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CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA
AS INTERFACES DA EDUCAÇÃO FÍSICA E ARTÍSTICA
COM A PSICOMOTRICIDADE,
O ESTUDO DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS E
O DESENVOLVIMENTO DAS COMPETÊNCIAS REQUERIDAS:
CONTRIBUIÇÕES À EDUCAÇÃO INCLUSIVA.
JAQUELINE COSTA CASTILHO MOREIRA
Ribeirão Preto
2003
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CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA
AS INTERFACES DA EDUCAÇÃO FÍSICA E ARTÍSTICA
COM A PSICOMOTRICIDADE,
O ESTUDO DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS E
O DESENVOLVIMENTO DAS COMPETÊNCIAS REQUERIDAS:
CONTRIBUIÇÕES À EDUCAÇÃO INCLUSIVA.
Monografia apresentada ao Centro Universitário Moura Lacerda,
como exigência parcial para obtenção do título de Licenciatura Plena
em Educação Física, sob a orientação da Profª. Giane Fregolente.
Ribeirão Preto
2003
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CENTRO UNIVERSITÁRIO MOURA LACERDA
AS INTERFACES DA EDUCAÇÃO FÍSICA E ARTÍSTICA
COM A PSICOMOTRICIDADE,
O ESTUDO DAS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS E
O DESENVOLVIMENTO DAS COMPETÊNCIAS REQUERIDAS:
CONTRIBUIÇÕES À EDUCAÇÃO INCLUSIVA.
COMISSÃO JULGADORA
________________________
Giane Fregolente
Orientadora
________________________
Isabelle Surrian
2
o
. Examinador
_________________________
Pedro Paes
3
o
. Examinador
Ribeirão Preto, 12 de dezembro de 2003.
5
DEDICATÓRIA
Ofereço este trabalho aos
que sonham e fazem de sua prática um
futuro melhor para todos.
6
AGRADECIMENTOS
A Deus;
Aos meus pais, falecidos, por me
permitirem estudar;
Ao meu marido e minha filha, Octávio e
Marina Terreri, pela quantidade de horas
que deixamos de passar juntos, pela
paciência e compreensão;
À Giane Fregolente, por me orientar;
À Isabelle Surrian, por acreditar ser
possível o projeto "Interfaces" e me ajudar
no início deste estudo;
Ao Walter dos Santos, por colaborar com a
pesquisa de campo;
À Marisol Raille, Sônia Maria Gaia, Dulce
Ananias e todos os alunos da 5
a
. A e B e da
6
a
. A da tarde, do Portal do Alto por
permitirem a implantação do Projeto;
À Profª Amarílis Aparecida Garbelini
Vessi, pela revisão;
Aos amigos que me incentivaram a voltar a
estudar;
Aos colegas, professores do Lacerda e do
Curso Santa Rita;
E a todos os que colaboraram, direta e
indiretamente, sem os quais não seria
possível completá-lo.
7
EPÍGRAFE
"…Imagine all the people
Sharing all the world.
You may say I’m a dreamer
But I’m not the only one
I hope someday you’ll joing us
And the world will be as one."
John Lennon
"El camino se hace al andar."
Antonio Machado
8
RESUMO
O projeto INTERFACES é uma proposta pedagógica acompanhada de metodologia, que faz a
intersecção de conteúdos e contextos da Educação Física e Artística, sem detrimento dos
saberes específicos de cada área e das contextualizações necessárias, utilizando-se da imersão
em vivências motoras e formas expressivas propiciadas pela aprendizagem da história da arte
e das atividades físicas, com o objetivo de resgatar e incluir alunos com necessidades
especiais de aprendizagem básicas. O projeto constou de três etapas. Na primeira, foi
realizada uma revisão bibliográfica dos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais)
específicos de cada disciplina, e das obras de autores como Perrenoud, Gardner, Schmidt e
Wrisberg, entre outros. Na segunda fase, foi realizada uma pesquisa de campo com 240
entrevistados, entre alunos e professores, durante o ano de 2003, com o Ciclo II do Ensino
Fundamental, referente à situação da Educação Física e Artística em Escolas Estaduais de
Ribeirão Preto e região, para, ao final, realizarmos uma proposta pedagógica que fosse capaz
de auxiliar e inspirar o professor de Educação Física e Artística desse ciclo, a desenvolver a
psicomotricidade, as inteligências múltiplas e as competências requeridas neste mundo pós-
moderno, através das interfaces: movimento e arte. Como resultado deste trabalho,
acreditamos na possibilidade de administrar o stress, aperfeiçoar os estímulos motores,
melhorar as vivências sociais e o grau de aderência às disciplinas específicas dos alunos,
principalmente daqueles que têm necessidades especiais. Dessa maneira, acreditamos, com
este trabalho, estar contribuindo com o paradigma da Educação Inclusiva.
9
SUMÁRIO
- Introdução
10
- Capítulo I: As Interfaces entre Educação Física e Artística
1.1. Conteúdos e Especificidades dos Saberes
1.2. Em Função dos Contextos
- Capítulo II: Possibilitando as Interfaces: Os Conceitos de
Psicomotricidade, Inteligências Múltiplas e Competências
17
17
32
43
- Capítulo III: Metodologia Utilizada
3.1. Diagnosticando o contexto das disciplinas no Ensino
Fundamental, em 2003
3.2. Implantação do Projeto Interfaces na Escola Estadual Portal do
Alto - Ribeirão Preto - SP
- Capítulo IV: Considerações Finais
- Bibliografia
- Anexos
- Pesquisa "Diagnosticando o contexto das disciplinas no Ensino
Fundamental, em 2003”
- Exemplo de um teste psicomotor
54
56
60
75
80
88
89
95
10
INTRODUÇÃO
A arte, ao evocar o espírito de inquietação, a necessidade natural e instintiva do
homem de exaurir seu estado emocional, ao retomar exemplos antigos, ao questionar, ao
justificar, recicla-se num moto contínuo.
Observamos estes “movimentos” em Ferraz (1975), que nos remete às citações de um
dos primeiros críticos de arte, o toscano Cennino Cennini, nascido por volta de 1370, ao
comentar que o pintor, além de apresentar técnicas de pintura, apresenta uma visão
retrospectiva da arte, ao mesmo tempo que proclama modernidade; passando por Mallarmé,
que assinalou ser a produção da arte uma tarefa espiritual, linguagem humana trazida das
profundezas do ser com seus rítmos próprios; a Nicolas Poussin, pintor e escultor, que, em sua
obra, “Observações sobre a pintura” cita Horácio, poeta grego, com sua frase Ut pictura
poesis”, concordando com o empréstimo das linguagens da música ou das imagens criadas
pela poesia ou das sensações geradas pelas danças, para expressar, na pintura, formas e cores.
Em muitos momentos, dança, sica e artes plásticas regem-se pelas mesmas leis.
Recorre-se a muitas das palavras usadas na dança ou pintura também na música e vice-versa;
a cor gradua-se em matizes, como o som em acordes e a dança em ritmos e movimentos
plásticos.
Segundo Gardner (1994, p. 98),
Não nenhum problema em encontrar pelo menos ligações superficiais entre aspectos
da música e propriedades de outros sistemas intelectuais. Meu palpite é de que as analogias
provavelmente podem ser encontradas entre quaisquer duas inteligências e que, de fato, um dos
grandes prazeres em qualquer área intelectual se deve a uma exploração do seu relacionamento
com outras esferas de inteligência.
11
Em qualquer uma dessas artes ou dessas inteligências, estamos empregando
movimento. Não importa se, para tanto, controlamos grandes ou pequenos grupos musculares;
o que realmente nos interessa é que, através do movimento, possamos desenvolver
habilidades e capacidades de sincronização perceptivo-motoras, proficiência física,
coordenação geral e outras potencialidades, como as inteligências corporal-cinestésica,
musical, pictória, inter e intrapessoais, linguística, lógico-matemática, espacial, naturalista e
emocional e as competências requeridas no domínio de linguagens, compreensão de
fenômenos, enfrentamento de situações-problemas, construção de argumentação e elaboração
de propostas.
Enquanto concertistas de piano e bailarinos parecem ter algumas capacidades em
comum, por exemplo, a capacidade rítmica, eles são presenteados com outras capacidades únicas
para as suas respectivas formas de arte...O fato de uma pessoa ter um padrão eficiente de
capacidades para realizar um tipo de tarefa não significa que terá um padrão eficaz para executar
uma outra tarefa, a menos que as duas tarefas requeiram essencialmente o mesmo subconjunto de
capacidades subjacentes (SCHMIDT e WRISBERG, 2001, p. 42 e 43).
Portanto, além do grande desafio de encontrar maneiras para auxiliar as pessoas
compensando suas deficiências em suas capacidades, quando estão aprendendo ou
reaprendendo uma habilidade, mediar a experimentação de movimentos dos mais simples aos
mais avançados, o profissional de educação terá em mãos uma importante ferramenta de
inclusão social, porque, ao associarmos experiências físico-motoras a experimentações
artísticas, como dança, música, pintura, teatro e expressão corporal, que envolvem também o
uso de todos os nossos sentidos, estamos em concordância com Piaget (1936), que afirma que
as primeiras experiências de interação com o mundo são sensório-motoras, que a manipulação
concreta das mãos, e abstrata com as idéias são homólogas. Da mesma forma, Bailão, Oliveira
12
e Corbucci (2002, p.01) citam Freire, que assevera que a inteligência corporal precede a
inteligência propriamente dita.
Os mesmos autores, neste artigo (op. cit.), defendem a idéia de que a aula de Educação
Física é o espaço da liberdade, onde a criança realiza atividades próprias de sua idade,
revelando suas habilidades, capacidades, inteligências, competências e potencialidades numa
atmosfera lúdica, recreativa e persuasiva, enquanto a Educação Artística, segundo Calabrese
(2002), está correlacionada à aprendizagem de quaisquer linguagens não verbais e outras
formas de comunicação.
Trabalhar com cada uma destas propostas de forma fluida, ou seja, disfarçada em seu
direcionamento, é também proporcionar a inclusão, pois cada pessoa, com sua capacidade,
habilidade ou, ainda, talento, coopera com o grupo na resolução de novos problemas
propostos pelo mediador, no desenvolvimento de projetos ou na assimilação de informações
novas dentro do processo de aprendizagem ou de performance.
Partindo do princípio de que a eficiência, em todas as habilidades, capacidades,
inteligências e competências, é utópica e irreal, e de que as pessoas trazem consigo diferentes
padrões de capacidades para situações de performance e aprendizado, fica mais simples a
transmissão de conceitos como consideração, respeito e acolhimento, em relação às diferenças
individuais, conseguindo assim estabelecer diálogo, cooperação, desenvolvimento inter e intra
pessoal, sua identidade como sujeito em processo de desenvolvimento, o reconhecimento do
outro e o conceito de alteridade, além de auxiliar o aluno e o grupo a processar e articular
conscientemente suas competências: "Todo aprendizado é a mistura de um eu e de um outro,
que resulta num mestiço, o terceiro instruído” (SERRES apud Aquino,1996, p. 38-39).
Desse modo, é necessário ampliar a discussão aqui proposta, trazendo à tona, alguns
conceitos essenciais para este trabalho, tais como: interface, como parte de um programa que
permite a transmissão de dados para um outro programa e conexões; Educação Física,
como
13
cultura corporal do movimento; Educação Artística, como uma disciplina que prioriza a arte
como área de conhecimento, linguagem e educação, estimulando o pensamento divergente;
psicomotricidade, definida como ensino/aprendizagem de atividades que devem proporcionar
às crianças o domínio de seu próprio corpo e uma desinibição voluntária; múltiplas
inteligências, como um espectro de competências ou ainda como a capacidade de resolver
problemas ou de criar produtos que sejam valorizados dentro de um ou mais cenários culturais
e que cooperam entre si em uma atividade humana complexa; competências, como capacidade
de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiada em conhecimentos, mas
sem limitar-se a eles; inclusão escolar, transitando pelos conceitos de integração baseada na
compreensão da excepcionalidade intelectual não concebida pelos seus déficits ou
impedimentos, mas pelo que tem a ser desenvolvido no aluno e no que ele tem de similar às
outras pessoas, como nos mostra a experiência de Mantoan (2001) com Educação Especial,
seguindo por Rios (2001), que pontua a viabilização da inclusão através de recursos; respeito,
para permitir o desenvolvimento das potencialidades e estimular novas capacidades;
elaboração e desenvolvimento de projetos cooperados de trabalho referendando um bem
coletivo, instalação de comunicação criativa e alegre através do diálogo com as diferenças e
as diversidades; inserção da família e da comunidade numa relação dinâmica e dialógica com
a escola, de co-responsabilidade, de construção de confiança mútua, novas alternativas de
participação, de desenvolvimento, no resgate da cidadania, como nos remete Szimansk
(2000).
Dessa maneira, penso que este projeto poderá colaborar com as pesquisas e
práticas na área, para que se estabeleça a possibilidade de interatividade entre as disciplinas,
como também com relação aos veículos, suportes, instrumentos, ferramentas, movimentos
corporais e quaisquer formas de linguagem; poderá permitir que o aluno identifique suas
próprias habilidades e capacidades, estimulando o funcionamento das suas diferentes
14
competências sem o sentido do competir, abrindo-lhe novas perspectivas dentro do processo
de inclusão social e mediação em vários veis; verificando a importância deste conteúdo e
aplicabilidade como motivador educacional; convergindo e, em outros momentos,
diversificando o seu emprego, possibilitando a todos participação ativa, bem como identificar
indicadores que impedem, limitam ou facilitam a construção da autonomia, independência,
produtividade e integração, utilizando-se dos movimentos, além de desenvolver rotas
alternativas de estabelecimento de competências dentro do aprendizado, da arte e da vida
cidadã.
Na tecitura da minha trajetória, a compreensão do meu tema de pesquisa conserva o
que me impulsionou a fazer minha primeira graduação: Comunicação Social, na Escola
Superior de Propaganda e Marketing de São Paulo, acreditar que haveria alguma forma de
desenvolver uma metodologia composta por materiais didático-pedagógicos menos hostis e
mais sedutores (tais como as propagandas), que estimulassem o interesse, o aprendizado
escolar eficaz e eficiente, e que tivesse, como saldo, a compreensão, a memorização dos
conteúdos a curto e longo prazo, o prazer causado pela ludicidade em conhecer e até mesmo
em aprender sobre o “novo”, além de desenvolver o potencial de capacidades, habilidades e
competências para inserção satisfatória do aluno no meio em que vive.
De 1987 para cá, meu projeto profissional, em função de problemas familiares e várias
mudanças de cidade, foi permeado de caminhos e descaminhos, ordens e desordens,
reorganizações e adaptações, abalos, desafios, provisoriedades e novas aprendizagens. Foi,
então, que voltei a fazer nova graduação, agora de Educação Física. O sonho da criação desse
material, até então guardado, ressurge no ano de 2002, e sob a supervisão de minha atual
orientadora, Profª Giane Fregolente, o trabalho ganhou embasamento didático-pedagógico e
atualização, bem como a visão de educação inclusiva.
15
Porém, ainda me sentia incomodada com questões como: Será que os materiais
escolares e didáticas do Ensino Fundamental continuam hostis como na época em que
estudei? Será que crianças tímidas, com dificuldades motoras, dificuldades de identificação
das lateralidades, orientação espacial e coordenação continuam sendo deixadas de lado?
Como estão sendo abordadas as crianças confinadas (como filhos únicos e as crianças de
apartamento), ou aqueles que têm necessidades especiais básicas de aprendizagem na prática
efetiva de educação inclusiva? O que está sendo realizado em termos de educação motora nas
escolas? A educação motora restringe-se às aulas de Educação Física? Como será nas aulas de
Educação Artística? Em especial, qual o grau de aceitação da Educação sica Escolar pelos
alunos de quarta à oitava série ou Ciclo 2? E com relação à Educação Artística? A inclusão na
perspectiva da motricidade é uma ficção, ou existem escolas públicas que conseguem realizá-
la? No que consiste este sucesso, vontade do professor, disposição das pessoas (alunos,
professores, funcionários administrativos e pais), estrutura conivente e solidária da
comunidade e escola, em apoio aos envolvidos com a inclusão, existência de equipamentos,
materiais, capacitação? Será que esta é uma inquietação apenas pessoal?
Por tudo isso, acredito ser este estudo uma retrospectiva nas minhas próprias angústias
existenciais, a revelação do meu fascínio pelo estudo das inteligências e do know-how para o
desenvolvimento das competências, aliados com o prazer de ser o mediador do aprendizado
do novo por uma outra pessoa e, por fim, a necessidade interior de estabelecer algum ponto de
tangência entre minhas duas formações acadêmicas, concretizado nessa inusitada comunhão
entre diferentes. E, talvez o desafio maior, transformar este esforço em utilidade ou, no
mínimo, inspiração para outros educadores, para que sua vida e seus aprendizados não
percorram caminhos tão árduos e hostis, que os façam desistir.
16
Explicitadas as reflexões acima, esta pesquisa objetiva referendar e embasar o tema
proposto, criar uma proposta pedagógica, composta de plano de unidade com atividades
práticas aplicadas e um material paradidático, composto de cd-room multimídia e apostila do
professor, que seja capaz de auxiliar e inspirar o professor de Educação Física e Artística do
Ensino Fundamental, Ciclo II, a desenvolver a motricidade, as inteligências múltiplas e as
competências requeridas, através das interfaces: movimento e arte.
17
CAPÍTULO I
AS INTERFACES ENTRE A EDUCAÇÃO FÍSICA E ARTÍSTICA
1.1. CONTEÚDOS E ESPECIFICIDADES DOS SABERES
Ao revisarmos a literatura existente sobre o assunto, obtivemos informações
indispensáveis para discutirmos, compreendermos e intervirmos. Dessa forma,
estender-nos-emos, neste capítulo, apresentando as principais reflexões de diversos autores,
com o intuito de embasarmos nossa pesquisa.
O sistema educativo brasileiro, antes da LDB 9394/96, acompanhava o modelo de
outros países, a política econômica do Estado e sua ideologia, que norteava o conceito de
educação como um instrumento de preparo para o mercado de trabalho, com duas finalidades
específicas: selecionar os melhores e capacitar profissionalmente (objetivos propedêuticos).
A partir de um diagnóstico mundial sobre educação, realizado em Jomtien, Tailândia,
em 1990, convocado pela Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura
(UNESCO), pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), pelo Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUDE) e Banco Mundial, os dados apresentados
na Conferência indicavam que aconteceram mudanças radicais, como novas tecnologias, a
globalização econômica, mundialização social e planetarização política e institucional
(RIOS, 2001:41), gerando novos serviços e novos conhecimentos, que por fim alteravam os
paradigmas educacionais. No caso do Brasil, foram apresentados na Conferência, além das
altas percentagens de evasão e repetência, baixos índices de rendimento escolar referentes às
avaliações discentes de comunicação e expressão e na resolução de problemas lógicos e
matemáticos, demonstrando a necessidade urgente de criar condições favoráveis à melhoria
18
na qualidade do ensino, para que o país não se torne excluído do processo político-financeiro-
histórico-social mundial.
Surgem, assim, do referencial filosófico e político, as bases legais da LDB 9394/96,
estabelecendo uma identidade educacional brasileira: o conhecimento visando ao trabalho e à
cidadania, tendo como foco principal a educação inclusiva, como nos remete o Artigo 1
o
do
Título I, o Artigo 2
o
do Título II, o Artigo 4
o
do Título III, o Artigo 32 do Título IV- seção III,
referindo-se ao Ensino Fundamental e o Artigo 58 do Capítulo V, sobre A Educação Especial.
A partir desse momento, foi criado o plano decenal e, finalmente, a elaboração dos
Parâmetros Curriculares Nacionais ( PCNs).
Os PCNs são propostas curriculares que
(...) objetivam garantir que, respeitadas as diversidades culturais, regionais, étnicas,
religiosas e políticas que atravessam uma sociedade múltipla, estratificada e complexa, a
educação possa atuar, decisivamente, no processo de construção de cidadania, tendo como meta o
ideal de uma crescente igualdade de direitos entre os cidadãos, baseados nos princípios
democráticos (PCN, 1997).
São fundamentados nos princípios de eqüidade, qualidade e educação permanente. A
intencionalidade dos livros dos PCNs é provocar debates, redefinindo alvos a serem
perseguidos de maneira flexível. A partir do momento em que um dos estados da nação
resolve adotar o PCN, ele se torna concretizado através das DELIBERAÇÕES e
INDICAÇÕES.
Neste estudo, que tem como amostra quatro escolas públicas de Ensino Fundamental
de Ribeirão Preto- SP, torna-se importante destacar que, no caso de São Paulo, o PCN vem
subsidiar a versão curricular do Estado, bem como a dos municípios, enfocando a
interdisciplinaridade, que visa ao conhecimento, a transdisciplinaridade, que visa aos valores
19
humanos, os temas transversais (ética, saúde, meio ambiente, orientação sexual, pluralidade
cultural), a criatividade, o desenvolvimento das competências básicas, o conhecimento com
significado, a contextualização, o incentivo ao raciocínio e a capacidade de aprender, pilares
já vislumbrados por Delors, em 1998, como perfil de pessoas bem sucedidas no novo milênio:
indivíduos que conseguem aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a conviver,
aprender a ser. Ainda se referindo ao Estado, vigoram as seguintes legislações pertinentes:
- a PROGRESSÃO CONTINUADA, instituída pela INDICAÇÃO CEE 8/97 e
DELIBERAÇÃO CEE N.º 9/97, que organiza o Ensino Fundamental em dois ciclos. Os
ciclos são marcos do processo de aprendizagem, e sua organização em quatro anos oportuniza
pessoas diferentes, aprender de maneiras diferentes, em tempos diferentes (Educação para
todos e para cada um, inclusão), permitindo aos alunos caminhar no conhecimento junto ao
seu grupo etário, garantindo acesso, permanência e qualidade, ao realizar avaliações
diagnósticas, parciais, contínuas e cumulativas durante todo o percurso do ciclo, assim como
recuperações contínuas ou paralelas, se necessárias, no final de cada período letivo ;
- a INDICAÇÃO CEE N.º 12/1999, sobre as políticas da Educação Especial,
tal qual o apoio diversificado, a distribuição dos alunos por classe, de forma equilibrada,
planejamento pedagógico bem fundamentado, para garantir o sucesso aos alunos que
apresentem significativas diferenças ou necessidades muito diferenciadas das da maioria das
pessoas em classes especiais;
- a DELIBERAÇÃO CEE N.º 5/2000, sobre as normas a serem obedecidas
quanto às atividades e procedimentos relativos à Educação Especial no sistema de ensino,
como o trabalho suplementar aos alunos de necessidades educacionais inclusos em classes
comuns, e especializados, quando houver necessidades específicas; adequação de prédios e/ou
locomoção com benefício de transporte; mobiliário específico para suprir suas necessidades;
professores habilitados e especializados; avaliação de desempenho contínua e cumulativa com
20
critérios iguais aos demais alunos com utilização de formas alternativas de comunicação e
adaptação dos materiais didáticos, prevalecendo os aspectos qualitativos sobre os
quantitativos; matrícula e transferência com disponibilização de histórico escolar e ficha de
avaliação pedagógica informando a escola de destino e o seu grau de desenvolvimento;
- a INDICAÇÃO CEE N.º 8/2001, que zela por medidas que assegurem o
acesso ao saber a todos os alunos, valorizam a participação e a inserção infantil e juvenil nas
escolas, envolvem as famílias no trabalho escolar e promovem o controle social sobre a
qualidade do atendimento educacional.
Neste estudo incluiremos, da LDB 9394/96, o artigo 26, incisos 2 e 3, que trata o:
ensino da arte como componente curricular obrigatório, nos diversos níveis de educação
básica, de forma a promover o desenvolvimento cultural do aluno e sobre a Educação Física, que
integrada à proposta pedagógica, é componente da Educação Básica, ajustando-se às faixas
etárias e às condições da população escolar, sendo facultativa nos cursos noturnos; o artigo 27,
que cita que os conteúdos curriculares observarão a promoção do desporto educacional e apoio
às práticas desportivas não formais;
- a RESOLUÇÃO CNE/CEB N.º 2/1998, que institui as Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Ensino Fundamental, ressaltando o artigo 3º, I parágrafo, no
qual as escolas devem estabelecer como norteadores de suas ações pedagógicas ... os
princípios estéticos da sensibilidade, da criatividade, e da diversidade de manifestações artísticas
e culturais;
- e os PCNs referentes ao Ensino Fundamental das respectivas disciplinas.
21
Em síntese, o objetivo de ambos os PCNs é gerar um aluno fruidor, um indivíduo
criativo, que passou por várias experiências, tanto signo verbais, quanto não verbais,
movimentos corporais, experiências motoras e proprioceptivas variadas, que tem
conhecimentos, que sabe fazer, ou que, se não sabe, consegue apreciar porque tem para isso
repertório cognitivo.
Os trabalhos com a Educação Física e Artística são altamente estimulantes ao processo
de aprendizado. Qualquer aprendizado se processa em ramificações do sistema nervoso, com
aumento de intensidade do fluxo sanguíneo dentro do cérebro. Essas teias, que denominamos
interfaces ou interconexões, podem muito bem ser aproveitadas,
(...) multiplicando a capacidade de aprendizagem, melhorando o desempenho do
indivíduo no emprego, aprimorando vínculos familiares e sociais (VEJA, 19/08/1998: p.104 e
105).
Essas ramificações são bastante proveitosas, por inserirem os alunos no mundo das
idéias, teorias ou fundamentos tanto quanto no mundo real - a prática. E as possibilidades de
interfaces entre as duas disciplinas são inúmeras, porque, além de permitir o aprimoramento,
através da educação, do treino, da experimentação, da vivência, das capacidades humanas
(cognitivas ou intelectuais, motoras, de equilíbrio, de autonomia pessoal e afetivas, de relação
interpessoal, de inserção e atuação social); consegue estendê-las a aprendizagens
subliminares, bem como ao aprendizado do papel social e de cidadania. A Educação Física e
Artística possibilita um contato mais próximo, intenso e individualizado com o aluno; o
educador assume o papel de mediador entre um desafio alcançável, tornando o potencial do
aluno em desenvolvimento real.
22
Vale acrescentar que educadores que se propõem a trabalhar com os conteúdos
conceituais, procedimentais e atitudinais de ambas as disciplinas, simultânea ou
paralelamente, devem levar em conta a diversidade do seu público, suas vivências, as
experiências individuais e a interpretação pessoal de cada um, além de saber articular suas
próprias inteligências múltiplas; ter controle sobre suas próprias multi-habilidades; assim
como ter objetivos bem definidos, para que sua ação educativa se torne compreensível. Não se
preocupar em priorizar uma ação em detrimento de outra acaba por arriscar-se num labirinto
de conhecimentos e informações que não levam a formação alguma, nem específica dos
saberes associados às duas disciplinas, nem integral, nem equilibrada.
Com o estabelecimento de parâmetros para a Educação Física e Artística, que os
conteúdos programáticos respectivos ficam a cargo de discussão e consenso entre professores
da área, alunos, pais, comunidade e direção da escola, através das propostas político-
pedagógicas de cada escola do Brasil, percebem-se possíveis interfaces de conteúdo e em
função de contexto social, devido à importância instrumental que ambas as disciplinas
oferecem.
A seguir, serão apresentadas as interfaces através dos conteúdos envolvendo a
educação pelo movimento e pela arte, nos quais serão discutidos parâmetros para a educação
motora e a questão da especificidade dos saberes. Posteriormente, serão discutidas as
interfaces em função de contextos, relacionados ao stress e violência na escola, inclusão e
exclusão.
23
1.1.1. Educando pelo Movimento
Começaremos este assunto com uma revisão bibliográfica de alguns conceitos que são
básicos ao entendimento da Educação pelo Movimento, entre eles o conceito de capacidade
física, que corresponde ao resultado motor da ação neuro-muscular em diferentes habilidades
e gestos esportivos, podendo ser básicas (resistência, força e flexibilidade) e específicas
(velocidade, coordenação, agilidade, destreza, descontração e equilíbrio).
As capacidades podem ser mensuradas através de freqüência cardíaca, freqüência de
pulso, respiração através de testes de VO² de forma direta e indireta , testes de aptidão, resultados
de freqüência de treino, entre outros. A capacidade para desempenhar habilidades é uma
característica proeminente da existência humana (SCHMIDT E WRISBERG, 2001, p. 18).
Os mesmos autores vêem habilidade a partir de uma perspectiva de tarefa, classificada
de acordo com a organização do movimento, da importância relativa dos elementos motores e
cognitivos e do nível de previsibilidade ambiental. Citam habilidades discretas (ação breve em
duração, com início e fim bem definidos); habilidades seriadas (habilidades discretas,
colocadas em rie para formar ações mais complexas); habilidades contínuas (ação que se
desdobra sem começo e fim identificáveis, de uma forma contínua e repetitiva); habilidades
motoras (ação para a qual os principais determinantes são o sucesso e a qualidade do
movimento que o executante produz) e habilidades cognitivas (aquelas para as quais o
determinante principal do sucesso é a qualidade da decisão do executante em relação ao que
fazer); habilidades abertas (quando a ação é executada em ambiente imprevisível ou que está
em movimento e requer que as pessoas adaptem seus movimentos em resposta às
propriedades dinâmicas do ambiente) e habilidades fechadas (executadas em ambiente
previsível ou parado e que permite que as pessoas planejem seus movimentos com
antecedência).
24
A habilidade ainda pode ser conceituada qualitativamente, referindo-se ao nível de
proficiência demonstrada. Temos, então, a performance motora ou desempenho, tentativa
observável de um indivíduo para produzir uma ação voluntária, sendo seu nível suscetível a
flutuações em fatores temporários, como motivação, ativação, fadiga e condição física.
Quando o indivíduo que executa uma ação tem qualidades associadas com altos níveis de
proficiência, podemos dizer que sua performance é habilidosa, incluindo as variáveis:
qualidade, como máxima certeza do alcance da meta, gasto mínimo de energia e mínimo
tempo de movimento. Compartilha desta visão HACCKER (1978), citado em SISTO e
GRECO, 1994, p. 2, ao afirmar que a ação motora é a menor unidade psicológica da atividade
exercida voluntariamente; quando realizadas mediante a execução de gestos motores
específicos são denominadas técnicas. A técnica é a forma de resolver um movimento de
modo objetivo e econômico, baseada em uma estrutura ideal de movimento que contemple as
características individuais do praticante seu estilo. E ao encontrarmos a soma de
comportamentos individuais e coletivos, ou medidas e atitudes que permitem obter o nível
ótimo, máximo das próprias capacidades, respeitando as regras e o adversário, temos a tática,
que implica uma função intelectiva, uma habilidade cognitiva.
A educação pelo movimento é referendada, atualmente, pela noção de multiplicidade
de capacidades e técnicas para aprendizagem e desenvolvimento motor, como nos remetem
alguns teóricos, SCHMIDT e WRISBERG (2001), MAGILL (1984) e GALLAHUE
(Rodrigues, 1997).
Eles iniciam suas reflexões com uma análise de pré-requisitos para realização de uma
tarefa motora qualquer; diagnóstico das capacidades dos alunos, avaliados em testes
psicomotores usuais; lei de Hick, que descreve a relação estável que existe entre o número de
alternativas estímulo-respostas e tempo de reação de escolha; o processamento paralelo, que
permite aos indivíduos dar conta de duas ou mais correntes de informação ao mesmo tempo,
25
desde que não sejam conflitantes; os sistemas de memória de curto prazo, médio e longo
prazo; a necessidade da prática motivada: com o desenvolvimento do aumento de certezas do
alcance da meta, a diminuição do gasto de energia e diminuição do tempo de movimento,
melhorando a proficiência de habilidade, até se chegar à performance habilidosa; a
estruturação das tarefas motoras em práticas randômicas, com execução de várias tarefas
distintas, sem que seja seguida uma ordem para facilitar a retenção; as alterações nos padrões
de capacidade durante a prática inicial; as dificuldades de mensuração da grande quantidade
de variáveis que compõem padrões de performance bem sucedidas e, ao se tratar com o
público escolar, a necessidade de se manter a visão longitudinal.
Isto nos faz refletir sobre o melhor modo de planejar a instrução, não só com relação à
organização, adaptação, interação, acomodação e assimilação, como propõe Piaget, citado em
Lopes (1974), mas também enfocando a precisão adequada de movimento, a definição de
pontos iniciais e finais de uma habilidade motora, a estabilidade do ambiente de instrução e o
controle de feedback- retroinformação.
Esses aspectos permitem aos executantes modificar seus movimentos em várias
dimensões, acelerando ou desacelerando, variando a amplitude e o sistema efetor para
produzir a ação, preservando ou não o padrão temporal do movimento sob vários tipos de
modificações e estimulações, além de garantir sua participação ativa no processo de
estabelecimento de metas de performance, metas de processo e metas de resultados.
Assim planejado, o educador tem como propiciar múltiplas experiências, permitindo
aos alunos tirar vantagem de suas capacidades e atividades de práticas mais fortes,
compensando as mais fracas, grifando sempre a importância da estimulação e da integração
sensorial das informações exteroceptivas (informações que vêm das fontes externas do corpo
da pessoa), interocpetivas (fontes internas do corpo do indivíduo) e proprioceptivas
26
(informações sensoriais que chegam de dentro do corpo da pessoa, e que sinalizam a posição
e o movimento do corpo e segmentos semelhantes à cinestesia).
1.1.2. Educando pela Arte
A educação através da arte inicia nova forma de pensar educação artística, num
processo social, por constituir-se em um meio de comunicação com nossos semelhantes:
A simples expressão motriz que resulta numa garatuja infantil, na idade que a expressão
falada não chega a produzir a frase, representa algo que emerge do caos, mas constitui, de fato, um
primeiro esforço para dar passo à expressão instintiva, física, em que muitas vezes a imaginação e
a intuição balbuciam também. Ironizando, então, o conceito de educação racional, mediante a
imagem do pássaro que voaria com uma asa somente, Read defende os direitos da imaginação e da
intuição, dos instintos e dos impulsos, “ a transfusão das energias vitais do animal da razão
(FERRAZ, 1975).
Um outro autor, Walter Gropius, também artista plástico, desenvolveu em sua
proposta pedagógica o princípio de ensinar fazendo e aprender imitando, fundamentando-se
no reconhecimento que o artesanato é uma categoria pedagógica fundamental e que, apesar de
a "arte" não poder ser ensinada, o ensino e a aprendizagem de técnicas de artesanato eram
possíveis, surgindo a Bauhaus, originada da idéia medieval do Bauhütte, comunidade de
trabalho desenvolvida nos séculos XII e XIII, formada por artistas e artesãos ocupados na
construção de uma grande igreja, geralmente uma catedral:
...O objetivo consistia em se executarem, sem maiores atritos, a divisão e integração de
trabalho... Tal objetivo podia ser alcançado através de uma forma de pensar realmente coletiva
de todos os participantes. Somente a subordinação voluntária dos anseios pessoais ao desejo do
27
mestre de construção, bem como o estreito e constante contato entre o diretor artístico da
construção e cada um de seus colaboradores, era capaz de levar ao desejado nivelamento das
diferenças individuais, sem que com isto se perdesse a qualidade artística dos trabalhos
individuais" (WICK, 1989: 73).
A Bauhaus, apesar de estar intimamente ligada à arquitetura, encontra-se aqui inserida
por questionar os limites conceituais entre arte e artesanato, o que vem de encontro aos nossos
próprios questionamentos relacionados às expressões de dança ou de música, amadoras,
profissionais, artísticas e virtuosas.
No conceito de artesanato, de Gropius, havia, em paralelo, uma implicação de reforma
social e econômica, uma contextualização; basta apenas observarmos a data em que a escola
apareceu.
Essa escola de arte reformou o conceito das escolas de belas artes dos anos 1920 e
1930, com adoção de novos princípios, métodos e estruturas. Para Gropius, " o potencial de
realização do homem depende do equilíbrio exato do trabalho de todos os órgãos criativos.
Não basta adestrar este ou aquele, mas todos ao mesmo tempo precisam ser
fundamentalmente educados." (WICK, 1989, p. 100)
"Gropius postula a educação harmônica de todas as capacidades humanas, a
conciliação entre razão e sensualidade, o equilíbrio entre trabalho manual e "trabalho
cerebral", a unidade de mens, anima e sensus, e total preferência ao desenvolvimento de
uma "cultura de vida pessoal", em lugar de uma especialização prematura, que bem mais
tarde deveria ter início" (WICK, 1989: 101)
Esse princípio de homem total - "homo totus"- tem suas origens na Grécia Antiga. O
indivíduo grego, supõe-se, desenvolvia a totalidade de suas forças, sem se auto-limitar por
uma estreita especialização. As forças harmonizadas entravam espontaneamente em
consonância umas com as outras, e ao fim ele estava em perfeita harmonia com o meio
exterior, quer fossem objetos, natureza ou Estado.
28
Vale ressaltar a citação do Estatuto do Ano de 1922, escrito dentro das concepções
pedagógicas de Gropius: "Durante todo o tempo que durar a formação, será ministrado um
ensino prático harmonizador, a repousar sobre uma base única formada por som, cor e
forma, cujo objetivo é equilibrar as qualidades físicas e psíquicas de cada um" (WICK,
1989,p. 99).
Observando o Estatuto, a escola Bauhaus organizou um Curso Básico, dividido em
três ciclos: uma introdução sistemática aos fundamentos da criação plástica em três áreas
setoriais: desenho, superfície e cor e espaço e corpo, visando ao caráter educativo, formativo
(aritmética, geografia, história natural, economia, sociologia, ciências naturais, literatura ...)
profissional, auto-conhecimento da pessoa e personalidade e a possibilidade de
desenvolvimento do ego criativo do aluno.
Nas aulas de Itten, outro mestre da Bauhaus, os alunos exercitavam seus sentidos e sua
propriocepção; exercitavam as forças motoras de seus corpos através de ginástica antes das
aulas de desenho, para libertação dos espasmos compulsivos, ao mesmo tempo que
experimentavam, direta e fisicamente, o movimento e o ritmo como princípio básico de sua
existência e de sua organização plástica; treinavam mãos, olhos e memória, com exercícios de
desenho de observação, quase que fotográficos; para ele, o desenvolvimento motor e ensino
da arte é um meio para se atingir um fim, que é o aguçamento dos sentidos.
Chegamos, assim, ao centro da filosofia e da pedagogia de Itten, a relação de
identidade entre movimento e forma; a visão conjunta de corpo, alma e espírito; a importância
da motricidade no processo artístico; o aspecto emocional mais enfatizado do que o
intelectual; a centralização no aluno considerando seu temperamento, talento e capacidades;
no incentivo do trabalho individual, no exercício de suas forças criativas e no contato com as
pessoas, revelavam uma pedagogia não alimentada pela formação artística acadêmica, mais
29
embasada nos movimentos reformistas pedagógicos liberais de Rousseau, Pestalozzi, Fröebel
e Montessori.
1.1.3. A Questão da Especificidade dos Saberes
Ana Mae Barbosa (2000) destaca o reconhecimento do lugar da Educação Artística no
currículo do Ensino Fundamental dentro dos PCNs, apesar dos resultados na prática serem
diferentes, faltando um aprofundamento em seus conteúdos. Acompanhando seu pensamento,
Ivone Richter, citada em Mae, destaca a importância da multiculturalidade como a existência
de um trabalho entre muitas disciplinas, sem que estas percam suas características, e da
interdisciplinaridade como uma inter-relação entre disciplinas, sem que nenhuma se
sobressaia sobre as outras, mas que se estabeleça uma relação de reciprocidade, colaboração,
desaparecendo as fronteiras entre as áreas de conhecimento.
Os saberes específicos da Educação Artística para o Ensino Fundamental relacionam-
se com as linguagens visuais, corporais e teatrais. A educação em artes visuais requer um
contínuo trabalho sobre os conteúdos e experiências relacionados aos mais diversos
instrumentos e momentos da história da arte, inclusive o atual, permitindo que o aluno saia do
abstrato para o concreto. A dança possibilita o desenvolvimento da expressão corporal, o
desenvolvimento motor, a audição inteligente, juntamente com o desenvolvimento de
autonomia, inteligências, responsabilidade, sensibilidade e integração, não rítmica, mas
num sentido maior de cooperação, tolerância para consigo e com os outros, desinibição e
integração com seus colegas.
Expande essas definições, a visão de Gonçalves (1997, p. 147) sobre os saberes
construídos com a Educação Física; ao tratar da compreensão da corporeidade e do
30
movimento, como consciência, experiência, percepção e vivência, estruturado em dois pólos:
homem e mundo. Gonçalves nos remete a pensar que:
todo o corpo se move com uma intenção determinada; por exemplo, arremessar uma
bola em um alvo. Em todo movimento, o sujeito que o executa forma com o objetivo (arremessar
no alvo), uma totalidade, que se reestrutura a cada instante, conforme se modifica a percepção do
objetivo (distância, ângulo de arremesso etc.), do próprio sujeito que arremessa (posição das
mãos e dos pés, força necessária etc.), do objeto a ser arremessado (peso da bola, forma, etc.) e
da mútua relação. A intenção do movimento é o fator totalizador das etapas parciais, da
percepção do sujeito dos seus próprios movimentos e da percepção dos componentes exteriores da
situação (outras pessoas ou outros objetos). No mundo e no próprio corpo físico, encontra-se uma
resistência que, no processo do movimento, busca a superação. Assim, os movimentos corporais
não são relações mecânicas, estabelecidas por um corpo que percorre um espaço fixo, objetivo,
mas relações dialéticas, em que o sujeito motriz forma, com o espaço circundante e os seres que
habitam esse espaço, uma totalidade aberta.
O “corpo próprio” o se reduz ao nosso corpo físico (músculos, órgãos, tendões, etc),
mas, sim, nele encontra suas possibilidades e seus limites. Como exemplo, podemos citar muitos
acontecimentos cotidianos, em que, ao intencionar e realizar um movimento, encontramos
inúmeros limites que definimos como força, flexibilidade, equilíbrio, problemas posturais.
Aprender sobre anatomia, fisiologia, cinesiologia, nutrição, qualidade de vida, controle
de stress, capacidades e aptidões, bem como a prática do esporte e seus fundamentos na
escola, fugindo da competição exagerada, elitizante e agressiva, oferecer amplas
oportunidades ao corpo para sentir, expressar, comunicar, criar, significar, proporcionar aos
alunos experiências corporais, auxiliá-los na aquisição de capacidades e aptidões, percepção
das dimensões físicas da qualidade de vida e do bem-estar emocional, através da preparação
para o lazer e da educação para a saúde; aprofundando-as, na medida do possível, ao mesmo
tempo que podem possibilitar concretamente a vivência dos princípios democráticos, através
das regras e regulamentos presentes nos jogos desportivos ou não, e da sociabilização,
respeitando os interesses e meios de cada comunidade são formas de se trabalhar as
especificidades.
Em resumo, as condições de aprendizagem, desenvolvimento e processamento do
conhecimento visando às interfaces não são puramente a transferência, a interdisciplinaridade
31
ou a especificidade dos saberes, mas sim a possibilidade de acréscimo ou criação nas
possíveis ramificações que o indivíduo possui em seu repertório cognitivo-psicomotor e sua
cultura.
32
1.2. EM FUNÇÃO DOS CONTEXTOS
1.2.1. Agressividade e violência: administrando o stress na escola
"A agressividade na escola existe e não pode ser ignorada, pois o fato de vivermos
em sociedade envolve um certo grau de hostilidade, sendo o meio ambiente onde estão
inseridos os alunos, relacionados aos comportamentos de frustração, alguns de seus
causadores". Para esta autora, a agressividade é definida como o ato de alguém vir a
prejudicar outra pessoa verbalmente ou fisicamente, lesando ou apenas magoando, podendo
envolver um agressor e uma vítima, ou apenas uma única pessoa que se auto-agride,
prejudicando-se ou se mutilando (BROGLIO, 2002, p. 358).
DIAS (1990) define agressividade como forma não positiva de comunicar-se com os
outros, sendo o ato agressivo o resultado de tensões, frustrações, conflitos e ansiedade.
AJURIAGUERRA & MARCELLI (1991) definem a agressividade como um estudo
das variações de conduta num plano experimental de destruição ou estimulação, localizados
no sistema nervoso central.
FREUD, apud DAVIDOFF (1983), conceitua agressividade como um dualismo
pulsional de vida e morte. Davidoff desenvolve o conceito, quando cita, como probabilidades
de agressão, certas condições sociais como o anonimato e a pobreza:
Visto que quando a pessoa vive no anonimato ela não tem identidade, não demonstrando
afinidades pelos outros, ou seja; é resultado de um mundo impessoal em que as pessoas não se
conhecem, a resposta disso é a probabilidade de uma menor inibição e com isso menor simpatia
pelas demais pessoas.
Na condição de pobreza as pessoas que ali vivem crescem nela por conseqüências
naturais, tendo a agressividade como reforço positivo, como meio de sobrevivência. Elas
33
aprendem que tomar as coisas dos outros ou apoderar-se delas enquanto é bom devem fazer,
porque senão outros farão. DAVIDOFF, apud BROGLIO (2002, p. 360)
Potencializando a definição de agressividade, entramos no conceito de violência que,
segundo Ferreira (1986), juridicamente significa constrangimento físico ou moral, uso da
força ou coação. Para Candau (1999), a violência não é um fenômeno social recente, mas,
particularmente a partir dos anos 80, vem adquirindo cada vez maior visibilidade social, sendo
preocupação tanto por parte do poder público e dos cientistas sociais, como também da
sociedade brasileira no geral. Segundo a autora, sua conceituação oscila entre dois extremos: a
redução dos comportamentos violentos, aqueles referidos à criminalidade ou à agressão física
de maior ou menor gravidade, e a ampliação da abrangência do conceito de tal modo que é
considerada violência qualquer manifestação de agressividade e indisciplina.
Baseada numa perspectiva mais ampla e tendo como referências fundamentais Jurandir
Freire Costa (1991) e Marilena Chauí (1999), fica claro que a violência não pode ser reduzida ao
plano físico mas abarca os planos psiquíco e moral. Talvez se possa afirmar que o que especifica a
violência é o desrespeito, a coisificação, a negação do outro, a violação dos direitos humanos
(Curso Santa Rita- Apostila do Professor 10- 2003- p. 18) .
É oportuno mencionar o depoimento de uma professora sobre a violência: claro
que a violência tem que permear o nosso sistema escolar, visto que ela está fora e nós não
somos um castelo encantado no meio do sistema. Então, é claro que, infelizmente, é uma
conseqüência natural que essa violência venha e se expanda aqui entre nós também."
(CURSO SANTA RITA- APOSTILA DO PROFESSOR 10, 2003, p.19).
Os tipos de violência assinalados por Candau, como estando presentes na rotina
escolar são: ameaças e agressões verbais; rixas entre alunos, que se revertem em "pegar
fora"; o desrespeito em relação à raça, à estética, à manifestação do outro; funcionário ao
34
aluno e vice-versa; aluno ao professor, através de indisciplina e ameaças; professor ao aluno,
através de apelidos e verbalizações negativas referentes às suas capacidades; o processo de
banalização e naturalização realizado pela cultura da violência, presente, também, nas sanções
dadas pelo professor e administração, e no cotidiano da escola; as depredações, as pichações,
o assédio de gangues e galeras às escolas, furtando-lhes equipamentos; a descontextualização
da cultura escolar com a cultura social, e, o mais dramático, o assédio das escolas pelo
narcotráfico, tema extremamente difícil que coloca a direção das escolas e o corpo docente em
situações limites, em que o medo, o sentido de impotência e o desânimo imperam.
Acompanham as constatações sobre a violência e a agressividade: Tiba (1996),
diagnosticando os comportamentos agressivos como distúrbios de conduta, e afirmando que
essa inconstância de alunos está ligada às oscilações de auto-estima entre eles, podendo
aparecer como brigas verbais ou corporais, tornando-se muito mais sérios nestas últimas
décadas, conduzindo à indisciplina e à falta de respeito pelas pessoas e bens alheios;
Abramowicz e Moll (2001), ao se referirem às regras e normas que a escola por si tem,
normalizando os indivíduos e seus comportamentos, acentuando os mecanismos de vigilância
e controle de todos os envolvidos, quer de alunos, como de professores; Aquino (1996),
apontando as turbulências e apatias nas relações entre alunos e na relação professor-aluno, os
confrontos velados, as ameaças de diferentes tipos, os muros e grades e as questões da
indisciplina, como a bagunça, o tumulto, a falta de limite, os maus comportamentos, o
desrespeito às figuras de autoridade, a carência psíquica surgida da ausência de uma infra-
estrutura psicológica e moral anterior à escolarização - a família; e Szimansk (2000), que
analisa, através das mudanças históricas dos modelos de família (família pensada X família
vivida), a importância da parceria da família com a escola, na formação, na inserção social e
na cidadania, relacionada ao controle da agressividade e da violência.
35
Da mesma forma que existem alguns alunos que conseguem se adaptar à vida regulada
de uma escola, bem como às situações de descontextualização com a realidade, agressividade,
e competição, a grande maioria reclama e se perturba; considerando-se manipulados,
perdendo oportunidades de se divertir e de participar de situações lhes dão prazer e que
realmente lhes fazem sentido, ficando impotentes perante as tomadas de decisão, pois estas
não lhes cabem, resultando na sensação de perda de oportunidades e, com ela, o stress.
O stress foi conceituado de várias formas, por diferentes especialistas. Alguns o
definem como estímulo, outros como resposta, e outros, ainda, como todo o espectro de
valores em interação com resposta inexistente ou inadequada. Cannon, um fisiologista,
denominou-o resposta de luta ou fuga; Selye, um endocrinologista, como mudanças
fisiológicas compostas de três fases: reação de alarme, resistência e exaustão. Uma situação
nova ou uma situação potencialmente desagradável ou ameaçadora podem provocar stress.
O que dizer de alunos provenientes de famílias pobres e numerosas, com apenas um
dos pais presente e responsável; ou jovens de famílias com níveis mais baixos de educação e
de capacitação para o trabalho que, infelizmente, reafirmam a interligação pobreza com baixo
nível educacional, pois a sobrevivência é a maior preocupação; crianças de família de
minorias, que sofrem exclusão em função de racismo, valores religiosos e culturais; ou, ainda,
jovens assediados pela criminalidade, que vivenciam o contato com o narcotráfico vizinho,
convivendo com agentes estressores presentes em sua realidade e na da escola, tais como o
confronto de contradições referentes à qualidade do ensino; a não contextualização mundo
real e escola; o confinamento em salas com outros 39 alunos; a rigidez na cobrança de
disciplina, silêncio, controle físico e atenção por várias horas; o não entendimento do conceito
de Progressão Continuada como um processo e não como aprovação automática; a pressão
dos pais para que tenham sucesso nos estudos, cobrando notas, além de outros: presença;
carga horária; avaliações; necessidade de estabelecer relacionamentos; necessidade de
36
superação de dependências, ansiedades, medos, timidez, levando o aluno a confrontar-se com
várias tarefas que precisa aprender, como: desenvolvimento de competências, controle de
emoções, liberação de relacionamentos interpessoais, desenvolvimento do sentido de
finalidade, integridade, identidade e autonomia, nas quais não vê sentido.
Greenberg (2002, p. 289), ao referir-se aos universitários americanos jovens: "os
alunos têm como objetivo principal obter boas notas, em lugar de aprender tanto quanto
puderem", de certa forma, em nossa realidade, com a pedagogia e didática adequadas, a escola
pós-moderna pode ter sucesso no que tange aprender tanto quanto puder, desde que os
estressores sejam monitorados e controlados ao mesmo tempo, que haja um resgate no prazer
e no sentido do ensino-aprendizagem para o aluno.
Em resumo, autores como Aquino (1996), La Taille (1996), Szimansk (2000) e Santos
(2002) sugerem o manejo do stress escolar através de uma conduta dialógica com negociação
constante, investimento nos vínculos concretos, fidelidade a um contrato pedagógico
estabelecido com os alunos, permeabilidade para as mudanças, o reforço do sentimento de
dignidade do aluno como ser moral, a recuperação para o valor da vida, a educação em
direitos humanos, a participação ativa da família vivenciada na escola e as possibilidades de
se vivenciar o lúdico, resgatando o prazer de estar na escola.
A Educação Física e Artística podem ajudar na administração do stress escolar.
Greenberg (op.cit) sugere intervenções no seu controle através de eliciação fisiológica, que
são exercícios regulares com o objetivo de expulsar, metabolizar as endorfinas ou descarregar
os produtos residuais do stress, de forma individual ou coletiva, pois a escola, na maioria das
vezes, é o único espaço físico e elemento de ligação social; e pela eliciação emocional, com
exercícios de relaxamento.
A influência benéfica da Educação Física Escolar na administração do stress, ocorre
através de múltiplos aspectos. Encontramos, em Ghorayeb (1999, p. 263-264),
37
fundamentação para essa argumentação. Segundo esse autor, o desencadear de uma reação de
stress e o inerente emprego natural da musculatura esquelética fica acumulado no organismo,
criando um estado de agitação e desassossego interior, tremendamente nocivo ao bem-estar e
à felicidade do indivíduo. Ao praticar atividade física, exercícios ou esportes, estamos
encontrando a via adequada de descarga, reduzindo-se o dano causado à saúde e ao bem-estar
das pessoas pelo acúmulo de tensão e das reações do stress. Acrescenta-se, ainda, na prática
de atividades físicas, o papel relevante das endorfinas na sensação de bem-estar, melhoria do
estado de humor global e satisfação com a própria imagem, quer em função da estética como
da saúde.
Com relação à influência positiva da Educação Artística Escolar na administração do
stress, para um melhor entendimento, cabe empregarmos alguns conceitos de Schmidt e
Wrisberg (2001) sobre ativação, que corresponde ao nível de estimulação ou excitação do
sistema nervoso central de uma pessoa; enquanto ansiedade trata mais da maneira como uma
pessoa interpreta uma situação específica e as emoções que estão associadas com aquela
interpretação, ou, ainda, preocupação ou aflição sobre incertezas futuras, percepção de
ameaças a si próprio, freqüentemente caracterizada por elevados níveis de ativação.
Ansiedade e ativação são fenômenos que fazem parte da rotina de muitos eventos diários,
como também surgem em resposta a avaliações de performance, sejam elas quais forem: notas
escolares, ser incluído, ou não, e as relações de auto-estima, entre outros.
Segundo os mesmos autores "uma tarefa do tipo tocar piano que requer um alto grau
de controle motor fino e altas demandas cognitivas é, geralmente, mais bem executada
quando o nível de ativação do participante é baixo (como na curva vermelha)", como nos
mostra o gráfico abaixo:
38
Figura 1 - Nível de Ativação e Performance (SCHMIDT & WRISBERG, 2001, p. 84)
O vel de estimulação e de excitamento do sistema nervoso acompanha o nível de
ativação baixo, propiciando, através de atividades de controle motor fino, como artesanato e
desenho, entre outros, relaxamento.
39
1.2.2. Inclusão e Exclusão
O desenvolvimento da linguagem está intimamente ligado ao desenvolvimento mental
dos seres humanos. Como linguagem e pensamento se entrelaçam em função de elaborações e
intercâmbios interiores, com intuito de estabelecer comunicação e interação com o meio
ambiente, o problema dos “inadaptados” e dos “desviantes” é, no senso comum, uma questão
patológica.
A sociedade contribui para a manifestação desses comportamentos, porque, à medida
que seus objetivos sociais são integrados e ordenados numa hierarquia de valores, regulando e
controlando as estruturas sociais e os modos aceitáveis de alcançá-los, geram um modelo
rígido para os seus membros. A inadaptação, a confusão e a incerteza nas relações sociais
fazem com que alguns indivíduos, que lêem a cultura de sua sociedade divergentemente,
fiquem soltos, perdidos, desenraizados. A idéia de que o estabelecimento de regras e
regulamentos rígidos em uma sociedade ou cultura é essencial para sua continuidade
permanece bastante vigorosa.
A pluralidade de comportamentos e as diferenças dentro de uma cultura são vistas
dentro de limites bem marcados pelos preconceitos e pela exclusão. Entender a pluralidade de
comportamentos, aceitar as diferenças e garantir a todos a acessibilidade ao conhecimento são
os primeiros passos para a inclusão social. Integrar significa adaptar-se, acomodar-se,
incorporar-se, mas sempre trata da reunião de grupos diferentes. Incluir significa envolver,
fazer parte, pertencer, trazer para dentro de um conjunto alguém que faz parte dele; acima
de tudo, é questionar a rigidez da estrutura e funcionamento das instituições escolares. É
através da conscientização sobre as diversidades que as necessidades especiais de alguns
passarão a ser vistas como algo natural, que faz parte da natureza humana.
40
A educação inclusiva propõe o desenvolvimento das habilidades, talentos pessoais e
papéis sociais, para todos os alunos, e, no caso dos que têm deficiência motora ou sensorial, o
desenvolvimento de habilidades alternativas, a identificação de indicadores que impedem ou a
limitam, ou que podem facilitar a construção de sua autonomia, independência, produtividade
e integração, além da observação e adequação dos seus desenvolvimentos: mental, cognitivo e
físico.
Os desafios que suscitam a inclusão social passam pelos (pré) conceitos de deficiência,
incapacidade e inadaptação e se originam muito antes do primeiro contato do indivíduo com a
escola.
Baseados em MANTOAN (1997, p. 79), ao analisar o grupo de deficientes mentais
leves e afirmar que a estimulação do desenvolvimento de crianças pequenas depende da
presença de adultos e crianças, pessoas sensíveis às suas necessidades e que mantenham com
elas relacionamentos saudáveis", concluímos que a ausência do componente afetivo familiar
torna essas crianças apáticas, sem razões e sem estímulos para conhecer o mundo ou para
aprender, pois seus esforços e empenhos positivos pouco significam para os que as rodeiam.
Sem estar habituadas a estabelecer trocas intelectuais, que o mundo exige muito mais a
intermediação pela linguagem do que pela ão, numa referência aos esquemas de ação
sensório motor de PIAGET, essas crianças têm grandes possibilidades de se tornarem apáticas
ou confundidas no lar, na escola, na sociedade, como sendo deficientes reais.
O modelo de Educação Física contido nos PCNs propõe como princípio básico a
necessidade das aulas serem dirigidas a todos os alunos. Segundo Darido, S.C. et alii ( 2001,
p. 20), "este modelo busca incluir e reverter o quadro histórico de seleção entre indivíduos
aptos e inaptos para as práticas corporais, resultantes da valorização exacerbada do
desempenho e da eficiência". O autor sugere a escolha de conteúdos, que não os esportivos
tradicionais, como futebol, basquetebol, voleibol e handebol, mas grandes jogos, capoeira,
41
atletismo, ginástica artística, dança, atividades expressivas, ginástica rítmica desportiva, tênis
e judô. Concordando com Darido, Ghorayeb (1999, p. 358), na fase de crescimento ( 6 a 12
anos), julga que o esporte competitivo desenvolve as aptidões e o esporte recreativo elimina
as inaptidões, desde que o esporte escolhido seja o correto, iniciado na idade certa, e que haja
um equilíbrio entre "benefício" e "performance", ou seja, que não se destrua o organismo para
obter melhores resultados. De qualquer forma, a dúbia funcionalidade dos jogos esportivos
está presente no cotidiano escolar. Discriminam quando centrados em habilidades técnicas, ou
incluem ao priorizar aspectos como sociabilidade, liberdade, ludicidade, aprendizado de como
conviver com as individualidades e de como partilhar recursos, sejam eles equipamentos,
idéias, práticas e regulamentos, chegando à idéia de co-responsabilidade do grupo.
De acordo com a revista Nova Escola (Inclusão 1999), as crianças com necessidades
especiais tendem a obter vantagens ao conviver com outras crianças: a) aprendem a gostar da
diversidade; b) adquirem experiência direta com a variedade das capacidades humanas; c)
demonstram crescente responsabilidade e melhor aprendizagem através do trabalho em grupo; d)
ficam melhor preparadas para a vida adulta em uma sociedade diversificada e) entendem que são
diferentes mas não inferiores. E por outro lado, os estudantes que participam auxiliando se
beneficiam: a) têm acesso a uma gama, bem mais ampla, de papéis sociais; b) perdem o medo e o
preconceito em relação ao diferente; c) desenvolvem a cooperação e a tolerância; d) adquirem
grande senso de responsabilidade, podendo melhorar o rendimento escolar; e) são melhor
preparados para a vida adulta porque desde cedo assimilam que as pessoas, as famílias e os
espaços sociais não são homogêneos e que as diferenças são enriquecedoras para o ser humano.
Darido, S.C. et alii ( 2001, p. 20-21)
A abordagem dessas crianças dentro do processo de inclusão questiona desde os
objetivos do ensino, a real necessidade de acumular conhecimentos, e quais conhecimentos, o
aprender a aprender, o aprender a inovar ou a produzir o novo em qualquer campo do saber, o
aprender a se relacionar, a assimilar, a criar, a identificar o que é comum entre as várias áreas
42
de conhecimento e usufruir desta abordagem, o aprender a controlar, a verificar, a se
autocorrigir, a se autoconhecer, a se autogestionar, e até mesmo o aprender para repetir.
Assim, ainda citando a mesma autora, o que espera do professor do século XXI é que realize
sua verdadeira e primitiva vocação, ou melhor, que seja aquele que ajuda a tecer as tramas
do desenvolvimento individual e coletivo. E que maneja os instrumentos e os elementos que a
cultura distingue como representativos do modo de viver e de pensar de um dado tempo"
(MANTOAN, 1997, p. 53).
Para sucesso no processo de inclusão escolar o professor necessita estar preparado
para desenvolver rotas alternativas de estabelecimento de conteúdos de aprendizagem, ser
sensível à importância do meio para o processo de interação, estar capacitado a persuadir para
a aprendizagem e estar freqüentemente se auto-avaliando e analisando os resultados,
propiciando, assim, a inclusão dos alunos com necessidades especiais e o aprimoramento
físico-emocional das crianças confinadas.
43
CAPÍTULO II
POSSIBILITANDO AS INTERFACES: OS CONCEITOS DE
PSICOMOTRICIDADE, INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS E COMPETÊNCIAS
A psicomotricidade, como Ciência da Educação, enfoca o movimento ao mesmo
tempo que põe em jogo as funções intelectivas.
As primeiras evidências de um desenvolvimento mental normal estão diretamente
ligadas às manifestações motoras. Gesell, 1955, citado em COSTALLAT, 1987, p. 1, afirma
que:
Durante toda a primeira infância até os 3 anos a inteligência é a função imediata do
desenvolvimento neuromuscular. Com o desenvolvimento da criança, a inteligência e a
motricidade se tornam independentes, rompendo sua simbiose. Este paralelismo se mantém
determinado na proporção que a um quociente intelectual diminuído corresponda um rendimento
motriz deficiente. Em casos graves como espasticidade, ataxia, hemiplegia não recuperação
total, mas podem ser atenuadas, com uma reeducação apropriada que compense ou ajudem a
equilibrar o déficit motor.
Segundo este autor, a coordenação geral alcança seu desenvolvimento pico em torno
dos 15 anos, o que facilita sua educação precoce e progressiva. Para que o plano de educação
ou reeducação psicomotriz abranja aspectos de coordenação geral e fina, estática e dinâmica,
de caráter ginástico, musical e de educação manual, e cumpra suas finalidades, deverá ser
observada se a evolução psicomotora dos movimentos do recém-nascido aos movimentos do
adulto refletem uma maturação gradativa do sistema nervoso e integração progressiva de suas
funções.
44
A avaliação motora para detecção dessas e de outras variáveis correlacionadas é
realizada por meio dos testes de Ozeretzki, Guilmains e Ajuriaguerra, que inseriram a questão
dos estímulos do meio ambiente.
A criança encorajada para o desenvolvimento psicomotor harmônico, " terá mais
autoconfiança, estará mais equipada para expressar-se, pois quem o faz bem com o corpo,
também o faz com a palavra" (PARADA, 1986), e, conseqüentente, mais habilitada para a
inclusão social.
O trabalho com psicomotricidade leva em consideração noções de situação, tamanho,
posição, movimento, formas e qualidade, além de trabalhar com os esquemas corporais
quanto à:
- Lateralidade:
Capacidade de perceber o eixo corporal, esquemas corporais de domínio - lado direito
ou esquerdo, percepção da simetria corporal, que contribui para a orientação no espaço -
estrutura espacial. Para desenvolvê-la, jogos de direita e esquerda, jogos de desenhos
espelhados - desenhos de simetria, desenhos inacabados, que deverão ser completados, ou
desenhos de transportes, que trabalhem com inversão de cores.
- Orientação Temporal:
Capacidade de perceber a sucessão de acontecimentos, sua duração, intervalos, rítmo,
tempo, cadência, irreversibilidade temporal e renovação cíclica de certos períodos.
Exercícios que reconstroem a ordem de uma música ouvida, ou de uma seqüência
rítmica, exercícios que treinem a percepção dos segundos, exercícios que trabalhem rítmo
fazendo evoluções, acompanhando, por exemplo, marchas militares.
45
- Orientação Espacial:
Capacidade de se orientar num espaço tridimensional em inércia ou em movimento,
compreender os conceitos de comprimento, largura e volume, de percorrer um trajeto. Para
desenvolver a memória: brincadeiras como dança das cadeiras; passar contas num colar
(envolve também a orientação temporal, pois requer a percepção de uma sequência); a noção
de trajeto percorrido fisicamente ou representativamente, a orientação com mudança dos
pontos de referência.
- Memória Perceptiva:
Capacidade de memorizar o lugar de diferentes objetos ou pessoas.
Brincadeiras como dominó, batalha naval, batalha naval modificada - os alunos
seguem a orientação do professor de onde estão os navios os caças, sem tirar o lápis do papel,
realizando traços em um papel quadriculado. Exercícios de precisão: deslocar os palitos sem
tirá-los da superfície da mesa para obter os seguintes modelos : 4 palitos (quadrado), 5 palitos
e 6 palitos.
- Coordenação Motora: andar como carregador de água chinês, brincar de vai-e-vem
feito de garrafa pet, fazer vários movimentos como abrir e fechar, atarrachar, desparafusar,
torcer e distorcer, amassar e desamassar, enroscar e desenroscar, girar pião, dar piparote com
bolinha de papel, brincar com bolinhas de gude ( fazer bolinas de argila do tamanho das de
gude e brincar), esticar o elástico no polegar e indicador, dedilhar o piano, virar as folhas de
um livro, folhear um livro levantando cada página pelo canto, com o indicador.
46
- Coordenação visomotora - acertar um alvo- mira.
Percepção de orientação e situação - numa partitura, colocar a legenda que envolve as
notas musicais e cores.
Os testes psicomotores funcionam como uma avaliação inicial diagnóstica, tanto dos
processos e estilos de aprendizagem, condições, relações com os saberes, com o projeto a ser
implantado e com o meio ambiente; enfim, quanto à identidade e possível dinâmica do grupo,
como quanto ao acervo de conhecimentos adquiridos, capacidades e habilidades de um aluno
específico, com o intuito de estabelecermos o percurso mais adequado de ensino-
aprendizagem.
Os testes psicomotores que serão utilizados neste estudo estão citados dentro do
Capítulo III - Metodologia Utilizada e disponíveis no Anexo III.
Valorizando a diversidade de conteúdos existentes dentro de cada um de nós e a
constante requisição de um repertório de recursos, entramos na área da Ciência Cognitiva, que
tem como objetivo estudar a cognição e todos os processos de aprendizagem tais como
percepção, inteligência, memória e aprendizagem, entre outros.
Gardner (1994), um dos principais cientistas cognitivos da atualidade, preocupado
com questões relacionadas ao conceito de inteligência, desenvolveu a Teoria das Inteligências
Múltiplas, na qual define inteligência como um potencial biopsicológico para processar
informações, que pode ser ativado em cenário cultural para solucionar problemas ou criar
produtos que sejam valorizados.
O autor apontou a existência de oito inteligências:
- A Inteligência Corporal Cinestésica, que está relacionada à perfeita forma de
expressão corporal, assim como a resolução de determinado problema por meio de
movimentos do corpo e a capacidade de manusear objetos.
47
- A Inteligência Espacial, que se relaciona à capacidade de extrapolar situações
espaciais para o concreto e vice-versa, possuindo, dessa forma, grande percepção e
relacionamento com o espaço. Uma de suas características é de perceber o mundo com
precisão, efetuando transformações e modificações, ou imaginando movimentos e
deslocamentos.
- A Inteligência Lógico-Matemática , que se origina da interação e confronto com o
mundo e com os objetos, avaliando-se quantidades, tamanhos, pesos, etc. É detectada quando
o indivíduo tem facilidade em desenvolver e/ou acompanhar cadeias de raciocínios, resolver
problemas lógicos e lidar bem com cálculos e números.
- A Inteligência Musical, considerada a capacidade de interpretar, escrever, ler e
expressar-se pela música, é uma inteligência intelectual autônoma, por não estabelecer
qualquer conexão sistemática com outras faculdades como o processamento lingüístico,
numérico e espacial. Apesar de a música ser, aparentemente, uma linguagem natural,
aproxima-se de padrões lógicos e matemáticos. É caracterizada pela aptidão, apreciação e
composição de obras musicais.
- A Inteligência Interpessoal, sugerida como a capacidade de entender outras pessoas,
comunicar-se de forma adequada com elas, motivando-as, incentivando-as e dirigindo-as, em
alguns casos, a um objetivo comum.
- A Inteligência Intrapessoal, referindo-se à capacidade de se conhecer, de entrar em
contato com seu próprio "eu", de se auto-avaliar, reconhecendo seus pontos positivos e
negativos, ficando, dessa forma, mais fácil de trabalhar.
- A Inteligência Lingüística, ou a capacidade de lidar bem com a linguagem, tanto na
expressão oral, quanto na escrita. Está relacionada à capacidade de usar a linguagem para
convencer outros indivíduos a respeito de um curso de ação; a capacidade de usar o potencial
mneumônico da linguagem para ajudar a lembrar informações e, finalmente, "grande parte do
48
ensino e da aprendizagem ocorre através da linguagem" (GARDNER, 1994, p. 61). É
caracterizada pela facilidade com palavras, textos e poesias, assim como habilidade para
aprender idiomas.
- A Inteligência Naturalista, ou a capacidade de realizar qualquer tipo de discriminação
no campo da natureza, reconhecendo, respeitando e estudando outro tipo de vida, e não
somente a humana. Além do reconhecimento da fauna e da flora, caracteriza-se pela
capacidade de fazer distinções no mundo natural e usar tal capacidade de maneira produtiva.
Posteriormente foram incluídas duas outras inteligências na Teoria de Gardner:
- A Inteligência Emocional
Proposta por Goleman, em 1995, está diretamente ligada ao perfeito equilíbrio das
inteligências pessoais - inter e intra, bem como à capacidade de reconhecer e lidar com as
emoções, aceitando-as e trabalhando-as quando assim for necessário.
- A Inteligência Pictória:
Justificada por Smole, em 1996, como a utilização de recursos pictórios como forma
de comunicação, com possibilidade de associação e complementariedade à inteligência
musical.
Sabendo-se que o desenvolvimento da linguagem e do pensamento se entrelaçam, não
se pode distinguir qual tem prioridade, pois é preciso elaboração mental para que as novas
experiências sejam integradas, e essa elaboração acontece devido a conceitos já digeridos e de
interfaces anteriores com o meio. Neste caso, todas as situações na escola oferecem
oportunidades para o ensino da arte e da motricidade, principalmente nas atividades
49
integradas, em que a criança planeja, debate, relata e se expressa de forma criadora e efetiva
com seu grupo.
Com relação às inteligências múltiplas concordamos com CAPRIO, 2003:Mais
importante do que reconhecermos as oito inteligências é compreendermos que todos nós as
temos potencialmente, e que essas podem (e devem) ser desenvolvidas ao longo da vida" (p.
06) .
Nesse sentido, o mundo pós-moderno exige a aquisição de novas competências, que
Perrenoud define como:
Representações da realidade, que construímos e armazenamos ao sabor de nossa
experiência e de nossa formação... conhecimentos bastante profundos são necessários para:
- analisar um texto e reconstruir as intenções do autor;
- traduzir de uma língua para outra;
- argumentar com a finalidade de convencer alguém cético ou oponente;
- construir uma hipótese e verificá-la;
- identificar, enunciar e resolver um problema científico;
- detectar uma falha no raciocínio de um interlocutor;
- negociar e conduzir um projeto coletivo. (Perrenoud, 1999, p. 7-8)
Segundo o autor, as competências manifestadas por essas ações não são, em si,
conhecimentos; elas utilizam, integram ou mobilizam conhecimentos: declarativos, que
descrevem a realidade sob a forma de fatos, leis, constantes e regularidades; procedimentais,
que descrevem os procedimentos a aplicar, para se obter algum tipo de resultado; e
condicionais, conhecimentos que determinam as condições de validade dos procedimentais.
Para se construir uma competência não basta chegar a conhecimentos confiáveis e
aprofundados; deve-se identificar e encontrar os conhecimentos pertinentes, organizá-los,
designá-los e julgá-los em relação à situação e mobilizá-los com discernimento.
Outros autores, como Bourdieu, 1972, chamam competência de arte de execução, pois,
através da ativação de um conjunto de esquemas lógicos de alto nível de abstração, diante de
50
situação inédita e complexa, o indivíduo consegue desenvolver estratégia eficaz com rapidez e
segurança maiores do que uma pessoa que contasse com os mesmos conhecimentos e também
fosse “inteligente”. Ou, ainda:
Sistema de disposições duráveis e transponíveis que integrando todas as experiências
passadas, funciona a cada momento como uma matriz de percepções, apreciações e ações e torna
possível a execução de tarefas infinitamente diferenciadas, graças às transferências analógicas de
esquemas que permitem resolver os problemas da mesma forma. (Bourdieu apud Perrenoud, p.
24).
Esses esquemas são construídos ao sabor de um treinamento, de experiências
renovadas, ao mesmo tempo que redundantes e estruturantes”( Perrenoud, 1999, p. 10),
vivenciadas e analisadas. Bourdieu insere, ainda, o conceito de Habitus, como uma forma que
permite enfrentar situações menores de conflito, com certa eficácia.
Assemelham-se à conceituação acima, os resultados das pesquisas de Wrinsberg e
Schmidt, 2001, p. 246- 265 , quando tratam da estruturação da experiência e aprendizagem
para o desenvolvimento de programas motores. Os autores asseguram que o desenvolvimento
de um programa motor envolve um padrão de movimentos ao invés de um movimento
específico, realizados através de esquemas e parâmetros que combinam a prática randômica e
variada.
Étienne e Lerouge, 1997, apud Perrenoud (1999, p. 10), citam ainda que:
A construção de uma competência depende do equilíbrio da dosagem entre o trabalho
isolado de seus diversos elementos e a integração desses elementos em situação de
operacionalização. A dificuldade didática está na gestão, de maneira dialética, dessas duas
abordagens. É uma utopia, porém, acreditar que o aprendizado seqüencial de conhecimentos
provoca espontaneamente sua integração operacional em uma competência.
51
Em síntese,
As competências, ao mesmo tempo que mobilizam lembranças de experiências passadas,
livram-se delas para sair da repetição, para inventar soluções parcialmente originais, que
respondem, na medida do possível, à singularidade da situação presente. A ação competente é uma
invenção bem-temperada, uma variação sobre os temas parcialmente conhecidos, uma maneira de
reinvestir o vivenciado, o visto, o entendido, o dominado, a fim de enfrentar situações
inéditas o bastante para que a mera e simples repetição seja inadequada. As situações tornam-se
familiares o bastante para que o sujeito não se sinta totalmente desprovido
(
Perrenoud, 1999, p.
31).
De qualquer maneira, as abordagens atuais sobre competência, criatividade e
performance habilidosa diferem dos antigos conceitos de talento ou de dons cedidos pelos
deuses. Todos os autores citados acreditam na possibilidade de construção desses esquemas.
Somam-se palavras fundamentais ao conceito de competências, como
desenvolvimento de auto-estima, estabelecimento de prioridades, gerenciamento de
conhecimentos, sinergias, conscientização sobre a alteridade, negociação de conflitos,
criatividade, administração do stress. Por não se formarem ou se transformarem
espontaneamente, junto com a maturação do sistema nervoso, ou serem realizadas da mesma
maneira em cada indivíduo, necessidade do aprendizado, de estabelecer e implantar o uso
de pedagogias diferenciadas, com situações de vivências, interação e contextualização do
conteúdo e realidade, ludicidade, prática intensiva através das imersões, e da análise com seus
vários feed-backs, permitindo que novas formas de abordagem e sedução para o aprender
induzam outras possibilidades de relações com os saberes, minimizando as desigualdades.
Assim, esse autor atribui, ao professor, papel fundamental nesse processo, pois cabem
a ele o know how, as estratégias, os recursos e a habilidade treinada, para extrair de seus
alunos suas competências mais adequadas, para as situações de aprendizagem e de vida em
sociedade.
52
Associadas às cinco competências relacionadas à progressão das aprendizagens feitas
pelos alunos, Perrenoud propõe, então, dez competências básicas para o professor:
- 1. Capacidade de organizar e dirigir situações de aprendizagem, bem como
observá-las e avaliá-las;
- 2. Administrar a progressão das aprendizagens no ciclo de aprendizagens do
Ensino Fundamental, fazendo balanços períodicos e contínuos, decidindo sobre a evolução
para uma nova etapa ou não.
- 3. Conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação.
- 4. Envolver seus alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho.
- 5. Trabalhar em equipe.
- 6. Participar da administração da escola.
- 7. Informar e envolver os pais na construção dos saberes.
- 8. Utilizar novas tecnologias.
- 9. Enfrentar os deveres e dilemas éticos da profissão.
- 10. Administrar sua própria formação contínua, condicionar sua atualização em
função das condições de trabalho estarem em evolução, e ao desenvolvimento das outras
competências, conservadas através de treino, e integrando as competências tradicionais às
emergentes. O professor deve seguir seu programa, dar suas aulas e exercícios, utilizar os
recursos oficiais de ensino e métodos recomendados, exigir silêncio, ordem, disciplina, dar
notas, conviver pacificamente com os colegas, simultaneamente à prática das novas
competências, que essendo requerida porque a especialização tradicional anterior tem
relação direta com a fabricação das desigualdades e exclusão.
A importância do professor é inquestionável; porém, essa profissionalização não
avançará sem o devido apoio e estímulo político, melhorando o salário dos professores, suas
53
condições de trabalho, seu plano de carreira e sua capacitação, entre tantas outras
reivindicações.
54
CAPÍTULO III
METODOLOGIA UTILIZADA
Para desenvolver este projeto utilizamos a pesquisa-ação, na qual
pesquisador e sujeitos da pesquisa buscam responder, com maior eficiência, aos problemas da
situação em que vivem, em particular, sob forma de diretrizes de ação transformadora.
Incorporando raciocínios dialógicos acerca do problema, e desta forma, produz ações e
conhecimentos de uso efetivo na escola, oferece conclusões, hipóteses de trabalho e a
possibilidade de contribuir na elaboração das teorias educacionais, deve fazer a mediação entre a
pesquisa e o ensino (Amorin, 2003).
Esta metodologia requereu pesquisa bibliográfica, "que se caracteriza pela utilização
de fontes secundárias, ou seja, pela identificação e análise dos dados escritos em livros, em
artigos de revistas, dentre outros. Sua finalidade é colocar o investigador, em contato com o
que já se produziu a respeito do seu tema" (GONÇALVES, 2001, p.35), e de campo
exploratória "aquela que se caracteriza pelo desenvolvimento e esclarecimento de idéias com
objetivos de oferecer uma visão panorâmica, uma primeira aproximação a determinado
fenômeno que é pouco explorado... e que suporte para realização de estudos mais
aprofundados sobre o tema" (op. cit, p. 65), que ocorreu através da observação da Educação
Física em escolas públicas de Ensino Fundamental e da Educação Artística, através de
questionário com professores, gerando o item "Diagnosticando o contexto das disciplinas no
Ensino Fundamental, em 2003".
Desta pesquisa resultou a "Implantação do Projeto Interfaces na Escola Estadual Portal
do Alto", acompanhado do Cd-Rom e da Apostila do Professor, com atividades aplicadas.
55
Para sua efetivação, foram coletados dados pessoais, peso e estatura, em uma ficha
biométrica simples. A seguir, obtivemos parâmetros para a realização de uma avaliação
psicomotora, que checou o desenvolvimento da lateralidade, dificuldades de ordens
perceptivas, como a organização do espaço (estruturação e orientação da direita e esquerda),
estruturação espaço-temporal, coordenação estática ou equilíbrio, coordenação visomotora,
coordenação dinâmica geral, coordenação dinâmica das mãos, rapidez, correspondência de
idade motora, observação da ocorrência de sincinesia (patologia na qual ocorre associação de
um movimento involuntário a um voluntário, por exemplo, levantar os dois braços quando se
ordenou que levantasse apenas um) e de paratonia, grande extensão ou distensão; utilizando-
se das provas I e II de Ozeretski, Guilman, prova de pontear e médias de correspondências de
idade motora de M. Stambak, e da adaptação da bateria de testes de Piaget-Head, descrita por
N. Califret, Granjon, todos encontrados em Bagatini (1987, p. 326).
Os protocolos desses testes psicomotores foram escolhidos por existirem e serem
aceitos, ao garantirem reprodutibilidade, confiabilidade e fidedignidade. Será recomendado
que, antes e durante a aplicação desta metodologia, cada aluno possa ter, em sua pasta, todos
os seus trabalhos com os processos decorrentes, possibilitando detectar o espectro de
habilidades, capacidades e competências existentes, bem como as deficiências, o que
permitirá orientação no sentido de amenizá-las e acompanhar o desenvolvimento total do
aluno. Essa pasta será chamada de um Processofolio.
A articulação do conjunto desses dados poderá embasar nossa hipótese de que, através
da estimulação individual de cada uma das diferentes habilidades, capacidades e
competências, através da experimentação e vivência motora (ampla e fina) das características
elementares de cada movimento artístico, pode-se melhorar o quadro geral de inteligências e
competências de cada indivíduo, além de torná-lo mais permeável com relação à aceitação das
suas próprias habilidades e inabilidades, assim como as dos outros.
56
3.1. DIAGNOSTICANDO O CONTEXTO DAS DISCIPLINAS NO ENSINO
FUNDAMENTAL, EM 2003
Como o foco desta investigação é a motricidade, nossa pesquisa abrangeu professores
de Educação Artística e observação e enquete com professores de Educação Física e alunos da
rede pública em aula.
3.1.1. Pesquisa com Professores de Educação Artística
Foi realizada através de entrevista com seis professores de Educação Artística, todos
da rede pública, oriundos de Ribeirão Preto, Santa Rosa do Viterbo, São Paulo e Jaboticabal,
obedecendo a um roteiro de perguntas com características qualitativas.
A estrutura do roteiro considerava os aspectos necessários para uma proposta
pedagógica na área, técnicas e materiais utilizados, grau de participação e adesão, sistema de
avaliação, inclusão, educação motora e a interface com a Educação Física.
A opinião desses professores, com relação aos aspectos que julgam necessários
abordar numa proposta pedagógica são o conhecimento, a contextualização e o fazer,
principalmente, seguidos do espírito crítico e da visão estética.
Técnicas e materiais variados são utilizados em suas aulas, desde pintura, desenho,
modelagem, música, teatro, lixo, vídeo e retroprojetor.
A participação dos alunos em sala de aula freqüentemente é ativa, trazendo materiais
pedidos com certa frequência, reconhecendo as linguagens artísticas fora do ambiente escolar,
em seu cotidiano e nas mídias, além de comentar sobre a diversão e o prazer que a aula
proporciona: "bem que a aula de artes poderia durar o dia todo".
57
As avaliações utilizadas por esses profissionais vão desde a participação do aluno, seja
ela qual for, passando pela diagnóstica e contínua, como recomendam os PCNs, às avaliações
mais específicas, referentes à composição, improvisação, auto-avaliação e registros em
gravador e filmadora.
Todos os professores de Educação Artística entrevistados acreditam ser possível a
inclusão dos alunos NEBAs através das aulas de artes, desenvolvendo atividades, melhorando
a auto-estima, a vontade de aprender. Um entrevistado comentou: " Todos são capazes de
produzir, mesmo sendo limitados".
Estes entrevistados disseram trabalhar com educação motora, através de expressão
corporal, dança, brincadeiras rítmicas, música , recortes e colagens e motricidade fina. Mas
desconhecem a profundidade do trabalho com a psicomotricidade.
Os seis professores acreditam ser ótimo e importante trabalhar o conteúdo de artes
com o de Educação Física, em função da transferência de conhecimentos, da
interdisciplinaridade e da complementação entre os conteúdos. Apenas um professor fez a
seguinte ressalva: " acho válido, desde que não se percam as especificidades".
3.1.2. Observação e enquete com Professores de Educação Física e alunos em aula
Com relação à Educação Física, foram questionados 230 alunos de quatro escolas
públicas, sendo que, destas, três escolas foram observadas em suas aulas de Educação Física,
por volta de 100 horas.
De uma forma geral, a infra-estrutura para a atividade física oferecida pelas escolas é
basicamente a mesma, ou seja, quadra poliesportiva descoberta e uso do espaço coberto da
58
cantina, diferindo, eventualmente, apenas na disponibilidade de materiais e nas propostas
pedagógicas de cada professor.
Verificamos a inclusão de alunos com necessidades especiais de aprendizagem,
principalmente com relação à faixa etária regulada pela Lei 9394/96; porém, na prática,
observamos problemas de entrosamento, comprometendo, em função das interferências
geradas, o interesse e o andamento da aula. De uma maneira geral, os professores têm
dificuldades de, a cada aula, criar jogos, brincadeiras e atividades diferentes, em função da
pouca disponibilidade de material e de motivação, ou até mesmo por não serem capacitados a
lidar com tamanha heterogeneidade.
Notamos poucos problemas de vandalismo e agressividade, além de elevado grau de
adesão à prática de atividade física, em escolas onde funciona o Ciclo I, enquanto que, nas
escolas que trabalham com o Ciclo II, ocorre aumento na agressividade dos alunos,
vandalismo nas estruturas e a diminuição do grau de adesão à medida que os alunos terminam
o Ciclo II. Nestas escolas acontece o “clássico”, meninos jogam futebol, enquanto gordinhos,
menos hábeis, são excluídos ou pseudo-incluídos, e algumas meninas ficam sentadas na
arquibancada, esperando o sinal para a próxima aula. As demais meninas fazem uma rodinha
de vôlei, num pedaço da quadra, pois na escola não existe rede para o desporto. Muitos
adolescentes estão acima de seu peso, mas nem por isso aproveitam a oportunidade de realizar
alguma atividade física. Essas turmas são bastante desmotivadas e desmotivantes, o que já não
acontece com as turmas de treinamento, que estão sempre presentes nos horários e dias
combinados. Além de estarem motivadas, realizam os exercícios para melhorar os
fundamentos do desporto, jogam entre si, ocorrendo rodízio de jogadores a cada cinco
minutos de jogo, e a aula flui bem. Ao serem questionados, independente da faixa etária e da
escola, os alunos percebem outros conteúdos gerados na aula de Educação Física, como a
necessidade do outro para que o jogo aconteça, e diversão e relaxamento na prática de
59
atividade física. Foi detectada a necessidade de aprofundamento dos saberes específicos da
disciplina.
À medida que o tempo de observação nas escolas foi passando, percebi que as
situações-problema se repetiam, e busquei informações de como poderiam ser solucionadas.
Com relação à agressividade escolar para com a estrutura física da escola, entre alunos, entre
alunos e funcionários e principalmente entre alunos e professores, vem sendo solucionada em
alguns países, como a Alemanha, com o aumento do número de aulas de Educação Física e
Educação Artística (Educação Motora), consideradas disciplinas que colaboram para
administração do stress escolar. Em relação ao desinteresse pela atividade física proposta nas
aulas de Educação Física, a partir de 14 anos, faixa etária correspondente à série, ou final
de segundo ciclo em São Paulo, supomos que está intimamente ligado ao conteúdo, à forma
pelo qual é apresentado, e pelo desconhecimento dos próprios alunos de temas transversais
afins com a Educação Física e Educação Artística, como a Educação pelo Movimento e
Educação Motora, o Desenvolvimento de Múltiplas Habilidades e Competências, a Educação
para a Saúde e a Administração do Stress. Acreditamos ser importante uma prospecção sobre
o assunto, principalmente com relação a série e faixa etária, onde é detectado o início do
desinteresse, corrigir a falha e modificar o curso do desinteresse. A pesquisa completa está no
Anexo I.
60
3.2. IMPLANTAÇÃO DO PROJETO INTERFACES NA ESCOLA ESTADUAL
PORTAL DO ALTO - RIBEIRÃO PRETO - SP
Efetuadas as observações nas escolas públicas, descritas anteriormente, escolhi a
Escola Estadual Portal do Alto para a implantação do Projeto.
Esta escola localiza-se na Rua Alfredo Calixto, 35, Fone: 639-9197 / 639- 8209, no
bairro de mesmo nome, na cidade de Ribeirão Preto - SP. O Projeto foi implantado durante o
ano de 2003, através do consentimento de suas Diretoras, da Profaª Marisol Raile, no primeiro
semestre, e Profª. Sônia Maria Gaia, no segundo semestre.
Figura 2 - Bairro Portal do Alto
3.2.1. Parte Descritiva do Local:
A escola ocupa cerca de 3000 m², possui jardim e horta em formação, cantina com
refeitório, quadra poliesportiva descoberta, dois blocos de prédios térreos, construídos com
estrutura metálica, eternit e placas de aglomerado, sala de vídeo, com uma pequena biblioteca
em formação, quatro salas destinadas à administração, como recepção e secretaria, diretoria,
61
sala de professores e almoxarifado, 7 salas de aula e 1 sala de reforço. Somente os banheiros e
o almoxarifado são de alvenaria.
Sua estrutura ainda não permite acesso a cadeirantes, em função da escada que une os
dois blocos, ausência de estacionamento exclusivo, rampas e banheiros adaptados. Porém,
como existe um outro acesso às salas de aula, sem escada, com pequenas modificações,
principalmente nos banheiros, este item pode ser sanado.
O público-alvo é composto por alunos em salas de Ensino Fundamental com inclusão
(classes reorganizadas), da primeira à sexta série, que possuem de 07 a 16 anos.
Durante os finais de semana, a instalação é emprestada para culto de igreja evangélica
do bairro e para o Programa Escola da Família, com apoio da UNESCO e da APM.
Funcionam, no período da manhã da primeira à quarta série, com uma sala cada série,
enquanto que, à tarde, funcionam primeira, terceira e sexta série, com uma sala cada e duas
salas de quinta série.
Figuras 3, 4 e 5 - Alunos do E.E. Portal do Alto em eventos especiais.
A escola vem prestando serviço à comunidade desde 2001, quando foi inaugurada.
Todas as instalações e equipamentos são novos e estão bem conservados.
62
A vizinhança é composta de residências e pouquíssimo comércio, principalmente
bares. Como é um bairro recente, possui uma grande quantidade de terrenos. O bairro Portal
do Alto é vizinho dos bairros Avelino Alves Palma, Jardim José Sampaio, D. Bernardo e
Miele, bairros classe C e D, reconhecidamente violentos. Durante minha estada, ocorreu o
furto de um tape do carro de um professor, o qual estava estacionado em frente à escola, além
do roubo do computador e impressora da escola, numa invasão noturna ocorrida em final de
semana. Depois desses episódios, a ronda, localizada a cinco quarteirões da escola, na Av. Ivo
Pareschi, é acionada sempre que surgem problemas internos relacionados a brigas e abusos de
alunos, ou quando funcionários percebem aproximação na vizinhança de elementos
estranhos. Até o momento não houve nenhum registro de tráfico de drogas nas proximidades
da escola.
Foram pesquisadas e séries, sendo 85 alunos, de ambos os sexos, com variação
etária de 11 a 16 anos, do período vespertino, em salas de ensino regular, com características
cognitivas, físicas e afetivas variadas, inclusive com desvios de comportamento, pesquisados
desde 20 de março a 14 de outubro de 2003.
Figuras 6 e 7 - Alunos desenhando nas aulas de Educação Artística.
63
3.2.2. Situação Inicial Diagnosticada
Ao aceitarmos ministrar as aulas de Educação Artística nessa escola, encontramos
peculiaridades e dificuldades quanto ao espaço físico reservado à disciplina, materiais
disponíveis e didática de professores anteriores. Com relação ao espaço físico, não existe um
lugar próprio para que as aulas aconteçam, sendo realizadas nas próprias salas de aula, tendo o
professor que liberar os alunos, um de cada vez, para ir buscar água no tanque próximo à
cantina. Além desse inconveniente, mesmo o professor pedindo para que as carteiras sejam
protegidas com papel, jornal ou plástico de lixo, ao encerrar as aulas, alunos e professor têm
que ficar cerca de dez minutos arrumando, secando e limpando a sala de aula.
Com relação aos professores anteriores, não houveram aulas antes de de abril de
2003, sendo essa ausência motivo para que os pais não pedissem ajuda de custos para compra
de material escolar de artes nas empresas onde o funcionários, como é o caso da Coca-cola,
empresa do bairro.
Os materiais disponíveis na escola são canetinhas e um rolo de papel craft. Alguns
alunos têm materiais como réguas, canetinhas, lápis de cor, pincéis e guache, enquanto outros
não têm nada e nem m como comprar. Considerando a falta de materiais de artes e a
carência de alguns alunos, resolvemos trabalhar apenas com materiais descartados, coletados
na natureza, reciclados ou reformados, para realizarmos nossas aulas - um grande desafio.
Inicialmente, os alunos não gostaram muito, pois todas as aulas de artes da semana, na
escola, são as últimas, e como não havia professor, os alunos eram dispensados mais cedo.
Em nosso primeiro contato, ao serem inqueridos sobre o conceito que tinham sobre
artes, muitos definiram como bagunça, ou seja, aula de bagunça, o que, inevitavelmente,
ocasionou-me muitos problemas disciplinares, de organização e regência de sala. Um outro
aspecto conflitante é o grau de agressividade de alguns alunos, para com o professor, a
estrutura física da escola e a própria aprendizagem.
64
Surgem, assim, questões sobre a necessidade de aprender a lidar com a agressividade,
quer seja dos líderes negativos, quer seja de alguns casos isolados, dentro da sala de aula, ao
mesmo tempo que temos o contraponto de estarmos trabalhando com a liberação de emoções
e expressões que envolvem diretamente o conceito de artes. Como estimular sua criatividade,
sua alegria, o relacionamento social com seus companheiros, as trocas, ao mesmo tempo que
os encarceramos em rigidez disciplinar? Acreditamos que cabe ao professor perceber as
múltiplas competências de seus alunos e ensinar-lhes em que circunstâncias seu uso é
adequado, dentro de situações de aprendizagem e de vida em sociedade, pois, relembrando
FREIRE (1997), a marca característica da criança é a intensidade da atividade motora e a
fantasia.
3.2.3. Os Objetivos de Ensino-Aprendizagem Expressos
Desenvolver habilidades relacionadas a psicomotricidade, múltiplas inteligências e
competências.
3.2.4. O Conteúdo Curricular Ensinado
Através do estudo dos estilos correspondentes a história da arte, cultura geral e
expressão corporal, auxiliar o aluno em suas dificuldades de expressão, quer sejam de
motricidade fina ou ampla, transformando-o em um aluno fruidor de conhecimento,
criatividade e comunicação, enfocando a inclusão e a cidadania.
65
3.2.5. A seqüência didática
A seqüência didática será esboçada através de um resumo de nossa atuação nas aulas:
Adaptação e Introdução:
O desenvolvimento das múltiplas inteligências ou diferentes competências através da
educação pela arte e para a motricidade possibilitou que tanto alunos quanto professor-
aplicador tomassem os primeiros contatos com a cnica de forma lúdica, respeitosa nas
limitações individuais e sem grandes intervenções nas primeiras vivências motoras e nas
práticas apresentadas, bem como permitiu a mensuração de aspectos físico-motores através de
aplicação de avaliação biométrica e psicomotora, com uso dos testes anteriormente descritos.
Os alunos se autodesenharam com lápis preto e colorido; realizaram um desenho comparativo
entre a guerra do Iraque, em evidência na época, e a obra Guernica, de Picasso. Com a técnica
que previamente dispunham realizaram um desenho animado com traços e lápis preto, e,
em função do período de iniciação da implantação sobrepor-se ao período da Páscoa, os
alunos confeccionaram um souvenir característico, envolvendo desde a preparação do ovo,
com o furo e a retirada da clara, até a sua pintura e embalagem. Ao final, foi aplicada uma
avaliação teórica.
Figuras 8 e 9 - Detalhe do trabalho em ovo e a produção dos alunos.
66
Pré-História e as Primeiras Prospecções:
Neste segmento, os conceitos sugeridos de arte e motricidade, vistos anteriormente,
interagirão com o aprendizado da Arte Pré-Histórica, através da confecção de pinturas
rupestres. Durante o estudo da Pré-História, os alunos assistiram parcialmente ao filme "A
Guerra do Fogo", pois as aulas duram 50 minutos e o filme 2 horas. Posteriormente, em sala,
trabalharam sobre o entendimento do filme, sendo que alguns aspectos foram enfocados,
como a linguagem pré-histórica, a pintura rupestre e a modelagem em argila. Os alunos
trabalharam com argila, confeccionando um coração, pingente de bijuteria, como presente
para o Dia das Mães. Foram aplicados testes de lateralidade, através de desenhos de mamute,
com a mão direita e esquerda, de jogos, como o labirinto, que utilizam direita e esquerda, e do
ditado rítmico, e foram iniciados os trabalhos de expressão corporal em grupo, como o
Cânone Gutural e o Jogo da Corda. Foi aplicada uma avaliação teórica.
Figuras 10 e 11 - Pinturas Rupestres, vista superior e frontal.
67
Antigüidade e a Inteligência Corporal Cinestésica:
As artes das grandes civilizações egípcias, gregas e romanas foram estudadas,
primeiramente de forma teórica e depois através de análise de filmes que retratam o período.
Pensando em zona proximal de desenvolvimento, a inteligência corporal cinestésica foi
escolhida para ser desenvolvida neste estilo, por ser o contato sensório-motor o primeiro
encontro que temos com a(s) civilização(ões). Estando relacionada à perfeita forma de
expressão corporal, assim como à resolução de determinado problema por meio de
movimentos do corpo, a experimentação e a vivência da motricidade ampla, foram baseadas
na ginástica rítmica popular, que utilizou os brinquedos manufaturados pelos alunos e os
mesmos brinquedos industrializados. Na motricidade fina, foi escolhida a manufatura de um
papel reciclado (papiro), desde o picotamento, a dissolução do papel em massa, o
peneiramento, a secagem e a pintura; o estudo dos crânios dos faraós - frontal e lateral, a
pedido de um dos alunos, que gostaria de aprender a desenhar rostos; a confecção dos
brinquedos para a GR Popular, como ioiôs, a partir de pedras e barbantes; bambolês, a partir
da secagem de galhos amarrados em forma de circunferência; boneca articulada, a partir do
desmembramento de uma boneca e posterior união das articulações com barbante; bolas
variadas, feitas de meias, e o teatro de sombras. Nesta fase, foi realizado um teste de
motricidade ampla, com os ioiôs, arcos e bolas.
Figuras 12, 13 e 14 - Faraós de papel reciclado, rosto de faraó de perfil e Exposição realizada na Delegacia de
Educação de Ribeirão Preto, em agosto de 2003.
68
Figuras 15, 16 e 17 - Ioiôs de pedra e industrializados, experimentação dos alunos com ambos os ioiôs.
Figuras 18, 19 e 20 - Boneca articulada, bolas variadas, inclusive bolas de meia, vivência em malabares.
Figuras 21, 22 e 23 - Arcos variados, experimentação dos alunos em grupo e individualmente.
A seguir o teste psicomotor de motricidade ampla. Disfarçado em coreografia de
Ginástica Rítmica, compunha-se de salto de entrada no banco e equilíbrio; pega do
equipamento escolhido para o teste, podendo ser ioiô, bola ou arco. O teste compunha-se,
inicialmente, do equilíbrio com apenas uma perna e coordenação com a manipulação do
equipamento, sem que fosse perdido; posteriormente, equilíbrio estático com os olhos
fechados por 10", andar manipulando o equipamento e sair do banco de forma grupada. O
objetivo deste teste é avaliar a coordenação visomanual, a dinâmica geral, o controle do
corpo, a organização no espaço e o equilíbrio.
69
Figuras 24 a 38 - Teste psicomotor, motricidade ampla.
Idade Média e a Inteligência Pictória:
Através da utilização de recursos pictórios como forma de comunicação, com
possibilidade de associação e complementariedade, esta inteligência foi escolhida para ser
vivenciada neste estilo, em função da citação de Ferraz, 1975: " A simples expressão motriz
que resulta na garatuja infantil, na idade em que a expressão falada não chega a produzir a
70
frase, representa algo que emerge do caos mas constitui, de fato, um primeiro esforço para
dar passo à expressão instintiva, sica, em que muitas vezes a imaginação e a intuição
balbuciam também".
Nesse período, além de aulas teóricas e apresentação do CD referente ao assunto, com
o qual puderam ouvir cantos gregorianos, foram estudados alguns textos da arte trovadoresca
e da literatura medieval, com a posterior co-criação de uma Iluminura. Livro de manufatura
coletiva, no qual se utilizou a reprodução de obra literária referente ao período, como "Poesia
de Amigo", através de desenhos com lápis de cor e caligrafia.
Figuras 39 e 40 - Capa de Iluminura e miolo, com o trabalho de desenho e caligrafia dos alunos.
Nessa vivência medieval foram feitos trabalhos de recorte com tesoura, madeira,
materiais reciclados e colagens, um portal vitral de madeira, decorado com mosaico, bem
como foi praticado em sala de aula, o jogo dramático, no qual todos os alunos participaram,
com improvisação da peça " A Santa Inquisição", que retrata o final desse período. Foram
estudadas algumas danças folclóricas.
71
Figuras 41, 42 e 43 - Vitral "Portal" feito de material reciclado (madeira, esmalte de unha, cola plástica, celofane
e garrafas pet). Vista frontal , detalhe interno e vista lateral.
Figuras 44 a 45 - Duas cenas do jogo dramático " A Santa Inquisição".
Figuras 46 a 47 - Forró e Catira.
72
Renascimento e a Inteligência Espacial:
A Inteligência Espacial relaciona-se à capacidade de extrapolar situações espaciais
para o concreto e vice-versa, possuindo, dessa forma, grande percepção e relacionamento com
o espaço. Foi escolhida para ser desenvolvida nesse período, porque é no Renascimento que
artistas como Leonardo da Vinci e Michelangelo, entre outros, dominaram a técnica da
perspectiva.
Foi realizada uma iniciação ao desenho arquitetônico, enfocando essa técnica. Os
alunos aprenderam a desenhar de forma simplificada, com apenas um ponto de fuga, e
tiveram contato com imagens de Autocad, programa gráfico que permite a construção de
plantas arquitetônicas, com o qual fizeram decalque em papel manteiga. Através dessas
imagens os alunos puderam analisar e descobrir os pontos de fuga. Para a estimulação da
inteligência espacial, agora em tamanho real, os alunos foram desafiados a participar do jogo
"Batalha Naval", abordado de duas formas: em sala e na quadra, onde as peças do jogo eram
caravelas, galeões e naus, vivenciadas pelos alunos.
Representando o período das grandes descobertas, de invenções, como a bússola, e das
navegações, foi montada em sala de aula, de forma coletiva, utilizando materiais reciclados,
uma caravela de madeira.
Figuras 48 a 49 - Desenho em perspectiva e caravela em exposição na Delegacia da Educação de Ribeirão Preto.
73
Dentro da literatura e do jogo teatral, estudaram Shakespeare. A pedido dos alunos, e
por influência da novela "Mulheres Apaixonadas"¹, na qual os personagens programaram a
encenação da peça "Romeu e Julieta", foi realizada uma adaptação da peça original, retirando
o fim trágico e substituindo-o pela fuga dos personagens para o Brasil, enfocando, através de
sua descoberta, a Semana do Folclore e o conhecido doce, Romeu e Julieta. Os alunos
interpretaram e foram responsáveis pela confecção dos cenários e dança.
Como não há anfiteatro na escola, os alunos encenaram a peça na quadra, sendo que os
atos ficavam dispostos em vários espaços e tanto atores como público se deslocavam durante
a encenação. Todos os materiais criados referentes à Idade Média foram aproveitados como
cenário.
Figuras 50 a 54 - Cenas do jogo teatral "Romeu e Julieta".
² Novela exibida pela Rede Globo, no ano de 2003, escrita por Manoel Carlos.
74
Classicismo e a Inteligência Lógico-Matemática :
Detectada quando o indivíduo tem facilidade em desenvolver e/ou acompanhar cadeias
de raciocínios, resolver problemas lógicos e lidar bem com cálculos e números.
Foi escolhido esse período, pela quantidade de batalhas e guerras - a necessidade de
estratégias militares, o que enfatiza essa competência. Na prática, foram utilizados jogos de
lógica, num grande festival. Os alunos, em sala de aula, aos pares, disputavam dama e ludo,
entre outros jogos disponíveis na escola e trazidos pelos alunos.
Foi realizada através de apresentação de fita VHS uma retrospectiva com relação à
música, aos espetáculos de balé e seus correspondentes artistas, bem como a lógica necessária
à confecção de uma coreografia, analisando a música, a iluminação, a dança, o
posicionamento dos bailarinos e sua movimentação, estendendo essa percepção ao jogo de
futebol, às partidas de dama ou xadrez.
Completados seis meses de pesquisa, encerramos aqui nosso trabalho.
75
CAPÍTULO IV
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como foi comentado, na situação inicial diagnosticada existe uma não aceitação das
aulas de Educação Artística nessa escola, além dos aspectos de agressividade e presença de
líderes negativos, pois vários alunos estão inseridos na e séries em idade acima da idade
própria, perdendo o referencial de seu grupo etário.
Esse contraponto foi resolvido por si só, pois as próprias aulas de artes ajudam na
liberação dessas energias, com as atividades de motricidade fina que, segundo as pesquisas de
Schimidt e Wrisberg (2001), diminuem o grau de ativação e, com ela, a ansiedade, a
agressividade e a agitação; e com as atividades de motricidade ampla, como danças, ginástica
rítmica popular e teatro, que promovem a liberação de endorfinas, também interferindo nesses
estados.
Com relação aos alunos excluídos, ou com relação aos hiperativos ou aos líderes
negativos, o ensino mútuo, através do sistema de monitoria, resolveu a questão. O sistema de
monitoria consiste na divisão da classe em grupos de trabalho, sendo que um grupo é
composto de seis alunos, no máximo, que podem se centrar em um único projeto de trabalho,
dividido em partes, que ao final se juntam num trabalho coletivo; ou em atividades
completamente diferentes, mas que ao final se complementam em uma única atividade, com a
participação intensa de toda a sala. Existem vantagens nesse sistema, as quais evitam a
exclusão, pois o trabalho é coletivo e ninguém faz melhor ou pior do que o outro. Além disso,
esses alunos-monitores são preparados para liderar seu grupo e mediar as intolerâncias,
ficando sob sua responsabilidade a coleta de materiais necessários (desde pincéis a livros)
para a confecção do trabalho, as instruções do professor (teoria e prática), o conhecimento
acerca da tarefa que será desenvolvida por seu grupo, sua capacidade de organização e
76
regência, a presença dos componentes de seu grupo, sua participação no trabalho/por dia, sua
adequação de comportamento em sala, o material criado e a apresentação do material criado.
A cada projeto de trabalho são escolhidos novos monitores que não irão se repetir ao longo do
ano. A avaliação dos componentes da equipe é realizada pelo monitor e regulada pelo
professor. A avaliação da monitoria é feita por seu grupo, pela sala e pelo professor, valendo
sempre uma pontuação acima, pelo fato de o aluno ter assumido uma responsabilidade.
Percebe-se, nos alunos monitores, durante e ao final dos projetos, uma melhora em sua auto-
estima, bem como em seu comportamento e aproveitamento escolar, como um todo.
Como os materiais, livros, imagens e equipamentos são sempre escassos, foi
empregada uma técnica muito comum em aulas de Educação Física: o rodízio em estações.
Cada estação tem um tipo de equipamento ou materiais que uma equipe irá utilizar. De tempo
em tempo, um sinal é dado e as equipes trocam de estações.
Isso pode acontecer em minutos, dentro de uma aula, ao trabalharmos com materiais,
jogos e técnicas simples; ou a cada aula uma equipe ficará numa estação, que pode ser
assistindo a um filme, na sala de vídeo, praticando um jogo motor, em quadra, ou
desenvolvendo um artesanato, em sala de aula.
Com relação ao emprego do multimídia, experimentamos duas possibilidades:
transformar o material de digital para VHS, pois todas as escolas possuem videocassete, ou,
através do rodízio em estações, no sistema de monitoria, utilizar somente um computador para
apresentação da parte digital. Como na escola onde foi implantado o projeto o computador
não está disponível para ser usado pelos alunos, foi levado um notebook e montado em sala de
aula, num primeiro momento. A experiência não deu certo, por ser uma tela pequena de
computador para que trinta alunos assistissem. O problema foi corrigido com o rodízio em
estações, no sistema de monitoria, instalando o notebook na sala de vídeo.
77
Dentro de uma perspectiva qualitativa, avaliando em termos gerais, observamos que a
prática randômica das atividades variadas de motricidade, de incentivo às múltiplas
inteligências e desenvolvimento de competências melhorou ao longo do tempo, comprovando
a lei de Hick, pois o tempo de reação-estímulo-resposta se tornou mais rápido à medida que o
projeto foi sendo implantado, mesmo porque, além de os alunos ficarem menos dispersos, seis
meses possibilitaram acomodação e adaptação entre o aplicador, alunos e projeto. Houve
melhora na memorização do conteúdo e nos processamentos paralelos que permitem a
associação de idéias e o desenvolvimento da criatividade. Reconstruindo um diálogo da aluna
T., da série, a respeito de uma reciclagem de vela, ela imediatamente percebeu o material
utilizado como molde, uma caixinha de leite, enquanto que pessoas que não estão ligadas ao
projeto dificilmente perceberiam o uso inusitado desse molde.
As turmas se tornaram mais motivadas para as aulas, tanto que, por duas vezes
diferentes, alunos suspensos por indisciplina, mesmo que não freqüentando, interessaram-se
em saber que trabalhos estávamos realizando, fizeram o trabalho e nos enviaram na data de
recebimento, por seus colegas vizinhos.
O desenvolvimento do ser de forma holística, o indivíduo como um todo, permitiu
desenvolver performances habilidosas, pois muitos dos alunos se destacaram nas diversas
atividades implantadas com essas performances, bem como desenvolveram habilidades
alternativas para suplantar suas dificuldades. Foi o caso de V., que superou seus problemas de
dicção e representação escrita ao se tornar monitora da peça de teatro "Romeu e Julieta",
sendo bastante elogiada pelos outros professores e pelos pais, quando houve a encenação. C.,
aluno agressivo, ausente, com desvio de comportamento, como fugas, foi valorizado em sua
única produção, um papagaio, utilizado como vela da caravela. Por conta disso, sempre que
estava presente na escola, ficava para a aula de Educação Artística, como se sentisse culpado
por não freqüentar, tanto que pedia liberação para ir embora.
78
O ensino prático, o aprender-fazendo, a contextualização, também realizada com o uso
do videocassete e do computador, a experimentação da técnica, do artesanato, a vivência
motora dos testes, das brincadeiras e do teatro, quando relacionados ao processos de ativação,
para menor grau quando trabalhos de motricidade fina e maior grau quando trabalhamos
motricidade ampla, com liberação de endorfinas, provocam relaxamento de formas diferentes,
ajudando a administrar o stress escolar. A maioria dos alunos gostam de colaborar nas
atividades, sentem prazer em fazer algo, pois muitas vezes ficaram além do horário do último
sinal, ou vieram à escola em um outro período, que não o de suas aulas, para terminar algum
trabalho.
Com relação ao reconhecimento da importância das disciplinas, acredito ser um
problema cultural. Os alunos reconhecem a ludicidade, mas não a sua importância na escola e
na sua saúde. É necessário um trabalho de marketing, para o desenvolvimento e, em outras
vezes, para o resgate da imagem das duas disciplinas.
Sem a colaboração da administração, através das figuras da coordenadora e diretoras,
que percebem as aulas como uma nova organização, bem como do professor de Educação
Física, esta implantação ficaria totalmente comprometida, e talvez engavetada. A liberação de
energias provocada pelas aulas foi considerada, por muitos professores, bagunça, falta de
regência de turma e indisciplina. Porém, a produção das três salas, elogiadas pelos pais e pela
Diretoria de Educação, em agosto/2003, quando expostos os trabalhos da escola,
minimizaram essa conceituação.
No entanto, é nítido que o sucesso de qualquer trabalho depende da vontade do
professor aplicador, da disposição das pessoas, administração, alunos, outros professores,
estrutura conivente e solidária da escola em apoio aos envolvidos, existência de
equipamentos, materiais, capacitação, pois nada disso seria possível se o esforço é isolado. A
grande falha no projeto é que, apesar de funcionar bem como prática pedagógica inclusiva, no
79
nível de necessidade básica de aprendizagem em alunos matriculados na rede regular de
ensino, ele não permite acessibilidade ao conhecimento ao se tratar de deficientes visuais,
havendo, portanto, necessidade da criação de outros meios para que o DV também participe.
Finalmente, pude observar, pela implantação do projeto "Interfaces", que a eficácia do
processo de aprendizagem também passa pelo reconhecimento da importância do lúdico na
vida pessoal e social; da possível administração da agressividade, da violência e do stress na
escola, pelas duas disciplinas; da necessidade de valorização perante as outras matérias,
profissionais e sociedade; apoio; capacitação; estrutura adequada e equipamentos; salário;
motivação; aumento do número de aulas das duas disciplinas, intercalando-as durante os dias
da semana com as outras matérias, além de uma alteração de propostas pedagógicas para que
os alunos não cheguem ao Ensino Médio desmotivados com a Educação Física/Artística,
enfocando experiências, vivências e jogos motores até 5ª série, e que, a partir da 6ª série, além
deles, se inicie o ensino da educação para a saúde: mental, física e social, o ensino-
aprendizagem de técnicas artísticas e fundamentos das práticas esportivas recreativas com
interfaces de conteúdos Educação Física e Artística; a partir da série, a prática de esportes
competitivos ou performances habilidosas em quaisquer das artes, e uso de metodologias
alternativas. As sugestões para uma proposta pedagógica que utilize as Interfaces”
encontram-se no anexo II.
80
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88
An ex os
89
"Diagnosticando o contexto da Educação Física e Artística
no Ensino Fundamental em 2003”
RESUMO:
O interesse deste trabalho concentra-se na identificação, determinação e avaliação de aspectos como: a educação
motora propiciada pelas disciplinas; o clima motivacional das aulas; a especificidade de conteúdos; a didática e a
disposição de infra-estrutura, materiais e equipamentos; a inclusão; a ludicidade; o relaxamento e a cidadania,
contextualizando-as no presente ano. A metodologia utilizada na Educação Física foi a "Observação em campo
da atuação de professores de Educação Física em quatro escolas públicas", com preenchimento de relatório e
"Questionário de perguntas abertas e fechadas com alunos". Neste estudo foram amostrados 230 alunos, sendo
entrevistadas salas de 4ª à 8ª séries. A metodologia utilizada na Educação Artística foi entrevista qualitativa com
seis professoras da área, que responderam um "Roteiro de perguntas abertas". O objetivo é diagnosticar a
situação atual e, com isso, perceber problemas, ameaças e oportunidades para uma atuação mais adequada. As
conclusões gerais são que, à medida que chegamos ao final do Ensino Fundamental, o interesse e a motivação
pelas disciplinas vão diminuindo; havendo necessidade de estabelecer especificidade nos conteúdos, focando não
aspectos esportivos e recreativos, mas também educação para a saúde e administração do stress através da
atividade física, dosados com interfaces de socialização e cidadania. Neste panorama, foram observadas, além
das crianças com necessidades básicas de aprendizagem, o aparecimento de um novo um grupo de alunos com
pobres vivências motoras e sociais, em função de seu confinamento em suas casas.
INTRODUÇÃO:
Em 2003, devido à obrigatoriedade de 300 horas de estágio curricular para as áreas de
licenciatura, previstas na LDB 9394/96, direcionei minha observação para a coleta de dados e
materiais em campo em escolas públicas da cidade de Ribeirão Preto, num total de 106 horas,
o que está dentro dos padrões de estudo na área de educação.
Sabendo-se que esta forma de investigação permite algumas lacunas em termos de
confiabilidade, em função de seletividade e parcialidade do observador, com o intuito de
minimizar essas interferências, foam realizados um planejamento e uma preparação, nos
quais foram definidos: foco da investigação; propósito da pesquisa quanto à forma de sua
inserção na Monografia; grau de participação do observador; duração das observações; grau
de explicitação do papel do observador.
Quanto ao foco da investigação, que é a motricidade, apesar de entrevistarmos os
professores de Educação Artística, nossa concentração de observação foram as aulas de
Educação Física, onde também foram aplicados questionários.
A participação de cada escola nesta pesquisa foi:
- E.E. DR. JOÃO RODRIGUES GUIÃO - 28 h estagiadas e 34 questionários
respondidos por alunos de 4ª série;
- E.E. CID DE OLIVEIRA LEITE - 28 h estagiadas e 23 questionários respondidos
por alunos de , 14 por alunos de , 24 por alunos de e 18 por alunos de série,
totalizando 79 entrevistados;
90
- E. E. PORTAL DO ALTO - 50 horas estagiadas e 23 questionários respondidos por
alunos de série, 23 questionários de alunos de e 25 questionários de alunos de 6ª,
totalizando 73 entrevistados.
Neste estudo, também tivemos a colaboração do Professor de Educação Física, Sr.
Walter dos Santos, entrevistando 44 alunos da ESCOLA MUNICIPAL VIRGÍLIO SALATA,
sendo 19 alunos de 7ª série e 25 de 8ª série, resultando num total geral de 230 alunos
entrevistados de 4ª à 8ª série e 9 professores.
Quanto ao grau de minha participação ao observar, em função do contato ser pequeno
(número de horas totais estagiadas por cada série ser de 4 horas) não houve grande imersão,
sendo, portanto uma atuação mais como espectadora do que como participante. Segundo
Junker (1971), enquadramo-nos no que denomina:
Participante como Observador “não oculta totalmente suas atividades, mas revela apenas parte do
que pretende....a preocupação é não deixar totalmente claro o que se pretende, para não provocar
muitas alterações no comportamento do grupo observado. Esta posição também envolve questões
éticas óbvias. Citado em LÜDKE, M. e ANDRÉ, M.E.D.A, 1986, p. 28
Quanto ao grau de explicitação do papel do observador, em cada escola observada, na
primeira semana a investigação se deu apenas com observação, sendo que, posteriormente,
geralmente nas últimas semanas, foi realizado um roteiro de perguntas e dúvidas referentes a
cada escola, com o professor responsável pela Educação Física e com a secretária. Foram
apresentados questionários aos alunos, que foram respondidos sem maiores problemas. Todas
as anotações de campo foram realizadas fora do local pesquisado. Em função do pequeno
tempo de imersão por série não houve envolvimento pessoal na vida do grupo, apesar de,
tratando-se de crianças, existir curiosidade sobre a minha presença. Com relação às Diretorias
das escolas, foi enviada uma carta de próprio punho, solicitando o estágio, acompanhada de
Declaração de Matrícula na qual constava o pedido oficial do Centro Universitário para
estagiar naquela entidade, o Resumo do Projeto da Monografia, e o Currículo.
Uma das escolas estudadas foi a E.E. DR. JOÃO RODRIGUES GUIÃO, localizada à
Av. Treze de Maio, 266, (Fone 618-0210), importante avenida de acesso da cidade, que divide
os bairros Jardim Paulista e Paulistano, reconhecidos como bairros de Classe Média. Tem
como Diretora, a Professora Aparecida Meire Foresto e como Responsável pelo estágio, a
Profa. Maria Lucila Siqueira Couto Rosa. O estágio foi autorizado pela Coordenadora Profa.
Maria do Carmo Pereira Barbieri Manfrin.
Fachada lateral e pátio interno da E.E. DR. JOÃO RODRIGUES GUIÃO
91
Aula de Educação Física na quadra poliesportiva.
A segunda escola estudada foi a E.E. CID DE OLIVEIRA LEITE,
localizado à R. Itararé, 608 (Fone: 618-0211), que tem como Diretora, a Profa. Sra. Carmen
C. Castro Marques. O estágio foi realizado junto a Professora responsável pela Educação
Física, Profa. Fabiana Márcia Monteiro.
Fachada da E.E. CID DE OLIVEIRA LEITE
A terceira escola estudada foi a E.E. PORTAL DO ALTO, localizada à R.
Alfredo Calixto, 35 (Fone: 639-9197 / 639- 8209), tendo no primeiro semestre, como
Diretora, a Profa. Marisol Raile e no segundo semestre a Profa. Sônia Maria Gaia e Prof.
Rogério Festucci Gonçalves, como responsável pela Educação Física.
Fachada da E.E. PORTAL DO ALTO
Dia do Desafio: atividades físicas realizadas por todos os alunos da escola.
92
Na E.M.E.I VIRGÍLIO SALATA, localizada à R. Japurá, 965, fone: 633-8943, não foi
feita "Observação", mas apenas aplicação dos questionários.
A seguir temos:
a) Roteiro de perguntas para os professores
1) Nome:
2) Escola:
3) Disciplina:
4) Há quanto tempo é professor desta disciplina?
5) Com que faixa etária trabalha? Indique se Ensino Fundamental ou Médio e qual ciclo:
6) Quais os aspectos que julga necessários serem abordados em uma proposta pedagógica para artes?
7) Com quais materiais e técnicas trabalha?
8) Quanto à participação dos alunos? É ativa?
( ) Freqüentemente ( ) Algumas vezes ( ) Raras vezes ( ) Nunca
9) Trazem materiais para que a aula ocorra?
( ) Sim, frequentemente ( ) Raras vezes
( ) Algumas vezes ( ) Nunca trazem material
10) Reconhecem a importância da disciplina, valorizando a aula?
( ) Sim. Cite algum motivo ou situação que o leva a crer que o aluno a considera importante:
( ) Não. Cite algum motivo ou situação que o leva a crer que o aluno não a considera importante:
11) O que acha de trabalhar o conteúdo de Artes junto ao conteúdo de Educação Física?
b) Modelo do questionário de perguntas abertas e fechadas aplicado aos alunos e as
tabulações de respostas:
Os resultados obtidos com os questionários foram em síntese:
93
- Em todos os gráficos, percebemos a inclusão de alunos mais velhos em salas
regulares, apesar de predominarem nas quartas séries a faixa de alunos com 10 anos, nas
quintas com 11 anos, nas sextas com 12 anos, nas sétimas com 13 anos e nas oitavas com 14
anos, fechando o Segundo Ciclo do Ensino Fundamental.
- Nas quartas séries obtivemos um percentual de 90 % de alunos que aprovam as aulas
de Educação Física, nas quintas séries temos 100 % de alunos que a aprovam, nas sextas
séries temos 97,7 % de alunos que a aprovam, nas sétimas temos um resultado de 100 % e
nas oitavas 93 %. Percebemos que o grau de aceitação diminui ao aproximarmos do Ensino
Médio.
- Com relação aos materiais que mais gostam de usar, a bola ocupa em torno de 70%
da preferência em todas as séries analisadas.
- Todas as séries responderam que ocorrem brincadeiras variadas nas aulas de
Educação Física, sendo as que mais gostam: cordas e queimadas.
- A pergunta sobre a prática de desporto gerou dúvidas, pois os alunos de todas as
escolas pesquisadas perguntaram o que vem a ser desporto, alegando que desconheciam seu
conceito. Na faixa etária de 10 e 11 anos, quartas e quintas séries, os desportos estão sendo
introduzidos de forma recreativa e não competitiva. Nas faixas superiores, os professores
ensinam os fundamentos básicos, regras e regulamentos, jogos adaptados, jogos pré-
desportivos e competitivos entre os alunos da própria escola e em campeonatos em outras
escolas.
- Os alunos percebem outros aprendizados nas aulas de Educação Física, como
ginásticas, alongamentos, brincadeiras, relaxar e se divertir.
Através da questão sobre o aprendizado mútuo " Não se aprende sozinho, é importante
a participação da classe na construção da aula. Sendo assim, existe a necessidade de TODOS
os alunos participarem das aulas TODOS os dias, em TODAS as brincadeiras? Explique por
quê?", o pensamento das crianças com relação ao ensino mútuo e integração está presente na
dinâmica das aulas de todos os entrevistados.
CONCLUSÃO
A educação permite a aquisição de noções, desenvolvimento de capacidades,
habilidades, competências, formação de hábitos como atenção, observação, organização,
formação de atitudes (valorização, interesse e curiosidade). Porém, não deve visar apenas à
auto-realização do aluno e ao enfoque para o trabalho, mas as questões de cidadania, como
inserção social, aceitação consciente dos valores sociais: moral, ética, direitos, deveres, justiça
e valores referentes a ajustamento ao grupo, como cordialidade, cooperação e confiança.
De uma maneira geral, o que se observa na escola é que muitas crianças e adolescentes
apresentam diversos tipos de impedimentos relacionados à comunicação e expressão nas
linguagens escrita, oral, visual, auditiva (timidez, ausência de auto-confiança, entre outros);
desmotivação para o aprendizado, complementação ou aprofundamento de conteúdos;
problemas relacionados à articulação de idéias com começo, meio e fim; ausência da
percepção da interação dos conteúdos, quer sejam de capital cultural trazido de sua realidade,
quer sejam do conhecimento adquirido na escola; dificuldades de coordenação, equilíbrio,
flexibilidade, destreza, sincronização, caligrafia, orientação espaço-temporal, percepção de
lateralidade, além de estarem acima do peso esperado para sua faixa etária; por viverem
94
confinados em suas casas, sendo pouco estimulados aos jogos e brincadeiras de rua, pois a
rua não é mais segura; derivando em uma vida social pobre, que os impede de ter variadas
experiências tanto motoras amplas e finas, como de relacionamento. Desconhecendo e
relevando a importância da estimulação sensória-psico-motora social, o que deveria ser
priorizado pelos pais, pelos professores nas escolas, pelo poder público e mídias; essas
crianças e adolescentes não aproveitam a oportunidade de realizar alguma atividade motora
ou social nas aulas de Educação Física; além de não perceberem a importância de aprender a
se expressar de várias formas, a necessidade de adquirir cultura, desenvolver meios que
permitam articular todos estes aprendizados para sua inserção social.
Com relação à Educação Motora, os materiais e didáticas continuam tradicionais: a
bola, a corda, o arco, a queimada, o futebol, o desenho com o lápis preto, com lápis colorido e
a pintura com guache, não sendo a motricidade o principal enfoque nas aulas de educação
física ou artística. Mas, apesar disso, percebemos tentativas isoladas de um ou outro professor,
em uma ou outra escola.
A educação motora propiciada por ambas as disciplinas pode ser aproveitada como
eficiente momento de estimulação, de criatividade, de desbloqueio, de fantasia, alegria,
apreciado pelo aluno, integrando-o nas atividades e em seu grupo.
A Educação Física e a Artística são as disciplinas que permitem o contato direto do
indivíduo em formação e são aquelas que mais necessitam ou se utilizam destas perspectivas.
Apesar do amparo legal, embora sejam a Educação Física e Artística que criem a
identidade escolar, expondo à comunidade o resultado da administração e do trabalho
realizado, ainda continuam muito desvalorizadas na sociedade brasileira, o que não ocorre em
outras culturas.
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