com ele à casa de Cícero. Aí, combinou-se que Cícero apoiaria César com a sua eloqüência e com o seu
prestígio no Senado e diante do povo. Por seu turno, o jovem César empregaria seu dinheiro e suas armas
na proteção à vida de Cícero, pois o rapaz dispunha de grande número de soldados que haviam servidor
às ordens do ditador.
Parece, porém, que Cícero se viu obrigado, por motivos mais poderosos, a receber com alegria os
oferecimentos de César. No tempo em que Pompeu e César viviam ainda, Cícero teve um sonho, no qual
lhe pareceu que eram chamados ao Capitólio os filhos dos senadores. Júpiter devia, dentre eles, eleger o
soberano de Roma. Os cidadãos acorriam em multidão e acercavam-se do templo. Os meninos, vestidos
de túnica pretexta, mantinham-se sentados em silêncio. De repente, as portas se abrem, os meninos se
levantam e passam, cada um na sua fila, diante do deus, que, após havê-los observado atentamente, os faz
retornar a seus lugares cheios de aflição. Quando, porém, o jovem César se aproxima, Júpiter estende-lhe
a mão e diz: "Romanos, eis aqui o chefe que porá termo às vossas guerras civis". Esse sonho, conta-se,
gravou tão vivamente no espírito de Cícero a imagem do menino, que ele jamais a esqueceu. Ele não o
conhecia, mas, no dia seguinte, quando descia o Campo de Marte, à hora em que os meninos voltavam
dos seus exercícios, o primeiro que notou foi o jovem César, tal qual o vira em sonho. Impressionado
com o encontro, perguntou-lhe o nome de seus pais. Seu pai chamava-se Otávio, homem de nascimento
pouco ilustre; mas sua mãe, Átia era sobrinha de César 52, o qual, não tendo filhos, o instituíra, por
testamento, herdeiro da sua casa e dos seus bens. Afirma-se que, depois dessa aventura, Cícero não
encontrou nunca o menino sem lhe falar cordialmente e sem deixar de fazer-lhe carícias, que o jovem
César aceitava com prazer. Aliás, o acaso determinara o seu nascimento sob o consulado de Cícero.
XLV. Eis ai as versões a respeito do fato. O que, porém, ligou Cícero a César foi, antes de tudo, seu
ódio contra Antônio, e, depois, seu caráter, que não sabia resistir à ambição. Ele esperava pôr a serviço
da República a atividade desse rapaz que, aliás, procurava por todos os meios insinuar-se na amizade de
Cícero, chegando até a chamá-lo de pai. Bruto, indignado com essa fraqueza, censurou Cícero
energicamente nas cartas a Ático. Cícero, segundo ele, adulando César pelo medo que lhe inspirava
Antônio, não deixa lugar para dúvida: procura, não tornar livre a sua pátria, mas dar-se a si próprio um
senhor doce e humano. Todavia, Bruto levou consigo o filho de Cícero, que se encontrava em Atenas
ouvindo lições de filosofia.
Encarregou-o de uma tarefa, que desempenhou com excelente êxito. O poder de Cícero em Roma
atingia, então, o seu apogeu: dispondo de tudo como senhor, expulsou Antônio, sublevou os espíritos
contra este e enviou os dois cônsules Hírtio e Parsa para declarar-lhe guerra. Enfim, Cícero convenceu o
Senado de que, por um decreto, devia conceder a César litores armados de feixes e todas as honras
militares, como ao defensor da pátria. Como, porém, Antônio houvesse sido derrotado, e mortos, no
campo de batalha, os dois cônsules, e como os dois exércitos que comandavam se tivessem ido reunir aos
de César, o Senado, que temia esse rapaz, cujo futuro devia ser brilhante, fez todos os esforços no sentido
de lhe arrebatar os soldados, conferindo-lhes honras e recompensas, e para lhe desorganizar as forças,
sob o pretexto de que, com a derrota de Antônio, a República não mais tinha necessidade de defender-se
pelas armas. César, alarmado com essas medidas, mandou secretamente algumas pessoas falar a Cícero,
exortando-o, com suas súplicas, a disputar o consulado para si e para César. Cícero, afirmavam eles,
dispunha da coisa pública a seu talante e, assim, governaria o rapaz, que não ambicionava outra coisa
senão títulos honoríficos. O próprio César confessava que, temendo ver-se abandonado por todos em
vista do licenciamento da sua tropa, jogou com a ambição de Cícero, pedindo-lhe se candidatasse ao
consulado, prometendo-lhe ajudá-lo com o seu prestigio e os pedidos de votos nos comícios.
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