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CADERNOS TEMÁTICOS Nº 12 DEZ. 2006
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Artigos
des de ampliação e atendimento às demandas pelos serviços que
se propõe a realizar. Em um contexto político caracterizado pela
privatização dos setores sociais, o ensino público de 3º grau está
freqüentemente ameaçado, paralelamente a formas de resistência da
parte de profissionais e estudantes das respectivas instituições.
As desigualdades de acesso à educação, de permanência em ins-
tituições escolares de quaisquer níveis de realização, bem como a
trajetória escolar de alunos afro-brasileiros e brancos, quando com-
paradas, revelam-se diferenciadas e sempre em detrimento dos
primeiros. Isso se confirma na perspectiva dos autores citados, do
IBGE (1999) e do IPEA. Em uma sociedade racialmente exclu-
dente como a brasileira, a formulação e implementação de políticas
sociais exclusivamente universalistas, por não atacarem os mecanis-
mos geradores dessas desigualdades, vêm operando antes como for-
ma de atualização delas, do que como instrumentos que concorram
para dirimi-las. É que tais políticas mantêm e em alguns casos au-
mentam, acentuadamente, o fosso que separa aqueles considerados
como cidadãos, daqueles percebidos como não-cidadãos.
Enquanto tenta-se caminhar rumo à democratização e acesso
de minorias no ensino superior, não custa lembrar que, sozinhos,
os cursos superiores não produzem igualdade. Medidas afirmativas
devem ultrapassar os muros das universidades, serem amparadas
por uma política de estado, disciplinada por leis que promovam a
igualdade racial e que interfiram mais diretamente nos mecanismos
de apropriação de renda. Se o estabelecimento de cotas pretende di-
versificar a composição racial da elite brasileira, de sua classe média
em especial, e se as cotas são uma tentativa de reconciliação do Bra-
sil consigo mesmo, são necessárias, não só cotas nas universidades,
como também cotas raciais nos empregos.
A universidade e os Cefets apresentam-se como um dos prin-
cipais instrumentos que possibilitam a construção de um projeto
de ascensão social. É nesse sentido que o estudo contribui para o
campo da educação na dimensão racial dentro das instituições que
ofertam cursos superiores. E também fica claro que a simples mu-
dança de ingresso é apenas um aspecto de um processo mais amplo,
segundo o qual se deve buscar um modelo de universidade mais
adequada à realidade do aluno brasileiro. A educação superior no
Brasil precisa ser acessível às classes populares, mas com qualidade.
Daí, a questão do ingresso e a permanência dos alunos negros no
ensino superior reclama uma política diferenciada devido a todo o
processo discriminatório e excludente sofrido no passado e atuante
no presente. Mas é preciso encontrar saídas próprias que respeitem
as culturas, os valores locais, regionais e nacionais.
Em um país como o nosso, no qual direitos quase sempre foram
confundidos com privilégios, as políticas de ação afirmativa orien-
tadas para os afro-brasileiros certamente sofrerão pesadas críticas.
Entretanto, é necessário avançar. Ousar recriar o Brasil em bases
mais democráticas. É possível que a conquista e a posse dos direi-
tos da cidadania, bem como a garantia de que os afro-brasileiros
possam exercer esses direitos, de forma efetiva, certamente requer
muito mais que a implementação de políticas de ação afirmativa.
Entretanto e certamente, terá que passar por elas.
2. Segundo Lucio Alcântara, “ações
afirmativas significam a adoção
de um conjunto de medidas para
compensar, no presente, os efeitos
provocados por atos discriminatórios
sucessivos e acumulados
historicamente que relegam parcela
da população à situação de cidadãos
de segunda classe”. ALCÂNTARA,
Lucio. Rota de igualdade. Folha de
São Paulo, 11/10/2000, p. A/3.
3. A declaração sobre raça e
preconceitos raciais da Unesco,
em 1978, estabelece que todos
os povos e todos os grupos
humanos, qualquer que seja
a sua composição ou a sua
origem étnica, devem contribuir,
conforme sua própria índole, para
o progresso das civilizações e das
culturas que, na pluralidade e
em virtude de sua interpretação,
constituem o patrimônio comum
da humanidade e “reconhece
o direito de todos os grupos
humanos à identidade cultural e
ao desenvolvimento de sua própria
vida cultural no contexto nacional
e internacional”. UNESCO,
1978. “Declaração sobre raça e
preconceitos raciais”.