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Vanda Maria Quecini
São Paulo
2007
Córrego
Eil
P
h
Gruta do Esmeril
TIMÓTEO:
O LEGADO URBANO DE UM PROJETO INDUSTRIAL
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Universidade de São Paulo
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Vanda Maria Quecini
T
IMÓTEO:
O LEGADO URBANO DE UM
PROJETO INDUSTRIAL
Tese de doutorado apresentada à Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de
São como requisito parcial à obtenção do
título de doutora em Fundamentos e História
da Arquitetura e do Urbanismo.
Orientadores:
Prof. Dr. Philip Oliver Mary Gunn
(ago/2001 a set/2005) in memoriam
Profa. Dra. Maria Irene de Queiroz Ferreira Szmrecsanyi
(nov/2005 a ago/2007)
São Paulo
2007
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AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE TRABALHO,
POR QUALQUER MEIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO,
PARA FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.
ASSINATURA:
Quecini, Vanda Maria
Q3t Timóteo: o legado urbano de um projeto industrial / Vanda
Maria Quecini. - - São Paulo, 2007.
396 p. : il.
Tese (Doutorado – Área de Concentração: História e Funda-
mentos da Arquitetura e Urbanismo) – FAUUSP.
Orientadores: Philip Oliver Mary Gunn e Maria Irene de
Queiroz Ferreira Szmrecsanyi.
1.Urbanização – Minas Gerais 2.Urbanização – Vale do Rio
Doce 3.Indústria siderúrgica – Brasil 4.Cidades novas – Timó-
teo (MG) 5.Cidades industriais – Timóteo (MG) I.Título
CDU 301(815.1-21)
DEDICATÓRIA
Para Rosamaria e José,
Cujo carinho e apoio me sustentam.
Para Vera, Vânia e Valda
Cuja companhia eleva meu espírito.
E para Marcos
(in memoriam)
Cuja cujos sonhos me ajudaram a sonhar.
Enigma para intranqüilos
Pelos dias do ano que virá
encontrarei uma hora diferente,
uma hora de cabelos em catarata,
uma hora nunca mais transcorrida,
como se o tempo se rompesse ali
e abrisse uma janela: um buraco
por onde deslizar-nos até o fundo.
Bom, aquele dia com aquela hora
chegará e deixará tudo mudado:
não saberá jamais se ontem foi-se
ou o que volta é o que não se passou.
Quando o relógio cair uma hora
ao solo, sem que ninguém a recolha,
e ao fim tenhamos amarrado o tempo,
ai! Saberemos por fim onde começam
ou onde terminam os destinos,
porque no trecho morto ou apagado
veremos a matéria das horas
como se vê a pata de um inseto.
E disporemos de um poder satânico:
voltar atrás ou acelerar as horas,
chegar ao nascimento ou à morte
com um motor roubado ao infinito.
(N
ERUDA, 2004)
AGRADECIMENTOS
Há um provérbio chinês que diz que quando o discípulo estiver pronto, o mestre aparecerá, mas estou
certa que foram os mestres que encontrei ao longo do caminho que me aprontaram, pois mais do que
conhecimento, freqüentemente eles foram modelos e fontes de inspiração.
Assim, não poderia deixar de agradecer de forma muito especial às doutoras Marisa Varanda
Carpintério e Maria Cecília Linardi Munguia que, ainda na graduação, me introduziram no universo da
pesquisa acadêmica.
Para muito além da indicação da cidade de Timóteo como objeto de pesquisa e da ajuda na elaboração
do projeto de mestrado, ou mesmo nas correções e comentários sobre o primeiro capítulo deste
trabalho, agradeço à professora Telma Correia por ter me apresentado o professor Philip Gunn. A ele
serei sempre grata pela confiança, permitindo que o acompanhasse em outros trabalhos e nas aulas da
graduação, e, acima de tudo agradeço por ter me despertado para a riqueza escondida nas contradições
da realidade que nos cerca e pela erudição que fazia de cada orientação uma viagem a outros
universos.
À professora Maria Irene Szmrecsanyi que me recebeu como orientanda após o falecimento do
professor Philip Gunn, agradeço pela dedicação e paciência nas leituras, pelas orientações e discussões
sempre repletas de novos questionamentos e propostas de encaminhamento.
Meus sinceros agradecimentos à professora Maria Lúcia Gitahy, que sem excitar, em mais de uma
ocasião veio em meu socorro e cujos comentários e críticas nas bancas de qualificação e passagem,
juntamente com as professoras Cristina Menguello e Sandra Lencione, me ajudaram a compreender
melhor alguns conceitos e organizar de forma mais clara as idéias.
Ao professor Silvio Macedo, juntamente com os professores Fábio Robba, Eugênio Queiroga, Valdmir
Bartalini e Maria Angela Faggin agradeço por terem me recebido e instruído durante os estágios PAE,
quando tive a oportunidade de conhecer uma outra forma de trabalhar as disciplinas de projeto.
Também gostaria de agradecer aos professores Nuno Fonseca, Csaba Déak, João Whitaker e Maria
Lúcia Refinetti pelas salutares discussões e por terem permitido acompanhá-los nas disciplinas de
planejamento.
Agradeço ainda às meninas das bibliotecas da FAU, à Zezé, Filó, Estelita, Regina, Regiane e Dina
pelo auxilio nas pesquisas e compreensão nos meus atrasos. Ao pessoal da FAU-Maranhão, Isa, Ivani
e Leonardo que se mostraram sempre prontos a sanar minhas dúvidas e atender minhas solicitações.
Ao Marcelo de Castro do Arquivo Público Mineiro, à Andrea Xavier do IEPHA de Minas, à Cirlei
Aparecida Rocha do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte, ao Carlos Paiva do América
Futebol Clube, à Luciana Patente da Fundação Belgo, ao Marco Antônio do CREA de Belo Horizonte,
à Adriana Ávila do Minas Tênis Clube, à Adaltiva e Luciana da Secretaria de Obras e Viação do
Estado de Minas Gerais, ao pessoal do Parque Estadual do Rio Doce e das bibliotecas da Fundação
João Pinheiro, do instituo de Geografia, das faculdades de Arquitetura, Educação e Filosofia da
Universidade Federal de Minas Gerais, meu apreço e gratidão por terem auxiliado a explorar de forma
mais ágil e eficaz seus acervos.
À dona Vanda Rodrigues Duffles Teixeira e seus filhos, agradeço terem partilhado comigo as
lembranças, memórias e documentos do senhor Romeu Andrade Duffles Teixeira, um material que
lançou novas luzes sobre o entendimento da organização urbana de Timóteo.
Em Timóteo devo agradecer a disposição das funcionárias da biblioteca municipal e a atenção do
pessoal da prefeitura, em especial a Rosana Diniz, ao Bruno de Bruno e Paulo Schettini que além de
concederem acesso a mapas e planos que serviram de base para entender como vem se organizando a
cidade, sempre arrumaram tempo para discutir idéias e pontos de vista.
Gostaria de agradecer à ACESITA que através da Fundação ACESITA e principalmente de José
Estáquio de Carvalho permitiu o acesso a textos, fotografias, plantas e mapas de seu Arquivo Central.
A José Estaquio de Carvalho gostaria de agradecer também pelo suporte logístico que o empréstimo
da bicicleta representou e por neste seis anos de pesquisa ter se tornado um ponto de apoio confiável
na busca de novos contatos e projetos.
Também não posso deixar de expressar minha gratidão por todos aqueles que ao dividir comigo suas
memórias deram sentido a este trabalho, pois seus conhecimentos, suas histórias hospitalidade e
generosidade mais do que conhecer, me levaram a sentir um pouco do gostinho de Minas Gerais, do
vale do Aço e de Timóteo. Portanto, aí vai meu muito obrigado ao Padre Abdala, aos senhores
Geraldo, Olinto, João Kleber, Perácio, José Cruz, Cícero, Leonardo Cunha, José Fausto, José Mendes,
Fernando Sena, Paulo, Joaquim Maria, Otávio, Antônio Carlos e Waldetário e às senhoras Regiane,
Núbia, Judith e Vilma.
Aos colegas do grupo de pesquisa Mauro, Marina, Carolina, Diogo, André, em especial à Yara, e
também ao Fernando Atique e ao Marcos Vírgilio, muito obrigada pelo aprendizado que o
conhecimento de suas exposições e comentários trouxeram.
Às amigas Alessandra Natali Queiroz, Claudia dos Reis Cunha e Mary Helle Balleiras agradeço terem
partilhado descobertas e enfrentado comigo alguns dos mais doces sabores e dos mais amargos
dissabores da vida acadêmica.
Acima de tudo gostaria de agradecer à minha família, a meus pais Rosamaria e José que aceitando
minhas ausências e colaborando com meu sustento, permitiram que perseguisse meu sonho. Aos
primos Patrícia e Pedro que me ensinaram a conhecer e desfrutar São Paulo de outra forma e, às
minhas irmãs Vera, Vânia e Valda que me ajudaram e apoiaram de diversas formas. À Valda pela
sinceridade nas opiniões e no afeto. À Vera pelas traduções e revisões do inglês, pelos artigos da
internet e pelos conselhos. À Vânia pelo apoio constante nos momentos mais críticos, corrigindo
textos, revisando a bibliografia, solucionando pendências em Piracicaba e me fazendo rir, uma ajuda
que nenhuma girafa ou hipopótamo jamais será capaz de retribuir.
À FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo agradeço a concessão da bolsa
que viabilizou a dedicação a esta pesquisa.
SUMÁRIO
I
NTRODUÇÃO: O ESTUDO DE UMA CIDADE E DE UMA EMPRESA
01
C
APÍTULO I: CONCEITUANDO CIDADES EMPRESARIAIS
10
2
TEMAS E ABORDAGENS DAS CIDADES EMPRESARIAIS NA LITERATURA ACADÊMICA
29
2.1 A HABITAÇÃO EM QUESTÃO
31
2.2 A CIDADE EM QUESTÃO
35
2.3 O OPERARIADO EM QUESTÃO
41
2.4 A ARQUITETURA EM QUESTÃO
50
3 OBSERVAÇÕES FINAIS SOBRE CIDADES EMPRESARIAIS
54
C
APÍTULO II: PROJETOS PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA CIDADE EMPRESARIAL
56
2
DESENVOLVIMENTO, INDUSTRIALIZAÇÃO E URBANIZAÇÃO 59
3 PROJETOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA NAÇÃO 64
3.1 O PROJETO DA TENNESSE VALLEY AUTHORITY
66
A CIDADE DE NORRIS
74
3.2 O PROJETO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE
78
INDUSTRIALIZAÇÃO NO BRASIL
79
FERRO E SIDERURGIA NO BRASIL
83
A ITABIRA IRON ORE E A CVRD
92
A CIDADE DE VOLTA REDONDA
101
C
APÍTULO III: URBANIZAÇÃO E CIDADES SIDERURGICAS EM MINAS GERAIS
1 URBANIZAÇÃO E INDUSTRIALIZAÇÃO EM MINAS GERAIS
107
1.1 URBANIZAÇÃO DOIRADA: CIDADES E TERRITÓRIO
107
1.2 O MOSAICO MINEIRO”: DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E URBANO
109
1.3 INDUSTRIALIZAÇÃO E SIDERUGIA EM MINAS GERAIS
111
2 O VALE DO RIO PIRACICABA E AS CIDADES SIDERÚRGICAS MINEIRAS 118
2.1 O VALE DO AÇO
119
2.1 MONLEVADE
127
2.2 IPATINGA
132
2.3 OURO BRANCO
143
C
APÍTULO IV: O PÚBLICO E O PRIVADO NA CONSTRUÇÃO DE TIMÓTEO
1 DE TIMÓTEO A ACESITA: FORMAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DA CIDADE
146
1.1 O POVOADO E A COMPANHIA (ATÉ 1946)
147
1.2 A CIDADE EMPRESARIAL DA ACESITA (1946-1968)
153
1.3 A CIDADE ABERTA: TIMÓTEO OU ACESITA ? (1968-1992)
166
2 DE ACESITA A TIMÓTEO: NOVOS PARÂMETROS PARA A RELAÇÃO EMPRESA X
MUNICÍPIO
181
2.1 DISCURSO AMBIENTAL, RESPONSABILIDADE SOCIAL E PLANEJAMENTO URBANO
181
2.2 PRIVATIZAÇÃO E REESTRUTURAÇÃO EMPRESARIAL
190
C
APÍTULO V: A CONSTRUÇÃO DE TIMÓTEO: PROJETO E DESTINO
1 OS PROFISSIONAIS DO URBANISMO E OS ESPAÇOS DA CIDADE
207
1.1 ROMEU DE ANDRADE DUFFLES TEIXEIRA: PARQUES E ESPORTES PARA A CIDADE
213
1.2 JOSÉ LUIZ BATISTA: UM ARQUITETO EM PELE DE ENGENHEIRO
238
1.3 FERNANDO SENA: UM ENGENHEIRO EM PELE DE ARQUITETO
246
1.4 O DESENHO DA CIDADE DE TIMÓTEO: UM DESTINO SEUS PROJETOS
251
2 UMA LEITURA DA PAISAGEM URBANA DE TIMÓTEO 257
2.1 PERCURSOS E VIAS
258
2.2 SETORES E BAIRROS
259
2.3 PONTOS NODAIS
260
2.4 LIMITES E BARREIRAS
261
2.5 MARCOS E EDIFÍCIOS
261
2.6 O DESTINO DA CIDADE EMPRESARIAL
263
C
APÍTULO VI: A CONSTRUÇÃO SOCIAL DA CIDADE DE TIMÓTEO
1 FORMAÇÃO SOCIAL E CULTURAL EM CIDADES EMPRESARIAIS
270
2
ORGANIZAÇÃO SOCIAL E CULTURAL DE TIMÓTEO 277
2.1 O FUTEBOL, OS CLUBES E OUTRAS ATIVIDADES DE LAZER
278
2.2 A IGREJA, OS SINDICATOS E OUTRAS ORGANIZAÇÕES OPERÁRIAS
287
DOS ARMAZÉNS À ASSOCIA
288
DO SESP AO METASITA
289
DA BENEPÓ AO SINDICATO DOS TRABALHADORES RURAIS
294
2.3 A CELEBRAÇÃO E A CONTESTAÇÃO NOS DESFILES CARNAVALESCOS
305
CONCLUSÃO: TIMÓTEO, O LEGADO URBANO DA ACESITA
1 LEGADOS E RUPTURAS
313
2 T
IMÓTEO: O LEGADO URBANO DA ACESITA 314
R
EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
320
A
NEXOS
349
LISTAS DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA
NÚMERO
TÍTULO PÁGINA
1 A usina da ACESITA em 1954 Capa
2 Panorâmica da usina e da cidade de Timóteo em 1945 Capa
3
Industrial Landscape 1
4
Industrial Landscape 9
5 Temas nos quais as cidades empresariais podem ser discutidas
25
6 Parâmetros para análise da relação indústria x cidade
7 Tucurui
26
8 Maarmolick
9 Usinas Santa Barbara
10 Pedra
11 Vila Maria Zélia
12 Vila Maria Zélia
13 Usina São João
27
14 Schefferville
15 Grand Hornu
16 Climax
17 Itabira
18 Birminghan
19 Vila Cerealina
20 Pullman
28
21 Saltaire
22-23 Fabrica Nacional de Motores
24 Noisel sur Maine
25 Hotep Sesostris
26 Usina Ipanema
27 Merthyr Tydfil
28 Raffard
29 Volta Redonda 55
30 A Usina2 de Nitrato
77
31 Rio Tennessee
32-33 Área da TVA
34 Barragens da TVA
35 Barragem de Norris
33-36 Casas em Norris
40 Planta de Norris
38-39 Casas em Norris
38-39 Vista da Fábrica de Ferros
90
40 Edifício sede da Fábrica de Ferros
41 Vista da Fábrica de Ferros
42 Edifício sede da Fábrica de Ferros
43-44 Residências da Fábrica de Ferros
45
Parte da Nova Carta da Capitania de Minas Gerais com a localização das principais siderúrgica da
região
46 Usina Esperança
91
47 Usina Esperança
48 Local antiga Usina Esperança
49 Forno da Usina Esperança
50 Vila operária da Usina Esperança
51 Grupo Escolar Laura Queiroz
52 Vila operária da Usina Esperança
53 Mapa de localização
104
54 Propaganda de inauguração da CSN
55 Passeio pelo Santa Cecília
56 O projeto da cidade operária
57 Vista da cidade e da CSN
105
58 Vista do bairro Santa Cecília
59 O bairro Santa Cecília em 1942
60 Escola Técnica
61-62 Área central
63-66 Residências
67 Vista geral da cidade e da usina
68 O mosaico mineiro de Rugendas 106
69 Vilas e cidades mineiras no período colonial
116
70 Fundação de vilas e cidades brasileiras no período colonial
71 Centralidade e desenvolvimento das regiões mineiras no século XIX
72-74 Distribuição das atividades econômicas pelo território nacional
75 O mosaico mineiro
117
76 Plano de eletrificação de Minas Gerais
77 Plano ferroviário mineiro
78 Deslocamento do desenvolvimento industrial mineiro entre 1890-1950
79-80 O traçado original e o novo traçado da ferrovia Vitória-Minas
125
81 As minas e usinas do Quadrilátero Ferrífero
82 O município de Antônio Dias e seus distritos
126
83 Evolução urbana do Vale do Rio Piracicaba
84 Carta de Ipatinga – Vale do Rio Piracicaba
85 Área residencial central
130
86 Projeto de residência
87-88 Projeto de Lincoln Continentino (perspectiva e implantação)
89-90 Vistas das duas margens do rio
91-92 O município de Monlevade e o sítio da USIMINAS
131
93 Vista da Usina e da cidade
94 Vista dos fundos da usina
95-96 A Igreja de São José Operário e o Solar Monlevade
97-107 Residências
108 O centro comercial
109-110 Projeto, implantação e perfil de Ipatinga
137
111 Área do projeto
112 Vista geral
113 Modulação das residências
114 Propriedade fundiária
138
115-116 A cidade e a área da USIMINAS
117-118 O centro
119-124 Residências
125 Vista geral
126-127 Localização e implantação
143
128 O centro antigo
129 Os setores do plano
130-132 Vista geral dos bairros
133 Paisagem geral da cidade
144
134 Zoneamento do município
135 Área urbana do município
136 Centro antigo
137-139 Habitações
140-141 Os centros comerciais
142 Vista geral
143
Monumento SINERGIA de Vilma Nöel
144-146 O povoado de Timóteo (localização e situação nas décadas de19 30 1940)
152
147-149 Sede das fazendas Angelina e do Alegre
149-151 A capela e o entorno da praça 29 de Abril
152-155 Sedes das fazendas da região
156 As possíveis localizações para a usina da ACESITA
162
157-158 A Fazenda Angelina
159 Evolução urbana de Timóteo – década de 1940
160-161 A Capela São José e os galpões da ACESITA
162 Evolução urbana de Timóteo – década de 1950
163-164 As casas de pau-a-pique e sapé do Angico
163
165 A primeira escola no Quitandinha
166-167 As casas de madeira da Vila dos Caixotes
167-169 Vistas do centro ainda por construir
168-169 A construção do Bromélias
164
172-173 A Vila dos Técnicos
174-175 O Quitandinha e Timirim em construção
176-179 As novas escolas no Quitandinha e Funcionários, o novo hospital e cinema
180-186 Residências
187 A cidade e a usina em 1968
165
188 A cidade e a usina em 1971
189-190 Evolução urbana de Timóteo – década de 1960 e o bairro de Cachoeira do Vale
179
191-192 Evolução urbana de Timóteo – década de 1970 e o bairro do Macuco
193-194 Evolução urbana de Timóteo – década de 1980 e o Centro Sul
195 Perspectiva do projeto do novo centro comercial
180
196-197
Maqueta do prédio do novo escritório da ACESITA e o novo prédio da Prefeitura Municipal de
Timóteo
198-199 Projeto do bairro Primavera e mapa de áreas da ACESITA em 1991
200-201 Evolução urbana de Timóteo – década de 1990 e o bairro Alphaville
203
202-203 Evolução urbana de Timóteo – década de 2000 e o distrito industrial do Limoeiro
204-205 Mapas de zoneamento e setores do Plano Diretor de 2004 204
206-207 A antiga Casa de Hóspedes, atual Fundação Acesita
205
208 Vista geral a partir do centro na direção noroeste
209 O Vale do Aço (jan/2007)
210 Vista aérea em 1961 206
211 Romeu de Andrade Duffles Teixeira
229
212-213 Levantamento do município de Sítio (parcial - 1954) e posta do centro da cidade
214-215
O primeiro time (1912)e o projeto da arquibancada do primeiro estádio do América Futebol Clube
(1939)
216 Os espaços de esporte em Belo Horizonte e suas mudanças
217-218
Vista de satélite dos fundos do Palácio da Liberdade e projeto para o Parque Palácio da Liberdade
(1938)
230
219-220 Fotografias da Praça Osvaldo Costa em Paraguaçu
221 Localização da Praça Osvaldo Costa
222-223 Vistas atuais da Praça Osvaldo Costa
224-225 O Grande HotelAraxá vista aérea e de satélite
231
226 O projeto de Romeu Duffles para o Barreiro do Araxá (1937
227-228 O balneário antes da reforma e o perspectiva do projeto de Dierberger para o Barreiro do Araxá
229 Projeto de Romeu Duffles para o estádio de Astolfo Dutra (1953?)
232
230-231
O projeto da praça de Alfenas de Romeu Duffles (1948)e o da praça da Liberdade de Dierberger
(1920)
232 Perspectiva do projeto de Romeu Duffles para o clube da Usina Esperança (194?)
233
233 Local da antiga usina Esperança
234-235 A cidade de Carangola e o Estádio Roseli Soares
236 Perspectiva do projeto de Romeu Duffles para Praça de Esportes em Carangola (1939)
237 Plano geral do projeto de Romeu Duffles para a ACESITA (1947-1951)
234
238-239 Organização geral do projeto de Romeu Duffles
240 Detalhe implantação nos lotes
235
241-242 Perfil da avenida parque e de uma rua residência
243 Detalhe das vias
244-245 Detalhamento do clube, implantação e cortes (1951)
246-247 Projetos para o atual bairro Funcionários (1946) e para o centro (atual bairro doTimirim) (1950) 236
248-250
O projeto de Georg Metzendorf (1909) para o subúrbio jardim de Margarethenhole, sua vista aérea
(1980) e entrada no início do século
237
251-253
Sistemas de parques e avenidas projetados por George Kessler para as cidades de Kansas (1893),
Saint Joseph (1912) e Indianapolis (1905)
254-257
O plano de George Kessler para Cincinnati (1907) e postas da cidade e seus parques no início do
século XX.
258 O bairro Serenata em 2007
244
259-260 A localização dos bairros e o bairro Primavera em 2007
261 O prédio da Prefeitura Municipal de Coronel Fabriciano
262-267 Projetos particulares de reforma e residências
268-270 As sedes do ACESITA Esporte Clube e do sindicato e o Colégio Macedo Soares
271 O edifício Pioneiros
245
272 Vista noroeste do Centro Norte
273-275
O Conjunto Comercial 31 de Outubro e detalhes da circulação e externa e a assinatura no autor
estampada no concreto
276-278 Edifícios construídos como empreendedor em Belo Horizonte
279 O bairro Recanto
250
280-281 A localização dos bairros e o Novo Horizonte
282 O manual do proprietário do bairro Novo Horizonte
283 A área do projeto e o destino da cidade de Timóteo
256
284-286
Os esquemas gerais da estruturas urbanas propostas por Ebenezer Howard, Romeu Duffles para a
ACESITA e o da atual cidade de Timóteo
287 Uma leitura da paisagem urbana de Timóteo
267
288-292
Cinco postais da cidade de Timóteo: a Fundação ACESITA, a estatua das Três Graças, a Igreja de São
Sebastião, a Matriz de São José e a Capela São José
293-294 As praças do Centro Norte (1º de Maio) e Sul (21 de Abril)
268
295-296 Imagens do Forno Hoffman, no bairro Olaria
297-298 As duas escolas projetadas por Éolo Maia, nos bairros Vale Verde e Cachoeira do Vale
299 Á direita o Centro Norte visto a partir do bairro São Cristóvão
300 O Centro Sul visto a partir do bairro Ana Malaquias
301 Desfile do bloco Andorinhas 269
302 Localização dos espaços esportivos em Timóteo
285
303 Os locais de encontro no centro norte
304-306
Primeiro time oficial do ACESITA Esporte Clube, o brasão da Liga Acesitana de Desporto e o Time
do Florestino
286
307 Os prédios dos antigos Cine ACESITA e Marabá
308-310 Alguns times em atividade na década de 1970: ACESITA, Funcionários e Vila novas time.
311 As primeiras obras de construção da sede campestre do ACESITA Esporte Clube
312 O clube Operário na década de 1960
313 Atual armazém da ASSOCIA no Quitandinha
303
314-315 Prédio da atual farmácia da ASSOCIA e sede da Associação dos Aposentados
316-317 Os galpões de alojamento e armazém no centro no Quitandinha
318 O antigo hospital
319-320 O hospital Vital Brasil na década de 1960 e atualmente
321-322 As celebrações em frente à Capela São José
304
323-325 A Corporação Musical Santa Cecília na década de 1950 e atualmente
326-328
O uso do solo no Vale do Aço, as baterias de fornos da ACESITA, os modernos fornosno Vale do
Jequitinha e os tradicionais no Vale do Aço
329-331 Colégio Salesiano na década de 1960 e atualmente
332 Desfile de 1º de Maio na década de 1960
310
335-336 Desfiles cívicos (7 de Setembro e 1º de Maio)
337-339 Concursos de Miss e os bailes no clube
340-344 A celebração no desfile das escolas de samba
311
345-350 A contestação nos desfiles dos blocos caricatos
351 Mapa de Timóteo para a população local 312
352 A versão local para o mascate Timóteo
320
353-355 Os pioneiros anônimos da ACESITA
356-359
Os pioneiros reconhecidos da ACESITA: Athos de Lemos Rache, Percival Farquhar, o engenheiro
Alderico de Paula Rodrigues e Aminthas Jacques de Moraes
360 O general Edmundo de Macedo Soares
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABOA – Associação Beneficente dos Operários da Acesita
ADEMG – Associação Desportiva do Estado de Minas Gerais
AEC – Acesita Esporte Clube
ART – Anotação de Responsabilidade técnica
ALFA – Associação de Lazer dos Funcionários da Acesita
ACESITA – Aços Especiais Itabira
AÇOMINAS – Aço Minas Gerais S.A.
ADT – Agência de Desenvolvimento de Timóteo
AFP – Aços Finos Piratini S.A.
BB – Banco do Brasil
BC – Banco Central
BENEPO – Beneficência Popular
BID – Banco Interamericano de Desenvolvimento
BIRD – Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento
BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (até 1982 era BNDE)
BNDESPAR – BNDES Participações S.A.
BNH – Banco Nacional de Habitação
CAFSB – Companhia Agrícola e Florestal Santa Bárbara
CCQ – Circulo de Controle de Qualidade
CEF – Caixa Econômica Federal
CELQUI – Centro de Serviço de Laminados à Quente de Inoxidáveis
CEMIG – Centrais Elétricas de Minas Gerais
CEPAL – Comissão de Econômica para a América Latina
CETEC – Fundação Centro Tecnológico de Minas Gerais
CHESF – Companhia Hidroelétrica do São Francisco
CGT – Comando Geral dos Trabalhadores
CIAM – Congrès Internacionaux d’Architecture Modern
CIGA - Clube de Investimento dos Empregados do Grupo Acesita
CIGA – Clube de Investimentos dos Empregado do Grupo Acesita
COFAVI – Companhia Ferro e Aço de Vitória
COHAB – Companhia Habitacional
CONAMA – Conselho Nacional de Meio Ambiente
CONSIDER – Conselho Nacional de Siderurgia
COPENE - Companhia Petroquímica do Nordeste
COPESUL – Companhia Petroquímica do Sul
COSINOR – Companhia Siderúrgica do Nordeste
COSIPA – Companhia Siderúrgica Paulista
CPDOC – Centro de Pesquisa e Documentação da FGV
CREA – Conselho Regional de Engenharia Arquitetura e Agronomia
CSN – Companhia Siderúrgica Nacional
CST – Companhia Siderúrgica de Tubarão
CUT – Central Única dos Trabalhadores
CVM – Comissão de Valores Mobiliários
EFVM – Estrada de Ferro Vitória-Minas
EMATER – Empresa Mineira de Assistência a Extensão Rural
FASA – Forjas Acesita S.A.
FAST – Fundo de Ação Social de Timóteo
FAU – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
FEAM – Fundação Estadual de Meio Ambiente
FFLCH – Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
FGV – Fundação Getúlio Vargas
FINAME – Financiamento para Aquisição de Maquinas e Equipamentos
FINEP – Financiadora de Estudos e Projetos
FJP – Fundação João Pinheiro
FUMIC – Fundação Mineira da Criança
GCIS – Grupo Consultivo da Industria Siderúrgica
IAIA – Instituto de Assuntos InterAmericanos
IAPI – Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Industriários
I PND – Primeiro Plano Nacional de Desenvolvimento
IBASE – Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ICC - Carboquímica Catarinense S.A.
IDH – Índice de Desenvolvimento Humano
IEF – Instituto Estadual de Florestas
IEPHA – Instituto Estadual do Patrimônio Histórico de Minas Gerais
IFCH – Instituto de Filosofia e Ciências Humanas
II PND – Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento
IBRA - Instituto Brasileiro de Reforma Agrária
INDA - Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário
SUPRA - Superintendência de Reforma Agrária
INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária
IPTU – Imposto Territorial Urbano
ITAVALE – Instituto de Trabalhadores e Trabalhadoras do Vale do Jequitinhonha
KMCL – Krupp Metalúrgica Campo Limpo Ltda.
LAD – Liga Acesitana de Desportos
LAF – Liga Acesitana de Futebol
LIDECEL – Liga Desportiva de Cel. Fabriciano
METASITA – Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos do Município de Timóteo
MTC – Minas Tênis Clube
NEIT – Núcleo de Economia Industrial e Tecnologia (UNICAMP)
OCDE – Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico
ONG – Organização não Governamental
PDDUA – Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental
PERD – Parque Estadual do Rio Doce
PETROQUISA - Petrobrás Química S.A.
PETROS – Fundo Petrobrás de Seguridade Social
PME – Programa de Metas por Equipe
PMT – Prefeitura Municipal de Timóteo
PND – Plano Nacional de Desestatização
POSTALIS – Instituto de Seguridade Social Correio e Telégrafos
PREVI – Caixa de Previdência dos Funcionários do. Banco do Brasil
PREVI BANERJ – Caixa de Previdência dos Funcionários do Sistema Banerj
SEP – Sociedade Brasileira de Economia Pública
SESI – Serviço Social da Indústria
SEST – Secretaria Especial de Controle das Empresas Estatais
SESP – Serviço Especial de Saúde Pública
SIDERAMA – Companhia Siderúrgica da Amazônia
SIDERBRAS – Siderurgia Brasileira S.A.
SIFCO – Steel Improvement and Forge Company
SINDIPA – Sindicato dos Metalúrgicos de Ipatinga
SISTEL – Fundo Telebrás de Seguridade. Social
TICCIH – The International Committee for Conservation of the Industrial Heretage
UFMG – Universidade Federal de Minas Gerais
UFRJ – Universidade Federal do Rio de Janeiro
UNICAMP – Universidade de Campinas
USIBA – Usina Siderúrgica da Bahia
USIMEC – Usinas Mecânicas S. A.
USIMINAS – Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais S.A.
USP – Universidade de São Paulo
RESUMO
Inserida no contexto das cidades empresariais, esta pesquisa objetiva contribuir com ainda incipiente
literatura nacional sobre o tema, deixando em segundo plano a abordagem usual que parte da
problemática habitacional e direcionando as discussões para o campo da urbanização. Portanto, nessa
pesquisa busca-se a compreensão de um processo de urbanização conduzido pela indústria através da
construção de cidades novas, mais especificamente das cidades siderúrgicas brasileiras a partir da
década de 1940.
O método de pesquisa adotado fundamenta-se na contextualização histórica e nos estudos de caso, de
forma que dentre os diversos aspectos que tangenciam a questão da produção do urbano pela indústria
privilegia-se sua contribuição para a formação e organização do espaço urbano brasileiro no nível
local e regional. Assim, apresenta-se e contextualiza-se a ACESITA e Timóteo no processo de
industrialização nacional, no universo das cidades siderúrgicas brasileiras, na região do Vale do Rio
Doce e do Vale do Aço. Em seguida a leitura da cidade é feita tendo como contraponto a indústria,
seja no seu relacionamento com o poder municipal ou com a comunidade local, de modo a que seja
possível identificar na cidade atual o legado econômico, político e social da indústria, ou seja, seu
legado urbano.
Palavras chave: cidades empresariais, cidades novas, urbanização, siderúrgicas brasileiras, Vale do
Aço, Timóteo, ACESITA.
ABSTRACT
The current research work aims to contribute to the yet-incipient Brazilian literature on company
towns departing from the usual approach that considers the housing problem as a starting point the
present discussion focus on the field of urbanization instead. Therefore, our goal is to comprehend one
special process of urbanization: a process conducted by the industry via the construction of new
towns; more precisely, iron-work Brazilian towns built from the decade of 1940s and later.
The methodology is based on historical contextualization and case studies in such a way that, among
several aspects associated to the industry-dependent generation of the urban space, the main focus is
on its local and regional contribution to the formation and organization of the urban space. Therefore,
the company ACESITA and the city of Timóteo are presented in the contexts of national
industrialization, Brazilian iron-work towns and Vale do Rio Doce and Vale do Aço region.
Subsequently, the interpretation of Timóteo is permeated by the industry, considering its role on the
municipal authority as well as on the local community. This interpretation allows the identification of
the industry legacy on economical, political and social aspects of the current city, therefore its industry
urban legacy.
Key words: company town, new-tow, urbanization, Brazilian iron works industries, Vale do Aço,
Timóteo, ACESITA.
INTRODUÇÃO: O ESTUDO DE UMA CIDADE E DE UMA EMPRESA
Fig. 03: Industrial Landscape
(L. S. LOWRY, s.d.)
Marco Polo descreve uma ponte, pedra por pedra.
- Mas qual é a pedra que sustenta a ponte? – pergunta Kublai Khan.
- A ponte não é sustentada por esta ou aquela pedra – responde
Marco -, mas pela curva do arco que estas formam.
Kublai Khan permanece em silêncio, refletindo. Depois acrescenta:
- Por que falar das pedras? Só o arco me interessa.
Polo responde:
- Sem pedras o arco não existe.
(C
ALVINO, 1990: 79
)
2
Apesar de ser reconhecida tanto por economistas, quanto por geógrafos, arquitetos e urbanistas, a
relação entre industrialização e urbanização ainda é pouco estudada quanto a seus reflexos no plano
local, sendo que no Brasil, uma literatura acadêmica preocupada em analisar o papel direto da
indústria na produção do espaço urbano parece ter começado a ganhar fôlego somente a partir da
década de 1990. Atraso que se pode justificar pelo contexto da época e pela diversidade de forma que
a participação da indústria na construção do espaço urbano brasileiro assumiu tanto ao longo do tempo
quanto nas dimensões e complexidade dos aspectos que envolveu, indo desde a construção de simples
grupos de casas até complexas estruturas urbanas, ou seja, de vilas operárias a cidades empresariais,
desde a mera oferta de moradia até uma vigilância rígida dos hábitos cotidianos do operariado.
Trata-se, portanto, de uma influência que não pode, nem deve, ser medida somente por sua
participação na criação e crescimento físico do espaço das cidades, pois implica em alterações tanto no
quadro econômico, quanto social e político dos locais onde se desenvolve, estes sim, aspectos que
desde a década de 1960 vem sendo estudados por antropólogos e sociólogos e que, a partir da década
de 1970, inseridos na problemática habitacional, passaram a ser objeto de estudo freqüente de
arquitetos e urbanistas.
Mas, apesar desta proximidade ser tão facilmente reconhecida, fazendo inclusive que estes processos
figurem como sinônimos nos dicionários, nesses estudos parece haver uma dissociação entre a ação
direta da indústria sobre a cidade e seu crescimento, resultante da dificuldade em se reconhecer com
exatidão o que foi produzido diretamente pela indústria e o que é conseqüência da urbanização por ela
desencadeada, portanto, fruto da indiferenciação entre os processos de industrialização e urbanização.
Tal dissociação ficou evidente no curso “Pioneirismo empresarial no Brasil e a construção do século
XXI.”, realizado na Faculdade de Economia e Administração da USP (nov/2003), quando entre relatos
sobre a vida e obra de figuras de destaque no cenário empresarial brasileiro, como Francisco
Matarazzo, Roberto Simonsen, Nami Jafet, Leon Feffer, Jorge Street, entre outros, professores de
história econômica, administradores e economistas clamavam pela necessidade de formar e motivar os
jovens a “empreender”, tornarem-se empreendedores, sem demonstrarem qualquer preocupação com o
impacto do início ou do fim destes empreendimentos nos locais onde se implantavam. Apelo que
vinha embalado pela promessa do “espetáculo do crescimento”, feita pelo presidente Lula, e que era
justificado pela atual “falta” de nomes que, como aqueles do passado, fossem capazes de dar cabo da
tarefa de “fazer o Brasil grande”.
Esta completa ausência de discussões sobre as conseqüências, no âmbito local, das grandes obras
empreendidas por industrialistas, soava perturbadora pois se esperava que, senão no que tange à
organização espacial da cidade, assumidamente um aspecto que concerne mais a arquitetos e
urbanistas do que a administradores de empresa e economistas, houvesse pelo menos algumas
considerações quanto aos impactos econômico e político que tanto o início quanto o fim de seus
3
empreendimentos ocasionaram
1
. Foi animado por tais inquietações que este trabalho foi elaborado.
Inquietações que nasceram ainda durante a graduação, quando a pesquisa sobre a Usina Santa Bárbara
2
demonstrou a importância deste empreendimento no crescimento e organização da cidade de Santa
Bárbara d'Oeste e que uma visita à cidade de Timóteo, sugerida pela professora Telma Correia,
mostrou ainda mais ser pertinente.
Assim, com a inquietação trazida para o âmbito da pesquisa acadêmica, iniciou-se a formulação do
projeto de pesquisa para o concurso de ingresso no programa de pós-graduação da Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo em 2001, sob a orientação do professor Philip
Gunn. Desde os momentos iniciais, o trabalho já tinha como objetivo principal a análise de um
processo específico de urbanização, aquele desencadeado pela indústria através da construção de uma
cidade empresarial, a cidade de Timóteo-MG, pela ACESITA (Aços Especiais Itabira), entre as
décadas de 1940 e 2000. Objetivo que se manteve inalterado mesmo com a passagem para o programa
de doutorado direto (2004) e a mudança de orientação, ocasionada pelo falecimento do professor
Philip Gunn (2005), quando a professora Maria Irene Szmrecsanyi assumiu a orientação.
Partindo da hipótese de que uma cidade empresarial é um legado industrial com componente urbano,
cuja trajetória é marcada por decisões patronais que persistem mesmo após a passagem da gestão
urbana da esfera privada para a pública e que, enquanto construção social, a cidade empresarial tem
seu caráter e identidade formados pelo embate de interesses e tensões inerentes ao projeto industrial
que a origina e transforma, é que foi elaborado este estudo da atuação da ACESITA na cidade de
Timóteo.
Uma atuação que se analisa a partir da noção de legado urbano não como patrimônio construído ou
herança cultural que a indústria transmite à cidade quando deixa de existir, mas como esse mesmo
conjunto de espaços, edifícios, hábitos e instituições que contaram com a participação da empresa para
se formar e desenvolver, tornando-se identificáveis a cada ruptura no seu modo de intervir sobre a
cidade. Legado entendido, portanto, como algo que não depende do fechamento da fábrica para ser
resgatado, pois evidencia-se a cada mudança significativa na postura da indústria com relação a cidade
e sua sociedade.
É com o objetivo de esclarecer qual este legado, qual o papel desempenhado pela indústria em
diversos aspectos da construção do urbano e o que resta, material e socialmente, de sua influência, que
se estruturou o trabalho seguindo três linhas de pesquisa. Na primeira delas, relacionada a fatores
políticos e econômicos, busca-se introduzir o objeto enquanto resultado de um processo onde
determinantes econômicas e políticas se mesclaram a condicionantes naturais, ou seja, de que forma
1
Mesmo a atuação de Jorge Street, embora tivesse forte cunho social foi analisada sob o ângulo do “pioneirismo”, sua
importância residindo no fato de ter sido o “primeiro” ou o “mais bem sucedido”. O mesmo ocorreu com Ramos de
Azevedo, cuja principal contribuição foi considerada a escola de Artes de Ofícios.
2
Cabe salientar que o tema das cidades empresariais já havia sido explorado superficialmente durante a graduação, quando
foi elaborado trabalho de iniciação científica, sobre as construções da Usina Santa Bárbara, trabalho financiado pela
FAPESP e que teve a duração de 18 meses, intitulado: “Usina Santa Bárbara: um espaço para a história, uma história para
a memória, uma memória para o espaço” (IC 98/11940-2).
4
políticas desenvolvimentistas, apoiadas na industrialização, colaboraram na urbanização do território e
no desenho do espaço das cidades siderúrgicas brasileiras, especialmente as mineiras. O segundo
aspecto abordado refere-se à análise do espaço projetado e construído na cidade de Timóteo e na
região do Vale do Aço pela iniciativa privada e pelo poder público, bem como o modo como os
profissionais da cidade entenderam e fizeram uso de teorias urbanísticas e arquitetônicas a fim de
projetar e construir seus espaços. Já seguindo a terceira linha, são analisados instituições e
acontecimentos que permitem reconhecer como se formou e organizou uma sociedade auto-dirigida,
uma comunidade urbana com autonomia política, no sentido weberiano, mesmo sob a égide da
indústria, um legado cujo principal mérito não está na sua forma original, mas no aprendizado gerado
a partir dele, transformando-o em expressão mais completa da cidade como um tudo, pois engloba
tanto imposições, quanto oposições, socialmente organizadas.
Norteada pelas linhas acima expostas, a pesquisa se deu através de levantamentos de campo,
(entrevistas, fotografias, documentos, mapas e depoimentos em acervos públicos e privados) e
bibliográficos (livros, imagens, teses, artigos técnicos e acadêmicos)
3
contendo elementos teóricos e
históricos. A elaboração do trabalho exigiu que esses levantamentos se entrelaçassem: num primeiro
momento os levantamentos de campo serviam como base para comprovação ou não das questões
teóricas apontadas a partir das pesquisas bibliográficas e, num segundo, era o contato com a realidade
que levava a formulação de questões cujas respostas exigiam um retorno à literatura acadêmica a fim
de encontrar paralelos e assim, poder entendê-las e explicá-las melhor. Portanto, o trabalho resultou de
um processo de sucessivas aproximações, no qual freqüentemente se transitou de um extremo a outro,
procedimento que visava uma compreensão mais ampla do objeto de pesquisa e a redução dos
equívocos na interpretação das informações analisadas.
Este procedimento apoiou-se nas portas conceituais propostas por Stella B
RESCIANI (1990)
4
, que
tomadas como balizas, sinalizaram para aspectos que guiaram a elaboração dos capítulos, cada um
deles focalizando um aspecto considerado relevante no relacionamento entre a ACESITA e Timóteo.
Portanto, cada capítulo privilegia determinadas fontes que, levantadas e analisadas no curso das
disciplinas e trabalhos programados, foram aprofundadas, reunidas e organizadas na forma aqui
apresentada.
Assim, no primeiro capítulo buscou-se reunir e avaliar os parâmetros teóricos sobre os quais se assenta
a noção de cidades empresariais. Neste sentido foram trilhados dois caminhos: num primeiro buscou-
se compreender alguns dos conceitos envolvidos na denominação “cidade empresarial”. A relação
entre indústria e cidade é analisada desde seu surgimento até os momentos atuais tendo como
parâmetro o desenvolvimento de atividades produtivas, verificando-se os principais responsáveis por
transformar a casa e a cidade de bens de consumo em bens de troca, processo facilmente reconhecível
3
Um relatório das atividades desenvolvidas ao longo da pesquisa, os acervos pesquisados e os principais materiais optidos
encontra-se no AnexoI_tab22.
4
O que se propõe é: ao transitar pelos corredores delimitados pelas linhas descritas acima lançar olhares através destas
portas, de forma a constantemente situar e contextualizar as informações e dados colhidos.
5
nas cidades empresariais. Outro aspecto abordado nesta parte diz respeito à diversidade de nomes,
definições e formas de classificação encontradas na literatura estudada a fim de designar os conjuntos
edificados por empresários para abrigar seus empregados. Na segunda parte deste capítulo, o foco cai
sobre os temas – habitação, cidade, condições de vida do operariado e arquitetura – que guiam as
discussões dos diversos autores que, direta ou indiretamente, tratam da influência da indústria na
construção do espaço urbano. Dentre esses temas, o que recebe maior destaque é a habitação, pois seja
construída pelos industriais, seja pelo Estado, ela é o elemento em torno do qual se tem
problematizado a organização das cidades modernas. A cidade é tratada tanto como indutora da
industrialização (pela concentração do mercado consumidor e oferta de mão de obra), quanto como
sua conseqüência (uma vez que muitas vezes a indústria, não só induz o crescimento da cidade, como
busca gerar novas). Já as condições de formação do operariado aparecem como a razão última de
obras realizadas por industriais tendo como fim a arregimentação, formação e manutenção de mão de
obra. Mais do que um instrumento neste processo, é na arquitetura, que todas estes desígnios são
concretizados com o emprego do componente tecnológico, apresentando-se como expressão da síntese
entre a intenção e a consecução.
O segundo capítulo tem por objetivo contextualizar nacional e historicamente a implantação da
ACESITA e o conseqüente início da construção de sua cidade operária. Ele principia com uma
tentativa de verificar o modo como desenvolvimento e industrialização se relacionam, através de uma
comparação entre este ideário no Brasil e nos Estados Unidos, o que indicA similaridades entre os
projetos que resultaram na formação da CVRD – Companhia do Vale do Rio Doce e da TVA –
Tennesse Valley Authority, sendo ambos planos de desenvolvimento regional de cunho nacionalista,
que haviam adotado a industrialização como elemento primordial para sua promoção e que foram
marcados por um prolongado e intenso debate entre iniciativa privada e o poder público local (Norris
x Ford e Bernardes x Farquhar) quanto à exploração de recursos naturais nacionais. Comparação que
além de mostrar que o projeto norte americano encontra paralelos não somente com a criação CHESF
e Paulo Afonso, como também com o grande impulso que o desenvolvimento da indústria siderúrgica
nacional deu a todo o processo brasileiro de industrialização. Além do que, o envolvimento de Percifal
Farquhar neste debate e seu encerramento com a assinatura dos Acordos de Washington marcam
também o nascimento da ACESITA, já que foi com os recursos oriundos daí que ele, associando-se a
dois brasileiros fundou a empresa. Assim, após uma contextualização da industrialização como ideal
de desenvolvimento e desta como um dos principais indutores do processo de urbanização, na
primeira parte é apresentado o caso da TVA e da cidade de Norris, construída a fim de viabilizar a
construção de uma de suas barragens. Na segunda parte se percorre as principais tentativas de
implantação da indústria siderúrgica no Brasil desde o período imperial, passando pelos embates sobre
a “vocação da nação”, pelas disputas pelo minério de ferro nacional, pelas discussões sobre
protecionismo, conflitos entre capital privado e estatal, até a assinatura dos Acordos de Washignton,
com a implantação da Companhia Siderúrgica Nacional e a construção da cidade de Volta Redonda.
6
O desenvolvimento econômico e o processo de urbanização do Estado de Minas Gerais são o objeto
do terceiro capítulo. A organização urbana gerada PELA exploração aurífera nos século XVIII e a
gerada pela siderurgia a partir da década 1930, sem terem ocorrido de forma homogênea, constituem
um dos poucos elementos comuns à região central do estado de Minas Gerais, significando, no século
XVIII, a exploração de um território praticamente virgem e no século XX, o rompimento com o
padrão de agricultura de subsistência fundamentada na pequena propriedade. Assim, embora a região
designada “mineradora central” jamais tenha perdido completamente sua importância, assiste-se ao
longo do século XIX uma reversão ao mundo rural a partir do quadro gerado pela mineração do ouro,
quando as cidades mais do que dominar o universo rural, o haviam antecedido. A implantação de
cidades siderúrgicas reviveu na metade do século XX a precedência urbana. Portanto, na primeira
parte deste capítulo busca-se, através da análise bibliográfica, apresentar as condições sobre as quais
se assentou o processo de urbanização gerado pela instalação de usinas siderúrgicas no Estado de
Minas Gerais, mais especificamente no Vale do Rio Piracicaba. Já na segunda parte são as fontes
documentais que conduzem ao conhecimento e ao reconhecimento das especificidades do Vale do
Aço e a do projeto, implantação e desenvolvimento das cidades siderúrgicas de Monlevade (1936),
Ipatinga (1955) e Ouro Branco (1978), deixando Timóteo para o capútlo seguinte.
No quarto capítulo, a história de Timóteo é apresentada em dois tempos. No primeiro observa-se desde
as primeiras notícias do estabelecimento do povoado, Às transformações pelas quais ele passou com a
chegada da ACESITA, com a construção e consolidação da cidade operária, chegando até o momento
que o estreito relacionamento entre empresa e cidade foi mais fortemente questionado. Tendo como
marco a década de 1980, quando o plebiscito para o nome da cidade explicita e oficializa uma
importante inflexão ness relacionamento, mostra-se que o que poderia ser a consagração da obra
iniciada Ha quase quarenta anos, com a comunidade reconhecendo a força do vínculo com a empresa,
acabou por explicitar o quanto a ACESITA não mais desejava este vinculo. Na segunda parte do
capítulo demonstra-se que embora a empresa tenha declarado desejar um maior afastamento dos
problemas urbanos, ela permaneceu presente, que seu afastamento foi sempre relativo, sendo esta
simplesmente umA ruptura no seu modo de intervir. De modo que, mesmo com a privatização e a
ampliação do uso do carvão mineral, alterando a matriz energética da usina - fatores que poderiam
significar uma drástica redução da presença da ACESITA na vida urbana da cidade pois implicaram
em violenta redução do quadro de SEUS empregados diretos - a cidade permaneceu e permanece
dependente da ACESITA. Finaliza o capítulo o exame da emergência da problemática ambiental E a
mudança de foco na ação social da empresa, com a companhia participando de planos e projetos de
recuperação de rios, córregos e da mata nativa mas sempre explorando novas regiões (Vale do
Paraopeba).
Já no quinto capítulo, o tema é a construção do espaço físico da cidade, que numa primeira parte é
analisado a partir daqueles que o conceberam e projetaram, os profissionais da cidade. Profissionais
que nem sempre possuíam formação condizente com os cargos que exerceram, mas que por serem
7
incumbidos pela companhia e pela prefeitura de cuidar do setor de urbanismo foram responsáveis pela
formação do pensamento urbanístico na cidade. Dentre estes profissionais se destaca o engenheiro
Romeu Duffles, autor do primeiro projeto da cidade, José Luiz Batista, único arquiteto empregado
pela empresa em Timóteo e que atuou concomitante como funcionário da ACESITA, das prefeituras
de Coronel Fabriciano e Timóteo, como arquiteto autônomo e posteriormente como empresário,
finalmente há Fernando Sena, engenheiro mecânico, que foi o responsável pelo setor de urbanismo da
empresa por mais de vinte anos. No entanto, há que se considerar que o espaço ora observado é muito
mais do que os projetos traçados por estes profissionais, o desenho das quadras e ruas são tanto
resultado dos ideais por eles elaborados e interpretados quanto da mão do destino, da ação de outros
atores que fizeram do traçado das ruas e do desenho das fachadas o que são hoje. Mas se na primeira
parte do capítulo a cidade é vista pelos olhos daqueles encarregados de projetá-la, na segunda a leitura
é feita a partir de seus usuários. Esta leitura perceptiva de sua paisagem toma de empréstimo os
mesmo cinco elementos utilizados por Kevin Lynch: vias e percursos, setores e bairros, limites e
barreiras, pontos nodais e por fim, marcos e edifícios, a fim de encontrar o sentido das dicotomias que
estão na base da organização espacial de Timóteo. Dicotomias cujas tentativas de diluição tem levado
ao progressivo desaparecimento de vestígios de seu passado e com eles da identidade da cidade.
No sexto capítulo busca-se entender a cidade como sociedade, a partir das instituições e movimentos
que sob os auspícios da companhia ou não, formaram-se e tomaram corpo fora dos portões da fábrica.
Tendo como pressuposto que, independentemente de ter um projeto social explicito e bem organizado
ou não, ao propor a construção de uma nova cidade, a indústria acaba também por propor uma
determinada forma de organização social, observando-se que mesmo os momentos de calmariam, em
que esta organização é dominada pela indústria há oposições e conflitos. O momento de explicitação
destes conflitos, especialmente através de organizações operárias e manifestações culturais, é também
o momento que marca a consolidação de uma identidade própria para a comunidade, uma identidade
que embora fundamentada na sua origem industrial reflete mais os anseios da população do que da
fábrica e ou seus prelados. Em Timóteo este processo de construção de uma identidade própria tomou
impulso na década de 1950, quando sob a direção do General Edmundo de Macedo Soares a
identificação entre a companhia e a população local foi fortalecida por obras sociais e urbanas,
identificação que sofreu poucos abalos na década de 1960 quando ela foi emancipada e aberta, sendo
que, somente na década de 1980, uma maior independência entre a cidade e a indústria se explicita na
forma de manifestações populares e instituições. Assim, a identidade social de Timóteo foi forjada
tanto pelo confronto quanto pelo consenso, pois ela tem como base a estrutura e os ensinamentos que a
indústria havia imputado a seus empregados, transformadas e adaptadas a fim de responder não aos
anseios da indústria mas da população. É assim que em Timóteo, a organização e a burocracia
aprendidas no escritório ajudam a fundar os times de futebol e a liga desportiva, cujas competições
motivaram a fundação de novos clubes recreativos, que a Igreja Católica passa de cúmplice na
exploração dos carvoeiros com a Benepó, a berço do sindicato dos trabalhadores rurais, que o
8
armazém se transformou em cooperativa de consumo, que o assistencialismo da empresa foi assumido
pelo sindicato e que o carnaval deixou de ser simplesmente uma brincadeira para tornar-se crítica da
realidade.
Mais do que o reconhecimento dos diversos aspectos do legado urbano da indústria à cidade
(econômico, político, social, cultural e urbanístico), discutidos ao longo do trabalho, neste último
capítulo busca-se verificar qual seu significado e assim descobrir porque alguns permaneceram
intocados, outros foram profundamente alterados e outros quase desapareceram. Esta identificação e
significação dos vestígios do passado ao esclarecer qual deles se deseja preservar, quais se têm tentado
apagar e de que forma isto vem sendo feito é o que permite vislumbrar os valores que tem norteado a
organização da cidade. Assim, da eleição dos heróis locais para protagonizar sua história,
fundamentada no pioneirismo dos seus fundadores e no patriotismo de seu grande construtor, até o
ecologismo das atuais políticas sociais, a ACESITA tem participado de forma ativa na construção de
um conjunto de valores que guiam mais do que os hábitos cotidianos da população, eles servem como
parâmetros na determinação dos elementos adotados para representar a cidade e sua sociedade.
Portanto, o legado urbano da ACESITA vai muito além da construção da Timóteo do passado ou
mesmo da do presente, pois mais do que a materialidade das ruas e edifícios, estradas e pontes, da
fumaça das chaminés e do apito da fábrica, ou mesmo do que a imaterialidade do conhecimento
técnico, de um modo de vida, de atividades sociais e das instituições que ajudam a regular o convívio
social, ele participa ativamente na construção de sua memória, ajudando a constituí-la enquanto
comunidade com poder de identificar seus interesses específicos e lutar por seus espaços físicos e
políticos.
Capítulo I: CONCEITUANDO CIDADES EMPRESARIAIS
Fig. 04: Industrial Landscape
(L. S. LOWRY, 1955)
Arte que te abriga arte que te habita
arte que te falta arte que te imita
arte que te modela arte que te medita
arte que te mora arte que te mura
arte que te todo arte que te parte
arte que te torto ARTE QUE TE TURA
(Leminski, 2001)
10
I.1 CIDADE E INDÚSTRIA: UMA RELAÇÃO ESPACIAL
Embora possa parecer obvio, é pertinente lembrar a observação de
LEFEBVRE (1991: 03): “A cidade
preexiste à industrialização”, e antes da cidade, acredita
MUMFORD (1998: 11), houve “... a povoação,
o santuário e a aldeia; antes da aldeia o acampamento, o esconderijo, a caverna, o montão de
pedras...”, todos frutos da disposição e necessidade do homem de viver em sociedade. Assim, o que
num primeiro momento chama-se “cidade” é um aglomerado humano de caráter mais ou menos
permanente, que é, no entanto, inseparável da substância econômica que o torna possível. Cidades
como as arcaicas, que eram moradas dos antepassados, centros de peregrinação e celebração de ritos e
mistérios; como as da Antigüidade clássica, que funcionavam como focos de poder político e ponto de
concentração militar; ou ainda como as medievais, que se constituíam em refúgio e entreposto
comercial; cidades que eram obras, pois ganhavam importância somente enquanto serviam de palco
para o desenvolvimento de atividades, estando, assim, isentas de qualquer valor de troca e repletas de
valor de uso (L
EFEBVRE, 1991).
Contudo, se, para M
UMFORD
5
, o surgimento da cidade é marcado pela constituição de comunidades
capazes de concentrar funções antes dispersas pelas aldeias, mais do que pela revolução agrícola, que
permite a produção de um excedente comerciável, para W
EBER (1958), o que caracteriza
economicamente
6
uma cidade é sua capacidade de comércio, independentemente da origem dessa
produção
7
, sendo a cidade um mercado, vista a necessidade de consumo de seus habitantes não ser
satisfeita pela produção local; já para B
ENÉVOLO (2001)
8
, é o domínio da produção que transforma a
aldeia em cidade, que passa então a controlar o campo; e, embora C
ASTELLS (2000: 42) deixe claro
que não se trata de uma questão de precedência do campo sobre a cidade, esta “... só pode existir na
base do excedente produzido pelo trabalho da terra”. Assim, ao tomar como parâmetro o processo
produtivo, o desenvolvimento de atividades rurais geradoras de um excedente é visto como pré-
condição ao surgimento das cidades, que, tornando-se responsável por seu controle, faz do campo seu
dependente.
5
Para MUMFORD (1998: 36), o germe da cidade é o ponto de encontro cerimonial, sendo que o que a distingue da aldeia é sua
capacidade de concentrar funções diversas (“cada novo componente da cidade, por essa mesma razão, apareceu
inicialmente fora de seus limites, antes que a cidade o adotasse.”), antes esparsas por diferentes aldeias, do que pela
revolução agrícola, sendo a cidade uma união entre a cultura neolítica (técnicas agrícolas e cultos religiosos) e a paleolítica
(belicosidade e divisão do trabalho). Para o autor, portanto, a cidade é descrita como: “... uma estrutura especialmente
equipada para armazenar e transmitir os bens da civilização e suficientemente condensada para admitir a quantidade
máxima de facilidades num mínimo de espaço, mas também capaz de um alargamento estrutural que lhe permite encontrar
um lugar que sirva de abrigo às necessidades mutáveis e às formas mais complexas de uma sociedade crescente e de sua
herança social acumulada.” .
6
WEBER (1958) salienta, contudo, que a noção econômica isoladamente não é capaz de definir a cidade, sendo necessário
somar um conceito político (fortaleza e cidadania). Na interpretação de M. I.
SZMRECSANYI (1994), Weber entende a cidade
como essencialmente uma comunidade política que defende sua autonomia ante poderes externos, estando na origem tanto
dos Estados como da democracia.
7
Economically defined, the city is a settlement the inhabitants of which live primarily of trade and commerce rather than
agriculture … In the meaning employed here the ‘city’ is a market place.” (W
EBER, 1958: 66)
8
Há cerca de 5.000 anos, nas planícies aluviais do Oriente Próximo, algumas aldeias se transformaram em cidades; os
produtores de alimento são persuadidos ou obrigados a produzir um excedente a fim de manter uma população de
especialistas: artesãos, mercadores, guerreiros e sacerdotes, que residem num estabelecimento mais complexo, a cidade,
daí controlam o campo.” .
11
Esta postura é levada além por Jane JACOBS (1969) em “The economy of the city”, em que a autora
defende as idéias de que não só o campo depende da cidade, como a de que esta é pré-condição para
a existência do campo (das atividades que levam à sua ocupação). Para construir seus argumentos, a
autora inspira-se em estudos sobre uma cidade neolítica – Çatal Hüyüka, no planalto da Anatólia
(Turquia), constrói uma cidade fictícia (New Obsidian), regida pelos mesmos “... processos
econômicos que tem encontrado operando em nossas próprias cidades e períodos históricos
9
.
(JACOBS, 1969: 19). Nascida do assentamento de um grupo de caçadores-coletores que se fixaram na
região e passaram a comercializar o vidro vulcânico (obsidian), ferramentas feitas com capim negro
(black grass)
10
, a cidade sobrevivia da troca desses produtos, sendo, portanto, caracterizada por
atividades extrativas e manufatureiras. Retratando os processos econômicos que ocorrem nessa
cidade, a autora indica como atividades consideradas tipicamente rurais, como a pecuária e a
agricultura, teriam nascido urbanas
11
, e que somente com o crescimento da população resultando na
necessidade de aumento da produção para abastecimento interno, novas técnicas de criação e plantio
iriam surgindo, as quais, pela necessidade de maior adensamento da cidade, iriam expulsá-las para o
campo. Assim, não só a cidade teria dado origem às atividades rurais, como teria ditado seu
crescimento e desenvolvimento, pois o campo teria se tornado cada vez mais dependente das
ferramentas e tecnologias desenvolvidas e produzidas na área urbana.
12
Essa dicotomia entre campo e cidade fez da sociologia um dos campos mais férteis para discussão da
relação entre cidade e indústria. Nela, o adjetivo “urbano” ganha força de substantivo designando o
“espaço da cidade”, contraponto do “rural”, o “espaço do campo”, e é sobre essa diferença que se
apóiam as definições de cidade, que também passam constantemente pelo conceito de cultura
13
.
Assim,
a atitude blasé do morador da cidade, descrita por George S
IMMELS (1902), opõe-se à do habitante do
campo; a civilidade que adota o urbanismo como modo de vida de Louis W
IRTH (1940) é sinônimo de
urbanidade, que se espraia dela para o meio rural e para os “confins da terra”, ou seja, pelo que não é
urbano; da mesma forma, Max W
EBER (1958) afirma que, enquanto as cidades concentram e
controlam as atividades econômicas, políticas e culturais, ao campo cabe a produção agrícola.
Entretanto, a contraposição entre campo e cidade, que, segundo Raymond W
ILLIAMS (1989), é uma
construção originária da necessidade de marcar duas formas diversas de organização (social e
econômica), parece fazer sentido somente a partir do momento em que se consolida a idéia de cidade,
havendo então a necessidade de algo que lhe faça oposição. De forma que a noção de campo só surge
quando se torna imprescindível uma distinção entre o que é urbano e o que não é, ou seja, mesmo
9
... economic processes that I have found operating in cities of our own historical time”. (JACOBS, 1969: 19).
10
Um capim preto que, por nascer das cinzas dos vulcões que margeiam o platô, existia somente nesta região, sendo colhido
desde os primórdios da povoação, nunca cultivado.
11
Próximas à aglomeração, muitas vezes nos quintais das casas.
12
Nesse ponto, CASTELLS (2000) e JACOBS (1969) concordam; para ambos é a cidade que detém o controle da produção,
inclusive a rural.
13
Para CASTELLS (2000: 39), na sociologia o termo “urbanização” assume duas conotações: “[1] Concentração espacial de
uma população, a partir de certos limites de dimensão e densidade. [2]Difusão do sistema de valores, atitudes e
comportamentos denominados ‘cultura urbana’.”
12
sendo considerado mais primitivo, até mesmo anterior por alguns autores, o rural ganha valor
explicativo somente à medida que faz contraponto ao urbano
14
.
No entanto, ao ser analisado sob a óptica da divisão social do trabalho, observa-se que esta
contraposição aproxima-se mais da idéia de complementação do que de oposição, verificando-se uma
especialização das atividades econômicas favorecidas pelas condições peculiares a cada um deles. De
tal forma que, no campo, priorizam-se a agricultura e a pecuária – maior disponibilidade de terras e
mão-de-obra menos qualificada – e na cidade concentra-se o comércio, serviços e indústria –
concentração do mercado consumidor, mão-de-obra mais qualificada, desenvolvimento tecnológico e
mercado financeiro. Segundo Paul S
INGER (1968: 10), “A divisão de trabalho o condiciona apenas
determinadas relações entre os indivíduos e grupos da sociedade; ela também condiciona as relações
entre coletividades diferenciadas no espaço, isto é, entre regiões geoeconômicas distintas
15
.
Também para Karl M
ARX (1999: 407) esta abordagem é essencial, pois acredita que “O fundamento
de toda divisão social do trabalho, desenvolvida e processada através da troca de mercadorias é a
separação entre cidade e campo. Pode-se dizer que toda história econômica da sociedade se resume
na dinâmica dessa antítese...” (sem grifo no original). E embora não se detenha neste ponto, ao
descrever o desenrolar da Revolução Industrial e a introdução da energia a vapor, aponta para a
ampliação da importância do papel desempenhado pelas cidades, pois, estas, já concentrando grande
parte da população, puderam prover abundante mão-de-obra e reunir um expressivo mercado
consumidor, tornando-se lócus preferencial para instalação das indústrias, que, antes (atraídas pelas
quedas d’água), encontravam-se dispersas no campo. A introdução do que M
ARX (1999) chamou de
“máquina-ferramenta”
16
acentua a substituição do modo de produção artesanal da manufatura pelo
fabril e abre caminho para o desenvolvimento da grande indústria. O relacionamento da indústria com
a cidade cresce em complexidade, pois, se por um lado, a proximidade entre ambas era atraente para a
primeira por causa da existência de redes de infra-estrutura
17
, ao contato com mercado consumidor e
ao acesso a reservas de mão-de-obra
18
, por outro, a atração era contrabalançado pela emergência de
graves problemas sociais e de ordem sanitária
19
, com raízes nos baixos salários; a extrema exploração
14
Indistinção que Paul SINGER (1968: 26) nota ao analisar a cidade de São Paulo na primeira metade do século XIX,
afirmando: “... como era notório, não havia separação nítida entre zona rural e urbana, invadindo as chácaras, áreas
diretamente adjacentes ao ‘centro’ da cidade”.
15
Embora o autor esteja referindo-se à diferenciação entre as microrregiões do país, das quais análise de cinco grandes
cidades, onde cada uma acaba por cumprir um papel, conforme indicado acima, campo e cidade podem ser vistos como
lócus ou regiões geoeconômicas distintas.
16
Para Marx, “máquina de ferramenta” é o equipamento que substitui as mãos humanas: “... máquina-ferramenta emancipa-
se, desde o início, da barreira orgânica que a ferramenta manual de um trabalhador não podia ultrapassar”. (M
ARX,
1999: 430). Isto se dá pela utilização de um instrumento com maior capacidade de realização (tear com múltiplos fusos),
por uma máquina transmissora de potência e pela regularidade das máquinas geradoras de força motriz diversa da humana
(vapor).
17
Principalmente vias de comunicação, estradas e posteriormente linhas telegráficas que facilitavam tanto a aquisição de
matéria prima quanto à comercialização e distribuição do produto manufaturado; além das redes de abastecimento (água e
gás) que iam sendo implantadas.
18
Constituindo-se num exército de reserva que permitia ampliar a extração da mais-valia pelo controle dos salários.
19
Destacam-se as descrições de Friedrich ENGELS (1988) e os trabalhos de Michelle PERROT (1991) e François BÉGÜIN
(1991), além de textos literários como os de Dickens, Zola entre outros.
13
do trabalho combinada à especulação com o preço da terra urbana e ao custo das construções gerava
nas cidades ocidentais extremas dificuldades de abrigo para o operariado urbano. Uma situação que,
conforme esclarece Fridriech E
NGELS (2000) em “The housing question”, só agravava os problemas
sociais, sendo a antítese entre cidade e campo o cerne do problema habitacional. Para Engels, a única
forma de eliminar esta diferenciação é a abolição do modo capitalista de produção, como os “utopistas
modernos” Robert Owen e Chales Fourier já haviam percebido elaborando planos-modelo nos quais
não há tal distinção
20
.
Esta visão da grande cidade como local que concentra os grandes males do momento é reforçada por
Louis M
UMFORD (1998), para o qual seu crescimento e o surgimento das primeiras metrópoles
modernas – descritas como “paraísos paleotécnicos
21
, uma vez que se mostravam capazes de reunir
às mais avançadas tecnologias de produção o mais ancestral modo de vida –, relaciona-se ao
predomínio do laissez-faire por parte do Estado, acompanhado do liberalismo econômico ditado pelos
interesses burgueses, seguindo-se um profundo questionamento do urbano. Transformadas em alvo da
atenção de pensadores, políticos, médicos e engenheiros, as principais capitais da Europa foram
varridas por ondas de reformas, sendo a de Paris paradigmática. Estas reformas tinham como
prioridade a regulação dos “fluxos” (da circulação de pessoas e mercadorias à circulação da água, ar e
dejetos) e o embelezamento urbano, deixando a cargo do mercado a oferta de habitação ao
proletariado expulso das áreas centrais, usualmente núcleo inicial da cidade. Para os industriais, esse
procedimento apresentava-se, por um lado, pouco compensatório, visto que acarretava gastos diretos e
indiretos com o operário, fosse pelo aumento de salários
22
ou pela queda da produtividade ocasionada
por doenças
23
; por outro, acenava com a possibilidade de ampliação dos lucros, por intermédio da
construção de habitação para os trabalhadores. Esses lucros poderiam ser obtidos de forma indireta,
pois, ao locador-patrão, era permitido controlar o tempo e as condições de vida do operariado, mesmo
fora da fábrica
24
, induzindo-o ou obrigando-o a atividades e condutas que poderiam refletir
20
On its own admission, therefore, the bourgeois solution of the housing question has come to grief-i has come to grief
owing to the antithesis of town and country. And with this we have arrived at the kernel of the problem. The housing
question can only be solved when society has been sufficiently transformed for a stat to be made towards abolishing the
antithesis between town and country,... but only by the solution of the social question, that is, by the abolition of the
capitalist mode of production, is the solution of the housing question made possible. To want to solve the housing question
while at the same time desiring to maintain the modern big cities is an absurdity.
(ENGELS, 2000).
21
O acentuado crescimento das cidades, no final do século XIX e início do XX, será acompanhado pela emergência de toda
uma literatura onde prevalece a idéia do urbano como algo grandioso e aterrador. Num misto de terror e deslumbramento, a
imagem da cidade é a do monstro, de um ser desconhecido cujos tentáculos se prolongam em todas as direções, gerando
novos ruídos e odores. Mais do que os edifícios das fábricas, ou mesmo as novas máquinas que circulam nas ruas (bondes
e automóveis), o monstro urbano tem seus humores regulados pelo movimento da multidão que toma as ruas. (BRESCIANI,
1985).
22
A fim de viabilizar a reprodução da força de trabalho, há necessidade de se compatibilizar o custo de vida (do qual o gasto
com habitação é um dos principais componentes) com os salários. Esta forma, a liberalidade que imperava no mercado de
então, onde a grande procura fazia os preços se elevarem, regulava o mercado em níveis muito elevados.
23
Os gastos diretos seriam relativos à necessidade de aumento dos salários ou da construção de moradia para os
trabalhadores. Os gastos indiretos dizem respeito à proliferação de doenças ocasionadas pelas péssimas condições de
higiene tanto na fábrica quanto na cidade e nas moradias, reduzindo o rendimento dos trabalhadores e refletindo na
produção.
24
Visitas surpresa e revistas, juntamente com toques de recolher (sirenes e interrupção do fornecimento de energia –
iluminação pública) e a promoção de atividades de diversas ordens, fossem obrigatórias ou não, eram instrumentos usados
com freqüência no controle do tempo do operariado, pois por intermédio delas se induzia aos comportamentos desejáveis.
14
positivamente na produção; e também de forma direta, pois, ao controlar o valor dos aluguéis, detinha
instrumento decisivo na regulação dos salários
25
.
Num contexto em que a crença no meio como formador do indivíduo vinha ganhando força nos mais
diversos setores da sociedade, a relação entre urbanização e industrialização, dada pela localização
industrial, deixava de ser determinada unicamente por condicionantes físicas (proximidade de fontes
energéticas ou de matéria-prima) e estruturais (vias de comunicação para escoamento da produção e
acesso ao mercado consumidor), adquirindo conotação social. E a construção de cidades inteiras por
indústrias assumia novos contornos ao somar ao projeto industrial um projeto social, cuja
concretização vinculava-se à existência de um projeto urbano. Nesse aspecto se pode sentir fortemente
a influência das idéias de Robert Owen e Charles Fourier
26
.
A partir daí, observa-se que a urbanização gerada pela indústria passa a criar cidades repletas de valor
de troca, pois, mais do que palco de atividades sociais, seus espaços compõem o quadro de
investimentos feitos pelo industrial, com a finalidade de ampliar seus ganhos, nos mesmos moldes do
que ocorrera com a moradia. E embora a “venda” do projeto urbano e social nem sempre seja condição
necessária para caracterizar uma cidade empresarial
27
, implícita ou explicitamente, o projeto urbano
foi, e continua sendo, utilizado pela indústria para atrair, explorar, manipular e fixar o trabalhador.
Assim sendo, a relação entre urbanização e industrialização, que nascera com a emergência da cidade
na condição de local de produção, valendo principalmente pelo seu caráter eminentemente de uso,
modifica-se com o empenho das indústrias capitalistas na construção do urbano, em especial, no caso
em que essas se incumbem de construir estruturas urbanas complexas, pois, transformadas em
mercadoria, são negociáveis tanto no plano concreto (moradia x salário) quanto no abstrato (qualidade
de vida), o que se torna possível devido ao entrelaçamento dos projetos industrial, urbano e social.
Momento em que, mais do que naquilo que B
EGUIN (1991) chama de passagem de um “conforto
selvagem” para o “conforto disciplinado”, esse caráter das cidades empresariais insere-se no contexto
do “urbanismo dos promotores de venda” de L
EFEBVRE (1991: 25), segundo o qual não se vende mais
“... uma moradia ou um imóvel, mas sim urbanismo. Com ou sem ideologia, o urbanismo torna-se
valor de troca”.
A intervenção empresarial no espaço urbano, no entanto, assumiu formas diversas, o que transparece
na diversidade de denominações dadas a estas experiências. Fato que, em si, não é problemático, como
coloca Telma C
ORREIA (2004a: 11):
25
A exploração do trabalhador pelo empresário industrial se dá por estas duas formas gerais, a partir das quais foram
desenvolvidos inúmeros mecanismos, que serão abordados com mais atenção no próximo capítulo e são descritos no texto
de François B
EGUIN (1991) “Maquinarias inglesas do conforto”, entre outros.
26
O século XIX foi prolífico na geração de pensadores sobre a cidade, assim as teorias sobre a cidade e com ela sobre a
cidade ideal incluíam preocupações de ordem econômica, social e política, compondo um grupo que Françoise C
HOAY
(2002) chamou “pré-urbanistas” (Robert Owen, Charles Fourier, Victor Considérant, Etiene Cabet, Pierre-Joseph Prodhon,
Bejamin W. Richardson, Jean-Baptiste Godin, entre outros)
27
Pois se encontra casos em que existiam núcleos populacionais anteriores à implantação da indústria, ou ainda em que esta
se instalou sem se preocupar com tais projetos, desenvolvidos a posteriori ou não.
15
... o problema essencial não está na diversidade das denominações empregadas, mas
exatamente numa atitude oposta de tentar eleger um único modo para nomear uma
diversidade de formas urbanas distintas. ... Aceitar estas diferentes formas de nomear é um
passo fundamental à compreensão da grande diversidade de formas assumidas pelo ambiente
construído destes lugares. Tal diversidade se expressa em termos de tamanho, variando entre
um pequeno grupo de moradias a grandes aglomerações com milhares de moradias e
equipamentos coletivos; em termos de forma, nos diversos estilos de arquitetura e de
parcelamento e traçado viário; e em termos do grau de autonomia da via local em relação à
empresa.”
Na mesma linha de raciocínio, Philip GUNN (1997) lembra que, se por um lado a construção de
assentamentos urbanos destinados à produção e marcados por um controle social rigoroso, exercido
por uma única empresa, pode ser encontrada em momentos muito anteriores, como no caso das
reduções indígenas e plantagens (plantations) criadas nas Américas nos séculos XVI e XVII
28
, por
outro lado, aponta para as descontinuidades e obstáculos desse percurso; obstáculos que permitem,
num primeiro momento, colocar num mesmo rol experiências tão distintas quanto reduções,
plantations, colônias de povoamento, colônias de exploração, comunidades religiosas e cidades
empresariais, pois em todos os casos encontram-se exemplos onde é possível detectar tanto uma forma
empresarial de gestão quanto o controle total da cidade por uma única companhia, mas por outro,
observa-se que os projetos, objetivos e intenções, que levaram à sua construção, são bastante diversos
e têm reflexos profundos tanto na sua organização formal quanto funcional.
A detecção de diferenças nos objetivos que conduzem a uma dada organização do território, levada a
cabo por agentes diversos, corresponde a um aspecto de grande relevância, visto sua estreita
vinculação com fatores formais e sociais que serão colocados em ação por ela. Das dimensões à
configuração espacial, localização e desenho de vias, edifícios industriais, comerciais e residenciais,
passando por espaços comunitários, como praças, clubes e escolas, até o número de pessoas, sua
procedência, formação e remuneração, são aspectos grandemente determinados ou, pelo menos,
conceitualmente planejados, pelos promotores de tais intervenções de acordo com suas intenções e
objetivos.
Intencionalidade que pode ser entendida como ”ato de vontade
29
,
conceito empregado por Ervin
G
ALANTAY (1975) ao estudar as cidades novas e que, segundo ele, é elemento essencial para seu
entendimento, pois
"As cidades novas são comunidades conscientemente criadas em resposta a objetivos
claramente formulados. A criação de uma cidade como um ato de vontade pressupõe a
existência de uma autoridade ou organização suficientemente efetiva para assegurar o lugar,
reunir os recursos para seu desenvolvimento, e exercer o controle continuamente até que a
28
Permitindo rastear, a partir daí, as origens das cidades empresariais (GUNN , 1997).
29
Conceito que GALANTAY (1975: 129) extraí da obra de Bacon, segundo o qual ‘a cidade é um ato de vontade’, pois a
definição da forma urbana depende do relacionamento de inúmeros fatores, sendo resultado da sucessão de decisões inter-
relacionadas.
16
cidade atinja um tamanho viável."
30
(GALANTAY, 1975: 01) (grifo meu)
De onde se extrai a idéia de que a criação de "novas cidades" está diretamente ligada a uma
necessidade de planejamento não necessariamente urbano, mas de um plano de ação que assume
características diversas: política, para as novas capitais; colonizadora, para as cidades coloniais;
econômica, para as cidades empresariais; militar, para as fortalezas; religiosa, para as comunidades
religiosas; locacional, para as cidades satélites; e assim por diante
31
. O que faz da construção de
cidades novas não um objetivo em si, constituindo-se, mais propriamente, um subproduto de um
projeto mais amplo.
Vistas desta forma, as cidades empresariais são passíveis de ser incluídas no rol das cidades novas,
pois estas são estruturas materiais implantadas com o objetivo primeiro de viabilizar a produção
industrial, ou seja, antes de tornarem-se um projeto urbano já eram um projeto industrial. Além do
que, sua implantação é causadora de grande impacto, tanto no meio físico quanto na organização
econômica e social no âmbito local e, por vezes, até regional. No entanto, enquanto as cidades
empresariais podem ou não nascer de um projeto urbanístico, este é imprescindível às cidades novas,
denotando-se que nem todas as cidades empresariais incluem-se neste rol. A ausência de um projeto
urbanístico, no entanto, pode ser relevada quando se verifica a intencionalidade da empresa em
construir um núcleo urbano de dimensões suficientes para constituir um conjunto urbano, não somente
um grupo de casas para abrigo de seus funcionários. Assim, a cidade nova, da mesma forma que a
empresarial, está associada à idéia de urbanidade, tendo como característica marcante a implantação de
uma estrutura urbana capaz de causar forte impacto na região onde é construída, de modo que ela não
se forma, mas se implanta, fazendo com que num entendimento mais amplo da noção de cidade ela
não passe de uma “cidade latente”, que pode ou não se consolidar como tal, ou seja, uma estrutura
física e econômica que depende ainda da formação de uma estrutura social e política.
Da terminologia empregada para designar a intervenção empresarial no espaço, as “model” e
landscape towns” de Margareth C
RAWFORD (1995), as “resource towns” de Ira ROBINSON (1962) e
as cidades pré-industriais descritas por John G
ARNER (1992) também podem ser consideradas cidades
novas. No entanto, conforme mencionado anteriormente, cada uma destas denominações carrega
consigo uma especificidade, um aspecto próprio que a distingue das demais. No caso das “model
towns”, é a presença indelével de um projeto social, seja de cunho religioso ou meramente
educacional. Projeto que implica num controle intenso da população tanto dentro como fora da fábrica,
30
"New towns are planned communities consciously created in response to clearly stated objectives. Town creation as an act
of will presupposes the existence of an authority or organization sufficiently effective to secure the site, marshal resources
for its development, and exercise continued control until the town reaches viable size." (G
ALANTAY, 1975: 01)
31
Assim, cidades novas como as novas capitais encontram-se subordinadas a uma ordem ou ideologia política que induz a
uma determinada localização, forma e dimensão; enquanto uma nova cidade colonial se submete às determinações
políticas, econômicas e sociais impostas pela metrópole, que estabelece sua posição, distribuição e dimensão; já as cidades
satélites têm como parâmetro as condições econômicas e sociais da cidade central; enquanto que nas cidades industriais
essa "autoridade ou organização" pode ser representada tanto pelo Estado como pela iniciativa privada, que, por sua vez,
traçam projetos, planos ou leis aos quais tais esforços se vêem subordinados.
17
aspecto considerado primordial para sua formação moral segundo os moldes pretendidos. Nestas
comunidades, muitas vezes inspiradas por utopias, é usual a figura do patrão confundir-se com a do
pai, conferindo-lhe uma autoridade que permite vigiar, premiar e punir sem questionamentos
32
. As
landscape towns” são cidades empresariais que, na concepção de Margareth C
RAWFORD (1995), têm
seu desenho condicionado às características da produção industrial e do local onde elas se
implantam
33
, sendo comum cidades ligadas a atividades extrativas, como a madeireira e mineração ou
mesmo barragens (Norris-USA).
34
Com relação àsresource towns”, o aspecto salientado é o tipo de
atividade: a exploração de recursos naturais. Atividade que, por exigir a proximidade das jazidas,
usualmente implica em grande isolamento ocasionado pela dificuldade de acesso (“remoteness”), além
de caracterizar-se por ter sua “durabilidade” limitada pelo esgotamento da mina. Fatores que indicam a
necessidade de edificar estruturas urbanas razoavelmente autônomas e auto-suficientes, que ao mesmo
tempo devem ser passíveis de transformarem-se, pois a perspectiva de modificação da atividade
principal, deslocamento para outra localidade ou abandono são intrínsecas à natureza da atividade à
qual se vinculam, dado o inevitável esgotamento do recurso explorado (Kitmat – Canadá, Tyrone –
USA, Marabá – BR).
A distinção entre cidade “mono-industrial” e “cidade industrial” também deve merecer alguma
atenção, haja vista a confusão que a popularização da denominação “cidade industrial” para as cidades
que sofreram alterações após a Revolução Industrial tem causado, levando a que se denomine como tal
qualquer cidade onde se localiza alguma atividade industrial, mesmo que esta não seja dominante ou
mesmo quantitativamente expressiva, confusão que se deve à influência dos trabalhos de Mumford e
Benévolo, e é perceptível na similaridade da forma com que a cidade pós-Revolução Industrial é
problematizada por autores nacionais e que, por vezes, tem levado a uma certa confusão no emprego
do termo “cidade industrial”. Para Maria Irene S
ZMRECSANYI (1994), esta confusão deve-se à forma
como Benévolo critica a cidade que denomina “industrial”, atribuindo-lhe característica mais
compatíveis a uma cidade capitalista da era concorrencial (liberal) do que de uma cidade dominada
pela indústria, o que fica patente na escolha dos principais exemplos utilizados pelo autor: Londres e
Paris. Cidades que embora sejam exemplos importantes do período o são não por seu caráter
industrial, mas por serem sede das transformações urbanísticas que o processo de industrialização, ao
introduzir tecnologias capazes de reestruturar a sociedade, havia acarretado e viabilizado, tornando-se
o que o próprio Benévolo denomina “pós-liberais
35
. Assim, designa-se “cidade industrial” aquela
32
Dentre os exemplos mais expressivos deste tipo de “company town” destacam-se as cidades de New Lannark (UK),
Pullman (USA) e Pedra (BR).
33
As cidades projetadas por Earle Draper, ao incorporar elementos do planejamento urbano de Unwin e Park e do paisagismo
de Olmstead, são precursoras da moderna “landscape architecture”.
34
No Brasil é difícil encontrar um exemplo deste tipo de cidades, pois as cidades planejadas para dar suporte à construção de
barragens e à extração mineração mineral (Ilha Solteira e Caraíba, por exemplo), têm seus projetos fortemente vinculados
ao movimento moderno, para o qual as especificidades locais na condição de condicionadoras da forma estavam
subordinadas às necessidades funcionais. Na Inglaterra as cidades jardins, por buscarem o respeito à paisagem local, são o
que mais se aproxima deste modelo, embora nelas não se explicite a relação com o processo produtivo.
35
Londres e Paris foram e continuam sendo importantes capitais comerciais e financeiras, enquanto uma maior concentração
industrial pode ser observada em cidades como Birmighan e Manchester e na França em Lyon.
18
cuja principal atividade econômica está baseada na produção industrial, sem que haja o domínio ou
controle de uma única empresa.
Já designações como acampamentos, cidades monoindustriais (ALLEN, 1966), vilas operárias (BLAY,
1985) e núcleos fabris (C
ORREIA,1995) também são utilizadas a fim de designar a atuação empresarial
sobre o espaço urbano
36
. Estas formas de atuação, no entanto, não são condizentes com o que se
entende por cidade empresarial, devido a características como: a efemeridade, para os acampamentos;
a existência de uma estrutura urbana anterior à chegada e domínio da indústria, no caso das cidades
monoindustriais
37
; a inserção ou proximidade de uma cidade preexistente, levando a uma condição de
dependência de seus equipamentos urbanos, quando se fala em vilas operárias
38
; e o fechamento
39
e
menores dimensões dos núcleos.
Desta forma, observa-se que a distinção entre núcleos fabris e cidades empresariais reside na condição
inicial dos primeiros, na condição de “núcleos de cidades” , e das segundas na qualidade de “cidades
latentes”. O núcleo fabril, embora usualmente possua características sociais condizentes com as de
uma comunidade urbana (dado seu isolamento, muitas vezes possuem comércio, atividades de lazer,
vigilância e administração independentes da municipal), sua estrutura física não possui dimensão
suficiente para se constituir numa cidade, além do que, conforme salienta Telma C
ORREIA (1995), por
ser propriedade privada, todos os equipamentos coletivos e todas as atividades desenvolvidas em seu
interior são controlados pelo proprietário. Desta forma, ao desenvolver-se e emancipar-se, ele pode
gerar uma cidade ou, ao permanecer com formato e dimensões próximos às originais, como os núcleos
construídos por usinas sucro-alcooleiras descritos por Gabriela C
AMPAGNOL (2003), continuar como
uma forma latente
40
.
Por sua vez, as cidades empresariais são “cidades latentes”, visto que, da mesma forma que as cidades
novas, são possuidoras de estrutura física condizente com a condição de cidade, embora possuam
estrutura social ainda carente de amadurecimento, amadurecimento que, não se pode negar, relaciona-
se a fatores de ordem política e administrativa, como a “abertura”
41
da cidade e sua emancipação
36
Para uma análise mais ampla das denominações da atuação empresarial na construção habitacional , incluindo jornais,
revistas e textos literários, ver Telma C
ORREIA (2004b).
37
Este é o caso de cidades como as dominadas pela Utah Copper Company Phelps Dodge Corporation, Morenci e Bisbee
(USA) descritas por A
LLEN (1966) e, no Brasil, como a cidade de Itabira.
38
Compõem este grupo vilas como a Cerealina, Crespi, Nadir Figueiredo, Economizadora, Boyes, etc, apresentadas
especialmente por Eva B
LAY (1985).
39
O fechamento dos núcleos fabris visava tanto regular o ingresso de pessoas e mercadorias, quanto a saída dos empregados,
de modo a facilitar a vigilância e controle dos hábitos cotidianos.
40
Assentamentos que, como os analisados pela autora na região de Piracicaba, usualmente localizam-se no meio dos
canaviais, portanto fora do perímetro urbano das cidades, e que são formados pelas casas para operários, chamadas
colônias ou avenidas, pelas casas dos patrões, escritórios, igreja, escola, cinema, armazém, campo de futebol e ambulatório
e, embora também sejam marcados por mecanismos de coação e exploração da mão-de-obra operária, como o sistema de
caderneta e as atividades recreativas, profundamente descritas e analisadas por José Sérgio LEITE LOPES (1978) em “O
vapor do diabo”, caracterizam-se pela sazonalidade e por reunir indústria e agricultura, constituindo-se numa forma de
moradia cuja origem é muito anterior à problematização da habitação popular nas grandes cidades.
41
Denomina-se “abertura” o momento em que a empresa decide-se pela venda ou doação de seus imóveis, usualmente a
venda das habitações para os empregados e doação dos espaços públicos ao poder municipal, que passa a se incumbir de
sua administração e manutenção. Outro termo utilizado neste mesmo sentido é “desmonte”, que se aplica neste trabalho no
19
política, bem como a própria organização social da comunidade
42
. Contudo, a estes devem somar-se
fatores de ordem psicossocial, observáveis somente a partir do momento em que a identidade da
fábrica não mais coincide com a da cidade. Este grau de maturidade é atingido quando a população,
por intermédio do surgimento de associações e organizações independentes da empresa, torna-se capaz
de expressar publicamente opiniões diversas das propostas ou impostas pela indústria-mãe. Em muitas
comunidades este processo torna-se evidente muito cedo,
43
enquanto em outras, tardiamente
44
.
Assim, no decorrer deste trabalho, “cidades empresariais” ou “company towns” são termos
empregados ao tratar de estruturas urbanas cuja construção deve-se exclusivamente a um projeto
industrial, independentemente de ter sido erigida ou administrada pela iniciativa privada ou pelo
Estado. Os fatores que as caracterizam são, primeiramente, o domínio por uma única empresa
industrial desde seu surgimento e, em segundo lugar, o fato de que, como as cidades novas, embora
muitas vezes nasçam com uma estrutura física condizente com a denominação “cidades”, seu corpo
social e sua organização política só mais tarde se consolidam.
A tradução de “town” como cidade é outro aspecto controverso, uma vez que pode ser entendido como
uma atribuição de características próprias de “cities” a núcleos urbanos cujas dimensões não seriam
condizentes com esta designação. Nas consultas a alguns dicionários de língua inglesa (The Merriam-
Webster Dictionary e The Webster Encyclopedic Unabridged Dictionary of English Language),
constatou-se que a distinção entre “city” e “town” baseia-se principalmente nas dimensões destes
agrupamentos urbanos, sendo a primeira definida em ambos como “um local habitado maior ou mais
importante que uma town, enquanto a segunda pode ser atribuída tanto a uma “área urbana em
contraste com o campo ao seu redor”, quanto a uma “área densamente povoada de tamanho
considerável com uma city ou borough”. E, embora a definição de “town” como “área urbana em
contraste com o campo ao seu redor” (The Webster Encyclopedic Unabridged Dictionary of English
Language, 1993) e, especificamente, na Nova Inglaterra, como “uma corporação municipal com poder
e organização menos elaborada que uma cidade” pareça aproximá-la mais do que no Brasil se pode
chamar “vila”: “povoação de categoria superior à aldeia ou arraial e inferior à de cidade”, seu
entendimento mais usual é de “conjunto de pequenas habitações independentes, em geral idênticas e
dispostas de modo que formem rua ou praça interior, por via de regra sem caráter de logradouro
público” (F
ERREIRA, 1999), sendo que o emprego corrente do termo “vila operária” para designar
conjuntos edificados por empresas para seus funcionários dentro ou nas vizinhanças das cidades, faz
sentido mais especifico do processo, seja ele gradual ou repentino, de desmanche e destruição dos conjuntos arquitetônicos
edificados pela indústria.
42
Importância que vai além do amortecimento dos conflitos de classe possibilitado pela formação de uma classe burguesa,
apontada Don R
EID (1981), pois o surgimento de atividades terciárias e, conseqüentemente, de uma burguesia comercial e
de serviços, ao adicionar uma nova camada à hierarquia social local, torna mais complexa e completa sua organização
social.
43
Como no caso de Nova Lima, cidade dominada pela mineradora Saint John d’El Rey Mining Comapny Limited,
constituída, em 1836 e que tem seu sindicato formado na década de 1930. Para a história da mina de Morro Velho
(adquirida pela Hanna Mining Company) e ver Osny P
EREIRA (1967).
44
Como se poderá verificar no caso de Timóteo (capítulo 6).
20
com que se evite tal tradução. Além disso, verificou-se não haver consenso quanto aos parâmetros que
diferenciam uma de outra, indiferenciação literalmente expressa em uma das mais populares
enciclopédias digitais da atualidade, a Wikipedia (pesquisa em jan/2007),
“A diferença entre towns e cities é entendida diferentemente em diferentes partes do mundo
de língua inglesa. Não há uma definição padrão internacional de city: o termo pode ser usado
tanto para uma town que possui status de city; como por uma localidade urbana que excede
um tamanho arbitrário de população; por uma town que domina outras towns devido a
particular significação econômica e administrativa.”
45
Esta acepção ampla para “cities” e “towns” também aparece na língua portuguesa com relação à
palavra “cidade”. Segundo Paulo César Xavier P
EREIRA (2001), o emprego abrangente da palavra
cidade acaba por se tornar um elemento redutor, camuflando diferenças e processos e promovendo
uma reificação da cidade, que passa a ser vista como objeto acabado, portanto a-histórico e passível de
ser representado somente por suas partes. É neste sentido que, a seguir, se busca demonstrar os
motivos por que se considera válido o emprego do termo “cidade empresarial”, justificando seu uso
não por ser a tradução mais literal, mas por proporcionar uma diferenciação com relação a outras
denominações dadas à intervenção empresarial no espaço urbano.
Postura oposta à visão de Giulio A
RGAN (1998: 234), para o qual, mesmo o termo “cidade nova” não é
válido, pois “A cidade não se funda, se forma. As cidades fundadas e construídas por imposição não
tiveram desenvolvimento, não são cidades”, levando-o a afirmar que Brasília não passa de um grande
ministério e que as cidades industriais de Ledoux e Garnier são uma extensão da fábrica. Noção da
qual Francisco D
AL CO (1972: 204) partilha. Segundo ele,
“... a cidade fábrica recusa a civilização urbana precisamente porque na cidade se realiza a
dialética entre as formas de economia e as formas sociais, enquanto que esta, de fato, tende a
configurar-se como puro modelo econômico. Por último, a ‘company-town parece o produto
de uma ideologia que tende a anular a cidade através da fábrica, fazendo desaparecer e
integrando o ‘urbano’ no ‘produtivo’.
46
De modo que o predomínio da finalidade econômica, ao sobrepor o componente produtivo ao urbano e
desta forma anular a cidade como tal, nega a mobilidade e complexidade social e reduz o espaço a
mero suporte funcional ou produtivo.
Também para Telma C
ORREIA (2004b: 22), o emprego do “termo cidade – nas variações ‘cidade
operária’, cidade de companhia’, ‘cidade industrial’ e ‘cidade-empresa’... ” é inapropriado, pois
45
The difference between towns and cities is differently understood in different parts of the English speaking world. There is
no one standard international definition of a city: the term may be used either for a town possessing city status; for an
urban locality exceeding an arbitrary population size; for a town dominating other towns with particular regional
economic or administrative significance.” (W
IKIPEDIA, s.d.3)
46
... la ciudad-fábrica rechaza la civilización urbana precisamente porque en la ciudad se realiza la dialéctica entre las
formas de la economía y las formas sociales, mientras que ésta, de hecho, tiende a configurarse como puro modelo
económico. Por último, la company-town parece el producto de una ideología que tiende a anular la ciudad a través de la
fábrica, haciendo desaparecer e integrando lo ‘urbano’ en lo ‘productivo’.
(DAL CO, 1972)
21
“... um núcleo fabril – planejado ou não por especialista, mas sempre construído por
imposição e sempre submetido a um controle amplo da empresa – nunca surge como uma
cidade. Eventualmente, pode vir a se transformar numa cidade, mas só quando perde sua
condição de núcleo pertencente e controlado pela empresa que o criou. Pelo tamanho e
características espaciais, podem surgir como aglomerações urbanas e como formas de
urbanização, mas nunca como cidades. São urbanos, mas não são cidades; estão no campo,
mas não são rurais: nisto está a especificidade destes lugares na urbanização capitalista.”
Sendo que as denominações anteriormente mencionadas visam somente a enfatizar aspectos
específicos destes locais, como a predominância de operários, o estreito vínculo com a empresa e seu
controle das propriedades fundiárias locais, acreditando que “todas estas designações, entretanto, não
superam o impasse de atribuir o estatuto de cidade a um lugar privado, destituído das condições e
atributos indispensáveis a uma verdadeira vida urbana”.
Analisando o caso de Paulista, José Sérgio L
EITE LOPES (1988: 510) diz se tratar de “... um caso
extremo na imprecisa fronteira que separa uma aglomeração residencial acessória a uma fábrica de
uma ‘cidade’”, pois, embora no aspecto econômico se aproxime da definição weberiana de cidade, em
decorrência da diversidade de ocupações e a abrangência do sistema de trocas, o controle centralizado
de todos os processos por uma mesma empresa e seu confinamento num espaço privado fazem que as
“fábricas com vila operária” se afastem desta definição. De modo que, mesmo permitindo a
constituição de uma “comunidade”
47
, estes locais só têm vida própria após a “libertação da cidade”, ou
seja, quando a “desobreirização” e conseqüente decadência da “fábrica com vila operária” tiverem
levado à desvinculação tanto financeira quanto técnica e pessoal (ou cultura) dos operários
48
, o que
ocorre somente quando a propriedade fundiária, os meios técnicos e a vida social local não são mais
controlados unicamente pela fábrica.
Contudo, apesar de concordar com a relevância destes processos, em vez de considerá-los como
elementos que desqualificam a condição de cidade dos conjuntos urbanos edificados por indústrias,
aqui eles são vistos como aspectos que ajudam a caracterizar uma forma específica de construção do
espaço urbano, na qual é um projeto econômico e produtivo que determina sua construção, na qual a
estrutura física antecede a social e na qual o controle e as decisões políticas de diversas ordens estão
submetidos à lógica empresarial. De modo que são exatamente estas características que se consideram
relevantes para validar a designação destes espaços como cidades empresariais, pois se trata
precisamente de uma forma de controle e conformação do território determinada e regida por ideais
capitalistas, com objetivos econômicos; portanto, fruto de uma ideologia fundamentada no lucro e que
47
Diferentemente dos núcleos das usinas, nos quais o afastamento do trabalho implica no rompimento de laços de sociais,
pois obriga a saída da casa, demonstrando que a indústria é o elemento que determina sua formação, desenvolvimento ou
fim.
48
José Sergio LEITE LOPES (1988: 581) fala em três vias de transformação. A primeira diz respeito à possibilidade de
obtenção de renda numa atividade que não seja controlada peal empresa. A segunda refere-se ao desenvolvimento de
atividades manuais independentemente do maquinário e tutela da fábrica. E, finalmente, a terceira relaciona-se à
transformação do operário da fábrica em “operário fabril clássico”, ou seja, que embora ainda esteja submetido à fábrica
pelo processo de trabalho, “... está livre dela na esfera exterior ao trabalho ...”, quando a exploração levada a cabo por
meio do controle da casa, do lazer e do consumo é substituída por outra, a da redução dos postos e intensificação do
trabalho.
22
não admite, ou pelo menos busca minimizar ao máximo, a influência de forças políticas e sociais
externas, constituindo-se, em última instância, em extensões da própria fábrica, um espaço que,
embora público, é gerido como privado.
A condição inicial de imposição de uma ampla e complexa estrutura urbana que, apesar do
fechamento, se pretende constituir numa cidade, é que, aqui, se considera como principal elemento de
distinção entre núcleos fabris e cidades empresariais, pois enquanto os primeiros são estruturas
urbanas cujo crescimento físico e social pode transformá-los em cidades, as cidades empresariais,
como as cidades novas, são estruturas que já nascem prontas, não se formam, se implantam, se
fundam, o que não implica em retirar delas seu caráter histórico, reconhecendo nas suas características
iniciais a possibilidade de concretização de um projeto urbano e industrial que pode vir a se consolidar
ou não, portanto de uma dinâmica social, econômica e política que, embora imposta, jamais pode ser
considerada estática ou acabada.
Valendo lembrar ainda que a observação dos conjuntos edificados por algumas hidroelétricas,
empresas de mineração e mesmo siderúrgica parece indicar a necessidade de oferecer uma maior
diferenciação entre empreendimentos que surgem como núcleos fabris e posteriormente conquistam
sua independência, e aqueles que já nascem não somente com dimensões e estrutura física condizente
com a de cidade, como emancipadas politicamente, como é o caso de Ouro Branco e Ipatinga
49
que
desde a fase inicial de projeto foram concebidas como “cidades abertas”. Fato que não implica em
terem funcionado desde o início como cidades plenas, verificando-se que até hoje apresentam
50
dificuldades na consolidação de um mercado imobiliário auto-regulado
51
. Assim como nelas, em Volta
Redonda e Timóteo também se pode observar a presença marcante da indústria na administração
pública, sendo constante tanto a presença de representantes das empresas diretamente no quadro da
administração municipal como a elaboração e desenvolvimento de projetos em conjunto
52
.
Portanto, observa-se que emancipação política não é sinônimo de independência administrativa, nem
social, pois, como se pode observar no caso de Timóteo, apesar de sua emancipação de Coronel
49
Apesar de ambos se implantarem em locais onde já havia pequenos núcleos urbanos (vide capítulo 3), inclusive Ouro
Branco tinha o status de município desde 1954, estes, embora “incorporados” às novas cidades, foram completamente
suplantados pelo modelo de urbanização por elas imposto.
50
Em Ouro Branco o superdimensionamento da área urbana, levando à desapropriação de terras muita além das necessárias,
gera um ressentimento tão profundo na população local, capaz de fazer com que, pelo menos até a década de 1990, a
planejada autonomia do mercado imobiliário não se concretizasse. Em entrevistas realizadas com a população local, este
ressentimento é evidente e, segundo um dos entrevistados, teria levado a empresa a reduzir seus esforços no sentido da
integração local (financiamento de moradias em novos bairros preenchendo o vazio entre os antigos e os construídos pela
AÇOMINAS), passando a prover transporte aos empregados residentes em cidades vizinhas.
51
Em ambas, estas dificuldades parecem estar ligadas à sua própria concepção espacial, pois concebidas para funcionar de
forma descentralizada, por um lado, muitos dos centros planejados não se consolidaram, enquanto por outro, o antigo
centro (povoação existente) foi sensivelmente enfraquecido. Além do que, enquanto em Ouro Branco o fracasso na
constituição de um mercado imobiliário parece estar vinculado à recusa da população local em comungar com os objetivos
da empresa, em Ipatinga a concentração fundiária nas mãos de duas famílias torna muito difícil qualquer tentativa de
abertura.
52
Fato que se deve à necessidade da indústria de manter uma imagem positiva junto à comunidade local, visto manter a
propriedade de áreas consideráveis dentro dos respectivos municípios, que, mais recentemente, assumiu papel de maior
destaque devido à busca de conquistar e manter certificados de qualidade, impreteríveis para conquista de mercados
externos.
23
Fabriciano ter ocorrido em 1964, somente quatro anos depois se iniciou o processo de abertura da
cidade, no qual serviços públicos, como abastecimento de água, iluminação pública, calçamento de
vias públicas, permaneceram sob responsabilidade da ACESITA (C
ERTIDÃO DE ESCRITURA Pública
de Reconhecimento de Domínio, 1968). Além disso, a emancipação política de Timóteo, como
momento de conquista do exercício da cidadania, foi ainda mais frágil por ocorrer durante a Ditadura
Militar, quando, pelo fato de ACESITA ser estatal e considerada “estratégica”, a cidade tornou-se
“área de segurança nacional”. Com o prefeito e presidentes da companhia nomeados diretamente pelo
presidente da República, conclui-se serem raros os pontos de conflito, que acabavam sendo
solucionados em outra esfera, a federal. Há ainda que se considerarem os fatores de ordem social e
cultural, posto que, embora desde a década de 1950 tenha-se conformado uma identidade local
diferenciada daquela do povoado original, ela permaneceu ditada pela usina, sendo somente nos anos
1980 que uma verdadeira oposição a estes cânones fez-se sentir, seja nas greves operárias ou na sátira
dos blocos carnavalescos,
53
estas sim, expressões do amadurecimento da cidadania no seio da
comunidade.
Deste modo, verifica-se que a dependência da indústria não se interrompe por decreto, pela concessão
de sua emancipação política, cabendo lembrar ainda o trabalho de Eli da V
EIGA (2002), no qual o
autor argumenta que um núcleo municipal no Brasil nem sempre pode ser considerado urbano, pois
são centenas os que não passam de vilas. Assim, em vez de negar a estas experiências industriais a
condição de cidade, dada pela intencionalidade de sua construção, busca-se aqui entender seu processo
de formação urbana subdividindo-o em três estágios. Desta forma, as cidades empresariais são vistas
como “cidades latentes” que, caso se tornem independentes da indústria, consolidando uma identidade
própria (mesmo que vinculada à da empresa), somente atingem a plenitude do termo quando sua
população é capaz de expressar e defender opiniões próprias, diferentes ou mesmo contrárias às da
companhia fundadora, momento em que ela conquista e exerce a cidadania no sentido weberiano do
termo
54
.
É imprescindível, portanto, salientar que, apesar da importância de se reconhecer que, à diversidade de
nomenclatura existente corresponde uma diversidade de formas de intervenção da indústria na
construção e organização do espaço urbano, isto não deve implicar no estabelecimento de definições
rígidas ou mesmo na tentativa de enquadrar os exemplos citados anteriormente em uma ou outra
categoria. Evita-se, desta forma, incorrer em equívocos, visto que, na maioria dos casos, as
especificidades de cada uma destas experiências permitem que sejam designadas de mais de uma
maneira, conforme o aspecto que se privilegia ou o período que se analisa. Este é exatamente o caso da
cidade de Timóteo que, conforme será possível verificar nos capítulos posteriores, tem suas raízes num
projeto de desenvolvimento nacional apoiado na promoção de atividades industriais. Assim, antes de
53
Este processo, no entanto, é bem mais complexo, devendo ser abordado com maior profundidade no capítulo IV.
54
É importante salientar que não se trata de um processo evolutivo, comandado pelas leis naturais, mas de transformações
cujas origens são múltiplas e variáveis, cuja ordem e período de ocorrência são regidos pelo embate de forças políticas,
sociais e econômicas, que, por vezes, podem ser influenciados por condições naturais e ambientais.
24
ser urbano ou mesmo industrial, o projeto que embasa a construção da cidade é de transformação
econômica do país. Com relação ao impacto de sua implantação, embora houvesse um núcleo urbano
nas proximidades, o plano de implantação contempla a construção de uma nova cidade, cujo projeto
urbanístico é posterior ao início dos trabalhos de construção da indústria, tendo, além disso, sua
implantação se arrastado por quase uma década e sofrido alterações significativas. Outros aspectos a
serem considerados são a inclusão de um projeto social tardiamente (década de 1950) e o fato de que,
mesmo após a “abertura” da cidade e sua emancipação política, a companhia manteve a propriedade
de grandes extensões de terras e, ainda após sua privatização (1992), quando houve uma redução de
quase 50% no número de empregados diretos, ela continua a ser a maior empregadora da cidade (cerca
de 40% dos empregos industriais). Esta situação de extremo controle, no entanto, foi sempre
subliminar, pois o núcleo nunca foi cercado, nem seu acesso negado, embora houvesse controle de
entrada e saída, e a comercialização de bebidas fosse proibida em seu interior. A ausência de revista às
casas e o incentivo a atividades de lazer e a associações auxiliaram a construção de uma forte
identificação da comunidade com a empresa, a ponto de, num plebiscito (1980), decidir-se pela
alteração do nome da cidade para ACESITA
55
, fato que demonstra não somente o reconhecimento da
importância da companhia para a comunidade local, como também seu amadurecimento, visto a
empresa ter se posicionado contra a adoção de seu nome para a cidade. Posicionamento oposto ao da
empresa aparece também nas conquistas obtidas pelos trabalhadores nas greves operárias que,
juntamente com as sátiras apresentadas por blocos carnavalescos, a partir de um carnaval “financiado”
pela ACESITA, e do plebiscito, fazem da década de 1980 a consolidação de Timóteo como cidade.
Assim, dependendo do ponto e momento que se destaque em sua trajetória, Timóteo pode ser vista
como “cidade nova”, pois foi fruto de um “desejo” desenvolvimentista e de um projeto urbano
impactante; pode ser vista como “núcleo fabril”, pelo fato de o projeto de cidade não se implantar de
imediato e por completo; ou, já na década de 1950, com a inclusão de um projeto social e conseqüente
intensificação da gestão da vida do operariado fora da fábrica, pode ser percebida como “model town”;
e, na década seguinte, com sua abertura e emancipação política já se apresenta como “cidade
empresarial”, embora somente nos anos 1980 demonstre características condizentes com uma
definição mais precisa de cidade, o que não significa que tenha ocorrido uma total desvinculação da
indústria. Esta relação permaneceu estreita mesmo após a privatização da ACESITA nos anos 1990 e,
embora tenha assumido novas formas, prolonga-se até os dias atuais.
55
Alteração que não se consuma por causa de um jogo político, segundo alguns entrevistados, por causa de pressões da
empresa.
25
Vila
operária
cidade empresarial
cidade
pre-
industriaLização
espontâneas
Cidade
modelo
cidade
monoindustrial
acampamento
núcleo
industrial
fazenda
cidade de
exploração
. localização
. dimensão
. propriedade
. isolamento
espaço
industrial
.estrutura econômica
. liberdade política
. organização social
. identidade cultural
PARÂMETROS
R
R
U
U
R
R
A
A
L
L
U
U
R
R
B
B
A
A
N
N
O
O
Fig. 06: Parâmetros para a análise da relação indústria x cidade
Fig. 05: Temas nos quais as cidades empresariais podem ser discutidas
26
O isolamento no campo e na cidade
Fazendas
Acampamentos
Cidades de exploração
Vilas operárias
Núcleos fabris
No campo o isolamento das
fazendas, acampamentos,
núcleos fabris e cidades de
exploração
Fig. 11: Vila Maria Zélia
(SP360º, s.d.)
Fig. 07: Tucuri (PA)
(
FARAH
,
204
)
Fig. 08:
Maarmorilik (Goelandia)
(
GARNER
,
1992
)
Fig. 09: Usina Santa Bárbara (SP)
(
Q
UECINI
,
2000
)
Fig. 10: Pedra (PB)
(
CORREIA
,
1998
)
Na cidade o isolamento das vilas operárias
Fig. 12: Vila Maria Zélia (SP)
(TEIXEIRA, 1990)
27
A indústria no campo
Acampamentos
Fazendas
Núcleos fabris
Cidades de exploração
A indústria na cidade
Vilas operárias
Cidades mono-industriais
Cidades industriais
Fig. 14: Schefferville (Canadá)
(Travelwith, 2002)
Fig. 16: Climax (Estados Unidos)
(ALLEN, 1966)
Fig. 15: Grand Hornu (Bélgica)
(PEVSNER, 1977)
Fig. 13: Usina São João (SP)
(CAMPAGNOL, 2004)
Fig. 19: Vila Cerealiana (SP)
(BLAY, 1985)
Fig. 18: Birminghan (Inglaterra)
(REVOLUTIONARY PLAYERS, s.d.)
Fig. 17:Itabira (MG)
(SILVA, 2004)
28
As cidades novas e antigas
Antes e depois da indústria
Cidades mono-industriais
Cidades empresariais
Cidades pré-industrialização
Os projetos da indústria
Cidades modelo
Núcleos fabris
Vilas operárias
Espontâneas
Fig. 27: Merthyr Tydfil (Inglaterra)
(GARNER, 1992)
Fig. 20: Pullman (Estados Unidos)
(BUDER, 1970)
Fig. 22 e 23: Fábrica Nacional de Motores (RJ)
(BONDUKI, 1998)
Fig. 24: Noisel sur Maine (França)
(GARNER, 1992)
Fig. 21: Saltaire (Inglaterra)
(FlORIN WEBSITE, s.d.)
Projetos econômicos, arquitetônicos, sociais e políticos
guiando a construção do urbano pela indústria
Fig. 26: Usina Ipanema (SP)
(AUTORA, 2004)
Fig. 28: Raffard (SP)
(CAMPAGNOL, 2004)
Fig. 25: Hotep Sesostris (Egito)
(GALANTAY, 1975)
29
I.2 TEMAS E ABORDAGENS DE ESTUDO DAS CIDADES EMPRESARIAIS NA LITERATURA
ACADÊMICA
Relatos sobre a atuação da indústria sobre o espaço urbano podem ser encontrados tanto em textos
acadêmicos como na literatura de ficção, biografias e histórias de empresas, ao retratarem o modo de
vida das classes trabalhadoras nas grandes cidades e em comunidades isoladas. Contudo, como se
poderá observar a seguir, a adoção das cidades empresariais como tema principal de pesquisa é
relativamente recente, sendo mais freqüente sua inserção em textos que tratam de outros assuntos.
Assim, a opção por enfatizar a literatura acadêmica fundamenta-se não tanto na abundância de
material, ou mesmo no destaque que o tema tem assumido no meio acadêmico, mas numa necessidade
de compreensão da forma objetiva como vem sendo tratada a ação de empresas industriais sobre o
urbano, em especial quando se propõem a construir cidades – as cidades empresariais. Esse
entendimento iluminará metodológica e teoricamente o caminho aqui seguido na análise tanto social
como formal do caso específico de Timóteo.
Assim, nos trabalhos de sociólogos, geógrafos e antropólogos, observa-se como foram estudadas as
relações entre classes, os movimentos sociais e o comportamento da população em comunidades
regidas por um sistema de produção capitalista; nos de historiadores de cidades, as nuanças dos
processos de construção das cidades e da casa popular; enquanto nos estudos de economistas
encontram-se importantes contribuições quanto ao modo de organização e funcionamento de empresas
e suas implicações no desenvolvimento do processo de industrialização brasileiro; por fim, nos textos
de arquitetos e urbanistas identifica-se a importância de vilas e cidades construídas por indústrias na
formação do pensamento urbanístico e na elaboração ou consolidação de técnicas construtivas
56
.
Com o objetivo de se obter uma visão geral da forma como o tema foi abordado e verificar a
correspondência com especificidades do processo de industrialização brasileiro, num primeiro
momento, os textos foram agrupados em literatura nacional e internacional. Então se constatou que, na
literatura internacional – em especial na norte-americana –, as abordagens sobre cidades empresariais
aparecem mais freqüentemente incluídas no contexto do processo de urbanização, aspecto quase
ausente na literatura nacional, na qual, de maneira geral, observa-se a ausência de levantamentos mais
sistemáticos, em especial, de urbanismo
57
. Nesta, predominam trabalhos em que as cidades operárias
pertencem ao campo de discussões da habitação popular
58
, pouco focalizado pela literatura
56
As visões de autores de referência na história do urbanismo, como as de Benévolo, Mumford e Lavedan, mesmo tratando
do tema de forma superficial, também foram analisadas.
57
Trabalhos como os de Yves BRUAND (1991), Henrique MINDLIN (2000), Hugo SEGAWA (1999) oferecem uma visão geral
da arquitetura brasileira, contudo, somente a partir de meados do século XIX. Com relação aos espaços públicos, o esforço
de levantamento de Silvio MACEDO (1999) também deve ser reconhecido; no entanto, tratando-se de urbanismo, um
compito geral aparece somente no trabalho de Nestor G
OULART REIS FILHO (2000a) referente ao período colonial, sendo a
visão oferecida pela coletânea organização por Cristina L
EME (1999) e a análise do espaço intra-urbano de algumas capitais
por Flávio V
ILLAÇA (1998), insuficientes para se compreender as linhas gerais do desenho de nossas cidades.
58
A abundância de trabalhos que tratam da questão habitacional na literatura nacional fez com que fossem selecionados,
dentre os acessíveis, somente os trabalhos considerados mais significativos, ou seja, trabalhos onde a moradia operária
30
internacional. Distinguindo-se abordagens mais específicas,
59
como os trabalhos que privilegiam as
relações de trabalho e condições de vida do operariado (L
EITE LOPES, 1978 e 1988; GROSSI, 1981;
F
ONTES, 1997), a política habitacional (ROLNIK, 1981; BLAY,1985; BONDUKI, 1998; CARPINTÉRO,
1997; V
ARON, 1988), ou ainda monografias sobre núcleos fabris (CORREIA, 1998b; LOPES, 1993;
LIMA, 2003; COMPAGNOL, 2003; BALLEIRAS, 2002; GUEDES, 1981 MINAMI, 1994) e arquitetura
habitacional (V
AZ, 1994; ATIQUE, 2004). Outro modo de abordagem compõe um grupo bem menos
expressivo, composto por trabalhos que partem do questionamento do papel desempenhado pelas
empresas na construção do urbano (P
IQUET, 1998; GERMANO, 1996; SOUZA, 1992).
Nos textos internacionais estudados, tanto quando se trata de estudos de casos específicos
(GARNER,
1992; REID, 1981; DONNACHIE & HEWITT, 1993; SPANN, 1992; MOORE, 1984;), quanto da
compreensão de um processo mais amplo em âmbito internacional (L
AVEDAN,1952; MUMFORD, 1998;
BENÉVOLO, 2001) ou nacional (REPS,1965), que assumiram características específicas (GALANTAY,
1975; CRAWFORD, 1995; DAL CO, 1972) ou foram conduzidos por empreendimentos empresariais em
áreas específicas (R
OBINSON, 1962; ALLEN, 1966), nota-se que a maior preocupação é com o processo
de urbanização. Reunidos segundo similaridades no “modelo explicativo” utilizado para descrever o
surgimento da interferência industrial no urbano
60
, distinguem-se dois grupos de trabalhos: um que
coloca as cidades empresariais como conseqüência direta do desenrolar do processo de
industrialização, e outro que as trata como mera especificidade do processo de urbanização. Assim,
para autores como
DAL CO (1972), GARNER
61
(1992), CRAWFORD (1995), MUMFORD (1998) e
BENÉVOLO (2001), o surgimento das grandes cidades é uma conseqüência lógica do desenvolvimento
industrial, que tem seu início marcado pelo desenrolar da Revolução Industrial e da grande indústria;
quando a fuga dos problemas existentes nas grandes cidades induz à busca de alternativas mais
lucrativas, muitas vezes inspiradas por projetos utópicos, como os de Charlie Fourier, Robert Owen e
Tony Garnier. No segundo grupo, a principal preocupação dos autores (L
AVEDAN, 1952; REPS, 1965;
ROBINSON, 1962; REID, 1981; ALLEN, 1966; GALANTAY, 1975 e MOORE, 1984) recai sobre o processo
de urbanização, ou seja, para eles a construção de cidades por indústrias é vista como uma
especificidade do processo de urbanização, a indústria é somente mais um dos agentes propulsores do
crescimento urbano.
construída pela indústria recebia algum destaque, além de trabalhos monográficos sobre cidades ou indústrias individuais.
Também não foi possível dar conta de romances e autobiografias nas quais as cidades empresariais são retratadas.
59
Deve-se salientar que, nessa subdivisão, buscou-se dar destaque ao que se considerou a principal questão de cada autor,
sendo freqüente a abordagem dos mesmos temas sobre ângulos diferentes, permitindo inclusive inseri-los em mais de um
subgrupo.
60
A divisão inicial tomava como critério o tratamento das cidades empresariais como tema principal ou como um aspecto da
história da arquitetura e urbanismo; contudo, trabalhos como os de R
OBINSON (1962), REID (1981), GALANTAY (1975) e
DAL CO (1972) não se enquadram com muita precisão nem em um caso nem em outro, além do que a verificação da
relevância dos objetivos por trás do projeto original levou à alteração dos parâmetros para agregá-las. Contudo, tendo em
vista a diversidade de abordagens a que estão sujeitas, deve-se atentar ainda mais para a pouca objetividade destes
parâmetros, mesmo dentro de um único campo do conhecimento: a história das cidades.
61
Dentre os autores da coletânea organizada por Garner, somente a Margareth CRAWFORD (1995) segue a mesma linha de
raciocínio, com os textos dos demais autores (Bruce Tomas, Mats Ahnlun e Lasse Brunnström, Richad M. Candee, Leland
M. Roth e Olga Paterlini de Koch) centrados em preocupações, como desenho urbano e arquitetura, numa abordagem que
leva em conta as transformações da paisagem industrial (industrial landscape) mais do que as de ordem social.
31
Sob perspectivas e formas diversas, com maior ou menor visibilidade, a habitação, a cidade, o
operariado e a arquitetura são as questões que conduzem os trabalhos de autores brasileiros e
estrangeiros ao abordarem as cidades empresariais. Portanto, é por intermédio destas quatro questões
que se busca compreender como a intervenção empresarial no urbano vem sendo tratada na literatura
acadêmica, e assim traçar parâmetros mais consistentes para discutir o caso de Timóteo.
I.2.1 A HABITAÇÃO EM QUESTÃO
Na condição de um problema que, direta ou indiretament, está no cerne de qualquer questão urbana, a
habitação é um tema de grande importância para o entendimento das cidades empresariais, assumindo
papel de destaque, em especial, na produção acadêmica brasileira.
Nos trabalhos estudados de autores nacionais, observa-se naqueles cuja atenção está voltada à
habitação popular, que num primeiro momento salientam as discussões sobre a atuação do Estado, em
detrimento da iniciativa privada (fossem incorporadores, construtores ou industriais), o que parece
condizente com o contexto em que estavam sendo produzidos. Elaborados nas décadas de 1980 e
1990, estes trabalhos surgem como uma visão crítica à crença na efetividade do planejamento urbano e
econômico, que havia caracterizado a administração militar nas duas décadas anteriores. A
predominante visão do planejamento como instrumento técnico, portanto neutro, encarregado de
viabilizar a melhoria das condições de vida da população, tornava estreito o relacionamento entre
fatores econômicos e urbanos, sendo somente nos últimos anos da década de 1970, que os
planejadores urbanos parecem ter se dado conta da relevância de seu caráter político, levando Maria
Adélia A. de Souza a afirmar que: “... o planejamento, por ser um exercício de política, é um
instrumento do poder. E se o sistema que detém o poder está em crise, o planejamento obviamente
também entra em crise.” (Espaço & Debate, 1981: 105). Assim, a “crise do planejamento” que tomou
corpo nos anos oitenta, passou a ser encarada como uma conseqüência da crise política e econômica
que se vinha enfrentando; crise cujas raízes estavam fincadas tão profundamente em fatores políticos e
econômicos que, na visão dos planejadores urbanos, o próprio fracasso dos planos elaborados
anteriormente representava somente um de seus sintomas; o verdadeiro mal residia na ausência de
modelos explicativos fundamentados na realidade do Brasil na condição de país subdesenvolvido.
Assim, diante da escassez de recursos e constatando-se a ineficácia dos métodos de planejamento
empregados até então, havia a necessidade de realizar um balanço das experiências passadas, a fim de
que, a partir delas, se encontrassem novas soluções.
Outro aspecto que deve ser levado em consideração para se entender o contexto da época é que a crise
dos anos oitenta fora precedida por um período de grande crescimento; eram os últimos anos da
década de 1960 e o início da de 1970. Período de grande crescimento econômico, um tempo de euforia
que veio acompanhado de um intenso processo de migração em direção aos grandes centros,
32
intensificando a especulação imobiliária e a urbanização, o que resultou na expansão da periferia de
forma pouco planejada
62
. Problema que era agravado pela forma dissociada com que a questão
habitacional e a problemática urbana vinham sendo tratadas pelo Estado. Este descompasso pode ser
atribuído à crença na economia como elemento capaz de conduzir todos os ajustes necessários,
levando a se postular que o problema habitacional se resolveria não pela construção de “... moradias
para assegurar condições mínimas de vida ao operariado mas, sim, de prover empregos para uma
considerável parcela da população, sem alternativas de obter trabalho”. (FINEP-GAP, 1985).
Portanto, embora os estudos elaborados neste contexto buscassem contemplar ambas as questões,
detectando-se desde então a relevância da produção habitacional na organização urbana, estas
tentativas de entender o crescimento urbano e a organização da cidade através da ótica da habitação,
de sua produção, localização e desenho, verifica-se a predominância de um pensamento de
“planejadores urbanos”, pois são raros os trabalhos em que não se parte do questionamento do papel
do Estado neste processo, fazendo com que a atuação do empresariado industrial acabasse por diluir-
se.
Ao observar esta produção seguindo o raciocínio de Raymundo F
AORO (1993), pode-se considerar que
o prolongado obscurecimento do papel da iniciativa privada, e com ela das indústrias, na organização
urbana, foi ocasionado não somente pelo grande número e monumentalidade das obras
governamentais ou mesmo pelo predomínio desta visão planificadora, mas também pela própria
organização da sociedade brasileira que, marcada pelo patrimonialismo, encontra dificuldades em
distinguir entre público e privado na administração pública, fato que se deve ao Estado ter sempre
assumido o papel de promotor do desenvolvimento econômico, ou seja, a atuação do empresariado
depende de seu aval e financiamento, como é o caso de inúmeros empreendimentos industriais
63
.
No caso específico da pouca atenção dada à construção de moradias pelos industriais, não se deve
descartar o possível desinteresse dos próprios industriais que, após garantir uma força operária de
reserva capaz de coibir o aumento dos salários devido à escassez de mão-de-obra, teriam pouco a
lucrar com a divulgação de seus empreendimentos urbanos. A partir da década de 1970, tais
investimentos tornam-se menos intensos, inclusive com o desmonte de um número considerável de
núcleos e vilas, o que não significa que deixaram de ser construídos, mas simplesmente que esta falta
de visibilidade fez com que muitas vezes se subestimasse sua extensão, aspecto já apontado por Telma
C
ORREIA e Philip GUNN (1996: 390): “... em termos numéricos, nada excede no Brasil do século XIX e
XX à ação dos industriais na construção de cidades e assentamentos empresariais novos.
Contudo, a ênfase dos autores nacionais na questão habitacional não implica a ausência de uma
problematização sobre o urbano. Ocorre exatamente o oposto: todo o questionamento sobre a moradia
62
Lembrando que data dos anos 1940 a periferização da cidade de São Paulo.
63
O próprio caso da ACESITA pode servir de exemplo, uma vez que o projeto e construção da usina foram de iniciativa de
particulares, no entanto o volume de dividas fez com que fosse encampado pelo Banco do Brasil em 1951, quando assumiu
as feições que marcariam sua trajetória na condição de estatal envolvida na promoção do desenvolvimento nacional (foi
privatizada novamente em 1992).
33
parte do reconhecimento do caos a que o crescimento intenso e descontrolado levara as cidades.
Assim, o empreendimento industrial na promoção de habitações e sua conseqüente intervenção sobre o
espaço urbano surgem como resposta às condições sanitárias e morais da “cidade liberal” de
B
ENÉVOLO (2001) e da “coketown” de MUMFORD (1998)
64
, bem como da necessidade de proximidade
de fontes de energia e matéria-prima, de forma que, embora nos trabalhos destes dois autores as
cidades empresariais desfrutem de uma quase total invisibilidade
65
, uma parcela considerável dos
autores nacionais constrói suas análises do mesmo ponto de vista
66
.
Partindo da problematização da cidade na qualidade de questão sanitária, que encontra na precariedade
das condições de vida da classe trabalhadora – mais especificamente da habitação – sua principal
causa, Marisa
CARPINTÉRO (1997) traça os parâmetros sobre os quais se assentaram os discursos da
casa própria até que esta fosse assumida pelo Estado. Observando o confronto entre o discurso lógico
e racional de técnicos
67
, políticos e empresários diante das reivindicações operárias referentes à
moradia, a autora demonstra que apontavam para caminhos opostos, pois, enquanto aqueles enfatizam
a necessidade de prover aos trabalhadores casa própria – viam a propriedade privada como um
eficiente instrumento de moralidade e redução do capital investido
68
, passando a pressionar o Estado a
participar mais efetivamente –, as reivindicações operárias somente iriam incorporar o discurso da
casa própria quando, a partir da década de 1930, sentiram a perda de espaço ao seu alcance no seio das
cidades existentes
69
. Com a expulsão desta população para áreas distantes do centro, a habitação, fosse
financiada pelo Estado, pela iniciativa privada ou autoconstruída, aparece como questão primordial
para compreensão e coordenação do processo de crescimento das cidades. É desta forma que ela é
abordada por Nabil B
ONDUKI (1998), Conceição VARON (1988) e Raquel ROLNIK (1981).
A visão da habitação como mecanismo de exploração do trabalhador e elemento disciplinador – cujas
raízes encontram-se nos ideais de sociedade formulados, em especial, por pensadores do século XIX
(Fourier, Cabet, Owen, entre outros) que, crentes na influência do ambiente na formação do indivíduo,
foram fonte de inspiração para a construção de alguns dos mais famosos núcleos fabris e cidades
empresariais, experiências tomadas como exemplo por industriais em todo o mundo – também é
64
A expressão “paraíso paleotécnico” também Mumford deve a Geddes, tomando emprestado desse a noção de avanço
tecnológico isento de um correspondente avanço nas condições de vida. ‘Podemos distinguir como Paleotécnicos os
elementos mais primevos e rudes da Era Industrial, e como Neotécnicos os elementos mais recentes e amiúde ainda
incipientes que daqueles se destacam.’ (H
ALL, 2002: 169)
65
São citados somente os casos mais notórios: Lewis MUMFORD (1998) cita: Lowell, New Hampshire, Saltaire, Bournville,
Port Sunlight, Earswick, Essen e Pullman, e Leonardo
BENÉVOLO (2001) prende-se mais aos projetos utópicos de Fourier,
Garnier e Owen, citando entre os projetos concretizados somente o Familistério de Godin em Guise.
66
Dentre eles destacam-se Nabil BONDUKI (1998), Telma CORREIA (1998), Marisa CARPINTÉRO (1997), Eva BLAY (1985),
Conceição V
ARON (1988) e Raquel ROLNIK (1981).
67
Entre os discursos técnicos analisados estão os dos principais profissionais que se debruçam sobre a questão da habitação:
médicos e sanitaristas, engenheiros e arquitetos, para os quais as vilas operárias constituíam-se em solução eficaz para
problemas tanto de ordem sanitária quanto moral e mesmo econômica.
68
Foi freqüente a cessão da moradia como indenização na demissão ou aposentadoria de funcionários, o que possibilitava
que o empresário não arcasse com gastos diretos nestas situações fazendo uso da casa como forma de pagamento ou
indenização.
69
Friedrich ENGELS (2000) também afirmava que a propriedade da casa própria pelos operários servia mais aos grandes e
pequenos burgueses que aos próprios operários, que além do endividamento para sua aquisição, tinham sua mobilidade
limitada.
34
reconhecida por estes autores, em especial por Telma CORREIA (2004)
70
que, ao focalizar o habitat
moderno, demonstra como a casa aparece como um importante instrumento de formação. Assim, a
casa era o elemento por intermédio do qual se iniciava a formação do “habitat” moderno
71
; ela era
incumbida de incutir em seus ocupantes princípios de higiene e individualização (distinção entre
público e privado, entre trabalho e descanso, entre adultos e crianças, homens e mulheres), sendo
responsabilizada também por tornar toda família apta para o trabalho e para o consumo.
Este processo de transformação da habitação operária em mercadoria, intercambiável tanto no plano
material quanto no abstrato, tem suas raízes no reconhecimento da casa proletária como “problema”;
problema que se constitui como tal, somente a partir do momento em que se constata os prejuízos que
dele podem decorrer. Processo confirmado pelo forte efeito provocado pelo relatório de Chadwick,
quando os números parecem mais chocantes que as descrições feitas por Engels. Transpostos para a
linguagem dos negócios, os problemas relativos ao habitat operário foram rapidamente incorporados
ao rol de investimentos tanto de empreendedores industriais quanto do Estado, que a fim de minimizar
as perdas buscaram apoio na tecnologia. Este raciocínio fez da casa operária importante objeto de
experimentação de novas técnicas e materiais de construção, o que pode ser observado no trabalho
introduzido por John N
OLEN (1919)
72
.
O papel de destaque da habitação na concepção e construção de núcleos e cidades por empresas
industriais deve-se ao seu reconhecimento como célula mater do viver moderno, constituindo-se em
agente ativo deste processo, pois mais do que refletir as mudanças que vinham sendo engendradas, ao
oferecer condições diversas de vida, induzia a mudanças nos hábitos cotidianos. A casa auxiliou na
incorporação de valores burgueses ao universo operário, pois por meio dela, de sua localização, da
distribuição e dimensões de seus espaços, dos materiais e métodos construtivos nela empregados e dos
utensílios domésticos que ampliavam sua funcionalidade, reforçava-se a idéia de modernidade, e ela
apresentava-se como símbolo de urbanidade, individualidade e privacidade. A questão da habitação,
da forma como foi adotada pelos industriais e vem sendo reconhecida na literatura acadêmica, assume
caráter semelhante ao que lhe atribui o movimento moderno, sendo a partir dela que se forma tanto o
homem como a cidade idealizada por aqueles preocupados em planejar e construir a sociedade
moderna, fazendo da casa tanto princípio como fim deste processo de transformação.
70
Enquanto no trabalho sobre Pedra destaca-se…, em “A construção do habiat moderno no Brasil”, a autora focaliza as
diversas facetas que se pretendia da habitação, a construção do ideal moderno de morar, demonstrando como a casa sempre
aparece como espaço de formação destes ideais que vai da higienização à individualização (distinção entre público e
privado, entre trabalho e descanso, entre adultos e crianças, homens e mulheres) responsável por tornar toda família apta
tanto para o trabalho e quanto para o consumo.
71
A noção de “habitat” extrapola em muito a da casa, permeando diversos aspectos da vida cotidiana e em diversas escalas e
atividades, desde o saneamento das cidades até hábitos privados de higiene e privacidade, de atividades de trabalho até as
horas de lazer e o cuidado com a casa, da vida em família ao comportamento nos locais de trabalho e no espaço público.
72
Os textos reunidos em “Homes for workmen: a presentation of industrial community development” tem como preocupação
comum a apresentação de exemplos bem-sucedidos de construção de casas para trabalhadores, não necessariamente
financiadas pela indústria que os emprega. São textos muitas vezes produzidos pelos próprios arquitetos e engenheiros
envolvidos na elaboração dos projetos e execução das obras, de tal forma que primam pelo detalhamento de sua concepção
técnica, do planejamento e dimensionamento do sítio até detalhes construtivos. Datando da primeira década do século XX,
antes mesmo da Primeira Guerra Mundial, este trabalho caracteriza-se mais como fonte do que como literatura acadêmica,
sendo que sua inclusão deve-se somente à riqueza do material referente ao desenho e à arquitetura destes edifícios.
35
I.2.2 A CIDADE EM QUESTÃO
De modo geral, embora a questão urbana surja como elemento embasador na literatura sobre cidades
empresariais, enquanto na literatura internacional ela aparece com destaque, na nacional a contribuição
destes empreendimentos para a configuração das cidades é menos evidente.
Mas a relevância do aspecto urbano dos empreendimentos industriais recebe maior destaque na
literatura internacional, para autores que têm como preocupação abarcar um espectro mais amplo do
processo de urbanização da sociedade ocidental, como Pierre L
AVEDAN (1952)
73
, Lewis MUMFORD
(1998) e Leonardo B
ENÉVOLO (2001), as cidades empresariais são quase invisíveis, sendo vistas como
mera especificidade do processo de urbanização e, embora partam de um mesmo ponto para explicar
sua emergência, a “cidade malsã
74
– vista como foco de problemas de ordem sanitária, estética, moral
e econômica
75
– cada um deles toma um caminho diverso.
Mas apesar de identificarem aspectos distintos
76
como o mal que deixa as cidades “doentes” e
buscarem suas respostas de modos diversos, com M
UMFORD (1998)
77
percorrendo trilhas sinuosas e
discutindo o urbano em função de transformações socioculturais e do ambiente no qual se situa
78
,
enquanto B
ENÉVOLO (2001)
79
tem um trajeto marcadamente linear, fazendo uma descrição do
73
Na “Histoire de l’urbanisme: époque contemporaine” de Pierre LAVEDAN (1952), elas são designadas “cités ouvrières” e
aparecem em três momentos: ao discutir os reformadores sociais do século XIX, ao falar do “urbanismo construtor” –
capítulo no qual aparecem referências às cidades de New Lanark, Port Sunlight e Lowell, onde LAVEDAN (1952) e onde o
autor reafirma a visão tradicional sobre cidades empresariais: como resultado da visão “caridosa” e empreendedora de
“homens excepcionais”. – das cidades jardim e das cidades satélites, e, finalmente, ao analisar os problemas de oferta de
habitação. Embora o autor reconheça o vínculo entre Revolução Industrial, reformadores sociais e cidades construídas por
empresas, a pouca atenção que dispensa a elas faz com que cometa o lapso de considerar a construção de Belo Horizonte
como decorrência da exploração mineral, juntamente com cidades como Joanesburgo e Kimberley (África) ou mesmo
Denver e Dawson City (EUA). «Beaucoup plus nombreuse et importantes sont les villes nées de l’industrie : ville de
mines, villes d’usines, cités ouvirère . ... Les gisements de métaux préciex ont été de grand animateur, souvent passager.
L´or, découvert en 1851, a suscité, en Australie, Ballarat, Bendigo, Daylessford ... En Afrique Australe, Johannesburg
n´était rien em 1884, ... Du diamant est né Kimberley. Au Brésil, dans lEtat de Minas Geraes, Belo Horizonte fondé en
1847 a aujourd’hui 350.000 habitnats. Aux USA, San Francisco (1849) en Californie, Denver (1859) dans Colorado son
également né de l’or. ... » (L
AVEDAN, 1952 : 183)
74
la ville malade” de Lavedan, “coketown ” de Mumford e “cidade liberal” de Benévolo
75
Estas duas últimas abordagens inserem-se num contexto em que o autor discorre sobre métodos empregados no
planejamento das cidades, partindo de análises da distribuição populacional até concluir com os espaços verdes e públicos.
LAVEDAN (1952)
76
LAVEDAM em problemas de ordem social, BENÉVOLO na moradia e MUMFORD nas condições sanitárias e ambientais.
77
Embalado pelo relacionamento entre biologia e urbanismo que havia se firmado no século anterior e que obrigava a pensar
a cidade não mais como um objeto inanimado, isolado e estático, mas como organismo vivo, considera a cidade como parte
de um sistema mais amplo, passível de ser conhecido somente ao levar em conta os diversos fatores que o compõe, bem
como o contexto físico e territorial no qual se insere.
78
Esse sistema complexo no qual a cidade seria somente mais uma célula, não podendo ser entendida fora de seu contexto
regional e que deve muito às noções difundidas por Patrick Geddes, constitui-se numa das idéias centrais da RPAA
(Regional Planning Association of America), organização encabeçada por Lewis Mumford, Clarence Stein, Benton
MacKaye, Stuart Chase, Heny Wright e Frederick Ackerman e que foi um dos mais importantes grupos de discussão sobre
planejamento urbano entre as décadas de 1930 e 1940. (H
ALL, 2002)
79
Escrevendo na segunda metade do século XX, a cidade e as formas que assume são conseqüências do desenvolvimento
técnico, fazendo com que o autor se atenha às suas formas mais palpáveis, prosseguindo a uma descrição do ambiente
construído na qual as nuances e excepcionalidades são pouco relevantes.
36
ambiente construído onde as nuances e excepcionalidades são pouco relevantes
80
, ambos vêem as
experiências de intervenção empresarial no urbano como algo positivo, uma busca pela concretização
de uma sociedade ideal, cujas raízes jazem no que M
UMFORD (1998) chamou “aldeia industrial
modelo”.
Num panorama mais restrito, os problemas acarretados pelo processo de industrialização também são
o ponto de partida dos trabalhos de Nabil B
ONDUKI (1998), Conceição VARON (1988), Eva BLAY
(1985) e Raquel ROLNIK (1981)
81
. Assim, embora não se encontre na literatura nacional um
compêndio do desenvolvimento urbano do país, o intenso crescimento das principais cidades
brasileiras, a partir do início do século XX, fez com que São Paulo e Rio de Janeiro recebessem grande
destaque, tornando-se focos preferenciais da atenção dos estudiosos. No caso de São Paulo, os estudos
buscam entender sua organização urbana tendo como premissa a relevância da localização
habitacional, porém por diferentes perspectiva – R
OLNIK (1981) por intermédio do mapeamento dos
interesses da burguesia capitalista, B
ONDUKI (1998)
82
por meio da legislação e BLAY (1985) por meio
dos exemplos de conjuntos habitacionais construídos por industriais. Embora tratem de cidades
distintas, tanto V
ARON (1988) quanto ROLNIK (1981) vêem a expansão urbana relacionada à
distribuição espacial da habitação operária, ou seja, admitem que a organização urbana da cidade é
fortemente condicionada pelos interesses da burguesia industrial capitalista, que atua também no
mercado imobiliário, aspecto que permite V
ARON (1988) considerar as vilas operárias como uma
forma de produção rentista, incluindo a habitação operária edificada pela indústria no mesmo rol das
companhias construtoras. No entanto, ao partilhar com as companhias construtoras os benefícios das
alterações na legislação e das reformas de Pereira Passos, implica em arcar com o ônus que tal
processo trouxe à cidade e sua população, ou seja, assumir sua parcela de culpa pela expulsão da
população pobre e encortiçada das áreas centrais.
83
A solução do problema urbano pela oferta de moradia à população de mais baixa renda é o tópico que
emoldura as preocupações de R
OLNIK (1981)
84
e BONDUKI (1998). Os autores observam que, ao serem
80
Escrevendo após a metade do século XX, observa-se que Benévolo, ao buscar uma generalização por intermédio do
reconhecimento de elementos comuns, aproxima-se da postura universalizante apregoada pelos adeptos do movimento
moderno.
81
A autora cita as vilas das fábricas: Santana, Santista, Penteado, Companhia Fabril de Tecelagem e Estamparia Ipiranga,
Cotonifício, Crespi, Santa Branca, Matarazzo, Lacta, Companhia de Ferro Esmaltado Sílex, Companhia Antártica,
Companhia Nacional de Tecidos, Indústria Clark de Calçados e Sudam e algumas unidades no interior do estado:
Votorantim , Santa Rosália, Rawlinson Muller (Carioba), Rodovalho, além das vilas ferroviárias (R
OLNIK , 1981).
82
Nabil BONDUKI (1998) descreve o papel do poder público e da iniciativa privada na construção de casas populares, em
especial dessa última que, a partir da década de 1940, passa a incluir de forma mais intensa o próprio morador.
83
Reconhecendo na construção de vilas operárias uma forma de atração, manutenção e formação moral dos empregados, a
autora estuda as vilas das tecelagens da Companhia América Fabril. Eram seis vilas estudadas, localizadas tanto em áreas
urbanas quanto suburbanas ou mesmo rurais. Embora possuíssem características distintas, eram regidas pelos mesmos
princípios; pelo menos até a década de 1940, todas seguiam as normas do Departamento de Trabalho, que regulamentavam
desde a forma de admissão e demissão dos empregados até horários, salários, organização dos serviços de saúde e
educação, segurança, higiene e conservação das casas, normas que haviam sido publicadas em livro. Concluindo, a autora
reconhece a efemeridade do sucesso dos conjuntos residenciais enquanto solução para os problemas de moradia da classe
trabalhadora, seja dos construídos pela indústria, seja dos construídos pelos institutos de pensão.
84
A autora reconhece duas configurações básicas para esse tipo de empreendimento: as vilas comuns – onde a fábrica
encontra-se cercada por moradias que se abrem para a cidade, e as vilas de fábrica – onde as residências dos trabalhadores
37
vistas pelo empresariado e pelo poder público como lócus ideal para moradia do trabalhador, as vilas
operárias serviam tanto ao interesse privado quanto ao público, pois, ao mesmo tempo em que
retiravam uma parcela significativa da população de áreas consideradas insalubres, desobrigavam o
Estado de lhe prover moradia. Por intermédio da legislação, B
ONDUKI (1998) vê essa responsabilidade
passar da iniciativa privada para o Estado e deste, ao próprio trabalhador.
85
O autor não acredita na
capacidade destes empreendimentos de terem influído significativamente na estruturação da metrópole
paulista.
Para além da organização intra-urbana, como colocaria Flávio V
ILLAÇA (1998), a indústria tem se
mostrado elemento significativo na organização espacial do território nacional, seja por meio da
construção de núcleos fabris ou de cidades empresariais. Processo que, pelo impacto da chegada de
novas tecnologias e de um significativo contingente populacional, conforme observado anteriormente,
tem levado a uma estreita aproximação entre os processos de industrialização e urbanização. No
Brasil, embora esta relação seja reconhecida, uma quantificação do fenômeno e da forma que assume
só recentemente tem sido levada a cabo, destacando-se o amplo compêndio realizado por Philip G
UNN
e Telma C
ORREIA (2004),
86
em que demonstram a abundância das formas de intervenção industrial no
espaço urbano, seja através da construção de conjuntos de habitações, seja de núcleos fabris, seja de
cidades empresariais, desde em locais tão isolados quanto às da Amazônia até os de grandes centros
urbanos, como São Paulo e Rio de Janeiro.
Uma preocupação semelhante pode ser encontrada em James A
LLEN (1966) ao inventariar as
comunidades construídas ou gerenciadas, por algum período de sua existência, predominantemente
por uma única empresa na região Oeste dos Estados Unidos. No entanto, em seu estudo, Allen acaba
por incluir cidades que não foram totalmente edificadas por empresas, o que aqui temos denominado
cidades monoindustriais
87
.
No entanto, enquanto A
LLEN (1966) reconhece a relevância tanto quantitativa
88
quanto qualitativa do
empenho das indústrias na construção de cidades no país, R
EPS (1965) afirma que, embora a “...
industrialização da América tenha contribuído mais que qualquer outro fator isolado para o
desenvolvimento e crescimento das cidades da nação
89
, essas experiências (as cidades empresariais)
foram esporádicas e nada imaginativas, pois colaboraram pouco para “o conhecimento de como as
encontram-se resguardadas pelos muros da indústria, isoladas do restante da cidade. Uma especificidade desse tipo de vila
são as “vilas cidadela”; construídas em localidades isoladas e possuidoras dos mesmos equipamentos coletivos existentes
nas cidades, funcionam como “laboratório de uma sociedade disciplinar” e como instrumento de barganha salarial.
85
Constata que parte significativa dessa produção (cerca de 20%) foi promovida pelo mercado formal, ou seja, contou com a
participação de profissionais de arquitetura e urbanismo, financiados pelo governo. Por conseguinte, a crítica recai sobre as
políticas que financiavam o produtor e não sobre o usuário, que vem se alterando nas últimas décadas com a busca de
projetos que contam com a participação comunitária e imbuídos de preocupações ambientais, onde a iniciativa privada foi
substituída pela “iniciativa comunitária”.
86
Desde a década de 1990, pelo projeto NUVILA, Correia e Gunn têm realizado um minucioso levantamento destas
experiências em todo o território nacional (aproximadamente 80%).
87
Esta denominação também aparece em ROLNIK (1981) e MARICATTO (1979).
88
ALLEN (1966) identifica na área estudada aproximadamente 200 casos de cidades empresariais.
89
The industrialization of America contributed more than any other single factor to the development and growth of the
nation’s cities.
(REPS, 1965: 414)
38
comunidades deveriam ser projetadas
90
, afirmação que acaba por contrariar, pois em seu trabalho
fica clara a importância que atribui às chamadas “cidades novas”, das quais as “company towns
91
, ou
como intitula o capítulo referente a elas, “As cidades que as empresas construíram
92
constituem uma
especificidade, ou seja, juntamente com as ferrovias ou a especulação imobiliária
93
, a indústria é um
fator que influenciou significativamente o projeto das cidades na América do Norte.
Este reconhecimento da indústria como agente construtor de cidades inteiras aparece com maior
destaque no trabalho de Ervin G
ALANTAY (1975) que, ao analisar cidades novas ao redor do mundo,
estabelece quatro categorias: “new capitals
94
, “colonial towns” “industrial towns” e
decongestion
95
. São cidades cuja principal característica consiste em derivarem de um projeto
urbano ou plano de implantação, com o objetivo de satisfazer a uma necessidade específica. No caso
das cidades construídas por indústrias: dar abrigo à força de trabalho, conseqüência inevitável da
exploração de recursos naturais em áreas isoladas, ou ainda da necessidade de políticas de
desenvolvimento regional cujo objetivo é a criação de pólos de crescimento
96
. Tratando das cidades
industriais nascidas a partir do século XX, o autor concentra-se no Leste europeu (Rússia e Alemanha)
e em países em desenvolvimento (Índia e Venezuela), predominando uma visão de planejador;
preocupa-se com questões metodológicas (cálculos populacionais, dimensionamento de vias e a
capacidade de expansão) e o papel do poder público no planejamento de novas comunidades, onde
90
The conclusion is inescapable, however, that town planning by American industry generally failed to produce
communities significantly differente or better than those wich owed their layout to other sources. Nor were compay towns
leaders in the development of new standards or patterns of design. Indeed, the reverse appears to be true. American
industry, which prided itself on its inventiveness in the operations of machinery or in business administration, remained
fundamentally conservative in its sporadic town planning activities. Like the myriad towns puffed into life by the American
railroads, company towns in this country added little to our knowledge of how communities should be planned.
(REPS,
1965) (sem grifo no original)
91
Com sua atenção voltada para o desenho urbano, constantemente contrapõe o padrão regular dos traçados reticulares (a que
chama de formal) com os mais orgânicos (informal). Dentre as cidades analisadas, R
EPS (1965) salienta o papel de Lowell
(Massachusetts, 1832), cujo esquema foi repetido por toda Nova Inglaterra; Vandergrift (Pennsylvania, 1895) projetada
pelo escritório Olmsted; e Gary (Indiana, 1907), onde a área planejada se estendia muito além da compreendida pela
cidade. Considerando o período anterior à Segunda Guerra Mundial como apogeu da construção de cidades empresariais,
esse autor comenta o desenho de algumas delas, concluindo, no entanto, que estas experiências não são significativas em
termos populacionais e mesmo possuindo alguns casos de interesse, a “... indústria americana, por todo seu sucesso na
produção, claramente falhou na tentativa de produzir comunidades expressivas.
91
92
The towns the companies built” (REPS, 1965: 414—438).
93
A organização geral do livro “The making of urban America: a history of city planning in the United States” apresenta uma
primeira parte dedicada ao planejamento de cidades por países que influenciaram a colonização norte-americana (da
Europa de modo geral e especialmente Espanha e França), passando então para as cidades norte-americanas agrupadas por
ordem cronológica, região e país responsável por sua edificação; em seguida são analisadas as três formas mais
freqüentemente adotadas no desenho das cidades (a “cidade bela”, o bulevar barroco e a grade); o papel de aspectos
especiais como cemitérios e parques, especulação imobiliária, expansão ferroviária, indústrias e filosofias sociais ou
crenças religiosas também são o critério para reunião e análise das cidades, que se encerra com uma visão dos processos
gerais que influenciaram o planejamento das cidades até então.
(REPS, 1965)
94
GALANTAY (1975) classifica as cidades novas em quatro categorias: novas capitais, cidades coloniais, cidades industriais,
cidades satélite (de descongestão).
95
Seguindo com a nomenclatura utilizada pelo autor “Decongestion”, mais do que um tipo de cidade nova seria uma forma
de descongestionar uma cidade existente e que poderia incluir quatro tipos de solução: desenvolvimento de regiões
alternativas de crescimento (deslocar o crescimento para outra região do país), de cidades satélites (dentro de uma mesma
área metropolitana, com comutação possível), de novas cidades independentes (desencorajando a comutação) ou a criação
de cidades gêmeas ou paralelas (devido à impossibilidade do crescimento continuo – barreiras naturais)
96
New industrial towns are planned to exploit location-bound natural resources or to provide growth poles for a regional
development policy. The town itself is created to accommodate the necessary labor force, and its site is chosen as a
function of conflicting needs to maximize accessibility and at the same time to avoid the noise, pollution, and traffic
generated by industry.” G
ALANTAY (1975: 38)
39
acessibilidade é a palavra-chave
97
.
O papel do poder público e a acessibilidade são questões primordiais também para Ira R
OBINSON
(1962). Tendo como pano de fundo a preocupação com as alterações que a construção de cidades
novas vem provocando no ambiente físico de regiões antes não urbanizadas, ele analisa as chamadas
resource towns
98
. Dependentes da exploração de recursos naturais, estes empreendimentos
canadenses têm como característica a possível efemeridade devido ao esgotamento da matéria-prima
não-renovável
99
. Embora este aspecto seja pouco explorado por ROBINSON, ele aparece com destaque
no trabalho de Joaquim G
UEDES (1981)
100
que relata os processos empregados na elaboração do
projeto da cidade de Caraíba (BA), encomendada pela CVRD. Ocasião em que fez uso das estimativas
de vida útil da mina como parâmetro para o dimensionamento e decisão quanto à forma de
administração do empreendimento (cidade aberta ou fechada):
“...o grau de compromisso da empresa (medido em termos de vontade de interferir no desenvolvimento
regional) com a população local [que] está associado com o grau de indução (medida em termos de maior
ou menor uso dos recursos persuasivos) que aplicará para mobilizar os indivíduos para o
empreendimento.”(grifo meu) (Guedes, 1981: 48)
Grau de compromisso” que pode ser traduzido por “grau de controle”, sendo o maior “compromisso
sinônimo de maior controle, ou seja, de cidade fechada e gerenciada pela empresa
101
. A parceria com o
Estado, no entanto, aparece com freqüência e não se restringe a decisões quanto à administração do
núcleo urbano, sendo que, tanto as “resouce towns” canadenses
102
quanto algumas cidades
mineradoras e de barragens no Brasil, somente se viabilizaram devido a uma incisiva participação
governamental
103
. Seja no planejamento ou mais efetivamente na construção de redes de infra-
estrutura, serviços públicos, seja na construção das moradias, o governo assumiu encargos
consideráveis na execução destes projetos. Essa participação fez com que alguns desses
empreendimentos já nascessem quer como uma administração municipal independente, ou seja, como
cidades abertas”, quer como “cidades monoindustriais”, enquanto outros seguiram no caminho
inverso, e, embora com dimensões e complexidade social considerável, permanecessem fechados até
97
Acessibilidade à matéria-prima e à natureza (entendida como sinônimo de bem-estar e lazer, nos moldes do ideal
cristalizado pelo movimento moderno);
98
Na visão do autor essas cidades “... são os filhos prodígios de empreendedores industriais americanos e canadenses que
tiveram que enfrentar ambientes inóspitos e inexplorados, [são] freqüentemente um ‘mal necessário’ se a floresta, os
minerais, o petróleo e a energia elétrica de sítios do norte do Canadá serão explorados com propósitos industriais.”. “…
they are the brain-children of American and Canadian industrial entrepreneurs who have to face the fact that the creation
of a new community in the wilderness is often a ‘necessary evil’ if the forests, minerals, oil, and hydro-electric power sites
of northern Canada are to be exploited for industrial purposes.
(ROBINSON, 1962: 3)
99
Embora haja cidades construídas para exploração de recursos naturais renováveis (madeira e pesca), a maioria dos casos
tratados na literatura é da exploração de minérios.
100
Joaquim Manoel Guedes Sobrinho também participou da elaboração do projeto das cidades mineradoras de Marabá (PA,
1972) e Barcarena (PA, 1978) (T
ELLES, 1991).
101
Embora não se posicione abertamente quanto à opção por cidade aberta ou fechada, no final da análise parece mais
propenso à primeira, afirmando que “A grande questão cidade aberta ou fechada deve ser analisada à luz de
considerações mais gerais e que atingem o cerne mesmo de uma ideologia do desenvolvimento nacional. Não apenas a
cidade aberta, mas a sociedade aberta como objetivo. (Guedes, 1981: 50)
102
Ira ROBINSON (1992) apresenta as cidades de: Kitmat (1953, Aluminum Company of Canadá), Elliot Lake (1954,
mineradoras de urânio), Drayton Valley (1956, exploradoras de petróleo) e Schefferville (1950, Iron Ore Company of
Canadá), todas originárias da necessidade de exploração de recursos naturais em pontos remotos.
103
No caso brasileiro, a construção da rede hidroelétrica nacional, por ser estatal (início das privatizações na década de 1990)
foi toda financiada pelo Estado, com a edificação de núcleos e cidades de dimensões e estrutura diversas, conforme mostra
em seu levantamento Flávio e Marta. FARAH (1993)
40
hoje, como Carajás.
Esta participação governamental na edificação de cidades empresariais, cujo objetivo último é a
promoção de um processo de industrialização, fez com que Rosélia PIQUET (1998) visse as “cidades-
empresa”, como denomina as cidades empresariais, como reflexo dos diversos patamares de
desenvolvimento da economia nacional. Salientando o papel preponderante das políticas nacionais, do
desenvolvimento tecnológico e do vinculo estreito entre economia e urbanização na organização do
espaço brasileiro, a autora afirma que “... as empresas que passam a operar em novos setores tendem
a apresentar um padrão locacional diverso daquele das atividades até então existentes no país.
(P
IQUET, 1998: 6), constituindo-se em “... veículos da expansão de novas condições técnicas de
produção em pontos selecionados do território nacional, proporcionando o avanço da fronteira
econômica e espacial, ...” (P
IQUET, 1998: 7). Padrões que Piquet acredita serem prioritariamente
determinados pela disponibilidade e custo de redes de infra-estrutura (energia, vias, água, etc.),
política tributária e por incentivos fiscais, bem como pela proximidade de fontes de matéria-prima; ou
seja, com exceção da localização das matérias-primas, todos fatores condicionados pela política.
Fundamentada nestes parâmetros, a autora divide em três períodos o processo de industrialização
brasileiro: o primeiro caracterizado pela precariedade e pelo monopólio dos serviços de infra-estrutura
das cidades, o que teria levado os industriais a diversificarem seus investimentos e a aplicarem altas
quantias em capital imobilizado distante delas
104
; o segundo a partir da década de 1930, quando foi
inaugurado “um novo estilo de cidade-empresa, não mais associada à figura do empresário (pessoa
física), mas à empresa enquanto instituição”. (P
IQUET, 1998: 25)
105
; o terceiro, na década de 1970,
distinguia-se pelos grandes empreendimentos propostos no escopo do II Plano Nacional de
Desenvolvimento, principalmente nas áreas de mineração, celulose e petroquímica.
106
Para a autora, o
tratamento desses projetos diretamente pelo Governo Federal foi responsável pela redução do poder de
decisão e ação nas instâncias locais, provocando em cidades como Volta Redonda, Telêmaco Borba,
Aracruz e Ouro Branco a reprodução das precárias condições existentes nas “cidades livres”. Uma
situação que, ao mesmo tempo em que podia ser benéfica à empresa e à cidade (abrigando um
mercado de reserva e diversificando a economia local), ao motivar a organização de grupos de pressão,
transforma a cidade em palco de conflitos, constituindo-se numa ameaça constante.
O período das privatizações, representando uma mudança na forma como o Estado passou a conduzir a
104
No Rio de Janeiro, PIQUET (1998) cita os bairros de: Del Castilho, Bangu, Vila Isabel e Gávea, em São Paulo: Lapa, Água
Branca, Casa Verde, Vila Prudente, Bás, Mooca, Belenzinho; em Recife: Jabotão, São José e Afogados; em Santos:
Quartéis; em Campinas: Vila Industrial e em Jundiaí: Vila Arens. Há ainda as cidades de Rio Tinto – PB, Navarro – PE,
Botorantim (Sorocaba – SP), Carioba (Americana – SP), Nova Lima – MG, Passagem de Mariana – MG.
105
Esse seria o caso da CSN (Volta Redonda – RJ, 1942), Chesf (vila de Paulo Afonso – PE, 1948), CVRD (bairros em
Itabira – MG, 1942), além da CSBM (Monlevade – MG, 1934), Klabin (Telêmaco Borba – PR, 1963), Indústria e
Comércio de Minérios S.A. Icomi (Vila Amazonas e Vila Serra do Navio – AP, 1950s), Companhia de Cimento Paraíso
S.A. (Italva – RJ, 1950s), USIMINAS (Ipatinga – MG, 1956) (P
IQUET, 1998).
106
Os casos citados pela autora são: a CESP (Ilha Solteira – SP), Jarí Florestal e Agropecuária Ltda. (Monte Dourado – PA,
1988), Eletronorte (Tucuruí – PA, 1976), CVRD (Marabá e Paraupeba– PA, vila em Tubarão – ES, 1970s), Aracruz
Celulose S.A. (Aracruz – ES, 1980s), AÇOMINAS (Ouro Branco – MG, 1985), Furnas Centrais Elétricas S.A. (residências
em Angra dos Reis – RJ, Itapeva – SP e Ivaiporã – PR, 1970s), Usina Hidroelétrica de Xingo-Caxingó (bairro em Piranhas
– AL, 1987). (PIQUET, 1998)
41
política industrial no Brasil
107
, poderia representar uma quarta etapa do relacionamento entre políticas
governamentais e industrialização; momento em que se esperava que a desvinculação entre o Estado e
as empresas (ex-estatais) alterasse a parceria (público-privado) na administração urbana
108
, que seria
cada vez mais deixada a cargo do governo. Contudo, com freqüência, observa-se ocorrer o oposto: a
influência empresarial na gestão pública não cessou nos anos 1990. Embora assentada em parâmetros
diversos dos anteriores, ela permanece até os dias atuais e continua a marcar fortemente a
administração de municípios sedes de grandes indústrias
109
. Esta permanência está associada à
influência das empresas na política
110
, uma condição fundada tanto no padrão patrimonialista das
relações do Estado brasileiro quanto no discurso desenvolvimentista herdado da ditadura, que vincula
a saúde financeira destes empreendimentos ao desenvolvimento do país, fazendo do sucesso de uma
empresa privada sinônimo de sucesso da nação.
I.2.3 O OPERARIADO EM QUESTÃO
A visão da oferta de moradia da “... vila operária, ou casa na vila operária, [como] elemento mediador
entre a venda da força de trabalho e o preço pago por essa força” (B
LAY, 1985: 11
111
), fazendo dela um
investimento indireto na produção, portanto elemento sobre o qual se fundamentam importantes
aspectos da relação entre o operário e a burguesia, é partilhada pela maioria dos autores que enfatizam
aspectos sociais do relacionamento entre patrões e empregados. Dentre os autores brasileiros, destaca-
se os trabalhos de antropólogos, sociólogos e historiadores como José Sérgio L
EITE LOPES (1978,
1988), Juarez B
RANDÃO LOPES (1964) e Yonne GROSSI (1981), bem como as dissertações de Paulo
F
ONTES (1997)
112
e Maria Alice CARVALHO (1983). São autores que buscam suas respostas em
análises de casos específicos
113
sobre questões relativas à organização da sociedade brasileira a partir
das tentativas, ou efetivo ingresso do país no sistema capitalista industrial, organização que, para
Juarez B
RANDÃO LOPES (1964), fundamenta-se numa estrutura social tradicional marcada pelo
107
Mudança que deve ser tomada com certo cuidado, uma vez que o pretenso afastamento do Estado pode ser questionado
devido mesmo à forma como ocorreram os processos de privatização. O financiamento de vultosas somas, a fim de
viabilizar compras e concessões, significou que o governo continuou a arcar com ônus relativos a elas, deixando apenas de
geri-las e lucrar com elas.
108
Com exceção de Carajás, as demais cidades apresentadas por PIQUET (1998) ou já nasceram como cidades abertas ou são
cidades mono industriais.
109
Trata-se, portanto, não somente de uma especificidade das cidades empresariais, mas de todas as cidades que têm a
indústria como principal atividade econômica.
110
Levando a situações de conflito tão perturbadoras quanto às descritas por Ricardo TIEZZI (2005) em Volta Redonda.
111
A visão dos operários sobre a oferta de habitação pela indústria, bem como da moradia em si, é colocada por intermédio
da análise de jornais operários e depoimentos de ex-moradores. O estudo das vilas Maria Zélia, Cerealina, Cresp, Nadir
Figueiredo, Guilherme Giorgi e Beltramo apresenta-se, então, como ponto de chegada onde, por meio dos depoimentos,
diversos aspectos discutidos no corpo do texto são abordados pontualmente. Cabe ressaltar que todos os casos estudados
pela autora são de vilas construídas próximo à cidade, justificando-se a predominante ausência de equipamentos urbanos,
tais como postos de saúde, escolas, clubes e, algumas vezes, até armazém, pela possibilidade de usufruir dos já existentes
na cidade.
112
Foi utilizada a publicação da dissertação em livro, sendo que a dissertação foi defendida em 1996.
113
Exceção feita à Maria Alice CARVALHO (1983: X) que, a fim de compreender “.. o papel desempenhado pelo
empresariado industrial na construção do mundo do trabalho...” não estuda uma ou mais indústrias, mas sim as práticas e
formulações teóricas correntes no Brasil, tendo como base a atuação das classes dominantes na cidade do Rio de Janeiro
42
patrimonialismo e paternalismo, mas que graças à influência de fatores econômicos e políticos tem se
tornado mais burocráticas
114
. No entanto, as mudanças vislumbradas por este autor na década de 1960
parecem nunca ter se consumado totalmente, uma vez que, quase vinte anos depois, mesmo com a
presença de combativos sindicatos operários indicando um significativo aumento no grau de
conscientização dos trabalhadores, tanto José Sérgio L
EITE LOPES (1978)
115
quanto Yonne GROSSI
(1981)
116
, Maria Alice CARVALHO (1983) ou mesmo Paulo FONTES (1997)
117
são capazes de encontrar
traços de métodos de dominação bastante antigos. Assim, ao analisar atividades como a açucareira e a
mineração do ouro, que já existiam muito antes da Revolução Industrial e num sistema escravista,
estes textos lembram que, embora a Revolução Industrial tenha vindo acompanhada de inúmeras
alterações, existem marcas que ela não foi capaz de apagar. Dentre elas pode-se ressaltar a utilização
da moradia como forma de manter o operariado próximo à fábrica e sempre disponível ao trabalho
(L
EITE LOPES, 1978), a hierarquização dentro e fora da fábrica (ou da mina), a instituição de um
114
Para Juarez BRANDÃO LOPES (1964), foram mudanças econômicas e políticas que levaram a alterações na atitude dos
patrões (aumento da produtividade e redução de custos coma mão-de-obra) e trabalhadores que, insatisfeitos, encontram
apoio na legislação para fazerem suas reivindicações, agora de forma organizada, processo que, para o autor, significa um
rompimento com as organizações tradicionais, marcadas pelo patrimonialismo e paternalismo, que passa então a possuir
características mais burocráticas. Um dos principais sinais desta transformação são a criação e crescimento do papel dos
sindicatos na intermediação das relações entre patrões e empregados.
115
Na visão do antropólogo José Sérgio LEITE LOPES (1978)
115
, a habitação ofertada pela indústria aparece como instrumento
necessário à atração e manutenção dos trabalhadores, em especial do grupo mais qualificado composto por artistas e
empregados (distingue três grupos de trabalhadores, sem contar os empregados - trabalhadores do escritório - e os que
trabalham fora da fábrica – ferrovia, foguistas, maquinistas e cassacos, ou no campo como os colonos, meeiros e
corumbas, que são trabalhadores sazonais). Esse sistema, que os próprios trabalhadores denominam cativeiro, a oferta da
moradia e de outros benefícios, como lenha, energia elétrica, água encanada e lotes para plantio de subsistência, constitui-
se num sistema onde a exploração da mão-de-obra ocorre de diversas formas. A proximidade da indústria permite mantê-
los disponíveis vinte quatro horas por dia e colabora com a manipulação no pagamento de horas extras; a colocação de
empecilhos à mobilidade da força de trabalho faz com que a mudança de emprego signifique também mudança de casa e o
fim de benefícios; além disso, tanto a casa como o lote disponibilizado para a produção de alimentos durante a folga
constituem-se em fatores que possibilitavam a redução do custo de reprodução da força de trabalho, ou seja, dos salários,
sistema que se fechava com a difusão da idéia de superpopulação, interiorizando no trabalhador o medo do desemprego.
116
Estudando a consciência de classe dos trabalhadores, porém por intermédio da constituição de organizações políticas e
sociais como sindicatos, partidos políticos e associações religiosas, Yonne G
ROSSI (1981) apresenta o caso de Nova Lima,
cidade mineira cuja atividade econômica é totalmente controlada pela mineradora inglesa Saint John d’El Rey Mining
Company Limited (constituída em 1830 e era proprietária de minas de ouro e ferro na região de Minas Gerais; as minas de
ferro foram adquiridas pela Hanna Mining Comapany, preconizando um longo embate pela exportação do minério de ferro
brasileiro na década de 1930 à de 1960 - ver P
EREIRA, 1967). Mais preocupada com a conscientização política dos
trabalhadores, o estudo de suas condições de vida dentro e fora da mina, “...adquire importância pela vinculação posterior
que se estabelecerá com o movimento operário, exprimindo um de seus condicionantes (G
ROSSI, 1981: 69), pois tanto a
dificuldade para conseguir a casa quanto as diferenças entre os tipos existentes (existiam três tipos de habitação: geminadas
duas a duas - com sala, dois quartos, cozinha e banheiro com água quente no chuveiro -, bom-será - seqüência de casas
geminadas com instalações sanitárias e tanques coletivos, que os próprios moradores consideram “um convite à
promiscuidade”- e em bairros separados, casas maiores e arejadas para os funcionários ingleses) eram fatores de
descontentamento que, somados ao sistema de caderneta com desconto na folha de pagamentos e escassez de atividades
recreativas e religiosas, faziam da moradia um dos poucos atrativos ao trabalho na mina e um dos mais eficientes
mecanismos para sua fixação. A moradia aparece somente como pano de fundo; não há representações gráficas ou
referências mais detalhadas quanto ao traçado urbano do núcleo, que é definido como tendo o formato de “cuia”; o mesmo
ocorre com as residências, o que se justifica também pela ausência de um projeto urbano e arquitetônico, ou mesmo de
profissionais dessas áreas envolvidos na sua elaboração.
117
Embora não discorra diretamente sobre a vila construída pela Nitro-Química em São Miguel Paulista, Paulo FONTES
(1997) reconhece a importância dessa indústria na transformação do bairro
117
e na vida das trabalhadores. Em sua
exposição, a preocupação com a adoção de técnicas gerenciais da mão-de-obra vem desde a escolha da localidade para
instalação da indústria
117
, cujo isolamento e precariedade contribuíam para o fortalecimento da noção da formação de uma
nova comunidade, da “família nitrina”A difusão dessa idéia, fortalecida pela implementação de um Serviço Social privado,
tido como pioneiro, era corroborada por um modelo gerencial onde, ao mesmo tempo em que era possível distinguir uma
nítida estrutura hierárquica, ela era quebrada pelo contato direto entre o alto escalão e o chão da fábrica, onde se
privilegiava a contratação de parentes e, embora ausente na maior parte do tempo, a figura mítica do “patrão bom e
caridoso” era cultuada em momentos-chave, como nas comemorações de final de ano e no primeiro de maio.
43
sistema de valores capazes de legitimar a autoridade do patrão como pai, gerando um sentimento de
família que permite um congraçamento ao trabalho fabril (F
ONTES, 1997), e segundo o qual qualquer
questionamento ou reivindicação é visto como traição, validando sua ação disciplinadora e policial
(C
ARVALHO, 1983), numa luta constante para coibir e desestruturar qualquer sinal de organização
contrária às vontades patronais (G
ROSSI, 1981).
Na literatura nacional, a reunião de aspectos sociais, urbanos e arquitetônicos pode ser percebida na
atuação do empresariado industrial, somente a partir da década de 1990, com especial destaque aos
trabalhos desenvolvidos e orientados por Telma C
ORREIA.
118
Dissertações como as de Fernando
A
TIQUE (2004), Gabriela COMPAGNOL (2003)
119
e Mary Helle BALLEIRAS (2002)
120
ou mesmo a tese
de Fábio L
IMA (2003)
121
que, focalizando casos específicos ou grupos de experiências onde a indústria
constitui-se num importante elemento formador do urbano, partem da premissa que núcleos fabris e
vilas operárias têm suas raízes na problemática urbana levantada pelas questões sociais e sanitárias que
tomaram corpo a partir da Revolução Industrial, contexto em que a manipulação do operariado aparece
como peça-chave para a obtenção do lucro e em nome do qual empreendedores industriais iriam
buscar inspiração em trabalhos de pensadores e técnicos. Desta forma,
“O núcleo fabril não é visto como lugar da civilização e progresso em oposição ao campo. Também não é
tratado como uma evolução da cidade, no sentido de uma suposta adequação aos problemas suscitados por
seu crescimento e por sua transformação, relacionados à industrialização. Nem como a efetivação de utopias
urbanas, embora estejam ambos inseridos na mesma tradição de concepção de espaços modelares.
Entendemos o núcleo fabril como um equipamento de arregimentação, fixação e controle do trabalhador,
em cuja organização a segurança da propriedade e da produtividade do trabalho foram questões centrais.”
(CORREIA, 1998b: 11) grifo meu
De modo que, tanto no exterior quanto no Brasil, a necessidade de formação de um mercado de
trabalho urbano levou a elite a buscar a transformação do trabalhador oriundo do campo que, visto
como ignorante, indisciplinado, preguiçoso e sujo, carecia de formação técnica, higiênica e moral,
além de vigilância constante. Nesse processo de formação, difunde-se a noção da comunidade fabril
como uma grande família, onde o patrão aparece como “pai”, pois detém o direito de premiar e punir,
118
Autora de uma extensa literatura sobre núcleos e vilas fabris, Telma CORREIA (2002, 2001, 1999 1998a, 1998b) privilegia
questões relacionadas ao cotidiano operário, à arquitetura e urbanismo desses núcleos.
119
Os assentamentos agroindustriais promovidos pela indústria sucro-alcooleira da região de Piracicaba são objeto de
trabalho de Gabriela C
AMPAGNOL (2003). Pelo seu isolamento no meio dos canavaiais, o que usualmente determina sua
localização fora do perímetro urbano das cidades, constitui-se de conjuntos de casas para operários, chamadas colônias ou
avenidas, as casas dos patrões, escritórios, igreja, escola, cinema, armazém, campo de futebol e ambulatório.
Empreendimentos que, embora também sejam marcados por mecanismos de coação e exploração da mão-de-obra operária,
como o sistema de caderneta e as atividades recreativas, caracterizam-se pela sazonalidade e por reunir indústria e
agricultura, fazendo com que a autora veja nas senzalas as origens desse tipo de moradia uma origem muito anterior à
problematização da habitação popular nas grandes cidades.
120
O trabalho de Mary BALLEIRAS (2002) caracteriza-se pelo estudo da arquitetura de conjuntos residenciais e edifícios fabris
construídos por indústrias na região de Campinas – SP. Trata-se tanto de conjuntos urbanos completos, compostos por
residências e equipamentos coletivos (Carioba, Brasital Gessy, São Martinho e Romi.) quanto de simplesmente conjuntos
de casas (Fiação Santa Bárbara, Boyes) que se encontram localizados dentro da cidade ou distantes dela, sendo descritos
como estruturas física e socialmente impactantes para as localidades onde se instalam. Embora o enfoque principal do
trabalho se volte para a arquitetura tanto dos edifícios fabris quanto dos residenciais, seu surgimento, entre o final do
século XIX e início do XX, contemporâneo ao nascimento da grande indústria no Brasil, leva a autora a comentar os
mecanismos de formação e controle empregado pelos empresários, a fim de atraírem e manterem trabalhadores mais
especializados.
121
Esta tese orientada pela professora Cristina Leme trata do caso de Monlevade, núcleo construído pela Companhia
Siderúrgica Belgo-Mineira, em Minas Gerais, na década de 1930.
44
enquanto os operários são vistos como “filhos”, estando, portanto, sujeitos às suas regras.
Um dos casos que mais contribuiu para a difusão desta forma de administração da força de trabalho é
certamente New Lanark, onde Robert Owen desenvolvera um sistema de gerenciamento e controle do
operariado fundamentado na premissa de que a formação do trabalhador não poderia se restringir à
fábrica, devendo englobar todo seu cotidiano, pois era preciso formar seu caráter. Partindo da premissa
de que
Qualquer caráter geral, do melhor ao pior, do mais ignorante ao mais iluminado pode ser
dado a qualquer comunidade, mesmo a todo o mundo, pela aplicação dos meios próprios; os
quais estão em grande extensão sob o comando e controle daqueles que tem influência nas
ocupações do homem”.(O
WEN apud DONNACHIE & HEWITT, 1993: 116)
122
Difundido pela Inglaterra
123
e pelo mundo, o método educacional implantado por Owen em sua
tecelagem tinha por objetivo a formação de um contingente operário disciplinado, ou seja, ao mesmo
tempo dócil e alfabetizado. Este sistema, tido como modelar, nada tinha de democrático ou
condescendente, pois, apesar das preocupações sociais alardeadas por seu idealizador
124
, objetivava
acima de tudo a obtenção do lucro por meio do aumento da produtividade, tendo como instrumentos a
vigilância e a educação do empregado dentro e fora da fábrica
125
.
Outro exemplo paradigmático do que Margarth C
RAWFORD (1995: 02) chamou “model industrial
town”, ou seja, um núcleo industrial cuja concepção era determinada por uma ideologia religiosa,
social ou artística (arquitetônica ou urbanística), e que foi extensamente explorado pela literatura, é
Pullman
126
. No entanto, enquanto New Lanak se sobressaiu por marcar o início de uma sistemática de
gestão do operariado fundamentada numa postura ditatorial, Pullman é tido como ponto de inflexão
deste processo. É com esta visão que Carl S
MITH (1995) relata como foi construído e destruído o mito
em torno da cidade de Pullman, pois nela se explicitara a exploração do trabalhador por intermédio da
122
Any general character, form the best to the worst, from the most ignorant to the most enlightened, may be given to any
community, even to the world at large, by the application of proper means; which means are to a great extent at the
command and under the control of those who have influence in the affairs of men.” (O
WEN apud DONNACHIE & HEWITT,
1993: 116)
123
DONNACHIE & HEWITT (1993) chegam a afirmar que o sistema desenvolvido e implantado por Robert Owen em New
Lanark auxiliou a reestruturação do sistema educacional inglês no século XIX, o que pela quantidade de livros tratando do
tema parece não estar longe da verdade.
124
Segundo DONNACHIE & HEWITT (1993:119), as três principais preocupações de Owen eram: “... o impacto social do
sistema de fábrica, reforma da lei dos pobres e educação popular” (“the social impact of the Factory System, poor law
reforma and ppular education”).
125
Um rigoroso sistema de controle da produtividade era levado a cabo tanto por anotações em planilha quanto pela
utilização do que Owen chamou “Silient monitor” e “telegraph”, sinais indicadores do comportamento e produtividade,
havendo ainda punições físicas para mau comportamento. Mesmo o consumo de mercadorias, embora não houvesse artigos
proibidos, era regulado pela divulgação do consumo de artigos considerados supérfluos, um controle moral que era
facilitado pela sua aquisição por intermédio de “tickets for wages”. A regulamentação da vida fora da fábrica era dada pela
new broom”, regulamento que ditava padrões de limpeza e ocupação da casa e cuja infração era punida com a expulsão
para uma área insalubre do núcleo “Botany Bay”. Além do que, a redução de doze para dez horas de trabalho diárias não
significava exatamente um conquista, já que eram seguidas de aulas noturnas. (
DONNACHIE & HEWITT , 1993).
126
A cidade de Pullman (Illinois, 1885) foi construída por George Motimer Pullman para abrigar seus empregados e fábrica
de luxuosos vagões-leito; sua construção iniciou-se em 1880 (projeto de Sólon S. Beman e Nathan F. Barret), localizada a
14 milhas de Chicago, com 150 acres de extensão, e em 1885 possuía cerca de 8.000 habitantes. Contudo, o capricho com
a arquitetura e a atenção com o paisagismo, os cuidados com infra-estrutura e edifícios públicos, não saíam barato para
seus moradores; eram intensamente explorados por George Pullman. Além dos altos aluguéis, por vezes mais caros que na
cidade de Chicago, a imagem da cidade foi muito usada como propaganda, constando inclusive com stand na feira de
Chicago (1893).
45
oferta de moradia
127
, cujas debilidades seriam expostas pela greve de 1894, greve que levara ao
questionamento da relação entre a idéia de desordem e modernidade, pois mostrara que a ordem
urbana era insuficiente para garantir o fim do conflito social. Assim, confirmava-se a necessidade de
criação de uma nova ordem, de valores segundo os quais a responsabilidade de salvar a sociedade não
dependeria necessariamente de líderes “inspirados”, mas de um método científico de gestão da mão-
de-obra. Este novo método, ao qual foi atribuída a qualificação “engenharia social”,
ao reconhecer
favelas e fábricas como os principais focos de “problemas sociais de primeira magnitude”, propunha-
se a uma atuação neutra, baseada em métodos científicos, portanto isenta de interesses de classe.
(C
RAWFORD , 1995: 49).
O movimento que deu origem a esta nova forma de gestão do operariado está relacionado à ação dos
muckrakers” e tinha como objetivo garantir um ambiente propício à formação de bons cidadãos,
estabelecendo parâmetros “científicos” para pautar a relação entre empregados e patrões
128
. Com sua
ação dirigida por profissionais, negava-se a defesa de quaisquer interesses de classe. A aplicação de
programas fundamentados nesta metodologia, no entanto, foi instrumento amplamente utilizado pelos
industriais que, por intermédio de uma extensa propaganda, eram capazes de atrair e baratear o custo
direto da mão-de-obra mais qualificada, além de auxiliar na conquista de compradores e fornecedores.
Contudo, mais do que a oferta de moradia, equipamentos de saúde, lazer e educação, era a construção
de uma imagem positiva das condições de trabalho e de vida no núcleo que era capaz de gerar a união
do operariado em torno de um objetivo comum, a empresa, reduzindo as possibilidades de conflito e
garantindo a produção.
Neste sistema, observa-se uma transferência de foco do patrão para a empresa, ocorrida devido à sua
subordinação a parâmetros científicos
129
traçados por técnicos, o que, no entanto, não reduziu a
autoridade patronal, que permaneceu inquestionável. Observa-se, inclusive, um reforço na sua
caracterização devido à consolidação de uma identidade operária associada à indústria, colaborando no
estabelecimento de um sentimento de família onde, assim como o pai, o patrão é o comandante
supremo
130
. O sucesso da fixação da figura patronal como a de um indivíduo iluminado, benfeitor e
altruísta também foi fortalecida pela implantação de programas sociais, pois uma vez que as decisões
quanto às punições poderiam ser atribuídas aos “técnicos”, os benefícios e premiações poderiam
continuar a ser distribuídos pelo patrão. Assim, mesmo na literatura estudada, encontram-se veementes
127
A decadência dos negócios de George Pullman, obrigando a abertura da cidade, deveu-se grandemente à greve de
ferroviários de 1894. Deflagrada pelos funcionários da companhia de vagões descontentes com a redução de seus salários e
manutenção dos abusivos aluguéis cobrados pelo empresário, ela contou com a solidariedade dos ferroviários e paralisou
quase toda a rede ferroviária do país.
128
Segundo Margareth CRAWFORD (1995), este movimento de “industrial betterment” ou “welfare work” foi responsável pela
implementação de inúmeros programas de melhoria das condições de trabalho e moradia em diversas localizações no país,
introduzindo o “serviço social” dentro das companhias,
129
A cobrança de alguel é freqüente e aparece nos discursos não como uma forma de reaver o capital investido, mas sim de
aprendizagem, pois o trabalhador deve aprender o custo das coisas. “Every feature in such town is designed to have some
constuctive influence for specifically benefiting the workman for his work, and he gets nothing he does not pay for, thus
eliminating the elment of paternalism.” (N
OLEN, 1919: 11)
130
Assumindo literalmente o papel de pai, autoridade “in lócus parentis” como a concedida pelos pais quando da contratação
de jovens moças.
46
defesas dos métodos de exploração e dominação, justificados pelo caráter disciplinador atribuído ao
patrão, tido como responsável pelo desenvolvimento do empregado como individuo “civilizado”.
(A
LLEN, 1966
131
)
A exploração do “congraçamento familiar” e da união em torno de um objetivo comum era reforçada
pela promoção de atividades coletivas, desde jogos e festas até celebrações religiosas e cívicas. Assim
como estas atividades, a formação de associações e cooperativas, embora muitas vezes fosse
incentivada, permanecia sob constante vigilância, pois, ao promover o fortalecimento de uma
identidade coletiva, o reconhecimento de objetivos comuns acabava por propiciar o reconhecimento de
problemas comuns, que levava à busca de soluções coletivas não necessariamente em conformidade
com as vontades patronais. Portanto, a consolidação de uma identidade local era também um processo
de desvinculação das regras ditadas pela empresa, o primeiro passo em direção à conquista da
cidadania
132
, fazendo com que algumas destas associações e cooperativas passassem a ser vistas como
focos de resistência e fossem intensamente combatidas
133
.
Como se poderá observar no sexto capítulo, o combate aos mecanismos de dominação e exploração,
portanto, o embate entre patrões e empregados que, segundo Don REID (1981)
134
, é induzido pelas
mudanças gerenciais
135
durante o processo de formação de uma cidade empresarial, tem reflexos na
organização social e conscientização política da comunidade, assumindo formas diversas, com os
trabalhadores explorando recursos ofertados pela própria companhia. Esta conscientização política,
acredita R
EID (1981), ocorre somente após a consolidação de uma identidade local firmada no embate
com os patrões, conflitos que, em comunidades “artificialmente constituídas”, como as cidades
empresariais, tendem a ser mais duros, pois não há uma camada intermediária independente, como a
burguesia comercial, para amortecê-los.
131
Somente no caso das cidades carvoeiras é que o autor parece dar razão às queixas dos trabalhadores, pois, mesmo
afirmando reconhecer que muitos industriais faziam uso do isolamento imposto pela localização dessas cidades para
explorarem os trabalhadores, os mecanismos utilizados para esse fim são um a um rebatidos ou justificados ao longo do
livro. Assim mesmo a baixa qualidade (construtiva e sanitária) dos assentamentos não deve ser-lhes imputada, pois
gastavam fortunas com a construção e manutenção das cidades (A
LLEN, 1966: 117); o alto valor dos aluguéis seria natural,
devido à qualidade das moradias e proximidade do trabalho (A
LLEN, 1966: 89); mesmo o isolamento seria vantajoso, pois
incentivaria os moradores a economizarem e se educarem, buscando lazer na natureza em vez de no consumo (A
LLEN,
1966: 95); críticas à precariedade dos serviços hospitalares, à censura religiosa, ao direcionamento educativo, ao controle
político e policial seriam plenamente justificáveis, pois os industriais tinham em mente somente o melhor para seus
empregados. Estes “grandes homens” responsabilizavam-se pela comunidade, tanto por sua integridade moral quanto
financeira, em nome das quais ficava-lhes assegurada autoridade total, sendo que, segundo Allen, a má fama das cidades
empresariais era totalmente injustificada.
132
Uma análise mais profunda deste aspecto do relacionamento entre empregados e patrões por sua relevância na formação
de uma identidade local, que ao se tornarem capazes de se expressar e lutar por seus próprios anseios lhe confere o sentido
de cidade, será objeto do quinto capítulo.
133
Como é o caso das cooperativas e do sindicato apresentados por GROSSI (1981).
134
Em seu estudo sobre Decazeville.
135
A atuação empresarial em Decazeville inicia-se em 1826, quando a SHFA (Société Anonyme des Houillères et Fonderies
de l’Averyron) se instala na comunidade, solicitando logo em seguida autonomia municipal para o controle dos
trabalhadores e que, embora não possuísse um cuidado rigoroso com os aspectos físicos (arquitetônicos e urbanísticos) da
cidade por intermédio do controle da igreja, escola (muito pouco), moradia, oferta de trabalho, salários e do comércio
(principal ponto de atrito com a comunidade), regulava a vida dos trabalhadores. Esse controle, no entanto, teve
características e intensidades diversas, sendo num primeiro momento marcado pelo rigor e vigilância quase militar,
passando para uma fase mais coerciva, quando sobre a direção de Cabrol, a então SNHFA (Société Nouveulle des
Houillères et Fonderies de l’Averyron) buscou envolver os trabalhadores nas eleições para a câmara e afastando-se do
controle do comércio, o que seria retomado nos anos seguintes.
47
Muito além do caráter espoliativo, a exploração da imagem de algumas cidades empresariais também
assumiu um caráter ideológico, sendo estas cidades utilizadas como símbolos de projetos de âmbito
nacional, como foi o caso de Norris (M
CDONALD, 1982) e Volta Redonda (SOUZA, 1992
136
; LOPES,
1993
137
), que, como se verá no capítulo seguinte, foram extensamente exploradas por Roosevelt e
Vargas a fim de consolidar uma imagem positiva e bem sucedida do desenvolvimento destas nações.
Descritas como “paraísos”, as propagandas das cidades empresariais
138
pretendiam fazer contraponto à
imagem infernal que se havia difundido entre os trabalhadores. O destaque ao estabelecimento de um
novo modo de relacionamento, contudo, somente era capaz de encobrir os mecanismos de exploração
utilizados, que permaneciam fundamentados nos mesmos princípios e com o emprego de ferramentas
semelhantes às do período anterior, levando Margareth C
RAWFORD (1995: 60) a dizer que tais
experiências, na verdade, não passavam de uma “interpretação conservadora de ideais
progressistas
139
.
Deste modo, seja dominada por um discurso “científico” ou não, esta forma de gerenciamento do
operariado caracteriza-se pelo controle e exploração do trabalhador por intermédio da imposição de
valores ditados pela empresa, representada pelo pai-patrão. No entanto, a fim de viabilizar este
processo de “formação”, por meio da regulação dos hábitos cotidianos mesmo durante o tempo livre,
os industriais iriam assumir a responsabilidade pela oferta de moradia e, por vezes, também de saúde e
educação das famílias trabalhadoras, o que, em última instância, acabava por desincumbir o Estado.
Este processo, que pode ser entendido como uma transferência de responsabilidade, vinha
acompanhado de uma transferência de autoridade do Estado para o industrial.
Segundo Marcos H
ORTA LIMA (2005: 72), até pelo menos a década de 1930, para os industriais
brasileiros, a incorporação dessa responsabilidade era vista como uma forma de garantir que a
interferência do Estado nas relações entre capital e trabalho por intermédio da adoção de medidas
legislativas só seria admitida “... no sentido de auxiliar o patrão na tarefa de reforçar o elo do
136
A reflexão de Claudia de SOUZA (1992) sobre Volta Redonda tem como premissa a noção de que os problemas sociais se
sobrepõem às determinações espaciais, sendo a origem dos conflitos urbanos. Investigar o relacionamento entre indústria e
cidade foi o meio encontrado pela autora para compreender seus reflexos na vida da população, em especial sua luta pela
moradia. O desenvolvimento do problema habitacional em Volta Redonda foi descrito a partir da atuação da CSN, desde a
construção das primeiras casas do projeto inicial, sua vinculação com os planos de expansão da usina nas décadas de 1960
e 1970, passando pela constituição de uma imobiliária – a CECISA; atuação do poder público, por intermédio da COHAB
de Volta Redonda, e o papel desempenhado por movimentos reivindicatórios organizados pela Igreja, por intermédio das
CEBs também são objetos da atenção. Entre os pontos destacados pela autora está a dicotomia entre a “cidade operária” e
a “cidade velha”, entre o cuidado dispensado pela indústria aos espaços que compõem seu patrimônio que, ao contrário das
fazendas das redondezas, jamais foi invadido, e aqueles que cabem ao poder publico, concluindo que, mesmo após a
abertura da cidade, já nos anos 1990, a presença da CSN continuou a ser fortemente sentida.
137
No trabalho do geógrafo Alberto LOPES (1993), a forma da cidade é analisada por meio das transformações por que passou
o projeto inicial ao se confrontar com a realidade, quando um modelo idealizado foi submetido a condicionantes jurídico-
econômicas, técnico-culturais, funcionais e semióticas. Assim, a cidade é vista a partir de sua idealização de três formas
distintas: no contexto de reformas de Governo de Getúlio Vargas; no universo dos ideais utópicos absorvidos pelos
urbanistas, com destaque para a cidade industrial de Tony Garnier; e no confronto com a realidade ao longo do seu
processo de construção, na luta pela implantação de planos de expansão que, por vezes, esbarravam em especificidades
sociais, culturais e econômicas locais.
138
No Brasil, dois casos emblemáticos: o núcleo fabril de Pedra de propriedade de Delmiro Gouveia (CORREIA, 1998b) e a
vila operária Maria Zélia de Jorge Street (T
EIXEIRA, 1990).
139
“… conservative interpretation of progressive ideals” (CRAWFORD, 1995: 60).
48
operariado com a indústria na qual trabalhava”, de modo que a legislação trabalhista deveria ajudar a
“... criar mecanismos institucionais auxiliando os patrões a organizar a mão-de-obra em
torno da indústria, retirando o operário do flagelo social e econômico no qual se encontraria
nos grandes centros urbanos do país
140
, fazendo com que fortalecesse laços com o mundo da
produção. A fim de obter-se da classe operária brasileira padrões morais e eficiência no
trabalho adequados ao capital e de evitar-se as lutas de classes que estavam marcando os
países industrializados, operário[sic] deveria ser radicado junto ao local de trabalho, por
meio da construção de vilas operárias ao redor d indústria, dispondo de serviços sociais
essenciais, como creches e escolas, formas de lazer, serviços médicos e farmácias, para que
permanecessem no universo da produção.” (H
ORTA LIMA, 2005: 45) grifo meu
Esta forma de atuação dos industriais, apresentada por intermédio dos exemplos de Rodolfo Crespi,
Jorge Street e do Conde Pereira Carneiro, é o que o autor considera “paternalismo industrial”. O
emprego do termo “paternalismo”, no entanto, é controverso, pois, tendo surgido no século XIX em
artigos de periódicos em que “... se referiam ao âmbito das relações trabalhistas e ao das relações entre
a metrópole e suas colônias”
141
(GARCÍA, 2005: 11)
142
, por ser entendido de modo geral como “... ‘o
princípio e a prática da administração paternal; o governo como um pai; a pretensão ou intento de
suprir as necessidades ou regular a vida de uma nação ou comunidade da mesma forma que um pai faz
com seus filhos’”
143
(Oxford English Dictionary apud GARCÍA, 2005: 11), carrega a noção de que a
parte dominada não tem discernimento ou capacidade suficiente para decidir o que lhe convém. Além
disso, como lembra Donald Reid (apud G
ARCÍA, 2005) ele tem sido um dos mais discutidos nas
ciências sociais, sendo utilizado tanto para explicar as relações de dominação masculina quanto
auxiliar no entendimento do processo de formação de uma consciência de classe, bem como no
140
O autor analisa o posicionamento dos industriais brasileiros na elaboração da legislação trabalhista no período de 1919 a
1930, considerando que “Do ponto de vista dos industriais, a edificação da vila operária com a prestação dos serviços
básicos de saúde e alimentação era ponto estratégico para aumentar o rendimento no trabalho. Entendiam que, ao retirar
o operariado das condições de penúria em que se encontrava no mercado de trabalho, oferecendo aos trabalhadores
condições de vida adequadas, a qualidade e o ritmo de trabalho melhorariam sobremaneira porquanto a produtividade do
trabalhador brasileira [sic] seria menor devido às condições do meio em que era reproduzida e do fato de ser um operário
que por passar ‘de um ofício para o outro com a facilidade com que muda a sua camisa’ não chega a tornar-se
qualificado. (H
ORTA LIMA, 2005: 56). No entanto, sem se aprofundar nas diferenças entre o gerenciamento do pessoal
levado a cabo pelas fábricas com e sem vila operária, Horta Lima também não questiona o quanto elas realmente
significavam uma melhora nas condições de vida do operariado ou eram simplesmente uma maneira de intensificar a
exploração do trabalho.
141
Como demonstra o autor em sua análise do conceito jurídico de paternalismo, o termo tem sido entendido e empregado
em quatro formas principais: paternalismo estatal, paternalismo industrial, paternalismo médico e paternalismo jurídico
(“... se referían al ámbito de las relaciones laboriales y al de las relaciones entre las metrópolis e sus colonias.”
GARCÍA,
2005: 11)
142
Macario GARCÍA (2005: 12) salienta que “O termo começou a ser usado principalmente no contexto de certas práticas
sociais desenvolvidas pelos patrões com relação a seus trabalhadores caracterizadas pela acepção de melhora da
qualidade de vida do operário, das quais ultrapassavam o cumprimento das condições contratuais em matéria de salário e
condições de trabalho.” (“El término comenzó a usarse principalmente en el contexto de ciertas prácticas sociales
desarrolladas por los patronos con relación con sus trabajadores caracterizadas por la asunción por la mejora de la
calidad de vida del obrero, de las cuales rebasavam con el cumplimiento de las condiciones contractuales en materia de
salario y condiciones de trabajo.”). Sua difusão primeiramente disfarçada de filantropia e que lentamente foi ganhando
maior estofo teórico, que se difundiu o termo paternalismo, devido.
143
Buscas para os termos em português e inglês em dicionários e enciclopédias resultaram em definições muito semelhantes,
todas enfatizando um princípio ou prática fundamentado na autoridade paterna, no qual uma das partes possui domínio
sobre o modo de agir ou pensar, tendo como justificativa protegê-la. (The New Merriam-Webster Dictionary, Novo
Aurélio, Wikipedia, Encyclopedia Britannica, Preberiam, Houghton Mifflin - American Heritage Dictionary of the English
Language e MSM Encarta) (“... el príncipio y la práctica de la administración paternal; el gobierno com un padre; la
pretensión o el intento de suprir las necesidades o regular la vida de una nación o comunidad da misma forma qui un
padre hace con sus hijos.” G
ARCÍA, 2005: 11)
49
entendimento das relações escravistas
144
, sendo um termo inadequado para descrever a sociedade
industrial. Contudo, apesar de advertências como a de Edward T
HOMPSON (1989: 17, 21), de que
“... se admitimos o termo, devemos também admitir que é demasiado amplo para uma análise
discriminatória. Nos diz muito pouco sobre a natureza do poder e do Estado, sobre formas de
propriedade, sobre a ideologia e a cultura e é, inclusive, demasiado incompleto para
distinguir entre modos de exploração entre a mão de obra servil e livre...
Para resumir: paternalismo é um termo descritivo impreciso. Tem considerável menos
especificidade histórica que termos com feudalismo ou capitalismo; tende a oferecer um
modelo de ordem social visto de cima; contem implicações de calor e de relações pessoais
que supõe noções valorativas, confunde o real com o ideal. Não significa isto que devemos
descartar o termo por completa inutilidade para todo serviço. Tem tanto, ou pouco, valor
como outros termos descritivos generalizados – autoritário, democrático, igualitário – que
por si mesmos, e sem substanciais acréscimos, não podem caracterizar um sistema de
relações sociais. Nenhum historiador sério deve caracterizar toda uma sociedade como
paternalista ou patriarcal. Porém, o paternalismo pode, como na Rússia czarista, no Japão
meiji ou em certas sociedades escravistas, ser um componente profundamente importante não
somente da ideologia, senão da mediação institucional e das relações sociais.”
145
ele continua a ser empregado na apresentação e análise do modo como os industriais, a fim de
incrementar seus lucros por intermédio do controle do operariado mesmo fora da fábrica, direta ou
indiretamente coagem os operários a agirem conforme sua vontade, como se observa nos trabalhos de
Marcos H
ORTA LIMA (2005) e Jeremy ROWAN (2003)
146
. Juarez BRANDÃO LOPES (1964) também
parece não ver problemas na utilização do termo, o que talvez se deva ao fato de ver uma continuidade
(persistência) do tipo de relação do universo rural das fazendas no urbano das fábricas, relação típica
de uma sociedade que considera patrimonialista, ou seja, fundamentada no favor e nas relações
pessoais. Entre os principais autores da literatura nacional, José Sérgio L
EITE LOPES (1988) e Telma
C
ORREIA (1995), o termo também não é considerado apropriado. Embora no trabalho de José Sérgio
L
EITE LOPES (1989) sobre Paulista não haja uma explicitação desta posição, sua ausência indica que
não é favorável à sua aplicação, denominando “sistema paulista” a forma de controle do operariado
levada a cabo principalmente no período dominado pelo Coronel Frederico, considerando-a uma forma
específica de dominação do padrão “fábrica com vila operária”, posição que deixa clara ao analisar o
trabalho de Juarez Brandão
147
. Já Telma CORREIA (1995: 269), embora reconheça que “... nas
144
Entre os autores que fazem uso do termo estão, respectivamente: E. P. Thompson, Eugene Genovese.
145
... si admitimos el término, debemos también admitir que es demasiado amplio para un análisis discriminatrorio. Nos
dice muy poco sobre la naturaleza del poder y el Estado, sobre formas de propriedad, sobre la ideiología y la cultura, y es
incluso demasiado romo para distinguir entre modos de explotación, entre la mano de obra servil y libre. (...) Para
resumir: paternalismo es un término descriptivo impreciso. Tiene considerablemente menos especificidadd histórica que
términos como feudalismo o capitalismo; tiende a ofrecerun modelo de orden social visto desde arriba; contiene
implicaciones de calor y de relaciones personales que suponen nociones valorativas; confunde lo real con lo ideal. No
significa esto que debamos desechar el término por completa inutilidad para todo servicio. Tiene tanto, o tan poc, valor
como otros términos descriptivios generalizados – autoritario, democrático, igualitario – que por sí mismos, y sin
sustanciales anânadiduras, no pueden caracterizar un sistema de relaciones sociales. Ningún historiador serio dbe
caracterizar toda una sociedad como paternalista o patriarcal. Pero el paternalismo puede, como en la Rusia zarista, en
el Japón meiji o en ciertas sociedades esclavistas, ser un componente profundamente importante no sólo de la ideología,
sino de la mediación institucional en las relaciones sociales.” (T
HOMPSON, 1989, 17, 19).
146
Jeremy ROWAN (2003) trata do modo como William Lever construiu uma imagem positiva de sua companhia por
intermédio da elaboração e divulgação de uma imagem positiva de si mesmo e da cidade que construiu, colocando-a como
exemplo.
147
Argumentando que o emprego da noção weberiana de patrimonialismo destinada a explicar grandes épocas históricas não
é apropriada para a análise de uma situação concreta e, citando Thompson, considera o termo pouco explicativo (L
EITE
LOPES, 1989).
50
experiências de vilas operárias e núcleos fabris, o industrial recuperou freqüentemente práticas e
rituais vinculados à idéia de paternalismo”, o termo não deve se aplicado tanto por ser por demais
generalizante quanto por sua conotação “benevolente”, muito utilizada pelos industriais para justificar
a ingerência na vida fora da fábrica, apresentando estes núcleos como “... indícios da possibilidade de
harmonia entre capital e trabalho”. Assim, a fim de evitar a consagração do discurso patronal, ou seja,
de uma visão de cima para baixo, e se permitir uma compreensão mais precisa no relacionamento entre
a empresa e seus empregados, evita-se o emprego do termo “paternalismo”.
Portanto, se a ingerência do patrão na vida fora da fábrica na sociedade brasileira pode ser rastreada
desde o período escravista
148
, ao longo do tempo ela foi se modificando, moldando-se às novas
realidades. Modificações que podem ser sentidas pelo discurso de legitimação da autoridade patronal
ao se colocar como responsável pela transformação do escravo em “homem”, do camponês em
operário e do trabalhador em cidadão. Assim, este relacionamento que nunca deixou de ser pautado
pela vinculação entre aspectos financeiros e morais, pois a garantia do trabalho – e com ele a
concessão de benefícios, como habitação, saúde, educação e lazer, além do próprio salário – implicava
no enquadramento do trabalhador num sistema de valores, que passara da noção de “filantropia” para
a de “responsabilidade social”, e a partir da década de 1980 torna-se “ecológico”, o que se verifica
tanto pelo número de desmonte de núcleos e vilas
149
quanto pelas justificativas que norteiam os
projetos nos quais as empresas industriais têm optado aplicar seus recursos, pois embora se observe
uma real preferência por projetos “ecológicos”, a solução de problemas sociais continua presente, só
que a partir de então como questão de fundo, pois a principal estratégia empresarial para promoção de
imagem positiva da companhia é o que se vem chamando “discurso verde”, instrumento tido como
mais eficaz na atração de profissionais mais qualificados e compradores mais fiéis
150
.
I.2.4 A ARQUITETURA EM QUESTÃO
A problematização da arquitetura nos estudos dos empreendimentos industriais, ao acrescentar a
questão tecnológica, fecha o ciclo de preocupações que se podem chamar modernas: habitação,
cidade, sociedade e tecnologia.
Assim as discussões sobre arquitetura, na literatura estudada sobre cidades empresariais, leva em conta
desde sua localização urbana
151
(CORREIA, 1998; BLAY, 1985) até a escolha de materiais e técnicas
148
Em sua análise do controle sobre as pessoas no Estado de São Paulo no final do século XIX, em especial sua exploração
para o trabalho, Wilson M
UNHÓS (1997) demonstra como não somente a herança das relações escravistas influenciaram a
forma de novas relações, também fundamentadas no favor, na dependência e na obediência patronal, constituindo-se
também numa forma de “direito sobre as pessoas”.
149
O que não implica que estas modificações se limitaram ao discurso tópico. Como já se observou e se poderá verifica no
sexto capítulo, ela representa alterações na escolha dos projetos nos quais as empresas se envolvem; portanto, no
tratamento que dispensam ao espaço.
150
A respeito ver INSTITUO ETHOS, 2002; THOMPSON, 1992; CHALHOUB, 1999.
151
Desde a ampliação das dimensões dos teares, devido ao aumento no número de fusos, que acaba por expulsá-los da esfera
doméstica e reuni-los em grandes galpões, até a decisão por uma determinada localização, como é o caso da instalação
51
construtivas (GUEDDES, 1994; NOLEN, 1919; GARNER, 1992), em trabalhos que, embora nem sempre
abordem a tecnologia, ao tocar em questões que se colocam somente a partir da difusão de um dado
avanço, ou que a partir dele assumem característica antes insuspeitas, tomam-na como premissa.
O trabalho de Lílian V
AZ (1994)
152
e de Fernando ATIQUE (2004), embora este último não trate
diretamente da construção de habitações operária, ao discutirem a verticalização, respectivamente nas
cidades de São Paulo e do Rio de Janeiro, descrevendo como em ambas o edifício em altura
explicitava o conflito quanto à definição do que representava um habitat moderno, pois ao mesmo
tempo em que caracterizava-se como edifício de habitação coletiva, fazendo referencia às iniqüidades
verificadas em cortiços, estalagens e casas de modos, por outro, ao exigir o emprego de novas
tecnologias e apresentar-se como marco na paisagem urbana, surgia como um dos mais expressivos
símbolos da modernidade
153
.
Esta disputa entre habitação coletiva e unifamiliar, no caso da habitação edificada por industriais foi
vencida com larga vantagem pela segunda, demonstrando que as possibilidades tecnológicas
permaneciam submetidas a ideais de sociedade
154
, com a opção pela habitação individual
representando uma vitória do ideal moderno da individualidade e privacidade
155
sobre as
possibilidades descortinadas pelo avanço tecnológico.
Transformada em “lar”, a casa operária era concebida como o local da família, de distanciamento do
trabalho, onde deveria reinar a paz e a harmonia, pois ao encontrar prazer no convívio familiar e
conforto no lar, reduzia-se a motivação do trabalhador em buscar satisfação em atividades
indesejáveis, como o jogo e a bebida, auxiliando na sua formação moral e mantendo-o apto para o
trabalho fabril. Assim, a casa foi compartimentada, cada cômodo destinado a uma função específica
156
,
industrial no campo – ligada, entre outras coisas, à necessidade de proximidade de fontes geradoras de energia – alterada
pela implantação de redes mais amplas e confiáveis de energia elétrica, que abre a possibilidade de instalação de unidades
fabris nas cidades, são inúmeras as conseqüências do desenvolvimento tecnológico.
152
Lílian VAZ (1994) parte da arquitetura das residências construídas por indústrias. Nesse trabalho, a autora estuda a história
da habitação coletiva na Cidade do Rio de Janeiro, descrevendo como fora vista; ora como solução, ora como problema.
Assim, em meados do século XIX, estalagens, casas de cômodo e cortiços foram a resposta aos problemas do grupo menos
favorecido e que precisava estar próximo ao centro. Contudo, a proliferação da precariedade das condições de higiene
desses estabelecimentos e a onda de epidemias que tomou a cidade, serviram de justificativa para sua expulsão, durante as
reformas urbanas do início do século XX. Dos debates sobre a casa higiênica despontava ainda o ideal da habitação
unifamiliar, principal modelo adotado nas vilas das fábricas, onde o espaço constituía-se em instrumento de controle do
operariado, e onde a autora verifica o progressivo abandono dos “quartos de solteiros” em favor de casas unifamiliares,
com a conseqüente priorização da contratação de famílias, em vez de trabalhadores solteiros, o que possibilitava ampliar a
extração da mais-valia por meio do trabalho de mulheres e crianças.
153
O reconhecimento do poder do aranha-céu como símbolo de prestígio e poder, discutido por Manfredo Tafuri no caso
americano (C
IUCCI et al, 1972), parece ter sua contraparte nacional explicitada no exemplo do Edifício Esther, que
Fernando A
TIQUE (2004) identifica como a concretização do sonho de reconhecimento do papel da família Nogueira na
consolidação do mais efervescente parque industrial da América Latina nos anos 1930. Uma representação simbólica de
poder que, para seus promotores, expressava-se tão claramente na escala e localização do edifício, que dispensava o apoio
de qualquer parâmetro estilístico ou método construtivo.
154
Embora a decisão quanto a este aspecto não passasse somente por parâmetros ideológicos, é interessante notar que a opção
por edifícios habitacionais coletivos, embora numa versão mais radical e não concretizada como o Familistério de Charles
Fourier, está presente e domina a paisagem da New Lanark de Robert Owen, sendo que a individualização e isolamento da
moradia ganha destaque somente na concepção da cidade industrial de Ebenzer Howard.
155
Vale lembrar que mesmo a privacidade do lar não era absoluta, sendo freqüentes as vistorias e revistas às residências.
156
As regras para utilização dos cômodos eram objeto de vigilância, como a proibição de utilizar a sala de estar como
dormitório na Vila Maria Zélia, fiscalizada por intermédio de visitas surpresa durante a noite.
52
sendo a cozinha um dos focos de maior atenção, pois, do mesmo modo que na fábrica, uma
racionalização no trabalho doméstico significava a redução do tempo gasto com estas atividades,
liberando a mulher para outras tarefas, inclusive a fabril.
Desta forma o impacto do desenvolvimento tecnológico, especialmente a partir do final do século
XIX, ao promover alterações nos hábitos cotidianos, levou a modificações significativas no modo de
se pensar e construir (nas) cidades. Processo no qual, mais do que reflexo, a arquitetura foi vista e
utilizada como elemento indutor de comportamentos, pois era por meio dela que novos equipamentos
deveriam tornar-se tanto disponíveis quanto desejáveis, nos espaços públicos ou nos privados; cada
vez mais responsável por ordenar a vida das pessoas, determinando quando e onde cada atividade
deveria se desenvolver. Além do que, a exigência de conhecimentos cada vez mais específicos, ao
mesmo tempo em que promovia o surgimento de um grande número de novas profissões, também
levava a uma especialização dos espaços. Assim, além da compartimentização da casa, difundiu-se o
zoneamento funcional, responsável por dividir a cidade em áreas industriais, comerciais, habitacionais
e de lazer; zoneamento que em, muitas cidades empresariais, com maior ou menor rigor, reproduz no
urbano a hierarquia da fábrica, construindo áreas residenciais e mesmo clubes exclusivos a
funcionários graduados e outros onde os menos especializados são admitidos; uma segregação visível
tanta na organização urbana, distribuição de equipamentos, quanto na dimensão e acabamento dos
edifícios e que em casos extremos era também racial.
O papel central da indústria como elemento irradiador da ordem, no sentido em que é a partir das
exigências da produção que se busca estruturar o núcleo urbano, faz com que ao edifício fabril seja
destinada a melhor localização
157
, o que nem sempre lhe confere uma posição de destaque. Embora em
alguns momentos o prédio da fábrica surja como ponto focal em projetos de cidades empresariais,
usualmente ele encontra-se escondido por morros ou pela vegetação
158
, auxiliando no reforço da
especialização dos espaços, traduzida por intermédio de um zoneamento funcional e justificada pela
necessidade de potencializar a utilização da infra-estrutura.
Do mesmo modo que o edifício industrial, a arquitetura industrial tem recebido menor atenção do que
os edifícios residenciais. Este campo de pesquisa sobre as cidades empresariais parece ter sido
inaugurado por Nikolaus P
EVSNER (1997) quando em seu “A history of building types” incluiu um
capítulo sobre as fábricas. Nesse livro, embora comente obras com finalidades sociais, como
157
A melhor localização é definida pela satisfação das necessidades de produção, sendo freqüente a implantação da fábrica
próximo a cursos d’água e vias férreas, ocupando as mais extensas planícies disponíveis, empurrando o núcleo urbano para
áreas mais acidentadas.
158
Embora ainda não possua dados suficientes para afirmar, a observação dos edifícios fabris apresentados pelos autores
estudados e em pesquisas de campo aponta para seu tratamento de forma distinta quando inseridos numa malha urbana pré-
existente e do que lhe é conferido quando são construídos núcleos fabris, diferenças que também podem ser encontradas
entre tipos diversos de indústrias ou ainda conforme a filosofia do empreendedor, mais ou menos preocupado com a
utilização de sua imagem enquanto elemento “propagandístico” de progresso, poder, etc., ou em tornar menos visível
possível as mazelas vinculadas à produção (além da precariedade das condições de trabalho, buscasse camuflar o papel da
indústria como fonte poluidora, portanto geradora de problemas sanitários e de saúde, que no discurso empresarial aparece
dissociado da imagem da empresa).
53
habitações, igrejas, escolas e cantinas
159
, centra sua atenção nos edifícios fabris, em seus aspectos
arquitetônicos, indicando as principais inovações estruturais e estilísticas. Trabalhos mais recentes
como os de S
KINNNER (1999) e BRADLEY (1999) também abordam a arquitetura industrial, mas
contrariamente a Pevsner, buscam relacioná-la diretamente às alterações verificadas no processo
produtivo no chão da fábrica, transpondo para a arquitetura conceitos exclusivos ao gerenciamento da
produção.
A exploração ideológica da arquitetura insere-se no mesmo contexto já mencionado nos itens
anteriores, servindo como elemento de atração e barganha salarial, com a ressalva do destaque ora
dado à sua monumentalidade, fazendo dela mais do que símbolo ou representação concreta de um
ideal, mas objeto de celebração, monumento erigido a fim de garantir a memória de seus idealizadores
ou de um dado momento histórico, como busca demonstrar Alberto L
OPES (1993) ao discorrer sobre
Volta Redonda.
Dada tal intenção, as preocupações com o patrimônio industrial, colocadas a partir da década de 1990,
quando se consolidam as tendências de redistribuição produtiva e de desindustrialização de algumas
regiões, tanto em escala municipal quanto mundial, devem ser consideradas com atenção, evitando-se
fixar memórias construídas em vez de reconhecer e resgatar significados ameaçados pelo
esquecimento.
159
Tais como: New Lanark e Saltaire, na Inglaterra; Lowell, Waltham, Lawrence e New Hampshire, nos Estados Unidos;
Chaux, Guise e Noisel-sur-Marne, na França; e Grand Hornu, na Bélgica.
54
I.3 OBSERVAÇÕES FINAIS SOBRE CIDADES EMPRESARIAIS
Da casa à cidade, o desenvolvimento industrial brasileiro tem provocado alterações profundas no
cotidiano das pessoas, no modo de viver e vivenciar o trabalho e o lazer, no modo de ocupar e
desfrutar a casa e a cidade, alterações que, muitas vezes, passam despercebidas ou que são tomadas
como conseqüências inevitáveis do “progresso”. Assim, o que se buscou ao longo do capítulo foi por
intermédio da análise bibliográfica questionar de que forma tais transformações foram conduzidas ou
motivadas pela indústria, em especial no concernente ao desenvolvimento urbano. Mais do que isso,
buscou-se nas diversas abordagens sobre as cidades empresariais parâmetros que venham a auxiliar as
discussões sobre o caso específico de Timóteo, o que levou ao reconhecimento da habitação, cidade,
operariado e arquitetura como tópicos por meio dos quais é possível dialogar com tais autores.
Dentre as principais conclusões desta análise bibliográfica, ressalta-se a abordagem das cidades
empresariais como cidades novas, o que se fundamenta principalmente na visão de Ervin G
ALANTAY
(1975), segundo o qual a associação entre grandes empreendimentos e o desenrolar de um processo de
urbanização, iniciado com a construção de uma nova cidade, é encontrado nos campos de trabalho pré-
industriais, cidades da Antigüidade que eram construídas a fim de servirem de canteiros para
construção de grandes obras, com o objetivo de homenagear um deus ou enaltecer um soberano
160
;
visão que leva à conclusão de que a urbanização desencadeada pela construção de uma cidade nova é
uma conseqüência de um projeto que antes de ser urbano é religioso, político ou econômico, o que faz
destas grandes estruturas um “meio”, impedindo que, contrariamente ao que sua denominação pode
sugerir, não nascem prontas; sua condição de cidade decorre da constituição de uma sociedade cujos
destinos não são exclusivamente determinados pelo projeto que a gerou. Desta forma, embora as
cidades empresariais só existam a partir da indústria, tenham sua construção e desenvolvimento
atrelados diretamente a ela, a formação de um corpo social com projeto e meios próprios que faz da
estrutura física uma estrutura urbana é o que permite considerar as cidades empresariais como uma
forma específica do processo de urbanização conduzido pela indústria. Caracterização que possibilita
uma visualização mais clara do papel da indústria na construção do espaço urbano, auxiliando a
distinguir os momentos em que ela age diretamente sobre o espaço, daqueles em que é simples
indutora da urbanização
161
, e assim colaborar na distinção entre os processos de industrialização e de
urbanização.
160
Just as the colonial city owes its origins to the military camp and the art of ‘castrametation,’ the ancestry of the planned
industrial town can be traced back to the labor camp. In pre industrial societies the only large-scale organized labor
force was employed in the constructions industry. Division of labor, specialization, complexity, and size led to a highly
efficient organization of production which Mumford describes as a ‘human machine’. It was to provide housing for such a
labor force that the first planned workers’ settlements were built in Pharaonic Egypt ....” GALANTAY (1975: 40)
161
A sobreposição do caráter urbanizador sobre o industrial, no caso das cidades empresariais, parece ter suas raízes tanto na
referência constante ao modelo das cidades jardim de Ebenezer Howard que se difunde a partir da experiência inglesa
(Letchworth e Welwyn) e que eram na verdade cidades satélites, com objetivos claramente urbanizadores, quanto na
indistinção dos processos de industrialização e urbanização, caso em que não se diferencia um processo do outro, sem que
se determine qual é a causa e qual a conseqüência.
Capítulo II: PROJETOS PARA A CONSTRUÇÃO DE UMA CIDADE EMPRESARIAL
x
cidade
Indústria
Fig. 28: Volta Redonda
(ESPINHEIRA, s.d.)
Fora do ferro não há salvação. Só o ferro
enriquece. O que chamamos os grandes países
modernos são apenas os países ferrados. País
desferrado chiniza-se – cresce em população e
miséria, gigantiza-se, no sentido patológico da
expressão. ....
Civilização é maquinação. Grande país hoje é
país que se maquinizou em grau maior que os
demais e por isso traz aos demais atrelados à sua
influência. Franca ou disfarçadamente, país não
maquinado é colônia.
(L
OBATO, 1956)
56
II.1 PROJETOS E DESTINO DA INDUSTRIALIZAÇÃO NO BRASIL
Neste momento, vivencia-se um tempo em que as idéias de fracasso do comunismo, decadência da
democracia, derrocada do ocidente, limitação da ciência, declínio do capitalismo e fim da natureza,
são discutidas com freqüência por intelectuais conceituados nos meios de comunicação de massa
162
,
induzindo a noção de que este é um momento de transição, de ruptura.
163
Esta sensação de que o futuro
se desvinculará do passado
164
vem do questionamento de conceitos e valores através dos quais havia se
aprendido a olhar o mundo, balizar a vida cotidiana e entender o universo ao redor, mais ainda, ela
origina-se de uma insatisfação para com os projetos que vinham ocupando todas as energias
disponíveis. Seja por sua superação, fracasso ou pela constatação de que não mais se deseja o que fora
almejado, fazendo com que antigos projetos sejam postos em cheque, abandonados ou substituídos.
165
Se no contexto internacional os atentados terroristas de 11 de setembro foram tomados como ponto
(simbólico) de inflexão, momento em que alterações gestadas ao longo do último século eclodiram,
forçando a criação de novos parâmetros sobre os quais se assentaria a ordem política, econômica e
social vigente, no Brasil foi a eleição de Luiz Inácio Lula da Silva para presidente da República que
fortaleceu a idéia de mudança, dando fôlego à sensação de ruptura. Contudo, essa sensação infundida
em toda a sociedade e que pode ser observada tanto na fala de moradores de favela
166
, quanto na de
alguns intelectuais
167
; não é absoluta nem pode ser considerada hegemônica, pois
168
paralelas às
162
Em especial artigos do caderno Mais! da Folha de São Paulo de autores como: Castells, Hobsbawm (2001), Burke,
Weinberg (2001), Fukuyama (2002), Kurz (2002) e Touraine (2002; 2003).
163
Na postura mais radical de Nancy (apud Leite Neto, 2002: 6): “... vivemos numa época de mutação comparável ao fim da
Antiguidade. É toda uma civilização que chegou ao fim, e nós a vemos hoje como um romano do século V enxergava a
sua. Ele não tinha nenhuma idéia do que iria se passar simplesmente constatava que a civilização romana, ou greco-
romana, estava desmoronando. Não via que era o começo de uma outra cultura, que seria a da Europa cristã.”
164
Sendo que a dissociação entre passado e presente, pelo o raciocínio de Bernard Lepetit (2001), levaria a um tratamento do
passado como mera “recapitulação celebrativa” e à sua “museificação”, formas não apropriadas de tratamento do passado
pela história, pois inviabilizam uma postura crítica com relação a ele.
165
Assim, a queda dos regimes comunistas coloca em cheque o pensamento marxista, abalando também a crença no
capitalismo que, embora praticamente hegemônico, tem sua estrutura fortemente criticada (Kurz, 2002); a decadência da
democracia, prenunciada pelo avanço das direitas radicais, representa a corrosão de um ideal herdado da Antigüidade
Clássica sob a égide do qual se abrigara, na Era Moderna, toda a cultura da civilização ocidental (Hobsbawm, 2001); já o
fim da natureza implica uma indefinição dos valores éticos e morais com relação à capacidade criativa (ou destrutiva) do
homem, onde a ciência, lente através da qual se habituara a entender o mundo e tida como único instrumento capaz de
explicá-lo e transformá-lo, admite suas limitações, sua incapacidade de explicar os “mais fundamentais princípios
científicos” e todos os “princípios morais” (Weinberg, 2001).
166
Não sei o que vai mudar, mas as coisas vão mudar, para melhor ou para pior elas vão mudar.”, foi a resposta de um
líder comunitário, um dos fundadores de uma organização não governamental mantida pelos próprios moradores da favela
com a finalidade de buscar melhorar suas condições de vida, quando perguntado sobre as perspectivas que tinha com a
eleição de Lula para a presidência, em 12/nov/2003 após a exibição do documentário “A voz da ponta - a favela vai ao
Fórum Social Mundial”, de Daniela Boitman e Fernando Salis, sobre a participação dessa entidade no Fórum Social
Mundial realizado em Porto Alegre em 2002
167
Tanto Alain Touraine (2003) quanto Laymert Garcia dos Santos (2003) ou mesmo Nicolau Sevcenko (2003), em textos
publicados no Caderno Mais! da Folha de São Paulo, 05/jan/2003, destacam pontos de ruptura na eleição de Lula. Para
Touraine a ruptura se dá pela inauguração da possibilidade de associar a democracia às reformas econômicas e estruturais e
para dos Santos ela é representada: a) pela chegada ao poder pela primeira vez na história brasileira de um homem do
povo, como ressalta: “não um self made man”, permitindo uma quebra no padrão de dominação em vigor desde o período
colonial; b) pela possibilidade de inversão da noção de que “no Brasil, desde os tempos da colônia, o público sempre foi
objeto de apropriação privada”; c) pelo fortalecimento do país frente a comunidade internacional; e d) pela “derrota da
mídia brasileira, grande eleitora do candidato tucano. Já Sevcenko ao mesmo tempo que adverte para a complexidade e
novidade da situação e para os falsos déjà vu, conclui que o futuro depende de fazer as pazes com o passado, resolvendo os
problemas de ontem estaríamos resolvendo os de amanhã.
168
Como diria Benard Lepetit o presente só pode ser entendido através do passado, pois se constituindo da reunião de
sucessivas camadas de passados, constantemente atualizados por outros passados (nem sempre contínuos), o presente é re-
57
rupturas correm continuidades
169
, e todo momento de ruptura caracteriza-se também como momento
de permanência. Assim, a essas reflexões sobre episódios recentes e que privilegiam as mudanças, é
necessário somar as permanências, características que marcaram o passado e que, embora tenham
sofrido mudanças, em essência, continuam presentes, assim, como lembra Nicolau S
EVCENKO (2003:
09): “Nossos problemas cruciais não surgiram com a globalização e o neoliberalismo, mas 500 anos
atrás com o colonialismo e a escravidão. Nossa fome de justiça começa ali. Nosso futuro é resolver
esse passado”. É, portanto, entre rupturas e permanências que marcaram o processo de
industrialização brasileiro e que, podem ser sentidas seguindo o curso do projeto político e ideológico
no qual ele se fundamentou, que se busca neste capítulo as raízes da ACESITA e da cidade de
Timóteo.
Entendidos como conjuntos de decisões e medidas tomadas de acordo com objetivos pré-
estabelecidos, esses projetos sofreram modificações ao longo de seu processo de implantação, e como
a Fedora de Ítalo C
ALVINO (1972), muitas vezes, tornaram-se algo bastante diverso do que
inicialmente se planejara. Portanto, do início ao fim, mesmo tendo mantido sua essência, dificilmente
o resultado inicialmente esperado coincidiu com o obtido, e mesmo quando isso ocorreu, eram
freqüentes os desvios tomados ao longo do percurso. Assim, a fim de se compreender esse processo é
necessário lembrar também Francisco de Oliveira
170
, segundo o qual nada adianta projetar o futuro
seguindo parâmetros que deixaram de ser válidos, tendência que Roberto S
CHWARZ, (2003: 09) chama
desatualização histórica” e que tem turvado a visão do país
171
, fazendo com que se construam
imagens destorcidas do presente e, portanto, que se acredite num futuro que jamais se cumprirá,
engrossando a “comprida lista de nossas frustrações históricas”.
Frustrações que conduzem a
exposição do caso brasileiro como uma “exceção permanente” e que induz a se tentar explicar o país
pelo que ele não é. Pois assim como o ornitorrinco O
LIVEIRA (2003), que bota ovos ao mesmo tempo
que amamenta seus filhotes, o Brasil superou o estágio de subdesenvolvimento, mas “nem por isso ele
é capaz de passar para o novo regime de acumulação”, o que impossibilita comemorar.
A relevância de se constatar tal fracasso reside no papel que a busca pelo desenvolvimento assumiu na
história nacional, porque, embora esse conceito tenha surgido somente após a Segunda Guerra
Mundial, ele foi utilizado, principalmente na literatura econômica, para explicar processos de períodos
significado e re-semantizado, devido a sua imersão em contextos temporal ou espacialmente diversos, mas mesmo ao
assumir um novo sentido, nele mantem-se algo de sua essência original. (Lepetit, 2001)
169
Enfatizando as mudanças desse processo o historiador José Murilo de Carvalho (2003) também em texto publicado no
Caderno Mais! da Folha de São Paulo, 05/jan/2003, salienta as continuidades. Para Carvalho o retorno a retórica populistas
de Getúlio Vargas, quando a noção de cidadão e mesmo a de classe (tão cara ao PT) sedem lugar a de povo, com uma
retórica populista e nacionalista agora encenada em novo palco e protagonizada por atores diferentes, quer crer o autor,
concretizando agora aquelas antigas promessas.
170
As observações que seguem são resultado da leitura do artigo de Roberto Schwarz (2003), sobre o livro de Francisco de
Oliveira e de entrevista do autor no programa Roda Viva da TV Cultura, vinculado em 1/dez/2003.
171
Que pode ser detectada pela negação da incompatibilidade entre processos freqüentes do cotidiano nacional (mutirão x
cidade moderna, trabalho informal x regime da mercadoria, patrimonialismo x concorrência entre capitais) ou ainda pela
incapacidade de identificação do surgimento de uma nova classe social composta por ‘... de um lado, técnicos e intelectuais
doublés de banqueiros, núcleo duro do PSDB, e operários transformados em operadores de fundos de previdência, núcleo
duro do PT. A identidade dos dois casos reside no controle do acesso aos fundos públicos, no conhecimento do ‘mapa da
mina’”, ou seja pela união de facções anteriormente opostas e que agora detém o controle do capital disponível. (Shwarz,
2003: 9)
58
anteriores, além do que, a coincidência entre o desenrolar dos processos de desenvolvimento,
industrialização e urbanização, especialmente a partir do início do século XX, autoriza identificar
semelhanças desse ideal desde os primeiros projetos de constituição da nação brasileira. Pode-se dizer
que foi perseguindo esse objetivo que se tentou conhecer o Brasil e identificar suas potencialidades, e
a partir daí traçar projetos para a nação. Com ele em mente se reuniram e debateram setores diversos
da sociedade, lançaram-se as bases do processo de industrialização, foram derrubadas matas, erguidas
chaminés, escavadas minas, montadas máquinas, abertas estradas e construídas cidades. É, portanto,
através do reconhecimento das noções de desenvolvimento e subdesenvolvimento e suas relações com
o processo de industrialização e urbanização que se buscam as bases para compreender a fundação da
ACESITA e, conseqüentemente de Timóteo.
59
II.2 DESENVOLVIMENTO, INDUSTRIALIZAÇÃO E URBANIZAÇÃO
Para Aldana, o surgimento dos termos desenvolvimento e subdesenvolvimento "(...) fêz seu
aparecimento no seio das Nações Unidas, entre os anos de 1944 e 1945, quando os países recém-
emersos das infernais destruições causadas pela Segunda Guerra Mundial, buscavam ansiosamente a
consecução de fatores dinâmicos que conduzissem à construção de uma ordem mundial ‘superior’”
(A
LDANA, 1968: 40). Nesse contexto, mais do que um processo, acabaram por designar a condição a
de desenvolvido ou subdesenvolvido, classificação que serviu de baliza, principalmente a economistas
e sociólogos, sendo utilizados no estudo de processos anteriores.
Em linhas gerais, podem-se detectar três formas como a noção de desenvolvimento foi abordada
inicialmente e, em alguns casos, ainda é. Na primeira ele é considerado como um processo passível de
ser medido em termos de rendimento por habitante e produto nacional bruto, que parece ser a postura
de A
LDANA (1968); na segunda, da qual Rostow aparece como principal expoente, encara
desenvolvimento e subdesenvolvimento como etapas de um mesmo processo histórico cuja
substituição requereria a combinação de condiões de “arranque” (take-off)
172
ou decolagem; a terceira
busca abranger aspectos sociais e políticos, além dos exclusivamente econômicosdefinindo
desenvolvimento como “um processo deliberado de mudança social, que tem como finalidade a
igualação[sic] das oportunidades sociais, políticas e econômicas, tanto no plano nacional como em
relação a outras sociedades que possuem padrões de bem-estar material mais elevados.” (L
LUCH,
1979: 25)
Mesmo sem negar as anteriores, a partir da década de 1960, uma outra abordagem ganhou força, sendo
difundida principalmente pelo CEPAL (Comissão Econômica das Nações Unidas para a América
Latina); ela baseia-se na noção de que “o subdesenvolvimento é uma conseqüência do desenvolvimento
nos países mais avançados, ou seja, que o desenvolvimento de uns países e o atraso de outros
constituem uma unidade, cujos termos não podem explicar um sem o outro.” (L
LUCH, 1979: 13)
Segundo Francisco de O
LIVEIRA (1976: 21), essa interpretação levou à transformação da “teoria do
subdesenvolvimento numa teoria da dependência.
173
, que ficou conhecida como “modelo dualista
cepalino” e que foi amplamente criticado por ele no artigo “A economia brasileira: crítica a razão
dualista”.
174
172
Segundo Rostow (apud Lluch, 1979) existem três níveis ou patamares (uma alternativa para os indicados por Marx:
feudalismo, capitalismo, socialismo e comunismo): no primeiro o arranque dependeria da implementação de infraestrutura,
desde educação e saúde até desenvolvimento tecnológico e industrialização; o segundo, que estaria condicionado ao
cumprimento das tarefas do anterior possibilitando um consumo massivo; e o terceiro, busca da qualidade, teria como
principal característica a rápida proliferação do setor de serviços, tanto público como privado.
173
Confusão que pode ser verificada nas palavras de Rostow (apud Lluch, 1979), que a denomina “doutrina da dependência
e que, segundo ele já nasce de uma deturpação, pois na realidade teria sido formulada pelo norte americano Alexander
Hamilton a fim de explicar que mesmo após a independência política, os Estados Unidos continuaram dependentes da
Inglaterra no que concerne a importação de produtos manufaturados, e teria sido emprestada pelos latinos americanos, que
tentariam explicar através dela seu subdesenvolvimento.
174
Nele Francisco de Oliveira (1976) faz uma analise do processo de desenvolvimento do capitalismo no Brasil da década de
1930 até o momento em questão (1975), apontando para o perigo de interpretar o caso brasileiro sob a ótica de um modelo
geral para a América Latina ou mesmo dos países centrais. A principal crítica reside na insistência de priorizar aspectos
econômicos em detrimento de sociais, fundamentando toda a interpretação na dicotomia entre opostos como: atrasado e
60
Contudo, independentemente dos parâmetros sobre os quais se assentam, para LLUCH (1979) os
termos desenvolvimento e subdesenvolvimento pressupõem tanto uma perspectiva de abordagem do
problema, quanto um programa econômico para solucioná-lo (L
LUCH, 1979) Assim, o problema é
abordado pela ótica da desigualdade econômica, dada pelo contraste entre riqueza e pobreza, e sua
solução consiste no aproveitamento de recursos produtivos ociosos, que levariam à independência
econômica, cultural, política e tecnológica. Originalmente tido tanto como gerador de “todos os
males”, quanto como único elemento capaz de dar cabo deles, o processo de industrialização foi
tomado como aspecto principal de inúmeros estudos sobre crescimento econômico, originando teorias
conclamadas a fundamentar políticas econômicas, nas quais o desenvolvimento era tido como a forma
certa de equilibrar as forças produtivas, promovendo a manutenção de uma certa estabilidade social,
num balanço harmônico entre capital e trabalho e assim, estreitamente vinculado ao desenrolar de um
processo de industrialização.
175
Contudo, mesmo valendo-se de indicadores com implicações sociais - como renda ou produto por
habitante, dados populacionais, disponibilidade de recursos naturais, grau de urbanização etc., numa
conceituação ampla de desenvolvimento -, o termo permanece fortemente vinculado a sua acepção
econômica. Fato que se explica pela sensibilidade desses fatores a qualquer mudança na estrutura
produtiva ou econômica em questão, pois assume-se que o crescimento econômico acarreta
automaticamente uma melhora nas condições sociais. Reflexo desse raciocínio pode ser encontrado
nas ênfases temáticas da Comissão Econômica das Nações Unidas para a América Latina (CEPAL)
176
e que objetiva a formulação de recomendações de políticas de desenvolvimento. Nestas políticas
destacam-se preocupações relativas à inserção de países com fluxo de capital instável na economia
internacional, a transmissão de inovações tecnológicas visando o equilíbrio nos níveis de
desenvolvimento e a igualdade na distribuição dos frutos do desenvolvimento, ou seja, a
predominância de aspectos característicos de sociedades com capacidade produtiva suficiente para
suprir tanto seu mercado interno quanto o externo, capazes de absorver novas tecnologias e expandir-
se horizontal e verticalmente, sociedades cujo nível de complexidade é crescente e que adotam o
moderno, externo e interno, desenvolvido e subdesenvolvido; que, para o autor convivem num mesmo sistema, fazendo do
’subdesenvolvimento’uma formação capitalista e não simplesmente histórica”. Assim, ao enfatizar a relação centro-
periferia, ou seja, fatores externos, o modelo cepalino se esquece de analisar aspectos internos, um desvio de atenção de tal
magnitude que permite que a teoria do desenvolvimento, bandeira sob a qual se abrigaram os governos populistas,
deslocando a atenção teórica e política do problema da luta de classes auxilie na afirmação da hegemonia do empresariado
urbano-industrial. Seu raciocínio baseia-se no estudo de fatores como: reprodução do exército de reserva, valor do salário
mínimo, papel dos setores: agrícola, industrial e terciário no processo capitalistas, através de políticas econômicas e pelo
viés da relação trabalho x capital.
175
Com ênfase na necessidade de atuar sobre a agricultura Schultz e Boserup insistem na sua modernização (técnicas de
produção e modo de comercialização) e Dumont ressalta a premência de medidas mais profundas como a redistribuição de
terras.
176
Órgão criado em 1948, com o objetivo de "(...) acelerar o crescimento com igualdade, tornando-o verdadeiramente
efetivo." Ênfases temáticas:
". El papel central que desempeña la modalidad específica de la inserción internacional de nuestras economías, es decir, su
estructura de especialización y la dependencia de flujos inestables de capital.
. La transmisión del cambio tecnológico desde los países que generan conocimiento hacia los nuestros, cuyas
imperfecciones generan dinámicas que no facilitan la convergencia en los niveles de desarrollo en ausencia de
intervención estatal.
. La equidad y su relación con el proceso global de desarrollo, ya que tanto la forma como las estructuras productivas y de
propiedad condicionan la distribución de los frutos del desarrollo y como ésta última afecta la estructura y dinámica
económicas." (CEPAL, s.d.)
61
processo de industrialização como instrumento de crescimento econômico e social. De tal forma que a
CEPAL definiu e trabalhou o desenvolvimento através da industrialização como um processo
transformador da estrutura colonial no âmbito nacional e internacional.
Nesse sentido é que a promoção do desenvolvimento, significando melhoras na qualidade de vida,
aumento da renda per capita, incremento na produção e aproveitamento de recursos naturais ociosos,
freqüentemente apresenta-se sob a forma de políticas de industrialização. E embora, o desenrolar de
um processo não implique diretamente no desenrolar do outro, no Brasil sua aproximação é tão intensa
a ponto de Csaba D
EÁK e Sueli SCHIFFER (1999: 16) afirmar que: “...não são apenas inseparáveis e
inter-relacionados: são um só processo.”, sendo inclusive apresentados nos dicionários como
integradas:
"Desenvolvimento. [De desenvolver + - imento]. S.m. (...) 1. Crescimento econômico (q.v.),
esp. quando acompanhado por modificações na estrutura produtiva do país ou da região,
como a industrialização. (...)" (F
ERREIRA, 1999 : 650)
No entanto, se como coloca Paul S
INGER (1968: 11):
"Desenvolvimento econômico é um processo histórico cuja dimensão propriamente econômica
consiste numa completa transformação da estrutura de produção preexistente. [E que as]
abordagens que o encaram como o resultado de certos mecanismos econômicos (...), somente
conseguem, na melhor das hipóteses, medir o processo pelos seus efeitos (...), sem penetrar
em sua essência." (
SINGER, 1968 : 11)
Nos anos 1950, para a CEPAL, ele deveria ser entendido não somente como processo de
transformação da estrutura produtiva, grandemente determinado por fatores sociais, políticos e
culturais inerentes ao contexto observado, mas também como de transformação de uma sociedade
especializada na produção primária e inserida numa divisão internacional do trabalho que, no século
XIX era alegadamente natural e que se dá a nível internacional, em uma sociedade industrial, cuja
divisão do trabalho pode chegar a extremos dentro do próprio território nacional ou mesmo da região.
A crítica do desenvolvimento levou Celso Furtado, um de seus expoentes, a mais tarde explicá-lo
como seria “... uma prolongação do mito de progresso, elemento essencial na ideologia diretora da
revolução burguesa, dentro da qual se criou a atual sociedade industrial.” (F
URTADO, 1998: 8). Para
esse autor o desenvolvimento econômico para os países periféricos seria um mito, segundo o qual a
perspectiva de universalização dos níveis de consumo das sociedades altamente industrializadas é
utilizada a fim de
“... mobilizar os povos da periferia e fazê-los aceitar enormes sacrifícios para legitimar a
destruição de formas de culturas arcaicas, para explicar e fazer compreender a necessidade de
destruir o meio físico, para justificar formas de dependência que reforçam o caráter
predatório do sistema ... Graças a ela, tem sido possível desviar as atenções da tarefa básica
de identificação das necessidades fundamentais da coletividade das possibilidades que abrem
ao homem o avanço da ciência, para concentra-las em objetivos abstratos, como os
investimentos, as exportações e o crescimento.” (F
URTADO, 1998: 89)
Na mesma linha, Francisco de OLIVEIRA (1976) também ressalta a capacidade dessa “idéia” de
direcionar esforços teóricos e políticos em favor de um determinado grupo; segundo ele
... a teoria do ‘desenvolvimentismo’ [que] desviou a atenção teórica e a ação política do
problema da luta de classes, justamente no período em que, com a transformação da
62
economia de base agrária para industrial-urbana, as condições objetivas daquela se
agravavam. A teoria do subdesenvolvimento foi, assim a ideologia própria do chamado
período populista; se ela hoje não cumpre esse papel é porque a hegemonia de uma classe se
afirmou de tal modo que a face já não precisa de máscara.
(OLIVEIRA, 1976:10)
E associado ao “mito do desenvolvimento econômico” cresceu o “mito da industrialização”, uma luta
antiga, que para Florestan Fernandes (1960) é passível de ocorrer independentemente do
desenvolvimento, bastando para tanto que o país ou região possua razoáveis base demográfica,
capacidade de importação, tecnologia científica, matérias-primas básicas e núcleos urbanos, havendo
inclusive características de sociedades subdesenvolvidas que auxiliam no processo de industrialização,
tais como:
...reserva de trabalho, margens de lucro do empresário e, a mais importante de todas, as
disposições subjetivas que fazem da industrialização um valor social de caráter moral.
...[Assim] uma sociedade subdesenvolvida, que chega a incluir a industrialização em seu
sistema de valores, atribuindo-lhe o caráter de mores, é uma sociedade na qual o
subdesenvolvimento se eleva à esfera de consciência social como condição socialmente
indesejável.” (F
ERNANDES, 1960: 64)
Assim, o desejo de desenvolvimento dispôs amplos setores da população a pagar altos preços
(monetária e socialmente falando) na luta pelo “progresso”, sacrificando-se em seu nome. Uma luta
que para F
ERNANDES (1960) encontra no processo de urbanização um importante apoio, pois através
da cidade e sua imagem se difunde o valor “benéfico” da industrialização.
rcausal mecânica entre urbanização e industrialização na história do Brasil [...] o espaço urbano
surge como uma das condições favoráveis à formação e ao desenvolvimento do capital industrial”,
sendo que
... a partir do momento em que o capital financeiro chegou a dominar todas as demais
atividades econômicas, ele passou também a determinar toda a expansão urbana, desde os
aspectos econômicos até sócio-políticos e culturais. Até a paisagem e a arquitetura, nesse
ponto, submeteram-se aos ditames do capital.
(HARDMAN & LEONARDI, 1982: 122)
Ditames que se referem à busca do lucro como objetivo primeiro e maior. Para tanto, busca-se
mercado de consumo, oferta abundante de mão-de-obra, disponibilidade de infraestrutura - sistema
viário e de transportes (ferroviário, marítimo ou fluvial), redes de comunicações e fontes energéticas.
Essa relação entre industrialização e urbanização, assim como em outros países, no Brasil significa
uma expansão da rede urbana, processo que, estudando quatro capitais brasileiras, Paul S
INGER
(1968), descreve:
"Graças à industrialização, cresce o mercado de trabalho, a população urbana aumenta, o
que leva a um aumento de demanda por produtos industriais na própria cidade; o mercado
em expansão atrai mais estabelecimentos à cidade, provocando nova expansão industrial. O
mercado urbano torna-se cada vez mais importante para a indústria, acabando por superar o
mercado representado pelo campo, já que, na medida em que a industrialização prossegue, a
população urbana cresce às custas da população rural. Em conclusão, a partir de um certo
momento, a industrialização, ao provocar a expansão do seu próprio mercado, se realimenta,
acelerando seu ritmo, tendo por única limitação as disponibilidades de produtos agrícolas
para nutrir a crescente população urbana e abastecer de matérias-primas a própria
indústria”.(S
INGER, 1968: 369)
No quadro pintado pelo autor, a relação entre industrialização e urbanização refere-se à expansão
demográfica dos centros urbanos, absorvendo a população do campo. Porém, as relações que ora se
63
estabelecem entre industrialização e urbanização, podem também assumir um caráter "colonizador",
que se refere à capacidade da industrialização de atuar como instrumento de ocupação do território
através da construção de novas cidades. Nesse aspecto, mesmo as políticas de promoção industrial de
âmbito local ou regional assumem proporções nacionais, pois se tornam capazes de modificar de
forma substancial tanto o desenho físico, como social e econômico do território. É, portanto, através
da indústria que giram as expectativas em torno do crescimento e desenvolvimento; o processo de
industrialização é então visto tanto como uma forma de salvaguardar a autonomia nacional,
proclamando a independência de capital e mercadorias estrangeiras, quanto se torna fonte de riqueza,
promovendo bem-estar social; é ainda símbolo de capacidade, de sucesso, de ordem e progresso. Dela
espera-se também a organização do território, pois a maior demanda de manufatura induziria à
propagação de atividades produtivas e provocaria o crescimento das atividades terciárias nos centros
urbanos.
Assim, projetos e políticas de desenvolvimento usualmente constituem-se em planos de
industrialização que, por sua vez, implicam o desenrolar de processos de urbanização. Ocorre, no
entanto, que usualmente os planos de desenvolvimento, ao desenhar um quadro econômico e social
composto por uma paisagem industrial, abdicam do direito de desenhá-lo urbanisticamente, pois no
bojo desses grandes planos, as novas cidades, bairros ou regiões metropolitanas, não passam de uma
conseqüência, o que permite dizer que, embora desenhadas e projetadas numa profusão de detalhes,
não foram verdadeiramente planejadas, mas induzidas, não são o objetivo do plano, são mero
subproduto, pois a “vontade” que as originou foi econômica e não urbana.
64
II.3 PROJETOS PARA O DESENVOLVIMENTO DA NAÇÃO
Referindo-se a um “longo século XIX”, Eric HOBSBAWM (1989) enfatiza os cento e vinte e cinco anos
(1789 - 1914
177
) que considera o período mais significativo para a formação do pensamento moderno,
do qual muito ainda resta em nós. Neste século longo ocorreram transformações que tomaram o
mundo de roldão e mudaram a ordem das coisas de forma irreversível. Assim, da Revolução Francesa
às diversas fases da Revolução Industrial, essas transformações atingiram desde instituições políticas,
até regras de convívio social e modos de produção a relações mercantis e trabalhistas, atividades
culturais e recreativas. Portanto, mais do que o quadro físico e social, elas significaram uma mudança
de filosofia nos mais diversos campos do pensamento, uma mudança de atitude com relação ao futuro
e que não se restringiu a determinadas áreas do globo, percorrendo-o por inteiro. Fundamentada na
idéia do predomínio global de preceitos políticos, sociais e econômicos, que, senão totalmente
semelhantes, minimamente dialogam entre si, surge a noção de uma “civilização universal”.
Analisando o impacto dessa “civilização universal
178
nas culturas nacionais, Paul RICOUER (1955)
reconhece que a necessidade imperativa de ingresso nesse universo moderno coloca tanto nações
subdesenvolvidas como desenvolvidas frente a um dilema: o apego ao passado cultural ou a
assimilação das mudanças impostas pela entrada em uma era científica e técnica. Essa busca pelo
progresso, por um futuro promissor inicia-se pela construção de uma nova imagem para a nação, para
os países subdesenvolvidos dissociada daquela de atraso herdado do período colonial e nos países
desenvolvidos, associada à de inovação constante, numa tendência a formação de uma “falsa
consciência” e que vem muitas vezes acompanhada do que Eric
HOBSBAWM e Terence RANGER (2002)
definiram como “criação de tradições
179
. Nesse contexto, mais do que romper com o passado é
necessário fazer as pazes com ele, pois é preciso “... reencontrar aquela personalidade profunda, re-
enraizá-la ao passado a fim de nutrir de seiva a reivindicação nacional.
180
(RICOUER, 1955: 280) O
passado é utilizado então como instrumento de legitimação de instituições, personagens, projetos,
177
Hobsbawm (1989: 22) afirma que: “O eixo central em torno do qual tentei organizar a história do século foi, basicamente,
o triunfo e a transformação do capitalismo na forma historicamente específica de sociedade burguesa em sua versão
liberal.”, sendo o primeiro volume “A era das revoluções” marcado pela análise dos processos desencadeados pela
predominância de modelos institucionais inaugurados pela Revolução Francesa e Guerra Civil Americana e pela expansão
do capitalismo pós Primeira Revolução Industrial; no segundo volume “A era do capital”a difusão da economia capitalista
e sua classe característica: a burguesia, aparecem vinculadas a novos movimentos culturais e ao liberalismo econômico; na
“Era dos impérios” a estabilidade reinante foi a geradora dos sangrentos conflitos do período posterior, em que economias
prosperas gestaram os mais radicais movimentos de trabalhadores, em que a democracia que caminhava em direção a
consolidação foi substituída por ditaduras fascistas, nazistas, socialistas ou mesmo republicanas.
178
Essa civilização é caracterizada pelo autor como fundamentada na difusão da tecnologia, imbuída de um espírito científico
utilitário e racional, que pela sua origem grega, assume um aspecto democrático e impessoal. Racionalidade técnica, dada
pela utilidade; política, dada pela constituição das nações enquanto estruturas capazes de satisfazer necessidades materiais
e sociais de uma determinada coletividade; e econômica, dada pelo estabelecimento do que o autor chama uma “técnica
econômica universal”, ou seja, o estabelecimento de um regime mercantil que compatibilize produção interna com
externa.(
RICOUER,1955)
179
“Por ‘tradição inventada’ entende-se um conjunto de práticas, normalmente reguladas por regras tácitas ou abertamente
aceitas; tais práticas, de natureza ritual ou simbólica, visam inculcar certos valores e normas de comportamento através da
repetição, o que implica, automaticamente, uma continuidade em relação ao passado. (...)Elas são altamente aplicáveis no
caso de uma inovação histórica comparativamente recente, a ‘nação’, e seus fenômenos associados: o nacionalismo, o
Estado nacional, os símbolos nacionais, as interpretações históricas, e daí por diante.” (HOBSBAW e RANGER, 2002: 9, 22)
180
“Il fallait donc d’abord retourver cette personnalité profonde, la réenraciner dans un passé afin de nourrir de sève la
revendication nationale.” (R
ICOUER, 1955: 280)
65
rituais e objetos, símbolos de um ideal nacional, portanto, da própria nação. Mais do que a identidade
de um povo, o estabelecimento e a fixação de tais símbolos coloca em jogo um projeto para a nação, a
construção de um quadro de valores que justifique o conjunto de ações concretas tanto com relação à
vida cotidiana como quanto às perspectivas de futuro, fazendo com que os projetos de
desenvolvimento nacional, enquanto portadores desses valores constituam-se em importantes
instrumentos para sua concretização.
No entanto, se à distancia, a similaridade de objetivos dos projetos de desenvolvimento que foram
implantados em diversos países, pregada pelos defensores da idéia de uma “civilização universal”,
parece evidente, ao aproximar o foco ela se desfaz. E, se a difusão do desejo de progresso,
modernidade e desenvolvimento uniformizou as metas, os meios para atingi-las mais os resultados
obtidos apresentaram variação e as diferenças de contexto histórico redesenham de tal forma o quadro
geral que, por vezes, torna-se difícil identificar contornos em comum. Assim a apresentação dos casos
da Tennesse Valley Authority e Companhia Vale do Rio Doce tem por objetivo desenterrar da
montanha de diferenças, sua base comum, a busca do desenvolvimento calcada em projetos de
industrialização de âmbito regional, evidenciando seu papel na organização espacial, através da
construção de novas cidades.
Desta forma enquanto o projeto da Tennesse Valley Authority (TVA) é lembrado principalmente
como um projeto hidroelétrico de âmbito regional, utilizado como um dos principais instrumentos de
Franklin Roosevelt para sair da crise pós-1929, a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), aparece
como mera reguladora da exportação de minério de ferro brasileiro. Enquanto a Tennesse Valley
Authority (TVA) nasceu das discussões em torno da exploração da fábrica de nitrato em Muscle
Shoals, considerada de segurança nacional, devido à necessidade desse para fabricação de munição,
após a crise de 1929 a preocupação com o nitrato foi colocada em segundo plano e, no momento de
sua instituição a TVA constituía-se num dos principais instrumentos de Franklin Roosevelt para a
concretização do seu Novo Contrato Social (New Deal). Nesse contexto, seu objetivo principal passou
a ser, através do estabelecimento de um sistema de gerenciamento regional, divido por bacias e que
incluía controle de enchentes, produção de energia hidroelétrica e desenvolvimento agrícola, promover
o desenvolvimento da região, servindo de referência a outros projetos que se multiplicariam por todo o
país.
181
A origem da Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) tem suas raízes na contenda sobre a
evasão do minério de ferro brasileiro para o exterior, fazendo com que se buscasse induzir seu
processamento dentro do território nacional, promovendo a fundação de uma forte indústria de base,
capaz de prover o mercado interno de manufaturas de ferro e reduzir a dependência de equipamentos
importados, o que possibilitaria o desenvolvimento da indústria nacional, incluindo o país no rol dos
países industrializados e tirando-lhe o estigma de subdesenvolvido.
Observa-se, desta forma, serem ambos originários de uma mesma fonte: projetos de desenvolvimento
181
Em 1937 Roosevelt insistiu com o Congresso para que fossem criadas mais seis autoridades regionais nos mesmos moldes
da TVA nas seguintes áreas: costa atlântica, Grandes Lagos e Vale do Ohio, Rio Missouri e Rio Vermelho do norte, bacias
dos Rios Arcansas, Vermelho e Grande, bacia do Rio Colorado, Vale do Rio Colúmbia. (LINK, 1965: 736).
66
nacional de âmbito regional, fundamentados na promoção da industrialização de regiões ricas em
recursos naturais ainda inexplorados (ou mal aproveitados). Foram projetos que se originaram de
longas e amplas discussões sobre a participação da iniciativa privada em serviços considerados de
segurança nacional, marcados por embates violentos entre grandes empreendedores e destacadas
figuras públicas (Henry Ford x George Norris e Percival Farquhar x Athur Bernardes), são também
projetos símbolo de um “Estado-empreendedor”, ou seja, cuja atuação na regulação econômica vai
além da concessão de empréstimos e controle tarifário, atuando ele próprio como empresário de
grandes empreendimentos, dos quais resultou a intensificação da ocupação do território, inclusive a
construção de novas cidades.
II.3
.1 O PROJETO DA TENNESSE VALLEY AUTHORITY
Assim como em grande parte do mundo ocidental, nos Estados Unidos a virada para o século XX foi
um período de agitação intensa. Momentos de grande euforia foram sucedidos por profundas crises, a
conquista de importantes avanços sendo seguida de ferozes retrocessos. Assim, após a Guerra Civil, ao
mesmo tempo em que se formavam algumas das mais vultuosas fortunas como as de Rockfeller e
Carnegie, o número de pobres e miseráveis atingia cifras nunca vistas; enquanto a chegada de novos
imigrantes obrigava a aceitação de culturas diversas, os negros eram ainda mais discriminados;
enquanto as indústrias de grande porte se multiplicavam pelo país, a produção agrícola passava por
sérias dificuldades; enquanto as linhas férreas cruzavam o território de costa a costa, decretava-se o
fechamento da fronteira; e ao mesmo tempo em que a América se firmava como o “país do negócio”,
reformadores sociais ganhavam espaço na imprensa
182
denunciando práticas fraudulentas e injustiças
geradas pelas grandes corporações, (C
URRENT et alli, 1967) mas como afirma Richard ABRAMS (1976:
50):
“Embora muita coisa na sociedade americana [...] fosse sórdida e deprimente, o que francamente
impressionava a maioria dos observadores deste período e seria geralmente assinalado pelos historiadores
era a atmosfera de efervescência, de expectativa e de grandes esperanças.”
Esse período conhecido como “Era Progressista” ou “Era das Corporações
183
foi caracterizado por
um extremo liberalismo econômico, que foi sendo corroído pela torrente de mudanças que varreram o
182
Esse ponto refere-se diretamente ao muckrakers, jornalistas preocupados em denunciar irregularidades tanto das grandes
corporações quanto do governo, que foram assim denominados por Theodore Roosevelt , que os comparou com um
personagem do livro “Pilgrim´s Progress” de John Bunyan, que estava tão “... preocupado em amontoar estrume que era
incapaz de ver coisas melhores. Os muckrakers formavam a voz literária do movimento progressista.” “They owned their
name from Theodores Roosevelt; he compared tem to the man in Joh Bunyan’s Pilgrim’s progress” (1678) who was so
intent on raking muck that he could not see the beter things above him. The muckrakers fromed the literary voice of the
Progessive movement.” (C
URRENT et alli, 1967: 488)
183
A invenção das corporações (sociedades anônimas), que levou Butler, então presidente da Universidade de Columbia, a
num ímpeto de entusiasmo afirma que a sociedade anônima era “... a maior descoberta do tempos modernos ... até o vapor
e a eletricidade são muito menos importantes... e estariam reduzidos a uma comparativa impotência sem ela.” (ABRAMS,
1976: 59), pois ao reunir diversas etapas do processo produtivo numa administração centralizada de diversas fábricas, com
companhias adquirindo outras companhias e formando holdings sem ferir a lei antitrustes, a comercialização de ações
preferenciais ao portador, possibilitou maior agilidade na captação de recursos para investimentos, enquanto uma série de
decisões judiciais que promovera uma redefinição da noção de propriedade, incluindo as expectativas de ganho pelo seu
uso comercial e a conquista do estatuto de “pessoa” às corporações, com direito a privilégios e proteção constitucional
(Quinta e Décima Quarta Emendas) (ABRAMS, 1976)
67
país ao longo das primeiras décadas do século XX, mas que teria sua morte oficialmente decretada
somente com as medidas intervencionistas de Franklin Roosevelt na década de 1930, a ponto de levar
o historiador Arthur L
INK (1965: 721) a afirmar que:
“Em 1941, a maioria dos americanos concordava em que o Governo Federal devia ser a mais poderosa
fôrça organizada dentro da democracia em que viviam: um avalista para a solvência dos lavradores, um
protetor benéfico para os trabalhadores, um amigo na adversidade, para rendeiros e desempregados, e uma
salvaguarda poderosa como regulador das atividades de banqueiros e homens de negócios.”
Pode-se dizer que o desgaste da postura liberal acompanhou o desgaste da crença numa estreita relação
entre virtude e sucesso, pecado e fracasso, profundamente arraigada no protestantismo norte
americano e que determinava o modo de vida americano. Fundamentada no princípio de que a
intervenção do “...Estado para assistir aos que sofriam era contrária aos ‘desígnios de Deus’.
(ABRAMS, 1976: 62), pois impedia que dessem prova, pela superação do sofrimento e trabalho árduo,
da disciplina e virtudes morais essenciais a sua salvação. Acreditava-se, então, que sinais desse
enfraquecimento podiam ser encontrados no fortalecimento do cristianismo social, cuja preocupação
com a reabilitação dos pobres (moral e física) levou uma legião de benfeitores
184
a organizar
estabelecimentos de ajuda aos necessitados; na proliferação de denúncias incisivas por parte dos
chamados muckrakers; no radicalismo das proibições dos saloons e bebidas;
185
no crescimento da
reivindicação de maior independência e liberdade de ação feminina; todos movimentos que
solicitavam uma participação mais ativa do Estado, mas que sofrem um baque quando os reformadores
sociais verificam que a correção dos
“... danos causados pelos valores humanos do industrialismo, [resultando n]uma sociedade livre,
preocupada com a dignidade humana, a confiança em si mesmo e a liberdade pessoal exigia uma variedade
de estilos de vida e de preferências sociais muito maior do que eles haviam imaginado ou, em última análise,
estavam dispostos a tolerar .”
(ABRAMS, 1976: 79)
Essa constatação que, ao mesmo tempo, exigia um retorno aos valores tradicionais, apontava para a
impossibilidade de retroceder; assim, o que ocorreu foi uma tentativa de vestir os antigos valores com
nova roupagem, fazendo surgir um “novo nacionalismo”, em que o bem da nação se sobreporia aos
interesses particulares, em nome da qual o Estado era chamado a agir.
186
Tal postura possibilitou um
fortalecimento do governo, o que, embora possa ser verificado pela intensificação de sua participação
em políticas sociais, com o advento da Primeira Guerra Mundial acabou por tingir de cores sombrias
esse sentimento nacionalista. Apoiados na máxima: “quem não está conosco está contra nós e deve ser
punido”, difundiu-se a idéia de que havia um inimigo interno a ser enfrentado, fazendo de qualquer
grupo, que adotasse uma postura considerada como ameaça as conquistas da nação, um inimigo em
potencial. Esse extremismo patriótico levou ao recrudescimento das discriminações étnicas
184
Inspirados no Tonybee Hall, instituição de assistência social fundada em 1884 em Whitecapel (Londres) por membros das
Universidades de Oxford e Cambridge. O primeiro deles foi fundado em 1886 em Nova Iorque e o mais renomado: a Hull
House de Ellen Gates Starr e Jane Adams em 1889 em Chicago. (A
BRAMS, 1976: 65)
185
Mais do que preocupações com a formação moral dos individuos, eles foram utilizados como instrumentos de medição do
grau de assimilação de grupos sociais, reforçando o racismo contra negros e imigrantes.
186
As origens desse “novo nacionalismo” Richard ABRAMS (1976) encontra na obra de Herbert Croly (“The promise of
american life” de 1909), segundo o quais as dificuldades que se vinha encontrando eram devidas as limitações das
oportunidades econômicas, pois a busca constante de expansão dos negócios estava exaurindo as oportunidades restantes e
o interesse público, em realidade uma somatória de interesses de grupos individuais, somente acentuasse as diferenças. O
único remédio para aliviar tal dor, era a criação de uma crença nacional, segundo a qual os interesse da nação suplantaria o
dos grupos individuais, sendo que a tradição e as instituições democráticas seriam capazes de frear qualquer tendência a
opressão, implantando-se um poderoso espírito nacionalista.
68
(especialmente contra negros e asiáticos) e colocou na lista de proscritos líderes sindicais, socialistas e
qualquer simpatizante de movimentos de esquerda. (C
OBEN, 1976) O alívio dessas tensões se deu
paulatinamente, a partir de duas frentes: por um lado, a insistência de estudos acadêmicos que punham
abaixo a noção anteriormente aceita de superioridade do branco;
187
e por outro, a ampliação do acesso
aos novos bens de consumo a camadas menos favorecidas da população.
Segundo Stanley COBEN (1976), esse acesso a mercadorias como rádio, telefone, carro ou outros
eletrodomésticos (geladeira, fogão elétrico, ferro de passar etc.) não se deu por um aumento da renda
propriamente dita, tendo em vista ter se mantido a elevada desigualdade da distribuição de renda, mas
pelo aumento do crédito ao consumidor, fator que auxiliou a mascarar os sinais de fragilidade da
estrutura monetária, criando um clima contagiante de entusiasmo
188
. Isto propiciou uma desmesurada
especulação na Bolsa de Valores que, sem o respaldo do aumento equivalente da produção, para se
sustentar, quebrou em setembro de 1929, quando generalizou-se a tentativa de venda de ações.
A crise deflagrada pela queda da Bolsa de Valores de Nova Iorque tomou o mundo de assalto, mas em
nenhum outro local foi mais fortemente sentida que no próprio país e, apesar das tentativas do
Presidente Hoover, os números que se seguiram eram estarrecedores e quando ele deixou o cargo em
1933:
“... um terço dos assalariados dos Estados Unidos estava sem trabalho e uma elevada proporção dos
restantes labutava, em horários reduzidos, por um salário de fome. Nas áreas industriais de aciaria, têxteis,
automóveis, borracha e mineração, cidades inteiras estavam virtualmente sem emprego. Os fundos de
assistência, públicos e particulares, estavam praticamente exaustos. Ninguém poderia calcular as
conseqüências da desnutrição, exceto nos hospitais locais que ainda aceitavam internações por caridade e
onde os resultados de pesquisas eram de causar horror. A indústria americana, como um todo funcionava
com prejuízo, ... as instituições financeiras estavam executando hipotecas sobre bens imóveis urbanos e
rurais às centenas por dia. Casamentos e nascimento caíram para as mais baixas taxas registradas na
história americana, mas a taxa de suicídio subira em um quarto desde 1929, para alcançar um novo recorde.
Mais pessoas emigravam do país do que entravam, apesar da depressão que lavrava em quase todo o mundo.
Pela primeira vez, mais americanos se mudavam para o campo – onde podiam comer, pelo menos – do que
trocavam o campo pelas cidades. ... provavelmente um milhão de andarilhos, no mínimo, em sua maioria
homens jovens e um menor, mas crescente número de moças, vagava pelo país de carona, por trem ou por
estrada, em busca de trabalho ou, pelo menos, de um clima mais temperado que compensasse a
impossibilidade de comprar roupa e teto. E, o mais desmoralizador de tudo, após anos de animadores
previsões, ninguém se atrevia a profetizar de maneira convincente que as condições melhorariam, em vez de
piorarem ainda mais.”
(COBEN, 1976: 362)
Este estado de ânimo que, para a surpresa de Otis GRAHAM (1976), era mais de impotência e derrota
do que de revolta, seria interrompido somente com a ação enérgica do novo presidente. “O New Deal
de Franklin Roosevelt quebraria a calma e encheria a nação de um sentido de ação.”
(GRAHAM,
1976: 370) O início de toda essa ação é considerado como começo de uma nova era na história dos
Estados Unidos e foi marcado por um intervalo de cem dias, nos quais o Congresso permaneceu
reunido e trabalhando freneticamente, a fim de promulgar as leis que seriam a base de um programa de
187
Dentre estes estudos destaca-se o dos antropólogos, que foram descrevendo inúmeros casos de sociedades supostamente
primitivas que apresentavam-se em vários aspectos, superiores à civilização da classe média americana, em especial os
trabalhos de Frans Boas. (COBEN, 1976: 322)
188
Exemplo desse entusiasmo é o caso da indústria automobilística (Ford e Chrysler), que, acreditando na livre concorrência
e devido a um esquema em que determinava cotas superiores a capacidade de venda aos revendedores, manteve um regime
de superprodução até o verão de 1929. (COBEN, 1976: 351)
69
governo que, na época, foi considerado inovador.
189
Dentre as quinze leis aprovadas entre março e
junho de 1933, merecem destaque: Emergency Banking Relief Act,
190
Economy Act,
191
Federal
Securities Act,
192
Federal Emergency Relief Act (FERA)
193
, Civilian Conservation Corps
Reforestation Relief Act,
194
National Industry Recovery Act (NIRA),
195
Agricultural Adjustment Act
(AAA)
196
e Tennesse Valley Authority Act.
197
Esse último foi considerado um dos principais instrumentos do presidente Roosevelt para combater a
depressão que assolava o país e constituiu-se num potente símbolo do New Deal. Anunciados no seu
ato de constituição, os objetivos da Tennesse Valley Authority (TVA) eram:
“Melhorar a navegabilidade e promover o controle de enchentes do Rio Tennesse; promover o
reflorestamento e o uso apropriado das terras marginais ao Vale Tennesse; promover o desenvolvimento
agrícola e industrial do dito vale; promover a defesa nacional pela criação de uma corporação para a
operação das propriedades do Governo em e próximas à Muscle Shoals no estado do Alabama, e para outros
propósitos.” (T
ENNESSE VALLEY AUTHORITY ACT, 2001: 1)
198
Contudo, a prioridade desses objetivos, definidos e aprovados em menos de três meses, havia estado
em pauta por mais de uma década, numa discussão que começara com a constatação da dependência
do nitrato chileno para produção de munição durante os preparativos para a Primeira Guerra Mundial.
Isso trouxe a incorporação de uma lei que destinava verbas para a construção de todas as instalações
necessárias para produção de nitrato, inclusive barragens e usinas hidroelétricas, ao National Defense
Act, de junho de 1916. Antes que se iniciassem as construções devia-se, no entanto definir qual
processo seria empregado em sua fabricação: Haber, um método novo que ainda não havia dado
provas de eficiência comercial, mas que exigia um baixo gasto de energia, ou o tradicional processo
cianamida,
199
que demandava alto consumo energético, o que significava a necessidade de construção
de instalações hidroelétricas. A determinação da construção de uma primeira fábrica (fábrica n.1)
utilizando o processo Haber, pelo Departamento de Guerra em 1917, foi considerada insuficiente para
suprir a demanda ampliada pelo ingresso do país na guerra
200
. Assim, foi determinada a construção de
189
“A maioria dos historiadores hoje acredita que mesmo as mais abrangentes dentre estas reformas não foram tão radicais
como pareceu a princípio, ou como os críticos do Novo Contrato Social proclamaram.” (C
URRENT et alli, 1967: 570), a que
nos estágios iniciais elas tenderam a ser ainda mais conservadoras, radicalizando-se posteriormente devido as exigências da
população.
190
Emergency Banking Relief Act, visava dar liberdade ao presidente para regular os bancos e a emissão de moeda,
permitindo a reabertura dos bancos em condições mais confiáveis (cerca de trinta e seis bancos haviam fechado)
191
Autorizava o governo a cortar gastos públicos para equilibrar o orçamento
192
Visava reduzir as fraude fazendo com que os “vendedores” fornecessem informações públicas sobre novas ações.
193
Destinava verbas para estados e cidades a fim de aliviar a carência.
194
Criava o Civilian Conservation Corps, contratando jovens desempregados para trabalhar em projetos de reflorestamento,
construção de estradas, controle de enchentes e conservação do solo.
195
Com o objetivo de recuperar a indústria buscava extinguir a competição desleal e limitar a produção excedente.
196
A fim de elevar os preços dos produtos agrícolas, impunha restrições a superprodução
197
Criava a Tennesse Valley Authority com o objetivo de desenvolver a região através da promoção de: controle de
enchentes, produção agrícola e hidroelétrica.
198
To improve the navegability and to provide for the flood control of the Tennesse River; to provide for reforestation and
the proper use of marginal lands in the Tennessee Valley; to provide for the agricultural and industrial development of
Said valley; to privide for the national defense by the creation of a corporation for the operation of Government properties
at and near Muscle Shoals in the State of Alabama, and for other purposes.” (T
ENNESSE VALLEY AUTHORITY ACT, 2001: 1)
199
cyanamid-process
200
Em 2 de abril de 1917 os Estados Unidos, rompeu com a postura de neutralidade relativa que havia assumido desde o
início do conflito (visto permanecer comerciando e cedendo empréstimos aos aliados), a principal justificativa foi a
divulgação de uma nota na qual o chanceler alemão tentava cooptar a México oferecendo como recompensa a restituição
das províncias perdidas para os Estados Unidos (Novo México e Texas), que somadas a morte de mais de cem americanos
no naufrágio do navio britânico Lusitânia e a quebra do compromisso de Sussex (navio britânico afundado por submarinos
70
uma nova fábrica em Muscle Shoals (fábrica n.2), empregando o processo cianamida. (HUBBARD, s/d)
A impossibilidade da conclusão da barragem e dessa fábrica antes do fim da guerra e os elevados
custos das instalações fizeram com que a discussão sobre a fábrica n.2 girasse em torno de sua
utilidade em tempos de paz e, após alguns estudos e apesar da proibição pelo National Defense Act, a
cessão para sua operação por empresa privada passou a ser fortemente considerada. A impossibilidade
de atrair investidores levou à formulação de um plano de utilização da fábrica de Muscle Shoals pelo
governo e que propunha
“... a organização de uma corporação que seria dotada com uma estrutura legal muito similar a de uma
corporação privada exceto que todas as ações estariam em posse do governo federal. Ela seria governada
por um conselho de diretores que seriam indicados e subordinados a Secretaria de Guerra. A principal
função dessa corporação governamental seria operar o projeto de nitrato de Muscle Shoals para produção
de produtos de nitrogênio e vender estes produtos, satisfeitas as necessidades de defesa nacional, para
fazendeiros e produtores de fertilizantes. Com a conclusão da Wilson Dam o excedente de energia não
necessário para a fabricação de produtos de nitrogênio e fertilizantes seria vendida diretamente ao
consumidores.”
201
(HUBBARD, 1968: 5)
Se por um lado essa proposta apresentava uma solução quanto à utilização da fábrica nos períodos de
paz, permitindo que parte do nitrato fosse destinada à produção de fertilizantes cuja necessidade havia
se verificado por um estudo que atribuía a decadência da produção agrícola do sul ao desgaste do solo,
provocado pelo manuseio inadequado e falta de nutrientes e o potencial hidroelétrico da região, já
começava a chamar a atenção de algumas especialistas; por outro, o controle governamental de
operação do projeto continuava a gerar polêmica, levantando a indignação dos produtores de
fertilizante e de energia elétrica, que se sentiam ameaçados pela concorrência. (H
UBBARD, S/D)
Uma nova fase nas discussões sobre Muscle Shoals iniciou-se com o fracasso da tentativa de
envolvimento das companhias elétricas no projeto e com o interesse de Henry Ford em adquiri-lo. A
proposta inicial de Ford, feita em 1921, incluía a cessão por cem anos das instalações hidroelétricas
(Wilson Dam, Dam n.3 e a usina hidroelétrica), que deveriam ser concluídas pelo governo; a compra
de todas as terras pertencentes ao projeto, incluindo duas usinas a vapor
202
e linhas de transmissão,
além da fábrica n.2, que deveria ser mantida funcionando em sua capacidade máxima. Comprometera-
se também a desenvolver pesquisas para melhorar o processo de fabricação de nitrogênio e limitar os
lucros na venda de fertilizantes a 8% (oito por cento).
Considerada por demais vaga, especialmente nos aspectos referentes à distribuição de energia, a
proposta de Ford teve grande repercussão e foi quase unanimemente vista pela imprensa como uma
oportunidade do governo de se ver livre de um “elefante branco”, além do que juntamente com seus
aliados ele foi bastante eficaz em difundir a idéia de que a proposta havia sido feita em favor dos
alemães no qual morreram 4 norte americanos), segundo o qual o governo alemão se comprometia a interromper os ataques
de submarinos a navios de passageiros aliados desde que a Inglaterra amenisasse o bloqueio marítimo, promoveu um
intenso sentimento anti-germanico. (WELLS, 1967)
201
...provided for the organization of a corporation which would be endowed with a legal struture very similar to a private
corportation except that all of the stock would be in the possession of the federal government. It would be governed by a
board of directors who would be appointed by and hold office at the pleasure of the Secretary of War. The principal
function of this government corportion would be to operate the Muscle Shoals nitrate project for the production of nitrogen
products and to sell these products, after meeting the needs of national defense, to farmers and producers of fertilizer.
Upon completion of WilsonDam the surplus power not needed in the production of nitrogen and fertilizer products would
be sold at the switchboard.” (HUBBARD, s/d: 5)
202
Steam plants
71
agricultores, representando um grande sacrifício que estava disposto a fazer para o bem da nação. As
dificuldades em conseguir a aprovação da proposta levaram-no a adotar uma estratégia mais
dramática, fazendo-se acompanhar de Thomas Edison numa nova visita ao local da fábrica e anunciar
que pretendia utilizar a energia excedente para produção de manufaturas como o alumínio, tecido, aço
ou componentes automobilísticos, além de fazer circular a notícia de que planejava construir na região
uma grande cidade, uma metrópole maior que Detroit.
203
Embora seu método tenha sido capaz de capturar a imaginação da população da área e fazer dos
agricultores seus mais empenhados defensores, as recomendações do Senador Weeks, que
acompanhavam seu projeto reformulado ao Congresso, não foram favoráveis. Além de ferir os
princípios tanto do National Defense Act quanto do Federal Water Power Act ele deveria ser
submetido ao Departamento de Guerra e da Agricultura, onde o Senador George Norris faria a mais
ferrenha oposição. Outro fator que complicou a pretensa vitória de Ford foi o despertar das
companhias elétricas e outras indústrias que, observando o crescimento de interesse por energia na
região e a possibilidade de instalação de concorrentes, resolveram entrar na disputa.
204
Dessa nova recusa surgiu a elaboração de uma nova proposta, onde a garantia da produção de
fertilizantes com preços reduzidos e o emprego do processo cianamida para fabricação do nitrogênio
foram esclarecidos. No entanto, a oposição a Ford continuava a ser ferozmente levada a cabo por
Norris que, em discursos inflamados e nos interrogatórios das comissões que discutiam o projeto de
Muscle Shoals, esmiuçava suas ofertas, buscando demonstrar que nelas pouco ou nada podia ser
encontrado de seu tão alardeado interesse filantrópico e patriótico. Somente quando os boatos da
candidatura de Henry Ford para a presidência nas eleições de 1924 foram negados e ele afirmou seu
apoio a Coolidge, o que pareceu um acordo que jamais foi confirmado, Ford conseguiu algum alívio,
conseguindo finalmente que seu projeto fosse enviado para votação no Congresso. A partir de então,
uma vitória rápida prenunciada pela agilidade com que fora votada nas comissões e no senado parecia
estar garantida. No entanto, ao chegar ao Congresso, a disputa havia se resumido a uma escolha entre a
proposta de Ford e a de Norris, que havia trabalhado muito para eliminar outras propostas como a da
Union Carbide Company; o apoio popular a Ford também havia se reduzido significativamente e
apesar de todo entusiasmo reinante em torno de Ford, o industrial de Detroit repentinamente retirou
sua proposta em outubro [de 1924]” (H
UBBARD, S/D: 138).
205
203
Essa cidade “... seria planejada de forma que protegesse a saúde e o bem estar social dos trabalhadores e suas famílias.
...a grande cidade de Muscle Shoals começaria a ser construída imediatamente após a aprovação da proposta pelo
congresso.” A nota emitida por seu escritório, que HUBBARD (1968: 39) considera “fabulosa”, dizia ainda que ele pretendia
que o projeto fosse todo destinado ao povo da área ou ao governo de tal forma que ninguém, nem mesmo ele, seria capaz
de extrair qualquer lucro da especulação de terras. Esse projeto, que jamais chegou a ser desenhado, ao mesmo tempo que
apresentava semelhanças com a cidade linerar de Soria e Mata, (G
IUCCI, 1972: 346) também parece imbuído de um espírito
de cidade empresarial, onde a contradição entre a extrema mobilidade proposta por um e o isolamento imposto pela outra,
desaparecem pela diluição da cidade no campo e pela descentralização da industria.
204
Enquanto algumas empresas de energia passaram a concorrer fazendo propostas como a Alabama Power Company (e
juntamente com nove outras) e a Union Carbide Company, outras empresas com DuPont e Pacific Gas and Eletric
passaram a testemunhar contra a proposta de Ford.
205
Ford alegou dois motivos: primeiro estar desgostoso pelo fato de um negócio que era meramente econômico e poderia ter
sido resolvido em questão de semanas, ter se transformado em um problema político e levar anos; em segundo não
acreditava que o Congresso desobedeceria ao Federal Water Power Act, cedendo a uma empresa privada a exploração de
72
Essa primeira grande vitória do Senador Norris ainda não seria a definitiva e sua proposta teria que
enfrentar outras concorrentes que, no período entre 1925 e 1928, Preston H
UBBARD (1968) afirma
terem se caracterizado pela descrença na capacidade da fábrica de Muscle Shoals ser lucrativa por si
só, dependendo da sua vinculação à comercialização do excedente da produção energética que, a partir
de então, se sobrepôs à produção de nitrogênio nas discussões sobre o projeto. Já num contexto onde a
ética das grandes empresas de negócios vinha sendo colocada em dúvida e o escândalo em torno da
concessão da reserva de petróleo Teapot Dome tomava grande espaço nos noticiários (C
URRENT et
alli, 1967), a contenda entre a operação pública ou privada do projeto e suas implicações na garantia
da segurança nacional fazia pender a balança para a operação pública (C
OLIGNON, 1997). Com os
ventos soprando a favor, a proposta do Senador Norris foi por duas vezes aprovada pelas comissões,
Senado e Congresso, sendo vetada em última instância pelo presidente, primeiro por Coolidge
206
e
depois por Hoover
207
. Seria somente com a posse de Franklin Roosevelt e a institucionalização da
Tennesse Valley Authority, em 1933, que o sonho de Norris se realizaria.
Para Roosevelt a Tennesse Valley Authority seria uma oportunidade para
“... atingir um grande objetivo para a população de inúmeros Estados e, na verdade, para toda a União. Isto
porque aí temos uma oportunidade de estabelecer um exemplo de planejamento, não só para nós mesmos
como para as gerações vindouras, interligando a indústria, a agricultura, o florestamento e a prevenção de
enchentes, reunindo-os todos em um conjunto unificado sobre uma distância de milhares de milhas de modo
tal que possamos ensejar melhores oportunidades e melhores locais nos dias do futuro, para a vida de
milhões de sêres ainda não nascidos.” (R
OOSEVELT apud PARKS, 1966: 144)
Como um dos grandes entusiastas do planejamento regional não é de se estranhar o destaque que
Roosevelt
208
deu ao Tennesse Valley Authority, sendo considerada por Arthur LINK (1965: 732) “... a
mais importante contribuição do New Deal para a teoria e prática de governo nos Estados Unidos.” e
o primeiro experimento significativo de planejamento público em escala regional.
Concebida enquanto uma organização apartidária, que deveria responder tanto ao povo da região
quanto ao governo federal, sua direção foi dada a três especialistas nas principais áreas de atuação da
empresa. Assim, a construção das barragens e controle de enchentes ficou a cargo de Arthur E.
Morgan; a produção e distribuição de energia passou a ser responsabilidade de David E. Lilienthal e os
programas de reflorestamento e agrícola foram entregues a Harcourt A. Morgan. (SCHLESINGER,
1958)
A idéia de experimentação e planejamento era endossada por Arthur Morgan que descreve a ação da
TVA como devendo ser limitada ao âmbito do modelo, num processo em que a larga escala seria
atingida por meio de cópias dos modelos desenvolvidos e apresentados à comunidade, segundo ele:
recursos naturais (navegação e energia hidroelétrica); no entanto ele não se retirou totalmente do cenário, desafiando o
Congresso a fazer-lhe uma proposta melhor.
206
Em 1928 presidente Coolidge vetou o projeto de Norris, que já havia passado pelo Congresso, sem dar maiores
explicações sua decisão foi atribuída ao fato dele discordar da distribuição de energia pelo governo para os municípios e
por alguns membros da imprensa a intenção de impedir a revelação dos abusos das taxas de energia cobradas pelas
companhias particulares. (H
UBBARD, s/d)
207
Novamente em 1930 a proposta do Senador Norris venceu no Congresso e foi vetada pelo presidente, dessa vez Hoover
buscou justificar a recusa por parâmetros técnicos fundamentando-se no parecer o Corpo de Engenheiros, que
recomendava a operação conjunta estado-privada do projeto. (HUBBARD, s/d)
208
Para quem o planejamento era também um símbolo para ser usado contra a falência do mercado (HARGROVE, 2001)
73
Uma fazenda de demonstração, uma cooperativa democrática e uma companhia energética
municipal da TVA seriam suficientes. O padrão iria exemplificar o modo certo de fazer as coisas.
209
(M
ORGAN apud HARGROVE, 2001: 31). Esse processo fundamentava-se ainda na defesa da democracia
em suas raízes (democracy at the grass roots), ou seja, tomava o individuo como seu principal
elemento, sendo considerada uma de suas principais contribuições, que em suas próprias palavras
210
(L
ILIENTHAL,1953: 77):
“As pessoas são o fato mais importante no desenvolvimento de recursos. Não somente o bem estar e a
felicidade dos indivíduos é o verdadeiro propósito, mas eles são os meios pelos quais tal desenvolvimento é
conquistado; seu gênio, suas energias e espírito são os instrumentos; não é somente ‘ para as pessoas’ mas ‘
pelas pessoas’.”
211
Embora esse modo de atuação fosse empregado pelos três diretores da TVA, Arthur Morgan defendia
ações menos “planejadas”, com inúmeras decisões sendo tomadas no momento da execução das obras,
enquanto David Lilienthal e Harcourt Morgan confiavam somente na tecnologia, o que levou a
inúmeras disputas internas e dificuldades de coordenação entre as diversas áreas.
O programa da TVA era bastante amplo e compreendia (H
UXLEY, 1944):
a construção de nove barragens no Rio Tennessee e onze em rios tributários, sendo todas
produtoras de energia elétrica e responsáveis pelo controle de enchentes, enquanto que as
localizadas no curso principal seriam ainda dotadas de comportas para facilitar a navegação;
distribuição direta de energia para áreas rurais e grandes indústrias;
auxilio às municipalidades na organização de sistemas de distribuição próprios e cooperativas
de energia elétrica nas áreas rurais;
construção e operação da fábrica de nitrogênio em Muscle Shoals e pesquisas para melhor
aproveitamento do minério
212
;
recuperação do solo através do reflorestamento e orientação de técnicas adequadas de manejo,
através de “fazendas modelo” ;
avaliação e “zoneamento agrícola” determinando áreas mais propícias a determinados tipos de
cultura, reflorestamento e reposição de nutrientes;
distribuição de fertilizantes e orientação para diversificação da agricultura (antes restrita a
maisena e algodão);
delimitação de áreas de conservação e criação de áreas de lazer e recreação (cinco parques);
O desenvolvimento de cada um desses objetivos levou ao seu desdobraram-se em inúmeros outros;
assim, constantemente novos programas eram incorporados aos originais, tais como a formação de
mão-de-obra, prevenção de doenças infecciosas (como a malária), habitação etc.
A
CIDADEDENORRIS
A expectativa de que a Tennessee Valley Authority fosse mais do qualquer outra coisa um
209
One demostration farm and one democratica cooperative and one TVA municipal power company woud be enough. The
yardstick would exemplify the right way of doing things.’ (H
ARGROVE, 2001: 31)
210
Pare Lilienthal a mais importante contribuição da TVA era a proposta de um modo de administração inovador,
centralizado e descentralizado ao mesmo tempo, algo semelhante ao atual: “pense global, aja local”, defendia a
centralização das decisões e ao mesmo tempo uma descentralização da ação que deveria ocorrer localmente, nas raízes.
(L
ILIENTHAL, 1953)
211
People are the most important fact in resource development. Not only is the welfare and happiness of individuals its true
purpose, but they are the means by which that development is accomplished; their genius, their energies and spirit are the
instruments; it is not only ‘for the people’ but ‘by the people’.
(LILIENTHAL, 1953: 77)
212
A força com que o projeto hidroelétrico acabou por assumir ofuscou de tal maneira a questão que deu origem a TVA, a
fábrica de nitrogênio e Muscle Shoals que ela nem mesmo é citada no livro de H
UXLEY (1944)
74
experimento social capaz de democratizar melhores condições de vida, introduzindo toda uma
população de “esquecidos” à modernidade, ao modo de vida americano, era a intenção expressa por
Roosevelt e que foi plenamente partilhada por Arthur Morgan, mas que era interpretada de forma
bastante diferente pelos demais membros da diretoria. Exemplo dessa divergência de opiniões pode ser
verificado na controvérsia quanto à construção da cidade de Norris.
Enquanto Arthur Morgan defendia a construção de uma cidade modelo, onde os moradores pudessem
estabelecer negócios próprios, dando origem a atividades econômicas que embasariam a formação de
uma sociedade com bases permanentes, cabendo à TVA somente adquirir as terras e organizar o
mercado imobiliário. Harcourt Morgan e David Lilienthal duvidavam da viabilidade dessa idéia,
defendendo a construção de um acampamento provisório para os trabalhadores das barragens e suas
famílias. Responsável pelo planejamento regional, Earle Draper
213
propôs que sua equipe elaborasse
um plano de uso do solo que trouxesse as pessoas de volta a terra em novas formas de assentamento,
onde Norris seria somente a primeira entre muitas cidades
214
; essa proposta que se não foi totalmente
aceita teve o mérito de quebrar o impasse e garantir a construção de um núcleo permanente.
(H
ARGROVE, 2001)
Contando com uma equipe composta por engenheiros, cientistas sociais, planejadores, geógrafos e
arquitetos, a principal contribuição de Draper à TVA foi a elaboração do estudo “Os recursos cênicos
do Vale do Tennessee”,
215
no qual fundamentou-se o programa de parques e áreas de lazer. Já o projeto
da cidade de Norris foi elaborado em conjunto com o arquiteto Roland Wank e foi considerado por
Margareth C
RAWFORD (1995: 196) como a “... expressão última de seu [Draper] estilo de
planejamento rural.”, pois sintetizava a tradição do planejamento paisagístico de Omsted, para o qual
as especificidades locais eram a base de criação do projeto, com as técnicas das cidades jardins que
escolhera adotar.
O local escolhido para a construção da cidade situava-se a pouco mais de seis quilômetros (cerca de
quatro milhas) ao sul da barragem, possuía terras relativamente férteis e topografia pouco acidentada,
com acessos viáveis a Knoxville e Clinton. O desenho da cidade baseou-se no respeito às condições
naturais do terreno, vias tortuosas com loopings davam origem a grandes quarteirões, onde as extensas
áreas verdes eram entrecortadas por caminhos de pedestres, garantindo ao mesmo tempo um certo
resguardo e liberdade de circulação. A diversidade do desenho das casas isoladas em lotes
213
Earle S. Draper era arquiteto formado pela Universidade de Massachusetts e após ter trabalhado no escritório de John
Nolen, onde “... recebeu um amplo treinamento em planejamento urbano, incluindo fundamentos de economia e aspectos
sociais.” “… received a broard training in the principles of city planning, including a grounding in economics and social
issues.”(C
RAWFORD, 1995: 180), dirigindo-se posteriormente ao sul onde atuou como landscape design projetando,
planejando e construindo inúmeras cidades têxteis (seu escritório trabalhou em mais de cem projetos de planejamento,
adaptação e construção de cidades empresariais). Assim a experiência em planejamento e o profundo conhecido da região
fez dele uma escolha inevitável para o cargo de planejador regional da TVA.
214
Earle Draper habituado a projetos de cidades empresariais havia-se acostumado a pensar no planejamento em moldes
muito semelhantes aos de Arthur Morgan o que somado ao fato de ter sido contratado por ele desde os momentos iniciais
de implantação da TVA, era tido como seu protegido e acabou por retirar-se logo após seu afastamento em 1940.Para
Margareth C
RAWFORD (1995) sua mudança para Washington foi devido ao interesse em difundir as funções do
planejamento no nível governamental, passando a preocupar-se mais com problemas urbanos e deixando de para trás o
planejamento rural
215
The scenic resources of the Tennesse Valley”.
75
irregulares
216
baseavam-se na tipologia vernacular indígena das casas que haviam sido inundadas pelo
represamento do rio. O único edifício de dimensões significativas foi a escola,
217
localizada num
grande círculo na área central da cidade. Um cinturão verde e a freeway de acesso a Knoxville
marcavam o fim da cidade, contribuindo para limitar suas possibilidades de crescimento.
Construída em menos de um ano, Norris foi terminada no fim de 1933. A cidade tornou-se vitrine do
regionalismo e planejamento comunitário do New Deal.”
(CRAWFORD, 1995: 199) e apesar dos
elogios de Raymond Unwin, como mostra o trabalho de Michael M
CDONALD e John MULDOWNY
(1982) ela fracassou miseravelmente em cumprir o objetivo de transformar a vida dos “esquecidos”
218
.
O fracasso da cidade, que entre outras coisas caracterizou-se por um elevado grau de discriminação
contra os negros, é atribuído mais à indefinição quanto aos parâmetros de atuação institucional do que
ao projeto urbano, pois foi uma cidade que já nasceu como fruto de uma ambigüidade tendo que servir
tanto como alojamento provisório quanto como assentamento permanente, como mero alojamento e
como comunidade auto-suficiente, como experimento e como modelo.
219
Percorrendo toda a trajetória da Tennesse Valley Authority, observa-se que, mesmo antes de seu
nascimento, a TVA fora sempre uma questão de âmbito nacional, sendo colocada e tratada como uma
questão de orgulho nacional, embasada pela necessidade de garantir o bem da nação, da democracia
americana. Primeiramente, devido à ameaça de dependência do nitrato importado, a preocupação
principal residia na produção de nitrato para fabricação de munição; quando essa passou a ser a
produção de fertilizantes, a recuperação de áreas degradadas foi vista como básica na garantia do
futuro; ao sobressair a exploração dos cursos d’água para navegação e controle de enchentes, mais do
que um direito, o que foi questionado foi a democratização do uso de recursos naturais; e quando o
ponto em destaque passou a ser a produção de energia, somaram-se a todos os aspectos apontados
acima o desejo de desenvolvimento através da industrialização. O que no contexto histórico em que se
insere, fez do projeto da Tennesse Valley Authority mais do que um projeto de desenvolvimento, nas
palavras de Erwin H
ARGOVE (2001: 22): “A TVA foi um dispositivo roosevelniano para criar a
esperança, para o sul e para a nação, de que a recuperação econômica e uma vida melhor estava ao
alcance.”,
220
ela foi um projeto para a nação, pois, mais do que um símbolo, pretendia-se um espelho
216
Eram cerca de 30 (trinta) projetos diferentes e a sua disposição no lote variava grandemente de um para o outro.
(CRAWFORD, 1995)
217
A escola de Norris é considera tanto por CRAWFORD (1995) como por MCDONALD &MULDOWNY (1982) como o coração
da cidade, o último inclusive argumenta ser esse o único estabelecimento que realmente mereceria elogios, pois cumpriu
efetivamente sua função, atraindo pessoas de outras localidades e servindo de modelo a outras comunidades.
218
Em seu livro “TVA and the dispossessed” Michael MCDONALD e John MULDOWNY (1982) analisam os resultados da TVA
pelo ponto de vista daqueles que foram o objeto do projeto, a partir das suas raízes (grass roots), concluindo que o processo
de reassentamento dos “afogados” levou ao abandono da região, sendo que os que desfrutaram das transformações foram
os recém chegados.
219
O fracasso da cidade, que se chamou “Subúrbio da TVA”, também se verifica por sua incapacidade de atrair a população,
sendo que após os primeiros anos, com a conclusão da barragem, verificou-se um decréscimo da população. A dificuldade
de manutenção da cooperativa e dos estabelecimentos comerciais pela TVA, em termos auto-sustentáveis, também indica a
busca de outros centros comerciais para satisfazer as necessidades de consumo dos moradores (o posto de combustíveis era
o único estabelecimento lucrativo e que foi mantido em posse da autoridade). Estas dificuldades foram apontadas por
M
CDONALD & MULDOWNY (1982) como elementos significativos na decisão de venda da cidade em leilão público em
1948.
220
TVA was a Rooseveltian device to create hope, for the south and the nation, that economic recovery and better life were
within reach.’ (M
ORGAN apud HARGROVE, 2001: 22)
76
onde seus sucessos refletiriam os sucessos do país, projetando uma imagem positiva e inquestionável
de sua capacidade de realização, que poderia ser verificada em cada obra realizada. E é enquanto tal,
enquanto vitrine da TVA que a cidade de Norris atesta seus sucessos e fracassos; nela está exposta a
ideologia que a originou, os princípios que a guiaram, estão em evidência suas vitórias, mas também
seus fracassos, pois assim como a TVA que deveria ter se constituído num modelo para outros
projetos de desenvolvimento regional pelo país, que nunca aconteceu, Norris é descrita não como
cidade modelo mas como um “subúrbio no meio da paisagem”
221
.
221
Suburb in the wilderness
77
Fig. 30: Usina de
Nitrato2
(NEW DEAL NETWOARK,
s.d.)
Fig. 31: Rio Tennessee
(
NEW DEAL NETWOAR
K
,
s.d.
)
Fig. 32-33: Área sob
administração da TVA
(GOOGLE, s.d.)
Fig. 36 e 37: Casas em Norris
(HUXLEY, 1944)
Fig. 40: Planta de Norris
(
CRAWFORD
,
1995
)
Fig. 38 e 39: Casas em Norris
(
HUXLEY
,
1944
)
Fig. 35: Barragens da TVA
(
HUXLEY
,
1944
)
Fig. 34: Barragem de
Norris
(HUXLEY, 1944)
78
II.3.2 O PROJETO DA COMPANHIA VALE DO RIO DOCE
Para Nicolau S
EVCENKO (1998: 08) as transformações ocorridas nos últimos anos do século XIX e
início do XX, não têm precedentes na história, " . . .nunca em nenhum período anterior, tantas pessoas
foram envolvidas de modo tão completo e tão rápido num processo dramático de transformação de
seus hábitos cotidianos, seus modos de percepção e até seus reflexos instintivos."
No Brasil, todo esse
processo de transformação seria sentido de forma profunda, devendo-se, ainda, somar às
transformações de ordem internacional às mudanças políticas e sociais de caráter nacional, dentre as
quais destacam-se a Abolição da Escravatura, a Proclamação da República e o fluxo imigrante.
Assim, ao mesmo tempo em que todos estes acontecimentos se sucediam, a necessidade inadiável do
progresso tecnológico impregnada o processo político, identificando a república ao progresso e a
monarquia ao atraso, as novas aspirações da elite exigiam que se aceitassem
"... os ponteiros brasileiros com o relógio global suscit[ando] a hegemonia de discursos técnicos, confiantes
em representar a vitória inelutável do progresso e por isso dispostos a fazer valer a modernização à
qualquer custo. ... era como se a instauração do novo regime implicasse pelo mesmo ato o cancelamento de
toda a herança do passado histórico do país e pela mera reforma institucional ele tivesse fixado um nexo co-
extensivo com a cultura e a sociedade das potências industrializadas." (SEVCENKO, 1998: 27)
Para PENNA (1999), o período que sucedeu a Proclamação da República
222
teria sido marcado por uma
intensa euforia, um tempo auspicioso que se convencionou chamar “Belle Epoque”, mas que não era
imune a problemas de todas as ordens. Politicamente, intensificavam-se as divergências internas
223
;
estouravam conflitos de norte a sul do país
224
; economicamente se somavam aos problemas
decorrentes do Encilhamento a crise do café e da borracha e os empréstimos realizados no exterior;
socialmente, a chegada do contingente imigrante, ao mesmo tempo que supria as demandas dos
proprietários rurais, colaborava na exclusão da mão-de-obra nacional do mercado de trabalho,
aumentando a massa desempregada nas cidades, já transformadas em local propício para disseminação
de doenças (tifo, febre amarela etc).
A necessidade de superação desses problemas e a firme convicção de um futuro grandioso para a
república brasileira, passaram então, a requerer um diagnóstico mais preciso, que permitisse a
consecução desse provir. A formulação desse diagnóstico levaria à conscientização da necessidade de
reconhecimento da própria realidade do país, de seu povo, sua natureza e sua história, tornando
inviável a negação do passado.
Partindo do questionamento das razões da própria unidade nacional, o Brasil pareceu trilhar o caminho
inverso de outros países, que tendo em comum fatores como economia, política, território, língua,
identificação étnica, religiosa ou meramente afinidade entre indivíduos iriam lutar por sua
222
Embora não seja objeto desse trabalho a análise do XV de novembro, a colocação de Penna, parece acertada, não
encarando o ato em si como um golpe militar, mas sim como uma reunião de fatores que favoreceu a ação militar. Visto
que contemplava anseios já expressos de grupos sociais que se batiam contra o império. (PENNA, 1999)
223
Com os jacobinos criticando mais veementemente as contradições do discurso federalista, na medida em que ficava mais
claro que o liberalismo dos federalistas, visava somente a manutenção dos privilégios de autonomia das oligarquias locais,
que se explicitaria com a "política dos governadores" e o "convênio de Taubaté" e a "política café-com-leite", a resposta
viria com a Reação Republicana. (P
ENNA, 1999)
224
Dentre esse se encontra: Canudos – BA, Revolta da Armada –RJ, Revolução Federalista –RS, Revolta da Chibata –RJ,
Contestado –SC, etc.
79
independência enquanto nação
225
. O Brasil, já independente, teria primeiramente que precisar qual sua
economia, seu território, língua, identidade étnica, religiosa e política, para então se apresentar como
nação.
Da política à cultura, o movimento intelectual que se desenvolveu a partir da proclamação da
República até a década de 20, caracterizou-se por um questionamento constante da realidade brasileira,
esse período
“... denominado pré-moderno, evidencia o enorme esforço desprendido pela intelectualidade do tempo para
compreender o Brasil. As múltiplas representações produzidas procuravam, por meio da relativização e
reinterpretação de matrizes provenientes do exterior, divisar um amanhã promissor para um país mestiço e
tropical que parecia fadado à incompletude.” (LUCA, 1999 : 34)
Dessa compreensão do país, que percorria questões como território, cultura, sociedade, etnia, política e
economia, podia-se distinguir duas facções – uma defensora da industrialização, vista como inevitável
e salvadora; e outra que via nela a causa de grandes males, como o esvaziamento do campo e desvio
de capitais (investimentos), defendendo uma vocação eminente agrícola para o país. Mesmo assim, os
mais ferrenhos defensores da vocação agrícola reconheciam o paradoxo presente na necessidade de
articular interesses agrários e industriais, a fim de viabilizar a modernização do campo, tornando a
industrialização um fator inevitável para a salvação da produção rural. Por essa via, tornou-se possível
compatibilizar interesses, fazendo com que, sem abandonar sua vocação eminentemente agrícola, o
Brasil buscasse industrializar-se. Agricultura e indústria haviam deixado de ser opostos inconciliáveis.
(MENDONÇA, 1997)
A
INDUSTRIALIZAÇÃONOBRASIL
Tentativas para dar início à industrialização do Brasil já vinham sendo feitas desde 1808. Pelo menos
era essa a intenção declarada pelo Regente D. João, quando promulgou o decreto de 1
o
de abril de
1808, que também promovia a abertura dos portos brasileiros às nações amigas e que objetivava “...
inaugurar, no Brasil a era industrial com o objetivo de multiplicar a riqueza nacional, promover o
desenvolvimento demográfico e dar trabalho a um certo elemento da população que não se
acomodava à estrutura sócio-econômica vigente, ...” (L
UZ, 1978: 20) Porém, conforme observa Luz,
não se efetua a “... industrialização de um país por um simples decreto concedendo liberdade
econômica.” (L
UZ, 1978: 21), mesmo porque como salienta Gabriel COHN (1982 : 284), “A
industrialização é um processo, ... [e portanto] ... implica em um conjunto articulado de mudanças, e é
por essa via que ela se distingue da simples criação de indústrias, ... Assim a identificação de
diversos tipos de indústria como a do açúcar, de tecidos, a naval e mesmo algumas experimentações de
siderurgia, ainda no período colonial, não poderia ser indicativa do desenrolar de um processo de
industrialização no Brasil (L
IMA, 1976).
225
Estes são os fatores apontados por Hobsbawm (1990) em "O apogeu do nacionalismo : 1918-1950", que justificariam ou
justificaram a constituição de nações independentes nesse período.
80
Somente na década de 1840, quando expiravam os tratados de tarifas reduzidas firmados com a
Inglaterra se viabilizaram as primeiras medidas protecionistas. O objetivo das novas taxas aduaneiras
incluía não somente a proteção à indústria nacional. Deveriam também “preencher o déficit do
Estado", sendo o desenvolvimento de uma "inusitada atividade industrial, ... favorecida pela tarifa
ligeiramente protecionista de Alves Branco, principalmente um reflexo da expansão econômica do
Brasil, nessa época.” (L
UZ, 1978: 35), mais do que conseqüência das novas tarifas. Às inúmeras
dificuldades (falta de capital, dificuldade em encontrar mão-de-obra capacitada e equipamentos,
instabilidade política, mercado consumidor incerto) enfrentadas pelos empreendedores industriais,
vinha se somar uma oposição cada vez mais voraz por parte dos produtores rurais, segundo os quais o
custo da proteção à indústria recaía totalmente sobre a agricultura.
Defendendo a adoção de uma política alfandegária liberal, os principais argumentos apresentados por
produtores agrícolas e importadores possuíam forte apelo social e referiam-se à subserviência a um
número reduzido de indústrias, o que acarretava uma elevação do preço dos produtos, que nem sempre
atingiam a mesma qualidade dos importados. Já os defensores da política protecionista alegavam que
somente a industrialização seria capaz de promover a independência econômica do país, pois “...
atrairia para o país braços e capitais estrangeiros, ocuparia uma população urbana desocupada, ...,
livraria o país da vulnerabilidade de uma economia monocultura e, abastecendo o mercado interno,
diminuiria a importação, aliviando a balança comercial” (L
UZ, 1978: 68)
Essa oposição, no entanto, não significava uma postura anti-industrial, mas uma tentativa de evitar o
desvio de recursos financeiros e de mão-de-obra, já bastante escassos, para outras atividades. (LUZ,
1978) Para Boris FAUSTO (1982: 231), porém, “... o jogo dos setores agrários, responsabilizando a
indústria pela alta do custo de vida perante as populações urbanas, demonstram que não havia
identidade de interesses entre as duas facções”,
resultando num processo de “industrialização por
rupturas”, ou seja, intercalando-se vitórias e derrotas, sucediam-se momentos de crescimento e
estagnação, o que acabou por dificultar a formação de um grupo social homogêneo, de uma burguesia
industrial brasileira.
Ainda para Boris F
AUSTO (1982), essas disputas possuíam fundo mais político do que econômico,
sendo marcadas pela competição entre grupos regionais, com o objetivo de conquistar o poder central.
Dessa maneira, o crescimento da cafeicultura na região sudeste, com seu subseqüente fortalecimento
econômico, significou uma concentração das disputas nessa região, principalmente entre os estados do
Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, aparecendo o estado do Rio Grande do Sul com papel
secundário.
A expansão da produção agrícola exportadora, destacadamente a cafeeira, e o desenvolvimento
industrial do Brasil durante a Primeira República estão fortemente vinculados, como mostram Celso
F
URTADO (1958), Wilson SUZIGAN (2000) e outros. Em sua análise, este último autor aborda quatro
aspectos explicativos do desenvolvimento industrial brasileiro: a teoria do choques adversos, a
expansão das exportações, o desenvolvimento capitalista e a intervenção das políticas governamentais.
81
Aprofundando as interpretações adotadas por diferentes autores
226
, Suzigan coloca que o
desenvolvimento industrial anterior a década de 30 foi “... induzido pelo crescimento da renda interna,
resultante da expansão do setor exportador, principalmente o café”, ocorrendo, mesmo durante o
período de crise nas exportações, crescimento da atividade industrial (S
UZIGAN, 2000: 28).
Procedendo a uma qualificação mais específica das teorias ao caso brasileiro, Suzigam constata que
embora o capital levantado devido à expansão das exportações incitasse o desenvolvimento industrial,
tido como uma “extensão do capital cafeeiro”, não estabelecia uma relação linear, mas contraditória
entre acumulação cafeeira e investimento industrial, pois, além de num momento de crise das
exportações o mercado interno ser capaz de manter aquecida a produção, ao subordinar-se ao comércio
de exportação, a produção industrial estava também subordinada ao mercado internacional, sendo tão
incentivada quanto limitada por ela.
Quanto à eficiência das políticas governamentais, auxiliando o desenvolvimento industrial, Suzigan,
mostra-se cético, afirmando que restringiam-se a algumas regulações da tarifa aduaneira, incentivos e
subsídios esporádicos e investimentos em infraestrutura. Essa opinião, no entanto, não é partilhada
por Nícea L
UZ (1978: 208), que afirma que “[se] não obtiveram os industrialistas uma tarifa
verdadeiramente protecionista, não deixou, contudo, o governo de recorrer a outras medidas para
satisfazer a indústria brasileira”.No entanto, seria somente na década de 1930 que o governo federal
adotaria algumas medidas verdadeiramente protecionistas.
Outro fator que parece ter colaborado para as freqüentes oscilações na defesa da indústria nacional
advém do debate sobre a realidade brasileira que toma corpo durante a Primeira República. Através de
viagens, expedições, mapeamento e catalogação da flora, fauna, geologia, hidrologia e etnia, a
intelectualidade nacional buscava desvendar a realidade do Brasil, tido como um "desconhecido jovem
gigante". Essa busca de auto-conhecimento era, no entanto, mais do que uma tênue tentativa de fazer
as pazes com o passado; através dele é que se tornaria possível vislumbrar um futuro para a nação
brasileira, determinar qual sua verdadeira vocação. Seria a partir desse novo quadro que se traçariam
os caminhos que levariam o país em direção ao progresso. E
“[por] mais divergentes que fossem estas análises a respeito da realidade nacional, pelo menos em um ponto
todos pareciam concordar: o Brasil, com suas fronteiras quase continentais, ostentava um patrimônio
geográfico invejável, que o distinguia dos demais países. ... No início do século XX, período em que a
voracidade das potências imperialistas parecia não ter limites, as dimensões do país insuflavam o orgulho
nacional.”(LUCA, 1999: 86)
Foi assim que, em nome da produção nacional, surgiu “... paralelo ao protecionismo industrial, um
protecionismo agrícola, traduzindo-se ambos num amplo movimento a favor da defesa da produção
nacional.” (L
UZ, 1978: 79)
A defesa da produção agrícola não excluía o desenvolvimento industrial, enfatiza Sonia M
ENDONÇA
(1997: 83), e mesmo a pauta do movimento Ruralista, diante do diagnóstico de crise e atraso
226
Analisando a questão dos choques adversos, SUZIGAN (2000) compara as posições de Furtado e Tavares relativas a
expansão das importações Dean, Nicol, Peláez e Leff; para o desenvolvimento capitalista tardio utiliza: Silva, Mello,
Tavares, Cano e Aureliano; e para a intervenção governamental toma F.R.Versiani e M.T.Versiani
82
verificado nesse setor, incluía quatro “... grandes linhas de intervenção [propostas no debate ruralista]
como capazes de superá-los: povoamento/colonização; educação; modernização/racionalização
produtiva e crédito/cooperativismo.”, nas quais a modernização implicava não somente o
desenvolvimento de uma 'agricultura científica', mas na mecanização da produção no campo.
Já o discurso nacionalista-industrialista apresentava-se fundamentado em duas facções distintas: uma
apoiada no conceito de "indústria natural x indústria artificial" e outra defensora de um protecionismo
industrial irrestrito. Tidas como indústrias naturais estavam aquelas cuja matéria-prima era de
procedência nacional, enquanto que o rol das artificiais incluía aquelas dependentes de matéria-prima
importada. A produção siderúrgica, contudo, mesmo dependendo do carvão importado, por ser
considerada “mãe de todas indústrias”, acabava por esquivar-se dos ataques mais vorazes, surgindo
como ponto de discórdia sua vinculação, ou não, à exportação de minérios, riqueza que certamente
faria o futuro da nação.
Esse debate é que faria com que a história da defesa e implantação da siderurgia no Brasil se
apresentasse fortemente vinculada ao exame da exploração do minério de ferro. Porém isto não se
deve simplesmente à presença de jazidas abundantes o suficiente para viabilizar uma produção ou
exportação em massa, mas à carência de recursos financeiros, carvão mineral e tecnologia nacional.
Essa ausência levou a uma corrida ao exterior, a partir da década de 1940, principalmente aos Estados
Unidos, quando a vinda desses recursos ficou definitivamente condicionada à exportação de minério
de ferro. Fruto destas transações, a Companhia Vale do Rio Doce, constituiu-se num elemento de
grande importância para o desenvolvimento da indústria siderúrgica nacional, pois, embora todo o
debate anterior tivesse como principal objetivo o estabelecimento de um parque siderúrgico nacional,
foi somente com a implantação de uma política definitiva, relativa à exploração de recursos naturais,
no caso do minério de ferro, com a consolidação da Companhia Vale do Rio Doce, que se viabilizou
seu estabelecimento.
83
FERRO E SIDERURGIA NO BRASIL
A primeira tentativa de produção de ferro no Brasil ocorreu ainda no século XVI. Dela tomou parte
Afonso Sardinha que, tendo verificado a existência de minério de ferro no Morro de Araçoiaba
227
, ali
“... começou em 1590 uma fábrica de ferro de dois engenhos para a fundição do ferro e aço ...”
(C
ÂMARA DE SÃO PAULO apud VERGUEIRO, 1979: 06) Tendo passado por várias mãos a fábrica
funcionou até 1629, ficando posteriormente abandonada. Tendo sido reativada somente em 1770,
funcionou por cerca de seis anos, quando, ainda incapaz de prover lucro significativo, nem possuir
alvará régio, foi mais uma vez fechada. Seguiu-se um novo período de abandono, sendo construída
sobre suas ruínas uma destilaria de açúcar. Sob a tutela do Conde de Linhares, então ministro da
Guerra, desde 1800 a montanha de Araçoiaba vinha sendo examinada com a finalidade de ali construir
uma nova fábrica de ferro. Para executar os planos, em 1810, o capitão Frederico Luís Guilherme
Varnhagen foi chamado de Portugal, onde dirigia a Real Fábrica de Figueiró dos Vinhos. Os trabalhos
de construção e operação da Real Fábrica de Ferro de São João de Ipanema ficaram a cargo de uma
equipe sueca, comandada por Carlos Gustavo Hedberg. Seguiu-se, no entanto, uma série de
desentendimentos entre Varnhagen e Hedberg, devido principalmente a suspeitas de que nem Hedberg
nem seus conterrâneos possuíam conhecimentos suficientes para dar prosseguimento aos trabalhos,
resultando no afastamento de Varnhagen. Somente quando se tornou patente a incompetência e a má
índole do sueco, que Varnhagen foi reconvocado, concluindo a construção da fábrica em 1818 e
colocando-a em operação. Porém, mesmo tendo funcionado por muitos anos,
228
essa fábrica jamais foi
capaz de dar lucro
229
. (VERGUEIRO, 1979; LIMA, 1976; “Industrialização de base”, jan/1956)
Outras quatro iniciativas datam ainda do período imperial: a Real Fábrica do Morro de Gaspar Soares
(ou Morro do Pilar, próximo a Congonhas – MG), a Fábrica Patriótica (ou Fábrica de Ferro do Prata –
MG) e duas de Monlevade (em Caeté e São Miguel de Piracicaba – MG).
A cargo do Intendente Câmara,
230
a construção da Real Fábrica do Morro de Gaspar Soares teve início
em 1808 e foi concluída em 1825, graças ao auxílio do engenheiro alemão Whilhelm Ludwig von
Eschwege. Sempre dando prejuízos, a fábrica foi se deteriorando aos poucos, sendo seus últimos bens
liquidados em 1831. No segundo projeto, Eschwege também estava envolvido e, com o apoio do
Conde de Palma, começaria a construção da Fábrica Patriótica (Congonhas - MG) em 1811, obtendo a
primeira corrida de ferro em 1812. Embora essa iniciativa tivesse auferido pequeno lucro, a fábrica foi
fechada em 1822. (E
SCHWEGE, s/d) Uma nova tentativa para produção de ferro na Região de Minas
227
O Morro de Araçoiaba localizava-se em Biraçoiaba, posteriormente Vila de Nossa Senhora da Ponte de Sorocaba, a atual
cidade de Sorocaba - SP
228
Nem Heitor Ferreira LIMA (1976), nem Nicoulau Pereira de Campos VERGUEIRO (1979) mencionam por quanto tempo
permaneceu funcionando a fábrica de Ipanema, Mário Lópes Leão, no entanto, coloca que foi reativada entre 1864 e 1869,
devido a necessidade de ferro para confecção de armamentos durante a Guerra do Paraguai, o que leva a considerar a
possibilidade de ter funcionado de forma intermitente, até as últimas décadas do século XIX.
229
SOARES E SILVA (1972) salienta que o derradeiro problema de Ipanema e que contribuira de forma decisiva para seu
fracasso, era a qualidade do minério não adequada aos fornos suecos, onde usualmente se empregava um minério muito
mais ácido e puro. Porém, ainda segundo Soares e Silva, não havia tecnologia suficiente na época para detecção ou mesmo
solução do problema.
230
Manuel Ferreira da Câmara Bithencourt e Sá, Intendente Geral das Minas e Diamantes.
84
Gerais foi a do engenheiro francês Jean Antoine de Monlevade
231
. Formado como o segundo melhor
aluno pela Politécnica de Paris, Monlevade ganhou uma viagem de estudos, escolhendo como destino
o Brasil
232
. Após ter trabalhado em diversos locais com Eschwege associou-se a Luiz Soares Gouvêa,
para construção de um alto-forno em Caeté, que entrou em funcionamento em 1818, mas que também
acabou sendo abandonado. Também à Monlevade se deve a experiência de maior sucesso do período,
quando seguindo para São Miguel de Piracicaba – MG, “... em vez de um alto-forno, êle construiu
algumas forjas catalãs e ensinou seus escravos a arte de fazer o ferro.”(B
AER, 1976: 78) Esse
empreendimento durou toda sua vida e, já no século XX, seria sobre esse mesmo sítio que a
siderúrgica Belgo-Mineira iria construir sua nova sede. Além dessas fábricas de maiores dimensões,
E
SCHWEGE (s/d) menciona a existência de pelo menos 16 pequenos fornos
233
, que se incumbiam de
produzir ferramentas para a lavoura e mineração, (L
IMA, 1976; SOARES E SILVA, 1972) também no
levantamento do conselheiro Crispiniano Soares (presidente da província) em 1864, há uma estimativa
de cerca de 120 unidades, indicando ser essa uma atividade conhecida desde cedo na região. (“A
iniciativa,...”, out/1943,
OBSERVADOR nº 93 )
Fazendo um apanhado da siderurgia brasileira nesse período, o General Edmundo S
OARES E SILVA
(1972), ressalta a ausência de técnicos e acadêmicos preocupados com o problema, acreditando que os
esforços por parte da coroa foram tenazes, constantes e generosos. Já Heitor L
IMA (1976: 162),
acredita no contrário; para ele essa indústria não teve o “... desenvolvimento que merecia,
principalmente por carência de apoio governamental e pela falta de continuação de nossa economia,
localizando-se em lugares distantes dos principais centros de produção.”
Já durante a Primeira República, sucessivos avanços e retrocessos marcaram o ritmo do
desenvolvimento da siderurgia brasileira, tendo sido ao longo desse período que entraram em cena
atores decisivos para o desenrolar desse drama. Tendo como pano de fundo um quadro político e
econômico pouco estável à nível nacional e um cenário internacional dominado pelas expectativas de
uma guerra, as primeiras décadas da República brasileira pareciam condenadas a assistir a
permanência do país como importador de manufaturas e exportador de matéria-prima. Nas palavras de
Paul S
INGER: (1984: 216) “... o Brasil permanece inteiramente à margem da Segunda Revolução
Industrial até ao fim deste período.”(1885-1930)
A partir de 1910
234
, no entanto, começam a se desenrolar alguns episódios que marcariam de forma
definitiva o processo de industrialização do país, em especial o nascimento da indústria de base. O
primeiro, dentre eles, foi certamente a constatação das abundantes jazidas de ferro brasileiras, através
231
SOARES E SILVA (1972: 25) apresenta o engenheiro francês com o nome de Félix Monlevade, afirmando serem escassas as
informações a seu respeito.
232
Na revista O Observador Econômico e Financeiro – XCIII, especula-se sobre a opção do Monlevade pelo Brasil ter sido
conseqüência da correspondência que vinha trocando com José Bonifácio. (O
BSERVADOR,nº 93, 1943 )
233
Sendo o da Fábrica de Ferro do Prata (Itabira do Mato de Dentro) o único com maiores proporções, havendo fábricas de
ferro também em: Vila do Príncipe, Antonio Pereira e Cocais
(ESCHWEGE, s/d).
234
PELÁEZ (1972), no entanto localiza a realização do Congresso de Estocolmo em 1908, talvez se confundindo com a
convocação feita pelo Presidente Roosevelt nesse mesmo ano.
85
da apresentação de estudos no Congresso Internacional de Estocolmo (DORNAS FILHO, 1945)
235
, que
acabaram por despertar o interesse de investidores estrangeiros. (
PEREIRA, 1967; PIMENTA, 1950). A
tabela a seguir apresenta algumas das empresas que viriam a adquirir jazidas no Brasil (P
ELÁEZ, 1972:
178).
JAZIDA EMPRESA COMPRADORA
AMERICANO
Alegria e Cota Brazilian Steel Co.
Morro Agudo The Brazilian Iron and Steel
Caué e Sant'Ana The Brazilian Iron and Steel
INGLÊS
Conceição e Esmeril Itabira Iron Co.
ALEMÃO
Córrego do Meio Phel Hartenback (representante do sindicato alemão)
Córrego do Feijão Deutche Luxembrugische-Bergsweks Aktiengesellschaf
FRANCÊS
Candoga Societá Franco-Brasilienne
Serra do Mascate And Bernard Gôudechax & Cia.
Jangada Bracuhy Falls Co.
Nhotin Societé Civile des Minas de Fer de Jangada Bracuhy Falls Co. (franco-belga)
BELGA
Gaia Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira(Acieries Reunies de Burback-Eick-Deudelange S.A.)
A atração despertada pelo relatório apresentado por Orville Derby
236
fundamentava-se em dois
aspectos principais: primeiramente a abundância de minério e em segundo seu alto teor de ferro. As
vantagens do minério de ferro brasileiro, comparativamente ao de outras localidades pode ser mais
bem compreendida levando-se em conta os dados apontados por N. J. G. P
OUNDS (1966). Ao
distinguir os diversos tipos de minério de ferro como a hematita, magnetita, limonita, siderita, etc.,
bem como uma relação das impurezas mais recorrentes nestes minérios, tais como o enxofre,
manganês, sílica, titânio, fósforo etc., o autor salienta o maior teor de pureza da magnetita (~72.4%),
seguido pela hematita (~70%) e limonita (60%), bem como o quanto algumas impurezas chegam a ser
desejáveis, como o manganês, enquanto outras podem inviabilizar a exploração do minério, como o
enxofre. Seguindo com uma análise das fontes mundiais de ferro, Pounds afirma não ser possível
precisar com exatidão as dimensões das reservas de ferro no mundo, mas acredita que o Brasil
“... poderá vir a ser o maior depósito de minério de ferro de alta qualidade do mundo. As jazidas maciças de
235
A realização do Congresso Internacional de Estocolmo em 1910, foi fruto de uma convocação do Presidente Roosevelt,
que receoso quanto ao abastecimento de recursos naturais para o parque industrial americano, em 1908, levou a cabo um
extenso levantamento das fontes de recursos nacionais, concluindo ser necessário um levantamento mundial, a fim de que
pudesse ser estabelecida uma política americana mais definitiva. (P
EREIRA, 1967: 28)
236
Durante o governo do Presidente Afonso Pena, o então Ministro da Viação Miguel Calmon, havia organizado a Comissão
Geológica do Brasil responsável (1907) pelo Serviço Geológico e Minerológico do Brasil, cuja finalidade era um
levantamento completo dos recursos minerais, questão levantada pelas tentativas de exploração do carvão em Santa
Catarina. Assim o território nacional foi dividido em três distritos: o sul, das jazidas de carvão, pelo qual ficou
responsável Paulo Oliveira; o Central, compreendendo Minas Gerais, à cargo de Gonzaga Campos; ficando Antonio
Olinto incumbido do Norte enquanto a direção geral atribuída à Orville Derby. Foi, portanto, baseado, principalmente no
relatório já realizado por Gonzaga Campos que se fundamentou o trabalho apresentado por Derby em Estolcomo. (SOARES
E
SILVA, 1972 : 49)
86
Minas Gerais são de uma hematita de alto teor, de origem sedimentar. No melhor deles a sílica foi lixiviada,
deixando um minério macio e facilmente trabalhado, com até 68% de ferro. As reservas reais deste minério
foram calculadas em 16.250 milhões de toneladas, e as reservas potenciais em muito mais do dobro.”
(POUNDS, 1966: 61),
sem contar as reservas do Mato Grosso e outras menores em São Paulo, Bahia e no vale do
Amazonas.
Assim, o minério brasileiro leva vantagem sobre o americano que, embora de alto teor é de difícil
extração, visto suas reservas serem subterrâneas; já o minério Inglês, relativamente abundante e de
fácil extração, é de baixo teor de pureza; o francês e luxemburguês, embora abundante e de alto teor de
ferro, ou encontra-se em camadas profundas ou em reservas individualmente pequenas; o ferro
alemão, também abundante e de alto teor, exige exploração subterrânea; já as jazidas suecas são
extensas e de boa qualidade, tendo como inconveniente somente a dureza do minério; a Noruega
possui jazidas semelhantes às da Suécia, porém bem menores; na Europa Ocidental (Polônia,
Tchecoeslováquia, Hungria, Iugoslávia, Bulgária e Romênia) as jazidas são pouco significativas
volumetricamente; na Espanha, Itália e Portugal, destaca-se o minério de Bilbao e Elba, porém,
enquanto o primeiro possui baixo teor o segundo encontra-se quase esgotado; os abundantes minérios
russos são de baixíssimo teor de pureza; já a Índia possuí boas e grande jazidas, inclusive de fácil
extração, enquanto o Paquistão tem suas melhores reservas nas montanhas "inacessíveis do Norte";
Vietnã, Birmânia e Malásia limitam-se a exportar o pouco minério que possuem; China e Coréia
possuem reservas ainda pouco exploradas ou conhecidas; espera-se poucas novidades, restando
somente a de Musan com alguma significação; no Japão, a exploração das inúmeras pequenas jazidas
não é considerada compensatória; a Austrália e a Nova Zelândia são também países com boas e
abundantes jazidas, porém pouco exploradas; enquanto na América do Sul, excetuando-se o Brasil,
somente a Venezuela apresenta reservas minerais de qualidade, mas elas já se encontram totalmente
dominadas por empresas estrangeiras, em especial a Bethlehem Steel Company, americana. (P
OUNDS,
1966).
No Brasil, às vantagens apresentadas anteriormente, somavam-se ainda a existência de uma possível
via de escoamento, a ferrovia Vitória a Minas e o baixo custo para aquisição das jazidas. Além do
que
“Pelo regime constitucional brasileiro de então, as minas pertenciam ao proprietário do solo, fosse este
nacional ou estrangeiro, de modo que a aquisição de jazidas era uma transação das mais simples: não havia
necessidade de trabalho de pesquisas, nem para localizá-las, nem para a estimativa da quantidade do
minério de ferro, e do seu respectivo teor, porque os mapas e os dados divulgados no Congresso de
Estocolmo eram os seus melhores e mais seguros guias.” (PIMENTA, 1950: 119)
Além dos investidores estrangeiros, essa corrida despertou a atenção da parcela interessada no
desenvolvimento de um parque siderúrgico nacional. Para esse grupo, a mera exportação do minério
não era vantajosa; além disso, numa análise mais cuidadosa passou-se a verificar que algumas das
companhias estrangeiras que haviam adquirido jazidas no Brasil, na verdade não tinham a intenção de
explorá-las a curto prazo. A finalidade da compra residia na possibilidade de controle da oferta do
produto e a conseqüente manutenção de seu preço no mercado internacional, garantindo ainda a posse
87
de reservas significativas para o futuro. Esse era o caso da St. John Del-Rey Mining Company
237
,
proprietária de jazidas no vale do Rio Paraopeba desde o Império e que até 1934 não havia cogitado
explorá-las. (P
EREIRA, 1967)
Nos primeiros anos da república “a exploração das minas de ferro não preocupava o Governo de
então. A sua atenção estava voltada mais para as minas de carvão, situadas no sul do País.
(P
IMENTA, 1950: 115), tendo sido, inclusive, em função das expectativas geradas pela possibilidade de
exploração desse mineral que se constituiu o Serviço Geológico e Mineralógico, que produziria o
relatório apresentado em Estocolmo e se modificaria a legislação, a fim de incentivar sua exploração,
regime que facilitaria a aquisição das jazidas por grupos estrangeiros. (S
OARES E SILVA, 1972)
Outro fator que pesava contra a instalação de usinas siderúrgicas no país, em especial na região do
Vale do Rio Doce, era a ausência de carvão mineral de boa qualidade, pois mesmo as jazidas do sul do
país não apresentavam características condizentes, naquele momento,
238
à sua utilização para a
produção siderúrgica, enquanto o carvão vegetal, facilmente produzido na região, devido à abundância
de matas, não era considerado adequado para uma produção de qualidade e em grande escala.
Isto, contudo, não significa a ausência total de tentativas de estabelecer uma siderurgia de grande porte
no território nacional. Embora em discurso o Presidente Nilo Peçanha se mostrasse pronto a incentivar
a instalação de grande siderúrgica
239
, o auxílio governamental efetivo era considerado escasso,
situação que só melhoraria em 1918 com a concessão de empréstimos e garantia de fornecimento para
o Estado. Em conseqüência desses pequenos incentivos, diversos projetos foram apresentados ao
governo, destacando-se entre eles o da Itabira Iron Ore Co.e o de Wigg e Trajano de Medeiros.
(S
OARES E SILVA, 1972). Porém, enquanto o primeiro seria intensamente debatido até a década de
1930, o segundo mesmo recebendo facilmente a concessão, jamais chegou a concretizar-se. Houve
ainda diversas tentativas de estabelecimento de siderúrgicas, mas muitas delas naufragaram já nos
primeiros anos, devido à falta de capital ou de experiência por parte de seus proprietários. Como
reflexo dessa situação, a produção brasileira de aço gusa, mesmo tendo dobrado, sofreu um acréscimo
pouco significativo na primeira década do século XX. (B
AER, 1976)
Constituídas nesse período, G
OMES (1976) enumera três usinas: a Usina Esperança, Usina Burnier e
Usina União. Grande destaque deve ser dado à Usina de Esperança (em Itabira do Campo, hoje
Itabirito – MG), pioneira na utilização do carvão vegetal. Na verdade, a adoção desse processo foi
fruto de seu re-aparelhamento, visto ter sido construída ainda em 1888 pela firma Amaro e
237
A St. John Del Rey Mining Company Ltda. seria posteriormente adquirida pela Hanna dando ensejo a mais um episódio
da luta pela manutenção de nossas jazidas minerais. (P
EREIRA, 1967)
238
GOMES (1976), diz que os problemas apresentados pelo carvão nacional, se devem a elevada proporção de cinzas que
produz, entupindo com facilidade as saídas do forno e a grande quantidade de enxofre, que durante o processo acaba sendo
transmitida para o ferro. Porém estudos realizados pelo Prof. Fleury Rocha, que em 1924 enviará diversas amostras para
serem analisas em laboratórios da Europa e Estados Unidos, já indicavam a possibilidade de utilização do carvão de Santa
Catarina para o coque metalúrgico, embora o do Rio Grande do Sul não fosse indicado.
239
Em 1909, o Presidente Nilo Peçanha, oferece “... privilégios especiais de monopólio e de subsídio com o fito de induzir
capitais, quer nacionais, quer estrangeiros, a estabelecerem uma indústria de aço de grande escala." (B
AER, 1976: 80) e
em 1910, “... concede redução de fretes nas estradas de ferro federais, isenção de direitos de consumo e outros favores, a
indivíduos e empresas que montasse no Brasil estabelecimentos siderúrgicos.” (GOMES, 1976: 149)
88
Gerspacher, de propriedade de Amaro da Silveira, Alberto Gerspacher, Carlos G. da Costa Wigg e
Henrique Hargeaves que, com pouco capital disponível e experiência insuficiente, logo a venderam
(G
OMES, 1976: 143). Foi adquirida pela empresa Forjas e Estaleiros em 1891, que comprara além da
usina e suas minas, as minas de Itabira do Campo, de Monlevade e Antonina (todas em MG), a antiga
fábrica de Ponta d'Areia (Niterói –RJ) e a serralheria de Manuel Joaquim Moreira & Cia., com a
intenção de produzir ferro e produtos metalúrgicos. Vendida novamente, a Usina Esperança passou às
mãos de José Joaquim Queiroz Júnior, chamado o "Bandeirante do Ferro" devido à qualidade da
produção que alcançara na Usina de Esperança utilizando carvão vegetal. (“A iniciativa ...”, out/1943”
OBSERVADOR Nº 93) Tal qualidade seria posteriormente citada como exemplo da viabilidade da
utilização do carvão vegetal para o coque siderúrgico na região do vale do Rio Doce e que o habilitaria
a fornecer material para produção de armamentos (granadas e tubos de ferro fundido centrifugado).
(G
OMES, 1976)
A Usina de Burnier, segundo G
OMES (1976: 146), foi uma “irmã gêmea da de Esperança”, tendo em
comum com ela inclusive Carlos G. da Costa Wigg como sócio, além do filho de Alberto Gerspahcer,
J. Gerspacher. Embora estivesse em funcionamento até pelo menos a década de 1970, jamais teve a
mesma importância histórica da Usina de Esperança.
O mesmo pode-se dizer da Usina União (Arraial do Inflacionado, à margem do Rio Piracicaba, no
sopé da Serra do Caraça), que teve suas atividades interrompidas muito mais cedo. De iniciativa do
engenheiro Alberto Betim Paes Leme, J. Alberto Martins da Costa e José Gomes de Almeida Costa,
sua falta de êxito foi atribuída à dificuldade de obter financiamento e à deficiência de transportes,
devido a interrupção da linha da Central do Brasil em Ouro Preto. (G
OMES, 1976)
Entre a 1
ª
Guerra Mundial e a década 1930, com freqüência, surgiram unidades pequenas, cuja
produção de ferro e aço apresentava-se como atividade complementar à principal, esse era o caso, por
exemplo, da Aços Paulista (São Paulo – SP, 1919) e da Dedini S.A. (Piracicaba – SP, 1920).
Contudo, o crescimento do consumo interno de manufaturas de ferro e aço, especialmente de
laminados, fazia com que quase a totalidade do produto fosse importado, pressionando o governo a
tomar medidas mais efetivas no incentivo da produção nacional. Mas foi somente no final da Primeira
Guerra Mundial, com o decreto de 1918 referido acima, que algumas empresas seriam beneficiadas
(em 1922, a Usina Esperança usufruiria dos benefícios dessa legislação, através da isenção de
privilégios quando comprada por J. J. Queiroz)
Assim, além da ampliação da Usina Esperança por Queiroz Júnior que a tornou o empreendimento
mais bem sucedido do período, em 1917 foi fundada a Companhia Siderúrgica Mineira (Sabará –
MG), dos engenheiros Amaro Lanari e Cristiano Guimarães. Essa companhia iria associar-se à
Acieries Réunies de Burbach-Eich-Dudelange (através da intermediação do Príncipe Alberto),
acabando por constituir a Companhia Belgo-Mineira. Reunindo capital belga, luxemburguês e
brasileiro, promoveria a construção de uma nova e moderna fábrica em Monlevade (1934), a primeira
usina integrada do país, sendo considerada por alguns autores como o acontecimento mais
89
significativo na siderurgia brasileira da década de 30. (BAER, 1976)
Mais quatro usinas, apontadas por G
OMES (1976), foram construídas antes da década de 1930: a Usina
de Caeté (Caeté – MG), Usina de Rio Acima (Rio Acima – MG), Usina de Morro Grande (Santa
Bárbara – MG) e Usina da Saudade (Barra Mansa – RJ). Destas, somente a Usina de Caeté, de
propriedade de João Pinheiro (especializada na produção de refratários), não contou com a
participação do engenheiro J. Gerspacher, que ainda trabalhou na Usina de Baldomero Barbará (Barra
Mansa – RJ) e é tido pelo autor como um dos grandes contribuidores da siderurgia nacional.
S
UZIGAN (2000) e GOMES (1976) lembram ainda da fundação da Companhia Eletro-Metalúrgica
Brasileira e da Eletro-Siderúrgica Brasileira. Tendo a primeira sido fundada pelo engenheiro Flávio de
Mendonça Uchoa, em Ribeirão Preto – SP, em 1921. Com fornos elétricos, essa empresa recebeu
incentivos governamentais através da isenção de impostos, inclusive federais. A crise de energia
elétrica de 1925 e o aumento nos fretes de minério proveniente de Minas Gerais, apesar do
recebimento de benefícios públicos, levaram-na à falência em 1929. O caso da Eletro-Siderúrgica
Brasileira, de Juiz de Fora – MG foi semelhante. Implantada por Acácio Teixeira em 1907, foi
inaugurada somente em 1921 e fechada ainda na década de 1920, sem ter recebido ajuda significativa
do Estado.
Resumindo a atuação governamental referente ao incentivo à siderurgia durante a Primeira República,
GOMES (1976: 152) coloca que:
“A República deixou morrer as forjas de Minas Gerais que, por modestas e primitivas que fossem, eram
passíveis de melhoramento, especialmente com sua adaptação ao método catalão. Deixou morrer Ipanema,
que, embora deficitária, foi um empreendimento útil. Deixou entrar em falência a usina de Monlevade, a
mais próspera de todas antes da moderna fase da siderurgia nacional, que Francisco Paes Leme de
Monlevade, um dos mais ilustres engenheiros do país, neto de João de Monlevade, tentou salvar. Nada fez
até 1918 para amparar as novas usinas a carvão de madeira com fornos altos modernizados.”
O impulso que se querida dar, e se deu de fato, ao incentivo da criação da indústria siderúrgica no
Brasil, teve a maior repercussão na terceira década do presente século. Usinas a carvão de madeira, de
potência ainda modesta para a época, mas muito superiores às criadas no tempo do Brasil–Reino e do
Brasil–Império, e cuja produção se contava por toneladas e não por arrobas, com uma tecnologia
moderna e um funcionamento não deficitário, começaram a ser instaladas no país.
90
Fig. 45: Parte da Nova Carta da Capitania de Minas Gerais com a
localização das principais siderúrgica da região
(ESCHWEGE, s.d.)
Belo Horizonte
Pequeno e médio
Fig. 41: Vista da Fábrica de Ferros
(
OBSERVADOR n º93
,
1943
)
Fig. 40: Vista da Fábrica Ferros
(
anônimo
,
s.d.
)
Fig. 43-44: Residências da Fábrica de Ferros
(
AUTORA
,
2004
)
Fig. 42: Edifício sede da Fábrica de Ferros
(
AUTORA
,
2004
)
A Fábrica de Ferros São João
de Ipanema foi a primeira
experiência de siderurgia a
ser tentada no Brasil
91
A Usina Esperança (antiga Usina
Queiroz Jr.) foi um marco no
desenvolvimento do emprego do
carvão vegetal como matriz energética
na região.
Fig. 52: Vila Operária da Usina Esperança
(
AUTORA
,
2003
)
Fig. 47: Usina Esperança
(
OBSERVADOR
,
1943
)
Fig. 50: Vila operária da Usina Esperança
(
OBSERVADOR n º93
,
1943
)
Fig. 46: Usina Esperança
(
OBSERVADOR
,
1943
)
Fig. 48: Local da antiga
Usina Esperança
(AUTORA,2003)
Fig. 51: Grupo Escolar Laura Queiroz
(
ITABIRITO
,
1992
)
Fig. 49: Forno da
Usina Esperança
(ITABIRITO, 1992)
92
A ITABIRA IRON ORE COMPANY E A COMPANHIA VALE DO RIO DOCE
Um episódio que germinara ainda nos anos de 1900, marcaria definitivamente a exploração do minério
de ferro brasileiro. Protagonizado pela Itabira Iron Ore Company
240
, o projeto Farquhar, assumiu
grande relevância na implantação da indústria siderúrgica nacional, que culminou com a realização
dos Acordos de Washington, impulso primordial para o estabelecimento de parâmetros definitivos
para a exploração e exportação do minério de ferro brasileiro e desenvolvimento da indústria de base
no país.
A origem desse projeto relaciona-se à divulgação das extensas reservas minerais brasileiras, através do
relatório de Gonzaga Campos. Antes mesmo de sua apresentação no Congresso de Estocolmo, o
empreendedor inglês Gotto já averiguara in loco suas potencialidades e adquirira opções de compra,
em 1909, de uma extensa área na região de Itabira – MG. Segundo S
ILVA (2000: 92), essa concessão
contava “... com reservas de minério de ferro equivalentes a 1 bilhão de toneladas e área territorial de
76.800 km
2
.” De volta à Inglaterra, Gotto fundou o Brazilian Hematite Syndicate
241
em nome do qual
procuraria a direção da Cia. Vitória a Minas a fim de verificar as condições para exportação do
minério por essa via.
Datando de 1901, a primeira concessão para construção dessa ferrovia objetivava dar vazão a
crescente produção agrícola do Vale do Rio Doce, ligando Vitória – ES à Peçanha – MG. Em 1902, a
concessão da Companhia Estrada de Ferro Bahia e Minas foi adquirida pela Companhia Estrada de
Ferro Vitória a Minas e estendida de Peçanha a Diamantina. Quando, em 1909, a direção da empresa
foi procurada pelo grupo inglês, haviam sido construídos 313 km de linha, no entanto, conforme
estudos executados pela companhia, todo o traçado teria que ser reforçado; seria aconselhável também
sua eletrificação, além de modificações no percurso a fim de que atingisse a região de Itabira. O custo
final de transporte do minério por tonelada/quilômetro, apesar do acréscimo devido a tais
modificações, foi considerado compensatório, levando a Brazilian Hematite Syndicate a interessar-se
por sua aquisição (referente a 73.3%).
Contudo, antecedendo à consolidação das opções de compra, era imperativo confirmar a concessão
desses novos favores junto ao governo. Obtida através do decreto n
o
7.773 de 1909, embora não
limitasse a quantidade de minério a ser exportada, concedeu um “privilégio de zona”, que representava
praticamente o monopólio da região, e ainda ofereceu incentivos adicionais como a eliminação do
limite de capital, com lucros garantidos pelo Tesouro Nacional (P
ELÁEZ, 1972), obrigava a companhia
concessionária a
“... a sua custa, dentro do prazo de três anos, que era também o prazo para a estrada de ferro ficar
construída até Itabira, a construir à margem da estrada, em ponto mais conveniente, escolhido de acordo
240
O episódio da Itabira Iron Ore Co. é descrito em toda a bibliografia estudada: PIMENTA, 1950; PEREIRA , 1967; PELÁEZ,
1972; SOARES E SILVA, 1972; GOMES, 1976; BAER, 1976; SILVA, 2000; SUZIGAN, 2000, não apresentando qualquer
discrepância significativa. Esta forma procedeu-se a uma seleção na citações conforme a maior ou menor profusão de
detalhes, relativa ao enfoque dado pelo autor, salientando-se algumas das diferenças nas notas.
241
O grupo Brazilian Hematite Syndicate possuía sua sede em Londres e era composto por: Baring Brothers, Cecil Rhodes,
Ernest Cassel (proprietário de minas na Suécia) e C. Rothschild. (P
ELÁEZ, 1972)
93
com o Governo, um estabelecimento metalúrgico, de instalação aperfeiçoada, capaz de produzir, utilizando
minério do país, numa média anual de 1.000 toneladas de produtos brutos de ferro.” (P
IMENTA, 1950: 121)
Exercendo as concessões transferidas pela Brazilian Hematite Syndicate, a Itabira Iron Ore Co.,
fundada em 1911 por Cassel e Rothschild, iria em busca de capital nos mercados de Amsterdã e Paris.
Entretanto, dois obstáculos dificultariam a obtenção de capital: o clima de instabilidade gerado pela
possibilidade de uma guerra e uma maciça campanha nacional contra a exportação do minério de
ferro. (P
ELÁEZ, 1972). Segundo BAER (1976), essa campanha partia principalmente de funcionários
públicos federais e do Estado de Minas Gerais, para os quais era preferível aguardar uma escassez
mundial do minério, para então exportá-lo de forma mais vantajosa. Sem conseguir o capital
necessário para dar prosseguimento ao projeto, em 1918, a Itabira Iron foi vendida ao grupo formado
pelas empresas British Ironmasters Dormann, Singel Ltd., Lloyds Bank e Lora Inverforth
242
, “... outro
grupo inglês de banqueiros e grandes negociantes de ferro. Esse grupo convidou um empresário
americano Percival Farquhar para representar seus interesses no Brasil e solucionar os problemas
técnicos e legais da exportação de minério.”
243
(PELÁEZ, 1972: 181).
Visto como um “... colorful engenheiro americano que tinha uma impressionante folha de serviços na
América Latina ....” (P
ELÁEZ, 1972: 181), Farquhar já era conhecido no país por seu envolvimento
“... na organização de uma série de empreendimentos, desde os últimos anos da década de 1890, e que
abrangiam desde a construção da ferrovia cubana, ferrovia guatemalteca, a Companhia de Bondes do Rio de
Janeiro, a Rio Light and Power Company, a Port of Pará, a Estrada de Ferro Madeira-Marmoré, no interior
do Brasil, até a promoção da criação de gado e atividades madeireiras no Sul do Brasil.” (B
AER, 1976: 91),
que entre ações, arrendamentos e concessões tinha parte nas ferrovias: Mogiana, Paulista, Vitória
Minas, Rede Ferroviária do Paraná, além da Madeira-Marmoré e de incorporadoras imobiliárias como
a Amazon Land Colonization Co., Brazil Land Cattle and Packing Co., Brazil Lumber and
Colonisation Co.
244
, além de controlar um total de 138.648 km2 (cento e trinta e oito mil e seiscentos e
quarenta e oito quilômetros quadrados), área que Antéro do A
MARAL (1915) calcula ser cinco vezes
maior que a Bélgica. O que teve graves conseqüências, pois atraiu a atenção dos defensores da
soberania nacional para o projeto da Itabira Iron Ore.
245
Assim, ao mesmo tempo em que Farquhar
conseguia minimizar as dificuldades na disputa entre americanos e ingleses pela primazia na
concessão de favores do governo brasileiro, através da associação de capital americano ao sindicato,
seu envolvimento em projetos tidos como imperialistas, fez com que o da Itabira Iron Ore Co.
ganhasse quase que imediatamente fortes opositores.
No momento, Farquhar parecia ser, sem dúvida, a escolha mais acertada para chefiar a Itabira Iron e
no ano seguinte já submetia um novo plano à apreciação do governo. Nele propunha que, em troca da
242
Para PEREIRA (1967: 29), essa transação se deu em 1915.
243
As colocações de BAER (1976), SILVA (2000), PEREIRA (1967) e PELÁEZ (1972) quanto a chegada de Farquhar apresenta
uma diferença sutil, enquanto para os três primeiros autores, Farquhar, apoiado por um grupo financeiro americano
adquirira ações da Itabira, que buscava parceiros na América do Norte; para PELÁEZ (1972) ele fora chamado diretamente
pelo grupo inglês que recentemente adquirira a Itabira Iron.
244
Manuel BANDEIRA (1973:192) inclui no curriculum de Percival Farquhar a responsabilidade de representar Société
Anonyme du Gaz, Brazil Railway.
245
Entre os nacionalistas destaca-se Alberto Torres, Antéro Freitas do Amaral e Dr. Alberto de Faria, além de Monteiro
Lobato, todos autores de artigos em periódicos do período que buscavam denunciar a infiltração do capital estrangeiro, em
especial do Syndicato Farquhar, na economia nacional ameaçando a soberania do país. (AMARAL,1915)
94
concessão para exportar 4 milhões de toneladas de minério de ferro por ano (pelo porto de Santa Cruz
– ES) e da liberação para construção de uma nova ferrovia de bitola larga ao lado da existente,
construiria uma usina siderúrgica integrada, com produção de 1500 toneladas/ano, fazendo também o
transporte, como carga de retorno e com frota da própria companhia, de carvão de pedra para
abastecimento da usina. Entretanto, segundo P
IMENTA (1972), Farquhar não tinha real intenção de
construir a usina. Para o autor, sua inclusão na proposta de 1919 deve-se a modificações na legislação
do Estado de Minas Gerais, pois em 1916, a fim de conceder favores à Cia. E. F. Vitória a Minas, o
governo federal havia transformado a obrigatoriedade de construção da siderúrgica em facultativa,
porém, antevendo suas intenções, o governador Artur Bernardes aumentou de 200 para 3.000 réis o
imposto estadual pago por tonelada de minério exportado por empresas que não produziam ferro
dentro do território mineiro. Fato que tornava inviável sua exportação sem a construção da siderúrgica.
Essa hipótese, apoiada por P
EREIRA (1967), é contestada por BAER (1976), afirmando que Faquhar
teria feito grande esforço para juntar capital para construção da usina, o que não se efetivou somente
devido à falta de interesse de investidores europeus e americanos em promover a indústria de base em
países subdesenvolvidos.
Embora o projeto tivesse sido sancionado no ano seguinte, havia despertado novamente o clamor
nacionalista, levando o presidente Epitácio Pessoa a submetê-lo à aprovação da Assembléia
Legislativa do Estado de Minas, onde aos interesses regionais mineiros se uniram aos dos
industrialistas do Centro Industrial Brasileiro, dos engenheiros da Escola da Minas de Ouro Preto, de
partidários da siderurgia nacional, produtores de carvão nacional, defensores da indústria local e
membros da sociedade civil (S
ILVA, 2000). Seu registro no Tribunal de Contas também se deu sob
protesto, obrigando a uma apreciação por parte do Congresso. Assim tomava corpo um embate que se
prolongaria por mais 20 anos.
Em 1923, uma conferência nacional reunia representantes do Poder Legislativo, industriais e
especialistas para estudar a questão da Itabira Iron. Suas conclusões transformaram-se em decreto
legislativo que incentivava a construção de três grandes siderúrgicas por agentes nacionais nas regiões
do Vale do Rio Doce e do Rio Paraopeba e na região carbonífera do sul do país, ou seja,
desconsideravam por completo a proposta do americano em favor da produção nacional. (P
EREIRA,
1967). Todavia, estas medidas nunca foram efetivadas e, em 1927, um novo projeto seria submetido
por Farquhar. Nele eram dispensados alguns privilégios, como o monopólio do transporte (ferrovia e
porto), a fim de se ver livre da obrigação da usina. Tendo agradado tanto ao Congresso Nacional como
ao governo de Minas Gerais, em pouco mais de dois meses, já contava com todas as aprovações de
que necessitava. A crise de 1929, entretanto, faria naufragar mais uma vez as tentativas de Farquhar.
Segundo B
AER (1976), passada a crise restava a Farquhar recorrer somente ao empresário alemão Fritz
Thyssen. Porém, com Osvaldo Aranha como Ministro das Relações Exteriores do Brasil, pouco
simpático à Alemanha, seus planos foram vetados pelo governo.
Com Vargas assumindo a presidência,
95
“[na] década de 30, o debate sobre o regime legal das minas assumiu o primeiro plano da agenda e se
constituiu num dos aspectos mais importantes da legislação nacionalista adotada pelo governo. Associada
ao desenvolvimento da siderurgia, a questão da exploração das reservas minerais se articulou com a
percepção do atraso do desenvolvimento econômico do país. Como tal, a siderurgia foi considerada como o
problema mais grave a impedir o desenvolvimento, fundando sólidos alicerces no industrialismo e na visão
de segurança nacional então associada à propriedade de recursos naturais. Essa posição está claramente
presente em Vargas e se expressa no interior do aparelho de estado tanto através de técnicos como através
do segmento militar.” (S
ILVA, 2000, 97). grifo meu
Através das palavras de Silva, pode-se observar alguns dos principais pontos que influenciariam o
nascimento da Companhia do Vale do Rio Doce, que no fundo não deixavam de ser um mecanismo de
controle do Estado, tanto sobre a economia, como sobre o território.
No âmbito nacional, a política centralizadora adotada por Vargas, assumia um caráter apaziguador,
colocando as disputas regionais de lado em favor de um bem maior – a nação. Desta forma, os
conflitos que opunham o setor industrial ao agrícola, cafeicultores a pecuaristas e burgueses a
operários, deveriam ser suplantados pela defesa da produção nacional. Configurava-se, assim, uma
postura claramente nacionalista, onde a concentração do poder na esfera federal era anunciada como
uma forma de garantir o desenvolvimento uniforme da nação, pois possibilitaria que nenhum grupo
fosse privilegiado em detrimento de outro, que os objetivos traçados para o futuro do país fossem
atingidos sem qualquer desvio.
Nesse contexto, nada mais almejado para o futuro da nação brasileira do que sua ascensão a níveis
mais elevados de desenvolvimento e independência. Fato que implicava em alcançar uma certa
estabilidade financeira e equilíbrio na balança comercial, ou seja, desenvolvimento significava
desenvolvimento econômico. Alcançar isto, demandaria todavia, não só mobilizar apoios políticos
mas basicamente modernizar a economia brasileira, transformando a pequena produção nacional,
quase artesanal, em produção em série, significava conduzir o país em direção à chamada “Segunda
Revolução Industrial”.
O crescimento industrial, que fora no passado objeto de intensas disputas e embates regionais,
despontava revestido de glórias. Como principal instrumento na promoção do desenvolvimento, a
política industrialista adotada pelo governo constituir-se-ia em importante fator de integração nacional,
pois a proliferação de indústrias pelo território geraria empregos, aumentando o poder aquisitivo de
uma parcela da população que vivera até então de uma produção praticamente de subsistência, o que
significaria sua inclusão no mercado consumidor, que por sua vez possibilitaria incremento da
produção, além da redução das importações. Enquanto ideologia, o industrialismo assumiria também
o papel de defensor da soberania nacional.
Embora fosse um país independente, há mais de um século, economicamente, o Brasil era ainda
dependente. As relações comerciais internacionais que desde o Período Colonial faziam do país um
exportador de matérias-primas e importador de manufaturas, durante a Primeira República pouco
haviam se alterado, tendo inclusive se agravado muito com as sucessivas crises da borracha, do açúcar
e do café. Essa dependência que, freqüentemente, possibilitava a instituições estrangeiras extrair
quantidades que pareciam cada vez maiores dos recursos naturais brasileiros, é que exacerbava o
96
sentimento de ameaça à soberania nacional. Além disso, a corrida pelas jazidas de ferro, ao ameaçar o
desenvolvimento da siderurgia, colocava em risco a fabricação de armamentos, que num contexto de
guerra configurava-se em ameaça à segurança nacional.
Assim o apelo por soberania é que conduziria a siderurgia a ser incumbida de responder aos clamores
nacionalistas por segurança e desenvolvimento industrial mais amplo, pois com seu desenvolvimento a
a manufatura básica do ferro, necessária a produção industria, seria feita dentro do território nacional.
Reflexo dessa postura foi a grande atenção dada às questões relativas às condições de
desenvolvimento desse setor, sendo criadas duas importantes comissões a fim de analisá-las: a
Comissão Nacional de Siderurgia do Ministério da Guerra e a Comissão Revisora do Contrato do
Ministério da Viação.
Tendo como principal meta um balanço da siderurgia no Brasil, a Comissão Nacional de Siderurgia,
formada em 1931, publicou seu relatório no final se 1935. Suas principais conclusões, interpretadas
por P
ELÁEZ (1972), indicavam o tratamento da questão siderúrgica em separado da exportação de
minério de ferro: enquanto a solução do problema do combustível seria resolvida com a exportação de
minério e importação de carvão, a da siderurgia caberia ao Estado empresariar e construir uma grande
siderúrgica no Vale do Rio Doce. (T
RONCA ,1984)
Com o vencimento do prazo para início das obras da Itabira, em 1930, a Itabira Iron Ore optou pelo
pagamento de multa mensal pelo atraso, prolongado-o por mais doze meses. Após o vencimento desse
novo prazo, o presidente convocou uma comissão para revisar seu contrato, a Comissão Revisora do
Contrato de 1931. O relatório dessa comissão, apresentado no mesmo ano, partia de seis quesitos
básicos, sendo suas recomendações apresentadas na forma de um novo contrato, que seria ainda
submetido à Comissão Nacional de Siderurgia. Esse novo contrato incluía modificações nas cláusulas
de forma a desvincular siderurgia e exportação do ferro, possibilitar o uso público das linhas férreas e
dos portos, limitar as prorrogações dos prazos das concessões, incentivar a exportação do minério de
ferro e impor maior limitação dos favores concedidos (taxas e alíquotas de impostos) etc. (S
OARES E
SILVA, 1972)
Para T
RONCA (1984: 344), enquanto o relatório da Comissão Nacional de Siderurgia representava um
veto ao projeto de Farquhar, o da Comissão Revisora o aprovava, inclusive prorrogando seus direitos
por mais dez anos e congelando os impostos de exportação do minério. O autor salienta também que,
enquanto a primeira comissão era formada por militares que durante os anos 20 já haviam se
pronunciado contra esse projeto, o grupo que compunha o segundo contava, entre outros, com apenas
um militar (único voto desfavorável ao relatório) e além de um representante da Itabira Iron Ore Co..
O contrato da Itabira Iron foi examinado por outras inúmeras comissões e órgãos ad hoc, tais como:
Comissão dos Onze, Comissão de Obras Públicas e Transportes, Comissão de Segurança Nacional,
Comissão de Transportes e Comunicações, Comissão de Finanças e Orçamentos da Câmara dos
Deputados etc. Porém, a análise decisiva caberia ao Conselho Técnico de Economia e Finanças do
97
Ministério da Fazenda. (PELÁEZ, 1972: 187)
Estudando a atuação das forças armadas na processo decisório que levou à implantação da Usina de
Volta Redonda, T
RONCA (1984) coloca que até a instituição do Estado Novo em 1937, era clara a
indecisão de Vargas quanto à adoção de uma política definitiva para a questão siderúrgica. Indecisão
que se acentuava diante dos pareceres divergentes das entidades por ele convocadas a opinar sobre o
assunto. Isso, todavia, não significava que essa questão tivesse passado para um segundo plano e,
embora politicamente ela não se resolvesse, um arcabouço jurídico vinha se constituindo.
Uma das primeiras medidas nesse sentido foi à suspensão dos atos que implicassem na alienação ou
oneração de qualquer jazida mineral, através de dois decretos de 1931. Dois anos mais tarde, a criação
do Departamento Nacional da Produção Mineral, subordinado ao Ministério da Agricultura, Indústria
e Comércio tornava-se responsável por todos os assuntos referentes a mineração, do ensino técnico à
geologia, da produção de energia ao aproveitamento das águas. Seguindo-se a implementação do
Código de Minas e do Código das Águas, ambos decretos vinculados à Constituição de 1934, cujo
principal mérito era a separação entre a propriedade do solo e a do sub-solo, ou seja, a partir deles
todas as jazidas conhecidas ou desconhecidas foram incorporadas ao patrimônio da nação de forma
inalienável e imprescritível. (S
ILVA, 2000: 98)
O interesse pelo minério brasileiro não cessara e, em 1937, a empresa americana DuPont mostrava-se
interessada em investir no país, enviando uma equipe técnica para analisar a viabilidade da construção
de uma siderúrgica. Constatando a existência de mercado para produtos laminados, propôs a
construção de uma siderúrgica de carvão vegetal, que poderia situar-se em Vitória ou no Rio de
Janeiro, com participação de aproximadamente 26% de capital nacional. Proposta que seria recusada
pelo governo brasileiro, segundo B
AER (1976), devido a fortes pressões por parte de nacionalistas.
Tratado a partir de 1937 sob um ponto de vista mais técnico do que político (T
RONCA, 1984), o
problema da siderurgia e da exportação de minérios foi destaque no discurso de Vargas em 1938,
quando, mostrando-se bem a par da questão, afirmou considerar propostas que conjugassem a
exportação de minério à siderurgia, implicassem elas no estabelecimento de empresas privadas
(associando capital estrangeiro ao nacional), estatais ou paraestatais (associada ao capital nacional).
Entre os projetos apresentados e que seriam submetidos a apreciação de órgãos consultivos estava os
da Itabira Iron Ore Co. e de Raul Ribeiro da Silva e do engenheiro Denizot. (B
AER, 1976)
Esses projetos seriam analisados por dois conselhos: o Conselho Técnico de Economia e Finanças do
Ministério da Viação e o Conselho Federal de Comércio Exterior. Nestes conselhos a opinião do
então Major Edmundo de Macedo Soares e Silva, professor de Engenharia do Exército e membro da
Comissão Nacional de Siderurgia, desempenharia um papel decisivo. Tendo estudado metalurgia na
França entre 1925 e 1930, Soares e Silva seria enviado novamente à Europa (Alemanha, França, Itália,
Bélgica, Polônia, Holanda, Áustria e Inglaterra) em 1938, a fim de estudar seu estado de
desenvolvimento tecnológico e a conseqüente possibilidade de absorção do minério de ferro brasileiro,
98
seguindo posteriormente aos Estados Unidos com as mesmas finalidades. (SOARES E MACEDO, 1972)
Na opinião de T
RONCA (1984), seriam suas colocações e argumentos, corroborados pelas informações
que colhera nessas viagens, que mais fortemente influenciariam a política siderúrgica e de exportação
de minérios adotada por Vargas.
Analisado pelo Conselho Técnico de Economia e Finanças, o projeto de Denziot propunha-se a escoar
o minério de ferro via Central do Brasil, tendo o Estado como mero financiador e regulador, enquanto
o de Raul Ribeiro da Silva solicitava uma participação mais direta do Estado, como sócio, propondo-
se a buscar empréstimos no exterior, pretendia o transporte do minério também pela Central do Brasil,
além de construir uma usina siderúrgica e uma hidroelétrica na Ilha do Governador. Para tanto
solicitava direito de desapropriação dos terrenos necessários, bem como isenção de todos os tipos de
impostos e taxas. E, embora para o relator as maiores vantagens estivessem reunidas no projeto
Itabira, o parecer dos conselheiros não lhe foi tão favorável. Estes apontaram outros aspectos
considerados problemáticos e dos quais o projeto não dava conta; entre eles estavam a necessidade de
estabelecimento da indústria de base no país, controle das minas por empresas estrangeiras, a
longevidade das concessões ferroviárias e portuárias, possibilidade de aproveitamento do carvão
nacional, excesso de favores concedidos etc. (S
OARES E SILVA, 1972) O segundo parecer (1939), do
Conselho Federal de Comércio Exterior, cujo relator era o Almirante Ari Parreira, ressaltava a
necessidade de manter o monopólio da exportação de minério pela Central do Brasil, instituir uma
indústria siderúrgica estatal e criar um instituto para regulação desse setor.
Chamado a opinar sobre o assunto, o então Major, Edmundo de Macedo Soares e Silva salientou a
impossibilidade de exportação do minério para a Alemanha, em substituição ao sueco, pois as usinas
alemãs teriam que se readaptar, sendo o minério brasileiro interessante para países como a Inglaterra e
os Estados Unidos, cujo minério possui características semelhantes ao nacional, daí o interesse de
Farquhar. A proposição de Soares e Silva mostrava-se a favor da separação entre indústria e
exportação, da implantação de uma grande usina no Vale da Paraíba com hulha nacional e importada.
(S
OARES E SILVA, 1972; TRONCA, 1984)
Uma nova tentativa de interessar empresas estrangeiras a investir no Brasil seria incitada por Osvaldo
Aranha (BAER, 1976: 99) e contaria com a participação intensa de Edmundo Soares. Buscando
reaproximar o Brasil dos Estados Unidos, Aranha tratou de interessar a United States Steel Ltda. Que,
em 1939, enviara uma comissão ao país. Acompanhada por Soares e Silva, a comissão propunha a
construção de uma usina que misturaria o carvão nacional ao importado; localizar-se-ia na baía de
Sepetiba – RJ e faria uso da ferrovia Vitória a Minas para abastecer-se de ferro. Conquanto as
perspectivas fossem extremamente promissoras, contando inclusive com aprovação do governo
federal, a Comissão Financeira da United States Steel considerara que a construção de uma usina no
exterior naquele momento seria um risco muito grande. (S
OARES E SILVA, 1972) A versão desse
episódio apresentada por B
AER (1976),
246
afirma que essa desistência ocorreu devido a uma
246
cuja referência é Wirth,
99
modificação no Código de Minas no início de 1940, que proibia capitais estrangeiros na mineração e
metalurgia, levando a empresa americana a fazer exigências quanto à garantia de direito sobre as
minas, que, obviamente, não foram atendidas.
Ainda segundo B
AER (1976: 101), durante 1940, grande número de companhias siderúrgicas e
empresas consultoras de engenharia foi convidado a analisar os problemas siderúrgicos
brasileiros”.(Brassert, Arthur G. McKee, Wenner-Gren e Krupp). Seria somente com o desenrolar da
Segunda Guerra Mundial, intensificando o receio norte americano da proliferação das idéias nazistas
no sul do país, onde se concentrava uma populosa comunidade de imigrantes alemães, que se superaria
a postura ambígua assumida por Vargas até então.
Contudo, a complexidade do contexto internacional que envolveu esse episódio parece levar a
opiniões divergentes quanto a intencionalidade ou não das ações de Vargas na disputa que se instaura
entre americanos e alemães pelo apoio brasileiro, uma disputa que parece assumir o caráter de jogo,
com todos preocupados em não desperdiçar suas cartas, jogando-as sem explicitar suas reais intenções.
Diferentes autores atribuem a cartas diversas a responsabilidade pela virada do jogo, a concessão do
empréstimo americano para a montagem de uma usina siderúrgica de grande porte no Brasil, através
da assinatura dos Acordos de Washington. Para T
RONCA (1984) teria sido o discurso ambíguo de
Vargas, interpretado como de apoio ao Eixo, levando o embaixador alemão no Rio a se pronunciar
favoravelmente ao empréstimo solicitado para construção da siderúrgica, que despertara os americanos
para a ameaça de perder o Brasil como aliado. Na opinião de P
EREIRA (1967: 48), “... a instalação de
siderúrgicas no Brasil, no Chile e na Colômbia fazia até parte dos planos do Pentágono, de
desconcentrar o parque industrial norte-americano, então seriamente ameaçado com as perspectivas
de Hitler chegar a bom têrmo, em suas experiências com as bombas V2. Para B
AER (1976) Vargas
fizera declaradamente um jogo duplo. Enfatizou aos Estados Unidos a importância de um projeto
siderúrgico nacional e convidou os alemães a apresentarem uma oferta, que fez com que os
americanos acreditassem que teria aceito. Para Moniz B
ANDEIRA (1973), mais do que jogo duplo,
Vargas na verdade já havia decidido que a instalação da indústria siderúrgica no Brasil seria feita por
empresa nacional e estatal, carecendo somente de financiamento. Já para S
ILVA (2000: 100), depois de
1937, apesar
“... dos protestos dos credores privados norte-americanos devido à escassez da cobertura cambial, os
Estados Unidos reorientaram sua política externa em relação ao Brasil renunciando a vantagens de curto
prazo em favor de objetivos estratégicos de longo prazo. ...
Assim, antes mesmo da entrada dos Estados Unidos na Guerra, as relações bilaterais com o Brasil se regiam
por um clima favorável permitindo que, em maio de 1941, fosse assinado um acordo para aquisição de
minerais estratégicos entre as autoridades brasileiras e o presidente do Export-Import Bank of Washington
(EXIMBANK)"
Assinado ainda em 1940, devido à conjuntura da guerra, esse empréstimo só se concretizaria com a
assinatura dos Acordos de Washington em 1942, quando então os 20 milhões de dólares passariam a
280 milhões
247
.
Fazia parte dos Acordos a desvinculação entre siderurgia e exportação do minério de
247
O valor emprestado pelos Estados Unidos para TRONCA (1984) é de 200 milhões de dólares e não de 280 milhões e os
Acordos são quatro e não seis como aponta S
ILVA (2000).
100
ferro, a exportação de minério seria feita somente ao governo britânico e à Metals Reserve Company,
órgão do governo americano, seria efetuada a negociação das pendências da Itabira Iron Ore Co., cujas
jazidas seriam adquiridas pelo governo britânico e transferidas, sem qualquer ônus, ao governo
brasileiro; 14 milhões de dólares financiados pelos Estados Unidos deveriam ser aplicados na
constituição de uma empresa exportadora, cujos equipamentos, tanto para o prolongamento e
remodelação da ferrovia Vitória a Minas, quanto para reestruturação do porto de Vitória, deveriam ser
comprados nos Estados Unidos, garantindo a exportação de 1,5 milhões de toneladas/ano, metade para
cada país e a preços fixos por três anos, condição renovável até o fim da guerra. Essa companhia
exportadora deveria ser brasileira, dirigida por cidadãos brasileiros e norte americanos, pelo menos até
que se liquidassem as pendências com o EXIMBANK. (S
ILVA, 2000) Assim, o Decreto-Lei n
o
4.352,
de 1
o
de junho de 1942, além de criar a Companhia Vale do Rio Doce também determinava que as
Companhias Brasileiras de Mineração e Siderurgia S.A. e a Itabira de Mineração S.A., ambas do
grupo Farquhar,
“(...) deveriam ser encampadas, os acionistas indenizados pelo governo federal, e os contratos em vigor
rescindidos. Os bens das duas empresas, assim como os da Estrada de Ferro Vitória a Minas, seriam
incorporados ao patrimônio da União e seriam administrados por um superintendente até a organização
definitiva da Companhia Vale do Rio Doce.”(S
ILVA, 2000: 106)
248
Outra determinação dos acordos constituía-se na construção de uma usina siderúrgica, que deveria ser
realizada pelo Estado com capital e técnicos americanos e brasileiros (Caixas Econômicas e Institutos
da Previdência e do Tesouro Nacional). A partir de então, com a definição do dimensionamento da
usina, capacidade de processamento e produção, o grande impasse a ser vencido pela Comissão
Executiva do Plano Siderúrgico Nacional
249
, presidida por Guilherme Guinle, dizia respeito à
localização da usina, mais do que um problema de logística deveria satisfazer os requisitos da “nova
ordem territorial e urbana” do projeto de governo de Getúlio Vargas, que pretendia a ordenação do
território de modo que intensificasse “ ... os fluxos e trocas internas, integrando o mercado nacional.
(L
OPES, 1993:23)
Em virtude disso, o debate que nascera ainda durante as décadas anteriores, no bojo dos projetos
siderúrgicos apresentados por empresas particulares, nesse momento levava em conta prioritariamente
a minimização dos deslocamentos no transporte da matéria-prima e do produto acabado e os custos
nele envolvidos. Entre Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro a disputa era acirrada, com cada
estado enfatizando suas vantagens enquanto os demais apontavam os obstáculos, pois, enquanto Minas
Gerais abrigava as maiores reservas do minério, a distância do mercado consumidor e do carvão
mineral ampliavam os gastos com infraestrutura, ocorrendo o oposto com São Paulo, onde os grupos
de pressão enfatizam as vantagens do Vale do Paraíba, já com uma ampla rede ferroviária implantada
e ponto intermediário tanto para o transporte dos minérios de ferro (Minas Gerais) e carvão (Rio
Grande do Sul), como próximo aos principais mercados consumidores: São Paulo e Rio de Janeiro. Já
248
Seria com o capital oriundo das desapropriações de suas empresas que Percival Farquhar se uniria a empreendedores
brasileiros para implantar uma usina de aços especiais na região do Vale do Aço, a Aços Especiais Itabira, que construiria a
nova cidade de Timóteo.
249
Um outro aspecto que foi discutido pela comissão dizia respeito ao emprego do carvão mineral nacional, sendo enviada
uma amostra para análise aos Estados Unidos. (O
BSERVADOR nº 93, 1943)
101
no Rio de Janeiro, a própria capital apresentava condições bastante favoráveis como a facilidade de
escoamento da produção pelo porto ou ferrovia, menor distância das minas de carvão do sul do país e
abundância de energia e água. Considerado como fator de desempate a capacidade de defesa, segundo
a qual a localização no alto da serra, seria uma vantagem estratégica, pois manteria a usina fora do
alcance da artilharia naval, dependendo somente da defesa terrestre e antiaérea, ficando estabelecida
pelo Decreto-Lei nº 3.002 de 30 de janeiro de 1941 sua localização no município de Volta Redonda,
entre Barra do Piraí e Barra Mansa no Estado do Rio de Janeiro
250
. (COSTA, 1991)
A
CIDADEDEVOLTAREDONDA
Para Alberto L
OPES (1993) Volta Redonda está para o nacionalismo populista de Getúlio Vargas como
Brasília está para o desenvolvimentismo liberal de Juscelino Kubitschek, ambas mais do que cidades-
modelo, seriam “cidades-monumento” desses períodos da história brasileira. Assim
“Volta Redonda não seria um mero projeto fabril. Nem a escala nem a localização do empreendimento
permitiram abandonar à sua própria sorte o imenso contingente de trabalhadores necessários à implantação
e operação das instalações fabris. Além disso, a edificação da cidade operária permitiria estabelecer uma
nova relação entre capital e trabalho, patrocinada exemplarmente pelo Estado” (LOPES, 1993: 55)
Para projetar este espaço, foi chamado um dos mais requisitados urbanistas do momento Atílio Corrêa
Lima,
251
que propôs uma estrutura urbana quase linear, que num primeiro momento, dada sua
inadequação ao sítio, foi rejeitado pela Comissão Executiva. No segundo projeto apresentado
observou-se uma clara referência à Cidade Industrial de Tony Garnier, sem que no entanto se
excluíssem suas contradições, pois, enquanto o desenho urbano dialogava diretamente com o projeto
utópico, o confronto com a realidade o afastava dele, o que se devia ao fato de que os fatores que
regiam os processos sociais em Volta Redonda serem diametralmente opostos aos da sociedade
imaginada por Garnier. Esse era o caso, por exemplo, de sua inserção num contexto administrativo
autoritário ao contrário da autonomia da cidade industrial do outro, ou ainda a vinculação com
atividades agrícolas, quase ausente no projeto brasileiro e primordial para o francês. (L
OPES, 1993)
O confronto com a realidade traria ainda outras conseqüências na construção da cidade, pois das 3.200
habitações programadas, até 1946 somente pouco mais de mil e quinhentas haviam sido construída
(P
IQUET, 1998). Isso fez com que o assentamento planejado como provisório (Rústico) fosse se
tornando permanente, e regiões de prostituição e comércio livre de bebidas se consolidasse como
“cidade livre”. Nesse período, podia-se distinguir três frentes de urbanização: a cidade nova, que vinha
sendo construída nas áreas desapropriadas das fazendas Santa Cecília e Bom Retiro; a cidade velha,
que crescia abrigando os empregados que não encontravam moradia disponível; e áreas urbanizadas
por especuladores imobiliários.
250
Além do que Alberto LOPES (1993) aponta como fatores para a escolha de um local no Rio de Janeiro, a perspectiva de
construção de novas unidades em Minas e São Paulo (USIMINASUSIMINAS e Cosipa)
251
Formado pela Escola Nacional de Belas Artes no Rio de Janeiro, em 1925 (com 24 anos), Atílio Corrêa Lima participou
também do projeto das cidades de Goiânia e da Cidade do Motores, além do Plano Urbanístico para o Recife (1942), além
de grandes conjuntos residenciais em São Paulo
102
Assim a cidade é composta por um conjunto de ruas amplas, de traçado reticulado, que são
organizadas paralelamente a dois eixos estruturadores: o primeiro é formado pelo conjunto de
quarteirões do bairro Conforto, paralelo à linha férrea, em seguida vem a área comercial, ao lado da
qual encontra-se outro bairro residencial - o Santa Cecília, que é cortado pelo segundo eixo,
constituído por um parque linear. Enquanto nestes bairros predominam as casas geminadas com jardim
e quintal
252
, os morros, onde estão localizados os bairros Laranjal e Bela Vista, abrigam casas isoladas
de diferentes estilos arquitetônicos, destinadas aos técnicos norte-americanos e oficiais mais
graduados. Este “zoneamento urbano” somado aos diferentes modos de ocupação do espaço nas três
área de expansão da cidade, constituiriam um território hierarquicamente segregado e que como
mostra Claudia de S
OUZA (1992), daria ensejo a conflitos sociais.
253
A radical diferenciação entre o modo de vida propiciado àqueles que trabalhavam e residiam em casas
da Companhia e àqueles excluídos, seria sempre um fator de inquietação, pois com os planos de
expansão que se seguiram nas décadas de 1950 e 1970, a demanda por habitação continuava a
transbordar, extravasando os limites das cidades, da nova, da antiga e da ilegal. Assim como em outras
cidades empresariais, mecanismos de atração, coação, exploração e punição faziam parte do processo
de arregimentação da mão-de-obra. No caso especifico de Volta Redonda, o apelo ao patriotismo
254
somava-se à possibilidade de desfrutar de outros benefícios, a criação de uma moeda de troca, o
boro”, e o poder de polícia representado pela presença da guarda da companhia, que detinha os
infratores no chamado “Núcleo 100”. (C
OSTA, 1991)
Essa dualidade que Claudia S
OUZA (1992) verifica na sociedade de Volta Redonda, entre “incluídos e
excluídos”, nem mesmo após a abertura da cidade e sua emancipação do município de Barra Mansa, a
mistificação da figura de Vargas, reunindo todos em torno de um projeto nacional, seria rompida.
Com relação aos conflitos urbanos tão pouco a emancipação da cidade e a institucionalização de uma
prefeitura municipal, em julho de 1954, representou qualquer alívio, pois, ainda que a partir desse
momento tenha sido possível notar um processo preparatório ao desligamento da usina com relação à
cidade,
“A dominância da CSN no cenário local permitia o que podemos chamar de uma inversão de posições em
sua relação com o Município. Não é o Executivo que instaura a discussão sobre matéria de sua competência
e interesse; pelo contrário, o prefeito é ‘convocado’ para o estudo da tributação aplicável à empresa
siderúrgica.”(
SOUZA, 1992: 65)
O ano de 1973
255
marca a abertura da cidade, com o início da comercialização das casas que, desde de
252
A escolha de casas geminadas havia sido uma imposição por parte da CEPSN, apoiada pelo clero local, que acreditava ser
essa aspiração dos operários brasileiros, em nítida oposição a idéia de Atílio Corrêia Lima que via nos edifícios de
habitação coletiva a resposta para a minimização dos custos através do emprego da tecnologia. Seria somente com o plano
de Hélio Modesto de 1953 que áreas de residências dariam lugar conjuntos habitacionais coletivos. (L
OPES, 1993)
253
Além da habitação os empregados da CSN tinham acesso a escola, assistência médica e podiam freqüentar o clube.
254
Claudia de SOUZA (1992) salienta inclusive, que estes operários eram muitas vezes literalmente recrutados para trabalhar
na CSN, visto que o abandono do emprego chegou a ser considerado crime de deserção, viam-se obrigados a passar por um
verdadeiro ritual de iniciação a fim de serem contratados, era a transformação do “JecaTatu em Arrigo”.
255
Para SOUZA (1992) essa inflexão no modo de atuação da empresa vinha sendo gestada desde 1967, quando foi “instituída a
era do planejamento”, através do Decreto-Lei n º 200 e quando foram feitos estudos para reformulação da estrutura
organizacional da empresa.
103
1964, vinham sendo construídas através da CECISA (Imobiliária Santa Cecília)
256
, e a entrega dos
equipamentos urbanos à municipalidade. Contudo, a declaração da cidade como área de segurança
nacional, subordinada diretamente ao governo federal, manteria pelos 10 anos seguintes a supremacia
das “vontades” da indústria sobre as da administração municipal.
Um sinal da capacidade de manobra da CSN em comparação à escassez de recursos enfrentada pela
administração municipal é a constatação de que, enquanto inúmeras fazendas e áreas vizinhas à cidade
eram invadidas ou loteadas ilegalmente, as terras pertencentes à companhia jamais foram invadidas,
mesmo quando essa loteava terras mais distantes, mantendo uma área intermediária desocupada, para
valorização futura. Os anos setenta seriam um período marcado por lutas sociais, em que os sindicatos
e a igreja se firmariam como os principais grupos de pressão, um período que S
OUZA (1992) considera
de aprendizado para as lutas das décadas seguintes, quando entre os movimentos sociais, os conflitos
urbanos estariam sempre representados.
E assim como a cidade-vitrine expõe, a cidade-monumento representa em suas ruas e edifícios as
glórias e os fracassos dos projetos sobre os quais assentara suas bases.
256
Com o desenrolar da parte D do plano de expansão da usina, as tensões já bastante acentuadas, para conseguir moradia,
fez com que a empresa se visse obrigada a buscar uma solução, que veio através da criação do Grupo de Trabalho de
Estudo das Vendas das Casas, em 1961 e que três anos depois se transformaria numa imobiliária a CECISA, braço da
política imobiliária da CSN e que atuaria de duas formas, aparentemente contraditórias: venda e construção de habitação.
(L
OPES, 1993)
104
Fig. 55: Passeio pelo Santa Cecília
(OBSERVADOR, 1950)
Fig. 53: Mapa de localização da CSN
(
OBSERVADOR
,
1950
)
Fig. 54: Propaganda de inauguração da CSN
(GEOCITIES, s.d.)
Fig. 56: O projeto da cidade operária
(
LOPES
,
1993
)
Fig. 57: Vista da cidade e da CSN
(
OBSERVADOR
,
1950
)
105
Fig. 58: Vista do bairro Santa Cecília
(
OBSERVADOR
,
1950
)
Fig. 60: Escola Técnica
(
OBSERVADOR
,
1950
)
Fig. 67: Vista geral da cidade e da usina
(
AUTORA
,
2002
)
Fig. 59: O bairro Santa Cecília
em 1942
(CPDOC, s.d.)
Fig. 63-66:
Residências
(OBSERVADOR , 1950;AUTORA, 2002)
Fig. 61-62: Área Central
(
AUTORA
,
2002
)
Capítulo III: URBANIZAÇÃO E CIDADES SIDERÚRGICAS EM MINAS GERAIS
Fig. 68: O mosaico mineiro de Rugendas
(FAYET, s.d.)
O maior trem do mundo
O maior trem do mundo
Leva minha terra
Para a Alemanha
Leva minha terra
Para o Canadá
Leva minha terra
Para o Japão
O maior trem do mundo
Puxado por cinco locomotivas a óleo diesel
Engatadas geminadas desembestadas
Leva meu tempo, minha infância,
minha vida
Triturada em 163 vagões de minério e
destruição.
O maior trem do mundo
Transporta a coisa mínima do mundo.
Meu coração itabirano.
Lá vai o maior trem do mundo
Vai serpenteando, vai sumindo
E um dia, eu sei, não voltará
Pois nem terra, nem coração existem.
Carlos Dummond de Andrade
(F
ROCHTENGARTEN, 2004)
107
III.1 URBANIZAÇÃO E CIDADES EM MINAS GERAIS
Apesar do desenvolvimento econômico e do processo de urbanização do Estado de Minas Gerais não
terem ocorrido de forma homogênea, consubstanciando a idéia do “mosaico mineiro”, eles tem um
elemento embasador comum: a organização urbana gerada a partir da exploração aurífera nos séculos
XVII e XVIII. Estrutura que, no momento de sua implantação, significou uma ruptura com o padrão
marcantemente agrário e fundamentado nas fazendas, vigente no restante do país, e que foi
interrompido com a decadência da mineração. Assim, embora a região designada “mineradora central”
jamais tenha perdido completamente sua importância assiste-se, ao longo do século XIX, uma
reversão do quadro gerado pela mineração do ouro, quando as cidades mais do que dominar o universo
rural o haviam antecedido. Um quadro que a implantação de cidades siderúrgicas no segundo quarto
do século XX reviveu.
Na primeira parte deste capítulo busca-se, através da análise bibliográfica, apresentar as condições
sobre as quais se assentou o processo de urbanização gerado pela instalação de usinas siderúrgicas no
Estado de Minas Gerais, mais especificamente no Vale do Rio Piracicaba. Já na segunda parte
procura-se dar voz a fontes documentais a fim de conhecer as especificidades do Vale do Aço e do
projeto, implantação e desenvolvimento das cidades siderúrgicas de Monlevade, Ipatinga e Ouro
Branco.
III.1.1 URBANIZAÇÃO DOIRADA: CIDADES E TERRITÓRIO
Entendendo a “natureza do processo de urbanização brasileiro” como o modo com que se dá a
relação entre a sociedade e a ocupação do território, Klara M
ORI (1999: 54) observa que desde seus
primórdios até os dias atuais ela foi dominada pela visão do espaço brasileiro como uma “dádiva
natural, derivando das excelências da paisagem as perspectivas futuras do país”. Assim a ocupação
do território teve sempre uma estreita relação com o desenvolvimento de atividades produtivas, com a
busca por riquezas levando à ampliação das fronteiras, cuja consolidação se dava a partir de sua
efetiva ocupação.
Neste processo merece destaque a ocupação do território mineiro, especialmente após a descoberta das
minas de ouro, pois ela marcou o inicio de “...uma nova forma de colonização, altamente urbanizada,
mesmo nas regiões mais afastadas do litoral...”,
quando a coroa portuguesa passou a assumir muitos
dos encargos relativos à ocupação da colônia,
257
a princípio transferidos aos donatários e colonos
(R
EIS, 1999: 08).
257
Nas palavras de Nestor Goulart REIS (2000a: 21): “A maioria dos núcleos urbanos, instalados nos dois primeiros séculos
de colonização, o foi pelo esforço e interesse dos colonos e donatários, com o estimulo da Metrópole mas sem a
participação direta desta.”, sendo que das trinta e sete povoações fundadas entre 1532 e 1650 apenas sete o foram pela
coroa portuguesa.
108
O novo projeto português para sua colônia americana
258
viabilizava-se pelo estabelecendo de uma
estrutura eclesiástica
capaz de atingir
259
todos os principais pontos de seu plano de ação, pois a difusão
e o fortalecimento de instituições religiosas significava a possibilidade de intensificação do controle
tanto fiscal quanto moral da população em áreas que ultrapassavam os limites das possessões
portuguesas, além do que a vinculação das paróquias e dioceses a uma base territorial estável
implicava na necessidade de institucionalização do poder em nível local. Assim, à reforma eclesiástica
seguiu-se uma reforma jurídica, uma militar e uma administrativa, todas calcadas no fortalecimento da
autoridade real via reforma urbana (F
ONSECA, 2001).
O impacto destas reformas fez-se sentir mais fortemente na província mineira, pois a necessidade de
controle da produção de ouro
260
levou a criação de novas vilas e cidades, assim enquanto no restante
do território predominava a formação de grandes latifúndios decorrente das concessões de terras em
sesmarias
261
e conseqüente papel secundário dos núcleos urbanos
262
, o controle da produção aurífera
dado pela concessão de datas
263
e pujança das cidades mineradoras deste período, marcou
profundamente a organização espacial mineira.
O conjunto de vilas e cidades
264
formado na região das minas a partir do século XVIII constituiu uma
“... trama urbana complexa e efervescente
265
(RODOARTE, 1999: 14), compondo-se de núcleos
geograficamente próximos, originados de pequenos arraiais vizinhos às lavras que, com a exploração
do ouro, haviam crescido e ganhado vitalidade, concentrando a maior porção da população da região.
Esta distribuição original da população urbana reflete-se numa ocupação também específica do
258
O projeto português possuía quatro objetivos básicos: estabelecer um código de regulamentação para as áreas auríferas,
definir uma jurisprudência sobre os aventureiros, refrear a crescente autoridade dos grandes proprietários e ampliar seus
domínios territoriais frente aos espanhóis (DELSON, 1997).
259
A relevância desta medida adotada pelo governo português está no seu reflexo na estruturação das cidades mineradoras,
pois com a implantação das igrejas antecedendo a constituição das cidades, ou mesmo a formação de um núcleo urbano,
com a reforma urbana que tomou corpo durante o século XVIII, encontrou grandes dificuldades, pois a necessidade de
incorporação das igrejas já existentes limitava a de escolha dos sítios e o traçado das vias.
260
A preocupação portuguesa com o controle da região das minas, que se resumia à garantia de seus rendimentos, tanto pela
fiscalização da produção quanto pagamento de impostos, tornara-se mais difícil com o aumento da população na região das
minas. Fato que ocasionara disputas pela concessão de datas e a abertura de caminhos de abastecimento (ABREU, 2002).
Este fato levou a coroa portuguesa à constatação de que o efetivo controle e conquista da região aurífera não dependia da
defesa contra estrangeiros, mas sim de assegurar o respeito à autoridade real.
261
Que podiam tornar-se ainda maiores que as concessões iniciais devido à possibilidade de ampliação pelo usucapião ou
direto de posse efetiva.
262
Esta institucionalização do “fenômeno do latifúndio” (DELSON, 1997), teve como decorrência o que REIS (2000a) chamou
“dispersão rural”, a qual se intensificou com o crescimento da produção açucareira, levando a pulverização da população
nas fazendas, onde se localizava a principal atividade econômica
262
. Este fato possibilitou a ampliação do poder dos
grandes proprietários, que controlando terras, pessoas e recursos econômicos, adquiriam um poder que se não era
suplantado, competia fortemente com a autoridade oficial sediada nos núcleos urbanos. Segundo Oliveira V
IANA (1974),
havia um antagonismo entre a política de colonização e a de exploração econômica ditada pela metrópole portuguesa, pois,
enquanto se buscava concentrar nas cidades e vilas o poder, situando nelas as principais instituições políticas, o
desenvolvimento de atividades produtivas nas fazendas gerava vigorosos núcleos dispersos, dificultando o controle e
regulação das atividades econômicas coloniais.
263
As datas eram os terrenos auríferos, que possuíam dimensões bastante reduzidas em comparação às sesmarias.
264
O período que vai de 1711até 1814, foi dividido pelo autor em três, sendo que entre 1711 e 1712 houve a elevação do três
principais povoados à categoria de vila (Ouro Preto, Mariana e Sabará); entre 1713 e 1729 foram criadas seis vilas e entre
1789 e 1814 seis povoados foram elevados à vila. (RODOARTE, 1999)
265
Cabe destacar também o papel civilizatório atribuído às vilas e cidades, pois ao fazer contraponto ao vasto espaço
desconhecido, despovoado e hostil, o sertão
265
, eram vistas como “sedes da civilização”. De maneira que a formação e
consolidação das cidades mineradoras representavam uma rápida proliferação da “civilização” pelo território, fazendo com
que o que antes fora considerado “... morada de índios e feras,... menos de meio século depois, surpreendentemente, já
conta[sse] com núcleos urbanos bem sedimentados, aparelho burocrático, templos, irmandades religiosas e praticamente
todos os elementos que constituem a vida social.” (S
ILVEIRA, 1997: 13)
109
território, dando origem ao que o autor chamou “estrutura urbana regionalizada”
266
.
III.1
.2 O MOSAICO MINEIRO E SEU DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E URBANO
Esta regionalização de Minas Gerais refere-se a uma diferenciação na sua estrutura produtiva que tem
impactos sensíveis na sua organização urbana e segundo a qual as regiões não somente especializam
sua produção, como se desenvolvem em ritmos e momentos diversos, sem que haja uma articulação e
alavancagem entre elas, compondo a imagem do "mosaico mineiro”
267
. Esta visão baseada na
diferenciação e especialização das atividades econômicas, no entanto, faz sentido somente a partir do
momento em que o desenvolvimento de atividades específicas provoca alterações suficientes para
diferenciar determinada área das demais (C
UNHA, 2004), de modo que, às regiões e territórios
designados sertão e minas, termos úteis na regulação das dimensões das áreas de concessão
268
e
determinação dos tributos a serem recolhidos, no correr do século XVIII somaram-se currais, matos e
campos. Denominações que se devem ao desenvolvimento da atividade agro-pastoril ao longo dos
caminhos no sul e norte da província e que, ao formarem uma paisagem de campos arados,
caracterizaram as regiões dos campos e currais, opostas às áreas tomadas pela mata atlântica, os
matos.
Esta organização em mosaico também teve reflexos na formação da malha urbana da província,
verificando-se que no período da exploração aurífera a fundação de vilas e cidades concentrou-se no
núcleo central minerador, enquanto a partir da segunda metade do século XVIII, com a abertura do
novo caminho para o Rio de Janeiro
269
e o incremento da produção agro-pastoril, núcleos urbanos
começaram a proliferar no sudeste
270
. Assim, juntamente com a região central, a região sul e sudeste
271
são as que apresentam maior índice de desenvolvimento
272
e onde se localizam as cidades com maior
266
O entendimento da organização mineira em regiões tem suas raízes nos trabalhos de autores ditos “revisionistas”, que a
partir da década de 1980 buscaram explicar como, como a decadência da mineração não levou a uma decadência da
economia de todo o estado, permitindo que este mantivesse um elevado contingente populacional e escravos pesquisas
conduzidas. Dentre estes autores Clotilde P
AIVA (1996) destaca: Gorender e Cardoso, nos anos 1970 e nos 1980, destaca-se
especialmente o trabalho de Martins, seguido por Slenes e Libby , entre outros,
267
Segundo Roberto Zimbrão Affonso de PAULA (2001) esta posição, também presente nos trabalhos de autores vinculados à
Universidade Federal de Minas Gerais (Marcelo Godoy, Alexandre Cunha, Clotilde Paiva, Mario Marcos Rodoarte e
Roberto Mont-Mór) foi proposta por J. Wirth .
268
Segundo CUNHA (2004), enquanto nos sertões era possível obter concessões de até três léguas, nas áreas das minas estas
não deveriam exceder meia légua.
269
Enquanto Capristano de ABREU (2002), embora reconheça que as dificuldades de fiscalização na arrecadação de impostos
e contrabando de ouro devia-se a proliferação de picadas, enfatiza a relação da abertura de um caminho mais direto das
minas ao Rio de Janeiro pela necessidade de abastecer à região das minas, Rafael STRAFORINI (2006) acredita ser a
fiscalização da produção aurífera seu principal objetivo.
270
Analisando a função das Estradas Reais, Rafael STRAFORINI (2006) coloca que a concessão de inúmeras sesmarias ao
longo destes caminhos e próximas a região aurífera foi uma estratégia da coroa portuguesa que, juntamente com a
concessão das datas auríferas concedeu cartas de sesmarias destinadas a suprir com produtos agrícolas os núcleos
mineradores.
271
Na divisão apresentada por Alexandre CUNHA (2002) para a primeira metade do século XIX, elas correspondem a quatro
regiões: X, XII, XIII e XVI (respectivamente: Diamantina, Intermediária de Pitangui-Tamanduá, Mineradora Central-Oeste
e Sudeste)
272
Nível de desenvolvimento que é definido pelo autor pela demanda de bens especializados, ou seja, um mercado
consumidor de produtos externos, o que geraria uma intensa circulação de capital, o oposto do que ocorreria em regiões de
baixo nível desenvolvimento, nas quais predominaria o consumo de produtos locais. (RODOARTE, 1999)
110
nível de centralidade
273
, ou seja, aquelas onde se concentravam bens e serviços com alcance espacial
mais abrangente
274
(RODOARTE, 1999).
É no poder centralizador das cidades da região central que reside sua importância, pois mesmo com a
decadência da produção aurífera e a decorrente redução do crescimento urbano não houve um
abandono tão intenso destas cidades. Isto porque,
“Do ponto de vista econômico, as Minas estiveram longe de um cenário definido pela preponderância total
da atividade mineradora, ou pela pequenez das atividades de mercado. Na verdade, a mineração não
somente conviveu com o comércio, a agricultura e os ofícios como também serviu de suporte para o seu
desenvolvimento.” (S
ILVEIRA, 1997: 87)
Uma produção diversificada que não se limitava à subsistência, abastecendo tanto o interior da
capitania como as rotas para as capitanias vizinhas
275
, portanto de âmbito regional. Assim, mesmo
antes do arrefecimento da euforia mineradora, enquanto o sul da província já se especializara na
produção de gêneros de primeira necessidade e voltava-se o mercado do Rio de Janeiro, assistia-se a
um significativo deslocamento dos habitantes da região das minas, os quais “...passaram a se dedicar
a várias outras atividades econômicas ocupando e desbravando territórios inexplorados a partir do
núcleo minerador central.”
276
(RODOARTE, 1999:12),.
No entanto, uma vez que o comércio de mercadorias nas novas áreas de produção, tanto ao norte como
ao sul, era controlado por comerciantes sediados em cidades do núcleo central, seu crescimento
econômico não era acompanhado por um proporcional crescimento na ocupação do território (Paiva
apud R
ODOARTE, 1999)
277
, encontrando-se aí um dos fatores que impediram que apesar do
enfraquecimento produtivo da região mineradora central, suas cidades perdessem sua importância
como centros regionais.
273
A análise do autor fundamenta-se teoria de Christaller, segundo a qual o nível de centralidade é dado pela oferta de bens e
serviços ditos centrais, ou seja, aqueles cujo mercado mínimo é de grande extensão (em oposição a bens e serviços de
consumo freqüente). A avaliação feita por Mário Marcos RODOARTE (1999: 61) estas atividades seriam as ocupações
liberais (exceto religiosos), comerciantes e parte dos artesãos
274
Uma centralidade que é reafirmada pelos trajetos dos correios, cujas linhas regulares, analisadas por Mário Marcos
R
ODOARTE (1999), mostra que ao longo de todo o século XIX há uma baixa integração leste-oeste nas porção norte,
predominando as ligações norte-sul a partir de cidades do centro minerador e do sul Ouro Preto, Sabará, São João Del Rei,
Juiz Fora, Campanha, etc., havendo no sul da província uma rede com ligações mais complexas e estruturadas.
275
Roberta DELSON (2004), no entanto, demonstra que embora a produção têxtil centrada nas fazendas realmente fosse
voltada para o auto-consumo, o desenvolvimento de uma atividade proto-industrial em fábricas nas cidades e comunidades
criadas para esta finalidade, promovidas pela própria coroa portuguesa, eram destinadas a suprir a carência de produtos
importados da Inglaterra. Uma produção que, apesar das distâncias envolvidas, era considerada como “substituição das
importações”, pois considera o funcionamento da metrópole e colônia com uma unidade econômica.
276
Rodoarte refere-se ao trabalho de Clotilde PAIVA (1996)
277
Em seu estudo sobre o setor comercial de Minas Gerais no século XIX, Marcelo GODOY (2002) coloca que embora
grandes comerciantes fossem, por vezes, também fazendeiros, suas aplicações mais substanciais estavam em imóveis
urbanos e aplicações financeiras, o que ajuda a entender a maior concentração de comerciantes nas regiões de alto nível de
desenvolvimento (chega a ser o dobro das de baixo nível de desenvolvimento) e em núcleos de maior centralidade (G
ODOY
& R
ODOARTE, 2004).
111
III.1.3 INDUSTRIALIZAÇÃO E SIDERURGIA EM MINAS GERAIS
Em conformidade com a noção de “mosaico”, observa-se que ao longo do século XIX enquanto o
centro da província continuava marcado pela atividade mineradora e concentrava suas primeiras
indústrias modernas, ao sul propagava a cultura do café, algodão e do fumo, no oeste e norte
predominava a pecuária de corte, enquanto a região leste mantinha-se praticamente desocupada. De tal
modo que apesar da busca por novos territórios, induzida pela decadência da produção aurífera e a
crise no sistema colonial português
278
tivessem
levado o governo imperial a oferecer benefícios fiscais
e concessão de terras àqueles interessados em explorá-las, além de declarar guerra à nação
botucuda,
279
a região do vale do Rio Doce, continuou caracterizada como sertão até meados do século
XX, quando a chegada da ferrovia e a implantação de grandes indústrias alterou definitivamente sua
paisagem quase intocada.
Na opinião de Ricardo Zimbrão A. de P
AULA (2001), a exemplo de seu processo de ocupação, a
industrialização de Minas Gerais também ocorreu de forma regionalizada e pode ser dividia em três
períodos, verificando-se em cada um deles a concentração de atividades industriais em diferentes
regiões. O primeiro período, que vai até a década de 1890, foi marcado pelo desenvolvimento da
industria, especialmente a têxtil, na porção central do estado. Esta concentração da produção na região
mineradora central (14 indústrias)
280
também foi resultado do deslocamento do centro dinâmico da
economia mineira oriunda da região norte após a década de 1870 e constituiu-se num dos fatores que
ajudaram a amenizar o abandono das cidades desta região devido à queda da produção aurífera,
contribuindo para a manutenção de sua centralidade. Conforme demonstra Roberta D
ELSON (2004),
esta produção não estava concentrada somente nas cidades, nem se destinava unicamente ao consumo
local e apesar das proibições de produção da manufaturas no Brasil e especificamente de tecidos em
Minas Gerais ela nunca cessou, atingindo a expressiva soma de oito jardas ( 7,314 milhões de metros)
entre 1827-28.
281
Entre as décadas de 1890 e 1930, observa-se um novo deslocamento do centro dinâmico da economia
mineira, agora da região central para o sul, na zona da mata. Esta região que teve suas primeiras
povoações formadas a partir da abertura do “caminho novo”
282
, ao redor do qual se estabeleceram
278
A crise do sistema colonial refere-se a intensa pressão que as metrópoles não industrializadas, vinham sofrendo da
Inglaterra para absorção de seus produtos manufaturados, levando-as a intensificar a exploração dos recursos naturais de
suas colônias. No caso do Brasil, após a vinda da família real portuguesa, a determinação de incentivos fiscais para
ocupação dessa área e é sintomática destas pressões, levando a tentativas de abertura de novas fronteiras. (C
ARNEIRO &
FAGUNDES, 1992)
279
A chamada “Guerra Justa” contra os botucudos, acusados dentre outras coisas de antropofagia, admitia somente duas
soluções: civilizá-los ou extingui-los, sendo Guido Malière, militar francês incumbido de comandar a divisão do Rio Doce
a partir de 1819, um dos poucos a preferir a primeira opção, sendo ele o responsável pela constituição de inúmeros
aldeamentos que dariam origem a cidades como: Cataguases, Ubá, Muriáe, etc. Foi também Malière encarregado em
auxiliar no transporte do maquinário da usina de Monlevade em 1827. (DIÁRIO DO AÇO, 1999)
280
Seguida pela porção norte (6), zona da mata (4), sul (3) e oeste (1)
281
Justificada por desviar a atenção da população local da mineração para uma atividade menos lucrativa, além do acordo
inglês de exclusividade de fornecimento para Portugal (Alvará de 1785) (D
ELSON, 2004).
282
Enquanto o caminho paulista para as minas de Cataguases levava cerca de dois meses, mesmo o caminho antigo vindo do
Rio de Janeiro levava menos de trinta dias
(ANTONIL: 1982). O caminho novo da cidade do Rio de Janeiro para as minas,
descrito pelo Padre A
NTONIL (1982: 78) seguia do Rio de Janeiro a Irajá; passando pelo ao engenho do alcaide-mor, Tomé
112
pontos de apoio às tropas que se dirigiam do Rio de Janeiro às minas, teve seu desenvolvimento
industrial sustentado pela cultura cafeeira que dominou a região nas últimas décadas do século XIX.
Transformada em principal centro armazenador da produção cafeeira
283
, a cidade de Juiz de Fora
tornou-se importante centro comercial e bancário, o que lhe permitiu “... uma maior concentração e
acumulação de capital, refletidos no crescimento e na diversificação da economia urbana,
engendrando um surto industrial.” (P
AULA, 2001: 76). A indústria que floresceu na zona da mata
mineira neste período foi principalmente a têxtil e alimentícia (bebidas), contudo, sua dependência dos
grandes centros (tanto externos para importar tecnologia e insumos básicos, quanto internos para
absorver sua produção), bem como a escassez de infra-estrutura (energia elétrica, água, transportes e
comunicação) e falta de representatividade política junto ao governo do estado, somados ao
direcionamento da política industrial mineira visando sua centralização no entorno de Belo Horizonte
a partir de 1930, foram fatores que levaram ao seu declínio
284
(PAULA, 2001). Este período marcou
uma reestruração das cidades mineradoras, pois com a produção agrícola comandando o
desenvolvimento de atividades urbanas alterou-se também o tripé sobre o qual se fundava sua noção
de urbanidade: o excedente (ou produção), o poder e a festa. Assim, na cidade mineira que ganhou
vida a partir da metade do século XIX o campo se sobrepõe ao urbano
285
, o Estado à Igreja e o laico ao
religioso, numa inversão quase total do quadro anterior e que determinou uma relação urbano-rural
que perdurou até a década de 1940, quando a industrialização tomou impulso no Estado (C
UNHA &
M
ONT-MÓR, 2000).
Um novo deslocamento do centro econômico para o centro do estado ocorreu entre os anos trinta e
meados da década de 1950, quando a implantação do parque siderúrgico mineiro, combinada a
políticas governamentais de centralização econômica fizeram da região central novamente o principal
pólo econômico do estado (S
INGER, 1968). Este deslocamento foi fundamental para consolidar Belo
Horizonte como “...centro de integração política e econômica do ‘mosaico mineiro’.” (P
AULA, 2001:
Correia; pelo porto do Nóbrega no rio Iguaçu, até o porto da freguesia de Nossa Senhora do Pilar; em canoa, subindo pelo
rio de Morobaí, ou indo por terra, chegava-se ao sítio do Couto, daí seguia ao pouso que chamam Frios, às roças do capitão
Marcos da Costa, do Alferes, e então ao Pau Grande, morro Cabaru, atravessava o rio Paraíba, na altura da venda de Garcia
Rodrigues se passava ao rio Paraibuna, nas vizinhanças do qual se passava pela roça do Contraste de Simão Pereira; de
“Matias Barbosa, e daí à roça de Antônio de Araújo, e desta à roça do capitão José de Sousa, donde se passa à roça do
alcaide-mor Tomé Correia. Da roça do dito alcaide-mor se vai a uma roça nova do Azevedo, e daí à roça do juiz da
alfândega Manuel Correia, e desta à de Manuel de Araújo..., que chamam da Ressaca, e desta à Ponta do Morro,” até o rio
das Mortes. “E quem segue a estrada das minas gerais da roça sobredita de Manuel de Araújo da Ressaca do Campo, vai à
roça que chamam de João Batista; daí à de João da Silva Costa, e desta à roça dos Congonhas, junto ao Rodeio da Itatiaia,
da qual se passa ao campo do Ouro Preto.”
283
Esta condição é conquistada por Juiz de Fora devido principalmente às suas condições de acessibilidade, dadas pela
conclusão da Rodovia União & Indústria em 1861 e da ligação ferroviária com o Rio de Janeiro, concluída em 1875.
284
O autor salienta ainda que outro fator que influenciou a decadência da produção industrial de Juiz de Fora diz respeito as
desvantagens competitiva com relação ás cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, tanto na transação comercial, quanto no
reinvestimento dos lucros e ainda no preço e qualidade dos produtos, uma vez tinham acesso mais rápido às inovações
tecnológicas.
(PAULA, 2001)
285
Embora a atividades agrícolas sempre tenham sido as que empregavam o maior número de mãos (especialmente escravas)
(S
ILVEIRA, 1997 e GODOY et al, 2003) as cidades abrigavam uma parcela expressiva da população e era a fim de suprir suas
demandas que se organizava a produção agrícola (M
ONT-MÓR, 2001; MONT-MÓR, 2001a), enquanto com o
desenvolvimento de uma agricultura de exportação e o recrudescimento da mineração, é a cidade que passa a se organizar a
fim de oferecer serviços e infra-estrutura (serviços financeiros, de comunicação e abastecimento) que o campo requer.
Configura-se um quadro de favorece a dispersão da produção e com ela uma certa descentralização do poder que a cidade
mineradora conseguira concentrar.
113
94), atingindo com quase cinqüenta anos de atraso a finalidade para a qual fora construída. Assim, a
partir da década de 1930 o interventor de Minas Gerais Benedito Valadares (1933-1945) vendo
frustrados seus planos de acabar com a dependência do café através do incentivo a policultura
286
,
acatou as reivindicações dos industriais mineiros e passou a incentivar a concentração de indústrias
nas vizinhanças da capital.
As principais medidas adotadas neste sentido focalizavam o fornecimento de energia
287
e redes
transportes
288
além de linhas de crédito, datando de seu governo o lançamento das bases da Cidade
Industrial de Contagem
289
. Cidade cuja construção representava a integração
290
não somente das
regiões mineiras, mas a busca do desenvolvimento de todo o interior do país através do
aproveitamento de seus recursos naturais, pois tornando-se um pólo industrial em pleno hinterland,
amenizaria as disparidades regionais, possibilitando a propagação do desenvolvimento território
nacional, portanto da nação brasileira, nas palavras do próprio governador:
“A cidade industrial contribuirá para criar a[sic] desenvolver um grande centro de produção e de consumo
em pleno hinterland. A sua projeção far-se-á sentir por todo um vasto espaço de nossa Pátria, oferecendo
maiores oportunidade às regiões produtoras de matérias primas, acelerando as permutas mercantis entre
várias zonas de Minas e de outros Estados convizinhos, promovendo maior movimentação de capitais, de
braços e de produtos.
A iniciativa reveste-se, portanto, de um sentido nitidamente nacional, seguindo as diretrizes da política do
Presidente Getúlio Vargas de valorização do elemento humano e dos recursos naturais do interior, no
sincero objetivo de que Minas possa contribuir sempre e cada vez mais para o engrandecimento do Brasil.”
(OBSERVADOR ECONÔMICO, n
o
64, 1941: 54).
No entanto, num dos aspectos que poderiam ter alavancado rapidamente a indústria mineira, a defesa
de Minas Gerais como local para instalação da Companhia Siderúrgica Nacional, Valadares teve uma
participação bastante tímida, privilegiando sua fidelidade a Vargas durante as discussões quanto a
localização do empreendimento
291
.
A política industrial dos governos subseqüentes, Milton Campos (1947-1951) e Juscelino Kubitschek
286
Embora a industrialização não fosse um dos objetivos principais de Benedito Valadares, que seguindo a linha de João
Pinheiro acreditava que a base da economia mineira deveria estar na agricultura e na agroindústria, buscando no incentivo
a policultura uma saída para a dependência da cultura cafeeira, postura que seria levado a abandonar devido ao aumento do
custo de vida e escassez de oferta, ocasionados pelo desenrolar da Segunda Guerra Mundial (P
AULA, 2001).
287
O Plano de Eletrificação do Estado de Minas Gerais descrito pelo secretário da Viação de Minas Lucas Lopes, tem por
objetivo quebrar o circulo vicioso, segundo o qual “não se instalam indústrias importantes porque não há energia elétrica
disponível e não há energia porque não existem indústrias que garantam o seu consumo.” (O
BSERVADOR ECONÔMICO, n
o
124, 1946: 137). Objetivo que busca alcançar através da reunião de hidroelétricas particulares (em 1946 existiam 405),
construção de novas grandes usinas e sistemas de transmissão num conjunto de sete sistemas integrados “... em condições
de acudir, com o potencial elétrico necessário, às expansões de progresso de todas as regiões.”
288
A construção de um “Parque rodoviário” para Minas Gerais pode ser acompanhada por notícias no OBSERVADOR
ECONÔMICO (n
o
41, 1939) se dá conta da construção de 36.828 km de estradas no ano de 1937.
289
O projeto da cidade industrial de Contagem, descrito no OBSERVADOR ECONÔMICO (n
o
64, 1941) contempla um núcleo
industrial de 84 alqueires aproximadamente, ligado à capital por uma grande avenida ao longo da qual se localiza a “cidade
operária”. É interessante observar o destaque do projeto industrial frente ao habitacional comparando-se o desenho urbano
da área da “cidade industrial” e das vilas operárias para abrigar o operariado, pois como refletindo a relevância e
importância de cada um destes espaços a área industrial possui formas menos convencionais e busca adequar-se a
hidrografia local, enquanto as vilas operárias são quadriculas abruptamente interrompidas pela proximidade da via férrea.
290
A busca pela integração do território através da implantação de redes de infra-estrutura (vistas como meios eficazes de
reduzir as disparidades regionais através da promoção do desenvolvimento local e intensificação das trocas), nas décadas
de 1930 à 1950, não eram exclusivas ao contexto mineiro, assim nas reportagens do Observador Econômico são freqüentes
reportagens discutindo tanto projetos quanto o andamento de obras viárias (ferrovias, rodovias e portos) e energéticas
(produção e logística do carvão, usinas e redes de distribuição de energia elétrica), além da exploração de recursos naturais
vistos como capazes de auxiliar neste processo.
291
Ricardo Zimbrão de PAULA (2001: 137) salienta “... que Valadares foi um dos interventores mais fiéis ao Governo Federal.
Por isso ficou tanto tempo no pode estadual..., um exemplo disso foi sua atitude com relação à implantação da Companhia
Siderúrgica Nacional, ... participando timidamente na defesa deste projeto para Minas...”
114
(1951-1955) se distinguiram pelo modo mais moderado com que o primeiro
292
buscou a modernização
do estado, pois enquanto Milton Campos, através do seu Plano de Recuperação Econômica e Fomento
da Produção
293
, buscava uma “modernização equilibrada da indústria e da agricultura”, Juscelino,
embora centrasse foco nos mesmos aspectos que seu antecessor, “concentrou-se no problema da infra-
estrutura para impulsionar o desenvolvimento industrial ... [abrindo] mão do planejamento global em
favor de programas mais específicos.
(PAULA, 2001: 142). Assim, foi durante o governo de
Kubitschek que ocorreu um efetivo favorecimento da promoção da industrialização na região leste de
Minas (O
BSERVADO ECONÔMICO nº193, 1952), sentida principalmente pela priorização dos projetos
das hidroelétricas de Salto Grande e Tronqueiras, pela centralização dos serviços de fornecimento de
energia elétrica com a criação da CEMIG, bem como pela viabilização de uma antiga aspiração dos
mineiros, uma grande siderúrgica estatal: a USIMINAS
294
.
A década de 1970 marcou o grande crescimento da economia mineira, quando na visão dos
mineiros após terem aguardado pacientemente o país e o estado encontrarem-se em
condições políticas e econômicas favoráveis ao seu desenvolvimento, promoveu-se uma
intensa campanha para industrialização do estado (P
AULA, 2001)
Com uma ampla infra-estrutura disponível e suas finanças em dia, em 1972, o Governador Rondom
Pacheco (1971-1975) reivindicou junto ao governo federal incentivos para implantação de uma fábrica
de automóveis e uma nova e grande usina siderúrgica. Reivindicações que, no artigo da Revista V
ISÃO
(ago/1972), assumem uma conotação de compensação pela instalação da COSIPA em São Paulo
(1966)
295
e resultariam na implantação da AÇOMINAS, no município de Ouro Branco em 1977.
Assim,
“Minas Gerais, nos anos 70, será lembrada como uma das experiências de industrialização mais exitosas do
país. Essa foi uma época de dramáticas mudanças estruturais, quando um grande surto de investimentos veio
reverter a perda de posição relativa do estado no contexto nacional, dando início a um processo de
diversificação e adensamento da estrutura industrial, de consolidação de novos setores industriais, e de
ampliação da inserção nacional e internacional.” (Santos apud SIMÃO, 2004: 34)
Este surto de desenvolvimento industrial, no entanto, não foi capaz de romper com as disparidades
regionais, nem na estrutura produtiva
296
(SIMÕES, 2003) quanto menos na distribuição da população ou
292
Enquanto Milton Campos, através do seu Plano de Recuperação Econômica e Fomento da Produção, buscava uma
“modernização equilibrada da indústria e da agricultura”, Juscelino, embora centrasse foco nos mesmos aspectos que seu
antecessor, “concentrou-se no problema da infra-estrutura para impulsionar o desenvolvimento industrial ... abria mão do
planejamento global em favor de programas mais específicos.”
(PAULA, 2001: 142)
293
A amplitude deste plano pode ser sentida pela apresentação de seus resultados feita por Omer MONT’ALEGRE (1950) em
reportagem ao
OBSERVADOR ECONÔMICO, em dezembro de 1950 (n º 179), onde se observa mais uma preparação da infra-
estrutura para o desenvolvimento industrial do que um incentivo direto, que pode ser sentido pela preocupação com a
formação técnica voltada para produção agrícola e agroindustrial, sem qualquer menção a escolas técnicas industriais. Este
enfoque induz também ao direcionamento dos investimentos em rodovias e energia privilegiarem as regiões oeste, sul,
sudoeste e sudeste além da central (e no caso das rodovias a ligação nordeste com a Bahia), em detrimento da leste, norte e
extremo oeste.
294
A Usiminas começou a ser construída em 1955, numa parceria entre um grupo japonês e o governo, seu processo de
implantação será apresentado mais a frente.
295
Competição que pode ser observada pela clara intenção de concorrer com o estado de São Paulo na localização de
indústrias, especialmente a automobilística, sendo citadas Fiat, General Motors e Toyota, todas interessadas em levar suas
fábricas para o estado de Minas Gerais (VISÃO, 1972).
296
Na avaliação de Rodrigo SIMÕES (2003: 138) nos anos 70 há uma diversificação na industria mineira, com a “a instalação
de indústrias de bens de capital (POLIHECKEL, KRUPP, CBC, USIMEC, ISOMONTE dentre outras), de fertilizantes
(ARAFÉRTIL, FOSFÉRTIL) de celulose (CENIBRA), de automóveis (FIAT) - se inicia a modernização da estrutura
industrial do Estado, o faz de forma parcial, sem conseguir alcançar uma integração intersetorial diversificada. Os
complexos econômico espaciais identificados para 1980 demonstram claramente este fato.” mas ela permanece presa a três
setores: agroindústria, metal-mecânico e minero-siderúrgico. Enquanto nas duas décadas seguintes a continuação do
115
de renda (SIMÃO, 2004), de tal forma que apesar de uma certa integração do território, viabilizada pela
constituição de uma ampla malha viária,
297
o “mosaico mineiro” ainda persiste
298
, com a região do
Triângulo Mineiro concentrando atividades ligadas à pecuária e agricultura e algumas industrias; a
pouco densa Noroeste marcada pela extração mineral e pecuária; a Zona da Mata encontra-se
fortemente vinculada à pecuária, ao café e a produção industrial; a região Sul tem sua base produtiva
fincada na industria, na pecuária e no café; no Vale do Rio Doce a siderurgia faz surgir ilhas de
desenvolvimento; no norte do estado, vales do Jequitinhonha e Murcuri, a pecuária de corte e
agricultura de subsistência são as principais atividades econômicas; já o Centro-Oeste do estado
conseguiu atrair e manter industrias têxteis, siderúrgicas e de alimentos; enquanto na Região Central,
onde se situa a capital, é a rede serviços e finanças que colabora com seu desenvolvimento.
A organização da malha urbana mineira
299
não podia, portanto, deixar de apresentar disparidades
regionais, verificando-se um maior adensamento nas áreas de maior desenvolvimento, como o centro e
o sul em marcante contraste com o norte do estado. Observa-se também uma maior concentração
urbana em torno da capital Belo Horizonte e dos centros regionais, com destaque para Juiz de Fora na
Zona da Mata, Araxá e Urberlândia no Triangulo, Governador Valadares e Ipatinga no Vale do Rio
Doce, e, timidamente, Montes Claros no Norte.
transbordamento paulista possibilita o adensamento da cadeia produtiva com a incorporação do subsetores elétricos e
eletrônicos e má localização dos petroquímico e carboquímico, levam ao desenvolvimento da industria de máquinas e
equipamentos e ao mesmo tempo a um desestimulo à têxtil, vestuário e calçados.
297
Minas Gerais possui a maior malha rodoviária do Brasil, correspondente a 16% de toda a malha viária existente no País
(G
UIANET,.s.d.)
298
Seguindo a divisão regional do estado de Minas Gerais pelo IBGE, Rocycler SIMÃO (2004) coloca que disparidades
podem ser verificadas também internamente as regiões, sendo a Sul uma das mais homogêneas (leite, café e indústrias) e a
do Vale do Rio Doce uma das mais heterogêneas.
299
Segundo Ricardo RUIZ (2004) a rede de cidades brasileiras em comparação com a norte americana, é mais fortemente
polarizada pelos grandes centros urbanos, assim a distribuição da rede urbana mineira sofre influência de São Paulo, Rio de
Janeiro, Goiânia e Brasília.
116
Fig. 70: Fundação de vilas e cidades no período colonial
(Base: DELSON, 1997)
Fig. 69: Vilas e cidades mineiras
no período colonial
(base: DELSON , 1997)
Fig. 72-74:
Distribuição das
atividades econômicas pelo
território nacional
(HERVÉ & MELO, 2005)
Fig. 71: Centralidade e desenvolvimento das regiões mineiras no século XIX
(base: R
ODOARTE, 1999)
Século XVII
Século XVIII
Século XIX
A ocupação e organização do
território brasileiro e mineiro
através da fundação de vilas e
desenvolvimento de atividades
econômicas.
N
N
0 500km
N
Café
Mate
Cacau
Fumo
Algodão
Ouro e diamantes
Drogas do sertão e borracha
Cana de açúcar
Pecuária
Ferrovias
Eixo de expansão da pecuária
0
500km
N
117
Fig. 78: Deslocamento do desenvolvimento industrial mineiro entre 1890-1950
(base: IBGE, 2005)
Fig. 75: O mosaico mineiro
(base:RODOARTE, 1999)
Fig. 76: Plano de Elitrificação de Minas Gerais
(OBSERVADOR, 1952)
Fig. 77: Plano rodoviário mineiro
(OBSERVADOR, 1950)
N
N
118
III.2 O Vale do Rio Piracicaba e aS CIDADES SIDERÚRGICAS MINEIRAS
Do percurso histórico da urbanização mineira apresentado anteriormente, a digressão ao período
colonial deve-se a persistência de noções e estruturas gestadas naquele momento e que, embora
tenham se alterado no correr dos séculos, influenciaram definitivamente a organização espacial
mineira, sendo reconhecíveis ainda hoje. Dentre elas destaca-se a ocupação e desenvolvimento
econômico desigual e descompassado do território; a formação de grandes latifúndios que devido a
restrições nas concessões nas áreas mineradoras, foi menos acentuada na região das minas; a intensa
produção organizada nas fazendas, levando alguns autores a encontrem no século XVIII as raízes da
industrialização mineira
300
, fator que ajuda a compreender tanto a vitalidade do universo rural mineiro
como o enfraquecimento das cidades nos século XIX e início do XX. Mas, acima de tudo é a estrutura
urbana formada pelas cidades mineradoras do período colonial que torna possível traçar um paralelo
com as cidades siderúrgicas do moderno, pois se constituindo de agrupamentos urbanos organizados
independente da produção de um excedente agrícola, têm reflexos profundos na organização territorial
e na própria constituição da noção de urbanidade.
Assim, embora haja diferenças
301
marcantes entre as cidades originadas da produção aurífera daquelas
originadas de empreendimentos siderúrgicos, é possível dizer que o tipo de urbanização promovido
pela implantação de grandes industrias siderúrgicas no século XX não é totalmente estranho ao
urbanismo mineiro, com a construção de “cidades novas” marcando tanto a região central do estado
durante o período colonial quanto à região do Vale do Rio Piracicaba na segunda metade do século
XX.
300
Este é o caso de Roberta Marx DELSON (2004: 13), para a qual a existência de unidades têxteis ainda no século XVIII,
configurando o que a autora chama proto-industrialização. Esta atividade industrial localizava-se tanto na cidade como em
núcleos de povoação indígenas e contava em sua maior parte com mão de obra que embora fosse mal remunerada e
intensamente explorada, era assalariada. Esta produção, salienta autora, difere da que ocorria na Europa no mesmo período
somente por ter como alvo o mercado interno, mas não somente a subsistência. “O ponto sobre a produção no Brasil
colonial e no dezenove era fornecer tecidos necessários a um mercado interno amplo e geograficamente espalhado, e
todos os indicadores sugerem que o objetivo foi alcançado com sucesso. (“The point of textile production in colonial and
nineteenth century Brazil was to provide needed fabrics to a very large and geographically far-flung internal market, and
all indicators suggest that the goal was successfully met.”)
301
A principal delas reside na própria condição do Brasil como colônia portuguesa no século XVIII e república no XX, bem
como o próprio desenvolvimento tecnológico, implica em demandas completamente diferenciadas de materiais,
equipamentos, formação e principalmente no dimensionamento das estruturas envolvidas, tanto para suporte quanto
produção. Da mesma forma observa-se diferenças no tipo de estrutura urbana que se pretende constituir e suas finalidades,
pois mesmo ambas sendo destinadas a abrigar a população empregada em atividades urbanas, enquanto as cidades
coloniais possuíam uma finalidade de fiscalização diretamente ligada ao poder central, as siderúrgicas foram erguidas
como empreendimentos meramente produtivos, com forte participação de capital privado
301
, pelo menos no momento de
sua implantação. Quanto à organização administrativa, enquanto Ouro Branco e Ipatinga, guardam alguma semelhança
com a independência administrativa das cidades do ouro, tendo sido pensadas como unidades politicamente independentes,
Timóteo e Monlevade nasceram como núcleos industriais, portanto muito mais subordinadas ao poder da fábrica do que do
Estado. Outro aspecto em que um paralelo entre elas se torna difícil, refere-se ao planejamento e projeto, pois embora no
período colonial houvessem diretrizes de implantação, projetos urbanísticos detalhados eram pouco comuns.
119
III.2.1 O VALE DO AÇO
Observando as regiões mineiras nota-se que a do Vale do Rio Doce permaneceu caracterizada como
sertão ao longo de todo século XIX, sendo uma das menos dinâmicas e menos povoadas da província
(P
AIVA, 1996)
302
, situação que não desagradava totalmente à coroa portuguesa, pois a dificuldade em
atravessá-la, dada tanto pelo desconhecimento da área como pela existência de uma densa mata
atlântica, considerada perigosa e insalubre devido a proliferação de mosquitos nos alagadiços e a
presença dos temidos índios botucudos
303
, faziam dela uma “barreira natural”, facilitando o controle
do comércio de ouro e barrando as invasões vindas do nordeste (D
IÁRIO DO AÇO, 1999)
304
.
Assim, foi somente com a chegada da ferrovia no início do século XX que o vale dos rios Piracicaba e
Doce começou a apresentar diferenças consideráveis com relação ao que viajantes do século XVIII e
XIX haviam encontrado
305
. No entanto, mesmo estas transformações foram ainda tímidas, o que pode
ser observado pela descrição de paisagem observada em 1930 a partir da janela do trem por Preston
J
AMES (1933: 101)
306
:
“Uma chuva pesada durante a noite havia encharcado o chão e a densa vegetação, e conforme
engrenávamos uma nevoa branca flutuava sobre a folhagem escura da floresta. O trilho único passou por
milhas e milhas de mata fechada (highwoods) – árvores gigantes, pregueadas por cipós, literalmente
pendendo sobre a estreita faixa de terra limpa. A cada curva havia novas e fascinantes vistas da floresta;
mas somente a longos intervalos nós passávamos por sinais de habitação humana.”
307
.
O geógrafo americano observou ainda o processo de devastação da mata atlântica da região, que a fim
de dar lugar a plantações de subsistência como o milho, arroz, feijão, mandioca e banana ia sendo
indiscriminadamente derrubada e queimada. Em seus relatos apresentou uma paisagem que se altera
somente ao aproximar-se de Antonio Dias, povoado que considerou marco do início da região das
minas, onde os sinais de ocupação eram mais antigos e as transformações provocadas por ela mais
evidentes, levando-o a afirmar que “Havia ainda retalhos de floresta em alguns fundos de vale mais
302
Juntamente com o Extemo Noroeste, o Sertão do Rio Doce é uma das regiões que foram menos visitadas por viajantes
estrangeiros, havendo poucas informações disponíveis sobre elas. Estas regiões possuíam baixíssima densidade
demográfica com enormes extensões de mata virgem, sendo freqüentes referências a “vazios” e áreas desocupas. Segundo
P
AIVA (1996), a precariedade de informações à respeito destas regiões também é um indício de seu baixo desenvolvimento
e dinâmica.
303
Descendendo dos Aimorés, “...que em guerra com os tapajós se refugiaram na densa mata atlântica e foram se
distanciando de tudo e de todos até perderem seu nome e se transformarem nos hostis botucudos, uma grande nação
indígena que se subdividia nas tribos dos Puris, Coroados, Macomis, Naknuck, Zamplans, etc, ocupando uma vasta região
de matas, às margens dos rios Piracicaba (rio sem peixe ou de peixe pequeno) e Watu (rio largo ou doce).” O temor dos
índios botucudos, no entanto foi em parte incutido pela coroa portuguesa, que a fim de estimular e justificar sua expulsão
ou eliminação engendrou o mito do canibalismo, sem que haja qualquer comprovação (D
IÁRIO DO AÇO, 1999: 06), um
temor que levou o geógrafo americano Preston J
AMES (1933) a comparar o Vale do Rio Doce ao Mohawk Valley dos
Estados Unidos.
304
Barreira cujos limites apontam também para o fim do universo civilizado, sendo a “Ponte Queimada” um dos poucos
pontos de travessia (entrada para o sertão), e era para além dela, margem norte do Rio Doce para onde eram enviados os
degredados, na esperança que eles fossem exterminados pela floresta ou pelos seus habitantes ou, na última das hipóteses,
que ali permanecessem fundando novas povoações e combatendo os índios. (D
IÁRIO DO AÇO, 1999: 06)
305
A situação de isolamento da população da região era tamanha, que a ferrovia tornou-se principal referencia, levando a que
“...com a ocupação efetiva das terras devolutas nas margens da ferrovia, muitas vezes os moradores de uma região
oferec[essem] mão de obra gratuita para a construção de uma estrada de rodagem...”, que os levasse às estações
(R
OSA,1976: 136)
306
Geógrafo da Universidade de Michigan que percorreu os vales dos rios Doce e Piracicaba em setembro de 1930.
307
A heavy rain during the night had soaked the ground and the thick vegetation, and as we stated off a white mist was
floating thru the dark foliagem of the forest. The single track passed thru miles and miles of highwoods – the giant trees,
draped with lianes, literally hanging out over the narrow ribbon of cleared land. At every curve there were new and
fascinating vistas of forest; but only at long intervals did we pass signs of human habitation.”
120
estreitos, ou nas encostas em terraço; mas a maior parte da terra estava coberta por forração e
arbustos esparsos.
308
(JAMES, 1933: 106). A descrição de uma fazenda, próxima à Santa Bárbara
também parece de especial interesse para entender a região, pois ao mesmo tempo que aponta para
diferenças com relação aos “isolados abrigos de barro” vistos nas clareiras no médio Rio Doce
309
,
nela encontra-se a mesma simplicidade das edificações e uma estrutura produtiva complexa, na qual o
desenvolvimento de variadas atividades denota a busca pela auto-suficiência exigida pelo isolamento
ocasionado pela precariedade das vias e grandes distancias dos principais centros, condições
semelhantes a de fazendas de outras regiões do estado.
Esta descrição de uma estruturação espacial organizada em torno das fazendas, com núcleos urbanos
esparsos e pouco expressivos, alguns datando ainda do período de incursões em busca de ouro, como
Antônio Dias (1706) e Itabira (1720), e pequenos povoados como São Sebastião do Alegre de Timóteo
e Santo Antônio do Piracicaba (surgidos a partir de sesmarias concedidas a Francisco de Paula Silva,
1832) foi também reconhecida por Heloisa C
OSTA (1995). Para a autora um marco fundamental na
organização urbana da região atualmente conhecida como “Vale do Aço” foi a implantação da Estrada
de Ferro Vitória-Minas, que passou a funcionar como espinha dorsal do vale “... transformando seu
meio-ambiente original, diversificando e incorporando mercados e produtos, fazendo surgir e
consolidando entrepostos comerciais, embriões das atuais áreas urbanas, estabelecendo ao longo do
tempo as condições necessárias à produção industrial.
(COSTA, 1995: 52)
Esta ferrovia, considerada como de penetração (L
ANNA, 2002), nasceu da união de duas concessões
Araxá- Peçanha e Peçanha-Vitória e tinha como objetivo ligar o interior mineiro à costa capixaba. Em
1902, no entanto, conflitos com a Estrada de Ferro São Paulo – Rio Grande, referentes à concessão
Vitória-Peçanha, levaram a uma revisão no contrato, quando então se determinou “... que o anterior
projeto de Vitória à Peçanha tenha um desenvolvimento maior, indo até Diamantina em direção ao
tão almejado norte de Minas Gerais e ficando cancelados os estudos aprovados da ferrovia Peçanha
ao Araxá.” (R
OSA, 1976: 83). Modificação justificada pelo intenso surto de crescimento por que
passava Diamantina (1870-1930), consolidando-se como principal entreposto comercial do alto
Jequitinhonha
310
(MARTINS, 2000) e pela proximidade desta com Curvelo, prevista como ponto final
308
“There were still patches of Forest in some of the narrower valley bottoms, or on the steeperhill slopes; but most of the
land was covered with grass and scattered shrubs. The original forests had not returned.
309
A descrição desta fazenda, Fazenda do Rio Peixe, parece bem acertada, já que foi considerada por Claudio GUERRA (2001)
como representativa das grandes propriedades que surgem na região de Itabira com a exploração aurífera. Segue a
descrição feita por Preston JAMES (1933): “The typical fazenda is a group of buildings...The main dwelling, altho built of
mud plastered on a framework o poles, is generally whitewashed, and has doors and Windows, and a red tile roof. Around
the dwelling are bans, storage sheds, hen houses, and other smaller structures, as well as a corral and a carefully fenced
garden patch in which there is a confusion of bananas, maize, manioc, rice, beans, and sugar. The buildings are
surrounded by pastures, with herds of poor cattle gaining what sustenance they can from them. On a nearby slope – never
in the valley, although there is no frost to enforce this traditional practice, there is a plantation of coffee, and always a
platform near the fazenda for the drying of the product.”
310
Com a decadência da mineração de diamantes a fortuna reunida pelos grandes comerciantes foi aplicada em diversas
atividades, desde comércio até indústrias e prestação de serviços, caracterizando o período como a “Belle Époque”
diamantinensefruto de um projeto de ligação desta cidade ao porto de Vitória – ES, num momento em que Diamantina.
Neste contexto a chegada da Estrada de Ferro Central do Brasil (Ramal Diamantin-Corinto) em 1914, foi considerada
consolidação definitiva de Diamantina como ‘boca de sertão’ e entreposto comercial do nordeste mineiro.” (MARTINS,
2000: 292).
121
da Central do Brasil, permitindo a conexão com outras linhas. Contudo, além de oferecer um caminho
de escoamento da produção mineira, a Vitória-Minas visava prover uma ligação da porção norte do
Espírito Santo, cuja ocupação vinha sendo incentivada pelo governo provincial e que até então
permanecia praticamente isolada
311
, além do que a partir de 1904 ganhou força a idéia de transformá-la
em tronco principal de uma vasta rede ferroviária ligando o Rio de Janeiro às ferrovias baianas e daí
todo o nordeste do país (R
OSA, 1976). Os trabalhos de construção começaram no Espírito Santo em
1904 e entre as dificuldades de enfrentar furiosos aimorés, “A estrada avanç[ou] em plena selva e, na
medida que vai desbravando as terras, provoca sua colonização.” (S
INGER, 1968: 240), até que em
1909, o interesse na exportação de minério de ferro das jazidas de Itabira, visto como única esperança
para sanar os déficits financeiros que o transporte de café, madeira e passageiros haviam colocado a
empresa, levou a uma mudança em seu traçado em direção a esta cidade
312
. Adquirida pela Itabira Iron
Ore Cia. a Estrada de Ferro Vitória-Minas além das dificuldades financeiras foi também alvo de
campanhas nacionalistas enfrentando disputas com o governo do estado de Minas Gerais, que buscou
vincular a exportação de minério à construção de uma grande siderúrgica no estado, causando grandes
atrasos na sua conclusão. Assim, embora em 1922 já tivessem sido concluídas as estações do Calado e
Ipatinga, núcleos originais das atuais cidades de Coronel Fabriciano e Ipatinga, o trecho Cachoeira
Escura-Itabira foi concluído com mais de vinte anos de atraso (1943)
313
(ROSA, 1976).
Embora a chegada da ferrovia ao vale do Rio Piracicaba tenha causado algumas transformações, com a
constituição de núcleos de povoamento em torno das estações, foi somente a partir da década de 1930,
com a implantação das primeiras grandes siderúrgicas à base de carvão vegetal, que alterações mais
profundas se fizeram sentir na região.
314
A implantação destes empreendimentos industriais causou
impactos que foram muito além de alterações no meio físico local, ela provocou uma completa
reestruturação social, econômica e ambiental.
Dentre as principais alterações, a primeira refere-se à concentração fundiária, pois a fim de garantir o
suprimento de carvão vegetal para abastecer seus fornos, a Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira, que
inaugurou sua nova usina em Monlevade em 1937, procedeu a compra de vastas extensões de terra
315
.
311
Segundo Lea ROSA (1976) a penetração pelo Vale do Rio Doce foi tentada desde o século XVI, no entanto foi somente
com o desenvolvimento do interior de Minas Gerais e a necessidade de prover um mercado consumidor capaz de auxiliar
na efetivação da ocupação do baixo Rio Doce, cuja ocupação o governo provincial vinha tentando desde a primeira metade
do século XIX (inclusive com a fundação de núcleos agrícolas povoados por imigrantes), que a busca por efetivar esta
ligação se tornou mais premente.
312
É importante salientar que, apesar dos atrasos que implicavam, mudanças de traçado eram freqüentes, sendo que já
durante o detalhamento dos estudos para o percurso até Diamantina, a avaliação do valor do fretes havia levado a se decidir
por interrompê-lo em Serro e investir numa ligação com a Bahia (ROSA, 1976).
313
As dificuldades financeiras da empresa neste período foram agravadas pelo contexto político e econômico do período,
compreendendo tanto a crise do café (principal produto transportado pela ferrovia), quanto à queda da bolsa de valores de
Nova Iorque, a Revolução de 1930, a promulgação do código de Minas em 1932 e aberta oposição do governo mineiro
exigindo a associação entre exportação de minério e construção de uma grande siderúrgica (O
BSERVADOR ECONÔMICO,
fev/1948), além dos danos causados pelas condições ambientais da região, com cheias que destruíam constantemente
trechos recém construídos e alagadiços onde a malária e impaludismo provocavam baixas continuamente. (R
OSA, 1976)
314
É importante salientar que desde muito cedo proliferavam pequenas fundições na região e conforme se pode observar no
segundo capítulo, desde o século XIX algumas usinas de menor porte já haviam sido erguidas até mesmo com certo
sucesso.
315
Segundo Heloísa COSTA (1995) era uma extensão “... correspondendo à quase totalidade do atual município de Coronel
Fabriciano.”e G
UERRA (2001) dá conta de que em 1950 a Belgo-Mineira já possuía 200 mil hectares.
122
Procedimento que seria repetido pela ACESITA na década de 1940
316
e Usiminas na de 1950
317
,
resultando num processo de expulsão da população do campo e redução das atividades de subsistência.
Esta desarticulação da produção trouxe, de imediato, duas conseqüências: disponibilidade de mão-de-
obra para os trabalhos de construção das fábricas e a necessidade de alojar tal contingente. Outra
conseqüência foi a quase completa destruição da mata original, além do que, com a concentração da
população nos núcleos urbanos edificados pelas empresas, a “substituição do homem e do boi pela
árvore” (JPD apud C
OSTA, 1995: 71) trouxe dificuldades de abastecimento, pois a liquidação de
inúmeros pequenos proprietários significou uma drástica redução na oferta de produtos destinados ao
mercado local, em especial alimentos (frutas legumes e hortaliças)
318
. Aspecto que torna evidente o
equivoco de uma organização produtiva segundo a qual, embora a cidade determine a produção do
campo, preocupou-se somente com o excedente comerciável esquecendo-se da própria subsistência
319
.
Estas transformações podem ser sentidas pela descrição apresentada no O
BSERVADOR ECONÔMICO em
1938 (nº 26: 73) de um viajante que parte de Belo Horizonte em direção ao Vale do Rio Doce:
“O perfil orographico daquella zona vae aos poucos se alterando, logo no início da viagem, depois da Serra
do Cuyabá; as montanhas roliças vão se aprumando e se eriçando, em ângulos agudos e caprichosos; o
arvoredo, já tão raro e rachitico nos arredores de Bello Horizonte, vae desapparecendo de todo à medida
que o viajante se distancia da capital e se approxima da zona do minério de ferro, cuja estanha topographia
é ainda tão pouco conhecida. Alli a terra é uma combinação desorientadora de granitos, de mármores, de
mica, de saibros polychromicos, de areias brancas, tudo à vista, nas camadas extratificadas dos barrancos,
nas grotas, nos recôncavos das montanhas pelladas, nas grandes massas criadas pela erosão. A vegetação
alta rarea mais e mais, esturrada pelo calor do céo aberto e pela reverberação daquella pedraria
desordenada, que pavimenta os caminhos, se encrosta nos valles e ainda sobrea para se amontoar no leito
dos córregos e dos riachos, concorrendo para mais ainda afastar as terras marginaes do contato das poucas
águas que banham a sáfara região.
Ninguém planta, e como ninguém planta, ninguém colhe... Mas, mesmo que se plantasse, a terra não
produziria. Afora pequenas manchas de várzeas banhadas pelas águas das serras íngremes, ou de um ou
outro raro tracto de terra trabalhado com esmero por algum sitiante previdente – de que a região inteira tem
tão poucos – o resto é só campo razo ou mattagal rachitico invadido de assalto pela samambaia, ou senão
escapas de chão negro, onde o fogo das queimadas já transformou em carvão e cinza todo o arvoredo.
É a zona do minéiro de ferro.”
Este descompasso entre campo e cidade foi visto por Heloisa COSTA (1995: 75) como uma relação que
nasce adulterada, uma vez que “as cidades se abastecem e realizam suas trocas com outros centros” e
a monocultura do eucalipto transforma o campo numa extensão da fábrica, transformando o campo
num “espaço industrial não construído” e fazendo desaparecer a diferenciação entre rural e urbano.
Na região, esta indiferenciação tornou-se ainda mais explicita após a implantação da CENIBRA
(1973), quando o emprego de uma gestão “moderna” e “flexível” levou a empresa a buscar na
terceirização da maior parte de sua força de trabalho e na oferta de um eficiente sistema de transporte a
solução para o problema de alojamento da mão de obra. No entanto, se esta substituição do ônibus
316
Somente entre 1944 e 1951 a ACESITA adquiriu 4.153ha, aproximadamente 2/3 do atual município de Timóteo (COSTA,
1995) e que em 1964 ultrapassava 81.000 ha (R
ELATÓRIO 1964, 1965).
317
O caso da Açominas em Ouro Branco, embora guarde semelhanças com o destas cidades, especialmente pela
concentração fundiária, diferencia-se tanto pelo período de sua implantação, quanto o estado já possuía um infra-estrutura
viária e energética constituída, como por localizar-se numa micro região já bastante ocupada, próxima à Belo Horizonte.
318
Esta dificuldade, constatada no depoimento de Dna. Wilma SPERANCINI (2004), é outro ponto onde é possível um paralelo
com a cidade mineradora do século XVIII, pois como coloca Capristano de A
BREU (2002: 81): “Não se pode crer o que
padeceram ao princípio os mineiros pro falta de mantimentos, achando-se não poucos mortos com uma espiga de milho
na mão sem terem outro sustento.
319
Pois embora, teoricamente, fosse possível a importação de produtos de subsistência, as dificuldades de acesso e grandes
distâncias somadas a baixa remuneração da população operária tornava este procedimento pouco aconselhável,
especialmente nos primeiros momentos de implantação das usinas.
123
pela moradia foi, por um lado, aparentemente capaz de reduzir o impacto ambiental e o ônus da
construção de uma cidade, por outro gerou um padrão de urbanização periférico, com núcleos
dispersos e carentes
320
de infra-estrutura, determinando uma sensível queda da qualidade de vida da
população atingida.
Assim enquanto a expansão da área de produção diluía as fronteiras entre urbano e rural, as acentuadas
disparidades intra-regionais faziam nascer novas, pois numa região onde “a cidadania se dá pelos
portões das fábricas” (C
OSTA, 1995: 192), a precariedade das condições de vida
321
a que a população
foi submetida com a terceirização decorrente do processo de flexibilização e das privatizações, reduziu
o nível de conscientização, enfraquecendo a capacidade de luta e conseqüentemente suas conquistas.
No relatório preliminar da F
UNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO para o Vale do Aço (s/d), elaborado na primeira
metade da década de 1970, as disparidades intra-regionais aparecem associadas à “fraca coesão e
complementaridade dos centros existentes”, que embora destinados a tornarem-se pólos regionais, têm
esta condição ameaçada pela deficiência de sua infra-estrutura (saneamento e sistema viário). Neste
contexto a pretendida consolidação da Região Metropolitana do Vale do Aço como pólo regional, hoje
já bastante avançada, levou a centralização do crescimento em torno de suas principais cidades
(especialmente Ipatinga, com aponta S
IMÕES, 2003). Crescimento que, numa região de relevo
acidentado com poucas planícies, usualmente situadas nas margens do Rio Piracicaba e seus afluentes,
inicialmente seguiu o curso destes rios, fazendo do binômio rio-ferrovia seu eixo estruturador, mas que
a partir da década de 1970
322
, com a continua polarização das cidades siderúrgicas (Timóteo e
Ipatinga), fez com que o crescimento ocorresse perpendicularmente ao eixo inicial, buscando a
aproximação de outros municípios, como Santana do Paraíso e Belo Oriente, Mesquista e Ipaba
(C
OSTA, 1995).
Contudo, esta reestruturação da malha urbana não modificou o padrão de ocupação inicial,
caracterizado pela urbanização de fundos de vale, ele seguiu acompanhando os cursos d’água, porém
agora de menor porte
323
. As conseqüências deste processo de ocupação observadas na expedição ao
Rio Piracicaba
324
, vão desde “... um violento processo de assoreamento e diminuição da vazão.” até,
320
As condições de moradia nos núcleos como Floresta Escura e Perpétuo Socorro são a materialização destes contrastes,
encontrando-se neles um padrão que se repete na periferia de centros maiores (com Governador Valadares), onde vão se
alojar os trabalhadores, obrigados ainda a longas viagens diárias (COSTA, 1995).
321
Vale salientar, contudo, que a precariedade das condições de vida já podiam ser notadas desde a década de 1930, quando a
produção carvoeira passou a dominar a paisagem rural da região, pois ela criara “...um proletariado cuja importância
numérica tem ecapado à investigação estatística, e cuja situação econômica, social e sanitaria, infelizmente ainda não
interessou nosso estudiosos dessas epecialidades. O resultado final dessa condições do meio e do trablaho é o seiguinte: a
região sidrurgica mineira é hoje uma zona sem agricultura, de via caríssima, habita por uma considerável massa operaria
mal remunerada, enferma e extraordinariamanete móvel. A paisagem revela tudo isso: velvela a pobreza da terra, a
riqueza bruta do sub-sólo, a indigência das populações ruraes, a miséria do operariado, as deficiências do saneamenteo,
a precariedade dos meios de comunicação rodoviária.
OBSERVADOR ECONÔMICO (n
o
26, 1938: 75)
322
Na década de 1970 ocorreram grandes projetos de expansão das usinas da USIMINAS e ACESITA, que a fim de abrigar a
ampliação de seu contingente operário promoveram a construção de novos conjuntos residenciais, que foi capaz de alojar
somente uma parcela dele.
323
Conforme se poderá observar a seguir, em Timóteo os fundos de vale sempre foram os primeiros locais a serem ocupados,
enquanto em Ipatinga, no momento inicial (até a década de 1960), buscou-se privilegiar os terraços e somente com o
crescimento é que a urbanização desceu em direção às planícies aluviais (V
ASCONCELOS, 2002).
324
Esta expedição foi organizada pela Secretaria da Bacia do Rio Doce (Secretaria de Recursos Hídricos do Ministério do
Meio Ambiente), com a participação de técnicos deste órgão, bem como de diversas prefeituras e algumas empresas da
124
do ponto de vista social, um grande esvaziamento demográfico “...caracterizando-se como ‘a região
que mais perdeu população em Minas Gerais’.”, na década de 1990 (G
UERRA, 2001: 09).
Apesar deste relativo esvaziamento, o processo de conurbação que já começava a se evidenciar nos
anos 1970, não sofreu qualquer tipo de reversão, levando a necessidade de tratamento conjunto de
questões ambientais e urbanas. A formação da Região Metropolitana do Vale do Aço (1998),
composto por 22 municípios, capitaneados pelas cidades de Ipatinga, Coronel Fabriciano, Santana do
Paraíso e Timóteo foi um passo importante neste sentido, uma vez que promoveu um maior dialogo
entre os municípios. No entanto, assim como em outras regiões metropolitanas a do Vale do Aço
apresenta grandes disparidades internas, com as cidades sede apresentando condições de moradia
muito melhores do que as do colar metropolitano (C
OSTA & COSTA, 2000). Uma heterogeneidade
interna capaz de fazer com que apesar das cidades de Ipatinga e Timóteo apresentarem IDH-M
(Índices de Desenvolvimento Humano Médio) em torno de 0,8, seu índice geral, apesar da região ter
sido uma das que mais cresceu na última década no estado, não chega à 0,7 (0,687), mantendo a última
colocação entre regiões metropolitanas brasileiras (PNUD, 2003).
região e pesquisadores da UFMG. Partindo em junho de 1999 da nascente do Rio Piracicaba, em Ouro Preto e seguindo até
onde ele deságua no Rio Doce (Ipatinga), os objetivos da expedição eram: avaliar a situação geral do meio ambiente físico,
social, econômico e cultural na bacia, ouvir e dialogar com diferentes segmentos, orientar e incentivar a formação de
comitês locais e por fim elaborar diagnóstico da situação atual com propostas de mudanças (G
UERRA, 2001).
125
Itabira
Diaman
ti
Peçanh
Belo
Hi
Vitória
Fig. 79-80: O traçado original e o atual da Ferrovia Vitória-Minasl
(ROSA, 1976)
USIMINAS
Fig. 81:
As minas do Quadrilátero Ferrífero
(R
ACHE, 1957)
N
N
0 500km
N
N
Diamantina
Itabira
BELGO-MNEIRA
AÇOMINAS
SÉC. XIX
126
III.2
.2 MONLEVADE
A história da siderúrgica Belgo-Mineira na cidade de João Monlevade inicia-se em 1917, quando os
SÉC. XX
DÉC. 1940
DÉC1950
DÉC. 1960
0 5Km
N
Fig. 84: Carta de Ipatinga – Vale do Rio Piracicaba
(IBGE,
1982)
DÉC. 1990
N
Fig. 83: Evolução Urbana do VRP
(COSTA, 1985)
0 20Km
Fig. 82: O município de
Antônio Dias e seus distritos
(Acervo:ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO, 1936)
Coronel Fabriciano
Hematita
Antônio Dias
127
recém-formados engenheiros da Escola de Minas, Cristiano França Teixeira Guimarães, Amaro Lanari
e Gil Guatimosin, juntamente com Sebastião Augusto de Lima (banqueiro e comerciante) e Américo
Teixeira Guimrães (industrial), fundaram a Companhia Siderúrgica Mineira em Sabará. Seu mais
importante ponto de inflexão, no entanto, é 1921, ano em que o grupo belga ARBD (Acieries Reunies
de Burback-Eich-Dudelange)
325
passou a participar da sociedade constituindo a Companhia
Siderúrgica Belgo-Mineira e quando foi decidida a construção de uma nova unidade, próxima à São
Miguel do Piracicaba (M
EMÓRIA BELGO, s.d.)
326
. O local onde seria construída a nova usina, um
patamar intermediário do acidentado terreno às margens do Rio Piracicaba nas proximidades do
salto
327
, fora adquirido mesmo antes da formação da companhia
328
e pertencera a Jean Antoine Félix
Dissandes de Monlevade, engenheiro franceses que ali haviam erigido uma usina no século anterior
(C
ARVALHO, 1998).
329
No escopo do projeto industrial estava a construção de uma cidade operária, que seguindo os moldes
do grupo em empreendimentos semelhantes na Bélgica
330
, promoveu na década de 1930 o primeiro
concurso público para construção de uma cidade no Brasil
331
(LIMA, 2003).
O edital do concurso propunha um programa para 300 moradias (7 tipos), uma escola, uma igreja, um
armazém, um cinema e um clube, que deveriam ser projetados nas vizinhanças da usina, reservando a
margem oposta do rio para futuras ampliações. Dentre as 13 propostas concorrentes foi possível o
325
O primeiro contato com o grupo foi apadrinhado por Arthur Bernardes (então governador de Minas Gerais), que
sensibilizou o Rei Alberto II da Bélgica, em visita ao Brasil, que por sua vez introduziu os brasileiros a Gaston Barbanson,
líder industrial belga (GOMES, 1976).
326
A intenção era manter a usina de Sabará como piloto, testando e ensaiando métodos de produção e ainda como unidade de
treinamento de pessoal, portanto mantendo-a atualizada e em perfeito funcionamento. Assim investimentos foram feitos
também em Sabará, que em 1925 tornou-se a primeira usina integrada da América Latina (GOMES, 1976).
327
O salto foi aproveitado para construção de uma usina hidroelétrica, a Usina Barbanson com capacidade para produzir
15.200 HP (O
BSERVADOR ECONÔMICO, 1943).
328
Segundo as informações que constam no histórico da empresa, este seria um indicativo que desde o princípio havia a
intenção de construir uma nova unidade industrial, projeto que fora adiado devido, por um lado, aos “resultados não muito
animadores da usina piloto [Sabará]e, por outro, pela demora na construção de um ramal ferroviário que garantiria o
funcionamento da usina em Rio Piracicaba” (M
EMÓRIA BELGO, s.d.). O ramal ferroviário ligando a Central do Brasil à
Vitória-Minas foi executado somente em 1935 (O
BSERVADOR ECONÔMICO, 1943).
329
A informações sobre João Monlevade encontradas na Enciclopédia de Municípios Mineiros e no Observador Econômico
são conflitantes. Enquanto na primeira havia apenas um Monlevade: Jean Antoine Félix Dissandes de Monlevade, francês
que se casa com uma brasileira em monta uma fábrica de ferros na fazenda de sua propriedade, até que em 1891, dois anos
após paralisar suas atividades, foi adquirida pela Forjas e Estaleiros do Barão de Mauá e funcionou até 1897, ficando
parada até sua aquisição na década de 1920 pela ARBED (CARVALHO, 1998). Já a versão do Observador Econômico, reza
que em 1817 Felix Dissandes e Monlevade, tendo Diogo Sturz como sócio, iniciou a construção da usina, com sua morte
esta passou a ser conduzida por João Antônio de Monlevade (possível filho de Félix), até que este, por sua vez, falecesse e
as atividades fossem interrompidas. Sua retoma se daria pelas mãos do sobrinho de João Monlevade, Francisco
Monlevade, que em sociedade com a Companhia Nacional de Forjas e Estaleiros tentou, mas falhou em reativa-la,
passando, então ao seu credor o Banco Ultramarino, do qual foi comprada pela ARBED (Aciérie Reunies de Burbach-
Eich-Dudelange) (D
ORNAS FILHO, 1945)
330
Esta experiência vinha da associação com a SAMOD (Société Aonyme pour la Construction de Maisons Ouvirères à
Dudelage – uma associada de uma das empresas cuja fusão deu origem a ARBED), empresa que desde os anos 1910 vinha
se especializando na construção de conjuntos residenciais para trabalhadores e que em 1919 promoveu o concurso para a
construção da Colonie du Brill . A construção dos bairros operários em Sabará também foram experiências que trouxeram
alguma contribuição para a construção da nova cidade (L
IMA, 2003).
331
Segundo LIMA (2003: 312): “Para a Belgo-Mineira o concurso constituiu um meio de difusão e respaldo junto ao
governo, para ampliação das suas atividades com a usina de Monlevade. Mais do que isso, o convite feito a especialistas
teve o sentido de garantir a qualidade das soluções técnicas que seriam implantadas, bem como um o respaldo unto ao
meio profissional para esta realização.
128
resgate de somente três, as de Lincoln Continentino
332
, Angelo Murgel
333
e Lucio Costa. Dentre estes
projetos o mais contrastante é o de Lucio C
OSTA (1936) que apesar do uso de técnicas construtivas e
uma estética moderna, reeditava muitas das posturas comuns aos núcleos habitacionais construídos por
empresas (C
ORREIA, 2000)
334
e enquanto Costa enfatiza o aspecto lúdico de edifícios mergulhados no
verde, os outros autores se pautam por questões técnicas, como o dimensionamento de vias e o traçado
de redes de infra-estrutura (M
URGEL, 1936; CONTINENTINO, 1936). Sem acesso a qualquer registro
quanto aos parâmetros que levaram a escolha da proposta de Lincoln Continentino, seja a convocação
ou resultado, pode-se somente especular quanto as duas justificativas. É neste sentido que se aponta
para dois aspectos: a previsibilidade de crescimento e a notoriedade do autor no contexto mineiro,
como razões que podem ter influenciado na sua escolha.
O conjunto edificado
335
, no entanto, não seguiu completamente os projetos inicialmente traçados pelos
por Lincoln Continentino e João Penna, e ainda na fase de projeto, a companhia solicitou a
modificação do centro comercial e administrativo para a parte baixa da cidade, onde, mesmo com seu
crescimento na margem oposta manteria uma maior centralidade (C
ONTINENTINO, 1936). Os
constantes questionamentos quanto ao seu dimensionamento, devido aos elevados custos da
construção da cidade e à busca por transferir para a cidade a hierarquização da fábrica, intensificando a
diferenciação entre os bairros destinados a operários e técnicos graduados ou pessoal administrativo,
reivindicada a partir de 1940, fez com que “...ao desenho inicial fossem sobrepostos outros desenhos e
redesenhos...”,
resultando numa malha urbana que, em 1953, era constituída por “... pequenos núcleos,
espalhados pela área da companhia, estendendo bastante o núcleo originalmente projetado. Estes
núcleos constituíam vilas residenciais que margeavam o rio Piracicaba e subiam pelas suas
encostas.
(LIMA, 2003: 368) e, enquanto algumas ruas e edifícios ainda eram capazes de nos remeter
ao projeto de Continentino, a presença da grande igreja na margem oposta do rio lembra o quanto ele
foi alterado.
Observando o histórico da empresa nota-se que fora as dificuldades iniciais, relativas à fábrica de
332
Formado em engenharia civil pela Escola Livre de Engenharia de Belo Horizonte em 1923, Lincoln de Campos
Continentino (1900-1976) especializou-se em engenharia sanitária na Universidade de Harvard (EUA) e teve uma
atividade profissional bastante diversificada, atuando como professor (UFMG) e técnico em diversos órgãos públicos
(Inspetoria de Engenharia Sanitária e Secretária de Viação e Obras Públicas do Estado de Minas Gerais, além ter sido
assessor da prefeitura de Belo Horizonte entre outras. Assim participou de trabalhos que foram desde estudos para
implantação de ferrovias até projetos urbanos de remodelação e construção de cidades em Minas e outros Estados (L
EME,
1999).
333
Ângelo Murgel (1907-1978) foi arquiteto formado pela Escola Nacional de Belas Artes, atuou tanto no meio acadêmico,
lecionando na Faculdade Nacional da Universidade do Brasil (1952), tornando-se vice-diretor da Faculdade de Arquitetura
e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro em 1974. Como profissional, tem entre suas principais obras o
projeto para o Edifício Cine Brasil, Igreja de São Judas Tadeu (RJ), Novo Hotel das Nações (MG), Penitenciária Agrícola
do Estado de Minas Gerais (1932) Universidade Rural do Rio de Janeiro (1938), sedes dos Parques Nacionais de Itatiaia
(RJ, 1937) e Iguaçu (PA, 1939), etc (L
IMA, 2003).
334
Na proposta de Lucio Costa revela-se uma conciliação entre o moderno e o tradicional, seja na utilização de técnicas
(paredes de taipa ou concreto armado e lajes de concreto ou taquara) ou organização urbana, reforçando muitos princípios
usuais a núcleos fabris (neutralização da rua, dispersão, moradias econômicas, higiênicas e protegidas de estranhos,
ingerência sobre produtos comercializados), o que “... revela não apenas o empenho do projetista em traduzir as demandas
colocadas pelo programa estabelecido pela Belog-Mineira, como os vínculos íntimos existentes entre os núcleos fabris ... e
a idéia de moradia de massa proposta pelas vanguardas modernistas.” (C
ORREIA, 2000: 14).
335
A coordenação dos trabalhos de construção tanto da usina quanto da cidade foi deixada a cargo do engenheiro Louis
Ensch, que não se furtava em opinar sobre sua construção. Empreiteiras de Belo Horizonte, como Carneiro de Rezende &
Cia e Empreza de Construções Geraes Ltda., entre outras foram contratadas para construção da cidade. (LIMA, 2003)
129
Sabará, a Belgo-Mineira parece ter sempre direcionado seus investimentos de forma correta, evitando
mergulhar em crises acentuadas
336
. Assim, nas décadas seguintes, a usina cresceu e ao seu redor
cresceu a cidade, fazendo com que o afastado povoado de Carneirinhos
337
, que funcionara como
“válvula de escape” absorvendo o contingente operário ao qual a empresa não fora capaz de oferecer
moradia, fosse definitivamente incorporado à cidade operária, transformada em sede de distrito em
1948.
À abertura da cidade, com a venda das moradias aos trabalhadores e a transferência dos logradouros
públicos à municipalidade, seguiu-se a emancipação do município de Rio Piracicaba (ex-arraial de São
Miguel do Piracicaba) em 1964.
338
Contudo, apesar da desvinculação com a usina, ao percorrer o
município de João Monlevade sua origem industrial continua a ser facilmente distinguível, seja por
suas pequenas dimensões (cerca de 99km2) e pela reduzida população rural
339
, ou mesmo pelo traçado
das ruas e homogeneidade das construções em alguns bairros. Uma presença que vai muito além da
percepção física, da grande massa de edifícios que divide a cidade ou mesmo das colunas de fumaça
que tomam o céu e do ruído ensurdecedor das máquinas, pois apesar da drástica redução do pessoal
empregado diretamente pela usina
340
e da cidade contar atualmente com atividades comerciais e de
serviços diversificadas o suficiente para tornar-se pólo micro-regional, a Belgo é ainda essencial para
sua economia, empregando diretamente quase quarenta por cento de todo pessoal ocupado no setor
secundário, um poder que fica mais evidente levando-se em conta que os 60% restante deve se divido
por 270 unidades fabris localizadas no município.
336
Durante a guerra passou a produzir trilhos, nos anos 1950 com o desenvolvimentista em plena marcha, investiu numa
trefilaria em Contagem, seu período mais crítico parece ter sido a década de 1960, quando sentiu diretamente a
desaceleração do mercado. A partir dos anos 1970, no entanto, ela firma-se no cenário nacional e mesmo a crise dos anos
1980, não seria sentida com tanta intensidade (M
EMÓRIA BELGO, s.d.; VISÃO, 1967 à 1992)
337
A origem de Carneirinhos também é controversa, com o site oficial da cidade afirmando que este povoado ser formou
após a implantação da usina (C
IDADES MINEIRAS, s.d.) e a Enciclopédia de Municípios Mineiros (CARVALHO, 1998)
afirmando que o povoado data do século XIX,
338
Embora não tenha dados quanto ao processo de emancipação política de Monlevade, as informações contidas no site
Cidades Mineiras dão conta da formação de uma Comissão Pró-Emancipação em 1958, sendo que sua efetivação data de
1964, um intervalo de tempo bastante significativo, indicando não ter sido de todo tranqüilo.(CIDADES MINEIRAS, s.d)
339
Segundo dados do Censo IBGE 2000, dos 66.690 habitantes somente cerca de 1,48% vive no campo (IBGE, 2000)
340
Observa-se que desde a década de 1970 tem havido uma gradual diminuição do pessoal empregado diretamente pela
empresa, que nos anos 1970 empregava uma média de 9.200pessoas, já nos anos 1980 este número estava em torno de
7.700, atingindo cerca de 6.200 nos anos 1990 e chegando à 2001 com não mais do que 2.986, sendo que deste 1.459 na
unidade de Monlevade. (dados retirados dos balanços anuais publicados na Revista Visão e do Balanço Anual de 2001).
130
0 10m (?)
N
N
N
Fig. 87-88:Projeto de Lincoln Continentino
(perspectiva e implantação)
(LIMA, 2003)
Fig. 89-90: Vistas das duas margens do rio
(DORNAS, 1945; PAIXÃO, 1953)
Fig. 85: Área residencial central
Fig. 86: Projeto de residência
(LIMA, 2003)
JOÃO MONLEVADE
131
Fig. 91-92: O município de João Monlevade e o sítio da USIMINAS
(GOOGLEARTH, 2006)
0 3,35Km
0 1,003Km
N
N
Fig. 108: O centro comercial
(AUTORA, 2003)
Fig. 93: Vista da usina e da cidade
(AUTORA, 2003)
Fig. 95-96: A igreja São José
Operário e o solar Monlevade
(PREFEITURA DE MONLEVADE, s.d.)
Fig. 97-107: Residências
(AUTORA, 2003)
Fig. 94: Vista dos fundos da usina
(AUTORA, 2003)
132
III.2.3 IPATINGA
Concebida a partir de uma associação entre capital nacional e o japonês
341
, a USIMINAS (Usinas
Siderúrgicas de Minas Gerais S.A.) foi fruto do empenho da Sociedade Mineira de Engenheiros e da
Federação das Industrias de Minas Gerais, que em 1955, conseguiram interessar empresários
japoneses a investir na construção de uma usina siderúrgica no Vale do Rio Doce. Dentre os fatores
que influenciaram a escolha do local de implantação da usina
342
foi privilegiada a logística. Levando
em conta a proximidade com a linha da ferrovia Vitória-Minas, que permitia tanto o escoamento da
produção, quanto o abastecimento de matéria prima (fosse o minério de ferro das jazidas, fosse o
carvão, via porto de Vitória), a existência de planícies banhadas pelo rio Piracicaba e suficientemente
grandes para implantação da usina e da cidade, levou a escolha de uma área de aproximadamente
trezentos hectares próxima à usina da ACESITA (G
OMES, 1976).
O local escolhido situava-se entre o rio Piracicaba, a Estação Nossa Senhora (próxima ao atual bairro
Horto) e o povoado denominado Barra do Alegre
343
e fora de propriedade da Companhia Siderúrgica
Belgo-Mineira
344
, que montou ali um serviço de produção de carvão a fim de abastecer sua nova usina
em Monlevade. Verifica-se desta foram que foi a produção de carvão vegetal para a Belgo-Mineira e
posteriormente para a ACESITA que deu o primeiro impulso de crescimento ao lugarejo,
anteriormente marcado pela produção de gêneros alimentícios (gado e lavoura) nas fazendas,
crescimento que se levou o povoado de 60 casas e 300 habitantes (H
ARDY FILHO, 1970) a condição de
distrito de Coronel Fabriciano em 1953 (C
ARVALHO, 1998).
Com a aquisição da área, começou a ser planejada uma “cidade industrial”, cujo projeto ficou a cargo
do arquiteto Raphael Hardy Filho
345
. Com uma equipe multidisciplinar, o processo de projeto iniciou-
341
Segundo reportagem do OBSERVADOR ECONÔMICO (nº288, 1960), inicialmente o governo federal e o estado de Minas
Gerais tinham uma participação de 60% e os japoneses de 40%, no entanto Ademar B
ARBOSA (1972) afirma que o BNDE
subscreveu 73,2% do capital social inicial, enquanto os acionistas japoneses participaram com apenas 18,7% de um total de
Cr$ 1.208.880.000,00, percentuais que, na verdade, equivalem aos arranjos feitos em 1971 a fim sanear as finanças
debilitadas pelos custos de implantação e prejuízos operacionais de seus primeiros anos. A participação do estado na
estrutura acionária da empresa só cresceria com o passar dos anos, totalizando já na década de 1980 o mesmo valor de
1991 quando foi privatizada: 94,9% (P
EREIRA, 2000).
342
Estavam sendo considerados também: Belo Horizonte, o Vale do Rio Paraopeba, Lafiete e Governador Valadares.
(G
OMES, 1976)
343
Este povoado formara-se inicialmente como acampamento para os trabalhadores da Estrada de Ferro Vitória-Minas,
durante a construção da estação do quilometro 457, situada na margem do ribeirão Ipanema, próxima ao local onde o Rio
Piracicaba deságua no Rio Doce, que não proliferou devido às condições pouco salubres da localidade (DIÁRIO DO AÇO,
1999). Uma ocupação mais permanente da região se deu somente a partir dos anos 1930, quando José Fabrício Gomes
(nativo de Barra do Alegre ou Água Limpa) se apossou “... de uma área de terra em matas viagens, para fazer uma
plantação e ficar mais preto da estrada de ferro, onde venderia seus produtos agrícolas. Decorrido dois anos, cedeu a
posse para José Cândido de Meira, que instalou um grande serviço de extração de madeira. Mais tarde, cedeu a posse
para o senhor Alberto Giovanini que construiu uma e casa e iniciou uma criação de gado.”, área que foi adquirida pela
Belgo Mineira em 1934 e em 1958 pela USIMINAS (M
ORAES, 2004: 22).
344
Segundo José Augusto MORAES (2004), a Belgo-Mineira exercia forte pressão sobre os posseiros a fim de que estes ou
vendessem suas propriedades ou se dedicassem à produção de carvão.
345
Formado em arquitetura pela Universidade Federal de Minas Gerais em 1938 e pós-graduado em urbanismo (1967)
Raphael Hardy Filho, além de atuar profissionalmente como arquiteto, com obras ligadas a indústrias (Companhia
Armazém e Silos do Estado de Minas Gerais, Usina de Furnas, Centro de Abastecimento de Belo Horizonte, Refinaria
Gabriel Passos e USIMINAS) e como superintende técnico da COHAB-MG, lecionou na Escola de Arquitetura da UFMG,
onde foi chefe do departamento de planejamento urbano e coordenador do curso (HARDY FILHO, 1970) constituindo,
juntamente com Shakespeare Gomes, Sylvio de Vasconcellos e Eduardo Mendes Guimarães, a segunda geração de
professores, não mais vinculada a tradição clássica, mas fortemente comprometida com os ideais modernos (OLIVEIRA, &
133
se pelo dimensionamento do conjunto de edificações a ser construído. Considerando-se que somente a
operação da usina exigiria cerca de 5.000 trabalhadores (uma média de 10 homens para cada 1.000, de
um total pretendido de 500.000 toneladas anuais), aos quais seriam somados os trabalhadores
empregados na sua construção e aqueles ocupados em atividades complementares (comércio e
serviços), levou-se em conta também que parte deste contingente se alojaria nas cidades vizinhas
(Coronel Fabriciano e Timóteo), chegando a uma população total de cerca de 40.000 habitantes
346
para
1960 e que em 1975 deveria atingir 150.000
347
.
O plano de Hardy tinha como objetivo lançar as diretrizes de planejamento urbano da cidade,
permitindo que a iniciativa privada passasse a atuar cada vez com maior intensidade, segundo ele “O
planejamento urbano e a arquitetura teriam, pois que permitir um desenvolvimento somente limitado
por algumas diretrizes básicas sobre as questões relativas ao uso do solo urbano.” (H
ARDY, 1970:
38), de modo que evitaria incorrer no “paternalismo” reinante em outras unidades construídas e
geridas por empresas
348
.
A exemplo de Brasília
349
, as 4.000 residências programadas, distribuídas em nove bairros
350
interligados por um sistema viário amplo e veloz, funcionariam como “unidades de vizinhança”,
compondo uma estrutura urbana formada a partir de dois eixos principais. Organização que permitia
localizar os bairros em áreas mais baixas e planas, preservando a vegetação dos morros, que serviria
de barreira natural à poluição sonora e atmosférica gerada pela usina.
Embora o plano tenha sido implantado quase na integra (até 1970 haviam sido edificadas cerca de
3.270 moradias, com contornos se não idênticos, muito próximos dos projetados por Hardy) e embora
o resultado geral seja bastante satisfatório, seu planejamento apresentou falhas, algumas bem graves.
A principal delas refere-se a um equivoco no cálculo de direção dos ventos, considerados como
soprando de sudeste para noroeste (SE-NW) quando na verdade deslocam-se preferencialmente na
direção NNE-SSW (V
ASCONCELOS, 2002), o que rompeu o esquema de proteção fundamentado no
binômio morro-vegetação, tornando os bairros destinados a gerentes e técnicos (Castelo e Cariru)
351
alvos diretos dos efeitos maciços da poluição atmosférica produzida pela industria. Outro aspecto no
qual o plano de Hardy falhou diz respeito à polarização das atividades nos bairros Cariru e Horto, onde
PERPÉTUO, 2005), como é possível observar no estudo de Hardy para pré-fabricação da moradia, vendo-a como um bem de
consumo, não de raiz (H
ARDY FILHO, 1971).
346
Destes, 8.200 seria a população ativa, da qual 6.000 estariam empregados diretamente pela USIMINAS (HARDY FILHO,
1970).
347
Calculo que, se a principio pareceu superdimensionado, chegando a 1960 com pouco mais de 9.000 habitantes, mostrou-se
bastante realista com a população de 1980 atingindo pouco mais de 150.000 (www.ibge.gov.br)
348
Levando-se em conta que o apelo paternalista fundamenta-se na constituição de uma comunidade que funcione como uma
família, onde o pai é o patrão e os filhos, obedientes e submissos, são os empregados, H
ARDY FILHO (1970: 40) parece não
ver contradição entre a eliminação deste sistema e a constituição de uma comunidade, afirmando ao final do texto que esta
é uma cidade “onde as famílias vivem e labutam em paz e com a tranqüilidade de saber que, ela e a vizinhança, são donos
de seus próprios destinos, donos de suas próprias casas, e todos fazem parte de uma só comunidade, de uma só família.
349
As referencias à Brasília vão além da inspiração, uma vez que o projeto foi também submetido à aprovação de Lucio
Costa, cujo aval foi amplamente alardeado.
350
Os nove bairros que constavam do plano inicial eram: Horto, Cariru, Castelo, Imbaúbas, Bom Retiro, Novo Cruzeiro,
Ideal e Vila Ipanema.
351
A hierarquização dos bairros, muito evidente na cidade, foi justificada por Raphael HARDY FILHO (1970) como
conseqüência da
134
foram projetados centros de comércio e serviços de maior porte, que se encontram quase abandonados,
como o amplo centro comercial do Cariru e do Horto, onde se estabeleceram apenas algumas agências
bancárias. De modo que, a pretensão de evitar o congestionamento da área central, viu-se frustrada,
sendo exatamente no local do antigo povoamento, uma região que não fora objeto de planejamento da
empresa, que se concentrou o número mais expressivo de estabelecimentos comerciais e serviços, bem
como a prefeitura, biblioteca municipal e do Fórum, etc.
O direcionamento do crescimento da cidade também acabou fugindo do que fora planejado, o que se
deu não tanto por qualquer erro na previsão da intensidade de crescimento populacional, já que os
150.000 habitantes previstos para 1975 foram atingidos somente em 1980, mas pelo abandono de
planejamento no seu período de maior crescimento.
População Residente no Município de Ipatinga (habitantes)
1 960 1 970 1 980 1 991 2 001 2 004
9 114 47 882 150 322 187 418
206 338 229.133
Fontes: IBGE, 2000
O que não quer dizer que o mercado imobiliário não tenha representado papel primordial na atual
configuração da cidade. Ocorreu exatamente o oposto, com poucas terras disponíveis, visto grande
parte pertencer à USIMINAS e o restante estar concentrado nas mãos de poucos proprietários
352
, e um
poder público ainda pouco estruturado, predominaram duas formas de ocupação que chamarei
“espontânea” e “imobiliária”. A primeira ocorria sem qualquer tipo de controle ou planejamento, como
ocorreu ao redor do centro e no Bom Jardim, sendo a segunda conduzida pelos grandes proprietários e
marcada pela especulação imobiliária, especialmente nas décadas de 1970 e 80, quando se formaram
loteamentos distantes e desligados da malha existente, promovendo a valorização das áreas
intermediárias (Cidade Nobre, Vila Formosa, Limoeiro e Veneza). Segundo Sueli
VASCONCELOS
(2002), a terceira etapa na urbanização de Ipatinga ocorreu nas décadas seguintes quando as áreas de
risco em encostas e várzeas passaram a ser ocupadas
353
.
Esta estrutura fundiária dicotômica acabou por gerar o que Tânia B
RAGA (1997:47) chamou de
“cidade dual”
354
, ou seja, uma cidade produzida pela industria e outra pelo mercado imobiliário
355
.
Uma divisão que ao invés de instigar o incremento dos patrões urbanísticos, com o mercado tentando
igualar os padrões oferecidos pela indústria, somente fortaleceu o papel da habitação como elemento
de barganha e controle por parte da empresa, pois a baixa qualidade dos novos loteamentos ressaltava
as vantagens e camuflava as desvantagens do emprego fabril.
352
A concentração fundiária em Ipatinga pode ser sentida
353
A primeira etapa dizia respeito ao povoado ao lado da ferrovia, a segunda à chegada da USIMINAS, havendo ainda uma
quarta iniciada nos anos noventa, quando começam a proliferar edifícios com mais de oito pavimentos no Horto e Cidade
Nobre (VASCONCELOS, 2002).
354
Para a autora a história da cidade pode ser dividida em três fases: Pré-urbana, dual e cidadã (BRAGA, 1997).
355
A concentração de terras nas mãos de poucos grandes proprietários se refletiu na formação do mercado imobiliário da
cidade, que acabou sendo completamente dominado por ele, verificando-se que somente, “uma delas [família proprietária]
foi responsável por 40% de todos os lançamentos imobiliários feitos no município desde sua fundação até 1991 (BRAGA,
1997).
135
A postura da empresa quanto ao controle urbanístico da cidade, embora embasada por um discurso
liberal é marcada pela ambigüidade. Ambigüidade que se evidencia ao considerar a intenção inicial de
fazer da “cidade da empresa” uma “cidade aberta” e promover uma rápida desvinculação das questões
urbanas, o que se confirma com a implantação de um programa de venda das casas aos funcionários já
em 1964 (H
ARDY, 1970), mas que é posta em cheque pela garantia de preferência na compra do
imóvel incluída no contrato de venda, permitindo que a empresa mantenha em seu poder um valioso
instrumento de controle sobre os destinos da cidade.
No entanto, enquanto o controle do espaço logo passou a ser feito de forma mais sutil, o operariado foi
sempre vigiado com mão de ferro. Mesmo não havendo uma política declarada de formação do
trabalhador que implicassem em punições devido à má conduta, a proximidade da direção da usina
com as autoridades locais fazia da policia uma extensão dos fiscais da fábrica. Um episódio que
marcou a história local, foi o massacre de 1963, quando o confrontamento com a polícia resultou na
morte de sete pessoas
356
Assim, o descontentamento quanto as condições de trabalho e moradia
oferecidas, especialmente nos primeiros anos de funcionamento, tinham pouco espaço para ocorrer,
havendo relados de coações e espancamentos. E se, fundiariamente a cidade não era tão aberta quanto
se pretendia, José Augusto M
ORAES (2004: 44) afirma que fisicamente ela também não o era, sendo
que até pouco antes da emancipação, “A cidade era divida ao meio por uma extensa cerca de arame
farpado. Só deixaram uma passagem de largura de um caminhão, por onde passavam os habitantes
naturais de Ipatinga em direção a Coronel Fabriciano.
357
Esta segregação, no entanto, era apenas
mais uma que os habitantes do antigo povoado tinham que enfrentar, vendo-se privados de desfrutar
356
Dentre os pesquisados, o relato do massacre que contem mais detalhes é de José MORAES (2004). Segundo ele, ocorreu
que, os empregados da USIMINAS, já descontentes com as péssimas condições de vida (baixos salários, má alimentação
no restaurante da empresa e precariedade dos alojamentos), se rebelaram contra a proibição de levarem o leite da merenda
noturna para a casa (uma represaria a suspeita de roubos dentro da fábrica), sendo então presos e espancados pela polícia
militar local. Agressão que levou a um pique no dia seguinte em frente ao portão principal, quando a dificuldade em
dispersar a multidão fez a polícia abrir fogo, atingindo tanto os operários quanto transeuntes, entre eles uma menina de três
meses.
No entanto, há outras versões, como a encontrada no Metasita 53 anos (M
ETASITA, s.d.3), que embora também afirme tratar-
se de um protesto dos funcionários a violência que vinham sofrendo, na primeira ela era justificada por roubos na usina,
enquanto que nesta ela era uma tentativa de reprimir o nascimento do movimento sindical na cidade: “Havia, entretanto
uma resistência muito grande por parte da diretoria da empresa. Revoltados com as péssimas condições de vida e o
tratamento desumano da empresa, os operários decidem não mais ficarem coniventes com a situação e lotam a assembléia
do dia 6 de outubro para reivindicarem. No mesmo dia, alguns que chegavam para trabalhar e outros saindo do turno se
depararam com policiais que os revistaram e espancaram sem piedade. Cansados com toda aquela circunstância em que
se encontravam no momento, eles partem para uma movimentação agitada, onde serão sufocados a bala de fuzil e
metralhadoras que dispararam por mais de quarenta minutos; os protagonistas dessas cenas é uma tropa de policiais
militares. O episódio passa a ser conhecido como “O Massacre de Ipatinga”, deixou um saldo de dezenas de mortos e
centenas de feridos. No final, os operários ainda foram considerados réus provocadores, enquanto os soldados foram
apenas afastados da corporação e os oficiais promovidos pelos “bons serviços” prestados ao regime militar.
Outras versões defendem que os conflitos se originaram quando a USIMINAS, a fim de impedir o livre transito de seus
funcionários à ACESITA, onde se localizava a sede do sindicato, instalou uma cerca de arame farpado e manteve um vigia
que permitia somente a passagem de funcionários devidamente identificados com um crachá, os que não o apresentassem
perdiam direito a remuneração, tendo sido uma discussão com um vigia exatamente devido a falta do dito crachá o estopim
que deu origem a discussão da qual o “massacre” foi o resultado (depoimento de José Deusdedity R
UEDA & NAHAS JR.,
1991). A proibição de sair com o leite oferecido dentro da usina e o estado precário dos alojamentos também aparecem
como elementos tidos como gatilhos do conflito (depoimento Jorge Noman in RUEDA & NAHAS JR., 1991), o que indica
que, para indivíduos diferentes pode ter havido motivações diferentes, demonstrando que para o operariado ipatinguense a
situação era tão sensível e se tornara tão insuportável que qualquer pequeno desentendimento poderia gerar um conflito de
grandes proporções, como realmente ocorreu.
357
Segundo Sueli VASCONCELOS (2002: 95) a construção da cerca ocorreu devido a intensificação do crescimento
desordenado da área central, enquanto para Tania B
RAGA (1997: 55) ela foi uma representação do descaso da Usiminas
com o poder municipal, que recém constituído, via seu acesso à área cerceado.
136
tanto das benfeitorias construídas pela usina
358
quanto dos benefícios provenientes da significativa
receita gerada pelos impostos industriais, devido ao descaso com que a prefeitura de Coronel
Fabriciano tratava um de seus distritos mais promissores. O descontentamento com esta condição
levou a criação da Sociedade Amigos de Ipatinga, com a finalidade de lutar pela emancipação do
município, conquistada em 1964. (D
IÁRIO DO AÇO, 1999; MORAES, 2004; USIMINAS, 1990).
Embora a emancipação do município tenha sido um passo importante na redução do controle da
USIMINAS sobre Ipatinga, ela pouco avançou até que entrassem em cena outros agentes, com
destaque para a Igreja, a CENIBRA, o sindicato
359
e principalmente, o fortalecimento do poder
municipal viabilizado pelas mudanças da Constituição de 1988 (B
RAGA, 1997)
360
. Assim, foi só na
década de 1980, que a cidade passou a se organizar mais independentemente da usina, possibilitando
um encurtamento nas distâncias entre o que fora obra da indústria e o que não fora, entre aqueles
vinculados à ela e os não.
No entanto, esta aproximação não significa que cessaram as dicotomias, nem os conflitos, a presença
da empresa ainda é fortemente sentida, seja nos planos de organização espacial, quanto social e
econômica. Uma cidade que entre outras coisas herdou da indústria um elevado índice de área verde
por habitante (127m
2
/hab), um pungente desenvolvimento econômico (tornando-se pólo regional),
possuindo clubes, parques, teatros, escolas e hospitais que lhe conferem um índice de desenvolvimento
humano de 0,8 (P
REFEITURA MUNICIPAL DE IPATINGA, s.d.), também recebeu da industria boa parte da
poluição que vem degradando seus rios, da população que tomou sua periferia e o desarranjo das
condições ambientais em toda uma região.
358
Ilustrando esta diferença Tânia BRAGA (1997) demonstra que ainda em 1989 enquanto as áreas construídas pela usina
tinham índices de infra-estrutura muito próximos de 100%, a cidade pública a média para abastecimento de água era de
75,65%, para rede de esgoto 67,35%, serviço de energia elétrica 91,65 e telefonia 35,9%.
359
O papel da igreja católica foi no sentido de conscientização dos direitos, com padres franciscanos da Pastoral Operária
auxiliando na organização de grupos de luta por melhores condições de habitação e trabalho. Já a CENIBRA influenciou
esta guinada pelo impacto econômico de sua implantação, enquanto o sindicato, embora o que se formou na cidade seja
claramente “patronal”, auxiliou na formação de lideranças (como Chico Ferramenta eleito prefeito duas vezes) (B
RAGA,
1997).
360
O impacto da privatização da Usiminas parece não ter sido tão drástico como em outras cidades, devido principalmente a
dois fatores: desde o início da década de 1980 ela vinha buscando reduzir o quadro de funcionários com programas de
produtividade e formação, e como a privatização houve uma pulverização do controle acionário da empresa, com
participação dos empregados em mais de 10% de seu controle acionário, o que levou a decisão de reduzir o quadro
funcional através de programas de demissão voluntária, gradualmente implantado somente a partir de 1995 (USIMINAS,
s.d.; P
EREIRA, 2000). Além do que, é importante salientar, que no momento de sua privatização a Usiminas já encontrava-
se financeiramente saneada, por este motivo escolhida para iniciar o programa de privatização das siderúrgicas brasileira
(DURANTE, 1999).
137
Fig. 112: Vista geral
(VASCONCELOS, 2002)
0 1Km
IPATINGA
N
N
ÁREA INDUSTRIAL
ÁREA RESIDENDIAL
CENTRO ANTIGO
ÁREA DE LAZER
LAGOA
Á
REA COMERCIAL
Fig. 111: Área do projeto
Fig. 109-110: Projeto, implantação e perfil
(HARDY, 1970)
Fig. 113: A modulação das residências
(HARDY, 1971)
138
0 2.5Km
0 6.1Km
USIMINAS
ACESITA
MUNICÍPIO
FAZENDA BETHÂNIA
FAZENDA PRATO RASO
F
AZENDA FERNANDES
Fig. 125: Vista geral
(AURTORA, 2004)
Fig. 114: propriedade fundiária
(BRAGA, 1997)
Fig. 115-116: A cidade e a área da USIMINAS
(GOOGLEARTH)
Fig. 117-118: O centro
(AUTORA, 2004)
Fig. 119-124: Habitações
(AUTORA, 2004; HARDY, 1790)
139
III.2.4 OURO BRANCO
Como colocaram Heloisa e Geraldo Costa (C
OSTA & COSTA, 1997), a história da Açominas pode ser
contada de duas formas, uma que inclui seu projeto nas expectativas mineiras de cumprir sua vocação
histórica tornando-se sede do parque siderúrgico brasileiro e outra que vincula seu projeto aos planos
nacionais de desenvolvimento do regime militar. Isto porque embora as primeiras decisões relativas a
construção de uma grande siderúrgica no Vale do Paraopeba datassem do governo de Arthur
Bernardes (decreto de 09/jan/1924), somente em 1966 ela começou a se efetivar
361
. Ainda assim,
segundo G
RECO (1984) o projeto só saiu do papel e, com as dificuldades financeiras posteriores, não
foi abandonado durante seu período de maior crise, devido à presença de um de seus “pais” na vice-
presidência da república
362
. Com a aprovação do CONSIDER (Conselho Nacional de Siderurgia), em
1975, e determinação do local de sua implantação, uma área a menos de sete quilômetros do núcleo
urbano da cidade de Ouro Branco no Vale do Paraopeba, estabeleceu-se um convênio entre o Governo
do Estado de Minas Gerais, o município de Ouro Branco
363
e a Açominas que determinou a
contratação da Fundação João Pinheiro (FJP)
364
para elaborar o Plano de Desenvolvimento Urbano
para a localidade (R
ESENDE, 1979).
Concebido num momento em que a construção de um “Brasil grande” parecia se concretizar através da
implementação de ambiciosos projetos de infra-estrutura, concebidos também como indutores do
desenvolvimento local, esperava-se que a AÇOMINAS cumprisse este papel. As modificações
econômicas e sociais esperadas para a região impactada tiveram como base os levantamentos
referentes ao Vale do Aço realizados pela FJP, predominando uma visão bastante otimista quanto ao
crescimento da região. Um exemplo deste otimismo pode ser verificado no trabalho de Adriana
R
ESENDE (1979)
365
cujos cálculos mais pessimistas para o crescimento populacional induzido pela
361
Desde de 1963 havia uma solicitação dos dirigentes do Estado de Minas Gerais, junto ao Conselho Nacional de Siderurgia
para aprovação da instalação de uma usina siderúrgica no vale do Rio Paraopeba, autorização que foi homologada somente
em 1975, através da resolução nº 31/75 do CONSIDER, de outubro de 1975. (RESENDE, 1979)
362
Segundo o autor: “A Açominas é um projeto polêmico desde o seu início, pois com exceção do Boverno de Minas Gerais,
de suas classes produtoras e de Ernesto Geisel e seu Ministro da Indústria e do Comérico, Severo Gomes, todos foram
contra sua implantação.”, o período mais crítico, quando o projeto quase para é o início dos anos 1980, quando Aureliano
Chaves era vice do General Figueiredo (
GRECO, 1984: 343).
363
A escolha de Ouro Branco foi justificado pela oferta de ampla infra-estrutura de transporte existente (ligação com os
principais mercados consumidores nacionais e portos para importação do carvão e exportação da produção), proximidade
das fontes de matéria prima (minério) e também por se inserir nos planos governamentais de desconcentração industrial.
(
AÇOMINAS, 1980)
364
A Fundação João Pinheiro é uma entidade do Governo de Minas Gerais, voltada para a realização de projetos de pesquisa
aplicada, consultorias, desenvolvimento de recursos humanos e ações de apoio técnico ao Sistema Estadual de
Planejamento e demais sistemas operacionais de Minas, nas áreas da administração pública e privada, economia, estudos
históricos, culturais, municipais e político-sociais. Criada pela Lei 5.399 de 12 de dezembro de 1969, seu nome é uma
homenagem a João Pinheiro da Silva
, político e ex-governador de Minas Gerais de 1906 a 1908, pai de Israel Pinheiro, que
governava Minas Gerais na época da criação da FJP. (F
UNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, s.d.)
365
O trabalho de Adirana RESENDE (1979) tem por objetivo verificar quais os possíveis impactos da Açominas na estrutura
agrícola da micro-região. A autora conclui que, embora desde a década anterior venha-se verificando uma progressiva
estagnação do setor agrícola, com a redução da área cultivada e um aumento nas pastagens, esse processo se intensificará
devido ao aumento do valor da terra, com conseqüente fracionamento das propriedades e desestimulo a investimentos em
tecnologia. No entanto, apesar deste caráter negativo, sua visão geral é otimista, acreditando que haverá um rearranjo dos
pequenos produtores, os quais buscarão formas de incrementar a produção e assim suprir o crescente mercado consumidor
local, um mercado ampliado pelos demais setores produtivos, cujo desenvolvimento propiciara tanto um aumento no poder
aquisitivo, quanto uma melhor distribuição de renda.
140
industria, previam uma população em torno de 115.000 habitantes para o ano de 1990
366
e a
proporcional inversão da relação rural x urbana, enquanto as previsões seguindo a tendência histórica
computavam pouco mais de 25.000 habitantes e uma quase igualdade entre população rural e urbana
(vide AnexoI_ tab06).
Mesmo sem que estas cifras jamais tenham sido atingidas
367
, as transformações provocadas pela
Açominas na pacata cidade de Ouro Branco
368
foram imensas, a cidade que vivia da produção da
batata
369
, milho e feijão, com mais de 60% da sua população vivendo no campo, passou a viver
basicamente de atividades urbanas, verificando-se pelos dados divulgados pelo IBGE para o ano de
2004, que 99,92% da sua população encontra-se ocupada em atividades urbanas, sendo 37,4%
empregadas diretamente na indústria de transformação, ou seja, dos 13% da população que permanece
na área rural, menos de 1% ainda é capaz de tirar dela seu sustento
370
.
A referência aos problemas enfrentados no Vale do Aço, levou os planejadores a buscar um controle
ainda maior sobre o desenvolvimento de toda a cidade, implicando na aquisição de áreas destinadas
não somente à construção da usina e da cidade operária, mas também um cinturão verde e áreas
agrícolas
371
, num total de 12.864,83 hectares desapropriados e adquiridos pela companhia
372
(A
ÇOMINAS, 1980b)
373
. A área objeto do plano foi então, dividida em quatro zonas funcionais: urbana,
industrial, agrícola e de preservação
374
, sendo a urbana novamente divida, agora em setores, dezenove
ao todo, sendo nove reservados para futuras expansões, preservando o núcleo antigo e evitando a
degradação das matas e dos recursos hídricos das imediações.
366
As previsões mais otimistas consideravam uma população de 60.000 para 1980 e 180.000 para 1990, gerando 4.000
empregos diretos e 40.000 indiretos somente na primeira fase. (
AÇOMINAS, 1980)
367
Em julho de 2005 a população de Ouro Branco contava 32.237habitantes (IBGE, 2000).
368
O povoado de Santo Antônio de Ouro Branco foi fundado em fins do século XVII, provavelmente no ano de 1664, como
conseqüência do processo de ocupação iniciado com as primeiras bandeiras que, subindo o Rio das Velhas à procura de
ouro, desbravaram a região, assentando-se ao pé da Serra do Ouro Branco, também denominada, à época, Serra do Deus
Te Livre” (R
ESENDE & SASSAK, s.d.). Sua denominação deveu-se a distinção da coloração clara do ouro encontrado nesta
localidade em comparação com o de Ouro Preto, o arraial tornou-se freguesia em
1724, em 1911 aparece como distrito de Ouro
Preto, conquistando a condição de município em 1953 (C
ARVALHO, 1998).
369
No período aurífero o povoado se firmara pela produção alimentícia, impossível no terreno pedregoso de Ouro Preto,
iniciando em meados do século XIX a produção de vinhos, tornando-se inclusive sede da Companhia de Vinhos Nacionais.
Já no início do século XX, a batata, introduzida pelo português Álvaro José dos Santos e seu associado, o comerciante
Diogo Mendes dos Reis, passou a caracterizar a agricultura da cidade, tornando-se, na década de 40, a maior produtora de
batatas do Estado (R
ESENDE & SASSAK, s.d.).
370
A redução na área plantada, embora baseada em estimativas quanto à pecuária, apresenta uma sensível redução com
relação aos valores de 1970, observando-se que a área atual corresponde a menos de 14% do que fora antes da implantação
da Açominas, passando de 16.680 ha em 1975 (área de estabelecimentos agropecuários em R
ESENDE, 1979) para 2.330 ha
em 2004.
371
Que caso estivesse inserido totalmente em Ouro Branco corresponderiam a quase 50% de toda sua área urbana.
372
As áreas pretendidas extrapolavam em muito a área direta de intervenção da companhia, foram então declaradas de
utilidade pública e desapropriadas. Desapropriações justificadas pela necessidade de garantir o sucesso do plano como um
todo, evitando que especuladores se aproveitassem do desenvolvimento local para empreender de forma irresponsável.
Estas desapropriações foram um dos fatores que causou maior descontentamento da população local, que também se sentia
inferiorizada diante dos novos moradores. Dificuldades que levaram a manutenção de diferenças sociais e a
impossibilidade de cumprimento do ideal de integração entre a comunidade local e o operariado (P
EREIRA, 1992)
373
Adquiridos de 322 proprietários, num processo que embora a empresa afirme ter buscado tornar “evitar agressão aos
proprietários das terras envolvidas, contornando as ações judiciária, através a negociação direta.” (A
ÇOMINAS, 1980b:
12), deixou marcas profundas na comunidade, como pode ser observado pelos depoimentos colhidos por Doralice P
EREIRA
(1992).
374
Centro do antigo povoado, que possui um igreja ainda do período colonial e a “Estrado do Ouro”, caminho que segue até
Ouro Preto e possui um conjunto de pontes de pedra edificadas por escravos durante os séculos XVII e XVIII.
141
A intenção era que a construção da cidade acompanhasse as fases de implantação do empreendimento
industrial, previsto para ser executado em três fases, de modo que no final da primeira deveriam ter
sido construídas em torno de 5 mil habitações
375
. Estas construções, no entanto seriam capazes de
abrigar somente uma parcela da população estimada em 60.000 habitantes, era esperado que o restante
fosse suprido pelo mercado imobiliário local, de tal forma que se procedia a “... urbanização do dobro
de terrenos necessários para moradia dos empregados da Açominas, colocando-se à venda, para
terceiros, os lotes não utilizados” (A
ÇOMINAS, 1980b). Procedimento que visava afastar Ouro Branco
do estigma das comunidades fechadas geridas por empresas
376
através da promoção de condições
propícias ao desenvolvimento do mercado imobiliário (que auxiliava ainda liberando a indústria de
encargos com a construção urbana) e à integração do novo contingente populacional com os antigos
moradores. Contudo, se integração e diversidade eram pré-requisitos para a manutenção do caráter
“aberto” da cidade, a hierarquização dos bairros retomava padrões comuns á núcleos fechados, onde a
hierarquia da fábrica se via refletida no desenho urbano, destinando-se os setores mais próximos da
usina, 8 (Metalúrgicos, 1º de Maio, Bandeirantes e São Francisco), á população de renda baixa e
média, o setor 10 (Pioneiros) à média e alta, o setor 4 (Siderurgia) à média, 17 (Inconfidentes) à alta,
ficando o setor 3 como centro principal.
Para dar conta de um projeto tão ambicioso foram feitos vultuosos financiamentos externos
377
e em
1976 iniciaram-se as obras de construção da usina e da cidade
378
. No entanto, as dificuldades
financeiras porque passou todo o país na década de 1970 e a falta de vontade política nos anos 1980
(G
RECO, 1984), levaram a um atraso de quase dez anos na construção da usina
379
e, com o
encerramento da primeira etapa de construção da cidade em 1986, a companhia buscou repassar os
financiamentos diretamente aos funcionários através da Caixa Econômica Federal e da Caixa
Econômica de Minas Gerais da empresa e
“A partir de então, a política empresarial da AÇOMINAS em relação a seus funcionários se restringirá a
programas de creche para filhos menores de seis anos, de alimentação ... e transporte grátis para o trabalho
dos que residem em Ouro Branco, Congonhas e Lafaiete.” (PIQUET, 1998: 109)
Deste momento em diante a prefeitura passou a atuar como principal agente conformador do espaço,
uma atuação que conta, no entanto, com o aval da companhia, que buscou manter funcionários nos
mais elevados escalões da administração municipal
380
e deter grande parte das terras das vizinhanças.
Assim, este “... ‘último capítulo, da história contemporânea da produção do espaço urbano sob a
grande indústria,” (C
OSTA & COSTA, 1997), tem desdobramentos, pois embora a presença do Estado
como promotor de condições favoráveis à produção e a reprodução da força de trabalho tenha se
375
Sem contar os acampamentos de madeira para abrigar cerca de 21000 (vinte um mil homens)
376
Também desde o plano inicial a empresa deixou claro seu afastamento, responsabilizando-se somente pela urbanização
dos lotes destinados ao comércio e serviços, que deveriam ser adquiridos e edificados pelos interessados. As áreas de lazer
e recreação ficariam a cargo da comunidade, cabendo a ela somente um certo incentivo e apoio (AÇOMINAS, 1980b)
377
Sua composição acionária inicial era a seguinte: 40% da USIMINAS, 20% da CVRD, 20% do Tesouro Nacional do
Estado de Minas Gerais e 29% (sic) de fornecedores estrangeiros (P
EREIRA, 1992)
378
Os primeiros bairros a serem construídos foram: Siderurgia, Pioneiros, Inconfidentes e Primeiro de Maio.
379
Até os últimos anos da década de 1990, havia-se implantado somente as duas primeiras etapas deste cronograma. – ver
após privatização.
380
Um exemplo desta “camaradagem” é a edificação de um complexo de lazer próximo ao centro antigo, num amplo terreno
doado pela empresa, parte do “Projeto Integração”
(PIQUET, 1998).
142
reduzido sensivelmente, após o processo de privatizações e pelos avanços tecnológicos, a mão forte da
indústria ainda pode ser sentida na construção do espaço urbano e na formação do trabalhador. O que
se pode verificar pelo controle que ainda exerce sobre o mercado de trabalho de algumas cidades,
como em Ouro Branco, onde das 5.338 pessoas ocupadas na industria de transformação, 4.000 são
empregados diretos da Açominas, ou seja, mesmo após a privatização (1993) a usina responde sozinha
por mais de 78% dos empregos no setor industrial e quase 30% de todo pessoal ocupado (IBGE,
2000). Outra forma de controle se dá através do engajamento em projetos de desenvolvimento local,
mesmo em áreas completamente distantes do seu “business core”
381
, como o projeto de Parceria Rural
implementado nas áreas da empresa para as atividades de reflorestamento, pecuária e agricultura, pois
ao ceder em arrendamento módulos de terra aos pequenos empresários rurais da região, que devem
então receber orientação técnica a fim de implementar técnicas de manejo sustentável, garantem a
preservação e valorização de seu próprio patrimônio, além de, como ela mesma reconhece ... também
auxilia na manutenção do adequado distanciamento das atividades industriais em relação as áreas de
ocupação urbana.”, evitando conflitos quanto a emissão de poluentes (AÇOMINAS, s.d.).
Com relação à organização espacial, se por um lado a influência da AÇOMINAS em Ouro Branco
permitiu a manutenção de uma certa qualidade urbanística, por outro ela constituiu-se num empecilho
à livre atuação do mercado imobiliário, presente na proposta inicial. Além do que, há que se admitir a
existência de falhas inerentes ao próprio plano, destacando-se entre ela o superdimensionamento, ou
ainda o excessivo distanciamento entre os setores. Assim, se por um lado os limites rigorosos para
urbanização dos setores, o amplo e hierarquizado sistema viário e as distancias entre os bairros,
possibilitava manter um certo controle sobre seu crescimento, por outro, com a frustração das
estimativas projetadas a cidade parece marcada por imensos vazios, as avenidas parecem grandes
demais, os bairros distantes demais e o que era para ser terra de todos, parece terra de ninguém.
381
Investimentos em cultura e lazer também são comuns, além dos recentes cuidados com questões ambientais, que
independentemente do retorno que podem trazer em termos financeiros e vinculação de uma imagem positiva,
indubitavelmente representam uma melhoria nas condições de vida local.
143
N
0 600m
N
N
0 600m
OURO BRANCO
N
Fig. 126-127: Localização e implantação
Fig. 128: O centro antigo
(CASTRO, 1997)
Fig. 129: Os setores
Fig. 130-132: Vista geral dos bairros
(AÇOMINAS, 1980b)
144
Fig. 133: Paisagem da cidade
(CAMARA MUNICPAL DE OURO
BRANCO
, s.d.)
Área de preservação
Área de exploração agrícola
Área de exploração pecuária
Área de reflorestamento
s/escala
N
Fig. 134: Zoneamento do município
Fig. 135: A área urbana do município
(GOOGLEARTH)
Fig. 136: O centro antigo
(AUTORA, 2003)
Fig. 137-139: Habitações
(AUTORA, 2003)
Fig. 140-141: Os centros comerciais
(AUTORA, 2003)
Fig. 142: vista geral
(AUTORA, 2003)
144
Capítulo IV: O PÚBLICO E O PRIVADO NA CONSTRUÇÃO DA CIDADE DE TIMÓTEO
Fig. 143: Monumento SINERGIA de Vilma Nöel
(cartão postal)
Hino de Timóteo
Timóteo dos meus sonhos
És o meu berço natal
Pensando em ti é que componho
Toda expressão do meu ideal.
Terra de riqueza cheia de encantos mil
És uma estrela engatada a brilhar
No coração do meu Brasil!
Terra de lindas montanhas
Onde a brisa adquire o perfume
Por isso que causas até,
As terras vizinhas
Inveja e ciúme.
Berço dos bons timotenses
Terra é meu lindo rincão
Prá saudar-te é que faço
Esta marcha que nasce
Do fundo do meu coração.
Será que tu recordas como eu
Daquela tarde de abril
Em que Timóteo se emancipou
Para ao Brasil.
Teu sino alegre sempre a badalar
E os brotinhos sempre em flor
Tu é a mais linda inspiração
De um trovador.
Minha cidade querida
O sonho de minha vida
Eu hei de sempre te amar
Eu hei de sempre te amar.
Teu povo bem ouvida
Seria ingratidão.
Havemos sempre de o ter
No coração.
Mas se algum dia eu daqui me for
E não voltar a ti rever
Lembrar- te-ei com todo meu amor
Até morrer.
Rita Erlene Martins Gomide
(Pasta Timóteo-história – Biblioteca Municipal de Timóteo)
146
IV.1 DE TIMÓTEO A ACESITA: A FORMAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DE UMA CIDADE
Como o presente, a cidade compõe-se de uma sucessão de passados, de tal forma que seus espaços são
mais do que o que ora aparentam, pois embora cada fragmento urbano guarde sua história, seu
conjunto é lido e vivido de forma diversa ao longo do tempo. Assim, a história da cidade se conta não
somente pelas transformações de seus espaços e edifícios, mas pela re-semantização do léxico urbano,
uma leitura constantemente atualizada pela sua imersão em novos contextos e pela emergência de
camadas soterradas pelo tempo.
Ao descortinar aspectos esquecidos, esta dinâmica enriquece a leitura do presente e atualiza o passado,
de tal modo que, mais do que expor todas as camadas do tempo, neste trabalho busca-se conhecer a
cidade de Timóteo, revelando os fatores que deixaram marcas mais profundas, aqueles que penetraram
grande número de camadas e causaram transformações que podem ser sentidas até hoje, imprimindo
no presente reminiscências de diversos passados.
É neste sentido que se buscou detectar na história de Timóteo tanto os eventos mais significativos no
relacionamento entre a indústria e a cidade, quanto os tempos dos quais se tornaram representativos.
Num quadro amplo, a história da cidade e seu relacionamento com a companhia podem ser divididos
em dois períodos, verificando-se num primeiro um intenso esforço de identificação e coexistência
entre ambas, traduzido num movimento cujo objetivo era aproximar e identificar a cidade à indústria,
Timóteo à ACESITA. No entanto, com o passar do tempo observa-se a inversão deste movimento,
com a abertura da cidade legalizando esta tendência e o plebiscito para decisão do nome da cidade
oficializando que Timóteo não é ACESITA, mas ACESITA é Timóteo.
Aprofundando a análise destes dois grandes períodos, chega-se a quatro tempos, três deles tratados na
primeira parte do capítulo, relativa ao período de grande identificação entre cidade e empresa, e o
quarto na segunda, quando a separação entre elas é mais nítida. O primeiro é o tempo dos “pioneiros”
que tem como marco a chegada de uma grande empresa industrial próxima a um pequeno povoado e
como figura-chave “doutor” Alderico. O segundo tempo é marcado pela intensificação da construção
da cidade operária e ampliação da usina, quando se destaca o General Edmundo Macedo Soares
382
; é o
período em que se consolida a identidade local fundamentada numa forte coesão social. O terceiro
tempo corresponde ao momento de consolidação da consciência cívica da população local, quando a
desvinculação entre cidade e empresa, legalmente representada pela “abertura da cidade”, ganha
sentido de fato, pipocando greves e manifestações em oposição à usina. Alterações de ordem
tecnológica e gerencial marcam o quarto tempo, quando a relação entre cidade e indústria aparece
mediada por instituições públicas e embalada pela questão ambiental.
A fim de fazer uma leitura tanto factual quanto perceptiva destes tempos, busca-se construir para cada
um deles uma imagem que agrega dados e impressões extraídos de documentos e memórias. Esta
imagem deve ser vista como uma fotografia do passado tirada no presente; seu valor não reside tanto
382
A escolha do ano 1946 para seu início deve-se ao fato deste ter sido o ano em que foi contratado o projeto urbano.
147
na precisão do relato histórico, embora ela seja imprescindível, mas em sua capacidade de síntese de
um dado período, na construção de um registro datado do passado.
IV.1
.1 O POVOADO E A COMPANHIA (ATÉ 1946)
A formação do povoado que deu origem à cidade de Timóteo tem suas raízes no século XIX, quando a
pressão inglesa e a decadência da produção aurífera
383
levaram a coroa portuguesa a buscar novas
áreas de exploração
384
. Entre as áreas que se buscava colonizar estava a do vale do rio Doce
385
,
território que o temor às tribos indígena e as matas insalubres haviam transformado em barreira ao
contrabando na região das minas
386
. Assim, a fim de promover sua ocupação de forma mais
sistemática, além dos incentivos fiscais e doação de terras, foi necessário que os portugueses
garantissem o acesso e a segurança aos povoadores
387
abrindo estradas, construindo pontes e
estabelecendo quartéis e aldeamentos.
Foi neste contexto que, em 1847, Francisco de Paula e Silva solicitou a posse de uma sesmaria na
região
388
, onde organizou a Fazenda do Alegre. Situada em local deslocado das principais rotas de
colonização
389
, às margens do córrego denominado “Thimóteo”, um afluente da margem direita do rio
Piracicaba a poucos quilômetros do ponto onde este deságua no rio Doce, esta fazenda cresceu e
passou a englobar três sesmarias: Alegre, Limoeiro e Timóteo
390
, possuindo pastos para criação de
gado, mulas e cavalos, além de produzir açúcar
391
. Legada a seus descendentes, os 7.267 ha da
Fazenda do Alegre, em 1907
392
, já pertenciam a diversos proprietários, entre eles os irmãos Sebastião e
383
Conforme apresentado no terceiro capítulo (notas 278 e 279), a Inglaterra vinha pressionando as colônias, no sentido de
torná-las mercados consumidores para seus produtos manufaturados, obtendo vantagens na troca com as materiais-primas
locais. O que, com o declino da produção aurífera brasileira, a partir da década de 1870, levou a Coroa portuguesa a buscar
novas riquezas passíveis de comercialização.
384
Embora expedições tenham sido enviadas ainda no século XVI (Tomé de Souza -1554, Martim Carvalho – 1567,
Sebastião Fernandes Tourinho - 1572 e Luís de Brito – 1574) (D
IÁRIO DO AÇO, 1999), foi somente no século XIX que
houve uma preocupação com a fixação da população na região.
385
Esta intenção da coroa portuguesa foi expressa nas cartas régias de 13 de maio e 2 de dezembro de 1808, nas quais o
caráter comercial da ocupação pode ser observado na obrigatoriedade de tornar produtivas as concessões e fazer uso da
mão-de-obra indígena, associada à sua educação cívica e religiosa (C
ARNEIRO & FAGUNDES, 1992).
386
Barreira tanto ao envio de ouro quanto à chegada de mercadorias, como o gado oriundo das margens do rio São Francisco.
387
O Comandante Geral das Divisões Militares no vale do rio Doce e Diretor Geral dos Índios da Província era Guido
Thomaz Marlière, que por sua crença na civilização dos índios, tornando-os elementos úteis à sociedade, não como
escravos, mas como trabalhadores assalariados, era considerado um grande humanista (CARNEIRO & FAGUNDES, 1992).
388
Embora a solicitação date de 1847, Francisco de Paula salienta que vinha cultivando as terras já há dezesseis anos, o que é
confirmado por relatos que atestam sua presença no local desde 1831 (C
ARNEIRO & FAGUNDES, 1992).
389
O local onde se estabeleceu a Fazenda do Alegre fora concessão feita a Felício Moreira da Silva, em 24 de outubro de
1825, que se acredita ter retornado à Coroa porque a terra não fora cultivada (C
ARNEIRO & FAGUNDES, 1992).
390
No entanto, os artigos que contam a história do município de Coronel Fabriciano relatam que estas três sesmarias foram
presente de Dom Pedro II a Francisco de Paula e Silva Santa Maria, recém-chegado de Leopoldina (IBGE, 1957;
ASSOCIAÇÃO Comercial, 1985) e não um de seus descendentes, que manteve e ampliou suas poses (CARNEIRO &
FAGUNDES, 1992).
391
Segundo relatos de 1855 havia “...huma fazenda denominada Alegre com três sesmarias de terra medidas de cultura
confrontando para a nascente com o rio Doce, para o sul com ribeirão do Belém, para o poente com terras de Francisco
José Ribeiro da Costa e Manoela Archanjo de Andrade, para ao norte com o rio Paricicava[sic],; assim somos senhores
de hum corrigo denominado Baratinha e outro dito Olaria, os houve por compras e levarão os ditos córregos pouco mais
ou menos duzentos alqueires onde já tenho princípio de propriedade”. (Livro de Registros Paroquiais 05 apud C
ARNEIRO
& FAGUNDES, 1992: 40)
392
A descrição da fazenda contida nos autos do processo de medição e divisão judicial de seus terrenos em 1906 é a seguinte:
... compõe-se em sua maior parte de terras em matta virgem, com algum campo de capim gordura, capoeiras, de
abundante e espessa vegetação denotando boa qualidade do terreno, com excepção de quase todos os altos morros, cuja
148
João Malachias Ferreira, que neste ano doaram parte de suas terras para construção da capela de São
Sebastião, em torno da qual se organizou o arraial, chamado a partir de então São Sebastião do Alegre.
A denominação Timóteo veio posteriormente e tem uma origem controversa até hoje. Segundo alguns
(C
ARVALHO, 1998; SILVEIRA, s.d.)
393
, ela é fruto da popularidade do comerciante Manoel Timóteo
que, por volta 1915, se estabeleceu no povoado, tornando-se uma referência tão forte que acabou por
nomear a localidade. Já a história local considera o nome oriundo da proximidade do córrego do
Timóteo (G
ONZAGA, 1980), assim denominado por Eschwege ao fazer o mapeamento da região no
início do século XIX (I
MAGEM, s.d.).
Oficialmente, a fundação da vila de Timóteo data de 1840, quando pertencia à freguesia de Santana do
Alfié, até que, em 1891, passou a Comarca de São Domingos do Prata, da qual São José do Grama
tornou-se distrito em 1923, trazendo Timóteo para sua jurisdição. Em 1938, foi criado o município de
Antônio Dias Abaixo e o núcleo urbano de Timóteo foi encampado como distrito deste.
Nesse momento, conforme pode-se observar no levantamento realizado pelo Serviço Geográfico do
Estado de Minas Gerais (1939), com uma economia baseada na produção rural, seja de gêneros
alimentícios, seja de carvão
394
, o núcleo “urbano” possuía pouco mais que seis ruas (vide mapa)
organizadas em torno da capela de pau-a-pique e seu pequeno cemitério nos fundos
395
(Elo Diocesano,
abril/2003). No entanto, esta condição sofreria profundas mudanças em poucos anos, pois a partir de
1942, o engenheiro Alderico Rodrigues de Paula passaria a percorrer a região buscando um local
adequado para a implantação de uma grande siderúrgica, a Aços Especiais Itabira (ACESITA).
Devido à ligação de Percival Farquhar com a ACESITA
396
, a história remonta à década de 1910; no
entanto, 1942 pode ser apontado como marco definitivo para a concretização da empresa, quando a
assinatura dos Acordos de Washington, determinando a nacionalização das jazidas brasileiras
adquiridas por estrangeiros, possibilitou a Farquhar, em
associação com dois brasileiros, Athos de
Lemos Rache
397
e Amynthas Jacques de Moraes
398
, aplicar o valor das indenizações pagas pelas minas
vegetação rachítica prova inferioridade do terreno, formando todo o terreno conhecido pela denominação de Alegre uma
só parte ou gleba bem distinta; e bem assim nos terrenos chamados Baratinha e Olaria, pertencentes à mesma Fazenda do
Alegre, porém separados della por uma facha de terras devolutas...” (C
ARNEIRO & FAGUNDES, 1992: 42).
393
Seguindo a mesma linha de raciocínio, no entanto com datas diversas, Suely SILVEIRA (s/d: 1) afirma que “Manoel
Timóteo foi um ‘mulato’, dono de uma vendinha localizada na mineração da Lavrinha, em época anterior a 1830 e que se
fixou nas margens do Ribeirão Timóteo (nome posteriormente dado com o tempo [sic])”.
394
Fato confirmado tanto pelos números do censo de 1940, que contam no município de Antônio Dias quase cinco mil
trabalhadores no setor primário, sete no secundário e menos de sessenta no terciário (C
ARNEIRO & FAGUNDES, 1992: 1937),
quanto pelos depoimentos do senhor José Fausto
D’ÁVILA (17/11/2002), que veio trabalhar numa carvoaria pertencente à
Belgo-Mineira em 1941, ou seu Perácio
BICALHO (15/11/2002), cujo pai se empregou como seleiro numa fazenda em
Coronel Fabriciano em 1934.
395
A capela inicialmente construída de tábua e coberta de folhas de palmeira foi substituída em 1915 por uma de taipa de
mão, sendo assistida por padres de Mariléia, Jaguaraçu e Fabriciano até 1930, quando foi construída a primeira casa
paroquial; a efetivação da paróquia, no entanto, ocorreu somente em 1963, quando a atual capela (construída na década de
1950) tornou-se Matriz (E
LO DIOCESANO, abril/2003).
396
Este aspecto, explorado no segundo capítulo, encontra-se bem descrito em reportagem do OBSERVADOR ECONÔMICO de
jun/1937(n
o
17, a).
397
Athos de Lemos Rache (1903-...) vinha de uma família ligada à produção de ferro, filho de Mário Rache (antigo
superintendente da usina Esperança (G
OMES, 1976)), sendo possuidor da Fundição Burnier, e segundo ATAÍDE (1986), foi o
autor da idéia de criar uma usina de aços especiais utilizando carvão vegetal e pelo empréstimo junto à Carteira Agrícola e
Industrial do Banco do Brasil, que possibilitou sua construção. A familiaridade com o assunto pode ser verificada por sua
participação nos projetos da AÇOMINAS e USIMINAS, empresa da qual foi diretor, e pelo análise sobre o papel da
149
pertencentes à Itabira Iron Ore Co. na construção de uma usina de aços especiais
399
na região do vale
do rio Doce
400
.
Com as jazidas localizadas em Itabira
401
e a necessidade para implantação da usina de combinar a
proximidade destas a uma extensa área de relevo pouco acidentado, fácil acesso a vias de escoamento
e disponibilidade de recursos energéticos (hídricos e vegetais – madeira), as buscas restringiram-se às
proximidades do vale do rio Piracicaba
402
. Incumbido de selecionar o local mais adequado, o
experiente engenheiro Alderico Rodrigues de Paula
403
começou considerando Itabira que, mesmo
sendo mais próxima das jazidas, era por demais montanhosa e apresentava dificuldades para
abastecimento de água e carvão. Nova Era e Antônio Dias também foram consideradas, sendo
descartadas por causa da topografia acidentada; com relação ao Calado (posterior Coronel Fabriciano),
a detenção de grandes extensões de terra próximas à linha férrea por parte da Belgo-Mineira (área que
hoje é Ipatinga) inviabilizava o negócio. Por intermédio da indicação de um conhecido do Governador
Valadares, Dr. Alderico encontrou, às margens do rio Piracicaba, uma das raras planícies extensas da
siderurgia no desenvolvimento do Estado de Minas Gerais e dos caminhos tomados na construção da USIMINAS (RACHE,
1957).
398
Amynthas Jacques de Moraes (1898-1977) formou-se em Engenharia Civil pela Escola Politécnica do Rio de Janeiro
(1927), e após participar da construção dos açudes de Orós e Poço dos Paus (CE) e da estrada de ferro Leopoldina, fundou
a Companhia de Serviços de Engenharia (SERVIENGE), da qual se originaram as empresas CONIQUEL, CODEMET,
CITABRIAN e MATSULFUR. Como grande empresário, fundou ainda as companhias Melhoramentos Ferroviários,
Carioca de Bens Móveis, Organizadora Industrial S/A, Nacional de Ferro-Liga, entre outras. Segundo ATAÍDE (1986), as
minas em Itabira que possibilitaram o início da empresa eram de sua propriedade; contudo, o material oficial da empresa
dá conta somente da compra das jazidas da Braszilian Iron and Steel Co. em 1947 (ACESITA, 1989).
399
Embora Lea de SOUZA (1989) coloque que a idéia da produção de aços especiais ocorreu somente durante o planejamento
da segunda fase da primeira expansão da usina, isto parece pouco provável, visto o próprio nome da empresa “Aços
Especiais Itabira”
400
A atuação de Farquhar, no final da década de 1930, foi resumida por Werner BAER (1976: 94) da seguinte forma: “ Com
alguns associados brasileiros, ele fundou a Companhia Brasileira de Mineração e Siderurgia, a qual compraria a opção
de Farquhar sobre a Itabira Iron sem a usina siderúrgica. Em setembro de 1939 Vargas autorizou a nova companhia,
concedendo-lhe o direito de explorar e exportar o minério de ferro e de operar a estada de Ferro Vitória a Minas.
Entretanto, nos anos subseqüentes, Farquhar encontrou dificuldades na obtenção de financiamento para a companhia.
Finalmente, em 1942, o Governo brasileiro desapropriou a empresa. Com o dinheiro que lhe foi pago pelo Governo
Brasileiro, Farquhar e alguns associados brasileiros fundaram a empresa siderúrgica ACESITA (Aço Especiais Itabira)
que foi construída próximo de Itabira. Farquhar justificou a localização da usina, longe dos centros consumidores, com
base em que a empresa produziria aços especiais de tal qualidade que, a despeito dos custos de transportes, eles seriam
competitivos. À medida que a usina foi construída, foram obtidos mais financiamentos do Banco do Brasil e em 1952 o
banco tinha o pleno controle da companhia.
401
Segundo Lea de SOUZA (1989: 14), “Apesar da venda, o Grupo Farquhar ficou ainda com grandes jazidas de minério em
Itabira e concessões de quedas dá água no rio Piracicaba. Com isso, Percival Farquhar reativa a sua idéia de construção
de uma siderúrgica na região.”, A
TAÍDE (1986), no entanto, diz que as jazidas eram de propriedade de um de seus sócios,
Amynthas Jacques de Moraes.
402
Segundo José FERREIRA (1997), foi definido por Athos Rache e por Constantino Nichollof, enviado da H. A. Brassert,
empresa norte-americana responsável pela elaboração do projeto definitivo da usina, que sua localização deveria ser entre
Itabira e Aimorés, ao longo da Estrada de Ferro Vitória-Minas.
403
No Boletim Informativo da Associação dos Aposentados de ACESITA (n.
o
03, s/d), onde se relata a vida de alguns de
seus mais eminentes associados, consta que Alderico Rodrigues de Paula era natural de Bonfim (MG), trabalhou na
Secretaria de Agricultura até 1932, quando se formou engenheiro pela Escola de Minas de Ouro Preto (ATAÍDE, 1986),
quando passou a trabalhar na Secretária de Viação e Obras Públicas do Estado de Minas Gerais onde, além da prospecção
de petróleo no Acre e levantamentos geológicos no Rio Grande do Sul participou da abertura de estradas como a São
Romão (MG)-Formosa (GO) e a Rio-Bahia, até ser contratado definitivamente pela ACESITA em 1944, para a qual já
fazia levantamentos desde 1942. Após os estudos para construção da hidroelétrica, foi nomeado Superintendente Geral e
incumbido da “... derrubada das matas, terraplanagem e levantamento topografico, ligação (por balsa com Cel.
Fabriciano, ramal ferroviário e ponte Mauá. Construiu-se também estrutura de apoio como armazém, hospital,
hospedaria, serraria, olaria, hortas, etx. Paralelamente orientou a execução de um plano de urbanismo para a cidade,
iniciou a construção das primeiras casas nas Bromélias e Técnicos, além dos acampamentos do Algodoal e Quitandinha”.
Segundo José Nazareno
o senhor Alderico Rodrigues de Paula (1906-1999) era engenheiro, trabalhara participando em
expedições de levantamento geológico no Acre e no Rio Grande do Sul até ser contratado definitivamente pela ACESITA
em 1944, para a qual já fazia levantamentos desde 1942.
150
região, era a Fazenda Angelina, de propriedade do farmacêutico Raimundo Alves Carvalho
404
.
Selecionada a área, ele iniciou as negociações para sua aquisição, “Mas a compra não foi fácil”, como
afirma A
TAÍDE (1986: 45), pois os proprietários não tinham interesse em vender a fazenda. Com a
recusa inicial, Alderico de Paula passou a adquirir em seu nome as propriedades no entorno
405
(Fazenda do Alegre, Fazenda Cachoeirinha, Fazenda Querubino, Fazenda do Vieiras, além de terras na
região do Barreiro, Atalho e Timotinho), de modo que, ao fim dos conflitos, que foram desde ameaças
de desapropriação até telegramas ao presidente da República, quando Raimundo Alves concordou em
se desfazer de seus quase quatrocentos hectares, perto de quinhentos outros já haviam sido adquiridos
(C
ARNEIRO & FAGUNDES, 1992: 66).
Acertada a localização da usina, em 31 de outubro de 1944, foi oficializada a fundação da empresa,
com o nome de Companhia de Aços Especiais Itabira Ltda. (ACESITA), sendo subscritos 171
acionistas e capital de Cr$ 64.000,00 (equivalente a aproximadamente US$ 3.500.000,00). O objetivo
do empreendimento era a construção de uma usina com auto-suficiência em matérias-primas e energia,
capaz de produzir “... aços especiais
406
de tal qualidade que, a despeito dos custos de transportes, eles
seriam competitivos” (B
AER, 1976: 94). Assim, além da aquisição das minas da Brazilian Iron and
Steel Co., em Itabira, e grandes extensões de terra para plantio de eucalipto
407
, da construção da
indústria e da cidade operária, previa-se a construção de uma hidroelétrica
408
.
Hoje, no entanto, a imagem representativa deste tempo não é a destas obras, mas a da singela igreja de
São Sebastião e do povoado que se organizava ao seu redor. Atestando a juventude do povoado, suas
ruas eram por demais largas e retilíneas para se enquadrarem na tradição colonial mineira, além do
que, partiam do córrego do Alegre, enfrentando o morro sem curvas e meandros até atingirem o rocio
da pequena igreja. Esta construção de paredes de taipa e teto de folhas de palmeira, com o pequeno
cemitério aos fundos, era tão simples quanto o casario ao seu redor e, assim como ele, não resistiria ao
404
Raimundo Alves de Carvalho havia chegado à região em 1922 para gerenciar a farmácia da Estrada de Ferro Vitória-
Minas, situada no Córrego Nossa Senhora (atual Parque Industrial da Usiminas), iniciando a construção da Fazenda Dona
Angelina em 1928 (S
ILVEIRA, s/d).
405
Esta estratégia visava tanto obter preços menos elevados, pois não criava expectativas quanto à valorização das terras
devido à implantação de um grande empreendimento nas vizinhanças, quanto acelerar sua implantação, uma vez que
oficialmente a companhia ainda não existia (ATAÍDE, 1986).
406
A idéia inicial era que a usina produzisse um milhão de toneladas de aço por ano, no entanto, restrições orçamentárias
levaram a serem previstas três etapas de 60 mil t/ano. No entanto, as 180 mil t foram atingidas somente na década de 1970
(vide AnexoI_tab 01) e a produção de aços especiais iniciou-se somente em 1955, pois o funcionamento da aciaria
dependia da conclusão da hidroelétrica, quando então se iniciou a fabricação de chapas de aço silicioso (F
UNDAÇÃO
ACESITA, s.d.2).
407
Segundo Francisco Magalhães GOMES (19760), a ACESITA “foi uma das companhias que mais cuidou do
reflorestamento”.
408
A usina de Sá Carvalho localiza-se a 21 km da usina da ACESITA, na Cachoeira do Salto, Município de Antonio Dias, ela
foi inaugurada em 1951, constituindo-se na única fonte de energia da usina até 1971 e, na época, a maior do Estado.
Segundo José FERREIRA (1997), a concessão de exclusividade para exploração da usina foi conseqüência das boas conexões
políticas dos sócios, vencendo a resistência da CVRD, que de 1944 a 1947 partilhava a concessão. Na data de sua
construção, era a maior hidroelétrica mineira, sendo responsável por fornecer eletricidade para as cidades de Timóteo,
Coronel Fabriciano, Antônio Dias (até 1983) e Belo Horizonte (1952-1961), e também para as usinas da Belgo-Mineira,
em Monlevade (1952-1960) e da Usiminas, em Ipatinga (160-1961) (ACESITA, 1989). Em 1999 a usina foi vendida à
CEMIG (s.d.).
151
tempo, sendo totalmente reconstruída na década de 1950
409
. Mas por trás de toda esta singeleza se
escondia uma intensa vida social, e ainda que não houvesse coreto ou mesmo um jardim organizado, a
banda de música fazia soar alto seus acordes em frente à igreja, enquanto na loja de “seu Joaquim”
eram representadas peças como “Rei Herodes” e “O diabo atrás da porta”. Também a fazenda deste
comerciante tornava-se sede do clube de futebol local, o Florestino Social Clube. Assim, do alto do
morro, a vila de Timóteo testemunhava a chegada do “doutor Alderico”, insuspeita das transformações
que suas sucessivas visitas iriam provocar. E, enquanto as fazendas iam se agrupando e a produção
agrícola ia minguando, a pouco menos de cinco quilômetros, uma extensa planície às margens do rio
Piracicaba começava a ser desmatada. Nesse local, destino de homens, máquinas e mercadorias que
constituíam quase toda a carga desembarcada na estação do Calado, começavam a ser plantadas as
sementes da moderna cidade de Timóteo, relegando à pequena vila o papel de abrigar parte desse
contingente de estranhos.
409
Segundo depoimento de Joana Coelis de Araújo, a construção da nova Matriz de São Sebastião ocorreu em 1954, quando
Monsenhor Rafael era o responsável pela paróquia. Por intermédio da compra de votos, cada um correspondente a um
tijolo, a própria comunidade incumbiu-se de erguer a nova igreja (CÂMARA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 2003).
152
Fig. 144-146: O povoado de Timóteo (localização e
situação nas décadas de 1930 e 1940)
(ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO; SILVEIRA, s.d.1)
0 10Km
Fig. 147-148: Sede das fazendas
Angelina e do Alegre
(SILVEIRA, s.d.1)
Fig. 149-151: A capela e o
entorno da praça 29 de Abril
(SILVEIRA, s.d.1)
Fig. 152-155: Sedes das fazendas da região (Pedro Estevão,
Joaquim Ferreira Souza, dos Maia, Tonico Lunga)
(SILVEIRA, s.d.1)
153
IV.1.2 A CIDADE EMPRESARIAL DA ACESITA (1946-1968)
Iniciados em 1945, com levantamentos topográficos, seguidos dos serviços de terraplanagem,
construção dos acampamentos provisórios e oficinas de apoio (mecânica, serraria, cerâmica
410
e
pedreiras), os trabalhos para a construção da usina foram conduzidos por profissionais estrangeiros
411
,
enquanto a construção da cidade era levada a cabo pela própria empresa
412
, contando com técnicos
nacionais e trabalhadores oriundos da região
413
.
Embora desde o início se explicite a necessidade e intenção de construir uma ampla estrutura urbana
414
para dar apoio ao empreendimento, a elaboração de um plano urbanístico inicialmente foi tida como
fator secundário, de modo que “... as primeiras habitações construídas pela ACESITA não obedeciam
a nenhum critério de planejamento,... [pois] do ponto de vista da empresa, não se faziam urgentes
neste momento grandes investimentos no setor de moradia.” (C
ARNEIRO & FAGUNDES, 1992: 66). A
grande disponibilidade de terras adquiridas pela empresa, a parca urbanização da região e a ausência
de pessoal qualificado
415
cuja atração justificasse maiores dispêndios eram fatores que permitiam um
certo descaso com o urbano, priorizando-se o projeto industrial. Portanto, as primeiras moradias
operárias não seguiram nenhum projeto urbano pré-definido, localizando-se o mais próximo possível
da área industrial; as casas eram edificadas em pau-a-pique ou com a madeira dos caixotes dos
equipamentos importados dos Estados Unidos, fazendo com que alguns bairros recebessem apelidos
como Mundo Vira
416
e Vai quem quer
417
ou, ainda, Vila dos Caixotes
418
.
410
Nazareno ATAÍDE (1986) diz que eram cinco as olarias construídas pela ACESITA. Situada entre os bairros Bromélias e
Timotinho estava a número 1, no Santa Maria a 3, no Algodoal a 4, no Quitandinha a 5 e uma das poucas remanescentes, a
número 2, é o Forno Hoffman, no atual bairro Novo Horizonte, próximo ao Olaria. Construído para fornecer tijolos
refratários para revestimentos dos fornos, este edifício tornou-se um dos cartões postais da cidade, e após ter passado por
uma “restauração”, na década de 1990 foi transformado em clube (C
ENTRO de Tradições Mineiras, 1989).
411
No caso, o projeto siderúrgico era de autoria da H. A. Brassert Co., contando com equipamentos importados dos Estados
Unidos, enquanto a construção da hidroelétrica, projetada pela Empresa Brasileira de Engenharia, teve como responsáveis
o engenheiro americano Lloyd Pratt, o suíço Fancis Salgat e o francês Marcel Berthe (ACESITA, 1989).
412
De acordo com José FERREIRA (1997), as obras civis foram levadas a cabo tanto por trabalhadores contratados
diretamente pela empresa como pela Companhia Melhoramentos Ferroviários, de propriedade de Athos Rache e Amynthas
de Morais, os sócios brasileiros de Percival Farquhar.
413
Segundo LEMOS & PIRES (1992), muitos funcionários que trabalharam na construção da usina e da cidade foram trazidos
por Athos Rache que, sendo empreiteiro e tendo participado da construção da ferrovia Vitória-Minas, nela os havia
recrutado.
414
Em CARNEIRO &FAGUNDES (1992), já em maio de 1945 iniciaram-se os contatos para contratação de Romeu Duffles para
elaborar “... um projeto de urbanização para a região, dando prioridade à construção de uma vila operária”.
415
Como se pode perceber pelas entrevistas, a maior parte do pessoal empregado na construção da usina era oriunda das
redondezas (as únicas exceções são a família Duffles e José Luiz Batista, sendo que a maioria dos entrevistados ou seus
familiares, esteve envolvida de alguma forma com a produção de carvão para a Belgo-Mineira), sendo o pessoal
especializado abrigado na sede da fazenda Dona Angelina (atual Restaurante ACESITA).
416
Este acampamento localizava-se “... na margem do Piracicaba, na entrada da ponte, debaixo do viaduto que passa sobre
a Estrada de Ferro”, e seu nome é uma referência à fazenda Mundo Vira, antiga propriedade de Amynthas Jacques de
Moraes (em Itabira) (ATAÍDE, 1986: 216).
417
Situava-se onde hoje é a laminação, e recebeu este nome porque eram muitas casas e muita gente circulando no local. No
entanto, quando foram construídas habitações melhores, o controle na distribuição das casas levou este novo bairro a ser
apelidado de Vai quem pode. Segundo ATAÍDE (1986), o Vai quem pode localizava-se atrás do Cruzeirinho.
418
Solicitados a colaborar na localização da Vila dos Caixotes os entrevistados (Sr. Fausto, Fernando Sena e Sr. Wavá)
disseram tratar-se da área onde hoje se situa o Centro Norte, sem que, no entanto, fossem capazes de precisar sua
localização.
154
Os primeiros bairros construídos foram o Quitandinha
419
e o Algodoal
420
. No entanto, enquanto o
Quitandinha abrigava o escritório
421
(hoje Associa
422
) e a escola
423
da companhia, sendo mais tarde
completamente reconstruído em alvenaria, o outro contava com cerca de oitocentos “barracões” de
madeira que foram totalmente demolidos e jamais reconstruídos. Outra área que foi ocupada sem
planejamento no início da implantação corresponde às imediações da antiga sede da fazenda Angelina
(atual restaurante ACESITA). Além de uma capela (São José), construída em 1946, ao seu lado (atual
Rua Vinte de Novembro) foi erguido um conjunto de galpões, onde funcionaram armazém, açougue,
padaria, barbearia, farmácia, cinema e ambulatório
424
(FUNDAÇÃO ACESITA, 2000 e 2000a).
A fundação do ACESITA Esporte Clube em 1945
425
, do cinema São José em 1947 e o início da
construção do Hospital da ACESITA em 1946 (concluído em 1956) demonstraram que preocupações
com o lazer e a saúde dos operários existiram desde os primeiros momentos, assim como com a
necessidade de melhorar as condições de acessibilidade, sendo construída a Ponte Mauá
426
e aberta a
estrada que liga a usina à vila de Timóteo.
A contratação de um projeto urbano ocorreu somente em 1946, quando foi chamado o engenheiro
Romeu Duffles Teixeira
427
para "... elaborar um projeto de urbanização para a região, dando prioridade
à construção de uma vila operária" (C
ARNEIRO & FAGUNDES, 1992: 40). No entanto, o projeto
entregue em 1953 não foi seguido na íntegra, verificando-se que somente o bairro Funcionários possui
traçado idêntico ao inicialmente projetado
428
por Romeu Duffles. Mas, apesar das diferenças, algumas
diretrizes gerais foram seguidas, como se podem observar pelo perfil das ruas e a organização dos
419
O nome Quitandinha é um exemplo do humor que marcou a história desta comunidade, que diante da rusticidade das
instalações oferecidas, em especial o edifício em madeira onde eram alojados os solteiros, deram ao local o mesmo nome
do luxuoso cassino de Petrópolis, Quitandinha (ACESITA, 1989).
420
Segundo Nazareno ATAÍDE (1986: 215), o Algodoal foi um bairro construído no início; eram aproximadamente 800
barracas muito pequenas, ... todas de pau-a-pique e sapé, na beira do rio Piracicaba, de frente para o Pinga, zona
Boêmia de Coronel Fabriciano e de toda a região”, era o porto de embarque da balsa, do qual hoje não resta nada.
421
O escritório da usina funcionara nos momentos iniciais em Antônio Dias, mudando-se seis meses depois, já em 1945, para
um escritório de madeira no bairro Quitandinha. (F
UNDAÇÃO ACESITA, 2000).
422
A Associa é o nome da cooperativa de consumo dos funcionários da ACESITA. Ela foi fundada com o auxílio financeiro
da ACESITA em 1984 e em dois anos já possuía quase 3.200 associados (A
TAÍDE, 1986). Hoje ela possui farmácias e
armazéns tanto nas áreas de exploração do carvão vegetal como na cidade (Centro Norte, Quitandinha e Timirim).
423
Tratava-se das Escolas Reunidas ACESITA; só em 1949 foi criada a Escola Municipal Ana Moura (MEMÓRIA AMBIENTAL
DE
TIMÓTEO, 2000). A ACESITA construiu também: Escola Estadual Getúlio Vargas (Funcionários), Escola Estadual
Carlos Drumond de Andrade (Olaria), Escola Estadual Tenente José Luciano (Quitandinha), Escola Estadual Percival
Farquhar (Técnicos) e as escolas técnicas: Escola de Formação Profissional (criada em 1954 em convênio com o SENAI),
Colégio Macedo Soares (localizado no centro, foi criado em 1956 e doado aos padres salesianos, que o mantiveram até
1971) e Instituo Educacional Monsenhor Rafael (administrado pelas irmãs da Beneficência Popular, numa pequena
construção na praça 1
o
de Maio, a fim de atender a população feminina. O Instituto foi crescendo até que em 1971, com o
novo prédio no Timirim, incorporou os alunos do Colégio Macedo Soares, sendo posteriormente encampado pela
UNILEST) (ATAÍDE, 1986).
424
O serviço de assistência médica foi implantado em 1945 e era dirigido pelo Dr. Pedro Sampaio Guerra, atendendo, além
dos acidentes de trabalho, doenças como a febre amarela, malária e verminoses, comuns na região (M
EMÓRIA AMBIENTAL
DE
TIMÓTEO, 2000). Mas além destas doenças, Nazareno ATAÍDE (1986) coloca que eram comuns pacientes com surtos
psicóticos, em decorrência da necessidade de ajustes do homem do campo aos novos hábitos, ao intenso ritmo de
trabalho, horários rígidos, etc., além de uma alimentação fraca, de difícil aquisição” (ATAÍDE, 1986: 230).
425
Para atividades de lazer e cultura, vide capítulo VI.
426
Recebeu este nome porque a companhia construtora era a Empresa Mauá do Rio de Janeiro (ATAÍDE, 1989).
427
As principais recomendações da ACESITA a Romeu Duffles no projeto dos bairros operários eram: - lotes amplos, para
evitar conflitos com vizinhos, criação de aves e vegetais; - respeito e valorização da paisagem natural; - “atenção para o
problema religioso, facilitando-o, para que o catolicismo contribuísse eficazmente no combate a idéias extremistas”; - a
casa como local de repouso (C
ARNEIRO & FAGUNDES, 1992: 42).
428
O Bromélias e São Cristóvão, embora apresentem um traçado bem próximo, acabaram tendo quarteirões menores e mais
regulares que os inicialmente projetados, enquanto os demais foram bastante alterados.
155
espaços no bairro das Bromélias e no centro, onde, embora a localização tenha sido completamente
alterada, o esquema definido por uma grande alameda central e quadras comerciais abertas foi
mantido.
A maioria dos bairros construídos nas décadas seguintes, como: São Cristóvão, Alvorada, Timotinho,
Garapa, Serenata, Funcionários, Timirim, Santa Maria, Olaria e Novo Horizonte, apresenta traçados
bastante diferentes do plano original, embora se localizem em áreas cuja ocupação estava prevista.
Situação oposta ao Centro e aos bairros Quitandinha e Técnicos, que ocupam áreas anteriormente
destinadas à expansão da usina. (vide mapa evurb, 1940)
Apesar da conclusão das obras e do início do funcionamento da usina, com a primeira corrida de gusa
ocorrendo em 1949
429
, imagens, depoimentos e entrevistas que falam da usina e da cidade nesse
período pintam um retrato dominado pela incompletude, pelo porvir, o que transparece na fala de José
Moreira de Castro que era Escrivão de Paz no povoado em 1947:
... não possuíamos água potável, luz, prédio escolar, igreja, praças, calçamentos e nem urbanização na
cidade, poucos prédios de construção que pudessem aparecer, nenhum de alvenaria, mesmo prevendo breve
e risonho futuro... (CARNEIRO & FAGUNDES, 1992: 43).
Imagem que começaria a se alterar a partir de 1950, quando o Banco do Brasil assumiu o controle
acionário da companhia.
A participação do Banco do Brasil na empresa existiu desde os primeiros momentos, quando os sócios
não conseguiram reunir mais que 65% (US$ 2,1milhões) do capital inicial previsto (US$ 3,2 milhões)
para a concretização do empreendimento
430
. O agravamento das dificuldades iniciais pode ser sentido
pela compra dos equipamentos da laminação e de algumas oficinas em leilões de sucata de guerra nos
Estados Unidos. A situação tornou-se insuportável em 1950, obrigando a contratação de sucessivos
empréstimos que, começando em US$ 7,5 milhões, neste mesmo ano, atingiram a casa dos US$ 20
milhões, com o custo total para conclusão da usina e da cidade sendo atualizado para US$ 25
milhões
431
, valores que levaram o Banco do Brasil a transformar sua dívida em 79% do capital da
empresa e tornando-se acionista majoritário da empresa (L
EMOS & PIRES, 1992).
Ao assumir o controle da empresa, o Banco do Brasil realizou estudos
432
a fim de determinar a
viabilidade do empreendimento. Nesses estudos, a ACESITA era vista como um empreendimento de
429
Em 1949 realizou-se a primeira corrida de gusa e foi inaugurada a forjaria (ATAÍDE, 1986), considerada “uma das
melhores seções de que dispõe o conjunto”, que juntamente com a venda do gusa, constituiu-se em importante fonte de
recursos por intermédio da venda de enxadas, machados, facões e garfos (Observador Econômico,
set/1953).
430
Para José FERREIRA (1997: 48), o equacionamento financeiro do projeto só se viabilizou graças às relações pessoais dos
sócios. “Athos Rache era sobrinho e genro de Pedro Demósthenes Rache, diretor da Agência Especial de Financiamento
do Banco do Brasil. Amynthas de Morais, por sua vez, era sobrinho de João Vieira de Macedo, fazendeiro gaúcho, ...,
amigo pessoa de Getúlio Vargas, assim como Pedro Rache”, sendo eles os responsáveis por intercederem em favor da
liberação de recursos junto ao Banco do Brasil. Além disso, na disputa com a CVRD pelo direito de exploração da
Cachoeira do Salto, contaram com o apoio de Luciano J. de Morais, irmão de Amynthas, então diretor geral do
Departamento Nacional de Produção Mineral.
431
Estimando-se que o custo de implantação final superou em 200% do que fora inicialmente planejado (LEMOS e PIRES,
1992).
432
Formaram-se duas comissões dirigidas, respectivamente, pelo General Edmundo de Macedo Soares, apoiado por Paulo
Miguel Bohomeletz, e Glycon de Paiva, auxiliado por Fonseca Costa, sendo que o diagnóstico que prevaleceu foi o da “...
primeira comissão [que], assessorada por empresas americanas, concluiu pela continuidade das obras de montagem da
usina e pela necessidade de sua ampliação sucessivamente para 120 mili e 240 mil toneladas/ano de aço bruto de modo a
torná-la economicamente viável
(FERREIRA, 1997: 50).
156
grande importância para o desenvolvimento industrial do país, tanto por ser a única usina que se
propunha à fabricação de aços especiais
433
, quanto por sua auto-suficiência energética e em termos de
matéria-prima. Estas condições lustravam os brios da nação por fazê-la, à exceção da tecnologia
importada
434
, totalmente independente de outros países. Assim, sob a óptica nacionalista, mesmo a
construção da cidade operária assumia ares desenvolvimentistas, sendo comparada em reportagem do
O
BSERVADOR ECONÔMICO (1953: 81) à interiorização promovida pela CHESF e por Volta Redonda,
afirmando-se que, assim como esses empreendimentos, a ACESITA “passará a marcar, no mapa do
Brasil, um novo núcleo de vida, de trabalho, repetindo em termos civilizados tudo que praticaram os
bandeirantes” e transformando
... o que era selva, hostil ao homem pelas condições sanitária, tornou-se num centro de civilização. Além de
cuidar de sua produção de aços especiais, ACESITA realiza obra de ocupação do território, no sentido
social econômico e político. O capital investido no empreendimento não pode, assim, ser considerado apenas
em função de um fábrica. E isto justifica plenamente o amparo que lhe tem dado o Governo federal.
(OBSERVADOR ECONÔMICO, 1953: 81)
Assim, a tomada do controle acionário da companhia pelo Banco do Brasil marcou um momento de
ruptura no relacionamento entre a cidade e a indústria, quando um projeto urbano e social de cunho
nacionalista passou a ser incorporado de forma definitiva ao industrial, marcadamente
desenvolvimentista.
A implementação desses projetos e a concretização dessa visão ficaram a cargo do General Edmundo
de Macedo Soares e Silva
435
que, indicado para o cargo pelo presidente do Banco Central, assumiu a
direção da empresa em junho de 1952. Em sua gestão (1952-1957) foram traçados os rumos da
política urbana e industrial adotada pela empresa, notando-se pela primeira vez uma preocupação com
o conjunto do empreendimento, que afirmou ter o desejo de transformar num “... marco definitivo que
fará o seu prazer e a sua honra; e mais [sic]; acima de tudo colocará o Brasil no nível das nações
mais adiantadas, ...” (Índice de Suplemento de ACESITA, 1953).
Diante de objetivos tão nobres e grandiosos, para Macedo Soares o projeto de Farquhar e seus
associados pareceu muito acanhado, sendo lembrado por ele em depoimento concedido ao CPDOC em
433
A disponibilidade de aços especiais mais acessíveis seria um elemento impulsor do desenvolvimento da industria
mecânica brasileira, em especial a automotiva, cujos componentes de aços finos chegam à casa dos 25%, que até então era
totalmente dependente de mercadorias importadas (OBSERVADOR ECONÔMICO, 1953).
434
Condição que era vista como facilmente remediável pelo investimento na formação de profissionais por meio de cursos
profissionalizantes, bem como via intercâmbio com outros países, postura defendida constantemente por Macedo Soares
(SOARES E SILVA, 1945: 44).
435
O General Edmundo Macedo Soares e Silva era professor de Engenharia do Exército e membro da Comissão Nacional de
Siderurgia; foi presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, e tendo acompanhado todo o processo de implantação da
indústria de base no país, foi chamado com freqüência pelo presidente Vargas, a fim de emitir pareceres sobre a questão.
Segundo T
RONCA (1983), suas colocações e argumentos foram os que mais fortemente influenciaram a política siderúrgica
e de exportação de minérios adotada por Vargas. Entre os principais cargos que ocupou estão os de ministro da Viação do
governo Dutra, governador do Estado do Rio de Janeiro, diretor-presidente da CSN e da ACESITA, vice-presidente e,
posteriormente, consultor da Mercedes-Benz do Brasil, presidente da Confederação Nacional das Industrias, ministro da
Industria e do Comércio do governo de Costa e Silva, foi ainda consultor da Cosipa, Mannesma, Dedini e Stand Eletric.
Foi defensor da desvinculação entre o comércio de minério de ferro e a indústria siderúrgica; defendeu a implantação de
uma usina de carvão mineral na região do rio Doce juntamente com a United States Steel Co. Foi ainda professor na Escola
Superior de Guerra, escreveu o livro “O ferro na história e na economia do Brasil” e inúmeros artigos sobre mineração e
siderurgia para a revista Observador Econômico.
157
1987
436
como “uma coisa pequenininha” que lhe coubera transformar em grandiosa. Assim,
acreditava, como muitos outros militares chamados a dirigir estatais durante o período militar, que fora
“chamado para corrigir as coisas”
437
, incumbindo-se de “transformar a empresa” que, embora tivesse
equipamento completo, vendia pouco quando chegou.
Com relação ao trabalho desenvolvido na empresa, afirmou que na usina teve “... que aumentar o trem
de vergalhões e fazer o trem de chapas”, possibilitando que “Por volta de 1955 a usina pass[asse] a
funcionar com equipamento que comprei
438
, e na parte urbana, construiu tudo: “Eu construí tudo: a
cidade, as escolas, o posto de saúde, as casas, tudo
439
(FARIAS & HIPPOLITO, s/d: 135). O que, se não
é totalmente verdade, foi a impressão que deixou. Dessa forma, embora não tenha sido o diretor que
ficou mais tempo no cargo, sua gestão foi a mais marcante e seu nome um dos mais celebrados ainda
hoje.
Contando com recursos oriundos do Banco do Brasil e do Banco Francês Parybas, respectivamente
para ampliação da usina, compra de terras e equipamentos, Macedo Soares iniciou a elaboração e
aplicação do primeiro plano de expansão da usina. Este plano previa aumentar a produção para
240.000 t/ano, englobava também a adequação da forjaria à produção voltada à indústria
automobilística, a implantação do setor de laminação de chapas de aço silício, a instalação do forno
elétrico de redução, da rede d’água industrial, trens desbastadores, poços elétricos, etc., exigindo o
incremento da produção de carvão e energia elétrica, o que levou a ampliar a capacidade da barragem
de Sá Carvalho e a compra de terras para plantio de eucalipto (ACESITA, 1989).
Além destes trabalhos de ampliação, um dos principais objetivos de Macedo Soares era garantir um
corpo operário devidamente capacitado, para não somente manter a usina em funcionamento, mas
acompanhar seu desenvolvimento; objetivo que o levou a investir em duas frentes: no incentivo à
formação técnica, por intermédio do estabelecimento de cursos profissionalizantes e do intercâmbio
com instituições e profissionais estrangeiros
440
, e na melhoraria das condições de vida dos
trabalhadores, pois acreditava que: “Se não houver boas condições, não teremos pessoal capacitado
para a indústria”
(ATAÍDE, 1986: 136).
Uma expressão clara da visão do general quanto aos desafios a serem enfrentados neste sentido pode
436
Este depoimento faz parte do Programa de História Oral do Centro de Pesquisa e Documentação de História
Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC), iniciado em 1975, que conta com depoimentos de
personalidades que se destacaram na vida pública nacional a partir do início da década de 1920.
437
Vide Trabalho Programado 10.
438
Realmente, mesmo antes do início dos trabalhos de ampliação, já no primeiro ano da administração de Macedo Soares,
observando-se um salto na produção de gusa que, embora não atinja as 60 mil t/ano previstas no projeto original, chega à
casa das 40 mil t/ano (vide tab. produção 1949-1957).
439
O ânimo e o ímpeto com que Macedo Soares se entrega à tarefa que lhe fora destinada podem ser sentidos pela sua
descrição das realizações do seu segundo ano como presidente da empresa: “Do seu conjunto resultaram: 458 residências,
das quais 219 permanentes foram edificadas e não contemos as residências provisórias na mata e acampamentos. Da
mesma forma, a nossa rêde de água, que está sendo executada de forma definitiva, estende-se mais cerca de 9 km, do
mesmo modo, nossa rêde de esgoto. A área pavimentada agora abrange 26.000m
2
. A instalação de colaboradores, para
esterilização da água; o reforço do abastecimento de água, de 259.000 litros por 24h, com a construção da barragem do
Zé Adão, e o início da arborização, são marcos a assinalar...” (Índice de Suplemento de ACESITA, 1953).
440
Sua crença na necessidade de formação da mão-de-obra para a indústria foi demonstrada em inúmeras ocasiões, afirmando
ser este um fator essencial para o desenvolvimento da indústria brasileira; para tanto, achava vital o investimento em
formação (OBSERVADOR ECONÔMICO, 1945 e 1957).
158
ser observada neste trecho, extraído de um discurso proferido em almoço comemorativo no final de
seu segundo ano como presidente da empresa:
“Em terras mais avançadas e em civilização, mais adiantadas na sua industrialização, não encontramos os
mesmos problemas que temos que enfrentar em ACESITA. Assim, temos que nos preocupar muito mais com o
bem estar dos nossos colaboradores, numa região de pouco progresso ainda. Pensamos desde logo em dar o
maior desenvolvimento possível à nossa cidade, e daí o planejamento feito para que, com todo o rigor
possível – com os elementos de que dispomos e com os que temos ido buscar longe de ACESITA
441
tenhamos um projeto harmonioso e possa a nossa cidade oferecer-vos, no futuro, o conforto de que
necessitais e que mereceis. Iluminação, calçamento, sistema de águas e esgotos, escolas, clubes, corpo de
bombeiro, tudo isso foi objeto de atenção... . Queremos que ACESITA seja o orgulho do Brasil, com já o
são outras cidades nossas construídas expressamente para objetivos predeterminados, como Belo-
Horizonte,... Goiânia,...; ACESITA será como outras cidades industriais, entre as quais podemos citar:
Siderópolis, em Sta. Catarina, e Volta Redonda, no vale do Paraíba.” (Índice de Suplemento de ACESITA,
1953) (sem grifo no original)
Assim, fica claro que além da criação de cursos técnicos como os oferecidos pela Escola de Formação
Profissional
442
, criada por ele em 1954, era necessário fazer da cidade, tanto quanto da fábrica, objeto
de orgulho e honra.
Para ele, não há distinção entre a cidade e fábrica; ambas são ACESITA, fazendo com que a condição
de uma seja transferida à outra, o que justifica o emprego constante, nos documentos deste período e
na referência dos moradores mais antigos, do nome ACESITA tanto para a usina quanto para a cidade.
Visando completar esta visão de progresso, foi incentivado também o desenvolvimento de atividades
de lazer, com a criação do Clube Elite e da Comissão de Bem-Estar Social (1952), assim como foi
instituído o concurso de jardins (A
TAÍDE, 1986), ocorrendo ainda nesta época os primeiros desfiles
carnavalescos (S
ENA, 22/abr/2002) .
Esta intensificação da vida social na comunidade muitas vezes requereu obras de infra-estrutura, como
rede de telefonia e de iluminação, além de obras civis, como o centro comercial (1953 - farmácia,
açougue e confeitaria), a sede do Elite Clube (1952), a Praça 1.
o
de maio (1955), a ponte Mauá (1956),
o Colégio Edmundo Soares Macedo (1956 – dirigido por salesianos), o cinema Marabá (1955 – atual
Cobal
443
) e o Colégio Técnico de Metalurgia (1963) (ATAÍDE, 1986).
Outro fator que vinha sendo negligenciado, e que pela primeira vez recebeu maior atenção, foi o
abastecimento de gêneros alimentícios. Como era comum na região, com a drástica redução do
número de pequenas propriedades e o núcleo de operários crescendo rapidamente, a dificuldade de
obter alimentos frescos logo se impôs. E, embora desde 1946, a empresa houvesse pensado em
organizar uma Cooperativa de Consumo, esta não chegou a concretizar-se (A
TAÍDE, 1986)
444
, de modo
441
É interessante notar o emprego de ACESITA como o nome do local, não somente da usina, uma constante tanto nos
documentos deste período quanto na referência dos moradores mais antigos e que resiste até os dias de hoje.
442
Em convênio com o SENAI, eram oferecidos cursos como os de soldador, eletricista, traçador, mecânico, etc. Até que em
1963, anexo à escola, foi criado o Colégio Técnico de Metalurgia (A
TAÍDE, 1986).
443
Posteriormente, o cinema foi transferido para o novo prédio, que hoje abriga a Igreja Universal.
444
Segundo José Nazareno ATAÍDE (1986), somente em 1959 foi fundada a Cooperativa de Consumo, organizada pelos
próprios funcionários; no entanto, a despeito do desejo da ACESITA que queria que cooperativa e armazém funcionassem
em conjunto, rivalidades e rixas tornaram a coexistência ainda mais difícil, o que levou ao fechamento da cooperativa em
1972. As dificuldades de abastecimento continuaram até a abertura da cidade, pois com o armazém da companhia como
único fornecedor local, além da limitação no crédito e oferta de produtos, as enormes filas tornavam o atendimento caótico.
159
que em 1953 a companhia determinou a criação da “Fazenda Ipanema”
445
, que deveria ser responsável
pelo abastecimento dos armazéns
446
da ACESITA (Relatório 1953).
Entre as melhorias empreendidas, como iluminação, calçamento, sistema de águas e esgotos, escolas,
clubes e corpo de bombeiro, também foi construído um grande número de novas casas
447
e foram
projetados pelo menos mais oito novos bairros (Timirim, Serenata, Olaria, Santa Maria, Timotinho,
Centro, Cruzeirinho e Novo Horizonte). Alguns desses bairros foram construídos e ocupados
rapidamente (Timirim e Olaria), enquanto outros foram concretizados somente nas décadas seguintes,
com traçados bastante diferentes do projetado inicialmente (Cruzeirinho e Novo Horizonte), ou ainda
permanecem até hoje com uma ocupação esparsa, lotes vazios e ruas não asfaltadas, como o Sereneta.
A área central também teve seu traçado definido nesse momento, com a construção de um único
edifício em alvenaria e que abrigava estabelecimentos comerciais e o cinema no térreo, tendo o
pavimento superior ocupado por apartamentos para os solteiros
448
. (projeto e foto do relatório)
Embora, em 1957, Macedo Soares tenha deixado a presidência da ACESITA
449
e os presidentes
seguintes não tenham cuidado com tanto afinco da construção da cidade
450
, a consciência de que a
urbe era uma condição primordial para consolidação do projeto industrial não foi abandonada. Nas
administrações seguintes manteve-se o cuidado com a cidade, o que levou, pela primeira e única vez
na história da empresa, à inclusão de um arquiteto no quadro de funcionários da companhia atuando na
cidade. Contratado para comandar o Setor de Obras e Serviços da ACESITA, José Luiz Batista e
Silva chegou à cidade em 1962. Sendo o único arquiteto atuando na região, conciliava o trabalho na
ACESITA com um de meio expediente na Prefeitura de Coronel Fabriciano, além de realizar trabalhos
como autônomo em casa.
451
Embora o número de projetos não revele
452
sua presença, parece ter sido
445
Embora nos relatórios subseqüentes haja menção corrente do desempenho dos armazéns, a Fazenda Ipanema não é mais
citada até 1966, quando é feito o anúncio da venda de lotes desta para os funcionários. E mesmo não sendo possível
afirmar com certeza se tratar da mesma fazenda, vale lembrar que as terras onde se implantou a Usiminas pertenciam à
Fazenda Ipanema, situada às margens do córrego de mesmo nome.
446
Em 1962, a companhia possuía 12 armazéns de abastecimento localizados nos núcleos de produção de carvão e
reflorestamento, além dos localizados no núcleo urbano.
447
Alguns como o Cruzeirinho e Novo horizonte seriam construídos com traçados completamente diferentes, provavelmente
na década seguinte quando se iniciaram os projetos para o segundo plano de expansão da usina.
448
As dificuldades em localizar os projetos deste período fizeram com que as conclusões apresentadas fossem baseadas,
principalmente, em depoimentos, fotografias e nas plantas do acervo da ACESITA, cujas datas finais de alteração são
1967, 1969 e 1973.
449
Desde a morte de Getúlio Vargas, em 1954, o General Edmundo Macedo Soares vinha acumulando a direção das duas
principais siderúrgicas nacionais (CSN e ACESITA), permanecendo à frente da CSN até 1959 (F
ARIAS, s/d).
450
O arrefecimento no ritmo das obras urbanas pode ser sentido pelos valores expressos nos relatórios anuais, assim,
enquanto em 1953, quase 5% dos ativos imobilizados se referiam a gastos com a obras públicas (que poderiam ser
somados ainda aos 6,9% destinados a edifícios sociais e comerciais), em 1970 este total não chega a 1%. O mesmo pode-se
dizer das construções que vão de 8,3% em 1954 para pouco mais de 1% em 1970. (Relatórios Anuais 1953-1972)
% dos Ativos Imobilizados 1953 1954 1955 1956 1958 1960 1961 1962 1969 1970
obras públicas 4,91 0,14
construções em andamento 8,33 12,18 14,27 7,67 6,89 1,64 0,73 0,48 1,03
451
Com apenas dois anos de formado e trabalhando na Secretaria de Viação e Obras Públicas de Belo Horizonte, em 1960,
recebeu convite para trabalhar na ACESITA. Com um salário três vezes melhor, e uma filha recém-nascida, sem casa certa
para morar, telefone ou estrada asfaltada, partiu para Timóteo onde atuaria por cerca de 15 anos. \(BATISTA E SILVA,
24/mar/2002)
160
decisiva para a consolidação de uma filosofia de trabalho no departamento de serviços e obras da
empresa, testemunho disso é a atuação de Fernando Sena, seu auxiliar e sucessor na ACESITA.
453
Assim, em 1958, a companhia já havia edificado 2.734 residências
454
; a cidade possuía, além da igreja,
do armazém, açougue e farmácia, um centro comercial com lojas, agência bancária e cinema, dois
clubes, banda de música, time de futebol, hospital, quatro escolas primárias e um colégio técnico
(Relatório 1958, 1959).
Mas não era somente a área urbana que crescia e recebia novos habitantes, pois a necessidade de
aumentar a produção de carvão vegetal implicou na aquisição de novas terras
455
e, conseqüentemente,
na ampliação do número de empregados ocupados na fabricação de carvão, fazendo com que a
população vinculada à empresa em 1964 fosse estimada em cerca de 50 mil pessoas
456
, das quais 25
mil na cidade e o restante no campo
457
, sendo aproximadamente 5 mil empregados diretos da
ACESITA
458
.
Assim, ao registrar uma imagem da cidade neste segundo tempo de sua história observa-se que ele foi
um tempo marcado pelo dinamismo dos acontecimentos e também pela fixação de filosofias e formas.
Dinamismo porque foi durante este período que a ACESITA modificou radicalmente a paisagem e a
vida da população local, provocando alterações tão marcantes que permanecem influindo nos destinos
da cidade até os dias de hoje. Assim, são as formas urbanas e a identidade coletiva construídas neste
período que, ao penetrar outras camadas de tempo, permanecem caracterizando a cidade e sua
comunidade.
Assim, um retrato da cidade desse período mostra o quanto ainda era difícil chegar até ela: o trajeto de
Belo Horizonte a Timóteo, cerca de duzentos e dez quilômetros e mais de quatorze horas (T
RIBUNA
DO
AÇO, 1995) de estrada de chão batido, com muita poeira e barro, percorrendo uma infinidade de
curvas fechadas, subidas e descidas íngremes, até se vislumbrar o rio Piracicaba serpenteando entre o
mar de morros onde a cidade parece mergulhada.
452
Além dos três bairros, a rotatória da saída para Coronel Fabriciano e Ipatinga e do Centro Comercial 31 de Outubro,
projetou e construiu muitas casas em Timóteo e Fabriciano, onde projetou também o prédio da prefeitura. Retornando a
Belo Horizonte (déc. 1970), projetava e construía edifícios, vendendo-os em seguida. (B
ATISTA E SILVA, 24/mar/2002)
453
Fernando Sena ingressou na empresa ainda jovem, e vindo trabalhar com José Luiz Batista, apaixonou-se pelo urbanismo.
Impossibilitado de fazer este curso, oferecido somente em Belo Horizonte, mesmo continuando a trabalhar no projeto e
construção de novos bairros, acabou formando-se engenheiro metalúrgico. (SENA, 22/abr/2002)
454
Apesar das dificuldades em calcular o número preciso de casas construídas pela companhia, visto os relatórios nem
sempre apresentá-las ou descrevê-las de forma diversa (ora se fala em rurais e urbanas, ora em provisórias ou desmontáveis
ou barracos ou para solteiros), observa-se que, mesmo com a abertura da cidade em andamento, novas casas continuaram a
ser edificadas, porém agora com o financiamento da COHAB. (vide tabela dados sociais AnexoI_tab03)
455
O Relatório de 1965 registra como de propriedade da ACESITA um total de 801.516.454 m
2
(cerca de 80.152 ha).
456
Deve-se levar em conta que a empresa possuía terras em diversos municípios e estados, fazendo com que neste momento a
população a ela vinculada ultrapassasse o total do município após sua emancipação (em 1970 Timóteo tinha 32.760
habitantes (IBGE, 2000).
457
O processo de concentração fundiária no vale do rio Doce remonta à implantação da Usina de Monlevade, que,
empregando carvão vegetal, passou a concentrar extensas áreas para cultivo de eucalipto. A segunda etapa seria a
implantação da própria ACESITA, com a aquisição de várias fazendas para a construção da usina, da cidade e das
plantações de eucalipto. Uma quarta etapa seria levada a cabo pela CENIBRA e pela terceira expansão da usina da
ACESITA, na década de 1980
(COSTA, 1995).
458
Os Relatórios de 1954 e 1955 falam em cinco mil empregados, mais de quatro mil empregados na usina siderúrgica. Já
em 1956 são computados 4.804, número que cairia para 4.235 no último ano de gestão de Macedo Soares (1957); porém
com seu afastamento, o número de empregados voltou a crescer até atingir os 6.023 em 1963, ano em que foram
concluídas as obras do primeiro plano de expansão.
161
Nela, via-se a grandiosidade dos galpões, chaminés e fornos da usina que em meio à planície faziam
contraponto à casa sede da Fazenda Dona Angelina, antigo escritório, que com toda sua simplicidade e
rusticidade acolhera os fundadores da empresa. Esta casa ampla e avarandada, uma das poucas de
alvenaria, marcava o início do novo centro, cujas ruas amplas e retas, ainda de terra, demarcavam
grandes quarteirões. Alguns deles ocupados por casas de madeira e pau-a-pique, enquanto outros
estavam tomados pelo mato. Era ainda ao redor da capela de São José que se concentrava grande
número de atividades – o cinema, o armazém e o alojamento de solteiros – que, lentamente, foram
sendo transferidos para o novo centro comercial.
Na continuidade do olhar, percebe-se que, ao mesmo tempo em que os acampamentos margeando o rio
iam desaparecendo, nos pequenos vales ao longo dos córregos iam se abrindo novos bairros com seus
limites claramente delimitados pela declividade acentuada dos morros. Assim, seja seguindo em
direção ao sul, ao centro velho e ao bairro dos Funcionários, ou a leste ao bairro das Bromélias ou
ainda a oeste rumo a Coronel Fabricano e os bairros dos Técnicos e Quitandinha, encontravam-se
calçadas gramadas, com muros baixos permitindo apreciar casas de tipologia simples, mas cuidadosa,
que assentadas em terrenos generosos eram ladeadas por jardins, de modo que, enquanto na varanda
frontal se desfrutava a beleza das flores, nos quintais havia espaço para horta e mesmo um pequeno
pomar.
Já tomando a direção da área rural, observa-se a mata que ainda cercava boa parte da cidade, sendo
derrubada para alimentar os fornos, as pequenas clareiras irem se agigantando e as cabeças de gado,
que já não eram abundantes, irem rareando; em seu lugar, esbeltos e rápidos os eucaliptos iam
ganhando terreno. Do outro lado do rio, com a estação do Calado, a cidade de Coronel Fabriciano
também acelerava o ritmo, ampliando seu comércio e abrigando como podia os novos migrantes.
162
Fig. 160-161: A Capela
de São José e os
galpões da ACESITA
(ACESITA - Arquivo
Central)
Fig. 156: As possíveis localizações para a usina da ACESITA
(IBGE, 1987)
0 5Km
Fig. 157-158: A Fazenda Angelina
(ACESITA – Arquivo Central)
Fig. 162: Evolução urbana de Timóteo – década de 1950
OBS.: A elaboração dos mapas de evolução urbana foi feita através da reunião de informações oriundas de diversas fontes, com destaque para os projetos obtidos junto à Acesita,
referências em jornais e entrevistas, bem como a comparação com o elaborado por Bernardo FURTADO (2005). Refere-se portanto a primeira menção do bairro, sem que se
considerasse sua delimitação exata, portanto serve somente como síntese das informações reunidas e não como expressão exata do crescimento urbano da cidade.
Fig. 159: Evolução urbana de Timóteo – década de 1940
163
Fig. 163-164: As casas de
pau-a-pique e sapé do
Angico (Serenata) -1946
(ACESITA - Arquivo Central)
Fig. 166-167: As casas de madeira da Vila dos
Caixotes
(A
CESITA,1986l)
Fig. 168-169: Vistas do centro ainda por construir
(ACESITA,1986l)
Fig. 165: A primeira escola no Quitandinha
(CARNEIRO &FAGUNDES,1992l)
164
Fig. 170-171: A construção
do Bromélias
(ARQUIVO CENTRAL;
ACESITA,1986)
Fig. 172-173: A Vila dos Técnicos
(ARQUIVO CENTRAL)
Fig. 174-175: O Quitandinha e Timirim
em construção
(ARQUIVO CENTRAL)
Fig. 176-179: As novas escolas no
Quitandinha e Funcionários, o cinema
e o novo hospital
(ARQUIVO CENTRAL)
Fig. 180-186: Residências
(ARQUIVO CENTRAL)
165
Fig. 188: A cidade e a usina em 1971
(Relatório 1971, 1972)
Fig. 187:
A cidade e a usina em 1968
(ARQUIVO CENTRAL)
166
IV.1.3 A CIDADE ABERTA: TIMÓTEO OU ACESITA? (1968-1992)
Com o fim da primeira expansão da usina, em 1963, ficou ainda mais evidente a gravidade da situação
financeira da empresa, pois às vésperas de completar vinte anos, ainda não fora capaz de equilibrar
suas contas. Nos relatórios de 1963 e 1964, além dos fatores conjunturais
459
, a capacidade produtiva da
aciaria, muito inferior à laminação, era apontada como responsável por limitar o incremento da
produção e, conseqüentemente, das vendas. Sem capital de giro suficiente para bancar uma expansão,
a empresa precisava ter seu plano de expansão aprovado, a fim de obter qualquer tipo de
financiamento, fazendo com que a principal preocupação dos presidentes da companhia, a partir de
então, fosse demonstrar a viabilidade de novos investimentos, o que os levou a adotar uma política de
contenção de despesas e ir em busca de novas fontes de recursos
460
.
Neste contexto, os gastos com a construção da cidade, considerados um dos principais fatores de
endividamento, acabaram finalmente por se mostrar compensatórios, pois além de terem
proporcionado o desenvolvimento da região e garantido a oferta de mão-de-obra, eram passíveis de ser
convertidos em “fonte de recursos”. Assim, a partir de 1964, acreditando já ter cumprido sua missão
civilizatória, a ACESITA adotou a estratégia de “liberar o capital empatado na cidade”, promovendo
sua abertura, ou seja, passou a planejar “A venda aos operários das casas que compõem o conjunto
residencial da Companhia [como] uma recuperação de recursos da empresa, que podem ser
reinvestidos em outras casas ou na expansão da indústria”. (Relatório 1965, 1966: 06)
Essa intenção de desincumbir-se da cidade foi reforçada pela emancipação de Timóteo do Município
de Coronel Fabriciano em 1964, do qual era distrito desde 1948
461
. Segundo o Sr. Waldetário
V
ITORINO DIAS,
28/mar/2002)
462
, havia um intenso jogo político por trás da emancipação da cidade,
uma vez que a Prefeitura de Coronel Fabriciano, “...
naquela época, não tinha nenhuma renda em
decorrência da atividade da ACESITA, nem mesmo de Imposto Territorial e Urbano, porque ela havia isentado
a ACESITA de todos os tributos. A filosofia tributária da época era do Imposto de Venda e de Consignações”.
459
Os fatores apontados são a crise política, que na realidade irá refletir somente na produção do ano seguinte, inflação e
decréscimo da produção industrial do país “A retração do mercado do aço, em decorrência, principalmente, da queda de
produção da indústria automobilística, a elevação de taxas cambiais, as crises políticas, as sucessivas greves e o crescente
agravamento da crise inflacionária, influíram, decisivamente, na estrutura econômico-financeira da Emprêsa, cuja
capacidade de produção nominal permanece limitada a 120.00 toneladas anuais de lingotes.” (Relatório 1963, 1964: 04)
(AnexoII_mapa04, AnexoI_tab03)
460
Neste processo de saneamento econômico destacam-se duas estratégias adotas pela direção da empresa: a dispensa de
pessoal – contrariamente ao que se afirma no relatório de 1964, não parece nada gradual, havendo uma redução de mais de
mil funcionários de um para o outro (1964 – 6023, 1964 – 4879). A outra estratégia diz respeito ao aproveitamento dos
passivos da empresa como fonte de recursos; assim, além da abertura da cidade operária, a Fazenda Ipanema em Ipatinga
também é loteada; a fim de aproveitar as propriedade rurais, cogita-se até mesmo o investimento em pecuária, além da
associação com a Companhia Vale do Rio Doce para exportação de minério das minas em Itabira (Relatório 1965, 1966).
461
O local onde hoje se situa a cidade de Coronel Fabriciano começou a ser ocupado com a chegada de Francisco Romão,
que numa canoa fazia o transporte entre as cidades da região. Em 1922, com a chegada da ferrovia e a construção da
estação do Calado, o povoado ganhou maior importância, ocorrendo a transferência da sede da povoação de Santo Antonio
de Piracicaba de Melo Viana para o Calado. No entanto, o impulso definitivo para a criação da cidade foi a exploração
madeireira para produção de carvão promovida pela Belgo-Mineira a partir de 1934 (vide mapa). Com o crescimento do
núcleo urbano e incremento da sua infra-estrutura, em 1948, o distrito de Coronel Fabriciano, assim chamado desde de
1938, conquistou o status de município em 1948 (ASSOCIAÇÃO Comercial e Industrial, 1985).
462
O Sr. Waldetário Vitorino Dias teve uma vida repleta de mudanças, desde os tempos de menino em Dionísio, de estudo
em São Domingos do Prata, até o trabalho junto a um caixeiro viajante, funcionário e depois proprietário de um laboratório
em Belo Horizonte, até o retorno ao Vale do Aço como almoxarife da CVRD na ponta de linha da Ferrovia Vitória-Minas,
depois no escritório da ACESITA e, finalmente, abrindo sua própria gráfica e presidindo a Associação Comercial de
Timóteo.
167
Em decorrência disso, a arrecadação municipal não era favorecida pela vinculação com Timóteo; este,
por sua vez, também não tinha qualquer vantagem em permanecer distrito de Coronel Fabriciano, pois,
sem uma arrecadação condizente, não havia recursos para serem aplicados na região. Outro aspecto
interessante é que a concentração de atividades econômicas nas cidades operárias de Ipatinga e
ACESITA tinha conseqüências sobre a representação nos órgãos do poder político local, sendo que
“...
dos 11 vereadores, 1 só era de Coronel Fabriciano”,
tornando ainda mais difícil a administração não ser
influenciada pelo interesse das empresas sediadas nesses distritos. Esta versão, semelhante à
apresentada pelo Sr. Perácio B
ICALHO
463
(15/nov/2002), segundo o qual, embora a arrecadação
municipal fosse
... inexpressiva, os municípios dependiam absolutamente de verbas do estado,... quando a cidade se
emancipou, não se pagava ICM, se pagava um tributo que chamava Imposto sobre Vendas e Consignações,
... as prefeituras recebiam uma certa parcela que quase nunca vinha, porque não havia sistematização do
processo, e mesmo assim a prefeitura de Fabriciano isentou a ACESITA durante alguns anos, no ano em
que a ACESITA ia começar a pagar, Timóteo se transformou em cidade e Ipatinga também. Então
Fabriciano perdeu suas principais fontes de renda.
Embora as impressões do senhor Waldetário – “seu” Vavá – pareçam bastante coerentes, enquanto as
do Sr. Perácio apresentem algumas contradições
464
, o material pesquisado favorece à postura do Sr.
Perácio, pois nele o processo de emancipação da cidade é constantemente descrito como uma “luta”
que começou a ser travada ainda na década de quarenta
465
, mas que somente em 1962, devido ao
empenho do deputado estadual Geraldo de Morais Quintão e representantes locais (A
NÔNIMO, s.d.),
conquistou-se a primeira vitória. Embora, a princípio, tenha sido vetado pelo governador do Estado,
Magalhães Pinto, data desse ano a promulgação da n
o
3.185 (posterior Lei 2.764 de 30 de dezembro de
1962), cujos anexos I e II dão conta da emancipação dos municípios de Timóteo e Ipatinga
466
(DIÁRIO
DO
AÇO, 29/04/1979). Após dois anos de intensas reivindicações, finalmente, em 29 de abril de 1964
foi homologada a emancipação política de Timóteo, fato descrito pelo jornalista Euclides S
ABARÁ
(1993) como motivo de grandes celebrações na cidade, tanto nas ruas quanto no Elite Clube, onde teve
lugar o “Baile da Vitória
467
.
A partir de 1967, além da emancipação política de Timóteo, a ACESITA encontrou uma conjuntura
favorável tanto local quanto mundialmente, pois nesse momento a capacidade instalada das
siderúrgicas brasileiras estava próxima de atingir seu limite e os elevados preços praticados no
463
O Sr. Perácio de Araújo Bicalho trabalha na prefeitura do município de Timóteo desde sua criação, natural da região, filho
de pai seleiro e posterior proprietário de um bar, aos 17 anos, após concluir seus estudos no seminário em Congonhas,
empregou-se numa empreiteira de carvão da USIMINAS, onde permaneceu cinco anos até ser contratado como escriturário
na Prefeitura de Timóteo, onde chegou a exercer o cargo de vice-prefeito (gestão 1989-1993 de Geraldo Nascimento) e
permanece empregado até hoje.
464
Se o imposto era estadual, não havia como ter sido isentado pela Prefeitura de Coronel Fabriciano, a não ser que ele se
referisse ao IPTU e não Vendas e Consignações ou ICM.
465
Segundo os Sr. Perácio BICALHO (15/nov/2002), anos antes houvera uma tentativa de emancipação de Timóteo da qual seu
pai participara e que fora frustrada devido à cooptação de um dos vereadores, o que impediu que ela saísse da esfera local.
Pelo que consta no material pesquisado, a primeira tentativa de emancipação do município de Timóteo ocorreu logo após a
instalação da ACESITA, ainda na década de 1940, cujo fracasso levou à condição de distrito de Coronel Fabriciano
(P
REFEITURAS MUNICIPAIS do Vale do Aço, 1998; PREFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1981).
466
Ipatinga foi emancipada em 29 de junho de 1964 (CARVALHO, 1998).
467
Quanto ao controle do executivo, embora não tenha sido possível verificar o número de eleitores em Coronel Fabriciano
no período, a comparação do quadro evolutivo da população destes três municípios indica que mesmo Ipatinga só superou
a população de Coronel Fabriciano na década de 1970, enquanto Timóteo até hoje abriga uma população 25% menor (vide
AnexoI_tab06).
168
mercado norte-americano indicavam a viabilidade da exportação da produção brasileira (Visão,
ago/1968), fazendo com que o segundo plano de expansão da ACESITA
468
não encontrasse grandes
dificuldades para ser aprovado. Especialmente levando-se em conta que, a partir de 1967, o general
Edmundo de Macedo Soares
469
assumiu o Ministério da Indústria e Comércio do governo Costa e
Silva, cuja postura era diametralmente oposta a do governo Castelo Branco que, além da política
recessiva, não via a siderurgia como um setor prioritário (G
RECO, 1984).
Batizado com o nome do presidente do Banco do Brasil responsável por sua aprovação, Nestor Jost
470
,
também internamente o plano encontrou um contexto favorável, com seu início coincidindo com as
comemorações do Jubileu de Prata da companhia e a presidência de Wilkie Moreira Barbosa que,
oriundo do Banco do Brasil e ex-aluno de Macedo Soares na Escola de Engenharia do Exército
(A
TAÍDE, 1986), tinha trânsito tranqüilo junto às duas instituições
471
.
O plano aprovado em 1969
472
deveria ser concluído em 1980 e constava de duas etapas. A primeira,
chamada de 2ª Expansão, pode ser considerada uma complementação da 1ª Expansão, pois pretendia
simplesmente equilibrar a produção da aciaria à capacidade da laminação, elevando a produção para
300.000 toneladas/ano. Mas, se a primeira etapa era tida como simples e de curto prazo
(aproximadamente três anos), a segunda etapa, ou 3ª Expansão, seria de longo prazo e implicava em
transformações bem mais profundas, tanto técnica quanto administrativamente.
Assim, no contexto deste grande plano, a abertura da cidade era somente mais uma parte, sendo
descrita no Relatório 1966 (1967: 03) como uma “... providência [que se] inscreve em plano de
alcance mais amplo, que é o de encerrar a fase de ACESITA como um núcleo fechado, situação que
não mais se justifica no estágio atual de desenvolvimento da região do Vale do Rio Doce”. A abertura,
no entanto, não significou um completo desligamento da indústria dos cuidados com a cidade, mas sim
uma nova forma de ela se relacionar com a população e participar do desenvolvimento do novo
município. Participação que, como se nota pela Escritura Pública de Reconhecimento de Domínio
lavrada em 31 de outubro de 1968, continuou a ser intensa.
Nesse documento se esclarece que a ACESITA
468
Booz-Allen and Hamilton International Corporation foi a firma contratada para realizar o plano de reestruturação
administrativa da companhia que incluía o desligamento da ACESITA da prestação de serviços urbanos (ACESITA,
1989).
469
Entre os principais feitos de Macedo Soares no ministério está a criação do CONSIDER e do GCIS (Grupo Consultivo da
Industria Siderúrgica), responsável pela elaboração do relatório que serviria como base para a elaboração do Primeiro
Plano Nacional de Siderurgia, revertendo a visão pessimista colocada pelo Relatório Booz-Allen, contratado em 1965 pelo
então ministro do Planejamento Roberto Campos por indicação do BIRD (G
RECO, 1984).
470
Na verdade, segundo Mauricio LEMOS & Júlio PIRES (1992), Nestor Jost pretendia a privatização da companhia, pois, ao
mesmo tempo em que o Banco do Brasil não pretendia transferir a empresa para o BNDE, já sobrecarregado com COSIPA,
USIMINAS e COFAVI, ele não tinha condições (técnicas ou financeiras) para administrá-la, além do que, já havia
encontrado interessados na aquisição.
471
Segundo um dos entrevistados, a fim de evitar que houvesse o que chamou de sucateamento da empresa, com a separação
da produção da extração de matéria-prima, dependia da aprovação deste plano que enfrentou a oposição da Sociedade
Mineira de Engenheiros e industriais paulistas, levando o presidente da ACESITA, Wilkie de Moraes, a buscar apoio num
movimento popular encabeçado pela Associação Comercial de Minas. Apoio que foi expresso em audiência com o
presidente Costa e Silva e ao qual o presidente teria respondido afirmativamente. (VITORINO DIAS, 28/mar/2002).
472
Segundo Mauricio LEMOS e Júlio PIRES (1992) o plano foi posto no papel em 1970 e deveria contar com três fontes de
recursos: externos, para equipamentos importados; FINAME/BNDE para equipamentos nacionais; Banco do Brasil para
reformas civis.
169
... como pioneira na região, foi forçada a construir, por sua própria conta, a cidade de ACESITA, nesta
localidade, na qual tudo lhe pertence, inclusive estação de captação de água e respectiva rede de iluminação
pública fornecida pela Usina Hidrelétrica de Sá Carvalho, rêde de esgotos, rêde telefônica local e interna na
uxina[sic] Siderúrgica (...). Calçamentos de vias públicas e logradouros públicos e obras de arte, escolas
primárias, secundárias e técnicas, clubes, hospital, cemitério, praças e jardins e demais benfeitorias
existente III) – que já agora, considerando o grande desenvolvimento do município de Timóteo e atendendo
ao geral apelo da população local e atendendo ainda a que muitos dos serviços públicos que mantem e que
podem ser melhorados por sua natureza em razão da emancipação (de Timóteo) digo política, administrativa
e econômica de Timóteo, da competência da municipalidade, tem por bem e pelo presente instrumento,
ouvido o poder competente do Município de Timóteo, declara o reconhecimento de domínio público sobre
avenidas, praças, ruas e outros logradouros públicos da cidade de ACESITA;... (sem grifo no original)
Desta forma, ao mesmo tempo em que transfere “... à Prefeitura para que passe a administrar ou
promover os seguintes serviços públicos: a) limpeza urbana; b) remoção de lixo; c) cemitério secular;
d) conservação das vias públicas no perímetro urbano; e) serviços de esgotos da cidade”, a companhia
permanece responsável pelos serviços de abastecimento de água, iluminação pública, além de prover,
pelos próximos cinco anos, imóveis para abrigar o zelador do cemitério, a sub-prefeitura e
almoxarifado municipal em ACESITA
473
, doando ainda um “... trator e quatro carretas para serviços
de limpeza pública urbana de ACESITA”.
De um modo geral, o conteúdo do documento demonstra que a abertura da cidade operária interessava
mais à empresa do que à administração municipal, fato que se explicita no caso da transferência das
redes de abastecimento de água, iluminação pública e calçamento das ruas
474
. Nota-se também que,
apesar de submeter-se às leis municipais e continuar responsável por esses serviços, a ACESITA deixa
claro que não abre mão de influir no desenho da cidade caso lhe convenha, deixando acertado que
“... nos Bairros denominados NEO [sic] e VAI QUEM QUER a Prefeitura fará apenas os serviços de
saneamento, sem nenhum compromisso de obras de infra-estrutura, uma vez que se realizados, poderiam vir
a ser danificadas ou tornadas sem efeito posteriormente, tendo-se [sic] em vista que tais áreas destinam-se à
expansão da Usina Siderúrgica.”
Percebe-se ainda que a manutenção dos serviços de infra-estrutura e a oferta de equipamentos e
imóveis por parte da empresa, muito mais do que uma preocupação com o conjunto da cidade, é uma
forma de garantir boas condições de moradia para seus empregados, viabilizando a atração de pessoal
mais especializado, o que implica numa restrição da sua área de interesse. Intenção que se evidencia
nos relatórios anuais a partir de 1969, nos quais, ao mesmo tempo em que saúda a abertura da cidade
apresentando o número de casas vendidas, que em 1972 somavam 1.676, destaca o projeto para
conclusão do centro comercial (Relatório 1966, 1967) e a permanência da empresa no provimento de
habitação à população, seja por financiamento das casas postas à venda (em 1972 representaram
473
Segundo o senhor Perácio BICALHO (15/nov/2002) “... a água continuou a ser administrada pela ACESITA, até que
... por volta de 75, fez-se um convênio da Prefeitura e da COMAG, depois transformada em COPASA
(Companhia de Saneamento de Minas Gerais) e ela, assumiu todo o processo. Mas a energia elétrica
continuou sendo administrada pela ACESITA. Basicamente, o que ficou na mão da Prefeitura foi o
calçamento e a limpeza das ruas.
474
Estabelecendo-se, no caso do abastecimento de água, inicialmente a organização de um convênio entre a prefeitura e a
companhia, que permanece responsável pelo serviço até “quando interessar à prefeitura” assumi-lo. Quanto à iluminação
pública, fica acertado que devido à sua complexidade e ao custo elevado serão necessários levantamentos técnicos mais
detalhados para determinar a “conveniência ou não de sua transferência à municipalidade”. Em contrapartida, o hospital e
as escolas da companhia estão isentos de impostos municipais; o calçamento a ser realizado pela prefeitura nas áreas
transferidas à municipalidade terá um abatimento de 60%, enquanto o das áreas que excedem este perímetro deverão ser
pagos nos cinco anos subseqüentes com desconto de 40% do total medido.
170
80%
475
), seja por parcerias com o governo estadual (COHAB).
Neste sentido, pode-se dizer que a abertura da cidade operária pouco iria colaborar no processo de
integração entre o antigo povoado e a cidade da fábrica, com as benfeitorias a encargo da ACESITA
concentrando-se no centro Norte, ou seja, em áreas próximas à usina e que esta tinha interesse em
manter em bom estado. A única exceção é a doação do terreno para construção do bairro Primavera
476
(consócio entre a prefeitura e o governo do estado), que tem a intenção declarada de promover a “...
unificação, ligando a sede política administrativa de Timóteo à sua Cidade Industrial, a ACESITA,...”
(P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1973: s.p.).
Observa-se, portanto, que a abertura da cidade não significou a venda de todas as terras de propriedade
da empresa, nem na área central (vide mapa com áreas da ACESITA em 1991), nem na área rural.
Também não significou seu desligamento total da construção de novos bairros, mas sim uma nova
forma de relacionamento, agora intermediada pelo poder municipal. E, se financeiramente a abertura
da cidade foi um bom negócio para a empresa, politicamente parece ter sido ainda mais promissora,
pois permitiu o estreitamento de laços já existentes.
Um dos aspectos onde esta aproximação se mostra mais evidente é o freqüente “empréstimo” de
funcionários para exercer cargos técnicos na prefeitura. Conforme disse o senhor Perácio B
ICALHO
(2002), isto “... foi muito comum nos primeiros tempos, quando a prefeitura não tinha muitos
recursos”; então havia empregados da ACESITA que “davam umas horas por dia aqui” (na
prefeitura). Este foi o caso de advogados, engenheiros e também do arquiteto José Luiz Batista que,
após o expediente na empresa, “fazia um bico” na prefeitura ajudando a organizar o setor de
fiscalização de obras. No entanto, mesmo após a formação de um quadro técnico bem qualificado,
lembra seu Perácio, “... este tipo de intercâmbio ainda existiu. Hoje, por exemplo [2002], nós temos o
secretário de desenvolvimento econômico, que foi cedido pela ACESITA. Ele licenciou lá e veio para
”. Assim, torna-se ainda mais difícil apontar com exatidão quais aspectos e projetos municipais
sofreram influência da ACESITA, pois nesta relação simbiótica, muitas vezes seus interesses estão
encobertos por justificativas técnicas gestadas internamente, não aparecendo na esfera política. Mas se,
por vezes, a participação da ACESITA na administração municipal de Timóteo parece difusa e pouco
evidente, em outras ela é bastante evidente, especialmente nos momentos iniciais, quando sua presença
é essencial, tanto no provimento de serviços públicos, cujos encargos o município ainda não tinha
recursos para suprir, quanto na oferta de pessoal técnico para organizar e supervisionar os serviços
municipais.
475
Relatórios Anuais 1969-1972 (1970-1973)
Ano Escrituras lavradas Compras financiadas
1969 156
1970 740 592
1971 422
1972 358
476
Das 546 unidades residenciais previstas para serem construídas em 1972, 471 situavam-se no Bairro Primavera (Relatório
1971, 1971).
171
Contudo, se os primeiros prefeitos
477
tiveram grandes dificuldades de compatibilizar o minguado
orçamento municipal com as despesas públicas, a partir de 1967, com o novo Código Tributário (Lei
n.
o
5.172, de 25 de outubro de 1966), a arrecadação municipal saltou de 102 milhões para 1 bilhão e
200 mil cruzeiros novos (B
ICALHO, 15/nov/2002); arrecadação que permitiu o aparelhamento da
administração municipal, por intermédio da realização de concurso público (1970) para formação do
quadro municipal e da compra de equipamentos para dar início a um extenso programa de obras que
visavam não somente equiparar Timóteo (centro sul) à ACESITA (centro norte), mas também
absorver o crescimento esperado para a cidade.
As grandes expectativas de crescimento que marcaram a década de 1970, em Timóteo foram
incrementadas pelo início da 3ª Expansão da usina (1972), que previa ampliar a capacidade de
produção para 1 milhão de toneladas/ano e incrementar a fabricação de aço inoxidável
478
, além da
adequação e atualização tecnológica da usina
479
. A fim de absorver todo este crescimento e
objetivando centrar seus recursos no que hoje se tem chamado “bussiness core” da empresa,
promoveu-se uma descentralização administrativa, com a criação de três empresas subsidiárias: a
Forjas ACESITA
480
, a ACESITA Florestal
481
e a Itavale, responsáveis, respectivamente, pela
fabricação de produtos destinados à indústria automotiva, exploração do carvão vegetal e extração e
comercialização de minérios
482
.
Essas mudanças tiveram reflexos que extrapolaram em muito os limites até mesmo da região do Vale
do Aço, pois a fim de aumentar a produção de aço, havia a necessidade de ampliar a produção de
carvão vegetal
483
, o que levou a ACESITA a intensificar a aquisição de terras, chegando a possuir
477
Não foi possível obter muitas informações sobre as administrações de José de Araújo e Jaimar de Castro Coura, sendo a
escritura de abertura da cidade e o relato do senhor Perácio Bicalho as principais fontes para as duas primeiras gestões.
478
A produção de aços especiais iniciou-se em 1951; no entanto, é somente em 1955 que começam a ser produzidas chapas
de aço silicioso, constando o ano de 1965 como o de início da fabricação de inox (ACESITA, s.d.).
479
Que seria executada a partir de convênios com empresas estrangeiras.
480
A FASA (Forjas ACESITA) foi criada em 1974, segundo Maurício LEMOS & Júlio PIRES (1992), num momento de
empolgação com o crescimento da economia nacional. Tendo como parceira a Sumitomo Metals Industries, que a partir de
1977 passou a se desinteressar pelo negócio, levando a participação da ACESITA a passar 60% para 90%. Enfrentando
problemas técnicos e um mercado fortemente competitivo e estagnado, até 1992 a empresa jamais atingiu sua capacidade
nominal de produção, ficando a efetiva em torno de 30% desse total. Este superdimensionamento e a perda de pessoal
especializado para o mercado, somados à crise dos anos 1980, fizeram com que, as vésperas de sua privatização, o prejuízo
acumulado fosse mais do que suficiente para a construção de uma nova FASA.
481
Criada com a finalidade de produzir o carvão vegetal para a usina de Timóteo, a ACESITA Energética (até 1984
denominada Florestal ACESITA) passou a ser responsável por 120 mil ha de florestas de propriedade da ACESITA (80
mil no vale do Jequitinhonha, 20 mil no vale do rio Doce e 12 mil no vale do Mucuri), administrando uma área total de 264
mil ha que lhe foi transferida em comodato. Enfrentando a concorrência do carvão produzido a partir de mata nativa (cerca
de 36% mais barato), a empresa jamais conseguiu dar lucro, o que tornou proibitivos os investimentos necessários para
suprir 100% da demanda de carvão vegetal da usina. A partir da década de 1990, seguindo a tendência das demais usinas
da região, a ACESITA passou a misturar ao carvão vegetal o coque importado (L
EMOS & PIRES, 1992), o que fez com que
a Energética fosse levada a buscar na indústria moveleira e na construção civil novos mercados consumidores. Hoje ela
continua a abastecer a usina da ACESITA em Timóteo, porém, a partir de 1995, com a criação da Preservar Madeira
Reflorestada Ltda. consolidou seu compromisso com a produção de madeira para multiuso (
ACESITA ENERGÉTICA, 2006).
482
Na constituição destas subsidiárias, a ACESITA buscou parceria com empresas que, juntamente com o capital,
trouxessem novas tecnologias, entre elas estão a japonesa Sumitomo Metals Industries Ltd., sua associada na Forjas
ACESITA S.A. e a Níquel Santa Maria S.A. na Itavale (empresa de mineração) (G
OMES, 1976).
483
Tendo por base os dados levantados no Relatório Booz-Allen, mas sem seguir suas determinações, em 1967 foi elaborado
o Plano Siderúrgico Nacional que previa para a década de 1970 ampliações nas principais siderúrgicas estatais brasileiras.
A partir de então, se reavivaram as discussões em torno da matriz energética (carvão mineral x carvão vegetal), da
localização e dimensão das unidades produtiva (V
ISÃO, 1968; EXAME, 1970).
172
cerca de 100 mil hectares
484
. Assim, enquanto a ACESITA vendia um número considerável de imóveis
urbanos, passou a comprar propriedades rurais, especialmente na região do Vale do Jequitinhonha
485
.
Observa-se, portanto, que, embora a ACESITA continuasse responsável por alguns serviços urbanos, e
a eminente contratação de pessoal para os trabalhos de expansão e operação da usina a mantivesse
atuando na produção de moradia para seus empregados, a responsabilidade de cuidar de ruas, praças e
equipamentos urbanos foi sendo cada vez mais assumida pelo poder municipal. Esse fato pode ser
constatado na Relação de Atividade do Prefeito Antônio Silva (P
REFEITURA MUNICIPAL DE
TIMÓTEO, 1973) para o biênio 1971-72, na qual a ênfase em obras de infra-estrutura demonstra
também que (AnexoII_mapa01), contrariamente ao que se podia imaginar, os bairros construídos pela
ACESITA careciam de obras tanto quanto o restante da cidade, pois, embora em sua maior parte as
redes de água potável, esgoto e pluvial tivessem sido construídas pela companhia, em alguns bairros
(Quitandinha, Bromélias, Técnicos e Centro), elas não tinham sido completadas. Além do que, a
pavimentação de ruas e calçadas sempre fora relegada a segundo plano pela ACESITA, o que fica
claro na Escritura de Transferência de Domínio Público, na qual este serviço é deixado totalmente a
cargo da prefeitura.
Fora as obras de infra-estrutura
486
, nas duas administrações
487
seguintes, Jésus Martins
488
e Geraldo
Ribeiro, a criação de programas de cunho social ganhou força, com a implantação do FAST (Fundo de
Ação Social de Timóteo), a construção de escolas (Cachoeira do Vale, Ana Rita, Primavera e João
XXIII), praças (Centro Sul, Olaria, Timirim, Quitandinha, São Cristóvão e Cachoeira do Vale) e
centros de esportes (Primavera e Cachoeira do Vale). Datam desse período também a construção do
Mercado Municipal, da Matriz São José (Timirim), do Quartel da Polícia Militar (4
a
Companhia da
PM-MG), do Centro Social e Urbano (CSU) e do Conjunto Habitacional Repouso para Idosos Tio
484
No Relatório de 1965 (1966) consta que a empresa possuía um total de 801.516.454 m
2
, ou seja, aproximadamente 80 mil
ha, enquanto em 1976 Francisco G
OMES (1976) diz que a ACESITA possui cerca de 100 mil ha, o que significa a aquisição
de aproximadamente 20 mil ha em dez anos, mas isto é pouco se comparado aos 264 mil computados em 1992 (L
EMOS
&P
IRES, 1992). Um pouco da evolução na aquisição de terras da ACESITA pode ser observada na tabela 03 do Anexo 1.
485
No site da empresa (ACESITA ENERGÉTICA, 2006) destacam-se as transformações provocadas nas cidades de Capelinha,
Itamarandiba, Minas Novas, Veredinha e Turmalina, todas cidades com população que vai de 15 mil a 31 mil habitantes
(IBGE cidades@) e onde a chegada da ACESITA Energética levou a criação de milhares de empregos e investimentos “...
em obras de infra-estrutura e na melhoria dos serviços de atendimento à população, com destaque para a educação, saúde
e lazer, melhorando a qualidade de vida nesses municípios”. O que não se menciona é a quantidade de terras adquiridas
pela empresa, novamente um processo de concentração fundiária que levou a uma completa reestruturação produtiva na
região, cuja população passou a depender fortemente da ACESITA, como se pode observar pelas atividades que a empresa
passou a patrocinar na região (ACESITA
ENERGÉTICA, 2006).
486
Até 1981, haviam sido executados trabalhos na rede de água pluvial nos bairros de Cachoeira do Vale, Olaria, Primavera,
São Cristóvão e Alvorada, além de redes de eletrificação na área rural e nos bairros de Cachoeira do Vale, Macuco, Alegre,
Ana Moura e Centro Sul. As obras de calçamento e urbanização foram executadas nos bairros: Alegre, John Kennedy, São
José, Serenata, Ana Rita, Santa Rita, Primavera, Ana Malaquias, Olaria, Nossa Senhora das Graças, Bela Vista, Cachoeira
do Vale Santa Maria, Garapa, João XXIII, Alvorada, Técnicos, Quitandinha, São Cristóvão e nos bairros rurais de Pelonha
e Macucuco.
487
As informações sobre as administrações municipais foram extraídas principalmente da entrevista com o senhor Perácio
Bicalho, de material produzido pelas administrações e recortes de jornal (obtidos do acervo da Biblioteca Municipal de
Timóteo nas pastas “prefeitos”).
488
As informações obtidas sobre Jésus Martins de Assis (1973-1976) são bastante escassas, constando apenas de um
informativo de 1977, que pouco esclarece sobre sua administração (P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1977).
173
Nestor. A partir de 1979 surgem as primeiras preocupações com o combate às enchentes
489
, reforma
do cemitério
490
e começa a ser pensada a reformulação da área central norte (ACESITA), que em 1981
já possuía os canteiros centrais e calçadões que a caracterizam até os dias de hoje.
A integração entre Timóteo e ACESITA ganhou destaque no início da década de 1980, sendo
abordada pela administração municipal sob dois ângulos, físico e psicológico. Desta forma, ao
promover a construção de três pontes ao longo do córrego do Timóteo, a prefeitura afirmava ter
conseguido “... integrar fisicamente a sede ao Município”, faltando somente “... uma maior
conscientização dos moradores para se promover uma verdadeira integração psicológica entre os dois
núcleos”. (P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1981a: 45). No entanto, a integração psicológica que
se pretendia por intermédio da realização de um plebiscito para definição do nome da cidade, a ser
escolhido entre Timóteo e ACESITA
491
, parece ter reavivado ainda mais as diferenças. Assim, em
outubro de 1980, Geraldo Ribeiro convocou um plebiscito onde os moradores eram chamados a
responder à pergunta: “Você é a favor ou contra a mudança do nome de Timóteo para ACESITA?” No
entanto, em vez de ajudar na aproximação entre os dois núcleos, o ressurgimento da questão do nome
da cidade, que já era polêmica devido às incertezas quanto à origem do nome Timóteo, acirrou os
ânimos, fazendo ressaltar as diferenças entre o antigo povoado e a cidade da fábrica. Enquanto de um
lado os “acesitanos” pregavam a mudança, afirmando que somente com a chegada da companhia a
região ganhou importância e que, pela quantidade de obras e pessoas a ela associadas, a companhia era
a verdadeira fundadora da cidade – segundo Padre Abdala Jorge, o nome Timóteo é artificial, “... não
condiz com a realidade. (...) o nome ACESITA se impôs desde antes da emancipação política da
cidade. A cidade sempre foi, e continuará sendo, ACESITA” –, por outro lado, moradores mais antigos
defendiam ferrenhamente a permanência do nome Timóteo, pois a comunidade existia muito antes da
chegada da ACESITA – em 1980, contava 119 anos e fora ela que acolhera e adotara como filhos os
trabalhadores da empresa (G
ONZAGA, 1980). Contudo, nada espelha melhor as dificuldades de
conciliação do que o resultado do plebiscito. Embora se tivesse registrado nas urnas uma arrasadora
vitória em favor da mudança, pressões políticas
492
levaram à não homologação da lei de mudança do
nome da cidade para ACESITA (F
IRMINO, 1994). Resultado que oficializa a idéia que a ACESITA
vinha tentando incutir na população desde a abertura da cidade, e que Seu Nelito (Manoel Assis
Bowen, ex-presidente da Câmara de Timóteo), resume muito bem: “A cidade não é a usina”. Assim,
em 1980, mais uma vez se reafirma oficialmente a separação entre a cidade e a usina, Timóteo não é
ACESITA.
489
Neste momento a principal preocupação ainda é com os efeitos da enchente, levando a administração a preferir
investimentos em inspeções sanitárias, vacinações e desinfecção e limpeza de bueiros e córregos em vez de em obras de
prevenção (PREFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1979).
490
A reforma, descrita nos jornais como “reurbanização”, do cemitério e a construção de uma nova capela e velório se
prolongaram durante as duas próximas administrações.
491
Vale ressaltar que esta não foi a primeira tentativa de modificar o nome da cidade; em 1970 houve uma tentativa de
mudança do nome da cidade para Guadalajara, em homenagem a conquista da Seleção Brasileira de Futebol no México,
mas que foi frustrada (SILVEIRA, s.d.).
492
Em 1994, os jornais novamente dão relevo à discussão, entrevistando partidários de ambos os lados. Segundo reportagem
assinada por Edmilson F
IRMINO (1994), o principal articulador da vitória dos timotenses sobre os acesitanos na Assembléia
Legislativa de Minas Gerais foi o ex-deputado Emílo Gallo e o advogado Geraldo Quintão.
174
Um relacionamento mais direto entre a ACESITA e a administração municipal reaparece somente com
Leonardo da Cunha (Lelé)
493
como prefeito, quando ela foi chamada a colaborar na construção da sede
da Fundação Mineira da Criança (FUMIC), na promoção do carnaval
494
, na solução do problema das
enchentes
495
e no Programa de Formação de Novos Empresários
496
. Comprometida com a implantação
de seu plano de expansão, neste período a empresa parece ter realmente se desligado dos problemas da
cidade, com sua participação nestes projetos consistindo principalmente na doação de terras
497
para
viabilizar os empreendimentos. Novamente, este afastamento não significou que deixasse de ser
responsável por mudanças significativas na estrutura urbana da cidade, e em conformidade com o que
já se previa no termo de transferência para o município, os bairros Neo (na verdade Neu – núcleo de
expansão da usina) e Vai Quem Quer
498
, localizados a leste da usina e entre os bairros Técnicos e
Quitandinha, foram completamente demolidos a fim de dar lugar à nova laminação de aço inoxidável
(vide AnexoII_mapa03,04 e 06).
Quanto à atuação da prefeitura no desenvolvimento urbano da cidade, nota-se que, nesta primeira
administração de Leonardo da Cunha, maior atenção foi dispensada às áreas periféricas, como os
bairros de Cachoeira do Vale
499
, Ana Moura
500
, Alvorada, Limoeiro e Macuco; atenção que reflete o
crescimento dessas áreas na última década e que a localização, ao longo do mesmo eixo viário
501
onde
se inicia a implementação do novo distrito industrial (Núcleo Industrial Maia, no bairro do Alegre),
indica que se espera que continuem a crescer.
Estas expectativas de crescimento, no entanto, não se confirmaram por causa, em grande medida, da
crise econômica que assolou o país no início da década de 1980, sendo que das 55 empresas que
tinham elaborado planos para se instalar na cidade nos anos seguintes, não mais que 7 buscaram apoio
493
A “restauração” do forno Hoffman também é reivindicada por Leonardo Cunha.
494
Também assunto a ser tratado no capítulo 6.
495
As enchentes na região são apontadas como eventos marcantes principalmente nos anos 1979, 1980, 1952, 1983, 1985,
1987, 1992, e 1996 (D
IÁRIO DO AÇO, 1999). Segundo reportagem do anuário Vale do Aço 2000 (DIÁRIO DO AÇO, 1999), já
em 1982 os danos causados pelas chuvas em Cachoeira do Vale são atribuídos à ponte da CVRD que, por ser muito baixa,
funcionaria como barragem durante o período de cheias; no entanto, reportagem da revista C
IDADES (1986) aponta que a
questão da ponte surge após terem sido iniciadas as obras de retificação e dragagem do Rio Piracicaba, que passa então a
ser analisada pelo DNOS (Departamento Nacional de Obras e Saneamento), CVRD e ACESITA.
496
Iniciativa da prefeitura visando gerar empregos e que contava com incentivos estaduais por inserir-se na busca da
diversificação do parque industrial mineiro. O novo distrito industrial estava dividido em 11 núcleos com lotes que variam
de 3 mil a 140 mil m
2
(PREFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1986).
497
Com exceção da enchente, quando participa disponibilizando pessoal técnico para avaliação do problema. Mas já para a
FUMIC (Fundação Mineira da Criança), a ACESITA doa uma área de 350 mil m
2
para construção do Lar do Menor, no
bairro Primavera (P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1986), para cada escola de samba (quatro no total) um lote para
erguer sua quadra, e para o Programa de Formação de Empresários disponibiliza glebas para implantação das novas
indústrias.
498
Segundo Nazareno ATAÍDE (1986: 219), nenhum dos dois bairros possuía casas de boa qualidade, nem primavam pelo
planejamento. Enquanto o primeiro fora surgindo aos poucos e possuía grande número de casas, sendo densamente
habitado, o Neu constituia-se de “três ruas paralelas, barracas de madeira, muito pequenas, com apenas quatro cômodos.
...foi levantado quando das primeira expansões a usina”.
499
Nos bairros de Cachoeira do Vale e Vale Verde são construídas novas escolas, e no primeiro são realizadas obras de
contenção.
500
O bairro Ana Moura é objeto do projeto CURA, que pretende provê-lo de redes de infra-estrutura (água, esgoto, pluvial e
calçamento); também são desapropriadas áreas de risco e reassentadas famílias, iniciando-se ainda a construção de um
posto de saúde.
501
Eixo composto pela BR-381 e pelas avenidas dos Rodoviários e dos Pinheiros.
175
do Programa de Incentivo ao Desenvolvimento Econômico (PROGRIDE)
502
. Para a indústria
siderúrgica, a situação foi ainda mais grave, pois, além da queda nas vendas, o aumento abrupto dos
juros tornou calamitosa a situação financeira das empresas que haviam empregado vultuosas somas
em projetos de expansão na década precedente, como era o caso da maior parte das siderúrgicas
nacionais.
Diante da crise, começaram a ganhar força as discussões acerca do papel do Estado na condução da
economia, em especial no setor produtivo. Sinal deste interesse é a mudança na forma de análise do
desempenho setorial das 200 maiores empresas realizada pela revista V
ISÃO: quem é quem na
economia brasileira (1979-1992), que, em 1980, após uma reportagem específica sobre o crescimento
no número de estatais
503
, passou a avaliar os dados separadamente para estatais, empresas privadas
nacionais e privadas internacionais. Para Antonio G
RECO (1984), no entanto, um dos principais
responsáveis pela caótica situação financeira em que se encontravam as siderúrgicas na década de
1980 era a autonomia administrativa e política de seus diretores, cujos bons relacionamentos somadosà
falta de poder político da SIDERBRÁS e à ausência de um quadro técnico permanente no ministério e
no CONSIDER (organizado em função de GT – grupos de trabalho) faziam com que o poder político
desses técnicos competentes lhes garantisse autonomia administrativa, permitindo que não
respondessem por suas decisões financeiras equivocadas. Assim, o único aspecto no qual as
siderúrgicas estatais brasileiras não possuíam autonomia era o financeiro.
Embora a ACESITA fosse a única das siderúrgicas estatais que não havia sido encampada pela
SIDERBRÁS
504
, respondendo diretamente ao Banco do Brasil e, dessa forma, permanecendo
vinculada ao Ministério da Fazenda e não ao da Indústria e Comércio como CSN, COSIPA, USIBA,
CST, etc. (V
ISÃO, 1980) (vide AnexoIII _org01), seu caso se encaixa perfeitamente na descrição feita
por Antonio Grecco. Tendo por nove anos um mesmo diretor, Amaro Lanari Guatimosin (1972-1980),
tomou corpo uma estrutura administrativa extremamente centralizada, tornando praticamente
impossível a coordenação entre as áreas administrativa, técnica e executiva da empresa, o que
acarretou problemas que iam desde o projeto até a operação dos equipamentos
505
(LEMOS & PIRES,
1992). Como conseqüência, os custos estimados para a expansão foram facilmente superados e os
502
Este programa parece vir substituir o iniciado na gestão anterior, configurando o início da rivalidade entre Geraldo
Nascimento (PT) e Leonardo da Cunha (PMDB) e que se estende até a gestão atual.
503
Segundo a reportagem, em 1977 eram 573 estatais, em 1978 passaram para 582, em 1979 para 607, até chegar às 654 em
1980. Destas, a maior parte controlada pela União e classificada como pertencente ao setor terciário e 92 ao secundário
(VISÃO, 1980: 42). Com relação às siderúrgicas, ao longo da década de 1980, a análise indica que, embora numericamente
inferior (aproximadamente 15%), as estatais tinham maior peso, possuindo uma média de 70% do patrimônio líquido e
empregando mais de 50% da mão-de-obra, o que fez com que fossem as principais responsáveis pelo fraco desempenho do
subsetor (o setor era composto por três subsetores: metalurgia, siderurgia e não-ferrosos). Um exemplo de que os
problemas financeiros das siderúrgicas não eram apenas conjunturais está no seu desempenho nos últimos anos desta
década, quando as empresas privadas apresentaram lucros, enquanto as estatais permaneceram no vermelho (AnexoI_tab
10).
504
Feito que, segundo José FERREIRA (1997), foi conseguido por Amaro Lanari Guatimosim ainda no seu primeiro ano na
presidência da empresa, o que lhe garantiu maior autonomia administrativa.
505
A descrição dos problemas enfrentados durante a execução do projeto de expansão feita por Mauricio LEMOS & Júlio
P
IRES (1992) é bastante detalhada. Nela, os autores enumeram entre os problemas: necessidade de execução de um novo
projeto (a firma inicialmente contratada não fora capaz de detalhá-lo), ocorreram falhas na compra, nas obras e na
instalação dos equipamentos; os prazos foram muito curtos, e problemas de projeto implicaram numa demora de 3 anos
para se dominar a produção de aços inoxidáveis e silicosos.
176
custos de produção se elevaram. Sem poder contar com recursos do Banco do Brasil
506
, a empresa fez
pesados empréstimos no exterior
507
, o que agravou ainda mais sua situação financeira, fazendo com
que, em 1981, o presidente Figueiredo a incluísse na lista de estatais privatizáveis e foi somente graças
aos esforços do então senador Tancredo Neves que o projeto de privatização foi engavetado
508
.
Embora tivesse afastado o fantasma da privatização, a situação financeira da ACESITA continuava a
se deteriorar, com sua dívida real ultrapassando US$ 1,1 bilhão, em 1982
509
. A fim de sanar suas
finanças e reunir recursos suficientes para completar sua expansão, as jazidas de ferro em Itabira
foram vendidas à CVRD; o Banco do Brasil fez dois aportes de capital e transformou parte
significativa da dívida em partes beneficiárias (L
EMOS & PIRES, 1992). Porém, mesmo em meio a esse
turbilhão de dificuldades, a companhia não deixou de cuidar do provimento de habitação para seus
funcionários que, em 1986, superava os 8 mil. Assim, sempre buscando parceria com COHAB e o
BNH, nos anos da expansão a empresa participou diretamente da construção dos bairros Recanto, Vale
Verde e Novo Horizonte (1982), além de construir conjuntos residenciais e apartamentos.
A partir de 1989, com a posse de Geraldo Nascimento (PT) na prefeitura, o relacionamento da
ACESITA com o poder local tornou-se ainda mais distante. Adotando uma postura mais combativa, a
gestão desse ex-presidente do sindicato dos metalúrgicos de Timóteo (METASITA) iniciou com um
levantamento dos equívocos das gestões anteriores
510
e seguiu centrada nos problemas ambientais do
município, promovendo já no primeiro ano de mandato um seminário sobre a situação ambiental do
Vale do Aço (P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1989). Realmente a partir daí, nota-se uma
preocupação clara com o planejamento da cidade, iniciando-se em 1990 as pesquisas que serviriam de
base para a elaboração do seu primeiro plano diretor. Esse planejamento, como na maioria das cidades
brasileiras, acabou sendo deixado em segundo plano diante da necessidade de resolver problemas mais
eminentes; um exemplo disso é o fato de que o plano foi concluído somente em 1997. Com a
prefeitura mantendo uma postura que buscava cada vez mais independência com relação à ACESITA,
a empresa é pouco mencionada nos informativos municipais, e quando isso ocorre aparece como
506
Sem poder contar com o suporte do Banco do Brasil, a empresa buscou capitalizar-se fazendo uso do monopólio de
importação de bobinas de inox, comprando-as com financiamento de doze meses e vendendo-as à vista no mercado
interno. No entanto, incapacitada de quitar seus débitos, mesmo este expediente esgotou-se rapidamente (F
ERREIRA, 1997).
507
De acordo com José Artur Ferreira (1997), a ampliação dos custos do projeto de expansão nunca foi aprovada pelo Banco
do Brasil, fazendo com que, além dos valores oriundo do Banco do Brasil, a empresa buscasse, para compra de
equipamentos nacionais, créditos junto ao BNDE (FINAME) e para equipamentos importados no EXIMBANK (Japão e
USA), Samuel Montagou (Inglaterra) e Parybas (França). Nas palavras de Júlo L
EMOS & Maurício PIRES (1992: 14) “O
Banco do Brasil recusou-se a fazer novos aportes, fazendo com que a companhia procurasse fontes alternativas de
financiamento. Em primeiro lugar, utilizaram-se de recursos de curto prazo, oriundo do monopólio na importação de aços
inox. Conseguindo financiar as importações por um ano, a cia. Conseguia se financiar por vias transversas. Tal método
foi, no entanto, muito limitado, partindo a cia. Para a tomada de empréstimos externos via Lei 4131, e posteriormente via
Resolução 63 do Banco Central.” (L
EMOS & PIRES,1992: 14)
508
Sua argumentação ainda se fundamentava na condição da companhia como empresa de interesse nacional, e que não podia
correr o risco de ser controlada por estrangeiros, além do que, segundo o senador, ela encontrava-se em tal situação
somente porque fora negligenciada pelo Estado que, por meio do Banco do Brasil, recusara novos aportes de capital
(L
EMOS & PIRES,1992: 14).
509
Nos dois anos seguintes, ela nem mesmo é classificada pela revista VISÃO (1983-1984) entre as 200 maiores empresas
brasileiras.
510
Como exemplos dessa postura podem-se mencionar: a reestruturação do FAST (Fundo de Ação Social de Timóteo), a
auditoria dos gastos da gestão anteriores e a proposta de reestruturação administrativa (P
REFEITURA MUNICIPAL DE
TIMÓTEO, 1989).
177
devedora da comunidade e não mais como benfeitora. Essa nova atitude com relação à companhia fica
evidente nas discussões sobre a produção de moradias
511
, quando a administração afirma “... que a
Cia. ACESITA tem de assumir de vez a sua parcela de responsabilidade. Como proprietária de 65%
dos terrenos da cidade, a empresa deve ceder os locais para o assentamento das famílias carente”,
visto que “... em 46 anos de existência, não construiu mais que 3.750 casas” (P
REFEITURA MUNICIPAL
DE
TIMÓTEO, 1990). Assim, embora ela tenha colaborado no maior projeto habitacional desenvolvido
nesta gestão, a construção de 1.500 moradias no bairro do Limoeiro (financiadas pela Caixa
Econômica Federal), as discussões sobre a aquisição do terreno se prolongaram por dois anos até que
ela se convencesse de sua viabilidade.
Assim, observa-se que a partir da abertura da cidade houve um progressivo afastamento da ACESITA
do controle do espaço da cidade; no entanto, não se pode dizer que ela deixou de determinar seu
crescimento, pois, além de continuar a construir moradias para seus empregados e participar de
loteamentos juntamente com o poder municipal, a empresa manteve a pose de extensas áreas no centro
e ao redor dele. Outro fator que deve ser levado em conta é que, por intermédio da implantação do seu
projeto de expansão, ela foi responsável pela atração de uma nova leva de migrantes que, ao não
encontrar moradia nas proximidades, buscou abrigo nas cidades vizinhas, especialmente em Coronel
Fabriciano. Assim, esse município, apesar de não possuir grandes empresas, passou de uma população
35% menor do que a de Timóteo na década de 1960, para 20% maior na de 1970, chegando a ser 27%
superior no início do século XXI
512
. Nas palavras de Heloisa COSTA (1995: 92): “Ao longo dos anos
setenta, Coronel Fabriciano se consolida como pólo migrante, de baixa renda e sem vínculo com as
empresas, embora também abrigue grande número de operários das duas usinas”(ACESITA e
USIMINAS).
Mas não foi somente na área urbana do Vale do Aço que a presença da ACESITA foi sentida. Com a
necessidade de crescimento da produção de carvão vegetal impulsionando a aquisição de terras, no
momento de sua privatização (1992), ela possuía propriedades em três estados, perfazendo 264 mil ha
(L
EMOS & PIRES, 1992), sendo sua participação nas comunidades localizadas nos vales do Mucuri e
Jequitinhonha, especialmente neste último, quase tão intensa quanto no início de sua implantação no
vale do Rio Doce
513
(ACESITA ENERGÉTICA, 2006).
Portanto, o retrato que fica desse tempo não é de uma cidade, suas ruas e monumentos, mas de uma
região, de suas estradas e rios, de suas matas, montanhas e indústrias. É a imagem das florestas de
eucalipto virando carvão, das montanhas se desmanchando em grãos de minério e dos longos trens de
511
Além das 1.500 casas no bairro do Limoeiro, foram construídas cerca de 400 habitações (posteriormente se falou em 700)
no Novo Tempo, e foi assinado convênio com CEF para construção de mais 336 apartamentos no Limoeiro (P
REFEITURA
MUNICIPAL DE
TIMÓTEO, 1900 e 1992).
512
Segundo dados do IBGE, população residente estimada em 1999 para Timóteo era 70.325 hab. contra 95.933 hab. Para
Coronel Fabriciano (IBGE) (vide AnexoI_tab06).
513
Embora não mais se empenhe na construção de uma comunidade fechada ou mesmo de uma cidade, por intermédio da
ACESITA Energética, a empresa colabora ou patrocina a construção de edifícios públicos como o da Prefeitura de
Itamarandiba, doa veículos às secretárias de saúde, constrói escolas, cercas, pontes, etc., além de promover a realização de
atividades culturais e recreativas (ACESITA
ENERGÉTICA, 2006).
178
ferro que seguem pela velha Vitória-Minas, serpentando e furando morros até atingirem o mar e daí
ganharem o mundo. É a imagem de grandes, médias e pequenas rodovias que não se cansam de riscar
o chão; dos rios Piracicaba e Doce lutando para manter seu curso, suas águas, sua flora e sua fauna. É
a imagem do urbano adentrando o campo, apagando fronteiras, redefinindo e sublinhando diferenças
sociais; das fábricas que pontilham a margem dos rios, pintando a terra, a água e o ar de cinza.
179
Fig. 189-190: Evolução
urbana de Timóteo –
década de 1960 e o bairro
de Cachoeira do Vale
(GOOGLEARTH)
Fig. 193-194:
Evolução
urbana de Timóteo –
década de 1980 e o
Centro Sul
(GOOGLEARTH)
Fig. 191-192:
Evolução
urbana de Timóteo –
década de 1970 e o bairro
do Macuco
(GOOGLEARTH)
0 564m
N
N
0 296m
N
0 906m
N
180
ACESITA
Municipal
Particular
usina
Fig. 198-199: Projeto do bairro Primavera e mapa
de propriedades da ACESITA na área central em
1991
(ARQUIVO ACESITA)
Fig. 196-197: Maquete do novo escritório da
ACESITA (1970) e o novo edifício da
Prefeitura do Município de Timóteo
(Acervo pessoal J.L. Batista;
SILVEIRA, s.d.1)
Fig. 195: Perspectiva do projeto do novo centro comercial para a cidade
(
Relatório 1964
1965
)
181
IV.2 DE ACESITA A TIMÓTEO: NOVOS PARÂMETROS PARA A RELAÇÃO EMPRESA X MUNICÍPIO
Caracterizar o relacionamento entre a ACESITA e o poder municipal nos últimos quinze anos é uma
tarefa que exige levar em conta as mudanças de postura da administração pública municipal e da
empresarial da ACESITA, tanto quanto um espectro mais amplo de fatores que condicionaram tais
mudanças. Neste contexto, hão de se considerar a privatização da companhia e as subseqüentes
reorganizações societárias que transformaram a estatal quase falida numa associada do maior grupo
produtor de aço do mundo, ACELOR-MITTAL
514
. Mais do que uma reestruturação societária, as
sucessivas alterações no quadro acionário da companhia representaram mudanças tecnológicas e
administrativas que se refletiram no papel que ela desempenhou, e ainda desempenha, localmente.
Dentre elas vale destacar a emergência do “discurso verde” como elemento embasador de sua política
social, fazendo com que os cuidados com o meio ambiente ditassem o tom do que se passou a entender
por “responsabilidade social”. Esta, por sua vez, ganhou novo status, tornando-se cada vez mais um
elemento de marketing internacional, o que pode ser observado pelo início da elaboração dos
chamados “balanços socais” e da importância que estes assumiram na construção da imagem da
empresa, uma atitude que confirma a máxima da globalização: “pensar global e agir local”.
Contudo, se nesse período a ACESITA passou por profundas mudanças administrativas, não foi
diferente com o poder municipal.
IV.2.1 DISCURSO AMBIENTAL, RESPONSABILIDADE SOCIAL E PLANEJAMENTO URBANO
Considerando a década de 1950 como o momento de emergência do ambientalismo, Philippe
L
AYRARGUES (1998) afirma que a partir de então ocorreu a chamada “ecologização da sociedade”, ou
seja, a penetração da problemática ambiental tão profundamente que tornou-se capaz de influenciar o
modo de vida das pessoas e, assim, intervir em instâncias decisórias superiores, entrando
definitivamente na agenda política. Segundo este autor, daí em diante, a cada década o ideário
ambientalista foi incorporado por novos grupos, sendo a década de 1950 marcada pelo ecologismo dos
cientistas; a de 1960, das organizações não-governamentais; a de 1970, dos políticos, e a de 1980, dos
empresários. Assim, embora desde o primeiro momento o discurso tenha se pautado pela
racionalidade, inicialmente dada pelo embasamento científico das proposições, somente trinta anos
depois a busca por um desenvolvimento sustentável levou à sua incorporação por setores ligados ao
mercado financeiro.
Num contexto dominado pelo liberalismo e em que os avanços tecnológicos têm aprimorado a
precisão das pesquisas científicas, o prenúncio de catástrofes ambientais ocasionadas pelas mudanças
climáticas globais tornou mais retumbante o alarme dos neomathusianos sobre as limitações da terra
514
A união da Mittal Steel (companhia foi fundada em 1976, mas que só ganhou destaque internacional a partir de 2004
quando foram combinadas a indiana ISPTAT Internacional (adquirida em 1995) e a LNM Holdings da Bósnia –
AnexoIII_org4) com a ARCELOR (resultante da união da francesa USINOR, da belga ARBED e da espanhola
ACERALIA em 2002); criando o grupo ARCELOR MITTAL foi anunciada ainda em 2006, mas deve-se efetivar somente
em 2007 (A
RCELORMITTAL, s.d.).
182
em absorver uma explosão demográfica, fazendo com que nos anos 1980 se retomassem as discussões
a cerca do significado de “desenvolvimento”. Tendo como principal referência o relatório “Nosso
Futuro em Comum”, elaborado pela ONU em 1987, surge então o termo “desenvolvimento
sustentável” (B
USATO, 1996).
Contudo, se neste relatório ele é entendido no sentido de preservação do meio ambiente como suporte
à existência humana, ao ser encampado pelo empresariado, ele passou a significar a manutenção de um
ambiente favorável ao desenvolvimento das atividades necessárias pelo indivíduo para sua
sobrevivência, levando o setor a transformar o discurso ambiental em parâmetro de atuação e fazer
dele um de seus principais “garotos propaganda”. Conforme demonstra Philippe L
AYRARGUES (1998),
o que houve foi uma apropriação ideológica que integrou a lógica ecológica à econômica e fez do setor
empresarial o mais apto a oferecer e implantar soluções que viabilizassem o desenvolvimento
sustentável
515
. Contudo, apesar do nivelamento proporcionado pela noção de que todos estariam
unidos em favor de um objetivo comum funcionar como uma nuvem de fumaça, encobrindo o caráter
contestatório dos movimentos ambientalistas e dificultando o reconhecimento de sua verdadeira
natureza pela opinião pública; esta, mesmo no Brasil onde é especialmente menos atenta e atuante, foi
capaz de fazer empresas e o governo sentir sua pressão em favor do meio ambiente
516
(BUSATO, 1996).
Desse modo, como coloca José Sérgio L
EITE LOPES (2006: 32), nota-se que, se por um lado os “...
empreendedores eles próprios, causadores principais da degradação ambiental, também se
apropriam da crítica à sua atuação e procuram usá-la a seu favor (...) partes das populações
atingidas por danos ambientais passam a utilizar-se também da questão ambiental como repertório de
seu interesse e reivindicações”, configurando o que o autor denominou “ambientalização dos conflitos
sociais”. Porém, se para as empresas os cuidados com o meio ambiente permitem a divulgação de
uma imagem positiva, auxiliando na abertura de novos mercados e, conseqüentemente, o incremento
de seu faturamento
517
, para o poder público eles vinculam-se à obtenção de verbas, seja junto a
instituições públicas ou privadas, nacionais ou internacionais.
O condicionamento da aprovação de planos e projetos ambientais para captação de recursos e o papel
da cidade como principal palco destes conflitos fazem dos planos diretores municipais importantes
instrumentos para o equacionamento da questão ambiental. Considerando-se o “... objetivo do Plano
Diretor não [ser] resolver todos os problemas da cidade, mas sim ser um instrumento para a
definição de estratégias para a intervenção imediata, estabelecendo poucos e claros princípios de
ação para o conjunto dos agentes envolvidos na construção da cidade, servindo também de base para
515
Esta posição é conquistada por causa do reconhecimento da capacidade financeira, tecnológica e racional, vista em
oposição a entidades governamentais e filantrópicas, vistas como utópicas, arrogantes, autoritárias e alarmistas.
516
Segundo a autora, pesquisas conduzidas pelo IBOPE e Vox Populi têm demonstrado que a população de um modo geral
incluiu a preservação ambiental ao rol de suas preocupações cotidianas, sendo levada em conta tanto nos seus hábitos
cotidianos, como compras e separação do lixo, quanto nas perspectivas de futuro, com o reconhecimento da preservação
ambiental como condição imprescindível ao desenvolvimento.
517
Sua utilização como moeda de troca na negociação salarial e atração de mão-de-obra especializada também não é um fator
que deve ser desprezado, prova disso é a continuidade das premiações e ranqueamento das empresas conforme a opinião de
seus empregados, como os prêmios LIF, da Câmara de Comércio França-Brasil e Balanço Social, da Ethos e IBASE, bem
como o ranking de melhor empresa do setor siderúrgico para se trabalhar da revista Guia Você SA.
183
a gestão pactuada da cidade” (CÂMARA DOS DEPUTADOS, 2002: 40), ele não somente deve ajudar na
arbitragem de conflitos, como também levantar e organizar demandas, sendo assim responsável por
sua legitimação e legalização.
Contudo, conforme o próprio texto do estatuto das cidades reconhece, a elaboração de planos diretores
já foi vista como definidora de um projeto de cidade, negando-lhes sua condição de política publica,
ou seja, de campo de explicitação de conflitos. Sua capacidade de refletir a situação local pode ser
detectada até mesmo pela própria ausência de um plano, o que mais do que a dominação de um grupo
cujos interesses poderiam ser feridos com a sua elaboração, pode indicar um equilíbrio da força
política de grupos opostos.
Este parece ter sido o caso de Timóteo que, embora nas últimas seis eleições tenha levado ao poder
somente três candidatos (vide AnexoI_tab02), passou por períodos bastante conturbados, pois o
revezamento de prefeitos de partidos políticos opostos (especialmente PT e PMDB) levou as gestões a
serem marcadas por discursos de mudanças e reformas, postura tidas como necessárias para corrigir os
equívocos das anteriores.
Contudo, como se nota na gestão de Leonardo Lelé da Cunha (1993-1996), estas reformas, via de
regra, diziam respeito somente à administração precedente, de modo que seu plano de governo para o
segundo mandato, sucedendo o petista Geraldo Nascimento, foi baseado nos mesmos programas que
havia buscado implantar em sua gestão anterior (1983-1988)
518
.
Reformas mais profundas foram sentidas somente na administração posterior, de José de Anchieta
Poggiali
519
(1997-2000). Reclamando da dívida herdada e de uma redução de quase 30% na
arrecadação do município em decorrência de mudanças na Lei Robin Hood
520
(“Timóteo comemora
aniversários...” (1998)
521
, Poggiali determinou uma ampla reforma administrativa e tributária
522
.
518
Como o FAST, o programa de microempresas no novo distrito industrial, o de habitação no Novo Tempo etc., tendo como
preocupação nova somente a incorporação de cuidados com o meio ambiente e a criação da ADT (Agência de
Desenvolvimento de Timóteo) (P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1993).
519
José Anchieta de Mattos Pereira Poggiali é farmacêutico-bioquímico, filho de político local (seu pai foi prefeito de
Coronel Fabriciano), participou da fundação do PSDB em Timóteo e se destacava na comunidade por sua participação em
entidades sociais e religiosas (clubes de lazer, escolas de samba, associações de bairro e grupos jovens) (D
IÁRIO DO AÇO,
1999).
520
A Lei nº 12.040, ou Lei Robin Hood, foi promulgada pela Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais em
dezembro de 1995. Tinha por objetivo desconcentrar a renda, transferindo recursos para regiões mais pobres e incentivar a
aplicação de recursos municipais nas áreas sociais. Para isso, determinava novos critérios para a distribuição da cota-parte
do ICMS dos municípios, segundo os quais as parcelas seriam condizentes não somente com a arrecadação municipal, mas
também com a população, área, investimentos realizados nas áreas de saúde, educação, saneamento e preservação
ambiental, entre outras. Isto implicava na possibilidade de municípios menos ativos economicamente ou que possuíam
extensas áreas de preservação receberem recursos antes concentrados naqueles mais dinâmicos (FUNDAÇÃO JOÃO
PINHEIRO, s.d.2; LEI 12.040).
521
Pelo que se pode averiguar nos dados disponíveis (Plano Diretor 1997 e Secretária da Fazenda do Estado de Minas Gerais
– vide AnexoI_tab09a), a queda mais significativa na arrecadação municipal deu-se em 1996, primeiro ano em que passou
a vigorar esta lei, sendo que reformas posteriores fizeram com que as perdas verificadas neste momento fossem
recuperadas nos anos seguintes.
522
A reforma tributária pretendia que os impostos fossem “... graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte
(P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1998), de modo que a cobrança do IPTU por exemplo, além de considerar a
tipologia do imóvel, seu uso, dimensões, índice de valorização e localização, permitia descontos de até 90%, conforme a
renda do proprietário. Assim, apesar da criação da taxa de saneamento e manutenção das existentes taxas de iluminação,
coleta de lixo, inspeção sanitária e limpeza pública, pretendia-se uma redução de cerca de 20% para o contribuinte (Jornal
P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, fev/1999).
184
No entanto, embora tenha iniciado o mandato enfatizando a necessidade de planejamento, onde “...
todas as ações do Executivo devem estar baseadas num planejamento prévio e dentro de uma visão de
futuro” (P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1998: 16), deixou que as decisões quanto às atividades
prioritárias fossem tomadas pelos Conselhos Setoriais, criados para representar os sete setores nos
quais a cidade foi dividida para distribuição de recursos do orçamento participativo, o chamado
PROPOR (Programa de Prioridades Orçamentárias)
523
. Essa forma de administração que visava a uma
maior participação da comunidade nas decisões da administração municipal e também o conhecimento
de problemas locais, possibilitando agilizar seu atendimento, implicava numa certa descentralização
administrativa
524
, fazendo com que, apesar dos esforços de planejamento representado pela finalização
do Plano Diretor de Desenvolvimento em 1997
525
e o recadastramento de imóveis, a imensa dívida
deixada e a falta de pagamento de fornecedores e funcionários por mais de seis meses alguns
considerassem a sua administração como a pior que a cidade já tivera
526
.
A despeito desses problemas, observando-se os informativos da prefeitura desta gestão, nota-se uma
grande preocupação com a diversificação de atividades econômicas, e há uma sensível ampliação das
preocupações com o meio ambiente. O desenvolvimento de programas de fomento a pequenos
produtores e indústrias vinculadas à produção de peças em inox aparecem então como lados opostos
de uma mesma moeda. Compondo a visão geral que tem predominado na cidade nos últimos anos, os
projetos voltados a pequenos produtores aparecem vinculados ao turismo, pois promovem o
desenvolvimento de atividades não poluidoras e geradoras de renda para uma camada da população
que não possui formação suficiente para integrar o quadro das grandes empresas da região. Ademais,
colaboram para sua fixação no campo ou em núcleos distantes da principal área urbana, auxiliando na
melhoria da qualidade de vida destas comunidades. Programas como os de incentivo à piscicultura, à
produção de frutas e doces, mel de abelha, leite, açúcar mascavo, rapadura e de chapéu de palha,
freqüentemente realizados em conjunto com EMATER, IEF e PERD, pretendiam também tornar as
comunidades instaladas em zona rurais e próximas a zonas de preservação ambiental parceiras na sua
manutenção e fiscalização, pois ao auxiliar a população a aproveitar melhor os recursos naturais
disponíveis na região, promovia-se a vinculação entre ela e o meio ambiente, levando a que,
523
Cada setor receberia R$ 200 mil, e as ONGs, R$ 100 mil, num total de R$ 1,5 milhões, fora os R$ 750 mil destinados a
obras de caráter municipal P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1998).
524
Embora não seja possível afirmar categoricamente o problema desta gestão, parece dever-se mais a dificuldades de
execução dos planos, à não-compatibilização com os custos dos projetos, do que a sua concepção, visto Poggiali ter
continuado a ser bem quisto pela população apesar do fracasso de sua administração. Além do que, há de se levar em conta
as dificuldades de promover grandes alterações em instituições consolidadas, especialmente quando dizem respeito à
descentralização do poder, o que usualmente implica na redução de autoridade individual.
525
Este plano foi fundamentado nos planos elaborados fora da prefeitura por firmas especializadas contratadas
especificamente para este propósito, como a RUMOS – Consultoria e Planejamento, responsável pelo Plano Diretor de
1989 e a LEME – Engenharia S.A., encarregada do Plano diretor de Esgotos 1989.
526
Segundo o senhor Perácio Bicalho (2002) (vinculado às administrações posteriores) “... Tivemos uma experiência
dramática para a cidade por que o último prefeito, uma pessoa jovem, bem sucedida na profissão dele, bioquímico, que
ganhou a Prefeitura do atual Prefeito (...) no dia 1º. de Janeiro quando nós entramos aqui, (...) os meus salários estavam
atrasados 6 meses! O comércio virou um caos na cidade, nenhum servidor tinha crédito, a Prefeitura não comprava de
mais ninguém. (...) Carreteiros tinham 10 meses sem pagamento. Os imóveis da Prefeitura, temos 100 casas alugadas pela
cidade, 1 ano sem pagamento. A COPASA em 4 anos nunca foi paga nem 1 mês. Água... Telefone...a rede virtual que o
Prefeito anterior contratou em18 meses e devia 18 meses!(...) Eu não tenho a menor dúvida que foi a pior administração
que já passou pela Prefeitura, em que pese o fato de outras administrações terem também sido muito ruins!
185
consciente da dependência deste para seu sustento, passasse a evitar sua degradação (ANÔNIMO, s.d.1.,
s.d., P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1999; PREFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1997; como
no Plano de Manejo do PERD, 2002).
O desenvolvimento de atividades industriais, especialmente as vinculadas à produção de aço inox,
embora também estivesse voltado apenas à criação de micro, pequenas e médias empresas, destinava-
se a empregar uma população com melhor qualificação e alocada na cidade. Entre as principais
providências neste sentido contam o estabelecimento do Centro Federal de Educação Tecnológica de
Timóteo
527
, a doação de lotes
528
e incentivos fiscais pela prefeitura
529
aos empreendedores interessados
em se instalar no município, para as empresas ligadas à produção de peças em inox, a participação da
ACESITA garantindo outros benefícios, como assistência técnica e disponibilidade de equipamentos e
locais para instalação
530
(PREFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1998; 1999a e 1999b).
O fomento à instalação de empresas de beneficiamento de aço inox vinculava-se ao projeto “Timóteo:
capital nacional do inox”, cujo objetivo era “... transformar o município num importante centro
fornecedor de serviços e produtos elaborados a partir da utilização do aço inox
531
”.
532
Além da
geração de emprego e renda, este projeto visava à promoção da cidade, seu “marketing” tanto interno
quanto externo, pois como observa Heloisa e Geraldo C
OSTA (2000: 1071), mais do que atrair
investimentos e diversificar a economia local se pretendia “promover a inserção do município de
Timóteo em áreas mais amplas de desenvolvimento estadual, nacional e, até mesmo internacional”.
Neste sentido, sua inclusão no rol das dez como melhor IDH-M do estado também foi bastante
explorada
533
.
Embora aparecesse desde o primeiro ano da gestão de Poggiali, o cuidado com a imagem da cidade
ganhou força a partir de 2000, com a implantação de programas, como o “Florir Timóteo”, “Natal de 1
527
O CEFET de Timóteo foi realizado em parceria com o CEFET de Minas Gerais e apoiado pelas principais indústrias da
região (ACESITA, USIMINAS, CENIBRA, CEPLAC, VANTEC e SINDIMIVA); ocupando o antigo Colégio Percival
Farquhar, ele oferecia inicialmente os cursos de metalurgia e química industrial, prevendo a implantação do turismo
(P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1999a).
528
Vale ressaltar que apesar da doação do terreno, presumivelmente no Distrito Industrial do Limoeiro, no material estudado
há pouca menção de melhorias realizadas na área, somente algum arruamento, limpeza e os já mencionados incentivos
fiscais (vide AnexoII_mapa12).
529
Os incentivos fiscais, descontos no IPTU, IPI e imposto de renda de pessoa jurídica seriam proporcionais ao número de
empregos gerados no município, sendo cem o mínimo para se candidatar aos benefícios (P
REFEITURA MUNICIPAL DE
TIMÓTEO, 1999b).
530
Com o objetivo de “... transformar o município num importante centro fornecedor de serviços e produtos elaborados a
partir da utilização do aço inox” , a Prefeitura Municipal e a Associação Comercial de Timóteo, com o apoio da Agência
de Desenvolvimento de Timóteo, formularam o projeto “Timóteo: capital nacional do inox”. Projeto que visava incentivar
a implantação de empresas prestadoras de serviços em aço inox na cidade; para tanto, receberiam incentivos municipais,
estaduais e federais, além da própria ACESITA, que implantou o Centro de Processamento de Aços Especiais (CEPAE)
onde as empresas podem se instalar dispondo de galpões com toda infra-estrutura necessária (ramal ferroviário, energia
elétrica, gases diversos” A participação da ACESITA no projeto ocorria também por intermédio da Fundação ACESITA
que, juntamente com a Associação de Aposentados e Pensionistas de Timóteo, oferecia cursos gratuitos para formação de
mão-de-obra ligada à transformação do aço inox (P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1999a).
531
A partir de então foi incentivada também a produção de artefatos, desde cubas e esquadrias até porta-retratos, enfeites e
bijuterias, sendo realizadas exposições com a Mostra Multi-Expor no Terminal Rodoviário Municipal (P
REFEITURA
MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1999a).
532
O programa foi lançado pela Prefeitura Municipal e Associação Comercial de Timóteo em 1997 e era coordenado pela
Agência de Desenvolvimento de Timóteo, responsável por auxiliar os interessados na obtenção de incentivos municipais,
estaduais, federais e da própria ACESITA (P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1998).
533
Com um IDH-M de 0,768, em 1991 a cidade foi considerada a quarta melhor classificada no Estado, passando para a
terceira colocação em 2000 com IDH-M de 0,831, ambos superiores à média do Estado e do País (vide AnexoI_tab19).
186
milhão de luzes”, “Memorial Centro Sul”, limpeza pública e os projetos de melhoria dos centros norte
e sul
534
. Além disso, em 1999 e 2000, a prefeitura voltou a incentivar os desfiles de carnaval, sendo
estes os últimos anos em que as escolas de samba da cidade voltaram a desfilar (P
REFEITURA
MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1999b e 2000). Com estes projetos ocorrendo concomitante à entrada da
USINOR como acionista majoritária da ACESITA, não é surpresa que a presença da empresa fosse
constante, pois com a possibilidade de internacionalização de sua produção, manter uma imagem
positiva junto à comunidade local tornara-se tão importante quanto incrementar sua produção.
No entanto, se por um lado a atenção com a imagem da cidade relacionava-se à promoção do turismo,
por outro se observa uma busca intensa por vinculá-la à proteção do meio ambiente, consolidando a
imagem de uma cidade consciente de seus recursos naturais e da necessidade de conservá-los.
Recursos que, no contexto geral de valorização dos cuidados com o meio ambiente, tornaram-se cada
vez mais espelho da própria cidade, pois como reflexo das condições de vida por ela oferecidas,
também demonstram o quanto o poder municipal e as instituições locais estavam atentos aos anseios
da população e aptos a atendê-los. Assim, se desde o início da década de 1990 já constava da agenda
municipal o cuidado com o meio ambiente, nos últimos anos dessa década eles ganharam ainda mais
força. Um exemplo disso é o estabelecimento de um zoneamento ambiental para o município, proposto
pelo Plano de Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental de 1997. Nele, além de atenção
especial às áreas vizinhas ao PERD, com o estabelecimento de uma zona tampão de 50 m, a partir da
divisa
535
foram determinados cuidados especiais para os fundos de vale e as encostas; incluindo, ainda,
o plano de saneamento ambiental, que previa a construção de redes coletoras e estações de tratamento
de esgoto para cerca de 90% da área urbana do município. Contudo, sem que tivesse ganhado a força
de lei, dada por sua aprovação pela Câmara Municipal, ou que os recursos para sua efetivação se
viabilizassem, o plano serviu apenas como apoio ao pessoal técnico da prefeitura, sem qualquer efeito
fiscal.
No contexto regional, a década de 1990 foi marcada pelo retorno das reivindicações para constituição
da Região Metropolitana do Vale do Aço (RMVA)
536
. Contudo, como salientam Geraldo e Heloisa
534
Além de algumas reformulações viárias de pequena monta (rampas de acesso e mudança de mãos de direção), estas
reformas diziam respeito principalmente à recomposição dos passeios, colocação de arcos de aço inox nos canteiros,
mudança do camelódromo e incentivo à colocação de letreiros de inox nas lojas (PREFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO,
2000).
535
Este zoneamento, no entanto, não é condizente com o proposto no Plano de Manejo do PERD de 2002 (PERD, 2002)
(vide AnexoII_mapa10) e será profundamente alterado pelo Plano Diretor de 2004.
536
Embora desde a implantação da USIMINAS se esperasse que as cidades de Coronel Fabriciano, Timóteo e Ipatinga
funcionassem em conjunto, com cada uma desempenhando uma função completar com relação à outra, levando a que em
1974 fosse criada a AMVA (Associação dos Municípios da Micro-Região do Vale do Aço) (DIÁRIO DO AÇO, 1984), a
institucionalização da RMVA era vista como uma forma de facilitar sua integração, já que viabilizava a obtenção de
recursos a serem empregados em obras que beneficiariam diversos municípios. No entanto, mesmo que esta
complementaridade de funções se verificasse, pelo menos até a década de 1980 não era possível caracterizar nenhuma das
cidades como metrópole (a partir de 1990, Ipatinga passou a exercer maior polarização, conquistando parte do setor
terciário antes concentrado em Coronel Fabriciano). Embora a complexidade da discussão sobre a conceituação e definição
das regiões metropolitanas e aglomerações urbanas exija e mereça mais atenção do que a aqui dispensada, vale notar que
foi somente quando a metrópole passou a ser entendia não somente como uma grande cidade, mas como uma região
composta por cidades que extravasam suas fronteiras, rompendo com a dicotomia campo-cidade e cuja influência se
estende a áreas circunvizinhas, que foi possível a instituição desta região (F
IGUEIREDO, 1994). Observa-se, no entanto, que
sua constituição fundamentou-se mais em decisões político-administrativas do que em parâmetros analíticos ou
187
COSTA (2000), sua efetivação em 1998 (LEI COMPLEMENTAR n
o
51/98)
537
não foi capaz de
promover um planejamento conjunto entre os municípios que a compõe
538
, verificando-se um
agravamento das disparidades locais em vez de sua redução, pois se por um lado verificava-se a
ausência de um Plano de Desenvolvimento Integrado
539
, uma exigência legal descumprida, por outro
notava-se que predominavam iniciativas pontuais, preocupadas em responder a interesses específicos
que portanto, dificilmente colaboravam para minimizar as disparidades e induzir a “solidariedade
espacial” da região. Assim, mesmo os encontros e fóruns de debate entre as autoridades locais
(P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 1999a; 1999b; 2000b) têm tido resultado concreto somente
quando se trata de atividades de interesse comum e que não implicam competição entre as cidades
540
,
como a unificação de tarifas de telecomunicações, transporte, abastecimento e meio ambiente (C
OSTA
& COSTA, 2000).
Nos dois últimos mandatos (2001-2004 e 2005-2008), Geraldo Nascimento do PT voltou a se eleger
prefeito; no entanto, se no primeiro mandato teve de lidar com os problemas financeiros e
administrativos herdados da gestão anterior, no segundo, uma seqüência de mandatos judiciais já o
afastaram do poder por três vezes
541
em menos de dois anos. No entanto, mesmo em meio a essas
dificuldades, em 2003 foi finalmente terminado o plano diretor do município. Votado e aprovado em
2004 (LEI 2.500 de 07/05/2004), o novo Plano Diretor focaliza, principalmente, a ordenação territorial
do município, sendo os aspectos sociais e econômicos tratados somente à medida que se relacionam
com sua organização espacial. Embora ainda carecendo de bases mais precisas de levantamentos
542
, o
plano demonstra a consciência das limitações do planejamento quando não acompanhado de intensa
fiscalização e engajamento da comunidade, o que invariavelmente leva à constituição de parcerias com
instituições e associações locais, municipais, estaduais e federais. Embora a incorporação de
instrumentos de regulação urbana propostos pelo Estatuto das Cidades (C
ÂMARA DOS DEPUTADOS,
conceituais, uma vez que realmente não há uma única cidade-sede, mas sim um grupo de cidades principais, nem mesmo
uma certa homogeneidade territorial, social ou econômica entre elas, como seria de se esperar respectivamente no caso das
regiões metropolitanas e das aglomerações urbanas (M
ATOS, 2000; COSTA, 2002).
537
Esta lei foi substituída pela LEI COMPLEMENTAR 90/2006, que institui o Colar Metropolitano, ficando a região constituída
pelos quatro municípios-sede: Ipatinga, Timóteo, Coronel Fabriciano e Santana do Paraíso e o Colar Metropolitano pelos
municípios de: Açucena, Antonio Dias, Belo Oriente, Braúnas, Bugre, Córrego Novo, Dom Cavati, Dionísio, Entre-Folhas,
Iapu, Ipaba, Jaguaraçu, Joanésia, Marliéria, Mesquita, Naque, Periquito, Pindo d’Água, São José do Goiabal, São João do
Oriente, Sobrália, Vargem Alegre.
538
Segundo os autores, “As tentativas de uma gestão articulada entre os três municípios terminaram em fim de 1978, com a
edição do plano [de Desenvolvimento Integrado do Aglomerado Urbano do Vale do Aço, 1978]...
539
Assim como os autores, não foi possível localizar até o momento nenhuma iniciativa neste sentido.
540
Segundo Geraldo e Heloisa (COSTA & COSTA, 2000), o sucesso da RMVA na promoção da “solidariedade territorial está
condicionada a fatores como: as diferenças sócio-espaciais entre o municípios, suas experiências de planejamento, as
iniciativas que vêm ocorrendo nos municípios economicamente mais fortes.
541
Foram cinco cerimônias de integração de posse, com Geraldo Nascimento sendo sucessivamente substituído pelo segundo
colocado nas últimas eleições, Leonardo Lelé da Cunha. As acusações de improbidade administrativas são devidas ao
contrato com empresa de iluminação pública dos irmãos Jannani que, em troca por um deságio de 20% na dívida que tem
com a prefeitura de Timóteo, teriam oferecido contribuir com a campanha eleitoral de Nascimento (G
UERRA, 2006), mas a
encrenca ganha ainda mais colorido quando se considera a participação das empresas dos irmãos Jannani em concorrências
fraudulentas em todo o país (ISTOÉ, s.d.) e ainda o afastamento do Juiz Juscelino José de
Magalhães, responsável pelas liminares contra Nascimento, devido “postura venal e
parcial” por possuir dívidas cujos credores seriam opositores do atual prefeito (ASSEMBLÉIA
LEGISLATIVA do Estado de Minas Gerais, 2006).
542
Segundo informações recebidas em 2004, estava para ser contratado um levantamento plani-altimétrico que possibilitaria
a atualização e correção do mapa da cidade, até então em base Acad e sem geo-referenciamento.
188
2002), como as “operações urbanas”, “transferência do direito de construir” e “outorga onerosa”,
demonstrem sua atualidade, eles parecem ter sido ainda pouco explorados
543
, com sua vinculação a
planos e projetos específicos, como o tratamento dos fundos de vale e encostas, deixados para ser
tratados separadamente, são as ADEs (Áreas de Diretrizes Especiais) Ana Moura, Cachoeira do Vale,
Petrópolis e os Fundos de Vale.
As preocupações ambientais são evidentes em todo o plano, aparecendo como elemento de destaque
no zoneamento. Assim, a determinação da localização das ZEIS (zonas especiais de interesse social) é
coincidente com ocupações irregulares em áreas de risco (inundáveis ou em morros) que, por
usualmente se situarem nas extremidades da malha urbana
544
, têm a maior parte de seu perímetro
fronteiriço às áreas de proteção ou preservação ambiental merecendo, portanto, maior atenção do
poder público. A própria instituição da APA (Área de Proteção Ambiental) da Serra do Timóteo e
projetos paisagísticos para fundos de vale e encostas na área urbana também são exemplos da
intensificação dos cuidados ambientais. No entanto, somando-se essas determinações à inexistência de
áreas destinadas à agricultura e pecuária, às dimensões reduzidas das áreas passíveis de abrigar
atividades de turismo e recreação (ZP-1)
545
, verifica-se que a garantia da qualidade ambiental da
cidade acabou por implicar numa séria limitação na disponibilidade de áreas para expansão urbana e
desenvolvimento de atividades econômicas que não de pequeno porte.
Caracterizado pela ocupação dos poucos terrenos planos nas margens dos córregos e rios, o
desenvolvimento urbano de Timóteo passou a enfrentar problemas mais sérios somente a partir do
momento em que a escassez de áreas próximas transformou os morros e os recuos entre as construções
e os cursos d’água nas únicas opções para novos loteamentos. Essa escassez de áreas urbanizáveis nas
vizinhanças da malha já fora notada em planos anteriores e a solução adotada, tanto anteriormente
quanto agora, é o incentivo ao adensamento daquelas cuja infra-estrutura tem capacidade ociosa (os
bairros Centro Norte, Funcionários, Novo Horizonte, Serenata e ao longo da Avenida ACESITA
546
.
Com o Parque Estadual do Rio Doce ocupando cerca de 40% do município, e os bairros localizados
próximos à sua divisa, sendo, em sua maioria, originários de assentamentos sem planejamento e que,
distantes da cidade e, portanto, pouco valorizados, acabaram por abrigar uma população com menos
recursos, fato que fez da região objeto constante de preocupação da administração do parque e da
prefeitura. Com o atendimento de uma antiga reivindicação, principalmente por parte da ADT, a
543
Outros instrumentos propostos pelo Estatuto da Cidade contidos no plano são o “estudo de impacto de vizinhança e do
“direito de preempção”; não há, contudo, nenhuma menção ao IPTU progressivo, uma das medidas tidas como mais
eficientes no combate à especulação imobiliária.
544
As exceções são as ZEIS de Cachoeira do Vale e Nova Esperança que, localizadas às margens do rio Piracicaba e ao longo
do principal eixo viário da região, merecem especial atenção, principalmente a última, tendo em vista a construção da nova
ponte ligando Timóteo diretamente com o centro de Coronel Fabriciano. (vide foto satélite)
545
Mesmo atividades de reflorestamento com fins comerciais são permitidas somente na ZP-1 (Preservação Relativa), não na
ZP-2 (Preservação Absoluta) e menos ainda na APA.
546
Contudo, seja pela alta concentração fundiária ou pela escassez de investidores, o mercado imobiliário tem-se mostrado
pouco inclinado a investir na verticalização (o único edifício com mais de 5 pavimentos localiza-se no Centro Norte e
sofreu inúmeras transformações, tanto de uso como de programa, sendo que sua construção já dura mais de oito anos, não
estando concluído ainda na última visita), fazendo com que o adensamento desejado deva depender da flexibilidade da
legislação com relação a coeficientes de aproveitamento, taxa de ocupação e parcelamento, para se concretizar.
189
duplicação da BR-381 e a construção de uma ponte ligando diretamente Timóteo ao centro comercial
de Coronel Fabriciano
547
, parece estar se confirmando a tendência de intensificação da ocupação do
setor leste da cidade
548
. Sentida desde a década de 1990, após a instalação do distrito industrial do
Limoeiro (década de 1980) e de bairros com melhor infra-estrutura, como o Alphaville (1994), a
efetivação dessa tendência pode ser comprovada pelo número de ocupações irregulares (13 num total
de 38 em todo o município) neste setor, justificando plenamente a intensificação da fiscalização
facilitada pela criação de uma comissão específica para este fim
549
.
Fechando as preocupações ambientais, o capítulo V do Plano Diretor (L
EI 2.500, 2004) trata do
“saneamento ambiental”, ou seja, da manutenção e da execução de redes e estações de tratamento de
água e esgoto, visando principalmente à adequação e complementação do projeto elaborado na década
de 1990 e que ainda não fora complementado
550
.
Portanto, de um modo geral, pode-se dizer que, nas últimas duas décadas, a cidade de Timóteo tem-se
debatido a fim de conciliar objetivos aparentemente opostos, demonstrando que são, na verdade,
somente lados opostos de uma mesma moeda. Assim, tem buscado transformar obstáculos em
trampolins, como ao fazer dos córregos e morros que limitam seu crescimento elementos de sua
paisagem e transformando as restrições impostas pela preservação ambiental em oportunidade de
diversificação de suas atividades econômicas e de inclusão de comunidades distantes no
desenvolvimento da cidade. No entanto, se internamente essa busca freqüentemente pode ser
considerada bem-sucedida, no contexto regional as dificuldades continuam a se acumular, com
disparidades regionais ampliando-se e os conflitos de interesse acirrando-se.
547
Conforme se pôde verificar na última visita e as fotos de satélite demonstram, embora a duplicação tenha sido feita, os
anéis de acesso não foram concluídos, impossibilitando sua utilização (vide fotos satélite).
548
Segundo Bernardo FURTADO (2005: 14), na década de 1990 esta região foi a “... alternativa da população sem recursos da
região de Cachoeira do Vale, conforme Cachoeira tornou-se mais integrada a cidade e com mais recursos e serviços
disponíveis ela também se tornou mais cara, fazendo do Macuco uma solução ‘natural’.” (“... it became as an alternative
to the population without resources from the region of Chachoeira do Vale, i.e. as Cachoeira [area 4] becomes more
integrated to the city and with more resources and services available it also becomes too expensive, Macuco[area 5] is
therefore the ‘natural’ solution.”)
549
A Comissão Permanente de Fiscalização da Expansão Urbana no Entorno do Parque Estadual do Rio Doce é constituída
por representantes das prefeituras limítrofes, do IEF, IBAMA, Polícia Militar, FEAM e do Ministério Público Estadual.
Reunindo-se trimestralmente, busca (P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 2004a e 2004b) coordenar as ações voltadas à
preservação da área de entorno, garantindo, assim, a integridade do parque.
550
Infelizmente não há dados precisos disponíveis quanto ao andamento das obras, sabendo-se somente que em 2004 havia
sido aprovado o projeto da ETE do Limoeiro, cuja execução aguardava somente a liberação de verbas (P
REFEITURA
MUNICIPAL DE TIMÓTEO, 2004a).
190
IV.2.2 PRIVATIZAÇÃO E REESTRUTURAÇÃO EMPRESARIAL
Desde o período colonial, as empresas estatais estiveram presentes na economia brasileira; no entanto,
somente a partir de Getúlio Vargas no poder que a intervenção estatal na economia tornou-se mais
contundente
551
, passando de 20 empresas estatais federais em 1940 para 573 em 1977
552
. Contudo, já
nos anos 1970, esta postura estatizante começou a ser questionada. Estas primeiras críticas foram
vistas por Armando P
INHEIRO (2000) mais como um movimento contra a “desprivatização”
553
do que
a favor da privatização, uma forma dos empresários privados demonstrarem sua insatisfação por
estarem afastados do processo decisório
554
, o que levava o Estado a conceder subsídios fiscais e
creditícios a fim de fortalecer as empresas privadas nacionais. Além disso, durante o período da
ditadura militar, privatizar soava muito semelhante a desnacionalizar, o que representava por em risco
a segurança e o desenvolvimento da nação, concluindo-se que, se a privatização não era prioridade
para o empresariado, era menos ainda para o governo.
Embora uma mudança nesta visão ainda fosse demorar pelo menos mais quinze anos para se impor, o
agravamento da situação econômica a partir de 1979, obrigando o governo a priorizar o controle da
inflação e o equilíbrio das contas externas em detrimento do crescimento em curto prazo, fez com que
a participação direta do Estado na produção passasse a ser questionada novamente. Nesse momento,
no entanto, a questão ainda não dizia respeito à ineficiência do setor público estatal, mas a uma
limitação do aumento das funções do estado, de modo que “... não se tratava de uma guinada
ideológica quanto ao papel desenvolvimentista do Estado, mas antes uma mudança na ênfase da
política econômica...” (P
INHEIRO, 2000: 156), na qual essas empresas serviam cada vez mais como
instrumento. Assim, em vez de serem responsáveis por incentivar o desenvolvimento de indústrias
privadas, como se pretendia nos governos de Getúlio Vargas e Juscelino Kubitschek (S
ARAVIA, 2004),
o papel das estatais tornou-se cada vez mais vinculado à política macroeconômica, com o rígido
controle de preços
555
aos quais foram submetidas a partir de 1975, sendo visto como medida de
contenção da inflação e uma forma de subsidiar as importações (P
INHEIRO, 2000).
Contudo, esta medida, além de não remediar a crise econômica, deteriorou ainda mais a saúde
financeira das estatais, que apor causa da limitação do crédito e obrigadas a buscar empréstimos no
exterior, submeteram-se às crescentes taxas de juros internacionais
556
. Além disso, a redução do valor
551
Sem tomar partido quanto à vinculação desse incremento da ação estatal na economia uma ideologia política ou a uma
postura pragmática, o autor a atribui à emergência de cinco fatores: desenvolvimentismo, segurança nacional,
nacionalização de empresas privadas estrangeiras, verticalização e diversificação de atividades das grandes estatais e a
estatização de empresas mal administradas (P
INHEIRO, s/d).
552
De acordo com a Secretaria de Controle das Empresas Estatais - SEST, entre 1960 e 1970 surgiram 153 empresas estatais,
e entre 1970 e 19 80, o número atingiu a cifra de 215. Em 1985, elas são, segundo a SEST, 226. De acordo com os nossos
dados, na conclusão do exercício 1985, elas eram 275 (210 sociedades anônimas, 29 sociedades limitadas e 27 empresas
públicas) (S
ARAVIA, 2004).
553
Ou seja, contra a estatização de empresas privadas que estavam em más condições financeiras.
554
visto que possuíam somente um assento no Conselho de Desenvolvimento Econômico.
555
Não somente o controle de preços, mas em 1975 houve uma real redução do valor dos produtos e serviços oferecidos pelas
estatais (P
INHEIRO, 2000).
556
Segundo Carlos GARCIA (2004), especialmente entre 1977 e 78, o governo manipulou artificialmente a taxa de juros
doméstica, a fim de estabilizá-la acima da internacional e, desta forma, incentivar a captação de recursos externos. Fato que
se mostrou desastroso para as estatais, pois com a crise do petróleo em 1979, houve uma substantiva elevação nas taxas de
191
real dos preços e tarifas significava também um desvirtuamento da função dessas empresas, cujos
objetivos produtivos eram sobrepujados pelos político-econômicos, ocasionando uma “... contínua
deterioração do seu desempenho, com a expansão da demanda reprimida e a perda de qualidade de
seus serviços
(PINHEIRO, 2000: 157).
No início da década de 1980, atingidas pela crise tanto em decorrência da retração do mercado, quanto
por causa dos ditames da política antiinflacionária de preços baixos e juros elevados, as estatais não
apresentaram sinais de melhora da situação financeira
557
, o que levou o governo Sarney a tentar
desvincular essas empresas dos ditames da política macroeconômica em favor de uma “... gestão
pública baseada no princípio de um certa autonomia empresarial; a partir da reestruturação dos
mecanismos de financiamento” (G
ARCIA, 2004: 44). Esta nova postura, que Licínio VELASCO JR.
(1997) considerou condizente com a emergência de um Estado empresarial
558
, teve como
conseqüência o fortalecimento do BNDES, que, como principal órgão de financiamento industrial do
país, ganhou legitimidade como o mais apto a avaliar as conseqüências da crise financeira do Estado,
sendo posteriormente chamado a comandar o processo de privatização. Assim, mesmo as privatizações
da década de 1980 tiveram mais a ver com a “... orientação pragmática deste Banco
559
, que entendia a
privatização como um meio de fortalecer uma intervenção desenvolvimentista em setores outros
situados na ponta do desenvolvimento tecnológico...” (V
ELASCO JR., 1997: 10), do que com as
medidas levadas a cabo pelo Conselho de Desestatização
560
.
Portanto, nesse período, as desestatizações constituíam-se num meio de promover a realocação de
recursos do BNDES, permitindo ao banco substituir devedores estatais não–executáveis por devedores
privados executáveis. Desta maneira, foram vendidas somente empresas de pequeno e médio porte (a
maioria reprivatizadas
561
), pertencentes a setores dominados pela iniciativa privada e que tinham por
objetivo o saneamento financeiro da BNDESPAR
562
(PINHEIRO, 2000; VELASCO JR., 1997).
Como um dos setores que mais haviam absorvido recursos do BNDES
563
e era intensamente utilizado
juros, e especialmente a partir de 1981 iniciou-se uma política de desvalorização cambial que levou ao aumento nas taxas
de juros internacionais.
557
Para Carlos GARCIA (2004), o impedimento das estatais substituírem seus passivos em moeda estrangeira por ativos da
dívida pública dificultou ainda mais sua situação, o mesmo não ocorrendo com as empresas privadas que, fazendo uso
desta estratégia, conseguiram sanear suas dívidas.
558
Processo que o autor, acompanhando a linha de Luciano Martins, considera ter-se iniciado com o regime militar,
coexistindo ao Estado burocrático, que iria aos poucos substituindo.
559
Este papel desempenhado pelo BNDES pode ser sentido nos 17 processos, 11 foram de empresas controladas pela
BNDESPAR (V
ELASCO JR., 1997).
560
Segundo o autor, a criação deste conselho era uma resposta às demandas “antiestatistas”, e, embora pouco efetivo, este
conselho estabeleceu inovações importantes para a transparência e visibilidade do programa de privatizações, como o
mecanismo público de vendas por meio da bolsa de valores e a contratação de empresas de consultoria privada
especializada para avaliar e acompanhar o processo.
561
Estas privatizações estavam no bojo do plano de saneamento da SIDERBRÁS, constando entre elas três siderúrgicas
controladas pela SIDERBRÁS (COSIM, COFAVI E USIBA) e duas subsidiárias do BNDES (Cimental e Nossa Senhora
Aparecida) (G
ARCIA, 2004).
562
A BNDESPAR (BNDES Participações S.A.) era a empresa incumbida de administrar as ações e companhias incorporadas
pelo BNDES.
563
A siderurgia nacional consumiu em 1963 85% dos recursos despendidos pelo BNDES e, ao longo da década de 1970,
absorveu uma média de 53% dos investimentos no setor. O banco foi ainda responsável pelo financiamento dos planos de
expansão da CSN, USIMINAS e COSIPA, além da implantação da CST e AÇOMINAS, direcionando 35% dos
investimentos industriais para metalurgia e siderurgia durante o I (1972-4) e o II (1975-9) PNDs (A
NDRADE & CUNHA,
2002).
192
como instrumento da política econômica, o setor siderúrgico foi um dos mais duramente atingidos pela
crise. Sem poder contar com empréstimos nacionais
564
, com os juros internacionais elevados, mercado
consumidor retraído e um quadro de pesado endividamento, mais do que as dificuldades para finalizar
seus planos de expansão, na segunda metade da década de 1980, as siderúrgicas estatais brasileiras
enfrentavam a ameaça da completa insolvência. Englobando as principais empresas do setor, a
situação da SIDERBRÁS
565
(vide AnexoIII_org1b) era sintomática deste estado das coisas, tornando
inevitável o saneamento dessa holding. Segundo Carlos G
ARCIA (2004), o plano de saneamento do
grupo SIDERBRÁS, iniciado em 1987, tinha três frentes: uma que visava o realinhamento tarifário, ou
seja, gradualmente tornar o preço do aço compatível com o custo operacional das usinas, permitindo
uma produção auto-sustentável; a segunda frente dizia respeito à privatização de companhias menores
e produtoras de não-planos
566
, levando à privatização da COSIM, COFAVI, USIBA, CIMENTAL e
Nossa Senhora Aparecida; e, finalmente, na terceira estava o saneamento financeiro das empresas do
grupo (CSN, COSIPA, USIMINAS, AÇOMINAS e CST)
567
.
Como a única siderúrgica estatal que não compunha o grupo da SIDERBRÁS, a ACESITA estava fora
deste plano, e seu saneamento dependeu de recursos oriundos diretamente do Banco do Brasil, que em
contrapartida, pelos US$ 575 milhões de que dispôs entre 1981 e 1985 (vide AnexoI_tab13), exigiu a
venda das minas da companhia em Itabira à Companhia Vale do Rio Doce
568
.
Embora esta intensa injeção de dinheiro tenha melhorado a saúde financeira das usinas estatais
569
,
reduzindo seu grau de endividamento não foi suficiente para promover sua desvinculação da política
macroeconômica, nem torná-las auto-suficientes
570
(GARCIA, 2004). Com o mercado interno
reprimido, o aumento de cerca de 6,5% ao ano
571
na produção nacional de ferro deveu-se à
564
A partir de 1988, mesmo o financiamento nacional não era possível devido à resolução 469, segundo a qual estava vetado
o acréscimo do endividamento de empresas públicas, o que se traduzia na proibição do banco fornecer empréstimo às
siderúrgicas já bastante endividadas (VELASCO JR., 2005).
565
A SIDERBRÁS foi criada pelo Presidente Médici em 1972, como uma sociedade de economia mista, cujos objetivos
eram: “I - promover e gerir os interesses da União em novos empreendimentos siderúrgicos e de atividades afins,
ressalvados os casos de empreendimentos vinculados a empresas existentes; II – programar as necessidades dos recursos
financeiros da União para a as suas subsidiárias e associadas; III promover, por intermédio de subsidiárias ou
associadas, a execução de atividades relacionadas com a indústria siderúrgica no Brasil e no exterior” (IBS, 1972: 06 –
sem grifo no original) e embora pela lei ela devesse se incumbir somente dos novos empreendimentos, em 1976 já havia
incorporado todas as grandes siderúrgicas estatais, com exceção da ACESITA (vide AnexoIII_org1b), funcionando como
uma holding. Com a posse de Fernando Collor de Mello, uma de suas primeiras medidas foi a dissolução da SIDERBRÁS,
juntamente com a PORTROBRÁS e a INTERBRÁS.
566
Segundo o autor, desde o II PND já se previa que o Estado iria manter em seu controle somente as empresas produtoras de
aços planos, deixando a produção de não-planos a cargo do setor privado.
567
Primeiramente, as dívidas seriam transferidas para a holding, em seguida, seriam transferidos recursos suficientes tanto
para a holding quanto para as companhias, até que seu grau de endividamento se tornasse compatível com suas respectivas
capacidades internas de pagamento. Segundo Carlos GARCIA (2004), isto implicou num desembolso desigual, com as
empresas mais endividadas (CST e AÇOMINAS) abocanhando cerca de 75% dos recursos, enquanto a menos endividada
(USIMINAS) ficou com pouco mais que 10% e, com a SIDERBRÁS incorporando as dívidas de suas subsidiárias, mesmo
não tendo sido capaz de romper com a subordinação das estatais a política econômica, o plano teve relativo sucesso.
568
As minas foram vendidas por U$S 70 milhões.
569
O saneamento foi feito por transferência das dívidas das empresas para a holding que, no entanto, recebeu um repasse da
União 24% menor do que o previsto (P
INHO, 2001).
570
A única exceção foi a USIMINAS, que apresentava uma situação mais equilibrada entre o endividamento e as vendas.
571
De acordo com Marcelo PINHO (2001), este aumento na produção e a necessidade de desovar a produção deveram-se ao
mau momento em que ocorreu a conclusão do plano de expansão das usinas iniciado no final da década 1970, que, devido
a enormes atrasos, deu-se somente na segunda metade da década de 1980, situação especialmente difícil para COSIPA e
AÇOMINAS.
193
reorientação das vendas para o exterior, o que não colaborava muito para recuperação financeira das
empresas, já que foi calcada na aceitação de preços inferiores aos internos e na exportação de produtos
de menor valor agregado (P
INHO, 2001).
Com a continuidade dos balanços apresentando prejuízos
572
, não foi surpresa que as discussões sobre a
privatização ganhassem ainda mais força. Além disso, conforme argumenta Armando P
INHEIRO
(2000), a partir de 1990 nota-se o repentino desaparecimento de duas importantes justificativas para a
manutenção do controle estatal: a segurança nacional e a desnacionalização da economia
573
. Com a
definitiva entrada da desestatização para a agenda política nacional, houve também mudanças no
modo de gerenciamento das empresas e de seu papel no processo de desenvolvimento do país, que
passou a priorizar produtividade e eficiência em vez do preenchimento dos espaços deixados pela
iniciativa privada, fazendo com que para algumas empresas, “... a privatização pass[asse] a ser
encarada como alternativa ao seu fechamento (por exemplo: CSN)” (P
INHEIRO, 2000: 162).
A esse quadro geral de insatisfação somou-se a dissolução da SIDERBRÁS e o papel-chave do
programa de privatizações no discurso de mudanças adotado pelo governo Fernando Collor, fazendo
que o Plano Nacional de Desestatização, posto em marcha já no primeiro ano de seu mandato,
enfrentasse poucos obstáculos
574
.
Com o objetivo declarado de auxiliar na redução da dívida pública, para a qual se destinavam os
recursos provenientes das privatizações, optou-se por iniciar o processo pelas empresas que se
encontravam em melhores condições financeiras. No entanto, antes de iniciá-lo, alguns ajustes seriam
necessários a fim de tornar essas empresas mais eficientes e competitivas e, assim, mais atraentes ao
mercado. Comandadas pela recém-criada Comissão de Controle das Empresas Estatais, optou-se pela
estratégia de promover o aumento da produtividade por intermédio da redução de custos; contudo,
segundo Carlos G
ARCIA (2001), a única medida nesse sentido que obteve algum êxito foi relativa ao
gerenciamento de mão-de-obra, iniciando-se um intenso programa de redução de salários e demissões
nas empresas privatizáveis. Porém, ainda de acordo com este autor, não é possível culpar somente a
privatização pelo elevado volume de demissões que ocorreram nesse período, pois,
concomitantemente, ocorria um processo de reestruturação produtiva que englobava tanto aspectos
572
Conforme averiguou Marcelo PINHO (2001), no apanhado geral da literatura sobre o tema, ademais os problemas de
gestão, são apontados seis fatores que levaram as siderúrgicas estatais à crise que precedeu sua privatização: contenção dos
preços, mau direcionamento, superdimensionamento dos projetos de investimento, elevado custo do capital, excessiva
dependência de empréstimos externos; sujeição aos cartéis de distribuição e transporte do produto, e crise internacional da
siderurgia.
573
Segundo o autor, este desaparecimento deve-se ao desenrolar do processo de democratização do país, com o afastamento
dos militares do poder e externamente ao fim da Guerra Fria.
574
Segundo Carlos GARCIA (2001), o principal deles eram os sindicatos, porém mesmo estes foram, em alguns casos,
seduzidos pela possibilidade de compra de ações pós-privatização (USIMINAS), ademais as maciças demissões
precedentes já haviam minado um pouco de sua força, que enfrentou maiores dificuldades, principalmente, no caso da CSN
e da COSIPA, em especial desta última. Isto, contudo, não quer dizer que havia consenso sobre a privatização, nem no
conjunto da sociedade nem no governo, sendo que o conjunto de medidas que viabilizaram a implementação do plano foi
fundamentado num sistema fechado de decisões, ou seja, sua base legal era oriunda de medidas provisórias e decretos, cuja
“...conversão em leis muitas vezes não levou em consideração quase a totalidade das emendas feitas pelo Congresso
(V
ELASCO JR.,1997: 21).
194
gerenciais quanto tecnológicos
575
.
A escolha da siderurgia como precursora do programa de privatizações ocorreu porque, diversamente
dos setores de comunicação, petrolífero e elétrico, ela apresentava menos barreiras jurídicas e
institucionais para alienação das empresa; ademais, com a conclusão dos planos de expansão, as usinas
apresentavam boa performance, estavam tecnologicamente atualizadas e com seu endividamento
parcialmente solucionado, graças ao plano de saneamento da SIDERBRÁS (G
ARCIA, 2004). Segundo
Licínio V
ELASCO JR. (1997), um dos principais gestores do plano, a escolha da USIMINAS
576
para
inaugurá-lo foi inspirada em parâmetros adotados pela Argentina, pois, além de ser uma das poucas
estatais lucrativas, era de grande porte; tecnologicamente equiparava-se à suas concorrentes
internacionais, e nela a resistência dos trabalhadores era menos acentuada, fatores que fortaleciam a
credibilidade e confiabilidade do mercado e da sociedade tanto nas intenções liberalizantes do governo
quanto no programa.
O novo modelo de privatização diferia do anterior (governo Sarney), principalmente por propor a
venda de ações na bolsa de valores, o que, apesar de gerar incertezas quanto à estrutura societária
resultante e significar a desistência do governo de controlar o setor industrial
577
, foi considerada uma
estratégia bem-sucedida, pois reforçava o discurso liberal e democrático do governo, permitindo o
acesso de uma parcela mais ampla da população às ações, ajudando também a enfraquecer as
oposições (V
ELASCO JR., 1997).
Seguindo o modelo adotado para a USIMINAS, em 1991 foi privatizada a COSINOR; no ano
seguinte, foi a vez da AFP (Aços Finos Piratini), CST e da ACESITA com suas subsidiárias (FASA e
Energética); em 1993, CSN, COSIP e AÇOMINAS (vide AnexoI_tab13) também foram privatizadas,
de modo que, em menos de três anos, o núcleo da siderurgia estatal brasileira, aproximadamente 70%
do parque siderúrgico nacional, havia passado totalmente para as mãos da iniciativa privada
578
.
De um modo geral, emergiu da privatização uma estrutura compartilhada de controle do capital, com
fraca participação de grupos estrangeiros, inicialmente concentrados na USIMINAS. Situação que iria
se modificar radicalmente a partir de 1995, quando a saída dos bancos e entrada de grupos
internacionais viriam acompanhadas da redução da participação dos fundos de pensão, compondo uma
organização menos pulverizada da estrutura acionária das empresas (P
INHO, 2001). Essas
modificações organizacionais, no entanto, não se limitaram à parte gerencial, pois ao modificar suas
575
Embora em números absolutos o número de demissões do setor estatal seja avassaladoramente maior, proporcionalmente e
em especial no período 1989-1993, as demissões feitas por companhias privadas, como Belgo-Mineira e Manessman,
atingiram índices superiores mesmo ao da COSIPA, sendo ultrapassadas por esta somente no período posterior (vide
AnexoI_tab14).
576
No primeiro decreto (n
o
99.465 de 16/08/1990) foram listadas as empresas: COSINOR; a Aços Finos Piratini S.A.; CST;
USIMINAS; USIMEC; Mafersa S.A.; COPESUL; as participações acionárias da PETROQUISA nas companhias de
segunda geração que integram o Pólo Petroquímico de Triunfo; a participação acionária da PETROQUISA na COPENE;
as participações acionárias da PETROQUISA nas companhias de segunda geração que integram o Pólo Petroquímico de
Camaçari; a Indústria ICC; GOIASFÉRTIL, e a Mineração Caraíba Ltda.
577
Contrariando até mesmo um dos objetivos do PND, qual seja, “contribuir para a modernização do parque industrial do
país, ampliando sua competitividade e reforçando a capacidade empresarial nos diversos setores da economia” (L
EI nº
8.031 Art. 1
o
IV).
578
Obviamente que na composição acionária das empresas a permanência de bancos e fundos de pensão.
195
estratégias empresariais, os setores técnico e produtivo também foram afetados
579
.
A ACESITA era uma das empresas que poderia ser incluída no grupo das que enfrentavam o dilema
“privatizar ou fechar”
580
, pois com a instabilidade gerencial
581
pela qual passou nos anos 1980,
complicando ainda mais o já difícil quadro geral, ela enfrentava novamente sérios problemas
financeiros. Embora as venda das minas e os aportes de capital feitos pelo Banco do Brasil tivessem
reduzido quase pela metade o seu endividamento líquido (em 1982 era de US$ 968 b), às vésperas de
sua privatização, ele era de US$ 482 bi, enquanto seu patrimônio líquido estava estimado em apenas
US$ 44,5 bi. Assim, a principal resistência à sua privatização veio da comunidade local, e mesmo esta
se viu enfraquecida pelo predomínio da imagem das estatais como “elefantes brancos”, empresas
grandes e pesadas cujos gastos não justificavam sua manutenção. A inevitabilidade da privatização e o
exemplo bem-sucedido da USIMINAS, segundo Cícero M
ACHADO (10/fev/2004), também colaboram
para debilitar a resistência operária, verificando-se ainda que, nesse momento, as principais
reivindicações coordenadas pelo sindicato local (Metasita) diziam respeito à reposição salarial e
jornada de trabalho
582
, sendo as greves deflagradas desde 1989 voltadas para este fim
583
.
Seguindo a tendência geral, logo após sua privatização a organização societária da ACESITA (vide
AnexoI_tab16) apresentava forte participação de bancos e fundos de pensão, enquanto os empregados
da própria empresa, reunidos no CIGA (Clube de Investimento do Empregados do Grupo ACESITA)
conseguiram adquirir somente cerca de 12% das ações. Esta presença intensa de grupos institucionais
(bancos e institutos de pensão somavam mais de 54% das ações) levou à presidência da companhia
Wilson Brumer
584
. Com carta branca dos acionistas, Brumer partiu para a implantação de um
programa de reestruturação focado na busca da lucratividade e competitividade internacional.
Iniciando pelo que considerou a parte mais traumática da reorganização da empresa, o ajuste de
pessoal, determinou o corte de 25% da folha de pagamentos. Isto significou a demissão quase imediata
579
Segundo Vanessa OLIVEIRA (2004), após a privatização, passado o período inicial de ajustes, juntamente com a maior
internacionalização patrimonial das empresas houve uma redução nas atividades de pesquisa e desenvolvimento, tanto em
virtude da possibilidade de acesso à tecnologia oriunda das matrizes, quanto ao foco no mercado externo, predominando a
venda de semi-acabados.
580
Segundo LEMOS & PIRES (1992), nos três momentos em que foi discutida a privatização (1950, 1967 e 1981) da
ACESITA, ela enfrentava este dilema.
581
Maurício LEMOS & Júlio PIRES (1992) consideram que em termos gerenciais a empresa sempre foi instável, com a
indicação do presidente constituindo-se num processo complexo, resultado de decisões políticas nas quais o Banco do
Brasil, seu principal acionista, pouco influía. Na década de 1980, após a longa gestão de Amaro Lanari Guatimosin na
presidência da empresa, a ACESITA enfrentou um período conturbado, com a rápida sucessão de quatro presidentes em
três anos, o que ajudou a agravar as dificuldades administrativas que vinha tendo.
582
A fraca adesão pode ser sentida pela decisão em assembléia de não participarem da greve geral convocada pela CUT em
22 e 23 de maio de 1991, em protesto contra o governo Collor e que tinha na pauta a “defesa dos serviços públicos” (CUT,
s.d.) e pelo fracasso do protesto pela demissão de 28 funcionários (METASITA, s.d.3)
583
Nas entrevistas, no entanto, aparece outro aspecto que pode ter colaborado para a minguada oposição da oposição: a
perspectiva de que a partir da aquisição de ações da empresa, os empregados teriam maior participação nas decisões da
diretoria. Idéia que aparece como solução ideal proposta no relatório de Maurício LEMOS & Júlio PIRES (1992) e que
levariam muitos dos entrevistados a se sentirem traídos após a privatização.
584
Wilson Nélio Brumer fez sua carreira na CVRD, onde começou como técnico de economia e finanças em 1976, passando
a superintendente financeiro em 1984, até chegar à sua presidência em 1990, a qual deixou em 1992 para assumir a
presidência da ACESITA. (G
AZETA MERCANTIL: balanço anual – MG, 1995). Ele também tomou parte no Conselho da
USIMINAS e CST e, em 1995, acumulava os cargos de vice-presidente do conselho de administração da Forjas ACESITA
e presidente dos conselhos de administração da ACESITA Energética, Brasifco e Eletrometal, além de ser diretor da
Associação de Comércio Exterior do Brasil (R
EVISTA TECNOLOGIA HOJE, 2003), assumindo a Secretária de
Desenvolvimento Econômico de Minas Gerais na gestão de Aécio Neves (2002-2006).
196
de cerca de 2.000 funcionários
585
, fazendo com que o impacto da privatização fosse instantânea e
duramente sentido pela comunidade local, pois, sem cortes anteriores
586
, como nos casos da COSIPA e
CSN
587
, mesmo as medidas mitigadoras
588
adotadas pela empresa não foram suficientes para evitar
uma sensível desaceleração da economia da cidade. Embora a estimativa divulgada pelo sindicato
local seja exagerada (M
ACHADO, 10/fev/2004), para cada demissão realizada pela empresa havia a
perda de três postos de trabalho na cidade; a queda no número total de pessoas ocupadas no município
entre os anos de 1980 e 1996 não foi pouco expressiva, passando de 17.287 em 1980 para 12.710 em
1996. Assim, enquanto em 1980 o pessoal ocupado na indústria de transformação correspondia a
53,5% de todo pessoal empregado na cidade, em 1996 esta relação era pouco superior a 40%%,
chegando a 36% em 2003. Valores que são ainda mais significativos quando se considera que em 1980
o total de empregos na indústria de transformação somava 9.260, enquanto a ACESITA empregava
8.116 pessoas, o que correspondia a 87,6% dos postos na indústria e 46,6% de todo pessoal ocupado
na cidade, números que passariam respectivamente para 50,8% e 18,7% em 2003.
O plano de ação, posto em prática após a privatização, previa também a renegociação de contratos
com fornecedores, o alongamento da dívida, melhoria da produção e qualidade dos produtos, além de
uma nova política comercial, com a destinação de recursos para marketing e um aumento no mix de
produtos, mais direcionados a mercados específicos e ao business core da empresa (R
EVISTA
TECNOLOGIA HOJE, 2003; HINCHBERGER, 1995). No entanto, somente com o retorno da lucratividade
e sua dívida renegociada, a companhia retomou os investimentos na produção, promovendo a partir de
1994 sua quarta expansão. Com a melhoria das condições financeiras e a contratação da empresa de
consultoria McKnsey, em 1995 a reestruturação passou a ocorrer de forma mais sistemática (M
ACEDO,
2000).
Entre as principais medidas adotadas estão: a substituição do carvão vegetal pelo coque importado no
alto forno de redução
589
, a alteração da “rota tecnológica” da produção de aços inoxidáveis na
585
Ele defendia que “em vez de eliminar 2.000 empregos, nós estávamos salvando os outros. A companhia não podia
sustentar aquele nível de emprego. Mas eu estou convencido que o problema não era somente de pessoal. Havia
burocracia demais, atrasando a tomada de decisões”. “But we knew that rather than eliminating 2,000 jobs, we were
saving the others. The company could not sustain that level of employment. But I'm convinced that the problem was not just
personnel. There was bureaucracy, slow decision making” (H
INCHBERGER, 1995).
586
Embora Maurício LEMOS & Júlio PIRES (1992) afirmem que entre os preparativos da privatização estava o corte de 10% do
pessoal, ao examinar o quadro de número de funcionário, verifica-se que isto não ocorreu; se houve corte com esta
intenção, ele não passou de 3%.
587
Segundo Marcelo PINHO (2001), as demissões tinham dois propósitos: enxugar a folha de pagamento, facilitando o
equilíbrio das contas internas, e enfraquecer os sindicatos. Novamente, a exceção foi a USIMINAS, onde antes da
privatização não houve demissões e, mesmo posteriormente, seu número foi bem menos expressivo. Já na CSN, antes da
privatização foram demitidos dois mil funcionários loteados no Estado de Santa Catariana e na COSIPA mais de 500,
números que só não foram maiores devido a dificuldades das empresas de reunir recursos para arcar com tais demissões.
588
Buscando minimizar suas conseqüências, iniciaram-se as demissões pelo escalão superior (o número de gerentes passou de
230 para menos 80, o pessoal no escritório em Belo Horizonte de 500 para 55), institucionalizou-se um programa de
incentivos à aposentadoria, garantiu-se a continuação do plano de saúde por mais um ano e uma firma de recolocação foi
contratada. Além disso, segundo Brumer, em menos de dois anos e meio, o incentivo à criação de pequenas empresas,
prestadoras de serviços levou à montagem de 25 a 30 novas empresas, com aproximadamente 1.000 funcionários
(H
INCHBERGER, 1995).
589
O Alto-forno 1 e o Forno-elétrico de Redução, para produção de ferro-cromo, continuaram a ser alimentados por carvão
vegetal.
197
aciaria
590
, e a ampliação da capacidade de produção de aços inoxidáveis planos, fazendo que, já no ano
seguinte, parte da planta fosse desativada
591
e a empresa fosse organizada em “unidades de
negócios”
592
, com um corte de 796
593
postos de trabalho, medidas de ordem tecnológicas, cujo impacto
foi amplificado por virem acompanhadas da terceirização de importantes setores, como a fábrica de
gazes (assumida pela AGA) e o grupo de automação industrial (comando pela IBM), ademais ainda
em 1992 o núcleo técnico, responsável pelo desenvolvimento tecnológico, foi extinto
594
.
Quadro de investimentos da ACESITA na usina em Timóteo entre 1994-1997
Área Tipo de investimento Valor (mil US$)
Redução Expansão 20.000
Aciaria Expansão 38.500
Laminação a quente Modernização 24.000
Laminação a frio (inoxidável) Expansão 227.000
Laminação a frio (silício) modernização 1.005
Fonte: FERREIRA, 1997
Quanto ao discurso de focalizar a produção no business core da empresa, ele pareceu aplicar-se
somente à usina de Timóteo, pois nesse período a empresa como um todo buscou “... a ampliação dos
seus negócios na área de mineração e siderurgia para além de seu núcleo de especialização (barras
de aços comuns e especiais e aços planos alto-carbono, inoxidável e siliciosos)” (F
ERREIRA, 1997:
70), sendo adquiridas a SIFCO e a Eletrometal (posteriormente negociada com a Aço Villares), ambas
voltadas para a produção de forjados para a indústria automobilística (respectivamente carbono e
especial), além do acordo com CVRD e Kawaski Steel para, unidas, controlarem a CST, levando a
ACESITA à compra de 34,14% de seu capital. Acordo que, dado o dispêndio de US$ 110 milhões e a
subseqüente queda dos valores das ações da empresa
595
, colocou a ACESITA novamente em uma
situação financeira pouco confortável
596
.
Com relação à política comercial, também foram tomadas medidas incisivas, destacando-se aquelas
voltadas à aproximação com os clientes. Neste sentido, passaram a ser desenvolvidas atividades que
590
Passa de duplex à triplex, ou seja, após a primeira (pré-tratamento do gusa, cromo e cromo nos fornos elétricos) e segunda
(refinamento no conversor a oxigênio) etapas, há uma terceira de correção da composição química no conversor VOD
(Vacuum Oygen Desgazing) (F
ERREIRA, 1997).
591
A laminação de barras finas foi fechada totalmente, significando uma redução de 25% do efetivo do setor de laminação
(F
ERREIRA, 1997).
592
Eram quatro unidades de negócios: produção de laminados de aço inoxidável, produção de laminados de aço carbono e
aço ao silício, fornecimento de serviços de apoio e assessoria à produção e fabricação de produtos básicos (ferro gusa e aço
bruto) (FERREIRA, 1997).
593
Somente em março/1996 foram demitidas 548 pessoas, fora as 100 demitidas em janeiro, o que, segundo José FERREIRA
(1997), teria levado à saída do diretor industrial.
594
Embora a ACESITA nunca tenha primado pelo desenvolvimento de novas tecnologias (como a USIMINAS), desde a
década de 1980, quando estabeleceu convênio com a UFMG, USIMINAS, IPT, IPEM etc., possuía um quadro técnico
com boa formação. Logo após a privatização, a nova direção decidiu extinguir a Gerência de Pesquisas, optando pela
compra de tecnologia em detrimento do desenvolvimento próprio. Mesmo a reativação do Departamento de Pesquisa e
Tecnologia em 1995 não significou uma mudança de perspectiva, uma vez que, formado por técnicos transferidos do setor
de metalurgia, tem uma produção marcada por relatórios de práticas-padrão (F
ERREIRA, 1997).
595
O lote de mil ações preferenciais da ACESITA passou de R$ 5,56 em abril para R$ 2,30 em setembro de 1996 (FERREIRA,
1997).
596
Para José FERREIRA (1997), a compra das duas primeiras se justifica por sua associação com a Forjas ACESITA – FASA e
pelas condições favoráveis na aquisição destas, o que não ocorreu no caso da CST, quando o autor estima que foi pago um
ágio de cerca de US$ 50 milhões.
198
visavam desde o atendimento de exigências específicas até parcerias com os clientes na divulgação
dos produtos em jornais e televisão
597
. Embora desde a década de 1980 programas de melhoria da
qualidade tivessem sido implantados (F
ERREIRA, 1997; SOUZA, 1989), somente a partir de 1992
buscou-se adequá-los às normas ISO 9000, o que permitia atingir mercados mais exigentes, fazendo
com que a conquista da certificação ISO 9000 (relativa à excelência no atendimento ao cliente
598
), em
1994, se insira no rol das medidas voltadas à satisfação do cliente.
A manutenção de um bom relacionamento com a comunidade local também compunha a pauta do
novo programa gerencial, de modo que, em 1994, foi criada a Fundação ACESITA, instituição
responsável pelo gerenciamento de projetos de cunho social, cultural, ambiental e comunitário
voltados para o desenvolvimento da cidade e região
599
. Mesmo que, inicialmente, a criação desta
entidade possa parecer pouco significativa, ao ser inserida no conjunto de medidas que a ACESITA
vinha implementando desde a década de 1960, a fim de se distanciar dos problemas da cidade, ela
ganha importância, pois representa a institucionalização de mais uma separação entre a cidade e a
indústria. Com a criação da Fundação ACESITA, o relacionamento da cidade com a indústria passa a
ser mediado por ela, pois esta assume a responsabilidade pela condução de projetos que vão desde
geração de renda, formação profissional e capacitação continuada, saúde, cuidado de crianças e idosos
até educação ambiental.
600
No segundo semestre de 1995, a súbita queda da demanda interna (G
AZETA MERCANTIL: balanço
anual – Minas Gerais, 1996) fez arrefecer o entusiasmo dos anos que se seguiram à privatização,
especialmente a partir do segundo semestre de 1993, quando tanto o mercado interno quanto o
internacional se mostravam aquecidos, fator que, somado ao enxugamento da folha de pagamentos,
auxiliou as siderúrgicas brasileiras a atingirem recordes de produção e saírem do vermelho,
possibilitando que, pela primeira vez na sua história, ACESITA e USIMINAS distribuíssem
dividendos aos seus acionistas
601
. À tendência de queda verificada em 1997 veio somar-se a crise
financeira deflagrada nos países do Leste asiático no final desse ano, de modo que, quando as usinas
estavam concluindo a primeira leva de reformas e ampliações pós-privatização, tiveram de se
confrontar com um mercado mundial com demanda em retração, superoferta e queda de preços
597
Esta visão fundamenta-se na noção de que quanto mais o cliente vender, mais aço comprará; nas palavras de Wilson
Brumer, “O mercado não consome aço. Ele consome produtos feitos de aço.” (“The market does not consume steel. It
consumes products made from steel.”) (H
INCHBERGER, 1995).
598
A certificação ISO 9002 é concedida pela ABS Qualty Evaluatins Inc. e se refere à engenharia de produtos, operação,
controle de processos e inspeção, enquanto a ISO 9001 acrescenta certificação de desenvolvimento do produto; com a
desativação do centro de pesquisa e desenvolvimento, esta última ficou fora do alcance da empresa.
599
A atuação da Fundação ACESITA será analisada com mais cuidado no sexto capítulo.
600
A maior parte destes projetos é de caráter multiplicador (instrução de instrutores) e desenvolvida pela Fundação
ACESITA em parceria com prefeituras, escolas ou entidades não-governamentais, tendo como público-alvo estes
estabelecimentos ou diretamente a população local.
601
Assim, apesar da crise do início de 1993, com a retomada do crescimento do setor automotivo no segundo semestre, a
maior parte das siderúrgicas conseguiu fechar o ano com lucros (G
AZETA MERCANTIL: balanço anual - MG, 1994). Com a
continuidade do crescimento do mercado nacional e internacional, no ano seguinte a única a ter prejuízo foi a COSIPA
(GAZETA MERCANTIL: balanço anual - MG l, 1995). No entanto, segundo semestre de 1996, a desaceleração da indústria
automobilística nacional dá os primeiros sinais de queda, fazendo com que as empresas busquem intensificar suas
exportações (GAZETA MERCANTIL: balanço anual - MG, 1996). Queda que num primeiro momento é atribuída à falta de
grandes projetos no setor (J
ORGE, 1998).
199
(ANDRADE, 1998). Sacudida pela crise mundial, a indústria brasileira que, após a estabilização
econômica viabilizada pelo Plano Real, vinha crescendo
602
, enfrentou dificuldades para se equilibrar
novamente, sendo a siderurgia, devido à importância da Ásia como mercado consumidor
603
, a primeira
a ser atingida. Assim, já em 1998, em vez de aumento da produção nacional esperado devido ao
aumento da produtividade e às ampliações promovidas durante o período anterior, verificou-se queda
tanto na produção quanto nas vendas e no faturamento das empresas (vide AnexoI_tab18).
Para a siderurgia brasileira e mais especificamente para a ACESITA, 1998 foi um ano marcado
também pela internacionalização, com a entrada do grupo USINOR no quadro de acionistas da
empresa
604
(vide AnexoI_tab06). Após a tomada de controle pelo grupo francês, houve um melhor
delineamento de seu foco estratégico, buscando-se progressivamente concentrar as atividades
comerciais e produtivas no atendimento de seu mercado original, qual seja, venda interna de aços
planos inoxidáveis e siliciosos. Especialização que permitiria elevar a qualidade da produção e ampliar
o mix de produtos, proporcionando também um melhor atendimento dos clientes, cujas necessidades
específicas seriam mais facilmente satisfeitas (O
LIVEIRA, 2004).
Dentre as prioridades da nova administração destaca-se a redução do endividamento, objetivo cujo
alcance deveria se dar por meio de um novo enxugamento do quadro de funcionários e pela alienação
de ativos físicos que não pertenciam ao core business da empresa
605
. Portanto, ainda em 1998 foi
implantado do Plano de Redução do Quadro de Pessoal, verificando-se ao final do ano uma redução de
mais de setecentos empregados
606
, com a relação entre empregados diretos da empresa e população
local passando de 14% em 1991, para pouco mais de 4% em 2000 (vide AnexoI_tab02 e 17). Visando
à redução das despesas com pessoal, também foram feitos ajustes no quadro funcional, com a
reprogramação de férias, eliminação de horas extras e alteração do regime de turnos, havendo, em
contrapartida, a introdução de um sistema de remuneração variável conforme o desempenho das
equipes formadas devido à implantação do Plano de Metas por Equipe (PME).
Já os benefícios que se esperava dessa associação eram de três ordens: logística, tecnológica e
gerencial, respectivamente o acesso à rede mundial de distribuição do grupo, melhoria no rendimento
dos equipamentos e aprimoramento de técnicas de comercialização e marketing (Relatório Anual,
602
Observando a taxa anual de crescimento do PIB (vide AnexoI_tab11), nota-se que a partir de 1998, há uma queda brusca
demonstrando a desaceleração da economia ocasionada tanto pela crise asiática quanto pela liberação do câmbio.
603
O reflexo do que ficou conhecida como a “Crise dos Tigres Asiáticos” foi fortemente sentida na siderurgia, pois “A Ásia
tem um papel crucial no mercado siderúrgico, tendo sido responsável, em 1997, por 45% do consumo mundial e 33% das
importações globais de aço. A crise financeira que assola a região gerou queda brusca da atividade industrial, com drástica
redução dos produtos internos brutos, à exceção da China”. (A
NDRADE, 1998).
604
Quanto à internacionalização da siderurgia brasileira, os autores estudados dão destaque ao caso do grupo Gerdau, que
desde 1989 a havia adotado como estratégia empresarial. Deste ano até 1999, a Gerdau preferiu adquirir prioritariamente
unidades de pequeno porte a investir na construção de novas plantas (exceção da argentina SIDAR; após a aquisição da
AmeriSteel, tornou-se mais agressiva e buscou ampliar seu leque de produtos adquirindo também a Birmingham Southeas;
com sua capacidade instalada no exterior, superando a nacional, correspondia a 51% em 2003 (OLIVEIRA, 2004).
605
Apesar desta diretriz, ainda em 1998 foi inaugurada a Cetubos, responsável pelo fornecimento de tubos redondos e
quadrados para a indústria automotiva e moveleira. Ainda em 1998 foram vendidas a FASA (para Krupp Metalúrgica
Campo Limpo Ltda.) e em 2000 a Usina de Sá Carvalho foi vendida para a CEMIG, enquanto se determinava a orientação
de venda da SIFCO e a saída da ACESITA do controle da Aços Villares (Eletrometal).
606
Segundo o Relatório Anual (1999), 555 funcionários aderiram ao programa de demissão voluntária. É interessante notar
que, apesar de todas estas demissões, somente oito anos depois da privatização, quando já se havia estabilizado o número
de empregados da empresa, voltaram a ocorrer greves na ACESITA (METASITA, s.d.).
200
1999).
A liquidação de ativos iniciou-se ainda em 1998, quando foi vendida a FASA (para Krupp Metalúrgica
Campo Limpo Ltda.), seguindo-se a da Usina de Sá Carvalho para a CEMIG em 2000, da SIFCO, as
ações da Aços Villares (Eletrometal) e da CST nos anos seguintes, chegando a 2006 com uma
estrutura societária bem mais enxuta (vide AnexoIII_org3). Estas vendas, contudo, não incluíram a
ACESITA Energética
607
, observando-se que, das empresas que permaneceram, é a única que não está
diretamente ligada à estratégia de especialização produtiva assumida a partir de 1998
608
.
A decisão de manter a ACESITA Energética parece ainda mais surpreende ao se considerar a venda da
Usina de Sá Carvalho, indicando não ser a manutenção da auto-suficiência energética um dos itens no
qual se pautou essa decisão. A perspectiva de ampliação do consumo de carvão pela usina também
parece não ter sido motivo suficiente, uma vez que há poucos anos (1994) dois alto-fornos haviam
sido convertidos para o carvão mineral. Além disso, em 2003 foi criada a Preservar Madeira
Reflorestada, empresa cuja “... atividade principal é o processamento de madeira de eucalipto para
uso múltiplo...” (P
RESERVAR Madeira Reflorestada, s.d.), ou seja, uma atividade muito distante do
core business da empresa. Embora nos relatórios não haja nenhuma explicação oficial sobre esta
postura, ela parece diretamente ligada à tentativa de firmar uma imagem da ACESITA como empresa
social e ambientalmente consciente, o que, além de contribuir com a melhora do relacionamento com a
comunidade local, satisfaz exigências do mercado internacional e serve como instrumento de
divulgação; portanto, ligada diretamente a estratégias comerciais e de marketing. Neste sentido, a
conquista da ISO 14.001 em 2001, permitindo que seus produtos carregassem o “selo verde”,
significou não somente a ampliação de cuidados com o meio ambiente, mas também a ampliação de
mercados para seus produtos, justificando não somente a manutenção da Energética, como também a
criação da Preservar Madeira Reflorestada.
A política ambiental tem sido destaque não somente no relacionamento com clientes externos, mas
também com a comunidade local e, embora a atenção com a produção de carvão vegetal já se
evidenciasse na década de 1970, levando Francisco G
OMES (1976) a considerar a ACESITA uma das
empresas que mais cuidou da produção de eucaliptos, ela já foi motivo de conflitos com a comunidade
local
609
.
607
Cetubos e ASCIPAR podem ser incluídas no rol de empresas voltadas à ampliação do atendimento de necessidades mais
específicas e especialização produtiva, enquanto as demais associadas que permaneceram eram responsáveis pela
comercialização
608
ACESITA Internacional Ltda., ACESITA Empreendimentos, Aços Planos do Sul (administradora da participação na
CST), ACESITA Energética, ACESITA Argentina, SIFCO, Panxa Trading Co (representação comercial no exterior),
Centro de Serviços ASCIPAR (CELQUI e CECA) e CETUBOS; coligadas: Indústrias Villares S.A. (20,75%), Aços
Vilares S.A. (11,58%) e Elevadores Atlas S.A. (10,42%) (Relatório Anual, 1999).
609
Na década de 1950, durante a gestão do general Edmundo Macedo Soares, a produção de carvão era contratada por
intermédio da BENEPO (Beneficência Popular). Embora esta entidade, administrada pelo pároco local, Monsenhor Rafael,
tivesse como finalidade auxiliar as famílias na geração de renda, oferecendo cursos de alfabetização para adultos, costura,
datilografia, etc., ela acabou intermediando a contração de carvoeiros. Vista pelos religiosos como uma forma de ajudar a
empregar a população pobre que chegava à cidade, a contratação dos carvoeiros por intermédio da entidade eximia a
empresa de pesados encargos sociais (seja diretamente vinculados ao salário, seja indiretos, como moradia, saúde e
educação), o que em vez de proporcionar melhores condições de vida acabava por agravar ainda mais a situação de um
número crescente de indivíduos (o Relatório 1955 fala numa população total de 30.000, sendo apenas 12.000 situada no
201
Os impactos na nova mudança do quadro societário da companhia, que em 2002 passou ao controle da
ARCELOR
610
, foram bem menos drásticos que nos casos anteriores. Mantendo-se vinculada ao grupo
francês, tanto o corte de pessoal quanto o remanejamento interno ou mesmo a política comercial e as
decisões tecnológicas adotadas parecem ter seguido a direção já adotada quando passou a ser
controlada pela USINOR. Assim, prosseguiu-se com as reformas programadas do alto-forno 2 e da
aciaria, bem como com a ampliação da capacidade da laminação a quente, a desativação da produção
de barras e a garantia da certificação ISO 14.000, por intermédio da inauguração da fábrica de
briquetes (terceirizada) e do desempoeiramento da casa decorrida do Alto-forno 2, entre outras. A
venda das ações da CST também seguiu conforme o planejado, do mesmo modo que o atendimento da
demanda interna por aços especiais planos, sendo o ano de 2002 apontado no Relatório Anual (2002)
como marco do ”... fim de um ciclo de mudanças estruturais”. O que parece se confirmar no ano
seguinte quando, com seu saneamento financeiro viabilizado pela alienação das ações da CST, a
ACESITA volta a dar lucro e passa a buscar com mais afinco a ampliação de seu mercado
consumidor, principalmente no exterior.
Contudo, é 2004 que assinala de forma definitiva a boa fase por que passa a empresa. Livre dos
grandes encargos financeiros que seu endividamento lhe impunha, contando com o reaquecimento do
mercado e o fim das grandes reformas na usina garantindo sua estabilidade funcional, neste ano ela
bateu recordes de produção e faturamento, com suas ações sendo as mais valorizadas (138%) da Bolsa
de São Paulo (Relatório Anual 2004, s.d.). A força desses resultados auxiliou a empresa a manter seu
saldo positivo no ano seguinte quando, a partir do segundo semestre, a desvalorização do dólar e a
retração na demanda levaram a um resultado menos compensador que o do ano anterior (Relatório
Anual 2005, s.d.).
A tranqüilidade com relação a questões financeiras também parece ter sido um dos fatores que
possibilitaram a retomada de planos de reestruturação, destacando-se dentre eles a reconversão do
Alto-forno 1 do coque para o carvão vegetal, cujo aumento na demanda exigiu a intensificação do
plantio de eucalipto, justificando a manutenção da ACESITA Energética (Relatório Anual 2004,
s.d.). A disponibilização de recursos por parte do BNDES num total de R$ 198,7 milhões
correspondente a 60,4% do valor total do investimento para expansão e modernização de sua
produção
611
(IBS, 2006b).
Mas se no horizonte econômico e produtivo da ACESITA parece não haver grandes conturbações, o
mesmo não ocorre no administrativo, acontecendo em janeiro de 2006 uma oferta não solicitada de
núcleo urbano e 18.000 no campo, número que no Relatório 1961 atinge 20.000). Sem que tenha sido possível localizar
documentos impressos e dada a resistência dos entrevistados em falar sobre o tema, não foi possível averiguar por quanto
tempo vigorou este arranjo, certamente alterado a partir de 1974 com a criação da ACESITA Energética.
610
A ARCELOR foi criada em 2002 pela união da ACERALIA (Espanha), ARBED (Luxemburgo) e USINOR (França)
(A
RCELORMITTAL, s.d.).
611
A maior parte deste valor deve ser aplicada na compra de equipamentos objetivando ampliar sua capacidade de produção
de laminados a quente de 850 mil toneladas/ano para 900 mil toneladas/ano e ainda em nove projetos menores para
modernização em diferentes pontos de sua linha de produção. (IBS, 2006b).
202
compra da ARCELOR pela MITTAL
612
(IBS, 2006a). A consolidação do negócio programado para
ocorrer em 2007 não se deu, no entanto, sem que houvesse resistência por parte do grupo
luxemburguês
613
. Para a ACESITA, a fusão dos dois maiores grupos de siderurgia do mundo
614
significou uma ampliação ainda maior de sua crescente internacionalização, conduzida pela expansão
de suas fronteiras comerciais do Cone Sul, onde já vinha instalando unidades de serviços (Chile,
Argentina e Colômbia) (IBS, 2006c).
No entanto, apesar dessas constantes reestruturões societárias, da mesma forma que as crises
enfrentadas no passado, a ACESITA manteve-se envolvida intensamente com a comunidade local; o
que se tem constado é que, ao longo do tempo, esse relacionamento tem se tornado cada vez mais
distanciado, não pela sua retirada total, mas pela inclusão de um número crescente de agentes
intermediários, passando de um contato direto com a comunidade e seus problemas, para um
intermediado pelo poder público municipal e, posteriormente, por um braço da própria companhia, a
Fundação ACESITA. Assim, embora a partir de 2002 esta fundação tenha voltado a se limitar a
atividades educativas e recreativas, com a ACESITA sendo chamada diretamente a agir junto com a
prefeitura e outros órgãos na solução de problemas urbanos e ambientais, estas são tratadas cada vez
mais como parte do “negócio”, subordinadas à mesma lógica do lucro da produção propriamente dita,
só que aqui representada pelo retorno na forma de marketing empresarial.
612
O grupo Mittal nasceu na Índia em 1976 com a fundação da Mittal Steel, e dirigido por Lakshmi N. Mittal tem-se
mostrado um dos mais dinâmicos mundialmente, que por sua agressiva política de aquisições demonstrando um rápido
crescimento, levou seu presidente a ocupar a posição de terceiro homem mais rico do mundo (MAIDMENT, 03/10/2005). O
grupo configura-se hoje como a maior e mais global das companhias siderúrgicas, que com a incorporação da ARCELOR,
passou a ser o responsável por cerca de 10% da produção mundial de aço bruto com capacidade produtiva de 113 milhões
de toneladas; emprega 330 mil pessoas e em mais de 60 países (A
RCELORMITTAL, s.d.).
613
Que buscando evitar a fusão anunciou a intenção de comprar em junho/2006 a companhia russa SEVERSTAL.
614
Em 2005 a produção mundial de aço estava assim organizada:
World's Largest Steel Producers
Company Country 2004 Production*
Mittal Netherlands 57
Arcelor Luxembourg 42.8
Nippon Steel Japan 31.3
JFE Japan 30.2
POSCO South Korea 28.9
Shanghai Baosteel China 19.9
Corus, Netherlands U.K. 19.1
*Millions of tons. Source: company reports (Forbes, 03/10/2005)
203
Fig. 200-201: Evolução urbana de Timóteo – década de 1990 e o bairro Alphaville
(GOOGLEARTH)
N
Fig. 202-203: Evolução urbana de Timóteo – década de 2000 e o distrito industrial do Limoeiro
(GOOGLEARTH)
0 338m
N
0 304m
N
204
Fig. 204-205: Mapas de zoneamento e setores do Plano Diretor de 2004
N
N
205
0 5.63Km
N
Fig. 206-207: A antiga casa de hóspedes, atual Fundação Acesita
(
ARQUIVO CENTRAL
,
SILVEIRA
,
s.d.1
)
Fig. 208: Vista geral a partir do centro em direção ao noroeste - 2004
(
AUTORA
)
Fig. 209: O Vale do Aço (jan/2007)
(GOOGLEARTH)
N
146
Capítulo V: A CONSTRUÇÃO DE TIMÓTEO: PROJETO E DESTINO
Fig. 210: Vista aérea em 1961
(ARQUIVO CENTRAL ACESITA)
147
Cidade - trabalho
Que acorda com o apito da fábrica
E capacete de aço
De homens de ferro, de coração de ouro
E braço valente,
Tudo é que é gente...
Pasta Timóteo-história
Biblioteca Municipal de Timóteo
207
V.1 OS PROFISSIONAIS E OS ESPAÇOS DA CIDADE DE TIMÓTEO
A primeira metade do século XIX foi o momento em que pela, primeira vez, as cidades foram “...
problematizadas em questão urbana, concebidas como um espaço de tensões empíricas e
conceituais,....” (B
RESCIANI, 1990:12), quando se buscou nas políticas de intervenção no meio urbano
a resposta tanto para problemas sociais quanto econômicos, fazendo com que, mais do que palco ou
cenário, o urbano se tornasse o principal elemento condutor do enredo. Contudo, se até então
caixeiros-viajantes, filósofos ou escritores
615
concebiam e propunham novas formas urbanas, a
transformação do urbanismo em disciplina acadêmica e prática política
616
passou a exigir a presença
de especialistas, levando médicos, sanitaristas, paisagistas, engenheiros e arquitetos a reivindicá-lo
como atribuição profissional.
Neste contexto, já na segunda metade do século XIX nos Estados Unidos, nota-se a formação de um
corpo de “profissionais da cidade” composto, principalmente, por “profissionais do design”
617
:
arquitetos, paisagistas e planejadores regionais
618
(CRAWFORD, 1995: 62), enquanto no Brasil os
planos e projetos urbanos eram predominantemente comandados por engenheiros civis e
sanitaristas
619
. Embora não seja possível atribuir unicamente a atuação de profissionais com diferentes
formações a diversidade nas soluções propostas, é interessante notar que, mesmo partilhando
preocupações estéticas e técnicas
620
semelhantes, a solução para os problemas de congestão e
615
Estes seriam o que Françoise CHOAY (2002) chamou “pré-urbanistas”, que a autora separou em progressistas, culturalistas
e sem-modelo, estando entre eles Robert Owen, Charles Fourier, Victor Considérant, ,Etiene Cabet, Pierre – Joseph
Prodhon, Benjamim Richardson, Jean-Baptist Godin, Julio Verne, Jonh Ruskin, William Morris, Friedrich Engels, Karl
Marx, P. Kropotkin, entre outros
616
Na verdade, para Françoise CHOAY (1985: 03), o projeto fundador dos escritos teóricos sobre urbanismo datam da
renascença italiana (1452), quando o texto de Leo Battista Alerti “De re aedificatoria” determinou um conjunto de
princípios e regras que deveriam reger a totalidade da construção do espaço, da casa à cidade. Contudo, somente na
segunda metade do século XIX, é que as pretensões científicas embutidas no termo “urbanismo” por Ildefons Cerdà (1867)
cimentaram a criação de uma “nova ciência urbanizadora”.
617
Na análise de Margareth Crawford, a aproximação entre planejadores e paisagistas, embora breve, está na base da
institucionalização destas profissões nos Estados Unidos no final do século XIX e início do XX. Embora com origens
diversas, os planejadores diretamente vinculados à resolução dos problemas sociais e os paisagistas tradicionalmente
ligados a questões estéticas e patrocinados pela elite, estes profissionais iriam encontrar no desenho de cidades
empresariais um campo de trabalho onde seria possível reunir suas preocupações estéticas e sociais, pois, enquanto elas
reuniam problemas semelhantes aos de uma cidade tradicional, nelas muitas das questões que deveriam ser enfrentadas
apareciam em escala mais reduzida, facilitando seu planejamento (especulação imobiliária, dimensões, complexidade
social, choque de interesses, entre outros).
618
Embora pertencentes a movimentos que iriam se distinguir (City Beautiful, Parques e Planejamento Urbano – City
Beautiful, Parks e City Planning), David J. E
DELMAN & David J ALLOR (2003) citam Frederick Law Olmstead, Daniel
Burham, Edward Bennet, John Nolen, Chales Eliot, George Kessler, Sidney, além de Herbert Hare e Ladislas Sego, e os
planos das cidades de Kansas, Detroit, Dayton, Cincinnati, Chicago, Indianápolis, Dallas, Saint Louis, e outras.
619
No rol de urbanistas que atuaram no Brasil apresentado por Cristina LEME (1999), dos 43 nomes que compõem o que a
autora chamou primeira e segunda geração, somente quatro se formaram em escolas onde o curso de Arquitetura não era
vinculado à Engenharia Civil (Cristiano Stockler das Neves, Atílio Correia Lima, Rino Levi, Lúcio Costa e os estrangeiros
Joseph Bouvard e Alfred Agache). Dentre os engenheiros e sanitaristas atuando no país nas últimas décadas do século XIX
e iniciais do XX, destacam-se Saturnino de Brito, Teodoro Sampaio e Lourenço Baeta Neves.
620
O que não quer dizer que não houvesse preocupações sanitárias nas cidades norte-americanas, mas como coloca Richard
C
URRENT (et ali1967: 385): “As cidades fizeram algum progresso lidando com seus problemas de transporte, iluminação
urbana, esgoto e abastecimento de água. Elas não tinham feito progresso suficiente, no entanto, para tomar conta
adequadamente do rápido crescimento populacional”. (“The cities made some progress in dealing with their problems of
transportation, street lighting, sewage disposal, and a water supply. They did not make enough progress, however, to take
adequate care of the fast-growing population.”). Além do que a ênfase em preocupações sociais e políticas, como mostra
Carl S
MITH (1995), fez com que as reformas urbanas assumissem o caráter de reformas políticas e morais, de modo que,
embora os problemas sanitários também fossem objeto de atenção, eles apresentavam-se tratados de forma diversa do que
208
insalubridade das cidades pós-revolução industrial no Meio-oeste
621
norte-americano usualmente
assumiu a forma de sistemas de parques e bulevares
622
, enquanto no Brasil predominavam as obras de
infra-estrutura (especialmente transporte, esgoto e água) e a remodelação das áreas centrais. Assim, a
disputa da cidade como campo legítimo de atuação profissional manifesta-se não somente como uma
disputa por uma fatia de mercado, mas também como uma forma de pensar e agir sobre ela.
No Brasil, esta disputa seria protagonizada por engenheiros e arquitetos e veio acompanhada de
reivindicações por uma melhor regulamentação profissional
623
. Uma das respostas a tais reivindicações
foi o Decreto Federal 23.569 de dezembro de 1933 (vide AnexoIV), que, por intermédio da
determinação das competências das atividades destes profissionais, possibilitava uma certa distinção
entre elas. No entanto, esta distinção não foi considerada satisfatória nem por Rino L
EVI (1959: 02), o
qual lamentava que “... as únicas atribuições exclusivas que o decreto deu aos arquitetos foram
referentes às ‘obras de grande decoração arquitetônica’ e à ‘arquitetura paisagística’”, nem por
Angelo Murgel, que afirmava que o decreto dava “... indistintamente ao architecto e ao engenheiro em
todas as suas especializações a capacidade de projectar, fiscalizar, construir e dirigir obras e todos
os trabalhos complementares. Os campos profissionaes de cada technico não ficaram ainda
delimitados
624
”(OBSERVADO ECONÔMICO, 1937b). Assim, embora a leitura do decreto pareça sugerir
exatamente o contrário, pois mesmo determinando uma nítida diferenciação na atribuição de
atividades, como aquelas onde há maior ênfase técnica atribuídas ao engenheiro civil e as que exigem
maiores aptidões artísticas
625
ao arquiteto, o decreto estabelece que:
foi no Brasil, pois, enquanto aqui o embelezamento era um aspecto secundário, lá, por estar atrelado ao saneamento
político e social da cidade, ele aparece como seu condutor, além do que a implantação de planos e projetos de
embelezamento ou parques e bulevares parece ter sido muito mais ampla e efetiva nos Estados Unidos do que no Brasil.
Assim, o que ora se argumenta é que, enquanto no Brasil as preocupações sanitárias eram respondidas por intermédio da
elaboração de projetos de saneamento (regulação dos fluxos: água, esgoto, chuva e transportes) e remodelação das áreas
centrais, usualmente comandados por engenheiros e sanitaristas, nos Estados Unidos, estas eram suplantadas por
preocupações sociais e políticas, levando à elaboração de projetos elaborados por paisagistas e arquitetos.
621
Os trabalhos pesquisados mencionam somente cidades do Meio-Oeste (CRAWFORD, 1995 e CIUCCI, 1972), e a atuação de
George Kessler também concentrou-se neste área; no entanto, não foi realizada uma pesquisa mais ampla para verificar sua
ocorrência em outras regiões.
622
Como demonstra Francisco DAL CO (1972: 154), a integração da natureza ao meio urbano, observada no desenho das
cidades na América do Norte do século XIX, deve-se muito mais à inspiração do bucólico “landscape gardening” inglês,
que faz do ideal de natureza um elemento de ligação entre razão, ética cristã e democracia, do que aos modelos utópicos
europeus. Assim, a presença de parques e bulevares tem suas raízes nas buscas por grandes perspectivas, revividas pelo
urbanismo barroco do “city beaufiful” e na difusão do que Dal Co chamou “Parks Moviment”, movimento que ganhou
força a partir do desenho de cemitérios e da formação de comissões de parques na década de 1830, influenciando
grandemente o desenho dos subúrbios norte-americanos do final do século XIX (R
EPS, 1987) e como mostra Margareth
C
RAWFORD (1995), muitas cidades empresariais.
623
A desvinculação das escolas de Arquitetura dos cursos de Engenharia foi um aspecto importante que se concretizou para a
maioria das escolas brasileiras somente na década de 1940, sendo a primeira a nascer independente a da Universidade
Federal de Minas Gerais, criada em agosto de 1930. Em São Paulo, a FAU/USP foi separada da Engenharia Civil em 1948,
e a FAU/Mackenzie, em 1947; na Universidade Federal do Rio de Janeiro, a arquitetura foi separada da Belas Artes em
1945, e na Federal da Bahia isto ocorreu somente em 1959. (FAU-UFBA, s.d.; FAU-UFRJ, s.d.; FAU-UFMG, s.d.; FAU-
USP, s.d.; FAU-Mackenzie, s.d.).
624
O artigo “Finanças do architecto” faz parte de uma reportagem maior sobre arquitetura no Brasil, publicada no n.
o
16
(abr/1937) da revista. O artigo é a transcrição do debate entre engenheiros e arquitetos do Rio de Janeiro e São Paulo
(Armando Godoy, Penna Firme, Angelo Murgel, Enéas Silva, Alves de Souza, Santos Maia, Cordeiro de Azevedo,
Marcelo Roberto e Gerson Pinheiro) promovido pela revista.
625
Como indica a proposta de Angelo Murgel de seguir a legislação alemã, reafirmada no final da reunião por Wladimir
Alves de Souza, é bastante provável que a insatisfação com o decreto se deva ao fato da diferenciação na condição do
engenheiro como técnico e do arquiteto como artista, e não como no caso alemão do engenheiro como construtor e do
arquiteto como projetista.
209
a) o estudo, projeto, direção, fiscalização e construção de edifícios, com todas as suas obras
complementares; ...
c) o projeto, direção e fiscalização dos serviços de urbanismo;
(Decreto Federal 23.596, Capítulo IV, art. 28 e 30)
são atribuições que devem ser partilhadas por ambos, ou seja, apesar da distinção entre “construtor” e
“projetista” insinuada nos demais itens, ao determinar que tanto planos e projetos quanto a construção
de edifícios e da cidade componham o rol das atribuições destes dois profissionais, o decreto perpetua
a indistinção entre elas.
Seguindo as idéias difundidas pelos CIAMs
626
, em especial pela “Carta de Atenas
627
, segundo a qual
a habitação é vista como a função urbana a partir da qual se deve desenvolver toda a cidade
628
, parece
ter ganhado força entre os profissionais brasileiros a idéia de que “A distinção entre arquiteto e
urbanista não tem nenhuma razão de ser” (P
RADO, 1945), pois “Arquitetura e urbanismo são a
mesma cousa. Urbanismo é a arquitetura da cidade, ambos são forma e função.” (K
NEESE DE MELLO,
1950: 291). Atribuía-se, assim, ao urbanismo o mesmo poder transformador conclamado pela
arquitetura
629
.
Esta aproximação entre arquitetura e urbanismo, no entanto, não significou a conquista da cidade
como campo de atuação exclusiva destes profissionais, pois, como se observa nas falas exaltadas de
Marcelo R
OBERTO (1948) e Carlos CARDIM FILHO (1946), não havia como negar a contribuição dos
engenheiros para o progresso do país, o que indica que a busca por uma determinação mais precisa das
atribuições de engenheiros e arquitetos estava muito mais fortemente ligada à tentativa de garantir o
reconhecimento de sua contribuição individual no desenvolvimento da sociedade do que à necessidade
de garantir uma faixa do mercado
630
. De tal modo que a conquista da cidade como atribuição
profissional significava, principalmente, a legitimação de sua missão civilizatória
631
, do papel desses
626
Embora Cristina LEME (1999) considere o desenvolvimento do planejamento urbano no país uma decorrência mais direta
dos planos de melhoramento do que da influência do movimento modernista por intermédio dos Congressos do CIAM
(Congrès Internationaux d’Architecture Modern), nos artigos sobre urbanismo pesquisados na revista A
CRÓPOLE (1941-
1965), a referência à Carta de Atenas (publicada no n
o
109, maio, 1947) é constante (dos doze artigos, em oito há
referência direta aos congressos ou arquitetos a eles vinculados).
627
Segundo Rebecca Scherer (LE CORBUSIER, 1993), havia pelo menos três versões da Carta de Atenas: a primeira era a
publicação oficial dos Anais Técnicos, feita pela Câmara Técnica de Atenas em grego e francês em 1933; outra anônima
publicada por Le Corbusier em 1941 na França, que incluía observações próprias e imagens, sendo esta a mais difundida;
uma terceira versão foi publicada nos Estados Unidos, em 1942, e fazia parte da obra de José-Luis Sert “Can our cities
survive?”. Outra versão que comparava o texto de Le Corbusier com as atas do congresso foi publicada em holandês.
Conhecendo somente a versão de Le Corbusier, não é possível indicar qual destas versões foi publicada em 1947 na revista
Acrópole (C
IAM, 1947), somente que não se trata desta versão. Embora ela pareça ter auxiliado na formação da opinião de
alguns profissionais, como se observa nos textos publicados na própria revista por Eduardo
KNEESE DE MELLO (/1950),
Carlos A. Gomes
CARDIM FILHO (1946) Marcelo ROBERTO (1948), a filiação de arquitetos brasileiros ao grupo (Scherer
menciona Lúcio Costa, Oscar Niemeyer, Firmino Saldanha e José de Souza Reis) indica que esta não foi a única nem a
mais importante referência ao pensamento moderno.
628
O ponto de partida de todo plano da cidade deve ser uma célula representada por uma simples residencia, que agrupada
a outras celulas semelhantes forma uma unidade de visinhanca de tamanho eficaz. Com esta celula como ponto de partida,
residencias, locaes de trabalho, areas de recreação devem ser distribuídos atravez da area urbana na mais favoravel
relação possível.”( C
IAM, 1947)
629
Embora de forma menos explícita, os textos de Carlos CARDIM FILHO (1946) e Marcelo ROBERTO (1948) seguem a mesma
linha.
630
Esta preocupação, no entanto, não estava ausente e pode ser percebida facilmente na reportagem de maio de 1937 do
Observador Econômico sobre “As finanças do arquiteto” (O
BSERVADOR ECONÔMICO, 1937b).
631
No debate promovido pelo OBSERVADOR ECONÔMICO (1937b), observa-se que, embora todos concordem haver uma
dificuldade de compreensão quanto à contribuição do arquiteto, Angelo Murgel e Armando de Godoy falam diretamente da
necessidade de educar a população para que ela seja capaz de reconhecer e valorizar sua atuação.
210
profissionais na instrução do público quanto às benesses do desenvolvimento tecnológico e no modo
de fazer uso dele no dia-a-dia.
Assim, mais do que propor novas formas ou desenhos, a missão de arquitetos e engenheiros era propor
novos usos, uma nova forma de se viver, fazendo do conhecimento técnico instrumento de
transformação da sociedade. Esta idéia, presente no cerne do movimento moderno, seria prontamente
adotada pelos profissionais brasileiros que, como aqueles que Anatole K
OPP (1990: 14, 16) chama
“verdadeiros modernos”, iriam abraçar a idéia de que
... a arquitetura ‘moderna’ não era apenas formas depuradas e técnicas contemporâneas, mas também e
sobretudo a tentativa de participar, ao nível do ambiente, na transformação da sociedade... esses arquitetos
não tinham por objetivo a realização de uma obra-prima pessoal, mas a edificação em grande escala de tudo
aquilo que os habitantes da cidade de pedra sempre estiveram privados.
E embora José DURAND (1972) afirme que foi somente durante o período militar que a politização
reforçaria a adoção de uma postura radicalmente moderna por parte significativa dos profissionais
brasileiros, na qual o caráter técnico seria sobrepujado pelo social, desde pelo menos a década de 1930
clamores quanto à necessidade do arquiteto assumir seu papel de responsável pela síntese entre os
novos recursos tecnológicos e as novas necessidades do homem podiam ser ouvidos. Como clamava
Gerson P
OMPEU PINHEIRO [sic] (1937:35):
Raros, raríssimos são os architectos que comprehenderam-na [a arquitetura] em seus
verdadeiros fins.( ...) Não existe um passado artístico aproveitável na architectura do Brasil.
Existe uma nova concepção da vida, como existem novos recursos technicos para executar as
creações do moderno architecto.
Nesta postura, que é também de crítica ao mero formalismo, seja ele clássico ou moderno, já está
embutida a idéia de que a uma nova arquitetura deve corresponder um novo arquiteto, profissional
capaz de combinar competência técnica à artística, e que vê no programa de necessidades um reflexo
da ordem social e econômica daqueles que iriam habitá-la, sem perder de vista o significado daquele
objeto específico para o conjunto da sociedade
(MACEDO,1979).
Portanto, se até então a ocupação do arquiteto no Brasil não fora resultado de pressões sociais, mas de
uma percepção da edificação
... não basicamente [como] um problema técnico, de tratamento racional, mas uma questão humana que
exigia soluções estéticas e funcionais, por meio da incorporação de elementos ideológicos enfáticos nestes
aspectos, elaborados em outros contextos sociais. (DURAND, 1972: 95).
A partir da difusão do ideal moderno, não somente ela assumiu estes contornos, como também se
legitimou a reivindicação de maior autonomia criativa, há muito posta pelos arquitetos.
Neste contexto, o que José Carlos DURAND (1972) considerou uma tentativa de manter a “identidade
entre o criador e a obra
632
pode ser lido não somente como a busca da afirmação da arquitetura na
condição de profissão de homens livres, cuja obra artesanal, expressão do gênio, permitira ao seu
criador escapar da condição de proletarização determinada pelo assalariamento, mas também como
uma tentativa de lhes assegurar maior liberdade de ação e assim viabilizar a concretização dos planos
632
Segundo José Carlos DURAND (1972: 101), no Brasil, dada a impossibilidade de realização de seu objetivo social, os
arquitetos buscaram preservar “...no interior da grande burocracia, a concepção artesanal de seu ofício”,fazendo de um
trabalho cujo caráter usualmente anônimo, como no caso dos grandes projetos públicos (aeroportos, cidades novas, escolas,
praças, etc.), uma obra assinada.
211
de transformação que se acreditava necessários
633
.
E não se tratava somente de convencer a sociedade da relevância do papel do arquiteto na garantia
deste futuro, mas de convencer empresários e o Estado a financiarem sua execução. No contexto da
primeira metade do século XX – em que a busca pela consolidação de uma identidade nacional podia
ser sentida tanto politicamente, com o fortalecimento do poder central, como economicamente, com o
ideal de progresso
634
, ou ainda culturalmente, com o grande impacto causado pela Semana de 1922 –,
na arquitetura e no urbanismo ela associava-se à cientificidade e racionalidade das técnicas
construtivas e métodos de planejamento que se vinham difundindo no país, cujo objetivo era fazer das
cidades e seus edifícios símbolos do ingresso do Brasil num novo estágio de desenvolvimento. Entre
os edifícios, o Palácio da Cultura (Ministério da Educação e Saúde no Rio de Janeiro) e entre as
cidades, Brasília, são sem dúvida os que mais impacto causaram, cativando leigos e profissionais que
fariam deles referência constante em seus projetos.
Mas o Estado não foi o único que encontrou na antiga tradição de fazer da arquitetura e do urbanismo
uma expressão de seu poder e seus ideais; industriais e empresários também se apresentariam como
“mecenas”, contratando arquitetos e engenheiros para dar forma a seus sonhos. Se com maior ou
menor intensidade vilas operárias, núcleos fabris e cidades empresariais são o resultado de projetos de
cunho econômico, político e social de seus financiadores, em cada casa, esquina ou praça, a marca do
gênio dos profissionais que as conceberam também se encontra presente, fazendo delas expressão
material de suas crenças e desejos.
Assim, seja pelo controle da indústria sobre a cidade e seus espaços, ou por sua condição de “cidade
nova”, portanto de uma estrutura urbana planejada a partir da tábua rasa para atender a objetivos
específicos, as cidades empresariais apresentam-se como locus privilegiado para se analisar o papel
dos profissionais da cidade na sua conformação, pois foi a partir de planos e projetos elaborados por
estes profissionais que suas ruas foram abertas e seus principais edifícios foram erguidos. Contudo, a
materialidade que ora se observa não é fruto somente de projetos e planos, muitos traços resultaram da
ação incisiva do destino, como diz Giulio A
RGAN (2001: 52):
O projeto tece a sua trama sutil e clara dentro da turbulenta névoa do destino, tornando-a menos densa...
[mas] quando as forças externas prevalecem o plano trai as razões e as vontades institucionais do
planejamento: a falência do projeto abre a porta à desordem do destino.
De modo que, este capítulo, ao analisar a organização do espaço urbano de Timóteo, propõe-se a
buscar “... saber se tudo aquilo que houve foi projeto ou destino, se o homem constituiu segundo os
próprios desígnios ou se, pensando fazê-lo, fez algo que já estava dito e decidido” (A
RGAN, 2001: 12),
e para isso procura na história de vida, nos relacionamentos e atividades profissionais de alguns dos
633
Para Marageth CRAWFORD (1995: 62), nos Estados Unidos esta busca por garantir um campo profissional significava
ocupar posições antes tomadas por uma “educated middle class”, ou seja, por pessoas culturalmente instruídas e
economicamente independentes, mas sem nenhuma formação acadêmica. Assim, exigia-se de paisagistas, arquitetos e
planejadores que fossem levados a provar tanto sua competência técnica quanto seu posicionamento social, comprovando
serem os mais aptos a “...atingir os padrões contemporâneos de racionalidade, eficiência e excelência técnica.” (“...meet
contemporary standard of rationality, efficiency and technical expertise”), pois somente adicionando à competência
técnica um certo grau de independência financeira, reuniam condições suficientes para garantir uma atuação ética e
socialmente consciente.
634
Como foi visto no capítulo II.
212
principais profissionais envolvidos na construção da cidade de Timóteo, pistas para entender intenções
mais e menos explícitas de seus desenhos e neles os reflexos de outras temporalidades e
espacialidades. Este procedimento possibilita a análise de espaços e edifícios para além de sua forma
inicial e final, ou seja, nem puramente projeto, nem puramente destino, substituindo a noção de acaso
pelas de intenção e conseqüência.
Neste sentido, a história profissional e de vida dos profissionais incumbidos pela ACESITA de
projetar e construir a cidade e seus edifícios foi considerada um importante instrumento de análise,
pois, sem que fosse possível acessar, localizar, identificar e datar com precisão os projetos e seus
autores, foi através dela que se buscou subsídios para identificar alguns dos princípios que nortearam a
construção do espaço da cidade para além da lógica imposta pela indústria e do poder municipal
(analisadas no capítulo anterior) ou da comunidade (a ser tratada no próximo capítulo).
Assim, o ponto de partida da primeira parte deste capítulo é a história profissional e de vida de Romeu
Andrade Duffles Teixeira, José Luis Batista e Fernando Sena, histórias que ajudam a compreender de
que modo profissionais de formações tão distintas acabaram por ser contratados pela empresa para
exercerem uma mesma função: projetar bairros e edifícios que viabilizassem o projeto industrial da
companhia em Timóteo. Ou ainda, de que maneira um engenheiro industrial, um arquiteto e um
engenheiro mecânico fizeram da cidade seu objeto de trabalho, demonstrando que, apesar de suas
diferentes especialidades e diferenças na suas noções de modernidade, ainda é ela o ponto de contato
que possibilitou vestir um profissional com a pele de outro.
No entanto, ao final deste caminho ainda cabe responder o que significou para a cidade em termos de
organização espacial e visual a atuação destes profissionais, se suas obras determinaram o destino da
cidade ou se foi este que as “projetou”. Questão que remete à materialidade presente, onde se procura
vestígios dos projetos originais e sinais do que foi retocado ao longo do tempo, atualizando assim o
papel da indústria na construção de Timóteo por intermédio de seus profissionais.
Contudo, não foi somente a atuação destes profissionais “transmutados” que influenciou o destino de
Timóteo; a mão do destino também pode ser sentida na interpretação que a comunidade faz de seus
edifícios e espaços. É neste sentido que na, segunda parte deste capítulo, se busca analisar a cidade.
Este outro olhar focaliza os elementos formadores da paisagem local numa tentativa de identificar
aqueles que colaboram para a formação de uma imagem que identifique a cidade. Não é, portanto,
uma busca centrada no extraordinário, mas no ordinário, ou melhor, nos elementos cujo conjunto
caracteriza o lugar e permite a distinção de marcos. Nesta busca por compor uma imagem da cidade
onde o usual é tão relevante quanto o excepcional, busca-se apoio no que Kevin L
YNCH (1997: 11)
chamou “imaginabilidade”, ou seja, sua capacidade de evocar uma imagem forte no observador, ou
como diz o autor: “... é aquela forma, cor ou disposição que facilita a criação de imagens mentais
claramente identificadas, poderosamente estruturadas e extremamente úteis do ambiente”. Assim,
numa cidade marcada por dicotomias como público e particular, curvo e retilíneo, plano e
montanhoso, vertical e horizontal, largo e estreito, coletivo e individual, público e privado, moderno e
213
tradicional, velho e novo, ou simplesmente norte e sul, busca-se identificar de que forma eles se
apresentam combinados e que imagem compõe
635
.
Esta imagem, entretanto, ao englobar os projetos e destinos que a desenharam, acaba por torná-los
indistintos, dificultando o reconhecimento de elementos que estão na sua essência. Assim, do mesmo
modo que no passado a implantação da grande usina deslocou o centro do povoado para as margens do
rio, impondo à comunidade uma nova imagem, alterações no traçado das vias, construção de novos
edifícios, adensamento de alguns bairros e surgimento de outros têm lentamente tornado a usina cada
vez menos visível. Esta tentativa de “apagamento”, que com maior ou menor intensidade ocorre
também em outras cidades siderúrgicas brasileiras, como Monlevade, Ouro Branco, Ipatinga e Volta
Redonda, revela-se no fortalecimento de outras imagens, como a da capela de São José e da Praça 1º
de maio. Assim, para fechar este capítulo, busca-se verificar o quanto da imagem atual da cidade é
fruto do projeto industrial, não somente onde a indústria a construiu e o quê , mas quais as
conseqüências de sua ação por meio das transformações e significação que a comunidade local lhes
atribui, ou seja, como a cidade pode ser lida hoje.
V.1
.1 ROMEU ANDRADE DUFFLES TEIXEIRA: PARQUES E ESPORTES NA CIDADE
636
Romeu Andrade Duffles Teixeira era de família carioca
637
que migrou para Minas Gerais durante o
governo de Dom Pedro II
638
, adquirindo uma fazenda nas proximidades de Barbacena. Produzindo
óleo das sementes de laranja, compotas de frutas e até tijolos para a construção da nova capital, a
família prosperou, impulsionando o desenvolvimento do próprio lugar, que logo deixou de ser
chamado Sítio para tornar-se Antônio Carlos, distrito de Barbacena
639
.
No entanto, toda esta prosperidade foi abalada por dívidas de jogo
640
, o que provocou uma certa
dispersão da família e comprometeu a educação dos mais jovens. Como o mais velho
641
de sete
635
Contudo, deve-se levar em conta que tanto as histórias quanto as análises fundamentaram-se no material e informações
que foi possível reunir, ficando ainda inúmeras questões sem uma resposta definitiva.
636
A busca por informações a respeito do projeto inicial para a construção da cidade pela ACESITA levou ao nome do
engenheiro Romeu Duffles Teixeira. No entanto, embora desde o primeiro ano da pesquisa tenham sido realizadas
consultas a obras de referência, entidades de classe, órgãos públicos onde havia trabalhado e mesmo ao catálogo telefônico,
foi somente em 2005, com a retomada das consultas ao catálogo telefônico, que foi possível localizar algum parente, de
modo que as informações pessoais e a maior parte das demais sobre este engenheiro foram obtidas junto à sua família,
numa reunião em 28/jul/2005, onde estavam presentes, sua cunhada (Vanda Rodrigues Duffles Teixeira) e os filhos dela
(Marcos e Roberto)
637
Segundo os membros da família entrevistados, o nome Duffles é de ascendência holandesa, remontando a um sanitarista
que veio para o Rio de Janeiro durante o governo de Dom João IV e foi incumbido de sanear a cidade de Itaguaí - cidade
próxima a Septiba – RJ, que no período colonial vivia da produção açucareira e, em 1818, quando passou à categoria de
vila, sofreu com surtos de febre amarela (P
REFEITURA DE ITAGUAÍ, s.d.).
638
Quando a empreiteira do avô ganhou uma licitação para construir um trecho da ferrovia que ligava Ouro Preto ao Rio de
Janeiro e encantados com a região acidentada próxima à Barbacena, adquiriram um pedaço de terra e organizaram uma
fazenda.
639
A estação da Estrada de Ferro Dom Pedro II foi inaugurada em 1878 (funcionou até 1889), quando passou à
E. F. Central do Brasil (1889-1975) (D
UCK & RAZABONI, s.d.).
640
Segundo contam, os tios-avós tinham por hábito ir jogar no cassino da Urca no Rio de Janeiro, onde perderam largas
somas, obrigando a família a se desfazer da maior parte de seus bens a fim de cobrir tais dívidas.
641
Entre os direitos que tal condição lhe atribuía, estava a herança da Ordem da Rosa, o que teria dado direito de sentar à
mesa do imperador.
214
irmãos, Romeu foi “o” escolhido para estudar, enquanto o irmão Gilberto
642
ia trabalhar no Banco
Hipotecário. Descrito pelos sobrinhos e pela cunhada como um autodidata, minucioso e idealista, tal
atribuição não deve tê-lo desagradado, além do que parece ter sido durante os anos de estudo em Belo
Horizonte que tomou contato com uma paixão que iria acompanhá-lo, mesmo em sua carreira como
engenheiro: o futebol.
Estudando em Belo Horizonte num período em que a cidade buscava consolidar seu destino de
símbolo da República, provando-se moderna, bela, prática e saudável, Romeu Duffles Teixeira aí
vivenciou a emergência do esporte como prática de lazer moderna e socialmente aceita
643
, pois, como
diz Marilita R
ODRIGUES (2006: 54):
Criar uma nova imagem de cidade significava, também projetar para ela corpos que
representassem esse novo ideal. Para uma cidade símbolo da República em Minas, os valores
ligados à racionalidade, à higiene, à assepsia e à civilidade também deveriam estar
impregnados nos corpos dos cidadãos que habitariam essa cidade.
Sob o emblema da modernidade, nas primeiras décadas do século XX, a prática de esportes começou a
se popularizar na cidade
644
e fez nascer os primeiros clubes e associações esportivas. A partir da
reforma do ensino de 1906 em Minas Gerais, os esportes foram incorporadas ao currículo escolar,
fazendo de escolas como Anglo-Mineiro e Isabela Hendrix (metodistas), Colégio Arnaldo e Instituo
Claret (católicas), Ginásio Mineiro e Escola Normal (públicas) as grandes responsáveis por
transformar o jogo popular em esporte. Calcadas no modelo inglês
645
, que via no desenvolvimento
físico, tanto quanto no intelectual, um fator necessário à formação de indivíduos capazes de exercer
adequadamente suas atividades, estas escolas, em especial o Colégio Anglo-Mineiro
646
, tiveram um
papel determinante na difusão de esportes como o tênis, a natação
647
, o criquete e, principalmente, o
futebol
648
.
642
No entanto, Romeu não foi o único a graduar-se; o pai dos entrevistados também conseguiu graduar-se em Agronomia na
Universidade de Lavras.
643
É importante salientar que uma completa aceitação do esporte e, com ele, de seus heróis se consolidaria na capital mineira
somente na década de 1930; até então, como mostra Marilita R
ODRIGUES (2006), são freqüentes as críticas ao papel
crescente que vinham assumindo na educação dos mais jovens e na vida das pessoas, afastando-as dos estudos e alienando-
as de assuntos mais relevantes, como da política e do que se entendia como cultura. A autora demonstra ainda que,
enquanto os jogos de futebol praticados pela elite eram aceitáveis, sua prática por operários era associada aos bares,
portanto à jogatina e à embriaguez.
644
Em sua análise dos espaços de lazer da cidade de Belo Horizonte, Marilita RODRIGUES (2006) destaca também a
relevância de outras atividades de lazer, como o teatro e as festas religiosas, além do ciclismo, do ruge, futebol, tênis,
críquete, patinação, luta romana, boxe, tiro ao alvo, natação e ginástica.
645
Marilita Rodrigues coloca que, embora o esporte tenha sido introduzido por uma escola francesa, o modelo francês dava
pouca importância ao desenvolvimento físico dos alunos, enquanto o modelo inglês buscava combinar o desenvolvimento
físico ao intelectual, habilitando os estudantes não somente para realizações intelectuais, mas também “... ‘para o exercício
das profissões mais úteis no mundo hodierno para aquelas de que se originam a força, a riqueza, a supremacia dos povos:
a indústria, o comércio, a agricultura’” (Félix Andrade apud RODRIGUES, 2006: 2011).
646
O ginásio metodista Anglo-Mineiro foi criado em 1914 e tinha como divisa “mens sana in corpore sano”. Além de
dirigido por metodistas, seu corpo docente também era compostos por professores ingleses provenientes de Oxford ou
Cambridge e, segundo Carlos PAIVA (s.d.), historiador do América Futebol Clube, também por professores norte-
americanos.
647
Este colégio possuía a primeira piscina construída na capital mineira, inaugurada em 1914 (RODRIGUES, 2006).
648
Segundo Marilita RODRIGUES (2006), embora, a exemplo do Rio e de São Paulo, seja atribuído a um estudante, Victor
Serpa, filho da elite, que ao retornar de seus estudos introduziu o esporte nem Belo Horizonte (1904), há indícios de que o
jogo já era praticado pela classe operária, cabendo a ele na verdade, somente a responsabilidade por sua difusão.
215
Embora não tenha sido possível uma confirmação sobre o colégio no qual Romeu Duffles Teixeira
esteve matriculado
649
, o Anglo-Mineiro parece uma aposta mais acertada devido à estreita ligação de
Romeu com o América Futebol Clube
650
, clube nascido por iniciativa de alunos deste ginásio
651
e onde
o contato com professores estrangeiros poderia ajudar a explicar sua referência à cidade de Cincinnati
no memorial do projeto feito para a ACESITA.
No entanto, com a ida para o Rio de Janeiro, onde ingressou na Escola Nacional de Engenharia da
Universidade do Brasil
652
e formou-se engenheiro industrial, o futebol teria de esperar alguns anos
para mostrar-se novamente como elemento importante em sua vida, pois, ao regressar a Minas Gerais,
empregou-se na Divisão de Obras e Viação do Estado como auxiliar de escritório. Coincidindo com o
período de implantação do Plano Rodoviário de Minas
653
, em seus primeiros anos de atividade esteve
envolvido com obras viárias, constando de seus registros o trabalho na construção do trecho
Barbacena – Palmeira (Rodovia Santos Dumond – 1928 a 1929) e da estrada São Romão – Formosa
(1933 a 1935)
654
. Em 1934 passou a exercer o cargo de auxiliar do serviço de estradas e somente em
1943 foi registrado como engenheiro, categoria na qual se aposentou dez anos mais tarde
(documentação Recursos Humanos – SETOP, vide AnexoV)
655
.
Na análise dos projetos recuperados
656
de sua autoria, verifica-se que foi somente a partir da segunda
metade da década de 1930 que começou a elaborar projetos de urbanização
657
, em sua maioria jardins
e praças esportivas (vide AnexoV), como: o jardim para a cidade de Paraguassu (s/ data)
658
, as praças
649
Não foi possível nenhum tipo de confirmação quanto ao colégio cursado por Romeu Duffles; o Ginásio Anglo-Mineiro
não existe mais e não foi possível obter uma relação de ex-alunos, nem deste nem do Ginásio Mineiro, que, embora Dona
Vanda não se lembre com precisão, mencionou como possibilidade.
650
Segundo a família, ele teria sido um dos fundadores do clube; no entanto, mesmo tendo a mesma idade dos meninos que
fundaram o clube (12 anos), seu nome não é mencionado por Marilita R
ODRIGUES (2006) e a consulta feita ao senhor
Carlos Paiva, historiador oficial do clube, revelou somente que ele havia jogado no “2º quadro” do clube entre 1917 e 1919
(o irmão Gilberto também foi jogador do 1º e 2º quadros em 1920).
651
Após um impulso inicial entre os anos de 1904 e 1907, quando foram criados: Sport Club, Plínio Foot-ball Club, Mineiro
Foot-ball Club e o Athletico Mineiro Foot-ball Club (posteriormente Club Athletico Mineiro), a partir de 1908 o futebol
voltou a ser notícia nos jornais da cidade, incentivando o surgimento de novos times como o Yale Atletic Club e o
América Foot-ball Club. Embora pareça haver alguma contradição quanto à fundação deste clube, com a versão de Marilita
RODRIGUES (2006: 173), reforçada por artigos de jornal e revista (ADEMG, 1995 e MOREIRA, 1997), afirmando que ele
surgiu do “interesse de 17 meninos das imediações da Praça da Liberdade, que se reuniam embaixo de uma árvore
próxima da casa comercial de Domingos de Meira...”, e o historiador do clube, Carlos Paiva, dizendo que foi “...fundado
por garotos da elite minera, em sua quase totalidade estudantes do "Gymnasium Anglo-Mineiro", onde as aulas eram
dadas em inglês, por professores norte-americanos na maioria. O nome do clube foi escolhido por sorteio. Entre os nomes
estava ‘América Foot-ball Club’, em homenagem aos Estados Unidos da América, dos quais os meninos eram fãs, pelas
histórias contadas por seus professores”, cabendo salientar que o local da dita árvore era muito próximo, praticamente
vizinho, do local onde funcionava o Ginásio Anglo-Americano.
652
As consultas feitas à associação de ex-alunos e ao departamento de diplomas da atual Escola Politécnica da Universidade
Federal do Rio de Janeiro ainda não tiveram resposta.
653
Embora, pelo texto apresentado na revista Observador Econômico (BESSAR, 1940), note-se que o transporte ferroviário
ainda recebia maiores atenções, segundo a reportagem de 1939, no ano de 1937, haviam sido construídos 36.828 km de
estradas de rodagem no Estado de Minas Gerais (OBSERVADOR,1939).
654
Não foi encontrado registro de atividades entre maio de 1929 e fevereiro de 1932.
655
Pela documentação do Departamento de Recursos Humanos da SETOP, conclui-se que Romeu Duffles trabalhou nesta
instituição de jan/1928 a jun/1929 e de out/1932 a dez/1953 na Secretaria de Viação e Obras Públicas do Estado de Minas
Gerais. Portanto, “Juntando os períodos acima mencionados, ficou apurado que o Sr. Romeu de Andrade Duffles Teixeira
obteve o exercício adquirido de 8.238 dias ou seja: 27 anos, 6 meses, 28 dias de serviços prestados.
656
Gentilmente cedidos pela família e posteriormente doados ao Arquivo Público Mineiro.
657
As tentativas de consulta ao arquivo da Secretaria de Viação e Obras Públicas, feitas desde 2004, não se viabilizaram pelo
fato de o acervo se encontrar em processo de organização (até set/2006 ainda não estava disponível para consultas).
658
Segundo os sobrinhos, o projeto da praça de Paraguaçu foi tido como modelo para o interior do Estado. Mas como esta,
que foi fotografada depois de concluída, não foi possível visitar as demais cidades para confirmar se tais obras foram
216
de esportes para as cidades de Carangola (193?), Belo Horizonte (1938), Alfenas (1948) e para a Usina
Esperança (1944), parque e praça esportiva para o balneário Barreiro de Araxá (1937), o estádio de
futebol de Astolfo Dutra (1953), a urbanização de Antônio Carlos (1954), além da urbanização geral e
da praça de esportes da ACESITA (entre 1946 e 1953)
659
.
Analisando cada um destes projetos, observa-se que a Praça Osvaldo Costa, em Paraguaçu
660
, é a única
onde não há nenhum espaço reservado para atividades esportivas. Localizada em frente à matriz da
cidade, seu traçado é linear e simétrico, inserindo-se no que Silvio M
ACEDO e Fábio ROBBA (2002)
classificam como “linha clássica”
661
e que não se distancia muito do projeto elaborado por Reinaldo
Dierberger para a Praça da Liberdade. Como esta, a Praça de Paraguaçu apresenta-se dividida
longitudinalmente em três sessões intercaladas por canteiros menos marcantes; os elementos mais
altos concentram-se nas extremidades, fazendo com que, juntamente com as árvores de maior porte, as
diferenças de nível e o passeio lateral superior auxiliem no afastamento da rua. Embora não seja
possível afirmar que o projeto de Romeu Duffles Teixeira foi seguido à risca
662
, a praça parece ter sido
pouco alterada desde sua construção, com mudanças somente na cobertura do coreto, nas luminárias,
na cobertura e no cercamento do espelho d’água .
A regularidade do traçado desta praça é uma característica que Romeu Duffles Teixeira parece ter
reservado aos jardins, como se evidencia no caso do balneário de Barreiro de Araxá. Nele, enquanto o
jardim frontal é dominado por formas geométricas e simétricas, desenhadas com o intuito de garantir a
perspectiva grandiosa do edifício principal, o hotel, o esboço das áreas dedicadas a atividades
esportivas é marcado por sua inserção em meio às arvores. Tanto as quadras quanto o estádio, ou as
piscinas e o playground encontram-se cercados por uma vegetação exuberante e menos regulada, sem
nenhuma simetria
663
. Embora não tenha sido este o projeto que foi executado
664
e sua participação nele
tenha sido pouco significativa
665
, sua importância reside em possibilitar a identificação de uma de suas
principais referências teóricas, pois o trabalho sob a coordenação de Lincoln Continentino,
realizadas, e pesquisas pela internet permitiram confirmar somente o parque do Palácio da Liberdade, comentado mais
adiante.
659
Em 1944, ele também foi incumbido de elaborar um parecer quanto ao plano de urbanização de Lincoln Continentino para
a cidade de Curvelo (L
IMA, 2003).
660
A cidade, emancipada em 1911, viveu da produção de seus engenhos e cafezais até a década de 1950, quando se
implantou na cidade a Paraguaçu Têxtil. Foi também nesta década que os dois “esses” foram substituídos pelo “ç” no nome
da cidade (ARAÚJO, 2002).
661
Rigor que, sem dúvida, remete a influência das beaux-arts e do jardim à francesa.
662
A análise baseia-se em fotografias de sua construção e não no projeto.
663
Não é possível, no entanto, atribuir-lhe uma referência ao pitoresco inglês, pois, além de o projeto não ter sido concluído,
a determinação das espécies vegetais não parece ter sido uma preocupação do autor. Outro aspecto relevante e único deste
projeto é que ele é o único de Romeu Duffles Teixeira, entre os analisados, em que a água é incorporada. Embora ela
permaneça primordialmente como elemento de composição visual, o pergolado, o Dancing Bar e a área designada como
“praia” promovem sua integração aos demais espaços.
664
Embora a disposição final das quadras não difira das últimas rasuras feitas no projeto, o desenho final do parque,
elaborado por Burle Marx em seu primeiro trabalho com Mello Barreto, foi profundamente alterado (P
ORTO, 2005).
665
Segundo Daniela PORTO (2005), além dos projetos dos edifícios realizados pelo escritório de Luiz Signorelli, sob a direção
de Lincoln Continentino, participaram do projeto da estância de Araxá os engenheiros Andrade Júnior (Serviço Geológico
Federal), David Mourão e Carvalho Lopes (Departamento de Comércio, Indústria e Estâncias Hidrominerais do Estado), o
arquiteto Aurélio Lopes (Divisão Sanitária da Diretoria de Saúde Pública do Estado), Fábio Vieira Marques e profissionais
ligados ao governo do Estado de Minas Gerais, grupo no qual é possível que se incluísse Romeu Duffles. Outra
possibilidade é que, com o afastamento do arquiteto incumbido do desenho do balneário, Aurélio Lopes, logo após o início
dos trabalhos (LIMA, 2003), Romeu Duffles Teixeira, então auxiliar do serviço de estradas, tenha sido chamado a participar
do projeto até que em 1944 Roberto Burle Marx foi contratado.
217
profissional profundamente imbuído de preocupações sanitárias e administrativas, parece ter
conduzido Romeu Duffles Teixeira para os ideais da Cidade-Jardim, que estariam presentes nos
projetos de Araxá (P
ORTO, 2005) e de Monlevade (LIMA, 2003)
666
. A importância de Continentino
como exemplo para Romeu Duffles Teixeira também foi sentido por Fábio L
IMA (2003: 173) que
afirmou que “[Romeu Duffles] Teixeira era amigo pessoal e admirador dos critérios urbanísticos
desenvolvidos por Continentino...”, notando-se a força de sua opinião no memorial do projeto de
ACESITA, quando diz que a aprovação do “ilustre professor”, classificando o projeto de “...‘notável,
formidável, maravilhoso e afirmando que o seu autor mais uma vez estava de parabéns’( ...),
tranqüilizaram o espírito, de quem tanto trabalhara”, e que, se o projeto estava perfeito, “... os
parabéns eram também do professor, porque foram seguidas as boas idéias, que êle vem pregando, há
tanto tempo” (T
EIXEIRA, 1952: 16).
O projeto do Parque do Palácio da Liberdade
667
é outro que parece ter sofrido poucas alterações
668
.
Nesse projeto destaca-se o aparecimento de elementos que seriam comuns a outros projetos de Romeu
Duffles Teixeira, tais como os pergolados e quiosques ou mesmo as diferenças de nível das áreas
dedicadas à prática esportiva. Esse esquema, caracterizado pela elevação do entorno das quadras e
campos visando separar os jogadores do público e permitir que este assistisse às partidas em áreas
sombreadas, pode ser encontrado com algumas variações em quase todas as quadras, campos e
estádios abertos por ele projetados, e tem uma descrição mais completa no memorial da Praça de
Esportes dos Operários da ACESITA (T
EIXEIRA, 1952: 21):
A idéia é circundar o campo por um aterro bem comprimido. Este aterro teria em sua parte superior uma
pista de passeio, destinada à circulação fácil.
Uma arborização, com espécies adequadas, sombrearia os degraus, destinados aos assistentes.
Envolvendo esta pista existiria outra em nível mais baixo, ligada à primeira, por escadas suaves. A
arborização da parte mais alta daria um aspecto agradável a este passeio.
Assim, tanto nos perfis do estádio de Astolfo Dutra, como ao redor do rinque de patinação e campo de
voleibol da Praça Rafael Mascarenhas em Alfenas um esquema semelhante foi proposto.
No projeto de Alfenas, no entanto, este esquema assume uma forma rigorosamente geométrica, com
ovais concêntricas, vegetação, desníveis e mobiliário (pergolados e bancos) determinando um
zoneamento rígido de atividades intercaladas por passeios (de dentro para fora: esportes, sombra,
666
Também foi neste trabalho que travou conhecimento com Alfred Agache, que embora tenha sido chamado a participar
como consultor, dificuldades no acerto dos honorários afastaram-no (P
ORTO, 2005).
667
Em consulta verbal a uma das historiadoras do IEPHA fui informada de que dificilmente este projeto se localizava nas
proximidades da Praça da Liberdade, o que as fotos parecem desmentir. Como sem uma confirmação oficial da localização
deste projeto, foi explorado um outro caminho explorado para verificação do contexto deste projeto, partindo da afirmação
da família de que Romeu Duffles Teixeira havia participado do primeiro projeto do Minas Tênis Clube, também situado
próximo ao Palácio da Liberdade. No entanto, nem nos trabalhos sobre a história do clube (ÁVILA & MIRANDA, 1999;
R
ODRIGUES, 1996), nem na consulta feita junto ao clube foi encontrada qualquer referência à sua participação. Contudo,
considerando-se que o parque aquático público projetado por Romeo Di Paoli (IEFHA-MG, 1997) atual Minas Tênis
Clube, foi executado tendo a “..terraplanagem e infra-estrutura a cargo da prefeitura, e as edificações realizadas pelo
governo do Estado” (Á
VILA & MIRANDA, 1999: 69), há uma tênue possibilidade de que, como empregado da Secretária de
Viação e Obras Públicas do Estado de Minas Gerais, ele tenha tomado parte nestes trabalhos (sem acesso aos projetos, não
foi possível verificar se havia elementos que podiam reforçar ou descartar esta hipótese).
668
Observando-se as imagens de satélite, nota-se que a construção nos fundos do Palácio da Liberdade é bastante semelhante
ao projetado; somente a ciclovia no entorno da quadra de tênis parece ter desaparecido, a piscina ocupa a área destina ao
banho de sol e um arvoredo está no lugar da edificação à esquerda, não sendo possível distinguir nenhum traço de uma
arquibancada.
218
repouso e recreação infantil). Esta opção pela geometrização dos espaços esportivos, única entre os
projetos analisados, pode estar associada à necessidade de harmonização com o desenho do jardim
669
,
pois numa área de dimensões pouco generosas não havia espaço para a criação de elementos de
transição
670
.
Outro aspecto da obra de Romeu Duffles Teixeira que merece atenção é a relação entre natureza e
esporte, notando-se que a integração de uma ao outro é apenas parcial, pois a natureza presente em
seus projetos, embora não esteja presa à geometria, é tão disciplinada quanto devem ser os corpos para
a prática esportiva. Assim, a ausência de um desenho regular não significa uma aproximação com o
pitoresco, pois a paisagem que propõe apresenta grande rigidez e está subordinada à funcionalidade
dos espaços; suas árvores, canteiros e cursos d’água são dispostos e selecionados com finalidades mais
práticas do que lúdicas, buscando sempre margear os caminhos e quadras . É isto que se observa na
praça de esportes de Carangola, onde a verticalidade dos ciprestes ajuda a direcionar o olhar e
demarcar a entrada, árvores de copas largas sombreiam os caminhos enquanto os gramados forram o
entorno das quadras dando-lhes coerência, os cursos d’água são as barreiras que delimitam seu
perímetro e, ao determinar a largura das áreas de circulação, os canteiros dimensionam seu fluxo
671
.
Contudo, o relacionamento entre esporte e natureza mostra-se realmente conflituoso somente ao se
analisar o tratamento dado ao rio que margeia tanto esta praça de esportes quanto o clube de futebol da
Usina Esperança. Em ambos, a proximidade da água, a existência de passeios em suas margens e de
pessoas remando, pescando ou simplesmente descansando em suas águas insinua uma integração com
o espaço projetado, mas em nenhum deles há sinal de um atracadouro ou pier para promovê-la, além
do que, a ausência de uma ponte reforça ainda mais o papel do rio como obstáculo e, com isso, a de
uma apropriação meramente funcional da natureza, longe de qualquer intento pitoresco.
Mas, se a relação esporte x natureza pode mostrar-se ambígua, o título do projeto da praça esportiva da
Usina de Esperança
672
: “Usina Esperança Futebol Clube – Praça de Esportes Campos de brasilidade
e eugenia” (sem grifo no original), deixa poucas dúvidas quanto ao papel das atividades físicas como
prática cívica e instrumento de melhoria da raça.
669
Tendo em vista o traçado clássico dos canteiros e do espelho d’água onde está situada a fonte luminosa.
670
Na observação de imagens de satélite da cidade de Alfenas não foi localizada nenhuma área com desenho que se
assemelhasse ao desta praça, impossibilitando a confirmação de sua execução.
671
Sem ter visitado a cidade nem a possibilidade de uma imagem de satélite (não disponível no Googlearth), a confirmação
quando a execução deste projeto é duvidosa baseia-se em imagem disponibilizada pelo site da Prefeitura de Carangola
(PREFEITUAR MUNICIPAL DE CARANGOLA, s.d.) e, embora a presença do rio, do campo e até mesmo o contorno das
montanhas se assemelhe ao da perspectiva analisada, não é possível garantir que o Estádio Roseli Soares corresponda ao
projetado por Romeu Duffles Teixeira.
672
Na análise das imagens de satélite da cidade de Itabirito, onde se situava a Usina Esperança, não foi identificado nenhum
conjunto esportivo que apresentasse semelhança com o referido projeto; no entanto, uma área nas vizinhanças da antiga
usina, formada por uma acentuada curva do rio, ladeada pela rodovia e cortada pela via férrea, possui conformação muito
próxima, o que reforça a idéia de que este clube não foi construído.
219
Para Silvana GOELLNER (2005: 92)
673
a eugenia fazia parte de
... um projeto político de abrangência nacional e que tinha como um dos seus objetivos criar uma população
racial e socialmente identificada com a camada branca da sociedade. Camada essa que deveria ser
aprimorada quanto às suas capacidades físicas e morais de forma a diferenciar-se dos corpos negros dos
escravos ou dos descendentes destes, identificados pela aristocracia nacional, como pertencentes a uma raça
inferior.
Contudo, se num primeiro momento a prática esportiva era identificada com a “elite”, o título
demonstra que neste período ela já tinha sido amplamente absorvida pelo operariado não somente
como uma distração proporcionada pelo patrão a fim de aliená-lo de questões políticas e sociais
674
,
mas como forma de engajamento no projeto “modelador da raça brasileira” (C
APRARO, 2002).
Inclusive, segundo Cristina Buarque de H
OLANDA (2005: 82), a popularização do futebol deve muito
aos times operários, pois foi por meio da assimilação de funcionários aos times dos patrões, que se
reforçava o civismo, e com ele a identificação da equipe com a nação, no caso com a fábrica. Assim,
no mesmo sentido que Marcos Virgilio da S
ILVA (2005: 100) demonstra como o Estado encontrou na
eugenia uma forma de garantir à elite um local privilegiado no espaço da cidade, uma “eugenização”
do espaço urbano, justificada pela necessidade de um combate mais rigoroso à “degenerância”, ela
também compôs o repertório de justificativas de seleção do operário
675
. Neste contexto, o esporte
apresentava-se como importante instrumento tanto de avaliação quanto de formação e, como se verá
no próximo capítulo, de atração e cooptação do operariado
676
. Contudo, apesar de todo este conteúdo
estar sugerido no título, sem um registro literal, é somente por intermédio dos projetos que se dá a
perceber a importância que Romeu Duffles Teixeira atribui ao esporte. Assim, tanto seu envolvimento
com o futebol quanto a seleção de projetos que optou manter consigo
677
, apontam para um interesse
que extrapola a dedicação profissional, mas que não foi expresso em palavras, observando-se que,
mesmo no memorial do projeto de urbanização de ACESITA (T
EIXEIRA, 1952: 15), onde se destaca a
parte dedicada à praça de esportes
678
, a única referência direta ao papel que atribui à pratica esportiva
ocorre a fim de justificar a criação de pequenos campos em diversos bairros, “Próximos às moradias,
concorreriam bastante para o divertimento e exercício dos operários e seus filhos, nas horas de folga,
673
O trabalho de Silvana GOELLNER (2005: 93) enfatiza a prática esportiva feminina, como ela foi incentivada com o intuito
de garantir “mães fortes” e assim gerar um povo forte, sem que, no entanto, como ocorreu em outros países, o esporte
contribuísse para a emancipação feminina, pois sua importância residia “Tanto quanto realizar um bom casamento,
evitando por exemplo, as relações inter-raciais,[em] fortalecer o corpo feminino passando a ser uma necessidade
nacional”.
674
Deve-se ressaltar, no entanto, que assim como outras atividades recreativas e religiosas, o futebol também foi empregado
como instrumento de controle do operariado, assunto que será tratado com mais profundidade no capítulo 6.
675
Embora nos textos estudados sobre vilas e cidades operárias, não haja notícias quanto a uma seleção “racial” dos
funcionários, com a preferência por imigrantes europeus sendo usualmente justificada por sua melhor capacitação, o
zoneamento das casas conforme a função exercida é que acabava por promover tal descriminação (Norris é o único caso
em que o zoneamento é declaradamente fundamentado em etnias). Apesar de este aspecto ser tratado com mais
profundidade no próximo capítulo, vale adiantar que com a valorização do esporte tornam-se freqüentes os relatos de
privilégios obtidos pelos melhores atletas, sendo esta, talvez, uma forma de “eugenização das vilas operárias”!
676
Este aspecto é estressado por André CAPRARO (2002), que afirma que a identificação entre as equipes de futebol e as
nações é tão visível a ponto de ter levado mesmo autores de orientação marxista como David Harvey e Eric Hobsbawn a
proporem o tratamento do futebol como atividade artística. Ele afirma ainda que a partir da década de 1930 o futebol
tornou-se o termômetro da imagem do Brasil, quando “... duvidava-se do futebol brasileiro, duvidava-se do Brasil.
677
Como foi dito anteriormente, somente o de urbanização de Antonio Carlos e as fotografias da Praça de Paraguaçu não são
projetos dedicados a praças esportivas.
678
Tanto no memorial, onde tem uma sessão exclusivamente dedicada ao seu detalhamento e que corresponde a
aproximadamente um terço de todo o documento, quanto nas plantas, sendo este o único espaço que mereceu pranchas
exclusivas para seu detalhamento.
220
afastando-os do ambiente nocivo das tabernas”.
Contudo, se no projeto de ACESITA a presença de campos e quadras em todos os bairros da cidade e
o detalhamento do clube deixam em evidência a importância do esporte, no projeto de urbanização de
Antônio Carlos, isso não é tão claro. Embora o material recuperado apresente somente uma parte da
cidade, pode-se notar sua preocupação em respeitar a topografia, traçando ruas curvas e quarteirões
irregulares, a atenção com a escala humana prevendo passagens de pedestres nas quadras mais longas
e dispondo as áreas de serviço e comércio próximas ás áreas residenciais, aspectos que remetem aos
princípios das “unidades de vizinhança” e das “cidades jardim”. Do mesmo modo que em ACESITA,
destaca-se a escolha de um local plano e amplo para atividades esportivas, e que, ao contrário do que
ocorre no projeto da cidade empresarial, neste a praça de esportes está muito mais inserida na malha
urbana e mais distante das áreas verdes, sendo sua integração com o parque vizinho dificultada pela
presença da ferrovia. Outro ponto comum aos dois projetos é sua organização em torno do eixo
formado por cursos d’água, situando suas vias estruturadoras ao longo dos córregos Gameleira e o rio
Bandeirinha
679
em Antônio Carlos e Timotinho em Timóteo. É também no vale destes córregos que
foram previstos, em Antônio Carlos, a maior parte dos equipamentos urbanos, deixando as áreas mais
acidentadas para as residências. Contudo, se em Antônio Carlos esta é uma exigência dada pelas
construções existentes e pela estrada de ferro, em Timóteo ela é a solução que melhor equaciona
topografia e respeito à natureza
680
.
Contratado em 1945
681
por Percival Farquhar, Athos Rache e Luciano de Morais
682
, o “plano da futura
cidade industrial
683
da ACESITA parece ter sido concluído somente quando o general Edmundo
Soares encontrava-se na presidência da empresa, a partir de dezembro de 1952
684
. Nesses sete anos, o
relacionamento entre o projetista e a empresa foi intermediado por Alderico Rodrigues de Paula,
engenheiro que havia sido o responsável pela compra das terras e acompanhava os trabalhos de
679
Como esta cidade não foi visitada e sua área não é coberta por imagens de satélite com resolução suficiente para distinguir
seu traçado, não foi possível confirmar se o projeto foi seguido ou mesmo como se organiza a parte não mostrada neste
projeto.
680
Segundo Romeu Duffles TEIXEIRA (1952: 02), estas recomendações eram:
a) os lotes, destinados às futuras residências operárias deveriam possuir grande área. Assim as casas ficariam afastadas,
umas das outras, evitando-se desavenças entre vizinhos, e haveria possibilidade de os moradores possuírem hortas,
árvores frutíferas e criação de aves.
b) respeito máximo à natureza, evitando-se soluções agressivas a seus encantos, os quais deveriam ser preservados e
realçados pelos toques paisagísticos.
c) atenção para o problema religioso, facilitando-o, para que o catolicismo contribuísse, eficazmente, no combate a idéias
extremistas.
d) a cidade deveria ser projetada de tal modo que o operário, ao regressar do trabalho cansativo, se esquecesse
completamente, do ambiente trepidante da usina, durante o repouso calmo e reconfortante, indispensável a refazer suas
forças, para as novas lutas cotidianas”.
681
Segundo Edilane CARNEIRO & Bruno FAGUNDES (1992: 66), “Em maio de 1945, a direção da ACESITA estabeleceu os
primeiros contatos com o engenheiro Romeu Duffles, para que este elaborasse um projeto de urbanização para a região,
dando prioridade à construção de uma vila operária”.
682
Embora não tenha sido possível confirmar de onde veio a indicação do nome de Romeu Duffles Teixeira para o projeto,
três hipóteses se colocam: o projeto da praça de esportes para a usina de Esperança, onde o pai de Athos Rache fora
superintendente; indicação de Lincoln Continentino, que já havia projetado a cidade da Belgo-Mineira, era seu amigo
pessoal e com quem havia trabalhado na Secretária de Viação e Obras Públicas no projeto do Barreiro de Araxá; ou ainda,
pelo contato com Alderico Rodrigues de Paula, que havia sido seu chefe durante a construção da estrada São Romão –
Formosa, também enquanto trabalhava na Secretária de Viação e Obras Públicas.
683
Para a elaboração do projeto de saneamento foi designado o engenheiro José Belém Barbosa, então chefe da Divisão de
Urbanismo da Secretaria de Viação e Obras Públicas do Estado de Minas Gerais.
684
Data do memorial descritivo.
221
construção da usina desde o início, sendo também o responsável por delimitar as áreas passíveis de
urbanização e aquelas que deveriam ser reservadas à indústria e às suas futuras expansões.
Contando com um levantamento topográfico ainda em andamento e enfrentando um terreno bastante
acidentado
685
, descrito como “... constituído de algumas áreas planas e irregulares, separadas por
grandes e profundas erosões, e cercadas de morros íngremes...”(T
EIXEIRA, 1952: 03), onde as
planícies mais extensas estavam vetadas para a construção da cidade, a opção de Romeu Duffles
Teixeira foi a ocupação dos vales ao longo do ribeirão do Timotinho
686
. Com a canalização desse
córrego descartada em razão dos elevados custos que implicaria, Duffles adotou como solução a
construção de “avenidas parque”
687
, vias amplas e arborizadas em ambas as margens do córrego, onde
seriam organizados parques e playgrounds, e situadas as habitações coletivas; segundo o autor, “A
cidade se desenvolveria entre as avenidas parque e as encostas” (T
EIXEIRA, 1952: 05).
Assim, os terrenos “acidentados e retorcidos” ao longo do Timotinho seriam transformados em
parques, servindo tanto a propósitos recreativos quanto sanitários, pois
se apresentavam como um “...
bem admirável para quem trabalha tanto, em condições tão penosas, e um enlevo e distração para as
vistas fatigadas. Além de constituir o indispensável pulmão ...”
(TEIXEIRA, 1952: 05).
No entanto, a solicitação da empresa de “respeito máximo à natureza, evitando-se soluções,
agressivas a seus encantos, os quais deveriam ser preservados e realçados, pelos toques
paisagísticos”
(TEIXEIRA, 1952: 02), carregava mais do que preocupações quanto à salubridade do
ambiente e o descanso dos empregados, ela era uma forma de racionalização dos recursos disponíveis,
tônica que guia todo o projeto. Nesse contexto, mesmo a opção por lotes com frentes mais largas e
menor profundidade, que implica maiores gastos com infra-estrutura, é vista como mais econômica
688
,
uma vez que responderia a outras exigências da companhia: a grande dimensão dos lotes e o
afastamento entre as residências, “... evitando-se desavenças entre vizinhos e possibili[tando aos]
moradores, possuírem hortas, árvores frutíferas e criação de aves
(TEIXEIRA, 1952: 02). Condição
que desonerava a indústria, pois, ao oferecer espaço para produção de alimentos, apresentava-se como
uma forma de salário indireto e, ao reduzir a demanda por hortifrutigranjeiros, desincumbia-se de
satisfazê-la.
685
Embora mencione uma viagem ao Rio de Janeiro para explicar o projeto, não há nenhuma referência a visitas ao local,
levando a crer que o conhecimento que tinha do local limitava-se às informações fornecidas por Alderico Rodrigues e aos
levantamentos que lhe foram entregues.
686
Embora Edilane CARNEIRO & Bruno FAGUNDES (1992: 66) afirmem que o primeiro projeto apresentado foi o da “Vila dos
Técnicos”, pelos projetos encontrados, a área ocupada por este bairro hoje, juntamente com o atual centro comercial,
parecem ser espaços reservados à usina, não sendo incluídos no plano geral de urbanização elaborado por Romeu Duffles
Teixeira. A única indicação que pode sugerir que este bairro foi projetado por Romeu Duffles Teixeira encontra-se na
relação de projetos que elaborou para a empresa, no item cinco: “Anteprojeto do núcleo residencial, junto à Usina, o qual
foi considerado como projeto”, sem citar em qual setor se localiza ou mesmo sua inclusão no plano geral.
687
A concepção desta “avenida parque” se assemelha à “grande avenida” da cidade jardim proposta por Ebenezer Howard,
mais do que às “parkways” norte-americanas, que foram concebidas como elementos de ligação entre parques.
688
O projeto dos núcleos, compreendidos entre as avenidas parque e os morros, obedeceu ao critério de quarteirões
longos, sem dúvida mais econômicos. Estes quarteirões seriam dotados de passagens para pedestres, quando
ultrapassassem o comprimento de 200 metros. Sendo mais estreitos, os seus lotes conservando [sic] a área sugerida, pela
diretoria, teriam a frente mais larga e menor profundidade. Isto sem dúvida, permitira o afastamento das residências,
umas das outras. Elas seriam mais isoladas e arejadas, além da vantagem de oferecerem aos seus moradores, maior
privacidade.” (T
EIXEIRA, 1952: 07). Pelas medições possíveis de identificar nos layouts existentes no plano geral, os lotes
variavam de 14 a 16 m de frente, por cerca de 35 m de profundidade.(desenho layouts - Plano Geral)
222
Além dessas justificativas, a opção por residências isoladas
689
refletia a valorização dos ideais
burgueses de privacidade e individualidade
690
, que fazia da casa o ponto de partida para a constituição
de um habitat moderno
691
; era a “célula de habitacional” que o movimento moderno iria proclamar
“núcleo inicial do urbanismo”
692
. No entanto, para Romeu Duffles Teixeira, as “células residências”
englobavam não somente a habitação, mas todo o conjunto de equipamentos necessários para propiciar
vida autônoma para seus habitantes”. Composta por “... um centro comercial, clube, pequena praça
ajardinada, escola, capela e locais para atividades esportivas, junto à reserva florestal.
(TEIXEIRA,
1952: 06), ele atribuía à “célula residencial” características que no urbanismo moderno ultrapassam até
mesmo a idéia de “unidade habitacional”, aproximando-se da noção de “unidade de vizinhança”.
Embora não faça uso desse termo, é nesse sentido que se dá a organização proposta para a cidade, com
seus núcleos residenciais situados ao longo das avenidas parque e dotados de equipamentos urbanos
693
próprios. O resultado é uma estrutura predominantemente linear que, apesar da referência feita no
memorial à cidade jardim de Ebenezer Howard
694
e sua “grande avenida”, guarda poucas semelhanças
com o esquema concêntrico com que este ilustra teoricamente sua proposta e que também não foi
fielmente seguido nas duas primeiras cidades construídas com sua participação (Letchworth e
Welwyn)
695
(OTTONI, 2002). Outros aspectos que dificultam uma aproximação entre as concepções de
Howard e o desenho de Romeu Duffles Teixeira para a ACESITA são a ausência de um centro
claramente definido e de edifícios públicos. Além disso, se para Howard o coração da cidade jardim
está no jardim central e em seus edifícios públicos (administrativos, de lazer e cultura), enquanto a
indústria localiza-se no outro extremo e juntamente com a linha férrea marca o fim da cidade, na
cidade industrial o centro é a planta fabril que, mesmo situada fora de seu centro geográfico, é o
689
Foram previstas, também, habitações coletivas para abrigo dos solteiros descritas como: “... edifícios simples, dotados de
conforto, com a capacidade julgada necessária ao desenvolvimento da população” (T
EIXEIRA, 1952: 14), embora sua
localização em áreas planas não loteadas marginais às avenidas parque possa induzir a pensar edifícios verticalizados; sua
descrição como “casas para solteiros” indicam o contrário (TEIXEIRA, 1952: 14).
690
Como confirmou Fernando SENA (2002), a busca pela individualização da monotonia seria uma constante na construção
das casas, indo muito além da proposta de combate à monotonia por intermédio da variação do recuo frontal das casas (de
3 a 5 m) feita por Romeu Duffles Teixeira, havendo até cinco fachadas distintas para uma mesma planta.
691
Segundo Telma CORREIA (2004a), a casa como habitat moderno pode ser entendida a partir de sua concepção como
santuário doméstico”, “estojo do homem privado” emáquina de morar”, ou seja, como lar, espaço de repouso e vida
familiar, como local de expressão da individualidade de seus moradores e, transformada em direito básico, torna-se
elemento que justifica e onde se aplica o desenvolvimento tecnológico a fim de proporcionar renovação de forças para o
trabalho, minimização dos custos e economia do tempo.
692
Em sua versão da carta de Atenas, Le Corbusier coloca que “A casa é o núcleo inicial do urbanismo. (...) Se ela deve
conhecer interiormente o sol e ar puro, deve, além disso, prolongar-se no exterior em diversas instalações comunitárias”.
(LE CORBUSIER, 1993: 88).
693
Excetuando-se esta referência, os únicos equipamentos urbanos mencionados no memorial são: a praça de esportes
(minuciosamente apresentada no final), a igreja e o hospital, que, apesar das mudanças no traçado urbano, foram todos
edificados exatamente no mesmo local onde haviam sido originalmente propostos.
694
Embora mencione Howard, parece que sua referência mais direta é o projeto de Unwin para a cidade de Letchworth:
Estão aí explicadas as soluções encontradas, na elaboração do plano da ACESITA, que obedeceu, ao caráter de Cidade
Jardim, e foi influenciado por tantos e variados fatores. Ele seguiu, guardadas as proporções, as idéias pregadas pelo
grande publicista inglês Howard. Este idealista confiou-as na ocasião ao notável arquiteto Unwin, que a tornou realidade
no projeto e realização da primeira cidade jardim do mundo, Letchworth (Inglaterra)” (TEIXEIRA, 1952: 15).
695
Letchworth (1903) foi projetada por Barry Parker e Raymond Unwin, que, segundo Dacio OTTONI (2002), havia recebido
influência também das idéias de Camillo Site, para o qual a Ringstrasse era uma “aberração”, o que levou a um desenho
mais orgânico, com maior respeito à escala humana e à topografia, fazendo desaparecer também a rigidez que a grande
avenida e o parque poderiam conferir à cidade. Já Welwyn (1920) foi projetada por Louis de Soisson, e seu desenho parece
muito mais próximo do esquema radial concêntrico proposto por Howard, com a grande avenida, o parque e a área
comercial determinando a intersecção entre os quadrantes, o que, apesar do cuidado com a topografia, resulta num
desenho mais fechado que o de Letchworth..
223
espaço em torno do qual se desenvolve a vida urbana, observando-se que, embora em Timóteo o
projeto inicial seja marcado pela linearidade, organizando-se paralelamente à área industrial, a cidade
acabou por adquirir uma estrutura radial, tendo como ponto de convergência a usina
696
. (colocar
esquemas – Romeu Duffles_cidJardim. cdr)
Mas, se por um lado é principalmente a idéia de “restituir as pessoas ao campo”, sem privá-las das
vantagens da cidade (H
OWARD, 2002: 107), presente em Timóteo na abundância de áreas verdes
(parques e morros), na arborização intensa das ruas e na generosidade dos lotes residenciais, que
permitem reconhecer atributos de cidade jardim no projeto da ACESITA, por outro, a incorporação da
natureza solicitada pela indústria e enaltecida pelo próprio autor constitui acima de tudo uma exigência
das condições topográficas do local e da falta de recursos financeiros, pois, como Duffles Teixeira
deixa ver em alguns pontos do memorial, se pudesse optaria pela canalização do córrego do Timotinho
e ocuparia o espaço conquistado com novos lotes
697
. Além disso, apesar da preocupação em garantir a
proximidade das áreas verdes e o córrego ser o elemento estruturador do sistema viário principal,
nenhuma parte do parque, nenhuma praça ou nem mesmo o playground foi objeto de maior atenção ou
detalhamento
698
.
Entretanto, se a referência à cidade jardim demanda algum esforço para ser apreendida, a menção à
Cincinnati (USA) guarda ainda mais pontos obscuros. Cincinatti é citada como um exemplo de cidade
que, por sua própria configuração, forma o caráter de seus cidadãos:
‘... ambiente urbano é que plasma o caráter humano, de acordo com a própria feição, para
fealdade ou para a beleza. Para isso temos de principiar pela formação de uma psicologia
urbana e anseio cívico’ (T
EIXEIRA, 1952: 16).
A referência termina no que parece ser uma exortação à divulgação propagandística do planejamento
e, em última análise, ao respeito cego às sua diretrizes como instrumento formador do caráter do povo,
respeito que deveria ser partilhado por toda a comunidade.
Daí a necessidade de uma propaganda sistematizada, como se fez alhures nos países de civilização mais
avançada, como a América do Norte. Na cidade de Cincinatti [sic] ‘a propaganda do plano da cidade
começou no Jardim da Infância e acompanhou todos os cursos preliminares e secundários, com o School
Manual of the Plan of Cincinatii[sic]’. (T
EIXEIRA, 1952: 16)
Assim, para Romeu Duffles Teixeira o plano urbano de uma cidade deveria ultrapassar sua condição
de conformação do espaço físico e também instrumento de formação cívica e moral, pois deveria vir
acompanhado da conscientização da população quanto às proposições feitas. Entretanto, esta
conscientização e educação cívica não são garantia de uma gestão democrática da cidade, o que se
verifica tanto nas cidades jardim inglesas quanto nos planos urbanos de Cincinnatti, todos implantados
de cima para baixo, contando com uma pesada participação do Estado e resultando em cidades que
respondiam aos anseios de somente algumas parcelas da sociedade. Em Timóteo, assim como em
696
Há que se considerar, contudo, que a consolidação do centro comercial próximo à indústria veio a reforçar esta tendência.
697
“O córrego poderia, no projeto, ter sido canalizado, servindo de ponto de partida para o desenvolvimento do plano”; “Os
córregos, que serpenteiam pelos vales, teriam o trato futuro, que as exigências da engenharia sanitária e os recursos
financeiros permitissem. Perguntava-se, então, se valeria a pena sacrificar os lotes, obtidos com a construção de canais e as
avenidas respectivas, com a solução focalizada” (T
EIXEIRA, 1952: 11, 05).
698
O único espaço que recebeu maiores atenções foi a praça de esportes, cuja descrição ocupa mais de um terço de todo o
memorial e ao qual ele dedica três pranchas, contra as sete restantes da cidade.
224
outras cidades empresariais, esta contradição fica ainda mais evidente, pois, se tratando de uma cidade
cujo projeto foi contratado pela empresa industrial, o plano urbano se implanta a fim de servir
unicamente a seus interesses, contribuindo para a formação moral do operariado, mas dificilmente para
sua formação cívica. Desse modo, se Romeu Duffles vê no plano de Timóteo uma forma de contribuir
para a educação cívica do povo brasileiro, a empresa via nele somente uma forma de abrigar o
operariado. A responsabilidade do empreendimento para com a nação, principalmente até a década de
1960, era produzir aço para gerar riquezas; estas sim, capazes de alçar o país a novos patamares de
desenvolvimento. Condição que se tornou ainda mais contundente quando, em 1952, o general
Edmundo de Macedo Soares assumiu a presidência da companhia e fez da conclusão do plano e da
melhoria das condições de vida na cidade uma de suas prioridades, reforçando, por meio do projeto
urbano, o sentido cívico do projeto industrial (vide capítulo IV).
Contudo, se é o plano diretor de 1925
699
e a proposta de um sistema de trânsito rápido
700
que fazem
John F
AIRFIEL (1993) considerar Cincinnati
701
a primeira cidade importante a ter um plano
reconhecido oficialmente e uma pioneira em planejamento urbano
702
, foi o sistema de parques e
699
O plano de 1925 foi elaborado pelo TAC (Technical Advisory Corportion), a primeira empresa de consultoria em
planejamento da América do Norte comandada pelo engenheiro húngaro Ladislas Segoe (E
LDEMAN & ALLOR, 2003),
George B. Ford e Ernest P. Goodrich, tendo como mentor o advogado Alfred Bettman. “O plano de Cincninati era um
elemento do movimento de reforma política que pretendia substituir o controle do capital da ’máquina política’ corrupta
por decisões tomadas em favor do interesse público por uma comissão de planejamento urbano dominada pelos cidadãos.
Esta comissão esta encarregada de preparar um plano integrado de longo prazo para se tornar a base do desenvolvimento
do capital do orçamento a ser implementado por uma administração urbana neutra. (“The Cincinnati plan was an
element of a political reform movement intended to replace corrupt "political machine" capital investment control with
decisions made in the public interest by a citizen-dominated city planning commission. This commission was charged with
preparing a long-range integrated city plan to become the basis for development of a capital budget to be implemented by
a politically neutral city manager.”). Portanto, ao contrário do plano de Nova York de 1916, mais do que regular o uso da
terra garantindo iluminação, ventilação e circulação às edificações, o plano de Cincinnati fazia do zoneamento um
instrumento de política pública voltado para comunidade, garantindo ao poder público meios de, mesmo no futuro,
controlar a especulação imobiliária, intervindo e direcionando o crescimento da cidade (GERCKENS, 2001).
700
A elaboração da proposta de implantação do sistema de transito rápido para a cidade de Cincinnati iniciou-se ainda em
1905, mas somente assumiu maiores proporções a partir de sua associação com a solução do problema habitacional, em
1912 (A
NÔNIMO, s.d.). No entanto, com o início da Primeira Guerra Mundial e os elevados custos da obra levando a
confrontos políticos sobre a forma de concessão da operação do sistema, sucessivas paralisações fizeram que a obra
permanecesse incompleta até 1925, quando a popularização e supremacia do automóvel permitiram que no novo plano
diretor a solução da questão habitacional fosse assumida pelo zoneamento (F
AIRFIELD, 1993). Assim, apesar do relatório
favorável à sua complementação (B
ELLER, 1927) e de boa parte das linhas, e mesmo algumas estações já estivessem em
estado bem adiantado, as obras foram paralisadas, permanecendo o que John Fairfield chamou de “o buraco no solo de
Cincinnati” (“Cincinnati’s hole in the ground”).
701
Com a derrota dos franceses e o fim da guerra com os índios, mesmo a proibição de novos assentamentos não foi capaz de
refrear a ação de companhias imobiliárias e especuladores privados em direção ao Oeste norte-americano. Assim, tendo
adquirido oitocentos acres, em 1788, Israel Ludlow, Mathias Denman e Robert Patterson fundaram o assentamento nas
proximidades da foz dos rios Linking Little Miami, às margens do rio Ohio, que, posteriormente, seria renomeado
Cincinnati. Com a mesma estrutura reticulada que já se consagrara no Leste e que o sistema de distribuição de terra
adotado pelo Continnental Congress de 1785 havia consagrado (R
EPS, 1987), a cidade cresceu rapidamente, e já em 1820
possuía mais de 10 mil habitantes. Com sua localização estratégica favorecendo o comércio com soldados e viajantes, a
cidade tornou-se um importante ponto de comercialização de carne, especialmente de porco, e com a chegada de
imigrantes alemães na década de 1830, além de incrementar o comércio de embutidos, proliferam as cervejarias. No
entanto, a economia da cidade foi sempre marcada pela diversidade, “sem que nenhum negócio isoladamente empregasse
mais de 3% da força de trabalho da cidade” (“no single business empolys more than three percent of the city’s workforce”,
O
HIO HISTORICAL SOCIETY, s.d.), posição reforçada pela reportagem da Harper’s New Monthly Magazine (HARPER, 1883),
segundo a qual a abundância de chaminés e o trânsito intenso no rio fazem com que seja constantemente comparada a
Londres.
702
...Cincinnati was leader in the city planning movement and the first major city to give official recognition to a master
plan,...” (F
AIRFIELD, 1993: 12).
225
avenidas (1907) de George Kessler
703
que determinou as principais características da cidade, inclusive
seu “embelezamento” e sua articulação estrutural, que podem ter sido tomadas por Duffles como
fundamento do processo educacional. Esse plano buscou integrar, por intermédio de um sistema de
parques e bulevares, a quadrícula original, localizada na parte baixa da cidade e já densamente
ocupada pelo comércio e serviços
704
, às retículas que compunham os bairros residências, menos densas
e situadas em áreas mais elevadas, não somente embelezando a cidade, mas também, ao ampliar e
melhorar as vias de circulação e espaços públicos, conferindo-lhe melhores condições para
desenvolvimento futuro (S
CHERMERHORN JR., 1912). Esta visão de conjunto e de futuro leva Mario
MANIERI-ELIA (1972) e Francisco DAL CO (1972) a considerarem que os planos de George Kessler,
mesmo que formalmente se aproximem do “City Beautiful” e proponham a inserção da natureza no
meio urbano de modo semelhante ao “Parks Moviment”, acabam por apresentar maior similaridade
com o planejamento multidisciplinar e progressista que começou a tomar corpo nos Estados Unidos no
final do oitocentos. Assim, apesar de preocupar-se com a reestruturação monumental e paisagística dos
centros urbanos, observa-se que George Kessler reveste seus parques e bulevares de funções que vão
muito além da estética ou da mera inserção do campo no meio urbano; ele os vê como meios de
promover a separação entre áreas congestionadas, possibilitando a racional utilização das estruturas
urbanas que, por causa da implantação dos parques e bulevares, tornam-se mais valorizadas e mais
bem equipadas, promovendo uma reestruturação e redistribuição dos usos por toda a cidade, não
somente das áreas monumentais.
A comparação entre o projeto da ACESITA e a organização formal de Cincinnati, incluindo a
estruturação funcional do plano de George Kessler, no entanto, não traz grandes esclarecimentos
quanto às motivações de Romeu Duffles Teixeira para citá-la. Tampouco é esclarecedora a indicação
dos sobrinhos da Alemanha, país natal e onde estudou Kessler, como sua principal referência em
urbanismo, pois o tom pitoresco das cidades jardim alemãs
705
– como Margarethenhöhe e Helllerau
(H
ALL, 2002)
706
ou mesmo das vilas projetadas por Theodor Fischer, Richard Riemerschmid, Robert
Schmohl e Olof Hallmann, visivelmente construídas seguindo os princípios estéticos de Camillo Sitte
e imbuídas do espírito das vilas medievais da Bavária (T
AGLIAVENTI , s.d.) – não parece ter sido a
tônica que guiou o projeto da cidade mineira. Embora isoladamente nenhum desses aspectos pareça
703
Nascido na Alemanha, mas residindo nos Estados Unidos desde os dez anos, George Edward Kessler voltou ao país natal
para completar sua formação cursando Engenharia Civil na Universidade de Jena e Botânica, “produção florestal”
(forestry) e paisagismo (landscape design) com instrutores particulares. Após um curso em Moscou e Paris, com 20 anos
retornou aos Estados Unidos, onde se empregou numa companhia de sementes até conseguir, por indicação de Olmsted, o
emprego de Superintende de Parques de Kansas City, Fort Scott e Gulf. Além de inúmeros projetos de bairros jardins e
parques, das universidades de Kentucky, Miami, Mississipi e Cincinnati, George Kessler elaborou planos de sistemas de
parques e bulevares para as cidades de Excelsior Springs (1890), Kansas (1893), Memphis (1900), Indianapolis (1905),
Cincinnati (1907), Siracuse (1906), Oklahoma (1910), Fort Wayne (1911), St. Josehph (1912), South Bend (1912),
Hamilton (1912) e Springfield (s.d.) , bem como o plano geral (comprehensive plan) de Dallas (1911), no Meio-Oeste
norte-americano.
704
A maior parte das indústrias se localiza a oeste do canal Miami-Eire e ao norte da cidade.
705
Segundo Gabriele TAGLIAVENTI (s.d.) na Alemanha o movimento cidade jardim foi muito influenciado pela visão
romântica da cidade medieval difundida principalmente na obra de Camillo Sitte.
706
Na verdade, seriam mais bem caracterizados como subúrbios-jardim. Margarethenhöhe foi construída em 1906 em
comemoração ao casamento da filha de Maragarethe Krup. Projetada por Georg Metzendorf para abrigar os trabalhadores
da Krupp, é considerada o melhor exemplo de subúrbio-jardim alemão (EUROPEAN GARDEN NETWORK, 2006).
226
suficientemente forte para justificar sua referência
707
, há outro aspecto da obra de Kessler que pode ter
chamado a atenção de Romeu Duffles Teixeira: a inserção de áreas esportivas nas proximidades dos
parques, fazendo destes tanto espaços de contemplação da natureza quanto de atividades recreativas.
Contudo, mais uma vez, essa postura mais progressista de George Kessler e que reafirma seu
distanciamento do pensamento do “Parks Movement” (para o qual as únicas atividades recreativas
inquestionavelmente aceitas nos parques eram os passeios
708
, a patinação no gelo e os piqueniques,
como se pode observar no projeto de Olmsted para o Central Park de Nova York, no qual espaços
destinados especificamente a atividades esportivas foram incluídos
709
somente na década de 1930),
não é exclusiva ao plano de Cincinnati.
A presença de espaços esportivos nos sistemas de parques e
bulevares projetados por Kessler aparece desde um de seus primeiros planos, o de Kansas City (1893),
no qual ele afirma que, além da garantia do uso correto dos espaços da cidade (residencial, comercial e
industrial), o plano tinha por objetivo “... oferecer a todos os residentes oportunidade de recreação ao
ar livre tão próxima de casa quanto fosse possível realizar
710
(Kessler apud GABELMAN, 1920: 08),
prevendo desde playgrounds até piscinas, estádios e mesmo campos de golfe em nove parques. O
mesmo ocorre nos planos de Indianápolis (W
YNNS, s.d.) e Dallas onde, desde as últimas décadas do
século XIX, a Comissão de Parques e Recreação reconhecia que a contribuição dos parques para “a
dispersão da desordem civil” seria mais eficaz se em vez de “espaços passivos” eles se tornassem
“espaços ativos”; afinal, “flores e arbustos têm bom visual, mas o domínio público deveria ser útil e
disponível”(J
EBSEN JR , 1979: 13)
711
.
707
Tratando-se da influência do urbanismo alemão transplantado para os Estados Unidos por George Kessler, seria mais
natural que fosse mencionada a cidade de Kansas, cujo plano ganhou maior notoriedade, uma vez que tanto nas pesquisas
em bibliotecas como na internet, entre os planos de parques e bulevares elaborados por George Kessler, o de Kansas City é
o mais freqüentemente citado e facilmente encontrado. Uma cópia do folheto descritivo do plano encontra-se disponível
para download no site do arquiteto (GABELMAN, 1920) e, embora dentro do contexto do movimento “City Beautiful”, o
livro de William W
ILSON (1964) trata especificamente dele.
708
Passeios a pé, a cavalo ou em charrete eram as atividades mais usuais, mas passeios em barcos e a pesca também eram
aceitáveis.
709
Com exceção do campo de críquete na porção oeste do parque e do Heckscher Playground, única área onde crianças eram
inicialmente aceitas, foi somente após a transformação do Lower Resevoir no grande gramado central (Central Lawn) e a
contratação de Robert Moses em 1934 como “park commissioner”, que as áreas ganhas com sua drenagem foram
transformadas em quadras de esporte, campos de jogos, playgrounds e piscinas: “Moses viewed all parks as places for
active, wholesome play, for ball fields, tennis courts, swimming pools, and playgrounds; he believed in recreation, not
conservation. For him, Central Park was ‘essentially a playground’. ... By the end of the 1930s, the park's thirty-one-
person recreational staff was overseeing a crowded schedule of folk dancing, kite flying, Ping-Pong, softball, baseball,
football, field hockey, horseshoe pitching, shuffleboard, volleyball, lawn bowls, tennis, croquet, and ice and roller skating,
as well as myriad festivals, carnivals, and tournaments (ROSENZWEIG & BLACKMAR, 1992).
710
“...giving all the residents opportunity for outdoor recreation as near the homes as it is possible to accomplish”
(GABELMAN, 1920: 08)
711
Flowers and shrubbery looked fine,but the public’s domain had to be useable and available.” (JEBSEN JR., 1979: 13).
227
Fora do campo do urbanismo, no entanto, há outro aspecto de Cincinnati que pode ajudar a
compreender sua menção: é o papel de destaque que assumiu na profissionalização do esporte nos
Estados Unidos
712
, constituindo-se na primeira cidade a possuir um time de beisebol totalmente
profissional
713
. E, embora isso tenha ocorrido ainda nas últimas décadas do século XIX, foi somente
em 1933 que se intensificaram as discussões sobre a profissionalização do futebol em Belo Horizonte,
quando o América, clube que Romeu Duffles Teixeira ajudou a fundar e no qual jogou por duas
temporadas
714
, posicionou-se contra, entabulando um protesto que durou cerca de dez anos
715
.
Assim, enquanto em Cincinnati bulevares e pakways dão coesão ao tecido urbano ligando parques e
praças esportivas
716
, em Timóteo estes espaços estão mergulhados no verde dos parques, promovendo
uma integração com a natureza pautada pelo aproveitamento máximo das condições locais, e o uso da
topografia e da vegetação existentes visa compor uma paisagem que tem na natureza o principal
elemento de suporte das atividades esportivas, servindo tanto como pano de fundo, como oferecedor
de condições mais favoráveis à prática esportiva, com o aproveitamento dos cursos d’água e desníveis
servindo como limite e como arquibancada. Opções de projeto que se podem observar também em
Araxá, Antônio Carlos e mesmo em Carangola e Esperança, e que ficam ainda mais evidentes na praça
esportiva da ACESITA, cuja imersão no parque é total e o aproveitamento da topografia é que
determina a localização e direcionamento das quadras, tanto na praça esportiva quanto nos campos e
playgrounds situados nas margens das avenidas.
Assim, além de guiado por sua formação como engenheiro industrial ou mesmo pelas leituras que
realizou ao longo da vida, Romeu Duffles Teixeira parece ter deixado em seus projetos a marca de
suas paixões, com a precisão do traço e a riqueza de detalhes atestando o entusiasmo com que se
dedicava a eles. Entusiasmo que parece ter esmorecido, a partir de meados da década de 1960, quando
uma sucessão de solicitações para contagem de seu tempo de serviço para deferimento do pedido de
712
A profissionalização do esporte nos Estados Unidos, mais do que um movimento que visava garantir melhores condições
de vida e de desenvolvimento dos atletas ou mesmo de popularização das atividades esportivas, com o afastamento da
noção de “esporte” da de “jogo”, associado a apostas e à embriaguez, foi uma condição que os capitalistas acreditavam
necessária a fim de consolidar o potencial do esporte como negócio lucrativo, pois possibilitaria a separação entre
jogadores e “sócios” nos clubes, fazendo deles meros assalariados (MOORE, 1996). Considerado como esporte símbolo do
país, desde meados do século XIX o beisebol já era jogado por todo o país, tanto pela elite como por operários e negros;
assim, é natural que tenha sido o primeiro esporte a se profissionalizar.
713
Além do que vale ressaltar que a tradição do esporte em Cincinnati, contando ao longo de sua história com 34 equipes
esportivas profissionais, oito delas anteriores à década de 1940, interesse que se reflete na abundância de espaços
esportivos, com a cidade abrigando hoje sete grandes estádios, dois times na liga principal, seis na secundária, e cinco
times universitários, o que é bastante representativo para uma cidade com uma população em torno dos 330 mil habitantes.
(WIKIPEDIA, s.d.).
714
Cabe lembrar ainda que o América Futebol Clube foi fundado por alunos do Colégio Anglo-Mineiro e que seu próprio
nome é um reflexo da admiração destes adolescentes pela cultura esportiva norte americana. Na história contada no site
oficial do clube, consta que, apesar de alguns alunos serem torcedores do América do Rio de Janeiro, a escolha do nome
foi feita por sorteio e a sugestão “América” era “em homenagem aos Estados Unidos da América, dos quais os meninos
eram fãs, pelas histórias contadas por seus professores...”(PAIVA, s.d.).
715
Enquanto os demais clubes da capital mineira abraçavam o profissionalismo, o América Futebol Clube, após ter
conquistado uma seqüência inédita até hoje de vitórias, vencendo cinco campeonatos consecutivos e se consagrado 10
vezes campeão mineiro na década de 1920, recusou-se a profissionalizar-se. Em protesto, alterou as cores de sua camisa,
permanecendo amador até 1943, quando abandonou o verde do protesto para voltar ao tradicional uniforme vermelho
(RODRIGUES, 2006). Embora Romeu Duffles Teixeira tenha jogado somente na equipe secundária, seu irmão Gilberto
jogou na equipe principal em 1920, quando venceu o campeonato (W
IKIPEDIA, s.d.1).
716
Dos nove espaços dedicados à prática esportiva identificados no plano de Kessler, somente dois não estão localizados
dentro ou diretamente ligados a áreas verdes.
228
aposentadoria aponta para certo desencanto, ou mesmo cansaço para o trabalho, momento a partir do
qual, contam os sobrinhos, voltou a viajar com maior freqüência, só que agora a regiões mais distantes
e a passeio; voltou-se, também, para os livros e ao estudo do russo, há muito abandonado. Solteiro e
sem filhos, faleceu em 1976 de ataque cardíaco enquanto organizava sua biblioteca
717
.
717
Infelizmente, a doação dos livros feita pelo sobrinho após sua morte, em duas consultas, não foi confirmada pelo Instituto
Isabela Hendrix (Belo Horizonte), tornando impossível verificar seu conteúdo.
229
Fig. 212-213: Levantamento do município de Sítio
(parcial - 1954) e posta do centro da cidade
Fig. 214-215: O primeiro time
(1912)e o projeto da
arquibancada do primeiro
estádio do América Futebol
Clube (1939)
Fig. 216: Os espaços de esporte em Belo Horizonte e suas mudanças
(ROMANO, 1997)
Fig. 211:
Romeu Andrade
Duffles Teixeira
orignal sem escala
Zoológico
Estádio
Minas Tênis Clube
Mercado Central
Estação Rodoviária
Diamond Mall
Minascentro
original sem escala
230
Fig. 217-218: Vista de satélite dos fundos do Palácio da Liberdade e projeto para o
Parque Palácio da Liberdade (1938)
Fig. 221: Localização da Praça Osvaldo Costa
Fig. 219-220: Fotografias da Praça Osvaldo Costa
em Paraguaçu
Fig. 222-223: Vistas atuais da
Praça Osvaldo Costa
sede do Minas Tênis Clube
N
Palácio da Liberdade
0
75m
0 331m
N
231
,tanque de lama
pegolado
brejo
stadium fonte radioativa
Dancing bar
tennis stadium
HOTEL
BALNEÁRIO
piscina
peteca
cro
q
uet
volley
basquete stadium
0 309m
N
Play ground
tennis
praia amphytheatro
tennis
Fig. 224-225: O Grande HotelAraxá
vista aérea e de satélite
(
W
d
G
)
Fig. 226: O projeto de Romeu Duffles
para o Barreiro do Araxá (1937)
(acervo Vanda D. Teixeira)
N
Fig. 227-228: O balneário antes da reforma e o perspectiva do
projeto de Dierberger para o Barreiro do Araxá
(
P
2005)
232
0 5 10 20m
Estádio de Futebol
passeio arquibancada campo
campo passeio pista de auto passeio
crianças
patinação
rinque
volibol
caramanchão
fonte luminosa
Fig. 229: Projeto de Romeu Duffles para o estádio de Astolfo Dutra (1953?)
(acervo Vanda D. Teixeira)
Fig. 230-231:
O projeto da praça de Alfenas de Romeu Duffles (1948)e o da praça da
Liberdade de Dierberger (1920)
233
0
230m
local da antiga usina
possível sítio do clube
Fig. 232: Perspectiva do projeto de Romeu
Duffles para o clube da Usina Esperança (194?)
(
V
dDTi i
)
Fig. 233: Local da antiga usina
Esperança
Atual Estádio Roseli Soares
Fig. 234-235: A cidade de Carangola e o
Estádio Roseli Soares
(
P
2005
)
Fig. 236: Perspectiva do projeto de Romeu Duffles para Praça de Esportes em Carangola (1939)
(acervo Vanda D. Teixeira)
234
Fig. 237: Plano geral do projeto de Romeu Duffles para a ACESITA (1947-1951)
(acervo Vanda D. Teixeira)
N
Cursos d’água
Grande avenida parque
Áreas urbanas
Parques
Campos e praças esportivas
Habitações coletivas
Áreas comerciais
Parques
Igrejas
Escola
Zonas
Fig. 238-239: Organização geral do projeto de Romeu Duffles
(acervo Vanda D. Teixeira)
N
235
GRAMA GRAMA RECÚO
RECÚO GRAMA GRAMA RECÚO
PASSEIO PISTA
PASSEIO
RECÚO GRAMA GRAMA RECÚO
RECÚO GRAMA GRAMA
GRAMA GRAMA
RECÚO GRAMA PASSEIO GRAMA GRAMA PASSEIO GRAMA RECÚO
RECÚO PASSEIO PASSEIO RECÚO
0
10m
0 10m
0 10m
PISTA
ESTÁDIO PASSEIO PASSEIO
PISTA PASSEIO
PASSEIO PASSEIO
PISCINA
ARQUIBANCADA PISTA
0 40m
BASQUETE
PISCINA
INFANTIL
ESTÁDIO
BASQUETE ESTÁDIO FUTEBOL
ESTACIONAMENTO
PASSEIO
Fig. 241-242: Perfil da avenida parque e
de uma rua residencial
(
acervo Vanda D. Teixeira
)
Fig. 240:
Detalhe implantação nos lotes
(acervo Vanda D. Teixeira)
N
Fig. 243: Perfil das vias
(acervo Vanda D. Teixeira)
Fig. 244-245:
Detalhamento do clube, implantação e cortes (1951)
(acervo Vanda D. Teixeira)
N
236
Fig. 246-247: Projetos para o atual bairro Funcionários (1946) e para o centro (atual bairro doTimirim) (1950)
(acervo Vanda D. Teixeira)
N
Campos de esportes
Habitações coletivas
Áreas comerciais
Alameda centra
Parques e praças
Igrejas
Escola
Zonas
Cursos d’água
Passagem pedestre
237
Fig. 248-250: O projeto de Georg Metzendorf (1909- original
s/esc.
) para o subúrbio jardim de Margarethenhohe, vista
aérea (1980) e entrada no início do século.
(K
RUPP, s.d.)
Fig. 251-253: Sistemas de parques e avenidas projetados por
George Kessler para as cidades de Kansas (1893), Saint
Joseph (1912) e Indianapolis
(1905)(originais sem escala)
(K
ESSLER SOCIETY, s.d.; NATIONAL REGISTER, s.d.; INDY PARKS, s.d.)
Fig. 254-257:
O plano de George Kessler para Cincinnati (1907) e postas da
cidade e seus parques no início do século XX. (original sem escala)
(acervo P
UBLIC LIBRARY OF CINCINNATI.; CINCINNATI MEMORY PROJECT, s.d.;)
N
238
V.1.2 JOSÉ LUIZ BATISTA: UM ARQUITETO EM PELE DE ENGENHEIRO
718
Natural de Ponte Nova (MG), José Luiz Batista da Silva
719
iniciou seus estudos de arquitetura no Rio
de Janeiro (Escola Nacional de Belas Artes da Universidade do Brasil) em 1953, mas, com a partida da
mãe para Belo Horizonte, acabou pedindo transferência e formando-se “engenheiro-arquiteto”
720
pela
Universidade de Belo Horizonte em 1958.
Dos tempos de faculdade, as recordações mais marcantes dizem respeito à matemática e à geometria,
disciplinas com as quais disse ter aprendido a “brincar”, fazendo delas instrumentos de racionalidade
a serviço do conforto e da economia. Foi este pensamento que fez com que em toda sua atividade
profissional optasse constantemente pelas aplicações mais racionais dos recursos materiais e
tecnológicos disponíveis, indicando grande afinidade com o racionalismo difundido pelo movimento
moderno e demonstrando que, como afirma Hugo S
EGAWA (1999: 79), se nada havia “... restado da
restauração [da Escola Nacional de Belas Artes] após a saída de Lucio Costa
721
, esse período foi
marcante o suficiente para que uma geração de futuros arquitetos tivesse concisência das
tranformações em curso na arquitetura mundial”, fazendo que, vinte anos mais tarde, a escola ainda
ajudasse a formar profissionais imbuídos destes conceitos.
Logo depois de formado, José Luiz Batista foi contratado como arquiteto pela Secretaria de Viação e
Obras Públicas de Minas Gerais, permanecendo em Belo Horizonte até 1961, quando foi convidado a
trabalhar na ACESITA. Com um salário três vezes maior, apesar da inicial precariedade das condições
de trabalho
722
e moradia
723
e da distância a Belo Horizonte, cujo trajeto acidentado o afastava ainda
mais da família, não hesitou em, acompanhado pela esposa e a filha recém-nacida, partir para Timóteo.
Em seus primeiros anos em Timóteo, era o único arquiteto residente nas imediações, o que fazia com
que fosse intensamente requisitado, levando-o a atuar profissionalmente de três formas distintas: como
funcionário de uma empresa privada (ACESITA), como funcionário público (prefeituras de Coronel
Fabriciano e Timóteo) e como autônomo:
Quando eu fui para lá, eu era o único arquiteto, eu trabalhava das 7:00 horas da manhã à meia noite.
Primeiro na companhia, depois das 17:00 horas ia para a prefeitura, aí jantava e ia para a prancheta da
minha casa, lá no fundo onde eu trabalhava para os outros.
Na década de 1960, no entanto, a empresa enfrentava sérias dificuldades financeiras, fazendo com que
em seu trabalho como encarregado do Departamento de Urbanismo, “...que abrangia a parte urbana
718
As informações referentes ao arquiteto José Luiz Batista e Silva fundamentam-se em entrevista realizada em sua
residência em Belo Horizonte – MG em 25 de março de 2002.
719
O pai era farmacêutico e a mãe, professora.
720
Embora a escola de Arquitetura da Universidade de Minas Gerais, criada em 05 de agosto de 1930 e federalizada em 1949
(Lei nº 971), tenha sido a primeira da América do Sul a nascer desvinculada das Escolas Politécnicas de Belas Artes e
Filosofia (FAU-UFMG, s.d.).
721
Lúcio Costa dirigiu a Escola de Belas Artes do Rio de Janeiro entre outubro de 1930 e setembro de 1931. (SEGAWA,
1999).
722
Conta que, antes da construção da BR 381 (Fernão Dias), muito do material de construção vinha de trem e que “... teve
muita coisa que foi feita com carroça de burro, muito urbanismo de carroça de burro, essas de modelo antigo, grandes e
pesadas. Aí carregava uns quilos e quem levava pra lá e pra cá os materiais e o pessoal, eram os burros
”.
723
Inicialmente foi alojado “... num apartamento de um quarto, eu, minha mulher e a empregada, nós fizemos um biombo pra
separar da empregada, senão como é que a gente ia arrumar?!... aí, um mês depois arranjaram uma casa, a gente foi morar
nela, que depois eu comprei”, inclusive afirmou ter sido o primeiro a adquirir e reformar a casa quando se iniciou a
abertura da cidade (bairro dos Funcionários – foto).
239
de água, esgoto e as casas da companhia”, não fossem muito numerosas as obras urbanas. Constam
entre as obras urbanas que realizou para a ACESITA somente os bairros Serenata e Primavera e o
trevo entre Ipatinga, Coronel Fabriciano e Timóteo, além de pequenas intervenções na área próxima à
usina.
Mas se nem numérica, nem urbanisticamente estes projetos eram muito significativos, pois não
apresentam grandes novidades
724
com relação ao que já existia na cidade, por outro lado, eles
evidenciam seu papel como elemento de ligação entre a empresa e o poder municipal, como no caso
do bairro Primavera
725
.
O Primavera foi um bairro construído em parceria com o município, este interessado em promover a
integração entre o centro sul e o norte, intensificada após a abertura da cidade, e a empresa desejando
preparar-se para receber os novos contratados por causa da segunda expansão. Tendo participado
diretamente apenas das primeiras etapas de construção deste bairro
726
, observam-se nelas os mesmos
princípios que haviam guiado a organização do espaço da cidade até então: a ocupação das estreitas
planícies às margens dos cursos d’água, com lotes residenciais de frente ampla (12 x 20 m), a fim de
permitir o isolamento lateral das casas, todas térreas e avarandadas.
Outro momento em que José Luiz Batista aparece como importante elemento de ligação entre o poder
municipal e a ACESITA ocorre quando se dá o processo de abertura da cidade, ocasião em que foi
incumbido de “desenhar as plantinhas para aqueles que comprassem a casa: uma planta de situação,
o terreno e a planta baixa.”, pois com a
... abertura da cidade, era necessário entregar para a prefeitura o arruamento, a rede de esgoto e a parte de
iluminação pública. Para a companhia vender as casas, ela tinha que vender casa que desse para
logradouro público, não logradouro particular dela.
Assim, ainda que de forma sutil, novamente sua influência foi sentida, pois nestas “plantinhas” buscou
introduzir as regulações que aprendera na faculdade e na Secretária de Viação e Obras Públicas,
guiando seus projetos pelas normas do Código de Obras da cidade de Belo Horizonte. Num momento
em que a cidade não possuía ainda um legislação urbana, a aplicação do código de obras de Belo
Horizonte ajudou a caracterizar a paisagem urbana da cidade, coibindo abusos e o aparecimento do
que José Luiz Batista chamou aberrações, garantindo que, ao mesmo tempo em que quebrava a
uniformidade imposta pela origem empresarial, a paisagem mantivesse certa coerência. O respeito a
724
Ambos localizam-se nos vales de ribeirões, com uma estrutura predominantemente linear. A horizontalidade também
marca os dois bairros, com grandes afastamentos frontais e residências isoladas nos lotes. No entanto, enquanto o Serenata
destinava-se ao pessoal mais bem colocado, com lotes ainda mais generosos e a construção das casas deixadas a cargo dos
proprietários, o Primavera foi construído em pelo menos quatro etapas, sendo que, nas duas primeiras, os lotes eram mais
reduzidos, com o distanciamento da rua também inferior. Na quarta etapa, iniciada em 1978, surgem os primeiros edifícios
verticais, uma opção pelo adensamento que parece ditada pela escassez de áreas planas, uma vez que ocupam áreas
descartadas para a urbanização nas etapas anteriores. Vale salientar ainda que, enquanto o Primavera encontra-se
plenamente ocupado, no Serenata ainda é possível encontrar lotes vagos.
725
O projeto obtido deste bairro mostra que sua construção ocorreu em quatro etapas, e embora não haja datas precisas das
três primeiras, observando-se as plantas antigas da cidade, nota-se que embora elas não apareçam na de 1967, estão
presentes nas de 1969 (sem os pontinhos que usualmente indicam residência ocupada), de modo que é provável que José
Luiz Batista não tenha participado somente da última, pois em 1978 já havia saído da empresa. Nessa última etapa, que
contou com a participação da COHAB-MG e para a qual parte do terreno foi doada pela prefeitura e parte vendida pela
ACESITA, estava prevista a construção de 17 edifícios de três andares (total de 204 apartamentos) e 28 casas, todos
construídos conforme o projeto.
726
Vide capítulo IV, a cidade de Timóteo foi emancipada de Coronel Fabriciano em 1964.
240
essas normas era considerado por ele de grande importância, estando presente tanto nos projetos feitos
para a Aceista quanto nos aprovados e executados nas prefeituras, levando-o ainda a frequentemente
deixar de cobrar por seus serviços. Em suas palavras:
... o código de obras, eu conhecia porque estudei em Belo Horizonte e na escola a gente fazia projeto dentro
do código da prefeitura. Aí, em Timóteo e Fabriciano, eu fazia e conferia de acordo com ele. Aberrações eu
não deixava passar não. Eu fazia até planta para dar de graça para o pessoal pobre que quisesse fazer casa
simples não precisasse pagar engenheiro. Eu fazia estes modelozinhos assim, tipo embrião.
Nessa fala evidencia-se também sua postura com relação à Engenharia, ciência cujos conhecimentos
acredita deveriam estar submetidos à arquitetura, esta sim, responsável por dirigir o trabalho de
construção da cidade. De tal forma que, para José Luiz Batista, estava evidente a supermacia
727
da
arquitetura sobre a engenharia, o que assegurava ao arquiteto o direito de agir diretamente sobre a
cidade sem intermediação alguma do engenheiro, pois ele também era detentor do saber construir.
Portanto, para este engenheiro-arquiteto a construção era a finalidade última de sua profissão, fazendo
com que o ato construtivo fosse mais do que a materialização do projeto; ele era símbolo da
capacidade técnica do profissional, um direito conquistado por seu empenho e dedicação na
construção de uma realidade melhor. Assim sendo, não é surpressa que o grande objetivo por trás de
tanto trabalho, fosse a reunião de capital para financiar suas próprias construções, fazendo dele
também um empreendedor.
Esta visão se confirma no prazer com que descreve os cuidados necessários à concretagem da cúpula
da igreja Matriz de São José:
O problema ali era terminar a cúpula. A concretagem de uma cúpula é complicada, você tem que ter cuidado
para ir concretando tudo igual, subindo tudo igualzinho, para o concreto poder curtir por igual. Se
concretar um lado só ele trinca, assim, embora tenha que fazer tudo de uma vez só, tem que dar tempo da
massa curtir, senão nunca chega em cima.
Ainda trabalhando para a ACESITA, responsabilizou-se tecnicamente e acompanhou as obras dos
edifícios do novo Centro Comercial (1964), inclusive o que abrigou o Cine Marabá; além do novo
escritório da empresa (1970)
728
, projetou e construiu o Colégio Monsenhor Rafael (hoje pertencente à
UNILESTE – Universidade do Leste de Minas) e o Conjunto Residencial Pioneiros (no qual era
sócio). Já os projetos e obras da sede social do ACESITA Esporte Clube
729
e da sede do sindicato dos
metalúrgicos, ele fez como autônomo. Em comum, todos esses edifícios têm o inconteste apego aos
princípios da arquitetura moderna, seja na forma, na escolha dos elementos arquitetônicos ou materiais
construtivos. Invariavelmente foram idealizados como estruturas de concreto independentes, têm
planta livre e são regidos por linhas e ângulos retos; os tetos planos (ou sua cobertura em telhas pré-
fabricadas é encoberta pelas platibandas), com programas ditando sua forma de modo a se estabelecer
727
Visão que se confirma em outros momentos da entrevista, quando demonstrou o desejo de diferenciar-se, formar uma
elite: “Mas às vezes a gente gostava mais de ficar separado, né?! Formar uma elite, porque engenheiro metalúrgico,
engenheiro hidráulico, engenheiro civil, engenheiro de não sei o que lá mais, era o que não faltava. O tempo que eu fui no
Rio de Janeiro, os próprios, Oscar Niemeyer e outros lutavam para acabar com o título de engenheiro-arquiteto. Ficar só
arquiteto, porque dava mais evidência”.
728
O projeto do novo escritório da ACESITA foi realizado mediante concurso, no qual venceu um escritório do Rio de
Janeiro, mas a construção ficou a cargo da empresa.
729
Embora o clube tenha sido fundado em 1945, foi somente no final da década de 1960 que deixou de ser dedicado
exclusivamente ao futebol, com a abertura da venda de cotas subsidiando a construção da sede campestre, situada no local
designado por Romeu Duffles para o clube, porém com projeto de autoria de José Luiz Batista (a única coincidência é a
posição do campo de futebol) (Assim nasceu o AEC, s.d.).
241
uma direta relação forma-função. Para José Luiz Batista, no Colégio Monsenhor Rafael merece
destaque o cuidado com a insolação, pois nem as salas de aula nem as da administração deveriam
receber nenhuma insolação direta, de modo que projetou todas voltadas para o sul e propôs combogós
para proteger a face norte; no edifício Pioneiros, ele ressalta a racionalidade do programa
730
, que busca
mesmo na padronização inicial dar margem para adaptações às necessidades individuais de cada
família sem que isso implique em gastos vultuosos, indicando a reversibilidade do quarto de
empregada em área social e a liberação do piso térreo para estacionamento possibilitada pela utilização
de pilotis; os pilotis também aparecem como elementos importantes na sede do sindicato, com o térreo
surgindo como espaço democrático a partir do qual se acessa o pavimento superior, com os escritórios
e consultórios, e se abre o salão de reuniões que, semi-enterrado, tem sua capacidade inicial de 150
pessoas grandemente ampliada
731
; já no clube, o grande balanço da marquise é que se sobressai; ela é o
elemento cuja beleza está na potencialidade da tecnologia em satisfazer as necessidades do homem, é
o exemplo mais acabado de como o conhecimento técnico da engenharia deve servir ao desenho
arquitetônico, fazendo com que cada viga, cada apoio de pilar ultrapasse suas funções estruturais
732
para constituírem-se em aclamações às potencialidades do concreto e em atestados da capacidade
técnica de seus idealizadores e construtores.
Talvez tenha sido exatamente este cuidado com a construção que, com o início da Segunda Expansão,
em 1972, levou a ACESITA a transferi-lo para a área industrial, onde permaneceu até sair da empresa
em 1977. Assim, apesar da intensificação do volume de obras civis e urbanas, a responsabilidade
sobre o Departamento de Urbanismo passou para seu assistente, o engenheiro mecânico Fernando
Sena, o que não significou que sua atuação sobre a cidade havia-se reduzido à área industrial, pois
além de se ter constituído na principal referência de Fernando Sena, continuou trabalhando como
autônomo e nas prefeituras, datando deste período os projetos do Sindicato dos Metalúrgicos, do
ACESITA Esporte Clube e da Prefeitura de Coronel Fabriciano
733
, além de alguns projetos de
residências.
Somente com a saída da ACESITA, no entanto, lhe foi possível iniciar a atividade de empreendedor.
Foi quando fez um acordo com a empresa, que lhe vendeu o terreno, e com a soma do dinheiro reunido
devido às longas jornadas diárias e ao fundo de garantia
734
construiu o Conjunto Comercial 31 de
Outubro. Nesse edifício, José Luiz Batista chama a atenção para o aproveitamento do pavimento
superior, que avança três metros sobre a calçada frontal, permitindo que ao longo da galeria inferior
730
Este aqui é um projeto de apartamento de dois quartos, para família recém casada, tem quartos, banheiro e quarto de
empregada reversível para a parte social, com uma porta que dava também para o corredor íntimo.”
731
No pavimento de cima, sobre pilotis, funcionava consultório médico, dentário e tudo mais. Aqui nessa parte eu fiz o
salão de reuniões e ele se estendia pra cá, para a parte livre, então deu para comportar 150-200, ficando o resto livre.
732
Respectivamente de liberação do espaço e de brise.
733
No edifício sede da Prefeitura de Coronel Fabriciano destaca-se a independência da estrutura de concreto, tornada
evidente pelo afastamento dos pilares frontais da fachada. A ausência de revestimento, com o emprego de concreto e tijolo
aparente, e do alinhamento vertical dos panos de vidro, são elementos que, além de externar suas funções, indicam sua
confiança nesses materiais e o domínio de seu manuseio.
734
Ai fui juntando dinheiro para comprar a fazenda, cheguei a ter muito garrote, muito boi. Então, quando eu saí da
companhia fiz um acordo, ela me vendeu o terreno e com o dinheiro (fundo de garantia) e a venda dos bezerros, deu para
fazer a obra.
242
uma loggia proteja os transeuntes do sol e da chuva. Na parte posterior do edifício, um esquema
semelhante se repete, integrando a galeria aberta à pequena praça que se organiza no miolo da quadra.
No entanto, é a estrutura de concreto aparente que parece lhe ter proporcionado maior satisfação,
levando-o a deixar sua assinatura gravada em baixo relevo no pilar central
735
.
Mas se na região esse foi seu projeto de maior porte, ao retornar para Belo Horizonte montou uma
firma com o sobrinho, construindo cinco edifícios
736
. Eram edifícios de apartamentos, de três a oito
pavimentos, localizados em bairros não muito distantes do centro de Belo Horizonte, que foram
projetados respeitando a relação forma-função, seja no programa, seja no emprego dos materiais, de tal
modo que a utilidade dos cômodos e a diferenciação dos materiais e suas funções, estruturais ou não,
se evidenciam no jogo de volumes e cores das fachadas.
Nas palavras do próprio autor:
Uma coisa que eu considero muito importante em arquitetura é você distinguir os volumes, cada volume tem
seu ‘desígnio’, não se parte um volume ou cômodo com estrutura ou com acabamento. Assim, você vê, só
pode mudar na aresta, onde começa um acabamento. Aqui você não pode partir, mas tem que partir num
ângulo de 90 graus, porque senão desmonta o volume, descaracteriza o volume... Eu gosto muito de jogar
com estes volumes.
Assim, no contexto geral de suas obras e discurso, destaca-se a paixão pelo processo construtivo e pela
tecnologia, ou seja, pela engenharia como disciplina e como profissão. Paixão que, mesmo tentando
negar, ao dizer-se grato a “... Niemeyer e outros que lutavam para acabar com o título engenheiro-
arquiteto e ficar só arquiteto...”, que às vezes gostava de “... formar uma elite, ficar separado da maré
de engenheiros mecânicos, hidráulicos, civis e não sei mais o quê”, transparece no cuidado e precisão
com que trata o projeto, com que chama a atenção para a racionalidade das estruturas, cuida da
insolação, da funcionalidade dos espaços e da atenção que dispensa aos pormenores dos
revestimentos. Que, no jogo entre o lembrar e o esquecer, revela-se quando o tom da voz aumenta e o
discurso flui com facilidade ao mencionar a importância da geometria, com a qual aprendera a brincar;
os colegas da escola de Belo Horizonte, cujos nomes esquecera, embora lembre-se de que “...eram
todos ligados a construção, ... e [que havia] alguns caras bons de serviço”; na descrição detalhada do
ponto de apoio das vigas do Clube e no branco das datas dos projetos; na recordação do nome de um
único professor, o de matemática e mecânica, a pouca referência aos bairros que projetara em oposição
à clareza com que reproduz o raciocínio que seguira para definir a divisão interna de alguns edifícios,
ou ainda pela própria descrição que faz de suas atividades:
...no meu caso era só mais construir, projeto e construção, variava, mas convergia. Para que dar para o
engenheiro construir, eu mesmo construo! (...) Lá na ACESITA
737
era assim, eu fazia o projeto, pegava o
projeto aprovado e fazia o contrato de responsabilidade técnica pela obra, o proprietário ia lá e contratava
735
É num dos pilares, no pilar central, eu colei o isopor com muito cuidado, e fiz o concreto com pouca brita, mais um
caldo, né?! Para não machucar...”.
736
Embora o entrevistado sempre saliente que assumiu a responsabilidade técnica sobre as obras que construiu, no CREA
estão registradas somente as ARTs (Anotações de Responsabilidade Técnica) da reforma de 1 metro quadrado no edifício
em que reside em Belo Horizonte e dois projetos arquitetônicos em Timóteo, ambos no bairro dos Funcionários, sendo um
de 2.156 m
2
na R. 95 n
o
20, de 1994, e outro na Av. Juscelino Kubitchek n
o
75, com 356 m
2
, de 1985. Cabe notar, contudo,
que somente em 1955 instituiu-se a ART, sendo que seu recolhimento passou a ser obrigatório somente a partir de 1967 e
que o acervo pesquisado (informatizado) inclui dados de 1984 em diante (consulta CREA-BH).
737
Como grande parte dos moradores, o arquiteto José Luiz Batista não faz distinção, também, entre ACESITA e Timóteo,
tornando muitas de suas falas ambíguas. Nesse momento ele se refere aos projetos particulares que realizou na cidade;
portanto, ACESITA é, na verdade, Timóteo.
243
os pedreiros e a turma toda, mas eu era o responsável pela obra.
É, portanto, por sua fome de construir, cuidado com os detalhes, paixão pela tecnologia, características
tão caras à Engenharia, que se considera “José Luiz Batista, um arquiteto na pele de engenheiro”.
244
N
N
N
Fig. 259-260: A localização dos
bairros e o bairro Primavera em
2007
(base P
REFEITURA MUNICIPAL DE
TIMÓTEO; GOOGLEARTH)
0 296m
N
Fig. 268-270: As sedes
do ACESITA
Esporte Clube e do
do sindicato de
Timóteo e o Colégio
Macedo Soares
(ACESITA ESPORTE
CLUBE, s.d.; AUTORA,
2002, 2004)
0 296m
N
Fig. 262--267: Projetos
particulares de reforma e
residências
(acervo pessoal J
OSÉ LUIZ
BATISTA; AUTORA, 2002)
Fig. 261:
O prédio da Prefeitura
Municipal de Coronel Fabriciano
(acervo pessoal J
OSÉ LUIZ BATISTA)
Fig. 258:
O bairro Serenata em 2007.
(G
OOGLEARTH)
N
245
Fig. 276-278: Edifícios construído como empreendedor em Belo Horizonte
(acervo pessoal JOSÉ LUIZ BATISTA)
N
Fig. 271: O edifício Pioneiros
(
AUTORAS, 2002)
N
Fig. 273-275: O Conjunto Comercial 31 de Outubro e detalhes
da circulação e externa e a assinatura no autor estampada no
concreto.
(AUTORA, 2002)
N
Fig. 272: Vista noroeste do
Centro Norte.
(
AUTORA, 2005)
0 296m
N
246
V.1.3 FERNANDO SENA: UM ENGENHEIRO EM PELE DE ARQUITETO
738
A trajetória de Fernando Sena na ACESITA inicia-se em 1967
739
, quando aos 16 anos e com
habilidade para desenho, foi trabalhar como contínuo na Divisão de Urbanização
740
, chefiada por José
Luiz Batista. Por intermédio do trabalho com José Luiz Batista, travou conhecimento com o universo
da arquitetura e se apaixonou por ela.
Quando fui trabalhar na ACESITA já tinha uma queda muito grande para projeto, eu era projetista, mas na
área industrial, mecânica, montagem, essas coisas. Aí, ... com a chegada de um arquiteto fiquei muito
impressionado. Quando surgiu a chance, que a cidade foi aberta, a empresa começou a vender as casas aos
funcionários, e a cidade estava começando a desgarrar dela nessa área urbana, eles me chamaram, ....
Então eu fui trabalhando muito em projeto arquitetônico com ele, naquele início da abertura da cidade, eu
tive como se fosse um curso de arquitetura. Trabalhando com um arquiteto e sendo o braço direito dele, eu
peguei prática, trejeito de arquitetura e urbanismo...
Contudo, embora sonhasse em estudar arquitetura, a ausência deste curso nas redondezas levou-o a
ingressar em Engenharia Mecânica, em Governador Valadares, para onde se dirigia todas as noites
após o trabalho.
Veja só como eu era deslocado, totalmente deslocado, estudando engenharia mecânica! Mas meu sonho era
o seguinte: para não perder tempo, eu tinha que fazer engenharia, assim dava tempo de vir a engenharia
civil, mas a engenharia civil não veio...
741
Mesmo acabando por se formar engenheiro mecânico, ele nunca perdeu a afinidade e interesse pela
arquitetura e, principalmente, pelo urbanismo. Interesse que alimentava com a leitura da revista
Acrópole
742
, e que fez com que, no início da segunda expansão da usina (1972), quando José Luiz
Batista foi transferido para coordenar os trabalhos de reestruturação da usina, ele ficasse responsável
pelos projetos e construção de moradias para os novos funcionários, função que exerceu até sua
retirada da empresa em 1996. Essa mudança lhe acarretou grandes responsabilidades, ampliadas ainda
mais pela ligação afetiva com o local e pela falta de formação, mas que assumiu com muita seriedade,
Segundo suas palavras:
... eu tive que assumir muita coisa depois que o José Luiz Batista saiu da área de urbanismo e foi para a
usina, ...
Foi no início da década de 1970, quando foi a primeira grande expansão da ACESITA
743
e
eles sentiram a necessidade de trazer um aspecto humano para dentro da usina. Então eu
fiquei prematuramente com esta responsabilidade. Foi uma responsabilidade muito grande, a
gente tinha muita vontade, mas não formação. E como eu era nascido lá, eu tinha uma
ligação afetiva, temia muito tomar uma decisão, então eu pesquisava muito, muito, muito.
Teve um lado bom da responsabilidade, tinha que fazer tudo, [pois] eu posso não ser bom,
738
As informações referentes ao engenheiro Fernando Sena Canto fundamentam-se em entrevista realizada em Volta
Redonda – RJ, em 22 de abril de 2002.
739
Natural de Timóteo, Fernando Sena viveu o período de formação da cidade, presenciou suas mais marcantes
transformações.C do tempo de menino, descreve como a mãe conservava a carne na banha de porco e preparava o
champanhe caseira de abacaxi; como ele e os irmãos cuidavam do pomar, da horta, das galinhas, porcos e da cabrita,
criações que eram periodicamente fiscalizadas pela companhia.
740
Setor de Urbanismo, Divisão de Urbanização, Sessão de Urbanização, Setor de Arquitetura e Urbanismo, etc., foram
nomes que a área que cuidava da construção de novos bairros, casas e edifícios da cidade da empresa recebeu ao longo do
tempo, e que Fernando Sena, embora se lembrasse dos nomes, não soube ordená-los cronologicamente.
741
Suas expectativas estavam na prometida implantação de um curso de Engenharia Civil que, embora não fosse a mesma
coisa que a arquitetura, pelo menos se aproximava mais de seu trabalho.
742
Ele (José Luiz Batista) tinha muito, ele assinava, não sei se você conheça, a Acrópole, o fino da arquitetura, era o
máximo.”
743
Embora se trate de uma complementação da primeira expansão, equiparando a capacidade da aciaria com a da laminação,
considera-se que a primeira foi concluída em 1963, sendo esta referente ao segundo grande projeto de expansão da usina
(vide capítulo IV).
247
mas posso me assessorar e cobrar ajuda. A empresa nos treinou muito bem, tinham cursos de
orientação sobre como tomar decisões, como negociar, a gente fazia uns 4 a 5 cursos por ano.
Assim, confiando na experiência adquirida no período anterior, na capacidade gerencial aprendida nos
cursos anuais e sua inata sensibilidade arquitetônica e urbanística, o pouco preparo foi compensado
por muita vontade, fazendo com que Fernando Sena descrevesse da seguinte forma seu trabalho no
Setor de Urbanismo:
Nos 29 anos em que trabalhei numa estatal (ACESITA), nunca tive mordomia nenhuma. Eram mais ou menos
9 pessoas [no departamento de urbanismo]: eu, um topógrafo, 3 ajudantes, uma secretária e 2 ou 3 outros
elementos, para construir 18 bairros. Projetávamos, construíamos e tudo mais. Então o meu trajeto na
empresa foi maravilhoso, porque eu vi tudo começar na ACESITA, é muito gostoso, sabe?! Você projetar,
fiscalizar e entregar a casa, é como a mulher ao dar a luz!
Trabalho que ganhou importância com a aprovação dos financiamentos para a Segunda Expansão, pois
a contínua atuação da ACESITA
744
havia frustrado suas próprias expectativas de formação de um
mercado imobiliário capaz de suprir a demanda por habitação após a abertura da cidade (1968),
obrigando a empresa a voltar a construir novos bairros e casas, só que a partir de então contando com
financiamentos de órgãos governamentais, como COHAB e BNH. Assim, partindo da análise dos
levantamentos quanto à “necessidade habitacional” dos empregados, feitos pela Superintendência de
Pessoal e Social, posteriormente pela DI (Divisão Imobiliária), iniciava-se seu planejamento
745
:
... a partir disso, eles [BNH e COHAB] determinavam o valor do FUNDEP[sic]
746
e eu começava a
pesquisar que terreno poderia utilizar. Se poderia ser um terreno mais plano, ou mais ‘morrado’, se poderia
ser aterrado, etc., tudo conforme o que os empregados poderiam pagar de financiamento. Se fosse de 0 a 10
salários mínimos teria que ser um bairro plano, para ter o mínimo gasto possível com infra-estrutura.
De tal modo que:
... as construções novas estavam mais voltadas para custo, porque a casa tinha que ficar adequada com os
preços, conforme as faixas [de salário] das pessoas que iam morar. Já não era mais construir casas para
alugar, era para vender.
No entanto, a necessidade de padronização dos projetos residenciais a fim de reduzir os preços da
construção, seria combatida pelos funcionários, principalmente
... alguns funcionários de nível superior que se rebelaram e fizeram movimento dentro da empresa, (...) Eles
diziam que não queriam comprar casa, queriam fazer a nossa própria casa, para poder personalizar. Aí
tentamos, modificar um pouco, (...) num loteamento que tinha umas trinta casas se fazia 3 ou 4 plantas
diferentes, mudava a fachada e pronto. Mas ficava muito artificial, porque na verdade não mudava nada. Aí
nós chegamos a conclusão que o bom mesmo era vender o lote. Era bom para a empresa, para o empregado,
era bom para todo mundo, mas o governo não deixava, não existia financiamento, era complicado.
Impasse que seria resolvido somente quando, após ter tentado, e fracassado, obter financiamento de
outros órgãos
747
, a própria ACESITA financiou o loteamento do bairro Timirim do Alto.
Dentre os dezoito bairros construídos neste período, ele destaca o Novo Horizonte, Vale Verde,
Serenata e Recanto, sendo este último o que considera ideal, dizendo: “Minha imaginação está toda
neste bairro. Este bairro é tudo que eu sonhei! Tudo! Ele tem área de lazer e sobra espaço para você
fazer piscina” , conquistas que associa à verticalização, pois ela possibilitou que o bairro “...
744
Fernando Sena comenta que, após 1975, a empresa não tinha mais fôlego para continuar a construir na cidade, passando
por um período de “vacas magras”, permanecendo de dois a três anos sem construir nenhum bairro novo.
745
... a imobiliária pesquisava e perguntava: como você quer essa pesquisa? E eu falava: preciso [do número de
funcionários interessados] na faixa de poder aquisitivo de zero a 3 salários, de 3,1 a 5, (...) por causa dos financiamentos
do BNH e das COHABs.”
746
Na verdade, ele se refere ao valor que seria financiado pelo BNH, não ao FUNDEP (Fundação de Desenvolvimento da
Pesquisa).
747
Somente a partir de 1975 com a aprovação do PROFILURB (Programa de Financiamento de Lotes Urbanizados), que o
governo passou a financiar a compra de lotes pelos trabalhadores (F
INEP GAP, 1985).
248
continuasse praticamente do mesmo tamanho, tendo mais área disponível para as crianças brincarem,
para passear e muito mais verde”.
Assim, os sobrados e edifícios que compõem o bairro, localizado em meio à vegetação do morro que
separa o córrego do Caçador e o ribeirão do Timóteo, aparecem para Fernando Sena como a
concretização de um sonho que Brasília não foi capaz de realizar, porque para ele esta sempre foi sua
principal inspiração, a referência que chegou com mais força:
O que chegou muito para nós, bem no início foi Brasília. Brasília foi o exemplo de tudo que eu estou te
falando, talvez eu tenha tirado tudo dela. ... Eu nem sei, foi inconsciente. Por quê? Porque foi uma cidade
projetada para o futuro. Hoje eu sei que está um caos, que teve muitos problemas, mas ele projetou as
avenidas o mais para frente possível, né? E as quadras!, eu via aquelas quadras todas, sem nada, para o
futuro! Aí eu via Timóteo, mal comparando,Timóteo tinha quadras vazias também, mas eu via que não tava
legal aquilo, as ruas todas dos bairros da mesma largura, sem uma hierarquia...
Cuidado com o futuro que para ele significava o enaltecimento do planejamento como ferramenta
essencial ao processo de concepção dos novos bairros e cujo valor buscou incutir nos moradores,
promovendo reuniões anteriores à entrega das casas
748
e entregando junto com as chaves pequenos
“manuais” que, além das plantas de hidráulica, elétrica e de arquitetura, continham uma sugestão de
ampliação
749
.
Contudo, das lições tiradas de Brasília, a verticalização parece ter sido uma das últimas incorporadas,
pois a tradição de horizontalidade das casas isoladas em lotes com frentes generosas ainda está
presente em bairros como Novo Horizonte de 1982 e Alphaville de 1994
750
. Assim, mesmo
maravilhado com as possibilidades arquitetônicas e urbanísticas descortinadas pelo projeto de Lúcio
Costa e Oscar Niemeyer, a leitura que fez de Brasília não se fundamentou na transcrição dos padrões
aí propostos, parecendo mais uma conseqüência da leitura do texto de Jorge Wilheim sobre a cidade,
publicado na revista Acrópole, em 1960, e reimpresso em 1970. Nesta edição especial, ao contrário do
uníssono ufanista de Eduardo K
NEESE (1970)
751
, o artigo de Jorge WILHEIM
752
(1970: 32) prima pelo
tom crítico apontando tanto os erros como o que considera os acertos no projeto e execução da nova
capital. Dentre os erros, ele destaca o caráter fechado do projeto de Lúcio Costa e da maioria dos
748
Aí eu chamava as meninas do trabalho social e falava que o bairro já está sendo construído e precisava decidir quem ia
[ter direito a uma casa]. Definindo quem eram estas pessoas, eram escolhidos os lotes, as casas que iam ficar. Então, eu
quero que vocês façam uma exposição para grupos de 30 pessoas, para ir começando a conscientizar... a intenção era
puxar neles o planejamento, o valor do planejamento. Quem sabe daí vai valorizar os arquitetos também, o pessoal do
projeto... está tudo neste contexto aí.
749
O primeiro bairro que foi entregue junto com o referido manual foi o Novo Horizonte e, embora não tenha sido possível
verificar em quais outros isto ocorreu, o manual do Alphaville demonstra que esta experiência deve te-se repetido, dada a
evolução que se nota neste último. O manual do Alphaville, além dos projetos e plantas acima referidos, contém
informações sobre os métodos construtivos e materiais empregados, com objetivo de esclarecer os proprietários quanto às
garantias e responsabilidades assumidas por cada uma das partes na manutenção do imóvel (ACESITA, 1995).
750
Embora neste último a justificativa seja o pretendido alto padrão do loteamento, os lotes mantêm a tradicional frente de 12
m com 30 m de profundidade.
751
O tom ufanista do artigo de Eduardo KNEESE (1970: 09) se deve à ênfase no deslocamento da capital, de modo que por
meio do retrospecto de todos os momentos em que a transferência da capital para o interior do país havia sido pensada, ele
vê sua inauguração como um marco de maturidade do país que, finalmente, é capaz de cumprir com suas metas, executar
seus planos, pois como diz já no início: “Não admitem mais empirismos. ...Vivemos a era do planejamento. Tudo que
fazemos deve ter o seu ‘porquê’. O ‘porquê’ humano e social. O ‘porquê’ técnico e artístico. O ‘porquê’ econômico. O
‘porquê’ estratégico. Brasília é uma cidade planejada”.
752
Vale salientar que Jorge Wilheim também participou do concurso, com seu projeto sendo classificado em quinto lugar. No
texto publicado em 1970, no entanto, “Brasília 1970: um roteiro”, ele parece ver a nova capital com novos olhos fechando
o artigo com uma nota bem mais otimista: “Deixamos assim Brasília 1970, uma cidade planejada objetivando condições
urbanas para uma vida feliz de seus habitantes. Isto, senhores leitores, talvez venha a acontecer...” (W
ILHEIM, 1970a:
130).
249
demais concorrentes, que, sem margem para adequações do corpo social ao espaço proposto, “...
idealizaram Brasília como gesto, fruto da decisão do homem, cidade que recriaria sua região”, tese
que não lhe parece válida, pois “... acarreta uma forçosa negligência pelos fatores sociais e
econômicos que dão vida à cidade
753
.
Esses fatores, na visão de Fernando Sena, eram determinantes do sucesso de uma cidade, e a
preocupação da empresa com a construção de praças, escolas e jardins, compatibilizando os interesses
da comunidade com seus próprios, permitia-lhe satisfazer ambas sem ferir seus sentimentos de
responsabilidade para com cada uma delas.
Uma vez que o relacionamento com a empresa foi muito bom, sempre marcado por uma “...
convivência maravilhosa, uma coisa muito boa mesmo!”, sua saída em 1996, poucos anos após a
privatização (1992), acabou sendo por ele considerada “catastrófica”. Isto se deveu não somente ao
fato de ter assistido ao desespero de alguns colegas
754
, nem à mágoa pelas possíveis desavenças dos
últimos momentos de trabalho, mas à dor do afastamento de uma atividade conduzida desde a
adolescência e que lhe permitira desenvolver uma sensibilidade diversa da de engenheiro:
... é uma sensibilidade que falta para a engenharia, [porque] a sensibilidade de um engenheiro civil para
achar uma solução estrutural é uma coisa, ele fecha os olhos e vê a viga trabalhando na veia, como se fosse
um coração que está lá dentro, ele sabe, ele tem essa visão. O arquiteto da mesma forma, ele fecha os olhos e
vê onde colocar cada cômodo, é uma sensibilidade diferente, (...) onde o mais importante é ter a
sensibilidade de analisar socialmente o urbanismo, ver para onde tem que ir a cidade, qual avenida tem que
ficar ou tem que mudar. ... O urbanista não trabalha com o presente, ele trabalha com o futuro, ele é o
planejador, ele só trabalha com o futuro, não é como o engenheiro civil que tem que construir e cuidar para
não cair.
Em sua fala, portanto, sensibilidade social confunde-se com responsabilidade social, traduzida no
cuidado com o futuro da cidade e da sociedade que nela terá de habitar. Responsabilidade que os
arquitetos e urbanistas modernos, crendo na capacidade do meio de formar o indivíduo, iriam chamar
para si, fazendo de Fernando Sena um “engenheiro em pele de arquiteto”.
753
Mais à frente ele esclarece: “Voltando às costas para os possíveis fatores sócio-econômicos determinantes, Costa deve
ter no entanto intuído que eles não modificariam o caráter e a forma resultante dum gesto arbitrário: uma capital
implantada, toda pronta, concebida como uma unidade, expressando claramente seu caráter político. Tais propósitos só
poderiam subsistir através dum plano formalmente rígido e duma disciplina subseqüente: um plano fechado.” (W
ILHEIM,
1970a: 39)
754
Contando que “... teve colegas que entraram em parafuso, uma coisa horrenda! Uns ameaçaram se suicidar, uns
morreram mesmo e outros começaram a ter doença de pele que não tinha explicação”.
250
N
N
N
Fig. 282: O manual do proprietário para o bairro do Novo Horizonte.
(acervo pessoal F
ERANDO SENA; ACESITA)
N
Fig. 280-281: A localização dos bairros e
o Novo Horizonte.
(P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO.
GOOGLEARTHs.d.;)
Fig. 279:
O bairro Recanto
(GOOGLEARTH)
251
V.1.4 O DESENHO DA CIDADE DE TIMÓTEO: UM DESTINO E SEUS PROJETOS
Analisando o papel dos profissionais da cidade contratados pela ACESITA para desenhá-la, observa-
se que nem tudo o que foi construído corresponde ao que foi projetado e, algumas vezes, mesmo os
projetos parecem não coincidir com o ideal a partir do qual foram concebidos, apontando para dois
níveis de distinção: entre o construído e o projetado e entre o projetado e o idealizado.
Esta distinção é mais patente no trabalho de Romeu Duffles Teixeira, cujo memorial possibilita
apontar algumas diferenças entre a cidade imaginada e a projetada. Assim, se o ideal de Romeu
Duffles era a cidade jardim de Howard, mesmo levando em conta as transformações que sua
acomodação a um sítio real implicaria, como as que Parker e Unwin enfrentaram em Letchworth e
Soisson em Welwyn, os pontos de contato entre o ideal de Howard e o projeto de Duffles são poucos.
Consistem basicamente na integração da natureza ao espaço urbano através da grande avenida parque,
da arborização das ruas (bulevares) e sua utilização como elemento limitador do perímetro urbano.
Além disso, admitindo-se Letchworth e Welwyn como modelos, o respeito à topografia e à escala
humana no dimensionamento dos percursos também pode ser incluído.
Tomando como referência o principal elemento que aproxima o esquema que se abstrai do projeto de
Duffles ao esquema proposto por Howard, a grande avenida parque, nota-se que em ambos ele se
constitui em elemento estruturador do sistema viário e de ligação entre áreas residenciais, servindo
também de abrigo para algumas atividades comerciais – em Howard, a grande galeria, e em Duffles,
os centros de bairro.
Convém lembrar, todavia, que enquanto Howard pensava numa organização radio-concêntrica,
Duffles projetou uma cidade marcada pela linearidade
755
. Esta linearidade, no entanto, não se
concretizou na forma pensada por ele. Em vez do córrego do Timotinho, foi o ribeirão do Timóteo que
se tornou o principal eixo estruturador da cidade que, integrando-se ao centro sul e acompanhando o
surgimento e crescimento de bairros no sentido leste-oeste, como Cachoeira do Vale e Limoeiro,
tornou-se predominantemente radio-concêntrica. No entanto, isto não significa que a planta da cidade
se tenha aproximado do esquema de Ebenezer Howard, pois, tomando como referência o poder de
atração da indústria, observa-se que, enquanto no esquema howardiano domina a força centrífuga, com
a localização das indústrias na periferia de um centro que, embora por elas impulsionado, é concebido
como o foco da vida social, na Timóteo atual a força de atração é centrípeta, tendo a usina como ponto
focal a partir do qual cresce e se organiza a cidade
756
.
E, embora não seja possível uma generalização desse processo para todas as cidades empresariais,
nota-se que entre as cidades siderúrgicas estudadas um processo semelhante ocorreu em Volta
Redonda e Ipatinga
757
, nas quais a usina deixou de marcar o limite da área urbana para tornar-se seu
755
Como observado anteriormente, o esquema
756
Mesmo a presença do rio e da ferrovia, embora tenha dificultado o crescimento nesta direção, não foi capaz de impedi-lo
totalmente, provocando o crescimento de Coronel Fabriciano.
757
À exceção de João Monlevade, onde o crescimento foi empurrado para Carneirinhos, o que se pode justificar topografia ao
redor da usina, bem como pelo controle da cidade pela indústria, uma vez que mesmo as casas e bairros por ela construídos
252
centro ou ponto focal
758
, posição central que é facilitada pelo seu inconteste domínio da empresa sobre
a cidade, seja pelo controle fundiário, seja pelo emprego de grande parte da população, pois como
afirma Flávio V
ILLAÇA (1998: 238):
Um ponto só se torna centro se e quando houver o círculo. Uma capela pode preexistir em relação ao centro
de uma cidade, mas ela somente se tornará centro ou parte do centro se e quando surgir uma cidade ou
povoado em torno dela que faça dela seu centro, isto é, se vier a existir algo do que ela se torne centro.
De modo que o centro de uma cidade não é necessariamente um ponto geometricamente determinado
marcando a menor distância entre os diversos bairros, mas ele pode se tornar centro ao ser capaz de
determinar a organização de seu entorno e de estabelecer um elo cognitivo que faz dele elemento de
referência da cidade.
Assim, o que se verifica em Timóteo é que o espaço que originalmente seria o responsável por
aglutinar atividades e indivíduos, o antigo povoado (centro sul), foi sobrepujado pelo projeto industrial
que determinou a implantação de um novo centro próximo à usina. O fortalecimento desse novo centro
não arrefeceu nem mesmo após a abertura e a emancipação da cidade, quando se buscou reforçar o
centro antigo, onde foram instaladas as principais instituições políticas do município, além disso, a
tentativa de integrar ambos por intermédio da melhoria das condições de acesso e a ocupação do
percurso de ligação entre eles. Ao melhorar a acessibilidade dos moradores da porção sul da cidade ao
centro norte, acabou por reforçar a polarização existente, ampliando a área de abrangência do centro
norte em vez de valorizar o sul.
Contudo, se o plano de Romeu Duffles não foi capaz de ditar a forma com que a cidade deveria se
organizar, seu estado atual guarda algumas reminiscências daquilo que projetou, pois se, por um lado,
a idéia da grande avenida parque foi completamente abandonada, com os cursos d’água desaparecendo
nos fundos dos lotes em vez de comporem a paisagem das avenidas parque que os ladeavam; por
outro, a localização de edifícios importantes para a comunidade como o hospital, a igreja matriz e o
clube foi mantida. Permanência que causa estranheza, uma vez que foram localizados no espaço que se
pretendia constituir como centro da cidade operária, mas cuja natureza mudou, já que o centro foi
completamente transferido para uma área mais próxima da usina.
Sobre a causa desta transferência, não se obteve nenhuma resposta oficial
759
, mas acredita-se que ela
não foi espontânea, e sim relacionada à tentativa de garantir maior isolamento do operariado,
preservam ainda hoje as mesmas feições de quando foram edificados. Já em Ouro Branco, como se pode verificar no
capítulo três, o superdimensionamento da cidade, a alteração da política da empresa, incentivando a comutação em vez da
construção de habitações, reduziu a pressão de crescimento da cidade, o que, somado à posse de quase todo o entorno da
cidade operária pela indústria, evitou a ocorrência de um processo semelhante nesta cidade.
758
Em Timóteo, portanto, a indústria se constitui no ponto para o qual converge a malha viária, cuja organização somente
não fecha o círculo devido à presença do rio. No entanto, considerando-se o crescimento de Coronel Fabriciano como
decorrente da presença da ACESITA, sua circunferência se completa e o esquema se aproxima ao de Letchworth e
Welwyn, com o ramal ferroviário deixando a periferia da cidade para atravessá-la a fim de ligar as áreas industriais.
759
Embora a localização do projeto de Romeu Duffles tenha sido relativamente tardia, dúvidas quanto à autoria e data do
projeto da área central norte foram feitas desde os primeiros momentos da pesquisa, sem que se obtivesse qualquer
resposta mais elucidativa. Para o sr. Fausto D’Ávila, por exemplo, ele foi projetado pelo ssr. Alderico Rodrigues, assim
como o restante da cidade. Já a maior parte dos entrevistados afirmou não saber nada a respeito da autoria do projeto,
sendo poucos que conseguiram apontar alguma data para as edificações; recordavam somente que, embora o traçado das
ruas já existisse há muito tempo, elas não eram pavimentadas, e algumas das quadras estavam ocupadas com habitações
provisórias.
253
significando o controle da força de trabalho com relação aos bairros “livres”, como o povoado de
Timóteo e o próprio Timirim, que é descrito por Nazareno A
TAÍDE (1986: 217) como: “... uma ilha de
propriedade particular, cercada pelas terras já compradas pela ACESITA”, e ainda é lembrado pela
população como “Timirim das Cachaças”, porque aí era possível se embebedar
760
. Assim, na porção
de terreno onde Romeu Duffles projetara o centro, foram erguidos os bairros residenciais Timirim,
Olaria e, posteriormente, Novo Horizonte, que, apesar de mudanças significativas no desenho e na
função, continuaram a abrigar o hospital, a igreja matriz, o clube e, com razoável aproximação, até
mesmo as praças e o centro comercial desses bairros. Mantendo esses edifícios e auxiliado por sua
localização intermediária entre o centro norte e sul, mesmo tendo perdido a condição de centro
principal, o bairro do Timirim se constitui num importante centro secundário.
O dimensionamento dos lotes, com frentes largas e recuos frontal, lateral de fundos e o perfil das ruas,
com uma faixa pavimentada seguida de uma gramada e arborizada até o meio-fio, também são
elementos do projeto de Romeu Duffles Teixeira, que permaneceram inalterados até a década de 1960.
Esta permanência, ao mesmo tempo em que possibilitou a construção de vias amplas e arborizadas,
também foi responsável pela dificuldade de se definir uma hierarquia viária capaz de colaborar na
organização do tráfego da cidade, pois mesmo as ruas internas dos bairros mais antigos como
Técnicos, Quitandinha, Timirim e Olaria, além do Bromélias e Funcionários, possuem perfis muito
semelhantes aos das periféricas, que no projeto original deveriam ser as avenidas parque.
No entanto, se a organização geral da cidade foi transformada pela supressão de seu principal
elemento estruturador, as avenidas parque, o esquema de organização do centro proposto por Romeu
Duffles parece ter sido transferido para sua nova localização próxima à usina. Embora haja dúvidas
quanto à autoria do projeto dessa área
761
, a atual Avenida 31 de Outubro, com sua pista dupla e amplo
canteiro central, ao servir como eixo visual e elemento estruturador da malha viária, remete
diretamente à avenida do projeto de 1953. Já a arquitetura moderna dos edifícios, com tetos planos e
pilotis determinando percursos sombreados e um espaço público mais permeável ao pedestre, embora
já esteja presente no edifício que hoje abriga a farmácia da ASSOCIA, tomou forma somente a partir
de meados da década de 1960
762
, quando os demais edifícios foram construídos, não havendo indícios
de nenhuma participação de Romeu Duffles na sua elaboração, de modo que as principais marcas de
modernidade que este engenheiro tentou imprimir na cidade foram profundamente retocadas; o
destino, aqui representado pela indústria e seus proponentes, não poupou esforços para retocar seus
traços, reconhecível somente em alguns bairros e em elementos isolados.
760
Uma vez que nas demais direções, ou não havia nenhum tipo de ocupação, como a leste e oeste, ou o rio aparecia como
uma barreira de mais difícil transposição, devendo-se recordar que a principal zona de prostituição da região até
aproximadamente a década de 1960 situava-se em Coronel Fabriciano.
761
A planta desta área foi obtida junto à ACESITA e data de 1991, mas ela não consta nos projetos de Romeu Duffles, e José
Luiz Batista diz não ter participado dele, lembrando que as ruas já existiam quando chegou à cidade, o que parece
confirmar a opinião do senhor Fausto D’ Ávila, de que foi projetada por Alderico Rodrigues (vide nota 760)
762
Uma perspectiva geral, com edifícios idênticos de tetos planos e pilotis foi apresentada no Relatório 1965 (1966), mas
embora guardem alguma semelhança quanto à sua disposição e organização funcional com o que foi construído, as
diferenças arquitetônicas com relação aos blocos comerciais existentes indicam que não foi exatamente este o projeto
implantado.
254
A presença de José Luiz Batista na companhia significou que, pela primeira vez em sua história, a
construção da cidade foi conduzida por um profissional especialmente treinado para fazê-lo; mais do
que isso, foi por intermédio dele que chegou a Timóteo a noção e a prática da legislação urbana como
instrumento de ordenação da cidade. O trabalho concomitante na empresa e nas prefeituras locais
(Timóteo e Coronel Fabriciano) fez de José Luiz Batista um dos principais responsáveis por sua
implantação, pois mesmo após a abertura da cidade e sua emancipação, foi somente na década de 1980
que se elaborou um código de edificações (Lei n
o
736 de 1980), de modo que ao realizar projetos tanto
para a ACESITA quanto para particulares, além de ser o responsável por fiscalizar outros projetos nas
duas prefeituras, foi sua visão que determinou os parâmetros para as construções de Timóteo por quase
vinte anos. Assim, mesmo não tendo participado da elaboração de uma legislação urbana municipal,
sua atuação fundamentada no código de obras de Belo Horizonte guiou tanto seus próprios projetos
como projetos alheios submetidos à aprovação dos órgãos municipais onde trabalhou, o que significou
uma preocupação com a contenção de abusos, impedindo que, com a abertura da cidade, não se
passasse de uma condição de extrema regulação pela empresa, para uma de completo descaso e, desse
modo, a cidade rapidamente se descaracterizasse.
Outra importante contribuição de José Luiz Batista para a composição da paisagem urbana de Timóteo
é a fixação de uma concepção arquitetônica moderna, ou seja, o uso de elementos arquitetônicos e
materiais a ela associados. Embora não tenha participado dos projetos dos conjuntos comerciais que
abrigam a farmácia da ASSOCIA, o Colégio Dom Bosco e o antigo Cine Marabá, com seus
combogós, tetos planos e pilotis, ele projetou e construiu outros edifícios que, com a mesma
linguagem, marcam a paisagem da cidade, tais como o Colégio Monsenhor Rafael, o Sindicato, o
edifício Pioneiros e o conjunto 31 de Outubro. Desse modo, pode-se afirmar que, se Batista não foi o
responsável por introduzir a estética moderna em Timóteo, colaborou de forma decisiva na
configuração de uma paisagem que a tem como referência, imprimindo à cidade uma imagem de
modernidade.
Dentre os bairros que projetou, o desenho urbano do bairro Primavera merece destaque, pois nele nota-
se uma clara distinção entre as vias arteriais e locais, o que indica não somente uma organização
interna mais coerente, como também uma preocupação com sua inserção na malha urbana da cidade
como um todo, ou seja, pela primeira vez um novo bairro foi projetado considerando-se sua função no
conjunto da cidade.
Essa preocupação é que Fernando Sena iria incorporar e transformar em importante parâmetro para a
implantação de novos bairros, o que, no contexto da década de 1970, quando as cidades brasileiras
apresentavam uma forte tendência à dispersão, auxiliou a evitar uma excessiva periferização de
Timóteo.
Contudo, apesar de no discurso as preocupações urbanísticas de Fernando Sena serem as mais
ressaltadas, sua principal contribuição diz respeito ao relacionamento entre a companhia e seus
empregados-clientes na aquisição de imóveis. Esta intermediação se observa no empenho em
255
satisfazer as exigências de maior personalização das moradias por meio de alterações nas fachadas das
casas, o que, além de evitar a repetição sucessiva de um mesmo modelo, veio a minimizar a monotonia
da paisagem local distanciando Timóteo da imagem típica de uma cidade industrial e na elaboração de
um manual para os novos proprietários que, além de instruções quanto ao uso do imóvel, apresentava
uma sugestão de ampliação, constituindo-se numa tentativa de induzir outra forma de padronização, ou
de pelo menos divulgar o que se considerava o mais adequado para a habitação dos funcionários.
Observa-se, portanto, que em Timóteo como em outras cidades siderúrgicas não foi somente a
qualidade intrínseca aos projetos que determinou as formas da cidade, já que esta estava subordinada
aos interesses da indústria, mas também a indústria não foi a única mão que alterou os destinos da
cidade, pois, ao apropriar-se ou não de edifícios e espaços, a população local foi e ainda é quem
reforçava ou não as intenções do plano industrial. Assim, se por um lado o abandono dos princípios
que guiavam o projeto de Romeu Duffles Teixeira demonstra o poder da fábrica, de outro, o
fortalecimento do bairro do Timirim como centro secundário mostra que ele não foi absoluto, mas
forte o bastante para por meio do traçado de ruas e edifícios ter ditado padrões de ordenação urbana e
desenho arquitetônico, determinando um modo de se viver na cidade, de vivenciar o urbano. Padrão
que se tornou tão importante a ponto de levar o poder municipal a buscar, sob a égide do discurso de
integração após a abertura da cidade, igualar os padrões urbanísticos da sede municipal aos da cidade
fabril, tido como parâmetro a ser atingido; de modo que, o que se desejava era transformar Timóteo
em ACESITA. Condição predomínio que o plebiscito da década de 1980 iria confirmar e que indica a
permanência do poder dos projetos industriais na condução dos destinos da cidade.
256
Fig. 284-286: Os esquemas gerais da estruturas urbanas propostas por Ebenezer Howard, Romeu Duffles para a
ACESITA e o da atual cidade de Timóteo
N
Centro Norte
ACESITA
centro projetado
R D ffl
Centro Sul
Ti ót
Área urbanizada no projeto de
Romeu Duffles
Fig. 283: A área do projeto e o destino da cidade de Timóteo
Área verde
Área industrial
Áreas residenciais
Áreas comerciais
Avenida parque
Centro administrativo
Parque central
Rio Piracicaba
Bulevares
257
V.2 UMA LEITURA DA PAISAGEM URBANA DE TIMÓTEO
Em “Saber ver a arquitetura”, Bruno Z
EVI (1994)
763
lamenta nossa incapacidade de entender a
arquitetura, segundo ele, oriunda da falta de hábito e de método para ler o espaço e suas
representações. Uma dificuldade da qual Philippe P
ANERAI (2006: 12) também se queixa, pois uma
vez que “... conhecer a forma das cidades e reconstruir sua história é também orientar uma maneira
de projetar.”, nossa “ignorância do fenômeno urbano”, dada pela incapacidade de interpretar o espaço
urbano, significa despreparo para projetá-lo, para intervir sobre a cidade. Levando-se em conta as três
chaves de leitura possíveis para o espaço – física, psicológica e social (S
OJA, 1993) –, é possível tentar
aqui a leitura da paisagem de Timóteo atual.
Entendida como “... conjunto de elementos naturais e artificiais, criado em tempos diferentes ..., que,
portanto, reflete as formas e o resultado final da contínua dinâmica do espaço geográfico
(V
ERVLOET, 2002: 134), a paisagem oferece no presente uma visão de passado e de futuro, o que se
deve ao fato de, embora estar fortemente vinculada ao sentido visual, sua leitura implicar na
compreensão de processos ainda em marcha. Assim, a rápida leitura que aqui se faz da paisagem
urbana de Timóteo busca entender elementos físicos, como vias, edifícios, montanhas, cursos d’água,
etc., como elementos sensíveis, tais como barreiras (limites), núcleos, percursos, marcos e setores
(L
YNCH, 1997), de modo a compor uma imagem que, embora de construção individual, seja genérica o
suficiente para permitir seu reconhecimento por todos aqueles que com ela têm alguma familiaridade.
Imagem construída a partir de levantamentos de campo, fotografias, plantas e entrevistas realizadas
durante cinco anos de pesquisas; portanto, fruto de uma vivência e sensibilidade particulares, porém
informadas teoricamente e, por isso, ao buscar identificar os elementos físicos (edifícios, monumentos,
espaços, etc.) que caracterizam Timóteo e lhe conferem uma identidade visual distinta, torna-se
comum e passível de ser partilhada, reconhecida, ou seja, objetivamente generalizada.
Para compor esta imagem, partiu-se, num primeiro momento, para a leitura da cidade como um todo,
buscando-se em seguida uma leitura mais específica de alguns de seus espaços. Assim, inicialmente,
tomou-se de empréstimo os elementos da análise de Kevin L
YNCH (1997), mas que, devido a
diferenças tanto nas características da cidade em questão quanto nos procedimentos empregados,
implicaram numa reinterpretação destes elementos
764
. Desse modo, os percursos escolhidos acabaram
763
A análise de Bruno ZEVI (1994) diz respeito à forma como a arquitetura tem sido interpretada na
literatura crítica sobre o tema, buscando mostrar que, embora ela tenha sido interpretada de diversas
formas (política, filosófico-religiosa, científica, econômico-social ou técnica, fisiopsicológica e
formalista), só mais recentemente se tem conseguido uma leitura espacial da arquitetura.
764
Dentre as diferenças destaca-se a dimensão das cidades, sendo as americanas grandes cidades. Em
2005, Nova Jersey tinha cerca de 240 mil hab., Los Angeles, 12 milhões hab., e Boston, 560 mil
hab., enquanto Timóteo não chegava a 90 mil (W
IKIPEDIA, s.d.). E embora o contexto nacional,
origem e idade, também sejam elementos de forte diferenciação entre elas e Timóteo, as principais
justificativas para a mudança na interpretação dos elementos são a escala da observação e seus
fundamentos empíricos, uma vez que a análise não se refere somente a uma parte da cidade, nem se
baseou em entrevistas específicas, mas numa visão geral da cidade e numa experiência individual
quanto aos dados colhidos em campo, incluindo a verificação de pontos de referência por
representantes da comunidade local.
258
por incorporar tanto rodovias interestaduais quanto vias arteriais urbanas; os pontos nodais foram
entendidos principalmente como pontos de atração; as divisões de setores fundamentaram-se no seu
isolamento ou caracterização visual própria, sendo considerados principais aqueles que identificam a
cidade; os marcos foram entendidos como os edifícios que, mesmo sendo visualmente pouco
representativos, servem de referência para comunidade local; finalmente, os limites foram
determinados pelo reconhecimento de barreiras visuais e ao crescimento urbano.
V.2.1 SETORES E BAIRROS
O primeiro aspecto que se destaca na cidade de Timóteo é a diferenciação entre o centro sul e o norte,
ou como a eles se refere a maioria de seus habitantes: entre Timóteo e ACESITA. Diferenciação
histórica que a paisagem vem confirmar e reforçar, pois desde a posição topográfica relativa até a
situação dos edifícios no lote, são muitos os aspectos marcados por posições antagônicas, observando-
se que o antigo povoado organizou-se em terreno elevado e, portanto, mais acidentado, concentrando
as edificações em torno da igreja, o que resultou numa malha urbana pouco regular e legível, com a
espontaneidade das construções determinando quarteirões sempre distintos e lotes de dimensões
reduzidas. O alinhamento das construções com a rua também é uma característica comum tanto no
entorno imediato da praça quanto nas residências morro abaixo e acima, notando-se um sensível
aumento no adensamento conforme o terreno torna-se mais íngreme e aproxima-se do alto do morro.
As ruas, embora não tão estreitas quanto as das cidades coloniais mineiras, também não são muito
largas; as calçadas são apertadas dificultando a arborização, por isso, muito escassa.
Já o núcleo construído pela usina priorizou as planícies ao longo dos córregos
765
, o que somado à
opção por grandes lotes e casas isoladas resultou numa ocupação mais dispersa, tanto no centro
comercial quanto nos bairros residenciais. Esta distinção funcional também é muito mais acentuada
aqui que na área sede do município, onde residências e edifícios comerciais ergueram-se sobre o
mesmo tipo de lote. Com quadras abertas, edifícios sobre pilotis e vias de dimensões mais generosas, a
paisagem do centro norte é muito menos fechada, mais permeável e verticalizada. Mesmo nos bairros
residenciais, considerados setores secundários e onde impera a propriedade particular, onde são poucas
praças e as calçadas são menos generosas, o recuo das casas
766
e a largura das ruas ainda fazem
persistir a sensação de abertura, pois o limite visual é dado somente pelos morros nos fundos dos lotes.
Há, no entanto, bairros que guardam características próprias, dadas pelas limitações da topografia, pelo
distanciamento de outros centros ou mesmo por uma ocupação menos regulada, como é o caso de
Cachoeira do Vale, Alegre, Limoeiro e nos extremos da cidade de Macuco e Ana Moura; ou no
765
Como foi mencionado anteriormente, tanto o local de implantação da usina quanto da cidade foram
incumbências do engenheiro Alderico Rodrigues, cabendo a Romeu Duffles projetar a cidade nas
áreas por ele indicadas.
766
Como se pode observar pelas imagens, as reformas e ampliações que se seguiram à aquisição das
casas ocorreram, principalmente, no sentido transversal e no fundo dos lotes, fazendo desaparecer
primeiramente os recuos laterais e preservando a maior parte dos recuos frontais, tomados somente
por abrigos e garagens.
259
sentido oposto, aqueles cuja organização rígida, dada por edifícios isolados, como no Recanto e em
partes do Primavera, dificilmente terão sua paisagem alterada num futuro próximo.
Apesar de sua importância e da proximidade do centro norte, a área industrial da ACESITA é pouco
visível da maior parte da cidade, sendo o alto do prédio de dez pavimentos no centro e o ponto mais
elevado do bairro dos Técnicos os únicos locais próximos em que se vê mais da indústria além do que
seu muro e edifícios mais periféricos. Assim, é somente a distância, seguindo em direção ao pico Ana
Moura nos bairros Vale Verde e Novo Tempo, que a usina se faz perceber, que as chaminés e a
fumaça delineiam claramente o perfil da cidade.
V.2.2 PERCURSOS E VIAS
Considerando-se a conurbação de Timóteo com Coronel Fabriciano e Ipatinga, bem como a
polarização da região por estas cidades, a fim de entender o sistema viário de Timóteo foi preciso levar
em consideração o papel da rodovia BR-381
767
e o impacto que a alteração de seu traçado irá provocar.
Essa via vem sendo incorporada à malha urbana e seu desvio para a margem oposta deve consolidar
esta tendência, fazendo com que o traçado atual torne-se definitivamente uma via arterial ligando os
bairros Santa Rita, Cachoeira do Vale, Alegre, Nova Esperança, Santa Teresinha e Limoeiro à cidade.
A paisagem que ali se descortina é bem diversa daquela que se observa nas vias estruturais que se
situam ao longo dos vales dos cursos d’água, principalmente por causa da presença marcante do rio,
que a usina e os morros tornam invisível nos demais bairros. Além do que, contrariamente ao que
ocorre com a rodovia, nas demais vias junto aos cursos d’água as margens foram tomadas por
edificações, sendo raros os trechos em que ruas e avenidas permitem vislumbrá-los. Por outro ângulo,
considerando-se os fluxos diários, a presença do rio também pode ser considerada mais significativa
do que a dos córregos, pois com Coronel Fabriciano e Ipatinga situadas na margem oposta a Timóteo,
sua transposição constitui percurso usual à grande parte dos moradores da região, enquanto os
córregos permanecem escondidos nos fundos das casas, decretando a falência de qualquer
possibilidade de concretização de uma paisagem fundamentada na incorporação da natureza por
intermédio das “avenidas parque” idealizadas por Romeu Duffles Teixeira.
Sem dúvida, o principal percurso intra-urbano de Timóteo é a ligação entre os centros norte e sul,
através das avenidas ACESITA, Juscelino Kubistchek e Monsenhor Rafael. Percurso que se destaca
não somente por ligar estes centros, mas também por constituir-se no trajeto visualmente mais bem
cuidado e por atravessar o bairro Timirim, onde se localizam edifícios símbolo da cidade. Portanto,
embora não haja uma hierarquia que distinga claramente estas vias das demais
768
, o conjunto de
edifícios no seu entorno ajuda a destacá-las. São tanto os grandes edifícios públicos, como os colégios
767
Refere-se ao trecho da Fernão Dias entre João Monlevade e Governador Valadares, ou seja, entre a
BR-262 (Corumbá-Vitória) e a BR-116 (Rio-Bahia).
768
Embora haja uma variação na largura das vias, seu perfil geral é muito semelhante; não há variação
na dimensão das calçadas nem do recuo das casas, que se alteram somente quando são transformadas
em estabelecimentos comerciais ou de serviços.
260
Monsenhor Rafael e Getúlio Vargas, a Matriz São José, como o espaço da Praça 29 de abril e do
sindicato da Metasita, quanto o conjunto mais ou menos homogêneo de residências, em especial ao
longo do bairro Funcionários, que, com suas calçadas gramadas, cercas baixas e varandas arqueadas,
dão identidade ao caminho e realçam os demais edifícios e espaços.
V.2.3 PONTOS NODAIS
Embora os dois centros da cidade possam ser considerados como principais pontos de referência,
espaços símbolo da cidade e da dualidade que marca sua história, somente o centro norte pode ser
considerado como um importante ponto nodal, uma vez que o sul, apesar de abrigar a sede da
administração municipal, não é capaz de concentrar atividades suficientes para caracterizar-se como
destino final, constituindo-se mais num último posto urbano antes dos bairros mais periféricos e rurais.
O contrário ocorre no centro norte, em especial ao logo da Alameda 31 de Outubro, onde se localizam
as principais lojas, escritórios de prestação de serviços e instituições bancárias. Além de importante
ponto nodal, esta via destaca-se também como elemento importante da paisagem local, tanto por seu
perfil diferenciado
769
quanto pelas funções dos edifícios que a margeiam. Assim, são
aproximadamente mil metros de edifícios que, seja por sua história ou por sua arquitetura, têm forte
significado local. Situam-se ao longo dela a Fundação ACESITA (antiga casa de hóspedes), o edifício
residencial Pioneiros (de autoria de José Luiz Batista), o Colégio Dom Bosco (antiga BENEPO), três
conjuntos comerciais (inclusive o 31 de Outubro também de autoria de José Luiz Batista), o único
prédio com mais de cinco pavimentos da cidade (em fase de acabamento), o Banco do Brasil, o antigo
Cine Marabá (atual igreja adventista), o edifício da farmácia da ASSOCIA, o grande hipermercado
local e o hotel ACESITA (antiga sede da fazenda Dona Angelina que atualmente funciona como
restaurante).
Considerando-se a capacidade de atração, o bairro do Timirim destaca-se dos demais, pois localizado
num ponto intermediário, com vias de acesso rápido tanto aos centros norte e sul quanto à rodovia e,
portanto, a Coronel Fabriciano e Ipatinga
770
, e concentrando edifícios importantes, como o hospital, a
matriz, a maior escola secundária
771
, varejão, a biblioteca municipal, o sindicato dos metalúrgicos e a
sede campestre do ACESITA Esporte Clube, ele só não se consolidou como centro principal pela
ausência de atividades comerciais e de prestação de serviços, maciçamente concentradas no centro
norte. É interessante notar ainda que a área ocupada por esse bairro e pelo Olaria havia sido escolhida
por Romeu Duffles Teixeira como centro da nova cidade operária e que, embora seu desenho tenha
sido alterado, com exceção do centro comercial e das habitações coletivas, os edifícios previstos por
769
Juntamente com a Avenida Waldomiro Duarte, ela é a única com canteiro central, mas
diferentemente desta cujo canteiro central não tem mais que meio metro de largura, entre as pistas da
Alameda 31 de Outubro é que se concentram as árvores, corre a ciclovia e situam-se baias de
estacionamento 45º.
770
Acesso que será ainda mais facilitado quando estiver concluído o novo trajeto da BR-381,
permitindo uma ligação direta com o centro de Coronel Fabriciano.
771
Antigo Colégio Monsenhor Rafael, atualmente pertence à UNILESTE.
261
ele mantiveram sua localização, como é o caso da matriz, do hospital, do clube e até mesmo dos
jardins desses dois bairros
772
.
O cruzamento dos bairros Olaria e Quitandinha é importante não tanto por sua capacidade de atração –
não que esta seja irrelevante, dado que são bairros dos mais antigos da cidade e que abrigaram o
escritório da companhia (atual ASSOCIA), sua primeira escola e praça de esportes –, mas por
constituir um importante nó viário, ponto de passagem para aqueles que, vindo das demais cidades da
região do Vale do Aço, se dirigem ao centro norte, ao centro sul ou mesmo ao Timirim.
V.2.4 IMITES E BARREIRAS
A determinação dos limites levou em consideração tanto sua capacidade de barrar o crescimento
urbano local quanto de impedir uma integração visual com o entorno. Desse modo, a quase
coincidência dos traçados da ferrovia Vitória-Minas, da rodovia BR-381 e do rio Piracicaba, embora
constitua-se somente numa barreira horizontal e não vertical, compõe-se de elementos fortes o
suficiente para tornar praticamente impossível uma identificação entre as margens opostas. Barreira
que se torna ainda mais forte ao longo da área ocupada pela usina, onde os muros e morros do entorno
tornam a usina pouco visível na maior parte da cidade. Assim, ao mesmo tempo em que o quinteto –
rio, ferrovia, rodovia, usina e morros – gera uma forte barreira tanto visual quanto de acessibilidade
com a margem oposta, a sinuosidade dos vales nos quais a cidade foi implantada faz com que esta
sólida barreira seja pouco perceptível
773
.
Outra barreira de difícil transposição é o Parque Nacional do Vale do Rio Doce, que limita de forma
definitiva seu crescimento na direção leste. Porém, enquanto o maciço vegetal e a topografia se
incumbem de determinar um forte limite visual, uma efetiva contenção do crescimento nesta direção
só se viabiliza pela instituição legal do parque como área de preservação permanente, garantida por
meio da guarda constante de seu entorno, em especial nas proximidades dos bairros Limoeiro, Recanto
Verde, Alphaville e Macuco.
Ao contrário do rio, da usina e do parque, imponentes obstáculos, os córregos não foram considerados
como limites, pois, além de não constituírem barreiras visuais, foram rapidamente transpostos. Já os
morros foram considerados como limites secundários, pois, apesar de determinarem o alcance visual
na maior parte da cidade, lentamente vêm sendo ocupados e incorporados à malha urbana, tornando-se
772
O que levanta a questão sobre a opção pela construção do centro comercial no local atual ter se
fundamentado tanto numa maior aproximação com Coronel Fabriciano do que com Timóteo,
configurando-se numa tentativa de manter o controle sobre o núcleo operário por intermédio de seu
isolamento, uma vez que o acesso a Fabriciano era de mais fácil controle do que a Timóteo, em
direção ao qual não havia qualquer barreira natural significativa a ser transposta.
773
Como esta parte da cidade encontra-se assentada em locais baixos e não há edifícios altos o
suficiente para se enxergar para além dos morros que a contornam, a cada curva a usina se torna
menos visível, de modo que, somente a distância e em pontos mais elevados no altos morros, ou
seja, locais ainda não ocupados, é que se vê a indústria.
262
permeáveis e assim deixando de ser barreiras
774
.
V 2. 5 MARCOS E EDIFÍCIOS
Como se observou previamente, é impossível falar da paisagem da cidade de Timóteo sem que se
considerem as dicotomias nela presentes, pois as diferenças entre norte e sul, público e privado, curvo
e retilíneo, plano e montanhoso, largo e estreito, moderno e tradicional, entre outras, mais do que a
distinção entre imagem e fundo, são o que permite identificar os marcos urbanos da cidade, fazendo de
espaços e edifícios o que Aldo R
OSSI (1982: 161) chamou de “fatos urbanos”
775
, ou seja “...um fato
singular determinado pelo espaço e pelo tempo, por sua dimensão topográfica e por sua forma, por
ser sede de vicissitudes antigas e modernas, por sua memória
776
.
É neste sentido que se considerou como os mais importantes marcos urbanos da cidade de Timóteo a
Fundação ACESITA
777
e a Matriz São José
778
, constituindo-se nos únicos edifícios que, além de
grande visibilidade, têm uma pesada carga simbólica, aparecendo como mais freqüente imagem de
divulgação da cidade e da ACESITA.
Como marcos secundários, na área central, destaca-se a praça 1º de Maio que, embora visualmente não
cause um grande impacto, constitui-se no único espaço público de permanência, e mesmo que
limitada, de concentração da população. No seu entorno também se situam edifícios importantes para a
comunidade local, tais como a capela São José, o escritório central da ACESITA e o Colégio Dom
Bosco. Vale salientar que, embora a partir da segunda metade da década de 1960 a maior parte do
comércio tenha se deslocado para a Alameda 31 de Outubro, os primeiros galpões de armazém,
farmácia, alojamento e restaurante construídos no início da implantação da usina localizavam-se onde
hoje é a Rua 20 de Novembro; os desfiles cívicos, procissões e as primeira rodas de samba também
partiam desta praça.
A escolha do Hospital Vital Brasil como marco secundário fundamenta-se mais na sua relevância para
774
Dada a escala da análise, não pareceu apropriado considerar a separação entre bairros ou setores
como limite, como fez Kevin Lynch. Esta pode ser identificada pela separação entre eles, decorrente
tanto da distância quanto das diferenças formais.
775
Embora a noção de “fato urbano” desenvolvida por Aldo Rossi esteja intrinsecamente ligada à
teoria do “lugar”, no âmbito deste trabalho não foi possível aprofundar esta abordagem.
776
“... un hecho singular determinado por el espacio y por el tiempo, por su dimensión topográfica y
por sus formas, por él ser sede de vicisitudes antiguas y modernas, por su memoria.” (R
OSSI, 1982:
161)
777
O edifício da Fundação ACESITA foi construído na década de 1970 para servir como casa de
hóspedes, abrigando visitantes e funcionários mais graduados que aguardavam a disponibilidade de
uma casa. A partir de 1992, ele passou a abrigar a sede da Fundação ACESITA, entidade
responsável pela coordenação das atividades socioculturais promovidas pela empresa.
778
A construção da igreja matriz da cidade neste local já estava prevista no plano de Romeu Duffles
Teixeira. No entanto, a construção da matriz de São José ocorreu somente na década de 1970,
baseada no projeto de Yard Burtan, para a Basílica de São José Operário em Barbacena. Contudo,
sua localização e a prévia existência da paróquia no centro parecem ter feito com que, apesar de
grande destaque na paisagem, a vida religiosa da comunidade continuasse a se concentrar em torno
da pequena capela construída pela ACESITA nas proximidades da Praça 1º de Maio.
263
a população local do que no seu impacto visual, apesar de este não ser totalmente desprezível
779
, pois,
apesar de tanto a praça 29 de Abril quanto os edifícios do Colégio Monsenhor Rafael e do sindicato,
seja por suas localizações ou dimensões, possuírem maior impacto visual, sua presença na vida
cotidiana da comunidade local desde a década de 1940 faz com que tenha mais força como “fato
urbano” do que qualquer um deles.
Outros marcos que, apesar de ainda serem usados freqüentemente como referência, carecem de algum
empenho para serem encontrados são a ASSOCIA e o Forno Hoffman. Ambos constituem-se em
edifícios símbolo dos bairros onde se localizam a ASSOCIA, antigo escritório da empresa
representando o Quitandinha e o Forno Hoffman, último forno remanescente dos erguidos
especificamente para fornecer tijolos para a construção da usina, do Olaria.
Os projetos de Éolo Maia
780
para as escolas em bairros periféricos, como Vale Verde e Cachoeira do
Vale
781
, embora tenham causado grande impacto na paisagem, em vez de promoverem alguma
melhora nestes bairros, acabaram por acentuar a precariedade da realidade local, tornada mais evidente
diante da beleza e sofisticação dessas obras. Assim, toda a força das estruturas metálicas da escola no
Vale Verde, e toda a graça dos arcos em tijolo aparente da escola em Cachoeira do Vale se diluíram
quando mergulhadas em meio a construções semi-acabadas, a vias não pavimentadas e calçadas sem
qualquer marcação, impossibilitando qualquer identificação desses edifícios com o local onde foram
erguidos, negando-lhes a pretendida condição de símbolos destes bairros.
Embora a estátua Sinergia
782
no trevo de acesso a Coronel Fabriciano e Ipatinga e a Matriz de São José
no centro sul também sejam utilizadas para representar a cidade, essas imagens fazem referência a
aspectos específicos da cidade, como sua situação regional e o antigo povoado de Timóteo, tornando-
se de mais difícil identificação geral. Além do que, embora de formas diversas, a localização de ambas
compromete sua visibilidade. No caso da estátua, mesmo não havendo elemento algum obstruindo sua
visualização, ela encontra-se num local ermo, mera passagem de veículos, o que faz dela uma imagem
fugaz e, portanto, de mais difícil fixação. Já a Matriz de São José, embora se situe num ponto elevado
do terreno e no coração do antigo povoado, o sentido das vias, o reduzido afastamento dos edifícios
vizinhos e sua própria disposição, com a fachada voltada para o oeste, fazem com que seja visível
779
Tanto a Praça 29 de Abril quanto os edifícios do Colégio Monsenhor Rafael e do sindicato, seja por
suas localizações ou dimensões, possuem maior impacto visual, porém menor importância na vida
da comunidade local.
780
Éolo Maia projetou também uma capela do velório de Timóteo, que embora desde a década de
1980 conste das reclamações da população e das promessas de campanha dos prefeitos, juntamente
com a “urbanização” do cemitério ainda não foi construída. A escola de Vale Verde também não foi
concluída, além de o prédio principal apresentar dimensões bem mais reduzidas que as do projeto,
extensas áreas de laboratórios, auditórios e biblioteca não foram nem mesmo iniciadas.
(V
ASCONCELOS, s.d.)
781
Ambos foram construídos durante a administração de Lelé Cunha na década de 1980, sendo
utilizados repetidas vezes como elementos propagandísticos de suas administrações.
782
Esta estátua de autoria de Vilma Nöel representa as três cidades pólo do Vale do Aço: Ipatinga,
Coronel Fabriciano e Timóteo, tendo sido encomendada na década de 1990, quando se intensificou a
luta pela consolidação da Região Metropolitana do Vale do Aço.
264
somente no seu entorno mais imediato, perdendo o posto de símbolo da cidade para a pouco utilizada
Matriz de São José.
V.2.
6 O DESTINO DA CIDADE EMPRESARIAL
Considerando-se que uma leitura da cidade hoje é também um exercício de atualização da sua imagem
e, portanto, de reconhecimento do seu destino, ou seja, daquilo em que o projeto se transformou, ela é
mais do que a descrição de ruas e edifícios, pois compreende tanto sua dimensão histórica quanto
sensitiva. Desse modo, a imagem apresentada neste trabalho constitui uma construção particular
engendrada a partir de informações comprovadas e percepções objetivas e sensíveis reunidas ao longo
de seis anos de pesquisas e vivências
783
na cidade, de modo a compor um conjunto de dados que a
fundamentação teórica e a comparação com outras cidades da região ajudaram a sintetizar e ganhar um
sentido mais amplo.
Na bacia do rio Piracicaba, Timóteo se destaca por ter nascido a partir de um projeto urbano, portanto
como cidade nova
784
, ou seja, diferentemente da maior parte das cidades da região, cujo crescimento se
deu a partir de um núcleo urbano cuja malha se expandiu conforme tinha sua população aumentada; a
estrutura física de Timóteo foi concebida como um todo, com sua implantação precedendo sua
ocupação. Nesse sentido, juntamente com João Monlevade e Ipatinga, Timóteo
785
representa um tipo
de construção do espaço urbano no qual a cidade não se “forma”, mas se “implanta”. Assim, a
primeira imagem à qual a cidade se associa é a do "novo”.
783
Durante os seis anos do trabalho, a cidade foi visitada cerca de seis vezes, seus espaços foram
fotografados e percorridos a pés, de carro, trem, ônibus e bicicleta, seus habitantes foram
entrevistados, bibliotecas, escolas, sindicato e prefeituras, consultados.
784
Analisando o surgimento e desenvolvimento das cidades na bacia do rio Piracicaba, nota-se que,
enquanto algumas cidades formadas no século XVIII em decorrência da corrida pelo ouro, como
Barão de Cocais e Santa Bárbara, Nova Era e Itabira continuaram a crescer mesmo após o
esgotamento das jazidas de ouro graças ao desenvolvimento da mineração de ferro
784
e atividades a
ela associadas; outras como São Gonçalo do Rio Abaixo, Rio Piracicaba e Antonio Dias, com o
declínio da mineração passaram a ter sua economia cada vez mais apoiada no desenvolvimento de
atividades agropecuárias (F
UNDAÇÃO JOÃO PINHEIRO, s.d.) (em Nova Era a partir de1988 também
esmeraldas), de modo que cidades fundadas com o intuito de comandar o campo acabaram por
depender dele para sua sobrevivência, situação que se inverte novamente a partir da década de 1930,
quando se inicia a implantação de cidades siderúrgicas na região. O que se deve, como coloca
Roberto M
ONTE-MÓR (2001: 10), ao fato de as cidades siderúrgicas do século XX, da mesma forma
que as mineradoras do século XVIII, constituírem-se num tipo de “cidade que se desenvolve com
base nos recursos minerais localmente definidos [como] uma comunidade de base industrial,
necessariamente integrada em um sistema regional maior, diferentemente da comunidade agrícola
de tendência autárquica gravitando em torno de um lugar central de bens e serviços”.
785
Diversamente de cidades como Barão dos Cocais, Santa Bárbara e Nova Era que se formaram
graças à descoberta de ouro, Timóteo, Monlevade e Ipatinga nasceram de um projeto industrial que
incluía a implantação de uma cidade operária. Assim, a Timóteo atual deve muito mais ao plano
urbano elaborado pela ACESITA do que ao povoado que hoje é a sede do município, o mesmo
ocorrendo com Carneirinhos e João Monlevade, bem como Barra do Alegre e Ipatinga, cujos rumos
foram completamente alterados pela implantação das usinas da ACESITA, Belgo-Mineira e
Usiminas em seus arredores.
265
No entanto, não é somente a grandiosidade do empreendimento que impacta e marca a cidade; a
“modernidade” é outra característica que veio embutida tanto no projeto industrial quanto no urbano, e
que permanece forte até a atualidade. Ruas e calçadas largas, edifícios isolados com tetos planos e
pilotis, constituem ali símbolos desta modernidade e ajudam a reforçar o contraste com o existente na
região. Assim, como se apontou anteriormente e se pode observar nos levantamentos dos povoados de
Timóteo, Coronel Fabriciano, Antônio Dias e Hematita de 1939
786
, a ocupação ao longo dos caminhos
e a instalação dos principais edifícios no alto dos morros, as ruas estreitas e os largos conformados por
casas e sobrados de porta e janela, como padrão da tradição urbana mineira, encontra no espaço
urbano construído pela indústria o seu oposto. Na cidade construída pela ACESITA, os morros são
preservados e os vales, ocupados; a tortuosidade das vias é racionalizada, sendo adotada somente para
contornar os morros, não para enfrentá-los, e o zoneamento dos espaços, da casa à cidade, se acentua,
separando “técnicos” de “funcionários”, “trabalho” de “lazer” e “público” de “privado”.
Diferenças que em Timóteo são ainda mais destacadas, pois ao mesmo tempo em que o projeto
industrial se implantou, o povoado manteve suas características, fazendo com que a dualidade se
constituísse na principal imagem da cidade. Dualidade que, mesmo evidente nos opostos que
compõem sua paisagem – como público e particular, curvo e retilíneo, plano e montanhoso, vertical e
horizontal, largo e estreito, coletivo e individual, norte e sul, moderno e tradicional, velho e novo, etc.
–, torna-se mais facilmente compreensível ao ser analisada a partir da dicotomia que a originou, a
relação público x privado.
Esta diferenciação, além de marcar a distinção entre o que era da fábrica e o que não era, justifica as
mudanças no desenho do traçado entre as áreas residenciais e as comerciais construídas pela empresa.
Assim, além de uma delimitação das áreas controladas pela companhia daquelas geridas pela
municipalidade, público e privado designam um zoneamento funcional da cidade operária, indicando
uma forma de ordenação de atividades que reforça a noção da casa como local destinado à
sociabilidade privada, e do centro como local de uma vivência compartilhada, entre locais de retiro e
convivência, da família e da comunidade, do individual e do coletivo, de repouso e de trabalho. Dessa
forma, as áreas residenciais caracterizam-se pela horizontalidade das casas térreas, por edifícios
afastados das ruas por muros e jardins, por ruas curvas e um espaço público diferenciado do privado,
enquanto no centro comercial a divisão entre os lotes praticamente desaparece diante da
permeabilidade dos edifícios sobre pilotis; são amplos conjuntos comerciais de dois pavimentos que
tomam as quadras cuja regularidade e cuja linearidade compõe um traçado que tende à retícula.
O zoneamento, como símbolo de racionalidade e modernidade, também está presente, estendendo-se
da fábrica à cidade, de modo que os nomes dos bairros foram concebidos indicando o status de seus
moradores dentro da usina, diferenciando técnicos, funcionários e operários. A dificuldade dos menos
qualificados de encontrarem uma casa e a acomodação dos solteiros nos alojamento também
786
Na data do levantamento eram todos distritos do município de Antônio Dias, que hoje tem pouco
mais de 10.200 habitantes.
266
representam um certo zoneamento, pois ao serem levados a buscar moradia em Coronel Fabriciano ou
serem reunidos num local específico, faz-se novamente do espaço uma lente através da qual se
vislumbram distinções, como entre qualificados e não-qualificados ou entre casados e solteiros.
Porém, além das dicotomias intrínsecas ao projeto industrial e apesar das tentativas de fundir a cidade
da companhia e a cidade livre, ainda é esta dualidade que marca sua imagem, e se por um lado busca-
se transpor para Timóteo os padrões urbanísticos de ACESITA, por outro, observa-se ao mesmo
tempo tentativas, tanto do poder público quanto da companhia, de reduzir ao mínimo as evidências de
sua origem industrial. Assim, embora se mantenha no mesmo lugar, progressivamente a usina parece
afastar-se da cidade, ocultando-se cada vez mais entre os morros e muros.
Desse modo, embora o poder da usina paire sobre toda a cidade, sua condição industrial é cada vez
mais ocultada, com muros e morros escondendo seus galpões e chaminés e fazendo com que ela
apareça somente por intermédio da cuidadosa arquitetura dos edifícios administrativos, com o
escritório e a Fundação ACESITA evidenciados por uma nova iluminação e um cuidadoso
ajardinamento, tornando-se postais tanto da indústria como da cidade. Essas transformações refletem
uma tentativa de obscurecimento da atividade produtiva da empresa diante de sua ação social que,
como se demonstrou no capítulo anterior, não é exclusiva à ACESITA, constituindo-se num padrão de
comportamento que tem sido cada vez mais difundido pelas empresas industriais e que se pode
verificar de forma mais ou menos eficaz em outras cidades empresariais
787
.
Portanto, Timóteo atual é uma cidade que se defronta com a descaracterização de suas imagens de
origem, a do povoado que se quer moderno e a da cidade operária que não se quer industrial
788
. Pois,
com o desaparecimento das casas de porta e janela e a retificação e asfaltamento das ruas no centro sul
somados ao ocultamento da usina no centro norte, a dicotomia que tão bem identifica esta cidade
também vai se perdendo, e em vez de se construir uma imagem, apagam-se duas, afinal, como é
possível entender e reconhecer uma cidade industrial sem suas chaminés ou uma cidade colonial sem
seu casario?
787
Entre as cidades estudadas a que parece ter tido menos sucesso foi a CSN, onde a postura mais abertamente controladora
de seu presidente tem gerado protestos acalorados por parte da população local. Já a mais eficaz, pelo menos a que vem
conquistando o maior número de prêmios por sua atuação social, segundo o Balanço Social da Siderurgia de 2004 (IBS,
2005), parece ser o grupo Gerdau, seguido da ACESITA e Belgo-Mineira.
788
Esta dificuldade em encontrar uma imagem de referência faz com que, hoje, nem a estátua de aço no trevo que a liga a
Coronel Fabriciano e Ipatinga, nem o edifício da Fundação ACESITA, principais postais da cidade, constituam-se em
emblemas capazes de associá-la ao topônimo que adotou no final dos anos noventa, “Capital do Aço Inox”
267
Fig. 288-292: Cinco postais da cidade de Timóteo: a Fundação ACESITA, a estatua das Três Graças, a Igreja
de São Sebastião, a Matriz de São José e a Capela São José
Fig. 287: Uma leitura da paisagem urbana de Timóteo
(base GOOGLEARTH)
N
268
Fig. 293-294: As praças do Centro Norte (1º de Maio) e Sul
(21 de Abril)
N
Fig. 299 Á direita o Centro Norte visto a partir do bairro São Cristóvão
(AUTORA, 2005)
Fig. 295-296:
Imagens do
Forno Hoffman, no
bairro Olaria
(AUTORA, 2002)
0 296m
N
Fig. 2957-298: As duas escolas projetadas
por Éolo Maia, nos bairros Vale Verde
e Cachoeira do Vale
(SABBAG, s.d.)
Fig. 300:
O Centro Sul visto a partir do bairro Ana Malaquias
(AUTORA, 2005)
N
Capítulo VI: A CONSTRUÇÃO SOCIAL DA CIDADE DE TIMÓTEO
Fig. 301: Desfile do bloco Andorinhas
(acervo pessoal Vilma Sperancini)
Abram alas,olhos e corações
É com limão-de-cheiro
É com o pé no chão
Abram alas, olhos e o coração
Vai passar o reinado da ilusão (bis)
(uma estrela)
Uma estrela molhada
Pode brilhar muito mais a
Ainda existe a pureza
Dos velhos carnavais
Despertem o Zé Pereira,
Cordões e ranchos gerais,
Esta mulata faceira
Pode sambar muito mais.
(vem morena)
Vem morena, vem despertar este silêncio de outrora,
Vem morena, anunciar que o carnaval chegou agora
Ginga, ginga, ginga,
Essa raça brasileira
A zueira não termina,
Quando chega a Quarta-feira (bis)
(E é por isso que eu digo)
Salve os foliões alarmados
Com nobres cordões se arrastando
Uma noite um furacão varreu
O carnaval das alamedas
Num entrudo assustador
Chorou a alma negra de emoção,
Ao ver o sonho que nascia
Morrendo nas águas da ilusão
Calunga, ô ô ô
NEGRA NADIR, o seu tempo não passou
Meus sinhô, VELHO QUINCÃO
tem quitanda na avenida
A tristeza acabou
Lélio, Paulinho e Ziza do Cavaco
Unidos da Quitandinha Cáentrenós fev/1985
270
VI.1 FORMAÇÃO SOCIAL E CULTURAL EM CIDADES EMPRESARIAIS
Em sua conversa com Jacques Le Goff, Jean L
EBRUN (apud LE GOFF, 1998) diz que é possível
observar nas obras de pintores medievais idealizações a cerca da cidade. Para ele as representações de
cidades estendidas para o alto“ engendram mais do que uma dificuldade de elaboração do desenho
em perspectiva, elas constituem concepções de um ideal de cidade, toda ela voltada para o alto.
789
O
direcionamento vertical verificado nestas pinturas e presente nas torres e catedrais das cidades
medievais, além de expressar uma necessidade – dada a escassez de espaço intramuros – constituía-se
em símbolo de poder e distinção moral
790
, projetando nas cidades os anseios daqueles incumbidos de
representá-las ou capazes de efetivamente agir sobre elas.
Assim, mesmo antes dos primeiros planos e projetos elaborados por especialistas, cidades ideais já
vinham sendo concebidas e, ao longo dos séculos, podem-se contar algumas centenas, ou até mesmo
milhares, de lugares imaginados por pintores e escritores.
791
Dentre esta vasta e rica produção destaca-
se o trabalho daqueles que tomaram a realidade na qual estavam mergulhados como ponto de partida
para elaborar suas criações, concebendo cidades e sociedades que eram verdadeiras críticas ao
universo que os cercava, as chamadas “utopias”.
Nome do país imaginado por Thomas M
ORUS (1997)
792
, “Utopia”, ou não-lugar (ou+tópos), passou
então a designar um projeto ou plano impossível de realizar, algo que só poderia existir num universo
mágico, ou ainda, referir-se a “... qualquer lugar ou situação ideais onde vigorem normas e/ou
instituições políticas altamente aperfeiçoadas”, como é definida atualmente (F
ERREIRA, 1999: 2038).
Já para Guilio A
RGAN (2001: 09), as utopias devem ser entendidas “... não tanto como prefiguração
de um tempo melhor, mas como desgosto e impossibilidade de viver no atual”, constituindo-se numa
deformação orgânica da história”, na qual a história “... escapa de si mesma, rompendo a curva do
próprio andamento cíclico e saindo pela tangente”, de modo que as utopias só se realizam num tempo
“a-histórico” e num local “a-espacial”. Mas, apesar destes deslocamentos, juntamente com os tratados
de arquitetura e os escritos do urbanismo, Françoise C
HOAY (1985) considera que, sem serem textos
propriamente de urbanismo, as utopias
793
são os textos instauradores de uma ciência do urbano
794
, pois
789
A cerca das representações de cidades medievais na pintura, Lewis MUNFORD (1998) comenta que a redução do plano
horizontal, acentuando a verticalização, ocorria em detrimento das áreas livres e verdes, uma verdadeira antecipação do que
estava por vir.
790
De poder, porque a possibilidade de construir edificações elevadas demandava custos elevados, devido à necessidade de
emprego de pedras. De distinção moral, porque representava a busca por ideais religiosos, localizados num plano superior;
portanto, o direcionamento para o alto representava também uma tentativa de aproximação com o divino. Para Lebrun, o
sonho da verticalidade medieval se concretiza nos arranha-céus, sendo Manhattam a materialização deste sonho.
791
A riqueza da literatura na criação e descrição de lugares pode ser atestada no livro de Alberto MANGUEL & Gianni
G
UADALUPI (2003) “Dicionário de lugares imaginários”, onde foram enumerados pouco mais de um mil lugares
imaginados por autores de diversos períodos históricos e que tem em comum, embora serem inexistentes, mas terem sido
imaginados na terra (e não em outros mundos ou dimensões, como os sonhos ou o céu ou inferno).
792
A obra de Tomás Morus foi publicada em 1516.
793
A autora inclusive determina sete traços discriminatórios das utopias, que não devem ser confundidas com os textos de
ficção, são eles: “[1] uma utopia é um livro assinado; [2] nela um indivíduo se exprime na primeira pessoa do singular, o
próprio autor e/ou seu porta-voz, visitante ou testemunha da utopia; [3] apresenta-se sob a forma de uma narrativa na
qual se insere, no presente do indicativo, a descrição de uma sociedade-modelo; [4] essa sociedade-modelo opõe-se a
uma sociedade histórica real, cuja crítica é indissociável da descrição-elaboração da primeira; [5] a sociedade-modelo
tem como suporte um espaço-modelo que é sua parte integrante e necessária; [6] a sociedade-modelo está situada fora
271
suas formulações constantemente se esmeravam em descrever a organização físico-espacial desses
“não-lugares”, sendo constantemente utilizados como inspiração e ponto de partida para projetos
urbanos. Utilização que se intensifica na segunda metade do século XIX quando o surto de
urbanização induzido pelo desenvolvimento industrial fez das cidades foco de problemas sociais,
políticos e econômicos que, mais do que reformar a estrutura física das cidades, exigia profundas
mudanças na sua organização social
795
.
Num contexto em que vigorava a crença no ambiente como meio capaz de colaborar na formação do
indivíduo, tanto as reformas das capitais européias quanto a intervenção de empresários industriais na
oferta de habitações aos operários objetivavam incutir na população novos valores, transformando
desde hábitos de higiene
796
até modos de convívio social
797
. Assim, a construção de núcleos fabris foi
vista pelos industriais tanto como uma forma de evadir-se das dificuldades inerentes às grandes
cidades
798
, quanto, com o surgimento das grandes plantas fabris, da necessidade de aproximação das
fontes de matéria-prima e energia. Além desses benefícios, o isolamento a que estavam sujeitos os
trabalhadores favorecia sua arregimentação, fixação, capacitação e controle, de modo que, mais do que
empreendimentos industriais, estes locais configuravam-se como experimentos sociais
799
;
experimentos cuja dimensão e abrangência variavam grandemente, pois, como se demonstrou no
primeiro capítulo, a atuação empresarial na construção de um habitat operário foi desde a edificação
de simples conjuntos de casas até complexas estruturas urbanas, variou de rigorosos sistemas de
vigilância e fortes laços de dependência econômica e cultural até organizações mais abertas e flexíveis.
Desta forma, pode-se dizer que as cidades empresariais
800
, embora originárias de projetos econômicos,
do nosso sistema de coordenadas espácio-temporais, alhures; [7] ela escapa à influência do tempo e das mudanças”
(C
HOAY, 1985: 36).
794
A ponto de seus autores serem considerados “pré-urbanistas” por CHOAY (2002).
795
Mudanças que diziam respeito à mudança de hábitos de higiene e de convívio, por causa tanto da inserção de novos
equipamentos no ambiente público e privado (de trabalho, lazer e saúde), quanto da chegada de novos contingentes
populacionais, e com eles uma nova configuração da hierarquia social urbana.
796
Françoise BEGUIN (1981: 48) fala de uma “disciplina suave”, que consistiria na passagem de um “conforto selvagem” para
um “conforto disciplinado”, sendo o primeiro marcado pela liberdade da vida desregrada nos cortiços e o segundo pelos
compromissos assumidos a fim de viver numa casa proletária. “Opressão doce e insidiosa, o conforto vai sujeitar os
pobres a um duplo controle: um controle econômico pelo viés dos instrumentos que são propostos para produzi-lo; um
controle político visto que, passando para o campo dos que têm alguma coisa a perder, (...) Controles cujos limites não
são percebidos, já que o conforto nunca provoca um fenômeno qualquer de saturação, sempre há novos elementos para
completá-lo, intensificá-lo, aperfeiçoá-lo, diversificá-lo.”
797
A intensificação da separação entre público e privado, segundo Richard SENNETT (1998), fez do espaço público palco de
uma sociabilidade burguesa mais formal, com a limitação do uso das praças, onde o comércio ambulante e acrobatas, entre
outras atividades, foram banidos, transformando-se em locais de encontro entre semelhantes, de exposição a estranhos
(platéia).
798
Telma CORREIA (1998b) aponta que a relação entre indústria e cidade no final do século XIX era contraditória, pois se, por
um lado, a cidade oferecia facilidades, como a oferta mão-de-obra mais especializada, disponibilidade de infra-estrutura e
proximidade do mercado consumidor e fornecedores, por outro, em especial as grandes cidades eram vistas como locus das
questões social e sanitária. Nelas, os salários eram mais elevados, os trabalhadores mais organizados, as epidemias,
constantes, e moralidade dos trabalhadores, precária.
799
Um exemplo emblemático desta conjugação entre projeto industrial (econômico) e social é a atuação de Robert Owen em
New Lanark (vide capítulo 1).
800
Cabe ressaltar que, contrariamente a James ALLEN (1966), que inclui no rol das cidades empresariais núcleos urbanos que
somente a partir de um determinado momento de sua história passaram a ser controlados por uma única empresa, ou
daquelas experiências que tinham como fim primeiro a construção de uma nova ordem social e não o empreendimento
industrial (este aparecendo como mera complementação), ou ainda dos conjuntos edificados espontaneamente por
empreendedores imobiliários e indivíduos que buscam uma localização mais próxima do trabalho. Neste trabalho o
emprego do termo “cidade empresarial” refere-se somente àqueles originalmente concebidos e construídos a fim de abrigar
272
são experiências emblemáticas do entrelaçamento entre projeto urbano e social, pois, ao construir
núcleos urbanos, as empresas, intencionalmente ou não, propõem uma forma de organização social.
Seja pela distribuição espacial, pelo programa e arquitetura dos edifícios e espaços públicos, ou pela
imposição de regras de comportamento no trabalho e na vida privada, à construção do corpo físico
segue-se a construção do corpo social, o qual, do mesmo modo que o primeiro, tem sua conformação
condicionada tanto pela incisiva atuação da indústria quanto por grupos que se opõe a ela,
demonstrando que, embora imperativa, a vontade da indústria não é absoluta.
Em alguns casos, no entanto, nem o projeto urbano nem o social compunham o plano inicial de ação
de alguns empreendedores industriais. Isso ocorria somente quando o plano empresarial vinha atrelado
a uma ideologia, fosse ela religiosa, social ou artística. Os empreendimentos construídos segundo estas
filosofias são o que Margareth C
RAWFORD (1995) chama “cidades modelo”
801
, em oposição àqueles
subordinados unicamente à lógica produtiva. Contudo, mesmo tendo sido idealizadas e edificadas para
funcionarem como verdadeiras cidades, em seus momentos iniciais essas experiências não possuíam
um corpo social com características de cidade no sentido pleno do termo, pois, além da ausência de
liberdades políticas, motivada pelo seu fechamento e condição de propriedade privada, sua
organização social ainda era rudimentar, não sendo possível mesmo distinguir mais que dois grupos
sociais: empregados e patrões. Não havendo, portanto, correspondência alguma entre corpo social e
estrutura física
802
.
Essa correspondência entre corpo físico e social, para Leonardo B
ENÉVOLO (1991), foi reconhecida
somente após o aprofundamento dos estudos sobre o Renascimento, quando se tornou primordial para
o entendimento da história das cidades
803
. E é sobre ela que o autor fundamenta seu estudo das
cidades.
804
Tomando como ponto de partida a noção de que as estruturas físicas sobrevivem às
estruturas sociais, B
ENÉVOLO (1991) acredita haver necessidade de períodos de adaptação para que
uma se equipare à outra. No entanto, levando-se em conta as consideráveis distâncias entre o conceber,
o construir e o apreender, a obrigatoriedade de uma correspondência direta entre físico e social, a fim
o conjunto de trabalhadores de uma única empresa industrial, sendo, de caráter permanente ou não, fruto de uma ação
planejada ou não. Uma delimitação mais precisa para o emprego do termo “cidade empresarial”, no entanto, fica para outro
momento.
801
Margareth CRAWFORD (1995) diferencia “model towns” de “landscape cities”, respectivamente “cidades empresariais
modelo” e “cidades empresariais industriais”. Enquanto as primeiras são subordinadas unicamente à lógica industrial, as
outras vinculam-se a outras ideologias (como a religiosa, social ou artística).
802
Para discussão sobre conceito de “cidade” e o emprego do termo “cidade empresarial”, vide capítulo 1.
803
Embora afirme que “A palavra cidade emprega-se em dois sentidos: para indicar uma organização da sociedade
concentrada e integrada, que começa há cinco mil anos no Oriente Próximo e que então se identifica com a sociedade
civil; ou para indicar a situação física desta sociedade” (BENÉVOLO, 1991: 13), e que “... o postulado da correspondência
incondicionada entre cidade e sociedade só funciona bem para as épocas felizes, onde existe uma medida comum entre as
duas realidades e um sistema de instituições que estabiliza tanto uma quanto outra” (
BENÉVOLO, 1991: 17). É exatamente
nessa confluência entre o físico e social que Leonardo Benévolo estrutura sua história das cidades. Fundamentada numa
divisão que leva em conta o modo de usufruir, pensar e construir a cidade, determinado pela sociedade, as cidades
posteriores ao Renascimento são classificadas em: Liberal, Pós-Liberal, Pós-Liberal Corrigida e Moderna.
804
O que não implica em concordar com o autor quando coloca a “Cidade Moderna” como o resultado de um longo processo
de adaptação entre o corpo físico e social, processo que se inicia com a industrialização e dá origem à “Cidade Liberal”,
que, ao sofrer as primeiras intervenções do Estado, torna-se “Cidade Pós-Liberal”. O estabelecido de um conjunto de
regras sobre as quais se devem fundamentar as futuras intervenções faz desta cidade a “Cidade Pós-Liberal Corrigida”; e,
finalmente, a incorporação de novos valores pela sociedade torna-a capaz de idealizar um modelo definitivo para as
cidades, a “Cidade Moderna”. (B
ENÉVOLO, 1991)
273
de que seja possível entender um por intermédio do outro, parece por demais irreal. A espera de
épocas felizes”, quando haja uma “correspondência incondicionada entre cidade e sociedade”, pode
funcionar enquanto modelo ou estereótipo que ajudam a compreender um determinado período e local,
mas jamais para descrever uma realidade específica, pois, como lembra Bernard L
EPETIT (2001): a
cidade é composta de uma sucessão de tempos, que se atualizam constantemente de forma desigual, o
que significa que, ao mesmo tempo em que partes da cidade permanecem imutáveis, outras estão se
alterando.
No caso das cidades empresariais, assim como nas cidades novas, as grandes dimensões e a velocidade
com que se estabelecem dão força ainda maior ao impacto causado por sua implantação, reforçando a
idéia da “tábua rasa”. Como estruturas materiais que se impõem de uma só vez sobre o território, elas
determinam de imediato uma nova forma de relacionamento com o espaço físico sobre o qual se
localizam, provocam repentinas modificações no modo de vida daqueles que vivem em suas
imediações e obrigam ao convívio com uma paisagem completamente diversa da anterior. Torna-se,
assim, mais difícil a permanência ou detecção de “camadas subterrâneas” e a sobrevivência de tempos
anteriores. Tanto estruturas físicas quanto organizações sociais e expressões culturais vêem-se, de um
momento para o outro, cobertas por elementos novos, num processo que se intensifica devido à
obrigatoriedade de adaptação a uma nova realidade e que perpassa todo o cotidiano, desde as
atividades profissionais até as do dia-a-dia.
805
Partir do “zero”, no entanto, mais do que uma necessidade, foi freqüentemente visto como algo
desejável, pois facilitava o processo de conformação da sociedade nos moldes pretendidos. Juntamente
com o isolamento, dado pela distância e pelo fechamento do núcleo operário
806
, o processo de
desenraizamento da população, intensificado pela vinda de um vasto contingente populacional oriundo
de várias regiões, se, por um lado, favorecia a dominação, por outro, gerava uma desagregação que
dificultava a composição de uma identidade local, o que era vantajoso para os industriais, pois
colocava mais um obstáculo na organização de movimentos reivindicatórios
807
. Nesse sentido, a
própria organização espacial dos núcleos, onde é freqüente a ocupação dos bairros unicamente (ou
majoritariamente) por empregados de mesma graduação (engenheiros, técnicos, operários, etc.),
aparece também como indicativo de uma segregação intencional
808
.
805
Exemplos destas modificações e necessidade de adaptação podem ser encontrados nos depoimentos do Sr. Perácio e Dona
Vilma. Do primeiro, quando o pai é obrigado a deixar o trabalho de seleiro, para abrir um bar, pois o cavalo perdera espaço
para o carro, e da segunda, pelo receio que tem de cumprir obrigações simples, como ir ao armazém, enfrentando todo um
grupo de pessoas desconhecidas.
806
O afastamento de outras cidades e o isolamento dos núcleos possibilitavam, além do controle e a exploração da mão-de-
obra, por intermédio de um sistema de dupla extração da mais-valia, como operários e inquilinos, havendo ainda o lucro
obtido diretamente pela venda de produtos nos armazéns e pelo emprego das cadernetas, eliminando por vezes o emprego
de dinheiro vivo dentro do núcleo, substituído por moedas alternativas, como o “piscirico” em ACESITA (Vilma
SPERANCINE, 2004) e o “boró” em Volta Redonda (COSTA, 1991).
807
Um exemplo disso pode ser verificado em Nova Lima, quando a companhia de mineração organizou um novo sindicato
para fazer oposição ao existente, numa clara tentativa de, pela divisão, enfraquecer os trabalhadores (G
ROSSI, 1981).
808
Que pode chegar a extremos como em Norris - cidade construída na década de 1930, nos EUA, para abrigar os
trabalhadores empregados na construção das barragens do projeto da Tennesse Valley Authority - onde há até mesmo
distinções raciais, com negros reunidos numa determinada região da cidade, imigrantes estrangeiros em outra, e nacionais
em uma outra (M
CDONALD & MULDOWNY, 1982).
274
A extensiva vigilância e a ingerência da vida do operário para além dos portões da fábrica foram
usualmente adotadas nos núcleos operários, com a finalidade de impor-lhes um determinado modo de
vida, todo ele voltado para o trabalho fabril, o que implicava em afastá-lo de “tentações mundanas”,
como a bebida e o jogo, reforçar os laços familiares e regrar seus hábitos de higiene e convívio social;
enfim, implicava na constituição de um novo habitat, todo ele regido pelos ideais burgueses e que
tinha na casa seu elemento estruturador
809
.
Este controle assumiu diversas formas e apresentou intensidades também variáveis
810
, havendo em
muitos casos um literal exercício de poder de polícia
811
sobre a comunidade, poder legitimado pela
idéia de fazer dela uma “grande família”, ou seja, tornar forte a identificação do grupo com a indústria,
a ponto de permitir que a autoridade de seus prelados se tornasse inquestionável. Nesse contexto,
foram comuns as tentativas de associar a figura do patrão à do pai, possibilitando a legitimação de sua
autoridade na premiação e punição de todos seus membros. Uma idéia construída por intermédio de
discursos, boletins internos e promoção de atividades de lazer e recreação, como campeonatos de
futebol, bandas de música, desfiles e festas religiosas e institucionais.
O sentimento de satisfação e orgulho por pertencer a uma “família” onde tais atividades eram
possíveis colaborava na elevação da auto-estima pessoal do operariado
812
, que se tornava, então,
passível de ser convertida em motivação para o trabalho
813
e submissão a salários menos
compensadores que fora dela
814
. Em contrapartida, essa maior identificação da comunidade facilitava a
formação e consolidação de grupos de interesse, cujos objetivos nem sempre eram condizentes com os
patronais.
815
Assim, um aprendizado de resistência, mais do que uma reação aos métodos de
convencimento e coação, surgia como desdobramento da própria “educação” imposta pelo patronato.
Resistência que, do mesmo modo que a “disciplina suave”, fazia uso de mecanismos inerentes ao
sistema capitalista, apropriando-se de instrumentos próprio dele para combater um “adversário”
aparentemente mais forte e preparado. Assim, fazendo uso dos termos utilizados por José Sérgio L
EITE
LOPES (1988), observa-se que, se por um lado havia uma “interiorização da dominação”, os embates
com a companhia demonstram que por outro havia uma “exteriorização do conflito”.
Mais do que expressão de resistência e protesto, manifestações como greves e passeatas, constituição
809
Vide capítulo 1.
810
As visitas surpresa nas casas e exame da vestimenta e higiene dos operários, bem como a obrigatoriedade na participação
de eventos cívicos, também eram práticas constantes e cujo descumprimento implicava tanto em punições físicas como em
multas ou mesmo dispensa. O controle moral estendia-se também ao armazém, onde a oferta e os preços dos produtos
também eram controlados. Até mesmo a circulação dos solteiros e os assentos nos cinema eram vigiados. A educação e
formação moral também eram reguladas de maneira rigorosa, tanto em Pedra como na Vila Maria Zélia, ficando somente
com dois exemplos nacionais.
811
Verificável pela criação de “delegacias” e grupo policiais, como no “Núcleo 100” de Volta Redonda (COSTA, 1991), no
episódio do “massacre de Ipatinga” e nas disputas em Nova Lima.
812
Um caso interessante é o do time de futebol da Usina Santa Bárbara, o CAUSB, que, embora nunca tenha chegado a jogar
sequer na segunda divisão do campeonato paulista, é lembrado na cidade como um time vencedor, imagem que se estendia
aos empregados da usina. (QUECINI, 2000)
813
Muitas vezes vistas como “favores”, conforme LEITE LOPES (1978).
814
O exemplo paradigmático dessa exploração é o de Pullman, onde os altos aluguéis e baixos salários levaram a uma greve
que se estendeu por quase todo o país, levando ao questionamento desse tipo de empreendimento.
815
Como o sindicato e os grupos de compra de Nova Lima (GROSSI, 1981) ou a identificação de insatisfações comuns na
“família-nitrina”, motor de partida das primeiras movimentações coletivas (F
ONTES, 1997).
275
de sindicatos e redação de jornais e folhetos, eventos artísticos e culturais, pelo envolvimento de
diversos grupos e uma parcela significativa da população, tornavam-se elementos de identificação
social, símbolos capazes de representar toda a coletividade. Assim, mais do que a existência de uma
consciência de classe, observa-se a formação de uma cultura local que, como observou Edward
T
HOMPSON (1989: 44) a respeito da cultura da plebe inglesa do século XVIII, é
..rebelde, porém rebelde em defesa de seus costumes. ...[e] Embora quando o povo busca uma legitimação do
protesto, recorre amiúde às regulações paternalistas de uma sociedade mais autoritária e seleciona entre
elas aquelas partes melhor pensadas para defender seus interesses do momento;816
O que que não há uma dominação cultural, mas o que Vera C
ANDIDO PEREIRA (1979: 139) chamou de
“reinterpretação criativa”, pois,
... embora submetidos a um controle organizacional rígido e a um código cultural dominante, que lhes
fornece as categorias e as práticas de trabalho de toda uma ‘cultura tecnológica’, os operários encontram
meios e espaços para uma ‘reinterpretação criativa’ do sentido da divisão do trabalho, das relações sociais
decorrentes e elaboram modelos ‘espontâneos’ de comportamento.
Portanto, nessas manifestações, expressa-se a consolidação de uma identidade local, importante
parâmetro para a consolidação da cidade como tal, condição conferida pelo desenrolar de uma vida
urbana que, embora seja fortemente influenciada pela presença da indústria, não é totalmente
controlada por ela, onde os conflitos não são mera conseqüência da atuação empresarial, mas uma
expressão da cultura dacomunidade que se formou em torno dela.
Aproximando-se do entendimento de cultura de Raymond W
ILLIAMS (1992: 13), segundo o qual a
cultura é um sistema de significações mediante o qual necessariamente “... uma dada ordem social é
comunicada, reproduzida, vivenciada e estudada”, que no seu ponto de vista permite englobar tanto a
visão materialista (centrada numa ordem social global, geradora direta das manifestações culturais),
quanto da idealista (cuja ênfase está no espírito formador, ou seja, no papel das expressões culturais
como geradoras de um modo de vida global), busca-se, por intermédio dessas expressões culturais,
conhecer o tipo de sociedade que a ACESITA ajudou a formar na cidade de Timóteo. Este
reconhecimento e entendimento da sociedade timotense têm como premissa olhar a cidade a partir de
seus habitantes
817
, procurando confrontar a intenção do plano empresarial com seu impacto social,
num momento em que movimentos sociais e projetos urbanos e arquitetônicos se mesclaram para
consolidar e dar identidade à cidade. Nesse contexto, destaca-se o período em que o general Edmundo
Macedo Soares esteve na presidência da usina, pois foi a partir de sua administração que ao projeto
industrial foi intencionalmente adicionado um projeto social, quando se evidenciou a intenção da
indústria de construir mais do que uma “cidade empresarial”, de construir uma “cidade modelo”
818
.
Construção sustentada tanto por um discurso que conclamava a comunidade local a trabalhar não pelo
bem da empresa, mas pelo bem da nação, como no que pronunciou no almoço de Natal de 1953, no
qual diz que a ACESITA deve ser vista como
“... uma execução nossa, como uma obra dos que vieram para o Vale do Rio Doce, a fim de plantar um
816
“... rebelde, pero rebelde en defesa de la costumbre. ...Pero cuando el pueblo busca una legitimación de la protesta,
recurre a menudo a las regulaciones paternalistas de una sociedad más autoritaria y selecciona entre ellas aquellas
partes mejor pensadas para defender sus intereses del momento; ...” (T
HOMPSON, 1989: 45)
817
Dessa forma buscou-se privilegiar o uso de fontes orais e recortes de jornal.
818
Para esta diferenciação, vide capítulo 1, e para atuação do general Edmundo Macedo, vide capítulo IV.
276
marco definitivo que fará o seu prazer a sua hora; e mais: acima de tudo colocará o Brasil no nível das
nações mais adiantadas, elevando esta grande Pátria que é de todos nós, dos que nela nasceram e daqueles
que para aqui vieram.” (Índice de Suplemento de ACESITA, 1953).
Objetivo que devia ser alcançado pela garantia de condições favoráveis à fixação de elementos cuja
capacidade de trabalho fosse tanto técnica quanto física e moral, de modo que Macedo Soares
esmerou-se não somente em trazer técnicos estrangeiros e criar cursos de formação, como também
promoveu uma sensível melhora na infra-estrutura urbana e no desenvolvimento de atividades
recreativas. Nesse período, também se destacou o papel da Igreja, intensamente utilizada pela empresa
como elemento de apoio tanto no plano moral quanto diretamente na organização dos trabalhadores
rurais. Ações que levaram ao fortalecimento dos vínculos da comunidade e à consolidação de uma
identidade coletiva fortemente atrelada à indústria.
Conquanto a década de 1960, quando a cidade empresarial foi aberta e posteriormente emancipada,
marque o fim da tutela direta da empresa sobre a moradia e o início da independência política do
município, o que exigiu a montagem de instituições cuja finalidade era atender não somente aos
empregados da usina, mas toda a comunidade local, ela ainda é marcada pela manutenção do vínculo
com a ACESITA (vide capítulo IV). Foi somente na década de 1980 que a atuação do sindicato voltou
a ser mais incisiva, e as manifestações culturais ocorridas na cidade parecem indicar a existência de
uma vida social autônoma dos ditames da usina, ocorrendo neste período as greves mais significativas,
as mais acirradas discussões sobre o nome da cidade, bem como a incorporação do protesto às
festividades carnavalescas. De modo que é por intermédio dessas atividades que se evidência a
resistência à disciplina e regulação impostas pela empresa, resistência por vezes aberta e direta, como
nos embates com o sindicato, e por vezes sutil e dissimulada por um clima de festa, como na
organização dos blocos carnavalescos. Essa resistência, mais do que mera oposição à companhia,
indica a consolidação de uma identidade que foi fortemente condicionada por sua atuação, que se
construiu a partir dos elementos oferecidos pela indústria, transformando seus ensinamentos e
imposições em instrumentos de luta, fazendo da sociedade timotense um exemplo primoroso de uma
“sociedade industrial”.
Mas entender essa sociedade é mais do que entender esses eventos e momentos; é, pela análise dos
discursos que buscam legitimá-los, encontrar mitos que lhes dão suporte, ou seja, quais foram os
elementos e de que forma eles foram incorporados à cultura local a fim de se construir a imagem que
hoje ela tem de si mesma. Permitindo esclarecer sobre que base se assenta a análise do papel
desempenhado por diversos atores na constituição de um agrupamento populacional e sua
transformação em sociedade, no caso de Timóteo, qual o papel da grande indústria, da Igreja Católica,
das associações esportivas, do sindicato e de outras formas de organização da coletividade local, na
realização de formas de expressão da cultura local, como o carnaval, os campeonatos esportivos, os
bailes, as celebrações religiosas e mesmo as greves.
277
VI.2 ORGANIZAÇÃO SOCIAL E CULTURAL DE TIMÓTEO
Se até a década de 1940 o crescimento da região do médio Rio Doce e do Vale do Piracicaba havia
sido bastante lento, com a população que ocupava o povoado de quase cem anos ao redor da capela de
São Sebastião e as fazendas da região do Alegre contando pouco mais de mil e setecentos habitantes,
com a implantação da ACESITA a situação modificou-se radicalmente. Em menos de dez anos esse
número saltou para mais de onze mil, um crescimento de quase sete vezes (6,76), sendo que, desse
total, cinco mil eram empregados diretos da companhia, ou seja, cerca de 40% da população local
trabalhavam para a ACESITA (vide AnexoI_tab01 e 08)
819
.
Mesmo sem dados precisos quanto à origem desta grande leva de imigrantes atraída para a localidade
pela perspectiva de facilmente encontrar trabalho
820
, observa-se pelas entrevistas que a maioria era
oriunda da própria região
821
, alguns já haviam inclusive trabalhado para a Belgo-Mineira, Companhia
Vale do Rio Doce ou para empreiteiras de carvão e mineração a elas vinculadas
822
.
Mas, apesar de haver certa familiaridade com a região e com as atividades de mineração e carvoaria,
nota-se que eram raros os que vinham de cidades de grande e médio porte, de modo que o impacto do
intenso burburinho de uma comunidade que em pouco mais de cinco anos ultrapassou os dez mil
habitantes, mas que não possuía quase nenhuma infra-estrutura, parece ter sido desnorteador. No
entanto, mesmo para aqueles como dona Núbia e dona Vilma
823
, que, ao contrário da maioria, estavam
acostumadas a cidades maiores como Conselheiro Lafaiete e Juiz de Fora, o choque foi grande e a
decepção maior ainda, pois não eram somente as condições materiais que eram precárias; a falta de
atividades de lazer e culturais também se fazia marcante, o que levou-as, cada uma a seu modo, a
rapidamente se empenharem em desenvolvê-las
824
.
Mas se estas senhoras sentiam tais deficiências na década de 1950, o que não dizer dos primeiros anos
819
Com a concentração fundiária, houve também um declínio significativo das pequenas propriedades e, conseqüentemente,
da produção agropastoril de subsistência que caracterizava a economia da região (vide capítulo III e IV).
820
Parece ter sido bastante comum a indicação de parentes e amigos, como no caso do sr. Kleber, que veio visitar um
cunhado que lhe arrumou emprego na companhia, ou o esposo de dona Núbia cujo irmão acreditava poder fazer bons
negócios na exploração de carvão, ou mesmo o sr. Paulo Della Libera, que veio na década de 1970 por indicação de um
amigo.
821
Entre os doze entrevistados que já se encontravam em Timóteo antes da década de 1960, somente o esposo de dona Wilma
era de outro estado (Espiríto Santo), nove eram de cidades da região (entre as cidades mencionadas estão: Ferros, Bom
Jesus do Galho, Dionísio, Afonsos, Barão dos Cocais e Nova Era) e, dos dois que nasceram em Timóteo, um já vivia em
Timóteo antes de 1940 (O pai do sr. Perácio Bicalho era celeiro numa fazenda e, embora tenha sido convidado para
trabalhar para a companhia, com a venda da fazenda onde trabalhava preferiu trabalhar como autônomo).
822
Entre os entrevistados, Antonio Carlos era terceira geração de metalúrgicos, o Sr. Wavá havia trabalhado na CVRD, José
Fausto D’Ávila trabalhara para uma empreiteira de carvão da Belgo e mesmo o sr. Perácio, que nunca chegou a trabalhar
para a ACESITA, trabalhou numa empreiteira que estava construindo o alto forno da USIMINAS. Também o sr. Kleber
Barbosa, em entrevista ao Jornal de Timóteo (B
ARBOSA, 2002: 03), também afirma que a ACESITA “... recrutou uma
grande leva de ex-servidores de uma empreiteira da Vale do Rio Doce/EFVM”.
823
Entre os entrevistados, as únicas exceções são dona Núbia e dona Vilma, sendo que a primeira havia trabalhado por
muitos anos em ateliês de alta costura em Juiz de Fora e vivera com o marido em Belo Horizonte, enquanto a segunda
nascera e fora criada em Conselheiro Lafaiete.
824
Dona Núbia começou a lecionar e foi uma das mais empenhadas em preservar a memória do centro sul, deu também aulas
de catecismo e participou ativamente da organização de festas locais, como o Congado de São Sebastião e as procissões de
Corpus Christi, e, apesar das dificuldades impostas pelas doenças e pela idade, ainda colabora no movimento de
consciência negra dando palestras nas escolas. Dona Vilma, primeiramente, se envolveu com a organização do time de
futebol onde o esposo era um dos craques, é uma das fundadoras da escola de samba Bocas Brancas e colabora em
atividades com entidades beneficentes, como a FUMIC e APAE.
278
de implantação da usina?! Quando a precariedade e o improviso eram sentidos nas habitações
construídas com a madeira dos caixotes que haviam embalado as máquinas, quando a cidade ainda não
tinha um projeto urbano, quem dera um social! Contudo, ao contrário do que se poderia esperar, as
raízes do desenvolvimento de atividades coletivas que denotassem a formação de um sentimento de
comunidade, onde a identificação ultrapassava os portões da fábrica deixando o universo do trabalho
para prolongar-se no cotidiano, em Timóteo não apareceu primeiramente para suprir necessidades
materiais; não foram reivindicações quanto ao salário, à habitação ou mesmo alimentação e saúde,
também bastante deficitárias
825
, mas a formação de um time de futebol que constituiu a primeira
notícia sobre uma iniciativa de organização de seus trabalhadores.
Isto, no entanto, não deve ser visto como um sinal de que não havia conflitos ou reivindicações e
insatisfações de outras ordens, mas somente que este foi o primeiro espaço onde foi possível uma
forma espontânea de organização. Espaço que se alargou dando origem aos clubes e ligas esportivas
que, diversamente das atividades que foram propostas desde o início pela ACESITA, como festas,
missas, desfiles e procissões religiosas e cívicas, ou mesmo a Cooperativa de Consumo e o Fundo de
Socorro ou ainda o carnaval de rua, que acabaram originando instituições que não hesitaram em
expressar sua oposição à empresa (como os sindicatos – metalúrgicos e carvoeiros – e os blocos
carnavalescos), os times de futebol e os clubes, mesmo sem dependerem diretamente da ACESITA
826
,
não se opuseram abertamente a ela.
VI.2.1 O FUTEBOL, OS CLUBES E OUTRAS ATIVIDADES DE LAZER
O primeiro time de futebol de Timóteo, o Florestino Social Clube, foi fundado pelos moradores do
povoado do Timóteo, tendo como sede a fazenda de Joaquim Ferreira de Souza, poucos anos antes do
início da implantação da usina, em 1938. Contudo, a distância entre esta localidade e o sítio onde a
companhia estava construindo sua cidade operária fez com que somente a posteriori houvesse uma
maior integração dessa equipe aos campeonatos organizados pelo pessoal da empresa. Além do mais,
no início a oferta de atividades de lazer pela ACESITA, como afirma o sr. José Nazareno A
TAÍDE
(1986: s/p), era feita “... de maneira acanhada, muito precária. Disto são testemunhas os antigos
Clubes Recreativos, a Corporação Musical, os Campos de Futebol, os Parques de Diversão em
alguns bairros, as boas apresentações musicais no palco do Elite Clube
827
. Assim, acredita-se que,
825
Como foi observado no capítulo IV, desde sua implantação a empresa teve dificuldades em garantir o abastecimento de
produtos agropastoris.
826
A maioria deles recebeu alguma forma de incentivo (doação de terreno, patrocínio de atividades, orientação na
organização, etc.), mas, na maioria, a sobrevivência dependia da contribuição mensal dos sócios.
827
Embora o sr. José Nazareno ATAÍDE (1986) aponte para as datas de fundação de clubes e associações esportivas e
recreativas anteriormente a 1975, diz que foi somente a partir do ano seguinte que “...outras modalidades de esportes
começaram a ser ensinadas e incentivadas através de competições, olimpíadas internas e externas”. Idéia que é reforçada
pelas reportagens das revistas Fato/Esporte de 1970 (A
CESITA, 1970a, b e c) nas quais, além de uma breve menção à equipe
de judô da USIPA (clube da Usiminas) não há menção alguma a outros times e esportes além do futebol e futebol de salão,
apesar de que, a partir de 1967, o presidente expressar preocupação quanto à necessidade de diversificação de atividades do
clube para sua sobrevivência: “Em meados de 1967, sentindo que alguma coisa deveria ser feita, pesquisando outros
clubes, colhendo exemplos, Cirênio [presidente do clube] chegou à conclusão de que somente com futebol o AEC não
poderia sobreviver e, vendo o que aconteceu com o: Siderúrgica, Metaluzina [sic], Renascença, e outros grandes clubes
279
apesar de desde a chegada dos primeiros operários para a construção da usina houvesse “peladas” e
mesmo times organizados, foi somente em 1945 que se fundou oficialmente o primeiro time dos
empregados da companhia, o ACESITA Esporte Clube
828
(BERGO, 1996).
Entre seus fundadores está Brasileiro Wilkes de Minas, que descreve para a revista Fato/Esporte
829
(A
CESITA, 1970b: 33) como a idéia do time foi espontânea e não tardou em se concretizar:
...‘A idéia de fundar um time de futebol era de todos nós, mas dificuldades eram enormes, pois faltava tudo
estivemos [sic] que ‘dar um duro danado’ para que a idéia fosse avante. ... Um dia – prossegue o Brasileiro
– após um treino, alguém lembrou que era melhor formar uma diretoria para resolver os problemas que a
fundação do clube estava exigindo [sic], reunimos a turma e fomos para a nossa república
830
, que ficava
onde é a Delegacia de Polícia. Com muita gente presente e depois de muita conversa, sem que chegasse a
uma solução par ao caso acabei indicando o nome [do] Dr. Ismael para presidente, o que foi aceito por
todos.’
O primeiro jogo oficial ocorreu no ano seguinte contra o Social (time de Coronel Fabriciano) e “... foi
realizado sob intensa expectativa de um grande público que compareceu ao campinho da Igreja”
831
.
(A
CESITA, 1997c: 30). Entusiasmo que parece ter contagiado também a companhia que, prontamente,
cedeu um novo local para os jogos, realizando-se ainda em 1946 o primeiro jogo no novo campo, uma
área da ACESITA no centro norte, onde funcionou o CRAPE
832
e hoje se situa uma filial da prefeitura
(A
TAÍDE, 1986: 234).
Rapidamente surgiram outros times
833
, e sentindo-se a necessidade de melhor organizar o
campeonato
834
local, já em 1955 foi fundada a Liga Acesitana de Futebol (LAF), posteriormente
chamada Liga ACESITA na de Desporto (LAD)
835
.
Com o campeonato organizado, os times também buscaram melhorar, trazendo, da capital, jogadores
profissionais em final de carreira, e jovens revelações dos times da região
836
para compor seu plantel.
do passado, idealizou a construção de uma Sede Campestre. ‘É moda, dá resultados, preenche uma lacuna, satisfaz um
sonho e atende a uma necessidade social’, pensava ele”.(
ACESITA ESPORTE CLUBE, s.d.).
828
Segundo o sr. José Nazareno ATAÍDE (1986), os fundadores do ACESITA Futebol Clube foram Brasileiro Wilkes de
Minas e Manuel Valentim do Carmo (fotógrafo); seus primeiros presidentes foram Josué Teodoro de Souza e Ismael
Oliveira Fábregas
829
Foram localizadas somente as duas primeiras edições desta revista, que parece ter sido motivada pela euforia da conquista
do campeonato mundial de 1970 pela Seleção brasileira, bem como pelo ingresso do ACESITA Esporte Clube para a
divisão Extra do campeonato mineiro de futebol neste ano.
830
A República à qual se refere Brasileiro é provavelmente o alojamento de solteiros, situado onde hoje está o escritório da
companhia, próximo à capela São José.
831
A localização exata deste campo é dada pelo sr. Kleber BARBOSA (2002: 03): “...cujo primeiro campo situava-se onde esta
o conjunto de lojas comerciais (entre a praça 1.
o
de Maio e a Alameda 31 de Outubro)”.
832
Infelizmente não foi possível desvendar o era o CRAPE.
833
Em 1970 eram treze: ACESITA, Vila Nova (1948), Botafogo (Mecânica), Funcionários, Laminação, Industrial, São
Cristóvão, Cachoeirinha, Cruzeiro, Náutico, Forjaria, Grêmio e Ipiranga (Fato/Esporte, 1970), além do Florestino e de
outros que rapidamente se extinguiram, como o Siderúrgica, Metaluzina e Renascença (mencionados na história do
ACESITA E
SPORTE CLUBE, s.d.). Em 1988, na tabela da primeira fase do “Campeonato Acesitano” de futebol, apresentada
no informativo da P
REFEITURA MUNICIPAL DE TIMÓTEO de abril de 1988, constam 15 times: ACESITA, Independente, Vila
Nova, Industrial, São Cristóvão, Cachoeirinha, Ipiranga, Florestino, Renascença, Palmeiras, CAF, Olaria, Mensageiro,
Laminação e Jaggar. E no atual campeonato participam 18 times: ACESITA Esporte Clube, Anápolis FC, Cachoeirinha
EC, Esplendor EC, Florestino SC, Independente PEC, Independente EC, Industrial FC, Ipiranga EC, Juping EC,
Laminação EC, Olaria EC, Palmeiras EC, Santa Cecília EC, São Francisco EC, Vila Nova EC (TIMES BRASILEIROS, s.d.).
834
... o que mais incomodava era o número de times existentes aqui. (MAGNANI, s.d.).
835
Entre os idealizadores da liga estão Kleber Barbosa, Diogo Sabará e Hélio Magnani, Diogo Sabará, quem conta que, após
uma reunião com os dirigentes e decidido seu escudo, em 1º de maio de 1955 foi fundada a Liga Acesitana de Futebol. No
mesmo ano ela se filiou à Federação Mineira de Futebol, em 1957 organizou um tribunal de justiça desportiva e, em 1964,
com a emancipação do município, ela tornou-se Liga Acesitana de Desportos (LAD) (M
AGNANI, s.d.).
836
Alguns dos jovens talentos trazidos para a cidade eram: Dico (José Raimundo) de Nova Lima, Dorvelino Rodrigues Coura
de Dionízio, Nelson Gonçaves Torres de Pedro Leopoldo, Otávio e Izídio Sperancini de Conselheiro Lafaiete. Entre os
jogadores que vinham de times grandes estão: Wilson Faria, que jogara no América e no Atlético (ACESITA, 1970b).
280
Este processo pode ser notado fortemente no ACESITA Esporte Clube, onde, como relata o sr. Kleber
Barbosa
837
, bons jogadores eram rapidamente contratados pela companhia:
No início, o time limitava-se a treinar e realizar jogos amistosos contra equipes das redondezas. Mas com o
passar dos tempos, já melhor estruturada, com um plantel renovado (ou reforçado) graças ao apoio recebido
dos dirigentes da empresa, que facilitava o emprego pra quem era bom de bola, o time passou a alçar vôos
mais altos, passando a enfrentar adversários de maior expressão, tais como: Social (Coronel Fabriciano),
Democrata e Pastoril (Governador Valadares), Valério (Itabira) e até mesmo agremiações de Belo
Horizonte, colhendo sempre bons resultados. Basta dizer que, em determinada época, chegou a permanecer
invicto (sem derrotas por cerca de cinqüenta jogos, o que levou a ser cognominado de ‘Esquadrão de Aço’.
(B
ARBOSA, 2002: 03)
Esta melhora da equipe foi apontada pela revista Fato/Esporte (ACESITA, 1970b: s.p.) como um dos
fatores que levaram o ACESITA E. C. a se profissionalizar, de modo que, apesar de até a década de
1970 o time ter vencido somente três vezes o campeonato organizado pela LAF (contra quatro do Vila
Nova), com estes jogadores já era possível jogar com times do Rio e Belo Horizonte
E os resultados eram bons e entusiasmavam a torcida. ... que já não aceitavam jogos com Raul Soares, Bom
Jesus do Galho, Nova Era, etc., porque o espetáculo não agradaria.”. Ao mesmo tempo “As cotas dos Clubes
profissionais subiram assustadoramente já não se podia falar em jogar com times profissionais do extra. Não
havia outra coisa a fazer: o profissionalismo tornou-se inevitável, a fim de se manter o clube em atividade ...
No entanto, a fim de dar suporte à equipe era necessário que o clube conseguisse uma maior
arrecadação, de modo que, já em 1967, o então presidente do clube Cirênio Guerra, pesquisando
outros clubes, propôs a construção de uma sede campestre. Com o apoio dos colegas, solicitou à
companhia a doação de uma área para o clube, que, após a anuência do Banco do Brasil, cedeu um
terreno de 69.000 m
2
próximo ao bairro Timirim
838
(ACESITA ESPORTE CLUBE, s.d.), onde desde 1958
a companhia já construíra um campo de futebol
839
.
Mas, ao contrário de sua sede campestre, que em 1970, com a construção do grande salão de festas
840
,
tornou-se também sua sede social, a equipe de futebol não conquistou o sucesso almejado. Sem
grandes vitórias no profissional e com dificuldades para manter uma arrecadação
841
capaz de cobrir
suas despesas, não tardou a que ela voltasse ao amadorismo. Mas, apesar de manter-se como um dos
principais times da cidade, foi 14 vezes campeão, três a mais que o segundo maior vencedor da cidade,
o Vila Nova (vide AnexoI_tab20), o time nunca mais recobrou a glória da década de 1970, quando
venceu oito dos dez campeonatos da LAD, levando seus mais dedicados torcedores a lamentarem seu
destino distante dos campeonatos oficiais, pois como lembra o sr. Kleber
BARBOSA (12/nov/2002):
O ACESITA Esporte Clube foi o pai da sede campestre, mas passou a ser filho, dependendo da sede. Hoje, o
837
O sr. João Kleber Gualberto BARBOSA (12/nov/2002) é natural de Bom Jesus do Galho e veio para Timóteo com 16 anos,
conseguindo trabalho na ACESITA por indicação do cunhado logo que chegou, em 1949. Começou como auxiliar de
almoxarifado e se aposentou como supervisor em 1984, mas continuou na companhia até a privatização em 1992, quando
se mudou para a Bahia com a esposa (casou-se em 1957), a fim de ajudar o mais jovem dos cinco filhos a se adaptar,
retornando para Timóteo em 2002. Juntamente com o trabalho na usina, o sr. Kleber Barbosa também escrevia crônicas
esportivas para o jornal Flan, foi um dos fundadores da Associação dos Aposentados de ACESITA e da LAF (Liga
Acesitana de Futebol), da qual foi secretário, tesoureiro e vice-presidente, foi conselheiro e diretor do ACESITA Esporte
Clube e diretor do Grêmio Recreativo Bocas Brancas.
838
Coincidentemente ou não, esta área é a mesma para a qual fora prevista a construção do clube no projeto inicial da cidade
de Romeu Duffles Teixeira (vide capítulo V).
839
Em 1958, a Companhia fez o campo no Bairro Timirim.” (ATAÍDE, 1986: 134).
840
Projeto de José Luiz Batista (vide capítulo V).
841
De 1965 a 1970, o ACESITA E.C. disputou a primeira divisão, neste ano passou para a Extra, onde chegou somente à
final do turno de classificação. Segundo a revista Fato/Esporte (A
CESITA, 1970b), o principal problema enfrentado pelos
times do interior é a falta de arrecadação nos jogos, o que pode levar muitas equipes à falência. Na reportagem “Futebol
deficitário”, chega a prever que, se não houver um melhor aproveitamento dos três campos fechados disponíveis na cidade
“...dentro de pouco tempo vermos eliminados muitos dos clubes do cenário esportivo Acesitano”.
281
ACESITA Esporte Clube é relegado, o departamento de futebol, está à zero! Sendo que ele era o orgulho da
cidade. Os antigos fundadores, os pioneiros, tinham orgulho de ver o ACESITA Esporte Clube, o time
grená
842
, o ‘Esquadrão de Aço’.
Embora nenhum outro esporte apareça com tanto destaque quanto o futebol, ele não foi o único a ser
incentivado pela ACESITA e, se a década de 1970 marca o apogeu e declínio do futebol Acesitano, ela
também marca a difusão de outras modalidades esportivas, com a realização da Copa Integração,
em1975, e no ano seguinte, da primeira Olimpíada ACESITA (F
UNDAÇÃO ACESITA, 2000a)
843
,
eventos que, segundo o sr. Nazareno A
TAÍDE (1986), demonstram o quanto havia se diversificado e
difundido a prática esportiva na cidade, e que estão relacionados com a chegada do professor de
educação física Francisco de Assis Oliveira Azevedo, contratado pela ACESITA em 1975 para
organizar atividades esportivas entre os empregados e que acabou sendo um dos responsáveis pela
criação da ALFA – Associação de Lazer dos Funcionários da ACESITA.
Este novo clube formou-se a partir da reunião de dois antigos clubes: o Elite Clube
844
e o Clube
Operário. Criados na década de 1950 pelo Gal. Edmundo de Macedo Soares, com a finalidade de
proporcionar espaços apropriados às atividades de lazer dos empregados, como o próprio nome indica,
o Elite Clube era destinado a funcionários mais graduados, dos setores técnicos e administrativos.
Privilegiando atividades sociais, na sua sede no bairro Bromélias ocorriam as mais importantes e
concorridas festas da região, em especial os bailes de carnaval e a festa comemorativa do aniversário
da ACESITA, quando eram trazidos artistas famosos, como Caubi Peixoto, Ângela Maria, Carlos
Imperial, Moacir Franco e até mesmo Roberto Carlos (entrevistas José C
RUZ, 2002
845
e Vilma
S
PERANCINI, 2004). Como disse o sr. Nazareno ATAÍDE (1986), até a conclusão da sede social do
ACESITA E. C. ele era o “ponto chique de toda a região”. Já o Clube Operário era destinado aos
operários e pessoal menos especializado, com sua construção descrita no relatório de 1953 como “...
uma praça de esportes, modesta, mas adequada à formação física da mocidade”. (Relatório 1953,
1954; s.p.). Situado no bairro Olaria, embora nele também ocorressem festas e bailes, sua estrutura
privilegiava as atividades esportivas, abrigando os jogos e campeonatos internos que, a partir da
década de 1970, passaram a ser organizados pelas “ligas esportivas internas”
846
.
A consolidação da ALFA, no entanto, data somente de 1982, ano em que o antigo Clube Operário foi
reinaugurado como “Praça de Esportes ALFA” (F
UNDAÇÃO ACESITA, 2000a), e iniciou-se a
construção de seu novo centro esportivo nas proximidades do bairro Primavera. Centro esportivo que
842
Referência à cor do uniforme da equipe.
843
A partir de 1976, outras modalidades de esporte começaram a ser ensinadas e incentivadas através de competições,
olimpíadas internas e externas. Formaram-se 16 ligas esportivas internas, cada uma com sua administração própria.
(ATAÍDE, 1986: 206?)
844
Vale salientar que, além destes, hoje a cidade possui mais dois clubes: o Clube Campestre Choupana, construído pelo sr.
Expedito Marcolino, em 1970, no centro sul, e o clube do SESI, também localizado no Timirim. Em Memorial ambiental
de Timóteo (FUNDAÇÃO ACESITA, 2000), consta a fundação do Vila Nova Esporte Clube em 1948, provavelmente
referindo-se à fundação do time responsável pela construção do campo de futebol ainda existente no bairro Quitandinha,
local onde nasceu o clube.
845
Inclusive segundo o sr. José CRUZ (16/nov/2002), a escassez de moças solteiras na cidade fazia com que algumas fossem
trazidas de trem de outras localidades.
846
Segundo Nazareno Ataíde (1986: 201?), a organização das ligas iniciou-se em 1976, quandoFormaram-se 16 Ligas
esportivas Internas, cada uma com sua administração própria. Seus líderes e Coordenadores, com dedicação extrema,
trabalhando de graça como Técnicos, Mesários, Massagistas, Roupeiros, providenciam transporte, etc..., substituindo, por
ideal, uma equipe de profissionais que a empresa não tem”.
282
se pretendia de grande porte, reunindo praça esportiva, parque aquático e outras facilidades a uma área
arborizada de cerca de 360.000 m
2
, espaço que deveria possibilitar a ALFA estender “... suas
atividades aos funcionários da Usina Hidroelétrica de Sá Carvalho, bem como aos funcionários de
Belo Horizonte) um clube próprio e um arrendado) e de São Paulo” (A
TAÍDE, 1986).
847
Entretanto, os clubes não eram os únicos espaços de lazer da população local; mesmo antes dos
grandes bailes e campeonatos esportivos, a patinação já fazia sucesso, reunindo sempre um público
considerável em torno do “Rinque”. Este espaço, mencionado por quase todos os entrevistados como
ponto de referência tanto do que existe hoje como da localização dos antigos edifícios, consistia numa
grande pista de patinação situada ao lado do centro comercial construído na década de 1950 e que hoje
abriga a ASSOCIA. Assim, enquanto alguns se divertiam patinando e contribuindo para a construção
da nova igreja no Timirim (matriz de São José), já que a arrecadação do aluguel dos patins era
destinada a este fim, outros podiam se divertir com a perícia ou inépcia dos patinadores. A vizinhança
do cinema também parece reforçar o papel do rinque como ponto de referência, já que, logo ao lado,
num galpão de piso cimentado, equipado somente com bancos de madeira capazes de comportar até
duzentas pessoas, desde 1947, quando o sr. Wenceslau Martins Araújo conseguiu a concessão para
explorar o cinema, ele se tornou o Cine São José
848
.
Mas se o rinque não sobreviveu à inauguração do novo centro comercial em 1954, ocorreu o contrário
com o cinema que prosperou passando a ocupar uma das novas salas (onde funcionou a Cobal) e
mudando de nome para Cine ACESITA. Mais de vinte anos depois, o cinema mudaria novamente de
nome e endereço, mas não de proprietário, pois em 1975, pertencente a uma rede regional de cinemas,
a Empresa de Diversões Piracicaba, também de propriedade do sr. Wenceslau Martins Araújo
(A
TAÍDE, 1986), ele foi transferido para um prédio construído especificamente para abrigar o novo
Cine Marabá. No entanto, na década de 1990, esta imponente sala teria a mesma sina de outros
cinemas país afora, sendo transformada em Igreja Universal e deixando Timóteo sem este tipo de
entretenimento, que foi transferido para as modernas salas do Shopping Vale do Aço, em Ipatinga.
No entanto, nem todas as atividades de lazer de Timóteo estavam relacionadas à companhia, sendo que
os piqueniques e pescarias nos córregos da região, em especial na Ponte Queimada, eram atividades
habituais da população desde muito cedo. Além do que, a partir da década de 1970, o sindicato
também passou a promover algumas festas e sessões de cinema (C
RUZ, 16/nov/2002; SPERANCINI,
09/fev/2004) e mesmo admitindo a influência da companhia no comportamento sócio-polítio-cultural
da cidade, Suely S
ILVEIRA (s.d.) relata um crescimento das atividades de lazer no centro sul com a
847
O projeto do novo clube foi elaborado pelo arquiteto Gil Pirolli, sendo que a única informação obtida a respeito do autor é
sua vitória no Prêmio Construções Pré-fabricadas pelo projeto da sede da empresa Spress Informática em Belo Horizonte,
oferecido pela Premo Construções e Empreendimentos S.A. (PREMO, s.d.). Além destas instalações, hoje os 1.500 sócios
do clube têm ao seu dispor também uma área de piquenique e camping, a Lagoa Bonita no município de Bom Jesus do
Galho a 54 km de Timóteo (ALFA, s.d.).
848
Em 1954 foi inaugurado um novo cinema, o Cine ACESITA, num salão no novo centro comercial onde funcionou a Cobal
até que, em 1975, foi concluído o Cine Marabá, pertencente a uma rede regional de cinemas, a Empresa de Diversões
Piracicaba, também de propriedade do sr. Wenceslau Martins Araújo (ATAÍDE, 1986). No entanto, esta imponente sala, na
década de 1990, seguindo a mesma sina de outras salas país afora, foi transformada em Igreja Universal.
283
criação da Boite Mocambos e do Clube La Bamboleira. Com a popularização dos concursos de beleza,
o Clube Campestre Choupana também parece ter ganhado mais destaque, promovendo anualmente o
concurso “Garota Piscina de Timóteo” e, em 1981, pela primeira vez desde que começou a ser
disputado em 1955, o time do centro sul, o Florestino Futebol Clube, venceu o campeonato local.
De um modo geral, pode-se dizer que o principal papel da ACESITA no desenvolvimento de
atividades de lazer em Timóteo foi a disponibilização de espaços e recursos, o que não significa que
sua participação foi, e continua sendo, isenta de interesses, voltada somente para a satisfação das
necessidades de lazer da população local. Vale lembrar que a primeira iniciativa neste sentido partiu
dos funcionários e não da empresa, com a criação do ACESITA Esporte Clube evidenciando tanto a
ausência de atividades de lazer como a de um projeto social que guiasse as ações dos empreendedores
nos primeiros momentos de implantação da usina. Esta situação se altera a partir da década de 1950,
com a chegada do Gal. Edmundo Macedo Soares, momento a partir do qual há um melhor
delineamento do que se pretendia construir como corpo social, principalmente de qual o tipo de
empregado que a empresa queria manter em seus quadros e, conseqüentemente, em sua “cidade”, de
modo que não somente há a contratação de pessoal mais especializado, como também se busca
incrementar a formação do pessoal local, seja nas atividades profissionais por meio dos cursos
técnicos, seja nas atividades de lazer por intermédio da criação dos novos clubes. Neste contexto, a
distinção entre Elite Clube e Clube Operário indica mais do que o mero rebatimento da hierarquia da
fábrica transposta para fora dela – é também uma forma de premiar a qualificação, incentivando a
formação técnica, que tanto preocupava Macedo Soares.
Embora não tenha sido possível obter informações mais precisas quanto à forma de associação e a
participação da ACESITA na construção destes clubes e na sua manutenção atual, constatou-se que
minimamente ela foi responsável pela construção dos clubes Operário e Elite, bem como pela doação
dos terrenos tanto da sede campestre do ACESITA Esporte Clube quando do Centro Esportivo da
ALFA
849
, sendo que dos clubes hoje existentes na cidade, o único que parece não ter contado com
apoio da empresa foi o Clube Campestre Choupana
850
, situado no centro sul. Além do mais, apesar de
não se ter verificado qualquer obrigatoriedade de filiação a estes clubes, nota-se que a prática de
descontos em folha de pagamento, usual na compra de mercadorias nos armazéns e farmácias, bem
como no pagamento do aluguel das casas oferecidas pelas indústrias, em Timóteo foi também adotada
em atividades que não eram patrocinadas diretamente pela ACESITA, sendo mencionada por
Fato/Esporte (A
CESITA, 1970), como uma das vantagens da Liga Acesitana de Futebol com relação a
outras do interior do estado, bem como por dona Vilma S
PERANCINI (2004) que contou ter ajudado a
preencher os recibos das contribuições dos associados ao ACESITA Esporte Clube. Assim, se por um
849
A construção do Clube Operário é indiretamente mencionada no Relatório de 1953 e há menção a doações feitas pela
empresa para melhorar sua estrutura, no Relatório de 1969 (1970). Além disso, sua junção com o Elite Clube formando o
ALFA indica que este clube também foi construído e era mantido por ela, com Nazareno A
TAÍDE (1986: 201?) afirmando
que “A ALFA já estendeu suas atividades aos funcionários da Usina Hidroelétrica de Sá Carvalho, bem como aos
funcionários de Belo Horizonte) um clube próprio e um arrendado) e de São Paulo”.
850
Embora não haja confirmação oficial, pela sua localização é muito provável que o clube do SESI também tenha sido
construído em terreno doado pela ACESITA.
284
lado ela não dirigia abertamente estas instituições, por outro, o respaldo oferecido pela garantia do
pagamento das mensalidades dos sócios era um indicativo de seu apoio às atividades por eles
promovidas. Mas, apesar desta vinculação não existir mais, o baile de aniversário da ACESITA
continua sendo uma das mais importantes festividades da sede campestre do ACESITA Esporte Clube,
e as olimpíadas das ligas internas ainda ocorrem no ALFA, sendo este o único momento em que os
operários voltam a freqüentar o clube, pois, como afirmou Antonio Carlos D
IAS (22/jul/2005), com a
saída da empresa as mensalidades se tornaram muito elevadas, fazendo com que muitos deixassem de
ser sócios.
É interessante notar ainda, como, desde muito cedo, o aprendizado de organização e burocratização foi
absorvido pelos empregados, pois já em 1945, a criação do ACESITA Futebol Clube indica que não
bastava haver um time de futebol, era necessário criar uma estrutura oficial para apoiá-lo; em 1955, a
criação da Liga Acesitana de Futebol demonstra novamente uma necessidade de institucionalizar as
atividades de recreação, que prossegue com a criação das “ligas internas” e da ALFA. Estas
recorrentes oficializações do lazer, no entanto, implicavam invariavelmente num esforço extra, pois,
como disse o sr. Nazareno Ataíde (1986:204?), “Seus Líderes e Coordenadores, com dedicação
extrema, trabalharam de graça como técnicos, mesários, massagistas, roupeiros, providenciando
transporte, etc..., substituindo, por ideal, uma equipe de profissionais que a empresa não tem”, um
esforço que, se por um lado indica a incorporação de um “saber fazer” aprendido no trabalho
burocrático nos escritórios da fábrica, visto que seus idealizadores invariavelmente trabalhavam no
setor administrativo, por outro demonstra como este aprendizado foi incorporado em benefício
próprio. Assim, mesmo que dentro dos limites impostos pela ACESITA, que obviamente não
patrocinaria atividades que fossem ser consideradas danosas ao rendimento de seus empregados, foi a
organização e oficialização dos times que pavimentaram o caminho para a criação do ACESITA
Esporte Clube, o primeiro onde o acesso não era determinado pelo cargo ocupado na fábrica.
285
CHOUPANA
ACESITA
ALFA
OPERÁRIO
CLUBES
Fig. 303: Os locais de encontro no centro norte
Fig. 2302: Localização dos espaços esportivos em Timóteo
(base GOOGLEARTH)
0 50m
1º campo cedido pela
ACESITA
Farmácia da ASSOCI
A
(antigo local do Rinque e Cine ACESITA)
Igreja Universal
(antigo Cine Marabá)
Lojas e casa paroquial
(local dos antigos armazém, , farmácia, alojamento, etc.
Capela São José
Praça 1º de Maio
Fundação ACESIT
A
(antiga Casa de Hóspedes)
Colégio Dom Bosco
(antiga BENEPÓ)
Colégio Percival Farquhar
Escritório da ACESIT
A
(local do antigo hospital)
Restaurante ACESITA
(antiga sede da Fazenda Angelina)
286
Fig. 313: O clube Operário na década de 1960
(
Relatório 1961
,
1962
)
Fig. 304-306: Primeiro time oficial do ACESITA
Esporte Clube, o brasão da Liga Acesitana de
Desporto e o Time do Florestino
(ACESITA, 1970c,; SILVEIRA, s.d.1)
Fig. 308-310: Alguns times em atividade
na década de 1970: ACESITA,
Funcionários e Vila novas.
(ACESITA ESPORTE CLUBE, s.d.; ACESITA,
1970a, 1970b)
Fig.311: As primeiras obras de construção da
sede campestre do ACESITA Esporte Clube
(ACESITA ESPORTE CLUBE, s.d.)
Fig. 307 Os prédios dos antigos Cine ACESITA e Marabá
(AUTORA, 2005)
287
VI.2.2 A IGREJA, OS SINDICATOS E OUTRAS ORGANIZAÇÕES OPERÁRIAS
Para Alain T
OURAINE (2002: s.p.) a idéia de movimento social se opõe à de consciência de classe no
sentido em que o primeiro refere-se a “... um processo do desenvolvimento capitalista ou a um
processo de crise social e econômica em termos objetivos
851
, enquanto a segunda é uma tentativa de
abordagem do conflito a partir do ponto de vista dos atores, sendo definido como:
... a combinação de um conflito com um adversário social organizado e da referência comum dos dois
adversários a um mecanismo cultural sem o qual os adversários não se enfrentariam, pois poderiam se situar
em campos de batalha ou em domínios de discussão completamente separados o que impediria, por
definição, tanto o conflito e o enfrentamento quanto o compromisso ou a resolução do conflito. (T
OURAINE,
2006: 01)
De modo que “... são condutas coletivas e não crises ou formas de evolução de um sistema”, o que
não significa que estão alheios aos movimentos gerais da sociedade, mas que são manifestações que
visam alterar a “... distribuição vigente de recompensas e sanções sociais
(ALEXANDER, 1998: s.p.)
pela luta pelo controle específico de certos recursos materiais e culturais. Assim, embora não
necessariamente estejam vinculados a uma determinada ideologia, os movimentos sociais “São
movimentos de natureza prática e histórica, mas que apenas podem ter êxito se forem capazes de
empregar a metalinguagem civil para relacionar esses problemas práticos ao centro simbólico da
sociedade e suas premissas utópicas (A
LEXANDER, 1998: s.p.), o que significa que se constituem em
conflitos onde o discurso é uma arma tão, ou até mais, importante do que a ação, pois mais do que
conduzir a ação ou legitimá-la é pelo discurso que se constrói o problema.
É exatamente neste processo de “construção do problema”, ou seja, na elaboração e transmissão de um
programa reivindicatório fundamentado no confronto entre a sociedade existente e a desejada, que no
caso dos movimentos operários ganham importância instituições, como o sindicato e a igreja, que, ao
se proporem a colaborar na solução dos problemas, são também as responsáveis por determiná-los, ou
seja, selecionar as questões a serem solucionadas, legitimando-as na qualidade de problemas a serem
resolvidos. Como coloca Jefrey A
LEXANDER (1998: s.p.):
“Antes de formar-se um movimento social, seja um movimento operário, seja um movimento pela libertação
das mulheres, poucos atores reconhecem a existência do problema que é colocado pelo movimento, muito
menos que haja uma solução para ele.”.
Embora a construção do problema por parte destas instituições não seja isenta, reflexo único das
necessidades dos trabalhadores, ela possibilita uma nova perspectiva sobre a situação, pois é uma
visão que não parte unicamente do ponto de vista da empresa. Entretanto, mesmo possuindo agendas
próprias e estando empenhadas em melhorar as condições de vida dos operários, em alguns momentos
é possível identificar pontos de convergência entre seus objetivos e os da companhia, principalmente
quando se trata da Igreja Católica.
Assim como a atuação da indústria, a organização de atividades culturais e associativas pela igreja e
851
“The idea of social movement was conceived, at least in my mind, in opposition to the traditional concept of class
conflict. Not opposition in the sense of being reformist. Instead when we speak about class conflict we refer, basically, to a
process of capitalist development or a process of social and economic crisis in objective terms. When we began speaking, a
long time ago now, about social movements, we tried to elaborate a new approach and to pass on the actor’s side.”
(T
OURAINE, 2002: s.p.).
288
pelo sindicato servia não somente para tornar o corpo operário mais coeso
852
, como também para
ensinar a população local a organizar-se, de modo que não tardaram a surgir instituições formadas
espontaneamente a fim de atender a demandas verificadas pelo próprio operariado, como jornais,
cooperativas de crédito e consumo, associações de comércio e dos aposentados, ou mesmo modificar o
formato e criar novas festas. Desse modo, observa-se em Timóteo que, enquanto uma das primeiras
preocupações da ACESITA foi com a saúde e alimentação dos operários, buscando organizar um
fundo de socorro e uma cooperativa de consumo, a Igreja buscou agrupar os trabalhadores e incutir-
lhes o sentimento religioso por intermédio da música e da formação para o trabalho, sendo iniciativa
dos trabalhadores a criação dos clubes, dos sindicatos, da associação dos aposentados, de uma
cooperativa de crédito e uma nova cooperativa de consumo, além da transformação do carnaval, de
uma festa de celebração em um festival de protestos.
D
OS ARMAZÉNS À ASSOCIA
Como se viu no capítulo IV, desde sua implantação a ACESITA teve dificuldades em garantir o
abastecimento de produtos agropastoris para o consumo dos empregados. No entanto, a tentativa de
organização de uma cooperativa de consumo fracassou rapidamente, o que levou a companhia a adotar
um sistema de abastecimento por intermédio de armazéns.
Em 1962 eram 16 armazéns (Relatórios 1962, 1963) os incumbidos a prover mais do que gêneros
alimentícios, pois como única fonte de abastecimento local, eles deveriam oferecer “tudo” o que era
necessário aos operários, desde roupas até gasolina. Destes, pelo menos 9 estavam localizados na área
rural, indicando que o abastecimento dos núcleos carvoeiros também se dava da mesma forma
(Relatório, 1960, 1961). Segundo a descrição do sr. Raimundo de Souza Netto, o “seu Mundico”,
gerente do armazém central, encontrada no material da exposição “Memória Ambiental de Timóteo”
da F
UNDAÇÃO ACESITA (1997),
O armazém central foi reformado na década de 1960, para atender a demanda criada. A ACESITA fornecia
uma “vale-compra”, apelidado pelos operários de Boró ou Picilico. O “vale-pão” era trocado na
bomboniere, ao lado do armazém. O “vale-leite” era fornecido pela ACESITA. A leiteria funcionava na
“Vila dos Caixotes”. O leite começava a ser distribuído às 5h da manhã e de madrugada, muitas pessoas já
esperavam em fila munidas de vasilhames. Os períodos de compra eram pré-determinados e o atendimento
escalonado conforme critérios estabelecidos pela empresa, que instituía um tratamento diferenciado entre
seus funcionários, gerando insatisfação. Na opinião de alguns deles, os moradores do bairro Funcionários
eram privilegiados pois faziam as compras antes dos demais, pessoas de baixa renda precisavam dormir na
fila para fazer compra no dia seguinte e empregados com mais de 10 anos de empresa tinham direitos de
fazer compras quinzenais e não mensais como faziam todos os outros.
Embora não haja notícia de um controle rigoroso quanto aos produtos comercializados, sabe-se que
bebidas alcoólicas não eram permitidas e a qualidade e variedade também não eram prioridades. Pela
descrição acima, percebe-se também que seu esquema de funcionamento era feito tanto de forma
discriminatória, privilegiando os empregados mais bem graduados (residentes em bairros como o
852
No sentido de conferir-lhe uma identidade comum, mais do que de igualdade.
289
Funcionários e Técnicos)
853
e mais fiéis à empresa (antigos), quanto possibilitava grande controle e
exploração dos empregados, pois os vales e o Boró ou Picilico, ao minimizar a circulação de dinheiro,
permitiam à companhia a redução dos gasto diretos com mão-de-obra, ao mesmo tempo em que o
crédito fazia dos empregados “eternos” devedores da empresa.
Com a abertura da cidade (1968), no entanto, o comércio local tomou grande impulso, fazendo que a
companhia considerasse desnecessária sua manutenção e determinasse sua desativação em 1973
854
.
Contudo, apesar de desde então o comércio local ter se desenvolvido significativamente, os
descalabros da economia do início da década de 1980, momento que José Nazareno A
TAÍDE (1986:)
considera de “... quase de desespero, quando a especulação e a exploração perseguiam o consumidor
por toda parte”, levou os funcionários a tentar novamente a organização de uma cooperativa de
consumo, a Associa (Cooperativa de Consumo dos Funcionários da ACESITA). Fundada com grande
apoio da companhia que, além de colaborar com a construção e adaptação do local de instalação, cedia
funcionários e financiava as compras nos períodos iniciais, esta iniciativa foi muito bem-sucedida,
expandindo-se para outros bairros e para as áreas de plantio de eucalipto, constituindo-se ainda hoje
num dos mais importantes pontos de abastecimento tanto de gêneros alimentícios quanto de vestuário
e medicamentos.
D
O SESP AO METASITA
Um dos principais problemas enfrentados pela ACESITA quando chegou à região dizia respeito à
insalubridade do local, que foi considerada como um dos fatores que retardaram a ocupação da região
e, juntamente com o receio da ferocidade dos índios botucudos, fez dela uma barreira natural ao
contrabando das minas no século XVIII (C
ARNEIRO & FAGUNDES, 1992)
855
. Segundo Nilo BASTOS
(1996: 25), nos primeiros anos da década de 1940,
Existiam na região várias doenças, dentre elas, a varíola, febre tifóide, malária, parasitoses [sic], que eram
responsáveis pelo baixo nível econômico e social da região, constituindo território inexplorado para o
desenvolvimento de medidas de caráter sanitário e educativo. A "malária dava até no galho de pau", diziam
as pessoas da região. Quando uma epidemia de uma dessas doenças se tomava mais grave, as pessoas se
mudavam para outro lugar. Muitas vezes isso fez com que os trabalhadores de uma mina ficassem
paralisados durante meses. Era uma região, virgem de assistência médica e de saúde pública.
Assim, o cuidado com a saúde dos empregados foi desde o início uma das preocupações da ACESITA.
No entanto, com poucos recursos, como afirma o sr. Nazareno A
TAÍDE (1986: 229), a empresa “... mal
agüentava dar assistência médica comum”, levando-a a buscar o apoio do SESP (Serviço Especial de
Saúde Pública
856
), órgão que vinha cuidando de sanear a região. Porém, logo depois de ter obtido
853
Condição reafirmada no depoimento do sr. Olinto Araújo (16/nov/2002), que afirma que “... no armazém, cada dia
da semana era para um bairro”, e que o pessoal mais antigo, com mais experiência, tinha privilégios.
854
Segundo Nazareno ATAÍDE (1986), os armazéns perduraram tanto tempo somente porque até então não havia
surgido outra solução para o abastecimento local de gêneros.
855
Vide capítulo 3.
856
Criado em 1942, sob a estrutura do então Ministério da Educação e Saúde (MES) do Brasil, o SESP respaldava-
se num acordo entre os governos norte-americano e brasileiro, e realizava suas políticas em parceria com o Instituto de
Assuntos Interamericanos (IAIA). Além disso, o SESP era financiado por recursos internacionais e também nacionais,
possuindo completa autonomia jurídica, administrativa e financeira no âmbito daquele Ministério. Por fim, o acordo que
o originou tinha, para os norte-americanos, um objetivo muito específico e imediato: criar condições sanitárias
290
sucesso no controle da malária, em 1949 a região foi acometida por um surto de tuberculose
857
que,
apesar do empenho desta instituição, apresentava-se de difícil solução. Além do que o rápido
crescimento da população local fazia com que o custo do serviço de saúde se tornasse cada vez mais
pesado para a empresa que, mesmo investindo em campanhas preventivas, como as competições do
“maior bebedor de leite” e do “bebê mais robusto” (A
TAÍDE, 1986) e do empenho de sua equipe
médica, não era capaz de atender a todos, fazendo crescer a importância do atendimento dado na
própria farmácia da companhia.
O primeiro local de atendimento médico dos empregados localizava-se no bairro Quitandinha, até que
foi construído um hospital de madeira na Praça 1º de Maio ao lado do qual funcionava a farmácia.
Segundo o sr. Olinto A
RAÚJO
858
(16/nov/2002), por ser a única da região, a farmácia atraía pessoas de
toda redondeza; assim, além dos funcionários diretos da empresa, também carvoeiros e empregados de
empreiteiras buscavam atendimento e medicamento nesta farmácia, que funcionava com o sistema de
caderneta e desconto direto na folha de pagamento. O atendimento da farmácia era feito pelo próprio
sr. Olinto Araújo e, anteriormente, por seu sogro que, ao contrário dele, que formado em contabilidade
aprendera a profissão pela observação e prática cotidiana, “... era um farmacêutico muito competente e
um grande terapeuta”, que depois de demoradas e bem estruturadas consultas, fazia o diagnóstico e a
formulação indicada ao paciente.
Além da malária e da tuberculose, o sr. Olinto A
RAÚJO (16/nov/2007) se recorda de que as principais
enfermidades tratadas por ele e pelo sogro eram as verminoses, a coqueluche, o sarampo, as gripes e as
doenças sexualmente transmissíveis, o que fazia a ACESITA levá-los para fazer palestras sobre
doenças sexualmente transmissíveis e controle de natalidade pelos núcleos carvoeiros e unidades da
usina.
Na tentativa de melhorar esta situação sem aumentar significativamente seus custos, a ACESITA
recorreu ao IAPI
859
, ao SESI
860
e até mesmo tentou uma solução conjunta com Belgo-Mineira, IAPI e
SESI, sem nenhum sucesso. Foi somente a partir da reunião dos empregados com o objetivo de criar
um sindicato, em 1950, que começou a se organizar um sistema de assistência médica mais
adequadas nos vales do Amazonas e do Rio Doce que garantissem o provimento de matérias-primas cruciais aos esforços
militares dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial.” (C
AMPOS, 2007). Este serviço de colaboração médico sanitária
foi um dos principais responsáveis pelo controle da malária e, posteriormente, da tuberculose na região do vale do rio
Doce. Programado para atender primeiramente só a região amazônica, rapidamente foi estendido ao vale do rio Doce e
ramificou-se para outros estados da federação; o sucesso da iniciativa fez com que sucessivas prorrogações também
prolongassem o contrato inicial, que iria somente até 1946, por mais 14 anos (BASTOS, 1996).
857
Segundo Nilo BASTOS (1996), o problema da tuberculose não havia sido considerado inicialmente no escopo dos trabalhos
do SESP; no entanto, no decorrer dos levantamentos, verificou-se tratar-se de um grande problema, fazendo do programa
de combate a tuberculose um dos mais importantes do serviço.
858
O sr. Olinto ARAÚJO (16/nov/2002) é natural de Nova Era, veio para Timóteo em 1956 para trabalhar na farmácia do
futuro sogro. Mesmo sem formação médica ou farmacêutica, era contador. Com o afastamento do sogro, assumiu a
farmácia até a companhia resolver pelo fim de sua concessão em 1984, quando a redução nas vendas e o aumento da
inadimplência levaram-no a decidir por seu fechamento.
859
O IAPI foi criado em 1936, durante o Estado Novo, e após 1945 expandiu suas áreas de atuação, passando principalmente
a financiar projetos de habitação popular nas grandes cidades.
860
O SESI nasceu como conseqüência dos debates sobre a condição operária e a intervenção do estado na economia, com os
empresários industriais propondo, em 1946, a criação do FAT- Fundação de Assistência ao Trabalhador, da qual o SESI
era um departamento então incumbido da distribuição de gêneros alimentícios (na época em crise na capital paulista).
Financiado pelos empresários, expandiu sua atuação para a área educacional, assistência social e cultura. (SESI-SP, s.d.).
291
abrangente. Segundo o sr. Nazareno ATAÍDE (1986: 229), a idéia do sindicato foi colocada por “...um
funcionário do Ministério do Trabalho, um identificador [que] sugeriu a Pedro Guerra
861
a criação
de um Sindicato, visando a união e colaboração mensal dos empregados, para se vencer a
tuberculose”.
Assim, mesmo antes da inauguração do novo hospital no bairro do Timirim (1952), os empregados
começaram a se organizar e instituíram o Fundo de Socorro. Este fundo era composto somente pela
contribuição mensal
862
dos associados, descontada em folha, mas sem nenhuma participação da
empresa; ele visava garantir o tratamento, em Belo Horizonte, daqueles que contraíssem tuberculose.
No entanto, em agosto de 1950, suspeitas de irregularidade no recolhimento das mensalidades
863
levaram à direção do fundo o dr. Pedro Guerra, que propôs sua transformação em um serviço
assistencial mais amplo, para o qual os trabalhadores que precisassem de auxilio financeiro pudessem
recorrer, transformando o Fundo de Socorro em Associação Beneficente dos Operários da ACESITA
(ABOA) (M
ETASITA, s.d.2). Esta associação foi o segundo passo para a legalização do sindicato
864
(C
OSTA & ARAÚJO, s.d.), que, no ano seguinte, virou Associação Profissional dos Empregados na
Indústria Metalúrgica e de Material Elétrico do Município de Coronel Fabriciano, sendo finalmente
reconhecida como sindicato em 1952, com o nome de Metasita (Sindicato dos Trabalhadores
Metalúrgicos do Município de Coronel Fabriciano
865
)
866
.
Embora a inconstância
867
e imprecisão dos relatos das atas de reunião, bem como a ausência de dados
quanto ao número de associados e das atividades desenvolvidas pelo Metasita, não permitam afirmar
com certeza se ele correspondia ao que a literatura tem considerado “sindicato pelego”, ou seja, um
sindicato que, seja devido à falta de consciência de classe de seus integrantes ou à dependência das
verbas oriundas do imposto sindical, dado o baixo número de associados, assumia uma postura pouco
combativa (S
OUTO JR., 2000), seu caráter assistencialista é patente desde seu nascimento e a ausência
de reivindicações pode ser comprovada tanto pelo depoimento do sr. Dezete, que afirmou que desde
861
O sr. Pedro Sampaio Guerra era um dos médicos da equipe da ACESITA e foi o idealizador e fundador do sindicato dos
metalúrgicos, sendo descrito por Nazareno
ATAÍDE (1986: 193) como “homem de profunda e ampla visão social e
humana”.
862
Nazareno ATAÍDE (1986) fala em Cz5 (cinco cruzeiros) e, embora em Metasita 50anos (METASITA, s.d.) se fale em cinco
réis, esta moeda havia sido substituída pelo cruzeiro desde 1942.
863
Segundo impresso do METASITA (s.d.): “O desconto que nada tinha de ético, não foi adiante, proque um jornalista da
época, conhecido como Siqueira, denunciou a Associação, pelo fato do Fundo não ser registrado no Ministério do Trabalho
e pelo fato de haver indícios de desvio do repasse da verba a favor do Dr. Campos, ex-chefe da seção pessoal da
ACESITA, e de outros poucos assessores da diretoria da Companhia.”, irregularidade que o dr. Pedro Guerra contesta
dizendo que havia uma exigência de ter pelo menos um terço da anuência dos empregados para se formar a associação e
que ele mesmo havia colaborado na coleta destas assinaturas (M
ETASITA, 1989).
864
Segundo Costa (METASITA, 1989), na época a legalização dos sindicatos se dava por intermédio da adesão de pelo menos
1/3 dos empregados a uma associação.
865
Após a emancipação ele tornou-se Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos dos Municípios de Coronel Fabriciano e
Timóteo, já que pouco depois (1965) o sindicato de Ipatinga se desmembrou (SINDIPA, s.d.).
866
A primeira reunião ocorreu no salão do Cine ACESITA, sendo as posteriores realizadas no Grupo Escolar ACESITA, no
Clube Operário e na sede social do sindicato, que até 1978, quando foi inaugurada sua nova sede no Timirim, localizava-se
no número 13 da avenida 1º de Maio, provavelmente onde hoje se localiza um estacionamento da empresa, em frente ao
estádio (M
ETASITA, s.d.2).
867
A relação das atas disponível para consulta apresenta um lapso de quase quatro anos, entre a 5ª e 6ª Ata, realizadas
respectivamente em 15/nov/1952 e 16/fev/1956, o mesmo acontecendo entre a 6ª e 7ª atas (15/fev/1957 e 29/set/1963), mas
entre 1966 e 1969 as notícias das reuniões tornam-se mais regulares, voltando a se espaçar e, a partir de 1973 até 1986,
treze anos, são noticiadas somente 17 reuniões (M
ETASITA, s.d.2).
292
que chegara, em 1949, “... convive[ra] 2 anos sem movimento nenhum, sem ninguém reclamar e tal e
coisa, reclamava mas não podia falar para a companhia saber, senão seria demitido,né?!
(M
ETASITA, 1989), e mesmo pela história oficial da instituição (METASITA, s.d.3), segundo a qual:
O sindicato então criado sem nenhuma restrição da empresa, e com os primeiros presidentes diretamente
ligados a ela, não tinha uma conduta de luta, que é adquirida pelo sindicato com o passar do tempo. O 3º
presidente do sindicato é José Pimenta, 1956 a 1958. Nesta fase já é [sic] feito algumas reivindicações a
empresa, mais [sic] sem muito empenho por parte do Pimenta, (...) Com a firmeza e vontade de lutar
mostrada pelos trabalhadores aos poucos esta situação foi mudando, conquistas trabalhistas foram surgindo,
mostrado que só conquista melhorias, quem vai a luta, quem não se curva, quem não se cala diante da
opressão.
Assim, após o movimento inicial para sua consolidação, o sindicato passou por um período em que a
tutela governamental e empresarial, que no caso de uma estatal como a ACESITA podia ser resumida
numa única pessoa, o presidente da companhia, parece ter restringido sua ação a aspectos mais
assistenciais do que reivindicatórios. Mas para além da conjuntura da época, vale salientar a
importância da presença do general Edmundo de Macedo Soares na presidência da companhia, que
com grande dinamismo e uma postura conciliadora buscou não somente alterar as condições de vida e
trabalho dos operários, como também buscar uma aliança com os trabalhadores por meio do
enaltecimento do trabalho como atividade cívica e promotora da higiene física e moral, valendo-se
tanto de festividades, de obras urbanas e melhorias na educação quanto da Igreja.
Já a partir de 1962, o clima geral de incertezas e conflito também se faz sentir fortemente na cidade,
que também está às voltas com o movimento de emancipação do município (S
ILVEIRA, s.d.), segundo
Costa: “O movimento sindical combativo que se estende pelo Brasil inteiro, nesse momento, influencia
no sindicalismo de Coronel Fabriciano, que tinha Ipatinga e Timóteo como distritos”. Neste mesmo
ano, o presidente do sindicato foi deposto e assumiu o secretário geral, Geraldo dos Reis Ribeiro, que
foi destituído após o golpe militar e uma junta governativa assume a instituição
868
.
Segundo Costa (M
ETASITA, 1989): “O movimento sindical combativo que estende pelo Brasil inteiro,
nesse momento, influencia o sindicalismo de Coronel Fabriciano, que tinha Ipatinga e Timóteo como
distritos”. Assim, em 1963 ocorre a primeira greve na ACESITA
869
, um conflito armado com os
trabalhadores da USIMINAS
870
, que desde 1958 passara a integrar o sindicato, e inicia-se o
movimento para a constituição de um sindicato em Ipatinga.
Segundo Jorge Noman (R
UEDA & NAHAS JR., 1991), a formação do sindicato em Ipatinga se deu sem
atrito com o de Timóteo, embora o grupo que conduziu sua fundação fosse de oposição ao então
presidente Geraldo Ribeiro. Assim, conta Noman: “Nossa diretoria optou por uma política de
relacionamento sem confrontação (...) porque os diretores da empresa eram também empregados, não
868
Esta junta governativa era formada por: Sr. Otávio Sperancini, João Diogo Pereira e Manoel Ferreira (Metasita 53
anos, s.d.).
869
Esta greve foi ocasionada pela determinação de se reduzir o tempo de descanso dos trabalhadores no “trem de
chapa”, que era de 30 minutos de trabalho e 30 de descanso, para 40 e 20 (ou de 20 e 40 para 30 e 30, segundo depoimento
de Geraldo Ribeiro) (METASITA, s.d.3), trabalho que é descrito por Geraldo Ribeiro como “inferno”: “Quem não conheceu
o trem-de-chapa perdeu, porque deixou de conhecer o inferno, porque o trem-de-chapa era igualzinho ao inferno. Para você
ter uma idéia, as pessoas que trabalhavam lá usavam um tipo de tamanco feito de madeira com mais ou menos 8cm de
altura para agüentar bem o calor das chapas de aço,o calor era muito forte. A pessoa recebia a chapa bem na frente do
rosto”.
870
As diversas versões sobre o massacre são apresentadas no capítulo III.
293
donos”, diferentemente do que ocorria no Metasita, onde havia a influência do pessoa de Nova Lima.
Esta posição mais firme com relação à defesa dos trabalhadores
871
é explicada por Antônio Carlos
D
IAS (27/jul/2005), um dos conselheiros do sindicato, segundo o qual: “O trabalhador se identifica
tanto com nós que tem prazer em nos ver ‘peitando’ o chefe. ..., o ‘cara’ se sente bem em ver cartas de
protesto no mural. ... [porque] o dia que perder a identidade como trabalhador aí acaba”, o sindicato
deixa de ser necessário, não tem mais razão que justifique sua existência.
Mas, apesar de toda esta combatividade, não foram muitas as greves que a empresa teve de enfrentar;
até 1986, Nazareno A
TAÍDE (1986) contara somente quatro greves significativas, e pelos relatos dos
fatos marcantes da Década de 50 a 90 (M
ETASITA, s.d.1), até 2000 não foram mais que nove greves
872
.
A análise reforça a idéia da década de 1980 como um marco na expressão de posturas oposta às da
ACESITA, pois além do carnaval, do plebiscito e da primeira gestão de Geraldo Ribeiro, foi durante
esse período que ocorreram mais greves. Possivelmente um reflexo da filiação do sindicato à CUT, em
1985, e a eleição do novo grupo dirigente, o Sem Censura, que tinha Jose Geraldo da Costa na
presidência. Mas se este é um momento de muita luta, ele é também considerado por Geraldo Costa e
Almir Murta como de perda de força, com a greve de 1986 considerada um fracasso, já que,
aproveitando-se do apoio governamental para reprimir a greve de protesto às medidas econômicas do
governo, a empresa “colocou para fora mais de 400 ativistas” (depoimento Costa in M
ETASITA,1989).
No entanto, o que a primeira vista poderia ser atribuído à falta de organização ou mesmo coesão,
fatores que debilitariam a força de qualquer movimento proposto pela instituição, indica também que a
empresa sempre buscou manter o menos aparente possível os conflitos e a postura do próprio sindicato
que parece ter adotado uma política que pode ser descrita como de “guerrilha”, visto que, em vez de
partir para um confronto aberto, busca apoio nas bases, cuidando da instrução sindical dos jovens
recém-chegados com bastante atenção e acreditando que a vitória final depende do sucesso em
pequenos embates.
Assim, as reivindicações feitas pelo sindicato são incessantes e abrangentes, de modo que, embora
possam ser inseridas em questões maiores como a salarial, carga horária e insalubridade, são muito
mais específicas. Portanto, além dos grandes movimentos durante o período do dissídio, pequenas
batalhas que são travadas cotidianamente, como mostram as denuncias em panfletos e cartas fixados
nos murais, no jornal Sem Censura (M
ETASITA, 2004) e no site do sindicato (METASITA, s.d.3). Neles
fica clara a preocupação do sindicato em esclarecer e esmiuçar as estratégias da empresa e assim evitar
871
Esta diferença de postura dos dois sindicatos pode ser observada também por sua filiação, pois enquanto o Metasita se
filiou à CUT (1985)(Central Única dos Trabalhadores), o SINDIPA responde à Força Sindical.
872
Em outubro de 1963 ocorreu a primeira greve (horário de descanso do pessoal do trem de chapa), em 1968 ocorreu a
segunda (o motivo não fica claro), sendo que no período da ditadura não houve greve, sendo que somente em 1984
acontece uma nova greve, considerada uma das mais abrangentes (aumento de salário somente para as chefias, problemas
de higiene, salubridade e segurança no trabalho). A greve de setembro de 1986 deveu-se às dificuldades de negociação
salarial, e a dezembro foi um protesto contra as medidas econômicas do governo, havendo nesta ocasião confronto com a
topa da ROTAM de Belo Horizonte. Em 1988 a greve deveu-se também à questão salarial, enquanto que a do ano seguinte
decorreu do não cumprimento do acordo quanto a adoção da “tabela francesa”. Somente 1991 ocorreria a nova greve, mas
de pequenas proporções e deflagrada visando à reposição de perdas salariais acumuladas; em 200 ocorre nova greve onde
as reivindicações vão desde salário até férias, horas extras e produtividades.
294
demissões e quaisquer outras formas de exploração ou manipulação, seja na forma de concessão de
empréstimos associados a outros benefícios, nas estratégias para desmobilizar os empregados,
camuflar o resultado das medições de poluentes, ampliar os horários de trabalho ou mesmo nos
“enganos” nos cálculos salariais, buscando sempre estar atento para que a empresa cumpra os acordos
feitos e não inviabilize a participação de seus membros nas assembléias do sindicato
873
.
Todas essas lutas e reivindicações, no entanto, não foram suficientes para eliminar totalmente o
assistencialismo do rol das atividades do sindicato. Muito pelo contrário, além de ter inspirado a
fundação da COPESITA (Cooperativa de Crédito Mútuo dos Empregados da ACESITA)
874
e da
Associação dos Aposentados
875
, ele ainda gerencia um plano de saúde próprio
876
, o Pró-Saúde, que
oferece assistência médica, ambulatorial e odontológica aos seus filiados e mantém uma colônia de
férias no município de Pontal do Linhares no Estado do Espírito Santo (M
ETASITA, s.d.3).
Assistencialismo que ajuda a fortalecer seus laços com a comunidade local, pois garante sua presença
tanto dentro como fora da fábrica, tanto nos horários de trabalho quanto nos de lazer, nos piores e
melhores momentos de seus associados e familiares.
D
A BENEPÓ AO SINDICATO DOS TRABALHADORES RURAIS
A emergência da questão social no século XIX parece ter sido um dos principais fatores que
despertaram a Igreja Católica para a necessidade de mudanças no seu relacionamento com a sociedade.
Essa questão, segundo Jessie Souza (2003: 71), “... tem sido, principalmente para os papas uma
questão do trabalho.”
877
Neste processo, que ganha grande impulso a partir do pontificado de Leão XIII, ela buscou uma
873
Estes cuidados foram observados a partir da análise de jornal Sem Censura (METASITA, 2004) e do link “Mural” no site do
M
ETASITA (s.d.) entre setembro de 2005 e julho de 2006, além das entrevistas com Antonio Carlos DIAS (27/jul/2005) e
Cícero Barbosa M
ACHADO (10/fev/2004).
874
A COPESITA foi criada em 1967 e continua funcionado até os dias de hoje, incumbindo-se não somente de possibilitar
empréstimos com juros baixos, como também instruir seus associados na aplicação dos recursos obtidos (A
TAÍDE, 1986).
875
A associação nasceu com o apoio e a cobertura do sindicato, que, além de abrigar suas primeiras reuniões, cedeu
mobiliário e dava-lhe assistência jurídica. Após as primeiras conversas para sua concretização, em 1979, encabeçadas por
José Serafim de Carvalho, Raimundo Machado Jacque e Antônio Lana Torres, a associação ficou paralisada por dois anos
e meio, aí então assumiu uma nova comissão e seu estatuto aprovado. Contando com o apoio do sindicato e da ACESITA
(cedeu o local da sua sede atual, no conjunto comercial do centro) (A
SSOCIAÇÃO DOS APOSENTADOS DE ACESITA, s.d.1). O
objetivo da associação, descrito no artigo 2 do seu estatuto (atualizado em 1991) reza que: “A Associação dos
trabalhadores Aposentados e Pensionistas do Município de Timóteo, com fone e Sede neste Município, é constituída com o
fim de representar legalmente os aposentados e pensionistas perante os órgãos públicos Federais, Estaduais e Municipais,
bem como junto as empresas, entidades de classe, associações diversas, no sentido de proporcionar a participação e a
promoção social de seus representados” (A
SSOCIAÇÃO DOS TRABALHADORES APOSENTADOS E PENSIONISTAS DO MUNICÍPIO
DE
TIMÓTEO, 1991). Assim, entre as principais conquistas da associação, conta a extensão do plano de saúde dos
funcionários ativos para os aposentados, permitindo que, como se lembra Nazareno A
TAÍDE (1986), “O aposentado
continu[e] ligado à sua empresa que, num gesto de justiça e reconhecimento, lhe retribui um pouco do muito que lhe deve.
Eles deram à Companhia o melhor da sua vida”.
876
Vale salientar que, a partir de 1974, a ACESITA também ampliou seu plano de saúde (ATAÍDE, 1986), que apesar de ser
considerado muito bom pelos empregados (D
IAS, 27/jul/2005), estes ainda encontram dificuldades em legitimar os
atendimentos psicológicos, problema que tem sido considerado pelo sindicato um dos principais atualmente e que é
atribuído aos horários dos turnos, que impossibilitam tanto um descanso quanto um convívio familiar e o desenvolvimento
de atividades sociais adequadamente.
877
Para Leão XIII, o problema estava na propriedade privada, e de Pio XI em diante, o foco fixa-se cada vez mais na
desordem social (S
OUZA, 2003).
295
reconciliação com a “modernidade”, ou seja, em vez da postura de negação e condenação às condições
existentes, a Igreja buscaria desempenhar um papel ativo na construção de uma sociedade mais justa.
Segundo Jessie Souza (2002: 46), foi
“O medo da desordem como conseqüência do crescimento do proletariado internacional [que] levou a Igreja
a divulgar, além das nacionalidades, seu discurso teológico-político de propaganda anti-revolucionária,
legitimando-o, ao mesmo tempo, como um discurso crítico ao individualismo. A Igreja, colocando-se acima
das classes, lança-se na pacificação da sociedade, buscando a solução da questão social pela via do
paternalismo, e, principalmente, por meio da criação de um aparato jurídico-político que garantisse a
harmonia social.”
Para tanto, era preciso não somente alterar seu modo de inserção, como também reorganizar sua
doutrina social a partir de uma nova abordagem da teologia cristã. Neste processo, a publicação da
encíclica papal Rerum novarum por Leão XIII (1891) foi decisiva
878
; nela fica clara sua opção pela
defesa dos pobres.
“2. ... é necessário, com medidas prontas e eficazes, vir em auxílio do homens das classes inferiores,
atendendo a que eles estão, pela maior parte, numa situação de infortúnio e de miséria imerecida.” (L
EÃO
XIII, s.d.).
Esta defesa, contrariamente ao que pensavam os comunistas e socialistas, grupos que a Igreja Católica
iria combater com grande tenacidade, tem como premissa o estabelecimento da paz social, uma paz
que é fruto do consenso entre as classes e não da exacerbação dos embates entre elas. Assim, a solução
proposta pela Igreja Católica não decorreria do estabelecimento de uma sociedade igualitária
constituída a partir da propriedade coletiva e cuja formação se daria somente após a vitória do
proletariado sobre a burguesia, mas sim da aceitação do papel de cada um na hierarquia social
determinada por Deus.
Partindo desse ponto de vista, a defesa da propriedade privada justificava-se pelo direito natural e pela
liberdade, princípio que João Paulo II chamou de “primado do homem sobre as coisas”, ou seja, o
direito natural do homem de possuir coisas e dispor livremente delas. Esse princípio permitia o
estabelecimento de uma relação direta entre propriedade privada e trabalho, pois sem o direito à
propriedade privada, o operário estaria também privado do direito de usufruir do fruto de seu trabalho,
que não pertenceria somente a ele, mas à coletividade. Além de que, o trabalho era visto como “... o
centro da finalidade divina do ser humano ”, pois era por intermédio dele que o homem deveria
concluir a criação divina, e, pelo trabalho árduo, redimir-se do pecado original, o que Jassie de S
OUZA
(2002) chamou de “economia da redenção”.
Como portadora dessa “verdade”, a Igreja Católica não somente negava a existência de qualquer
conflito entre capital e trabalho, como se colocava como elemento vital para o entendimento entre as
classes, pois era a principal, senão única, intermediária entre elas.
Intermediação que ela pretendia exercer por meio da instrução da sociedade, ou seja, servindo como
“compasso moral” tanto para os ricos, incentivando o exercício da caridade, quanto aos pobres, que
878
O que não quer dizer que as encíclicas posteriores, como a Quadragesimo anno de Pio XI e a Mater et registra de João
XXIII, ou mesmo a Gaudium et Spes do Concílio Vativano II e a Centesimus annus de João Paulo II, não tenham trazido
contribuições, mas somente que a Rerum novarum além de ser a que inaugurou esta abordagem, considerada por R.
Z
AMBON (s.d.) como a “primeira encíclica social”, também a tratou com profundidade suficiente para ser ainda hoje uma
das principais referências à visão católica da questão social.
296
deveriam aceitar sua condição
879
. Assim, a Igreja Católica incumbia-se tanto da intermediação entre os
ricos e os pobres como entre os homens e Deus, legitimando sua missão educativa para além da
catequese. Postura que iria conduzi-la cada vez mais a uma imersão no universo laico, com a
proliferação de grupos leigos cujo objetivo era intervir mais direta e cotidianamente no
comportamento moral dos homens
880
.
No entanto, conduzir o processo não significava suportá-lo sozinha, de modo que a colaboração do
Estado no processo de pacificação das classes era considerada essencial, pois enquanto a Igreja
cuidava da moral e do espírito dos homens, o Estado deveria apoiá-la, servindo como um de seus
braços executivos.
“20. ... Os direitos, em que eles se encontram, devem ser religiosamente respeitados e o Estado deve
assegurá-los a todos os cidadãos, prevenindo ou vingando a sua violação.” (L
EÃO XIII, s.d.).
No Brasil, embora a estreita vinculação entre o Estado e a Igreja Católica tivesse sido rompida com a
proclamação da República e o fim do patronato
881
, durante o governo de Getúlio Vargas o
relacionamento entre eles voltaria a se estreitar
882
. Segundo Kenneth SERBIN (1992: 03):
“Com a ascensão de Getúlio Vargas ao poder, Igreja e Estado estabeleceram um novo pacto de cooperação,
largamente informal mas não sem concessões da parte do governo. ... [e que] se tornou ainda maior durante
o Estado Novo e permaneceu forte durante a administração Dutra (1946-1950) e o segundo governo Vargas
(1951-1954).”
883
Neste novo pacto, em troca de subsídios governamentais, a Igreja se colocaria como base de apoio
para o governo
884
, fazendo uso de suas instituições e de sua oratória para colaborar na pacificação das
classes e conclamar o povo ao respeito das leis e aos benefícios do trabalho. Portanto, ao aliar-se ao
governo, a Igreja não somente se mantinha fiel a seus preceitos, como também obtinha subsídios para
pôr em marcha suas obras
885
, assumindo o papel de responsável pela sustentação da política social do
879
“9. O primeiro princípio a pôr em evidência é que o homem deve aceitar com paciência a sua condição: é impossível que
na sociedade civil todos sejam elevados ao mesmo nível.” (L
EÃO XIII, 1891).
880
“15. Entretanto, a Igreja não se contenta com indicar o caminho que leva à salvação; ela conduz a esta e com a sua própria
mão aplica ao mal o conveniente remédio. Ela dedica-se toda a instruir e a educar os homens segundo os seus princípios
e a sua doutrina, ... . Depois, esforça-se por penetrar nas almas e por obter das vontades que se deixem conduzir e governar
pela regra dos preceitos divinos. ... Os intrumentos de que ela dispõe para tocar as almas, (...) São os únicos aptos para
penetrar até às profundezas do coração humano, que são capazes de levar o homem a obedecer às imposições do dever, a
dominar as suas paixões, a amar a Deus e ao seu próximo com uma caridade sem limites, a ultrapassar corajosamente
todos os obstáculos que dificultam o seu caminho na estrada da virtude.” (L
EÃO XIII, 1891).
881
“ ‘... o patronato régio era um regime de dependência instituído em Portugal no limiar da era dos Descobrimento – [no
qual] a igreja permanecia essencialmente sobre a tutela do Estado.” (S
OUZA, 2002: 101). Sistema que se estendeu para sua
colônias e que permitia que o governante um controle tal sobre a Igreja que até mesmo o dízimo era recolhido pelo Estado,
que em troca se responsabilizava pela construção de igrejas, capelas e confrarias, além da designação de párocos e bispos.
882
Segundo Jessie de SOUZA (2003), no início do século XIX, ergue-se no Brasil o que ficou conhecido como a “questão
religiosa”, ou seja, um intenso debate ocasionado pela proibição do ensino religioso nas escolas e do financiamento estatal
de qualquer instituição religiosa.
883
“... With the rise of Getúlio Vargas to power, Church and state established a new pact of cooperation, largely informal but
not without concessions on the part of the government. ... became even greater during the Estado Novo and remained
strong during the Dutra administration (1946-1950) and the second Vargas government (1951-1954),” (SERBIN, 1992: 03).
884
Segundo Jessie de SOUZA (2002), esta separação entre o Estado e a Igreja foi o que possibilitou à última constituir e
ampliar sua estrutura, criando livremente novas dioceses e paróquias e, deste modo, formar uma base mais sólida, tanto
física como economicamente. Também foi a partir daí que a Igreja Católica brasileira iniciou um processo de
“romanização”, ou seja, uma reaproximação dos preceitos católicos conforme ditados pela sua mais alta hierarquia,
significando uma maior submissão à Roma.
885
Segundo Kenneth SERBIN (1992) a concessão de benefícios à Igreja Católica, feita por intermédio da Caixa de
Subvenções, sendo muito facilitada quando, a partir de 1940 (até 1947), eles passaram a não depender mais da aprovação
do poder legislativo, sendo decididas diretamente pelo responsável pelo Conselho Nacional de Serviço Social, órgão
subordinado ao Ministério da Saúde e Educação, comandado sucessivamente por Francisco Costa e Gustavo Capanema,
ambos defensores desta aliança.
297
Estado
886
. Entre as principais atividades desenvolvidas pela Igreja e que eram financiadas pelo
Estado
887
estavam escolas, hospitais, fraternidade, grupos de mulheres, as sociedades São Vicente de
Paula, orfanatos, seminários para padres e universidades, organizados e gerenciados por ordens
religiosas com o apoio de grupos leigos, como a Ação Católica Operária (ACO), os Círculos Operários
(CO), Juventude Operária Católica (JOC), Juventude Universitária Católica (JUC), etc.
Outro aspecto no qual a Igreja e o Estado estavam afinados era na forma pela qual a sociedade deveria
se organizar, com ambos investindo seus esforços na formação de cooperativas e sindicatos, pois,
como pretendia a doutrina social da Igreja, a organização da sociedade deveria “... basear-se na
associação representativa dos interesses e das atividades profissionais, [pois] o corporativismo
católico acreditava ser possível construir, a partir da solidariedade básica que redundaria dessa
organização, elementos que harmonizassem a sociedade” (S
OUSA, 2002: 163). Instituições que, assim
como as coorporativas surgidas após a Revolução Industrial, deveriam ser utilizadas a fim de
determinar uma organização hierárquica da sociedade, incumbindo-se, portanto, de organizar a base
social de modo que fosse possível aos seus dirigentes, tanto espirituais quanto políticos, reconhecerem
e distinguir mais facilmente entre os diversos grupos sociais, o que se, por um lado agilizava o
atendimento de demandas específicas, por outro facilitava o controle e a vigilância. Situação que
Jessie de S
OUZA (2002) resumiu como: espiritualização das relações de classe pela Igreja e supervisão
pelo Estado.
É neste contexto e imbuído de todo este ideário que o general Edmundo de Macedo Soares assumiu a
presidência da ACESITA e se, desde o momento inicial, o papel da Igreja na conformação da
sociedade local já se esboçava, com a capela constando entre as primeiras construções erguidas
888
,
após a estatização da empresa ele tornou-se ainda mais evidente.
Como presidente de uma estatal, Macedo Soares era também representante do Estado, e como tal, ele
iria incumbir-se de não somente melhorar o desempenho industrial da companhia, como também fazer
dela um exemplo de civilidade, de modo que é neste momento em que o projeto industrial da
ACESITA torna-se também um projeto social
889
. Projeto que, logo ficou claro, contaria com a
participação intensa da Igreja Católica, datando de 1950 a chegada do primeiro pároco para a capela da
ACESITA
890
, Monsenhor Rafael
891
, que, como engenheiros, técnicos e outros profissionais, havia sido
886
Esta “aliança” era também uma forma de clientelismo, pois, embora de um lado houvesse um real “... interesse numa
política racional de subsídios, por outro, se queria satisfazer legitimamente o maior número de pedidos possível” (S
ERBIN,
1992: 14) permitindo a Getúlio Vargas, por intermédio da Igreja, fortalecer seus laços com a população atendida.
887
Para Kenneth SERBIN (1992), embora o subsídio governamental não fosse vultuoso, para as instituições ele era bastante
representativo.
888
Embora não tenha sido possível verificar como Aminthas Jacques, Percival Farquhar e Athos Rache viam a presença da
Igreja Católica na comunidade operária que começavam a construir, nem mesmo datar com exatidão o ano da construção
da capela, ela já aparece em fotografias de 1946, inclusive durante uma festividade com grande público reunido em frente
dela (C
ARNEIRO & FAGUNDES, 1992).
889
Para as obra urbanas construídas nesse período e seu posicionamento quanto à cidade e a moradia operária, vide capítulo
IV.
890
Assim, apesar de a capela de São Sebastião, no centro sul, ser mais antiga, a capela da ACESITA tornou-se paróquia
antes, em 1950, enquanto a primeira foi constituída somente em 1962.
891
Não foram obtidas muitas informações a respeito do Monsenhor Rafael Arcanjo Coelho, sabe-se somente que era natural
de Alvinópolis (A
TAÍDE, 1986).
298
trazido pelo general para auxiliá-lo a implantar seu projeto, como ele mesmo colocou no almoço
natalino de 1952:
Assim, meus senhores, quando trouxemos, ontem, êsses homens que aqui estão conosco, foi
para unir seus esforços aos nossos esforços, com o objetivo único de que êles se coloquem ao
lado daqueles que trabalham e lutam, numa pátria livre, pela justiça e pela fé cristã...”
(Índice de Suplemento de ACESITA, 1953: s.p.).
Com o mesmo propósito, as Irmãs da Beneficência Popular
892
também foram trazidas e, juntamente
com Monsenhor Rafael, fundaram o Instituto Educacional Monsenhor Rafael
893
cujo objetivo era
melhorar a formação básica de toda a família dos trabalhadores, de modo que, funcionando em um
edifício cedido pela ACESITA, além da alfabetização, oferecia aulas de corte e costura e de
datilografia.
Um entrelaçamento ainda maior entre a Igreja Católica e a companhia, no entanto, se daria com a
criação da Benepó (Beneficência Popular), entidade que pretendia oferecer trabalho no
reflorestamento de eucalipto a “...pessoas desempregadas que não tinham condições ou capacidade de
trabalhar na Usina: menores, idosos, mulheres, deficientes físicos, etc. com a finalidade de aumentar
a renda da casa, famílias inteiras eram admitidas a trabalhar” (A
TAÍDE, 1986)., vista pela Igreja e a
companhia viam este trabalho como uma forma de caridade, pois como diz Nazareno A
TAÍDE (1986),
... significava dar ocupação e salários, embora magros, a muita gente desempregada que não tinha
onde se agarrar”. Como conta Padre A
BDALA (12/nov/2002), na época o Monsenhor Rafael foi
procurado pelo Dr. Alderico Rodrigues de Paula, pois como as instituições reconhecidamente de
utilidade pública estavam isentas do pagamento de impostos,
Monsenhor Rafael aceitou fichar as pessoas na Beneficência Popular, para a companhia não ter que pagar
os ingressos[sic] sociais, que na mentalidade do monsenhor Rafael era para dar condições de trabalho a
velhos, crianças e adultos no reflorestamento, plantio de eucalipto e no carvão. (Padre ABDALA,
12/nov/2002)
Mas como o próprio Padre Abdala admitia, essas pessoas “trabalhavam como escravos
894
, não tinham
carteira assinada, era um absurdo a indiferença!”. Apesar de toda essa indignação, a situação
começou a mudar somente quando
895
grupos considerados comunistas, ligados à reforma agrária
896
,
892
Segundo Mauro PASSOS (1986), no início do século XX, Minas Gerais tornou-se o centro do movimento católico leigo,
devido principalmente à grande afluência de padres europeus, especialmente alemães, belgas e franceses. Entre essas
instituições está a Confederação Católica do Trabalho, que, na verdade, funcionava como os sindicatos do período, ou seja,
voltava-se principalmente à formação moral dos trabalhadores e ao assistencialismo. Posteriormente, a Ação Católica,
embora atuasse em todo o país, era particularmente forte em Minas Gerais (S
OUZA, 2002).
893
A partir de 1971, o instituto foi unificado ao Colégio Macedo Soares e transferido para o novo prédio no Timirim (Ataíde,
1986), que posteriormente foi incorporado pelo Colégio Dom Bosco até que este se retirou da região em 2003, transferindo
suas unidades para o ICMG (Instituto Católico de Minas Gerais), mantido pela Sociedade Mineira de Cultura, também
mantenedora da UNILEST (Universidade do Leste de Minas Gerais) à qual ele encontra-se hoje associado. Vale ressaltar
ainda que esta universidade originou-se dos esforços do padre holandês Cornelius Maria de Man que, como membro da
Associação dos Padres do Trabalho, elaborou o projeto para uma universidade no Vale do Aço, mais precisamente em
Coronel Fabriciano, que em 1976 foi doada à Sociedade Mineira de Cultura, originando a atual UNILEST (D
IÁRIO DO
AÇO¸ 1999).
894
O processo artesanal de produção do carvão vegetal (no Vale do Jequitinhonha) e os malefícios por ele causados são
descritos por Elizabeth D
IAS et al (2002).
895
Embora Padre Abdala não tenha conseguido precisar até quando durou a Benepó, dizendo somente que foi antes do golpe
de 1964, ele também associa o fim desta entidade com a criação da ACESITA Energética, que ocorreu no início da década
de 1970, quando se iniciou a segunda expansão da usina.
896
Tratando-se do inicio da década de 1960, é provável que fossem membros das Ligas Camponesas, que ao levantar a
questão da propriedade da terra, eram associadas aos comunistas e durante o governo João Goulart estavam muito ativas na
região Centro-Oeste.
299
levaram a denuncia ao órgão antecessor do INCRA
897
, o que resultou em processos contra a
entidade
898
e um mal-estar entre esta população e a Igreja
899
. Entretanto, mesmo com Monsenhor
Rafael se colocando como responsável
900
e a companhia ter posto fogo na documentação
901
, Nazareno
A
TAÍDE (1986) conta que a ACESITA acabou sendo responsabilizada e condenada por solidariedade
econômica.
No entanto, mais surpreendente que a história em si é o quanto sua lembrança causa desconforto,
havendo somente uma fonte escrita que menciona o episódio, o texto de Nazareno A
TAÍDE (1986).
Também entre os entrevistados, o único que falou com detalhes sobre os acontecimentos foi Padre
Abdala, enquanto entre os demais, os poucos que não se mostraram desconfortáveis em falar sobre o
assunto, diziam pouco saber dele
902
. Assim, em última análise, o soterramento desta memória
demonstra que ainda hoje há uma forte identificação da população com a ACESITA, pois sua
“vergonha” é partilhada pela comunidade.
Identificação que sem dúvida vem do trabalho, mas que a Igreja, por intermédio de seus prelados,
ajudou a construir, pois como diz Padre A
BDALA (12/nov/2002) “.... foi [Monsenhor Rafael] quem
ensinou a comunidade a gostar da ACESITA, ele fez até um hino para a ACESITA. Porque
antigamente tudo girava em torno do altar, o altar era o centro da vida”. Um altar que, consagrado a
São José, também celebrava o trabalho e os trabalhadores, já que este é o santo padroeiro dos
operários. Mais do que padroeiro e protetor, como demonstra Mauro
PASSOS (1986: 180), ao analisar a
formação da classe trabalhadora de Belo Horizonte, São José era o modelo de operário ideal, de modo
que a consagração da capela a este santo também reforçava o tipo de comportamento considerado
adequado, ou seja, como São José, os operários deveriam ser amáveis e serviçais, fiéis à família, à
pátria e á religião
903
, pois como José, era do suor do rosto que extraíam o ganha-pão da família,
897
O INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) foi criado em 1970, a partir da fusão do IBRA (Instituto
Brasileiro de Reforma Agrária) e INDA (Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário) que vieram a substituir a
Superintendência de Reforma Agrária (SUPRA), criada logo após o golpe de 1964.
898
Dizendo que havia sido procurado pelo Dr. Geraldo Abreu, quando da mudança da diretoria, que lhe advertira quanto à
necessidade de modificar alguma coisa porque o problema social estava se agravando e a empresa iria demitir toda aquela
gente: “A companhia não pode deixar estas pessoas trabalharem, elas não tem condições de trabalhar, nem de passar num
exame médico. Ela vai colocar esta gente na rua,, milhares de pessoas vão ficar sem teto” (Padre A
BDALA, 12/nov/2002).
899
Segundo Padre Abdala, tanto a companhia quanto o prefeito de Coronel Fabriciano colaboraram por, pelo menos
momentaneamente, esvaziar sua igrejas, afirmando que ele era contra o recebimento de indenizações pelo funcionários,
quando, na verdade, estava tentando defender seus direitos, visto que poderiam receber indenizações muito maiores do que
as conquistadas.
900
“Eu falei: olha pessoal, a única coisa que eu pediria a vocês é ver se consegue que a companhia assine a carteira dessa
gente, porque a responsabilidade é da companhia. É deles o departamento de carvão, o Monsenhor Rafael não tem
conhecimento nenhum, é só o intermediário, não tem interferência nenhuma na companhia. Eu falei também com
Monsenhor Rafael: Monsenhor o senhor vai ser procurado por pessoas aí de Belo Horizonte e eu falei com eles que a
companhia que é responsável pelo departamento próprio de carvão, de modo que o senhor não tem conhecimento de nada.
Mas o monsenhor Rafael falou que ele era o responsável, foi a primeira vez que eu me ressenti com ele assim, né?, ele era
muito paternal, a gente compreendia, a intenção dele era boa!” (Padre A
BDALA, 12/nov/2002)
901
“... queimaram os documentos todos. O escritório deles era anexo à casa das irmãs, tinha um comodozinho ali, era ali o
escritório onde eles guardavam as coisas. Queimaram quase tudo, a gente viu eles queimarem os documentos.” (Padre
ABDALA, 12/nov/2002).
902
Apesar de ciente de que um maior aprofundamento da pesquisa, com a entrevista direta de carvoeiros que trabalharam na
região no período pudesse ajudar a responder muitas das dúvidas que ficaram, no material pesquisado não foi possível
precisar as datas de fundação e fechamento da Benepó, nem mesmo conhecer mais detalhes sobre seu funcionamento e os
processos movidos contra a companhia.
903
Como demonstra o artigo transcrito pelo Mauro PASSOS (1986: 180) do jornal O operário de maio de 1920:
“José, o carpinteiro de Nazareth, foi um modelo de vida privada para o operario moderno.
300
devendo, como ele, suportar provações diante das quais outros teriam se revoltado.
No entanto, se a mansidão e a postura conciliaria de São José eram capazes de inspirar o
comportamento dos operários e conduzir a atuação de Monsenhor Rafael, Padre Abdala assumiu uma
atitude mais contestatória. Tendo chegado a Timóteo, que ainda hoje chama de ACESITA, em 1953, o
Padre Abdala Jorge é a figura mais popular da cidade, sendo referência obrigatória em todas as
entrevistas. Posição que conquistou por causa de sua postura austera e sincera, sempre se posicionando
com extrema lucidez e sem se importar se suas atitudes parecem contraditórias. Assim, mesmo
declarando seu afeto pela ACESITA, que para ele é mais do que a companhia, ACESITA é o lugar,
um lugar que considera
“... modelo de uma cidade do futuro, porque eu prego de corpo, sangue e alma a socialização da democracia
do social e, a gente vê aqui o ideal de uma cidade do futuro, com todos os prós e contras: a garantia do
trabalho, o direito de receber do trabalho que é preciso para morar, se alimentar, para ter boa segurança
com uma vida muito austera.” (Padre
ABDALA, 12/nov/2002)
E, portanto, um lugar onde todas as conquistas partem do trabalho e que nasceu dele, afirma ainda que
o apito da fábrica a marcar as horas do dia o encanta mais do que o badalar do sino de sua cidade natal,
São João del Rei, onde
“... até hoje, é os sino da matriz de Nossa Senhora do Pilar que marca as horas. Aqui, quando eu cheguei,
havia um apito às 6 horas da manhã, havia um apito às 4horas, havia um apito às 10 horas da noite e às 11
horas. ... Eu não escondo não, eu prefiro o apito da usina, que é uma expressão do trabalho, da vida. Prefiro
o apito do que o sino da igreja que eu batia.”
Mas, apesar do grande respeito pela empresa como a geradora do trabalho, e da profunda admiração
por alguns de seus presidentes, em especial pelo general Edmundo de Macedo Soares, como
intermediário entre os operários, o sindicato e a companhia, o Padre Abdala não hesitava em pôr de
lado a via preferencial da conciliação para confrontar publicamente a ACESITA. Assim, além de
reconhecer a responsabilidade da ACESITA no caso da Benepó, deixou de fazer sermões durantes as
missas para “... falar com a voz daqueles que não podem falar em sinal de protesto pelo que a
companhia fez...”, e chamou de desumano o brusco divórcio entre a ACESITA e a cidade após a
privatização, condenando a criação da Fundação ACESITA como intermediária num relacionamento
que sempre fora direto.
Esta Postura se tinge de um colorido comunista, ao afirmar que
“A ACESITA é um modelo de cidade do futuro, porque aqueles que estão trabalhando é que tem as rédeas na
mão. Hoje nos somos como uma das cidades mais importantes da história, a vitória do povo! Porque a classe
trabalhadora conseguiu ter um braço político no país. O desafio é esse, porque uma mudança dessas,
qualitativa, tem que mexer nas estruturas e não é fácil mexer numa estrutura, é um desafio dos maiores.”
(Padre ABDALA, 12/nov/2002).
Ou mesmo que “não são as pessoas que estão a serviço do altar, mas é o altar que está a serviço das
pessoas. Não é o homem está a serviço de Deus, mas Deus que está a serviço do homem. Tudo gira em
torno da pessoa”, e que, embora admita ser “um padre que possui uma cultura comunista”, que
Desde sua mocidade deve ser o typo ideal para todo o trabalhador que desejar sinceramente conseguir um ideal ao
mesmo tempo util e elevado e nobre. Como rapaz, José foi illibado em vida, vivendo longe dos meios corrompidos,
preoccupado constantemente em ser fiel à sua família, à sua patria, à sua religião, a seu Deus. Por isso procurou
instruir-se nas verdades da fé, ouvindo com perseverança as instruções dos sacerdotes e obedecendo docemente aos
conselhos dos ministros do Senhor. Todos o estimavam. Estimavam porque ele era prestimoso, serviçal, amavel,
caritativo com todos sem distinção de edade, sexo, posição, riqueza. Assim deve ser todo o operario consciente.” (sem
grifo no original).
301
“entend[e] as vantagens e desvantagens do socialismo”, e mesmo reconhecendo os descaminhos da
Igreja, jamais abriu mão de tê-la como guia. Assim, o Padre Abdala parece ter encontrado um
equilíbrio delicado entre a conciliação e a contestação, apresentando-se não somente como
intermediário entre a companhia e os trabalhadores, mas também como símbolo de um momento de
transição na postura da Igreja Católica, quando a opção pelos pobres se fortalece e os laços com o
Estado se enfraquecem. Assim, apesar de ter se formado como padre antes mesmo da convocação do
Concílio Vaticano II (1962-1965), ele incorporou muitos dos ensinamentos, relutando mais em
substituir a batina do que em opor-se à companhia.
Embora com menor destaque que em outras cidades siderúrgicas, como Volta Redonda
(SOUZA, 1992)
e Ipatinga (B
RAGA, 1997), por exemplo, a participação da Igreja Católica na formação de lideranças
904
mais combativas, também ocorreu em Timóteo. Na verdade, não exatamente em Timóteo, mas em
Cocais, onde se concentrava o maior número de trabalhadores do carvão e onde irmã Lila, membro de
Comunidade Eclesiástica de Base, instruía e dava assistência a estes trabalhadores.
Assim, reunindo-se na capela do lugar, depois de rezar e ler a bíblia, o sr. Joaquim Maria L
IMA
905
(26/jan/2006) conta que começavam a conversar sobre as dificuldades enfrentadas, chegando à
conclusão de que a única maneira de modificá-las era pela união, sendo “... aí, através da oração que a
gente conquistou as pessoas para irem lá para a igreja, onde toda 4ª feira a gente se reunia”. Portanto,
com o apoio e a orientação da irmã Lila e argumentando: “Vocês acham que Deus criou o mundo para
nós ficarmos desse jeito? Para sermos mandados por homens como estes?! Com um salário como
este?!”, em 1990, após um racha com o sindicato de Timóteo
906
, conseguiu fundar o Sindicato dos
Trabalhadores da Indústria de Extração de Antônio Dias e Região, do qual até então ainda era o
presidente.
Um sindicato com uma postura marcadamente distinta do Metasita, já que não se baseia na assistência
social, mas na organização e fortalecimento da consciência de classe, posição que Joaquim Maria
L
IMA (26/jan/2006) resume muito bem ao dizer: “Não adianta dar suporte financeiro, tem que ajudar a
lutar”. Assim, em vez de tomar para si o cuidado direto com os trabalhadores, ele se empenha em
reivindicar junto à Cenibra e às empreiteiras a melhoria no transporte, a construção de novos postos de
saúde, incentivo à formação, o que, embora seja posto como uma opção, parece ser também uma
necessidade, uma vez que o número de associados é de apenas 400, entre os 2.800 vinculados a
904
Uma das mais importantes no Brasil foi a Ação Católica Brasileira (ACB), criada em 1935 com o objetivo de
“recristianizar” a sociedade e formar lideranças leigas e que era muito forte em Minas Gerais (M
ORAES, 2003).
905
O sr. Joaquim Maria das Graças Lima nasceu em na fazenda Clemente, em Antonio Dias, onde trabalhou na roça até os 17
anos. Com a morte dos avós e a venda da fazenda, empregou-se na área de plantio de eucalipto na CAFSB, empreiteira da
Belgo-Mineira. Em 1976 foi trabalhar nos serviços de terraplanagem para a construção da usina de Ouro Branco, voltando
para a CAFSB em 1979 e dois anos depois se empregou na ACESITA Energética, onde ficou por três anos. Finalmente,
em 1984, foi trabalhar na CENIBRA, da qual ainda é empregado.
906
Acreditando que o sindicato não estava atendendo os trabalhadores como deveria e gastando de modo indevido seus
recursos (abusos com telefone e etc.), quando recebeu apoio de somente um dentre os demais 23 diretores, montou uma
chapa de oposição, que não venceu. Além do que, com a maioria dos trabalhadores concentrados em Antonio Dias e outras
pequenas localidades, achou que seria apropriada a criação de uma sede nesta cidade, levando à fundação do sindicato em
1990.
302
empreiteiras na região
907
.
As diferenças entre estes sindicatos, no entanto, não para por aí, pois enquanto o Metasita é favorecido
por sua inserção no contexto urbano, possibilitando uma maior aproximação com seus associados, o
sindicato de Antônio Dias é penalizado pelo distanciamento que a própria natureza do trabalho de seus
associados
908
exige, tendo como conseqüência a dificuldade de identificação com esta organização,
que, focalizando as questões do trabalho, não é tão presente no cotidiano do trabalhador. Além disso,
enquanto em Timóteo a ACESITA concentra grande número de empregados e sua presença já faz
parte da história local, para os trabalhadores rurais, na maioria das vezes não há uma “empresa” à cuja
imagem possam se referir; são cerca de 25 empreiteiras que reúnem empregados alojados em
pequenos municípios, povoados e “patrimônios”
909
dispersos na região.
907
O sr. Joaquim Maria falou que eram em torno de 25 empreiteiras na região, empregando cerca de 2.800 trabalhadores, a
maioria emprega entre 60 e 120 pessoas, com exceção da KTM, com aproximadamente 1.500 empregados. Já a Cenibra
chegara a ter 6.080 trabalhadores ocupados em serviços rurais na região, mas com a privatização, este número tinha
passado a 165 pessoas.
908
Feito em grandes propriedades, o plantio do eucalipto exige o deslocamento dos trabalhadores para áreas distantes dos
centros urbanos (usualmente em torno de 40 km), o mesmo ocorrendo com o carvão, que é produzido nas chamadas
“baterias” no meio da mata. Assim, reunindo entre 20 e 30 fornos, um carvoeiro e um ajudante para cada 7 deles, cada
bateria não exige mais que 20 pessoas para ser tocada, enquanto que no plantio e colheita usualmente se trabalha em duplas
ou pequenas turmas.
O processo de produção do carvão é descrito por Joaquim Maria L
IMA (26/jan/2006): “Tem um forno na base de tijolo (16
m
2
), coloca as toras de madeira e o fogo por cima, na chaminé. Aquele fogo vai descendo e vai cozinhando,cabendo ao
carvoeiro ir acertando o rodapé para não dar labareda, porque se der labareda queima tudo, vira cinza. Deixa queimar por 4
dias e já pode fechar. Aí tem que varrer e pegar um balde para esfriar.Onde é perto de água, eles colocam uma mangueira,
mas precisa tomar cuidado com a água, ela quebra o carvão... Então tira o carvão, na minha época era com o garfo que
enchia as gaiolas, tirava o carvão do forno, amontoava na praça da bateria, colocava no balaio, subia numa escada e virava
dentro da gaiola. Era muito difícil, mas hoje é tudo mecanizado, tem lugar q as máquinas já entram com a madeira dentro
do forno e já tiram tudo, o trabalhador só cuida de cozinhar o carvão.”
909
Patrimônios são agrupamentos de casas, usualmente organizado pelas empreiteiras, onde se situam os alojamentos e
alguma espécie de bem feitoria como o armazém.
303
Fig. 319-320: O hospital Vital Brasil na década de 1960 e
atualmente
(
AUTORA, 2005; ARQUIVO ACESITA
)
Fig. 313: Atual armazem da ASSOCIA no Quitandinha
(
AUTORA
,
2005
)
Fig. 314-315: Prédio da atual farmácia da ASSOCIA e sede da
Associação dos Aposentados
(Relatório 1961, 1962; ARQUIVO ACESITA)
Fig. 316-317:
Os galpões de
alojamento e armazém no centro
no Quitandinha
(ARQUIVO ACESITA)
Fig. 318: O antigo hospital
(ARQUIVO ACESITA)
304
Fig. 321-322: As celebrações em frente à Capela
São José
(ARQUIVO ACESITA)
Fig. 329-331: o Colégio Salesiano na
década de 1960 e atualmente
(ARQUIVO ACESITA; AUTORA, 2005)
Fig. 326-328:
O uso do solo no Vale do Aço, as
baterias de fornos da ACESITA, os
modernos fornos no Vale do Jequitinha
(COSTA, 1985; ACESITA ENERGÉTICA, 2006,
ACESITA, 1989)
Fig. 323-325: A Corporação Musical Santa Cecília na
década de 1950 e atualmente
(SILVEIRA, s.d.1)
Áreas industriais Áreas urbana Áreas reflorestadas Área do PERD
305
VI.2.2 A CELEBRAÇÃO E A CONTESTAÇÃO NOS DESFILES CARNAVALESCOS
Diferentemente dos bailes de carnaval, comuns em diversas comunidades operárias, inclusive em
Timóteo, e que são realizados em ambientes fechados, onde um controle, tanto na entrada quanto
durante a festa, é mais facilmente exercido, o carnaval de Timóteo realizava-se nas ruas e tinha como
marcas registradas a descontração e a espontaneidade. Era, portanto, bastante diverso dos desfiles
relatados pelos antigos moradores da Usina Santa Bárbara, que, se não fosse pelo caráter de
descontração, mais se assemelhavam a procissões
910
de Corpus Christi ou mesmo dos desfiles cívicos
como os de 1º de maio e 7 de setembro, que juntamente como as festividades de 31 de outubro,
aniversário da ACESITA, compunham o calendário festivo da cidade. Este último, como lembra Padre
A
BDALA (12/nov/2002), era
“...o feriado maior daqui, de ACESITA. Aí havia o desfile de todas as associações, das escolas e terminava
sempre com a missa campal. ... o 1• de maio também era importante. havia desfile dos trabalhadores,
representando o trabalho, encontrando na frente os estabilizado com a bandeira deles. No 7 de setembro,
também tinha presença forte da ACESITA, que trazia os homens do campo, a turma do reflorestamento.
Terminando sempre com a missa, porque o altar era um ponto de convergência.”
Assim, ao contrário destes desfiles e paradas, o carnaval Acesitano era marcado pela espontaneidade, e
independência com relação à usina, pois, embora num determinado momento tenha contado com a
participação da ACESITA, até mesmo dependido dela, esta jamais teve força para conduzir o
espetáculo por si só. Fato que se torna mais visível com a constatação de que, o momento em que
houve maior aproximação da companhia com a organização da festa foi também quando se
constituíram os blocos caricatos, que faziam do humor instrumento de crítica à empresa e a outras
instituições locais.
O nascimento do carnaval Acesitano é descrito por Manoelina L
USTOSA (1987), numa entrevista
realizada com Tia Nadir
911
, da seguinte forma:
“Inicialmente sua família [de Tia Nadir] e alguns garimpeiros, companheiros de trecho que trabalhavam na
construção de barracas pro pessoal que vinha pra cá, juntaram-se a ela para fazer o carnaval ‘-Inventei de
não ficar parada, fui à cabeceira do carnaval em 46. Fizemos um bloco, carregando um tronco de imbaúbas,
que é madeira leve, fixamos nele um casco de tatu. Aí todo mundo saía atrás com uma espingardinha de pau
cantando: tatu subiu no pau, atira, Antônio. Atira, Antônio’.
‘-No outro ano, em 47, fizemos o carnaval de Sinhô. Meu irmão vestiu-se de fazendeiro, de botas, bigode,
chapéu e chicote, e todo mundo cantando com ele ‘Samba, nego, branco não vem cã [sic]. Se vier, pau há de
levar. Quando chega a madrugada, nego não quer levantar. Levanta, nego...’
Eles dançavam animados na pracinha do Rink, em torno de um coreto de sapé, bem no centro de
ACESITA
912
. ‘-A gente dava umas voltinhas e vinha embora, porque não tinha luz, não podia ficar no noitão.
Ah! No começo era tão bom, modificou muita coisa. Não usava a diretoria da Companhia apreciar...’ .”
910
Os desfiles de carnaval organizados pela usina perfaziam um percurso de aproximadamente 2,5 km entre sua sede e a praça
central. Organizado pela fábrica, contava com “carros alegóricos”, puxados por caminhões ou tratores, além dos foliões,
sem que se tenha notícia de um samba-enredo ou mesmo um tema para o desfile; também não havia mestre-sala nem porta-
bandeiras e ala de baianas; em vez disso, havia uma tropa de cavaleiros e alguns foliões fantasiados. Enfim, era algo que se
assemelhava mais à organização das procissões do dia de Corpus Christi do que a uma escola de samba, procissões que
faziam o mesmo caminho e possuíam também carros decorados, levando algumas crianças da comunidade. (Q
UECINI,
2000)
911
Com o nome de registro de Nair Gomes da Silva, Tia Nadir veio para a região acompanhando o irmão mais velho e o
marido, o primeiro trabalhava como administrador da ACESITA, e o segundo era pedreiro (“peão de trecho, como ela o
descreve) (LUSTOSA, 1985)
912
Atual praça 1 º de Maio.
306
A organização da primeira escola de samba, no entanto, se daria somente em 1966
913
, quando ao grupo
de foliões comandados por tia Nadir se uniu o pessoal da batucada de fundo de quintal do “Seu
Quincão”
914
, nascendo daí a Unidos da ACESITA (futura Unidos da Quitandinha). Embora não se
tenha notícia de sua dimensão ou da estrutura exata da Unidos da ACESITA, ela desfilava da
Cachoeirinha até o centro da cidade com seus foliões e alegorias embaladas pelas marchinhas que
vinham fazendo sucesso país afora, como no ano em que, ao som de “Eu bebo sim, estou vivendo”,
trouxe para o desfile uma grande garrafa de Coca-Cola
915
de onde saía uma formosa donzela
916
. Assim,
mesmo que de forma precária, a presença de uma bateria e a organização das fantasias e alegorias em
torno de um tema comum levam a admitir a Unidos da ACESITA, senão no rol das escolas de samba,
pelo menos no dos blocos carnavalescos.
No final da década de 1960
917
, no entanto, a partida de Seu Quincão para Ipatinga e a conjuntura
política de forte repressão
918
parecem ter feito arrefecer a febre carnavalesca, febre que voltou a se
manifestar novamente em 1980, quando a lembrança da animação dos carnavais passados aflorou
graças a uma grande enchente que interditou inúmeras estradas e impediu a população de festejar o
feriado em outros locais, trazendo grande animação para o carnaval da cidade (L
USTOSA, 1985).
Assim, o nascimento do “grande carnaval” em Timóteo data da década de 1980, quando alguns
funcionários da área de promoção social da ACESITA
919
e da prefeitura reuniram-se com a
comunidade para organizar um desfile.
A iniciativa quanto ao desfile, no entanto, é assunto controverso
920
, com Dona Vilma SPERANCINI
(09/fev/2004) afirmando que ela coube à comunidade, e Fernando SENA (10/abr/2002)
921
que foi da
ACESITA. Já Manoelita L
USTOSA (1987b) não toma partido, e em documento da biblioteca
municipal, assinado por Raquel Drumond, salienta-se a participação da prefeitura que, segundo consta
913
Há controvérsia com relação às datas deste primeiro desfile. Em arquivo da Biblioteca Municipal de autoria de Raquel
Pacífico Drumond datando de 1962, sendo que a opção por 1966 deve-se ao depoimento de Tia Nadir e à entrevista com
Dona Vilma Sperancine.
914
Joaquim Cirilo, ou como era conhecido na cidade, Seu Quincão, foi também um jogador de destaque na cidade.
915
Que em outra reportagem, da mesma autora, dois anos mais tarde, vira Brahma (LUSTOSA, 1987a).
916
Outras marchinhas, utilizadas como inspiração para enredo e como tema musical para dos desfiles, foram: “Se a canoa não
virar”, “Uma casa de sapê”, “Mas eu vou à lua se Deus quiser, mas se puder levar mulher”, “Tatu tá no pau” e “Casa de
marimbondo”
(LUSTOSA, 1985).
917
Não há registros precisos nem da data de partida de Seu Quincão, nem do último desfile da Unidos da ACESITA.
918
Esse período ainda não foi estudado a fundo, mas trata-se do período da ditadura militar, quando a usina era considerada
área de segurança nacional, portanto sob a administração e vigilância direta do governo federal, que usualmente nomeava
seus diretores dentre o quadro técnico do exército.
919
Mais precisamente: Ênio Resende, Nazareno Ataíde e Ivo Vilano (LUSTOSA, 1985).
920
Esta controvérsia quanto à iniciativa do desfile parece enraizada na extrema rivalidade que se desenvolve entre as diversas
escolas, rivalidade que também parece ter sido apreendida no Rio de Janeiro. Assim, enquanto Fernando Sena participa da
Vai-quem-quer, declaradamente apadrinhada pela ACESITA, Dona Vilma é uma das fundadoras da Bocas-brancas, sua
mais temida rival e uma das que, segundo a própria, menos recebe patrocínio da usina.
921
Seguindo a versão da história contada por Fernando SENA (2002), a ACESITA, seguindo as diretrizes de seu diretor
administrativo Domingos Muchon, reuniu um grupo de casais interessados em organizar o carnaval de rua na cidade. Estes
5 ou 6 casais foram enviados ao Rio de Janeiro, onde receberam aulas de como montar uma escola de samba e organizar
um desfile competitivo.
A empresa criou as escolas de samba, né? Só que de uma forma muito organizada, muito certinha mesmo! Elas tinham
que dar certo, não tinha nenhuma e de repente tinham 7 grandes. Foi tudo separado eqüitativamente por bairro. Aí, deu
receita de bolo, né? Onde é que tem escola de samba boa? É no Rio, é? Então vocês vão e cada um escolhe a sua
madrinha. Então nós aprendemos tudo! ... Nós (Vai-quem-quer), por exemplo, ficamos com a Portela, como madrinha e o
cara da Portela deu uma lição para a gente do que é que é uma escola de samba. Aí, é que eu fui descobrir a seriedade da
coisa. ...“ (S
ENA, 10/abr/2002).
307
“... resolveu apoiar os desfiles de carnaval”. De uma forma ou de outra, o resultado foi que,
financiados pela ACESITA, o grupo interessado partiu para o Rio de Janeiro
922
, onde recebeu aulas de
como montar uma escola de samba e organizar um desfile competitivo. Estes ensinamentos iam desde
como escolher o enredo, selecionar o samba, organizar as alas, confeccionar fantasias, escolher
mestre-sala e porta-bandeira, distribuir e construir carros alegóricos, ensaiar a bateria, até quais os
quesitos e como eles deveriam ser julgados. Assim, cada um deles, devidamente apadrinhado por uma
escola de samba carioca, deveria voltar à cidade e organizar a sua
923
.
Esta ligação com o carnaval do Rio de Janeiro permaneceu ao longo dos anos, com Dona Vilma e Sr.
Otávio S
PERANCINI (09/fev/2004) afirmando que, mesmo após já se ter formado um grupo local que
conhecia e sabia como confeccionar fantasias e construir carros alegóricos, todos os anos alguns
membros das escolas vão até o Rio a fim de aprimorar suas técnicas e conhecer novos materiais,
aproveitando para assistir aos desfiles e visitar os galpões das respectivas madrinhas.
Quanto ao financiamento do desfile, os relatos apontam para a colaboração da Prefeitura Municipal na
infra-estrutura (arquibancadas, policiamento, divulgação, limpeza, organização, etc.) e na doação de
material para construção do galpão das escolas. A participação da ACESITA, após o momento inicial
e doação de um terreno para sede social de cada escola, parece ter-se tornado mais partidária,
colaborando mais com a escola que possuísse membros mais influentes dentro da empresa
924
, sendo
que, de um modo geral, o sentimento de gratidão pelo impulso inicial se contrapõe às críticas quanto à
sua interferência na constituição das escolas, desconsiderando laços de amizade e parentesco em favor
de uma divisão baseada na distribuição espacial por bairros
925
. Talvez tenha sido esta a gota d’água
que faltava para que a insatisfação com a interferência da companhia na vida da comunidade
transbordasse na forma da criação de blocos caricatos, dando vazão a críticas anteriormente
recalcadas.
Segundo o Sr. Fernando S
ENA (10/abr/2002), um dos fundadores do Tem-nada-a-ver
926
, a criação dos
blocos caricatos
927
foi conseqüência direta do formato excessivamente regulamentado do carnaval
aprendido no Rio de Janeiro e que se desejava implantar em Timóteo. Em suas palavras:
“Ela [a ACESITA] organizou, falou é assim, é assado e pronto. E a gente falou, peraí, agora é a nossa hora
de criticar, nós que estamos com o poder na mão (...) Então a gente descobriu, não sei aonde, que nos blocos
podia criticar, aí nós fizemos uma reunião em casa, na quarta e tinha desfile dos blocos no sábado. ... e
montamos um bloco, mas um bloco todo diferente. porque todos os blocos sambavam, aquele negócio do
bloco ser meio escola de samba pequena, sabe? Aí, nós bolamos um bloco, bem autêntico. Nele ninguém
922
Cinco casais representantes de áreas diferentes da cidade, foram enviados para o Rio de Janeiro, cada qual responsável por
comandar a organização de uma escolas de samba, foram enviados para o Rio de Janeiro
923
São fundadas então as escolas de samba: Unidos da Quitandinha (Quitandinha, Olaria e Cruzeirinho), Vai-que-quer
(Funcionários, Vila dos Técnicos, Serenata, e Recanto), Bocas-brancas (Bromélias, Santa Maria, Alvorada, Garapa e
Timotinho), Ala Leste (Timirim, João XXIII e John Kennedy), Mensageiro (São Cristóvão e Ana Moura), Primavera
(Primavera), Unidos do Vale (Cachoeira do Vale) e em 1982 a Alegria-Alegria, que já não segue mais a divisão por
bairros.
924
Pelo menos esta é a impressão que se extrai dos relatos da Dona Vilma e Sr. Otávio SPERANCINE (2004)
925
Divisão unanimemente criticada, e como afirma Dona Vilma SPERANCINE (09/fev/2004) e que jamais chegou a funcionar
de fato.
926
O bloco caricato Tem-nada-a-ver é o mais conceituado da cidade e, embora tenha pouco mais de vinte anos de existência,
em 2000 foi tombado como patrimônio cultural da cidade.
927
Entre os blocos que foram surgindo com o passar dos anos, nem todos caricatos, contam-se: o Andorinhas (só de moças),
Plumas e paetês (só de rapazes), Tô nem, Boi badalo, Deixeu fala e Super-heróis.
308
sambava, não cantava nada, andava em silêncio e todos de roupa preta. Com mala, com defunto, tipo um, um
vendedor de funerária, não tocava samba. A bateria tinha um toque fúnebre, o surdo batia BUM! e o talado
fazia BÁ!, BUM BÁ! Tinham também umas cornetas, então soava mais ou menos assim: FÓÓÓÓM! BUM
BÁ! BUM BÁ! ... e o Carnaval que começou copiado, passou a ter criatividade, né?!”
Contudo, o começo impactante e entusiasmado, devido tanto ao esplendor e luxo das escolas de samba
quanto ao humor inteligente e criativo dos blocos caricatos e que conquistou toda a região e tornou o
carnaval de Timóteo famoso e concorrido, rapidamente se arrefeceu. Apesar da vontade e das
promessas de manter sempre vivo o carnaval, foram freqüentes os anos em que não houve desfile das
escolas de samba, que foram se reduzindo até que ficassem somente três: Vai-quem-quer, Bocas-
brancas e Unidos da Quitandinha. Os blocos, no entanto, continuam a desfilar e entusiasmar o público
da mesma forma todos os anos desde quando surgiram.
Na condição de festa que tem sua origem relacionada à celebração da primavera, quando ritos de
fertilidade eram tidos como responsáveis por garantir a sobrevivência do grupo, conclamando as
forças da natureza a colaborarem com seu sustento e reprodução, o carnaval atual parece
completamente diferente, seu descompromisso e irreverência parecem fazer dele uma outra festa. No
entanto, ao seguir sua trilha através dos tempos e lugares, percebe-se a constância de alguns elementos
que, em vez de desaparecerem, foram se transformando, recebendo novas significações e incorporando
outros elementos. É assim que de rito mágico consagrado às forças ocultas da natureza, acabou
tornando-se numa festa de irreverência e espontaneidade, uma celebração dos instintos naturais do
homem, de sua sexualidade, sociabilidade e competitividade. Instintos que a moral cristã rechaçava,
mas cuja força não permitia ignorar, fazendo com que fossem incorporados à sua liturgia como um
momento que antecede os preparativos da redenção, momento de licenciosidade e imprudência,
quando infringir as regras é lei. Inaugurando-se, assim, uma das premissas mais comemoradas do
carnaval: a possibilidade de subverter a ordem estabelecida
928
(LADURIE, 2002).
Mas subverter a ordem significa reconhecê-la e imaginar alternativas para ela, o que reflete tanto um
certo descontentamento com o presente quanto preocupação com o futuro, bastante semelhante ao
método adotado na construção de utopias. No entanto, as transformações carnavalescas concretizam-
se, mesmo que num tempo fora do tempo
929
, como os antropólogos se referem ao momento de
celebração dos ritos. É nesse tempo de excepcionalidade, que cada aspecto da realidade pode
transformar-se no seu exato oposto, dando vazão às críticas reprimidas.
Das danças em torno da fogueira ao samba na avenida, o carnaval assumiu diversos formatos. No
Brasil, a tradição carnavalesca veio de Portugal, onde o Entrudo
930
era bastante popular. Esta
festividade marcadamente burguesa, onde bailes de mascara e “guerras de água” constituíam-se em
confraternizações permitidas somente entre iguais (tanto grupos sociais quanto etários), lentamente iria
928
Subversão que segundo DAMATTA (1981) relativiza opostos tidos como irreconciliáveis, tais como: tempo, gênero, rua e
casa, a morte, o sagrado e o profano, a riqueza e a pobreza, a individualização e a coletividade, etc.
929
Nas utopias a grande questão era o espaço, ou melhor, o “não-espaço” ou “não-lugar”, enquanto o tempo tinha pouco ou
nenhuma importância, podia ser qualquer tempo.
930
“Entrada da Primavera”, que com o cristianismo passa a ser celebrado entre o sábado Gordo e a Quarta-feira de Cinzas,
que mesmo dentro de Portugal assumiu formas diversas, mas que se caracterizava por brincadeiras e disputas entre grupos
mascarados. Para mais detalhes vide Maria Isaura Pereira de QUEIROZ (1999).
309
deixando o ambiente familiar dos grandes salões para realizar-se em clubes e agremiações. A
popularização da festa, no entanto, custaria ainda a se concretizar.
Uma segunda fase do carnaval brasileiro é exatamente esta transição, quando a família burguesa passa
a desfilar seu luxo e elegância pelas avenidas das cidades; são os corsos carnavalescos. Tempo em que
o carnaval começa a configurar-se como uma festa tipicamente urbana e ocupar as ruas e os clubes
onde, ao “populacho”, não é permitido brincar, somente assistir.
931
O samba e os desfiles carnavalescos são somente o mais recente episódio dessa história, quando a
animação do samba e o ritmo forte das batucadas dos morros são permitidos no centro da cidade,
quando a população pobre, composta também por negros e imigrantes, torna-se protagonista da festa,
enquanto a burguesia é convidada a assistir.
No entanto, a reconstrução deste percurso para o carnaval de Timóteo, só é possível parcialmente, pois
quando ele tomou vulto, na década de 1980, o Entrudo já havia caído no esquecimento a muito e os
bailes e corsos já haviam se consagrado como manifestações tipicamente urbanas. Mas se, como a
cidade, o carnaval timotense não se formou, mas foi implantado, ele preservou o espírito original da
festa, constituindo-se numa celebração que ao reconhecer as mazelas da realidade, busca contestá-la.
Binômio que permite, mesmo que no plano da fantasia, a proposição de uma nova realidade, fazendo
do carnaval de Timóteo é uma manifestação cultural que demonstra quão tênue é linha que separa
aqueles que pensam e fazem a cidade, daqueles que nela vivem.
Mais do que isso, ele é a expressão legítima da identidade de um grupo, de uma identidade que, sem
negar sua origem industrial, mostra-se livre da tutela empresarial. Portanto, este evento que Roberto
D
AMATTA (1997) classifica como “evento imprevisto” é mais do que uma “tradição inventada” ou
mesmo do que uma “reinvenção criativa”, pois nele não se recria um acontecimento ou se atribui a ele
novos significados; nos cartazes, fantasias e encenações estão sintetizados os desejos e frustrações de
toda a comunidade, fazendo dele não somente um momento de contestação, mas também de auto-
reflexão, de reconhecimento, que, ao tornar-se público, dá o primeiro passo rumo à sua concretização.
931
Maria Isaura QUEIROZ (1999) mostra que é nesta transição que começa o declínio do carnaval em Portugal, onde o
Entrudo sobrevive ainda nas pequenas cidades.
310
Fig. 337-339: Concursos de Miss e os bailes no clube
(
SILVEIRA
,
s.d.
;
AR
Q
UIVO ACESITA
)
Fig. 332: Desfile de 1º de Maio na
década de 1960
(ARQUIVO ACESITA)
Fig. 333-336: Desfiles cívicos (7 de Setembro e 1º de Maio)
(SILVEIRA, s.d.; ARQUIVO ACESITA)
311
Fig. 340-344: A celebração no desfile das
escolas de samba
(Acervo pessoal VILMA SPERANCINI)
Fig. 345-350: A contestação nos desfiles dos blocos caricatos
(RIBEIRO, 199; LUSTOSA, 1987b)
Conclusão: O LEGADO URBANO DA INDÚSTRIA
Fig. 351: Mapa de Timóteo para a população local
(Pasta Timóteo – história, Biblioteca Municipal de Timóteo)
Zaíra
Inutilmente, magnânimo Kublai, tentarei descrever a cidade de Zaíra dos
altos bastiões. Poderia falar de quantos degraus são feitas as ruas em forma
de escada, da circunferência dos arcos dos pórticos, de quais Lâminas de
zinco são recobertos os tetos; mas sei que seria o mesmo que não dizer nada.
A cidade não é feita disso, mas das relações entre as medidas de seu espaço
e os acontecimentos do passado: a distância do solo até um lampião e os pés
pendentes de um usurpador enforcado; o fio esticado do lampião à
balaustrada em frente e os festões que empavesavam o percurso do cortejo
nupcial da rainha; a altura daquela balaustrada e o salto do adúltero que
foge de madrugada; a inclinação de um canal que escoa a água das chuvas e
o passo majestoso de um gato que se introduz numa janela; a linha de tiro da
canhoneira que surge inesperadamente atrás do cabo e a bomba que destrói
o canal; os rasgos que, sentados no molhe, contam pela milésima vez a
história da canhoneira do usurpador, que dizem ser o filho ilegítimo da
rainha, abandonado de cueiro ali sobre o molhe.
A cidade se embebe como uma esponja dessa onda que reflui das
recordações e se dilata. Uma descrição de Zaíra como é atualmente deveria
conter todo o passado de Zaíra. Mas a cidade não conta o seu passado, ela o
contém como as linhas da mão, escrito nos ângulos das ruas, nas grades das
janelas, nos corrimãos das escadas, nas antenas dos pára-raios, nos mastros
das bandeiras, cada segmento riscado por arranhões, serradelas, entalhes,
esfoladuras.
(C
ALVINO, 1990: 14)
313
VII.1 LEGADOS E RUPTURAS
Apesar dos dicionários (FERREIRA, 1999; PRIBERAM, s.d.) trazerem “legado” como sinônimo de
“herança”, para o Direito esses termos designam formas diversas de transmissão dos bens de uma
pessoa ao seu sucessor. O C
ÓDIGO CIVIL brasileiro (2002) os conceitua diferentemente :
“A herança não se confunde com o legado, porque aquela se refere à universalidade indistinta do
patrimônio ou quota deste, ao passo que o legado refere-se a bens especificados, individualizados. Ademais,
enquanto o herdeiro é obrigado a saldar os débitos hereditários, o legatário não se obriga por dívidas do
patrimônio que constitui a totalidade da herança.”
Nesta tese legado tem, não obstante, um sentido amplo, pois o legado a ser avaliado não é oriundo da
morte de indivíduo, instituição ou empresa que deixou de existir, mas de uma siderúrgica em pleno
funcionamento. Além do mais, aos legatários cabem, no caso, tanto os direitos quanto as obrigações
com relação à cidade ‘herdada’, ao contrário do que estabelece o código civil
932
. Aborda-se, então,
legado como aquilo que se transmite não quando a indústria fecha suas portas, mas quando ocorrem
rupturas
933
na sua forma de intervir na cidade. Assim, estas inflexões na relação cidade - indústria são
recortes temporais dentro dos quais se reconhece uma forma característica de relacionamento, da qual
resulta uma determinada cidade, ou pelo menos, uma determinada imagem da cidade.
É a partir desses momentos que se torna possível apreender, dentre toda a herança industrial, quais
aspectos se tornaram mais relevantes para a formação urbana. Desse modo, o conceito de legado como
uma herança posta e reposta ajuda a pensar, na leitura final e geral de Timóteo, quais os bens materiais
e imateriais
934
que lhe foram transmitidos pela indústria, fazendo da cidade o que ela é hoje.
Trata-se, portanto, de um legado transmitido ao longo do tempo e que ainda se desdobra, atingindo
desde a materialidade de edifícios e monumentos até a imaterialidade do saber fazer operário ou do
próprio modo de vida urbano, englobando um aprendizado político, econômico e de novas formas de
sociabilidade. Um legado que é urbano porque se refere à cidade, mas não somente às suas ruas e
edifícios, mas também à sua sociedade, ao modo de viver e conviver das pessoas, referindo-se ainda à
sua organização econômica e política, ou seja, aos meios através dos quais a população ganha seu
sustento obtem poder e relaciona-se com lideres e governantes, decidindo seus rumos.
Tudo isto constitui um legado que, embora específico e individualizado, não é uno, nem invariável, e
cuja sobreposição forma diversas camadas que compõe a cidade, ou melhor, diversas cidades sob uma
mesma designação, que fomos descobrindo escavando os “como”, “onde” e “por que” ou ‘por quem’
da cidade atual.
932
Segundo o qual cabe ao herdeiro tanto os direitos quanto as obrigações, enquanto ao legatário são transmitidos somente
bens individualizados, sem que ele tenha que arcar com qualquer obrigação (C
ÓDIGO CIVIL, 2002).
933
Deve-se lembrar, no entanto, que nenhuma ruptura não é total, as continuidades, mesmo que poucas, continuam a fazer
parte do processo.
934
Embora não se trate de uma discussão sobre patrimônio, emprega-se os termos “bens materiais” e “bens imateriais”, no
mesmo sentido que assumem como categorias jurídicas que designam respectivamente bens passíveis de serem apropriados
e não passíveis de serem apropriados (FONSECA, 1997).
314
VII.2 TIMÓTEO, O LEGADO URBANO DA ACESITA
Curiosamente, observa-se no caso da ACESITA que, na mente de seus legatários, o legado da
indústria pode anteceder sua implantação. Isto se evidencia tanto nos debates que a antecederam
quanto nos mitos fundadores da cidade de Timóteo, encontrando-se na discussão sobre seu nome
935
elementos importantes para entender a importância da indústria para a auto-estima e a identidade do
local.
Os heróis escolhidos para protagonizar os mitos de origem e que fundamentam o favoritismo de um ou
outro nome para a cidade foram de dois: os defensores do nome ACESITA, que exaltam Percival
Farquhar como responsável pelas transformações que a implantação da empresa provocou na região e
os que apoiaram o nome Timóteo, remetendo-se aos desbravadores da área quando inexplorada e
inóspita, Eschwege, o pioneiro no seu mapeamento e quem batizara o córrego local, e o mascate
Timóteo, o primeiro a ali se fixar, abrindo caminho para a formação da povoação.
Mesmo não sendo possível afirmar com precisão os motivos desta escolha, aponta-se a possibilidade
dela fundamentar-se numa maior identificação das atividades destes personagens com o paradigma
desenvolvimentista e com as atividades atuais da população local, ao contrário do que seria o
enfrentamento dos índios e o desbravamento da mata nativa
936
por distantes e solitários sesmeiros ou
militares que antecederam
937
os escolhidos, pois para uma sociedade que se forma na década de 1940
em torno do trabalho fabril, nem o comércio, nem o conhecimento técnico, nem a própria chefia da
fábrica eram elementos estranhos.
Mas, seja qual for o herói ou o mito de origem adotado pela população, na análise do relacionamento
entre a indústria e a cidade é impossível não privilegiar o momento de implantação da ACESITA
como marco fundamental na construção da Timóteo de nossos dias.
Encontrando-se na essência do mito fundador da ACESITA, o pioneirismo aparece como valor
relevante para toda a cidade. Como fundamento do ideal desenvolvimentista, a industrialização foi
vista não somente como um elemento imprescindível para o progresso econômico do país, mas
também como uma forma de integrá-lo, através do reconhecimento e valorização das riquezas naturais
de diversos cantos do território, que, ao serem exploradas, promoveriam o engrandecimento de toda a
nação. Assim sendo, o projeto ACESITA, antes de sua concretização, promoveu regionalmente um
935
O nome da cidade aparece em Timóteo como um elemento importante para se entender o imaginário local, pois além da
constante disputa entre Timóteo e ACESITA, na década de 1970 houve um movimento para mudá-lo para Guadalajara
(SILVEIRA, s.d.), em homenagem ao local da vitória do Brasil na Copa do Mundo, reflexo da empolgação com o esporte,
em especial o futebol, que dominava a cidade.
936
Embora o trabalho dos carvoeiros possa se assemelhar com o destes desbravadores, seu isolamento nos “patrimônios” e
acampamentos faz com que seja pouco ouvidos.
937
Figuras como Guido Marlière, militar reconhecido por ser contrário à escravidão indígena e defender os índios contra os
maus tratos dos colonizadores, ou mesmo Felício Moreira da Silva e Francisco de Paula e Silva, respectivamente, o
primeiro a receber uma sesmaria na região e o donatário da sesmaria que daria origem à Fazenda do Alegre, ao redor da
qual se ergueria o povoado.O preterimento destes nomes demonstra uma opção clara pela valorização de um determinado
tipo de pioneirismo, já que não se trata de figuras totalmente esquecidas como foi a do deportado Cosme Fernandes Pessoa,
primeiro colonizador de Santos (G
ITAHY, 1992), mas de personagens que são apresentados e descritos por historiadores e
memorialistas locais, cuja atuação, no entanto, parece não ter se mostrado tão pioneira quanto a do mascate ou do
empresário.
315
sentimento de inserção no progresso e modernidade, sentimento que perdura até hoje entre os
habitantes de Timóteo.
Neste contexto, não é de se estranhar a valorização do “pioneirismo” da implantação da ACESITA e
de personagens emblemáticas como exemplo do papel que a iniciativa privada soube desempenhar no
desenvolvimento do país. Apesar da associação com Percival Farquhar ter sido um dos fatores que
mais colaborou para o atraso de cerca de trinta anos na implantação de uma siderúrgica de grande
porte em Minas Gerais
938
, ele ainda é tido como o grande empreendedor, aquele que concebeu e
viabilizou a construção de uma usina que produziria no meio do “sertão” mineiro um tipo de aço do
qual o país era, até então, totalmente dependente.
A implantação em território mineiro de uma grande
939
usina de aços especiais tendo como matriz
energética o carvão vegetal local, além de despertar sentimentos nacionalistas afirmou sentimentos
bairristas, como uma resposta do estado de Minas Gerais à sua derrota quando da localização da
Companhia Siderúrgica Nacional em Volta Redonda. Assim, embora ambas as empresas tivessem suas
raízes fincadas nos acordos de Washington, enquanto a CSN se mostrava como baluarte do
empreendedorismo estatal, a ACESITA, mesmo tendo contado desde o início com vultuoso
financiamento governamental, tornou-se símbolo de resistência e persistência de investidores privados.
Assim, a imagem que se construiu da ACESITA era a de uma empresa totalmente nacional, auto-
suficiente em matéria prima e energia, possuindo minas, plantações de eucalipto e até sua própria
hidroelétrica, o que lançou o envolvimento do norte-americano Farquhar com o capital estrangeiro ao
esquecimento e fez esvanecer a existência da Belgo-Mineira, vista como uma empresa forânea,
embora já tivesse construído sua vila operária na região há mais de dez anos e também não dependesse
da importação de carvão mineral.
No entanto, para a maioria dos entrevistados, os grandes “pioneiros” da ACESITA não eram somente
seus três fundadores Percival Farquhar, Aminthas Jacques e Athos Rache, a eles somava-se um quarto,
o engenheiro Alderico Rodrigues de Paula. Responsável pela aquisição das terras, inclusive pela
coação dos que não se mostravam dispostos a vendê-las, pelos primeiros trabalhos de construção da
usina e, muito provavelmente, pela implantação da cidade operária, o dr. Alderico, como a ele se
referem os entrevistados, tornou-se uma referência tão forte dos momentos iniciais da companhia na
cidade que aparece no mesmo patamar dos sócios fundadores da ACESITA.
Neste momento de fundação, contudo, ao contrário do que se podia esperar e do que ocorria com a
usina, que possuía um projeto industrial bem esboçado, a construção da cidade aparecia como uma
obrigação secundária, que foi adiada tanto quanto possível. Prova disso é a contratação do projeto de
urbanismo ter ocorrido somente quando já se iniciavam os trabalhos de terraplanagem e a construção
das oficinas e acampamentos provisórios, ou ainda a demora de quase dez anos na construção de uma
938
Discussão do capítulo II.
939
“Grandeza” que o General Edmundo de Macedo Soares iria questionar, considerando o projeto “uma coisa pequeninha
(vide capítulo IV).
316
estrutura urbana mais ampla e permanente. Assim, se por um lado a intencionalidade de se construir
uma estrutura urbana com dimensão e complexidade condizente com a de uma cidade, permite uma
aproximação com o que se entende por “cidade nova”, o atraso na sua implantação e as sucessivas
alterações por que passou o projeto deixam margem para considerar que para a empresa tratava-se
simplesmente de equipar um “núcleo fabril”
940
.
Ajudando a tornar ainda mais imprecisa a definição do que seria o conjunto edificado pela ACESITA,
a existência do antigo povoado de Timóteo, cerca de três quilômetros ribeirão à cima, permitiria
considerar o povoamento pós ACESITA como constituindo uma “cidade mono-industrial”. Mas,
considerando-se as modificações que Macedo Soares imbuído dos ideais nacionalistas implantou na
década seguinte (1950), ela poderia passar a ser considerada uma “cidade modelo”, isto é, pautada por
projeto social, não somente econômico
941
.
Conquanto estas qualificações possam ajudar a descrever a ação da indústria na cidade, elas devem ser
tomadas com cuidado, pois o preto e o branco do quadro que pintam se sobrepõem aos tons de cinza
que matizam a história do lugar, deixando lacunas consideráveis na compreensão do processo histórico
que conduziu os núcleos ao seu estado atual, dificultando se alcançar um entendimento mais amplo do
papel da indústria na organização do espaço como legado urbano
942
.
Por outro lado, é prudente reconhecer que se o processo de construção e organização econômica e
espacial não era totalmente estranho à região – uma vez que, assim como as cidades do ouro, as
cidades siderúrgicas mineiras constituíam-se em núcleos urbanos capazes de, através da implantação
de uma nova atividade econômica pungente, reorganizar social e espacialmente todo seu entorno
943
.
Da mesma forma que antes a descoberta de ouro fortalecera o caráter urbano de cidades como São
João Del Rey e Ouro Preto, por exemplo, Timóteo teve suas estruturas produtiva, social e espacial
profundamente alterada com a construção da usina da ACESITA, o que possibilitou que em menos de
20 anos (1946-1964), o distrito que levara quase um século para deixar de ser uma vila (1840–1938),
se tornasse um município. E embora uma intensificação no processo de urbanização da região dos
vales do Rio Doce e Piracicaba já pudesse ser notada desde a construção da Ferrovia Vitória-Minas,
com a formação de núcleos ao redor das estações, era uma transformação tímida se comparada a que a
nova usina siderúrgica iria provocar.
Além da urbanização, a implantação de uma usina siderúrgica de grande porte cuja matriz energética
era o carvão vegetal, também incrementou a concentração fundiária, iniciada na década de 1930
quando a Companhia Siderúrgica Belgo-Mineira se instalou na região. Concentração que tomou
grande impulso com a chegada da ACESITA e teve prosseguimento com a instalação da USIMINAS e
940
Discussão do capítulo I.
941
Estendendo a discussão e levando-a ao extremo, não se deve esquecer que embora não tão isolada nem distante quanto as
canadenses ou mesmo Marabá, Caraíba e outras construídas por mineradoras, do mesmo modo que as “cidades de
exploração” (“resourse towns”) a cidade operária construída pela ACESITA tem sua origem extremamente vinculada a
exploração de recursos minerais locais.
942
Discussão do capítulo I.
943
Para as diferenças entre elas vide capítulo IV.
317
mais recentemente com a CENIBRA, o que significou não somente um significativo deslocamento da
população rural para os centros urbanos, como também dificuldades no seu abastecimento, visto que a
progressiva redução do número de pequenas propriedades significou a substituição de uma produção
predominantemente de subsistência e destinada ao mercado local, por extensas plantações de
eucalipto.
Assim, no âmbito regional, o legado urbano da indústria no vale do rio Piracicaba é também rural, é
um legado de profunda e pouco feliz alteração na sua estrutura produtiva e que põe a descoberto
alguns dos lados mais perversos da industrialização: a expulsão do pequeno agricultor, freqüentemente
coagido pelas grandes empresas a vender sua propriedade; a exploração da mão de obra pouco
qualificada, que ainda luta para conquistar os mesmos direitos dos trabalhadores urbanos; e a
degradação ambiental, seja a dos rios, do solo e do ar causada pela fábrica na cidade e pelo
desmatamento, pela monocultura do eucalipto e pelos fornos de carvão em meio à mata.
Este é, portanto, um legado do qual a indústria tem pouco orgulho e que a emergência da questão
ambiental como parâmetro de competitividade tem feito que muitas delas busquem revertê-lo, ou pelo
menos a se mostrarem empenhadas em fazê-lo
944
. Para a ACESITA este empenho aparece no seu
envolvimento com projetos locais e regionais de recuperação do rio Piracicaba e tratamento das
margens de córregos urbanos, da implantação de um centro de educação ambiental ou mesmo na
participação em projetos de incentivo a diversificação de atividades econômicas. Qualquer atividade
empresarial, especialmente a partir dos anos 1990, parece estar sempre revestida de preocupações com
o meio ambiente, não importando se são de caráter assistencial, educacional, cultural ou simplesmente
recreativo.
Mas, se nas últimas décadas o cuidado com o meio ambiente tem sido uma preocupação constante,
para além da área da fábrica, intra-muros, melhores condições de salubridade continuam a ser
intensamente reclamadas. Salubridade que não diz respeito somente à prevenção de exposição a altas
temperaturas, gases tóxicos, percursos perigosos e esforços repetitivos, mas também ao
estabelecimento de turnos capazes de garantir um período de descanso suficiente tanto ao corpo,
quanto a mente, minimizando os problemas psicológicos que tem se tornado cada vez mais freqüentes
entre os operários nos últimos anos. Assim, ao mesmo tempo em que o trabalho fabril constitui-se num
legado que garante o sustento da família e confere identidade ao grupo, sendo através dele que se
aprende a sobreviver, conviver e viver, ele é também um legado de dor e perda, debilitando o corpo e
dificultando o convívio social.
Essa ambigüidade do legado que não se restringe a exploração direta do trabalhador na produção, pois
a busca do lucro, que garante o sucesso do projeto industrial, assume formas muito mais complexas e
sutis. Da promoção de festas cívicas e religiosas, a oferta de moradia, cuidados médicos, educação e
lazer, todas atividades que a indústria se empenhou em promover, tem como finalidade fazer do
empregado um empregado ideal, ou seja, além de buscar a satisfação do trabalhador - o que
944
Discussão do capítulo IV.
318
atualmente também traz dividendos à empresa já que os cuidados com a comunidade local contam
pontos importantes na manutenção de uma imagem apreciada internacionalmente - são instrumentos
de formação, induzindo a população a um comportamento considerado adequado.
Contudo, todo este instrumental, ao ser assimilado é também transformado, convertido em ferramentas
de luta pela garantia de direitos como trabalhadores e como cidadãos
945
. Trata-se do momento que,
numa cidade empresarial, representa mais do que a consolidação de uma consciência de classe, pois
constitui expressão da independência da cidade ante a fábrica, da sociedade civil frente a seus
mandatários. Tal momento em Timóteo é tardio, pois somente na década de 1980, mais de quinze anos
após sua emancipação e doze da abertura da cidade operária, as atividades culturais e recreativas locais
deixam de ser unicamente celebrativas, para tornarem-se expressão
946
de uma identidade local, não
necessariamente vinculada à indústria. Assim, seja nas greves, nas missas, no plebiscito ou no
carnaval, neste momento fica claro que, ao contrário do que continuam a indicar os letreiros dos
ônibus, Timóteo não é a ACESITA.
Portanto, se o legado social da ACESITA é, por um lado, de aproximação entre a indústria e a
sociedade, por outro lado ele também é de contestação, afastamento, de identidade autônoma. Dos
times de futebol à igreja e às cooperativas, o ideal de congraçamento em torno de um objetivo comum,
apreendido no universo da produção fabril, passou a ser a inspiração para o ideal de ações em prol da
assistência e defesa dos operários e não da empresa
947
.
Contudo, um entendimento mais preciso deste legado social depende de sua inserção no quadro
espacial onde se realiza, do espaço urbano de Timóteo. Um espaço que foi em grande parte construído
diretamente pela ACESITA, sendo em essência fruto da vontade de seus subseqüentes dirigentes, de
seus projetos econômicos, políticos e sociais. Assim, da mesma forma que a demora na contratação do
projeto e da construção da cidade demonstra a pouca importância que inicialmente foi atribuída a esse
espaço, as alterações que lhe foram impostas indicam que, apesar das preocupações sociais reveladas a
partir da década de 1950, a construção do espaço urbano pela indústria continuou dominada pela
lógica financeira. Entre os elementos que atestam esta subordinação do social ao financeiro, está o
desaparecimento da grande avenida-parque e o ocultamento dos córregos, que deixaram de ser
elementos referenciais da paisagem e passaram aos fundos dos lotes; o deslocamento do centro para
uma área mais próxima da indústria e mais isolada de outros núcleos urbanos, enquanto alguns de seus
principais equipamentos eram mantidos na localização original e a alocação dos habitantes nos bairros
e moradias seguindo a hierarquia da fábrica. Alterações que direta ou indiretamente visavam garantir
945
Discussão do capítulo VI.
946
Aqui talvez seja importante uma ressalva, já que a pesquisa em jornais de oposição (há notícia de ter havido pelo menos
um) não foi possível (não constava de nenhum dos acervos pesquisados, sendo mencionada por uma das entrevistadas), o
que, até certo poderia pintar um quadro diverso do aqui descrito. No entanto, a escassa referência e a dificuldade de
localização permitem inferir que, ou se tratava de um material de pouca circulação, ou seja, não capaz de exercer qualquer
influência ou expressar o pensamento de uma parcela significativa da população local, ou, a ACESITA exerceu tamanha
pressão que foi capaz de apagar os vestígios e esmorecer a memória mesmo de algo altamente significativo, em qualquer
um dos casos a população ainda não se mostra capaz de expressar e fazer valer suas próprias vontades, de modo que o
argumento ainda se sustenta.
947
Discussão do capítulo VI.
319
ganho nos lucros da empresa, pois embora muitas vezes não representavam uma economia direta nos
gastos com a cidade, permitiam um melhor controle do operariado e de seus hábitos cotidianos,
formando e reforçando os laços de dependência com a companhia. Assim, além de garantir um melhor
desempenho no trabalho, as transformações no projeto, incutiam noções de higiene e normas de
conduta social. Exemplo disso é a dificuldade de acesso à cachaça vendida livremente no Timirim,
proibida dentro da área a empresa, e à zona de prostituição em Coronel Fabriciano
948
. Ao mesmo
tempo eram construídos pela empresa edifícios escolares, um novo hospital, o rinque de patinação e o
clube, além da capela (um dos primeiros a serem construídos) que, dando suporte à realização de
atividades “sadias” fortaleciam os vínculos de lealdade e afeto com os colegas, com o trabalho e com o
empregador. Tais vínculos, se por um lado ajudaram a construir uma identidade coletiva fortemente
associada à ACESITA, por outro ajudaram a identificação de demandas contrárias aos seus interesses,
levando a formação de grupos e instituições independentes e de oposição.
Assim, observa-se que se o projeto social nasceu com atraso e embora tenha sofrido modificações e
vestido roupagens diversas a fim de adequar-se a exigências do momento, nunca deixou totalmente de
lado seu caráter assistencial, já o projeto urbano, além de tardio e de ter sido implantado gradualmente,
sofreu alterações que modificaram completamente sua concepção inicial. Da cidade-jardim organizada
ao longo do córrego e cercada por um exuberante parque, construiu-se uma cidade-tentacular que dá as
costas aos seus cursos d’água e morros. Da cidade como elemento de ligação entre o antigo povoado e
a indústria, como a localização do centro no projeto inicial indicava, construiu-se uma cidade operária
ao redor da usina. Dos diversos campos de futebol e alojamentos inseridos no verde dos parques,
construíram-se alguns clubes fechados. De modo que, só inspecionando com olhos técnicos e com
cuidado se é capaz de identificar, no traçado viário e na organização das quadras de bairros como
Funcionários e Bromélias, ou mesmo na localização de alguns edifícios como a Matriz, o hospital e o
clube, alguns vestígios da cidade idealizada.
No entanto, a cidade não é somente o que se construiu, sua condição é dada também pelo modo como
é entendida e vivenciada. Vivência na qual se reafirma a dicotomia que marca toda sua história, de
modo que, apesar das tentativas do poder municipal e da companhia de transformar estas dicotomias
em dualidade, a Timóteo de hoje, como a de ontem, ainda se caracteriza pela distinção entre público e
o privado, vertical e horizontal, montanhoso e plano, curvo e retilíneo, cidade e fábrica, entre o centro
norte e o sul. Pois enquanto a dualidade significa separação dependente, a dicotomia indica uma
relação de complementaridade competitiva, que aviva a persistente questão, muito alem de um mero
nome: Timóteo ou ACESITA?
Estas são somente algumas dentre as inúmeras conclusões possíveis a partir das respostas encontradas
para parte das perguntas que se elaborou, ficando sem resposta tantas outras e muitas mais que nem
948
Embora a cidade não fosse literalmente fechada, o principal acesso à Coronel Fabriciano era controlado, sendo que após as
22:00h era necessária a identificação, tornando os funcionários sujeitos a advertências e reprimendas. Assim, era comum
que os mais experientes dessem nomes falsos. Conta-se inclusive que ao observar na lista nomes como: Cláudio Manuel da
Costa, Tomás António Gonzaga, Alvarenga Peixoto ou mesmo Joaquim José da Silva Xavier, um encarregado dirigiu-se
ao chefe dizendo: “O senhor não vai adivinhar quem passou por aqui ontem a noite!? Os inconfidentes.
320
mesmo foram formuladas. Esta é, portanto, uma história filha de seu tempo, das fontes pesquisadas,
das conversas e discussões entabuladas, das pessoas entrevistadas, dos retratos tirados, dos textos lidos
e de quem a escreveu, porque como disse Marco Polo a Kublai Khan: “Todas as vezes que descrevo
uma cidade falo algo [da minha cidade], de Veneza.”(C
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Relatório 1953. abr/1954
Relatório 1954. abr/1955
Relatório 1955. abr/1956
Relatório 1956. fev/1957
Relatório 1957. abr/1958
Relatório 1958. abr/1959
Relatório 1959. mar/1960
Relatório 1960. mar/1961
Relatório 1961. abr/1962
Relatório 1962. abr/1963
Relatório 1963. abr/1964
Relatório 1964. abr/1965
Relatório 1965. s/d.
Relatório 1966. mar/1967
Relatório 1969. mar/1970
Relatório 1970. mar/1971
Relatório 1971. s.d.
Relatório 1972. mar/1973
Relatório Anual 1998. s.d.
Relatório Anual 1999. s.d.
Relatório Anual 2000. s.d.
Relatório Anual 2001. s.d.
Relatório Anual 2002. s.d.
Relatório Anual 2003. s.d.
Relatório Anual 2004. s.d.
Relatório Anual 2005. s.d.
Relatório Anual 2006. s.d.
Balanço Social Anual. 2000-2004
Demonstrativos Financeiros 2001-2004
Manual Integrado de Qualidade, 2005
Política Corporativa, 2005
347
ENTREVISTAS
A
RAÚJO, Olinto. Timóteo, 16/ nov /2002
B
ARBOSA, Kleber. Timóteo, 12/ nov /2002
B
ATISTA DA SILVA, Núbia . Timóteo, 14/ nov /2002
B
ATISTA E SILVA, José Luiz. Belo Horizonte, 24/mar/2002.
B
ICALHO, Perácio de Araújo . Timóteo, 15/ nov /2002
C
ARVALHO, José Eustáquio de. Timóteo, 25/mar/2002
L
EÃO, Geraldo . Ouro Branco, 10/ nov /2002
C
RUZ, José. Timóteo, 16/ nov /2002
C
UNHA, Leonardo Rodrigues (Seu Lelé) , Timóteo. 26/julho/2005
D’ÁVILA, José Fausto. Timóteo, 17/ nov /2002
D
INIZ, Rosana . Timóteo, 14/ nov /2002
D
UFFLES TEIXEIRA, Fábio, Belo Horizonte. 28/julho/2005
D
UFFLES TEIXEIRA, Marcos, Belo Horizonte. 28/julho/2005
D
UFFLES TEIXEIRA, Vanda Rodrigues, Belo Horizonte. 28/julho/2005
L
IBERA, Paulo Della, Timóteo. 27/julho/2005
L
IMA, Joaquim Maria das Graças. Antônio Dias. 26/jan/2006
M
ACHADO, Cícero Barbosa. Timóteo, 10/fevereiro/2004
M
ENEZES, José Mendes. Timóteo, 27/julho/2005
P
ADRE ABDALA JORGE. Timóteo, 15/nov/2002.
S
ANTOS, Judith Rosa dos, Timóteo. 26/julho/2005
S
ENA, Fernando. Volta Redonda, 22/abril/2002
S
PERANCINI, Otávio. Timóteo, 09/fevereiro/2004
S
PERANCINI, Vilma. Timóteo, 09/fevereiro/2004
D
IAS, Antonio Carlos. Timóteo. 27/julho/2005
V
ITORINO DIAS, Waldetario. Timóteo, 28/mar/2002
S
ITES
<http:// www. gerdau.com.br>
<http://wikipedia.org
<http://www.acesita.com.br>
<http://www.acesitaenergetica.com.br>
<http://www.alfaclube.com.br>
<http://www.americamineiro.com.br/club/
<http://www.arcelormittal.com>
<http://www.arquitetura.ufba.br>
<http://www.arquitetura.ufmg.br?
<http://www.bndes.gov.br>
<http://www.camaradetimoteo.mg.gov.br>
<http://www.cedeplar.edu.br>
<http://www.cepal.com
<http://www.cincinnati-transit.net/subway.html>
<http://www.cni.org.br/brasil.pib.html>
<http://www.cpdoc.fgv.br>
<http://www.debit.com.br/consulta20.php
<http://www.ethos.org.br>
<http://www.fiesp.org.br>
<http://www.fjp.gov.br>
<http://www.ibge.gov.br>
<http://intranet.ief.mg.gov.br>
<http://www.ibs.org.br>
<http://www.mackenzie.br>
<http://www.metasita.org.br>
<http://www.ourobranco.com>
<http://www.planejamento.gov.br>
<http://www.pnud.org.br>
<http://www.scielo.usp.br>
348
<http://www.sindipa.gov.br>
<http://www.tva.gov.us
<http://www.usp.br/fau/fau/index.html>
Anais
IV Congresso Brasileirao de História Econômica e V Conferência Internacional de Hisória de
Empresas. São Paulo, 2001.
Simpósio: A organização do território pelo capital: o caso das vilas e núcleos gerados por
empresas. São Paulo, setembro 2004.
V Seminário de História da Cidade e do Urbanismo. Campinas, 1998.
VII Encontro da ANPUR, Recife, 1997.
VIII Seminário de História da Cidade e do Urbanismo. Niterói, 2004.
XIII TICCIH International Congress. Italy. Terni, 2006.
Jornais(ACERVODERECORTESDABIBLIOTECAMUNICIPALDETIMÓTEO)
Diário do Aço. 1987-1997
Fato (ACESITA). 1953-1954
Jornal do Vale do Aço. 1999-200
Jornal Novos Rumos. 1999-2000
Minas em Revista.
O Vale em Revista.
Revistas
Acrópole. 1940-1965
Balanço social da siderurgia. 2004
Boletim do IBS – Instituto Brasileiro de Siderurgia. 1966-2007
Exame. 1970
Folha Florestal – Informativo da ACESITA Energética Ltda. Jan-out/2006
Gazeta Mercantil - Balanço Anual Minas Gerais 1994-2000
Gazeta Mercantil – Balanço Anual. 1991-1999
O Observador Econômico e Financeiro. 1936-1962
Siderurgia: revista do IBS. 1973
Acervos
Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais: CEDEPLAR – Campi Centro e Pampulha, FAU, Geografia, FAE
Fundação João Pinheiro
Acervos pessoais: Sr. José Luis Batista, Dna. Vanda Rodrigues Duffles Teixeira
Arquivo Público Mineiro
Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte
Instituto do Patrimônio Histórico da Cidade de Belo Horizonte
Secretaria de Obras do Estado de Minas Gerais
DETRAN – MG
Associação de ex-alunos e professores da Escola de Engenharia da UFMG
Coronel Fabriciano: Instituto Católico de Minas Gerais
Biblioteca Municipal
Ipatinga: Biblioteca Municipal
São Paulo: Universidade de São Paulo: FEA, FAU, FFLCH, IBGE
Timóteo: Fundação ACESITA
Biblioteca Municipal
Prefeitura Municipal
Arquivo Central da ACESITA
Acervos pessoais:Waldetaro Vitorino Dias, Kleber Barbosa, Padre Jorge Abdala , Vilma e Otávio
Sperancini
349
ANEXOS
ANEXO I: TABELAS
Tab1
352
Tab2
351
Tab3
352
Tab4
353
Tab6
354
Tab7e8
355
Tab9
356
Tab9a
357
Tab10
368
Tab11
359
Tab12
360
Tab13
361
Tab14
362
Tab15
363
Tab16
365
Tab17
366
Tab18
367
Tab19
369
Tab20
370
Tab21
371
Tab22
372
ANEXO II: MAPAS
Mapa1
373
Mapa2
374
Mapa3
375
Mapa4
376
Mapa5
377
Mapa6
378
Mapa7
379
Mapa8
380
Mapa9
381
Mapa11
382
Mapa12
383
Mapa13
384
Mapa17
385
A
NEXO III: ORGANOGRAMAS
Org1a_b
386
Org3
387
Org4
388
Org5
389
A
NEXO IV: LEIS
Leis
390
A
NEXO V: RADT
RADT
392
350
AnexoI_tab1
350
351
AnexoI_tab2 351
352
AnexoI_tab3 352
353
AnexoI_tab4
353
354
AnexoI_tab6 354
355
AnexoI_tab7 e 8 355
356
AnexoI_tab9 356
357
AnexoI_tab9a 357
358
AnexoI_tab10 358
359
AnexoI_tab11
Produto Interno Bruto brasileiro 1950-2006
ANO
Taxa de
variação real
(%)
Valor Bruto
(milhões US$)
GOVERNO
1950 6,7 Dutra
1951 4,6
19.943,00
Getulio Vargas
1952 7,6
23.389,00
1953 4,8
11.183,00
1954 7,9
11.610,00
1955 8,67
11.596,00
Café Filho, Carlos Luz,
Nereu Ramos
1956 2,45
14.747,00
Juscelino Kubitschek
1957 8,38
17.568,00
1958 10,5
12.810,00
1959 9,50
15.792,00
1960 9,59
17.883,00
1961 8,75
18.215,00
Jânio Quadros
1962 6,51
20.470,00
João Goulart
1963 0,36
24.684,00
1964 3,58
22.002,00
Castelo Branco
1965 2,42
23.953,00
1966 6,76
30.078,00
1967 4,43
33.006,00
1968 9,70
36.019,00
Costa e Silva
1969 9,39
39.486,00
1970 10,35
45.017,00
Médici
1971 11,44
51.929,00
1972 11,91
62.076,00
1973 13,94
88.761,00
1974 8,05
116.649,00
Geisel
1975 5,22
137.272,00
1976 10,34
162.901,00
1977 4,88
187.646,00
1978 5,02
212.922,00
1979 6,76
236.027,00
Figueiredo
1980 9,17
250.315,00
1981 -4,28
267.499,00
1982 0,81
270.310,00
1983 -2,92
188.583,00
1984 5,39
188.083,00
1985 7,91
210.844,00
Sarney
1986 7,50
256.538,00
1987 3,61
282.392,00
1988 -0,05
307.105,00
1989 3,20
411.737,00
1990 -5,05
469.318,00
Collor
1991 1,03
405.679,00
1992 -0,54
387.295,00
Itamar Franco
1993 4,93
429.685,00
1994 5,85
543.087,00
1995 4,22
705.449,00
Fernando H.Cardoso
1996 2,66
775.475,00
1997 3,27
807.814,00
1998 0,13
787.889,00
1999 0,81
536.554,00
2000 4,36
602.207,00
2001 1,42
509.797,00
2002 1,52
459.379,00
Lula
2003 0,55
498.426,00
2004 4,94*
2005 2,60**
2006 4,00**
Lula
2007
2008
2009
FONTE: FGV (Conjuntura Econômica, dez.2003) e http://www.ai.com.br/pessoal/indices/PIB.HTM
* valor estimado
** valores projetados
Obs1:conversão com valor da taxa média de câmbio
Obs.2.: datas em vermelho, referentes a anos em que houve mudança na moeda nacional
Moeda Símbolo Vigência
Real Rs 1435 a 8/10/1833
Mil-Réis 1$000 8/10/1833 a 31/10/1942
Cruzeiro Cr$ 01/11/1942 a 30/11/1964
Cruzeiro
(eliminando os centavos)
Cr$ 01/12/1964 a 12/02/1967
Cruzeiro Novo NCr$ 13/02/1967 a 14/05/1970
Cruzeiro Cr$ 15/05/1970 a 14/08/1984
Cruzeiro
(eliminados centavos)
Cr$ 15/08/1984 a 27/02/1986
Cruzado Cz$ 28/02/1986 a 15/01/1989
Cruzado Novo NCz$ 16/01/1989 a 15/03/1990
Cruzeiro
Cr$
16/03/1990 a 31/07/1993
360
AnexoI_tab12 360
361
AnexoI_tab13
EMPRESAS ESTATAIS FEDERAIS PRIVATIZADAS DESDE 1990
SIGLA
NOME DA EMPRESA
DATA DE
EXCLUSÃO
BEC
Banco do Estado do Ceará S.A. e uma subsidiária (BEC-DTVM),
adquirida pelo Bradesco.
21.12.2005
BEM
Banco do Estado do Maranhão S.A. e treis subsidiárias (BEM-
SG, BEM-VTV, BEM-DTVM), adquirida pelo Bradesco.
10.02.2004
BEA Banco do Estado do Amazonas S.A. 24.01.2002
BEG
Banco do Estado de Goiás S.A. e duas subsidiárias (BEG/DTVM
e Sisplan)
04.12.2001
BANESPA Banco do Estado de São Paulo S.A. e cinco subsidiárias 20.11.2000
DATAMEC Datamec S.A. - Sistemas de Processamento de Dados 23.06.1999
GERASUL Centrais Geradoras do Sul do Brasil S.A. 15.09.1998
TELEBRÁS
12 novas controladoras, abrangendo todas as empresas que
compunham o Sistema TELEBRÁS (EMBRATEL, 27 empresas
de telefonia fixa e 26 de telefonia celular)
29.07.1998
MERIDIONAL Banco Meridional do Brasil S.A. (e cinco subsidiárias) 04.12.1997
CVRD Cia. Vale do Rio Doce (e 13 subsidiárias) 06.05.1997
LIGHT Light Serviços de Eletricidade S.A. 21.05.1996
ESCELSA Espírito Santo Centrais Elétricas S.A. 11.07.1995
EMBRAER Empresa Bras. de Aeronáutica S.A. 07.12.1994
EAC Embraer Aircraft Corporation 07.12.1994
EAI Embraer Aviation International 07.12.1994
NEIVA Indústria Aeronáutica Neiva S.A. 07.12.1994
CARAÍBA Mineração Caraíba Ltda. 28.07.1994
PQU Petroquímica União S.A. 25.01.1994
AÇOMINAS Aço Minas Gerais S.A. 10.09.1993
COSIPA Cia. Siderúrgica Paulista 20.08.1993
ULTRAFÉRTIL Ultrafértil S.A. Ind. e Com. de Fertilizantes 24.06.1993
CSN Cia. Siderúrgica Nacional 02.04.1993
FEM Fábrica de Estruturas Metálicas S.A. 02.04.1993
ACESITA Cia. Aços Especiais Itabira 23.10.1992
ENERGÉTICA Acesita Energética S.A. 23.10.1992
FASA Forjas Acesita S.A. 23.10.1992
GOIASFÉRTIL Goiás Fertilizantes S.A. 08.10.1992
FOSFÉRTIL Fertilizantes Fosfatados S.A. 12.08.1992
CST Cia. Siderúrgica de Tubarão 23.07.1992
CNA
Cia. Nacional de Álcalis 15.07.1992
ALCANORTE Álcalis do Rio Grande do Norte 15.07.1992
COPESUL Cia. Petroquímica do Sul 15.05.1992
PETROFLEX Petroflex Indústria e Comércio S.A. 10.04.1992
AFP Aços Finos Piratini S.A. 14.02.1992
SNBP Serviço de Navegação da Bacia do Prata 14.01.1992
COSINOR Cia. Siderúrgica do Nordeste 14.11.1991
COSINOR
DIST.
DIST. Cosinor Distribuidora S.A. 14.11.1991
MAFERSA Mafersa S.A. 11.11.1991
CELMA Cia. Eletromecânica 01.11.1991
USIMINAS Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais S.A. 24.10.1991
USIMEC Usiminas Mecânica S.A. 24.10.1991
MP/SE/DEST 23.10.2006
Fonte: http://www.planejamento.gov.br/controle_estatais/conteudo/perfil/empresas_privatizadas.htm, pesquisado em 21/11/2006
362
AnexoI_tab14 362
363
AnexoI_tab15
Programa Nacional de Desestatização
Relatório de Atividades 2005
Balanço 1990-2005
Quadro 1 – Situação das Empresas Incluídas no PND
Nº do Decreto
de Inclusão
Data Empresas Controladas Sigla UF Setor de Atividade
s/n 05/03/1991 Companhia de Aços Especiais Itabira Acesita MG Siderurgia Integrada
426 16/01/1992 Aço Minas Gerais S.A. Açominas MG Siderurgia Integrada
426 Companhia Nacional de Álcalis Álcalis RJ Química/Álcalis
99.464 16/01/1992 Mineração Caraíba Ltda. Caraíba BA Mineração de Cobre
99.666 01/11/1990 Companhia Eletromecânica Celma Celma RJ Material Aeronáutico
99.464 16/08/1990 Companhia Petroquímica do Sul Copesul RS Petroquímica Básica
99.464 16/08/1990 Companhia Siderúrgica do Nordeste Cosinor PE Siderurgia
426 16/01/1992 Companhia Siderúrgica Paulista Cosipa SP Siderurgia Integrada
426 16/01/1992 Companhia Siderúrgica Nacional CSN RJ Siderurgia Integrada
99.464 16/08/1990 Companhia Siderúrgica de Tubarão CST ES Siderurgia Integrada
1.510 01/06/1995 Companhia Vale do Rio Doce CVRD RJ Mineração
Quadro 2 – Resultado de Venda das Empresas por Ofertas Realizadas
US$ Milhões
Empresa Oferta Data da
Oferta
%CapitalTotal
Ofertado*
%Capital
Total
Vendido
Receita
Total
Dívida
Transferida
Resultado
Acesita Leilão/Ordinárias 22/10/1992 64,0% 64,0% 450,3
Oferta/Empregados 25/09/1992 10,0% 10,0% 15,1
Total 74,0% 465,4 232,2 697,6
Quadro 3 – Moedas de Privatização: Resultado Consolidado
Siderurgia
US$ Milhões
Empresa SIBR CP OFND Disec TDA Divex CEF Moeda
Corrente
Não
IdentificadaTotal
Usiminas 545,6 323,5 248,1 259,3 65,5 4,4 0,0 494,8 0,0 1.941,2
Cosinor 0,0 15,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 15,0
Piratini 23,6 66,2 0,0 9,8 7,0 0,0 0,0 0,1 0,0 106,7
CST 5,2 72,6 7,2 172,2 12,3 0,0 77,9 6,2 0,0 353,6
Acesita 26,5 74,0 152,0 75,9 111,6 2,1 23,3 0,0 0,0 465,4
CSN 211,0 94,6 32,8 567,2 144,0 1,2 177,6 259,3 7,6 1.495,3
Cosipa 199,8 4,5 0,0 139,3 2,4 0,0 0,0 239,7 0,0 585,7
Açominas 89,2 6,1 0,1 439,8 23,0 0,2 10,3 29,9 0,0 598,6
Total 1.100,9 656,5 440,2 1.663,5 365,8 7,9 289,1 1.030,0 7,6 5.561,5
Quadro 4 – Resultado Consolidado por Tipo de Oferta
Siderurgia US$ Milhões
Empresa Leilão Empregados Público Oferta Pública
Doméstica/Internacional
Total
Usiminas 1.377,4 34,0 49,8 480,0 1.941,2
CSN 1.266,9 76,0 152,4 1.495,3
Açominas 554,2 44,4 598,6
Cosipa 340,1 29,4 216,2 585,7
Acesita 450,3 15,1 465,4
CST 338,5 15,1 353,6
Piratini 105,3 1,4 106,7
Cosinor 15,0 15,0
4.447,7 215,4 418,4 480,0 5.561,5
Venda de Participações(Decreto 1.068)
Total 1.168,8 1.168,8
Total Geral 22.211,8 731,7 663,1 7.217,0 30.823,6
72,0% 2,4% 2,2% 23,4% 100,0%
363
364
Quadro 5 – Resultado Consolidado por Tipo de Comprador
Siderurgia US$
Milhões
Empresa Instituições
Financeiras
Fundos de
Pensão
Empresas
Nacionais
Capital
Estrangeiro
Pessoa
Física
Total Venda
Usiminas 480,7 469,6 286,5 138,1 566,3 1.941,2
CSN 574,6 182,0 458,7 47,5 232,5 1.495,3
Açominas 168,8 2,4 381,8 0,5 45,1 598,6
Cosipa 1,9 0,6 317,1 11,0 255,1 585,7
Acesita 144,8 204,4 65,3 9,9 41,0 465,4
CST 226,1 10,2 92,4 0,2 24,7 353,6
Piratini 105,1 1,6 106,7
Cosinor 13,6 1,4 15,0
Total 1.596,9 869,2 1.720,5 207,2 1.167,7 5.561,5
Quadro 6 – Ofertas em Leilão
US$ Milhões
Empresa Tipo de Oferta Data da
Oferta
Resultado
de Venda
Mínimo
do Leilão
Ágio Mínimo de
Moeda Corrente
Celma Leilão/Ordinárias 01/11/1991 90,7 72,5 25,1% 0,0%
Cosinor Leilão/Ordinárias Preferenciais 14/11/1991 13,6 12,0 13,7% 0,0%
Mafersa Leilão/Ordinárias Preferenciais 11/11/1991 48,4 18,5 161,8% 0,0%
Usiminas Leilão/Ordinárias 24/10/1991 1.112,4 973,2 14,3% 0,0%
Leilão-2/Preferenciais 18/11/1991 264,3 264,3 0,0%
Soma1991 1.529,4 1.340,5 14,1%
Acesita Leilão/Ordinárias 22/10/1992 450,3 347,7 29,5% 0,0%
Álcalis Leilão/Ordinárias Preferenciais 15/07/1992 78,9 78,9 0,0% 0,0%
CBE Leilão/Ordinárias 03/12/1992 10,9 10,9 0,0% 0,0%
Copesul Leilão/Ordinárias 15/05/1992 797,1 617,1 29,2% 0,0%
CST 1ºLeilão/Ordinárias Preferenciais 16/07/1992 295,4 295,4 0,0% 0,0%
2ºLeilão/Ordinárias Preferenciais 23/07/1992 36,9 36,9 0,0% 0,0%
Quadro 7 – Modificação da Estrutura do Capital Votante após a Venda
Acesita
Acionistas Anterior Posterior
Banco do Brasil 91,5%
Outros Acionistas Prévios 8,5% 8,5%
Outros Adquirentes 22,7%
Previ – Caixa Prev. Func. Banco do
Brasil
15,0%
Empregados 12,4%
Outras Ent. Previdência Privada (37) 9,7%
Fundação Sistel 9,2%
Banco Safra/Albatroz S.A. 8,8%
Banco Real S.A. 5,6%
Banco Comercial Bancesa S.A. 4,2%
Fundação Petros 2,2%
Capital Estrangeiro (14) 1,8%
Total 100,0% 100,0%
Quadro 8 – Valores de Avaliação (Serviços A e B) – 100% DO CAPITAL
SIDERURGIA US$ Milhões
EMPRESAS
VALOR ECONÔMICO AJUSTADO
VALOR FIXADO PELO CND
Serv. A Serv. B Serv. C
1. Usiminas 1.650,2 1.819,6 1.844,7
2. CSN 1.730,7 1.462,8 1.587,9
3. Açominas 346,4 320,0 346,4
4. Acesita 417,0 476,6 476,6
5. Cosipa 229,0 201,0 229,0
6. CST 350,0 400,0 400,0
7. Piratini 33,2 42,9 42,9
8. Cosinor 8,5 9,0 12,4
364
365
AnexoI_tab16 365
366
AnexoI_tab17 366
367
AnexoI_tab18
Produção por Empresa – 1997/98/99
Mil t
Empresas
1997
% 97/96
1998
% 98/97
1999
*
% 99/98
CST
semi 3.713 +4
,
0 3.819 +2
,
9 4.413 +15
,
6
A
ç
ominas
semi 2.375 -1
,
1 2.330 -1
,
9 2.354 +1
,
0
CSN
p
lanos 4.796 +9
,
9 4.708 -1
,
8 4.851 +3
,
5
Usiminas
p
lanos 3.930 -2
,
7 4.023 +2
,
4 2.980 -25
,
9
Cosi
p
a –
p
lanos 3.790 +5
,
2 3.517 -7
,
2 2.593 -26
,
3
A
cesita –
p
lanos 632 +1
,
3 687 +8
,
7 785 +14
,
3
Gerdau
lon
g
os 3.043 +5
,
7 2.957 -2
,
8 3.258 +9
,
9
B
el
g
o-
M
ineira – 1.744 -0
,
7 2.156 +23
,
6 2.266 +5
,
1
os Villares – lon
g
os 746 +10
,
4 624 -16
,
3 632 +1
,
2
Mannesmann
lon
g
os 500 -4
,
3 433 -13
,
4 364 -15
,
8
Outras
lon
g
os 879 +23
,
7 492 -44
,
1 494 +0
,
6
Total
26.152
+
3,6
25.750
-
1,5
24.995
-
3,0
Fonte: Andrade, 2000
*estimativa BNDES.
A estatística da Belgo-Mineira inclui a produção da Mendes Junior; Outras = Barra Mansa, CBAço, Itaunense, Mafersa.
Produção por Produtos – 1997/98/99
Milhões de t
Produtos 1994 1995 1996 1997 % 97/96
1998 % 98/97 1999 % 99/98 2001 2002 2003 2004 2005
Aço Bruto 25,7 25,1 25, 26,2 +3,6 25,8 -1,5 25,0 -3,0 26,7 29,6 31,1 32,9 31,5
Laminados
17,4 +4,5
16,4 -6,1 16,8 +2,3
Planos 11,3 +2,2 10,4 -7,9 10,1 -2,5
Longos 6,2 +8,8 6,0 -2,9 6,7 +10,7
Semi-acabados
6,7 +4,0
6,9 +2,2 7,3 +7,4
Placas 4,5 +3,6 5,0 +10,5 5,4 +9,3
Blocos Tarugos 2,3 +4,7 1,9 -14,4 2,0 +2,3
Fonte: Andrade, 1998; 2000 e Sarti, 2005
Faturamento, Impostos Pagos e Empregos – 1997/98/99
US$ milhões
Dados 1997 % 97/96
1998 % 98/97 1999 % 99/98
Faturamento 11.781 +0,6 10.182 -13,6 8.170 -19,7
Merc. Interno 8.722 +3,9 7.351 -14,0 5.764 -21,6
Merc. Externo 2.873 -9,3 2.509 -15,7 2.259 -9,9
Outras Rec. 186 +30,0 248 +33,2 147 -40,7
Impostos Pagos 1.783 +4,3 1.652 -7,4 1.352 -18,1
IPI 448 +3,5 404 -3,2 315 -22,0
ICMS 1.153 +5,1 1.035 -10,3 808 -21,9
Outros 182 +1,1 214 +16,9 229 +7,0
Efetivo na Ativ. mil empreg. 73,5 -5,1 62,9 -14,6 58,9 -6,4
Fonte: Andrade, 2000
Mundo: Maiores empresas siderúrgicas – 2004
Milhões ton
Class. Empresas Produção de Aço Nacionalidade
1 Mittal Steel 58,9 Índia
2 Arcelor 46,9 Luxemburgo
3 Nippon Steel 32,4 Japão
4 JFE 31,6 Japão
5 Posco 30,2 Coréia do Sul
6 Shanghai Baosteel 21,4 China
7 US Steel 20,8 EUA
8 Corus Group 19,0 Inglaterra / Holanda
9 Nucor 17,9 EUA
10 ThyssenKrupp 17,6 Alemanha
11 Riva Acciao 16,7 Itália
12 Gerdau 16,3 Brasil
13 Sumitomo 13,0 Japão
14 EvrazHolding 12,2 Rússia
15 Sail 12,1 Índia
Fonte: Elaboração NEIT-IE-UNICAMP, a partir de dados do IISI. (Sarti, 2005)
368
Internacionalização das siderúrgicas brasileiras – 2005
Milhões ton.
Empresas Produção global
Início da
Internacionalização
Subsidiárias País
Gerdau
16,3 1980
Gerdau Ameristeel Canadá e EUA
Gerdau Aza Chile
Gerdau Laisa Uruguai
Sipar Argentina
Diaco e Sidelpa Colômbia
Arcelor Brasil
2
10,5 2000 Acindar Argentina
Grupo Usiminas
9,5 1992 Ternium
1
Argentina
Venezuela e México
CSN
5,5 2001
Heartland EUA
SteelLusosider Portugal
1. Participação minoritária.
2. Empresa brasileira, controlada pelo Grupo Arcelor de Luxemburgo.
Fonte: Elaboração NEIT-IE-UNICAMP (Sarti, 2005)
Internacionalização da ACESITA - 2006
Ano da tomada 2005 2002 1998 Empresas brasileiras
Controladora
MITTAL
*
Índia
ARCELOR
ACERALIA
Espanha
ARBED
Luxemburgo
Belgo-Mineira
Vega Sul
USINOR
França
ACESITA
CST
Fonte: Elaboração própria
*
Em jan/2006, quando a Mittal Steel comunicou sua intenção de adquirir todas as ações da ACELOR, sendo que em junho comunicaram que estavam estudando
uma fusão. Em virtude deste comunicado, a SEP solicitou que a ACELOR Brasil prestasse as informações necessárias e suficientes ao mercado brasileiro a
respeito dos reflexos da mencionada operação, contudo as novas informações não atenderam satisfatoriamente às determinações de seus ofícios, a SMI e a SEP
determinaram, em 29.06.2006, a suspensão da negociação das ações de emissão da Arcelor Brasil, bem como dos valores mobiliários a elas referenciados. Até o
final de julho, no entanto o embargo havia sido retirado e já em agosto (CVM, 2006). Apesar destes notícias da revista Valor Econômico (23/ago/2006) falam do
impacto da fusão delas, que segundo o site da empresa, já denominado ACELORMITTAL, deve ocorrer somente em 2007(www.arcelormittal.com).
368
369
AnexoI_tab20
C
AMPEÕES DA LIGA ACESITANA DE FUTEBOL
ANO TIME
1955 Acesita
1956
1957 Vila Nova
1958 Vila Nova
1959 Vila Nova
1960 Ginásio
1961 Grêmio
1962 Industrial
1963 Industrial
1964 Industrial
1965 Vila Nova
1966 Acesita
1967 Vila Nova
1968 Forjaria
1969 Acesita
1970 São Cristovão
1971 São Cristovão
1972 Acesita
1973 Acesita
1974 Acesita
1975 Laminação
1976 Acesita
1977 Acesita
1978 Acesita
1979 Acesita
1980 Vila Nova
1981 Florestino
1982 Vila Nova
1983 Industrial
1984 Acesita
1985 Palmeiras
1986 Vila Nova
1987 Vila Nova
1988 Palmeiras
1989 Olaria
1990 Acesita
1991 São Cristovão
1992 Olaria
1993 Florestino
1994 Industrial
1995 Mensageiro
1996 Florestino
1997 Independente
1998 Florestino
2000 Acesita
2002 Vila Nova
2003 Acesita
2004 Esplendor
2005 Palmeiras
2006 Vila Nova
Fonte: http://www.ligaacesitana.hpg.com.br/, pesquisada em 31/5/2007.
369
R
ANKING DOS CAMPEÕES
14 Acesita
11 Vila Nova
5 Industrial
4 Florestino
3 São Cristovão
3 Palmeiras
2 Olaria
1 Ginásio
1 Grêmio
1 Forjaria
1 Laminação
1 Mensageiro
1 Independente
1 Esplendor
370
AnexoI_tab21
RELAÇÃO DE PRESIDENTES DO METASITA
Sindicato dos Trabalhadores Metalúrgicos de Coronel Fabriciano e Timóteo
PRESIDENTES
Nº NOME PERÍODO
Pedro Sampaio Guerra 1952 à 1954
Estanil de Freitas 1954 à 1956
José Pimenta 1956 à 1958
Camilo Lelis Neto 1958 à 1960
Manoel Ferreira da Silva 1960 à 1961
Joaquim Gonçalves 1961 à 1962 - Rural
Geraldo dos Reis Ribeiro 1962 à 1965
(Foram três juntas governativa que deveria ser de 90 dias, ficando por 1ano e 16 dias.) (Período de 1964) Sr. Sperancini, João Diogo
Pereira e Joaquim Ferreira
Antônio Brum 1965 à 1970
Almir de Souza Ameno agosto de 1970(em memoria) – “mimi”
10º
José Machado Sena 1970 à 1978
11º
Dermeval Julio de Andrade 1978 à 1981
12º
Antônio Vicente Xavier 1981 à 1983
13º
Almir de Fiqueiredo Murta 1983 à 1987
14º
José Geraldo Costa 1987 à 1992
15º
José Gonçalves Ribeiro 1992 a 1995
16º
Marinho da Costa Teixeira 1995 a 1998
17º
Gildásio José Ribeiro 1998 a 2001
18º
Kleber Willian de Souza 2001 a 2004
370
371
AnexoI_tab22
Tipo de
Pesquisa
AcervosConsultados MaterialObtido
Pesquisa
bibliográfica
Timóteo: Fundação ACESITA, Biblioteca Municipal
Belo Horizonte: Universidade Federal de Minas Gerais
(CEDEPLAR – Campi Centro e Pampulha, FAE,
FAFICH , IGC, FAU e Geografia), Fundação João
Pinheiro,
Coronel Fabriciano: Instituto Católico de Minas Gerais
São Paulo: Universidade de São Paulo (FEA, FAU e
FFLCH) e IBGE.
Ipatinga: Biblioteca Municipal
Principais temas estudados:
. urbanização e exploração de recursos naturais
. industrialização e siderurgia no Brasil
. TVA e CVRD: políticas de desenvolvimento e planejamento
. expansão territorial e mineração em Minas Gerais
. cidades novas e empresariais
. habitação social
. arquitetura moderna
. movimentos sociais (religião, trabalho e lazer)
. história e memória
. política empresarial
. movimentos trabalhistas (sindicalismo)
. identidade social e cultura (definições e formas de expressão, em
especial o carnaval)
. religiosidade e atuação da igreja católica em movimentos trabalhistas
. abordagens do patrimônio arquitetônico
. militares e empresas estatais
. dados técnicos e econômicos da Acesita (Revistas: Exame, IBS, Gazeta
Mercantil e Conjuntura Econômica)
Levantamentos
documentais
Timóteo: Fundação ACESITA, Biblioteca Municipal ,
Prefeitura Municipal, Arquivo Central da ACESITA,
Paróquia de São Francisco, Sindicato dos Metalúrgicos
de Timóteo, Sindicato dos Trabalhadores Rurais,
arquivos pessoais dos Srs. Waldetaro Vitorino Dias,
Kleber Barbosa, Padre Jorge Abdala , sra Vilma e Sr.
Otávio Sperancine, sindicato dos siderúrgicos
Belo Horizonte: Fundação João Pinheiro, Secretaria de
Obras Públicas do Estado de Minas Gerais,
Departamento de Transito do Estado de Minas Gerais,
Associação de ex-alunos da Faculdade de Engenharia da
UFMG, CREA Belo Horizonte e cervo pessoal do Sr.
José Luis Batista, família Duffles Teixeira de Andrade,
Arquivo Público Mineiro, Arquivo Público da Cidade de
Belo, Horizonte, Instituto Estadual do Patrimônio
Histórico e Artístico, Minas Tênis Clube, Departamento
de Estadual de Obras Públicas
São Paulo: IBGE.
Consultas em por email: Museu Mineiro, Instituto do
Patrimônio Histórico e Cultural de Minas
Consultas em por telefone: Biblioteca do Instituto
Izabella Hendrix, América Futebol Clube
. Plano diretor do Município 20041 (não aprovado) e 2004 (aprovado)
. relação de loteamentos aprovados no município (1979-2002)
. Mapa de Municípios do Estado de Minas Gerais
. Mapa topográfico do Município de Timóteo
. Mapa da região de Ouro Branco (1936)
, Mapa da Região de Antonio Dias (1939)
. Lei orgânica do Município
. produção acadêmica da UFMG, sobre siderurgia e sobre a região do
Vale do Aço
. recortes de jornal sobre Timóteo e Acesita (atualizado)
.Recortes sobre América Futebol Clube, Mercado Municipal de Belo
Horizonte e Minas Tênis Clube
. revistas (1960-1970) e encartes (década de 1990 e 2000)) editados pela
Acesita
. Relatório da Diretoria da Acesita (1954), Relatórios da Diretoria,
Balanço e demonstração de conta (1953), Parecer do Conselho Fiscal e
Ata de Aprovação da Assembléia Geral (1953)
. escritura de transferência das terras da Acesita para o Município de
Timóteo
. programa do Projeto Portal
. mapa e histórico da cidade de Coronel Fabriciano
. trabalhos acadêmicos sobre Ipatinga e Ouro Branco
. imagens do carnaval de rua de Timóteo
. relação de diretores: Petrobrás, Acesita, CSN, CVRD e Belgo-Mineira
. entrevista com militares que presidiram empresas estatais
. Sindicato Metalúrgicos de Timóteo(Metasita)
. memorial e projetos solicitados pela Acesita ao engenheiro Romeu
Duffles
. projetos realizados por Romeu Duffles
. plano de parques e bulevares de Cincinnati (1907) George Kessler
. folheto sobre o de George Kessler para Kansas City (1920)
Levantamento
iconográfico
(plantas, fotos,
projetos de
arquitetura)
Timóteo: Fundação ACESITA, Biblioteca Municipal,
Arquivo Central da ACESITA, Parque Nacional do
Vale do Rio Doce
Belo Horizonte: acervo pessoal do Sr. José Luis Batista e
família, DufflesArquivo Público Mineiro, Arquivo
Público da Cidade de Belo Horizonte, Museu Abílio
Barreto, Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e
Artístico, Minas Tênis Clube
Biblioteca Pública Municipal
Secretaria de Obras Públicas do Estado de Minas
Gerais, Departamento de Estadual de Obras Públicas
Levantamento de campo das cidades: Volta Redonda,
Ouro Branco, Monlevad, Itabirito, Itabira, Nova Era,
Ipatinga, Sorocaba (antiga fábrica Ipanema) e Timóteo
O material obtido é bastante significativo, constando desde fotografias
(da década de 1940 à 1970), projetos de edifícios, implantação de
loteamentos, plantas de cidades (cópia em papel e um arquivo em
autocad), livros de memórias, fotografias e filmagem do estado atual de
locais de interesse. Sua descrição e catalogação foi realizada para o
terceiro trabalho programado e completada pelo trabalho programado
6.
Além de Timóteo, buscou-se elaborar mapas que demonstrem a
organização espacial das demais cidades siderúrgicas mineiras.
Entrevistas
Timóteo: José Eustáquio de Carvalho, Waldetario
Vitorino Dias, João Kleber Barbosa, Olinto Araújo, José
Cruz, Padre Jorge Abdala, Aparecida, Rosana Diniz,
Perácio de Araújo Bicalho, Núbia Batista da Silva, José
Fausto d´Ávila, Sr. Vilma Sperancine, Sr. Otávio
As informações obtidas através das entrevistas (~23horas de gravação)
são um material riquíssimo, demonstrando a visão da cidade e da
empresa pelos olhos de ex e atuais trabalhadores de setores e períodos
diversos, de um farmacêutico, membro do sindicato, uma professora, um
padre, funcionários da prefeitura, da cooperativa de trabalhadores de
aço inox, organizadores do carnaval, sindicalistas e um ex-prefeito.
372
Sperancine, Sr. José Mendes de Meneses e Sr. Ciro
Barbosa Machado, Toni (sindicato), Paulo de Della
Libera (funcionário Acesita), Leonardo Rodrigues da
Cunha (ex-prefeito)
Belo Horizonte: José Luis Batista, Dna. Vanda Duffles
Teixeira de Andrade, (cunhada do eng. Romeu Dufles) e
seus filhos Marcos e Fábio
Volta Redonda: Fernando Sena,
Ouro Branco: Legiana e Jorge Peres
Antônio Dias: Joaquim Maria das Graças Lima
Pesquisa em
periódicos
Bibliotecas Municipais: Timóteo, Ipatinga, Coronel
Fabriciano
Bibliotecas universitárias: FEA e FAU - USP
Revistas: Observador Econômico, Visão: Quem é Quem, Fato (Acesita),
Minas em Revista, O Vale em Revista, Módulo (incompleto).
Jornais: Diário do Aço, Jornal do Vale do Aço, Novos Rumos.
373
374
375
376
377
378
379
380
381
382
383
384
385
AnexoIII_org1_2
385
386
AnexoIII_org3
Estrutura Societária da ACESITA em 2006
Fonte: http://www.acesita.com.br/port/conheca_acesita/perfil_estrutura.asp em 21/dez/2066
386
387
AnexoIII_org3
Estrutura Societária da ACESITA em 2006
Fonte: http://www.acesita.com.br/port/conheca_acesita/perfil_estrutura.asp em 21/dez/2066
387
388
AnexoIII_org5
FLUXOGRAMA DA PRODUÇÃO DE CARVÃO VEGETAL
388
389
AnexoIV_leis
DECRETO FEDERAL 23.569 DE 11 DE DEZ DE 1933
Regula o exercício das profissões de engenheiro, de arquiteto e de agrimensor.
Capítulo IV -Das especializações profissionais
Art. 28 - São da competência do engenheiro civil:
o estudo, projeto, direção, fiscalização e construção de
a) ‘’.trabalhos topográficos e geodésicos;
b) ‘’ edifícios, com todas as suas obras complementares;
c) ‘’ das estradas de rodagem e de ferro;
d). ‘’ das obras de captação e abastecimento de água;
e) ‘’ de obras de drenagem e irrigação;
f) ‘’ das obras destinadas ao aproveitamento de energia e dos trabalhos relativos às máquinas e fábricas;
g) ‘’ das obras relativas a portos, rios e canais e das concernentes aos aeroportos;
h) ‘’ das obras peculiares ao saneamento urbano e rural;
i) projeto, direção e fiscalizão dos serviços de urbanismo;
j) a engenharia legal, nos assuntos correlacionados com as especificações das alíneas "a" a "i";
Art. 30 - Consideram-se da atribuição do arquiteto ou engenheiro-arquiteto:
o estudo, projeto, direção, fiscalização e construção de
a) ‘’ de edifícios, com todas as suas obras complementares;
b) ‘’ das obras que tenham caráter essencialmente artístico ou monumental;
c) o projeto, direção e fiscalização dos serviços de urbanismo;
d) o projeto, direção e fiscalização das obras de arquitetura paisagística;
e) o projeto, direção e fiscalização das obras de grande decoração arquitetônica;
f) a arquitetura legal, nos assuntos mencionados nas alíneas "a" a "c" deste Artigo;
g) perícias e arbitramentos relativos à matéria de que tratam as alíneas anteriores.
LEI Nº 5.194, DE 24 DE DEZEMBRO DE 1966.
Regula o exercício das profissões de Engenheiro, Arquiteto e Engenheiro-Agrônomo, e dá outras
providências
Capitulo I - Das Atividades profissionais
SEÇÃO IV
Atribuições profissionais e coordenação de suas atividades
Art . As atividades e atribuições profissionais do engenheiro, do arquiteto e do engenheiro-agrônomo
consistem em:
a) desempenho de cargos, funções e comissões em entidades estatais, paraestatais, autárquicas, de economia
mista e privada;
b) planejamento ou projeto, em geral, de regiões, zonas, cidades, obras, estruturas, transportes, explorações
de recursos naturais e desenvolvimento da produção industrial e agropecuária;
c) estudos, projetos, análises, avaliações, vistorias, perícias, pareceres e divulgação técnica;
d) ensino, pesquisas, experimentação e ensaios;
e) fiscalização de obras e serviços técnicos;
f) direção de obras e serviços técnicos;
g) execução de obras e serviços técnicos;
h) produção técnica especializada, industrial ou agro-pecuária.
Parágrafo único. Os engenheiros, arquitetos e engenheiros-agrônomos poderão exercer qualquer outra
atividade que, por sua natureza, se inclua no âmbito de suas profissões.
Art . As atividades e atribuições enunciadas nas alíneas a , b , c , d , e e f do artigo anterior são da
competência de pessoas físicas, para tanto legalmente habilitadas.
Parágrafo único. As pessoas jurídicas e organizações estatais só poderão exercer as atividades discriminadas
nos art. 7º, com excessão das contidas na alínea " a ", com a participação efetiva e autoria declarada de
profissional legalmente habilitado e registrado pelo Conselho Regional, assegurados os direitos que esta lei Ihe
confere.
Art . As atividades enunciadas nas alíneas g e h do art. 7º, observados os preceitos desta lei, poderão ser
exercidas, indistintamente, por profissionais ou por pessoas jurídicas.
Art . 10. Cabe às Congregações das escolas e faculdades de engenharia, arquitetura e agronomia indicar, ao
Conselho Federal, em função dos títulos apreciados através da formação profissional, em têrmos genéricos, as
389
390
características dos profissionais por ela diplomados.
Art . 11. O Conselho Federal organizará e manterá atualizada a relação dos títulos concedidos pelas escolas
e faculdades, bem como seus cursos e currículos, com a indicação das suas características.
Art . 12. Na União, nos Estados e nos Municípios, nas entidades autárquicas, paraestatais e de economia
mista, os cargos e funções que exijam conhecimentos de engenharia, arquitetura e agronomia, relacionados
conforme o disposto na alínea " g " do art. 27, sòmente poderão ser exercidos por profissionais habilitados de
acôrdo com esta lei.
Art . 13. Os estudos, plantas, projetos, laudos e qualquer outro trabalho de engenharia, de arquitetura e de
agronomia, quer público, quer particular, sòmente poderão ser submetidos ao julgamento das autoridades
competentes e só terão valor jurídico quando seus autores forem profissionais habilitados de acôrdo com esta lei.
Art . 14. Nos trabalhos gráficos, especificações, orçamentos, pareceres, laudos e atos judiciais ou
administrativos, é obrigatória além da assinatura, precedida do nome da emprêsa, sociedade, instituição ou firma
a que interessarem, a menção explícita do título do profissional que os subscrever e do número da carteira
referida no art. 56.
Art . 15. São nulos de pleno direito os contratos referentes a qualquer ramo da engenharia, arquitetura ou da
agronomia, inclusive a elaboração de projeto, direção ou execução de obras, quando firmados por entidade
pública ou particular com pessoa física ou jurídica não legalmente habilitada a praticar a atividade nos têrmos
desta lei.
Art . 16. Enquanto durar a execução de obras, instalações e serviços de qualquer natureza, é obrigatória a
colocação e manutenção de placas visíveis e legíveis ao público, contendo o nome do autor e co-autores do
projeto, em todos os seus aspectos técnicos e artísticos, assim como os dos responsáveis pela execução dos
trabalhos.
Fontes:
http://200.242.128.189/legislacao/d23569.htm
http://www.planalto.gov.br/CCIVIL/leis/L5194.htm
Pesquisadas em 03/fev/2007
314
AnexoV_RADT
Pesquisa: Romeu de Andrade Duffles Teixeira
D
ADOS PESSOAIS E PROFISSIONAL
Nascido em 04/fev/1900 - Antonio Carlos (antigo Sítio, distrito de Barbacena)
Estudou na Escola Nacional de Engenharia – Universidade do Brasil – RJ
Registrado no Crea 4
o
Sessão n
o
1.023/D – engenheiro industrial
Falecido em 06/set/1976
A
RQUIVOS PESQUISADOS E INFORMAÇÕES OBTIDAS:
1.
SECRETARIA DE VIAÇÃO E OBRAS PÚBLICAS DO ESTADO DE MINAS GERAIS (ATUAL SECRETARIA DE
OBRAS E TRANSPORTES)
Rua Manaus, 467 – Santa Efigênica – Belo Horizonte – MG
Fone: (31) 3239.0908 / 0909 / 0900
Assessoria de Comunicação Sr. José Alves (chefe gabinete) – Patrícia
RH – Aldativa
22/dez/1953 - Carta de próprio punho pedindo contagem de tempo de serviço para aposentadoria
Trabalhou em:
jan/1928 à maio 1929 – 5
o
Residência de Estradas de Rodagem (trecho Barbacena –
Palmeira (Santos Dumond)
fev/1932 á jan/1933 – Estrada São Romão – Formosa (auxiliar de escritório) – sob a chefia
do engenheiro Cícero Andrada de Magalhães Gomes e Alderico Rodrigues de Paula
jan/1933 à abri/1935 – Departamento de Viação – sob a chefia do engenheiro José Soares
de Matos, Odilon Dias Pereira e Santana
12/jan/1954 - Carta pedindo Certificado para aposentadoria de serviços prestados ao Estado
admitido em 1928
contratado como engenheiro industrial em 1943
11/maio/1953 – começou a trabalhar no Estado como apontador chefe na 5
o
Residência do Estado,
no trecho Barbacena – Palmira da estrada Belo Horizonte – Rio de Janeiro, em 2/jan/1928, onde
trabalho até 30/jun/1929.
Voltou a prestar serviços, desta feita, como auxiliar de escritório, sob a chefia de Cícero Andrada de
Magalhãres Gomes, na Estrada São Romão – Formosa (08/ou/1932 – 10/abr/1934) na Divisão de
Viação.
Em 11/abr/1934, passou a prestar sua colaboração em serviços internos da Secretaria de início como
praticante, auxiliar do serviço de estradas e finalmente como engenheiro, trabalhando sem
interrupção até 15/dez/1953.
Juntando os períodos acima mencionados, ficou apurado que o Sr. Romeu de Andrade Duffles
Teixeira obteve o exercício adquirido de 8.238 dias ou sejam: 27 anos, 6 meses, 28 dias de serviços
prestados.
26/jul/1954 – recebeu a referida certidão
29/dez/1954 – solicita recontagem do tempo para recebimento dos qüinqüênios – resultado: 23 anos
18/jan/1956 – solicita nova contagem – cuja certidão saí neste dia, tendo como resultado: 8.619 dias
11/mar/1958 – pede recontagem dos períodos 1928-1929 e 1932-1933
10/abr/1958 – recebe a certidão onde se acrescentam 1.070 dias, referente ao período solicitado
2.
CREA BH (CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E AGRONOMIA BELO
HORIZONTE)
Não foi localizado registro
3. DER – MG (D
EPARTAMENTO DE ESTRADAS E RODAGENS DE MINAS GERAIS)
314
315
Com o desmembramento da secretaria de obras em 1946 e sua transformação em autarquia em 1953,
alguns funcionários foram transferidos para o DER, Romeu Duffles não consta entre eles.
4.
ESCOLA POLITÉCNICA UFRJ - antiga ESCOLA NACIONAL DE ENGENHARIA
Confirmação do curso, ano de ingresso e conclusão – aguardando resposta UFRJ
5.
BIBLIOTECA DO INSTITUO IZABELA HENDRIX BH
Não há registro da doação dos livros de sua biblioteca pessoal
6.
AMÉRICA FUTEBOL CLUBE
Segundo informações fornecidas pelo Sr. Carlos Paiva (historiador do clube), entre 1917 e 1919 jogou
no 2
o
quadro, time formado por garotos norte-americanos do time
7.
MINAS TÊNIS CLUBE
Segundo informação obtida em consulta ao clube, junto a Adriana Avila (setor de relações públicas),
não há registro da participação do engenheiro Romeu A. D. T. do projeto do clube.
8.
IEPHA - Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas
O acervo da SETOP (Secretária Estadual de Transportes e Obras Públicas), que deveria ser transferido
para um dos edifícios do “Corredor Cultural” a fim de poder ser consultado, até agosto de 2006 não
estava disponível para consulta (informações de Andreia Xavier em setembro/2006).
9.
PREFEITURA MUNICIPAL DE BELO HORIZONTE Secretaria de Obras
Guarda acervo somente de obras posteriores a 1970.
P
ROJETOS ANALISADOS
19... – Paraguassú – Praça Oswaldo Costa
Foto: Orvando
Referência: fotografias
193.. – Carangola – Urbanização – Praça de Esportes Minas Gerais
Projeto
Desenho:J. Cantagallo
Secretário da Viação: Odilon Dias Pereira
Eng. Chefe do Serviço de Saneamento e Urbanismo: Afonso Cast...
Prefeito:Waldemas Soares
Referência: perspectiva
1937 (out) – Barreiro de Araxá – Praça parque sports
Projeto
Desenho: Eurico R. Coelho
Eng. Chefe do Serviço de Saneamento e Urbanismo: Lincon Continentino
Eng. Chefe do Serviço de Estancias: José Francisco de M... Jr.
Referência: planta
1938 – Belo Horizonte – Palácio da Liberdade – Parque
Projeto
Desenho:J. Cantagallo
Secretário da Viação: ...
Eng. Chefe do Serviço de Saneamento e Urbanismo: João P... Filho
Construção: Otto Jacob
Referência: perspectiva
1942 – Belo Vale – Urbanização
Projeto
Referencia: correspondência Lincoln Continentino (in L
IMA, 2003)
316
1944 – Curvelo – Urbanização
Projeto
Referencia: correspondência Lincoln Continentino (in L
IMA, 2003)
1944(9?) – Itabirito (?) – Usina Esperança Futebol Clube (Praça de Esportes – Campo da
Brasilidade e Eugenia)
Projeto
Desenho:J. Cantagallo
Referência: perspectiva
1948 – Alfenas – Jardim da Praça Rafael Magalhães
Projeto e desenho
Secretário da Viação: Odilon Dias Pereira
Eng. Chefe do Serviço de Saneamento e Urbanismo: Lincoln Continentino
Prefeito: Salomão Barroso
Referência: planta
1946 – Cel. Frabriciano – Acesita – urbanização – subdivisão de terrenos (setor II – Funcionários)
Projeto e desenho
1947 – Cel. Frabriciano – Acesita – Plano Geral
Projeto e desenho
Cópia 1951
Referência: planta
1950 – Cel. Frabriciano – Acesita - Projeto de urbanização parcial (setor IV)
Projeto e desenho
Referência: planta
1951 – Cel. Frabriciano – Acesita – Praça de esportes (geral)
Projeto e desenho
Referência: planta
1951 – Cel. Frabriciano – Acesita – Praça de esportes (detalhe quadras)
Projeto e desenho
Referência: planta
1951 – Cel. Frabriciano – Acesita – Praça de esportes (detalhe pista de atletismo)
Projeto e desenho
Referência: planta
1953 – Astolfo Dutra – Urbanização parcial (Estádio de Fubebol Olyntho Almada)
Projeto e desenho
Gestão do prefeito: Domingos G. Oliveira
Referência: planta
1954 – Antônio Carlos (ex-sítio) – Urbanização
Projeto e desenho
Divisão de Urbanismo
Chefe do Departamento (D.A.M.): Reny Rabello
Referência: planta
Relação de Projetos realizados para a Acesita
T
EIXEIRA, Romeu Andrade Duffles. Memorial Urbanização de Acesita. Mimeo, 1952. 27p.
“PLANO GERAL - LOTEAMENTO
317
O número de lotes, contidos no Plano de Urbanismo é de 1.725, assim distribuídos,
pelos vários setores.
Setor I – margem esquerda do Timotinho – 390
Margem direita – 214. Total – 604
Setor II – 133
Setor III – 238
Setor IV – 460
Setor V – 167
Setor da margem esquerda do Timotinho e Timóteo – 123
TRABALHOS ANTERIORES EXECUTADOS PELO AUTOR DO PLANO
1) Esboço de urbanização no primeiro terreno, próximo ao rio Piracicaba.
2) Anteprojeto de grande área, posteriormente urbanizada.
3) Cópia colorida em papel vegetal, dêsse anteprojeto.
4) Ida ao Rio para explicação à Diretoria, das soluções, contidas nêsse estudo.
5) Anteprojeto do núcleo residencial, junto à Usina, o qual foi considerado como
projeto.
( mencionado, possível projeto da “Vila dos Técnicos”)
6) Cópias do projeto de urbanização parcial, correspondente ao Setor II do Plano
Geral.
7) Cópias dêsse Setor com mais detalhes
8) Cópia do Setor I do Plano Geral, margem esquerda do Timotinho
9) Cópia do Setor III do Plano Geral.
10) Cópia do Setor IV do Plano Geral.
11) Anteprojeto da Praça de Esportes dos Operários, em escala de 1:2.000.
12) Cópia de uma parte do projeto da Praça de Esportes dos Operários, em escala de
1:500.
TRABALHOS FINAIS DO PLANO DE URBANISMO E
DA PRAÇA DE ESPORTES DOS OPERÁRIOS
1) Cópia em papel tela do Plano de Urbanismo, em escala de 1:2.000.
2) Cópia em papel tela na escala de 1:2.000, da Urbanização Parcial (Setor II).
3) Cópia em papel tela, em escala de 1:2.000 da Urbanização Parcial (Setor IV)
4) Cópia em papel tela, na escala de 1:500, do projeto da Praça de Esportes dos
Operários.
5) 4 cópias em papel tela, contendo plantas ampliadas dos campos esportivos e os
respetivos[sic] perfis.
DESESSEIS PLANTAS COLORIDAS EM PAPEL CANSO, ASSIM DISTIBUÍDAS
1) 2 cópias do Plano de Urbanismo
2) 2 cópias da primeira urbanização Parcial
3) 2 cópias da segunda Urbanização Parcial.
4) 2 cópias do projeto da Praça de Esportes dos Operários.
5) 8 cópias das plantas ampliadas e perfis dos campos esportivos.
CÓPIAS EM PAPEL OZALID
Urbanização – 16
Praça de Esportes – 20
FOTOGRAFIA
Fotografias da Urbanização e Praça de Esportes –
8 cópias fotográficas em tamanho ofício.
1 cópia fotográfica do Plano de Urbanismo, ampliada para a escala 1:5.000.
MEMORIAL
2 vias do memorial descritivo.
Obs.:
negrito – material localizado e analisado, cópias xerox do memorial, heliográficas no tamanho A4 dos
projetos e fotografia das plantas
sublinhado
– atribuição de títulos e setores (autora)
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )
Milhares de Livros para Download:
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