas conjuntamente por homens e mulheres com equidade na
defesa dos interesses e atitudes de um e de outros.
Desse modo, como estratégia para diminuir a desigualdade e status
social baixo relacionado ao sexo feminino, as medidas de ação afirmativa vêm
sendo incorporadas nos organismos nacionais e internacionais, a fim de aumentar a
participação da mulher nos processos de decisão e representação política nas
instâncias de poder.
4.2 A L
EI DE COTAS E A REPRESENTAÇÃO DAS MULHERES NO PODER
Frente à baixa representatividade das mulheres nos espaços
decisórios de poder, mencionadas anteriormente, a políticas de cotas vem sendo
analisada e debatida como meio para fortalecer a presença feminina dentro dos
cargos políticos/partidários.
A baixa participação das mulheres no espaço parlamentar direcionou
os movimentos de mulheres a lutar por políticas afirmativas de gênero, que culminou
com a implementação da Política de Cotas no Brasil que, embora ainda muito
recente, vem, pelo menos, dando maior visibilidade à exclusão da mulher nos
espaços políticos e às disparidades existentes no âmbito político, entre homens e
mulheres (RODRIGUES, 2004).
Em vigor desde o final dos anos de 1970 em países europeus,
especialmente do norte da Europa, as chamadas ‘políticas de cotas’ expandiram-se
e hoje, vigoram em boa parte das democracias representativas presentes, inclusive,
em muitos países latino-americanos. Essa política tem como objetivo declarado,
65
incentivar a presença das mulheres nos centros decisórios, através da garantia de
um número mínimo de candidaturas ou de assentos parlamentares e em instâncias
dos poderes executivo e judiciário (MIGUEL, 2000).
Pode-se dizer que a política de cotas insere-se no amplo contexto
das ações afirmativas que reconhecem as discriminações existentes e agem no
sentido de impedir que se perpetuem. Constituem-se, portanto, como medidas que
visam alterar quadros variados de desigualdades e, no caso das cotas eleitorais por
sexo, criar condições para o estabelecimento de maior equilíbrio entre homens e
mulheres no plano da representação política (MIGUEL, 2000).
Dessa forma, os 30% das vagas, reservadas ao sexo feminino,
perpetuam no sentido de efetuar ações, projetos e políticas públicas voltados para a
superação das desigualdades de gênero.
A questão das políticas de cotas é um tema bastante complexo, que
acaba gerando divergência de opiniões a respeito da sua validade. Outro fato
questionado é que as cadeiras legislativas, representadas por mulheres, não
garantem ações, propostas e projetos voltados para o direito das mulheres e a
superação das desigualdades, uma vez que parlamentares estão inseridas num
sistema excludente e que, para atingir o ideal igualitário, é necessário romper com
os paradigmas conservadores e com a cultura patriarcal.
No Brasil, segundo estudos da CFEMEA,
12
a reserva de vagas de
candidatura para mulheres está em vigor desde as eleições municipais de 1996. A
primeira ‘lei de cotas’ brasileira foi a Lei 9.100 aprovada em 29 de setembro de
1995. Esta lei, além de estabelecer as normas para a realização das eleições
municipais do ano seguinte (1996), determinou uma cota mínima de 20% para as
mulheres. Em 1997, a Lei nº 9.504 estendeu a medida para os demais cargos eleitos
por voto proporcional (Câmara dos Deputados, Assembléias Legislativas Estaduais
e Câmara Distrital), alterou o texto do artigo, assegurando, não mais uma cota
mínima para as mulheres, mas uma cota mínima de 30% e uma cota máxima de
70%, para qualquer um dos sexos.
12
CFEMEA – Centro Feminista de Estudos e Assessoria – Brasília/DF.
66
Diante dessas considerações, vale mencionarmos que muitos são os
aspectos a respeito das cotas que precisam ser elucidados. Delgado (1996), por
exemplo, enfatiza que 30% de participação das mulheres não resolvem a
desigualdade: a luta deve ser por 50%.
Já, Ferreira (2003) enfatiza que, embora o movimento lute pela
paridade, um percentual de 30% representa um ganho político, ao se considerar a
estrutura da sociedade e as relações patriarcais que perpassam toda sua estrutura.
Por outro lado, a autora acima afirma que a Lei das Cotas não
garante que a mulher tenha real acesso ao poder, já que as cotas não irão mudar as
relações de poder a curto prazo, pois representa um elemento que modifica a
composição dos órgãos diretivos, traz novas idéias para o debate e propicia uma
nova forma de aprendizagem do exercício do poder.
É importante frisar, também, que as mulheres nos cargos legislativos
e, executivos, não garantem políticas voltadas para o avanço no combate à
desigualdade de gênero. O fato é que, a participação da mulher nas instituições
políticas ainda é bastante limitada, muitas vezes, por estarem inseridas num sistema
excludente, onde o poder, segundo Pinto (2003), concentra-se na mão dos “homens
adultos de meia-idade, brancos e proprietários”.
Cabe assinalar, ainda, que as ações afirmativas (aqui referindo-se
mais precisamente à lei de cotas) são aqui consideradas formas positivas de
reverter o quadro de desigualdade entre os gêneros e entre seres historicamente
excluídos.
Dessa forma, a Lei 9.100/95 vem responder às reivindicações dos
movimentos de mulheres. Entretanto, cabe enfatizarmos que, somente com uma
ação conjunta das diversas organizações de mulheres, com os partidos políticos, e a
partir de um projeto de educação política que tenha o gênero como recorte
metodológico, será possível diminuir de forma significativa as disparidades.
Evidentemente a Lei das Cotas não irá mudar o quadro da baixa
representatividade feminina em curto espaço de tempo, entretanto, não podemos
desconsiderar a possibilidade que abre no sentido de uma ampliação da inserção
67
das mulheres num mundo antes à elas interditado. Assim, as mudanças que ela
pode proporcionar no cenário político podem ser previsíveis pelo menos num ponto:
maior visibilidade para as questões da mulher em relação a sua participação política
partidária.
Para finalizarmos este capítulo, cabe, ainda, mencionarmos alguns
elementos apontados por um estudo realizado pelo Centro Feminista de Estudos e
Assessoria - CFEMEA (2006) que podem favorecer o envolvimento das mulheres
com a política, em especial a política representativa.
O primeiro elemento indispensável a uma atuação política, em
qualquer de suas modalidades, conforme a instituição refere-se à disponibilidade de
tempo para: buscar informação e formação política; organizar e planejar o trabalho
político; articular , mobilizar e participar em eventos e iniciativas públicas e políticas.
Como segundo elemento, destacamos o desejo, o gosto pela ação
política. Isto se desenvolve no trabalho conjunto, no compartilhamento de projetos,
esperanças, das conquistas, mas também das privações e frustrações. Assim, é
preciso tirar satisfação do próprio processo de luta, do encontro com os/as
companheiros/as, da oportunidade para a ampliação das capacidades, antes mesmo
dos bons resultados, até porque, nem sempre as conquistas são as esperadas.
Desse modo, tempo e desejo são suficientes para a participação
política no âmbito da sociedade civil e, mesmo, no âmbito da política partidária, mas
não para a participação num processo eleitoral, que exige políticas afirmativas mais
concretas no sentido de viabilizar uma participação mais efetiva da mulher na
política representativa e partidária.
Conforme colocamos na introdução desse trabalho, entre os
objetivos dessa pesquisa, destaca-se o de averiguar os motivos que estimulam as
mulheres paranaenses a participar da política, apesar de tanta diversidade e
desigualdade no jogo do poder. Assim, para ampliar o entendimento desse aspecto,
buscamos ouvir as Deputadas Estaduais, sobre a participação feminina na
Assembléia Legislativa do Estado do Paraná, os avanços, dificuldades,
preconceitos, contribuição para a desigualdade de gênero, vida pública e vida
privada, enfim, analisar a atuação das cinco deputadas enquanto parlamentares.
68
4.3 A REPRESENTATIVIDADE FEMININA NO ESTADO DO PARANÁ
Antes de focarmos as análises das entrevistas, torna-se necessário
fazermos, algumas considerações acerca da presença feminina nos espaços
políticos dentro do Estado do Paraná.
O ano de 1947 foi o ano que elegeu a primeira mulher paranaense
num cargo legislativo. Portanto, desde o ano de 1932 em que o código eleitoral
garantiu o voto feminino como direito universal, o Paraná teve difícil acesso à
participação política das mulheres. Foram 15 anos, desde a concessão do voto, de
ausência feminina no espaço parlamentar do Paraná.
Atualmente, a mulher ocupa quatro cadeiras na Assembléia
Legislativa, um número bem menor do que o sexo masculino,que é composto por 50
homens. No entanto, as mulheres ocupam 7,41% das 54 cadeiras, uma média ainda
pequena para alcançarmos a igualdade de participação política entre os sexos, mas
bastante significativa em relação ao avanço na representatividade feminina nos
últimos anos, pois, a Assembléia Legislativa do Estado do Paraná - ALEP, em 2003
atingiu o maior número de mulheres desde sua fundação.
Segundo Tribess e Perissinotto (s/d), existem alguns fatores que
podem ter contribuído para esse aumento de mulheres na ALEP: o maior número de
candidatas, o reflexo da política de cotas de gênero nos partidos ou, até mesmo,
uma maior abertura social, tendo em vista que pela primeira vez na história do
Paraná uma mulher, Clair da Flora Martins, foi eleita Deputada Federal no ano de
2002.
Em relação à Câmara de Deputados Federais e Senado Federal,
atualmente, o Paraná não tem representação feminina nesses espaços. De acordo
com o núcleo de pesquisa de Sociologia Política, ‘Curitiba Pensa o Paraná’
13
, o
Estado se encontra num seleto grupo composto por Alagoas, Paraíba, Piauí, Sergipe
(nordeste), Distrito Federal e Mato Grosso do Sul (centro-oeste) que não elegeram
13
Núcleo de pesquisa de Sociologia Política da Universidade Federal do Paraná.
69
nenhuma Deputada Federal em 2006. São apenas sete Estados da Federação que
têm bancadas exclusivamente masculinas, e o Paraná é um deles.
Quanto ao Governo Estadual, o Paraná nunca elegeu uma
represente feminina e, até hoje, não há mulheres candidatas para a próxima eleição
em 2010. Para o governo municipal, o Paraná também tem uma baixa participação
das mulheres exercendo a função de prefeitas. Na média nacional, de acordo com o
núcleo de pesquisa de Sociologia Política – Curitiba pensa o Paraná, 7,3% dos
municípios brasileiros são administrados por mulheres. No Paraná a média é de
5,76%. Nesse quesito o Paraná é o 18º colocado nacional.
Portanto, o desafio de elegermos mulheres no Paraná ainda é
grande. Mantemos números pequenos e pouca participação, ou seja, as mulheres
se candidatam e se elegem menos que os homens, por isso, ocupam menos cargos
políticos, apesar de serem mais da metade da população economicamente ativa e
mais da metade de eleitores.
Desse modo, o Paraná concentra no campo político a maior
disparidade entre homens e mulheres. De acordo com Maria Aparecida Zago,
coordenadora do Movimento ‘Nós podemos Paraná’
14
,da Federação das Indústrias
do Estado do Paraná (FIEP), o Estado está em 23º lugar em pior participação
feminina na política. Prova disso é o fato de o Estado ter uma mulher na Câmara dos
Deputados Federais e uma mulher no Senado Federal em Brasília.
Diante disso, é necessária a ruptura da ideologia machista que ainda
permanece na sociedade paranaense e o aumento das políticas e ações que reforce
para as mulheres e para a população em geral, a importância da presença feminina
nos espaços de poder, educando-as para a política, a fim de garantirmos o avanço
da representatividade e a igualdade entre os sexos.
14
Movimento criado para sensibilizar e articular a sociedade através de ações que possibilitem ao
Paraná cumprir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) da ONU até 2010.
70
CAPÍTULO 5
ANÁLISE DAS ENTREVISTAS
Antes de procedermos a análise das entrevistas, apresentamos
algumas considerações acerca da história da fundação da Assembléia Legislativa do
Estado do Paraná - ALEP (2007).
O Poder Legislativo no Paraná, de acordo com o site oficial da ALEP
(2007)
15
nasceu com a criação da Província do Paraná, pelo Imperador D. Pedro II
em 1853, e a instalação da Assembléia Provincial em 1854. Na condição de
Comarca, o território não tinha sua própria Constituição e regia-se pelas Leis Gerais
da Província de São Paulo.
Os paranaenses acreditavam que assim que o Paraná se libertasse
da tutela de São Paulo, atingiria toda sua magnitude no seu desenvolvimento sócio-
cultural e econômico. A Carta outorgada em 1824 por D.Pedro I e elaborada pelo
Conselho de Estado, em seu artigo 99, dizia: “A pessoa do Imperador é inviolável e
sagrada: ele não está sujeito a responsabilidade alguma”.
O capítulo VII, desta carta, que trata da Administração e Economia
das Províncias, diz no primeiro artigo: “Haverá, em cada Província, um presidente,
nomeado pelo Imperador, que poderá remover, quando entender que assim convém
ao bom serviço do Estado”. Essa era a Constituição em vigor no Brasil em 1853,
quando da criação da Província do Paraná.
As Províncias, antes do Ato Adicional de 12 de agosto de 1843,
mantinham o Conselho Geral da Província que foi substituído pelas Câmaras dos
Distritos e pelas Assembléias Legislativas Provinciais.
A eleição era indireta e a massa ativa de cidadão era o colegiado,
que elegia os eleitores da Província, e estes, os Deputados da Assembléia
Provincial. O direito de votar e ser votado eram prerrogativas apenas de cidadãos do
15
José Carlos Pereira Portela - Coordenadoria de Estudos e Promoções Especiais.
http://www.alep.pr.gov.br
71
sexo masculino, alfabetizados ou não. Além disso, era necessário que o cidadão
auferisse determinada renda anual, sem o que nem sonharia em eleger-se.
Se, para Deputado os requisitos financeiros já se tornavam um
grande obstáculo, para ser eleito Senador, a renda ainda teria de ser muito mais
alta. A maioridade que garantia o direito de votar era prerrogativa dos homens,
maiores de 25 anos.
Segundo o site oficial da ALEP (2007), no dia 12 de julho de 1854,
foi realizada uma primeira Sessão Preparatória à Assembléia Legislativa, numa casa
adquirida por quatro contos de réis, cujo local, hoje, situa-se a Biblioteca Pública do
Paraná, à Rua Cândido Lopes. No dia 15 de julho de 1854, aconteceu a Sessão
Solene de instalação da primeira Assembléia Provincial do Paraná.
Até 1963, a Assembléia Legislativa funcionou em um prédio na Rua
Barão do Rio Branco, na Capital do Estado e, no dia 19 de Dezembro de 1964,foi
inaugurado novo prédio situado no Centro Cívico que continua como sede do
Legislativo Paranaense até os dias de hoje.
Desse modo, é possível notarmos que a sociedade, regida pela
ideologia patriarcal, tinha, no imperador o detentor das tomadas de decisões.
Ademais, as primeiras eleições eram permitidas somente aos homens, os quais
estavam inseridos num regime autoritário.
Após o direito do voto às mulheres em 1932, percorremos quinze
anos para conquistarmos o direito de participar, efetivamente, das decisões políticas
inerentes ao Legislativo Paranaense. Em 1947, foi quando elegemos a primeira
mulher deputada no Estado do Paraná, Rosy Pinheiro Lima.
Atualmente, das 54 cadeiras parlamentares, quatro são ocupadas
pelas mulheres sendo Cida Borguetti, reeleita pelo Partido Progressista - PP,
Rosane Ferreira, primeira gestão pelo Partido Verde - PV, Luciana Rafagnin reeleita
pelo Partido dos Trabalhadores - PT e Beti Pavin, eleita pela primeira vez pelo
Partido do Movimento Democrático Brasileiro - PMDB.
De acordo com dados publicados no Jornal da Assembléia
Legislativa do Estado do Paraná, ano 1, nº 33 em março de 2005, nos 150 anos do
72
Poder Legislativo, doze mulheres exerceram mandatos. Desde 1947 até 2008,
exerceram mandatos as deputadas Rosy Pinheiro Lima (1ª legislatura), Amélia
Hruschka (10ª e 11ª legislatura), Irondi Pugliesi (10ª,11ªe13ª legislatura), Vera
Antonio Agberti (11ª legislatura), Emília Belinatti (12ª legislatura), Ligia Pupatto (13ª
legislatura), Serafina Martins Carrilho (14ª legislatura), Marlene Salete C. Pereira
(14ª legislatura), Arelete Caramês (15ª legislatura), Elza Correia (15ª legislatura),
Cida Borghetti (15ª e 16ª legislatura) , Luciana Rafagnin (14ª,15ª e 16ª legislatura),
Rosane Ferreira (16ª legislatura) e Beti Pavin (16ª legislatura).
Podemos dizer que, apesar das mulheres serem minoria no
Legislativo do Paraná e dos outros estados brasileiros, depois de tantas lutas e
reivindicações, percorridas ao longo dos anos, através das manifestações e dos
movimentos feministas, em favor do direito político, elas começam a inserir-se no
espaço político e, hoje, contribuem efetivamente para o desenvolvimento do Estado.
A presente pesquisa buscou, portanto, analisar, por meio das
entrevistas, a atuação das deputadas estaduais do Paraná. Foram entrevistadas,
cinco deputadas, sendo quatro parlamentares em exercício (16ª legislatura) e uma
deputada da gestão anterior (15ª legislatura).
A partir do conteúdo extraído das entrevistas, definimos três eixos
temáticos a serem comentados: participação política, assembléia legislativa e
atuação parlamentar.
5.1 P
ARTICIPAÇÃO POLÍTICA: MOTIVAÇÕES, DIFICULDADES DE INGRESSO E RELAÇÃO
FAMILIAR
Iniciamos a entrevista com as deputadas em exercício e com uma
deputada da gestão anterior com a seguinte pergunta: como surgiu o interesse pela
carreira política?
Vale mencionarmos aqui que o nome das deputadas será omitido.
Elas serão identificadas como deputada A, B, C,D e E.
73
Diante das respostas obtidas, as deputadas revelaram que o
interesse pela atuação política se deu através da origem familiar, da militância nos
movimentos sociais e do serviço público.
A entrevistada D, advinda da zona rural, por estar engajada nos
movimentos sociais em prol dos direitos das agricultoras, percebeu, através da sua
militância, que a participação feminina nas esferas de poder político seria
fundamental na mediação das ações e direitos das agricultoras. Por isso,
candidatou-se ao cargo de vereadora e depois deputada estadual, a fim de
representar as mulheres agricultoras.
Quando comecei minha participação na organização das mulheres,
nossa grande bandeira era pelo salário maternidade, aposentadoria
das mulheres agricultoras, crédito para habitação, entre outras.
Foram muitas mobilizações em Brasília, Curitiba e região sudoeste
[...] Foi assim que percebemos que era muito importante a mulher
participar mais da política [...] Porque tudo isso dependia de políticos
que tivessem a mesma linha de pensamento (D).
As deputadas A e E, através da sua atuação no serviço público, em
serviços voluntários e no contato direto com a população, também se envolveram na
política com o propósito de concretizar a ajuda ao próximo e contribuir com
interesses pertinentes a sua ideologia como é o caso da deputada E que tem uma
grande preocupação com o meio ambiente.
Foi um processo natural. Em 1977 ingressei no serviço público na
Prefeitura de Colombo, no cargo de telefonista. Depois, ocupei
outros cargos (recepcionista, auxiliar administrativo e, em meados de
1985, fui nomeada chefe de gabinete do prefeito). Durante todo este
período no serviço público, sempre tive uma relação direta com a
comunidade. Em 1988 fui eleita vereadora, depois, em 1992, vice-
prefeita,e, posteriormente, fui eleita e reeleita prefeita da cidade
(1997/2000 – 2001/2004) (A).
De formação, eu sou enfermeira, com atuação em saúde pública e
nós tínhamos muitas dificuldades no setor. Além disso, as questões
ambientais me preocupavam bastante. A principio, comecei fazendo
trabalhos voluntários em movimentos populares, pastorais, igrejas e,
com isso, percebi que só o poder político é que faria com que as
coisas acontecessem. Nesse momento, me filiei no partido político
(E).
74
As respostas acima levam-nos a considerar que um dos motivos do
envolvimento da mulher na política se dá no processo de representação, através de
associações, movimentos sociais,pastorais,sindicatos na luta em prol dos interesses
em favor do seu segmento. Aqueles que são investidos de um cargo na política
formal acabam voltando-se para ações que protejam e/ou garantam o interesse de
seu eleitorado. Por isso, as mulheres tendem a propor temas pertinentes aos direitos
femininos, instigando debates e ações sobre a igualdade de gênero, maior
representatividade, diminuição da violência, aborto, saúde, entre outros.
De acordo com Cawp (1996), as mulheres tendem a dar mais
atenção e prioridade às políticas dos direitos da mulher e às políticas públicas
relacionadas com questões familiares, tais como condição de vida para as crianças,
saúde, reprodução (CAWP, 1996 apud AVELAR, 2001, p. 133).
Nesse contexto, Avelar (2001) aponta uma questão relevante ao
assunto. É fundamental para o alcance da igualdade e para a ampliação de políticas
públicas voltadas para os direitos das mulheres, elegermos representantes com
consciência feminista que ultrapasse os limites da cultura patriarcal, pois existem
mulheres que são eleitas, mas continuam a reproduzir uma política tradicional e
conservadora.
Desse modo, a autora acima afirma que somente homens e
mulheres com consciência feminista fazem diferença na política, pois
estes têm a capacidade de politizar novos temas que correspondem
a necessidades de inúmeros grupos alijados da representação
política em virtude da sua condição desigual, da sua condição inferior
nas sociedades em que os interesses políticos são definidos
aprioristicamente, como é o caso das mulheres negras, idosas,
lésbicas, trabalhadoras, domésticas, rurais etc.” (AVELAR, 2001, p.
133).
Já as deputadas B e C, advindas de família de militantes políticos,
tiveram interesse na vida política desde jovens por presenciarem as lutas e
reivindicações dos movimentos sociais dos quais seus pais faziam parte.
Cresci ouvindo história sobre política. Meu pai era um getulista de
carteirinha que dizia sempre que a classe política deve ser
respeitada e que, quando não estamos contentes é necessário
75
colaborar com novas idéias para promover mudanças [...] Fui
desenvolvendo esse gosto de servir e discutir os problemas sociais.
(B).
O meu interesse pela política foi uma conseqüência natural da minha
criação. Eu sou filha de pais militantes políticos. Meu pai e minha
mãe eram militantes políticos num momento muito complicado na
vida nacional, eles militavam num partido que era ilegal e proibido, o
partido comunista e eu vivi toda aquela movimentação (C).
Muitos estudos têm apontado que a entrada das mulheres na política
se faz por dois canais: a participação em movimentos sociais (conselhos, grupos de
bairros, sindicatos, pastorais etc.) e as relações familiares (o parentesco com um
político, avô, pai ou marido).
A esse respeito Tabak (1983, p.103) comenta que a história política
do país mostra que várias mulheres chegaram ao parlamento em substituição a seus
maridos, que tiveram seus direitos políticos cassados por dez anos,depois de
1964,ou ocuparam lugar dos maridos mortos ou seja: foram eleitas graças ao saldo
do prestígio político de seus parentes, impossibilitados de se candidatar a postos
eletivos.
De acordo com Grossi e Miguel (2001), chegar à política pelo
primeiro canal seria enobrecedor, mas chegar pelo segundo canal, pelas relações de
parentesco, seria desabonador. Isto porque a sociedade, muitas vezes, enxerga a
segunda via como uma política facilitadora e clientelista.
Esta posição pode ser considerada preconceituosa, pois, uma
mulher, quando resolve seguir a carreira do pai, como a medicina, o direito, entre
outras, é visto de maneira positiva. Assim, questionamos: por que o fato de as
mulheres criadas em famílias de tradição política, de militantes que resolvem seguir
a carreira política, não é visto como algo positivo? Esta pergunta pode ser
esclarecida nas palavras dos autores acima mencionados:
[...] a carreira política, diferentemente de outras carreiras
profissionais, é mais fortemente representada como uma carreira
com duplo sentido, ora como fruto de projeto coletivo ideológico, ora
como fruto de um projeto totalmente individual. Por detrás da crítica a
essas mulheres parece haver uma visão de que a política deva ser
somente vocação, e não uma carreira que exigiria um longo processo
de formação. (GROSSI; MIGUEL, 2001).
76
Portanto a inserção política intermediada pelos laços familiares, para
alguns, é vista como negativa por “facilitar” o ingresso num cargo eletivo,
favorecendo a campanha daqueles que mantém esse vínculo em relação aos
candidatos que não possuem nenhum parentesco com políticos. Essa posição não
deixa de ser um pré-conceito estabelecido pelo eleitorado brasileiro em
conseqüência de atitudes compensatórias e práticas individualistas por parte de
alguns políticos, que, na trama do jogo do poder, buscam caminhos e estratégias
que garantam a manutenção ou inserção num cargo eletivo.
É nesse sentido que a presença de segmentos da sociedade, tidos
como excluídos nessa arena, torna-se importante dentro da elite política brasileira, a
fim de romper com a prática individualista e conservadora, além de ampliar as
questões em prol do coletivo. As mulheres, por exemplo, ao engajar nesse espaço
deixam de ser sub-representadas, viabilizando a ampliação dos temas voltados para
a igualdade de gênero, mostrando através da participação ativa nas instituições
políticas, que são capazes de pensar, agir, propor, articular e contribuir na
construção de uma sociedade mais justa e igualitária.
Uma vez que estamos falando sobre a importância da presença
feminina, verificamos, nesse momento, a experiência na vida política das envolvidas
na pesquisa, antes de assumirem uma cadeira no parlamento.
Das cinco entrevistadas, quatro responderam afirmativamente que já
tinham experiência política antes da atuação parlamentar:
Estou em meu primeiro mandato como Deputada Estadual. Já fui
vereadora, vice-prefeita e prefeita por dois mandatos. (A)
Fui eleita, no primeiro mandato 2003/2006 com 53.225 votos. No
segundo mandato, 2007/2010, com 66.491 votos. Antes de ser
deputada, fui presidente do Provopar, na condição de voluntária.
Também fui chefe da Representação do Governo do Paraná em
Brasília. (B)
Atuei como parlamentar durante 4 anos. Na vida política, atuo há
muitos anos. Na década de 70, já militava na vida política. Já fui
secretária de estado, criei em Londrina, a 1º Coordenadoria Especial
da Mulher no Brasil [...] Eu, no Paraná, tive uma participação muito
grande nos primeiros conselhos municipais e estaduais. Fui
presidente do Conselho Estadual da Mulher e criei, em Curitiba, o 1º
77
Centro de Referência de Atenção à Mulher em Situação de Violência.
Em 1985, participei das primeiras lutas para instituirmos, no Brasil, as
delegacias de mulheres [...] (C)
7 anos – iniciei em janeiro de 2001. Já fui Vereadora. (D)
Somente a deputada E relatou que não tinha experiência em cargo
político antes da atuação no Legislativo:
Faz um ano que atuo como Deputada. De formação eu sou
enfermeira com atuação em Saúde Pública e nós tínhamos muitas
dificuldades no setor. Além disso, as questões ambientais me
preocupavam bastante [...] por isso me filiei no partido. (E)
Diante das respostas das deputadas, observamos que a experiência
política das envolvidas na pesquisa é localizada no município de origem e na
atividade assistencial voluntária dentro do Programa do Voluntariado do Paraná -
Provopar
16
. Apenas uma deputada extrapolou o município, fato este que pode estar
relacionado à sua trajetória de lutas e militância em prol dos direitos das mulheres
no decorrer da década de 70.
A ação voluntária pode ser considerada um espaço de abertura à
inserção política da mulher, pois o contato com a população nesse trabalho pode
garantir uma maior aproximação aos canais corporativos formais, estreitando laços
com a política eletiva, fortalecendo as oportunidades de ascender na carreira
política. Além disso, a participação, nesses espaços, possibilita a maior presença de
mulheres por concentrarem as ações dentro do município, o que permite conciliar os
afazeres domésticos com os afazeres públicos.
Assim, o maior envolvimento das mulheres na política local está
relacionado à dinâmica entre o público e privado. Segundo Avelar (2001), a
participação das mulheres nos legislativos municipais é crescente, pois, na política
local é mais fácil conciliar vida profissional, vida familiar e vida política, três universos
altamente envolventes e de múltiplas demandas.
16
Uma entidade civil, sem fins lucrativos, voltada ao 3° setor, que age em parceria com o governo do
Estado do Paraná e a sociedade civil.
78
Dentro do lar, mostra, através dos afazeres domésticos, sua
dedicação e responsabilidade na educação dos filhos e na vida pública. Ademais,
mesmo com alta qualificação profissional ou investida de um alto cargo nos espaços
decisórios de poder, precisa estar afirmando, por meio de discursos, ações,
reivindicações, projetos, que a mulher tem competência técnica e teórica para atuar
com veemência.
Perguntamos então: frente a tantas situações discriminatórias,
ocorridas ao longo da trajetória de luta das mulheres na conquista do ato de votar e
candidatar-se a cargos eletivos, o que estimula sua participação política enquanto
mulher?
As deputadas entrevistadas responderam entusiasmadas:
O que me estimula principalmente é a crença de que a emoção, a
capacidade de ternura, a maneira mais humana de ver a vida,
características tipicamente femininas, são imprescindíveis para a
construção de uma sociedade mais justa e igualitária (A).
Fazemos uma pergunta, questionou a deputada B. As mulheres
fazem diferença na política? Sim, fazem muita diferença. As
pesquisas em todo o mundo apontam para o fato de que elas tratam
de defender as questões que fazem parte de seu universo de
interesses, como as políticas sociais ligadas à saúde da mulher e da
criança, a luta pela implantação de escolas e creches, discriminação
e assédio sexual, dependência econômica. (B).
O que me motiva é a possibilidade concreta de ajudar a movimentar
a roda dessa história. Eu me sinto assim junto com outras mulheres e
homens. Também estamos tentando construir um mundo novo e se
você não tem uma participação ativa,efetiva, você não vive,você
passa pela vida. Viver para mim é lutar,correr riscos,é acreditar e se
posicionar (C).
Quando pensamos ou olhamos para uma família, sentimos que é
fundamental a presença do homem e da mulher. Na política também
é assim, é importante a presença dos dois para termos equilíbrio
social. É normal o homem na política, por isso que temos que
construir uma participação maior da mulher. Eu falo que o olhar
feminino, de mãe, de companheira, de apaziguadora, olhar que sabe
ver e valorizar, das pequenas às grandes causas, por isso eu
entendo que se tivermos só olhos masculinos, vamos atrasar muito o
desenvolvimento político social (D).
79
A vontade de fazer, a garra e a fé que ainda tenho na humanidade.
Pode até parecer piegas, mas acredito que a minha participação
política é uma missão divina. A quem muito foi dado muito será
cobrado e eu tenho dons divinos. Eu considero um dos meus
maiores dons a questão de ser destemida, ou seja, de eu não ter
medo da exposição, não ter medo do outro, do desafio. Considero
isso um dom divino e creio que se foi me concedido este dom,
espera-se que eu use-o em prol de algo positivo para o planeta. Isto
é o que motiva minha participação na política (E).
Nas respostas dadas pelas deputadas, constatamos que a maioria
considera que um dos maiores estímulos é o fato de mulher e política estar
relacionado com as características ditas femininas. A fragilidade, a afetividade, a
ternura e a honestidade foram mencionados como diferenças positivas no fazer
política entre homens e mulheres. Na resposta de duas deputadas, essas
características ficam nítidas na expressão “a capacidade de ternura” mencionada
pela deputada A e “olhar de mãe” mencionado pela deputada D.
Esse fato reafirma que as mulheres estão culturalmente
posicionadas pelas diferenças biológicas entre os sexos, as quais começam ser
reproduzidas desde o nascimento, conforme aponta a deputada C: “ninguém nasce
sabendo o que são coisas de menina e o que são de menino [...]
Sendo assim, as diferenças biológicas entre os sexos, como
justificativa da ausência feminina nas instâncias de poder, é fruto de uma sociedade
machista e patriarcal, cujos resquícios estão presentes até os dias de hoje, conforme
mencionado no segundo capítulo dessa pesquisa. Isso vem de um processo cultural
e ideológico, em que o homem está para o público e a mulher para o privado. A
partir do momento que o sexo masculino mantém economicamente sua família, ele
estabelece uma relação de poder sobre a esposa, que, diante da naturalização e da
privação feminina, focadas na maternidade e nas responsabilidades domésticas,
acaba, muitas vezes, reproduzindo tal ideologia, ou seja, a mulher é mais frágil, mais
afetiva, mais honesta, mais doce pelo dom da maternidade.
Outro estímulo que aparece como resposta pela deputada B é que
as mulheres enfrentam as urnas eleitorais com o intuito de lutar pelas questões que
dizem respeito às mulheres, pois acreditam que, somente com a participação
feminina nos cargos eletivos de poder, serão ouvidas as questões pertinentes ao
80
seu universo, abrindo canal para a articulação de ações que garantam a igualdade
entre os sexos, colocando na “ordem do dia seus desejos e expectativas”
(TABAK,1983).
Ao mesmo tempo em que a maioria das entrevistadas se posicionam
sobre o ponto de vista das características tipicamente femininas, as deputadas C e E
deixam explícito, em suas respostas,valores que não condizem com a fragilidade e
sim a uma posição de firmeza frente às questões emergidas na esfera política. Lutar,
correr risco, acreditar, posicionar-se, ser destemida e não ter medo do desafio são
características vistas como masculinas dentro da sociedade brasileira, mas que,
também, fazem parte do universo feminino.
Por isso, no conjunto das características mencionadas pelas
deputadas paranaenses, percebemos diferenças de agir e pensar entre as próprias
mulheres e isto mostra que o fazer político diverge de acordo com a forma de ser de
cada sujeito. Estas diferenças são importantes e devem ser respeitadas para que
haja um debate plural e não homogêneo frente às demandas emergidas. Assim, o
que o equilíbrio entre o ser forte e frágil das mulheres viabiliza uma atuação política
menos individualista através de ações e projetos que favoreçam a causa dos grupos
historicamente excluídos.
De acordo com Avelar (2001) as pesquisas em todo o mundo
apontam para o fato de que só elas tratam de defender as questões que fazem parte
de seu universo de interesses, como as políticas sociais ligadas à saúde da mulher e
da criança, a luta pela implantação de escolas e creches, controle produtivo, aborto,
discriminação e assédio sexual, dependência econômica e assim por diante. Além
disso, é largamente sabido que os temas defendidos pelas mulheres, na política, são
principalmente os de natureza social, o que, no Brasil, significa modernidade política
devido a emergência de novos temas, antes tratados de modo secundário pelos
políticos.
Nesse sentido, aumentando o contingente feminino em todos os
níveis de poder, esperamos maior sensibilidade com as iniciativas que beneficiarão
uma grande maioria excluída. Obviamente, não são todas as mulheres políticas que
81
atuam desse modo. Muitas delas, cujas origens são tradicionais e conservadoras,
defendem antes interesses individuais e deixam de lado os interesses coletivos.
Ademais, a espiritualidade, o dom divino explícito na fala da
deputada E também aparece como motivação na política. O impulso político dado
pelos seus princípios e valores engendrados no bem do próximo, a partir de valores
morais, religiosos coloca a ação política como um dom divino, da natureza e não
como um processo resultante das relações sociais concretas. De forma empírica,
podemos dizer que a espiritualidade está mais presente na vida das mulheres.
A Igreja desenvolveu duas vertentes no que diz respeito à política
formal. De um lado, temos mulheres, influenciadas pela posição de uma Igreja que
permanece sob a ideologia conservadora, em que a prioridade na vida da mulher
deve ser a responsabilidade com a reprodução, com o lar e com a família. Por outro
lado, temos uma Igreja posicionada nas preocupações sociais, impulsionando os
fiéis a lutarem pelo progresso das classes oprimidas.
A esse respeito, Avelar (2001) comenta que a “Igreja que é
comprometida com questões sociais é uma das instituições que mais politizam as
mulheres”, o que pode ser considerado um progresso na vida política do sexo
feminino, pois, num passado remoto, as mulheres dentro da Igreja tinham uma
postura tradicional e conservadora.
Em seguida, perguntamos às deputadas como ocorreu o processo
eleitoral em relação às dificuldades relacionadas à campanha. Das cinco
entrevistadas, as deputadas A, B e C apontaram a questão financeira como a maior
dificuldade:
Creio que as maiores dificuldades foram de ordem financeira.
Concorri com candidatos da região com alto poder aquisitivo, e fiz
uma campanha muito simples. Entretanto, foi uma dificuldade que
acabou demonstrando-se uma surpresa muito boa: a de que o povo
que acompanhou o nosso trabalho no município ficou satisfeito e,
com uma campanha modesta, nos honrou com o mandato de
deputada (A).
A pedido da deputada (B) essa resposta não foi mencionada.
82
[...] Não posso competir, por exemplo, na questão econômica com
aqueles que têm muito mais dinheiro do que eu tem, eu não faço a
política da maneira que muitos fazem, eu não troco nada. Então,
essa é a dificuldade (C )
Nas respostas acima, percebemos que as deputadas fazem uma
campanha modesta e sem muitos recursos, o que acarreta dificuldades nas
oportunidades de eleger-se perante aqueles que possuem maior viabilidade
financeira. O sistema eleitoral brasileiro ainda é mediado por correlações de forças
ditadas pelo poder econômico. Quem investe mais, tem mais chances de ingressar
num cargo eletivo. Este processo pode estar relacionado à falta de uma educação
menos sexista sobre política no Brasil e a ausência de princípios democráticos.
Uma maior preocupação com a politização da população por parte
das autoridades seria fundamental para o rompimento de uma prática política
engendrada de atitudes compensatórias. Infelizmente, muitos ainda votam pelo que
lhe é oferecido e não pela avaliação das propostas de seu candidato.
Assim, a cultura política brasileira é marcada por práticas
clientelistas, vigorando um sistema político personalista. Araújo (2005) argumenta
que o personalismo corrobora com ações de patronagem e assistencialismo,
fragmentando a participação daqueles que possuem menores financiamentos em
sua campanha.
A característica do personalismo, que tendem a marcar a atuação de
muitos partidos, conferindo-lhes também uma prática política individualizada e
mediada pelo clientelismo, pode ser considerada como um fator que afeta
negativamente as mulheres. (ARAÚJO, 2005, p.206).
A fala da deputada C, “eu não troco nada” vem ao encontro da
afirmação acima. O Brasil, infelizmente, alimenta uma política assistencialista e
autoritária, cujo troca de favores, nepotismo, jogos de interesses e individualismo
fazem parte da vida de alguns políticos. Esse movimento injusto e anti-democrático
acaba afetando principalmente os segmentos de menor status social.
17
17
Menor status social quer dizer a menor posição econômica e ocupacional dentro da esfera pública.
83
Além disso, o fato da política formal ser um campo tradicionalmente
ocupado pelos homens, tende a gerar discriminação quando se trata de candidatas
mulheres, pois os partidos continuam a reproduzir perfis tradicionais e
conservadores, não dando as mesmas oportunidades de acesso aos segmentos
historicamente excluídos da sociedade como as mulheres,negros e homossexuais.
Dessa forma, observamos que a dificuldade da mulher em estar
mais presente dentro da política formal não reside somente na disponibilidade em
participar ativamente nos espaços decisórios de poder e de conseguir destaque
dentro dos partidos, mas sim de alcançarem condições concretas para competirem
dentro do sistema eleitoral, agravado de situações excludentes.
Nesta perspectiva, Araújo afirma:
O processo de recrutamento eleitoral é mediado por fatores internos
e externos ao partido e ao próprio sistema eleitoral. A eleição das
mulheres também é mediada por um processo que envolve desde as
motivações individuais para candidatar-se - condicionadas por sua
disposição, pelas oportunidades para disputar e pela análise dos
recursos disponíveis – até a possibilidade de ser indicada pelo
partido. Isso na maioria dos casos, implica um cálculo pragmático da
correlação de forças e dos objetivos partidários em uma determinada
eleição, passando, ainda, por seus compromissos ideológicos
(ARAÚJO, 2005, p.198 - 199)
Além da dificuldade financeira, o fato de ser mulher também aparece
como dificuldade para alcançar um cargo eletivo. A deputada D comenta que:
[...] muitos criticavam e falavam que não tinha viabilidade eleitoral,
por eu ser agricultora e mulher. Depois de eleita, isso tudo foi
superado.Tenho me esforçado muito para corresponder a confiança
depositada na minha pessoa (D).
A resposta acima, afirma, mais uma vez, que a sociedade ainda está
marcada de resquícios patriarcais e machistas, visto que a política, muitas vezes,
não é vista como um campo pertinente à atuação feminina. A sociedade ainda
considera que a mulher não tem condições de exercer um cargo de poder. Esse
preconceito não é uma prerrogativa apenas masculina, estudos afirmam que a
própria mulher carrega consigo essa ideologia.
84
Tabak e Toscano (1982, p.39), afirmam que as próprias mulheres
são preconceituosas com relação à candidatura do sexo feminino. Em pesquisa
realizada com 300 mulheres, através de entrevistas apareceram falas como “Política
é coisa de homem”, “eu não posso participar da política”, ou “é difícil”, “mulher fala
muito e não cumpre”, demonstrando de modo inequívoco, os pesados preconceitos
que ainda cercam o desempenho político da mulher.
A esse respeito, a deputada E afirma que por ser mulher, sua maior
dificuldade neste período foi conciliar vida familiar com a vida política:
Conciliar a vida política partidária com minha vida pessoal foi a minha
maior dificuldade. Conciliar os papéis que a sociedade te cobra como
mãe, esposa, como cuidadora da família é muito difícil. A sociedade
cobra muito mais da mulher em relação a estes papéis do que o
homem e estas duas funções são complicadas. A política
propriamente dita requer muito tempo e a família também (E).
Mais uma vez a fala acima nos remete ao preconceito, aos valores
machistas engendrados pelo patriarcalismo. Os cuidados com a família ainda
recaem prioritariamente sobre as mulheres.
Essa é uma questão levantada por Tabak ao afirmar que:
[...] muitas mulheres que estão no espaço público - no mercado de
trabalho, na política e que desempenham atividades profissionais de
alta qualificação não estão liberadas de responsabilidades
domésticas. Seu papel como esposas e mães ainda considerado
pela sociedade em seu conjunto - como a sua primeira obrigação.
Logo muitas delas se deparam com uma situação extremamente
dúbia, uma vez que tem que ser, simultaneamente, “boas” mães e
esposas e “muito boas” profissionais, porque ainda estão num
processo de reconhecimento profissional e torna-se necessário
provar que são tão capazes quanto os homens e isto acarreta
conseqüências negativas na vida pública das mulheres
(TABAK,1983, p.75).
Mulheres profissionais e políticas, muitas vezes, sentem-se culpadas
ao deixarem seus filhos e maridos para trabalhar fora, ou, nas palavras da autora
mencionada acima, as mulheres por dedicarem-se todas as horas do dia à vida
85
pública acreditam prejudicar a vida doméstica. Com isso, é comum sabermos que
muitas mulheres, ao casar e ter filhos abandonou a profissão para dedicar-se,
exclusivamente, aos cuidados do bebê e da casa.
Nesta perspectiva, Tabak (1983, p. 75) menciona que mulheres
desistem de suas atividades profissionais quando têm filhos pequenos, como
resultado da pressão social que têm que enfrentar. Algumas delas retornam ao
mercado de trabalho depois que seus filhos estão crescidos, mas os anos de
inatividade profissional forçados, certamente, refletem sobre seu desempenho e isso
causa sérios danos a suas carreiras.
Diante do exposto, perguntamos às parlamentares se tiveram apoio
dos filhos, do marido, da família, em geral, para candidatarem-se deputadas
estaduais e quais as maiores dificuldades que encontraram na relação entre o
público e o privado, principalmente no período eleitoral. Todas as deputadas
responderam que tiveram total apoio da família.
A propósito:
A minha família sempre acompanhou e foi solidária em toda a minha
trajetória (A).
Minha família sempre militou na política e sempre contei com a ajuda
de todos. Minha mãe tem 82 anos e trabalha na campanha eleitoral
todos os dias, sempre atenta aos movimentos de todos. É uma honra
contar com todo esse apoio. É um orgulho para mim (B).
Sempre tive total apoio da minha família. Eu sou a segunda filha de
uma família de onze irmãos, minha mãe teve oito filhos e adotou três.
A única filha que deu continuidade na vida política e pública fui eu.
Sempre me deram apoio integral. Meus filhos desde pequenininhos
me acompanhavam pra lá e pra cá. Participavam comigo das
manifestações e das passeatas. Hoje já são adultos, sou até avó.
Considero minha participação política muito importante e até
determinante na educação dos meus filhos como cidadãos críticos,
cidadãos do bem, cidadãos de bom caráter (C).
86
Sempre contei com o apoio da minha família, principalmente do meu
marido e dos meus filhos. Isso é fundamental numa campanha e no
trabalho depois. (D).
Tive total apoio da minha família. É impossível chegar onde estou
sem o apoio da família, sem a compreensão do marido e dos filhos
(E).
Diante dessas respostas, o apoio familiar é notadamente
fundamental nas decisões políticas das entrevistadas. Dessa forma, a deputada E
enfatiza que,
[...] o apoio familiar é muito importante porque as mulheres ainda são
muito ligadas na esfera privada. Tem coisas que nós mulheres
fazemos questão de manter com a gente e não abrimos mão, como
exemplo, o cuidado com a casa e com os filhos (E).
De acordo com Araújo (2005), o envolvimento das mulheres ainda é
condicionado na sua dinâmica entre a vida familiar e a vida profissional, pois a
ligação com o privado é muito forte. Esta ligação é uma tendência ligada ao
feminino, pois está associada à naturalização biológica de mãe e esposa. Por
séculos, a mulher ficou limitada à esfera doméstica restringindo sua condição de
cidadã e essa ideologia machista percorre a sociedade ainda nos dias de hoje.
Portanto a ligação da mulher ao espaço privado, à sua condição de
mãe e esposa ainda são funções, valores e princípios que conduzem o agir
feminino. Como prova disso, verifica-se que todas as deputadas acima mencionam a
importância da família nas suas decisões fora de casa, dentro da vida política. Atuar
na política, sem o consentimento familiar, seria romper com sua identidade
socialmente construída. Dessa forma, notamos que a família tem lugar prioritário na
vida dessas parlamentares.
Este fato nos leva às considerações de Avelar (2001) ao afirmar que
a presença feminina na política local é mais evidente, conforme mencionamos
87
anteriormente, porque permite de forma mais fácil conciliar os deveres domésticos
com os deveres políticos.
Tanto que, se analisarmos a presença feminina nas esferas políticas
locais, encontramos um aumento considerável na representação feminina. De
acordo com os dados estatísticos do Centro Feminista de Estudos e Assessoria
(CFEMEA) no ano de 2000, foram eleitas 317 mulheres (5.70%) e 5.241 homens
(94,28%), a prefeituras municipais, totalizando 5.559 eleitos/as. Já em 2004, foram
eleitas 407 prefeitas (7,35% do total) e 5.111 homens (91,95%). O crescimento
absoluto das mulheres eleitas foi de 90 cadeiras, representando um crescimento de
28,3%. Elas ampliaram a sua participação em 1.6 pontos, passando de 5,70% para
7,35% do total de prefeitos/as eleitos/as (CFEMEA, 2004).
Sendo assim, podemos dizer que a família ainda desempenha um
papel fundamental no processo de socialização política dos seres humanos e,
principalmente, do sexo feminino, qualquer que seja o sistema político vigente no
país e não obstante as profundas transformações sociais que ela vem sofrendo no
período histórico mais recente, dos conflitos de gerações, de novo tipo de
relacionamento que se estabelece entre seus membros. É muito forte a influência
dos laços familiares sobre o comportamento político, particularmente, naqueles
países em que a prática democrática não é regra, mas antes exceção (TABAK,
2001, p. 50).
Mesmo sabendo que a dificuldade de conciliar esfera doméstica com
a esfera pública tenha aparecido como dificuldade na resposta de uma deputada,
consideramos importante saber como as deputadas articulam a vida pessoal com a
vida profissional. A esse respeito, fizemos a seguinte pergunta: No decorrer da sua
atuação pública, como concilia vida familiar com a carreira política? Há dificuldades?
Como em qualquer outra atividade, e isso é típico de nós, mulheres,
sempre há que se buscar mecanismos que conciliem a vida pessoal
com as exigências do nosso trabalho, comenta a entrevistada A.
Temos que nos virar em dez, utilizando um tema bem popular. Não
adianta, tem algumas coisas que nós mulheres não abrimos mão
mesmo trabalhando fora de casa. Alguns afazeres domésticos que
88
gostamos de manter com a gente e isso não é fácil. Mas com o
tempo fui me adaptando, abrindo mão de algumas coisas, passando
funções para os filhos, marido e adequando os horários num
constante movimento de abrir mão. Hoje eu trabalho aqui na
assembléia no Centro Cívico e resido em Araucária com minha
família. Lá eu tenho meu escritório, eu tenho minha vida pessoal e
fico dividida entre esses dois momentos. E
Eu sempre dedico um tempo para a família. Tenho dois filhos que
estão cursando o ensino superior. Nós temos muito dialogo e acho
isso fundamental. Eu procuro acompanhar tudo na vida deles, e acho
que consigo ser uma mãe presente, mesmo às vezes não estando na
presença física. O fato de eles acompanharem nossa luta desde
pequenos, faz com que tenham compreensão do trabalho, isso ajuda
superar algumas dificuldades. (D)
A resposta dada pelas deputadas acima nos leva a questão da dupla
jornada que vem sendo discutido nos últimos anos. A dupla jornada é o exercício de
funções dentro e fora do lar. O acúmulo dessas atividades sobrecarrega as
mulheres, provocando uma enorme desigualdade entre homens e mulheres.
Desigualdade esta percebida ao analisar que a mulher que atua na esfera pública
não obtém o mesmo salário que os homens e na esfera privada, muitas vezes, não
têm a colaboração do marido na divisão dos afazeres domésticos.
As atividades da reprodução social (tarefas domésticas, cuidados
com as crianças, enfermos, idosos do grupo familiar) precisam ser reconhecidas
como trabalho produtivo e socialmente necessário, embora não remunerado. A
dupla jornada de trabalho da mulher (que não é exercida por vocação) tem um custo
altíssimo porque implica a sua participação no mercado de trabalho em condições
absolutamente injustas e desiguais, provocando, muitas vezes, a interrupção da vida
profissional, a opção forçada pela informalidade e até a exclusão definitiva do
mercado. (OLIVEIRA, 2003).
Vejamos o comentário da deputada B:
Estar disposta a representar a população é uma missão muito
importante na vida de cada um de nós, mas é preciso saber separar.
Temos uma vida diferente, mas procuro preservar e garantir o bem
estar de minha família. A educação nós recebemos no berço e temos
que passar o melhor para nossos filhos, prepará-los para a vida. É
uma missão honrada e delicada, a família precisa de respeito e
atenção, mas consigo conciliar sim, valorizando sempre a qualidade
89
do tempo que passamos juntos. O convívio e o amor com minha
família são essenciais.
As frases mencionadas pelas deputadas como “preparar os filhos
para a vida” e “o amor essencial da família” demonstram que as mulheres, mesmo
aquelas que não estão alienadas no mundo privado, reproduzem, muitas vezes,
valores, princípios e comportamentos tradicionais e conservadores.
De acordo com Avelar (2001, p.89), atitudes e comportamentos
conservadores são aqueles que referendam a continuidade da ordem estabelecida,
ou seja, o cuidado com os filhos, com o marido e com o lar, no geral, recaem sobre
as mulheres, os quais foram impostos pela sociedade patriarcal e vêm sendo
reproduzido até os dias de hoje.
Exemplo disso pode ser encontrado nas relações familiares quando
mães e pais determinam que as filhas, enquanto crianças devem brincar de casinha
e de boneca. Nesta perspectiva,
[...] a tradição, o costume, e mesmo o comodismo, concorrem para
que se mantenha o mito da existência de trabalhos que são
naturalmente femininos,mesmo depois que a ciência demonstrou que
não há, a priori, uma divisão sexual, por assim dizer, biológica das
atividades humanas, decorrendo tal divisão de conceitos que são
tipicamente cultural e socialmente condicionados. (TABAK;
TOSCANO,1982, p. 62).
Em contrapartida, a entrevistada C demonstra, através do seu
depoimento, que não reproduz essa ideologia. A saber:
Conciliar as duas esferas é absolutamente possível quando você
incute na sua família que ela é a primeira sociedade por direitos e
obrigações. Eu nunca fui uma mulher que entendesse que era
responsabilidade única e absoluta minha, por eu ser mulher, o
serviço doméstico, eu sempre dividi isso com minha família. Meus
dois filhos homens sempre arrumaram suas próprias camas e
lavaram suas próprias cuecas, sempre me ajudavam a colocar a
mesa, me ajudavam nos afazeres domésticos, sempre conciliando
seus estudos e outras responsabilidades. Nós tínhamos uma agenda
coletiva de divisão das tarefas dentro de casa. Isto foi muito
bom,muito produtivo e nunca me senti culpada por atuar na vida
pública, porque acredito que o importante na relação entre mãe e
90
filho é a qualidade da relação e não a quantidade de tempo que você
fica com eles. É um exercício democrático, tentando dentro da minha
casa não reproduzir a ideologia machista e deu muito certo. Se as
mulheres que trabalham fora tem essa consciência tudo fica mais
fácil. Seu marido ajuda na cozinha,você administra com todas as
tarefas de casa como uma primeira sociedade porque todo mundo
come,bebe, dorme, então,essa divisão do trabalho era minha
obrigação política. Se lutamos por uma sociedade com igualdade e
oportunidade por que você vai fazer diferente dentro da sua casa?
Por que você te que ser a única responsável pelo serviço doméstico?
Não, isso tem que ser mudado. Hoje meus filhos cozinham, lavam e
passam como algo natural e foi muito bom essas atitudes na relação
com suas namoradas e esposas. Eles são totalmente independentes,
se não tenho tempo de ir para casa na hora do almoço sei que eles
farão o almoço deles. Que homem que não é capaz de fazer seu
próprio prato de comida. Por isso, é muito importante adotarmos isso
na nossa vida, não como discurso, mas sim como prática. (C)
De acordo com as respostas das entrevistadas, foi nos possível
perceber que as deputadas A, B, D e E ainda permanecem dentro da ideologia
tradicional, trazendo para si maior responsabilidade com a educação familiar,
mesmo trabalhando fora de casa.
Apesar do acúmulo de responsabilidades entre o público e o privado,
não sentem dificuldades de conciliar as duas esferas, exceto a deputada E. A
dificuldade exposta pela deputada E pode estar relacionada ao fato da falta de
experiência em cargos políticos, visto que, eleita pela primeira vez, ainda não tem o
domínio das redes que articulam e dão apoio a sua função de parlamentar, o que
pode vir a exigir mais dedicação e tempo para se familiarizar com toda a estrutura de
trabalho. Já a deputada C revela que estabeleceu a divisão das tarefas domésticas a
fim de romper com paradigmas e estereótipos femininos.
5.2
ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA: DISCRIMINAÇÃO; CARGOS DE REPRESENTAÇÃO
A respeito da participação das deputadas dentro da Assembléia
Legislativa do Estado do Paraná, fizemos a seguinte pergunta a elas: Como é sua
participação dentro da ALEP? Tem um bom acesso para mediar suas ações
enquanto liderança pública?
91
A entrevistada A respondeu:
Creio que tenho conseguido desenvolver a contento as atividades
legislativas. Sempre fiz política de uma forma simples, dedicada e
sem alardes, e é como tenho feito meu trabalho como deputada.
A deputada B afirmou:
Sou bastante atuante. Já fui líder do Partido Progressista, Presidente
da Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher, da Criança e do
Adolescente. Hoje, sou 4ª Secretária da Assembléia. Participo das
discussões dos Projetos de Lei e de todas as matérias em pauta.
Atuei na implantação da TV Assembléia e estou trabalhando na
implantação da Escola do Legislativo, buscando treinamento para os
servidores do Poder Legislativo. Em razão dos projetos de lei
apresentados, em 2005 recebi o Prêmio de Melhor Deputada
Estadual, na 38ª edição dos Melhores do Ano, do Diário
Popular.Costumo dizer que faço a política da boa vizinhança. É claro
que existem momentos mais complicados, mas acima de tudo, sou
uma pessoa tranqüila, que aprendeu em casa a respeitar o próximo.
Para mim, a Assembléia é a Casa de todos os paranaenses,
estamos para trabalhar pelo bem do nosso Estado. Além disso,
sempre consigo, de maneira eficaz, transmitir todas as mensagens
no plenário da Assembléia. Agradeço muito porque sou uma
deputada respeitada pelos meus colegas, mesmo quando há
divergências.
A esse respeito, a entrevistada C comenta:
[...] sempre procurei ser uma deputada muito atuante,cumprindo meu
papel,enfrentando situações complicadas mas nunca deixando o
“rolo compressor” passar por cima de mim. Nunca permiti isso,
sempre mantive uma postura e essa postura tem que ser mostrada
para os colegas de trabalho e para a sociedade através de sua
competência do seu trabalho mostrando que você tem condições de
defender idéias, que você tem conhecimento, tem informação da
conjuntura nacional, estadual e municipal pois contra conhecimento e
informação não há discurso machista que resista. Por isso, temos
que estar preparadas, capacitadas para exercer esses papéis. Eu
sempre fui uma defensora incondicional das minhas idéias [...]
O depoimento acima explicita que as mulheres enfrentam
preconceito e, por isso, precisam ser motivadas a inserir-se na política através de
92
uma educação política menos sexista, que contribua para a mudança de valores
culturais machistas e tradicionais.
Atualmente, diversas ações vêm sendo instituídas para ampliar a
presença feminina, por exemplo, a campanha nacional “Mais Mulheres no Poder
18
cujo objetivo é estimular a participação das mulheres nos espaços de poder e
decisão no Brasil.
Segundo o Centro Feminista de Estudos e Assessoria (CFEMEA), a
participação das mulheres, nos espaços de poder e decisão, tem entre seus
objetivos, a promoção de mudança cultural na sociedade. Tais mudanças visam à
formação de valores e atitudes em relação à autonomia e ao empoderamento das
mulheres e o estímulo à ampliação da participação feminina nos cargos de decisão
dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, nos partidos políticos, assim como
em entidades representativas de movimentos sociais, como sindicatos, conselhos e
associações, promovendo uma participação igualitária, plural e multirracial.
A entrevistada D, também, afirma:
Tenho um bom acesso, não encontro muitas dificuldades na
Assembléia. O problema é que muitas reivindicações que nos chega
não depende só de nós para ter respostas, isso dificulta o trabalho. É
um conjunto de coisas, interesses partidários,políticos que não
dependem só da minha boa vontade, relata a entrevistada.
A resposta da deputada D vem ao encontro dos diversos estudos
sobre o sistema político brasileiro o qual, muitas vezes, é dominado por práticas
individualistas que acabam dificultando o verdadeiro exercício democrático, uma vez
que, se as opiniões, demandas de modo coletivo não têm a mesma abertura dentro
das instituições, não há como existir democracia.
De acordo com Tabak (1983 p.127), no Brasil, as experiências
políticas têm demonstrado existir uma relação estreita entre a verdadeira
democracia e com a mais ampla participação das mulheres e das massas populares
em geral. Tal fato limita a luta pela igualdade de direitos e pela emancipação social,
18
www.maismulheresnopoderbrasil.com.br
93
ou seja,quanto menor a participação dos segmentos tidos como excluídos,menor
realização do exercício democrático no Brasil. E, sem democracia, não há como
garantir os direitos iguais a todos os cidadãos.
Nesse contexto, Avelar (2001, p.158) comenta que os debates sobre
a democracia deliberativa
19
estão aí para mostrar que, na maioria dos países latino-
americanos, há democracia para uns e não para outros. Assim, afirma que
democracia sem participação dos segmentos diferenciados é vista sob a perspectiva
de uma privação de direitos de cidadania da grande maioria.
Já a resposta dada pela entrevistada E deixa explícito que ela tem
um bom acesso dentro da ALEP, reafirmando, como já foi tratado anteriormente, que
as dificuldades estão no período das campanhas.
Assim, relata:
Acho essa pergunta bastante pertinente, porque as mulheres
acabam achando que sofrem alguma discriminação quando estão
investidas de um cargo político pela questão de gênero, e
absolutamente, eu não consigo detectar isso. Hoje eu sou presidente
da comissão de defesa dos direitos da mulher, da criança e do
adolescente e vice-presidente da comissão de ecologia e meio
ambiente e também membro ativo da comissão de saúde. Em todos
os lugares eu tenho voz e voto e sempre tive por parte dos demais
parlamentares. Apesar de sermos a minoria, o respeito e o
reconhecimento do nosso trabalho existem. Então, não vejo nenhum
tipo de preconceito aqui dentro. O difícil é chegar até aqui. Agora,
depois que você está investido de um cargo público eu não acredito
na existência do preconceito e da discriminação. É claro que temos
que nos capacitar, temos que marcar nosso território através da
competência política, e a partir do momento que alcançamos isso,
temos reconhecimento como qualquer outro parlamentar
independente do sexo ou da opção sexual”, finaliza a entrevistada.
Apesar do avanço dentro dos espaços institucionais, através da
abertura e participação das parlamentares em cargos de maior representação dentro
da ALEP, percebemos que há uma maior atuação das mulheres em atividades tidas
como femininas. Para exemplificar essa questão, os cargos que elas ocupam são,
na maioria das vezes, direcionados para áreas de natureza social como: criança e
19
Democracia deliberativa é a necessidade de justificar as decisões tomadas pelos cidadãos e pelos
seus representantes. Espera-se que ambos justifiquem as leis que querem impor uns aos outros.
Sobre democracia deliberativa ver Gutmann e Thompson (1996).
94
adolescente e saúde. Portanto, mesmo que as legisladoras não percebam
preconceito nesse espaço institucional, consideramos que ele existe sim, enrustido
em pequenas situações como a ausência feminina nas comissões de orçamento e
finanças.
Mesmo assim, não podemos deixar de considerar que as
parlamentares paranaenses demonstram um discurso ativo dentro da prática
parlamentar. É plausível que as deputadas estão investidas de um cargo político
nunca antes permitido a elas, o que já é um grande avanço na conquista dos direitos
femininos. Além do mais, fazem-se visíveis dentro dos espaços institucionais da
ALEP, através dos debates e participação nas comissões e secretarias.
Em relação aos cargos de representação, as mulheres em exercício
parlamentar (16ª legislatura) fazem parte da mesa executiva, ocupam cargos de
poder, estão presentes em várias comissões e encontram abertura no campo do
debate. Em virtude dessa atuação política, relatam que o acesso, o reconhecimento
e o respeito são preservados no dia-a-dia de seu trabalho, o que facilita o
desenvolvimento de suas ações dentro do parlamento. Por isso, reafirmam que a
maior dificuldade de acesso e reconhecimento está no período das campanhas
eleitorais e não quando estão investidas de um cargo na elite política.
Vale ressaltarmos que, segundo o regimento interno da ALEP (art.
15), a mesa é órgão diretivo dos trabalhos da Assembléia Legislativa, sendo
composta de: Presidente, 1º Vice-Presidente, 2º Vice-Presidente, 3º Vice-Presidente,
1º Secretário, 2º Secretário, 3º Secretário, 4º Secretário e 5º Secretário.
O fato das mulheres, atualmente, fazerem parte da mesa executiva é
considerada como um grande avanço na igualdade de oportunidades dentro da
ALEP.
Hoje sou 4ª Secretária da Assembléia, participo das discussões dos
projetos de lei e de todas as matérias em pauta [...] Agradeço muito
porque sou uma deputada respeitada pelos meus colegas,mesmo
quando há divergências (B).
95
Com relação aos cargos, acreditam que estão caminhando para a
igualdade, pois, hoje, todas estão integradas nas discussões de grande
relevância nos trabalhos legislativos.
Importante mencionarmos que “o trabalho na Assembléia Legislativa é
regulado pelas Constituições Federal, Estadual e pelo Regimento Interno da
Casa”. “As divisões de vagas nas Comissões Permanentes são feitas na
forma de Regimento Interno e observado a representação partidária”, relatou
a deputada B.
Uma vez que estamos falando da participação feminina nos órgãos
diretivos da ALEP, sabemos que, até os dias de hoje o cargo de maior
representação dessa instituição - a Presidência - ainda não foi ocupada por
uma mulher, mas as entrevistadas comentam que elas vêm caminhando para
alcançar esse objetivo.
Nesse contexto, as deputadas C e E afirmam, respectivamente:
Dessa forma, a questão da participação deve ser trabalhada dentro
dos partidos através de uma política educacional menos excludente e
sexista, onde as mulheres consigam viabilidade através da sua
vontade, da sua militância, e não pelos critérios estabelecidos, que
muitas vezes, as distanciam do universo político. “Estamos lutando
muito para que a educação não seja sexista, que a educação seja
solidária e democrática. (C)
Na história da ALEP, não vi nenhuma mulher ser eleita presidente.
Pela primeira vez, no ano de 2006 uma mulher passou a integrar a
mesa executiva. Acho que é porque nossa representação ainda é
pequena: de 54 parlamentares, apenas 4 são mulheres.
Ainda não conseguimos á presidência porque somos minoria. Por
isso, é necessário maior participação e envolvimento das mulheres
para atingirmos a igualdade. (E)
Na resposta da deputada C, verificamos uma questão importante a
ser mencionada: a educação política dentro dos partidos políticos. Os partidos
políticos, muitas vezes, adotam regras sexistas e excludentes que acabam
inviabilizando a maior participação feminina.
96
Portanto é necessário, para ampliarmos a presença das mulheres na
política, que haja uma educação política relacionada com os direitos e deveres
cívicos, sobretudo o direito à participação. De acordo com Avelar (2001), para uma
educação menos sexista, “os governos, parlamentares, partidos políticos,
organizações sindicais, organizações não-governamentais e mídias podem todos
contribuir para esse processo.”
A esse respeito, Norris afirma que:
[...] a baixa representação tem observado que o problema das
mulheres não reside tanto em conseguirem ser indicadas candidatas
e, sim em conseguirem condições efetivas de competir – no primeiro
momento, internamente nos partidos, com aqueles que já detêm
certa vantagem eleitoral como a de possuir mandato ou ter redes
partidárias de apoio e, em seguida, extremamente ao partido, no
mercado eleitoral” (NORRIS, 2003, apud ARAÚJO, 2005, p.196).
Ter vontade política, portanto, não é suficiente para o engajamento
numa candidatura. O sistema é muito mais complexo, pois há que se considerar os
requisitos do sistema eleitoral brasileiro, os interesses partidários e a viabilidade das
redes de apoio.
Segundo Araújo (2005, p. 209), os registros relacionados às
mulheres nos programas partidários de alguns partidos ainda surgem como forte
referência à sua condição de mãe e instrumento de sustentação e reprodução de
valores familiares e não à sua condição de sujeitos políticos configurados
independentes da maternidade e/ou da família.
Nesse contexto, fizemos a seguinte pergunta: Por ser mulher, já
enfrentou algum tipo de preconceito, discriminação, exclusão no decorrer da sua
atuação parlamentar ?
Das cinco entrevistadas, apenas uma deputada comentou que
enfrentou preconceito na sua atuação parlamentar. Essa situação foi mencionada
pela entrevistada C:
97
Há preconceitos sim, há discriminação sim [...] É difícil, porque se você tem
uma posição como a minha de firmeza as pessoas dizem “parece um homem
fazendo política”. E se você se sensibiliza , emociona aí dizem “é uma mulher
fazendo política”. A mulher quando vê uma situação, como exemplo, a
questão do boicote sobre nossa carne diante da febre aftosa que nem existia
no Paraná, mas que levantou toda aquela polêmica, eu entendi que a
Assembléia Legislativa tinha que discutir a situação, porque nós estávamos
perdendo recursos, era uma situação econômica gravíssima que estava se
estabelecendo no Brasil e no Paraná. Nesse momento um colega me disse:
isso não é assunto para mulher, ponha-se no seu lugar. Como se a mulheres
tivessem na política para trocar receitas e não para trocar idéias e nós temos
que quebrar isto. Diante dessa situação, me posicionei e disse: este assunto
é de interesse do Estado e eu fui eleita para isso, não só para fazer leis e
fiscalizar, mas para fiscalizar, acima de tudo as boas leis, os cuidados com o
patrimônio público, acompanhar as ações do governo. Assim, procurei
cumprir meu papel com maior respeito, com maior ética e isso não é mérito, é
mais que obrigação.
E continua:
Dentro da Assembléia Legislativa, das Câmaras de Vereadores, dos governos
constituídos, se reproduz o que a sociedade é; o parlamento é o que a
sociedade é: machista e preconceituosa; pois acham que nós mulheres temos
que ser enfermeiras, professoras, assistentes sociais, profissões
consideradas femininas [...]; que não podemos ser matemáticas, físicas,
engenheiras. Nós estamos quebrando esses paradigmas, mas muitos ainda
continuam nos rotulando.
Apesar de apenas uma deputada relatar uma situação de
preconceito, sabemos, por meio de pesquisas e estudos, que o preconceito sobre a
mulher ainda ocorre em pleno século XXI. É só pararmos e olhar a situação feminina
nas instâncias de poder, sua minoria e a falta de acesso.
Essa situação está ligada à trajetória histórica de restrições, limites e
submissões que, por muito tempo, condicionou a mulher como sujeito incapaz de
atuar na vida pública, principalmente em esferas de poder como o Parlamento. Por
isso, a entrada na esfera pública é marcada por preconceitos que foram construídos
socialmente, através de conceitos machistas estabelecidos há muito tempo na
sociedade brasileira.
Esses preconceitos e machismo acabam limitando a entrada da
mulher na política. Jaquette (1975) assinalou que a limitada participação da mulher
em atividades produtivas e a sua escassa aparição nas esferas políticas é resultado
98
da permanência de valores tradicionais com respeito a qual deve ser o papel
adequado da mulher e a forma que a família impõe de maneira contínua uma
concepção estereotipada das diferenças entre os sexos. A causa principal é o
machismo. Em geral, a política continua sendo terreno só para os homens; e são os
valores masculinos que se consideram apropriados (apud TABAK, 1983, p. 59).
O exposto acima revela que a mulher ainda está para o privado e
homem para o público. As conotações estereotipadas dentro da sociedade
permanecem, ao refletirmos de forma empírica que, quando nos deparamos com
uma mulher que dedica o tempo máximo de sua vida ao público, escutamos
comentários como “que mãe desnaturada, não dá atenção a seu filho” ou essa
“mulher tem atitudes masculinas”, “coitado do marido”, “política é coisa de homem”.
Estas expressões revelam a dicotomia entre público e privado, a qual, nas palavras
de Studart “a mulher em nosso país ainda é um ser privatizado e isto se deve aos
preconceitos machistas consolidados e reforçados em nossa cultura” (apud TABAK;
TOSCANO, 1982, p.17).
Studart (apud TABAK; TOSCANO, 1982) afirma também, que este
fator explica as diferenças profundas que existem entre homem público e mulher
pública: a primeira é o cidadão de grandes virtudes que se ocupa dos interesses
gerais da comunidade; a segunda, uma pessoa degradada, posta a serviço da
sexualidade de todos.
O preconceito, experimentado pelas mulheres, acaba intimidando
muitas delas a exercerem uma participação ativa dentro das decisões políticas do
país, uma vez que a arena política, arraigada de conceitos patriarcais, tem sido
ocupada, na grande maioria, pelos homens. Porém, sabemos que as mulheres,
conforme apontamos no terceiro capítulo dessa pesquisa, sempre esteve lutando
através de reivindicações, manifestos e movimentos contra a ideologia dominante,
fato este que vem permitindo uma evolução na vida pública feminina.
5.3 A
TUAÇÃO PARLAMENTAR: OS PROJETOS E A PERSPECTIVA DE GÊNERO
99
Iremos agora analisar a atuação parlamentar na perspectiva de
gênero, buscando evidenciar se as deputadas, por serem mulheres, atuam mais que
os homens nas ações voltadas para a defesa dos direitos femininos.
Segundo Guzmán (2000) as políticas públicas de governo incluem
uma perspectiva de gênero quando existe uma vontade explícita, de parte das
autoridades, de promover uma redistribuição entre os gêneros em termos de
destinação de recursos, direitos civis e de participação,posições de poder e
autoridade e valorização do trabalho de homens e mulheres..
De acordo com as entrevistadas, as mulheres atuam com uma
perspectiva coletiva, com uma visão mais holística voltada para as questões sociais
que emergem cada vez mais na sociedade brasileira. Foi enfatizado pelas
deputadas que a grande maioria das mulheres trabalha com a razão e com a
emoção e preocupa-se mais com questões voltadas para a família, fortalecendo as
políticas públicas voltadas para defesa dos direitos femininos.
A propósito:
As mulheres fazem muita diferença na política. As pesquisas em todo
o mundo apontam para o fato de que elas tratam de defender as
questões que fazem parte de seu universo de interesses, como as
políticas sociais ligadas à saúde da mulher e da criança, a luta pela
implantação de escolas e creches, discriminação e assédio sexual,
dependência econômica. É largamente sabido que os temas
defendidos pelas mulheres na política são eminentemente os de
natureza social, o que, no Brasil, significa modernidade política,
devido ao seu caráter redistributivo, alvo muito longe ainda de ser
alcançado pelas práticas políticas atuais (B).
Hoje, no Brasil, se existe 76 casas abrigos, 85 centros de referência,
14 defensorias públicas, 392 delegacias de mulheres é porque as
mulheres estavam lá lutando por esses direitos. Nós conseguimos
tirar do Código Penal o capítulo onde o estupro era considerado um
crime contra os costumes e não contra a pessoa humana [...]
conseguimos mudar para crime contra a pessoa humana (C).
Além disso, destacaram que:
100
as mulheres trabalham na política pensando nas próximas gerações,
preocupadas com a construção de um mundo mais justo e igualitário,
enquanto os homens, não generalizando, trabalham pensando no
que vai dar ou não voto, pensando na sua reeleição. (C)
A participação feminina é fundamental e por isso vejo com muita
preocupação essa dificuldade de termos mulheres na política. Em 60
anos, de 1947 a 2007 passaram por esta casa apenas15 mulheres
enquanto já passaram mais de 800 homens. Isso me preocupa, pois
existem particularidades de gênero que são muito claras na
compreensão e no modo das mulheres verem o mundo (E).
Todas as deputadas afirmaram que a mulher faz diferença na
política. Deixam claro que a presença feminina é fundamental para o equilíbrio social
e para o avanço na igualdade de gênero, assim dizer que, somente com a
participação efetiva nesses espaços irão atingir a mudança e a construção de um
mundo melhor para todos, uma vez que as mulheres entram na política para colocar
em pauta debates que proporcionam ampliação de políticas públicas, ações efetivas
na defesa dos direitos femininos.
Diante das respostas acima, indagamos: O fato de termos
representantes femininas no parlamento realmente contribui para o avanço na
igualdade de gênero e para a ampliação das políticas públicas voltadas para os
direitos das mulheres?
Como resposta, podemos afirmar que as mulheres quando
investidas de um cargo político propõem mais ações voltadas para os direitos
femininos do que os homens, mas ainda de forma tímida e pequena. O quadro
abaixo mostra que de 1999 a 2007, foram aprovados no legislativo paranaense
apenas oito projetos de leis voltados para as questões das mulheres.
Nesta perspectiva, muitas vezes, a presença feminina não garante a
ampliação das políticas públicas voltadas para a defesa dos direitos das mulheres,
pois, inseridas no sistema político, a atuação torna-se complexa ao relacionar-se
com interesses partidários. “As candidatas e possíveis eleitas chegam às casas
legislativas, via partido e com uma quase ausência de preocupação com a agenda
feminista [...] e o campo da política institucional é problemático pela dificuldade de
101
candidaturas de sucesso que se articulem em torno das questões referentes aos
direitos das mulheres (PINTO, 1994, p. 204).
Segue, abaixo, o quadro comparativo de projetos apresentados por
algumas deputadas e deputados paranaenses, no período de 1999 a 2007:
Detalhamento dos Projetos de Lei
20
MULHERES
Áreas temáticas
Número de projetos
Criança e adolescente
3
Divulgação dos crimes e das penas relativas á
prostituição e a exploração sexual da criança e
adolescente
Institui o dia 18/05 como dia estadual do combate ao
abuso sexual e a exploração de crianças e
adolescente
Obriga os hotéis a manterem fichas de identificação de
crianças que se hospedem nos estabelecimentos
Saúde
16
Realização de exames de emissões otoacusticas
evocadas nos estabelecimentos de hospitais públicos
e particulares do Estado
Realização do exame ultra- acreen nos hospitais e
maternidades da rede pública do estado
Altera o art.1 da lei 14.588 que dispõe sobre a
obrigatoriedade de realização do exame de
otoacusticas
Dispõe sobre o fornecimento de alimentos especiais
para os portadores de doença celíaca nas escolas
públicas
Cria o programa estadual saúde vocal preventiva para
professores da rede estadual de educação
Autoriza a construção do Hospital Regional do
Sudoeste,no município de Francisco Beltrão
Autoriza o poder executivo a tornar obrigatório a
realização do teste de acuidade de visão e auditiva na
rede pública de ensino.
Dispõe sobre atendimento prioritário aos portadores de
deficiência
Define diretrizes para uma política de prevenção e
atenção integral a saúde da pessoa portadora de
diabetes
20
No quadro abaixo foram detalhados somente os projetos de lei aprovados pela plenária legislativa.
102
Institui no Estado do Paraná o programa de
rastreamento do câncer de colo retal
Dispõe sobre a criação do programa estadual saúde
vocal preventiva para professores(as) da rede pública
estadual de educação
Dispõe sobre o programa apoio às pessoas com
psoríase(doença da pele)
Institui o dia de luta contra o câncer de mama no
Estado do Paraná
Institui no Estado do Paraná o dia 06 de dezembro
como o dia de luta contra o câncer de prostata
Disciplina a utilização de eletrotermofoterapia em
clínicas, consultórios e estabelecimentos de estética.
Autoriza a construção do Hospital Regional do
Sudoeste no município de Francisco Beltrão
Educação
5
Autoriza o poder executivo a conceder benefícios aos
professores do ensino especial- APAES.
Dispõe sobre a exigibilidade da carteira de identidade
para a realização de matrícula da rede estadual de
ensino
Prioriza a pessoa portadora de deficiência vaga em
escola pública mais próxima de sua casa
Institui o programa compromisso social de prestação
de serviços à comunidade por alunos dos cursos de
graduação das universidades estaduais públicas
Institui a política de prevenção de acidentes e violência
nas escolas da rede pública de ensino médio - CIPAS.
Meio ambiente
13
Altera o art.10 da lei 12.493 de 22/01/99, que dispõe
sobre a destinação dos resíduos sólidos no PR,
visando o controle da poluição,da contaminação e a
minimização dos seus impactos ambientais.
Autoriza o gov do PR, IAP e Cohapar fazer
cooperação e utilizar madeiras ilegais provenientes
das apreensões e das florestas públicas
remanescentes da Paraná ambiental, para a
construção de casas populares
Institui o programa estadual de recuperação e
proteção de minas naturais de água no âmbito do
Estado do Paraná
Cria no Estado do Paraná o programa de conservação
e uso racional da água nas edificações públicas
estaduais.
Dispõe sobre a urbanização de micro bacias nos
perímetros urbanos do Estado do Paraná
Dispõe sobre o "dia estadual da conscientização e
prevenção de intoxicações por agrotóxicos"
Cria no âmbito do Estado do Paraná o programa de
incentivo a implantação de aquecedores solares de
água.
Dispõe sobre o uso e consumo de madeira
reflorestada em obras públicas do Estado do Paraná
103
reflorestada em obras públicas do Estado do Paraná
Determina o povoamento com a distribuição de
alevinos nos rios que cortam o território paranaense no
período de proibição de pesca
Cria no calendário oficial do Estado do Paraná o dia da
àgua, a ser comemorado no dia 22 de março
Dispõe sobre o Programa de incentivo à produção de
biodisel no Estado do Paraná
Dispõe sobre a criação do serviço voluntário ambiental
no âmbito do Paraná
Dispõe sobre a comercialização de garrafões
reutilizáveis
Transporte Coletivo
4
Dispõe sobre a utilização de sistema de catacras e
máquinas de emissão de bilhetes nos veículos de
transporte coletivo de passagem
Concede passe livre as pessoas portadoras de
deficiência de transporte coletivo intermunicipal no
Estado do Paraná
Altera a redação da lei 11.911/97 sobre transporte
gratuito a pessoas portadoras de deficiência
Determina as empresas concessionárias do transporte
coletivo intermunicipal a obrigatoriedade da instalação
de sanitários nos veículos utilizados nessa linha.
Direitos da mulher
8
Institui o projeto "casa abrigo" para acolher mulheres
vítima de violência através da SECAF
Autoriza a criação da delegacia da mulher pelo poder
executivo
Estabelece a notificação comp.da violência contra a
mulher atendida em serviços de urgência e
emergência e cria a comissão de monitoramento da
violência contra a mulher
Cria o programa Vida Nova Mulher Mastectomizada"
Dispõe sobre a obrigatoriedade de que os municípios
do Paraná que possuam mais de 20 mil habitantes
seja criado delegacias especializadas no atendimento
às mulheres em situação de violência.
Dispõe sobre a alteração do período das licenças
maternidades a serem concedidas as servidoras
públicas do Estado do Paraná
Cria o programa de combate à violência contra a
mulher
Cria o programa especial de atendimento para fins de
renda e emprego, às mulheres vítimas de violência
conjugal.
Segurança
2
Obriga instalação de câmaras filmadoras nos hospitais
e maternidades do Estado
Dispõe sobre a instalação de bloqueadores de sinais
de radiocomunicações nas penitenciarias do Paraná
104
Trabalho e Previdência
2
Institui o selo empresa incentivadora do primeiro
emprego no Estado
Dispõe sobre a concessão de beneficio ao portador de
necessidade especial, filho de servidor público
Cultura
3
Fica instituído em caráter permanente no calendário
oficial de políticas púbicas de cultura, o programa
Paranização do teatro Guairá.
Fica instituído em caráter permanente no calendário
oficial de políticas públicas de cultura, o programa
fazendo arte da SEC
Cria o projeto cultural para todos - sistema de adoção
de biblioteca e equipamentos culturais por empresas
com responsabilidade social
Declaração de Utilidade Pública
123
Título de cidadão honorário
20
Outros
14
HOMENS
21
Áreas temáticas
Número de projetos
Saúde
3
Regulamenta os recursos mínimos para o
financiamento da saúde pública
É vedado ao PR conceder incent. fiscais ou créditos
para empresas que causem danos a saúde e seg. do
trabalhador
Obriga fixar avisos,alertando as pessoas portadoras
de marcapassos cardíacos (detectores de metais em
bancos
Educação
2
Autoriza a criação da disciplina de informática para a
rede pública
Autoriza a inclusão do sistema de educação em tempo
integral do ensino fundamental da rede pública
Licitação
1
Exige a utilização do pregão, de preferência na forma
eletrônica, para entes públicos e privados, nas
contratações de bens e serviços comuns.
21
Das 50 cadeiras ocupadas por homens na ALEP foram analisados os projetos de lei de cinco
deputados com maior familiaridade na região da pesquisadora.
105
Segurança
1
Cria o sistema de bônus pecuniários e de pontuação
para merecimento aos policiais civil e militar em caso
de apreensão de armas
Incentivos Fiscais
1
Dispõe sobre incentivos fiscais quando da implantação
ou expansão das grandes e micro-empresas.
Desenvolvimento Urbano
6
Altera a redação do art.1º da lei 9368 de 17/09/90
(Cria o município de quatro pontes)
Altera a redação do art.1º da lei 9370 de 13/09/90
(Cria o município de Mercedes)
Cria a circunscrição regional de serviços do Detran no
município de Santa Helena.
Cria a circunscrição regional de serviços do Detran, no
município de Céu Azul, com abrangência no município
de Vera Cruz do Oeste
Cria a circunscrição regional de serviços do Detran no
município de Cafelandia.
Autoriza a construção de uma mini usina
elétrica,localizada no Rio São Francisco Falso,no
município de Céu Azul
Econômico
4
Dispõe sobre a não cobrança de taxa de
estacionamento em shopping centers. Lei 15.133 de
06/06/06
Dispõe sobre crédito agrícola, critérios de pagamentos
e dá outras providências
Autoriza o poder executivo a celebrar convênios com
Sicred e Sicob
Revoga o art.4º da lei estadual 13.213 de 29/06/2001
(precatório)
Direito do Consumidor
1
As instituições bancárias e os supermercados deverão
atender os consumidores em tempo razoável evitando
106
longas filas
Declaração de Utilidade Pública
127
Título de cidadão honorário
24
Doação de Imóvel
2
Outros
18
Notamos, por meio do quadro comparativo, que ambos os sexos
ainda estão presos numa prática clientelista e assistencialista. Essa assertiva é
concluída ao analisarmos que, de 25 questões levantadas nos projetos, à maioria
delas são: declaração de utilidade pública e concessão de títulos de cidadão
honorário.
Os projetos de maior freqüência proposto pelas mulheres foram:
declaração de utilidade pública, o qual aparece em primeiro lugar no quadro das
mulheres, com 123 projetos; em segundo lugar, título de cidadão honorário, com 20
projetos; em terceiro lugar, saúde, com 16 projetos; em quarto lugar, meio ambiente,
com 13 projetos; em quinto lugar, direitos da mulher, com 8 projetos; em sexto lugar,
educação, com 5 projetos; em sétimo lugar, transporte coletivo, com 4 projetos; em
oitavo lugar, cultura, com 3 projetos e, em nono lugar, segurança pública,trabalho e
previdência, com 2 projetos de lei cada.
Os projetos dos deputados de maior freqüência foram: declaração
de utilidade pública, em primeiro lugar com 127 projetos; em segundo, título de
cidadão honorário, com 24 projetos; em terceiro, desenvolvimento urbano, com 6
projetos; em quarto desenvolvimento econômico, com 4 projetos; em quinto, saúde,
com 3 projetos; em sexto, doação de imóvel e educação, com 2 projetos cada e, em
sétimo lugar, aparecem licitação, incentivo fiscal,segurança e direito do consumidor,
com 1 projeto cada.
Em relação à igualdade de gênero e direitos das mulheres, nenhum
projeto foi apontado, porém, quando comentamos da falta de projetos na área dos
direitos femininos não estamos menosprezando os projetos apontados, pelo
contrário, desenvolvimento urbano, segurança e outros também são importantes
para a sociedade. O problema não está na direção dos projetos e sim na
107
manutenção do preconceito e da discriminação entre os sexos, além da falta de
preocupação com questões voltadas para os grupos excluídos e vitimizados.
Dessa forma, se observamos as áreas temáticas desenvolvidas
pelas deputadas, notamos que elas recaem, em maior quantidade, sobre questões
de cunho social e familiar como a saúde da mulher e da criança, a educação,
violência, etc. Essas temáticas são tidas como áreas pertinentes ao universo
feminino, as quais são colocados com maior ênfase na arena política, graças à
presença feminina nesses espaços.
Apesar de notarmos que as áreas temáticas propostas pelas
parlamentares entrevistadas recaem, em grande quantidade, para questões ditas
femininas, é importante frisarmos que, no caso da saúde, elas preocupam-se com a
saúde masculina também. Além de propor ações contra o câncer de mama, também
fizeram projetos para prevenir o câncer de próstata.
Isto vem ao encontro da afirmação de Avelar (2001) que argumenta
que as mulheres, uma vez inseridas na política, vão participando e redefinindo sua
identidade, vivenciando novas relações sociais, alterando sua visão de mundo e
aprendendo na prática o que é solidariedade do ponto de vista do coletivo.
Uma outra ação de cunho coletivo são os projetos voltados para o
meio ambiente. Questão essa que vem sendo uma preocupação mundial em todos
os canais corporativos de poder
22
, pois o planeta está passando por um momento
drástico em relação à saúde dos rios, das matas e do ar. Assim, desenvolver ações
em prol do meio ambiente, da conscientização ambiental da população é pensar no
futuro das próximas gerações.
Assim, o fato de as mulheres focarem suas ações nas questões
sociais, nos interesses do seu segmento, muitas vezes, está relacionado a sua
história de lutas dentro dos movimentos sociais e pelas situações de discriminação,
preconceito, violência vivenciada dentro da esfera privada. Por exemplo, milhares de
mulheres no Brasil são vítimas da violência doméstica e quando uma delas tem a
22
Segundo Avelar (2001, p.47) canais corporativos de poder, são as formas de envolvimento dos
indivíduos em organizações voluntárias.
108
oportunidade de ascender no poder, levam consigo a preocupação de garantir,
através de ações e projetos, a minimização desta problemática.
É, pois, natural que, “ao conseguirem alçarem-se à elite política, as
mulheres trabalhem para que temas antes não considerados, sejam incluídos na
pauta política”, expandindo, deste modo, o campo dos direitos femininos. (AVELAR,
2001, p.147).
Além disso, a referida autora comenta que, “a presença da mulher
na política vem de sua participação nos movimentos urbanos, sindicais e
movimentos de mulheres, os quais, via de regra, trazem à tona novas demandas,
antes não contempladas pelas mobilizações que as precederam.”
Isto é fato, pois a maioria das deputadas entrevistadas relata que a
sua entrada na política formal foi impulsionada pela participação anterior em
movimentos socais, feministas, pastorais e trabalhos voluntários.
A atuação das mulheres na vida pública tem trazido significativa
contribuição para a sociedade, pois no conjunto das vivências percebidas por elas
ao longo da história de exclusões e submissões, acabam influenciando a formulação
e implementação de políticas mais justas, como a luta pelo acesso à saúde,
educação e o combate à discriminação e à violência.
Por outro lado, percebemos por meio da análise que apesar das
ações em prol dos direitos das mulheres, as entrevistadas precisam romper com a
prática clientelista e assistencialista que ainda faz parte do cotidiano de muitas
delas. Este fato é comprovado, ao analisarmos quantitativamente que os projetos
que mais aparecem na bancada feminina nesses sete anos (1999 à 2007) foram os
de declaração de utilidade pública, titulo de cidadão honorário e doação de imóvel.
O clientelismo dentro da política brasileira está atrelado à cultura
política nacional, que tem sido descrita por estudos mais recentes como “um
conjunto rígido de padrões político-culturais, dotado de forte capacidade de
continuidade, dos traços herdados de valores autoritários, hierárquicos e
plebiscitários [...]” (MOISÉS, 1995 apud PINTO, 2007).
109
Neste contexto, o sistema político é organizado de forma tradicional,
muitas vezes comandado por lideranças autoritárias e individualistas os quais não
dão abertura a novos segmentos da sociedade a fim de manter o poder centralizado
na mão dos dominantes. Tal fato, portanto, fortalece políticas personalistas,
assistencialista e individualistas, reforçando o caráter clientelista das ações políticas.
110
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A história de luta dos movimentos feministas pelos direitos políticos
permitiu uma evolução histórica no exercício da cidadania das mulheres.
Nos últimos anos, a mulher vem exercendo sua cidadania por meio
do voto e da participação em espaços decisórios de poder. Porém, apesar das
conquistas no campo político, o número de mulheres nos espaços formais de poder
ainda é muito baixo, se comparado à bancada masculina.
As mulheres brasileiras, embora constituam a maioria do eleitorado,
ocupam apenas 46 lugares no Legislativo Federal contra 513 homens, o que
significa 8,22% de representação feminina.
No decorrer deste estudo, verificamos um conjunto de fatores que
limitam a atuação da mulher na política, tais como o conservadorismo, o
autoritarismo, a cultura machista e os valores patriarcais ainda presentes na
sociedade contemporânea.
Rodrigues (2006) afirma que a reduzida representação política das
mulheres é explicada por vários motivos, a saber: a ainda prevalente cultura
patriarcal, as características do processo eleitoral e da representação política no
país, as desigualdades competitivas de gênero e a lógica da estrutura e
funcionamento dos partidos políticos.
Esses fatores interferem negativamente na ruptura com estereótipos
machistas que recaem sobre o sexo feminino, bem como na ampliação da presença
das mulheres nos cargos eletivos da política formal.
Durante muitos anos, a política eletiva foi eminentemente ocupada
por homens e, após 76 anos da conquista do direito do voto feminino, os homens
ainda são maioria em todos os níveis do legislativo.
Nesta perspectiva, Tabak (2002, p.101) argumenta que a história de
exclusões do sexo feminino alimentou uma ideologia machista que induziu até
111
mesmo as mulheres a acreditarem que o espaço político é um campo destinado
apenas aos homens.
A questão da responsabilidade exclusiva da mulher com a família
vem sendo discutida até os dias de hoje como fator que dificulta a maior participação
feminina nos espaços decisórios de poder.
Neste sentido, procuramos analisar como se dá a atuação das
deputadas paranaenses dentro do Legislativo Estadual, considerando que elas
representam apenas 7% do parlamento, ou seja, atuam num espaço dominado por
valores e conceitos masculinos.
Das cinco entrevistadas, todas são mulheres que, antes de
exerceram o cargo no legislativo paranaense, já tiveram outras experiências
públicas, o que viabiliza o recrutamento no legislativo paranaense, ou seja, permite
maior acesso dentro da política e maior contato com a população eletiva.
Uma deputada exerceu o cargo de prefeita municipal, duas são
advindas de família de militantes políticos e trazem consigo uma história de lutas e
participação dentro de movimentos feministas ou organização de mulheres, além da
participação em cargos públicos como Secretária de Estado.
Outra é advinda da luta em movimentos sociais em prol das
mulheres agricultoras, e uma apenas não teve experiência anterior no campo da
política formal, mas atuava no setor público hospitalar, o que demonstra que as
entrevistadas são mulheres que, mesmo antes da atuação parlamentar, já
expandiram seus horizontes para além da esfera doméstica.
Com relação à atuação parlamentar, ficou claro, por meio de nossa
análise, que a participação das mulheres no legislativo paranaense vem ao encontro
das teorias que afirmam a existência da cultura patriarcal, do preconceito, do
autoritarismo e conservadorismo presente nos espaços da política formal.
Dessa forma, as deputadas entrevistadas demonstram uma
preocupação unânime com a ampliação da presença feminina nos espaços
decisórios de poder, por considerarem que, para haver a justiça, a equidade e a
igualdade de gênero, é necessária à visão feminina nas propostas legislativas.
112
Quando elas falam de visão feminina, remetem ao sexo as
características da fragilidade, sensibilidade, afetividade, aquela com o olhar de mãe
e esposa. Características estas que, por muitos anos, foi justificativa para a negação
do direito e emancipação política das mulheres.
Diante dessas características induzidas à imagem feminina,
notamos que algumas das entrevistadas, mesmo exercendo atividades fora do lar,
ainda mantêm uma postura sob os conceitos conservadores, cujas
responsabilidades domésticas são essenciais na sua vida. Nas respostas de
algumas das deputadas, este conservadorismo ficou claro ao mencionarem que
“sem o consentimento do marido e dos filhos não haveria a possibilidade da
participação no parlamento” ou ainda “existem afazeres domésticos que não abrimos
mão”.
Outras, porém, demonstram uma postura na contramão da ideologia
masculina, ou seja, traduzem uma prática e uma educação familiar sob a divisão das
tarefas domésticas, em que homens e mulheres exercem as mesmas funções. Essa
postura fica evidente na fala “meus filhos lavam, passam e cozinham.”
Desse modo, romper com ideologia imposta pela sociedade: mulher
está para o privado e homem para o público, não significa um rompimento com a
família. A mulher pode sim ser mãe, esposa e política.
Outro eixo em destaque na análise foi a atuação parlamentar. As
deputadas entrevistadas vêm atuando de maneira a inserir-se em cargos de maior
representatividade e expressão na Assembléia Legislativa. Atualmente, fazem parte
da mesa executiva, das secretarias e das comissões legislativas, o que fortalece a
visibilidade política da mulher dentro da ALEP.
Em contrapartida, apesar da atuação e participação das deputadas
em cargos de maior representatividade, as parlamentares ainda estão “presas” ao
sistema personalista que caracteriza a política brasileira. Isso foi observado através
do quadro dos projetos de leis proposto pela bancada feminina.
Numa rápida abordagem, verificamos que dos 211 projetos de lei
proposto pela bancada feminina na ALEP, 123 são declarações de utilidade pública
113
e 20 concessões de título honorário. Projetos relacionados à defesa dos direitos da
mulher aparecem em 5º lugar, com apenas 8 projetos de lei.
Importante ressaltarmos que algumas áreas temáticas com caráter
social, como a saúde, contemplam questões que favorecem o direito das mulheres
como projetos de prevenção ao câncer de mama. Mas, mesmo que somássemos os
projetos sociais (saúde, educação, criança e adolescente, etc.), não ultrapassariam
os 123 projetos de declaração de utilidade pública.
Por outro lado, ainda que pequena a quantidade dos projetos
relacionados ao direito da mulher, as deputadas vêm propondo mais ações nesta
área do que os homens. Nos projetos de lei elaborados pelos cinco deputados que
definimos para a observação das áreas temáticas, não aparece nenhuma questão
voltada para os direitos femininos.
Dessa forma, verifica-se a importância da participação feminina
nesses espaços, pois, sem elas no poder, o tema mulher não teria ganhado
visibilidade no cenário político.
Levantar questões pertinentes ao universo feminino é, na grande
maioria, iniciativa das mulheres, pois elas, por vivenciarem situações que oprimem o
seu gênero, acabam envolvendo-se mais com a luta pela igualdade e direitos
femininos. É claro que existem homens preocupados com a igualdade, mas a
maioria deles tende propor ações voltadas para o aspecto econômico, enquanto a
mulher tende a propor mais ações voltadas para o social.
De acordo com Avelar (2001, p. 134), só as mulheres podem levar à
frente políticas sociais ligadas à saúde da mulher e da criança e lançar-se com tanta
decisão para a defesa de assuntos como violência doméstica, controle reprodutivo,
discriminação e assédio sexual, prostituição infantil, dependência econômica. Por
isso, para alcançarmos a equidade e uma política mais justa e democrática, é
fundamental ampliarmos a participação e a consciência feminista das mulheres na
elite política.
Sendo assim, quando falamos da importância da mulher na vida
política, não podemos deixar de colocar que os homens também são importantes
114
nessa arena. A questão é que homens ou mulheres são sujeitos fundamentais no
movimento da ação política, mas devemos nos ater que, tanto um, quanto o outro,
devem ter uma consciência feminista para construir uma política em que as
diferenças sexuais não sejam vistas com desigualdade ou incapacidade.
Nesta perspectiva, Avelar (2001, p. 24) afirma que o feminismo,
como uma ideologia política, é elemento crucial na construção de identidades
políticas femininas, porque é um conjunto estruturado de idéias que guiam a ação
política.
Outra questão importante mencionado pelas entrevistadas foi a
dificuldade em relacionar vida pública e privada. A política requer muito tempo e a
família também. Este dilema contribui para a menor participação das mulheres nas
atividades parlamentares.
Avelar (2001), comenta que o status social mais baixo das mulheres
é fator que também as exclui dos espaços decisórios de poder, ou seja, o alto grau
de desigualdade na divisão sexual do trabalho social na sociedade brasileira,
combinado ao peso da dupla jornada, possui impacto direto na desmobilização das
mulheres comuns em relação à política.
De acordo com Rangel (2008), com o acúmulo dos trabalhos
remunerado e não remunerado, elas não dispõem de tempo ou de incentivo para se
envolver em atividades sindicais, partidárias ou comunitárias. Em 96% dos
domicílios em que residem mulheres, uma mulher é a principal responsável pelos
afazeres domésticos. Somente essa informação já nos auxilia a entender, ao menos
em parte, porque as mulheres permanecem fora da política partidária.
Ademais, de acordo com Rodrigues (2006), as características
inerentes à política partidária favorecem um aprofundamento das desigualdades no
processo, considerando-se que a política tende a ser a atividade exclusiva (ou
principal). Porém, no caso das mulheres, essa prática é normalmente associada a
outras atividades, profissionais e domésticas, o que acaba por limitar a participação
política feminina. Além disso, o sistema político partidário ainda está investido de
regras que excluem as mulheres de suas direções.
115
Vale ressaltarmos que, somente por meio dos partidos, os cidadãos
podem candidatar-se ao exercício de cargos públicos eletivos (Legislativo e
Executivo). Dessa forma, a militância partidária constitui-se como o meio exclusivo
de acesso à política representativa junto ao Estado.
Sendo assim, entendemos que os partidos deveriam constituir-se em
espaços que privilegiassem a formação política e a discussão de projetos, visando
transformações sociais e a igualdade entre todos os cidadãos. Infelizmente, a
formação política, o acesso às discussões de maior relevância e os critérios de
escolha para indicação de um candidato ficam restritos a apenas uma parcela dos
filiados.
Outro fator excludente é que, muitas vezes, os partidos políticos
limitam a candidatura de mulheres por estabelecerem, como requisito de acesso a
uma campanha bem sucedida, as condições econômicas do candidato. Este fato foi
afirmado pelas entrevistadas, ao relataram ser o aspecto financeiro a maior
dificuldade encontrada numa campanha.
Dessa forma, fica evidente a necessidade de continuar lutando não
só pela ampliação dos espaços de participação das mulheres, mas também lutar
para que haja uma reforma política com abertura de espaço para a inserção na elite
política de todos os segmentos socialmente excluídos, efetivando, assim, uma
política mais justa e democrática.
Acreditamos que a mulher, inserida na política, é peça fundamental
para lutar, questionar e criticar o sistema político vigente. Por outro lado, não basta
ampliarmos a participação feminina para garantirmos a equidade, é necessário,
antes, politizar os canais de acesso à política formal, por meio de uma educação
sobre conceitos adversos ao conservadorismo, a fim de acreditarem na possibilidade
de romper com os paradigmas preconceituosos e excludentes que fazem parte da
vida política do Brasil.
Parafraseando Prazeres (2007), a visão conservadora e machista
que ainda permeia a sociedade contemporânea reproduz estereótipos, discrimina,
sub-representa e reproduz preconceitos e visões distorcidas da realidade, o que,
obviamente, responde aos interesses de uma minoria da população.
116
Sendo assim, faz-se necessária maior participação das mulheres, no
sentido de contribuir para a construção de uma Reforma Política que discuta a
democracia, incentive uma educação menos sexista, uma campanha mais justa,
partidos políticos menos conservadores e que ampliem as medidas de ação
afirmativa.
No Brasil, sabemos que a Lei de Cotas foi implantada para reverter o
quadro de sub-representação feminina, mas ainda não está sendo suficiente para
romper com o conservadorismo, com a cultura machista e outros fatores que
inviabilizam a maior presença feminina nos espaços decisórios de poder.
O projeto de emancipação política e igualdade de direitos, portanto,
tem que ser mediado à luz de um projeto societário que ultrapasse os limites
institucionais e contribua para a efetivação da cidadania feminina e da igualdade de
gênero enquanto sujeito social, coletivo e político.
117
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123
ANEXOS
124
ANEXO A
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Eu, __________________________________________ concordo em participar da
pesquisa sobre - A Atuação Parlamentar da Mulher no Estado do Paraná e a
Perspectiva de Gênero através do fornecimento de dados por meio de entrevistas.
Esclarecemos que esta pesquisa tem como objetivo desenvolver uma análise crítica
sobre a participação e representação feminina na Assembléia Legislativa do Estado
do Paraná.
A sua identidade será preservada e você poderá desistir dessa contribuição
comunicando a pesquisadora. Poderá ainda ter acesso a qualquer informação sobre
a pesquisa através do telefone (43) 3525-3372, com Lívia Ramos Pinto, mestranda
em Serviço Social e Políticas Sociais.
------------------------------------------------------
Assinatura da entrevistada.
Mestranda: Lívia Ramos Pinto
Departamento de Serviço Social - CESA
Universidade Estadual de Londrina - UEL
Setembro/2008.
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