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RAFAELA BOMFIM
BABEL DE VOZES:
CRENÇAS DE PROFESSORES DE INGLÊS INSTRUMENTAL
SOBRE TRADUÇÃO
Brasília DF
2006
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RAFAELA BOMFIM
BABEL DE VOZES:
CRENÇAS DE PROFESSORES DE INGLÊS INSTRUMENTAL
SOBRE TRADUÇÃO
Dissertação apresentada ao Departamento
de Línguas Estrangeiras e Tradução da
Universidade de Brasília como requisito
parcial para a obtenção do título de Mestre
em Lingüística Aplicada.
Orientador: Prof. Dr. Mark David Ridd
Brasília DF
2006
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BANCA EXAMINADORA
Prof. Dr. Mark David Ridd – Orientador
Universidade de Brasília (UnB)
Profª Dra. Rosinda de Castro Guerra Ramos – Examinadora Externa
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC – SP)
Profª Dra. Mariney Pereira Conceição – Examinadora Interna
Universidade de Brasília (UnB)
Prof Dr. Álvaro Silveira FaleirosSuplente
Universidade de Brasília (UnB)
Brasília, 26 de outubro de 2006.
iii
DEDICARIA
Dedico este trabalho a meu Deus, pois
dEle, por Ele e para Ele é tudo o que
faço, a meu querido esposo, Luiz Junior,
a meu amado pai, Wilson, à minha e,
Jane, que desde cedo me mostrou o
valor da educação e do pensar crítico
com seu próprio exemplo, e a meu irmão
e grande amigo, Wilson Junior.
iv
AGRADECIMENTOS
A meu Senhor, em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento
e que, de fato, nenhum bem negligencia aos que o buscam.
A meu esposo, Luiz Junior, por seu apoio tão intenso, por seu amor incondicional e por fazer
tanto por mim.
A meu pai, Wilson, e minha mãe, Jane, por terem investido tanto em minha educação.
A meu irmão, Wilson Junior, pela lealdade, companheirismo e suporte.
A meu orientador, Prof. Dr. Mark David Ridd, por ser uma fonte de inspiração e um exemplo
de comprometimento com o conhecimento, por seu profissionalismo e sinceridade.
À Faculdade Multieducativa por compreenderem minhas eventuais ausências quando da
conclusão da pesquisa.
A todos os professores que contribuíram para a minha formação, em especial os da s-
Graduação em Lingüística Aplicada, sempre tão solícitos.
Às informantes, por tornarem este trabalho possível.
A meus colegas do Programa, pelo encorajamento e companheirismo.
A todos aqueles que contribuíram direta ou indiretamente para a realização deste estudo.
v
Tua é, ó Senhor, a grandeza, e o poder,
e a glória, e a vitória, e a majestade,
porque teu é tudo quanto há no céu e na
terra; teu é, ó Senhor, o reino, e tu te
exaltaste como chefe sobre todos.
Tanto riquezas como honra vêm de ti, tu
dominas sobre tudo, e na tua mão
força e poder; na tua mão es o
engrandecer e o dar força a tudo.
1 Cnicas 29: 11 e 12.
vi
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1INTRODUÇAO
1.1. Justificativa
1.2. Objetivos
1.3. Perguntas de pesquisa
1.4. Organização do trabalho
CAPÍTULO 2REVISÃO DA LITERATURA
2.1. A tradução no ensino de LE
2.1.1. Uma tradução da tradução
2.1.2. Tradução, habilidade e competência
2.1.3. Resistências ao uso de tradução no ensino de LE
2.1.4. Por que a tradução no ensino de LE?
2.1.6. O uso da LM
2.2. O Inglês Instrumental
2.2.1. ESP: Histórico e definições
2.2.2. ESP no Brasil: O Inglês Instrumental
2.2.3. A leitura
2.2.4. Tradução e Inglês Instrumental
2.3. Crenças
2.3.1. Histórico
2.3.2. Definição
CAPÍTULO 3METODOLOGIA DE PESQUISA
3.1. O tipo de pesquisa
3.1.1. A investigação na área de crenças
3.2. Pilotagem
3.3. Contexto
3.4. Informantes
3.5. Instrumentos de coleta de dados
3.5.1. Observação
3.5.2. Notas de campo
3.5.3. Gravações em áudio e transcrições
3.5.4. Entrevistas
3.5.5. Documentos
3.6. Agenda de pesquisa
3.7. Procedimentos de análise
CAPÍTULO 4APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS
4.1. Jaqueline
4.1.1. Dados biográficos
4.1.2. Crenças sobre tradução
4.1.3. Crenças e experiências
4.2. Rose
4.2.1. Dados biográficos
4.2.2. Crenças sobre tradução
15
15
18
19
19
20
20
20
23
27
34
37
39
39
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57
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79
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92
93
93
97
97
98
100
100
100
101
112
114
114
119
vii
4.2.3. Crenças e experiências
4.3. Marília
4.3.1. Dados biográficos
4.3.2. Crenças sobre tradução
4.3.3. Crenças e experiências
CAPÍTULO 5CONSIDERAÇÕES FINAIS
5.1. Conclusões
5.2. Dificuldades
5.3. Limitações e encaminhamentos
5.4. As informantes e eu
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
127
129
129
133
141
148
148
150
151
154
viii
LISTA DE ABREVIATURAS
LA Lingüística Aplicada
L2 Segunda Língua ou Língua 2
LE Língua Estrangeira
ESP English for Specific Purposes
ou Inglês para Fins Específicos
II Inglês Instrumental
IIELA Inglês Instrumental com Enfoque em
Leitura Acadêmica
MGT todo Gramática e Tradução
UT Unidade de Tradução
LM Língua Materna
PNN Professor Não-Nativo
PN Professor Nativo
L1 Língua 1
BALLI Beliefs About Language Learning
Inventory Inventário de Crenças sobre
o Aprendizado de Línguas
ix
LISTA DE QUADROS
Quadro 1Definições de ESP.
Quadro 2Alguns trabalhos sobre crenças de aprendizes.
Quadro 3Alguns trabalhos sobre crenças de professores em formação.
Quadro 4Alguns trabalhos sobre crenças de professores.
Quadro 5Características, vantagens e desvantagens das três abordagens para a
investigação de crenças.
Quadro 6Questionário sobre Inglês Instrumental
Quadro 7Dados iniciais sobre as informantes.
Quadro 8Quadro cronológico de observações e entrevistas.
Quadro 9Possíveis relações entre as crenças de Jaqueline sobre tradução e suas
experiências.
Quadro 10 – Possíveis relações entre as crenças de Rose sobre tradução e suas
experiências.
Quadro 11 – Possíveis relações entre as crenças de Marília sobre tradução e suas
experiências.
41
62
67
70
82
84
89
98
113
127
142
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Parte A: Minha opinião sobre Inglês Instrumental
Gráfico 2 – Parte B: Somente para professores de cursos livres de inglês
85
85
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Classificação dos ramos de ESP segundo Dudley-Evans e St. John (1998) 42
x
CONVENÇÕES PARA TRANSCRIÇÃO
As convenções que serviram a transcrição de dados foram parcialmente baseadas em
Marcushi (2003).
Letras para representar os participantes da pesquisa, pessoas e locais que mencionam:
P1, P2, P3 e P4 professores informantes
P pesquisadora
A aluno não identificado
As vários alunos
A1, A2, etc. aluno identificado, mas o pelo
nome
Símbolos para indicar os demais aspectos:
(( )) comentários da analista
(+) pausa
[[ ]] falas simultâneas
citação, discurso indireto ou
referência a outras falas.
aspas dentro de aspas
- não é enunciado o final projetado
da palavra
/ truncamentos bruscos
? indica entonação ascendente ou pergunta
! indica forte ênfase
, descida leve indicando que mais fala virá
. descida leve finalizando o final do
enunciado
:: parada de um falante por desistir da fala
em favor de outro devido a interrupção
(*) uma palavra incompreensível
(**) mais de uma palavra
incompreensível
(****) trecho incompreensível
( ) hipótese do que se falou
MAIÚSCULA ênfase
/.../ indicação de que o excerto em
questão é um recorte de um trecho mais
longo.
Ah, é, oh, ih, uh, ahã, mhm, mm, nhum pausa preenchida, hesitação ou sinais de
atenção.
Estilos da fonte:
Itálico palavras em inglês ou outra
língua estrangeira.
xi
RESUMO
O objetivo deste estudo de caso é investigar crenças de três professoras de Inglês
Instrumental com enfoque em leitura acadêmica a respeito do uso da tradução e as possíveis
relações dessas crenças com as experiências prévias das mesmas. Os instrumentos de
pesquisa foram: entrevista narrativa e semi-estruturada, observação de aulas, notas de campo,
transcrições e documentos de sala de aula. Os resultados apontam que: uma das informantes
concebe a tradução como atrelada às palavras e às idéias e é favorável a seu uso; outra,
percebe a tradução associada mais a idéias que a palavras e a considera componente central; e
a terceira na tradução uma barreira para a compreensão e a utiliza sob pressão dos
aprendizes. As origens dessas crenças podem ser: experiências pessoais, como aprendizes, de
formação profissional e como professoras; as crenças de seus professores, de colegas de
trabalho e aprendizes; material didático; pesquisa; literatura em Linística Aplicada;
instituições de ensino; ideologias imperialistas; contexto histórico brasileiro; e o status do
inglês na sociedade brasileira.
Palavras-chave: tradução, crenças de professores, Inglês Instrumental, ESP, Inglês para Fins
Acadêmicos.
xii
ABSTRACT
This case study investigates beliefs of three EAP teachers about the use of translation and the
possible relations between these beliefs and their prior experiences. Research instruments
include: narrative and semi-structured interviews, classroom observation, field notes,
transcriptions and classroom documents. The results show that: one of the informants
conceives translation as related to both words and ideas, and is favorable to its use in EAP;
another views translation as more related to ideas than words and considers it a key
component; the third one views translation as a barrier to comprehension and only uses it in
class because of student pressure. These beliefs may derive from: their personal experiences,
experiences as learners, trainees, and teachers; the beliefs of their teachers, coworkers, and
students; teaching materials; research; Applied Linguistics literature; educational institutions;
colonialist ideologies; Brazilian historical context and the status of English in Brazilian
society.
Key words: Translation, teacher’s beliefs, ESP, EAP.
xiii
CAPÍTULO 1INTRODUÇAO
Os aprendizes podem ser motivados e
auxiliados depois que seus professores
entenderem a si mesmos.”
1
Peter Medgyes (1994, p. 23)
2
1.1. Justificativa
A motivação para o desenvolvimento deste trabalho surgiu há muito, quando eu ainda
era aluna de graduação do curso de Letras-Tradução e experimentei um substancioso
refinamento de meus conhecimentos, então tão escassos, da língua inglesa por meio da
tradução. Na mesma época engajei-me mo ambiente de ensino de inglês. Ao me tornar
professora, intrigava-me ouvir comentários um tanto negativos de alguns colegas de trabalho
a respeito do uso de tradução em sala de aula. Logo em seguida comecei a dar aulas de Inglês
Instrumental em uma escola de idiomas que me permitia fazer uso explícito da tradução, de
modo que eu procurava transmitir aos aprendizes as mesmas estratégias que havia aprendido
em minha formação como tradutora e obtinha bons resultados. Assim, acatando a
recomendação de Holmes (2005a) e de Dewey (1933), de que a reflexão na própria
experiência deve servir de base para construção de uma pergunta de pesquisa, decidi que,
assim que tivesse oportunidade, desenvolveria algum tipo de pesquisa que pudesse trazer à
tona reflexões a respeito da tradução no ensino de línguas estrangeiras e assim, contribuir,
ainda que de forma indireta, para a reflexão de professores de inglês em geral e
especialmente os de Inglês Instrumental sobre sua prática, a começar de mim mesma.
Optei por investigar crenças por ter me confrontado com a situação descrita por
Kumaravadivelu (2005), de que as teorias de aquisição de segunda língua que vêm de fora
tratam como dogma questões como ter a competência de um falante nativo, fossilização e
aculturação e estão profundamente embebidas da crença de que não necessidade de um
modelo alternativo de aquisição de língua (neste caso, estrangeira) proveniente de outros
países. Diante disso, afirma (p. 34):
1
Students can only be motivated and helped after teachers have understood themselves. (Esta tradução é
minha, bem como todas as demais cujos textos de partida são apresentados em notas de rodapé ao longo do
trabalho.)
2
As normas para citações, notas de rodapé, referências e estruturação da dissertação estão de acordo com
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ., 2002a, 2002b, e 2002c.
uma necessidade de os estudiosos da periferia realizarem estudos empíricos completos,
coordenados e fundamentados em dados a partir de seu próprio ambiente de aprendizagem
particularmente sobre assuntos como estratégias e estilos de aprendizagem, insumo e interação na
sala de aula e o papel da língua materna na aquisição de uma outra língua. Neste contexto, as
pesquisas sobre crenças de aprendizes e professores relativos à aquisição de uma outra língua que
vem sendo realizadas por Barcelos e seus colegas (...) oferecem contribuições bem-vindas. A agenda
deste tipo de pesquisa pode abrir caminhos não apenas para um modelo alternativo de aquisição de
uma outra língua mas também para a uma melhor compreensão do aprendizado e ensino de inglês e
de outros idiomas
3
.
Uma outra razão por se fazer esta opção é o fato de que há uma forte relação entre as
crenças dos aprendizes e as dos professores, pois as crenças dos professores sobre as crenças
dos aprendizes podem moldar sua prática e também as percepções e crenças dos aprendizes
sobre a aula. (Barcelos, 2005). Além disso, o professor, que também já foi aprendiz, pode ser
influenciado por suas experiências de aprendizagem em sua prática de ensino (Richards e
Lockhart, 1996). Por isso, faz sentido ressaltar que as crenças influenciam o comportamento,
mas também são influenciadas e usadas no processo de decisão dos professores (Woods,
2003; Barcelos, 2004) e que os professores devem refletir sobre suas próprias crenças e
compará-las às de aprendizes (Barcelos, 2003a), pois há “a necessidade de professores serem
preparados para lidar com a diversidade das crenças em suas salas e estarem preparados para
o conflito que pode surgir entre suas crenças e as de aprendizes” (Barcelos, 2004, p. 146).
Por esta razão, creio que as reflexões sobre, e questionamentos das crenças sobre
ensino/aprendizagem devem partir dos professores, para que estes possam ajudaros
aprendizes a também analisarem e criticarem este processo. Assim, a pesquisa a respeito de
crenças de professores constitui-se a primeira etapa para a revisão de todo o ciclo
ensino/aprendizagem, especialmente diante do que afirma Dewey (1933, pp. 33 e 34):
Com relação à curiosidade, os professores têm, em geral, mais a aprender do que a ensinar. (…) Sua
tarefa consiste em manter viva a faísca sagrada do enleio e insuflar a chama que resplandece. Seu
problema é evitar que o espírito de investigação se torne blasé por causa do excesso de empolgação,
ou inexpressivo por causa da rotina, ou fossilizado pela instrução dogmática, ou, ainda, dissipado
pelo descomprometido exercício das coisas triviais.
4
3
There is a need for periphery scholars to conduct comprehensive, coordinated and data-based empirical
studies grounded in their own learning environment particularly on issues such as learning strategies and
styles, classroom input and interaction and the role of mother tongue in SLA. In this context, the ongoing
research on learner/teacher beliefs about SLA conducted by Brazilian scholars such as Barcelos and her
colleagues (…)offers a welcome addition. Such research agenda may shed useful light leading not only to an
alternative model of SLA but also to a better understanding of learning and teaching English and other second
languages.
4
With respect then to curiosity, the teacher has usually more to learn than to teach. (…) His task is to keep
alive the sacred spark of wonder and to fan the flame that already glows. His problem is to protect the spirit of
inquiry, to keep it from becoming bla from overexcitement, wooden from routine, fossilized through
15
Leffa (2005) explica que quando o professor olha apenas para dentro da sala de aula,
está enfrentando meramente problemas metodológicos os quais foram, de certa forma,
esgotados mas, quando se preocupa com a repercussão exterior daquilo que acontece em
sala de aula, tem uma preocupação política, pois não isola a sala de aula do mundo, mas faz
uma ponte entre os dois pólos. O autor alerta ainda que a falta de consciência política pode
levar a alienação, ou “ruptura entre o sujeito e sua capacidade de se realizar plenamente por
alguma deficiência da situação em que ele se encontra” (p. 208). Entretanto, “embora o
ensino de língua inglesa ao redor do mundo tenha se tornado uma atividade controversa,
poucos profissionais da área levam em consideração a complexidade política daquilo que
fazem” (Canagarajah, 1999, p. 3)
5
Acredito que o estudo de crenças é o primeiro passo para
maior reflexão sobre a prática de ensino de professores e para maior tomada de consciência
de seu papel social e político, pois segundo Santos (2005, p. 51):
O comportamento pessoal e profissional do professor de LE é político enquanto logos (razão,
palavra), mas é também nomos (criação de regras, escolha e compromisso). No comprometer-se, no
empenhar-se está o teor político da atuação profissional. Finalmente, a articulação do saber, do
querer, do dever e do poder, por estarem indissoluvelmente associados à intencionalidade e à
vontade, resume o sentido político da ação profissional do professor de LE. Ter vontade, porém, não
basta para ser reconhecido como profissional; é preciso que haja consciência plena de si, de sua
missão, do contexto de atuação, etc.
Além de se ter optado por pesquisar crenças de professores, julguei interessante
também que fossem trazidas à baila crenças de professores sobre tradução, e que os
professores informantes fossem, necessariamente, professores que atuassem no ambiente de
ensino de Inglês Instrumental (I.I.), já que:
Existem muito poucas pesquisas no momento ligando crenças às ações mais específicas e levando-se
em consideração o contexto. Precisamos ter menos pesquisas descritivas e mais pesquisas que aliem
a investigação das crenças ao processo de aprender e ensinar línguas e às ações tomadas em
determinado contexto. (Barcelos, 2004, p. 147)
À luz do que também diz Barcelos (2004, p. 145), “precisamos criar oportunidades
em sala de aula para aprendizes e, futuros professores [e, por quê não, professores
atuantes] questionar não somente suas próprias crenças, mas crenças em geral, crenças
dogmatic instruction, or dissipated by random exercise upon trivial things.
5
Although teaching English worldwide has become a controversial activity, few ELT professionals have
considered the political complexity of their enterprise.
xvi
existentes até mesmo na literatura em LA e crenças sobre ensino”, a escolha por se tratar de
Tradução deriva do fato que será mais explorado oportunamente: existe uma tendência a se
aceitar a Tradução como improdutiva e/ou descartável devido às influências imperialistas
sobre a literatura em LA e sobre o ensino de LE
6
, fato este que será abordado em mais
detalhes abaixo. Quanto a isso, Nicolaides e Fernandes (2002, p. 94) oportunamente
argumentam que “quando se reprime ou ignora a autonomia
7
, o que ocorre é apenas
imposição da opinião dominante”. Os aprendizes precisam se tornar agentes da própria
aprendizagem (Barcelos, 2004, p. 146), mas os professores também precisam ser autores do
próprio ensino. Entendo que, ao repensar suas crenças, podem tornar-se mais autônomos e
menos susceptíveis a manipulações.
Em se tratando de Inglês Instrumental, três fatores que justificam sua pesquisa. O
primeiro é que os cursos são desenvolvidos ou deveriam ser a partir de uma análise das
necessidades de cada grupo (Dudley-Evans; St John, 1998). Assim, tem-se necessariamente
cursos feitos “sob medida” e, por isso, distintos. O segundo é que, como relatam Hutchinson
e Waters (1987, p. 6), “... o ESP [English for Specific Purposes ou “Inglês Instrumental”, ou
ainda “Inglês para Fins Específicos”] o foi um movimento planejado e coerente, mas um
fenômeno que cresceu a partir de várias tendências convergentes. ”
8
Deste modo, não há uma
teoria metodológica de ESP (Hutchinson e Waters, 1987 e Dudley-Evans e St John, 1998) e,
devido ao seu caráter inclusivo, o ESP vazão a uma diversidade de enfoques para esta
modalidade de ensino de inglês. Por isso a curiosidade por conhecer o que outros professores
desta área vêm realizando.
Além disso, o nível de responsabilidade que recai sobre professor de I.I. é diferente
daquele que define o professor de inglês em geral. O primeiro quase sempre, precisa
pesquisar por tere que fazer análises constantes de necessidades e da situação-alvo,
desenvolver de seus cursos e/ou negociar, ser mediador entre os aprendizes, ele mesmo,
aqueles que financiam os cursos e as instituições para as quais trabalham e desenvolver e/ou
avaliar materiais didáticos. Por isso é fundamental para ele a prática e leitura constante de
pesquisas em sua área de atuação (Dudley-Evans e St John, 1998, Hutchinson e Waters,
1987, Celani, 2005b, Deyes, 2005a, Holmes, 2005a). Ademais os trabalhos de Celani
6
Normalmente apagada ou substituída por L2.
7
Entendo autonomia como a habilidade de encarregar-se de sua própria aprendizagem (Holec, 1981, p. 3,
apud Nicolaides; Fernandes, p. 79)
8
ESP was not a planned and coherent movement, but rather a phenomenon that grew out of a number of
converging trends.
xvii
(2005a), Moraes (2005) e Silva (2005) deixam claro a necessidade de comunicação e
intercâmbio de idéias entre professores do ramo. Uma última justificativa é a preocupação de
Holmes (2005a) e Celani (2005b) de que o I.I., tão aberto e inclusivo, transforme-se em
ortodoxia caso não haja mais reflexão e pesquisa para sustentar seu dinamismo.
Optei também por investigar cursos mais focados no ensino da leitura instrumental
acadêmica. Primeiramente porque fazem parte da minha experiência pessoal. Depois porque
esta é a modalidade mais comum no Brasil. Também pelo fato de não terem sido encontrados
na literatura pertinente até então um número significativo de trabalhos que tratem a respeito
do uso explícito de tradução e isso torna interessante investigar como esta vem (ou não)
sendo utilizada pelos professores, que as aulas são geralmente ministradas na língua
materna dos aprendizes. Ademais, Barcelos (2006, p. 33) ressalta que “necessitamos
investigar crenças em contextos diversos cursos de Letras em instituições particulares, em
universidades públicas, cursos de idiomas (...) para chegar a padrões cognitivos entre grupos
de professores trabalhando em contextos semelhantes.”
1.2. Objetivos
O objetivo desta pesquisa é contribuir para uma revisão do papel da Tradução no
ensino de línguas. Espera-se que, ao trilhar o caminho da investigação de crenças, sobretudo
daquelas que os informantes trazem consigo quanto ao uso da Tradução no ensino de I.I., e
da relação dessas crenças com as experiências, possa-se contribuir para que o professor desta
modalidade de ensino de línguas se torne mais reflexivo a respeito das crenças que permeiam
sua prática e das razões pelas quais elas existem, tornando-se assim, um profissional mais
autônomo.
1.3. Perguntas de pesquisa
Levando-se em consideração uma relação experiência-crença, sem ignorar o contexto
de atuação dos respondentes, este trabalho busca responder as seguintes perguntas de
pesquisa:
1) Quais as crenças de três professoras de Inglês Instrumental a respeito de
Tradução?
xviii
2) Quais as possíveis
9
relações entre essas crenças e as experiências de
aprendizagem e / ou ensino vivenciadas por estas professoras?
1.4. Organização do trabalho
Para que alcance respostas às perguntas acima, pretendo seguir algumas etapas. No
primeiro momento, tenho como objetivo esclarecer qual definição de Tradução está sendo
tomada como referência para este trabalho, qual o seu status no ambiente de ensino de
línguas e o porquê da necessidade de seu uso neste ambiente. A segunda etapa dedica-se a
definir Inglês Instrumental, partilhar alguns dados de sua história, descrever seus princípios,
reafirmar sua validade e discutir o uso de Tradução nesta modalidade de
ensino/aprendizagem. O terceiro momento consiste em tentar definir crenças e sua relação
com a experiência, além de perfazer, brevemente, os cursos da história desta área de pesquisa
e do desenvolvimento dos estudos. Em seguida, serão apresentados os enfoques
metodológicos escolhidos para esta pesquisa; os dados que coletei, para realização de um
estudo de caso, quando em contato com três professoras de I.I., por meio de observações de
aula, entrevistas, gravações em áudio, notas de campo e documentos; a discussão e
interpretação dos referidos dados e minhas conclusões.
CAPÍTULO 2 – ASPECTOS TEÓRICOS DE TRADUÇÃO,
INGLÊS INSTRUMENTAL E CRENÇAS
“Diga-me para que precisas do inglês e te direi
de que inglês precisas.”
10
Hutchinson; Waters (1987, p. 8)
2.1. A tradução no ensino de LE
2.1.1. Uma tradução da tradução
o um consenso entre os teóricos da área do que seja tradução. Para Catford
(1980, p. 22), por exemplo, “... tradução é a substituição de material textual de uma língua
9
De acordo com Abrahão (2004) e Silva (2006), não como mapear com precisão as origens das crenças,
pressupostos e conhecimentos trazidos por professores, mas como levantar hipóteses a partir dos fatos e
reflexões das histórias de vida de cada um para ter uma visão dessas origens.
10
Tell me what you need English for and I will tell you the English that you need.
xix
por material textual equivalente em outra”. Em contrapartida Arrojo (1986, p. 42) cita
Derrida (1980, p. 87) ao advogar a favor de uma definição de tradução como “uma
transformação: uma transformação de uma língua em outra, de um texto em outro”.
segundo Campos (1987, p. 7), traduzir é “nada mais do que fazer passar, de uma língua para
outra, um texto escrito na primeira delas”. Bosley (apud Campos, 1987, p. 11), por sua vez,
concebe a tradução como “uma língua fazendo amor com outra”.
Um dos fatores geradores da multiplicidade de significados entre estes autores e
tantos outros é a noção de equivalência. Travaglia (2003) atribui à equivalência a razão de ser
da atividade tradutória, isto é, a principal questão do ato tradutório é determinar quais
elementos devem equivaler. Ela mostra que para Catford (1980, p. 54), por exemplo, a
equivalência se estabelece quase sempre no nível da frase, considerada por ele “a unidade
gramatical mais diretamente relacionada com a função da fala dentro de uma situação”. Alves
(2003) aborda a mesma problemática ao explicar que, para alguns autores, como Catford
(1980), a equivalência em tradução é análoga à equivalência em matemática, ou seja, é
quantificável por isso a tradução é tratada como mera questão de substituição de
equivalentes.
Como conseqüência, a questão da equivalência também assumirá vital importância na
determinação do papel da tradução no ensino de línguas. Um retrato disso é que a idéia de
equivalência formal, que rege a definição de Catford (1980), ancorava a “Tradução
companheira da gramática no Método Gramática e Tradução (MGT). Este fato é confirmado
por Brown (2001. p. 19) ao atestar que uma das principais características de tal todo são
“exercícios de tradução de frases desconexas, da língua-alvo para a língua materna”
11
. Ridd
(2000, p. 125) confirma que o MGT relacionou e subordinou a tradução à “gratica, e não
mais a textos, cultura e literatura
12
e fez com que ela se tornasse “uma atividade seca, estéril
e divorciada do mundo real de uso da língua(gem)”
13
.
Grande parte dos professores de inglês como L2 ou LE ainda hoje tem como única
referência de tradução aquela legada do MGT, o que naturalmente é uma referência negativa
(Atkinson, 1987; Duff, 1989; Ridd, 2000; Checchia, 2002; Deller; Rinvolucri, 2002; Cervo,
2005). Além disso, o banimento do uso de língua materna no ensino/aprendizagem de L2/LE,
decretado pelo Método Direto, e depois pelos métodos Áudio-Oral e Áudio-Visual de
11
… are exercises in translating disconnected sentences from the target language into the mother tongue.
12
… translation became associated with grammar, no longer with texts, culture or literature.
13
… became a dry, sterile classroom activity divorced from the real world of language use.
xx
cunho estruturalista-comportamental – contaminou ainda mais a imagem da tradução perante
os professores da área (Cervo, 2003; Butzkamm, 2003). Ainda o fato de os professores não
estarem inteirados de outras concepções de Tradução, mesmo que elas remontem do início da
era cristã (Cervo, 2003), pode resultar naquilo que prevê Lavault (1998, pp. 53,54):
O leigo que não tem nenhuma experiência com tradução acredita piamente que traduzir consiste em
transpor as palavras de uma língua de partida para as de uma ngua de chegada, fundamentando-se
nas significações codificadas pelos dicionários e na prática de regras gramaticais específicas da
língua de chegada. (...) [esta] visão ingênua e errônea da atividade tradutória (...) provoca riso nos
profissionais, mas ainda está profundamente ancorada no espírito dos aprendizes de cursos de
aprendizagem de ngua estrangeira. (...) É bom lembrar que o tradutor não transpõe as palavras de
uma língua para a outra, ele transmite um conteúdo a um destinatário, ele compreende e restitui um
sentido que não se pode reduzir às significações dadas pela língua.
14
É por esta razão que Ridd (2003, p. 102), ao se referir à viabilidade de praticar a
tradução dentro da Abordagem Comunicativa de ensino de línguas, argumenta que: “Os
óbices maiores são os professores e suas crenças, frutos compreensíveis de uma tradição que
rotineiramente exclui a tradução do elenco de recursos no ensino de LE.”
Diante disso, a definição de Tradução de Hurtado Albir (2001, p. 41, apud Hurtado
Albir, 2005, p. 27) é pertinente para a proposta deste trabalho: “um processo interpretativo e
comunicativo que consiste na reformulação de um texto com os meios de outra língua e que
se desenvolve em um contexto social e com uma finalidade determinada”. Também se
aproxima do conceito de tradução a que pretendo me referir em minhas perguntas de pesquisa
a definição dada por Travaglia (2003). Primeiramente, a autora define texto como “uma
unidade geradora de sentidos, arranjo de marcadores, lugar dialógico, onde a língua
representa a mais importante condição de base da atividade humana chamada linguagem” (p.
10). Afirma também que a tradução é, assim como o texto, “produto e processo: tudo é
dinâmico, gerador de significados, fenômeno de mão dupla, de interação” (p. 10). Assim,
segundo seu conceito de tradução como retextualização, “as etapas da tradução vão ser
semelhantes às etapas da produção mesma de um texto: a partir da intenção de comunicar
algo, o falante desenvolve um plano global que lhe permite, levando em conta a situação, o
contexto lingüístico e extralingüístico, realizar com êxito a sua comunicação e por último
14
Le profane qui n’a aucune expérience de la traduction croit volontiers que traduire consiste á transposer les
mots d’une langue de dèpart en ceux d’une langue d’arrivée en se fondant sur les significations codifiées des
dictionnaires et en mettant en pratique les règles de grammaire spécifiques à la langue d’arrivée. (...) [cette]
vision naïve et erronée de l’activité traduisante (...) ne fait plus que sourire les professionnels, mais qui est
encore profondément ancrée dans l’esprit des élèves en cours d’aprentissage d’une langue étrangère. (...) Il est
bon de rappeler que le traducteur e transpose pas des mots d’une langue à l’autre, il transmet un contenu à un
destinataire, ile saisit et restitue un sens qui ne peut se réduire aux significations données par la langue.
xxi
realiza todas as operações necessárias para transformar sua intenção num produto verbal”
(Travaglia, 2003, p. 68). Por conseguinte, na tradução que é retextualização, estarão em jogo,
diante do tradutor, os mesmos fatores que operam na produção de um texto diante de quem o
produz: conhecimentos lingüísticos, conhecimento de mundo, conhecimentos partilhados,
informatividade, focalização, inferência, relevância, fatores pragmáticos, situacionalidade,
intertextualidade, intencionalidade e aceitabilidade. Assim, a Tradução como processo de
retextualização consiste na “elaboração em uma língua B de um texto com estreita relação de
intertextualidade com o original escrito na língua A, e que visa a suscitar efeitos de sentido
semelhantes aos suscitados pelo texto de origem, embora em condições de leitura (...)
diversas das condições de leitura do texto original” (Travaglia, 2003, p. 138).
A autora projeta esta mesma proposta de tradução para o ensino de L2/LE. Assim,
encaminha sua teoria, de tradução como retextualização, ao campo do ensino, da seguinte
maneira: “o do ensino da tradução propriamente dita” e “o ensino de uma segunda língua
com a utilização da tradução; o ensino de uma língua estrangeira via tradução ou usando esta
como recurso auxiliar” (Travaglia, 2003, p. 179).
2.1.2. Tradução, habilidade e competência
Faço uma ressalva às colocações de Travaglia (2003) acima. Quando a autora percebe
a tradução como “recurso auxiliar”, deixa de atribuir a ela o papel de habilidade necessária ao
aprendiz de L2 e, principalmente, de LE. Nesse aspecto, parece-me mais interessante o ponto
de vista de Janulevičienė e Kavaliauskienė (2002). Assim como ouvir, falar, ler e escrever na
língua estrangeira, são consideradas habilidades nos círculos de ensino/aprendizagem de
inglês como LE
15
, a tradão também deveria ser considerada como tal - uma quinta
habilidade, a qual definem da seguinte maneira: “A quinta habilidade é compreendida como
uma habilidade de funcionar fluentemente em duas línguas, de forma alternada. Isso implica
em uma habilidade de trocar rapidamente de códigos, sem preparação ou tempo para
pensar.”
16
Em se tratando ainda de habilidade e também de competência, a literatura pertinente
oferece múltiplas definições para ambos os termos. Para alguns, as definições de competência
15
O termo as quatro habilidades vem do jargão, em inglês, the four skills. Segundo Savignon (1983), o termo
está associado com as práticas de ensino advindas da visão estruturalista/comportamental da linguagem.
16
The fifth skill is understood as an ability to function fluently in two languages alternately. This implies an ability to switch
from one language to another at the moment’s notice, without any preparation or thinking time.
xxii
e habilidade se justapõem, para outros, a primeira engloba a segunda (Brasil, 2002; Burnier,
2001; Gonçalves, 2005; Hurtado Albir, 2005; Moura, 2005; Pagano; Magalhães; Alves,
2005; Silveira, não publicado)
17
. Contudo, não pretendo me aprofundar nesta discussão.
Assim como Janulevičienė e Kavaliauskienė (2002), acredito que a tradução no
contexto de ensino/aprendizagem de inglês como língua estrangeira se presta ao papel de
habilidade de ir e vir na língua materna (LM) e na LE, e que deveria gozar de prestígio igual
às outras quatro. Especialmente porque é algo que um aprendiz de uma língua de outro país,
que não pretende sair do seu, precisa fazer fora de sala de aula. Não é apenas uma
ferramenta, ou seja, mais um recurso para que se aprenda, por exemplo, gramática. É um fim
em si mesma.
Além disso, considero que a tradução cumpre os requisitos de uma habilidade,
listados por Johnson (1996)
18
. A princípio porque é hierarquicamente organizada e não é
padronizada. Alves (2003) lembra que na tradução trabalha-se tanto o texto de partida como o
de chegada em partes denominadas “unidades de tradução (UT) que podem ser divididas no
nível das sílabas, palavras, expressões idiomáticas, frases, orações, períodos e discurso. Estas
UTs variam em forma e tamanho de acordo com o nível de compreensão de texto dos
tradutores, que, por terem graus distintos de conhecimentos prévios sobre o assunto e de
conhecimentos lingüísticos na língua de partida e de chegada, produzirão, cada um, uma
tradução diferente. Especialmente porque “em tradução raramente haveuma única resposta
correta”
19
(Duff, 1989, p. 7), “cada texto é único e irrepetível” (Alves, 2003, p. 183) e
também porque “seria impossível que uma tradução (ou leitura) de um texto fosse definitiva e
unanimemente aceita por todos, em qualquer época, em qualquer lugar” (Arrojo, 1986, p. 45).
Pagano (2003, p. 22) apresenta outras características do fazer tadutório:
A sensibilidade para com aspectos macro e microlingüísticos de um texto é uma característica do
tradutor experiente que, podemos afirmar, é antes de mais nada um leitor proficiente e analista de
textos. Relacionadas com essa habilidade, encontram-se estratégias diversas de análise do léxico, da
suposta intenção do autor do texto, do efeito das escolhas lexicais no leitor do texto original, todas
orientadas para a produção de um texto traduzido adequado e que possa atrair a atenção do leitor na
nova cultura na qual o texto está sendo inserido por meio da tradução.
17
Na literatura sobre formação de tradutores vem-se priorizando o termo competência (i.e. conjunto de
habilidades) justamente para frisar a natureza complexa da atividade. na literatura de ensino de línguas,
uma tendência a referir-se à tradução como habilidade.
18
Características de uma habilidade, segundo Johnson (1996): a) é hierarquicamente organizada; b) é um
comportamento direcionado a metas, a curto e longo prazo; c) envolve a avaliação de dados; d) envolve
escolhas; e) envolve fazer mais de uma coisa ao mesmo tempo; f) não é estereotipada.
19
In translation, there is rarely a ‘right’ answer.
xxiii
Deste modo, os aspectos “macro” e “micro” reiteram o caráter hierárquico da
tradução. Esta tem como meta produzir um texto que seja apropriado para a cultura do leitor
da língua de chegada. Para tanto, o tradutor necessitará administrar simultaneamente algumas
variáveis: os aspectos macrolingüísticos (a partir das UTs nero e padrões retóricos e da
contextualização) e microlingüísticos (com enfoque na equivalência ou não entre o léxico e a
gramática entre o texto de partida e de chegada), as possíveis intenções do autor do texto de
partida e a receptividade do texto para o leitor da língua de chegada. Estas variáveis guiarão,
então, quais escolhas serão feitas.
Insisto ainda na tradução como habilidade - agora em oposição à tradução como
competência. Em termos mais específicos, acredito que a habilidade tradutória que o aprendiz
de LE necessita adquirir (da mesma forma de adquire a habilidade de ouvir, falar, ler e
escrever e também nos moldes de Johnson (1996)) é diferente da competência tradutória que
um tradutor profissional precisa desenvolver.
Se por um lado, “a tradução (...) não é [meramente] um dispositivo para ser usado
para ganhar tempo para atividades ‘mais úteis’, ou para tornar a vida do professor ou dos
aprendizes mais fácil
20
(Harbord, 1992, p. 355), por outro, “o uso de tradução (...) não deve
ser confundido com a capacitação de tradutores profissionais. Algumas horas de tradução por
semana não podem proporcionar aos aprendizes a quantidade de habilidades necessárias ao
tradutor profissional
21
(Tudor, 1987a, p. 366). O mais sensato seria “sem ter a pretensão de
formar tradutores profissionais, (...) a finalidade de um curso de língua [estrangeira] pode
também incluir aprendizagem de tradução, ou, mais modestamente, uma iniciação razoável
ao saber traduzir”
22
(Lavault, 1998, p. 119).
Esta perspectiva está de acordo com a de Hurtado Albir (2005, p. 19), quando define a
competência tradutória como “conhecimento especializado, integrado por um conjunto de
conhecimentos e habilidades, que singulariza o tradutor e o diferencia de outros falantes
bilíngües não tradutores”.
20
... translation (...) is not a device to be used to save time for ‘more useful’ activities, nor to make life easier
for the teacher or the student.
21
The use of translation (...) should not be confused with the training of professional translators. A few
hours’ translation a week cannot provide learners with the array of skills that are needed by the professional
translator.
22
Sans avoir la prétention de former des traducteurs professionnels, nous pensons que les finalités d’un cours
de langue peuvent aussi inclure un apprentissage de la traduction, ou plus modestement une initiation
raisonnée au savoir traduir.
xxiv
Se, a partir do modelo de Hurtado Albir
23
, compararmos as necessidades do tradutor
profissional às do aprendiz de LE, perceberemos que, embora o aprendiz de LE desenvolva
(o que a autora chama de) subcompetências bilíngüe e extralingüística em profundidade
enquanto desenvolve (o que venho chamando de) habilidade tradutória, não precisará obter
entranhados conhecimentos declarativos sobre a tradução, tampouco se aprofundar nas
subcompetências instrumental e estratégica. Mesmo porque a própria autora afirma que
existem hierarquias e variações entre essas subcompetências e que a interação entre elas varia
de acordo com o grau de experiência do tradutor e o contexto de tradução.
Travaglia (2003) também faz distinção entre a utilidade da tradução para o tradutor e
para o estudante de L2/LE. Em seu ponto de vista, a pessoa que procura um curso de tradução
para se profissionalizar tem certo conhecimento da língua estrangeira com a qual pretende
trabalhar. O curso, então, aprimora esse conhecimento e propõe procedimentos e técnicas de
tradução, reflexão teórica sobre o ato de traduzir e extensa prática de tradução dos mais
variados tipos de texto. em relação ao ensino de uma outra língua, a autora orienta que
desde o início do processo de ensino/aprendizagem de LE o aprendiz seja estimulado a
retextualizar, a compor textos na nova língua, dentro de situações comunicativas, e que a
tradução que ele já faz naturalmente seja canalizada para a retextualização – cujos elementos
foram citados neste trabalho. O argumento que fundamenta sua sugestão de fazer da
tradução uma “aliada” e não uma “inimiga” é que “é impossível impedir o aprendiz de
‘traduzir’, de comparar, de aproximar o idioma materno do estrangeiro que está aprendendo,
uma vez que domina a língua materna, ‘pensa’ nela e toda a sua vida está nomeada,
qualificada, enfim, estruturada nela (p. 182). Ladmiral (1986), Lavault (1998), Harbord
23
O modelo de competência tradutória desenvolvido pela autora (Hurtado-Albir, 2005, pp. 28 e 29) inclui
cinco subcompetências: a) bilíngüe (“está integrada por conhecimentos essencialmente operacionais,
necessários para a comunicação entre duas línguas: conhecimentos pragmáticos, sociolingüísticos, textuais e
léxico-gramaticais”); b) extralingüística (“conhecimentos, essencialmente declarativos, sobre o mundo em
geral e de âmbitos particulares: conhecimentos biculturais e enciclopédicos”); c) conhecimentos sobre a
Tradução (“conhecimentos essencialmente declarativos, sobre os princípios que regem a Tradução (unidade
de Tradução, tipos de problemas, processos, métodos e procedimentos utilizados) e sobre aspectos
profissionais (tipos de tarefa e de destinatário)”); d) instrumental (“conhecimentos, essencialmente
operacionais, relacionados com o uso das fontes de documentação e das tecnologias de informática e
comunicação (TIC) aplicadas à Tradução”); e e) estratégica, que é composta de conhecimentos operacionais
e serve para: “planejar o processo e elaborar o projeto tradutório (...); avaliar o processo e os resultados
parciais obtidos em função do objetivo final perseguido; ativar as diferentes subcompetências e compensar
deficiências entre elas; identificar problemas de Tradução e aplicar os procedimentos para sua resolução”.
xxv
(1992), Medgyes (1994), Upton e Thompson (2001), Deller e Rinvolucri (2002), Butzkamm
(2003) também sustentam esta premissa.
2.1.3. Resistências ao uso de tradução no ensino de LE
Duff (1989) e Ridd (2000) apresentam e questionam algumas crenças (embora o
utilizem este termo) contrárias à tradução no ambiente de ensino de LE. Por exemplo, a de
que a tradução es limitada ao texto e ativa apenas duas habilidades leitura e escrita e,
por envolver tarefas escritas na maior parte do tempo, é inapropriada para a dinâmica do
ambiente de ensino/aprendizagem de inglês como LE. Além disso, considera-se a tradução
lenta e passível de desperdiçar o tempo da aula. Não se percebe, contudo, que a tradução
também pode ser trabalhada oralmente e com textos curtos, e, assim, gerar discussão e
reflexão entre os aprendizes. A tradução também é vista como entediante, sua correção
problemática, além do que os professores não se sentem capacitados a ensiná-la por não
terem sido capacitados para tal. Neste caso, é mister ressaltar que trabalhar com tradução
pode ser empolgante tudo depende da maneira como o professor a concebe (Ridd, 2003).
Prova disso é o amplo repertório de atividades desenvolvidas e/ou adaptadas por Duff (1989)
e Deller e Rinvolucri (2002) com enfoque no uso dinâmico, variado e comunicativo de
tradução na sala de aula de LE. Quanto ao mais, a partir do momento em que se concebe a
tradução como valiosa para o ensino/aprendizagem de línguas estrangeiras, não porque
não habilitar os professores para aplicá-la em sua prática docente.
Uma outra crença é a de que a tradução ou envolve ou é sinônimo de uso da língua
materna (LM) do aprendiz e de que isso o é bom. Este assunto será melhor abordado na
seção 2.1.5.
Lavault (1998) também expõe e questiona a crença – mesmo que também não use este
termo de que a diferença essencial entre a tradução profissional e aquela feita no ambiente
de ensino/aprendizagem de LE, chamada por ela de Tradução Pedagógica, está na finalidade
de cada uma, de que o tradutor profissional tem por objetivo cumprir um contrato com um
cliente, que implica em traduzir um texto, destinado a certo público que não compreende o
texto na língua de partida. Ou seja, o tradutor é fundamental, pois sem ele a comunicação não
se estabeleceria e o aprendiz de LE que faz tradução, por sua vez, tem um objetivo
essencialmente didático de praticar a língua e o seu público-alvo se limita aos professores e
aos colegas de classe. Esta crença é passível de ser confrontada por pelo menos duas boas
xxvi
razões. Primeiro porque a tradução faz parte das necessidades reais diárias de um aprendiz de
LE. Também porque o professor pode orientar sua aula para o ensino baseado em tarefas de
tradução, até para prestigiar tais necessidades do aprendiz, como por exemplo, traduzir um e-
mail em LE no ambiente de trabalho, entender a letra de uma música, as regras de um vídeo-
game, as instruções do manual da televisão, do rótulo de um cosmético, a leitura de um texto
acadêmico ou de interesse geral na internet. Além disso, o próprio tradutor profissional
carece de aprender seu ofício e por isso existem os cursos de tradução onde o tradutor
aprendiz se exercita “fingindo” estar trabalhando para um cliente e uma audiência
específicos, quando, na verdade, só quem vai ler seu trabalho é o professor e seus colegas de
sala. Diante disso, a própria Lavault desenvolve a proposta de enxertar na Tradução
Pedagógica princípios da Teoria Interpretativa da Tradução (Seleskovitch; Lederer, 1984,
apud Lavault, 1998) e princípios da Abordagem Comunicativa de ensino de línguas e, assim,
preenche as lacunas deixadas pela crença que ela critica.
Pagano (2003, pp. 12, 13 e 14) trata das seguintes crenças da sociedade em geral
com relação à tradução: “a tradução é uma arte reservada a uns poucos que podem exercê-la
graças a um dom especial”; “a tradução é uma atividade prática que requer apenas um
conhecimento da língua e um bom dicionário”; “o tradutor deve ser falante bilíngüe ou ter
morado num país onde se fala a ngua estrangeira do par lingüístico com que trabalha”; “só
se pode traduzir da língua estrangeira para a língua materna, uma vez que só dominamos esta
última”; e “Traduttori, traditori” o tradutor é um traidor do texto original. Esta última
crença implica em outras duas: a de que se traduz “num vácuo temporal e cultural, no qual
uma idéia bem formulada da língua pode ser automaticamente transposta para outra língua
como se se tratasse de uma operação matemática de equivalências entre palavras mediada por
um dicionário” e a de que “haveria uma transposição ideal e única que seria, então, a
tradução perfeita”. Assim, “como as avaliações das traduções freqüentemente diferiam ou
não preenchiam os requisitos específicos de um avaliador, o resultado era rotulado de
traição.”
Todas as crenças apontadas por Pagano podem causar problemas no ambiente de
ensino de LE, se endossadas pelo professor. A primeira delas apresenta barreiras ao uso da
tradução em sala de aula a partir do momento em que os professores crêem que nem eles e
nemos aprendizes sejam capazes de fazer uma boa tradução. A segunda, por sua vez,
apresenta problemas na medida em que, se um professor pensa assim, poderá agir
xxvii
arbitrariamente em relação ao uso da tradução, exigindo, por exemplo, queos aprendizes
produzam uma tradução tendo apenas o dicionário como subsídio. Além disso, se o professor
considera que o tradutor deve se bilíngüe ou ter morado em um país falante de língua inglesa,
não acredita queos aprendizes possam fazer tradução. Ainda, se o professor toma como
verdade que o apenas uma tradução correta, não aceita as múltiplas possibilidades de
tradução apresentadas pelos aprendizes, mas provavelmente somente a que está no livro
didático. Finalmente, quando o professor crê que a tradução é uma traição, ela é vista como
negativa e infrutífera, e a medida mais lógica é bani-la de sala de aula.
É provável que todas essas crenças que servem de barreira para o uso da tradução
estejam alicerçadas em uma postura imperialista dentro da própria LA. Phillipson (1993)
afirma que, no momento em que a Inglaterra perdeu o domínio econômico sobre suas
colônias, sentiu a necessidade de acelerar a formação de bases acadêmicas para o ensino de
línguas estrangeiras, em geral, e inglês, em particular, para que se preservasse, através da
língua, seu domínio econômico e político como metrópole sobre as ex-colônias e estender
este domínio para outros países. Assim, criou-se a Escola de Lingüística Aplicada da
Universidade de Edimburgo em 1957 e diversas conferências, simpósios e palestras
aconteceram para debater idéias e difundir os pressupostos elaborados, como a Conferência
de Makarere, Uganda, 1961. Nesta conferência foram estabelecidos cinco axiomas que até
hoje influenciam o ensino de línguas: o inglês deve ser ensinado sem o uso da língua materna
do aprendiz, o professor ideal é o falante nativo da língua inglesa, quanto mais cedo o inglês
for ensinado, melhores os resultados, quanto mais exposição houver, melhor será o resultado,
e se outras línguas forem usadas, os padrões do inglês cairão.
Canagarajah (1999, p. 3), por sua vez, alerta que uma tendência
monolíngüe/monocultural no ensino de inglês mundo afora de insistência no inglês “padrão”
como norma, de recusa a atribuir à LM do aprendiz um papel ativo na aprendizagem e
aquisição do inglês e de desprestígio do professor não-nativo. Para que tudo isso se torne
aceitável, toma-se o aprendizado como livre de juízos de valor, igualitário e pragmático.
Como se tal neutralidade fosse possível, ignora-se o fato de que, “no mundo s-moderno, a
educação perdeu sua inocência
24
(Canagarajah, 1999, p. 126), de que muitos construtos em
LA são amplamente motivados por interesses econômicos e ideológicos, e de que é preciso
que o professor assuma sua “responsabilidade ética de negociar os valores e interesses
escondidos atrás do conhecimento e que ajudem os aprendizes a adotarem uma postura crítica
24
But, in the post-modern world, education has lost its innocence.
xxviii
diante da aprendizagem”
25
(Canagarajah, 1999, p. 17). Assim, ocorre o que Phillipson (1993)
e Canagarajah (1999) chamam de “falácia monolingüística”, que consiste na transformação
de uma crença em senso comum pedagógico ou ortodoxia profissional: a crença de que a LM
do aprendiz [e, por conseguinte, a tradução] deve ser evitada a todo custo e somente o inglês
deve ser utilizado, para lembrar que a insistência neste ponto “fortalece o domínio dos
círculos profissionais de ensino de língua inglesa dos países centrais
26
e garante que as aulas
pelo mundo afora serão previsíveis e uniformes quanto à prática instrucional”(Canagarajah,
1999, p. 126)
27
. Esta atitude é conveniente para o mercado editorial fornecedor de livros
didáticos e complementa o que Phillipson (1993) chama de “falácia do professor nativo”, ou
seja, a idéia de que o professor de inglês que é falante nativo da língua é o melhor professor,
o que, por sua vez, faz com que, até mesmo as instituições de ensino da periferia
28
insistam
em dar preferência a empregar professores nativos como uma forma de “assegurar” que a
aula seja dada somente em inglês. Uma outra implicação geopolítico-ideológica da falácia
monolingüística é a conseqüente imposição do inglês padrão como “puro”, o devendo se
misturar com o vernáculo dos países onde é ensinado. Ora a idéia de que, para que o aprendiz
desenvolva competência em inglês, ele tenha necessariamente que negligenciar sua LM
reforça os discursos e as ideologias dos países centrais nas comunidades periféricas.
Ainda atrelada à questão do imperialismo lingüístico está a obsessão pelo método.
Adota-se um método, muitas vezes com a roupagem de “abordagem”, com fórmulas pré-
desenvolvidas, como se funcionassem para qualquer tipo de aprendiz, mesmo diante da
tendência pós-método, que ao professor a oportunidade de refletir sobre e redefinir sua
prática de acordo com as necessidades de seu grupo. A esse respeito, Canagarajah (1999, p.
195) se posiciona da seguinte maneira:
Os métodos de ensino de inglês, como são atualmente definidos e praticados, sufocam a reflexão e a negociação na
medida em que reforçam um conjunto partidário de valores, processos cognitivos e estratégias de aprendizagem
como norma. O movimento emergente pós-método, contudo, libera os aprendizes e os professores do controle
totalizante dos métodos e os estimula a desenvolver uma abordagem reflexiva.
29
25
… teachers have the ethical responsibility of negotiating the hidden values and interests behind knowledge,
and are expected to help students to adopt a critical orientation to learning.
26
Inglaterra e EUA.
27
Insistence on the classroom use of English (by which is usually meant the ‘standard’ dialects of center
communities) strengthens the dominance of center professional circles of ELT, and ensures that classrooms
all over the world will be predictable and uniform in their instructional practice.
28
Países sujeitos à dominação dos chamados países centrais.
29
ELT methods, as they are currently defined and practiced, stifle such reflexivity and negotiation as they
enforce a partisan set of values, thought processes, and learning strategies as the norm. The emergent post-
method movement, however, liberates learners and teachers from the totalizing control of methods and
encourages them to develop the reflexive approach I…
xxix
Esse conjunto de posturas tem feito com que professores brasileiros se sintam
inferiores em relação ao professor falante nativo de inglês e tem negligenciado a tradução
como habilidade no ensino de línguas. Estes acontecimentos evidenciam o domínio
lingüístico-cultural da Inglaterra e dos EUA, os quais têm transmitido seus valores e
ideologias mundo afora, inclusive no Brasil, através de literatura, materiais didáticos e
teacher trainers (“treinadores” de professores) a uma preço muito alto, como afirma Ridd
(2003, pp. 93 e 94), neste caso específico com relação à abordagem comunicativa:
pelo menos duas décadas, a abordagem comunicativa reina absoluta nos cursos autônomos, principalmente as
que se dedicam ao ensino de língua inglesa, regidos à distância pelo receituário do ensino de inglês como segunda
língua nas metrópoles de onde emanam os métodos e materiais (quando não os próprios professores) vendidos em
pacotes fechados a peso de ouro. Eis um dos braços visíveis da globalização que faz com que aquilo que se
aprende em Kobe será o mesmo que se ensina no Cairo e em Cuiabá – tudo regado a Earl GreyTea ou Coca-Cola.
Canagarajah (1999, p. 85) reforça esta premissa ao lembrar que as agências culturais
dos países centrais, implantadas em países periféricos servem de ponte para a influência de
suas instituições educacionais que fornecem “treinamento” (termo este que não sugere
necessariamente reflexão, mas implica em aceitação do que é transmitido) para os professores
e de suas instituições comerciais que produzem os livros didáticos, de forma que haja um
compromisso com estas na prática de sala de aula da “periferia”.
Toda essa discussão não significa simplesmente assumir uma postura maniqueísta de
total rejeição ou abnegação dos benefícios trazidos pelos métodos e/ou abordagens ao longo
da história do ensino de LE/L2, especialmente por muitos dos princípios da Abordagem
Comunicativa. Nem se trata de desprezar a literatura de LA e os livros didáticos que já foram
escritos até então, e o posso agir como se toda pesquisa que os respalda tivesse sido em
vão, pois sei que é de grande valor. Tampouco almejo fomentar um discurso xenófobo contra
as instituições estrangeiras que investiram e investem em educação no Brasil. Preocupo-me,
contudo, com a tomada de consciência, por parte dos professores, de seu papel social de
formadores de opinião, para que tenham uma atitude dialógica diante dos fatos, como
cidadãos críticos e responsáveis que são ou deveriam ser. Um feliz exemplo de convergência
entre o global e o local é o intercâmbio de idéias entre professores brasileiros e professores
ingleses que redundou no Projeto de Inglês Instrumental nas Universidades Brasileiras na
PUC-SP, financiado pela CAPES e pelo British Council. O fato de o Projeto não ter sido um
“treinamento”, ou adestramento”, mas estar fundamentado em cooperação, debates,
xxx
reflexões e principalmente respeito pelas necessidades locais específicas, além de ter havido
ao final desenvolvimento reconhecidamente mútuo tanto dos brasileiros como dos
estrangeiros envolvidos, e de terem sido valorizadas as particularidades do professor de
inglês brasileiro (Celani, 2005a) é uma prova de que professores que têm consciência de seu
papel social trabalhando em conjunto podem colher resultados surpreendentes.
Contudo, essa realidade o é muito comum em nível nacional. Em se tratando
especificamente do contexto brasileiro, Moita Lopes (1996) evidencia que há uma postura de
glorificação da cultura de língua inglesa por parte de professores de inglês. Propõe também
como uma das justificativas para este fato a herança colonial histórica do Brasil, que leva os
brasileiros a supervalorizar tudo o que vem de fora e a menosprezar o que é propriamente
seu. Aponta ainda que os materiais didáticos (que, por sinal, são desenvolvidos no exterior
para um público de L2) reforçam esta tendência quando sugerem que o aprendiz se torne
bicultural.
O autor também sugere que se repense o ensino de inglês como língua estrangeira em
termos de realidade brasileira, não nos deixando envolver por pontos que não atendem à
necessidade da maioria dos aprendizes. Destaca que deveríamos parar de insistir em
demasiado em despertar no aprendiz uma motivação integrativa quando este possui apenas
motivação instrumental. Alerta também que se tornar bicultural pode ser um objetivo muito
elitizante e distante do propósito da maioria das pessoas que aprende inglês como LE no
Brasil. Questiona também a insistência em se ensinar regras do uso da fala ou noções de
cultura para tornar possível a competência comunicativa quando a maior parte dos aprendizes
terá pouquíssimas chances de usar tal conhecimento.
Por outro lado, no que tange à cultura, que se considerar, em consonância com
Medgyes (1994), que o inglês não é o portador de uma única cultura, mas das culturas de
vários indivíduos e comunidades que fazem uso dele diariamente. Creio que a cultura da
língua estrangeira em sala de aula se torna interessante a partir do momento em que ela
não é imposta sobre a cultura brasileira, menosprezando-a. A esse respeito, a postura de
Kumaravadivelu (2005) parece bastante sensata. Não se pode negar que o inglês é a língua
internacional destes tempos. Por isso, o autor faz uma feliz colocação ao afirmar que os
profissionais da LA precisam deixar de ter uma percepção colonial da relação entre educação
e língua inglesa e ter uma percepção global. Explica que, para isso, a língua inglesa precisa
deixar de ser vista como veículo cultural para ser vista como ferramenta de comunicação, que
xxxi
é necessário abandonar o texto colonial em favor do contexto crítico e também o discurso dos
que aqui foram chamados países centrais para favorecer a descoberta local, e ainda passar das
imposições do todo para a condição pós-método. Assim, o autor continua argumentando
que as forças regionais e nacionais podem impedir que as identidades locais sejam
“sacrificadas no altar da globalização cultural”
30
(p. 30) e alerta que “... se uma língua pode
ser transformada em produto do colonialismo, deveria ser igualmente possível descolonizá-la,
caso haja vontade coletiva”
31
(p. 31). Leffa (2005) também adverte que precisamos ter
consciência de que, em um mundo globalizado, interagimos com e somos afetados por aquilo
que acontece no mundo. Isso implica em dizer que a aprendizagem de uma LE redunda em
enfrentar conflitos e perigos. O autor defende ainda que a motivação para estudar uma LE
deve partir do gosto de fazê-lo.
Acredito que uma maneira de fazer essa “descolonização”, proposta por
Kumaravadivelu, acontecer é através da tradução e do ESP ou I.I. Assim, aqueles que
tomarem “gosto (termo de Leffa) pela língua ao aprenderem aqueles aspectos da LE que
suprem suas necessidades imediatas podem aprofundar-se posteriormente no estudo da
língua, não por imposição, mas porque encontrou por si razões para conhecer essa nova
língua.
2.1.4. Por que a tradução no ensino de LE?
Em consonância com a discussão levantada acima, faz sentido afirmar que rias
razões para se utilizar a tradução como habilidade no ensino de inglês como LE. Duff (1989),
Ridd (2000, 2003) e Deller e Rinvolucri (2002) enumeram algumas: a) a tradução nos ajuda a
entender melhor a influência de uma língua sobre a outra e o potencial de ambas; b) é uma
atividade natural que faz parte do mundo real (ou seja, fora da sala de aula); c) possibilita ao
aprendiz transitar entre sua língua mãe e a LE, que esta é uma habilidade requerida em
muitos ambientes de trabalho; d) há uma grande variedade de material autêntico que pode ser
utilizado para se trabalhar com tradução – pode ser encontrado em todos os estilos e registros,
sob forma falada ou escrita; e) por natureza, convida à especulação e discussão, uma vez que
não uma resposta correta e muitas vezes o aprendiz sabe mais sobre o assunto do texto
30
... sacrificed at the altar of cultural globalization.
31
... if a language can be made a product of colonialism, then, it should be equally possible to decolonize it,
if there is a collective will.
xxxii
que o professor; f) desenvolve a exatidão, clareza e flexibilidade lingüística; g) com o fim de
utilizá-la, o professor pode selecionar material para ilustrar aspectos específicos de língua e
estrutura, os quais, ao serem trabalhados na LM pelo aprendiz, vão levá-lo a perceber a
relação entre língua (gramática) e uso.
Lavault (1998, p. 118) alega que a tradução contribui para “a formação intelectual, o
desenvolvimento da lógica e clareza, a aprendizagem da precisão e a expressão da
criatividade.
32
Ribeiro (2003) como benéfico desenvolver no aprendiz de LE em
ambiente de língua nativa a habilidade de traduzir, de comparar e contrastar os dois sistemas
lingüísticos, que tal proceder corresponderia a suas expectativas e aptidões. Sendo assim,
os professores não devem ignorar as reivindicações de aprendizes por mais exercícios de
tradução (Medgyes, 1994, p. 20). Afinal, “... técnicas de tradução formam uma parte das
estratégias de aprendizagem favoritas da maioria dos aprendizes, na maior parte dos lugares.
Assim, sua importância não deveria ser subestimada.”
33
(Atkinson, 1987, p. 242) e “se os
aprendizes gostam de tradução, não há razão para privá-los desta ferramenta de
aprendizagem. que se ter em mente que eles tendem a obter melhores resultados se
confiarem no método de ensino pelo qual estão aprendendo.”(Medgyes, 1994, p. 67)
34
Para os que fazem questão de se utilizar de uma abordagem comunicativista de ensino
de línguas, cabe ressaltar que a tradução não contradiz o comunicativismo, mas pode ser tão
comunicativa quanto as outras quatro habilidades. De acordo com Ridd (2003, p. 102), “a
tradução empregada de forma consciente e criativa pode enriquecer o ensino nos moldes da
abordagem comunicativa sem, de maneira alguma, contrariar os postulados e as filosofias que
a cercam”. Ou seja, a tradução é uma tarefa que sempre desafia a capacidade e a criatividade
de aprendiz e professor, pois não existe uma única resposta certa, mas, isto sim, opções mais
e menos apropriadas ao propósito comunicativo que se estabeleceu para a tarefa, que, como
tal, exige soluções de problemas. Ademais, faz parte das habilidades esperadas daqueles que
aprendem um outro idioma, possibilita um melhor conhecimento das estruturas e meios
utilizados para veicular uma informação ou argumento, além de evidenciar peculiaridades
culturais através do trabalho comparativo envolvido em toda operação tradutória, tornar as
relações entre professor e aprendiz menos assimétricas e usar materiais autênticos. Também
32
... la formation intellectuelle,veloppement des qualités de logique et de clarté, l’apprendissage de la
précision et l’expression de la créativité.
33
… translation techniques form a part of the preferred learning strategies of most learners in most places, the
importance of which should not be underestimated.
34
Firstly, if learners like translation, there is no point in depriving them of this learning tool. Bear in mind
that they are likely to achieve better results if they trust the teaching method with which they are learning.
xxxiii
Tudor (1987a) oferece algumas orientações quanto a como ser bem-sucedido no uso de
tradução em um ambiente comunicativista de ensino de LE. Entretanto, antes de tudo, ele
advoga que a crença de que tradução é igual a tradução literal, no sentido de que cada palavra
no texto de partida tem que ser substituída por um equivalente direto na língua-alvo é
extremamente prejudicial para o ensino comunicativo de tradução. Além disso, ele acredita
que o aprendiz ideal para sua proposta de ensino é aquele que tem um bom nível de
competência na ngua-alvo e que reconhece que o aprendizado da língua em questão tem
aplicabilidade relevante para além do ambiente de sala de aula. A partir dessas premissas, o
autor aconselha que o professor use material autêntico; que não traduza em um vácuo
comunicativo, isto é, o texto deve ser situado em um contexto e deve ter um propósito
comunicativo; que traduza para um público específico; que utilize material variado; que lide
com dificuldades lingüísticas específicas dentro de textos autênticos, onde as ocorrências
destas dificuldades surjam naturalmente, e de forma contextualizada; e que varie as tarefas de
tradução. Ainda Titford (1983) estimula o uso de tradução com estudantes em nível avançado
de proficiência na L2 (o que se estende também para LE), pois considera que a tradução
amplia a competência que os aprendizes já têm na L2, além de ser uma atividade motivadora,
por ser focada na resolução de problemas.
A tradução também valoriza o professor não-nativo, tão relegado pela preponderância
dos princípios imperialistas citados. A este respeito Medgyes (1994) aponta dois males de
que o non-NEST
35
sofre: a “esquizofrenia” e o complexo de inferioridade. Ou seja, apesar de
o professor não-nativo (PNN) sentir-se defasado em relação ao professor nativo (PN) em
termos de conhecimentos quanto à cultura e à língua-alvo, ele precisa representar o papel de
bem informado em sala de aula, diante de aprendizes. Por outro lado, por ser um bom
conhecedor da língua materna do aprendiz, antecipa e prevê melhor as dificuldades
lingüísticas e é um representante nato de sua própria cultura e língua e carrega consigo a
vantagem de ter conhecimento de duas culturas e duas línguas, podendo ir e vir entre ambas.
É bem verdade que algumas características dos PNNs que podem servir de obstáculos ao
uso da tradução. O mesmo autor (p. 60) destaca uma delas: “Se eles [os PNNs] estão absortos
na luta contra suas próprias dificuldades lingüísticas, não podem se dar ao luxo de perder o
35
NEST é um acrônimo para designar o professor falante nativo de inglês native-speaking teachers of
English. O non-NEST é o não-nativo. Percebe-se a partir daí a maneira pejorativa de se definir este professor,
uma vez que, em inglês, a palavra nest significa ninho. Assim, o non-NEST não faz parte do ninho. Em
tempos em que se tanto valor à linguagem politicamente correta, a utilização deste termo é, no mínimo,
preocupante. Especialmente por ser um termo forjado entre profissionais da linguagem e, por isso, pouco
inocente.
xxxiv
controle na aula.
36
Cita também um de seus respondentes: “Falantes não-nativos temem a
paisagem caótica que se encontra quando se distancia de um mundo orientado por regras
37
.
Por esta razão, os resultados de sua pesquisa mostram que os PNNs demonstram preferência
por se tornarem bons conhecedores de gramática, pois é menos complexa que vocabulário e
cabe em um livro (apesar de a gratica do livro nem sempre corresponder ao uso que se faz
dela em contextos de vida real). Ora, essa postura de dependência de regras pode implicar
também no banimento do uso de tradução, ou pelo menos de um uso eficaz da tradução, uma
vez que, como foi colocado, para uma atividade de tradução em sala de aula, o professor
precisa analisar uma variedade de opções de respostas cabíveis e inesperadas e o aprendiz
pode saber mais que o professor com relação a um determinado assunto.
Já com relação aos PNs, Medgyes (1994, p. 65) também sugere que “a melhor prática
para os PNs melhorarem sua capacidade de empatia é aprender a língua do país anfitrião.”
38
Assim, neste sentido, usar a tradução em sala de aula pode ajudá-los também.
2.1.5. O uso da LM
Diante de algumas considerações feitas aqui sobre a utilização da língua materna
dos aprendizes no ambiente de ensino/aprendizagem de LE/L2, faz-se necessário lembrar que
esse uso não é a mesma coisa que o uso de tradução. Antes, consiste em uma categoria mais
ampla que inclui o uso de tradução.
Assim, mesmo que o objetivo central deste trabalho não seja tratar especificamente de
usar ou o a LM dos aprendizes, mas a tradução, aquilo que for dito sobre a língua nativa
dos aprendizes influi diretamente no status da tradução na sala de aula. Por isso, esta seção
revisa alguns trabalhos que tratam do assunto.
Turnbull e Arnett (2002) revisaram uma parte considerável da literatura teórica e
empírica sobre o uso da língua-alvo e da LM dos aprendizes por professores em salas de aula
de L2 e LE. Concluem afirmando que parece haver um consenso aproximado de que o
professor deve tentar usar ao ximo possível a língua-alvo. Autores como Fries (1945),
Lado (1957), Gaies (1979) e Ervin-Tripp (1978), todos citados por Cervo (2003), opõem-se
36
If they are engrossed in fighting their own language difficulties, they cannot afford to loosen grip over the
class.
37
Non-native speakers fear the chaoic landscape one encounters when stepping away from a rule-oriented
world..
38
the best training for NESTs to enhance their capacity of empathy is to learn the language of the host
country.
xxxv
ao uso da LM dos aprendizes no ensino/aprendizagem de LE. Propalam a ideologia de
métodos como o Áudio-Oral e Audiovisual, que, por sua vez, se embasam em uma teoria
estruturalista e comportamental de ensino/aprendizagem. De acordo com essas teorias, a
língua é vista como um conjunto de hábitos adquiridos de forma empírica, pela exposição
intensa a essa língua e pelo uso repetido de suas estruturas e vocabulário. Neste pacote
teórico, es incluída a crença de que os processos de aprendizado de primeira e segunda
língua são similares e que a LM deve ser evitada para não causar resistência psicolingüística
e perturbar a aprendizagem da segunda língua. Souza (2005), ao se posicionar contra o uso da
LM e/ou “tradução (pois não faz distinção entre as duas), acredita que seu uso é prejudicial
para a autoconfiança e auto-estima dos aprendizes, pois, em sua opinião, os aprendizes se
sentem frustrados de ter que recorrer ao português para participar das atividades de sala de
aula e para aprender a LE.
Por outro lado, há muitos argumentos a favor do uso da LM no ensino/aprendizagem
de LE: a) Não há evidência empírica do axioma imperialista “quanto mais você usar a língua-
alvo, melhor vo irá dominá-la” (Phillipson, 1993; Medgyes, 1994); b) métodos como o
Áudiolingual foram concebidos e construídos por países centrais com a finalidade de
promover seus interesses coloniais (Kumaravadivelu, 2005); c) a Psicolingüística e as teorias
cognitivas provaram que é impossível descartar a LM do ensino de LE que o
conhecimento pré-existente é fundamental para que um ser pensante adquira novos
conhecimentos, o uso da LM exerce um papel positivo no nível microlingüístico, ou seja,
pode favorecer a aquisição da competência gramatical em inglês, e no nível sociolingüístico,
isto é, ajuda a desenvolver práticas comunicativas bilíngües tais como a negociação de
valores e papéis e atitudes por meio da escolha de códigos (Lavault, 1998; Canagarajah,1999;
Hutchinson e Waters, 1987; Deller e Rinvolucri, 2002; Butzkamm, 2003); d) recorrer à LM
permite que o aprendiz evite constrangimentos, livre-se da ansiedade, torne-se mais confiante
e sinta-se independente em sua escolha de expressão. (Janulevičienė e Kavaliauskienė, 2004);
e) a santificação do monolingüismo esconde a inabilidade PNs de conseguirem entender a
língua de aprendizes e a barata produção em massa de livros didáticos escritos
exclusivamente em inglês (Butzkamm, 2003); f) a LM co-constrói a L2 como uma estratégia
que o aprendiz usa ao associar itens lexicais a certas estruturas e como instrumento de uso
consciente do professor para o ensino de L2 e transformação das relações sociais em sala de
aula (Cristóvão,1996); g) o uso exclusivo do inglês em sala de aulas de LE no Brasil é
xxxvi
resultado do status da língua no país, pois um estrangeiro aprendendo outra LE em seu país
pode não admitir essa postura (Pontes, 2005). Atkinson (1987), Harbord (1992), Florez
(2000), Centéno-Cortéz e Jiménez (2004), Cardoso (2005) são também favoráveis ao uso da
LM.
o pretendo me envolver profundamente na discussão quanto à intensidade
adequada de uso generalizado de LM em qualquer ambiente de ensino/aprendizagem de LE
ou L2. com relação ao ambiente de ensino/aprendizagem de Inglês Instrumental com
enfoque em leitura acadêmica no Brasil, que é o foco da minha pesquisa, em consonância
com Hutchinson e Waters (1987), Dudley-Evans e St John (1998) e Celani (2005a), advogo
que as aulas sejam dadas em língua portuguesa.
2.2. O Inglês Instrumental
2.2.1. ESP: Histórico e Definições
Segundo Dudley-Evans e St John (1998) o ensino de línguas para fins específicos
remonta a época dos impérios grego e romano. Howatt (1984), apud Dudley-Evans e St John
(1998), argumentam que na Inglaterra do século XVI existia o inglês para negócios, e
registros de livros didáticos do século XIX sobre redação de cartas de negócios. De acordo a
narrativa de Hutchinson e Waters (1987), essa modalidade de ensino/aprendizagem começou
a ganhar força ao final da Segunda Guerra Mundial, quando houve uma grande expansão da
tecnologia e do comércio, cujo foco era os Estados Unidos e o inglês se tornou a língua
internacional destas áreas. As pessoas começaram então a se interessar por aprender o inglês
como LE para vender produtos, ler manuais ou manterem-se atualizadas quanto ao
desenvolvimento de suas áreas. A crise do petróleo, nos anos 70, aumentou a necessidade de
se aprender inglês com alvos claramente definidos em um curto período de tempo. De acordo
com Lynch e Hudson (1991), esta década foi um período de grande desenvolvimento para o
ESP. Primeiro, porque houve um aumento na quantidade de produção de informações
técnicas em inglês e ao mesmo tempo no número de falantes não nativos nas universidades
americanas. Além disso, assuntos como análise do discurso, competência comunicativa e uso
de tarefas autênticas começaram a ser tratados. Os cursos de língua deveriam, então, ser
relevantes para os interesses dos aprendizes fora da sala de aula. Percebeu-se que termos
científicos eram correspondentes entre o inglês e línguas cognatas, bem como funções
xxxvii
retóricas e atos da fala. O ESP transformou-se em uma disciplina, com características
próprias, textos cuidadosamente selecionados e exercícios práticos envolvendo trabalho com
léxico e gramática. Partiu-se do nível da sentença para o nível do discurso e a comunicação
passou a ser priorizada em detrimento da estrutura lingüística.
Hutchinson e Waters (1987) também ressaltam que, em termos de localidade, o ESP
se desenvolveu em ritmos distintos, o que torna possível encontrar em locais diferentes essa
modalidade de ensino/aprendizagem em qualquer um dos níveis distintos acima. Dudley-
Evans e St John (1998) lembram que o ESP foi vanguardista no desenvolvimento do ensino
de inglês ao passar de um currículo gramatical, funcional e nocional a uma abordagem mais
eclética e baseada em tarefas. Narram não haver um movimento dominante no ESP, mas
aceitação de muitas abordagens diferentes. Destacam também a análise de gêneros como uma
inovação trazida por Swales
39
em 1990, não como um “novo movimento” no ESP, mas parte
da análise do discurso. Swales (2000) faz um balanço do desenvolvimento em ESP desde
1964, quando da publicação de The linguistic sciences and language teaching
40
e constata
que nos EUA, diferente do que acontece no Brasil e na Grã-Bretanha, por exemplo, o ESP
não se casa com certas áreas da LA como aquisição de língua, metodologia básica de LE,
Psicolingüística e Sociolingüística. Essa situação lhe confere um lugar minoritário em
programas de graduação. Por outro lado, pondera, o ESP é uma área verdadeiramente muito
mais internacional que tantas outras da LA.
Quanto às definições de ESP, o quadro a seguir ilustra o posicionamento de alguns
autores:
39
Segundo Swales (1990, p. 58) apud Wadt e Pereira (2004, p. 53) “um gênero constitui uma classe de
eventos comunicativos, cujos membros compartilham um conjunto de propósitos comunicativos. Estes
propósitos são reconhecidos pelos membros de comunidade discursiva e, por esta razão, constituem o
fundamento para um gênero.” (“A genre comprises a class of communicative events, the members of which
share some set of communicative purposes. These purposes are recognized by the expert members of the
parent discourse community, and thereby constitute the rationale for the genre.”).
40
uma edição brasileira da obra: HALLIDAY, M.A.; McINTOSH, A.; STREVENS, P. As ciências
lingüísticas e o ensino de línguas. Tradução: M.F. Morau. Petrópolis: Vozes, 1974.
xxxviii
Quadro 1 : Definições de ESP
Autor(es) Definição
Hutchinson
e Waters
Não é o ensino de variedades especializadas de inglês, não é vocabulário e gramática de áreas específicas, não é diferente de outras formas de ensino de
inglês no que tange a basear-se em princípios de aprendizagem bem-sucedida. Também não é uma metodologia e nem um tipo de material de ensino
específico. É uma abordagem, e não um produto, de aprendizagem de inglês baseada nas necessidades do aprendiz. Todas as decisões a respeito de
conteúdo e método são tomadas a partir das razões do estudante para aprender. (Hutchinson; Waters, 1987)
Strevens Define ESP a partir de características absolutas e relativas. Assim, segundo Strevens (1988, apud Dudley-Evans e St John 1998, p.3), as características
absolutas são que o ESP:
É projetado para suprir necessidades específicas do aprendiz, es relacionado em termos de conteúdo (isto é, em termos de temas e tópicos) a disciplinas, ocupações e
atividades distintas; está centrado na linguagem apropriada para essas atividades em termos de sintaxe, léxico, discurso, semântica e assim por diante, além de análise do
discurso; contrasta com o ensino/aprendizagem de inglês regular.
as relativas indicam que o ESPpode se restringir às habilidades de aprendizagem necessárias (por exemplo, apenas a leitura)” e “pode ser ensinado
sem estar de acordo com nenhuma metodologia pré-estabelecida”.
Robinson De acordo com Robinson (1991, apud Dudley-Evans e St John, 1998, p.3), o ESP está focado principalmente na análise de necessidades e por isso é
normalmente orientado a metas que devem ser atingidas em um curto período de tempo. Além disso é projetado para o ensino de adultos em classes
homogêneas quanto a área de trabalho ou estudo.
Dudley-
Evans e
St John
Também definem ESP a partir de suas características absolutas e relativas (Dudley-Evans e St John, 1998, pp. 4 e 5):
Características absolutas: é projetado para suprir necessidades específicas dos aprendizes; faz uso das metodologias e atividades das disciplinas que serve; e está
centrado na língua (gramática, léxico, registro), habilidades, discurso e gêneros apropriados para estas atividades.
Características variáveis: pode estar relacionado a ou projetado para disciplinas específicas; pode usar, em situações de ensino específico, uma metodologia
diferente daquela usada no ensino de inglês em regular; tende a servir aprendizes adultos cursando nível superior ou a profissionais de uma determinada área,
podendo também ser desenvolvido para aprendizes de ensino médio; e é geralmente voltado para aprendizes em nível intermediário e avançado. A maioria dos
cursos de ESP exige como pré-requisito o conhecimento básico do sistema lingüístico em questão, mas podem ser desenvolvidos com iniciantes.
A definição mais adequada a meu ver é a última, em especial porque é notadamente a
mais completa e favorece um ensino voltado para disciplinas específicas, em oposição à
primeira, que se baseia numa crença de que o é necessário ensinar variedades
especializadas.
Em termos de classificação de áreas específicas, o organograma abaixo ilustra a
maneira como Dudley-Evans e St John (1998) dividem o ESP:
ESP
(English for Specific
Purposes – Inglês
para Fins Específicos)
EAP
(English for Academic
Purposes – Inglês
para Fins
Acadêmicos)
EOP
( English for
Occupational
Purposes – Inglês
para Fins
Ocupacionais)
EST
(English for (Academic)
Science and Technology
Inglês para Ciência e
Tecnologia (em
Ambientes Acadêmicos))
EMP
(English for (Academic)
Medical Purposes
Inglês para Medicina (em
Ambientes Acadêmicos))
ELP
(English for (Academic)
Legal Purposes – Inglês
para Direito (em
Ambientes Acadêmicos))
EMFE
(English for Management,
Finance and Economics
Inglês para
Administração, Finanças
e Economia)
EPP
(English for
Professional Purposes
– Inglês para Fins
Profissionais)
EVP
(English for
Vocational Purposes
Inglês para Fins
Vocacionais)
EMP
(English for Medical
Purposes – Inglês
para Medicina)
EBP
(English for Business
Purposes – Inglês
para Fins de
Negócios)
Pre-Vocational
English
(Inglês Pré-
Vocacional)
Vocational English
(Inglês Vocacional)
ESAP
(English for Specific
Academic Purposes
Inglês para Fins
Acadêmicos
Específicos)
EGAP
(English for General
Academic Purposes
Inglês para Fins
Acadêmicos Gerais)
41
Figura 1: Classificação dos ramos de ESP segundo Dudley-Evans e St John (1998)
A base do ESP é desenvolver cursos que correspondam às necessidades dos
aprendizes. Então, a estruturação de um curso envolve principalmente a análise de
necessidades O desenho de um curso envolve também as diferentes descrições do que é a
língua/linguagem e os modelos de aprendizagem que influenciam aqueles que estarão
envolvidos nesse processo educacional: quem financia o curso, a instituição que o oferece, os
aprendizes e professores. O projeto de curso aplica-se às seguinte situações: desenvolvimento
de um plano de ensino, avaliação e/ou elaboração de materiais e metodologia. Todos estes
ESP
(English for Specific
Purposes – Inglês
para Fins Específicos)
EAP
(English for Academic
Purposes – Inglês
para Fins
Acadêmicos)
EOP
( English for
Occupational
Purposes – Inglês
para Fins
Ocupacionais)
EST
(English for (Academic)
Science and Technology
Inglês para Ciência e
Tecnologia (em
Ambientes Acadêmicos))
EMP
(English for (Academic)
Medical Purposes
Inglês para Medicina (em
Ambientes Acadêmicos))
ELP
(English for (Academic)
Legal Purposes – Inglês
para Direito (em
Ambientes Acadêmicos))
EMFE
(English for Management,
Finance and Economics
Inglês para
Administração, Finanças
e Economia)
EPP
(English for
Professional Purposes
– Inglês para Fins
Profissionais)
EVP
(English for
Vocational Purposes
Inglês para Fins
Vocacionais)
EMP
(English for Medical
Purposes – Inglês
para Medicina)
EBP
(English for Business
Purposes – Inglês
para Fins de
Negócios)
Pre-Vocational
English
(Inglês Pré-
Vocacional)
Vocational English
(Inglês Vocacional)
ESAP
(English for Specific
Academic Purposes
Inglês para Fins
Acadêmicos
Específicos)
EGAP
(English for General
Academic Purposes
Inglês para Fins
Acadêmicos Gerais)
42
componentes deverão ser submetidos a constantes avaliações. (Hutchinson e Waters, 1987;
Dudley-Evans e St John, 1998).
Hutchinson e Waters (1987), Dubin e Bycina (1991) e Dudley-Evans e St John (1998)
reconhecem que os professores de ESP diferem muito dos professores de inglês regular
porque: a) têm que lidar com análise de necessidades, desenho de um plano de ensino e com
a elaboração, adaptação e/ou avaliação de material; b) a grande maioria dos professores de
ESP não passou por um programa de capacitação para exercer este tipo de ensino; c) a falta
de ortodoxia da área faz com que novatos na área sintam-se um tanto perdidos, o que torna
necessário que eles se orientem para lidar com os problemas que surgirão, através de
pesquisa, formação de grupos de discussão de professores, intercâmbio de publicações e
participação em eventos como seminários, workshops e minicursos; d) precisam ter
disposição para aprender sobre o assunto dos textos que os aprendizes utilizam; e) precisam
estar preparados para momentos em que os aprendizes saberão mais que eles a respeito de
suas respectivas áreas de especialidade; f) precisam ser flexíveis, estar prontos para mudar o
rumo da lição e discutir as questões que aparecerem, pensar e responder rápido a eventos, ter
disposição para correr riscos; e g) devem ser mediadores entre eles mesmos, os aprendizes, a
instituição para a qual trabalham (se for o caso) e a instituição que contratou o curso (se for o
caso). Em suma, precisam ser capazes de fazer perguntas inteligentes.
2.2.2. ESP no Brasil: O Inglês Instrumental
No Brasil, o Inglês Instrumental ter se popularizado, há quem prefira dizer que ensina
ESP ou Inglês para Fins Específicos, talvez para se desvencilhar da forte relação reducionista
que ficou estabelecida entre o termo Inglês Instrumental e o ambiente de ensino de leitura em
inglês como LE em ambiente acadêmico
41
. (Vian Junior, 1999; Ramos, 2005).
O desenvolvimento da Abordagem Instrumental de ensino de línguas foi iniciado no
Brasil na década de 70. No início dos anos 80, foi iniciado o Projeto Nacional de Inglês
Instrumental em universidades brasileiras, que perdurou até 1989. Foi, então, identificada a
41
A fim de evitar esse tipo de generalização neste trabalho, utilizarei Inglês Instrumental, ou I.I. como
sinônimo de ESP, que especificamente no Brasil, e, sempre que mencionar a modalidade de ensino de
inglês para fins específicos que é priorizada nesta pesquisa, usarei o termo Inglês Instrumental com enfoque
em leitura acadêmica, ou IIELA, para simplificar. Esta pesquisa preocupa-se especificamente com o ambiente
acadêmico de leitura instrumental tanto para estudantes de graduação, como os aprendizes-alvo do Projeto de
Inglês Instrumental nas Universidades Brasileiras, quanto para aprendizes e candidatos a exames de Pós-
Graduação em instituições de ensino.
43
leitura como a principal necessidade, em detrimento da gramática intensiva ou do ensino de
vocabulário. O Projeto favorecia uma filosofia participativa, de teor não prescritivo em que
cada professor refletia sobre a natureza e as necessidades do contexto em que se inseria e, por
isso, houve a preservação das características locais. Embora seus participantes o tenham
resistido a princípio, por influência das “metodologias importadas” em que tinham sido
educados, logo perceberam que tais metodologias não se adequavam às necessidades dos
aprendizes e desenvolveram um senso de identidade como praticantes de ESP. As discussões,
em seminários e workshops, resultaram no desenho de uma abordagem de ESP
especificamente brasileira, com ênfase no conhecimento que os professores e aprendizes
traziam consigo, que preconizava o desenvolvimento de estratégias de leitura e que
considerava importante o uso da língua materna do aprendiz. Decidiu-se por abordar nos
cursos aspectos como os seguintes: níveis de compreensão textual; noções; funções retóricas;
estratégias de aprendizagem; estratégias de processamento; registro; habilidades cognitivas;
vocabulário e gramática (Deyes, 2005a, Scott, 2005e, Holmes, 2005c). Livros didáticos
produzidos desde então corroboram estes procedimentos, como se percebe em Silva, Garrido
e Barreto (1995), Dias (1996), Cruz, Silva e Rosas (2003) e Oliveira (2003a).Expandiu-se
para as escolas técnicas brasileiras e atraiu também grupos de professores de outras línguas
como português e espanhol. (Celani, 2005a).
Paralela e posteriormente ao Projeto, o I.I. também se espalhou por outras instituições
de ensino superior, privadas (Silva, 2005) e blicas (Moraes, 2005)
42
. Vem sendo utilizado
em cursos preparatórios para a leitura de textos de vestibular, concursos públicos, em
algumas escolas de ensino fundamental e médio e em cursos preparatórios para candidatos à
seleção aos cursos de Mestrado e Doutorado (Sedycias, 2002; Checchia, 2002 e Ramos,
Lima-Lopes e Gazotti-Vallim, 2004), além de haver também cursos de I.I. pela Internet
(Wadt e Pereira, 2004). Assim, os cursos de I.I. tornam-se cada vez mais difundidos, pelo
fato de atender às necessidades específicas do aprendiz quanto à sua área de atuação e
desenvolver a linguagem apropriada ao seu contexto e habilidades específicas (Vian Junior,
1999).
Ramos (2005) retrata a situação atual do I.I. no Brasil e trata de perspectivas futuras.
A autora também esboça algumas crenças mesmo que o use este termo, mas “vozes” e
42
A autora retrata a perspectiva da autora como participante do processo de implementação de I.I. na
UNICAMP, embora os relatos da autora sobre o uso da Abordagem Instrumental nesta instituição destoe, e
muito, da literatura da área.
44
“mitos” correntes no ambiente de ensino de inglês como LE no Brasil: o I.I. está
ultrapassado; uma aula de I.I. é monótona; o I.I. não trabalha com a língua ou linguagem;
quem não sabe muito aula de I.I; o Instrumental é leitura; é mono-skill, ou seja,
trabalha com uma habilidade; é inglês técnico; não usa dicionário, não dá gramática, tem que
usar português; para ensinar depois que o aprendiz domina o “inglês básico”; em um
curso de Instrumental a aprendizagem é manca. Para mostrar que essas premissas não
condizem com I.I., apresenta as características da Abordagem Instrumental (exploradas na
seção 2.2.4.) e aponta algumas mudanças no panorama do ensino/aprendizagem instrumental
do inglês no mundo acadêmico hoje os aprendizes estão muito mais interessados em
publicações de periódicos, textos, livros, resenhas e abstracts e buscas na Internet
relacionados a suas áreas de especialidade e procuram por cursos de língua em geral e de
leitura com este fim. Aponta também as peculiaridades do Ensino Fundamental e Médio,
que muitas escolas estão transpondo cursos de leitura instrumental endereçados a pessoas de
20, 30 anos, da cada de 80, para crianças e adolescentes da presente geração. Trata ainda
das necessidades de estudantes e profissionais de áreas como hotelaria, turismo, relações
internacionais e negócios em geral, taxistas, pilotos, recepcionistas e pessoas de outras
ocupações e da tecnologia digital e a crescente demanda por cursos à distância.
2.2.3. A leitura
Dubin e Bycina (1991), e Hood, Solomon e Burns (1996) apresentam uma história da
leitura em L2/LE. Segundo os autores, no século XIX e no início do século XX o
ensino/aprendizagem de línguas concentrava-se em línguas clássicas e na gramática
tradicional. Nesse ambiente surgiu a vertente escolar do Método Gramática e Tradução
43
que
via a leitura como um processo cognitivo relacionado a como o cérebro aplica regras
gramaticais a enunciados escritos para que estes sejam compreendidos e foi condenado sob o
argumento de negligenciar a expressão oral e o aspecto comunicativo da língua
44
.
No início do século XX estavam em voga a lingüística estrutural e a psicologia
behaviorista, as quais originaram o Método Áudio-lingual. A leitura, pormenorizada, era
43
Na verdade o MGT surgiu no final do século XVIII. Os livros-texto de Ahn (1827 Francês para
aprendizes alemães) e Ollendorf (1835 – Um novo método para ler, escrever e falar uma língua em seis meses
(alemão para falantes de inglês e francês)) datam das primeiras décadas do século XIX. Ou seja, o MGT
estava em pleno vigor há décadas no início do século XX.
44
Novamente, a crítica vale mais para a segunda fase escolar, que misturava elementos do MGT e do Método
Clássico, que para a segunda fase, que tinha orientação mais instrumental dirigida às necessidades da nova
classe de representantes comerciais surgida da Revolução Industrial.
45
abordada a partir do domínio, passo a passo, de sons, de seus símbolos alfabéticos, palavras,
sentenças simples, sentenças complexas, e assim por diante, o que caracterizou o
processamento bottom-up, ou ascendente, de leitura, que predominou até os anos 70.
Nessa época, em um retorno a um modelo cognitivo de linguagem, despontou com
maior impacto a lingüística gerativa transformacional de Chomsky, que introduziu o
princípio da gramática universal. Esse período também impulsionou o enfoque em funções e
noções da linguagem – onotional-functional syllabus”.
Nas décadas de 80 e 90, cresceu o interesse pela Sociolingüística, Lingüística
Sistêmico-Funcional e Análise do Discurso que preconizavam a identificação e análise do
prosito comunicativo da linguagem. Foi nesta época que brotou a abordagem orientada a
gêneros, criticou-se a abordagem ascendente de leitura e despontou a influência de teorias
psicolingüísticas, que passam a valorizar o conhecimento prévio do leitor e a ver o ato de ler
como um processo, um jogo de adivinhações. Estes princípios originaram o conceito de
processamento top-down”, ou descendente.
Mais recentemente, a teoria psicolingüística passou a sugerir que a leitura é, na
verdade, uma combinação dos processamentos ascendente e descendente, pois é interativa e
os leitores se utilizam de uma combinação de estratégias de decodificação cognitiva e de
predição para chegar ao significado. As abordagens interativas de leitura, por sua vez,
originaram a Teoria de Esquemas, segundo a qual o mundo existe por meio de estruturas
mentais abstratas, reconhecidas como “esquemas”, os quais aprendemos a partir de nossas
repetidas experiências ao longo da vida.
Os modelos interativos têm sido questionados por teorias sociais por não enfatizarem
a leitura como uma atividade social e psicológica. Para os teóricos sociais, a leitura tem forte
relação com relações e propósitos humanos e que os significados são derivados da maneira
como as pessoas interpretam esses aspectos dentro do texto. Teóricos, como Paulo Freire,
argumentam que a leitura não é um processo neutro, mas que existe uma relação de poder
entre o escritor e o leitor.
No que tange a trabalhos mais recentes em nível nacional, Leffa (1996) investiga os
fatores que mais contribuem para a compreensão do texto a partir de uma revisão da literatura
da década da ocasião dessa publicação. Concluiu que a compreensão da leitura envolve uma
multiplicidade de fatores que podem ser divididos em três grupos: 1) relativos ao texto; 2)
relativos ao leitor 3) relativos à intervenção pedagógica. No final da cada, Leffa (1999)
46
constitui um panorama do fenômeno cognitivo e social da leitura em que classifica em três
abordagens as linhas teóricas que investigam a leitura, a saber: a ascendente (ou bottom-up);
a descendente (ou top-down), e a conciliadora (ou interativa). Conclui que, sob uma ótica
centrada no texto, ler é decodificar, extrair significados do texto em sua totalidade e sempre
serão extraídos os mesmos significados por qualquer leitor e que a leitura é um ato coletivo –
o leitor sempre lê algo com e para alguém, pois faz parte de uma comunidade consumidora de
textos.
Ainda abordando facetas teóricas da leitura, Oliveira (2003b) cita Smith (1978) para
defini-la como fazer perguntas [provavelmente sobre o texto] e ter suas perguntas
respondidas. Enfatiza que ser capaz de questionar adequadamente um texto corresponde à
metade da compreensão, enquanto que poder responder a essas questões equivale à outra
metade. Para que essa compreensão se , as perguntas geradas pelos aprendizes devem ser
relevantes e apropriadas e, assim, serão bem-sucedidas em gerar predições a respeito do
texto. Este processo converge para a Teoria dos Esquemas, a qual pressupõe a integração
entre o processamento ascendente e descendente. A autora termina enfatizando a necessidade
de os professores e aqueles que desenvolvem materiais passarem a levar em consideração
diferenças entre subculturas e descobrirem maneiras de ajudar os aprendizes a construir/ativar
esquemas para que se tornem leitores bem-sucedidos.
No contexto prático, Silva (2001) constatou que aprendizes do (então) Grau têm
grande preocupação em extrair do texto um “produto final” capaz de lhes proporcionar
compreensão. Alega ainda que os estudantes permanecem linguisticamente presos à
literalidade do texto e ignoram as conexões entre o texto e seu conhecimento prévio. Coracini
(2002) alerta que nas aulas de leitura de LM e LE da escola de (então) 1º e 2º graus o texto é
um pretexto para estudar gramática, vocabulário ou outro aspecto da linguagem considerados
importantes pelo professor e/ou livro didático. Desta forma, não é concebido como
provocador de efeitos de sentido no leitor. Coracini também reitera o que havia sido
exposto aqui por Oliveira (2003b): as perguntas de compreensão fornecidas pelo professor
são do tipo “o que o autor quis dizer?” ou “quais as idéias principais do texto?ou ainda de
localização, no texto, da resposta “correta”. Além disso, especificamente na aula de LE, a
“tradução linear do texto, principalmente das palavras consideradas importantes pelo
professor, constituem a única atividade de compreensão, o estudo do vocabulário aponta para
a concepção de leitura enquanto decifração e de texto enquanto conjunto linear de palavras
47
sucessivas. Scaramucci (1997) desenvolveu um trabalho de investigação a respeito da
competência lexical de aprendizes universitários de leitura em inglês como LE e concluiu que
a competência lexical dos leitores é vaga e imprecisa. Assim, esses aprendizes desconhecem
tanto palavras de baixa quanto de alta freqüência, o que dificulta o processo de inferência de
palavras. Grigoletto (2002), investiga como o aprendiz dos (então) e graus reage à
postura do professor como sujeito detentor de um saber, que lhe é conferida
institucionalmente em aulas de leitura em inglês. Seus resultados retratam que, embora haja
diversidades advindas das múltiplas experiências de professores e aprendizes e conflitos entre
os participantes dessa cena discursiva, estes conflitos são dissimulados, abafados
(in)conscientemente por professores e estudantes.
A realidade espelhada por esses trabalhos reforça a necessidade de investigar as
crenças de (futuros) professores, responsáveis pelo status da leitura, potencialmente tão
poderosa como agente de mudança social, como ponto de partida para a construção de um
novo cenário. Um exemplo deste tipo de trabalho é o de Carmagnani (2002). A autora
investigou as crenças de estudantes do primeiro e terceiro semestre de Letras-Inglês, a saber:
a) quando se trata de leitura e compreensão em LE os aprendizes seguem um processo
diferente daquele seguido na LM; b) a leitura é vista como um processo de decodificação na
qual a forma é privilegiada em detrimento do conteúdo; c) os estudantes associam o ato de ler
à leitura de textos literários e julgam que o bom leitor tem domínio da pronúncia e entonação
da LE; d) o professor é visto como detentor do “saber” e controlador da aprendizagem; e) os
aprendizes preferem trabalhar com textos simplificados a textos originais.
2.2.4. Tradução e o Instrumental
Em toda a literatura revisada, poucos trabalhos foram encontrados que faziam
referência explícita à tradução em cursos de ESP ou Instrumental. Tudor (1987a) traz uma
perspectiva muito interessante a esse respeito, quando propõe atividades de tradução a
homens e mulheres de negócios que tinham como principal objetivo aprimorar sua fluência
oral em inglês e adquirirem mais confiança ao se expressar, também em inglês, com
facilidade e exatidão em sua área de especialidade a partir de materiais em alemão, sua LM.
O curso foi desenvolvido na Alemanha. O pesquisador, então, idealizou e aplicou duas
atividades. A primeira consistia de apresentações orais a partir de um texto-base em LM
selecionado em seu ambiente de trabalho. Uma semana antes da apresentação, o apresentador
48
tinha uma sessão de consultoria com o professor, após ter preparado seu trabalho, apenas para
discutir a melhor maneira de se expressar em inglês e de traduzir termos de sua área de
especialidade. O autor observa que os aprendizes tomavam notas, às quais ele chama de
summary translation”, ou seja, notas resumidas na L2 [que eu chamaria de LE] a respeito do
conteúdo do texto-base em L1 e ocasionalmente detalhavam a tradão de termos e
expressões-chave. A Atividade 2 usava como material um texto sobre atualidades em alemão
e outro em inglês sobre o mesmo tema. Assim, os aprendizes desenvolveriam a seguinte
tarefa, em inglês, a partir do texto em alemão: uma skim translation, ou seja, uma curta e
resumida tradução oral do texto, uma “summary translation” por escrito, ou seja, um resumo
de, no ximo, 200 palavras do artigo em questão, e uma discussão do tópico em sala de
aula. O autor afirma que, por terem os aprendizes trabalhado em um ambiente de predomínio
de LM, utilizaram o inglês como extensão do que sabiam e tornaram-se mais conscientes
de problemas da comunicação entre línguas e ficaram mais receptivos às oportunidades de
aprendizagem.
Lynch e Hudson (1991, p. 230) referem-se ao uso da tradução em ESP da seguinte
maneira:
Mesmo que em geral a tradução venha sendo considerada como prejudicial para o desenvolvimento
das habilidades comunicativas no ensino de inglês como L2 ou LE, parece que ela pode ter um papel
importante e muito positivo no ensino de inglês para ciência e tecnologia. Aprendizes deste tipo de
curso terão, em geral, que avaliar material escrito em inglês e serem capazes de traduzir aquele
material de forma acurada para a sua língua materna com o propósito de discussão, aplicação e
crescimento profissional. A tradução, neste contexto, torna-se uma habilidade importante a ser
desenvolvida. Em termos de vocabulário, as noções tradicionais de que os aprendizes precisam
aprender a inferir significados pelo contexto para que se tornem bons leitores deve ser reexaminada
no contexto de leitura de inglês para ciência e tecnologia, uma vez que os leitores destes tipos de
textos precisam, em geral, compreender de forma precisa o conteúdo com que estão lidando; a mera
adivinhação do significado de palavras não familiares pode ter efeitos potencialmente desastrosos.
45
Em caráter nacional o trabalho de Checchia (2002), que embora o trate
especificamente dessa relação, escolheu como um de seus contextos de pesquisa um ambiente
em que se ensinava I.I. com o uso explícito de tradução. O fato de os estudantes aprenderem
mais rápido a gramática e as diferenças lingüísticas e haver diminuição na heterogeneidade
45
While translation has usually been considered detrimental to development of communicative skills in
ESL/EFL classroom, it seems likely that it can have an important, positive role in the EST reading classroom.
EST reading students will typically need access material written in English and be able to translate that
material quite accurately into their native language for purposes of discussion, application, and professional
growth. Translation, in this context, becomes an important skill to be developed. In terms of vocabulary, the
traditional notions that students need to learn how to guess at meanings through context in order to become
successful readers must also be reexamined in the context of EST reading. Given that EST readers typically
have a very accurate and precise sense of the content they are dealing with, simply guessing at the meaning of
unfamiliar vocabulary could have potentially disastrous effects.
49
da turma são apenas alguns exemplos dos benefícios do uso de tradução no curso de
Instrumental apontados pelas professoras.
Silva (2005) desenvolve uma proposta de I.I. que inclui preceitos da Abordagem
Comunicativa e o uso declarado de tradução. Sua pesquisa foi realizada em três instituições
de ensino superior, a partir de cursos de Inglês Instrumental. Desenvolveu uma proposta de
triangulação entre Instrumental, Tradução e Abordagem Comunicativa. Sua proposta inclui
apresentação de seminários pelos aprendizes a partir de textos em inglês selecionados por
eles, atividades de listening em inglês com discussão em português e dinâmicas de tradução
em grupos.
No mais, não se fala muito de tradução nos círculos brasileiros de Inglês Instrumental.
Talvez essa aparente ausência da tradução em um campo tão fértil e promissor, tão aberto a
novidades, seja uma extensão inconsciente das mesmas justificativas de recusa ao uso de
tradução no ensino de inglês em geral. Afinal, como expõe Hutchinson e Waters (1987),
mesmo descrições da língua(gem) e teorias de aprendizagem que aparentemente não estão
mais “na moda” continuam a exercer algum tipo de influência ainda que indireta sobre os
professores [de ESP] , aliadas à experiência destes na docência que, por sua vez, pode vir
de um ambiente de ensino de inglês regular
46
. No caso específico do Brasil, Celani (2005)
alerta que a experiência prévia é uma das mais poderosas barreiras contra mudanças,
especialmente no caso dos professores de II que participaram do Projeto e que vinham de
uma tradição áudio-oralista.
Levando em conta o caráter promissor do I.I. no Brasil (Ramos, 2005); o fato de que,
“organismos vivos necessariamente passam por mudanças”
47
(Celani, 2005a, p. 25); o
reconhecimento de que realização de pesquisa e o contínuo questionamento do contexto de
aprendizagem no ambiente de II é crucial para a sustentabilidade do ESP (Holmes, 2005a); e
motivada pela constatação de que “a abertura do ESP para atividades e pesquisa em outras
disciplinas devem assegurar sua flexibilidade contínua e adicionar novas perspectivas para
enriquecer suas práticas” (Dudley-Evans e St John, 1998, p. 232), listo abaixo algumas
justificativas para o uso de tradução no ensino/aprendizagem de IIELA.
46
A respeito da persistência de conceitos ultrapassados no ambiente de ensino de línguas, vê também Neves
(1998).
47
Living bodies necessarily undergo changes.
50
Tradução e Inglês Instrumental m sendo vítimas de más interpretações. Contudo o
futuro reserva a ambas as áreas um espaço de bastante relevância no cenário de
ensino/aprendizagem de LE (Ridd 2000, 2003 e 2004 e Ramos 2005).
Ridd (2004, p. 89) explica:
A tradução [como concebida e discutida exaustivamente nesta pesquisa] pode beneficiar a LA com
um olhar mais crítico, descomprometido com o jogo de poder econômico e ideológico que informa e
dirige muito mais do que se faz e do que se pensa no ensino de línguas, convertido não raro em
doutrinas que viram dogmas com o passar do tempo.
Em caráter mais específico o autor reitera que a tradução pode humanizar a prática de
ensino de LE e contribuir para que este saia da marginalidade nos currículos e ambientes
escolares. Pode também contribuir para que o professor retome sua autonomia didática e
suscitar o despertar dos aprendizes até então silenciosos em sala de aula, pois “quando as
atividades propostas são adequadas, o aprendiz que traduz se manifesta, discute e discorda,
obrigando o professor e os colegas a negociar” (p. 90).
No mesmo tom, Scott (2005d, p. 81), da parte da Abordagem Instrumental, critica a
tendência dos professores de LE a adotarem cegamente novas metodologias por serem
novas:
O que eu estou querendo dizer é que muito de nosso entusiasmo por novas metodologias e materiais
mais relevantes, embora muitas vezes louvável, pode nos tirar de foco, de tal forma que a conhecida
síndrome de “maria-vai-com-as-outras” pode ser produto de nossa relutância em parar e repensar os
aspectos básicos de nossa situação de ensino.
48
Ainda Ramos (2005) pondera que o Instrumental, talvez mais do que qualquer outra
abordagem de ensino de inglês como LE no contexto nacional, contribui em muito para
formar cidadãos e atender as novas exigências do mercado de trabalho. Ademais, o valor da
Abordagem Instrumental o no analisar as necessidades únicas do aprendiz brasileiro e
desenvolver um programa de ensino de fato voltado para a realidade deste aprendiz (Moita
Lopes, 1996), mas também no que é afirmado em Celani (2005a): o fato de que, enquanto o
ensino de inglês em geral até bem recentemente [e até hoje em certos meios] centralizava
suas preocupações na garantia de eficácia de determinados métodos, a Abordagem
48
I am suggesting that much of our enthusiasm for new methodologies and more relevant materials, although
generally laudable, may lead us astray, so that some of the well-known tendency to ‘join the bandwaggon’ of
novelty may be the product of our reluctance to stand back to reconsider basic aspects of our teaching
situation.
51
Instrumental sempre priorizou questões como o papel do aprendiz, o papel do professor, o
papel do material didático e as necessidades e anseios do aprendiz. Pode-se, então, dizer que,
em seu surgimento, o I.I. estava adiante de sua época. Também pelo que explicam Allwright
(2001), Canagarajah (1999) e Kumaravadivelu (2005): até pouco tempo, o pensamento
pedagógico em voga no ensino de inglês era obcecado por métodos, ainda que estes
simbolizassem maneiras pré-concebidas de lidar com populações de estudantes, culturas e
estilos de aprendizagem não previstos. Hoje, admite-se o que os idealizadores do I.I.
sabiam: as diferentes realidades de sala de aula raramente corresponderão a qualquer método
reconhecível, especialmente porque os métodos o são neutros, mas difundem a ideologia
daqueles que o idealizaram a respeito de relações sociais e valores culturais.
Acredito que Tradução e Abordagem Instrumental (especialmente quando
concentrada na leitura acadêmica) têm muito em comum:
A leitura (que é o foco do IIELA) e a tradução no ensino de
ensino/aprendizagem de LE sofreram os mesmos revezes ao longo da história,
de serem vítimas de marginalização pela hegemonia dos métodos
49
;
Instrumental e Tradução desbancam princípios “colonizadores no
ensino/aprendizagem de inglês e “globalizam” a LE (terminologia de
Kamaravadivelu, 2005), além de não serem subproduto de nenhuma
metodologia específica (Ridd, 2004 e Hutchinson; Waters, 1987);
Instrumental e Tradução são influenciados por teorias cognitivas de
aprendizagem e por isso são orientados para tarefas de resolução de problemas
e voltadas para a vida real e valorizam o conhecimento prévio dos aprendizes,
tanto lingüístico como de mundo. Isso justifica a abertura do I.I. para uso da
LM, que pode, necessariamente, incluir o uso de tradução. (Hutchinson;
Waters, 1987; Lavault, 1998; Oliveira, 2003b; Alves; Magalhães; Pagano,
2003a; Travaglia, 2003; Pagano; Magalhães; Alves, 2005);
Os gêneros textuais são de grande importância para o aprendizado tanto de
Instrumental quanto de tradução (Tudor, 1987b; Dudley-Evans e St. John,
49
Como ilustração disso, assim como muito tempo se pensou que a leitura era sinônimo apenas de
processamento ascendente, paralelamente a tradução era vista como substituição de material textual de uma
língua por material textual em outra, equivalente no nível da frase, como uma equivalência matemática, a
exemplo do MGT. Em seguida ambas foram inferiorizadas pelo Método Audiolingual. Assim, parece ter
havido ao longo do tempo muito mais erros que acertos no que tange e esses dois campos por parte dos
responsáveis pela educação e até hoje se faz necessário reparar danos e repensar o papel das duas habilidades.
52
1998; Alves; Magalhães; Pagano, 2003a; Ramos; Lima-Lopes; Gazotti-
Vallim, 2004; Wadt; Pereira, 2004) e também por isso a tradução se adequa
perfeitamente a um curso que trata de linguagens de especialidade pré-
determinadas;
Instrumental e tradução estimulam a leitura crítica na medida em que “o
tradutor precisa ajustar as características lingüísticas da tradução de acordo
com a idade, gênero, ideologia, religião, contexto cultural, experiências
educacionais e assim por diante”
50
(Shei, 2005, p. 313);
Instrumental e tradução favorecem relações menos assimétricas em sala de
aula, e contribuem para maior autonomia do professor e dos aprendizes
51
(Ridd, 2005). A autonomia do estudante acontece à medida que, em ambos os
campos, este tem voz para reagir criticamente ao material textual em questão e
para desenvolver estratégias individuais de trabalho (Hutchinson; Waters,
1987; Tudor, 1987b; Alves; Magalhães; Dudley-Evans e St. John, 1998;
Pagano, 2003a; Travaglia, 2003; Hurtado-Albir, 2005; Scott, 2005a; Shei,
2005).
Diante de todas essas semelhanças, será que a tradução já não faz parte do domínio do
IIELA? Eu responderia que “sim”; a tradução vem sendo usada em II, que de maneira
implícita, intuitiva, em muitos casos apenas como recurso auxiliar de aprendizagem
52
. Grande
parte do que se pratica na leitura instrumental é semelhante à proposta de Tudor, que
invertida, ou seja, o material textual é em LE e a interação com o texto, na mente do
aprendiz, e em sala de aula, a respeito do texto, acontece em LM. A partir do momento em
que o aprendiz tem que ler um texto em inglês e comentar com o colega ou com o professor,
em português, qual o assunto do texto, qual a idéia principal, se concorda ou não com o ponto
de vista do autor e porque, está fazendo tradução. Também, quando o estudante tem que
responder uma questão de múltipla escolha, ou de verdadeiro ou falso em português, ou em
50
... the translator needs to adjust the linguistic features of the translation according to the targeted reader’s
age, gender, ideology, religion, cultural and educational background and so on.
51
O papel do tradutor profissional se assemelha muito ao do professor de ESP no sentido de que a) ambos
precisam aceitar que o “cliente” muitas vezes tem mais conhecimento especializado da área em questão e
saber negociar com ele e b) ambos precisam ser pesquisadores, curiosos, refletir sobre e reconstituir
constantemente sua prática; ter a mente aberta e uma dose de ceticismo. (Hutchinson; Waters, 1987; Dudley-
Evans e St. John, 1998; Alves; Magalhães; Pagano, 2003a; Hurtado-Albir, 2005; Celani et. al, 2005)
52
Não condeno o uso da Tradução como recurso auxiliar de aprendizagem. Contudo acreditomuito mais a
explorar da tradução se ela for vista também e principalmente como habilidade.
53
inglês, mas troca idéias com um colega em português, ou até mesmo sozinho, mas refletindo
na língua materna, está também fazendo tradução.
Além disso, outra questão de relevância ainda maior. Se imaginarmos um
profissional de negócios que tem que ler e-mails comerciais, atender a telefonemas, ou
receber comissões estrangeiras, tudo em inglês, e depois relatar tudo ao superior, em
português que procura um curso de Instrumental, será que ele não tem a necessidade de
aprender a traduzir? E, em um caso mais específico, quando um candidato a uma vaga de
s-Graduação que precisa fazer um exame de proficiência em língua inglesa envolvendo
questões a serem respondidas em português procura um curso de Instrumental, será que ele
não tem a necessidade de aprender a traduzir? Será que esses dois aprendizes ideais não têm
que aprender estratégias de tradução propriamente dita?
Neste caso, entra em jogo a “conscientização”
53
proposta por Paulo Freire e
resignificada por Scott (2005b), que em vez de se aplicar aos aprendizes, aplica-se aos
professores, passa a ser parafraseando Scott a compreensão dos professores, com o
coração e com a mente o porquê de estarem ensinando as habilidades que ensinam, como eles
o fazem individualmente, até que ponto as estratégias que propõem o eficazes, e o que o
processo de ensinar leitura envolve.
A conscientização dos professores da natureza da tradução e de que a utilizam,
aliada à aceitação deste fato como positivo, pode levar o profissional a buscar aprimoramento
no fazê-lo. Assim o professor poderá se utilizar mais e melhor da tradução em sala de aula, de
maneira explícita. O aprendiz, por sua vez, será beneficiado já que tem que traduzir no dia-a-
dia acadêmico e profissional. Todo este processo poderá resultar da promoção da tradução da
posição de atividade, ou recurso auxiliar, para habilidade, uma habilidade que o
perfeitamente se adequa à leitura e desmancha o mito de que a aula de Instrumental é mono-
skill”.
Essa aderência da tradução à leitura é porque ela é, de fato, uma leitura. Há, contudo,
uma distinção a ser feita. O leitor comum – e também o aprendiz de LE que utiliza a tradução
como mero recurso auxiliar de aprendizagem lingüística - lê para si e assim, entram em jogo,
53
No contexto de ESP para leitura acadêmica, conscientização é definida por Scott (2005, p. 93) como:
“Garantir que os aprendizes compreendam, com o coração e com a mente, o porquê de estarem aprendendo e
praticando as habilidades ensinadas, como eles o fazem individualmente e até que ponto as estratégias
propostas são eficazes, e o que o processo de leitura envolve”. (“Ensuring students understand, with their
hearts as well as their heads, why they are learning and practising the skills being taught, how they
individually do so, and to what extent proposed strategies are effective, and what the reading process
involves.”
54
para dialogar com o texto, a sua identidade, as comunidades lingüísticas das quais ele faz
parte, apenas. Já o tradutor profissional – e também o aprendiz de LE que traduz visando uma
situação de tradução na vida real traduz para si e também para o outro, um outro ideal que
também tem identidade própria e faz parte de outras comunidades lingüísticas. Nota-se que o
segundo diálogo é de proveito muito maior.
Enfim, no “baile” do ensino/aprendizagem de LE, é possível que a tradução se torne a
“Cinderela” do ESP. Para Delisle (1984, apud Cervo, 2003), que desenvolveu a Teoria
Interpretativa da Tradução para profissionais da área, a tradução profissional difere daquela
utilizada na aula de LE porque, no ponto de vista do autor, no primeiro caso a compreensão
do texto e a extração de seu sentido precedem o ato da tradução, enquanto que no segundo a
tradução é um meio de se chegar à compreensão da língua, ou seja, o ato da tradução precede
a compreensão. Ora, não tem que ser assim, mesmo quando os aprendizes de LE são de nível
“básico”. É exatamente neste ponto que ESP e tradução como habilidade se completam.
Grande parte do processo de compreensão pode se dar através dos recursos do ESP e a
completude da tarefa pode culminar em uma tradução, a exemplo da proposta de Lavault,
oportunamente sintetizada por Cervo (2005, p. 74), ao definir o que ela chama de “processo
de tradução” da Tradução Pedagógica com Enfoque Interpretativo:
1. Leitura crítica do texto;
2. compreensão textual, incorporando a análise do discurso (análise do pára-texto, e do texto,
extração das idéias e das palavras-chaves, organização das idéias, estrutura textual, identificação da
intenção comunicativa do autor pela análise da linguagem, avaliação do nível estilístico, dos recursos
retóricos reveladores da harmonia da forma e do conteúdo);
3. na fase de interpretação textual, junção e síntese dos significados semânticos das palavras, de
elementos extralingüísticos contextuais que participam do esquema de comunicação (Jakobson) e são
inseparáveis dos fatos de linguagem e de complementos oriundos da bagagem cognitiva do leitor:
saber prévio temático, intertextual, conceptual, regras de interação social, convenções de linguagem;
4. a reescrita textual é condicionada por todos esses elementos do processo de tradução; eles
determinam a negociação dos sentidos do texto e regulam sua reformulação, isto é, a escolha
sistemática e rigorosa dos recursos formais e das equivalências discursivas e textuais do texto de
chegada.
Nota-se, nos pontos 1, 2 e 3 grande semelhança com o proceder da Abordagem
Instrumental aplicada à leitura acadêmica.
Insisto, por uma última razão, que, além da tradução ser importante no ensino e
aprendizagem de línguas, faz-se fundamental no ensino/aprendizagem de Inglês Instrumental
pelo fato de este dar grande valor ao conhecimento prévio do aprendiz. Quanto a isso, Dewey
(1933, p. 12) considera:
55
Dada uma dificuldade [por exemplo, tarefas de resolução de problemas aplicadas à vida real] (...) se
a pessoa [envolvida na tarefa] estiver familiarizada com situações ou material semelhantes, sugestões
mais ou menos aceitáveis e úteis [de como resolver o problema] surgirão [em sua mente].(...) Mesmo
quando uma criança (ou uma pessoa adulta) tem um problema, exigir que ele pense quando ele não
tem experiência prévia que envolva algumas das mesmas condições é completamente inútil.
54
Assim, quando um falante de português um texto em inglês, ele vai recorrer àquilo
que conhece: a referência de leitura em sua língua materna, e vai procurar “trazer” este
texto em inglês para ela.
Os estudos de Upton e Thompson (2001) corroboram esses fatos. Os autores
realizaram uma pesquisa com aprendizes de inglês como segunda língua (L2) em nível
intermediário usando protocolos verbais e concluíram que o usuário de L2 não se desliga da
L1 ao processar a L2. Antes, faz uso da tradução mental, ou seja, dos “reprocessamentos
mentais das palavras, expressões e sentenças de L2 em formas de L1 durante a leitura de
textos em L2”. Os resultados desse estudo conduzem a duas informações básicas: a de que os
aprendizes recorrem à tradução mental sempre que esbarram em um problema de
compreensão e a de que a recorrência à L1 diminui à medida que a fluência aumenta.
Contudo, retomando a metáfora do conto de fadas, a tradução pode passar de
mero dispositivo intuitivo de aprendizagem a habilidade funcional no ESP, “príncipe
encantado emergente no Brasil, quando os professores deixarem de representar a “madrasta
malvada”. E isso acontece com a tomada de consciência através do estudo de crenças.
Kennedy e Kennedy (1996) oportunamente lembram que crenças sobre inovações, suas
conseqüências e as variáveis contextuais relacionadas a elas são tão importantes quanto a
própria atitude dos professores e por isso a conscientização das crenças e de suas origens são
fundamentais para que os professores possam questioná-las e, quem sabe, mudá-las.
2.3. Crenças
2.3.1. Histórico
Barcelos (2004) afirma que o conceito de crenças surgiu em campos como a
antropologia, sociologia, psicologia, educação e filosofia. Assevera, ainda, que o interesse
pelo estudo de crenças em Lingüística Aplicada (LA) surgiu quando se partiu de uma visão
54
Given a difficulty, (…) If the person has had some acquaintance with similar situations, if he has dealt with
materials of the same sort before, suggestions more or less apt and helpful are likely to arise. (…).Even when
a child or (a grown-up) has a problem, to urge him to think when he has no prior experience involving some
of the same conditions, is wholly futile.
56
de línguas focada no produto (linguagem) para uma visão com foco no processo. Assim, na
década de 70, quando os aprendizes passaram a ser vistos não como mímicos ou seres
puramente cognitivos, mas também afetivos e sociais, surge o termo “mini-teorias de
aprendizagem de línguas dos aprendizes”, usado por Hosenfeld, em 1978. Nos anos 80
surgem os trabalhos de Horwitz (1987) e Wenden (1987), que se utilizaram, pela primeira
vez, do termo “crenças sobre aprendizagem de línguas”. Na década seguinte são realizadas as
primeiras pesquisas mais específicas sobre crenças no Brasil: Leffa (1991, apud Barcelos,
2004) investigou concepções de aprendizes que entrariam na série; Almeida Filho (1993,
apud Barcelos, 2004) definiu “cultura de aprender” ; e Barcelos (1995, apud Barcelos, 2004)
utilizou-se do termo anterior para investigar crenças de formandos em Letras.
Desde então, surgiram vários termos como “conhecimento metacognitivo” (Wenden,
1986a), “crenças” (Wenden, 1986), “representações dos aprendizes” (Holec, 1987), “filosofia
de aprendizagem de línguas dos aprendizes” (Abraham; Vann, 1987), “crenças culturais”
(Gardner, 1988), “representações” (Riley, 1989 e 1994), “teorias folclórico-linguísticas de
aprendizagem” (Miller; Ginsberb, 1995), “cultura de aprender línguas” (Barcelos, 1995),
“cultura de aprender” (Cortazzi; Jin, 1996), “cultura de aprendizagem” (Riley, 1997) e
“concepções e crenças (Benson; Lor, 1999)
55
. Por trás destes termos não se pode encontrar
uma única definição de crenças, mas em todas as crenças são vistas como opiniões e idéias de
aprendizes e professores sobre o ensinar e o aprender línguas (Barcelos, 2001). A autora
também explica que esses diferentes termos sugerem diferentes maneiras de se investigar
crenças. Por isso, separa a investigação de crenças em três momentos, ainda que estes três
enfoques coexistam.
O primeiro momento se caracteriza, basicamente, por se utilizar de questionários
fechados com afirmações abstratas sobre crenças, ignorando-se o contexto de ensino-
aprendizagem dos respondentes e as perspectivas destes. Além disso, o aprendiz é visto como
inadequado e suas crenças são descontextualizadas e consideradas “errôneas”, na medida em
que divergem das de especialistas. Nesse momento, o marco no estudo de crenças em geral
foi o trabalho de Horwitz (1987). A autora foi responsável pela “primeira tentativa de
identificar as crenças explícitas dos aprendizes de forma sistemática”
56
(Wenden, 1987, P.
103) por meio de um instrumento denominado BALLI (Beliefs About Language Learning
55
Todos os autores deste parágrafo foram citados por Barcelos (2004).
56
To date, except for Horwitz, no one has attempted to identify learners’ explicit beliefs in any systematic
way.
57
Inventory Inventário de Crenças sobre o Aprendizado de Línguas). Horwitz (1987)
apresenta o BALLI como um questionário do tipo escala de Likert em que o informante pode
escolher uma resposta que varia entre “concordo completamente (“strongly agree”) e
“discordo completamente” (“strongly disagree”). De acordo com Gimenez (1994) e Silva
(2004), o BALLI deixa os informantes mais à vontade que as observações, é viável em
termos financeiros e temporais, é fácil de tabular e pode alcançar diversos contextos cio-
culturais e épocas, mas restringe as possibilidades de escolha dos participantes, corre-se o
risco de os participantes responderem com base no que “a vanguarda acha mais adequado” e
finalmente julga as crenças de aprendizes a partir do ponto de vista de professores. Apesar
disso, vem sendo utilizado em várias pesquisas e tem se mostrado especialmente útil em
trabalhos que envolvem um grande número de informantes e quando acompanhado de outros
instrumentos de pesquisa. Outros pesquisadores têm usado o BALLI como modelo para
desenvolverem seus próprios questionários, juntamente com outros instrumentos. (Silva,
2004).
O segundo momento do estudo de crenças aproxima as crenças de conhecimento
metacognitivo, a exemplo de Wenden (1987). As crenças são, então, tratadas de forma
paralela a conceitos como aprendizagem autônoma, capacitação de aprendizes e estratégias
de aprendizagem. O aprendiz é concebido de maneira ideológica, como aquele que deveria
adotar crenças mais “saudáveis” ou “produtivas”. Fala-se em “classificação de crenças e
“tipos de crenças”, mas não necessariamente naquilo que os aprendizes acreditam. Persiste a
noção prescritiva das crenças: quais as corretas, quais as erradas e quais representam um
obstáculo à autonomia, como se crenças pudessem ser representadas desta forma, como se
não fossem resultado da interação do aprendiz com o ambiente e ainda como se não fossem a
expressão dos aprendizes enquanto seres pensantes. Segundo Barcelos (2001), nesta fase usa-
se basicamente questionários e/ou entrevistas semi-estruturadas e auto-relatos como
instrumentos de pesquisa.
o terceiro momento vem acompanhado de uma pluralidade de instrumentos
simultâneos, como observações, entrevistas, diários e estudos de caso. Por causa da
influência de diferentes teorias sócio-histórico-culturais, passaram a fazer parte da discussão
sobre crenças fatores como interação, identidade, metáforas, discurso e principalmente
contexto, o que significa que as crenças passaram a ser analisadas à luz de sua relação com as
experiências e/ou ações. Deste modo, embora admita que as crenças também têm um
58
componente cognitivo, a autora alega que o primeiro momento, mais normativo, e o segundo,
o metacognitivo, pecaram por não analisar as crenças nos próprios termos dos respondentes,
em tratá-las como um conceito fixo, a priori, e em negligenciar seu contexto social (Barcelos,
2001 e 2004).
Assim, Barcelos (2004) nota que, de um momento para o outro, uma mudança da
concepção de crenças. Por conseguinte, mudaram também as perguntas de pesquisa e os
métodos de investigação.
Enquanto Barcelos (2004) divide o estudo de crenças em três momentos, Kalaja
(1995) divide-o em dois: “atual” ao que ela caracteriza como tendo uma visão
metacognitiva das crenças e “alternativo” proposto pela autora e fundamentado em
análise do discurso. Assim, Kalaja tece algumas críticas ao modelo metacognitivo de
investigação de crenças. Uma delas é a de que encara crenças e conhecimento metacognitivo
como sinimos quando, segundo a autora, é possível medir crenças por meio de
questionários como o BALLI, mas não o conhecimento. Além disso, o fato de crenças serem
consideradas entidades cognitivas e o se poder “entrar” na mente dos informantes para
investigá-las, e ainda diante do caráter indireto dos métodos de pesquisa utilizados
questionários, entrevistas semi-estruturadas e auto-relatos a validade dos estudos fica
comprometida. Finalmente, as crenças são consideradas estáveis, quando se sabe que
podem mudar. Diante disso, propõe um outro modelo de investigação com as seguintes
características: em vez de descrever as crenças e estabelecer uma relação de causa entre
crenças e ações, descreve as funções das crenças; em vez de considerar que as crenças são
representações cognitivas, são enxergadas como construções discursivas; em vez de serem
cognitivas, estáveis, declaráveis e falíveis, as crenças são variáveis e construídas socialmente;
em vez de ter como dados de pesquisa auto-relatos retrospectivos, toma-se o discurso
naturalístico dos participantes; em vez de se utilizar questionários e entrevistas como
métodos de pesquisa, utiliza a análise do discurso.
Woods (2003) também questiona os trabalhos pioneiros de investigação de crenças. O
autor reitera que as crenças o são discretas, mas interconectadas e estruturadas; não são
entidades estáveis localizadas dentro de um indivíduo, mas socialmente contextualizadas,
formadas a partir de eventos sociais específicos e, por isso, estão em constante mudança; não
são separáveis de outros aspectos dos processos cognitivos, mas integradas em um modelo
dinâmico e amplo de pensamento e ação. Assim, parte de uma visão construtivista e orientada
59
ao processo para definir as relações entre crenças e conhecimento. O que os dois têm em
comum é o fato de serem construídos ao longo do tempo por meio de interação sociais e
porque em ambos os casos as novas informações o interpretadas a partir do conhecimento
pré-existente. A diferença é que a construção do conhecimento parte de “como as coisas são”,
enquanto que a construção das crenças envolve juízo de valor e talvez parta de “como as
coisas devem ser”. Por causa dessa forte relação entre crenças e conhecimento, em vez de
usar somente o termo “crenças”, cunhou a sigla BAK (“Beliefs, Assumptions and
Knowledge”, ou “Crenças, Pressuposições e Conhecimento”).
Kalaja (1995), Barcelos (2001), Woods (2003) e Barcelos (2004) dão maior atenção à
investigação das crenças dos aprendizes, embora seus estudos sejam, em muito,
generalizáveis para o estudo de crenças de professores. O quadro abaixo resume alguns
exemplos de trabalhos sobre crenças de aprendizes. o relevantes para este estudo
principalmente porque o professor filtra aquilo que percebe em um curso de capacitação
profissional através de suas experiências de aprendizagem (Gimenez, 1994). Pesquisas com
esse enfoque podem ajudar a traçar o perfil contextual das professoras envolvidas no presente
estudo.
60
ALGUNS TRABALHOS SOBRE CRENÇAS DE APRENDIZES
Pesquisador(a) (Alguns) Objetivos Informante(s) e Contexto Instrumentos Algumas Conclusões
Wenden (1987) Identificar crenças de
aprendizes de L2 sobre a
melhor maneira de
aprender essa nova
língua.
25 adultos residentes nos EUA
no máximo dois anos e aprendizes
de um programa de ensino de
inglês em nível avançado.
Entrevista semi-
estruturada,
gravada e
transcrita.
Os achados do estudo foram divididos em três
grupos, sob a forma de declarações: Grupo 1: O uso
da língua (Ex: “Pense na L2”); Grupo 2:
Aprendizagem sobre a língua (Ex: “Aprenda com
seus erros”); Grupo 3: A importância de fatores
pessoais (Ex: “O auto-conceito facilita/inibe a
aprendizagem”. )
Huang e Tsai
(2003)
Investigar as diferenças
entre as crenças de
aprendizes de inglês com
um alto nível de
proficiência lingüística
(AANP) e aqueles com
baixo nível de
proficiência (ABNP).
89 estudantes de duas turmas de
High School em Taiwan.
BALLI, GEPT
(General English
Proficiency Test
Teste de
Proficiência em
Inglês em Geral) e
entrevista.
Os AANP tendem a ter crenças mais positivas
quanto à aprendizagem que os ABNP. Alega-se que
os fatos de sustentação das discrepâncias podem
sem: as percepções dos aprendizes das reações dos
colegas de turma quanto à seu desempenho, a
formação da auto-eficácia dos aprendizes, a
influência dos métodos de ensino utilizados pelo
professor sobre as crenças dos aprendizes, as
instruções sobre estratégias de comunicação em
inglês e o impacto das crenças dos pais sobre as
expectativas dos aprendizes quanto ao aprendizado
de LE.
Silva (2003) Explicar como os
aprendizes de uma escola
pública de ensino médio
encaram a aprendizagem
de inglês e levar
professores e aprendizes a
refletirem sobre suas
crenças, atitudes e
pressupostos.
Dez estudantes entre 15 e 18 anos
do ano do Ensino Médio em
uma escola pública do DF e uma
professora de inglês licenciada em
Letras Português/Inglês
Observação,
questionários,
entrevistas e
gravações de
aulas.
Os estudantes acreditam que estudar inglês tem a
única função de habilitá-los a passar no vestibular e
mostram desinteresse pela aprendizagem. Apesar
dos esforços da professora em ser mais comunicativa
usando jogos, vídeos e bingo, isso o atende às
crenças e expectativas dos aprendizes. A abordagem
de ensinar influencia a cultura de aprender dos
aprendizes, pois tanto eles quanto a professora estão
desmotivados.
Quadro 2: Alguns trabalhos sobre crenças de aprendizes.
Em se tratando do desenvolvimento do estudo de crenças de professores, Gimenez
(1997) e Abrahão (2004) explicam que houve uma mudança no perfil dos cursos de
capacitação profissional. Em vez de estarem voltados para “treinar” professores para aplicar
um determinado método, hoje entende-se que o método não tenha a eficácia antes imaginada
(Allwright, 2003). Assim, a opção agora é por uma abordagem de educação de professores,
voltada para a investigação e reflexão crítica e uma menor dependência de teorias
lingüísticas. Essa nova visão confere valor à pesquisa sobre crenças de professores.
Na LA, as crenças de professores têm recebido rótulos variados, como os seguintes,
citados por Gimenez (1994): Abrahão (2004) e Silva (2006): “teorias populares” (Lakoff,
1985), “conhecimento prático” (Elbaz, 1981), “perspectiva” (Janesick, 1982), “conhecimento
prático pessoal (Elbaz, 1981), “teoria prática (Handal e Lauvas, 1987), "teoria implícita”
(Breen, 1985; Clark, 1988), “imagens” (Calderhead e Robson, 1991), “teorias práticas
pessoais” (Connely e Clandinin, 1998), “conhecimento estratégico do professor (Shulman,
1986), “crenças e princípios” (Munby, 1983), “crenças, pressuposições e conhecimentos”
(Woods, 1996), além de “teorias pessoais” (Pessoa; Sebba, 2006).
Silva (2006) afirma que a profusão de termos é indício da importância da área e
mostra que há ainda muito potencial de pesquisa neste campo.
Gimenez (1994) trata mais minuciosamente desse tipo de investigação quando revela
que os estudos sobre o pensamento do professor m sido um grande auxílio para tentativas
de se compreender como professores de LE aprendem a ensinar. A justificativa é que ambos
os campos têm um ponto em comum: um interesse na ação (que envolve interpretação de
significados) em vez de apenas no comportamento (o ato físico em si). Narra então que o
estudo sobre o pensamento do professor brotou de uma insatisfação com os métodos
behavioristas, nos anos 70. Sob a influência da psicologia cognitiva, surgiram dois modelos
para explicar o pensamento do professor: o de tomada de decisão (que parte da hipótese de
que os professores escolhem entre alternativas) e o de processamento de informação
(radicado em como os professores definem as situações de ensino e como estas definições
influenciam seu comportamento). O modelo construtivista, mais recente, tem seu eixo no
princípio de que a teoria pessoal do mundo abraçada pelo professor é constantemente
construída, reelaborada e testada por ele. Os estudos que partem desses modelos se
subdividem em três áreas: a) planejamento; b) cognição e interação e c) teorias e crenças. O
último campo é de particular interesse para estudos que preconizam a resistência de
professores a inovações e a lacuna entre teorias de pesquisas, ou teorias externas, e as teorias
pessoais dos professores e é relativamente recente dentro das pesquisas sobre ensino de LE.
Assim, Gimenez (1994) cita alguns estudos a respeito de crenças de professores em
formação (por exemplo, Cumming (1989), Freeman (1991a); Gutierrez (1992); Richards, Ho
e Giblin (1992) e Johnson (1994)) e ainda outros sobre crenças de professores (Dingwall
(1985), Zuber-Skerritt (1989), Breen (1990), Burns (1991), Richards et al. (1991)). A autora
comenta que trabalhos como os de Dingwall e Richards et. al., por usarem somente
questionários e recorrer a um número grande de informantes, “tendem a perder a perspectiva
individual que constitui as teorias dos professores, que estas estão ligadas a suas ações na
sala de aula”
57
(Gimenez, 1994, p. 25), o que faz com que as crenças sejam expressas de
forma idealizada. Estudos que associam crenças às práticas de ensino têm necessariamente
que trabalhar com poucos informantes, como no caso de Breen (1990) e Burns (1991).
Assim, a investigação sobre crenças de professores pode estar voltada para o ensino em
termos gerais, ensino em termos específicos e pode também se referir a uma situação real
comentada pelos professores ou ainda hipotética, idealizada também por eles, de modo que,
quanto mais específica for a pesquisa, mais centrada na realidade estará.
Todos esses estudos se limitam a descrever crenças, porém “além de capturar as
teorias e as crenças dos professores, precisamos também compreender como essas teorias são
formadas e desenvolvidas”
58
(Gimenez, 1994, p. 34). Daí a importância da investigação na
área de socialização
59
de professores, a qual constitui uma perspectiva de construção coletiva
de significados em vez de uma mudança por imposição interna.
A socialização de professores relaciona-se à perspectiva sócio-construtivista de
aprendizagem de L2 [e LE] de Woods (2003). Ao mencionar a zona proximal de Vygotsky, o
autor alega que o conhecimento é construído ativamente, e o recebido passivamente. Ou
seja, o conhecimento é recriado a partir da interação entre adulto e criança, ou, no campo
profissional e acadêmico, entre especialistas e novatos, mestres e aprendizes, “veteranos” e
“calouros”. Barcelos (2005, p. 160) corrobora essa visão ao afirmar que:
57
... tend to lose the individual perspective that constitutes the teachers’ theories as these are linked to their
actions in the classroom.
58
.. besides capturing teachers’ theories, we also need to understand how these theories are formed and
developed,...
59
Segundo Gimenez (1997, p. 3), a socialização é definida como o processo pelo qual todas as experiências
de vida ajudam a moldar o sistema de crenças e valores desses profissionais [os professores].
63
Professores e aprendizes possuem seus hábitos, costumes e expectativas sobre aprendizagem de
língua estrangeira que são sustentados e legitimamente aceitos na sociedade. Ao mesmo tempo em
que esses bitos e crenças são interiorizados coletivamente, eles também o resignificados
individualmente de acordo com a cultura específica de cada um.
Em se tratando de formação de professores, visões controversas sobre o momento
em que as experiências sociais do indivíduo exercem maior influência na formação de
crenças (Gimenez, 1994). Alguns pesquisadores crêem que as crenças são moldadas antes da
educação profissional, durante o tempo que o professor passou na escola no papel de
aprendiz, a chamada “aprendizagem de observação”, termo usado por Lortie (1975, apud
Gimenez, 1994) e que essas crenças tendem a não mudar, mas atuam como “filtro” na medida
em que os futuros professores utilizam-se do pré-serviço para confirmar, e o para
confrontar, as crenças trazidas consigo (Zeichner et al., 1987; Calderhead; Robson, 1991;
Zuzovsly, 1995, todos citados por Cabaroglu e Roberts, 2000). outros documentam
mudanças de crenças de professores (Kyriacou; Cheng, 1993; Rodriguez, 1993; Bullough;
Stokes, 1994; Anderson; Bird, 1995; Bramald et. al. 1995; Sendan, 1995; Sendan; Roberts,
1998, todos citados por Cabaroglu e Roberts 2000). Kagan (1992, apud Cabaroglu e Roberts,
2000) acredita que o problema dessa inflexibilidade dos professores em formação se deve não
às crenças pré-existentes, mas ao fato de os cursos de capacitação docente não encorajarem
os novatos a expor suas crenças. Kudiess (2005) declara que o que gera a mudança de crenças
de professores é também a informação teórica, mas principalmente uma situação de confronto
e que as crenças que os professores adquiriram enquanto aprendizes de LE permanecem com
eles, e aquelas que adquiriram mais tarde através da experiência na prática docente, faculdade
ou cursos de desenvolvimento são mais passíveis de sofrerem mudanças. Pessoa e Sebba
(2006) ponderam que a mudança das teorias pessoais dos professores, ou “conhecimentos
que eles m sobre sua prática não ocorre com facilidade, mas é necessária. Atestam que
essa mudança é gradual e acontece a partir de experimentações simples até que o profissional
esteja convencido de que sua filosofia de ensino deve ser revista. Basso (2006) argumenta
que, muitas vezes, a prática do docente destoa de seu discurso teórico, pois reproduz os
fazeres de sua formação inicial e continuada e sugere que pesquisas que aliem o mundo
acadêmico à prática de sala de aula podem ser agentes transformadores nesse sentido.
Barcelos (2005) ressalta a necessidade de os programas de formação de professores
proporcionarem espaço para que professores discutam suas crenças sobre aprendizagem e
tornem explícitas suas crenças sobre as crenças de aprendizes. Gimenez (1994) atesta que
64
alguns programas de educação de professores tratam as experiências prévias dos futuros
docentes simplesmente como algo a ser superado para que a reprodução dessas experiências
não ocorra. Argumenta, contudo, que essa atitude pode muito mais incentivar a reprodução
de comportamentos, uma vez que ignoram o passado dos futuros professores, principalmente
na escola. Sugere, então, que se ouça as experiências desses profissionais em potencial por
meio de autobiografias geradas em narrativas a fim de levá-los a refletir sobre a própria
identidade. É exatamente isso que ela faz ao envolver em sua pesquisa estudantes do e
ano de um curso de Letras e 10 professores, egressos da mesma universidade, com níveis
variados de experiência de ensino e utilizando de narrativas, questionários, diários, grade de
repertórios e entrevistas. Gimenez (1994, p. 293) conclui que “a conscientização a respeito da
prática de ensino tem que ultrapassar o contexto imediato da sala de aula e relacioná-lo a
forças institucionais e sociais mais amplas”.
60
Em minha pesquisa, procurei seguir os passos de Gimenez no sentido de tentar
retratar aspectos do ensino de LE no Brasil em relação à tradução e ao Inglês Instrumental e,
em seguida, dar voz a três professoras de Instrumental para que expressem suas opiniões a
respeito de sua prática e relatem um pouco de suas experiências prévias, tanto como
estudantes quanto como docentes.
Os quadros abaixo apresentam informações básicas sobre alguns outros trabalhos a
respeito de crenças de professores em formação e crenças de professores já atuantes.
60
… the awareness of teaching practices has to go beyond the immediate context of the classroom and to link
them to wider social and institutional forces.
65
ALGUNS TRABALHOS SOBRE CRENÇAS DE PROFESSORES EM FORMAÇÃO
Pesquisador(a) (Alguns) Objetivos Informante(s) e Contexto Instrumentos Algumas Conclusões
Cabaroglu e
Roberts (2000)
Testar se as crenças de
professores em pré-
serviço são inflexíveis.
25 professores em pré-serviço em
um curso de ensino de línguas
estrangeiras modernas de 36
semanas com enfoque reflexivo e
experiencial, montado pela
University of Reading, no Reino
Unido.
Autobiografias,
entrevistas e
questionários.
As crenças de apenas um participante parecerem
permanecer inalteradas. Quanto aos outros 19, a
mudança de crenças ocorreu gradualmente. O fato de
o curso contar com um forte elemento de
conscientização e discussão a respeito de crenças
pré-existentes logo no início contribuiu para a
ocorrência de mudanças.
Peacock (2001) Um estudo longitudinal
com o fim de investigar
possíveis mudanças de
crenças sobre
aprendizagem de L2 dos
informantes.
146 professores de inglês em
formação durante os 3 anos de
curso pela Universidade da cidade
de Hong Kong .
BALLI,
pontuação de
proficiência em
língua inglesa
obtida pelos
participantes nos
cursos
compulsórios de
inglês, instruções
sobre como
corrigir crenças
prejudiciais ao
aprendizado e
observações.
Houve pouquíssimas mudanças nas crenças dos
informantes ao longo dos 3 anos de curso. Ao final
dele, a maioria dos estudantes ainda acreditava que
a) aprender uma L2 significa aprender muito
vocabulário e regras gramaticais e b) as pessoas que
falam mais de uma ngua fluentemente são mais
inteligentes. Como implicações destas crenças para
sua carreira profissional, esses futuros professores
poderão: a) centralizar seu ensino em vocabulário e
gramática e b) atribuir falta de inteligência como
sendo o problema de futuros aprendizes mais lentos.
Nicolaides e
Fernandes (2002)
Mostrar e posicionar-se
diante de crenças e
atitudes de aprendizes de
LE que resistem à
autonomia.
24 aprendizes de nível básico de
proficiência em LE do curso de
Letras de uma universidade
particular do sul do Brasil.
Tarefas de
compreensão oral
e escrita a serem
desenvolvidas em
um laboratório de
línguas equipado
com recursos
audiovisuais e
computadores,
reuniões,
relatórios,
gravação,
transcrição, fichas
de avaliação
Percepções: a) os estudantes sentem a necessidade
de vincular o que está sendo visto em sala de aula às
tarefas no laboratório; b) dificuldades dos estudantes
em perceber os benefícios do uso do laboratório; c)
consciência, por parte de alguns aprendizes, da
necessidade de melhor gerenciamento de tempo; d)
resistência dos aprendizes à utilização de recursos
tecnológicos.
Barcelos, Batista e
Andrade (2004)
Crenças de estudantes do
6º período de Letras sobre
o que é ser professor de
inglês, quais as suas
expectativas a esse
respeito e quais
dificuldades perceberam
em sua formação
profissional.
15 aprendizes de Letras do
semestre de uma universidade
federal do estado de Minas
Gerais.
Questionários
abertos,
entrevistas e notas
de campo,
Crenças constatadas: para ser professor é necessário
não ter domínio dangua Inglesa, como também
excelente desempenho lingüístico; é necessário
dominar gramática para poder ter a confiança do
aprendizes; o bom professor deve gostar do que faz,
ser paciente e criativo; não se aprende inglês na
escola pública, por isso, o trabalho do professor é
mais fácil nessas escolas. Esta última crença
contribui curiosamente para a profecia auto-
realizadora: aqueles que não tiveram um bom ensino
na escola pública acreditam que não adianta fazer
investimentos significativos neste ambiente e
reforçam o ciclo vicioso.
Abrahão (2004) Investigar quais crenças,
pressupostos e
conhecimentos são
trazidos pelos aprendizes-
professores ao programa
de formação inicial
desenvolvido na
universidade e quais as
origens dessas crenças e
desses pressupostos e
conhecimentos.
6 aprendizes-professores de um
curso de licenciatura em Letras.
Autobiografias
por escrito,
sessões de história
de vida,
questionário,
inventário de
crenças adaptado
de Horwitz
(1987), relatório
do aprendiz-
professor.
Exemplos de algumas crenças: a) concepção da
linguagem: princípio social e forma de agir no
mundo; b) concepções de ensino: transmissão de
conhecimento, colocar o aprendiz em contato com
conteúdos relevantes em um processo crítico e
reflexivo; c) concepções de aprendizagem: está
ancorada no conhecimento, controle do
conhecimento socialmente aceito; d) o bom
professor de línguas: altamente proficiente na língua,
capaz de usar uma boa metodologia, consciente da
realidade e das dificuldades do aprendiz, capaz de
usar estratégias adequadas para o ensino, bem
sucedido no ensino da fala e da escrita, reflexivo,
consciente e crítico, capaz d ensinar cultura e as
diferentes formas de conhecimento.
Barcelos (2005) Investigar como se
caracteriza a cultura de
aprender línguas de um
grupo de aprendizes no
último período de Letras.
14 aprendizes do último período
de língua inglesa de um curso de
Letras de uma universidade
federal no interior de um estado
do sudeste brasileiro.
Questionário,
entrevistas semi-
estruturadas
transcritas;
gravações de aula
em áudio; diário
da professora-
pesquisadora e
notas de campo.
Algumas crenças constatadas: a) aprender línguas é
saber sobre a estrutura dessa língua e adquirir
conhecimentos a esse respeito; b) o professor é
responsável pela aprendizagem do aprendiz; c) o
exterior é o lugar ideal para aprender a LE porque
neste ambiente não seria necessário tanto esforço e a
aprendizagem é rápida; d) a concepção de linguagem
sugerida é a de aquisição de palavras.
Concluiu-se que a experiência educacional anterior
dos aprendizes exerce grande influência sobre as
67
crenças desses estudantes
Silva (2006) Levantar as crenças, os
aglomerados de crenças e
as suas possíveis origens
entre os aprendizes
ingressantes num curso de
Letras.
Uma professora de inglês e seis
aprendizes de Letras de uma
universidade pública no interior
de São Paulo.
Questionários,
entrevistas semi-
estruturadas,
gravações de
aulas em áudio e
vídeo,
observações
diretas, notas de
campo.
Crenças sobre o ensino e a aprendizagem de línguas:
ensinar LE é ter conhecimento de sua totalidade,
para aprender inglês em sua totalidade é preciso
viver em um país onde se fala essa língua; c) é muito
difícil aprender inglês em uma escola pública; d)
aprende-se somente o sico na escola pública; e)
quanto mais cedo se iniciar o processo de
ensino/aprendizagem de uma LE, melhor; f) para
aprender uma LE é preciso falar o tempo todo; g) o
aprendizado de uma LE depende do aprendiz; h) é
possível aprender uma língua em pouco tempo e
com pouco esforço; i) não se deve usar português em
sala de aula se você quer aprender inglês; j) a língua
inglesa é mais cil do que a língua portuguesa; l) a
aprendizagem de uma língua depende mais do
professor que do aprendiz.
Quadro 3 : Alguns trabalhos sobre crenças de professores em formação
ALGUNS TRABALHOS SOBRE CRENÇAS DE PROFESSORES
Pesquisador(a) (Alguns) Objetivos Informante(s) e Contexto Instrumentos Algumas Conclusões
Martins (2001) Sondar as crenças de
professores de LE sobre as
Cinco professores de inglês de
uma escola privada de inglês de
Observações,
notas de campo,
Dois dos professores procuram refletir sobre sua prática e
sobre teorias que a embasam a ponto de confrontar seus
68
dificuldades do aprendiz
adulto em sala de aula, bem
como a correspondência
entre tais crenças e a prática
dos profissionais.
Brasília com formação superior e
com experiência de ensino entre 8
e 22 anos.
gravações em
áudio,
questionário,
entrevista.
sistemas de crenças com a realidade de sala de aula e se
dispor a alterar seu proceder. Os outros três encaram o
ensino como transmissão de conhecimentos e
preocupam-se mais com o cumprimento do programa do
que com a necessidade de aprendizes. Para estes, suas
crenças permanecem inconscientes ou pouco articularas
internamente.
Sakui e Gaies
(2003)
Descobrir que tipos de
crenças uma professora
pesquisadora tem e como
essas crenças estão situadas
em seu ambiente de ensino,
além de relacionar essas
crenças a suas identidades.
Uma das autoras do artigo em seu
ambiente de ensino: 23 estudantes
de uma turma de redação em
inglês de uma universidade
particular no Japão.
Auto-estudo,
narrativas e
análise de dados
em equipe.
a) A professora o ensino como muito mais que
transmissão de conhecimentos de professor para
aprendiz; b) seu ensino reflete e usa muito de suas
experiências de vida e profissional, que derivam de suas
muitas identidades sociais.
Cunha (2003) Verificar as mudanças na
prática de sala de aula
causadas por um curso que
propõe reflexão e se a
prática reflexiva favorece a
construção de novas
identidades.
5 professores de inglês escolas
públicas de São Paulo concluintes
de um curso de formação contínua
oferecido por uma universidade e
uma escola de idiomas.
Questionário,
narrativa,
entrevista semi-
estruturada,
gravação de aula,
descrição de aula,
descrição de aula
do curso, relato de
mudanças
percebidas após o
curso.
Algumas mudanças de paradigmas dos professores após
o curso: a) quanto à teoria de ensino-aprendizagem: de
tradicional e behaviorista a cognitivista e sócio-
interacional; b) quanto à linguagem: de conteúdo a ser
passado a sistema facilitador de comunicação social: c)
quanto ao papel do aprendiz: de passivo a ativo; d)
quanto ao papel do professor: de transmissor de
conhecimento a facilitador e guia; e) quanto às tarefas
executadas: de tradução de textos palavra por palavra a
comparações com a LM; f) quanto ao material utilizado:
de lousa e giz a fitas, filmes, músicas e poesia.
Constatou-se que o curso realmente causa mudanças nas
práticas dos professores.
Belam (2004) Analisar a interação entre a
cultura de avaliar de uma
professora de inglês e a de
aprendizes.
Uma professora de inglês e 10
aprendizes do ano do curso de
Letras em uma universidade
particular do interior do estado de
São Paulo.
Questionários,
histórias de vida,
entrevistas,
observações de
aulas, gravações
em áudio,
anotações de
campo e diários.
a) Apesar de possuírem uma cultura de avaliar
predominantemente classificatória, professora e
aprendizes têm consciência dos benefícios da avaliação
formativa, o que se revela em seu discurso e ações; b)
sua prática avaliatória predominante é justificável por
fatores contextuais, tais como: falta de tempo da
professora, pressões institucionais e crenças e
concepções decorrentes de experiências acadêmicas,
profissionais e pessoais prévias da professora e
aprendizes.
Vechetini (2005) Investigar as crenças de dois
professores de inglês como
Dois professores de inglês de uma
escola de idiomas do interior do
Questionários,
entrevistas,
a) Os informantes acreditam queos aprendizes
apresentam dificuldades devido ao baixo conhecimento
69
LE de uma escola de
idiomas com relação ao
ensino de vocabulário para
aprendizes iniciantes.
estado de São Paulo observações de
aula, gravações
em áudio e vídeo
e anotações de
campo.
lexical da LE; b) os participantes ensinam vocabulário de
forma aleatória e acreditam que este ensino deve ocorrer
em resposta a uma pergunta dos aprendizes; c) os
informantes declaram ser favoráveis ao uso de estratégias
de ensino/aprendizagem de vocabulário, mas raramente
as utilizam.
Kudiess (2005) Conhecer as crenças de
professores de inglês sobre o
ensino e aprendizagem de
línguas, especialmente sobre
o ensino da gramática,
entender as origens e
evolução dessas crenças e
como elas se modificam.
10 professores de inglês como LE
de escolas particulares de língua,
sendo 5 formados em Letras (dois
com formação com enfoque em
tradução), 1 com mestrado em
língua e 4 com outros cursos de
bacharelado
Entrevistas sem-
estruturadas,
recordações
estimuladas e
observações de
aula.
a) Exemplo de crença em comum dos informantes sobre
gramática: falar inglês é mais importante que estrutura e
regras gramaticais; b) a experiência como aprendiz de LE
e como profissional influencia suas crenças.
Pessoa e Sebba
(2006)
Analisar se a estratégia de
reflexão interativa,
estimulada pela prática e
teoria, provoca mudanças
nas teorias pessoais e na
prática pedagógica de uma
professora.
Uma professora do Centro de
Línguas da Universidade Federal
de Goiás.
Gravações em
vídeo, sessões de
reflexão
interativa,
gravação e
transcrições das
sessões, notas de
observação de
aula.
a) Exemplo de mudança nas teorias pessoais e na prática
pedagógica: a informante achava que uma aula toda em
inglês é muito difícil nos níveis iniciais porque os
aprendizes recorrem à língua materna. Depois de
observar uma aula gravada de uma outra colega, toda na
língua-alvo, deixou de usar a LM em sala de aula e
concluiu que o professor não deve usar português em
sala para não dar abertura pra que eles [os aprendizes]
também comecem a falar”.
Garbuio (2006) Descrever as crenças que
compõe a competência
implícita de um professor e
quais suas possíveis origens.
Um professor de uma escola
particular de inglês.
Questionários,
diários e
entrevista.
Algumas crenças: falar inglês em sala de aula, ser um
“professor show”, proporcionar atividades interessantes e
ensinar gramática. A primeira professora de inglês, o
professor que dava treinamentos e a troca de idéias com
outros profissionais da área parecem ser a origem dessas
crenças.
Quadro 4 : Alguns trabalhos sobre crenças de professores
70
Os trabalhos acima mencionados representam diferentes facetas e abordagens da curta
tradição do estudo de crenças e servem para nortear a presente pesquisa. O que se nota neles,
de forma geral, é que: a)as experiências de fato têm grande influência sobre as crenças; b) os
axiomas imperialistas apresentados por Phillipson (1993) ainda ecoam no ensino de inglês
como LE e c) os princípios de abordagens mais tradicionais de ensino ainda têm forte
influência sobre os professores (Neves, 1998).
Alguns trabalhos o de maior relevância para esta pesquisa por estarem de algum
modo relacionados à investigação de crenças sobre tradução, uso de LM, leitura e Inglês
Instrumental.
lix (2005), por exemplo, investigou as crenças de duas professoras de uma escola
blica de ensino fundamental e médio no interior do estado de São Paulo. Embora não se
preste diretamente a investigar crenças sobre tradução, descobriu, entre outros achados, que
ambas as informantes são contrárias ao uso de tradução em sala de aula, mas que recorrem a
ela com freqüência considerável. É interessante notar que os trechos das transcrições de aula
destacados por Félix mostram apenas o uso de uma tradução pontual, ou seja, de palavras
e/ou expressões isoladas.
Em se tratando da relação entre tradução e aprendizes, uma das perguntas feitas aos
estudantes no estudo de Huang e Tsai (2003) foi : “Você acha que a tradução é importante na
aprendizagem de línguas?”. Os resultados atestam que os aprendizes com alta proficiência
lingüística na LE acreditam que podem inferir os significados da língua se tiverem acesso a
materiais de compreensão oral e escrita. os aprendizes com baixa proficiência lingüística
acreditam que a tradução é uma habilidade importante de auxílio na compreensão de
significados em textos em inglês. Diante disso, os autores advertem que os aprendizes de
baixa proficiência m essa reação como reflexo de o MGT ter sido usado por muito tempo
em Taiwan, ambiente pesquisado. Essas evidências, em confronto com toda a discussão
travada aqui sobre tradução, apontam para duas conclusões: a) a tradução pode ser um
mecanismo para reduzir a ansiedade dos aprendizes; b) as crenças dos professores sobre
tradução podem influenciar na formação de seus aprendizes e c) os próprios pesquisadores
têm uma concepção distorcida de tradução, na medida em que a associam ao MGT, e não a
uma necessidade inerente dos aprendizes de usar a LM.
Pagano (2003a) aborda diretamente crenças sobre tradão. Duff (1989) e Ridd
(2000), também mencionam algumas idéias pré-concebidas a esse respeito. Exceto Pagano,
os demais autores não usam o termo “crenças” diretamente, mas acredito que as informações
que trazem se assemelham muito ao conceito de crenças tomado como referência aqui.
Philipps (2003) propõe-se a investigar as crenças e as práticas de quatro professores
de inglês em um curso de Letras e chegou a um curioso resultado: embora os professores
discriminem o uso da tradução como recurso de ensino em suas falas, fazem uso
indiscriminado dela em sua prática docente.
também os estudos de Macaro (1997); Turnbull (2001a) e Turnbull e Lamourex
(2001) todos citados por Turnbull e Arnett (2002) a respeito de crenças de professores
sobre o uso da língua-alvo e da língua materna. Macaro mostrou que professores, daquilo que
se assemelha ao Ensino Médio brasileiro no País de Gales, usam a LM com maior freqüência
para esclarecer instruções, dar feedback, traduzir e checar a compreensão dos aprendizes.
Quanto às suas crenças constatou-se que reprovam o uso exclusivo de língua-alvo em todas
as turmas, exceto as mais motivadas. A maioria dos professores também indicou que a
intensidade do uso que fazem da língua-alvo depende da capacidade dos aprendizes e
alegaram que é mais fácil usar a língua-alvo com aprendizes mais jovens.
Turnbull e Turnbull e Lamoureux investigaram as experiências, crenças e ações sobre
o uso da língua-alvo e LM de candidatos a professor de L2 e LE em pré-serviço, antes e
depois do estágio. Antes do estágio, os informantes estavam convencidos de que o professor
deve usar a língua-alvo, inclusive fazendo referências positivas à imersão. Alem disso,
muitos consideravam a LM útil para ensinar gramática, disciplinar os aprendizes, interagir
informalmente e fazer brincadeiras. Depois, houve drástica diminuição no número de
informantes que antes acreditavam que a LM era necessária para ensinar gramática.
Carmagnani (2002), discutido na seção 2.2.3., investiga crenças de aprendizes de
Letras-Inglês sobre a leitura, enquanto Ramos (2005), como foi abordado na seção 2.2.2.,
menciona crenças sobre Inglês Instrumental.
Scott (2005b) levanta algumas crenças ao que chama de common
misapprehensions, ou mal-entendidos comuns sobre a leitura que os aprendizes trazem
consigo: a leitura é passiva e é um processo palavra-por-palavra, deve-se ler um texto apenas
uma vez, não é apropriado retornar em algum ponto para esclarecimento de dúvidas durante a
leitura, o objetivo da leitura deve ser compreender e lembrar de praticamente tudo em um
texto, o texto deve ser lido exatamente na ordem em que foi escrito, a função primordial de
um texto é informar, um texto autêntico não é apropriado para leitores iniciantes. Scott
72
sugere, então, que estes “mal-entendidos” sejam diluídos perante os aprendizes por meio de
experimentos e demonstrações simples, em vez de por meio de uso de terminologia técnica.
Conceição (2004) analisa as experiências anteriores de aprendizagem de LE dos
informantes, suas crenças sobre o vocabulário e o dicionário e a influência das experiências
sobre suas ações na aprendizagem. Participaram de sua pesquisa 51 informantes de uma sala
de aula de língua instrumental de uma universidade pública de Minas Gerais. Os
instrumentos utilizados no estudo foram uma tarefa de leitura, questionários, entrevistas
individuais e um teste de retenção. A pesquisadora concluiu que as experiências anteriores
dos aprendizes fazem parte do processo de formação de crenças e também influenciam suas
ações em sala de aula. Um indício disso é o fato de os estudantes repetirem sua experiência
no ensino médio de utilizar o dicionário durante a realização da tarefa de leitura, mesmo que
esse procedimento não contribua de forma significativa para a retenção de vocabulário.
Barcelos (2006) faz um balanço da investigação sobre crenças. De acordo com a
autora, os trabalhos iniciais sobre crenças preocupavam-se com a identificação destas, sua
influência na prática do professor e na aprendizagem do aprendiz e relações entre crenças e
ensino e aprendizagem autônomos. Atualmente, o estudo de crenças se divide em categorias
não-excludentes, a saber: investigação de crenças relacionadas a fatores mais específicos,
como gramática, leitura, tradução e outros; crenças e sua relação com o contexto e
experiências, crenças e o processo de reflexão, crenças e metáforas, uso de referenciais
teóricos diversos, como Bakthin, Vygotsky e Dewey; estudos mais longitudinais; crenças e
identidade, foco na escola pública e relação entre crenças de aprendizes e professores. Nota-
se no presente momento uma procura pela função das crenças na aprendizagem e ensino e
maior preocupação com a contextualização das crenças (p. ex., em escolas públicas). São
sugeridos para futuras pesquisas temas como formação de professores; investigação em
contextos diversificados para que seja possível alcançar padrões cognitivos entre professores
que trabalham em contextos semelhantes; a influência dos diversos métodos sobre a maneira
como professores e aprendizes refletem sobre suas crenças; a influência do pesquisador na
elicitação de crenças e questões de formulação de perguntas de entrevistas e questionários; a
estrutura da cognição do sistema de crenças; relações entre crenças e cultura; crenças sobre
outras línguas estrangeiras; crenças mais comuns encontradas em diversos contextos
brasileiros; e melhor entendimento da relação entre contexto, crenças e ações.
73
2.3.2. Definição
Em Barcelos (2006, p. 18), crenças são definidas como se segue:
Entendo crenças, de maneira semelhante a Dewey (1933), como uma forma de pensamento, como
construções da realidade, maneiras de ver e perceber o mundo e seus fenômenos, co-construídas em
nossas experiências e resultantes de um processo interativo de interpretação e (re)significação. Como
tal, crenças são sociais (mas também individuais), dinâmicas, contextuais e paradoxais.
Em relação aos fins desta pesquisa, a definição acima parece-me a mais plausível
encontrada. Tanto que vale a pena dar um pouco mais de voz a Dewey (1933). O filósofo
explica que o significado do pensamento está limitado a crenças, as quais se apóiam em
algum tipo de evidência ou testemunho daquilo em que se crê. Prossegue revelando que as
crenças podem, então, partir da tradição, instrução ou imitação. Ademais, esses fatores são
influenciados por algum tipo de autoridade, além de serem preconceitos, pré-julgamentos, e
não julgamentos embasados em um levantamento de evidências. Assim, quando um
indivíduo enfrenta alguma dificuldade, surgem, em sua mente, sugestões de como resolver o
problema. Tais sugestões estão radicadas na experiência e no conhecimento prévio dessa
pessoa.
Dewey admoesta o leitor que, diante disso, é necessário estar sensível àquilo que é
incerto e questionável. Lamenta que, embora em algumas pessoas a curiosidade intelectual
seja tão insaciável que não pode ser desencorajada por nada, em outras ela é rapidamente
enfraquecida por indiferença, negligência, frivolidade, ou por falta de relevância pessoal. Em
se tratando de professores, lembra que eles precisam ter consciência de que são responsáveis
por propagar, por estimular o questionamento, a reflexão. Conceição (2004) corrobora este
pensamento quando afirma que não só as pesquisas na área de aprendizagem de línguas, mas
também os professores, deveriam se preocupar mais com as experiências de aprendizagem de
aprendizes no passado e ajudá-los a refletir sobre elas. Creio que, antes de chegar neste
estágio, é necessário que os professores repensem suas próprias experiências e as influências
delas sobre aquilo que acreditam.
Assim, segundo Barcelos (2004, p. 129), Dewey define crenças como “todos os
assuntos para os quais ainda não dispomos de conhecimento certo, dando-nos confiança
suficiente para agirmos, bem como assuntos que aceitamos como verdadeiros, como
conhecimento, mas que podem ser questionados no futuro. Barcelos (2000 e 2005) explora
74
de modo mais profundo o conceito deweyano de experiência quando esclarece que os
professores e aprendizes devem ser vistos como seres humanos que têm modos particulares
de interpretar os eventos em sala de aula e que suas crenças devem ser encaradas como parte
de um contexto. Nesta perspectiva, define experiência como não sendo “um estado mental,
mas a interação, adaptação e ajuste de indivíduos a um ambiente. É a maneira humana de
estar no mundo”
61
(Barcelos, 2000, p. 15). Isso implica em dizer que nada existe em
isolamento, mas em relação, e que as pessoas constroem significados a partir das situações
que vivem. Assim, as experiências são regidas por dois princípios: o da continuidade e o da
interação. O primeiro representa a conexão entre as experiências passadas e futuras. Por
exemplo, a aprendizagem, “é um reflexo das continuidades que estabelecemos dentro da
experiência. É o processo de dar significado àquilo que experimentamos e fazer conexões
como o que está por vir”
62
(Barcelos, 2000, p. 16). O segundo representa o intercâmbio entre o
indivíduo e o ambiente, em que este indivíduo molda e é moldado pela interação.
Desta forma, segundo Barcelos (2003a), as crenças são parte de nossas experiências e
têm natureza paradoxal: ao mesmo tempo em que promovem o conhecimento, servem-lhe de
obstáculo, pois as barreiras criadas pelas crenças podem desencadear o pensamento reflexivo.
Em outras palavras, sem crenças, não haveria dúvidas ou problemas para servirem de base
para a investigação reflexiva. Além disso, Dewey pressupõe que as crenças estão
interconectadas com identidades, que o conceito deweyano de experiência implica no
relacionamento orgânico entre indivíduos e o ambiente em que moldamos e somos moldados
pela avaliação dos outros sobre o nosso comportamento. Por isso, identidade, aprendizagem e
crenças o inseparáveis, além de que nossa identidade social envolve a soma de todos os
grupos dos quais somos membros competentes e reconhecidos. Uma grande contribuição de
Dewey para o estudo de crenças é o questionamento da investigação descontextualizada de
crenças ao conectar as crenças dos professores e dos aprendizes sobre LE às suas ações e
experiências.
O caminho trilhado por Almeida Filho para chegar às crenças é igualmente
interessante aos propósitos deste trabalho. O autor parte da concepção de abordagem (2002,
p. 13):
61
Experience is not a mental state, but the interaction, adaptation, and adjustment of individuals to the
environment. It is the human mode of being in the world.
62
Learning is a reflection of the continuities that we establish within experience. It is the process of giving
meaning to what we experience and making connections to what is to come.
75
uma filosofia de trabalho, um conjunto de pressupostos explicitados, princípios estabilizados ou
mesmo crenças intuitivas quanto à natureza da linguagem humana, de uma língua estrangeira em
particular, de aprender e de ensinar línguas, da sala de aula de línguas e de papéis de aprendiz e de
professor de uma outra língua.
Abordagem (ou cultura) de aprender “é caracterizada pelas maneiras de estudar, de se
preparar para o uso e pelo uso real da língua-alvo que o aprendiz tem como ‘normais’.” (p.
13).
a abordagem (ou cultura) de ensinar (p. 13):
se compõe do conjunto de disposições de que o professor dispõe para orientar todas as ações da
operação global de ensinar uma língua estrangeira. A operação global do ensino de uma língua
estrangeira compreende o planejamento de cursos e suas unidades, a produção ou seleção criteriosa
de materiais, a escolha e construção de procedimentos para experienciar a língua-alvo e as maneiras
de avaliar o desempenho dos participantes.
Ainda em consonância com Almeida Filho (2002 e 2004), a abordagem de ensinar de
um professor deve estar pautada em cinco competências: a)implícita, que é a mais básica e
constitui-se de intuições, crenças e experiências, parte da maneira como fomos ensinados e
geralmente é desconhecida pelo professor; b) lingüístico-comunicativa, também básica, que
faz com que o professor ensine o que sabe sobre a língua e que envolva o aprendiz na
linguagem; c) teórica, que envolve os processos de ensinar e aprender línguas, os quais se
fazem conhecer por meio de teorizações de autores e pesquisadores; d) aplicada, que é
“aquela que capacita o professor a ensinar de acordo com o que sabe conscientemente (...)
permitindo a ele explicar com plausibilidade porque ensina da maneira como ensina e porque
obtém os resultados que obtém” (Almeida Filho, 2002, p. 21); e) profissional, que faz com
que os professores conheçam “seus deveres, potencial e importância social no exercício do
magistério na área de ensino de línguas” (Almeida Filho, 2002, p. 21).
Assim, as crenças constituem “componente vital da composição de outro construto-
chave para o trabalho de ensinar línguas e formar professores de línguas – o de abordagem de
ensinar e de aprender” (Almeida Filho, 2006, p. 7). Desta forma, advêm principalmente da
competência implícita do professor, e esta está inserida em sua abordagem de ensinar. A
perspectiva do autor também mostra que as crenças são resultantes das experiências prévias
do professor, ou como aprendiz, ou como profissional a intensidade de uma ou outra
experiência depende de seu tempo de carreira.
Richards e Lockhart (1996) listam alguns fatores que influenciam as crenças do
professor são: a) suas próprias experiências como aprendizes; b) experiência empírica ou
seja, os resultados obtidos da tentativa e erro; c) prática estabelecida (dentro de uma escola,
76
instituição, distrito escolar, etc.); d) fatores de personalidade; e) princípios derivados de
educação e/ou pesquisa: e f) princípios derivados de uma abordagem ou método. Enumeram,
também, alguns possíveis tipos de crenças de professores, como: a) crenças sobre inglês; b)
sobre aprendizado; c) crenças sobre o ensino; d) crenças sobre o programa e o currículo; e e)
crenças sobre o ensino de línguas como profissão.
Em suma, em consonância com Barcelos (2006), as crenças são experienciais. São
também dinâmicas mudam com o tempo; emergentes, socialmente construídas e situadas
contextualmente; são mecanismos de mediação para regular aprendizagem e a solução de
problemas; são paradoxais e contraditórias; relacionam-se à ação de modo indireto e
complexo; e o são facilmente distinguíveis de aspectos como conhecimento, motivação e
estratégias de aprendizagem.
CAPÍTULO 3 – METODOLOGIA DE PESQUISA
Para uma mente aberta, as experiências
naturais e sociais são cheias de ricos e
instigantes desafios à investigação
63
.
John Dewey (1933, p. 33)
3.1. O tipo de pesquisa
Nunan (1997), bem como Bogdan e Biklen (1982, apud Ludke e André, 1986), lista
as características da pesquisa qualitativa: a fonte direta de dados é o ambiente natural e o
pesquisador é o principal instrumento; preocupa-se em compreender o comportamento
humano; faz-se observação não-controlada; coletam-se dados descritivos; o processo importa
mais que o produto; o pesquisador especial atenção à perspectiva dos participantes diante
63
Tradução minha de “To the open mind, nature and social experience are full of varied and subtle challenges
to look further.”
77
dos fatos; a análise dos dados costuma ser indutiva; seus resultados não são necessariamente
generalizáveis; pressupõe a realidade como sendo dinâmica; é orientada para a descoberta, é
exploratória e expansionista; e é válida na medida em que os dados são reais, ricos e
profundos. Por estar consonância com tais princípios, este é um trabalho fundamentalmente
qualitativo que parte de uma concepção de verdade como co-construída por seus agentes.
Assim, o estudo da prática pedagógica aqui retratada é desenvolvido do ponto de vista dos
professores que realizam essa prática. (Telles, 2002 e Pessoa; Sebba, 2006).
Em um âmbito mais específico, trata-se de um estudo de caso. Cohen e Manion
(1985) explicitam que neste tipo de pesquisa o objetivo do pesquisador é observar as
características de uma unidade individual, por exemplo, uma criança, uma turma, uma escola
ou ainda uma comunidade. A observação visa investigar, analisar de forma profunda e
objetiva os rios aspectos dos fenômenos que compõem o ciclo de vida da unidade
possivelmente com vistas a estabelecer generalizações sobre uma população mais ampla à
qual aquela unidade pertence. Merrian (1998, p. 16, apud Nunan, 1997, p. 77) define o estudo
de caso como se segue:
O estudo de caso qualitativo pode ser definido como uma descrição e análise intensiva e holística de uma única
entidade, fenômeno ou unidade social. Os estudos de caso são de natureza particular, descritiva e heurística e
baseiam-se essencialmente no uso de raciocínio indutivo e no processamento de várias fontes de dados.
64
Desta forma, o objetivo primordial do estudo de caso seria investigar profundamente
e analisar a intensidade de fenômenos variados que constituem o ciclo de vida da unidade
talvez com vistas a estabelecer generalizações sobre a população mais abrangente à qual a
unidade pertence. Busca-se compreender um caso particular, suas idiossincrasias, sua
complexidade (Nunan, 1997; Stake, 1988, apud Nunan, 1997).
Segundo Adelman et al. (1976, apud Nunan, 1997), as seis vantagens de se adotar o
estudo de caso como método são: a) apóia-se fortemente em uma realidade contextualizada, o
que serve de apelo para aqueles que estão envolvidos na prática investigada, pois podem se
identificar com as questões levantadas; b) é possível generalizar a partir de um caso que
represente um único exemplo, ou o exemplo de uma classe; c) pode representar uma
multiplicidade de pontos de vista e pode oferecer suporte para múltiplas interpretações; d)
pode servir como base de dados de materiais que podem ser reinterpretados em futuras
64
... the qualitative case study can be defined as an intensive, holistic description and analysis of a single
entity, phenomenon, or social unit. Case studies are particularistic, descriptive, and heuristic and rely heavily
on inductive reasoning in handling multiple data sources.
78
pesquisas; e) as reflexões geradas a partir de um estudo de caso podem ser imediatamente
colocadas em uso para um propósito específico, como, por exemplo, o desenvolvimento de
uma equipe; e f) dados provenientes de um estudo de caso são, em geral, mais acessíveis que
os relatórios de pesquisa convencionais e, por isso, capazes de servir ablicos múltiplos.
Lüdke e André (1986), por sua vez, explicam que, ao se fazer um estudo de caso, são
salientados aspectos únicos, particulares da situação, pois “visam à descoberta” (p. 17);
enfatizam a interpretação em contexto (p. 17); “buscam retratar a realidade de forma
completa e profunda” (p. 18); “usam uma variedade de fontes de informação” (p. 18);
“revelam experiência vicária e permitem generalizações naturalísticas (p. 18), que ocorrem
quando se tenta associar dados do estudo a experiências pessoais do leitor ou usuário do
estudo; e “procuram representar os diferentes e às vezes conflitantes pontos de vista presentes
numa situação social” (p. 19). As autoras sugerem três etapas para o seu desenvolvimento: a)
a exploratória, em que se esboça um plano baseado no exame da literatura pertinente à área
em que se pesquisa, em observações e/ou depoimentos de especialistas sobre um determinado
problema, em contato com documentos e/ou pessoas relacionadas ao fenômeno em questão
ou, ainda, em questionamentos advindos da experiência pessoal do pesquisador; b) a
delimitação do estudo, em que se faz um recorte da situação em cheque; c) a análise dos
dados e elaboração do relatório. Admitem que essas fases não seguem uma seqüência linear.
Tratam também da questão de representatividade e generalização no estudo de caso.
Para elas, como o estudo de caso trata de uma instância única, a relevância da generalização
torna-se menor. O tipo de leitor ou usuário do estudo é que vão determinar se é possível fazer
generalizações de um contexto para outro. A princípio, espera-se que este leitor faça uso do
estudo de caso para desenvolver novas idéias, significados e compreensões. também
potencial para generalização no sentido de vários leitores reconhecerem bases comuns de
diferentes estudos de caso desenvolvidos em diferentes contextos, o que permite uma
ampliação e maior solidez no conhecimento do objeto estudado.
Ao tratar de pesquisa acadêmica sobre a prática de professores de línguas nas escolas,
Telles (2002) explica que os estudos de caso podem ser descritivos ou narrativos. Costumam
ser realizados por professores-pesquisadores que desejam tratar de um determinado evento
pedagógico, componente ou fenômeno relativo à sua prática profissional. Como
instrumentos, podem ser utilizados entrevistas, diários, autobiografias dos participantes,
documentos, objetos, notas de campo, gravações em áudio e questionários para identificar
79
pontos específicos e comuns a todos os participantes. Quanto aos procedimentos de análise, o
pesquisador poderá “examinar os dados, extrair temas ou questões variadas, buscar indícios
de padrões e tentar explicá-los” (p. 109).
Uma das principais justificativas de eu ter optado pelo estudo de caso é a preocupação
com a observância do contexto de pesquisa, fator este determinante para a investigação de
crenças, pois, “para que se realize um estudo de caso, seleciona-se um exemplo da classe de
objetos e fenômenos que se está investigando (...) e investiga-se a maneira como este
exemplo funciona em contexto
65
(Nunan, 1997, P. 75).
3.1.1. A investigação na área de crenças
Em termos mais específicos, como mostra a história da investigação de crenças,
existem abordagens próprias para seu estudo. De acordo com Barcelos (2000 e 2001) são elas
a normativa, a metacognitiva e a contextual. O quadro abaixo esboça o perfil de cada uma
delas.
Normativa Metacognitiva Contextual
Metodologia Questionários tipo
Likert-scale
Entrevistas Observações, entrevistas,
diários e estudos de caso
Definição de crenças
sobre aprendizagem de
línguas
Crenças são vistas como
sinônimos de idéias pré-
concebidas, concepções
errôneas e opiniões.
Crenças são descritas
como conhecimento
metacognitivo estável e
às vezes falível que os
aprendizes possuem
sobre aprendizagem de
línguas.
Crenças são vistas como
parte da cultura de
aprender e como
representações de
aprendizagem em uma
determinada sociedade.
Relações entre crenças e
ações
Crenças são vistas como
bons indicadores do
comportamento futuro
dos aprendizes, sua
disposição para ensino
autônomo e sucesso
como aprendizes de
língua.
Crenças o vistas como
bons indicadores do
comportamento futuro
dos aprendizes, sua
disposição para ensino
autônomo e sucesso
como aprendizes de
língua, embora admita-se
a influência de outros
fatores como objetivos,
por exemplo.
Crenças são vistas como
específicas do contexto,
ou seja, as crenças
devem ser investigadas
dentro do contexto de
suas ações.
Vantagens Permite que as crenças
sejam investigadas com
amostras grandes, em
épocas diferentes e em
Permite que os
aprendizes usem suas
próprias palavras,
elaborem e reflitam
Permite que as crenças
sejam investigadas
levando em consideração
não as próprias
65
... it is the study of an ‘instance in action’. In other words, one selects an instance from the class of objects
and phenomena one is investigating (…) and investigates the way this instance functions in context.
80
vários contextos ao
mesmo tempo.
sobre suas experiências
de aprender.
palavras dos aprendizes,
mas também o contexto
de suas ações.
Desvantagens Restringe a escolha dos
participantes com um
conjunto de afirmações
predeterminadas pelo
pesquisador. Os
aprendizes podem ter
interpretações diferentes
sobre esses itens.
As crenças são
investigadas somente
através das afirmações
dos aprendizes (não
preocupação com a ação
dos aprendizes)
É mais adequada com
pequeno número de
participantes. Consome
muito tempo.
Quadro 5: Características, vantagens e desvantagens das três abordagens para investigação de crenças.
Fonte: Barcelos (2002)
Ainda quanto aos instrumentos de pesquisa, Barcelos (2006) insta que, mesmo que o
tipo de pergunta defina o tipo de método utilizado, já se constatou que o uso do questionário,
apenas, pode ser problemático para uma pesquisa focada em crenças. Discute também a
tendência atual de usar mais entrevistas com perguntas abertas do que estruturadas. Além
disso, outros todos têm sido agregados ao tipo de estudo em pauta, como análise de
metáforas, análise do discurso e de vida, narrativas e histórias, diários, autobiografias, ou
auto-estudos e desenho. Abrahão (2006) assevera que um estudo de crenças contemporâneo e
contextual, inserido em um paradigma qualitativo deve combinarrios instrumentos.
Kalaja (1995) proe ainda uma outra abordagem, baseada na análise do discurso dos
informantes. Os princípios desta são: o uso que se faz da língua é fortemente relacionado à
ação; a língua cria realidade, o uso da ngua é moldado pelas ideologias da sociedade. o
pretendo entrar em detalhes quanto a esta abordagem, tendo em vista que não consiste na
base deste trabalho. Antes, opto pela abordagem contextual.
3.2. Pilotagem
Antes de esta pesquisa ter sido iniciada de fato, houve uma outra tentativa que pode
ser considerada uma espécie de pilotagem. Foi distribuído um questionário a um grupo de
professores de inglês que participariam de uma oficina sobre Inglês Instrumental dirigida por
mim em um encontro de professores em novembro de 2004. Os respondentes tinham diante
de si questões fechadas, a respeito de suas crenças sobre o ensino de línguas e tradução. O
questionário foi desenvolvido a partir de Seliger e Shohamy (1995). O objetivo deste
questionário foi o de visualizar, ainda que de maneira opaca, o que pensam os professores
que se interessam por este tipo de oficina, especialmente os que trabalham na área de Inglês
Instrumental.
81
O perfil geral dos 17 respondentes é de professores com diversidade no tempo de
experiência profissional (há uma leve preponderância no número de professores menos
experientes sobre os mais experientes), que trabalham em cursos livres (apenas quatro
professores trabalham com ensino fundamental e dio e um com ensino superior) e que
foram à oficina principalmente porque gostariam de saber mais sobre Inglês Instrumental.
O quadro abaixo mostra um trecho do questionário e as respostas em porcentagem:
Parte A: Minha opinião sobre Inglês Instrumental
Concordo completamente
ou em parte (%)
a.O ensino de Inglês Instrumental foca-se no ensino de gramática. 64
b.Deve-se adotar o Inglês Instrumental no ensino fundamental/médio. 94
c.Antes de fazer um curso de Inglês Instrumental, o aprendiz(a) deve ter algum
conhecimento de inglês.
52
d.Ao se ensinar Inglês Instrumental, faz-se uso de atividades de tradução. 100
e.Os cursos livres de inglês deveriam oferecer ao público cursos de Inglês
Instrumental.
94
f.As aulas de Inglês Instrumental devem ser ministradas em português. 94
g.Um curso de Inglês Instrumental pode substituir um curso convencional de
inglês.
18
h.Uma aula de Inglês Instrumental pode ser comunicativa
(ou seja, estar de acordo com a abordagem comunicativista).
94
i.Nos cursos de Inglês Instrumental, os(as) aprendizes(as) são estimulados a não se
preocuparem com o significado exato das palavras.
88
j.Atividades de tradução são fundamentais em um curso de Inglês Instrumental. 100
Parte B: Somente para professores de cursos livres de inglês. Concordo completamente
ou em parte (%)
k.Apenas uso tradução como último recurso. 82
l.A tradução atrapalha o desenvolvimento do(a) aprendiz(a), causando
interferência.
64
m.Os(As) aprendizes(as) e o professor(a) devem pensar somente em inglês. 47
n.Gostaria de usar atividades de tradução em minha sala de aula (ex: tradução de
textos, atividades de conversação bilíngües, etc.)
64
o.A tradução pode ser considerada uma quinta habilidade (além de listening,
speaking, reading e writing)
88
p.Usar tradução é retornar ao Método Gramática e Tradução. 35
q.O(A) melhor professor(a) é o(a) nativo(a). 0
r.Todo(a) professor(a) de inglês deveria passar um tempo em um país falante de
inglês.
70
s.A tradução não faz parte das “ferramentas” lingüísticas de que meu(minha)
aprendiz(a) precisa fora de sala de aula.
52
t.Trabalhar atividades de tradução é mais confortável para o professor. 35
Quadro 6: Questionário sobre Inglês Instrumental
82
Os dados obtidos podem também ser visualizados resumidamente nos gráficos a seguir:
0
20
40
60
80
100
"A" "B" "C" "D" "E" "F" "G" "H" "I" "J"
concorda (com pletam ente ou
em parte)
discorda / não respondeu
Gráfico 1: Parte A: Minha opinião sobre Inglês Instrumental
0
20
40
60
80
100
"K" "L" "M" "N" "O" "P" "Q" "R" "S" "T"
concorda (com pletam ente ou
em parte)
discorda / não respondeu
Gráfico 2: Parte B: Somente para professores de cursos livres de inglês
Todos concordaram (completamente ou em parte) que atividades de tradução são
fundamentais em um curso de I.I. e 94% concordaram que uma aula de II pode ser
comunicativa. Contudo, dentre os que responderam a “Parte B”, 29% acham que usar
tradução é retornar ao todo Gramática e Tradução. Dos 64% que entendem que II é
centrado na gramática, 81% acham que a aula de II pode ser comunicativa. Entre os que
concordaram com a premissa “b”, 80% discordaram de “g”, o que favorece a idéia de que os
83
professores crêem que o inglês ensinado na escola regular deve ser diferente do inglês
ensinada na escola de idiomas. Dos 94% que concordaram com “f”, 93% concordaram com
“h”, o que pode estar mostrando que estes professores crêem que uma aula ministrada em
português pode ser comunicativa. Dos 64% que concordaram com “l”, 54 % concordaram
com “n” e dos 82% que concordaram com “k”, 71% concordaram com “n”. Acredito ser esta
a maior das disparidades, pois ao mesmo tempo em que gostariam de usar tradução em sala
de aula, entendem que a tradução atrapalha o desenvolvimento do aprendiz e utilizam-na
apenas como último recurso? Um outro problema é: dos 88% que concordaram com “o”,
50% concordaram com “s”. Também parece contraditório a tradução poder ser a quinta
habilidade se não faz parte das ferramentas lingüísticas de que os aprendizes necessitam fora
de sala. também algumas constatações curiosas: dos 64% que concordaram com “n”,
54% discordaram de “t”, ou seja, mesmo sabendo que a tradução é mais trabalhosa, gostariam
de usá-la.
No que diz respeito aos cinco professores de Inglês Instrumental, notou-se que o
professor mais experiente apresentou respostas mais coerentes. No geral, eles concordaram
em suas respostas. Quatro deles concordam com as premissas “a”, “b”, “c”, “i”, “l”, “m”, “n”,
e discordam da “t”. Os cinco concordam com as premissas “d”, “e”, “f”, “h”, “j”, “k”, “o”,
“r”. Os cinco discordam das premissas “g” e “q”; contudo suas opiniões não se destacam
significativamente do restante do grupo.
É evidente que o problema destes resultados é que eles trazem muitas incongruências.
Parte delas pode ser atribuída às limitações do instrumento de pesquisa utilizado. O fato de
ser um questionário nos mesmos moldes do BALLI traz vantagens como a possibilidade de
alcançar um número maior de informantes em pouco tempo. Por outro lado, não me
possibilitou saber se aquilo que es no questionário é também aquilo que eles consideram
relevante quanto à tradução, se eles agem de acordo com suas respostas ou se estão apenas
tentando parecer bem informados diante da pesquisadora e se as interpretações que deram às
respostas são as mesmas que eu dei quando construí o questionário. A maior limitação é que
eu não como saber qual a influência de sua história e contexto de vida nas respostas. A
vantagem de ter utilizado este questionário foi que serviu de estímulo para tentar averiguar de
as incoerências que aqui aparecem também fariam parte das crenças e experiências de outras
três professoras acompanhadas de perto, numa pesquisa que utilize instrumentos mais
84
democráticos e por um tempo maior. (Gimenez, 1994; Barcelos, 2001; Silva, 2005; Barcelos,
2006).
.
3.3. Contexto
Esta pesquisa se deu em três
66
instituições distintas, sendo que, em cada uma delas
leciona uma das professoras-informantes. Em cada instituição foi observada uma turma de
Inglês Instrumental com enfoque em leitura. Duas turmas eram de Inglês Instrumental para o
curso de Sistemas de Informação em faculdades particulares. A terceira, em uma escola de
idiomas, era de Inglês Instrumental para leitura acadêmica em geral e exames de proficiência
na língua para ingresso em Pós-Graduação. A professora do curso de idiomas também
leciona Inglês Instrumental para Sistemas de Informação em outra instituição.
As turmas do curso de Sistemas de Informação tinham algumas características em
comum: eram numerosas (entre 20 e 40 estudantes, em média), heterogêneas quanto ao nível
de proficiência na LE, tinham uma carga de três horas por semana, no período noturno, com
duração de um ou dois semestres, e os aprendizes estavam entre o primeiro e terceiro
semestre do curso superior. As duas professoras dos respectivos cursos trabalhavam
principalmente com textos de especialidade em sala de aula e davam aula em português.
a turma do curso de idiomas era composta de uma média de 15 aprendizes, sendo
que todos possuíam curso superior e tinham aula de inglês aos sábados, no período
vespertino, com a intenção de aprimoras sua habilidade de leitura em inglês ou,
principalmente, prestar exames de seleção em programas de Mestrado e Doutorado, dos quais
um dos requisitos é a aprovação em um teste escrito de proficiência em língua inglesa, com
leitura, interpretação e tradução de textos. A carga horária do curso era de três aulas
semanais.
Toda a pesquisa foi realizada durante o segundo semestre de 2005. Foram observadas
e gravadas entre oito e doze horas de aula de cada professora, com o mínimo de três
encontros. As entrevistas foram realizadas mais ou menos na metade do decorrer das
66
Na verdade, participaram da pesquisa quatro professores de quatro diferentes instituições. Contudo, pelo
fato de eu ter conseguido dados suficientes com as três primeiras professoras entrevistadas e observadas,
preferi não utilizar aqui os dados obtidos deste último professor.
85
observações. Não foram realizadas no início por eu ter julgado necessário ganhar tempo para
que as professoras me conhecessem melhor e eu pudesse estabelecer rapport. No caso de
Jaqueline, foram necessárias duas entrevistas, uma vez que na primeira entrevista não foi
possível conseguir todos os dados necessários. As duas entrevistas juntas duraram em média
cinqüenta minutos. com Rose e Marília apenas uma entrevista de em dia uma hora foi
suficiente.
3.4. Informantes
Por se tratar de um estudo de caso, eu poderia ter concentrado minha investigação em
apenas um informante. Contudo, julguei que ouvir informantes com histórias de vida distintas
e que atuam em contexto variado enriqueceria minhas reflexões. Assim, a investigação se
transformou em um estudo de casos.
No que tange à escolha dos participantes, lancei mão das reflexões de Gaskell (2002,
p. 70):
O objetivo da pesquisa qualitativa é apresentar uma amostra do espectro dos pontos de vista. Diferentemente da
amostra de levantamento, onde a amostra probabilística pode ser aplicada na maioria dos casos, não existe um
método para selecionar os entrevistados das investigações qualitativas. Aqui, devido ao fato de o número de
entrevistados ser necessariamente pequeno, o pesquisador deve usar sua imaginação social científica para montar a
seleção dos respondentes.
Logo em seguida afirma que “sejam quais forem os critérios para a seleção dos
entrevistados, os procedimentos e as escolhas devem ser detalhados e justificados em
qualquer tipo de relatório”.
Assim, o principal requisito para a seleção das informantes foi a busca de professores
que tiveram alguma experiência de ensino, aprendizagem e/ou prática de tradução e
também que não tiveram experiências parecidas. Um outro critério foi encontrar professores
que tivessem uma maior experiência com IIELA e também que estivessem em início de
carreira. Além disso, procurava por professores que dessem aula de IIELA em diferentes
ambientes. Também busquei profissionais que utilizassem textos de uma área de
especialidade, como é o caso de Jaqueline e Marília, e aqueles que utilizassem textos
diversos, como Rose. Uma outra variável interessante, mas não antevista, é o fato de Rose ser
estrangeira, falante nativa de língua inglesa. Inicialmente, ignorei este fato e até cheguei a vê-
lo como um problema, pelo fato de não conhecer muitos professores de I.I. com este perfil.
Contudo, isso se tornou importante durante a análise de dados, pois pude observar como uma
86
estrangeira lida com o fato de ter que usar a língua materna de aprendizes e, em especial,
como lida com a tradução e pude também dialogar com o trabalho de Medgyes (1994) a
respeito do professor nativo e o-nativo. O quadro abaixo mostra alguns dados biográficos
das participantes:
Jaqueline
67
Rose Marília
Formação Graduada em Letras
Português e Inglês
Habilitada em língua
francesa e espanhola em seu
país de origem, cuja língua
oficial é o inglês, mestre em
Lingüística (título obtido no
Brasil) e doutoranda na
mesma área, também no
Brasil.
Graduada em Letras Português
e Inglês e mestre em
Lingüística Aplicada.
Tempo de
docência em
língua inglesa
/estrangeira
Por volta de um ano. Pouco mais de dez anos Por volta de 18 anos.
Tempo de
experiência com
II / enfoque do
curso
Sempre deu aula de II
com enfoque em leitura
acadêmica.
Trabalha com II com
enfoque em leitura
acadêmica a cerca de seis
anos.
Sempre deu aula de II com
enfoque em leitura acadêmica.
Idade 22 anos 34 anos 45 anos
Brasileira? Sim Não Sim
Experiência com
tradução
Uma disciplina na
universidade, com
enfoque teórico e
prático em tradução e
um curso
profissionalizante, do
qual cursou um
semestre.
Prática intensa de tradução
na graduação, curso de
interpretação, professora de
curso superior de Tradução,
de disciplinas teóricas e
práticas, e tradutora
profissional.
Não tem.
Contexto de
ensino observado
Turma de IIELA para o
curso de Sistemas da
Informação.
Turma de IIELA em escola
de idiomas com finalidade
de aprimoramento de
habilidade de leitura em
inglês e preparação para
exames de proficiência em
inglês para ingresso em Pós-
Graduação.
Turma de IIELA para o curso
de Sistemas da Informação.
Quadro 7 Dados iniciais sobre as informantes
3.5. Instrumentos de coleta de dados
Considerando a necessidade de ltiplos instrumentos para validar uma pesquisa
qualitativa, inclusive o estudo de caso (Seliger e Shohamy, 1995; Bauer, Gaskell e Allum,
2002) e as questões de boa prática para a abordagem contextual de investigação de crenças,
utilizei a observação de aulas, as notas de campo, gravações em áudio e respectivas
67
Os nomes Jaqueline, Rose e Marília são fictícios.
87
transcrições, entrevistas (narrativas e semi-estruturadas) e documentos, ou seja, os textos,
apostilas, exercícios e demais materiais didáticos utilizados pelos professores e aprendizes
em sala de aula durante o período das observações.
Cabe salientar que o material transcrito foi apresentado às respectivas informantes via
e-mail para que confirmassem a veracidade das transcrições para que eu pudesse proceder
com a análise e discussão do material.
Constituem instrumentos primários de pesquisa as entrevistas e suas respectivas
transcrições.
3.5.1. A observação
De acordo com Seliger e Shohamy (1995), a observação comumente praticada na
pesquisa qualitativa ocorre quando o pesquisador observa vários comportamentos que se
desenrolam simultaneamente sem determinar com antecedência quais aspectos em particular
serão observados. Descrevem, também, dois tipos de observação: a primeira, quando o
observador é participante, ou seja, quando ele se torna parte integrante da situação a ser
observada como um dos informantes sem que os demais tenham consciência do fato; e a
segunda, com o observador não-participante, em que este registra comportamentos em
detalhes como alguém de fora.
Cohen e Manion (1985) fazem a mesma distinção entre os dois métodos de
observação e reiteram que o observador participante se envolve na atividade em que observa
de tal forma que passa a ser visto como um do grupo, ao passo que o observador não-
participante posiciona-se à parte das atividades do grupo e deixa claro que não é um de seus
membros. Contudo, defendem que o observador-participante não pode – e nem precisa – estar
sempre ‘disfarçado’, no sentido de simular fazer parte do grupo a ponto de, de fato, ser
confundido com um de seus componentes.
dke e André (1986) classificam o grau de envolvimento do pesquisador com os
informantes no decorrer da observação em termos de um continuum variável segundo o qual
o pesquisador pode exercer quatro papéis distintos: o de participante total, o de participante
como observador, o de observador como participante e o de observador total. O primeiro tipo
de observador faz-se passar por um membro do grupo observado sem revelar seus propósitos
investigativos. O segundo, revela aos observados parcialmente o que pretende. O terceiro, por
88
sua vez, revela sua identidade e objetivos ao grupo desde o início. O quarto, por fim, não
interage com o grupo observado, podendo até observar sem ser visto por aqueles a quem
observa.
No caso específico de estudos de crenças, Abrahão (2006) aponta que a observação de
aulas possibilita a documentação sistemática das ações e ocorrências de relevância particular
para os tópicos de investigação propostos. Assim, também classifica a observação em a)
participante, em que o pesquisador observa-se e observa o outro e participa da cultura e
atividades do contexto pesquisado como membro e b) não-participante, em que o pesquisador
observa e grava o que ocorre em sala de aula sem envolvimento pessoal com o contexto, a
fim de se manter distante dos sujeitos da investigação. Contudo pondera que o primeiro
modelo de observação é mais freqüentes em estudos de caso centrados em crenças, pois a
própria natureza da pesquisa em sala de aula requer que o observador seja participante
lembrando que neste caso pode haver diferentes níveis de envolvimento na situação de
pesquisa.
Acredito ser o continuum de Cohen e Manion (1985) mais apropriado para que eu
possa descrever o papel que exerci durante minhas observações. Minha postura oscilou entre
a de participante como observador e observador como participante, pois procurei transmitir, a
princípio, aos aprendizes observados e, principalmente, aos professores, apenas uma
perspectiva geral do que era meu estudo. Contudo, aos professores mais curiosos, forneci
informações mais detalhadas quanto a meus objetivos por acreditar que, mesmo que corra
alguns riscos no sentido de os professores direcionarem suas ações para aquilo que acham
que eu gostaria de ver como pesquisadora, a transparência e honestidade para com os
informantes é fundamental. Ao chegar às salas de aula, sentava-me entre os aprendizes e,
quando solicitada pelos professores, respondia eventuais perguntas relacionadas à aula e ao
meu trabalho de pesquisa.
dke e And(1986) ainda tratam da questão do tempo de permanência em campo.
Segundo elas, os estudos da área de educação têm sido mais curtos que os antropológicos e
sociológicos – que, por sua vez, variam entre seis meses a vários anos de observação – e que
a extensão do período de observação depende, sobretudo, do tipo de problema e do prosito
do estudo. No caso desta pesquisa, as observações são fontes de dados secundárias, haja vista
que, por se tratar fundamentalmente de uma investigação da relação entre crenças e
experiências de professores, que se focar a análise e discussão de dados principalmente
89
nas narrativas dos informantes. Por esta razão, como já mencionado, as observações tiveram
em média a duração de três encontros com cada professor, o que soma aproximadamente oito
horas de observação com cada um.
Também pelo fato de estar fazendo uma investigação que envolve a relação entre as
experiências e as crenças das professoras, não utilizei nenhum esquema de observação prévio
por acreditar que este procedimento poderia acarretar em prejuízo para a apuração dos dados.
Acreditava que poderiam surgir possíveis justificativas inesperadas para determinados
comportamentos das docentes, para suas falas nas entrevistas posteriores e para aquilo que
omitiram nas entrevistas. Assim, em vez de um esquema de observação pré-estabelecido,
optei pela combinação entre anotações e material transcrito das gravações, de acordo com o
que sugerem Lüdke e André (1986).
3.5.2. Notas de campo
dke e André (1986) sugerem que as observações tenham uma parte descritiva e
outra reflexiva. Para compor a primeira, listam algumas possíveis informações, tais como
descrição dos sujeitos e reconstrução de diálogos o que foi obtido por meio das gravações
de áudio e notas de campo, descrição de locais, descrição de eventos especiais, descrições das
atividades e o comportamento do observador. a segunda deve ser composta de reflexões
analíticas, reflexões metodológicas, dilemas éticos, conflitos, mudanças na perspectiva do
observador e demais esclarecimentos necessários.
Em estudos de crenças, define-se notas de campo como “descrições ou relatos de
eventos no contexto de pesquisa que são escritos de forma relativamente objetiva”. Assim,
podem incluir relatos de informação não-verbal, ambiente físico, registros de conversa e
interação. Basicamente buscam responder às perguntas quem, o quê, onde, quando, como e
porque. Podem, ainda, ser categorizadas para posterior conversão em diários. As próprias
notas de campo já constituem uma análise. (Abrahão, 2006, p. 226)
Com base nos argumentos acima, as notas de campo foram feitas à mão em um
caderno à parte durante a observação das aulas. Nele eu descrevia os acontecimentos da aula
em ordem seqüencial, o comportamento dos professores, bem como os procedimentos que
utilizavam, além de reflexões a esse respeito. Em seguida, as notas foram digitadas e
acrescidas de novas reflexões.
90
3.5.3. Gravações em áudio e transcrições
Todas as entrevistas foram transcritas em detalhes. Apesar de se admitir que toda
transcrição é limitada, pois “certamente sempre haverá algo mais que poderia ser incluído na
transcrição” (Myers, 2002, p. 277), acredito que as informações obtidas por meio das
transcrições constituem uma rica fonte de análise e discussão.
No que diz respeito às aulas observadas, com exceção de duas, todas foram
completamente gravadas com boa qualidade sonora e alguns trechos de maior relevância para
a análise de dados foram transcritos em seguida, partindo-se de um empréstimo de um dos
princípios da análise da conversação, segundo o qual, “os argumentos são feitos através da
comparação de muitos extratos curtos, muito detalhados”, os quais “ocupam espaço e exigem
muita atenção.” (Myers, 2002, p. 276)
Segundo Abrahão (2006), em pesquisa sobre crenças, dependendo do enfoque, pode-
se recorrer somente à gravação em áudio, como é o caso desta pesquisa, em detrimento da
gravação em vídeo, já que a segunda pode constranger os informantes. Justifica, ainda, o uso
de gravações pelo que possibilitam ao pesquisador inferir crenças embutidas no discurso e
nasões do professor.
Utilizei parcialmente as convenções de Marcuschi (2003). Como as convenções do
autor não cobriam as necessidades desta pesquisa, acrescentei alguns símbolos a fim de
tornar mais claras as transcrições.
3.5.4. Entrevistas
Segundo Gaskell (2002, pp. 64 e 65), as entrevistas para pesquisa qualitativa podem
ser classificadas da seguinte maneira: a) semi-estruturada, com um único respondente, ou
entrevista em profundidade; b) semi-estruturada, com um grupo de respondentes, ou grupo
focal; c) entrevista de levantamento fortemente estruturada, com uma série de questões pré-
determinadas; e d) conversação continuada menos estruturada da observação participante, ou
etnografia, cuja ênfase é o conhecimento local e da cultura e, por isso, é necessário um
período de tempo mais longo. Ele também expõe como vantagem da entrevista qualitativa o
fato de ela fornecer “os dados básicos para o desenvolvimento e a compreensão das relações
91
entre os atores sociais e sua situação”. Completa, ainda, que “o seu objetivo é a compreensão
detalhada das crenças, atitudes, valores e motivações, em relação aos comportamentos das
pessoas em contextos sociais específicos”.
dke e And (1986) asseveram que a entrevista, apesar de ser uma técnica que
consome uma grande quantidade de tempo do pesquisador, tem como vantagem os seguintes
aspectos: a) ao contrário de outros métodos de coleta de dados, que estabelecem uma relação
hierárquica entre pesquisador e informante, a entrevista gera uma relação de influência mútua
entre o entrevistador e o entrevistado; b) permite a captação imediata da informação desejada
com quase qualquer tipo de informante sobre tópicos variados; c) pode permitir abordar
assuntos de natureza íntima e complexa que talvez não fossem tão aprofundados se tratados a
partir de uma outra técnica; e d) permite correções, esclarecimentos e adaptações.
Ademais, as mesmas autoras classificam as entrevistas nas seguintes categorias:
entrevistas estruturadas ou padronizadas, durante as quais o entrevistador segue um roteiro
fixo de perguntas feitas a todos os entrevistados de maneira idêntica com o fim de se obter
resultados uniformes entre os entrevistados; entrevistas semi-estruturadas, que, apesar de se
valerem de um esquema básico, permitem ao entrevistador fazer adaptações necessárias; e
entrevistas não-estruturadas ou não-padronizadas, em que o entrevistado fala sobre o assunto
em questão a partir das informações que ele detém. Explicitam também que o tipo de
entrevista mais adequado para pesquisa em educação é aquele que segue um esquema mais
livre, menos estruturado.
Abrahão (2006) afirma que as entrevistas podem ser utilizadas como ferramenta
primária. Classifica-as então, em estruturadas aquelas que se assemelham ao questionário
nos quesitos forma e pressupostos; semi-estruturadas as que têm um roteiro geral, mas
permitem maior flexibilidade; e as não-estruturadas as quais consistem em travar uma
conversa livre com os entrevistados com base nas questões e tópicos que orientam a
investigação, sendo que as duas últimas são as mais utilizadas nas investigações das crenças.
Jovchelovitch e Bauer (2002) tratam mais especificamente da entrevista narrativa e a
classificam como um método de pesquisa qualitativa não estruturada, de profundidade e com
características específicas. Ela vai além do esquema pergunta-resposta e o entrevistado tende
a ficar mais à vontade e a fornecer subsídios para que sua história seja plausível. “Ele dará
conta do tempo, lugar, motivos, ponto de orientação, planos, estratégias e habilidades” (p.
94). Primeiro, porque a narrativa é inerente à vida humana. Depois porque, através dela, “as
92
pessoas lembram o que aconteceu, colocam a experiência em uma seqüência, encontram
possíveis explicações para isso, e jogam com a cadeia de acontecimentos que constroem a
vida individual e social” (p. 90). Assim, “a narrativa não é apenas uma listagem de
acontecimentos, mas uma tentativa de ligá-los, tanto no tempo, como no sentido”. (p. 92) As
narrativas são, então, pertinentes para esta pesquisa na medida em que têm como alvo
reconstruir acontecimentos sociais a partir da perspectiva dos informantes. Por isso o uma
ferramenta de extrema utilidade para detectar crenças e a relação destas com as experiências
dos entrevistados.
Em se tratando daquilo que se chama de narrativas, auto-relatos ou histórias de vida,
Abrahão (2006, p. 224) define-os como “relatos orais ou escritos de experiências pessoais
(...) construídos por meio de um número amplo de cnicas conversacionais, como
entrevistas, discussões, conversas casuais ou por meio de relatos verbais escritos, como
descrições pessoais e relatos de eventos da vida pessoal.” Acrescenta ainda que têm grande
utilidade na busca por captar histórias dos informantes a fim de explicar mais profundamente
suas ações e respostas em sala de aula. Ressalta também a importância de se criar um clima
afetivo favorável para que o procedimento seja bem-sucedido. Segundo a autora, as histórias
de vida podem buscar diferentes tipos de informações, como recuperar a vida do participante,
do nascimento ao momento da investigação; buscar dados referentes a momentos específicos
em sua vida; ou, como tem sido mais comum, voltar-se para experiências de ensino e
aprendizagem ao longo da vida dos informantes.
Quanto às vantagens das narrativas em pesquisas de crenças focada em professores,
as “experiências anteriores narradas sob a forma de histórias pessoais são particularmente
relevantes, que a educação formal de professores engloba também aspectos relacionados à
identidade do futuro profissional” (Gimenez, 1997, p. 4). Assim, as múltiplas identidades do
profissional de ensino estão de certa forma conectadas a valores, alvos e necessidades que
competem entre si e por isso, as narrativas pode favorecer uma apreciação maior da
complexidade do ensino e da extensão e profundidade do conhecimento prático pessoal de
professores. Por isso, as narrativas revelam que tornar-se professor envolve mais que
“treinamento”, que as identidades do professor são forjadas por suas histórias de vida e
redes de conhecimento, atingindo um âmbito que vai muito além da sala de aula (Sakui;
Gaies, 2003).
93
Ainda Gimenez (1997) argumenta que, na pesquisa com histórias pessoais, o
pesquisador deve definir com antecedência o nível de estrutura estabelecido. que se
considerar que em entrevistas que têm por finalidade investigar as experiências dos
informantes, muita estruturação pode impedir que revelações importantes venham à tona.
Contudo, limites de tempo podem impor a necessidade de se definir algum tipo de estrutura
sobre o que será tratado. O ideal então seria buscar um certo grau de informalidade que
permita aos informantes contar suas experiências educacionais concentrando-se em tópicos
específicos.
Pautada nestes esclarecimentos nos princípios da abordagem contextual do estudo de
crenças e, por esta razão, entendendo a entrevista como fundamental neste tipo de pesquisa,
elegi a entrevista como meu instrumento principal. A partir de reflexões sobre estes aspectos,
e das limitações dos dois tipos de entrevista enfocados acima (da entrevista semi-estruturada
porque as imposições do entrevistador podem inibir o respondente; das narrativas porque, na
necessidade de um trabalho comparativo, pode faltar um padrão de referência entre os relatos
de diferentes entrevistados) houve uma tentativa de aplicar uma entrevista mista, que se inicia
com narrativa e passa a semi-estruturada, que “uma entrevista pode percorrer várias
seqüências de narração e subseqüente questionamento” (Jovchelovitch; Bauer, 2002, p. 103).
Os principais temas abordados na entrevista foram: a) as experiências de aprendizagem de
língua inglesa dos informantes; b) sua trajetória profissional enquanto professor(a) de língua
inglesa; c) conceito e abordagem de ensinar Inglês Instrumental; e d) o conceito de tradução e
seu papel no ambiente de Inglês Instrumental e em outros ambientes.
3.5.5. Documentos
De acordo com Phillips (1974, p. 187, apud Lüdke e André (1986, p. 38)),
documentos são “quaisquer materiais escritos que possam ser usados como fonte de
informação sobre o comportamento humano”. Desta forma, a análise documental, segunto
Caulley (1981, apud Lüdke e André (1986, p. 38)), “busca identificar informações factuais
nos documentos a partir de questões ou hipóteses de interesse”. Tem, por conseguinte, como
vantagem o fato de os documentos constituírem uma fonte estável e rica, poderem ser
consultados repetidas vezes, representarem uma fonte natural e contextualizada de
informação e serem uma fonte não-reativa (Guba; Lincoln, 1981, apuddke; André, 1986).
94
Esta última vantagem justifica o fato de se combinar os documentos com outros
mecanismos de pesquisa tais como a entrevista e a observação porque, enquanto estas últimas
técnicas podem influenciar o comportamento ou pontos de vista do informante no sentido de
querer fazer ou dizer aquilo que agrada o pesquisador, os documentos, especialmente aqueles
que existiam antes da presença do pesquisador em sala de aula, não são influenciados
devido a alterações no ambiente de pesquisa. Em consonância, Holsti (1969, apud dke e
André, 1986, p. 39) enumera algumas situações em que se deve usar a análise documental:
quando é mais conveniente utilizar uma técnica não-obstrusiva (que não causa alterações no
ambiente de pesquisa), quando se pretende validar informações obtidas por meio de outras
técnicas de pesquisa ou quando o interesse do pesquisador é estudar o problema a partir da
própria expressão dos indivíduos.
Desta maneira, optei por utilizar a análise documental com o objetivo de combiná-la
aos outros instrumentos e possibilitar a garantia de maior validade à minha pesquisa. Os
documentos analisados foram apostilas, textos e exercícios utilizados em sala de aula pelos
professores e aprendizes durante as observações.
3.6. Agenda de pesquisa
Segue o quadro cronológico das observações e entrevistas com cada professor:
DATA PROCEDIMENTO DURÃO
17/08/05 Primeira observação – Jaqueline 1h e meia
19/08/05 Segunda observação – Jaqueline 1h e meia
26/08/05 Terceira observação – Jaqueline 1h e meia
03/10/05 Primeira observação – Rose 3 horas
16/09/05 Quarta observação – Jaqueline 1h e meia
17/09/05 Segunda observação – Rose 3 horas
21/09/05 Quinta observação – Jaqueline 1h e meia
27/09/05 Primeira entrevista – Jaqueline Por volta de 30 min.
17/10/05 Primeira observação – Marília 3 horas
23/10/05 Sexta observação – Jaqueline 1h e meia
24/10/05 Segunda observação – Marília 3 horas
28/10/05 Sétima observação – Jaqueline 1h e meia
29/10/05 Terceira observação – Rose 3 horas
09/11/05 Segunda entrevista – Jaqueline Por volta de 20 min.
12/11/05 Terceira observação – Rose 3 horas
16/11/05 Entrevista – Marília Por volta de 1h e meia
19/11/05 Entrevista – Rose Por volta de 1h e meia
95
27/11/05 Terceira observação – Marília 2 horas
Quadro 8 Quadro cronológico de observações e entrevistas
3.7. Procedimentos de análise
A análise de dados para esta pesquisa, ainda que de maneira informal, teve início no
mesmo momento em que se iniciou a coleta de dados. Isso se deve ao fato de que, desde a
primeira observação, ao fazer anotações a respeito do que se passava em sala de aula e ao
receber dos professores cópias dos materiais que seriam utilizados em aula, foram feitas
suposições a respeito das possíveis crenças dos professores, suposições estas que seriam
confirmadas ou refutadas a partir da triangulação de dados.
Após concluídas minhas observações e entrevistas, procurei seguir a orientação de
Gaskell (2002, p. 85) quanto a entrevistas semi-estruturadas: “Seja qual for a opção analítica
escolhida, o primeiro passo é produzir uma transcrição com boa qualidade” que inclua “todas
as palavras faladas, mas não [necessariamente] as características páralingüísticas”. Assim,
transcrevi as gravações das entrevistas e organizei minhas anotações das observações em
arquivos digitados. À medida que assim procedia, ocasionalmente acrescia meus dados de
notas críticas e reflexões.
Em se tratando da análise das entrevistas semi-estruturadas propriamente dita,
considerei igualmente valiosos os seguintes comentários de Gaskell (2002, p. 85): “Em
termos práticos, a análise e interpretação exigem tempo e esforço e o existe aqui um
método que seja o melhor. Na essência, elas implicam na imersão do próprio pesquisador no
corpus do texto.”
com relação à parte narrativa da entrevista, atentei-me para alguns dos passos
sugeridos por Schütze (1977; 1993, apud Jovchelovitch e Bauer, 2002). Reli, então, minhas
transcrições e comecei o trabalho de análise a partir do estágio narrativo das entrevistas,
traçando uma espécie de biografia para cada professor. Em seguida, recorri à parte semi-
estruturada para organizar em tópicos as respostas de cada informante, de acordo com
constatações a respeito de crenças sobre Tradução. Ademais, procurei estabelecer possíveis
relações entre as crenças e as experiências de aprendizagem e ensino evidenciadas nas
narrativas. A partir deste momento, passei a explorar outros instrumentos observação e
material didático – para estabelecer esta relação e confirmar ou confrontar minhas conclusões
até então. Além disso, utilizei estes instrumentos para também encontrar alguma eventual
relação entre as crenças destes professores e sua prática de ensino ainda que de forma
96
opaca, pois o tempo de observação não foi suficiente para uma análise mais aprofundada a
este respeito.
CAPÍTULO 4 – APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DE RESULTADOS
Crenças de professores e aprendizes a respeito
da aprendizagem de línguas não devem ser
consideradas errôneas a priori. Elas
representam as respostas dos aprendizes e
professores à tarefa complexa de aprender e
ensinar em diferentes contextos.”
68
Barcelos (2000, p. 330)
4.1. Jaqueline
4.1.1. Dados Biográficos
Jaqueline tem 22 anos de idade e começou a aprender inglês na infância em uma escola do
idioma na qual estudou por sete anos. Ela alega não ter estudado inglês por escolha, a
princípio, mas por decisão da e. Assim, estudou inglês praticamente durante toda a sua
adolescência em uma escola particular da língua. Este tipo de experiência também é relatada
68
Teachers’ and learners’ language learning beliefs should not be considered erroneous a priori. They
represent students’ and teachers’ responses to the complex task of learning and teaching in different contexts.
97
por Silva (2006), quando as crenças dos pais com relação à necessidade de aprender língua
inglesa, e que deriva do status da língua em nossa sociedade, influencia na história de vida
dos informantes. Ao final deste, fez um outro curso, de Tradução, de duração de um semestre
na mesma instituição. Descreve-o da seguinte maneira:
[Excerto 1]
69
Jaqueline: Bem, nós tínhamos (+) a professora (+) ensinava tanto a tradução de (+) inglês pra
português quanto português pra inglês. E a gente via textos de várias áreas. É (+) resenhas (+) de
filme (+) sinopse de filme (+) uh (+) receita médica, é (+) xeu lembrar (+) texto sobre futebol (+)
diversas áreas (+) Pra gente aprender como traduzir, mesmo.
P: Mhm. (+) E como que era feita essa tradução? Como que era o procedimento do fazer a
tradução desses textos?
Jaqueline: Bem, ela (+) ela explicava alguma coisa de vocabulário e a gente, sempre com o
dicionário em sala, tanto inglês/inglês, como inglês/português, português/português, tudo quanto é
tipo de dicionário (+)
P: Mhm.
Jaqueline: Na sala. E aí cada um ia (+) ia fazendo a sua tradução. E aí depois ela corrigia.
P: Como que era a correção? Ela corrigia no quadro, [[pedia pra vocês escreverem no quadro (+)]]
Jaqueline: [[Não, corrigia no quadro, não.]] A gente ia fazendo e discutindo (+) “Ah, porque que
você colocou isso, por que que você colocou aquilo(+) Qual que fica melhor(+)
P: Então vários alunos iam lendo(+) e [[aí ela ia(+)]]
Jaqueline: [[É. Cada um colocava(+)]] Se tivesse alguma opinião diferente, ela falava(+)
Cursou Letras com habilitação em língua inglesa em uma universidade particular do
DF. Durante a graduação cursou uma disciplina denominada “Tradução e Bilingüismo”, a
qual ela descreve como se segue:
[Excerto 2]
P: Aí, eu queria que descrevesse pra mim, como (+) se você trabalhava com tradução nessa
disciplina, como é que era?
Jaqueline: Ah (+) bem, a gente lia (+) textos, a respeito de tradução (+) Sabe que eu não lembro os
textos de tradução (+) Eu lembro de textos de interferência da língua materna na língua (+)
estrangeira, lembro de textos sobre empréstimos lingüísticos(+)
P: Mhm (+)
Jaqueline: Num (+) num (+) lembrada de textos sobre a tradução mesmo, mas (+) nós exercemos
tradução em sala de aula.
P: É? Como que era (+) como que era feito esse trabalho? De tradução?
Jaqueline: A professora passava o texto e a gente tinha que traduzir! E depois a gente corrigia (+) no
mesmo esquema do outro curso lá, da outra instituição.
P: Vocês faziam a tradução por escrito?
Jaqueline: Fazia a tradução, aí uma roda assim, aí, cada um falava uma frase (+) eàs vezes o outro
traduziu diferente (+) a gente discutia (+) qual que fica melhor (+)
P: Mhm (+)
Jaqueline: Mais ou menos nesse estilo.
69
Todos os excertos desta seção, bem como das demais seções deste capítulo, foram retirados das falas dos
informantes, transcritas a partir das entrevistas e/ou observações de aula. Há também excertos de anotações de
campo feitas durante as observações.
98
Começou a dar aulas em uma faculdade particular do DF local onde se deu esta
pesquisa – imediatamente após se graduar. Conta que trabalhava na secretaria da instituição e
foi convidada pelo coordenador de um dos cursos a assumir a cadeira de inglês devido ao
abandono das turmas pela professora da época. Trabalha somente no período noturno com
turmas de Inglês Instrumental para leitura, inclusive no curso de Sistemas de Informação,
turma em que se deu a pesquisa. Antes desta, não tinha passado por nenhuma outra
experiência profissional como professora até o momento.
4.1.2. Crenças sobre tradução
4.1.2.1. Tradução como ferramenta para esclarecimento de dúvidas e centrada
no professor.
Quando questionada a respeito da maneira como a tradução era abordada na
instituição onde estudou inglês, Jaqueline revela o seguinte:
[Excerto 3]
Jaqueline: Bem, na Escola Alfa
70
, era (+), aula (+) a professora falava em português. Os
professores no geral. falavam em inglês, desculpa. E (+), alguma dúvida que a gente tivesse, não
tinha tradução não! A gente se virava, ia atrás do dicionário, ia atrás de qualquer forma. As aulas
eram sempre em inglês.
Disse ainda:
[Excerto 4]
Jaqueline: Aí, no início, a gente tinha mais dificuldade (+) de entender alguma coisa. Aí, as
professoras eram mais maleáveis. Se tivesse alguma coisa que a gente não entendesse, aí ela traduzia,
e tal. Mas a tradução era evitada, assim, o curso inteiro. Sempre evitada. E (+) o professor fazia
mímica em sala pra gente entender o que era aquilo e (+) se virava pra explicar. Se por último caso a
gente não entendesse, aí sim havia a tradução.
, nestes trechos, um indício de uma concepção de tradução como ferramenta para
esclarecimento de vidas neste caso, quanto a vocabulário. Nota-se que a concepção de
Jaqueline de tradão pode estar pautada em sua experiência como aprendiz e parece estar
limitada a decodificação de palavras, expressões e frases. A entrevistada enfatiza o mesmo
tipo de postura ao descrever o curso semestral de tradução que fez na escola de inglês, no
excerto 1.
70
Em todas as transcrições, utilizo letras gregas para referir-me às instituições mencionadas pelas
informantes.
99
Abaixo, Jaqueline também demonstra endossar a atitude de fazer da tradução um
mecanismo de dirimir vidas. Embora mencione que, ao trabalhar textos mais complexos,
traduz todo o texto para os aprendizes, fala também de traduzir termos que os aprendizes não
conhecem. De qualquer modo, em ambos os casos, a tradução é vista como mecanismo de
esclarecimento, facilitadora da compreensão.
[Excerto 5]
P: Você usa tradução em suas aulas de Inglês Instrumental?
Jaqueline: Uso, sim.
P: Como que você usa?
Jaqueline: Bem, às vezes (+) teve aulas de eu traduzir o texto todo para melhor compreensão dos
aprendizes, principalmente quanto o nível do texto tá um pouco mais elevado. E às vezes quando
algum aprendiz pergunta o significado de alguma coisa ou às vezes no momento que eu falei, do
aquecimento, da aula inicial, assim, eu coloco o termo em inglês e se eles o sabem o que é, eu
traduzo.
Nota-se o mesmo fenômeno em uma descrição que Jaqueline faz de suas aulas:
[Excerto 6]
Jaqueline: Bem, no primeiro momento da aula a gente conversa sobre o assunto principal do texto
que eu preparei pra aquele dia. , a gente conversa (+) Às vezes eu faço um brainstorming (+) no
quadro (+) Ou às vezes a gente só conversa mesmo (+) Depois eu passo o texto pra eles. Às vezes eu
peço uma leitura, né, antes de fazer os exercícios. Às vezes a gente discute. Depois que eles leram o
texto a gente discute, antes deles fazerem os exercícios. E eles fazem os exercícios. São sempre
baseados em (+) compreensão do texto mesmo, né? E (+) tradução de alguns termos, tanto do
português pro inglês quanto do inglês pro o português. Às vezes identificar alguma palavra no texto
que significa aquilo. Alguma coisa (+) nesse sentido. E aí depois a gente corrige os exercícios.
Ao tratar do papel da tradução no ensino de línguas, Jaqueline também afirma:
[Excerto 7]
P: É (+) Na sua opinião, qual o papel da tradução no ensino de línguas?
Jaqueline: Bem (+), bem (+), o papel da tradução é (+) fazer o aluno ter certeza de que o que ele
aprendeu é aquilo mesmo. Porque (+) é muito mais fácil a gente pensar na língua (+) nativa do que
na língua que a gente tá aprendendo.
P: Ok.
Jaqueline: Então muitas vezes a tradução torna-se necessária nesse sentido. A gente confirmar que
aquilo é realmente o que eu tô pensando.
Define, ainda, a tradução da seguinte maneira:
[Excerto 8]
P: É (+), e como você definiria tradução? O que é tradução pra você?
Jaqueline: tradução é (+), eu passar (+) alguma coisa de uma língua (+) pra outra língua.
100
Percebe-se, então, que assim como seus professores, Jaqueline associa tradução
imediatamente a equivalência lexical para fins de esclarecimentos. É algo geralmente
fornecido pelo professor em caso de o aprendiz ter problemas de compreensão na língua
estrangeira. Isso é notável primeiramente pelas lacunas deixadas pela simplicidade da sua
definição de tradução – “passar alguma coisa de uma língua para outra língua”: passar o quê?
Palavras? Textos? Quem deve passar? O professor? O aprendiz? O dicionário? Todos estes?
Passar como? Oralmente? Por escrito? Essa perspectiva parece ser herdada de enfoques
estruturalistas de ensino, como explicam Hutchinson e Waters (1987) e Cervo (2003) e
teorias de tradução limitadas a equivalência formal, como a de Catford (1980).
A questão da tradução limitada a trechos isolados também se percebe em suas aulas,
segundo as anotações
71
feitas durante as observações de suas aulas (o trecho a seguir foi
retirado das notas de campo da terceira aula observada):
[Excerto 9]
Após este aquecimento, Jaqueline corrige o exercício 1 (uma questão de “verdadeiro” ou “falso” em
português) e o exercício 2. Então escreve no quadro a tradução para o inglês das palavras técnicas do
exercício. Os aprendizes participam da correção voluntariamente. Jaqueline explica a relação entre as
palavras “develop”, “developed” e “developer” traduzindo cada uma delas.
E ainda (trecho da quarta aula observada):
[Exerto 10]
Ao término das correções, Jaqueline divide a turma em dois grupos para uma competição. O jogo se
baseia em uma série de tiras de papel com algumas sentenças para revisão (relacionadas às do teste).
Algumas sentenças estão gramaticalmente incorretas. Cada grupo deveria escolher ao acaso uma tira
de papel e dizer se a sentença está correta ou incorreta, além de explicar porque. Cada componente
de um grupo que escolhesse a sentença, deveria lê-la em voz alta, em inglês e a professora a
escreveria no quadro. Durante o jogo, os aprendizes tentam traduzir as sentenças antes de dizer se são
corretas ou incorretas. Após ouvir as respostas, Jaqueline fornece mais esclarecimentos e, alguns
casos, traduz a sentença.
Além de confirmar o uso de tradução para esclarecimento de dúvidas e/ou como
aplicável a trechos específicos, é evidente também a tradução como uma forma de confirmar
a coerência gramatical das sentenças. Isso também é perceptível nas anotações de campo de
uma aula que Jaqueline deu sobre o superlativo:
[Excerto 11]
71
Reitero que as anotações de campo não são dados primários de pesquisa, pois o número de observações não
foi suficiente para estabelecer com segurança uma relação entre crenças e ação em sua completude.
101
Jaqueline escreve no quadro:
Mainframes are more expensive than PCs.
Pergunta, então, aos aprendizes o que compreenderam. Um aprendiz responde com a tradução da
sentença e Jaqueline o elogia. Em seguida, ela repete o mesmo procedimento com outras sentenças:
PCs are cheaper than mainframes.
Mainframes are bigger than minicomputers.
Ela utiliza as sentenças para explicar os comparativos. Faz perguntas à classe com bastante
freqüência. Os aprendizes estão todos envolvidos. À medida que explica as regras para o uso dos
comparativos, sublinha palavras comparativas. Um deles pergunta se less é “pouco”. Jaqueline
responde dizendo que less é “menos”. Jaqueline pergunta aos aprendizes se até o momento
entenderam a explicação e os aprendizes respondem afirmativamente.
Jaqueline pede aos aprendizes que comparem os PCs aos mainframes até conseguir a sentença “O PC
é menos potente que o mainframe”. Escreve, então, a sentença em português e, em seguida, em
inglês, no quadro:
PCs are less powerful than mainframes.
Ela usa a sentença acima para explicar os comparativos de inferioridade e segue o mesmo
procedimento para explicar os comparativos de igualdade, usando a frase “Os laptops são tão caros
quanto notebooks” com a seguinte tradução:
Laptops are as expensive as notebooks.
Nota-se também que Jaqueline tem uma concepção de tradução centrada no professor
no sentido de, quando não o dicionário, é ela quem fornece as respostas certas. Por exemplo:
[Excerto 12]
P: (risos). (+) É (+) Ah, eu perguntei pra você, como é que você usa a tradução(+) em sala de aula.
Aí, você me disse que às vezes você (+) é (+) traduz o texto todo para melhor compreensão dos
alunos (+) é (+) eu queria te fazer uma pergunta. Eu queria esclarecer (+) quando é feita essa
tradução do texto todo, quem é que faz a tradução? É (+) você que faz?
Jaqueline: É. Mais eu.
P: Mhm.
Jaqueline: Principalmente quando o texto é um pouco mais complicado, (+) que eu vejo que eles
não tão conseguindo responder as questões (+)
P: Mhm (+)
Jaqueline: Daí eu auxilio.
P: Como é feita a tradução? Você (+) dá por escrito?
Jaqueline: Não. A gente vai lendo (+) O primeiro parágrafo, por exemplo (+) Às vezes eu pergunto
pra eles: “Quê que vocês entenderam daqui?” E eles vão dizendo. E aí às vezes (+) eu traduzo,
literal. E às vezes fica só no (+) “é realmente, tá dizendo isso, isso e isso.”
Isso mostra um outro lado da abordagem de ensinar de Jaqueline. Evidenciam-se duas
posturas conflitantes: a) os alunos resignificam as idéias do texto oralmente e b) a professora
“entrega” a tradução literal aos alunos. Neste trecho, ela reconhece a segunda situação
como tradução. Ela de fato explora o conhecimento prévio dos aprendizes, como mostra a
transcrição de um trecho de uma de suas aulas abaixo. Neste trecho, a professora fazia um
102
brainstorming a respeito de tipos de computadores antes de introduzir o texto Types of
Computer:
[Excerto 13]
Jaqueline – Quais os tipos de computador que você conhece?
AA – (****) Palm, palm top
Jaqueline- Palm top ou.. handheld. Vocês sabem o que é handheld? Por que ele se chama assim?
AA – (****)
Jaqueline – Hand, mão. Held.. segurando. Certo?
/.../
A- (+) Minicomputador é intermediário.
Jaqueline – Intermediário entre quem?
A Porque você tem o mainframe, grandão. Você tem o microcomputador, bem menor,... Ele é tipo
um ponto médio, entendeu? Você não pode classificar como mainframe porque é bem maior, mini,
bem menor. O micro é intermediário.
Jaqueline – Aí, sim. Aí você foi bem.
/.../
Jaqueline – Quais as características do microcomputador ou PC? O que que é PC?
As – Computador Pessoal.
Jaqueline – Personal.. Computer. Quais são as (+) características dele?
A – Acessível.
Jaqueline Acessível. Pra quê que ele serve? Qual é a maior (+) qual é a maior população que
utiliza?
A – Uso doméstico e comércio.
Jaqueline – Uso doméstico e (+) ?
A – Comércio.
Jaqueline – Isso. Muito bem. O notebook e o laptop.
/.../
Jaqueline – Notebook e o laptop. Quais são (+) Quem (+) mais utiliza esse tipo de computador?
A – Executivo.
AA – (****)
Jaqueline – E quem mais? Executivo (+) Em que situação vocês usariam um notebook ou um laptop?
Jaqueline/ AA – (****)
AA – (****) Daqui uns dias na faculdade todo mundo tem um.
/.../
Ou seja, ao mesmo tempo em que Jaqueline sofre a influência de abordagens de
ensinar mais democráticas, como aquelas propostas em Celani et al. (2005), ela também é
influenciada por abordagens mais tradicionais como o MGT, descrito por Hood, Solomon e
Burns (1996).
4.1.2.2. Tradução e uso da LM dos aprendizes
Percebe-se no excerto 3 que Jaqueline parece não fazer sempre uma distinção clara
entre uso de LM e uso de tradução quando afirma: “[os professores] falavam em inglês,
desculpa. E (+), alguma dúvida que a gente tivesse, não tinha tradução não!”. Imediatamente
após fazer estas afirmações, ela continua:
103
[Excerto 14]
P: E aí eu queria saber como você se sentia em relação a isso (+) Você achava isso um procedimento
necessário, correto, (+) você achava que não deveria::
Jaqueline: Não. É (+) como o propósito desses cursinhos é de falar, escrever, entender (+) e? ((risos
- começa a contar nos dedos, como que tentando relembrar algo)) Falar, entender, escrever (+) e ler!
Então, eu acho que (+) realmente as aulas tinham que ser em inglês mesmo pra gente (+) tar em
contato com a língua o tempo inteiro.
E em seguida:
[Excerto 15]
P: Mhm (+) E a sua opinião sobre isso é que naquele momento::
Jaqueline: É. Eu acho que como o objetivo era de(+) adquirir as quatro habilidades da língua, eu acho
que(+) realmente tinha que ser em inglês pra gente tar em contato com a língua o tempo inteiro.
Tanto entendendo a professora falando, quanto a gente falando o inglês, treinando tudo!
Pode-se inferir destes trechos, então, a seguinte relação feita por Jaqueline quanto à
tradução: não ter tradução significa dar aulas em inglês. Logo, em alguns momentos, para ela,
traduzir é o mesmo que usar a língua materna do aprendiz. Esse tipo de confusão é comum
entre professores de inglês e pode ter sido uma das causas das disparidades nos resultados da
pilotagem para este estudo.
4.1.2.3. Ambientes apropriados para o uso de tradução
Apesar de Jaqueline somente ter experimentado até então o ensino de Inglês
Instrumental, ela afirma que, se tivesse oportunidade de dar aulas em um ambiente
semelhante àquele em que aprendeu inglês, também não usaria tradução:
[Excerto 16]
P: Mhm. Se você fosse dar aula num ambiente desse, você usaria tradução?
Jaqueline: Nesse ambiente, o. Até mesmo porque é regra da instituição que não se use (+)
tradução, não se use a língua portuguesa em sala de aula. Então (+) depende das regras da instituição,
né? [[Pra gente saber se usa ou não.]]
P: [[Mas se você tivesse liberdade de usar, você usaria?]]
Jaqueline: Nesse tipo de curso de inglês, não, justamente por causa do que eu te falei: que o objetivo
é adquirir as quatro habilidades, então, (+) acho que não tem necessidade de usar tradução.
Confirma-se que Jaqueline endossa a crença de que em ambientes de cursos de inglês
onde se ensina as habilidades de falar, ouvir, ler e escrever não espaço para tradução. Em
outras palavras, ainda que, diante das explicações do professor em língua estrangeira, o
aprendiz o compreenda o que se passa em sala de aula, e o desempenho do professor em
104
sala de aula não seja satisfatório, e com isso se sacrifique a comunicação, não se deve
traduzir. Em vez disso, o aprendiz deverá, posteriormente “se virar”, com o uso de
dicionários ou “de qualquer forma para decifrar significados. Situações como esta causam
um problema. Embora se veja vantagem no estímulo à pesquisa como via de
desenvolvimento da autonomia do aprendiz (o fato de se recorrer ao dicionário), o fato de
esta consulta ser feita posteriormente ao momento da comunicação faz com que este
momento seja comprometido, pois a comunicação não foi completada com êxito. Ou seja, o
receptor não “recebeu” a mensagem apropriadamente. Melhor seria propor uma atividade
tradutória como as sugeridas por Duff (1989) e Deller e Rinvolucri (2002), em que o aprendiz
teria a oportunidade de recorrer à LM a tempo de concluir a tarefa.
A informante não a tradução como uma quinta habilidade comunicativa, como
apontam Janulevičienė e Kavaliauskienė (2004), mas reproduz o discurso vigente no contexto
de ensino/aprendizagem de inglês no Brasil, que é resultante de uma imposição imperialista
(Moita Lopes, 1996) e de uma crença, resultante do MGT, de que a tradução consiste em um
“processo de troca de rótulos com equivalência paritária completa entre correspondentes
lexicais” (Ridd, 2003, p. 97).
Assim como os respondentes do questionário piloto, é notável que Jaqueline faz uma
distinção clara entre o ambiente de ensino de Inglês Instrumental e o de ensino de inglês em
escolas de idioma: no primeiro deve-se usar tradução; no segundo, não, pois ela crê que a
tradução impede o aprendiz de estar em contato contínuo com a língua inglesa, e impede
também o aprendiz de “treinar tudo”, ou seja, treinar o ouvir, o falar, o ler e o escrever em
língua inglesa. Uma das causas desta distinção pode ser o fato de Jaqueline ter feito um curso
de tradução após o término de seu curso regular de inglês, ou seja, sua experiência reforça a
crença de que a tradução deve ser usada em ambientes de ensino de inglês para fins
específicos.
Tais crenças da informante corroboram as afirmações de Phillipson (1993) e
Carnagarajah (1999) a respeito de como as ideologias dos países centrais quanto ao
ensino/aprendizagem de L2 ecoam nos países periféricos no ensino/aprendizagem de LE.
Outro aspecto notável é a influência da instituição sobre as crenças. No excerto 16, a
entrevistada ressalta que as normas da instituição devem ser seguidas sem questionamento. A
esse respeito, Gimenez (2004, p. 172) afirma “... para que os professores não fossem apenas
proletários seria necessário que seu trabalho envolvesse algum grau de liberdade para tomar
105
decisões e a existência de uma base de conhecimentos que lhes permitissem responder às
demandas contextuais e localizadas”. No caso de Jaqueline, ela pode ter tido professores que
não tiveram o direito à autonomia e isso pode ter sido uma das causas de ela pensar desta
forma.
4.1.2.4. A tradução em sala de aula
Enquanto aprendiz, Jaqueline não era estimulada a valer-se de nenhuma estratégia
declarada de tradução, e isto também não ocorre em sua prática. Ou seja, apenas usa o
dicionário e discute as possibilidades de acerto ou erro. Também não era encorajada a utilizar
outra fonte de pesquisa que não o dicionário, conforme consta nos excertos 1 e 2, acima.
Tal postura se reflete em sua prática, segundo os trechos abaixo das anotações de
campo que correspondem, à segunda aula:
[Excerto 17]
A professora traz dois dicionários para a aula: um monolíngüe e outro bilíngüe. (...) Diz que isso é
um resumo de suas explicações e pergunta se os aprendizes têm dúvidas. Distribui, então, uma
apostila com um texto entitulado Types of Computers e alguns exercícios de interpretação.
Disponibiliza seus dicionários para a turma e pede aos aprendizes que tentem fazer os exercícios. Ela
se senta enquanto os aprendizes trabalham. Um deles pergunta se pode responder às questões em
português. Jaqueline responde que deve. Também diz que, no dicionário, laptop e notebook têm a
mesma definição. Todos os aprendizes trabalham em silêncio, como se estivessem fazendo um teste.
Depois de alguns minutos, Jaqueline começa a caminhar pela sala, monitorando os aprendizes e
dando explicações individuais.
Em outras palavras, Jaqueline parece acreditar ser a tradução uma atividade que não
requer o uso, ensino e aprendizagem de estratégias específicas, como por exemplo, o cotejo
com outros textos afins em LM, pesquisas em enciclopédias e glossários, especialmente na
Internet (Pagano, 2003b), bastando o uso do dicionário e posterior discussão e correção para
que seja realizada. Quanto a isso, Pagano (2003b, p. 41) adverte que “... o dicionário está
longe de ser o recurso mais bem utilizado”. Atribui ainda à exclusividade de sua utilização
“alguma crenças ainda existentes em relação à tradução que apontam para o dicionário
bilíngüe (...) como sendo a única ferramenta disponível e indispensável para o tradutor.”
Fracaro (2002, p.107) aponta a falta de uso de estratégias para traduzir como resultado de
uma concepção equivocada da tradução. Afirma ainda: “Para que esse panorama mude é
preciso mudar a visão dos professores sobre ela. E para mudar essa visão é necessário
106
conhecer primeiro o pensamento, concepções, medos e incertezas desses profissionais.” Nisto
reside a razão de ser desta pesquisa.
4.1.2.5. Tradução e o nível de proficiência dos aprendizes na LE
Na vivência de Jaqueline enquanto aprendiz explicitada no exceto 4, ela foi
estimulada a pensar que tradução é para aprendizes iniciantes. É bem provável que isto esteja
relacionado ao fato discutido acima de ela não parecer ver a tradução como algo que
estimule o aprendiz a pensar e desenvolver autonomia, mas algo pronto produzido pelo
professor o que reafirma o professor como detentor absoluto de conhecimento, tal qual no
todo Gramática e Tradução e que faz com que o aprendiz fique cada vez mais dependente
dele. Talvez também por isso, como ela mesma afirma, fosse evitada a todo custo. Isso
confirma a crença de que tradução é igual ao uso de LM, a qual deixa de ser tão necessária
com o tempo. Esta experiência de Jaqueline pode ter resultado na crença de que a tradução é
para turmas lingüisticamente heterogêneas:
[Excerto 18]
P: O que você acha de usar tradução em aulas de Inglês Instrumental?
Jaqueline: Eu acho necessário, justamente por causa dessa heterogeneidade da turma. Então, alguns
aprendizes conseguem entender o texto pelo contexto (+) ou viram alguns termos ali. que
outros não conseguem, né? É um pouco mais difícil. E aí, que entra a tradução pra ajudar um
pouco.
4.1.2.6. A tradução no material didático
Perguntei a Jaqueline se ela utilizava tradução no material didático, ao que ela
respondeu que sim e explicou como procedia conforme se segue:
[Excerto 19]
Jaqueline: Por exemplo, seu eu dou um (+) às vezes eu dou um texto e(+) tiro uma frase daquele
texto e peço pro aluno dizer em português o quê que ele entendeu daquele pedaço.
P: Mhm.
Jaqueline: Ou então, peço o aluno pra (+) listar os pontos mais importantes do texto. Isso é tradução
também, né?
Do excerto acima percebe-se mais uma vez que Jaqueline trabalha com tradução de
frases específicas, mas também introduz a tradução como compreensão das idéias principais
do texto.
107
A entrevistada também revela, no trecho abaixo, que desenvolve o seu curso de Inglês
Instrumental a partir da consulta de material didático já existente:
[Excerto 20]
P: E aí, o seu material didático (+) o material que você usa em sala (+) com os aprendizes (+) você
tira de que tipo de (+) de (+) Ou [[você mesma que elabora?]]
Jaqueline: Bem, eu preparo, que eu (+) às vezes eu pego texto pronto, de livro, com alguns
exercícios. Às vezes eu adapto os exercícios (+) Ou então da Internet. Pego algum texto de outra
disciplina que eles estejam vendo, e aí eu vou lá na internet, procuro alguma coisa daquilo, pra haver
interdisciplinaridade também, que eu acho isso muito importante(+) E eu vou fazendo(+) Eu
mesma preparo, tal. E às vezes eu pego pronto também. Não vô negar não. ((risos)).
P: Ótimo (+) Que tipo de (+) de (+) questão você coloca nos exercícios para os aprendizes
responderem?
Jaqueline: Eu tento intercalar um pouco. Dar um texto com a parte de interpretação mesmo (+) e dar
dicas gramaticais. De verbos, de sujeitos, de pronomes (+) que estão se referindo a outros nomes (+)
Uh (+) conectivos, prefixos e sufixos (+) isso tudo é Inglês Instrumental também. E eu tento
intercalar. Porque (+) uma aula (+) uma aula é pouco até pra gente dar essa parte de gramática. [[Ás
vezes]]
O material didático utilizado por Jaqueline na maior parte do tempo faz uso de
tradução, e, em especial, na amostra abaixo, que constitui parte de uma apostila:
[Excerto 22]
WHAT IS A COMPUTER
A computer is an electronic machine which processes data and provides the results of the
processing as information. Modern-day computers process information in the form of binary numbers.
Binary is a counting system that uses the numbers one or zero (and not zero through nine). The
advantage of this system is that you only need two symbols to express any number, independently of
how big it is. So, a computer is a glorified calculator that can do millions of binary calculations for a
second.
After being converted into 0s and 1s, the data are then changed into electrical impulses which
travel over a cable to the computer, where they are stored in memory. Each computer word, called a
byte, is assigned a place in a memory cell to wait processing. The data, now in the memory cells, are
acted upon and processed according to the program being used.
The output, or final result, is then achieved and converted back into numbers and letters,
which are displayed on a TV screen or printed on paper by a printer.
In addition, there are typically two types of computers: those built by Apple Computer, called
Machintoshes or “Macs”, and those called PCs, or “personal computers”. These PCs were originally
designed by IBM and are sometimes referred to as “IBM compatibles”.
Today, PCs have a variety of different parts, but the majority use Intel processors, which are
controlled by an operating system called Microsoft Windows. An operating system is the program that
controls the computer. PCs use Microsoft Windows. Macs use the MacOS operating system. Programs
for Macs do not run on PCs. As a general rule, programs for PCs do not run on Macs.
Adapted from: http://www.cyberwalker.net/columns/aug01/090801.html and GALANTE, Terezinha
Prado. Inglês Básico para Informática. São Paulo: Atlas, 1992.
1) Conforme o texto, responda em português às questões abaixo:
a) O que é o sistema binário?
108
b) Quais são tipicamente os dois tipos de computadores?
c) O que ocorre depois que os dados são convertidos para o sistema binário?
2) Em que parágrafo encontram-se as seguintes informações?
a) Quando o resultado final é alcançado, é convertido outra vez em números e letras.
b) Como regra geral, programas para PCs não rodam em Macs.
c) O computador é uma gloriosa calculadora que faz milhões de cálculos binários por
segundo.
O fato de a interpretação de texto ser feita em português requer que os aprendizes
façam tradução nos moldes da retextualização defendida por Travaglia (2003), que, para
fazer estes exercícios os estudantes têm que lidar com conhecimentos lingüísticos,
conhecimento de mundo, conhecimentos partilhados, informatividade, focalização,
inferência, relevância, fatores pragmáticos, situacionalidade, intertextualidade,
intencionalidade e aceitabilidade na LE e na LM. Contudo pesquisadores na área de
Instrumental (Celani et. al., 2005) não costumam reconhecer abertamente este processo como
tradução.
4.1.3. Crenças e experiências
Jaqueline não acredita que sua experiência como aprendiz tenha influência sobre sua
prática, como evidencia abaixo:
[Excerto 23]
P: É? acha que o que você aprendeu nesse curso tem alguma influência na maneira como você
ensina? Alguma coisa que você aprendeu lá que você usa(+)
Jaqueline: Não! Eu acredito que não.
P: Não? A maneira de trabalhar os textos (+)
Jaqueline: Não. Acho que não.
P: Trabalha diferente, então?
Jaqueline: É.
Ainda assim, o quadro abaixo é uma tentativa de sintetizar as crenças de Jaqueline a
respeito de tradução e suas possíveis relações com as experiências da informante enquanto
aprendiz e também enquanto professora:
109
Crenças sobre tradução Possível relação com as experiências
Tradução é sinônimo de uso oral de LM, em
sala de aula, por professores e aprendizes.
O único uso de língua materna nas aulas de inglês de Jaqueline, enquanto aprendiz, ocorria quando o
professor traduzia palavras e/ou expressões que não tinha conseguido explicar por meio de outros
recursos. Assim, pode ter havido, por parte de Jaqueline, associação em que traduzir é
necessariamente usar LM oralmente em sala de aula, associação esta negativa por simbolizar um
fracasso de compreensão pelos meios pretendidos pelo professor.
Tradução é atividade escrita que se desenvolve
por meio de uso de dicionário e posterior
discussão entre professor e aprendizes quanto a
escolhas vocabulares.
Durante os dois cursos que fez em que se praticava tradução, eram estas as únicas estratégias de
tradução utilizadas em sala de aula. Quanto ao dicionário, Jaqueline foi muito estimulada a utilizá-lo
durante sua aprendizagem de inglês, primeiro quando não entendia as explicações dos professores no
curso convencional e estes costumavam se recusar a usar tradução assim ela pesquisava, ou, como
ela mesmo diz, “se virava, ia atrás no dicionário”, e depois quando fez os dois cursos que envolviam
prática de tradução e era costume levar vários tipos de dicionários para a aula.
A tradução é um mecanismo de esclarecimento
de dúvidas sobre vocabulário e gramática, mas
também mecanismo de compreensão textual.
No decorrer do tempo em que estudou inglês em uma escola de idioma, a tradução era utilizada
pelos professores para esclarecer dúvidas dos aprendizes.
A tradução é um mecanismo de compreensão
textual.
Os materiais didáticos que a informante utiliza em sala de aula possuem exercícios que envolvem a
identificação e expressão, em língua materna, das idéias principais do texto e demais partes
compreendidas pelo aprendiz e Jaqueline vê isso como tradução.
A tradução é aplicável especificamente a
palavras, expressões e/ou frases tradução
pontual.
Esta é mais uma crença que pode estar relacionada à experiência de Jaqueline enquanto aprendiz de
língua inglesa: mais uma vez relembra-se que neste ambiente a tradução era o último recurso utilizado
por seus professores pra esclarecer dúvidas de compreensão.
A tradução deve ser fornecida pelo professor. Outra vez, há relação com o procedimento dos professores do curso de inglês de Jaqueline de traduzir
apenas no caso de não haver compreensão dos aprendizes. Nesta ocasião, o próprio professor fornecia
a tradução. Nos casos dos cursos que envolviam prática de tradução, embora os aprendizes
apresentassem várias possibilidades, a professora “corrigia”, ou dava a resposta final.
A tradução é ideal para ser usada em ambientes
de ensino de inglês com fins específicos
A informante teve oportunidade de tratar abertamente da tradução, e de ser estimulada por seus
professores a fazê-lo, em cursos específicos de tradução. No curso convencional de inglês, não.
A tradução é ideal para aprendizes que m
dificuldades com a língua estrangeira ou que
estão em nível inicial de aprendizagem
Jaqueline conta que, embora traduzir fosse uma prática evitada sempre em seu curso de inglês, no
início “as professoras eram mais maleáveis” e traduziam alguma coisa que os aprendizes não
entendessem.
Quadro 9: Possíveis relações entre as crenças de Jaqueline sobre tradução e suas experiências
Pode-se inferir algumas concepções aparentemente controversas das maneiras como
Jaqueline a tradução: a) sinônimo de uso de LM, mas também uma atividade escrita que
se desenvolve por meio de uso de dicionário e posterior discussão entre aprendizes e
professor quanto a escolhas vocabulares; b) mecanismo de esclarecimento de dúvidas sobre a
vocabulário e gramática, mas também mecanismo de compreensão textual; c)aplicável
especificamente a palavras, expressões e/ou frases, mas também à compreensão de idéias
principais de um texto; e d) é recebida “pronta” do professor, mas também é fruto de pesquisa
do aprendiz no dicionário e/ou discussão entre aprendizes e professor.
Estas inconsistências refletem alguns resultados da pilotagem e demonstram que o
fato de existirem professores de inglês que não sabem bem ao certo o que pensar sobre a
tradução pode se dever à falta do preparo destes para lidar com ela. Ou ainda, à diversidade
de “vozes que ecoam na mente do professor: a voz da experiência como aprendiz, da
experiência prévia de ensino, das profissionais da língua que passaram por sua vida ou que
são ícones da Lingüística Aplicada pelos quais ele nutre admiração, a voz do material
didático e do seu status diante dos colegas. (Richards; Lockhart, 1994; Garbuio, 2006)
No caso de Jaqueline, ela não teve a oportunidade de fazer muitas leituras a respeito
de Teoria da Tradução na universidade. O mais perto que chegou de uma reflexão sobre o
assunto foi na disciplina sobre Tradução, como menciona no excerto 2, mas mesmo assim, só
se lembra da parte prática. Acredito que se a informante tivesse tido a oportunidade de se
aprofundar no assunto, poderia estar tirando maior proveito da tradução em suas aula, uma
vez que tem disposição para refletir sobre sua prática e aprimorá-la.
4.2. Rose
4.2.1. Dados Biográficos
Rose tem 34 anos de idade e é estrangeira. Seu país tem o inglês como língua oficial,
mas também se fala uma língua crioula. Tem boa fluência em língua portuguesa, e falou
português durante toda a pesquisa.
Quanto às suas experiências enquanto aprendiz de línguas, a entrevistada conta que
foi alfabetizada pela mãe. Apesar de seu país não se tratar mais de uma colônia britânica, a
entrevistada considera ser o sistema educacional semelhante ao sistema inglês. Assim,
quando tinha por volta de onze anos de idade, cursou o que ela denomina high school e
começou a estudar a língua inglesa, espanhola e francesa formalmente. Aos treze anos,
precisou escolher entre alguns agrupamentos de matérias. Havia a área de línguas, que inclui
Inglês, Francês, Espanhol, Literatura e História, e também a parte de ciências e a parte de
negócios. Rose optou pela primeira opção. Ela considera esta segunda fase escolar, que vai
até os quinze anos de idade do aprendiz, mais complexa, como se nota logo abaixo:
[Excerto 25]
Rose: [[É porque]] assim, no high school level era uma coisa mais simples, né, só que nos dois anos
que você escolhe as matérias, de treze a quinze aí é mais assim, uh, puxado, você aprende ler,
aprende ouvir, porque a prova é dividida em partes, a parte da gramática é puxada, tem que determ- /
às vezes tinha coisa pra preencher branco, mas não uma coisa fácil, era uma coisa mais, assim, de
você pensar que forma da gramática, tempo verbal em espanhol. tinha uma prova oral, que você
tinha que fazer uma leitura, eles faziam perguntas, eu acho que era sobre fotos, aquela coisa toda.
Isso já na primeira parte. Aí, nos últimos dois anos, já é mais puxado ainda, porque além de ouvir, cê
tem que fazer redação em francês ou espanhol, tem que preparar um speech, pra o exame oral.
eles trabalham temas da atualidade, tipo, naquela época era terceira idade, gastronomia, então aí,
tinha Literatura também.
P: Mhm.
Rose: Que a gente tinha que escrever redação, em espanhol.
Nesta mesma época, começou a ter aulas particulares de Francês e Espanhol. Ela
descreve estes dois momentos, respectivamente, abaixo:
[Excerto 26]
Rose: era um professor francês, né, ele falava francês. Tinha aula particular em espanhol. Era
professor de lá, mas falava tudo em espanhol. A hora que a gente treinava ouvir, normalmente os
testes de ouvir são puxados. É (+) Quê mais? eu fazia amizade, às vezes tinham estrangeiros que
iam pra (+) pra / meu pai que me empurrava pra (isso assim) bastante. A gente fazia amizade.
Às vezes tinha o pessoal que ia trabalhar nas empresas de petróleo, aí, eu fazia amizade, de vez
em quando tinha algum francês, tipo tem aquela empresa (*), é, uh, internacional. Aí iam
venezuelanos é, ou pra trabalhar ou pra estudar inglês.
P: Aí, cê aproveitava [[pra]]
Rose: [[Aí a gente]] fazia trocas, amizade com gente no shopping.
P: Olha só! Aí cê chegava, abordava [[as pessoas]]
Rose: [[É, assim, né. ]] No início, eu sou tímida. Incrível, né?
P: Não parece!
Rose: Pois é, eu acho que, assim, eu sou menos tímida nas línguas estrangeiras do que na em inglês.
Por que? Porque, assim, eu tinha essa coisa de querer estudar, de aperfeiçoar, /.../
O fato de chegar ao ponto de vencer sua própria timidez para fazer amizades com
estrangeiros e abordar estrangeiros no shopping demonstra que a informante tinha motivação
intrínseca para aprender LEs. Outro aspecto relevante é que nos excertos 25 e 26 Rose utiliza
com freqüência na entrevista o termo “puxado” para descrever sua história de aprendizagem.
Rose continua a descrever o seu percurso educacional. Ela cursou Letras
bacharelado, com duração de três anos, em uma universidade local. Optou por cursar dupla
habilitação em francês e espanhol, e descreve seu curso segundo os dois excertos abaixo:
112
[Excerto 27]
Rose: Então, tem vários tipos de, nas humanas, né. Então eu optei por dupla habilitação francês
espanhol. Então, como que é? È dividido com as habilidades. Então, você tem, reading, writing,
listening, speaking, uh (+) quê mais? tem, às vezes, no primeiro semestre, gramática, mas não a
gramática bê-a-bá. Totalmente, assim, pontos, assim, só pra lapidar o seu conhecimento da gramática
em língua estrangeira.
[Excerto 28]
Rose: /.../ Aí, assim, normalmente, a gente tinha aquela mistura de professores. O professor nativo, o
pessoal da Espanha, ou da Venezuela, ou (+) tinha de também, que tinha morado fora e (+) no
geral / no francês, sempre tinha o pessoal francês. Aí, eu optei assim, então habilitação francês
espanhol. a gente tinha assim, de manhã às oito poderia começar com (+) sei lá, uma aula de
conversação em espanhol. Poderia ser as duas horas, uma hora, e depois você ia pra uma aula de (+)
listening talvez em espanhol, de onze até uma hora, depende, ia ter aula de francês, que ia ser
compre-, reading comprehension, leitura, ou conversação, à tarde você poderia ir ter aula de literatura
francesa, a gente estudava temas da literatura. Era comédia, teatro, tragédia, franco-caribenha, o
espanhol era , uh, (+) tema da morte, o realismo maravilhoso, então tinha, né. Aí, então.
Nesta mesma época, Rose resolveu tomar aulas de língua portuguesa em seu tempo
extra. Suas merias destas aulas são as seguintes:
[Excerto 29]
P: Como é que eram tuas aulas de português? Era o mesmo esquema?
Rose: Era mais ou menos. Só que assim, o português era (+) uma OPÇÃO. Era, eu acho assim, tinha
parado o programa e tava voltando. Aí, assim, a gente começou do básico. que, assim, era como,
mais intensivo. Por quê? Porque (+) como a maior parte dos aprendizes que tavam estudando
tinham conhecimento (+) de espanhol, ou de francês, ou tavam fazendo os dois, já, aí era bem mais
rápido. Então, assim, o professor misturava, tudo assim, dava mais gramática no primeiro semestre.
Mas aí tinha, a gente aprendia aquelas coisas básicas, de (+) né, “tudo bem”, e tal, e tal. Aí a parte da
cultura, depois os outros semestres começou puxar porque (+) ele trabalhava de uma forma
muito mais criativa.
P: Mhm.
Rose: Tanto é tinha um momento que até o português interferia (+) no espanhol. Mas assim, ele
sempre assim, a gente, ele dava aquela bronca se a gente misturava espanhol e português.
P: Mhm.
Rose: Mas assim, ele fazia este / era, eu tava comentando isso hoje de manhã com o pessoal. Tirava,
ele era fotógrafo tam-.
P: Ah, que legal!
Rose: a gente fazia análise das fotos, às vezes gravava programas, né, pegava revista, e tal. Mas
eu, é, assim, além das coisas da aula, tipo, ele sempre dava leitura, ou um listening, ou uma coisa pra
escrever, então, aí, então, era muito mais um estilo que puxava a produção, do que apenas (+) coisas
(+) de de preencher branco, né?
P: É.
Rose: Particularmente nos nos últimos semestres ele fez assim.
A entrevistada continua sua narrativa tratando das atividades extraclasse que fazia
enquanto estudante de línguas estrangeiras:
[Excerto 30]
113
Rose: Então o laboratório ficava um pouquinho separado, assim, do prédio da Faculdade. Mas assim,
tinha uma mesa, grande, no início da semana os professores deixavam tipo, dez leituras em
espanhol sobre um tema pra gente refletir, mas assim, sempre um nível muito puxado. Nunca era
uma coisa (+) light, né? Aí, em francês, o pessoal trazia material da embaixada, e tal. Mas (+) eu ia,
meu pai me levava, né / a Embaixada Francesa tem um (+) serviço de (+) uma biblioteca, um serviço
cultural. cê poderia pegar revistas, fitas, e tal. E eu, também o meu tio comprou / naquela época
não tinha cabo, assim, tipo rádio de onda curta, eu pegava notícia assim, em francês, espanhol,
rádio França, também tinha, Hora de España. eu pe-, eu ouvia à noite isso, porque, eu morava
perto da universidade na época. /.../ E em português tinha o, a Faculdade de Engenharia, eles tinham
uma antena, parabólica ali. eu pegava gravações de , meu pai tinha um conhecido que, ele
também tinha / porque na época não tinha essas coisas de TV a ca- / eu pegava gravações, de vez
em quando a gente ia até a embaixada e pegava revistas (+) antigas, né, que eles recebiam a Veja. E
sempre iam brasileiros lá, pra estudar inglês. Aí eu fazia amizade. Depois, fazia amizade, e tal.
Rose evidencia que se sentia responsável pelo próprio aprendizado e reafirma sua
motivação para buscar novos recursos por meio de leituras, atividades de compreensão oral e
conversas com estrangeiros. Mais uma vez ela destaca, e parece valorizar, o caráter
desafiador de suas tarefas escolares a utilizar novamente o termo “puxado” e opô-lo a “light”.
A informante prossegue com uma declaração bastante interessante:
[Excerto 31]
Rose: /.../ Uma componente das provas que a gente trabalhava era a tradução. Que um teste, às vezes
os professores (colocavam) um texto DESTE tamanho. Por isso que aprendi a ser torturadora.
((risos))
P: ((risos))
Rose: Aí, dava um texto deste tamanho pra gente traduzir em uma hora.
P: Ahã.
Rose: Pra espanhol!
P: Ah, tô entendendo agora. ((risos))
Rose: Eu agora / sim, por causa deste sistema / eu sou produto deste sistema, entendeu? ((risos))
De, particularmente desses testes de de
P: Sei como é.
Rose: Aí cê tinha que dar conta. Cê dava conta ou então (+).
Rose trata, então, de como a tradução era trabalhada em seus cursos como
mecanismo de avaliação em que os aprendizes tinham uma hora para traduzir um texto
considerado por ela longo. Além disso, ela expressa o nível de rigor do teste ao declarar: “aí
tinha que dar conta”. Ela também revela que isso influencia sua atitude enquanto
professora quando diz que é “produto desse sistema” e que, com esta situação, aprendeu “a
ser torturadora”.
Quando a entrevistada concluiu seu curso na universidade, fez um curso de
interpretação, e chegou a fazer alguns trabalhos de tradução, como narra abaixo:
[Excerto 32]
Rose: /.../ Aí, eu voltei pra universidade e fazia o curso no final da tarde, um curso bem puxado,
porque tem, tinha que traduzir, ou pra inglês, ou pra espanhol e francês e era um / primeiro tinha
114
uma seleção pra entrar. E só nove pessoas entraram e cinco passaram. Então, assim, pra você ter uma
idéia como que era uma coisa de, era muito muito puxado mesmo, a gente levava até bronca, do
professor, e tal. depois, assim, eles chamam pra trabalhar, eu trabalhava de vez em quando, na
época, quando tinha trabalho, pegava de vez em quando, trabalho free lancer de tradutor.
Novamente Rose trata do grau de cobrança do sistema educacional do qual fez parte e
do rigoroso processo seletivo. Além disso, esta é a segunda vez que ela menciona “levar
bronca do professor” como indício de que havia um alto nível de exigência. Isso mostra que a
experiência de Rose com tradução segue os mesmos moldes de toda a sua experiência de
aprendizagem na escola.
Em seguida começou a dar aulas no curso e na universidade onde estudou. Depois de
algum tempo resolveu vir para o Brasil e assumiu o cargo de professora visitante em uma
universidade pública onde dava aulas para os cursos de Letras com habilitação em língua
inglesa, em língua francesa e tradão. Neste curso, ministrou disciplinas como “Teoria da
Tradução e “Tradução de Textos Gerais”. Na disciplina “Expressão Escrita”, deu aulas para
os estudantes de Letras Inglês e de Tradução juntos, como narra:
[Excerto 33]
Rose: Eu comecei com o pessoal de bacharel inglês, depois comecei a misturar, que era tradução,
inglês, francês, depois teve um (+) eu acho que nos últimos dois anos, assim, que eu fiquei, quase só
(+) na parte de tradução. Eu dava uma matéria de expressão escrita. E às vezes era interessante
comparar os alunos de Letras Inglês e os alunos de Tradução. Porque às vezes eu pegava os dois
numa mesma turma. Ai eu via a diferença no nível (+) dos alunos. Porque muitas vezes os alunos de
Tradução tinham mais (+) garra, assim.
P: Ahã.
Rose: Até na produção deles, eles tinham uma produção muito boa. Isso naquela época, né? Mas isso
foi a experiência da Instituição A”. Porque à medida em que eu comecei a trabalhar mais a
Tradução, aí eu comecei, assim, a dar Teoria de Tradução, aí eu tinha que pesquisar, ler os livros.
Neste mesmo período, era professora de Inglês Instrumental e Francês Instrumental e
fazia mestrado em Lingüística, na área de Análise do Discurso, na mesma universidade.
Atualmente faz doutorado na mesma área e não trabalha mais nesta universidade, mas dá aula
em duas faculdades. Em uma delas leciona para os cursos de Letras Inglês e Espanhol e na
outra tem uma turma de IIELA no curso de Sistemas de Informação. Também aulas em
uma escola de línguas, local onde se deu a pesquisa. Trata-se de um curso de Inglês
Instrumental com foco em leitura acadêmica, aos sábados, no período da tarde. Quanto ao
perfil dos aprendizes da turma por volta de quinze a informante diz que alguns estão
fazendo Pós-Graduação e outros não, e que têm como objetivo “facilitar, aprenderem mais
rápido. Outros têm pretensões de entrar nas, seja Mestrado ou Doutorado”.
115
4.2.2. Crenças sobre tradução
4.2.2.1. Concepção de tradão
Ao longo da entrevista, solicitei à informante que definisse tradução, ao que ela
respondeu o seguinte:
[Excerto 34]
Rose: Não vou falar / assim / vou falar agora bem como professora. Eu falo assim que é um (+) é um
diálogo! Um diálogo com o texto e com o outro. E como se você entrasse em outro mundo. Quando
eu trabalho com tradução e revisão de texto, eu esqueço de tudo. É um é um mundo assim (+) não sei
até colocar em palavras. É como se você (+) entrasse naquele texto, se envolvesse naquele texto, (+)
uma sensação, às vezes, que pode ser positiva ou negativa, depende de de de / você está
controlando o texto de outra pessoa, né? Você tem que (+) né, colocar o jeito que é apropriado,
assim, pra o público e pra quem fez o o texto.
P: Mhm.
Rose: Então, assim, pra mim, eu vejo como um diálogo, , e e pra mim assim / é porque quando
faço tradução, eu não / eu me desligo de tudo.
A palavra-chave para a definição que Rose propõe de tradução é diálogo – ou seja, há
que se interagir com o texto. Além disso, ela esboça qual o papel e responsabilidade do
tradutor, de “entrar”, de se “envolver” no texto, da possibilidade de controlá-lo, de levar em
consideração o público-alvo e de refletir sobre o que é apropriado para ele. O “entrar” e o
“envolver-se” no texto, são fatores fundamentais para o tradutor, e o “aprofundar-se na
língua”, o “pensar”, o “pesquisar”, o “raciocinar”, aspectos cruciais para os aprendizes de
leitura instrumental (Scott, 2005c) . Sua perspectiva aproxima-se da de Lavault (1998) e
Travaglia (2003).
4.2.2.2. O Papel da tradução no ensino de LE
Para Rose traduzir é benéfico e fundamental para o aprendiz, não apenas no ambiente
de Inglês Instrumental, mas também no ensino de línguas em geral:
[Exceto 35]
P: Mhm. Bom, e agora, saindo um pouco desse ambiente Inglês Instrumental, e indo mais pro
ambiente de ensino de línguas em geral. Na sua opinião, qual o papel da tradução no ensino de
línguas, no sentido mais amplo.
Rose: Eu acho assim que / eu pelo menos, assim, (+) bem fundamental, porque assim, eu acho que o
aprendiz começa a se aprofundar tanto na língua que o mesmo tanto dangua mais, aliás, no inglês,
no caso. Que (+) ele aprende a pesquisar, pensar, raciocinar. /.../
4.2.2.3. A tradão e o nível de proficiência dos aprendizes
116
Na continuação imediata do excerto acima, Rose afirma o seguinte:
[Exceto 36]
Rose: /.../ Assim, eu acho uma coisa que precisa ser bem dosada nos níveis sicos. Mas no
intermediário e avançado, é uma coisa que vale a pena. Pra pessoa desenvolver ainda mais a língua
estrangeira. E eles aprendem com isso que não podem generalizar em relação às regras. Muitas vezes
eles pensam que tem uma regra pra uma forma, e à medida que você começa a trabalhar com o
curso eles descobrem que não é bem assim.
Logo, ela entende que a atividade tradutória é mais apropriada para níveis mais
avançados de ensino/aprendizagem, assim como Titford (1983) e Tudor (1987a) e diferente
de Lavault (1998), Duff (1989), Deller e Rinvolucri (2002) e Travaglia (2003) que propõem
tradução para todos os níveis.
4.2.2.4.Tradução e autonomia
Quando Rose trata de tradução, muito freentemente a associa ao desenvolvimento
da autonomia dos aprendizes. O trecho abaixo ilustra esta postura:
[Excerto 37]
Rose: /.../ Como é um curso extremamente prático, tem aulas que não / como você notou, não tem
tanto conteúdo de, assim, de gramática essas coisas, ou de explicação de uma matéria. É mais assim
(+) eles aprenderem a pensar, de resolver sozinho, de usar o dicionário. Porque o meu objetivo, um
dos objetivos mesmo é de treiná-los a serem autônomos, de não ficarem dependentes de mim. Tem
vez que até eles fazem uma pergunta, ou uma palavra, deve notar que eu dou (muito rápido),
porque eu não quero que eles até aprendam aquela técnica de olhar (+) no dicionário. Então, assim,
têm aulas que são programadas nem pra tanta teoria, mas (+) pra eles poderem pegar o ritmo e
autonomia.
As anotações de campo corroboram esta atitude da informante. Em um dado
momento da primeira aula observada, Rose recolhe os dicionários da turma e leva-os a
procurar entender o texto lançando mão de outras estratégias, como se segue:
[Excerto 39]
Após concluir o trabalho com este texto, pede à turma que abra a apostila no texto What does
neoliberalism mean e distribui os aprendizes em grupos para que façam uma rápida primeira leitura
do texto. Logo depois de concluída esta etapa, Rose pede aos grupos que leiam o texto e procurem as
palavras-chaves e que resumam o texto. Ela recolhe todos os dicionários, ignorando as queixas de
alguns aprendizes. Escreve no quadro:
1. Seguir os passos de skimming/scanning e leitura extensiva
2. Identificar as palavras-chaves
3. Identificar a frase principal
4. Tentar responder as perguntas básicas (“O quê?”, “quem?”, “onde?”, “quando?”, “por
que?”, e “como?”)
5. Fazer um resumo em português (5 a 7 linhas).
Diz aos aprendizes que, para a realização deste exercício, terão um tempo limite. Diz
também que lerá o texto em voz alta para que os aprendizes possam começar a pensar a respeito.
117
Justifica o limite do tempo por não querer que os aprendizes façam uma tradução neste momento.
o texto em voz alta e alerta que este texto tem um estilo diferente do anterior e que sua linguagem é
mais técnica. Pede a um componente de cada grupo que faça uma lista das palavras técnicas e
desconhecidas encontradas no texto.
Neste trecho da aula, os aprendizes são estimulados a trabalhar sem os dicionários.
Ou seja, estão praticando estratégias que os levam à autonomia, tão valorizada por Scott
(2005b) quanto ao ambiente de aprendizagem de I.I.
Rose fez uso de várias atividades que pudessem desenvolver a autonomia dos
aprendizes. Segundo informações das notas de campo, em outras aulas houve apresentação de
trabalhos por parte dos aprendizes. Eles foram divididos em grupos de acordo com sua área
de interesse e cada grupo fez uma apresentação em português sobre um texto que eles
mesmos escolheram e traduziram. Durante as apresentações os aprendizes falavam de suas
escolhas vocabulares para realizar a tradução, distribuíram uma cópia do texto de partida e
sua tradução para os colegas, além de um glossário com os termos técnicos. Houve também
uma aula em que a professora distribuiu um texto aos aprendizes e os dividiu em grupos para
que cada equipe elaborasse uma prova sobre o material. Estas provas foram fotocopiadas e
distribuídas aos demais colegas, que as responderam.
4.2.2.5. Tradução e o nível de proficiência dos aprendizes na LE
A entrevistada entende que a tradução é mais adequada para os níveis intermediário e
avançado que para o nível básico de ensino/aprendizagem de inglês. Isso pode estar
relacionado com a sua própria experiência enquanto aprendiz, em que tinha que traduzir
textos que ela chama de “DESTE tamanho” quando estava nos mesmos níveis recomendados.
Assim, o curso de Inglês Instrumental em que suas aulas foram observadas e que é
coordenado por ela mesma – por ser ela a única professora da escola que o oferece – tem um
exame de seleção no início. Neste teste os aprendizes o avaliados em termos de
compreensão e produção escrita. Quando compara seu ambiente de trabalho neste curso e no
curso de Inglês Instrumental para Sistemas de Informação que oferece em uma faculdade,
afirma: “Por isso, aqui é mais fácil trabalhar porque todo mundo tem mais ou menos o
mesmo nível.”
4.2.2.6. A utilidade da tradução para o grupo
118
Rose atribui à tradução em torno de setenta e cinco por cento do conteúdo do curso, o
que é evidenciado abaixo:
[Excerto 40]
P: Uma outra coisa que eu queria saber, é (+) qual o papel que você atribui pra tradução dentro desse
seu curso, aqui, agora já saindo dessa comparação?
Rose: Olha, eu diria que, a tradução ocupa setenta por cento ou mais do curso, por causa dos
objetivos do trabalho deles. Porque se você notar, até nesses exercícios que eles tão fazendo agora,
eles têm que fazer tradução pra poder achar (+) os conectivos em alguns casos, a leitura. tradução
tem que raciocinar.. Então, assim, é uma, um peso muito grande. A tradução.
Rose chega a fazer um paralelo entre a utilidade da tradução para o grupo observado e
para o outro grupo com que trabalha em uma faculdade particular: um grupo de aprendizes do
curso de Sistemas de Informação. Declara que, apesar das dificuldades com a falta de preparo
dos aprendizes da faculdade, ela faz o mesmo tipo de trabalho com eles:
[Excerto 41]
P: Lá você trabalha a tradução também.
Rose: Trabalho. A tradução, resumo (+). Trabalho assim, mais ou menos igual aqui, só que, uh, não
de uma forma tão intensa igual (+) eu faço com eles aqui. Os alunos não têm o mesmo preparo.
Em se tratando da utilidade da tradução para os aprendizes que lidam com
informática, a informante prontamente mostra a que se aplica esta prática:
[Excerto 42]
P: Aí, lá no outro curso que você dá, você também trabalha com tradução, né?
Rose: Qual?
P: O de Sistemas. Aí, é (+) em que sentido que eles vão poder usar essas [[técnicas de tradução]]?
Rose: [[Porque no dia-a-dia]] de quem já trabalha na área, às vezes eles têm que traduzir um manual,
têm que traduzir um e-mail, têm que (+) às vezes chega alguém de fora, às vezes chega algum novo
produto, ou às vezes, o próprio material que eles têm de programação, eles m que saber ler,
entender, e, também, (+) especialmente, eles têm que traduzir.
P: Mhm.
Rose: Aí, tem que ser rápido. Eles são pessoas que trabalham, normalmente, sobre pressão, prazo, e
tal.
A informante acredita que a tradução é necessária em sala de aula porque faz parte
das necessidades cotidianas dos estudantes dos dois ambientes onde ensina IIELA. Sua
postura está de acordo com Duff (1989), Ridd (2000, 2003) e Deller e Rinvolucri (2002).
4.2.2.7. O aprendiz de tradução x o aprendiz de Inglês Instrumental
119
Embora ache que o curso de Inglês Instrumental é o ambiente de ensino de inglês
como LE mais propício para o uso da tradução, Rose afirma o seguinte:
[excerto 43]
P: E como cê acha assim que seus alunos reagem à às atividades de tradução.
Rose: Depende do aprendiz, né? Eu acho assim, se a gente for pensar, vamos pensar na turma que
observando. São alunos que de fato não são alunos de tradução. Eles caíram nesse / eles têm que
fazer a tradução por causa das (+) das circunstâncias deles, né? Que eles têm que fazer a prova e
tudo.
P: Mhm.
Ou seja, a informante, que também deu aula para futuros tradutores profissionais,
reconhece que o objetivo de aprendizes atuais é diferente: prestar um exame de seleção para
s-graduação. Ela discerne então o tradutor do aprendiz de LE em termos de necessidades
quanto ao uso da tradução. Tudor (1987a) e Lavault (1998) também fazem esta distinção.
4.2.2.8. A tradão em sala de aula
Perguntei a Rose como ela utiliza a tradução em sala de aula, ao que ela responde:
[Excerto 44]
Rose: Aí, assim, às vezes é uma coisa indireta, como você viu hoje. Pra eles poderem resolver os
exercícios eles tinham que entender, ler e entender. De certa forma eles tinham que traduzir, mesmo
(+) conscientemente, inconscientemente. Porque pra ajuntar aquele texto eles tinham que ler e
entender o texto, traduzir um pouco pra acertar, né?
P: Sei.
Rose: Ou os outros exercícios. Às vezes também, assim, eu faço tradução em grupo, (+)
P: Mhm.
Rose: E (+) ou às vezes eu peço pra fazer (+) tipo uma tradução (+) uh (+) tem vez que faço em
grupo (+), tem vezes que eu gosto, assim, individual (+)
P: Aí cê dá um texto e pede pra eles traduzirem?
Rose: É. Ou uma parte de um texto, tem vezes que eu faço algumas coisas assim, é, eu peço pra usar
o dicionário, não usar o dicionário, eu dou pouco tempo pra usar o dicionário (+) tem vezes que é
tradução oral, eu leio rápido pra (+) traduzir uma linha, colocar no quadro, sabe aquele dia que eu
fiz aquilo, né?
P: Ahã. Que eles tiveram que colocar, né?
Rose: Pois é. Então assim, é (+) é muito assim, é muito (*), é bem relativo. Eu acho assim, a idéia,
não é apenas de, de trabalhar a tradução, mas o raciocínio rápido, o raciocínio rápido. E (+) aí, assim,
é pra levar eles a trabalhar em ritmo normal, saber trabalhar sobre pressão, e de saber também como
checar a (+) a tradução, como fazer a revisão. Isso é um outro passo que eu quero trabalhar até um
pouquinho nessas últimas aulas que restam, né?
P: Sei.
Rose: Então, é bem variado. Não é assim tipo traduzir na aula. Às vezes eu peço pra traduzir
em casa, (*****).
Assim, nessa fala, os aspectos mais importantes listados por Rose quanto à tradução
em seu curso são: tradução consciente e inconsciente; em grupo e individual; oral; trabalhar o
raciocínio rápido; trabalhar sobre pressão; fazer revisão; traduzir em casa.
120
mais adiante, a professora cita outras maneiras de exercer a atividade tradutória:
[Excerto 45]
Rose: /.../ Então, assim, esse é um aspecto que a gente sempre tem que procurar trabalhar, de puxar,
assim, no início do semestre a gente teve aula de exercícios de revisão de textos de correção na aula
pra que eles possam perceber que não é traduzir por traduzir ao da letra, mas assim a tradução
não é isso / como eu falei, é um diálogo, aí que quando termina o primeiro passo, tem que
voltar e olhar de novo. /.../
Mais abaixo ela faz mais algum acréscimo à lista de atividades:
[Excerto 46]
Mas assim, eu trabalho essa linha de dar, trabalhar tradução, fazer resumo, essas coisas, aí deixo de
fazer apenas interpretação de texto pelo seguinte, eu, eu como pessoa, eu fico (+) como se diz,
entediada, eu ficaria entediada se eu apenas chegasse ali no texto e pedisse pra o pessoal responder a
pergunta. Minha aula ia ficar monótona.
Ou seja, ela trabalha com interpretação de textos e também o resumo do texto.
Considera inclusive que trabalhar somente interpretação do texto é insuficiente para uma aula
estimulante.
Rose também trabalha com testes com exercícios de tradão para checar vocabulário
e gramática, como o seguinte:
[Excerto 47]
Pequeno teste – 1 ponto
1. Explique a função do prefixo em ‘overflowing
2. a) Karen made a tempting desert.
b) The cat is tempting the bird.
Explique as duas formas do –ing.
3. Dê dois sinônimos para a expressão “to knick into gear” (em inglês).
4. Dê um sinônimo em inglês para “pencilled in
5. Dê um sinônimo em inglês para “unwary
6. Explique o uso do sufixo “-ness” na palavra “awareness
7. Dê um sinônimo em inglês para “to come up with a deal”.
8. Explique “as such” (a tradução e a classe gramatical)
9. Dê um sinônimo em inglês para “even though”.
10. Surprise: TRADUZIR TUDO E IDENTIFICAR OS USOS DE “-ING”.
But it is time now for us to deal directly with the reigning ideology of individualism, to understand its roots
and its tendencies, and to see that it is perhaps closer in its real aspirations to aspects of the older religious
and political traditions than its proponents have imagined. Indeed it may be only in terms of those older
traditions that the deeper meaning of our individualism and the aspirations it embodies can be salvaged at
all.
Durante os primeiros dez minutos de teste, os dicionários dos aprendizes foram
recolhidos pela professora para que tentassem responder às questões sem eles. Em seguida,
foi entregue novamente aos aprendizes o material de consulta.
121
4.2.2.9. Tradução e o progresso dos aprendizes
Quando questionada diretamente quanto ao progresso da turma, a informante é bem
otimista e reporta-se novamente à questão da rapidez no trabalho de classe:
[Excerto 48]
P: Então você tem percebido progresso, no seu grupo?
Rose: É. Eu percebo. Assim, claro. Teve / depende / tem turmas que às vezes até anda mais rápido.
Teve uma turma, uns dois semestres atrás, que eu pressionei um pouquinho mais até, né. Mas é / a
gente / eu noto (+) a rapidez que isso muda, né?
P: Mhm.
Rose: Porque pra mim isso é um sinal do (+) progresso. Porque senão / se eles tivessem lendo (+)
do mesmo jeito, ou traduzindo do mesmo jeito que estavam início do semestre, é complicado.
Tinha um problema.
P: Mhm.
Rose: Porque ela cons- / eu observando ali que ela conseguindo fazer. Tem alguns que assim
eles demoram, né? (+)
É também interessante notar acima que Rose associa o nível de progresso dos
aprendizes à quantidade de pressão exercida por ela sobre a turma. Um outro fator de
progresso apontado por Rose é o seguinte:
[ Excerto 49]
Rose: /.../ E eles aprendem com isso que não podem generalizar em relação às regras. Muitas vezes
eles pensam que tem uma regra pra uma forma, e à medida que você começa a trabalhar com o
curso eles descobrem que não é bem assim.
Além disso, os aprendizes ampliam sua perspectiva do que é a tradução enquanto
entendem que é necessário revisar o texto para que ele faça sentido em português. Rose fala
disso:
[Excerto 50]
Rose: Então, provavelmente eles devem ter feito a tradução sem perceber que eles tavam fazendo a a
tradução antes, em casa, ou em uma prova que eles já fizeram, e uma coisa que eles enfrentam, e eles
descobrem que / você até deve perceber às vezes de umas perguntas que eles fazem, que eles às
vezes pensam que tem que ser uma coisa ao da letra. Então, assim, esse é um aspecto que a gente
sempre tem que procurar trabalhar, de puxar, assim, no início do semestre a gente teve aula de
exercícios de revisão de textos de correção na aula pra que eles possam perceber que não é
traduzir por traduzir ao da letra, mas assim a tradução não éisso / como eu falei, é um diálogo,
que quando termina o primeiro passo, tem que voltar e olhar de novo. Então, no início, eu
acho que eles têm uma percepção que é mais assim limitada. E à medida que a gente vai trabalhando
eles vão descobrindo que é mais (+)
P: Mhm.
Rose: Do que isso.
122
Percebe-se nos relatos de Rose que durante o curso acontece aquilo que Holmes
(2005b) chama de conscientização na medida em que os estudantes sabem que precisam
traduzir a fim de passar no teste de seleção da Pós-Graduação e passam também a saber sobre
a natureza da tradução, como ela funciona. Além disso, como defendem Ridd (2000 e 2003) e
Duff (1989), a tradução ajuda no desenvolvimento do raciocínio dos aprendizes.
4.2.2.10. A tradução e o uso da LM dos aprendizes
Mesmo sendo estrangeira, Rose dá aulas de Inglês Instrumental em língua portuguesa.
É fato que ela a entender que esta atitude não facilita a comunicação para ela, mas que é
uma vantagem para os aprendizes, como se percebe a seguir:
[Excerto 51]
Rose: Aí, assim, eu vejo assim, como o foco é o texto, que você tem, às vezes, alunos que têm mais
ou menos o mesmo nível de leitura, mas eles podem ter níveis diferenciados de ouvir ou de falar.
Então, pra agilizar, e tendo em vista que a gente trabalhando pra o português, que embora o texto
seja em inglês pra o português, é muito mais prático trabalhar em português. Prático entre aspas, né?
Porque eu sou estrangeira, mas (+) enfim.
No trecho abaixo, Rose complementa com uma outra justificativa que está de acordo
com Janulevičienė e Kavaliauskienė (2004) a questão de o aprendiz se sentir mais seguro
em uma aula ministrada em sua língua materna:
[Excerto 52]
Rose: Entendeu, é por isso também / é uma (+) / eu não falo inglês também por isso porque (+) pode
provocar uma insegurança, pode apavorar o aprendiz se ele não tem bom domínio do inglês, assim,
falado ou ouvido e tal, então, é, o aprendiz, ele sabe que focaliza só o texto. Então, ele não se expõe /
aí você não este outro lado que você vê às vezes no básico ou ou no básico intermediário, em que
os alunos têm aquela, você tem que trabalhar outras barreiras, né. Enquanto assim, o foco ser o texto,
cê trabalha só a barreira de ter medo (+) de ver o texto tudo junto.
Logo, estas falas de Rose levantam dois pontos de fundamental importância para
discussão. O primeiro é que ela não confunde uso de LM com tradução. O segundo é que ela
prova que é possível um professor falante nativo da língua estrangeira que ensina dar aula na
língua materna dos aprendizes, e que isto é benéfico para eles. Levando-se em consideração
Medgyes (1994), Rose agrega os pontos fortes de um PNs (por exemplo, usar o inglês com
mais confiança, usar linguagem real, ensinar itens em contexto, preferir atividades mais
livres) e tem também algumas das principais vantagens do PNN: usa mais a LM dos alunos.
4.2.3. Crenças e experiências
123
O quadro abaixo sintetiza as crenças de Rose a respeito de tradução e suas possíveis
relações com as experiências da informante enquanto aprendiz e também enquanto
professora:
124
Crenças sobre tradução Possível relação com as experiências
A tradução é um diálogo com o texto e com o outro. Esta definição um pouco mais aprofundada do que as das outras informantes e mais próxima das teorias de
Tradução mais atuais pode se dever à experiência de Rose enquanto professora de Teoria da Tradução e à sua
experiência como tradutora e intérprete.
A tradução é fundamental no ensino de línguas
estrangeiras porque leva o aprendiz a se aprofundar
na língua, a pesquisar, a pensar, raciocinar.
Ao longo de toda a sua experiência como aprendiz, bem como sua carreira docente, Rose tem tido a
oportunidade de utilizar a tradução mesmo que em níveis diferentes inclusive nas diferentes disciplinas
que tem ministrado e experimentar seus resultados, que os tipos de instituições em que tem lecionado (a
universidade em que cursou Letras em seu país, a universidade pública em que deu aula no Brasil, a faculdade
particular em que aulas para o curso de Letras, inclusive de língua inglesa, e a faculdade particular em que
aulas para o curso de Sistemas de Informação, além da escola de idiomas em que observei suas aulas, na
qual ela mesma desenvolveu o curso) dão liberdade para que o professor monte seu próprio curso. Talvez por
isso, ela tenha tal crença.
A tradução o é ideal para os níveis sicos de
ensino/aprendizagem de LE.
Tal crença pode ser resultado da própria experiência de aprendizagem de LE da informante em que a tradução
era trabalhada em níveis mais elevados do curso e pode também ser conseqüência daquilo que Rose
experimentou com seus grupos de aprendizes de nível básico.
A tradução é uma maneira de levar o aprendiz de
Inglês Instrumental a desenvolver autonomia.
O trabalho com tradução precisa ser desafiador para o
aprendiz.
Trabalhar com tradução evita que a aula se torne
monótona.
Em toda a história de aprendizagem de Rose autonomia e desafio eram fatores fundamentais para o sucesso.
Talvez ela tenha encontrado na tradução uma maneira de lidar com estes dois princípios e tornar o ensino mais
empolgante.
O curso de Inglês Instrumental (com enfoque em
leitura acadêmica) é o melhor ambiente para se
trabalhar com tradução.
Talvez Rose faça essa relação por causa da semelhança que entre o ambiente de ensino deste enfoque de
Inglês Instrumental e o ambiente de ensino de Tradução. Por exemplo, o fato de não ter que lidar segundo a
entrevistada com as frustrações psicológicas do aprendiz quanto à expressão oral em LE e o fato de haver
um texto a ser trabalhado pela turma. Todas essas conclusões podem ser resultantes da experiência de ensino
da informante nos dois ambientes.
O aprendiz de Inglês Instrumental tem um perfil
distinto do aprendiz de Tradução.
Esta percepção pode advir do fato de Rose ter ensinado, durante alguns anos, e ao mesmo tempo, os dois tipos
de aprendizes.
A tradução precisa ser feita com certa velocidade.
O dicionário tem uma função limitada na tradução.
A tradução pode também ser feita oralmente.
Estas três crenças podem ter relação com o fato de Rose ter feito curso de Interpretação e ter uma certa
experiência como intérprete. Neste ambiente, trabalha-se rapidamente, não se pode usar o dicionário e o texto
e falado.
Produção de resumos e trabalhos de revisão de textos
traduzidos levam os aprendizes a perceberem que a
tradução não deve ser feita “ao pé da letra”.
Esta crença possivelmente se relaciona à experiência de Rose como aprendiz de Tradução e como professora
na mesma área, nos âmbitos teórico e prático.
A tradução faz parte da vida real do estudante. Tal crença pode resultar de sua experiência como aprendiz e professora de Tradução e por perceber a
necessidade de seus alunos ao longo de sua carreira como professora de IIELA.
Quadro 10: Possíveis relações entre as crenças de Rose sobre tradução e suas experiências
4.3. Marília
4.3.1. Dados Biográficos
Marília tem 45 anos de idade e aulas de inglês aproximadamente 18 anos.
Desde criança, Marília tinha desejo de aprender inglês. A amizade que tinha com um vizinho
da mesma idade que depois foi morar nos EUA aguçou ainda mais essa vontade, pois tinha o
costume de escrever a ele cartas em inglês. Assim, seu amigo escrevia de volta e mandava
novamente as cartas da informante corrigidas. Isso aconteceu quando Marília tinha por volta
de 11 anos de idade e tinha entrado para o período “ginasial” na escola. As aulas de inglês
que tinha na escola não eram suficientes para ela alcançar seus objetivos de aprendizagem da
língua. Como era extremamente motivada, procurava aprender sozinha, como narra:
[Excerto 53]
P: Sem nunca ter estudado em escola [[de idioma?]]
Marília: [[Em escola]] de idiomas. Eu tinha a base do colégio, que eu estudei em colégio particular.
O professor, ele tinha uma maneira tradicional de ensinar. Mas a minha motivação de aprender era
tão grande, que eu percorri os caminhos sozinha, praticamente. Através de (+) música, por exemplo,
muita (+) música, leitura. Eu lia, aí eu não sabia como é que pronunciava,(+) às vezes eu pronunciava
errado, (+) então, eu comecei a querer tentar entender como é que eu ia (+) matar a charada da
pronúncia só lendo, então (+)
Durante a adolescência tentou fazer um intercâmbio no exterior, mas o conseguiu.
Para ter a oportunidade de conversar em inglês, Marília abordava os estrangeiros que
encontrava e, enquanto conversavam, pedia a eles que a corrigissem. Aos vinte e três anos
Marília mudou-se para Brasília e o seu desejo de aprimorar seus conhecimentos em ngua
inglesa continuava. Contudo, não tinha condições financeiras de arcar com os custos de um
curso superior e nem de pagar um curso de inglês. Havia uma escola de inglês que Marília
admirava e sempre sentiu vontade de estudar lá. Decidiu, então, procurar a coordenadora do
curso. Escreveu uma carta à gerência da instituição em que contava de sua vontade de estudar
inglês e explicava sua limitação financeira da época. Ao enviar o pedido, Marília conseguiu
uma bolsa integral, inédita, na instituição e, após fazer teste de nivelamento, entrou no
quinto ano de curso. Terminou o curso e foi bem sucedida em um exame que conferia
certificação internacional de proficiência em língua inglesa. Depois de algum tempo, fez
vestibular para Letras em uma faculdade particular do DF. Foi aprovada e durante seu curso
desenvolveu grande interesse pela vida acadêmica. Afirma que era muito envolvida com as
atividades da faculdade, que fazia amizade com professores e participava de eventos.
Envolveu-se também em eventos para profissionais de ensino de inglês. Em um deles ganhou
uma bolsa para fazer um curso de Literatura em Cambridge. No entanto, o tinha como
custear a passagem e acabou não indo.
Ainda durante a graduação começou a dar aulas particulares. Dividia, então, o aluguel
de uma sala de aula com um amigo e dava aulas particulares individuais e para pequenos
grupos que incluíam seus colegas de classe. No tempo em que dava aulas particulares,
Marília tinha preferência por ministrar aulas individuais e desde essa época Marília trabalhava
com inglês para fins específicos:
[Excerto 54]
Marília: /.../ E aí, a maior parte, pra responder tua pergunta, a maior parte do (+) dos alunos que me
procuravam pedindo (*) pra ter aula, eram pessoas que queriam fazer mestrado, eram pessoas que
queriam fazer doutorado. Então eu dava cursos objetivos pra elas de Inglês Instrumental, que são
técnicas de leitura pra o acompanhamento, né? De textos acadêmicos. Eu trabalhava bem nesse
recorte, normalmente, né?
P: Mhm.
Marília: E (+) é (+) agora é óbvio que também tinham pessoas que iam viajar, que iam(+) fazer
entrevista em inglês, também. Então elas precisavam(+) porque também nessa época começaram a
haver algumas empresas dentro de telefonia, essa coisa do telefone celular, essa coisa começou,
também, a vir com mais potência pra cá, e aí, algumas pessoas me procuravam porque (+) queriam é
(+) aprender melhor o inglês pra poder se sair bem numa entrevista (+)
P: Então, você trabalhava inglês pra fins específicos(+)
Marília: É! Exatamente. Meu alunado particular era todo fins específicos.
Até esse momento de sua carreira, Marília ainda tinha o sonho de ir à Inglaterra. Ela
afirma o seguinte:
[Excerto 55]
Marília: /.../ mas o meu sonho era ir pra Inglaterra.
P: Era?
Marília: Meu sonho era participar daquela / porque eu não me sentia competente o suficiente
enquanto eu não pisasse num país de língua inglesa. Isso era uma coisa que eu sentia. Ninguém
nunca me falou, eu sentia essa necessidade.
havia, então, conseguido juntar algum dinheiro e, com a ajuda do reitor da
instituição onde estudara e também seu aprendiz particular, foi à Inglaterra por um curto
período de tempo.
Após a graduação, a informante começou a trabalhar em um curso de inglês, mas não
se identificou com o todo, como conta no excerto 62. Também fez concurso público para
professora e foi aprovada, mas decidiu não assumir o cargo. Assim, enviou um currículo para
a própria instituição onde cursou Letras e começou a dar aulas de Inglês Instrumental. No
127
período em que trabalhou nessa instituição, chegou a propor mudanças no currículo do curso
e obteve sucesso:
[Excerto 56]
P: E era pra qual [[nível]]?
Marília: [[Pro curso de (+)]] de Tecnologia, de Ciência da [[Computação]].
P: [[Ah, tá.]] Que jóia. Tem quanto tempo, mais ou menos, isso?
Marília: Isso é (+) isso foi (+) nos idos de (+) noventa (+) ((risos)). Século passado! ((risos)) Em
noventa e um (+) que eu acho que (+) não! É porque eu me graduei em 91. É, 91 mesmo.
P: Então cê já tinha uma experiência boa com isso, né?
Marília: É! É! A partir daí, por exemplo, eu me lembro que eu reformulei, o programa que tinha .
Que o que eles davam, os professores davam lá, era gramática. eu, eu comprei um livro que era
muito mais voltado realmente pras habilidades que a gente hoje trabalha, que a gente entende como
Inglês Instrumental, que é essa abordagem morfossintática, que faz (+) não sei, mas era um livro,
totalmente voltado pra informática. E aí, textos genéricos, que falavam em (+) redes (+) de
computação, falavam em software, e essas coisas (+) textos, mas com exercícios de interpretação do
texto, mais as dinâmicas que você tem pra entender a estrutura da língua que você (+) desenvolver a
habilidade de leitura pra entender a idéia principal, essas coisas todas.
P: Então, na época, você mudou o paradigma lá.
Marília: É, eu (+) pelo menos eu fazia isso, e eu sugeri que se mudasse o curso porque não podia
fazer gramática, então, eu falei com o coordenador, e tudo. que, aí, ao mesmo tempo, eu me
mudei (+)
P: Mhm.
Marília: Me mudei, não. Eu me mudei depois. /.../
Enquanto lecionava Inglês Instrumental para essas turmas, Marília procurou uma
instituição que oferecia o Mestrado em Língua Inglesa e foi selecionada para o curso.
Durante o tempo em que fez as disciplinas do mestrado, a entrevistada continuava dando
aulas particulares e de Instrumental na faculdade onde estudou. Além disso, começou
também a lecionar na mesma instituição em que cursava o mestrado.
Com relação a sua abordagem de ensinar Inglês Instrumental, Marília fala daquilo que
influenciou suas escolhas metodológicas:
[Excerto 57]
Marília: Então essa, esse conhecimento, naquela época, era, quando eu fiz meu mestrado, era
um conhecimento que a Instituição Omega praticava. Então eu fui aprendendo as técnicas, e eu tinha,
não sei se você conheceu a Professora “X” e a Professora “Y”?
P: Não cheguei a conhecer não.
Marília: A Professora “X” fez o mestrado dela na Inglaterra em Londres e ela também ficou
interessada nessa área de compreensão de texto, trabalhar técnicas de leitura. E ela e a Professora
“Y” fizeram um livro para o ensino de língua inglesa. E basicamente todo, toda a, paralelamente a
isso, eram os estudos, né, era a análise do discurso. Os estudos na linha da análise do discurso foram
o que na verdade deram um grounding para o estabelecimento do Inglês Instrumental. Porque você
parte pra aquelas análises de uma abordagem morfossintática, que você cai naquela análise de
coesão e coe- / desses marcadores, todos que são os MARCADORES de discurso são como que um
caminho pra você perseguir essas idéias. E através disso tem que obviamente dominar o
vocabulário chave. E desenvolve-se essa estratégia, como você lidar com essas palavras / então
muito do aprendizado que eu desenvolvi pra dar Inglês Instrumental foi através desse material
didático da Professora “X” e da Professora “Y”
128
P: Aí você também [[trocava idéias com ela]]?
Marília: [[Através desse material didático]] e eu trocava algumas idéias mas eu comecei olhar o
o o arcabouço teórico / que eu tava na época fazendo mestrado.
P: Mm, então cê tava em contato com isso também::
Marília: Então eu tava LENDO. Eu tava LENDO sobre análise do discurso, eu tava lendo uma série
de coisas (+)
P: Mhm.
Marília: Que eu fui construindo, então o pensamento (+) e a partir da minha prática entendeu? Então
eu fui construindo. (+)
Marília resolveu então ir uma segunda vez à Inglaterra, desta vez para morar. Tinha a
princípio o propósito de permanecer por apenas um ano, mas acabou ficando oito. Quanto
ao impacto que essa experiência causou em sua carreira, Marília afirma o seguinte:
[Excerto 58]
P: Vem cá, uma curiosidade que surgiu agora. Você foi pra Inglaterra, ficou esse tempo lá, depois
voltou e voltou dando aula de Instrumental de novo. Você acha que você (+) esse tempo que você
passou lá, uh (+) mudou um pouco a sua abordagem de ensinar Inglês Instrumental (+) ou você
reforçou aquilo que você acreditava?
Marília: Ah!(+) Good question (+) Eu acho que muda um pouco a abordagem, porque toda
experiência de vida (+) eu mudei, eu não sou mais a mesma pessoa. Graças a Deus eu tenho esse
dinamismo ((risos)). Não celular, de ficar mais velha!((risos)) Mas, é (+) eu acho que sim, que
mudou um bocado a minha percepção de (+) sobretudo de olhar o outro, de me colocar sobretudo no
lugar do aprendiz. Entendeu? Isso, eu acho que, às vezes é (+) eu não sei, você chegou a observar
algumas aulas minhas. Eu acho que eu pontuo um pouco pra eles muitas coisas que são (+)
diferenças que eles têm que ter em mente, que tudo não é igual(+) entendeu?
P: Mhm.
Marília: Essa questão das diferenças culturais, das identidades, a forma de você expressar as coisas,
que você não pode esperar.
Atualmente Marília leciona IIELA para alunos de cursos variados na mesma
universidade em que cursava as disciplinas do Mestrado em Língua Inglesa para onde
retornou após o tempo em que viveu no exterior e que aqui será chamada de “Instituição
Omega”. Além disso, aulas de Inglês Instrumental para uma turma de Sistemas de
Informação numa instituição privada de ensino superior – que é onde a pesquisa ocorreu.
4.3.2. Crenças sobre tradução
4.3.2.1.Concepção de tradução
Ao longo da entrevista Marília não define explicitamente a tradução. Contudo,
momentos em que ela trata do assunto de forma mais indireta. No excerto abaixo, por
exemplo, ela fala de qual ela percebe ser o ponto de vista de aprendizes a respeito:
[Excerto 59]
129
Marília: /.../ Porque eles ali, por exemplo, no recorte do Inglês Instrumental, naquele nível de turma
ali, que você viu, a tendência deles é (+) eles sempre usam o termo ‘tradução’. Eles sempre usam
assim (+) “Mas professora, é (+) é (+) eu (+) como é que eu vou traduzir isso aqui”, né? Então, eu
agora tô começando a fazer mais esse jogo deles, de (+) porque eu vi que isso dá mais (+) confiança,
pra eles na verdade. O que (+) agora, é um trato que eu faço diferenciado, do que o pessoal na
manhã, na Instituição Omega, é um pessoal que consegue, por exemplo, entender inglês,
determinado nível, mais intermediário, mas que, no texto, o quê que ele vai explorar? É o recurso do
compreender a palavra não conhecida (+) naquele contexto (+) de uma estrutura gramatical que é (+)
diferenciada, um pouquinho (+) menos (+) comum do que o que ele acostumado. Então eu vou
tratar, de coisas assim, que são (+) porque o aprendiz já tem uma bagagem e ele entra no âmbito da
(+) da (+) como se fala? Do entendimento.
Neste caso ela se refere primeiramente à turma que observei, ou seja, um grupo de
aprendizes do curso de Sistemas de Informação em uma faculdade particular. Segundo a
informante, os aprendizes sempre perguntam a ela como traduzir. Então, Marília acaba
fazendo o que os aprendizes pedem para, como ela diz, “fazer mais esse jogo deles”, para
satisfazê-los. Isso evidencia a influência das crenças dos alunos sobre as ações dos
professores (Barcelos 2006).
Por outro lado, na Instituição Omega, em que a professora também tem turmas de
Inglês Instrumental, mas considera estarem os aprendizes em um vel melhor de
conhecimento lingüístico quando diz: “...é um pessoal que consegue, por exemplo,
entender inglês, determinado nível, mais intermediário...” – ela alega não ter a mesma atitude.
Para ela, o fato de aprendizes terem “uma bagagem” leva-os a entrarem no âmbito do
“entendimento” do texto. Entretanto, um fato que merece destaque com relação a esta
comparação entre os grupos de aprendizes das duas instituições. Embora o aprendiz da
Instituição Omega tenha toda essa bagagem, fatalmente ele terá que lidar com aquilo que
ainda não sabe. O curioso é que a própria fala da entrevistada denuncia que ele usa o mesmo
processo que o aprendiz de Sistemas para isso, já que lança mão do “recurso do compreender
a palavra não conhecida (+) naquele contexto (+) de uma estrutura gramatical que é (+)
diferenciada, um pouquinho (+) menos (+) comum do que o que ele tá acostumado”. Ou seja,
o grupo de Sistemas não tem muito conhecimento lingüístico prévio, a maioria das palavras é
desconhecida para ele, quase todas as estruturas gramaticais são “diferenciadas”. Então,
porque têm interesse em compreender o texto, os aprendizes vão procurar saber o significado
do que não conhecem. É exatamente isso que estão fazendo quando perguntam à Marília:
“Mas, professora, como é que eu vou traduzir isso aqui?”. Por outro lado, o grupo da
Instituição Omega, que já tem certo conhecimento de língua inglesa, não pergunta sobre tudo,
mas em algum momento os aprendizes vão querer saber o significado da “palavra não
conhecida” e da “estrutura gramatical diferenciada” e muito provavelmente o farão em língua
130
portuguesa, que a aula de Inglês Instrumental é em português, como alega a própria
informante em outro momento. Além de tudo isso, o estudo de Upton e Thompson (2001)
mostra que estudantes de cursos de leitura em LE em nível intermediário fatalmente recorrem
à tradução ao ler um texto.
Assim, o processo de busca de significados utilizado pelas duas turmas é o mesmo – a
diferença é o nível de conhecimento da LE. Ambos os grupos traduzem aquilo que não
entendem. que a tradução feita pelo grupo da Instituição Omega é mais bem vista pela
informante que aquela feita pelo grupo que observei. Ainda em relação ao que se diz no
excerto 61, em especial o que é dito pela voz da entrevistada, e não pela dos aprendizes,
pode-se fazer duas inferências. A primeira, é que “tradução” e “entendimento são
excludentes; traduzir não significa entender. A segunda é que o principal fim da tradução,
mesmo que não implique em entendimento, em turmas em que os aprendizes têm um nível
mais baixo de conhecimento lingüístico, é dar aos aprendizes mais “confiança”.
Após Marília tratar da definição que o seu grupo de aprendizes endossa a respeito do
que é tradução, ela expõe um pouco daquilo que ela acredita ser esse fenômeno. Para ela,
traduzir é atividade exclusiva para profissionais da área, pessoas que se especializam em
fazê-lo. Assim, ainda sob a ótica da informante, para que se aprenda a traduzir devidamente,
deve-se fazer um curso superior específico para tal. Infere-se, então, que, para Marília,
traduzir é por demais complicado para as pessoas que não se encaixam neste grupo, o que
incluios aprendizes e até ela mesma. Em outras palavras, não é o objetivo de um curso de
Inglês Instrumental, mas ela acaba fazendo concessões devido à insistência da turma. O
excerto abaixo valida tais afirmações:
[Excerto 60]
P: Você acha (+) você concorda com eles com relação a esse conceito de tradução (+) como você
definiria, assim, tradução?
Marília: Não, eu digo pra eles, sempre, todas as minhas aulas eu brinco com eles que (+) uma lauda
de tradução custa R$ 40,00 e que (+) se eles quisessem fazer isso, eles tinham que (+) pelo menos (+)
((risos)) ficar quatro anos na Instituição Omega fazendo um curso de Tradução. Então, o nosso
objetivo de curso não é a tradução! Mas eles insistem em usar essa palavra. Então, eu agora digo
pra eles: “Tá bom! Vamo fazer assim (+) Então, vamo, vamo entender isso aqui (+) vamo usar.
Vamo traduzir? Tá. Cês querem traduzir, vamos traduzir, vamo tentar enten- mas, olhar pra o que
atrás (+) das linhas, pro mecanismo da idéias. Eu não sei se você pegou uma aula [[que eu tava
falando de coesão e coerência]] com eles(+)
P: [[Peguei.]] Peguei. Mhm!
Marília: Eu falei nessa coisa da (+) desse mecanismo de você perseguir as idéias, que é uma coisa
muito importante.
131
Ao expressar que traduzir não é para todos, Marília mostra, ao menos em parte, uma
crença semelhante àquelas listadas por Pagano (2003a) sobre Tradução.
Se por um lado não uma definição clara daquilo que a tradução é, fica evidente
aquilo que Marília acha que não é. Nota-se que quando a professora diz “Cês querem
traduzir, vamos traduzir, vamo tentar enten- mas, olha pra o que atrás (+) das linhas, pro
mecanismo das idéias.” Deste modo, traduzir é paralelo a ler “atrás das linhas”, a “a
compreender o mecanismo das idéias”, a “perseguir as idéias”; traduzir não é compreender as
idéias.
Ela continua dizendo que os aprendizes ficam presos ao “universo lexical” em vez de
tentar compreender o que lêem. Ela ainda explica que tenta convencer os aprendizes que eles
podem compreender sem utilizar sua LM:
[Excerto 61]
Marília: /.../Então, eles ficam muito presos no universo lexical. Como se aquilo (+) esse universo
lexical fosse entidade. Como se, é como se eles achassem o seguinte: se eles lessem um dicionário
inteiro e aprendessem o dicionário todo, eles iam saber falar inglês! Eles têm essa (+) essa visão.
Então, eu tento é (+) tirar um pouco dessa visão que eles têm e chamar a atenção para uma coisa (+)
uma coisa é você compreender. Sem, inclusive, necessariamente, você ter que passar por esse
mecanismo de passar pra sua língua. pode comentar, em português, mas você vai (+) E eu
sempre dou o exemplo, pra eles (+) “Olha, o quê que eu falei agora? Quem tá prestando atenção no
que eu falei?” Né.
P: Eu já reparei (+) nas observações.
Marília: É. Isso. “Quê que (+) quê que eu falei agora? s num o (+) Ah, eu falei isso? Eu usei
essas mesmas palavras? Não, eu não usei! Por que? Mas eu falei mais ou menos isso, não foi?”
Porque, quê você sabe? sabe que usando um outro mecanismo. Uma outra estratégia, que a
gente acompanha idéia. (+) Né?
Ante a todos esses fatos, uma hipótese surpreendente é a de que, embora Marília veja
essas crenças na boca de aprendizes, se for feita uma relação com a experiência prévia de
ensino de Marília tem-se uma forte razão para acreditar que essas crenças são, na verdade da
própria professora, mesmo que ela não tenha consciência disso. Ora, quando ela descreve a
decepcionante experiência que teve na Escola Lambda, onde lecionou por poucos dias após
se graduar e rejeitou o emprego por o acreditar no todo, fica claro que o motivo do
descrédito é o fato de as traduções serem feitas apenas no nível da equivalência formal (como
defende Catford, 1980):
[Excerto 62]
Marília: /.../ Agora, eu também não acredito num curso de inglês que, por exemplo, que toma por
base a tradução constantemente. Que é o caso da Escola Lambda, que quando eu tava lá, todos os
primeiros módulos / eu acho que vai falar inglês diretamente / de uma, da noite pro dia, eles
acham que vai, pro quinto semestre ou o quê. Antes disso o tempo todo é assim ah, “eu tenho
fome”. “Então vamo ver como é que diz ‘eu tenho fome’? É I am hungry’.” Mas não
132
EXPLORANDO o porquê daquilo! Você diz I’m hungry”, com fome”, “Tô com fome”, I’m
hungry”.
P: Mhm.
Marília: Are you hungry?” Yes, I’m hungry.” tem aquela coisa parroting, também que eles
fazem. Então, eu não acredito nisso. /.../
Assim, esta crença de que a tradução é mera decodificação de palavras pode ter vindo
desta impressão que ela teve deste todo em especial. Além disso, todo o seu discurso
acima é muito semelhante aos princípios estruturalistas e behavioristas do método
audiolingual, como explicam Hutchinson e Waters (1987) e Cervo (2003). Conforme Lavault
(1998), as teorias cognitivas admitem que o aprendiz de uma LE não deixa de pensar em
sua LM durante a aprendizagem de uma outra língua.
Após toda essa discussão, percebe-se um ponto de desarmonia naquilo que a
informante diz. Por um lado, traduzir não é entender, não é perseguir as idéias do texto, mas
está apenas no nível das palavras e é feita na sala de aula de nível básico apenas para dar
confiança aos aprendizes. Por outro lado, é uma atividade reservada a profissionais bem
qualificados que ganham bem para fazê-lo. Contudo, se Marília acreditasse que a tradução
feita por profissionais da área fosse algo limitado à transposição de léxico e não implicasse
em compreensão textual, ela não acreditaria tanto nos tradutores a ponto de achar de fato que
eles devem fazer um curso superior para isso e ganhar R$ 40,00 por lauda. Ela veria o seu
trabalho como algo frustrante, assim como o curso da Escola Lambda.
Sob a perspectiva de Richards e Lockhart (1996) sobre os fatores que influenciam as
crenças, estas incongruências podem ser fruto da influência de muitas vozes sobre as crenças
de Marília a respeito da tradução, inclusive sua motivação integrativa em aprender o inglês
que, por sua vez é resultado do status da língua em nossa sociedade, o qual deriva de valores
de imposição colonialista (Phillipson, 1993; Moita Lopes, 1996; Kumaravadivelu, 2005)
Ademais, o próprio fato de ela ter morado tantos anos fora pode contribuir para que ela nutra
essa perspectiva, já que ela afirma o seguinte:
[Excerto 64]
Marília: E que quando você aprende uma SEGUNDA língua, você cria um outro slot. (+) No
comunicar, quando você começa a aprender uma segunda língua, você comunica com a sua primeira,
você faz essa comunicação. Então é importante você ter essa / mas se você ficar o tempo todo
recorrendo a um e outro, fica doido. Pô, onde é que vai acontecer, ou quando que vai acontecer, a
automatização? Quando que você vai con- quando que eu falante de ngua inglesa vou automatizar
(+) o meu conhecimento se eu o tempo todo recorrendo ao meu conhecimento em português / as
TRANSFERÊNCIAS, elas vão acontecer naturalmente. E elas de acontecem de um lado pro outro
não. Elas acontecem do outro lado pra também. Porque, eu depois de ter ficado tanto anos na
Inglaterra ACOSTUMANDO, , a conviver com uma cultura / naturalmente o meu sistema, o
sistema que eu automatizava mais era o inglês!
133
P: Mhm.
Marília: Então, quando eu vim pra cá, e comecei a automatizar em português, novamente, virava e
mexia eu ainda vinha com alguma coisa do tipo (+) É, “eu posso ter um copo d’água, por favor?”
No trecho acima, Marília como uma vantagem o fato de ter morado fora e, por
isso, ter conseguido “automatizar o uso de língua inglesa. Fica claro que para ela esta
experiência de “automatização” evite que ela fique recorrendo à ngua portuguesa. Todavia,
se seus relatos forem analisados sob uma outra perspectiva, ela também diz que, pelo fato de
ter morado muito tempo fora e por isso ter “automatizadoa língua inglesa, ela recorre à L2
para falar português e diz coisas como “posso ter um copo de água” porque está acostumada
com a segunda língua. Ora, se ela concede a si mesma a possibilidade de dizer “posso ter um
copo com água” pelo fato de ter em mente sua L2, a situação abaixo não deveria ter lhe
causado estranheza:
[Excerto 65]
Marília: E nessa prova, que eu dei na Instituição Omega, por exemplo, eles (+) eu deixei eles usarem
o dicionário. Eles insistiram e eu deixei eles usarem o dicionário. E muitos acharam no dicionário
spooked” relacionado a (+) fantasma. Porque não acha spooked”, acha spook. acharam
fantasma, assustado (+) Aliás, assustado seria (+) uma das possibilidades, mas (+) eles achavam (+)
uns dois acharam fantasma, ou mais. Mas o pior de tudo é que como nessa turma era uma turma de
informática, eles conhecem a palavra “bits” com um conceito de “bits” que é (+) o(+)
P: Técnico, né?
Marília: Que é o (+) conceito de dígito, né? Dígito binário. ((A fita acaba. Pausa para a troca))
Marília: “I’m a bit spooked”, eles traduziram assim, é (+) alguns, né?
P: Mhm.
Marília: Teve um em especial que disse assim: “Eu”(+) é (+) “Eu agora sou um bit de fantasma.” Um
bit de fantasma!
P: Ah!
Marília: Mhm. Então, eu acho que alguém colocar uma coisa que não tem sentido (+) “Eu sou um bit
de fantasma”, eu fico (+) eu me (+) eu, se fosse enveredar por esse caminho do Inglês Instrumental,
eu iria trabalhar com essas (+) esses níveis de respostas que eles dão pra tentar entender o quê que
vai (+) o quê que passa (+) qual mecanismo tá funcionando na cabeça do sujeito ali, entendeu?
Ela deveria perceber que a LM de aprendizes está muito mais “automatizada” para
eles do que a L2 para ela, afinal o português é a única língua que eles conhecem em
profundidade até então. De qualquer modo, é também interessante notar nesse mesmo excerto
que a professora percebe que um “elo perdido”, algo que ela ainda não consegue
compreender, quando revela: “...se fosse enveredar por esse caminho do Inglês Instrumental,
eu iria trabalhar com essas (+) esses níveis de respostas que eles dão pra tentar entender o q
que vai (+) o quê que passa (+) qual mecanismo funcionando na cabeça do sujeito ali...”.
134
Talvez a resposta para este seu questionamento esteja em ligar sua própria experiência à dos
aprendizes.
Há ainda uma outra questão digna de ser levantada com relação às crenças de Marília
sobre a natureza da tradução. No excerto 61 que tenta estimular os aprendizes a entenderem o
texto sem recorrer à LM. Contudo, amparada na discussão da seção 2.1.6., creio que é difícil
para eles poderem compreender o texto somente na LE se ela mesma reconheceu que eles não
estão abaixo do nível (intermediário) dos aprendizes da Instituição Omega, e por isso não têm
conhecimento lingüístico para ao menos tentarem “não usar a língua materna deles”. Os
próprios aprendizes da Instituição Omega recorrem à língua materna.
4.3.2.2. O papel da tradução
Embora Marília tenha deixado claro que o objetivo de seu curso não é traduzir, ela
na tradução algumas vantagens. A primeira é a de dar mais confiança aos aprendizes, o
que já foi tratado aqui e é enfatizado pela seguinte fala da informante:
[Excerto 66]
Marília: [[Exatamente]]. Justamente porque baixa o nível de ansiedade e (+) e(+) a eles uma
sensação de mais auto-confiança. Simplesmente por isso que eu utilizando esses recursos. Porque
eu (+) confesso a você que no começo, eu (+) queria insistir com ele nisso, de eles irem (+) é (+)
desenvolver a habilidade de (+) acompanhar a idéia pinçando o tema. Eu dizia: “Gente, s sabem
isso aqui. (*****). Cês têm que antecipar o que o cara vai falar através dessas idéias aqui.” Eu não
deixei isso de mão. Eu continuo usando, mas eu agora (+) concedo (+) na coisa do traduzir.
“Então, mas o quê que ele falando aqui efetivamente. Vamo pegar.” Aí, que eu exploro a
estrutura. Então, eu procuro trazer consciência das estruturas lingüísticas que tem ali que não são
iguais as nossas. Então não adianta você querer saber palavra por palavra. Você (+) agora, interessa
muito saber isso, que, como é que você vai conseguir botar isso no português. Por exemplo, John is
supposed to come earlier. Né? Como é que vai traduzir isso? vai dizer “João era suposto de
vim mais cedo”? Isso faz sentido na nossa língua? Então, porque eles começam (+) Quando eu peço
pra eles dizerem (+) alguma coisa, responderem alguma coisa que tá no texto, eles vão lá e traduzem,
e põe coisas que não têm o menor sentido. Então, a minha batalha agora com eles é esse desafio de
(+) dar a eles a compreensão através do que eles chamam de tradução, (+)
P: Mhm.
Marília: Mas reforçar essa (+) esse trabalho com (+) o (+) o (+) perseguir das idéias. Eles
trabalharem o aparelho (+) cognitivo, mesmo, entendeu?
P: Mhm.
Um outro papel atribuído à tradução, semelhante ao que pensa Ribeiro (2003), é o de
contraste entre a língua materna e a estrangeira para que os aprendizes entendam que as duas
línguas em questão têm naturezas distintas:
[Excerto 67]
Marília: É. (+) Então, esse é o recorte que eu acho que é importante na tradução. A tradução, na sala
de aula de ensino dengua, eu acho que ela é importante, principalmente pra você contrastar. Então
135
eu começo às vezes num básico, um curso de básico, (+) eu digo assim “Quantos anos você tem?”
pra pessoa, em português.
P: Mhm.
Marília: ela me diz “Ah, eu tenho vinte.” (+) eu digo “Como é que a gente faz isso em inglês?
Vamo ver? alguém alguém sabe? Porque sempre tem alguma informação periférica, alguém
sabe alguma coisa. Então eu sei que a gente chega no “How old are you?” Aí eu começo, digo “Olha,
vamo explorar agora esse universo”. Aí eu exploro cada palavra que tem ali.
P: Mhm.
Marília: E ponho “Quantos anos você tem?” / Então, A tradução dessa frase aqui é essa. Mas
vamos raciocinar o seguinte, tem alguma coisa a ver com nós? Vamo raciocinar em termos verbais.
Qual o verbo? O verbo é o ‘ter’. Aqui é o verbo ‘ser’.” Né, quantos anos você / em inglês, o enfoque
tá (+) no ser velho. “O quê que isso mostra a vocês? (+) Que as culturas diferentes vêem o mundo de
uma forma diferente e EXPRESSAM de forma diferente. / Então eu acho que a pertinência no curso
de língua, a pertinência da tradução, ela É importante, sobretudo pra você começar a mostrar que o
pensamento é diferente.
4.3.2.3. Tradução e Uso da LM dos Aprendizes
Marília considera que todo curso de IIELA dever ser dado na LM dos aprendizes a
qual ela não confunde com tradução para que aqueles que têm um nível de conhecimento
lingüístico mais básico não sejam injustiçados. Evidência disso é o excerto a seguir:
[Excerto 68]
P: Quê que você acha de dar aula assim, em português, e tudo?
Marília: Todo curso de Inglês Instrumental parte da premissa que você tem que dar a aula em
português, porque é uma questão de (+) digamos assim, de justiça, com as diferenças de um nível de
conhecimento da língua na (+) é (+) no curso.
P: É (+) é (+) heterogeneidade?
Marília: É, exatamente. Então vai ter pessoas, exatamente! Com um nível muito sico, pessoas
com um nível intermediário,(+)
P: Mhm.
Marília: Entendeu? Então essa falta de homogeneidade, de vel, de conhecimento, ela também
afasta você desse processo comunicativo, né?
P: Mhm.
Marília: Da (+) da (+) desculpa! De você usar o veículo instrucional, que o que me
questionando é o veículo instrucional. O veículo instrucional(+)
P: Isso.
Marília: Ser em inglês. Quando o veículo instrucional é(+) é em inglês, eu acho, ele teria, o nível da
turma tinha que ser bem avançado.
4.3.2.4. Tradução e autonomia
Ao investigar as experiências de Marília como aprendiz de língua inglesa, percebe-se
que ela tinha bastante motivação interior para aprender o idioma. Ademais, sempre teve uma
atitude de autonomia perante o aprendizado. Alguns excertos das notas de campo evidenciam
que Marília procura também desenvolver nos aprendizes a autonomia no aprender, como se
pode notar logo abaixo:
136
[Excerto 69]
Marília inicia a aula dizendo que vai comentar os resultados da prova feita em aulas anteriores.
Coloca uma estatística no quadro, de acordo com a qual 32% dos alunos não atingiu a média. Então,
ela distribui as provas aos alunos e propõe refazer todas as questões com eles. Começa a correção
solicitando aos aprendizes as respostas. Um aprendiz, em dúvida a respeito de uma questão, pede a
Marília que traduza uma das alternativas de marcação. Ela replica pedindo a ele que tente traduzir.
Ele traduz a sentença como se “only significasse “todos”. Marília, então, esclarece que onlyé o
mesmo que “apenas”, e por isso ele errou a questão. Um outro aprendiz pergunta se uma outra
possibilidade está correta. Ela pergunta a ele se faz sentido. Ele responde que sim, então ela diz que
está certo.
Marília continua a correção, sempre pedindo a voluntários que leiam sentenças em inglês e
corrigindo sua pronúncia. De vez em quando Marília usa frases/expressões em inglês para se
comunicar com a turma. Por exemplo, “Would you like to do letter ‘f’?”. Ela anda pela sala sanando
dúvidas e prosseguindo com a correção, lendo sentenças em inglês e confirmando respostas.
Contudo, essa autonomia está dissociada da tradução e isso é notável no excerto 61
Ou seja, o compreender – que torna o aprendiz autônomo no sentido de poder dialogar com o
texto por si - está desvinculado do traduzir, o que diverge de Lavault (1998), Travaglia
(2003) e Ridd (2000 e 2003).
4.3.2.4. A tradão no material didático
O material didático utilizado por Marília não faz uso ou menção direta de tradução.
Ele é composto basicamente de textos e exercícios retirados de livros didáticos de inglês para
informática, que em inglês. No segundo dia de aula observada, por exemplo a professora
trabalhou o texto Computer capabilities and limitations” e respectivos exercícios, como por
exemplo: 1) Main idea (exemplo: “Which statement best expresses the main idea of the text?
Why did you eliminate the other choice?”, seguido de três alternativas em inglês); 2)
Understanding the passage (exemplo: Decide whether the following statements are true or
false by referring to the information in the text. Then make the necessary changes so that the
false statements become true.” , seguido de sentenças em ingles), e assim por diante. As
anotações de campo feitas durante esta aula mostram que o uso de tradução durante a
realização e correção dos exercícios em sala é esporádico:
[Excerto 70]
Marília começa a aula promovendo uma breve discussão sobre leitura crítica, discurso e
manipulação. Ainda que indiretamente, fala também de imperialismo lingüístico. Faz, então,
referência ao texto Computer capabilities and limitations”. Ela pede a um aprendiz que leia o
primeiro parágrafo em inglês. Pede também aos aprendizes que façam esta primeira leitura do texto
sem usar dicionários, mas procurando encontrar a idéia principal. Faz, em seguida, perguntas sobre o
texto em português. Fala um pouco a respeito da voz passiva e exemplos, em português, de voz
137
ativa (“O computador precisa dirigir e controlar.”) e passiva (“O computador precisa ser dirigido e
controlado.”) e também em inglês (“The man was killed by a snake.”).
Marília também traduz várias expressões do texto e fala sobre a estrutura de textos acadêmicos.
Afirma que, em geral, a idéia principal vem no primeiro parágrafo. Em seguida, 5’ para que os
aprendizes leiam o primeiro parágrafo e respondam a primeira questão. É interessante ressaltar que
todos os exercícios estão em inglês. Após a maioria dos aprendizes ter concluído esta atividade,
Marília corrige o exercício 1, explica o significado de usefulnessfazendo um paralelo entre use,
useful eusefulnesse traduzindo estas palavras, além de fazer alguns comentários, em português,
a respeito de algumas idéias do primeiro parágrafo. Logo depois, lê o final do texto. Há um intervalo.
Ao retornar, Marília faz a chamada e à turma mais tempo para concluir o exercício 2 do texto
Computer capabilities and limitations”. Ela anda pela sala checando se os aprendizes têm dúvidas e
encorajando aqueles que estão dispersos a se concentrarem no texto. Ela conversa com cada dupla a
respeito do exercício. Finalmente, corrige o exercício 2 e encerra a aula.
4.3.3. Crenças e experiências
O quadro abaixo sintetiza as crenças de Marília a respeito de tradução e suas possíveis
relações com as experiências da informante enquanto aprendiz e também enquanto
professora:
138
Crenças sobre tradução Possível relação com as experiências
Traduzir o implica necessariamente em
entender.
A tradução está no nível das palavras
enquanto a interpretação de texto está no
nível das idéias.
Talvez isso se relacione ao desapontamento que teve com um curso de inglês em que
trabalhou, onde se utilizava a tradução descontextualizada sem preocupação com o
porquê de seu uso.
Traduzir mais confiança para os
aprendizes.
Tal percepção pode advir da experiência da professora com a própria turma observada
e da constatação deste fato.
Traduzir é só para profissionais. Esta crença pode estar ligada ao fato de Marília nunca ter tido nenhum preparo
específico para lidar com tradução.
Os aprendizes podem compreender as idéias
de um texto usando outras estratégias sem
ter, necessariamente, que passá-lo para sua
língua materna.
A fonte desta afirmação pode ser a experiência da informante de viver no exterior e
como ela mesma diz – “automatizar” o uso do inglês.
É benéfica no sentido de possibilitar a
comparação entre as duas línguas (LM e LE)
Pode ser resultante de suas experimentações em sala de aula (como notei em suas
explicações gramaticais nas observações de aula) e conseqüência de suas leituras e/ou
conversas com colegas e outros profissionais de ensino a respeito de tradução
contrastiva (ex: Vinay e Darbelnet, apud Alves (2003), Cervo (2005) e, em nível
nacional, Ribeiro (2003))
Quadro 11: Possíveis relações entre as crenças de Marília sobre tradução e suas experiências
4.4. Contrastes e comparações
Em se tratando da experiência das participantes como aprendizes de LE, a motivação
de Jaqueline para aprender LE foi, a priori, exterior. Já a de Rose e Marília, intrínseca, sendo
que Marília também tinha a motivação integrativa e sonhava em se comunicar em inglês.
Percebi que as três profissionais projetam para as expectativas que nutrem quanto ao
desempenho da turma parte de suas próprias motivações como aprendizes. Isso acontece, por
exemplo, quando Jaqueline afirma que o inglês é importante para os aprendizes porque o
precisar dele no mercado de trabalho, quando Rose revela que prefere trabalhar com
aprendizes que estão convencidos do porquê de estudarem inglês e quando Marília tenta
convencer os aprendizes que é melhor tentar pensar na LE. Isso mostra que as crenças dos
professores podem, de fato, afetar o ambiente da sala de aula, especialmente as crenças dos
aprendizes.
Utilizando a terminologia de Almeida Filho (2002 e 2006, pp. 103-105), Rose e
Marília têm maior competência teórica que Jaqueline, embora esta informante tenha
demonstrado bastante interesse em desenvolver mais esta competência. As três participantes
têm um bom nível de competência profissional, na medida em que se preocupam com a
maneira como os aprendizes se sentem na aula, o futuro deles, suas necessidades extraclasse
de uso da língua, a efetividade de suas abordagens e aulas, e têm disposição de refletir em sua
prática e de se aprimorarem. Além disso, todas também demonstraram ter um excelente nível
de competência lingüística. Ainda, as três recorrem com bastante freqüência à sua
competência aplicada, pois explicam, ou tentam explicar, o porq de seus atos em sala de
aula e, com isso, esclarecem muitas de suas “teorias pessoais” (termo usado por Pessoa;
Sebba, 2006) ou “experiência com aquilo que funciona melhor” (termo usado por Richards;
Lockhart, 1996), mas nem sempre se fundamentam em teorizações de autores e
pesquisadores para isso.
Pelo fato de Jaqueline estar em começo de carreira, em fase de desenvolvimento ou
aprimoramento de seus próprios paradigmas, recorre com maior freqüência à sua
competência implícita, o que é bastante natural, como preGimenez (2004) ao afirmar que
o professor que ainda tem pouca vivência em sala de aula recorre mais à sua experiência
enquanto aprendiz que à sua experiência profissional. Por esta razão, seus conceitos são mais
reducionistas que os das outras participantes. Contudo, essa atitude não é exclusividade sua,
pois ao mesmo tempo em que Rose trata o Inglês Instrumental como algo mais simples, e
aborda a tradução com mais intensidade e profundidade, Marília faz exatamente o oposto. A
questão é que, ao passo que Rose tem mais leituras e experiência prática, ou seja,
competência teórico-aplicada, em tradução, Marília o tem com Inglês Instrumental. Assim,
por exemplo, enquanto Jaqueline considera a tradução e a abordagem de Inglês Instrumental
dos livros didáticos que consulta igualmente bem-vindas (isto é, não tem dificuldades em
lidar com o diferente, é mais flexível), Rose tem suas reservas quanto às abordagens mais
corriqueiras de ensino de leitura instrumental quando considera monótono trabalhar apenas
com interpretação de texto. Marília, por sua vez, vê a tradução como uma atividade exclusiva
para especialistas que, na sala de aula, constitui, em geral, uma barreira para a compreensão.
O mais curioso é que Rose crê que interpretar o texto o gera autonomia é preciso
traduzir. para Marília, traduzir não gera autonomia é preciso interpretar. Não poderia
haver demonstração mais oportuna da relação entre a experiência (ou falta dela) e as crenças
das profissionais da educação, em consonância com o que afirmam Dewey, Barcelos,
Gimenez, Abrahão e tantos outros citados aqui. Toda essa discussão me leva a imaginar de
que riqueza seria a união dos pontos de vista das três informantes em uma proposta mais ou
menos semelhante àquela de Lavault (1998). Por isso a importância do intercâmbio de idéias
entre os professores, como reconheciam os idealizadores da implantação do Inglês
Instrumental com enfoque em leitura acadêmica no Brasil (Celani et. al., 2005).
Talvez paire sobre Marília as influências do estruturalismo e do behaviorismo, unidos
por áudio-lingualistas, em reação de protesto ao MGT, conforme explicam Hutchinson e
Waters, 1987; Brown, 2001; Cervo, 2003 e Celani, 2005, Kumaravadivelu, 2005 e Ramos,
2005, enquanto que as vozes que ecoam em torno de Rose podem ser de teóricos da tradução
que têm perspectivas semelhantes às de Lavault; 1998; Travaglia, 2003; Alves, 2003; Pagano,
2003a e Hurtado-Albir, 2005. Ainda Jaqueline parece dar ouvidos mais diretamente a alguns
princípios da Abordagem Comunicativa (Almeida Filho, 2002) e principalmente às
particularidades de sua experiência prévia de estudante de inglês.
A partir dessas suposições, atribuo a aspectos experienciais os fatos a seguir.
Jaqueline não está exatamente definida quanto a se a tradução ocorre em nível lexical
ou no vel da completude do texto, de uma maneira contextualizada. Marília opta
claramente pela primeira opção, enquanto que Rose, pela segunda.
141
Ao separar leitura de tradução, no caso da leitura, Marília foge do processamento
bottom-up ou ascendente explicado por Dubin e Bycina (1991), Hood, Solomon e Burns
(1996), Leffa (1996) e outros e, no caso da tradução, vai de encontro a ele quando a reduz
àquilo que teóricos como Catford (1980) chamam de “equivalência formal”.
Jaqueline e Marília vêem a tradução como adequada para aprendizes iniciantes,
enquanto que Rose a considera mais apropriada para aprendizes em nível mais avançado.
Quando a tradução é vista como algo que deve desaparecer gradativamente nos cursos de I.I.
– fenômeno equivalente ao que ocorre com o uso de LM nos cursos de inglês em geral, como
explicam Deller e Rinvolucri (2002) pode estar sendo vista, necessariamente, como algo
negativo. Em outras palavras, deve-se a alguma limitação do aprendiz e vai sendo eliminada
à medida que este se torna mais proficiente na LE. Neste caso, não é percebida como uma
habilidade em aperfeiçoamento, mas um “mal necessário”.
Jaqueline e Rose - que fizeram cursos de Tradução estimulam os aprendizes a
usarem o dicionário, enquanto Marília, não.
Em alguns momentos, Jaqueline e Marília entram em contradição ao abordar a
tradução, pois estão sob a influência de um “babel de vozes”
72
que “falam mais ou menos na
mesma altura”. Rose “escuta” muito mais sua experiência como tradutora e professora de
teoria e prática para futuros tradutores profissionais ao longo de mais de dez anos.
As três informantes criticam a falta de homogeneidade lingüística nas turmas de
Sistemas de Informação, em que a maioria dos aprendizes tem níveis baixos de proficiência,
e vêem no uso de LM um meio de tentar equalizar o nível dos estudantes. Isso corrobora os
argumentos de Medgyes (1994), Lavault (1998), Canagarajah (1999), Deller e Rinvolucri
(2002), Butzkamm (2003), Janulevičienė e Kavaliauskienė (2004) e outros, quanto ao uso da
LM no ensino de LE em geral e o posicionamento de Hutchinson e Waters (1987), Dudley-
Evans e St. John (1998) e Celani et al. (2005) a respeito do uso da LM em cursos de leitura
instrumental como LE.
Jaqueline utiliza material didático que contém textos em inglês e exercícios em
português. todo o material utilizado por Marília é em inglês (embora os estudantes
respondam questões mais complexas em português). O material de Rose é misto, mesmo
porque muito do material é produzido pelos próprios aprendizes, como testes sobre
determinados textos para que os colegas respondam, glossários bilíngües de terminologia
encontrada nos textos e slides com resumo, em português, de textos em inglês para
72
Referência ao título deste trabalho, que será melhor explicado no capítulo de conclusão.
142
apresentação aos colegas. Se no I.I. o material didático dever ser selecionado, avaliado e/ou
produzido a partir de uma análise das necessidades dos aprendizes conforme Hutchinson e
Waters (1987), Dudley-Evans e St. John (1998); Scott (2005e) e Deyes (2005a) , e se as três
professoras têm consciência disso, então cada uma tem uma percepção diferente do que
sejam as necessidades de seu grupo e isso mostra que as crenças das professoras influenciam
na análise que fazem das necessidades dos estudantes.
A razão de Rose e Jaqueline atestarem progresso de aprendizes no curso, enquanto
Marília não o faz, pode estar ligado ao fato de as duas primeiras acreditarem mais na tradução
e a reconhecerem, de algum modo, como fundamental no curso de IIELA. Se as crenças dos
professores influenciam todo o ambiente da sala de aula, em especial as crenças do aprendiz
(Richards; Lockhart, 1996; Barcelos, 2003ab e Kudiess, 2005), então, a concepção que um
professor tem da tradução influencia direta e imediatamente a atitude dos aprendizes com
relação a ela (Ridd, 2000). Assim a reação das três à tendência dos aprendizes de traduzir um
texto palavra por palavra é diferente. Jaqueline, ao mesmo tempo em que reforça essa
tendência, acredita que compreender as idéias principais do texto é também tradução. Rose
faz da tradução o centro de seu curso e nos estudantes tomada de consciência e mudança
de atitude. Marília reforça a idéia de que tradução é para profissionais e tenta negociar
com os aprendizes a possibilidade de não fazê-la. Assim, se fosse traçado um continuum, de
um lado estaria Rose, por acreditar que a tradução é útil para os aprendizes de Sistemas, com
aplicabilidade para a vida real. No meio, Jaqueline, que encara a tradução como atividade de
sala de aula para compreender textos. No outro extremo, Marília, que admite usar a
tradução por causa das pressões do grupo e como forma de contraste das duas línguas (LM e
LE). A literatura de IIELA parece estar mais próxima da postura de Jaqueline e mais ainda da
de Marília, pois aparentemente não se reconhece que muito do que se faz em II é também
tradução.
Ainda com relação à experiência, Rose tem bastante consciência da influência de sua
história de vida em sua prática. Jaqueline, por sua vez, afirma que suas experiências não têm
influência sobre sua prática, enquanto Marília parece estar em um meio termo.
no que tange ao Inglês Instrumental, nenhuma das profissionais teve a
oportunidade de desenvolver sua competência teórica na área antes de começar a dar aulas.
Ademais, mesmo fazendo um esforço para pesquisar a respeito, nem sempre conseguiram um
suporte teórico sólido para fundamentar sua prática, mas quase que apenas materiais didáticos
143
desenvolvidos na área e consultas a colegas. Isso mostra que aquilo que Hutchinson e Waters
constataram em 1987 continua valendo: todos os professores de ESP são, de certo modo,
pioneiros, pois, vindos de uma tradição de ensino de inglês regular, não foram preparados
para lidar com as peculiaridades do ensino de inglês para fins específicos. As professoras que
participaram deste estudo não tiveram o privilégio, ao menos não na mesma intensidade, que
os professores que participaram do Projeto de Inglês Instrumental, de trocar idéias e de expor
suas dificuldades e crenças diante de outros profissionais da mesma área (Celani, 2005).
Mesmo assim, cumprem o papel próprio do professor de Instrumental, de pesquisador, autor
do próprio curso, avaliador de material didático, colaborador e cooperador (Hutchinson;
Waters, 1987; Dudley-Evans e St. John, 1998; Celani, 2005; Ramos, 2005).
CAPÍTULO 5 – CONSIDERÕES FINAIS
“Pensar no amanhã é fazer profecia, mas o
profeta (...) é o que, fundado no que vive, no que
vê, no que escuta, no que percebe (...) fala, quase
adivinhando, na verdade, intuindo, do que pode
ocorrer nesta ou naquela dimensão da
experiência histórico-social..”
Paulo Freire
73
73
Citação atribuída à obra: FREIRE, P. Pedagogia da indignação: cartas pedagógicas e outros escritos. São
Paulo: UNESP, 2000. A citação está disponível em: http://www.consciencia.net/citacoes/ef/freire.html; acesso
em 03 out 2006.
144
5.1. Conclusões
Em resposta à primeira pergunta desta pesquisa (“Quais as crenças de três professoras
de Inglês Instrumental a respeito de Tradução?”) as crenças das três informantes a respeito da
tradução no ensino de Inglês Instrumental com enfoque em leitura acadêmica podem ser
condensadas no seguinte: a tradução a) é sinônimo de uso oral da LM, em sala de aula, por
professores e aprendizes; b) é atividade escrita que se desenvolve por meio de uso de
dicionário e posterior discussão entre professor e aprendizes quanto a escolhas vocabulares;
c) um mecanismo de esclarecimento de dúvidas sobre vocabulário e gramática, mas também
mecanismo de compreensão textual; d) é aplicável especificamente a palavras, expressões
e/ou frases; deve ser fornecida pelo professor; e) é ideal para ser usada em ambientes de
ensino de inglês com fins específicos; f) é ideal para aprendizes que têm dificuldades com a
língua estrangeira ou que estão em nível inicial de aprendizagem; g) é um diálogo com o
texto e com o outro; h) é fundamental no ensino de línguas estrangeiras porque leva o
aprendiz a se aprofundar na língua, a pesquisar, a pensar, raciocinar; i) não é ideal para os
níveis básicos de ensino/aprendizagem de LE; j) é uma maneira de levar o aprendiz de Inglês
Instrumental a desenvolver autonomia; l) precisa ser desafiadora para o aprendiz; m) evita
que a aula se torne monótona; encontra o ambiente ideal no curso de Inglês Instrumental
(com enfoque em leitura acadêmica); n) precisa ser feita com certa velocidade, assim o
dicionário tem uma função limitada; o) pode também ser feita oralmente; p) faz parte da vida
real do aprendiz; q) não implica necessariamente em compreensão; r) está no nível das
palavras enquanto a interpretação está no nível das idéias; s) mais confiança aos
aprendizes; e t) é só para profissionais.
Em suma, as crenças de Jaqueline convergem para uma visão de tradução atrelada
tanto às palavras, quando às idéias. É um paradigma intermediário, que soma perspectivas
como as dos teóricos da leitura explicados por Dubyn e Bycina (1991); Hood, Solomon e
Burns, (1996); Leffa (1996); Scaramucci (1997); Leffa (1999); Silva (2002); Coracini (2002);
Grigoletto (2002); Oliveira (2003b), às linhas teóricas de tradução mais tradicionais
(Catford,,1980), bem como as mais inovadoras (Lavault, 1998; Travaglia, 2003; Alves,
2003; Pagano, 2003a; Hurtado-Albir, 2005). Rose, por sua vez, percebe a tradução mais
atrelada às idéias que às palavras mais relacionada a teorias da tradução mais
contemporâneas. Marília na tradução uma barreira para a compreensão das idéias
145
perspectiva voltada para o áudiolingualismo (relação explicada por Hutchinson e Waters,
1987; Cervo, 2003; Celani, 2005; Ramos, 2005).
Em resposta à segunda pergunta (“Quais as possíveis relações entre essas crenças e as
experiências de aprendizagem e/ou ensino vivenciadas por estas professoras?”), em
consonância com Dewey (1933); Phillipson (1993); Richards e Lockhart (1996); Medgyes
(1994); Moita Lopes (1996); Canagarajah (1999); Barcelos (2003b); Kudiess (2005); Leffa
(2005); Silva (2006); Garbuio (2006), constatei que as crenças das três profissionais do
ensino partem das seguintes fontes, ou o que eu chamaria de “vozes babélicas” às quais me
refiro no título do trabalho: experiência como aprendiz; experiência pessoal; experiência na
formação profissional; as crenças de seus professores; experiência como professor; colegas
de trabalho e de profissão; material didático; pesquisa; literatura em LA; instituições de
ensino; crenças dos aprendizes; ideologias imperialistas, ou colonizadoras; contexto histórico
brasileiro de colonização; o status do inglês na sociedade brasileira.
O que tornou tão oportuno para mim aliar o estudo de crenças à Tradução e ao
Instrumental é que esses três ramos da LA são desafiadores e propõem, de certa forma, uma
revolução no ensino de línguas por estimularem a reflexão, o ouvir das muitas vozes, a
construção coletiva do conhecimento, o pensar crítico. Para mim, tornou-se muito natural
afirmar que crer é traduzir, ler a realidade, é interpretar as tantas vozes, advindas de tantas
“linguagens” e “culturas” conflitantes e que ecoam na cabeça e na voz do professor.
Acredito que o presente trabalho pode servir de ponto de partida para reflexão de
professores que não tiveram, em sua formação, a oportunidade de expor suas crenças,
investigar suas origens e resignificá-las, como sugerem Gimenez (1994), Cabaroglu e Roberts
(2000), Abrahão (2004) e Gimenez (2004). Mesmo tendo consciência de que a mudança de
crenças é lenta e gradual (Barcelos, 2006; Pessoa e Sebba, 2006), creio que pode ocorrer.
5.2. Dificuldades
A primeira das dificuldades encontradas na coleta de dados relaciona-se à quantidade
de observações para cada informante. Tinha como intuito fazer uma quantidade maior e
uniforme de observações dos participantes. Limitações de tempo e dificuldades da
agendamento impediram-me de fazê-lo. Outra limitação foi a questão da neutralidade no
comportamento dos informantes idealizada por mim no início das observações. Lüdke e
André, 1986, p. 17, alertam que o observador, desde os primeiros contatos com os
146
participantes, deve procurar “não ser identificado com nenhum grupo particular”, pois isso é
fundamental “para que ele consiga obter as informações desejadas”. Como se nota nas
gravações, por mais que eu tentasse permanecer neutra durante a observação das aulas, os
professores – e eventualmente os aprendizesse reportavam a mim, ora para fazer perguntas,
ora para dar algum tipo de esclarecimento quanto ao andamento da aula (neste caso, os
professores). Mesmo porque, para que as professoras me concedessem a oportunidade de
observá-las, precisei identificar-me como pesquisadora desde a primeira conversa e,
fatalmente, fui questionada a respeito da pesquisa. Fez-se necessário fornecer às informantes
uma idéia, ainda que vaga, a respeito da razão de eu estar ali.
Em se tratando das entrevistas, tive dificuldades em conseguir que Jaqueline fosse
mais detalhista em seus relatos. Gaskell (2002, p. 74), ao tratar da entrevista semi-
estruturada, adverte que, por ser o tópico uma escolha do entrevistador, o entrevistado pode
não se sentir preparado para tratar do assunto e se sentir um pouco constrangido, hesitante ou
defensivo, especialmente se o entrevistador o deixar o entrevistado à vontade. Assim, é
possível que minhas dificuldades com Jaqueline se devam ao fato de ter sido a primeira
pessoa a quem entrevistei, e por isso faltou-me habilidade para estabelecer rapport. Acredito
que o uso do gravador interferiu, pois quando foi realizada a segunda entrevista, eu havia
terminado as observações e tido diversas conversas informais e mais reveladoras com a
professora. Nestas conversas, ela parecia muito mais à vontade que diante do gravador,
embora a segunda entrevista não tenha sido suficiente para fazê-la se expressar tão
confiantemente com o fizeram Rose e Marília. Em contrapartida, também que se
considerar o que esclarem Jovchelovitch e Bauer (2002, p. 95):
O contador de histórias narra aqueles aspectos do acontecimento que são relevantes, de acordo com
sua perspectiva de mundo. A explicação dos acontecimentos é necessariamente seletiva. Ela se
desdobra ao redor de centros temáticos que refletem o que o narrador considera importante. Estes
temas representam sua estrutura de relevância.
Por este motivo, uma outra justificativa para o comportamento de Jaqueline pode ser
o fato de ela não ter considerado relevante fornecer maiores esclarecimentos a respeito dos
tópicos abordados e nem sobre sua história de vida. De qualquer forma, mesmo diante destes
aspectos, acredito que as entrevistas com ela foram extremamente válidas. Prova disso é o
que ocorreu quando lhe questionei a respeito do porquê de ela traduzir o texto todo oralmente
enquanto os aprendizes tão somente ouviam a tradução e acompanhavam a leitura em seu
147
texto em língua inglesa. As a pergunta, ela pediu que eu interrompesse a gravação para que
pudesse pensar um pouco e concluiu que aquela pergunta a havia feito mudar de postura. Em
outras palavras, a entrevista, no mínimo, serviu de convite à reflexão para a entrevistada. Este
acontecimento corrobora o pensamento de Gaskell (2002, p. 75): “Detalhes e interpretações
falados podem até mesmo surpreender o próprio entrevistado. Talvez seja apenas falando que
s podemos saber o que pensamos.”
5.3. Limitações e encaminhamentos
Esta pesquisa limitou-se a investigar crenças de professores e suas possíveis relações
com as experiências destes. A título de delimitação do estudo, precisei suprimir dados e
discussões a respeito de crenças das professoras sobre Inglês Instrumental para evitar que o
trabalho ficasse demasiadamente longo. Ademais, havia mais um informante, porém decidi
não levar a cabo a apresentação e discussão de suas crenças pelo fato de ter obtido dados
bastante ricos das outras professoras, por ter sido ele o último informante a integrar a
pesquisa e por sua narrativa ser, em muitos pontos, contraditória.
Sugiro para futuras pesquisas a investigação de crenças de professores sobre Inglês
Instrumental, de aprendizes sobre tradução e também a relação entre as crenças, experiências
e ações, de professores e estudantes em diferentes ambientes, como escolas regulares e de
idiomas, além do ensino de nível superior.
Sugiro também pesquisas colaborativas com professores de Inglês Instrumental a fim
de proporcionar maior diálogo entre estes e a tradução. Além disso, seriam interessantes
pesquisas que envolvessem reflexão teórica e prática com estudantes de Letras a respeito de
Inglês Instrumental, tradução e suas relações. Uma maneira oportuna de fazê-lo seria a
pesquisa através de um curso de extensão que envolvesse esses tópicos e, principalmente,
discussão de crenças.
Quanto à parte teórica, certamente muito mais a ser explorado no que tange ao
entrelaçamento de Tradução e Instrumental. Uma maneira de começar poderia ser a
identificação entre ambos os campos pelo enleio da Análise do Discurso.
Este trabalho também apresenta limitações quanto à revisão teórica na área de
crenças, pois não foram mencionados muitos trabalhos sobre crenças de professores
148
desenvolvidos no exterior. Seria igualmente interessante um estudo comparativo entre as
crenças de professores que atuam no exterior e aqueles que atuam em nível nacional.
5.4. As informantes e eu
Assim como não posso ser a “pesquisadora ideal” no sentido de ser totalmente
neutra e imparcial, procurei não projetar nas informantes a minha concepção de “professoras
ideais” por ter consciência das múltiplas identidades (Woods, 2003; Sakui e Gaies, 2003)
que atuam sobre nós quatro, das muitas vozes que precisamos ouvir e da riqueza do
potencial da diversidade. Lembro que uma das minhas maiores motivações para investigar
crenças foi a constatação de que se não houvessem crenças, não haveria dúvidas e problemas
para fundamentar a investigação reflexiva (Dewey, 1933 e Barcelos, 2003a). Assim, minha
expectativa consciente não era a de ouvir um discurso completamente coerente.
Sakui e Gaies (2003) indicam que a narrativa expõe informantes à vulnerabilidade, já
que leitores diferentes necessariamente interpretam os dados de formas variadas. Além disso,
crenças, valores e limitações dos participantes são expostos sem que seja dado a eles direito à
defesa. , também, pouca probabilidade de ser feito outro estudo que mostre seu
desenvolvimento posterior. Por isso, professores que se submetem a esse tipo de pesquisa
correm riscos e enfrentam desafios. Reitero aquilo que foi dito, também como citação de
Barcelos, no início do capítulo anterior: o objetivo deste trabalho não é, de forma alguma,
fazer meros julgamentos das crenças dos informantes e classificá-las entre “erradas” e
“certas” e tampouco desmerecer o esmero com que desempenham sua profissão e o interesse
genuíno, sincero que demonstraram, cada um a sua maneira, em contribuir para o bom
andamento desta pesquisa. Antes, este trabalho é de intenção dialógica, de convite à reflexão,
convite este feito não só aos professores entrevistados e observados, mas a todos aqueles que
abraçam a árdua tarefa de ensinar línguas e têm ganas de aprimorarem sua prática por
acreditarem terem um papel social determinante para o progresso da nação brasileira. Trata-
se, sobretudo, de um convite a mim, professora e depois, pesquisadora, a rever minha prática
docente, a enxergar-me constantemente nos relatos e no fazer de meus informantes, seja para
reconhecer-me em suas crenças ou idealizar um novo agir a partir daquilo que aprendo com
eles. Este trabalho realmente representa um marco em minha vida, em todas as esferas, e
devo isso a esses corajosos e responsáveis profissionais. Gostaria de concluir referindo-me a
149
Gimenez (2004, p. 175), quando lembra que a profissão de professor não se inicia quando
licenciados ocupam na sala de aula a cadeira de professor pela primeira vez, mas o
aprendizado sobre a carreira docente começa quando as crianças iniciam o contato com os
papéis dos atores da sala de aula e se prolonga pelos cursos de formação, e citando Celani
(2005b, p.400): “A educação de professores é um processo interminável que envolve
crescimento – consequentemente deve ser entendida como um processo dinâmico”. Agradeço
mais uma vez a Jaqueline, Rose e Marília por me fazerem crescer.
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_____. Sistema de bibliotecas. Normas para a apresentação de trabalhos. Curitiba: Ed. da UFPR, 2002b. pt. 6: Referências.
161
_____. Sistema de bibliotecas. Normas para a apresentação de trabalhos. Curitiba: Ed. da UFPR, 2002c. pt. 2: Teses, dissertações,
monografias e trabalhos acadêmicos.
VECHETINI, L.R. Crenças sobre o ensino de vocabulário em língua estrangeira (inglês) para aprendizes iniciantes. Campinas,
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Campinas.
VIAN JUNIOR, O. Inglês instrumental, inglês para negócios e Inglês Instrumental para negócios. D.E.L.T.A., Vol. 15, especial,
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WADT, M. P. S.; PEREIRA, K. M. Uma experiência didática com apresentações pessoais em um curso via Internet. The ESPecialist, v.
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DADOS DA LICENÇA
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On June 18, 2007, Rafaela Bomfim dedicated to the public domain the
work "Babel de vozes: crenças de professores de inglês instrumental sobre tradução." Before making the dedication, Rafaela Bomfim
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