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construções fílmicas convida o sujeito ao fantástico, libertando-o para o
encontro com suas sombras e com seus duplos, dotados do caráter afetivo,
ilógico e psíquico, respondendo ao que está latente no seu espectador.
Bettelheim (2002) complementa, afirmando que nos contos de fadas, os
processos internos externalizam-se e permitem que sejam compreendidos
enquanto representados pelas figuras da história. Assim, os diferentes
espectros e sombras do homem estão sempre em cena, sendo constantemente
despertos pelos estímulos que, juntamente com a imagem, demovem do sujeito
emoções, prazer ou devaneio. Enquanto a imagem comporta a qualidade
subjetiva e mágica do duplo, este, por sua vez, detém a qualidade alienada e
afetiva da imagem. Como motor da narrativa fílmica, a imagem potencializa
suas representações, traduz a realidade da vida, imprimindo truques, que
permitem metamorfoses ilógicas e amplificam as potencialidades do duplo, ao
mesmo tempo em que transmutam elementos como tempo e espaço.
As metamorfoses permaneceram vivas e ativas nas histórias
de fadas e para crianças, nos contos e narrativas fantásticas da
infância e, por outro lado, na prestidigitação (...) que é precisamente,
a arte mágica não apenas das transferências do visível para o
invisível, e reciprocamente (aparições, desaparições), mas também,
e sobretudo, das transmutações e transformações (MORIN, p.74,
1997).
Apesar de freqüentemente identificadas por uma mesma forma, pela
narrativa maravilhosa, os contos de fadas e os contos maravilhosos dão
expressão a problemáticas diferentes. Enquanto os “contos de fadas exploram
uma problemática social, a busca da realização interior pelo amor, os contos
maravilhosos interessam-se pela problemática social, a busca de realização da
personagem pela fortuna material” (COELHO, p.109, 2000). Revelam-se
idênticas quanto ao modelo narrativo de Propp. Os contos de fadas, com ou
sem fadas têm seus argumentos desenvolvidos
dentro da magia feérica (reis, rainhas, príncipes, princesas, fadas,
gênios, bruxas, gigantes, anões, objetos mágicos, metamorfoses,
tempo e espaço fora da realidade conhecida etc.) e tem como eixo
gerador uma problemática existencial. Ou melhor, têm como núcleo
problemático a realização essencial do herói ou da heroína,
realização que via de regra, está visceralmente ligada à união
homem-mulher (COELHO, p.13,1987).