
Colonialidade do poder, globalização e democracia
Diplomacia, Estratégia E política – abril/Junho 2007
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já que as estatísticas registram apenas os que procuram emprego, e a
cifra deve ser multiplicada pelo menos por 5, se considerar o número
de famílias, ou lares, que dependeriam desses salários inexistentes.
E a população conjunta de desempregados e sub-empregados é
mais ou menos a metade da população mundial, já que 3 bilhões
de pessoas vivem com menos de 2 dólares diários. Os economistas
cunharam a noção de “desemprego estrutural” para referir-se à
tendência que produz um desemprego mundial crescente. Não são
poucos agora os que propõem a idéia do “m do trabalho” para
explicar as implicações dessa tendência
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.
9. Da mesma forma, e ainda que não estejam sucientemente avançadas
as pesquisas especícas e os dados sejam igualmente provisórios, a
população mundial em situação de escravidão é estimada em mais
de 200 milhões de pessoas
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. Ainda não estão estatisticamente
estabelecidas as informações sobre servidão e sobre reciprocidade.
10.
Todas essas tendências na distribuição de capital, de emprego, de
produção, de renda e de bens e serviços no mundo de hoje estão
vinculadas à mudança nas relações entre as diversas formas de
acumulação capitalista em favor da absoluta hegemonia da acumulação
especulativa. Assim, as transações cambiais mundiais, que eram mais
ou menos de 20 bilhões de dólares em 1970, já representavam 1,3
trilhões em 1999. Somente nos Estados Unidos, em 1980 os “fundos
de pensão”, os “fundos comuns”, as companhias de seguros e os
seguros de vida constituíam ativos nanceiros da ordem de 1,6 trilhões
de dólares, cerca de 60% do PIB do país. Mas em 1990 esses ativo
eram já de 5,2 trilhões de dólares, ou 95% do PIB, e em 1993 mais de
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Por exemplo, Jeremy Rifkin, The End of Work. Nova York, Jeremy Tarcher Inc., 1996. Também Dominique
Meda: Le Travail, une valeur en voie de disparition. Paris: Champs, Flamarion, 1995. A pesquisa sobre tendências nas
relações entre trabalho e capital se refere exclusivamente ao emprego assalariado. Suas descobertas produziram
uma numerosa família de categorias: a “exibilização”, a “precarização”, a “subcontratação”, o regresso do
“putting-out system”, a “informalização”, entre as principais de uma abundante literatura. Sobre a América Latina,
veja-se, por exemplo, de V.E. Tokman e D. Martines, orgs., Flexibilización en el margen: La reforma del contrato de
trabajo. OIT 1999. Também os estudos do Primeiro Encontro Latinoamericano de Estudos do Trabalho. Carlos Santiago,
org. Revista de Administración Pública, Universidad de Porto Rico, 1996.
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Em 1991 a OIT reconhecia a existência de cerca de 6 milhões de pessoas em situação de escravidão no mundo. A
ONU encarregou a uma comissão o estudo desse problema. O relatório da comissão, em 1993, arma que existiriam
200 milhões de escravos na população mundial. Veja-se a entrevista de José de Souza Martins em Estudos Avançados,
Revista do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), 31, 1997. São Paulo, SP, Brasil.
Desde então cresceu a documentação sobre a expansão do tráco de escravos e sua correspondente ética social.
Existe, inclusive, legislação recente que proíbe o trabalho escravo, como por exemplo, no Brasil, desde 2004.