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TERRORISMO INTERNACIONAL E POLÍTICA
EXTERNA
BRASILEIRA
APÓS
O 11 DE SETEMBRO
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MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES
Ministro de Estado Embaixador Celso Amorim
Secretário-Geral Embaixador Antonio de Aguiar Patriota
FUNDAÇÃO A LEXANDRE DE GUSMÃO
Presidente Embaixador Jeronimo Moscardo
INSTITUTO RIO BRANCO
Diretor Embaixador Fernando Guimarães Reis
A Fundação Alexandre de Gusmão, instituída em 1971, é uma fundação pública vinculada ao
Ministério das Relações Exteriores e tem a finalidade de levar à sociedade civil informações
sobre a realidade internacional e sobre aspectos da pauta diplomática brasileira. Sua missão é
promover a sensibilização da opinião pública nacional para os temas de relações internacionais
e para a política externa brasileira.
Ministério das Relações Exteriores
Esplanada dos Ministérios, Bloco H
Anexo II, Térreo, Sala 1
70170-900 Brasília, DF
Telefones: (61) 3411-6033/6034
Fax: (61) 3411-9125
Site: www.funag.gov.br
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Brasília, 2010
CIRO LEAL M. DA CUNHA
Terrorismo internacional e política
externa brasileira
após o 11 de setembro
Prêmio Azeredo da Silveira - 2
o
lugar entre as
dissertações apresentadas no Mestrado em Diplomacia
do IRBr, 2004-2005
Direitos de publicação reservados à
Fundação Alexandre de Gusmão
Ministério das Relações Exteriores
Esplanada dos Ministérios, Bloco H
Anexo II, Térreo
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Depósito Legal na Fundação Biblioteca Nacional conforme
Lei n° 10.994, de 14/12/2004.
Capa:
Emanoel Araújo
Grande Relevo Branco - sem data
Madeira esmaltada de branco, 2,7x11,17m
Equipe Técnica:
Eliane Miranda Paiva
Maria Marta Cezar Lopes
Cíntia Rejane Sousa Araújo Gonçalves
Erika Silva Nascimento
Júlia Lima Thomaz de Godoy
Juliana Corrêa de Freitas
Programação Visual e Diagramação:
Juliana Orem e Maria Loureiro
Impresso no Brasil 2010
Cunha, Ciro Leal M. da.
Terrorismo internacional e a política externa
brasileira após o 11 de setembro / Ciro Leal M. da
Cunha. — Brasília : Fundação Alexandre de Gusmão,
2009.
216p.
Dissertação (Mestrado) — Instituto Rio Branco.
2005
ISBN: 978.85.7631.190-4
Política externa – Brasil. 2. Terrorismo. I. Título.
II. Instituto Rio Branco.
CDU 327(81)
CDU 323.28(73)
A Renata.
Agradecimentos
Devo enorme gratidão a algumas pessoas e instituições em razão do
apoio com que me presentearam na elaboração deste trabalho. Em primeiro
lugar, agradeço ao meu orientador, Ministro Alexandre Guido Lopes Parola,
seu exemplo, confiança e disposição a ensinar.
Devo muitíssimo a Renata, minha companheira, por seu apoio
incondicional, paciência, interesse e carinho. Espero que este trabalho faça
jus, ao menos, a um de seus dias perdidos em meu auxílio; duvido poder, um
dia, retribuir.
A minha família, por tudo lhe sou eternamente grato. Como sempre, não
me faltaram; seu estímulo e compreensão mostraram meu caminho e o abriram.
Espero jamais decepcioná-los.
Aos colegas e mestres do Instituto Rio Branco, agradeço de coração o
aprendizado diário proporcionado no período tão marcante do curso. O Instituto,
que propiciou a alegria de elaborar esta dissertação, terá sempre meu
reconhecimento e carinho profundos. Faço menção especial ao colega e amigo
Leonardo de Almeida Carneiro Enge, grande incentivador desta publicação.
Na Secretaria de Estado das Relações Exteriores, obtive o apoio
necessário à pesquisa e à análise contidas neste estudo. Faço menção especial
ao Embaixador Marcos Vinícius Pinta Gama e ao Secretário Marcus Rector
Toledo Silva, então na CG-COCIT; e ao Ministro Achilles Emílio Zaluar
Neto, à época na DNU.
A Universidade de Brasília, a Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo, o Instituto Brasileiro de Ciências Criminais e o Senado Federal,
com suas excelentes bibliotecas, prestaram valioso auxílio às pesquisas que
desembocaram neste estudo.
Expresso, por fim, minha gratidão ao Professor Guido Fernando Silva
Soares, que me apresentou ao tema fascinante do terrorismo e à beleza da
carreira diplomática. Sua memória segue como inspiração.
Lista de abreviaturas e siglas
ABACC: Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de
Materiais Nucleares
ABIN: Agência Brasileira de Inteligência
ACNUR: Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados
ADM: arma de destruição maciça
AGNU: Assembleia Geral das Nações Unidas
AIEA: Agência Internacional de Energia Atômica
ALCA: Área de Livre Comércio das Américas
AMIA: Asociación Mutual Israelita Argentina
ASEAN: Association of Southeast Asian Nations
BCB: Banco Central do Brasil
BID: Banco Interamericano de Desenvolvimento
Brasemb: Embaixada do Brasil
CAT: Comitê Antiterrorismo
CDH: Comissão de Direitos Humanos
CIA: Central Intelligence Agency
CICAD: Comissão Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas
CICTE: Comitê Interamericano Contra o Terrorismo
CIDH: Comissão Interamericana de Direitos Humanos
CNEN: Comissão Nacional de Energia Nuclear
COAF: Conselho de Controle de Atividades Financeiras
COCIT: Coordenação-Geral de Combate aos Ilícitos Transnacionais
CONARE: Comitê Nacional para os Refugiados
CPAB: Convenção sobre a Proibição de Armas Biológicas
CPAQ: Convenção sobre a Proibição de Armas Químicas
CSNU: Conselho de Segurança das Nações Unidas
CTBT: Comprehensive Test Ban Treaty
CTNBio: Comissão Técnica Nacional de Biossegurança
Cúpula ASPA: Cúpula América do Sul - Países Árabes
Delbrasonu: Missão do Brasil junto às Nações Unidas
Delbrasupa: Missão do Brasil junto à Organização dos Estados Americanos
DNU: Divisão das Nações Unidas
DRCI: Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica
Internacional
ENCLA: Estratégia Nacional de Combate à Lavagem de Dinheiro
EUA: Estados Unidos da América
FARC: Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia
FATF: Financial Action Task Force
FBI: Federal Buerau of Investigation
FMI: Fundo Monetário Internacional
G4: Grupo dos Quatro
G7: Grupo dos Sete
GAFIC: Grupo de Ação Financeira do Caribe
GAFI: Grupo de Ação Financeira
GAFISUD: Grupo de Ação Financeira da América do Sul
GSI: Gabinete de Segurança Institucional
GTE: Grupo de Trabalho Especializado sobre Terrorismo
Interpol: International Criminal Police Organization
IPCC: Comitê Intergovernamental de Mudança de Clima
IRA: Irish Republican Army
JID: Junta Interamericana de Defesa
Mercosul: Mercado Comum do Sul
MNA: Movimento Não Alinhado
MP: Ministério Público
MRE: Ministério das Relações Exteriores
MST: Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra
NSS: The National Security Strategy of the United States of America
OCDE: Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico
OEA: Organização dos Estados Americanos
OMC: Organização Mundial do Comércio
ONG: organização não governamental
ONU: Organização das Nações Unidas
OPAQ: Organização para a Proscrição de Armas Químicas
OTAN: Organização do Tratado do Atlântico Norte
PDN: Política de Defesa Nacional (Decreto 5.484/05)
PF: Polícia Federal
PM: Polícia Militar
RBPI: Revista Brasileira de Política Internacional
SDQBNEx: Sistema de Defesa Química Biológica e Nuclear
SERE: Secretaria de Estado das Relações Exteriores
SGNU: Secretário-Geral das Nações Unidas
SISBIN: Sistema Brasileiro de Informações
SIVAM: Sistema de Vigilância da Amazônia
STF: Supremo Tribunal Federal
TIAR: Tratado Interamericano de Assistência Recíproca
TNP: Tratado de Não Proliferação Nuclear
UE: União Europeia
UIF: Unidade de Inteligência Financeira
URSS: União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
Sumário
Introdução, 15
1.A temática do terrorismo no pós-11 de Setembro, 21
1.1.Ordem e agenda internacionais, 21
1.2.O regime internacional antiterrorista, 26
2.Características gerais do regime internacional antiterrorista, 31
2.1.Repúdio inequívoco ao terrorismo, 31
2.2.O terrorismo como ameaça à paz e à segurança internacionais, 34
2.2.1.A perspectiva acadêmica – o “novo terrorismo”, 36
2.2.2.O tema no Conselho de Segurança das Nações Unidas, 39
2.3.Os deveres de prevenção e repressão – visão geral, 44
3.O cumprimento das normas estabelecidas, 47
3.1.Repúdio inequívoco do terrorismo, 48
3.2.Providências brasileiras quanto à prevenção e à repressão, 49
3.2.1.Direito brasileiro, 49
3.2.2.Vinculação às normas internacionais (tratados e resoluções), 51
3.2.3.Preparo institucional, 53
3.2.4.Cooperação internacional, 55
3.2.5.Armas de destruição maciça (ADMs), 60
3.2.6.Financiamento do terrorismo, 66
3.2.7.Tríplice Fronteira, 76
3.3.Conclusões parciais, 83
4.O regime em construção – visão geral, 85
4.1.EUA, 85
4.1.1.A Estratégia de Segurança Nacional, 89
4.1.2.O segundo mandato de Bush, 94
4.1.3.Posicionamento dos EUA – resumo, 95
4.2.Reino Unido, 98
4.3.França, 101
4.4.China, 104
4.5.Rússia, 107
4.6.Conclusões parciais, 111
5.O regime em construção – posições brasileiras, 113
5.1.Baixa prioridade do tema na agenda externa, 113
5.1.1.Antiterrorismo: oportunidade contra o crime organizado, 117
5.2.Prioridade ao desenvolvimento na agenda externa, 119
5.3.Ênfase nas causas subjacentes do terrorismo, 122
5.3.1.Perspectiva comparada – EUA e a noção de “Estados
fracassados”, 129
5.4.Oposição, em princípio, à resposta militarizada, 133
5.4.1.Conselho de Segurança das Nações Unidas, 135
5.4.2.Contexto hemisférico, 138
5.4.3. A invocação do TIAR, 143
5.4.4.Colômbia – solução pacífica e contrariedade às listas de
terroristas, 144
5.5.Fortalecimento do multilateralismo e do direito internacional, 150
5.5.1.A defesa dos direitos humanos no combate ao terrorismo, 156
5.5.2.Apoio à convenção abrangente sobre terrorismo, 159
5.6.Conclusões parciais, 163
Conclusão, 167
Referências, 173
Livros e artigos, 173
Artigos de jornais e revistas, 195
Documentos, 200
Discursos, 211
Entrevistas ao autor, 214
15
Introdução
O objetivo deste trabalho é descrever e analisar as principais diretrizes
da política externa brasileira quanto ao tema do terrorismo internacional
após o 11 de Setembro. Tenciona-se compreender, basicamente, o teor e
as razões dessas orientações, além de avaliar os riscos e as oportunidades
que a temática do terrorismo apresenta ao Brasil. Para tanto, as posições
brasileiras e suas motivações são comentadas em um quadro formado pelo
presente contexto internacional e suas repercussões no tratamento do
terrorismo, pelas linhas tradicionais e atuais da diplomacia brasileira e pelos
interesses nacionais mais diretamente relacionados à temática do terrorismo
internacional.
Devido ao caráter predominantemente descritivo e analítico deste trabalho,
foram empregados, mormente, os métodos histórico e hermenêutico. Com o
primeiro, buscou-se a reconstituição das posições recentes da política externa
brasileira quanto ao tema, bem como de suas motivações, e do ambiente
internacional em que se inserem. Já com o segundo, visou-se à interpretação
dos materiais pesquisados, sobretudo documentos e discursos diplomáticos.
Não se trata, destarte, de investigação teórica. Não se especula sobre
importantes pontos como o conceito de terrorismo e suas causas, a não ser
como parte do objeto central desta dissertação.
Tampouco se estabeleceu um marco teórico rígido em que se inserisse o
esforço analítico geral. Não obstante, conceitos como regime internacional,
CIRO LEAL M. DA CUNHA
16
hegemonia e ordem internacional foram centrais à apresentação e à
organização dos problemas tratados neste estudo.
A escolha do tema é justificada, em primeiro lugar, pela atual mudança
no perfil dos conflitos armados, sua multiplicação e globalização. Os
conflitos armados envolvendo entes não estatais tendem, hodiernamente, a
ocorrer com elevada frequência, em detrimento das guerras tradicionais. Estas
minguam, dentre outras razões, por haver poucas disputas de fronteiras e em
função da possibilidade de escalada nuclear. Em oposição, outras formas de
conflitos armados (“novos conflitos”) proliferam. Tornou-se menos complexa
a aquisição e a operação técnica de armamentos de enorme poder destrutivo
por entes não estatais. A Guerra Fria inundou o mundo com armas sofisticadas,
as quais o fim da bipolaridade disponibilizou a grupos não estatais,
especialmente nos arsenais da ex-URSS. Os particulares, hoje, detêm também
os meios financeiros para armar-se pesadamente. Essa convergência de fatores
gera a atual multiplicação de grupos armados independentes dos Estados,
prontos a combater. Enfim, as armas estão disponíveis, o conhecimento
tecnológico é de fácil operação e os recursos necessários não são
proibitivamente vultosos. É natural, portanto, como aponta F. Reinares, que
os ataques terroristas causem mais mortes, mesmo nos períodos em que seu
número diminui.
1
De fato, têm-se observado inúmeros conflitos sangrentos envolvendo
entes outros que os Estados. Evidencia-se claramente, assim, o retorno da
iniciativa civil (não estatal) à guerra. Isso aumenta a necessidade do estudo
dos “novos conflitos”, dos quais o terrorismo é espécie.
2
A intensa e crescente transnacionalização do terrorismo justifica a escolha
por estudar o tema em sua face internacional. A linha divisória entre conflitos
internos e internacionais tende a desaparecer. A globalização, acentuada a
partir dos anos 1990 e fundada na inovação tecnológica, acelerou o tempo,
reduziu os espaços e estreitou a distância entre o interno e o externo. Faz o
mundo funcionar por meio de redes, entre elas as finanças, a produção, o
1
E.J. Hobsbawm, O novo século: entrevista a Antonio Polito, São Paulo, Companhia das Letras,
2000, pp. 16-20,41-46; E.J. Hobsbawm, A epidemia da guerra, in Folha de S. Paulo, 14.04.2002,
caderno mais! nº 531, pp. 06-10; W. Laqueur, The new terrorism – fanaticism and the arms of
mass destruction, New York, Oxford University, 1999, pp. 04-05; F. Reinares, Terrorismo y
antiterrorismo, Barcelona, Paidós, 1998, p. 212; L. Martínez-Cardós, El terrorismo:
aproximación al concepto, in Actualidad Penal 1 (1998), p. 484; P. Wilkinson, Terrorism and
the liberal state, London, Macmillan, 1977, p. 181.
2
E.J. Hobsbawm, A epidemia... cit., pp. 06-10.
17
INTRODUÇÃO
crime organizado e o terrorismo. Com efeito, segundo aponta R.O. Keohane,
[w]hen globalism is characterized as multidimensional, (…) the
expansion of terrorism’s global reach is an instance of globalization”.
3
Por conseguinte, o terrorismo é mais frequentemente dotado de
internacionalidade que no passado, tanto em seu cometimento quanto em
suas repercussões. Esse atributo vem sendo demonstrado, como na operação
que resultou nos ataques do 11 de Setembro. Importa, pois, que os estudos
sobre terrorismo focalizem seus aspectos internacionais.
4
Em segundo lugar, mostra-se relevante, nesse contexto, o estudo das
diversas posições de política externa, inclusive a brasileira, acerca do
terrorismo. Tal exame pode fornecer subsídios à compreensão de como o
terrorismo afeta os Estados e, adicionalmente, de maneiras possíveis de
os governos lidarem com o fenômeno.
O tema também é justificado, em terceiro lugar, em razão da importância
do terrorismo na agenda internacional e de suas repercussões para a
ação externa do Brasil. Apesar de, recentemente, não ter sido alvo direto
de ataques terroristas internacionais, o País viu-se colocado em situações
nas quais importantes interesses seus relacionavam-se ao tema. Desde o início
da década de 1990, e mais intensamente após os atentados de 11 de
Setembro, existem suspeitas de que a Tríplice Fronteira abrigaria grupos
terroristas e financiadores do terrorismo. Em decorrência daqueles atentados,
o País invocou o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR),
considerando-os uma agressão às Américas. Recentemente, houve pressões,
aparentemente difusas, para que o governo brasileiro classificasse as Forças
Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) como grupo terrorista. Deve-
se, ademais, ter em conta que a Constituição Federal de 1988 tem no repúdio
ao terrorismo um princípio das relações exteriores brasileiras (art. 4º, VIII).
Por fim, o marco temporal escolhido para o estudo justifica-se devido
ao aumento na relevância do terrorismo na agenda internacional após o
3
Conforme R.O. Keohane, “[t]he globalization of informal violence was not created by September
11. Indeed, earlier examples, extending back to piracy in the seventeenth century, can be easily
found. But the significance of globalization – of violence, as well as economically and socially –
is not its absolute newness but its increasing magnitude as a result of sharp declines in the costs
of global communications and transportation.
4
R.O. Keohane, The globalization of informal violence, theories of world politics and the
“liberalism of fear”, in Dialog-IO 1 (2002) pp. 29-43; C. Lafer, A identidade internacional do
Brasil e a política externa brasileira – passado, presente e futuro, São Paulo, Perspectiva, 2001,
pp. 17, 63.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
18
11 de Setembro e à importância histórica do período. Como coloca A.
Remiro Brotóns, “[e]l terrorismo se ha destacado, así, a partir del 11 de
septiembre de 2001, sobre cualquier otra amenaza, vieja o nueva, a la
paz y la seguridad internacionales.” Conforme o Chanceler Celso Amorim,
o mundo vive, sob o impacto das grandes interrogações surgidas do 11 de
Setembro e da recente invasão do Iraque, diante de uma encruzilhada,
momento tão decisivo quanto 1945.
5
Diante desse quadro, afigura-se relevante o estudo da política externa
brasileira com relação ao terrorismo internacional após o 11 de Setembro.
O trabalho está organizado da seguinte forma: no capítulo 1, desenvolve-
se reflexão acerca do impacto do 11 de Setembro nas relações internacionais
e nos esforços internacionais antiterroristas, com o objetivo de contextualizar
e delimitar o estudo das posições brasileiras sobre o tema proposto. Enfoca-
se o tratamento do terrorismo como um regime internacional que apresenta
normas estabelecidas e, ao mesmo tempo, importantes pontos em discussão.
A partir de então, o estudo é dividido em duas partes: a primeira, sobre do
cumprimento, pelo Brasil, das regras antiterroristas postas e a segunda, sobre
as posições brasileiras para os aspectos em construção do regime em tela.
O capítulo 2 trata de características gerais do regime internacional
antiterrorista estabelecido. Ressaltam-se a evolução do tratamento do flagelo
rumo a sua condenação inequívoca pela comunidade internacional, a inserção
do terrorismo no temário da segurança internacional e os deveres gerais de
prevenção e repressão desse delito. Objetiva-se, assim, preparar a discussão
central da primeira parte do estudo – o cumprimento das obrigações
antiterroristas pelo Brasil – que é trazida no capítulo 3. Neste, a consideração
de medidas internas justifica-se em razão da natureza das normas internacionais
antiterroristas, que determinam, em geral, medidas nacionais de prevenção e
repressão.
No capítulo 4, introduz-se a segunda parte da análise – as discussões
sobre a parcela em construção do regime internacional antiterrorista –, ao se
analisarem, brevemente, as posições dos cinco países com assento permanente
no Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU). Visa-se, assim,
5
A. Remiro Brotóns, El orden internacional tras los atentados del 11 de septiembre de 2001, in
Revista Española de Derecho Internacional 1-2 (2001), p. 126; C. Amorim, O Brasil e os novos
conceitos globais e hemisféricos de segurança, in Brasil, Ministério da Defesa, Seminário
“Atualização do pensamento brasileiro em matéria de defesa e segurança”, disponível [on-line]
in https://www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/ciclodedebates/textos.htm [15.09.2004].
19
INTRODUÇÃO
demonstrar, primeiro, a existência de desacordos a respeito de pontos centrais
do tratamento do terrorismo internacional e, segundo, estabelecer as principais
tendências para esse tratamento. Pode-se, assim, melhor visualizar o contexto
em que se inserem as posições brasileiras sobre o regime em construção,
assunto do capítulo 5. Neste, busca-se cotejar o discurso externo brasileiro
sobre terrorismo com as orientações gerais da ação externa do País e seus
interesses mais concretos. O capítulo traz uma tentativa de sistematizar os
aspectos centrais da visão brasileira acerca do regime em construção.
Por fim, o capítulo “Conclusão” sintetiza os resultados do trabalho.
21
1. A temática do terrorismo no pós-11 de
Setembro
A grande importância dos atentados de 11 de setembro de 2001 torna inadiável
o esforço, teórico e político, de avaliar de que forma impactaram o tratamento
internacional do terrorismo. No presente capítulo, trata-se da centralidade obtida
pelo tema na agenda internacional e da maior disposição da comunidade internacional
a reforçar as medidas de prevenção e repressão do flagelo, ainda que importantes
discussões sobre o terrorismo permaneçam em aberto.
1.1. Ordem e agenda internacionais
Num plano simbólico, os atentados a Nova York e Washington
representam o fim dos “felizes anos 90” iniciados com a queda do Muro de
Berlim, da era Clinton e da ideia de “fim da história”. Simboliza, em verdade,
a era de “muros”, reais ou virtuais, como aqueles entre Israel e Gaza, ao
redor da União Europeia (UE) e na fronteira entre EUA e México.
6
No âmbito das relações internacionais, em geral, os analistas parecem
dividir-se entre, de um lado, os que interpretam os atentados como ponto de
inflexão profunda na ordem ou no sistema internacional, e, de outro, aqueles
que enxergam somente uma modificação significativa na agenda internacional.
6
S. Zizek, A fortaleza América, in Folha de S. Paulo, 07.11.2004, disponível [on-line] in http:/
/www1.folha.uol.com.br/fsp/mais/fs0711200404.htm [07.11.2004].
CIRO LEAL M. DA CUNHA
22
Dentre aqueles está C. Lafer, ao afirmar que “o mundo mudou”. A lógica das
relações internacionais tenderia a tornar-se hobbesiana e as relações
internacionais, à moda de Carl Schmitt, a polarizar-se entre amigos e inimigos
– tudo isso com a decorrente maior proeminência dos temas de segurança.
As expectativas por apoios e alinhamentos teriam passado a ser mais
expressivas, reduzindo o espaço para nuanças.
7
No mesmo sentido, A.C. Lessa e F.A. Meira veem o realinhamento das relações
internacionais, como após a queda do Muro de Berlim, agora com os novos conceitos
de segurança internacional no centro da agenda diplomática. D.L. Rosenfield também
diagnostica mudanças profundas: o terrorismo islâmico, ao exigir novos enfoques
diplomáticos e militares, teria gerado uma reconfiguração geopolítica na qual aliados
dos EUA, como Egito e Paquistão, passariam a ser mais importantes que aliados
tradicionais como França e Alemanha. G.M.C. Quintão vê uma redefinição do
funcionamento do sistema internacional, tendo sido deslocados os eixos diplomático
e estratégico em benefício de maior unipolaridade dos EUA – o que teria levado
muitos países a uma visão hobbesiana da realidade internacional.
8
Por outro lado, R.A. Barbosa analisa o pós-11 de Setembro como um
misto de ruptura e continuidade: a agenda política internacional teria mudado,
não a ordem internacional. O câmbio desta dependeria de “novo arranjo
global entre as principais potências militares”, processo de longo prazo –
nesse ponto, o autor parece aproximar-se do realismo estrutural, que prioriza
a análise dos polos de poder na descrição do sistema internacional.
9
7
R.A. Barbosa, Os Estados Unidos pós 11 de setembro de 2001: implicações para a ordem
mundial e para o Brasil, in RBPI 1 (2002), p. 72; C. Lafer, Mudam-se os tempos: diplomacia
brasileira 2001-2002, vol. 2, Brasília, Funag/IPRI, 2002, p. 51.
8
A.C. Lessa e F.A. Meira, O Brasil e os atentados de 11 de setembro de 2001, in RBPI 2 (2001),
pp. 44-61; D.L. Rosenfield, Bush e o terror, in Folha de S. Paulo, 30.10.2004, disponível [on-
line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz3010200408.htm [30.10.2004]; G.M.C.
Quintão, Os desafios do novo cenário internacional de segurança e suas implicações para o
Brasil, in C. Brigagão e D. Proença Jr. (orgs.), Paz e terrorismo – textos do seminário “Desafios
para a política de segurança internacional: missões de paz da ONU, Europa e Américas”, São
Paulo, Hucitec, 2004, pp. 25-26.
9
Sobre realismo estrutural, ver K.N. Waltz, Theory of international politics, trad. port. de
M.L.F. Gayo, Teoria das relações internacionais, Lisboa, Gradiva, 2002. Nesse sentido parece
argumentar R. Ricupero, que aponta três fatores de mudança na “mais decisiva estrutura” das
relações internacionais: a consolidação do euro como moeda universal de reserva; a expansão da
UE a 25 membros, com possibilidades de novos sócios; e, sobretudo, a aprovação da Constituição
Europeia. Teriam efeitos mais duradouros, p.ex., que o terrorismo (Nasce uma estrela, in Folha
de S. Paulo, 13.02.2005, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/dinheiro/
fi1302200505.htm [07.03.2005]). R. Ricupero, assim como R.A. Barbosa, privilegia a análise
dos pólos internacionais de poder na análise do sistema internacional.
23
A TEMÁTICA DO TERRORISMO NO PÓS-11 DE SETEMBRO
Alteraram-se, contudo, as prioridades dos atores principais (EUA, UE,
Japão, China e Rússia) em suas alianças e parcerias. Sobretudo em virtude
da demonstração de vontade de poder dos EUA, o terrorismo foi inserido
no centro da agenda internacional, onde permanecerá como dado
permanente na cooperação em segurança e na formulação de política externa
de todos os países.
10
P.R. Almeida tampouco crê numa mudança radical no sistema
internacional. Concorda que a agenda alterou-se: são prioritários os temas
de segurança e de combate ao terrorismo, em detrimento das preocupações
com o desenvolvimento, agora em segundo plano. Similarmente, em 2001,
C. Amorim avaliava ser cedo para considerar o 11 de Setembro um divisor
de águas como os ataques nucleares ao Japão, mas seria indubitável a
modificação da agenda internacional.
11
A melhor percepção parece ser a do segundo grupo de interpretações
sobre o pós-11 de Setembro. O dado essencial do funcionamento das
relações internacionais, entendido aqui como a hegemonia estadunidense,
não se alterou. Passou a haver, contudo, um fortalecimento do elemento
coerção dessa hegemonia.
Os atentados ocorreram quando os EUA, após a vitória na Guerra Fria
e uma década de crescimento econômico extraordinário – em que seu
orçamento de defesa se multiplicou –, haviam atingido a plena maturidade de
seu poder relativo, comparável somente àquele do Império Romano. Alçaram-
se à situação de superioridade incontrastável nos campos econômico,
tecnológico e militar, traduzível na expressão “hiperpotência”.
12
10
R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., pp. 72, 81-82.
11
Veja on-line 1723, 24.10.2001, Ricos e arrogantes, http://www.pralmeida.org/00PRAfiles/
VEJAentrevPagAmar.html [10.11.2004]; C. Amorim, Reflexões sobre o mundo “pós-11 de
Setembro”, in Panorama da Conjuntura Internacional 12 (2001-2002), pp. 08-09.
12
R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., pp. 73-74; T. Todorov, Le nouveau désordre mondial,
trad. esp. de Z. de Torres Burgos, El nuevo desorden mundial, Barcelona, Península, 2003, pp.
48-68. Conforme R.A. Barbosa, os EUA representavam, por volta de 2001, cerca de 31% do
produto mundial (mais que os quatro seguintes – Japão, Alemanha, Inglaterra e França –
juntos); eram os maiores importadores e exportadores do planeta (17% das importações de
bens e 8% de serviços; 13% das exportações de bens e 18% de serviços, em dados de 1998); os
maiores produtores industriais (cerca de 25% da produção mundial); os maiores investidores
recipientes de investimentos diretos; e os principais produtores e exportadores de filmes e de
programas televisivos. A superioridade tecnológico-militar é evidente e revela-se no fato de os
EUA serem, historicamente, o único ator a projetar poder militar, simultaneamente, em diferentes
e distantes terrenos. Seu orçamento de defesa supera a soma daqueles dos quinze seguintes. No
mesmo sentido, G. Dupas, Fundamentos, contradições e conseqüências hegemônicas, in Política
Externa 3 (2002-2003), p. 16.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
24
Seus interesses encontram-se no mundo inteiro e há disposição a defendê-
los pela força. Contudo, ao contrário dos imperialismos tradicionais, os EUA
se contentam com a não hostilidade econômica e política dos governos
estrangeiros. Essa situação é satisfatoriamente referida como hegemonia.
13
No presente trabalho, entende-se hegemonia como a situação em que
um país (hegemon) exerce, sobre os demais, preeminência militar, econômica
e cultural, inspirando-lhes e condicionando-lhes as opções, tanto por força
de seu prestígio quanto em virtude de seu elevado potencial de coerção e
intimidação. O sistema internacional é conduzido na direção desejada pelo
hegemon, mas há, em geral, percepção disseminada de que o interesse geral
é buscado. Assim compreendida, hegemonia é uma posição intermediária no
binômio consenso-coerção (ou influência-domínio), oscilando no tempo entre
os dois polos, mas sempre composta por ambos.
14
Como se verá (4.1), a
reação estadunidense aos atentados reforçou a coerção em detrimento do
consenso no binômio que compõe a noção de hegemonia.
Isso não implica afirmar que as alterações na agenda internacional – em
grande medida, resultado das novas prioridades dos EUA – representem
alterações de pouca profundidade no funcionamento das relações
internacionais. Na verdade, a hierarquia das prioridades na política
internacional guarda relação íntima com a ordem internacional. Parcela
significativa da gestão da ordem consiste no descongestionamento da agenda
do sistema internacional, por meio de sua simplificação em favor das grandes
potências. Dessa forma, alguns temas – de interesse dessas potências –
prevalecem sobre outros em prol da gestão mundial. Esse mecanismo requer,
evidentemente, formas de controle (especialmente dominação, primazia ou
hegemonia) sobre os demais Estados para que as grandes potências possuam
o “poder positivo” de obter dos demais atores internacionais comportamentos
adequados a seus interesses e valores.
15
Como afirma H. Bull,
Como os estados são bastante desiguais em poder, só alguns
problemas internacionais são resolvidos. As demandas de certos estados
13
T. Todorov, Le nouveau désordre... cit., pp. 48-68.
14
S. Belligni, verbete Hegemonia, in N. Bobbio et.al., Dizionario di politica, trad. port. de C.C.
Varriale et.al., Dicionário de Política, vol. 1, Brasília, UnB, 2004, pp. 579-81; G. Dupas,
Fundamentos, contradições... cit., p. 17; B. Fausto, Hegemonia: consenso e coerção, in Política
Externa 3 (2002-2003), pp. 45-49.
15
C. Lafer, Paradoxos e possibilidades – estudos sobre a ordem mundial e sobre a política
exterior do Brasil num sistema internacional em transformação, Rio de Janeiro, Nova Fronteira,
1982, pp. 96-107.
25
A TEMÁTICA DO TERRORISMO NO PÓS-11 DE SETEMBRO
(os fracos) podem ser na prática ignoradas, enquanto as de outros (os
fortes) são admitidas como as únicas relevantes na pauta do que precisa
ser resolvido.
16
A desigualdade de poder entre os Estados determina que certas temáticas
sejam fundamentais na agenda internacional, geralmente em favor dos Estados
mais fortes. Essa seletividade implica simplificação das relações internacionais
e, assim, contribui para a ordem.
17
É lícito, portanto, compreender que uma
alteração radical da agenda internacional, como verificada após o 11 de
Setembro, provavelmente leve a um funcionamento diferente das relações
internacionais como um todo.
Feitas essas ressalvas de natureza conceitual, devem-se ressaltar
alguns pontos exemplificativos de alteração. É notório que a segurança
passou ao topo da agenda internacional, em detrimento dos temas
econômicos e da agenda do desenvolvimento. Até processos
integracionistas de cunho mais econômico, como o Mercado Comum do
Sul (Mercosul) e a Association of Southeast Asian Nations (ASEAN),
são forçados a considerar aspectos de segurança mais seriamente. Ao
mesmo tempo, o governo Bush testa o conceito de “risco moral” nas
finanças internacionais (os credores devem assumir a responsabilidade
pelos riscos tomados, sem que o Fundo Monetário Internacional (FMI)
os “salve” em caso de default) no caso da Argentina, mas considerações
político-estratégicas ensejaram tratamentos muito mais benevolentes a
Turquia e Paquistão com relação a suas dívidas externas.
18
Verifica-se maior tolerância para com ações contrárias ao Direito
Internacional em nome da segurança e das políticas de poder. Com esse
retorno da Realpolitik, reduzem-se os espaços para relações de corte
16
H. Bull, The anarchical society, trad. port. de S. Bath, A sociedade anárquica, Brasília, UnB/
IPRI; São Paulo, Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2002, p. 236.
17
H. Bull, The anarchical... cit., p. 236. Em H. Bull, ordem internacional significa “um padrão
de atividade que sustenta os objetivos elementares ou primários da sociedade dos estados, ou
sociedade internacional” (p. 13).
18
J. Almino, Reflexões sobre a guerra morna, in L.N.C. Brant (org.), Terrorismo e direito: os
impactos do terrorismo na comunidade internacional e no Brasil – perspectivas político-
jurídicas, Rio de Janeiro, Forense, 2003, p. 325; J. Almino, Inserção internacional de segurança
do Brasil: a perspectiva diplomática, in C. Brigagão e D. Proença Jr. (orgs.), Brasil e o mundo
– novas visões, Rio de Janeiro, Francisco Alves, 2002, pp. 57-61; A.G.A. Valladão, A autonomia
pela responsabilidade: o Brasil frente ao uso legítimo da força, in C. Brigagão e D. Proença Jr.
(orgs.), Brasil e o mundo – novas visões, Rio de Janeiro, Francisco Alves, 2002, pp. 222-25;
V.C. Mello, Paz e segurança na ONU: a visão do Brasil, in C. Brigagão e D. Proença Jr. (orgs.),
Brasil e o mundo – novas visões, Rio de Janeiro, Francisco Alves, 2002, pp. 164-65.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
26
grociano, de modo que mesmo comércio e meio ambiente são temáticas
“infectadas” pela lógica de segurança.
19
1.2. O regime internacional antiterrorista
Como reflexo e causa das alterações na agenda internacional – que passou a
ter no terrorismo um tema central –, nota-se a maior cobrança que os países sofrem
para prevenir e reprimir o fenômeno. Esse recrudescimento dá-se concomitantemente
com alterações significativas no tratamento internacional do tema, o que não exclui
a existência de importantes pontos em aberto nesse tratamento.
É sustentável afirmar que a estrutura de combate ao terrorismo
internacional atingiu, após o 11 de Setembro, níveis de institucionalização,
cooperação e consentimento que permitem sua classificação como um regime
internacional.
20
A despeito da inexistência de uma definição unânime de
terrorismo, os documentos internacionais antiterroristas, sobretudo aqueles
das Nações Unidas, são percebidos como sistema coerente que constitui
verdadeiro código de conduta na matéria. A eficácia desse regime dependeria
da condenação geral ao terrorismo como método político e da fiscalização
dessa condenação pelos principais atores internacionais, sobretudo os EUA.
21
J.S. Nye Jr., ao refletir sobre a cooperação internacional antiterrorista à
luz da noção de bem público global, considera não haver interesse unânime
na produção do bem “não terrorismo”, mesmo porque há Estados que se
valem do terrorismo ou o apoiam.
22
Ainda que houvesse essa unanimidade,
19
A.G.A. Valladão, A autonomia pela responsabilidade... cit., pp. 213-14, 222-25. Em sentido
semelhante, C. Lafer, Mudam-se os tempos... cit., p. 51. Similarmente: “Atos terroristas de
indescritível barbárie provocam reações e suscitam posturas que têm o potencial de afetar os
princípios do multilateralismo. O risco de guerra volta a pairar sobre o mundo. Tudo isso se
reflete em crises econômicas, financeiras e políticas, que tendem a ser mais graves nos países
mais pobres. Nossa região – a América do Sul – também sofre os efeitos desses abalos.”
(Discurso do Embaixador Celso Amorim, por ocasião da transmissão do cargo de Ministro de
Estado das Relações Exteriores, em Brasília (1º.01.2003), in L.I. Lula da Silva, C. Amorim, e S.P.
Guimarães, A política externa do Brasil, Brasília, IPRI/Funag, 2003, p. 52).
20
Na definição de R.O. Keohane: “Regimes are institutions with explicit rules, agreed upon by
governments, that pertain to a particular set of issues in international relations” (Neoliberal
institutionalism: a perspective in world politics in R.O. Keohane, International institutions and
state power: essays in international relations theory, Boulder, Westview, 1989, apud L.G.
Nascentes da Silva, A estruturação de uma política internacional sobre anti-terrorismo sob a
ótica da teoria dos regimes internacionais, Dissertação (Mestrado) – Instituto de Relações
Internacionais da UnB, Brasília, 2003, pp. 46-70). Sobre regimes internacionais, sobretudo na
área de segurança, ver G. Lamazière, O conceito de regime internacional e o regime de não-
proliferação de armas de destruição em massa, in Política Externa 4 (1996).
21
L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 08-28.
27
A TEMÁTICA DO TERRORISMO NO PÓS-11 DE SETEMBRO
permaneceriam as disputas acerca da definição dos fornecedores do bem
em questão, uma vez que, se todos dele se beneficiam, há grande vantagem
em ser um “carona” (free rider), ou seja, em não contribuir. Normalmente,
quando há muitos participantes pequenos, a maior parte teme arcar com
custos maiores que seus benefícios, tornando mais difícil a produção do bem.
Entretanto, a existência dos EUA como país preponderante e com o maior
incentivo para a supressão do o terrorismo facilita a tarefa – mas não elimina
todas as disputas sobre o custeio e a tentação de não contribuir.
23
É nesse contexto que o regime em tela serve exatamente para induzir que
alguns Estados adotem políticas antiterroristas que, de outra forma, não
adotariam. Tal adesão depende, portanto, da disposição dos Estados mais
poderosos a imporem as normas e princípios do regime. Afinal, mesmo sendo
o hegemon atual do sistema internacional, os EUA, que são capazes de fazer
tal “cobrança”, são incapazes de produzir, sozinhos, mecanismos antiterroristas
eficazes. O caráter transnacional do terrorismo demanda políticas públicas
de âmbito mundial contra o fenômeno.
24
Por isso, as contribuições para a produção do bem coletivo (prevenção
e repressão do terrorismo) são exigidas e impostas, sobretudo pelos EUA,
22
Conforme J.S. Nye Jr., os céticos argumentam que, se o terrorista de um é o guerreiro da
liberdade do outro, tratar a luta contra o terrorismo como um bem público internacional é mera
hipocrisia dos fortes, interessados em desarmar os fracos. Contudo, afirma, esse não é o caso,
pois nem todos os movimentos de libertação nacional causaram a morte aleatória de inocentes,
e todas as grandes religiões professam códigos morais nas guerras. O terrorismo é inaceitável
mesmo quando praticado pelos mais fortes. Portanto, o cerne do terrorismo é claro o suficiente
para que, na ONU, a conduta seja deslegitimada. Para ser um bem comum global, arremata J.S.
Nye Jr., uma ampla coalizão deveria deslegitimar o uso do terrorismo (com o argumento central
de condenar ataques a não combatentes) e punir os Estados que abrigam terroristas.
23
J.S. Nye Jr., A North American perspective, in THE TRILATERAL COMMISSION, Addressing the
new international terrorism: prevention, intervention and multilateral cooperation, Washington
D.C., The Trilateral Commission, 2003, pp. 05-14. Conforme J.S. Nye Jr., medidas militares
ou de nation building implicam custos elevados, que nem todos estão dispostos a oferecer. Até
mesmo a perigosa ideia de desviar o terrorismo para outros pode vir a surgir. Em geral, afirma o
autor, essas medidas egoístas são errôneas, pois cidadãos de muitos países são vitimados nos
ataques e alguns terroristas islâmicos têm como alvo toda a civilização ocidental. Assim, nessa
perspectiva, ser um free rider não constitui solução.
24
A. Procópio, Terrorismo e relações internacionais, in RBPI 2 (2001), pp. 62-81. Nesse
sentido, J.S. Nye Jr. entende que a maior lição do pós-11 de Setembro é que os EUA necessitam
de uma cooperação ampla para combater o terrorismo. (A North American perspective cit., pp.
05-14). Da mesma forma, P. Wilkinson aponta que o fundamental, nessa causa, é a cooperação
em inteligência e que a “hiperpotência” estadunidense é incapaz de vencer essa luta
unilateralmente (A European viewpoint, in T
HE TRILATERAL COMMISSION, Addressing the new
international terrorism: prevention, intervention and multilateral cooperation, Washington
D.C., The Trilateral Commission, 2003, pp. 21-28).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
28
que têm grande interesse nesse bem (ver 4.1)
25
. Os ônus (ajustes das políticas
domésticas e externas) são distribuídos sem, necessariamente, guardar relação
com os ganhos individuais. A paz e a segurança, nesse caso, são consideradas
indivisíveis.
26
Mesmo com a elevada legitimidade do antiterrorismo
27
e a
consequente disposição da comunidade internacional a bancar seus
custos, há, no seio do regime em questão, razões para graves desacordos
que impedem uma estratégia comum. O terrorismo, afirma J.S. Nye Jr.,
afeta os países de maneira desigual; é natural que haja diferentes
abordagens e avaliações sobre a ameaça. De fato, é difícil a coordenação
entre os atores nos casos em que concordam quanto ao resultado a ser
evitado, mas discordam quanto a como evitá-lo (quanto ao equilíbrio
preferido). É essa a situação do antiterrorismo: compartilha-se a
premissa básica de que é necessário combater o terrorismo, mas há
discordância a respeito de aspectos centrais da tarefa.
28
Quanto
maior esse conflito de interesses, mais difícil a coordenação entre os
atores e mais provável a resolução do dilema pelo poder relativo dos
Estados envolvidos.
29
25
Os EUA também buscam convencer do interesse geral no regime: “Os ataques do terror
internacional já demonstraram que nenhum país ou região pode se considerar a salvo do flagelo
do terrorismo, mas [com] maior cooperação, (...) nós podemos tornar o mundo um lugar melhor
e mais seguro. (...) Todas as nações, inclusive o Brasil, têm interesse nesse conflito. O terrorismo
é uma ameaça para todos nós e precisamos fazer tudo o que pudermos para derrotá-lo.” (J.
Danilovich, Resoluções de ano novo, in Folha de S. Paulo, 09.01.2005, disponível [on-line] in
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz0901200508.htm [09.01.2005]).
26
L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 46-70; R.A. Barbosa, Os Estados Unidos...
cit., pp. 81-82.
27
Como aponta G. Picco, a al-Qaeda, ao atacar Rússia, China, Índia e EUA, aproximou-os. Os
quatro representam cerca de metade da população mundial e muito mais em termos militares e
tecnológicos. Entretanto, cabe ao tempo dizer se essa “gang of four” seria formada (New entente
after September 11? The United States, Russia, China and India, in Global Governance 1
(2003), pp. 15-21).
28
Nesse sentido: ”pelo menos no plano do discurso, existe amplo consenso em torno da
necessidade de se atacar o flagelo do terrorismo. Divergem os países, entretanto, em relação a
importantes aspectos do problema, tais como o papel a ser atribuído ao respeito aos direitos
humanos no encaminhamento de medidas na área de contraterrorismo, bem como a definição
das melhores estratégias para lidar com as causas do fenômeno.” (B
RASIL, MRE, Delbrasonu
para SERE, Telegrama nº 1724, 23.07.2004).
29
J.S. Nye Jr., Introduction, in THE TRILATERAL COMMISSION, Addressing the new international
terrorism: prevention, intervention and multilateral cooperation, Washington D.C., The Trilateral
Commission, 2003, pp. 01-04; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 46-70. R.
Calduch Cervera, La incidencia de los atentados del 11 de Septiembre en el terrorismo
internacional, in Revista Española de Derecho Internacional 1-2 (2001), pp. 198-99.
29
A TEMÁTICA DO TERRORISMO NO PÓS-11 DE SETEMBRO
Todos os países com assento permanente no CSNU, com efeito, veem
na cooperação internacional antiterrorista uma prioridade, mas cada um tem
uma visão específica a respeito das políticas a serem adotadas. Até a
designação de determinados grupos como terroristas encontra discrepâncias
(ver 4.4 e 4.5).
Essas divergências, como será mostrado ao longo do trabalho, permeiam
toda a discussão a respeito do tema. Por conseguinte, deve-se apontar uma
característica ao regime internacional antiterrorista: nele, há pontos
fundamentais em aberto. O regime tem regras sólidas e indiscutíveis (como
os tratados setoriais das Nações Unidas e a resolução 1373 do CSNU),
mas muitas questões, como a definição de terrorismo, a possibilidade de uso
da força e o terrorismo de Estado, permanecem em discussão, fazendo com
que o regime tenha elevado grau de plasticidade.
A presente dissertação parte dessas premissas para demonstrar que o
Brasil insere-se nas regras do regime antiterrorista e busca nele uma
determinada configuração favorável e um lugar determinado na agenda
internacional. As posições a serem analisadas tratam da substância desse
equilíbrio pretendido.
Para melhor sistematizar a análise proposta, o comportamento brasileiro
quanto ao regime internacional antiterrorista será estudado em dois blocos.
O primeiro dirá respeito, predominantemente, ao cumprimento das normas
estabelecidas do regime. Por sua vez, o segundo tratará das posições
brasileiras quanto a aspectos do regime ainda em construção. A análise assim
compartimentada deverá oferecer melhor organização ao trabalho.
31
2. Características gerais do regime
internacional antiterrorista
Visto que o 11 de Setembro levou ao estabelecimento – ainda que com pontos
importantes em discussão – de um regime internacional antiterrorista, cabe comentar
alguns pontos de ordem geral desse regime. Em primeiro lugar, cumpre ressaltar
que o tratamento do flagelo, na atualidade, é de condenação incondicional. Segundo,
que o terrorismo se tornou um tema definitiva e profundamente inscrito na agenda
de segurança internacional, suscitando a possibilidade de graves sanções e até de
intervenções armadas – o que reforça a coercitividade do regime. Terceiro e último,
serão abordados brevemente os deveres gerais do regime.
2.1. Repúdio inequívoco ao terrorismo
Os debates e as decisões da Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU)
sobre terrorismo refletem, de maneira suficientemente fidedigna, a evolução de
discussões fundamentais sobre o tema no âmbito internacional. Sua análise auxilia
o presente estudo no que tange à descrição do estado atual da matéria.
30
30
Conforme C.A.C. Gonçalves da Silva, “ainda que as Resoluções da Assembleia Geral das
Nações Unidas padeçam do caráter de obrigatoriedade, espelham ou ao menos insinuam a
formação de indispensáveis consensos internacionais que paulatinamente vão se sedimentando
e estabelecendo a vontade da sociedade internacional representada por aquele plenário. Essa
assertiva torna-se patente em se tratando de terrorismo.” (A proteção jurídica internacional
contra o terrorismo e o Tribunal Penal Internacional, in L.N.C. Brant (org.), Terrorismo e
direito: os impactos do terrorismo na comunidade internacional e no Brasil – perspectivas
político-jurídicas, Rio de Janeiro, Forense, 2003, p. 246).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
32
Em 1972, incluiu-se a temática do terrorismo internacional, pela primeira vez,
na agenda da AGNU. Os debates daquele ano giraram em torno de duas opções
básicas: (a) tratamento jurídico-normativo – isolar o terrorismo do contexto político-
social, formulando conceito geral e abstrato, e, assim, legislar criminalmente, com
regras abstratas e impessoais. Tal era a posição do bloco ocidental, desejoso de um
tratado internacional para a repressão; e (b) abordagem jurídico-política – prevenir
o terrorismo por meio da identificação e da eliminação de suas causas subjacentes,
particularmente o colonialismo e o racismo. Partir-se-ia da análise da ordem
internacional e das formas de subvertê-la para tratar o terrorismo. A ideia era defendida
pelo grupo afro-asiático e apoiada pelo bloco comunista. Em princípio, as perspectivas
não parecem excludentes; porém, enquanto a primeira enfatizava a repressão, a
segunda privilegiava a eliminação das causas do terrorismo, em especial o
colonialismo, contexto no qual seria legítimo usar de violência.
31
A partir dessas discussões, adotou-se a resolução 3034 (XXVII), resultado
de relativa convergência
32
. O título da resolução
33
mostra o predomínio da visão
jurídico-política na ocasião. O documento não trata de nenhuma medida concreta
de repressão ao terrorismo nem ao menos o condena. Enfoca, ao contrário, as
causas subjacentes do terrorismo e o direito à autodeterminação dos povos –
condena o colonialismo e legitima os movimentos de libertação nacional.
Estabelece, também, um Comitê Especial sobre Terrorismo (chamado “Comitê
dos 35”) que, entre 1973 e 1979, funcionou sem conseguir alcançar consensos.
Nesses anos, prevaleceu o dissenso entre as duas abordagens acima descritas;
as resoluções da AGNU sobre o tema somente foram adotadas devido à maioria
afro-asiática, privilegiando o enfoque jurídico-político.
34
31
J. Alcaide Fernández, Las actividades terroristas ante el derecho internacional contemporáneo,
Madrid, Tecnos, 2000, pp. 39-40; C. Ramón Chornet, Terrorismo y respuesta de fuerza en el
marco del derecho internacional, Valencia, Tirant lo Blanch, 1993, pp. 148-51.
32
76 votos a favor, 34 contra e 16 abstenções – a maior parte daqueles que não votaram
favoravelmente eram do bloco ocidental.
33
3034 (XXVII). Measures to prevent international terrorism which endangers or takes innocent
human lives or jeopardizes fundamental freedoms, and study of the underlying causes of those
forms of terrorism and acts of violence which lie in misery, frustration, grievance and despair
and which cause some people to sacrifice human lives, including their own, in an attempt to
effect radical changes”.
34
C.A.C. Gonçalves da Silva, A proteção jurídica... cit., p. 247; S. Pellet, A ambigüidade da
noção de terrorismo, in L.N.C. Brant (org.), Terrorismo e direito: os impactos do terrorismo
na comunidade internacional e no Brasil – perspectivas político-jurídicas, Rio de Janeiro,
Forense, 2003, pp. 13-4; C. Ramón Chornet, Terrorismo y respuesta... cit., pp. 147-48, 152-
55; J. Alcaide Fernández, Las actividades terroristas… cit., p. 40; J. Pérez Montero, La lucha
y la cooperación internacional contra el terrorismo, in Anuario Hispano-Luso-Americano de
Derecho Internacional 9 (1991), p. 178.
33
CARACTERÍSTICAS GERAIS DO REGIME INTERNACIONAL ANTITERRORISTA
No entanto, desde o início da década de 1980 até hoje (exceto as
resoluções 42/129, 54/110 e 55/158), todas foram adotadas por consenso.
Especial significação é legada à resolução 40/61, de 1985
35
, que, pela primeira
vez, exprimiu consenso na condenação inequívoca e na qualificação criminal
de todos os atos, métodos e práticas de terrorismo, cometidos em qualquer
lugar e por qualquer pessoa. Desde então, todas as resoluções incluem esse
repúdio incondicional, o que demonstra a prevalência atual da visão jurídico-
normativa. Esse processo, fortalecido na década de 1990, foi favorecido,
dentre outros fatores, pelo virtual término da descolonização, pelo fim da
Guerra Fria e pelo processo de paz árabe-israelense.
36
A resolução 49/60
AGNU é paradigmática da mudança. Aprovada em 1994 e renovada
anualmente, inclui a condenação inequívoca e o chamado à cooperação
internacional antiterrorista, sem mencionar as causas subjacentes do terrorismo
nem mesmo no preâmbulo. De fato, uma importante característica original
das resoluções da AGNU na década de 1990 e no pós-11 de setembro de
2001 é a nova ênfase nas medidas repressivas contra o terrorismo internacional.
Como avalia B. Wanderley Jr., repeliram-se dois conceitos: o da legitimidade
do terrorismo em certos casos e a alegação de neutralidade legítima perante
o terrorismo (não colaboração na luta antiterrorista).
37
35
G. Guillaume, (Terrorisme et droit international, in Recueil des Cours 215 (1989), p. 316)
também ressalta a importância dessa resolução – trata-a como a. mais importante. No mesmo
sentido, C.A.C. Gonçalves da Silva, A proteção jurídica... cit., pp. 248-49; A.D. Sofaer,
Terrorismo e direito internacional, in Dialogo 3 (1987), p. 04. Como aponta J. Pérez Montero,
também nessa ocasião, houve disputa entre, de um lado, os países de influência soviética e os
não alinhados e, de outro, os ocidentais, com posições análogas às já tratadas. Entretanto, o grau
de enfrentamento foi menor nos debates, demonstrando desejo real de proteger os inocentes do
flagelo do terrorismo (La lucha... cit., pp. 182-83).
36
Ver, a título de exemplo de como o fim da Guerra Fria levou à maior convergência entre EUA
e URSS sobre o tema: I. Beliaev e J. Marks (orgs.), Common ground on terrorism: Soviet-
American cooperation against the politics of terror, New York, W.W. Norton, 1991.
37
J. Alcaide Fernández, Las actividades terroristas… cit., pp. 41-43; C.A.C. Gonçalves da
Silva, A proteção jurídica... cit., pp. 248-49; P.C. Wilcox, Intergovernmental responses:
international organizations and law, in Y. Alexander e E.H. Brenner (orgs.), Terrorism and the
law, Ardsley, Transnational, 2001, pp. 31-32; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo: a
evolução do tratamento multilateral e os reflexos para o Brasil, Tese (XLV Curso de Altos
Estudos), Instituto Rio Branco, Brasília, 2003, pp. 40-73; B. Wanderley Jr., A cooperação
internacional como instrumento de combate ao terrorismo, in L.N.C. Brant (org.), Terrorismo
e direito: os impactos do terrorismo na comunidade internacional e no Brasil – perspectivas
político-jurídicas, Rio de Janeiro, Forense, 2003, p. 294; M. Halberstam, The evolution of the
United Nations position on terrorism: from exempting national liberation movements to
criminalizing terrorism wherever and by whomever committed, in Columbia Journal of
Transnational Law 3 (2003), pp. 575-77; L. Migliorino, La dichiarazione delle Nazioni Unite
sulle misure per eliminare il terrorismo internazionale, in Rivista di Diritto Internazionale 4
CIRO LEAL M. DA CUNHA
34
Sinteticamente, a comunidade internacional passou de uma visão jurídico-
política sobre o terrorismo – condescendente com o flagelo em determinadas
situações, particularmente em movimentos de libertação nacional – para uma
jurídico-normativa, de condenação inequívoca do fenômeno. Passou-se a
enfatizar medidas de repressão ao terrorismo e a exigir, com maior vigor, a
cooperação dos Estados nesse sentido.
2.2. O terrorismo como ameaça à paz e à segurança internacionais
Para o presente estudo, é central a percepção de que o 11 de Setembro
levou à incorporação definitiva, num novo e elevado patamar, do terrorismo no
temário da paz e da segurança internacionais. Manifestações inequívocas desse
fenômeno são a invocação do TIAR e a inédita utilização do artigo 5º do Tratado
do Atlântico Norte (que determina a obrigação básica de autodefesa coletiva) e,
sobretudo, a invasão do Afeganistão, legitimada politicamente pela resolução 1368
do Conselho de Segurança das Nações Unidas (ver 5.4.3 e 2.2.2). Esta
intervenção deixa patente que o terrorismo tornou-se um assunto de paz e guerra.
38
É certo que, desde o fim da Guerra Fria, havia uma tendência de ampliação
do alcance da noção de segurança internacional para incluir temas não
militares, entre eles o terrorismo. Essa vaga era defendida pelos países centrais
e pela burocracia onusiana (ideia de multidimensionalidade da segurança).
39
As sanções do CSNU contra Estados apoiadores de terroristas, ainda na
década de 1990 (2.2.2), mostram que, no que tange ao terrorismo, essas
tendências já haviam alcançado resultados concretos.
(1995), p. 966. A Resolução 40/61 foi influenciada pela consternação da opinião pública
internacional com os eventos do caso Achille Lauro (sequestro de navio por terroristas palestinos,
que ensejou uma morte e crise diplomática entre EUA e Itália) e de Beirute (tomada de reféns
americanos e assassinato de diplomata soviético), ambos em 1985.
38
P. Wilkinson, A European viewpoint cit., pp. 21-28; C. Amorim, O Brasil e os novos... cit.
Conforme C. Amorim, “o 11 de setembro despertou na OTAN ambições quase que ilimitadas.
(...) [O] terrorismo passou da categoria de “risco” para transformar-se em uma “missão” de
permanente combate (ofensivo, se necessário) da aliança transatlântica. [A] OTAN transforma-
se de uma organização de defesa coletiva, no sentido clássico e militar do termo, em uma
organização mais bem de segurança coletiva.” Ainda, com a ação no Afeganistão, decidiu-se a
celeuma acerca da possibilidade de “operações fora da área” da OTAN.
39
Sobretudo no período Boutros-Ghali e de sua “Agenda para a Paz”, houve militarização (num
sentido intervencionista e coercitivo) do discurso abrangente sobre paz e segurança internacionais,
em detrimento da linguagem da diplomacia (A.A. Patriota, O Conselho de Segurança após a
Guerra do Golfo: a articulação de um novo paradigma de segurança coletiva, Brasília, Instituto
Rio Branco/Funag/Centro de Estudo Estratégicos, 1998, p. 192).
35
CARACTERÍSTICAS GERAIS DO REGIME INTERNACIONAL ANTITERRORISTA
Contudo, entende-se, aqui, que os atentados a Nova York e Washington
levaram a um aprofundamento desse processo e à integração definitiva do
terrorismo na agenda de segurança internacional, desta vez como tema central.
As reações imediatas aos eventos foram, como exposto acima, de alta gravidade,
bem como os desenvolvimentos subsequentes. Nunca houvera intervenção militar
apoiada pelo CSNU em retaliação a atos terroristas. São inéditos, outrossim, os
esforços internacionais para conter o financiamento do terrorismo (3.2.6) e a
aquisição de armas de destruição maciça por terroristas (3.2.5).
Jamais vista, também, é a elevada importância que as principais potências
atribuem à luta contra o terrorismo na atualidade, inscrevendo-a no bojo das
ameaças à segurança internacional (ver capítulo 4)
40
. O Secretário-Geral das
Nações Unidas (SGNU) também reconhece a centralidade do tema:
The threats to peace and security in the twenty-first century include
not just international war and conflict but civil violence, organized
crime, terrorism and weapons of mass destruction.
41
Após o 11 de Setembro, também a VI Comissão da AGNU endossou a
avaliação de que o terrorismo internacional constitui ameaça à paz e à segurança
internacionais.
42
O tema é tratado pela diplomacia brasileira com percepção similar:
Ao olharmos para o futuro, continuamos a considerar que a
concertação diplomática representa a melhor forma de se forjar um
consenso internacional na luta contra a proliferação de armas de
destruição em massa, o terrorismo e outras ameaças à paz e
segurança internacionais. [grifo nosso]
43
Também a atual Política de Defesa Nacional (PDN, Decreto 5.484/
05) considera que atores não estatais e novas ameaças “permeiam as relações
40
Quanto à China, ver ONU, A/56/410–S/2001/914, disponível [on-line] in http://
daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N01/554/05/PDF/N0155405.pdf?OpenElement
[02.03.2005].
41
ONU, Secretário-Geral, In larger freedom: towards development, security and human rights
for all – Report of the Secretary-General, 2005, disponível [on-line] in http://www.un.org/
largerfreedom/report-largerfreedom.pdf [1º.06.2005].
42
BRASIL, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 149, 29.01.2002.
43
Aula Magna do Senhor Ministro das Relações Exteriores, Embaixador Celso Amorim, no
Instituto Rio Branco – A diplomacia do Governo Lula, Brasília, 10 de abril de 2004.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
36
internacionais e os arranjos de segurança entre os Estados”; o terrorismo
internacional, bem como outros delitos transnacionais, “são ameaças à paz, à
segurança e à ordem democrática” (§ 2.6).
Como se notará mais adiante (5.4), essa interpretação condiciona e molda, em
grande medida, as respostas possíveis ao fenômeno terrorista, inclusive a brasileira.
No caso dos Estados Unidos da América (EUA) e, em certa medida, da Rússia e
do Reino Unido, enseja a doutrina da guerra preventiva (4.1, 4.2 e 4.5).
2.2.1. A perspectiva acadêmica – o “novo terrorismo”
Também na academia, após a queda do Muro de Berlim, passaram a proliferar
ideias a respeito de segurança internacional diferentes das considerações a respeito
de conflitos interestatais. O fim do conflito bipolar levou à elaboração de inúmeras
definições de segurança que incluem aspectos outros que a guerra e a paz
tradicionais entre os Estados.
44
A natureza atual do fenômeno terrorista leva muitos
acadêmicos a sua inclusão no rol das ameaças estratégicas ou a ressaltarem, de
forma menos conceitual, a grande magnitude do risco que representa.
45
Expressão exacerbada de tal tendência é oferecida por M. van Creveld.
Conforme o renomado historiador da guerra, os conflitos de baixa intensidade
(com destaque para o terrorismo) têm tornado irrelevantes as forças armadas e a
guerra tradicionais. Após a II Guerra, predominou aquele tipo de violência que,
mais eficiente em termos de mortes e de restabelecimento de fronteiras, humilhou
até os mais poderosos exércitos em praticamente todos os confrontos. M. van
Creveld chega a afirmar que o Estado não terá futuro se não defender-se
eficazmente desses conflitos, pois perderá o monopólio da violência armada.
46
44
L. Tibiletti, Antiterrorismo na América Latina, in C. Brigagão e D. Proença Jr. (orgs.), Paz e
terrorismo – textos do seminário “Desafios para a política de segurança internacional: missões
de paz da ONU, Europa e Américas”, São Paulo, Hucitec, 2004, p. 293; G. Sarfati, Estudos de
segurança internacional: de Tucídides aos novos conceitos, in C. Brigagão e D. Proença Jr.
(orgs.), Panorama brasileiro de paz e segurança, São Paulo, Hucitec; Rio de Janeiro, Konrad
Adenauer, 2004, p. 178.
45
Para J.L. Bruguière, o terrorismo constitui “um dos riscos mais importantes do século XXI,
um risco estratégico.” (O desafio da ameaça islamita no limiar do século XXI: riscos e processo
de reação, in Revista CEJ 18 (2002), p. 39).
46
M. van Creveld, The transformation of war, New York, Free, 1991, pp. 02-10, 17, 20-25, 60-61,
197-98, 202. Este último argumento, radical e aparentemente equivocado, deriva logicamente da
visão de M. van Creveld de que o Estado é, historicamente, produto e causa do monopólio da
violência organizada e da necessidade de proteção distintiva dos civis. Em sentido similar, A. Cassese
propõe que o terrorismo seja lido no contexto do declínio dos Estados nacionais e, especialmente,
dentro do quadro da desintegração de comunidades em grupos menores, subgrupos e minorias
(Terrorism, politics, and law: the Achille Lauro affair, Cambridge, Polity, 1989, pp. 15-16).
37
CARACTERÍSTICAS GERAIS DO REGIME INTERNACIONAL ANTITERRORISTA
Muitos apontam para o alto poder destrutivo de que os atentados podem
valer-se atualmente. Armas potentes estão, pela primeira vez, disponíveis aos
terroristas, sendo de difícil rastreamento. Sua tecnologia é de fácil operação e seu
custo não é impraticável. Na visão de W. Laqueur, isso significaria uma transformação
radical, talvez uma revolução, na natureza do terrorismo. Todavia, o autor não
sugere que todos os grupos terroristas usarão armas de destruição maciça (ADMs)
no futuro próximo; a maioria não o fará, provavelmente. Há, por enquanto, dificuldades
técnicas consideráveis (ver 3.2.5). O terrorismo tradicional, de menor poder
destrutivo, persistirá: apesar do surgimento do novo terrorismo, o velho está longe
de morto. Mesmo assim, o perigo é enorme; poucos ataques de natureza maciça
podem ser devastadores e há grupos que têm adotado um tom apocalíptico. A
atividade terrorista, em suma, é mais rentável e menos arriscada hoje devido às
tecnologias disponíveis para a articulação, a destruição e o impacto psicológico. S.
Rosenne reforça: “[t]errorist acts increased in their severity, unpredictability
and everywhereness”.
47
A percepção do terrorismo como ameaça à paz e à segurança internacionais é
justificada também pela natureza crescentemente transnacional e organizada em
redes do fenômeno, que se tornou “globalizado”. As novas tecnologias de transportes,
comunicação e fluxos financeiros, marca dos anos 1990, ensejaram essa tendência.
Hoje, o terrorismo tende à transnacionalização – para santuários, obtenção de
fundos, armas e outros recursos. Sua atuação e seus impactos superam as fronteiras
estatais, atingindo, muitas vezes, o sistema internacional, que se tornou mais vulnerável
em função da crescente interdependência. Estratégias nacionais isoladas são,
portanto, quase ineficazes contra o novo terrorismo; há necessidade de colaboração
internacional.
48
47
E.J. Hobsbawm, O novo século... cit., pp. 16-20,41-46; E.J. Hobsbawm, A epidemia... cit.,
pp. 6-10; W. Laqueur, The new terrorism – fanaticism and the arms of mass destruction, New
York, Oxford University, 1999, pp. 04-05; L. Martínez-Cardós, El terrorismo... cit., p. 484; B.
Wanderley Júnior, A cooperação internacional... cit., p. 295; T. Todorov, Le nouveau désordre...
cit., pp. 48-68; S. Rosenne, General course on public international law, Recueil des Cours 291
(2001), p. 169; O.B. Amorim Filho, A geopolítica e a primeira guerra do século XXI, in L.N.C.
Brant (org.), Terrorismo e direito: os impactos do terrorismo na comunidade internacional e
no Brasil – perspectivas político-jurídicas, Rio de Janeiro, Forense, 2003, p. 341. Como afirma
S.E. Flynn, “Terrorism is simply too cheap, too available, and too tempting to ever be totally
eradicated” (The neglected home front, in Foreign Affairs 5 (2004), pp. 20-33).
48
J. Almino, Inserção internacional... cit., pp. 57-61; Reflexões sobre a guerra... cit., p. 323;
A.C. Vaz, Cooperação multilateral frente ao terrorismo internacional: dimensões e desafios da
participação brasileira, in II encontro de estudos: terrorismo, Brasília, Gabinete de Segurança
Institucional, Secretaria de Acompanhamento e Estudos Institucionais, 2004, pp. 79-101; L.G.
Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 151-69; J.M. Lasmar, A ação terrorista
CIRO LEAL M. DA CUNHA
38
A organização em rede de pequenas células terroristas, também
produto da chamada “sociedade da informação”, dificulta sobremaneira
o combate ao terrorismo. Tradicionalmente, os grupos consistiam de
centenas ou milhares de membros organizados hierarquicamente em
organizações semimilitares, ao passo que, hoje, podem constituir uma
infinidade de células minúsculas, descentralizadas, dispersas e com
poucos elos de comunicação entre si. A detecção e a infiltração
tornaram-se praticamente impossíveis. Conforme M. Castells, essas
redes podem expandir-se infinitamente, desde que os novos nós
compartilhem os mesmos códigos de comunicação (como valores e
objetivos de desempenho). Em síntese, os avanços tecnológicos e
organizacionais tornaram o terrorismo mais perigoso e de mais difícil
controle pelas autoridades. Ainda, não se pode mais falar em uma
“Internacional Terrorista” de orientação marxista: hoje, a ameaça é muito
mais difusa.
49
Além disso, com os meios de comunicação em massa – alguns de
difusão global – um ato violento clamoroso pode, a partir de qualquer ponto,
prender a atenção de uma parte grande da humanidade. A natureza
espetacular do terrorismo desperta o sensacionalismo da imprensa,
amplificando os efeitos imateriais do ato. Isso confere maior eficácia aos
internacional e o Estado: hegemonia e contra-hegemonia nas relações internacionais, in L.N.C.
Brant (org.), Terrorismo e direito: os impactos do terrorismo na comunidade internacional e
no Brasil – perspectivas político-jurídicas, Rio de Janeiro, Forense, 2003, pp. 427-32; J.B.
Bell, Transnational terror, Washington D.C., American Enterprise for Public Policy Research;
Stanford, Hoover Institution on War, Revolution and Peace, 1975, p. 04; A. Cassese, Terrorism,
politics... cit., pp. 3-4; C. Lafer, A diplomacia brasileira e o terrorismo, in L.N.C. Brant (org.),
Terrorismo e direito: os impactos do terrorismo na comunidade internacional e no Brasil –
perspectivas político-jurídicas, Rio de Janeiro, Forense, 2003, p. 106-107; O. Malik, Enough of
the definition of terrorism, London, The Royal Institute of International Affairs, 2002, p. 55; C.
Ramón Chornet, Terrorismo y respuesta... cit., pp. 161-68.
49
W. Laqueur, The new terrorism… cit., p. 05; N. Chomsky, 9-11, trad. port. de L.A. Aguiar, 11
de setembro, 3ª ed., Rio de Janeiro, Bertrand Brasil, 2002, pp. 40, 68; M. Castells, The rise of
the network society, trad. port. de R.V. Majer, A sociedade em rede, 6ª ed., São Paulo, Paz e
Terra, 2002, pp. 40, 566-67; J. Arquilla e D. Ronfeldt, The advent of netwar (revisited), in J.
Arquilla e D. Ronfeldt (orgs.), Networks and netwars: the future of terror, crime, and militancy,
Washington D.C., 2001, disponivel [on-line] in http://www.rand.org/publications/MR/MR1382/
[30.09.2002], pp. 01-10; D.S. Soares, De Marx a Deus – os tortuosos caminhos do terrorismo
internacional, Rio de Janeiro, Renovar, 2003, p. 199; J.S. Nye Jr., A North American perspective
cit., pp. 05-14. J.S. Nye Jr. também considera as novas motivações terroristas, sobretudo a
religiosa, um fator de maior brutalidade e indiscriminação dos ataques. Anteriormente, os objetivos
mais delimitados dos terroristas limitariam a violência.
39
CARACTERÍSTICAS GERAIS DO REGIME INTERNACIONAL ANTITERRORISTA
grupos radicais em seus pleitos. O novo terrorismo é, enfim, como expõe
J. Baudrillard, o resultado da apropriação pelos terroristas dos recursos
do poder dominante da modernidade.
50
Todas essas facilidades, que “democratizaram” o terrorismo e o
fortaleceram, também reduziram sua dependência de eventuais apoios de
Estados. Esse auxílio existe por vezes, mas as ações fogem do controle oficial.
Como afirma X. Raufer, após a Guerra Fria, os grupos terroristas deixaram
de ser “máquinas” sob o comando de Estados para se tornarem “organismos”
(lifeforms) independentes, de difícil identificação e de rápida proliferação.
51
2.2.2. O tema no Conselho de Segurança das Nações Unidas
Também no âmbito do CSNU, confirma-se a hipótese de que o terrorismo
ganhou espaço definitivo e central na agenda de segurança internacional pós-
11 de Setembro. Com o fim da Guerra Fria (mais especificamente, após a
Guerra do Golfo), as manifestações do Conselho, particularmente com a
invocação do Capítulo VII da Carta das Nações Unidas (“Ação Relativa a
Ameaças à Paz, Ruptura da Paz e Atos de Agressão”), multiplicaram-se em
número e funções – tendência em que se inserem as medidas antiterroristas.
A agenda do CSNU tornou-se cada vez mais complexa, indo muito além de
situações de conflitos interestatais. Segundo A.A. Patriota, o Capítulo VII foi
posto a serviço de uma concepção de paz e segurança internacionais menos
tolerante a preceitos como igualdade soberana e não ingerência em assuntos
internos – “sobretudo quando levantados como escudo para justificar atos
50
H.C. Fragoso, Terrorismo e criminalidade política, Rio de Janeiro, Forense, 1981, p. 123; C.
Ramón Chornet, Terrorismo y respuesta... cit., pp. 161-8.; J. Baudrillard, L’Espirit du terrorisme,
in Le Monde, 2.11.2002, trad. ingl., The spirit of terrorism, disponível [on-line] in http://
www.chass.utoronto.ca/~ikalmar/illustex/baudriterror.htm [24.07.2003]. Sobre como os
terroristas usam os meios de comunicação maciça, ver: F.P. Melo Neto, Marketing do terror,
São Paulo, Contexto, 2002.
51
S. Halper e J. Clarke, America alone: the neo-conservatives and the global order, New York,
Cambridge University, 2004, p. 34; A. Cassese, Terrorism, politics… cit., pp. 15-6; X. Raufer,
Al Qaeda: a different diagnosis, in Studies in Conflict & Terrorism 6 (2003), pp. 392, 397-98.
P. Wilkinson também entende que o “novo terrorismo” não tem necessidade de Estado
patrocinador. (A European viewpoint cit., pp. 21-28). Em sentido similar, A.S. Cruz Jr. afirma
que os elementos característicos da globalização alçaram o terrorismo a um dos grandes problemas
atuais da humanidade (O caráter contraproducente do terrorismo diante de seus fins, in C.
Brigagão, e D. Proença Jr. (orgs.), Paz e terrorismo – textos do seminário “Desafios para a
política de segurança internacional: missões de paz da ONU, Europa e Américas”, São Paulo,
Hucitec, 2004, p. 223).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
40
de violência do estado contra o indivíduo, para acobertar o terrorismo, para
promover o armamentismo agressivo, para perpetuar as formas flagrantes de
injustiça.”
52
Tradicionalmente, examina G. Guillaume, o CSNU observava a prática
de somente condenar o terrorismo em incidentes determinados. A partir
da década de 1990, o combate ao terrorismo já ensejou sanções contra
Estados (por exemplo, resoluções 731 (1992), 748 (1992) e 883 (1993)
contra a Líbia; e 1044 (1996) e 1054 (1996), contra o Sudão), e contra
o governo Talibã e a al-Qaeda (1267 (1999) e 1363 (2001), sobretudo)
– o que M.C. Bassiouni considera uma forma de facto de
responsabilidade criminal de Estados.
53
Mais importante, a resolução 1368
(2001), ao reconhecer o direito de legítima defesa, individual ou coletiva,
serviu para conferir legitimidade política (juridicamente, há controvérsias
54
)
52
A.A. Patriota, O Conselho de Segurança... cit., pp. 155-56, 168; Intervenção do Embaixador
Ronaldo Mota Sardenberg, Representante Permanente do Brasil na ONU, na 59ª AGNU –
Report of the Security Council; Question of equitable representation on and increase in the
membership of the Security Council and related matters: joint debate”, em Nova York (11.10.2004),
disponível [on-line] in http://www.un.int/brazil/speech/04d-rms-59agnu-equitablerepresentation-
1110.htm [25.06.2005]. Como afirma J. Alcaide Fernández, até 1990, somente se utilizara a força
militar sob o CSNU em duas ocasiões. (Las actividades terroristas... cit., p. 252). Segundo A.A.
Patriota, após a Guerra do Golfo, o Capítulo VII foi invocado em número maior de vezes, em
processo contínuo de experimentação, e reinterpretado em seus meios e objetivos. Seu escopo
teleológico de aplicação ampliou-se, passando a incluir situações de emergência humanitária,
violações maciças dos direitos humanos, defesa da ordem democrática, proliferação de armas de
destruição em massa e para o combate ao terrorismo, tema que nos ocupa.
53
M.C. Bassiouni, Legal control of international terrorism: a policy-oriented assessment, in
Harvard International Law Journal 1 (2002), pp. 96-97. Desde a década de 1970, a Comissão
de Direito Internacional da ONU discute, sem sucesso, a ideia de crimes de Estado.
54
A. Pellet considera inquietante o fato de a Resolução 1368 ter admitido, contra os atentados
de 11 de Setembro, o exercício do direito de legítima defesa individual ou coletiva. Por se tratar
de ato não estatal e de autoria ainda não identificada, tratar-se-ia de interpretação ampla do art.
51 da Carta das Nações Unidas, não correspondendo ao seu teor literal (Terrorismo e guerra.
O que fazer nas Nações Unidas?, in L.N.C. Brant (org.), Terrorismo e direito: os impactos do
terrorismo na comunidade internacional e no Brasil – perspectivas político-jurídicas, Rio de
Janeiro, Forense, 2003, p. 176). Sobre o uso da força contra o terrorismo, ver: A. Cassese, The
international community’s “legal” response to terrorism, in International and Comparative
Law Quarterly 3 (1989); R. Bermejo García, El derecho internacional frente al terrorismo:
¿nuevas perspectivas tras los atentados del 11 de septiembre?, in Anuario de Derecho
Internacional 17 (2001); N. Schrijver, Responding to international terrorism: moving the frontiers
of international law for “enduring freedom”?, in Netherlands International Law Review 3
(2001); S.D. Murphy, Terrorism and the concept of “armed attack” in article 51 of the UN
Charter, in Harvard International Law Journal 1 (2002); M.P.P. Garcia, O direito internacional
e o uso da força, in C. Brigagão eD. Proença Jr. (orgs.), Panorama brasileiro de paz e segurança,
São Paulo, Hucitec; Rio de Janeiro, Konrad Adenauer, 2004; A.F. Velloso, Terrorismo
internacional e a legítima defesa no direito internacional: o artigo 51 da Carta das Nações
41
CARACTERÍSTICAS GERAIS DO REGIME INTERNACIONAL ANTITERRORISTA
à invasão do Afeganistão pelos EUA e seus aliados após o 11 de
Setembro. Até o 11 de Setembro, havia pequeno apoio internacional ao
uso da força em reação a ataques terroristas, apesar de nem a AGNU
nem o CSNU terem repudiado os ataques dos EUA contra Afeganistão e
Sudão, em 1998, como resposta aos atentados contra suas embaixadas
em Nairóbi e Dar-es-Salaam.
55
Quantitativamente, percebe-se a importância do 11 de Setembro para a
maior atenção do CSNU ao terrorismo. No sítio das Nações Unidas na
internet, são listadas, atualmente, 29 resoluções antiterroristas do Conselho.
Delas, apenas uma – 635 (1989) – é anterior à Guerra do Golfo. Nos 12
anos entre esta resolução e o 11 de Setembro, emitiram-se 12 resoluções;
nos quatro anos posteriores, as 17 restantes.
56
As resoluções mais recentes consideram qualquer ato de terrorismo uma
ameaça à paz e à segurança – como a resolução 1611 (2005)
57
– o que
possibilita, em teoria, a invocação do Capítulo VII da Carta das Nações
Unidas. Apesar de essa tendência expressar-se anteriormente – como no
preâmbulo da resolução 748 (1992)
58
– parece ter-se solidificado após os
atentados a Nova York e Washington. Afinal, é com a resolução 1368 (2001)
que se legitima, politicamente, a invasão do Afeganistão como resposta aos
ataques.
59
Dessa forma, parece correto reiterar que a percepção do terrorismo
Unidas, in L.N.C. Brant (org.), Terrorismo e direito: os impactos do terrorismo na comunidade
internacional e no Brasil – perspectivas político-jurídicas, Rio de Janeiro, Forense, 2003; A.
Remiro Brotóns, El orden... cit.; C. Ramón Chornet, La lucha contra el terrorismo internacional
después del 11 de septiembre de 2001, in Revista Española de Derecho Internacional 1-2
(2001); J. Alcaide Fernández, La «guerra contra el terrorismo»: ¿una «opa hostil» al derecho
de la comunidad internacional?, in Revista Española de Derecho Internacional 1-2 (2001).
55
G. Guillaume, Terrorisme et droit international cit., p. 316; J. Alcaide Fernández, Las
actividades terroristas… cit., p. 253; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 103-
17; N. Schrijver, Responding... cit., p. 275; S.D. Murphy, Terrorism and the concept... cit., p.
49.
56
ONU, CSNU, UN action against terrorism – actions by the Security Council, disponível [on-
line] in http://www.un.org/terrorism/sc.htm [31.05.2005]. Parece haver resoluções do CSNU
anteriores a 1989, como a 579 (1985), que, na sequência do caso Achille Lauro, condena os atos
de terrorismo, de forma mais ou menos genérica, e a tomada de reféns.
57
1. Condemns without reservation the terrorist attacks in London on 7 July 2005, and regards
any act of terrorism as a threat to peace and security
58
Convinced that the suppression of acts of international terrorism, including those in which
states are directly or indirectly involved, is essential for the maintenance of international peace
and security.
59
S.P. Subedi, The UN response to international terrorism in the aftermath of the terrorist
attacks in America and the problem of the definition of terrorism in international law, in
International Law Forum 3 (2002), p. 160.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
42
como ameaça à paz e à segurança internacionais cristalizou-se e fortaleceu-
se após o 11 de Setembro.
Também chamam a atenção os grupos de trabalho e comitês do CSNU
que tratam do terrorismo internacional. Primeiro, existe o comitê de sanções
contra o Talibã e a al-Qaeda, estabelecido pela resolução 1267 (1999)
60
.
Segundo, há o Comitê Antiterrorismo (CAT), criado pela resolução 1373
(2001), mais importante de todos, que será comentado abaixo. Terceiro,
criou-se um comitê pela resolução 1540 (2004) para implementar o próprio
documento, que trata da prevenção da aquisição de armas de destruição
maciça por terroristas. Por último, cumpre mencionar o Grupo de Trabalho
estabelecido pela resolução 1566 (2004), com vistas a produzir
recomendações ao CSNU a respeito de medidas práticas a serem impostas
a indivíduos, grupos e demais entidades – além daqueles apontados pelo
comitê da resolução 1267 – envolvidas com atividades terroristas.
Centrais a essa marcha rumo ao combate recrudescido e institucional do
terrorismo pelo CSNU são a resolução 1373 e o CAT, por ela criado. Emitida
como decorrência do 11 de Setembro, a resolução determina medidas a
serem adotadas por todos os Estados, numa espécie de “cartilha” antiterrorista
supostamente vinculante.
61
A resolução em tela estabelece um conjunto de deveres de grande abrangência.
Com grande ênfase, cria deveres estatais relacionados à prevenção e à punição do
financiamento do terrorismo, bem como ao congelamento de ativos de terroristas
ou facilitadores. Os Estados são proibidos de oferecer apoio – passivo ou ativo – a
entidades ou pessoas envolvidas com atos de terrorismo. Os Estados, ademais,
devem negar santuário àqueles que financiam, planejam, apoiam ou cometem atos
terroristas; devem certificar-se de que tais pessoas sejam levadas à justiça e de que
as leis locais reprimam tais condutas. Determina-se que cooperem em investigações
60
“Security Council Committee Established Pursuant to Resolution 1267 (1999) Concerning
Al-Qaida and the Taliban and Associated Individuals and Entities”.
61
L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 103-17. Na opinião de A. Pellet, esse
documento excede os poderes do Conselho de Segurança. Ao prever obrigações muito gerais e
impessoais, faz parecer – supostamente sob o Capítulo VII da Carta da ONU – que o CSNU
pode tomar decisões vinculantes para todos os Estados. O jusinternacionalista vê nisso, portanto,
legislação internacional que, além de tudo, torna obrigatórios, na prática, vários documentos que
os países não ratificaram, especialmente a parte que trata do financiamento do terrorismo
(artigos 1 e 2), com o que concorda S. Rosenne. Para A. Pellet, isso fere o direito internacional.
Um governo ou legislador mundial somente seria legítimo se razoavelmente democrático, o que
não é o caso (Terrorismo e guerra... cit., pp. 180-181; S. Rosenne, General course... cit., p.
171). Similarmente, J. Alcaide Fernández, La «guerra... cit., pp. 295-98.
43
CARACTERÍSTICAS GERAIS DO REGIME INTERNACIONAL ANTITERRORISTA
e procedimentos criminais, bem como no campo da inteligência, e que previnam o
movimento transfronteiriço de terroristas. Os Estados são convocados a, dentro de
três meses, apresentarem relatório ao CAT sobre a implementação da resolução. É
dessa maneira que, após o 11 de Setembro, instalou-se, no CSNU, processo de
uniformização das leis nacionais antiterroristas, notadamente por meio da resolução
1373.
62
Cumpre tratar agora, em breves apontamentos, do CAT. Formado por todos
os membros (temporários e permanentes) do CSNU, compete-lhe monitorar a
implementação da resolução 1373 e convocar os países a informarem as medidas
tomadas para tanto. As diretrizes aprovadas pelo CAT são geralmente dotadas de
obrigatoriedade, já que são referendadas pelo CSNU com base no Capítulo VII
da Carta das Nações Unidas. O CAT tem a competência de requerer aos países
quantos relatórios entender necessários acerca do cumprimento daquela resolução.
O CAT é, assim, capaz de montar um case contra certos países, apresentando-o
ao CSNU com sugestões de providências ou oferecimento de assistência.
63
O
Comitê também tem pressionado os países nas altas instâncias multilaterais.
Entretanto, em julho de 2004, cerca de um terço do total dos membros das Nações
Unidas ainda não havia cumprido as obrigações perante o CAT naquele ano. Em
razão disso, a atuação do Comitê tende a endurecer contra países considerados
não cooperativos, como vem sendo o caso do Paraguai.
64
62
S. Rosenne, General course... cit., pp.171-72; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit.,
pp. 103-17; V.C. Mello, Paz e segurança... cit., p. 179; R. Bermejo García, El derecho... cit.,
pp. 10-12.
63
Parece que, com a atuação do CAT, realiza-se a inversão do ônus da prova proposto por A.
Carter, J. Deutch e P. Zelikow, segundo os quais as normas internacionais deveriam mudar no
sentido de que os Estados assegurassem não proliferação e o combate a criminosos em suas
fronteiras (Catastrophic terrorism – tackling the new danger, in Foreign Affairs 6 (1998)).
64
S. Rosenne, General course... cit., p. 172; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp.
103-17; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 40-73; B
RASIL, MRE,
Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 1724, 23.07.2004. Em reunião de 19 de setembro de 2004,
o Paraguai obteve avaliação bastante negativa do CAT no que tange ao cumprimento dos
deveres internacionais antiterroristas. Diversos países insinuaram que lhe falta vontade política
de implementar a resolução 1373. Enviou-se carta ao país, em cobrança do cumprimento dos
deveres em tela. A escolha do Paraguai como primeiro “alvo” ter-se-ia dado, segundo diplomata
russo, por três razões: demonstra indisposição ou dificuldade em cumprir o regime de
contraterrorismo; não se situa em área politicamente conturbada; e não é de maioria muçulmana.
O Brasil afirmou que as eventuais dificuldades de países nesse cumprimento deve ser examinada
com cautela, mas é avaliado que seria importante convencer o Paraguai a cooperar, já que, além
de o Brasil ter interesse na credibilidade dos mecanismos multilaterais antiterrorismo, é essencial
“evitar que tema envolvendo país da nossa vizinhança imediata seja levado à consideração do
CSNU.” (B
RASIL, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 2434, 22.09.2004; BRASIL, MRE,
Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 2435, 22.09.2004).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
44
Ao mesmo tempo, é tarefa do CAT, segundo a resolução 1377 (2001)
do CSNU, cooperar com Estados e organizações internacionais universais,
regionais e sub-regionais para auxiliar no cumprimento da resolução 1373
(2001). Não há assistência “ativa” (como a captura de terroristas) nem
intercâmbio de inteligência no CAT.
65
Em síntese, esses processos (mormente, a institucionalização e o reforço
do antiterrorismo no CSNU; a aplicação de sanções e a legitimação da invasão
do Afeganistão) indicam a centralidade do terrorismo no temário da segurança
internacional. Outrossim, explicitam – como já ressaltado (1.2) – que existe
um grupo de normas fortalecido em sua eficácia e obrigatoriedade coercitiva,
apesar seus pontos em desenvolvimento.
2.3. Os deveres de prevenção e repressão – visão geral
Cumpre, por fim, delinear os deveres gerais de que consistem as
regras mais bem acabadas do regime internacional antiterrorista. As normas
decorrentes do regime podem, basicamente, ser diferenciadas entre
deveres de prevenção e deveres de repressão do terrorismo. Os primeiros
decorrem da igualdade soberana dos Estados, enquanto os segundos têm
como fundamento imediato evitar a impunidade de pessoas culpadas de
terrorismo.
66
No que tange à prevenção, devem os Estados evitar, em seu território, o
cometimento de atentados contra outros Estados ou nacionais destes, bem
como coibir a organização de atividades preparatórias de terrorismo contra
outros territórios. Uma manifestação desses deveres inscreve-se nas resoluções
49/60 e 51/210 da AGNU (4 e 5.a).
67
O Estado não é responsável objetivamente por eventuais atentados, mas
deve evitar sua comissão com a “diligência devida”, examinada caso a caso
em função, sobretudo, das informações disponíveis às autoridades. A
determinação da negligência depende, v.g., de queixas anteriores de outros
Estados acerca de atividades terroristas, bem como da notoriedade destas;
da tolerância e da aquiescência com essas atividades etc. É, enfim, um dever
de agir em prevenção, não uma responsabilidade pelos resultados.
68
65
L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 103-17.
66
J. Alcaide Fernández, Las actividades terroristas… cit., pp. 86-95.
67
J. Alcaide Fernández, Las actividades terroristas… cit., pp. 86-95, 152.
68
J. Alcaide Fernández, Las actividades terroristas… cit., pp. 86-95.
45
CARACTERÍSTICAS GERAIS DO REGIME INTERNACIONAL ANTITERRORISTA
A cooperação internacional, por todos os meios factíveis, faz parte das
obrigações de prevenção. Incumbe aos Estados, ilustrativamente, intercambiar
informações. Esses deveres de cooperação estão presentes nos tratados
parciais sobre terrorismo, bem como em todas as resoluções consensuais da
AGNU. O fornecimento de informações é obrigação absoluta quando constitui
a única maneira de evitar atos ou atividades de terrorismo.
69
É evidente que uma obrigação particularmente importante dos Estados
é, tanto dentro quanto fora de seu território, não organizar, instigar, ajudar ou
participar de atos terroristas contra outros Estados ou seus nacionais.
70
Enfim,
o state-sponsored terrorism tem proibição clara no direito internacional, já
tendo ensejado pesadas sanções, como contra a Líbia.
Quanto à repressão do terrorismo, o dever básico e geral do Estado é a
extradição ou o julgamento penal de supostos terroristas em seu território
(princípio aut dedere aut judicare). Isso decorre dos tratados antiterroristas
e do direito internacional geral. Como deveres acessórios de repressão, devem
os Estados: (a) tipificar os delitos estabelecidos em tratados em seu direito
interno, além de estabelecer jurisdição sobre esses crimes; (b) subministrar a
informação relativa às circunstâncias dos atos e aos supostos terroristas; (c)
deter os suspeitos, conforme a situação, e investigar preliminarmente os fatos;
(d) prestar toda a assistência possível ao processo penal ou de extradição
(como traslado do acusado e envio de provas); e (e) prestar contas dos
resultados dos procedimentos para repressão e punição dos terroristas.
71
Evidentemente, tratou-se, acima, dos deveres antiterroristas em seus
aspectos gerais. As obrigações mais específicas, como o combate ao
financiamento do terrorismo (3.2.6) e a prevenção da ADMs por terroristas
(3.2.5) são tratadas adiante.
69
J. Alcaide Fernández, Las actividades terroristas… cit., pp. 86-95.
70
J. Alcaide Fernández, Las actividades terroristas… cit., p. 206.
71
J. Alcaide Fernández, Las actividades terroristas… cit., pp. 95-105, 118.
47
3. O cumprimento das normas estabelecidas
Como se notou, o temário do terrorismo adquiriu posição central na agenda
internacional pós-11 de Setembro. Seu tratamento adquiriu maior institucionalidade
e consenso e, ao mesmo tempo, maior coercitividade. Dado que o regime
internacional antiterrorista contém determinadas regras estabelecidas de prevenção
e repressão, é mister, agora, avaliar seu cumprimento pelo Brasil.
O cumprimento do regime justifica-se por três razões básicas. Primeiro,
existem sanções por descumprimento. Segundo, no longo prazo, uma violação
atual por um país constitui precedente que pode favorecer futuras infrações
contra si, anulando possíveis benefícios imediatos.
72
Por fim, a deterioração da
reputação do país representa custo – que se afigura crescente à medida que o
cumprimento do regime universaliza-se.
73
Dessa maneira, afora os valores
brasileiros de defesa da paz e do repúdio ao terrorismo, inscritos na Constituição
Federal (ver 3.2.1), interessa cumprir as regras do regime internacional
antiterrorista em virtude de eventuais sanções, da possibilidade de tornar-se
vítima do terrorismo no futuro
74
e da preservação da imagem do País.
72
Como aponta P.R. Pillar, uma possível desvantagem de cooperar contra o terrorismo é estar
sujeito a represálias dos grupos terroristas contrariados (Terrorism and U.S. foreign policy,
Washinton D.C., Brookings, 2001, pp. 188-89).
73
L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 46-70.
74
Vale lembrar, com H. Bull, que, independente do que os separe, os Estados modernos visam
a manter para si o predomínio na organização política mundial, sem contestação de atores não
estatais, cooperando para manterem entre si o monopólio da violência (The anarchical... cit.
pp. 23, 25).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
48
3.1. Repúdio inequívoco do terrorismo
Em conformidade com o tratamento jurídico e político do terrorismo
internacional na atualidade, o Brasil tem expressado, reiteradamente, seu
repúdio inequívoco a todas as formas e manifestações do terrorismo e o
compromisso com seu combate. A Constituição Federal de 1988 assim o
determina (art. 4º, VIII), bem como a vocação pacifista do País.
75
Nesse
sentido, estabelece a nova PDN:
A Constituição Federal de 1988 tem como um de seus princípios, nas
relações internacionais, o repúdio ao terrorismo. O Brasil considera que o
terrorismo internacional constitui risco à paz e à segurança mundiais.
Condena enfaticamente suas ações e apóia as resoluções emanadas pela
ONU, reconhecendo a necessidade de que as nações trabalhem em conjunto
no sentido de prevenir e combater as ameaças terroristas. (§ 4.8)
Como demonstração do repúdio, o País, em reação ao 11 de Setembro, apoiou
as decisões da AGNU e do CSNU contra o terrorismo e propôs a convocação do
órgão de consulta do TIAR (ver 3.2.2 e 5.4.3). Manifestou solidariedade com o povo
dos EUA e disposição a combater o terrorismo. O Presidente Cardoso enviou carta
a 30 chefes de Estado e de importantes organizações internacionais, expressando
indignada repulsa com os ataques e conclamando-os à cooperação.
76
Mais recentemente, em conjunto com os demais chanceleres do G4 (grupo
formado por Alemanha, Brasil, Índia e Japão para a reforma das Nações Unidas),
o Chanceler Amorim emitiu condenação dos ataques de 7 de julho de 2005 em
Londres.
77
Cerca de dois meses antes, houve afirmações de que o Brasil, ao firmar
declaração conjunta (“Declaração de Brasília”) no âmbito da Cúpula América do
Sul – Países Árabes (ASPA), relativizaria sua condenação ao terrorismo.
78
Não
parece ser correta essa interpretação: a declaração ressalta “a importância do combate
ao terrorismo, em todas suas formas e manifestações”, bem como a necessidade
do fortalecimento da cooperação, inclusive no campo das informações, nesse sentido
75
Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 2625, 06.10.2004; A.J.M. Souza e Silva,
Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; A.P.C. Medeiros, O terrorismo na agenda
internacional, in Revista CEJ 18 (2002), p. 65.
76
Brasil, MRE, SERE (COCIT) para Brasemb Assunção, Fax nº 138, 14.12.2001.
77
Brasil, MRE, Assessoria de Imprensa do Gabinete, Nota à Imprensa nº 339, 08.07.2005.
78
P.ex., Boletim da Confederação Israelita do Brasil, 11.05.2005, Terror, não!, disponível [on-
line] in http://www.conib.org.br/ [20.07.2005].
49
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
(§ 2.16). No documento, a ocupação estrangeira é repudiada e é reconhecido o
direito à resistência à ocupação, mas “de acordo com os princípios da legalidade
internacional e em conformidade com o Direito Humanitário Internacional” (§ 2.17)
– ambos os quais condenam o terrorismo em todas suas formas e o ataque a civis
em conflitos armados.
79
3.2. Providências brasileiras quanto à prevenção e à repressão
É fundamental ressaltar que, no presente estudo, apesar de sua pertinência aos
assuntos internacionais, é imprescindível a investigação acerca das medidas antiterroristas
adotadas internamente pelo Brasil – o que não constitui confusão de níveis de análise.
Como afirma J.S. Nye Jr., a temática da segurança interna (homeland security) tem
ascendência internacional na temática terrorista, pois, num mundo em que o terrorismo
opera por meio de redes transnacionais globalizadas, o sistema de proteção contra o
terrorismo é tão forte quanto seu elo mais fraco. É patente que um ponto central do
combate ao terrorismo é a adoção de medidas internas em conformidade com o
regime internacional. Tanto é assim que A.G.A. Valladão afirma que o 11 de Setembro
“internalizou” as questões de segurança internacional no mundo inteiro.
80
3.2.1. Direito brasileiro
O arcabouço jurídico nacional para o combate ao terrorismo pode ser
considerado suficiente – bem desenvolvido e razoavelmente complexo. O
repúdio ao terrorismo é um princípio das relações exteriores do Brasil na
Constituição Federal de 1988 (art. 4º, VIII). O art. 5º, XLIII, trata a conduta
como crime inafiançável e insuscetível de graça ou anistia, por ele respondendo
os mandantes, executores e os que, se puderem evitá-lo, omitirem-se.
Entretanto, o texto constitucional não confere conteúdo semântico preciso
ao terrorismo, o que tampouco se faz em nível infraconstitucional.
81
79
Cúpula América do Sul – Países Árabes, Declaração de Brasília, disponível [on-line] in
http://www2.mre.gov.br/aspa/Decl/portugues.doc [16.05.2005]. Cf. L. Rohter, Little Common
Ground at Arab-South American Summit Talks, in New York Times 11.05.2005, disponível
[on-line] in http://www.nytimes.com/2005/05/11/international/americas/11brazil.html?ex=1116
561600&en=bc34137cbcd65944&ei=5070 [12.05.2005].
80
J.S. Nye Jr., Introduction cit., pp. 01-04; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit.,
pp. 40-73; A.G.A. Valladão, A autonomia pela responsabilidade... cit., p. 219.
81
J.A.L. Sampaio, Constituição e terror – uma visão parcial do fenômeno terrorista, in L.N.C.
Brant (org.), Terrorismo e direito: os impactos do terrorismo na comunidade internacional e
CIRO LEAL M. DA CUNHA
50
Os imperativos constitucionais informam extensa legislação sobre o
terrorismo. O artigo 2º da Lei 8.072/90, que dispõe sobre crimes hediondos,
prevê que, além de o terrorista ser insuscetível de fiança, anistia e graça,
também o indulto e a liberdade provisória lhe são proibidos, e a pena deve
ser cumprida somente em regime fechado.
82
Na Lei 6.815/80 (Estatuto do Estrangeiro), o artigo 77, § 3º, dispõe que o
Supremo Tribunal Federal (STF) pode considerar comuns os crimes de terrorismo
e de assassinato político. Tal é o espírito do tratamento do terrorismo no direito
internacional hodierno, que o considera crime comum. Evita-se a concessão de
asilo para terroristas e se possibilita sua extradição, deportação ou expulsão do
território nacional. Isso se expressa na Lei 9.474/97, que estabelece o Comitê
Nacional para os Refugiados (CONARE): proíbe-se a concessão de status de
refugiado a terroristas, conforme o Estatuto do Refugiado, de 1951.
83
A Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/83), ainda vigente – mas de
constitucionalidade contestada
84
– condena o terrorismo (art. 20), mas não o
define. Conforme M. Cepik e A.J.M. Souza e Silva, também os artigos 15,
19, 20 e 24 tratam do terrorismo, apesar de não utilizarem o termo.
85
Dois dias após o 11 de Setembro, o Presidente Cardoso requereu medidas
de combate à ameaça terrorista. O Ministério da Justiça, em resposta, anunciou
um anteprojeto de Lei que, criando um novo título no Código Penal Brasileiro,
deveria substituir a Lei de Segurança Nacional. Essa é a origem do Projeto de Lei
no Brasil – perspectivas político-jurídicas, Rio de Janeiro, Forense, 2003, pp. 158-9; C. Lafer,
A diplomacia brasileira... cit., p. 104; M.S. Morais, Aspectos do combate ao terrorismo:
prevenção e repressão legal no exterior e no Brasil, in Revista Direito Militar 34 (2002), p. 10.
82
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; M. Cepik, Adequação e
preparo institucional do Brasil para o enfrentamento da ameaça terrorista: avaliação crítica e
sugestões preliminares, in II encontro de estudos: terrorismo, Brasília, Gabinete de Segurança
Institucional, Secretaria de Acompanhamento e Estudos Institucionais, 2004, pp. 47-77; Brasil,
MRE, SERE (COCIT) para Brasemb Assunção, Fax nº 138, 14.12.2001.
83
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; M. Cepik, Adequação e
preparo... cit., pp. 47-77; H.C. Fragoso, Terrorismo e criminalidade... cit., p. 38; E. González
Lapeyre, Aspectos jurídicos del terrorismo, Montevideo, A. M. Fernández, 1972, pp. 13-4;
Brasil, MRE, SERE (COCIT) para Brasemb Assunção, Fax nº 138, 14.12.2001.
84
Como aponta M.O.L. Guimarães, muitos autores argumentam pela inconstitucionalidade da
Lei de Segurança Nacional (Terrorismo – tratamento penal e evolução histórico-jurídica,
Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Direito da USP, São Paulo, 2004, p. 117).
85
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; M. Cepik, Adequação e
preparo... cit., pp. 47-77. “Art. 15 - Praticar sabotagem contra instalações militares, meios de
comunicações, meios e vias de transporte, estaleiros, portos, aeroportos, fábricas, usinas,
barragem, depósitos e outras instalações congêneres”; “Art. 19 - Apoderar-se ou exercer o
controle de aeronave, embarcação ou veículo de transporte coletivo, com emprego de violência
51
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
6.764/02, que, entre outras disposições, tipifica o terrorismo e prevê penas para
seus autores.
86
Ainda como efeito direto do 11 de Setembro, por meio da Lei
10.309/01, possibilitou-se à União assumir as responsabilidades civis no caso de
atentados terroristas contra aeronaves de empresas aéreas brasileiras (art. 1º).
87
Aspectos comumente conexos ao terrorismo também são objeto da
legislação brasileira. Apesar de não mencionar “terrorismo”, a Lei 9.034/95
(alterada pela Lei 10.217/01), que dispõe sobre prevenção e repressão ao
crime organizado, pode ser considerada um instrumento antiterrorista.
Possibilita, v.g., a infiltração de agentes em organizações criminosas (art. 2º,
V) e redução de pena por colaborar com a justiça (art. 6º). Quanto à entrada
e saída em território nacional, tanto a legislação interna quanto a mercosulina
são consideradas apropriadas. As autoridades policiais e militares brasileiras
são responsáveis por esse controle.
88
3.2.2. Vinculação às normas internacionais (tratados e resoluções)
O governo brasileiro tem-se esforçado para que o País vincule-se a todos
os tratados internacionais sobre terrorismo e os internalize. O Brasil é parte
ou grave ameaça à tripulação ou a passageiros”; “Art. 20 - Devastar, saquear, extorquir, roubar,
sequestrar, manter em cárcere privado, incendiar, depredar, provocar explosão, praticar atentado
pessoal ou atos de terrorismo, por inconformismo político ou para obtenção de fundos destinados
à manutenção de organizações políticas clandestinas ou subversivas”; “Art. 24 - Constituir,
integrar ou manter organização ilegal de tipo militar, de qualquer forma ou natureza armada ou
não, com ou sem fardamento, com finalidade combativa.”
86
No Projeto de Lei 6.764/2002, lê-se:
“Terrorismo. Art. 371. Praticar, por motivo de facciosismo político ou religioso, com o fim de
infundir terror, ato de: I – devastar, saquear, explodir bombas, sequestrar, incendiar, depredar
ou praticar atentado pessoal ou sabotagem, causando perigo efetivo ou dano a pessoas ou bens;
ou II – apoderar-se ou exercer o controle, total ou parcialmente, definitiva ou temporariamente,
de meios de comunicação ao público ou de transporte, portos, aeroportos, estações ferroviárias
ou rodoviárias, instalações públicas ou estabelecimentos destinados ao abastecimento de água,
luz, combustíveis ou alimentos, ou à satisfação de necessidades gerais e impreteríveis da
população”. Esse texto recebe a crítica de M. Cepik de tender a caracterizar o terrorismo como
dissidência política, rebelião social ou subversão armada, aprofundando essa tendência da Lei
de Segurança Nacional. Segundo o analista, o artigo 371 teria sido elaborado visando à
criminalização do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), não levando em
conta natureza multifacetada e específica do terrorismo contemporâneo.
87
M. Cepik, Adequação e preparo... cit., pp. 47-77; A.M. Cardoso, Terrorismo e segurança
em um estado social democrático de direito, in Revista CEJ 18 (2002), p. 50.
88
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; M. Cepik, Adequação e
preparo... cit., pp. 47-77; ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the Counter-Terrorism
Committee on the implementation of United Nations Security Council resolution 1373 (2001),
disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/203/76/IMG/
N0220376.pdf?OpenElement [14.07.2005], pp. 11-27.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
52
das doze principais convenções no âmbito das Nações Unidas, das quais
nove
89
já foram internalizadas e ratificadas. No âmbito hemisférico, o Brasil é
signatário das três convenções da Organização dos Estados Americanos
(OEA) relacionadas ao terrorismo
90
, estando apenas uma na dependência
de aprovação legislativa.
91
Anteriormente ao 11 de Setembro, o governo brasileiro já buscava adequar-
se às resoluções sobre o assunto emanadas da AGNU e do CSNU. A resolução
1.373 do Conselho, de importância extremada após os atentados também foi
prontamente internalizada. O Itamaraty tem encaminhado, ao Comitê Antiterrorismo
89
Convenção Relativa às Infrações e a Certos Outros Atos Cometidos a Bordo de Aeronaves
(Tóquio, 1963); Convenção para a Repressão ao Apoderamento Ilícito de Aeronaves (Haia,
1970); Convenção para a Supressão de Atos Ilícitos Contra a Segurança da Aviação Civil
(Montreal, 1971); Convenção sobre a Prevenção e Punição de Crimes Contra Pessoas que
Gozam de Proteção Internacional, Inclusive Agentes Diplomáticos (Nova Iorque, 1973);
Convenção Internacional Contra a Tomada de Reféns (Nova Iorque, 1979); Convenção sobre a
Proteção Física de Materiais Nucleares (Viena, 1980); Protocolo para a Repressão de Atos
Ilícitos de Violência em Aeroportos que Prestem Serviço à Aviação Civil Internacional (Montreal,
1988); Convenção para a Marcação de Explosivos Plásticos para Fins de Detecção (Montreal,
1991); e Convenção Internacional para a Supressão de Atentados Terroristas a Bomba (Nova
Iorque, 1997). Faltam ratificar e internalizar as seguintes convenções das Nações Unidas:
Convenção para a Supressão de Atos Ilícitos Contra a Segurança da Navegação Marítima
(Roma, 1988), seu Protocolo para a Supressão de Atos Ilícitos Contra a Segurança de Plataformas
Fixas Localizadas na Plataforma Continental (Roma, 1988) e a Convenção Internacional para a
Supressão do Financiamento do Terrorismo (Nova Iorque, 1999). A última já foi aprovada pelo
Congresso, devendo ser ratificada em setembro de 2005. As duas penúltimas já foram aprovadas
na Câmara dos Deputados em julho de 2005, tendo sido enviadas ao Senado Federal para
conclusão do trâmite de aprovação congressual (Brasil, MRE, SERE para Delbrasonu, Despacho
Telegráfico nº 815, 12.08.2005).
90
Convenção para Prevenir e Punir os Atos de Terrorismo Configurados em Delitos Contra as
Pessoas e a Extorsão Conexa, Quando Tiverem Eles Transcendência Internacional (Washington,
1971); Convenção Interamericana Contra a Fabricação e o Tráfico Ilícitos de Armas de Fogo,
Munições, Explosivos e Outros Materiais Correlatos (Washington, 1997); Convenção
Interamericana Contra o Terrorismo (Bridgetown, 2002). A última foi aprovada pela Câmara
dos Deputados em 07.07.2005, devendo seguir ao Senado Federal (Brasil, MRE, SERE para
Delbrasupa, Despacho Telegráfico nº 285, 11.07.2005).
91
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; M. Cepik, Adequação e
preparo... cit., pp. 47-77; BRASIL, MRE, COCIT para Subsecretaria-Geral de Política Bilateral,
Memorandum 004, 28.01.2002; BRASIL, MRE, O Brasil no combate aos atos de terrorismo,
disponível [on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/temas_agenda/
terrorismo/brasil.asp [16.05.2005]; BRASIL, Congresso Nacional, Sistema de Informações do
Congresso Nacional, disponível [on-line] in http://www6.senado.gov.br/sicon/
PreparaPesquisa.action?tipoPesquisa=3 [16.05.2005]; ONU, United Nations treaty collection
– conventions on terrorism, disponível [on-line] in http://untreaty.un.org/English/Terrorism.asp
[16.05.2005]; OEA, Inter-American treaties – texts of Inter-American treaties by year, disponível
[on-line] in http://www.oas.org/main/main.asp?sLang=E&sLink=http://www.cicte.oas.org
[16.05.2005].
53
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
(CAT), relatórios minuciosos sobre a implementação daquela e das resoluções 1.390
(2002) do CSNU e 56/88 (2002) da AGNU. Em áreas conexas ao terrorismo, o
Brasil ratificou a Convenção Interamericana contra a Fabricação e o Tráfico Ilícito
de Armas de Fogo, Munição, Explosivos e Outros Materiais Relacionados, bem
como a Convenção das Nações Unidas Contra o Crime Organizado Transnacional
(Convenção de Palermo) e dois de seus três Protocolos.
92
Pode-se afirmar, conforme o exposto, que, tanto com relação à legislação
doméstica quanto à incorporação das normas internacionais para a prevenção
e repressão do terrorismo, o Brasil encontra-se em boa posição. Resta explorar
a questão do desempenho das organizações nacionais encarregadas de sua
implementação.
93
3.2.3. Preparo institucional
Em linhas muito gerais, passa-se a avaliar o preparo institucional brasileiro para
ação antiterrorista eficiente. Cabe ao Sistema Brasileiro de Inteligência (SISBIN,
criado pela Lei 9.883/99 e cujo órgão central é a Agência Brasileira de Inteligência
ABIN), com o intuito de prevenir ataques terroristas e obstruir seu financiamento,
desenvolver atividades de inteligência por meio de seus diversos órgãos, inclusive
em cooperação internacional. Na hipótese de suspeita de ataque terrorista, a ABIN
deve informar suas agências regionais, que acionam os órgãos competentes.
Também à Polícia Federal (PF) incumbe reprimir o terrorismo por diversos meios,
94
inclusive identificando células suspeitas em território nacional. Para proteger alvos
terroristas potenciais (como embaixadas e consulados), a PF opera em coordenação
com as Polícias Militares (PMs) dos Estados. A ABIN e a PF têm promovido seminários
sobre o terrorismo, particularmente no contexto latino-americano.
95
92
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 40-73; ONU, S/2002/796, Brazil -
Supplementary report submitted to the Security Council Counter-Terrorism Committee on
implementation of Security Council resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://
daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/504/59/PDF/N0250459.pdf?OpenElement
[14.07.2005], p.21.
93
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109.
94
As técnicas utilizadas para esse fim são: interceptação de comunicações, vigilância de alvos,
vigilância eletrônica, operações encobertas, utilização de informantes anônimos, controle de
entrada e saída de estrangeiros, execução de ordens judiciais, acesso a propriedade privada, e
intercâmbio de inteligência com outros órgãos de inteligência.
95
ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the Counter-Terrorism Committee on the implementation
of United Nations Security Council resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://
daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/203/76/IMG/N0220376.pdf?OpenElement
[14.07.2005], pp. 11-27; ONU, S/2002/796, Brazil - Supplementary report submitted to the
Security Council Counter-Terrorism Committee on implementation of Security Council resolution
CIRO LEAL M. DA CUNHA
54
No Brasil, um grande desafio é o estabelecimento de cooperação ampla
entre os órgãos que lidam com a temática do terrorismo – inclusive o Itamaraty,
que protagoniza as negociações no tema. Também é necessário definir claramente
as competências de cada um deles, buscando a complementaridade e o fim da
duplicação de esforços. Um óbice a essa cooperação é o sigilo que envolve
temas dessa natureza. Outra limitação a ser superada é o preenchimento das
lacunas na regulamentação de ações operacionais da ABIN. É positiva, portanto,
a ampla revisão por que passam as normas sobre segurança e inteligência.
96
Após o 11 de Setembro, as autoridades brasileiras adotaram e aperfeiçoaram
iniciativas de prevenção do terrorismo em âmbito nacional. Há ações mais rigorosas
nos aeroportos, na fiscalização de operações financeiras (ver 3.2.6) e na vigilância
de suspeitos. O Exército implantou a Brigada de Operações Especiais, preparada
para missões como o combate ao terrorismo.
97
Ressalta-se, ainda, a instituição de Grupo Técnico (GT) para elaborar uma
política nacional antiterrorista e propor a criação de uma autoridade nacional
para o assunto. Criado no âmbito da Câmara de Relações Exteriores e Defesa
Nacional (CREDEN), pela Portaria 16 de 10.05.2004 do Gabinete de Segurança
96
II encontro de estudos: terrorismo, Brasília, Gabinete de Segurança Institucional, Secretaria
de Acompanhamento e Estudos Institucionais, 2004, pp. 103-23; M. Cepik, Adequação e
preparo... cit., pp. 47-77; A.C. Vaz, Cooperação multilateral... cit., pp. 79-101; M.P. Buzanelli,
Introdução, in II encontro de estudos: terrorismo, Brasília, Gabinete de Segurança Institucional,
Secretaria de Acompanhamento e Estudos Institucionais, 2004, pp. 09-13; E. Diniz,
Considerações sobre a possibilidade de atentados terroristas no Brasil, in II encontro de
estudos: terrorismo, Brasília, Gabinete de Segurança Institucional, Secretaria de
Acompanhamento e Estudos Institucionais, 2004, 122-39; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao
terrorismo... cit., pp. 74-109; L.O.S. Bonfim, A política externa dos EUA e o combate ao
narcotráfico na Colômbia (1997-2002), Dissertação (Mestrado) – Instituto de Relações
Internacionais da UnB, Brasília, 2002, pp. 122-39. Passo importante na cooperação institucional
foi o acordo, em 29.10.2001, de que todas as informações recebidas sobre as iniciativas
hemisféricas antiterroristas seriam repassadas aos Ministérios da Defesa, Justiça e Fazenda
(COAF), ao GSI e à ABIN, com o intuito de permitir uma coordenação interministerial mais
fluida (Brasil, MRE, SERE para Delbrasupa, Despacho Telegráfico nº 473, 29.10.2001).
Conforme A.J.M. Souza e Silva, é provável que os EUA intensifiquem suas operações diretas
de inteligência na América Latina, pois não consideram as autoridades da região confiáveis como
fonte de informações sobre terrorismo; o aumento da capacidade das agências brasileiras
competentes, portanto, seria central para um relacionamento mais equilibrado e eficiente.
97
C. Lafer, A diplomacia brasileira... cit., p. 112; ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the
Counter-Terrorism Committee on the implementation of United Nations Security Council
resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/
N02/203/76/IMG/N0220376.pdf?OpenElement [14.07.2005], pp. 11-27; R.M. Silveira,
Segurança e defesa – a visão do exército brasileiro, in Brasil, Ministério da Defesa, Seminário
“Atualização do pensamento brasileiro em matéria de defesa e segurança”, disponível [on-line]
in https://www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/ciclodedebates/textos.htm [15.09.2004].
55
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
Institucional (GSI), o GT conta com representantes de vários órgãos: Casa Civil
da Presidência da República, Ministério da Justiça, Ministério da Defesa, Itamaraty,
GSI, e Comandos da Marinha, Exército e Aeronáutica. A iniciativa demonstra a
busca de avanços no preparo institucional do País para enfrentar o terrorismo.
98
Em síntese, o Brasil dispõe de meios adequados para o combate ao terrorismo,
levando em conta as limitações inerentes à condição de país em desenvolvimento
e o baixo grau de ameaça terrorista contra o País. Avanços institucionais fazem-
se necessários e são buscados.
3.2.4. Cooperação internacional
A cooperação internacional antiterrorista gira em torno de três aspectos principais:
(a) a geração e a disseminação de informações; (b) a aplicação de medidas de
controle e supervisão dos fluxos financeiros e de pessoas; e (c) a cooperação
judicial. Não obstante as limitações de recursos (materiais, humanos, financeiros
etc.)
99
, pode-se afirmar que o Brasil coopera satisfatoriamente para o combate ao
terrorismo. A contribuição tem-se dado, por exemplo, por meio da coordenação
com agências de segurança e inteligência em todo o mundo
100
, além da inibição do
uso transfronteiriço criminoso de sistemas bancários.
101
No âmbito bilateral, o Brasil negociou ou assinou acordos de cooperação
em matéria criminal com cerca de 25 países.
102
Regionalmente, há tratados
98
Brasil, MRE, Circular Telegráfica nº 50782, 14.05.2004. No mesmo sentido vai o texto da
PDN: “6.18. Com base na Constituição Federal e nos atos internacionais ratificados, que
repudiam e condenam o terrorismo, é imprescindível que o País disponha de estrutura ágil,
capaz de prevenir ações terroristas e de conduzir operações de contraterrorismo.”
99
Interessante é a ponderação brasileira acerca do convite russo para participar num Grupo de
Ação Antiterrorista a ser formado no âmbito do G8. Entendeu-se conveniente que uma eventual
participação “não se daria na qualidade de país doador, dadas as contingências orçamentárias”
(Brasil, MRE, COCIT, Despacho ao Memorandum SGAP/14 de 17.06.2003, 23.06.2003).
100
A ABIN mantém cooperação e intercâmbio de informação com suas contrapartes no Mercosul,
nos EUA e em outros países. A PF também mantém acordos de cooperação com órgãos similares
em outros países e com a Interpol (ONU, S/2002/796, Brazil - Supplementary report submitted
to the Security Council Counter-Terrorism Committee on implementation of Security Council
resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/
N02/504/59/PDF/N0250459.pdf?OpenElement [14.07.2005], p.11).
101
A.C. Vaz, Cooperação multilateral... cit., pp. 79-101; R.A. Barbosa, Os Estados Unidos...
cit., pp. 86-87.
102
A cooperação bilateral pode ser exemplificada na prisão, pela Interpol com mandado expedido
pelo STF (Rio de Janeiro, 22.06.2005), de suposto terrorista italiano, Pietro Mancini, condenado
a mais de 35 anos de reclusão pela Justiça italiana. (Folha Online, 22.06.2005 – 18h50, Interpol
prende suposto terrorista italiano no Rio, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/
folha/cotidiano/ult95u110336.shtml [24.06.2005]).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
56
de extradição com os membros plenos e associados do Mercosul para facilitar
a repatriação de fugitivos da justiça.
103
Com os EUA, o Brasil tem sido “muito cooperativo”, na avaliação do
subsecretário de Segurança Interna, Asa Hutchinson. Com esse país, o Brasil
coopera, por exemplo, ao informar sobre passageiros – em procedimento que
estabelece reciprocidade, acordado em 2004. Após o 11 de Setembro, a
inteligência brasileira conduziu pesquisa e cruzamento de informações com
relação à lista, produzida pelos EUA, de mais de 340 suspeitos de terrorismo.
104
Regionalmente, até mesmo o Sistema de Vigilância da Amazônia
(SIVAM), como ressalta E.P. Wittkoff, pode ser considerado um avanço na
prevenção e na repressão do terrorismo, entre outros delitos, o que beneficiará
o Brasil e o mundo. Recentemente, o Itamaraty e o Ministério da Defesa têm
explorado a possibilidade de compartilhar dados do SIVAM com os demais
países amazônicos.
105
O Mercosul tem sido particularmente instrumental em questões de
segurança. Da perspectiva brasileira, constitui importante fonte de
compromissos e iniciativas antiterroristas de caráter pragmático e cooperativo.
103
ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the Counter-Terrorism Committee on the implementation
of United Nations Security Council resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://
daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/203/76/IMG/N0220376.pdf?OpenElement
[14.07.2005], pp. 11-27. Muitos desses tratados de extradição não especificam crimes –
especialmente os antigos, que falam em pena mínima. Aqueles que listam delitos, geralmente,
não incluem o terrorismo. Convenções multilaterais, contudo, podem ser usadas para a concessão
de extradição por terrorismo. O artigo 5 (c) do Acordo sobre Extradição do Mercosul determina
que terroristas devem ser extraditados. Em seu texto, exemplificam-se certas condutas de natureza
terrorista (ONU, S/2002/796, Brazil - Supplementary report submitted to the Security Council
Counter-Terrorism Committee on implementation of Security Council resolution 1373 (2001),
disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/504/59/PDF/
N0250459.pdf?OpenElement [14.07.2005], p.17).
104
ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the Counter-Terrorism Committee on the implementation
of United Nations Security Council resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://
daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/203/76/IMG/N0220376.pdf?OpenElement
[14.07.2005], pp. 11-27; Folha de S. Paulo, 26.02.2005, Brasil fornece dados de passageiros
aos EUA, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2602200512.htm
[26.02.2005]. Na reportagem, vê-se um exemplo das tendências que tentamos destacar (5.5 e
3.2.7): segundo o ministro Marcos Vinícius Pinta Gama, coordenador-geral da Coordenação-
Geral de Combate aos Ilícitos Transnacionais (COCIT), do Itamaraty, as negociações abordaram
três questões fundamentais pelo Brasil: a reciprocidade, o respeito ao direito internacional e o
veto à discriminação de grupos específicos.
105
Brasil, MRE, SERE para Brasemb Bogotá, Despacho Telegráfico nº 576, 22.07.2003; Wittkoff,
E. Peter, Brazil’s SIVAM: surveillance against crime and terrorism, in International Journal of
Intelligence and Counterintelligence 16/4 (2003), pp. 544, 550-51. Com o SIVAM, aponta E.P.
Wittkoff, Brasil e EUA poderão compartilhar dados de inteligência.
57
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
Nesse foro, não se instituiu marco jurídico conceitual para o terrorismo, pois
regras dessa natureza inscrevem-se em instrumentos multilaterais (universais
ou interamericanos). O marco normativo orientador dos esforços antiterroristas
mercosulinos é formado pelo Protocolo de Assistência Judiciária Mútua em
Assuntos Penais, de 1996, pelo Acordo sobre Extradição, de 1998, e pelo
Protocolo sobre Coordenação e Cooperação Recíprocas para a Segurança
Regional, de 1999.
106
É evidente a cooperação antiterrorista entre os países da Tríplice
Fronteira. Já em 1991, a preocupação com a segurança da região ensejou a
realização a Primeira Reunião de Ministros da Justiça do Mercosul. Em reunião
de 1995, os chanceleres de Argentina, Brasil e Paraguai manifestaram
preocupação com as atividades ilegais na região. Na ocasião, determinou-se
a realização de encontro entre as autoridades competentes para a elaboração
de um conjunto de medidas de segurança fronteiriça. Em 1996, acordou-se
a criação de base de dados comum entre os três países, com o fito de melhor
controlar e identificar o fluxo de pessoas e veículos.
No mesmo ano, após alguns encontros com resultados menos
expressivos, os três países firmaram o Acordo Operativo sobre a Zona da
Fronteira Tríplice, tendo instalado o Comando Tripartite, para promover,
em níveis sem precedentes, a cooperação em segurança e o intercâmbio de
informações, bem como coordenar ações policiais, migratórias e fazendárias,
com ênfase nos ilícitos da Tríplice Fronteira
107
. Ainda em novembro de
1996, ocorreu, por iniciativa argentina, a primeira Reunião dos Ministros
do Interior e da Justiça dos países do Mercosul. Em 1997, houve a Primeira
Reunião dos Ministros do Interior do Mercosul (Ministro da Justiça, no
caso brasileiro), que, já em sua 17ª edição, vem tratando do terrorismo,
entre outros temas.
106
L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 118-21; A.M. Cardoso, Terrorismo e
segurança... cit., p. 52.
107
Segundo C.V. Corach e M. Baizán, isso contribuiu decisivamente para a criação e fortalecimento
do “Mercosul da Segurança”, que, muitas vezes, se mostraria mais consistente, eficiente e
estável que o Mercosul político, econômico e comercial. Já em 1999, os êxitos seriam visíveis:
afastara-se a possibilidade do “terceiro atentado” à Argentina e atividades suspeitas eram
acompanhadas. C.V. Corach e M. Baizán avaliam, assim, que se logrou compromisso político
antiterrorista entre os governos do Mercosul, expresso em vários mecanismos efetivos de
cooperação. O saldo dos esforços teria sido positivo: “en pocos meses los terroristas comenzaron
a percibir que habían cambiado radicalmente las condiciones en que desarrollaban sus
actividades porque ya existía una voluntad clara y consistente, decidida a impedir sus
actividades”.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
58
Inicia-se, em 1998, uma cooperação mais abrangente, eficaz e institucional,
com a aprovação, no foro dos Ministros do Interior do Mercosul, do Plano
Geral de Segurança para a Tríplice Fronteira e do Plano de Cooperação e
Assistência Recíproca para a Segurança Regional no Mercosul.
108
Este último
foi substituído, já em 1999, pelo Plano Geral de Cooperação e Coordenação
Recíprocas para a Segurança Regional, mais abrangente, pois aplicável a
todas as fronteiras do Mercosul e envolvendo, também, Chile e Bolívia.
109
Preveem-se reuniões periódicas da Comissão Técnica do foro dos Ministros
do Interior para analisar as medidas adotadas pelas partes.
A despeito de todas essas manifestações de cooperação em segurança,
até o 11 de Setembro, o enfrentamento do terrorismo era objetivo secundário,
nem sempre explicitado nos instrumentos e planos referidos – que privilegiavam
os ilícitos transnacionais mais correntes no Mercosul. Após os atentados, a
cooperação antiterrorista mercosulina passou a ser contemplada mais
explicitamente. Já em 28 de setembro de 2001, os Ministros do Interior do
Mercosul reuniram-se, extraordinariamente, em Montevidéu, para avaliarem
a situação na região e discutirem medidas a serem tomadas.
Nesse dia, com a “Declaração dos Ministros do Interior do Mercosul
sobre Terrorismo”, repudiaram os atentados e comprometeram-se a
“empreender a mais ampla cooperação, entre si e com outros países, para
conseguir informações, estudos e ações contra atividades terroristas”. Para
tanto, instituiu-se o Grupo de Trabalho Especializado sobre Terrorismo (GTE),
reunido três vezes por semestre, cujo escopo precípuo é implementar as
ações operativas e de coordenação previstas no capítulo sobre terrorismo
do Plano Geral referido. Dos esforços do Grupo, pode-se ressaltar o Acordo
108
Como aponta A.C. Vaz, essas duas iniciativas configuravam respostas ao aumento do
narcotráfico e às pressões estadunidenses por maior “pró-atividade” do Brasil em seu
enfrentamento. Ambos os planos contemplam a cooperação entre as forças de segurança, as
forças policiais, as autoridades aduaneiras e os órgãos de inteligência, com vistas ao intercâmbio
de informações, ao desenvolvimento de operações conjuntas e ao monitoramento do movimento
de pessoas e bens através das fronteiras.
109
O Plano Geral, que, segundo A.C. Vaz, vem sofrendo adequações periódicas desde sua
criação e objetiva a otimização dos níveis de segurança no bloco, a promoção da assistência
recíproca entre forças de segurança e policiais, a coordenação de ações operativas e a
implementação de um sistema conjunto de informações e comunicações, denominado Sistema
de Intercâmbio de Informações de Segurança do Mercosul. Em consonância com esses objetivos,
em 2000, criou-se o Centro de Coordenação e Capacitação Policial do Mercosul, Bolívia e
Chile, e teve início o Programa de Ação do Mercosul de Combate aos Ilícitos no Comércio
Internacional.
59
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
de Cooperação em Operações Combinadas de Inteligência Policial sobre
Terrorismo e Delitos Conexos entre os Estados Partes do Mercosul, firmado
em 2002. Pretende-se também, no GTE, examinar as diferentes manifestações
do terrorismo em outras regiões para, confrontando experiências alheias,
incrementar a própria capacidade de prevenção.
110
No âmbito da OEA, já em 1971, elaborou-se a Convenção para
Prevenir e Punir os Atos de Terrorismo configurados em delitos contra
as pessoas e a extorsão conexa, quando tiverem eles transcendência
internacional. No entanto, a temática terrorista voltaria a receber maior
atenção somente na década de 1990, com os atentados na Argentina.
Em 1996, realizou-se a Primeira Conferência Especializada
Interamericana sobre Terrorismo, em que se aprovou o Plano de Ação
sobre Cooperação Hemisférica para Prevenir, Combater e Eliminar o
Terrorismo, que insta os países a criminalizar o terrorismo e cooperar
em seu combate. Em 1998, ocorreu a II Conferência Especializada,
quando firmou-se o Compromisso de Mar del Plata, que estabelece a
moldura institucional para o tema – o Comitê Interamericano Contra o
Terrorismo (CICTE), órgão responsável por conectar os elementos de
segurança dos países participantes, como o compartilhamento de
inteligência e respostas conjuntas a atentados.
Com o 11 de Setembro, intensifica-se a preocupação antiterrorista na
OEA. A 23ª Reunião de Consulta de Ministros das Relações Exteriores, em
21 de setembro, adotou a Resolução Fortalecimento da Cooperação
110
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; A.C. Vaz, Cooperação
multilateral... cit., pp. 79-101; C.V. Corach e M. Baizán, La respuesta argentina frente al
terrorismo, Buenos Aires, FUPOMI, 2002, pp. 29-32, 39, 133-73; C. Lafer, A diplomacia
brasileira... cit., p. 113; Brasil, Ministério da Justiça, Relatório de Atividades – Reunião de
Ministros da Justiça e do Interior do Mercosul – Presidência Pro Tempore do Paraguai –
Segundo Semestre de 2005, disponível [on-line] in http://www.mj.gov.br/mercosul/documentos/
Relatório%20de%20Atividades%20-%20RMJ%20e%20RMI%20-%20Paraguai%202005.pdf
[14.07.2005]; Brasil, MRE, SERE (COCIT) para Brasemb Assunção, Fax nº 138, 14.12.2001;
Brasil, Ministério da Justiça, XII Reunião de Ministros do Interior do Mercosul – Acordo Nº
23/
02 - de Cooperação em Operações Combinadas de Inteligência Policial sobre Terrorismo e
Delitos Conexos entre os Estados Partes do Mercosul, disponível [on-line] in http://
www.justica.gov.br/noticias/2002/novembro/Opera%C3%A7%C3%B5es%20Combinadas%20-
%20MERCOSUL%20-%20PORTUGU%C3%8AS.pdf [21.07.2005]; Brasil, MRE, COCIT,
Despacho ao Memorandum SPD/01/POIN de 16.01.2003, 21.01.2003. Conforme A.J.M. Souza
e Silva, além de todas essas manifestações de cooperação antiterrorista, há o mecanismo informal
entre a Subsecretária de Inteligência da Casa Militar da Presidência da República e suas congêneres.
Essa interação foi intensificada após os atentados em Buenos Aires.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
60
Hemisférica para Prevenir, Combater e Eliminar o Terrorismo. O CICTE,
em hibernação sob o comando dos EUA, foi revitalizado após os atentados.
Foi rechaçada, contudo, a proposta argentina de transformação do Comitê
em estrutura permanente, pois, conforme posição apoiada pelo Brasil, melhor
seria concentrar-se no estreitamento da cooperação entre órgãos nacionais;
a proposta deveria ser reavaliada quando houvesse maior clareza do escopo
das tarefas do CICTE. Foram criados, nesse contexto, os grupos de controle
financeiro, controle de fronteiras e de plano de trabalho; o foro tem-se
concentrado na adoção de medidas práticas, sobretudo em vista da fragilidade
institucional de vários países. Seu feito mais significativo foi a construção do
consenso para a Convenção Interamericana Contra o Terrorismo, de 2002,
que não define terrorismo, pretendendo-se instrumento de cooperação,
sobretudo nos âmbitos judiciário e financeiro. O Brasil tem cooperado com
os esforços da OEA, sobretudo no âmbito do CICTE.
111
3.2.5. Armas de destruição maciça (ADMs)
Existe uma importante área de intersecção entre, de um lado, os esforços
internacionais de não proliferação e desarmamento e, de outro, o regime
internacional antiterrorista. Tal área é formada pelo esforço da comunidade
internacional em evitar que armas de destruição maciça (ADMs – nucleares,
químicas ou biológicas) sejam adquiridas por terroristas. Já em 1977, P.
Wilkinson alertava para o perigo. Na literatura especializada, demonstra-se
grande preocupação com a probabilidade de os arsenais ex-soviéticos de
ADMs servirem de fonte para terroristas.
112
Os receios adquiriram realidade
em 1995, quando membros da seita Aum Shrinkyio atacaram o metrô de
111
J. Pérez Montero, La lucha… cit., p. 205; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo...
cit., pp. 40-73; C.V. Corach e M. Baizán, La respuesta argentina… cit., p. 47; A.C. Vaz,
Cooperação multilateral... cit., pp. 79-101; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp.
118-21; F. Rojas Aravena, A construção de regimes cooperativos de segurança – a América
Latina diante do terrorismo, in C. Brigagão e D. Proença Jr. (orgs.), Paz e terrorismo – textos do
seminário “Desafios para a política de segurança internacional: missões de paz da ONU,
Europa e Américas”, São Paulo, Hucitec, 2004, p. 274; OEA, Compromiso de Mar del Plata,
disponível [on-line] in http://www.oas.org/main/main.asp?sLang=E&sLink=../../documents/eng/
publications.asp [28.06.2005]; Brasil, MRE, COCIT, Despacho ao Memorandum SGAP/14
de 17.06.2003, 23.06.2003; Brasil, MRE, SERE para Delbrasupa, Despacho Telegráfico nº
506, 14.11.2001; Brasil, MRE, SERE para Delbrasupa, Despacho Telegráfico nº 08, 14.01.2002.
112
Cf. A.M. Cardoso, Terrorismo e segurança... cit., p. 49; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao
terrorismo... cit., pp. 02-39; A. Schaper, Terrorisme nucléaire: analyse des risques depuis le 11
semptembre 2001, in Forum du Désarmement 2 (2003), p. 14.
61
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
Tóquio com gás sarin. O 11 de Setembro reforçou os temores, reavivados,
logo depois, pelas cartas com antraz. A gravidade dessas ameaças leva J.S.
Nye Jr. a julgar o uso terrorista de ADMs uma verdadeira “privatização da
guerra”, que vulneraria qualquer sociedade, podendo matar aos milhões. Não
se poderia mais ver o terrorismo como “business as usual”.
113
Há que se perguntar da probabilidade dessa prática devastadora. A.
Schaper considera possível que terroristas venham a utilizar armas nucleares
ou, com menor dificuldade técnica, realizar explosões tradicionais para dispersar
matéria radioativa (“bomba suja), mas não é sabido se há grupos trabalhando
nesse sentido. Autonomamente, seria improvável disporem dos meios financeiros,
do tempo e da estrutura física necessários. Mais factível seria sua associação
com um Estado ou o desvio das armas ou materiais de Estados. Li Bin e Liu
Zhiwei também consideram praticamente impossível a produção autônoma de
armas nucleares. Contudo, dado o risco de desvio de materiais físseis e outros
insumos, ressaltam a necessidade de rigoroso controle dos armamentos e
materiais nucleares para evitar ataques terroristas nucleares ou radiológicos.
114
J.D. Merchet minimiza a caracterização das armas biológicas e químicas
como ADMs, pois não seriam mais eficazes que ataques tradicionais, além
de implicarem dificuldades técnicas consideráveis em sua utilização e controle.
Ressalta, ainda, a impossibilidade de desenvolvimento autônomo de armas
nucleares por entes não estatais. Como ressalta E. Diniz, os armamentos
mais utilizados por terroristas são leves, de fácil aquisição, armazenamento e
de distribuição simples. Cerca de 95% dos atentados utiliza seis táticas:
atentados à bomba, assassinatos, ataques armados, sequestros de pessoas,
barricadas e tomadas de reféns, e sequestros de aviões ou de outros tipos de
transporte coletivo.
115
W. Laqueur afirma que a maioria dos grupos terroristas não fará,
provavelmente, uso de ADMs, em grande parte devido às dificuldades técnicas
113
J. Almino, Inserção internacional... cit., pp. 57-61; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação...
cit., pp. 151-69; A.M. Cardoso, Terrorismo e segurança... cit., p. 49; J.S. Nye Jr., A North
American perspective cit., pp. 05-14; P. Wilkinson, Terrorism and the liberal... cit., p. 203.
114
A. Schaper, Terrorisme nucléaire... cit., pp. 09-10, 13-15 ; Li Bin e Liu Zhiwei, L’interêt de
la maîtrise des armements pour lutter contre le terrorisme nucléaire, in Forum du Désarmement
2 (2003), pp. 19-20.
115
J.D. Merchet, La vérité sur les armes de destruction massive, in Politique Internationale 103
(2004), pp. 190-95; E. Diniz, Compreendendo o fenômeno do terrorismo, in C. Brigagão e D.
Proença Jr. (orgs.), Paz e terrorismo – textos do seminário “Desafios para a política de segurança
internacional: missões de paz da ONU, Europa e Américas”, São Paulo, Hucitec, 2004, p. 216;
L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 71-103.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
62
consideráveis e da má publicidade que ataques dessa natureza gerariam. O
autor considera de maior probabilidade os atentados químicos, seguidos pelos
nucleares e, por fim, os biológicos. Mesmo assim, avalia o perigo como enorme,
pois um único ataque poderia ser devastador. Soma-se a isso o tom apocalíptico
adotado pelo fanatismo recentemente. Como afirma R. Gunaratna, um dos
volumes da enciclopédia da al-Qaeda (de cerca de 7 mil páginas), fornecido
somente a membros selecionados, trata de guerra química e biológica. Contudo,
o grupo jamais buscou metas apocalípticas (destruição pura e simples em massa).
São muito pragmáticos, com metas políticas claras.
116
Na comunidade internacional, a preocupação com a possibilidade de
aquisição de ADMs por terroristas é clara. Já em 1980, no âmbito da Agência
Internacional de Energia Atômica (AIEA), elaborou-se a Convenção sobre a
Proteção Física de Materiais Nucleares, que apontava, preambularmente,
para os “potential dangers posed by the unlawful taking and use of nuclear
material”. O tratado é considerado antiterrorista pelas Nações Unidas.
117
A
resolução 1373 (2001) do CSNU convoca todos os Estados a acelerar e
intensificar o intercâmbio de informações operacionais relacionadas às
ameaças representadas pela posse de ADMs por terroristas. Do mesmo
órgão, a resolução 1540 (2004) estipula, sob o Capítulo VII da Carta das
Nações Unidas, deveres estatais de prevenção da aquisição de ADMs por
terroristas, além de criar um Comitê no CSNU para implementar o próprio
documento, devendo os Estados enviar relatórios sobre as medidas adotadas.
Ainda, desde a 57ª AGNU, vêm-se aprovando, anualmente, resoluções
chamadas Measures to prevent terrorists from acquiring weapons of mass
destruction (resoluções 57/83, 58/48 e 59/80), que apontam para aqueles
riscos e convocam os Estados, em linhas gerais, a agirem e cooperarem no
sentido da prevenção. Não se pode olvidar o grande interesse dos EUA pelo
assunto
118
, tido como importante aspecto de sua segurança (4.1.1).
116
W. Laqueur, The new terrorism… cit., pp. 04-05; Postmodern terrorism, in Foreign Affairs
5 (1996), passim; R. Gunaratna, Inside Al Qaeda – global network of terror, New York,
Columbia University, 2002, pp. 54-94. Ver também J.B. Tucker, Terrorismo químico-biológico:
enfrentándose a una nueva amenaza, in Revista Occidental 2 (1997).
117
ONU, United Nations treaty collection – conventions on terrorism, disponível [on-line] in
http://untreaty.un.org/English/Terrorism.asp [16.05.2005].
118
Os EUA patrocinam, na AIEA, sobretudo a partir de 1999, iniciativas voltadas para o
aprimoramento da proteção física de materiais e instalações nucleares. Mais recentemente, os
EUA passaram a advogar o aperfeiçoamento das diretrizes do Nuclear Suppliers Group (NSG)
e do Missile Technology Controls Regime (MTCR) para regulamentar a exportação de bens
relacionados a armas de destruição maciça e seus vetores. Depois do 11 de Setembro, esse
63
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
O Brasil apresenta credenciais impecáveis no que tange à não
proliferação e às medidas internas de controle de materiais possivelmente
utilizáveis pelo terrorismo de destruição maciça. A Constituição Federal
proíbe a utilização da energia nuclear para fins não pacíficos (art. 21, XXIII,
alínea a). O País vincula-se plenamente ao Tratado de Não Proliferação
Nuclear (TNP), ao Tratado de Proscrição das Armas Nucleares na América
Latina e Caribe (Tratado de Tlatelolco), ao Comprehensive Test Ban Treaty
(CTBT, que proíbe todos os testes com explosões nucleares), e dispõe da
Agência Brasileiro-Argentina de Contabilidade e Controle de Materiais
Nucleares (ABACC, modelo de cooperação em inspeções mútuas). Em
conformidade com a AIEA, o País sempre manteve suas instalações
nucleares em elevado nível de proteção, sendo parte da Convenção sobre
a Proteção Física de Materiais Nucleares. O Brasil participa, além disso,
do Nuclear Suppliers Group (NSG, que regula a exportação de material
nuclear com vistas à não proliferação).
Fora do âmbito nuclear, o Brasil é membro da Convenção sobre a Proibição
de Armas Químicas (CPAQ) e da Convenção sobre a Proibição de Armas
Biológicas (CPAB). Faz parte do Missile Technology Control Regime (MTCR,
regime informal que busca controlar a tecnologia balística, tendo em vista seu
uso dual). Em todos os casos, o Brasil participa de forma ativa no sentido de
fortalecer a cooperação no desarmamento e na não proliferação.
119
Internamente, os instrumentos de não proliferação e controle de materiais
parecem adequados. A Lei 9.112/95 dispõe sobre o controle da exportação de
bens sensíveis (de aplicação bélica, de uso duplo e de uso nas áreas nuclear,
empenho viu-se referendado (Brasil, MRE, SERE para Brasemb Viena, Despacho Telegráfico
nº 232, 24.05.2002). Conforme G. Dupas, é curioso que o caminho mais provável de aquisição
de ADMs por terroristas se dê em países não inimigos dos EUA, como Rússia; em laboratórios
ocidentais, como no caso do antraz; ou mesmo em países amigos, como Paquistão (Fundamentos,
contradições... cit., pp. 06-07).
119
Brasil, MRE, SERE (COCIT) para Brasemb Assunção, Fax nº 138, 14.12.2001; Intervenção
do Embaixador Ronaldo Mota Sardenberg, Representante Permanente do Brasil na ONU,
WMDs and Non-State Actors”, em Nova York (20.04.2004), disponível [on-line] in http://
www.un.int/brazil/speech/004d-rms-csnu-WMDs%20AND%20NON-STATE%20ACTORS-
2004.htm [26.06.2005]; ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the Counter-Terrorism Committee
on the implementation of United Nations Security Council resolution 1373 (2001), disponível
[on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/203/76/IMG/N0220376.pdf?
OpenElement [14.07.2005], pp. 11-27; ONU, S/2002/796, Brazil - Supplementary report
submitted to the Security Council Counter-Terrorism Committee on implementation of Security
Council resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/
GEN/N02/504/59/PDF/N0250459.pdf?OpenElement [14.07.2005], p.21.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
64
química e biológica) e serviços vinculados; cria, também, a Comissão
Interministerial de Controle de Exportações de Bens Sensíveis, responsável por
implementar as normas e regular a matéria. A Lei 8.974/95, por sua vez, institui a
Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) e regula técnicas de
engenharia genética e de liberação de organismos geneticamente modificados,
inclusive aqueles passíveis de emprego terrorista. Quanto às armas químicas, há
regulação infralegal, sempre renovada, segundo a qual cabe ao Exército licenciar
e monitorar atividades com uso dos materiais controlados, inclusive aqueles listados
na CPAQ. Recentemente, o Exército Brasileiro criou o Sistema de Defesa Química
Biológica e Nuclear (SDQBNEx), que objetiva capacitar a força terrestre para
ambientes operacionais onde ocorra ameaça ou presença de ADMs, inclusive
em casos de terrorismo. Frisa-se, por fim, que, após o 11 de Setembro, a
Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) adotou medidas para reforçar
a segurança das instalações nucleares brasileiras – procedimentos mais rígidos de
controle de acesso de pessoal às instalações e incremento no número de guardas.
120
Internacionalmente, o Brasil está de acordo com a avaliação de que a
possibilidade de aquisição de ADMs por terroristas constitui ameaça proeminente
à segurança internacional. Entende que isso fortalece a necessidade de ações de
não proliferação, mas aponta, também, que, são necessários avanços vigorosos no
sentido do desarmamento (o que não parece vir ocorrendo). Afinal, a existência de
arsenais nucleares aumenta a possibilidade de obtenção ilícita, por indivíduos e
demais atores não governamentais, de materiais dessa natureza. Tal perigo somente
pode ser vencido por meio da eliminação completa dos arsenais. Isso reflete a já
tradicional posição brasileira a favor do desarmamento. Ao contrário, os atores-
chave do cenário internacional concentram esforços em agenda seletiva, que somente
enfatiza a não proliferação e marginaliza as discussões sobre desarmamento. A
ameaça de aquisição de ADMs por terroristas perfaz parte importante dos
argumentos dessa posição.
121
120
ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the Counter-Terrorism Committee on the implementation
of United Nations Security Council resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://
daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/203/76/IMG/N0220376.pdf?OpenElement
[14.07.2005], pp. 11-27; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109;
R.M. Silveira, Segurança e defesa... cit.
121
ONU, S/2002/796, Brazil - Supplementary report submitted to the Security Council Counter-
Terrorism Committee on implementation of Security Council resolution 1373 (2001), disponível
[on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/504/59/PDF/
N0250459.pdf?OpenElement [14.07.2005], p.21; Intervenção do Embaixador Ronaldo Mota
Sardenberg, Representante Permanente do Brasil na ONU, na 56ª AGNU – “General Debate of
the First Committee”, em Nova York (06.10.2003), disponível [on-line] in http://www.un.int/
65
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
A elaboração de convenção contra o terrorismo nuclear – iniciativa russa
– esteve na pauta do Comitê Ad Hoc estabelecido pela resolução 51/210 da
AGNU desde o início. Houve dura controvérsia entre o grupo ocidental e o
Movimento Não Alinhado (MNA). Aqueles, sobretudo as potências nucleares,
não queriam que membros de forças armadas de Estados fossem passíveis
de punição por atos de terrorismo nuclear (afinal, desejam preservar a
liberdade em suas políticas de defesa nuclear); afirmavam que somente entes
não estatais podem perpetrar atos de terrorismo. Caberia somente ao CSNU
sancionar a ação de Estados e de seus agentes acusados de ameaçar a paz e
a segurança internacionais (o que resguardaria os interesses dos cinco membros
permanentes do CSNU, todos potências nucleares). Por sua vez, o MNA
não admitia a possibilidade de agentes estatais não serem passíveis desse
crime, já que os Estados são os detentores, por excelência, das armas
nucleares.
122
O Brasil, dada a gravidade do risco de terrorismo nuclear, apoiava a
conclusão dessa convenção.
123
À luz de sua posição de princípio de que a
utilização – por Estado ou ente não estatal – de armas nucleares é ilegítima, o
Brasil corroborava a visão do MNA: os exércitos não deveriam ser excluídos
do tratado.
124
Finalmente, em 13 de abril de 2005, aprovou-se, no âmbito da AGNU
(resolução 59/290), com base em relatório do referido Comitê Ad Hoc, a
brazil/speech/003d-rms-GA-%20gb1co-0610.htm [26.06.2005]; Discurso do Ministro da Defesa
José Alencar na VI Conferência de Ministros de Defesa das Américas, em Quito (17.11.2004),
disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/discursos/2004/11-
04/discurso_vi_confe_ministros_americas.htm [22.06.2005]; L.G. Nascentes da Silva, A
estruturação... cit., pp. 151-69.
122
Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 213, 08.02.2000; Brasil, MRE, SERE
para Brasemb Viena, Despacho Telegráfico nº 232, 24.05.2002; L.G. Nascentes da Silva, A
estruturação... cit., pp. 71-103.
123
A delegação brasileira na ONU, falando em nome próprio e de vários países latino-americanos
(Argentina, Bolívia, Colômbia, Costa Rica, Chile, Equador, El Salvador, Guatemala, Guiana,
Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, República Dominicana e Uruguai),
afirmou: “Nos preocupa la ausencia de voluntad política para alcanzar un progreso sustantivo
con miras a finalizar tanto un convenio general sobre el terrorismo internacional, como otro para
la prevención de los actos de terrorismo nuclear. La sola posibilidad de que terroristas puedan
acceder a armas nucleares constituye, sin duda, uno de los peligros más serios para todas las
naciones. Consideramos que este riesgo es tan grave que no debemos dejar pasar la oportunidad
de llegar, lo antes posible, a un acuerdo sobre el tema.”(Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE,
Telegrama nº 667, 31.03.2005).
124
Brasil, MRE, SERE para Brasemb Viena, Despacho Telegráfico nº 232, 24.05.2002; Brasil,
MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 667, 31.03.2005
CIRO LEAL M. DA CUNHA
66
Convenção Internacional para Supressão de Atos de Terrorismo Nuclear, que
será aberta a ratificações a partir de 14 de setembro de 2005 (art. 24). As
atividades de forças armadas durante a guerra não são reguladas pela Convenção,
mas pelo direito humanitário (art. 4.2); a Convenção exclui qualquer interpretação
tendente a relacioná-la à questão da legalidade do uso ou ameaça de uso de
armas nucleares por Estados (art. 4.4). Como se pode notar, venceu a tese
ocidental (apesar da afirmação egípcia de que a Convenção não implica a
isenção de Estados da responsabilização por terrorismo nuclear). Resta saber
qual será o grau de adesão a esse tratado, considerando o fato de que a resolução
59/290 foi aprovada por consenso. O Brasil acolheu o instrumento com
satisfação e considera sua ratificação assim que possível.
125
Em síntese, a comunidade internacional demonstra grande
preocupação com a possibilidade de aquisição de ADMs por terroristas,
e requer ação e cooperação para se prevenir essa ameaça. O Brasil
tem credenciais excelentes na área de não proliferação e de controle de
materiais sensíveis, sendo, portanto, cumpridor exemplar do regime
internacional antiterrorista no que tange às ADMs. O País tem advogado,
conforme sua tradição diplomática e na contramão do discurso das
grandes potências, que o desarmamento é mais importante que a não
proliferação como forma de evitar o terrorismo maciço. Nesse diapasão,
apoiou a proposta vencida de que os exércitos nacionais deveriam ser
incluídos no âmbito de uma convenção contra o terrorismo nuclear.
3.2.6. Financiamento do terrorismo
Como qualquer outra organização, um grupo terrorista necessita
de recursos para seu funcionamento. É evidente, portanto, o interesse
da comunidade internacional em inviabilizar o financiamento dos
terroristas – especialmente porque atentados suicidas impedem a
utilização dos mecanismos tradicionais de repressão. Essa prática, ao
empregar inteligência financeira, não só permite a localização e a
apreensão de fundos de terroristas, mas também o possibilita em
relação a ativos destinados a outros crimes, criando a oportunidade
125
ONU, AGNU, A/59/PV.91, http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N05/306/10/PDF/
N0530610.pdf?OpenElement, pp. 06-16; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº
1139, 05.05.2005.
67
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
de identificar e localizar pessoas que, de outra forma, não deixariam
rastro.
126
Já em 1999, com a Convenção Internacional para a Supressão do
Financiamento do Terrorismo – que, grosso modo, objetiva punir quem financia
terroristas, independente da ocorrência de atentados, e cria mecanismos de
cooperação para tanto – percebia-se o engajamento da comunidade internacional
na estratégia financeira de antiterrorismo. Em decorrência do 11 de Setembro,
essa tendência foi fortalecida
127
, com novo estímulo à cooperação internacional e
à criação de ambiente jurídico-financeiro que coibissem não apenas o terrorismo
internacional, mas também outros delitos nem sempre imediatamente associados
a ele (como corrupção e lavagem de ativos). As então poucas ratificações da
Convenção passaram a multiplicar-se. Também é sintomática a grande ênfase
conferida, na resolução 1373 do CSNU, às obrigações gerais de adoção de
medidas contra o financiamento de terroristas (ver 2.2.2).
128
126
E. Diniz, Compreendendo o fenômeno... cit., pp. 216-17; L.G. Nascentes da Silva, A
estruturação... cit., pp. 71-103; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 149,
29.01.2002. Há vozes que contestam a eficiência do combate ao financiamento do terrorismo.
P.ex., V. Comras questiona as afirmações de que a al-Qaeda estaria retraída e financeiramente
enfraquecida. Haveria muitas deficiências no combate ao financiamento do terrorismo, que, não
obstante, deveria ser fortalecido (Following terrorists’ money, in The Washington Post,
04.06.2005, disponível [on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/noticiario/internacional/
selecao_detalhe.asp?ID_RESENHA=138899) [04.06.2005]. Conforme R. Gunaratna, as finanças
da al-Qaeda permanecem em funcionamento, apesar dos transtornos, sobretudo no sistema
bancário legal. Contudo, seu esquema de financiamento é altamente complexo, resistente e
flexível: envolve empresas, pessoas ricas, fraude de cartão de crédito, instituições de caridade,
e o sistema bancário informal hawala – que não sofre escrutínio das autoridades. Compara-se o
sistema de financiamento da al-Qaeda, p.ex., à Fundação Ford, à qual pesquisadores requerem
fundos para projetos, a maioria dos quais é descartada (Inside Al Qaeda... cit., pp. 54-94). S.
Halper e J. Clarke, por sua vez, criticam a visão neoconservadora que, ao contrário das evidências
(o 11 de Setembro, v.g., operação mais cara da al-Qaeda, foi financiado com menos de US$ 500
mil), enxerga no terrorismo um negócio necessariamente multibilionário (America alone... cit.,
pp. 09-39).
127
Os EUA, após os atentados, receberam cooperação internacional considerável para confiscar
ativos de terroristas. O presidente Bush emitiu uma lista expandida de organizações terroristas
e suspeitas de associação com o terrorismo e autorizou o Tesouro a impedir transações com
qualquer banco que se recusasse a congelar ativos desses terroristas. Aos demais países, pediu-
lhes confiscar os ativos de vários grupos e indivíduos supostamente terroristas. Muitos desses
grupos, como Hamas, Hezbollah etc., não têm ligações comprovadas com a al-Qaeda (P.L.
Griset e S. Mahan, Terrorism in perspective, Thousand Oaks, Sage, 2003, p. 281).
128
R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., pp. 77-79; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação...
cit., pp. 71-103; A. Pellet, Terrorismo e guerra... cit., pp. 180-181; A.G.N. Senna e R.C.
Albuquerque, As recomendações especiais da Força-Tarefa de Ação Financeira (FATF) para o
combate ao financiamento do terrorismo, in L.N.C. Brant (org.), Terrorismo e direito: os
impactos do terrorismo na comunidade internacional e no Brasil – perspectivas político-
CIRO LEAL M. DA CUNHA
68
Nesse contexto, apresenta-se com importante papel o Grupo de Ação
Financeira (GAFI).
129
Logo após os atentados, os ministros das finanças do G7
reuniram-se para discutir medidas de combate ao financiamento do terrorismo e
de bloqueio dos ativos de organizações terroristas. Solicitaram ao GAFI que
adotasse medidas específicas contra o financiamento do terrorismo, de modo
que isso reduzisse os ataques. Em outubro de 2001, o GAFI adotou oito
recomendações especiais contra o financiamento do terrorismo, que, em outubro
de 2004, se tornariam nove. O financiamento do terrorismo insere-se no universo
mais amplo da lavagem de dinheiro
130
, como expressam A.G.N. Senna e R.C.
Albuquerque. Assim, é em combinação com as 40 recomendações contra a
lavagem de dinheiro do GAFI que as recomendações especiais fornecem diretrizes
às instituições financeiras para que detectem e comuniquem atividades suspeitas
de financiarem o terrorismo às autoridades.
131
O GAFI busca assegurar a aplicação de suas recomendações por todos os
países, mesmo os não membros. Para tanto, monitora o progresso na implementação
das recomendações pelos países e dispõe de uma lista de países e territórios não
cooperativos.
132
O Brasil é um dos 31 membros do GAFI.
133
jurídicas, Rio de Janeiro, Forense, 2003, pp. 260-61; R.C. Albuquerque, A tipologia do crime
de financiamento do terrorismo na Convenção Internacional para a Supressão do Financiamento
do Terrorismo, “Patriot Act” e “Loi relative à la Sécurité Quotidienne”, in Revista do Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária 15 (2001), pp. 150-51.
129
Em inglês, FATF – Financial Action Task Force. É um grupo intergovernamental criado para
investigar fluxos ilícitos de dinheiro associados à lavagem de dinheiro, em 1989, pelos países
das Comunidades Europeias e do G7. É um organismo internacional independente, com
Secretariado na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
130
Em comunicado adotado por ocasião da reunião de Unidades de Inteligência Financeira
(UIFs), no âmbito do Mecanismo “3 + 1”, expressou-se que, muitas vezes, possibilita-se a
identificação de operações específicas de financiamento do terrorismo por meio da identificação
de tipologias de lavagem de dinheiro. Dessa forma, o combate ao financiamento do terrorismo
deve inserir-se no bojo mais amplo dos crimes financeiros (Brasil, MRE, Circular Telegráfica nº
46138, 24.05.2003).
131
A.G.N. Senna e R.C. Albuquerque, As recomendações especiais... cit., pp. 257-60; GAFI,
Nine recommendations on terrorist financing, disponível [on-line] in http://www.fatf-gafi.org/
document/9/0,2340,en_32250379_32236920_34032073_1_1_1_1,00.html [13.07.2005].
132
Atualmente, constam dessa lista Mianmar, Nauru e Nigéria (GAFI, NCCT Initiative, disponível
[on-line] in http://www.fatf-gafi.org/document/4/0,2340,en_32250379_32236992_33916420
_1_1_1_1,00.html [13.07.2005]). Conforme a posição brasileira, é de especial importância o
fortalecimento e o aperfeiçoamento das unidades de inteligência financeira nos países não
cooperativos e naqueles sob acompanhamento do GAFI (Brasil, MRE, SERE para Delbrasupa,
Despacho Telegráfico nº 507, 14.11.2001).
133
A.G.N. Senna e R.C. Albuquerque, As recomendações especiais... cit., p. 268; GAFI, Annual
Report 2004-2005, disponível [on-line] in http://www.fatf-gafi.org/dataoecd/41/25/34988062.pdf
[13.07.2005].
69
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
O País tem-se provado excelente cumpridor das recomendações do Grupo a
respeito de lavagem de dinheiro. Em 2001, a reunião plenária do GAFI considerou
o Brasil em total cumprimento dos critérios de avaliação derivados das 40
recomendações. Da mesma forma, em 2004, todos os ratings of compliance
mostram o Brasil compliant ou largely compliant.
134
Conforme visto acima, o combate ao financiamento do terrorismo é
intimamente ligado à repressão e à prevenção da lavagem de ativos e demais
crimes financeiros. Se o Brasil não tem interesse prioritário pelo primeiro (ver
5.1), estas são questões consideradas fundamentais para o País. O
recrudescimento da estratégia financeira do antiterrorismo – dado que, após
o 11 de Setembro, aumentou o interesse da comunidade internacional pela
coibição da lavagem do dinheiro
135
– é visto como oportunidade:
São medidas muito fortes que temos que tomar, crescentemente, quanto
à lavagem de dinheiro, contra o dinheiro do narcotráfico, contra o
dinheiro da corrupção, o contrabando de armas e, eventualmente,
contra os recursos que possam passar por esses mecanismos através
da lavagem de dinheiro para chegar até o terrorismo. É claro que
isso implica também (...) uma posição ativa (...) no sentido de que se
imponham controles maiores aos paraísos fiscais. É o momento (...),
na crise, de utilizar as oportunidades. É uma oportunidade para certas
revisões profundas da condescendência que há no sistema
internacional para o delito, porque esses paraísos fiscais são,
realmente, fontes que abrigam o delito.
136
134
ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the Counter-Terrorism Committee on the implementation
of United Nations Security Council resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://
daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/203/76/IMG/N0220376.pdf?OpenElement
[14.07.2005], pp. 04-11; GAFI, Federative Republic of Brazil – Mutual Evaluation Report on
Anti-Money Laundering and Combating the Financing of Terrorism – 28 June 2004, disponível
[on-line] in http://www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], pp. 76-78. Em fins de 2001, no
hemisfério, somente Argentina, Brasil, Canadá, EUA e México eram membros plenos do GAFI/
FATF. Dentre esses, somente o Brasil, conforme o relatório de autoavaliação de 2000-2001,
teria cumprido as 28 recomendações integralmente (os EUA, p.ex., somente teria satisfeito 17
recomendações). “Essa situação revela o empenho do País no combate interno e na cooperação
internacional contra a lavagem de dinheiro.” (Brasil, MRE, SERE para Delbrasupa, Despacho
Telegráfico nº 507, 14.11.2001).
135
Brasil, Ministério da Justiça, Entrevista – Madruga quer nova cultura de combate à lavagem
de dinheiro, disponível [on-line] in http://www.mj.gov.br/ [14.07.2005].
136
Discurso do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, na solenidade de formatura
dos alunos do Instituto Rio Branco e inauguração da galeria de fotos dos ex-Secretários-Gerais,
CIRO LEAL M. DA CUNHA
70
É de se notar que o presidente Bush, na 56ª AGNU, também tenha
conclamado a comunidade internacional à coibição dos paraísos fiscais como
meio de enfraquecer financeiramente o terrorismo.
137
No atual governo, elevou-se a prioridade conferida aos esforços contra
a lavagem de ativos, considerados eixo estratégico de desmonte do crime
organizado pelo Ministério da Justiça. A dimensão internacional é bastante
enfatizada: criou-se, nesse Ministério, o Departamento de Recuperação de
Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI); na Estratégia Nacional
de Combate à Lavagem de Dinheiro (ENCLA) de 2005, um dos cinco
objetivos é a “Atuação e Cooperação Internacional”; é expresso o interesse
em acelerar a ratificação de tratados que tenham reflexos no combate à lavagem
de dinheiro (Meta 34).
138
O Brasil dispõe de instrumentos suficientes contra lavagem de
dinheiro e para a cooperação nessa área, instrumentos esses que são
utilizados também contra o financiamento do terrorismo. A legislação
centra-se na Lei 9.613/98, que tipifica penalmente a “1avagem” ou
ocultação de bens, direitos e valores provenientes, entre outros, do crime
em Brasília (10.10.2001), disponível [on-line] in http://www.ifhc.org.br/palavra/textos/2001/
01_2_54.pdf [04.07.2005]. Para o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF),
nos últimos anos, os principais casos de lavagem de dinheiro descobertos envolvem organizações
criminosas que se aproveitaram das facilidades oferecidas por paraísos fiscais e centros off-
shore. Nas Américas, vários países e territórios nessas categorias – o Caribe, possivelmente,
concentra a maior quantidade de paraísos fiscais e centros off-shore do mundo. O Uruguai
também se encaixa na categoria de paraíso fiscal. Dessa forma, é entendido pelo COAF que a
cooperação hemisférica contra a lavagem de dinheiro deve evitar que esses países cessem de
colaborar na lavagem de dinheiro (Brasil, MRE, SERE para Delbrasupa, Despacho Telegráfico
nº 527, 26.11.2001).
137
Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 2759, 12.11.2001. No Brasil, a lavagem
de dinheiro está, primordialmente, associada a crimes domésticos (sobretudo contrabando,
corrupção, narcotráfico e crime organizado em geral). Normalmente, o dinheiro deixa o País para
centros off-shore e volta disfarçado de empréstimo ou investimento (Brasil, Ministério da
Fazenda, Conselho de Controle de Atividades Financeiras, Sumário Público do Relatório da
Segunda Avaliação Mútua da República Federativa do Brasil no âmbito do Grupo de Ação
Financeira contra a Lavagem de Dinheiro (GAFI/FATF) – Junho de 2004, disponível [on-line]
in http://www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], pp. 02-12). Nesse sentido, A. Procópio critica
os paraísos fiscais, que seriam utilizados pelos capitalistas mundiais e, como efeito colateral,
pelos terroristas. A indisposição por parte do mundo desenvolvido em acabar com essas práticas
(exemplificada na rejeição dos EUA ao acordo sobre lavagem de dinheiro proposto pela OCDE)
abasteceria o terrorismo (Terrorismo e relações internacionais cit., pp. 62-81).
138
Brasil, Ministério da Justiça, Estratégia Nacional de Combate à Lavagem de Dinheiro –
ENCLA 2005, disponível [on-line] in http://www.mj.gov.br/drci/documentos/
ENCLA%202005.pdf [13.07.2005]; Brasil, Ministério da Justiça, Lavagem de dinheiro,
disponível [on-line] in http://www.mj.gov.br/drci/default.asp [13.07.2005].
71
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
de terrorismo e de seu financiamento (art. 1º, II, redação dada pela Lei
10.701/03), além de determinar medidas para seu combate. Dentre elas,
destaca-se a criação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras
(COAF), Unidade de Inteligência Financeira (UIF) responsável por
coordenar e propor mecanismos de cooperação e intercâmbio de
informações de modo a possibilitar ações de combate à lavagem de
dinheiro. Quaisquer transações suspeitas deverão ser informadas pelas
instituições financeiras ao COAF, que deverá levar a cabo medidas para
apurar as possíveis irregularidades (art. 14). A Lei 9.613/98 permite,
ainda, o mandado judicial, antes de sentença, de apreensão ou sequestro
dos bens de suspeitos (art. 4º). Desde que haja reciprocidade ou tratado,
as mesmas medidas podem-se aplicar em decorrência de pedido de
autoridade estrangeira (art. 8º). Os recursos materiais e jurídicos do
COAF são considerados adequados pelas autoridades brasileiras. Em
2004, seu contingente foi aumentado, parecendo-lhes suficiente, apesar
de enxuto. Três são os pilares da atuação do COAF: desenvolvimento
tecnológico, treinamento do pessoal e evolução no intercâmbio de
informações.
139
O COAF tem-se mostrado importante ferramenta de cooperação
internacional. Desde 1999, é membro do Grupo de Egmont
140
e, desde
2000, do GAFI, tendo presença ativa nas reuniões de ambos, bem como
no âmbito do Grupo de Ação Financeira da América do Sul (GAFISUD)
139
ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the Counter-Terrorism Committee on the
implementation of United Nations Security Council resolution 1373 (2001), disponível [on-
line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/203/76/IMG/N0220376.pdf?Open
Element [14.07.2005], pp. 04-11; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-
109; M. Cepik, Adequação e preparo... cit., pp. 47-77; Brasil, MRE, SERE (COCIT) para
Brasemb Assunção, Fax nº 138, 14.12.2001; ONU, S/2004/286, Ministry of Foreign Relations
– Federative Republic of Brazil – Fourth Report to the Counter-Terrorism Committee, 2004,
disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N04/310/57/PDF/
N0431057.pdf?OpenElement [14.07.2004], pp. 08-09; Brasil, Ministério da Fazenda, Conselho
de Controle de Atividades Financeiras, Relatório de Atividades – 2004, disponível [on-line] in
http://www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], p. 04.
140
“O Grupo de Egmont foi criado pelas Unidades de Inteligência Financeira de diversos países,
em 1995, com a finalidade de propiciar meios e criar padrões para o desenvolvimento de suas
atividades em nível mundial, sobretudo facilitando o trabalho sintonizado e o intercâmbio de
experiências no que concerne às possibilidades de troca de informações, investigações e controle
da lavagem de dinheiro. Atualmente o Grupo congrega 95 UIFs, tendo ampliado sua esfera de
atuação para incluir a prevenção e a luta contra o terrorismo e seu financiamento.” (Brasil,
Ministério da Fazenda, Conselho de Controle de Atividades Financeiras, Relatório de Atividades
– 2004, disponível [on-line] in http://www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], p. 13).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
72
e da Comissão Interamericana para o Combate do Abuso de Drogas
da OEA (CICAD). Também teve participação em eventos do G20 e do
Mecanismo “3 + 1”. O COAF tem intercambiado informações com
outras unidades de inteligência financeira de maneira informal e flexível,
ou por meio de memorandos de entendimento.
141
Ainda na seara da cooperação, o Brasil liderou o estabelecimento
do GAFISUD
142
em 2000. Trata-se de órgão intergovernamental de
países da América do Sul para combater a lavagem de ativos e, a partir
do 11 de Setembro, o financiamento do terrorismo. Atua no sentido da
implementação das “40 + 9” resoluções do GAFI e do aprofundamento
dos mecanismos de cooperação entre os países-membros – durante a
II Reunião Plenária (Montevidéu, 2001), por exemplo, foram tomadas
medidas para estabelecer um programa de avaliações mútuas. A
cooperação é buscada também com seus observadores
143
. O GAFISUD
vem ganhando força e centralidade regional no combate à lavagem de
dinheiro e ao financiamento do terrorismo.
144
No âmbito jurídico-financeiro, ressalta-se a Lei Complementar 105/01, que
autoriza a quebra de sigilo bancário para a investigação de certos crimes, inclusive
141
ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the Counter-Terrorism Committee on the implementation
of United Nations Security Council resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://
daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/203/76/IMG/N0220376.pdf?OpenElement
[14.07.2005], pp. 04-27; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109;
Brasil, Ministério da Fazenda, Conselho de Controle de Atividades Financeiras, Relatório de
Atividades – 2004, disponível [on-line] in http://www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], pp.
01,13.
142
Existem dois subgrupos do GAFI nas Américas: o primeiro, o Grupo de Ação Financeira do
Caribe (GAFIC), sediado em Trinidad e Tobago, com 30 membros (inclusive a Venezuela, a
Guiana e o Suriname); e o segundo, para a América do Sul (GAFISUD), com sede em Buenos
Aires e integrado por nove membros (Argentina, Bolívia, Brasil, Chile, Colômbia, Equador,
Paraguai, Peru e Uruguai). No GAFISUD, o Uruguai era considerado não cooperativo, ou seja,
ineficiente ou tolerante no combate à lavagem de dinheiro, tendo saído dessa categorização –
mas continua a ser acompanhado pelo GAFI (Brasil, MRE, SERE para Delbrasupa, Despacho
Telegráfico nº 507, 14.11.2001). Brasil e Argentina são os únicos a pertencerem tanto ao GAFI
quanto ao GAFISUD (Brasil, MRE, SERE para Brasemb Buenos Aires, Despacho Telegráfico
nº 1037, 17.12.2003).
143
Alemanha, Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Comissão
Interamericana para o Controle do Abuso de Drogas (CICAD/OEA), Espanha, EUA, Fundo
Monetário Internacional (FMI), França, Grupo de Egmont, México, ONU e Portugal
(GAFISUD, Miembros, disponível [on-line] in http://www.gafisud.org/miembros.htm
[15.07.2005]).
144
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; A.C. Vaz, Cooperação
multilateral... cit., pp. 79-101; Brasil, MRE, SERE para Brasemb Buenos Aires, Despacho
Telegráfico nº 1037, 17.12.2003.
73
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
terrorismo (art. 4º, I). O Banco Central do Brasil (BCB) e a Comissão de Valores
Mobiliários (CVM) deverão informar ao Ministério Público (MP) suspeitas do
cometimento desses delitos (art. 9º).
145
Descendo um pouco mais a minúcias, identificam-se pontos positivos no combate
ao financiamento do terrorismo: o sistema do BCB de monitoramento on-line de
operações financeiras suspeitas; a criação, em 2003, de varas regionais especializadas
em lavagem de ativos e crimes financeiros, que deverão auxiliar a atuação ativa do MP
da União na apuração de financiamento do terrorismo; o esforço governamental pela
criação do cadastro único de correntistas; e o avanço nas discussões sobre
procedimento administrativo de congelamento preventivo de ativos.
146
No entanto, o País ainda carece de estatísticas unificadas sobre processos
e condenações por lavagem de dinheiro e financiamento do terrorismo, o que
dificulta a avaliação da eficácia das medidas adotadas. Mais importante, parece
ressentir-se da ausência de mecanismos para o bloqueio administrativo (não
judicial) de ativos potencialmente vinculados a atividades terroristas, o que vem
sido reiteradamente cobrado pelo CAT
147
. Existem problemas, ademais, quanto
145
ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the Counter-Terrorism Committee on the implementation
of United Nations Security Council resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://
daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/203/76/IMG/N0220376.pdf?OpenElement
[14.07.2005], pp. 04-11. Mesmo assim, o GAFI entende que o sigilo bancário limita a capacidade da
CVM de fiscalizar totalmente o setor e compartilhar todas as informações com agências equivalentes
estrangeiras (Brasil, Ministério da Fazenda, Conselho de Controle de Atividades Financeiras, Sumário
Público do Relatório da Segunda Avaliação Mútua da República Federativa do Brasil no âmbito do
Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro (GAFI/FATF) – Junho de 2004, disponível
[on-line] in http://www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], pp. 02-12).
146
Brasil, MRE, SERE para Brasemb Buenos Aires, Despacho Telegráfico nº 1037, 17.12.2003;
Brasil, Ministério da Fazenda, Conselho de Controle de Atividades Financeiras, Sumário Público
do Relatório da Segunda Avaliação Mútua da República Federativa do Brasil no âmbito do
Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro (GAFI/FATF) – Junho de 2004,
disponível [on-line] in http://www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], pp. 02-12.
147
Conforme o último relatório do GAFI, não é claro se os fundos apontados pelas resoluções
do CSNU podem ser congelados sem ordem judicial. O GAFI entende que a capacidade dos
bancos de congelar tais fundos deveria ser aperfeiçoada. As autoridades brasileiras têm procurado
ativos ligados a terroristas constantes das listas apresentadas por outros países, mas jamais os
encontraram – nenhum procedimento judicial foi iniciado nesse sentido (Brasil, Ministério da
Fazenda, Conselho de Controle de Atividades Financeiras, Sumário Público do Relatório da
Segunda Avaliação Mútua da República Federativa do Brasil no âmbito do Grupo de Ação
Financeira contra a Lavagem de Dinheiro (GAFI/FATF) – Junho de 2004, disponível [on-line]
in http://www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], pp. 02-12). A recomendação especial III do
GAFI prevê a necessidade de medidas para apreender, congelar e confiscar fundos de terroristas.
A Resolução 1.373 (art. 1, c) do CSNU exige que os Estados congelem os fundos e outros ativos
financeiros de terroristas e pessoas associadas. Milhares de contas bancárias foram investigadas,
tendo Suíça e Liechtenstein, p.ex., congelado contas suspeitas (A.G.N. Senna e R.C. Albuquerque,
As recomendações especiais... cit., pp. 266-67).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
74
à supervisão de instituições não bancárias de câmbio, como agências de viagens
e hotéis.
148
Questão sobremaneira importante diz respeito à Convenção Internacional
para a Supressão do Financiamento do Terrorismo. O Brasil apoiou sua
elaboração
149
, assinou-a e o Congresso a aprovou recentemente
150
; sua ratificação
é prevista para setembro de 2005, na 60ª AGNU.
151
O tratado contém disposições
para punir o financiamento do terrorismo de maneira muito abrangente, inclusive
quando associado à lavagem de dinheiro. A Convenção exige, assim como a
resolução 1373 do CSNU, a criminalização do financiamento do terrorismo,
que, na lei brasileira, não se inscreve em tipo penal autônomo.
152
O Brasil tem argumentado que outros dispositivos legais seriam suficientes
para punir o financiamento do terrorismo
153
, inclusive o crime de lavagem de
ativos (que tem no financiamento do terrorismo um de seus crimes
148
Brasil, MRE, SERE para Brasemb Buenos Aires, Despacho Telegráfico nº 1037, 17.12.2003;
Brasil, Ministério da Fazenda, Conselho de Controle de Atividades Financeiras, Sumário Público
do Relatório da Segunda Avaliação Mútua da República Federativa do Brasil no âmbito do
Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro (GAFI/FATF) – Junho de 2004,
disponível [on-line] in http://www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], pp. 02-12; ONU, S/2004/
286, Ministry of Foreign Relations – Federative Republic of Brazil Fourth Report to the Counter-
Terrorism Committee, 2004, disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/
N04/310/57/PDF/N0431057.pdf?OpenElement [14.07.2004], p. 17. Além desses apontamentos,
o Relatório do GAFI de 2004 recomenda, entre outras medidas: (a) continuar a implementação de
varas especializadas em lavagem de dinheiro e crimes financeiros; (b) ampliar as medidas legais de
confisco de bens de terroristas; (c) alterar a regulação de sigilo bancário de modo a permitir melhor
atuação do COAF; (d) melhorar a base legal para cooperação internacional direta na área financeira;
(e) considerar medidas para a melhor identificação de titulares de contas, particularmente pessoas
jurídicas, e também das partes em transferências eletrônicas, além de informar transações de
seguros de qualquer valor; (f) ampliar o número de investigadores e promotores especializados em
lavagem de dinheiro, além de aparelhar os órgãos de investigação e as varas especializadas; e (g)
estabelecer parâmetros melhores para auditorias sobre lavagem de dinheiro, e impor os mesmos
controles a agências de bancos brasileiros no exterior.
149
Nessas negociações, a delegação brasileira teve por referência as “Medidas para Eliminar a
Captação de Fundos para o Terrorismo”, conforme Anexo III do Compromisso de Mar del Plata
(Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 399, 27.03.1999).
150
Decreto Legislativo 769, de 30.06.2005.
151
Brasil, MRE, SERE para Delbrasonu, Despacho Telegráfico nº 815, 12.08.2005.
152
G. Fonseca Jr. (org.), O Brasil no Conselho de Segurança da ONU. 1998-1999, Brasília,
IPRI/Funag, 2002, pp. 259-61; A.G.N. Senna e R.C. Albuquerque, As recomendações especiais...
cit., pp. 260-61; Brasil, Ministério da Fazenda, Conselho de Controle de Atividades Financeiras,
Sumário Público do Relatório da Segunda Avaliação Mútua da República Federativa do Brasil
no âmbito do Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro (GAFI/FATF) – Junho
de 2004, disponível [on-line] in http://www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], pp. 02-12.
153
A conduta poderia ser enquadrada, p.ex., como associação criminosa (art. 288 do Código
Penal, considerado insuficiente pelo CAT por condenar apenas a associação de, ao menos, três
pessoas), bem como nos artigos 20 e 24 da Lei de Segurança Nacional (Lei 7.170/83).
75
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
antecedentes), mas isso não parece ser o bastante. O CAT já advertiu quanto
à falta de tipo específico e pediu providências; os EUA também exercem
certa pressão nesse sentido.
154
Apesar de os mecanismos de combate ao financiamento do terrorismo e à
lavagem de dinheiro poderem ser similares, a tipificação de cada um é diferente.
Como apontam A.G.N. Senna e R.C. Albuquerque, o financiamento “diz respeito à
provisão ou recebimento de fundos, com origem legal ou ilegal, que serão utilizados
com propósito criminoso”, enquanto a lavagem é ligada “à adoção de medidas
destinadas a ocultar a origem ilícita de fundos obtidos com a prática do crime.”
155
No último relatório do GAFI, na parte que trata do financiamento do terrorismo,
o Brasil foi considerado materially non-compliant com relação à capacidade legal
de congelar e confiscar fundos de terroristas, à criminalização autônoma do delito,
e ao dever de ratificar os instrumentos relevantes das Nações Unidas. Foi julgado
compliant ou largely compliant dos deveres de reportar transações suspeitas de
ligação com o terrorismo, de assistir investigações de outros países, de impor
requerimentos antilavagem de dinheiro a sistemas alternativos de remessa de fundos
e de reforçar medidas de identificação em transferências eletrônicas.
156
Em conclusão, as maiores deficiências brasileiras no cumprimento dos
deveres de combate ao financiamento do terrorismo são a falta de ratificação
154
ONU, S/2001/1285, Brazil – Report to the Counter-Terrorism Committee on the implementation
of United Nations Security Council resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://
daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/203/76/IMG/N0220376.pdf?OpenElement
[14.07.2005], pp. 04-11; ONU, S/2003/256, Brazil: report to the Counter-Terrorism Committee
concerning the application of resolution 1373 (2001), disponível [on-line] in http://
daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N03/295/26/PDF/N0329526.pdf?OpenElement
[14.07.2005], pp. 03-04. Em 2005, o relatório anual dos EUA sobre o controle internacional de
narcóticos tece críticas ao Brasil pela ausência de legislação específica contra o financiamento
do terrorismo. Entretanto, estabelece que a cooperação entre os dois países para combate ao
narcotráfico “nunca esteve melhor” (F. Maisonnave, Financiamento do terror no Brasil preocupa
EUA, in Folha de S. Paulo, 05.03.2005, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/
fsp/brasil/fc0503200511.htm [05.03.2005]). Outra mostra do grande interesse dos EUA pelo
tema: o Secretário do Tesouro dos EUA obteve a concordância de seu homólogo neerlandês,
para a realização, nos Países Baixos, no início de 2006, de uma conferência especial sobre
financiamento do terrorismo (Brasil, MRE, Brasemb Haia para SERE, Telegrama nº 456,
14.06.2005).
155
A.G.N. Senna e R.C. Albuquerque, As recomendações especiais... cit., p. 263; R.C.
Albuquerque, A tipologia... cit., p. 149. Apesar de a legislação brasileira ser suficiente no que
tange à lavagem de fundos de origem ilícita, não criminaliza a aplicação de recursos de origem
lícita em atividades ilegais (Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 455, 12.03.2002).
156
GAFI, Federative Republic of Brazil – Mutual Evaluation Report on Anti-Money Laundering
and Combating the Financing of Terrorism – 28 June 2004, disponível [on-line] in http://
www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], pp. 76-78.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
76
da Convenção Internacional para a Supressão do Financiamento do Terrorismo,
a ausência de tipificação penal do crime no direito interno e a inexistência de
procedimento administrativo de congelamento de bens de terroristas. Há que
ressaltar que a enorme aderência à Convenção
157
reforça o constrangimento
brasileiro; isso, porém, deverá ser corrigido na 60ª AGNU, com a ratificação
brasileira. No tocante ao bloqueio administrativo de bens, o Brasil foi elogiado
pelo GAFI pelos avanços das discussões internas. Quanto à tipificação
autônoma, há que se ter em mente o trâmite democrático e o engajamento
expresso nas palavras do Presidente Lula: “[u]ma das formas mais eficazes de
combater o terrorismo é sustar suas fontes de financiamento.”
158
A estrutura nacional contra a lavagem de dinheiro, julgada suficiente,
bem como os meios para o combate ao financiamento do terrorismo, não
são superados pelas dificuldades apontadas. Deve-se compreender o processo
democrático por que passam os compromissos assumidos externamente e,
ainda, sublinhar que o Brasil vem equipando-se e cooperando de maneira
consistente, como se viu acima. Essa atuação pauta-se pelo repúdio inequívoco
ao terrorismo (ver 3.1) e pelo interesse do País pelas sinergias positivas que
a cooperação no combate ao financiamento do terrorismo gera à luta contra
a lavagem de dinheiro e o crime organizado em geral.
159
3.2.7. Tríplice Fronteira
É importante tratar do antiterrorismo na Tríplice Fronteira
160
, questão que
suscitou, provavelmente, as maiores queixas quanto à determinação brasileira a
combater o flagelo. Com o enorme crescimento populacional desde a construção
da usina hidrelétrica de Itaipu (entre 1971 e 2001, passou-se de 60 mil a 700 mil
157
Conforme a o sítio das Nações Unidas, há 132 signatários e 117 membros plenos da Convenção
(http://untreaty.un.org/ENGLISH/Status/Chapter_xviii/treaty11.asp [16.07.2005]).
158
Palavras do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na conferência “Combatendo o Terrorismo
em Prol da Humanidade”, em Nova York (22.09.2003), disponível [on-line] in http://
www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/discurso_detalhe.asp?ID_
DISCURSO=2152 [22.06.2005].
159
P.C.A. Pinto, O papel dos organismos regionais: OEA, Grupo do Rio, Mercosul e Comunidade
Andina, in C. Brigagão e D. Proença Jr. (orgs.), Paz e terrorismo – textos do seminário “Desafios
para a política de segurança internacional: missões de paz da ONU, Europa e Américas”, São
Paulo, Hucitec, 2004, pp. 263-68; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-
109.
160
A região é assim chamada por lá se formarem os limites entre Argentina, Brasil e Paraguai. A
fronteira “viva”, entretanto, diz respeito apenas aos dois últimos, já que a porção argentina da
região tem reduzida população e movimento transfronteiriço.
77
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
habitantes), a região passou a experimentar graves problemas de segurança pública.
Tornou-se centro de prática de delitos como contrabando, narcotráfico, pirataria,
furtos de automóveis e lavagem de dinheiro, os quais têm sido objeto de grande
preocupação, monitoramento e cooperação do governo brasileiro.
161
Outra peculiaridade daquela fronteira é a expressiva presença de comunidades
árabes – 12 mil pessoas somente do lado brasileiro. Cerca de 90% destes é de
origem libanesa, particularmente do Vale da Bekaa, região de grande influência do
Hezbollah.
162
Essa situação enseja suspeitas e acusações de atividades terroristas e de
financiamento do terrorismo no local. Em razão dos atentados terroristas ocorridos
na Argentina em 1992 e 1994
163
, as imprensas nacional e internacional
164
passaram
veicular a existência de terroristas homiziados em comunidades árabes da Tríplice
Fronteira. Houve, é verdade, eventos que alimentaram as especulações acerca de
atividades terroristas na região.
165
Mais tarde, com o ambiente do pós-11 de
161
BRASIL, MRE, COCIT para Subsecretaria-Geral de Política Bilateral, Memorandum 004,
28.01.2002 A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109.
162
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109. Conforme o autor, a
comunidade estrangeira mais numerosa na região é a chinesa (de Formosa e da China continental),
que tem sido vítima de bandos chineses que praticam extorsão em troca de “proteção”,
particularmente contra os varejistas.
163
Em 1992, houve atentado à Embaixada de Israel e, em 1994, à sede da Asociación Mutual
Israelita Argentina (AMIA), ambos em Buenos Aires, com o total de 114 mortos. As investigações
argentinas, pouco conclusivas, apontam operações planejadas no Irã e executadas a partir de
conexão local do Hezbollah. O responsável direto pelo atentado de 1992, p.ex., teria ingressado
na Argentina a partir de Foz do Iguaçu.
164
V.g., em julho de 2000, a rede de notícias CNN difundiu supostos informes reservados do
governo paraguaio contendo a informação da existência de cerca de 460 militantes ativos da
Hezbollah na Tríplice Fronteira (A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-
109). Segundo o diário paraguaio ABC Color, autoridades paraguaias e estadunidenses, em
2003, suspeitavam de remessas de pequenos comerciantes da Tríplice Fronteira a empresas do
Texas suspeitas de serem fachada para al-Qaeda ou Hamas (Brasil, MRE, Brasemb Assunção
para SERE, Telegrama nº 955, 28.08.2003). Em história aparentemente descabida, “altas fontes
policiais” argentinas teriam acusado o Itamaraty de conceder documentos a terroristas islâmicos
para transitarem sem problemas pela região. Parte da “cooperação” adviria de pressões iranianas
relativas às exportações brasileiras, bem como de corrupção pura e simples (La Nación,
17.01.1999, Terrorismo legal – vinculan a Itamaraty con el Hisbolá).
165
Seguem dois exemplos. Como resultado de investigações da PF com sua contraparte paraguaia,
o Brasil expulsou o sacerdote xiita iraniano Mohsen Tab-Tabai Eimaki, residente em Foz do
Iguaçu – que, conforme a imprensa, seria o líder do Hezbollah na região das três fronteiras
(Brasil, MRE, Brasemb Assunção para SERE, Telegrama nº 474, 26.04.1999). Em 2000, foi
preso o libanês identificado como Salah Abdul Karim Yassine, portando documentos colombianos
falsos, suspeito de ligação com o Hamas e de ameaças de atentado contra a Embaixada de Israel
em Assunção. Sua movimentação teria sido acompanhada por agentes policiais e de inteligência
estadunidenses e israelenses. O libanês, preso em Encarnación, teria afirmado residir em Ciudad
del Este (Brasil, MRE, Brasemb Assunção para SERE, Telegrama nº 1122, 04.12.2000).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
78
Setembro, essa suposta vinculação com o terrorismo islâmico tornou-se tema
importante na agenda de segurança dos países da região e dos EUA.
166
Alguns analistas e acadêmicos afirmam a presença terrorista em na região.
167
Os EUA
168
, por sua vez, parecem ter atitude ambígua quanto à Tríplice
Fronteira. Autoridades estadunidenses como Donna Hrinak (Embaixadora em
Brasília), J. Cofer Black (Coordenador de Contraterrorismo do Departamento
de Estado) e Colin Powell (Secretário de Estado) já ressaltaram a inexistência
de terroristas na região.
169
Na contramão dessas declarações, o relatório anual
de 1999 sobre terrorismo do Departamento de Estado menciona a Fronteira
Tríplice como “ponto focal” para o extremismo islâmico, apesar de alguns
sucessos de esforços de ativa cooperação antiterrorista.
170
Extenso relatório
166
W.F.B. Jacini, Terrorismo: atuação da Polícia Federal, in Revista CEJ 18 (2002), p. 78-79;
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; M.P. Buzanelli, Introdução
cit., pp. 09-13; E. Diniz, Considerações sobre a possibilidade... cit., pp. 15-45.
167
Seguem exemplos. Conforme diário local, a população da fronteira indignou-se com a realização
do seminário “O terrorismo global e a Tríplice Fronteira: mito ou ameaça”, realizado pelo
Center for the Study of Terrorism and Political Violence, da Universidade Saint Andrew, em
conjunto com a consultoria internacional de segurança Security Intelligence Advising (A Gazeta
do Iguaçu, 1º.09.2003, “Não há terror em Foz”, afirma embaixadora). A estudiosa J. Stern,
por sua vez, apesar de reconhecer os sinceros esforços brasileiros no combate ao terrorismo,
sobretudo com o mecanismo “3+1”, crê existirem atividades terroristas e de financiamento do
terrorismo na região. O esforço internacional de monitoramento seria uma prova disso, bem
como vasta literatura e fontes anônimas da autora. A resposta correta deveria ser mais cooperação,
ao invés de negar o problema (Triborder dispute, in Foreign Affairs 1 (2004), pp. 188-89). De
acordo com O.B. Amorim Filho, a Tríplice Fronteira é caso em que as comunidades migrantes,
que vivem no mundo sob a forma de diásporas, apoiam atividades terroristas. Tal assistência
seria muito importante na atualidade (A geopolítica... cit., pp. 341-42). Segundo conclusão de
estudo do Gabinete de Segurança Internacional, a região brasileira de maior possibilidade de
ligação com o terrorismo internacional é a Tríplice Fronteira (II encontro de estudos... cit., pp.
103-23).
168
Os EUA passaram a definir zonas de risco de presença terrorista nas Américas, basicamente
em regiões de elevada presença de imigrantes árabes ou palestinos, como a Tríplice Fronteira, a
Ilha Margarita (na Venezuela) e a Zona Franca de Iquique (no Chile). Também houve declarações
de autoridades dos EUA a respeito do perigo de atividades terroristas provenientes do Suriname,
onde 35% da população é muçulmana. (P.C.A. Pinto, O papel dos organismos... cit., p. 267;
Brasil, MRE, Brasemb Paramaribo para SERE, Telegrama nº 421, 07.11.2003). Tom Ridge,
então diretor de segurança interna dos EUA, afirmou que, como um todo, a América Latina
ofereceria facilidades às redes terroristas; apesar de não haver, ainda, ligações entre terroristas
“nativos” (FARC e Sendero Luminoso, p.ex.) e al-Qaeda, haveria células dormentes entre os
muçulmanos da América Latina (R. S. Leiken, War on terror: Mexico more critical than ever for
the US, in The Sacramento Bee, 24.03.2002, disponível [on-line] in http://www.brookings.edu/
views/op-ed/leiken/20020324.htm [13.11.2004]).
169
A Gazeta do Iguaçu, 1º.09.2003, “Não há terror em Foz”, afirma embaixadora. Black e
Hrinak expressaram preocupação, não obstante, com remessas financeiras.
170
Brasil, MRE, Brasemb Washington para SERE, Telegrama nº 951, 03.05.2000. No documento,
elogiam-se os esforços argentinos para o estabelecimento do CICTE.
79
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
produzido pela Biblioteca do Congresso trata a região como santuário de
terroristas e aponta falhas nos aparelhos de segurança dos países da fronteira.
171
A Central Intelligence Agency (CIA), por sua vez, aponta “levantamento de
fundos para organizações extremistas”.
172
Em sentido parecido, o relatório anual
dos EUA sobre o controle internacional de narcóticos de 2005 lança suspeitas
de atividade terrorista na Tríplice Fronteira, sobretudo de financiamento
173
, que,
de fato, tem-se provado a maior preocupação estadunidense na região.
174
Da parte da Argentina, houve acusações oficiais diretas de descuido
brasileiro quanto à presença de terroristas na região, inclusive para a realização
dos atentados em Buenos Aires em 1992 e 1994.
175
Uma forma de
compreender essas queixas é interpretá-las como meio de satisfazer a opinião
pública argentina e internacional diante da inexistência de resultados
satisfatórios nas investigações. Mesmo assim, aponta E. Diniz, em caso de
um “terceiro atentado”, o Brasil poderá enfrentar isoladamente acusações de
descuido em seu território. Grandes pressões adviriam de países como
Argentina, EUA, Israel e Reino Unido.
176
171
R. Hudson, Terrorist and organized crime groups in the Tri-Border Area (TBA) of South
America – A report prepared by the Federal Research Division, Library of Congress under an
interagency agreement with the Director of Central Intelligence Crime and Narcotics Center,
Washington D.C., Library of Congress, 2003, pp. 01-04. Segundo o relatório, os grupos presentes
na região seriam os egípcios Al-Gama’a al-Islamiyya e Al-Jihad, al-Qaeda, Hamas, Hezbollah e
al-Muqawamah. Haveria, desde 1996, plano do Hezbollah e da al-Qaeda para, a partir da
fronteira, explodir a embaixada dos EUA em Assunção. Esforços nacionais e cooperativos dos
países da região pareceriam ter restringido as atividades terroristas a partir de 2001, mas, não as
teriam eliminado.
172
Estados Unidos da América, CIA, The world factbook, disponível [on-line] in http://
www.cia.gov/cia/publications/factbook/index.html [25.05.2005].
173
F. Maisonnave, Financiamento do terror... cit.
174
Brasil, MRE, Brasemb Buenos Aires para SERE, Telegrama nº 208, 03.02.2004.
175
Conforme Carlos Corach (Ministro do Interior da Argentina entre 1995 e 1999) e Mario
Baizán (Subsecretário de Cooperação Internacional daquele Ministério entre 1997 e 1999,
tendo representado a Argentina no Comando Tripartite), ambos os atentados teriam sido
executados e planejados a partir da Tríplice Fronteira, conforme inteligência fornecida à Argentina
por órgãos de países ocidentais poderosos. Esses informes indicariam, na região, uma “trama
de varias redes delictivas que permitían a los terroristas crear su propio paraíso, donde
colectaban fondos, generaban inteligencia regional y organizaban y entrenaban a los cuadros
que debían ser evacuados de las zonas en conflicto”. Haveria, basicamente, três grupos terroristas
islâmicos instalados na região: Hezbollah, Hamas e Irmandade Islâmica (La respuesta argentina...
cit., pp. 18-19, 29).
176
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; E. Diniz, Considerações
sobre a possibilidade... cit., pp. 15-45. Conforme a Força-tarefa independente patrocinada
pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), “[o] assunto da segurança na
Tríplice Fronteira tem sido mais levantado mais pela Argentina do que pelos próprios Estados
Unidos” (Relatório sobre os EUA, in Política Externa 3 (2002-2003), pp. 125-26).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
80
Dado esse contexto, a posição brasileira tem sido balizada por duas
considerações fundamentais. Primeiro, expressa não haver
comprovação, até o momento, da existência de células terroristas ou
de financiadores do terrorismo na região – mesmo após a intensificação
das atividades policiais e de inteligência
177
na região em 1996, com a
criação do Comando Tripartite (Argentina, Brasil e Paraguai). A área
tem constituído especial atenção das autoridades brasileiras, inclusive
por aspectos estratégicos e de segurança nacional, com sensível aumento
de ações antiterroristas preventivas.
178
Segundo, reafirma-se que o Brasil é um país de várias etnias e religiões
em convivência pacífica e harmoniosa, sendo, portanto, contrário a nossas
tradições estigmatizar uma comunidade com aquelas graves suspeitas
somente em razão de sua origem. Busca-se, de forma condizente com o
ideal de Estado democrático de direito, identificar e punir, individualmente,
eventuais terroristas ou seus financiadores, cooperando com outros países
para tanto e rechaçando discriminações contra grupos específicos.
179
O
trecho seguinte resume, grosso modo, esses dois aspectos centrais da
posição brasileira:
177
Desde 1997, a Polícia Federal tem investigado as suspeitas terroristas na região, sem elementos
comprobatórios (W.F.B. Jacini, Terrorismo: atuação... cit., pp. 78-79). A ABIN, preocupada
com a eventual montagem de “santuários ou bases terroristas, tem monitorado as comunidades
muçulmanas da fronteira (A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109).
M.P. Buzanelli ressalta a ausência de menção, pelas autoridades brasileiras, à natureza limitada
dessas ações de inteligência, às restrições legais para seu emprego, à dificuldade de atuação em
comunidades pouco permeáveis e à crônica carência de recursos – todos esses fatores restritivos
da inteligência na fronteira (Introdução cit., pp. pp. 09-13).
178
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; Intervenção do Senhor
Ministro de Estado da Defesa, José Viegas Filho, na Comissão de Relações Exteriores e de
Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, em Brasília (14.05.2003), disponível [on-line] in
https://www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/discursos/2003/resenha,14,05,03,01.htm
[12.07.2005]; Brasil, Ministério da Fazenda, Conselho de Controle de Atividades Financeiras,
Sumário Público do Relatório da Segunda Avaliação Mútua da República Federativa do Brasil
no âmbito do Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro (GAFI/FATF) – Junho
de 2004, disponível [on-line] in http://www.fazenda.gov.br/coaf/ [15.07.2005], pp. 02-12;
Entrevista concedida ao autor pelo Professor Celso Lafer, ex-Ministro das Relações Exteriores,
em Brasília (23.06.2004).
179
Brasil, MRE, COCIT para Subsecretaria-Geral de Política Bilateral, Memorandum nº 04,
28.01.2002; A.M. Cardoso, Terrorismo e segurança... cit., p. 51; A.J.M. Souza e Silva, Combate
ao terrorismo... cit., pp. 74-109; Palavras do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na conferência
“Combatendo o Terrorismo em Prol da Humanidade”, em Nova York (22.09.2003), disponível
[on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/
discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=2152 [22.06.2005].
81
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
Inexistem, até o momento, elementos comprobatórios da presença ou
financiamento de terroristas a partir daquela região. Não podemos
permitir que a Tríplice Fronteira continue sendo apontada como
celeiro de terroristas. A vinculação que por vezes se faz entre
atividades terroristas e a presença de comunidade de origem árabe
na região é particularmente perniciosa e contraproducente. Somos
uma sociedade multiétnica e multicultural (...) e repudiamos acusações
fundadas em preconceitos étnicos ou religiosos.
180
O Brasil mostra-se, ademais, aberto à cooperação. Sempre que o tema
do terrorismo na Tríplice Fronteira é provocado por autoridades estrangeiras,
o Brasil tem-lhes solicitado inteligência acerca das suspeitas, de modo a permitir
melhor investigação. Até o presente, não foram recebidos dados que
demonstrem as alegações. O trabalho das autoridades brasileiras defronta-
se, entretanto, com a necessidade de “prova de não existência”. Isso leva à
permanência das desconfianças – de boa ou má-fé – quanto à ação
antiterrorista brasileira na região e demanda, pois, cooperação, inclusive em
inteligência, para que a questão seja discutida de forma construtiva.
181
Além das iniciativas de cooperação entre os países da Tríplice Fronteira e do
Mercosul, já apontados (ver 3.2.4), é de suma importância, para a presente
questão, o Mecanismo “3 + 1”, entre os países que conformam aquela fronteira
e os EUA. O foro tomou corpo em fins de 2002, em reuniões com representantes
dos quatro países. Chegou-se, então, a um consenso quanto à inexistência de
atividades operativas de terrorismo naquela fronteira. Pela primeira vez, uma alta
autoridade estadunidense (J. Cofer Black, Coordenador de Contraterrorismo
do Departamento de Estado) afirmou não haver indícios de células terroristas na
região.
182
Decidiu-se, ademais, seguir com o formato “3 + 1”, buscando
mecanismos operacionais de cooperação na região. O mecanismo parece ter-se
consolidado e deverá gerar sua própria agenda de implementação. Prova disso é
180
C. Amorim, O Brasil e os novos... cit.
181
L.O.S. Bonfim, A política externa... cit., pp. 122-39; Brasil, MRE, COCIT para Subsecretaria-
Geral de Política Bilateral, Memorandum nº 4, 28.01.2002; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao
terrorismo... cit., pp. 74-109.
182
Também em 2004, após participar da reunião do CICTE em Montevidéu, o coordenador de
Antiterrorismo do Departamento de Estado dos EUA visitou a Argentina, onde elogiou o
mecanismo “3+1” como modelo para o continente e afirmou não haver prova de financiamento
do terrorismo na região da Tríplice Fronteira (Brasil, MRE, Brasemb Buenos Aires para SERE,
Telegrama nº 208, 03.02.2004).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
82
o encontro de unidades de inteligência financeira (UIFs), realizado em Brasília em
maio de 2003, que, dando seguimento às primeiras reuniões, concentrou-se na
análise dos riscos de financiamento do terrorismo a partir da Tríplice Fronteira,
até o momento não comprovado. Como se viu, por meio desse foro, o Brasil tem
logrado afastar as acusações que pesam contra a região e, ao mesmo tempo,
mostrar-se pronto a contribuir para o esforço mundial antiterrorista.
183
Em conclusão, a suposta presença de terroristas ou de seus financiadores na
Tríplice Fronteira representa risco multifacetado para o Brasil – risco de destruição da
harmonia social entre as diversas comunidades, em razão do estigma lançado por
muitos sobre os muçulmanos da região; risco de deterioração das relações com os
vizinhos da fronteira em hipótese de descaso com a segurança da área; e até mesmo
risco de intervenção, quiçá armada e unilateral, sob pretexto de “guerra contra o
terrorismo”.
184
Contudo, o Governo brasileiro, por meio da cooperação e do diálogo
com os países da fronteira, o Mercosul e os EUA, vêm demonstrando boa vontade
para com o combate ao terrorismo e, ao mesmo tempo, vai afastando as suspeitas
que recaem sobre a região. A reiteração da negativa da presença terrorista na Tríplice
Fronteira, aliada à ampla cooperação preventiva, lograram inegável êxito.
De todo modo, não parece haver espaço para desatenção à região no
contexto da “guerra contra o terrorismo”. Comprovam-no as especulações
acerca da criação de uma base militar dos EUA próxima à região.
185
183
Brasil, MRE, SERE para Brasemb Buenos Aires, Despacho Telegráfico nº 1037, 17.12.2003;
Brasil, MRE, Brasemb Buenos Aires para SERE, Telegrama nº 2479, 06.12.2003; Comunicado
del Grupo 3 + 1, em Assunção (3 de dezembro de 2003), disponível [on-line] in http://
www.cicte.oas.org/Docs/Comunicado%20del%20Grupo%203.doc [09.09.2004]; A.J.M. Souza
e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; J. Maschio, Agora, EUA descartam terror
na Tríplice Fronteira, in Folha de S. Paulo, 19.12.2002, disponível [on-line] in http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1912200203.htm [20.07.2005].
184
Segundo a revista Newsweek, logo depois de 11.09.2001, o subsecretário do Pentágono
Douglas Feith sugeriu a invasão da Tríplice Fronteira, a fim de capturar terroristas e ocupar a
região permanentemente (M. Santayana, EUA no Paraguai, in Carta Maior, 04.07.2005,
disponível [on-line] in http://agenciacartamaior.uol.com.br/agencia.asp?id=1351&coluna=boletim
[04.07.2005]).
185
Em julho de 2005, surgiram notícias, confirmadas pelos governos, sobre acordo entre Paraguai
e EUA para a presença de militares estadunidenses naquele país, com status diplomático.
Existem, também, rumores, negados pelos governos, sobre a construção de uma base militar,
supostamente situada perto de Mariscal Estigarribia, a 250 km da fronteira com a Bolívia e
próxima da Tríplice Fronteira, que teria capacidade para 16 mil homens. Além do combate ao
narcotráfico, seriam objetivos da suposta base garantir acesso às reservas bolivianas de
hidrocarbonetos e reprimir o terrorismo na Tríplice Fronteira. O Itamaraty, conforme as notícias,
não se pronunciou sobre o assunto, alegando não ingerência em assuntos internos (M. Santayana,
EUA no Paraguai cit.; Carta Maior, 1º.07.2005, Paraguai recebe militares dos EUA com
garantia de imunidade, disponível [on-line] in http://agenciacartamaior.uol.com.br/
83
O CUMPRIMENTO DAS NORMAS ESTABELECIDAS
3.3. Conclusões parciais
Conforme o exposto neste capítulo, o Brasil tem sido bom cumpridor das
regras estabelecidas do regime internacional antiterrorista. Há, como se viu, algumas
deficiências, particularmente a ausência de congelamento administrativo de bens de
terroristas e da tipificação do crime de financiamento do terrorismo. Contudo, isso
não transforma o País, aos olhos da comunidade internacional, em “inadimplente”
de suas obrigações. Ao contrário, o Brasil faz parte de uma minoria de países que
têm entregado relatórios ao CAT, em geral, nos prazos estabelecidos. Os relatórios
elaborados pelo Brasil (cinco, até hoje) são crescentemente detalhados, mas com
número decrescente de perguntas. Jamais se cogitou de incluir o País nas visitas que
a Diretoria Executiva do Comitê vem fazendo a lugares que geram preocupação; o
Brasil nunca esteve “no radar” do CAT.
186
agencia.asp?id=3227&cd_editoria=005&coluna=reportagens [20.07.2005]; C. Vila-Nova, EUA
e Paraguai negam base militar, in Folha de S. Paulo, 07.07.2005, disponível [on-line] in http:/
/www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft0707200518.htm [20.07.2005].
186
Entrevista concedida ao autor pelo Ministro Marcos Vinícius Pinta Gama, Chefe da COCIT,
em Brasília (22.08.2005).
85
4. O regime em construção – visão geral
Tratada a questão da conformidade do Brasil às regras do regime
internacional antiterrorista, chega o momento de tratar dos pontos mais em
aberto do regime. Nesta parte, busca-se demonstrar a discordância na
comunidade internacional com relação aos aspectos mais gerais de tais pontos.
Para tanto, optou-se por estudar, brevemente, apenas as orientações dos
cinco países com assento permanente no Conselho de Segurança das Nações
Unidas (China, EUA, França, Reino Unido e Rússia). A opção decorre,
primeiro, da limitação temática e de espaço do presente estudo e, segundo,
do entendimento de que, por essa sua condição institucional, são as nações
de maior centralidade política nas decisões internacionais afetas à paz e à
segurança internacional.
4.1. EUA
Os ataques de 11 de Setembro, que destroçaram a percepção de
invulnerabilidade do território estadunidense, causaram um redirecionamento
na agenda da administração Bush no sentido de combater o terrorismo.
Internamente, criou-se o Department of Homeland Security, maior reforma
administrativa dos EUA desde a II Guerra. Tal departamento, de ampla
competência e generoso orçamento, passou a controlar as 22 agências federais
dedicadas a combater o terrorismo no país. Aprovaram-se também diversas
CIRO LEAL M. DA CUNHA
86
normas para os mesmos fins
187
e houve redirecionamento do Federal Buerau
of Investigation (FBI) para o antiterrorismo. Criticam-se essas medidas,
sobretudo o Patriot Act, por poderem reduzir as liberdades civis, com
intrusão na intimidade, prisões arbitrárias e ameaças, sobretudo contra
estrangeiros.
188
Além da teoria conspiratória segundo a qual setores radicais da
comunidade de inteligência estadunidense praticaram os atentados
189
, existe
a crítica de que o trauma da “descoberta” da vulnerabilidade dos EUA tenha
sido manipulado pelo governo (com níveis de alerta e recomendações confusas,
por exemplo) e pela cobertura sensacionalista da imprensa, garantindo rapidez
e pouca resistência interna às reformas e ao aumento maciço do orçamento
militar. Conforme o eminente psicólogo nova-iorquino P. Zimbardo, “Não
precisamos de um ataque terrorista, porque nós mesmos estamos fazendo
todo o trabalho para eles”.
190
Sobretudo no âmbito externo, a ação dos EUA recebeu grande influência
do pensamento neoconservador, pré-existente, mas apresentado como única
resposta possível ao terror. Essas opiniões informariam o maior unilateralismo
e a insistência dos EUA em enfatizar o combate ao apoio estatal ao
terrorismo.
191
187
Sobretudo, Homeland Security Act of 2002, USA PATRIOT Act of 2001, Aviation and
Transportation Security Act of 2001, Public Health Security and Bioterrorism Preparedness
and Response Act of 2002, Enhanced Border Security and Visa Entry Reform Act of 2002, e
Maritime Transportation Security Act of 2002.
188
C.S. Pecequilo, A América inviolável: o fim de um mito, in Meridiano 47 16 (2001), p. 02;
L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 02-39; T. Todorov, Le nouveau désordre...
cit., pp. 48-68; R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., pp. 77-79.
189
T. Meyssan, 11 septembre 2001 – l’effroyable imposture, trad. port. de K.R.C. Guimarães,
11 de setembro de 2001 – uma terrível farsa, São Paulo, Usina do Livro, 2003, pp. 07-24, 44,
93-109. Apesar de não concordarmos com essa visão geral – até mesmo porque o que nos
importa neste trabalho são os efeitos do 11 de Setembro –, não se pode negar que o T. Meyssan
apresenta evidências contundentes de que o Pentágono não foi atingido por uma grande aeronave,
conforme afirma a versão oficial.
190
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 110-15; S. Dávila, “Abu Ghraib foi
só o começo”, diz psicólogo, in Folha de S. Paulo, 17.01.2005, disponível [on-line] in http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1701200511.htm [17.01.2005]; G. Dupas, Fundamentos,
contradições... cit., pp. 06-09; R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., p. 76. A respeito dessa
manipulação, ver A. Gore, The politics of fear, in Social Research 4 (2004).
191
S. Halper e J. Clarke, America alone… cit., pp. 09-39. Conforme S. Halper e J. Clarke, o
neoconservadorismo não é propriamente um movimento intelectual, mas uma linha de pensamento
cuja coesão é frequentemente exagerada. Atualmente, três crenças comuns fundamentais unem
os neoconservadores: (a) a condição humana é definida como uma escolha entre o bem e o mal,
e de que a verdadeira medida de caráter político encontra-se na disposição de confrontar o mal;
(b) a variável fundamental das relações entre os Estados é o poderio militar e a disposição de
87
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
Externamente, os EUA optaram por encarar os ataques como
guerra
192
, o que pressupõe não apenas punir os responsáveis, mas
empreender ações de maior envergadura, até mesmo a guerra
tradicional. Segundo J. Almino, isso seria fundamental para o
hegemon, pois todo um sistema de segurança e defesa tem sua
credibilidade desafiada. “Não dar sinais de que a guerra está sendo
vencida é o mesmo que reconhecer que o acúmulo de armas e a
enorme superioridade do poderio bélico pouco servem na luta contra
o inimigo”. A caracterização do antiterrorismo como guerra reforçou
a ideia de alguns de que os EUA têm a necessidade estratégica de
sempre terem um inimigo externo.
193
Essa “guerra” foi percebida pelos EUA como luta entre o Bem e o Mal,
legitimando a reação imediata contra Afeganistão e al-Qaeda e a expectativa
usá-lo; e (c) o Oriente Médio e o islamismo global seriam os principais loci de interesse
internacional dos EUA. Na prática, isso implica que: (a) os neoconservadores analisam questões
internacionais com padrões morais absolutos; (b) sublinham a unipolaridade dos EUA, enxergando
o uso da força militar como primeira, não última opção em política externa. Repudiam as lições
do Vietnã e abraçam aquelas de Munique; (c) desdenham agências diplomáticas tradicionais e
análises realistas. São hostis a órgãos multilaterais não militares e a acordos e tratados
internacionais; e (d) idealizam uma certa interpretação do governo Reagan e buscam repeti-la.
Para mais detalhes acerca dos neoconservadores e de sua influência na administração Bush, ver:
I.H. Daalder, e J.M. Lindsay, America unbound: the Bush revolution in foreign policy, Washington
D.C., Brookings, 2003; J. Mann, Rise of the Vulcans – the history of Bush’s war cabinet, New
York, Viking, 2004; T. Todorov, Le nouveau désordre... cit., pp. 34-45.
192
Como análise crítica dessa utilização do termo “guerra”, ver M. Howard, What’s in a name,
in Foreign Affairs 1 (2002), e A. Pellet, Terrorismo e guerra... cit., pp. 173-74. Para A. Pellet,
por o ataque não ter partido de Estado, “seria necessário (...) um grande esforço de imaginação
para identificar uma agressão armada” no sentido do art. 51 da Carta da ONU.
193
J. Almino, Inserção internacional... cit., pp. 57-61; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação...
cit., pp. 141-50; T.G. Costa, A segurança internacional do Brasil e os Estados Unidos da
América na era do anti-terror, in C. Brigagão e D. Proença Jr. (orgs.), Brasil e o mundo – novas
visões, Rio de Janeiro, Francisco Alves, 2002, pp. 192-94. Conforme S.P. Guimarães – em
publicação anterior ao 11 de Setembro –, os EUA têm na caracterização de inimigos (antes, os
comunistas; agora, o narcotráfico, o terrorismo etc.) um meio de estigmatizar como inimiga e
perigosa qualquer crítica à política, à sociedade e aos interesses estadunidenses, bem como uma
forma de justificar elevados gastos militares e a manutenção de suas forças armadas ao redor do
mundo (Quinhentos anos de periferia – uma contribuição ao estudo da política internacional,
3ª ed., Rio de Janeiro, Universidade; Porto Alegre, UFRGS/Contraponto, 2001, pp. 97, 156).
Similarmente: O. Ianni, Sociologia del terrorismo, in E. López (org.), Escritos sobre terrorismo,
Buenos Aires, Prometeo, 2003, p. 33. M. Moreno afirma que o recurso à guerra contra o
terrorismo pode ter importante funcionalidade nos avanços estadunidenses no Oriente Médio
e na Ásia Central (Terrorismo: em busca de uma definição universal, in C. Brigagão eD.
Proença Jr. (orgs.), Panorama brasileiro de paz e segurança, São Paulo, Hucitec; Rio de
Janeiro, Konrad Adenauer, 2004, p. 349.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
88
– então correspondida
194
– de corroboração da comunidade internacional
(“quem não estiver com os EUA estarão contra”). Nesse contexto, os
EUA exercem pressão sobre os demais países para cooperarem com
CIA e FBI em matéria policial e de inteligência.
195
Os EUA deixam transparecer uma crescente tendência unilateral,
já perceptível anteriormente
196
, marcada pela prioridade conferida a
coalizões ad hoc para missões específicas, em que se flexibilizam as
alianças estadunidenses. Isso é temperado por um multilateralismo
conflituoso e “à la carte” em foros específicos, como a Organização do
Tratado do Atlântico Norte (OTAN) e a Organização das Nações
Unidas (ONU).
197
O unilateralismo dos EUA e sua agenda centrada no terror têm
também face econômica. Na área financeira, países prioritários no
combate ao terrorismo – como Turquia e Paquistão – têm sido
privilegiados bilateralmente, no Clube de Paris, no FMI e nos bancos
multilaterais, enquanto a Argentina, em profunda crise, não recebeu
auxílio das instituições de Bretton Woods. Passou a haver ênfase em
doações aos países menos desenvolvidos, em detrimento de países
médios como o Brasil, que terão maiores dificuldades em obter
financiamentos multilaterais.
198
Quanto à América Latina, os planos iniciais de Bush de relações
mais abertas com a região foram abandonados devido à prioridade
acachapante da segurança e do antiterrorismo. No pós-11 de Setembro,
194
Logo após o 11 de Setembro, a solidariedade e a cooperação partiu dos mais diversos países,
inclusive países muçulmanos, tendo chamado a atenção o apoio do Sudão, que fora atacado com
míssil dos EUA em 1998 devido a suposto apoio a atentado terrorista (P.L. Griset e S. Mahan,
Terrorism in perspective cit., p. 281).
195
R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., pp. 75-79; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao
terrorismo... cit., pp. 02-39.
196
P.ex., a recusa do Tribunal Penal Internacional, do Protocolo de Quioto, do Protocolo de
Verificação da Convenção sobre Proibição das Armas Biológicas, do Tratado de Proibição de
Testes Nucleares - CTBT, do Tratado sobre Mísseis Balísticos - ABM e do Protocolo de
Montreal sobre Minas Terrestres. No mesmo sentido vai a insuportável pressão para o
afastamento do diretor-geral da Organização para a Proscrição de Armas Químicas (OPAQ), do
Presidente do Comitê Intergovernamental de Mudança de Clima (IPCC) e para a renúncia da
Alta Comissária de Direitos Humanos, Mary Robinson.
197
M. Cepik, Adequação e preparo... cit., pp. 47-77; R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit.,
pp. 77-79; J.L. Gaddis, E essa agora: lições da antiga era para a próxima, in S. Talbott e N.
Chanda (orgs.), A era do terror – o mundo depois de 11 de Setembro, Rio de Janeiro, Campus,
2002, p. 29.
198
R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., p. 83.
89
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
a América Latina é ainda mais periférica: não é um centro global de
poder nem tem problemas tão graves que demandem a preocupação
imediata dos EUA.
199
4.1.1. A Estratégia de Segurança Nacional
O documento The National Security Strategy of the United States of
America (doravante chamado de NSS), emitido pelo presidente dos EUA, informa
à nação a direção que o Executivo seguirá em matéria de segurança, deixando
claras as metas estratégicas dos EUA e seus meios. A nova NSS
200
foi apresentada
em 20 de setembro de 2002, cerca de um ano após o 11 de Setembro.
201
Uma premissa central da NSS é a ideia de um mundo em novos tempos,
com o fim da Guerra Fria e o surgimento do novo terrorismo global. O 11 de
Setembro haveria cristalizado a sensação de vulnerabilidade dos EUA e da
civilização em geral, que enfrentariam ameaça existencial comparável à Guerra
Civil e à Guerra Fria. Porém, agora, as causas de temor não seriam tanto os
exércitos poderosos, mas grupos terroristas e Estados fracassados
202
. Terroristas
e rogue states, irracionais, não poderiam ser dissuadidos
203
e, ademais, poderiam
199
J. Castañeda, The forgotten relationship, in Foreign Affairs 3 (2003), pp. 67-81. I.H. Daalder
e J.M. Lindsay reforçam essa visão de esquecimento quanto ao México (America unbound
cit., p. 191). Similarmente, P. Kennedy afirma que a intensificação dos esforços político-
diplomáticos dos EUA na Ásia Central e no Oriente Médio leva à dedicação de menos tempo à
América Latina e à África (A manutenção do poder americano: da ferida à recuperação, in S.
Talbott e N. Chanda (orgs.), A era do terror – o mundo depois de 11 de Setembro, Rio de
Janeiro, Campus, 2002, p. 72).
200
Estados Unidos da América, The national security strategy of the United States of America,
Washington D.C., The White House, 2002, disponível [on-line] in http://www.whitehouse.gov/
nsc/nss.html [25.04.2005]. As citações posteriores referem-se a esse documento.
201
L.O.S. Bonfim, A política externa... cit., pp. 02-39.
202
America is now threatened less by conquering states than we are by failing ones. We are
menaced less by fleets and armies than by catastrophic technologies in the hands of the embittered
few” (NSS, cap. I, p. 01).
203
In the Cold War, especially following the Cuban missile crisis, we faced a generally status
quo, risk-averse adversary. Deterrence was an effective defense. But deterrence based only
upon the threat of retaliation is less likely to work against leaders of rogue states more willing
to take risks, gambling with the lives of their people, and the wealth of their nations” (NSS, cap.
V, p. 15). Para J.S. Nye Jr., a administração Bush teria percebido, corretamente, a inoperância
da dissuasão quando o inimigo não tem endereço. Assim, ataques preventivos seriam justificados
– em autodefesa e quando a dissuasão for impossível. Entretanto, alargar a preempção para
casos de países que, no futuro, poderiam vir a auxiliar terroristas cria um precedente perigoso
que enfraquece as normas internacionais que regulam o uso da força. A melhor saída, assim, seria
limitar a preempção a casos definidos restritiva e claramente, além de sujeitar essas matérias aos
foros multilaterais (A North American perspective cit., pp. 05-14).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
90
vir a atacar com ADMs: essas são, grosso modo, as justificativas da doutrina de
ataque preventivo. A NSS mostra disposição a combater tanto grupos terroristas
quanto terceiros (grupos ou Estados) que os apoiam, toleram ou lhes dão refúgio.
204
Com a doutrina de guerra preventiva
205
, explicitada diversas vezes na NSS
206
,
coloca-se que situações – segundo os EUA – potencialmente ameaçadoras da
paz e da segurança internacionais poderiam ser enfrentadas manu militari. A
natureza das ameaças é vaga, podendo ensejar desde “intervenções humanitárias”
até ataques a proliferadores de ADMs, tudo em nome da “dignidade humana, da
liberdade de culto e da liberdade de consciência”.
207
A NSS afirma que todos os países têm responsabilidades no combate
ao terrorismo. De fato, os EUA reconhecem que o antiterrorismo requer
ampla participação e a buscam, sempre dentro das premissas estadunidenses.
Os países cooperativos serão ajudados, sendo o oposto válido para aqueles
que apoiarem o terrorismo de qualquer forma.
208
Essa ideia de ajuda espraia-
se do domínio militar ao socioeconômico. Cumpre ressaltar a centralidade,
na “guerra ao terrorismo”, das ligações entre Estados e grupos terroristas – o
combate aos Estados colaboradores é o eixo central dessa “guerra”.
209
204
B. Fausto, Hegemonia: consenso e coerção cit., p. 46; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao
terrorismo... cit., pp. 02-39; C.E. Lins da Silva, Doutrina Bush foi gerada há dez anos, in
Política Externa 3 (2002-2003), p. 53; C. Rice, Consciência de vulnerabilidade inspirou doutrina,
in Política Externa 3 (2002-2003), pp. 62-63; M.C. Flores, O policial benigno e a tolerância
zero, in Política Externa 3 (2002-2003), pp. 74-77; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação...
cit., pp. 151-69.
205
Para diferenciação entre “preempção” e “prevenção” e seu uso na doutrina Bush, ver J.L.
Gaddis, Grand strategy in the second term, in Foreign Affairs 1 (2005).
206
The United States has long maintained the option of preemptive actions to counter a sufficient
threat to our national security. The greater the threat, the greater is the risk of inaction – and the
more compelling the case for taking anticipatory action to defend ourselves, even if uncertainty
remains as to the time and place of the enemy’s attack. To forestall or prevent such hostile acts
by our adversaries, the United States will, if necessary, act preemptively” (NSS, cap. V, p. 15).
207
C. Amorim, Multilateralismo acessório, in Política Externa 3 (2002-2003), pp. 59-61; A.J.M.
Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 02-39; T. Todorov, Le nouveau désordre...
cit., pp. 34-45.
208
While our focus is protecting America, we know that to defeat terrorism in today’s globalized
world we need support from our allies and friends. Wherever possible, the United States will
rely on regional organizations and state powers to meet their obligations to fight terrorism.
Where governments find the fight against terrorism beyond their capacities, we will match their
willpower and their resources with whatever help we and our allies can provide” (cap. III, p.
07).
209
M.C. Flores, O policial benigno... cit., pp. 74-77; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao
terrorismo... cit., pp. 02-39; I.H. Daalder e J.M. Lindsay, America unbound… cit., pp. 85, 99.
Conforme S. Halper e J. Clarke, o pensamento neoconservador, ao privilegiar os conflitos
interestatais e ao entender o terror como necessariamente apoiado por Estados, oferece resposta
equivocada à ameaça (America alone... cit., pp. 01-08).
91
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
A despeito desse amplo espaço para a cooperação (alinhada aos EUA),
na NSS, o multilateralismo passa a ter caráter meramente acessório. Ao
contrário dos períodos Bush sênior e Clinton – que tampouco centravam
suas prioridades no multilateralismo – o unilateralismo não é ultima ratio,
mas recurso sempre à mão. Dessa forma, na ausência de consenso
internacional, os EUAwill not hesitate to act alone, if necessary, to exercise
our right of self-defense by acting preemptively against such terrorists
(NSS, cap. III, p. 06).
210
Deve-se ressaltar que essa determinação a agir sozinho aplica-se a
situações muito mais amplas e difusas que no passado. Dotados de poder
militar incontrastável, os EUA não se querem ver “amarrados” a
compromissos limitadores de sua capacidade de intervenção preventiva.
Tanto é assim que, na NSS, as Nações Unidas mal são lembradas – apenas
uma vez
211
, tendo-lhe sido reservadas questões não prioritárias aos EUA.
Sobretudo nesses termos, a noção de ataque preventivo, decidida sua
aplicação por um Estado sozinho, pode desmontar a estrutura onusiana de
paz e segurança.
212
Também é preocupante o embasamento ético da doutrina, apresentado
no início da NSS, que pode ser sintetizado no seguinte trecho:
The United States possesses unprecedented – and unequaled – strength
and influence in the world. Sustained by faith in the principles of
liberty, and the value of a free society, this position comes with
unparalleled responsibilities, obligations, and opportunity. The great
strength of this nation must be used to promote a balance of power
that favors freedom. (NSS, cap. I, p. 01)
A vocação de instaurar o Bem no mundo, tradicionalmente evocada pelos
EUA, apresenta-se na NSS. O poder sem paralelo dos EUA concretizaria
um desígnio superior, transmutando a força em direito. Esse excepcionalismo,
210
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 02-39; C. Amorim, Multilateralismo
acessório cit., p. 57.
211
As we pursue the terrorists in Afghanistan, we will continue to work with international
organizations such as the United Nations, as well as non-governmental organizations, and
other countries to provide the humanitarian, political, economic, and security assistance necessary
to rebuild Afghanistan so that it will never again abuse its people, threaten its neighbors, and
provide a haven for terrorists” (NSS, cap. III, p. 07).
212
C. Amorim, Multilateralismo acessório cit., pp. 57-61.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
92
consubstanciado na missão de fazer triunfar a liberdade sobre os inimigos,
torna mais perigosa a noção de ataque preventivo.
213
Outro aspecto da NSS, porém de corte claramente realista, é a busca
da manutenção do poder militar relativo incontrastável dos EUA. Conforme
Condoleezza Rice, “tentaremos dissuadir todos os adversários em potencial
de tentarem obter uma preparação militar com a esperança de suplantar ou
de se equiparar ao poder dos Estados Unidos e de nossos aliados”. A clareza
dessa posição evitaria possíveis conflitos e corridas armamentistas.
214
O interesse em “congelar” o poderio militar relativo no mundo, com os
EUA no topo, apresenta-se na estratégia estadunidense há várias décadas.
Entretanto, não há paralelo anterior ao empenho atual, caracterizado pelo
incremento grande e constante do orçamento de defesa e pela forma ostensiva
de apresentação dessa política. Antes do 11 de Setembro, o total de gastos
militares estadunidenses equivalia à soma dos outros 12 maiores orçamentos
de defesa; em 2004, correspondia à soma dos 21 seguintes.
215
Ademais, a busca da invulnerabilidade completa (sobretudo por meio do escudo
antimísseis) pressupunha, anteriormente, a segurança defensiva. Após os atentados e
com a NSS, amplia-se o escopo da invulnerabilidade com a troca da contenção pela
prevenção, esta de natureza ofensiva. A reação de Bush aos atentados foi: “We need
to fight it [terrorismo] overseas by bringing the war to the bad guys”. Embora a
NSS não proponha o uso preventivo de ADMs, declarações oficiais posteriores
aventam a possibilidade de first strike, nunca descartada durante a Guerra Fria contra
potências nucleares. A extensão dessa hipótese aos demais países e até a grupos
terroristas, sobretudo se em posse de armas químicas ou biológicas, é inédita e contraria
o direito internacional, particularmente o TNP. Reforça essa tendência o retorno do
debate oficial, nos EUA, acerca das “armas nucleares utilizáveis” (usable nukes ou
mini-nukes), de menor potência e de natureza ofensiva.
216
213
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 02-39; C. Amorim, Multilateralismo
acessório cit., pp. 59-61; T. Todorov, Le nouveau désordre... cit., pp. 34-45; G. Dupas,
Fundamentos, contradições... cit., p. 09.
214
C. Rice, Consciência de vulnerabilidade... cit., pp. 74-77.
215
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 02-39; S.P. Guimarães, Quinhentos
anos... cit., pp. 79-83; J.G. Tokatlian, O momento pró-consular – a América Latina depois da
reeleição de Bush, in Política Externa 4 (2005), p. 30.
216
C. Amorim, Multilateralismo acessório cit. pp. 56-57; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao
terrorismo... cit., pp. 02-39; R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., p. 80; J.G. Tokatlian, O
momento pró-consular... cit., p. 31; I.H. Daalder e J.M. Lindsay, America unbound... cit., p. 85.
Em dezembro de 2003, o embaixador Linton Brooks, chefe da National Nuclear Security
Administration, afirmou não haver, por enquanto, intenção dos EUA de desenvolver as armas
93
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
Quanto às ADMs, a NSS confere elevada ênfase a seu combate.
Demonstra a firme disposição estadunidense a pressionar e combater países
que tencionem o desenvolvimento desses armamentos. Isso está claro na
argumentação para a invasão do Iraque em 2003.
217
Em conclusão, a postura atual dos EUA tem uma vertente pragmática e
outra messiânica. Aquela se expressa na importância atribuída à manutenção
da superioridade estratégica e de poder e na elevada determinação a usá-la.
O messianismo, por sua vez, revela-se no excepcionalismo e nos valores
morais absolutos. A NSS é clara nessa dualidade: “The U.S. national security
strategy will be based on a distinctly American internationalism that
reflects the union of our values and our national interests” (NSS, cap. I,
p. 01).
218
Não obstante, é lícito entender que o unilateralismo realista constitui
o cerne e a originalidade da NSS.
219
No binômio que compõe a noção
de hegemonia (ver 1.1), reforçou-se a coerção em detrimento do
consenso, apesar de o mundo ser dividido em “fronteiras morais”
(terroristas e antiterroristas). Trata-se de “policiamento” internacional,
supostamente benigno, mas intolerante no que tange à segurança, como
entendida pelos EUA. É impossível saber se essa inflexão é duradoura.
O fato é que a doutrina Bush é um produto partidário que vem
nucleares pequenas (mini-nukes). A notícia em contrário teria sido gerada pela solicitação do
Executivo, ao Congresso, da ab-rogação de norma proibitiva da realização de determinadas
pesquisas nucleares – inclusive de mini-nukes. Os EUA teriam consciência do elevado custo
político de uma eventual decisão de desenvolver essas armas (Brasil, MRE, Brasemb Londres
para SERE, Telegrama nº 1416, 16.12.2003).
217
L.O.S. Bonfim, A política externa... cit., pp. 20-26; M.C. Flores, O policial benigno... cit.,
pp. 74-77; R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., pp. 77-79.
218
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 02-39.
219
Alguns autores interpretam essa percepção como oportunismo estadunidense para expandirem
suas posições militares e sua influência no mundo. P.ex., afirma H. Jaguaribe: “A “guerra ao
terrorismo” (...) representa uma opção política mais complexa do que aparenta. Não se trata (...)
de uma postura ingênua que considera que os Estados Unidos se tornaram, por seus valores
liberais, o alvo do terrorismo islâmico, o que requereria, por isso, vigorosas medidas preventivas.
(...) O “terrorismo” não é uma entidade, é uma estratégia, não centralmente coordenada, de
adversários destituídos de poder militar (...). A “guerra contra o terrorismo”, precisamente por
essa ambiguidade, proporciona aos Estados Unidos a vantagem de pretensamente legitimar, em
nome da autodefesa, atuações militares unilaterais, assumidas como preventivas e desencadeadas
onde, por outras razões, convenha fazê-lo. Mais ainda do que isso, depois da “contenção” do
poder soviético, que desapareceu, era indispensável criar um novo “inimigo” que justificasse a
presença de fortes contingentes militares americanos em todos os pontos estratégicos do mundo.”
(O segundo mandato, in Política Externa 4 (2005), pp. 22-23). Não cabe, aqui, indagar acerca
das verdadeiras intenções dos EUA, uma vez que foge ao objeto do presente trabalho.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
94
enfrentando oposição de setores como os democratas e acadêmicos
realistas.
220
Deve-se alertar, ademais, que, a despeito de ser a NSS uma inflexão na
política externa estadunidense, o documento expressa certa continuidade de
tendências anteriores. O combate ao terrorismo (à época, supostamente
apoiado pelos soviéticos) era tema central na agenda externa do governo
Reagan, justificando, em certa medida, o recrudescimento da Guerra Fria
pelos EUA. O conceito de rogue states foi elaborado por Clinton e Albright,
e muitas posturas pós-11 de Setembro já eram expressas na campanha de
Bush em 2000
221
. Ataques a países supostamente patrocinadores do
terrorismo já foram executados pelos EUA – como em 1986, contra a Líbia,
e, em 1998, contra Sudão e Afeganistão. Mais importante: a NSS é idêntica
a documento formulado pelo governo Bush pai, mas arquivado após a derrota
eleitoral para Clinton. A NSS é, portanto, um marco, mas não porta ideias
essencialmente novas – aprofunda certas tendências mais agressivas,
unilaterais e hegemonistas.
222
4.1.2. O segundo mandato de Bush
Com a vitória eleitoral republicana em 2004, essa doutrina e prática
seguem caracterizando a política externa estadunidense.
223
Conforme E.J.
Hobsbawm, Bush e seus assessores estão engajados numa reordenação
do mundo, baseada em espalhar a democracia, e cujos primeiros atos
220
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 02-39; B. Fausto, Hegemonia:
consenso e coerção cit., pp. 47-49; M.C. Flores, O policial benigno... cit., pp. 74-77. Como
exemplo dessa oposição, ver A. Gore, The politics of fear, in Social Research 4 (2004), bem
como Coalition for a Realistic Foreign Policy, The perils of empire: statement of principles by
the Coalition for a Realistic Foreign Policy, disponível [on-line] in http://
www.realisticforeignpolicy.org/static/000027.php [12.08.2005]. Este último texto, de 2004, é
uma interessante manifestação de autores realistas como Kenneth N. Waltz e Robert Jervis
contra a política externa de Bush, considerada imperialista e perniciosa aos interesses dos EUA.
221
Vale perceber a semelhança entre a política externa atual dos EUA e o texto de campanha de
C. Rice (Promoting the national interest, in Foreign Affairs 1 (2000)).
222
B. Fausto, Hegemonia: consenso e coerção cit., pp. 47-49; C.E. Lins da Silva, Doutrina
Bush... cit., pp. 50-52; G. Dupas, Fundamentos, contradições... cit., p. 09; A. Remiro Brotóns,
El orden... cit., p. 134, 138; B. Grosscup, The newest explosions of terrorism – latest sites of
terrorism in the 90’s and beyond, Far Hills, New Horizon, 2002, pp. 123-33.
223
Sobretudo se notado que, pela primeira vez em 70 anos, o partido do presidente eleito tem
maioria em ambas as casas do Congresso e, provavelmente, consolidará a maioria conservadora
na Suprema Corte (L. Martins, As eleições nos EUA: implicações e ameaças, in Política Externa
4 (2005), p. 11.
95
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
foram as invasões do Afeganistão e do Iraque.
224
Isso é perceptível no
discurso da segunda posse de Bush – quase todo dedicado às relações
exteriores –, em que o combate à tirania no mundo e a promoção da
democracia seriam fundamentais para a segurança estadunidense,
podendo, aparentemente, justificar ação militar.
225
Ao mesmo tempo,
entretanto, a administração Bush parece disposta, ao menos retoricamente,
a moderar sua atuação internacional e a privilegiar a diplomacia, o que foi
confirmado por Condoleezza Rice na sabatina do Senado que a referendou
como secretária de Estado (”Nossa interação com o restante do mundo
deve ser de diálogo, não de monólogo”).
226
4.1.3. Posicionamento dos EUA – resumo
Todo o exposto acerca dos EUA, sobretudo a respeito da NSS, forma
o contexto geral em que devem ser compreendidas suas posições acerca do
combate ao terrorismo. Conforme o U.S. Department of State, a política
antiterrorista dos EUA tem quatro princípios básicos: (a) não realizar acordos
com terroristas e não lhes fazer concessões; (b) levar terroristas à justiça por
seus crimes; (c) isolar e pressionar os Estados que apoiam o terrorismo para
forçá-los a mudarem de comportamento; e (d) apoiar as capacidades
antiterroristas dos países que trabalham com os EUA e necessitam de
assistência.
227
224
E.J. Hobsbawm, The dangers of exporting democracy, in The Guardian, 22.01.2005, disponível
[on-line] in http://www.guardian.co.uk/comment/story/0,3604,1396038,00.html [23.04.2005].
O historiador vê nessa política um futuro fracasso.
225
“[A] sobrevivência da liberdade em nossa terra depende cada vez mais do sucesso da liberdade
em outras terras (...).Essa tarefa não deve ser realizada primordialmente pela força das armas,
ainda que pretendamos defender nossa terra e os nossos amigos com o uso de armas, quando
necessário.”
226
F. Maisonnave, Bush promete atacar a “tirania” no mundo, in Folha de S. Paulo, 21.01.2005,
disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2101200501.htm
[21.01.2005]; Folha de S. Paulo, 19.01.2005, ”É a hora da diplomacia”, afirma Rice, disponível
[on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1901200506.htm [19.01.2005]; Folha
de S. Paulo, 21.01.2005, “Pôr fim à tirania é um trabalho concentrado que vai levar gerações”,
disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2101200508.htm
[21.01.2005]; L. Martins, As eleições nos EUA... cit., pp. 17-18; H. Jaguaribe, O segundo
mandato cit., p. 22. No discurso, aponta F. Maisonnave, Bush não usou a palavra “terror”, mas
“tirania” foi pronunciada cinco vezes, freedom, 27, e liberty, 15. Para uma interpretação mais
pessimista e simbólica do segundo mandato de Bush, ver S. Zizek, A fortaleza América cit.
227
Estados Unidos da América, U.S. Department of State, disponível [on-line] in http://
www.state.gov/s/ct/ [29.05.2005].
CIRO LEAL M. DA CUNHA
96
Numa dimensão mais prática, os EUA adotam listas de grupos
terroristas (determinadas pelo Antiterrorism and Effective Death
Penalty Act, de 1996) e de países que apoiam o terrorismo. Não se
preocupam, comumente, em ressaltar as causas subjacentes do terrorismo.
Os direitos humanos vêm sendo sistematicamente violados em nome da
“guerra ao terror”, sobretudo em Guantánamo.
228
Ademais, como visto
na NSS, uma das formas expressas de os EUA lidarem com o terrorismo
é a força militar, quiçá preventivamente, cuja função antiterrorista mais
importante tem sido a retaliação a atentados.
229
É de grande importância apontar, com P.R. Pillar, que, apesar de o
terrorismo islâmico ser composto de vários grupos e tendências, os EUA,
muitas vezes, o consideram algo unificado e poderoso – como se pudesse
competir internacionalmente com seu poder. Afinal, esse terrorismo foi
responsável – além do 11 de Setembro – pelos maiores atentados contra os
EUA nos anos 1990 (à exceção da explosão em Oklahoma City) e por
diversos dos mais importantes nos anos 1980. A emergência de Osama bin
Laden como alguém que personificava esse terrorismo favoreceu a visão
unitária do terrorismo islâmico.
230
Afora a substância das posições estadunidenses, deve-se ressaltar a
grande ênfase dada ao terrorismo em sua política externa. Isso pode ser
atribuído, além de ao impacto do 11 de Setembro, ao fato de serem os EUA,
atualmente, o alvo preferencial de atentados. Durante os anos 1990, os ataques
terroristas contra interesses estadunidenses foram 37% do total, mais que os
31% da década de 1980.
231
228
Para mais detalhes, ver J.A. Lindgren Alves, Fragmentação ou recuperação, in Política
Externa 13/2 (2004).
229
P.R. Pillar, Terrorism and U.S… cit., pp. 30, 99-100, 150, 159. Segundo P.R. Pillar, a
primeira operação de retaliação ocorreu contra a Líbia, em 1986, em resposta à explosão de uma
boate frequentada por militares estadunidenses em Berlim. A segunda foi contra o Iraque, em
resposta à tentativa de assassinar o ex-presidente George Bush, em 1993. A terceira, em 1998,
contra alvos no Afeganistão e no Sudão, em resposta aos ataques às embaixadas em Nairóbi e
Dar-es-Salaam.
230
P.R. Pillar, Terrorism and U.S… cit., pp. 51-55. Para P.R. Pillar, essa percepção também é
fomentada pelo entendimento do Mundo Islâmico como um todo único e em colisão com o
mundo judaico-cristão, para o que teriam contribuído os trabalhos de Bernard Lewis e Samuel
Huntington.
231
P.R. Pillar, Terrorism and U.S… cit., pp. 57-61. Segundo P.R. Pillar, três são as razões
principais dessa “preferência”: o terrorismo é a arma dos fracos contra os fortes – uma das
únicas formas em que se pode enfrentar os EUA; os interesses dos EUA são muito expostos; e
há grandes ressentimentos com o hegemon.
97
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
Como visto, a NSS requer a cooperação de todos os países na luta
contra o terror. A incapacidade dos EUA de combaterem o terrorismo
isoladamente, mesmo sendo o hegemon, é a causa fundamental dessa sua
pressão por apoio. Os EUA parecem capazes de vencer qualquer conflito
clássico, mas, contra o terrorismo – exceto casos excepcionais como o
Afeganistão (de quase identificação entre terroristas e o Estado) – a guerra
não é o meio mais eficaz de ação. Métodos mais eficientes seriam a inteligência,
a supressão do financiamento, a punição de culpados e a propaganda. Esses
meios demandam a cooperação.
232
Os EUA demonstram firme disposição a exigir o apoio internacional no
antiterrorismo; para isso, recorrem a seu poder. No entanto, nem isso garante
o acolhimento completo de suas demandas. É necessário que estas sejam
vistas como legítimas, sobretudo quando criam precedentes expansivos das
hipóteses legais de uso da força – como a doutrina do ataque preventivo.
Segundo J. Almino, “a batalha decisiva é a que se trava no terreno político e
ideológico”. De fato, a percepção de justiça da causa antiterrorista é importante
não só para obter apoios estatais, mas também para a vitória dessa causa.
Portanto, o apoio desejado pelos EUA é buscado por meio não só de seu
poder, mas também da tentativa de legitimação da “guerra ao terrorismo”.
233
Muitas vezes, essa legitimidade é posta em xeque. As supostas vinculações
entre o governo do Iraque e a al-Qaeda, não provadas e improváveis, soam
como oportunismo e não foram aceitas pela comunidade internacional. Os
EUA também são frequentemente percebidos como usuários de double
standards no juízo de quem é terrorista e quais são as medidas adequadas,
sobretudo nas questões relativas ao Oriente Médio. Mais recentemente, tem-
se cobrado a aceitação pelos EUA do pedido de extradição para a Venezuela
232
T. Todorov, Le nouveau désordre... cit., pp. 48-68, 107-08; A.G.A. Valladão, A autonomia
pela responsabilidade... cit., p. 240; L.O.S. Bonfim, A política externa... cit., pp. 102-21; J.S.
Nye Jr., The paradox of American power – why the world’s only superpower can’t go it alone,
Oxford, Oxford University, 2002, p. 40; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 09-
28; P.R. Pillar, Terrorism and U.S… cit., pp. 186-88; F. Rojas Aravena, A construção de
regimes... cit., p. 280.
233
L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 151-69; J. Almino, Inserção internacional...
cit., pp. 57-61; T. Todorov, Le nouveau désordre... cit., pp. 48-68. Bom exemplo da luta pela
legitimidade é dado por J. Danilovich, embaixador estadunidense no Brasil: “Os ataques do
terror internacional já demonstraram que nenhum país ou região pode se considerar a salvo do
flagelo do terrorismo, mas [com] maior cooperação, (...) nós podemos tornar o mundo um lugar
melhor e mais seguro. (...) Todas as nações, inclusive o Brasil, têm interesse nesse conflito.”
(Resoluções... cit.).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
98
do suposto terrorista Luis Posada Carriles, ex-agente da CIA – a recusa
expressaria incoerência e double standard no combate ao terror.
234
4.2. Reino Unido
O Reino Unido apresenta grande interesse direto no combate ao
terrorismo. A violência na Irlanda do Norte entre católicos e protestantes
tem mais de quatro séculos de história. A partir de 1968 e 1969, o
terrorismo passou a ser instrumento desse conflito e, desde então, não
deixou de ser usado. Em 1993, iniciaram-se negociações para o fim da
violência, completadas em Belfast em 1998, sem que, contudo, minorias
dos grupos terroristas de ambos os lados respeitassem os acordos.
Recentemente, foi concluído novo acordo, cujos resultados seguem
imprevistos. Ademais, o Reino Unido já foi palco de atentados de maior
transcendência internacional, como no notório caso em que um avião foi
explodido no ar por agentes líbios sobre a cidade de Lockerbie, na
Escócia.
235
234
Folha de S. Paulo, 23.05.2005, Chávez diz ter interesse em energia nuclear, disponível [on-
line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2305200507.htm [23.05.2005]; Folha de
S. Paulo, 10.05.2005, Caso de terrorista cubano constrange EUA, disponível [on-line] in http:/
/www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1005200505.htm [10.05.2005]. Cuba já vinha reclamando
dos double standards dos EUA quanto a Posada Carriles (ONU, AGNU, A/55/PV.84, disponível
[on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N00/791/64/PDF/
N0079164.pdf?OpenElement [18.07.2005], p. 09).Outra situação característica diz respeito
ao financiamento do terrorismo: “Sometimes, Americans give material support (with official
acquiescence) to groups that close American allies regard as terrorists. This was the case with
the flow of money and arms from Irish Americans to the IRA.” (S. Halper e J. Clarke, America
alone… cit., pp. 276-77). Além disso, se, no Afeganistão, os EUA puderam atacar terroristas
(logrou destruir apenas cerca de um quarto da al-Qaeda) por meio da guerra e de bombardeios
‘cirúrgicos’, essa não é opção para lugares como Hamburgo, Cingapura ou Detroit –
comprovadamente lares de muitos terroristas ou financiadores (J.S. Nye Jr., A North American
perspective cit., pp. 05-14).
235
W. Laqueur, The new terrorism... cit., pp. 33-34; P.R. Neumann, Bringing in the rogues:
political violence, the British government and Sinn Fein, in Terrorism and Political Violence 3
(2003), pp. 154-71; G.F.S. Soares, O terrorismo internacional e a Corte Internacional de
Justiça, in L.N.C. Brant (org.), Terrorismo e direito: os impactos do terrorismo na comunidade
internacional e no Brasil – perspectivas político-jurídicas, Rio de Janeiro, Forense, 2003, p.
230; W.F. Maierovitch, O fim do IRA?, in Carta Capital 354, 10.08.2005, p. 41. Conforme lista
da Jane’s World Insurgency and Terrorism, há sete grupos terroristas ainda ativos no Reino
Unido – Real IRA (RIRA), Provisional IRA (PIRA), Ulster Volunteer Force (UVF), Loyalist
Volunteer Force (LVF), Continuity Irish Republican Army (CIRA), Ulster Defence Association
(UDA) e Irish National Liberation Army (INLA) (disponível [on-line] in http://jwit.janes.com/
docs/jwit/browse_section_results.jsp?SelPub=jwit&bucket=Section&selected=GROUPS%20-
%20EUROPE%20-%20ACTIVE&start=1 [24.05.2005]).
99
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
Conforme o Home Office, a maior ameaça ao Reino Unido e a seus
interesses no exterior é a al-Qaeda, que teria nos britânicos um alvo
privilegiado. Demonstraria isso, v.g., o atentado em Istambul, em novembro
de 2003, contra o consulado britânico e uma agência do HSBC. Haveria
células da al-Qaeda no Reino Unido, onde vários atentados teriam sido
frustrados desde o 11 de Setembro.
236
Mais recentemente, em julho de 2005,
houve dois atentados múltiplos de elevada gravidade contra usuários de
transportes coletivos londrinos.
Essa realidade justifica a prioridade estratégica conferida pelo Foreign
and Commonwealth Office ao combate do terrorismo.
237
A “relação especial”
entre Reino Unido e EUA é de importância ao menos igual para esse
engajamento.
Os dois países têm relações consideradas muito próximas desde fins do
século XIX, tendo os governos britânicos do pós-guerra, seguidamente,
buscado manter e reforçar essa “Aliança Atlântica”. Em linhas gerais, tal
ligação, conforme buscada pelo Reino Unido, visa a tirar proveito do poder
dos EUA e, ao mesmo tempo, influenciar suas posições. Isso garantiria um
papel global ao Reino Unido e a ajuda ianque em uma eventual necessidade,
em troca de apoio quase incondicional às decisões dos EUA. Conforme H.
Kissinger, os britânicos, na “relação especial”, preservam sua identidade por
meio de subordinação ostensiva. Porém, trata-se de uma empresa comum –
se as preferências estadunidenses tivessem sido aceitas passivamente, haveria
uma dependência desmoralizante que destruiria a própria relação.
238
O 11 de Setembro e sua sequência mostraram-se ótima oportunidade
para os britânicos reforçarem esses laços. O primeiro-ministro Tony Blair
declarou apoio incondicional à “guerra ao terrorismo” e envolvimento de longo
prazo, posicionando o país como protagonista no conflito e reforçando a
condição de principal aliado estadunidense. De fato, forças britânicas de
inteligência e de defesa – não consideradas indispensáveis – foram dedicadas
a essa cooperação, inclusive com envio de 1.500 tropas ao Afeganistão.
236
Reino Unido, Home Office, The threat to the UK from international terrorism, disponível
[on-line] in http://www.homeoffice.gov.uk/terrorism/threat/index.html [24.05.2005].
237
Reino Unido, Foreign and Commonwealth Office, Terrorism and security, disponível [on-
line] in http://www.fco.gov.uk/servlet/Front?pagename=OpenMarket/Xcelerate/
ShowPage&c=Page&cid=1007029394239 [08.03.2005].
238
S. Azubuike, Still buying insurance? The realism behind Tony Blairs post-September 11
evangelization, in The Review of International Affairs 1 (2003), pp. 64-80; H. Kissinger, Years
of renewal, New York, Touchstone, 2000, pp. 606-07.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
100
Pouco após os atentados, Blair viajou intensamente, em amplo esforço
diplomático pela “guerra ao terrorismo” – até 7 de novembro de 2001, havia
conversado com 54 chefes de Estado.
239
Segundo S. Azubuike, é possível afirmar que a “relação especial”, já não
mais tão importante para os EUA após a Guerra Fria, permanece como
objetivo mediato fundamental dos britânicos, que se aproveitaram da crise
terrorista para assegurar essa relação histórica. Nesse sentido,
By offering full British support in the American campaign against
‘terrorism’ Blair hopes and expects that in a time of British need the
USA would remember and reciprocate.
240
A despeito de muitas manifestações populares em contrário, o apoio
britânico não faltou na invasão do Iraque, em março de 2003, e segue em sua
melhor forma. Esse apoio foi crucial para conferir aparência de legitimidade à
invasão.
241
De maneira geral, as posições britânicas quanto ao terrorismo
internacional e à “guerra ao terrorismo” devem sempre ser lidas à luz da
“relação especial”. Há, porém, espaço para posturas divergentes das
estadunidenses.
O esforço britânico na “guerra ao terrorismo” é, como expresso
acima, prioritário e de longo prazo, e alia-se ao combate à proliferação
de ADMs. Ao contrário da visão dos EUA, contudo, não se limita à
repressão, mas enfatiza ações políticas para eliminar as condições sob
as quais o terrorismo surge e é tolerado. Seriam causas do terror, para
o Reino Unido, as frustrações nos países árabes, os double standards
no processo de paz do Oriente Médio (promovidos, em geral, pelos
EUA e Israel), a pobreza e as doenças, bem como injustiças políticas e
239
S. Azubuike, Still buying insurance… cit., pp. 64-80; D.S. Soares, De Marx… cit., p. 219.
Para A. Azubuike, Blair deve ter compreendido que a melhor forma de influenciar os
desenvolvimentos do pós-11 de Setembro era apoiar completamente os EUA. Sugere, ainda,
que o engajamento britânico pode ter-se baseado na avaliação de que o Reino Unido seria um
provável próximo alvo do terrorismo islâmico – nesse caso, seria socorrido pelos EUA.
240
S. Azubuike, Still buying insurance… cit., p. 74.
241
C. Cogan, The Iraq crisis and France, in French Politics, Culture & Society 3 (2004), p.122.
Conforme S.P. Kramer, a “relação especial” foi prejudicada como resultado da invasão do
Iraque, pois, apesar da contribuição política e militar britânica, Blair teria alienado a linha-dura
estadunidense ao insistir em decidir a questão na ONU (Blairs Britain after Iraq, in Foreign
Affairs 4 (2003), pp. 90-104).
101
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
a falta de resolução de disputas (sobretudo a israelo-palestina). Mesmo
assim, o Reino Unido tem sido instado a abandonar práticas
antiterroristas que violam os direitos humanos, tais como detenção de
estrangeiros por tempo indeterminado, sem acusação ou julgamento;
maus tratos de detentos; e falta de proteção aos nacionais britânicos
detidos arbitrariamente em Guantánamo. A percepção de abusos no
antiterrorismo reforçou-se quando, em julho de 2005, a polícia britânica
executou o brasileiro Jean Charles Menezes, como resultado da doutrina
de “atirar para matar” terroristas.
242
4.3. França
A França é vítima histórica de três espécies de terrorismo: interno, colonial
e transnacional. Internamente, há os exemplos, a partir dos anos 1960, dos
movimentos autonomistas da Bretanha, dos bascos e da Córsega. Nos anos
1970 e 1980, a França sofreu com o grupo esquerdista Action Directe. O
terrorismo colonial pós-guerra, na dissolução do império francês, foi
gravíssimo, sobretudo na Argélia.
243
O terrorismo transnacional deu-se, entre outros, com assassinatos
de líderes árabes e atentados contra alvos judaicos, no contexto do
conflito árabe-israelense, a partir dos anos 1970. Neste tipo de
terrorismo, a França adotou abordagem de não desagradar aos
terroristas para não se tornar seu alvo preferencial: atribuíam-se pequenas
penas e, preferencialmente, deportavam-se os suspeitos. A estratégia
foi duramente criticada. Nos anos 1990, a França foi vítima, em seu
território, da violência da guerra civil argelina, pois apoiou a anulação
das eleições de 1991 (vencidas por partidos islâmicos) e o subsequente
regime militar na Argélia. Os terroristas argelinos contavam com forte
242
S. Azubuike, Still buying insurance… cit., pp. 64-80; Reino Unido, Foreign and
Commonwealth Office, Terrorism and security, disponível [on-line] in http://www.fco.gov.uk/
servlet/Front?pagename=OpenMarket/Xcelerate/ShowPage&c=Page&cid=1085325608403 e
http://www.fco.gov.uk/servlet/Front?pagename=OpenMarket/Xcelerate/
ShowPage&c=Page&cid=1007029394239 [08.03.2005]; Anistia Internacional, Rights denied:
the UK’s response to 11 September 2001, disponível [on-line] in http://web.amnesty.org/library/
index/ENGEUR450162002 [26.07.2005]; M.S. Moraes, ONGs exigem de Blair investigação
detalhada, in Folha de S. Paulo, 26.07.2005, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/
fsp/mundo/ft2607200503.htm [26.07.2005].
243
S. Gregory, France and the war on terrorism, in Terrorism & Political Violence 1(2003), pp.
124-33.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
102
apoio da al-Qaeda, que, em meados dos anos 1990, tinha na França
seu principal inimigo.
244
Com esse histórico, a França desenvolveu formidável aparato institucional,
responsável por enorme sucesso no combate ao terrorismo em seu território
e alhures. Além disso, o país pratica, tradicionalmente, intensa cooperação
internacional antiterrorista.
245
O 11 de Setembro teve repercussões profundas na França, a ponto de o
diário Le Monde ter publicado o editorial “Nous sommes tous Américains
no dia seguinte. Internamente, reforçaram-se as ações preventivas do
terrorismo e de seu financiamento. Na frente externa, destacou-se no
oferecimento de apoio militar e de inteligência no Afeganistão desde o início.
Dados o alcance global de sua influência e, em particular, seus ativos de
inteligência na África Setentrional, no Oriente Médio e no restante do mundo
francófono, o apoio da França é de grande importância na “guerra ao
terrorismo” estadunidense.
246
Deve-se ressaltar que a França, com 6% de muçulmanos em sua
população, tem profundo interesse no combate ao terrorismo islâmico; seu
território é uma das importantes frentes de combate desse terror. Há células
da al-Qaeda na França – como demonstra a prisão, em dezembro de 2001,
de Richard Reid, o shoe bomber, em voo de Paris a Miami.
247
A despeito de seu engajamento antiterrorista, a França teve atuação
destacada no combate à intervenção no Iraque, episódio que gerou
244
S. Gregory, France and the war… cit., pp. 124-33; G. Northam, Justice against terrorism:
what should Britain learn from French techniques?, in International Journal of Police Science
& Management, 3 (2003), pp. 155-60.
245
S. Gregory, France and the war… cit., pp. 124-38; França, Ministère des Affaires Étrangères,
La France et la lutte contre le terrorisme, disponível [on-line] in http://www.france.diplomatie.fr/
actu/article.asp?ART=28704 [20.05.2005]. Quanto à participação recente na discussão do
terrorismo, sublinha-se que a França propôs, em nome do G-8, o projeto de Convenção
Internacional para a Repressão de Atentados Terroristas a Bomba; teve papel importante na
elaboração da Convenção Internacional para a Supressão do Financiamento do Terrorismo; e
apoia, ainda, a rápida conclusão da convenção abrangente sobre terrorismo (França, Ministère
des Affaires Étrangères, Note de présentation générale de la lutte contre le terrorisme, disponível
[on-line] in http://www.france.diplomatie.fr/actu/article.asp?ART=23428 [20.05.2005]).
246
S. Gregory, France and the war… cit., pp. 138-43; França, Ministère des Affaires Étrangères,
La France et la lutte contre le terrorisme, disponível [on-line] in http://www.france.diplomatie.fr/
actu/article.asp?ART=28704 [20.05.2005].
247
S. Gregory, France and the war… cit., pp. 138-43; França, Ministère des Affaires Étrangères,
La religion et les valeurs, disponível [on-line] in http://www.france.diplomatie.fr/france/
ouvragefrance/1530.html#La%20religion%20et%20les%20valeurs [25.05.2005]. Segundo S.
Gregory, em abril de 2002, sete pessoas foram presas em conexão com Reid, somadas a mais
oito em novembro.
103
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
ressentimentos e desconfianças nos EUA. De fato, os franceses não aceitaram
a suposta vinculação de Saddam Hussein ao terror internacional e à proliferação
de ADMs, muito menos a doutrina do ataque preventivo.
248
Conforme o ex-
primeiro-ministro Lionel Jospin,
The necessary struggle against terrorism seemed to us to require more
of a global action – diversified and persistent – against international
terrorist networks, rather than an intervention in Iraq. We have been
leading this struggle alongside you from the very beginning, and it
must be continued.
249
De forma geral, a postura da França deve ser lida à luz de seu desejo de
preservar e aperfeiçoar as instituições e as regras internacionais do pós-guerra
(particularmente, as Nações Unidas), favorecendo um mundo multipolar
cooperativo em que os EUA tenham papel especial, mas levem em conta as
outras vozes. Em termos mais específicos, (a) a França está determinada a combater
todas as formas de terrorismo, sobretudo por meio da cooperação internacional;
(b) apoia, ao mesmo tempo, a luta contra os dramas humanos, políticos e sociais
que nutrem o terrorismo e lhe dão base de recrutamento; (c) reforça a
compatibilidade entre a luta contra o terrorismo e o respeito aos direitos humanos
e liberdades fundamentais; (d) adota, salvo exceção, resposta de tipo judicial e
policial, rechaçando a noção de ataque preventivo – somente o CSNU poderia
legitimar o uso da força; (e) evita ligações simplificadoras entre terrorismo e crime
organizado, reconhecendo os laços crescentes, sobretudo financeiros, entre os
dois fenômenos; e (f) favorece o reforço da cooperação antiterrorista por meio
de foros internacionais, sobretudo as Nações Unidas.
250
248
C. Cogan, The Iraq crisis… cit., pp. 120-32; L. Jospin, The relationship between France and
the United States – reflections for an American audience, in French Politics, Culture & Society,
2 (2004), pp. 118-26; F. Bozo, La relation transatlantique et la «longue» guerre contre le
terrorisme, in Politique étrangère 2 (2002), pp. 341-42. Na verdade, já antes do 11 de Setembro,
as relações franco-estadunidenses eram perturbadas pelo crescente unilateralismo dos EUA e
pelas divergentes percepções estratégicas, sobretudo no campo da segurança. O contexto da
“guerra ao terror” somente teria dramatizado essa situação.
249
L. Jospin, The relationship... cit., p. 120.
250
França, Ministère des Affaires Étrangères, Note de présentation générale de la lutte contre le
terrorisme, disponível [on-line] in http://www.france.diplomatie.fr/actu/article.asp?ART=23428
[20.05.2005], e La France et la lutte contre le terrorisme, disponível [on-line] in http://
www.france.diplomatie.fr/actu/article.asp?ART=28704 [20.05.2005]; L. Jospin, The
relationship... cit., pp. 118-26.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
104
4.4. China
A China apresenta problemas internos de separatismo violento que a inclinam
a apoiar o regime internacional antiterrorista. O caso considerado mais
problemático
251
por Pequim é a província Xinjiang, onde há movimento da etnia
uigur, de maioria muçulmana, pela criação do “Turquistão Oriental” soberano.
Com cerca de 18 milhões de habitantes, o Xinjiang produz um terço do algodão
chinês e contém as maiores reservas de petróleo e gás do país, além de fazer
fronteira com oito países. Devido às migrações internas, a proporção da etnia
uigur na província caiu de quase 90%, em 1949, para os atuais 45% a 50%.
252
A demanda uigur por um Estado tem longa história: sua primeira
manifestação data de 1865, mas o ápice do terrorismo deu-se nos anos 1990.
A resposta chinesa vinha sendo endurecida, com penas de morte (muitas
vezes não relatadas), tortura e repressão violenta a revoltas, conforme M.
Vicziany. A posição oficial é de não negociar, pois isso também poderia
fortalecer o separatismo de Formosa e Tibet.
253
Desde o 11 de Setembro, o governo chinês insiste em equiparar os
separatistas uigur aos terroristas islâmicos que estão no foco da “guerra ao
terrorismo”. Pequim aproveitou o momento para esmagar grupos de oposição,
inclusive os insurgentes uigur. Endureceram-se as leis contra estes, que,
segundo a versão oficial, têm motivações religiosas e fazem parte de uma
rede internacional de terrorismo com financiamento do Oriente Médio,
treinamento no Paquistão, bases no Cazaquistão e experiência de combate
na Chechênia e no Afeganistão.
254
251
Conforme apontam A.J. Nathan e B. Gilley, o governo chinês considera a situação do
Xinjiang mais crítica que o Tibet e Formosa, contrariando numerosos especialistas ocidentais
(Os novos dirigentes da China, in Política Externa 4 (2003), p. 36).
252
M. Vicziany, State responses to Islamic terrorism in western China and their impact on
South Asia, in Contemporary South Asia 2 (2003), pp. 243-62; Chien-peng Chung, China’s
“war on terror”, in Foreign Affairs 4 (2002).
253
M. Vicziany, State responses… cit., pp. 243-62; Chien-peng Chung, China’s “war on terror”
cit. Conforme M. Vicziany, os dados oficiais chineses apontam, entre 1990 e 2001, 41 incidentes
terroristas importantes, com 58 mortos e 179 feridos; ao todo, teria havido mais de 200 atentados,
com 162 mortos e mais de 440 feridos.
254
M. Vicziany, State responses… cit., pp. 243-62; J.M. Malik, Dragon on terrorism: assessing
China’s tactical gains and strategic losses after 11 September, in Contemporary Southeast Asia
2 (2002), pp. 256-60; Chien-peng Chung, China’s “war on terror” cit.; A.J. Nathan, e B. Gilley,
Os novos dirigentes… cit., p. 35. Segundo J.M. Malik, durante a ocupação soviética do
Afeganistão, a China colaborou com os mujahedin e talibãs, chegando a enviar combatentes
uigur. Vitoriosos, estes voltaram à China nos anos 1990, tendo alguns participado do separatismo.
105
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
A China demonstrou, logo após o 11 de Setembro, grande solidariedade
para com os EUA e compromisso com a “guerra ao terrorismo”: ratificou
importantes convenções, apoiou a resolução 1373 do CSNU e o uso da
força contra o Afeganistão, contrariando sua tradição de defesa veemente da
soberania; compartilhou inteligência sobre a al-Qaeda e permitiu a presença
do FBI em Pequim. Essa participação ativa inicial não parece desinteressada:
China’s support for the anti-terrorism operation was based on the
assumption that its success would help Beijing solve one of the oldest
problems faced by the Chinese empire: how to pacify, control and
Sinicize Xinjiang and Tibet – two vast regions that occupy about 30
per cent of China’s land mass and are rich in mineral resources, oil,
and gas.
Além da mão livre no Xinjiang, aponta J.M. Malik, a China buscava
apoiar a “guerra ao terrorismo” também em troca da redução nas vendas de
armas dos EUA a Taiwan.
255
Entretanto, os EUA têm rejeitado as tentativas de igualar os uigur aos
talibãs – os problemas internos chineses não teriam relação com os “terrorists
with global reach”; não haveria células da al-Qaeda no Xinjiang; separatismo
não seria o mesmo que terrorismo; e a solução das tensões na província
deveria ser política. Os EUA negaram-se a repatriar à China a maioria dos
uigur capturados no Afeganistão, e a questão de Formosa permanece em sua
dinâmica própria. Alegam que a adesão ao suposto oportunismo chinês poderia
prejudicar a legitimidade da “guerra ao terrorismo.” Do lado de Pequim,
essas opções constituem exemplo dos double standards dos EUA e fazem
parte da estratégia de contenção da China.
256
Praticamente frustradas essas expectativas de ganho de Pequim com seu
engajamento inicial na “guerra ao terror”, algumas vantagens, pequenas e
255
J.M. Malik, Dragon on terrorism… cit., pp. 257-60.
256
J.M. Malik, Dragon on terrorism… cit., pp. 268-87; Chien-peng Chung, China’s “war on
terror” cit.; M. Vicziany, State responses… cit., pp. 243-62; A.J. Nathan, e B. Gilley, Os novos
dirigentes… cit., p. 35. Segundo M. Vicziany, havia cerca de 1000 uigur nos campos de treinamento
do Talibã. Após a invasão ao Afeganistão, dos cerca de 300 detidos pelas forças estadunidenses,
apenas 10 foram extraditados para a China. Ainda conforme a autora, em fins de 2002, o grupo
East Turkestan Islamic Movement” foi incluído na lista dos EUA de terroristas. Atualmente,
entretanto, nenhum grupo uigur figura nesse rol (Estados Unidos da América, U.S. Department
of State, Foreign terrorist organizations (FTOs), disponível [on-line] in http://www.state.gov/
s/ct/rls/fs/37191.htm [24.05.2005]).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
106
táticas, são apontadas por J.M. Malik, das quais se destacam: (a) aproximação
dos EUA e maior previsibilidade nas relações sino-estadunidenses – vistas
por Pequim como essenciais para o crescimento econômico contínuo e para
a estabilidade doméstica
257
; (b) maior garantia de fornecimento de petróleo a
preços estáveis, dada a tendência de estabilização da Ásia Central
258
; (c)
redução sensível das críticas à campanha chinesa contra separatistas, cultos
religiosos e dissidentes políticos; e (d) suposta melhora da imagem chinesa
de potência responsável, racional e construtiva.
As perdas estratégicas chinesas com a “guerra ao terror” são mais
importantes, especialmente após a rápida derrota do Afeganistão. Dentre
essas perdas, listadas por J.M. Malik, ressaltam-se: (a) no Afeganistão, violou-
se a soberania, valor caro a Pequim – que, pela primeira vez, concordou com
uma intervenção dos EUA contra uma soberania; (b) aumentou
substancialmente a presença estadunidense, inclusive militar, ao redor do
território chinês, dando a Pequim sensação de estar cercada e reduzindo sua
“influência estratégica”, em particular na Ásia Central, onde também a Rússia
incrementou sua influência; (c) a Rússia, recente parceiro estratégico chinês
de contra-hegemonia, aproximou-se dos EUA; (d) a Organização de
Cooperação de Xangai
259
foi marginalizada, falhando em seu primeiro teste
diante do unilateralismo de Washington; e (e) Japão e Índia, rivais da China
na Ásia, adquiriram perfil mais elevado e maior protagonismo em questões
de segurança. Dessa maneira, a China, após os primeiros desenvolvimentos
da “guerra ao terror”, mantém-se relativamente silenciosa e ambígua quanto
ao terrorismo e tal “guerra”.
260
Essa postura indica, por um lado, o interesse vital chinês – pouco atendido
– pelo combate ao separatismo e, por outro, a aversão ao unilateralismo dos
257
Sustentar o crescimento até 2050, atingindo o “bom conforto”, é o propósito do Partido
Comunista Chinês, que espera retirar apoio popular desse êxito para sua continuidade (A.P. de
Oliveira, A China busca apoio na Europa, in Política Externa 13/4 (2005), pp. 58-59).
258
Cf. C. Lohbauer, A China e a dimensão energética da Ásia, in Política Externa 4 (2003), pp.
49-58.
259
Conforme J.M. Malik, a Organização de Cooperação de Xangai (atualização do Fórum de
Xangai, criado em 1996), formada por China, Rússia, Cazaquistão, Quirguistão, Tadjiquistão e
Uzbequistão em 2001, é a mais séria iniciativa chinesa de política externa em uma década.
Constituiria uma alternativa à política de poder e às alianças da Guerra Fria, tendo como
funções resolver o dilema de segurança regional, oferecer uma saída regional para o terrorismo,
estender a influência chinesa a oeste e manter os EUA estrategicamente fora da região.
260
Chien-peng Chung, China’s “war on terror” cit.; J.M. Malik, Dragon on terrorism… cit.,
pp. 252-54, 261-63, 268-87. G. Picco, ao contrário, vê Japão e Alemanha como os principais
perdedores geopolíticos do pós-11 de Setembro (New entente... cit., pp. 15-21).
107
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
EUA e à expansão de sua presença e influência na Ásia. Disso derivam as
posições de Pequim a respeito do combate ao terrorismo: (a) condena o
terrorismo em qualquer manifestação, bem como qualquer forma de apoio
estatal, sem double standards; (b) favorece a cooperação internacional nesse
combate, sobretudo nas Nações Unidas; (c) apoia as convenções
antiterroristas, inclusive a proposta de convenção abrangente; (d) considera
as causas subjacentes do terrorismo; e (e) defende o direito internacional,
sobretudo a Carta da ONU, como marco do antiterrorismo, sem interferir
nos assuntos internos de Estados soberanos.
261
No último ponto, pode-se entender que a China propõe um regime que
não abra espaço para ataques preventivos ou unilaterais – tende a exigir
mandato do CSNU para qualquer intervenção.
262
De fato, o governo chinês
apresenta seu país como um pilar do status quo global, a favor da estabilidade
e da paz. Apoia a ONU e a multipolaridade, não no sentido de disputas de
poder, mas de que mais nações tenham voz nas decisões internacionais.
263
4.5. Rússia
Com o colapso do socialismo real e o fim da União Soviética, a Federação
da Rússia mergulhou em profunda crise social, econômica, demográfica,
política e sanitária, contexto em que Putin assumiu a presidência (1999). O
separatismo checheno e a consequente violência, bem como as tensões na
Inguchétia e no Daguestão, são considerados fatores da fraqueza estrutural
do país. Tal percepção levou à tentativa de estabilização forçada da Chechênia,
sobretudo a partir de 1999, quando enviaram tropas com a justificativa de
antiterrorismo. Na última década, cerca de 15 mil militares e 50 mil chechenos
pereceram no conflito, inicialmente de tintas nacionalistas, mas crescentemente
associado ao radicalismo islâmico do lado checheno. Moscou recusa-se a
261
ONU, A/56/410–S/2001/914, disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/
GEN/N01/554/05/PDF/N0155405.pdf?OpenElement [02.03.2005]; ONU, A/56/776–S/2002/
78, disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/222/45/PDF/
N0222245.pdf?OpenElement [02.03.2005].
262
Como afirma A.P. de Oliveira, entre 1976 e 2002, a China vetou apenas uma resolução do
CSNU (os EUA, seis), evidenciando, em certa medida, a tendência multilateral e institucional
chinesa – expressa no repúdio à intervenção do Iraque em 2003 (A China busca apoio na
Europa, in Política Externa 13/4 (2005), pp. 58, 67).
263
J.M. Malik, Dragon on terrorism… cit., pp. 268-87; A.J. Nathan, e B. Gilley, Os novos
dirigentes… cit., p. 33.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
108
negociar – mesmo a autonomia regional poderia gerar “efeito dominó” na
desagregação russa.
264
Essa situação leva a Rússia a ser um dos principais demandantes do
fortalecimento do combate internacional ao terrorismo. Há suspeitas de que
Geórgia e Azerbaijão apoiem os chechenos
265
, além dos prováveis elos dos
separatistas com grupos terroristas islâmicos, sobretudo al-Qaeda. A Rússia
queixa-se, ainda, de campanha de informação hostil, que a acusa de
atrocidades na Chechênia, especialmente do double standard europeu, que
prega “conversas de paz” com os separatistas, não os considerando
necessariamente terroristas e, por vezes, dando-lhes tratamento benigno.
266
Dessa maneira, o endurecimento da “guerra ao terror” é corroborado
e alimentado pela Rússia de Putin, que busca liberdade e legitimidade
internacional para combater, isolar e conter o separatismo checheno
(como nas pressões para o fechamento das representações chechenas
no estrangeiro), se necessário à força e no exterior. Desde o 11 de
Setembro, Putin associa sua luta pela Chechênia ao combate ao
terrorismo global, ressaltando o envolvimento da al-Qaeda. Dada a
coincidência de interesses e a crescente influência da Rússia em região
de grande presença islâmica (sobretudo, nos países ex-soviéticos), o
264
D. Lynch, The enemy is at the gate: Russia after Beslan, in International Affairs 1 (2005), pp.
141-61; A. Rasizade, Chechnya: the Achilles heel of Russia – part one, in Contemporary
Review, 1671 (2005), p. 194; M.S. Moraes, Ocidente ignora drama tchetcheno, dizem analistas,
in Folha de S. Paulo, 12.09.2004, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/
mundo/ft1209200417.htm [12.09.2004]. A. Rasizade atribui parte da dificuldade em combater
o terrorismo na região ao costume tradicional, presente em todo o Cáucaso, de dar refúgio a
qualquer um que o peça (kunak).
265
A. Rasizade, Chechnya… cit., p. 194. A. Rasizade afirma essa hipótese. Em carta de
31.07.2002, a representação russa protestou ao Secretário-Geral das Nações Unidas contra a
permissividade da Geórgia para com os terroristas chechenos. Teria havido, a partir de supostas
bases em Pankisi George, tentativas de ataques ao território russo. Tbilisi estaria evitando
cooperar, tendo acusado a Rússia de agressões. A responsabilidade pelas consequências de
eventuais ataques terroristas é atribuída à Geórgia (ONU, A/57/269–S/2002/854, disponível
[on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/504/19/PDF/
N0250419.pdf?OpenElement [08.03.2005]).
266
D. Lynch, The enemy... cit., pp. 141-61; Folha de S. Paulo, 21.11.2004, Terror ameaça
território, diz presidente, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/
ft2111200407.htm [21.11.2004]. Conforme D. Lynch, a justiça britânica recusou-se a extraditar
Ahmed Zakayev, ex-ministro checheno do exterior e considerado terrorista por Moscou. Ainda,
um dos auxiliares mais próximos de Aslan Maskhadov, ex-presidente checheno considerado
terrorista por Moscou, Ilyas Akhmadov, obteve asilo no Reino Unido (Folha de S. Paulo,
09.09.2004, Moscou quer caçar terroristas no exterior, disponível [on-line] in http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft0909200401.htm [09.09.2004]).
109
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
terrorismo tornou-se tema proeminente e fluido na cooperação com os
EUA. Houve iniciativas como o apoio da inteligência e das forças russas
no Afeganistão, a anuência para a utilização estadunidense do espaço
aéreo russo e de bases militares em ex-repúblicas soviéticas, além do
apoio ao rearmamento da Aliança do Norte, grupo afegão antitalibã.
Criou-se, ainda, grupo de trabalho bilateral de alto nível sobre
antiterrorismo. Como coloca Condoleezza Rice, a “Rússia é um
importante aliado na guerra contra o terror.”
267
Esse contexto gerou maior aproximação entre OTAN e Rússia, oferecendo
a esta ocasião propícia para redefinir suas relações globais com o Ocidente
rico, agora mais próximas, sobretudo no campo militar. Apesar de essa
aproximação legitimar, de certa forma, a guerra na Chechênia, o diálogo com
a UE segue difícil na questão dos direitos humanos, também levantada por
ONGs como Human Rights Watch.
268
Também há receios entre EUA e os russos. Estes temem que o
unilateralismo estadunidense na “guerra ao terror” prejudique suas
interessantes relações com países do “eixo do mal”, como a cooperação
nuclear com o Irã e, antes da invasão, as propostas de negócios com o
Iraque. Tampouco aceitam a presença da OTAN no treinamento de
tropas georgianas e o desejo da aliança de expandir-se para o Báltico e
para o antigo bloco socialista. Da parte dos EUA, o irregular
comprometimento russo com a democracia de mercado e com a não
proliferação de ADMs conturba a aproximação, bem como o cuidado
afirmado na NSS para com possíveis concorrentes estratégicos. De
267
M.S. Moraes, Ocidente ignora... cit.; D. Lynch, The enemy... cit., pp. 141-61; Folha de S.
Paulo, 15.05.2005, Rússia e EUA são aliados militares, diz general russo, disponível [on-line]
in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1505200508.htm [15.05.2005]; L. Pomeranz, A
nova estratégia e a Rússia, in Política Externa 3 (2002-2003), pp. 71-72; C. Rice, Consciência
de vulnerabilidade... cit., p. 66; J.M. Malik, Dragon on terrorism… cit., p. 282; D.S. Soares,
De Marx... cit., pp. 273-74. Conforme D.S. Soares, em troca do apoio russo à “cruzada contra
o mal” dos EUA, estes passaram a ignorar a carnificina de Putin na Chechênia, intensificada
após o 11 de Setembro, e que em nada se liga ao antiterrorismo global.
268
R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., pp. 81-82; D. Lynch, The enemy... cit., pp. 141-61;
L. Pomeranz, A nova estratégia... cit., pp. 70-71; M. Walker, Post 9/11: the European dimension,
in World Policy Journal 4 (2001-2002), pp. 01-10; M.S. Moraes, Ocidente ignora... cit.; Folha
de S. Paulo, 22.04.2005, Otan e Rússia fazem acordo de cooperação militar, disponível [on-
line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2204200522.htm [22.04.2005]. Segundo
esta reportagem, OTAN e Rússia assinaram, em abril de 2005, acordo de cooperação militar
para a realização de exercícios e de treinamento conjuntos, além de permitir a passagem de
tropas da aliança por território russo e vice-versa.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
110
qualquer forma, as relações EUA-Rússia enfocam os interesses comuns,
sobretudo no campo do terrorismo.
269
O engajamento russo na “guerra ao terror” permanece elevado, sobretudo
após o atentado de Beslan
270
, devido ao qual o presidente Putin declarou
estar a Rússia em guerra e realizou reformas centralizadoras (eleição indireta
dos governadores das repúblicas da Federação e eleição na Duma por
representação proporcional). Como os EUA no pós-11 de Setembro, o atual
discurso russo acentua a dimensão moral – não há nuanças no combate ao
terrorismo –, o que dificulta as críticas a Moscou sobre o tratamento aos
chechenos e o apoio a estes. Reforça-se a ideia de que o conflito configura
questão interna e soberana.
271
Afirmou-se a possibilidade de medidas russas para liquidar terroristas
em qualquer parte, se necessário com ataques preventivos fora do território
russo (como em agosto de 2002, contra supostas bases chechenas na
Geórgia). Inicialmente, descartou-se o uso de armas nucleares nessas
operações, mas, em novembro de 2004, Putin anunciou o desenvolvimento
de um novo tipo de mísseis nucleares, sob o pretexto de combate ao terror.
272
Essa postura mais agressiva, contudo, não implica desengajamento
multilateral da Rússia. As organizações internacionais, especialmente a ONU,
têm papel central na estratégia russa para o tema, que gravita, grosso modo,
em torno dos seguintes objetivos: (a) de forma geral, estabilizar a ordem
mundial emergente, garantindo voz ativa à Rússia nesse processo, sobretudo
no sentido de evitar a unipolaridade estadunidense e fortalecer as Nações
Unidas; (b) moldar os instrumentos antiterroristas conforme os interesses de
269
L. Pomeranz, A nova estratégia... cit., pp. 70-71; D. Lynch, The enemy... cit., pp. 141-61;
Folha de S. Paulo, 28.02.2005, Um Bush diplomático, disponível [on-line] in http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz2802200503.htm [28.02.2005].
270
Em 1º.09. 2004, 32 terroristas tomaram a Escola Número Um na cidade de Beslan, na Ossétia
do Norte, mantendo mais de mil pessoas como prisioneiras, episódio que terminou, dois dias
depois, com 326 mortos e 540 feridos.
271
D. Lynch, The enemy... cit., pp. 141-61; ONU, A/59/337–S/2004/721, disponível [on-line]
in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N04/503/72/PDF/N0450372.pdf?OpenElement
[08.03.2005]. A queixa russa de double standard repetiu-se após Beslan (ONU, A/59/538,
disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N04/577/39/PDF/
N0457739.pdf?OpenElement [02.03.2005]).
272
D. Lynch, The enemy... cit., pp. 141-61; Folha de S. Paulo, 09.09.2004, Moscou quer caçar...
cit.; Folha de S. Paulo, 11.12.2004, Moscou diz que pode fazer ataques preventivos, disponível
[on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1112200414.htm [11.12.2004]; Folha
de S. Paulo, 18.11.2004, Putin diz desenvolver novo míssil nuclear, disponível [on-line] in
http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1811200409.htm [18.11.2004].
111
O REGIME EM CONSTRUÇÃOVISÃO GERAL
Moscou; (c) mais particularmente, adaptar o conceito de autodefesa de modo
que permita ataques preventivos contra o terrorismo; (d) incluir integralmente
a violência chechena no bojo da “guerra ao terrorismo”, impedindo, assim,
as críticas sobre direitos humanos nos foros internacionais e o apoio ou
tratamento benigno aos separatistas; e (e) rechaçar novas concepções e
princípios que menoscabam a soberania, como a ideia de “intervenção
humanitária”.
273
4.6. Conclusões parciais
As diferentes posições dos membros permanentes do CSNU levam a
duas constatações fundamentais: (a) todos conferem grande importância ao
combate ao terrorismo, percebido como ameaça à paz e à segurança
internacional. Isso demonstra a centralidade da temática na atualidade; e (b)
suas ideias de como deve ser esse combate divergem em vários pontos, o
que sustenta a afirmação de que o regime internacional de antiterrorismo tem
pontos centrais em aberto (ver 1.2).
Nota-se, nos casos de Estados Unidos, Reino Unido e Rússia – ao
contrário de China e França – apoio a medidas de intervenção militar
preventiva no bojo dos esforços antiterroristas. Estes três, mais a China,
aceitam a “flexibilização” dos direitos humanos no combate ao terrorismo, ao
que a França opõe-se a princípio.
Por outro lado, China, França e Rússia – ao contrário de EUA e Reino
Unido – privilegiam a moldura multilateral, particularmente as Nações Unidas,
para a cooperação antiterrorista. Temem o unilateralismo dos EUA e
favorecem uma ordem internacional multipolar, não no sentido da confrontação
com o hegemon, mas de modo a terem participação ativa nas questões
internacionais relevantes. China e Rússia, em especial, mostram-se altamente
ciosas da noção de soberania.
Do exposto, em linhas muito gerais, percebe-se, de um lado, uma forte
propensão à inserção do regime internacional antiterrorista em um quadro de
militarização intervencionista, de enfraquecimento das Nações Unidas no que
273
D. Lynch, The enemy... cit., pp. 141-61; S. Lavrov, Rússia e Brasil: uma parceria prática, in
Folha de S. Paulo, 23.11.2004, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/
fz2311200409.htm [23.11.2004]; Brasil, MRE, SERE para Brasemb Moscou, Despacho
Telegráfico nº 570, 21.12.2001.
CIRO LEAL M.DA CUNHA
112
tange às formas legítimas do uso da força, e de relativização do direito
internacional, particularmente os direitos humanos. De outro, verifica-se
tendência à cooperação antiterrorista pacífica, ao fortalecimento das Nações
Unidas e à revalorização do direito internacional e dos direitos humanos. Em
ambos os casos, o combate ao terrorismo é considerado tema internacional
de grande importância.
O que se pretende, doravante, é situar o Brasil nessa discussão acerca
dos temas em aberto do regime internacional antiterrorista. De antemão, pode-
se afirmar que a política externa do País encontra-se no segundo grupo de
opções.
113
5. O regime em construção – posições
brasileiras
Analisadas as atuais vertentes da discussão acerca dos aspectos em aberto
do regime internacional antiterrorista, cumpre investigar as posições do
Governo brasileiro quanto ao regime em construção, bem como as motivações
que as justificam. Buscou-se realizar uma análise que cotejasse o discurso
externo brasileiro sobre terrorismo com as orientações gerais da ação externa
e os interesses mais concretos do País.
5.1. Baixa prioridade do tema na agenda externa
Como praticamente todos os países, a chance de o Brasil ser alvejado
por terroristas é função quase exclusiva da disposição destes. Não obstante,
essa é considerada uma ameaça menor ao País. Não há terroristas identificados
no Brasil, apesar de já ter havido terrorismo doméstico há não muito tempo.
274
274
O ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, Gen.
Alberto Cardoso, aponta um sequestro de avião para ser lançado contra o Palácio do Planalto,
em 1988, e a explosão de torres de transmissão de energia como exemplos, mas corrobora a
inexistência atual de terrorismo no Brasil, considerando as notícias esporádicas de explosões de
artefatos caseiros manifestações isoladas diferentes de terrorismo (A.M. Cardoso, Existe
terrorismo no Brasil?, in Folha de S. Paulo, 24.09.2001, caderno Opinião). Ver também J.C.K.
Daly, Is Brazil ripe for revolution?, in Jane’s Terrorism and Security Monitor, 1º.01.2004,
disponível [on-line] in http://www4.janes.com/subscribe/jtsm/doc_view.jsp?K2DocKey=/
content1/janesdata/mags/jtsm/history/jtsm2004/
jtsm0204.htm@current&Prod_Name=JTSM&QueryText= [1º.04.2005].
CIRO LEAL M. DA CUNHA
114
Como a identificação antecipada de potenciais terroristas internos é
incompatível com o Estado de direito e muito dispendiosa, resta ao Brasil
considerar a possibilidade de atentados por grupos que já optaram pelo
terrorismo – hoje, tais grupos são aqueles de atuação internacional.
275
Contra o Brasil, não há predisposição ostensiva por parte desses grupos
mais atuantes nem notícia de sua presença – o que é, em grande medida,
função da tradição brasileira de não intervenção e respeito à soberania, bem
como da perfeita integração da comunidade árabe. Contudo, a possibilidade
de presença de terroristas internacionais e de ataques em solo brasileiro não
pode ser excluída
276
– a ausência de alertas poderia refletir mera dificuldade
na obtenção de informação, sobretudo quanto a “células dormentes”. Ademais,
a lógica organizacional do novo terrorismo – estruturado em pequenas células,
com vínculos associativos de difícil detecção, além de taticamente mais ousado
e indiscriminado – aumenta a probabilidade de ações preparatórias ou de
ataques no Brasil. Vale ressaltar que, no País, há grande presença de instalações
e pessoas relacionadas a alvos tradicionais do terrorismo internacional
(particularmente EUA e Israel). Consulados, embaixadas, organismos
internacionais, empresas, templos etc. ligados a esses alvos constituem a causa
maior de suscetibilidade do Brasil ao terrorismo internacional. Mesmo que o
País não seja o alvo, seu território pode ser palco dos conflitos globais
expressos no terrorismo. O fator surpresa é sempre vantagem tática do
terrorista. Além disso, uma desvantagem de cooperar contra o terrorismo,
como faz o Brasil, é estar sujeito a represálias dos grupos contrariados.
277
Também conspira a favor de possíveis atentados ou sua preparação a
natureza relativamente aberta do Estado brasileiro a conexões externas. Entre
outros fatores, contribuem com isso a grande diversidade de laços
275
E. Diniz, Considerações sobre a possibilidade... cit., pp. 15-45; A.M. Cardoso, Existe
terrorismo... cit.; Brasil, MRE, COCIT, Despacho ao Memorandum SGAP/14 de 17.06.2003,
23.06.2003; Entrevista concedida ao autor pelo Professor Celso Lafer, ex-Ministro das Relações
Exteriores, em Brasília (23.06.2004).
276
Na análise de M. Cepik, haveria risco médio de o Brasil ser atacado, devido à suposta baixa
prioridade atribuída ao tema pelos órgãos governamentais e à realidade internacional
contemporânea (Adequação e preparo... cit., pp. 47-77).
277
W.F.B. Jacini, Terrorismo: atuação... cit., p. 79; II encontro de estudos... cit., pp. 103-23;
E. Diniz, Considerações sobre a possibilidade... cit., pp. 15-45; L.O.S. Bonfim, A política
externa... cit., pp. 122-39; M.P. Buzanelli, Introdução cit., pp. 09-13; M. Cepik, Adequação e
preparo... cit., pp. 47-77; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109;
A.M. Cardoso, Existe terrorismo... cit.; A.M. Cardoso, Terrorismo e segurança... cit., pp. 52-
53; P.R. Pillar, Terrorism and U.S… cit., pp. 188-89.
115
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
transnacionais da população, a porosidade das fronteiras e sua limitada
fiscalização, além da boa oferta de serviços (sobretudo transportes,
comunicações e serviços financeiros) e das deficiências nos aparatos policiais
e de inteligência.
278
Ataques com ADMs são, no Brasil, tão possíveis quanto nos demais
lugares do mundo. Nesse sentido, os avanços da não proliferação e do
desarmamento são positivos (ver 3.2.5).
279
De maior risco para a segurança nacional, atualmente, são as possíveis
conexões entre o crime organizado brasileiro e organizações guerrilheiras ou
terroristas em países vizinhos, como as FARC, que se limitam ao território
colombiano, mas participam do narcotráfico transnacional. Deve-se atentar,
sobretudo, para que o terrorismo não seja reproduzido pela criminalidade
brasileira como método de ação.
280
A recente explosão de bomba num estacionamento da Petrobras na
Bolívia, na sequência de discussões e protestos sobre a exploração de
hidrocarbonetos naquele país, apesar de ação isolada e sem gravidade, lança
nova luz na questão da espécie de desafio que pode afetar interesses brasileiros
no exterior. Houve brasileiros sequestrados em zonas de conflito, sendo o
mais recente o do engenheiro da Odebrecht no Iraque. Ainda, em 2003, o
brasileiro Sérgio Vieira de Mello, representante das Nações Unidas no Iraque,
foi morto em um atentado terrorista, bem como os brasileiros presentes no
11 de Setembro. Mesmo assim, não se pode afirmar que o Brasil sofra
ameaças terroristas graves no exterior, sobretudo porque, afora talvez o caso
da Petrobras – cuja pequena gravidade parece não caracterizar terrorismo –
as vítimas não foram escolhidas por serem brasileiras.
281
278
II encontro de estudos... cit., pp. 103-23; E. Diniz, Considerações sobre a possibilidade...
cit., pp. 15-45. P. Wilkinson ressalta as vulnerabilidades a que estão sujeitas as democracias
liberais industrializadas, tais como liberdade de movimentação interna, disponibilidade de
tecnologia e imprensa livre (Terrorism and the liberal... cit., pp. 188-91.
279
E. Diniz, Considerações sobre a possibilidade... cit., pp. 15-45.
280
II encontro de estudos... cit., pp. 103-23.
281
M.P. Buzanelli, Introdução cit., pp. 09-13; Folha de S. Paulo, 23.01.2005, Insurgentes
assumem seqüestro de brasileiro, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/
mundo/ft2301200501.htm [23.01.2005]; L. Coelho, Petrobras sofre ataque terrorista na Bolívia,
in Folha de S. Paulo, 14.05.2005, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/
mundo/ft1405200502.htm [16.05.2005]; Folha de S. Paulo, 20.01.2005, Brasileiros já foram
seqüestrados em zonas de conflito, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/
mundo/ft2001200502.htm [20.01.2005]. Em mensagem por vídeo, os autores do atentado à
Petrobras, incógnitos, demandaram a nacionalização dos recursos energéticos bolivianos em 15
dias (Brasil, MRE, Brasemb La Paz para SERE, Telegrama nº 583, 13.05.2005).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
116
Nesse contexto, justifica-se a baixa prioridade conferida ao tema do
terrorismo na política externa brasileira, bem como na agenda interna.
Contudo, não se pode perder de vista que o custo de eventuais atentados ao
Brasil ou aos vizinhos seria elevadíssimo. Implicaria, provavelmente, enorme
pressão, interna e externa, sobre o governo. Além disso, sub-regionalmente,
um atentado contra a Argentina, principal parceiro brasileiro, poderia levá-la
a maior aproximação aos países de destaque na “guerra ao terrorismo”. Tal
readequação política poderia afetar diretamente as prioridades da política
externa brasileira – sobretudo no que tange ao exercício de uma ativa liderança
na América do Sul.
282
Dessa maneira, justifica-se a postura brasileira de, por um lado, conferir
baixa prioridade, relativamente a outros temas, à temática do terrorismo,
mas, por outro, não descurar o preparo interno e a participação internacional
nos foros existentes, bem como a cooperação. Como afirmou o Ministro da
Defesa José Viegas Filho, “[f]elizmente, não há terrorismo brasileiro nem
contra o Brasil. Mas mantemos constante vigilância.”
283
A todos os países, na
verdade, interessa combater o terrorismo, pois podem ser suas vítimas futuras.
À percepção de baixo risco de atentados terroristas no Brasil ou contra
interesses do País, soma-se a necessária prioridade conferida a outros temas
de segurança e defesa. A proteção da Amazônia é considerada a maior
prioridade em termos de defesa. Afinal, o País não tem inimigos clássicos visíveis;
uma guerra generalizada seria improvável e, nessa hipótese, o Brasil não teria
papel relevante. Ainda, um conflito interestatal sul-americano é possibilidade
remota, já que a região vive momento de integração e de consolidação da paz.
Já quanto à segurança pública, existe uma preocupação premente com respeito
à criminalidade, particularmente o crime organizado urbano.
284
282
E. Diniz, Considerações sobre a possibilidade... cit., pp. 15-45.
283
Intervenção do Senhor Ministro de Estado da Defesa, José Viegas Filho, na Comissão de
Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, em Brasília (14.05.2003),
disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/discursos/2003/
resenha,14,05,03,01.htm [12.07.2005].
284
G.M.C. Quintão, A política de defesa para o século XXI e a missão constitucional das
Forças Armadas, in A. Rebelo e L. Fernandes (orgs.), Política de defesa para o século XXI,
Brasília, Câmara dos Deputados, 2003, pp. 27-28; T.G. Costa, A segurança internacional...
cit., p. 201. Em discurso, o então Ministro da Defesa José Viegas Filho, aponta algumas
prioridades brasileiras na área de defesa: (a) proteção da Amazônia, não somente em decorrência
da vizinhança com a Colômbia, mas também em virtude dos vazios demográficos, da criminalidade
transnacional, da necessidade de vigilância do espaço aéreo e das águas brasileiras. O Ministro
apontava, ainda, as carências materiais para o cumprimento da proteção da Amazônia; (b)
117
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
Dessa maneira, fica evidente que o combate ao terrorismo, na realidade
brasileira, representa tema secundário na hierarquia das prioridades. Isso
não implica, contudo, descuido com a questão ou falta de cooperação com a
comunidade internacional, como se viu (capítulo 3). O Brasil assume sua
parcela de responsabilidade na luta contra o terrorismo, mas reconhece que
os interesses por esse tema não são equivalentes entre as nações.
5.1.1. Antiterrorismo: oportunidade contra o crime organizado
Em cotejo com a baixa prioridade conferida pelo Brasil à temática do
terrorismo, cumpre ressaltar a oportunidade aberta pelo fortalecimento do
regime internacional antiterrorista no que tange ao combate à criminalidade
organizada, área de elevada preocupação para o País.
285
Afinal, existem elos
entre as redes criminosas e terroristas transnacionais, sendo os instrumentos
de cooperação internacional semelhantes nos dois campos – basicamente,
compartilhamento de informações, cooperação judicial e controles de fluxos
de pessoas e bens (ver 3.2.4).
Conforme B. Hoffman, é ineditamente elevada a intensidade, após o
fim da Guerra Fria, da formação de alianças entre organizações criminosas
motivadas economicamente e grupos terroristas e guerrilheiros. A
preocupação com esse fato é explícita na comunidade internacional. A
resolução 1373 do CSNU reconhece a estreita ligação entre terrorismo
internacional e crime organizado transnacional (como narcotráfico, lavagem
de dinheiro e contrabando de materiais nucleares, químicos e biológicos),
e o CAT tem tratado desses vínculos. Segundo relatório de 2004 do
presidente do Comitê, crime organizado e terrorismo são “dois lados da
promoção da integração das Forças Singulares (Exército, Marinha e Força Aérea) sob a égide do
Ministério da Defesa; e (c) o relacionamento internacional em temas de segurança e defesa
(Intervenção do Senhor Ministro de Estado da Defesa, José Viegas Filho, na Comissão de
Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, em Brasília (14.05.2003),
disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/discursos/2003/
resenha,14,05,03,01.htm [12.07.2005]). Nesse sentido, de fato, a Política de Defesa Nacional,
de 1996, não menciona qualquer ameaça estatal ao Brasil, mas considera, especificamente, que
a “ação de bandos armados que atuam em países vizinhos, nos lindes da Amazônia brasileira, e
o crime organizado internacional são alguns dos pontos a provocar preocupação.” (J.P.S. Alsina
Jr., A síntese imperfeita: articulação entre política externa e política de defesa na era Cardoso,
in RBPI 2 (2003), p. 23).
285
Entrevista concedida ao autor pelo Ministro Marcos Vinícius Pinta Gama, Chefe da COCIT,
em Brasília (22.08.2005). A PDN atual, p.ex., considera os delitos transnacionais ameaças à
paz, à segurança e à ordem democrática (§ 2.6).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
118
mesma moeda”: existe grande semelhança de modus operandi e efeitos,
bem como financiamento do terrorismo pelo crime organizado. Dessa
forma, esforços contra este constituiriam um meio direto de combater o
terrorismo.
286
Participando dessas tendências, o Brasil entende que a prevenção e a
repressão do terrorismo, mesmo com especificidades, associam-se ao
combate de outros ilícitos internacionais. Reiteradamente, menciona a
necessidade de cooperação contra o tráfico de armas pequenas: argumenta
que esse tráfico tem papel importante no cometimento de atos terroristas e
no crime organizado.
287
No mesmo espírito, nas negociações da Convenção Interamericana
Contra o Terrorismo, o Brasil defendeu texto que relacionasse o terrorismo
internacional e o crime organizado transnacional, particularmente a indústria
das drogas. Também no que respeita à lavagem de dinheiro (ver 3.2.6), o
Brasil tem no combate ao terrorismo uma importante fonte de sinergias contra
o crime organizado. O País tem-se valido, outrossim, das discussões na OEA
sobre terrorismo cibernético para avançar na segurança informática em geral.
288
Em síntese, o recrudescimento do antiterrorismo constitui oportunidade
para que o Brasil fortaleça suas ações contra o crime organizado. O País
tem, de fato, aproveitado a chance em área que, contrariamente ao terrorismo,
é prioritária em sua agenda.
286
B. Hoffman, Inside terrorism, New York, Columbia University, 1998, pp. 27-28; V.C.
Mello, Paz e segurança... cit., p. 179; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp. 103-
17; ONU, CSNU, S/2004/70, Report by the Chair of the Counter-Terrorism Committee on the
problems encountered in the implementation of Security Council resolution 1373 (2001),
disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N04/219/97/PDF/
N0421997.pdf?OpenElement [18.07.2005], p. 07.
287
A.C. Vaz, Cooperação multilateral... cit., pp. 79-101; Brasil, MRE, SERE para Delbrasupa,
Despacho Telegráfico nº 508, 14.11.2001; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº
1690, 20.10.1999. Já em 1996, durante a Conferência Especializada Interamericana sobre
Terrorismo, a delegação brasileira realizou proposta de criação de controle de armas de fogo
como forma de combater o terrorismo (OEA, Conferencia Especializada Interamericana sobre
Terrorismo – actas y documentos, Washington D.C., 1996, p. 38). O Brasil, em 2001, insistia
na necessidade de os membros da OEA ratificarem a Convenção Interamericana contra a
Fabricação Ilícita de Armas de Fogo, suas Peças e Partes, Munições e Explosivos, de 1997.
288
Brasil, MRE, SERE para Delbrasupa, Despacho Telegráfico nº 493, 06.11.2001; Entrevista
concedida ao autor pelo Ministro Marcos Vinícius Pinta Gama, Chefe da COCIT, em Brasília
(22.08.2005). Porém, o Brasil não reconhece a automaticidade entre o narcotráfico e o
financiamento do terrorismo (Brasil, Ministério da Fazenda, Conselho de Controle de Atividades
Financeiras, Relatório de Atividades – 2004, disponível [on-line] in http://www.fazenda.gov.br/
coaf/ [15.07.2005], p. 12).
119
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
5.2. Prioridade ao desenvolvimento na agenda externa
Outro motivo essencial da baixa atenção relativa conferida pela
diplomacia brasileira ao tema do terrorismo é sua prioridade absoluta
ao desenvolvimento. Nas palavras do Chanceler Celso Amorim:
I would like to distinguish between two sets of cases: (a) on the
one hand, situations that are part of the international agenda,
irrespective of our will; and (b) on the other hand, our effort to
reshape the international agenda – albeit in a limited way – with
a view to creating a world more conducive to international
cooperation for peace and development. The security challenges
stemming from September 11th and the current Iraqi crisis clearly
fall into the first category. International terrorism is at the
forefront of the international agenda, whatever we may think of
its causes, or of the most effective way of coping with it.
289
Nota-se, pois, que a temática do terrorismo é vista como assunto
inescapável na agenda internacional com que o Brasil é obrigado a lidar.
Contudo, o País busca uma reformulação dessa agenda, de modo a
construir ambiente mais propício ao desenvolvimento pacífico e
cooperativo. As prioridades absolutas da política externa brasileira
encontram-se, claramente, no campo do desenvolvimento.
Predomina, no discurso diplomático brasileiro, a percepção de que
o grande desafio do País encontra-se no campo do desenvolvimento
econômico e social, para a construção de um Estado moderno, eficaz,
mais justo e menos corrupto. Sua ação externa funda-se na preocupação
de criar ambiente externo favorável a seu desenvolvimento. É por isso
que o Brasil, tem, há tempos, buscado direcionar as energias diplomáticas
voltadas à segurança internacional stricto sensu para uma concepção
de segurança econômica.
290
289
Palestra proferida pelo Ministro Celso Amorim na London School of Economics, em Londres
(17.03.2004), disponível [on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/
discursos/discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=2331 [13.08.2005].
290
R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., pp. 86-87; L.F. Seixas Corrêa, O Brasil e o mundo
no limiar do novo século: diplomacia e desenvolvimento, in RBPI 1 (1999), p. 12; J. Almino,
Inserção internacional... cit., p. 39.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
120
De fato, o País é um dos patrocinadores da ideia de segurança econômica
coletiva nas Nações Unidas desde 1953.
291
Privilegia a visão de que não
pode haver paz duradoura sem esforços pelo desenvolvimento sustentável,
com enfrentamento da pobreza e das desigualdades; seria “diplomacia
preventiva” a cooperação para o desenvolvimento. A segurança econômica
dependeria da criação de uma ordem econômica internacional (comercial e
financeira) mais justa.
292
Na mesma tradição, insere-se o seguinte discurso
do Presidente Cardoso:
Não basta, no entanto, acabar com as armas de destruição em massa.
O bem-estar das nações é outra importante vertente da paz e da
segurança internacionais. É necessário que se encontrem soluções
para a escassez, a pobreza e a miséria, e sobretudo para as diversas
manifestações de intolerância e de violações dos direitos humanos
que colocam em risco a paz mundial. (...) Não pode haver verdadeira
paz num mundo crescentemente marcado por disparidades entre as
nações, pela concentração de conhecimento, ou pelo predomínio de
visões e interesses de curto prazo.
293
Nesse sentido também discursou o Presidente Lula:
Estou convencido de que não haverá desenvolvimento econômico
sem sustentabilidade social e que, sem ambos, teremos um mundo cada
vez mais inseguro. É nesse espaço de desagregação social que
291
Nesse ano, em seu discurso na AGNU, o Chanceler Mario de Pimentel Brandão expressou
tal conceito, em nome do qual se reclamavam mecanismos para atenuar os efeitos negativos
causados, nos países subdesenvolvidos, em virtude das desigualdades internacionais de
crescimento econômico. Esse ideal e o conceito seriam retomados muitas vezes naquele foro (A
palavra do Brasil nas Nações Unidas, 1946-1995, Brasília, Funag, 1995, pp. 80, 84, 266).
292
J. Almino, Inserção internacional... cit., pp. 40-41, 52; V.C. Mello, Paz e segurança... cit.,
pp. 175-77; C. Amorim, Entre o desequilíbrio unipolar e a multipolaridade: o Conselho de
Segurança da ONU no período pós-Guerra Fria, in G. Dupas e T. Vigevani (orgs.), O Brasil e
as novas dimensões da segurança internacional, São Paulo, Alfa-Ômega, 1999, pp. 93, 97. V.C.
Mello afirma que, a despeito dessas posições, o Brasil mantém-se prudente, avesso que é à
possibilidade de que essa relação entre economia e segurança possa ensejar interferência indevida
nos assuntos internos.
293
Discurso do Senhor Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, por ocasião da
Sessão Especial do Conselho Executivo da Organização para a Proibição das Armas Químicas
(OPAQ), na Haia (09.10.2000), disponível [on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/
politica_externa/discursos/discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=1185 [22.03.2005].
121
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
prosperam os ressentimentos, a criminalidade e, em especial, o
narcotráfico e o terrorismo.
294
Essa vinculação de agendas resgata o discurso que atribui à política externa
a tarefa de complementar os esforços em prol do desenvolvimento. Teria o
mesmo senso de oportunidade da Operação Pan-Americana, proposta por
Juscelino Kubitschek, em 1958, como estratégia de contenção do comunismo
internacional nas Américas.
295
Nesse contexto, o 11 de Setembro, ao centralizar temas de segurança
na agenda internacional (ver 1.1), provocou um impacto “diversionista” dos
anseios brasileiros. Temas de tradicional interesse para o país, como comércio
e desenvolvimento, cederam espaço na pauta. É emblemático o fato de a
administração Bush, ao buscar apoio legislativo para as negociações da Área
de Livre Comércio das Américas (ALCA) e da Organização Mundial do
Comércio (OMC), tê-las associado ao programa de combate ao
terrorismo.
296
O Brasil, em conjunto com muitos países, tem insistido em apontar
que a agenda não pode ser “sequestrada” pelo item terrorismo.
297
Outros
temas deveriam ter maior espaço, devendo haver compatibilização entre
294
Discurso do Senhor Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, no Diálogo Ampliado
no Contexto da Cúpula do G8, em Evian (1º.06.2003), disponível [on-line] in http://
www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/
discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=2099 [12.08.2003].
295
A.C. Lessa e F.A. Meira, O Brasil e os atentados... cit., pp. 44-61.
296
R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., pp. 84-85; A.C. Lessa e F.A. Meira, O Brasil e os
atentados... cit., pp. 44-61.
297
Nesse sentido: “Se nós damos esse apoio [repúdio ao terrorismo], isso não nos pode fazer
esquecer outros temas (...). Temos que ir além e insistir nos nossos temas sobre o comércio e
sobre as desigualdades que existem, não só no comércio, mas também no plano das relações
financeiras” (Discurso do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, na solenidade
de formatura dos alunos do Instituto Rio Branco e inauguração da galeria de fotos dos ex-
Secretários-Gerais, em Brasília (10.10.2001), disponível [on-line] in http://www.ifhc.org.br/
palavra/textos/2001/01_2_54.pdf [04.07.2005]). Ainda: “the ‘security agenda’, which is largely
centered on terrorism, must not be allowed to overshadow the ‘agenda for hope’. Issues such
as open trade, the international financial regime, and the fight against poverty, on which the
expectations and legitimate aspirations of many peoples hinge, must not be forgotten or ignored
(Intervenção da Delegação Brasileira na ONU – Sexto Comitê da AGNU – “Measures to
Eliminate Terrorism”, em Nova York (03.10.2002), disponível [on-line] in http://www.un.int/
brazil/speech/02d-del-57agnu-terrorism-0310.htm [26.06.2005]). No mesmo diapasão, em 2002,
os representantes brasileiros avaliaram como positiva a manutenção dos temas das reuniões de
Doha (sobre comércio e desenvolvimento), Monterrey (sobre financiamento do desenvolvimento)
e Joanesburgo (sobre desenvolvimento sustentável) (Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE,
Telegrama nº 1854, 23.09.2002).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
122
as agendas de segurança e econômica. Nesse espírito, o País logrou incluir,
na Declaração da V Conferência de Ministros de Defesa das Américas
(2002), e em resolução no Conselho Permanente da OEA (2004), menção
ao combate à pobreza extrema como meio de fortalecer a segurança.
298
O Governo brasileiro também tem demonstrado grande preocupação
com possíveis medidas comercialmente protecionistas baseadas em
suposto reforço de medidas de segurança, particularmente contra o
bioterrorismo. Teme-se, ademais, que a nova metodologia de avaliação
das medidas de combate ao financiamento do terrorismo, elaborada
pelo FMI, gere condicionamentos arbitrários para a liberação de
recursos.
299
5.3. Ênfase nas causas subjacentes do terrorismo
Figura como parte essencial da percepção brasileira da ameaça
terrorista a ênfase atribuída às causas subjacentes ao fenômeno. Essa é
uma maneira pela qual se constrói uma “ponte” temática entre o terrorismo
internacional e os temas que mais interessam ao Brasil – ligados ao
desenvolvimento – bem como parece refletir uma visão de mundo baseada
menos no conflito e mais na cooperação e na solução pacífica de
controvérsias.
Como afirmou o Presidente Lula na Conferência “Combatendo o
Terrorismo em Prol da Humanidade”,
O terrorismo é sintoma de mal-estar social. Apoiar valores
democráticos e de respeito aos direitos humanos, e promover o
desenvolvimento econômico das nações e o bem-estar social dos
298
R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., pp. 81-82, 86-87; Brasil, MRE, Delbrasonu para
SERE, Telegrama nº 1974, 08.10.2002; Brasil, MRE, Delbrasupa para SERE, Telegrama nº 332,
19.05.2004. Conforme este telegrama, o Brasil, “ao estimular o debate do tema da pobreza
extrema sob uma perspectiva ‘estratégica’, contrabalança a insistência dos EUA em impor uma
pauta centrada no combate ao terrorismo e ao narcotráfico e aos ‘crimes conexos’, elidindo
questões-chave aos demais países do Hemisfério.” Ilustra-se essa estratégia: na discussão do
plano estratégico da 59ªAGNU, EUA e Reino Unido propuseram que o combate ao terrorismo
internacional fosse destacado individualmente como prioridade para 2006 e 2007. O Brasil, por
sua vez, propôs a inclusão da erradicação da fome no plano (Brasil, MRE, Delbrasonu para
SERE, Telegrama nº 1314, 15.06.2004).
299
M.P. Buzanelli, Introdução cit., pp. 09-13; Brasil, MRE, SERE para Brasemb Buenos
Aires, Despacho Telegráfico nº 1037, 17.12.2003.
123
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
povos são formas de construir sociedades saudáveis, imunes ao o
terrorismo.
300
Na mesma ocasião, o primeiro mandatário brasileiro apontou questões
políticas como o maior empecilho para a cooperação antiterrorista. A
repressão seria incapaz de dissipar o ódio que anima os extremistas. Haveria
necessidade de iniciativas diplomáticas, coordenadas e legitimadas pelo direito
internacional, no sentido de combinar a firmeza no combate à violência ao
compromisso claro com a democracia e a inclusão social. O diálogo deveria
ser privilegiado, pois, “sempre que aspirações legítimas por representação
política ou por justiça social forem sufocadas”, o terrorismo ganhará eco.
Ao mesmo tempo, Lula admite – em concordância com os resultados da
reunião de especialistas que precedeu a Conferência em tela – não haver
relação direta de causa e efeito entre pobreza e terrorismo. Essa percepção,
na verdade, poderia gerar discriminação contra países em desenvolvimento.
A origem do terrorismo seria política, mas a ausência de bens elementares,
como educação e saúde, corromperia o tecido social, tornando as pessoas
mais vulneráveis ao crime, inclusive o terrorismo.
301
Pode-se entender que a
“ausência de bens elementares” constitui causa indireta do terrorismo. Assim,
a pobreza permanece, no discurso exterior brasileiro, como mal a ser atacado
para prevenir essa violência.
300
Palavras do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na conferência “Combatendo o Terrorismo
em Prol da Humanidade”, em Nova York (22.09.2003), disponível [on-line] in http://
www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/discurso_detalhe.asp?ID_
DISCURSO=2152 [22.06.2005].
301
Palavras do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na conferência “Combatendo o Terrorismo
em Prol da Humanidade”, em Nova York (22.09.2003), disponível [on-line] in http://
www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/discurso_detalhe.asp?ID_
DISCURSO=2152 [22.06.2005]. A alusão à vulnerabilidade ao crime remete-nos ao conceito de
“vulnerabilidade” de E.R. Zaffaroni, segundo quem o sistema penal atua (com seu poder
militarizador e verticalizador-disciplinar) sobre os setores mais carentes da população e sobre
alguns dissidentes ou diferentes mais incômodos ou significativos. Dado o elevadíssimo número
de figuras penais e a baixíssima capacidade operacional das agências do sistema, este estaria
estruturado para agir seletivamente, contra os setores vulneráveis, enquanto os que não padecem
dessa vulnerabilidade permaneceriam impunes. Por conseguinte, o exercício de poder do sistema
penal não se dirigiria à “repressão do ilícito”, mas à contenção de grupos bem determinados (En
busca de las penas perdidas, trad. port. de V.R. Pedrosa e A.L. Conceição, Em busca das penas
perdidas: a perda de legitimidade do sistema penal, 5ª ed., Rio de Janeiro, Revan, 2001, pp. 23-
27, 40). Aplicada essa visão ao presente trabalho, o regime internacional antiterrorista visaria,
na verdade, a coibir e punir alguns terroristas, não outros.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
124
A mesma relação é traçada a respeito da desigualdade econômica
internacional. Segundo o Chanceler Amorim, “[a]s raízes do terror são
profundas e na maioria das vezes se alimentam da exclusão social e da
pobreza.”
302
No contexto da Cúpula América do Sul – Países Árabes, Lula
fala do comércio internacional como via de duas mãos, equilibrada. Afinal,
“se apenas alguns crescerem, essa árvore poderá ser muito alta, mas os seus
galhos serão frágeis e poderão quebrar com a falta de democracia, com o
terrorismo existente por causa da má distribuição da riqueza produzida no
planeta Terra.”
303
Nesse diapasão, em discurso na VI Conferência de Ministros da Defesa
das Américas, o Vice-Presidente da República e Ministro da Defesa, José
Alencar, apontou que a fome e a miséria devem ser eliminadas como forma
de combater o terrorismo e o crime organizado. Ressaltou a iniciativa do
Presidente Lula de luta mundial contra a fome e rechaçou a força como solução
para as “novas ameaças”. Tais colocações, em um foro de defesa, expressam
bem a visão e as prioridades brasileiras. A ideia central do discurso é a
segurança econômica: “Não existe segurança política sem segurança
econômica, e não existe segurança econômica sustentável sem justiça
social”.
304
302
C. Amorim, EUA e o mundo, uma perspectiva brasileira, in Folha de S. Paulo, 12.10.2004,
disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1210200416.htm
[12.10.2004].
303
Discurso do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, no encerramento da Cúpula
América do Sul – Países Árabes, em Brasília (11.05.2005), disponível [on-line] in http://
www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/discurso_detalhe.asp?ID_
DISCURSO=2611 [14.05.2005]. Nos subsídios enviados à Embaixada brasileira em Viena em
maio de 2002, frisa-se o entendimento de que a luta contra o terrorismo não deve ofuscar o
combate às desigualdades econômicas prevalecentes no mundo, assimetrias essas que alimentam
o terrorismo internacional (Brasil, MRE, SERE para Brasemb Viena, Despacho Telegráfico nº
232, 24.05.2002). De forma mais abrangente, em intervenção da delegação brasileira no plenário
da 58ª AGNU, em outubro de 2003, afirmou-se que a solidariedade no combate ao terrorismo
não deve obscurecer a busca da extirpação das raízes desse mal; conflitos, pobreza, preconceito,
ignorância e racismo são causas do terrorismo; terroristas encontram solo fértil em situações de
conflitos civis e privações, vencendo na frustração e no desespero, manipulando a angústia e a
sensação de desesperança dos esquecidos (Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº
2171, 16.10.2003).
304
Discurso do Ministro da Defesa José Alencar na VI Conferência de Ministros de Defesa das
Américas, em Quito (17.11.2004), disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/
sitios/internet/discursos/2004/11-04/discurso_vi_confe_ministros_americas.htm [22.06.2005].
E. Cantanhêde, a respeito da ocasião, afirmou: “al Qaeda está muito longe, e a miséria, muito
perto” (Fim da ordem unida, in Folha de S. Paulo, 19.11.2004, disponível [on-line] in http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz1911200404.htm [19.11.2004]).
125
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
Não é exclusividade do governo Lula a ênfase nas causas subjacentes
do terrorismo. Em outubro de 2001, o Presidente Cardoso afirmou que
“[é] preciso reagir com determinação ao terrorismo, mas ao mesmo tempo
enfrentar, com igual vigor, as causas profundas e imediatas de conflito, de
instabilidade, de desigualdade.” Seria necessário, por exemplo, resolver
o conflito israelo-palestino de forma justa e duradoura.
305
Nota-se, portanto, um discurso brasileiro já consolidado, que enfatiza
a resolução das causas profundas do terrorismo, em particular os conflitos
políticos, o subdesenvolvimento e a pobreza, mas não aceita justificativa
ao terrorismo em hipótese alguma (ver 3.1). Reconhece a necessidade
de combate eficaz e concertado ao terrorismo e, ao mesmo tempo, prega-
se um enfoque abrangente, alertando quanto à ineficácia da ação
meramente repressiva. Preocupa-se, assim, com o desequilíbrio, a
iniquidade e a consequente exasperação, particularmente no mundo
islâmico. Como coloca o Embaixador Henrique Valle,
The strategy for combating terrorism should not privilege repressive
measures and should rather tackle, in a proper manner, the scourge
of terrorism in all its aspects.
306
Conforme A.J.M. Souza e Silva, essa leitura ampara-se nos
fundamentos tradicionais da diplomacia brasileira
307
e constitui política
de Estado. Importa notar, por fim, que as causas do terrorismo são tema
muito levantado nos debates onusianos, particularmente o vínculo entre
305
Discurso do Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, em sessão solene na
Assembleia Nacional da República da França, em Paris (30.10.2001), disponível [on-line] in
http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/discurso_detalhe.asp?ID_
DISCURSO=1119 [04.07.2005].
306
Intervenção do Representante Permanente Adjunto do Brasil nas Nações Unidas, Embaixador
Henrique Valle, no “Informal Meeting of the Plenary on the High-Level Plenary Meeting of the
General Assembly Of September 2005”, em Nova York (22.06.2005), disponível [on-line] in
http://www.un.int/brazil/speech/005d-hv-Informal-Meeting-2206.htm [25.06.2005].
307
Nem sempre foi assim. Em 1972, em seu discurso na AGNU, o chanceler Mário Gibson
Barboza afirmava: “Continuamos a sustentar que essa violência indiscriminada é um flagrante
desmentido da tese de que a subversão terrorista é fruto da injustiça social ou da pobreza de
determinada sociedade.” Lamentava, assim, o título da resolução 3034, já referido (2.1). Tal
denominação, ao contrário da posição brasileira de repúdio inequívoco e absoluto do terrorismo,
expressaria termos normalmente utilizados para justificá-lo ou tolerá-lo. A visão brasileira não
seria movida por qualquer preferência política ou ideologia, mas pela “defesa dos mais comezinhos
princípios da convivência humana” (A palavra do Brasil... cit., p. 276).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
126
terrorismo e falta de perspectivas, sobretudo entre os países em
desenvolvimento.
308
Essa forma de ver o problema do terrorismo – num composto de
condenação inequívoca e proposta de resolução de suas causas, tidas
como fruto de circunstâncias perversas – expressa, na política externa
brasileira, uma busca da conjugação entre ordem e justiça, nos moldes
de H. Bull. Segundo este, não há contradição inescapável entre as
exigências de preservação da ordem e de promoção de mudanças
justas na política mundial – por vezes, a conciliação é factível. Mais
que isso, a justiça é condição de longevidade da ordem, apesar de
dependente desta:
Para ser duradouro, qualquer regime que proporcione ordem
na política mundial precisará responder, pelo menos em certa
medida, às demandas por mudanças justas. Em conseqüência,
uma busca esclarecida da ordem levará em conta essas
demandas. Da mesma forma, a exigência de mudanças justas
308
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109; Brasil, MRE, Delbrasonu
para SERE, Telegrama nº 104, 22.01.2002. Em sentido semelhante ao discurso brasileiro em
análise, o Painel de Alto Nível sobre Ameaças, Desafios e Mudança, convocado pelo SGNU,
“defende a elaboração de uma estratégia abrangente de combate ao terrorismo, com os seguintes
elementos: enfrentar as suas causas estruturais, pela promoção dos direitos políticos e sociais,
do Estado de Direito e da democracia, solução de problemas políticos graves como a ocupação
estrangeira, combate ao crime organizado, redução da pobreza e do desemprego, e prevenção do
colapso de Estados; combater o extremismo e a intolerância, inclusive por meio da educação e
do debate público; promover a cooperação antiterrorismo em nível global, em áreas como
aplicação da lei, compartilhamento de inteligência, interdição e controles financeiros;
fortalecimento da capacidade dos Estados; controle de materiais perigosos, e defesa civil.”
(Brasil, MRE, Circular Telegráfica nº 53045, 21.12.2004). Em sentido parecido vai o relatório
do SGNU intitulado “Em liberdade mais ampla”, o qual o Brasil endossa (Brasil, MRE,
Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 1028, 25.05.2005). Também há semelhanças entre as
posições brasileiras e aquelas de certos países com assento permanente no CSNU. A Rússia
admite que o terrorismo toma força em situações de padrões de vida desesperadores, especialmente
com relação ao Norte do Cáucaso (D. Lynch, The enemy... cit., pp. 141-61). Para a China, a
abordagem do terrorismo deve ser ampla, envolvendo meios políticos, econômicos e diplomáticos
para tratar do fenômeno e de suas causas subjacentes (ONU, A/56/410–S/2001/914, disponível
[on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N01/554/05/PDF/
N0155405.pdf?OpenElement [02.03.2005]). Conforme o primeiro-ministro britânico Tony
Blair, além das ações “duras”, é importante a redução da pobreza, sobretudo na África, para o
combate ao terrorismo (ABC Color, 04.07.2005, Reducir la pobreza, una forma de combatir
terrorismo global, disponível [on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/noticiario/
internacional/selecao_detalhe.asp?ID_RESENHA=145881 [04.07.2005]).
127
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
precisará levar em conta a manutenção da ordem
internacional.
309
Apesar da coerência e da clareza do discurso brasileiro, é notória a
dificuldade de identificar as causas do terrorismo. Uma tentativa de grande
valia e visibilidade foi apresentada, em 2003, pelo Norwegian Institute of
International Affairs
310
, mas está longe de encerrar a questão. Mesmo com
essas dificuldades teóricas, são vários os autores que apresentam visão
parecida à do discurso brasileiro nessa matéria.
R.A. Barbosa entende que o 11 de Setembro remete à exclusão da
prosperidade de boa parte do mundo, à instabilidade política e à privação
econômica e social; à resistência à integração na globalização; à arrogância
imperial dos EUA, como em sua política externa para o Oriente Médio.
311
L. Martins, similarmente, vê no terrorismo atual uma contrapartida ao
sentimento de impotência diante dos “enormes desequilíbrios sociais,
econômicos, étnicos” etc., geradores de desespero e ódio.
312
Para A.M.
Cardoso, a democracia, os direitos humanos, o desenvolvimento, a
309
H. Bull, The anarchical... cit., p. 111. Para o autor, “na vida social, ordem é um padrão de
atividade humana que sustenta os seus objetivos elementares, primários ou universais” (p. 09);
ordem internacional é “um padrão de atividade que sustenta os objetivos elementares ou primários
da sociedade dos estados, ou sociedade internacional” (p. 13); e “[e]xiste uma sociedade de
estados (...) quando um grupo de estados, conscientes de certos valores e interesses comuns,
formam uma sociedade, no sentido de se considerarem ligados, no seu relacionamento, por um
conjunto comum de regras, e participam de instituições comuns” (p. 19). Dentre os objetivos
elementares da ordem internacional, H. Bull destaca (a) a preservação do sistema e da sociedade
de estados; (b) a manutenção da soberania externa dos estados individuais; (c) a manutenção da
paz como situação normal no relacionamento interestatal; e (d) a limitação da violência, o
cumprimento das promessas e a estabilidade da posse por meio de regras de propriedade (pp.
23-26). Em H. Bull, ao contrário da ordem, a justiça é termo definível somente em termos
subjetivos (haveria, assim, diversas categorias de justiça). Nas relações internacionais, muitas
vezes, as exigências de justiça surgem não na forma de moralidade, mas de igualdade – demandas
pela remoção de privilégios, pela igualdade na aplicação ou distribuição de direitos etc. (pp. 92-
94). Evidentemente, a ordem internacional real não satisfaz algumas aspirações por justiça
amplamente apoiadas. Apesar de, hoje, órgãos como as Nações Unidas comprometerem a
sociedade internacional com certas ideias de justiça, persistem muitos obstáculos a tais aspirações
– por vezes, a própria manutenção da ordem internacional (pp. 102).
310
Cf. Norwegian Institute of International Affairs, Root causes of terrorism – findings from an
international expert meeting in Oslo, 9-11 June 2003, disponível [on-line] in http://www.nupi.no/
IPS/filestore/Root_Causes_report.pdf [05.07.2005]).
311
Os Estados Unidos pós 11 de setembro de 2001: implicações para a ordem mundial e para
o Brasil, in RBPI 45/1 (2002), p. 75.
312
A substituição da política pelo terror e violência, in Política Externa 10/3, (2001-2002), pp.
17-18.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
128
superação das desigualdades sociais e a estabilidade econômica seriam as
principais armas antiterroristas numa concepção de Estado social e
democrático de direito; ater-se ao plano da segurança traduz concepção
estreita do antiterrorismo.
313
E. Sader também analisa que, ao contrário da
visão do presidente Bush, não é com mais violência que se combate o
terrorismo. As raízes do terrorismo devem ser atacadas, por exemplo, com
a desocupação dos territórios palestinos e do Iraque.
314
No mesmo diapasão, avaliam S. Halper e J. Clarke que, no longo
prazo, o uso da força não resolve as causas políticas do terrorismo,
que é um meio de atingir determinados fins. Ao contrário do pensamento
neoconservador, o predomínio militar não garante vitória contra o
terrorismo. Melhor seria resolver as causas políticas da violência.
315
Também J. Almino acredita na resolução de questões políticas sensíveis:
em última instância, o terrorismo será derrotado à medida que grupos
hoje marginalizados do processo político forem incluídos, e à medida
que se reduza a opressão, a miséria e a discriminação.
316
Da mesma
forma, T. Todorov crê no ataque às causas originárias e de apoio ao
terrorismo – ressentimento, injustiça etc.
317
, assim como A.
Procópio.
318
Conforme J.S. Nye Jr., a proposição do auxílio ao desenvolvimento como
forma de combater as causas do terrorismo, apesar de ter bons argumentos
contrários
319
, é positiva, pois as injustiças do mundo fornecem bons argumentos
para a ação e o recrutamento de terroristas. Deve-se, para o estudioso, tomar-
lhes a iniciativa de defender os pobres.
320
313
Terrorismo e segurança em um estado social democrático de direito, in Revista CEJ 6/18
(2002), p. 52.
314
Guerra à guerra, in Folha de S. Paulo, 30.10.2004, disponível [on-line] in http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/opiniao/fz3010200409.htm [30.10.2004].
315
America alone: the neo-conservatives and the global order, New York, Cambridge University,
2004, pp. 282-83.
316
J. Almino, Inserção internacional... cit., pp. 57-61.
317
Le nouveau désordre… cit., pp. 48-68.
318
Terrorismo e relações internacionais, in RBPI 44/2 (2001), pp. 62-81.
319
Um exemplo nosso: para R. Clutterbuck, o terrorismo seria uma forma de loucura produzida
não pela pobreza, mas pela riqueza e pela educação universitária. A grande maioria dos terroristas
internacionais são oriundos de famílias de classe média e receberam educação acima da média.
Muitos não têm qualquer ligação com as classes oprimidas que buscam representar (Guerrillas
and terrorists, trad. port. de V. Bombeta, Guerrilheiros e terroristas, Rio de Janeiro, Biblioteca
do Exército, 1980, pp. 92-93).
320
J.S. Nye Jr., A North American perspective cit., pp. 05-14.
129
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
5.3.1. Perspectiva comparada – EUA e a noção de “Estados fracassados”
É interessante comparar as declarações brasileiras acerca das relações
entre desenvolvimento e terrorismo com aquelas dos EUA. Conforme a NSS,
Poverty does not make poor people into terrorists and murderers. Yet poverty,
weak institutions, and corruption can make weak states vulnerable to
terrorist networks and drug cartels within their borders. (NSS, prefácio)
Nesse modo de ver a questão, a pobreza, associada à fraqueza de
Estados, criaria condições para o terrorismo, o que guarda coerência com a
preocupação estadunidense com os “Estados fracassados” (failed states)
321
.
A desigualdade entre as nações também seria causa de instabilidade:
A world where some live in comfort and plenty, while half of the human
race lives on less than $2 a day, is neither just nor stable. (NSS, cap.
VII, p. 21)
À primeira vista, parece haver grande coincidência entre as visões
brasileira e estadunidense acerca das causas do terrorismo e da maneira de
tratá-las. Entretanto, os EUA fazem pouquíssimas referências às causas
subjacentes do terrorismo
322
(nunca sob a dimensão da justiça, como faz o
Brasil), corroboram que “the root cause for terrorism is terrorists
323
e,
321
America is now threatened less by conquering states than we are by failing ones. We are
menaced less by fleets and armies than by catastrophic technologies in the hands of the embittered
few” (NSS, cap. I, p. 01). O National Intelligence Council, da CIA, avalia a fraqueza estatal
como caldo de cultura para o terrorismo – como antes se falava em relação ao comunismo (N.
Carlos, Estados fracos ameaçam soberania dos EUA, in Folha de S. Paulo, 23.01.2005,
disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2301200513.htm
[23.01.2005]).
322
No discurso do presidente Bush na 56ª AGNU, a única referência de às causas subjacentes
do terrorismo deu-se de maneira oblíqua: afirmou que os terroristas “exploram a pobreza e o
desespero” (Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 2759, 12.11.2001). A primeira
vez em que os EUA admitiram, ao menos retoricamente, que a pobreza é uma das causas do
terrorismo foi na Conferência sobre Financiamento ao Desenvolvimento, em Monterrey (Brasil,
MRE, SERE para Delbrasupa, Despacho Telegráfico nº 107, 02.04.2002).
323
Na sessão de 18.01.2002 do CSNU, o SGNU, Kofi Annan, enfatizou que o terrorismo é arma
dos alienados e desesperados; o oferecimento de condições reais de vida digna para todos os
humanos inviabilizariam o recrutamento e o apoio ao terrorismo. Coube ao Canadá, que se
pronunciou em nome do G-8, contrariar essa visão, afirmando que “the root cause for terrorism
is terrorists” (Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 104, 22.01.2002).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
130
ademais, adotam a noção de “Estado fracassado” (failed state), que não
faz parte do discurso externo brasileiro, como possível causa de terrorismo.
Como aponta V.C. Mello, o Brasil e outros países em desenvolvimento
guardam grande prudência com relação às supostas novas formas de
prevenção de conflitos por meio da ação econômica – como na doutrina
onusiana de segurança humana – pois poderiam eclipsar os temas
propriamente ligados ao desenvolvimento e, ainda, resultar em crescente
interferência nos assuntos internos dos “agraciados”. Essas concepções
poderiam levar, v.g., o CSNU a atuação sistemática sobre temas
econômicos, sociais e ambientais. Como se verá abaixo, a noção de failed
state e suas consequências podem ser incluídas no bojo dessas
tendências.
324
A noção é presente no pensamento acadêmico. R.I. Rotberg alerta para
o risco que, atualmente, “Estados fracassados” oferecem à segurança regional
e global. Sua incapacidade de projetar poder e fazer respeitar a autoridade
em seu território prejudica a ordem internacional, pois a falta de governo
efetivo é terreno fértil para ameaças como migrações maciças e terrorismo.
Por conseguinte, prevenir o fracasso estatal é imperativo moral e estratégico.
Casos de fracasso já configurados deveriam receber missões de nation-
building, com intervenções nos moldes da missão da ONU no Kossovo. A
melhor estratégia seria o governo por uma organização internacional que, aos
poucos, devolveria o poder aos nativos.
325
Na visão de R.O. Keohane, a possibilidade de ameaças vindas desses
países fracos obscurece a distinção entre intervenção humanitária e autodefesa.
Como coloca o autor,
324
V.C. Mello, Paz e segurança... cit., pp. 175-77.
325
R.I. Rotberg, Failed states in a world of terror, in Foreign Affairs 4 (2002), pp. 127-40. O
autor não define “estado fracassado”, mas oferece características importantes para sua
identificação: “failed states are tense, conflicted, and dangerous. They generally share the
following characteristics: a rise in criminal and political violence; a loss of control over their
borders; rising ethnic, religious, linguistic, and cultural hostilities; civil war; the use of terror
against their own citizens; weak institutions; a deteriorated or insufficient infrastructure; an
inability to collect taxes without undue coercion; high levels of corruption; a collapsed health
system; rising levels of infant mortality and declining life expectancy; the end of regular schooling
opportunities; declining levels of GDP per capita; escalating inflation; a widespread preference
for non-national currencies; and basic food shortages, leading to starvation”. Aponta,
entretanto, que os Estados fracassados podem ser muito diferentes entre si. Quando da publicação
do artigo, R.I. Rotberg considerava fracassados os seguintes países: Afeganistão, Angola, Burundi,
República Democrática do Congo, Libéria, Serra Leoa e Sudão, que exibiriam a maior parte das
características apontadas, se não todas.
131
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
Future military actions in failed states, or attempts to bolster states
that are in danger of failing, may be more likely to be described both
as self-defense and as humanitarian or public-spirited. When the only
arguments for such policies were essentially altruistic ones, they
commanded little support, so the human and material price that U.S.
leaders were willing to pay to attain them was low. Now, however,
such policies can be framed in terms of U.S. self-interest, properly
understood. Sound arguments from self-interest are more persuasive
than arguments from responsibility or altruism.
326
No caso de “Estados fracassados”, portanto, a intervenção humanitária
passa a pertencer a uma lógica realista. O reconhecimento dos riscos da
“violência informal” (como o terrorismo) forçaria os EUA a redefinirem seus
interesses de diferentes maneiras possíveis, sendo uma delas o auxílio a
medidas de redução da pobreza, desigualdade e injustiça em países pobres.
A globalização da “violência informal” teria gerado maior interpenetração
entre temas tradicionais de segurança e outros, como a política econômica.
327
Na visão de J.S. Nye Jr., apesar de ações militares não lidarem com
todo o problema do terrorismo, são essenciais em alguns casos, especialmente
em “Estados fracassados” e Estados patrocinadores do terrorismo. Para
aqueles, incapazes de coibirem atividades terroristas, assistência militar
estrangeira seria uma saída.
328
Nota-se, nos três estudiosos acima, que a noção de failed state levanta,
quase inescapavelmente, a questão da intervenção, inclusive militar. A temática
do auxílio ao desenvolvimento também surge nesse debate, com intensidade
igual ou maior que a intervenção. Trata-se, sobretudo, do apoio aos países de
menor desenvolvimento relativo, inclusive com a pretensão de nation-building,
ou seja, de dotar países das instituições estatais mínimas. Não se trata, contudo,
326
R.O. Keohane, The globalization… cit., pp. 39-40.
327
R.O. Keohane, The globalization… cit., pp. 39-40, 42. Em juízo similar, Y. Satoh aponta a
importância de esforços contra a pobreza e pela a criação para evitar que failed states venham
a servir de abrigo para terroristas (An Asia-Pacific view on counterterrorism cooperation, in
The Trilateral Commission, Addressing the new international terrorism: prevention, intervention
and multilateral cooperation, Washington D.C., The Trilateral Commission, 2003, pp. 15-20).
328
J.S. Nye Jr., A North American perspective cit., pp. 05-14. Para considerações acerca dos
failed states latino-americanos, ver E. Viola e H.R. Leis, Unipolaridade: terrorismo e
vulnerabilidade latino-americana, in L.A. de Carvalho, F.Q. Véras Neto e I.F.M. Lixa (orgs.),
Política internacional, política externa e relações internacionais, Curitiba, Juruá, 2003.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
132
do incentivo ao desenvolvimento em geral. Essa orientação insere-se
coerentemente na tendência dos EUA de privilegiar os países centrais à “guerra
ao terrorismo”, como o Paquistão, tanto bilateral quanto multilateralmente (FMI
e Banco Mundial). Enfatiza-se a ajuda a países de menor desenvolvimento
relativo, em detrimento de países médios como o Brasil.
329
Outra diferenciação a ser feita concerne à consideração das causas
políticas do terrorismo. Segundo S. Halper e J. Clarke, os neoconservadores,
grupo com grande influência no atual governo Bush, argumentam que
“terrorismo é terrorismo”, sendo os esforços para compreender suas causas
subjacentes ilusórios ou contraditórios, além de constituírem relativismo moral.
Como bem coloca G. Dupas, os EUA ignoram as evidentes relações entre o
terrorismo islâmico, o conflito no Oriente Médio e seu próprio papel na região.
As ações e palavras da al-Qaeda provam-no.
330
Não são poucos os autores
331
que apontam a necessidade de avanços no processo de paz na região para a
prevenção do terrorismo islâmico.
332
Em síntese, o discurso externo dos EUA, mesmo quando adota
considerações acerca das causas subjacentes do terrorismo, diverge do
brasileiro, em primeiro lugar, por não o fazer sob considerações de justiça.
Segundo, ao contrário da perspectiva do Brasil, a estadunidense vale-se da
noção de “Estados fracassados”, que apresenta grande potencial
intervencionista – o que não deixa de ir ao encontro da noção de guerra
preventiva. Por fim, essa forma de ver o problema favorece o apoio a países
de menor desenvolvimento relativo, sobretudo quando centrais à “guerra ao
terror”; o Brasil, ao contrário, tem em seu discurso um pleito mais geral de
desenvolvimento, que, como se verá (5.5), é marcado por reformismo da
ordem internacional, no sentido da maior democratização das instâncias
decisórias internacionais.
329
R.A. Barbosa, Os Estados Unidos... cit., p. 83; J.M. Malik, Dragon on terrorism… cit., p.
280.
330
Como explica R. Gunaratna, a organização tem objetivos políticos de curto e longo prazo.
No curto prazo, antes do 11 de Setembro, o objetivo era a retirada das tropas estadunidenses da
Arábia Saudita e a criação de um Califado. No médio prazo, visa retirar do poder do Oriente
Médio líderes “apóstatas” e a criação de estados verdadeiramente islâmicos (Inside Al Qaeda...
cit., pp. 54-94).
331
P.ex. Y. Satoh, An Asia-Pacific view… cit., pp. 15-20, e The Trilateral Commission, Addressing
the new international terrorism: prevention, intervention and multilateral cooperation,
Washington D.C., The Trilateral Commission, 2003, pp. 29-31.
332
S. Halper e J. Clarke, America alone… cit., p. 275; G. Dupas, Fundamentos, contradições...
cit., pp. 06-07.
133
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
5.4. Oposição, em princípio, à resposta militarizada
Há duas formas básicas e ideais, na literatura e nas políticas
governamentais, de tratar o terrorismo, aponta R. Calduch Cervera. A primeira,
chamada anglo-saxã pelo autor, vê o terrorismo como espécie de guerra de
baixa intensidade que deve ser tratada, fundamentalmente, por meios militares,
estando a cooperação internacional e os aspectos judiciais, policiais e
normativos em segundo plano. A segunda, europeia continental, enxerga o
terrorismo como espécie de criminalidade organizada, o que implica tratamento
contrário ao da primeira visão. Deve-se ressaltar que, atualmente,
compreendido o terrorismo como ameaça à paz e à segurança internacional
(ver 2.2), passa a haver maior predisposição lógica a adotar o ponto de vista
anglo-saxão. Mesmo assim, o Brasil pode ser situado na segunda alternativa,
como se verá abaixo.
333
A nova PDN brasileira, ao mesmo tempo em que considera o terrorismo
internacional um a ameaça “à paz, à segurança e à ordem democrática”,
estipula que seu enfrentamento é, normalmente, realizado “com os instrumentos
de inteligência e de segurança dos Estados” (§ 2.6). Dessa forma, apesar de
não excluir completamente a possibilidade de uso militar antiterrorista – já
que, na PDN, as medidas de segurança são “de largo espectro”, envolvendo
desde a defesa externa até políticas econômicas (§ 1.3) –, tal uso não é
privilegiado pela PDN, que reafirma o princípio tradicional da política externa
brasileira da solução pacífica de controvérsias (§ 6.2, I). De fato, como coloca
C. Amorim, a postura diplomática do País, “que tende a considerar as medidas
coercitivas como opções de última instância, se expressa também por uma
atitude pró-ativa de preferência pelo diálogo e pela negociação”, bem como
pelos demais meios pacíficos de solução de controvérsias.
334
Nesse contexto, mostra-se verdadeira a suposição de J. Almino de que,
quanto menor a capacidade bélica de um país, maior seu interesse em uma
ordem internacional justa na qual se limite o uso da força e se sustentem a
autodeterminação e o repúdio à intervenção. O uso da força não se coloca,
ao Brasil, como alternativa à persuasão – mesmo nas questões de segurança
internacional –, mas como ultima ratio complementar.
335
333
R. Calduch Cervera, La incidencia… cit., pp. 190-91.
334
C. Amorim, Entre o desequilíbrio... cit., pp. 93, 97.
335
J. Almino, Inserção internacional... cit., pp. 40-41, 62-64.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
134
É natural, portanto, que a postura brasileira quanto à resposta ao
terrorismo – levadas em conta, ademais, a percepção de baixo risco de ataque
dessa natureza ao País (ver 5.1), a ênfase colocada nas causas subjacentes
do fenômeno (ver 5.3) e a preferência por respostas multilaterais (ver 5.5) –
se expresse de modo a evitar respostas coercitivas ou intervencionistas e a
militarização do tema. Como notam M. Hirst e L. Pinheiro, já no governo
Itamar Franco, procurou-se assegurar que as discussões de temas globais,
como o terrorismo e os direitos humanos, se dessem em oposição aos então
novos conceitos intervencionistas (como “soberania limitada” e “intervenção
humanitária”).
336
A isso não se opõe o fato de o Brasil, historicamente, compartilhar o
entendimento, como se viu acima, de que o terrorismo constitui ameaça à paz
e à segurança internacional.
337
Na verdade, a compreensão brasileira tradicional
acerca da segurança (ver 5.2) corrobora essa visão branda e cooperativa –
que se reflete no fato de que, nas últimas décadas, os latino-americanos e
caribenhos integram a região que menos gasta em armamentos.
338
Não parece ingênua essa leitura geral da segurança internacional. O
tema da impotência do poder tradicional é recorrente na literatura de
relações internacionais. M. van Creveld, em obra dedicada ao assunto,
escreve: “A ghost is stalking the corridors of general staffs and defense
departments all over the world – the fear of military impotence, even
irrelevance”.
339
J.S. Nye Jr. ressalta a importância do soft power, sobretudo
em temas que, como o terrorismo transnacional, demandam cooperação
internacional e não são passíveis de resolução somente pelo hard power.
Esta forma de poder, ainda assim, permanece fundamental para a
segurança.
340
Nesse diapasão, como bem coloca C. Lafer, a centralidade da segurança
na agenda internacional – resultado do 11 de Setembro – não implica,
336
M. Hirst e L. Pinheiro, A política externa do Brasil em dois tempos, in RBPI 1 (1995), p. 12.
337
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 74-109.
338
Brasil, MRE, Circular Telegráfica nº 47574, 31.10.2003.
339
M. van Creveld, The transformation… cit., p. 01.
340
J.S. Nye Jr., Soft power and American foreign policy, in Political Science Quarterly 2 (2004),
pp. 256, 263, 268. Para o autor, “[s]oft power is the ability to get what you want through
attraction rather than coercion or payments. (…) Hard power, the ability to coerce, grows out
of a country’s military and economic might. Soft power arises from the attractiveness of a
country’s culture, political ideals, and policies. When our policies are seen as legitimate in the
eyes of others, our soft power is enhanced.”
135
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
necessariamente, a adesão a concepções tradicionais de política de poder.
Afinal, o combate às redes criminosas transnacionais dá-se, sobretudo, por
meio de normas de mútua colaboração.
341
5.4.1. Conselho de Segurança das Nações Unidas
Seguindo a orientação geral de evitar respostas coercitivas e
militarizadas ao terrorismo, tem sido prática brasileira, no âmbito do
CSNU, opor-se ao recurso excessivo ao Capítulo VII da Carta da
ONU. Sua invocação poderia enfatizar a punição, não a cooperação,
como a melhor forma de combater o terrorismo. Essa cautela, por
vezes, tem-se mostrado sensível no CSNU, onde o Brasil também já
chegou a protestar contra a velocidade da emissão de resolução sobre
terrorismo e contra a prática do CSNU de, sob o Capítulo VII, apelar
para que os países negociem convenções antiterroristas – pois não
deveria haver constrangimento à liberdade de negociar.
342
Até os regimes de sanções impostos pelo CSNU como alternativa
ao uso da força são considerados, pelo Brasil, medidas graves, cuja
adoção se justificaria somente após a exaustão de outros meios de
solução pacífica de controvérsias. As ações coercitivas, assim, são
341
C. Lafer, A diplomacia brasileira... cit., pp. 106-07.
342
Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegramas nº 2625 e 2626, 06.10.2004; ONU, CSNU,
S/PV.5059, disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/PRO/N04/560/47/PDF/
N0456047.pdf?OpenElement [18.07.2005], pp. 11-12. Nesse sentido: “(…) what we believe
is a disturbing tendency to apply a range of explicit enforcement provisions – under Chapter VII
– not only to actual threats to international peace and security, but also to potential ones.
Moreover, increasingly liberal reference to Chapter VII has led it to become a conceptual
umbrella for issues not directly related to security and even to situations where the Security
Council may potentially interfere with legal and political prerogatives of States, such as treaty-
making. This is not, in our view, the most judicious use of provisions intended to be of last
resort, the application of which should result from thorough and exhaustive assessment, grounded
on sound criteria and political judgment. The Council should not allow that ambiguities seep
into its resolutions and decisions. Nor should it tacitly permit profuse resort to Chapter VII,
thus negatively affecting multilateral efforts for the promotion of collective action with a focus
on cooperation.” (Intervenção do Embaixador Ronaldo Mota Sardenberg, Representante
Permanente do Brasil na ONU, na 59ª AGNU – “Report of the Security Council; Question of
equitable representation on and increase in the membership of the Security Council and related
matters: joint debate”, em Nova York (11.10.2004), disponível [on-line] in http://www.un.int/
brazil/speech/04d-rms-59agnu-equitablerepresentation-1110.htm [25.06.2005]). Ainda, aponta
A.A. Patriota que, no período de 1993 e 1994, em que o Brasil foi membro não permanente do
CSNU, nas poucas ocasiões em que o Brasil não se associou à decisão adotada ou se absteve,
estiveram em jogo medidas coercitivas do órgão (O Conselho de Segurança... cit., p. 191).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
136
vistas como a última opção, devendo também ser focalizadas e
seletivas.
343
Ao resguardo da moderação do CSNU, alia-se, ao mesmo tempo, a
defesa de sua importância e legitimidade. Como avalia A.A. Patriota,
Para um país que não tem interesse em enfraquecer o multilateralismo,
o desafio que se apresenta é o de conviver com a imprevisibilidade
inerente aos métodos decisórios do Conselho de Segurança, evitando,
na medida do possível, que eles se distanciem da letra e do espírito
da Carta, sem contudo assumir um legalismo intransigente que acabe
por levar as grandes potências militares, e sobretudo os EUA, a preferir
ação independente e unilateral e contribua indiretamente para
marginalizar o Conselho de Segurança. Um Conselho excessivamente
ativo e intrusivo pode ser um problema ao invés de uma solução. Mas
um Conselho irrelevante talvez comporte ameaças ainda maiores para
a convivência internacional.
344
De fato, C. Amorim entende a proteção da credibilidade do CSNU como
um verdadeiro objetivo nacional brasileiro. Seu enfraquecimento, além de
arriscar a estabilidade internacional, dar-se-ia em benefício de instâncias de
concertação em que o Brasil teria diminuta influência. Além disso, desperdiçaria
avanços, conquistados nos últimos sessenta anos, na consolidação do direito
internacional nas Nações Unidas.
345
Em coro com A.A. Patriota, C. Amorim também entende que a atuação
brasileira no CSNU tem preocupação central com a administração
responsável dos instrumentos de coerção do Capítulo VII da Carta das
Nações Unidas. Parte-se do princípio de que “nada expõe mais as decisões
do Conselho de Segurança ao descrédito do que o recurso injustificado à
coerção”. O critério da ameaça à paz e à segurança internacional, requisito
343
J. Almino, Inserção internacional... cit., p. 76. Nesse sentido, intervenção do Embaixador
Ronaldo Mota Sardenberg no debate sobre a Seção III do relatório “Em liberdade mais ampla”,
do SGNU: “Sanctions should be solely used as a last resort, only in situations referred to in
Chapter VII of the Charter and when other attempts have proved ineffective. They should not
function as a form of punishment, but primarily as an instrument to foster cooperation and law.
For this reason, they should not be maintained on an automatic basis, but be periodically
renewed by the Security Council, after assessing the need to carry on the measures.” (Brasil,
MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 1028, 25.05.2005).
344
A.A. Patriota, O Conselho de Segurança... cit., pp. 195-96.
345
C. Amorim, Entre o desequilíbrio... cit., p. 93.
137
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
para o acionamento da coerção onusiana, seria desvalorizado nas hipóteses
de seu uso arbitrário, excessivamente intervencionista ou para agendas
individuais.
346
Mesmo na invasão do Afeganistão, o Brasil – que expressou
entendimento de que a ação era apoiada pelo CSNU – mostrou-se
cauteloso. O Presidente Cardoso afirmou que era “momento grave, ainda
que esperado diante da brutalidade” do 11 de Setembro. Expressou a
esperança de que as operações procurassem poupar a população civil. No
mesmo sentido, em entrevista, o Chanceler Lafer exprimiu que
“compreendia” os ataques ao Afeganistão, mas esperava que fossem
“limitados e circunscritos”; não usou as palavras “apoiar”, “aprovar”,
“defender” ou “endossar” para definir a posição brasileira.
347
A atuação brasileira no CAT também expressa essa atuação cautelosa
quanto a medidas coercitivas que, ao mesmo tempo, valoriza as decisões
multilaterais. O País, fiel cumpridor das regras mutuamente acordadas sobre
terrorismo, tem interesse na credibilidade dos mecanismos multilaterais
antiterroristas, particularmente o CAT. A visão desses mecanismos como
instâncias meramente protelatórias e de pouca utilidade para o estímulo de
comportamentos adequados pelos países constituiria um convite ao
unilateralismo.
348
Ao mesmo tempo, a diplomacia brasileira entende que o maior desafio
do CAT e de sua Diretoria Executiva é persuadir os governos a aproveitarem
as várias formas de cooperação disponibilizadas pelos órgãos e não
plenamente utilizadas. Afinal, a função precípua dessas instâncias é apoiar
Estados que desejam cooperar, mas encontram dificuldades. O Brasil
pretende, assim, evitar a valorização excessiva da repressão; reitera que o
CAT e sua Diretoria Executiva não representam comitê de sanções, corte de
346
C. Amorim, Entre o desequilíbrio... cit., pp. 93, 97.
347
Nota à imprensa do Senhor Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, sobre as
operações militares dos EUA contra alvos estratégicos no Afeganistão (07.10.2001), disponível
[on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/
discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=1125 [04.08.2005]; Entrevista do Senhor Ministro de
Estado das Relações Exteriores, Embaixador Celso Lafer, concedida ao Jornal Folha de São
Paulo – “Brasil espera ação limitada dos EUA” (15.10.2001), disponível [on-line] in http://
www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/
discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=1376 [04.08.2005]. Conforme a matéria, a suposta
ambiguidade deveu-se à contrariedade da opinião pública à guerra (em São Paulo, 66% da
população seria contra a invasão).
348
Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 2434, 22.09.2004.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
138
justiça ou recinto policial, e que seus trabalhos não podem exceder a delegação
da resolução 1373.
349
5.4.2. Contexto hemisférico
Também no espaço das Américas, é patente o desinteresse brasileiro
pela militarização das políticas de segurança. O Brasil vem rechaçando as
propostas estadunidenses de atuação das forças armadas latino-americanas
como forças policiais e de transformação da Junta Interamericana de Defesa
(JID) em órgão operacional. Essas proposições são formuladas tendo, no
combate ao terrorismo, uma de suas justificativas. A opção cautelosa do
Brasil é comungada, consideravelmente, pelos países latino-americanos.
350
Causa preocupação a tendência estadunidense de favorecer o uso
da força no combate do terrorismo. Este foi, de fato, uma das causas
do recrudescimento da presença militar dos EUA no mundo, em níveis
comparáveis aos da Guerra Fria
351
. É grande o receio latino-americano
de que os EUA, com seu imenso poder e o discurso “quem não está
conosco está contra nós”, utilizem o combate ao terrorismo como
pretexto para interferências em suas soberanias.
352
Reforça os temores
349
Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 1667, 19.07.2004, e Telegrama nº 1724,
23.07.2004; ONU, CSNU, S/PV.5059, disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/
UNDOC/PRO/N04/560/47/PDF/N0456047.pdf?OpenElement [18.07.2005], pp. 11-12.
350
Em 2004, na VI Reunião dos Ministros da Defesa das América, esse rechaço deu-se em
conjunto com Argentina, Bolívia, Chile, México, Paraguai, Peru, Uruguai e Venezuela. A posição
comum foi sintetizada por Jaime Javinet, Ministro da Defesa do Chile: “Nós queremos uma
posição mais ampla, ratificando que nossa realidade é de paz e que o desenvolvimento, o
progresso e a justiça social devem ser consideradas também questões de segurança” (E.
Cantanhêde, Brasil rejeita projeto dos EUA de criar exército continental, in Folha de S. Paulo,
19.11.2004, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1911200421.htm
[19.11.2004]).
351
Brasil, MRE, Brasemb Washington para SERE, Telegrama nº 667, 11.03.2003. Conforme o
telegrama, há forças estadunidenses em, ao menos, 40 países. Esse aumento responde a objetivos
de curto (combate ao terrorismo) e de longo prazos (contenção da China) – de acordo com o
objetivo da NSS de conter qualquer potência que possa ameaçar a hegemonia dos EUA. Tal
expansão militar coincide com um “refluxo diplomático” estadunidense, representado por seu
isolamento crescente na política internacional. “O governo George W. Bush, rompendo com
tradição consagrada [na Guerra Fria], tem dado repetidos sinais de privilegiar, em sua relação
com o resto do mundo, os argumentos da força militar e da pressão econômica à persuasão da
diplomacia.”(Brasil, MRE, Brasemb Washington para SERE, Telegrama nº 668, 11.03.2003).
352
P.C.A. Pinto, O papel dos organismos... cit., p. 266; L.O.S. Bonfim, A política externa... cit.,
pp. 122-39. Agravam essas desconfianças manifestações como as do Comando Sul do Exército
dos EUA, que afirmou considerar o que chama de “populismo radical” uma possível porta de
139
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
o fato, apontado por J.G. Tokatlian, de que, graças à centralidade atual
do Pentágono e da dimensão militar na política externa dos EUA, foi
fortalecido o papel do Comando Sul
353
nas relações com a América
Latina – tendência alimentada pelas turbulências políticas na região.
354
Antes de tudo, há que se ressaltar a desproporcionalidade entre o
grande interesse dos EUA no combate ao terrorismo e a relevância
secundária do tema em praticamente toda a América Latina
355
. Assim,
a primeira reação à agenda de segurança dos EUA – que instam todos
a assumirem como suas as prioridades estadunidenses – consiste em
estabelecer uma hierarquia de prioridades na área conforme a situação
factual de cada Estado. Como coloca L. Tibiletti, não se deve repetir
o erro da Guerra Fria – “comprar”, acriticamente, a agenda de
segurança do Norte e descuidar da principal preocupação latino-
americana, o desenvolvimento equânime. Não significa deixar de
assumir compromissos de cooperação, mas evitar “confundir nossos
próprios problemas com os de outros”. É nesse espírito que o Brasil
– bem como Argentina, Chile, México, Peru, Uruguai e Venezuela –
vem reafirmando seu “direito soberano (...) de identificar suas próprias
entrada para o terrorismo na América Latina e, portanto, uma ameaça à segurança estadunidense.
A instabilidade causada por esse tipo de governo favoreceria o surgimento de terroristas e
guerrilhas urbanas (C. Vila-Nova, Populismo radical favorece o terrorismo, alertam EUA, in
Folha de S.Paulo, 1º.05.2005, disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/
ft0105200510.htm [1º.05.2005]).
353
Na estrutura do Departamento de Defesa dos EUA, existem cinco Comandos com
responsabilidade geográfica: Northern Command, European Command, Central Command,
Southern Command (Comando Sul) e Pacific Command. O Comando Sul tem competência,
grosso modo, pela América Central e do Sul (Estados Unidos da América, U.S. Department of
Defense, DoD 101 – an introductory overview of the Department of Defense, disponível [on-
line] in http://www.defense.gov/pubs/dod101/dod101for2002.pdf [27.08.2005]).
354
J.G. Tokatlian, O momento pró-consular... cit., p. 33.
355
Como aponta B. Martynov, a preservação da identidade cultural nacional, bem como
desenvolvimento econômico igualitário é o cerne de doutrinas políticas e de segurança dos
países latino-americanos mais importantes, como Brasil, Argentina, México, Chile e Venezuela.
Tais países, segundo o autor, relacionam o terrorismo internacional à desigualdade internacional
entre países ricos e pobres e à expansão de culturas e ideologias que confrontam a realidade das
sociedades tradicionais (Latin America and terrorism, in International Affairs – a Russian
Journal of World Politics, Diplomacy & International Relations, 4 (2003), pp. 90-91). No
mesmo sentido, L.F. Macedo Soares: os países sul-americanos “compartilham apenas
parcialmente com os países desenvolvidos as preocupações inerentes às ‘novas ameaças’”,
dentre as quais o terrorismo (O Brasil no cenário regional de defesa e segurança, in Brasil,
Ministério da Defesa, Seminário “Atualização do pensamento brasileiro em matéria
de defesa e segurança”, disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/sitios/
internet/ciclodedebates/textos.htm [15.09.2004]).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
140
prioridades nacionais de segurança e defesa”, conforme se lhe colocam
(ver 5.1).
356
Exemplo disso foi a proposta brasileira, na Comissão de Segurança
Hemisférica, em discussões acerca do tema “Estudo sobre os Problemas e
Riscos para a Paz e a Segurança no Hemisfério e sobre a Prevenção e Solução
de Conflitos”, de dividir os principais aspectos de segurança em três grandes
categorias – ameaças relacionadas à defesa clássica, ameaças não tradicionais
(terrorismo, narcotráfico, insegurança pública etc.) e ameaças relacionadas a
questões estruturais dos problemas de segurança (pobreza extrema,
instabilidade econômica, fragilidade de governos democráticos, doenças etc.).
Ao contrário, os EUA insistiam em lista única, com uma visão hierárquica dos
desafios – priorizando o terrorismo e o narcotráfico. A proposta brasileira,
ressaltando a especificidade dos desafios para cada país, objetivava evitar a
lista única, que diluiria as prioridades latino-americanas de segurança.
357
Dentre as propostas estadunidenses de militarização do combate ao
terrorismo na América Latina, sobressai aquela de ampliar o escopo de atuação
das forças armadas para ações policiais, inclusive contra o terrorismo.
358
Interessa ressaltar que as forças armadas dos EUA são legalmente proibidas
de realizarem atividades policiais pelo Posse Comitatus Act.
359
356
P.C.A. Pinto, O papel dos organismos... cit., p. 266; L. Tibiletti, Antiterrorismo... cit., p.
291; Discurso do Ministro da Defesa José Alencar na VI Conferência de Ministros de Defesa
das Américas, em Quito (17.11.2004), disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/
enternet/sitios/internet/discursos/2004/11-04/discurso_vi_confe_ministros_americas.htm
[22.06.2005]; C. Amorim, O Brasil e os novos... cit. O Brasil tem sido apontado por diversos
países americanos como o único capaz de apresentar visão alternativa viável à pressão dos EUA
no sentido de direcionar a agenda hemisférica de segurança a aspectos de seu interesse exclusivo
(Brasil, MRE, Delbrasupa para SERE, Telegrama nº 787, 17.12.2004). Em comentário acerca da
atuação brasileira na VI Conferência citada, aponta a jornalista E. Cantanhêde: “Alencar teve
um curioso encontro com o secretário da Defesa dos EUA, Donald Rumsfeld. Um falava de
terrorismo, e o outro, de fome. Um discorria sobre crime organizado, e o outro, sobre o
desarmamento dos países ricos.” (Fim da ordem unida cit.).
357
Brasil, MRE, Delbrasupa para SERE, Telegrama nº 106, 19.02.2003; Brasil, MRE, Delbrasupa
para SERE, Telegrama nº 118, 28.02.2003; Brasil, MRE, Delbrasupa para SERE, Telegrama nº
179, 13.03.2003.
358
Como afirma C. Amorim, não há documento ou proposta formal dos EUA sobre o assunto,
mas apenas posições em casos específicos, além de artigos e declarações de altos funcionários
(O Brasil e os novos... cit.).
359
E. Cantanhêde, Brasil rejeita projeto... cit.; E. Cantanhêde, Exército deve virar polícia,
dizem EUA, in Folha de S. Paulo, 17.11.2004, disponível [on-line] in http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1711200421.htm [17.11.2004]A. Barbosa, Visão militar
sobre a inserção internacional de segurança do Brasil, in C. Brigagão e D. Proença Jr. (orgs.),
141
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
O Brasil tem defendido a manutenção das funções atuais das forças
armadas, respaldada pelos militares e pelo direito brasileiro
360
. Conforme o
Ministro da Defesa, José Alencar,
O Brasil, juntamente com os demais países do Grupo ALADI, tem
defendido a posição de que a atividade-fim das Forças Armadas é a
defesa da soberania e da integridade territorial. Compete às forças
policiais e órgãos de inteligência de cada país, trabalhar no sentido
de prevenir e combater o terrorismo e o crime organizado
transnacional (...). Com base em tais princípios, participamos da luta
contra o terrorismo
361
Essa decisão funda-se nas seguintes justificativas: (a) do contrário, as
Forças Armadas se afastariam de sua atividade-fim, com sensível prejuízo
para o preparo militar, além de não estarem aptas a patrulhar cidades – o que
poderia causar inconvenientes graves; (b) o ambiente de corrupção que
envolve o crime poderia contagiar as tropas; e (c) como na Colômbia, o
emprego policial poderia prejudicar a imagem dos militares perante o país.
Por outro lado, não se pode olvidar de que há setores internos, inclusive
estudiosos, que favorecem essa adaptação dos militares, geralmente em virtude
Brasil e o mundo – novas visões, Rio de Janeiro, Francisco Alves, 2002, p. 93; L. Tibiletti,
Antiterrorismo... cit., p. 295. Essa proposta, defendida pelo Secretário da Defesa dos EUA na
VI Conferência de Ministros da Defesa das Américas, em 2004, teve como principais aliados
Canadá, Colômbia e Equador (E. Cantanhêde, artigo referido nesta nota, e Exército deve virar
polícia, dizem EUA, in Folha de S. Paulo, 17.11.2004, disponível [on-line] in http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1711200421.htm [17.11.2004]). Para análise da
possibilidade e consequências da utilização das forças armadas no antiterrorismo em território
estadunidense, ver: W.C. Banks, Troops defending the homeland: the Posse Comitatus Act and
the legal environment for a military role in domestic counterterrorism, in Terrorism and Political
Violence 3 (2002).
360
Segundo L.O.S. Bonfim, o artigo 142 da Constituição Federal de 1988 atribui, às Forças
Armadas, a missão da defesa da Pátria, o que impediria sua atuação na segurança pública. A Lei
Complementar 97/99, por sua vez, prevê a possibilidade de emprego de força militar em
ocasiões de grave comprometimento da ordem pública, desde que esgotados os demais meios
policiais. No mesmo sentido, acrescenta G.M.C. Quintão, que há necessidade de emergencialidade
e temporariedade para essas missões, em que deverão desempenhar papel de Polícia Militar (A
política de defesa... cit., p. 32).
361
Discurso do Ministro da Defesa José Alencar na VI Conferência de Ministros de Defesa das
Américas, em Quito (17.11.2004), disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/
sitios/internet/discursos/2004/11-04/discurso_vi_confe_ministros_americas.htm [22.06.2005].
CIRO LEAL M. DA CUNHA
142
do aprofundamento da crise da segurança pública e da suposta inexistência
de ameaças externas clássicas.
362
Existe também a proposta, patrocinada por EUA e Canadá, de expandir
as atividades da JID rumo ao campo da segurança, função das “novas
ameaças”, inclusive o terrorismo. A JID centralizaria um eventual novo arranjo
hemisférico de segurança e, possivelmente, se transformaria em órgão
operacional, “braço armado” do arranjo. A proposta guarda íntima relação
com a ideia de atuação policial das forças armadas latino-americanas.
Atualmente, a JID é instância hemisférica de prestação de assessoria militar e
serviços técnicos à OEA. Tem-se concentrado em programas de desminagem
na América Central, assistência em desastres, fomento a medidas de confiança
e segurança, ademais de elaborar programas de educação em matéria de
segurança regional. O Brasil entende que a proposta ampliaria sobremaneira
o leque de ação desse órgão, entregando-lhe decisões de defesa.
363
Na VI
Conferência de Ministros de Defesa das Américas, José Alencar afirmou que
“nossos Governos acordaram em sucessivas Assembleias Gerais da
Organização dos Estados Americanos que a Junta Interamericana de Defesa
362
L.O.S. Bonfim, A política externa... cit., pp. 122-39; E. Cantanhêde, Exército deve virar
polícia, dizem EUA, in Folha de S. Paulo, 17.11.2004, disponível [on-line] in http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1711200421.htm [17.11.2004]; J.P.S. Alsina Jr., A síntese
imperfeita... cit., p. 30; Intervenção do Senhor Ministro de Estado da Defesa, José Viegas Filho,
na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, em
Brasília (14.05.2003), disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/
discursos/2003/resenha,14,05,03,01.htm [12.07.2005]; A.C. Pereira, Notas sobre a política de
defesa, in Brasil, Ministério da Defesa, Seminário “Atualização do pensamento brasileiro em
matéria de defesa e segurança”, disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/
sitios/internet/ciclodedebates/textos.htm [15.09.2004]. Para A.C. Pereira, as chamadas “novas
ameaças”, dentre as quais figura o terrorismo, são ilícitos que, ainda que afetem a segurança
nacional, “dificilmente podem ser combatidas eficazmente pelas Forças Armadas”. Segundo
A.C. Vaz, a posição de evitar o envolvimento das Forças Armadas no antiterrorismo gera
maiores responsabilidades sobre os demais órgãos de segurança brasileiros, que se encontram
sobrecarregados e subdimensionados em relação às demandas internas e externas. Essa condição
seria paradoxal frente aos compromissos internacionais assumidos e limitaria a cooperação
internacional em matéria de segurança (A.C. Vaz, Cooperação multilateral... cit., pp. 79-101).
363
E. Cantanhêde, Exército deve virar polícia, dizem EUA, in Folha de S. Paulo, 17.11.2004,
disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1711200421.htm [17.11.2004];
Folha de S. Paulo, Alencar se reúne com Rumsfeld no Equador, 16.11.2004, disponível [on-
line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc1611200410.htm [16.11.2004]; Junta
Interamericana de Defesa, Reseña, disponível [on-line] in http://www.jid.org/sp/about/
[12.07.2005], e Bienvenido, disponível [on-line] in http://www.jid.org/sp/ [12.07.2005]; C.
Amorim, O Brasil e os novos... cit.; Brasil, MRE, Delbrasupa para SERE, Telegrama nº 193,
17.03.2003.
143
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
deve continuar a ser um órgão de assessoria técnico-militar da OEA, sem
funções operacionais.”
364
5.4.3. A invocação do TIAR
A invocação do Tratado Interamericano de Assistência Recíproca
(TIAR), na esteira do 11 de Setembro, parece refletir as orientações brasileiras
tratadas acima. Em 21 de setembro de 2001, aprovou-se, por iniciativa
brasileira, a resolução “Ameaça Terrorista nas Américas”, que, no âmbito do
órgão de consulta do TIAR, considerou os atentados um ataque aos países
americanos e determinou a assistência de todos para enfrentar o terrorismo.
365
Essa iniciativa, de natureza puramente política e diplomática, tencionava
inserir a reação dos países da região, inclusive dos EUA, em moldura
estritamente jurídica. O governo dos EUA reagiu positivamente, agradecendo
a iniciativa. O então Chanceler brasileiro, Celso Lafer, negou,
peremptoriamente, a ideia de envio de tropas, relembrando a tradição brasileira
de enviá-las somente em forças de paz e o fato de que essa não seria a única
forma de apoio recíproco segundo o TIAR. Ademais, argumentou-se que,
apesar de seus mais de cinquenta anos de existência, o tratado é válido
366
e
foi invocado em consonância com a resposta das Nações Unidas aos
364
Discurso do Ministro da Defesa José Alencar na VI Conferência de Ministros de Defesa das
Américas, em Quito (17.11.2004), disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/
sitios/internet/discursos/2004/11-04/discurso_vi_confe_ministros_americas.htm [22.06.2005].
365
C. Lafer, A diplomacia brasileira... cit., pp. 108-14. Houve, na mesma data, outra
manifestação interamericana – Resolução da OEA chamada “Fortalecimento da Cooperação
Hemisférica para Prevenir, Combater e Eliminar o Terrorismo”, que, basicamente, condena o
terrorismo em geral e os atentados especificamente, além de conclamar os países a maior
cooperação; Brasil, MRE, SERE (COCIT) para Brasemb Assunção, Fax nº 138, 14.12.2001. A
invocação do Tratado não poderia ser feita pelo México, que já anunciara sua intenção de
denunciar o acordo, nem pela Argentina, dado o antecedente malsucedido de invocação no
episódio da Guerra das Malvinas. Essa invocação seria sinal de autonomia, não de heteronomia,
baseada no uso de instrumento de direito internacional com objetivos diplomáticos (Entrevista
concedida ao autor pelo Professor Celso Lafer, ex-Ministro das Relações Exteriores, em Brasília
(23.06.2004)).
366
Para o ex-chanceler Lafer, a reunião do TIAR demonstra a flexibilidade e a adaptabilidade do
sistema interamericano de segurança coletiva (A diplomacia brasileira... cit., pp. 108-14). Na
visão do atual Ministro, Celso Amorim, o TIAR, moldado na Guerra Fria, deveria ser revisitado
(Brasil, MRE, Circular Telegráfica nº 47574, 31.10.2003; Discurso do Senhor Ministro de
Estado das Relações Exteriores, Embaixador Celso Amorim, por ocasião da Conferência Especial
sobre Segurança, no âmbito da OEA, na Cidade do México (28.10.2003), disponível [on-line] in
http://www.rbjid.com/Discurso%20Embx%20CES.doc [27.06.2005]).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
144
atentados. O artigo 52 da Carta da ONU, que trata da complementaridade
de organismos regionais na manutenção da paz e da segurança internacionais
com a ONU, reforça essa adequação. Além disso, a invocação do TIAR
atenderia ao objetivo diplomático brasileiro de inserção singular e própria no
mundo, defensora do multilateralismo, que favoreça a manutenção de um
clima pacífico no entorno regional.
367
Foi deixado claro, quando da emissão da resolução sob o TIAR, que o
apoio latino-americano à “guerra ao terrorismo” não era incondicional nem
ilimitado. Assim, como expressa B. Martynov, ao contrário de espelhar o
domínio hemisférico dos EUA, a utilização do tratado consistiu em uso dos
marcos jurídicos interamericanos no interesse dos latino-americanos. Serviu
para evidenciar solidariedade, mas também para sinalizar a necessidade de
encaminhamento multilateral do problema. A.C. Lessa e F.A. Meira ressaltam
que foi evitada a internalização da “guerra ao terrorismo” no hemisfério.
368
No entanto, A. Procópio critica a invocação do TIAR como atitude
subalterna. O tratado poderia ser invocado para intervenções contra o
“narcoterrorismo” na Amazônia ou na Tríplice Fronteira, e a ocorrência de
um atentado em um país signatário poderia justificar nova invocação. Enfim,
o gesto ameaçaria a tradição pacifista brasileira.
369
Não parece acertada essa
análise, pois o enquadramento da resposta hemisférica num marco jurídico,
sem ação militar, reforça aquela tradição e o multilateralismo nas Américas.
5.4.4. Colômbia – solução pacífica e contrariedade às listas de terroristas
A região amazônica é considerada prioridade estratégica brasileira,
sobretudo nos últimos vinte anos, com a superação da rivalidade brasileiro-
argentina. Há clara percepção de vulnerabilidade da Amazônia devido à baixa
densidade demográfica e aos desafios nos campos do narcotráfico, do meio
ambiente e da vigilância do território. Considera-se ameaça possível o
367
Entrevista coletiva concedida pelo Senhor Ministro de Estado das Relações Exteriores,
Celso Lafer, sobre a atuação do Governo brasileiro na Organização dos Estados Americanos
(OEA), em Brasília (14.09.2001), disponível [on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/
politica_externa/discursos/discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=1393 [07.03.2005]; C. Lafer,
A diplomacia brasileira... cit., pp. 108-14; A.C. Lessa e F.A. Meira, O Brasil e os atentados...
cit., pp. 44-61.
368
F. Rojas Aravena, A construção de regimes... cit., p. 276; B. Martynov, Latin America... cit.,
p. 89; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 02-39; A.C. Lessa e F.A. Meira,
O Brasil e os atentados... cit., pp. 44-61.
369
A. Procópio, Terrorismo e relações internacionais cit., pp. 62-81.
145
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
transbordamento de conflitos internos em vizinhos amazônicos para a
Amazônia brasileira, sobretudo no contexto do Plano Colômbia
370
, em que
as guerrilhas, mormente as FARC, têm enfrentado forte ofensiva militar. A
situação colombiana é considerada o maior ponto de preocupação brasileira
em segurança regional.
371
O governo colombiano, ainda com o presidente Pastrana, aproveitou o
contexto de “guerra ao terrorismo” para convencer os EUA
372
e a opinião
pública internacional da existência de vínculos entre os guerrilheiros
colombianos e as redes transnacionais de terrorismo, já que ambos
financiavam sua ação por meio do tráfico de entorpecentes. Com isso, os
movimentos revolucionários ligados ao narcotráfico passaram a ser percebidos
como terroristas. Aos objetivos do Plano Colômbia, acresceu-se, pois, o
combate ao terrorismo.
373
No primeiro semestre de 2002, as FARC e paramilitares
colombianos passaram a constar da lista estadunidense de grupos
terroristas, tendo a UE feito o mesmo. Os recursos do Plano Colômbia
foram reorientados para o combate aos supostos terroristas, agora com
liberação mais rápida de equipamentos e fundos pelos EUA. Contudo,
foram mantidas as restrições quanto ao envolvimento de militares
estadunidenses no conflito. Como expõe L.O.S. Bonfim, os EUA
tendem, cada vez mais, a inserir o narcotráfico no bojo da “guerra ao
terror”. A Colômbia, segundo o presidente Bush e importantes
370
O Plano Colômbia tem no combate às drogas e ao terrorismo apenas uma de suas várias
dimensões; liga-se a questões econômicas, sociais etc. (L.O.S. Bonfim, A política externa... cit.,
pp. 01-10). A Colômbia é o maior receptor de assistência oficial estadunidense na América
Latina, e o quarto global (atrás de Israel, Egito e Iraque). Entre 1998 e 2003, foram US$ 2,9
bilhões. Em 2005, prevêem-se US$ 724 milhões. O Congresso dos EUA autorizou a presença
de até 800 militares e 600 contratados privado (J.G. Tokatlian, O momento pró-consular... cit.,
pp. 32-33).
371
J. Almino, Inserção internacional... cit., p. 46; T.G. Costa, A segurança internacional.. cit.,
p. 201; G.M.C. Quintão, A política de defesa... cit., p. 28; II encontro de estudos... cit., pp. 103-
23; J. Almino, Inserção internacional... cit., p. 48; Conferência do Ministro de Estado da
Defesa, José Viegas Filho, no Curso de Gestão de Recursos de Defesa, em Brasília (21.10.2003),
disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/discursos/2003/10-
03/discurso,21,10,03_a.htm [27.09.2004].
372
Segundo A.P. Tello, já antes do 11 de Setembro, os EUA buscavam igualar o terrorismo
islâmico às FARC. (Cooperação antiterrorista na América Latina, in C. Brigagão e D. Proença
Jr. (orgs.), Paz e terrorismo – textos do seminário “Desafios para a política de segurança
internacional: missões de paz da ONU, Europa e Américas”, São Paulo, Hucitec, 2004, p.
285).
373
L.O.S. Bonfim, A política externa... cit., pp. 01-10, 102-21.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
146
congressistas estadunidenses, teria um papel destacado nessa
“guerra”.
374
Nesse contexto, o processo de paz liderado pelo presidente
Pastrana
375
malogrou. Derrogou-se, com forte apoio internacional, a zona
desmilitarizada e, desde então, os militares ocuparam as principais cidades
da área, levando as FARC a reagirem com a retração para selvas e
montanhas e mediante forte ofensiva terrorista. O sucessor de Pastrana,
Uribe, adotou estratégia ainda mais enérgica, que gerou recrudescimento
da violência das FARC.
376
Como aponta L.O.S. Bonfim, a maior preocupação brasileira quanto
ao Plano Colômbia é o transbordamento do conflito
377
; há risco de seu
acirramento impactar o território brasileiro, v.g., com refugiados e
perseguição de grupos guerrilheiros. Favorece o Brasil a ausência de
precedentes das FARC em atentados fora da Colômbia, apesar de seus
notórios vínculos com outros movimentos guerrilheiros e com o narcotráfico
internacionais. Positivo, também, é o retraimento atual das FARC no
território colombiano, devido à forte ofensiva militar. Mesmo assim, a guarda
das fronteiras e a ação dissuasória na Amazônia brasileira são essenciais
para afastar esses inconvenientes, o que é favorecido pela familiaridade
das Forças Armadas com a região e pela reconhecida eficiência de seu
treinamento.
378
O transbordamento não é visto como provável, dada a distância entre as
zonas de conflito e a fronteira brasileira – apesar da proximidade de
374
L.O.S. Bonfim, A política externa... cit., pp. 102-21, 122-39; J. Castañeda, The forgotten
relationship cit., pp. 67-81; Brasil, MRE, Brasemb Bogotá para SERE, Telegrama nº 539,
12.06.2002.
375
O período Pastrana representa, sobretudo devido à concessão de uma área desmilitarizada à
guerrilha, uma tentativa radical de resolução do conflito colombiano por meio das negociações.
376
J. Castañeda, The forgotten relationship cit., pp. 67-81; L.O.S. Bonfim, A política externa...
cit., pp. 102-21. J. Castañeda considera a estratégia de Uribe tão irreal e unilateral quanto a de
Pastrana. L.O.S. Bonfim assinala que, ao contrário de Pastrana, Uribe prometeu acabar a guerra
com mais guerra. O diálogo com as guerrilhas é condicionado ao abandono do terrorismo, dos
sequestros e do narcotráfico. Por sua vez, as FARC exigem, para retomar o diálogo, intenso
combate do governo aos paramilitares, a desmilitarização de dois Departamentos do sul do
país, além da condição de não serem mais chamadas de terroristas ou narcoterroristas. Os dois
lados, como aponta L.O.S. Bonfim, parecem fazer exigências radicais, o que adia o retorno ao o
diálogo.
377
A PDN considera que a “existência de zonas de instabilidade e de ilícitos transnacionais pode
provocar o transbordamento de conflitos para outros países da América do Sul” (§ 3.5).
378
L.O.S. Bonfim, A política externa... cit., pp. 122-39.
147
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
acampamentos das FARC na região de Cucuí
379
. Por enquanto, mais preocupa
o Brasil o aumento do contato entre narcotraficantes brasileiros e as FARC
380
,
sobretudo as operações envolvendo trocas de armas (muitas vezes,
contrabandeadas dos EUA para o Brasil) por cocaína colombiana.
381
Outra ordem de preocupações é político-estratégica. Uma presença
militar estadunidense mais efetiva na região constituiria incômodo ao Brasil,
sendo que muitos já a percebem como risco concreto à integridade de nossas
fronteiras. Entretanto, o número de assessores estadunidenses é legalmente
limitado a 400 militares e a 400 civis contratados. De qualquer maneira, é
preocupante para a América do Sul a doutrina do ataque preventivo, pois
guerrilheiros e paramilitares são considerados organizações terroristas capazes
de afetarem a segurança dos EUA – participam do narcotráfico internacional,
desestabilizam a região e podem pôr em risco interesses vitais estadunidenses,
como o acesso ao Canal do Panamá e ao petróleo da região.
382
Por todas essas razões, sobretudo as duas últimas, o Brasil favorece a
saída pacífica do conflito colombiano. Não interessa ao Brasil uma presença
militar importante na vizinhança, tampouco o transbordamento do conflito
para território nacional.
379
“Quanto à Colômbia, o noticiário com certa freqüência alimenta o temor de atividades das
FARC em território nacional. Na realidade, foram raros os episódios de contato na área da
fronteira. Não creio que as FARC tenham intenção alguma de entrar em território brasileiro.
Mas faço questão de ressaltar que qualquer incursão em nosso território será rechaçada com
todo o rigor. Que não fiquem dúvidas a esse respeito.” (Intervenção do Senhor Ministro de
Estado da Defesa, José Viegas Filho, na Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional
da Câmara dos Deputados, em Brasília (14.05.2003), disponível [on-line] in https://
www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/discursos/2003/resenha,14,05,03,01.htm
[12.07.2005]).
380
Segundo W.F.B. Jacini, a Frente 16 das FARC possui grande articulação no tráfico de drogas,
compra de armamentos e outros materiais e realiza transações com o Brasil, México, Cuba,
Venezuela e Paraguai. Destaca-se, para o Brasil, a relação direta entre o traficante Fernandinho
Beira-Mar e as FARC, por meio do comandante “Negro Acácio”. No campo estritamente
político, segue o autor, as FARC desenvolvem, no Brasil, trabalho de base em algumas
universidades e movimentos sociais. Com isso, buscam o reconhecimento do estado de
beligerância, recursos econômicos e apoio de ONGs. (Terrorismo: atuação... cit., pp. 79-80).
381
Brasil, MRE, Brasemb Washington para SERE, Telegrama nº 1625, 15.07.2002.
382
L.O.S. Bonfim, A política externa... cit., pp. 122-39; II encontro de estudos...cit., pp. 20-26;
103-23; Força-tarefa independente patrocinada pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais
(CEBRI), Relatório sobre os EUA cit., pp. 126-28. S.P. Guimarães avalia como maiores ameaças
à Amazônia brasileira “a presença militar americana na região, a militarização do combate à
droga e a possível internacionalização de conflitos internos existentes ou latentes de Estados
vizinhos em direção ao Brasil” (O paraíso perdido: território e Amazônia, in Carta Maior,
1º.06.2005, disponível [on-line] in http://agenciacartamaior.uol.com.br/
agencia.asp?id=1305&coluna=boletim [02.06.2005]).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
148
De fato, os governos brasileiros têm advogado a inconveniência de intervir
diretamente, com forças militares, no combate ao narcotráfico e ao terrorismo
internacionais. Enfatiza-se o combate ao trânsito fronteiriço de narcóticos, o
aperfeiçoamento dos meios de segurança pública e inteligência, além da
vigilância de “áreas-chaves” suspeitas de abrigar células terroristas.
383
Buscado não se imiscuir no conflito colombiano, o Brasil considera-o
assunto interno e propugna, assim como a ONU, uma saída política. Além do
fortalecimento dos controles de fronteira
384
e do oferecimento de ajuda no
processo de paz nas formas escolhidas por Bogotá, o Brasil coopera por
meio do Grupo de Trabalho para a Repressão da Criminalidade e do
Terrorismo, estabelecido em 2003, e que tem em pauta temas como
intercâmbio de inteligência, cooperação judiciária e modalidades de utilização
do SIVAM. Mesmo assim, a posição brasileira é criticada, vista como
recalcitrante e descompromissada pelos EUA e pelos demais países envolvidos
na questão colombiana, o que é agravado pelo fato de não dispor de recursos
para oferecer uma alternativa viável ao Plano Colômbia.
385
A despeito das reclamações, permanecem os elevados interesse e cautela
brasileiros, como se percebe nas palavras do então Ministro da Defesa, José
Viegas Filho,
Especificamente com relação ao conflito interno na Colômbia (...),
registro que, na minha avaliação, se trata do principal foco de
insegurança do nosso entorno geográfico. Temos claro interesse no
fim do conflito interno colombiano e faço questão de ressaltar que o
383
L.O.S. Bonfim, A política externa... cit., pp. 122-39.
384
Exemplo desse controle constitui a Operação “CoBra”, cooperação, desde 2000, entre a
Polícia Federal brasileira– com apoio logístico das Forças Armadas – e autoridades colombianas
com o fim de obstruir o ingresso e o trânsito de entorpecentes em território brasileiro, além de
neutralizar a propagação do conflito colombiano. Na região amazônica, as vias de acesso da
Colômbia ao Brasil com prioridade de fiscalização são aéreas e fluviais. Realizam-se, com essas
finalidades, operações de inteligência policial. (W.F.B. Jacini, Terrorismo: atuação... cit., p. 79;
Brasil, MRE, SERE para Brasemb Bogotá, Despacho Telegráfico nº 576, 22.07.2003). Ainda,
em maio de 2005, as Forças Aéreas Brasileira e Colombiana assinaram acordo que permite a
interceptação e a destruição de aeronaves irregulares que cruzarem a fronteira entre os países. A
ideia é combater cooperativamente o narcotráfico e o tráfico de armas (K. Brasil, Abate de
aviões alia FAB à Colômbia, in Folha de S. Paulo, 23.05.2005, disponível [on-line] in http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2305200512.htm [23.05.2005]).
385
J. Almino, Inserção internacional... cit., p. 48; L.O.S. Bonfim, A política externa... cit., pp.
102-39; J. Castañeda, The forgotten relationship cit., pp. 67-81; Força-tarefa independente
patrocinada pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (CEBRI), Relatório sobre os
EUA cit., pp. 126-28; C, Amorim, O Brasil e os novos... cit.
149
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
Brasil está pronto a fazer a sua parte, em resposta a iniciativas
apoiadas pelo próprio Governo daquele país, para que a grave
situação por que passa a Colômbia seja encaminhada da maneira
mais adequada ao pleno restabelecimento da normalidade social e
política no nosso vizinho.
386
A expressão mais importante, para o Brasil, da questão do terrorismo na
Colômbia, refere-se às pressões – ainda que aparentemente difusas – pela
classificação das FARC como grupo terrorista
387
. Ao manter sua posição
cautelosa quanto ao conflito colombiano e negar a existência de qualquer
pedido formal quanto à denominação dessa guerrilha, o País não cedeu e
seguiu sua política de não elaborar listas de grupos terroristas.
388
386
Conferência do Ministro de Estado da Defesa, José Viegas Filho, no Curso de Gestão de
Recursos de Defesa, em Brasília, (21.10.2003), disponível [on-line] in https://www.defesa.gov.br/
enternet/sitios/internet/discursos/2003/10-03/discurso,21,10,03_a.htm [27.09.2004].
387
Exemplo claro das pressões estadunidenses pelo reconhecimento das FARC como terroristas
é o informe “Asking our partners to weigh in with Venezuela on Granda and the Farc”, do
Departamento de Estado, enviado aos países sul-americanos com o pedido de que pressionassem
a Venezuela a encerrar suas relações com as FARC e passar a considerá-las terroristas. No
conflito acerca da prisão de Rodrigo Granda (espécie de “Chanceler” das FARC, preso em
Caracas e entregue a autoridades colombianas por militares venezuelanos, sem conhecimento
do presidente Chávez), os EUA ficaram do lado colombiano, tendo reconhecido o papel mediador
de Peru e Comunidade Andina para a solução do conflito, em detrimento do Brasil (E. Cantanhêde,
EUA cobram pressão de sul-americanos sobre Chávez, in Folha de S. Paulo, 22.01.2005,
disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2201200512.htm
[22.01.2005]; Folha de S. Paulo, 22.01.2005, “Venezuela deve ser pressionada”, disponível
[on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft2201200513.htm [22.01.2005]).
388
“[E]ste tema se originou desta forma numa carta do governo colombiano que figurou na
Internet, mas que nunca chegou a ser enviada como tal, nunca houve o pedido formal direto ao
Governo brasileiro de que classificasse as FARC como movimento terrorista. Houve, sim, dias
depois, uma carta em que o Presidente colombiano pediu apoio a uma iniciativa, de cuja
concretização não tenho notícia, para que os organismos internacionais — a ONU e a OEA —
classificassem as FARC como movimento terrorista” (Audiência Pública do Senhor Ministro
de Estado das Relações Exteriores, Embaixador Celso Amorim, na Comissão de Relações
Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, em Brasília (23.04.2003), disponível
[on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/
discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=2109 [14.09.2004]). Em artigo publicado em março de
2003, o colunista Andréas Oppenheimer tece duras críticas à falta de categorização das FARC
como grupo terrorista por Brasil, Equador e Venezuela. Com a recusa, esses países não podem
ser considerados mediadores possíveis para o conflito (Brasil, MRE, Brasemb Washington
para SERE, Telegrama nº 711, 13.03.2003). Também C.C. Maia discorda da posição do Itamaraty:
a denominação das FARC como terrorista, a exemplo do Irish Republican Army (IRA), não
prejudicaria futuras negociações de paz, nas quais o Brasil poderia participar. Tampouco tal
caracterização se prestaria ao desrespeito do governo colombiano ao direito humanitário (Così
fan tutte: o drama jocoso da classificação das FARC como organização terrorista, in Meridiano
47 38/39 (2003), pp. 04-06).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
150
Com efeito, o Brasil – a exemplo das Nações Unidas – tem-se afirmado
contrário à elaboração de listas de terroristas, o que considera improdutivo
e imprevisto no direito nacional. As listas poderiam limitar a consideração
das causas últimas da violência. Os contatos com certos grupos seria
dificultado, afastando as chances de solução negociada. Ainda, não há
procedimentos precisos de inclusão e exclusão nas listas. Na ausência de
uma concepção comum de terrorismo, a elaboração de uma lista
internacional de terroristas poderia levar a uma politização indevida do
antiterrorismo, não sendo apropriado, sobretudo, identificar pessoas ou
grupos para fins de sanções (conforme previsto na resolução 1566 do
CSNU). Ao mesmo tempo, o Brasil, coerente com sua postura de repúdio
incondicional, condena ataques terroristas pontuais na Colômbia, tendo
apoiado, na OEA, uma resolução relativa a atos terroristas em Bogotá,
que o governo colombiano concluiu terem sido cometidos pelas FARC. Tal
forma de enquadrar o problema encontra-se de acordo, também, com a
visão brasileira do conflito interno colombiano – que favorece uma saída
política não militar, não se imiscuindo em assuntos internos colombianos
sem convite.
389
5.5. Fortalecimento do multilateralismo e do direito internacional
Num cenário em que, como percebido pelo Itamaraty, atos terroristas
provocam reações unilaterais que podem debilitar o multilateralismo e gerar
389
ONU, CSNU, S/PV.5059, disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/
PRO/N04/560/47/PDF/N0456047.pdf?OpenElement [18.07.2005], pp. 11-12; Brasil, MRE,
Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 2625, 06.10.2004; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE,
Telegrama nº 259, 02.02.2005; Palavras do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na conferência
“Combatendo o Terrorismo em Prol da Humanidade”, em Nova York (22.09.2003), disponível
[on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/
discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=2152 [22.06.2005]; Audiência Pública do Senhor
Ministro de Estado das Relações Exteriores, Embaixador Celso Amorim, na Comissão de Relações
Exteriores e Defesa Nacional da Câmara dos Deputados, em Brasília (23.04.2003), disponível
[on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/
discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=2109 [14.09.2004]; L.F. Macedo Soares, O Brasil no
cenário... cit.; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 1139, 05.05.2005. O Grupo
do Rio parece ter a mesma posição: não chega a afirmar serem as FARC terroristas, mas condena
seus atos dessa natureza (Brasil, MRE, Circular Telegráfica nº 46035, 15.05.2003). Bom exemplo
da oposição às listas dá-se no CSNU. Apoiando a resolução 1566 (2004), que criaria grupo de
trabalho para estudar medidas contra terroristas em geral, o Brasil opôs-se – com Alemanha,
Angola e Chile – à elaboração de listas de terroristas (Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE,
Telegrama nº 2624, 06.10.2004).
151
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
instabilidade, o Brasil, que não busca afirmar-se militarmente, “tem como
foco central de sua diplomacia o fortalecimento do sistema internacional
baseado em normas e compromissos entre os Estados”.
390
Como bem coloca
S.P. Guimarães,
A identificação do terrorismo como inimigo difuso (...) e contra o
qual todas as medidas são justificadas, tanto no plano interno quanto
no externo, e a designação de Estados como promotores, coniventes
ou lenientes com grupos terroristas, e portanto passíveis de serem
punidos, torna os princípios fundamentais da ordem jurídica das
Nações Unidas “relativizados” e extremamente instável, imprevisível
e tensa a situação internacional.
De fato, o unilateralismo de grandes potências fragiliza a ordem jurídica
criada no pós-guerra, fundada na igualdade soberana dos Estados, na
autodeterminação, na não intervenção, na solução pacífica de controvérsias
e no monopólio legítimo do uso da força pelo CSNU.
391
Assim, a defesa da centralidade do multilateralismo e do direito
internacional – inclusive por meio de uma reforma ampliadora do CSNU –
na resposta ao terrorismo faz parte das posições brasileiras sobre o tema.
Ganha importância essa argumentação no momento atual – sobretudo após a
invasão do Iraque –, em que o mais importante foro multilateral (ONU) se
encontra fragilizado, arriscado de retrocesso.
392
Na nova PDN, lê-se:
390
Brasil, MRE, Secretário-Geral das Relações Exteriores para Subsecretário-Geral de Política
Bilateral, Memorandum nº 133, 16.05.2003.
391
S.P. Guimarães, Uma estratégia militar para o Brasil, in Brasil, Ministério da Defesa,
Seminário “Atualização do pensamento brasileiro em matéria de defesa e segurança”, disponível
[on-line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/ciclodedebates/textos.htm
[15.09.2004]. Exemplo do desafio à ordem jurídica fundada no multilateralismo das Nações
Unidas é, como nota C. Amorim, a atuação da OTAN após o 11 de Setembro. As ambições da
Organização passaram a ser virtualmente ilimitadas: o combate ao terrorismo é considerado
missão permanente – se necessário, ofensivamente. A OTAN teria evoluído de ente de defesa
coletiva para organização de segurança coletiva – conceito de difícil compatibilização com a
exclusividade do CSNU nessa matéria (O Brasil e os novos... cit.).
392
Brasil, MRE, SERE para Brasemb Moscou, Despacho Telegráfico nº 570, 21.12.2001; C.
Amorim, Conceitos e estratégias da diplomacia do Governo Lula, in Diplomacia, Estratégia e
Política 1 (2004), p. 45. Nos dizeres de S.P. Guimarães, a confirmação de um mundo unipolar
e hegemônico ensejaria aumento na probabilidade de arbítrio e violência internacionais – inclusive
a possibilidade de o Brasil ser vítima de pressões e agressões (Uma estratégia... cit.).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
152
O Brasil propugna uma ordem internacional baseada na democracia,
no multilateralismo, na cooperação, na proscrição das armas químicas,
biológicas e nucleares e na busca da paz entre as nações. Nessa
direção, defende a reformulação e a democratização das instâncias
decisórias dos organismos internacionais, como forma de reforçar a
solução pacífica de controvérsias e sua confiança nos princípios e
normas do Direito Internacional. (§4.7)
Já faz parte das tradições diplomáticas brasileiras a grande importância
conferida aos foros multilaterais. Conforme C. Lafer, cabe ao Brasil privilegiá-
los em sua atuação internacional, pois constituiriam o melhor tabuleiro para o
País – possibilitam alianças de geometria variável, facilitadas por um mundo
em que não há polos definidos de poder.
393
O plano multilateral seria propenso
à geração de poder – entendido, em termos arendtianos, como ação conjunta
–, que surge quando há espaço para capacidade de iniciativas, aptas a
consequências quando há concordância. É nesse ambiente que se poderia
desenvolver o melhor do potencial brasileiro “para atuar na elaboração das
normas e pautas de conduta da gestão do espaço da globalização”.
394
Como bem coloca o Chanceler Celso Amorim, era ingênua a percepção,
no início dos anos 1990, de que a cooperação multilateral, sobretudo no
CSNU, aumentaria de forma automática. O multilateralismo deve ser
defendido e fortalecido, inclusive pela superpotência estadunidense, primeiro
porque, mesmo imperfeito, é o único meio de diálogo construtivo entre
diferentes visões de mundo, que conduza à cooperação abrangente e benéfica
para todos; e, segundo, porque contribui para a estabilidade internacional,
sendo que “[u]m mundo imprevisível e instável não é bom para ninguém”.
Ademais, o multilateralismo representa, nas relações internacionais, o mesmo
que a democracia no plano interno. O unilateralismo “apenas reforça o
isolamento, agrava desigualdades e alimenta frustrações e fanatismo”.
395
É natural que, sem uma resposta multilateral legítima e eficaz para o
terrorismo, ações unilaterais sigam como prática dos países poderosos para
393
Como bem ressalta G. Fonseca Jr., na Guerra Fria, havia, para os países em desenvolvimento,
liberdade de proposição e restrições de alianças; no mundo atual, contudo, é o oposto que se
opera (A legitimidade e outras questões internacionais – poder e ética entre as nações, São
Paulo, Paz e Terra, 1998, p. 214).
394
C. Lafer, A identidade internacional do Brasil e a política externa brasileira – passado,
presente e futuro, São Paulo, Perspectiva, 2001, pp. 67-98, 105-18.
395
C. Amorim, EUA e o mundo... cit.; C. Amorim, Conceitos e estratégias... cit., p. 45.
153
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
tanto, podendo acentuar a instabilidade internacional e a insegurança. Isso
significaria um retrocesso jurídico-político internacional
396
. Não se pode perder
de vista, conforme assinalou o Chanceler Amorim, que
Embora, originalmente, o problema do Iraque seja estritamente o de
armas de destruição em massa, digamos, do ponto de vista psicológico,
sociológico e político, ficou mesclado com a questão do terrorismo
internacional, ou pelo menos em termos de motivação, sobretudo por
parte da maior potência.
397
De maneira análoga ao que se verificou nesse episódio, há uma tendência
de, quando em situações avaliadas como extremas, os Estados recorrerem à
força sob o pretexto de interpretações extensivas do direito de legítima defesa
(inscrito na Carta das Nações Unidas no art. 51), sem autorização do CSNU
e, portanto, ilicitamente.
398
Como ressalta M.C. Flores, nesse contexto,
marcado pela doutrina dos EUA de guerra preventiva e seu papel de polícia
do mundo, duríssima contra o terrorismo,
[O] melhor que um país como o Brasil tem a fazer é prestigiar os
foros internacionais, em particular mas não apenas a ONU, para,
sem hostilizar frontal e inocuamente o poder hegemônico, contribuir
no esforço de ao menos balizá-lo com o condicionamento
internacional realisticamente possível.
399
Não se trata, portanto, de contra-hegemonia, mas de buscar circunscrever
as ações antiterroristas a arranjos multilaterais, em nome da maior estabilidade
internacional e da defesa da influência brasileira, ainda que limitada, no processo
decisório.
396
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 110-15.
397
Intervenção do Senhor Ministro de Estado das Relações Exteriores, Embaixador Celso
Amorim, na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional do Senado Federal, em Brasília
(27.02.2003) disponível [on-line] in http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/
discursos/discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=2078 [20.07.2005].
398
L.N.C. Brant e J.M. Lasmar, O direito internacional e o terrorismo internacional: novos
desafios à construção da paz, in C. Brigagão e D. Proença Jr. (orgs.), Paz e terrorismo – textos
do seminário “Desafios para a política de segurança internacional: missões de paz da ONU,
Europa e Américas”, São Paulo, Hucitec, 2004, pp. 194-95; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao
terrorismo... cit., pp. 40-73.
399
M.C. Flores, O policial benigno... cit., pp. 74-77.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
154
É de se apontar, com A. Cassese, que as respostas pacíficas ao terrorismo
devem preceder as coercitivas, conforme os princípios fundamentais da
comunidade internacional, sobretudo a Carta das Nações Unidas. O Brasil
está, como se viu (5.4), de acordo com essa leitura – que parece a mais
acertada – do direito internacional. Sua defesa do multilateralismo e desse
direito figura, em grande parcela, como oposição ao uso indevido da força.
400
Conforme o discurso diplomático brasileiro, as Nações Unidas deveriam
ter a responsabilidade primária pela resposta coordenada, ampla e integrada,
da comunidade internacional contra o terrorismo. Não espanta, assim, que o
País tenha copatrocinado a resolução 57/145 da AGNU (“Responding to
global threats and challenges”), de iniciativa russa e adotada por consenso,
que afirma a necessidade de a ONU estar adaptada para combater, dentre
outras novas ameaças, o terrorismo. Aliás, o Brasil tem destacado que
privilegia a AGNU como foro decisivo no combate ao terrorismo – reitera
que vê com reserva a penetração do CSNU em assuntos de competência
privativa da Assembleia. Essa preocupação é natural, dado que o País não é
membro permanente daquele Conselho, e que este tem adotado resoluções
crescentemente legislativas e coercitivas (ver 2.2.2 e 5.4.1), podendo também
intervir excessivamente em questões de instabilidade interna que não ameacem,
propriamente, a paz e a segurança internacionais.
401
A defesa do multilateralismo em sua crise hodierna traz em si, além do
exposto, um reformismo declarado. O cenário de crise
402
pós-11 de Setembro,
na análise de J. Almino, possibilita ímpetos reformistas – “após grandes crises
400
A. Cassese, The international community’s… cit., pp. 589-91. No mesmo sentido, J.F.
Murphy (State support of international terrorism: legal, political and economic dimensions,
Boulder, Westview, 1989, pp. 55-64, 69, 85-108). Conforme J.F. Murphy,, as respostas pacíficas
ao terrorismo podem incluir protestos públicos, quiet diplomacy e meios judiciais; as respostas
mais coercivas incluem sanções econômicas, missões de resgate e ataques armados a países que
apoiem terroristas.
401
Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 259, 02.02.2005; Brasil, MRE, Delbrasonu
para SERE, Telegrama nº 53, 21.01.2003; ONU, AGNU, A/57/PV.75, disponível [on-line] in
http://daccessdds.un.org/doc/UNDOC/GEN/N02/740/84/PDF/N0274084.pdf?OpenElement
[24.07.2005]; Brasil, MRE, SERE (COCIT) para Brasemb Assunção, Fax nº 138, 14.12.2001;
Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 2625, 06.10.2004; Brasil, MRE, Delbrasonu
para SERE, Telegrama nº 98, 20.01.2004.
402
“Chama-se crise a um momento de ruptura no funcionamento de um sistema, a uma mudança
qualitativa em sentido positivo ou em sentido negativo, a uma virada de improviso, algumas
vezes até violenta e não prevista no módulo normal segundo o qual se desenvolvem as interações
dentro do sistema em exame.” (G. Pasquino, verbete Crise, in N. Bobbio et.al., Dizionario di
politica, trad. port. de C.C. Varriale et.al., Dicionário de Política, vol. 1, Brasília, UnB, 2004,
pp. 303-06).
155
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
é que se constroem novas ordens”. No mesmo sentido, A.C. Lessa e F.A.
Meira argumentam que, não obstante os vários riscos que a situação gera ao
Brasil (como a militarização e a ênfase na segurança), se lhe oferece um
momento de grande plasticidade, cheio de oportunidades.
403
Essa avaliação é especialmente verdadeira quando se consideram as
atuais movimentações por reformas nas Nações Unidas, particularmente
de seu Conselho de Segurança. Conforme o Embaixador João Clemente
Baena Soares (um dos 16 notáveis do Painel de Alto Nível sobre Ameaças,
Desafios e Mudanças da ONU), a corrida para a reforma e a modernização
da Organização representa, em grande medida, resposta à política externa
agressiva de Bush, considerada hostil à entidade. “O comportamento da
política externa dos EUA contribuiu para uma inquietação da comunidade
internacional, que levou a esse movimento de renovação mais acentuado”
– em que existe a possibilidade de o Brasil conquistar um assento permanente
no CSNU.
404
Nesse diapasão, já na 56ª AGNU, o Presidente Cardoso destacou
que o Brasil “quer contribuir para que o mundo não desperdice as
oportunidades geradas pela crise de nossos dias”. Em seguida, fala da
necessidade de superar o “déficit de governança” internacional, o que
implicaria, além da reforma do FMI e outras instâncias, um fortalecimento
das Nações Unidas. Esta mudança passaria pela instituição de “um Conselho
de Segurança mais representativo, cuja composição não pode continuar a
refletir o arranjo entre os vencedores de um conflito ocorrido há mais de
50 anos” – pleito mais aparente nos dias atuais, que precedem a 60ª AGNU.
V.C. Mello aponta que, nesse pronunciamento, indica-se o desejo brasileiro
de influir na agenda internacional, ligando o terrorismo à agenda da
403
J. Almino, Inserção internacional... cit., p. 324; A.C. Lessa e F.A. Meira, O Brasil e os
atentados... cit., pp. 44-61.
404
F. Zanini, Reforma da ONU é resposta a política de Bush, diz diplomata (entrevista com o
Embaixador João Clemente Baena Soares), in Folha de S. Paulo, 28.03.2005, disponível [on-
line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2803200513.htm [28.03.2005]. No mesmo
sentido, o Embaixador Ronaldo Sardenberg avalia que a retomada do assunto da reforma do
CSNU deu-se em função da percepção de desgaste político, sobretudo do CSNU, e com a
iniciativa de Kofi Annan de convocar o painel de discussões de alto nível. Considera, ainda, que
a oportunidade para a reforma do CSNU é histórica e única, pois, se não for aprovada neste ano,
dificilmente o será posteriormente. A perspectiva é de que a proposta do G4 (Alemanha, Brasil,
Índia e Japão) obtenha a maioria necessária na AGNU e que, no CSNU, não seja vetada (P.D.
Leite, Reforma na ONU é agora ou nunca, diz Sardenberg, in Folha de S. Paulo, 21.06.2005,
disponível [on-line] in http://www1.folha.uol.com.br/fsp/brasil/fc2106200526%2ehtm
[21.06.2005]).
CIRO LEAL M. DA CUNHA
156
governança e utilizando a ONU para assumir papel ativo e regionalmente
influente na resposta ao terrorismo.
405
Há que se ressaltar, por fim, que tanto a defesa do multilateralismo
quanto o reformismo das instituições internacionais ora tratados
parecem inserir-se na tendência diplomática brasileira que G. Fonseca
Jr. chamou de “autonomia pela participação”. Após a Guerra Fria, o
mundo apresenta-se em transição, momento de criação de regras e
instituições – como parece evidente com relação ao terrorismo. Dado
que existem poucos assuntos que não afetam o Brasil – o tema presente
não é exceção, como se viu (3.2.7, 5.4.3 e 5.4.4) –, não é possível
ser autônomo em política externa distanciando-se das discussões,
senão participando “com valores que exprimem tradição diplomática
e capacidade de ver os rumos da ordem internacional com olhos
próprios.” Entendemos que, para um país como o Brasil, sem
“excedentes de poder”, a defesa do fortalecimento e da maior abertura
das instituições internacionais são corolários de sua busca por maior
participação.
406
5.5.1. A defesa dos direitos humanos no combate ao terrorismo
É evidente que atos de terrorismo constituem violações atrozes dos
direitos fundamentais – como está inscrito na Declaração e Programa de
Ação de Viena, adotada pela Conferência Mundial de Direitos Humanos em
405
V.C. Mello, Paz e segurança... cit., pp. 164-65, 180-82; Texto base do discurso do Senhor
Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, na abertura do debate geral da 56a
Sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York (10.11.2001), disponível [on-
line] in http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/
discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=1115 [13.09.2004]. Em discurso de 10 de outubro de
2001, Cardoso ressalta a necessidade de integrar os países emergentes nos órgãos decisórios
internacionais, o que pode ser compreendido como renovação do pleito, p.ex., a um assento
permanente do CSNU, como afirmam A.C. Lessa e F.A. Meira. O Brasil, assim, oferece à
comunidade internacional sua “moderação construtiva” como elemento de ponderação em um
ambiente inflamado, ao que se soma uma folha de serviços prestados à estabilidade sistêmica
regional e globalmente (O Brasil e os atentados... cit., pp. 44-61).
406
G. Fonseca Jr., A legitimidade... cit., pp. 359-68. Nesse sentido, V.C. Mello: “A visão que
dominou parece ter sido de que somente pela participação será possível influenciar a agenda de
paz e segurança e ter uma voz na redefinição dos novos rumos da ordem internacional. O
objetivo, como sempre, parece ter sido o fortalecimento das instituições multilaterais.” (Paz e
segurança... cit., pp. 180-82). Conforme S.P. Guimarães, o Brasil é sujeito às decisões do
CSNU, sem poder influir sempre no processo decisório – que pode contrariar os princípios e
pontos de vista do País (Quinhentos anos... cit., p. 117).
157
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
1993 (Seção I, § 17).
407
Por outro lado, após o 11 de Setembro, o combate
ao terrorismo passou a justificar violações graves dos direitos humanos – aos
quais mesmo o pior terrorista faz jus. Tais direitos têm sido legados a segundo
plano, inclusive pelas “grandes democracias” ocidentais. São recorrentes as
iniciativas a distorcer o direito para acomodar medidas ilegítimas de
investigação e repressão (cerceamento do direito à livre expressão, detenções
arbitrárias e longas, tortura etc.). Ainda, passou a haver maiores restrições à
concessão de status de refugiado e mais detenções de candidatos a refúgio.
Isso tudo gera a preocupação com a compatibilidade entre a campanha
mundial contra o terrorismo e os direitos humanos. Como afirma R.
Clutterbuck, o terrorismo – que não pode ser eliminado por completo –
pode ser minimizado sem grandes perturbações às liberdades civis se houver
trabalho policial de rotina eficiente.
408
A política externa brasileira vem defendendo que o combate ao terrorismo
internacional se circunscreva aos meios compatíveis com a Carta das Nações
407
M. Basso reitera a caracterização do terrorismo como violação dos direitos humanos (Reflexões
sobre terrorismo e direitos humanos: práticas e perspectivas, in Revista da Faculdade de
Direito 97 (2002)). Nesse sentido, a resolução 48/122 da AGNU (“1. Unequivocally condemns
all acts, methods and practices of terrorism in all its forms and manifestations, wherever and
by whomever committed, as activities aimed at the destruction of human rights, fundamental
freedoms and democracy, threatening the territorial integrity and security of States, destabilizing
legitimately constituted Governments, undermining pluralistic civil society and having adverse
consequences on the economic and social development of States”). Desde a 48ª AGNU, tem-se
aprovado, agora bienalmente, a resolução intitulada Human Rights and terrorism (resoluções
48/122, 49/185, 50/186, 52/133, 54/164, 56/160 e 58/174). Esses documentos condenam o
terrorismo como violação dos direitos humanos e conclamam os Estados a o combaterem dentro
da moldura dos direitos humanos. Aparentemente, a dimensão do combate ao terrorismo é
privilegiada nesses documentos.
408
J.A. Lindgren Alves, Fragmentação ou recuperação, in Política Externa 13/2 (2004), pp.
09, 16, 18; ACNUR, Refugees Magazine, 133 (2003); N. Rodley, Terrorismo: segurança do
Estado – direitos e liberdades individuais, in Revista CEJ 18 (2002), p. 21; Y. Satoh, An Asia-
Pacific view... cit., pp. 15-20; R. Clutterbuck, Guerrillas and terrorists cit., pp. 103, 113-15;
R.S. Gerstein, Do terrorists have rights?, in D.C. Rapoport, e Y. Alexander (orgs.), The morality
of terrorism, New York, Pergamon, 1982, p. 304. Ver J.E. Méndez, Human rights policy in the
age of terrorism, in Saint Louis University Law Journal 2 (2002). O Alto Comissariado das
Nações Unidas para Direitos Humanos, apesar de acenar com denúncias (sobretudo do SGNU)
de violações de direitos humanos no combate ao terrorismo, abstém-se de exercer juízo a
respeito. Justifica essa posição com o argumento de que tem sido limitada, fragmentada e
dispersa a análise a respeito da compatibilidade entre medidas antiterroristas nacionais e as
obrigações internacionais na seara de direitos humanos (ONU, AGNU, A/59/428, Protection of
human rights and fundamental freedoms while countering terrorism – Study of the United
Nations High Commissioner for Human Rights, disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/
doc/UNDOC/GEN/N04/544/76/PDF/N0454476.pdf?OpenElement [05.07.2005]). Para visão
mais jornalística e dramática das violações de direitos humanos e liberdades fundamentais nos
EUA pós-11 de Setembro, ver E. Graça, Terra da liberdade?, in Carta Capital 346, 15.06.2005.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
158
Unidas e com as normas do direito internacional, em particular os direitos
humanos e o direito humanitário. O regime internacional antiterrorista deve
ser submetido aos ditames do devido processo legal e do estado de direito;
afinal, o império do direito, as liberdades individuais e os valores democráticos
são considerados pelo País, em si, objetivos centrais do antiterrorismo.
409
A defesa da resposta antiterrorista multilateral e conforme as regras da
Carta das Nações Unidas, já abordada (5.5), demonstra o compromisso
brasileiro com o direito internacional em geral. Como afirmou o Chanceler
Amorim, é em instituições como as Nações Unidas que esses valores
encontram sua melhor proteção.
410
A atuação diplomática brasileira no CAT fornece demonstrações
concretas dessas postulações. Nessa instância, o Brasil tem ressaltado, em
conjunto com outras delegações, a necessidade de incorporar a dimensão
do respeito aos direitos humanos no contexto das iniciativas antiterroristas.
Quanto à reforma do Comitê, o representante brasileiro deixa claro que
qualquer mudança deve inserir-se nos limites do mandato do CAT, estipulado
pela resolução 1373 do CSNU; a reforma deveria ensejar, tão-somente,
novidades procedimentais e operacionais. Ao mesmo tempo, a delegação
409
Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 2625, 06.10.2004; Brasil, MRE,
Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 427, 05.03.2004; A.J.M. Souza e Silva, Combate ao
terrorismo... cit., pp. 74-109. Nesse sentido, discursou o Presidente Lula: “A luta contra o
terrorismo não pode ser encarada como incompatível com a promoção e o fortalecimento dos
direitos humanos, inclusive o direito a uma vida digna. Essa noção não tem sido enfatizada com
a firmeza necessária. Devemos garantir, em quaisquer circunstâncias, o respeito à legalidade. A
detenção de indivíduos exige mandados de prisão e supõe processos regulares, universalmente
aceitos.” (Palavras do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva na conferência “Combatendo o
Terrorismo em Prol da Humanidade”, em Nova York (22.09.2003), disponível [on-line] in
http://www.mre.gov.br/portugues/politica_externa/discursos/
discurso_detalhe.asp?ID_DISCURSO=2152 [22.06.2005]). Como coloca R.A. Dotti, o “devido
processo legal é uma exigência do Estado democrático de Direito e também da própria formulação
da consciência social e humana.” (Terrorismo e devido processo legal, in Revista CEJ 18
(2002), p. 30). Conforme J. Miranda, o pior que poderia ocorrer seria os Estados, com a
desculpa do terrorismo, abandonarem os princípios do Estado de Direito. (Os direitos
fundamentais perante o terrorismo, in L.N.C. Brant (org.), Terrorismo e direito: os impactos
do terrorismo na comunidade internacional e no Brasil – perspectivas político-jurídicas, Rio
de Janeiro, Forense, 2003, pp. 66-68). Segundo esse raciocínio, somente se pode vencer o
terrorismo internacional sem qualquer desrespeito aos direitos fundamentais. Existe a ressalva
de que o Brasil, no âmbito da Comissão de Direitos Humanos (CDH) das Nações Unidas, não
tenha votado, entre 2001 e 2004, contra as violações russas na Chechênia. O País justifica essa
posição com base na seletividade e na politização da CDH (A. Flor, Brasil privilegia política ao
votar sobre China e Rússia, in Folha de S. Paulo, 14.03.2005, disponível [on-line] in http://
www1.folha.uol.com.br/fsp/mundo/ft1403200506.htm [14.03.2005]).
410
C. Amorim, EUA e o mundo... cit.
159
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
brasileira apoiou a função da Diretoria Executiva do CAT de relacionar-se
com o Alto Comissário de Direitos Humanos. Favoreceu, também, a inclusão
de um especialista em direitos humanos naquela Diretoria, o que foi
aprovado, a despeito da oposição de Rússia e EUA. Fora do CAT, por
fim, o Brasil expressou apoio à proposta do SGNU, presente no relatório
“Em liberdade mais ampla”, de instituir um rapporteur especial acerca da
compatibilidade entre medidas antiterroristas e os direitos humanos
internacionalmente consagrados. No âmbito do CICTE, o Brasil apoiou
proposta mexicana de inclusão do item “Terrorismo e Direitos Humanos”,
convidando a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) a
apresentar estudo especial sobre o tema; ainda, propôs a designação de
um perito em direitos humanos para acompanhar as atividades da Secretaria
Executiva do CICTE.
411
A defesa brasileira da compatibilidade entre a luta contra o terrorismo e
a proteção integral dos direitos humanos marca, pode-se afirmar, uma posição
de princípio. Ao País, atualmente livre da ameaça terrorista, não parece difícil
manter tal postura, já que não encontra os dilemas que a repressão
antiterrorista diária enseja. Aproveita-se, dessa forma, para reforçar um
princípio constitucional de sua política externa (art. 4º, II)
412
, que, desde a
redemocratização, vem-se aprofundando – por meio do reconhecimento das
obrigações internacionais em direitos humanos, consubstanciadas em vários
mecanismos e foros.
413
5.5.2. Apoio à convenção abrangente sobre terrorismo
No plano internacional, marcado por discurso jurídico mais politizado
que nacionalmente, o emprego da expressão “terrorista” é muitas vezes retórico
– aponta inimigos e os valores sociopolíticos que se quer defender. O termo
411
Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 427, 05.03.2004; Brasil, MRE, Delbrasonu
para SERE, Telegrama nº 1724, 23.07.2004; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº
1908, 10.08.2004; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 2433, 22.09.2004; Brasil,
MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 1028, 25.05.2005; Brasil, MRE, SERE para
Delbrasupa, Despacho Telegráfico nº 382, 20.11.2002; Brasil, MRE, Delbrasupa para SERE,
Telegrama nº 120, 19.02.2004.
412
“Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos
seguintes princípios: (...) II - prevalência dos direitos humanos”.
413
G.V. Sabóia, Direitos humanos – evolução institucional brasileira e política externa –
perspectivas e desafios, in G.Fonseca Jr. e S.H.N. Castro (orgs.), Temas de política externa
brasileira II, vol. 1, 2ª ed., Brasília, Funag; São Paulo, Paz e Terra, 1997, p. 189.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
160
é pleno de julgamentos valorativos, o que expressa a frase “o que é terrorismo
para alguns é heroísmo para outros.”
414
A ausência de consenso sobre o tratamento internacional do terrorismo
(ver 1.2) e sua definição, aliada à necessidade comum de combate à ameaça,
levou à celebração de uma série de convenções setoriais sobre o tema –
geralmente em reação a táticas terroristas em voga – que evitam adentrar
aspectos de ordem conceitual. Desde 1963, no âmbito das Nações Unidas,
esses tratados são criados, criminalizando condutas específicas – muitas vezes,
sem utilizar os termos “terrorismo” ou “terrorista” em seu texto
415
– com o
fito principal de punir os terroristas em qualquer lugar onde se encontrem.
Essa linha de atuação proporcionou certa uniformidade ao tratamento jurídico
do tema e ensejou melhor repressão dos delitos identificados.
416
Existe projeto de convenção abrangente sobre terrorismo, de iniciativa
indiana, no Comitê Ad Hoc criado pela resolução 51/210 da AGNU. Não
tem havido muitos avanços no sentido da conclusão desse tratado. As fórmulas
de acomodação encontradas nas convenções parciais são de mais difícil
produção quando se trata de instrumento que deverá servir de moldura
institucional para toda a cooperação antiterrorista.
Os pontos de maior impasse para a elaboração de uma convenção
abrangente são a definição de terrorismo e o escopo da convenção – se deve
ou não aplicar-se a movimentos de libertação nacional e às forças armadas
estatais. Em linhas gerais, os países do Terceiro Mundo (sobretudo, os árabes
e da Organização da Conferência Islâmica (OCI) e Cuba) desejam uma
convenção que isente os movimentos de libertação nacional, que deveriam
ser tratados no âmbito do direito humanitário
417
, e inclua a noção de terrorismo
de Estado – os exércitos nacionais deveriam ser incluídos como possíveis
414
C.E.F. Coracini, O terrorismo como resultado de relações de poder, in Revista da Faculdade
de Direito 97 (2002), p. 469; M.C. Bassiouni, Legal control... cit., p. 101.
415
O emprego desses termos em tratado multilateral da ONU somente se dá com a Convenção
Internacional Contra a Tomada de Reféns, de 1979.
416
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 40-73; A.P.C. Medeiros, O terrorismo
na agenda... cit. p. 65; A.C. Vaz, Cooperação multilateral... cit., pp. 79-101; G. Gilbert, The
‘law’ and ‘transnational terrorism’, in Netherlands Yearbook of International Law 26 (1995),
pp. 12, 14; G.E. Nascimento e Silva, Terrorismo e direito internacional, in Carta Mensal 500
(1996), p. 06. Conforme G. Gilbert, a única convenção não reativa teria sido a Convenção sobre
Proteção Física de Materiais Nucleares.
417
M. Halberstam afirma que a proposta da OCI de incluir disposição que torna inaplicável a
convenção em casos de conflitos armados, inclusive em situação de ocupação estrangeira, obsta
os avanços. Afinal, há poucos ou nenhum terrorista que não esteja, ao menos, relacionado com
algum conflito armado. A insistência da OCI em um texto que tornaria a convenção inaplicável
161
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
terroristas na convenção
418
. Por sua vez, os ocidentais defendem que as ações
de integrantes de forças armadas devem responder exclusivamente ao direito
das relações entre Estados (Carta das Nações Unidas).
A mesma clivagem é mantida no que respeita à amplitude da convenção.
Os ocidentais defendem a assinatura de um instrumento “minimalista”, que
somente preencha as lacunas das convenções em vigor – as convenções
contra atentados a bomba e contra o financiamento do terrorismo teriam
completado o ciclo de convenções prioritárias sob a ótica ocidental. Por sua
vez, o Movimento Não Alinhado (MNA) e muitos países da OCI desejam
um instrumento “maximalista”, que cubra o terrorismo em todas suas
manifestações – abrangendo, inclusive, ações de forças armadas. Entendem
que se deve ir além das convenções setoriais já celebradas, mediante a adoção
de uma definição global e sistemática de terrorismo e o reconhecimento da
legitimidade de movimentos de libertação nacional.
419
Logo após o 11 de Setembro, houve a expectativa de que se concluísse a
convenção abrangente. Mais recentemente, tem-se a espera-se avanço no Comitê
Ad Hoc mediante debate profundo sobre as propostas do Relatório do Painel de
Alto Nível sobre Ameaças, Desafios e Mudança e do relatório do SGNU sobre
as propostas do Painel (“Em liberdade mais ampla”). Particularmente, a definição
operacional de terrorismo oferecida pelo Painel tem gerado esperanças de
desobstrução das negociações acerca da convenção abrangente.
420
à maioria dos terroristas desafiaria, segundo a autora, a determinação criada para o combate
inequívoco ao terrorismo (The evolution... cit., pp. 581-84). No entendimento de N. Chomsky,
não seria possível chegar a tal convenção devido ao fato de que os EUA não aceitariam nada
parecido com o pleito terceiro-mundista e que não excluísse o terrorismo praticado pelas
potências e por sua clientela. (9-11 cit., p. 85).
418
Os árabes consideram, particularmente, as violências israelenses nos territórios ocupados
atos de terrorismo (ONU, AGNU, A/55/PV.84, disponível [on-line] in http://daccessdds.un.org/
doc/UNDOC/GEN/N00/791/64/PDF/N0079164.pdf?OpenElement [18.07.2005], p. 09).
419
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 40-73; Brasil, MRE, Delbrasonu
para SERE, Telegrama nº 667, 31.03.2005; L.G. Nascentes da Silva, A estruturação... cit., pp.
71-103; E. Hugues, La notion de terrorisme en droit international: en quête d’une définition
juridique, in Journal du Droit International 3 (2002), pp.766-77; Brasil, MRE, Delbrasonu
para SERE, Telegramas nº 213, 08.02.2000 e nº 295, 25.02.2000; Brasil, MRE, SERE para
Brasemb Viena, Despacho Telegráfico nº 232, 24.05.2002.
420
S. Pellet, A ambigüidade… cit., p. 19; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº
667, 31.03.2005. “164. That definition of terrorism should include the following elements: (a)
Recognition, in the preamble, that State use of force against civilians is regulated by the Geneva
Conventions and other instruments, and, if of sufficient scale, constitutes a war crime by the
persons concerned or a crime against humanity; (b) Restatement that acts under the 12 preceding
anti-terrorism conventions are terrorism, and a declaration that they are a crime under
international law; and restatement that terrorism in time of armed conflict is prohibited by the
CIRO LEAL M. DA CUNHA
162
O Brasil apoia a elaboração da convenção abrangente, que deveria trazer
uma definição de terrorismo largamente aceitável e também ampla, a ponto
de englobar todas as manifestações possíveis de atos terroristas; aspectos de
natureza étnica, ideológica, política ou religiosa não deveriam influir na
cooperação antiterrorista. Ao mesmo tempo, deveria ser preservada e
ampliada a rede de convenções setoriais, numa relação de subordinação ao
instrumento abrangente a ser especificada. O Brasil não tem sido dogmático
a respeito do teor da convenção abrangente: com o Grupo do Rio, mostra-
se construtivo e flexível, disposto a acompanhar um consenso que acomode
as divergências. Vale notar que o apoio brasileiro à convenção abrangente
reflete a reserva com que o País vê a penetração do CSNU em assuntos de
competência privativa da AGNU, onde a falta de consenso tem levado o
CSNU a legiferar sobre terrorismo. É sintomático que, com a resolução 1373
do CSNU, tenha crescido o desinteresse pelo projeto indiano de convenção
abrangente.
421
Quanto à iniciativa egípcia (endossada pelo Grupo Árabe e pelo MNA)
de convocação de conferência de alto nível para examinar formas de
Geneva Conventions and Protocols; (c ) Reference to the definitions contained in the 1999
International Convention for the Suppression of the Financing of Terrorism and Security Council
resolution 1566 (2004); (d ) Description of terrorism as ‘any action, in addition to actions
already specified by the existing conventions on aspects of terrorism, the Geneva Conventions
and Security Council resolution 1566 (2004), that is intended to cause death or serious bodily
harm to civilians or non-combatants, when the purpose of such an act, by its nature or context,
is to intimidate a population, or to compel a Government or an international organization to do
or to abstain from doing any act.’” (ONU, AGNU, A/59/565, A more secure world: our shared
responsibility - Report of the High-level Panel on Threats, Challenges and Change, disponível
[on-line] in http://www.un.org/secureworld/report.pdf [22.07.2005], p. 49).
421
Brasil, MRE, SERE (COCIT) para Brasemb Assunção, Fax nº 138, 14.12.2001; C. Lafer, A
diplomacia brasileira... cit., p. 111; A.P.C. Medeiros, O terrorismo na agenda... cit., p. 65;
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 40-73; Brasil, MRE, SERE para
Brasemb Viena, Despacho Telegráfico nº 232, 24.05.2002; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE,
Telegrama nº 130, 25.01.2002; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 2625,
06.10.2004; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 667, 31.03.2005; L.G. Nascentes
da Silva, A estruturação... cit., pp. 71-103. Há grande apoio à elaboração de uma convenção
abrangente pelo Grupo do Rio. O Grupo tem adquirindo voz própria na VI Comissão da
AGNU em razão da capacidade de moderar os debates mais polêmicos, inclusive o combate ao
terrorismo, o que é favorecido pela incapacidade do MNA de mobilizar os países em
desenvolvimento por iniciativas de maior transparência política e previsibilidade jurídica nas
relações interestatais (Brasil, MRE, SERE para Delbrasupa, Despacho Telegráfico nº 496,
08.11.2001; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 150, 29.01.2002). O Brasil não
tem aceitado o texto da resolução 1566 do CSNU como definição conceitual de terrorismo, mas
apenas como mensagem política (Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 1139,
05.05.2005).
163
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
coordenação do combate internacional do terrorismo, o Brasil a tem apoiado.
Contudo, em posição semelhante à europeia e a outras, inclina-se a condicionar
sua convocação a progressos concretos nas discussões sobre o tema, já que
se trataria de ocasião para consagrar esforços internacionais antiterroristas.
Novamente, a definição de terrorismo é o principal obstáculo; mesmo assim,
em março de 2005, na AGNU, a maior parte das delegações favorecia o
evento.
422
É interessante analisar a afirmação de M.C. Bassiouni, segundo quem
os EUA opõem-se, desde 1972, à convenção abrangente. Afirma o
jusinternacionalista que esse país deseja manter sua margem de manobra
para agir unilateralmente, escolhendo as normas que deseja aplicar.
Percebe-se, portanto, a importância da convenção abrangente para uma
resposta antiterrorista multilateral e fundada no direito internacional.
423
5.6. Conclusões parciais
Como se pôde notar, as posições do Brasil acerca da parcela em
construção do regime internacional antiterrorista são marcadas por
significativo principismo, com poucas iniciativas concretas, aplicando
linhas tradicionais da política externa brasileira (não intervenção, solução
pacífica de controvérsias, prioridade ao desenvolvimento, a noção de
segurança econômica e a defesa do direito internacional). Quanto ao
perfil brasileiro nas discussões sobre terrorismo, tende a ser baixo –
como se viu no que tange à convenção abrangente, o País apoia a
elaboração do texto, mas se coloca, quanto à substância, mais próximo
de apoiar um consenso do que de insistir em uma posição dogmática.
Como apontou em entrevista o Ministro Marcos Vinícius Pinta Gama, é
possível que o principismo e o perfil baixo se devam ao fato de, por um
lado, o Brasil ter de fazer face aos compromissos jurídicos
antiterroristas, e, por outro, não perceber o flagelo como ameaça
significativa. O tema, dessa forma, é tratado com cuidado e com esforços
de implementação, mas, no conteúdo de seu discurso, o País segue
422
A.J.M. Souza e Silva, Combate ao terrorismo... cit., pp. 40-73; Brasil, MRE, Delbrasonu
para SERE, Telegrama nº 213, 08.02.2000; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº
55, 13.01.2004; Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 667, 31.03.2005; Brasil,
MRE, SERE para Brasemb Viena, Despacho Telegráfico nº 232, 24.05.2002.
423
M.C. Bassiouni, Legal control... cit., p. 92.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
164
incluindo outras prioridades, particularmente a agenda social do atual
governo.
424
É natural o baixo protagonismo brasileiro na temática do terrorismo
internacional. Como aponta R.U. Sennes, os países intermediários (ou
potências médias), como o Brasil, ao contrário das grandes potências, têm
presença heterogênea nos diferentes foros e temas. Em alguns, apresentam
grande influência e destaque; em outros, vulnerabilidade e pequena influência.
Isso significa que, em contraste com as pequenas potências, as intermediárias
têm certa margem para definir e perseguir estratégias internacionais autônomas,
embora limitadas pela escassez de recursos e pela maior capacidade de
influência das grandes potências. Quanto mais politizado o regime internacional,
menores as chances de potências médias terem papel relevante, pois, nesse
caso, o diferencial de poder é mais determinante. No caso do regime
internacional antiterrorista – que, como se viu, é um regime pouco politizado
quanto aos fins, mas muito politizado quanto aos meios, tanto que tem parcela
relevante em construção (ver 1.2 e 4.6) – os países intermediários tendem a
apresentar postura contestatória e, ainda, a buscar a contenção de ações
casuísticas e excessivas dos países dominantes. Conforme R.U. Sennes,
[M]esmo em regimes muito “politizados”, as proximidades de agenda
e de interesses com os países dominantes podem fazer com que os
Países Intermediários prefiram se concentrar em objetivos políticos,
principalmente reativos (por exemplo, atenuar o excesso de
unilateralismo das grandes potências). Dessa forma, beneficiar-se-
iam do arranjo produzido pelo regime, mesmo que com baixa
capacidade política de influenciá-lo, e buscariam utilizar seus
próprios mecanismos para constranger excessos.
425
Como se viu neste capítulo, o Brasil tem apresentado pleitos por reformas
democratizantes nas instituições internacionais, bem como demandas por
424
Entrevista concedida ao autor pelo Ministro Marcos Vinícius Pinta Gama, Chefe da COCIT,
em Brasília (22.08.2005); Entrevista concedida ao autor pelo Conselheiro Achilles Emílio Zaluar
Neto, Subchefe da DNU, em Brasília (03.08.2005).
425
R.U. Sennes, Países intermediários e fóruns multilaterais: algumas considerações, Trabalho
apresentado no 3º
Encontro Nacional da Associação Brasileira de Ciência Política, em Niterói
(28 a 31 de julho de 2002), disponível [on-line] in http://www.cienciapolitica.org.br/encontro/
relint5.1.doc [18.01.2004].
165
O REGIME EM CONSTRUÇÃOPOSIÇÕES BRASILEIRAS
maior justiça nas relações internacionais, particularmente com seu discurso
sobre as causas subjacentes do terrorismo. Isso seria o núcleo de sua postura
contestatória no regime internacional antiterrorista. Como centro da estratégia
de contenção dos excessos das grandes potências, o País tem defendido, no
regime, a centralidade dos órgãos multilaterais e do multilateralismo, o respeito
ao direito internacional (sobretudo nos campos da não intervenção, dos direitos
humanos e da elaboração de convenção abrangente contra o terrorismo) e a
não militarização das respostas ao terrorismo internacional.
A “proximidade de agenda e de interesses com os países dominantes”,
tratada na passagem acima, existe no caso brasileiro, em grande medida, se
comparadas as posições brasileiras às tendências, apresentadas anteriormente
(4.6), resultantes da análise das posturas das cinco potências com assento
permanente no CSNU. Em primeiro lugar, como elas, o Brasil reconhece a
importância do combate ao terrorismo, percebido como ameaça à paz e à
segurança internacional. Segundo, não obstante a divergência entre as ideias
dessas potências a respeito de como proceder ao combate, o País insere-se
em uma das duas vertentes principais do debate.
Com efeito, a postura brasileira quanto à parcela em aberto do regime
internacional antiterrorista é, essencialmente, coincidente com a vertente
identificada (ver 4.6) que valoriza a cooperação antiterrorista pacífica, o
fortalecimento das Nações Unidas e a revalorização do direito internacional
(inclusive os direitos humanos). Coincide, em grande medida, com o discurso
diplomático francês. Diferencia-se o Brasil, no entanto, em razão da elevada
ênfase conferida às causas do terrorismo – particularmente em virtude da
conclusão que indica a necessidade de maior justiça nas relações internacionais
– e da demanda por reforma nos órgãos internacionais.
Desse modo, a política externa brasileira para as regras em construção
do regime antiterrorista não é irrealista, pois liga-se fortemente a uma tendência
central de tratamento do tema. Tampouco é passiva ou laudatória: contém
elementos que, oriundos do interesse do País por maior participação
internacional e desenvolvimento, refletem suas especificidades e prioridades.
Com isso, reforçam-se a legitimidade do discurso externo brasileiro e sua
coerência – patrimônio inestimável para um país que carece de “excedentes
de poder”.
167
Conclusão
Este trabalho objetivou descrever e analisar as linhas gerais da política
externa brasileira para o terrorismo internacional após o 11 de Setembro,
com o foco na motivação das posições adotadas pelo Brasil. Buscou-se
avaliação dos riscos e das oportunidades geradas ao País pela temática. O
estudo não se inscreveu em marco teórico rígido, apesar de se ter valido de
instrumentos conceituais como hegemonia, ordem internacional e regime
internacional.
Inicialmente, para estabelecer o ambiente em que se insere o tema do
terrorismo na atualidade, especulou-se acerca do impacto do 11 de Setembro
nas relações internacionais. Concluiu-se que houve importante mudança na
agenda internacional, agora centrada em assuntos de segurança, inclusive o
terrorismo. O sistema internacional segue marcado pela hegemonia dos EUA,
com maior ênfase na coerção que antes. Contudo, o câmbio na agenda –
elemento importante da ordem internacional – traz consigo, provavelmente,
funcionamento diferente das relações internacionais como um todo.
Fruto dessas mudanças é a elevação dos esforços internacionais
antiterroristas a níveis de institucionalização, cooperação e consentimento
que permitem chamá-los de regime internacional. Tal regime, impulsionado
sobretudo pelos EUA, é caracterizado pela maior coercitividade na cobrança
da contribuição dos demais países, independente de seus ganhos individuais.
O regime também é marcado pela incompletude: aspectos centrais seus, como
CIRO LEAL M. DA CUNHA
168
a definição de terrorismo e dos meios lícitos para o combate do flagelo seguem
em construção. Por isso, optou-se por dividir a análise em duas partes: a
primeira tratou das regras estabelecidas pelo regime e seu cumprimento pelo
Brasil; a segunda, dos pontos em aberto do regime e do posicionamento
brasileiro a seu respeito.
Ao descreverem-se as características gerais do regime internacional
antiterrorista, notou-se que o tratamento internacional do terrorismo não
comporta mais a relativização na condenação do flagelo – o repúdio deve ser
incondicional, em todos os casos. Verificou-se que o tema inscreve-se,
definitivamente e com grande capacidade coercitiva, na agenda de paz e
segurança internacionais. Por fim, expuseram-se, brevemente, os deveres de
prevenção e repressão do terrorismo que, agora, são dotados de maior
cobrança e coercitividade factual.
Em seguida, examinou-se o cumprimento dos deveres antiterroristas pelo
Brasil. Em conformidade com o estado atual da matéria, o País condena o
terrorismo inequivocamente, inclusive em sua Constituição. O direito brasileiro,
não obstante a falta de uma definição de terrorismo, constitui arcabouço
suficiente. O País tem aderido, no ritmo próprio da democracia, a todos os
tratados e resoluções multilaterais antiterroristas. No âmbito do preparo
institucional, a despeito de certas limitações – que hoje se busca reduzir –, o
Brasil dispõe de meios adequados ao baixo grau da ameaça terrorista contra
si. A cooperação internacional tem-se mostrado intensa e proveitosa. O País
é modelar cumpridor das demandas internacionais pela prevenção da
aquisição de ADMs por terroristas. Quanto ao combate ao financiamento do
terrorismo, falta ao Brasil, para o inteiro cumprimento de seus deveres, ratificar
a Convenção Internacional para a Supressão do Financiamento do Terrorismo
(que está programada para setembro de 2005), criar tipo penal autônomo
para o crime e estipular procedimento de bloqueio administrativo de bens de
terroristas. Isso, porém, não obscurece os esforços e avanços na questão,
que interessam também à agenda interna de combate ao crime organizado.
Por fim, é lícito afirmar que houve encaminhamento favorável das suspeitas
de atividades ligadas ao terrorismo na Tríplice Fronteira, que parecem ter
arrefecido mediante cooperação ampla, que deixou claro o compromisso
antiterrorista brasileiro.
Sinteticamente, o esforço brasileiro de cumprimento das regras do regime
internacional antiterrorista pode ser considerado meritório e comprometido
– como reconhecido pelo presidente do CAT em março de 2002.
169
CONCLUSÃO
Evidentemente, podem-se levantar objeções leves – como já o foram. Isso
não compromete o esforço brasileiro, sobretudo se levado em conta que o
País não tem sido alvo de terrorismo.
426
Após a análise do cumprimento dos deveres antiterroristas pelo Brasil,
abordou-se a parcela do regime internacional ainda em aberto. Discutiram-
se as posições dos cinco membros permanentes do CSNU sobre o tema, o
que demonstrou a grande importância atribuída por todos eles ao antiterrorismo
e, também, a existência de desacordos sobre como atacar o flagelo. Além de
comprovar que o regime internacional de antiterrorismo tem pontos centrais
em aberto, a análise permitiu sistematizar, em dois conjuntos, as vertentes
centrais do regime em construção. O primeiro apresenta forte tendência a
inserir o regime internacional antiterrorista em um quadro de militarização
intervencionista, de enfraquecimento das Nações Unidas no que tange ao
uso legítimo da força, e de relativização do direito internacional,
particularmente os direitos humanos. O segundo conjunto, em oposição,
inclina-se à cooperação antiterrorista pacífica, ao fortalecimento das Nações
Unidas e à revalorização do direito internacional (inclusive os direitos
humanos).
Colocadas essas vertentes, abordou-se a visão da política externa
brasileira a respeito do regime em aberto. A percepção do terrorismo como
ameaça menor ao País – ao mesmo tempo em que outras questões de
segurança, como a defesa da Amazônia e o crime organizado, parecem mais
urgentes – faz com que a temática antiterrorista não tenha prioridade elevada
na ação externa brasileira. Mesmo assim, a possibilidade, sempre existente,
de ser vítima de ataques terroristas e a centralidade do tema na atual agenda
internacional determinam que as autoridades brasileiras não descurem o preparo
interno, a cooperação internacional e a participação nas discussões no que
tange ao tema. Esses esforços são vistos, ao mesmo tempo, como
oportunidade de criação de sinergias para o combate ao crime organizado,
tema premente no Brasil.
A política externa brasileira atribui prioridade absoluta ao objetivo do
desenvolvimento econômico e social. Mesmo nas questões de segurança,
essa lógica central repercute de maneira determinante: tradicionalmente, o
Brasil professa a tese da segurança econômica, segundo a qual, grosso modo,
somente uma ordem econômica internacional justa poderá trazer paz, em
426
Brasil, MRE, Delbrasonu para SERE, Telegrama nº 455, 12.03.2002.
CIRO LEAL M. DA CUNHA
170
sentido amplo, ao mundo. Essa orientação geral aplica-se à temática do
terrorismo. Por um lado, os representantes brasileiros pleiteiam que a agenda
internacional não seja dominada pelo tema: deveria haver espaço para os
assuntos econômicos sob o viés do desenvolvimento. Por outro, o País, ao
ressaltar a necessidade de combate às causas subjacentes do terrorismo,
reforça seu pleito por uma ordem internacional justa econômica e
politicamente, com a redução das desigualdades e a solução pacífica de
conflitos políticos.
O Brasil, por ser país sem “excedentes de poder”, particularmente no
âmbito militar, e por sua tradição de solução pacífica de disputas, mostra-se
avesso, em princípio, às respostas coercitivas, sobretudo as militares, ao
terrorismo. Mesmo reconhecendo esse flagelo como uma questão de paz e
segurança internacional, o País adota concepção segundo a qual a melhor
forma de resolução do problema, além do ataque a suas causas subjacentes,
é a cooperação – nos campos judiciário e de inteligência, entre outros. É
nesse espírito que, também na luta global contra o terrorismo, os representantes
brasileiros buscam moderação na invocação do Capítulo VII da Carta da
ONU pelo CSNU. Favorecem, ainda, uma atuação cooperativa do CAT,
que não se deveria comportar como comitê de sanções.
No mesmo diapasão, no âmbito interamericano, o Brasil tem mantido
sua oposição às propostas – justificadas, agora, em nome do combate ao
terrorismo – de atuação policial das forças armadas latino-americanas e de
transformação da JID em órgão militar operacional. Além disso, o País
expressa a concepção de que cada nação hemisférica tem suas próprias
prioridades de segurança e defesa, o que significa afirmar que a agenda de
segurança dos EUA não deve ser transposta para as Américas.
Sob o mesmo prisma deve ser analisada a invocação do TIAR, pelo
Brasil, na sequência do 11 de Setembro. A iniciativa, de caráter somente
político-diplomático, visou a condenar o terrorismo e cooperar com sua
erradicação e, ao mesmo tempo, a incluir a reação, particularmente a dos
EUA, numa moldura jurídica solidária sem implicações necessariamente
militares. O Brasil, assim, aproveitou a oportunidade para reafirmar sua
inserção internacional como defensor do multilateralismo e da manutenção
da paz na região.
A leitura brasileira do conflito colombiano – associado, atualmente, à
“guerra contra o terrorismo” – insere-se naquela visão de mundo contrária à
força como resposta a conflitos, inclusive o terrorismo. No caso, essa postura
171
CONCLUSÃO
mostra-se afetada por interesses diretos do Brasil. A presença militar dos
EUA na região amazônica, bem como a possibilidade de transbordamento
das operações na Colômbia para território nacional, são determinantes para
que o País, assim como a ONU, defenda uma saída politicamente negociada
para a situação no vizinho. Nesse contexto, o Brasil recusa-se a catalogar as
FARC ou qualquer outro grupo em listas de terroristas, o que considera
improdutivo e politicamente parcial, já que não existe definição
internacionalmente consensuada de terrorismo.
Em suas posições acerca do regime internacional antiterrorista em
formação, o Brasil tem ressaltado a necessidade de fortalecimento do
multilateralismo. A condição de país médio, que, nos foros multilaterais, pode
ter certa influência sobre as decisões internacionais, faz com que essa linha
de ação seja tradicionalmente adotada pelo País. No caso do terrorismo, é
mais nítido ainda o interesse em preservar e fortalecer aquelas instâncias: seu
enfraquecimento significaria uma involução rumo ao unilateralismo, inclusive
com o uso da força, gerando instabilidade nas relações internacionais. Isso
foi notado na invasão do Iraque em 2003, relacionada – indevidamente – ao
terrorismo internacional. Ao Brasil, país que não pretende ter nas armas seu
meio central de inserção no mundo, não interessa essa situação. Nesse
contexto, o País tem defendido o fortalecimento das instituições multilaterais,
em especial as Nações Unidas e seu Conselho de Segurança, como foros
centrais da manutenção da paz e da segurança internacionais. Nessa defesa,
o Brasil expõe reformismo declarado, postulando maior representatividade
das instâncias decisórias internacionais como solução para seus déficits de
legitimidade e eficácia. Exemplo mais expressivo dessa argumentação diz
respeito ao CSNU, onde o País pleiteia, vigorosamente, um assento
permanente – em harmonia com a orientação de buscar “autonomia pela
participação”. Assim, a política externa brasileira tem tratado o cenário de
crise como desafio e oportunidade históricos.
Ao fortalecimento do multilateralismo alia-se, inseparavelmente, a defesa
de uma resposta ao terrorismo no marco do direito internacional. Isso implica
a aceitação do uso da força somente nas hipóteses previstas na Carta das
Nações Unidas – em legítima defesa ou mediante autorização do CSNU em
casos de ameaça à paz e à segurança internacionais – bem como a oposição
à ampliação excessiva dos casos de invocação do Capítulo VII da Carta.
Também no campo dos direitos humanos, manifesta-se a importância atribuída
pela diplomacia brasileira ao direito internacional. Na condição de país que
CIRO LEAL M.DA CUNHA
172
não tem de lidar diariamente com o terrorismo e que, desde sua
redemocratização, tem progredido no respeito aos direitos fundamentais, o
Brasil sente-se à vontade para exigir da comunidade internacional uma resposta
ao terrorismo que respeite os direitos humanos, como fez ao sugerir a inclusão
de especialista nessa temática na Diretoria Executiva do CAT. A defesa do
direito internacional expressa-se, com destaque, no apoio que o Brasil oferece
à elaboração de uma convenção abrangente sobre o terrorismo, que defina o
fenômeno de forma abrangente e forneça um marco legal sólido ao regime
antiterrorista.
O estudo das opções acima parece indicar que a política exterior do
País para o tema respeita orientações mais gerais de sua ação externa. Nota-
se a reiteração de posições de princípio caras à tradição diplomática brasileira,
como o multilateralismo, a solução pacífica de controvérsias, a inclinação
pelo desenvolvimento e a defesa do direito internacional. Pode-se especular
que isso se deva à ausência de ameaça terrorista direta ao Brasil, no contexto
da centralidade do terrorismo e das obrigações antiterroristas na presente
agenda internacional. Fato é que, ao agir dessa maneira, a política externa do
País reforça sua coerência – patrimônio inestimável para um país que carece
de “excedentes de poder”.
Em síntese, como potência média num regime altamente politizado como
o antiterrorista em sua parcela por construir, o Brasil tem estreitas margens
para destaque ou influência. Isso, aliado à baixa prioridade que o País confere
à agenda antiterrorista, explica o baixo perfil de atuação brasileiro no tema.
Não obstante, as posições do Brasil, mesmo principistas, inserem-se em uma
vertente central do tratamento do terrorismo – aquela que defende o
fortalecimento do multilateralismo, do direito internacional e das respostas
não militares ao flagelo – não podendo ser consideradas irrealistas. Ao mesmo
tempo, o País expressa especificidade e autonomia ao demandar, nas
discussões sobre o terrorismo, a construção de ordem internacional mais
justa, econômica e politicamente, e a democratização dos organismos
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CIRO LEAL M. DA CUNHA
214
_____________. Intervenção do Representante Permanente do Brasil na
ONU – “WMDs and Non-State Actors”, em Nova York (20.04.2004),
disponível [on-line] in http://www.un.int/brazil/speech/004d-rms-csnu-
WMDs%20AND%20NON-STATE%20ACTORS-2004.htm
[26.06.2005].
_____________. Intervenção do Representante Permanente do Brasil na
ONU, na 59ª AGNU – “Report of the Security Council; Question of
equitable representation on and increase in the membership of the Security
Council and related matters: joint debate”, em Nova York (11.10.2004),
disponível [on-line] in http://www.un.int/brazil/speech/04d-rms-59agnu-
equitablerepresentation-1110.htm [25.06.2005].
Valle, Henrique. Intervenção do Representante Permanente Adjunto do Brasil
nas Nações Unidas – “Informal Meeting of the Plenary on the High-Level
Plenary Meeting of the General Assembly of September 2005”, em Nova
York (22.06.2005), disponível [on-line] in http://www.un.int/brazil/speech/
005d-hv-Informal-Meeting-2206.htm [25.06.2005].
Viegas Filho, José. Intervenção do Senhor Ministro de Estado da Defesa na
Comissão de Relações Exteriores e de Defesa Nacional da Câmara dos
Deputados, em Brasília (14.05.2003), disponível [on-line] in https://
www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/discursos/2003/
resenha,14,05,03,01.htm [12.07.2005].
________________. Conferência do Ministro de Estado da Defesa no Curso
de Gestão de Recursos de Defesa, em Brasília (21.10.2003), disponível [on-
line] in https://www.defesa.gov.br/enternet/sitios/internet/discursos/2003/10-
03/discurso,21,10,03_a.htm [27.09.2004].
Entrevistas ao autor
Conselheiro Achilles Emílio Zaluar Neto, Subchefe da DNU, em Brasília
(03.08.2005).
215
REFERÊNCIAS
Ministro Marcos Vinicius Pinta Gama, Chefe da COCIT, em Brasília
(22.08.2005).
Professor Celso Lafer, ex-Ministro das Relações Exteriores, em Brasília
(23.06.2004).
Formato 15,5 x 22,5 cm
Mancha gráfica 12 x 18,3cm
Papel pólen soft 80g (miolo), duo design 250g (capa)
Fontes Times New Roman 17/20,4 (títulos),
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