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sistema freudiano postula, então, uma energia própria no sujeito,
uma espécie de pulsão de conservação de si e de sobrevivência
que contrabalança as forças pulsionais primitivas. É no amor-pró-
prio que está à raiz da obrigação moral e, portanto, de educabilidade.
“O recalcamento, como dissemos, provém do eu; podemos pre-
cisar: da estima de si mesmo (selbstachtung) que tem o eu.”
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A interdição exterior, a frustração, corresponde a um meca-
nismo interno que é a condição mesma da educabilidade e faz
com que o homem não seja endireitado mecanicamente, mas seja
educado, quer dizer, capaz de autorregulação.
É, portanto, o eu, com seus instintos de autoconservação e seu
ideal de eu, que entra em conflito com os instintos, cuja energia é
caracterizada pela libido
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e as forças primitivas do “isso”. A educa-
ção não pode controlar o que a natureza tem de perigoso para a
cultura, a não ser sob a condição expressa de que o sujeito encontre
um interesse no sacrifício que esta exige dele. É o eu que vê na sua
sobrevivência e no respeito de si mesmo um contrapeso à frustração.
Ademais, não se trata de um sacrifício absoluto, mas de um des-
locamento. O eu põe em jogo os mecanismos pelos quais a energia
primitiva vai ser desviada, dramatizada, sublimada para encontrar
uma saída na realidade. É, portanto, no interior do sujeito que se acha
o equilíbrio dos instintos primitivos. Enfim, é também no sujeito que
se constituem os mecanismos de defesa pelos quais as pulsões primi-
tivas encontram uma realização parcial ou simbólica na realidade.
Vê-se, então, onde se encontra toda a originalidade e a coerência
do pensamento de Freud sobre a educação em relação à Reich, Neill
ou Marcuse. Em vez de apresentar a educação de maneira maniqueísta,
como o adestramento exterior de uma personalidade conduzida à
obediência, Freud mostra que se a educação é possível é porque existe
no próprio indivíduo, no interior de seu aparelho psíquico, tendências
28
Freud, S. Introdução ao narcisismo, in: A vida sexual, Paris, PUF., 1972, p.92.
29
Freud, S. O mal-estar da civilização, op. cit., p.72.
Sigmund Freud_fev2010.pmd 21/10/2010, 09:4926