
A PERFORMANCE MUSICAL COMO INTERAÇÃO Seibert 44
que o público não ia entendê-lo, poderia tocar também o Estudo Op. 10, No. 1, de
Chopin, o intertexto que tanto lhe ajudou a interpretar a obra de Lutoslawski.
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Outra consideração dos horizontes do ouvinte envolve a comunicação
consciente em linguagens de mídias além dos sons musicais. Tanta informação
frequentemente fora do controle do músico, da divulgação do evento à arquitetura do
lugar, informa a experiência de uma performance. O foco poderia continuar no
discurso sonoro ao vivo, mas o músico poderia aproveitar outra mídia que contribua
à conexão com o ouvinte. Pensa-se, por exemplo, no ouvinte especializado na
interpretação de informação visual; esta pessoa pode estranhar o recital que tem
pouca informação visual. Um discurso de determinada linguagem é pura lenga-lenga
se o ouvinte não é “alfabetizado” na linguagem em questão. Podem-se lamentar os
baixos índices de alfabetização tradicional, em termos de habilidades para ler e
escrever, e culpar a fácil universalidade da televisão. Porém Schechner (2006, p. 4,
tradução da autora) vê no efeito das novas tecnologias de comunicação “uma
explosão de literacias múltiplas”
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. “As pessoas são cada vez mais „alfabetizadas
corporalmente‟, „alfabetizadas auditivamente‟, „alfabetizadas visualmente‟, e assim
por diante”
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(SCHECHNER, 2006, p. 4). “Hipertexto” – no sentido mais amplo da
palavra –
combina palavras, imagens, sons, e várias abreviações. Pessoas com
telefones celulares falam, é claro. Mas também tiram fotos e utilizam os
teclados para teclar mensagens que combinam letras, pontuação e outras
imagens gráficas [...]. Correio eletrônico, telefones celulares, blogues,
instant messaging, e wi-fi estão transformando o que significa a
alfabetização (SCHECHNER, 2006, p. 5).
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Quando a entrevistadora Mach pergunta para o pianista Glenn Gould (1991 [1980], p.
101) o que ele acha que os compositores dos próximos 50 ou 100 anos vão criar, ele
menciona as possibilidades de novos contextos para elementos conhecidos e sínteses
de várias disciplinas para casar elementos abstratos com elementos mais objetivos.
Gould (p. 102, tradução da autora) acrescenta, “[...] [À]s vezes tenho dúvidas muito
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Também o intérprete pode considerar a duração do programa, respeitando um prazo realista da
atenção do público para tanta informação nova, e equilibrar peças exóticas com peças familiares.
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“[...] [A]n explosion of multiple literacies [...]”. A palavra “literacia” vem do inglês literacy que
significa alfabetização. Estudiosos do fenômeno de literacias múltiplas em português adotaram a
palavra do inglês porque o termo “alfabetização” parece restrito ao aprendizado da leitura e escrita na
língua materna.
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“People are increasingly „body literate‟, „aurally literate‟, „visually literate‟, and so on.”
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“Hypertext combines words, images, sounds, and various shorthands. People with cell phones talk,
of course. But they also take photos and use the keypads to punch out messages that combine letters,
punctuation marks, and other graphics…. Email, cell phones, blogs, instant messaging, and wi-fi are
transforming what it means to be literate.”