
Ação e Cooperação, Maio 2001- MCT-
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previsões daquela indústria, representariam uma agregação de valor real e
significativa ao produto final a ser posto à disposição do consumidor.
No entanto, para Mooney, talvez pela proximidade da liberação de uma nova
geração de produtos, o debate sobre biossegurança comentado acima derivou para
duas vertentes: por um lado, foi retomada com mais força a questão dos direitos de
apropriação intelectual dos produtos, direitos estes que determinam quem possui e
controla essas tecnologias. Essa preocupação vem dos usuários diretos de insumos,
produtos e serviços, que têm observado uma concentração assustadora
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tanto da
indústria farmacêutica, como da biotecnológica e de insumos agrícolas, que acabam
sendo poucas, poderosas e globais.
Embora a indústria apostasse na possibilidade de convencer o consumidor dos
bons negócios representados pela substituição de produtos –e processos- ‘tradicionais’
pelos biotecnológicos, discussões mais recentes sobre biossegurança, agravadas ainda
mais pelos surtos de doenças observados na Europa, como a BSC e a Febre Aftosa com
uma intensidade avassaladora, têm provocado um recrudescimento dos debates sobre
aqueles temas. Do lado dos direitos de propriedade intelectual (DPI) -quesito
indispensável segundo o setor industrial para a viabilização da bioindústria- a
controvérsia recente sobre a venda de medicamentos contra AIDS na África do Sul
representa um novo balizamento das conversas e negociações sobre o tema.
Portanto, importantes questionamentos têm sido colocados com relação ao
outrora hegemônico e aparentemente irreversível desenvolvimento da biotecnologia.
Embora parecesse, durante as duas últimas décadas, que ela estivesse se delineando
como a resposta para as mazelas da produção biológica, hoje se tem buscado saber de
forma mais específica quais são essas mazelas e se, de fato, a biotecnologia se
qualifica ‘irrestritamente’ para solucioná-las.
A racionalidade econômica per se não será suficiente para justificar a
necessidade inadiável e incondicional do desenvolvimento da biotecnologia. Para
ilustrar esse ponto, podemos nos referir ao crescimento do mercado de produtos
orgânicos observado na Europa. A despeito dos preços mais elevados dos produtos
obtidos a partir da agricultura orgânica, uma pesquisa recente realizada na Grã-
Bretanha mostrou que 82% dos consumidores
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daquele país desejam um retorno à
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Como ilustração, vale reproduzir aqui trecho de uma entrevista concedida por Pat Mooney sobre os “buy
outs” ocorridos entre aquelas empresas durante o último quarto de século, com o objetivo de criar a
indústria da ciência da vida. No final dos anos 70, existiam 65 companhias investindo e negociando no ramo
da agroquímica –herbicidas, inseticidas, nematicidas e assim por diante. Hoje existem apenas 9 companhias,
que realizam 91% dos negócios do setor no mundo todo. No final dos anos 70, as 20 maiores empresas
farmacêuticas controlavam coletivamente cerca de não mais que 5% do mercado farmacêutico global. Hoje
elas possuem 40% daquele mercado. A medicina veterinária, o patinho feio da indústria farmacêutica de 20
anos atrás, tem hoje 60% de seu mercado controlado por apenas 10 daquelas maiores empresas. Mais
importante, no entanto, é que hoje, entre as 10 maiores companhias de pesticidas, sementes, farmacêutica e
medicina veterinária e, acrescente-se, as maiores empresas em termos de investimento em P&D para
biotecnologia, tem-se que as empresas dominantes naquele setor são de novo: DuPont, Novartis,
AstraZeneca, Monsanto, Dow e Aventis. (Mooney, 2000)
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A Europa é hoje o maior mercado consumidor de alimentos orgânicos e cresce a uma taxa anual de 25%,
taxa histórica dos últimos 10 anos.