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Cachoeira em
Crônicas
COTIDIANO
Jeferson Selbach
Cachoeira do Sul
2005
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Livros Grátis
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Copyright © 2005 by Jeferson Selbach
Direitos reservados à Jeferson Francisco Selbach.
Rua General Portinho, 1701 - térreo Cachoeira do Sul/
RS - CEP 96508-061 - [email protected]
Capa: fotografia de 1928, antiga Avenida das Paineiras,
praça José Bonifácio, Cachoeira do Sul. Cedida pelo
Museu Histórico Municipal - Patrono Edyr Lima.
Sumário
Sviluppo Cachoeira! 5
Nostalgia 7
Bandeira simbólica 9
Kamikaze social 12
Aceita bala de troco? 15
Sinto versus cinto 18
Picareta certeira 20
Diálogo 23
Ding-dong infernal 26
A dor do fiador 28
Em se plantando tudo dá... 31
Bancos, filas e outras chatices 34
Contas, juros & Cia ltda. 37
Conta d’água 40
Cidade de papel versus cidade real 42
Alcoólatras Anônimos 45
Alô, alô CRT 48
Tolerância zero 51
Dados Internacionais de
Catalogação na Publicação (CIP)
S464c Selbach, Jeferson Francisco.
Cachoeira em crônicas : cotidiano /
Jeferson Francisco Selbach. – Cachoeira do
Sul : Ed. do Autor, 2005.
96 p.
ISBN 85-905426-2-9
1. Crônica. 2. Literatura Brasileira.
I. Título.
CDU 869.0(816.52)-94
CDD 869.987
Bibliotecária Responsável:
Simone Costa da Silva CRB/10-1564
Revisão: Ivouny Dargelio Maciel
De acordo com a Lei n.10.994, de 14/12/2004, foi feito
depósito legal na Biblioteca Nacional
Este livro foi autorizado para domínio público
através do site http://www.dominiopublico.gov.br, com
Licença Creative Atribuição-Uso Não-Comercial-Não
a obras derivadas 2.5 Commons, licenciado no site
http://creativecommons.org/license/?lang=pt.
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Baú da felicidade 53
Desenvolvimento turístico 56
Repercussão 59
Cidade Turística 61
Quem casa quer casa 64
HCB X Prefeitura 66
Acidente de trânsito 69
Correios 72
Apenas bons amigos 75
Compras de natal 78
Estacionamento 82
T-Liga no ECA 85
T-Liga de novo no Patronato 87
Blitzkrieg 90
Tratoraço 93
Sviluppo Cachoeira!
A Umbria, terra dos italianos São
Francisco de Assis e Santa Rita de Cássia, está na
vanguarda do desenvolvimento econômico. A
região nada faz de revolucionário, só o dever de
casa, desde a década de 50. Eles têm um
mecanismo de atração de investimento, baseado
em micro e pequenas empresas. Lá tem uma
agência de desenvolvimento chamada
Sviluppumbria. Seu diretor, Vinicio Bottacchiari,
esteve na capital mês passado, defendendo a
cultura do “empreendedorismo local”.
Como na região não havia latifúndios
(propriedade rural, característica de países
subdesenvolvidos, de monocultura e com terras
incultas, explorada por um só proprietário, que
utiliza mão-de-obra não especializada, mediante
salário muito baixo), apenas pequenas
propriedades agrícolas, “cada família se
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transformou numa pequena empresa”. É o que
chamaram de “Família ltda.”.
Diferente dos mastodontes que são as
grandes corporações multinacionais, as pequenas
empresas têm a vantagem da flexibilidade na
produção. “Temos competência e know-how para
trabalhar com aço, que não precisa ser usado para
fabricar carros. Se a Fiat está em situação crítica,
o sistema não, porque pode fornecer para outros
setores”, explicou Bottacchiari.
Este espírito empreendedor, pasmem, não
depende de verba pública. Segundo o diretor da
agência, o maior desafio é desenvolver recursos
humanos, despertar a capacidade de arriscar e de
lançar um negócio próprio. O apoio da organização
vai na orientação das empresas com pesquisa
tecnológica universitária, para que estas
aproveitem as oportunidades do território. Além
disso, a região conta com uma eficiente
administração pública, o que não quer dizer
aprovar investimentos a toque de caixa, no afã
(desespero) de não deixá-los ir embora.
Por esta razão, ele afirma que “incentivos
atraem apenas especuladores”. Ao buscar
investimento de verdadeiros empreendedores e
não “caçadores de dotes”, evita a instalação do
que chama “catedrais do deserto”, empresas que
não criam nada ao redor de onde se instalam, não
trazem nenhum desenvolvimento ao território, só
se aproveitam do subsídio e do baixo custo do
trabalho.
Se Cachoeira do Sul está sedenta por
soluções que tragam desenvolvimento, a
experiência desta região italiana cai como uma
luva. Ao invés de tentar desesperadamente atrair
uma empresa de grande porte, que traz somente
empregos e não desenvolvimento (quem lembra
dos calçadistas?), a cidade pode e deve pensar no
potencial local, a fim de estancar a sangria de
jovens empreendedores cachoeirenses migrando
para outras regiões.
Para isso, é necessário, antes de tudo, auto-
estima.
Taí! É uma boa campanha. Sugiro até o
slogan: “Cachoeirense, depois da vitória da
seleção, não deixe sua estima cair no chão!”
Nostalgia
Nada é mais perfeito, moldável e utópico
do que o passado. Tudo o que se pensa que
aconteceu, de fato não aconteceu como se pensa,
até porque a memória é fraca e coisas ruins só
servem na hora da discussão familiar, quando um
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joga na cara do outro aquilo que já deveria estar
morto e enterrado.
O pretérito pode tomar o caráter de
felicidade ou de infelicidade, depende de quem
está fazendo o review (exercício de rememoração).
Um otimista lembra da alegria ao ver o filho que
nasceu, mas se esquece das horas de sono perdidas
devido ao incessante choro do rebento; já o
pessimista irá lembrar do polpudo cheque que
deixou na maternidade, mas se esquece das
lágrimas por ser pai.
Tem aquele que insiste em olhar o passado
com aquilo que chamo de visão pastoral. Este
costuma dizer que antigamente as coisas eram
melhores: não havia assaltos, corrupção e fome;
sobrava honestidade, solidariedade e emprego. É
algo como ver na cidade de ontem a paródia do
filme Como era verde meu vale.
Para Cachoeira do Sul, é ainda mais
presente esta questão da nostalgia, entendida como
a melancolia produzida pela saudade do passado
ou apego às glórias de outrora. Com a pujança
econômica nos áureos tempos do arroz irrigado,
explorou a idéia de progresso ao mesmo tempo
que cultivou suas tradições. Com a decadência
econômica, apega-se aos feitos passados, como
se eles pudessem trazer de volta o tão sonhado
progresso. Desta forma, a cidade parece se
acomodar, deitar em berço esplêndido.
Na famosa história do Fausto de Goethe,
há uma força vital que anima o heróico
personagem, um impulso que Marshall Berman
chamou de desejo de desenvolvimento. A bola da
vez é aspirar à mudança, ir efetivamente em busca
dela, procurá-la de maneira ativa. Deve-se
aprender a não lamentar com nostalgia as relações
fixas e imobilizadas de um passado real ou
fantasioso, se empenhando na renovação.
Se nostalgia é um sentimento que emperra
o crescimento de uma comunidade, não é preciso
abandonar a Princesa do Jacuí para deixar aflorar
este desejo de desenvolvimento.
As respostas às nossas dúvidas não estão
lá onde elas nunca existiram, mas em nós mesmos,
que as criamos.
Bandeira simbólica
Xenófobo é aquele sujeito que tem aversão
ao estrangeiro. Não é difícil encontrar um típico
exemplar passeando pela cidade. Aliás, cada um
de nós carrega consigo um pouco deste sentimento
de aversão aos gringos. Pode-se chamar de
bairrismo, amor às origens ou outra coisa que o
valha, ambos trazem este componente xenófobo.
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Claro que com o advento da globalização, muitos
passaram a ver aquilo que é estrangeiro como o
melhor. De qualquer forma, ainda somos
impregnados, lá no fundo, desta vontade de fazer
parte de uma comunidade e estreitar os laços com
ela.
Uma mostra clara do que falo pôde ser
vista esses dias. Um comerciante resolveu colocar
em frente a sua loja uma bandeira de Cachoeira
do Sul. Está lá, fulgurante, chova ou faça sol.
Achei o gesto simbólico muito bonito. A imprensa
deu destaque merecido e a inauguração, ou
hasteamento, como queiram, teve direito a
discurso (até porque é época eleitoral).
Passado uns dias, precisei de um material
e não tive dúvida, fui à loja da bandeira hasteada.
Lá chegando, demoraram para me atender, devido
ao grande movimento, diga-se de passagem
(acredito que outros tiveram a mesma idéia que
eu). Fiquei algum tempo escorado no balcão e um
rapaz jovem veio ver o que eu queria. Solicitei o
preço e as condições de pagamento do material,
um piso de borracha. O valor era igual ao de uma
grande loja de materiais de construção
“estrangeira”, que eu havia consultado
previamente. Só que, na loja da bandeira hasteada,
o prazo era menor. Fiz a contra-proposta (o natural
choro): levaria o material se eles fizessem as
mesmas condições de pagamento (ao invés de três
vezes, cinco vezes). O vendedor foi duas vezes ao
escritório e voltou com a resposta negativa. Disse
que eu deveria trazer um comprovante da outra
loja para poder vender nas mesmas condições, ou
poderia pagar os juros, o que vai contra minha
natureza.
Sei que, nas cidades em que todos se
conhecem, é comum a relação cliente/empresa se
basear na amizade entre aquele que compra e o
que vende. “Ai do vivente se comprar na
concorrência”, habitualmente se ouve. Ou de
basear o marketing simplesmente na questão do
pertencer à comunidade, como é o caso da rede
de supermercado que adotou o slogan “compre
aqui, é de Cachoeira” depois da inauguração do
concorrente.
Fico a pensar na validade de uma gesto
simbólico como o da bandeira hasteada, sem a
recíproca do profissionalismo empresarial. De
pouco adianta tais simbolismos apelativos, ainda
mais para um consumidor que, aos poucos, como
disse antes, passa a acreditar que tudo que é
estrangeiro é melhor.
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Continuo gostando muito da bandeira
hasteada em frente a loja, mas fui comprar na loja
estrangeira por pura inabilidade do jovem
vendedor e da falta de visão empresarial/
profissional do proprietário. Talvez seja o caso dele
recolher a bandeira e ir se atualizar num dos vários
cursos disponíveis no mercado.
E isto vale para todos nós que, de alguma
forma, carregamos um sentimento parecido.
Kamikaze social
A campanha de um tradicional clube local
para novos sócios traz um estigma interessante:
quem mora na cidade mas não se associar, não
poderá assistir os eventos promovidos pelo clube,
mesmo que pese o fato de querer pagar pelo
ingresso. Assim, se você for cachoeirense mas não
for sócio e quiser ir ao baile de carnaval, esqueça.
É melhor assistir o de rua.
Esta jogada arriscada em muito se
assemelha aos ataques suicidas realizados pelos
pilotos de avião japoneses, mundialmente
conhecidos por kamikazes, que literalmente se
jogavam contra os navios de guerra aliados. Na
vã esperança de que muitos vão se associar por
não querer ficar de fora dos grandes
acontecimentos sociais, o clube acaba apostando
num futuro incerto e duvidoso.
Explico: o mais importante para quem vai
num baile é que outras pessoas também estejam
nele, para não correr o risco de beber ou dançar
sozinho no meio do salão. Este princípio do ver e
ser visto é tão importante nas casas noturnas que
praticamente em todas elas só é possível saber se
a casa está cheia ou vazia entrando. É tipo
armadilha para animais: uma vez lá dentro você
não vai querer sair sem antes aproveitar cada
centavo do dinheiro do ingresso. E isto é levado
tão a sério que muitas boates dificultam
propositadamente a entrada para que se aglomerem
pessoas na frente. Quem passa e olha as longas
filas é levado a acreditar que ali é o point da noite.
Impedindo o acesso de cachoeirenses não-
sócios, se elimina uma parcela considerável de
público. Pode-se argumentar que estão
selecionando as pessoas e só aquelas que têm
vontade e dinheiro suficiente para pagar uma
mensalidade estarão lá, logo, fazer parte da high-
society, nem que seja por poucos instantes, tem
seu preço. Na prática não é bem assim. Poucos
são os que acreditam na necessidade de manter
um status quo aparente (ser sócio de um tradicional
clube faz parte). Os valores mudaram e muitos se
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aperceberam que é mais proveitoso mandar a filha
debutante viajar a pagar um baile, instalar uma
piscina em casa a ir na do clube, pagar canais de
televisão por assinatura a passar a tarde numa área
verde.
Neste contexto, os eventos promovidos
por uma sociedade que limita o público não pelo
valor do ingresso, mas pela opção de ter se
associado ou não, acabam esvaziados pois quem
não se associou acaba indo para outro lugar se
divertir. Quem se associou, vai acabar indo junto
pelo baixo movimento de pessoas (claro que
sempre tem aqueles que gostam de beber ou dançar
sozinhos).
Se você for cachoeirense mas não for sócio
e quiser ir ao baile de carnaval, não esqueça: todos
vão estar na rua, como já vem ocorrendo nos
últimos tempos. A menos que a campanha fique
só na propaganda e nos próximos bailes o clube
feche os olhos para os não-sócios cachoeirenses e
deixe-os entrar, desde que paguem o ingresso,
obviamente.
PS: Escrevi esta crônica depois de ouvir
as lamúrias de uma amiga que foi impedida de
entrar num baile em outubro, pois, era sócia, mas
estava com a mensalidade atrasada. Ela queria
pagar o ingresso mas exigiram que ela colocasse
em dia sua conta. Só resolvi escrever sobre o tema
depois de confirmar o fato num anúncio onde se
lê: “não será permitida a entrada de não-sócios
residentes no município”. Posteriormente, li que
o clube vai abrir uma exceção no baile de carnaval,
contradizendo o anunciado (até porque a
campanha para novos já acabou e como dizia meu
pai: “antes de meter tudo prometer, depois de
metido tudo prometido”).
Aceita bala de troco?
Bala é como se chama aqui no Brasil uma
pequena guloseima de consistência firme, feita
com calda de açúcar aromatizada e acrescida de
corantes, ou de ingredientes com sabores diversos.
Normalmente ela vem numa embalagem
convidativa, principalmente para as crianças. Que
o diga minha sobrinha pequena: é só ver uma bala
cor-de-rosa que pede para comprar pra ela.
Aqui em Cachoeira do Sul, nos
supermercados, bala também designa o troco das
compras. Digo isto porque em todas oportunidades
que fiz compras nestes estabelecimentos, a
operadora do caixa perguntou se eu queria, ao
invés de 1, 2, 3, 4 e até 5 centavos, uma balinha
de troco. Sempre respondo, com a maior cara de
tacho que se pode imaginar, que aceito só se puder
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pagar posteriormente as compras com as próprias
balas. Aí começa a romaria: toca campainha
chamando a operadora central pedindo moedas de
1 centavo porque um cliente mala exigiu seu troco
como se isso fosse uma afronta ao bom senso pois
não sabe ele que a tal moedinha é tão escassa nas
caixas registradoras que o dono resolveu sortear
brindes para quem pagar suas compras com
moedas e os outros clientes na fila já começam a
ficar impacientes que a operadora me deixa num
canto esperando o insignificante troco.
Um senhor viajado, amigo meu, ouviu
atentamente minhas lamúrias por causa do tal 1
centavo de troco pago em bala e me contou uma
história que ocorreu com ele, na Alemanha.
Acostumado a deixar o troco para a moça do caixa,
fez isso lá e foi chamado de volta. A moça ficou
ofendida e disse não precisar de esmolas.
A febre das lojas 1,99 se deu com base
justamente neste aspecto. Não custa R$ 2, até
porque este valor parece ser mais do que é, mas
R$ 1,99, o que, psicologicamente, é mais
convidativo. Para os norte-americanos, de onde o
conceito destas lojas veio, é impensável comprar
algo que custe um valor cheio, como R$ 8 mil.
Mas se for R$ 7.999,99 é oferta imperdível.
Mesmo num valor tão alto, eles exigem o troco
até porque estimam tanto seu dinheiro que
colocaram impresso nele “Em Deus nós
acreditamos”. O engraçado que nestas lojas de 1,99
sempre te devolvem o troco, mesmo que você nem
esteja pensando nele.
Mais engraçado ainda é nos
supermercados que falei. Sistematicamente eles
não têm troco, a ponto de eu pensar que ambos
brigaram com o banco que fornece o troco. Claro
que o contador de tostão vai afirmar que isto se dá
porque se em cada compra o caixa registrador
vender uma bala ou não dar a afamada moeda, o
lucro no final do mês será considerável, por isto
desta prática ter se tornado algo normal.
Não sei se é o caso de algum órgão público
(Defensoria? Procon? Sei lá!) entrar na jogada e
multar a empresa que não der o troco total. O mais
certo é eu me resignar e começar a aceitar balas,
não sem antes fazer um plano de saúde que inclua
tratamento dentário, até porque logo logo vou
precisar, de tão bom que é comer bala (ou chupar,
não sei exatamente qual é o verbo correto) e só
escovar os dentes antes de dormir.
De qualquer forma fica a sugestão: você
cidadão, acostumado com a desconsideração, de
tostão em tostão terá um monte de bala na mão!
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Sinto versus cinto
Quando se diz que uma pessoa é a “ovelha
negra” da família, é porque ela se sobressai no
grupo por suas más qualidades, por seu mau
proceder. Quem nunca ouviu aquela tia fuxiqueira
dizer que “desde criança é a ovelha negra da
família”? Advogando para o tal “diabo”, dá para
alegar que ele não é ruim de um todo, só é
“diferente” ou “contestador” (rebelde). Ao invés
de ficar sentado quietinho como o pai mandou,
prefere infernizar as visitas. Para não passar
vergonha na frente delas, o pai diz que é uma
criança “ativa” e depois lhe dá uma surra na
cozinha.
O que importa é que somos uma sociedade
de indivíduos diferentes com algumas coisas em
comum. Por exemplo: sonhos, todos temos. Os
da maioria referem-se a coisas materiais, tipo
automóvel, casa própria ou DVD. Nos últimos
anos, a carreira profissional está em voga no
quesito “desejo veemente”, não só pelo salário de
marajá almejado mas pela própria realização
pessoal que proporciona auto-estima, massagem
do ego, etcéterá e tal. Poucos têm sonhos para
melhorar a moral, como ser mais caridoso e menos
egoísta, mais humilde e menos vaidoso. Até
porque estes entram nos desejos que fazemos nas
orações e que cabe a nós mesmos, portanto
irrealizáveis a curto prazo. E diferentes somos, isso
ninguém nega. Caso contrário poderíamos resgatar
os casamentos arranjados pelos pais, uma vez que
casar com este ou com aquela não faria diferença.
Por sermos assim tão iguais e diferentes
ao mesmo tempo é que, em algumas vezes, agimos
da mesma maneira que os outros, e, em outras,
agimos em acordo com a nossa própria vontade.
O sociólogo Max Weber explica que agir em
sociedade implica em racionalidade (ou
irracionalidade), porque parte de quem age. Nosso
agir em sociedade pode ter um objetivo claro (fim
específico), pode ser com base numa tradição
(valores), pode ser regular (todos agem assim) ou
pode ser de forma afetiva (esta irracional). Esses
tipos de ações se confundem entre si, adverte ele.
Um exemplo bem simples que demonstra
de maneira inconfundível como agimos tanto pelos
agir dos outros como pela nossa própria vontade
é a do cinto de segurança. Para quem vem de
cidades maiores, com trânsito intenso e
fiscalização rigorosa, usa o cinto de forma quase
automática: abre a porta, senta no banco, atrela o
cinto, liga o carro e vai embora. Se vem para
Cachoeira do Sul, perde aos poucos este hábito.
Como poucos são os que usam o cinto de
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segurança nas ruas da cidade, e como os
“amarelinhos” preferem ficar na sombra agradável
(normalmente em bandos), o motorista acaba se
vendo como “ovelha negra” (ou diferente) por usar
o cinto.
Isto até receber uma multa pesada ou
sofrer um grave acidente. Aí, sem cinto, sinto
muito...
Picareta certeira
Cachoeira do Sul é uma terra complicada
de se entender, ainda mais para quem vem de fora,
de uma cidade que, em nome do progresso,
derrubou prédios históricos, asfaltou
desmedidamente as ruas e tornou-se uma pseudo-
micro-metrópole terceiro-mundista. Lá em Novo
Hamburgo isto tudo teve início em meados dos
anos 70, quando o pensamento norte-americano
veio na carona dos importadores de calçados.
Querendo se parecer como as downtowns Yankees,
as casas em estilo germânico foram substituídas
por prédios envidraçados, numa típica
transformação simbólica: a cidade não queria mais
ser lembrada como uma zona de colonização
alemã.
Aqui em Cachoeira, esta aculturação
ocorreu de forma mais amena, por conta da própria
tradição conservadora e da escassez econômica,
até porque para ocorrerem transformações são
necessários recursos. Por esta razão, em alguns
bairros da cidade, principalmente nos mais antigos,
ainda existem casas antigas habitáveis. Esta
peculiar situação produziu uma outra realidade:
devido a um plano diretor produzido por técnicos
com pouco senso estético e social, ao lado de
construções antigas ergueram-se prédios
modernos, descaracterizando todo contexto visual.
Se fala tanto em soluções para a crise
cachoeirense, sempre com o intuito de querer
transformar a cidade em pólo de alguma coisa,
como transporte (quem lembra do ramal rodo-
hidro-ferroviário que de vez em quando alguns
ressuscitam?), indústria calçadistas,
armazenamento de grãos, universitário, turismo,
etcetera, etcetera e, suspiros, etcetera. Um com-
ponente não falta sempre quando tocam neste as-
sunto: o do messias, ou salvador da pátria que tra-
rá a fertilidade econômica tão desejada. Assim, a
solução da crise sempre dependerá de alguém ou
algo externo e não dos próprios cachoeirenses.
Um pequeno exemplo de como a cidade
pode encontrar seu rumo, caminhando com as
próprias pernas, é o do turismo histórico. Para isto
é necessário ter o que mostrar, e não só um
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Château d’Eau descaracterizado pelos chafarizes
em formato de estrela. Como é uma coisa simples,
e que cabe à própria cidade se organizar e fazer, a
poucos interessa. Se assim não fosse, já haveria
lei proibindo desfigurar fachadas históricas (caso
exista esta lei, haveria fiscalização). Esta semana
vi demolirem uma bela residência, localizada uma
quadra abaixo da prefeitura, para decerto ser
erguido um edifício. Com tantos terrenos baldios
na área, fica difícil entender tal atitude. Esta
desfiguração arquitetônica também se dá em
outros prédios, principalmente naqueles adaptados
para o comércio. Quem segue pela rua 7 de
Setembro ou desce a Júlio de Castilhos pode ter
uma idéia do que falo: poucos prédios exploram
as fachadas históricas, a maioria as escondem com
placas de propaganda apoiadas normalmente nas
marquises. A cidade esconde um de seus maiores
patrimônios e acaba assemelhando-se a outra
qualquer. Para quem duvidar da viabilidade deste
tipo de turismo é só fazer o circuito Nova
Petrópolis/Gramado/Canela. O estilo arquitetônico
da serra faz o visitante acreditar que está em outro
país.
Eu me questiono. Cadê as “forças vivas”
da cidade nesta hora? Será que crêem que cultura
é tão somente carnaval? Uma grande caminhada
começa com o primeiro passo. E se Cachoeira do
Sul quer aproveitar um pouco do seu próprio
potencial, e crescer a partir dele, pode começar a
pensar em pequenas coisas como essas, coisas
simples, mas que podem gerar grandes soluções
se bem trabalhadas. Caso contrário, pode continuar
vendo as picaretas certeiras enterrarem seu
passado e, sob os escombros, dar uma de Fênix e
sair voando por aí...
Diálogo
Diálogo é a fala entre duas ou mais
pessoas; uma conversação ou colóquio. É uma
troca ou discussão de idéias, de opiniões, de
conceitos, com vista à solução de problemas, ao
entendimento ou à harmonia; enfim, uma
comunicação. Para que ela se dê de forma
satisfatória é necessário que tanto aquele que fala
quanto aquele que ouve adotem uma linguagem
comum, falem a mesma língua.
Quando você entra num estabelecimento
bancário, e vê uma imensa fila e só um caixa
atendendo, a primeira idéia que lhe ocorre é
perguntar se o que você quer fazer pode ser feito
de maneira mais rápida. Foi o que eu fiz, na
véspera de carnaval.
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Entrei na agência local do Itaú e me
deparei com uma fila de aproximadamente 20
pessoas e só um caixa para atendê-las, inclusive
os idosos que têm preferência. Uma moça estava
passando e perguntei a ela se poderia fazer um
simples depósito em dinheiro nos caixas
eletrônicos. Eram 11 horas e ela me respondeu que
o dinheiro só estaria disponível ao meu recebedor
no final do expediente bancário (15 h).
Inconformado, fui para a fila. Ah. nada como testar
a paciência... Uns 15 minutos depois passou o
rapaz que assessora o público, perguntando para
cada uma das pessoas o que elas queriam. Quando
chegou a minha vez, não lhe respondi
absolutamente nada, só fiquei com aquele olhar
de peixe morto, esperando que ele entendesse o
meu pensamento: “Vai atender no caixa que tu
ganhas mais!” Ao chegar no caixa, este ainda me
gozou, dizendo que eu fiquei de bobo (não usou
esta palavra) todo aquele tempo, pois podia ter
feito o mesmo depósito nos caixas eletrônicos.
Expliquei a ele que tinha pensado nisso mas fui
persuadido. Ele retrucou afirmando que os tais
envelopes do caixa eletrônico não são retirados
somente no final do expediente, mas ao meio-dia.
Fui falar com a moça que me explicou errado; para
variar, ela tinha mil e uma novas explicações que
não fiquei para ouvir.
Isto é uma pequena mostra de como o
diálogo (ou a falta dele) pode atrapalhar a vida de
uma pessoa. Primeiro que a moça não deve ter
sido orientada pelo gerente ou responsável. Se foi,
ouve falha na comunicação. Segundo que eu
poderia ter respondido para o rapaz que assessora
o público, ao invés de ter ficado calado. Neste caso,
a falta de diálogo fez com que eu passasse mais
tempo na fila. Claro que o rapaz poderia também
estar mal informado (ou não estar informado),
como a moça. Terceiro, o caixa poderia falar
menos. Não que isso tenha algo a ver, mas é que
quem está na fila ansioso pelo atendimento, acha
dispensável a conversa inútil (essa terceira situação
ocorre com freqüência nos caixas dos
supermercados locais). Além do mais, se ele não
tivesse me falado, sairia dali sem saber que perdi
um tempo precioso, sem que fosse preciso.
Por fim, o fato de escrever sobre isto é
uma tentativa de estabelecer uma comunicação
com os leitores, para que eles compartilhem com
a minha dor (nas pernas, de tanto ficar em pé na
fila).
Espero que tenha sido claro na
comunicação...
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25
Ding-dong infernal
O sino é um instrumento, em geral de
bronze, obcônico, que tem uma sonoridade mais
ou menos aguda, de acordo com o tamanho e a
espessura, e pode ser percutido na superfície
interna por um badalo, ou na externa por um
martelo.
Desde épocas remotas, os sinos são
instalados em torres e campanários. Naquele
tempo, ele era o meio mais eficiente de
comunicação: incêndios, hora do dia e
falecimentos; a comunidade tomava conhecimento
instantaneamente dos acontecimentos. Como
poucos possuíam relógios e todos conheciam seus
doentes, quando os sinos de uma igreja badalavam
funebremente, sabia-se quem tinha falecido. Hoje,
os sinos podem gemer funeriamente e não se fica
sabendo quem morreu. Ouve-se o “dong-dong”,
lê-se os avisos de enterro colados nas paredes e
não se tem a mínima idéia de quem foi o vivente,
ou melhor dito, o morrente. Além do mais, com
jornais diários e estações de rádio para notificar o
infausto, não há necessidade do “dong-dong”
lúgubre, irritante e assustador, repicando nos
ouvidos como uma tortura mental.
Com o advento do relógio de pulso
produzido em massa pelos japoneses, o repicar dos
sinos acabou ficando só como auxílio para a
poluição sonora urbana, algo irritante, ainda mais
se for domingo pela manhã, dia mundial do sono
prolongado. Se antes a comunidade se dividia
basicamente em duas grandes religiões, e o sino
servia de maneira espetacular para chamar os fiéis
para a missa domingueira, hoje ele está na
categoria das “coisas que incomodam os ouvidos”,
junto com os carros de mensagem ao vivo e os
“magrinhos” azoando nos postos de gasolina noite
adentro.
Por outro lado, quem vem de fora pode
até ficar maravilhado com o barulho do sino. Por
esta razão, sugiro que se transfira as igrejas com
sino para perto dos hotéis, de modo que o turista
seja acordado com um badalar nostálgico. Só não
posso garantir que eles voltem tão cedo para
Cachoeira do Sul.
Brincadeiras a parte, toda religião deve ser
respeitada na sua fé, crença, costumes e tudo o
mais. Em contrapartida, todas religiões devem ter
um mínimo de urbanidade. Não adianta pregar
contra as boates e sua barulheira infernal se no
templo religioso se promove gritaria que assusta
deuses, demônios, vizinhos e infiéis, não
necessariamente nesta ordem. Ou ainda deixar
tocar durante toda tarde de sábado uma música
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incômoda do lado de fora da igreja, pensando em
trazer harmonia ao ambiente. Em todos os caos, o
direito de produzir o som deve levar em conta o
direito daqueles que não querem ouvi-lo, ainda
mais em horários impróprios.
Fica uma pergunta: Não há lei
regulamentando a poluição sonora? Quantos
decibéis permite e em quais horários? Os sinos
estão adequados? De qualquer forma, tenha dó,
domingo cedo tocar um barulho “infernal” é repelir
mais possíveis fiéis do que atrair os já existentes
para uma casa que se quer de Deus.
A dor do fiador
Fiador é aquele sujeito que fia ou abona
alguém, responsabilizando-se pelo cumprimento
de obrigações do abonado. Em outras palavras, é
aquele que presta fiança. Já se fez filmes sobre
esta figura. O último foi estrelado por Kevin
Bacon: “O homem invisível”, isto porque, pela
praxe, você nunca encontra um quando mais
necessita.
Um boa fórmula para convencer alguém
de ser seu fiador é começando por indicá-lo nas
fichas de crediário das lojas. É só colocá-lo no
item “referências pessoais” e esperar a loja ligar
para ele perguntando como você é, se você paga
as contas, etcéterá e tal. Depois de alguns dias,
passe na casa da “vítima”, assim como quem não
quer nada, leve um presente ou um quitute mesmo
que ele não esteja festejando nada (escreva um
cartão: “Pensei em você por acaso!”). Pergunte
como estão as coisas e deixe que ele diga que
telefonaram da loja pedindo referências suas. Faça
cara de desentendido e depois de alguns minutos
se lembre com ares de pouca importância. Diga
que nem queria comprar à prazo, mas como a loja
vendia em prestações a perder de vista pelo preço
à vista (até rimou), você acabou optando por fazer
o tal crediário. E como não poderia deixar de ser,
na hora de indicar alguém, lembrou do “amigo”.
Depois disso troque o rumo da conversa “pra modo
dele não desconfiar”.
Se seu “amigo” não desabonou sua
iniciativa passe para a segunda parte do plano.
Escolha um dia qualquer e convide-o para passear
sem rumo. Diga que está estressado e pensando
em mudar (não fale em mudança física, senão “dá
na telha”). Por “coincidência”, passe em frente à
moradia tão almejada e ressalte os aspectos
positivos da casa. Se ele se entusiasmar, vá
correndo para a imobiliária buscar a chave; caso
contrário, dê quantas voltas forem necessárias até
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ele ver a casa com os mesmos olhos que os seus.
Ao entrar na futura residência, comece a
se entusiasmar aos poucos. Vá imaginando em voz
alta como ficaria o sofá na sala nova, a mesa de
jantar, o fogão e a geladeira na cozinha e a cama
no dormitório. Gaste um tempo maior na
churrasqueira: lembre a ele o quão importante é
celebrar aos domingos o encontro com a família;
não esqueça de informá-lo que ele faz parte da
sua família.
Depois disso, caia em “deprê” novamente.
Lamente sobre sua morada velha, ressaltando
como ela está caindo aos pedaços. Se for preciso,
caia em prantos nos braços de seu “amigo” e diga
a famosa frase: “Oh! Mundo cruel!” Se tudo isto
não comovê-lo, desista da amizade e compre um
cachorro.
Alugar algo é uma coisa inesquecível. Se
não fosse pelas almas caridosas de alguns que
aceitam o chamado “caução”, ficaria impossível
morar sozinho nesta cidade ou mesmo montar um
negócio. De um lado, as imensas exigências das
imobiliárias que, querendo se prevenir de
eventuais mal pagadores, praticamente
inviabilizam a locação. De outro lado, o
constrangimento de ter de pedir para um amigo
ser “fiador”.
Quem constrói um prédio para alugar ou
mesmo secciona uma residência em vários pedaços
(como num cortiço), opta por um investimento,
portanto de “risco” como todos outros. Claro, que
vão alegar que é preciso prevenir, mas quantos
hoje em dia podem alugar uma casa conseguindo
dois fiadores com imóveis? Não estou entre estes,
portanto, pelo menos aqui, sou um excluído.
Por pouco não moro na rua...
Em se plantando tudo dá...
Li ontem a entrevista com o presidente do
Sindicato Rural de Cachoeira do Sul, Alberto
Costa, e, não sei se foi bem isso que ele falou,
uma coisa ficou me encucando: “A passagem por
Cachoeira do Sul [do MST] é tida como um ato
de desrespeito para com o Secretário da Segurança,
José Otávio Germano, pois vem contra a ideologia
e política que são adotadas no município”. Se eu
entendi bem, isso quer dizer que aqui na cidade
só se pode pensar de uma forma? A ditadura militar
continua e não me avisaram, pô! Acredito que isto
tenha sido uma expressão mal colocada ou até
impensada, pois os porões do DOPS fecharam a
tempo, e podemos falar e escrever o que pensamos,
sem ofensas, é claro!
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Sobre a questão da terra, ela é tida como
um bem particular. O uso dela, entretanto, tem
conotação pública, uma vez que não pode servir
para mera especulação imobiliária. Na teoria isto
é muito bonito, mas na prática não é bem assim
que ocorre. Neste caso, a lei posta na Constituição
Federal precedeu os fatos. Se escreveu no papel
na vã esperança que acontecesse. É por isso que
dizem que o Brasil das leis é perfeito, enquanto o
da realidade...
A maior bronca dos ruralistas (“grandes”,
diga-se de passagem) é o índice de produtividade.
Eles consideram muito alto ter de colocar mais do
que meia dúzia de bois por hectare. Em terra onde
“o olho do dono é que engorda o boi” poderiam
adotar o confinamento: colocar os terneiros no
lugar da televisão e plantar feijão, batata e outros
alimentos que sirvam para dar de comer à gente e
não bichos.
Li um livro muito interessante, que fala
do binômio soja-trigo adotado nos anos 60 e 70.
Para quem não lembra, passamos de “celeiro do
Brasil” para “grandes exportadores de soja” em
pouco mais de uma década. Na prática isso quer
dizer parar de plantar para abastecer o mercado
interno e passar a produzir uma commodity com o
preço cotado pela bolsa de Chicago. O autor traz
uma informação interessante: através da
alimentação de animais convertemos sete proteínas
em uma. O que se conclui que seria mais produtivo
dar comida direto para as pessoas do que para as
galinhas, os porcos e as vacas.
O conflito por causa de terras não é novo.
Assisti a poucas semanas atrás uma defesa de tese
no pós-graduação em História da Unisinos que
versa justamente sobre os conflitos agrários do
século passado na região. A autora mostrou como
os colonos recebiam um pedaço de terra do
governo e se apossavam de mais outros tantos,
esticando uma cerca aqui, desviando o curso de
um arroio ali, e outros artifícios mais. No Centro-
Oeste e Norte do país, os grileiros fazem algo
muito parecido. Adquirem uma propriedade e
fazem ela dar cria em seguida.
Neste embate, cada um usa a arma que
tem: os grileiros, o papel; os ruralistas, o poder
político-econômico; os sem-terra, a foice e a
enxada. Ingênuo é pensar que o conflito está
resolvido ou, o que é pior, que vai ser resolvido
de forma pacífica e ordenada. Nenhum lado vai
ceder, até por que usam a máxima “não tá morto
quem peleia” e seguem se digladiando.
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Outra informação interessante: se o “Fome
Zero” der certo parece que vai faltar comida, pois
o que se produz no país não é suficiente para que
todos comam no mínimo uma vez por dia. Se
levarmos em conta que tem alguns que comem
por dois, concluímos facilmente que a existência
de uma legião de famintos não é imaginação de
um militante de esquerda.
Parece que foi Pero Vaz de Caminha que
disse que aqui no Brasil “em se plantando tudo
dá”. Problema é que se não plantamos, nada dá...
Bancos, filas e outras chatices
Banco, como todo mundo sabe, é o
estabelecimento, particular ou estatal, cuja
atividade consiste na guarda e empréstimo de
dinheiro, transações com títulos de crédito, etc.
Abrir uma conta num banco, atualmente, é questão
de cidadania, de ser cidadão. Estar excluído do
sistema bancário é privilégio dos rebeldes e
miseráveis. Digo privilégio porque o banco é um
dos últimos estabelecimentos comerciais que ainda
trata seus “clientes” com desprezo. Já falei aqui
sobre uma situação que ocorreu comigo no Itaú,
quando tive de ficar numa enorme fila para
descobrir que a mesma operação podia ser feita
no caixa eletrônico, isso depois de perguntar para
uma moça do banco e ela me informar errado.
Mas semanas atrás fui ao campeão dos
campeões do setor privado: o Bradesco. Eram 14
h aproximadamente e a fila contava com mais de
50 pessoas para, pasmem, um único caixa.
Também nos poucos caixas eletrônicos havia
enormes filas. O engraçado, se não fosse trágico,
é que tinha um atendente só para orientar no auto-
atendimento porque há muitos idosos e analfabetos
que se atrapalham com os botões. Lá dentro, havia
uma pessoa só para organizar a fila, qual fosse
uma manada de bois e não clientes. Na fila, fiquei
pensado se os bancários não sentem vergonha de
trabalhar ali. Sei que a culpa nunca é deles, nem
do gerente, pobre homem que acaba sendo o
pelego entre instituição, empregados e clientes.
Mas sei lá, eu teria...
Um homem na fila só reclamava,
lembrando que há uma lei que prevê multa aos
estabelecimentos bancários que deixarem seus
“clientes” mais de tanto tempo esperando pelo
atendimento. Segundo os bancos, esta lei não vale
nada. Argumentam que as regras bancárias são de
competência de uma instância federal cujos
membros são indicados pelos próprios banqueiros.
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Uma mulher, também desesperada por causa da
demora, falava ao celular com alguém, dizendo
para chamar o jornal a fim de fotografar o descaso.
Tanto faz, os bancos não costumam dar
importância aos reclames da comunidade.
Mas o negócio do banco é vender serviços.
Meu pai faleceu quando eu tinha recém
completado 18 anos e deixou um seguro,
infelizmente do Bradesco. Quando vivo,
garganteava que com sua morte a família não teria
mais dificuldade, tal a quantia do seguro. “Não
revelo porque senão vão querer me matar antes
do tempo”, brincava ele. Ledo engano, além do
seguro ser mísero devido aos desajustes que o
banco promovia por conta própria, o pagamento
levou mais de seis meses para ser efetuado. Sempre
tinha um papel que faltava assinar ou outra coisa
impedindo.
Jurei desde então que não cairia na
tentação de trabalhar com banco, ainda mais o dito
cujo. Nas vezes que descumpri o prometido me
dei mal. Como o cheque-especial e o cartão de
créditos dão a falsa impressão de um poder
aquisitivo irrisório, acabei pagando os juros
extorsivos e, no final das contas, sendo protestado.
Ironicamente, depois que passei a não ter mais tais
regalias, consegui poupar dinheiro, até porque
pagando tudo à vista o desconto é bem maior.
E assim sigo até hoje. A única conta que
mantenho em banco é a que recebo salário. Nesta,
só posso sacar se tiver dinheiro. Em compensação,
não gasto o que não tenho e não pago taxas
embutidas. Não preciso fazer seguro disto ou plano
de capitalização daquilo.
Para pensar na fila do banco: a greve dos
bancários, já resolvida, deveria ter como exigência
contratar mais pessoas, para melhor atender o
público...
Contas, juros & Cia ltda.
É Natal! Depois do Papai Noel vem a
ressaca das contas a pagar. Muitos consumidores
usam e abusam das compras à prestação, com
cheque pré-datado ou carnê de crediário. A
diminuição de alguns pontos percentuais nas taxas
de juros nacional pouco refletiu no dia-a-dia. Vou
dar uma de economista e demonstrar como o juro
se faz presente.
Vi lojas anunciando o pagamento em até
quatro vezes sem juros (30/60/90/120 dias). Para
pagamento à vista oferecem desconto de 20%. Por
exemplo, uma compra de R$ 100,00 pode ser paga
em quatro vezes de R$ 25,00 ou R$ 80,00 à vista.
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Na primeira prestação, o juro real (mas não
demonstrado) é de 25%. É só pegar o valor de
etiqueta (R$ 100,00), diminuir o desconto (20%)
e dividir o valor final (R$ 80) em quatro prestações
(R$ 20,00). A diferença da primeira prestação é
de R$ 5,00 (equivalente a um aumento de 25% da
prestação se fosse paga à vista). Na segunda
prestação, o juro é de aproximadamente 12% ao
mês (R$ 20,00 + 12% + 12% = R$ 25,00). Na
terceira prestação, o juro é próximo a 7,8% ao mês.
A última prestação tem um juro mais suave, de
aproximados 5,8% ao mês.
Somando isso tudo, o juro médio desta
pequena compra fica próximo a, pasmem, 9,6%
ao mês. O cálculo é meio complicado, mas dá uma
idéia. Para o valor pago à vista soma-se 9,6%. Em
30 dias, quando se paga a primeira prestação, o
valor é de R$ 87,68 (R$ 80,00 + 9,6%).
Diminuindo o valor pago de R$ 25,00, tem-se R$
62,68 que vão ser acrescidos de mais juros para a
prestação de 60 dias, totalizando R$ 68,69. Paga-
se mais R$ 25,00 e ainda faltam R$ 43,69 para
pagar. Nos 90 dias, o valor subiu para R$ 47,89.
Diminuindo o valor a ser pago, sobra R$ 22,89.
Este, acrescido de mais 9,6% (120 dias), acaba no
valor da última prestação.
Por que os juros são tão altos nas lojas?
Quando o lojista encomenda uma mercadoria da
fábrica, ele recebe um prazo para pagamento, que
coincidentemente é de 30/60/90/120 dias,
normalmente. Ora, ninguém é ingênuo a ponto de
pensar que a fábrica não dá também desconto para
pagamento à vista, até porque, além de receber o
dinheiro antes e poder girar com ele, não existe
risco de não pagamento, o que ocorre numa
compra a prazo.
As lojas não compram à vista por uma
razão bem simples. A maioria não tem capital de
giro, dinheiro disponível. A maioria dos
empresários, micros e pequenos principalmente,
têm um sonho de botar um negócio próprio. Nem
sabem ao certo de que tipo, só que não querem ter
um patrão. Com os poucos recursos que têm,
investem nos móveis e equipamentos (prateleiras,
mesas, balcão, bancos, etc.) e propaganda. Na hora
de comprar a mercadoria, encomendam e torcem
para que as vendas sejam boas, caso contrário têm
que liquidar ao final para pagar a fábrica. É por
isso, simplesmente isso, que a maioria quebra em
pouco tempo.
Tentei demonstrar como é muito mais
vantagem comprar à vista, não importa se na loja
A ou B. Mas como diria minha mãe: “Daí eu não
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compro nada meu filhinho, pois não consigo
guardar o dinheiro!” Para esta resposta não existe
argumento.
PS: Lembre-se de perguntar antes de
comprar, qual o desconto para pagamento à vista.
Se for maior do que 10%, saiba que está pagando
caro.
Conta d’água
A água é a maior riqueza do século XXI.
Em nome disto, já se prevê que mesmo aqueles
que têm poço artesiano pagarão pelo precioso
líquido futuramente. Lá em casa, depois que me
casei, a conta teve um crescimento estratosférico.
E não foi por conta dos banhos demorados da
minha amada, das maquinadas de roupas que ela
lava ou da banheira que encho no verão, a fim de
ficar de molho nas tardes calorentas. A conta
aumentou porque o hidrante tem a mesma idade
que nossa família: eu, minha esposa e as tartarugas.
Por ser tão velho, o relógio marcava 20%
a mais do que consumíamos. Sei disso porque o
técnico da CORSAN foi chamado e verificou.
Segundo ele, se o relógio marcasse somente 5% a
mais ou a menos, não haveria troca. A Companhia
de Água acha normal uma diferença assim. Não
levam em conta que ao final de um ano eu acabava
pagando uma conta a mais, a título, quiçá, de 13
o
.
Fiquei feliz por eles terem me dado o
desconto equivalente ao excesso do último mês
de consumo. Sim, se o consumidor não chama,
eles não vêm e quando vêm não dão desconto por
todos aqueles meses que cobraram a mais. Em
outra situação seria caso de polícia, pois a cobrança
em excesso é comprovada e não há ressarcimento.
Claro que o argumento que vão usar é o dos banhos
demorados da minha esposa, das maquinadas de
roupa e da minha banheira, esquecendo-se que o
relógio não ficou enferrujado só porque casei.
Fico pensando se não seria o caso da
CORSAN fazer uma vistoria preventiva para saber
se não é só o meu hidrante que está marcando a
mais. Sei que eles não vão fazer isto por uma razão
bem simples: caso seja verificada a cobrança
excessiva, não haverá relógios suficientes para
trocar. Relógios até que são fabricados, não existe
é verba suficiente para comprá-los.
Só resta pedir a vistoria individualmente.
Mas atenção usuário: a CORSAN inibe esta
reivindicação com a cobrança de uma taxa de
vistoria que é cobrada caso o relógio não ultrapasse
os 5% (a favor ou contra). Assim se a conta ainda
cabe no seu orçamento doméstico, vá tomar um
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banho de água fria e esqueça que você pode estar
pagando mais do que consome.
Lembre-se que a água é um líquido
precioso e que futuramente ela vai estar mais cara,
mais escassa e menos parecido com água, com
coloração, cheiro e gosto de cloro. Pensando por
este lado, você dará graças a Deus por ainda ter
água saindo pela torneira e pensará que a cobrança
em excesso estará beneficiando milhares de
famílias que ainda não terão acesso à água potável
encanada, que ainda vão estar buscando água em
riachos poluídos (apesar de sua conta prever
tratamento de esgoto) ou de bica públicas
contaminadas.
Quando estiver no chuveiro, cantarole um
antigo jingle: “Apanhe o sabonete, duchas Corona,
um banho de alegria, num mundo de água quente...
tchuaaaa”
Cidade de papel versus cidade real
“A cidade deve se desenvolver de forma
harmoniosa”, dizem os arquitetos. Para os
engenheiros, a cidade deve ter um
“desenvolvimento racional”. Eles acreditam que
o Plano Diretor (conjunto de leis e normas que
têm por finalidade regular obras e construções da
cidade) é condição para o progresso, algo essencial
e fundamental para o futuro de uma cidade.
Querem que tudo seja organizado, parecendo uma
casa de boneca. Esta é a cidade de papel, aquela
que só existe na cabeça dos assim chamados
“técnicos”.
Nos anos 80, Cachoeira do Sul teve sua
última reformulação do Plano Diretor. Já naquela
época se dizia que o antigo plano estava superado
e era necessário um novo para “corrigir
distorções”, discurso este que se repete agora. O
novo projeto objetivava “preservar problemas
futuros, tendo em vista o crescimento vertiginoso
da cidade”. Por conta disto, a cidade aprovou um
plano que previa um crescimento norteado pela
implantação do entroncamento rodo-ferro-
hidroviário, na extremidade sudeste da cidade, e
o surgimento do campus universitário, localizado
no passo D’Areia. Como tais obras nunca foram
realizadas, conclui-se que se a cidade crescesse
conforme os “técnicos” teria dado com os burros
n’água.
A mentalidade daquela época, que ainda
hoje está muito presente, era a da “concepção
integral do desenvolvimento”; em outras palavras,
a centralização das decisões nas mão de poucos.
Em 1983, o Plano Diretor foi aprovado de
“sopetão”, com pouca discussão da comunidade
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que teve de engolir a seco várias distorções: áreas
industriais sem indústrias, áreas residenciais sem
residências, prédios comerciais deixando de ser
construídos em nome de exigências pueris.
Entretanto, com o mesmo ímpeto que os
engenheiros, arquitetos, urbanistas e políticos
pensam a cidade, os habitantes reais constroem-
na a sua imagem e semelhança. De um lado,
projetos urbanísticos complexos e desenhos
arquitetônicos arrojados; de outro, ocupação
desordenada e construções irregulares. A
discrepância é tamanha, que num levantamento
parcial pode ser constatado que mais de 1/3 dos
prédios na cidade estão de alguma forma
irregulares, o que é válido pois na hora de erguer
um casebre, antes se pague o pedreiro do que o
engenheiro.
Felizmente, há um esquecimento
sistemático por parte das administrações públicas
dos planos diretores, deixando que a cidade cresça
conforme seus habitantes querem. Cidadãos
comuns desobedecem ao código e ninguém
fiscaliza, inibe ou penaliza. Assim, a cidade cresce
de forma desordenada, mas cresce livre.
Ora, o plano diretor é uma tentativa de
ordenar esta desordem. Por essa razão, estará
desatualizado antes de ser aprovado. A cidade de
papel dos técnicos não condiz com a cidade real
dos seus habitantes.
E tem solução melhor? Sim, organizar um
Conselho Urbanístico permanente e atuante, com
membros de toda comunidade, não só de técnicos.
Este órgão teria como finalidade legislar
sistematicamente sobre as normas urbanas. A
partir de algumas resoluções gerais, teriam a
flexibilidade de aprovar ou desaprovar obras,
loteamentos e outras atividade que geram maiores
impactos urbanos.
Cachoeira do Sul poderia ser pioneira
nisto.
Ou elaborar outro Plano Diretor para daqui
a algum tempo refazê-lo outra vez.
Alcoólatras Anônimos
Dia desses estava num dos caixas do
Supermercado Tischler, o da rua 7 de Setembro.
Atrás de mim um guri, 9 ou 10 anos, com uma
garrafa de aguardente de cana, como é mais
conhecida a cachaça, numa das mãos e na outra o
dinheiro dobrado. Acontece que sou meio chato
para essas coisas. E avisei a moça que estava
empacotando minhas compras (ela estava
ensinando a novata do caixa) da proibição de
vender bebidas a menores de idade. Me fiz de
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sonso e fiquei por ali até o menor passar com a
bebida recém comprada. Fui para o carro, que
estava no estacionamento do futuro shopping. Em
seguida, passa o guri com a bebida e entra,
acreditem, no prédio do shopping, pela porta que
tem em meio aos tapumes.
“Tudo em família”, pensei eu. O
supermercado vende a bebida ao menor que
trabalha ou é filho de quem trabalha no prédio da
mesma família. Claro que pelo horário, 19 h
aproximadamente, decerto não estavam mais
construindo nada. A cachaça deveria ser para o
vigia que, ou mora ali no prédio, ou bebe em
serviço. Não culpo o vigia de beber. Deve ser
difícil mesmo passar a noite num prédio inacabado
daquele tamanho. Nem por ele ter mandado o guri
ir comprar cachaça. Como a maioria da população,
ele deve desconhecer a proibição.
Já o supermercado, até pelo tamanho,
deveria saber da proibição de vender a menores
bebidas alcoólicas e coibir a venda, treinando seu
pessoal. Em países da América do Norte ou
Europa, os comerciantes exigem dos clientes a
carteira de identidade para comprovar a
maioridade, até porque se forem pegos vendendo
bebidas a menores vão para a cadeia. Aqui no
Brasil, tudo acaba em samba mesmo. Nem multa
aplicam. Pensando bem, também não dá para
culpar o Tischler, pois se ele não vender, qualquer
boteco de esquina vende. “Teria que haver mais
fiscalização”, diriam aqueles que só sabem pôr a
culpa nos órgãos públicos. Mas quem fiscalizaria?
A Prefeitura? O Conselho Tutelar? A Promotoria?
Como se eles não tivessem coisas mais importantes
para fazer e se preocupar.
Nos anos 30, o Congresso dos Estados
Unidos impôs à população a chamada “Lei Seca”.
Foi a época em que mais se bebeu, dentro da lógica
que tudo que é proibido desperta mais vontade de
experimentar. Foi a época também dos gângsteres,
como Al Capone de Chicago que enriqueceu com
a venda ilegal de bebida e foi preso não por
assassinato, mas por sonegar impostos.
No mesmo dia do ocorrido, li uma notícia
interessante aqui no jornal. A atriz Juliana Paes
foi proibida de fazer comerciais de cerveja. Isto
porque a estrela global é menor de 25. É algo
parecido com o que hoje se faz com os comerciais
de cigarro. Botam uma mulher daquelas, com o
corpo escultural e rosto angelical, dando a imagem
de quem bebe é bonito igual ela. Ora, longe de
dar uma de moralista, mas quem freqüentemente
enche a cara deforma o corpo, não só o fígado
mas a pele e outras partes visíveis. Acostumar
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guris a comprar de forma corriqueira bebidas
alcoólicas é, no mínimo, fazer com que eles
naturalmente provem futuramente.
Daí é um passo para se tornar alcoólatra...
Alô, alô CRT
Na metade dos anos 90, quando eu ainda
era acadêmico na universidade, assisti um colóquio
onde se confrontavam posições sobre a questão
da telefonia fixa, na época ainda estatal. O primeiro
a falar era um daqueles defensores ferrenhos da
privatização. Ele parecia o Baldi, do programa
Guerrilheiros da Notícia da TV Guaíba, com suas
posições ultra-conservadoras e se achando o dono
da verdade (Cachoeira tem também o seu, é só
pensar um pouco). Ele discorreu entusiasticamente
sobre os benefícios da telefonia privada: linhas
telefônicas baratas, tarifas promocionais,
instalação imediata, etc.
O segundo falou que de fato o poder
público não conseguia mais atender a demanda
de telefones. Explicou que a diferença entre o
modelo estatal e o privado é que no primeiro se
faziam altíssimos investimentos iniciais, na
maioria dos casos através de vendas de planos de
expansão, o que gerava a necessidade de vender
ações da companhia telefônica junto com o a linha,
e as tarifas domésticas eram subsidiadas pelas
internacionais. No segundo, os investimentos
ficavam por conta da iniciativa privada, o que
geraria uma oferta que suprimiria a demanda
contida, mas as tarifas sofreriam um lento e
gradual ajuste, principalmente entre os que
utilizam o telefone dentro da localidade, de uma
micro-região, do Estado e até do país. Em
compensação, as tarifas internacionais baixariam
drasticamente.
Lembro que nos anos 90, um irmão meu
foi passear na França uns três meses. Antes de ir,
ele combinou com meu pai que iria ligar, mas a
chamada não completaria. Assim, saberíamos que
ele estava bem. Hoje tudo mudou, fica mais barato
ligar para os Estados Unidos do que para minha
mãe em Novo Hamburgo. Eu gastei R$ 6,67 para
falar com ela durante 14 min e 4 s, no horário da
manhã (9 h 36 min). Teria gasto bem menos se ela
morasse no outro lado do mundo. Para variar,
alegria de pobre dura pouco. Tem o telefone, mas
se ligar acaba faltando dinheiro para a comida no
final do mês. Em compensação, quem pode
mandar o filho estudar no exterior, pode ligar para
ele a qualquer hora do dia. Grande vantagem, para
um dos lados, obviamente.
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O problema do telefone não era ser estatal
ou privado, mas de não existir concorrência. O
monopólio deixou de ser público para se tornar
privado e se antes ainda existia um mínimo de
senso coletivo, hoje a lógica do lucro domina o
mercado.
E nesta lógica, nada mais natural do que
colocar o cliente em segundo, terceiro ou último
plano. Um exemplo foi o que ocorreu comigo neste
mês. Incluíram na minha conta um serviço de
identificador de chamadas telefônicas, no valor
de R$ 5,76 mensais. Na primeira ligação, a
atendente disse que eu tinha solicitado tal serviço
e me deu até a data. Ela me passou para outra
“célula de relação com o cliente”, nome pomposo
para o jogo de empurra-empurra. Com a segunda
atendente cancelei o serviço que nunca havia
solicitado. Aí, pedi uma nova conta e ela me
passou para a terceira atendente. Ao todo, gastei
mais de meia hora na ligação 0800, destes 20 min
esperando com uma música intragável, que a cada
minuto dava o bip-bip do papa-léguas, símbolo
da empresa.
Passada a ressaca desta embriaguez que
foi a bandeira ideológica da iniciativa privada a
todo custo, dá para se ter uma idéia mais sóbria da
situação. As empresas telefônicas são campeãs de
reclamações no Procon. Na internet, elas se
associam com outras empresas e oferecem
“gratuitamente” conexão, quebrando os
provedores locais. Esta semana saiu que uma
destas empresas está sendo enquadrada em crime
de crime de colarinho branco, por ter um controle
acionário indevido. Viva a privatização!
Tolerância zero
Nova Iorque, no final dos anos 80, tomou
uma decisão radical: a de não mais aceitar os
crescentes índices da violência urbana. Chamou
o programa de Tolerância Zero. Isto não significou
trancafiar todos aqueles que praticassem algum
delito. O programa, de tão simples, deu certo. Sua
simplicidade residia no fato de tentar prever onde
os crimes ocorreriam. Calma, não chamaram a
Mãe Dinah ou outra vidente. Eles criaram um
mapa eletrônico e começaram a abastecê-lo de
informações essenciais. De posse destas
informações, praticaram a conhecida segurança
preventiva. Colocaram policiais em locais e
horários predeterminados. Desta forma, os índices
de violência baixaram violentamente (com o
perdão do trocadilho).
Além deste programa preventivo, a justiça
do estado nova-iorquino passou a ser mais rígida
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na aplicação das penas. Essa história de prender e
soltar em seguida o assaltante, bandido ou pequeno
traficante virou coisa do passado lá.
Big Brother Brasil
A reportagem da Revista Carta Capital de
algum tempo atrás nos informa que os britânicos
estão sendo observados 24 horas por dia por 15
milhão de câmeras de televisão de circuito
fechado. O governo, serviço secreto e a polícia
inglesa têm mais poderes legais e tecnologia
(celulares, internet, etc.) para bisbilhotar o dia-a-
dia dos britânicos do que o governo comunista na
China. Excetuando o fato de que lá no Reino Unido
há uma perversa invasão de privacidade, a
segurança realizada através do “olhar frio” das
câmeras de televisão funciona. E muito bem, diga-
se de passagem.
Em algumas cidades do Estado,
principalmente nas mais ricas, iniciou-se uma onda
de instalação de câmeras de vigilância nas
principais ruas da cidade. A iniciativa, ao que
parece, está sendo acertada.
Revitalizar a praça
Disto tudo, lanço uma idéia. Para acabar
com as gangues de Cachoeira do Sul poderíamos
mesclar o Tolerância Zero da Big Apple com o
Big Brother inglês. Sem muitas pretensões,
poderíamos começar pela zona central, na praça
José Bonifácio. Já que a Brigada Militar está
instalada no antigo Bar América, dali fica fácil
monitorar os transeuntes através de um circuito
interno de TV, com meia dúzia de câmeras
espalhadas pela praça (seu custo não ultrapassaria
R$ 2 mil).
Se algum vândalo arrancasse uma planta,
depredasse algum banco ou violentasse alguém
(até porque a ordem de agressão é do delito simples
para o mais grave), os praças da Brigada
prenderiam o meliante em questão de minutos. A
penalidade poderia ser até os trabalhos
comunitários, tão em voga na justiça criminal. O
delinqüente ficaria obrigado a trabalhar na própria
praça, repondo aquilo que destruiu e mais um
pouco, de modo a servir de exemplo para os outros.
Aos poucos, na medida das verbas
disponíveis, a vigilância televisiva seria ampliada
aos pontos de maior criminalidade. Aí sim,
Cachoeira do Sul serviria de modelo para os
outros.
Baú da felicidade
Sílvio Santos enriqueceu com um sistema
de vendas baseado na distribuição de prêmios.
Quem paga mensalmente o carnê do baú da
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felicidade, concorre desde pequenas quantias em
dinheiro ou badulaques até a tão sonhada casa
própria. Ao final, caso não ganhe nada, retira tudo
o que pagou em mercadorias. Já ouvi dizer que
ele é o maior contribuinte pessoa física do Imposto
de Renda. Isto porque prefere pagar o imposto a
quem de direito, deixando ao governo o papel de
gerenciador da redistribuição social, e não fundar
fundações que na maior parte das vezes só tem a
finalidade de desviar impostos.
Loteria
Em se tratando de jogos de azar, as que
mais iludem são as loterias oficiais. O prêmio que
o ganhador de fato leva para casa não chega a 30%
do total arrecadado, com exceção da Loteria
Federal que paga quase 50%. De 1% a 3% são
destinados ao Fundo Municipal da Cultura. O
Imposto de Renda abocanha entre 12,6% a 20,1%.
A Seguridade Social entre 7% e 18,2%. O Fundo
Penitenciário Nacional recebe 3%. Em algumas
modalidade de aposta é destinado ao Programa
Crédito Educativo entre 4,5% e 9,6% e em outras
10% a Entidades Práticas Desportistas. As
despesas consomem de 20% a 30% do total
arrecadado, sendo que a comissão da agência
lotérica é de 9% a 13%, a tarifa de administração
entre 5% e 16% e a comissão da Caixa Federal
entre 1% e 15%. Trocando em miúdos: para cada
R$ 1 apostado é devolvido R$ 0,30. Barbada
melhor só no cassino ou nas corridas de cavalos.
Jogo do bicho
Lá em Novo Hamburgo, um arrecadador
me disse que o jogo do bicho é a mais honesta das
apostas entre todos jogos de azar. Do valor da
aposta, 20% fica para quem fez o jogo, 10% para
quem arrecadou e 70% para o banqueiro que paga
o prêmio. Através do rádio e jornal fica-se sabendo
do resultado do sorteio das 14 h e o das 18 h.
Apostas podem ser feitas tanto nos botecos da
periferia quanto nas próprias agências lotéricas
oficiais. Apesar de ser contravenção, é a aposta
mais popular. “Todo mundo conhece alguém que
já ganhou no bicho, o que não acontece com outros
tipos de jogos de azar”, me explicou ele.
Campanha Leva Tudo
A campanha que o CDL repete este ano
tem este quê de ilusão do ganho fácil. Li no folder
explicativo distribuído aos lojistas, que
“especialistas de marketing são unânimes em
afirmar que sorteios de prêmios ajudam o
consumidor na hora de escolher em qual
estabelecimento entrar”. Assim como no baú da
felicidade, o consumidor se ilude que poderá ser
o contemplado com a premiação. Maior ilusão que
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esta só o sorteio do supermercado Tischler, que
premiou coincidentemente uma das proprietárias
da gráfica que fez os cupons e também tem vínculo
familiar com os proprietários do supermercado.
Bingo
É pífia a discussão sobre a moralidade dos
bingos. A legalização só tirou jogadores das outras
modalidades de jogos de azar. Viciado não deixa
nunca de apostar.
Filosofando
“A embriaguez mais ponderada e mais
liberal do jogo de azar, do qual toda a família
participa, substitui a alcoólica”. Walter Benjamin
(1930-40)
Desenvolvimento turístico
Se fala tanto em transformar Cachoeira do
Sul em pólo de alguma coisa, como transporte,
cargas, universitário, agro-negócios, etcetera e
etcetera. Se cogitou recentemente o turismo. Fazer
da cidade uma referência para além dos hermanos
del Plata que aqui pernoitam para seguir viagem
ao litoral. Desenvolver o turismo depende de algo
a mais do que verbas concedidas por alguém
(governo federal, estadual ou empresas privadas).
Depende da vontade interna, de toda uma
população. É na soma destas pequenas iniciativas
locais que reside a alavancagem necessária ao
desenvolvimento.
Poucas cidades no Brasil se
desenvolveram unicamente com o turismo. No
nordeste, o clima quente e as praias paradisíacas
não resolveram o problema de renda e
desigualdade social, materializada na construção
de arranha-céus ao lado de favelas. Gramado e
Canela, na região serrana do Estado, têm por detrás
de seu natal-luz uma centena de micro-empresas
que produzem os souvenires que o turista leva para
casa. Elas é que ampliam a renda local.
Gastronomia capenga
Um bom começo é pela rede
gastronômica. Cachoeira do Sul carece de uma
diversidade de restaurantes à noite. O La Cagge
faz iguarias apreciáveis, mas o preço é salgado.
No La Barca, especializado em frutos do mar, o
prato dá para dois desde que um esteja de regime.
Em termos de churrascarias, me lembro de quatro:
o Grill, boa opção a quilo ou livre; a do Hotel
União, só fui uma vez e não me agradei muito; a
Querência, onde se escolhe o espeto que se quer,
impedindo uma variedade; e a Nova Grécia, onde
nunca fui.
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Pizzarias nada italianas
O que decide qualquer iniciativa para se
pensar o turismo é o atendimento. Fui jantar na
pizzaria Número Um e solicitei um prato para
colocar as bordas da pizza e um pedaço que não
me apeteceu. A resposta do garçom: “não damos
prato para sobras que é para comer tudo”. Na Bella
Pizza, pedi uma pizza e a surpresa foi que o
tamanho grande se transformou em médio - as
quatro opções de sabor foram reduzidas a três -,
além do recheio vir diminuto. Pedi ao garçom para
mudar para rodízio, pagando a diferença de valor.
Ele consultou o dono e a resposta foi negativa.
Depois dessa, comer pizza só em casa. Ainda mais
depois que descobri que alunos do Roque
Gonçalves fabricam e vendem a R$ 1 a de tamanho
pequeno.
Eu recomendo
Há boas opções, sem dúvida. Recomendo
o Café Florence, com uma variedade de pratos a
la carte. No inverno não dá para perder a sopa.
Também a Sorveteria Doce Deleite é digna de
premiação. O sorvete flambado é dos melhores
que já provei. No frio, tem os pastéis, com várias
opções de recheio e tamanho. Servem um com
brócolis e queijo catupiri que é fenomenal. O Santa
Maria é uma boa opção para lanches mais rápidos.
Por fim, é de se ficar atento para as jantas
promovidas pelo grupo de tradição italiana. Fui
numa que é indescritível, de tão bom.
Repercussão
A crônica que escrevi semana passada
sobre o atendimento em restaurantes aqui em
Cachoeira do Sul surtiu algum efeito. Algumas
pessoas me pararam na rua para comentá-la. Uma
delas aproveitou para me contar o que lhe
aconteceu. Ela estava entrando de mão dadas com
a mãe numa pizzaria e o proprietário recepcionou-
as com um certo preconceito: “o casal pode ficar
a vontade para escolher uma mesa”. A filha
respondeu: “Que casal, é minha mãe!” Depois da
mancada, o mesmo foi atendê-las e querendo
agradar não parou de chamar a senhora de “vovó”.
Ela respondeu que não tinha netos ainda.
Tiroteio
Essa eu ouvi de uma dessas pessoas que
elogiaram a abordagem. Diz ela que ficou sabendo
(parece aquela brincadeira de telefone sem fio)
que por esses dias, numa pizzaria daqui, um cliente
estava aguardando impaciente para ser atendido e
explodiu de raiva, tirando um revólver da cintura
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e atirando para cima. Com o pandemônio, alguns
clientes se esconderam debaixo da mesa e outros
saíram correndo sem pagar. Se a história for
verídica, a que ponto chegamos.
Sorveteria Doce Deleite
O Marcelo Melatti, da sorveteira Doce
Deleite, me enviou um e-mail reconfortante:
“Venho por meio deste, expressar nosso
agradecimento pelas palavras de reconhecimento
escritas por você na crônica Desenvolvimento
turístico. Apesar de sabermos que o bom
atendimento e a qualidade dos produtos não são
mais do que obrigações da nossa empresa, são
palavras como as suas que nos incentivam a
melhorar cada vez mais”. Eu respondi
agradecendo pelo bom atendimento que prestam
quando vou lá, pelo pastel espetacular e pelo
sorvete flambado premiadíssimo. Eu pulo da ponte
do Fandango se suspenderem a fabricação.
Cinema Coliseu
Uma coisa está me incucando. Sobre o
tombamento da fachada do antigo cinema Coliseu,
na Sete de Setembro, li que a dívida ativa que o
proprietário tem com a Prefeitura Municipal já
ultrapassa os R$ 40 mil. Diz ele que o imóvel vale
R$ 200 mil. Assim, o comprador teria de pagar a
diferença, R$ 160 mil.
O que me intriga é porque até hoje a
prefeitura ainda não entrou com uma ação de
cobrança na justiça deste valor. Se entrou, porque
ainda o imóvel não foi penhorado para pagamento
da dívida. Se já foi, porque ainda não ocorreu o
leilão. Sei que se isso ocorrer, o proprietário vai
ter de acabar pagando sua dívida caso não queira
perder o imóvel a preço abaixo do mercado (não
sei se um imóvel no centro vale tanto) ou do preço
que estipulou. Se o proprietário deixar o imóvel ir
a leilão, esta ronha vai acabar, porque se alguém
já se dispôs a pagar o que ele pediu, pagará de
bom grado o lance num leilão.
Penso que esta questão é mais importante
do que o próprio tombamento.
Para pensar na cama
Seria interessante a prefeitura dispor de
uma listagem com os maiores devedores de IPTU
do município. Se constataria que quanto menos
se tem mais fiel se é nos pagamentos.
Cidade Turística
Estive neste final de semana em Nova
Petrópolis, primeira parada da rota romântica das
cidades turísticas da serra gaúcha. A cidade é uma
espetáculo de organização, ao menos na área
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central onde os turistas passeiam. Os canteiros com
flores das mais diversas cores e espécies estão pela
cidade inteira.
O luxo é ter tempo
Reportagem da revista CartaCapital desta
semana traz matéria sobre o consumismo.
Acreditem ou não, o maior luxo atual é ter tempo
disponível para si e para a família. Muitas pessoas
estão abrindo mão de empregos sedentários e
salários maiores por uma vida mais saudável. E
isto não é modismo de uma geração, como o
psicodelismo hippie dos anos 70 ou os “naturebas”
que os sucederam. É algo concreto frente a um
mundo de desilusões, frustrações e sonhos
desfeitos. Como efeito, o lazer de final de semana
ou final de tarde ganhará novos adeptos, a ponto
de se tornar predominante como estilo de vida.
Aqui na terrinha
Sem querer dar um de nouveau-riche, que
volta das viagens querendo materializar os locais
visitados na sua cidade, poderíamos concatenar
algumas linhas de atuação urbanísticas, com vistas
a preparar a cidade para esta tendência do
“consumo do lazer”. A começar pelas praças e
calçadas. Dispomos de dois grandes entendidos,
o Henrique Witeck e o Eduardo Minssen. Eles
poderiam prestar consultoria para um plano de
ajardinamento municipal. Cada praça da cidade
poderia ter um tema, com vegetação apropriada:
tropical, temperada, oriental, etc. Ligando elas,
uma rota permeada por pequenos canteiros
construídos nas calçadas, a exemplo da idéia
proposta pelos comerciantes da rua lateral do Imec.
Caminhos históricos
Uma idéia paralela seria a rota histórica.
É simples: escolhe-se um trajeto que tenha alguns
pontos importantes da história local e coloca-se
pequenas placas contando os fatos marcantes. Para
ficar mais atraente, poderíamos batizar os trajetos
de “caminhos”, a exemplo do “Caminho da
Compostela”, narrado por Paulo Coelho. Para
diferenciar os caminhos, teríamos placas de
diferentes cores.
Socializando responsabilidades
Tal idéia, longe de ser responsabilidade
da prefeitura e de algumas empresas privadas
conscientes do seu dever comunitário (leia-se
Divinut), poderia ser socializado na comunidade.
Se praças são modificadas essencialmente pelo
poder público, calçadas são de responsabilidade
dos proprietários dos imóveis. Arrumar as lajes
do passeio é obrigação; colocar alguns canteiros
de forma harmônica é o plus que se exige de uma
cidadania consciente.
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Vandalismo
Os pessimistas de plantão vão argumentar
que em Cachoeira do Sul os vândalos impedem
tais iniciativas. Bom, aí não tem outro jeito senão
combater com tolerância zero. E mais. Refazer o
que foi desfeito.
Taí um remédio para a baixa auto-estima
cachoeirense.
Quem casa quer casa
O antigo refrão – “Quem casa quer casa”
- caiu-me como uma luva ano passado. A lua-de-
mel - viagem a locais paradisíacos, noite de
núpcias espetacular, essas coisas - foi procedida
de um retorno onde o grande sonho da união, a
casa própria, apareceu.
Levar a amada para morar no bunker,
vulgo porão, não era aconselhável, visto que as
condições insalubres que um solteiro agüenta não
são próprias para um casal recém-casado. Como
resultado, os passeios domingueiros acabaram
sendo de visita a imóveis.
Vende-se excelente moradia
O êxodo rural, emigração de trabalhadores
rurais para as cidades por conta da mecanização
do campo, aumentou exponencialmente a
necessidade de construções residenciais nas áreas
urbanas. As cidades cresceram e se desenvolveram
carecendo de estrutura apropriada. O desenlace
desta situação é o surgimento de favelas ao lado
de áreas urbanas valorizadas.
Em Cachoeira do Sul foi um pouco
diferente. As favelas não foram acompanhadas de
um boom imobiliário, com poucas exceções, como
o bairro Soares. As casas antigas sobreviveram.
Algumas foram reformadas e se transformaram em
belas residências. A maioria, entretanto, ou foi
reformada parcialmente, se limitando a uma mão
de tinta, ou foi deixada por conta. O que se vê
aqui para venda são casas velhas, com sua estrutura
interna desatualizada, mas supervalorizadas por
seus proprietários ou pelas próprias imobiliárias.
Lei da oferta e procura
Os classificados de final de semana são
repletos de anúncios do mercado imobiliário, com
fotos e valor de venda do imóvel. Tem casas sendo
anunciadas desde que eu cheguei a Cachoeira do
Sul, há quatro anos. Antigas residências que ao
longo das décadas sofreram uma depreciação
aguda, próximas do Centro, são anunciadas por
R$ 50 mil ou mais.
Aqui na cidade impera uma lei da oferta e
procura inversa. Quanto mais as pessoas querem
vender suas casas para ir embora em busca de
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emprego e quanto menos pessoas têm interesse
em comprar alguma coisa aqui, mais os imóveis
se valorizam ao invés de baixar de preço. O
vendedor pode pedir o quanto quiser, o problema
é ter alguém disposto a pagar.
Sem contra-oferta
Há várias repostas para isso. Primeiro, o
proprietário do imóvel não tem para onde ir se
vender a casa. É melhor pedir um valor alto e não
vender do que vender barato e não conseguir
comprar nada mais. Segundo, aquele que quer
vender tem muitos outros imóveis e não faz
questão de se desfazer por um preço abaixo do
estipulado. Terceiro, o vendedor pede uma
avaliação para a imobiliária que joga o valor para
as alturas. Quando a imobiliária recebe uma oferta
muito abaixo da sua avaliação, não repassa ao
proprietário. Aí fica aquele círculo vicioso de
anunciar o imóvel, não vender e não baixar o
preço.
A conseqüência disto tudo é previsível. O
dinheiro não tem pátria, foge para onde haja
possibilidades de ganhos.
Nova lei de Gerson
Se não ganho o que quero ninguém leva
nada.
HCB X Prefeitura
Se tem uma coisa que ninguém mais
agüenta em Cachoeira do Sul é essa briga entre o
Hospital de Caridade e a Prefeitura Municipal.
Crônicas sarcásticas, reportagens acusativas,
apedidos, etc., fazem disto uma verdadeira novela
mexicana ou um filme holywoodiano de quinta
categoria. Ninguém me perguntou, mas sugiro uma
solução pacífica. E não é nada de extraordinário,
extravagante ou impossível de ser realizado. Igual
ocorreu lá em Novo Hamburgo.
Todo mundo concorda que negócio
comercial, tal num casamento, é uma relação entre
duas partes. Neste caso, o negócio é saúde pública
e as partes são o hospital e a prefeitura. Se esta
relação se abala a ponto de não ser mais possível
conviver, o melhor remédio é a separação. Se para
o HCB não é vantagem atender pacientes do SUS,
uma vez que alega não receber em dia o que acha
devido, e se a Prefeitura acredita estar sendo lesada
com cobranças clonadas, é melhor que o HCB pare
de atender pelo SUS e a prefeitura procure outro
parceiro ou, aqui está minha solução transplantada
de onde venho, monte seu próprio hospital,
encampando algum já existente ou construindo um
novo.
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Esta solução acabaria com os diz-que-me-
diz-que. O HCB ficaria feliz só com seus pacientes
privados e a prefeitura poderia investir o quanto
dispusesse.
A saúde vai mal!
Podem maldizer o quanto quiserem a
saúde pública no Brasil, falar da baixa
remuneração de médicos e enfermeiras, afirmar
que o preço das internações são infâmias, mas
poucos médicos ou hospitais conseguem
sobreviver só com saúde privada. Para o HCB,
deixar de atender pacientes do SUS é abrir mão
de uma significativa renda que, bem ou mal, serve
para equilibrar as contas.
Em contrapartida, a prefeitura terá
dificuldades para reunir verbas e montar seu
próprio hospital. Terá dificuldades também de
gerir o dia-a-dia do hospital, visto que médico
ainda é tido como um ser a parte na criação divina,
afinal detém o poder de nos curar, e lidar com eles
é algo complexo, que requer mais habilidade
administrativa do que política. Além disso, caso
o paciente não consiga consulta ou internação, a
responsabilidade será do próprio gestor público,
que não terá desculpas para se abster das
dificuldades e nem terá em quem colocar a culpa.
Hierarquia no atendimento
Ainda na defesa desta sugestão, um
argumento importante é a necessidade de
hierarquização da saúde pública. Explico. Em
saúde, há procedimentos mais simples e
procedimentos mais complexos. Não se manda um
paciente gripado para um hospital, nem aquele que
necessita de cirurgia para um posto de saúde. Cada
caso deve ser tratado em local apropriado. Não
que o hospital não seja apropriado para tratar de
alguém gripado, mas este procedimento pode ser
feito tranqüilamente num posto de saúde,
desafogando assim o hospital que deve priorizar
o atendimento de procedimentos mais complexos,
como cirurgias e doenças infecto-contagiosas.
A relação entre o posto de saúde
(procedimento simples) e o hospital (procedimento
complexo) deve ser extremamente afinada. Uma
briga entre os gestores pode respingar nesta
relação, prejudicando o atendimento. Mais uma
razão para HCB e Prefeitura se divorciarem.
Acidente de trânsito
Domingo desses, 15 h 40 min. Aguardo o
sinal abrir na David Barcelos com Juvêncio
Soares. Uma Fiat Pálio branco força ultrapassagem
por um pequeno espaço no lado esquerdo. O sinal
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abre e ele vê que não é possível. Arrancamos. O
motorista afobado ultrapassa a todo vapor, desta
vez pela direita. Assim vai ziguezagueando em
alta velocidade.
Algumas ruas acima, um pouco antes da
Dona Hermínia (logo depois tem a Rede Super),
um carro dá passagem ao Pálio transloucado que
ultrapassa pela esquerda. Entretanto, depara-se
com uma motocicleta que dá sinal para dobrar à
esquerda. Como vem a mil, tenta travar em vão.
Levanta fumaça dos pneus. Como resultado, colhe
o motociclista que rodopia uma ou duas vezes
antes de se estatelar no chão.
Eu parei, apesar de estar quase no horário
do meu ônibus. Vi que o motociclista sangrava
um pouco no lábio. Perguntei a ele se estava tudo
bem e dei meu endereço para me procurar, caso
precisasse de testemunha. Segui adiante
despreocupado, pois logo na esquina passava a
viatura da Brigada Militar.
Registrando a ocorrência
Alguns dias depois o rapaz me procurou.
Me contou que o tal motorista que bateu na sua
traseira era um taxista e o Fiat Pálio era de outra
pessoa. A viatura da Brigada Militar logo
encostou. O motociclista desconfiou que o taxista
tivesse um pouco grogue, talvez por conta de um
almoço em família, churrasco e cerveja, essas
coisas.
Um parente seu, que logo chegou no local,
ouviu o praça da Brigada dizer para o taxista que
“ia dar uma força pois sou teu conhecido”. Por
isto, não o encaminhou para exame de embriaguez.
Tampouco encaminhou o motociclista para um
exame médico, para ver se tinha algum ferimento.
Ficou por isso: tudo certo e nada resolvido.
Acertando as contas
Na hora do acidente, o proprietário do
veículo disse que ia pagar todo prejuízo. Ia acertar
“numa boa”. O motociclista mandou a moto para
a concessionária. Orçamento: R$ 380,00. Mandou
a conta e esperou, esperou... Recebeu como
resposta, alguns dias depois, que estava muito
caro. “Mas você não disse que era só uma
sinaleira?”, alegou.
Agora quer “acertar”. Não significa pagar
o prejuízo, mas pagar só parte dele.
Coisas nossas
Bebida e trânsito, definitivamente, não
combinam. Nem sei se o taxista estava
embriagado. Pelo modo como forçou
ultrapassagem, pode até ser. Para isto existe um
procedimento a ser tomado. Encaminhar para
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exame, ambos envolvidos. Se desse positivo, tanto
na embriaguez quanto no que se machucou, o
problema seria “mais embaixo”. Porque não foi?
Coisas de cidade pequena, onde todo mundo
conhece todo mundo e as amizades afetam as
relações profissionais.
E quanto a não pagar o prejuízo? Dizem
que o Judiciário é vagaroso. Pois bem, o acúmulo
de trabalho para poucos servidores é uma parte da
explicação. A outra é o fato das pessoas não
cumprirem o acordado e deixar por isso mesmo.
Aí a saída é ingressar com uma ação. Coisas
nossas...
Correios
Foi-se o tempo em que enviar uma carta
era algo rápido. A demora no atendimento, pelo
menos aqui na agência dos Correios de Cachoeira
do Sul, tornou-se padrão. Num dia desses esperei
das 11 h 37 min e 5 seg. (cf. tíquete) até às 12 h 18
min para comprar cinco míseros selos. Pelo tempo
gasto, 41 min, teria sido mais rápido entregar as
cartas pessoalmente.
Isto tem várias explicações. Uma delas é
o fato de eu ter ido num horário em que todas
pessoas comuns costumam ir, próximo ao meio-
dia. Como a maioria trabalha, decerto que gastar
o tempo do almoço para ficar em fila auxilia na
dieta de emagrecimento.
Banco Postal
Outra explicação para a demora no
atendimento é a associação dos Correios com o
Bradesco, criando o serviço de Banco Postal. Um
dos caixas estava abrindo uma conta para um
senhor, desde a hora em que cheguei. Já falei aqui
nas filas do Bradesco, na falta de respeito que o
banco tem com seus clientes. Inclusive recebi um
e-mail de um bancário, aqui publicada, dando a
entender que fila é para pessoas de baixo nível ou
ignorantes.
Parece osmose ou, para usar um termo
técnico, sinergia. Assim como no banco, onde a
lucratividade vem na frente da satisfação do
cliente, os Correios passaram a adotar a lógica de
instituições privadas. Um exemplo é o serviço de
Sedex. Com a concorrência, tiveram de acelerar a
entrega e baixar o preço dos serviços. Só pelo fato
de ter de ficar em fila, passei a usar os serviços de
entrega da Vaspex, que tem uma agência na Aníbal
Loureiro. Além de mais barato, o atendimento é
eficiente e imediato. Viva a concorrência!
Mas a lógica do lucro impede a
contratação de funcionários. Alguns reacionários
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alegam que isso é “inchar a máquina”. Por isso
ter poucos caixas, mesmo em momentos de pique.
Postar uma carta simples é um serviço
popular, portanto quase um monopólio. Aí não tem
outra opção, é ficar na fila mesmo, com direito a
almoço frio quando chegar em casa.
Poluição sonora e visual
Repito um tópico já publicado aqui. Se
tem uma coisa ruim neste processo eleitoral são
os carros de som tocando os jingles de campanha.
Até que algumas músicas a gente ouve e sai
cantarolando. O problema é que alguns cabos
eleitorais estacionam seus veículos e deixam
ligados os alto-falantes a todo volume. Tem um
automóvel Belina cor vinho que estaciona todo
sábado em frente ao Banco do Brasil e liga o som
a todo volume
Alô candidato, dá uma conversada com
ele, senão é tortura chinesa!
Panfletagem nos postes
Outro tópico repetido é o da panfletagem
em postes. Como um produto que se vende, os
candidatos querem se apresentar e estar nas mentes
do eleitorado. Além dos outdoors, cola-se
propaganda nos postes públicos. Sugeri de algum
vereador com bom senso propor uma lei proibindo
pendurar cartazes nos postes. Nenhum deles
manifestou vontade.
Sugiro outra coisa. Já que existe (ou
existia) um estudo para cobrar o uso do espaço
público, como postes, fios e encanamentos, o
prefeito Pipa pode mandar contar as placas e emitir
os carnês para os candidatos. Dinheiro líquido mas
não tão certo.
Apenas bons amigos
Imperdível foi a melhor definição para o
show Apenas bons amigos, na Sociedade Rio
Branco, no feriado do Dia das Crianças. Ver meu
irmão Carlos Henrique Selbach, Juiz do Trabalho,
cantando e dançando em público, no melhor swing
e balanço, me trouxe aquele orgulho saudável de
quem já se sente parente de alguém que deixará
impresso seu solado na calçada da fama.
A apresentação me fez lembrar do cineasta
nova-iorquino Wood Allen, que dedica parte do
seu tempo para se apresentar em casas de
espetáculos com uma banda de jazz. Ou do gaúcho
Luis Fernando Veríssimo, que costuma
acompanhar uma banda com seu sax pelo Brasil
afora. Outro é o Jô Soares, que toca pequenos
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tambores e faz algumas poucas apresentações pela
noite paulista. A relação entre todos eles - Allen,
Veríssimo, Jô e Carlos Henrique Selbach - é que
se destacaram em atividades profissionais das mais
diversas, mas têm talento de sobra para novas
empreitadas, como é o caso da música.
A banda
Assim como os famosos que citei, meu
irmão também é parte integrante da banda, o que
torna a idéia mais interessante. Todos se destacam
em algum momento da apresentação. Não há um
ícone, mas vários talentos. No vocal, Carlos
Henrique cantou Tanto Amor, New York, New
York, Martim Alencar cantou Azul e Espanhola,
Luciano Leite cantou Iolanda e Farinha e Rodrigo
Fieira cantou Eclipse Oculto e Como vovó já dizia,
com direito a peruca e óculos escuros para lembrar
Raul Seixas. O quarteto também cantou junto as
músicas Samba de Orly, Maria Fumaça, What a
wonderful world, O pato e O que é o que é, além
de uma canção própria, composta por Martim
Alencar, Nosso viver, nosso cantar.
Instrumentos: Fábio Calderaro no violão,
Maiquel Fortes na bateria (cantou também a
música Just like you), Jonatas Brasil no teclado e
piano e Denis Oliveira no baixo. Num dos
momentos, os quatro tocaram uma música
instrumental, onde cada um fez um solo magnífico.
Convidados
Como se fosse pouco, alguns convidados
subiram ao palco. Elinor Fagundes tocou piano
na música Tanto Amor e Amanda Pereira cantou
A festa, com a companhia de Diego Cruz no
acordeom. Espetacular também foi a dança do
Promotor Vanderlei Willig e sua filha, Wana, na
música nordestina Farinha.
Senhora Cultura
O incentivo, segundo falaram na própria
apresentação, partiu da Marúcia Castagnino,
Diretora do Departamento Cultural da SRB. Só
podia. Com poucas verbas e muitas idéias ela tem
a capacidade de fazer ferver os meios artísticos.
Infelizmente, anunciaram que ela está se
aposentando do cargo. Sem dúvida para vôos
maiores. É o que se espera para alguém com tal
capacidade e carisma.
Equipe de apoio & Patrocinadores
Na apresentação, não esqueceram de
registrar o apoio inconteste da minha cunhada,
Eliane Selbach. Dizem que preparou os sanduíches
e agüentou a barulheira dos ensaios em sua
residência. Também foram lembrados os
76
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patrocinadores: Casas Bartz, Caixa Econômica
Federal, Posto do Pingo, Moinhos Horbach e
Restaurante da SRB, que ofereceu uma janta aos
artistas.
Turnê
Só resta esperar o anúncio da turnê ou a
segunda edição do espetáculo Apenas bons
amigos. Quem sabe ano que vem!
Compras de natal
O natal está chegando, ainda mais para os
lojistas que querem antecipar o espírito
consumista-natalino e vender mais. Li que os
shoppings de Porto Alegre não farão mais sorteios
para alavancar as vendas, pois é exigido certidão
negativo de débitos com a receita de todas as lojas
que participem da promoção e não só do promotor
do evento, no caso o shopping.
Interessante é pensar se todos as lojas de
Cachoeira do Sul que oferecem algum prêmio para
aquele que compra no estabelecimento têm a tal
certidão. Grandes empresas, como os
supermercados, até acredito. Mas as pequenas,
tenho minhas dúvidas.
Penso na própria campanha do CDL, o
“Leva tudo”. Pela lógica seguida em Porto Alegre,
também aqui deveria ser exigido dos comerciantes
que aderiram à promoção a certidão negativa. Se
assim fosse, muitas lojas ficariam de fora,
inviabilizando a própria iniciativa.
Fiscalização
Não sei quem é de direito fiscalizar isso.
Talvez os Promotores Públicos pudessem tomar a
frente nesta questão. Se depender de denúncia de
alguém para as coisas acontecerem, vai acontecer
como no caso das placas dos candidatos
penduradas nos postes públicos. Passadas as
eleições e ainda vemos elas lá.
Fábrica de calçados
A idéia de desenvolvimento industrial
para Cachoeira continua pobre e simplista. Em
2002 escrevi que a atração de indústrias calçadistas
não passava de uma falsa expectativa na geração
de empregos e, como queiram alguns,
desenvolvimento. Para quem não se lembra,
“empresários” (para mim não passavam de
embusteiros) anunciaram, na época, a instalação
de um complexo coureiro-calçadista na cidade,
desde que recebessem em doação uns poucos 80
hectares. Escrevi que Cachoeira do Sul continuaria
crescendo igual rabo de cavalo enquanto
acreditasse numa solução externa, ainda mais desta
estirpe.
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No final dos anos 80, o anúncio da Focus
Calçados já atraía muitos desempregados. Na
mesma época, a Fibra Calçados se instalou na
cidade, prometendo vários empregos a longo
prazo, e a Ravena fechou as portas deixando vários
empregados sem receber direitos trabalhistas.
Portanto, trazer uma indústria de calçados para dar
empregos não é novo, atual ou inédito, muito
menos interessante. São só alguns exemplos da
história da industrialização local que refletem quão
efêmera é a política industrial municipal que se
baseia na atração de indústrias estrangeiras.
Empresas de calçado são o típico
estereótipo da praga de gafanhotos. Exigem para
se instalar isenção de impostos, prédio, telefone,
luz, água e outras tantas regalias. Quando chega a
hora de retribuir, simplesmente fecham as portas,
na maior parte das vezes deixando para trás débitos
trabalhistas, previdenciários e fiscais impossíveis
de cobrar.
Irmãos Schimidt
Embora a indústria de calçados Irmãos
Schimidt de Campo Bom seja uma empresa
idônea, continuo afirmando que sua instalação não
resolverá o desemprego em Cachoeira do Sul.
Além do mais, o valor que a prefeitura deverá dar
em contra-partida, com a construção do prédio e
outros incentivos, não surtirá grande impacto na
economia.
Imaginei que a perspectiva empresarial do
vice Hilton poderia mudar a política de
desenvolvimento industrial de Cachoeira. Pelo
visto, ou ele não tem muita voz no paço municipal,
ou suas idéias também são de que a solução é atrair
indústrias estrangeiras e entrar na guerra fiscal que
não traz benefícios a nenhuma comunidade, a não
ser às empresas beneficiadas.
Soluções caseiras
Sei que santo de casa não faz milagre, mas
a única saída plausível é apostar nas pratas da casa.
E não falo daqueles que dominam a política há
vários anos, nem das empresas tradicionais, com
suas unidades lúgubres, desorganizadas,
estrategicamente mal localizadas, com o marketing
voltado para si ao invés do cliente. Muito menos
apostar nos arrozais, visto serem basicamente
grandes latifúndios.
Pequenas iniciativas, grandes resultados.
Ou pequenas empresas, grandes negócios. Quem
sabe a agricultura familiar, industrializando o que
produz. Ou as pequenas empresas (indústrias,
comércio, serviços), responsáveis pela maior parte
da geração de empregos no mundo.
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Só faço um apelo. Vamos parar de sonhar
com uma indústria de fora, que prometem
desenvolvimento e não cumprem. Vamos pensar
que a solução está embaixo do nosso próprio nariz
e apostar nisso, para que daqui alguns anos não
seja a mesma história, de expectativa e frustração.
Estacionamento
A implantação do estacionamento pago
nas principais ruas da cidade é algo urgente. Tem
gente que estaciona seu veículo na melhor vaga
pela manhã e só retira à tardinha, depois do
expediente. O mau hábito restringe o número de
vagas para aqueles que precisam fazer alguma
coisa no centro, como comprar, que é a razão
principal da zona central.
O engraçado, se não fosse irônico, é que
muitos dos que deixam seus veículos estacionados
nas melhores vagas são os próprios comerciantes
ou funcionários do comércio. Quem faz isso, tem
preguiça de caminhar algumas quadras ou
estacionam bem em frente ao estabelecimento,
como se quisessem ficar vigiando o veículo.
Não sei se é medo de furto ou se ficam
sonhando com uma fuga da rotina diária,
proporcionada pelo automóvel. Depois, quando
seus clientes reclamam que não conseguem
estacionar próximo da loja, acusam autoridades
pelo descaso ou pelas “poucas” vagas.
Tolerância: 20 minutos
Em Novo Hamburgo, o estacionamento
pago tem uma tolerância de 20 minutos. É simples.
Quando alguém estaciona o veículo e sabe que
vai demorar pouco para fazer o que tem de fazer,
como pagar uma conta na lotérica ou até a
prestação numa loja de roupas, não coloca o cartão.
Caso tenha de ir a vários lugares ou em algum
lugar que sabe que vai demorar, como entrar numa
fila de banco, coloca o cartão, que vale para, no
máximo, 2 horas, evitando os “espertos” que
deixam o carro estacionado o dia inteiro na vaga.
A princípio parece inviável, mas
funcionou a contento. O fiscal de trânsito, além
de vigiar possíveis infratores, quem anda sem cinto
de segurança ou atravessa sinal vermelho, passeia
pelas ruas observando quem colocou ou não o
cartão. Para quem colocou, ele confere a hora. Se
ultrapassou as 2 horas, emite um aviso (não multa).
Caso não tenha colocado, o fiscal deixa no pára-
brisa um bilhete com o aviso “20 minutos”,
escrevendo a hora exata. Quando passar
novamente pelo veículo, confere o horário
marcado e, caso tenha ultrapassado o tempo
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estabelecido, emite um aviso de cobrança de
estacionamento.
Alguns vão dizer que isso implicará em
maior número de fiscais de trânsito. Sim, em parte.
O aumento será pouco se compararmos ao retorno
financeiro. Entretanto, não serão necessários
muitos mais fiscais dos que já existem. O que muda
é que, ao invés deles ficarem passeando
despreocupadamente pelas ruas ou parados nas
esquinas, olhando de forma passiva os que andam
sem cinto de segurança ou não dão preferência
para pedestres, eles terão de ficar atentos para os
veículos estacionados.
O valor arrecadado pelo estacionamento
pago deve ir, “teoricamente”, para equipar o
trânsito (agentes, sinalização, etc.), e não ser
desviado para saúde, educação, assistência social
ou outra coisa. Isso possibilita melhorias visíveis.
Além do mais, desafoga as vagas de
estacionamento nas principais ruas do centro.
Para pensar na cama
Em Londres, o acesso de veículos à zona
central (não estou falando do estacionamento, mas
do simples acesso) é cobrado através de um
sistema parecido com os pardais nas estradas.
T-Liga no ECA
A polêmica em torno do Patronato chama
a atenção para o Estatuto da Criança e do
Adolescente, conhecido como ECA (Lei n. 8.069,
de 13/06/90). O artigo 4
o
é bem interessante: “é
dever da família, da comunidade, da sociedade em
geral e do Poder Público assegurar, com absoluta
prioridade, a efetivação dos direitos referentes à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência
familiar e comunitária”.
Para uns, o certo era entregar a guarda dos
filhos aos cuidados do poder público; para outros,
esse dever cabe, antes de tudo, à família, por mais
que o poder público tenha condições de assegurar
as garantias que dispõe a lei (no caso do Patronato,
a polêmica era se assegurava ou não condições).
Para além da discórdia que se instalou,
penso nos direitos e deveres do ECA, que
deveriam atingir crianças e adolescentes da
sociedade como um todo, não só aos internados
numa escola agrícola.
Nesta lucubração, penso nos eventos
sociais onde a idade dos freqüentadores é cada
vez menor. No carnaval, anos atrás, a polêmica
foi da idade mínima para o baile adulto. Em poucas
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palavras, os adolescentes menores de 14 anos
queriam pular junto com os adultos. E os pais?
Como diz a música, “tô nem aí”...
O poder público interveio no assunto, mas
muitos pais não concordaram com a proibição.
Preferiam ver seus filhos livres, leves e soltos num
ambiente onde predomina a embriaguez e a
licenciosidade.
Não pretendo dar uma de moralista. O que
ocorre é que o carnaval é a festa do inverso, onde
as pessoas trocam seus papéis sociais, dando asas
aos impulsos reprimidos. O que entendo é que
nenhum pai ou mãe tem moral para embravecer
com filho alcoólatra ou drogado, depois de
permitir seu livre acesso a festejos deste tipo.
E não adianta dizer que o mundo é cruel
ou o Estado incompetente. O primeiro responsável
é a família, ponto final. Ou se assume como pai
presente e toma as iniciativas de educação através
do exemplo e de atitudes firmes, ou o filho vai ter
pais ausentes e acabar aprendendo com o grupo
social que faz parte, normalmente liderado por
outro filho desgarrado.
Esta lógica vale para eventos sociais
destinados a adultos, mas onde prevalece a
presença de menores, como a tal festa do “T-Liga”.
Não sei se a entrada de menores na festa
foi disciplinada pelo poder público (art. 149) ou
se foi cumprida a proibição de venda de bebidas
alcoólicas a menores (art. 81).
Isso não se costuma falar, é um tabu, até
porque se aceita socialmente que o menor cujos
pais tenham relativa condição econômica,
freqüente tais eventos e, uma vez lá, entre no
“clima” da festa.
Muitos pais deixam os filhos ir porque os
filhos dos outros pais vão. E o que acontece lá
não importa muito, desde que chegue vivo em casa
(sem falar naqueles pais que acham graça o filho
embriagar-se).
Tais questões são encobertas pelo véu da
caridade, como a destinação de parte da renda para
entidade de renome, como a própria Liga de
Combate ao Câncer.
Ao que parece, vestimos um santo,
deixando o outro nu...
T-Liga de novo no Patronato
A crônica de algumas semanas atrás, sobre
Patronato, ECA e festa do T-Liga, rendeu
polêmica.
A secretária da STAS, Scheila Boustany,
escreveu elogiando, dizendo que sempre fizera
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questionamentos como os que levantei aqui. Para
ela, os pais deveriam se dar conta dos riscos que
seus filhos estão expostos, trilhando caminhos
muitas vezes sem volta. Numa função pública, ela
se vê na obrigação de buscar soluções.
Eu acrescento que não basta a vontade do
poder público, é necessário a dedicação e a
presença dos pais. Ou há envolvimento, ou os
filhos vão acabar sendo criados pelos outros.
Em síntese, ela pegou a idéia que eu quis
passar, bem na essência.
Em compensação, li que um vereador usou
a crônica na tribuna da Câmara para acusar o
Prefeito pelo fechamento do Patronato.
Ou leu e não entendeu, ou agiu de má-fé,
pois me limitei a apontar a polêmica.
Eu disse que para uns, o certo era entregar
a guarda dos filhos aos cuidados do poder público,
enquanto que para outros, esse dever caberia, antes
de tudo, à família, por mais que o poder público
tivesse condições de assegurar as garantias legais.
No caso do Patronato, a polêmica era se assegurava
ou não tais condições.
A Promotoria foi clara: quem são e onde
estão as famílias dos internados? Afinal, são elas
as primeiras (e principais) responsáveis; e não a
Prefeitura.
A posição do vereador me parece meio
anárquica: se há governo sou contra! Em outras
palavras, critica tudo que o governo faz, até fazer
parte do governo, aí esqueçam o que foi falado.
Por coincidência, assisti uma sessão do
legislativo, onde o mesmo vereador votava sempre
contrário aos projetos do governo, mesmo sem
saber do que se tratava. Na hora da votação,
quando chamavam seu nome, ele respondia
prontamente com um “não” rotundo, depois
perguntava para o colega sobre o que estava sendo
votado.
Em suma, afora a polêmica questão do
Patronato, que me parece estar resolvida (as
famílias são as responsáveis, ainda mais num
município como Cachoeira do Sul, com diversas
carências econômicas e sociais), o que fica em
aberto é a diminuição da idade para adolescentes
participarem de eventos sociais dos adultos.
A festa do T-Liga só vem corroborar com
esse consenso/aceitação social, de que com 12 ou
13 anos já é possível entrar tranqüilamente em
festas de adultos, acompanhados ou não por
(ir)responsáveis, com aquiescência
(consentimento) dos poderes públicos (Conselho
Tutelar, Promotoria, Prefeitura, Juizado, etc.) e dos
próprios pais.
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E isso que é complicado, os próprios pais
confundem liberdade com licenciosidade.
Sinal dos tempos. Até encontrar um
equilíbrio, o ser humano experimenta os extremos:
repressão e rigor em demasia, ou liberou geral...
Em tempo: as obras da Corsan mostram o
quão é desnecessário o debate sobre sua
municipalização (sem falar na contratação de um
engenheiro hamburguense por R$ 70 a hora). O
que precisamos é isso: investimentos pesados. O
resto é conversa para boi dormir...
Blitzkrieg
Blitzkrieg foi o modo como Hitler e seus
comparsas chamaram a guerra relâmpago na
Alemanha. A tática nazista consistia em atacar o
inimigo de assalto, com um poder de fogo até então
nunca visto. Divisões inteiras invadiam os países
em questão de dias ou semanas, não possibilitando
qualquer defesa.
No Brasil, o termo ganhou o diminutivo
de blitz, que significa a batida policial de
improviso e que utiliza grande aparato bélico. É
mais ou menos a intenção da Brigada Militar de
Cachoeira do Sul, nas sextas-feiras, à noite,
quando coloca várias viaturas e policiais na rua
Sete de Setembro, para fiscalizar as irregularidades
dos automóveis e os motoristas imprudentes.
Digo mais ou menos intenção porque a
tática começa na surpresa, ou, no caso daqui, na
falta dela. O dia e o local são sempre os mesmos.
Todo mundo sabe antecipadamente que as sextas,
à noite, a Brigada estará fazendo uma batida em
algum ponto da Sete. Claro que já vi batidas em
outros bate-horários e outros bate-locais. Mas as
da Sete, as sextas, já fazem parte das cousas
cachoeirenses, é conhecida e esperada, portanto
mais uma fiscalização de rotina do que uma blitz.
É semelhante à proposta de pôr cancelas
nas saídas da cidade. O assaltante não vai fugir de
Cachoeira do Sul, não ao menos no momento do
crime. Vai esperar alguns dias, quiçá numa casa
alugada, como fizeram os assaltantes do Banrisul
(sem falar que a maioria dos furtos na cidade não
são feitos por gente de fora). Assim também aquele
que tem veículo irregular. Vai evitar passar na Sete
no horário da “blitz”.
Esta tática de batidas as sextas, à noite (que
procede os Embalos de sábado à noite), acaba por
deslocar grande parte do efetivo para dia e local
determinado, fragilizando outros dias da semana,
como se o delito tivesse hora e local certo para
ocorrer.
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Digo isso porque numa quinta-feira
dessas, véspera da esperada “blitz”, um grupo de
jovens subiu feliz e embriagada a minha rua,
cantando e uivando de madrugada (1 h,
aproximadamente), em direção ao Clube
Comercial. Parecia ser uma daquelas gangues que
assolam a cidade, detonando placas de trânsito e
vidros das residências e, de quebra, espancando
os notívagos.
Liguei para a Brigada, sugerindo que
enviassem uma viatura. A atendente me disse que,
naquele momento, a única, isso mesmo, a única
viatura de plantão estava atendendo um chamado
em outra parte da cidade. Insisti dizendo que um
praça da Brigada poderia se deslocar do posto na
José Bonifácio e flagrar a gangue na esquina do
Clube Comercial. Também não dava, disse-me ela.
O policial de plantão estava envolvido nas
burocracias de uma ocorrência.
Que a bandidagem não leia isso, porque é
só trocar horários: roubar livre na semana e
descansar aos finais-de-semana.
Como todo trabalhador honesto, diga-se
de passagem...
Tratoraço
Interessante o modo como um livreiro
participou do protesto dos rizicultores
cachoeirenses semanas atrás. Ao lado dos sacos
de arroz empilhados em frete à Catedral, colocou
um cartucho de tinta de impressora. Queria
comparar o preço da saca de arroz (R$ 18,00) com
o do cartucho (R$ 136,90), mostrando a diferença
entre o minúsculo cartucho frente ao enorme saco
de arroz.
Disse pouco e falou tudo. É uma maneira
simples de mostrar o quanto o arroz, e os produtos
agrícolas de uma maneira geral, são desvalorizados
no mercado. Faz tempo que outras regiões
descobriram que o campo não produz riquezas
suficientes para engordar o PIB e partiram para a
industrialização, ao invés de vender seus produtos
in natura. Já venho batendo nesta tecla desde que
cheguei aqui em Cachoeira do Sul, afinal sou de
Novo Hamburgo, região tipicamente industrial.
Anos atrás, fui o único a criticar os
aventureiros que se colocavam na condição de
“curtidores” e “calçadistas”, que diziam querer
investir milhões na região, com a instalação de
um curtume e uma fábrica de calçados. Disse, na
92
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época, que era impensável que um grupo industrial
com tamanho capital não dispusesse de quantia
suficiente para adquirir alguns hectares de terra.
Isso, por si só, demonstrava o quão fajuta era a
vontade de instalar algo aqui.
Essa idéia de trazer indústrias de fora é de
uma pobreza extrema. Apesar disso, entra
governo, sai governo e se continua a apostar neste
sonho. As indústrias que vêm de fora são
verdadeiras “catedrais do deserto”, “caçadores de
dotes”, não criam nada ao redor de onde se
instalam, não trazem nenhum desenvolvimento ao
território, só se aproveitam do subsídio e do baixo
custo do trabalho. Quando chega a hora de trazer
algum retorno, simplesmente fecham as portas,
levam o maquinário, deixando desemprego e
desestruturação na comunidade.
Aos que pensam em emprego e renda para
Cachoeira, sugiro que enriqueçam a idéia de
desenvolvimento. O poder público tem sua parte
a fazer, qualificando a mão-de-obra, fomentando
o empreendedorismo (financiando ou a
intermediando financiamentos), reduzindo
impostos de quem já está instalado aqui e quer
ampliar suas atividades, essas coisas que trazem
verdadeiro retorno.
Aos que reclamam do preço baixo da saca
de arroz, sugiro não vender. Estoquem o produto.
Não tem silos? Construam! Não tem capital para
estocar? Economizem! Não querem estocar?
Industrializem o arroz. Não falo em descascar e
vendê-lo ao consumidor. Falo em inventar alguma
coisa para fazer, como biscoito, massa ou outra
coisa que agregue valor.
Só não argumentem que falta dinheiro na
região. Li esses tempos que os cachoeirenses
teriam R$ 100 milhões depositados em poupança.
Isso é mais que suficiente para desencadear um
processo de industrialização.
Claro que traz riscos, mas o mundo vive
disso!
Quem não quiser arriscar, não fique
chorando por aquilo que não mereceu ganhar.
Quem não arrisca, não petisca... sábio
ditado popular.
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