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da do ser. Para o narrador, o espírito vive na palavra. O homem sente-se aterrorizado, ao rerceber a
palavra, que é uma forma de se perceber, uma experiência dura. Subitamente, alguém surge à minha
frente e é, no entanto, invisível. O personagem consegue visualizar a grandeza do homem: maior
que a montanha, o deserto e a neve. O narrador coloca em relação o homem e a natureza: o sol, a
montanha, o deserto de neve, o dia e a noite. “O sol é um apelo ao exterior, à alegria, à ação física,
espaço aberto e afirmação das imagens diurnas.”
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À noite, a visão é limitada, o que nos força a
buscar a proximidade, para a reflexão interior. É a instauração do espaço fe-chado e do regime da
imagem. À dialética dia versus noite corresponde aberto versus fechado, interno versus externo.
O sol, a montanha e a neve são três constantes em Aparição. Os locais, muitas vezes, não
recebem nenhum nome, o que remete a um espaço simbólico, ideal, universal. O mais importante
não é a localização real, mas o espaço experienciado pelas personagens.
É comum na literatura recorrer a imagens de fenômenos da natureza para expressar
conteúdos morais, psicológicos ou metafísicos. “A luz, o noite, o dia, o sol, o fogo, o caminho, a
montanha, a neve, o rio, o mar e tantos outros são fenômenos que ocorrem independente da ação e
vontade do homem, às vezes, prejudicando-o, às vezes, beneficiando-o. Tais fenômenos apontam
uma superatividade ultraterrena, sobre-humana, que mostra a pequenez e fraqueza do homem para
enfrentá-los e, ao mesmo tempo, serve como elementos significantes.”
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Caminho, por exemplo, é
uma imagem-símbolo que pode indicar a existência humana como destino, itinerário ou um modelo
de vida a ser seguido. Pode significar o desejo de uma união amorosa e, também, como ocorre em O
Caminho Fica Longe, o fracasso do personagem masculino, que procura reorientar sua vida numa
encruzilhada de caminhos. Agora, é o deserto a imagem-símbolo, no qual ele vaga perdido, à pro-
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DURAND, Gilbert. As estruturas antropológicas do imaginário: introdução à arquetipologia geral. São Paulo:
Martins Fontes, 1997, p. 67: "Semanticamente falando, pode-se dizer não há luz sem trevas, enquanto o inverso não é
verdadeiro: a noite tem uma existência simbólica autônoma. O Regime Diurno da imagem define-se, portanto, de uma
maneira geral, como o regime da antítese."
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LASO, J. L. Vergílio Ferreira - Espaço simbólico e metafísico, op. cit., p. 91.