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É no dia-a-dia que as pessoas se expõem a situações que beneficiam ou
prejudicam sua saúde. No território, as pessoas estudam, produzem e
consomem. A exposição às situações que afetam a saúde, em geral, não são
escolhas de indivíduos nem de famílias, mas o resultado da falta de opções
para evitar ou eliminar as situações de vulnerabilidade. Também participa dessas
situações o desconhecimento sobre essa vulnerabilidade. Os lugares com
condições de vida desfavoráveis são em geral marcados pelo saneamento
precário, contaminação das águas, do ar, dos solos ou dos alimentos, por
conflitos no relacionamento interpessoal, pela falta de recursos econômicos e,
portanto, enormes limitações para o consumo de bens e serviços, incluindo os
mais elementares.
Assim, as condições de vida de grupos sociais nos territórios definem um
conjunto de problemas, necessidades e insatisfações. Essas condições de
existência podem ser boas ou ruins, e se modificam para melhor ou pior, a
depender da participação de instituições de governo e da própria população.
Por isso diz-se que a situação de saúde de um grupo populacional em um
território é definida pelos problemas e necessidades em saúde, assim como
pelas respostas sociais a esses problemas.
A Epidemiologia tem como preocupação compreender e explicar o processo
saúde-doença nos indivíduos e em populações. A Geografia da Saúde por sua
vez, procura identificar na estrutura espacial e nas relações sociais que ela
encerra, associações plausíveis com os processos de adoecimento e morte
nas coletividades. Ambas aceitam como premissa geral que os padrões de
morbi-mortalidade e saúde não ocorrem de forma aleatória em populações
humanas, mas sim em padrões ordenados que refletem causas subjacentes
(Curson, 1986). A maior contribuição da geografia para os estudos de saúde é
antiga, mas vem sendo retomada com a Geografia Crítica a partir da década
de 1970. Segundo esta abordagem, o espaço geográfico não é um espaço
abstrato, sinônimo de superfície ou área da geometria, nem o espaço natural.
O espaço geográfico é o espaço social onde se dão as relações humanas,
é um espaço relacional. Milton Santos dizia que o espaço geográfico é o
conjunto de relações realizadas através de funções (produção, a circulação e
o consumo) e formas (objetos geográficos).
O espaço é construído pelas relações sociais no processo de reprodução
social e, portanto, reflete a divisão do trabalho, a divisão em classes, as relações
de poder, a centralidade e a marginalização, as diferenças, as desigualdades
e as injustiças da distribuição dos recursos e da riqueza, dos produtos do
trabalho coletivo, e as contradições deste processo. Assim, a ocupação do
espaço refletirá as posições ocupadas pelos indivíduos na sociedade, e sendo
conseqüência de uma construção histórica e social, reproduz as desigualdades
e os conflitos existentes. O espaço socialmente organizado guarda as marcas
impressas pela organização social, inclusive aquelas herdadas do passado,
adquirindo características locais próprias que expressam a diferenciação de
acesso aos resultados da produção coletiva (Santos, 1979).
O território, segundo o geógrafo Milton
Santos, é um espaço de relações
(sociais, econômicas e políticas), um
sistema de objetos e de ações (fixos e
fluxos) em permanente interação. Mas,
sobretudo, são nesses espaços
delimitados de poder onde os diferentes
atores sociais que fazem uso do território
buscam viabilizar seus projetos e desejos
para levar a vida.
Situação de saúde é um conjunto
detalhado dos problemas e das
necessidades de uma população em um
dado território em um tempo estabelecido.
A situação de saúde revela as condições
de vida e o perfil de adoecimento e morte de
uma população, evidenciando seus
determinantes e condicionantes (causas e
conseqüências). Constitui-se em subsídio
fundamental para o processo de plane-
jamento de ações para o enfrentamento
contínuo dos problemas identificados.
CAPÍTULO 1 - Espaço geográfico e Epidemiologia
Objetos Geográficos
Geralmente pensamos nos objetos como
coisas pequenas, mas uma casa, uma
fábrica, uma plantação ou até mesmo uma
cidade podem ser considerados objetos
geográficos. Para o geógrafo Milton Santos,
os objetos geográficos são tudo que existe
na superfície da Terra, toda herança da
história natural e todo resultado da produção
humana que se concretizou. São objetos
móveis e imóveis, tal como uma cidade,
uma barragem, uma estrada de rodagem,
um porto, um prédio, uma floresta, uma
plantação, um lago ou uma montanha.
Aquilo que se cria fora do homem e se
torna instrumento material de sua vida. O
uso deles pelas pessoas possibilita e
potencializa as ações humanas e podem
produzir ou ampliar, em decorrência de sua
utilização e qualidade, problemas para a
saúde humana.