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E, de fato, o conceito de dano moral que o associa à ofensa à
honorabilidade, à respeitabilidade, à dignidade, à autoridade e à boa imagem
afigura-se mais preciso, posto que o sofrimento, dor ou incômodo causados ao
Visando a aclarar o conteúdo da definição e encontrar os contornos que modelam o dano
moral, far-se-á breve dissecação do enunciado. Tomou-se nessa faina os ensinamentos
de Ramon Daniel Pizarro na obra Daño Moral, p. 47 a 50:
a) Logo de início, é de se verificar que a definição atende às conseqüências que a
ação antijurídica produz no ânimo do prejudicado. Encontra-se a entidade qualitativa e
quantitativa do dano moral. É o dano considerado em si mesmo e a repercussão no
ânimo da vítima.
b) O detrimento no espírito provém de uma lesão a algo que não está no patrimônio da
pessoa. Antes, atinge o mais recôndido do ser, em sua subjetividade. Sem a lesão
espiritual, não existe minoração na capacidade anímica de ninguém, inexistindo dano
moral passível de indenização.
c) A definição afasta o mal vez o já assinalado de definir por negação, porque afirma o
que o dano moral é, de forma positiva, e encerrando em seu conteúdo, o que ele
significa, sem a tradicional contraposição ao dano material. É posto em relevo o
conteúdo próprio e específico, e não mera contraposição com o dano material.
d) A perda, o dano, o prejuízo, o detrimento, encontram-se na modificação do espírito,
assinalando que os múltiplos aspectos da personalidade humana hão de ser respeitados.
A modificação desvaliosa considera a pessoa humana em toda a sua dimensão,
enquanto corpo e espírito, o que compreende os múltiplos aspectos da personalidade,
dignos de proteção.
e) O dano moral ultrapassa aquele dado puro e simples do afetivo, dos sentimentos,
projetando seus efeitos para outras áreas da personalidade, como capacidade de querer,
de sentir e de entender. A modificação espiritual estende seus efeitos de forma ampla,
pois essa alteração desfavorável pode atingir outros espaços da subjetividade do
prejudicado. Zavala discrimina cada uma dessas capacidades, afirmando que a dimensão
espiritual de uma pessoa não se reduz à órbita afetiva ou de sua sensibilidade
(capacidade de sentir), pois compreende também uma intelectual (capacidade de
entender) e outra volitiva (capacidade de querer). Quando o ato afeta ou compromete o
desenvolvimento de qualquer destas capacidades de um modo negativo ou prejudicial,
configurado estará o dano moral. A privação ou supressão temporal de qualquer dessas
faculdades deve ser indenizado pelo desvalor subjetivo que denotam.
f) Os seres mais insensíveis, ou a criança, um louco ou um demente, incapazes de
entender e compreender a dor espiritual que os afeta, não estão excluídos da
possibilidade de sofrerem dano moral. Mesmo na ausência de sensibilidade e de
compreensão, há lugar para configuração do desvalor da ação. A consciência do
sofrimento não passa a ser requisito indispensável e inafastável para o exsurgimento do
dano moral. ‘Com isso, fica superado o estreito molde do chamado pretium doloris, que
pressupõe necessariamente aptidão do prejudicado para sentir o dano. Portanto, a perda
dos sentimentos ou da possibilidade de experimentá-los, e mais ainda, da aptidão de
encontrar-se em uma situação anímica desejável, é dano moral’ (Daniel Pizarro, Daño
Moral, p. 49).
g) Desdobrando o elencado no item f supra, existe a possibilidade de o dano moral
existir mesmo que não haja derramamento de lágrimas, ou que não haja a percepção
sensitiva do menoscabo. O sofrimento não é um requisito imprescindível para que o dano
moral ocorra, embora seja uma de suas manifestações mais encontráveis no cotidiano.
O sofrimento, caracterizado pela dor, angústia, vergonha, humilhação, perda do desejo de
viver, etc., é apenas possível manifestação do dano moral. Nesse quadro, mesmo sem a
existência de lágrimas ou sem que a vítima perceba o que está ocorrendo em seu
derredor, é possível que sofra dano moral (p. 97/9).