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UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
ISABELLA BENINI LOLLI GHETTI
A QUESTÃO URBANA NO UNIVERSO FRONTEIRIÇO
Sobre a fronteira internacional de Ponta Porã / MS
São Paulo
2008
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ISABELLA BENINI LOLLI GHETTI
A QUESTÃO URBANA NO UNIVERSO FRONTEIRIÇO
Sobre a fronteira internacional de Ponta Porã / MS
Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana
Mackenzie, como requisito para a obtenção do título de
Mestre em Arquitetura e Urbanismo.
Orientadora: Prof.ª Drª Angélica Aparecida Tanus
Benatti Alvim
São Paulo
2008
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G418q Ghetti, Isabella Benini Lolli
A questão urbana no universo fronteiriço: sobre a fronteira
internacional de Ponta Porã – MS / Isabella Benini Lolli Ghetti.
São Paulo, 2008.
194 f. : il. , 30 cm
Dissertação (Mestrado em arquitetura e urbanismo) Faculdade
de Arquitetura e Urbanismo, Universidade Presbiteriana
Mackenzie São Paulo, 2008.
Referências bibliográficas : p. 185-191.
1. Fronteira Internacional. 2. Ponta Porã/MS. 3. Plano diretor.
4. Política Urbana em municípios de fronteira. I. Título
CDD 711.4098171
FOLHA DE APROVAÇÃO
ISABELLA BENINI LOLLI GHETTI
A QUESTÃO URBANA NO UNIVERSO FRONTEIRIÇO
Sobre a fronteira internacional de Ponta Porã / MS
Dissertação apresentada à Universidade Presbiteriana Mackenzie, como
requisito para a obtenção do título de Mestre em Arquitetura e
Urbanismo.
Aprovado em 20 de agosto de 2008
____________________________________________________________________
Profª.Dra. Angélica Aparecida Tanus Benatti Alvim (orientador)
Universidade Presbiteriana Mackenzie
____________________________________________________________________
Prof. Dr. Carlos Guilherme Mota
Universidade Presbiteriana Mackenzie
____________________________________________________________________
Profª. Dra. Heliana Comin Vargas
Universidade de São Paulo
Aos meus pais, Sandra e Geraldo, pelo carinho, apoio,
dedicação, compreensão e, principalmente, por terem me
proporcionado a oportunidade de seguir este caminho.
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer ao Instituto Mackenzie de
Pesquisa – Mackpesquisa - pelo apoio com a reserva técnica e
pelo financiamento
à pesquisa
Políticas Públicas e Planos de
Urbanismo: elementos de avaliação
, através da qual me
beneficiei não com bolsa de estudo (março a agosto de
2007), mas também com todo o aprendizado adquirido.
Da mesma forma devo agradecer à FAPESP
Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo -
pela bolsa concedida a partir de setembro de 2007, de suma
importância para a concretização deste trabalho.
Agradeço em especial à professora Angélica A. Tanus
Benatti Alvim pela extrema dedicação e paciência com as
minhas dificuldades e inexperiência, além de todo
aprendizado que me concedeu. Da mesma forma devo
agradecer ao professor Carlos Guilherme Mota, meu primeiro
orientador, incentivador, sempre disposto em ajudar, o qual
foi essencial para a obtenção da bolsa FAPESP.
Igual consideração tenho pelo professor Ricardo
Medrano, tutor e grande incentivador, a primeira pessoa a
acreditar no meu tema de pesquisa quando entrei nesta
Universidade. À professora Heliana Comin Vargas por ter
aceitado fazer parte da banca e pelas valiosas sugestões no
exame de qualificação.
Não poderia deixar de agradecer a duas pessoas
essenciais neste processo, a amiga e professora Sibila, a
primeira pessoa a me incentivar a fazer este mestrado e o
professor Tito Carlos Machado de Oliveira, por todo seu
estímulo e conhecimento a respeito das fronteiras.
Gostaria de agradecer à toda a equipe do Plano
Diretor de Ponta Porã que de alguma forma contribuíram
nesta pesquisa, em especial ao Theo Andreoli Corrêa, pela
paciência em me conceder informações importantes, ao Sr.
Hélio Peluffo, Secretário de Infra-estrutura da Prefeitura
Municipal e Coordenador do Plano Diretor de Ponta Porã,
prof. Sergio Yonamine, prof. Wandi M. F. Tirelli, Prof.
Roberto W. Steil, Tina, Regazone e todos os outros; e à
amiga e companheira de equipe Karin F. Schwambach.
Cabe ainda agradecer ao Sr. Marcelino Nunes,
vereador e ex-presidente da Câmara dos Vereadores de
Ponta Porã, pela sempre atenciosa contribuição. Da mesma
forma agradeço aos profissionais da Secretaria de
Planejamento, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso do Sul -
SEPLANCT - Adevanir Fátima da Silva, Paulo Melchiur, Elite,
Lucimar e Wilson Eurípedes.
Além disso, não posso esquecer do apoio de pessoas
que com um simples ato colaboraram para o desenvolvimento
deste trabalho, como Wilda Inês Mendoza, arquiteta da
Intendência de Pedro Juan Caballero e Sr. Domingos José de
Oliveira, historiador e responsável pelo Acervo Cultural Santo
Antônio de Ponta Porã.
Às queridas amigas Flávia, Juliana Manosso, Juliana
Portioli, Dayanne e Milena, por todas as caronas e ajudas
dadas nas pesquisas de campo em Ponta Porã; Thais e Tássia
pela sempre compreensão de minha ausência em Campo
Grande; Victoria e Clariane, amigas de incentivo e suma
importância em minha vida; Paty, Dayse e Giovanna pelo
apoio em São Paulo e à Maura, companheira virtual de todas
as horas!
Aos meus familiares, mãe, pai, irmão, cunhada, avós,
todos eles pela constante dedicação e paciência; à minha
querida Sophia e à avó Talita, pelas valiosas orações.
Aos amigos e familiares de São Paulo, tia Luzia,
Soraia, Junior, Lu, Carol, e Paulo, pelo suporte prático,
além da compreensão e paciência em tantos momentos de
nervosismo e ausência.
À professora Regina Célia, pela tradução para o
inglês; à Juliana Dalbello, na elaboração das tabelas; à
Larissa pela parte artística do trabalho e ao Thiago pelo
suporte técnico.
Por fim, um agradecimento especial ao meu amor
Diego, companheiro de paciência incondicional e suporte
emocional, carinho irrestrito, compreensão absoluta, cujo
apoio foi essencial em todos os momentos.
Muito obrigada a todos vocês, que direta, ou
indiretamente fizeram, ou ainda fazem parte de um pedaço
de minha história!
[...] É como se o indivíduo fronteiriço vivesse em dois
estados (sólido e gasoso), cuja necessidade imperativa é
se adaptar. Assim é na fronteira.
Tito Carlos Machado de Oliveira, 2005.
9
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS iv
LISTA DE FOTOS vi
LISTA DE QUADROS vii
LISTA DE TABELAS vii
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS viii
RESUMO x
ABSTRACT
xi
APRESENTAÇÃO xii
INTRODUÇÃO
1
1.
ENTENDENDO OS CONCEITOS E AS RELAÇÕES FRONTEIRIÇAS (no Brasil)
5
1.1. Limites, fronteiras, divisas –
diferenças conceituais
9
1.1.1 Fronteira 9
1.1.2 Limite 12
1.1.3 As mudanças recentes de abordagem sobre o conceito 15
1.2 A questão da fronteira internacional no Brasil 17
1.2.1 Classificação das fronteiras internacionais 18
1.2.2 Faixa e zona de fronteira 21
10
2.
FRONTEIRA BRASIL - PARAGUAY: FORMAÇÃO, ACORDOS E POLÍTICAS
24
2.1 Formação e demarcação das fronteiras brasileiras
27
2.1.1 O processo de formação e demarcação da fronteira internacional Brasil-Paraguai
34
2.1.2 As fronteiras no Mato Grosso do Sul e suas regiões
37
2.1.2.1 faixa de fronteira do Estado de Mato Grosso do Sul
42
2.2 Acordos internacionais em áreas de fronteira
44
2.2.1 Marcos Institucionais da Faixa de Fronteira
46
2.2.2 O Mercosul e a Integração Regional
49
3.
PLANOS E PROGRAMAS PARA AS ÁREAS DE FRONTEIRA BRASILEIRA PÓS 1988: O CASO DE
PONTA PORÃ NO MATO GROSSO DO SUL
54
3.1 A Política Nacional de Desenvolvimento Regional
56
3.2 O Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira – PDFF.
58
3.2.1 O Arco Central
65
3.2.1.1 Principais características do Arco Central
66
3.2.2 Tipologia da Fronteira Internacional Brasileira –
as interações transfronteiriças
69
3.2.3 As relações e interações transfronteiriças:
conflitos e perspectivas
73
3.2.4 As questões que envolvem a fronteira do Mato Grosso do Sul no PDFF
76
3.2.4.1 As proposições para a fronteira de Ponta Porã – Pedro Juan Caballero
78
3.3 O Plano Regional de Desenvolvimento Sustentável da Região Sul-Fronteira
79
11
4.
PONTA PORÃ E AS RELAÇÕES FRONTEIRIÇAS
85
4.1 Aspectos recentes da ocupação e urbanização brasileira - as áreas de fronteira no Centro-Oeste brasileiro
88
4.2 Contextualização da área de estudo e as relações fronteiriças
96
4.2.1 Caracterização geral de Ponta Porã
104
4.2.1.1 Estrutura Urbana e Uso do Solo
105
4.2.1.2 A Linha de Fronteira
115
5.
A POLÍTICA URBANA DE PONTA PORÃ E A FRONTEIRA: LIMITES E DESAFIOS
126
5.1 Política Urbana e Planos de Urbanismo: uma discussão conceitual
129
5.2 A Política Urbana recente no Brasil
131
5.2.1 O Papel do Município na Constituição Federal de 1988
132
5.2.2 Política Urbana Recente: a Constituição Federal, o Estatuto da Cidade e o papel do Plano Diretor
134
5.2.3 As relações complexas das Escalas Local e Regional nos municípios de Fronteira
139
5.3 A política urbana de Ponta Porã pós 1988
142
5.3.1 O Plano Diretor Participativo de Ponta Porã e o desafio da incorporação da fronteira
145
5.3.2 A concepção do Plano Diretor Participativo e a fronteira
148
5.3.2.1 A estrutura formal do documento
152
5.3.2.2 Aspectos do Plano Diretor que envolvem diretamente a fronteira
161
6. CONSIDERAÇOES FINAIS 171
ANEXOS 175
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 184
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 192
12
LISTA DE FIGURAS
Capítulo 1
Figura 01 - Faixa de Fronteira internacional do Brasil 17
Figura 02 - Fronteiras Marítimas e Terrestres do Brasil 20
Figura 03 - Faixa, Região e Zona de Fronteira do Brasil 23
Capítulo 2
Figura 04 - Tratado de Tordesilhas 29
Figura 05 - Faixa de Fronteira dos municípios brasileiros 33
Figura 06 - Limites de Mato Grosso do Sul 38
Capítulo 3
Figura 08 - Cidades gêmeas da faixa de fronteira brasileira 60
Figura 09 - Cidades gêmeas priorizadas 61
Figura 10 - Mesorregiões Diferenciadas 62
Figura 11 - Sub-regiões da fronteira internacional brasileira. 64
Figura 12 - Sub-regiões da faixa de fronteira do Arco Central 67
Figura 13 - Tipologia das Interações Fronteiriças 71
Figura 14 - Faixa de Fronteira Arco Central: Tipologia das Interações Fronteiriças 72
Figura 15 - Área Piloto de MS 78
Figura 16 - Região Sul-Fronteira 80
Figura 17 - Sistema de Gestão da Região Sul-Fronteira 82
13
Capítulo 4
Figura 18 - Limites de Ponta Porã 99
Figura 19 - Bacias Hidrográficas de Mato Grosso do Sul 100
Figura 20 - Vias estaduais – MS 101
Figura 21 - Planta urbana de Ponta Porã (Brasil) e Pedro Juan Caballero (Paraguai) 102
Figura 22 - Vista aérea com destaque para a área militar de Ponta Porã 106
Figura 23 - Mapa das municipalidades de Pedro Juan Caballero e Ponta Porã 129
Figura 24 - Planta urbana de Ponta Porã com destaque para o centro comercial 111
Figura 25 - Imagem de satélite de Ponta Porã (Brasil) e Pedro Juan Caballero (Paraguai) 116
Figura 26 - Planta das duas cidades ilustrando a degradação da Linha de Fronteira 123
Capítulo 5
Figura 27 - Divisão de Bairros e Setores proposta pelo Plano Diretor 150
Figura 28 - Perímetro Urbano antes do Plano Diretor 154
Figura 29 - Perímetro Urbano proposto no Plano Diretor 155
Figura 20 - Plano Urbanístico Básico 157
14
LISTA DE FOTOS
Capítulo 4
Foto 01 - Shopping Calçadão reformado, em 2008 106
Foto 02 - Avenida Marechal Floriano 106
Foto 03 - Avenida Brasil 107
Foto 04 - Avenida Internacional 107
Foto 05 - Rua de Pedro Juan (bairro afastado do centro) 111
Foto 06 - Rua do centro de Pedro Juan Caballero 111
Foto 07 - Avenida Brasil – Ponta Porã 112
Foto 08 - Avenida do centro de Ponta Porã 112
Foto 09 - Terminal rodoviário de Ponta Porã 113
Foto 10 - munícepes atravessando a fronteira de moto 113
Foto 11 - Linha Internacional na década de 1930 115
Foto 12 - Linha de fronteira no estado atual 117
Foto 13 - Linha de Fronteira – destaque para os camelôs 117
Foto 14 - Shopping Calçadão em 2005 118
Foto 15 - Shopping Calçadão reformado, em 2008 119
Foto 16 -
casilleros
do lado paraguaio da Linha 119
Foto 17 - camelôs formando um grande camelódromo 119
Foto 18 - Ruas formadas a partir da organização dos camelôs 120
Foto 19 - Interior da Linha de Fronteira invadido pelos camelôs 120
Foto 20 - degradação no ‘interior’ da Linha 121
Foto 21 -
casillas
construídas em alvenaria no lado paraguaio 121
Foto 22 - camelô (restaurante) construído em alvenaria em Ponta Porã 122
Foto 23 - Linha - destaque para ausência de camelôs ao fundo 122
15
LISTA DE QUADROS
Capítulo 3
Quadro 01 - Tipologia das Interações Fronteiriças – destaque para a fronteira entre
Brasil e Paraguai
75
Capítulo 4
Quadro 01 - Tipologia das Interações Fronteiriças – destaque para a fronteira entre
Brasil e Paraguai
75
Quadro 02 - Índice de Desenvolvimento Humano do Município de Ponta Porã 103
Quadro 03 - Conflitos existentes na fronteira entre Ponta Porã e Pedro Juan Caballero 125
Capítulo 5
Quadro 04 - Atribuições do Plano Diretor Participativo a respeito da Fronteira 164
Quadro 05 - Quadro síntese da Consulta Urbana – Tema Linha Internacional 168
LISTA DE TABELAS
Capítulo 4
Tabela 01 - Brasil - População nos Censos Demográficos por situação do domicílio e
Taxa de Urbanização (1940 – 2000)
90
Tabela 02 - Brasil - População nos Censos Demográficos por situação do domicílio e
Taxa de Urbanização por Regiões (1940-2000)
91
Tabela 03 - Taxa geométrica de crescimento da população do Brasil, Centro-Oeste,
Mato Grosso do Sul e Ponta Porã entre 1980 – 2000
92
Tabela 04 - População residente por situação de domicílio em Ponta Porã - MS 93
Tabela 05 - Taxa de Crescimento Anual dos Municípios por Faixa Populacional 95
16
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABNT Associação Brasileira de Normas Técnicas
AC Estado do Acre
ADA Agência de Desenvolvimento da Amazônia
ADENE Agência do Desenvolvimento do Nordeste
ALADI Associação Latino-Americana de Desenvolvimento e Integração
ALALC Associação Latino-Americana de Livre-Comércio
AM Estado do Amazonas
ARCS Acordos Regionais de Comércio
AVA Avaliação da Vulnerabilidade Ambiental
BR Brasil
CCPP Conselho da Cidade de Ponta Porã
CEFF Comissão Especial da Faixa de Fronteira
CEPAL Comissão Econômica para a América Latina
CEUC Cadastro Estadual de Unidades de Conservação
CF Constituição Federal
CNUDM Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar
CODEVASF Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba
COREDES Conselho Regional de Desenvolvimento Sustentável da Região Sul-Fronteira
CSN Conselho de Segurança Nacional
DNOCS Departamento Nacional de Obras Contra as Secas
EUA Estados Unidos da América
FMDL Fundo Municipal de Desenvolvimento Local
17
GEO
Global Environment Outlook
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDH Índice de Desenvolvimento Humano
IGUAPP Instituto de Gestão Urbana e Ambiental de Ponta Porã
IPLAN/MS Instituto de Estudos e Planejamento de Mato Grosso do Sul
KM quilômetro
MERCOSUL Mercado Comum do Sul
M.I. Ministério da Integração
MS Estado de Mato Grosso do Sul
MT Estado de Mato Grosso
ONU Organização das Nações Unidas
PDFF Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira
PDP Plano Diretor Participativo
PNDR Política Nacional de Desenvolvimento Regional
PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PPA Plano Plurianual
PR Estado do Paraná
PRD Plano Regional de Desenvolvimento
PY Paraguai
RCMEC Regimento de Cavalaria Mecanizado
RS Estado do Rio Grande do Sul
SC Estado de Santa Catarina
SEPLANCT Secretaria de Planejamento, Ciência e Tecnologia
SPDR Secretaria de Políticas de Desenvolvimento Regional
SPR Secretaria de Programas Regionais
UN-HABITAT Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFMS Universidade Federal de Mato Grosso do Sul
18
RESUMO
A discussão a respeito das fronteiras internacionais tem-se ampliado a partir da década de 1990, tanto no âmbito nacional, quanto no
internacional, principalmente face às relações locais destas realidades em um contexto de interações e conflitos supranacionais. A fronteira
brasileira de Ponta Porã, no Estado de Mato Grosso do Sul, separa-se por meio de uma faixa – Linha Internacional – da cidade-gêmea Pedro
Juan Caballero, no Paraguai. A partir da compreensão da política urbana recente do Brasil (Constituição Federal de 1988 e Estatuto da
Cidade de 2001) e do entendimento dos aspectos peculiares dos municípios de fronteira, este trabalho tem como objetivo discutir o Plano
Diretor Participativo de Ponta Porã, de 2006, em sua interface com a cidade paraguaia. Partindo do entendimento histórico de formação
dessa realidade, da análise das interações existentes no espaço fronteiriço e da identificação dos conflitos e potencialidades da região,
destacam-se os aspectos do Plano Diretor que incorporam a fronteira internacional, bem como os desafios que se colocam para a articulação
da política urbana com outros instrumentos de âmbito nacional, de forma a equacionar os conflitos e encaminhar soluções integradas para
essa realidade.
PALAVRAS-CHAVE: Fronteira Internacional; Plano Diretor em município de fronteira; Ponta Porã/MS.
19
ABSTRACT
The discussion about international borders has increased since the 1990s both at the national and international levels, especially face to the
local relations of these realities in a context of supranational interests and conflicts. Brazilian border, Ponta Porã, in Mato Grosso do Sul
State, is separated from its twin-town, Pedro Juan Caballero, in Paraguay, by means of a strip Linha Internacional ( International Strip).
On the basis of the understanding of the peculiar aspects of border cities and of the recent urban policy in Brazil (Constituição Federal of
1988 and Estatuto da Cidade of 2001), the objective of this study is to discuss the Plano Diretor Participativo (Participative Direction
Planning), of Ponta Porã - 2006, and its interface with the Paraguayan town. The historical formation of this reality, the analysis of the
interactions in the frontier space and the identification of the region conflicts and potentialities made up the basis for this study to analyze
not only the aspects of the Plano Diretor, which incorporate the international border, but also its challenges face to the articulation of urban
policy with other instruments at the national level, so that conflicts may be equated and solutions for this reality may be devised.
KEY-WORDS: International Border; Direction Planning in Border Towns; Ponta Porã/MS.
20
APRESENTAÇÃO
Esse trabalho insere-se nas pesquisas desenvolvidas pelo Grupo de Pesquisa
Urbanismo Contemporâneo: Redes, Sistemas e
Processos
, particularmente na linha de pesquisa
Políticas Públicas e Planos de Urbanismo
, coordenada pela Profª. Drª. Angélica Aparecida
Tanus Benatti Alvim. Destaca-se, nesse contexto, a oportunidade de participar da pesquisa
Políticas Públicas e Planos de Urbanismo:
elementos de avaliação,
entre fevereiro e agosto de 2007, como bolsista do Fundo Mackenzie de Pesquisa MACKPESQUISA, o que
propiciou o amadurecimento da temática. Em seguida, a obtenção da bolsa de mestrado no âmbito da FAPESP (desde setembro de 2007),
permitiu a continuidade do desenvolvimento da pesquisa.
Cabe ressaltar, que o trabalho em si tem como antecedente o Trabalho Final de Graduação, desenvolvido pela autora na
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), intitulado
Linha Viva: revitalização da Linha de fronteira entre Ponta Porã e Pedro Juan
Caballero,
bem como da participação no Centro de Estudos de Fronteiras da mesma instituição, e da equipe de elaboração do Plano Diretor
Participativo de Ponta Porã, ambos coordenados pelo Prof. Dr. Tito Carlos Machado de Oliveira.
A partir da compreensão desta região em situação peculiar, surgiu o interesse em estudar políticas urbanas em cidades de fronteira,
em especial a implementação do Plano Diretor Participativo de Ponta Porã/ M, à luz de sua cidade-gêmea Pedro Juan Caballero.
21
INTRODUÇÃO
As fronteiras políticas internacionais estão sendo cada
vez mais discutidas por diversos especialistas. O interesse
pelo assunto vem sendo propagado no meio científico com
mais freqüência, principalmente a partir da década de 1990.
A situação peculiar do município de fronteira, no caso
brasileiro, se explica principalmente pelo processo histórico
de ocupação do território. As cidades que se localizam nestas
regiões possuem funções peculiares, que as tornam distintas
de outros municípios não enquadrados em zonas de
fronteira.
A existência de cidades-gêmeas localizadas junto à
esta zona - cidades de fronteira-seca - onde Estados
Nacionais distintos estão em contato, aponta uma
organização sócio-espacial diversa, em que os limites, apesar
de serem distintos, não são claros
1
.
1
Por cidade-gêmea entendem-se cidades em contato direto. Este assunto será
melhor detalhado no capítulo 1.
As cidades de fronteira, em especial as de fronteira-
seca, possuem uma condição peculiar dentro do território em
que se inserem, uma vez que concentram fluxos
transfronteiriços, ou seja, fluxos comerciais transnacionais
que atravessam o limite internacional. A migração dentro dos
países nessa condição é uma questão importante, uma vez
que diferenças culturais e sociais passam a conviver,
ocasionando, muitas vezes, conflitos internos no território
envolvido. As relações sócio-econômicas estão presentes no
cotidiano da sociedade, onde a travessia da fronteira é livre e
as culturas se misturam.
Nesse sentido, a cooperação e interação entre elas
são essenciais para o pleno desenvolvimento da região. Na
América do Sul alguns fatores contribuem para o interesse no
assunto, como a tentativa de cooperação econômica entre
países sul-americanos a partir da criação do MERCOSUL
Mercado Comum do Sul na década de 1990. Com sua
criação, surgiu também a preocupação em resolver juntos
problemas comuns de países fronteiriços.
22
Nesse contexto, insere-se a preocupação, um tanto
quanto recente (2002), do governo federal em elaborar
planos e programas que visam especialmente o
desenvolvimento dos municípios em regiões de fronteiras.
Nesse sentido, reconhecer a importância da faixa de fronteira
para a integração sul-americana é um grande avanço no
que tange as relações internacionais do Brasil com outros
países sul-americanos.
Por estarem situadas em posição excêntrica em
relação aos centros de decisões do território nacional, as
cidades de fronteira marcam o fim do território nacional, ou
seja, delimitam o limite político com o país vizinho. Sendo
assim, concentram peculiaridades importantes em relação às
suas políticas públicas, uma vez que dependem, além de
ações da esfera local (município) de ações no âmbito
nacional, oriundas da preocupação do governo federal com
essas regiões especiais.
Complementando essa discussão, e ao mesmo tempo
se contrapondo, os municípios que se situam em áreas de
fronteira, bem como qualquer outro município brasileiro com
população acima de 20.000 habitantes
2
, que desde 1988,
com a Constituição Federal, e particularmente após 2001,
com a instituição da Lei Federal 10.257 (Estatuto da Cidade)
se vêem obrigados a formular seus planos diretores, sem
qualquer definição clara relacionada a tal problemática.
O objetivo geral dessa pesquisa é contribuir para a
ampliação do conhecimento em relação á problemática de
formulação de políticas urbanas, em um contexto recente,
dos municípios brasileiros que se situam em áreas de
fronteira, tendo em vista o entendimento da situação peculiar
de Ponta Porã como fronteira-seca e as interfaces com o
município de Pedro Juan Caballero, no Paraguai.
Tem-se como objetivo específico, discutir o processo
de planejamento urbano do município de Ponta Porã,
destacando os conflitos, bem como as potencialidades de
interação com o município de Pedro Juan Caballero. Busca-se
identificar os desafios que se colocam para ambas as
cidades, tendo em vista a implementação desse processo de
forma integrada, de modo a superar os entraves
2
Além dos municípios com esta população, aqueles localizados em regiões
metropolitanas e aqueles considerados aglomerados urbanos também ficaram
obrigados, até o ano de 2006, a elaborarem seus planos diretores.
23
institucionais, políticos, econômicos e sociais presentes em
tais sociedades.
Como recorte temporal da pesquisa, embora seja
fundamental entender os aspectos históricos que envolvem o
objeto de estudo, particularmente a análise dos instrumentos
urbanísticos detém-se no período entre 1988 quando se
institui no Brasil a nova Constitucional Federal e 2007
ocasião que se encerra o processo de elaboração do Plano
Diretor Participativo do Município de Ponta Porã, articulado à
outros instrumentos de âmbito federal.
Como parte do processo de investigação, a
metodologia utilizada na pesquisa incorpora levantamentos,
análises e sínteses, decorrentes e iterativas. Inicialmente, a
partir de revisão bibliográfica, elaborou-se uma análise
teórica da problemática das fronteiras, buscando identificar
os principais conceitos que devem ser entendidos na análise
do estudo de caso. Em seguida, a partir de levantamento
bibliográfico, procurou-se entender o conceito histórico de
formação e demarcação das fronteiras brasileiras. A pesquisa
documental centrou-se na análise de planos, programas e
legislações que incidem na área de estudo. Nessa etapa, para
aprofundar o conhecimento do problema, utilizou-se de
levantamento de campo, associado a entrevistas qualitativas
com diversos atores. Destacam-se, nesse processo, as visitas
de campo realizadas no período de 2006 a 2008.
O presente trabalho estrutura-se em seis capítulos,
além desta Introdução. Como dentro do contexto das cidades
de fronteira internacional a conceituação dos termos é de
grande relevância, o primeiro capítulo dedica-se a explaná-
los e elucidar os principais conceitos utilizados ao longo do
trabalho. Nesse capítulo, é discutida também a mudança de
abordagem que vem ocorrendo a respeito das fronteiras
internacionais, no contexto recente da globalização, assim
como sua respectiva classificação.
No segundo capítulo apresenta-se, de forma sucinta,
o processo histórico de formação e demarcação das
fronteiras brasileiras, destacando, particularmente, a
fronteira da região Centro-Oeste. É nesse capítulo também
que se discute a institucionalização da fronteira internacional,
ou seja, legislações e acordos que regulam a faixa de
fronteira brasileira e com outros países da América do Sul,
enfocando até o contexto de formação do Mercosul, na
década de 1990.
24
Em seguida, o terceiro capítulo trata dos planos e
programas federais e estaduais direcionados para a faixa de
fronteira brasileira, enfocando em especial o Plano de
Desenvolvimento da Faixa de Fronteira do Ministério da
Integração Nacional – PDFF 2005.
A estrutura urbana de Ponta Porã e as relações
espaciais e socioeconômicas com a cidade vizinha paraguaia
são sintetizadas no capítulo quatro.
A partir da compreensão da realidade da fronteira,
procura-se construir uma visão daquele território e sua
sociedade em sua complexidade, com suas diferenças e
contradições, procurando-se discutir o processo de
implementação do planejamento urbano em Ponta Porã,
considerando as relações de âmbito inter-escalares: regional,
nacional e internacional, o que está exposto no quinto
capítulo da pesquisa. Os aspectos conclusivos da pesquisa,
por sua vez, constam no capítulo seis.
7
1. ENTENDENDO OS CONCEITOS E AS
RELAÇÕES FRONTEIRIÇAS (no Brasil)
A conceituação dos termos tangentes às concepções de
fronteira, contraditórios ou não, abrange várias áreas de estudo.
Geografia, Arquitetura, História e áreas afins discutem as
fronteiras tanto no seu aspecto político e econômico, como
também urbano. Porém, um entendimento a respeito dos termos
parece um desafio para os estudiosos.
Os diferentes sentidos atribuídos ao termo fronteira
relacionam-se com contextos geográficos, acontecimentos
históricos, ou até mesmo a partir da vivência do autor. Associar as
fronteiras a fatos históricos é comum na literatura a respeito do
processo de formação e delimitação de territórios (associada à
disputa por terras) e das relações internacionais entre os povos.
É a partir daí que surgem as primeiras intenções de se
institucionalizarem as regiões de fronteira. Nesse contexto, os
conceitos podem se misturar. O que ora é chamado de fronteira
no sentido de divisa de territórios; borda de separação, ou seja,
8
fronteira física, pode passar a designar uma zona de integração,
representada por somente uma linha imaginária que separa povos
de culturas distintas também chamadas de fronteiras
imaginárias. Ou seja, a fronteira representa um espaço de
dualidade, pois ao mesmo tempo em que separa também
aproxima.
Esse duplo sentido atribuído às fronteiras
está expresso
ainda hoje na distinção anglo-saxônica entre os termos ‘boundary’,
‘frontier’ e ‘borderlands’”
(RIBEIRO, 2002, p. 2). Além disso, a
fronteira pode também ser considerada um espaço de alteridade,
como bem explica José de Souza Martins (1997):
[...] a fronteira é essencialmente o lugar da
alteridade. É isso que faz dela uma realidade
singular. À primeira vista é o lugar do encontro dos
que por diferentes razões são diferentes entre si,
como os índios de um lado e os civilizados de outro;
como os grandes proprietários de terra, de um lado,
e os camponeses pobres de outro. Mas o conflito faz
com que a fronteira seja essencialmente, a um
tempo, um lugar de descoberta do outro e de
desencontro. Não o desencontro e o conflito das
diferentes concepções de vida e visões de mundo de
cada um desses grupos humanos. O desencontro na
fronteira é o desencontro de temporalidades
históricas, pois cada um desses grupos está situado
diversamente no tempo da História. (Ibidem, p. 150-
151)
Este capítulo tem a intenção de abordar algumas
diferenças existentes a respeito do conceito de fronteira desde os
primórdios de sua existência e a conseqüente mudança na
abordagem sobre o tema, que vem acontecendo nos últimos anos.
Em seguida realizar-se-á a discussão das fronteiras
internacionais brasileiras e como elas estão classificadas
atualmente. Para tanto, será necessária uma breve abordagem a
respeito da diferenciação dos termos zona e faixa de fronteira,
essencial para melhor compreensão do tema.
9
1.1 Limites, Fronteiras, Divisas diferenças
conceituais
A convergência conceitual existente a respeito dos diversos
significados atribuídos ao tema das fronteiras, segundo a geógrafa
Lia Machado (2000) é, em parte, responsabilidade dos Estados
nacionais, que, ao precisarem resolver questões burocráticas e
diplomáticas entre as nações, sempre estimularam a coincidência
entre os termos. Na conceituação da autora:
Enquanto o limite jurídico do território é uma
abstração, gerada e sustentada pela ação
institucional no sentido de controle efetivo do Estado
territorial, portanto, um instrumento de separação
entre unidades políticas soberanas, a fronteira é
lugar de comunicação e troca (Ibidem, p. 1).
Atualmente, porém, pode-se perceber que uma nova
discussão sobre os papéis de limites e fronteiras vem
acontecendo. Sendo assim, é importante explanar a respeito das
diferentes formas de abordagens existentes. Fronteiras, limites e
divisas são, portanto, alguns dos termos escolhidos aqui para tal
esclarecimento. Vale lembrar, contudo, que o tema das diferenças
conceituais referentes à fronteira é amplo e não é o objetivo aqui
detalhar cada um em sua totalidade, e sim abordar questões
pertinentes para o desenvolvimento desta pesquisa.
1.1.1 Fronteira
A palavra
fronteira
, originária do latim
front
, surgiu entre
os séculos XIII e XV na maioria das línguas européias (STEIMAN,
2002a). O termo, no período medieval, era utilizado para indicar
uma ordem de batalha, uma vez que, pelo fato de ser derivado do
substantivo fronte, ou frente, tem forte conotação militar
(RIBEIRO, op.cit.).
Segundo Torres (2004), na língua portuguesa o termo
fronteira
pode ser entendido tanto como a fronteira política de um
território, como também pela área-limite da expansão
(demográfica e econômica) de uma dada sociedade
3
. Haroldo
Torres completa que “nesse último sentido o termo tem sido
empregado frequentemente no Brasil para definir a região-limite
3
O termo utilizado na língua inglesa para representar a fronteira política de um território é
border,
e a fronteira como área limite da expansão demográfica e econômica é traduzida
como
frontier
(TORRES, 2004, p. 103)
.
10
da expansão agrícola, a chamada fronteira agrícola”. (Ibidem, p.
103).
A partir de contextos geográficos diversos, o significado da
palavra fronteira foi sendo alterado, muitas vezes coincidindo ou
confundindo-se com o termo limite, ou até mesmo com barreiras,
como é o caso da descrição do Dicionário Aurélio, o qual conceitua
fronteira como
Extremidade dum país ou região do lado onde
confina com outro; limite
” (FERREIRA, 1985, p. 230).
A partir da revisão bibliográfica sobre o assunto, pôde-se
perceber que a convergência ou coincidência entre os termos
relaciona-se com o tipo de abordagem dada por determinado
autor. É possível perceber, por exemplo, que além de demarcar
um território, ou seja, utilizar a palavra fronteira como barreira
física ou natural, existe o caráter simbólico, espiritual e religioso
com que a palavra pode ser associada. Como explica José de
Souza Martins (op.cit):
A fronteira [...] é um cenário altamente conflitivo de
humanidades [...]. É, sobretudo, no que se refere
aos diferentes grupos dos chamados civilizados que
se situam ‘do lado de cá’, um cenário de
intolerância, ambição e morte, [...] lugar da
elaboração de uma residual concepção de Esperança
[...]. no âmbito dos diversos grupos étnicos que
estão ‘do outro lado’ [...] a fronteira é ponto limite
de territórios que se redefinem continuamente,
disputados de diferentes modos por diferentes
grupos humanos (Ibidem, p. 12).
Torrecilha (2004, p. 20) afirma que
os limites e fronteiras
nascem com o processo de sedentarização, possuindo ao longo
dos vários períodos históricos muitos significados
”. Como explana
Rebeca Steiman (2002a) sobre os impérios chineses e romanos,
que entendiam a fronteira como o limite de uma civilização:
[...] no caso chinês, pelo menos ao norte, ocorreram
inúmeras tentativas de cristalizar a fronteira através
da construção de rígidas muralhas, no caso romano,
estabelecer fronteiras fixas significava limitar a
expansão de seus domínios, o que não lhes
interessava, donde o longo período que levaram
para definir seu sistema de fronteiras. (Ibidem, p.
8).
A fronteira pode ser entendida tanto como elemento de
aproximação, de integração entre sociedades, propiciando
contatos espontâneos e naturais, ou seja, zona de intercâmbios
econômicos e sociais, como também elemento de desintegração,
dividindo territórios, o que se aproxima da concepção moderna de
fronteira, limite dos estados nacionais. Nas palavras de Castello
(1995):
A fronteira é, a um tempo, área de separação e
de aproximação, linha de barreira e espaço
polarizador. É, sobretudo um espaço de tensões, de
11
coexistência das diferenças, e do estabelecimento de
novas realidades sócio-culturais (Ibidem, p. 18).
Entendendo as fronteiras como elemento de integração,
faz-se referência da explicação de Reichel e Gutfreind (1995):
Ela propicia contatos espontâneos e naturais,
responsáveis pelo surgimento de interesses socio-
econômicos e culturais comuns. [...] pode ser
entendida como zona de intercâmbios econômicos e
de integração humana que se superpõe às
determinações dos estatuos políticos de soberania
de um Estado sobre um território (Ibidem, p. 3).
Segundo Lia Machado (1998), a palavra fronteira implica à
‘aquilo que está na frente’ (como o próprio nome sugere), ou seja,
que está orientada ‘para fora’ - forças centrífugas (Ibidem, p. 43).
Ressaltando o caráter histórico do conceito a autora afirma que
em sua origem, a palavra fronteira
não estava associada a
nenhum conceito legal e que não era um conceito político ou
intelectual. Nasceu como um fenômeno da vida social espontânea,
indicando a margem do mundo habitado
” (loc. cit.).
Mesmo com o desenvolvimento das civilizações
4
o
significado de fronteira não era de uma área ou zona que
marcasse o limite definido ou fim de uma unidade política. Dessa
forma, não marcava o fim, mas o começo do Estado (Ibidem).
Ainda na concepção de fronteira como demarcações de
território, o geógrafo Martin (1997, p. 19-20) explana:
entre os
povos primitivos colocou-se a questão da delimitação do território,
o qual servia de base à reprodução biológica e cultural do grupo
”.
De alguma forma, a abordagem da fronteira como
demarcação de territórios está relacionada com as guerras.
Reichel e Gutfreind (op. cit.) acreditam que quando o as fronteiras
são associadas com esses acontecimentos históricos, passa a ser
entendida como uma linha de separação de sociedades, grupos, e
até mesmo de domínios político-administrativos. Nesse sentido, a
fronteira pode ser entendida como limite, uma vez que passa a
marcar fim do espaço por onde se pode transitar e se ter domínio.
Assim, como bem explica Corrêa (1999, p. 179)
a fronteira
sempre representou de forma emblemática os limites que podem
ser ultrapassados ou superados por posse ou ocupação
”.
4
Após significarem áreas habitadas ou possíveis de habitação, as fronteiras passaram a
marcar locais onde existia comunicação, até chegarem ao estado de adquirirem caráter
político (MACHADO, 1998).
12
Além dos aqui mencionados, outros significados também
são empregados para o termo
fronteira
. Pode-se destacar aqui a
idéia de fronteira urbana, bastante utilizada na área de
planejamento urbano e utilizada por alguns autores para designar
áreas periurbanas ou de periferias
5
.
Ressalta-se, contudo, que a categoria de fronteira
assumida neste trabalho, é a fronteira politica internacional, a qual
separa Estados nações - ou seja, demarca territórios, e, ao
mesmo tempo, tem a intenção de aproximar povos e sociedades
distintas.
5
A esse respeito conferir o artigo de Haroldo Torres: A fronteira paulista. In: MARQUES,
Eduardo, TORRES, Haroldo.
São Paulo
Segregação, Pobreza e Desigualdades Sociais.
Senac: São Paulo, 2004. O autor explana a respeito das áreas periurbanas de São Paulo,
chamadas por ele de fronteira urbana, e seus efeitos na organização social e urbana da
cidade. O trabalho de Roberto Luís Monte-Mór
- Outras fronteiras
: novas espacialidades na
urbanização brasileira - vale também ser destacado.
1.1.2 Limite
Apesar da abrangência de significados existentes na
abordagem das fronteiras, algumas vezes, como pôde ser
percebido, os conceitos de
fronteira
e
limite
coincidem, ou seja,
podem ser considerados como sinônimo, como mostra a definição
do Dicionário Aurélio para o termo limite:
Linha de Demarcação;
Divisa, fronteira; Fim, termo
(FERREIRA, op.cit, p. 293). É
necessário, entretanto, destacar algumas diferenças essenciais
entre esses dois termos.
Segundo Machado (1998, p. 44) a palavra
limite
designa “
o
fim daquilo que mantém coesa uma unidade político-territorial, ou
seja, sua ligação interna
”. A autora afirma que enquanto a
fronteira está orientada ‘para fora’
6
, os limites estão orientados
‘para dentro’ (forças centrípetas).
Para a autora a fronteira também pode representar um
fator de integração, uma vez que pode ser
uma zona de
interpenetração mútua e de constante manipulação de estruturas
6
A geógrafa Lia Machado explica que o entendimento sobre a orientação da fronteira “para
fora” relaciona-se com os lugares a serem estendidas: “cada lugar quer estender sua esfera
de influência e reforçar sua centralidade além dos limites internacionais e sobre as faixas de
fronteira” (MACHADO, 1998, p. 45).
13
sociais, políticas e culturais distintas
(Ibidem, p. 44). o limite
representa separação,
pois separa unidades políticas soberanas e
permanece como um obstáculo fixo, não importando a presença
de certos fatores comuns, físico-geográficos ou culturais
(Ibidem,
p. 44)
7
.
A mesma autora, no texto
Sistemas, Fronteiras e Território
(MACHADO, 2005), contextualiza os limites internacionais na
história. Para ela é difícil caracterizar as noções de limite e
fronteira uma vez que passaram por muitas evoluções e mudam
com o tempo. Ela explica que
a primeira resposta européia à
questão dos limites [...] foi que os limites de um estado seriam os
limites do reino ou [...] os da colônia de onde o estado tinha
emergido
” (Ibidem, p.01).
A autora afirma que
o limite internacional é um princípio
organizador do intercâmbio, seja qual for sua natureza, não
para os territórios que delimita como para o sistema interestatal
em seu conjunto
” (Ibidem, p. 01).
7
Uma mais completa abordagem a respeito das características e diferenças entre os termos
Limite e Fronteira pode ser encontrada em: MACHADO, Lia. Limites, Fronteiras e Redes. In:
STROHAECKER, T. M.; DAMIANI, A.; SCHAFFER, N. O.; BAUTH, N.; DUTRA, V. S. (orgs.).
Fronteiras e Espaço Global
, AGB-Porto Alegre, Porto Alegre: 1998, p. 41-49.
Ainda sobre as diferenças entre os termos, Martin (op. cit.,
p. 47) explica:
Hoje, o limite é reconhecido como linha, e não pode,
portanto, ser habitada, ao contrário de fronteira que,
ocupando uma faixa constitui uma zona, muitas
vezes bastante povoada onde os habitantes de
Estados vizinhos podem desenvolver intenso
intercâmbio, em particular sob a forma de
contrabando.
Esse autor lembra ainda das diferenças de cotidiano vividos
de um lado e de outro de um limite. Embora os dois lados do
limite de uma região fronteiriça possam possuir estilos de vida
semelhantes, a presença do Estado impõe distinções marcantes, o
que contribui para um choque entre o
direito de ir e vir
e o
intercâmbio com os vizinhos.
Outros autores também distinguem fronteira de limite,
entre os quais vale ressaltar Moodie (apud MARTIN, 1997) o qual
diz que a fronteira é natural e remete, portanto à geografia,
enquanto limite é artificial e remete diretamente ao Estado.
Kevin Lynch (1997) analisando três cidades norte-
americanas, Boston, Los Angeles e Jersey City, abordou os
elementos vias, limites, bairros, pontos nodais e marcos para
explanar sobre a imagem das cidades. Para o urbanista os limites
14
são os elementos lineares que não são usados ou entendidos com
via pelo observador. São as fronteiras entre duas faces, quebras
de continuidade lineares: praias, margens de rios, lagos, etc.,
cortes de ferrovias, espaços em construção, muros e paredes. São
referências laterais, mais que eixos coordenados. Para ele, esses
limites podem ser barreiras mais ou menos penetráveis que
separam uma região de outra, mas também podem ser costuras,
linhas ao longo das quais duas regiões se relacionam e se
encontram.
O geógrafo André Roberto Martin (op. cit.) acrescenta mais
um elemento com certa semelhança aos dois termos acima
abordados, trata-se da
divisa
, isto é, o aspecto visível do limite. O
autor afirma que a divisa é o limite que se apóia geralmente em
cursos de água, cristas montanhosas, coordenadas geográficas ou
outras linhas geodésicas. Essa conceituação assemelha-se ao que
alguns autores designam como fronteiras naturais. De acordo com
o Dicionário Aurélio o termo divisa significa
Sinal divisório;
Distintivo, marca
” (FERREIRA, op.cit., p. 167).
Cabe então explanar sobre a
marca,
termo também
relacionado às fronteiras
8
. Ribeiro (op.cit., p. 01) explica que essa
8
Segundo Ribeiro (2002)
marca
é um termo originário da época românica, utilizado
principalmente no período carolíngio (742 – 814).
terminologia era utilizada para
designar uma zona de defesa do
império, esparsamente povoada, porém sujeitas a disputas
territoriais, correspondendo a uma faixa de extensão variável
”. A
autora explica ainda que as marcas sobreviveram mesmo com o
fim do império de Carlos Magno e ao longo da Baixa Idade Média,
principalmente no contato Ibérico com o Islã.
Toda essa conceituação exposta serve como base para
entender melhor como as fronteiras estão sendo interpretadas na
atualidade. Percebe-se, contudo, que nos últimos anos,
principalmente com a globalização da economia
9
, o entendimento
das fronteiras vem se modificando, como será abordado a seguir.
9
O termo globalização será discutido mais a diante, no item 1.1.3.
15
1.1.3 As mudanças recentes de abordagem sobre o
conceito
A partir de estudos recentes sobre as fronteiras, é possível
perceber que a existência de fronteiras ou limites internacionais
não é a preocupação fundamental, e sim seu desaparecimento,
mesmo que para alguns autores a existência das fronteiras ainda
seja essencial, como explica Raffestein (1993) ao dizer que [...]
a
fronteira é uma necessidade incontrolável, um mecanismo de
regulação que garante a existência contra os perigos do caos
(Ibidem, apud STEIMAN 2002a, p. 11).
Esse pensamento parece coerente ao pensar que as
fronteiras são fundamentais para distinguir as legislações entre
países, como explica Rebeca Steiman ao afirmar que:
[...] a fronteira continua a sublinhar tanto
diferenças legais como o princípio da identidade
territorial e a separação entre ‘nacionais’ e ‘não-
nacionais’ através de impedimentos jurídicos,
políticos e ideológicos (STEIMAN, Ibidem, p. 11).
Entretanto, com o advento da globalização
10
e as
transformações sociais, econômicas, políticas e territoriais e
conseqüentes mudanças no sistema de estados nacionais, a
conceituação de limites e fronteiras está se modificando.
A mudança nas abordagens do conceito e do papel das
fronteiras no contexto atual deve-se, segundo Machado (1998, p.
45), à
institucionalização de mercados regionais transnacionais
”,
que acarreta a mudança de perspectiva do estado a respeito do
papel das fronteiras e limites
11
.
Machado (Ibidem) observa também que a mudança de
perspectiva pelos estados a respeito das fronteiras tem modificado
inclusive o conceito de lei territorial. Os regulamentos internos dos
10
A partir do final do século XX, com a evolução dos novos meios de comunicação, muito
se ouve falar sobre a globalização, fenômeno no qual se tem um aprofundamento na
integração política, cultural, social e econômica. Nesta perspectiva, a economia passa a ter
caráter mundial - ressaltando-se então o termo mercado global, ou economia de livre
mercado. A tentativa de integrar espaços, entretanto, não é um processo novo. Segundo
diversos autores, pode-se perceber que desde o período colonial se tinha a idéia de tal
integração, tanto quanto de integrar povos e culturas distintas. A este respeito é possível
citar alguns notáveis autores: o brasileiro Milton Santos, o sociólogo alemão Ulrich Beck e o
historiador inglês Eric Hobsbawn, entre outros. Segundo Hobsbawn (1995, p. 551), a
internacionalização da economia, ou a “economia de livre mercado irrestrita e incontrolada”
não é a solução para os problemas de desigualdades verificados na atualidade. Neste
contexto o autor explica as conseqüências presenciadas a respeito desta “liberalização
econômica e quais os custos da mesma para a população”.
11
O resultado dessa alteração de abordagem, contudo, será discutido no capítulo 3 quando
serão tratados os planos e programas para área de fronteira.
16
países têm se transformado e territorialidades específicas estão
sendo criadas
12
. Segundo essa autora:
Isso se observa tanto na criação de territórios
especiais, sujeitos a legislação especifica, no interior
do estado nacional, como na criação de territórios-
simulacros-de-estado que coexistem com os estados
‘históricos’ de maneira integrada e funcional (Ibidem,
p. 45).
Ressalta-se, portanto, que na perspectiva de integração
dos espaços fronteiriços, o conceito de fronteira como símbolo de
separação e fim do território, altera-se passando a representar
aproximação, relação e início de território. Sobre a nova visão a
respeito das cidades fronteiriças, Shäffer (1995, p. 79) acredita
que a principal questão “
diz respeito ao desmoronar do significado
das fronteiras rígidas e militarizadas e o apelo à intensificação da
cooperação e da integração transfronteiriça
”.
O papel das fronteiras, dirigidas por centro de decisões
muitas vezes distantes, é, segundo a autora, colocado em pauta,
assim como a existência de espaços nacionais, uma vez que a
economia mundial (avanço da expansão capitalista) tem passado
12
Para exemplificar tal questão (criação de territórios com legislação específica), Lia
Machado explana sobre o caso da cidade de Resende, no Rio de Janeiro, a qual pretende
ser o “entreposto comercial da Zona Franca de Manaus, concentrando o fluxo de
mercadorias procedentes da zona franca para depois redistribuí-las para o resto do país”
(Ibidem, p. 46).
por mudanças marcantes com o advento da tão falada
globalização.
Shäffer explica que com a economia voltada à exportação,
a fronteira deixa de ser considerada limite de uma economia
nacional, ou seja, deixa de ser fechada.
A ela pede-se que esteja
equipada para facilitar os fluxos, os trâmites. Que seja ágil,
quando sempre foi lenta em suas aduanas, em suas vistorias, em
suas mesas de renda
” (Ibidem, p. 81).
A partir do que foi exposto a respeito da conceituação das
fronteiras, será abordada a seguir a classificação das fronteiras
internacionais brasileiras fronteiras aéreas, marítimas e
terrestres - e alguns de seus desdobramentos – fronteiras naturais
e artificiais. Para melhor entendimento do assunto, é importante
também abordar sobre a diferenciação entre os termos zona e
faixa de fronteira.
17
1.2 A questão da Fronteira Internacional no Brasil
Com 8.514.876,599 quilômetros quadrados e uma
população de 169.590.693 habitantes, o Brasil está classificado
como o quinto país em extensão entre os países do mundo
13
.
Ocupando 47% do território da América do Sul, o Brasil é o
país sul-americano que mais possui vizinhos, fazendo fronteira
internacional com 10 países. De acordo com o Programa de
Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (PDFF) (Brasil, 2005), a
faixa de fronteira brasileira corresponde a 27% do território
nacional, abrangendo 588 municípios em 11 Estados e uma
população estimada em 10 milhões de habitantes.
Segundo dados do PDFF (Ibidem), a fronteira internacional
brasileira compreende a uma extensão total de 23.102
quilômetros, sendo 15.735 quilômetros de fronteiras terrestres e
7.367 quilômetros de fronteiras marítimas. A figura 01 ilustra a
fronteira internacional brasileira, destacada na parte listrada em
vermelho, e os países limítrofes.
13
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, disponíveis em <http:// www.
ibge.gov.br>. Acesso em 15 jun. 2005.
Figura 01 - Faixa de Fronteira internacional do Brasil
Fonte: Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, 2005).
18
1.2.1 Classificação das Fronteiras Internacionais
Como apresentado, a classificação das fronteiras se de
maneira abrangente e se diferencia com o decorrer dos anos e
interesses das regiões (função, circulação e intensidade de
movimentos). Cada autor as define de diferentes maneiras. A
discussão data de muitos anos, desde as lutas por delimitação
territorial e paz entre as nações, principalmente durante as
Grandes Guerras Mundiais.
Alguns especialistas consideravam necessária a existência
de fronteiras físicas para demarcar um território, formando
barreiras. Outros, contudo, acreditavam que a ausência de limites
físicos proporcionaria integração entre os povos, sem a
necessidade de uma barreira que os separassem
14
.
De maneira geral, as fronteiras podem ser classificadas em
naturais
15
(rios, lagos, montanhas), artificiais (sem limite físico
14
A autora Rebeca Steiman (2002a), em seu trabalho
A geografia das cidades de fronteira:
um estudo de caso de Tabatinga (Brasil) e Letícia (Colômbia) faz um balanço das
classificações das fronteiras no mundo segundo diversos autores (Thomas Holdich, Lionel
Lyde, Richard Hartshorne, Julian Minghi) e contextos geográficos diversos.
15
“A idéia de ‘fronteira natural’, surgida na França no século XVI, seria um indicativo da
nova função dos limites, relacionada à fundamentação da base territorial do Estado. O
debate que surgiu entre os franceses e os alemães sobre essa questão, voltada, no plano
empírico, para justificar a soberania francesa sobre a Alsácia e o vale do Reno, deu
margem ao aparecimento do conceito de fronteira baseado no princípio de que a base do
aparente); ou até mesmo a partir de sua paisagem cultural.
Segundo Steiman (op.cit.), a classificação de fronteiras políticas
internacionais mais conhecida e utilizada atualmente é justamente
a de fronteiras naturais/ artificiais, classificação esta que foi escrita
em 1907 por Lord Curzon de Kedleton, no texto intitulado
Frontiers
(Ibidem, p. 05).
As fronteiras naturais são, segundo Mattos (1975), as mais
desejadas, uma vez que propiciam maior grau de nitidez.
Entretanto, alguns autores afirmam que muitas vezes essas
fronteiras são ineficazes,
dependentes sempre da interpretação
de velhos tratados e da convenção de detalhes e minúcias entre
os Estados confinantes
” (Ibidem, p. 35).
A classificação a partir de sua paisagem cultural é, por sua
vez, uma evolução da classificação de natural/ artificial (MINGHI,
1963, apud STEIMAN, op.cit.). Alguns autores, como aponta
Mattos (op. cit.), classificam ainda as fronteiras como:
fronteiras vivas ou de tensão/ mortas/ esboçadas
caso dos geógrafos franceses Vallaux e Brunhes,
que as classificam de acordo com sua evolução;
Estado deveria ser lingüística ou racial, posição defendida pelos humanistas alemães”
(Norman Pounds 1951, p. 154 apud STEIMAN, 2002a, p.9).
19
fronteiras ocupadas ou ecumenizadas/ fronteiras
inocupadas ou anecumênicas, classificação dada
pelo geopolítico Backheuser (1952);
fronteiras históricas/ naturais/ planejadas ou de
construção/ étnicas, lingüísticas, estratégicas e
econômicas, determinadas pelo também geopolítico
Rodolfo Kjéllen;
e por fim a classificação dos geógrafos Whitemore e
Braggs: fronteiras físicas/ geométricas/
antropogeográficas, baseadas apenas no existente.
Segundo estudiosos da geografia humana, as condições
geográficas em que o homem vive pode influenciar também em
sua psicologia, ou em seu modo de vida
16
.
Ainda no âmbito das diversas classificações existentes é
importante entender a classificação feita para delimitar as diversas
fronteiras existentes entre os países. São elas: fronteiras
terrestres, fronteiras marítimas e fronteiras aéreas.
16
Mattos (1975, p. 7) conta como a influência do meio físico é interpretada pelo povo: “diz-
se que o homem da montanha é triste, fechado, desconfiado, enquanto o homem da costa,
que vive à beira do mar, é alegre, aberto e otimista; que a
psiche
do homem da planície é
ampla (gaúcho) como os espaços que domina, e a do montanhês é defensiva porque tem
seu horizonte fechado pelas serras que compartimentam o seu habitat”.
Dentro dessa classificação, a fronteira terrestre, que
interessa a esta pesquisa, se desdobra em naturais e artificiais,
sendo que, segundo Mattos (Ibidem) as fronteiras naturais têm
predominância (89%) sobre as artificiais (11%). Dentre as
naturais o autor destaca os acidentes físicos demarcadores (rios e
riachos), as linhas de vertente (montanhas, serras menores,
cerros e coxilhas) e as linhas artificiais, (astronômicas ou
geodésicas)
17
.
No caso brasileiro as fronteiras terrestres correspondem a
15.735 quilômetros do território nacional, enquanto a fronteira
marítima corresponde a 7.367 quilômetros do território brasileiro,
como mostrado na figura 02.
As fronteiras marítimas foram reguladas, de acordo com
Torrecilha (op.cit.), por uma convenção realizada na Jamaica no
ano de 1982 (Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do
Mar - CNUDM), a qual “
determinou os direitos e deveres dos
Estados quanto ao uso do mar e o aproveitamento das águas
marinhas
” (Ibidem, p. 53).
17
De acordo com Mattos a fronteira por meio de rios pode seguir vários critérios: limite em
uma margem; linha de talvegue; linha média, ilhas fluviais ou pontes. As montanhas como
demarcadoras de fronteira, por sua vez, oferecem ótimas vantagens para defesa e
isolamento. Elas “convergem as comunicações para as linhas de menor resistência [...],
facilitando o controle aduaneiro e a vigilância militar” (Ibidem, p. 34)
20
Legenda:
_____ Fronteiras Marítimas: 7.367 quilômetros
_____
Fronteiras Terrestres: 15.735 quilômetros
Figura 02 - Fronteiras Marítimas e Terrestres do Brasil.
Fonte: TORRECILHA (2004).
21
De acordo com vários estudiosos o mar representa uma
fronteira ideal, ou completa, como afirma Ratzel (s/d, apud
MATTOS, 1975, p. 29) ao dizer que
o mar oferece todas as
características de uma fronteira completa
”. Mattos explica a
afirmação de Ratzel expondo que o mar, conforme a conveniência
pode separar, proteger, favorecer ou isolar o intercâmbio.
As fronteiras aéreas - também chamadas de fronteiras
espaciais - por sua vez, estão regulamentadas pela Lei 7.565,
de 19 de dezembro de 1976, que, de acordo com Torrecilha
(op.cit., p. 53)
estabelece o Código Brasileiro da Aeronáutica, em
substituição ao Código Brasileiro do Ar de 1966
”.
Torrecilha destaca ainda que, de acordo com o artigo 11
dessa lei,
O Brasil exerce completa e exclusiva soberania sobre o
espaço aéreo acima de seu território e mar territorial
(Ibidem, p.
53). No âmbito internacional, as fronteiras aéreas são
regulamentadas pela Convenção de Aviação Civil Internacional -
Convenção de Chicago que foi ratificada pelo Brasil em 1946
(MATTOS, op. cit., p. 31).
Apesar da classificação das fronteiras em terrestre,
marítima e aérea ser a mais comumente utilizada para definir os
limites do Estado Nacional, outras nomenclaturas são
fundamentais para a compreensão da complexidade do tema.
Nesse contexto, é importante salientar a diferença dos termos
faixa
e
zona
de fronteira, bastante utilizados nesta pesquisa, que
são muitas vezes interpretados com o mesmo significado.
1.2.2 Faixa e Zona de Fronteira
Como colocado, é importante salientar a diferença de
conceitos existentes entre
faixa
e
zona de fronteira
, em geral
utilizados para fronteira terrestre. De acordo com o Ministério da
Integração, no relatório completo do Programa de
Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, op.cit., p. 21), o
conceito de zona de fronteira corresponde a um espaço de
interação, o qual é
“[...] composto por diferenças oriundas da
presença do limite internacional, e por fluxos e interações
transfronteiriças, cuja territorialidade mais evoluída é a das
cidades-gêmeas
18
”:
18
Segundo Steiman (2002a, p. 2)
as cidades gêmeas formam subespaços estruturados
dentro da faixa de fronteira, onde se realizam preferencialmente os fluxos transfronteiriços.
Estão longe da imagem de estagnação que lhes é constantemente atribuída e estão
inseridas em múltiplas redes que ampliam sua capacidade relacional
”.
22
Produto de processos e interações econômicas,
culturais e políticas, tanto espontâneas como
promovidas, a zona de fronteira é o espaço-teste de
políticas públicas de integração e cooperação,
espaço-exemplo das diferenças de expectativas e
transações do local e do internacional, e espaço-
limite do desejo de homogeneizar a geografia dos
Estados nacionais (Ibidem, p. 21).
Steiman e Machado (2002b, p. 11-12) concordam e
complementam afirmando que a zona de fronteira, formada pelas
faixas de cada lado do limite internacional “
caracteriza-se por
interações que, embora internacionais, criam um ‘milieu’ próprio
de fronteira, perceptível na escala local/regional
”. De acordo
com as autoras, a referência do termo
zona
com
região de
fronteira
é constante na literatura sobre fronteiras, porém o termo
região
é utilizado normalmente para distinguir a faixa de fronteira
do restante do território de cada país, ao invés de enfocar as
interações locais.
A respeito da
faixa de fronteira,
o relatório do PDFF
(op.cit.), afirma que ela está associada aos limites territoriais do
poder do Estado. Para o entendimento deste trabalho
19
a faixa de
fronteira é uma faixa estabelecida pelos Estados nacionais, que no
caso brasileiro determina ser uma faixa de 150 km ao longo das
19
O conceito e processo de regulamentação da faixa de fronteira será abordado no capítulo
2, item 2.2.1.
fronteiras terrestres, conforme instituiu a Constituição Federal de
1988.
A zona de fronteira
(borderlands)
, por sua vez, é entendida
aqui como o somatório de regiões de fronteira, ou seja, espaços
de interação onde existe a concentração de dois ou mais Estados
limítrofes. A partir da figura 03 é possível perceber essas
tipologias, separadas por regiões (norte e sul) na fronteira
terrestre internacional brasileira.
23
Figure 03 – Faixa, Região e Zona de Fronteira do Brasil.
Fonte: Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, 2005)
25
2. FRONTEIRA BRASIL - PARAGUAI:
FORMAÇÃO, ACORDOS E POLÍTICAS
Existe, atualmente, uma escassez de estudos sobre
fronteira entre países da América do Sul, mais precisamente entre
o Brasil e o Paraguai, uma vez que a maior parte dos trabalhos
encontrados sobre fronteiras internacionais
enfoca ou a fronteira
dos Estados Unidos com o México, ou as fronteiras entre países da
Europa Ocidental, no contexto pós-União Européia
(GASNSTER et
al., 1997, apud STEIMAN, 2002a, p. 11).
No Brasil, a maioria deles está compreendida na área da
Geografia, mais precisamente da Geografia Urbana, caso dos
trabalhos do Grupo Retis
20
da Universidade Federal do Rio de
Janeiro - UFRJ, o qual, de maneira primorosa analisa cidades
localizadas na faixa de fronteira brasileira, principalmente as da
região Norte do país.
No campo sociológico, é importante destacar os estudos de
José de Souza Martins, o qual afirma que
a história
20
O endereço eletrônico do portal do Grupo Retis de Pesquisa é:
<http://www.igeo.ufrj.br/gruporetis/>.
26
contemporânea da fronteira, no Brasil, é a história das lutas
étnicas e sociais
” (MARTINS, 1997, p. 150) e, nesse sentido,
explana sobre tais lutas na Amazônia. Esse autor afirma que a
situação de conflito social é o que existe de mais relevante para
caracterizar a fronteira no Brasil. Para esse autor, é necessário se
ter uma compreensão de que a fronteira possui dois lados, ‘o lado
de e o lado de lá’ para então estudá-la como concepção de
fronteira do humano (loc. cit).
Embora não seja o foco da pesquisa discorrer
exaustivamente sobre a história de formação das fronteiras
brasileiras, é fundamental neste capítulo entender o percurso
histórico de demarcação de suas fronteiras terrestres, sintetizando
aspectos relevantes desse processo.
Objetiva-se compreender, portanto, ainda que de maneira
sucinta, o processo histórico de formação e demarcação das
fronteiras terrestres brasileiras, especialmente nos limites que
envolvem o estado de Mato Grosso do Sul com o Paraguai,
explanando alguns aspectos importantes, tais como as lutas, os
acordos realizados e as distintas sociedades que se formaram.
Embora a demarcação das fronteiras brasileiras tenha sido
objeto de tratados e acordos, de um modo geral pacíficos, no caso
da fronteira Brasil-Paraguai, essa delimitação envolveu, num
primeiro momento, confrontos, relacionados à Guerra do Paraguai,
que ocorreu entre os anos de 1864 e 1870. Recentemente, no
mundo contemporâneo, destaca-se o acordo de formação do
Mercado Comum do Sul Mercosul, em 1991, que altera a lógica
de entendimento das relações transfronteiriças.
Neste sentido, este capítulo abordará, além de aspectos da
formação e demarcação das fronteiras brasileiras, como se deu o
processo na fronteira entre Brasil e Paraguai. Em seguida, realizar-
se-á uma abordagem a respeito das fronteiras do Mato Grosso do
Sul e suas regiões, assim como a faixa de fronteira do estado,
onde se localiza a área de estudo Ponta Porã e Pedro Juan
Caballero. Para tanto, é importante explanar os acordos
internacionais pertinentes
a essas áreas de localização peculiar,
destacando os marcos reguladores da faixa de fronteira brasileira e,
principalmente a formação do Mercosul.
27
2.1 Formação e Demarcação das Fronteiras
Brasileiras
A categoria fronteira internacional tem uma longa trajetória
no exterior e no Brasil, onde a discussão passa por processos de
ocupação do oeste do Paraná nos anos 1940, a marcha para o
Oeste nos anos 1950, e a ocupação da Amazônia de 1970 em
diante. Nas ciências sociais, essa categoria se refere à ocupação
demográfica de uma dada região e sua integração ao mercado
nacional, seja como produtora de bens agrícolas ou minerais, ou
como consumidora de bens industriais e serviços. (TORRES,
2004).
Estudos referentes às áreas de fronteira emergiram nos
últimos anos, uma vez que conceitos de integração são cada vez
mais constantes.
Crescer juntos
”, como escreve Schäffer (1993,
p. 11) é a proposta atual para essas áreas, as quais passaram por
mudanças de funcionalidade: “
do papel de símbolo de separação e
de limite, de terras onde estava ‘o fim do País’, para o de
aproximação e permeabilidade. Na fronteira começa o País
(loc.
cit).
A retomada do interesse público a respeito das questões
de fronteira é para Martin (1997), um fenômeno recente. Muitas
são as discussões em relação a que momento isso se deu:
De uns tempos pra a humanidade tem sido
submetida a uma avalanche tão grande de
informações difundidas através dos meios de
comunicação de massa, vindas e dirigidas a todas as
partes do planeta, que a remota utopia de se viver
livremente num “mundo sem fronteiras” nunca
pareceu tão próxima (Ibidem, p. 60).
O mesmo autor afirma que vários são os episódios
contemporâneos em relação a essa retomada de interesse. Um
dos motivos se atribui à guerra Irã/Iraque (conflito militar que
ocorreu entre 1980 e 1990). Outros autores, como Benedict
Anderson (apud MARTIN, 1997), acredita que a guerra entre
China e o Vietnã de 1979 é a principal causa. A queda do Muro de
Berlim, em 1989, entretanto, é o acontecimento mais importante
para Martin, pois representou o início de uma nova era.
Além disso, as questões fronteiriças da União Soviética,
que, segundo o autor, sempre deu atenção especial às suas
fronteiras, uma vez que além de possuir a maior área, era o país
que possuía o maior número de vizinhos.
28
As questões de fronteiras da América do Sul, merecem
destaque, já que tantas delas foram estabelecidas por meios
pacíficos. O mesmo autor ressalta, entretanto, as realidades luso-
castelhanas na área do Prata, as quais se prolongaram até a
Guerra do Paraguai e afirma que essa forma pacífica de se
estabelecerem fronteiras se deve ao princípio do
uti possidetis
21
como regulador das disputas. Sobre esse princípio, Corrêa (1999,
p. 180) destaca que, na América de Colonização ibérica, “
foi
utilizado como argumentação para justificar e referendar posses
em áreas entre os impérios coloniais espanhol e o português
”.
As disputas por terras entre Portugal e Espanha, após
alguns protestos, principalmente por parte de Portugal, foram
afirmadas em 7 de junho de 1494 com o Tratado de Tordesilhas.
Esse Tratado estipulou que as terras a leste do meridiano, situado
a 370 léguas do Arquipélago de Cabo Verde, seriam de Portugal,
ampliando as 100 léguas antes consagradas, e a oeste, da
Espanha, estabelecendo, portanto, os limites das possessões entre
as colônias da Espanha e de Portugal. Na figura 04 mostra-se a
divisão do território brasileiro segundo o Tratado de Tordesilhas.
Manuel Nunes Dias (1995) explica que a raia de
demarcação do Tratado corta o litoral do Brasil por meio do
21
Direito de posse.
meridiano que passa ao norte por Belém, e ao Sul por Laguna
(próximo à cidade de Florianópolis), ficando para Portugal o
domínio de quase todo o Atlântico Sul e o Brasil (a parte de terra
firme que fica a leste dessa linha, o qual se suspeitava da
existência).
Sobre o Tratado Dias completa:
Tordesilhas constitui, na verdade, um marco no
processo histórico da partilha política e econômica
das regiões coloniais, partilha nunca ultimada pelas
exigências sempre crescentes da orgânica
imperialista (Ibidem, p. 23).
29
Figura 04 - Tratado de Tordesilhas
Fonte: Ministério das Relações Exteriores. Disponível em:
<www2.mre.gov.br/.../portg/h_diplom/lc001.htm> Acesso em 19 jun. 2007
.
Dias explica ainda que as lutas por terras entre Portugal e
Espanha começaram com as disputas pelo Oceano Atlântico.
Portugal foi quem deu inicio à expansão ultramarina no século XV,
e a Espanha iniciou a sua expansão após a conquista de Granada,
em 1492. Como o Atlântico era uma importante via marítima, os
dois países lutavam por interesses políticos e econômicos. “
A
concorrência dos mares impôs a divisão de águas e terras do
mundo como expressiva fórmula política de uma imperiosa
necessidade de expansão oceânica
” (Ibidem, p. 21).
Após perceberem que a linha de divisa estabelecida pelo
Tratado de Tordesilhas não fazia mais sentido, Portugal e Espanha
fizeram várias negociações até chegarem ao Tratado de Madri
22
,
assinado em 13 de Janeiro de 1750. Esse Tratado designava
finalmente as terras pertencentes a cada um dos dois domínios.
Segundo Accioly (1938, p. 03), esse tratado
constitui a primeira
tentativa de definição geral dos limites do Brasil
”. Sob o domínio
de Portugal ficaram todas as terras que tinham ocupado no rio
Amazonas e em Mato Grosso. O Meridiano de Tordesilhas foi
desmanchado e o
uti possidetis
passou a ser o princípio orientador
da diplomacia brasileira.
Apesar de ter sido o tratado norteador do território
brasileiro, o Tratado de Madri gerou algumas dificuldades, como
Guerra Guaranítica
23
, que teve duração de dez anos e foi o
período em que Portugal e Espanha esmagaram os indígenas
22
Trato de limites das conquistas entre os muito altos e poderosos senhores Dom João V,
rey de Portugal, e D. Fernando VI, rey de Espanha, assignado em 13 de janeiro de 1750,
em Madrid, e ratificado em Lisboa a 26 do dito mez, e em Madrid a 8 de Fevereiro do
mesmo ano”
(grafia original – SOARES, 1939, p. 141).
23
A Guerra Guaranítica foi uma guerra ocasionada pelo forçado êxodo de cerca de 30.000
índios que ocupavam a margem esquerda do rio Uruguai, devido à troca que o Tratado de
Madri estipulou, da Colônia do Sacramento para os Sete Povos das Missões.
30
rebeldes. Devido à insatisfação que gerava, o Tratado de Madri foi
anulado em 1761 e substituído pelo Tratado de El Pardo
24
.
Depois de outras guerras e tratados (Guerra dos Sete
Anos, Tratado de Paris), período em que Portugal perdeu e
recuperou terras (como a Colônia do Sacramento), foi assinado,
em 1777, o Tratado de San Idelfonso
25
, reconhecidamente
favorável à Espanha. Segundo Corrêa (op.cit., p. 180), as
delimitações dos tratados de Madri e de Santo Idelfonso foram
norteadas, principalmente pelos marcos de ocupação,
representados por fortificações, agrupamentos populacionais
fortificados e a presença ostensiva de soldados e colonos
”. Esse
Tratado, segundo Accioly (op.cit., p. 06),
era preliminar,
destinado a servir de ‘base e fundamento’ ao tratado definitivo de
limites, que se celebraria ‘a seu tempo’ e nunca chegou a se
concluir
”.
24
Tratado entre S.M.F. o senhor D. José I, Rei de Portugal, e S.M.C., o senhor D. Carlos
III, Rei de Hespanha, assignado no Pardo a 12 de Fevereiro de 1761, pelo qual se annulou
o de 13 de Janeiro de 1750 e se mandou observar os anteriores”
(grafia original – SOARES,
1939, p. 158).
25
“Tratado Preliminar de Limites da América meridional entre S.M.F. a senhora D. Maria I,
Rainha de Portugal, e S.M.C. o senhor D.Carlos III, Rei de Hespanha, assignado em San
idelfonso, no de Outubro de 1777, e ratificado, por S.M.F., em Lisboa, no dia 10 e, por
S.M.C. em San Lorenzo El Real, no dia 11 do mesmo mez e anno”
(grafia original
SOARES, 1939, p. 171).
Por meio deste Tratado a Espanha ficou com o território da Colônia e os Sete Povos das
Missões (mais tarde recuperado por Portugal), mas teve que devolver a ilha de Santa
Catarina.
Em 1801 foi assinado o Tratado de Badajoz, que, por meio
do princípio do
uti possidetis
estabeleceu a incorporação ao
território brasileiro das terras que haviam sido conquistadas no Rio
Grande. Esse Tratado colocou um fim na guerra entre Portugal e
Espanha e, segundo Soares (1939, p. 205-206)
não restaurou
nenhum dos acordos anteriores nem mandou que as cousas
continuassem ao estado anterior à guerra ‘statu quo ante
bellum
’”.
A esse respeito, Hidelbrando Accioly escreveu:
ao se
tornarem independentes as antigas colônias de Espanha e
Portugal na América do Sul, não havia nenhum ato internacional
vigente que definisse os limites entre o Brasil e os países vizinhos
(ACCIOLY, 1934-1935 apud SOARES, Ibidem, p. 206).
A respeito da formação territorial do Brasil, é importante
destacar o apossamento de terras pelos índios, constatado no final
do século XVI, desrespeitando a demarcação do Tratado de
Tordesilhas. De Belém a São Paulo, índios ou mestiços, com os
mesmos objetivos econômicos, se apossavam de terras que,
segundo o Tratado de Tordesilhas, deveriam ser espanholas. Ao
mesmo tempo, os luso-brasileiros iam conquistando território pelo
norte do país e, nas primeiras décadas do séc. XVIII, tinham
31
conseguido ocupar os pontos estratégicos da imensa bacia
amazônica.
Nesse mesmo século, surgiam também as monções
26
, que
levavam bandeirantes de São Paulo em busca de ouro, descoberto
em 1718, em Cuiabá (atual capital do Estado de Mato Grosso, que
naquela época era chamado de ‘mato grosso do rio Jauru’). A
partir de então, o movimento expansionista aumentava. De Cuiabá
para as margens do Guaporé; da Bacia do Prata para o rio
Madeira, no norte do país, e assim, o território brasileiro ia se
alargando muito além dos limites estabelecidos pelo Tratado de
Tordesilhas.
A partir do processo de formação e demarcação do
território brasileiro as fronteiras terrestres passaram por diversas
fases, desde sua legalização (no período imperial), sua
demarcação (durante a República), até seu povoamento.
Como dito, coube ao Império fixar as fronteiras. Como não
existiam textos jurídicos para serem seguidos, o critério utilizado
foi
a aplicação das normas oriundas das instituições Corpus Júris
Civilis em matérias de posse e propriedade
(SOARES, Ibidem, p.
206). Foi quando se consagrou o princípio do
uti possidetis
,
26
Monções eram comboios de canoas que formavam um sistema de transporte por meio
dos rios.
critério essencial para determinar as fronteiras entre nações de
forma pacífica. Esse era o único principio disponível para o Brasil
traçar suas fronteiras quando se tornou independente.
As questões de delimitação das fronteiras brasileiras,
iniciadas no período imperial, como apresentado, foram concluídas
no período republicano. De acordo com Martin (op.cit.), 440 mil
quilômetros quadrados de área foram obtidos para o Brasil, (30
mil referentes à disputa da região de Missões com a Argentina,
260 mil relativos ao Amapá e 150 mil do Acre). Tudo isso se deve
ao diplomata José Maria da Silva Paranhos, o Barão do Rio
Branco, o qual teve seu mérito reconhecido, uma vez que
alcançou os objetivos nacionais de forma pacífica.
Segundo Torrecilha (2004, p. 49),
as fronteiras do Brasil
estabeleceram-se definitivamente nas primeiras décadas após a
instalação da República pela arbitragem ou pelo acordo direto por
meio dos trabalhos dos diplomatas
”.
O ano de 1930 é um marco de referência na história
brasileira, pois assinala o fim da Primeira República,
o início da revolução de 1930 (...), a instalação do
governo de Getúlio Vargas (...), a aceleração da
indústria, os sinais da urbanização e o princípio da
modernidade brasileira (TORRECILHA, Ibidem, p.
49).
32
Atualmente, como colocado, são 11 os Estados brasileiros
fazendo fronteira com 10 países sul-americanos. Uma população
de aproximadamente 11 milhões de habitantes ocupa a faixa de
fronteira terrestre internacional brasileira. Na figura 05, mostram-
se os municípios localizados nesta faixa de fronteira terrestre. A
partir da ilustração é possível perceber que a região que mais
possui municípios nessa localização é a região Sul do país,
compreendida pelos estados do Paraná, Santa Catarina e Rio
Grande do Sul e a região que apresenta menos municípios em
situação de fronteira internacional é a região Norte do país.
33
Figura 05 - Faixa de Fronteira dos municípios brasileiros
Fonte: Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, 2005).
34
2.1.1 O Processo de Formação e Demarcação da
Fronteira Internacional Brasil - Paraguai
Apesar de muitos confrontos, conflitos e tratados
envolvidos na demarcação da fronteira entre Brasil e
Paraguai, é importante nesta etapa da pesquisa, reter-se
apenas aos elementos indispensáveis para a compreensão do
contexto histórico de um modo geral. Para tanto, cumpre
destacar os tratados demarcadores dessa fronteira, assim
como os acordos feitos para sua demarcação.
Como colocado no item anterior, os trabalhos de
demarcação da fronteira entre Brasil e Paraguai tiveram início
com os Tratados de 1750 e 1777 (Tratado de Madri e San
Idelfonso respectivamente), os quais continham disposições
muito parecidas a respeito dos limites entre esses dois
países
27
. Como as negociações de terras entre estes países
sempre foram baseadas no princípio do
uti possidetis
, e a
linha de divisa adotada nos dois Tratados eram as mesmas, o
27
No Tratado de Madri tais disposições encontram-se no final do artigo V e no artigo
VI, e no Tratado de Santo Idelfonso no final do artigo VIII e no artigo IX. Sobre as
disposições na íntegra conferir: ACCIOLY, Hidelbrando.
Limites do Brasil
A
fronteira com o Paraguay. Série 5ª Brasiliana, Vol. 131, Biblioteca Pedagógica
Brasileira. Companhia Editora Nacional, 1938, p. 10-11.
estabelecimento definitivo daquela fronteira deveria ter sido
concluído com esees dois Tratados.
Entretanto, as divergências entre Portugal e Espanha
eram constantes:
uns e outros se dirigiam, de continuo,
fortes acusações de desrespeito aos compromissos
assumidos e de incursões além das fronteiras respectivas
(Accioly, 1938, p. 16). Accioly explica que a primeira
dificuldade sobre os limites entre Brasil e Paraguai era a
dúvida quanto à existência de um rio, o Igurei (ou Igurey),
que seria o limite entre os dois países e que, a partir de
várias divergências e especulações, foi provada a existência.
Após várias modificações na linha delimitadora dos
territórios, em 7 de outubro de 1844, foi assinado o primeiro
tratado de limites entre Brasil e Paraguai
28
, com esse país
independente. A partir de então, outros tratados foram
propostos, por meio de expedições e convenções, com
modificações na linha demarcatória e a inclusão da questão
da navegação fluvial, a qual começou a ser discutida em um
tratado em 1850. A esse respeito Accioly (Ibidem) explica
que o Governo paraguaio ligava a questão da navegação
28
Segundo Accioly (1938) o Tratado entre Brasil e Paraguai assinado em 1844 teve
como facilitador o Ato de 14 de Setembro do mesmo ano, que aconteceu em
Assunção e o qual reconheceu a independência da República Paraguaia.
35
fluvial à questão dos limites e, por isso, não chegava a
qualquer acordo, adiando o reconhecimento do direito do
Brasil a ter a livre navegação nos rios Paraná e Paraguay.
Em 1856 foi assinado o Tratado de Amizade,
Comércio e Navegação entre o Brasil e a República do
Paraguai, no qual, mais uma vez se discutiam os limites das
terras brasileiras e paraguaias, entretanto, mais uma vez este
não seria o acordo definitivo. Nessa etapa, no entanto,
definiu-se que
as duas partes contractantes
comprometeram-se a respeitar e fazer respeitar
reciprocamente ‘seu uti possidetis actual’’
” (Ibidem, p. 82).
Segundo Marin (2000, p. 41)
o tratado permitia a
livre navegação de embarcações nacionais e estrangeiras em
toda a extensão dos rios Paraná e Paraguai até Corumbá
”.
Em 1858, foi assinada, em Assunção, uma convenção para
estabelecer as práticas do Tratado de 1856 e, em 1° de maio
de 1865, foi negociado o Tratado de Aliança.
Por fim, em 1872 foi fixado o Tratado de Limites, o
qual definia a fronteira Brasil-Paraguai desde a foz do rio
Apa, localizada no atual Estado de Mato Grosso do Sul, até a
foz do rio Iguaçu, no Paraná. Até em 1874, foram definidos
seis marcos principais ao longo da fronteira - três na região
do rio Apa e três divisores de águas das serras de Amambai e
Maracaju.
Entretanto, um marco não foi estabelecido no final da
linha seca, na região do Salto Grande das Sete Quedas, no
rio Paraná, por ser considerado um acidente de fronteira
imutável
”. Com o fechamento da barragem de Itaipu, ao
final de 1982, esse acidente geográfico ficou submerso vindo
a desaparecer. Contudo, até a década de 1920, a fronteira
permaneceu imprecisa e os mapas discordantes (Ibidem, p.
42).
Em 1927, outro tratado foi assinado para delimitar
essa fronteira, o chamado Tratado Complementar de 1927,
que definia o limite ao longo do rio Paraguai. Entre 1978 e
1980 foram instituídos 24 marcos nas ilhas ao longo do
trecho limítrofe desse rio.
Atualmente, a fronteira do Brasil com o Paraguai tem
extensão de 1.365,4 km. Em sua extensão total, a linha-
limite percorre 928,5 km por rios e 436,9 km por divisor de
águas
29
.
29
Os trabalhos de caracterização, quase concluídos, estão a cargo da Comissão
Mista de Limites e de Caracterização da Fronteira Brasil-Paraguai (criada em 1930),
36
Ressalta-se que esses marcos, instituídos ao longo
dos anos, são sistematicamente inspecionados pela Comissão
Mista de Limites e reparados quando necessário, assim como
a faixa de fronteira que acompanha toda a fronteira seca, a
faixa ‘non-aedificandi’, que possui 50 metros de largura,
sendo 25 metros pertencentes a cada país.
Durante as tentativas de acordos para delimitar a
fronteira entre Brasil e Paraguai, foram instalados, na região
fronteiriça, agrupamentos militares, com o intuito de
consolidar a posse de terras. Como exemplo de agrupamento
militar, Marin (Ibidem) cita o Núcleo Militar de Dourados,
criado em 1861. Apesar de um grande contingente militar
que migrava para a região, não foram os destacamentos
militares que mais contribuíram para o povoamento daquele
território fronteiriço. O estabelecimento de campos para
pecuária, foi, segundo esse autor, o principal atrativo de
migrantes de várias regiões do país para aquela fronteira, o
que ocorreu mais intensamente entre 1829 e 1840.
Neide Patarra (2000) explica que os movimentos
recentes das correntes migratórias na divisa entre o Brasil e
que tem implantados 901 marcos. Disponível em:
<http://www2.mre.gov.br/daa/histparg.htm> Acesso em 03 jul. 2005.
o Paraguai estão diretamente relacionados com a formação
da fronteira entre esses dois países, ressaltando a
importância da constituição de suas fronteiras agrícolas nesse
processo. A colonização das regiões fronteiriças do Paraguai
iniciou-se com a venda de grandes latifúndios a companhias
estrangeiras agro-industriais e a colonos brasileiros,
japoneses e americanos
(Ibidem, p. 228). Os brasileiros,
segundo a autora, conseguiram, inicialmente, aproveitar os
benefícios do governo paraguaio, uma vez que lá havia terras
com preço mais baixo, além de créditos e benefícios
bancários.
No final de década de 1970, entretanto, como explica
Patarra, essa condição de aproveitamento dos benefícios em
terras paraguaias começou a se modificar e os migrantes
brasileiros de menos condições financeiras - aqueles que não
estavam na condição de produtores de mercadorias ou como
arrendatários começaram a se prejudicar, tornando-se
assalariados temporários ou exercendo outras atividades.
A autora (Ibidem, p. 229) afirma ainda que, mesmo
com esses problemas, o número de brasileiros vivendo no
Paraguai permanece alto. Segundo Patarra, o
Censo Nacional
de Poblacion y Viviendas
de 1992 censo realizado pelo
37
governo paraguaio - registrou 108.526 residentes paraguaios
com nacionalidade brasileira, e completa com os seguintes
dados:
Os dados do Ministério de Relações Exteriores
do Brasil registraram, em 1996, um total de
350.000 brasileiros residentes naquele país,
com a seguinte distribuição: Assunción:
107.035; Cuidad del Leste: 190.070; Salto de
Guaira: 40.000; Concepción: 6.112;
Encarnación: 3.102 e Pedro Juan Caballero:
3.618 (Ibidem, p. 229).
Segundo o Ministério da Integração, no Programa de
Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, op.cit),
vários são os fatores que atraem brasileiros para a fronteira
paraguaia nos dias de hoje, como a economia ilegal e a
compra de terras por sulistas para o plantio de soja ou
criação de gado bovino. De acordo com o Programa,
a
expansão dos brasiguaios na fronteira paraguaia é hoje uma
fonte de tensão para as relações transfronteiriças
30
(Ibidem, p. 240)
.
Dentro desse contexto encontra-se a
fronteira de Ponta Porã (Brasil) e Pedro Juan Caballero
(Paraguai), objeto de estudo deste trabalho.
30
Sobre o conceito de ‘brasiguaios’, Patarra explica que “está relacionado a três
categorias: estrangeiro, brasileiro e imigrante; estrangeiro, porque é a condição na
qual os pequenos proprietários agrícolas penetram em território paraguaio;
brasileiro, porque tal condição produz uma consciência de nacionalidade e imigrante,
pela própria condição jurídica” (op. cit., p. 229).
Não se podem esquecer, no contexto das correntes
migratórias na fronteira entre o Brasil e o Paraguai, os
processos de migração ocorridos no Brasil na época de sua
intensa urbanização que teve seu ápice a partir da década
de 1950 enfocando a urbanização do centro-oeste
brasileiro, região onde se encontra a fronteira entre Ponta
Porã e Pedro Juan Caballero
31
.
2.1.2 As Fronteiras no Mato Grosso do Sul e suas
regiões
Até quase o final da década de 1970, o estado de
Mato Grosso do Sul formava um estado juntamente com
Mato Grosso. Desde o início deste século, no entanto, a
região sul do estado aspirava tornar-se independente, idéia
rejeitada pela região norte do território estadual, que temia o
esvaziamento econômico do estado de Mato Grosso. Em 11
de outubro de 1977, foi aprovada a lei que desmembrou a
31
Este assunto será tratado no item 4.1 do capítulo 4.
38
parte sul, transformando-a em Estado de Mato Grosso do Sul
em 1º de janeiro de 1979.
Em publicação sobre a história do Estado de Mato
Grosso, Alisolete Antonia dos Santos Weingärtner (2004)
explica que a criação do Estado de Mato Grosso do Sul é
resultado de um longo movimento, com características
socioeconômicas, políticas e culturais, que permearam sua
formação histórica recente. Ela afirma que a resistência sul-
mato-grossense é uma das peculiaridades que entremeiam a
história de Mato Grosso do Sul desde os primeiros tempos de
conquista espanhola, depois luso-brasileira.
O movimento divisionista no Sul de Mato Grosso,
explica a historiadora, tem sua origem nos fins do século XIX
quando alguns políticos corumbaenses divulgaram um
manifesto, em 1889, no qual propunham a transferência da
capital de Mato Grosso para Corumbá. Alguns fatores como a
sistematização da pecuária, o desenvolvimento sócio-
econômico das vilas e cidades, a exploração da erva-mate
pela Companhia Matte Laranjeira e a ligação entre o Sul de
Mato Grosso e São Paulo, marcaram a origem desse
movimento divisionista.
Segundo informações do Ministério das Relações
Exteriores, o novo Estado, criado em 1979, foi governado por
um interventor nomeado pelo Presidente da República até o
ano de 1982, quando teve lugar a primeira eleição realizada
para Governador do Estado.
O Estado de Mato Grosso do Sul está localizado ao sul
da Região Centro-Oeste do Brasil. Faz limites ao norte com o
Estado de Mato Grosso, a nordeste com os Estados de Goiás
e Minas Gerais, a leste com São Paulo e a sudeste com o
Paraná, como pode ser verificado na figura 06. Além disso,
possui 730,8 km de fronteira-seca com outros países:
Paraguai, a sul e sudoeste e Bolívia a oeste. Sua capital é
Campo Grande, localizada na região central do Estado, com
uma população de 734.164 mil habitantes e uma área
territorial de 8.096 quilômetros quadrados
32
.
32
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, disponíveis em: http://
www. ibge.gov.br>. Acesso em 27 de jun. 2005.
39
Figura 06 – Limites de Mato Grosso do Sul
Fonte: Disponível em: http://www.guianet.com.br/ms/mapams.gif>. Acesso em 25
mai. 2007
.
Apesar de ser um estado muito jovem, a história da
fronteira internacional do atual estado de Mato Grosso do Sul
merece destaque, uma vez que se desenvolveu, em sua
maior parte, a partir de lutas pela posse de terras em uma
fronteira seca. O Rio Paraguai foi o maior alvo de disputas
pelos povos vizinhos, que, além de divisor de territórios,
era uma estratégica via de acesso.
A ocupação da fronteira sul-mato-grossense teve
início no século XVI com a presença espanhola na foz do Rio
da Prata, enquanto Portugal tentava dominar o litoral do
Oceano Atlântico. Por meio da abertura de um portal, os
espanhóis penetraram no interior do continente (pelo Rio
Paraguai) e por terra rumo às áreas minerais dos Andes
(CORRÊA, op.cit., p. 182).
na segunda metade do século XVIII, Portugal
iniciou seu processo de ocupação no atual sul de Mato
Grosso. Até então, os portugueses estavam investindo no
atual norte de Mato Grosso devido à descoberta do ouro.
Nessa época, a presença espanhola na região Sul do estado
era pouca. Marin (op.cit.) explica que a presença espanhola
na região se esgotou totalmente com a destruição das
missões.
Vale ressaltar que foi, por meio da organização dos
índios em missões jesuítas, que os espanhóis conseguiam
cada vez mais adentrar pelas terras brasileiras. Segundo
Corrêa (op.cit., p. 186)
a questão indígena assumiu grande
destaque à medida que exerceu um papel fundamental na
40
configuração geográfica da fronteira
”, onde pode ser
enfatizado os Payaguá, índios atuantes nos combates contra
os inimigos portugueses, e os Guaikurú, que barraram o
avanço dos inimigos castelhanos e luso-brasileiros, marcando
o espaço fronteiriço
33
.
A partir de então, Portugal estabeleceu em 1775 o
Forte de Coimbra e Albuquerque e, em 1778, Corumbá,
marcando assim seu império colonial. Corrêa (Ibidem) explica
que para tentar uma aproximação com os índios Guaikurú (já
que não era possível derrotá-los) e garantir suas posses
fronteiriças, o governo de Mato Grosso, sob orientação
portuguesa, precisou fazer tratados de amizade, inclusive
estimulando casamentos interétnicos. Por muito tempo, ainda
segundo Corrêa, esse ramo indígena foi objeto de estudo das
questões fronteiriças, mesmo após a Guerra da Tríplice
Aliança (Guerra que envolveu Brasil Paraguai, Argentina e
Uruguai), quando restaram apenas os índios Kadiwéu.
33
O autor destaca alguns estudos sobre a presença dos jesuítas no vale do Rio
Paraguai e região pantaneira, como GAY, João Pedro.
História da República Jesuítica
do Paraguai.
Desde o descobrimento do Rio da Prata até aos nossos dias, ano de
1861. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1942; e estudos sobre o agrupamento dos
índios Payaguá, como SCHIMIDT, Max. Los Payaguá. In:
Revista do Museu Paulista.
São Paulo, nova série, v. III, 1949.
A Guerra do Paraguai, ou Guerra da Tríplice Aliança,
de acordo com Bethel (1995), teve início com a declaração
de guerra pelo Paraguai em primeiro lugar ao Brasil e depois
à Argentina, seguida por uma invasão aos territórios desses
dois países, e acabou por se tornar uma guerra travada entre
Brasil, Argentina e Uruguai para a destruição do Paraguai.
Durou mais de cinco anos (de outubro/novembro de 1864 a
março de 1870) e consumiu cerca de 300 mil vidas.
Além disso, a guerra teve um impacto profundo sobre
os assuntos econômicos, sociais e políticos de todos os
quatro países nela envolvidos. Conhecida também como a
Grande Guerra, a Guerra do Paraguai foi um episódio inserido
na guerra civil extremamente longa entre
blancos
e
colorados
no Uruguai, que detonou a seqüência de eventos que
culminou com a invasão do Brasil e da Argentina pelo
Paraguai e, portanto, com a Guerra da Tríplice Aliança contra
o Paraguai (BETHEL, Ibidem).
Essa Guerra surgiu de um complexo encadeamento de
rivalidades internacionais, de ambições pessoais e das
peculiares condições geográficas da região platina. Bethel
ainda afirma que na época do conflito, o Império do Brasil
emergia provavelmente como a nação mais influente e bem
41
organizada da América do Sul, tendo fortalecido sua posição
no continente após o período de lutas contra Rosas (na
Argentina) e Oribe (no Uruguai). Desde a independência do
Paraguai, em 1813, o Brasil passara a manter relações
satisfatórias com esse país, mesmo durante o longo período
de isolamento que sofrera a nação paraguaia sob os
governos de Francia e de Carlos Antonio López.
A Guerra da Tríplice Aliança deixou, contudo,
inúmeros relatos e estudos para a história de formação da
América do Sul. Por ser um episódio de grande importância,
a bibliografia sobre essa Guerra é bastante abrangente e
diversificada. Alguns pesquisadores enfatizam o drama do
país perdedor Paraguai - enquanto outros escrevem sob a
visão dos países vencedores
34
.
Outro episódio bastante relevante na história das
fronteiras sul-matogrossenses é o ciclo da erva-mate nativa,
ocorrido a partir de da década de 1870, no qual grandes
34
A respeito dos estudos sobre a Guerra do Paraguai pode-se destacar: BETHELL,
Leslie.
A Guerra do Paraguai: História e historiografia
. In: MARQUES, Maria Eduarda
Castro Magalhães (org.).
A guerra do Paraguai 130 anos depois
. Rio de Janeiro:
Relume Dumará, 1995; POMER, Leon.
A guerra do Paraguai
. A grande tragédia
rioplatense. São Paulo: Global, 1980 e algumas teses acadêmicas, como SQUINELO,
Ana Paula.
A Guerra do Paraguai ontem e hoje
: Mato Grosso e Mato Grosso do Sul
(1868-2003). São Paulo, 2006. Tese
(Doutorado em História Social) - Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas, USP, 2006.
propriedades rurais se desenvolveram. Com o território
bastante destruído em função da Guerra, o Paraguai iniciou a
exploração da erva-mate nativa na região sul do estado,
formando-se um novo período de desenvolvimento tanto
para o território paraguaio, quanto brasileiro, o que motivou
o fluxo migratório para aquela região, principalmente por
gaúchos que migravam com a finalidade de cultivar a terra e
criar gado.
Quem iniciou a extração dos ervais nativos foi a
Empresa Mate laranjeira, em 1874, dirigida por Thomaz
Laranjeira. Em 1882 a empresa obteve do governo imperial o
monopólio para a exploração dos ervais por dez anos. Como
a atividade se tornou a mais importante atividade comercial
do estado, o arrendamento dos ervais foi ampliado no regime
republicano (MARIN, op.cit.). Em 1902 a razão social da
empresa passou a ser Laranjeira Mendes & Cia, uma vez que
a empresa foi vendida para a argentina Francisco Mendes
Gonçalvez & Cia.
A produção da erva-mate fez parte do
desenvolvimento da região sul de Mato Grosso do Sul, sendo
que, além de milhares de hectares de terra que foram
arrendadas, muitos trabalhadores, principalmente
42
paraguaios, foram empregados (ARRUDA, 1989 apud
TORRECILHA, op.cit.).
De acordo com o Ministério da Integração (BRASIL,
op.cit.) a Companhia Matte Laranjeira (que até o pós-guerra,
na década de 1940, compreendia as sub-regiões do
Bodoquena e do Cone Sul-mato-grossesnse) recebeu grandes
concessões de terras da União após a Guerra do Paraguai,
tanto em Mato Grosso do Sul, como no Paraná. A erva-mate
nativa era explorada e exportada por via fluvial (Rios
Paraguai e Paraná) para a Argentina, onde se fazia o
beneficiamento, venda e revenda. Aos poucos a Companhia
foi incorporando terras dos dois territórios (brasileiro e
paraguaio) e tornou-se um pequeno império extrativista.
A sede da Companhia, que ficava na cidade de Porto
Murtinho, à margem do Rio Paraguai, foi transferida para
Guaíra, cidade paranaense, devido à riqueza de seus ervais.
O esgotamento dos ervais, as mudanças políticas no Brasil e
Argentina, e a imigração de sulistas e nordestinos foram,
segundo o Ministério da Integração (Ibidem), alguns dos
fatores que levaram ao fim do domínio da Companhia Matte
Laranjeira.
Foi no contexto da expansão da produção da erva-
mate que se desenvolveram os territórios de Ponta Porã, em
Mato Grosso do Sul, a qual continha um posto fiscal que
arrecadava o imposto de exportação, e Pedro Juan Caballero,
no Paraguai
35
. Outras localidades foram fundadas também
nessa época, como Porto Murtinho, Campanário, Maracaju,
Entre Rios, Amambai, Dourados e Guairá no Paraná.
2.1.2.1 Faixa de Fronteira do Estado de Mato
Grosso do Sul
O Estado de Mato Grosso do Sul possui 44 municípios
compondo sua Faixa de Fronteira Internacional. Além da
Bolívia, por meio das cidades de Corumbá (Brasil) e Porto
Soares (Bolívia), é principalmente com o Paraguai que ele
divide a maior parte de seu território, por meio de quatro
Departamentos: Alto Paraguay, Concepción, Canendiyu e
Amambay, onde se localiza a área de estudo.
35
O processo de formação dos municípios fronteiriços Ponta Porã e Pedro Juan
Caballero será aprofundado no capítulo 4 - Ponta Porã e as relações fronteiriças
43
É importante ressaltar que, apesar de Mato Grosso do
Sul ser um dos estados brasileiros que mais possui cidades
de fronteira internacional, apenas três municípios do Estado
fazem contato contíguo com municípios paraguaios, ou seja,
cidades que se caracterizam como cidades-gêmeas: Coronel
Sapucaia (Brasil) e Capitão Bado (Paraguai), Paranhos
(Brasil) e Ipê-Juhi (Paraguai) e Ponta Porã (Brasil) e Pedro
Juan Caballero (Paraguai), além do distrito Sanga Puitan,
distante 11 km de Ponta Porã, que faz divisa com Sanga
Puitã (Paraguai).
A extensão da faixa de fronteira do Estado
corresponde a quase 10% do total das fronteiras brasileiras,
que, por sua vez, compreende 15.719 quilômetros paralelos
ao limite internacional.
Uma característica importante da faixa de fronteira
internacional brasileira, inclusive a faixa sul-mato-grossense,
a ser ressaltada é a presença institucional representada pelas
unidades militares, as quais, além de defenderem a fronteira,
caracterizam-se por ser fonte de sobrevivência de várias
povoações. A esse respeito Steiman explica:
A implantação de batalhões e pelotões de
fronteira do exército foi responsável não só
pela sobrevivência de vilas e povoados da
época colonial como também, no Brasil, pela
formação de núcleos urbanos que ascenderam
à condição formal de cidades (STEIMAN,
op.cit., p. 37).
Na figura 07 a seguir, retratam-se as Bases do
exército na faixa de fronteira de Mato Grosso do Sul em suas
diferentes atribuições: brigada, batalhão, companhia,
pelotão, destacamento e futuro destacamento
36
. A base
militar do município objeto desta pesquisa - Ponta Porã
caracteriza-se como brigada, e é denominado como 11°
RCMEC - Regimento de Cavalaria.
36
A respeito das atribuições militares, Cf: www,exercito.gov.br. Acesso em 03 jun.
2008.
44
Figura 07 – Bases do exército na faixa de fronteira de MS -
1998
Fonte: Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, 2005).
Atualmente, o Estado de Mato Grosso do Sul pode ser
considerado como um ‘corredor’ próprio das regiões
fronteiriças, como explica Marin ao escrever que esse Estado
é cenário dos crimes de pistolagem, do tráfico de drogas, do
contrabando de mercadorias e gado e de esconderijo e ponto
de fuga de criminosos e traficantes
(MARIN, op.cit., p. 31).
Além disso, por ser uma região fronteiriça com outros países
(Bolívia e Paraguai), a heterogeneidade social (várias
nacionalidades, línguas e etnias) torna a região em um ponto
de troca e convivência cultural, em um
intercâmbio
fronteiriço
37
.
A respeito dessa efervescência cultural presente na
região de fronteira de Mato Grosso do Sul, ressalta-se um
trecho do conto
Sanga Puytã
, de Guimarães Rosa:
Distamos ainda, verdade, da zona de osmose,
onde nos falará uma língua bizarra, com
vogais teclados; dos exércitos de ervateiros
forasteiros, que povoam redutos de trabalho;
das terras de tangência amorosa, em que os
sangues diversos se influem; desse povo
fronteiro, misto, que, e lá, valha
chamarmos
brasiguaios
, num aceno de
poesias. (ROSA, 1978, p. 18)
37
O termo
intercâmbio fronteiriço
é bastante utilizado por diversos autores para
designar as áreas onde acontecem relações mútuas entre duas cidades vizinhas,
geralmente de dois países distintos. Jérri Roberto Marin utiliza o termo ao tratar das
relações de troca existentes na fronteira do Brasil com o Paraguai e com a Bolívia.
45
2.2 Acordos Internacionais em áreas de
Fronteira
No final do século XX as fronteiras sul-americanas
passaram por um processo de transformação. Uma nova
realidade política, econômica e social surgiu com o processo
integracionista, ocasionado, principalmente, pelo advento do
Mercosul.
Nesse contexto, é importante ressaltar que em um
processo de integração, seja internacional ou regional
38
,
existem situações conflituosas, uma vez que estão envolvidas
questões como tentativa de aproximação de povos distintos,
estreitamento de culturas diversas e, principalmente, de
dissolução de legislações específicas.
A respeito da integração regional utiliza-se das
palavras de Neiva Otero Shäffer (1993):
38
Existem diferenças de conceituações sobre integração internacional e integração
regional. Segundo Faria (1993, p. 25-26 apud JAEGER JUNIOR, 2001, p. 126) a
integração internacional é um termo mais genérico, “empregando-se usualmente pra
descrever características e tendências da economia capitalista global, impulsionada
pela interação e pela interdependência”. O termo integração regional, por sua vez,
consiste no produto de acordos políticos realizados por países próximos
geograficamente, “com vistas à obtenção das vantagens típicas do processo”
(Ibidem, p. 126)
A Integração Regional que vem sendo
discutida especialmente após 1986, quando foi
firmado o Acordo e Alta de Integração entre
Brasil e Argentina, posteriormente com
participação do Uruguai e Paraguai
(MERCOSUL, março de 1991), tornou
numerosos os discursos sobre a necessidade
de encaminhamento efetivo de integração
regionalizada no continente (Ibidem, p. 11-
12).
A integração regional, segundo Alemar (2001), era
o ideal de alguns desde Simon Bolivar, por volta de 1890.
Porém, apenas 70 anos depois se teve uma real tentativa de
aproximação das Américas, com o surgimento, em 1960, da
Associação Latino-Americana de Livre-Comércio (ALALC). A
respeito dessa associação Reis (2001) afirma que:
[...] a ALALC contribuiu para o incremento do
comércio intra-regional nas duas primeiras
décadas de sua existência. Com a crise do
petróleo e a crise da dívida externa, as
economias da região tiveram de passar por
fortes ajustes macroeconômicos, que
colocaram em segundo plano a integração
econômica (Ibidem, p. 254).
Como essa associação, segundo Alemar (op.cit.),
trouxe poucos benefícios práticos para os países envolvidos,
em 1980, houve outra tentativa de impulsionar a integração:
46
a Associação Latino-Americana de Desenvolvimento e
Integração (ALADI).
Sabe-se, entretanto, que a aproximação dos países no
sentido político, econômico e social é de bastante dificuldade,
uma vez que as realidades políticas e econômicas de cada
Estado membro destes acordos são bastante discrepantes.
Neste sentido, Alemar destaca as idéias de Raymond Barre,
que, em 1957 dizia que
“[...] as diferenças no ritmo de
desenvolvimento originam desigualdades gritantes entre os
países
” (BARRE, 1957 apud ALEMAR, Ibidem, p. 40).
O mesmo acontece com as realidades dos países-
membro do Mercosul Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai
países com realidades econômicas e políticas bastante
diversas. Brasil e Argentina se assemelham em questões
econômicas, ao passo que se afastam da realidade
econômica do Paraguai e Uruguai, que, por sua vez, se
assemelham em outros quesitos.
É imprescindível lembrar também que não se pode
haver espaços integrados economicamente sem pensar nas
questões socioculturais de cada país, as quais possam afetar
tal integração, tais como desigualdades sociais, discriminação
e exclusão. A esse respeito:
Aquellos de menores recursos, los que han
acusado uma postergación creciente em sus
espacios locales, no pueden internalizar que
enunciados de integración reflejen actitudes
de desintegración. Se sienten excluídos,
expulsados del nuevo sistema em la medida
em que no logran insertarse em el engranaje
de la economia globalizada
(MORENO, 2001,
p. 67).
Moreno acredita que a construção de um espaço
social real com menores taxas de discriminação, exclusão e
desigualdades sociais - é fundamental ao se tratar da
integração econômica dos países da América Latina, e,
especialmente dos países membros do Mercosul.
O Mercosul é, no contexto dos acordos internacionais
promovidos em busca da integração, o Tratado de maior
relevância para as fronteiras internacionais brasileiras, uma
vez que consiste em um organismo internacional
caracterizado como modelo de integração econômica
regional, cujo objetivo maior é a consolidação de um
mercado comum entre seus países membros.
A década de 1990, não foi palco apenas da assinatura
do Mercosul como tentativa de integração, mas também de
diversos outros Acordos Regionais de Comércio (ARCs).
Segundo a classificação de Balassa (1982 apud REIS, op.cit.,
47
p. 251), a integração econômica pode aparecer de diversas
formas
Zonas de livre-comércio, União Aduaneira,
Mercado Comum, União Econômica ou Integração Econômica
Total
”.
É importante ressaltar também, no contexto da
integração regional, a Comissão Econômica para a América
Latina (CEPAL)
39
a qual elaborou uma proposta para a
criação de uma Zona de Livre Comércio entre os países do
Caribe e América Latina
40
. Vale lembrar que apesar de serem
várias as tentativas de ações integracionistas, alguns fatores
dificultam-nas, como obstáculos geográficos, determinantes
para algumas regiões terem mais dificuldades em se integrar
do que outras.
Recentemente, foi elaborada uma proposta de criação
de área de livre comércio envolvendo a fronteira do Brasil
com países do Cone-Sul. Trata-se de um projeto de Lei
39
A Cepal consiste na principal fonte de informações sobre a realidade latino-
americana. Trata-se de uma instituição dependente da ONU - Organização das
Nações Unidas - que foi estabelecida em 1948 com o objetivo de impulsionar o
desenvolvimento dos países da América Latina e cuidar de problemas pertinentes da
região (BACK, 2001).
40
Áreas de livre Comércio constituem regiões com isenção fiscal, que tem por
objetivo beneficiar o comércio de bens de outras regiões do país ou de outros
países. É um entreposto comercial com o intuito de promover o desenvolvimento
regional.
apresentado por deputados da região Sul do país
41
com o
intuito de impulsionar o desenvolvimento das regiões
fronteiriças, no âmbito econômico e social, e melhorar as
relações bilaterais entre os países com que fazem fronteira
(PROPOSTA, 2008).
Ponta Porã, entretanto, não foi contemplada nessa
proposta. O projeto beneficiou o município catarinense
Dionísio Cerqueira, que faz fronteira com a Argentina; Foz do
Iguaçu, no Paraná, que faz fronteira com o Paraguai e
Argentina; e o município gaúcho Santana do Livramento,
fronteira com Rivera, no Uruguai.
2.2.1 Marcos Institucionais da Faixa de Fronteira
A faixa de fronteira brasileira passou por diversas
regulamentações até chegar à atual definição. Cada país da
América do Sul a considera de forma diferenciada. De acordo
com Rebeca Steiman (2002b) apenas seis deles, incluindo o
41
O projeto de lei PL 2830/08 foi assinado pelos deputados Celso Maldaner
(PMDB-SC), Gustavo Fruet (PSDB-PR) e Paulo Pimenta (PT-RS) (PROPOSTA, 2008).
48
Brasil, reconhecem-na como uma unidade espacial distinta e
sujeita à legislação específica. São eles: Peru (Constituição
de 1993) e Bolívia (Constituição de 1967, reformada em
1994), ambos determinam a faixa de fronteira de 50 km; e
Colômbia (Constituição de 1991, reformada em 1997),
Venezuela (Constituição de 1999) e Equador (Constituição de
1998), que não especificam largura da faixa de fronteira.
No Brasil, a demarcação e caracterização dos limites
são feitas por comissões mistas de limites, como explica
Steiman:
O Brasil mantém duas comissões bilaterais
demarcadoras de limites. A primeira, com
sede em Belém, é responsável pelas fronteiras
setentrionais, com a Guiana Francesa, o
Suriname, a Guiana, a Venezuela, a Colômbia
e o Peru. À segunda comissão, sediada no Rio
de Janeiro, cabe executar trabalhos nas
fronteiras meridionais, com a Bolívia, o
Paraguai, a Argentina e o Uruguai (Ibidem, p.
04).
A propriedade de terra em áreas de fronteira
brasileira tem passado por modificações desde o século XIX,
quando a Constituição Republicana de 1891 definiu a faixa de
fronteira de 66 km a partir da linha de fronteira para dentro
do território nacional. De acordo com a Carta Magna da
época, todas as terras devolutas
42
dentro da faixa de
fronteira estavam sob domínio da União, enquanto os
Estados eram responsáveis pelas terras devolutas não
localizadas nessas áreas.
Quase meio século depois, com a Constituição de
1934, promulgada por Getúlio Vargas, a faixa de fronteira
passa a ser uma faixa de 100 km paralela às fronteiras
brasileiras. E nessa constituição apareceu também o conceito
de
faixa de segurança nacional
, na qual o Estado ficou
proibido de conceder títulos de terra sem a anuência do
Conselho Superior de Segurança Nacional, criado na mesma
Constituição. Em 1937, a Constituição, editada sob o Estado
Novo, por meio do artigo 165, amplia a faixa para 150 km,
largura mantida pela Constituição Federal de 1988, cujo
conceito de
faixa de segurança nacional
passou a ter o
mesmo significado de faixa de fronteira.
A partir de 1939, dois decretos foram criados para
revisar a concessão de terras na faixa de fronteira, o Decreto
42
Terras devolutas
são aquelas que não integram e nunca integraram patrimônio
particular, consideradas indispensáveis à defesa das fronteiras. Com a instituição da
Lei das Terras Lei n. 601 de 18/09/1850 para a substituição do antigo estatuto
das sesmarias, extinto em 1822, o território brasileiro passou a ser dividido em dois:
terras particulares e terras públicas. As terras públicas foram, portanto, designadas
como
terras devolutas
(ALVIM, 1996).
49
Lei 1164/39, que criou a Comissão Especial de Revisão de
Concessão de Terras pelos Estados e municípios na faixa de
fronteira e o Decreto Lei n° 1968/40, que ampliou suas
atribuições (STEIMAN, Ibidem).
Na Constituição de 1946 a largura da faixa de
fronteira não é mencionada, ficando a cargo de uma lei
criada apenas 10 anos depois, a Lei n° 2597/55, que “
definiu
as zonas indispensáveis à defesa nacional, mantendo entre
elas a faixa de fronteira de 150 km como zona de segurança
(Ibidem, p. 05). Assim como a Constituição de 1946, a
Constituição de 1967 também não mencionou a faixa de
fronteira, a qual continuaria sendo responsabilidade da Lei
2597/55. O Conselho de Segurança Nacional (CSN), órgão
supervisor da Comissão Especial da Faixa de Fronteira
(CEFF), ficaria responsável pela segurança destas áreas.
Em 1979 entra em vigor a Lei 6634, revogando a
Lei 2597/55, e que está em vigor até hoje. Sobre as
alterações ocorridas com a mudança na legislação Steiman
salienta:
O limite de tamanho das terras públicas para
alienação ou concessão na faixa de fronteira
passa de 2.000 para 3.000 hectares (artigo
8º); a União não mais se obriga a concorrer
com 50% do custo de obras públicas
municipais na faixa, mas se reserva o direito
de concorrer com o custo total ou parcial de
acordo com o interesse da área para a
segurança nacional; não caberia mais à CEFF
(extinta pela Lei nº. 6559/78) providenciar a
consignação, no Orçamento Nacional, dos
recursos para os projetos na faixa, mas à
Secretaria Geral do Conselho de Segurança
Nacional (STEIMAN, Ibidem, p. 09).
Na Constituição de 1988 a faixa de fronteira é
abordada não apenas em relação à sua largura, mas também
em relação aos seguintes aspectos:
são bens da União as
terras devolutas indispensáveis à defesa das fronteiras, das
fortificações e construções militares, das vias federais de
comunicação e à preservação ambiental, definidas em lei
(BRASIL, 2002, art. 20). E ainda, reafirmando a lei 6634
de 1979, no mesmo artigo, § 2º:
A faixa de até cento e cinqüenta quilômetros
de largura, ao longo das fronteiras terrestres,
designada como faixa de fronteira, é
considerada fundamental para defesa do
território nacional, e sua ocupação e utilização
serão reguladas em lei.
O artigo 21, por sua vez, delega como competência
da União a execução de serviços de polícia de fronteira. O
artigo 91 compete ao Conselho de Defesa Nacional:
50
Propor os critérios e condições de utilização de
áreas indispensáveis à segurança do território
nacional e opinar sobre seu efetivo uso,
especialmente na faixa de fronteira e nas
relacionadas com a preservação e a
exploração dos recursos naturais de qualquer
tipo.
Por fim, o último artigo da atual Constituição a
abordar as questões de fronteira é o artigo 176, o qual trata,
no § 1º, da pesquisa e exploração dos recursos minerais do
subsolo, que, quando em áreas de fronteira terão condições
específicas para serem tratados.
De acordo com o Programa de Desenvolvimento da
Faixa de Fronteira (BRASIL, 2005), a preocupação com a
segurança nacional, mesmo sendo legítima, não tem sido
acompanhada de uma política pública ordenada atendendo
as especificidades regionais, nem do ponto de vista
econômico, nem da cidadania fronteiriça. No relatório do
Programa são citadas algumas causas para tal questão, como
a baixa densidade demográfica, a vocação atlântica do país,
as grandes distâncias; as dificuldades de comunicação com
os principais centros divisórios, entre outros.
Dentro do contexto dos acordos internacionais,
inclusive os pertinentes à fixação da faixa de fronteira
internacional, é de suma importância uma breve abordagem
do acordo de maior destaque nas questões recentes
relacionadas à fronteira o Mercosul uma vez que seus
países-membro - Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai
fazem fronteira entre si e dois deles (Brasil e Paraguai) estão
destacados nesta pesquisa.
55
2.2.2 O Mercosul e a Integração Regional
Em um panorama de transformações mundiais, a década
de 1990 foi cenário de vários movimentos de tentativas
integracionistas ocorridos no mundo - como a formação de um
mercado norte-americano livre, englobando Canadá, EUA e
México; a rediscussão da integração do Grande Círculo Asiático;
a integração da Bacia do Pacífico; e a Europa do Leste e a URSS
se aproximando da Europa (SANTOS, 1999).
Nessa mesma década o Cone-Sul latino-americano
também obteve um salto no processo integracionista de seus
países, trata-se do Acordo assinado em 1991: o Mercado
Comum do Sul (MERCOSUL), realizado entre quatro países sul-
americanos: Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai -
representando mais de dois terços de todo o território da
América do Sul (CASTELLO, op.cit.).
Nesse contexto, o Mercosul é considerado como a
primeira experiência de tentativa de efetiva integração da
América do Sul, e foi afirmado com a assinatura do Tratado de
Assunção
43
. Seu objetivo fundamental é promover a integração
econômica dos países envolvidos e melhorar as condições de vida
dos seus cidadãos
44
.
Vale lembrar que os demais países da América do Sul, que
não são membros do Mercosul, mas associados ao bloco, têm a
obrigação de manter relações comerciais livres com os países
membros, mas não possuem direito de voto nas questões
econômicas, não podendo também opinar em questões políticas e
institucionais.
O Mercosul colocou em prática a preocupação exposta pela
Constituição Federal de 1988 artigo 4°, parágrafo único que
trata da integração econômica, política, social e cultural
45
. Segundo
Kerber (2001, p. 260) “
tal dispositivo [...] identifica que a diretriz da
integração tem objetivo programático de política externa
”.
43
Tratado para a Constituição de um Mercado Comum entre a República Argentina, a
República Federativa do Brasil, a República do Paraguai e a República Oriental do Uruguai., O
Tratado está disponível em: http://www.mercosul.gov.br/assuncao>. Acesso em: 19 jan.
2008.
44
Alguns autores discordam da idéia de que o Mercosul surgiu a partir do Tratado de
Assunção, como Aguinaldo Alemar, que acredita que daquele Tratado nasceu o rótulo do
Mercosul e não o acordo em si.
45
“[...] Parágrafo único. A República Federativa do Brasil buscará a integração
econômica, política, social e cultural dos povos da América Latina, visando à
formação de uma comunidade latino-americana de nações” (BRASIL, 1998, p. 02).
56
Afirmando que esse dispositivo consta da parte permanente da
Constituição, o autor (loc. cit.) acredita que a partir do texto
constituinte
o Brasil pretende uma integração visando à
formação de uma comunidade latino-americana de nações, e
que tenha efetivas condições de sobrevivência
”.
O modelo de ‘mercado comum’ proposto tem como
objetivo central uma integração econômica de grande
abrangência, caracterizada por uma zona de livre comércio
entre os países envolvidos. Sobre as atribuições econômicas do
acordo Iára Castello (op. cit) explica:
[...] implicará na adoção de tarifa zero ou
tendente a zero nos países signatários do acordo
e diferente de zero com outros países, podendo
haver zona aduaneira única compreendendo dois
ou mais países (Ibidem, p. 16).
O Mercosul é um dos principais demarcadores da
globalização internacional, como afirma Hirano (1993 apud
SHÄFFER, 1995, p. 83) ao situá-lo como:
[...] um procedimento inserido nesse quadro
internacional da globalização da economia,
exigente de uma rearticulação regional e que
empurra as economias do continente à ideologia
neo-liberal, centrada no livre mercado [...] e
permissiva aos investimentos estrangeiros.
Para alcançar seus objetivos - criação de um mercado
comum com livre circulação de bens; adoção de uma política
externa comum; coordenação de políticas macroeconômicas e
setoriais; entre outros no acordo do Mercosul foram traçadas
linhas de ações, e para coordená-las foi criada uma estrutura
organizada por Comissões, Conselhos, e Grupos
46
. A estrutura
institucional do Acordo está definida no Protocolo de Ouro Preto,
instrumento normativo de 1994.
É sabido que existem discrepâncias notáveis entre os países
membros do Mercosul, como diferenças culturais, raízes históricas e
outras características comuns de cada país, como economia e
legislação. Castello (op. cit.) explana a respeito de algumas
disparidades entre os países membros e as conseqüentes
problemáticas que possam afetar o acordo.
Entre as dessemelhanças são destacadas pela autora as
diferenças de tamanho dos territórios e densidades populacionais -
o Brasil é o mais extenso, o de maior densidade ocupacional e
corresponde a cerca de 70% da área do Mercosul, ao passo que o
Uruguai, de menor tamanho possui a densidade ocupacional mais
46
Não é objetivo deste trabalho, contudo, explanar a respeito da estrutura do Acordo, e sim
explicitá-lo como forma de tentativa de integração regional. Para maiores informações
consultar o portal oficial do Mercosul, disponível em: http://www.mercosur.int/msweb/.
Acesso em 19 jan. 2008.
57
baixa - as diferenças nas operações das estruturas
administrativas - os Estados brasileiros, de regime federativo,
possuem grande autonomia, enquanto os Departamentos do
Uruguai possuem pouca autonomia, as Províncias Argentinas
têm autonomia relativa e o Paraguai possui regime centralizado
- e as diferenças no contingente populacional - 78% do
contingente populacional do Mercosul pertencem ao Brasil,
enquanto apenas 1,6% são representadas pelo Uruguai.
Ou seja, essas diferenças mostram as formas distintas
de reflexos do acordo para cada um dos países. Concordando
com Castello:
O entendimento de que a esperada atuação em
bloco não significa igualdade de ações em todas
as áreas e homogeneização de práticas, usos e
costumes, é uma condição primordial, que deve
ser reconhecida e da qual depende o nível de
sucesso da integração regional pretendida
(Ibidem, p. 18).
É possível perceber a partir de revisão bibliográfica sobre
o assunto que o Mercosul implica em uma questão de dualidade
das áreas de fronteiras, uma vez que ao mesmo tempo em que
tem por objetivo promover a integração regional por meio de
trocas e interesses comuns, precisa respeitar a necessidade do
estabelecimento de limites entre os países, necessários para a
preservação da soberania nacional de cada um.
As diferenças existem, mas por serem áreas de modo de
vida e cultura tão particulares, as semelhanças também estão
presentes.
Concretizar as expectativas da integração regional é difícil. A
fronteira está perdendo sua posição de território fixo, impermeável,
o que pode afetar em muito as condições de vida da população e
sua economia.
Schäffer argumenta:
A fronteira deixa de ser limite, finitude, o lugar da
diferença, da pletora de homens e de funcionários
públicos, o espaço do comércio, dos serviços, do
contrabando. Passa a assumir um espaço central entre
as sedes nacionais de gestão, concepção e produção.
Torna-se aberta, porosa, exemplo da integração e da
aproximação. Integração vivenciada
tradicionalmente em várias pautas do cotidiano, do
social e que se fazia à revelia da definição das
economias centrais; aproximação que não tem o
sentido que hoje recebe numa ordem que dirige a
organização de blocos nacionais integrados (Schäffer,
op.cit., p. 84).
Nesta perspectiva de integração regional, os termos
enfatizados são a competitividade e a fluidez, e essas não são
58
características das cidades de fronteira até então. Daí a
preocupação dos efeitos da integração – Mercosul - e das
dificuldades de sua concretização. Nesse contexto, Schäffer
completa:
A fronteira vive dessa diferença de nacionalidade
e, dela, das diferenças de normas e moedas. A
peculiaridade que vida e que garante a
produção material e a reprodução social,
organizando o território fronteiriço sustenta-se na
‘existência da fronteira’; desaparece sem ela
(Ibidem, p. 86).
Apesar da diferença de nacionalidades existentes nas
regiões de fronteira, a integração existe de outro modo. É na
integração cotidiana, caracterizada pelo convívio diário, relações
sociais, culturais e cambiais. Porém, o que se pretende
principalmente com o Mercosul é a integração política e
econômica de grande abrangência, que, como explanado
anteriormente, encontra dificuldades em diversos setores.
Os recursos para investimentos para regiões de fronteira
são escassos, a disputa pelo poder é grande no contexto da
busca por alternativas para essas regiões. Nesse contexto, o
poder local, em geral, age com descaso, apesar de dever ser
este o principal agente de apoio a essas regiões tão peculiares.
No contexto da tentativa de integração promovida pelo
Mercosul é de suma relevância destacar a fronteira entre o Brasil e
o Paraguai, particularmente as cidades-gêmeas Ponta Porã BR - e
Pedro Juan Caballero - PY.
Essa fronteira-seca situada no sul de Mato Grosso do Sul é
um bom exemplo para se retratarem as dificuldades encontradas na
prática integracionista, uma vez que se percebe na região a
ausência de políticas territoriais integradas, o que resulta em um
processo de desenvolvimento territorial fragmentado e cheio de
conflitos.
A falta de ações conjuntas para o desenvolvimento da região
reflete não somente na economia das cidades, mas também nas
condições de vida da população, fatores estes que vão contra o
objetivo maior do Mercosul - promover a integração econômica dos
países envolvidos e melhorar as condições de vida dos seus
cidadãos. Surge, então, a dúvida a respeito da eficiência e da
efetividade de um acordo com dimensões tão grandiosas como o
Mercosul.
59
3. PLANOS E PROGRAMAS PARA AS ÁREAS DE
FRONTEIRA BRASILEIRA PÓS 1988: O CASO
DE PONTA PORÃ NO MATO GROSSO DO SUL
O atual governo federal tem reconhecido a importância da
faixa de fronteira brasileira em âmbito nacional, como área
fundamental na dinamização de regiões.
Por a faixa de fronteira ter vital importância na integração
sul-americana, o governo do presidente Luis Inácio Lula da Silva
desenvolveu, em 2005, a reestruturação do Programa de
Desenvolvimento da Faixa de Fronteira PDFF como orientação
estratégica de seu governo.
De acordo com o então Ministro de Estado da Integração
Nacional, Ciro Gomes, antes da proposta de reestruturação os
projetos do Programa eram fragmentados e desarticulados, uma
vez que não continham planejamento adequado. Nas palavras do
Ministro:
60
O novo PDFF busca promover a superação das
desigualdades intra e inter regionais por meio do
aproveitamento das especificidades locais com
perspectiva de consolidação das relações
comerciais e culturais com os países vizinhos.
(BRASIL, 2005, p. 5)
É a partir do entendimento da importância de programas
como o PDFF para o desenvolvimento das regiões fronteiriças
do país que esse capítulo será desenvolvido.
Após uma breve apresentação do PDFF, será exposto
como esse programa atua na área de fronteira internacional
focada nesse estudo. Além disso, apresenta-se uma breve
síntese do Plano Regional de Desenvolvimento Sustentável da
Região Sul-Fronteira, elaborado em 2002, que trata também de
aspectos relacionados com a temática.
3.1 A Política Nacional de Desenvolvimento Regional
A Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR),
assim como seus programas, encontra-se prevista no Plano
Plurianual (PPA 2004-2007). Formulada pela Secretaria de Políticas
de Desenvolvimento Regional (SPDR), a política consiste na junção
dos Programas de Desenvolvimento Regional do Ministério da
Integração Nacional. São eles: o Promeso (Programa de Promoção
de Sustentabilidade de Espaços Sub-regionais); o Promover
(Programa de Promoção e Inserção Econômica de Sub-regiões); o
Conviver (Programa de Desenvolvimento Integrado e Sustentável
do Semi-Árido), o Produzir (Organização Produtiva de Comunidades
Pobres), e o PDFF (Programa de Desenvolvimento da Faixa de
Fronteira).
Esses cinco Programas envolvem iniciativas que tem por
objetivo reverter o quadro de desigualdade e exclusão das regiões
brasileiras e suas populações. Os cinco grandes Programas estão
organizados em dois grandes eixos: 1) organização da sociedade
local em bases sub-regionais; 2) dinamização econômica das sub-
regiões.
61
Segundo o então Ministro da Integração Nacional, Ciro
Gomes, a orientação da PNDR “se concretiza na articulação e na
implementação das ações pela Secretaria de Programas
Regionais” (BRASIL, 2004, p.3).
Para tanto, a Secretaria de Programas Regionais SPR -
age em parceria com as Secretarias de Desenvolvimento do
Centro-Oeste, de Infra-Estrutura Hídrica, de Defesa Civil, o
Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS), a
Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e
Parnaíba (CODEVASF), a Agência de Desenvolvimento da
Amazônia (ADA) e a Agência do Desenvolvimento do Nordeste
(ADENE).
A organização social em bases sub-regionais consiste na
criação de novos espaços sub-regionais, cujas delimitações,
segundo o então Secretário de Programas Regionais, Carlos
Gadelha, “avançam para uma conformação que permita uma
maior eficiência e eficácia do ponto de vista da organização
social, da convergência produtiva das forças sociais, econômicas
e políticas” (Ibidem, p. 5).
A dinamização econômica das sub-regiões, por sua vez,
tem como instrumentos os sistemas e arranjos produtivos locais
em espaços territoriais determinados. Esta dinamização, segundo
Gadelha, tem por objetivo “a criação de emprego e a
desconcentração da renda por meio da inclusão social e do
crescimento, [...] bem como a dinamização do mercado de
consumo de massa” (Ibidem, p. 5).
O instrumento mais evidente contido no PPA 2004-2007
47
,
que faz parte da PNDR, é, segundo o então Secretário de
Programas Regionais, Augusto Gadelha, o PROMESO, uma vez que
trata da questão territorial de forma diferençada, em bases sub-
regionais, e suas ações são voltadas para a “redução das
desigualdades mediante o desenvolvimento endógeno do potencial
econômico num processo articulado com a sociedade local”
(Ibidem, p. 5).
O CONVIVER, por sua vez, atua como o PROMESO, porém
com um recorte territorial, uma vez que atua na região do Semi-
Árido. O programa tem por objetivo integrar as ações do Governo
Federal que são direcionadas para esta região.
47
A descrição completa dos Programas do PPA 2004-2007 está disponível no portal do
Ministério da Integração Nacional. Disponível em:
<http://www.integracao.gov.br/programas/programasregionais/index.asp>. Acesso em 12
mai. 2008.
62
O PROMOVER tem como prioridade apoiar as iniciativas
que dependem de uma maior dinamização, ou seja, promover,
em espaços sub-regionais com potencial dinâmico, a inserção
competitiva de atividades produtivas nas economias local,
regional, nacional e internacional.
O PRODUZIR faz a identificação e viabilização para a
população mais carente de alternativas de trabalho e renda, por
meio de capacitações específicas.
E por fim tem-se o PDFF, o qual foi mais bem abordado
anteriormente em decorrência de ser o Plano voltado para a
melhoria das áreas de fronteira brasileira.
3.2 O Programa de Desenvolvimento da Faixa de
Fronteira - PDFF
Como colocado, o PDFF é um dos cinco grandes
programas de ações da Secretaria de Programas Regionais
(SPR) do Ministério da Integração Nacional (MI). Esse programa
é parte da Política Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR)
juntamente com os outros programas de âmbito nacional,
abordados no item anterior, (Promeso, Promover, Conviver),
exercem “iniciativas voltadas para a reversão do quadro de
desigualdade e de exclusão das regiões brasileiras e das populações
que nelas residem e trabalham” (Ibidem, p. 6).
O trabalho completo do PDFF foi desenvolvido pelo Grupo
Retis, do Departamento de Geografia da Universidade Federal do
Rio de Janeiro e intitulado “Proposta de Reestruturação do
Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira” (2005)
48
. O
documento foi elaborado a pedido do Ministério da Integração e
teve a coordenação de Lia Machado e Rogério Haesbaert. O estudo
do Grupo Retis elaborou os conceitos, tipologias e categorias da
faixa de fronteira brasileira, os quais foram incorporados em um
documento preparado pela SPR, como síntese da nova proposta do
Programa – PDFF
49
.
48
Este projeto foi desenvolvido no período de dezembro de 2003 a maio de 2004. O
resultado completo do trabalho encontra-se no portal do Ministério da Integração Nacional.
Disponível em:
<http://www.integracao.gov.br/programas/programasregionais/faixa/publicacoes.asp?area=s
pr_fronteira>.
49
A síntese do PDFF encontra-se no portal do Ministério da Integração Nacional. Disponível
em:
63
A proposta de reestruturação do Programa foi elaborada
a partir do entendimento da faixa de fronteira como região
fundamental na estimulação da integração regional. Ou seja,
incentivar o desenvolvimento da faixa de fronteira significa uma
diretriz essencial da política nacional brasileira.
Nesse entendimento, as fronteiras caracterizam-se como
regiões singulares que, apesar de possuírem posição estratégica
para o desenvolvimento regional, são esquecidas pelo Estado,
ficando na maioria das vezes com precárias condições de
segurança pública e de cidadania.
O objetivo principal do Programa é estimular o
desenvolvimento da Faixa de Fronteira “por meio de sua
estruturação física, social e econômica, com ênfase na ativação
das potencialidades locais e na articulação com outros países da
América do Sul” (Ibidem, p. 11). Para tanto, foram criadas
diretrizes multissetoriais de ação para atender as
especificidades e complexidades da faixa de fronteira:
Fortalecimento Institucional; Desenvolvimento Econômico;
<http://www.integracao.gov.br/programasregionais/publicacoes/faixa_de_fronteira.asp
>. e também no portal do Grupo Retis em:
<http://www.igeo.ufrj.br/gruporetis/programafronteira/tiki-
index.php?page=Bemvindo>.
Condições de Cidadania; Desenvolvimento Econômico Integrado;
Marco Regulatório/ Legal.
A respeito das estratégias utilizadas para implementar o
PDFF vale ressaltar as três grandes linhas de ação propostas: 1)
Desenvolvimento Integrado das Cidades-Gêmeas; 2) Articulação das
Prioridades do PDFF com o Desenvolvimento das Mesorregiões
Prioritárias; 3) Melhoria das Condições Econômicas, Sociais e de
Cidadania das Sub-regiões que compõem a Faixa de Fronteira. A
seguir destacam-se os principais aspectos de cada uma.
1) Desenvolvimento Integrado das Cidades-Gêmeas
Apesar de não serem muitas as cidades contíguas na
fronteira brasileira, ou seja, cidades gêmeas, a priorização desta
ação é de suma importância para o fortalecimento dos processos de
integração social e institucional destas localidades. Essa ação
baseia-se nas potencialidades locais cujo padrão de atuação é
articulado. Na figura 08 podem ser vistas as cidades-gêmeas da
fronteira internacional brasileira, com suas correspondentes nos
países vizinhos.
64
Figura 08 – Cidades gêmeas da faixa de fronteira brasileira
Fonte: Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, 2005). Disponível em:
<http://www.igeo.ufrj.br/gruporetis/programafronteira/tiki-index.php?page_ref_id=49>. Acesso em 09 mar. 2008
65
Do total de 27 cidades-gêmeas na fronteira internacional
brasileira, foram escolhidas cinco para serem priorizadas com esta
ação, sendo as que apresentam relações mais críticas com suas
vizinhas e que tem a possibilidade de desenvolver de forma
integrada suas potencialidades. São elas: Tabatinga (AM) Letícia
(Colômbia); Ponta Porã (MS) Pedro Juan Caballero (Paraguai);
Dionísio Cerqueira (SC) Barracão (PR) Bernardo de Irigoyen
(Argentina); Uruguaiana (RS) Paso de Los Libres (Argentina);
Sant’Ana do Livramento (RS) – Rivera (Uruguai).
A localização destas cidades pode ser vista na figura 09 a
seguir, na qual é possível perceber que a região Norte contempla
apenas uma cidade priorizada, assim como a região Centro-Oeste,
ficando as outras três cidades-gêmeas situadas na região Sul, que é
a região brasileira que mais possui cidades em contato contíguo
com outro país
50
.
A respeito de como estas cidades estão sendo tratadas nesta
etapa de priorização, ressalta-se as linhas de ações designadas pelo
Governo: dinamização econômica; infra-estrutura econômica; infra-
estrutura social; e organização social e institucional.
50
Apesar de a região Sul contemplar o maior número de cidades-gêmeas da fronteira
internacional brasileira, o estado de Mato Grosso do Sul é um dos estados que concentram o
maior numero de cidades-gêmeas do país, assim como o Rio Grande do Sul. A maior cidade-
gêmea do país, contudo, é Foz do Iguaçu, localizada no estado do Paraná.
Figura 09 – Cidades gêmeas priorzadas
Fonte: Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, 2005). Disponível em:
<http://www.integracao.gov.br/programas/programasregionais/faixa/cidades_gemeas.asp>.
Acesso em 07 mar. 2008.
Para melhor compreensão da organização sócio-espacial dos
territórios em zonas de fronteira o PDFF assume algumas tipologias
chamadas de tipologias das interações transfronteiriças, que serão
abordadas no item 3.1.2
66
2) Articulação das Prioridades do PDFF com o Desenvolvimento das
Mesorregiões
51
Prioritárias
As mesorregiões prioritárias em que o governo federal vem
atuando encontram-se em áreas coincidentes com a faixa de
fronteira. São elas: Alto Solimões (AM), Vale do Rio Acre (AM e AC),
Grande Fronteira do Mercosul (PR, SC e RS) e Metade Sul do Rio
Grande do Sul (RS).
Além de fazerem parte das ações do PDFF, tais
mesorregiões também são beneficiadas pelo PROMESO (Programa
citado anteriormente), os quais, juntos, almejam garantir seu
desenvolvimento sustentável. As mesorregiões prioritárias estão
destacadas na figura 10 a seguir assim como outras mesorregiões
brasileiras.
51
De acordo com o Ministério da Integração as Mesorregiões Diferenciadas são “espaços
subnacionais contínuos que compreendem territórios de um ou mais estados da Federação,
menores que as Macrorregiões, com identidades definidas e objetivos específicos voltados
para a identificação de potencialidades e vulnerabilidades socioeconômicas, culturais, político-
institucionais e ambientais que propiciem uma ação mais efetiva das políticas públicas”. Esta
e outras informações a respeito das Mesorregioes estão disponíveis em:
<http://www.integracao.gov.br/programasregionais/publicacoes/promeso.asp>. Acesso em
07 mar. 2008, assim como uma cartilha do PROMESO disponível para download.
Figura 10 – Mesorregiões Diferenciadas
Fonte: Elaborado a partir de imagem do PDFF (BRASIL, 2005). Disponível em:
<http://www.integracao.gov.br/programas/programasregionais/index.asp?area=spr_promeso
>. Acesso em 07 mar. 2008.
67
3) Melhoria das Condições Econômicas, Sociais e de Cidadania das
Sub-regiões que compõem a Faixa de Fronteira
Articular os atores da faixa de fronteira (sociedade civil,
setor privado e representantes dos países vizinhos) em projetos de
interesses comuns e na construção de percepções das realidades
envolvidas são ações propostas nesta fase das estratégias utilizadas
para implementar o PDFF.
Para a implementação de programas regionais e sub-
regionais, o PDFF dividiu a faixa de fronteira em três grandes Arcos
Arco Norte, Arco central e Arco Sul
52
, compostos por 17 sub-
regiões, as quais podem ser conferidas na figura 11.
Para a separação da faixa de fronteira em sub-regiões, o
Grupo Retis utilizou da análise dos dois principais vetores que
nortearam a pesquisa para a elaboração do relatório final, que são:
desenvolvimento regional e identidade cultural.
No primeiro vetor encontram-se fatores de desenvolvimento
econômico, tais como: densidades econômicas, técnico-tecnológica,
social, institucional; avaliação do grau de instabilidade local,
52
A configuração da faixa de fronteira em arcos será explanada no item 3.1.1.1 deste
capítulo, no qual o Arco Central será mais aprofundado devido à localização da área de
estudo focada ma pesquisa.
estabilidade municipal e desequilíbrio interno local, medidos por
município através de índices. A análise das bases produtivas locais
de cada região também foi utilizada pelo grupo de pesquisa nesta
etapa.
No segundo vetor, de identidade cultural, foram utilizados
elementos quantitativos (migração, etnia, práticas religiosas) e
qualitativos para identificar características culturais das sub-regiões
(referência identitária, histórica e identidade étnico-cultural).
Os nomes dados às sub-regiões estão relacionados às
referências identitárias de cada região, em relação aos meios
econômicos e sociais, e à maior estabilidade das regiões-paisagem.
68
Figura 11 – Sub-regiões da fronteira internacional brasileira.
Fonte: Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, 2005). Disponível em:
<http://www.integracao.gov.br/programas/programasregionais/faixa/estrategias.asp>. Acesso em 07 mar. 2008.
69
3.2.1 O Arco Central
A divisão da fronteira brasileira em Arcos Arco Norte,
Arco Central e Arco Sul - permite uma melhor análise das
potencialidades de cada região, assim como a compreensão de
seus modos de vida, seus meios econômicos, políticos e
sociais
53
.
Os Estados que compõe o Arco Norte são Amapá, Pará,
Roraima, Amazonas e Acre. Esta parte da faixa de fronteira
brasileira é caracterizada pela predominância de índios (existe
um grande número de reservas indígenas nesta região, por isso
esse arco pode ser chamado de “arco indígena”).
Dentre as potencialidades destacadas pelo PDFF nesse
Arco, destaca-se a agroindústria, aqüicultura, artesanato,
atividade pesqueira, beneficiamento de frutas regionais,
bovinocultura, construção civil, extração e beneficiamento de
látex, floricultura, madeira e movelaria, mandioca, e turismo.
53
Embora não seja o foco da pesquisa a explanação a respeito das características de
todos os arcos, a seguir, será feita uma síntese das principais características dos arcos
Norte e Sul e em seguida um aprofundamento a respeito do Arco Central, que está
diretamente relacionado á temática em questão.
As sub-regiões do Arco Norte, assim como as do Arco Sul
não serão explanadas em separado, apenas as sub-regiões do Arco
Central serão abordadas mais extensivamente, por estar localizada
nesta região a área de fronteira focada na presente pesquisa. Vale
ressaltar apenas que as sub-regiões localizadas no Arco Norte são:
1) Oiapoque Tumucumaque; 2) Campos do Rio Branco; 3) Parima
Alto do Rio Negro; 4) Alto Solimões; 5) Alto Juruá; 6) Vale do
Acre – Alto Purus.
O Arco Sul, por sua vez, compreende a faixa de fronteira dos
Estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Santa Catarina. De acordo
com o relatório do Programa, esta faixa de fronteira, a mais
meridional do país é o espaço “mais intensamente afetado pela
dinâmica transfronteiriça decorrente do projeto de integração
econômica promovida pelo MERCOSUL” (BRASIL 2005, p. 30). As
sub-regiões desse Arco são: o Portal do Paraná, os Vales Coloniais
Sulinos, e a fronteira da Metade Sul do Rio Grande do Sul
(conhecido como Campanha Gaúcha).
Sobre as potencialidades destacadas pelo PDFF para o
desenvolvimento desta região, destacam-se a agroindústria, o setor
industrial madeireiro/moveleiro, o setor têxtil, erva-mate,
fruticultura, o setor industrial de bebidas e conservas, a fabricação
70
de produtos cerâmicos, fabricação de tecidos e artigos de
malha, bovinocultura de corte, ovinocultura e rizicultura.
A seguir detalhar-se á as principais características do
Arco Central, onde se insere a área de estudo.
3.2.1.1 Principais Características do Arco Central
Compreendendo oito sub-regiões, o Arco Central, onde
se localizam a Bacia Amazônica e a Bacia do Paraná-Paraguai,
engloba a faixa de fronteira dos Estados de Mato Grosso, Mato
Grosso do Sul e Rondônia. Segundo o relatório do PDFF, apesar
da organização territorial dos Estados desse Arco apresentar
grande diversidade, é a posição de ligação entre o Centro-Sul
do país com a Amazônia que permite a unidade desse Arco.
A partir das diferenças culturais existentes no território,
assim como diferenças na base produtiva, foi feita a divisão em
sub-regiões, as quais podem ser vistas na figura 12. A primeira
sub-região, de número VII, denominada Madeira-Mamoré,
concentra 20% da população do Arco Central. O caráter da
produção desta sub-região é urbano-industrial, ressaltado pela
cidade de Porto Velho, a qual, por possuir muitas indústrias,
dificulta o desenvolvimento do setor industrial no restante da sub-
região.
Situada por inteiro no Estado de Rondônia, a sub-região
VIII, denominada Fronteira do Guaporé, concentra 53% da
população na zona rural. Dentre as potencialidades de
desenvolvimento da região destacadas pelo PDFF, encontram-se a
agroindústria por meio do café (principal produto comercializado
na região) e da pecuária leiteira e a estrutura fundiária, por meio
da produção de banana e melancia em pequenas e médias
propriedades rurais.
71
Figura 12 – Sub-regiões da faixa de fronteira do Arco Central
Fonte: Elaborado a partir de imagem do PDFF (BRASIL, 2005).
A sub-região IX, Chapada dos Parecis, não apresenta
municípios em contato direto com o país vizinho, uma vez que
compreende a extensão da região sul do Estado de Rondônia
até o sudoeste de Mato Grosso. Dentre as atividades produtivas
desta sub-região, o cultivo da soja é destacado pelo relatório do
PDFF, além da plantação de algodão e extração de madeira em
tora.
A sub-região Alto Paraguai, de número X, que marca a
divisão de águas entre as bacias amazônica e Paraguai-Paraná,
apresenta baixa densidade demográfica, apesar de muito
urbanizada. De acordo com o relatório do PDFF, esta sub-região é a
que mais produz no Arco Central, uma vez que, além da criação de
gado bovino para corte e gado leiteiro, da extração de madeira para
lenha e carvão vegetal, produz hevea para a produção de látex
coagulado. Por possuir bastante diversidade de solo, essa sub-
região tem potencial para se tornar produtora de grande variedade
de alimentos, além do leite.
O Pantanal é a sub-região de número XI. Conhecida por sua
riqueza ambiental esta sub-região engloba nove municípios dos
Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. A pecuária é a
principal atividade da região, sendo o segundo maior rebanho
bovino da Faixa de Fronteira, ficando atrás apenas da Campanha
Gaúcha. Além da pecuária, outras atividades produtivas se
destacam, como a fruticultura, produção de leite, plantação de
mandioca, arroz e cana-de-açúcar (lavouras temporárias) e a
72
extração de madeira em tora (destacada na cidade de Porto
Murtinho - MS). Segundo o relatório do PDFF, contudo, o
turismo ecológico é tido como importante potencial de
desenvolvimento da região.
A sub-região XII, Bodoquena, localizada a sudoeste de
Mato Grosso do Sul, é, segundo o PDFF, a sub-região mais
problemática em relação à produção. É uma sub-região que
depende em muito das sub-regiões vizinhas por possuir baixo
grau de especialização. Além disso, o empresariamento agrícola
também é pouco, e o nível técnico-tecnológico muito baixo.
Apesar de a base produtiva ser caracterizada pela plantação de
soja e mandioca, é o turismo o principal atrativo e fonte de
emprego, potencializado pelo Parque Nacional da Serra da
Bodoquena, ainda pouco explorado, mas com grande potencial
de desenvolvimento.
As sub-regiões de Dourados e Cone-Sul-Mato-Grossense
(XIII e XIV) são, segundo o PDFF, “duas das mais complexas e
desafiadoras da Faixa de Fronteira” (Ibidem, p. 28). Apesar de
serem conhecidas por regiões ricas na agropecuária, são
também símbolo do contrabando e narcotráfico. Destaca-se
como potencial de desenvolvimento a criação de gado de corte
e leiteiro (existem na região muitas grandes fazendas de criação de
gado), plantação de mandioca e de soja (ressalta-se a existência de
uma grande rede de armazenamento e secagem de soja).
É na sub-região do Cone-Sul-Mato-Grossense que se
encontra a região fronteiriça focada no presente trabalho, Ponta
Porã (Brasil Estado de Mato Grosso do Sul) e Pedro Juan
Caballero (Paraguai Departamento de Amambay). Além de Ponta
Porã as outras cidades brasileira que compõem essa sub-região são:
Amambaí, Antônio João, Aral Moreira, Coronel Sapucaia, Eldorado,
Iguatemi, Itaquiraí, Japorã, Juti, Mundo Novo, Naviraí, Paranhos,
Sete Quedas e Tacuru, todas no Estado de Mato Grosso do Sul
73
3.2.2 Tipologia da Fronteira Internacional Brasileira
as interações transfronteiriças
Como colocado, na proposta de reestruturação do
Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira foram
definidos alguns conceitos para melhor entendimento das
relações que permeiam as regiões de fronteira. Foram seguidos
os modelos sugeridos pelo geógrafo francês Arnaud Cuisinier-
Raynal
54
, com devidas adaptações, para a elaboração da
tipologia das interações transfronteiriças no Brasil, que são
cinco: 1) margem; 2) zona-tampão; 3) frentes; 4) capilar; 5)
sinapse.
Esses conceitos são importantes para fazer a
diferenciação das fronteiras, uma vez que suas condições não
são as mesmas ao longo do extenso limite internacional
(continental) do país
55
. Isso acontece não somente devido às
54
CUISINIER-RAYNAL, A. “La Frontière au Pérou entre fronts et synapses”.
L’Espace
Géographique
3: 213-229, 2001
55
Outra tipologia para as relações fronteiriças consta em Oliveira (2005). O autor
determinou as tipologias a partir, de uma lado, da intensidade e fragilidade de relações
‘formais’ de trocas, e de outro, da intensidade e fragilidade de relações ‘funcionais’ de
trocas, Como resultado, quatro tipologias são definidas: A) Baixa Integração
formal
com
baixa integração; B) Baixa interação
formal
com alta integração; C) Alta integração
formal
com alta integração; D) Alta integração
formal
com baixa integração. A partir
diferenças geográficas, mas também ao tratamento diferenciado
que recebe dos órgãos de Estado e ao tipo de relação estabelecida
com os povos vizinhos.
1) Margem: “na margem a população fronteiriça de cada lado
do limite internacional mantém pouco contato entre si,
exceto de tipo familiar ou para modestas trocas comerciais”.
É o caso de trechos do Estado do Acre (trechos laterais a
Santa Rosa do Purus).
2) Zona-tampão: “zonas estratégicas onde o Estado central
restringe ou interdita o acesso à faixa e à zona de fronteira,
criando parques naturais nacionais, áreas protegidas ou
áreas de reserva, como é o caso das terras indígenas”. Ex:
regulamentação da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, em
Roraima.
3) Frente: Além de ser empregado para
frentes pioneiras
, o
modelo “frente” designa outros tipos de dinâmicas espaciais,
como
frente cultural
,
frente indígena
ou
frente militar
. Ex: a
frente indígena da área “cabeça do cachorro”, na fronteira
de São Gabriel da Cachoeira/AM com a Colômbia, que
destas diferenciações, o autor explica como cada município de Mato Grosso do Sul se insere
em cada uma das tipologias.
74
conviveu com a frente militar do lado brasileiro durante
anos e mais tarde foi substituída pela marca indígena e
unidade de conservação natural do Alto Rio Negro.
4) Capilar: Essas interações podem se dar somente no
nível local, caso das feiras (exemplo de interação e
integração fronteiriça espontânea), por meio de trocas
difusas entre vizinhos fronteiriços com limitadas redes
de comunicação, ou resultam de zonas de integração
espontânea, o Estado intervindo pouco, principalmente
não patrocinando a construção de infra-estrutura de
articulação transfronteira. É o caso da fronteira entre
Mato Grosso do Sul e o Paraguai (Departamento de
Amambay), objeto de estudo desse trabalho.
5) Sinapse: “esse tipo de interação é ativamente apoiado
pelos Estados contíguos, que geralmente constroem em
certos lugares de comunicação e trânsito infra-estrutura
especializada e operacional de suporte, mecanismos de
apoio ao intercâmbio e regulamentação de dinâmicas,
principalmente mercantis”. A fronteira entre o Paraguai
e o Cone-Sul-Mato-Grossense pode ser classificada como
sendo de sinapse conjuntural, estimulada não pela
frente agrícola como pelo domínio da produção e comércio
ilícito da
Cannabis sativa
por brasiguaios (Departamento de
Amambay e Concepción).
A figura 13 ilustra as interações transfronteiriças da fronteira
internacional brasileira, explanadas anteriormente. Pode-se
perceber, contudo que as interações predominantes no estado de
Mato Grosso do Sul, localizado, portanto, no Arco Central são a
Capilar e a Sinapse, as quais estão destacadas na figura 14.
Dentro da interação do tipo Capilar encontram-se as cidades
fronteiriças de Corumbá (Brasil) - Puerto Suarez (Bolívia) e Porto
Murtinho (Brasil) - Puerto Palma Chica (Paraguai).
A interação do tipo Sinapse, por sua vez, compreende a
fronteira entre Bela Vista (Brasil) - Bella Vista (Paraguai); Ponta
Porã (Brasil) - Pedro Juan Caballero (Paraguai), ambos os casos
caracterizados como interação espontânea estrutural; Coronel
Sapucaia (Brasil) - Capitan Bado (Paraguai), caso de interação
espontânea conjuntural; Paranhos (Brasil) - Ype Jhu (Paraguai); e a
tríplice aliança também caracterizada como espontânea estrutural,
Mundo Novo (Brasil) Guaíra (Paraná) Salto del Guairá
(Paraguai).
75
Figura 13 - Tipologia das Interações Fronteiriças
Fonte: Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, 2005)
76
Figura 14 - Faixa de Fronteira Arco Central: Tipologia das Interações Fronteiriças
Fonte: Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, 2005).
77
3.2.3 As Relações e Interações Transfronteiriças:
Conflitos e Perspectivas
A questão das interações das regiões de fronteira merece atenção,
pois, por serem obrigadas a conviverem em todos os sentidos,
inclusive formando alianças políticas e econômicas, as cidades
limítrofes podem também, além de interagirem, se tornarem
conflitantes, uma vez que coexistem infra-estruturas, comércios,
serviços, sistema de saúde, etc., mesmo sendo os interesses de
cada lado da fronteira diversos. Ou seja, “[...] os elementos de
integração e desintegração coexistem e se interpenetram
incessantemente de forma diversa para as diferentes funções
desempenhadas” (STEIMAN, 2002a, p. 14).
As interações transfronteiriças existentes são, contudo,
interação nacional (ação supranacional), estadual e local. A
interação estadual (regional) refere-se às relações que o país
mantém com a sub-região onde se encontra a fronteira, e a
interação local são as relações - políticas, econômicas e culturais -
que as cidades limítrofes mantêm entre si, interação essa
característica das cidades-gêmeas.
A fronteira entre Ponta Porã e Pedro Juan Caballero
(cidades-gêmeas) pode ser considerada uma zona de alta
interação, apesar de serem cidades marcadas por grandes
assimetrias, as quais são caracterizadas por diferenças culturais
marcantes, legislações diversas e até pela infra-estrutura urbana
distinta. É importante dizer, entretanto, que as assimetrias são
essenciais para o desenvolvimento das cidades, como explica
Steiman (Ibidem, p. 15)
56
ao dizer que “as assimetrias e
diferenças de gradiente são a fonte do dinamismo dos espaços
fronteiriços”.
A interação predominante na fronteira Ponta Porã/ Pedro
Juan Caballero é a local, uma vez que existe uma forte
interdependência entre as duas cidades, marcada tanto pelo fluxo
de pessoas e bens como também por informações e capitais que
diariamente cruzam o limite internacional.
De acordo com o PDFF (op.cit., p. 152), as cidades-gêmeas
“apresentam grande potencial de integração econômica e cultural
assim como manifestações ‘condensadas’ dos problemas
característicos da fronteira”, pois são nestas localidades que os
56
Para mais esclarecimentos a respeito das assimetrias nas regiões de fronteira conferir
STEIMAN, 2002a. Também disponível em: <http://acd.ufrj.br/fronteiras/>. A autora aborda
a questão das assimetrias econômicas e culturais, ressaltando os efeitos positivos e
negativos para a zona de fronteira.
78
conflitos se acentuam, com conseqüências diretas sobre a
cidadania e o desenvolvimento da região onde se encontram.
Sendo assim, são essas as regiões que necessitam de políticas
públicas prioritárias no contexto da melhoria das condições da
faixa de fronteira brasileira.
Entretanto, os Estados correspondentes às faixas de
fronteira das cidades-gêmeas podem ter dificuldade de ações
dependendo dos efeitos territoriais destas localidades e a
extensão desses efeitos, que segundo o PDFF correspondem ao
trabalho, terra, capital e serviços públicos e privados.
De acordo com o Programa (Ibidem, p. 152): “A
dificuldade advém principalmente do fato de que esses efeitos se
expressam com formas e amplitudes diferenciadas no território, às
vezes de forma conjugada ou isolada, contínua ou descontinua”.
Ou seja, em cada lado do limite político-administrativo as
ações são recebidas de maneira distinta, uma vez que legislações
diversas atuam de maneira particular nos respectivos lados de
dada fronteira, além do grau de desenvolvimento de cada parte,
diferenças de nível cultural, enfim, simetrias e assimetrias que
existem em qualquer zona de fronteira e que podem acarretar
conflitos em suas interações.
Destacam-se no quadro 01 as interações fronteiriças
existentes na fronteira entre o Brasil e o Paraguai, elaborado pelo
Grupo Retis para o relatório do PDFF para toda a fronteira
brasileira. A fronteira entre Ponta Porã (BR) e Pedro Juan
Caballero (PY) está, nesse contexto, situada no Departamento de
Amambay com MS, onde se percebe herança étnica de índios,
pessoas vindas do Rio Grande do Sul e também de nordestinos. É
possível perceber também que existe certa permeabilidade cultural
(de média a alta) entre os povos dos dois lados. Com os
Departamentos do Alto Paraná e Canindeyú a interação cultural,
de forte intensidade, apresenta assimetrias, uma vez que se
percebe preponderância da cultura brasileira. O mesmo ocorre
com as interações culturais em relação ao Departamento de
Amambay, onde se localiza Pedro Juan Caballero. com o Chaco
paraguaio, a interação cultural é inexpressiva, de fraca
intensidade, predominando também a cultura brasileira. Quanto
aos movimentos migratórios, intensificam-se nas regiões
fronteiriças quem envolvem os Departamentos do Alto Paraná e
Canindeyú, com características de movimento pendular nas
cidades-gêmeas, tanto por migrantes brasileiros, quanto
estrangeiros.
86
Nos Departamentos de Amambay e Canindejú com MS, os
migrantes brasileiros têm chegado mais recentemente, e a
migração de estrangeiros atualmente é fraca. na fronteira que
envolve o Chaco paraguaio a migração de brasileiros também é
recente, mas verifica-se um processo de intensificação, enquanto
o movimento migratório de estrangeiros se apresenta em média
intensidade, onde se pode ressaltar movimentos pendulares
localizados nas cidades de fronteira sul-mato-grossenses Bela
Vista e Porto Murtinho
57
.
57
Sobre movimentos migratórios em áreas de fronteira, conferir: OLIVEIRA, Marco A. M.
Imigrantes em região de fronteira: uma condição Infernal. In: OLIVEIRA, Marco A. M (org.)
Guerras e Imigrações.
Campo Grande: UFMS, 2004.
Quadro 01 - Tipologia das Interações Fronteiriças destaque
para a fronteira entre Brasil e Paraguai
Fonte: Adaptado pela autora a partir do PDFF (BRASIL, 2005).
87
3.2.4 As Questões que envolvem a Fronteira do Mato
Grosso do Sul no PDFF
O extenso trabalho elaborado para a Reestruturação do
Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira aprofunda
questões variadas a respeito da fronteira internacional brasileira.
Entretanto, observa-se que para que as diretrizes propostas por
esse Programa possam efetivamente ser colocadas em prática em
sua totalidade, muito tem que ser feito, além do progresso
alcançado.
Dentre os objetivos almejados pelo PDFF destacam-se
(Ibidem, p. 35):
Estimular processos sub-regionais de
desenvolvimento, contribuindo para a redução
da desigualdade regional e para a integração
da América do Sul.
Melhoria da governança e estímulo à
participação da sociedade civil , envolvendo a
articulação dos atores locais em torno a
projetos de desenvolvimento na Faixa de
Fronteira.
Estruturação e dinamização de Arranjos
Produtivos Locais e transfronteiriços.
Promoção articulada da infra-estrutura
econômica e social, associado às estratégias
locais de desenvolvimento.
Melhoria das condições de cidadania da
população local.
Revisão do marco regulatório que possui
impacto no desenvolvimento econômico da
região e nas condições de cidadania.
Para tanto, o estudo destaca a necessidade de articular os
Poderes Executivo e Legislativo. De acordo com o programa, para
cada governo cabe então uma competência. Ao Governo Federal
compete deixar suas diretrizes políticas claras e transparentes. Os
governos estaduais devem estar articulados com os governos
municipais e estes, por sua vez, além de se articularem com os
demais governos, devem promover a participação da sociedade
civil e sempre informá-la sobre suas ações
58
. No contexto de
integração, o interesse do governo federal em definir estratégias
para o desenvolvimento das áreas de fronteira, assim como a
compreensão da necessidade da integração, são considerados um
passo importante.
Dentre as proposições mais recentes do PDFF é importante
destacar as que estão relacionadas (direta ou indiretamente) à
58
A respeito da legislação e proposições do governo para as áreas de fronteira podem ser
conferidas no livro completo do PDFF (BRASIL, 2005), o qual apresenta a legislação
aprovada no Senado entre 1980 a 2003, e também as proposições apresentadas na
Câmara dos Deputados entre 1999 e 2003
88
fronteira internacional do Estado de Mato Grosso do Sul.
Separando-as por temas têm-se as seguintes proposições
59
:
Tema: Cidadania - Educação
- criação da Universidade Federal da Mesorregião Grande
Fronteira do Mercosul
Tema: Cidadania – Mobilidade
- controle de veículos particulares de outros países nas
fronteiras do Brasil
Tema: Cidadania – Infra-estrutura
- construção UTE à gás em Puerto Suarez - Bolívia e
Corumbá – Brasil
Tema: Ambiente
- Acordo de conservação da fauna aquática nos rios
limítrofes entre Brasil e Paraguai
Tema: Fundiário
- disposição sobre convalidação de alienações de terras
procedidas pelos Estados federados de fronteira
- demarcação de terras indígenas na área de fronteira
- alterações do prazo de ratificação de concessões e
59
Estas informações foram extraídas da tabela completa de proposições para toda a faixa
de fronteira internacional brasileira do PDFF.
alienações terras na Faixa
Tema: Segurança
- disposições sobre a ida de policiais federais para as áreas
de fronteira do Brasil
- restituição de veículos roubados na fronteira com a
Bolívia
Tema: Institucional – Militar
- combate ao tráfico de drogas pelas Forças Armadas na
Faixa de Fronteira
- Programa de transferência para a Faixa de Fronteira de
grandes unidades das Forças Armadas
- inclusão na Constituição Federal, entre as missões das
forças armadas, a guarda, o patrulhamento e a vigilância
da Faixa de Fronteira.
- autorização para as Forças Armadas atuarem na área de
segurança pública, podendo fazer o policiamento da
Faixa de Fronteira
Tema: Desenvolvimento Econômico
- incentivo ao turismo internacional na fronteira
- Acordo entre países do MERCOSUL para pesca durante a
piracema
89
3.2.4.1 As Proposições para a Fronteira de Ponta Porã
Pedro Juan Caballero
A partir das proposições descritas anteriormente para o
MS, é possível perceber que praticamente todas servem para a
fronteira de Ponta Porã – Pedro Juan Caballero. Dentre tudo o que
foi visto sobre a Proposta de Reestruturação do Programa de
Desenvolvimento da Faixa de Fronteira é de suma importância
destacar que a fronteira de Ponta Porã/ Pedro Juan Caballero está
inserida em um dos estudos de caso do Programa, o estudo do
Cone-Sul-Mato-Grossense. Além deste, o outro estudo de caso do
Programa é na fronteira Brasil/ Colômbia/ Peru, o estudo de Alto
Solimões.
Por meio da coleta de dados
in loco
sobre os problemas e
potencialidades da região, os estudos de caso tiveram como
objetivo a elaboração de diretrizes e instrumentos para o
desenvolvimento local das mesmas.
Figura 15 – Área Piloto de MS
Fonte: Programa de Desenvolvimento da Faixa de Fronteira (BRASIL, 2005).
90
No caso do estudo de caso da fronteira com o Paraguai
(Cone-Sul-Mato-Grossense) foram pesquisados os municípios de
Sidrolândia, Dourados, Maracajú, Naviraí, Rio Brilhante, Mundo
Novo, Guaíra, Salto del Guairá (Paraguai), Japorã, Coronel
Sapucaia, Capitán Bado (Paraguai), Amambaí, Ponta Porã, Pedro
Juan Caballero (Paraguai), Bela Vista e Bella Vista (Paraguai),
como pode ser visto na figura 15, a qual destaca a fronteira entre
Ponta Porã e Pedro Juan Caballero.
Para tanto, foram elaboradas entrevistas com a sociedade
e autoridades locais de Dourados a Ponta Porã, além de
entrevistas com a população, reconhecimento de campo, coleta de
dados e documentos, e entrevistas com autoridades do município
vizinho de Ponta Porã, Pedro Juan Caballero
60
.
Com o diagnóstico da região em estudo, no qual foram
identificados problemas e potencialidades de cada área piloto, o
programa sintetizou algumas diretrizes para o desenvolvimento da
faixa de fronteira brasileira. A partir de uma relação de temas,
foram relacionados os instrumentos necessários para sua
60
Segundo o programa, os trabalhos em Ponta Porã/MS foram realizados por meio de
encontros informais que reuniram autoridades e segmentos da sociedade local, do Brasil e
do Paraguai, e dois representantes do Ministério de Relações Exteriores do Paraguai,
convidados pela
Intendencia
de Pedro Juan Caballero, em março de 2004.
viabilização, bem como os atores estratégicos e o prazo para a
resolução dos problemas (Anexo 03).
3.3 O Plano Regional de Desenvolvimento
Sustentável da Região Sul-Fronteira
Assim como o PDFF em relação à fronteira internacional
brasileira, o Plano Regional de Desenvolvimento Sustentável da
Região Sul-Fronteira foi elaborado com a intenção de identificar os
principais problemas e potencialidades da Fronteira Sul do Estado
de Mato Grosso do Sul, da qual fazem parte: Antônio João,
Amambai, Aral Moreira, Coronel Sapucaia, Eldorado, Itaquiraí,
Iguatemi, Japorã, Laguna Carapã, Naviraí, Mundo Novo, Paranhos,
Sete Quedas, Tacuru e Ponta Porã
61
.
Estes 15 municípios representam 8,14% da área total de
Mato Grosso do Sul e foram escolhidos por meio de critérios de
homogeneidade, similaridade e de identidade de caráter histórico,
61
O último exemplar do Plano disponível, assim como importantes informações a respeito
nos foram gentilmente cedidos pelo Sr. Wilson Eurípedes Pinto, da superintedência do
Planejamento do Estado de Mato Grosso do Sul.
91
econômico, político, social e geográfico. Na figura 16 é possível
visualizar a Região-Sul Fronteira com os municípios localizados.
Figura 16 – Região Sul-Fronteira
Fonte: Plano Regional de Desenvolvimento Sustentável da Região Sul-Fronteira (MS,
2002).
Elaborado em 2002, esse documento se caracteriza por ser
um instrumento que visa o desenvolvimento da região. Composto
por técnicos do IPLAN/MS (Instituto de Estudos e Planejamento de
Mato Grosso do Sul), prefeituras municipais, representantes da
sociedade civil, entidades de classe e da Universidade Federal de
MS, o Plano Regional teve como embasamento os conceitos e
princípios da Agenda 21 (Conferência Rio 92).
Com a idéia principal de desenvolvimento local sustentável,
a elaboração do PRD (Plano Regional de Desenvolvimento) teve
como objetivos centrais a busca da melhoria da qualidade de vida,
da qualidade social e o aumento da eficiência econômica com
conservação ambiental.
Para tanto, foram seguidos os seguintes passos
metodológicos: 1) Capacitação da equipe técnica e dos
representantes da sociedade local; 2) Levantamento de dados e
informações gerais; 3) Sensibilização; 4) Pesquisa qualitativa; 5)
Análise do cenário estadual e de suas implicações na Região; 6)
Consulta à sociedade local em oficinas; 7) Formulação da visão de
futuro; 8) Sistematização, organização e hierarquização das
informações e dos conhecimentos; 9) Definição das opções
estratégicas; 10) Elaboração da versão preliminar completa do
plano; 11) Organização do espaço institucional; 12) Elaboração do
Estatuto; 13) Definição da carteira de projetos estratégicos; 14)
Aprovação do plano.
Após extensa pesquisa para caracterização da região, onde
foram identificados aspectos da realidade da fronteira Brasil-
Paraguai; no contexto da dimensão econômica, ambiental e sócio-
92
cultural da Região Sul-Fronteira, foram identificados problemas e
potencialidades da região.
Dentre 31 problemas identificados destacam-se:
Alto índice de desemprego
Alta concentração fundiária
Comercialização dos produtos agropecuários com baixo
valor agregado
Dificuldade de acesso ao ensino superior
Infra-estrutura urbana inadequada
Manejo inadequado de recursos naturais e ineficiência na
fiscalização
Pouca qualidade e capacitação técnica da mão-de-obra
Sociedade civil com baixo nível de organização, pouca
participação política e desinteresse pelo desenvolvimento
local e regional
Política inadequada de auto-sustentação e gerenciamento
das áreas indígenas.
A respeito das potencialidades que foram identificadas na
Região Sul-Fronteira têm-se
62
:
Recursos hídricos abundantes para aproveitamento
econômico, geração de energia e transporte fluvial
62
Todas estas informações estão disponíveis na cartilha de publicação do PRD: MATO
GROSSO DO SUL. Governo de.
Plano Regional de Desenvolvimento Sustentável da Região
Sul-Fronteira
. Campo Grande: Secretaria de Estado e Planejamento, 2002.
Vasta produção agropecuária com possibilidade de
consolidação da cadeia produtiva e verticalização
Existência de pequenas propriedades que possibilitam a
promoção da diversificação agro-econômica
Existência de erva-mate para beneficiamento
Localização geográfica estratégica com fácil acesso
rodoviário, ferroviário, aeroviário e hidroviário para
outros estados e países do Mercosul
Diversidade étinico-cultural, comidas típicas e práticas
folclóricas regionais e de fronteira para a promoção de
festas típicas, feiras de artesanato e atividades
similares.
Após análise de macrotendências mundiais, nacionais e do
Estado de Mato Grosso do Sul, o PRD relacionou algumas
oportunidades e dificuldades (denominadas no Plano de ameaças
exógenas) para o desenvolvimento da Região Sul-Fronteira.
Dentre as oportunidades pode-se destacar: 1) Projetos
estruturadores (como Gasoduto Bolívia-Brasil); 2) Ampliação do
acesso aos novos mercados (com a consolidação do Mercosul); 3)
Demanda de produtos naturais e agropecuários (como a
exportação da soja orgânica); 4) Disponibilidade de energia em
Mato Grosso do Sul; 5) Demanda mundial e nacional de turismo;
93
6) Disponibilidade externa de novas tecnologias; 7) Posição
geográfica fronteiriça.
Sobre as dificuldades ou restrições - ameaças exógenas -
detectadas pelo PRD destacam-se: 1) Barreiras protecionistas e
sanitárias; 2) Redução relativa da demanda e do valor das
commodities
; 3) Ameaças sanitárias e propagação de endemias;
4) Redução dos investimentos públicos; 5) Mudança dos
determinantes da competitividade; 6) Abertura de novas fronteiras
econômicas no Brasil; 7) Concorrência dos países vizinhos
(MERCOSUL).
Após a elaboração de uma visão de futuro desejada para a
Região Sul-Fronteira, com perspectiva para os 20 anos próximos,
relacionaram-se opções estratégicas para alcançá-las. Como
resultado de toas as discussões e análises feitas durante o
trabalho, uma lista de 17 Programas e Projetos foi preparada.
Dentre eles destaca-se o Programa 16: Integração Fronteiriça, o
qual objetiva criar condições para que a fronteira assuma o papel
de suporte para a integração entre o Brasil e o Paraguai. Como
projetos o Programa designou: promover o combate ao tráfico de
drogas e à corrupção; melhorar a segurança pública da fronteira;
assegurar recursos nas áreas de saúde e educação. Entretanto,
não foram estipulados instrumentos para a viabilização desses
projetos.
Elaborou-se, contudo, uma carteira de projetos (separadas
por prioridades – Prioridade I, II, III), onde um total de 48
projetos estão detalhados, todos com seus objetivos, atividades,
responsáveis financeiros, local, prazo e fonte.
Para garantir que as diretrizes elaboradas pudessem ser
colocadas em prática, criou-se um sistema de gestão, coordenado
pelo COREDES Conselho Regional de Desenvolvimento
Sustentável da Região Sul-Fronteira. Esse sistema tem a
organização funcional retratada na figura 17 a seguir:
Figura 17 – Sistema de Gestão da Região Sul-Fronteira
Fonte: Plano Regional de Desenvolvimento Sustentável da Região Sul-Fronteira (MS,
2002).
94
Segundo profissionais da Secretaria de Planejamento,
Ciência e Tecnologia do Estado de Mato Grosso do Sul
SEPLANCT
63
- o Plano Regional de Desenvolvimento Sustentável
da Região Sul-Fronteira não foi colocado em prática, devido à falta
de recursos e investimentos públicos para essas áreas.
Apesar de, como colocado, o papel dos limites e fronteiras
estar se modificando, principalmente a partir do final do século
passado, devido à institucionalização de mercados transnacionais,
percebe-se que além da escassez de programas no Brasil para o
desenvolvimento dessas regiões, quando se tem, os investimentos
tornam-se dificultosos e as ações não acontecem.
É imprescindível lembrar, contudo, alguns projetos
brasileiros que exemplificam esta mudança e mostram a tentativa
de se elaborar políticas de integração, tanto regional, como
também com os vizinhos sul-americanos. No arco Norte pode-se
citar o Projeto Calha Norte, elaborado pelo governo central
brasileiro na década de 1980, o qual tinha por objetivo “defender
os limites territoriais do Estado territorial e estimular a ocupação
63
Em julho de 2007 foi realizada uma entrevista informal, sem registro, na SEPLANCT, com
técnicos de vários setores educação, saúde, planejamento os quais forneceram
informações importantes para o desenvolvimento da pesquisa, além de dados e mapas da
Superintendência de Planejamento.
da fronteira Norte” (MACHADO, 1998, p. 45) e o projeto de
construção da rodovia transguianense, permitindo a ligação das
Guianas com o Estado do Amapá.
Alguns projetos, apesar de bem elaborados, não saem do
papel, não tem ações concretas, como o recém citado Plano para
a Região Sul-Fronteira do Mato Grosso do Sul. Entretanto, algum
progresso já pode ser observado, uma vez que as autoridades têm
se organizado para discutir o assunto.
Pode-se dizer, portando, que este quadro de descaso com
as regiões de fronteira internacional brasileiras vêm se
modificando nos últimos anos. Grande parte dessa mudança se
deve à retomada de interesse pelas regiões de fronteira brasileira
por parte dos estados nacionais.
Nesse contexto, é de suma importância destacar a
preocupação do governo federal em elaborar planos e programas
para o desenvolvimento das regiões de fronteira brasileira.
Segundo Lia Machado (Ibidem), além do emprenho do âmbito
nacional com relação às regiões fronteiriças, existe um grande
interesse sub-nacional, ou seja, comunidades locais passaram a
vislumbrar sua influência e reforçarem sua localidade além dos
limites internacionais.
95
Dentro desse contexto, é importante conhecer a realidade
de uma cidade de fronteira e como tais acordos vêm se
procedendo, especialmente aqueles que estão diretamente
relacionados ao ordenamento territorial.
96
4. PONTA PORÃ E AS RELAÇÕES
FRONTEIRIÇAS
Como foi discutido nos capítulos anteriores, o termo
fronteira
remete a diversos significados e interpretações
dependendo do contexto ao qual está inserido. No contexto das
fronteiras internacionais, os governantes dessas localidades
devem buscar constantemente a integração regional, pois as
diferenças, disparidades e particularidades estão sempre
presentes.
Dentro desse contexto, esse capítulo objetiva entender as
particularidades do município de Ponta Porã, MS em diversos
aspectos, principalmente aqueles que se relacionam às questões
que envolvem sua cidade gêmea Pedro Juan Caballero, para em
seguida, discutir os conflitos e possibilidades de integração com a
cidade paraguaia.
Para tanto, tratar-se-á do tema entendendo que as
relações entre as fronteiras de diferentes países devem ser vistas
mais como elementos integradores entre diferentes sociedades.
97
Alguns cuidados na abordagem de regiões fronteiriças
devem, todavia, ser tomados. Segundo Castello (1995), o enfoque
dominante deve ser transfronteiriço, ou seja, enfocando os
problemas e potencialidades destas regiões de modo integrado.
José de Souza Martins apresenta resultados coletados em
trinta anos de uma extensa pesquisa antropológica/social na
região da fronteira Amazônica
64
, onde afirma que:
É na fronteira que se pode observar melhor como as
sociedades se formam, se desorganizam ou se
reproduzem. É que melhor se quais são as
concepções que asseguram esses processos e lhes
dão sentido. (MARTINS, 1997, p. 12)
A afirmação de Martins (Ibidem) a respeito da fronteira
Amazônica pode ser rebatida no caso da fronteira Brasil-Paraguai:
[...] a fronteira de modo algum se reduz e se
resume à fronteira geográfica. Ela é fronteira de
muitas e diferentes coisas: fronteira da civilização
[...], fronteira espacial, fronteira de culturas e visões
de mundo, fronteira de etnias, fronteira de História e
da historicidade do homem. E, sobretudo,
fronteira
do humano.
(Ibidem, p. 13)
64
C.f. MARTINS, José de Souza.
Fronteira:
a degradação do Outro nos confins do humano.
São Paulo: Hucitec, 1997. Este livro é resultado de extensa pesquisa realizada das frentes
expansionistas do Brasil principalmente na Amazônia, a qual compreende mais de 200
horas de entrevistas gravadas em Rondônia, Goiás, Mato Grosso, Pará e Maranhão.
A partir dessa compreensão, é possível discorrer mais
facilmente a respeito de dessemelhantes sociedades,
principalmente por se encontrarem em situação tão particular, a
de cidades-gêmeas
65
. A esse respeito, ressalta-se a observação de
Castello (op.cit, p. 23-24):
[...] cidades localizadas na linha de fronteira, em
muitos casos estruturas urbanas contíguas, as
cidades gêmeas, tendentes a constituírem um fato
urbano único, situação que indica a necessidade de
uma abordagem integrada.
Esta abordagem integrada se torna difícil uma vez que as
sociedades envolvidas apresentam conflitos sociais, políticos e
econômicos que tornam o processo dificultoso. Para entender
como se dão essas relações na fronteira estudada conflitos e
interações transfronteiriças - é fundamental discorrer, ainda que
de maneira sucinta, sobre o processo de ocupação da fronteira do
Centro-Oeste brasileiro, via movimento migratório pós década de
1960, destacando alguns dados relacionados ao Estado de Mato
Grosso do Sul e o município estudado.
65
Como colocado, cidades-gêmeas são aquelas que fazem contato contíguo – direto – com
outro país, como é o caso da fronteira de Ponta Porã (BR), vizinha do município paraguaio
Pedro Juan Caballero.
98
4.1 Aspectos recentes da ocupação e urbanização
brasileira – as áreas de fronteira no Centro-
Oeste brasileiro
O Brasil, até aproximadamente a década de 1930, era um
país essencialmente agrícola, as principais cidades situavam-se
junto à costa, pois eram centros de apoio à economia,
essencialmente agro-exportadora. O principal produto no início do
século era o café, que foi fundamental na formação de um
conjunto de cidades, localizadas na região sudeste do país,
especialmente no Estado de São Paulo. Nesse período as cidades
eram pequenas, e concentravam apenas uma parcela da
população.
A ocupação da região Centro-Oeste, quase incipiente,
resumia-se a núcleos importantes, caracterizados como rotas de
comércio e trocas, tais como Cuiabá - que surgiu em função do
ouro.
No final da década de 1920, particularmente com a crise
de 1929 queda da Bolsa de Nova Iorque a economia cafeeira
entra em declínio, e novas alternativas econômicas foram então
introduzidas no comércio brasileiro. Foi neste momento que o país
se viu obrigado a intensificar a industrialização. A população que
vivia no campo começou a migrar para as cidades em busca de
novas oportunidades ou dirigiam-se para as fronteira internas do
país. De acordo com Chaffun (1997) foi nesta época que se deu o
início da ocupação de várias áreas no interior do Brasil.
Em meados do século XX, mais precisamente do final dos
anos de 1940 até meados da década de 1970, o Brasil passou por
um intenso período de urbanização, decorrente do processo de
modernização do campo e de consolidação da industrialização
brasileira
66
.
No contexto mundial, importante destacar que apesar do
intenso crescimento populacional das cidades após a Segunda
Guerra Mundial, esse processo teve início no final do século XIX,
com a Revolução Industrial, principalmente nos países do noroeste
europeu. (ANTONUCCI, et. al., 2008).
Foi a partir da década de 1950, portanto, que muitas
cidades tiveram um rápido crescimento, com destaque para a
66
Enquanto em 1960, a população urbana representava 44,7% da população total – contra
55,3% de população rural – dez anos depois essa relação se invertera, com números quase
idênticos: 55,9% de população urbana e 44,1% de população rural. No ano 2000, 81,2%
da população brasileira vivia em cidades. Essa transformação, imensa em números
relativos, torna-se ainda mais assombrosa se pensarmos nos números absolutos, que
revelam também o crescimento populacional do país como um todo: nos 36 anos entre
1960 e 1996, a população urbana aumenta de 31 milhões para 137 milhões, ou seja, as
cidades recebem 106 milhões de novos moradores no período. (BRASIL, 2005, p. 23)
99
América Latina, Ásia e África, impulsionadas pelas inovações
econômicas da época. Com a Segunda Guerra Mundial, o processo
produtivo passou a se modernizar e consequentemente as
relações de trabalho também, ocasionando, segundo Chaffun
(op.cit.), a intensificação da migração para as cidades.
De acordo com Antonucci et al. (op. cit.), os países
desenvolvidos são, nessa ocasião, os que possuem a urbanização
mais articulada, em um
“processo combinado entre
industrialização e conseqüente modernização das atividades
terciárias de alguns centros por um lado, e mecanização e
modernização da agricultura de outro”
67
(Ibidem, p. 110).
Nos países denominados de “terceiro mundo” ou “pouco
desenvolvidos”, a industrialização é mais tardia, caso do Brasil. O
desenvolvimento da industrialização no país trouxe o
fortalecimento do mercado interno e intensa migração, tanto de
pessoas saindo do campo para as cidades em busca de ofertas de
empregos urbanos, alterações na tecnologia de produção agrícola,
entre outros motivos, quanto de movimentos populacionais intra
regionais. (LOBÃO, 2007).
67
No Relatório Final da Pesquisa
30 Anos de Habitat e as Transformações da Urbanização,
Antonucci (2008) fazem um panorama geral a respeito das taxas de urbanização mundial,
inclusive com o nível de urbanização separados por região, no período de 1950 a 1975 e
também abordam a respeito da população mundial - total e urbana comparando os anos
1990 e 2001.
Antonucci et. al, (op. cit.), salientam que nesta época as
áreas rurais incorporaram novas formas de produção agrícola,
relacionadas com a indústria brasileira que estava surgindo.
É de suma importância destacar a realidade das fronteiras
neste momento, as quais passaram a instalar
“novas frentes de
culturas e pecuária, principalmente no Centro-Oeste do país,
voltadas a atender o consumo interno da população crescente”
(Ibidem, p. 122).
De acordo com Brito e Carvalho (2006), o Centro-Oeste
brasileiro, assim como a região Norte e o estado do Paraná
passaram a ser – após os estados de São Paulo e Rio de Janeiro -
o alvo de brasileiros que migravam de seus Estados (migração
interestadual), por estas serem áreas de expansão agrícola
68
.
Segundo Chaffun (1997) na década de 1940 a população
urbana brasileira correspondia a 32% da população total.
Entretanto, esse dado não era uniforme para todas as regiões.
68
Segundo Maricato (2006), em 1970 o Brasil tinha cinco metrópoles com mais de 1 milhão
de habitantes: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife e Salvador. Em 2000
somaram-se a estas: duas metrópoles no Centro-Oeste - Brasília e Goiânia - duas na região
Norte (Belém e Manaus), além de Porto Alegre, Curitiba e Fortaleza.
100
Constata-se, com isso, que os investimentos públicos ao
longo do processo da urbanização brasileira foram mais
direcionados ao desenvolvimento econômico - incentivando o
processo de industrialização - do que ao desenvolvimento social -
adequando o espaço urbano ao crescimento da população.
Na tabela 01 apresenta-se a evolução da população urbana
e rural brasileira entre 1940 e 2000. Observa-se que é a partir dos
anos de 1970 que esta população ultrapassa 50%, ou seja, até
este período o Brasil era predominantemente rural.
Entretanto, tanto a ocupação do território brasileiro,
quanto a urbanização não aconteceu de forma homogênea nas
diversas regiões do país. A partir das idéias de Brito (2006),
Antonucci et al. (op.cit.) explicam que entre as décadas de 1950 e
1980 o movimento migratório é caracterizado como trajetórias
internas, das regiões menos desenvolvidas para as mais
desenvolvidas. Após 1980 intensifica-se a migração entre cidades,
uma vez que surge uma rede de municípios de pequeno e médio
porte espalhadas por todo o país, em diferentes regiões. A
diferença das taxas de urbanização entre 1940 e 2000 das cinco
regiões brasileiras podem ser observadas na tabela 02.
Tabela 01: Brasil - População nos Censos Demográficos
por situação do domicílio e Taxa de Urbanização
(1940 – 2000)
Anos
Censitários
Total Urbana Rural
Taxa de
Urbanização
(%)
1940
(1)
41.236.315 12.880.182 28.356.133 31,24
1950
(1)
51.944.397 18.782.891 33.161.506 36,16
1960
(1)
70.992.343 32.004.817 38.987.526 45,08
1970
(1)
93.134.846 52.097.260 41.037.586 55,94
1980
(2)
119.011.052 80.437.327 38.573.725 67,59
1991
(2)
146.825.475 110.990.990 35.834.485 75,59
2000
(2)
169.590.693 137.755.550 31.835.143 81,23
Fonte:
(1) IBGE - Censos Demográficos de 1940, 1950, 1960, 1970
apud
RONCA, 1980.
(2) IBGE - Censos Demográficos de 1980, 1991 e 2000. Disponível em www.ibge.org.br.
Acesso em jul. 2007. Organizado por Antonucci et al. (2008)
91
Tabela 02: Brasil - População nos Censos Demográficos por situação do domicílio e Taxa de Urbanização por Regiões
(1940-2000)
1940
(1)
1950 (1) 1960 (1) 1970 (1) 1980 (2) 1991 (2) 2000 (2)
REGIÕES
Total
Taxa de
Urbanização
(%)
Total
Taxa de
Urbanização
(%)
Total
Taxa de
Urbanização
( %)
Total
Taxa de
Urbanização
(%)
Total
Taxa de
Urbanização
(%)
Total
Taxa de
Urbanização
(%)
Total
Taxa de
Urbanização
(%)
Norte
1.627.608 24,93 2.048.696 29,64 2.930.005 35,54 3.603.679 45,13 5.880.706 51,63 10.030.556 59,05 12.893.561 69,83
Nordeste
14.434.080 23,42 17.973.413 26,40 22.428.873 34,24 28.111.551 41,82 34.815.439 50,46 42.497.540 60,65 47.693.253 69,04
Sudeste
18.345.831 39,42 22.548.494 47,55 31.062.978 57,36 39.850.764 72,70 51.737.148 82,81 62.740.401 88,02 72.297.351 90,52
Sul
5.735.305 27,73 7.840.870 29,50 11.892.107 37,58 16.496.322 44,29 19.031.990 62,40 22.129.377 74,12 25.089.783 80,94
Centro-Oeste
1.093.491 24,77 1.532.924 25,91 2.678.380 37,16 5.072.530 48,08 7.545.769 67,78 9.427.601 81,28 11.616.745 86,73
Fonte: (1) IBGE - Censos Demográficos de 1940, 1950, 1960 e 1970
apud
RONCA, 1980;
(2) IBGE - Censos Demográficos de 1980; 1991 e 2000. Disponível em www.ibge.org.br. Acesso em jul. 2007.
Organizado por Antonucci et al. (2008)
92
Com destaque para a região Centro-Oeste é possível
observar que a população urbana ultrapassa a rural na década
de 1980, enquanto na região Sudeste o mesmo ocorre já na
década de 1960. No período entre 1970 e 1980 o Centro-Oeste
tem um salto na urbanização – quando 48,8% da população
urbana aumenta para 67,78%. Na década de 1990 esta taxa
alcança 81,28%, e na década de 2000 a taxa sobe para 86,78%,
demonstrando que existe um predomínio absoluto de pessoas
vivendo no meio urbano - apesar da economia da região estar
bastante ligada ao setor rural com destaque para o cultivo de
soja, erva-mate e criação de gado.
O mesmo ocorre para a taxa geométrica de crescimento
tgca das diferentes regiões brasileiras. Observa-se, a partir da
tabela 03, a taxa geométrica de crescimento da região Centro-
Oeste, em relação ao Brasil no período de 1980 a 2000. Segundo
Antonucci et al. (Ibidem), com a mudança das correntes
migratórias do Nordeste para outras regiões que não mais a
região Sudeste, a fronteira agrícola do Centro-Oeste passa a ser
um dos novos destinos dos migrantes, principalmente nordestinos,
ocasionando, portanto, o aumento do contingente populacional
desta região.
Tabela 03: Taxa geométrica de crescimento da população do
Brasil, Centro-Oeste, Mato Grosso do Sul e Ponta Porã
entre 1980 – 2000
TGCA
Período
Brasil Centro-
Oeste
Mato Grosso
do Sul
Ponta
Porã
TGCA
1980-1991
1,93
2,04 2,41
3,49
TGCA
1991-2000
1,61
2,35 1,72
1,03
Fonte: IBGE - Censos Demográficos de 1980; 1991 e 2000. Disponível em
www.ibge.org.br. Acesso em 07 jun. 2008.
No contexto do Centro-Oeste brasileiro, importante
explanar sobre o crescimento do Estado de Mato Grosso do Sul e
da cidade de Ponta Porã no mesmo período abordado
anteriormente. A partir da tabela 04 é possível perceber o
crescimento da população total, em comparação com a população
urbana e rural de Ponta Porã.
93
Tabela 04 – População residente por situação de
domicílio em Ponta Porã - MS
Anos População Total Urbana Rural
1980¹ 38.070 27.483 10.587
1991¹ 55.541 47.040 8.501
2000¹ 60.916 54.383 6.533
2005² 67.190 ..... ......
(1) Censo Demográfico. (2) Estimativa.
Fonte: elaborado pela autora a partir de dados da SEPLANCT
Por meio da análise das tabelas anteriores, constata-se que
em 1980, quando a região Centro-Oeste detinha 7.545.769
habitantes (tabela 02), Ponta Porã possuía 38.070 destes, sendo a
maior parte desta população vivendo nas cidades (72% da
população total), conforme tabela 04. Em 1991 um aumento
considerável ocorreu no Centro-Oeste e, consequentemente em
Ponta Porã - a população total da cidade foi para 55.541
habitantes, apresentando uma taxa geométrica de crescimento de
3,49%. No Brasil, neste mesmo período a taxa é de 1,93. Até o
ano de 2000, entretanto, o crescimento da população se deu mais
lentamente, aumentando pouco menos de 5.000 habitantes em
Ponta Porã. Percebe-se que a taxa geométrica de crescimento
neste período – 1991-2000 - é de apenas 1,03%, não muito
diferente da mesma taxa no Brasil, que neste período é de 1,61,
enquanto que no Mato Grosso do Sul a taxa é de 1,72.
Importante ressaltar no contexto atual, que Ponta Porã
ainda tem sua população urbana em constante crescimento,
principalmente devido aos assentamentos criados nos últimos
anos
69
. Segundo dados do Plano Diretor Participativo do Município
de Ponta Porã (PONTA PORÃ, 2006), a população rural que
migrou para a cidade na última década representa 20% da
população urbana do município. Soma-se a este quadro o fato da
cidade-gêmea vizinha Pedro Juan Caballero estar passando
por modificações em suas estruturas agrárias, o que, impulsiona o
êxodo rural a partir da migração dos
campesinos
para a área
urbana. Em decorrência, as condições urbanas de Ponta Porã e
Pedro Juan Caballero são afetadas.
69
Os assentamentos da cidade de Ponta Porã serão abordados no capítulo 5, item 5.3.2.
94
Com a rápida industrialização e urbanização a partir dos
anos de 1960, o Brasil passou a demandar maior quantidade de
capital a ser investido com infra-estrutura regional e em setores
produtivos de indústrias de base. Entretanto, a priorização de
investimentos públicos nesses setores superpôs às necessidades
dos setores urbanos e sociais - moradia, equipamentos urbanos
para a população de baixa renda, entre outros - proporcionando
baixos recursos para a infra-estrutura das cidades. Ou seja, a
concentração de renda ficava com uma parcela privilegiada, a
parcela relacionada com os setores produtivos da sociedade,
aumentando as desigualdades sociais nas cidades.
Dessa forma, a construção do espaço urbano se deu de
maneira desigual e desequilibrada. A crescente população não
tinha condições de instalação adequadas no território urbano. Esta
situação de desigualdades sociais foi aumentada entre os anos de
1980 e 1990, quando o país passou por um período de recessão
econômica. A expansão urbana desigual das cidades brasileiras é
resultado de “uma interação bastante perversa entre processos
sócio-econômicos, opções de planejamento e de políticas públicas
e práticas políticas” (BRASIL, 2005, p. 24).
A intensa urbanização pela qual passaram as cidades
brasileiras no século XX gerou profundas mudanças, econômicas e
sociais, para a população
70
. Com as taxas de urbanização
crescendo, a necessidade de infra-estrutura nos centros urbanos
aumentava, decorrendo em medidas de gestão urbano-ambiental
adequadas para suprir tal demanda. Entretanto, segundo Quinto
Junior (2003), a legislação e instrumentos então vigentes não
acompanhavam essa necessidade. Era preciso “novos
instrumentos urbanísticos que superassem a visão voltada
unicamente para o controle de uso do solo urbano” (Ibidem, p.
187).
De acordo com Maricato (2006), o crescimento da
população vivendo nas cidades a partir da década de 1980 é de
maior intensidade nas cidades de médio porte 100.000 a
500.000 habitantes em relação às metrópoles, como pode ser
visto na tabela 05 com as populações de 1991 a 2001
70
Segundo Maricato (2006) a partir do século XX as cidades brasileiras receberam
aproximadamente 120 milhões de novos habitantes.
95
Tabela 05: Taxa de Crescimento Anual dos Municípios
Brasileiros por Faixa Populacional
População
Média da Taxa de Crescimento Anual
1991 a 2001
Até 20.000 hab. -0,07
De 20.000 a 100.000 hab. 0,77
De 100.000 a 500.000
hab.
1,91
Acima de 500.000 1,41
Fonte: MARICATO (2006)
Nesse contexto, pode-se concluir que a alta taxa de
urbanização verificada atualmente no meio urbano (mais de 80%
da população vive hoje nas cidades) relaciona-se com a
modernização das políticas econômicas que acarretam atratividade
urbana aliada à migração do setor rural para o urbano.
Tal fato não é diferente das cidades de fronteira. O
contraste social antes presente, de modo geral, nas grandes
cidades, hoje se repete em cidades de menor porte e também
naquelas que se situam longe dos grandes centros urbanos, como
é o caso das áreas de fronteira internacional. Hoje se configura a
cidade desigual, onde alguns setores, geralmente ocupados pelas
classes de mais alta renda, recebem maiores investimentos
públicos em detrimento às áreas periféricas, que por terem menor
custo são a opção de moradia para a classe de menor renda.
A busca das elites por áreas mais privilegiadas, segundo
Villaça (1998), configura um eixo de desenvolvimento. Ao mesmo
tempo em que crescem as áreas elitisadas, as periferias, além de
não receberem investimentos para melhoria de infra-estrutura,
ampliam seus limites para atender à demanda de população que,
como não tem condições de se locarem nas áreas centrais, vão
em busca de assentamentos precários, ocasionando um aumento
relativo das regiões pobres nas cidades brasileiras.
O ambiente fronteiriço, ou transfronteiriço, nesse contexto,
sofre as pressões de aumento populacional da mesma maneira
nos dois lados do limite internacional, uma vez que nem sempre
se é possível separar as estruturas urbanas de municípios em tal
condição.
96
4.2 Contextualização da área de estudo e as
relações fronteiriças
Para se entender o processo de formação das cidades de
Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, assim como suas relações
políticas, econômicas e sociais, é importante, inicialmente,
destacar algumas considerações a respeito da formação do
território do Paraguai.
O Paraguai foi colonizado primeiramente pelos índios, que,
de acordo com Goiris (1999), encontravam-se distribuídos em
vários locais com assentamentos geográficos bem definidos. Após
os índios, em 1516 chegaram os espanhóis, iniciando o período de
conquistas do território.
De acordo com Goiris (Ibidem) a primeira cidade paraguaia
foi Santiago de Jeréz
71
, fundada em 1593 por Ruy Díaz de
71
Se reconocen dos ciudades de Santiago e Jerez. La primera fundación de Santiago e
Jerez, la de 1593, en el Guayrá, estaria localizada en la proximidad de la desembocadura
del rio Ivinhema en el rio Paraná, MS, BR. Este local estaria próximo a Porto Caiuá, a unos
250 kilómetros de la actual Pedro Juan Caballero. La “segunda fundación”, o sea, el
traslado de Santiago de Jerez, en 1599, estaria localizada más al norte, en la región de los
indios Nú-guarás (ya en el Itatin), próximo a la actual ciudad de Miranda, MS, BR. En el
mapa se nota también las dos regiones dominantes: el Guayrá y su ciudad Villa Rica (en el
actual estado de Paraná, Brasil) y el Itatin e su ciudad Santiago de jerez (en la actual
región de Mato Grosso do Sul). Tanto el Guayrá como el Itatin pertenecían a los espanoles
siendo posteriormente dominados por los portugueses, particularmente después de 1750,
Guzmán, a qual possui importante relação histórica com a atual
cidade de Pedro Juan Caballero.
No período da colonização, as áreas conquistadas por
espanhóis foram ocupadas e dominadas por bandeirantes
portugueses. Surgiam então as chamadas Entradas e Bandeiras
dos portugueses, que tinham por objetivo a obtenção de ouro. Em
1778, de acordo com Goiris (Ibidem), o território de Jeréz foi
destruído em virtude do Tratado de Santo Idelfolso, explanado
no capitulo 2. As terras que incluíam a antiga região dos
itatines
,
hoje Mato Grosso do Sul, (Bela Vista, Miranda, Nioaque,
Corumbá), depois da guerra de 1870 veio a cair definitivamente
nas mãos da Republica Federativa do Brasil.
Em 1862 apareceu, pela primeira vez na historiografia, o
nome da localidade de
Punta Porã - Paraguay
, quando o Coronel
Francisco Isidoro Resquín traçava planos para a futura Campanha
de Mato Grosso para a Guerra de 70. Goiris (Ibidem) afirma que
em 1864 o exército paraguaio, comandado pelo major Martín
Ubieta, chegava a
Punta Porã
- Paraguay, para depois ocupar
militarmente territórios brasileiros, como a Colônia de Dourados,
Nioaque e Corumbá.
cuando Espana y Portugal firmaron un tratado de limites.
(Fonte: Quevedo R., ABC, revista
Asunción, 24/10/1982, apud Goiris 1999).
97
Em 1870, Francisco Solano López chegou a
Punta Porã
e
dias depois retornou com seu exército à Cerro Cora, quando
terminou a Grande Guerra. Novos Departamentos foram criados,
em 1901, pelo Congresso paraguaio, como o de Pedro Juan
Caballero, que será explicado logo adiante.
Ponta Porã e Pedro Juan Caballero, contudo, possuem
formação histórica bastante similar, uma vez que as duas cidades
se formaram a partir de acontecimentos comuns: a Guerra do
Paraguai e a exploração da erva mate. Com o território bastante
destruído em função da Guerra (também conhecida como Guerra
da Tríplice Aliança), o Paraguai iniciou a exploração da erva-mate
nativa na região, iniciando-se um novo período de
desenvolvimento também para o território brasileiro
72
.
Por volta de 1892, quando chegaram à região muitos
migrantes gaúchos - com a finalidade de cultivar a terra e criar
gado - Ponta Porã teve seus primeiros impulsos de progresso
econômico.
Em 1900 Ponta Porã tornou-se Distrito do município de
Bela Vista, e no dia 18 de julho de 1912, pela Lei nº. 617, o
72
Importante destacar que o Café também teve grande importância no contexto histórico
de Pedro Juan Caballero. Em 1953 instalou-se na cidade a Companhia Americana de
Fomento Econômico – CAFÉ, para a plantação do café, que também trouxe benefícios para
a cidade vizinha, Ponta Porã.
município de Ponta Porã foi criado, deixando, portanto, de ser
distrito.
Em 1919 foi criado em Ponta Porã o 11º RCMEC
(Regimento de Cavalaria) e instalado no ano seguinte. Em 1943, o
Presidente Getúlio Vargas criou o território Federal de Ponta Porã,
tendo como capital a cidade de mesmo nome. Em 1946, contudo,
esse território foi extinto e a cidade deixou de ser capital do
Território e voltou a ser apenas Município de Ponta Porã.
Pedro Juan Caballero (antes denominada
Punta Porã
Paraguay) desenvolveu-se também em função da erva-mate, pois
era próximo da lagoa que os carreteiros descansavam quando
transportavam a erva para
Concepción
no Paraguai (Goiris,
Ibidem). O mesmo autor ainda explica que em 1º de dezembro de
1899 foi estabelecida a
Comissaría Policial de Punta Porã
Paraguay
, que passou a marcar o aniversário da cidade. Mas foi
em 1901 que o Congresso Paraguaio criou o Departamento de
Pedro Juan Caballero, e em 1945, pelo decreto de 10 de julho,
que Pedro Juan Caballero foi designada cidade (não mais
Departamento) e capital do Departamento de
Amanbay.
Segundo análise de Torrecilha (2004) as duas cidades
nasceram com uma atividade econômica comum, uma vez que
possuem as mesmas alavancas históricas e econômicas. Nesse
98
contexto, a autora explica que o comércio teve um papel
importante de ligação ente os dois municípios e, ao mesmo
tempo, de dependência, uma vez que as relações de comércio,
negócio e lazer sempre fizeram a integração entre os dois
territórios.
Ponta Porã e Pedro Juan Caballero possuem juntas
aproximadamente 130 mil habitantes
73
e são separadas por uma
faixa (Linha de fronteira) que possui em sua parte central 50
metros de largura, podendo variar ao longo de sua extensão, a
qual representa o limite internacional. Assim como ocorre em
outras cidades de fronteira-seca, caso de Santana do Livramento
(Brasil) e Rivera (Uruguay), a Linha de fronteira se torna um
espaço de dependência por ambos os lados, e é junto a essa Linha
que se concentra o comércio das cidades.
A esse respeito, no caso da fronteira entre Livramento e
Rivera, Schäffer (1993, p. 31) explica que “diferente de estruturas
referidas a outros centros urbanos, nos quais, de modo geral, o
“centro” coincide com o espaço da administração e do comércio,
aqui ele é tangência entre os dois territórios nacionais”. E
73
A população de Ponta Porã, de acordo com o Censo Demográfico do IBGE de 2000 é de
60.916 habitantes. Entretanto, pesquisas locais informam que até o ano 2008 esse número
ultrapassa 70.000 habitantes, 89% da população residindo na cidade.
acrescenta que, devido à concentração do comércio junto à Linha,
há, nesse espaço, um trânsito maior de pessoas.
Ponta Porã foi uma das cidades que mais sofreu com a
Guerra do Paraguai, que deixou marcas bem profundas. Bem
próximo da cidade está Cerro-Corá, local onde morreu o ditador
Solano Lopes e que figura como um dos mais importantes
monumentos da cidade.
A cidade situa-se a sudoeste do estado de Mato Grosso do
Sul com superfície territorial de 5.329 km² e tem como distritos
Sanga Puitã e Cabeceira do Apa. Limita-se ao norte com os
municípios de Guia Lopes da Laguna, Jardim, Bela Vista e Antônio
João; ao sul, com Laguna-Carapã e Aral Moreira. O limite a leste
se com Dourados e Maracaju, e a oeste com a República do
Paraguai, como pode ser visto na figura 18. Além do destaque
para os municípios vizinhos à Ponta Porã, ressalta-se sua inserção
na faixa de fronteira brasileira dentro dos 150 km, a qual está
destaca em cinza.
A fronteira com a cidade paraguaia Pedro Juan Caballero
se por uma faixa Linha Internacional - de aproximadamente
14 quilômetros na área urbana
74
.
74
A Linha Internacional será abordada no item 4.2.2.2 deste capítulo.
99
Figura 18 – Limites de Ponta Porã.
Fonte: Adaptado pelo autor a partir de TORRECILHA (2004).
100
Ponta Porã
75
localiza-se sobre a Serra de Maracajú, com altitude média de 655 m, sendo divisor de águas, uma vez que se situa entre
as Bacias dos rios Paraná (80%) e Paraguai (20%). Na figura 19 estão representas estas Bacias dividindo o Estado de Mato Grosso do Sul e,
consequentemente, o território de Ponta Porã. O Rio São João, que nasce em Ponta Porã é contribuinte da Bacia do rio Paraná, o qual
alimenta duas usinas hidrelétricas de pequeno porte. A Bacia do rio Paraguai, por sua vez, tem como contribuinte o Rio Apa, o qual também
tem cabeceira no município brasileiro.
Figura 19: Bacias Hidrográficas de Mato Grosso do Sul
Fonte: Adaptado pelo autor a partir de SEPLANCT/MS (2007)
75
A palavra Ponta Porã significa
ponta bonita
, e tem origem espanhola e guarani.
101
É importante ressaltar, no contexto de desenvolvimento da
cidade de Ponta Porã, a chegada, em 1953, de um ramal
ferroviário vindo de Campo Grande, que melhorou a comunicação
da cidade com o interior do estado e sudeste do Brasil
76
. À medida
que novos migrantes foram chegando, a região foi crescendo,
ampliando as atividades econômicas para a agricultura e a
pecuária. Torrecilha (op.cit) afirma ainda que houve um aumento
do contingente militar, que se instalou inicialmente no ano de
1920 para a proteção das fronteiras. Todos esses fatores
ocorreram em função da Constituição do Território de Ponta Porã,
criada por meio do decreto Lei nº. 5.812 de 13 de setembro de
1943, que inclui sete municípios (Porto Murtinho, Bela Vista,
Dourados, Miranda, Nioaque, Maracaju e Ponta Porã).
Atualmente o acesso à cidade brasileira - Ponta Porã - se
por meio da BR 463 (Figura 20), que liga a cidade aos
municípios de Dourados e Campo Grande, da qual dista 328 km.
Pedro Juan Caballero, por sua vez, tem acesso pela Ruta 5, que
76
Inaugurada em 1993, a Estação Ferroviária Noroeste do Brasil em Ponta Porã é a maior
ferroviária de Mato Grosso do Sul, e a segunda do Brasil (superada pela Estação de Bauru,
em São Paulo). Funcionava como ponto final do ramal ferroviário utilizado para tráfego de
cargas e passageiros, porém a estação não é mais utilizada desde 1996. Disponíveis em:
<http://www.estacoesferroviarias.com.br/ms_pontapora/ponta.htm>. Acesso em 03 mai.
2008.
liga o município à Assunção, capital do Paraguai. Como pode ser
observado na figura 21.
Figura 20: Vias estaduais – MS
Fonte: Disponível em: <www1.dnit.gov.br/rodovias/condicoes/ms.htm>. Acesso em
03 mai. 2008
102
Figura 21: Planta urbana de Ponta Porã (Brasil) e Pedro Juan Caballero (Paraguai).
Fonte: GHETTI (2005)
103
De acordo com o Índice de Desenvolvimento Humano
IDH - de Ponta Porã, comparando-o com o IDH do Estado de Mato
Grosso do Sul, Ponta Porã é o município do Estado em
desenvolvimento humano, de um total de 78 municípios (Quadro
02). Esse fator pode estar relacionado com o fato de o município
ter uma economia predominantemente agrícola, a qual está em
constante desenvolvimento no Estado.
Quadro 02: Índice de Desenvolvimento Humano do
Município de Ponta Porã
Município Estado
IDH
1991 2000 1991 2000
Total 0,746 0,780 0,769 0,757
Renda 0,696 0,694 0,718 0,720
Longevidade 0,736 0,744 0,724 0,710
Educação 0,808 0,872 0,864 0,830
Rank no Brasil - 1059° -
Rank no Estado - - -
Fonte Prefeitura Municipal de Ponta Porã. Disponível em:
<http://www.pontapora.ms.gov.br/index.php?pagina=cidade-perfil>. Acesso em: 19. mai.
2008.
A economia de Ponta Porã, segundo dados da SEPLANCT -
Secretaria de Planejamento, Ciência e Tecnologia do Estado
baseia-se fundamentalmente na agricultura, propiciada pela
abundância de terras férteis para o plantio. Além de ser o maior
produtor de feijão e trigo do Estado de Mato Grosso do Sul, sua
produção de soja é a terceira do estado.
Não se pode esquecer também da pecuária, atividade
igualmente importante para a economia do município. Segundo
relatório do Plano Diretor, Ponta Porã tem como matriz - bovinos,
eqüinos, suínos, ovinos e aves - um rebanho total de mais de 612
mil animais, registrado em 2002.
O comércio, juntamente com a agricultura, é uma das
principais atividades econômicas do município. Importante
destacar sobre esse setor que são 642 estabelecimentos em
atividade regular, sendo 103 do comércio atacadista e 539 do
varejista. Segundo dados da SEPLANCT, a maioria desses
estabelecimentos são de pequeno porte, e as atividades não se
restringem apenas à população de Ponta Porã, uma vez que o
município presta serviços a populações de várias cidades em seu
entorno, inclusive paraguaias. De acordo com o Plano Diretor a
região de influência é de aproximadamente 500.000 pessoas,
caracterizando-se como forte centro regional econômico, o qual
vem se consolidando espontaneamente
.
Ainda a respeito da economia da região, vale ressaltar o
setor industrial. De acordo com a SEPLANCT, esse segmento,
apesar de não ter grande influência sobre a economia local,
104
apresenta cerca de 260 estabelecimentos, sendo 35% deles
destinados à construção civil e ao comércio e reparação de
automóveis.
4.2.1 Caracterização geral de Ponta Porã
Como colocado, Ponta Porã tem grande influência sobre a
cidade paraguaia Pedro Juan Caballero, e vice-versa. As duas
cidades vivem lado a lado e possuem características muito
particulares que as tornam formadoras de uma situação peculiar.
A partir da compreensão da interação existente entre os dois
municípios social, cultural e até mesmo econômica será
realizada uma abordagem a respeito de vários aspectos da cidade
brasileira e seus conflitos com sua cidade-gêmea.
Nota-se que as relações existentes entre as duas cidades
são relacionadas ao cotidiano, ou seja, existe a interação social.
Isto se deve tanto pela localização em que se encontram
condição de fronteira-seca quanto pela formação histórica
similar de ambas, conforme abordado no capítulo 2.
Ressalta-se, todavia, que apesar das relações e
intercâmbios presentes, as cidades se distinguem em vários
aspectos, como a estrutura urbana e uso e ocupação do solo. Tal
diferenciação se faz em função das distintas sociedades e aspectos
econômicos e políticos institucionais que incidem diretmente sobre
elas. Um dos aspectos que aproxima os munícipes das duas
cidades é a presença da Linha Internacional, por meio da qual as
cidades se desenvolveram e concentraram seus setores de
comércio e serviço, mesmo com dessemelhanças.
Nesse sentido, faz-se necessário o esclarecimento de
alguns aspectos da estrutura urbana dos municípios, com ênfase
para a cidade brasileira de Ponta Porã, bem como aspectos
relevantes da Linha de Fronteira Internacional. Tais questões são
consideradas relevantes para o entendimento dos conflitos
existentes nesta região de fronteira, destacadas no Plano Diretor
Participativo da cidade brasileira.
105
4.2.1.1. Estrutura Urbana e Uso do Solo
Ponta Porã pode ser considerada uma cidade linear, a qual
tem como característica a formação por meio de um eixo de
ocupação de fortes características, ou seja, cidades onde a
geografia determina a forma de ocupação. Segundo texto do
Plano Diretor de Ponta Porã (Ibidem) eixos fortes de ocupação
podem impedir que a cidade estabeleça um centro urbano
determinado, principalmente cidades de pequeno porte, como, no
caso de Mato Grosso do Sul, os municípios de Amambai,
Bandeirantes, Jaraguari e Ponta Porã.
Ponta Porã, apesar de se constituir com um centro
regional, não quebrou a característica de cidade linear, uma vez
que seu eixo formador é a Linha Internacional, que a separa de
Pedro Juan Caballero.
No texto do Plano Diretor é explicado que, incorporando o
distrito de Sanga Puitã, é formado um eixo de estruturação urbana
de aproximadamente 14 quilômetros de extensão de urbanização
consolidada. No eixo transversal à Linha (que corresponde a esses
quase 14 quilômetros) a extensão não ultrapassa dois
quilômetros.
Ao eixo longitudinal característico de Ponta Porã, relaciona-
se a presença da área militar – um grande vazio urbano que divide
transversalmente a cidade (Figura 22), e que, segundo o Plano
Diretor do município impõe
“à sua estruturação um tipo de
distorção que impele a circulação para o seu redor, criando
corredores artificiais de circulação
” (Ibidem, p. 15). Esta área
institucional, localizada próxima à faixa internacional, denomina-se
11º RCMEC - 11º Regimento de Cavalaria Mecanizado - Regimento
Marechal Dutra
77
- (Foto 01). Pode-se dizer que esse espaço
subutilizado representa uma barreira para o crescimento da
cidade.
77
Em área doada pela Companhia Mate Laranjeira ao então Ministério da Guerra, o 11º R C
Mec teve origem em 1919, com a assinatura de um decreto pelo Presidente Epitácio Pessoa
- o Dec. 13.916 de 11 de dezembro de 1919 ficando criado o 11º R C I. Informações
disponíveis em: <www.exercito.gov.br>. Acesso em 03 jun. 2008
106
Figura 22: Vista aérea com destaque para a área militar de
Ponta Porã.
Fonte: Adaptado pela autora a partir de imagem do Programa
Google Earth
Foto 01 - Shopping Calçadão reformado, em 2008.
Fonte: GHETTI (2007)
A malha urbana de Ponta Porã constitui-se
ortogonalmente, com quadras quadradas ou retangulares, de
dimensão média de 180m. As principais vias da cidade são as
Avenidas Brasil, Marechal Floriano e Internacional, paralelas à
Linha internacional (Fotos 02, 03 e 04). O sistema viário organiza-
se nos sentidos noroeste/sudeste e nordeste/sudoeste. O
perímetro urbano hoje possui 14.517 hectares (TORRECILHA,
op.cit.).
Foto 02 – Avenida Marechal Floriano.
Fonte: GHETTI (2006)
107
Foto 03 – Avenida Brasil.
Fonte: GHETTI (2006)
Foto 04 – Avenida Internacional
Fonte: GHETTI (2006)
O desenho da cidade brasileira é diferente da cidade
paraguaia. Como colocado, Ponta Porã vem crescendo de forma
linear em direção à Sanga Puitã - distrito distante 11 km da
cidade. As particularidades do desenho das duas cidades podem
ser visualizadas na figura 23.
A partir da figura é possível perceber a característica de
linearidade da cidade. A parte amarela corresponde à área
residencial, que em ambos os municípios correspondem à maior
parte do traçado urbano. Percebe-se que tanto em Ponta Porã,
quanto em Pedro Juan os setores de comércio e serviços se
concentram na maior parte no mesmo local região central - ou
seja, formam uma área mista. Em relação à área mista comercial-
residencial, Pedro Juan Caballero concentra a maior parte. A área
institucional, entretanto, possui maior extensão no lado brasileiro,
principalmente devido à existência da área militar, abordada
anteriormente. Além do exército, destacam-se como área
institucional de Ponta Porã o aeroporto e a estação ferroviária.
Sobre as áreas verdes, Ponta Porã apresenta um número reduzido
de praças e parques, diferente de Pedro Juan, que apresenta
áreas verdes bem distribuídas, todavia maior quantidade de área
verde urbanizada concentra-se na cidade paraguaia. Os vazios
urbanos se concentram mais em Pedro Juan, porém na periferia
108
da cidade. Sobre o setor industrial percebe-se que o município
paraguaio concentra a maior parte.
Importante dizer a respeito dos usos das duas cidades que
nenhuma área se restringe apenas ao seu país, ou seja, todos os
setores de um dos lados é abundantemente utilizado pelo
município vizinho. Além do comércio - setor mais utilizado em
comum pelas duas populações - hospitais, escolas, e até
universidades têm seus usos compartilhados. Pedro Juan, por ser
uma cidade mais pobre, depende em muito do setor de saúde do
município vizinho, o que causa uma superlotação nos hospitais de
Ponta Porã
78
. Não se tem uma contagem registrada do número de
munícipes que utilizam serviços do outro lado do limite
internacional, o que seria de grande valor para estudos mais
aprofundados sobre o assunto. Ao mesmo tempo, as
Universidades paraguaias estão cada vez mais sendo utilizadas
pelos brasileiros, que ali existem cursos que Ponta Porã não
oferece, como faculdades de medicina
79
.
78
De acordo com dados da SEPLANCT Secretaria de Planejamento, Ciência e Tecnologia
do Estado de Mato Grosso do Sul, em 2006 Ponta Porã conta com três hospitais gerais,
sete centros de saúde, 4 postos de saúde, seis clínicas especializadas e um total de 181
leitos.
79
Em relação à educação, Ponta Porã conta com seis instituições de Ensino Superior.
Informações também fornecidas pela SEPLANCT.
109
Figura 23 - Mapa das municipalidades de Pedro Juan Caballero e Ponta Porã
Fonte: TORRECILHA (2004).
110
Ainda sobre a estrutura urbana dos municípios, importante
ressaltar que, diferente de outras cidades brasileiras, em Ponta
Porã e em Pedro Juan a Linha de fronteira define o centro das
cidades, como pode ser visto na figura anterior. Segundo Villaça
(1998) o centro é algo que se torna ou deixa de ser. Na cidade de
Ponta Porã, observa-se que o centro se define a partir da Linha de
divisa, ou seja, ela define o centro do comércio da região.
Para Villaça o centro é ou não é centro. Nas suas palavras:
O centro surge a partir da necessidade de
afastamentos indesejados, mas obrigatórios.
Ele, como todas as ‘localizações’ da
aglomeração, surge em função de uma disputa:
a disputa pelo controle do tempo e energia
gastos nos deslocamentos humanos (Ibidem, p.
239).
Sendo assim, entende-se que, de modo geral, nas cidades
existe, ao mesmo tempo, a necessidade de aglomeração, e de
afastamento de um ponto onde todos gostariam de se localizar. O
mesmo não é percebido nas cidades de Ponta Porã e Pedro Juan,
uma vez que o centro das duas cidades é o local privilegiado por
parte dos moradores e é onde o valor imobiliário é de mais alto
custo. O centro, nesse caso, é o ponto nodal onde toda a
comunidade pode se reunir no menor tempo possível.
Analisando os centros das grandes cidades, Villaça
(Ibidem, p. 243) explica que
“sendo objeto de disputa entre as
classes, o centro se torna mais acessível a uns do que a outros,
tanto pelo desenvolvimento de um sistema viário, como o
deslocamento espacial do centro e de suas transformações”.
No
caso de Ponta Porã percebe-se que o centro é de fácil acesso para
a maioria da população, o que ocorre, entretanto, é a barreira
física ocasionada pela área do exército do município. O 11º RC
MEC, abordada, que dificulta o acesso dos bairros mais
afastados ao centro. A localização do centro comercial de Ponta
Porã está destacada na figura 24.
De modo geral, em Pedro Juan Caballero as atividades
comerciais e de serviços também se concentram na região da
Linha, ou seja, o local que define o centro da cidade. As quadras
do lado paraguaio medem, em geral, 100x100m e organizam-se
em eixos norte-sul e leste oeste (TORRECILHA, op.cit).
111
Figura 24: Planta urbana de Ponta Porã com destaque para o
centro comercial
Fonte: elaborado pela autora a partir de imagem cedida pela Prefeitura Municipal de Ponta
Porá.
A infra-estrutura de Pedro Juan é mais precária em relação
à Ponta Porã. É possível perceber sinais de falta de limpeza
pública pelas ruas da cidade paraguaia e transporte coletivo
urbano defasado, não atendendo a população, enquanto que na
cidade brasileira as ruas são, em sua maioria, mais conservadas.
Na foto 05 está ilustrado um caso comum de rua da cidade
paraguaia em bairro mais afastado do centro - sem qualquer sinal
de infra-estrutura, e a foto 06 mostra uma rua localizada no
centro da cidade paraguaia. A foto 07, por sua vez, ilustra uma
avenida da cidade brasileira em bom estado de conservação e a
foto 08 uma rua da região central da cidade brasileira.
Foto 05 – Rua de Pedro Juan (bairro afastado do centro)
Fonte: GHETTI (2007)
Foto 06 – Rua do centro de Pedro Juan Caballero
Fonte: GHETTI (2007)
112
Foto 07 – Avenida Brasil – Ponta Porã
Fonte: GHETTI (2006)
Foto 08 – Avenida do centro de Ponta Porã
Fonte: GHETTI (2006)
Em Ponta Porã, o transporte urbano, ainda que não seja o
desejável pela população, oferece melhores condições, ou seja,
atende maior número de bairros. No entanto, o número de linhas
de ônibus não é suficiente, tornando o intervalo entre os ônibus
muito grande, fazendo com que o usuário espere no ponto por
mais de uma hora de uma condução para a outra. Em 2007 foi
inaugurado um novo terminal de ônibus em Ponta Porã, que pode
ser observado na foto 09, o qual se localiza na Linha
Internacional.
É importante ressaltar que não existe linha de ônibus que
atravesse a fronteira. Entretanto, são muitas as pessoas que
cruzam o limite internacional diariamente, uma vez que moram de
um lado e trabalham do outro; ou cruzam a fronteira para utilizar
o comércio, ou até mesmo serviços de educação, como salientado
anteriormente. Essa população que passa de um lado para outro
diariamente utiliza de outros meios de locomoção, como bicicleta,
moto ou carro (foto 10).
113
Foto 09 – Terminal rodoviário de Ponta Porã
Fonte: GHETTI (2008)
Foto 10 – munícepes atravessando a fronteira de moto
Fonte: GHETTI (2008)
Percebe-se, a partir do que foi exposto, que, apesar das
duas cidades possuírem processo de formação similar, elas se
distinguem em muitos aspectos.
A ausência de fiscalização para a travessia da fronteira as
torna cidades de convívio direto, que, mesmo com todas essas
diferenças expostas, dependem e demandam uma da outra de
diversas maneiras.
Além das questões rotineiras, as moedas e línguas faladas
nas cidades também se misturam. O ‘portunhol’
80
se torna comum
naquela região, além do guarani língua também falada no lado
paraguaio da fronteira.
As disparidades culturais existentes na fronteira, além de
conviverem, influenciam o cotidiano da comunidade, inclusive “nas
variações de capitais e nos preços de mercadorias” (OLIVEIRA,
1998).
80
Com a mistura da língua portuguesa falada em Ponta Porã e a língua espanhola
falada em Pedro Juan Caballero tem-se o chamado ‘portunhol’, uma vez que as duas
línguas acabam se misturando constantemente.
114
As relações existentes entre as cidades-gêmeas Ponta Porã
e Pedro Juan Caballero são exemplos de fronteira como ‘zona de
passagem’, uma vez que, mais do que um limite entre países, esta
região representa uma ‘zona de interação’, onde intercâmbios são
freqüentes e fenômenos de mestiçagem se tornam comuns,
tornando a população fronteiriça responsável por sua própria
história.
Enfim, pode-se entender a fronteira internacional como um
“universo cultural”, onde a língua, cultura e identidade nacional
convivem e se justapõem, fazendo da territorialidade um símbolo
de nacionalidade (HOBSBAWN, 1990).
115
4.2.1.2. A Linha de Fronteira
Como dito, a separação entre as cidades de Ponta Porã e
Pedro Juan Caballero se por meio de uma Linha de divisa, ou
seja, uma faixa central entre as duas cidades, consideradas
fronteira-seca. Sendo o limite internacional de dois paises,
Torrecilha (op.cit., p. 63), explica que “
a linha de fronteira tornou-
se um ponto por onde começa o crescimento de forma linear e
contígua, tanto de Ponta Porã como de Pedro Juan Caballero
”. Tal
fato explica-se porque as primeiras residências e comércios das
duas cidades foram construídos ao redor da Linha
É nesta área
que sempre se fizeram as manifestações culturais e cívicas das
duas cidades. Na foto 11 encontra-se a Linha, representando o
limite internacional, na década de 1930.
A Linha que separa Estados nacionais, “ou une, mas não
mistura uma cultura de outra” (OLIVEIRA, 2005, p. 379) é
considerada o espaço de maior significação na fronteira entre
Ponta Porã e Pedro Juan - tanto que historicamente era conhecida
na região como
O Boulevar de la Frontera.
A extensão atual da
faixa de divisa é de 13.800 metros dentro do perímetro urbano,
definindo um eixo longitudinal, como pode ser visto na figura 25.
Foto 11 - Linha Internacional na década de 1930
(autor desconhecido)
Fonte: Disponível em:
<http://www.estacoesferroviarias.com.br/ms_pontapora/ponta.htm>.
Acesso em 03 mai. 2008.
116
Figura 25: Imagem de satélite de Ponta Porã (Brasil) e Pedro Juan Caballero (Paraguai). Traço amarelo representando a fronteira
Fonte: Elaborado pela autora a partir de imagem gerada no Programa
Google Earth
. Acesso em: 10 jun. 2007.
117
Entretanto, o local símbolo da fronteira - a Linha - foi se
modificando com o tempo. O que antes era uma grande faixa
gramada, agradável visualmente segundo a população residente
nas duas cidades, hoje apresenta sinais de degradação
81
, ocupada
de forma inadequada pelo comércio irregular, como pode ser
observado nas fotos 12 e 13.
Foto 12 - Linha de fronteira no estado atual
Fonte: GHETTI (2005).
81
A respeito da conceituação do termo degradação, utiliza-se a definição da Política
Nacional do Meio Ambiente - Lei n. 6.938/81: “degradação da qualidade ambiental:
alteração adversa das características do meio ambiente”.
A partir da análise das condições físicas da Linha
Internacional, observa-se que os sinais de deterioração da mesma
estão cada vez mais evidentes, e as ações por meio das instâncias
competentes cada vez mais necessárias.
Foto 13: Linha de Fronteira – destaque para os camelôs
Fonte: GHETTI (2005)
118
Sobre a Linha nos dias atuais Torrecilha (op.cit) coloca
que:
Marco físico, geográfico e cultural, é onde os
povos misturam-se aos precários equipamentos
urbanos (poucas lixeiras, falta de telefones
públicos, banheiros públicos insuficientes,
ausência de iluminação), aos monumentos, ao
“Shopping de lata” (barracas de camelôs
construídas de alumínio), aos casilleros, aos
pontos de vendas de drogas e prostituição
(Ibidem, p. 73)
A respeito da ocupação da Linha, vale destacar
primeiramente a localização do comércio formal. Em 1995, foi
fundada a Associação do Primeiro Shopping Calçadão Mercosul
iniciativa de um grupo de brasileiros - a qual solicitava, segundo
informações da população residente, a autorização de compra de
mercadorias nos países do Mercosul para vendê-las no lado
brasileiro. O Shopping encontra-se registrado nas fotos 14 e 15.
A Comissão Brasileira Demarcadora de Limites, de acordo
com Torrecilha (op.cit.), autorizou a construção das barracas do
shopping Mercosul, desde que ficassem a 10 metros (no mínimo)
do marco divisório internacional
82
. Foram construídos, em uma
82
Torrecilha (2004) explica que a distância do marco divisório internacional varia na área
urbana – a média é de 20m, conforme Acordo de 1940. Na zona rural, conforme o
extensão de aproximadamente 600 metros, 100 módulos de
alumínio de 3x3m e 4x4m. Hoje existem aproximadamente 125
boxes de comércio e serviços no lado brasileiro, que empregam
cerca de 390 funcionários e, no Paraguai, são aproximadamente
560
casillas
dispostas de forma linear, como acontece também no
lado brasileiro (Torrecilha, Ibidem).
Foto 14 - Shopping Calçadão em 2005
Fonte: GHETTI (2005)
Protocolo de Instruções pela Comissão Mista de Limites e de caracterização de Fronteira
Brasil-Paraguai de 1977, esta distância aumenta para 25m. Nesta área não se pode
construir; destina-se apenas ao trânsito.
119
Foto 15 - Shopping Calçadão reformado, em 2008.
Fonte: GHETTI (2008)
Em contraposição, tem-se a ocupação da Linha por parte
dos
casilleros
(denominação para camelôs, em espanhol, que
trabalham em barracas construídas, em geral, de madeira). A
partir da ocupação ilegal, o local está cada vez mais sem
conservação, tanto do lado brasileiro como paraguaio, e tornando-
se ponto de promiscuidade e tráfico de drogas. A distribuição dos
camelôs e
casilleros
ao longo da Linha Internacional,cada vez mais
intensa, formam um grande camelódromo e concentram grande
parte do comércio local (Fotos 16 e 17).
Foto 16:
casilleros
do lado paraguaio da Linha
Fonte: GHETTI (2005).
Foto 17: camelôs formando um grande camelódromo
Fonte: GHETTI (2005).
120
A ocupação irregular na Linha não se concentra apenas no
lado brasileiro. O lado da faixa do limite internacional que
pertence à Pedro Juan Caballero é em sua maior parte mais
degradada que o lado brasileiro.
Além das extremidades da faixa, seu “interior” também
está sendo utilizado pelos camelôs e
casilleros.
Como a Linha
possui, em sua parte central a mais degradada cerca de 50m
de largura, os comerciantes informais invadiram também a parte
central da faixa, formando uma rua em seu interior, a qual, sem
infra-estrutura, abriga veículos e até ônibus da prefeitura
municipal de Ponta Porã, como pode ser visto nas fotos 18 e 19.
A respeito da constante ocupação dos camelôs na Linha
Internacional, ressaltam-se as idéias de Vargas (2001). A autora
afirma que os locais onde existem cruzamentos de fluxos de
pessoas (caso da Linha Internacional) são propícios para a
realização da troca, ou seja, da atividade comercial.
Foto 18: Ruas formadas a partir da organização dos camelôs
Fonte: GHETTI (2005).
Foto 19: Interior da Linha de Fronteira invadido pelos camelôs
Fonte: GHETTI (2008).
121
A ocupação irregular na área causa diversos efeitos
negativos para todos que ali transitam. Na foto 20 pode ser visto
um amontoado de lixo no meio da Linha, que pode causar, além
de desconforto, doenças para as pessoas que daquela área
dependem.
Foto 20: degradação no ‘interior’ da Linha
Fonte: GHETTI (2008).
Outro fator que vem ocorrendo nos últimos tempos nesta
área é a construção de unidades de comércio informal em
alvenaria ao invés da madeira, como era mais utilizado. Não se
importando com sua situação irregular na Linha, os comerciantes
ampliam seus negócios e até mesmo constroem pequenas
residências irregulares para ali viverem, como pode ser visto nas
fotos 21 e 22.
Foto 21:
casillas
construídas em alvenaria no lado paraguaio.
Fonte: GHETTI (2008).
122
Foto 22: camelô (restaurante) construído em alvenaria em
Ponta Porã
Fonte: GHETTI (2008).
Não se pode afirmar, entretanto, que a área por onde
passa a Linha encontra-se mal conservada em toda sua extensão.
É possível verificar áreas de maior ou menor degradação ao longo
da Linha. O comércio informal concentra-se na região mais
central, local coincidente com o comércio formal das duas cidades.
Na região mais afastada do centro comercial, a incidência desta
atividade diminui. Na foto 23 percebe-se a diminuição do comércio
informal à medida que a faixa vai se afastando do centro.
Entende-se que a área de maior degradação encontra-se
na região mais central das duas cidades, onde existe a maior
concentração de vendedores ambulantes (camelôs) e menor infra-
estrutura disponível. A parte de média degradação ainda
apresenta camelôs, porém em menor quantidade e um pouco de
área verde pode ser percebida, enquanto a região de menor
degradação praticamente não apresenta comércio informal e
possui maior conservação, uma vez que se pode perceber maior
extensão de áreas verdes (GHETTI, op.cit). Tais diferenças no
estado de conservação da Linha podem ser identificadas na figura
26.
Foto 23: Linha - destaque para ausência de camelôs ao fundo
Fonte: GHETTI (2005)
123
Figura 26 - Planta das duas cidades ilustrando a degradação da Linha de Fronteira.
Fonte: GHETTI (2005)
124
Ressalta-se, nesse sentido, que o aumento do comércio
informal prejudica, cada vez mais, tanto Pedro Juan, como Ponta
Porã, tornando-se, portanto, um desafio para os governantes
locais e suas políticas públicas.
Contudo, a faixa internacional representa um local por
meio do qual se formou um comércio muito fortalecido, e onde o
uso e a ocupação irregular acontecem de maneira similar dos dois
lados do limite internacional. Voltada ao setor de comércio e
serviços de pequeno porte, a Linha sofre com as divergências
entre os governos locais, o que dificulta a implantação de projetos
de revitalização da mesma e de implementação de legislações
específicas. De acordo com texto do Plano Diretor de Ponta Porã a
Linha “é o resumo urbanístico das contradições e impossibilidades
de integração entre as duas cidades” (PONTA PORÃ, 2006, p.
13)
83
.
Para finalizar, e a partir das questões expostas, sintetiza-se
um quadro de conflitos em relação aos principais temas discutidos
anteriormente sobre a fronteira de Ponta Porã e Pedro Juan
Caballero (Quadro 03).
83
As especificações do Plano Diretor para a Linha Internacional, assim como as
reivindicações dos comerciantes que ocupam este local, serão abordadas no item 5.3.4 do
capítulo 5.
127
Quadro 03: Conflitos existentes na fronteira entre Ponta Porã e Pedro Juan Caballero
TEMAS/CONFLITOS PEDRO JUAN CABALLERO PONTA PORÃ
Linha Internacional
Ocupação irregular, ausência de infra-estrutura,
degradação ambiental, presença de prostituição
infantil e tráfico de drogas
Ocupação irregular, ausência de infra-estrutura,
degradação ambiental, presença de prostituição
infantil e tráfico de drogas
Infra-estrutura
Carência de infra-estrutura. Apenas as ruas mais
próximas ao limite internacional possuem boas
condições de uso. O restante torna a circulação de
pedestres dificultosa. Deficiência de mobiliário
urbano e iluminação pública
Em melhores condições em relação à Pedro Juan. Porém
observa-se carência de mobiliário urbano.
Iluminação pública deficiente em torno da Linha
Internacional. Centro da cidade com iluminação
recentemente reformada.
Habitação
Predominância de residências construídas em madeira –
telhado de duas águas com telha cerâmica.
Em geral construídas em alvenaria. Observa-se sinais de
verticalização.
Transporte
A população utiliza mais o transporte coletivo de Ponta
Porã devido à deficiência desse serviço no município,
principalmente junto à Linha Internacional.
Deficiência no transporte coletivo.
Áreas verdes e de
lazer
Praças e áreas verdes bem distribuídas na área
residencial do município.
Número reduzido de praças e parques
Áreas institucionais
Menos ostensiva que no município de Ponta Porã. Barreira física (vazio urbano) ocasionada pela área do
exército - 11° RCMEC
Comércio
Casilleros
na Linha Internacional prejudicam o comércio
formal.
Comércio formal prejudicado pelo comércio informal e
baixos preços do lado paraguaio.
Educação
População divide-se nos oferecidos nesta cidade e nos
de Ponta Porã.
Com novas faculdades em Pedro Juan, os
pontaporanenses passam a utilizar os serviços de
educação daquele município.
Saúde
Deficiência de hospitais e áreas de saúde. Hospitais e postos de saúde superlotados devido ao uso
dos habitantes da cidade vizinha.
Segurança
A vantagem locacional da fronteira contribui para ações
ilícitas – contrabando de mercadorias e tráfico de
drogas – o que gera insegurança para a população.
A falta de infra-estrutura da cidade, combinada com a
violência gerada pelo narcotráfico, implicam na
segurança do município, que se faz de maneira
ineficaz.
Cultura
Manifestações culturais marcantes, identificadas na
música, culinária, dança e religião.
Manifestações culturais menos evidentes
Fonte: Elaborado pela autora a partir de observações decorrentes das visitas de campo, entrevistas com a população e autoridades, bem como a partir da vivência no local.
128
5. A POLÍTICA URBANA DE PONTA PORÃ E A
FRONTEIRA: LIMITES E DESAFIOS
A política urbana de Ponta Porã não está enquadrada em
um contexto histórico de muito tempo. Constitui-se em um quadro
recente, onde inúmeros fatores sempre dificultaram sua
efetivação, tanto por sua condição peculiar no território nacional –
cidade de fronteira-seca com um município paraguaio quanto
por ser um município de porte relativamente pequeno.
Anterior à exigência da Constituição Federal de 1988 e da
Lei Federal n°. 10.257 de 10 de julho de 2001 - Estatuto da
Cidade - onde vários municípios brasileiros se tornaram obrigados
a elaborar seus planos diretores, Ponta Porã nunca havia
elaborado um plano diretor. Entre a promulgação da CF de 1988 e
do Estatuto da Cidade o município elaborou o Código de Obras
Lei 2890/93 - e o Código de Polícia Administrativa do Município
- Lei 2889/93. Somente a partir da instituição do Estatuto da
Cidade, o município de Ponta Porã elaborou seu Plano Diretor
Participativo, promulgado como Lei 031, em 10 de outubro de
2006.
129
A exigência de elaboração de um Plano Diretor, que
incorpore os princípios estabelecidos pelo Estatuto da Cidade,
instituiu em Ponta Porã, pela primeira vez, a necessidade de
discutir questões ligadas ao seu desenvolvimento municipal, entre
elas os problemas que decorrem de sua situação de fronteira
internacional. Entretanto, não existe na política urbana federal
instrumentos urbanísticos que definam mecanismos de
incorporação e resolução de conflitos em áreas de fronteira a
serem incorporados pelo Plano Diretor.
Ao mesmo tempo em que esta é uma questão mais ampla,
que ultrapassa as atribuições do município, pois se trata de um
assunto específico da União e de sua relação internacional, no
âmbito local, envolve aspectos rotineiros que devem ser
encaminhados pelo poder municipal.
Agravando ainda mais esta situação específica, a existência
de uma cidade-gêmea no país vizinho, com área urbana
conurbada, pressupõe-se a ampliação da discussão que envolve
aquele território com vistas à política de ordenamento territorial
integrado. Entretanto, o município de Pedro Juan Caballero nem
sequer possui um instrumento de desenvolvimento urbano, apesar
da exigência também existir no Paraguai
84
.
Nesse contexto, esse capítulo tem por objetivo discutir o
Plano Diretor de Ponta Porã, apontando como o município
brasileiro vem enfrentando a problemática da fronteira nesse
processo, ressaltando principalmente os avanços e dificuldades,
bem como os desafios futuros para o equacionamento desta
questão.
Para tanto, inicialmente introduz-se o conceito de política
urbana de forma sucinta, e os aspectos recentes que envolvem a
formulação da política urbana no Brasil pós Constituição Federal
de 1988. Em seguida, apresenta-se o processo de planejamento
de Ponta Porã, e finalmente discutem-se os aspectos que
envolvem a fronteira e em quais medidas o Plano Diretor
considera a cidade vizinha de Pedro Juan Caballero, no Paraguai.
84
Este assunto será discutido no item 5.3.1 deste capítulo.
130
5.1 Política Urbana e Planos de Urbanismo: uma
discussão conceitual
85
O intenso processo de urbanização no Brasil
contemporâneo, traz desafios a serem vencidos sobre as questões
relacionadas às políticas urbanas, de gestão das cidades e de
organização do território. Com isso, surgem novos problemas a
serem questionados pelos profissionais competentes das áreas
de arquitetura, urbanismo e planejamento urbano.
Peça importante da política pública, a discussão sobre
política urbana envolve o entendimento ainda que inicial desse
conceito. Silva (2005 apud ALVIM et. al, 2006) afirma que as
políticas públicas representam codificações e recodificações das
demandas e das práticas sociais pelo conjunto de instituições que
forma o Estado. Belloni, Magalhães e Sousa (2000 apud Ibidem)
colocam que se política pública é a ação intencional do Estado,
todas as suas ações devem estar voltadas à sociedade e envolver
recursos sociais.
85
Cabe salientar a participação da autora do presente trabalho na pesquisa
Políticas
Públicas e Planos de Urbanismo na escala local intra-urbana: instrumentos e metodologias
de avaliação e acompanhamento”
(ALVIM et al, 2006), a qual contribuiu para o
entendimento e elaboração das questões pertinentes à política urbana no Brasil, sua
conceituação, aplicação e eficiência.
Segundo Alvim et al (Ibidem), o termo
política
pode ser
entendido de diversas maneiras, dependendo de como é
empregado. Na língua inglesa o termo (seu correspondente) pode
ter três significados, conforme explica Silva (op.cit. apud Ibidem):
o termo
policy,
em inglês, significa em português a expressão
política pública
, e quando utilizado no plural políticas, o termo
em inglês correspondente é
policie.
E o termo política, relativo aos
aspectos estruturais e de longa duração da organização política e
social e ao ordenamento jurídico-institucional do Estado também é
o correspondente em inglês do termo
polity.
Além disso, o autor
explica que o termo
política
também é utilizado quando
relacionado à esfera das negociações e disputas entre as forças
sociais ou seja, as disputas e negociações político-partidárias
nas várias instâncias de poder que se travam a respeito das
funções e finalidades do Estado. Quando empregado para estes
fins, contudo, seu correspondente na língua inglesa é o termo
politics
(Ibidem).
Para esse autor, as políticas públicas englobam tanto
políticas de caráter geral, podendo-se citar as políticas de
desenvolvimento, quanto políticas setoriais, por exemplo, as da
área de transporte, educação, segurança, saúde, habitação, entre
outras.
131
ALVIM et al (2006; 2007) destacam que as políticas
urbanas diferenciam-se das políticas públicas mais gerais devido à
sua escala de atuação, uma vez que suas ações provocam efeitos
diretos no território urbanizado, em especial no meio urbano
construído. Ou seja, são políticas que estão relacionadas com a
produção e transformação do ambiente urbano construído,
caracterizando-se assim por serem menos abrangentes do que as
políticas públicas. Incluem, portanto,
as infra-estruturas e
estruturas físicas, equipamentos e serviços urbanos, sua
localização relativa no território e as práticas sociais aos quais se
articulam e das quais não podem ser separadas
(ALVIM et al.,
2007, p. 07).
Percebe-se, com isso, que a política urbana está
diretamente relacionada ao território urbanizado, ou que ainda
está por se urbanizar ou até mesmo a se urbanizar novamente -
re-urbanizar. Isto se dá, principalmente, por meio de intervenções
físico-territoriais.
Apesar de a nova ordem constitucional brasileira destacar a
importância da política urbana na escala local, isto é na escala do
município - a incorporação da mesma encontra dificuldades em
relação
“à incorporação efetiva de perspectivas e processos
planejamento, principalmente em relação ao acompanhamento e à
avaliação de etapas que envolvem a formulação, os resultados e
os meios e instrumentos utilizados
(ALVIM et al., 2006, p. 16).
O plano de urbanismo é o principal instrumento da política
urbana, pois nele inserem-se os meios e instrumentos
operacionais a serem utilizados para se atingir os objetivos
específicos e desejados na política adotada.
Não basta, no entanto, entender o caminho a percorrer
para se consolidar uma política, mas também de se ter
conhecimento dos processos sócio-espaciais sobre os quais os
instrumentos de ação dessas políticas são aplicados. Ou seja, mais
do que adotar políticas, é necessário discutir a eficácia, eficiência
e efetividade
86
das políticas e dos projetos, programas e planos
voltados para a transformação do ambiente urbano construído.
86
Sobre a conceituação dos termos citados utiliza-se a pesquisa de ALVIM et al (2006):
Eficácia
(Effectiveness) -
Grandeza em que se alcança ou se espera alcançar os
objetivos do projeto;
Efetividade - Relação entre o resultado e objetivo, expressa, em geral, ações que
conduzem a resultado concreto, e assumem duas dimensões distintas que variam em
função dos fins perseguidos pelo projeto: a medida do impacto ou o grau de alcance dos
objetivos;
Eficiência (
Efficiency) -
Grandeza em que os recursos/insumos (fundos, tempo, etc.) são
convertidos economicamente em resultados.
132
5.2 A Política Urbana recente no Brasil
A política urbana recente no Brasil é caracterizada pela
promulgação da Constituição Federal de 1988, que pela primeira
vez incluiu um capítulo especifico para a política urbana, definindo
instrumentos para a garantia, no âmbito de cada município, do
direito à cidade, da defesa e da função social da cidade e da
propriedade e da democratização da gestão urbana (artigos 182 e
183). Além disso, propicia aos municípios uma autonomia política
e financeira antes não muito bem definida, questão abordada nos
arts. 29 e 30 da Constituição Federal, como bem explica Compans:
A Constituição Federal, promulgada em 5 de outubro
de 1988, concedeu aos municípios os direitos: à
auto-organização, regendo-se por meio de leis
orgânicas próprias; ao autogoverno, pela eleição do
prefeito, do vice-prefeito e dos vereadores; e à auto-
administração, podendo instituir e arrecadar
tributos, aplicar rendas, legislar sobre assuntos de
interesse local, organizar e prestar serviços, e
promover o ordenamento territorial (COMPANS,
2005, p. 180).
Nesse contexto, ressalta-se o desafio dos municípios
localizados em área de fronteira internacional, principalmente
aqueles que fazem contato direto com outros localizados em
países distintos, ou seja, municípios conurbados
internacionalmente, uma vez que, ao mesmo tempo em que
possuem legislações distintas, apresentam reais dependências
entre si.
A conjuntura internacional marca alterações no espaço
local. A linha demarcatória
87
- Linha Internacional - é o elemento
principal da configuração urbana e a integração entre nações.
Nesse contexto, a integração é dificultada, considerando que cada
município articula-se com as demais instâncias de poder do seu
país.
87
Faixa que separa municípios em fronteira internacional.
133
5.2.1 O Papel do Município na Constituição Federal de
1988
Antes da Constituição Federal de 1988, grande parte das
cidades brasileiras cresciam sem um marco jurídico adequado que
permitisse o controle do processo de desenvolvimento urbano.
Fernandes (2001) explica que a falta de um tratamento adequado
à questão prejudicava os municípios em relação aos instrumentos
legais disponíveis para o controle do desenvolvimento e uso e
ocupação do solo urbano.
A partir da nova ordem constitucional, o município, menor
unidade político-administrativa do Estado brasileiro, passa a ter
competências imprescindíveis na gestão das políticas urbanas. Ou
seja, adquire maior autonomia local
88
, como jurisdições exclusivas
na organização e prestação dos serviços de transportes coletivos,
na educação pré-escolar e ensino fundamental e no ordenamento
territorial (art. 30).
88
Por autonomia política local entende-se a capacidade dos governos municipais de
definirem e instituírem uma agenda política e de políticas públicas própria, mesmo que
minimamente.
Os princípios adotados pela nova Constituição Federal, os
quais mais tarde se consolidariam nas constituições estaduais, leis
orgânicas e planos diretores, são, como explica Compans (op.cit.):
[...] alguns princípios integrantes da agenda
reformista da coalizão de forças políticas que
viabilizara a transição do regime autoritário [...]
Consistiam, basicamente, no restabelecimento da
democracia e do Estado de direito, na
universalização dos direitos sociais e da
redistribuição da renda nacional, e na
descentralização administrativa (Ibidem, 179-180).
A autora explica ainda que a descentralização
administrativa do Estado concedeu ao município brasileiro maior
autonomia política, fiscal e financeira. Nesse caso, os maiores
beneficiados foram os grandes centros urbanos (governos das
cidades), principalmente as capitais, que concentram grande
número de atividades econômicas, população e renda, uma vez
que nelas os governantes
puderam aliar a uma sólida base de
arrecadação de tributos municipais a participação acrescida nos
impostos federais de seus territórios
” (Ibidem, p. 180-181). A esse
respeito Compans explica:
A Constituição Federal estabeleceu que os
municípios podem instituir arrecadar impostos sobre
a propriedade imobiliária, a transmissão “intervivos”
de bens imobiliários e serviços (art. 156), além de
134
taxas, da contribuição de melhoria e do Imposto
Predial e Territorial Urbano progressivo (art. 145).
Os municípios devem ainda receber 50% do produto
da arrecadação do Imposto sobre Propriedade Rural
e do Imposto sobre Propriedade de Veículos
Automotores, e 25% do Imposto sobre Circulação de
Mercadorias e Serviços realizados em seus territórios
(art. 158), além de 22,05% do Imposto de Renda,
de proventos de qualquer natureza e sobre produtos
industrializados, mediante rateio do Fundo de
Participação dos Municípios - art. 159 (Ibidem, p.
181).
Ainda segundo Compans (Ibidem), a autonomia política e
financeira dada aos municípios não os livrou de resolver os
problemas urbanos em conjunto e em áreas conurbadas. Para as
novas competências municipais tornou-se necessário, de acordo
com a autora, uma cooperação intergovernamental. Entretanto,
vários fatores dificultam sua consecução, como a política de ajuste
fiscal do governo federal; o debilitamento financeiro dos estados,
em face da elevação da divida publica interna; ausência de
governos regionais ou metropolitanos; a falta de capacidade
técnica dos executivos municipais para efetuar convênios, captar
recursos externos; entre outros.
Apesar da autonomia dada aos municípios com a
Constituição Federal, como apontam Negreiros e Santos (2001),
entre 1988 e 2001, em muitas cidades brasileiras a legislação
ainda se dava por meio de códigos de obras e posturas
municipais, os quais muitas vezes não eram atualizados ou, até
mesmo, aplicados. Os municípios que procuravam aplicar a
legislação obrigatória pós Constituição Federal de 1988
enfrentavam algumas dificuldades, como explicam esses autores:
A dificuldade reside, frequentemente, na
complexidade dos diversos instrumentos, na
desarticulação entre estes, e no excesso de
regulação; sem esquecer ainda que muitas dessas
leis possuem um caráter elitista desde sua
formulação (Ibidem, p. 133)
Vale ressaltar que o processo de autonomia dos municípios
teve início na Constituição de 1946, apesar de as Leis Orgânicas
Municipais continuarem como prerrogativa dos estados federados
(o que será modificado pela Constituição de 1988). Como explica
Márcio Antonio Cataia:
Pela primeira vez o município passa ser um ente
federativo, prefeitos e vereadores passam a ser
eleitos pelo povo e são fixadas com clareza as
atribuições municipais, fato essencial à autonomia.
Certas limitações foram impostas a alguns
municípios pela Constituição de 1946. A Carta previa
que prefeitos de capitais e de estâncias
hidrominerais poderiam ser nomeados. os
prefeitos de municípios com base ou porto militar de
importância para a defesa nacional (dezoito
135
municípios foram considerados como de importância
para a defesa externa, sendo nove em capitais de
Estado) seriam nomeados (CATAIA, 2006, p. 04).
5.2.2 Política Urbana Recente: a Constituição Federal, o
Estatuto da Cidade e o papel do Plano Diretor
A importância das relações entre política e
desenvolvimento urbano tem sido abordada por diversos autores,
onde, conforme Alvim et al (2006), o papel da ação pública local
no processo de modernização e desenvolvimento da sociedade e
da economia local ganha amplitude em tempos de globalização.
Com o desenvolvimento das cidades, principalmente com a
urbanização intensiva, a necessidade de políticas públicas de
habitação, transporte, saneamento básico, educação, saúde, entre
outras, aumentam substancialmente, emergindo, nos anos de
1980, a questão da participação popular e o processo de
redemocratização no Brasil. É nesse contexto que o tema da
Reforma Urbana é retomado, abrangendo questões como
urbanização de favelas, regularização fundiária, transporte
público, etc.
A partir da década de 1970 os movimentos populacionais,
inicialmente apenas reivindicativos, aumentaram e se
fortaleceram. Os interesses populares, apresentados inicialmente
em 1963 no Primeiro Seminário de Habitação e Reforma Urbana
89
em Petrópolis e abafados pela ditadura, foram retomados.
Segundo Maria Lucia Refinetti Martins
esses movimentos
cresceram e se articularam nos anos 1980, apresentando
propostas próprias e cobrando do Estado reconhecimento e
abertura da esfera pública para sua participação
(MARTINS, op.
cit., p. 22).
O Movimento Nacional pela Reforma Urbana – MNRU
90
surge em um período marcado de lutas e conquistas sociais no
Brasil, que impulsionaram os marcos institucionais de regulação
urbana, hoje vigentes na Constituição Federal.
O MNRU, em parceria com a Comissão de Desenvolvimento
Urbano e Interior da Câmara de Deputados, incentivou a
89
O movimento da reforma urbana foi iniciado no período de João Goulart e interrompido
pelo regime militar.
90
Este movimento encaminhou “à Assembléia Constituinte uma emenda popular da
reforma urbana contendo assinatura de 130.000 eleitores” (SOUZA; RODRIGUES, 2004
apud ALVIM et al 2006, p. 73).
136
realização anual de Congressos das Cidades
91
. Foi encaminhada ao
Congresso Nacional uma Emenda Popular à Constituição com 160
mil assinaturas, contendo reivindicações em relação à propriedade
e gestão urbanas, habitação e transporte, uma vez que a questão
urbana tinha pouca consideração na agenda política nacional.
Consolidava-se assim o Movimento Nacional pela Reforma Urbana.
Os artigos 182 e 183 da Constituição Federal é o resultado
da luta desses movimentos, na qual a função social da
propriedade e da cidade é o foco central.
A regulamentação desses dois artigos e da Política
Urbana de um modo geral tardou, no entanto, treze
anos de persistência, mobilização e negociações, até
a aprovação, em 2001, do Estatuto da Cidade Lei
Federal n° 10.257/2001 (Ibidem, p. 22).
A Constituição Brasileira, promulgada em 5 de outubro de
1988, é, segundo Martins (Ibidem, p. 23)
a Lei Maior que
estabelece direitos e deveres dos cidadãos, o Regime de Governo
e a forma de exercício do Poder
”. Ela determina a elaboração das
constituições estaduais, leis orgânicas municipais e planos
91
De acordo com Martins (2006, p. 28) “a partir daí foram promovidas durante o ano de
2003, [...] quase três mil Conferencias Municipais, Conferencias Estaduais, e finalmente a
Conferencia Nacional das Cidades, em Brasília, que elegeu o Conselho Nacional das
Cidades”.
diretores das cidades. Ou seja,
define a organização dos poderes
no país, bem como as atribuições e os recursos do governo nas
suas diferentes instâncias
” (loc. cit.).
Vale ressaltar, a esse respeito, sobre o processo histórico
da legislação brasileira no âmbito da política urbana até chegar à
atual ordem constitucional – Constituição Federal de 1988.
No início do século XX a legislação urbana brasileira era
baseada nos Códigos de Posturas de origem colonial, substituído
posteriormente por Códigos de Obras e por Leis de Zoneamento
Urbano. Destacam-se duas legislações que imperavam: o Código
Civil de 1916 (visão individualista) e a Constituição Federal de
1934 (que introduziu o principio da função social da propriedade),
contextualizadas por Edésio Fernandes:
[...] o crescimento urbano se deu sob inúmeras
controvérsias jurídicas acerca da possibilidade de
intervenção estatal no domínio dos direitos
individuais de propriedade e, especialmente, quanto
à competência dos municípios para agir em matérias
urbanísticas e ambientais, que, na visão
dominante, somente uma lei federal poderia
regulamentar os direitos de propriedade privada
diferentemente do Código Civil (op. cit., p. 20-21).
É certo que o processo constituinte trilhou novos rumos
para a gestão urbana no Brasil. Jupira Gomes de Mendonça
137
explica que a preservação dos princípios da descentralização e da
autonomia dos municípios, estabelecidos pela nova ordem
constitucional,
deve ser pautada pelo princípio da coordenação e
da articulação central
” (MENDONÇA, 2001, p.161). Por isso a
necessidade de uma lei federal que garanta aos municípios (nível
local) o cumprimento da função social da propriedade e
conseqüente eliminação das desigualdades sócio-espaciais.
O princípio da
função social da propriedade urbana
,
reforçado na Constituição Federal de 1988
92
, separa o direito da
propriedade do direito de construir. Segundo Mendonça (Ibidem)
a nova ordem constitucional traz a figura da terra ociosa ou
subutilizada e a possibilidade da intervenção pública com objetivos
de garantir o cumprimento de sua função social.
Tal princípio, de acordo com Quinto Junior (2003) é
considerado o fator fundamental para a
determinação dos direitos de propriedade imobiliária
urbana e da ação do Estado na condução do
processo de desenvolvimento urbano e da garantia
do acesso à habitação digna para os moradores.
92
Constituição Federal de 1988, artigo 182, § 4°: “a propriedade urbana cumpre sua
função social quando atende às exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas
no Plano Diretor”.
Nesse sentido, reafirma-se a importância do Estatuto da
Cidade, uma vez que define diretrizes e mecanismos que auxiliam
no exercício de autonomia dos municípios brasileiros buscando
propiciar uma sociedade mais igualitária. De acordo com o artigo
primeiro, o Estatuto
“estabelece normas de ordem pública e
interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol
do bem coletivo, da segurança e do bem estar dos cidadãos, bem
como do equilíbrio ambiental”
(BRASIL, 2005, p. 258).
O Estatuto da Cidade baliza o novo quadro institucional da
Política Urbana Brasileira, uma vez que além de valorizar o
processo de planejamento urbano na ação pública, reconhece a
importância da cidade na articulação dos processos de
desenvolvimento econômico e social (ALVIM et al., 2007).
Defendendo que esta lei federal é um marco referencial para uma
Política Urbana
93
, Maria Lucia Refinetti Martins destaca também
que o mesmo
atribui papel de maior relevância ao município,
esfera de poder mais afeta à cidade [...] É o município o ente
federativo onde primordialmente pode se expressar o Direito à
Cidade
” (MARTINS, op.cit., p. 23).
Parafraseando Maria Lucia Refinetti Martins:
93
De acordo com texto do Estatuto da Cidade, artigo 2°, a Política Urbana tem por objetivo
ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana.
138
Assim, compreender o Estatuto da Cidade vai além
de conhecer o que ele regula enquanto Direitos e os
instrumentos que apresenta, mas inclui também
considerar o que pode ser implementado a partir de
suas disposições enquanto Política Urbana para o
conjunto do país e para cada cidade em sua
especificidade, de modo participativo e
descentralizado (Ibidem, p. 28).
Segundo Alvim et al. (2007)
o enquadramento do
planejamento urbano brasileiro, instituído pelo Estatuto da Cidade,
aponta para a superação das práticas patrimonialistas e
clientelistas
”. Os autores explicam que essas práticas:
[...] reforçam a produção de condições urbanas de
concentração social e espacial de serviços e
benefícios, combinada à generalização de
assentamentos precários onde se abriga a população
de mais baixas rendas (Ibidem, p. 14).
Pode-se dizer que, por meio da elaboração de políticas
urbanas adequadas, os instrumentos do Estatuto da Cidade
deveriam fornecer melhoria na qualidade de vida de seus
habitantes.
É inegável, contudo, que o principal instrumento de política
urbana exigido no Estatuto da Cidade é o Plano Diretor. Sobre sua
importância, Negreiros e Santos explicam (op.cit., p. 132):
O Plano Diretor ficou definido como instrumento
básico da política de desenvolvimento e expansão
urbana, tornando-se obrigatório para cidades com
mais de 20.000 habitantes, e devendo fixar diretrizes
gerais a serem executadas pelo poder municipal,
com o objetivo de ordenar o pleno desenvolvimento
das funções sociais da cidade e garantir o bem estar
de seus habitantes (Constituição Federal de 1988:
artigo 185).
Elaborado com a participação dos diferentes setores da
sociedade, o Plano Diretor, conforme exigência do Estatuto é
obrigação para todos os municípios com mais de 20 mil
habitantes, para aqueles localizados em regiões metropolitanas e
aqueles considerados aglomerados urbanos deverão, até o ano de
2006. Para garantir sucesso nos resultados dos instrumentos é
importante avaliá-los em relação a seus conceitos, finalidades e
objetivos.
Aprovado treze anos após a Constituição, o Estatuto da
Cidade contém diversos instrumentos e diretrizes que podem ser
utilizados pelos municípios desde que orientados pelo Plano
Diretor. Sobre seus instrumentos Alvim et al. (2007) explicam:
Os instrumentos do Estatuto da Cidade podem ser
caracterizados como de indução do desenvolvimento
urbano, de regularização fundiária, de financiamento
das políticas urbanas e de democratização da gestão
das cidades. Ou seja, a implementação desses
instrumentos sugere a transformação da ordem
139
urbanística tradicional e a atuação na lógica
econômica da cidade. (Ibidem, p. 14).
A respeito dos instrumentos urbanísticos desta lei federal,
Martins explica que
podem ser utilizados como indutores de um
desenvolvimento urbano mais justo e sustentável, quanto
simplesmente para gerar recursos orçamentários, reforçando na
cidade desequilíbrio e processos de segregação
” (op.cit., p. 31).
Ou seja, o Plano Diretor passa a englobar temas de
reforma urbana e princípios de justiça social. Os problemas
abordados passam a ser questões de política e não mais de
técnica. Seu conteúdo passa a restringir os aspectos de
competência municipal, e seus instrumentos passam a ser de
caráter urbanístico, tributário e jurídico.
É imprescindível lembrar a importância da participação
popular no processo de elaboração dos Planos Diretores
municipais
94
, de forma a articular diversos setores da sociedade e
instituições público-privadas. Ressalta-se que a participação
popular incorporada no processo de gestão urbana pode contribuir
94
Villaça (2005, p. 50) define a
participação popular
como “o conjunto de pressões que a
população exerce sobre o poder político, por ocasião da tomada de importantes decisões
de interesse coletivo”.
para criação de melhores condições de acesso à terra e à moradia
e para a promoção de políticas sociais e ambientais.
Villaça (2005) constata certa fragilidade no processo de
participação popular. O autor aborda os motivos desta fragilidade
e denomina o problema de
a ilusão da participação popular”.
Caracteriza
população
como sendo grupos e classes sociais, e
explica que estas classes sociais possuem
não poderes
políticos e econômicos muito diferentes, mas também diferentes
métodos de atuação, diferentes canais de acesso ao poder e,
principalmente, [...] diferentes interesses
(Ibidem, p. 50). Para
Villaça, a participação da sociedade civil é ‘ilusória’.
140
5.2.3 As relações complexas das Escalas Local e Regional
nos Municípios de Fronteira
O Brasil é um Estado Federativo
95
, e por isso estabelece
distintas competências aos diferentes níveis de poder. Conforme
ordem constitucional, cada ente federativo
96
(União, Estado
Municípios e Distrito Federal) compete sobre seu território e
dispõe de um orçamento próprio. Entretanto, cada território pode
ter subdivisões ou agregações, segundo organização do governo
97
.
As diferentes instâncias e níveis de poder (executivo,
legislativo e judiciário), embora articulados, determinam diferentes
políticas públicas, programas e ações, uma vez que envolvem
95
“Um estado federativo diferencia-se de um estado unitário na medida da distinção entre
delegação de poder funcional (administrativo) e territorial. A delegação de poder funcional,
característica do estado unitário, implica a utilização de normas uniformes em todo o país.
a delegação de poder territorial característica do estado federativo, não contempla essa
uniformidade, uma vez que estabelece distintas competências em termos de receitas e
encargos – ela se aproxima do conceito de descentralização” (MARTINS, 2006, p. 24).
96
Os entes federativos no Brasil são considerados Pessoas Jurídicas de Direito Público
(MARTINS, 2006, p. 24).
97
Martins (2006, p. 26) cita como exemplo dessa situação: Regiões Administrativas (caso
de Sorocaba); Regiões Metropolitanas, formadas pela conurbação de grandes áreas (caso
de São Paulo, Santos e Campinas); ou um grupo de Estados que constitui uma Região
(Região Nordeste, por exemplo).
múltiplos interesses e atores sociais
98
. O conjunto de pertinências
e funções a que correspondem obedecem às determinações da
Carta Constitucional e conseqüente legislação, ou seja, estão
articuladas a processos mais amplos de organização e mutação
das formações sociais.
Os níveis institucionais são estabelecidos de acordo com a
história das diferentes formações sociais, do local ao regional,
supra-locais e sub-nacionais. Segundo Alvim et al (2006, p. 26) o
nível local corresponde às questões que envolvem o município; os
supra-locais
“constituem-se basicamente em torno de interesses
ou questões comuns em função da contigüidade ou proximidade
geográfica
e os sub-nacionais correspondem a
agrupamentos
geográficos e populacionais mais ou menos extensos, com
características políticas, econômicas, culturais e sociais comuns
”.
Esses agrupamentos se diferenciam de outros de mesmo nível ou
similar no interior do território federativo.
Nesse contexto, Friedmann, 1992 (apud MENDONÇA,
op.cit.) coloca que a escala local é o nível preferencial para a
98
Alvim et. Al (2006, p. 27) explicam que “o conjunto das políticas públicas definido nessas
instâncias terá objetivos diferenciados obedecendo, de um lado, à extensão territorial e à
totalidade da população que abarca organizada e articulada segundo diferentes classes,
agrupamentos, atividades e interesses e de outro, a objetivos estratégicos das forças
sociais e econômicas articuladas na coalizão ou partido político que detém o poder de
Estado”.
141
atividade do planejamento, uma vez que nela existem maiores
possibilidades de experimentação social e reanimação das práticas
democráticas. Para ele, a especificidade do lugar guiará o
processo de planejamento. E acrescenta que, para qualquer escala
de planejamento é de extrema importância a
participação da
população afetada e o aprendizado mútuo entre o ‘expert’ e o
cidadão comum
” (Ibidem, p. 159).
Apesar de na escala local a participação popular ser muito
mais concreta e viável, Mendonça (2001) explica que a escala de
planejamento não determina o grau de democracia possível. A
respeito dos princípios básicos da democracia, autonomia
municipal e descentralização, essa autora elucida que “
devem
estar organicamente vinculados a um processo de coordenação e
articulação central, que garanta princípios distributivos e o
interesse coletivo
” (Ibidem, p. 160).
Como a partir da Constituição de 1988 os municípios
passaram a ter maior autonomia, geraram-se tensões entre os
níveis local e regional. Para explicar essa situação, Martins coloca
que [...] “
as Leis Orgânicas Municipais passaram a ser atribuição e
responsabilidade de cada Município. Até então cada Estado
dispunha de uma única Lei Orgânica (estadual) para todos os
Municípios
” (MARTINS, op.cit., p. 25).
Quando se trata de municípios conurbados, o
planejamento regional é fundamental e a escala regional deve ser
considerada. Entretanto, no Brasil, a Constituição Federal de 1988
não institui o ente regional, deleganso aos Estados o poder de
instituir unidades regionais: regiões metropolitanas, aglomerações
urbanas; microrregiões, constituídas por municípios limítrofes,
para integrar a organização, o planejamento e execução de
funções publicas de interesses comuns (BRASIL, 2002 - Cap. III,
art. 25, § 3º).
Constata-se, contudo, que a articulação de políticas
públicas entre níveis de governo distintos é bastante complexa e
muitas vezes frágil, uma vez que suas competências são
concorrentes, exigindo processo de negociação contínua. Ou seja,
não existe uma unidade regional instituída a partir do nível
federal, a organização desses territórios depende das constituições
estaduais, de suas respectivas legislações específicas, bem como
da instituição de processo negociado entre Estado e município. O
local é bastante valorizado, devido à autonomia que assumem os
municípios e questões relacionadas aos problemas comuns deixam
de ser devidamente tratadas, entre elas o uso e ocupação do solo,
o transporte intermunicipal, o saneamento básico e o meio
ambiente.
142
Sendo assim, o planejamento e a gestão de municípios
conurbados situados em fronteira internacional é ainda mais
complexo, que a imposição de limites político-administrativos
depende, além dos níveis locais, de acordos que envolvam esferas
nacionais, independentemente das relações vivenciadas pelas
sociedades em questão. Ou seja, não se trata apenas de instituir
uma organização regional em que o estado tenha o pleno poder.
Trata-se de uma região de caráter internacional em que os limites
político–administrativos são distintos e as políticas comuns a
serem planejadas e executadas dependem de acordos que vão
além da negociação Estado-município, e envolvam as esferas
nacionais dos dois lados, independentemente das relações
cotidianas das localidades afetadas.
Nesse sentido, como as regiões fronteiriças (ou
transfronteiriças) ainda não contam com legislação específica nem
com projetos de estímulo realmente orientados para elas, como
bem explica Steiman (2002, p. 13), as ações partindo dos
governos nacionais (que atuam no âmbito supranacional) sobre
essas áreas, acabam descaracterizando a interação tão desejada
no nível local.
Pode-se concluir que, como a legislação de um município
situado em região fronteiriça não considera as leis e políticas do
lado vizinho, a cooperação transfronteiriça é dificultada. Para se
ter ações efetivas na faixa de fronteira, não se podem descartar
as características intrínsecas dos municípios envolvidos. Segundo
Steiman (Ibidem), tais características são, entre outras: a conexão
política direta com o nível federal; a situação incerta da
propriedade da terra; a conexão econômica direta com o nível
internacional; a heterogeneidade etno-cultural; a presença e a
atuação de instituições governamentais e não governamentais em
outras escalas que não a do poder executivo federal; e a
importância de atividades da economia informal, lícita ou ilícita, na
geração de renda da população.
Ou seja, embora os municípios brasileiros que se situam
em áreas de fronteira possuem características distintas, no âmbito
da organização de sua unidade municipal, eles são conduzidos
pela mesma legislação federal que rege tantos outros municípios
situados em outras localidades. De modo geral, possuem
características relacionadas principalmente ao porte que os
obrigam a ter o instrumento de desenvolvimento urbano – o Plano
Diretor sem necessariamente levar em consideração a
proximidade, e muitas vezes a interdependência, com municípios
situados em outros países.
143
5.3 A Política Urbana de Ponta Porã pós 1988
Ponta Porã passou por um período de grande estagnação
com relação à sua política urbana, uma vez que muitos anos
não se tinha no município qualquer instrumento pertinente ao
assunto.
Na década de 1990 o município ganhou um regulador
visando melhorias ao desenvolvimento urbano, o Código de Obras
Lei n. 2890. Elaborado em 1993, no governo do prefeito Oscar
Goldoni (1993 - 1994)
99
. De acordo com o art. 1°, seu objetivo é
regular os projetos, os novos empreendimentos e as reformas dos
edifícios existentes nos municípios, observando padrões de
higiene, conforto, segurança e salubridade.
Até a data de sua elaboração as construções do município
não seguiam qualquer legislação, ficando livres questões
importantes como aprovação de projetos e licenciamento de
construções. Entretanto, mesmo depois de sua aprovação, apesar
das exigências impostas no Código, nem sempre suas disposições
são seguidas. Conhecida como a “cidade sem lei”, Ponta Porã
tinha suas obras públicas e privadas construídas e reformadas
99
O prefeito deveria permanecer no cargo até o ano de 1996, mas renunciou para se
candidatar à Deputado Federal.
– sem um acompanhamento legal, que realmente punisse seu não
cumprimento.
A esse respeito, espera-se que com a elaboração do Plano
Diretor Participativo se tenha o cumprimento da Lei de Uso e
Ocupação do Solo no município – exigida no texto do Plano,
porém até o momento não finalizada
100
.
Importante ressaltar no contexto de legislações do
município, a existência da Lei Orgânica Municipal de Ponta Porã,
exigência do artigo 29 da Constituição Federal, a qual objetiva,
segundo o texto da própria Lei
101
:
[...] garantir a dignidade do ser humano e o pleno
exercício dos seus direitos; para reafirmar os valores
da liberdade, da igualdade e da fraternidade; para
consolidar o sistema representativo, republicano e
democrático; para ratificar os direitos do Estado no
contexto da Federação; para assegurar a autonomia
municipal e o acesso à educação, à saúde e à
cultura; e para promover um desenvolvimento
econômico subordinado aos interesses humanos,
visando a justiça social para o estabelecimento
definitivo da democracia (PONTA PORÃ, 1997, p. 1).
100
A elaboração da Lei de Uso e Ocupação do Solo será abordada no item 5.3.3 deste
capítulo.
101
O texto da Lei Orgânica do município de Ponta Porã foi elaborado em 1990 e revisado
em 1997.
144
A partir do art. 133 da Lei Orgânica do Município de Ponta
Porã e da exigência da Constituição Federal de 1988
102
, foi
elaborado o Plano Plurianual da Prefeitura Municipal de Ponta Porã
(PPA), Lei 3456 de 25 de novembro de 2005, para o quadriênio
2006 a 2009, na administração do prefeito Flávio Kayatt (2004-
2008).
O Plano Plurianual consiste em um instrumento de
planejamento que determina objetivos, metas e diretrizes que a
Administração Municipal deve seguir visando o desenvolvimento
do Município. De acordo com o art. do PPA ficam definidas as
seguintes diretrizes estratégicas para o município:
I - Cidade para Todos - para que o cidadão tenha acesso aos bens
e serviços públicos básicos, à moradia, à participação nas
discussões das políticas públicas e ao controle social das ações da
Administração Municipal;
II - Cidade do Trabalho - com atuação direta da Administração
Municipal em ações geradoras de emprego e renda, capacitação
tecnológica e fomento às atividades produtivas empresariais,
102
“A lei que instituir o plano plurianual estabelecerá, de forma regionalizada, as
diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de
capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração
continuada” ( Constituição Federal de 1988, art. 165, § 1º)
promovendo a sua inserção no contexto econômico, regional,
nacional e internacional;
III - Cidade Saudável - visando a integração e sistematização dos
programas, projetos e ações destinados ao bem-estar social e
elevação da qualidade de vida dos cidadãos pontaporanenses.
Para cada diretriz do PPA, diversos programas são
detalhados. Dentro da diretriz “Cidade para Todos” encontram-se
os programas:
Política urbana;
Construção, reforma, ampliação e manutenção de áreas
verdes e de lazer e convenções;
Ampliação do sistema de iluminação pública;
Urbanização de fundos de vale;
Melhorias na infra-estrutura rural;
Construção, pavimentação e manutenção de vias públicas;
Desvio do fluxo de caminhões pesados do perímetro
urbano; melhoria do trânsito;
Modernização do sistema de transporte coletivo;
Entre outros.
145
No âmbito da diretriz “Cidade do Trabalho” têm-se os
programas:
Desenvolvimento rural;
Desenvolvimento econômico;
Educação profissional para trabalhador;
Intermediação de emprego;
Política de meio ambiente;
Elaboração e implementação da cidade industrial.
para a diretriz “Cidade Saudável” verificam-se os
programas:
Educação pré-escolar;
Ensino fundamental;
Cursos de suplência;
Desenvolvimento da cultura;
Desenvolvimento do esporte;
Assistência e programas de saúde;
Atenção à saúde da família;
Assistência odontológica;
Controle de zoonoses;
Vigilância sanitária;
Entre outros.
Em cada programa são descritas as ações e o produto, a
unidade de medida e o total pretendido dentro do período de
2006 a 2009. Para o cumprimento das diretrizes do Plano
Plurianual foi necessário que a administração municipal se
adequasse às novas exigências e demandas. De acordo com texto
do PPA, apenas com o aprimoramento dos meios de informação
será possível seu cumprimento na totalidade e a integração das
ações setoriais administrativas se torna de suma importância
nesse processo.
Ressalta-se que, a partir desse documento, origina-se no
município a intenção de propiciar o pleno desenvolvimento da
cidade por meio da implementação de um conjunto de políticas
públicas, destacando-se principalmente aquelas que se referem às
políticas urbanas na diretriz “Cidade para Todos”. Nesse contexto,
o Plano Diretor é tido como o instrumento que orienta a
formulação do PPA, e visto pela comunidade fronteiriça como
perspectiva de desenvolvimento legal do município.
A seguir, será apresentado o Plano Diretor de Ponta Porã
em seus diversos aspectos: sua concepção etapa que envolve o
processo de elaboração e formulação do documento; o documento
146
em si; e principalmente as questões que envolvem sua condição
de fronteira internacional - sua relação com Pedro Juan Caballero.
5.3.1 O Plano Diretor Participativo de Ponta Porã e o
desafio da incorporação da fronteira
Embora seja um município atípico, pois se localiza em uma
fronteira internacional, Ponta Porã se enquadra no caso de
municípios com mais de 20.000 habitantes, tornando necessária a
elaboração do Plano Diretor, conforme exigência da legislação
federal.
Como colocado, se a operacionalização dos planos urbanos
nas cidades brasileiras de médio e grande porte possui
inúmeras dificuldades, em cidades de fronteira a situação é ainda
mais difícil, uma vez que esta situação peculiar requer cuidados
dobrados (relativos às ambas as cidades) para ser bem sucedido e
as práticas políticas de diferentes países normalmente não são as
mesmas.
Embora a preocupação com a cidade vizinha sempre
esteve presente no processo de elaboração do Plano Diretor de
Ponta Porã, algumas dificuldades foram obstáculos para a inclusão
efetiva de Pedro Juan Caballero. No anteprojeto da lei é explicado
que, por questões institucionais e financeiras, não foi possível a
inclusão do município paraguaio, resultando apenas na assinatura
de um protocolo de cooperação entre o governo municipal de
Ponta Porã e o governo municipal de Pedro Juan Caballero,
assinado em setembro de 2005, onde ficou declarado o interesse
em elaborarem um Plano Diretor transfronteiriço
103
.
Como intenção inicial, o Plano Diretor Participativo do
município brasileiro PDPP pretende propiciar o
desenvolvimento de Ponta Porã e propagar efeitos positivos à sua
vizinha, a cidade paraguaia Pedro Juan Caballero. Cabe ressaltar
que no âmbito do Paraguai existe a exigência da Lei Orgânica e de
um Plano Diretor, nesse caso chamado de Plano Regulador.
Entretanto, Pedro Juan Caballero possui apenas a Lei Orgânica -
Ley Orgánica Municipal
1294/87 sendo que o Plano
Regulador do município nunca foi elaborado.
Importante ressaltar que, apesar do município de Ponta
Porã ainda não ter conseguido implantar um Plano Diretor
conjunto com a cidade vizinha, a Lei de Uso e Ocupação do Solo
103
O Protocolo de Intenções assinado nesta ocasião pode ser visualizado no Anexo I desta
pesquisa.
147
prevista como importante instrumento do Plano Diretor, em fase
de elaboração na ocasião da pesquisa, iria prever, segundo
entrevista com técnicos da prefeitura municipal, alguns
instrumentos que buscam superar os conflitos observados em
relação às barreiras e limites do território. Nesse caso, ressalta-se
a intenção de elaboração de um projeto de revitalização da Linha
de Fronteira, bem como de um projeto de ordenamento para a
área do exército da cidade brasileira.
Concomitante à elaboração do Plano Diretor Participativo,
foi desenvolvida em Ponta Porã a
Estratégia de Apoio a Gestão
Ambiental Urbana”
, com apoio do PNUMA - Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente
104
- e UN-HABITAT - Programa das
Nações Unidas para os Assentamentos Humanos
105
- por iniciativa
do Governo Federal, envolvendo uma cooperação interministerial
Ministério da Integração, do Ministério do Meio Ambiente e
104
“O PNUMA, estabelecido em 1972, é a agência do Sistema ONU responsável por
catalisar a ação internacional e nacional para a proteção do meio ambiente no contexto do
desenvolvimento sustentável. Seu mandato é prover liderança e encorajar parcerias no
cuidado ao ambiente, inspirando, informando e capacitando nações e povos a aumentar
sua qualidade de vida sem comprometer a das futuras gerações”. Informações disponíveis
no Portal das Nações Unidas no Brasil: <http://www.onu-
brasil.org.br/agencias_pnuma.php>. Acesso em 18 mai. 2008.
105
“UN-Habitat é a agência da ONU responsável por promover o desenvolvimento social e
ambientalmente sustentável dos assentamentos humanos, tendo como meta principal
assegurar moradia adequada para todos”. Informações do Portal do Observatório das
Metrópoles, Disponível em:
<http://web.observatoriodasmetropoles.net/index.php?option=com_content&view=article&
id=150>. Acesso em 18 mai. 2008.
Ministério das Cidades. Esta estratégia tem como objetivo integrar
diferentes metodologias voltadas ao planejamento e gestão
ambiental urbana, onde se enquadram o Relatório GEO Cidades
106
e a Avaliação da Vulnerabilidade Ambiental AVA - que geraram
um Plano de Ações Prioritárias e um portifólio de projetos
107
.
Nesse contexto, gestões do Ministério da Integração foram
realizadas destinando recursos do governo federal para a inclusão
de Pedro Juan Caballero nos três projetos integrados - Plano
Diretor Participativo, Relatório GEO Cidades e Avaliação de
Vulnerabilidade Ambiental - por meio do programa interministerial
de fronteira
108
, o que, entretanto, não ocorreu.
No âmbito de Ponta Porã, os instrumentos foram
desenvolvidos de forma articulada, sendo que o Plano Diretor foi o
“carro-chefe”, uma vez que seria o único a ser transformado em
Lei. O processo de elaboração dos três programas, por sua vez,
teve igual importância, tanto que as reuniões de apresentação
106
O GEO Cidades consiste em uma parte do projeto GEO -
Global Environment Outlook
, o
qual é um projeto que teve início em 1995 pelo Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (PNUMA) para avaliar o estado do meio ambiente nos níveis global, regional e
nacional. O objetivo do GEO Cidades é produzir relatórios de avaliação do meio ambiente
de cidades na América Latina e Caribe.
107
Apesar de estes documentos serem importantes para a questão, esta dissertação se
restringe à análise do Plano Diretor Participativo, uma vez que se constitui em um
documento essencial para o desenvolvimento urbano do município.
108
Ressalta-se a tentativa do Ministério da Integração Nacional em sensibilizar a Itaipu bi-
nacional a financiar a parte paraguaia.
148
para a sociedade e reuniões comunitárias eram realizadas
simultaneamente.
O objetivo do Geo Cidades em Ponta Porã foi analisar a
dinâmica urbana e a situação do meio ambiente do município. No
relatório apresentado à população, constam alguns aspectos
levantados durante o processo de trabalho. Dentre eles destacam-
se as diferenças de classes sociais em um mesmo bairro; presença
de vazios urbanos; problemas no abastecimento de água;
ausência de políticas para recuperação do patrimônio histórico do
município.
A Avaliação da Vulnerabilidade Ambiental AVA, por sua
vez, trata de aspectos gerais do Meio Ambiente local
109
. Por meio
da participação da comunidade, reuniões técnico-comunitárias,
mapeamento das áreas, relatórios de avaliação e mapeamento
com diagnósticos, o programa teve como principais objetivos
construir a avaliação das ações ambientais do município de Ponta
Porã, e contribuir na elaboração de cartas geotécnicas para
109
Destaca-se que até a presente gestão o Município de Ponta Porã, não havia
desenvolvido políticas efetivas voltadas ao meio ambiente, apesar da existência de um
conjunto de leis aprovadas voltadas às questões ambientais. Em 2005 houve um avanço
nesta questão, confirmado com a criação da primeira unidade de conservação cadastrada
no CEUC - Cadastro Estadual de Unidades de Conservação. Trata-se da área de Proteção
Ambiental dos Mananciais Transfronteiriços de abastecimento público da Cabeceira do Apa,
bacia do Alto Paraguai. Segundo informações do relatório do GEO e AVA a criação de uma
segunda unidade de conservação - nos mananciais do Rio Amambay, na Bacia do Paraná –
está sendo estudada.
subsidiar o Plano Diretor Participativo. Por meio da apresentação
de slides do ciclo urbano tratando de temas como
desmatamento e ciclo hidrológico, cobertura vegetal e rolagem da
água, rede de drenagem, rios com mata ciliares, entre outros
foram apresentados os problemas detectados pela equipe
responsável, onde se pode destacar: poluição, matas ciliares
reduzidas ao mínimo, invasões em fundo de vales, carvoarias e
olarias.
Ressalta-se que, segundo os documentos, Pedro Juan
Caballero não foi incorporado em suas análises por falta de dados
consistentes sobre esse município.
Pode-se concluir que esses programas foram importantes
para a retomada do interesse da população de Ponta Porã sobre a
questão ambiental do município. Instituições de ensino, vários
segmentos da sociedade e até a população rural se sensibilizaram
em ajudar nos levantamentos, contribuindo para que esses
programas se tornem instrumentos de suma importância,
subsidiando o processo de planejamento municipal.
149
5.3.2 A Concepção do Plano Diretor Participativo e a
Fronteira
A concepção do Plano Diretor Participativo envolveu, além
da formalização do documento em si, o processo de elaboração.
Esse processo, considerado fundamental para a legitimidade do
instrumento, envolveu, além da população pontaporanense,
membros da sociedade civil de Pedro Juan Caballero.
Os primeiros contatos para a elaboração do Plano Diretor
de Ponta Porã, liderados pela Secretaria de Obras e Infra-
Estrutura do município
110
, foram realizados no ano de 2003,
envolvendo reuniões com a Intendência de Pedro Juan Caballero,
com instituições de ensino superior de ambas as cidades,
representantes das cidades - também gêmeas - Bela Vista (BR) e
Bella Vista Norte (PY) e com professores da Universidade Federal
de Mato Grosso do Sul.
110
O Plano Diretor Participativo de Ponta Porã foi coordenado pelo Secretário de Obras e
Infra-Estrutura, Hélio Peluffo Filho. Importante destacar também a equipe de consultoria e
acessoria: Tito Carlos Machado de Oliveira (sócio-técnico local), Sergio Seiko Yonamine e
Karin F. Schwambach, que iniciou o processo como estagiária, juntamente com Isabella B.
Lolli Ghetti, Regazzone F. Rodrigues e Theo Andreoli Corrêa. Armando L. Matoso, Dionete
M. Lima, Elaine C. Teixeira, Ernestina M. Lima, João Alberto Caimare, João Manoel C. Braz,
Nilson M. Peixoto, Osmar de Mattos, Ramão A. Jasis, Roberto W. Steil, Wandi M. F. Tirelli,
formaram a equipe técnica local.
Em 2004, com a mudança de gestão da prefeitura, houve
uma paralisação das discussões, sendo retomadas apenas em
2005. Nesta fase, era necessária a viabilização de recursos
financeiros para a montagem da equipe de elaboração. Como o
Plano Diretor foi desenvolvido concomitantemente ao GEO
Cidades e à AVA, foram montadas simultaneamente as equipes
técnicas para cada um dos programas.
Em julho do mesmo ano houve a apresentação da intenção
de elaboração do Plano Diretor para toda a sociedade fronteiriça.
Em agosto um treinamento oferecido pelo Ministério das Cidades,
Ministério do Meio Ambiente e UN-HABITAT foi realizado para a
capacitação dos membros da equipe técnica para a elaboração do
Plano. Na ocasião, alguns membros da comunidade de ambas as
cidades, que tinham interesse no processo, também tiveram a
oportunidade de participar do treinamento.
Em seguida, no mesmo ano, montou-se a Equipe
Ampliada, na qual representantes de diversos segmentos da
sociedade se pronunciaram para fazer parte, não havendo,
portanto, votação. Representantes de Pedro Juan Caballero
também participaram, com direito à opinião, mas sem direito à
voto.
150
A primeira decisão tomada pela equipe do Plano Diretor
para a realização da consulta à comunidade foi a divisão do
município em cinco regiões urbanas: Setor Vilela, Setor Ipê, Setor
Centro, Setor Aeroporto e Setor Marambaia, que podem ser
visualizados na figura 27. A partir de então, foram realizadas as
reuniões comunitárias separadas por esses setores.
151
Figura 27 – Divisão de Bairros e Setores proposta pelo Plano Diretor
Fonte: Prefeitura Municipal de Ponta Porã.
152
No total, foram feitas 26 reuniões, entre elas as realizadas
no Assentamento Itamaraty
111
, Salão Paroquial, Associação
Comercial, Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul,
Aeroporto, Sindicato Rural, Shopping Mercosul local que envolve
diretas relações transfronteiriças, diversos bairros da cidade e o
distrito de Sanga Puitã. Nestas reuniões, a partir do treinamento
do Ministério das Cidades, a equipe técnica realizou dinâmicas de
grupo onde os participantes relatavam os problemas e
potencialidades de seus bairros, de forma a contribuir para a
elaboração do Plano
112
, proporcionando uma ampla leitura do
município, tanto do ambiente urbano, quanto rural.
Vale ressaltar que a questão da fronteira mais
precisamente da Linha Internacional foi constante em quase
todas as reuniões comunitárias, entre elas discutiu-se também a
segurança, prostituição infantil, contrabando de mercadorias, o
comércio informal, enfim, a degradação daquele espaço,
considerado o centro comercial de ambas as cidades. Sintetiza-se
a seguir aspectos relevantes discutidos na reunião diretamente
111
O município de Ponta Porã possui seis assentamentos - com aproximadamente 9.600
habitantes no total. São eles: Itamaraty I - com 1.147 famílias, Itamaraty II - com 2.600
famílias, Corona - com 58 famílias, Dorcelina Folador - com 270 famílias, Boa Vista - com
70 famílias e Nova Era - com 97 famílias.
112
Nas reuniões comunitárias foi aplicado o Jogo do Direito à Cidade, difundido no
treinamento pelo Ministério das Cidades, com devidas adaptações.
voltada aos envolvidos com a Linha da Fronteira - os comerciantes
e trabalhadores do Shopping Mercosul
113
. Nesta ocasião, os
comerciantes foram questionados sobre os problemas existentes
naquela área e tiveram a oportunidade de fazer reivindicações a
serem consideradas no Plano Diretor. Dentre os problemas
levantados pelos comerciantes destacam-se: a prostituição
infantil; violência; contrabando de drogas e mercadorias e
ausência de legislação específica para a área. Sobre as
reivindicações feitas pelos envolvidos é importante ressaltar a
necessidade de uma audiência pública com autoridades de Ponta
Porã para resolver questões da Linha Internacional; a criação de
uma comissão dos comerciantes locais; a apresentação de Pedro
Juan Caballero como um destino turístico, em especial para o
turismo de compras; e um projeto de revitalização da Linha
Após um ano de trabalho, a Lei Complementar do Plano
Diretor, quase finalizada, foi revisada pela Secretaria Municipal de
Assuntos Jurídicos e apresentada em Audiência Pública em 10 de
junho de 2006 para toda a sociedade da fronteira. Em 6 de
setembro do mesmo ano a Lei foi votada na Câmara Municipal de
Vereadores, a qual promoveu, no dia 27 do mesmo mês, uma
113
Ressalta-se que nesta ocasião estiveram presentes o presidente da Associação dos
Casilleros
de Pedro Juan Caballero, o presidente da Comissão de Limites e a diretora do
Shopping Mercosul, além de vários proprietários de comércio informal tanto do lado
brasileiro quanto paraguaio.
153
Audiência Pública para apresentar à sociedade as emendas que
julgaram necessárias. A Lei Complementar do Plano Diretor foi
votada e aprovada no dia 29 de outubro, como Lei Complementar
nº. 031/2006, e em seguida encaminhada para o Ministério das
Cidades.
5.3.2.1 A estrutura formal do documento
Não é o objetivo aqui apresentar todo o Plano Diretor do
município, e sim, ressaltar os aspectos que envolvem a condição
de conurbação com a cidade paraguaia Pedro Juan Caballero.
Sendo assim, nesse item serão abordados aspectos gerais do
plano, instrumentos previstos e os que foram implantados
desde a aprovação da Lei, bem como o sistema de planejamento
previsto.
Conforme exposto, o Plano Diretor de Ponta Porã é o
instrumento básico para a efetiva implementação de sua política
de desenvolvimento urbano e tem como objetivos gerais,
conforme o texto da Lei:
[...] a fixação dos termos e condições para
cumprimento da função social da cidade e da
propriedade, e garantir o bem estar de seus
habitantes, nos termos do artigo 182 da Constituição
Federal e do artigo [...] do Estatuto da Cidade, e
a definição das diretrizes gerais para a Política de
Desenvolvimento Local Sustentável, como
preconizado na Agenda 21 Global, em seu capítulo 7
(PONTA PORÃ, 2006, p. 9)
154
A sua estrutura divide-se em seis títulos, cada qual com
seus respectivos artigos. São eles: Título I - Das disposições
iniciais; Título II - Do Sistema Municipal de Planejamento; Título
III - Da Política Municipal de Desenvolvimento Urbano; Título IV -
Da Política Municipal do Meio Ambiente; Título V - Da Política de
Desenvolvimento Sustentável; Título VI - Do Fundo Municipal de
Desenvolvimento Local Sustentável; Título VII - Das Disposições
Finais.
De acordo com o artigo 2°, o Plano Diretor rege-se pelos
seguintes princípios:
I. Participação da população nos processos de
decisão, planejamento e gestão;
II. Direito à cidade, compreendido este como o direito
à terra urbana e à moradia; ao trabalho; à
circulação e ao transporte; ao lazer:
III. Racionalização do uso do sistema viário e da infra-
estrutura instalada, evitando sua sobrecarga ou
ociosidade, buscando completar suas redes básicas
em todo o município;
IV. Inclusão social, compreendida esta como garantia
de acesso a bens, serviços e políticas sociais a todo
s os munícipes;
V. Consolidação do município de Ponta Porã como
centro regional, de articulação internacional, sede
de atividades produtivas e geradoras de emprego e
renda;
Em relação ao Título I, o artigo prevê a alteração do
perímetro urbano do município, reduzindo o atual. Esse fato
justifica-se pelo grande vazio urbano com características rurais
compreendido no perímetro antigo. A equipe do PDP entende que
a redução do perímetro é uma estratégia fundamental de controle
de expansão urbana, pois junto à mancha urbana atual existem
diversos vazios urbanos passíveis de ocupação. Nas figuras 28 e
29 é possível verificar o perímetro urbano antigo e o novo,
proposto pela Lei
114
.
114
Todas as coordenadas do novo perímetro urbano estão contidas no documento do Plano
Diretor Participativo, página 09.
155
Figura 28 – Perímetro Urbano antes do Plano Diretor
Fonte: Prefeitura Municipal de Ponta Porã.
155
Figura 29 – Perímetro Urbano proposto no Plano Diretor
Fonte: Prefeitura Municipal de Ponta Porã.
156
A Política Municipal de Desenvolvimento Urbano, que
consta no Título III, propõe, além da divisão do município em
bairros e setores
115
, assumida na discussão da elaboração do PDP,
a criação de “categorias territoriais de planejamento”, que
instituem as diretrizes para o zoneamento urbano, a serem
detalhadas na lei complementar de Uso e Ocupação do Solo. As
seguintes zonas foram definidas: Zonas de Adensamento
Prioritário – ZAP; Zonas de Adensamento Secundário – ZAS; Zonas
Empresariais ZEM; Zonas Especiais de Proteção Ambiental
ZEPA; Zonas Especiais de Estruturação Urbana ZEEU; Zonas
Especiais de Interesse Histórico e Cultural ZEIHC; Zonas
Especiais de Economia Solidária ZEES; Corredores de Múltiplo
Uso CMU. O mapa de Plano Urbanístico elaborado pelo Plano
Diretor onde aparecem todas estas categorias territoriais consta
na figura 30.
Ainda sobre esta política é importante destacar que os
coeficientes de aproveitamento (c.a.
básico = 1,0; c.a.mín. = 0,1;
c.a.máx. = 4,0) são fixados igualmente para toda a área urbana (artigos
16, 17 e 18).
115
A divisão do município em Bairros e Setores, segundo texto do documento, confere do
Plano Diretor sua eficácia. Além disso, possibilita a organização de cadastros e bancos de
dados no município, e a elaboração dos orçamentos municipais anuais (artigo 15).
Algumas leis complementares também constam no Plano
Diretor (artigo 21), as quais deveriam ser elaboradas no prazo de
dois anos após a aprovação do Plano. São elas: Lei de Uso e
Ocupação do Solo Urbano; Lei de Parcelamento do Solo Urbano;
Lei de Estudo de Impacto de Vizinhança. Entretanto, apesar dos
trabalhos terem sido iniciados, por falta de recursos, segundo
entrevistas com técnicos da Prefeitura
116
, foram interrompidos e
não finalizados. Não consta na Lei do Plano Diretor, sobretudo,
qual é a efetiva punição para a não elaboração e aprovação das
mesmas.
116
Segundo informações do técnico da Prefeitura Municipal de Ponta Porã, Theo Andreoli
Corrêa, a Lei de Uso e Ocupação do Solo, assim como a Lei de Parcelamento Urbano
estavam sendo elaboradas, porém o processo foi interrompido por falta de verba para
pagamento da equipe de elaboração.
157
Figura 30 – Plano Urbanístico Básico
Fonte: Prefeitura Municipal de Ponta Porã
158
A Política de Desenvolvimento Local Sustentável (Título V)
foi traçada a partir de um Plano de Ações Prioritárias, as quais têm
o prazo de até 2010 para serem cumpridas. Dentre as ações
básicas destacam-se (artigo. 33):
- Implantar programas municipais, supervisionados pelo Conselho
da Cidade, com a participação do setor público, comunidade e
iniciativa privada, com o objetivo de criar a infra-estrutura local
necessária à execução de atividades relacionadas direta ou
indiretamente ao turismo;
- Constituir instrumentos de apoio e incentivo aos micros e
pequenos empreendedores locais;
- Implantar o contorno rodoviário interligando a BR 463 à MS 164
para desviar o tráfego de veículos pesados das vias urbanas
interiores;
- Implantar o projeto de urbanização de fundo de vale dos
córregos Ponta Porã e São João Mirim, com implantação de vias
estruturais, recuperação das áreas de fundo de vale, várzeas e
matas ciliares, reassentamento e regularização fundiária das
famílias de baixa renda e qualificação ambiental;
- Elaborar o zoneamento ecológico-econômico do município;
- Implantar o programa de compras ecologicamente corretas,
priorizando, na forma da lei, na seleção de produtos baseados em
processos produtivos e de cultivo limpos;
- Reduzir o volume de resíduos sólidos urbanos gerados,
promovendo sua reciclagem, e implantar sistema de destinação
final de resíduos sólidos no prazo máximo de três anos;
- Rever o contrato de concessão de água e esgoto em vigor e
definir condições para a universalização dos serviços no prazo
máximo de quatro anos.
Destaca-se, contudo, que para muitas destas ações não
foram definidos os instrumentos para viabilização.
As ações estruturais, por sua vez, possuem um prazo maior
para serem efetivadas – até o ano de 2018 – onde se destacam:
- Elaborar da Agenda 21 da Região do Amambay-Porã, nos termos
da II Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento (Rio-92);
- Promover estudos e fomentar articulações institucionais visando
a criação de roteiros turísticos regionais, especialmente o corredor
turístico Campo Grande – Assuncion, passando por Ponta Porã;
159
- Promover estudos, fomentar articulações institucionais e criar o
portfólio de projetos de desenvolvimento específicos para a região
de fronteira, de influência das duas cidades;
- Implantar o Sistema Municipal de Unidades de Conservação,
visando a manutenção da biodiversidade local, a proteção e
recuperação de áreas frágeis e criar imediatamente a APA da
Cabeceira do Apa para estabelecer critérios de zoneamento e
manejo para adequado desenvolvimento das propriedades em sua
área de abrangência.
Ainda a respeito do Desenvolvimento Local Sustentável do
município, o P.D. estipula a criação do FMDL - Fundo Municipal de
Desenvolvimento Local Sustentável de Ponta Porã - abordado no
Capítulo II, Título VI. O Fundo tem por objetivo “
apoiar ou realizar
investimentos destinados a concretizar os objetivos, diretrizes,
planos, programas [...] decorrentes da implementação do Plano
Diretor
” (PONTA PORÃ, 2005, p. 16).
Até o momento o FMDL não foi criado, pois segundo
informações de técnicos da Prefeitura do Município, a Comissão
responsável pelo Fundo será formada na primeira semana de
junho desse ano – 2008.
Cabe ressaltar que o PDP prevê um Sistema Municipal de
Planejamento (Título II) no qual fica estabelecido a criação de dois
órgãos responsáveis pelo encaminhamento e ações de
implementação do Plano: o CCPP Conselho da Cidade de Ponta
Porã, criado e IGUAPP - Instituto de Gestão Urbana e
Ambiental de Ponta Porã.
A CCPP, órgão colegiado de caráter consultivo, propositivo
e deliberativo, tem como atribuições:
- Exercer o controle social sobre os encaminhamentos para
implementação do Plano Diretor de Ponta Porã;
- Discutir os projetos decorrentes do Plano Diretor de Ponta
Porã;
- Aprovar as propostas dos projetos de lei decorrentes do Plano
Diretor de Ponta Porã para envio à Câmara Municipal;
- Convocar audiências públicas para debates de assuntos de
interesse da população, especialmente os decorrentes da
implantação do Plano Diretor de Ponta Porã;
- Deliberar sobre alterações no uso do solo urbano, nos termos
deste Plano Diretor;
160
É importante destacar que os conselheiros não são
remunerados pelo trabalho, o qual é entendido como exercício de
relevante valor comunitário. Aos moldes do processo de
elaboração do Plano Diretor, representantes da Intendência de
Pedro Juan Caballero e da sociedade daquela cidade podem
participar nos assuntos pertinentes à fronteira, com direito a voz,
mas sem direito a voto.
O outro órgão criado a partir do Sistema Municipal de
Planejamento - o IGUAPP - é uma entidade autárquica, vinculada
ao prefeito do município, que possui, dentre outras atribuições:
- Exercer a coordenação geral das ações de planejamento do
Executivo Municipal, promovendo a integração das políticas,
programas e planos setoriais;
- Organizar e manter atualizado o cadastro econômico e
imobiliário municipais;
- Implementar a Política de Desenvolvimento Urbano Municipal,
especialmente o Plano Diretor;
- Implementar a Política Municipal de Meio Ambiente e
desenvolvimento sustentável, especialmente a Agenda 21 local;
- Organizar e realizar o licenciamento e controle ambiental
municipal, na forma da lei.
- Coordenar as ações de gestão local da prestação dos serviços
públicos de saneamento básico.
- Elaborar e manter atualizado o conjunto da legislação urbanística
e ambiental de interesse local;
- Organizar e aplicar sistema de indicadores locais de qualidade de
vida visando monitorar os resultados da implementação do Plano
Diretor de Ponta Porã.
Por fim, o art. 41, Título VII Das Disposições Finais
estabelece que, com a vigência do Plano Diretor, o Relatório GEO-
Cidades e a Avaliação de Vulnerabilidade Ambiental passam a ser
instrumentos técnicos do planejamento municipal, devendo ser
consultados em quaisquer planos e projetos de abrangência e
impacto municipais.
A seguir, serão destacados os aspectos do plano que
envolve diretamente a fronteira.
161
5.3.2.2 Aspectos do Plano Diretor que envolvem
diretamente a Fronteira
Como colocado, durante o processo de elaboração do
Plano Diretor Participativo de Ponta Porã, houve a incorporação de
representantes da sociedade de Pedro Juan Caballero e o
levantamento de aspectos que envolvem principalmente conflitos
na Linha Internacional. Senso assim, a análise do documento
formal aprovado pretende discutir quais as diretrizes e ações
foram elencadas pelo PDP que envolve diretamente os aspectos
ressaltados no processo participativo, bem como outros
indiretamente associados.
A questão da fronteira internacional é tratada inicialmente
pelo PDP que destaca como um dos princípios gerais da política
urbana a “c
onsolidação do município de Ponta Porã como centro
regional, de
articulação internacional, sede de atividades
produtivas e geradoras de emprego e renda
” (PONTA PORÃ, 2006,
p. 9, Grifo nosso). Percebe-se que a preocupação em articular
economicamente o município com o país vizinho, o que de certa
forma ocorre, posto que Pedro Juan depende em muito da
mão-de-obra dos pontaporanenses e estes dependem,
abusivamente, do comércio da cidade paraguaia.
Outro item do Plano Diretor que considera a cidade
paraguaia é o Capítulo II, em seu artigo 12, que trata do IGUAPP,
mencionado. Em uma de suas atribuições observa-se a
necessidade de organizar, atualizar e disponibilizar o sistema
municipal de informações, com dados e informações de interesse
do município e da população, e a preocupação em criar e
“manter
um banco de dados específicos sobre a natureza da interação,
influência e impactos decorrentes da conurbação entre
Ponta Porã e Pedro Juan Caballero”
(Ibidem, p. 10, Grifo
nosso).
A Política de Desenvolvimento Local Sustentável (Capítulo
I, artigo 31) tem como uma das diretrizes gerais institucionais a
elaboração da Agenda 21 Local, levando em consideração para
isso a região que abrange o município de Ponta Porã, Brasil, e ao
município de Pedro Juan Caballero, no Paraguai
(Ibidem, p. 15).
Entretanto, tal documento ainda não foi elaborado.
Como encaminhamento posterior, o PDP propõe a criação
de uma
instância não governamental, de interesse público
e personalidade jurídica bi-nacional”
(Ibidem, p. 19, Grifo
nosso, a qual será responsável pela elaboração da Agenda 21 da
162
Região do Amambay-Porã
117
. Esta instância será formada tanto
pela comunidade fronteiriça, como também por representantes
dos dois governos e dirigentes eleitos e com mandatos definidos.
Uma das diretrizes de desenvolvimento econômico e social
da Política de Desenvolvimento Local Sustentável trata de orientar
as ações econômicas a partir de uma articulação com a cidade
vizinha,
no âmbito da conurbação internacional existente,
com vistas à mediação, resolução de problemas e implantação de
programas de natureza comum aos dois municípios
(Ibidem, p.
15, Grifo nosso). No artigo 32, do mesmo capítulo, a condição de
cidade conurbada é retomada quando se destaca a necessidade
de implementação de um espaço
propício para criação de
ambiente de solidariedade institucional entre as cidades
conurbadas
” (loc. cit).
Vale ressaltar também uma ação estrutural importante
prevista no P.D. com relação à cidade vizinha, que consiste em
promover estudos, fomentar articulações institucionais e criar o
portfólio
de projetos de desenvolvimento específicos para a
região de fronteira
, de influência das duas cidades
(Ibidem, p.
16, Grifo nosso).
117
A regiao Amambay-Porã, consiste, segundo o PDP, em uma a área referente ao
município de Ponta Porã, no Brasil, e ao Departamento de Amambai, no Paraguai (artigo
31).
A respeito do zoneamento proposto pelo PDP, destaca-se
que as zonas do lado brasileiro que envolvem o limite com o país
vizinho são: a ZEEU - Zonas Especiais de Estruturação Urbana - e
CMU - Corredores de Múltiplo Uso. As ZEEU são porções do
território de relevante significado, pois constituem em referências
fundamentais social, cultural, econômico, ambiental ou
urbanístico - do município de Ponta Porã. Nesta zona, serão
estabelecidos pela Lei de Uso e Ocupação do Solo, regimes
urbanísticos específicos, a implementação de projetos e obras de
recuperação, estruturação e qualificação desta área da cidade. A
região central da cidade, que coincide com a porção central da
Linha Internacional, faz parte desta zona. Os CMU, por sua vez,
constituem-se em faixas lindeiras às vias estruturais urbanas,
onde usos diferenciados são permitidos. Caracterizam-se por
localizarem comércios e serviços de caráter regional, possuírem
maior capacidade de adensamento do solo e por ser passagem de
linhas de transporte coletivo urbano. As vias próximas e paralelas
à Linha Internacional são caracterizadas no PDP por CMU.
Vale ressaltar que na ZEEU poderão ser realizadas
operações urbanas consorciadas
118
, mediante parecer prévio do
118
De acordo com o PDP, operações urbanas consorciadas consistem no “conjunto de
intervenções e medidas coordenadas pelo Poder Público municipal, com a participação dos
moradores, usuários permanentes e investidores privados, com o objetivo de alcançar em
163
Conselho da Cidade de Ponta Porã, conforme o artigo 27 do Plano
Diretor Participativo. Nesse contexto, prevê-se, para a Linha de
fronteira, a instituição de área de Operação Urbana Consorciada a
ser delimitada e regulamentada por lei específica.
A Operação Urbana Consorciada tem por finalidade a
viabilização de recursos para a elaboração de um projeto de
recuperação da Linha Internacional (requalificação apenas do lado
brasileiro da faixa). Tal projeto, segundo o artigo 33 do PDP,
deverá abranger a elaboração de projeto paisagístico, terminal de
transportes urbanos, e a readequação de um espaço para
pequenos comerciantes e prestadores de serviços. Objetiva-se
com o projeto a transformação da área em estrutura turística
privilegiada para passeios, eventos e compras
119
.
O quadro 04 a seguir apresenta uma síntese de todas as
diretrizes previstas no Plano Diretor de Ponta Porã que consideram
a área de fronteira com o município vizinho Pedro Juan Caballero,
bem como os instrumentos e ações previstos.
uma área transformações urbanísticas estruturais, melhorias sociais e a valorização
ambiental” (PONTA PORÃ, 2006, p. 33).
119
Estudos preliminares de um projeto de revitalização da Linha Internacional foram
elaborados no ano de 2005 e posteriormente apresentados às autoridades municipais do
lado brasileiro. Atualmente encontra-se em Brasília para viabilização de recursos.
164
QUADRO 04 – ATRIBUIÇÕES DO PLANO DIRETOR PARTICIPATIVO A RESPEITO DA FRONTEIRA
Localização no
PDP
DIRETRIZ PROGRAMAS/PROJETOS AÇÕES INSTRUMENTOS OBSERVAÇÕES
Título I, artigo 2°
Das Disposições
Gerais
Consolidação do município de Ponta
Porã como centro regional, de
articulação internacional, sede
de atividades produtivas e geradoras
de emprego e renda.
Implícito no próprio Plano
Criação de uma
instância não
governamental, de
interesse público e
personalidade jurídica
bi-nacional.
Agenda 21 Amambay-
Porã
120
Ainda não foi
elaborada
Título II,
Capítulo II,
artigo 12
Sistema Municipal
de Planejamento
Organizar e disponibilizar o sistema
municipal de informações, e criar e
manter um banco de dados
específicos sobre a natureza da
interação, influência e impactos
decorrentes da conurbação
entre Ponta Porã e Pedro Juan
Caballero.
Sistema Municipal de
Planejamento
Criar e manter um
banco de dados
sobre a natureza da
interação, influência
e impactos
decorrentes da
conurbação
existente.
Criação do CCPP e do
IGUAPP
O CCPP já foi criado
Título II
Sistema Municipal
de Planejamento
Do Conselho
Implementar o processo de gestão
democrática
Não definido
Instituir o Conselho
da Cidade de Ponta
Porã - CCPP
não foram previstos O CCPP já foi criado
Título III –
Política de
Desenvolvimento
Urbano
Controlar o uso e ocupação do solo
urbano
Não definido
Implementar novo
zoneamento (ZEU
para Linha
Internacional)
Lei de Uso e Ocupação do
Solo
Não foi finalizada
Título V, Capítulo
I, artigo 31
Política de
Desenvolvimento
Local Sustentável
Elaboração da Agenda 21 Local,
levando em consideração a região
que abrange Ponta Porã, no Brasil, e
Pedro Juan Caballero, no
Paraguai.
Agenda 21 Local
_______
Instrumentos a serem
definidos pela Agenda 21
Local (considerado
instrumento principal)
Ainda não foi
elaborada
120
A Agenda 21 do município ora aparece no PDPP como Agenda 21 Local, ora como Agenda 21 Amambay-Porã. Entende-se, contudo, que se refere à mesma política.
165
QUADRO 04 – ATRIBUIÇÕES DO PLANO DIRETOR PARTICIPATIVO A RESPEITO DA FRONTEIA -
continuação
Localização no
PDP
DIRETRIZ PROGRAMAS/PROJETOS AÇÕES INSTRUMENTOS OBSERVAÇÕES
Título V, Capítulo
I, artigo 31
Política de
Desenvolvimento
Local Sustentável
Coordenar a Política de
Desenvolvimento Local Sustentável
Não definido
Criação de instância
não governamental,
de interesse público
e jurisdição bi-
nacional
Criação do fundo de
Implementação da
Agenda 21 da Região do
Amambay-Porã
_______
Título V, Capítulo
I, artigo 31
Política de
Desenvolvimento
Local Sustentável
Promover a articulação com
entidades nacionais e internacionais
e instituições multilaterais.
Não definido
Ampliação de
parcerias e
protocolos de
cooperação
Financiamentos e
programas de capacitação
e assistência técnica
nacional e internacional
_______
Título V, Capítulo
I, artigo 31
Política de
Desenvolvimento
Local Sustentável
Orientar as ações econômicas
municipais a partir de uma
articulação transfronteiriça, no
âmbito da conurbação
internacional existente, com
vistas a mediação, resolução de
problemas e implantação de
programas de natureza comum aos
dois municípios
Não definido
Definição de um novo
zoneamento para a
Linha de Fronteira
ZEEUS
Depende da
elaboração da Lei de
Uso e Ocupação do
Solo
Título V, Capítulo
I, artigo 33
Política de
Desenvolvimento
Local Sustentável
Viabilizar recursos e implantar o
projeto urbanístico geral de
recuperação e qualificação do lado
brasileiro da faixa de fronteira,
visando transformar a área em
estrutura turística privilegiada para
passeios, eventos e compras.
Projeto de revitalização da
Linha Internacional
Viabilização de
recursos por meio de
parceria público-
privada
Operação Urbana
Consorciada
Depende de parecer
prévio do CCPP
Fonte: elaborado pela autora a partir de análise do Plano Diretor Participativo de Ponta Porã.
165
Apesar de o PDP elaborar esse conjunto de diretrizes que
envolvem algumas questões da fronteira, para a maioria não é
previsto programas ou projetos, decorrentes ações a serem
seguidas, bem como instrumentos para sua viabilização. Cabe
ressaltar que mesmo para o projeto de revitalização da Linha
Internacional, onde se definiu uma operação urbana consorciada,
a delimitação deste instrumento no território nem sequer foi
definida, deixando todos os aspectos para a legislação específica.
Ou seja, embora o PDP expresse em suas intenções o
encaminhamento dos conflitos da fronteira, observa-se que a
maioria das diretrizes são isoladas, faltando, principalmente, a
definição mais clara dos instrumentos urbanísticos e/ou jurídicos
que vão concretiza-las.
Não se sabe, por exemplo, até que ponto tais diretrizes
previstas pelo Plano Diretor surtirão efeitos positivos para a
fronteira internacional. O que se sabe, contudo, é que um Plano
de Desenvolvimento Transfronteiriço, previsto pelo Ministério da
Integração, continuará apenas na intenção e longe de qualquer
manifesto de concretização.
Importante destacar como continuidade do processo, a
Consulta Urbana, realizada como parte do encerramento das
atividades do GEO Cidades durante audiência de apresentação do
Plano Diretor Participativo para a sociedade.
Realizada em março de 2007, a Consulta Urbana teve
como parceiros o Ministério de Meio Ambiente, o Ministério das
Cidades, o UN-Habitat, o PNUMA e a Prefeitura de Ponta Porã. A
partir da Consulta foi assinado o Pacto Urbano entre todos os
atores envolvidos nos temas elencados como prioritários.
A partir de um treinamento realizado em fevereiro de
2007, a equipe técnica da Consulta Urbana decidiu por priorizar
três assuntos fundamentais e de suma importância para o
desenvolvimento do município, que interferem na saúde, na
economia, na estética e no meio ambiente da cidade. São eles: a
Linha internacional, as nascentes dos córregos e os resíduos
sólidos (lixo) de Ponta Porã. A escolha dos temas foi baseada nos
diagnósticos do relatório GEO Cidades e do relatório da Avaliação
de Vulnerabilidade Ambiental. O documento encontra-se no Anexo
II.
Como a Linha de fronteira é destes temas o de maior
relação com esta pesquisa, deter-se-á aqui apenas sobre esse
assunto. O quadro síntese a seguir foi resultado da discussão da
Consulta Urbana sobre o tema. Nesse quadro são apresentadas as
raízes do problema, o que contribui para a sua existência, os
166
atores mais afetados e as ações previstas para resolver tal
problema (Quadro 05).
168
Fonte: Prefeitura Municipal de Ponta Porã
Quadro 05 – Quadro síntese da Consulta Urbana – Tema Linha Internacional
Visão de Futuro. Raízes do Problema.
Quem ou o que
contribui para
existência do
problema.
Os mais afetados pelo
problema.
Elementos a serem
enfrentados
(econômico,
ambiental, e social).
Como resolver o
problema.
Quais os principais
atores serem
envolvidos para a
solução do problema.
Urbanização
sustentável
Ausência de
legislação
especifica
Falta de
fiscalização
toda sociedade concessão
anterior irregular
parceria binacional
(criação de
comissão)
autoridades
municipais,
estaduais e
federais
Serviços básicos a
comunidade
Ausência de
planejamento
urbano
desorganização do
comercio
ocupantes da Linha
internacional
ocupação irregular regulamentação de
leis
toda sociedade em
geral, BR e PY
Espaço cultural e
lazer
caráter
internacional
o comercio regular; abuso/interesse
político
processo de
sensibilização
ocupantes da Linha
Monumentos
históricos
divulgação
diversidade étnica
e cultural
poluição em geral criação de entidade
de gestão não
governamental ou
publico privado
comerciantes
formais
turistas prostituição
infantil
falta de segurança
urbanizar o espaço
existente; criação
de espaço
alternativo para os
comerciantes.
meios de
comunicação
falta de limpeza e
coleta de lixo
169
Observa-se, a partir da leitura do quadro, que são quatro
os temas definidos a partir de uma visão de futuro: urbanização
sustentável; serviços básicos à comunidade; espaço cultural e de
lazer; e divulgação de monumentos históricos na Linha
Internacional. Sobre as raízes do problema, dois aspectos foram
detectados: ausência de legislação específica e ausência de
planejamento, uma vez que não se tinha até a aprovação do Plano
Diretor, uma legislação que orientasse essas questões. Foi
detectado que a falta de fiscalização; a desorganização do
comércio; e o fato da Linha possuir caráter internacional,
contribuem para a existência de todos esses problemas.
Com base nesse diagnóstico, dentre os atores mais
afetados, o documento destaca os seguintes: os comerciantes
formais (uma vez que a Linha encontra-se tomada por camelôs ou
casilleros
), os quais também sofrem com a ausência de serviços
básicos; os turistas; e de modo geral toda a sociedade. Em
relação ao movimento turístico cabe a observação de que Pedro
Juan Caballero depende tanto dos turistas brasileiros, que vêm
àquele município em busca de “preços baixos”, quanto da infra-
estrutura hoteleira do município. Entretanto, com a degradação
física da Linha de fronteira, o movimento do lado paraguaio na
região adjacente à Linha, caiu em demasia, prejudicando os
comerciantes regulares e conseqüentemente o movimento
turístico
121
. Alguns entraves sociais, econômicos e ambientais -
devem ser enfrentados para a resolução dos problemas, como o
interesse político; a prostituição infantil; a falta de segurança e de
iluminação; além da ocupação irregular.
A Consulta Urbana definiu algumas ações importantes para
a resolução desses problemas, reforçando aquelas previstas no
PDP, entre elas a criação de uma comissão com parceria
binacional; a regulamentação de leis; a promoção de um processo
de sensibilização de toda comunidade fronteiriça; e a criação de
entidades de gestão não governamentais ou público-privadas.
Importante destacar que para resolver a questão do comércio
irregular é essencial que aconteça a revitalização da Linha
Internacional – urbanização do espaço existente com a criação de
espaço alternativo para os comerciantes, conforme projeto de
revitalização.
Por fim, é importante relacionar os principais atores
envolvidos em todo este processo de encaminhamento dos
121
Sobre os turistas da fronteira, cabe salientar as idéias de Oliveira (1998) a respeito da
fronteira de Corumbá/MS, o qual analisa o comportamento dos turistas com relação à
cidade. O autor afirma que existem dois tipos de turistas, o “natural contribuinte para o
crescimento da economia” da fronteira; e o ‘sacoleiro’, que, por ficar pouco tempo na
cidade, contribui de forma reduzida apenas para o lado brasileiro. As análises do autor
cabem perfeitamente à fronteira foco desta pesquisa, Ponta Porã e Pedro Juan Caballero.
170
problemas da Linha Internacional. Nesse contexto, a Consulta
Urbana destacou, além de toda sociedade fronteiriça população
de Ponta Porã e de Pedro Juan; as autoridades municipais,
estaduais e federais de ambos os países; os ocupantes da Linha
comerciantes formais e informais diretamente afetados, bem
como um dos responsáveis pelos problemas.
Enfim, o desafio que se coloca é a real implementação das
diretrizes e instrumentos previstos de forma integrada,
incorporando os problemas e potencialidades das duas cidades.
Como a aprovação do Plano Diretor Participativo de Ponta Porã é
bastante recente, ainda não se pode afirmar sua eficiência e
eficácia em relação às diretrizes previstas para a área de fronteira,
mesmo porque, como colocado, algumas diretrizes não passam de
um conjunto de boas intenções.
Como avanço desse processo que visa a integração, as
diretrizes do PDP são afirmadas e ampliadas pela Consulta
Urbana, realizada em conjunto com equipe envolvida no
diagnóstico do Geo-Cidades, de responsabilidade do governo
federal. Observa-se, neste episódio, a integração entre o poder
local e o federal para discutir os problemas de Ponta Porã, de
modo geral, e particularmente sua situação de fronteira.
Resta saber se esses instrumentos serão conduzidos de
forma articulada entre si e se realmente serão efetivos para a
melhoria da qualidade de vida da sociedade fronteiriça.
171
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A categoria de fronteira internacional vem sendo discutida
no mundo contemporâneo mais como zonas de contato e
interação de diferentes culturas, do que como zonas de separação
ou de barreiras impostas por limites internacionais. Neste sentido,
é necessário uma abordagem a respeito da conceituação de
fronteiras
e
limites
, os quais recebem diferentes significados
dependendo do contexto em que se inserem.
À medida que diferentes fluxos transnacionais vêm
surgindo, o papel da fronteira internacional como reguladora das
relações interestatais é evidenciado. Apesar de muitas vezes
caracterizadas apenas como lugares de passagem, os fluxos
existentes nas regiões fronteiriças são evidentes, principalmente
em cidades de contato direto com outro país. Evidencia-se assim,
a mudança de abordagem que vem ocorrendo a respeito das
fronteiras internacionais nos últimos anos, principalmente a partir
da década de 1990, quando novas alternativas de integração são
formadas.
Mais do que o fim de um Estado Nacional, as cidades de
fronteira muitas vezes obtêm grande importância na sub-região
em que está inserida, formando importantes zonas de interação.
Neste contexto, a população local e a ação estatal são de grande
relevância, uma vez que são agentes de sua própria história.
As relações fronteiriças podem ser objeto de estudo tanto
geográfico, urbanístico e histórico, quanto sociológico ou
antropológico, uma vez que por serem resultado de complexas
formações históricas. As relações que ali ocorrem normalmente
geram fenômenos de mestiçagem, de práticas políticas,
econômicas e sociais peculiares, ocasionando interessantes
estudos sobre sua sociedade, cultura, política e economia.
Fronteiras territoriais, simbólicas, políticas ou culturais,
todas com suas peculiaridades, envolvem estudos de Estado,
nação e sociedade. Conflitos se tornam constantes, uma vez que
Estados distintos entram em questão.
Relações de poder e identidade relacionam-se com
questões de legalidade e ilegalidade, que fazem parte da vida
cotidiana da sociedade fronteiriça. Enquanto as transações
comerciais nestas localidades são vistas pela sociedade como
relações naturais, para o Estado estão associadas ao contrabando
e, muitas vezes, ao refúgio de bandoleiros, entre outros,
principalmente na fronteira entre Brasil e Paraguai.
172
No contexto atual, de integração regional, as políticas
voltadas a estas regiões peculiares tomam impulso. Entretanto, as
dificuldades para sua real efetividade são claras quando
relacionadas às questões legais e políticas restritivas a cada país.
Cabe ao governo a definição de ações que podem tanto aproximar
o contato de cidades-gêmeas, quanto produzir situações de crise,
podendo inclusive acentuar conflitos entre as populações dessas
cidades. Ou seja, o governo se torna o principal agente da
integração, à medida que incentiva práticas para o
desenvolvimento conjunto entre cidades de fronteira-seca, sem
esquecer, no entanto, que as relações, ou interações existentes
entre elas diferenças sócio-espaciais, nível cultural podem
influenciar neste processo.
Com formação histórica similar, Ponta Porã e Pedro Juan
Caballero se desenvolveram ao redor do limite internacional a
Linha de fronteira, a qual determinou a organização espacial dos
municípios. Entretanto, as articulações que ali existem se
sobrepõem ao limite internacional. As trocas comerciais que se
consolidaram, os imigrantes vindos de países vizinhos ou de
regiões próximas (que migravam em busca de terras férteis e
trabalho) alteraram a organização espacial, e consequentemente
as relações cotidianas.
Atualmente, na fronteira de Ponta Porã e Pedro Juan
Caballero as relações são estreitas, ou seja, a densidade de fluxos
locais é grande. O contanto é real, apesar das assimetrias sócio-
espaciais existentes. As diferenças étnicas promovem processos
de mestiçagem. Nesta fronteira a ilegalidade também está
presente, assim como o ‘bilingüismo’ e a troca de moedas. Dólar,
real e guarani convivem nas duas cidades
122
.
O ilegal, o informal ou irregular faz parte da comunidade
fronteiriça de maneira natural, o que muitas vezes atrai população
de outras localidades, principalmente pela possibilidade de infringir
a lei, também de maneira natural. A mídia contribui neste
processo, uma vez que constantemente vincula a fronteira ao
contrabando e narcotráfico. Entretanto, o controle dessas
atividades em cidades com a vantagem locacional da
irregularidade se torna dificultosa.
Para se promover qualquer ação como tentativa de
resolução do problema, e para tentar criar alternativas econômicas
envolvendo dois municípios com particularidades específicas, é
necessário levar em consideração tanto as características de cada
uma, como os conflitos e potencialidades da região.
122
Na fronteira internacional de Ponta Porã é possível comprar em guarani no lado
brasileiro e receber o troco em real, e o mesmo ocorre do outro lado.
173
Aliado a isso, torna-se necessário a definição de órgãos
gestores eficazes para a faixa de fronteira, como tentativa de
integrar países vizinhos e de propiciar o desenvolvimento regional
das áreas fronteiriças. Não apenas o governo federal e estadual
devem ser os responsáveis pela melhoria de vida de uma
comunidade fronteiriça, mas também os atores locais, entidades
religiosas, organizações não governamentais e até mesmo
entidades de classe, devem se fazer presente com ações que
beneficiem a população da fronteira e apassivem seus conflitos.
Importante dizer que, como as legislações de um território são
desconhecidas ou inalcançáveis para o outro, a cooperação
transfronteiriça é dificultada.
Em relação ao Plano Diretor para municípios em área de
fronteira, as questões que se colocam vão além daquelas definidas
pela então política urbana brasileira. É necessário uma visão
integrada, bem como a implementação de instrumentos passíveis
de uma gestão compartilhada entre ambas as cidades, parte da
cooperação transfronteiriça. No caso do processo de elaboração
do PDPP de Ponta Porã, embora fossem incorporados
representantes de Pedro Juan Caballero, a legitimidade desta
representação não foi alcançada, uma vez que nem direito à voto
tais representantes tinham: ou seja, um processo “ilusório”, como
aponta Villaça (2006). No âmbito do documento formal, algumas
importantes diretrizes foram elencadas, entretanto, poucos são os
detalhamentos que viabilizam sua “real efetividade” (ALVIM, et.
al., 2007). Neste contexto, ressalta-se o avanço da elaboração de
instrumentos, pelo governo federal, de forma paralela e articulada
ao Plano Diretor Participativo de Ponta Porã, ainda que vinculado
à fase de diagnósticos, mas que incorpora as questões da
fronteira.
Acionar as redes políticas de maneira organizada, com
atores passíveis de acordo, é de grande valor neste processo
dificultoso, integrando a participação de diferentes escalas de
poder, inclusive de territórios distintos onde se tenha a
necessidade de superposição de ações. Do contrário, políticas
públicas integradas continuam ilusórias, planos de
desenvolvimento binacionais se transformam em exercício de
retórica e o Plano Diretor neste processo, apenas uma tentativa de
propiciar a organização de um só lado da fronteira internacional.
176
ANEXO I
177
178
ANEXO II
PACTO URBANO DE PONTA PORÃ
“Ponta Porã verde, limpa e mais bela”.
(documento preliminar)
Durante os dias 29, 30 e 31 de março de 2007 no Paço Municipal
de Ponta Porã foi realizada a CONSULTA URBANA como parte do
processo de desenvolvimento sustentável em conformidade com a
Agenda 21 local. Este evento realizado pelo UN-Habitat (Programa
das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos) e pela
Prefeitura Municipal em parceria com o Ministério dos Meio
Ambiente, Ministério das Cidades e PNUMA dentro da Estratégia
de Apoio a Gestão Ambiental Urbana do Brasil, contou com a
participação de 128 pessoas, representantes da sociedade civil,
organizações publicas e da iniciativa privada de Ponta Porã, além
de autoridades municipais e convidados.
A
Consulta foi desenvolvida tendo como parâmetro um enfoque
estratégico, multi-setorial e participativo, pautado no diálogo
aberto, na cordialidade e no respeito às opiniões divergentes
sobre o futuro e bem estar da cidade.
Tendo como base conceitual os estudos realizados pelo Relatório
GEO e pela Avaliação de Vulnerabilidade Ambiental, realizados nos
anos de 2005-2006, que incorporou o componente ambiental no
Plano Diretor Participativo de Ponta Porã, a
Consulta centrou a
análise em três problemas urbano-ambientais definidos segundo a
necessidade de atenção imediata, por se constituir em obstáculo
ao desenvolvimento harmônico da cidade, por sua capacidade de
impactar no meio ambiente e por influenciar negativamente a
economia, a estética e integração social dos citadinos. Neste
sentido, se reconheceu que os temas priorizados foram:
1. As
nascentes e fundos de vales dos córregos da
região urbana
por apresentarem alto nível de degradação
provocada pela perda da mata ciliar, pela invasão de áreas
de proteção permanente e lançamento de entulhos, lixo e
esgoto domiciliar e industrial;
2. A
linha internacional por apresentar um alto nível de
degradação da paisagem arquitetônica, ocupações
irregulares que dificultam a gestão social e o controle
sanitário dos resíduos e dejetos; e
3. Os
resíduos sólidos por apresentar alto nível de
dificuldade de manejo da coleta e do deposito final devido
a sua diversidade e quantidade, possibilitando elevada
contaminação do solo e onerando os cofres públicos e, por
efeito, os cidadãos.
Estes problemas ambientais e sociais dos três temas decorrem de
múltiplos e complexos fatores materiais como: i) o crescimento
populacional acelerado em décadas passadas consolidando uma
ocupação do território urbano de forma expansiva horizontal, sem
infra-estrutura, e sem planejamento; ii) os níveis consideráveis de
pobreza da população; iii) a presença de área militar (do exército)
que divide a cidade ao meio; iv) a condição de fronteira e de
cidade conurbada com Pedro Juan Caballero regida por leis e
179
concepções administrativas diferentes, entre muitos. Este
crescimento expansivo e horizontal da cidade permitiu uma grave
seqüência de vazios urbanos e, paradoxalmente, preservou poucas
áreas para o lazer e a convivência comunitária. No mesmo
sentido, observam-se um manejo inadequado das áreas verdes,
especialmente aquelas protetoras de nascentes e matas ciliares
dos córregos, prejudicando a paisagem e reduzindo a
biodiversidade.
Ainda mais. A pressão urbana descompassada consentiu a
especulação imobiliária empurrando os mais pobres para periferias
mais distantes. Como efeito, tem-se observado o acréscimo nos
custos das infra-estruturas e serviços (coleta de lixo e limpeza dos
logradouros, por exemplo); expansão do comercio formal ou
informal para áreas de preservação urbanística (o canteiro da
linha, por exemplo); e, a perda da capacidade de monitorar a
preservação do meio ambiente (caso típico da deterioração dos
córregos e nascentes).
Isto posto, desafios também se colocam. É necessário ampliar a
consciência ecológica e preservacionista do poder público, da
iniciativa privada e da população em geral; construir pilares que
sustente uma nova tradição em gestão profissional e
planejamento urbano; e, instituir uma nova concepção cooperativa
e associativista engendrando projetos consorciados de
desenvolvimento sustentável com entidades públicas e privadas e
com outras cidades.
Como resultado final da Consulta, se reconheceu que:
O desenvolvimento sustentável (econômico, social e
ambiental) é um direito de todos os viventes e das
gerações futuras de Ponta Porã, logo, é um
dever de
todo cidadão
que vive e transita na cidade, independente
de sua posição social e seu status político, preservar este
direito.
A expansão urbana pouco planejada e a marginalização
social são as causas centrais dos principais problemas
ambientais, neste sentido, faz-se necessário fortalecer
propostas concretas de re-ordenamento do território e
gestão do uso do solo urbano.
Os córregos, as nascentes e as áreas verdes devem ser
tratados como recursos estratégicos e sua degradação
influencia negativamente na paisagem produtiva, na saúde
e na qualidade de vida de toda população.
Ponta Porã é gêmea com Pedro Juan Caballero, assim
entendido, para projetos ecológicos, paisagísticos e
urbanísticos devem-se buscar ações compartilhadas com a
cidade vizinha.
A busca por soluções e gestão dos problemas tratados
deve ser dividida entre poder público, iniciativa privada e
sociedade civil organizada.
Nestes termos, reconhecendo o interesse de toda população
pontaporanense e a vontade das autoridades locais em enfrentar
a deterioração ambiental e social, todos os participantes bem
como todos aqueles que queiram aderir a este Pacto Urbano, nos
comprometemos:
Apoiar as políticas urbano-ambientais que representem
a vontade da maioria da população de Ponta Porã
fortalecendo os mecanismos de participação popular e
ampliação da cidadania.
Colaborar para que Ponta Porã se converta em uma
cidade sustentável com crescimento baseado na
180
preservação ambiental, redução da pobreza urbana e
no aumento da qualidade de vida de sua gente.
Canalizar esforço para junto ao poder público municipal
edificar uma política descentralizada e democrática de
gestão do uso do solo urbano.
Participar na formulação de estratégias, elaboração e
implementação de Planos de Ação e desenhos de
projetos que visem solucionar a degradação dos
córregos e nascentes, adequar o manejo, coleta e
depósito dos resíduos sólidos as normas técnicas-
ambientais, e, melhorar o ambiente social e paisagístico
da linha internacional.
Monitorar e denunciar o desmatamento abusivo das
matas ciliares, o depósito indevido de lixos e entulhos
nas proximidades de nascentes e córregos urbanos;
E por fim, mas não em último lugar, nós participantes
nos comprometemos colaborar na divulgação e adesão
aos propósitos deste Pacto Urbano.
Ponta Porã 31 de março de 2007
181
ANEXO III
182
183
185
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